Redação Processo Seletivo: Toron, Torihara e Cunha Advogados – Mariana Mattavelli
Nassar O Estado de Coisas Inconstitucional e o Sistema Penitenciário Brasileiro
O conceito do Estado de Coisas Inconstitucional colombiano foi importado para a
realidade brasileira como possibilidade para o enfrentamento das omissões inconstitucionais que decorrem da ausência ou deficiência da atuação estatal quanto à garantia de direitos fundamentais. A justificativa para a viabilidade de tal importação pode ser observada a partir de um paralelo entre a Colômbia e o Brasil, à luz do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH): desde a criação do indicador, em 1990, ambos os países apresentam valores e evoluções semelhantes, o que significa que encontram-se em patamares próximos de saúde, educação e renda per capita. Além disso, problemas comuns de violação sistemática e massiva de direitos constitucionais ocorrem nos dois países – o que também os aproxima quanto à aplicabilidade do mecanismo do ECI. Nesse sentido, é conveniente ressaltar que a importação do mecanismo do ECI para o contexto jurídico brasileiro exige uma adaptação à realidade processual-constitucional: aqui, o controle concentrado de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal é o meio mais conveniente para a declaração do ECI. Dentre as ações de controle de constitucionalidade, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) revela-se a mais adequada, dado o seu caráter amplo e residual e sua função de evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do poder público. Sendo assim, é perfeitamente cabível que o STF se utilize desse mecanismo para declarar um Estado de Coisas Inconstitucional, já que não há, em nosso ordenamento jurídico, uma figura própria para isso. Trata-se, então, de uma solução incompleta, embora justa, para servir-se do ECI colombiano, visando enfrentar problemas de proteção de direitos fundamentais profundamente lesionados, decorrentes da falta de coordenação das esferas administrativa, legislativa e orçamentária na concretização de políticas públicas. No Brasil, o primeiro caso de aplicação do instrumento de ECI consiste no julgamento da medida cautelar na ADPF nº 347/2015, em que o Tribunal declarou, por unanimidade, o Estado de Coisas Inconstitucional em que se encontra o sistema penitenciário brasileiro, em razão de inúmeras violações dos direitos fundamentais dos detentos e da ausência de políticas públicas destinadas a protegê-los. Isso porque, de fato, os presos são uma minoria marginalizada dentro da sociedade civil, e o emprego de esforços e ações em seu favor costuma ser politicamente indesejado. Atualmente, talvez seja o sistema carcerário brasileiro o setor em que se produz o maior grau de lesões a direitos humanos em função de falhas estruturais e omissões das autoridades públicas. Nesse sentido, a propositura da ADPF nº 347/2015 representa um passo importante para a mitigação do quadro de violação massiva e sistemática dos direitos dos detentos, já que visa obter tanto efeitos instrumentais, por meio do cumprimento dos pedidos elaborados, quanto efeitos simbólicos, por meio da mudança da percepção do Judiciário e da sociedade sobre a urgência e a gravidade do problema.
Instrumentos Empregados no Estado Democrático de Direito para persuadir o cidadão a respeito de sua responsabilidade tributária: coerção, incentivo e educação