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Primeira edição, 2021

www.cursoprius.com.br
SUMÁRIO
ANÁLISE SANGUÍNEA 07

Aspectos Pré-Analíticos 08

Técnica de Coleta 20

Hemograma 26

Hematopoiese 28

Série Vermelha 36

Anemias 50

Série Plaquetária 55

Série Branca 59

Coagulograma 73

Eletrólitos 85

URINÁLISE 99

Outros exames de urina 119

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 122


05

INTRODUÇÃO
A solicitação, leitura e interpretação dos exames
laboratoriais de rotina e complementares fazem
parte do cotidiano do cuidado como um
componente importante para a Sistematização
da Assistência de Enfermagem (SAE). Os
resultados obtidos, aliados ao raciocínio clínico
de enfermagem, dão base para a construção de
diagnósticos, bem como o planejamento da
assistência, conforme previsto na Resolução
COFEN nº358/2009.

De acordo com a Resolução COFEN nº195/97,


que dispõe sobre a solicitação de exames de
rotina e complementares, o Enfermeiro pode
solicitá-los no exercício de suas atividades
profissionais. Posteriormente, em 2002, o
COFEN, no gozo das suas prerrogativas legais,
publicou a Resolução nº271/2002, que trata da
prescrição de medicamentos e a requisição de
exames complementares. No seu art. 4º consta
que para assegurar o pleno exercício profissional,
06

garantindo ao cliente/paciente, uma atenção


isenta de risco, prudente e segura, na conduta
prescricional/terapêutica, o Enfermeiro pode
solicitar exames de rotina e complementares,
conforme disposto na Resolução COFEN 195/97.

Deste modo, cabe ao profissional enfermeiro


buscar conhecimentos e habilidades específicas
para incorporar essa tecnologia de cuidado à sua
prática profissional, através do uso sistemático
das informações obtidas por meio de exames
complementares, aliadas ao raciocínio clínico
para o desenvolvimento de uma prática mais
segura e autônoma.
1
ANÁLISE
SANGUÍNEA
08

ASPECTOS PRÉ-ANALÍTICOS
O laboratório clínico pode ser fundamentado em
três fases:

1
- Fase pré-analítica: nesta etapa envolvem-se
os processos de recepção do pedido de exames,
a preparação do cliente, a coleta do material,
realizar a sequência de tubos, identificação,
triagem, armazenamento e o transporte da
amostra até a entrada do material para a
avaliação.

2
- Fase analítica: realiza-se a avaliação
propriamente dita e o fluxo dos dados
levantados.

3
- Fase pós-analítica: executa-se o preparo do
laudo, transmissão ou impressão, recebimento
do laudo e tomada de decisão.
09

Estima-se que cerca de 70% equívocos que podem gerar


resultados não consistentes com o quadro clínico do
paciente acontecem na fase pré-analítica. Entre eles, vale
destacar os aspectos relacionados à orientação do
paciente, como a necessidade ou não do jejum e o intervalo
adequado desse, o tipo de alimentação, a prática de
exercício físico, o uso de medicamentos capazes de
interferir na análise e mudanças abruptas nos hábitos da
rotina diária precedendo a coleta.

As condições pré-analíticas comumente abordadas no


laboratório clínico incluem variação cronobiológica, gênero,
idade, posição, prática de atividade física, dieta, jejum e uso
de drogas para fins terapêuticos ou não.

- Variação cronobiológica:
Essa alteração envolve as alterações cíclicas na
concentração de determinados parâmetros em função do
tempo, podendo ser diária, mensal, sazonal, anual etc. A
circadiana, por exemplo, ocorre nos níveis séricos de
cortisol e ferro. As coletas realizadas à tarde fornecem
resultados mais baixos do que os obtidos nas amostras
coletadas pela manhã.
10

- Posição:
A mudança rápida na postura corporal determina variações
no teor de alguns componentes séricos. Quando o indivíduo
se move da posição supina para a ereta, ocorre um afluxo de
água e substâncias filtráveis do espaço intravascular para o
intersticial. Assim, proteínas de alto peso molecular e
elementos celulares elevam-se relativamente até que o
equilíbrio hídrico se restabeleça. Por essa razão, níveis de
albumina, colesterol, triglicérides, hematócrito e
hemoglobina, além de drogas que se ligam a proteínas e
também os leucócitos, podem ser superestimados (em
torno de 8% a 10%) se a coleta de sangue for feita antes da
estabilização do equilíbrio hídrico.

- Gênero:
Alguns exames de sangue e urina apresentam níveis
significativamente distintos entre homens e mulheres
devido a variações hormonais, metabólicas e de massa
muscular, entre outras. As alterações típicas do ciclo
menstrual também se refletem em outras substâncias. A
aldosterona fica cerca de 100% mais elevada na fase
pré-ovulatória do que na folicular. De qualquer modo, os
intervalos de referência para esses parâmetros são
específicos para cada gênero.
11

- Faixa etária:
Certos indicadores bioquímicos possuem nível sérico
dependente da idade, o que se deve a fatores como
maturidade funcional dos órgãos e sistemas, conteúdo
hídrico e lipídico, massa corporal, limitações funcionais da
senilidade, etc. Em situações especiais, os intervalos de
referência devem considerar essas diferenças. Convém
ponderar que as mesmas causas de variações
pré-analíticas que afetam os resultados laboratoriais em
jovens interferem nos resultados de idosos, mas com
intensidade maior nestes últimos. Doenças subclínicas
também são mais comuns na maturidade e precisam ser
levadas em conta na interpretação dos resultados.

- Jejum:
A necessidade do jejum decorre do fato de os valores de
referência dos testes terem sido estabelecidos em
indivíduos nessa condição. Ademais, a refeição pode alterar
a composição sanguínea momentaneamente – sem o
pré-requisito, cada exame teria de ser analisado à luz do que
a pessoa ingeriu. A maioria dos exames exige três horas de
jejum, com exceção da glicemia (oito horas) e do perfil
lipídico (12 horas), dentro do qual, vale lembrar, existe
considerável variação individual nos lipídios plasmáticos,
12

da ordem de 5% a 10%, para o colesterol total, e superior a


20%, para os triglicérides. Na população pediátrica e de
idosos, o tempo sem alimentação deve guardar relação com
os intervalos das refeições. Para crianças mais novas, o
jejum pode ser de uma ou duas horas.

- Dieta:
A amplitude das alterações de parâmetros no plasma ainda
depende da composição da dieta e do tempo decorrido
entre a ingestão e a coleta da amostra. Alimentos que
contêm muita gordura, por exemplo, fazem subir a
concentração de triglicérides, da mesma forma que dietas
ricas em proteínas promovem níveis elevados de amônia,
ureia e ácido úrico.

- Álcool e fumo:
Da mesma forma que os medicamentos, o álcool e o fumo
determinam variações nos resultados de exames
laboratoriais por seus efeitos in vivo e in vitro. Mesmo o
consumo esporádico de etanol pode ocasionar alterações
significativas e quase imediatas na glicose, no ácido lático e
nos triglicérides. Já o uso crônico eleva a atividade da
gama-glutamiltransferase. O tabagismo, por sua vez,
aumenta a concentração de hemoglobina, a quantidade de
13

leucócitos e de hemácias e o volume corpuscular médio,


além de reduzir o HDL-colesterol e elevar a adrenalina, a
aldosterona, o antígeno carcinoembriogênico e o cortisol.

- Atividade física:
O efeito dos exercícios sobre alguns componentes
sanguíneos é, em geral, transitório e decorre da mobilização
de água e outras substâncias entre os diferentes
compartimentos corporais, das variações nas necessidades
energéticas do metabolismo e da modificação fisiológica
que a atividade condiciona. Desse modo, dá-se preferência
à coleta de amostras com o paciente em condições basais,
que são mais facilmente reprodutíveis e padronizáveis. O
esforço físico ainda é capaz de aumentar a atividade sérica
de enzimas de origem muscular, como a creatinoquinase
(CK), a aldolase e a aspartato aminotransferase, pelo
aumento da liberação celular. Pode haver ainda
hipoglicemia, elevação da concentração de ácido láctico em
até dez vezes e aumento nas atividades das enzimas renina
e CK em até quatro e dez vezes, respectivamente. As
variações chegam a persistir por 12 a 24 horas, a depender
da intensidade do exercício e do grau de condicionamento
físico do indivíduo.
14

- Gestação:
Existem mecanismos que mudam o nível das substâncias no
plasma durante a gravidez, os quais decorrem de vários
fatores, como a hemodiluição de proteínas totais e albumina,
as deficiências relativas em função do maior consumo de
ferro e ferritina e o aumento das proteínas de fase aguda,
como a velocidade de hemossedimentação.

- Medicamentos em uso:
Uma vez que podem se constituir em interferentes, os
fármacos usados pelo paciente devem ser protocolados
para evitar alterações que acabem induzindo o profissional
a erros na interpretação dos valores encontrados. Tais
interferências ocorrem in vivo, quando o medicamento
modifica o resultado, como a hiperglicemia causada pelo
uso de corticoides ou a elevação da atividade da CK total
pelo uso de estatinas.

A coleta da amostra também tem um papel preponderante


para um exame confiável.

Entre os fatores pré-analíticos, devemos citar ainda as


variáveis de coleta, que têm como agentes as condições do
material biológico (como a temperatura), o tempo excessivo
15

de garroteamento, o sangue colhido em locais de acesso


venoso com infusão de líquidos e até a hospitalização, que
pode afetar os resultados. Alguns dos fatores mais
importantes nesse contexto são:

- Temperatura:
A temperatura ideal para a coleta deve ser de 22-25ºC. Já
aquela necessária para o armazenamento das amostras tem
de ficar entre 2-8ºC para inibir o metabolismo das células e
estabilizar certos constituintes termolábeis. Para a dosagem
de potássio, a refrigeração de amostra não centrifugada não
pode passar de duas horas, uma vez que tal processo é
capaz de impedir a glicólise, que alimenta a bomba de
potássio, e promover sua saída para o meio extracelular,
elevando o resultado do teste. É oportuno lembrar que as
amostras para alguns exames requerem transporte
refrigerado, tais como: catecolaminas, amônia, ácido láctico,
piruvato, gastrina e paratormônio.

- Hemólise:
Durante a coleta, os fatores que provocam hemólise devem
ser prevenidos. Desse modo, os tubos precisam
permanecer na posição vertical até a completa coagulação
do sangue, quando, então, é possível centrifugá-los. A
16

hemólise afeta substancialmente a dosagem de alguns


elementos, como desidrogenase láctica, aspartato
aminotransferase, potássio e hemoglobina. Outros testes,
como os que medem ferro, alanina transferase e T4, são
moderadamente influenciados por soros hemolisados.
Ainda há aqueles que sofrem pequenas influências desse
processo, tais como fósforo, proteína total, albumina,
magnésio, cálcio e fosfatase ácida.

- Luz:
Alíquotas para dosagem de bilirrubina, betacaroteno,
vitamina A, vitamina B6 e porfirinas devem ser preservadas
ao abrigo da luz, pois sofrem interferência dela.

- Infusão de líquidos e medicamentos:


A coleta de sangue tem de ser realizada sempre em local
distante da instalação do cateter, preferencialmente no
outro braço e, se possível, pelo menos uma hora após o fim
da infusão.

Existe um tubo específico com aditivos diferentes para cada


tipo de aplicação e exames. Os tubos de coleta a vácuo já
contêm a quantidade de vácuo calibrado ao volume de
sangue que deve ser colhido, assim é possível garantir a
17

proporção correta de sangue e aditivo.

A maioria dos tubos de coleta de sangue contém um aditivo


que acelera a coagulação do sangue (ativador de coágulos)
ou evita a coagulação (anticoagulante). Isso preserva a
amostra garantindo o processamento adequado para cada
exame. Um tubo que contém um ativador de coágulo
produzirá uma amostra de soro quando o sangue for
separado por centrifugação, já um tubo que contenha um
anticoagulante irá produzir uma amostra de plasma após
centrifugação. Alguns testes exigem o uso de soro, alguns
requerem plasma e outros testes requerem sangue total.

SANGUE

Sangue total Soro Plasma

Soro Plasma

Gel

Coágulo Células

Fig. 1 – Separação do sangue para análise laboratorial.


18

Como cada tubo tem uma função pré-determinada, a


padronização com a codificação por cores indica o seu
conteúdo (aditivo) e tem aplicação universal.

Fig. 2 – Tubos para coleta de sangue, seus respectivos aditivos e cores.


19

Mas é preciso seguir uma sequência correta para evitar a

contaminação cruzada de aditivos entre tubos, gerando

resultados alterados nos analíticos sensíveis a este tipo de

interferência. A ordem correta para coleta de sangue por

tubos a vácuo é: 1. Azul (citrato de sódio); 2.

Amarelo/vermelho (ativador de coágulo); 3. Verde

(heparina); 4. Lilás/roxo (ETDA); 5. Cinza (fluoreto de sódio).

Fig. 3 – Sequência correta de tubos para coleta de sangue.


20

TÉCNICA DE COLETA
Coleta de sangue com seringa e agulha:

1
Coloque a agulha na ponta da seringa, sem retirar
dela a sua capa protetora. Tome cuidado para
não tocar na parte inferior da agulha e a
manuseie apenas pela capa;

2
Pressione o êmbolo da seringa, retirando dela
todo o ar;

3
Coloque o garrote no braço do seu paciente e
peça para que ele feche a mão;

4
Escolha a veia que será puncionada
delicadamente;

5
Faça a antissepsia da pele, utilizando álcool 70%
e algodão e não toque mais no local que foi
limpo;
21

6
Retire a capa da agulha, peça que o paciente
abra a mão e faça rapidamente e
cuidadosamente a punção da veia;

7
Solte o garrote tão logo o sangue flua pela
seringa;

8
Retire apenas o volume de sangue indicado para
cada um dos tubos;

9
Retire a agulha, coloque a agulha e a seringa em
uma cuba enquanto pressiona com a outra mão,
delicadamente, o local da punção. Depois peça
que o paciente repita o movimento com a
mesma pressão;

10
Coloque, então, o sangue da seringa no(s)
tubo(s) apropriado(s) para a sua amostra,
respeitando a sequência de cores;

11 Descarte o material em local apropriado para


perfurocortantes.
22

Coleta de sangue a vácuo:

1
Coloque a agulha no adaptador para retirada de
sangue cuidadosamente, sem tocar na base da
agulha, manuseando-a apenas pela capa;

2 Ajuste o garrote no braço do paciente de forma


cuidadosa;

3
Peça que o paciente feche a mão e escolha a veia
que será puncionada;

4 Faça a antissepsia no braço do seu paciente


utilizando algodão e álcool 70% e não toque mais
o local da punção;

5
Então, retire do adaptador a capa da agulha e
faça a punção, no local escolhido;

6
Imediatamente, coloque o tubo de coleta no
canhão;

7
Retire, então, o garrote tão logo o sangue flua pelo
tubo;
23

8 Aguarde atingir o volume demarcado no frasco e


siga enchendo os demais frascos (caso
necessário), de acordo com a sequência
recomendada;

9 Tire a agulha e faça seu descarte de forma


apropriada, bem como do próprio canhão;

10 Pressione cuidadosamente o local da punção e


oriente o paciente para que mantenha
pressionado, sem dobrar o braço.

1 2 3 4 5

6 7 8 9

Fig. 4 – Sequência para coleta de sangue a vácuo.


24

Algumas observações importantes:

- Deve-se aplicar o garrote cerca de 8cm acima do local da


punção. O garroteamento por tempo superior a 1 minuto
afeta a hemoconcentração, elevando os valores do
hematócrito em 4% a 6%. Isso acontece porque o aumento
da pressão no segmento venoso gera extravasamento
plasmático de dentro do vaso para o interstício sem que
haja a saída das células sanguíneas, falseando uma elevação
de hematócrito que não é compatível com a realidade.

- Golpes como tapas e pressão na veia escolhida ou


massagem no local da coleta podem ocasionar hemólise e
redução na contagem celular de até 5%.

- Para promover o enchimento adequado da veia e sua


consequente evidenciação, recomenda-se: abaixar o braço;
fechar e abrir as mãos; massagear delicadamente o local (do
punho para o cotovelo);

- A escolha inadequada dos dispositivos, como agulhas de


calibre muito pequeno ou seringas de pouco volume gera
altas pressões favorecendo também a hemólise da amostra.
25

- Atenção à integridade dos invólucros dos dispositivos a


serem usados e à validade dos tubos, principalmente o de
EDTA, devido ao risco de contaminação por microrganismos
patogênicos e potencial infecção, aumento da chance de
coagulação da amostra e diminuição do vácuo do tubo.

- Não é indicada a coleta de sangue via cateter preenchido


com soluções fisiológica ou glicosada, pois isso pode
comprometer a avaliação do hematócrito. Deve-se também
evitar coletar sangue em membros que tenham acesso
venoso com infusão contínua de soluções para evitar
hemodiluição.

- Em caso de transfixação do vaso, se a aspiração se der


fora do vaso sanguíneo ou numa lesão do tipo hematoma, a
amostra virá misturada com o líquido intersticial,
inviabilizando a análise da amostra.

- A homogeneização insuficiente ou excessiva da amostra


pode alterar a análise. Se mal homogeneizada, há potencial
formação de coágulos; se homogeneização excessiva ou
brusca, há potencial hemólise, tornando a amostra inviável.
O ideal é que a amostra seja homogeneizada suavemente,
com 8 a 10 inversões.
26

- Armazenamento: atenção ao local, luminosidade e


temperatura, que devem ser adequadas para a preservação
da amostra até a análise.

- Os tubos devidamente identificados (de preferência na


frente do paciente) devem ser enviados ao setor analítico
do laboratório, sempre que possível acompanhados do
pedido médico e no menor tempo possível. Amostras de
hemograma (coletadas em tubos com EDTA) devem ser
encaminhadas para o setor de análise em, no máximo, 4
horas após a coleta.

HEMOGRAMA
O hemograma é o conjunto de testes laboratoriais que
possibilita a análise das variações quantitativas e
qualitativas dos elementos figurados do sangue (hemácias,
leucócitos e plaquetas), portanto ele é subdividido em 3
partes: série vermelha, série branca e série plaquetária. É um
dos exames complementares mais requisitado, sendo útil na
avaliação de diversas condições clínicas.

Para realização do hemograma recomenda-se a coleta de


sangue venoso e transferência para um tubo contendo
27

anticoagulante etilenodiaminotetracético (EDTA) para


manter as características celulares.

Nosso sangue é formado basicamente por uma parte líquida


chamada de plasma e outra sólida constituída por células
(hemácias, plaquetas e leucócitos).

• O plasma contém água, albumina, globulinas, fatores de


coagulação, dentre outras proteínas.

• As hemácias (conhecidas como glóbulos vermelhos)


transportam o oxigênio para todo o organismo.

• As plaquetas controlam sangramentos, participando do


processo de coagulação.

• Os leucócitos (conhecidos como glóbulos brancos)


combatem infecções e funcionam como parte do sistema
imunológico do corpo.

Por meio do hemograma é possível avaliar o número e tipos


de células brancas do sangue, número de células vermelhas
do sangue, bem como sua variação no tamanho celular,
28

seu percentual em relação ao plasma (hematócrito), a


concentração de hemoglobina, contagem de plaquetas, o
tamanho médio de hemácias e a Hemoglobina Corpuscular
Média.

HEMOGRAMA

Série vermelha Série Branca Série Plaquetária

Hematócrito Leucometria Contagem Diferencial


de Leucócitos

Hematimetria
Neutrófilos Eosinófilos Basófilos Linfócitos Monócitos

Hemoglobina
Metamielócitos

Bastonetes

Segmentados

Fig. 5 – Células avaliadas no hemograma.

HEMATOPOIESE
A hematopoiese (ou hemopoese) é processo pelo qual são
formadas as células do sangue. Ela abrange todos os
fenômenos relacionados com a origem, a multiplicação e a
maturação de células primordiais ou precursoras das
células sanguíneas.
29

Apesar de serem distintas umas das outras, todas as células


sanguíneas são oriundas de uma célula-mãe única,
denominada célula pluripotente, toipotente, stem–cell ou
célula-tronco.

As primeiras células sanguíneas surgem no período


embrionário, por volta da sétima ou oitava semana de vida.
Daí até o quarto mês, a formação das células se faz em
agrupamentos de células redondas localizadas no saco
vitelínico. Ocorre, nesse sítio, eritropoiese, que se
desenvolve no mesoderma.

Ainda durante a gestação, do quarto ao sexto mês de vida


fetal, as células tronco hematopoiéticas emigram do saco
vitelínico para o fígado e as células do sangue são, então,
formadas no fígado e também no baço.

Nesse período, além de haver eritropoiese, surgem outras


linhagens hemopoiéticas, como granulócitos e
megacariócitos. Após o período hepatoesplênico, a
hematopoiese passa a ser feita na porção esponjosa dos
ossos, também denominado período medular. A medula
óssea é o sítio hematopoiético mais importante a partir de 6
a 7 meses de vida fetal, durante a infância e na vida adulta.
30

Nos dois primeiros anos (fase criança), toda a medula óssea


é hematopoiética. Porém, durante o resto da infância, há
substituição progressiva da medula dos ossos longos por
gordura, de modo que a medula hemopoética no adulto
(fase adulta) é confinada ao esqueleto central e às
extremidades proximais do fêmur e do úmero.

No microambiente da medula óssea, as células


pluripotentes encontram condições favoráveis para sua
sobrevida, autorrenovação e formação de células
progenitoras diferenciadas, dando origem a células
progenitoras de linhagens mielocíticas, linfotítica,
megacariócitos e eritroblastos.

A linhagem mieloide compreende os eritrócitos, plaquetas


(também chamadas trombócitos), leucócitos granulares
(neutrófilos, basófilos e eosinófilos) e
monócitos-macrófagos.O desenvolvimento de tais
elementos se conhece como mielopoiese e parte de uma
célula mãe precursora comum (progenitor mieloide). A
linhagem linfoide compreende unicamente os linfócitos, que
podem ser de dois tipos: linfócitos B e linfócitos T (existe
ainda um terceiro tipo, os linfócitos NK). O desenvolvimento
destas células se denomina linfopoiese e se dá a partir da
célula progenitora linfoide.
31

Fig. 6 – Hematopoiese e células sanguíneas

- Mielopoiese ou Granulopoiese:
Se denomina assim ao processo de formação de células
granulocíticas (eosinófilos, basófilos e neutrófilos) a partir
de uma célula única (UFC-G) ou unidade de colônias
granulocíticas.

- Linfopoiese:
É o processo mediante o qual se formam os linfócitos.
Engloba os linfócitos T e B. Os linfócitos B saem maduros da
medula óssea enquanto os linfócitos T precisam migrar para
o Timo onde irão sofrer o processo de maturação. Os
linfócitos B ainda se diferenciam em plasmócitos quando
32

encontram um antígeno num órgão linfoide secundário e


secretam anticorpos nos tecidos.

- Monopoiese:

Por monopoiese se conhece a formação dos monócitos a

partir das UFC-M (unidade formadora de colônias

monocíticas ou monócitos). Sua formação está

caracterizada por duas fases de maturação que se

consideram as mais importantes: monoblastos e

promonócitos. Os monócitos se diferenciam em macrófagos

e células dendríticas mieloide e podem se localizar como

células fixas em órgãos como no baço, alvéolos pulmonares,

e nas células de Kupffer do fígado. Sua função principal

consiste em fagocitar bactérias, micobactérias, fungos,

protozoários ou vírus.
33

Fig. 7 – Mielopoiese, Linfopoiese e Monopoiese

- Eritropoiese:
A eritropoiese é o processo que se corresponde a geração
dos eritrócitos (ou também chamados de glóbulos
vermelhos). O processo se inicia com uma célula mãe que
gera, por bipartição dupla, 4 células diferenciadas para
produzir eritrócitos que, mediante diferentes mecanismos
enzimáticos, chega à formação de reticulócitos e, três dias
depois, se transformam em hemácias maduras anucleadas.
A vida média de um eritrócito é de 120 dias.
34

A diminuição da concentração de O² no sangue arterial gera


um estímulo nas células intersticiais peritubulares do córtex
renal que liberam um hormônio chamado eritropoietina. A
eritropoietina estimula a medula óssea a produzir células
precursoras da linhagem eritrocítica e a liberar reticulócitos
na corrente sanguínea.

Fig. 8 – Regulação da produção de eritrócitos.


35

- Trombopoiese:
Este é o processo mediante o qual se geram as plaquetas
(tombócitos) a partir de partes do citoplasma do
megacariócito.

Fig. 9 - Eritropoiese e Trombopoiese.


36

SÉRIE VERMELHA
Também conhecido como eritrograma, consiste na parte do
hemograma que avalia especificamente as hemácias
através dos seguintes parâmetros: hematimetria, dosagem
de hemoglobina, hematócrito e índices hematimétricos.

SÉRIE
VERMELHA

Hematócrito Hematimetria Hemoglobina

Fig. 10 – Série Vermelha.

- Hematimetria:
Refere-se a contagem total de hemácias por mm³ de
sangue, após a adição de um líquido diluidor isotônico que
evite a lise e conserve o formato dos eritrócitos,
utilizando-se para leitura uma câmara de contagem,
denominada câmara de Neubauer. A contagem de
hemácias, a dosagem de hemoglobina e o hematócrito
estão intimamente relacionados, podendo revelar, quando
diminuídos, condições de anemia e, quando aumentados,
policitemia.
37

- Dosagem de Hemoglobina:
A hemoglobina é uma proteína globular, localizada no interior
das hemácias e sua função é transportar gases na corrente
sanguínea (O² e CO²). Ela é composta por quatro
subunidades proteicas, sendo duas alfa e duas betas, nas
quais existe um grupo heme que contém ferro e o pigmento
vermelho de porfirina.

Em cada um dos grupos heme se ligam moléculas de


oxigênio, sendo que cada grama de hemoglobina é capaz de
transportar 1,34mL de O². Sendo assim, a quantidade de O²
no sangue é diretamente proporcional à concentração de
hemoglobina e não ao número de hemácias.

Fig. 11 – Estrutura da Hemoglobina.


38

A avaliação da hemoglobina serve para realizar a triagem e


estabelecer a intensidade da anemia, acompanhar sua
resposta ao tratamento e avaliar a policitemia. Mas a
hemoglobina, por si só, não é suficiente para classificar o
tipo de anemia.

- Hematócrito:
A palavra hematócrito significa “separar o sangue”. O plasma
e as células são separados por centrifugação e o
hematócrito representa a relação percentual entre o volume
eritrocitário e a quantidade de plasma.

Fig. 12 – Hematócrito.
39

Quando o hematócrito está baixo, é indicativo de que há

diminuição da quantidade de hemácias ou, mais

frequentemente, de hemoglobina no sangue, como ocorre

na anemia ferropriva por exemplo. E quando está elevado,

pode estar relacionado a redução do volume de líquido

sanguíneo, que acontece em casos de desidratação grave,

ou na policitemia. Em geral, o hematócrito representa 3x a

concentração plasmática de hemoglobina, ou seja, se temos

uma Hb de 12g/dL, teremos um hematócrito em torno de

36%.

A análise do hematócrito é rápida e objetiva, ela é também

uma medida bastante utilizada em serviços de emergência,

especialmente para avaliar a necessidade transfusional. No

entanto, apenas o hematócrito não permite realizar um

diagnóstico preciso para a maioria dos casos, por conta

disso ele deve ser utilizado em conjunto com os demais

índices hematimétricos do sangue para avaliação da causa

da anemia, da perda sanguínea ou da desidratação.


40

Eritrócitos Hemoglobina Hematócrito


(x 106/mm3) (g/100 dL) (%)

Recém-nascido (a termo) 4,0-5,6 13,5-19,6 44-62


Criança (3 meses) 4,5-4,7 9,5-12,5 32-44
Criança (1 ano) 4,0-4,7 11,0-13,0 36-44
Criança (10-12 anos) 4,5-4,7 11,5-14,8 37-44
Mulheres grávidas 3,9-5,6 11,5-16,0 34-47
Mulheres não grávidas** 4,0-5,6 12,0-16,5 35-47
Homens** 4,5-6,5 13,5-18,0 40-54
Fonte: Verrasto e Lorenzi, 2005.

Fig. 13 – Valores de referência para hematimetria, hemoglobina e hematócrito


para adultos do sexo masculino, feminino, grávidas, recém-nascidos e crianças.

- Índices Hematimétricos:

Os índices hematimétricos, ou índices hematológicos,

definem o tamanho e o conteúdo de hemoglobina

existentes dentro das hemácias. São eles o volume

corpuscular ou globular médio (VCM/VGM), hemoglobina

corpuscular ou globular média (HCM/HGM), a concentração

de hemoglobina corpuscular ou globular média

(CHCM/CHGM) e o índice de anisocitose (RDW).


41

ÍNDICES
HEMATIMÉTRICOS

VCM HCM CHCM RDW

Volume Hemoglobina Concentração


Índice de
Corpuscular Corpuscular de Hemoglobina
Anisocitose
Médio Média Corpuscular Média

Fig. 14 – Índices Hematimétricos

Volume Corpuscular Médio (VCM):


A melhor maneira de se classificar uma anemia é pelo
tamanho das células individuais. Dessa forma, o VCM
representa o volume médio das hemácias expresso em
fentolitros (fL). Ele indica se o tamanho é normal
(normocítico), aumentado (macrocítico) ou diminuído
(microcítico). O VCM é a base para a classificação das
anemias, pois através dele classificamos uma anemia em
normocítica (VCM 80 – 100 fL), macrocítica (VCM >100 fL)
ou microcítica (VCM <80 fL).

Hemoglobina Corpuscular Média (HCM): A HCM


representa o peso da hemoglobina nas hemácias. O peso da
hemoglobina depende do seu volume e concentração no
interior das hemácias, medido em pictogramas (pg). Esse
42

peso implica na coloração da hemácia, seu valor normal


varia de 27 à 33 pg - normocromia. Quando as hemácias têm
poucas hemoglobinas, elas são ditas hipocrômica e o HCM
está < 27 pg. Quando têm muitas, são hipercrômicas e o
HCM é > 33 pg.

Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média


(CHCM): A CHCM mede a concentração média de
hemoglobina nas hemácias medida em g/dL, sendo um
parâmetro útil para o monitoramento do tratamento da
anemia. Considera-se HCM e CHCM índices de cor, as quais
refletem a concentração de hemoglobina presente nas
hemácias. Portanto, também usamos o CHCM para
classificar as hemácias como normocrômicas (CHCM 32 –
36 g/dL), hipocrômicas (CHCM < 32 g/dL) ou hipercrômicas
(CHCM > 36 g/dL).

Fig. 15 – Entendendo os índices hematológicos.


43

Deficiência de ferro

População Mista Anemia megaloblástica


de Hemácias Anemia sideroblástica
Após transfusões

Fragmentos Quimioterapia
celulares Microangiopatias

Fig. 16 – Causas de RDW elevado.

- Hematoscopia:
A hematoscopia é um procedimento que faz parte do hemograma
e tem como finalidade confrontar os dados obtidos nos
analisadores hematológicos com a avaliação na microscopia
óptica. Esse procedimento é de fundamental importância já que os
equipamentos não conseguem detectar alterações principalmente
morfológicas.

A revisão manual das lâminas tem o objetivo de identificar


anormalidades no tamanho, forma, coloração e presença de
inclusões. Atualmente, existe uma grande variedade na
denominação das alterações da série vermelha.

AGLUTINAÇÃO – é definida como a aglomeração de hemácias na


forma de cachos de uvas. A aglutinação causa um falso aumento do
VGM e da contagem de hemácias acarretando em valores
aumentados de HGM e CHGM.
44

ROULEAUX – refere-se ao empilhamento de hemácias (como

moedas) ocorrendo usualmente quando as proteínas plasmáticas

estão aumentadas.

ANISOCITOSE – é definida como um aumento na variabilidade do

tamanho das hemácias. Não é específica e pode ser refletida no

aumento do RDW nos contadores automatizados.

DIMORFISMO – é a presença de duas populações distintas de

hemácias podendo ser claramente vista na análise do histograma

de hemácias com correspondente aumento do RDW. O termo é

comumente utilizado quando existe uma população microcítica e

hipocrômica e outra normocrômicas e normocítica. Entretanto, o

termo pode também ser usado para descrever a coexistência de

populações macrocítica e normocítica.

HIPOCROMIA – é a diminuição da coloração da hemácia com

aumento do halo claro central superior a 1/3 do diâmetro celular. O

HGM e o CHGM estarão diminuídos nos casos de hipocromia grave.

As condições clínicas que causam a hipocromia estão sempre

associadas à microcitose.
45

MACRÓCITOS – são hemácias maiores que apresentam diâmetro


superior a 8,5 μm (VGM > 100 fL). O HGM pode permanecer normal
ou se elevar se o VGM aumentar significativamente. As hemácias
em prematuros e recém-nascidos são fisiologicamente maiores
que as dos adultos. A reticulocitose também pode causar
macrocitose.

MICRÓCITOS – são hemácias menores que apresentam diâmetro


inferior a 7,0 μm (VGM < 80 fL). Podem estar associados à
diminuição de hemoglobina (hipocromia). As hemácias de crianças
saudáveis são fisiologicamente menores que as dos adultos. Sendo
assim, é imprescindível que os valores de VGM sejam interpretados
de acordo com a idade do paciente.

POLICROMASIA – se refere a aparência mais azulada das hemácias


causada pela presença de restos de RNA ribossomal. São maiores
que as hemácias normais. A recomendação é quantificar a
policromasia e proceder à contagem de reticulócitos.

ACANTÓCITOS - são células redondas, hipercrômicas apresentando


de 2 – 20 projeções do citoplasma ou espículas de tamanho,
espessura e forma variáveis.
46

POIQUILOCITOSE – variações de formas das hemácias.

DREPANOCITOSE – hemácias em formato de foice, típicas da


anemia falciforme.

ESFEROCITOSE – hemácias em formato esférico.

ESQUIZOCITOSE – hemácias de formas bizarras.

ELIPTÓCITOS E OVALÓCITOS - Eliptócitos são células com forma


elíptica (o eixo maior é o dobro do eixo menor) enquanto que os
ovalócitos apresentam forma ovalada (o eixo maior é menor que o
dobro do menor).
47
48

Fig. 17 – Nomenclatura das alterações morfológicas das hemácias

- Velocidade de Hemossedimentação (VHS)


Existem, atualmente, vários métodos laboratoriais para verificar a
existência de marcadores de resposta inflamatória. A velocidade de
hemossedimentação (VHS) é um teste simples e de baixo custo que
tem sido usado, há mais de meio século, com este objetivo. O
exame consiste na medida da altura da camada de hemácias de
uma amostra de sangue venoso anticoagulado que se sedimenta
49

em um tubo de vidro graduado num determinado período


de tempo. Ainda hoje, a VHS vem sendo utilizada com
frequência na prática clínica como marcador inespecífico
de doenças. Porém, vários fatores podem afetar o resultado
da VHS, produzindo tanto resultados falso-positivos como
falso-negativos, levando a dificuldades diagnósticas ou a
investigações subsequentes caras e desnecessárias. Ainda
assim, esse pode ser um exame útil, quando bem indicado.

Faixa etária Sexo masculino Sexo feminino


< 50 anos de idade até 15mm/h até 20mm/h
> 50 anos de idade até 20mm/h até 30mm/h
> 85 anos de idade até 30mm/h até 42mm/h

Fig. 18 – Valores de referência da VHS.

Fatores Aumento da VHS Diminuição da VHS


Tubo inclinado =/ temperatura Temperatura ambiente
Analíticos
ambiente. Erro na diluição Demora ao realizar o teste

Contraceptivos orais Antiflamátórios não hormonais


Medicamentos Heparina (Salicilato em altas dores)
Corticosteróides

Sexo feminino; Idade avançada; Hipofibrinogenemia;


Gravidez; Diabetes mellitus; Hipogamaglobulinemia;
Hipotireoidismo; Doenças do CIVD; Drepanocitose;
teccido conjuntivo; Processos Policitemia; Microcitose;
Fisiológicos e infecciosos diversos; Processos Anemias hemolíticas
Patológicos
inflamatórios diversos; Neoplasiais; Hemoglobinopatias;
IRC (estágio final) Obesidade; Esferocotose; Leucocitose
Hipercolesterolemia; Dano tecidual extrema (LLC).
(IAM,AVC); Anemia; Macrocitose.

IRC: insuficiência renal crônica; IAM: Infarto agudo do miocárdio; AVC: acidente vascular cerebral; CIVD: coagulação
intravascular disseminada; LLC: Leucemia linfocítica crônica.

Fig. 19 – Fatores que influenciam a VHS.


50

ANEMIAS
Anemia é definida como a redução da concentração de
hemoglobina do sangue abaixo de 13,5 g/dL em homens
adultos e 11,5 g/dL em mulheres adultas. Essa diminuição
geralmente é acompanhada por redução da contagem de
eritrócitos e do hematócrito, porém esses valores podem
ser normais em alguns pacientes com níveis baixos de
hemoglobina.

Raramente a anemia é a doença principal, na maioria das


vezes é uma alteração secundária de uma doença de base.
Por isso é fundamental além de estabelecer o diagnóstico
da anemia, buscar suas possíveis causas.

A anemia pode ser consequência de três mecanismos


principais:

• Diminuição da sobrevida dos eritrócitos (hemorragias


agudas/hemólise);

• Defeitos na produção medular (hipoproliferação);

• Defeitos na maturação dos eritrócitos (eritropoese


ineficaz);
51

Na anemia por hemorragias as manifestações dependem da


velocidade de instalação do quadro. Uma hemorragia aguda,
como nos traumas, pode levar rapidamente ao choque,
enquanto a hemorragia crônica, comum em sangramentos
do trato gastrointestinal, pode haver uma redução muito
significante dos eritrócitos sem apresentar sintomas.

O aumento dos reticulócitos, como compensação medular,


não ocorre inicialmente nas hemorragias agudas, devido ao
curto período para proliferação. Diferente da anemia
hemolítica que está associada a altos índices de
reticulócitos devido a compensação.

A anemia hipoproliferativa pode ser resultado da redução da


eritropoetina, como ocorre na insuficiência renal, pela
carência de vitamina B12, ferro e ácido fólico, fundamentais
para o processo de eritropoiese, ou devido a doenças
inflamatórias e neoplásicas.

Os sintomas estão associados a redução do transporte de


oxigênio pelo sangue, alteração do volume sanguíneo total e
a resposta compensatória cardiopulmonar.
52

Quanto mais abrupta a queda nos níveis de hemoglobina


e/ou volume sanguíneo, mais intensos são os sintomas. É o
que ocorre nas hemorragias agudas ou crises hemolíticas
em que os pacientes podem apresentar dispneia,
palpitação, tontura e fadiga.

Já nas anemias crônicas, como a ferropriva, o paciente pode


permanecer assintomático ou pouco sintomático, mesmo
com baixos níveis de hemoglobina. Esse paciente pode
apresentar a língua lisa e uma vontade de comer
substâncias insólitas tais como barro ou tijolo (síndrome de
Pica).

O sinal mais comum das anemias é a palidez, que é mais


bem detectada nas mucosas da boca, conjuntivas e leito
ungueal.

Também pode ocorrer icterícia e esplenomegalia sugerindo


anemia hemolítica, a glossite pode ocorrer nas anemias
carenciais e úlceras de pernas são comuns na anemia
falciforme.
53

Outros sintomas associados a anemias são:

• Cefaleia;
• Vertigem;
• Hipotensão postural;
• Fraqueza muscular.

Existem diversas formas de classificar as anemias. A mais


comum é segundo critérios morfológicos ou
fisiopatológicos.

Fig. 20 – Classificação morfológica das anemias.

Classificação fisiopatológica das anemias:

• Anemias por falta de produção: (podem acompanhar

doenças inflamatórias, infecciosas e neoplásicas).

• Produção deficiente de glóbulos vermelhos por


acometimento primário ou secundário da medula óssea;
54

• Falta de eritropoetina;

• Carência de ferro, vitamina B12 e ácido fólico.

• Anemias por excesso de destruição ou regenerativas:


ocorre nas anemias hemolíticas ou anemias por perda de
sangue. A hemólise pode ser causada por defeitos
intrínsecos, como nas anemias associadas a alterações
hereditárias ou fatores extrínsecos, como exposição a
toxinas, parasitas ou agentes infecciosos.

Anemia Anemia Anemia


Normocítica/ Microcítica/ Microcítica/
Normocrômica Hipocrômica Hipocrômica

Megaloblástica/
Hemorragias Ferropriva
Perniciosa

Hemólise Talassemia Aplástica

Leucemia
Doença Renal Sideroblástica Mieloide

Doença Crônica Chumbo

Fig. 21 – Tipos de anemias de acordo com os índices hematimétricos.


55

SÉRIE PLAQUETÁRIA
Também conhecida como plaquetograma, avalia a
quantidade total de plaquetas por mm³ de sangue e,
consequentemente, o estado de coagulação.

As plaquetas ou trombócitos são fragmentos


citoplasmáticos do megacariócito com vida útil média de
8-10 dias que atuam na coagulação sanguínea como
primeira barreira para conter hemorragias, além de
participar da via intrínseca da cascata de coagulação.

Uma pessoa normal tem entre 150.000 e 450.000


plaquetas por milímetro cúbico de sangue. Sua diminuição
ou disfunção pode levar a sangramentos, assim como seu
aumento pode aumentar o risco de trombose.
Trombocitopenia ou plaquetopenia é a diminuição do
número de plaquetas no sangue, enquanto trombocitose ou
plaquetose é o seu aumento.

A trombocitopenia pode ser causada por doenças como:


púrpura trombocitopênica idiopática, púrpura
trombocitopênica trombótica, trombocitopatias genéticas,
síndrome hemolítico-urêmica. Alguns medicamentos
também podem induzir a trombocitopenia, tais como os
56

anti-inflamatórios não esteroides (AINES), quimioterápicos e


alguns antibióticos. Em casos de gravidez pode ocorrer
diminuição no número de plaquetas devido a síndrome
HELLP). Tanto a trombocitopenia quanto a trombocitose
podem estar presentes em problemas de coagulação.

Causas Situações
Produção insuficiente Infiltração leucêmica na medula óssea.
Aplasia de medula, Medicamentos,
Produtos químicos, Infecções virais.

Destruição aumentada Imunológica por auto e alo-anticorpos.


Púrpura trombocitopênica auto-imune.
Esplenomegalia.

Consumo exagerado Coagulação intravascular disseminada.


Púrpura trombocitopênica trombótica.

Fig. 22- Principais causas de plaquetopenia.

As elevadas contagens plaquetárias podem se dever a


diversos processos patológicos:

• Essencial (primária)

• Trombocitose essencial (uma forma de doença


mieloproliferativa)

• Outras patologias mieloproliferativas, como a leucemia


mielógena crônica, policitemia vera, mielofibrose.
57

• Reativa (secundária)

• Inflamação

• Cirurgia

• Hiposplenismo (devida a uma função diminuída do baço)

• Deficiência em ferro

- Volume Plaquetário Médio (VPM):

O tamanho da plaqueta, medido através do Volume


Plaquetário Médio (VPM), é um marcador da função
plaquetária. Plaquetas grandes contêm mais grânulos
densos e produzem mais tromboxano A2, substância
liberada para agregação plaquetária.

A padronização do valor de referência para o VPM não é um


fato definido, existindo variações nas citações científicas.
No entanto, o valor de referência mais utilizado é VPM=8,7 µ
m³ (± 1.46). Nos indivíduos saudáveis, o VPM varia, dentro
dos valores de referência, inversamente com a contagem de
plaquetas, ou seja, a interpretação dos valores de VPM como
anormalmente baixa ou alta é melhor realizada com
referência à contagem de plaquetas do paciente.
58

Na trombocitopenia, se VPM se apresentar diminuído, o


problema é de origem medular e, aumentado, se estiver
acontecendo uma maior destruição periférica das
plaquetas. O VPM está geralmente aumentado quando há
um aumento do “turnover” plaquetário (plaquetas são
produzidas e destruídas rapidamente) e consequentemente
existe um defeito e falha de produção.

Encontra-se aumento do VPM no hipertireoidismo, na


doença mieloproliferativa, na púrpura trombocitopênica
idiopática, na púrpura trombocitopênica trombótica, na
coagulação intravascular disseminada, nas síndromes
mieloproliferativas (leucemia mieloide crônica, mielofibrose,
trombocitemia essencial), na pós-esplenectomia, nos
estados hipoesplênicos, no diabetes mellitus e na doença
vascular.

No caso das síndromes congênitas, o VPM está aumentado


na Síndrome de Bernard-Soulier, Síndrome de Epstein e
Síndrome de Plaqueta Cinzenta, situações clínicas bastante
raras.
59

Portanto, deve-se iniciar a avaliação do paciente atentando


se tem ou não diabetes mellitus e/ou doença vascular, pois
estas são patologias muito comuns e intimamente
relacionadas com a presença das macroplaquetas.

Este índice também apresenta relação com problemas


cardíacos, visto que plaquetas grandes agregam mais
facilmente e podem formar trombos, o que se torna um fator
de risco independente para o infarto agudo do miocárdio
(IAM) e para o aparecimento da obstrução arterial
coronariana na angina instável.

Recentemente se associou o VPM como um possível


marcador inflamatório, sendo que o mesmo se mostrou
diminuído em doenças crônicas como lúpus e artrite em
atividade em comparação à pacientes portadores com
doença inativa. Ele também se mostra diminuído em
doenças inflamatórias do intestino.

SÉRIE BRANCA
Essa análise é também conhecida como leucograma e avalia
as contagens total e diferencial (valores relativo e absoluto)
60

dos leucócitos, bem como a morfologia dessas células. A

contagem pode ser feita pelo método automatizado ou

manual, utilizando-se a câmara de Neubauer.

A contagem global dos leucócitos (leucometria) nos dá o

quantitativo absoluto de todos os leucócitos encontrados,

em mm³ de sangue. Seus valores de referência (VR) para um

adulto jovem são de cerca de 4.000 a 11.000/mm³, mas

esses valores podem sofrer pequenas variações de

laboratório para laboratório ou de referência para referência

bibliográfica.

Os elementos celulares do leucograma podem ser divididos

em granulócitos polimorfonucleares (basófilos, eosinófilos e

neutrófilos) e em mononucleares ou agranulócitos

(linfócitos e monócitos). Os neutrófilos, por sua vez, ainda

são subdivididos em mielócitos, metamielócitos, bastões e

segmentados, sendo os segmentados a forma madura de

neutrófilos e, as demais, formas imaturas.


61

Fig. 23 - Tipos de leucócitos.

Fig. 24 - Vida média dos leucócitos.

Os granulócitos são úteis no processo de fagocitose, e


desempenham função essencial na resposta aos
microorganismos. Eles atuam, também, na reação tecidual
inflamatória associada.
Os linfócitos pertencem ao grupo dos leucócitos
mononucleares ou agranulócitos, uma vez que eles não
62

possuem grânulos citoplasmáticos específicos. São células

centrais na resposta imune adaptativa, atuando tanto em

seu braço celular – linfócitos T, como no seu braço humoral

– linfócitos B.

Por fim os monócitos, que também pertencem ao grupo dos

mononucleares. Em condições fisiológicas, é a maior célula

do sangue periférico, com 14 a 18 micrômetros de diâmetro.

Quando saem da circulação, migrando para os tecidos,

passam a ser denominados de macrófagos. Os macrófagos

relacionam-se com a resposta imune inata, assim, são

igualmente estimulados pelos linfócitos T após a montagem

da resposta imune adaptativa.

Fig. 25 - Resposta imune inata e adaptativa.


63

Célula Principais Funções


Participam da resposta imunológica inata,
Neutrófilos com atuação especial nas infecções bacterianas.

Eosinófilos Participam da resposta imunológica inata, com


atuação especial nos processos alérgicos e nas
infecções parasitárias.

Basófilos Participam de processos alérgicos.

Participam da resposta imunológica adaptativa,


Linfócitos
celular (linfócitos T) e humoral (linfócitos B).

Participam da resposta imunológica inata; além


Monócitos
disso, são ativados por linfócitos T.

Fig. 26 - Função dos leucócitos circulantes.

Leucograma

% existente no sangue Por microlitro

Leucócitos 3600-11000

Neutrófilos 45-70 1500-7000

Linfócitos 20-50 1000-4500

Monócitos 2-10 100-1000

Eosinófilos 0-7 0-700

Basófilos 0-3 0-200

Fig. 26 - Função dos leucócitos circulantes.


64

- Alterações na contagem total de leucócitos:


Leucocitose e Leucopenia

A leucocitose é uma condição em que os leucócitos estão


acima do valor de normalidade, enquanto leucopenia é
quando estão abaixo dos valores de referência.
Especialmente a leucocitose deve ser adjetivada em
discreta (ou leve), moderada e acentuada, de acordo com os
valores do leucograma.

As leucocitoses ocorrem basicamente


em três situações:

1 Leucocitose fisiológica: geralmente de grau leve é


comum em gestantes, recém-nascidos, lactantes,
após exercícios físicos e em pessoas com febre;

2 Leucocitose reativa: estão notadamente


relacionadas com o aumento de neutrófilos e se
devem às infecções bacterianas, inflamações,
necrose tecidual e doenças metabólicas;

3 Leucocitose patológica: estão relacionadas a


doenças mieloproliferativas (leucemias mieloides,
policitemia vera, mieloesclerose) e linfoproliferativas
(leucemias linfoides e alguns linfomas).
65

A leucopenia muitas vezes se deve à diminuição dos


neutrófilos e pode ser de causas fisiológica ou induzida por
drogas e poluentes, reativa e processos imunológicos.

Leucopenia Leucocitose

Fisiológica (africanos e Fisiológica (gestantes, RNs)


descendentes ou familiar)
Doenças mieloproliferativas
Drogas (anti-inflamatórios, (leucemias mieloides, policitemia
antibacterianos, vera, mieloesclerose) e
anticonvulsivantes, linfoproliferativas (leucemias
antidepressivos) linfoides e alguns linfomas)

Intoxicação por benzeno, Infeções


agrotóxicos
Inflamação
Infecções graves
Trauma
Insuficiência da medula óssea
Necrose tecidual
Doenças autoimunes

Fig. 28 - Causas de Leucocitose e Leucopenia

- Alterações na contagem de neutrófilos:

O aumento na contagem de neutrófilos denomina-se


neutrofilia. Enquanto a diminuição da contagem de
netrófilos chama-se neutropenia.
Na vigência da alteração na leucometria, é fundamental a
cuidadosa análise da morfologia leucocitária, distinguindo
para os neutrófilos as seguintes verificações: presença de
neutrófilos jovens (bastões, metamielócitos, mielócitos e
66

promielócitos), granulações tóxicas e vacúolos


citoplasmáticos.

Em casos de infecção bacteriana aguda observa-se


neutrofilia reativa, ou seja, um aumento na produção de
neutrófilos na medula óssea em resposta à infecção. Neste
caso, temos a presença de neutrófilos jovens no sangue
periférico, o que conhecemos como “desvio para a
esquerda”.

Fig. 29 - Desvio para a esquerda no leucograma.

Obs.: em condições normais pode-se encontrar até 4% de bastonetes e


até 1% de metamielócitos no sangue periférico sem que essa condição
esteja associada à leucocitose e à quadros de infecção.

Nas leucocitoses patológicas, especialmente aquelas que


derivam de leucemias agudas, é comum observar leucócitos
jovens e com nucléolos – os blastos. Em leucemias
mieloides agudas a presença de blastos (ou mieloblastos) é
muito frequente, da mesma forma que os blastos (ou
linfoblastos) nas leucemias linfoides agudas.
67

Neutropenia Neutrofilia

Infecções bacterianas graves Infecções bacterianas agudas

Infecções virais Inflamação

Medicamentos, substâncias Distúrbios metabólicos (diabetes


químicas, radiação e venenos melito, insuficiência renal e
hepática)
Doenças hematopoiéticas
(anemia aplásica, leucemia) Hemorragia aguda e anemia
hemolítica

Doenças mieloproliferativas
(leucemias mieloides, policitemia
vera, mieloesclerose)

Fig. 30 - Causas de Neutropenia e Neutrofilia.

- Alterações na contagem de eosinófilos:

Muitas vezes o leucograma apresenta situações de aumento


na contagem de eosinófilos - eosinofilia. No Brasil, as
eosinofilias são causadas principalmente por infestações
parasitárias (ascaris, estrongiloides e schistosomas,
principalmente). Há também as eosinofilias familiares
(benignas) e as síndromes hipereosinofílicas. Outras causas
de eosinofilias são: alergia, câncer com metástases, doença
de Hodgkin, leucemia mieloide crônica, eczema, psoríase,
pênfigo e dermatite.
68

Algumas situações podem interferir na contagem de


eosinófilos, tais como:

Ritmo circadiano: a contagem normal de eosinófilos é


menor pela manhã, depois aumenta; por este motivo, a
contagem seriada de eosinófilos deve ser repetida sempre
no mesmo horário.

Situações de estresse: queimaduras, estados


pós-operatórios, choque elétrico e trabalho de parto
podem reduzir a contagem.

Uso de corticosteroides: geralmente causam uma


diminuição e até ausência de eosinófilos no sangue
periférico.

- Alterações na contagem de basófilos:

Os basófilos são células que constituem um percentual


pequeno do número de células brancas, representando os
leucócitos menos numerosos no homem. Eles são células
que apresentam grânulos grandes, pretos e pouco
numerosos e têm afinidade por corantes básicos, daí o
nome basófilos.
69

No citoplasma dos basófilos existem grânulos cheios de


substâncias como heparina, histamina e serotonina, essas
substâncias representam um papel essencial na resposta à
quadros alérgicos e em reações anafiláticas, relacionadas à
ação da imunoglobulina E (IgE).

Ou seja, numa situação de basofilia (aumento na contagem


dos basófilos), costuma haver associação direta com
quadros alérgicos. Mas essa condição também pode estar
relacionada à leucemia, doença de Hodgkin, inflamação,
radiação ionizante, hipotireoidismo e infecções.

Os basófilos têm similaridades funcionais com os


mastócitos, mas são células distintas: os mastócitos são
células do tecido conjuntivo que não entram em circulação
e seus grânulos são menores mais abundantes do que os
basófilos. Sendo assim, não encontramos mastócitos no
leucograma.

- Alterações na contagem de linfócitos:


Os linfócitos representam o último estágio do sistema
linfocítico. Eles são essenciais à resposta imune humoral e
celular do organismo a antígenos e constituem
pequenas células de núcleo arredondando e único (células
70

mononucleares); e, de modo geral, não apresentam grânulos


citoplasmáticos, portanto, são agranulócitos.

Podem ser de dois tipos:


Linfócitos B – participam apenas nos processos de
imunidade humoral e é o precursor da principal célula
formadora de anticorpos do organismo – o plasmócito.

Linfócito T - estão envolvidos em processos de imunidade


celular e na regulação da síntese de anticorpos, podem ser
do tipo T CD4 (auxiliares) ou T CD8 (citotóxicos).

Uma terceira classe de linfócitos, a célula assassina natural


(natural killer – NK), também foi identificada. Ela diverge da
linhagem de células T em estágio inicial; não necessita de
condicionamento tímico; e difere funcionalmente da célula T
porque ataca certos tipos de células-alvo sem
sensibilização anterior da célula-alvo.

As células T e B são distribuídas diferentemente do tecido


linfoide periférico. Normalmente, as células T constituem
aproximadamente 70% dos linfócitos no sangue. As células
B, que constituem 10 a 15% dos linfócitos circulantes,
também se movem nos dois sentidos entre sangue e tecido,
71

mas em menor extensão do que as células T.

A linfocitose é uma condição em que há um aumento na


produção total de linfócitos, enquanto a linfocitopenia, uma
redução. Existem algumas situações em que os enfermeiros
precisam estar atentos para alterações de linfócitos que
não estejam relacionadas à quadros patológicos, tais como
acontece nos recém-nascidos, exercícios e estresse.

As infecções virais geralmente induzem a linfocitose relativa,


com ou sem leucocitose e, às vezes, até leucopenias. Nesses
casos a presença de linfócitos atípicos que se caracterizam
pelas morfologias alteradas nas formas do núcleo e da
célula, na relação núcleo/citoplasmática e intensa basofilia
do citoplasma, constantemente ultrapassa a 5% dos
linfócitos contados. Muitas vezes, as infecções virais
sensibilizam as células apresentadoras de antígenos as
quais são caracterizadas pela monocitose e linfocitose
conjuntamente, como ocorrem na mononucleose
infecciosa.

Outras causas de linfocitose incluem infecções crônicas


(tuberculose, sífilis e brucelose), leucemia linfocítica,
linfomas e mieloma múltiplo. Já a linfocitopenia pode estar
72

associada à quadros de imunodeficiência, sepse,


radioterapia e uso de antineoplásicos.

Linfocitopenia Linfocitose

Imunodeficiência Infecções virais

Sepse Infecções bacterianas crônicas

Radioterapia Leucemia linfocítica

Uso de medicamentos (por Linfomas


exemplo, antineoplásicos)
Mieloma múltiplo

Estresse

Fig. 31 - Causas de Linfocitopenia e Linfocitose.

- Alterações na contagem de monócitos:

Os monócitos são células responsáveis por remover células


mortas, micro-organismos e partículas insolúveis do sangue
circulante. São células grandes com núcleo oval que
participam da fagocitose e da resposta imune inata.

O termo monócito refere-se às células fagocíticas do


sangue, uma vez atravessando o endotélio vascular e
migrando para os tecidos, transformam-se em macrófagos.
73

Monocitopenia Monocitose

Leucemia monocítica e outras Infecções bacterianas e virais


leucemias agudas

Distúrbios mieloproliferativos Infecções bacterianas crônicas


(leucemia mieloide, anemia
aplásica e policitemia vera) Inflamação crônica

Doença de Hodgkin e outros Infecções por protozoários


linfomas (malária, leishmaniose visceral e
tripanossomíase)
Infecções graves

Lúpus Eritematoso Sistêmico

Fig. 32 - Causas de Monocitopenia e Monocitose.

COAGULOGRAMA
O coagulograma é um conjunto de exames que permite
avaliar os processos de coagulação do sangue.

O exame possui inúmeras aplicações clínicas, nas quais


saber o real status de capacidade coagulatória faz grande
diferença, tais como em situações de pré-operatório,
investigação de sangramentos, diagnóstico e seguimento de
doenças hematológicas, sepse, coagulação intravascular
disseminada (CIVD), acompanhamento em vigência do uso
de medicamentos que alteram a coagulação, após a picada
de animais peçonhentos cujo veneno altera a coagulação
sanguínea, suspeita de dengue, dentre outros.
74

A coagulação é um processo sequencial de eventos dentro


do nosso corpo conhecido como hemostasia. Esse é o
fenômeno fisiológico, responsável pelo equilíbrio dinâmico
que procura manter o sangue fluido no interior dos vasos,
bem como impedir a sua saída para os tecidos vizinhos. Este
fenômeno é dividido em primário e secundário.

A hemostasia primária atua regredindo o sangramento por


meio da formação de um trombo ou tampão plaquetário. A
formação do tampão de plaquetas em um sítio de injúria
vascular requer a integridade de três componentes da
função plaquetária: adesão, ativação e agregação.

A hemostasia secundária é feita a partir da ativação de


várias proteínas por meio de uma cascata da coagulação até
a formação de uma rede adesiva de fibrina que consolida o
trombo. Além dos fatores de coagulação e das plaquetas, a
vitamina K e o cálcio possuem papéis essenciais para uma
boa coagulação.

Da mesma forma que produzimos substâncias


pró-coagulantes, também produzimos substâncias para
degradar os coágulos formados nos vasos sanguíneos
através da fibrinólise.

Fibrinólise pode ser definida como a degradação da fibrina


75

mediada pela plasmina. O sistema fibrinolítico ou sistema


plasminogênio/plasmina é composto por diversas proteínas
(proteases séricas e inibidores) que regulam a geração de
plasmina, uma enzima ativa produzida a partir de uma
pró-enzima inativa (plasminogênio) que tem por função
degradar a fibrina e ativar metaloproteinases de matriz
extracelular.

São conhecidos dois ativadores fisiológicos do


plasminogênio: o ativador do plasminogênio do tipo tecidual
(t-PA, “tissue-type plasminogen activator”) e o ativador do
plasminogênio do tipo uroquinase (u-PA, “urokinase-type
plasminogen activator”).

Fig. 33 Hemostasia primária, secundária e fibrinólise.


76

A cascata da coagulação é um processo pelo qual os fatores


da coagulação são ativados de forma sequencial até a
formação do coágulo de fibrina.

Fator Nome Onde/como surge


FATOR I Fibrinogênio FÍGADO
FATOR Ia Fibrina VIA COMUM
FATOR II Protrombrina FÍGADO (depende de vitamina K)
FATOR IIa Trombina VIA COMUM
FATOR III Tromboplastina Tecidual ENDOTÉLIO
FATOR IV Cálcio FÍGADO
FATOR V Proacelerina FÍGADO E PLAQUETAS
FATOR VII Proconvertina FÍGADO (depende de vitamina K)
FATOR VIII Fator Anti-hemofílico A FÍGADO
FATOR IX Fator Anti-hemofílico B FÍGADO (depende de vitamina K)
FATOR X Fator Stuart FÍGADO (depende de vitamina K)
Precursor da Tromboplastina
FATOR XI Plasmática FÍGADO

Fator Hageman (esse nome não


FATOR XII FÍGADO
vai nos ajudar muito).

Fig. 33 – Fatores da coagulação.

O modelo da cascata dividiu a sequência da coagulação em


duas vias: a via intrínseca, na qual todos os componentes
estão presentes no sangue; e a via extrínseca, na qual é
necessária a presença da proteína da membrana celular
subendotelial, o fator tecidual – Tromboplastina Tecidual.
Essas duas vias convergem para uma via comum.
77

A coagulação, pela via intrínseca, é desencadeada quando o


fator XII e ativado pelo contato com alguma superfície
carregada negativamente (por exemplo, colágeno ou
endotoxina). Além do fator XII, estão envolvidos neste
processo o fator XI, a pré-calicreína e o cininogênio de alto
peso molecular (HMWK = high molecular weight kinogen).
Tanto o fator XI quanto a pré-calicreína necessitam da
HMWK para efetuar a adsorção à superfície em que está
ligado o fator XIIa. Da interação destes elementos é ativado
o fator XI, que transforma o fator IX em IXa. O fator IXa e o
fator VIIIa associam-se à superfície de fosfolipídio através
de uma "ponte" de cálcio estimulando a conversão de fator X
para Xa.

De modo mais simples, na via extrínseca, a coagulação é


desencadeada quando os tecidos lesados liberam o fator
tecidual (tromboplastina tecidual), que forma um complexo
com o fator VII, mediado por íons cálcio. Este complexo age
sobre o fator X estimulando sua conversão em Xa. A partir
deste ponto, as duas vias encontram um caminho comum
em que ocorre a conversão de protrombina em trombina
que, por sua vez, estimula a transformação de fibrinogênio
em fibrina.

Os eventos comuns da coagulação (via final comum),


quer sejam iniciados pela via extrínseca ou intrínseca, são a
78

ativação do fator X(Xa), a conversão de trombina a partir da


protrombina pela ação do fator Xa, formação de fibrina
estimulada pela trombina e estabilização da fibrina pelo
fator XIIIa.

Fig. 34 – Cascata da coagulação e vias de anticoagulação.


79

Os exames tradicionais utilizados para avaliação da


coagulação devem ser interpretados em conjunto,
associados aos eventos clínicos observados e, desta forma,
poderão ajudar a determinar a causa básica do
sangramento anormal. Entretanto, os exames tradicionais
nem sempre estão disponíveis com a rapidez necessária nas
situações críticas que ocorrem habitualmente nas salas de
operação e nas unidades de tratamento intensivo. O
coagulograma determina, principalmente, o perfil
quantitativo dos elementos envolvidos no processo de
coagulação.

Para avaliação do estado de coagulação, além da série


plaquetária, pode-se avaliar o Tempo de Sangramento (TS),
o Tempo de Ativação da Protrombina (TAP), o Tempo de
Tromboplastina Parcial Ativada (TTPA), o Tempo de
Trombina (TT) e a Dosagem de Fibrinogênio.

- Tempo de sangramento (TS):

O tempo de sangramento é o tempo necessário para que


um pequeno corte superficial na pele pare de sangrar.
Geralmente é feito por uma lanceta padronizada no lobo
auricular (Teste de Duke), com uma incisão em torno de 1
mm de profundidade, ou na pele do antebraço (teste de Ivy).
O TS depende da hemostasia primária (plaquetas, fator de
80

von Wille-brand), mas também da integridade vascular


cutânea. O valor normal é de 3-7min.

- Tempo de Protrombina (TP ou TAP):

O tempo de ativação da protrombina é o tempo em


segundos para formação do coágulo de fibrina,
normalmente entre 10 – 14 segundos. É um procedimento
laboratorial que avalia os fatores de coagulação II, V, VII e X
(via extrínseca), sendo que, destes, os fatores II, VII e X são
vitamina K-dependentes. Por esse ensaio, consegue-se
estabelecer o tempo de formação do coágulo de fibrina, o
qual é iniciado a partir da ativação do fator VII, culminando
com a conversão do fibrinogênio (Fator I) em fibrina.

TP TP
Deficiência de fibrinogênio Terapia de reposição hormonal
Deficiência de protrombina Uso de contraceptivos orais
Deficiência de um dos fatores
Terapia com barbitúricos
de coagulação (II, V, VII, ou X)

Deficiência associada de vários Administração de multivitamínicos


fatores, por insuficiência hepática, ou suplementos alimentares
deficiência de vitamina K contendo vitamina K

Fig. 35 Etiologia das anormalidades no tempo de protrombina.

Infelizmente, existe uma grande diferença entre os extratos


de tromboplastina utilizados, com variações significativas
de qualidade, de sensibilidade em relação aos fatores
81

vitamina K dependentes, de matriz (humana, sintéticas) e


até mesmo entre aparelhos/metodologias diferentes.

A fim de se adequar a todas essas variáveis, foi necessário


criar uma forma de padronizar, à nível mundial, os resultados
entre os laboratórios clínicos. Dessa necessidade, foi
desenvolvido o INR (International Normalized Ratio), ou razão
normalizada internacional. O INR nada mais é que um cálculo
automático, realizado pelos aparelhos a partir do resultado
do TAP, o que permite uma comparação interlaboratorial,
independentemente da tromboplastina utilizada.

Já o ISI (International Sensitivity Index) é uma medida,


determinada pelos fabricantes, que cada reagente (e até
mesmo entre cada lote do mesmo fabricante) do TAP
possui, tendo em vista as diferentes sensibilidades destes
para as deficiências dos fatores da coagulação. O ISI é
considerado 1,00 quando a tromboplastina utilizada é a
padrão (OMS), quanto maior a sensibilidade/qualidade da
tromboplastina do kit, mais próximo de 1,0 será o ISI. O valor
de referência utilizado é de 0,8 a 1,1.

O INR ou RIN é expresso por essa fórmula:

INR = [TAP do paciente em segundos / TAP médio normal em segundos] ISI


82

A determinação de TP é imprescindível na avaliação, no

acompanhamento e na evolução de pacientes portadores

de patologias variadas e no monitoramento de pacientes

que estão em terapia com anticoagulantes orais. Um

exemplo clássico dessa finalidade é o de monitorar, pelo INR,

os efeitos dos antagonistas da vitamina K (ex.: varfarina) na

coagulação.

A adoção do INR, por parte dos laboratórios clínicos, foi de

grande importância para a padronização dos seus

resultados. Portanto, especialmente para aqueles pacientes

que fazem uso de alguma droga antagonista da vitamina K, e

que necessitam de um acompanhamento periódico para se

atingir uma determinada faixa terapêutica, o INR permite

uma comparação válida entre os diferentes kits e

metodologias disponíveis. Dessa maneira, resultados

reportados em laboratórios diferentes podem ser ajustados,

contribuindo assim para uma maior segurança e adequado

manejo da anticoagulação.
83

Situação INR alvo


Normal 0,8 – 1,1
Profilaxia para TVP 1,5 – 2,0
Cirurgia ortopédica 2,0 – 3,0
TVP 2,0 – 3,0
FA 2,0 – 3,0
Embolia Pulmonar 2,5 – 3,5
Valvas cardíacas mecânicas 3,0 – 4,0
Valor crítico > 5,5

Fig. 36 – Situações de anticoagulação e INR alvo.

- Tempo de Tromboplastina Parcial Ativada (TTPA):

O TTPA avalia a via intrínseca da coagulação que envolve


vários fatores de coagulação como os fatores XII, XI, IX, VIII, X,
V, II (protrombina), I (fibrinogênio) e finalmente a fibrina. O
TTPA é relativamente mais sensível às deficiências dos
fatores VIII e IX do que às deficiências dos fatores XI e XII ou
fatores da via comum. O valor de referência do TTPa para
uma pessoa saudável deve variar entre 24 a 40 segundos.

Distúrbios hereditários e adquiridos da via intrínseca da


cascata da coagulação são caracterizados pelo TTPA
prolongado e o tempo de protrombina (TP) normal, é o caso
de pacientes com hemofilias A (deficiência do fator VIII) e B
(deficiência do fator IX), uso de heparina doenças hepáticas,
uso de anticoagulantes.
84

Alargamento de TTPa Encurtamento de TTPa


Deficiência de fatores da coagulação Câncer avançado
CIVD Trombofilias
Doença de Von Willebrand
Uso de heparina

Fig. 37 – Fatores associados ao alargamento e encurtamento de TTPa.

- Tempo de Trombina (TT) e Dosagem de Fibrinogênio:

O Tempo de Trombina (TT) é medido adicionando trombina


humana a uma amostra de plasma. A trombina converte o
fibrinogênio solúvel em fibrina, formando o coágulo. O
tempo normal é de 7-12s, sendo que, após 60 segundos, o
coágulo encontra-se sólido.

Um tempo de trombina alargado ou a formação de um


coágulo sem as características citadas significa que existe
afibrinogenemia, hipofibrinogenemia (fibrinogênio
plasmático <100 mg/dl) ou disfibrinogenemia. A coagulação
Intravascular Disseminada (CIVD) é o principal exemplo de
hipofibrinogenemia grave adquirida. O TT também está
alargado na presença de fatores antitrombínicos, como a
heparina e o veneno botrópico.

Atualmente, utiliza-se com mais frequência a dosagem


direta do fibrinogênio plasmático para o diagnóstico da
85

hipofibrinogenemia. O valor normal é acima de 100 mg/dl. A


hipofibrinogenemia hereditária e a CIVD são as principais
entidades que alteram esses valores.

ELETRÓLITOS
Para manutenção da homeostase corporal, faz-se
necessário um equilíbrio entre o volume de água e
eletrólitos nos 3 compartimentos corporais: líquido
intracelular, intersticial e intravascular (plasma). Esse
equilíbrio se dá por complexos mecanismos de regulação
química, renal e hormonal (hormônio antidiurético – ADH e
aldosterona).

Fig. 38 – Ciclo de regulação de líquidos. ADH = hormônio antidiurético; LEC =


líquido extracelular; PA = pressão arterial; TFG = taxa de filtração glomerular.
86

Eletrólitos são minerais que carregam uma carga elétrica


quando estão dissolvidos em um líquido como o sangue. Os
eletrólitos do sangue – sódio, potássio, cálcio, cloreto,
bicarbonato – ajudam a regular o funcionamento das células
dos músculos, inclusive o coração, cérebro e rins, bem como
manter um equilíbrio ácido-base e um equilíbrio hídrico
(osmolaridade plasmática).

Os eletrólitos, sobretudo o sódio (Na+), ajudam o corpo a


manter os níveis de líquido normais nesses compartimentos,
uma vez que a quantidade de volume contida em um
compartimento depende da sua concentração de solutos e
o Na+ é o principal soluto plasmático, responsável pela
osmolaridade plasmática (concentração do sangue), em
conjunto com a glicose e as proteínas do plasma. Se a
concentração de eletrólitos for alta, o líquido se move para
este compartimento (um processo chamado osmose). Do
mesmo modo, se a concentração de eletrólitos for baixa, o
líquido se move para fora deste compartimento. Para ajustar
os níveis de líquidos, o corpo pode mover ativamente os
eletrólitos para dentro ou para fora das células. Assim, ter
eletrólitos nas concentrações corretas (um estado
denominado equilíbrio eletrolítico) é importante para
manter o equilíbrio líquido entre os compartimentos.
87

Os rins ajudam a manter as concentrações de eletrólitos


através da filtragem de eletrólitos e água do sangue,
devolvendo alguns para a circulação e excretando qualquer
excesso pela urina. Assim, os rins ajudam a manter um
equilíbrio entre o consumo diário e a excreção de eletrólitos
e água.

Proteínas
300 - Uréia
Uréia
Glicose Proteínas,
Glicose outros solutos
Outros íons contendo
HCO3- HCO3- nitrogênio
Outros íons
Fosfatos
orgânicos

200 - CI- CI-


mOsm/kg H2O

Outros íons

Mg++

100 - K+
Na+ Na+

HCO3-
CI-
0 Na+
Plasma Fluido Fluido intracelular
intersticial (músculo-esquelético)

Fig. 39 – Distribuição eletrolítica nos três compartimentos corporais.


88

Os rins ajudam a manter as concentrações de eletrólitos


através da filtragem de eletrólitos e água do sangue,
devolvendo alguns para a circulação e excretando qualquer
excesso pela urina. Assim, os rins ajudam a manter um
equilíbrio entre o consumo diário e a excreção de eletrólitos
e água.

Fig. 40 – Fatores que interferem na osmolaridade plasmática e urinária.

- Sódio:

O sódio é o íon mais importante do espaço extracelular. A


manutenção do volume do líquido extracelular depende do
balanço de sódio. Sua regulação é mantida pelo organismo
em níveis estreitos (Na+ = 135 a 145 mEq/L), sendo vários os
mecanismos envolvidos no seu controle (osmorreceptores,
barorreceptores, mecanismos extra-renais e sistema
justaglomerular).
89

As alterações no equilíbrio de sódio plasmático são


conhecidas como hipernatremia (Na+ >145mEq/L) ou
hiponatremia (Na+ <135mEq/L). Existe uma estreita relação
entre a água e o sódio, de tal modo que os distúrbios desses
dois elementos não devem ser tratados de maneira
independente.

Hiponatremia
Causas: excesso de líquidos, doença renal,
insuficiência suprarrenal, diuréticos, SIADH,
hiperglicemia e ICC.

Sinais/Sintomas: hipotensão, anorexia, náuseas,


vômitos, ganho de peso, pele seca, fraqueza muscular,
hiporreflexia, câimbras, edema, irritabilidade/letargia,
cefaleia, convulsões, edema cerebral.

Tratamento: Restrição hídrica, correção Na+.

Hipernatremia
Causas: desidratação, diabetes insípidus.

Sinais/Sintomas: Sinais de desidratação, perda de


peso, sede, taquicardia e hipertensão.

Tratamento: Hidratação, monitorizar função renal.


90

- Potássio:

O Potássio (K+) é um cátion predominantemente


intracelular. Sua concentração sérica é bem menor que a do
Na+, variando de 3,5mEq/L até 5,0mEq/L. Esse mecanismo
regulatório depende da ação da bomba de Na+/K+/ATPase,
da insulina, aldosterona, de agentes beta-adrenérgicos e do
pH sanguíneo. Os distúrbios de K+ são muito frequentes na
prática clínica e podem ser fatais, devido ao fato de que as
flutuações nos níveis séricos (Hipercalemia >5,0mEq/L e
hipocalemia <3,5mEq/L) podem induzir a arritmias
ventriculares.

Hipocalemia
Causas: Diarreia, hipercalcemia, alcalose (mobilização
K+ para o líquido intracelular), medicamentos
(anfotericina B, laxantes, diuréticos de alça ou
tiazídicos, corticoides, metilxantinas, salbutamol,
digitálicos).

Sinais: fraqueza muscular, íleo paralítico, arritmias


(intensificada com uso de digitálicos). Onda T
achatada, presença de onda U e aumento do PR no
ECG.

Tratamento: Reposição K+.


91

Hipercalemia
Causas: infusão excessiva, insuficiência renal, uso de
diuréticos poupadores de K+, acidose,
hemotransfusão, rabdomiólise.

Sinais: alteração na FC e FV. Onda T apiculada, alta em


tenda no ECG.

Tratamento: diuréticos, metilxantinas, salbutamol,


Gluconato de Cálcio, NaHCO³, glicoinsulinoterapia,
resina de troca de cátions (Sorcal), diálise.

- Cálcio e Fósforo:

Os íons cálcio e fósforo são abundantes no esqueleto


humano, tendo um metabolismo em comum e associado a
fatores como a vitamina D e o paratormônio. Por meio
destes fatores se processa a homeostase destes íons,
havendo participação de órgãos como o rim, o intestino e o
próprio esqueleto.
A maior parte do cálcio encontra-se ligada e associada a
estruturas ósseas (99%). O cálcio livre, tanto na forma
ionizada, como na forma não ionizada, é encontrado no
fluido intra e extracelular. A manutenção da homeostase
do cálcio depende da adaptação da absorção intestinal às
92

necessidades do organismo, que é fruto do balanço entre


formação e reabsorção óssea e excreção urinária de cálcio.
Os níveis séricos de cálcio são regulados de maneira
rigorosa, uma vez que pequenas alterações em sua
concentração têm séria influência em processos biológicos,
como a condução cardíaca do estímulo elétrico. Esses níveis
são controlados por uma resposta integrada de hormônios
reguladores: o paratormônio, a vitamina D e a calcitonina. A
concentração sérica total de Ca++ varia de 8,5mg/dL à
10,5mg/dL.

Hipocalcemia
Causas: Hipoparatireoidismo (lesão após
tireoidectomia), hipertireoidismo, pancreatite,
insuficiência renal, transfusão, deficiência de vitamina
D, jejum.

Sinais: irritabilidade neuromuscular, convulsões,


tremores, tetania, arritmias com intervalo QT longo no
ECG. Os Sinais de Trousseau e Chvostek podem
acontecer tanto na hipocalcemia como na
hipomagnesemia.

Tratamento: Reposição Ca++ (gluconato de cálcio).


93

Hipercalcemia
Causas: hiperparatireoidismo (adenomas),
hipotireoidismo, neoplasia malígna, hipervitaminose,
diuréticos tiazídicos

Sinais: hipertensão, fraqueza muscular, íleo paralítico,


poliúria, cálculos renais e bradicardia com intervalo QT
curto no ECG.

Tratamento: hiperidratação, corticoide.

Fig. 41 Sinais de Trousseau e Chvostek.


94

No organismo humano adulto, há em torno de 600 g de

fósforo (1% do peso corpóreo), sendo 85% encontrado no

esqueleto e 15% no fluido extracelular, sob a forma de

fosfato inorgânico, e nos tecidos moles, sob a forma de

ésteres de fosfato. Embora o fósforo participe de reações

bioquímicas envolvidas na geração e na transferência de

energia, sua concentração intracelular é baixa,

localizando-se principalmente nas mitocôndrias. Em

condições normais, a concentração sérica de fósforo varia

entre 2,5 e 4,5 mg/dL. A deficiência crônica de ingestão de

fósforo leva primeiramente à hipofosfatemia e,

posteriormente, à depleção intracelular do íon. Por

comparação, a hiperfosfatemia ocorre na insuficiência renal

crônica avançada, mesmo quando a dieta contém níveis

normalmente aceitáveis de fósforo. O transporte de fósforo

é regulado por transportadores sensíveis à ingestão de

fósforo, como o paratormônio, a vitamina D e o pH.


95

Hipofosfatemia
Causas: cetoacidose, alcalose, deficiência de potássio
e magnésio, hiperparatireoidismo, vômitos, diarreia,
hiperventilação, uso de diuréticos, confusão,
miocardiopatia.

Sinais: parestesias, fraqueza muscular, dor,


insuficiência respiratória, convulsões.

Tratamento: reposição de fosfato por via oral.

Hiperfosfatemia
Causas: insuficiência renal, acidose,
hipoparatireoidismo, rabdomiólise, leucemia/linfoma
tratados com drogas citotóxicas.

Sinais: tetania, taquicardia, fraqueza muscular, sinais e


sintomas de hipocalcemia, calcificações nos pulmões,
coração, rins e córnea.

Tratamento: Vitamina D, restrição de diuréticos


tiazídicos.

- Magnésio:

O magnésio é, após o potássio, o segundo cátion


mais abundante no fluido intracelular dos organismos vivos.
96

É envolvido na maioria dos processos metabólicos,


participando no evento da síntese proteica via DNA. Está
envolvido na regulação da função mitocondrial, processos
inflamatórios e defesa imune, alergia, crescimento e
estresse, controle da atividade neuronal, excitabilidade
cardíaca, transmissão neuromuscular, tônus vasomotor e
pressão arterial.

A concentração sérica de magnésio varia de 1,8 – 2,7mg/dL,


e é o resultado de um balanço na ingestão/absorção do íon,
biodistribuição dentro do organismo e excreção (tanto
urinária quanto intestinal). O magnésio sérico total
correlaciona-se pobremente às reservas corpóreas, devido
à baixa fração presente no plasma.

Hipomagnesemia
Causas: alcoolismo, hiperparatireoidismo,
hiperaldosteronismo, NPT, laxativos, IAM, ICC,
concentrações de potássio e cálcio diminuídas.

Sinais: irritabilidade neuromuscular, tetania, sinal de


Trosseau e Chvostek (hipocalcemia e
hipomagnesemia), alterações do humor e hipertensão.
No ECG se assemelha à hipocalemia.

Tratamento: reposição de magnésio.


97

Hipermagnesemia
Causas: insuficiência renal e suprarrenal,
hipotireoidismo.

Sinais: hipotensão, rubor, fraqueza muscular,


sonolência, depressão cardiorrespiratória e coma. No
ECG se assemelha à hipercalemia.

Tratamento: gluconato de cálcio.

- Cloro

O cloro é o principal ânion extracelular filtrado pelos


glomérulos e reabsorvido nos túbulos renais. Este é
importante não apenas para manter a osmolaridade, mas
também participa do equilíbrio ácido-básico. Entre as
causas das alterações do cloro estão aquelas relacionadas
ao sódio, pois estes têm estreita relação entre si. No entanto
existem alterações no cloro independentes dos níveis de
sódio, as quais estão relacionadas com o equilíbrio
ácido-básico. A concentração sérica do Cloro (Cl-) varia de
96 -108mEq/L.
98

Hipocloremia
Causas: Doença de Addison, cetoacidose diabética,
acidose respiratória e alcalose metabólica, uso de
diuréticos tiazídicos ou de alça, fístulas e ileostomias,
fibrose cística.

Sinais: irritabilidade, tremores, hipertonicidade,


tetania, respirações lentas, convulsões.

Tratamento: administração intravenosa de líquidos


ricos em cloreto, como o cloreto de sódio a 0,9%
suplementados com cloreto de potássio, se indicado.

Hipercloremia
Causas: TCE, hipernatremia, insuficiência renal, uso de
corticoide, desidratação, alcalose respiratória e
acidose metabólica, uso de salicilatos.

Sinais: taquipneia, letargia, fraqueza, diminuição do


débito cardíaco, arritmias.

Tratamento: eliminação da fonte de cloreto e


administração de bicarbonato de sódio.
2
URINÁLISE
100

Uma urinálise, exame de urina tipo 1, também conhecido


como urina parcial, sumário de urina ou EAS (Elementos
Anormais do Sedimento) pode ser necessária na avaliação
de distúrbios nos rins e trato urinário, além de auxiliar, de
forma complementar no diagnóstico de outras condições
patológicas, como diabetes, hipertensão, distúrbios
hemolíticos ou hepatopatias.

Trata-se de um exame de rotina com alta demanda que


compreende um conjunto de provas não invasivas e de
baixo custo, com grande variedade de achados. Portanto,
além do EAS, há outros exames complementares que
avaliam a urina, tais como o exame de proteinúria de 24
horas e o exame e urocultura.

É de suma importância que a coleta do material seja feita


com qualidade, para confiabilidade e a exatidão dos
resultados observados. Assim, deve-se estar atento para a
coleta, o armazenamento e o transporte do material, visando
a qualidade da análise.

Uma amostra de urina é normalmente coletada pelo próprio


indivíduo usando um método de coleta asséptica em frasco
próprio ou saco coletor (crianças). A amostra estéril da
urina pode ser coletada por cateterismo vesical ou punção
101

suprapúbica pelo profissional enfermeiro, conforme previsto

na resolução COFEN nº680 de 2021.

A coleta da urina para o exame não necessita de jejum,

recomenda-se que se use a primeira urina da manhã, após

higiene, desprezando-se o primeiro jato e o jato do final,

usando apenas o jato médio. Deve-se coletar cerca de

20-50 ml de urina em um recipiente próprio para coleta de

urina. O material pode ser acondicionado em geladeira e

deve ser encaminhado ao laboratório em até 2 horas após a

coleta para que seja analisada, exceto nos casos de exames

de 24h.

O exame de urina completa inclui:

• Análise Física - inspeção visual quanto à cor, à


aparência e odor.

• Análise Química - realização de testes bioquímicos


por meio de reagentes em tiras para a determinação
da presença ou ausência de proteínas, medida de pH
e densidade, glicose, cetona, bilirrubina,
urobilinogênio, nitritos e leucócitos.
102

• Exame microscópico – a amostra de 10 a 15 mL de


urina é centrifugada a 1.500 a 2.500rpm durante 5
minutos. O sobrenadante é totalmente decantado; uma
pequena quantidade de urina permanece com o resíduo
no fundo do tubo da centrífuga. Uma única gota é
pipetada em uma lâmina e a amostra é examinada no
microscópio quanto à presença de cilindros, cristais e
células.

- Cor:

A cor é o atributo mais óbvio da urina, e a observação da cor


é uma parte integrante da urinálise. A coloração da urina em
indivíduos normais apresenta-se em diferentes tonalidades
de amarelo, com variações de amarelo-pálido a
âmbar-escuro, as quais se relacionam com o estado de
hidratação corporal.

Existem vários fatores e constituintes que alteram a


coloração da urina, tais como substâncias ingeridas,
atividade física e diversos compostos em situações
patológicas.
103

Fig. 42 – Causas das alterações na cor da urina.

- Aspecto:

Quanto ao aspecto, após a homogeneização da urina,


detecta-se a transparência da amostra, a qual é
normalmente límpida ou ligeiramente turva. Em condições
patológicas, a urina apresenta-se opaca, leitosa, levemente
turva, turva ou fortemente turva. A turvação da urina pode se
dar por conta da presença de sedimento, infecção, ingestão
de alimentos, presença de sêmen ou secreção vaginal e
contaminação fecal.
104

- Odor:

O odor, geralmente notado sem intenção durante a


inspeção visual, transmite informações úteis em ocasiões
raras de doenças herdadas do metabolismo de
aminoácidos quando a urina tem um cheiro distinto. Alguns
odores anormais:

• Frutado: Diabetes Melito

• Fétido: Infecção urinária

• Açúcar queimado ou xarope de bordo:


Leucinose ou doença da urina do xarope de bordo

• Repolho ou peixe: Tirosinemia

• Ninho de rato: Fenilcetonúria

• Pés suados: Acidose isovalérica

- Densidade:

A densidade urinária fornece uma medida aproximada da


concentração urinária (osmolalidade). É uma medida útil
para avaliar a capacidade dos rins de concentrar a urina a
partir da ação do Hormônio Antidiurético (ADH).
105

A densidade urinária varia em função da ingesta hídrica,


condições climáticas, ingestão de álcool (inibe o ADH),
estados compensatórios com maior liberação de ADH como
por exemplo em quadros de desidratação grave,
queimaduras, choque, ou ainda em condições patológicas
que interferem na secreção do ADH, como o Diabetes
Insípido e a Síndrome da Secreção Inadequada do ADH
(SIADH).

O teste de densidade urinária compara a concentração da


urina com a concentração da água. A densidade da água é
1.000, os valores normais de densidade urinária situam-se
entre 1.001 e 1.025; os valores podem ser mais baixos em
pessoas mais velhas ou em pacientes com insuficiência
renal, que são menos capazes de concentrar a urina ou mais
altos em situação de baixa ingesta hídrica, desidratação,
choque e SIADH.

Densidade Urinária Aumentada Densidade Urinária Diminuída


Diabetes Melito Diabetes Insípido
Nefrose Alcoolismo agudo
Perda excessiva de líquido Glomerulonefrite
SIADH Pielonefrite
ICC Lesão renal aguda (fase diurética)
Politraumatismo
Síndrome hepatorrenal

Fig. 43 – Fatores que interferem na densidade da urina.


106

- pH Urinário:

O pH urinário normal pode variar muito de (5,0 a 8,0) em


função da necessidade renal de aumentar ou diminuir a
secreção de hidrogênio e a reabsorção de bicarbonato para
regular o pH plasmático. Em geral a urina tende a ser mais
ácida (pH <7), entretanto valores maiores de pH podem ser
encontrados mesmo em situações de normalidade.

pH urinário baixo (ácido) pH urinário alto (alcalino)


Acidose metabólica Vômitos
Acidose respiratória Síndrome de Addison
Diarreia grave Infecções por Proteus
Uremia Demora para análise de urina não refrigerada
Infeção de trato urinário
Deficiência de potássio

Fig. 44 – Fatores que interferem no pH urinário.

- Proteína:

Em condições normais, a molécula de proteína é muito


grande para sofrer filtração, portanto não é eliminada na
urina. A presença de proteínas na urina chama-se
proteinúria e pode indicar, de acordo com a quantidade e
frequência uma condição normal que pode estar associada
ao uso de medicamentos, febre, exercícios físicos,
conhecida como proteinúria transitória; ou pode
representar um importante indicador de lesão glomerular
107

associada à patologias como hipertensão arterial, diabetes

melito ou doenças renais.

A proteinúria avaliada no EAS é detectada por reagentes em

tiras reflete principalmente a concentração de albumina

urinária, classificada como negativa (< 10 mg/dL), traços (15

a 30 mg/dL), ou de 1+ (30 a 100 mg/dL) até 4+ (> 500

mg/dL). A microalbuminúria, um importante marcador de

complicações renais em pacientes com diabetes, não é

detectada por tiras comuns, mas dispõe-se de tiras

específicas para microalbuminúria.

A urina diluída pode causar resultados falso-negativos,

enquanto a urina concentrada pode gerar resultados

falso-positivos, assim como pH alto (> 9), presença de

células e meios de contraste radiopacos.

Ao detectar proteinúria nas tiras reagentes, deve-se realizar

medidas quantitativas de proteínas urinárias através do

exame de urina de 24h. Em relação à intensidade, a

proteinúria de 24h pode ser classificada em:


108

• Leve: descrita em algumas doenças renais ou nos


distúrbios do trato urinário inferior.

• Moderada: é detectada em doenças renais, na


pré-eclâmpsia e na glomerulonefrite. Os valores observados
variam de 0,5 a 3,5g/dia.

• Elevada: é típica da síndrome nefrótica, mas pode ocorrer


em casos de glomerulonefrite, amiloidose, lúpus
eritematoso sistêmico e insuficiência cardíaca congestiva.
Costuma apresentar excreção superior a 3,5g/dia.

- Glicose:

Toda glicose plasmática sofre filtração glomerular,


entretanto, em condições normais, toda glicose filtrada é
reabsorvida para o sangue nos túbulos renais. Deste modo,
não é normal encontrarmos glicose na urina (glicosúria).
Entretanto, quando a glicose plasmática ultrapassa 180
mg/dL (> 10,0 mmol/L), os transportadores renais ficam
sobrecarregados e a reabsorção tubular não é suficiente
para evitar a glicosúria. Sendo assim, no diabetes melito,
quando a glicemia é >180mg/dl, a glicose começa a ser
eliminada na urina – glicosúria positiva.
109

Resultados falsamente baixos ou negativos podem surgir em


qualquer um dos seguintes casos:

• Ácido ascórbico
• Cetonas
• Ácido acetilsalicílico
• Levodopa
• Tetraciclina
• pH urinário muito alto
• Urina diluída

- Cetona:

Os corpos cetônicos são produzidos a partir do catabolismo


lipídico e, geralmente, não estão presentes na urina.
Entretanto, a produção excessiva de corpos cetônicos
provoca um aumento na concentração sanguínea
(cetonemia), com a consequente excreção urinária
(cetonúria). Tal condição é tipicamente associada à
glicosúria no paciente diabético do tipo 1 e pode ser um
marcador da cetoacidose diabética.

Mas o uso de tiras reagentes para dosagem de cetonas


urinárias não é mais tão recomendado, porque medem
apenas o ácido acetoacético e a acetona, não dosando o
ácido beta-hidroxibutírico. Assim, é possível um resultado
falso-negativo mesmo na ausência de uma causa exógena
110

(p. ex., vitamina C, fenazopiridina, N-acetilcisteína); a


dosagem direta de cetonas séricas é mais precisa.

Urinas não analisadas logo após a coleta e/ou não


refrigeradas podem gerar volatização de centonas com
consequente redução da concentração urinária, gerando
resultados falso-negativos.

- Hemoglobina:

Detecta-se hematúria quando há lise de eritrócitos na tira


reagente, liberando hemoglobina (Hb) e causando alteração
de cor. A variação vai desde negativa (0) até 4+. Traços de
sangue (3 a 5 eritrócitos/campo de grande aumento) são
normais sob algumas circunstâncias (p. ex., exercícios) em
algumas pessoas. Como a tira reagente reage com Hb, a
hemoglobina livre (p. ex., em razão da hemólise
intravascular) ou a mioglobina (p. ex., em razão da
rabdomiólise), causam resultado positivo. Pode-se
distinguir hemoglobinúria e mioglobinúria da hematúria pela
ausência de eritrócitos no exame microscópico e pelo
padrão de alteração da cor na tira reagente. Os eritrócitos
criam um padrão pontilhado ou espiculado; a hemoglobina
livre e a mioglobina criam uma alteração uniforme da cor. O
iodo povidona, bem como a possibilidade de contaminação
menstrual podem causar resultados falso-positivos; o ácido
ascórbico causa resultados falso-negativos.
111

- Bilirrubina:

A bilirrubina é o produto do metabolismo do radical heme


da hemoglobina, produzido a partir da destruição das
hemácias. A bilirrubina produzida a partir do metabolismo
do heme é a fração indireta (não conjugada). Essa fração é
insolúvel e precisa sofrer a conjugação com o ácido
glicurônico no hepatócito para ser convertida na forma
solúvel – bilirrubina direta ou conjugada.

A bilirrubina direta é excreta principalmente nas fezes (98%)


e, em menor quantidade (2%), na urina. A análise desse
composto é útil para o diagnóstico diferencial de doenças
hepáticas e biliares, além de outras causas não
hepatobiliares de icterícia.

- Urobilinogênio:

O urobilinogênio é um pigmento biliar incolor obtido por


meio da redução da bilirrubina nas vilosidades intestinais
por ação bacteriana. Esse pigmento é reabsorvido para a
corrente sanguínea e sofre filtração glomerular para ser
eliminado na urina. Nessa etapa é convertido em urobilina,
substância presente na urina responsável pela sua cor
amarela. O urobilinogênio remanescente no instestino
(estercobilinogênio) é oxidado para formar estercobilina,
112

substância que dá a cor marrom às fezes.

Uma quantidade maior de bilirrubina é formada nos


processos hemolíticos e leva a um aumento na
concentração de urobilinogênio urinários. Em doenças
hepáticas, o ciclo êntero-hepático do urobilinogênio pode
estar inibido, o que aumenta os níveis intestinais de
urobilinogênio. A demora na pesquisa em urinas não
refrigeradas provoca diminuição do urobilinogênio por sua
oxidação e conversão em urobilina.

Urobilinogênio Interpretação
0,1 a 1UI/dL Exame normal
Aumentado Hepatopatias e distúrbios hemolíticos
Diminuído Obstrução biliar

Fig. 45 – Significado clínico do urobilinogênio na urina.

- Nitrito:

A urina costuma ser rica em nitratos. Os nitritos são


produzidos quando as bactérias reduzem os nitratos
urinários derivados do metabolismo de aminoácidos.
Normalmente, não se observam nitritos e, quando
presentes, denotam, em geral, bacteriúria. Entretanto, nem
todas as bactérias são capazes de metabolizar o nitrato,
sendo assim, o resultado negativo não descarta a infecção.
113

Podem ocorrer resultados falso-negativos em qualquer uma


das seguintes condições:

• Infecção por certos patógenos que não conseguem


converter nitrato em nitrito (p. ex., Enterococcus faecalis,
Neisseria gonorrhoeae, Mycobacterium tuberculosis,
Pseudomonas sp)

• Quando a urina não permaneceu tempo suficiente (< 4


horas) na bexiga

• Baixa excreção urinária de nitratos

• Enzimas (de certas bactérias) que reduzem nitratos a


nitrogênio

• Nível alto de urobilinogênio urinário

• Presença de ácido ascórbico

• pH urinário < 6,0

Os nitritos são usados principalmente nos testes de


esterases leucocitárias, para controlar pacientes com
infecções urinárias recidivantes. A pesquisa de nitritos é
feita por meio da reação de Griess, portanto, alguns
laboratórios fornecem resultados como Griess positivo ou
Griess negativo, ou seja, nitrito positivo e nitrito negativo,
respectivamente.
114

- Leucócitos:

A esterase de leucócitos é liberada pelos neutrófilos que


sofreram lise. Sua presença na urina reflete inflamação
aguda, mais comumente em decorrência de infecção
bacteriana, mas, algumas vezes, devido à nefrite intersticial,
nefrolitíase ou tuberculose renal.

O teste não é muito sensível para detecção de infecção. A


contaminação da amostra de urina pela flora vaginal é a
causa mais comum de resultado falso-positivo. Resultados
falso-negativos podem advir de:

• Urina muito diluída

• Glicosúria

• Urobilinogênio

• Uso de fenazopiridina, nitrofurantoína, rifampicina ou


grandes quantidades de vitamina C

A esterase de leucócitos é utilizada principalmente com o


teste de nitrito para acompanhar pacientes com infecções
urinárias recidivantes e, algumas vezes, para diagnosticar
uma infecção do trato urinário não complicada em mulheres
gestantes. Se ambos os testes forem negativos, a chance de
cultura positiva é pequena.
115

Na análise microscópica geralmente não se observam


leucócitos no sedimento urinário, mas pode-se considerar
normal até 5 leucócitos por campo. O aumento do número
de leucócitos (maior que 5 por campo) é denominado piúria.

- Hemácias:

Sua presença pode ser percebida nas três fases da análise


urinária e pode indicar lesões inflamatórias, infecciosas,
neoplásicas, litíase ou traumáticas dos rins e vias urinárias.
Após a análise na fita regente que indica a presença de
hemácias/hemoglobina, a urina deve ser analisada
microscopicamente para confirmação da hematúria.

É normal um resultado de até 3 – 5 eritrócitos por campo,


especialmente após a realização de exercícios. O maior
número de hemácias na urina indica rompimento da
integridade da barreira vascular, por lesão traumática ou
doença, na membrana glomerular ou no trato geniturinário.
Exames falso-positivos podem estar relacionados à
menstruação.

- Células epiteliais, cilindros e muco:

As células epiteliais (renais tubulares, transicionais,


escamosas) surgem com frequência na urina; em sua
116

maioria, são células descamativas da porção terminal da


uretra e contaminantes da vagina. Somente a presença de
células tubulares renais não tem importância diagnóstica;
entretanto, podem ter significado clínico quando
apresentadas em cilindros.

Como os túbulos renais são cilindros, quando há alguma


substância em grande quantidade na urina, eles se agrupam
em forma de cilindros e esse formato indica que essa
substância se origina nos túbulos renais e não de outros
pontos do trato urinário.

Os cilindros que podem representar alterações são:

• Cilindros hemáticos (sangue): indicam glomerulonefrite,


mas podem também resultar de dano tubular, como na
nefrite intersticial aguda.

• Cilindros leucocitários: indicam infecção ou inflamação


renal.

• Cilindros epiteliais: indicam lesão dos túbulos e podem


estar associados às infecções virais, como citomegalovírus.
Frequentemente são observados em conjunto com os
cilindros hemáticos e leucocitários.
117

• Cilindros gordurosos: indicam proteinúria,


frequentemente associada à síndrome nefrótica.

• Cilindros hialinos: são inespecíficos e, em geral, não


indicam doenças. Podem estar presentes em pacientes com
baixo fluxo urinário (p. ex., em decorrência de desidratação
ou após tratamento com diuréticos), estresse fisiológico,
doença renal aguda com outras anormalidades, ou doença
renal crônica (como cilindros grandes formados nos túbulos
dilatados).

A presença de muco é inespecífica e costuma ocorrer pelo


aumento de células epiteliais com cristais e leucócitos. Não
é considerado clinicamente significativo.

- Cristais:

Os cristais na urina são comuns e, em geral, não são


clinicamente significativos. A presença de cristais na urina,
principalmente de oxalato de cálcio, fosfato de cálcio ou
uratos amorfos, não tem nenhuma importância clínica. Ao
contrário do que se possa imaginar, a presença de cristais
não indica uma maior propensão à formação de cálculos
renais. Dito isso, é importante destacar que, em alguns
casos, a presença de determinados cristais pode ser um
sinal para alguma doença.
118

Os cristais com relevância clínica são:

• Cristais de cistina – Indicam uma doença chamada


cistinúria.

• Cristais de magnésio-amônio-fosfato (chamado de cristais


de estruvita ou cristais de fosfato triplo) – podem ser
normais, mas também podem estar presentes em casos de
urina muito alcalina provocada por infecção urinária pelas
bactérias Proteus ou Klebsiella. Pacientes com cálculo renal
por pedras de estruvita costumam ter esses cristais na
urina.

• Cristais de tirosina – Presentes em uma doença chamada


tirosinemia.

• Cristais de bilirrubina – Costumam indicar doença do


fígado.

• Cristais de colesterol – Costuma ser um sinal de perdas


maciças de proteína na urina (síndrome nefrótica).

A presença de cristais de ácido úrico, caso em grande


quantidade, também deve ser valorizada, pois podem surgir
em pacientes com gota ou neoplasias, como linfoma ou
119

leucemia. Cristais de ácido úrico em pequena quantidade,


porém, são comuns e não indicam nenhum problema.
Tipo Aparência Comentários
Ocorre de diversas formas, mas é mais Quando presente em grande número, os oxalatos sugerem fortemente
Oxalato facilmente reconhecido quando adquirem envenenamento por etileno glicol ou, raramente, síndrome do intestino
de cálcio formas octaédricas, pequenas, em forma curto, oxalose hereditária e oxalúria, ou, ainda altas doses de vitamina C
de envelope Importante na avaliação como constituintes potenciais dos cálculos

Hexágonos perfeitos, algumas vezes isolados


Cistina em placas planas ou como cristais sobrepostos Diagnóstico de cistinúria, uma causa rara hereditária de cálculos
de tamanhos diversos

Fosfato
Podem lembrar tampa de caixão ou cristais Geralmente, ocorrem na urina alcalina normal ou na urina de pacientes
amoníaco-
de quartzo com cálculo de estruvita
magnésio

Geralmente presentes na urina altamente concentrada, ácida, fria


Ácido Podem ter forma de diamante, aguha ou
Podem indicar desidratação leve em neonatos ou síndrome da lise
úrico romboides, apesar de o ácido úrico ser amorfo
tumoral em pacientes com câncer ou insufiência renal

Fig. 46 – Principais tipos de cristais urinários e suas correlações clínicas.

OUTROS EXAMES DE URINA


Outros exames são úteis em circunstâncias especiais.

A excreção de proteínas totais pode ser medida na urina


de 24 horas ou pode ser estimada pela relação
proteína/creatinina, a qual, em uma amostra aleatória de
urina, correlaciona-se bem com os valores em g/1,73 m2
área de superfície corporal de uma amostra de urina de 24
horas (p. ex., 400 mg/dL proteínas e 100 mg/dL de creatinina
em uma amostra aleatória equivalem a 4 g/1,73 m2 em uma
amostra de 24 h). A relação proteína/creatinina é menos
precisa quando a excreção de creatinina está
significativamente aumentada (p. ex., em atletas
musculares) ou diminuída (p. ex., na caquexia).
120

A microalbuminúria representa a excreção persistente de


albumina entre 30 e 300 mg/dia (20 a 200 mcg/min);
valores menores são considerados dentro da variação
normal, e valores > 300 mg/dia (> 200 mcg/min) são
considerados proteinúria evidente. O uso da relação
albumina urinária/creatinina urinária é confiável e um
método de triagem mais conveniente, pois evita a coleta de
amostras de urina seriadas e correlaciona-se bem aos
valores de urina de 24 horas. Um valor > 30 mg/g (> 0,03
mg/mg) sugere microalbuminúria. A confiabilidade do teste
é melhor quando se utiliza uma amostra coletada pela
manhã porque exercícios vigorosos podem resultar em tira
reagente positiva para proteína, e não ocorre produção
incomum de creatinina (em pacientes caquéticos ou muito
musculosos). A microalbuminúria pode ocorrer nos
seguintes casos:

• Diabetes melito

• Hipertensão

• Disfunção de aloenxerto renal

• Pré-eclâmpsia

• Infecção do trato urinário

• Nefropatia crônica
121

Microalbuminúria é um estágio precoce da doença renal


diabética no diabetes tipo 1 e 2; a progressão da doença
renal é mais previsível no tipo 1 do que na doença tipo 2. A
microalbuminúria é um fator de risco de doenças
cardiovasculares e mortalidade cardiovascular precoce,
independentemente da existência de diabetes ou
hipertensão.

Outras medidas úteis incluem as seguintes:

• Fração de excreção de bicarbonato (HCO3) para avaliação


da acidose tubular renal

• Níveis de cloreto (Cl) para o diagnóstico de alcalose


metabólica

• Hiato aniônico urinário na avaliação da acidose metabólica

• Níveis de potássio para determinação da causa de


hipopotassemia ou hiperpotassemia

• Níveis de sódio, cálcio, magnésio, ácido úrico, oxalato,


citrato e cistina para avaliação de cálculos

Indicam-se culturas e coloração de Gram com testes de


sensibilidade se houver suspeita de infecções do trato
geniturinário; deve-se interpretar um teste positivo no
contexto clínico.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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laboratorial: é preciso entender as variáveis para controlar o
processo e garantir a segurança do paciente, 2011.

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n197/95. Brasília, 1995.

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FISCHBACH, F. Manual de enfermagem exames laboratoriais


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MORALES, P. S. Conheça as três fases dos exames


laboratoriais. 2019.

OLIVEIRA, JBA. Exames laboratoriais para o clínico. São Paulo:


Medsi, 2003.
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Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia


Clínica/Medicina Laboratorial para coleta de sangue venoso.
2. ed. Barueri: Minha Editora, 2010.

Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia


Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML): coleta e preparo
da amostra biológica. Barueri, SP: Manole, Minha Editora,
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SMELTZER, S.C; BARE, B.G. Brunner & Suddarth: Tratado de


Enfermagem Médico-Cirúrgica. 12 ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2012.

VIEIRA, N.; MOYSÉS N. Fluid and electrolyte disorders.


Medicina, Ribeirão Preto. 36:325-337, apr./dec. 2003.

XAVIER, Ricardo M., DORA, José Miguel, BARROS, Elvino.


Laboratório na Prática Clínica, 3ª edição . ArtMed, 2016.
125

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este material compila conhecimentos muito superiores


àqueles tipicamente cobrados em provas de concursos
e residências atualmente. No entanto, minha intenção
nunca esteve limitada ao básico, muito menos ao
mínimo necessário; antes, em consonância com os
princípios que sempre nortearam meu modo de
trabalho, entreguei tudo: dos ensinamentos mais
elementares, erroneamente negligenciados nas
formações de todo país; às evidências mais atuais para
que você, querido aluno, alcance excelência,
reconhecimento e valorização profissional.
OBRIGADO!
Juntos formaremos
uma enfermagem
mais empoderada

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