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AUTOS Nº 0004719-19.2017.8.16.

0160
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO
REQUERIDOS: CARLOS ALBERTO DE PAULA JÚNIOR e outros

DOUTA MAGISTRADA:

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO


PARANÁ, por seu Promotor de Justiça ao final subscrito, vem,
respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, oferecer
IMPUGNAÇÃO ÀS CONTESTAÇÕES apresentadas pelos requeridos
nas seq. 111, 121 e 167.

1 – SÍNTESE FÁTICA

Trata-se de Ação Civil Pública de Improbidade


Administrativa ajuizada pelo presente órgão ministerial em face de
CARLOS ALBERTO DE PAULA JÚNIOR, ELBER ALMEIDA DA
SILVA, LUIZ CARLOS DE AGUIAR, PAULO SERGIO BERNARDINO
DE OLIVEIRA e RAFAEL DOMINGUES GOTARDO.
Conforme relatado na inicial, o primeiro requerido
exerceu mandado eletivo de Prefeito Municipal de Sarandi entre 2010 e
2016, LUIZ CARLOS DE AGUIAR, então Vice-Prefeito (e Prefeito
Municipal em exercício, em determinado período do ano de 2013) e
PAULO SÉRGIO BERNARDINO DE OLIVEIRA, Superintendente da
autarquia previdenciária municipal PRESERV – Caixa de Aposentadoria e
Pensão dos Servidores Municipais de Sarandi, respectivamente, realizaram
a contratação dos requeridos ÉLBER ALMEIDA DA SILVA e RAFAEL
DOMINGUES GOTARDO a cargos de provimento em comissão na
estrutura funcional municipal, com evidente violação aos limites
constitucionais relativos à destinação que se pode conferir a essa espécie de
cargo e às funções que seus ocupantes podem desempenhar, deixando de
observar os princípios norteadores da Administração Pública, de modo a
caracterizar atos de improbidade administrativa, nos termos do artigo 11,
caput da Lei nº 8.429/92.
Os requeridos CARLOS ALBERTO DE PAULA
JUNIOR e LUIZ CARLOS DE AGUIAR apresentaram sua contestação à
seq. 111, tendo alegado, em síntese, que: a) tempestividade b) ausência de
irregularidade nas nomeações, visto que a Autarquia possui autonomia,
devido ser ente com personalidade jurídica própria, aludindo ainda ser esta
improbidade uma via inadequada; c) não configuração do ato de
improbidade administrativa, vez que não há elemento subjetivo
imprescindível (dolo ou má-fé ou culpa grave) para tornar perfeito o ato
ímprobo; d) não ocorrência do ato de improbidade prevista no art. 11,
caput, da Lei 8429/92, bem como inexistência de elemento subjetivo
(dolo); e) inconstitucionalidade indicada pela doutrina do caput do art. 11,
da Lei 8429/92 devido à impossibilidade de punição pela conduta prevista
no referido dispositivo; f) subsidiariamente, caso de reconhecimento dos
atos de improbidade, pela obrigatoriedade da gradação das sanções,
reconhecendo a inexistência de lesão ao erário e enriquecimento ilícito; g)
Por fim, pela improcedência da ação.
O requerido PAULO SERGIO BERNARDINO DE
OLIVEIRA e RAFAEL DOMINGUES GOTARDO apresentaram sua
contestação à seq. 121, ocasião em que alegaram, em síntese, que: a) da
ausência de qualquer ato de improbidade, pois exercerem cargos em
comissão, em conformidade com a lei; b) que a inicial foi narrada de forma
genérica; c) que os réus ELBER e RAFAEL eram competentes para exercícios
das atribuições dos cargos desempenhados; d) Por fim, pela improcedência
da ação.
Embora não tenha sido encaminhada a carta de citação
para o réu ELBER ALMEIDA DA SILVA, ante as restrições trazidas pela
pandemia, conforme certificado em seq. 162, 165 e 166, verifica-se que seu
patrono se manifestou nos autos apresentando contestação em seq. 167.
Dessa forma, entende esse Parquet suprida a ausência
da citação nos termos do art. 239, §1°, do CPC.
O requerido ELBER ALMEIDA DA SILVA em sua
contestação à seq. 167, alegou a) Excludentes de Ilicitude pelo Exercício
Regular de Direito e Estrito cumprimento do dever legal, com aplicação na
ação de improbidade, consequentemente pelo reconhecimento da carência
de ação por falta de interesse processual; b) Inépcia da inicial pela
insuficiente descrição das condutas, o que impossibilita a responsabilização
do réu, devido forma genérica da inicial, não se enquadrando no tipo artigo
11, inciso V, da LIA, consequente pela extinção da ação sem julgamento do
mérito; c) inexistência do elemento subjetivo (dolo), pela
imprescindibilidade de ocorrência de dolo para caracterização da conduta
do art. 11 da LIA; d) Por fim, pela improcedência da ação.
Apresentadas as contestações, foi intimado o
Ministério Público para, querendo, se manifestar.

2 – DAS PRELIMINARES
2.1 DA INÉPCIA A INICIAL

Alegam os réus ELBER ALMEIDA DA SILVA,


PAULO SERGIO BERNARDINO DE OLIVEIRA e RAFAEL
DOMINGUES GOTARDO que o pedido formulado pela parte autora é
genérico, o que implica inépcia da inicial.
Contudo, tal alegação não merece prosperar.
Com efeito, a exordial narra os fatos de forma clara,
objetiva e inteligível (tanto que ambos os requeridos demonstraram ter
compreendido perfeitamente bem o seu conteúdo), veiculando pedidos
juridicamente possíveis e perfeitamente relacionados com os fatos
expostos.
Veja-se que a inicial trouxe elementos mínimos de
provas a respeito das condutas ímprobas praticadas pelos réus CARLOS
ALBERTO DE PAULA JÚNIOR, ELBER ALMEIDA DA SILVA, LUIZ
CARLOS DE AGUIAR, PAULO SERGIO BERNARDINO DE
OLIVEIRA e RAFAEL DOMINGUES GOTARDO, razão pela qual,
inclusive, foi devidamente recebida por este Juízo.
Ademais, os fatos nela veiculados encontram substrato
consistente no Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público, de modo
que não só a petição inicial é apta e atende os requeridos legais, como
também é amparada pela imprescindível justa causa para ensejar o
processamento dos requeridos.
Assim, não há que se falar em inépcia da referida peça
inaugural, razão pela qual requer este órgão a rejeição de tal questão
preliminar.
2.2 DA AUSÊNCIA DE INTERESSE
PROCESSUAL
Alega o réu ELBER ALMEIDA DA SILVA que o
pedido formulado pela parte autora não foi analisada a excludente de
ilicitude, o que implica na carência de ação por falta de interesse
processual.
Já os réus CARLOS ALBERTO DE PAULA JUNIOR
e LUIZ CARLOS DE AGUIAR alegaram que ser inadequada a via
utilizada por esse Parquet, vez que deveria “atacar a lei de criação do
referido cargo (talvez uma ADI estadual ou ADPF), mas não uma ação de
improbidade”.
Alegaram ainda que “Se quer fazer controle do mérito
da nomeação de servidores – fora dos limites da Súmula 13/STF
(nepotismo) – que se sujeite ao regime político, e não ao jurídico
administrativo, pois, pretender exercer tal múnus implica em gravíssima
violação ao princípio da tripartição dos poderes do Estado”.
No entanto, sem razões tais alegações.
O Ministério Público é legitimado para toda e qualquer
demanda que vise à defesa do patrimônio público, quer sob o ponto de vista
material, ou seja, no que tange às perdas e danos, quer sob o ponto de vista
imaterial, ou seja, no que se refere à moralidade administrativa. Tal
legitimidade deriva das próprias funções institucionais do órgão ministerial,
as quais estão previstas constitucionalmente:
Art. 129. São funções institucionais
do Ministério Público (...)
III - promover o inquérito civil e a
ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e
social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos;
A possibilidade de o parquet ajuizar Ação Civil Pública
em defesa do patrimônio dos entes públicos também consta na legislação
infraconstitucional. O art. 1º, da Lei 7.347/85 prevê, em seu art. 1º, IV, que
se rege pela Lei da Ação Civil Pública as ações de responsabilidade por
danos patrimoniais causados a interesses difusos ou coletivos. E, o art. 5º, I,
da referida lei, aponta o Ministério Público como legitimado para a
propositura de ACP. No caso em tela, evidente a existência de interesses
difusos, já que o desfalque do patrimônio do ente público repercute na
esfera de direitos de todos os habitantes do Município de Sarandi.
A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei nº
8.625/93) também dispõe acerca da incumbência do órgão ministerial de
promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção, prevenção
e reparação dos danos causados aos interesses difusos e coletivos (art. 25,
IV). E, a Lei Orgânica do Ministério Público do Estado do Paraná (Lei
Complementar nº 85/99), em seu art. 68, itens 1 e 4, prevê ser atribuição do
promotor de justiça instaurar inquérito civil e promover ação civil pública
para a proteção do patrimônio público, bem como promover ações
indenizatórias quando houver dano ao patrimônio público.
No mesmo sentido, cumpre apontar o enunciado da
Súmula 329, do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual “O Ministério
Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do
patrimônio público”.
Assim, não prevalece a tese de que não pode o
Ministério Público pleitear o ressarcimento do ente público lesado pelas
condutas improbas praticadas pelos requeridos. A prevalência de tal tese
implicaria negar ao órgão ministerial a prática de atos voltados ao
cumprimento da função que lhe foi instituída pela ordem constitucional. O
que torna a via adequada.
Por esses motivos, imperioso o afastamento da
preliminar de falta de interesse processual arguida pelo réu.

3 - DO MÉRITO

Os réus CARLOS ALBERTO DE PAULA JÚNIOR e


LUIZ CARLOS DE AGUIAR alegam que a aplicação do caput do artigo
11 da Lei n. 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa) como único
substrato para punição do agente público vem sendo afastada pela doutrina,
uma vez que tal dispositivo “(…) apresenta previsões genéricas, abstratas,
demasiadamente abertas, ao prever que qualquer ação ou omissão poderá
ser punida com a aplicação da Lei de Improbidade fere a constituição
(…)”, em especial o § 4º do artigo 37 da Constituição Federal.
Alega que “(…) tal artigo deve ser lido como uma
mera declaração de intenção, já que seria inviável a sua aplicação isolada,
como base à imposição de penalidades da Lei de Improbidade
Administrativa. Entendimento diverso levaria a conclusão de que quase
todos atos públicos ferem os princípios constitucionais e, portanto, são
atos ímprobos. (…)”
Afirma, ainda, que consoante entendimento
jurisprudencial, para a configuração de atos de improbidade administrativa
descritos no artigo 11 da Lei n. 8.429/92 deve haver a necessidade de
comprovação do dolo do acusado (má-fé).
Por fim, quanto a tal alegação, argumenta que a
exordial não seguiu o sentido do entendimento jurisprudencial e “(…)
equivocou-se ao mencionar como elemento apto a demonstrar a conduta
dolosa do requerido o fato dele simplesmente assinar documentos
fundamentados, calcados em fatos reais e precedidos de parecer
autorizatório do departamento jurídico do Município (…)”.
Posto isso, fundamenta que não há improbidade
administrativa em seus atos, vez que não há provas de que houve dolo ou
má-fé nas condutas de realizar atos com o objetivo de atender ao público.
Ocorre que tal posicionamento trazido pelos requeridos
é defendido apenas pela doutrina minoritária, pois predomina na tanto na
doutrina majoritária, como nos Tribunais Superiores de que é constitucional
a Lei 8429/92 que trata dos atos de improbidade administrativa e das
sanções a serem aplicadas por meio de Ação Civil Pública por ato de
improbidade1.
Esclarece a doutrina que, “a Lei 8429/92 não é lei que
prevê sanções administrativas a servidores públicos, mas sim lei que
estipula penalidades civis a todos aqueles que praticarem atos vinculados
da moralidade publica ou danosa ao patrimônio publico, seja agente
publico, seja particular”2.
Veja-se, Excelência, que embora tenham os requeridos
alegado a inconstitucionalidade de punição pela conduta prevista no caput
do artigo 11 da lei n. 8.429/92, ele não requereu expressamente a
declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum de tal dispositivo
(controle difuso de constitucionalidade).
Além disso, em sua argumentação, confunde a
fundamentação de inconstitucionalidade do dispositivo com a falta de
provas para a caracterização do requisito subjetivo do tipo na realização de
suas condutas (dolo e má-fé), matérias essas que dizem respeito ao mérito
da causa.

1
CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo. 7ª ed. rev. ampl. e atual. – Salvador.
JusPODIVM, 2020.
2
CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo. 7ª ed. rev. ampl. e atual. – Salvador.
JusPODIVM, 2020.
Portanto, não há que se falar em questão prejudicial
incidente no que diz respeito à inconstitucionalidade material incidenter
tantum do artigo 11, caput, da Lei n. 8.429/92.
No mais, já é entendimento notório que o STF já
enfrentou na em sede ADI n° 2182 o mérito formal da Lei n. 8.429/92
confirmando sua constitucionalidade.
Por outro lado, será demonstrado, adiante, que há
elementos robustos indicando a prática dos atos de improbidade
administrativa pelos requeridos, inclusive o dolo nas referidas condutas.
Os réus CARLOS ALBERTO DE PAULA JÚNIOR,
ELBER ALMEIDA DA SILVA, LUIZ CARLOS DE AGUIAR, PAULO
SERGIO BERNARDINO DE OLIVEIRA e RAFAEL DOMINGUES
GOTARDO, em suas contestações, alegaram, em mesmo sentido que,
PAULO SERGIO BERNARDINO efetuou as nomeações de ELBER
ALMEIDA DA SILVA e RAFAEL DOMINGUES GOTARDO para
exercerem cargos em comissão, em conformidade com os ditames legais
pertinentes a matéria, sendo ainda, um ato discricionário do administrador
ou no âmbito do mérito administrativo, ou ainda, “estrito exercício regular
de direito, sem a violação de qualquer dispositivo constitucional ou
qualquer violação aos princípios basilares da Administração Pública”.
Ainda, aludiram ausência de elementos
imprescindíveis para a perfectibilização do ato ímprobo está demonstrada,
vez que o “superintendente tem o poder de aceitar indicação como também
pode nomear pessoa diversa; não há vinculação”, afirmando que inexiste
dolo - ou culpa grave - na conduta questionada.
Alegaram ainda que, efetivamente realizava as
atribuições de seu cargo comissionado, tendo em vista que eram estes que
“passaram a desempenhar as atribuições de seus cargos e muitas outras”,
confirmando ainda que os réus ELBER e RAFAEL possuíam competência
para tanto.
Sendo ainda questionado pelos réus qual o princípio
que supostamente foi violado.
Aludiram ainda que não há indícios que o “requerido
CARLOS ALBERTO DE PAULA JUNIOR ou de LUIZ CARLOS DE
AGUIAR – que demonstre a existência de fato tipificável como
improbidade ou, ainda, que o ato cometido tenha substanciado o requisito
do dolo de violar a normalidade administrativa”.
Contudo, conforme demonstrado na exordial, onde há
inclusive a transcrição do depoimento do pai do réu Elber (Sr. Anésio José
da Silva), não deixou dúvidas de ter se valido da amizade existente entre
ele e os requeridos CARLOS ALBERTO DE PAULA JÚNIOR e LUIZ
CARLOS DE AGUIAR (Prefeito Municipal e Vice-Prefeito, ambos ex-
Vereadores da Câmara Municipal local, onde Anésio é Servidor efetivo há
muitos anos) para que o requerido ÉLBER ALMEIDA DA SILVA, seu
filho, ocupasse cargo de provimento em comissão junto ao Poder
Executivo, tendo o requerido PAULO SÉRGIO BERNARDINO DE
OLIVEIRA, Superintendente da autarquia previdenciária municipal,
aderido a esses atos, atendendo às vontades dos correqueridos.
Sendo ainda que tais fatos foram confirmados no
depoimento prestado por ÉLBER ALMEIDA DA SILVA a este órgão nos
autos de inquérito civil (mov. 1.7).
O referido réu deixou claro que não detinha não
detinha qualificação alguma para o exercício das funções a que foi
nomeado, não vindo a desempenhar quaisquer funções efetivamente
voltadas a alguma forma de assessoramento, de direção ou de chefia, como
preconiza o inciso V do art. 37 da Constituição Federal para o exercício dos
cargos de provimento em comissão na estrutura do quadro de servidores
públicos. Durante todo o período em que ocupou os cargos de provimento
em comissão em questão, ELBER ALMEIDA DA SILVA limitou-se a
exercer funções de simples rotina burocrática, que devem ser
desempenhadas por servidores públicos efetivos, vinculados por aprovação
em concurso público, restando claro que as nomeações se deram com o
mero e ilícito fim de “dar um emprego” a um “apaniguado”, irregularmente
beneficiado, assim, de forma contrária ao interesse público.
Tais alegações desabonam todo o afirmado pelo réu em
sua contestação, vez que foram confirmadas nos depoimentos de Larissa
Fernanda de Moraes Bueno, Marco Aurélio da Rosa, Karen Cristina Alves,
Roberto Vagner Sant'ana Júnior, Samanta Daniele Rodrigues e Valdicéia
Angelo de Lima.
O mesmo foi alegado pelo réu RAFAEL
DOMINGUES GOTARDO.
Contudo, conforme já levantado nos autos, apurou-se
que o requerido RAFAEL DOMINGUES GOTARDO foi nomeado para
ocupar cargo de provimento em comissão de Diretor de Administração
junto à autarquia PRESERV, cargo que ocupou durante o período de
01/01/2012 a 20/08/2013, por indicação do requerido CARLOS ALBERTO
DE PAULA JÚNIOR, com o mesmo fim único de garantir um emprego a
um aliado e simpatizante, violando-se, assim, os princípios da
Administração Pública, na medida em que o requerido RAFAEL
DOMINGUES GOTARDO, da mesma forma como ocorreu com ÉLBER
ALMEIDA DA SILVA, não detinha qualificação ou experiência que o
recomendasse a cargos de provimento em comissão, restando certo que,
também aqui, o que se deu foi a nomeação para tais cargos de natureza
especial seguida do desempenho de tarefas meramente burocráticas, de
rotina de mero expediente administrativo, desvinculadas de atividades de
assessoramento, direção ou chefia.
Sendo que tais informações foram confirmadas tanto
pelo requerido RAFAEL DOMINGUES GOTARDO (mov. 1.8), quanto
pelo requerido PAULO SÉRGIO BERNARDINO DE OLIVEIRA que
afirmou quando ouvido que CARLOS ALBERTO DE PAULA JÚNIOR
deliberou pela nomeação de RAFAEL DOMINGUES GOTARDO ao cargo
de Diretor do PRESERV, tendo ele aderido a tal conduta ímproba, eis que a
nomeação se baseou unicamente na indicação do Prefeito Municipal de um
aliado político (mov. 1.7).
Quanto a alegação da nomeação dos cargos ser ato
discricionário, é pacífico já o entendimento de que o Poder Judiciário
analisará os atos administrativos no que tange aos aspectos da legalidade
(tanto ato vinculado, como discricionário), o que não viola a Tripartição
dos Poderes, já que esta é essa é uma fórmula clássica dos “checks and
balances” (freios e contrapesos), evitando o excesso de poder e condutas
desarroadas pelo administrador3.
Oportuno destacar que os requeridos CARLOS
ALBERTO DE PAULA JUNIOR e LUIZ CARLOS DE AGUIAR, ao negar
sua participação no ato improbo, em sua contestação, afirmaram que “O
que pode ser verificado é a tentativa de questionar a própria estrutura
institucional e o próprio quadro funcional da autarquia, o que sequer é de
responsabilidade dos requeridos, e tampouco pode lhes ser imputado como
improbidade. Aliás, basta verificar a própria literalidade do inc. I do art.
11 da LIA para verificar que, bem ao contrário da tese acusatória, o que
fizeram os requeridos foi, justamente, obedecer as prescrições legais de
acordo com a regra de competência”.
Em que pese, bastante demonstrado na inicial, não
haver dúvidas quanto ao atendimento de interesses pessoais ilegítimos dos
envolvidos, em detrimento do interesse público, violando os princípios que
3
CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo. 7ª ed. rev. ampl. e atual. – Salvador.
JusPODIVM, 2020.
devem reger os atos administrativos, nos termos do art. 11, caput, da Lei n.º
8.429/92; assim, não há como os corréus fingirem que não perceberam as
referidas nomeações “apaniguadas”, vez que possuíam o objetivo de lesar o
patrimônio publico, além dos benefícios próprios e troca de favores.
Nesse sentido, cita a doutrina4 que a 9ª Camara do
Direito Público do TJ/SP, no julgamento da Apelação Cível n.
009252.56.2010.8.26.073, em 09/04/2014, considerou aplicável em matéria
de improbidade a Teoria Norte-Americana denominada “cegueira
intencional” (“willful blindness”), com o fim de punir a ignorância
consciente de agentes que intencionalmente fingem não enxergar a pratica
de atos ilícitos para, com isso, obter algum tipo de beneficio.
Assim, esclarece a doutrina que a espécie de ato de
improbidade descrita no art. 11, da Lei 8429/92, embora envolva condutas
de menor gravidade, que atentam dolosamente contra os princípios da
administração publica, violam os deveres de honestidade, imparcialidade,
legalidade, mesmo que sem provocar qualquer lesão financeira ao erário5,
vez que o agente público deve se pautar na busca dos interesses da
coletividade, não visando a beneficiar ou prejudicar ninguém em especial,
além da obrigatoriedade na observância a padrões éticos de conduta, que
assegure a função púbica de atender ao coletivo6.
Por fim, os réus, afirmaram que todas as nomeações
foram realizadas, e suas funções exercidas pelos nomeados, de boa-fé, sem
a existência de dolo algum, o que descaracterizaria os atos de improbidade
administrativa em questão. Além disso, afirmaram que, deste modo, nada
haveria de ilegal nestas condutas, devendo a demanda ser julgada
improcedente.

4
MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo, 7ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2017.
5
MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo, 7ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2017.
6
CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo. 7ª ed. rev. ampl. e atual. – Salvador.
JusPODIVM, 2020.
Contudo, observando todo o exposto, incontestável a
existência de improbidade administrativa no caso em apreço, em relação a
todos os réus. Reforçando o já pontuado na petição inicial, o Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná já reconheceu, e vem seguidamente
reconhecendo, que a contratação de servidor para ocupar cargo de
provimento em comissão com o fim de que este realize atividades
rotineiras de atribuição de cargo de provimento efetivo é irregular,
viola os princípios da Administração Pública e o art. 37, V da CF/88 e
caracteriza improbidade administrativa, nos termos do art. 11, caput da
Lei n. 8.429/92:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. (…). IRREGULARIDADE NO DESEMPENHO
DE CARGO EM COMISSÃO DE CHEFE DA DIVISÃO DE
FISCALIZAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DA SECRETARIA
MUNICIPAL DE SANEAMENTO E MEIO AMBIENTE.
REALIZAÇÃO DE ATIVIDADES BUROCRÁTICAS
DESVINCULADAS DE FUNÇÕES DE DIREÇÃO, CHEFIA OU
ASSESSORAMENTO EM DESACORDO COM O ART. 37, V DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DOLO GENÉRICO
CARACTERIZADO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS QUE REGEM
A ADMINISTRAÇÃO. IMPROBIDADE COMPROVADA. (…).
(TJPR - 5ª C.Cível - ACR - 1415461-5 - Região Metropolitana de
Maringá - Foro Regional de Sarandi - Rel.: Carlos Mansur Arida - Por
maioria - J. 13.09.2016)

Claramente se observa, mesmo após a análise das teses


defensivas apresentadas, que as condutas dos réus estão eivadas de evidente
dolo, bastando, nestes casos, a presença de sua modalidade genérica
(vontade do agente de realizar o ato que atenta contra os princípios da
Administração Pública)7 para a caracterização dos atos de improbidade
administrativa tipificados pelo art. 11, caput da Lei n. 8.429/92.
Ademais, nos casos do art. 11, da LIA, a Primeira
Seção do STJ no julgamento do Resp 951.3898 pacificou o entendimento de
que o elemento subjetivo necessário para caracterizar a improbidade é o
dolo genérico (podendo consistir em simples má-fé), sendo desnecessária a
presença do dolo específico consistente na comprovação da intenção do
agente.
Subsidiariamente, foram alegados pelos réus CARLOS
ALBERTO DE PAULA JUNIOR e LUIZ CARLOS DE AGUIAR o modo
quanto a gradação das sanções.

7
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE
TRANSPORTE SEM LICITAÇÃO. ATO ÍMPROBO POR ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES. (...) 2.
Conforme já decidido pela Segunda Turma do STJ (REsp 765.212/AC), o elemento subjetivo, necessário à
configuração de improbidade administrativa censurada nos termos do art. 11 da Lei 8.429/1992, é o
dolo genérico de realizar conduta que atente contra os princípios da Administração Pública, não se
exigindo a presença de dolo específico. (...) (REsp 951.389/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/06/2010, DJe 04/05/2011)

8
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE
TRANSPORTE SEM LICITAÇÃO. ATO ÍMPROBO POR ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES. (....) 2.
Conforme já decidido pela Segunda Turma do STJ (REsp 765.212/AC), o elemento subjetivo, necessário
à configuração de improbidade administrativa censurada nos termos do art. 11 da Lei 8.429/1992, é o
dolo genérico de realizar conduta que atente contra os princípios da Administração Pública, não se
exigindo a presença de dolo específico. 3. Para que se concretize a ofensa ao art. 11 da Lei de
Improbidade, revela-se dispensável a comprovação de enriquecimento ilícito do administrador público
ou a caracterização de prejuízo ao Erário. (...) 6. Na hipótese dos autos, a sanção de proibição de
contratar e receber subsídios públicos ultrapassou o limite máximo previsto no art. 12, III, cabendo sua
redução. As penas cominadas (suspensão dos direitos políticos e multa) atendem aos parâmetros legais
e não se mostram desprovidas de razoabilidade e proporcionalidade, estando devidamente
fundamentadas. 7. A multa civil é sanção pecuniária autônoma, aplicável com ou sem ocorrência de
prejuízo em caso de condenação fundada no art. 11 da Lei 8.429/92. Precedentes do STJ. 8. Consoante o
art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa, a multa civil é transmissível aos herdeiros, "até o limite do
valor da herança", somente quando houver violação aos arts. 9° e 10° da referida lei (dano ao
patrimônio público ou enriquecimento ilícito), sendo inadmissível quando a condenação se restringir ao
art. 11. 9. Como os réus foram condenados somente com base no art. 11 da Lei da Improbidade
Administrativa, é ilegal a transmissão da multa para os sucessores do de cujus, mesmo nos limites da
herança, por violação ao art. 8º do mesmo estatuto. 10. Recurso Especial parcialmente provido para
reduzir a sanção de proibição de contratar e receber subsídios públicos e afastar a transmissão mortis
causa da multa civil. (REsp 951.389/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
09/06/2010, DJe 04/05/2011)
No entanto, quanto à dosimetria da pena, o próprio
parágrafo único art. 12, da Lei 8429/93, esclarece que “na fixação das
penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano
causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente”.
No mais, traz a doutrina que o Superior Tribunal de
Justiça consolidou o entendimento no sentido que, uma vez caracterizado o
prejuízo ao erário, o ressarcimento é obrigatório e não pode ser considerado
propriamente uma sanção, mas uma consequência imediata e necessária do
ato questionado (Resp 658.389), sendo que a pena de multa civil cumpre o
papel de verdadeiramente sancionar o agente ímprobo, já que o
ressarcimento serve para caucionar o rombo consumado em desfavor ao
erário (Resp 622.234)9, sendo que todas as penas o juiz levará em conta os
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (Resp 658.389).
Nestes termos, pugna o Ministério Público pelo
desacolhimento de tais alegações formuladas pelos réus, determinando-
se o regular prosseguimento do feito.

4 - CONCLUSÃO

Assim, impugnadas as teses de defesa apresentadas,


pugna o Ministério Público seja julgada PROCEDENTE a presente
demanda, reiterando, em sua íntegra, a petição inicial.
Por fim, requer que seja considerada suprida a
ausência da citação do réu ELBER ALMEIDA DA SILVA nos termos do
art. 239, §1°, do CPC.

Sarandi/PR, datado e assinado eletronicamente.

9
MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo, 7ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2017.
IVANDECI JOSÉ CABRAL JÚNIOR
Promotor de Justiça

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