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História da América -

Aspectos Introdutórios
Material Teórico
A Conquista da América

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Ms. Geraldo Barbosa Neto

Revisão Textual:
Prof. Ms. Claudio Brites
A Conquista da América

• Introdução: Conceitos de Conquista


• Hernán Cortez e Francisco Pizarro
• Por que os espanhóis venceram?
• A resistência à conquista

·· Nosso principal objetivo será compreender que o processo histórico de conquista


da América, empreendido pelos espanhóis, a um só tempo, marcou a história
do continente com a ocupação europeia de seu território e desdobrou-se na
destruição da cultura pré-colombiana e no extermínio dos habitantes nativos.

Nesta Unidade, deve ler atentamente o conteúdo. Ele lhe possibilitará reflexões sobre o
processo histórico de conquista da América. Nela, você encontrará interpretações indígenas
e europeias em torno do conceito de conquista. Será apresentado a acontecimentos que
marcaram essa conquista e como as culturas pré-colombianas o compreenderam. Conhecerá
algumas razões que podem explicar a vitória espanhola frente aos mexicas (astecas) e aos incas
e, também, algumas formas de resistência empregadas por mexicas (astecas) e incas contra
a ocupação dos espanhóis. Além disso, encontrará descrições sobre o genocídio indígena
ocasionado durante conquista da América.

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Unidade: A Conquista da América

Contextualização

Para iniciarmos esta unidade, convido você a ler um trecho do poema Os Conquistadores,
de Pablo Neruda. O poeta alude à destruição e ao genocídio que ocorreram na ocupação da
América. Além disso, refere-se a uma das principais justificativas que os espanhóis empregaram
para essa ocupação: a propagação da fé.

Canto Geral - CANTO III


Os Conquistadores
[...]
Chegam pelas ilhas (1493)
Os carniceiros desolaram as ilhas.
Guanahaní foi a primeira
nesta história de martírios.
Os filhos da argila viram partido
seu sorriso, ferida
sua frágil estatura de gamos,
e nem mesmo na morte entendiam.
Foram amarrados e feridos,
foram queimados e abrasados,
foram mordidos e enterrados.
[...]
Só ficavam ossos
rigidamente colocados
em forma de cruz, para maior
glória de Deus e dos homens.

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Introdução: conceitos de conquista

Diálogo com o Autor


[...] vieram os Dzules [os espanhóis] que transtornaram tudo. Eles ensinaram
o terror, eles secaram as flores, sugando até ferir a flor [honra] dos outros para
poderem fazer sobreviver a própria... Não havia entre eles nem grande sabedoria,
nem palavras, nem ensinamentos. Os Dzules não vieram senão para mutilar o
sol! E os filhos de seus filhos permaneceram entre nós, que deles não recebemos
senão amargura. (Chilam Balam de Chumayel apud. GENDROP, 1987, p. 109).

Maias, mexicas (astecas) e incas que sobreviveram ao processo de conquista da América


deixaram algumas crônicas nas quais registraram suas visões sobre esse acontecimento. Para
a cultura maia, a chegada dos dzules, os estrangeiros, marcou o fim de sua tradição, significou
um angustiante abandono de suas cerimônias milenares. Os registros mexicas (astecas)
interpretaram esse acontecimento dentro do quadro de suas profecias, elas anunciavam a
vinda de forasteiros montados em grandes animais, esse evento marcaria o regresso de seus
legendários deuses. Os incas também compreenderam o advento da chegada dos espanhóis
como um sinal do retorno de seus deuses (LEÓN-PORTILLA, 1985). Em resumo, nessas
culturas, o desembarque dos espanhóis e seu empreendimento conquistador foram entendidos
como o princípio de uma tragédia provocada por inimigos estrangeiros.

O sentido de conquista para os espanhóis implicava a ideia de povoar. Essa ideia tinha
suas raízes na Espanha medieval. Ela se contextualizava no processo da guerra de reconquista,
o conflito no qual os reinos cristãos buscavam reconquistar os territórios europeus que há
séculos tinham sido ocupados pelos muçulmanos durante seu empreendimento de expansão.
As batalhas tinham como estratégia principal rápidas invasões, seguidas do assentamento de
habitantes no local e da colonização da região. Nesse sentido, o ato de conquistar ocorria por
meio de campanhas militares bem sucedidas de uma expansão territorial organizada (ELLIOTT,
1990, p. 127). Essa fórmula de conquista ganhou sua maior expressão sob o comando de um
homem que se destacou na conquista da América: Hernán Cortez (1485-1547).

Diálogo com o Autor


Conquistar [...] pode significar colonizar, mas também pode significar invadir,
saquear e avançar. Conquistar no primeiro sentido dá primazia à ocupação e à
exploração da terra. No segundo sentido, se concebe como poder e riqueza [...]
em termos de posse de objetos portáveis, como o ouro [...]. (ELLIOTT, 1990, p.
109, tradução nossa).

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Unidade: A Conquista da América

Hernán Cortez e Francisco Pizarro

Se pudermos mencionar uma data que marcou a conquista da América, será 1519. Nesse
ano, Hernán Cortez (1485-1547), o mais famoso conquistador espanhol, comandou uma
expedição pelo vale do atual México, chegando até Tenochtitlán, centro do império dos mexicas
(astecas), onde aprisionou o imperador mexica Montezuma. Ele estabeleceu alianças com
povos hostis ao império mexica. Penetrou nesse império deixando um rastro de massacres,
saques e destruição (SOUSTELLE, 2002). O cerco que realizou a Tenochtitlán, a matança que
promoveu, a destruição que empreendeu, sua vitória nessa cidade, constituíram os primeiros
passos para que o império dos mexicas fosse transformado na Nova Espanha.

Diálogo com o Autor


O significado dessa conquista para os mexicas pode ser resumido em um canto
remanescente dessa cultura, redigido, provavelmente, em 1523:
“Chorai amigos meus, entendei que com esses fatos, perdemos a nação mexicana”
(CANTARES MEXICANOS apud. LEÓN-PORTILLA, 1985, p. 48)

Ilustração de Hernán Cortez em combate

Fonte: Getty Images

Outra data que marcou a conquista da América foi 1532. Foi o ano em que Francisco
Pizarro (1476-1541) comandou uma expedição espanhola contra as forças de Ataw Wallpa,
imperador dos incas. Tal como Cortez, Pizarro utilizou a estratégia de constituir alianças com
os inimigos dos incas. A exemplo de Cortez, ordenou muitos massacres (FAVRE, 1987),
aprisionou e assassinou Ataw Wallpa, conquistando o império centralizado na região peruana.

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Francisco Pizarro diante de Ataw Wallpa

Fonte: Hulton Archive/Getty Images

Diálogo com o Autor


À exemplo dos mexicas, os incas também registraram o significado que atribuíram
à conquista da América:
“Barbudo inimigo, homem vermelho,
de onde chegas extraviado,
a que vieste,
que vento te trouxe,
o que é que queres,
aqui em minha casa, aqui em minha terra”
(DIÁLOGO DE UMA ENCENAÇÃO INCA apud. LEÓN-PORTILLA, 1985, p. 130)

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Unidade: A Conquista da América

Por que os espanhóis venceram?

Representação de Montezuma Tzvetan Todorov (2003, p. 73) formulou um


problema rico a respeito do resultado vitorioso
dos espanhóis nas guerras ocorridas durante o
processo de conquista do território americano. Esse
estudioso questiona como os mexicas (astecas),
muito superiores numericamente frente as forças
espanholas e conhecedores dos cenários onde
ocorreram as batalhas, saíram derrotados no
processo de conquista da América.
Vejamos algumas razões apontadas por Todorov:

• Talvez por acreditar no caráter profético da


chegada dos espanhóis, Montezuma (ao lado),
o imperador mexica, não ofereceu qualquer
resistência a eles (TODOROV, 2003, p. 76-77);

• Montezuma priorizou evitar o derramamento


de sangue em sua cidade, deixando-se
Fonte: Wikimedia Commons aprisionar e desencorajando a resistência
mexica (TODOROV, 2003, p. 78-79);

• Hernán Cortez teve exímia habilidade em explorar os conflitos internos existentes dentro
do império mexica, visto que esse império não era homogêneo, reunia muitos povos
subjugados aos mexicas (TODOROV, 2003, p. 80-81);

• Os espanhóis eram superiores em armas em relação aos mexicas (astecas) – dispunham


de espadas, armaduras, arcabuzes, canhões, cavalos e bergantins (TODOROV, 2003,
p. 85).

O termo arcabuzes designa armas de fogo portáteis, parecidas com


espingardas. O termo bergantins denomina embarcações pequenas e
Glossário rápidas empregadas pelos espanhóis.

Quanto ao cenário que Pizarro encontrou no Peru, pode-se apontar uma razão específica
para a derrota inca: Ataw Wallpa e Wascarr disputavam o poder imperial inca. Essa disputa
colocou em confronto o norte e o sul do império, cada região apoiando um desses chefes.
Ocupados com a disputa interna pelo poder, ambos não se atentaram para a invasão externa do
europeu. Posteriormente, Pizarro se aliou a Wascarr contra Ataw Wallpa. O enfraquecimento
do império inca provocado pela disputa interna abriu caminho para a conquista espanhola da
região (FAVRE, 1987).

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A resistência à conquista
A conquista espanhola da América não ocorreu sem resistências. Ela encontrou resistências
mais acentuadas no Peru. Manco Inca foi um exemplo dessas resistências. Inicialmente, aliou-
se aos espanhóis, mas, posteriormente, conscientizou-se dos projetos espanhóis e se opôs a
invasão empreendida por eles. Ele controlou um extenso território nas regiões montanhosas,
no qual restaurou elementos das tradições incas. Persuadia aqueles que estavam sob sua
autoridade a não aceitar a cultura dos europeus, em especial, a religião. Incentivava o culto
ancestral classificado pelos espanhóis como heresia e, por conseguinte, objeto de proibição
(WACHTEL, 1990).
Outro exemplo foi Taqui Ongo. Ele arquitetou uma grande sublevação indígena contra os
espanhóis. O principal argumento era o de que, por consequência da adesão indígena ao
batismo cristão, os deuses os fizeram errantes, enfermos e acometidos pela fome. Em torno
de Taqui Ongo constituiu-se um movimento de retorno aos cultos ancestrais. Esse movimento
foi alvo de repressão por parte dos espanhóis (WACHTEL, op.cit.).

Tupac Amaru: o último imperador inca.


Tupác Amaru (ao lado) também marcou
a resistência inca. Ele é considerado o último
imperador dos incas. Terminou decapitado diante
de seu povo (WACHTEL, op.cit.).

A conquista espanhola também enfrentou


resistências no México. No norte do atual México,
enfrentaram uma resistência tão significativa
que os espanhóis tiveram que organizar três
expedições para reprimi-las. Tal qual na América
do Sul, fazia parte da pauta de oposição dos
indígenas mexicanos a recusa da cultura espanhola
(WACHTEL, op.cit.).

Essas resistências foram responsáveis pela


preservação de elementos da cultura indígena na
atualidade (WACHTEL, op.cit.).

Fonte: Wikimedia Commons

A tragédia da conquista da América.


Ao vislumbrar a riqueza da coroa espanhola, vislumbra-se, na verdade, “as veias abertas da
América Latina”. Essa expressão, que intitula o livro clássico escrito por Eduardo Galeano,
é empregada aqui no sentido de que devemos nos atentar paro o rastro de destruição e de
extermínio que os espanhóis deixaram quando se apoderaram das riquezas americanas.

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Unidade: A Conquista da América

Ilustração do genocídio indígena, Theodore de Bry

Fonte: LAS CASAS, 1996, p. 25

Diálogo com o Autor


Aqueles que foram de Espanha para esses países (e se tem na conta de
cristãos) usaram de duas maneiras principais para extirpar da face da terra
aquelas míseras nações. Uma foi a guerra injusta, cruel, tirânica e sangrenta.
Outra foi matar todos aqueles que podiam ainda respirar ou suspirar e pensar
em recobrar a liberdade ou subtrair-se aos tormentos que suportam, como
fazem todos os Senhores naturais e os homens valorosos e fortes; pois
comumente na guerra não deixam viver senão as crianças e as mulheres: e
depois oprimem-nos com a mais horrível e áspera servidão a que jamais se
tenham submetido homens ou animais
(LAS CASAS, 1996, p. 27)

O frei Bartolomé de Las Casas descreveu o extermínio das culturas pré-colombianas com
uma riqueza de detalhes que causam surpresa ainda nos dias de hoje.

Ilustração de Theodore de Bry

Fonte: LAS CASAS, 1996, p. 25

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Diálogo com o Autor
Os espanhóis, com seus cavalos, suas espadas e lanças começaram a praticar
crueldades estranhas; entravam nas vilas, burgos e aldeias, não poupando
nem as crianças e os homens velhos, nem as mulheres grávidas e parturientes
e lhes abriam o ventre e as faziam em pedaços como se estivessem golpeando
cordeiros fechados em seu redil. Faziam apostas sobre quem, mais habilmente
e mais destramente, de um só golpe lhe cortaria a cabeça, ou ainda sobre
quem abriria melhor as entranhas de um homem de um só golpe.
(LAS CASAS, op.cit., p. 30)

Para concluir esta unidade, mais um breve trecho de Las Casas:

[...] os espanhóis se arremessaram no mesmo instante em que os conheceram;


e como lobos leões e tigres cruéis, há muito tempo esfaimados, de quarenta
anos para cá, e ainda hoje em dia, outra coisa não fazem senão despedaçar,
matar, afligir, atormentar e destruir esse povo [...]
(LAS CASAS, op.cit., p. 26).

Ilustração de Theodore de Bry

Fonte: LAS CASAS, 1996, p. 25

A conquista da América deixou em sua trajetória um rastro de sangue na história de


nosso continente. Os que sobreviveram a ela foram submetidos a trabalhos forçados e ao
catolicismo. Após a ocupação do território, os espanhóis implementaram sua colonização das
terras americanas.

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Unidade: A Conquista da América

Material Complementar

Para complementar os conhecimentos adquiridos nesta unidade, assista aos seguintes


documentários sobre Hernán Cortez (1485-1547) e Francisco Pizarro (1476-1541):
Vídeos:
Hernán Cortez (1485-1547)
https://www.youtube.com/watch?v=aOx6j5jv-h8
Francisco Pizarro (1476-1541)
https://www.youtube.com/watch?v=mPAkqcRBRrk

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Referências

CORTEZ, Hernán. O fim de Montezuma: relatos da conquista do México. Porto Alegre:


L&PM. 1996.

ELLIOTT, J. H. La conquista española e las colonias de América. In: BETHEL, Leslie.


Barcelona: Editorial Crítica, Cambridge University Press, 1990, v. I, p. 125-169.

FAVRE, Henri. A civilização inca. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987. (As civilizações
pré-colombianas)

GENDROP, Paul. A civilização maia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987. (As
civilizações pré-colombianas)

LAS CASAS, Bartolomé de. O paraíso destruído: brevíssima relação da destruição das
Índias. 6.ed. Porto Alegre, 1996. (Coleção Descobertas L&PM)

LEÓN-PORTILLA, Miguel. A conquista da América vista pelos índios: relatos astecas,


maias e incas. Petrópolis: Vozes, 1985.

SOUSTELLE, Jacques. A civilização asteca. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002. (As
civilizações pré-colombianas)

TODOROV, Tzvetan. A conquista da América: a questão do outro. Beatriz Perrone-Moisés


(trad.) 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. (Tópicos)

WACHTEL, Nathan. Los indios y la conquista española. In: BETHEL, Leslie. Barcelona:
Editorial Crítica, Cambridge University Press, 1990, v. I, p. 170-202.

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Unidade: A Conquista da América

Anotações

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