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~1~

Jessica Gadziala
#3 Mark

Série Mallick Brothers

Tradução Mecânica: Bia Z.

Revisão Inicial: Beatriz, Daise, Mirian, Andressa,


Rose, Vera

Revisão Final: Clau

Leitura: Mari

Data: 06/2018

Mark Copyright © 2017 Jessica Gadziala

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SINOPSE

Mark

O amor e o compromisso podem ser excelentes. Você sabe, para


os meus irmãos. Não para mim. Mas, em um encontro casual, eu me
deparei com ela.

Por que ela era diferente? Não poderia dizer com certeza. Talvez
fosse o fato de que ela era a mulher mais linda que já tinha visto. Talvez
fossem as arestas afiadas que ela usava como um escudo que me fazia
querer ver o que estava por baixo. Ou talvez tenha algo a ver com
qualquer segredo que ela estivesse tentando desesperadamente
esconder.

Scotti

O amor e o compromisso não estavam mesmo no campo das


coisas possíveis para mim. Minha vida tinha um propósito, uma
missão, e eu não poderia permitir que ninguém se interpusesse. Mas
então, surgiu Mark Mallick — mulherengo, agiota executor e muito
determinado em conhecer meus segredos.

Isso seria problema em qualquer dia, especialmente com ele. Por


quê? Talvez porque as coisas que ele me oferecia, as coisas que me
mostraria eram possibilidades para mim, poderiam me fazer reavaliar a
missão que tinha me consumido completamente nos últimos dez anos
da minha vida.

Mas eu poderia ter essas coisas? Poderia escapar da vida em que


estava presa há tanto tempo? Com Mark Mallick ao meu lado, eu estava
pensando que talvez fosse possível...

~3~
A SÉRIE

Série Mallick Brothers

Jessica Gadziala

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Um
MARK

— De quem é esse sangue?

Esta não era uma saudação completamente incomum em minha


família, especialmente entre mim e meus irmãos. Estando em nossa
linha de negócios, era uma questão válida. Em qualquer dia, poderia
pertencer a uma das cinquenta pessoas que não pagaram um
empréstimo que meu pai lhes deu. Na maioria dos dias, certamente a
resposta não seria o meu.

— O meu, — respondi, levantando minhas mãos para olhar para


elas, vendo o sangue seco como seu tivesse esquecido que existia. Eu
esqueci. O que posso dizer, quando você vive uma vida dura e bruta
como nós, as manchas de sangue eram tão normais quanto as manchas
de suor. — O maldito motor em uma das máquinas não estava a fim de
funcionar hoje. Vamos dizer que fui um pouco excessivamente zeloso
com a chave inglesa. De quem é esse cachorro?

Eli era um monte de coisas, um artista, bom com palavras,


descontraído, perigoso pra caralho. Mas um dono de cachorro ele não
era. No entanto, lá estava ele, do lado de fora do Chaz’s, com um vira-
lata feio de doer em uma coleira laranja brilhante. Veja, eu curto
cachorros. Mas feio era feio, mesmo que fosse o melhor amigo do
homem. E esse bicho parecia ter vivido uma vida difícil. Sabe, todas as
dez semanas disso. Seus pelos eram arrepiados com manchas, uma
mistura de cores como as de um border collie, mas com um focinho
achatado, orelhas pontiagudas, pés gigantes, um olho azul brilhante e
outro cinza.

— Algum idiota o deixou ao lado do lixo na noite passada. — A


voz de Eli era baixa e lívida e, já que fazia menos de cinco graus à noite
e o cachorro era muito novo para estar longe de uma mãe e muito
menos suportar esse tipo de queda de temperatura, essa merda fazia
sentido. — Então, acho que ele é meu agora. Tudo bem. Você pode
acariciá-lo. Não tem sarna. Eu o levei ao veterinário. Apenas tem uma

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pelagem fodida assim. — Eu me abaixei para acariciá-lo, surpreendido
quando ele se virou e disse. — A melhor aposta é que seja como uma
mistura de border collie e husky. Realmente perdido na loteria genética.

— Ei, mesmo cães feios são um ímã para as gatas, — falei,


encolhendo os ombros. — Você deu um nome?

— Coop.

— As meninas vão passar o tempo todo para vê-lo. Não sobrou


algum pra deixar na porta de Hunt? Ele ia gostar muito, — acrescentei
com um sorriso malicioso, sabendo que Fee não era uma grande fã de
cachorro, embora parecesse, porque já tinha três animais selvagens em
sua casa, também conhecidos como suas três filhas.

— Encontramos apenas um e olhamos em todos os cantos para


garantir. De qualquer forma, pelo que sei, Becca queria uma cobra e
não um cachorro.

— É macio e têm quatro pernas, elas vão ficar em cima dele. Você
recebeu a mensagem do pai? — perguntei, voltando aos negócios. —
Shane já falou com o merdinha na semana passada. É a sua vez.

— Sim, — ele concordou, balançando a cabeça, conhecendo a


rotina. Ele era o último recurso. Ele era o que fazia os homens
realmente, realmente querer pagar suas dívidas antes que ele batesse
em suas portas. E, na maior parte dos casos, ele era o mais
subutilizado de toda a equipe.

Meu pai fazia os negócios. Ryan fazia uma visita mais civilizada se
você estivesse devendo e ainda não pagou. Então, eu era chamado para
ficar um pouco mais firme, às vezes derramando algum sangue, mas,
na maior parte das vezes, não. Então, se não fosse o bastante, vinha
Shane que manchava seus tapetes com seu próprio sangue. As chances
de você pagar depois que Shane terminasse eram grandes. Quem se
submeteria a mais disso? Então, Eli estaria livre e limpo na maior parte
do tempo para fazer o que quisesse, lidar com seus negócios, fazer sua
merda artística. Se ele recebesse uma ligação por mês do pai, era muito.
O que, na opinião de todos nós, era melhor. Quando Eli surtava, não
era bonito.

— O pai disse que está de marcação dessa vez. Ele odeia esse
bastardo.

Eli muitas vezes precisava de uma babá quando estava num


trabalho, alguém para fazê-lo parar antes que a merda ficasse fora de

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controle. Normalmente, era eu. Ocasionalmente, Shane interviria.
Raramente Ryan. Meu pai quase nunca ia a um trabalho. Mas este
vacilão supostamente estava usando o dinheiro que emprestou para
cuidar de sua filha doente, deixando meu pai muito mais tolerante com
os juros e o prazo. Acontece que o fodido nem tinha filhos.

Meu pai é um agiota há bastante tempo para saber que merdas


surgiam e as pessoas nem sempre faziam seus pagamentos. Era parte
do trabalho e ele não ficava incomodado por isso. Mas mentir? Sim, ele
não tolerava essa merda.

— Interessante, — disse Eli, ainda tão calmo como sempre. Esse


era o lance dele. Sua raiva era um interruptor que poderia ser ligado.
Não era parte de sua personalidade diária. — Certo, bom, preciso
preparar minha casa para o cão. Te vejo amanhã na mãe.

Jantar de domingo.

Sem desculpas.

Todos nós cinco, todos na casa dos trinta, e nossos traseiros


ainda tinham medo do que uma mulher como Helen Mallick nos faria se
não aparecêssemos. Apavorados o bastante para que nenhum de nós
nunca tentasse faltar. Além disso, qual homem de verdade recusaria
uma refeição caseira?

Entrei no bar por um instante, zoando Ryan que conferia a


contabilidade e pegando a longa lista de “afazeres” para o abrigo das
mulheres que estava convencido de que foi construído sobre um antigo
cemitério nativo ou algo assim, porque a porra da casa era
amaldiçoada. Tinha sempre uma merda quebrando. E eu sempre era o
único envolvido nesse trabalho, já que era o melhor nesses lances de
reforma.

Então, saí pela porta dos fundos, admirando meu novo bebê
enquanto avançava até ele. Uma pick-up novinha em folha, toda de
titânio, pintura preta perolizada brilhante e todos os acessórios que a
concessionária poderia me dar.

O que posso dizer, sou louco por acessórios.

Câmera de ré? Confere. Rádio por satélite? Confere. Bancos com


aquecimento e refrigeração? Confere e confere. É só falar o nome que eu
tenho.

Mas passei muito tempo na minha caminhonete. Dentro de um


ano, estaria riscada, amassada, quebrada. Tudo graças à merda

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constante de carregar e descarregar ferramentas, à propensão de usar
meu veículo pessoal para puxar árvores do chão em vez de uma das
minhas caminhonetes de jardinagem e toda merda que rola quando
você era o tipo de cara que usa sua caminhonete e não do tipo que só
gosta de olhar.

Então, gostei de sua aparência intocada durante o curto período


de tempo que ia durar.

Estava quase fora do banco antes de meu telefone zumbir no


suporte para copos. — Sim, mãe?

— Livros de adesivos, detergentes para máquinas de lavar louça e


almofadas para esse novo cão do seu irmão.

Então, sim, minha mãe fazia merdas assim, ligando e exigindo


coisas. Dito isso, ela também era do tipo que entregava assados quando
estava de bom humor, então essa incumbência ocasional não era um
grande problema.

— Entendi.

— Seis, — ela disse, desligando sem esperar por uma resposta.

Meus planos para uma cerveja em frente à minha TV teriam que


esperar, pois o único lugar em que poderia achar essa estranha
variedade de itens era em uma maldita loja de departamentos. Seria
obrigado a perder três horas e meia e sair não só com essas três coisas,
mas cerca de trezentos dólares de alguma outra merda que
provavelmente não precisaria.

A última vez em que entrei em uma loja de departamentos, de


alguma forma acabei gastando com três sacos de coisas que vi na TV,
que ocupavam meu armário até hoje. Por que diabos pensei que
precisaria de uma máquina de macarrão de abobrinha, estava além de
mim.

Eles bombeavam drogas através de seus fodidos sistemas de


ventilação, eu juro.

Mas pelo menos eu pegaria outro pacote de cerveja e talvez algo


para fazer para o jantar.

Uma hora depois, estava cheio de DVDs com desconto. Por quê?
Essa era uma boa pergunta. Literalmente, cada DVD na maldita coisa
estava disponível para streaming, o que significava que nem teria que
sair do sofá para assistir a fodida coisa que, como todos sabemos, é o

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maldito sonho. Aqueles dias de “levantar para colocar um filme” foram
difíceis.

Finalmente, saindo daquela névoa de estupor da loja em que eu


estava, coloquei de volta a cópia do Bad Boys 2 e caí fora daquele covil
de maldades e voltei para as listas.

Mesmo ao meio-dia, literalmente, a vinte minutos de as aulas


terminarem, que era quando eu fazia todas as minhas compras na
esperança de evitar a muvuca, estava relativamente cheio. Cheio de
pobres almas que perderam o controle da hora, do dia, da semana e de
sua vida, graças ao turbilhão de luzes fluorescentes gritantes e um
infinito labirinto de corredores.

Segui as luzes para o caixa, prometendo esvaziar minha carteira


com uns bons trezentos dólares de merda que não precisava, quando
aconteceu.

As luzes foram cortadas.

Ainda era março e isso significava que não havia sobrecarga de ar


condicionado nas linhas elétricas, como às vezes ocorre quando
entramos no verão. Não havia tempestades e lojas como essa tinham
um gerador para esse tipo de merda. Parei subitamente.

Talvez não houvesse uma razão real e concreta para me sentir


assim, mas havia um aperto inconfundível em meu interior, como
costumava acontecer antes de uma briga explodir dentro do Chaz’s ou
quando estava prestes a fazer um trabalho para o pai. Mas seja como
for, ali estava. Meu corpo estava se preparando para algo.

Me sentindo um alvo fácil, empurrei meu carrinho num corredor,


caminhei silenciosamente para a parte de trás em direção à parede,
parando ao lado do final de uma prateleira e esperando por algum sinal,
qualquer sinal de que meu corpo não estava sendo ridículo.

Uma sombra se moveu para baixo do corredor na minha frente.


Mesmo quando meus olhos se ajustaram ao escuro, consegui distinguir
o longo e magro corpo de uma mulher com cabelos longos e escuros. De
costas para mim, era tudo o que podia distinguir. Bem, isso e o fato de
que ela andava com cuidado, levantando e pousando suas robustas
botas de combate, como se o toque das solas de borracha em seus pés,
pudessem entregá-la.

Talvez sentisse o mesmo aperto no estômago que eu estava tendo


e quisesse ficar mais escondida.

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Obviamente alheia a mim, ela recuou quase se encostando em
mim, deixando apenas alguns centímetros entre nós dois.

O silêncio era estranhamente pesado enquanto seu cheiro encheu


minhas narinas. Era agradável, nada daquele cheiro químico. Ervas,
um toque de lavanda e talvez algo cítrico. Único, atraente e apenas um
leve toque, como o perfume deve ser. Já voltei para casa depois de
noitadas com mulheres, precisando tirar minhas roupas e tomar banho
imediatamente, porque não suportava o cheiro da porcaria com a qual
praticamente se banhavam.

Fiquei bastante convencido de que era apenas um problema de


rede ou um problema de fiação ou alguma outra merda aleatória,
renunciando ao fato de que teria de abandonar meus itens e depois
dirigir-me a outra loja para pegar a merda que minha mãe queria,
quando aconteceu.

Mesmo que você não estivesse familiarizado com o som, se não


fosse uma parte constante da vida estar às margens da lei, mesmo que
não soubesse porque você ouviu o som causado por sua própria mão e
dedo antes, você conhecia o som de tiroteio quando escutava um.

Meu sangue ficou frio quando meu estômago se apertou mais.

O que me seguiu foi um instinto, talvez porque eu tinha cunhadas


que significavam o mundo para mim, talvez porque eu amava as
mulheres, talvez fosse apenas um instinto primitivo neandertal
enterrado profundamente. Mas num instante eu estava de pé, com os
ouvidos doloridos do alto e próximo som de armas de dentro da loja
fechada. A seguir, minha mão estava presa na boca da mulher
aleatória.

— Shh, — fiz, quando meu outro braço passou por seu estômago,
puxando-a contra o meu peito, tirando-a fora da vista se alguém
passasse.

Quem era o fodido que disparava armas em lojas de


departamentos?

Loucos fodidos. Caras fora da casinha com rifles e rancor contra


suas ex-esposas.

Mas eles não seriam tão inteligentes para cortar a energia.

Não.

Essa merda era profissional.

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E merda profissional significava que eles provavelmente estavam
lá para roubar.

Sabe quanta grana devia ter nos doze caixas ou mais em uma loja
dessas? Bastante. Bastante para correr o risco de fazer um assalto à luz
do dia. Basta descobrir como cortar as luzes. E se eles soubessem como
cortar as luzes, eles sabiam cortar as câmeras.

Como se estivessem alinhados a esse raciocínio, vi uma figura de


aparência escura entre dois dos monitores que bloqueavam a mim e à
mulher da vista dos caixas registradores Podiam cortar a luz, mas não
podiam fazer nada sobre as portas automáticas da entrada, trazendo
raios de sol. Apenas o suficiente para ser capaz de distinguir os homens
nas etapas iniciais de um assalto.

E esses homens, sim, nem sequer tinham máscaras. Nem um dos


três que eu podia ver.

Estava bastante escuro, o que funcionava a favor deles, lançando


sombras sobre suas feições. Nem mesmo eu poderia dar uma descrição
adequada para um esboço de retrato falado, e muito menos os homens
e as mulheres nos caixas que estavam muito ocupados sufocando por
conta própria com medo de prestar atenção a coisas como a forma da
sobrancelha ou a cor dos olhos.

Tudo o que poderia dizer com certeza era que eram altos, de
cabelos escuros e em forma. Era isso. E estava bem perto para perceber
mais, para perceber tudo se houvesse uma luz melhor.

— Ninguém vai se machucar, — um deles falou, fazendo-me


respirar lentamente, aliviando um pouco da tensão. Porque eles não
disseram “se você fizer o que dissermos ninguém vai se machucar”. Eles
não colocaram a segurança de todos nas mãos dos outros idiotas
assustados ao redor deles que poderiam tentar ter algumas grandes
ideias. Talvez fosse ingênuo acreditar na palavra de um criminoso.
Sendo quem eu era, fazendo o que fazia para ganhar a vida, conheci
muitos criminosos. Eu os conheci bem o suficiente para saber quando
estavam te enrolando. Esses caras não eram burros. Eles estavam lá
pelo dinheiro que estavam cuidadosamente colocando em sacolas da
loja nos três caixas que os homens estavam pertos.

— Quinze, — outro dos homens chamou os outros. Então, vários


segundos depois. — Dez.

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Porque, como eu disse, eles eram profissionais. Eles sabiam que
havia a chance de um alarme silencioso ter sido acionado ou pelo
menos dez chamadas feitas por compradores assustados para a polícia.

— Scott. Porra, cadê você? — Aquele que falou primeiro, talvez o


líder, gritou, parecendo um pouco preocupado.

Faltava um membro em algum lugar.

— Cinco, quatro, três, — o outro continuou gritando quando


coletou sacos.

— Scott!

— Um. Temos que ir, — o outro falou, agarrando o braço do líder,


puxando duramente. — Você conhece o procedimento. Precisamos
vazar.

Então, com isso, eles vazaram.

Para onde?

Não tinha nem uma fodida ideia.

Um minuto eles estavam lá pelos caixas. No seguinte, tudo o que


ouvi, eram botas correndo.

Tudo o que sabia era que eles não saíram pelas portas da frente
que estavam literalmente a cinco metros de distância deles.

Contra mim, a mulher tentou se soltar de meu braço. — Ainda


não, — disse perto de sua orelha, a voz quase não mais do que um
sussurro. E, juro por Deus, um arrepio percorreu a mulher, fazendo
com que uma centelha de desejo inconfundível e completamente
inapropriado disparasse em mim. Era a adrenalina, para nós dois. Já
tinha ouvido dizer que o lance da quase morte sempre foi um
afrodisíaco. As pessoas em situações como essa sempre ficavam
excitadas, sempre queriam uma merda para reafirmar a vida.

Deus sabia que mais tarde estaria indo direto para o Chaz’s, ou
talvez procurasse entre meus contatos uma amiga que sempre fazia
algo casual.

Você sabe, depois do depoimento para os tiras e das inúmeras


chamadas que teria que fazer para contar para a minha família. Esta
porra era suculenta. Eles iriam devorar isso. Ladrões de lojas
profissionais na área? Isso era novo.

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Distraído, fui apanhado completamente de guarda baixa quando
um daqueles pés com botas de combate chutou forte o meu. Não era a
maneira hesitante e cuidadosa que a maioria das mulheres faria,
programada desde o berço pela sociedade para ser mais suave, mais
doce e aceitável. Ouvi em algum lugar que esse era o maior problema
que as mulheres tinham no treinamento de autodefesa, o fator
constrangimento, o instinto profundo de nunca machucar ninguém,
para sempre ser acolhedora. Esta mulher, sim, ela não sofria com a
necessidade de ser suave, doce ou acolhedora. E se não estivesse
chiando e me perguntando se precisava fazer um maldito raio-X no meu
pé, acharia isso sexy como o inferno.

E, literalmente, no decurso de sua volta para me encarar, as luzes


voltaram, provocando em mim mesmo uma dor com a mudança
repentina de contraste, ficando embaçado por um longo segundo até
que meus olhos se ajustassem.

E porra.

Ela poderia quebrar meu pé qualquer maldito dia.

Mesmo na escuridão, com o corpo dela grudado em mim, sabia


que ela era longa e magra, mas vê-la com luz apenas cimentou a ideia.
Ela era toda pernas e tronco, só com um indício de quadril e peito,
vestida com jeans pretos, botas de combate e uma camiseta preta. Seu
cabelo brilhante, grosso e castanho escuro, quase preto, caia em
cascata nas costas e nos braços, enquadrando um rosto que pertencia a
revistas, não a uma loja aleatória de roupa barata e detergente.

Insanamente linda pra caralho.

Essa seria a única maneira justa de descrevê-la.

E senti mesmo que não lhe fazia nenhuma justiça.

Havia uma pequena sugestão de exotismo em seus traços, na pele


clara e nos cabelos escuros, na forma amendoada de seus olhos
escuros. Sua mandíbula era forte e quase quadrada, seu nariz era
pequeno e reto, seus lábios cheios, suas sobrancelhas escuras e traços
dominantes.

Apenas... tão linda pra caralho.

Não era nem justo para o resto do mundo.

— Mantenha suas mãos de merda longe de mim, — ela


respondeu, enfatizando seu ponto, empurrando as mãos contra o meu

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peito com força. O que, devido ao meu pé quase alarmantemente
latejante, me enviou a quase cinco metros no impacto.

— Sei, certo? Sou um merda por tentar manter você a salvo, —


disse secamente, os lábios ligeiramente curvados, achando que gostava
de seu fogo tanto quanto gostava de como ela me olhava. Sua voz era
tão quente quanto o resto dela, sexy e gostosa. Sensual, alguém poderia
dizer. E esse alguém era eu, que definitivamente achou sensual pra
caralho.

— Certo porque sou uma florzinha delicada. Você achou que eu


iria gritar por causa de uns tirinhos desses? — Ela perguntou, as
sobrancelhas se juntaram como se a ideia fosse louca. Enquanto isso,
eu literalmente ouvi três gritos de mulheres diferentes quando as luzes
acabavam de voltar. Juntamente com dois homens. Não era sexista. As
pessoas, independentemente do seu gênero, tinham uma tendência a
reagir exageradamente antes de conhecerem a situação.

— Tirinhos? — repeti, batendo os lábios. Quem diabos usava um


termo como “tirinhos”?

— Aqui é Navesink Bank. Fiquei sabendo que Third Street gastou


algumas balas sem motivo e que ainda estavam vivos esta manhã. Eu
não precisava...

Qualquer coisa que ela quisesse dizer foi interrompida pelos gritos
dos policiais quando invadiram, armas em punho, olhos atentos,
espalhando-se de um jeito militar que eu não sabia que eram tão bem
treinados para saber como fazer isso. Porque, fala sério, a maioria do
departamento de polícia estava nos bolsos de uma ou mais das
organizações criminosas na área. Eles realmente não precisam de
treinamento para saber como “perder” papelada ou provas
contundentes.

— Mallick, — uma voz familiar chamou, fazendo com que nós dois
déssemos um sobressalto e nos virássemos para o corredor onde um
policial estava abaixando sua arma. — Que parte de “saiam da loja” foi
tão difícil de entender?

Era o detetive Lloyd. Ele era, pelo que ouvi, o mais novo detetive
do departamento de polícia de Navesink Bank. Também não estava no
bolso de ninguém, o que realmente dizia algo sobre seu caráter. Às
vezes também era um pouco babaca. Bem, só para mim e para os meus
colegas criminosos. Não poderíamos realmente culpá-lo por isso.

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Alto, sombrio e atraente. Ele poderia ter qualquer mulher que
quisesse, mas nunca o vi na cidade à procura de qualquer uma.

Ele era um idiota estranho.

— Lloyd, prazer em te ver, — falei, ignorando o olhar que a


mulher estava me enviando, algo que parecia uma mistura confusa e
intrigada. — Você vai nos desculpar se não somos tão respeitadores das
regras. Estávamos no meio de um assalto. — eu disse, sem me
preocupar em manter o sorriso.

E, Lloyd, apesar de ser babaca às vezes, também tinha um senso


de humor bastante decente, fazendo com que ele colocasse sua arma de
volta no coldre e me desse um meio sorriso. — Você? Seguindo as
regras? Pensei que o inferno congelaria se isso acontecesse. Vamos, lá
pra fora, — ele disse, avançando para o lado, com o braço erguido, um
convite e ordem silenciosa para fazer o que ele mandou.

A mulher me lançou um olhar quando também acenei uma mão,


convidando-a a ir primeiro, algo que ela não pareceu gostar muito, mas
foi mesmo assim. Eu a segui, ladeada por Lloyd, até caminharmos em
direção às portas da frente, encontrando um monte de detetives.

— Mark, — Collings cumprimentou-me, dando-me um sorriso


malicioso. Eu gostava de Collings. A maioria dos criminosos ao redor
gostava. Ele entendia a merda em Navesink Bank. Conhecia a dinâmica
do poder. Aceitou que, mesmo sendo todos criminosos, havia uma
hierarquia, havia regras, havia um código. A maioria de nós só feria um
ao outro se fizermos mal a alguém. Nenhum inocente ficou preso no
fogo cruzado. Nenhum sangue de pessoas que não estavam envolvidas
foi derramado. Então ele não se incomodava em ser uma pedra em
nossos sapatos. Deixou-nos lidar com nossos negócios e só nos
algemava se fôssemos presos em flagrante ou se houvesse alguma
queixa contra nós. Ele investia seu tempo indo atrás de estupradores,
maridos violentos e traficantes.

— Collings, porra, você ainda não se aposentou? Juro que você


está no meu pé desde meus onze anos.

— Só porque estava em problemas desde que tinha dez anos, —


ele concordou. — Mais alguns anos. Falta pouco para chegar.

— Pelo menos teve uma carreira emocionante, — falei, encolhendo


de ombros. — E agora pode adicionar assalto à mão armada ao seu
currículo. Bons momentos.

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— Sim, era tudo o que a minha pressão precisava hoje. Onde você
estava quando isso aconteceu? — Ele perguntou, puxando um pequeno
caderno caindo aos pedaços e caneta, pronto para anotar.

— Cerca de dois corredores. Estava no corredor principal quando


as luzes se apagaram e achei que tinha alguma merda errada, então fui
pelo corredor e fiquei no final da prateleira. Esta coisinha fofa, — eu
disse, dando-lhe um sorriso quando ela olhou para mim, — teve a
mesma ideia. Foi ali que estávamos quando os tiros dispararam.

— Certo. E posso ter seu nome? — Ele perguntou a ela, fazendo


com que ela relaxasse um pouco os ombros.

— Angela Boots, — ela informou.

— E algum de vocês deu uma boa olhada nos criminosos?

— Estava escuro, — Angela informou automaticamente.

Os olhos de Collings foram para mim, sabendo que se tinha


alguém naquela loja capaz de fazer uma descrição decente,
provavelmente seria um cara que estava durante todas as semanas em
situações complicadas e que não deixaria o medo nublar sua visão. —
Alto. Meu peso. Um deles talvez até mais alto. Cabelos escuros. Corpos
fortes, mas não volumosos como Shane. Como ela disse, estava escuro.
Foi tudo o que pude conseguir de onde eu estava. Mas eram
experientes. Profissionais. Nem um passo em falso. Ah, estavam
procurando alguém.

— Procurando alguém? — Ele perguntou, animando-se


ligeiramente.

— Um de seus homens deve ter desaparecido. Scott, eles o


chamaram. O líder parecia estar enlouquecendo sobre não conseguir
encontrá-lo. Mas aparentemente tinham uma regra para situações como
essa. Um dos outros o lembrou disso, e eles tiraram a bunda daqui.

— Temos pelo menos um nome, — disse Collings, soando


monótono, sem entusiasmo. Ele provavelmente assumiu ou confirmou o
que eu pensava. As câmeras foram cortadas e os relatos das
testemunhas oculares eram uma merda. — Consegue identificar mais
do que isso? Além de alto, em forma, cabelos escuros?

— Não estou convencida de que seus cabelos fossem tão escuros,


— disse ela, voltando minha atenção para ela, vendo seus olhos
apertados como se estivesse tentando lembrar. — Acho que era marrom
claro ou médio para ser mais preciso. Na verdade, poderia ter visto dois

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deles na loja antes que as luzes se apagassem. Ele apenas me lembrou,
— disse ela, acenando casualmente comigo. — No calor do momento,
não me toquei desse lance de Scott. Mas agora que ele tocou no
assunto, vi dois caras caminhando e um deles chamou o outro Scott.
Ambos eram altos e em forma, como ele disse. Mas seus cabelos eram
mais claros. E também tinham olhos claros. Talvez verde ou azul? Ela
perguntou, olhando-me com olhos franzidos, como se me pedisse
confirmação. Mas eu não os tinha visto. E estava certo pra caralho que
os três que vi na frente tinham cabelos escuros. Mas talvez houvesse
cinco deles. Quem sabia.

— Qualquer outra marca peculiar? Cicatrizes? Tatuagens? —


Collings perguntou, soando um pouco mais esperançoso.

— Um deles tinha uma tatuagem na mão, aqui mesmo, — ela


disse, tocando o topo da mão com os dedos longos e finos da outra mão.
— Uma, ah, caveira, talvez? Havia chamas à sua volta. Não olhei bem.

— Alguma coisa sobre o outro homem?

Ela balançou a cabeça: — Desculpe, realmente não vi o rosto e


não parecia haver tatuagens.

— Não se preocupe, querida. Isso foi mais do que qualquer outra


pessoa deu para seguir em frente. Eu agradeço. E nossos garotos devem
encontrar esses homens nas câmeras antes de serem cortadas. Então
você acabou de tornar nosso trabalho um pouco mais fácil. Aqui, você
pode ir com Lloyd para dar sua declaração oficial? — Ele perguntou,
estalando Lloyd. — Nós só precisamos disso por escrito com algumas
informações de contato.

— Acho que você tem todas as minhas informações, — eu disse,


enquanto ela era levada para um dos caixas para preencher a papelada,
juntamente com duas dúzias de outras pessoas, funcionários e
compradores.

— Um fodido assalto à mão armada, — disse Collings, balançando


a cabeça. — Como se já não tivéssemos bastante merda para combater
em Navesink Bank. Você ouviu falar sobre aquele corpo? — Ele
perguntou, falando como se fôssemos velhos amigos porque de certa
forma nós éramos. Várias vezes Collings foi obrigado a me procurar e
questionar sobre alguém que foi espancado na área. Nunca deu em
nada. Nunca dava. Normalmente, a gente apenas ficava de conversa
fiada por um tempo e ele voltava para a delegacia.

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— Acho que isso é coisa de Lex Keith. — eu disse, suspirando.
Não era muito a favor de assassinato, mas algumas pessoas não
mereciam continuar respirando. Lex Keith era uma delas.

— Quarta mulher este ano, — ele concordou, o rosto redondo


ficou vermelho com sua indignação, e estava um pouco corado desde o
começo. Devia ser difícil, às vezes, ver esse nível de brutalidade, a pior
coisa que os seres humanos poderiam fazer uns aos outros, sabendo
quem o fazia, sabendo que havia até provas, mas que devia admitir o
nível de corrupção. E isso significaria que nunca haveria justiça.
Espantava-me que Collings e os outros policiais corretos da corporação
não se uniram e sentenciaram justiça com as próprias mãos.

— Você é um maldito santo, Collings. Não sei como enfrenta essa


merda diariamente.

Ele resmungou nisso. — Sabe quem me espanta? Dr. Fenton.


Tipo assim, nós também vemos os corpos. Mas é por pouco tempo. Ele
fica catalogando cada corte, cada unha sangrenta, cada hematoma e
pancada. Não sei como ele faz essa merda. Quero dizer isso, — disse
ele, abanando uma mão para a loja. — Isto é quase como se fossem
malditas férias. Quem, senão um detetive em Navesink Bank poderia
dizer isso de um assalto à mão armada? Mas no fim das contas,
ninguém ficou ferido. A empresa, francamente, pode ter perdido alguns
trocados, mas estão no seguro, de qualquer maneira. Não houve
nenhum dano, nenhuma falta.

Eu não estava exatamente de acordo com isso.

Como disse, eles eram treinados e profissionais.

E se um guarda de segurança tivesse a ideia de bancar o herói? E


se um cidadão civil possuísse permissão para porte de armas? E se um
policial fora de serviço estivesse com sua arma?

Havia muitas variáveis que poderiam ter alterado o resultado e ter


fodido com um sistema perfeito.

E, francamente, era apenas uma questão de tempo antes de uma


dessas situações rolar. Esses ladrões poderiam manter-se calmos?
Poderiam cumprir sua promessa de não machucar ninguém?

Só o tempo diria.

— Ainda tenho que tentar encontrá-los. Veja se há algum modus


operandis aqui que combina com os registros. Não pode ter ladrões
armados soltos por aí criando caos. Mesmo que seja um caos

~ 18 ~
relativamente pacífico. Faça-me um favor e preencha um relatório com,
ah, aquele bastardo do Marco, — ele disse, apontando uma mão a um
homem de uniforme, alto, em forma, mas magro, boa aparência, com
tom e características de pele italiana. Alguma coisa nele parecia gritar
“dinheiro”, mas dei de ombros, visto que os policiais não ganhavam
tanto dinheiro. Quando olhei de volta para Collings, ele me deu um
olhar dolorido. — Para constar, ele é meu novo parceiro. Por que é
exatamente o que a minha velha e cansada bunda precisa, sangue novo
para treinar. Vá em frente, — disse ele, balançando a cabeça em sua
própria autopiedade.

— Força aí, Collings, — falei, segurando uma mão na parte de


trás do ombro por um instante antes de partir para Marco.

— Mallick? — Ele perguntou imediatamente.

— Minha reputação me precede, posso ver.

— Agiota, — ele disse zombando, como se eu estivesse de alguma


forma atrás das grades por ter uma “boa reputação” para um criminoso.

E, bem, estava bem com isso. Não queria exatamente ser


enquadrado como os traficantes locais de drogas e assassinos de
mulheres. Estava perfeitamente feliz em estar associado a tipos como os
Grassis e The Henchmen. Inferno, até os Hailstorm. Só não aqueles
bastardos vigaristas como Lex Keith, que precisavam ficar ostentando
um monte de novos buracos em seu corpo.

— Sou um empresário. Você não ouviu? Tenho um negócio de


paisagismo e uma empreiteira, oh e ultimamente um negócio de painéis
solares...

— E, ocasionalmente, você espanca um homem que lhe deve


dinheiro.

— Não acho que muitos agiotas realmente quebram os joelhos


hoje em dia. De onde você tirou sua informação? Filmes de gangues da
década de 1940?

— Tudo bem, espertinho. Preencha a papelada e mantenha a boca


fechada.

— Caramba, eles vendem sais aromáticos aqui? Estou prestes a


desmaiar pelo seu charme, — provoquei, pegando a caneta esticada de
uma mão coberta de cicatrizes que, novamente, me fez sentir algo
estranho sobre ele. Mas ignorei isso, preenchi o meu formulário o mais
rápido que pude, então fui em direção à rua.

~ 19 ~
E talvez eu estivesse procurando por ela.

Angela.

Inferno, não havia um talvez.

Também não tinha vergonha disso.

Vasculhei com meus olhos para cima e para baixo do


estacionamento procurando por sua bunda bonita. Ela terminou o
depoimento cinco minutos antes de terminar o meu. Eu mesmo a ouvi
se despedir de Collings antes de sair, certificando-se de dizer para
entrar em contato com ela, caso precisasse de algo mais.

Talvez estivesse me lembrando de Velocidade Máxima, na cena em


que eles disseram que você não devia basear um relacionamento em
situações de vida ou morte, então eles decidiram basear em sexo? Sim.
Dito isto, se você me perguntasse, o sexo era uma ótima coisa para
basear qualquer coisa.

E o sexo com ela, sim, meu instinto me dizia que seria demais.

Além disso, talvez uma parte de mim estivesse interessada em o


que lhe causou toda aquela arrogância. Havia uma atração em
mulheres suaves e doces do tipo que Ryan sempre gostou, como aquela
com quem Ryan se amarrou. Eu amava Dusty. Não poderia pedir uma
cunhada melhor, juntamente com a Fee e Lea. Mas sempre gostei das
mulheres com um pouco mais de fogo, um pouco mais de atitude, um
pouco menos de tolerância para aguentar minhas merdas. Dê-me uma
mulher que saiba o que quer e que assuma isso sem desculpas e eu era
um homem feliz.

Houve uma decepção quando não vi nada além de um mar de


carros e espectadores curiosos. Caminhei de volta para minha
caminhonete, já me preparando para ter que dirigir fora da cidade e
pegar a merda para o jantar da mãe, pensando se poderia encontrá-la
novamente.

Uma coisa eu tinha certeza. Nunca cruzei seu caminho antes. Ela
era o tipo de mulher que um homem perceberia, quisesse ou não. Não
havia nenhuma maneira de ela ter fugido de minha vista nesta cidade.

Eu tinha um nome.

Ainda que eu fosse o tipo de cara para ir na internet e fazer uma


busca de Angela Boots ainda era vago. Não que me opusesse em ter um
pouco de trabalho para conseguir uma mulher. A maioria dos homens

~ 20 ~
gostava de uma caçada de vez em quando. Mas tinha que gastar sola de
sapato e tinha que perseguir.

Ela disse uma coisa que podia tê-la entregado.

Ela se referiu a alguma briga estourando sem motivo em Third


Street naquela manhã. Third Street tinha um território bem definido e
geralmente ficavam ali para evitar conflitos. Podiam ser uma aceitável
gangue de drogas de segunda categoria e de cafetinagem, mas não
tinham chance de enfrentar rivais como Lex Keith ou Richard Lyon.

Então, eles ficavam na sua rua profissionalmente.

E, mais importante para mim, eles ficaram na sua zona quase


que exclusivamente.

Esse bairro era meio que uma favela e nenhum de nós vivia por
perto.

Mas meu irmão Shane tinha um edifício na área. Na verdade, era


praticamente na frente da sede da Third Street.

Talvez Shane precisasse consertar algumas coisas no prédio.

Inferno, o prédio inteiro precisava ser condenado, caralho.

E tinha muita coisa para arrumar e talvez olhar ao redor sem


parecer um maldito tarado.

E, talvez o mais importante, sem meus irmãos descobrirem que


eu estava obcecado por uma mulher qualquer, com quem passei apenas
cinco minutos durante um assalto à mão armada.

Eu essa merda nunca rolaria.

Conhecendo-os como os conheço, eles estariam apostando em


quando eu iria me casar.

Como se essa merda fosse acontecer.

Embora uma coisa estava para acontecer.

Eu encontraria Angela novamente.

~ 21 ~
Dois
Scotti

Merda.

Merda de merda, merda, merda.

Isso não deveria ter ido por esse caminho.

Primeiro, eu nunca deveria ficar cara a cara com os malditos


policiais. Em segundo lugar, deveria ter havido mais tempo antes da
polícia chegar lá. Alguém fodeu com o cronograma. E, bem, na nossa
particular linha de trabalho o que não podia era foder com o
cronograma. Era o elemento mais importante, seguido pela precisão dos
cortes das câmeras, a vedação das portas e depois a fuga.

E Kingston disse a porra do meu nome.

Admito, pelo menos ele teve o bom senso de dizer Scott e não
Scotti, mas ainda assim. Isso foi uma porra épica.

Estávamos tão desconcentrados.

O excesso de confiança fez isso.

Atravessei o estacionamento, esforçando-me para manter meu


ritmo, como se “tivesse acabado de sofrer um assalto à mão armada” e
não como se “tivesse, com sucesso, ajudado a realizar um assalto à mão
armada”. Foi um delicado equilíbrio.

Caminhei pela rua abaixo, por um pequeno beco no centro


comercial da rua, atravessando a rua, encostando-me contra a parede e
respirando devagar e devagar. Queria ir direto para eles. Queria torcer
seus malditos pescoços. Dito isto, não ajudaria se fugisse e levasse os
policiais diretamente a eles, implicando a todos nós. Tínhamos feito isso
muito bem por muito tempo para sermos apanhados em alguma cidade
estranha em Jersey.

Pelo que senti, eles compraram minha história. Minhas mentiras


sustentaram a descrição de dois dos suspeitos. O único que me olhou
~ 22 ~
como se eu tivesse sido menos de cem por cento precisa foi o cara
chamado Mallick. Ele era uma ponta solta.

Nada sobre ele parecia sugerir que era um policial ou tivesse


alguma conexão com os policiais. No mínimo, eles o trataram como
policiais em uma cela de bêbados cumprimentando o bêbado local de
vinte anos que se mostrou sóbrio todas as sextas-feiras à noite.

Aposto que o homem era um algum tipo de criminoso.

Bem, o que era interessante.

Não que isso importasse, mas era um pedacinho de informação


fascinante. Também era intrigante como seu primeiro instinto foi me
silenciar. Ele manteve-se alerta. Mais uma vez, provavelmente devido a
algum antecedente suspeito, mas ainda assim, era uma característica
atraente para uma mulher como eu ver um homem assim.

Ele também era estupidamente bonito. Havia isso também. Nem é


preciso dizer. Homens com aquela aparência mereciam uma rápida
atenção. Ou uma longa atenção, incrivelmente detalhada. Na cama.
Com um dispositivo de bateria depois de alguns copos de vinho.

Porque, porra.

Pra começar, ele era alto. Era sempre o que reparava primeiro em
um homem, porque eu mesma era alta. Nem o vi, mas podia senti-lo
contra minhas costas. Ele tinha no mínimo, 1,85 com um porte forte,
mas não excessivamente volumoso. No escuro, tudo o que consegui
notar, além disso, era que ele cheirava bem. Viril. Não todo encharcado
de colônia. Havia uma sugestão do que era ou gel de banho ou
desodorante. Além disso, uma pitada de suor, mas não cecê, e uma
mistura de substâncias incomuns de óleo, gasolina e grama. Como
coisas do chão, não vaso. Ele cheirava à grama fresca cortada.

Mas quando as luzes voltaram e olhei para ele, bem, sim. Ele era
um tipo alto, moreno e bonito, mas de uma maneira áspera. Nunca fui o
tipo de mulher caidinha por homens de ternos. Eles eram muito limpos,
muito arrumadinhos, muito sem graça para o meu gosto. Achei que eles
fossem do tipo que se irritavam se eu bagunçasse seus cabelos durante
o sexo. Mas o cabelo desse Mallick já estava bagunçado. Escuro,
perfeito e bagunçado. Ele não se oporia a um pouco mais de bagunça.
Depois, havia a estrutura óssea absolutamente perfeita. Clássica. Ele
era classicamente bonito. Ah, e tinha que mencionar aqueles olhos.
Aqueles olhos azuis claros e quase transparentes. Havia algumas boas
tatuagens por seus braços também. Outra coisa que eu gostava.

~ 23 ~
Quero dizer, não que isso significasse qualquer coisa. Exceto
talvez que estivesse focada demais no trabalho para trepar nos últimos
dois meses. Ou talvez mais. Oh, Deus, tinha sido muito mais tempo. O
último homem havia retornado de alguma cidade no meio do nada do
Mississippi. O que posso dizer, ele tinha aquele lance de sotaque do sul
e eu tinha cerca de cinco bebidas em mim. E era um agricultor real com
uma vida real. Tipo ele cultivou sua terra com suas próprias mãos. Isso
foi irritantemente atraente para mim.

Mas tinha que me assegurar de dar uma verificada no Sr. Mallick


quando voltasse para o abrigo. Apenas para ter certeza de que não era
uma espécie de ameaça.

Duvidava que fosse, mas nunca se sabe.

Respirei profundamente fazendo meus pulmões arderem, me


afastando do beco e pegando o caminho mais longo e complicado de
volta para o abrigo.

Ver o carro de Rush através de uma janela na garagem externa


quase dilapidada foi um alívio que eu nem sabia que precisava,
livrando-me do estresse do qual nem tinha me dado conta. Era como
voltar ao início, quando éramos tão inexperientes quanto poderíamos
ser. Quando mais nos ferramos do que fizemos certo. Quando Rush
ainda dirigia a velha minivan da nossa mãe. Sem uma carteira de
motorista.

Na verdade, nenhum de nós tinha uma habilitação.

Isso aconteceu porque não queríamos nossas fotos em lugar


nenhum além dos nossos anuários do oitavo ano.

Então, mesmo quando estávamos em algum golpe, Rush, o


motorista, respeitava não só os limites de velocidade, mas também os
sinais de preferencial e de parada obrigatória.

Meus olhos examinaram as ruas por um longo minuto,


procurando por alguma coisa. Mas não havia nada. Claro que não
havia. Foi por isso que escolhemos o lugar.

Era um pouco mais do que um barraco na frente do bosque, na


esquina, a poucas casas abaixo da sede do comando da Third Street.
Era um dos dois barracos. O outro ficava do outro lado da rua e parecia
igualmente abandonado, mas ninguém se meteu ali por algum motivo.
A única melhoria que este teve de um barraco de verdade era um
banheiro funcionando O que, fala sério, é obrigatório. Depois de um par

~ 24 ~
de passagens em lugares com apenas banheiros de paradas, decidi
estabelecer a lei sobre o encanamento funcionando. Nada contra
banheiros de paradas. Sabia que eram a coisa do futuro e tudo isso.
Mas este era o presente. E essa mulher já lidou com comida de fast food
e dormiu na traseira de carros desde que tinha dezessete anos. Ganhei
o direito de ter privacidade sobre algumas pequenas coisas. Como dar
descarga. Dar descarga era uma coisa boa.

Caminhei na parte de trás da construção de madeira de um andar


que uma brisa decente poderia derrubar, empurrando a porta aberta e
entrando com confiança, pronta para armar uma confusão.

E me deparei com o que era normal - a construção de um quarto


com uma cozinha pequena à esquerda com uma geladeira que poderia
ter antecedido a minha existência, um micro-ondas e uma pia. Havia
uma área de estar em direção à porta da frente. Mas nós puxamos
todos os móveis para um canto e colocamos cinco colchões de espuma
iguais. Outra concessão minha. Eu não ia compartilhar uma cama com
nenhum deles. Havia a mesma tinta amarela desbotada nas paredes
que se encontrava no meio do caminho com os painéis de madeira
diretamente dos anos 70. O piso era o mesmo linóleo desgastado com
redemoinhos de marrom e branco, a maioria soltando nas beiradas e
arranhando os saltos altos em todas as principais áreas de caminhadas.

Havia a encantadora e linda mesa de jantar feita à mão que quase


ficaria triste por deixar para trás, encontrando todos os arranhões
encantadores, lembrando um momento em que um grupo de ladrões
armados não a estava usando para guardar uma grande pilha de
dinheiro roubado de uma loja da cidade.

O dinheiro estava lá. Precisava ser contado com atenção antes de


transferi-lo para um contato para que fosse limpo para nós. Apenas no
caso de algo acontecer. Quando você era um criminoso, a paranoia não
era necessariamente uma falha. Muitas vezes, era um trunfo.

Outra coisa que não era completamente incomum era que havia
fogo na lareira, sendo a única fonte de aquecimento. A única parte
incomum disso era que havia muito pouca madeira na lareira. Não, em
vez disso, tinha uma grande quantidade de roupas masculinas.

Era até comum surpreender os homens.

O que não era exatamente comum era entrar para encontrar


quatro armas apontadas para mim.

Apontadas pelos meus irmãos.

~ 25 ~
— Puta merda, Scotti, — disse Kingston, abaixando a arma, o
alívio era visível em seu rosto sempre sério. Ele era o cara que Mallick
mencionou, aquele que procurava Scott. Bem, eu. Foi Nixon, o segundo
mais velho, que teve que forçá-lo a seguir o plano. Não porque ele me
amasse menos. Ele só sabia que não seria bom para qualquer um ser
preso. Se eles estivessem presos, não havia como descobrir o que
aconteceu comigo e fazer algo a respeito.

— O que aconteceu, porra? — Atlas perguntou, sentando-se como


se suas pernas não pudessem impedir o alívio.

Porque eles eram meus grandes, maus e protetores irmãos mais


velhos.

E eu era a mulher que ainda viam como uma garotinha em


tranças e macacões. Ainda era a garota que os seguia como um
cachorrinho perdido, fascinada com todas as coisas divertidas de
meninos. Quem queria brincar com bonecas quando você poderia estar
caindo das árvores ou pulando nos lagos?

Ainda era a adolescente muito influenciável, muito carente, que


perdeu sua mãe e ficou aos cuidados deles. E, Deus os abençoe, eles
realmente fizeram o seu melhor. Mas eles só estavam nos seus vinte
anos. E sabemos como eram os jovens de vinte anos sem supervisão.
Houve várias noites em que eu só tinha cereais para jantar com meus
pés apoiados em uma grade de cerveja, ainda pegajosa pelo álcool
derramado da festa na noite anterior.

Mas eles se preocupavam comigo mais do que qualquer coisa.

O suficiente para que Kingston usasse um nome durante um


assalto em que ele estivesse tão preocupado.

Meus irmãos eram muito como Mallick descreveu. Todos eram


altos, fortes, mas não grandes, de cabelos escuros e de olhos escuros. E
enquanto eles eram meus irmãos e suas aparências eram assustadoras
como o inferno, eu poderia dizer que todos nós compartilhamos alguns
genes realmente bons e que eles não tinham problemas para encontrar
mulheres quando as queriam.

Mal entrei na porta antes de me encontrar contra o peito de


Kingston, esmagada por um braço nas minhas costas, me segurando
tão forte que o ar ficou apertado no meu peito. — Porra, nunca mais me
assuste assim de novo, você me entendeu? Você levou vinte malditos
anos de minha vida hoje.

~ 26 ~
Esse era Kingston para você. Como era o mais velho, muita
responsabilidade foi deixada em seus ombros antes mesmo de chegar
aos trinta. Foi forçado a receber seus três irmãos adultos e sua irmã de
dezessete anos em seu apartamento de um quarto. Suas contas de luz,
de água e de comida triplicaram. Na época, ele trabalhava como
segurança durante a noite em uma loja. Mas, depois de um tempo, ele
também precisou trabalhar de dia, lavando louça em um restaurante.
Ele fez tanto por todos nós. Nos primeiros anos, na maioria das vezes,
retribuíamos com reclamações e resmungos.

Mas ele foi mãe e pai para todos nós.

Dez anos depois, ele ainda ocupava esse papel na maior parte de
nossas vidas.

Daí o sermão.

— Você nem pode me culpar por isso, — falei quando ele me


liberou e recuou. — Hoje foi um show de merda. O que aconteceu,
porra? As luzes foram apagadas na hora errada. Não cheguei nem perto
de estar na posição. A polícia chegou lá muito rápido. A fuga foi por
pouco. Tive que falar com os policiais.

— Você teve que falar com a polícia? — Perguntou Nixon,


preocupado. Não era um olhar que você via em seu rosto com
frequência. — Como? Por quê? Você estava na loja, certo? Por que você
não correu para a saída planejada?

— Porque um idiota com um complexo de salvador estava me


segurando com suas boas intenções. Tive uma mão sobre minha boca
se eu gritasse, — acrescentei, os lábios se contorcendo. Todos eles
sorriram em uníssono com isso. Eu não era esse tipo de garota. Como
poderia ficar com eles se são as pessoas que mais admiro na vida? — A
gente precisa averiguá-lo... Ele deu uma boa olhada em vocês, mas eu
dei uma descrição muito diferente. Aposto a minha parte, — eu disse,
apontando para o dinheiro na mesa, — que ele é algum tipo de
criminosos por aqui. Os policiais o conheciam bem, mas não do tipo de
“bebemos cervejas na sexta-feira”.

— Bem, se ele é um criminoso, não vejo por que ele tem algum
interesse em tentar nos derrubar. Tipo, vai contra toda a honra entre os
ladrões, não é? — Isso veio de Rush, o mais novo dos meus irmãos. Era
apenas dois anos mais velho do que eu. Também era nosso motorista. E
se você estava se perguntando, sim, Rush era o seu verdadeiro nome.
Ele tinha tanta pressa para chegar ao mundo que nasceu dois meses e
meio prematuro. Aconteceu que o nome era que trazia um pouco de
~ 27 ~
premonição, porque Rush sempre foi e sempre curtiu de tudo rápido e
imprudente. Ele estava marcado de cicatrizes para provar isso. E era o
melhor motorista que já vi.

— Não sei. Só tenho uma sensação esquisita sobre dele. Quero


dar uma verificada e ver o que encontramos, apenas para a minha paz
de espírito. Sei lá, ele viu vocês na sombra. Mas ele me viu. Vamos
apenas ser cuidadosos. Mas primeiro, temos que rever esse roubo. Uma
repetição desta nunca mais pode acontecer novamente.

Duas horas depois, acho que percebemos as falhas e os erros.

— Então, esse cara Mallick, — disse Nixon, olhando para mim,


sorrindo surgindo em seus lábios.

— O que tem ele? — perguntei, sentindo o estômago


inevitavelmente apertado, o quê? Antecipação? Preocupação? Por que se
preocupar? Isso não fazia sentido algum.

— Aparentemente, a família Mallick é uma realeza local, — disse


Nixon, sempre sendo um pé no saco. O idiota costumava transformar
meus presentes de aniversário em caças ao tesouro que eram tão
difíceis que geralmente levava uma semana para encontrá-los.

— Mallick, — pensou Atlas. — O quê? Talvez irlandês? Máfia


irlandesa?

— Não. Escuta essa, — disse Nixon, claramente encantado com o


que ele descobriu. — Eles são uma família inteira de agiotas. De todas
as fodidas coisas. Na verdade, essa cidade inteira é a porra de uma
latrina do crime organizado. Tem um MC traficante de armas, uma
máfia italiana, três seitas diferentes de traficantes de drogas, um
atirador, um músculo contratado, luta subterrânea, oh, e este lugar
chamado Hailstorm. É algum campo paramilitar ou alguma merda. A
gente podia acabar por aqui.

— Ag gente não vai “acabar” por aqui, — insisti. — Estamos aqui


para um golpe. É isso. Quando a gente se aposentar, damos o fora do
país. Em algum lugar sem extradição. Você sabe disso.

— Sim, ouvi que a Rússia é adorável nesta época do ano, — disse


Rush, horrorizado com a ideia.

Tínhamos considerado a Rússia porque, sejamos francos, é uma


aposta segura de muitas maneiras. Além disso, muitos outros países
sem um tratado de extradição com os EUA eram do Oriente Médio e
estavam envolvidos em conflitos no meio dos quais não queríamos

~ 28 ~
estar. Ficaram opções como África e alguns países asiáticos. Nós
estávamos debatendo entre a Rússia e a China, em ambos os lugares
poderíamos desaparecer facilmente.

Embora, se estivesse sendo completamente honesta, a ideia de


deixar nossa pátria era mais do que assustadora. Além disso, os
métodos que teríamos que empregar eram igualmente preocupantes.

Males necessários, lembrei-me.

Um pequeno preço para pagar pelo que fizemos.

— Pelo que posso dizer, eles parecem permanecer neutros em


praticamente todas as situações. Não se envolvem no negócio de outras
pessoas, a menos que isso os afete diretamente. Não acho que haja
nada com que se preocupar. E os policiais locais, aparentemente, têm
muito com que lidar. E “muito” significa estupro e assassinato e
grandes quantidades de drogas atingindo as ruas. Realmente, duvido
que, no momento, nosso pequeno golpe seja prioridade em sua lista de
prioridades.

Bem, isso era um conforto pelo menos. E, para ser honesta, o


sujeito Collings parecia muito tranquilo com a coisa toda. Ninguém
afinal se machucou.

Essa era a regra.

Inferno, durante um trabalho, as armas só tinham balas de


borracha.

Ninguém ficaria verdadeiramente ferido em nossas mãos.

Não era sobre as pessoas.

Não era nem mesmo sobre o dinheiro.

Era sobre a corporação.

Eles tinham que pagar.

Nós éramos os malditos cobradores de dívidas.

Era tão simples e tão complicado quanto isso.

— Então, o que você está dizendo é que a gente fica aqui um par
de dias e partimos para o próximo trabalho, — pensou Nixon.

Olhei em volta, soltando um suspiro no nosso encantador


barraco.

~ 29 ~
Lar doce barraco.

E seria lar pela próxima semana.

E não, absolutamente não tinha estranhos sonhos eróticos com


um homem que cheirava à grama recém-cortada e óleo e virilidade.

Não.

Eu não.

~ 30 ~
Três
MARK

Pelo que vi, o assalto não deu em nada. Foi notícia nos noticiários
e nos jornais duas vezes naquele dia, nada na página principal
novamente. Afinal, havia traficantes de drogas, estupradores e
assassinos para serem notícias.

Não tinha ouvido falar de Collings novamente. E, francamente,


tinha certeza de que nunca ouviria. Pelo menos não sobre esse
incidente.

Estava feito, caso encerrado.

O dinheiro do seguro provavelmente já foi pago.

Eu, bem, eu realmente estava fodido quando me ofereci para fazer


algum trabalho ao redor do prédio de Shane na esperança de localizar a
mulher quente pra caralho, Angela.

Porque a semana seguinte foi fodida e eu tinha uma lista de


afazeres tão longa quanto o meu braço direito, vinda não apenas de
Shane, mas de todos os inquilinos que tinham passado sem o luxo de
tubulações funcionando ou sistemas de aquecimento estáveis há anos.

Esse era o preço que você tinha que estar disposto a pagar para
viver em um lugar onde ficasse fora do radar da polícia quando você era
um criminoso.

Mas enquanto eu estava arrancando a calçada da frente, porque


tudo estava roído e o município estava em cima de Shane por causa
disso, acho que todos os inquilinos se aproximaram com pelo menos
três pedidos cada. E, bem, eu simplesmente não tinha coragem para
dizer a alguém que sofra com o calor apenas trabalhando a metade do
tempo. Além disso, o cara cuja banheira estava vazando, no futuro só
teria dor de cabeça com o mofo caso não fosse cuidada.

Neste dia em particular, Shane estava lá, sentando na carroceria


de sua caminhonete, tomando café e me observando suar minha bunda
~ 31 ~
quando coloquei os tijolos novos para a calçada. Ele não iria me ajudar.
Estava lá apenas para derrubar minha moral e me ver trabalhar. Você
sabe, coisas de irmão. Estava meio esperando que Eli, Ryan e Hunter
aparecessem para encherem o saco. Era assim como minha família era.

— Mas sim, o pequeno merda comeu um dos sapatos de grife da


Fee, — Shane continuou falando sobre o novo cachorro de Eli, Coop.
Aparentemente, ele era pequeno. — Você pode imaginar o quanto ela
curtiu isso. E agora, tudo o que Hunt tem escutado a semana toda é o
quanto Becca quer um cachorro.

— Dou um mês, — eu disse, puxando um pedaço irregular de


tijolo antigo da parte de trás da minha caminhonete, estacionada perto
de Shane.

— Quer colocar algum dinheiro nisso?

Bem, diabos.

Eu estava perdendo epicamente no departamento de apostas com


minha família. Mas, agora que falei, sempre fui bom em apostar um
pouco de dinheiro. — Vinte, — disse, não me sentindo excessivamente
seguro na previsão do mês. Hunt provavelmente traria uma casa se
Becca implorasse, mas a Fee era um pouco mais difícil em relação a
esse tipo de coisa. Como foi falado, ela tinha seus sapatos com os quais
se preocupar.

— Aposto no Natal. Que melhor momento para arrumar um


filhote de cachorro? E eles não vão fazer isso no aniversário de Becca,
porque isso significaria que o cachorro seria só dela e as outras garotas
vão querer. Então, acredito no Natal.

As chances eram que, não importava o que ela escolhesse, minha


mãe seria a única a ganhar a aposta. Em parte porque ela passou pela
coisa da maternidade e, portanto, tinha uma espécie de sexto sentido
sobre isso. Mas a outra possibilidade era, se Hunt e Fee não cedessem
antes que sua aposta estivesse certa, não estava exatamente longe de
ela mesma comprar um filhote de cachorro para elas.

— Sim, eu... — Comecei, um movimento do outro lado da rua


prendeu meus olhos.

Não que fosse incomum que houvesse movimento no outro lado


da rua. Na verdade, era estranho quando não havia. Os membros da
Third Street estavam constantemente dentro e fora do prédio, pegando
suprimentos ou recebendo dinheiro. Mas o movimento não estava vindo

~ 32 ~
da rua em frente ao prédio deles. Estava vindo do barraco
aparentemente abandonado algumas casas abaixo.

Tudo o que peguei no início foi um brilho de cabelo escuro e


brilhante sendo levado por uma leve brisa, voando pelas costas e pelos
ombros de uma mulher. Nada realmente especial.

Mas quando meus olhos foram e ficaram naquela direção, vi


alguém ao lado dela com um rosto que, embora não fosse familiar para
mim, eu sabia... Sabia que era um dos caras do assalto à loja. Foi no
porte, na postura, o cabelo escuro que eu sabia que era escuro. Foi a
primeira vez que observei bem as características. E estava bem seguro
da minha masculinidade para reconhecer que o cara era bonitão.

Estava prestes a chamar Shane para lhe dizer, achando o


incidente inteiro interessante.

Mas então a mulher agarrou seus cabelos, girando-o em sua mão,


depois os arrastando para o outro lado e parando de voar em seu rosto.

E sim, agora aquele rosto era muito, muito familiar.

— Não acredito, — sibilei em voz baixa, meus batimentos


cardíacos pareciam estranhos naquele momento enquanto a observava
atirar a cabeça para trás e rir de algo que o ladrão disse. Então, ele deu
um soco falso no queixo e saiu, dizendo algo por cima do ombro que
não consegui entender.

Bem, não consegui distinguir nenhuma das palavras exceto uma.

—... Scotti...

Não.

Porra.

Mas mesmo quando meu cérebro tentou encontrar qualquer outra


explicação, estava além de qualquer uma delas. Porque tudo o que você
tinha que fazer era olhar para aqueles dois. A semelhança familiar era
parecida à da minha família. Se você me ver e um ou todos os meus
irmãos juntos, você saberia que éramos parentes. Mesmo com meu pai.
Não havia dúvida de que ele era o nosso velho.

E Angela / Scotti e o (s) ladrão (ões) da semana passada, sim,


eram irmãos e irmã. Não tinha a menor dúvida.

A mulher quente como pecado que eu estava esperando para ver


há semanas era uma fodida assaltante.

~ 33 ~
Claro.

Você sabe, porque os homens da minha família nunca poderiam


ficar com mulheres fáceis e normais. Não, seriam operadoras de sexo
por telefone, ex-motoqueiras traficantes de drogas e agorafóbicas.

E agora, aparentemente, assaltantes a mão armada de caixas de


lojas grandes.

Sim, isso parecia certo.

Quero dizer, não que eu tivesse planos de ficar sério com a


mulher. Estava apenas fazendo uma comparação. Aparentemente, os
agiotas eram inerentemente atraídos por mulheres que eram problemas.

— O que diabos você está procurando... — Shane começou, a voz


se aproximando quando ele pulou da caminhonete e caminhando para
ficar ao meu lado. — Oh, droga. Tudo bem, sim. Entendi, — ele disse,
batendo-me nas costas. Não era segredo que Shane tinha o mesmo
gosto que eu antes de conhecer Lea e cair duro por ela. E enquanto tive
oportunidade de ter igualmente todos os tipos de mulheres, todos
tinham um tipo que geralmente preferiam. Então, Shane sabia disso
quando via. — E, caralho, você ainda está aqui porque...

Porque a garota em quem pensei na porra do banho durante uma


semana estava de pé na minha frente. Parecia estupidamente sexy,
num jeans azul claro que parecia tão macio enquanto se agarrava às
coxas e quadris, uma leve camiseta de manga comprida com alguma
escrita na frente que eu não conseguia distinguir da distância e suas
botas de combate em seus pés.

Aliás, fiz o raio-X do meu pé no centro de emergência apenas para


ter certeza. Sabia quando minhas mãos, dedos ou costelas estavam
quebrados, já que eram lesões que frequentemente tive ao longo dos
anos, mas meus pés sempre ficaram relativamente seguros. Só queria
me certificar de que não estivesse quebrado antes de ir e piorar com a
correria habitual do meu trabalho.

Estava bem.

Tinha um hematoma desagradável.

O médico disse que minhas botas foram o que me salvaram.

A garota podia causar dano de verdade.

Não deveria saber, mas era incrivelmente quente, porra.

~ 34 ~
Balancei minha cabeça, afastando meus pensamentos. — Estou
no meio de colocar uma calçada aqui, — falei, não querendo
compartilhar a informação que acabei de saber. Eu não era assim, em
geral, era o mais boca aberta. Mas essa informação, essa situação, essa
mulher intrigante, queria manter em segredo.

— Uma vez vi você se distrair com uma mulher e ganhar um corte


de vinte centímetros embaixo do antebraço numa merda de mesa.
Então correu e, porra, sangrava por toda parte. Se você se lembra,
precisou de quarenta e quatro pontos, uma vacina antitetânica e uma
transfusão.

Ele não estava exatamente errado sobre isso. Na verdade, ele não
estava errado sobre isso, afinal. Aquela também foi uma boa mulher.
Valeu a pena e a tontice. Na verdade, poderia ter desistido do meu
cartão de mulherengo para sair com ela se ela já não tivesse sacado
qual era a minha intenção e decidido que só me queria para uma
aventura.

— Tudo bem. Talvez simplesmente não queira uma fodida


audiência, cara, — falei, balançando a cabeça quando Angela/Scotti
olhou para a Third Street por um momento e desapareceu de volta ao
seu barracão. Uma mulher assim em uma cabana, também não fazia
sentido.

— Quando tínhamos vinte e um anos, você já teve uma mulher


enquanto eu estava...

— Tudo bem, afaste-se, — eu disse, rindo levemente. Esse era o


único problema com famílias pequenas, eles conheciam toda sua
porcaria, então você nunca poderia esconder alguma besteira deles. —
Vou falar com ela quando quiser conversar com ela.

— Apenas dizendo, irmão, fico preocupado com você. Não


conseguir nada não é bom para você, — ele continuou, com um sorriso
malicioso e completamente maligno, como se de alguma forma soubesse
que não tive uma foda desde o dia em que conheci a misteriosa
Angela/Scotti. Conhecendo ele, conhecendo minha família, sabendo
como todos conhecíamos todas as malditas pequenas coisas, ele
provavelmente sabia disso.

— Pô, sabe, não me irrite e me deixe trabalhar, talvez eu esteja


tentado ganhar uma grana de você por todo esse trabalho. Você sabe o
que ganho por uma hora, cara.

~ 35 ~
Ele riu com isso, balançando a cabeça. — Certo, tudo bem. Fico
quieto sobre sua garota não-sou-uma-donzela-em-perigo, tudo o que
quiser. Não diga que não avisei que esse período de celibato
provavelmente vai fazer você explodir no instante em que entrar nela,
porque eu simplesmente fiz isso, porra.

E com esse comentário completamente inapropriado, mas


absolutamente parecido com Shane, ele fechou a carroceria de sua
caminhonete, acenou sobre o ombro para mim e foi embora.

Eu, bem, voltei ao trabalho. Todo o tempo, fingia que não


prestava atenção ao barraco. Mas, claro, eu estava. Assim, vi outros
três homens saírem, entrar na garagem e saírem em algum sedan preto
indescritível. Foram na direção que levava a Navesink Bank.

E, bem, quatro homens saíram.

Tinha certeza de que estava sozinha naquele barraco.

Eu, bem, queria algumas respostas.

Nem me incomodei de limpar minha bagunça. Podia ser uma área


de merda, mas duvidava que alguém quisesse roubar concreto, pás e
merdas básicas assim.

Corri para o outro lado da rua, limpando minhas mãos pelo jeans,
sabendo que não havia nada que pudesse fazer com elas e não me
importando muito. Na minha experiência, as mulheres gostavam de um
homem em roupa de trabalho, tanto quanto gostavam de um homem de
terno. E, não quero parecer arrogante, mas podia fazer os dois.

Andei pela parte de trás do prédio de onde eu os vi sair, passando


pelos tijolos que estavam desmoronando e irregulares.

Levantei minha mão para bater na porta apodrecida quando de


repente ela se abriu na minha cara, fazendo-me quase tropeçar para
trás, o ar trazendo um redemoinho de um aroma de lavanda e citrino
muito distinto.

— O que o... oh, — ela disse, os olhos se arregalando quase


comicamente enquanto sua boca caia ligeiramente aberta.

Recuei meu braço, tocando a lateral da casa, bloqueando-a


ligeiramente, sabendo que seu primeiro instinto seria me bater e fugir
antes que eu pudesse falar. Esse parecia seu estilo.

~ 36 ~
Mesmo que o choque estivesse deixando seu rosto pálido, ele
estava sendo substituído por um tipo de aborrecimento. Como se eu
fosse um problema e ela não quisesse lidar com isso.

De alguma forma, também gostei dessa merda.

— Scott, hein? — perguntei, meus lábios se contorcendo


enquanto seus olhos escuros baixavam para mim, enquanto seus
braços se moviam e cruzavam sobre seu peito, parecendo hostis e
defensivos. — Uma assaltante armada.

— E você é Mark Mallick, um agiota. Então, e daí?

— Realmente não acho que ser uma, repito, assaltante, é um tipo


“e daí” de situação.

— Sério, porque acho que ser um quebra joelhos brutal e tirano é


totalmente um tipo “e daí”, de situação. E no meu caso, querido,
ninguém se machucou. Você não pode sair por aí dizendo que não tem
sangue em suas mãos. Sabe, junto com... o que é isso? Concreto? — Ela
perguntou, apertando os olhos na mão, bloqueando o caminho.

— No meu caso, meu bem, — falei, os lábios se contraindo quando


os olhos voltaram para mim novamente, — Não tomo de pessoas
inocentes.

— Não tomo nada de qualquer pessoa. Pego de uma corporação


que tem o seu dinheiro segurado, então, no fim das contas, realmente
não estou machucando ninguém de uma forma ou de outra. O mesmo
não posso falar de você, que não só faz mal fisicamente às pessoas, mas
também as condena com taxas de juros que ninguém com uma alma
exigiria de outra pessoa, que procuram você claramente por falta de
outras opções.

Não me sentia mal pelo meu trabalho. Na verdade, nada que ela
pudesse dizer poderia me fazer sentir desse jeito. O fato era que não era
como se emprestássemos dinheiro a mães solteiras com filhos doentes e
que não conseguem pagar. Na verdade, não fizemos nenhum lance de
empréstimo com as mulheres, porque nenhum de nós jamais colocaria
as mãos sobre uma mulher. Os caras que vieram até nós, foram os
merdas que perderam tudo nos jogos da hexagonal ou nos cassinos de
Atlantic City ou quando escolheram a equipe errada no Fantasy
Football. Nós emprestamos dinheiro a pessoas que, desde o começo,
eram irresponsáveis com isso.

Tenho um dos empregos mais limpos? Não, claro que não.

~ 37 ~
Mas também não era tão sujo quanto parecia.

E você tem muito mais chance com a família Mallick do que em


qualquer outro lugar. Às vezes merdas acontecem e meu pai entendia
isso. Ele seria compreensivo se você o procurasse. Era só quando você
dava uma de covarde e escondia as coisas que ele ficava chateado.

Além disso, no final das contas, ser executor era apenas uma
parte da minha renda nos dias de hoje. Com a empreiteira e a empresa
de paisagismo cada vez maior, eu estava, francamente, saindo disso.
Assim como todos os meus irmãos com seus diversos
empreendimentos. A agiotagem, era apenas, sei lá, uma tradição. Uma
homenagem ao nosso pai que trabalhou duro para conseguir
proporcionar recursos à nossa mãe e a nós quando éramos pequenos.
Foi a única coisa que, por fim, nos permitiu ter práticas empresariais
legítimas.

Não tinha nada para me envergonhar.

— Como você me achou? — ela perguntou de repente, a voz


assumindo um tom que demonstrava um pouco de sua inquietação.
Adivinhei que sua liberdade dependia de não ser encontrada ou
descoberta. Entrar em seu esconderijo e ser tratada pelo seu nome não
parecia ser uma coisa boa.

— Sabe, estava pensando nessa situação e sou o único a fazer


perguntas. Sei lá, já que você quase quebrou meu pé e tudo.

— Oh, por favor, — ela bufou, revirando os olhos. — O maior


dano que poderia ter feito era um hematoma no nível dos ossos com
aquelas pesadas botas que você estava usando. Não se comporte como
um bebê.

Poderia ter soado arrogante se seus olhos não estivessem


dançando um pouco quando ela disse. Talvez como algo com que ela
provocasse um dos seus muitos irmãos. Na verdade, ter quatro que
pareciam ser irmãos mais velhos explicava muito sobre ela.

— Independentemente disso, não seria educado me convidar para


uma bebida fresca ou quente?

Para isso, seus lábios se contraíram por um segundo antes de


forçá-los a uma linha reta. — Sei que se acha esperto e encantador,
mas já saquei qual é a tua, o Sr. Mark Mallick.

Alguma coisa sobre essa frase tinha a sensação de soco no


estômago. Talvez fosse apenas a frase “saquei qual é a tua”, quase

~ 38 ~
idêntica à que eu estava pensando em relação à outra mulher apenas
alguns minutos antes. Mas, independentemente do que fosse, provocou
um desafio dentro de mim, fosse sua intenção ou não.

Meu braço deslizou da parede e se moveu para plantar ao lado da


porta ao seu lado. Então meu outro braço foi para o outro lado,
cercando-a, aproximando-nos.

Porque, francamente, sabia que eu era encantador. Também


sabia que tinha jeito com as mulheres. E sabia que era um cara
bonitão. Apesar de todo o fogo que continuava a cuspir em mim, ela não
era tão indiferente quanto queria fingir ser.

E ia usar isso a meu favor.

Como estava prestes a provar.

Observei-a enquanto eu subia um degrau, enquanto tirava


vantagem da altura dela, enquanto ela levantava o pescoço para manter
contato visual que era muito teimosa para quebrar. Sua respiração
ficou mais fraca, mais rápida. Seus olhos ficaram um pouco aquecidos,
um pouco encapuzados. E aqueles lábios cheios, sim, eles se separaram
também.

— Fazemos assim, — falei, mantendo a voz baixa. — Se você falar


para eu ir me foder agora mesmo, irei. Irei e você não terá que me ver
novamente. —deixei isso em suspenso por um segundo, então me
inclinei um pouco mais perto, minha cabeça inclinando-se perto de seu
ouvido, sabendo que minha respiração a arrepiava pelo lóbulo, sabendo
que sua barriga ia estremecer. Sempre, porra. — Mas não acho que
você vai fazer isso.

— Eu... Por que... — ela começou, então parou, respirando fundo,


tentando manter a calma. — Por que não?

— Simples. Você não quer que eu vá.

— Isso é idiota. Claro que quero que você... — Ela parou


enquanto me inclinava para frente, deixando meus lábios roçarem o
lóbulo de sua orelha, sentindo contra o meu corpo como o seu próprio
respondeu, enquanto se excitava e se inclinava, enquanto o desejo
trabalhava através de seu corpo.

— Quer que eu faça o quê? — perguntei, os dentes agarrando seu


lóbulo da orelha por um instante. — Isto? — Minha língua fez um
pequeno deslize enquanto meu pau crescia forte no caminho em que ela
se inclinou, suas mãos caindo do peito para pousar na minha cintura,

~ 39 ~
não me segurando, nem me aproximando. Suas mãos ainda estavam
apertadas, aparentemente, lutando entre a mente e o corpo.

— Isso? Sim, — ela me surpreendeu admitindo, provando que ela


não era o tipo de mulher que fugia ou se fazia de ingênua ou estava de
brincadeira. Ela gostava de algo, ela mostrou isso, simples assim. —
Espere. Não. Não é isso, — disse ela, com voz ronca, respirando apenas
um pouco frenética. Ela queria, tudo bem, mas talvez não tanto assim,
a ponto de saber que precisava me afastar.

Poderíamos trabalhar com isso.

— Qual deles, querida? — perguntei, recuando um pouco,


olhando para o rosto dela, achando-o um pouco corado em seu desejo
óbvio. — Você quer ou não quer isso?

— Você quer dizer, você? — ela especificou, tomando uma


respiração lenta e desigual. Literalmente, fez seu peito estremecer com o
esforço.

— Sim, querida. Quero dizer, eu. Você me quer, ou não.

— Essa é uma pergunta difícil.

— Ela tem apenas uma das duas respostas, — respondi.

— Meninos, — disse ela, revirando os olhos. — Claro, pode haver


duas respostas, mas há uma multiplicidade de fatores.

— Tais como? — perguntei, disposto a brincar, talvez apenas


gostando de sua companhia mais do que devia para praticamente uma
estranha. Fiquei no meu lugar, recusando-me a voltar e dar espaço a
ela. Se quisesse, teria que pegar sozinha. Ela era bastante forte para
fazer isso se realmente quisesse. Mas também bastante teimosa para
recusá-lo.

— Tais como você ser um agiota que sabe que sou uma assaltante
procurada. Como você saber onde é meu esconderijo. Como, apesar
disso, essa coisa do cimento e da grama fresca faz algo comigo por
razões que não quero explicar. E esse sorriso é uma distração. Se você
pudesse simplesmente... parar, tipo... tirar isso do seu rosto. Tire. —
Ela mandou quando sua brincadeira acabou de tornar o sorriso mais
aberto. Sua mão estendeu, pressionando meus lábios por um segundo.
— Entendo, você é quente. Não precisa continuar me dando esse
maldito sorriso.

~ 40 ~
— Acha que sou quente, hein? — Perguntei, ignorando o pedido,
sorrindo como ela queria.

— Oh, por favor. Você sabe que é quente. Você contou com isso.

— Contei, é? — perguntei, as sobrancelhas se juntaram, me


sentindo talvez um pouco insultado nisso.

— Sim, você contou. Certamente, com a arrogância e com a


confiança que você usa como uma segunda pele, você terá certa
quantidade do que quer, mas você e todos os outros sabem que são os
bons genes, o maxilar forte, os bonitos olhos, o corpo legal, isso é tudo o
que leva aos finalmentes. E não tente me insultar dizendo que não
entendo, de alguma forma, como isso funciona. Chame isso de
objetivação se quiser, mas é o que é. Ter uma boa aparência é o que
atrai as mulheres que passam uma por cima das outras para levá-lo
para casa, não você. Você como pessoa, elas nem se preocupam. É o
pacote que elas querem. Você contou com isso porque é o que tem para
levar as mulheres para casa e divertir-se um pouco com elas. Não há
nada de errado com isso. Mas não se iluda em pensar que é alguma
coisa mais que isso.

Bem, merda!

Se não fosse um chute autêntico no saco, não sabia o que era. Na


verdade, as palavras tiveram impacto suficiente para me fazer recuar
contra a porta e me endireitar, colocar um espaço entre nós, meus
braços caindo ao meu lado.

Uma coisa era aproveitar os bons momentos com as mulheres,


como Scotti disse. Mas outra coisa era ser informado de que ninguém
me dava a mínima. Nem era mesmo um pensamento com o qual já
tinha me entretido antes. Sempre aceitei que não estava a fim de nada
além de uma aventura. Nunca parei para considerar se as mulheres
queriam mais se eu oferecesse. E, francamente, era mais do que um
pouco inquietante pensar que tudo o que elas queriam de mim era uma
boa foda.

Droga.

Acho que era assim que muitas mulheres sentiram.

E acho que era um idiota por não ter visto isso dessa maneira
antes.

— Sim, é uma pílula amarga para engolir, não é? — Ela


perguntou, me dando um olhar de simpatia, seguido de um encolher de

~ 41 ~
ombros. — Tive que engolir uma dessa na oitava série, mas acho que é
mais difícil para os garotos aprenderem. Não preocupe sua linda cabeça
com isso, — disse ela, tocando minhas têmporas enquanto avançava
pelo meu ombro como pensei que faria quando subi pela primeira vez.

Foi assim, então, que me dei conta que assalto à mão armada e
mentir para a polícia não eram seus únicos talentos.

Não, Scotti era uma maldita ninja mental. Ela entrou lá com uma
espada toda silenciosa, esgueirada e cortou-a. Apenas para que pudesse
fazer uma fuga limpa.

Apostaria minhas bolas que, caso eu a deixasse ir embora, se eu


voltasse, tanto ela quanto os irmãos dela teriam ido embora sem
nenhum rastro.

E, pela primeira vez, era uma aposta que tinha certeza de que
venceria.

Então, embora meu orgulho estivesse irremediavelmente


machucado com o seu comentário, dei meia volta e subi o restante da
escada, apressando-me a impedi-la, fazendo-a parar com um grito
silencioso, provavelmente pensando que estava saindo livre, surpresa
de que eu consegui alcançá-la tão rápido para detê-la.

Mas veja, ela esqueceu uma coisa. Não era a única que cresceu
com um grupo de irmãos. Lidei com as piores formas de tormentos
mentais, emocionais e físicos desde que tinha idade suficiente para
entender as palavras. Porque, vamos ser realistas, ninguém poderia te
machucar tanto quanto a família, já que ninguém o conhecia tanto
quanto a família. Estava com um nocaute técnico aos meus pés em
segundos, graças a esse histórico.

Ela não sabia quem estava enfrentando.

— Então, o que você está dizendo aqui é, quer me foder, mas não
quer admitir isso, então está desviando do assunto tentando magoar
meu ego.

— A perseverança é uma boa qualidade nos negócios. Caso


contrário, é desagradável.

Ela correu para o lado, passando por mim.

Mas não terminei.

Porque foi duas vezes perguntei e duas vezes ela fugiu.

~ 42 ~
Eu queria que ela admitisse.

Era praticamente uma compulsão nesse ponto.

Apressei-me, novamente bloqueando-a quando estava prestes a


rodear a lateral do prédio. — Você não pode negar isso, então está
fugindo. Tática agradável, se conseguir isso. Mas enquanto você só me
vê como um rostinho bonito, querida, na verdade tampouco sou
estúpido. Você me quer. Admita.

— Tudo bem, — ela estalou, levantando os braços de repente,


pegando-me desprevenido o suficiente para que pudesse plantá-los no
centro do meu peito, empurrando-me com força para trás, fazendo
minhas costas colidirem contra a lateral firme do barraco. Antes que eu
conseguisse registrar essa surpresa, ou a onda de desejo que trazia
consigo, seu corpo esmagou o meu, todas as linhas perfeitas e
sugestões sutis de curvas suaves. Suas mãos moldaram meu rosto
quase agressivamente uma fração de segundo antes de levantar na
ponta dos pés e esmagar seus lábios nos meus.

E, novamente, foi tão inesperado que não reagi rápido. Não


envolvi meus braços ao redor dela, nem deslizei as mãos pelas costas,
mergulhando-as em sua bunda, chicoteando-a e mudando de posição,
assumindo o controle, levando-a ao ponto de esquecimento sem ter que
usar nada além dos meus lábios sobre ela.

Não consegui fazer nada além de sentir seus lábios pressionar o


meu, duro, com fome, exigente.

Porque assim que começou, acabou.

Ela estava de volta a seus pés, suas mãos estavam ao seu lado.

— Quero você, — ela admitiu, o queixo levantou, sem sentir


vergonha em dizer essas palavras, algo incomum e mais quente. — Mas
isso nunca vai rolar.

Com isso, antes que pudesse alcançá-la, ela se virou e, porra,


correu pela rua.

Talvez estivesse disposto a retomar o controle e pegá-la


desprevenida. Eu não era, no entanto, o tipo de homem que perseguiria
uma mulher na rua.

Então, respirei muito e profundamente, tive uma conversa de


coração para coração com o meu pau dizendo-lhe para aliviar o
desapontamento em outro lugar, que isso não tinha acabado, então

~ 43 ~
voltei para o outro lado da rua, me jogando de volta ao trabalho como
uma distração muito necessária.

Uma coisa era certa, se ela não desse uma de covarde e saísse da
cidade, eu e Scotti, sim, nós tínhamos algum negócio inacabado.

Francamente, minha curiosidade foi aguçada.

Não só porque ela era linda.

Nem mesmo porque existia química que nenhum de nós pretendia


negar.

Não.

Queria dissecá-la e estudar como as peças funcionavam. Então


queria juntá-la de volta em seu muito particular e perfeito estado de
funcionamento e adorar fodê-la tanto até que nós dois fôssemos apenas
pilhas de suor, saciados, entorpecidos e emaranhados. Então,
poderíamos ir a partir daí.

Isso parecia um bom ponto de partida.

Tudo o que sabia era, eu e Scotti, sim, estávamos começando.

~ 44 ~
Quatro
Scotti

Ok.

Bem.

Pelo menos acabou.

Para ser perfeitamente honesta, houve um sentimento estranho e


pesado sobre mim durante toda a semana, como se algo fosse
acontecer, algo que não planejei.

Então, ao me confrontar com Mark Mallick de pé na porta dos


fundos, bem, pode ter sido surpreendente, excitante e perturbador, mas
pelo menos pareceu aliviar aquela estranha nuvem negra que me
seguia.

Sei lá, não que toda a interação não deu uma injeção de ânimo
para pensar e ficar obcecada com isso. Mas isso não significava nada.

O que eu disse era verdade.

Eu o queria.

Eu o queria de um jeito que não deveria ser possível em tão pouco


tempo, de uma maneira completamente irracional, inteiramente
incontrolável. Era puro, cru, primitivo, atração animal. Nossos
feromônios apenas... gostavam um do outro. Era tão básico.

Claro, nós dois éramos atraentes e não éramos cegos e também


percebemos isso, mas os hormônios eram a única explicação para o que
estava rolando conosco apenas em duas interações muito curtas.

E de novo ele cheirava gostoso, caramba.

Ele não podia cheirar cecê ou Bozzano e arruinar isso para mim?
Ou, melhor ainda, cecê tentando ser mascarado com uma abundância
excessiva de Bozzano.

~ 45 ~
Oh, sim.

Aí está, assassino puro da libido.

Isso teria tornado a vida muito mais fácil.

Mas não. Claro que não. Ele apareceu cheirando concreto, suor e
apenas a sugestão mais estranha dessa coisa de lubrificante que
usavam em objetos metálicos.

O que posso dizer... Sempre fui sensível a cheiros.

Foi por isso que não consegui tolerar uma casa que usasse esses
horríveis aromatizadores de tomada ou sprays. Os cheiros devem ser
orgânicos, caso encerrado. Não havia nada orgânico sobre tempestade
de chuva de baunilha tropical ou qualquer que fosse o nome do inferno
que eles colocavam nos bonitos e brilhantes recipientes.

Mas gostei da forma como Mark Mallick cheirava. Como um


homem trabalhador. Como alguém que não tinha medo de se sujar.
Como um homem que ficaria muito feliz de ficar sujo com você.

Oh, sim.

Ok.

Deus, precisava parar de deixar minha mente viajar.

Para ser justa, tentei acabar com isso. Fui uma filha da puta e
usei todas as armas que aprendi por ter crescido em torno de quatro
provocações, pé no saco, irmãos mais velhos. A maioria dos indivíduos
teria recuado.

Mas Mark Mallick aparentemente não é a maioria dos homens.

Claro, minhas palavras atingiram como golpes, verdadeiras e


brutais. Mas ele pegou o golpe e se recuperou, me confrontou de novo.
Isso foi inesperado. Realmente, pensei que ia fugir antes que algo
ficasse fora de controle.

Eu deveria saber melhor.

Então fui e o beijei.

Sabe, porque precisava disso para enfatizar todos os momentos


de vigília depois do que aconteceu. Inferno, nem mesmo consegui
aproveitar. Foi um pouco como... fazer uma declaração. Terminou antes
que pudesse realmente apreciá-lo. O que foi uma porcaria.
Especialmente desde que meu cérebro já estava cheio de pensamentos
~ 46 ~
sensuais de Mark Mallick e eu nem tinha nada de suculento para me
concentrar.

Porque, sabe, como eu disse. Isso nunca iria aconteceu. Então, se


isso era verdade, teria sido bom ter pelo menos um beijo para pensar
antes de dar o fora da cidade e quem sabe encontrar um homem em
algum lugar para aliviar minha frustração sexual.

Já estávamos em Navesink Bank por mais tempo do que gostaria,


mais do que já ficamos em alguma cidade depois de um golpe. Mas o
cara que estava lavando o dinheiro estava enrolando e não havia nada
que pudéssemos fazer. Parece que ele tinha algum trabalho maior para
um revendedor de cocaína ou algo com o que precisava lidar primeiro. E
uma vez que nosso movimento rendeu apenas uns dois mil dólares,
ficamos abaixo na lista de prioridades.

Veja, o que a maioria das pessoas não sabe sobre lojas é que não
há muito dinheiro nos caixas. Hoje em dia a maioria das pessoas paga
com cartões. E nosso esquema não era com cartões. Não tínhamos nada
contra os clientes das lojas. Eram as próprias lojas que tinham que
pagar. Então, se os caixas começassem com cerca de quinhentos em
uma parte da manhã e dobrassem isso durante o dia, se você roubasse
nos horários de pico quando todos os caixas estavam abertos, mas
antes da mudança de turno, então você estaria contando com dez a
quinze mil dólares. Não eram tão pouco, mas também não era o que
levaria se roubasse um banco. Não é o tipo de dinheiro que vai te deixar
rico para o resto da vida.

De qualquer maneira, esse não era nosso plano. Claro,


precisávamos de um bom pé de meia para viajar e se estabelecer na
vida em um novo país, mas planejávamos conseguir empregos normais
e corretos, uma vez que terminássemos. Fomos criminosos por tempo
demais. Já está quase na hora de nos aposentarmos dessa carreira de
uma vez.

Mais três golpes.

Era tudo o que tínhamos planejado.

Mais três e quase uma década de nossa carreira profissional


ficará para trás.

Não havia como negar que o alívio também aumentava uma


estranha e incômoda incerteza. Talvez estivesse apenas me sentindo
estranha por ir a outro país, aprender a língua, aprender os costumes,
descobrir como sobreviver lá. Mas achei que uma quantidade quase

~ 47 ~
igual da ansiedade dentro de mim era que, ao parar o trabalho,
estaríamos deixando uma grande parte de nós mesmos para trás. Não a
de criminosos, mas a razão pela qual nos tornamos criminosos, a
missão que nos levou a essa vida, o vínculo que nos manteve unidos em
todas as noites sem dormir, em todos os erros que poderiam ter nos
mandado para a prisão, em cada cuidadosa saída da cidade, rezando
para conseguir fugir.

Não se preocupar em acabar em uma cela seria um sentimento


completamente desconhecido para mim. Essa foi uma ideia constante
que manteve um nó no meu estômago. Não tanto por mim. Eu ficaria
bem na prisão. As mulheres podiam ser horríveis, mas, em geral, eram
menos violentas do que os homens. Eu me preocupava com meus
irmãos. Eles tinham todos os seus próprios tipos de erros. Todos eram
fortes e confiantes. E, embora fossem tecnicamente criminosos, não
eram assassinos ou estupradores ou pessoas que agrediam outras
pessoas sem motivo. Eles certamente não tinham afiliações de gangues.

Isso e, francamente, a ideia de me separar deles era fisicamente


dolorosa. Não que eu não quisesse um pouco de espaço depois de tanto
tempo tão próximos, mas espaço que significasse apartamentos
separados na mesma cidade, não celas separadas em diferentes
estados.

Apenas mais três golpes.

Mais três meses para completar esses golpes.

Então, mais alguns meses passando despercebidos enquanto


resolvíamos nossa saída dos EUA.

No ano que vem, todos estaríamos fora dessa vida, longe dessa
preocupação, tentando desesperadamente aprender como xingar uns
aos outros de “inúteis” e outros insultos em russo ou chinês.

E, depois de um tempo, essa vida se tornaria nossa nova


normalidade.

Levaria algum tempo, mas isso aconteceria.

Então, poderíamos nos sentar e lembrar sobre as vezes que


fizemos as coisas erradas pelas razões certas.

— Você poderia sair com a gente, — disse Rush, encolhendo os


ombros, obviamente ainda não aprovando outra das minhas pequenas
concessões. Academia. Eu precisava malhar. Precisava de uma esteira,
de um aparelho de subir degraus, uma elíptica, uma bicicleta e as

~ 48 ~
máquinas que lhe diziam como fazer os movimentos. Para meus irmãos,
aparentemente, isso era para “garotas” e caras que “precisam se
flexionar”. Eles não faziam academias. Eles faziam treinamento militar
em parques ou bosques ou onde quer que pudessem encontrar colinas,
áreas planas e lugares para correr e fazer as flexões sempre detestáveis
que eles gostavam tanto.

— Ainda não é meu estilo, — respondi, pegando minha bolsa de


ginástica.

— Você pode ficar em forma sem todos aqueles acessórios, Scott.

— Com vocês gritando comigo para acelerar o ritmo e parar de me


esticar entre os exercícios? Não, obrigada.

— O alongamento é para o aquecimento e relaxamento, — disse


Rush, revirando os olhos.

— O alongamento é para manter meus músculos longos e flexíveis


em vez de compacto e robusto como você quer. Viu? É por isso que
preciso da academia. Você se recusa a aceitar que existem diferentes
estilos de treino para diferentes resultados desejados. Desculpe, não
quero ter os braços musculosos como de um fuzileiro. Gosto de ser
longa e me inclinar como na yoga. Sabe, sem ter que fazer yoga de
verdade. Volto em duas horas.

Com isso, entrei nas sapatilhas e saí para a rua, fazendo meu
caminho a pé. Tínhamos o carro, mas tentávamos evitar dirigir sempre
que possível, porque não deveríamos legalmente fazer isso. Qualquer
coisa que pudéssemos fazer para evitar a suspeita seria bom.

A academia estava em uma rua chamada Willow, a uma boa


caminhada de vinte minutos do barraco, mas era exercício adicional e
uma maneira de tentar limpar minha cabeça.

Estava pensando demais no lance com Mark. Novamente, estava


culpando a frustração sexual reprimida, a falta de contato com
qualquer pessoa fora da minha família e o fato de que ele era sexy como
poderia ser. Eu só era uma mulher.

A verdade era que havia uma parte de mim que precisava


desesperadamente de conexão, de contato humano. Nossas vidas,
embora cheias de propósito, embora cheias de apoio, eram ainda muito
limitadas. Eu não poderia dizer que tinha um amigo desde que tinha
dezessete anos. Nunca consegui um namorado. Nós nos mudamos
demais. Estávamos metidos em uma linha de trabalho muito suja. As

~ 49 ~
conexões pessoais próximas não eram apenas indesejáveis, elas eram
verdadeiramente arriscadas.

Então fizemos nossa parte. Ficamos lá um para o outro. E


tentamos muito fingir que era mais que suficiente.

Quando éramos mais jovens, talvez até fosse. Nenhum de nós


queria raízes. Ninguém estava pronto para se estabelecer e pagar uma
hipoteca e voltar para casa com a mesma pessoa todas as noites.
Estávamos muito ocupados, superando a aceleração da adrenalina do
que fazíamos, abastecidos pela revolta que nos levou a fazer o que
fizemos. Realmente gostamos de estar em uma nova cidade todos os
meses. Gostamos de ver quais as condições de vida com as quais
estaríamos lidando, seja um barraco na floresta ou um bom aluguel
mobilado. Gostamos de conhecer o país, construindo laços familiares
mais fortes.

Mas à medida que envelhecemos, ficou claro que estava


começando a pesar sobre todos nós, cada um à sua maneira. Kingston
estava cansado dos assaltos em si, cansado de se preocupar com todos
nós, como sempre fazia. Atlas estava cansado do novo barraco. Nixon
estava cansado de todo o planejamento intrincado e minucioso. Rush
estava cansado das regras que tínhamos para viver.

E eu, bem, estava cansada de não poder ter amigos ou um


homem. Nunca pensei que seria o tipo de pessoa a dizer isso, mas
definitivamente era um pensamento dominante nos últimos meses. Eu
queria uma amiga para fazer o meu cabelo, beber café e falar sobre
coisas de garotas. Meus irmãos eram ótimos, mas tente mencionar que
você está menstruada ou falar em cor de esmalte, eles gelam com os
olhos.

Além disso, queria ser capaz de namorar. Não só encontrar um


homem nas minhas viagens e dar uns amassos, ou mais, se o humor
estivesse bom. Não apenas trocando conversa fiada que parecia
promissora, mas ao mesmo tempo, lembrando-me para não criar
esperanças porque estava condenada desde o início.

Queria compartilhar uma refeição com um homem. Então queria


esperar ele ligar. Então queria outro encontro. Talvez uma sessão de
amassos. Então, outro encontro que poderia acabar em um tour em
seus lençóis. Queria a possibilidade de mais do que apenas um toque
físico. Queria saber o que era encontrar conforto em um homem, ter
confiança e possibilidades, e para ficar com um tempo suficiente para
começar a ficar enjoada deles. Ficar com eles pelo menos seis meses,

~ 50 ~
quando você descobre que são seres humanos que fazem coisas comuns
e desordenadas, como cortar as unhas dos pés e recolher os pedaços.

Talvez isso não soe romântico para pessoas normais, mas para
mim era como um buquê de flores, caixa de chocolates, e brincos de
diamante gigante.

Algum dia.

Eu teria algum dia.

E já que hoje não era esse dia, eu levava meu crachá de visitante
e queimaria calorias com toda a minha energia incansável em uma
esteira até as oito.

A academia era legal. Já estive em algumas que pediam para


serem processadas, então reconhecia uma boa quando via uma. Havia
certo orgulho de propriedade, nos pisos novos sem nenhum arranhão,
na pintura fresca nas paredes, nas máquinas muito atualizadas em
abundância, nos armários seguros e limpos, na qualidade do sistema de
som que enchia o lugar com música animada.

Depois de trinta minutos de aeróbico que não me deu o barato de


endorfinas com o qual estava contando, desci um piso para onde
ficavam os pesos.

E imediatamente congelei no piso inferior.

Porque ali, refletidos nos espelhos do chão ao teto, parados para


admirar seus músculos salientes, estavam cinco, sim cinco, muito altos,
cabelos escuros, de olhos muito claros, classicamente homens muito
bonitos.

Os irmãos Mallick.

— Só pode estar de brincadeira. — Na minha cabeça, isso deveria


sair como um sussurro de descrença para mim mesma. Na realidade,
foi dito alto e orgulhoso e todos ao meu redor puderam ouvir. Incluindo,
a julgar pelo sorriso surgindo nos lábios de um dos irmãos Mallick,
Mark.

Ótimo.

Isso foi simplesmente fantástico.

— Porra, sabia que você deu em cima dela, seu merda, — disse
um dos outros. Dos cinco, ele era o mais amplo. Ele definitivamente

~ 51 ~
passou uma boa parte de seu tempo na academia pegando e puxando
peso.

Ao lado dele, por um lado, Mark estava com calções de basquete


pretos e um tênis preto. Para o outro lado havia outro irmão com o
mesmo aspecto que seus irmãos, mas havia algo mais sério, mais
maduro sobre ele. Ele me lembrou um pouco Kingston. Então,
provavelmente o mais velho, supus. Ao seu lado era outro irmão como
uma tela humana de tinta muito boa. E, finalmente, havia um apenas
um pouco mais fino do que seus irmãos, com os olhos que, de algum
modo, pareciam mais profundos, mais gentis, mas assombrados. Não
sei o que me fez pensar, mas havia um forte desejo de conhecer sua
história.

Esquisito, eu sei.

— Angela, querida, — Mark disse, os lábios se contraindo e ele


nem sequer tentou mascarar sua diversão quando me olhou.

Graças a Deus, não usei apenas suéteres e um tênis para a


academia. É verdade, meu cabelo estava preso e meu rosto estava livre
de maquiagem, mas minha legging era um padrão floral azul e amarelo
pálido, e minha regata era azul escuro, tudo bem colada ao corpo e de
alguma forma sexy mesmo que estivesse suada.

— Pelo jeito ainda me seguindo como um cachorrinho perdido, —


falei, tentando esconder que mesmo estando do outro lado da sala longe
dele, de alguma forma estava me afetando.

— Querida, este é o meu ritual da quarta-feira. Tem sido durante


anos. Você é quem não pertence aqui. Então, daria a entender que você
é a única que me persegue.

— Certo, porque estou oh em você, — eu disse, levantando uma


sobrancelha de uma maneira altiva que sabia que os homens odiavam.
Geralmente, funcionava para matar meus irmãos.

Seus irmãos, poderia acrescentar, julgando por quatro sorrisos


quase idênticos tocando suas bocas, estavam claramente amando essa
interação.

— Bem, você sabe... você foi a única que me empurrou contra


uma parede e me beijou.

Droga. Eu devia ter adivinhado que isso poderia voltar contra


mim.

~ 52 ~
— Somente para provar uma coisa, — respondi, o queixo erguido.

— E provar o que, querida?

— Provar, querido, que você não é tão irresistível como pensa que
é. E agora, se me der licença, você meio que arruinou o encanto da sala
de musculação, — falei, correndo em direção à parede em curva e ao
corredor que achei que levava aos vestiários. Mas devo ter me virado em
algum lugar, porque estava de pé na frente de uma porta que dizia que
isso levava à piscina.

Talvez um pouco paranoica de ser seguida e ele provar que era, de


fato, tão irresistível quanto pensava que era, ou mais, andei em direção
a essa porta, decidindo que provavelmente poderia usar meu top e
calcinha de ginástica como uma peça de banho improvisada. Além
disso, também exercitaria meus músculos, o que era bom.
Especialmente agora que estava completamente acabada novamente.

Falando sério, não era como se Navesink Bank fosse uma cidade
pequena. Na verdade, para ser honesta, era bastante grande. Tinha um
monte de grupos diferentes, diferentes culturas, diferentes tipos de
casas. Eu deveria ser capaz de andar livremente sem encontrar-me com
ele novamente.

Mas não.

Claro que não.

O universo tinha um senso de humor desordenado.

Vamos continuar pendurando ele na frente dela como um delicioso


pedaço de carne de homem enquanto ela morre de fome. Isso vai ser
divertido.

Dei quinze voltas, parando apenas quando meus braços


começaram a sentir os golpes, minha barriga doendo no esforço, meus
pulmões queimando e meus ouvidos um pouco entupidos da água.
Arrastei-me até onde pendurei uma das toalhas de cortesia em um
trilho que levava à piscina, escorrendo água de meu corpo como
cascata, expondo meu corpo ao ar que de repente ficou muito mais frio
do que antes de eu ter pulado.

— Você queimou sua frustração sexual? — perguntou uma voz,


fazendo-me sacudir tanto que quase voei para trás na parte rasa
novamente. Minha mão escapou, agarrando a grade enquanto
simultaneamente deixava a toalha na água e me deixando sem nada
para cobrir minha quase nudez.

~ 53 ~
Foi exatamente aí que fiquei muito infeliz comigo mesma por
escolher um top rosa. Porque, fala sério, os mamilos ficavam imensos
em um top assim e o preto teria escondido essa situação melhor.

— Jesus, — gritei, olhando para o lado para vê-lo encostando-se


contra a parede lateral, com a perna apoiada sobre ela, os braços sobre
o peito, o rosto olhando muito divertido para minha vida atual. — Você
estava me observando? — perguntei, forçando minhas pernas a me
levar para fora da água quando cada instinto em mim estava me
dizendo para pular de volta, que lá era mais seguro.

— Anunciei minha presença quando entrei. Você estava


mergulhada.

— Que foi, naturalmente, um convite para me encarar.

— Estava só te esperando, Scotti. Pode guardar as garras.

É claro que ele estava debruçado diretamente junto ao maldito


armário de toalhas. Era como se soubesse que eu deixaria a minha cair.
Com uma respiração profunda, decidindo que não ficaria lá quase
completamente nua, congelando e pingando em todos os lugares,
caminhei em direção a ele, pegando uma toalha e tentando ignorá-lo
enquanto me envolvia.

Eu tinha quase conseguido até que, ao pegar a toalha e dobrá-la


sobre meu peito, senti uma mão forte, ampla e calejada me agarrando
ao redor do bíceps e puxando-me ligeiramente.

Meus olhos pousaram ali por um segundo, vendo todas as linhas


de cicatrizes nos dedos e no alto de sua mão, algumas envelhecidas,
outras novas. Na verdade, acho que havia mais cicatrizes do que pele
intacta. De alguma forma, isso era quase incrivelmente sexy para mim.
Os dedos também não estavam perfeitamente retos. Eles não eram
deformados ou nada, mas alguns mostraram sinais reveladores de
terem sido quebrados mais de uma vez, sendo deixados para se
curarem sozinhos em vez de serem imobilizados com uma tala, o que
poderia tê-los mantidos perfeitos.

Mas quem queria perfeição de qualquer maneira?

Eu gostava das falhas.

Eu gostava do áspero.

— Scotti, — sua voz retumbou, um som baixo, profundo e sexy


que parecia passar pelas minhas veias, depois se acomodar dentro de

~ 54 ~
minha barriga, conseguindo, de alguma forma, transformá-la em
prazer. Quando consegui desviar meus olhos de sua mão, o que tinha
certeza de ser cerca de vinte minutos depois, achei que ele me
observava com aqueles olhos claros ilegíveis, algo intenso que não
conseguia nomear seja lá o que fosse.

— O quê? — consegui dizer, embora parecesse ser tão difícil


quanto engolir com uma boca tão seca quanto a minha estava.

— Você já acabou com esses joguinhos? — ele perguntou no


mesmo tom, muito sexy e eficaz.

— Não estou jogando...

— Mesmo? — Ele perguntou, puxando-me ligeiramente, fazendo


meus pés estupidamente cooperativos o seguirem enquanto ele me
arrastava para o seu pequeno canto, até o seu espaço pessoal. —
Porque você quer isso tanto quanto eu, mas ainda assim está tentando
agir como se não. Isso é um jogo. Entendo. Mas estou perguntando se
você terminou ou não. Então podemos avançar.

— Avançar para o quê? — perguntei.

Antes que eu pudesse terminar de falar, senti-me sendo virada


quando ele se afastou, colocando-me contra a parede fria e me
bloqueando.

— Para isso.

E com isso, consegui o que precisava desde o dia no barraco.


Inferno, desde o dia do assalto na loja.

Suas mãos se moveram para enquadrar meu rosto, tanto gentil


quanto possessivo, com pressão suficiente para mostrar o domínio, mas
não o bastante para doer.

E seus lábios esmagaram os meus.

E desta vez, realmente experimentei isso.

Não havia nada hesitante, nada de incerto sobre ele. Seus lábios
se queimaram sobre os meus, tanto que podia jurar que ele estava
deixando uma marca, como se me reivindicasse para que todos vissem
depois que ele terminasse comigo. De alguma forma, eu estava bem com
isso.

Suas mãos deslizaram do meu rosto, avançando pelas laterais do


meu pescoço, meus ombros, os lados dos meus seios, em seguida, para

~ 55 ~
fechar em torno da minha parte inferior das costas, me puxando para a
frente, esmagando meu corpo inteiro contra o dele, completamente
despreocupado se eu o estivesse encharcando.

E no segundo impacto, um gemido baixo, inesperado e


necessitado escapou dos meus lábios quando minhas mãos deslizaram
sobre os músculos de seus braços para fechar em torno de seus ombros
sólidos.

Meus seios, já esmagados em seu peito, ficaram pesados. Meus


mamilos endurecidos com frio pareciam apertar ainda mais, quase ao
ponto de dor, quando uma onda de desejo começou entre minhas coxas
e se espalhou para fora até que parecia desencadear todo o corpo, até
que fosse um fogo nas minhas veias, queimando de dentro para fora.

Um baixo e estrondo som de grunhido reverberou através do peito


de Mark e entrou em mim, trazendo com ele outra onda de desejo. Seus
dentes fisgaram meu lábio inferior, puxando duramente por um
segundo antes de liberá-lo e seus lábios desceram até minha garganta.
A pressão diminuiu quando seus braços se desenrolaram de mim,
movendo-se para os meus lados, em seguida, pressionaram-se sobre
minha barriga, exatamente na direção oposta de onde eu tão
desesperadamente precisava.

Seus dedos apertaram minha toalha. Mas antes de entender sua


intenção, suas mãos seguraram as tiras do top, agarrando e puxando o
tecido molhado até rasgar, o tecido era muito apertado para evitar que
mulheres com peitos muito grandes de conseguir olhos roxos quando
saltam por aí, foi puxado para baixo mais do que pretendia.

Então, houve uma onda de ar em meus seios nus quando ele os


expôs completamente, novamente fazendo esse som de grunhido que
enviou um arrepio na minha pele enquanto ele lentamente começou a
baixar, sua língua rastejando pelo centro do meu peito lentamente.

— Mark, nós estamos...

— As câmeras não cobrem esse canto, — ele me informou,


fazendo uma genuína dúvida passar pela incrível camada de desejo que
me cobria. Como ele saberia tal coisa? — E essa porta faz barulho
quando você abre.

Essa foi a última coisa que ele disse, o último consolo que ele me
deu no segundo antes de sua boca se fechar em torno do meu mamilo
endurecido, sugando-o com força, fazendo meu corpo inteiro se
abandonar nesse contato inesperadamente. Uma das minhas mãos

~ 56 ~
bateu em seu ombro, principalmente para me permitir me manter em
meus próprios dois pés. A outra pousou na parte de trás de seu
pescoço, trazendo-o para mim, implorando silenciosamente por mais do
lindo tormento. O que ele me deu de bom grado, trabalhando sua língua
sobre o pico em círculos torturantemente lentos. Então, assim que a dor
requintada de seus dentes na carne sensível começou a explodir através
do meu corpo, pelo som de meus batimentos de coração trovejante, eu,
de alguma forma, ouvi um grito.

Literalmente aconteceu em um piscar de olhos.

Um segundo, ele estava mordendo meu mamilo.

No outro, meu top estava de volta ao lugar, eu estava


desmoronando contra a parede, segurando desesperadamente minha
toalha, e Mark estava perfeitamente de pé, com as mãos nos quadris,
olhando para a piscina.

— Não sei, Angela, — disse ele, balançando a cabeça. — É o


mistério da toalha afundada. Vou ter que contar a Shane...

— Dizer a Shane o quê? — perguntou a voz na direção da porta,


chamando minha atenção para um de seus irmãos, o maior, de pé,
levantando as sobrancelhas, os lábios curvados em um pequeno sorriso
malicioso. — Que você gosta muito dos pontos cegos da câmera? — Ele
perguntou, me fazendo sentir dolorosamente consciente de como eu
parecia culpada naquele momento em top e calcinha, pingando água em
todos os lugares, com a pele corada, com os olhos aquecidos.

— Ah é, — disse Mark, acenando com a cabeça para mim. —


Esqueci de mencionar, esta academia é do meu irmão.

Claro que sim.

— É dele também esse conjunto de apartamentos em frente à


Third Street.

Sim.

Então, sua família, aparentemente, era dona de tudo a que eu


estava associada.

— E uma vez que esse merda esqueceu a boa educação, vou me


apresentar. Eu sou Shane, — Shane informou, não se aproximando,
mas me dando um aceno quando puxei minha toalha no lugar.

~ 57 ~
— S... Angela, — imediatamente tentei disfarçar, olhos grandes,
coração frenético. Jesus. Estava perdendo o jeito. O que estava errado
comigo, porra? Nunca ferrei um disfarce. Nós pagamos uma pequena
fortuna por eles. Seria tolo fazer isso.

— Prazer em conhecê-la, S... Angela, — disse ele, me dando um


sorriso que dizia que sabia que eu estava aprontando alguma, mas que
não me culpava. — Tenho a sensação de que vou te ver de novo, — ele
disse como um modo de despedida, dando um olhar para o irmão que
eu entendia, porque meus irmãos e eu fazíamos iguais - comunicação
não verbal você só podia interpretar se tivesse sido fluente na sua vida
toda.

Assim que a porta se fechou, soltei a respiração que nem sabia


que estava segurando, sentindo meus pulmões queimando quando
respirei profundamente de novo. Recostando-me contra a parede, com
os olhos fechados, tentei recompor não apenas meus pensamentos
rebeldes, mas também a constante excitação palpitante entre minhas
coxas. Era literalmente doloroso. Não sabia que o desejo poderia doer.
Mas, naquele momento, doía não conseguir satisfação.

No entanto, não iria mais longe. Estávamos em um lugar público


assustador. Quase fomos flagrados no ato.

Eu poderia ter uma ocupação que me faz parecer um pouco


viciada em adrenalina, mas na verdade não era como se eu estivesse
ligada.

— Querida, — disse a voz de Mark, mais perto, embora não


tivesse ouvido ele se mover em minha direção. Essa era uma deixa para
ele não usar aqueles coturnos dele. Seu tom era baixo, quase suave. —
Scotti, — ele tentou quando não abri meus olhos. Eu poderia estar
lutando, e perdendo, uma batalha interna, mas meu orgulho não me
deixou esconder. Meus olhos se abriram lentamente, encontrando-o
olhando-me, sem provocações, sem mais sua leveza jocosa. Ele estava
totalmente sério naquele momento. — Que tal fazermos uma pausa no
seu jogo e jogamos o meu por um tempo?

— Qual é o seu jogo? — perguntei, fazendo respirações lentas,


profundas e deliberadas que estavam conseguindo ajudar minha mente
a se concentrar além do desejo que ainda me provocavam como um fio
vivo.

— Meu jogo é dar uma chance.

~ 58 ~
— Chance? — repeti, as sobrancelhas juntas. — Não pode haver
chance. Estou indo embora, Mark. Estou dando o fora daqui alguns
dias.

— Então passe esses dias comigo, — ele ofereceu, encolhendo os


ombros. E, Deus, eu estava tão tentada. Mas, estando no estado
emocional um tanto frágil e carente em que estava ultimamente, tive a
sensação de que alguns dias não iriam ser suficientes. Corria o risco de
me apegar. Eu não poderia ter isso. — Tudo bem, — ele disse como se
estivesse lendo minha linha de pensamento. — Apenas comprometa-se
com um.

— Um o quê?

— Um dia. É tudo o que vou pedir. Um dia em que você não vai
estar no seu lance “quero ele, mas não”.

— Quero você, mas não.

— Dê uma chance para um dia. Veja onde vai dar. Se você quiser
mais depois disso, então, iremos dali. — Quando não respondi, ambos
querendo isso mais do que eu poderia dizer, mas também apavorados
com isso, sua cabeça abaixou um pouco, aproximando-se de mim. —
Diga sim, Scotti.

Respirei profunda e firmemente.

Porque sabia qual seria a resposta.

Realmente, havia apenas uma resposta para um sexy irmão


Mallick pedindo que você lhe desse um dia de sua vida. Especialmente
quando esse dia provavelmente lhe daria pelo menos um orgasmo de
classe mundial que você precisava desesperadamente.

— Sim.

— Amanhã ao meio-dia.

Com isso, ele se virou para se afastar.

— Espere... o que... meio-dia? — Perguntei, confusa. Desde


quando meio-dia era hora de encontro?

— Sim, querida. Se eu tiver um dia com você, vou levar toda a


merda, — ele disse com o sorriso maroto no lugar novamente, antes de
virar e sair.

~ 59 ~
Foi talvez dois minutos depois, quando o estúpido sorriso
feminino deixou meu rosto, que me dei conta de uma coisa.

Ele ia me buscar.

No barraco.

Onde estavam todos os meus irmãos.

Isso, bem, isso não seria bom.

Maravilha.

~ 60 ~
Cinco
Scotti

— Whoa, espere, — disse Nixon, olhando-me como se me brotasse


outra cabeça e estava falando em línguas. — O que diabos você quer
dizer que tem um encontro com o único cara por aí que poderia
reconhecê-la como uma suspeita de assalto à mão armada?

Então eles não estavam aceitando bem as novidades.

O que era esperado.

Honestamente, suas reações eram até válidas.

— Sim, eu, uma mulher adulta, tenho um encontro com um


homem que descobriu nosso esconderijo há uma semana e não nos
denunciou à polícia. O que pode ter a ver com o fato de ele mesmo ser
um criminoso e não faz merda como entregar outros criminosos.

— Cristo, Scott, sei que você está desesperada por um cara


ultimamente, — atinou Atlas, sempre o menos delicado de todos os
meus irmãos, — mas isso é tipo cagar onde come, não acha ?

Mais uma vez, outro ponto justo.

Veja, eu sabia que eles iriam encrencar.

Porque se fosse o contrário, eu também teria encrencado. Na


verdade, com certeza minha crise seria muito mais dramática.

No entanto, uma parte de mim não estava a fim de ouvir isso. Por
mais errado que isso poderia ser, estava tão animada que senti que
estava zumbindo. O que era bobo, mas eu estava indo em um encontro
de verdade. Eu não tinha tido um encontro há anos.

— Olha, o que você quer de mim? — Tentei, tentando enganá-los


com razão. — Você quer que o dispense e o irrite? Não o conhecemos.
Por tudo o que sabemos, ele tem um ego enorme e não aceitaria bem
isso.

~ 61 ~
— E daí?— - perguntou Atlas, quase ofendido. — Você vai dar pra
ele para impedir talvez, de ele nos delatar para os tiras? Scott, a gente
nunca vai deixar isso acontecer. Preferimos ir embora.

Maldito seja ele por ser tão sensato.

— Oh, pelo amor de Deus. Eu não iria dormir com ele para evitar
de entregar a gente. Jesus. Você realmente pensa tão baixo de mim?

— Então, o quê?— Nixon perguntou. — Você só vai enrolar ele?


Porque isso vai acabar tão bem.

— Ok. Já chega, — declarei, parada, colocando minha xícara de


café na pia. Era cerca de dez da manhã. Eu tinha guardado a novidade
para mim principalmente porque eles estavam atrasados e fingi estar
dormindo quando entraram para evitar contar a eles, sabendo que seria
assim. E queria manter minha excitação o maior tempo possível. —
Preciso ir. Ele vai estar aqui ao meio-dia. Se vocês quiserem interrogá-lo
ou acorrentá-lo na garagem, isso depende de vocês. Mas preciso me
recompor no caso de vocês decidirem que é mais esperto me deixar
passar a tarde com ele e ter uma ideia de onde ele está.

Se tudo correr como planejado, definitivamente haveria alguma


emoção. E eu precisava fazer uma boa sessão de esfoliação, depilação e
hidratação para me preparar para isso. Embora não fosse transar para
preservar meu anonimato, estava mais do que disposta a transar pelo
meu maldito prazer.

Vinte minutos depois, houve uma batida suave na porta do


banheiro. Esta batida foi seguida por uma pausa. O que me disse
exatamente qual irmão era. Porque Nixon, Atlas e Rush acabariam de
entrar depois da batida, esquecendo completamente a boa educação.

Kingston sempre tentou se certificar de que deu à sua única irmã


a privacidade que ela desesperadamente sempre quis em um mar cheio
de homens.

— Entre, King, — ofereci, limpando a condensação do espelho


quando entrou, fechando a porta e depois se encostando contra ela. Seu
peito expandiu-se, enquanto ele respirava profundamente, com a
cabeça dobrada ao lado, observando meu reflexo.

Veja, a coisa sobre Kingston era, ele podia ver através de mim. E
por isso nunca me safei de minhas merdas desde que fiquei
inteiramente sobre seus cuidados. Sem sair escondida. Sem faltar na
escola. Sem encontro com meninos. Nada.

~ 62 ~
Mesmo que fiquei adulta, nunca consegui descobrir como deixá-lo
de fora.

— Fale comigo, garota.

— King, não quero continuar...

— Olha, entendo, está bem? Confie em mim, Scott, — ele disse


com um sorriso, — eu entendo pra caralho. Essa vida teve bons
momentos, mas teve tanto, se não mais, sacrifício e decepção. Acho
que, de muitas maneiras, você foi a única que precisou desistir de mais.
Isso é foda , — disse ele, acenando uma mão para indicar a sala de
estar onde nossos irmãos falavam alto, provavelmente provocando um
ao outro até o próximo interrogatório sobre Mark Mallick. — Eles não
querem coisas como cercas brancas, esposas e filhos. No entanto, são
jovens. Gostam da ação, do sexo sem compromisso, da capacidade de
abandonar tudo quando a vida fica estagnada. Eles ainda não estão
prontos, mas você sim. E você tem estado por um tempo. E é uma
merda que você ainda não foi capaz de conseguir isso.

— King, ninguém está me forçando a...

— Não, não forçando. Ninguém está forçando nenhum de nós.


Mas acho que você, como todos nós, tem essa necessidade de seguir em
frente. E não há nada de errado com isso. Mas está demorando mais do
que qualquer um de nós planejou. E você colocou tudo o que você quer
em segundo plano e tem estado lá por tanto tempo que finalmente está
começando a acabar. Você acha que o escondeu bem, garota, mas tenho
observado que esses sorrisos se tornaram mais difíceis, as risadas se
tornam forçadas, e as caras feias ficam mais visíveis. E isso está
acabando comigo.

— Kings...

Ele balançou a cabeça para mim, observando meus olhos


cuidadosamente no espelho. — Há alguns minutos, essa foi a primeira
luz real que vi em seus olhos em meses, Scott. Não conheço esse cara
Mallick, embora acho que você me conhece bem o suficiente para saber
que vou conhecer ele e bem...

Ele não estava errado.

Kingston mataria a maioria dos pais de vergonha com o esquema


“meter medo nos rapazes”. Não que ele não quisesse que eu namorasse.
Ele era bastante evoluído para entender que eu ia namorar, que, para
mim, era saudável namorar. Mas, eu era sua irmãzinha e ele queria ter

~ 63 ~
certeza de que eu estava segura nas mãos de qualquer homem com
quem eu ficava.

— Eu entendo isso, King.

— Mas sei que ele devolveu um pouco de vida em você com essa
oferta. Isso é importante para mim. E nem vou tentar negar a você algo
que te deixou animada. Nem vou falar que é arriscado. Você não é
estúpida. Sabe quais são os riscos que podem ou não ocorrer. Nem vou
falar que é perigoso porque se está tão entusiasmada desde o início,
talvez seja melhor tirar isso da cabeça e apenas deixar de lado. Você
sabe disso. Em vez disso, vou falar que, — ele continuou, me dando um
pequeno sorriso,— quero que você se divirta. E espero que ele seja
digno de você, criança.

Com isso, ele se desencostou da porta, abriu-a e desapareceu.

E isso, bem, tudo isso me deixou com um pouco de lágrimas nos


olhos.

Sempre quando achava que já entendia todos eles, um deles


sempre vinha e me surpreendia.

Então, quando voltei às minhas escolhas de cabelo e maquiagem


e roupas, senti-me ainda mais animada pelo dia, tendo permissão de
alguém que era, para todos os efeitos, minha única figura parental.

Claro, não precisava de nenhuma aprovação, mas foi bom ter


isso.

Quando faltavam dez a doze minutos, estava tão pronta quanto


era possível. Não tinha ideia do que Mark tinha planejado para o dia.
Então, vesti um bonito conjunto de calcinha e sutiã de renda rosa bebê
e um jeans skinny preto e simples e um bonito suéter branco, macio e
leve, borrifei um pouco de meu perfume e calcei botas pretas e encerrei
o assunto. Era casual, mas sofisticado o suficiente para comer fora, se
esse fosse o plano em algum momento.

Fazia tanto tempo que eu não saía com alguém que me esqueci de
esclarecer os parâmetros do encontro.

Mas, enfim.

Não iria focar demais nessa falta.

Eu ia focar na excitação do desconhecido.

~ 64 ~
Geralmente, na minha vida, o desconhecido era aterrorizante, o
melhor era nunca permitir que acontecesse. Por isso planejávamos tudo
em detalhes. Para nos salvar de qualquer imprevisto que pudesse nos
levar a uma cela ou para um caixão.

E claro, talvez meus irmãos estivessem certos, talvez Mark fosse


barra pesada. Mas meu instinto me dizia o contrário.

Então, seja qual for o desconhecido que ele estivesse planejando,


eu farei de tudo para apreciá-lo.

— Ei, seu namorado está aqui! — Rush chamou, fazendo-me


bufar enquanto enfiava dinheiro em minha bolsa. Peguei meu mais
novo celular descartável e saí do banheiro na mesma hora em que uma
batida soou na porta.

Nem me preocupei em tentar chegar primeiro. Seria um esforço


inútil. Atlas e Nixon estavam praticamente esperando na soleira da
porta.

Então fiquei de frente encostada contra a porta fechada do


banheiro e esperei para ver o show acontecer.

— Mallick, — cumprimentou Nixon, dando um passo para trás de


uma maneira que sugeria que Mark deveria entrar. E, talvez como se já
esperasse uma interação como essa, Mark parecia completamente
confortável enquanto entrava, vestido casualmente com jeans e um
camisa azul de mangas compridas, me deixando feliz por não estar tão
produzida.

— Scotti, — ele me cumprimentou com um pequeno sorriso antes


de enfrentar meus irmãos.

— Apresentações rápidas, — informei, ficando onde estava. —


Este que respira em seu pescoço é Nixon. Este que está procurando por
possíveis armas é o Atlas. O que lhe dá um olhar de morte da sala de
estar é Rush. E aquele que olha para você como se fosse te estripar se
você colocar um arranhão em mim, e devo avisar, ele pode te estripar, é
meu irmão mais velho, Kingston. E como todos vocês sabem, este é
Mark Mallick.

— Por que você tem tanto interesse em minha irmã? — Atlas,


perguntou levantando a testa.

O sorriso de Mark se esticou divertido, seus olhos dançando. —


Estamos fazendo isso, hein?

~ 65 ~
— Fazendo o quê?— Nixon perguntou.

— O lance “quais são suas intenções com minha irmã”. Respeito


isso. Só estou surpreso de ela estar de boa com isso.

— Você sabe, é mais fácil simplesmente ir com o fluxo, — eu


disse, dando-lhe um sorriso. — Além disso, isso elimina logo no início
os caras frouxos que querem sair comigo.

— Mais fácil para você, talvez, — disse ele, me dando uma


piscadela antes de virar completamente para encarar todos os meus
irmãos. — Tudo bem, vamos fazer isso.

E então eles fizeram.

Só fiquei em pé assistindo com um crescente respeito por um


homem que conhecia tão pouco. Você conhece o caráter de um homem
quando ele consegue manter-se firme ao ser confrontado por quatro
homens tentando assustá-lo quando está interessado na irmãzinha
deles. Talvez fosse melhor do que qualquer um antes dele porque ele
mesmo tinha muitos irmãos, provavelmente era usado para mostrar
confrontações masculinas, batidas de tórax e infiltração de
testosterona.

Algum tempo no meio de tudo isso, Kingston atravessou a sala


para se apoiar contra a porta comigo, com os braços cruzados em seu
peito.

— Tenho que dizer, eu meio que gostei deste.

Isso foi realmente muito importante. Embora ele nunca tivesse


tentado efetivamente evitar que eu namorasse, certamente deixava claro
quando achava que alguém que estava ao meu redor não digno de mim.
Que era todo homem.

Kingston não era um homem difícil de agradar. Na verdade, era


definitivamente o mais descontraído de todos eles, provavelmente
porque acabou criando uma úlcera por cuidar de nós por tanto tempo.
Ele aprendeu quando precisava ignorar várias coisas.

Mas erroneamente me colocou em um pedestal.

Talvez porque eu o lembrava de nossa mãe morta.

Na verdade, isso explicaria muito.

— Meio que uma pena que temos apenas uma semana antes de
partimos, hein?— ele perguntou, me dando um sorriso simpático.

~ 66 ~
Concordando talvez até demais com isso, já que não tinha
passado mais de cinco minutos com o homem, rechacei. — Não vamos
nos precipitar. Vai que ele mastiga com a boca aberta ou me faz tirar os
sapatos antes de entrar em seu carro.

— As duas infrações capitais em seu livro de leis.

— Exatamente.— No entanto, duvidava que ele fosse esse tipo de


cara, já que sua aparência era geralmente áspera e dura e muitas vezes
suja de trabalho. A coisa de mastigação, sim, isso seria imediatamente
broxante.

— Você tem seu celular, certo?— Kingston perguntou, sempre


paranoico sobre minha segurança. — E seu spray de pimenta?

— Caramba, olha, devo ter deixado isso na minha cômoda, logo


ao lado do meu cinto de castidade. — Quando ele levantou as
sobrancelhas sem expressão, eu ri. — Relaxe. Você sabe que posso
tomar conta de mim.

Graças aos cinco anos de várias aulas de autodefesa que ele me


obrigou a fazer, alegando que iria salvá-lo de ter de me acompanhar
para ter certeza de que nada aconteceu comigo se eu saísse à noite.
Talvez, no começo, eu tivesse ficado chateada, mas não havia sensação
melhor no mundo do que saber que poderia caminhar pela rua com
segurança e, literalmente, assassinar com minhas mãos nuas qualquer
um que tentasse me tocar.

Estava prestes a voltar trazer minha atenção de volta à realidade


quando ouvi Rush pronunciar as palavras, — E quando você acha que
vai trazê-la de volta pra casa?

— Ok, ok, — eu disse, afastando-me da parede com um sorriso.


Eles poderiam ser uns malucos, mas eram os meus malucos e eu os
amava. — Chega de perguntas.

— Quer saber, — disse Mark, deixando sua mão deslizar do meu


quadril para se acomodar na minha parte inferior das costas, apesar
dos olhares que meus irmãos estavam lhe dando sobre me tocar na
presença deles , — se essa coisa toda de assalto não funcionar a longo
prazo, acho que vocês podem arrumar um trabalho no serviço de
inteligência. — Com isso, ele pressionou um pouco mais nas minhas
costas. — Pronta?

— Depende, — respondi, encolhendo os ombros.

— Do quê?

~ 67 ~
— Se você vai me fazer tirar os sapatos antes de entrar no seu
carro.

— Primeiro, é uma caminhonete. Tipo uma caminhonete de


trabalho. Então, o chão tem um centímetro de pó de concreto, areia,
terra, serragem, grama e qualquer outra quantidade de porcaria. Se
quiser seus pés nisso, fique à vontade. Mas acho que você prefere
manter seus sapatos.

Não deveria ficar, mas fiquei ligeiramente excitada pelas palavras


pó de concreto, areia, terra, serragem e grama. O que posso dizer, sou
uma aberração.

— Tudo bem. Vamos, então.

— Sério, — Kingston chamou, fazendo-me olhar por cima do meu


ombro para ele. — O spray de pimenta?

Para isso, Mark riu, voltando-se para o meu irmão mais velho. —
Ela não vai precisar disso. Ela quase quebrou meu maldito pé na loja
quando a conheci. — Então, seu rosto ficou um pouco mais sério,
provavelmente apontando o quanto isso era importante para ele e
respeitando isso. — Sua irmã está segura comigo, Kingston. Sei que
você vai, mas não precisa se preocupar com ela.

Então com isso, e o sentimento carinhoso e fofinho que isso me


causou, ele me levou para fora e ao redor do prédio.

— Sei que eles podem ser um pouco... demais, — tentei explicar


enquanto circulávamos sua caminhonete, que parecia nova, mas já um
pouco arrebentada.

— É bom que eles se importem, querida. Não vou culpá-los por


isso.

— Kingston gosta de você, — esclareci quando ele abriu a porta


para mim, completamente insegura do porquê quis dizer isso.

— E farei tudo o que estiver ao meu alcance para não foder isso,
— disse Mark, voltando-se sério por um segundo antes de um grande
sorriso começar a surgir em seus lábios. — Você vai subir essa bunda
bonita ou precisa de ajuda?

Olhei para a caminhonete e voltei para ele.

— Primeiro, quero saber para onde estamos indo.

~ 68 ~
— Mercado, — ele me informou, casual como podia ser. E antes
que eu pudesse até mesmo desenroscar minha língua e perguntar o
que, senti suas mãos fortes se afundando em meu quadril e levando-me
para cima, levantando-me de meus pés e depositando-me dentro da
caminhonete. A porta bateu e fiquei sozinha no carro por um momento.

Já estive em muitos lugares estranhos com homens antes: salões


de bilhar, pistas de boliche, faixas de tiro, nos fundos de um celeiro de
uma fazenda.

Mas isso era novo.

Por que diabos ele estava me levando para um mercado?

~ 69 ~
Seis
MARK

Seus irmãos eram bons homens.

Acabou de cimentar algo que eu já sabia estar errado sobre a


crença popular em relação aos criminosos. Não eram todos vermes
nojentos. Não eram essas figuras malignas, tortuosas, sentadas em
salas escuras, fumando charutos e fazendo coisas terríveis.

Na verdade, seria amável se as pessoas soubessem o quanto os


criminosos eram normais como elas. Tinham casas que precisavam ser
limpas e latas de lixo que precisavam retirar. Muitas vezes tinham
esposas e filhos a quem amavam e protegiam. Comiam e trabalhavam
preocupados com a merda do cotidiano.

E seus irmãos poderiam ser assaltantes, mas ainda eram,


primeiro e acima de tudo, os grandes irmãos de uma irmãzinha que
achavam que precisavam de sua proteção.

Vindo de uma grande família, entendia os laços familiares. Eu os


respeitava. Fiquei feliz por Scotti ter tido isso. Provavelmente, isso a
livrou de muitas dores de cabeça por causa de trouxas que não tinha
nada o que fazer perto dela se não pudessem aguentar a ideia de seus
irmãos acabarem com eles se fizessem alguma coisa para machucá-la.

E, na verdade, todos me lembravam um pouco dos meus irmãos.


Kingston, como Ryan, era o mais velho, o mais nivelado. Rush me
lembrou um pouco de Shane, parecia o tipo que agia antes de pensar,
obstinado e confiante. Nixon e Atlas foram mais agressivos, mas tive a
sensação de que era para tentar assustar os namorados de sua irmã,
eles pareciam ser os mais despreocupados e brincalhões de todos.

Entrei na caminhonete ao lado de uma mulher que, de alguma


forma, fazia jeans e um suéter de merda parecer a roupa mais sexy,
virando a caminhonete e chegando por trás de seu apoio para a cabeça
para olhar na parte de trás.

~ 70 ~
— Mercado?— ela perguntou enquanto meus olhos pegavam os
dela.

Encontrando as sobrancelhas juntas, estendi a mão e apertei meu


dedo nas linhas que se formaram entre elas, suavizando-as. — Sim. É
aí que mora a comida. Se vou cozinhar para você, Scotti, preciso ter
algum alimento para fazer isso. E como não sei muito sobre você ainda,
incluindo o que come ou o que não come, achei que iria facilitar a
minha vida se a levar comigo.

Não encontrando falhas no meu argumento, ela me deu um


pequeno aceno. — Oh, tudo bem. Bom, eu como qualquer coisa, exceto
abacates e queijo cottage. — Quando levantei a sobrancelha, ela riu, o
som era baixo, rouco, quente como a porra de uma coisa que foi direto
para o meu pau. — É uma coisa de consistência. Os abacates são
macios e o queijo cottage é espesso. — Mesmo quando ela disse isso,
seu rosto fez uma careta que não deveria ter sido, mas era, totalmente
adorável.

— Então você cozinha, — ela comentou enquanto seguíamos pela


rua principal em direção à mercearia.

— Sim. Minha mãe socou isso na gente enquanto crescíamos.


Disse que não podíamos esperar que as mulheres cozinhassem para
nós.

— Acho que gosto da sua mãe, — disse ela, me dando um sorriso.

— Você cozinha?

— Não se depender de mim. — foi sua resposta imediata. — Sei


como fazer. Minha mãe me ensinou todos os princípios culinários aqui e
ali. Mas tentar cozinhar para mim e meus irmãos é inútil. Uma semana,
Rush estará na dieta cetogênica e se recusando a comer qualquer coisa
que eu cozinhe com carboidratos. Na próxima, talvez Nixon vai estar em
algum detox, então carne está fora. Você simplesmente não consegue
agradar a todos. É mais fácil encomendar para que todos tenham o que
querem.

— Ou, quer saber, diga para eles cozinharem para eles mesmos se
vão ser um pé no saco, porra, — eu sugeri.

— Então, oh, ficarem reclamando, — disse ela, balançando a


cabeça. — Para homens adultos, eles podem envergonhar meninos de
cinco anos.

— Você assa?

~ 71 ~
Seu sorriso ficou um pouco melancólico com isso, seus olhos
aparentemente longe. — Às vezes. Principalmente perto dos feriados.
Essa era uma tradição na minha família há tanto tempo quanto me
lembro.

— Que tal eu fazer o jantar e você fica com a sobremesa?—


sugeri.

— Isso parece justo, — ela concordou. — Então suponho que


estamos indo para sua casa.

— Não. Vou construir um maldito forno de sol. Você pode esperar


doze horas para comer, certo?

— Por que imagino sua casa como uma república universitária?

— Deve ser meu encanto travesso, — brinquei, sem ofender. Aliás,


provocar os outros era apenas parte do meu dia-a-dia. Geralmente eu
era o que mais perturbava os outros. Gostei que ela se sentisse
confortável e confiante o suficiente para dizer o que estava em sua
cabeça. Isso era refrescante. Especialmente nos estágios iniciais com
alguém. Quase nunca se conhece a verdadeira pessoa nos primeiros
encontros. Você conhece uma representação. Você conhece a versão
com suas melhores maneiras, o seu melhor lado, suas melhores
palavras, sem aborrecer ninguém.

Foi refrescante ver além da máscara.

— Não, — alertei quando ela se aproximou dos carrinhos.

Eu peguei um carrinho e ela deu um sorriso. — Estamos


alimentando um pequeno exército?

— Não, mas significa que posso fazer... isso...— respondi,


puxando-a para o carrinho e colocando suas mãos sobre a barra. Então
fiquei bem atrás dela, colocando minhas mãos ao lado de suas mãos.

— Você só pode estar de gozação, — ela disse, o corpo pulando


com uma pequena risada. — Isso parece ridículo.

— E brega. E quase tão irritante quanto sentar do mesmo lado da


mesa em restaurantes, — concordei. — Qual é, vamos fazer com que
todas as solteironas e donas de casa mal comidas fiquem com um
pouco com ciúmes,— sugeri, aproximando-me mais, não me
incomodando com a resposta de meu corpo contra o dela assim que
comecei a empurrar o carrinho. Preso entre mim e ela, ela foi forçada a
começar a andar também. — Elas estão roxas de inveja, — falei em sua

~ 72 ~
orelha, sentindo-a estremecer um pequeno enquanto meus lábios
roçavam seu lóbulo.

— Ok, Scarlett O'Hara, — ela bufou, mas olhando por cima do


ombro, vi que ela estava sorrindo.

— Então... vagem ou couve-de-bruxelas?

— Vagem, — disse ela enquanto eu me afastava. Então ela


também se afastou, mas fugindo de mim.

— Eita, onde você pensa que vai, pequena dama?— perguntei,


agarrando seu braço e girando suas costas, pegando-a desprevenida e
fazendo-a colidir contra o meu peito com uma risada.

— Este não é um desses comerciais de Romance Harlequin, —


disse ela, olhando ansiosamente para o espetáculo que fazíamos. —
Para com isso. Você está fazendo uma cena.

— Ah, bem... isso não foi a coisa mais esperta para falar, — disse,
sorrindo. — Porque agora preciso mostrar-lhe o que é uma cena real, —
acrescentei enquanto abraçava sua parte inferior das costas,
arqueando-a para trás quando eu avançava.

— Ei... espere... o que você está...

— Você quer Romance Harlequin, baby, então eu vou te dar.

E com isso, antes de eu conseguir tirar o sorriso do meu rosto


com os olhos arregalados dela, inclinei-me e a beijei, até que suas mãos
estivessem agarrando meus ombros, até que seu corpo derreteu, até eu
ser a única coisa que a impedia de cair para trás no chão.

Então, e só então, eu me afastei, prometendo-me voltar nisso


mais tarde, depois de alimentá-la, e na privacidade intensificar o que
parece que ambos queríamos.

— Tudo bem, vagem, — eu disse, puxando-a para trás comigo,


com o braço ao seu redor até que ela recuperou o equilíbrio, ouvindo
alguns aplausos ao longe e ignorando-os completamente.

— Ah... o quê?

Sim, não tinha como parar o sorriso que ameaçava dividir meu
rosto naquele momento. Beijei a mulher enlouquecidamente.

— Vagem, — reafirmei. — Você precisa de um minuto? —


perguntei, observando-o escovar seus cabelos para trás.

~ 73 ~
— Eu, ah, sim. Volto logo. Preciso de maçãs e outras coisas.

— Encontro você no caixa, — sugeri a ela uma rápida batida em


retirada.

Oh sim.

Eu iria me divertir com ela mais tarde.

~ 74 ~
Sete
Scotti

Então... aconteceu.

Tenho certeza de que coisas assim nunca aconteceram na vida


real. Sabe, né, porque tinha outras pessoas ao redor, e era bobo, e os
caras, na minha experiência pessoal, não gostavam de grandes
exibições românticas. Nem mesmo com namoradas de longa data. Ou
com esposas.

No entanto, havia Mark Mallick, um casal empurrando carrinho


de compras, ele me girando e me curvando para trás e me beijando no
maldito corredor das frutas e verduras.

E ele nem sabia meu sobrenome verdadeiro.

Acho que me deixei levar pelo seu, com ele disse, encanto
travesso. Ele nem ligava para o que as pessoas pensavam de suas
divertidas e meio exageradas palhaçadas. E talvez a ele fosse permitido
fazer isso, pois era tão loucamente lindo que tudo o que precisava fazer
era sorrir e tudo estava perdoado.

Esse beijo, por mais pateta que tenha sido, foi eficaz. Quase não
sendo capaz de obrigar minhas pernas a andar enquanto me afastava
dele, certifiquei-me de ficar fora da sua vista antes de me encostar no
final de uma prateleira e me recompor. Se não fizesse isso, eu ia cair
matando em cima dele assim que entrarmos pela porta. E, embora isso
seja verdade, eu queria mesmo fazer isso, também não queria apressar
as coisas. Queria aproveitar o dia, ver o que ele tinha planejado, não ir
direto para as coisas físicas.

Embora, cara, aposto que as coisas físicas iam valer a pena.

Voltei à tarefa, peguei maçãs, canela, massa folhada e algumas


coisas para fazer a torta caseira e caminhei em direção ao caixa para
encontrar Mark casualmente ao lado de um carrinho e lendo as
manchetes ridículas dos tabloides.

~ 75 ~
— Ei, você sabia que nosso senador é um zumbi? Aparentemente,
esse reconhecido “jornal” tem uma prova empírica.

— Merda. Precisamos voltar para o corredor de cozimento e pegar


algum papel alumínio para esse chapéu que, obviamente, você vai
precisar?— Brinquei secamente, fazendo uma profunda risada rolar em
seu peito enquanto ele colocava um braço ao redor dos meus ombros e
colocando um rápido, doce e desarmante beijo na minha testa.

Maldito seja ele.

Por mais estranho que eu poderia imaginar, estar ao redor dele


parecia muito com um caloroso abraço em um dia ruim, com um copo
fumegante de chocolate quente em uma noite chuvosa, com meia dúzia
de cobertores quando você quer se esconder do mundo.

Ele era... reconfortante.

O que era absurdo já que eu não o conhecia. Mas os sentimentos


não eram racionais. Aceitei isso na primeira vez em que fiquei
emputecida por causa da separação de um casal de ficção em um
programa pelo qual estava obcecada como uma adolescente. Claro, eles
não eram reais, mas eles pareciam reais.

Ok, talvez eu ainda não tenha superado completamente esse


assunto.

— Baby, fico feliz com você encarando minha bunda sexy o dia
todo, — disse Mark, fazendo com que eu me afastasse dos meus
pensamentos para encontrá-lo olhando para mim enquanto colocava
algumas sacolas no carrinho. De alguma forma, ele colocou as compras
na esteira do caixa, registrou-as e empacotou sem que eu percebesse. —
Mas temos que ir, — ele acrescentou quando eu apenas fiquei de pé
olhando para ele como uma psicótica.

— Certo, — respondi quando ele empurrou o carrinho e saiu da


pista para que eu pudesse seguir.

Examinei a operadora de caixa que me deu um olhar consciente


que me fez sentir um pouco menos estranha e ridícula. Todas nós
estávamos impressionadas por um homem atraente e encantador. Ela
sabia como era.

— Então, o que você vai fazer? — Perguntei quando o silêncio se


prolongou um pouco demais no caminho de volta para a caminhonete.

— Bife, vagem, batatas fritas. O que você vai fazer?

~ 76 ~
— Flores de maçã.

— Flores de maçã? — Ele repetiu quando começou a carregar as


compras.

— Você corta uma tira de massa folhada, passa um pouco de


manteiga e canela, depois põe as maçãs em fatias, enrola e cozinha em
uma forma de cupcake. Elas assam e ficam parecidas com flores. Ah, e
são deliciosas.

Foi quando me dei conta que não tinha feito flores de maçã desde
que minha mãe morreu. Meus irmãos me pediram várias vezes, mas
isso sempre foi um carinho de minha mãe, um mimo que ela fazia
quando eu tinha um dia ruim. Sempre doeu demais pensar em fazê-las.
Por que, então, nem pensei duas vezes para fazer isso para Mark?
Praticamente um estranho?

— Querida, você está bem? — perguntou Mark, olhando-me com


sobrancelhas franzidas e olhos preocupados. — De repente você ficou
super pálida.

— Ah, sim. Foi mal. Acho que estou com fome, — menti. Em vez
disso, notei uma mudança estranha e significativa na minha vida que
me deixou inquieta e sem saber o que pensar. E isso era muita
informação para um primeiro encontro.

— Bem, ainda bem que estou prestes a alimentá-la logo, — ele


disse, estendendo a mão para segurar meu braço, observando-me como
se eu fosse desmaiar, enquanto ele me levava até minha porta e me
ajudava a entrar, antes de desaparecer com o carrinho. Você tinha que
gostar de um homem que levava o carrinho de volta.

Não estava mentindo quando disse a ele que imaginava sua casa
como uma república universitária. E com isso, eu quis dizer nada
suave, sem decoração, somente com o que é indispensável, ou, no caso
dos eletrônicos, dispensável mas em enorme quantidade.

Quanto à construção em si, achei que ele era um cara de


apartamento. Por quê? Porque a manutenção era barata. Porque você
poderia sair e partir para uma aventura a qualquer momento sem se
preocupar com isso. Porque, além de um contrato de um ano, tinha
baixo compromisso.

O que eu definitivamente não tinha planejado era uma linda e


desgastada casa no estilo craftsman1, situada em um pedaço de terra

1 São casas rústicas no estilo americano (N.T.).

~ 77 ~
com quase dois hectares. Era uma encantadora construção azul
profundo com vigas e suportes brancos, toda a pintura precisando
desesperadamente uma atualização, uma pequena varanda dianteira
sob um telhado pendendo profundamente, grandes colunas quadrada
apoiando o telhado, janelas de duas colunas e uma torre de janela
individual.

— Não é exatamente uma república universitária?

— Bem, estou reservando meu julgamento até ver o interior.

— Justo. Algumas partes ainda estão em construção, mas a sala


de estar e a cozinha estão completas. Este lugar estava quase caindo
quando comprei. Tem dado trabalho pra caralho.

Peguei algumas sacolas. — Por que não conseguir um que


precisasse de menos trabalho?

— Essa fodida belezinha craftsman, — ele disse enquanto


caminhávamos pelo caminho, os tijolos quase desaparecendo debaixo
do chão. — Sobre este pedaço de terra? Os investidores teriam colocado
tudo abaixo para construir casas mais ousadas e sem personalidade.
Não podia deixar isso acontecer. Além disso, é isso que faço.

— O que você faz? — perguntei enquanto caminhávamos na


varanda e ele alcançou a porta para destrancar.

— Construção.

— Pensei que você fosse um agiota, — disse, fazendo um pouco de


careta sobre o quanto isso soou cruel.

— Eu sou. Mas todos nós temos negócios legítimos. Shane com


sua academia e seus apartamentos. Meu pai tem um bar. Ryan tem um
monte de merda chata. Eu tenho uma empresa de construção e uma
companhia de paisagismo. Merda que envolve trabalhar com minhas
mãos. Era bom para variar poder colher os benefícios de todo o
trabalho. Venha, — ele convidou, abrindo a porta e esperando que eu
passasse.

As origens eram coisas pelas quais eu tentava não pensar muito.


Mas quando entrei na sala de estar de Mark, senti algo que não me
permiti sentir por muito, muito tempo. A madeira no chão era larga, e
uma variedade de todos os tipos diferentes de madeiras aparentemente
recuperadas, todas as imperfeições ainda intactas, dando ao espaço
inteiro uma sensação aconchegante. As paredes de um verde acolhedor
e convidativo. O sofá era marrom escuro. A mesa de centro estava

~ 78 ~
arranhada, como se muitos tivessem descansado suas botas lá em
algum momento ou outro. A TV, bem, era enorme. E que homem não
tinha uma TV enorme?

— Uau, isso é realmente bom, — eu disse, dando-lhe um sorriso


genuíno quando ele passou por mim através da entrada que parecia
levar à cozinha.

— Obrigado, — ele agradeceu enquanto colocava as sacolas em


uma ilha em um espaço que parecia quase grande demais para uma
casa que não parecia ser tão grande do lado de fora. — Tirei a sala de
jantar para fazer uma cozinha grande. Faz parecer mais amplo aqui, —
ele disse, gesticulando para as janelas alinhadas na parede traseira que
deixavam entrar uma tonelada de luz natural e, de fato, fazia com que
sentisse mais amplo.

Também ajudou que ele tivesse escolhido armários brancos,


bancadas de madeira e mais do mesmo piso de madeira recuperado.
Tudo parecia fluir perfeitamente.

Havia uma mesa de café da manhã branca perto das janelas com
quatro lugares e uma cesta de batatas no centro.

Encantador.

Todo o lugar era totalmente encantador.

Era definitivamente o tipo de lugar em que você queria voltar para


casa depois de um longo dia.

Gradualmente ele começou a tirar as compras das sacolas,


colocando as coisas juntas para começar o trabalho de preparação. Fui
até uma coleção de fotos em uma grande moldura na parede que achei
que deveria ter sido dada de presente a ele porque, fala sério, que
homem se senta ao redor de fotografias e as coloca cuidadosamente em
uma grande moldura?

Havia uma foto dele e de seus irmãos quando crianças, cada um


com máscaras de sorrisos em palito de sorvete quase idênticas, cores
escorrendo pelos rostos. Havia outra deles adolescentes, dois deles
ensanguentados, os três restantes feridos. Havia um casal mais velho, a
genética era bem forte em sua família para dizer imediatamente que
deveriam ser os pais. Havia três fotos no meio, cada uma de uma
garotinha diferente. E então três imagens restantes de casais - uma
com Shane, que já conheci, e uma bela mulher de cabelos escuros.
Havia outra com o irmão sério que vi na academia e uma mulher linda e

~ 79 ~
loira com olhos verdes. E, finalmente, havia uma com seu irmão coberto
de tatuagens, juntamente com uma mulher coberta com elas também,
de cabelos loiros, impecavelmente vestida.

Todos, dos pais aos irmãos, todos pareciam felizes com seus
parceiros.

Havia aquela estranha sensação de anseio de novo, enquanto me


obrigava a me afastar, para voltar para a ilha, onde Mark também havia
montado os ingredientes para mim.

— Você é o único irmão solteiro?

— Não. Eli ainda não sossegou. Não sei por que. Ele nunca foi um
mulherengo. Gosta da ideia de esposa e filhos. Simplesmente não
encontrou isso ainda. Ele está namorando alguma garota agora, mas...

— Mas? — perguntei quando ele parou.

— Não quero falar mal de uma mulher que possivelmente poderia


ser minha cunhada um dia, mas ela é desagradável pra caralho.
Ninguém gosta dela.

— Isto é sério?

— Eles só saíram algumas semanas. Não acho que vai durar.


Acho que ele só queria tentar algo menos casual.

Acenei com a cabeça, pegando uma faca e começando a cortar as


maçãs diretamente na bancada, como ele estava fazendo com as
vagens. Definitivamente havia uma vantagem naqueles balcões de
madeira.

— Tudo bem, Scotti. Qual é a sua história?

Quase cortei a ponta do meu dedo.

— O quê?

— Sua história, — ele repetiu quando olhei para ele, encontrando-


o olhando para mim. — De onde você é. O que levou você e seus irmãos
para uma vida de crime? Por que, especificamente, assalto a mão
armada?

Por que ele queria minha história?

Tinha certeza de que estava claro que seja lá o que for que rolou
com a gente, seja lá o que quisesse chamar, era casual. Não poderia ser
sério. Eu estava só ficando. Sempre estaria ficando. Essa era a vida que
~ 80 ~
levamos. Não havia como contornar isso. Não havia como continuar um
relacionamento por isso. Especialmente quando minha última jogada
estava na Rússia ou na China. A única maneira de funcionar seria se o
cara quisesse entrar nisso. E como ele era superligado com sua família,
não havia chance disso. Então, por que se preocupar em tentar
conhecer minha história? Por que tentar trazer à tona todos os meus
segredos e ver como eles pareciam na luz?

— Nós não precisamos fazer isso, — eu disse, tentando ser alegre


e casual, embora sentisse que meu coração iria explodir do meu peito.
— Acho que está claro que essa coisa entre nós é casual. Você não tem
de perguntar sobre minha vida.

— Não, não tenho — ele concordou, levantando as sobrancelhas.


— Mas eu quero.

— Por quê?

— Por que não?

— Isso não é uma resposta.

— Não era uma pergunta, — ele devolveu, quase confuso. — É tão


estranho que alguém queira conhecê-la? Só consegui passar uma hora
ou mais com você e acho que você é fascinante. Você está aqui. Nós
temos tempo. Então gostaria de saber mais. — Quando não respondi
imediatamente porque estava muito envolvida na percepção de que
ninguém além de meus irmãos realmente conhecia minha história, seu
sorriso foi um pouco perverso. — O quê? Preocupada que eu vá dedurar
você ou que estou com uma escuta ou alguma merda? Aqui. Posso
provar. — Então, com isso, ele pegou a camisa e tirou-a.

Eu repito. Ele alcançou as costas dele, agarrou sua camisa,


puxou-a sobre a cabeça e depois a jogou no chão. No chão. O que
parecia implicar que ele não tinha intenção de recuperá-la.

Isso também significava que ele estava sem camisa.

Sem camisa.

Com toda a área do seu peito e do torso em exibição.

E, deixe-me contar, era boa a área do peito e torso.

Primeiro, não tinha notado que ele tinha tanta tatuagem. Mas
com nada o cobrindo, eu podia ver duas nos braços até o cotovelo, uma
no peito e alguma coisa serpenteando pelas costas. Ele, felizmente,

~ 81 ~
deixou toda sua área de estômago livre. O que era bom porque você
realmente podia apreciar os sulcos profundos e recuados de seus
músculos abdominais e os deliciosos (sério, eu queria lamber) os
músculos do cinturão de Adônis que desapareceram na cintura do
jeans.

— Vê uma escuta em qualquer lugar, querida?— ele perguntou,


fazendo meus olhos culpados dispararem como um rubor rastejado
sobre cada centímetro de pele, excitando-me, fazendo o desejo
desencadear-se pelo meu corpo. — Sei lá, posso tirar isso também se
você quiser verificar, — ele sugeriu, mãos indo para o botão e zíper de
seu jeans, sorrindo absolutamente diabólico.

— Isso não será necessário. — A menos que ele quisesse que eu


fizesse uma inspeção prática. Com a minha boca.

Ai Jesus.

— Bem, se você tem certeza, — ele disse encolhendo os ombros


quando apenas voltou a cortar as extremidades das vagens, como se
não estivesse meio nu e totalmente distraído. — Como se eu quisesse
denunciar você. Querida, na segunda-feira passada, segui um cara
chamado Mick Mallard até um beco, onde eu sabia que ele ia na hora
do almoço para ficar chapado, e bati a cabeça dele nos tijolos até
concordar em pagar o dinheiro no final do dia. Então, agora você sabe
alguns podres de mim. Considere isso como uma amostra de confiança.
Agora, tudo o que você precisa fazer é confiar em mim de volta.

Surpreendentemente, na verdade não tinha problemas de


confiança. Não na maneira típica que muitas vezes as pessoas tinham
nos relacionamentos, constantemente preocupadas com coisas tipo
traição ou alguém se entediando com elas e indo embora. Eu era muito
segura para isso.

As minhas questões de confiança tinha origem no fato de que fiz


coisas ilegais e não estava a fim de ir para a prisão por elas. Nem meus
irmãos.

Dito isto, Mark sabia exatamente como isso era para ele ou para a
família dele.

Eu poderia, eu tinha certeza, que podia confiar nele.

— Quando eu tinha nove anos, meu pai caiu morto de um súbito


aneurisma. Nenhum aviso. Sem seguro de vida. Nenhum apoio para a
minha mãe dona de casa com cinco filhos.

~ 82 ~
Lembrei-me da devastação, com certeza. Era algo que todos
sentimos, algo que todos experimentamos, cada um à sua maneira.
Mas, por algum motivo, lembrei mais do pânico. Lembrei-me dos olhos
ferozes quando ela olhava para uma parede ou para uma pilha de
correspondência. Lembrei-me da forma como, do dia para a noite, seu
rosto jovem e adorável ficou dez anos mais velho e afundado. Lembrei-
me das ligações completamente desesperadas para todas as empresas
locais, de todas as tardes depois da escola quando ficávamos sentados
na parte de trás da van fazendo lição de casa enquanto ela fazia
entrevistas. Lembrei-me da forma como ela levava uma calculadora
para a mercearia e teria que escolher entre o sabão para roupa e as
toalhas de papel. É por isso que temos tantos panos de prato! Além
disso, é melhor para o meio ambiente! Mesmo para uma menina de nove
anos, esse entusiasmo parecia falso.

Porque, veja, as empresas nunca ligaram de volta.

Afinal, ela se formou no ensino médio e engravidou quase


imediatamente. E então, novamente. E de novo. E de novo. E de novo.
Mas não importava porque meu pai ganhava muito dinheiro e ela
poderia se concentrar em nos criar.

Mas também significava que ela não tinha absolutamente


nenhuma experiência profissional.

Nada.

Zero.

Tentando conseguir um emprego pela primeira vez no final dos


trinta anos foi, bem, quase impossível. Pelo menos, se você quisesse
ganhar um salário real para poder viver.

Mas três meses depois que nosso pai foi enterrado, ela finalmente
recebeu uma ligação. Então, três dias depois do teste de droga, ela teve
um emprego.

Ganhando sete dólares por hora.

Com outras cinco bocas para alimentar.

No entanto, era o melhor que podia fazer. Então vendemos a casa


e nos mudamos para dois quartos, eu e minha mãe em um, todos meus
irmãos no outro. Cortamos tudo o que poderia ser considerado um luxo,
como roupas escolares novas a cada outono que antes sempre foi uma
tradição. Natal ficou um pouco mais miserável sem os presentes. Não
havia dinheiro para o sorveteiro ou almoço escolar.

~ 83 ~
Mas as luzes ficaram e nunca passamos fome.

As coisas ficaram bem por um longo tempo.

Kingston ficou adulto e mudou-se. Seguindo-o, Nixon e Atlas


também mudaram. Até que era só eu, minha mãe e Rush em casa.
Rush nunca estava mesmo em casa, então eu ficava sozinha na maioria
das vezes.

— E fui eu quem primeiro notou que o resfriado que a mãe tinha


simplesmente não parecia ir embora, talvez não fosse apenas um
resfriado.

— Merda, — disse Mark em voz baixa, os olhos tristes por mim.

— Veja, embora seu trabalho fosse bastante decente, eles


mantiveram suas duas horas em tempo integral para que não tivessem
que pagar seus benefícios. Felizmente, todos nós... ficamos
relativamente bem. Ninguém nunca teve que ir ao médico, nem sequer
lhe ocorreu ir. Mas então ela continuou a perder peso, depois a voz
dela. E finalmente... começou a tossir sangue. Câncer de pulmão,
estágio três. Ela e meu pai fumaram casualmente quase toda a minha
infância. Do lado de fora, mas eles fizeram isso. E então, quando ele
morreu, ela fumou muito. Isso... trouxe consequências a ela. Ela foi
para sua empresa e implorou para a colocarem em tempo integral e
conseguir o seguro, para tentar compensar os custos. Mas era uma
condição pré-existente. Ninguém queria ficar com ela.

— Scotti...

Ele tentava me dizer que eu não precisava continuar. Mas o lance


era que eu precisava. Porque, me dei conta que nunca coloquei isso
para fora antes. Meus irmãos apenas... sabiam o que estava rolando.
Nunca consegui me libertar disso em um ouvido amigo.

— Mas ela começou o tratamento. Eu acho... você sabe... ela


tinha muito para viver. Ela começou a químio e continuou trabalhando
e tentando cuidar de todos nós. Parecia que estava melhorando. Então
ela teve uma consulta em que o médico lhe disse que estava ficando
mais agressivo, e, por sua vez, o tratamento precisava se tornar mais
agressivo. Mas ela já estava com dívidas. Nós não sabíamos o quanto
então. Não descobrimos até depois que ela morreu. Era meio milhão de
dólares. E então ficou muito doente para trabalhar. Ela morreu apenas
algumas semanas depois, — disse, com uma voz um pouco espessa. —
Não soubemos até depois de morrer que ela recusou o tratamento,
sabendo que não ajudaria, apenas prolongaria sua vida... e a dívida.

~ 84 ~
Mark colocou a faca, observando-me com um olhar que não
conseguia ler, mas era intenso. — Aposto que posso adivinhar para qual
empresa de merda ela trabalhou.

Eu assenti com isso.

— Nós éramos jovens, estávamos devastados e sozinhos no


mundo e tão zangados o tempo todo. Nunca houve nem um descanso
dessa raiva. Uma noite, estávamos sentados, trocando algumas ideias
de vingança contra uma empresa que não valorizava seus funcionários
o suficiente para tentar ajudar a mantê-los vivos. E isso apenas...
surgiu para nós. Todos nós... sabíamos que queríamos que eles
pagassem. Que eles tinham que pagar cada último centavo do dinheiro
que a fez decidir oferecer sua vida em vez de ter que pagar mais.

— Você não poderia ser mais do que uma criança.

— Eu tinha dezoito anos. Na verdade, no dia em que fiz dezoito


anos entrei na antiga loja da minha mãe e consegui um emprego.
Então, Rush conseguiu um. E Atlas. Então, Nixon. Finalmente, uma vez
que ele teve tempo, Kingston. Cada um de nós trabalhava em
departamentos diferentes. Todos nós prestávamos atenção. Aprendemos
como funcionavam as entradas e saídas de caixas, como faziam o
sistema de segurança. Quando o dinheiro caia. Quando a mudança de
turno acontecia. Tudo. Cada pequeno detalhe aparentemente
inconsequente Então, lentamente demos o fora ao longo de vários
meses, ninguém suspeitou. E então nós os roubamos.

— Vocês não poderiam ter conseguido tanto.

— Apenas tímidos cinco mil pela primeira vez. Mas para nós, isso
foi muito.

— E daí?

— Daí saímos da cidade. Fizemos as malas e juntamos nosso


dinheiro. Escolhemos outro alvo e começamos a trabalhar lá. Tomar
banho, enxaguar, repetir2. Dez anos. Ainda não recuperamos tudo.
Alguns golpes foram muito menores do que o esperado. Mas estamos
perto.

— E depois?

— Depois, dar o fora daqui antes que qualquer coisa mais cedo ou
mais tarde nos denuncie. Quero dizer, somos cuidadosos. Identidades

2 Do original shower, rinse, repeat. A personagem faz referência a um antigo comercial de televisão para
xampu. Na cultura americana, é adicionado a frases em que algo é feito repetidamente (N.T.)

~ 85 ~
falsas até o fim e todos os meus irmãos usam narizes protéticos ou
tatuagens falsas ou cicatrizes falsas durante assaltos, apenas o
suficiente para despistar qualquer coisa que pareça semelhante.
Algumas vezes, só teremos um de nós agindo. Às vezes, sou a única a
gritar e atirar. Tentamos ser originais.

— Sair daqui, para onde?

— Estamos pensando na China ou na Rússia.

— Não há extradição.

Não era algo que as pessoas normais conheciam.

De alguma forma, achei reconfortante que ele soubesse disso.

Isso me fez sentir menos uma aberração por saber disso também.

— Exatamente.

— Então, isso é tudo o que você conhece desde que sua mãe
morreu? A estrada, o planejamento, vivendo inseguros.

Respirei fundo, segurando até queimar, depois soltei lentamente.


— Praticamente.

E isso nunca pareceu tão patético quanto naquele momento.

Esperava mais perguntas, mais seriedade, aparências mais


tristes.

Mas acho que, quando se tratava de Mark Mallick, não tinha


como prever o que você ia ganhar.

Porque a próxima coisa que saiu de sua boca foi — Então você vai
assar essas fodidas coisas ou vou ter de comê-las cruas? Não é que não
vou comer, mas acho que ficarão melhores assadas.

Então, como se nada tivesse acontecido, como se minhas


entranhas não caíssem cruas e molhadas pelo chão, ambos começamos
a cozinhar. E não era estranho. O silêncio não era desconfortável.
Apenas parecíamos um casal normal fazendo algo que faziam todas as
noites.

Exceto que não éramos normais.

Não éramos um casal.

E nós provavelmente nunca mais faríamos isso de novo.

~ 86 ~
Esse último, sim, trouxe consigo uma tristeza que era muito
intensa.

— Tudo bem, — ele disse abruptamente, fazendo-me começar.


Meus olhos se afundaram para encontrá-lo de pé ali com um prato de
bife cru em uma mão e uma pinça de metal na outra. — Tenho que
fazer a coisa de churrasco de macho. Sinta-se livre para me comer com
os olhos através da janela de trás.

Eu ri daquilo, descobrindo como isso vinha com facilidade para


ele. — Ou eu poderia arrumar a mesa.

— Bem, isso não é tão divertido, — ele disse, encolhendo os


ombros, desaparecendo pela porta dos fundos.

Eu arrumei a mesa.

Mas também o olhei.

Ele mesmo me pegou fazendo isso, enviando um sorriso


descarado em troca.

— Por que estamos comendo tão cedo? — Perguntei quando vi o


relógio digital no forno enquanto retirava as sobremesas.

— Você quer a resposta politicamente correta ou a honesta?

Minha cabeça girou sobre meu ombro, sorriso surgindo em meus


lábios. — A honesta.

— Quero você bem alimentada para te foder nas próximas seis


horas.

Bem, então.

Isso respondia, não é.

— Com uma pequena pausa para flores de maçã, — ele alterou,


alcançando meus dedos e dando-lhes um pouco de aperto. — Vamos,
vamos comer.

Então nós comemos.

E fingi que não estava pressionando minhas coxas juntas para


acalmar o desejo que pulsava lá enquanto falávamos sobre pequenas
coisas, os lugares onde estive, quais filmes gostamos, música, seus
trabalhos, suas sobrinhas que pareciam adoráveis como infernos, o
filhote de cachorro de seu irmão mais novo, sua história como... líder de
torcida?
~ 87 ~
— Calma, calma, calma, — eu disse, praticamente engasgando
com um pedaço de carne meio mastigado com tanta pressa para falar.
— De jeito nenhum. Você não pode apenas dizer que foi líder de torcida
e passar isso batido. Explique-se.

Ele sorriu, pegando uma cerveja que estava cuidando desde que
nos sentamos. — Minha mãe nos forçou a fazer todas as atividades
extraclasses. Por toda a nossa vida. Acho que tentando nos manter fora
de problemas. O que não adiantou nada. Mas de qualquer forma, no
ensino médio, tudo o que queria saber era qual seria a próxima garota
que eu ia correr atrás. Desperdiçar inúmeras horas por semana no
campo de futebol ou de beisebol ia foder com o meu estilo.

— Então, nada melhor que juntar o útil ao agradável?

— Exatamente, — ele concordou, sorrindo, fazendo com que seus


olhos se enrugassem de forma encantadora. — Passei todo o treino
pegando, jogando, pegando e carregando as mulheres mais lindas da
escola. Foi um bom exercício.

— E você teve bons momentos.

— Isso eu tive, — ele concordou, recostando-se na cadeira e me


observando.

— O que queria ser quando estava no ensino médio, querida?

— Principalmente... dar o fora do ensino médio. Além disso,


nunca tive essa coisa que algumas pessoas têm, sabe? Aquele sonho ou
paixão. Achei que me formaria, faria algum programa do tipo
profissional e apenas arrumar algum emprego normal. Agora, foda-se se
souber no que sou qualificada.

— Trabalho de segurança privada, — ele sugeriu imediatamente,


como se sequer tivesse pensado nisso. — Você e seus irmãos. Vocês
saberiam exatamente quais pontos fracos os criminosos procurariam.

— Porque somos criminosos, — completei, não com raiva ou


ofendida, mas com uma sensação de desconforto por ele me ver dessa
maneira. Por quê? Não tinha certeza, pois era exatamente o que eu era.

— Porque essa é a especialidade de vocês. Suas habilidades. É o


que vocês conhecem.

Com o humor um pouco menos entusiasmado do que um


momento antes, levantei-me e peguei ambos os nossos pratos. — Bem,
vou ter que ver se na China ou na Rússia tem oportunidades de

~ 88 ~
trabalho nesse campo, — disse enquanto caminhava em direção à pia,
abrindo a torneira e pegando o sabão.

Quase não consegui ensaboar a esponja quando vi suas mãos


planearem largamente nos lados da pia e senti sua frente pressionada
nas minhas costas, com a cabeça apoiada no meu ombro.

— Que botão pressionei?

— O quê? — perguntei, fingindo inocência quando todos nós


sabíamos que eu sabia do que ele estava falando.

— Pressionei um botão. Não sei qual é, mas quero saber para não
pressioná-lo novamente.

— Não é grande coisa.

— Dois minutos atrás você estava me olhando como se quisesse


que eu te jogasse na mesa e te comesse como sobremesa. — Ele não
estava errado e ele ter visto isso em mim fez um pequeno
estremecimento de antecipação correr através de mim. — Agora, você
nem quer olhar para mim. Então acho que é uma fodida e grande coisa.
— Suas mãos deslizaram através da bancada e pousaram nos meus
quadris, parando antes de cruzar sobre minha barriga e me dando um
aperto. — O que eu fiz?

— Você não fez nada. É só... é estúpido.

— Sim, pode ser, — ele concordou, me fazendo rir apesar do meu


humor. Tive que apreciar um homem que não adoçava tudo. — Ainda
quero ouvir isso.

Respirei fundo, olhando para minhas mãos com sabão, me


sentindo desconfortável. — Não gosto que você pense em mim como
uma simples criminosa.

Houve uma pequena pausa. — Não me lembro de dizer nada nem


mesmo parecido com isso. — Isso realmente era verdade. Acabei de
distorcer suas palavras para apoiar ainda mais minha insegurança.
Como isso era patético. — Não estou julgando você, Scotti.
Especialmente agora que sei por que vocês fazem isso. Eu espanco as
pessoas e nem tenho nada como sua desculpa. Você pensa em mim
como um simples criminoso?

— Não.

— Então percebe como está sendo um pouco boba, certo?

~ 89 ~
— Boba?— Eu repeti, sorrindo apesar de mim mesma. Que tipo
de homem adulto usava a palavra “boba”?

— Completamente louca fica melhor para você? — ele perguntou


quando virou o rosto no meu pescoço para pousar um doce beijo sob
minha orelha.

— Sim, isso soa mais como eu, — concordei, recostando-me um


pouco sobre ele.

Será que a porra da noite poderia começar?

Agora que parei de pensar bobagens, notei como era bom sentir
seu corpo forte atrás do meu, seus braços me segurando forte.

— Os pratos podem esperar, certo? — ele perguntou.

— Sim, — concordei, deixando cair a esponja e deixando a água


enxaguar os dedos quando ele esticou para desligar a torneira.

Um segundo, eu estava encostada em seu peito, no seguinte,


estava girando tão rapidamente que meu estômago agitou e soltei um
suspiro silencioso antes de me sentir pressionada contra a ilha. Suas
mãos agarraram os meus quadris e me puxaram para cima, levantando-
me completamente para me acomodar no topo da ilha enquanto ele se
abaixava de joelhos.

No meu olhar confuso, ele encolheu os ombros. — Tenho a


sensação de que esses malditos sapatos vão impedir o jeans, — ele
explicou quando puxou os cadarços. Ele tirou um, depois foi para o
outro.

Assim que livrou meus pés das meias pretas, seu dedo se moveu
para massagear a sola de meu pé, que, para uma mulher normal,
poderia ter sido um pouco - ou descontroladamente - erótico, mas para
mim era tortura. Porque eu, sim, eu tinha ridiculamente cócegas em
lugares estranhos como meus pés e minhas costelas. Então, não havia
como segurar a risada que gritava, soltei-me enquanto meu corpo
inteiro sacudiu, fazendo com que o olhar de Mark se levantasse para o
meu, fazendo meus olhos se arregalarem. Porque eu conhecia esse
olhar. Era o mesmo que meus irmãos fizeram quando perceberam pela
primeira vez que poderiam usar isso contra mim em uma briga. — Fala
sério, — ele disse, os dentes brancos piscando por toda parte.

— Não,— eu exigi, presa, completamente incapaz de escapar.

~ 90 ~
— Não o quê? Não faça... isso? — perguntou, agarrando meu
tornozelo, puxando-o para cima enquanto ele estava de pé e indo para a
minha sola. Até que eu estivesse perdendo o fôlego enquanto
inutilmente golpeava suas mãos, até estar deitada de costas,
implorando que ele parasse.

Então ele soltou meu tornozelo e suas mãos afundaram em meus


joelhos, empurrando-os abertos, avançando e curvando-se sobre mim.

— Você não vale nada, — declarei, tentando recuperar o fôlego


enquanto ele sorria para mim.

— Mhmm, — ele concordou em um estrondo, inclinando-se e


pressionando seus lábios na minha garganta, deixando minha mente
completamente em branco num piscar de olhos. — Pense que posso
fazer você mudar de ideia em relação a isso, — ele declarou deslizando
sua língua pela coluna da garganta. — O que acha?

Pensar?

Nem tinha certeza se era capaz de pensar. Pelo menos nada que
não envolvesse o caos percorrendo-me ao seu toque.

— Acho que vou ter que te mostrar, — ele argumentou,


levantando-se ligeiramente, em seguida, alcançando a bainha da minha
camisa e arrancando-a em um movimento rápido, jogando-a no chão,
onde foi esquecida em algum lugar.

Seus dedos pousaram perto de minhas costelas, as pontas de


seus dedos roçaram a beira do meu sutiã, enquanto se inclinava para
pousar um beijo logo abaixo do umbigo, me esmorecendo com isso.
Então, lentamente arrastou-se para cima, fazendo com que os músculos
do meu estômago estremecessem sob a atenção, fazendo meu coração
disparar e minha pulsação bater em lugares incomuns – em meus
pulsos, em minhas têmporas, em minha garganta, entre minhas pernas
onde meu desejo fazia minha calcinha espetar minha pele com
necessidade.

Sua língua lambeu sob a linha do meu sutiã, fazendo-me arquear


na bancada, deixando seus dedos escorregarem para trabalhar o fecho.
Sua mão se moveu entre nós, liberando meus seios do tecido e depois o
descartando também. Uma de suas mãos encaixou-se sob a curva
inferior de um dos seios, quase com reverência durante um longo
segundo, antes de fechar-se sobre ele e apertá-lo, enquanto sua boca
sugava meu outro mamilo, excitando-o com círculos. Um gemido baixo
e dolorido emergiu de algum lugar profundo dentro de mim, o som

~ 91 ~
desesperado e suplicante. Ele levantou e tomou posse do meu outro
mamilo até que a pressão sobre a minha barriga se tornasse
extremamente dolorosa, o desejo entre minhas coxas intolerável, e
afundei minhas mãos em seus cabelos, puxando forte até que ele se
levantou e selou seus lábios sobre os meus.

Minhas mãos ávidas se moviam em suas costas, apertando os


fortes músculos de seus ombros. Minhas pernas levantadas, fechando
ao redor dele, cruzavam a parte inferior das costas.

Então, incapaz de me controlar, dominada pela necessidade de


liberação, meus quadris levantaram-se para encontrá-lo, exigindo
satisfação, mostraram-lhe o quanto eu precisava que ele fizesse isso
para mim.

E embora ele me deixasse esfregar nele, mesmo se afundando em


mim para seu pau duro me pressionasse exatamente onde eu precisava,
isso era tudo o que ele me daria quando seus dentes prenderam meu
lábio inferior, mordendo. Quando um gemido saiu de mim, sua língua
avançou para atacar a minha, atormentando-me ainda mais.

Quando pensei que não seria capaz de aguentar mais, suas mãos
deslizaram sob minhas costas arqueadas, cruzando-me, segurando-me
apertado enquanto ele se endireitava, puxando-me e levantando-se
comigo enrolada ao seu redor. Um de seus braços ficou no meio das
minhas costas, o outro vagou para baixo até afundar em minha bunda,
segurando-me, quando ele começou a caminhar pela cozinha, depois
pela sala de estar.

Meus lábios se afastaram dos dele, querendo deixá-lo tão louco


quanto eu estava naquele momento, meus lábios, língua e dentes
atormentando seu pescoço enquanto ele subia as escadas até o segundo
andar.

Não saberia dizer como era o corredor, onde ficava seu quarto,
como era o piso, se havia uma suíte. Tudo o que sabia era que sua pele
cheirava a uma pitada de gel de banho e fumaça da churrasqueira, e
sua pele parecia estar superaquecida como a minha, e sua respiração
não estava tão controlada quanto eu pensava, indicando que ele estava
se segurando para se manter no controle.

Mas não o queria no controle.

Queria-o tão selvagem, tão frenético, tão desesperado quanto eu.

~ 92 ~
Então, assim que senti o minha bunda encostar-se na cama,
soltei-me dele e pulei para fora da cama, ajoelhando-me diante dele e
alcançando a cintura do jeans. Eu o soltei e me aproximei para agarrar
seus jeans e cueca boxer, minha cabeça inclinando-se para cima para
encontrá-lo olhando-me, intenso e pesado. E isso, essa desejo, era tudo
o que eu precisava quando suas calças caíram e seu pau duro
finalmente apareceu. Minha mão avançou para envolver o rígido
comprimento macio e aveludado, parando na base assim que me
inclinei, movendo minha língua provocativamente na cabeça,
observando seus olhos. Meu sexo apertou ao som de sua respiração
sibilando entre seus lábios, me animando.

Eu o chupei profundamente, ouvindo uma maldição enquanto o


levava quase até a base, forçando meu reflexo de vômito a diminuir.
Acariciei suavemente suas bolas, excitando-o com toques rápidos e
implacáveis de minha mão e minha boca, fazendo um movimento de
torção a cada toque íntimo.

Houve uma sensação afiada e dolorida no meu couro cabeludo


quando sua mão avançou para frente e agarrou forte. Sua outra mão foi
no meu ombro, apertando-me com força suficiente para deixar marcas.
Cada pedaço daquela intensidade me fez ir mais rápido, fez-me fazer
barulhos devassos enquanto eu o sugava, dando-lhe sequer uma noção
da necessidade de liberação que eu sentia arranhar profundamente em
meu interior.

— Porra, baby, — ele resmungou, puxando meus cabelos para me


fazer parar. Houve um som baixo, infeliz e queixoso quando seu pau
deslizou fora da minha boca, constatando, talvez pela primeira vez na
vida, o quanto eu queria dar prazer, talvez até mais do que queria
encontrar o meu. E ele tirou essa chance de mim. — Você pode ter meu
pau sempre que quiser, Scotti, — ele me disse, sua mão soltando meus
cabelos para correr um dedo em minha mandíbula. — Mas parece que
perdi a sobremesa. E, bem, estou com fome, ainda com fome.

Com isso e nada mais, levantou-me, enquanto ele se abaixava,


desabotoando minhas calças, em seguida, deslizando-as com minha
calcinha pela minha bunda, quadris e coxas, fazendo-me pela primeira
vez amaldiçoar meu amado jeans justo e como ele se agarrava
carinhosamente em cada curva reconhecidamente discreta que eu
possuía. Tropecei desajeitadamente enquanto trabalhava para libertar
meus pés, fazendo minhas mãos caírem em seus ombros para me
estabilizar por um longo momento antes dele me empurrar de volta para
a cama.

~ 93 ~
Ele não perdeu tempo nos meus seios ou na barriga novamente.

Nem quis me provocar mais.

Espalhou minhas coxas, segurando-as firmemente contra a cama


e malditamente me devorou. Sua língua deslizou na minha fenda lisa,
reivindicando meu clitóris por um curto segundo antes que seus lábios
o sugassem, usando uma sucção pulsante que me fez perguntar se era
possível gozar rápido. Então, quando o prazer estava quase perto de
uma dor, ele me liberou, levando sua língua abaixo para curvar e então
empurrar dentro de mim enquanto seus olhos se levantavam para me
olhar.

— Oh, meu Deus. Oh, meu... oh... — gritei enquanto ele voltava a
sugar meu clitóris ao mesmo tempo em que seu dedo empurrava para
dentro, curvando-se e varrendo meu ponto G, e enviando um orgasmo
cegante e intenso pelo meu corpo. Ele fez um ruído baixo de grunhido
enquanto continuava me excitando, prologando, tirando o máximo que
conseguia.

Eu mal tinha voltado quando senti suas mãos esmagarem em


meus lados, levantando-me e jogando-me no meio da cama enquanto
ele subia, sentando-se sobre os tornozelos, pegando um preservativo e
fez um trabalho rápido para nos proteger.

Ele me encarou tempo suficiente para lentamente me curvar para


cima, quase escalando seu colo, sentindo seu pênis pressionar de forma
promissora a minha barriga, enquanto meus braços se espalhavam pelo
pescoço. — Foda-me, — eu disse enquanto ele continuava olhando para
mim. — Mark...— gemi, alcançando entre nós, agarrando seu pênis e
trazendo-o para onde eu precisava dele, depois afundando meus
quadris sobre ele, sentindo-o pressionando-me, esticando-me, fazendo-
me dele. — Por favor, — pedi com um gemido quando ele me abaixou.

Sua mão apoiou minhas costas por trás, inclinando-me o


suficiente para eu conseguisse me preparar com meus braços apoiados
atrás de mim, meus quadris ainda em seu colo. Sua outra mão se
deslocou para o meu quadril, afundando-se com força, usando-o para
me guiar quando ele começou a empurrar, lentamente por um segundo,
então mais rápido, completamente além de qualquer restrição.
Sentindo-me da mesma forma, empurrei contra ele enquanto ele
empurrava contra em mim, levando-o profundamente, ajudando-nos a
aproximar-nos do esquecimento.

Meus gemidos tornaram-se tão altos até para meus próprios


ouvidos quando meus braços começaram a tremer debaixo de mim da
~ 94 ~
posição e pressão estranhas. O braço em volta da minha parte inferior
das costas apertou-me, levando-me bruscamente para ele, depois me
jogando de volta, sem perder contato. Suas mãos deslizaram pelas
minhas costas para agarrar meus ombros por trás, segurando-me
completamente no lugar, enquanto ele me fodia com mais força, mais
rápido, até que meus gemidos se tornassem algo parecido com gritos, o
aperto no fundo prometendo um orgasmo que faria tudo antes pequeno.

— É isso, — Mark rosnou, observando-me. — Goze para mim.


Deixe-me sentir você apertar meu pau, baby.

Essas pequenas palavras atrevidas eram o último impulso que eu


precisava.

Seu pênis bateu dentro de mim e me estilhacei com um orgasmo


que parecia começar na base da espinha e explodia para fora.

Gritei seu nome, o rosto enterrado em sua garganta, sentindo-o


me foder, sua própria respiração ficando esfarrapada, maldizendo
violentamente antes de bater com força, apertando o corpo, gozando
com meu nome em seus lábios.

Seu peso se colapsou em mim, pressionando-me mais


profundamente no colchão, fazendo da respiração mais um desejo e
uma oração que uma realidade. Mas não importava.

Meus braços deslizaram ao redor de sua parte superior das


costas. Minhas pernas enroladas ao redor de seus quadris.

E eu simplesmente... o segurei.

Porque sabia que não teria tempo. Na ordem natural das coisas,
apenas alguns minutos com ele. Então iria segurá-lo enquanto eu o
tinha. Para mim enquanto eu o tinha.

Mas não poderíamos ficar assim para sempre.

Mark provou isso apenas alguns minutos depois, quando ele


plantou as mãos, tirando um pouco de seu peso, e puxando-me para
segurar-me, para que ele pudesse flexionar e olhar para mim.

Os seus olhos estavam intensos por um momento, completamente


ilegíveis.

Mas então um sorriso lento, perverso e travesso surgiu em seus


lábios.

— Acho que fiz isso com você.

~ 95 ~
— Fez o que comigo?— Perguntei entorpecidamente, o cérebro
completamente coberto com uma satisfação pós-orgasmo que fazia tudo
o mais distorcido.

Uma risada rolou através de seu peito, vibrando pelo meu corpo.
— Adivinha o que isso prova, — ele disse, levantando um pouco,
encontrando resistência enquanto eu o abraçava mais apertado. —
Deixe-me levantar, querida. Tenho que lidar com o preservativo, — ele
me informou, fazendo-me soltar um grunhido quando minhas pernas se
desdobraram e caíram pesadamente sobre o colchão. Meus braços o
libertaram em seguida e ele rapidamente se flexionou, rolando para sair
da cama, afastando-se de mim em direção a uma porta ao lado do
quarto, fechando-a depois que entrou.

Eu não queria ficar sozinha naquele momento. Nem mesmo por


um minuto. Porque minha cabeça começaria a pensar no que sabia que
não deveria. E ela disparou a pensar. Parecia disparar em uma centena
de direções ao mesmo tempo, completamente frenética, mas de alguma
forma as informações ainda eram claras e nítidas e repletas de
felicidade, medo, excitação e preocupação.

Porque não importava como eu me sentia bem naquele momento,


e talvez tenha sido melhor do que nunca antes, era fugaz. Em algum
breve momento, talvez em apenas mais um dia, talvez uma semana,
mas não mais, tudo desapareceria. Mark seria uma figura
desaparecendo no meu retrovisor.

As poucas horas de satisfação, de felicidade, não seriam senão


uma lembrança que eu tentaria esquecer no início. Porque se eu me
lembrasse, isso me deixaria irritada e amarga por ter que perder uma
chance de uma vida diferente daquela que escolhi para mim. No
entanto, isso desapareceria mais cedo ou mais tarde. Isso se tornaria
um sonho acordado que eu invocaria nas pequenas horas da noite em
alguma casa alugada onde estivesse compartilhando com meus irmãos,
depois de um longo dia do mesmo material antigo pelo qual tenho
passado por uma década, em uma missão que, embora fosse
justificada, ainda era de alguma forma vazia. Naquele momento,
naqueles momentos de trabalho pesado, de descontentamento, de
desejo profundo por algo mais, era quando eu iria trazê-lo, eu o rodaria
como um vídeo, rebobinando e reproduzindo cem vezes as minhas
partes favoritas.

Estava preocupada com o fato de que partes dele se desfocassem


ao redor das bordas desbotadas pelo tempo. Esquecerei o timbre exato
de sua voz? As palavras que ele disse que fizeram minha barriga

~ 96 ~
balançar? A intensidade com que ele me olhou? O sentimento de
possessividade que tive ouvindo-o gozar com meu nome em seus lábios?

Tudo isso perderia seu impacto?

Será que eventualmente não passará de um filme silencioso


embebido em um tom tonificado e fraco?

Haveria um dia em que o nome Mark Mallick não significaria


nada?

De alguma forma, houve uma sensação cortante e perfurante só


de pensar nisso.

— Que olhar profundo, — disse Mark de repente, fazendo-me


pular e me virar para encontrá-lo de pé ao lado da cama, de alguma
forma entrando sem que eu ouvisse. — Você está bem? — perguntou,
um pequeno vinco entre as sobrancelhas.

Forcei um sorriso que sabia que não era convincente e deslizei na


cama, alcançando para escorregar sob as cobertas. — Sim, tudo bem.
Apenas frio. — Exalei com força, deixando cair minhas mãos nos meus
lados e olhando ao redor. — Oh, uau, — disse, um verdadeiro sorriso
surgindo em meus lábios. — Não tive a chance de olhar ao redor antes.

O sorriso de Mark era diabólico quando ele deslizou comigo,


alcançando-me, puxando minhas costas contra seu peito. — Sim, você
estava um pouco ocupada adorando meu pau para perceber a
decoração.

A risada era genuína e muito necessária quando as pontas dos


dedos começaram a passar para cima e para baixo em meu braço, seu
outro braço com um peso sobre minha barriga. — Você realmente é
bom no que você faz.

— Fazendo você gozar? Sim, baby, eu sou a porra de um


profissional se o jeito que sua boceta me apertou era alguma indicação.
Ah, você quer dizer na decoração, — ele acrescentou, soando leve e doce
e despreocupado.

Quase bastou para me fazer sentir da mesma maneira.

Quase.

Ele definitivamente era bom no lance do orgasmo. Mas também


não lhe faltavam habilidades de decoração.

~ 97 ~
O quarto não era um espaço enorme, considerando a pequena
casa em geral. Mas os pisos eram como os do andar de baixo. As
paredes eram de um chocolate profundo. A cama de madeira era
enorme de tamanho king-size, encantadoramente amassada em
lugares, mas bonita. Descobri que gostava desse estilo de decoração.
Ele parecia não gostar do novo e brilhante. Preferia peças com um
passado, com personalidade, com uma história a contar. Não havia TV,
um pouco surpreendente para mim, e um muito peculiar conjunto de
criados e cômodas de madeira escura.

— Onde você comprou esses? —perguntei, fazendo um gesto para


a longa cômoda em frente à cama ao lado da porta do corredor.

— Meu irmão Hunter, aquele coberto de tatuagem, ele é tatuador,


mas faz móveis por diversão. Acontece que ele também leva jeito com
isso. Quando tem tempo, uso-o para construir algumas merdas para as
casas que reformo.

— Ele tem um cartão de visita? — Perguntei, sabendo que nunca


conseguiria uma peça original de Hunter Mallick. E em nenhum
momento, visto que estaria a meio mundo de distância.

E havia aquele medo novamente.

Mas desta vez não tinha nada a ver com a conclusão de uma
missão de uma década, com a preocupação com novos costumes, em
aprender novas línguas, em encontrar emprego remunerado.

Não, isso era completamente diferente.

Então, antes que ele pudesse dizer algo que tornasse esse
sentimento mais profundo na minha alma, virei-me para encará-lo,
passando minha mão sobre a tatuagem de seu braço. — Ele fez todo
esse trabalho em você?

— Algumas coisas, — ele disse. Na minha sobrancelha levantada,


ele encolheu os ombros. — Hunter sumiu alguns anos atrás. Ele não
queria mais o estilo de vida, mas não pensou se havia uma saída. Então
simplesmente foi embora sem dizer nada. Foi quando conheceu Fee, na
verdade. Mas, de qualquer maneira, sim, durante esse período, fiz
algum trabalho com outro cara por aqui chamado Paine.

— Espere, — eu disse, sorrindo, observando enquanto ele sorria


de volta. — Um tatuador chamado Paine3?

3 Paine, em inglês, significa dor, aflição (N.T.)

~ 98 ~
— Sim. Também é seu nome de batismo. Ele fez esse braço, — ele
disse, gesticulando. — E as minhas costas. O resto disso é Hunt.

— Este é o seu brasão de família? — perguntei, nem precisava


responder, já que tinha o nome de sua família lá, juntamente com
suportes de penas vermelhas, uma crista de Phoenix e o lema da família
no topo. — Vis nescia vinci? — repeti, querendo a tradução, querendo
todos os pequenos pedaços dele, que eu poderia dobrar em minhas
memórias como uma flor pressionada nas páginas de um diário para
ser retirada anos mais tarde, levando-a até o nariz como se houvesse
algum rastro da memória real deixada ali. Não haveria. Eu sabia. Mas
queria mesmo assim.

— Poder que desconhece a derrota, — Mark forneceu facilmente.

— Esse é o lema para viver, hein?

— Parece que você está questionando meus músculos, — ele


disse, fingindo estar ofendido. — Tenho músculos enormes, —
acrescentou, flexionando um braço.

— Sim, enormes, — concordei, acariciando-o, sorrindo o tempo


todo.

— Então, não quero arruinar o momento, mas, ah, quero uma


maldita flor de maçã.

Ri inclinando-me para pressionar um beijo rápido em seus lábios


antes de rolar para o lado da cama. — Nós vamos ter que reaquecê-las.
Elas são muito melhores quando acabam de sair do forno.

Com isso, ambos vestimos nossas roupas, metade no quarto,


metade no meio da cozinha, onde o resto das nossas roupas ficou.
Comemos muitas flores de maçã falando sobre nossas famílias,
comparando nossos irmãos, criando vínculos muito mais do que era
inteligente, já que não duraria muito em Navesink Bank.

No final, essa constatação me fez deixar de lado a oportunidade


de voltar para o quarto. — Acho que tenho de voltar antes de
começarem um grupo de busca. Acredite, eles são capazes de fazer isso.

— Certo, também não quero me tornar inimigo deles, acho.


Vamos levá-la para casa.

A viagem e o silêncio que nos envolveu durante a volta eram


estranhos.

~ 99 ~
— Ei, — ele disse quando fui abrir minha porta, deslizando um
braço em meus ombros e me puxando de volta para ele, fazendo meu
estômago pressionar contra o console central. — Nem vai me dar um
beijo pelo jantar e dois orgasmos?

Eu sorri para isso, gostando de como ele poderia se transformar


ao redor de momentos desconfortáveis. Então, antes que eu pudesse
arruinar isso também, ele me puxou apertado e selou seus lábios sobre
os meus.

Então, me beijou como se não houvesse um amanhecer amargo.


Saí da caminhonete e subi o caminho com uma espécie de
atordoamento.

Ouvi sua caminhonete dar a volta quando estiquei o braço para


abrir a porta dos fundos, respirando profundamente para me preparar
para o provável interrogatório.

Exceto que isso não aconteceu.

Porque quando abri a porta e entrei, encontrei o barraco limpo,


cheirando fortemente água sanitária e desinfetante. E encontrei meus
quatro irmãos de pé lá, esperando por mim, malas de lona nas mãos.

— O dinheiro está limpo, — Kingston informou, me dando um


olhar arrependido.

— É hora de ir, — acrescentou Nixon.

Era hora de ir.

Mas, assim como não havia como negar a forma que essas
palavras enviavam uma severa dor através do meu corpo, também não
havia como negar a verdade delas.

Era hora de ir.

~ 100 ~
Oito
MARK

— Como assim ela se foi? — Eli perguntou, sentado na minha


varanda dos fundos, jogando obedientemente uma bola de tênis
amarela para Coop, que, como acabou se descobrindo, não era apenas
feio e difícil de treinar, mas absolutamente cheio de energia inquieta. Eli
tinha começado a levá-lo em corridas duas vezes por dia, depois uma
longa caminhada, cheia de sessões de busca intermitentes. E ele ainda
estava sempre em movimento. O veterinário disse que era
provavelmente porque ainda era um filhote, que uma hora se acalmaria.
Especialmente depois que fosse castrado.

Até lá, o único jeito era tentar cansá-lo.

Uma tarefa infrutífera, se você perguntasse a Eli.

Ficava ativo até mesmo quando dormia, correndo tanto em seus


sonhos que por várias vezes se arrastava no chão.

Oh, as alegrias de ser dono de um cachorro.

— Estou falando que fui para a casa depois de não ter notícias
dela por três dias, mesmo depois que liguei e enviei mensagens, e o
barraco estava vazio. Não há rastro deles. Nada, porra, literalmente. O
lugar estava limpo. Duvido que haja até mesmo uma impressão digital
em qualquer lugar.

Contei a Eli toda a história, mantendo o resto da família por fora.


No geral, não mantínhamos segredos, mas como esse segredo não era
exatamente meu, achei melhor esconder.

Dito isto, eu precisava desabafar e Eli parecia ser a opção mais


segura.

— Você ligou para ela depois? — Ele perguntou, as sobrancelhas


juntas, segurando a bola em sua mão quando Coop literalmente saltou
para cima e para baixo esperando que ele a atirasse novamente.

~ 101 ~
— É claro que liguei. — E não era como eu não fizesse essa
merda. Nem sempre era o tipo de cara que dá uma rapidinha e cai fora.
Havia muitas mulheres com quem conversei depois, que mantive
contato para algo casual, mas amigável. Mas se ligava uma vez e não
tinha retorno, acabava ali. Não queria implorar a ninguém por atenção.
Mas mandei mensagens para Scotti. E quando a última mensagem não
foi enviada, continuando a me dar notificação de falha, liguei também.

Foi quando notei que o número já estava fora de serviço.

— Eles se mudaram para um novo golpe. — adivinhou Eli, assim


como eu adivinhei depois que joguei meu telefone e chutei uma pilha de
madeira empilhada no meu local de trabalho, quase quebrando a porra
do meu pé por isso.

— Sim.

— Não houve um bilhete ou nada?

— Acho que eu não fazia parte dos planos dela, cara. Acho que
apareci e estraguei seu esquema. Acho que nunca ficaram tanto tempo
em uma cidade depois de um golpe como ficaram aqui. Tinha alguma
coisa os segurando. Pra começar, essa foi a única razão que posso
imaginar para ela concordar em vir aqui. Acho que logo depois,
qualquer que seja o motivo para prendê-los aqui, terminou, e eles
tiveram que ir.

— Que merda, cara, — disse Eli, exalando com força.

Realmente.

Talvez não devesse ter que ser assim.

Não era como se estivéssemos juntos por algumas semanas,


ficando bem próximos e ela me largasse. Inferno, passei mais tempo
com uma amiga de foda, cujo sobrenome, endereço e idade nem sabia
do que eu passei com Scotti. Nunca tinha ficado tão fissurado por tão
pouco antes.

Dito isto, isso não parecia ser pouco.

Talvez fosse porque conversamos sobre temas que significavam


muito para nós, sobre o que era importante, sobre o que realmente nos
fazia ser quem éramos como pessoas, em vez das besteiras inúteis e
triviais que a maioria das pessoas discute durante as primeiras
semanas para conhecer alguém.

~ 102 ~
Talvez fosse porque nunca conheci uma mulher como ela antes. E
isso significava algo porque conheci muitas mulheres. Já conheci
mulheres fodonas e incríveis. Mas ela estava em uma classe própria.
Fora as mulheres que eu não conhecia tão bem, tipo a Lo e a Janie do
Hailstorm, não poderia dizer que já encontrei uma mulher com uma
mente tão honesta, como conduzir a realizar sua própria versão de
justiça, tal era sua dedicação à causa. E mesmo com tudo isso, por trás
da máscara que ela usava como escudo, ela não era fria, distante ou
solitária. Na verdade ela tinha vínculos mais fortes com sua família do
que qualquer outra pessoa que eu já tenha visto, além de mim.

Ela era franca, mas de uma maneira sarcástica que não era
ofensiva. Ela era confiante, mas tinha uma vulnerabilidade escondida
também. Ela era uma criminosa experiente, mas não endurecida.

O sexo estava muito acima da média.

E nem era preciso dizer que ela era linda demais.

Ela passou por muita coisa. E aprendi sobre isso em apenas


algumas horas. Queria saber o que poderia aprender em dias ou
semanas ou, inferno, mesmo meses.

Isso era diferente de mim. Eu não era esse tipo de sujeito. Não
olhava para uma mulher e via um futuro.

Mas talvez fosse porque nunca tinha olhado para uma mulher
como Scotti.

Talvez seja isso que aconteceu com os meus irmãos. Porque,


francamente, nenhum deles estava a fim de ficar amarrado tanto
quanto eu. Shane estava sempre fora da cidade, mas alguma coisa
apenas... mudou quando Lea entrou em sua vida. Ele correu atrás dela
com uma determinação que nunca tinha teve com uma mulher antes. E
eles estavam felizes.

O mesmo poderia ser dito de Ryan, que sempre esteve casado com
seu trabalho, muito ocupado para notar a maioria das mulheres. E
então havia uma doce e problemática Dusty. Toda a sua vida tornou-se
focada nela, deixando-a confortável a redor dele, deixando-se tornar-se
um “lugar seguro” para ela e sua ansiedade. E, embora nenhum de nós
viu como isso começou, Hunter e Fee tinham um vínculo tão profundo
como qualquer um que eu já tinha visto. Ele conheceu as partes mais
trágicas de Fiona e nunca as encontrou menos atraentes ou não
amáveis. Na verdade, ele a amava mais justamente por essas partes.

~ 103 ~
Todos eles conheceram suas mulheres quando as viram.

Talvez não o tenham admitido enquanto estava rolando. Na


verdade, tinha certeza de que nenhum deles fez tal coisa. Eles
provavelmente fugiram, deram desculpas sobre apenas quererem uma
trepada, ficando levemente intrigados, seja lá o que for. Mas pensando
bem, cada um dirá que houve apenas... uma atração. Simples assim.

O que senti por Scotti era sem dúvida uma atração.

E eu estava ficando malditamente louco por não ter a chance de


correr atrás disso e descobrir se levava a algum lugar que
milagrosamente me faria deixar minha vida antiga para trás e começar
um futuro com ela. Tão louco quanto pudesse soar.

Francamente, estava mais do que um pouco chateado pela


chance que foi completamente tirada de mim.

— Descobriu se falta muito para o próximo golpe deles? — Eli


perguntou, tentando enfiar a bola atrás dele, o que só fez Cooper dar
um salto e cutucar-se nele até que ele suspirou e cedeu.

Dei de ombros nisso, um estranho buraco formando-se na minha


barriga.

— Parece que eles quase terminaram com seus planos. Depois


disso... É Rússia ou China. Nunca mais a vejo novamente.

— Apenas assista às notícias. — disse Eli com um encolher de


ombros, me dando uma olhada que anos de experiência na leitura das
expressões faciais dos meus irmãos me diziam “seu idiota fodido”.

— O quê?

— Se continuarem roubando as lojas, isso vai dar em algum


noticiário. Acho que eles têm de dormir em algum lugar próximo. Não se
arriscariam atravessando a fronteira do estado com dinheiro sujo.
Provavelmente foi por isso que ficaram aqui por tanto tempo. Talvez
tenham conseguido mais identidades falsas se ouviram falar sobre
Barney. Então, se você ouvir notícias de um assalto, pode dar o fora da
cidade e procurá-la.

— Parece uma atitude um pouco perseguidora, você não acha?

— Ou talvez um grande gesto romântico? — Ele sugeriu, não


parecendo tão convencido disso.

~ 104 ~
— Acho que é um pouco forçado, cara. — eu disse com uma
risada. — Coop, Jesus, sente-se por dois minutos. — eu disse, pegando
o cachorro e puxando-o entre nós, tentando distraí-lo com afagos. Isso
não funcionou, caso você quiser saber. Ele se debateu até que se
afastou e voltou a implorar que a bola fosse jogada.

— Sei lá. Acho que você pode se livrar disso. Apenas uma vez.
Apenas para enfrentá-la e ver o que ela tem a dizer. Qual o pior que
pode acontecer? Ela contou a seus irmãos sobre você? Você sobreviveu
a golpes de todos nós. Acho que você pode lidar com isso. — Ele desviou
o olhar por um longo minuto. — Sabe... Apenas para você não ter
sempre esse “e se” pendurado sobre sua cabeça. Isso não é jeito de
viver, Mark.

Infelizmente, tinha certeza de que ele sabia disso por experiência


própria.

Não sobre uma mulher, digo.

Mas acho que ele se sentiu assim sobre suas escolhas de vida,
sua carreira, sua constante colocação de seus desejos em um segundo
plano para lidar com negócios familiares, sendo forçado a ser um
monstro de raiva quando era necessário.

Houve momentos em que me senti realmente mal por culpa.

— Como estão as coisas com qual-é-mesmo-o-nome-dela?

— Você quer dizer a garota que vocês chamam de harpia nas


minhas costas? — Ele perguntou com um pequeno sorriso. — Coop
comeu um de seus sapatos esta manhã, então ela deixou uma
mensagem desagradável sobre algo como “ou ela ou o cão”.

— Então, naturalmente, é o cachorro. — disse, observando o dito


perseguindo uma maldita gigante abelha no quintal.

— Vou dizer a ela pela manhã na cafeteria de Hollydell. Ah, — ele


disse de repente, mudando de assunto. — Ouvi rumores de que abriu
uma nova cafeteria em Navesink Bank. Existem essas duas garotas que
estavam fazendo uma exposição em alguma feira gastronômica local ou
alguma merda falando sobre seus planos para um estabelecimento
físico. Ouvi falar que o café é bom pra caralho.

E quem conhecia Eli sabia que ele gostava de seu café. Ele passou
por duas cidades até encontrar um café decente.

~ 105 ~
— Depois me conte como foi, cara. — falei quando ele se levantou
e assobiou. E, selvagem como aquele cachorro era, ele parou
imediatamente e correu em direção a Eli, deixando sua corrente ser
presa à sua coleira. — Ele só está sendo bom porque sabe que temos
uma meia hora a pé para casa.

Ele ficou de pé para se afastar.

— Apenas pense nisso. Ela pode valer a pena todos os problemas.

Com isso, ele se foi.

Na verdade, nem precisei pensar.

Porque sabia que ela valia a pena o aborrecimento.

E talvez fosse um pouco obsessivo de minha parte, mas eu ia ficar


de olho nele e nos seus irmãos.

Então vou encontrá-la.

~ 106 ~
Nove
Scotti

— Preciso saber se sua cabeça está nisso. — disse Nixon, dando-


me um olhar impaciente em frente à mesa da sala de jantar.

Fazia duas semanas e meia.

Rush já havia sido contratado e depois deixou um emprego na


próxima loja. Não precisávamos gastar tanto tempo lá como
costumávamos. Nós sabíamos os prós e contras. O único motivo para se
ficar disfarçado agora era garantir que ninguém tivesse feito nada
diferente. Todos esses anos e aconteceu apenas três vezes, quando
atualizaram sistemas de informática e caixas registradoras. Mas sempre
quisemos ter certeza.

Você deve pensar que depois de serem assaltados tantas vezes,


eles encontrariam algo melhor para se proteger. Mas a questão era que
deixávamos um lapso de tempo suficiente entre os golpes para lhes dar
uma sensação de segurança novamente. Alguns anos, apenas fazíamos
um ou dois roubos, a milhares de quilômetros um do outro. Alguns
anos, era um a cada dois meses.

Nós sempre permitimos esse período de carência para as notícias


e gerentes e funcionários surtarem e começarem a serem vigilantes.

Mas o fato era que todos nós sabíamos disso porque trabalhamos
em tantas dessas lojas, que o sensacionalismo se perdia facilmente na
labuta diária do trabalho.

Oh, então a loja a cinco estados de distância foi roubada ontem?


Sim, bem, alguém cagou nos vestiários hoje, então... Quem é que se
importa?

Essa era a vida de um funcionário de uma megaloja.

Eles não eram pagos o suficiente para se importarem com as


finanças da loja. Inferno, metade deles recebia algum tipo de auxílio

~ 107 ~
social, graças ao salário de escravos. Provavelmente, mais do que
ninguém, queriam que os lugares pegassem fogo.

Eu não tinha o direito de estar tão mal humorada. Em


comparação com o barraco em Navesink Bank, Nova Jersey, esta
cabana na floresta no estado de Nova Iorque era realmente muito
agradável. Era algum lugar que alugavam para pessoas que queriam
experimentar viver “fora do sistema” porque era completamente movido
à energia solar, com energia eólica, com lareiras para se aquecer no
inverno e, bem, nada para se refrescar no verão. Havia uma enorme
horta e uma pequena estufa para cultivar toda a sua própria comida.
Tinha três quartos, o que fazia viver com outras quatro pessoas muito
menos estressante.

Era lindo aqui. Não havia poluição sonora para acordar você de
noite, apenas o som distante de uma coruja cantando através dos céus.
O ar era fresco. As paisagens eram absolutamente adoráveis. Eu deveria
ter amado isso.

Mas tudo no que eu conseguia pensar era uma pequena casa


craftsman com uma estilosa e conveniente ilha na cozinha, uma linda
cama para rolar e um homem cheirando a trabalho árduo e as chances
que valiam a pena.

Eu não poderia descrever com precisão a você a sensação daquela


noite que passei com Mark.

Parecia errado.

Parecia que meu corpo estava lutando comigo a cada passo do


caminho. Meu estômago estava retorcido em nós dolorosos, fazendo
com que cada movimento no trajeto causasse uma onda de náusea
sobre mim. Senti-me alternadamente quente e fria e tive que lutar
contra um desejo quase constante de chorar, dar um tapa na nuca de
Rush e exigir que ele se virasse e me levasse de volta à Navesink Bank.

Mas talvez seja por isso que eu mordia tão forte o meu lábio
inferior para deixar um hematoma e não disse nada, guardando minha
decepção e tristeza para mim mesma, fingindo que deixar Navesink
Bank não parecia ser o maior erro da minha vida.

Porque era tudo tão ridículo, tão irracional, então tão diferente de
mim.

Claro, fiquei muito feliz com Mark, mas foi um dia.

~ 108 ~
Um dia perfeito e maravilhoso, quando me senti mais confiante,
mais livre, mais feliz do que já estive desde... porra, nem sabia. Talvez
desde que minha mãe estava viva.

Mas mesmo assim.

Apenas um dia de milhares de outros.

Mil mais para vir.

Eu superaria isso.

Embora Nixon tinha razão em ser impaciente e preocupado


comigo. Não tinha sido eu mesma. Chegava a casa, me trancava no
quarto, tomava longos banhos, fazia caminhadas mais longas. Fiquei
um pouco isolada, absorta nos meus pensamentos, não relaxando com
eles como costumava fazer.

— Minha cabeça está sempre nisso. — respondi, encolhendo os


ombros. Inferno, eu poderia fazer isso dormindo depois de tanto tempo.

Minha cabeça estava, na verdade, nisso.

Era meu coração que não estava a fim de mais nada com isso.

Estava pensando muito nisso na verdade. E a conclusão


ressonante parecia ser - para que, inferno, tudo isso? Tínhamos o
suficiente. Já causamos muitos danos. Por que ainda estávamos tão
entusiasmados em terminar o golpe? Não traria a mãe de volta. Isso não
apagaria seu sofrimento, nem o nosso. Não mudaria a opinião das
empresas sobre a contenção de despesas com a saúde de seus
funcionários.

Em última análise, nada.

Nenhuma maldita coisa.

Dez anos em uma missão tola.

Dez anos dedicados inteiramente a uma vingança que nunca iria


acontecer, porque nunca poderia acontecer. Não havia olho por olho.
Não era tão “fácil” quanto matar a pessoa que matou seu ente querido,
para se vingar verdadeiramente.

Em seis meses, ninguém se lembraria de nós. Ninguém saberia


por que fizemos o que fizemos. Ninguém teria uma vida melhor por
nossa causa.

~ 109 ~
Acabamos de criar uma pequena bolha isolada para viver sem
nenhum maldito motivo.

Era triste.

Mas eu estava completamente sozinha com aquela percepção.

Mais sozinha do que já senti na minha vida.

E para não arrastar mais ninguém na minha festa de piedade,


simplesmente me isolava.

Isso não significava que não poderia fazer o trabalho.

Eu poderia fazer o trabalho.

Eu iria fazer o trabalho.

Talvez não fosse mais a vida que queria para mim, mas eles ainda
a queriam. E eu não iria tirar isso deles, pelo menos não tão perto da
linha de chegada. Parecia cruel e sem sentido fazer isso com eles.

Então, bem, estaríamos do outro lado do mundo.

Talvez fosse bom.

Seria um começo verdadeiramente novo. Eu poderia aprender as


línguas e os costumes, conhecer a região, fazer um exame de
consciência e descobrir o que eu queria fazer com o resto da minha
vida. Então eu poderia sossegar. Talvez possa encontrar um bom
homem. Talvez tenha alguns filhos, o que era um ideal que minha vida
não tinha me proporcionado até agora.

As coisas ficariam melhores.

Elas tinham que ficar melhor.

Já estava cansada de ser pessimista.

Mas, vendo que as coisas ainda estavam exatamente na mesma,


não podia fazer nada.

Quando terminarmos, encontraria algum alívio.

— Tudo bem, — disse Nixon, encolhendo os ombros. — Eu e Atlas


iremos para a cidade para comprar mais alguns mantimentos antes de
nos trancarmos aqui por um mês.

Esse era o padrão.

~ 110 ~
A mesma merda, dia diferente.

Aff, eu estava sendo uma criança petulante.

Estas eram as escolhas que fiz. Eu não tinha o direito de estar tão
incomodada com elas.

— Parece bom. Eu vou cuidar da horta, ter certeza de que tudo


está como deve ser.

Isso fazia parte do acordo para ficarmos lá. Cuidar da horta e


deixar as galinhas vagarem durante o dia, tirar os ovos do galinheiro e
colocar as aves de volta à noite.

Isso basicamente cabia a mim e era bom já que eu estava de mau


humor e ninguém queria estar ao meu redor de qualquer maneira.

Vinte minutos mais tarde, eu estava sentada entre os canteiros da


horta, o sol quente batendo em mim, me carregando com uma boa dose
da velha vitamina D e levantando o astral, segurando um pintinho
contra meu peito porque, aparentemente, nós perdemos um ovo ou algo
assim.

— Cuidado para não se apegar a você. — a voz de Kingston me


chamou.

— Acho que esses são patinhos. — sugeri, acariciando sua cabeça


macia. — Além disso, a mamãe está bem ali, de olho nas coisas. Seus
bebês não vão virar nuggets. Certo, mamãe? — perguntei, ouvindo os
ruídos que ela fez quando coloquei seu garoto no chão e observei ele
correr para ela. — O que foi, King? — perguntei enquanto olhava
através da parte desobstruída da floresta, separada por uma cerca,
assim nenhum bicho intrometido teria ideias selvagens.

— Fale comigo, Scott. — ele pediu suavemente, sentando-se na


minha frente.

— Por quê? Com todo esse barulho na casa, acho que você
gostaria de toda essa solidão aqui.

Não era nenhum segredo que Kingston também gostava de tempo


sozinho, precisando limpar a cabeça, sair antes de explodir e se
estressar com um de nós.

— Você sabe o que quero dizer. — ele disse, inclinando a cabeça


um pouco para pegar meus olhos, um sorriso pequeno e reconfortante
nos lábios. — Vamos, Scott. Você não consegue guardar as coisas. Sei

~ 111 ~
que talvez não seja tão bom como ter uma mãe ou uma amiga por perto,
mas estou aqui e me importo. Fale comigo.

— Não queria vir embora. — admiti, desviando o olhar, não


conseguindo confessar enquanto ele me dava aquele olhar
compreensivo. Peguei uma erva que crescia entre as fileiras de
cenouras, arrancando-a e depois a rasgando. — É estúpido. — adicionei
rapidamente. — Eu sei disso. Foi apenas um dia, você sabe?

— Mas você queria mais, — disse Kingston, fazendo meus olhos


encontrar os dele. — Entendo isso, criança. De verdade. Acredite em
mim quando digo que tentei conversar com esses imbecis sobre partir
tão cedo. Na verdade, foi Rush, de todas as pessoas, que me disse que
só faríamos você ficar pior se deixássemos você ficar mais próxima dele.
Eu sei que eles... Nós podemos parecer tapados, às vezes, Scott, mas
realmente não somos. E a última coisa que queremos é ver você se
machucar. Isso, — ele disse, apontando uma mão para mim. — já faz
duas semanas e meia que está nos deixando doente, mas é, de certo
modo, a prova de que isso precisava acontecer, você não acha? Como
você estaria se tivesse ficado mais alguns dias, mais algumas semanas
com esse cara?

Expirei lentamente. — Você não está errado. — concordei. Não me


fez sentir melhor, mas podia ver a lógica lá. — Eu não deveria estar tão
mal-humorada por causa disso. — acrescentei, balançando a cabeça
para mim mesma. — Eu só... nunca tive qualquer ligação com alguém.
Não tenho um único amigo no mundo que não seja meu parente. Nem
sei o que é dormir com um homem. Ou acordar com um. Ou falar sobre
o futuro com um. — Estendi a mão, limpando uma estúpida e inútil
lágrima da minha bochecha. — Eu o odeio por me mostrar o que antes
nunca tive consciência de querer.

King resmungou nisso, balançando a cabeça. — Não, você não o


odeia.

— Não, eu não. — concordei com um pequeno sorriso.

— Entendo que você precisa processar e levar seu tempo com


isso. Mas talvez deva parar para pensar que isso não era uma coisa
completamente terrível de acontecer. Deixe-me terminar, — disse ele
quando abri minha boca para dizer algo. — Não porque você se sente
como uma merda agora, mas porque se sentir uma merda significa que
algo não está certo, você precisa mudar algo. Todos nós já estivemos
nesta porta giratória há uma década. Estava começando a me
preocupar que você nunca pensou em querer mais.

~ 112 ~
— Você já?

— Criança, vou fazer quarenta aqui. Claro, pensei sobre o que


quero da vida.

Foi então que senti uma onda de culpa quase irresistível. Não só
por ter sido um bebê chorão nas últimas semanas, mas porque estava
tão obcecada com meus próprios dramas durante a última década que
nem me dei conta que meu irmão também não estava feliz. Claro que
ele sentiu o peso mais do que o resto de nós, sobretudo mais do que eu,
a mais jovem. Sacrificou sua vida sem hesitação, levando-nos todos um
a um. Pelos meus irmãos, conforme eles apenas envelheciam e queriam
um pouco mais de liberdade. Por mim, quando fui empurrada para ele
pela morte prematura da nossa mãe. E ele nunca se ressentiu. Nunca
me fez sentir como se fosse um fardo, embora soubesse que havia dias
em que era exatamente o que eu era. Nunca conseguiu encontrar uma
mulher, ter uma casa, filhos, um trabalho normal. E, ao contrário de
mim, ele não era tão jovem.

Deus, todos nós perdemos tanto, tanto, sem mesmo perceber isso.

— Não me olhe assim, Scott. — disse ele, balançando a cabeça


para mim. — Não me arrependo um dia por isso. Nem mesmo quando
você era uma louca varrida de dezessete anos que me fez voltar para a
maldita farmácia três vezes porque não comprei os absorventes certos e
você estava com vergonha de fazer isso sozinha. E, olha, não foi um dia
fácil. — disse ele, me dando um sorriso. — Nem mesmo no dia em que
Rush se intoxicou com álcool e tive que sentar ao lado dele depois da
lavagem estomacal, com uma úlcera queimando mais ainda no meu
estômago. Nada disso, Scott. Foi uma fodida honra ser uma figura
paterna para todos vocês.

— Mas todos nós crescemos agora, King. Não estou dizendo que
não precisamos de você, porque precisamos. Eu especialmente. Mas se
isso não é o que você quer mais, descubra o que quer e vá atrás.

— Eu deveria ser o único que está dando a conversa paterna aqui,


criança. — ele disse com um sorriso, estendendo a mão para tirar um
fio de cabelo do meu rosto enquanto o pintinho gingava de volta para
mim. — Tem certeza de que não se apegou a você?

— Hum... Não? — Eu disse, fazendo uma expressão confusa. — O


que você acha que dizem as leis sobre levar aves vivas para a China ou
a Rússia? — Coloquei-o de volta e ele fugiu. — Desculpe-me ter sido
chata sobre isso, King. Sei que traz toda a moral para baixo.

~ 113 ~
— Ei, olha, estou realmente feliz por você ter estado com um
humor de merda. Não, — ele disse, erguendo a mão quando fui falar
algo. — Não porque gosto de te ver infeliz. Longe disso. Mas porque é a
primeira vez que vejo você sentir algo profundamente, porra, nem sei
por quanto tempo. Odiaria pensar que, ao escolher este estilo de vida,
atrapalhou seu crescimento, fez você endurecer ou incapaz de
experimentar o desejo por algo mais. Fico feliz que não seja isso, —
disse ele, ficando de pé e limpando os jeans. Depois, me puxou de pé ao
seu lado e me apertou contra ele em um abraço firme, que não percebi o
quanto precisava até que ele me deu. — Mais três assaltos. — ele disse
com uma voz reconfortante.

— Mais três. — concordei com um aceno de cabeça enquanto


voltamos para a casa.

Dois dias depois, carregamos um carro novo que compramos em


dinheiro vivo de alguém muito ignorante para perceber que
precisávamos fazer a transferência do documento. Levei algum tempo a
mais no banheiro para ter certeza de que meu disfarce estava perfeito.
Eu e King estávamos fazendo a parte principal desta vez, algo que quase
nunca aconteceu, porque os outros caras sempre estavam preocupados
que King ficaria muito preocupado comigo para terminar o serviço.

King colocou seu nariz falso e uma verruga horrorosa sobre isso,
e pintou seus cabelos com uma tinta temporária lavável que deu aos
seus cabelos castanhos escuros uma tonalidade avermelhada feia. Eu
tinha o meu cabelo preso sob uma peruca loira levemente avermelhada,
lentes de contato azul claras e passei mais de uma hora fazendo um
contorno pesado no meu rosto, o que me fazia parecer ter uma
estrutura óssea completamente diferente do que eu realmente tinha.
Também aumentei meu sutiã e usei três camadas apertadas de roupa
por baixo para fazer parecer que eu era maior. Estava sendo
excessivamente cautelosa já que precisei mostrar meu rosto no último
assalto.

— Parece que você está contratada. — Atlas me informou quando


eu saí, fazendo-me jogar meu perfume para ele enquanto eu ria. Eu
odiava o cheiro dessas coisas também. Todos os perfumes falsos, todos
os aromas “frescos” que não eram frescos e me davam uma dor de
cabeça perversa.

— Obrigada. — respondi, pegando o casaco jeans leve que Rush


me entregou. Normalmente, eu não seria pega usando uma jaqueta
jeans nem morta, nem mesmo em um assalto, mas Rush tinha sido

~ 114 ~
responsável pela compra de roupas desta vez, já que eu estava com um
humor do cão.

— Todos prontos? — Kingston perguntou, um pouco mais tenso


do que o costume, como sempre ficava antes de um roubo.

— Sim. — eu disse, dando-lhe um sorriso encorajador.

E então fomos e fizemos o trabalho.

E... Nada.

Não havia nenhuma alegria que eu usualmente tinha da descarga


de adrenalina. Não houve nenhum alívio porque estávamos a um golpe
mais perto do final.

Eu deveria ter estado feliz.

Mais dois golpes.

Apenas alguns meses mais.

Então, todo o estresse, toda a preocupação, acabaria.

Poderíamos encontrar um lugar e viver.

King poderia, finalmente, finalmente, ter uma vida própria, livre


da preocupação constante com seus irmãos e sua irmã.

Eu seria livre.

Exceto que a pequena voz chata na parte de trás da minha cabeça


dizia que isso não era liberdade. Livre não era livre se vinha com
cláusulas e alterações. Eu poderia fazer o que quisesse na China ou na
Rússia. Poderia ser quem queria ser, exceto Scotti. Poderia fazer
amigos, mas nunca, nunca dizer-lhes onde eu estava e o que eu fiz.
Poderia ter um homem, mas nunca Mark Mallick.

— Qual é, Scott, você precisa tanto quanto nós. — Rush


ponderou, observando-me pelo retrovisor enquanto eu esfregava meu
rosto com lencinhos de bebê, querendo tirar a massa de maquiagem.
Meu rosto não podia respirar com tudo aquilo.

Honestamente, eu poderia ter uma rodada ou duas ou cinco. Eu


poderia afogar o mau humor na tequila, fingir que o mundo não se
sentia um pouco menos brilhante e maravilhoso como parecia. Poderia
flertar com um homem. Poderia até ir até sua casa se eu quisesse.

~ 115 ~
Mas a maior parte de mim queria tomar um longo banho, lavar o
dia, talvez passear pela horta que achei ser catártico. Nunca fiquei em
um lugar tempo o suficiente para pensar em ter uma planta, muito
menos uma horta. E percebi, enquanto colocava as mãos e joelhos na
terra e puxava ervas daninhas, enquanto pegava ovos, colhia verduras
para saladas verdadeiramente frescas, que era algo que eu gostava
muito.

Talvez tenha sido a primeira coisa que descobri algo que gostava
de fazer, já que foi a única coisa que realmente consegui explorar.

Que opções de carreira isso me deixava caso eu quisesse seguir


esse caminho?

Não tinha certeza. Talvez pudesse ser florista. Talvez pudesse


conseguir um emprego em uma fazenda. Talvez, algum dia, eu poderia
ter minha própria pequena fazenda e vender meus produtos.

Ou talvez eu tivesse apenas uma horta de quintal e galinhas de


quintal que poderia cuidar no meu tempo livre.

Pelo menos, era algo.

Pelo menos isso me deu algo além dos assaltos e família para me
apaixonar.

— Estou com dor de cabeça por causa desse perfume todo. —


insisti. Eles sabiam como eu era sobre aromas e não soou como
mentira, embora um olhar para Kingston me disse que ele sabia que era
apenas uma desculpa, mesmo que apenas a meio caminho da verdade.
— Mas podem me deixar e vão se divertir. Vocês merecem. Este foi um
mês puxado.

— Estávamos pensando em dormir por lá. — disse Nixon, me


sondando.

Nunca fui deixada sozinha. Certo, algumas noites, um ou dois dos


caras encontrariam uma garota e iam para casa com ela, mas alguém
estava sempre no esconderijo comigo.

Mas neste caso, o esconderijo estava no meio do nada, e não


havia um bar por quase quarenta e cinco minutos, na cidade mais
próxima. E todos queriam liberar um pouco de tensão, então nenhum
deles seria capaz de dirigir.

— Tudo bem. — insisti, encolhendo os ombros. — Estou


perfeitamente segura nesta casa. E não se preocupem. — eu disse,

~ 116 ~
dando-lhes um sorriso provocante por pensar que eu estava tão
indefesa que não poderia passar uma noite sozinha. — Vou me
certificar de que tranquei as portas e verificar as janelas antes de ir
para a cama.

— Se você tem certeza. — Atlas retornou.

— Oh, meu Deus, tenho vinte e sete anos, pessoal. Parem de me


tratar como uma jovem de dezessete anos. Na verdade, se eu me lembro
bem, aos dezessete anos, dormi sozinha todas as noites já que vocês
estavam ocupados e mamãe estava trabalhando.

— Justo. — concordou Nixon. — Quer que a gente traga algo para


você amanhã?

Não sei o que me possuiu para dizer isso, mas eu disse. — Sim,
você pode me trazer um vaso e um saco de adubo.

— Ah... O quê? — King perguntou enquanto dirigíamos para a


casa.

— Um vaso para plantar algo e um pequeno pacote de um adubo.


Qualquer marca. Pare de me olhar como se estivesse louca. — falei,
rolando meus olhos. — Gosto deste lugar de verdade. Encontrei
alguma... paz aqui. E vou cuidar disso aqui e não arruinar tudo. Então
pegue um vaso e um pouco de adubo. Deus. — Peguei o saco que eles
passaram para mim, sabendo que parte do meu trabalho pela noite
seria queimar tudo o que usamos no assalto. — Divirtam-se, caras. —
eu disse, e quis dizer isso de verdade.

Queria que eles se divertissem.

E eu ia gostar da minha solidão enquanto durasse.

Talvez baixasse um aplicativo de idioma no meu celular e tentasse


aprender um pouco de russo e chinês, ver qual era mais fácil para eu
pegar.

Estava decidida a manter minha cabeça em direção ao futuro,


não me preocupando com o passado, deixar de pensar em todas as
coisas que poderia ter perdido ou deixado para trás. Era melhor para
mim e para todos os que me rodeavam se eu começasse a esconder
minhas esperanças sobre as possibilidades do futuro em vez das
lembranças do passado.

Então, observei meus irmãos se afastarem. Fiz uma grande


fogueira. Carreguei lentamente todas as roupas e perucas e até mesmo

~ 117 ~
as malas. Então, entrei no banheiro, tomei um banho bem demorado,
porque ninguém começou a bater na porta, dizendo-me para apressar-
me, porque eles precisavam entrar. Vesti uma das camisas de King, que
ficou enorme, e calças de pijamas, depois me enrolei no sofá com um
livro de jardinagem que encontrei numa prateleira na sala de estar.

Uma noite tranquila em casa.

Será que o meu futuro tinha guardado para mim.

Quando as palavras começaram a nadar na página, ouvi uma leve


batida vinda da porta da frente.

E todas essas garantias que joguei em meus irmãos, sobre ser


capaz de ficar em casa sozinha, que eu não tinha medo de nada, que
poderia lidar comigo mesma, meio que voou fora da minha mente no
momento em que o pânico inundou meu corpo.

Levantei-me silenciosamente do sofá, andando em direção à


cozinha, onde uma das pistolas estava guardada, carregada de balas de
borracha. Elas podem não matar ninguém, mas iriam machucar o
suficiente para que eu tivesse a chance de vencer uma briga.

E então... Eu não sei.

Eu teria de descobrir enquanto eu caminhava.

Andei em direção à porta da frente, me forçando a tomar uma


respiração lenta e profunda antes de alcançar a maçaneta,
completamente sem pistas sobre o que poderia estar causando esse
som.

Então, puxei a porta aberta.

E quase esvaziei a arma contra ele com puro e absoluto choque.

Mark Mallick estava na minha porta.

Com o meu pequeno frango preto nas mãos.

E descobri que essa era a fonte do toque - seu pequeno bico na


madeira.

Antes que pudesse efetivamente engasgar na minha própria


maldita língua, sua cabeça mergulhou um pouco sobre o lado, seus
olhos claros intensos.

— Quando esta porra será suficiente para você, baby?

~ 118 ~
Dez
Scotti

Ok.

Bem.

Sim.

Mark Mallick estava à minha porta.

Segurando meu amigo frango.

E ele estava com raiva de mim.

Na verdade, nunca pensei que voltaria a ver o rosto dele. Nunca


pensei que ouviria sua voz depois da última mensagem de voz, que
escutei quinze vezes antes de finalmente ter que destruir o aparelho
como sempre fazíamos.

Claro, de uma forma assustadora, ele aparecia logo quando eu


estava bem novamente, quando terminei de falar sobre alguém que
sabia que jamais poderia ter além da noite que tive com ele.

— O quê? — disse, percebendo que a arma ainda estava


levantada quando seus olhos foram lá, com uma sobrancelha levantada.
Minha mão caiu entorpecida ao meu lado. — São balas de borracha. —
senti a necessidade de explicar. — Nós nunca usamos as de verdade.

— Não posso dizer que isso não me faz sentir melhor. — ele
concordou. — Esta pequena coisa é permitida dentro da casa? Ele
parece pensar que é. Estava batendo quando me aproximei.

— Acho que ele poderia ter, hum, se apegado em mim algo assim.
— expliquei, soltando a arma e pegando o bichinho, com cuidado para
não deixar nossos dedos se encostarem. Sabia que contato físico não
seria bom. Porque eu gostaria de mais e mais disso e isso só
complicaria tudo.

~ 119 ~
Eu me forcei a afastar-me dele, olhando ao redor enquanto levava
o frango para a cozinha, onde peguei um punhado do arroz que fiz na
noite anterior e dei-lhe.

Podia literalmente senti-lo atrás de mim, mesmo que ele não


estivesse perto. Podia sentir a maneira como seus olhos estavam se
aproximando de mim. Podia ouvir as perguntas não formuladas.

Sentindo-me desconfortável, olhei para fora da janela no escuro.


— O que você está fazendo aqui, Mark?

— Você não poderia nem dizer que você estava saindo da cidade,
Scotti?

— Para quê? — Perguntei, sentindo que ele se movia atrás de


mim, mas recusando-me a virar. Suas mãos plantadas no balcão do
meu lado, trazendo a lembrança brilhante e vívida dele fazendo
exatamente o mesmo em sua cozinha. — Você tinha que saber que o
que tínhamos era temporário. — Deus, essas palavras eram difíceis de
por para fora. A verdade sempre era.

— Talvez você tenha visto assim, Scotti. Eu não. Eu queria mais.

As últimas três palavras foram ditas ao lado da minha orelha, sua


respiração quente fazendo um curso de arrepio através do meu corpo.

E elas também cortaram através de mim.

O sentimento foi imediato e esmagador.

— Eu queria mais também. — admiti, engolindo com força,


usando cada força que possuía para não me inclinar para trás nele.
Precisava me manter firme. Precisava manter meu juízo.

— E ainda...

— E ainda assim, tive de ir. Você sabia disso. Eu sabia disso. Não
tinha como ficar em Navesink Bank. Inferno, não tem nem como eu
ficar neste país.

— Desde quando, porra? — perguntou Mark, soando exasperado,


afastando-se de mim.

Sentindo-me a salvo quando ele estava a poucos metros de


distância, perguntei. — O quê?

— Querida, este país está cheio de criminosos. A maioria deles é


muito pior do que você e seus irmãos. Assassinos. Sequestradores.

~ 120 ~
Pessoas que ganham a vida pisando no pescoço dos outros. Não sentem
que precisam ir para a porra da Rússia. Eles molham a mão certa. São
inteligentes. Confiam em poucos com a verdade. Mas eles ficam.

— Não vejo como vale a pena o risco.

— O risco de quê? Prisão? Scotti, vi o relatório sobre esse assalto.


As descrições não parecem em nada com você ou seus irmãos. Eu nem
poderia dizer qual deles fez o trabalho. Vocês cobrem seus rastros muito
bem. Aposto que eu nem reconheceria os mais velhos, já que eles
mudam de aparência quase que diariamente. Aliás — ele disse, de
repente, parecendo sério. — Se vocês usam disfarces, por que você não
estava usando um no dia em que nos encontramos?

— Eu não estava tecnicamente dentro desse trabalho. A gente se


reveza para ver quem vai fazer o que, exceto Rush, que está sempre
envolvido. Mas para aqueles que não estão no esquema atual, só damos
uma volta pela loja para ter certeza de que nenhum policial está por
perto, ou que qualquer cliente esteja por ali e isso poderia causar um
problema. Eu estava apenas de olho em problemas.

— Acho que você achou isso, hein? — Ele perguntou, uma


centelha diabólica em seus olhos por um segundo antes de olhar ao
redor. — Cadê seus irmãos?

— Eles estavam com clima de festa.

— E você não estava? — Ele perguntou, afastando-se de mim, um


ato que parecia me permitir respirar novamente, enquanto caminhava
em direção à sala de estar, pegando o livro que estava lendo. — Você
prefere ficar em casa e ler livros sobre plantas?

— Há uma enorme horta aqui. Descobri que sou meio disso. —


expliquei, me sentindo um pouco estranha admitindo isso. Não era
como aprender um hobby legal como Krav Maga ou guitarra elétrica.
Meu interesse era horticultura. Como minha avó costumava ser. Se me
lembrava corretamente, ela tinha uma horta incrível. Talvez estivesse
esperando que essas mãos boas com plantas fossem de família.

— Isso é ótimo, baby. — ele disse, me fazendo querer encontrar


sarcasmo lá, mas tudo que ouvi foi sinceridade.

— E eu só... Já superei isso. — admiti, sem saber o que estava me


possuindo para compartilhar isso. — Quero que tudo isso termine para
que eu possa seguir em frente.

— E começar uma horta na Rússia.

~ 121 ~
Suspirei. — Por que estamos falando sobre isso? Por que você
está aqui? — Parei então, a sensação de meu estômago subindo pela
boca. Não, sério. Por que ele estava aqui? Como ele chegou aqui? Como
sabia onde procurar por mim? Se ele pode nos encontrar com tanta
facilidade, então qualquer um poderia, certo? Nós teríamos que partir.
Eu precisaria deixar minha amada horta e meu bebê frango.

— Scotti, relaxe. — sua voz me alcançou, soando uma mistura


estranha de divertida e reconfortante.

— Relaxar? — repeti, indo em direção ao fogo e cutucando-o para


que as chamas se elevassem, aquecendo meu rosto até o ponto em que
quase fiquei preocupada com minhas sobrancelhas. Que se danem as
minhas sobrancelhas. A evidência precisava desaparecer
imediatamente. E eu precisava empacotar. E chamar meus irmãos. Eu
só... não poderia deixá-los voltar para mim, no entanto. Isso era muito
arriscado. Precisava chamar um táxi, ver se eles estavam dispostos a
fugir para longe. Então eu precisava embalar e limpar. Normalmente,
demorava quatro ou mais horas para limpar, mas eu teria que me
esforçar para fazem em menos de uma.

— Scotti, porra, o que você está fazendo? — Mark perguntou,


andando comigo enquanto eu corria freneticamente para o meu quarto
e começava a arrumar itens na minha bolsa.

— Eu tenho que arrumar. Nós temos que ir. — falei, passando por
ele para entrar no banheiro.

Sua mão grande e firme agarrou meu braço logo abaixo da


manga, curvando-me com força e me puxando para parar. — Jesus,
acalme-se, porra. O que quer dizer, você tem que ir? Cinco minutos
atrás, você estava lendo um livro de horticultura.

— Cinco minutos atrás, alguém não apareceu do nada, sabendo


exatamente onde nos encontrar. Acho que você não entende
completamente o significado de uma “casa segura”.

— Scotti, só encontrei você porque o noticiário entregou a cidade


e sabia que meus pais ficaram em uma cabana aqui uma vez, antes de
nós nascermos, quando estavam preocupados com a lei farejando em
torno deles. As únicas pessoas que sabem que este lugar existe são
aquelas que ficaram aqui.

Ok.

Talvez isso me fizesse sentir um pouco melhor.

~ 122 ~
Mas ainda não estava convencida.

— Nunca vi um criminoso tão paranoico como você é. E confie em


mim, querida, conheço muitos criminosos.

— Sim, mas a maioria dos criminosos opera sob os olhos da lei,


mantendo um perfil baixo. Temos muita fanfarra envolvida em nosso
esquema. Sempre que fazemos isso, chamamos a atenção.

— Conheço um cara que é um atirador. Seu trabalho rotineiro


vira notícia.

— Claro, mas a palavra atirador implica que é feito de muito longe


e que ninguém vê-lo.

— Tudo bem, então. Bem, eu conheço capangas contratados,


motoqueiros, máfia italiana, militar fora da lei...

— O que você quer provar, Mark?

— Que fugir não é sua única opção no mundo. Você poderia ficar
fora de vista por um tempo, ter certeza de que todos esqueçam sobre
isso, então construir uma vida aqui. Como Scotti, não Angela ou
qualquer outro nome que você use. Presumo que sua ficha está limpa.
Assim como a de seus irmãos.

— Eu tinha dezoito anos quando começamos. — disse com um


sorriso. — Antes disso, eu tinha uma mãe e quatro irmãos super
protetores. Não podia ignorar a lição de casa sem ter alguém no meu pé.
Nem dar uma escapada de casa sozinha ou beber quando era menor de
idade.

— Então, por que não pensar sobre isso? — Ele sugeriu. —


Talvez, após todo esse tempo, se você se sentar e analisar muito bem as
coisas, pode ver que é possível ficar. Inferno, você poderia até ficar aqui
se quisesse até que tudo passasse. Por que não pensa nisso?

Porque eu não queria ter esperanças.

Não queria começar a ter ideias, começar a fazer planos, apenas


para perceber em algum momento eu teria que destruí-los e começar de
novo.

Mas, novamente, ele estava certo.

Meus irmãos e eu inventamos o plano há uma década e acabamos


de... Segui-lo desde então. Os objetivos foram todos planejados. As

~ 123 ~
cidades em que ficamos foram planejadas. O orçamento foi mapeado. E
o objetivo final sempre foi o mesmo.

Talvez também tivessem dúvidas. Talvez eles desejassem ficar.


Talvez soubessem uma maneira de podermos fazer isso.

— Apenas pense nisso, sim? — Ele perguntou, abaixando a


cabeça, pegando meus olhos.

— Por que você está insistindo tanto nisso? — perguntei,


precisando saber seus motivos. Bem, na verdade, talvez uma parte de
mim realmente estivesse esperando que ele estivesse tão confuso com a
separação quanto eu, não importa o quanto isso pode ser ridículo.

— Sei lá, baby. Por que diabos tenho assistido às notícias de


todos os estados nas últimas duas semanas esperando por essa
história? Por que arrastei minha bunda aqui, a quase cento e trinta
quilômetros por hora para não ter que sentir sua falta? — Suas mãos se
moveram, pousando em meus quadris e puxando-me, fazendo-me
pressionar contra ele, mas mantendo nossos troncos separados. —
Simplesmente... Parecia ter algo aqui, você não acha?

— Nós nos conhecemos apenas um dia.

— E ainda estou aqui. — ele disse, cruzando os braços sobre


minhas costas, me aproximando. — E, no entanto, você está pronta
para reavaliar uma década de planos.

— Eu não disse nada sobre isso, sobre estar mais próximo de


você.

— Admita que é um fator. Não importa como isso pode parecer já


que é tudo tão novo. Você queria mais de mim.

Respirei fundo, sabendo que não havia como ele acreditar, mesmo
que eu mentisse. — Eu queria mais com você.

— Viu? Sabia que tudo o que tinha que fazer para fisgar uma
mulher era fazer uma boa comida. E, sabe né, o orgasmo provavelmente
ajudou.

— Hmm. — concordei, sentindo um movimento elétrico contra


mim, descansando e fortalecendo entre minhas coxas, onde o desejo
estava se tornando algo palpitante. — Os orgasmos podem ter sido
definitivamente um fator.

~ 124 ~
— Talvez eu devesse te dar mais. Sabe, apenas para ter certeza.
Pela ciência.

— A ciência é a espinha dorsal de qualquer argumento lógico. —


concordei, inclinando a cabeça para o lado enquanto sua cabeça se
abaixou para dar um beijo logo abaixo da minha orelha. — Nós
realmente devemos, hum... Oh. — gemi quando sua língua rastejou pelo
meu pescoço.

— Devemos o quê? — Ele perguntou, puxando minha camisa


para o lado para pressionar um beijo abaixo da minha clavícula.

— Devemos conduzir um experimento... Oh, sim. — gemi


enquanto suas mãos deslizavam pelos meus lados e caíam debaixo da
minha camisa, tocando a pele nua do meu estômago.

Minha pele se sentia superaquecida, mais sensível do que


costumava ser. O próprio roçar de seus dedos em minhas costelas
enviou um choque quase doloroso de desejo através de mim.

— Estava sentindo minha falta, né? — Ele perguntou, parecendo


satisfeito consigo mesmo enquanto eu rebolava contra ele. — Então, se
eu fizesse isso... — ele parou quando seus dedos inesperadamente
pressionaram entre minhas coxas, fazendo-me soltar um gemido. —
Sim, eu pensei assim. Aposto que bastariam cinco minutos da minha
língua nesta doce boceta e você estaria gritando meu nome.

Ele ganharia essa aposta.

— Mas não vou fazer isso.

— Por que não? — choraminguei quando seus dedos


pressionaram meu clitóris e depois se afastaram.

— Porque vou fazer você implorar por isso. — ele me informou, as


mãos voltando para a bainha da minha blusa, lentamente levantando-a
para cima. — Acho que ganhei o direito de torturá-la depois que você
me fez pensar por uma semana inteira que nunca mais a veria.

— Não seria mais divertido arrancar a roupa um do outro e depois


transarmos até esquecer todas essas outras coisas? — sugeri enquanto
meus braços passavam por cima da minha cabeça e ele descartava
minha camisa, deixando-me nua da cintura para cima.

Havia uma risada estridente de Mark enquanto ele se abaixava na


minha frente, com as mãos indo para a cintura de minhas calças. —
Boa tentativa, baby. — ele disse enquanto o tecido deslizava para baixo

~ 125 ~
e eu saí das calças e da calcinha. — Mas você terá que se resignar a
esta realidade. — ele me disse enquanto a cabeça dele se abaixava, seus
dedos me espalhavam e sua língua deslizava entre minhas dobras.

Minhas pernas tremulavam tão forte que eu tinha que manter


minhas mãos em seus ombros para me segurar enquanto ele
continuava, levando-me para cima, chegando ao ponto de provar seu
ponto anterior. Mas assim que meu sexo começou a apertar, quando eu
tinha certeza de que o tormento ia acabar, ele se afastou, olhando para
mim com um sorriso perverso.

— Eu odeio você. — gritei quando ele pôs-se de pé, mãos indo aos
meus quadris, levando-me para a cama, depois me pressionando contra
ela.

— E, no entanto, você vai se deitar aí e tocar sua boceta como


uma boa garota enquanto eu tiro essas malditas roupas.

Ele estava certo; estava totalmente certo.

Provei isso deixando as pernas se abrirem levemente, deslizando


minha mão entre elas enquanto ele olhava para mim.

— Vê? — Ele perguntou, a voz mais profunda, olhos mais


encapuzados. Ele estendeu a mão para as costas, puxando sua blusa e
jogando-a do outro lado. — Espalhe suas pernas, baby. Deixe-me ver
você deslizar esse dedo dentro dessa boceta molhada.

E realmente, com ele olhando para mim com aqueles lindos olhos,
falando comigo naquela voz sensual, de pé, parecendo um deus com
todos aqueles músculos, havia alguma forma de negar o que ele queria?

Enquanto meu dedo deslizava para baixo, suas mãos também


desceram, abrindo o botão e o zíper, depois deslizando os jeans e a
cueca.

Houve um aperto de pré-orgasmo distinto à medida que seu pênis


ficou à vista, duro e tenso e cheio de promessas.

— Agora, Scotti. — ele exigiu em um som que não era mais do que
um grunhido.

Assim como ele ordenou, meu dedo deslizou enquanto sua mão
enrolava seu pênis, acariciando-o até a base.

Depois disso, bem, tudo o que soube era o desejo que senti por
dentro de ver seu pênis, ao imaginar que estaria enterrado dentro de

~ 126 ~
mim novamente. Nunca notei antes como era quase insuportavelmente
sexy assistir a um homem se tocar, especialmente quando o fazia ao
mesmo tempo em que observava você ficar ainda mais inebriante.

Estava tão absorta nesses pensamentos que nem vi sua outra


mão alcançar e apertar meu pulso, segurando-o. — Você não goza até
que eu diga para você gozar. — ele rosnou, acariciando-se mais rápido.

E, desesperada para levá-lo ao limite, sentei-me, cobrindo sua


mão com a minha, então inclinando-me para levá-lo na minha boca.

— Porra. — ele rosnou, a mão indo para a parte de trás da minha


cabeça, deslizando no meu cabelo na base do meu pescoço, curvando-
se e puxando até o ponto de dor.

Mas ele não me deixou torturá-lo por muito tempo.

Num momento eu o levava profundamente. A seguir, houve uma


dor penetrante no meu couro cabeludo enquanto ele me puxava de
volta, torcendo mais forte, fazendo-me olhar para ele.

— Na cama, de quatro. — ele exigiu, antecipação estremecendo


pela minha barriga.

Não consegui me mover rápido o suficiente.

Fiquei vagamente ciente dele alcançando suas calças e o som do


preservativo antes de sentir suas mãos afundarem nos meus quadris,
me puxando para trás, depois deixando seus dedos escorregarem pela
minha barriga até meus seios, rolando os mamilos com perfeita
pressão, fazendo-me descaradamente pressionar minha bunda contra
ele.

Suas mãos deslizaram pelas minhas costas, uma agarrando forte


a minha bunda, a outra se movendo entre minhas coxas e afundando
dois dedos dentro de mim profundamente. Antes que eu pudesse
mesmo registrar a invasão, seus dedos estavam me fodendo duro,
rápido e implacavelmente, fazendo-me cair meio para frente, os dedos
cavando nos lençóis.

— Mark, por favor. — implorei, rosto enterrado nos lençóis


enquanto seus dedos ficavam mais rápidos, mais duros.

— Por favor, o quê? — Ele perguntou, tocando em si mesmo.

— Por favor, foda-me. — esclareci, sentindo seus dedos se


afastarem de mim.

~ 127 ~
Mal houve uma pausa antes que seu pau estivesse dentro de
mim, incrivelmente profundo, com pressão suficiente para que todo o
meu corpo se movesse para frente. Ele deslizou sua mão pelas minhas
costas para afundar as mãos nos meus cabelos, enrolando,
embrulhando e puxando, usando isso para me segurar no lugar quando
ele começou a me foder.

— Oh, meu Deus. — choraminguei, descaradamente empurrando


de volta para ele enquanto ele afundava para frente, levando-o tão
profundo quanto meu corpo iria permitir, indo em direção ao clímax
mais rápido do que nunca. Podia sentir minhas paredes apertadas,
quase dolorosamente intensas.

— Não. — Mark rosnou, puxando completamente para fora de


mim quando pensava que o tormento chegaria a um final glorioso.

— Não. — choraminguei, caindo na cama enquanto sua mão me


deu uma bofetada com força o suficiente para ter certeza de que haveria
uma marca vermelha lá mais tarde.

Mas antes que eu pudesse registrar a picada completa, suas mãos


estavam agarrando meus quadris e me jogando deitada de costas,
pegando minhas pernas e arrastando-as para trás, então minha bunda
estava fora da cama, minhas pernas descansando em seus ombros.

Suas mãos deslizaram para cima e para baixo na minha


panturrilha e seu sorriso maroto surgiu de novo, trazendo uma
estranha sensação de aperto começando no meu peito. Era algo que eu
tinha certeza de nunca ter sentido antes e, portanto, não podia nomear,
mas era uma mistura de incrível e aterrorizante, o que quer que fosse.

— Tenho mesmo que fazer você sofrer. — ele me disse, beijando o


interior do meu tornozelo. — Daí você não vai fugir novamente sem falar
comigo primeiro.

Então com isso, senti seu pênis pressionar e lentamente me


penetrar, sem pressa, doce. Uma das suas mãos deslizou para baixo e
entre minhas coxas, movendo-se suavemente sobre meu clitóris
enquanto seu olhar encontrava o meu, sustentando esse olhar.

E tive certeza de que nunca me senti mais exposta como naquele


momento. Vulnerável. Completamente desnuda para outra pessoa.

Onde talvez eu devesse me sentir assustada ou desconfortável,


cheia de dores, tudo o que conseguia sentir era um pesado tipo de
acerto.

~ 128 ~
Parecendo que ele mesmo sentia esse peso - ou possivelmente era
só eu projetando meus próprios sentimentos sobre ele - Mark abaixou
minhas pernas, envolvendo-as ao redor de sua cintura, depois se
inclinou para frente, pressionando seu corpo completamente no meu.
Foi a primeira vez que percebi o quanto eu queria esse contato.

Suas mãos alcançaram as minhas, enroscando-se entre meus


dedos, e segurando-os contra a cama enquanto seu rosto se abaixava e
seus lábios reivindicavam os meus.

Então ele não estava mais me fodendo.

Ele estava fazendo algo que tinha certeza de que nunca ter
experimentado antes.

Ele estava fazendo amor.

E todas as vezes em que me encolhi com aquela frase, achei que


era brega, ridículo, antiquado, bem, eu estava errada.

Isso não era brega ou ridículo ou antiquado.

Era fantástico.

Quase esmagador.

Mais intenso que qualquer coisa que já havia experimentado


antes.

Enquanto ele me levava ao limite, desta vez eu sabia que ele iria
me deixar chegar lá, enquanto seus lábios suavemente pertenciam aos
meus, senti uma picada de lágrimas nos meus olhos que eu tive que
lutar para mantê-las longe, ao mesmo tempo em que Mark me
pressionava no vazio suspenso.

Seus lábios soltaram os meus quando ele trouxe para cima, me


observando com olhos intensos. — Quero ver você gozar. — ele me
disse, nada mais do que um sussurro áspero quando seu pênis
pressionou dentro de mim mais uma vez e eu... Completamente
desmoronei.

Meus dedos deixaram marcas de unhas em seus ombros quando


gritei seu nome, as ondas batendo contra mim sem parar enquanto
Mark continuava acariciando-me, prolongando.

— Lindo. — ele declarou quando a última onda se instalou,


investindo profundamente uma última vez e depois gozando com meu
nome em seus lábios.

~ 129 ~
O rosto dele enterrou-se no meu pescoço e minhas pernas e meus
braços o envolveram, segurando-o talvez muito apertado.

Não queria que o momento terminasse.

Queria ficar assim por horas, dias, para sempre.

Até que finalmente Mark se empurrou contra mim, plantando um


beijo no meu ombro antes de pressionar as mãos. — Deixe-me levantar,
querida. — ele meio perguntou, meio declarou com uma voz calma,
pousando um doce beijo nos meus lábios enquanto eu forçava minhas
pernas e braços a desistir do seu apoio.

Ele se afastou da cama e saiu do quarto para o banheiro. Eu me


obriguei a sentar na cama e ajeitar as cobertas, respirando
profundamente para manter tudo junto, então não iria fazer algo
insano, como perguntar-lhe, logo após a sessão de sexo que
acabávamos de ter, se ele sentia a mesma conexão intensa.

Porque, convenhamos, não era o tipo de conversa que um homem


tinha após o sexo. Era demais, muito cedo. Mesmo que ele te
perseguisse até seu esconderijo e fizesse você reavaliar seus planos de
vida para que ele pudesse talvez ter mais de você.

Mesmo assim, parecia muito arriscado.

Eu não queria arruinar o que estava parecia ser uma coisa boa,
por ir fundo rápido demais.

Talvez, talvez, se, ou quando eu discutisse isso com meus irmãos,


pudéssemos ficar por aí. Havia uma chance, embora pequena, de que
pudesse conhecer Mark bem o suficiente para contar a ele como eu me
senti com ele, nesta cama, dentro desta encantadora casa, onde passei
tanto tempo infeliz desejando poder ter mais dele.

Isso seria legal.

— Essa banheira parece ser grande o bastante para dois. — Mark


me informou enquanto caminhava de volta, maravilhosamente nu,
lindamente despreocupado com aquele fato, cabelo bagunçado, sorriso
maroto. — Preciso tirar um cochilo e então podemos usar isso. Imagino
que esses jatos possam ser muito divertidos se pudermos colocá-los na
posição certa. — ele prosseguiu, deixando meu sexo se excitar com a
ideia, apesar do fato de que o orgasmo que acabei de ter deveria ter sido
o suficiente para me fazer durar dias, semanas, uma vida inteira.

~ 130 ~
— Tentando me torturar mais um pouco? — perguntei quando ele
afastou os lençóis e deslizou, sentando-se levemente contra a cabeceira
da cama e puxando-me para que minhas costas estivessem contra seu
peito, seus braços em minha frente.

— Você me torturou primeiro. Você mereceu. — ele me informou,


seus dedos roçavam minha barriga.

Meus olhos se estreitaram quando meu corpo endureceu. — O


que você está fazendo?

— Procurando por mais pontos de cócegas. Ops. — ele disse


quando a ponta dos dedos atravessou o sensível lado de baixo do meu
seio. — Encontrei um ponto quente em vez disso. Catalogando isso para
mais tarde. De volta às cócegas... Ah, aí está! — Ele declarou quando
seu toque leve encontrou minhas costelas, e eu gritei automaticamente
e tentei me afastar. — Não se preocupe. Não estou torturando você
agora. Apenas mantendo isso em mente na próxima vez que seu lado
teimoso decidir fugir ao invés de conversar.

— Tenho certeza de que a mulher é geralmente aquela que quer


conversar.

— Tenho certeza de que o homem geralmente é o único que está


correndo assustado de uma conversa. Nós temos uma coisa de reversão
de gênero rolando aqui. Sorte minha, conversar nunca foi um ponto
fraco. — Houve uma pequena pausa quando seus braços cruzavam em
mim, apertando-me forte. — E tenho algumas fodidas correntes na
minha caminhonete, se a sua bunda pensar em fugir por causa de
besteira novamente.

— Promotoria e prisão perpétua, você quer dizer.

— Sim, pequenas coisas. — ele concordou, soando como se


estivesse sorrindo.

— Você é ridículo.

— Então você deve ter alguma coisa por homens ridículos.

— Não, eu tenho alguma coisa por homens que cheiram como


grama fresca cortada e concreto. O ridículo realmente me perseguiu. —
Por causa disso, consegui seus dedos provocando as minhas costelas
por um segundo brincalhão, fazendo-me bater minha cabeça de volta
em seu ombro. — Mas você compensa isso no departamento de
culinária e quarto, — concedi.

~ 131 ~
— Então, você vai falar com seus irmãos sobre ficar?

Virei o rosto em seu pescoço, o respirei, deixando o cheiro me


acalmar. — Sim.

— Mais uma vez, com sentimento. — ele exigiu, voz baixa.

— Eu não quero que você tenha muitas esperanças. — admiti,


acrescentando silenciosamente. Ou a minha própria.

— Pense que você ficará surpresa e descobrirá que eles também


querem ficar. Nada contra a China ou a Rússia, mas eles não estarão
em casa, né? Isso é tudo o que eles sabem. Os costumes e estilo de vida
aqui são com o que eles estão acostumados. Talvez o mais importante,
— ele acrescentou, a voz soando mais clara, — eles sabem como colocar
as mulheres americanas na cama. Quem sabe o que as mulheres da
China ou da Rússia esperam de nós.

— Deus me livre se precisar levá-las a um encontro ou levar-lhes


flores, certo?

— Você quer flores, querida? Eu vou te dar flores.

— Estava sendo sarcástica. — apressei-me para dizer, não


querendo que ele pensasse que precisasse fazer coisas para “me
ganhar”. Ele já me tinha, se isso ainda não fosse tão doloroso para ele
quanto era para mim. Doloroso, porque ainda havia uma chance de ter
que desistir dele se meus irmãos achassem que era muito arriscado
ficar. Às vezes, quando eu tinha certeza de que iria seguir um caminho
sobre uma questão, eles jogariam tudo fora, indo para outro.

— Ainda te darei flores. — Mark declarou casualmente. — Você


pode praticar seu lado jardineiro e toda essa merda. — Houve um longo
silêncio ao sentir que o corpo de Mark se ondular e se soltar debaixo de
mim, bocejando. — Você não está esperando por eles até a manhã,
certo?

— Ou até mais tarde. — concordei, interiormente emocionada


com a ideia de conseguir uma noite, apenas uma única e solitária noite
sozinha com Mark. Não me preocupando com o fato de alguém entrar,
ou fazer coisas desconfortáveis ou nos ouvir demais. Só nós. Sozinhos
na floresta.

— Tudo bem. Então, durma. Então, depois banheira com jatos de


foda. Daí nos arrastamos para fora e vamos preparar comida para
ajudá-los a absorver a bebida quanto tropeçarem para dentro. E aí você
pode conversar com eles enquanto dou uma caminhada.

~ 132 ~
Eu sorri largamente porque estava bastante segura de que ele não
podia ver, e assenti com a cabeça. — Combinado. — concordei.

— Bom. Agora descanse. Estou imaginando que a banheira pode


levá-la a quatro orgasmos antes que meu pau chegue perto de você.
Você precisa de sua força.

E essa foi o boa noite de Mark Mallick.

Ridículo? Sim.

Sexy? Sim, definitivamente isso também.

Perfeito? Estava bastante convencida de que era.

Eu deveria ter ficado acordada, olhando as paredes, lembrando-


me de como era perigoso essa linha de raciocínio. Essa era a coisa
inteligente, prudente, muito Scotti para se fazer.

Mas não fiz isso.

Rolei quando ele me puxou para baixo em seu peito, afundei em


seu calor, sua força, seu cheiro reconfortante. Esmoreci quando ele
beijou minha testa. Tracei suas tatuagens enquanto ele vagava
lentamente para dormir. Então, decidindo que eu iria me deixar ter isso,
não me preocupar com isso, para não arruiná-lo, também me afundei,
me sentindo mais segura do que nunca na minha vida.

E talvez, se estivesse acordada para pensar nisso, poderia ter


percebido o que isso significava.

~ 133 ~
Onze
MARK

— Apenas se solte, baby, — eu pedi quando ela bateu de volta em


mim, as pernas tremendo, emitindo um som animal dolorido que
disparou diretamente no meu pau, que esperava sua vez, não tão
pacientemente, por três orgasmos agora.

Eu não estava errado sobre os jatos.

Estava bastante convencido de que cada casa precisava de uma


banheira como esta. Pode realmente salvar alguns malditos
casamentos. Era tão intenso que os fodidos orgasmos que Scotti estava
tendo eram fortes o suficiente para esquecer que, durante oito semanas,
seu bunda preguiçosa se esqueceu de tirar o lixo e que a máquina de
lavar louça ainda estava quebrada e você ainda tinha que mudar uma
fralda suja após três crianças e sete anos. Pode até fazê-la perdoar o
fato de que você só ficou meio duro, fodido como um macarrão e nunca
aprendeu onde estava o clitóris ou o ponto G. Você sabe, enquanto você
falava sujo e a segurava nos jatorgasmos. Sim. Inventei essa. Era
apropriado.

Mas seriamente.

Ter uma banheira de hidromassagem.

— Lá vai você, aperte meus dedos, — rosnei, parte de mim


realmente desejando que fosse meu pinto obtendo esse maldito
tratamento naquele momento, mas adorando o maldito som de seu grito
reverberando nas paredes de azulejos do banheiro.

Mudei meu pênis entre nós para acariciar sua fenda depois que
ela puxou as pernas debaixo dela, ajoelhada, as mãos na beira da
banheira enquanto lutava para recuperar o fôlego.

— Não é o momento mais ideal para trazer isso, — comecei


puxando-a contra meu peito enquanto eu continuava acariciando meu
pau contra sua boceta.

~ 134 ~
— Trazer o quê? — Ela perguntou, soando um pouco sonhadora,
completamente contente com os quatro orgasmos sólidos que já tinha.

Se eu tivesse algo a dizer sobre isso, estávamos chegando a seis.

— Testes e contracepção, — ofereci, olhando pela porta em


direção ao quarto, minha carteira e preservativos a um mundo de
distância.

— Ah.

— Sim, não é um assunto romântico, mas temos que resolver


isso, independentemente. Eu me testo duas vezes por ano. Um mês
atrás, estava limpo. Sempre usei preservativos antes. Tenho a prova no
meu telefone se quiser me dar uma bela vista da sua bunda perfeita
quando você chegar lá para isso, — sugeri, o que significa ir ao balcão
onde eu o deixei.

— Eu acredito em você.

— Sua vez, baby, — ofereci, pressionando meu pau em seu


clitóris, sorrindo quando solto um silvo.

— Tenho checado em minhas visitas semestrais ao gineco.


Sempre limpa. Sempre usei preservativos.

— E nessas visitas semestrais ao gineco, vocês falam sobre algo


além dos resultados do teste?

— Oh, falamos sobre o clima e como fazer autoexames. — Oh, —


ela acrescentou enquanto eu começava a sorrir, conhecendo seu jogo,
talvez gostando mais do que eu deveria que ela escolhesse esse
momento para jogar. — Nós também falamos sobre minha receita para
o Anel.

Obrigado porra.

Nunca, na minha vida, nunca tive a ideia de que gozar sem algo
entre mim e uma mulher parecia ser tão atraente. Na verdade, eu tinha
certeza de que não era algo sobre o qual eu pensava, exceto de
passagem. Quando você não era um cara de relacionamentos, você
nunca fodia sem proteção. Para você, claro, e para a mulher. Ninguém
queria qualquer surpresa desagradável ou um bebê não planejado de
uma ficada de uma noite.

Mas com Scotti, não sei, era diferente.

Eu queria senti-la.

~ 135 ~
Eu queria que ela me sentisse.

— Então, o que você está dizendo é... — perguntei quando o


silêncio pendia por um longo minuto.

— O que eu estou dizendo é, — ela disse, sua mão se movendo


entre nós, agarrando meu pênis e trazendo-o para a entrada de sua
boceta, — Eu preciso de você dentro de mim agora mesmo, — ela disse,
sua voz falhando enquanto lentamente deslizei dentro dela, sentindo
suas paredes quentes, molhadas e apertadas perto de mim, tendo que
respirar devagar e devagar para mantê-la unida.

Nada, nada já me fez sentir tão malditamente bem.

— Jesus, — rosnei, descansando minha testa no ombro dela


enquanto meu pau se enterrava até as bolas.

Sua cabeça caiu no meu ombro, suas mãos subindo e indo para
envolver a parte de trás do meu pescoço. Minhas próprias mãos
deixaram seus quadris para deslizar pela barriga e agarrar seus seios,
rolando seus mamilos endurecidos até que seus quadris começaram a
se contorcer contra mim, até que ela estivesse tão carente quanto eu
estava sentindo naquele momento.

Então, antes que eu pudesse me concentrar o suficiente para


pensar em assumir o controle, ela começou a empurrar contra mim,
assumindo isso em vez.

Uma das minhas mãos escorregou, alcançando seu clitóris entre


suas coxas, trabalhando ao redor, mas não tocando, sabendo que era
provavelmente nesse estágio excessivamente sensível, e sabendo que
nessa posição, meu pau estava riscando seu ponto G, e seu clitóris
estava apenas aumentando a coisa, sem entregar tudo de uma vez.

— Oh, meu Deus, — ela choramingou, me levando mais forte, a


água escorria pelos lados da banheira e ninguém deu a mínima sobre a
bagunça que teríamos que limpar depois. Estávamos muito perdidos no
momento. — Mark, eu estou...

Ela nem chegou a terminar de me contar antes que sua boceta


começasse a ter espasmos em meu pau, arrastando um grunhido
profundo de mim enquanto eu começava a empurrar para dentro dela,
seu corpo dando tudo.

— Porra, baby, — gritei quando comecei a entrar no fundo de sua


doce e acolhedora boceta.

~ 136 ~
E, tão doido como pode ter sido pensar assim antes, nada parecia
ser tão certo.

Era apenas sorte minha estar me apaixonando por alguém com


risco de fugir.

Me apaixonando?

A minha reação imediata e instintiva era fugir para longe, negar,


chamar isso de loucura.

E talvez estivesse louco, mas também era verdade.

Não havia como negar. Por que outra razão, caralho, eu teria
parado o que estava fazendo durante o horário de trabalho, para checar
meu telefone, que já tinha preparado para me alertar com notícias sobre
uma determinada loja de departamentos? Por que mais eu teria pulado
o jantar com Shane e Lea para entrar na minha caminhonete e arrastar
a bunda fora da cidade enquanto ligava para todos os criminosos que
conhecia sobre possíveis esconderijos na área do Estado de Nova
Iorque? Por que mais eu exigiria que ela mudasse todo o curso que ela
tinha estabelecido para sua vida? Por que mais eu sentiria uma
profunda necessidade de estar cru dentro dela? Para preenchê-la com
meu gozo? Para reivindicá-la de uma maneira que nunca quis antes?

Havia apenas uma resposta para tudo isso, independentemente


de como - logo iria acontecer.

Eu estava me apaixonando.

E, no final das contas, não foi tão rápido.

Shane sabia que Lea era importante quase que imediatamente.

Hunt sabia que Fee era especial.

Ryan sabia que precisava de Dusty depois de uma noite em que


ela estava muito apavorada com um ataque de pânico para ter uma
interação completamente normal.

Foi assim que aconteceu com meus pais também.

Talvez tenha algo a ver com todos nós, homens mulherengos.


Tivemos o suficiente do sabor do que não era certo para saber o gosto
do que era.

Talvez tivéssemos sorte.

~ 137 ~
Não precisamos passar semanas ou meses sentados em frente a
alguém em restaurantes antes de percebermos que estavam certos. Não
precisamos fazer listas de prós e contras. Não precisávamos pesar as
opções.

Nós simplesmente conhecemos.

Eu só sabia que era Scotti.

Era tão simples isso.

Talvez a situação não fosse a ideal? Bem, ela era uma porra de
assaltante armada, indo embora do país, então... sim.

Mas que homem não gosta de um desafio?

As coisas boas na vida nunca eram fáceis.

Se Scotti fosse a minha chance de experimentar o que Hunter,


Shane, Ryan e meus pais tinham, então, sim, eu estava disposto a dar o
melhor.

O que incluía mantê-la forte o suficiente para conversar com seus


irmãos. Então, precisávamos sair da banheira e vestir roupas antes de
aparecerem. Caso contrário, eu provavelmente não conseguiria nada
além do brilho da morte, embora todos malditamente saibam que sua
irmã não era uma virgem de olhos brilhantes que eu deflorei. Acho que
irmãos tinham que ser assim com suas irmãzinhas.

— Vamos, querida, — eu disse, soltando meus quadris para


deslizar fora dela.

— Minhas pernas são gelatina, — ela resmungou quando saí e


comecei a secar.

— Está tudo bem, então, — eu disse, amarrando uma toalha em


volta da minha cintura e alcançando-a para arrastá-la. — Você segura
em mim e eu vou te secar, — eu sugeri, já esticando para esfregar a
toalha em seu cabelo escorrendo.

— O quê? Não. Eu posso...

— Deixe-me cuidar da minha mulher? Sei que você pode fazer


isso. Então pare de encher o saco, — eu disse com um sorriso que ela
retornou enquanto lentamente caminhei para enxugá-la, notando sua
pele se ruborizando enquanto eu me movia lentamente sobre ela.
Quando olhei seu rosto, seus olhos estavam pesados de novo. Essa
mulher poderia me desgastar pra caralho. Nem pensei que fosse

~ 138 ~
possível. Também decidi que isso precisava ser uma forma de
preliminares em algum momento no futuro. Mas não está certo.
Naquele momento precisávamos nos vestir antes de sermos invadidos.
— Como elas estão se sentindo agora?

— Como o que está sentindo agora? — Ela perguntou, a voz


fazendo aquela coisa sexy e distante que fez quando ela ficava excitada.

— Você está me matando, mulher. Olhe para longe ou algo assim.


Meu estômago precisa de combustível antes que meu pau se aproxime
de você novamente.

Ela riu disso, avançando para tirar a toalha de mim e ficar de pé.
— Bem, acho que posso te alimentar então, — declarou, afastando-se
de mim e em direção ao quarto. Ela vestiu um jeans e um top preto,
deixando os pés descalços, e se afastou em direção à cozinha. — Oh,
merda. Literalmente.

— O quê? — perguntei, caminhando para trás, ainda encolhendo


os ombros na minha camisa.

— O maldito pintinho. Nós o esquecemos e... bem... ele não é


treinado. Ugh. Eca. Você é uma pequena merda, — ela disse com uma
voz de mamãe-pássaro, pegando-o e se movendo para entregá-lo para
mim. — Vá devolvê-lo a sua mãe enquanto eu limpo. — Ah, e pegue
alguns espinafres da horta. Posso fazer omeletes. Ah, sim e aqui, pegue
esta cesta e pegue os ovos.

— Bem, suponho que posso recolher alguns ovos para quebrar o


pequeno jejum, pequena dama.

— Ha, ha, — ela zombou da minha estupidez, mas estava


genuinamente sorridente. — Vá enquanto corto as batatas.

Então, fui, com o pintinho pulando na cesta, feliz como podia ser.
Realmente era um lugar agradável. Especialmente depois de uma vida
em lugares como o barraco em que ela tinha ficado por tanto tempo. A
terra estava esparramada, fazendo com que os dois acres, da minha
área fossem praticamente uma quantidade desagradável de terra, como
se fosse um quintal muito pequeno em uma grande cidade. O ar estava
limpo. Não havia sons de carro ou vizinhos.

Podia entender porque ela encontrou um pouco de paz aqui.

Era um lugar para respirar, para limpar a cabeça, para reavaliar.

~ 139 ~
E foi exatamente isso que eu esperava que ela e seus irmãos
fizessem naquela manhã. Porque eu sabia que estava certo. Estava tão
certo, maldição. Eles não tinham que ir embora. Na verdade, ao
procurar por notícias de novos assaltos, segui adiante e pesquisei todos
os antigos. Ela estava certa quando disse que se disfarçavam. Nenhum
relatório era o mesmo. Às vezes, havia ruivas, morenas. Às vezes, havia
olhos azuis, verdes, cinza. Às vezes, ela e seus irmãos eram magros,
sarados, gordos. Às vezes eles falavam em malditos gestos ou outras
línguas que ninguém mais entendia, o que eu achava ser inventado.
Eles despistavam seus rastros. Um cão de caça treinado não seria capaz
de cheirá-los. Não havia qualquer suspeita de haver cinco deles.

Eles poderiam começar de novo com seus nomes reais, conseguir


empregos reais, fazer vidas reais. E, francamente, talvez o melhor lugar
do mundo para eles fazerem isso era em Navesink Bank. Estava tão
atolado no crime que os policiais nem sequer pensariam em suspeitar
de nada. E mesmo que o fizessem, os contatos corretos no escritório da
polícia e no gabinete do promotor e eles certamente sairiam impunes.

Era a solução ideal.

E eu não estava apenas dizendo isso porque queria levar sua


bunda de volta para minha cama por um mês inteiro, eu queria vê-la na
minha cozinha cozinhando para mim, cuidando de um jardim, me
repreendendo quando estiver fazendo merda, conhecendo minha
família.

Eu estava dizendo isso porque era a maldita verdade.

Eles poderiam fazer isso dar certo.

Agora era apenas Scotti convencê-los.

Quanto de uma luta seus irmãos poderiam aguentar?

~ 140 ~
Doze
Scotti

— Pode parar por aí! — Rush me cortou quando finalmente


obriguei as palavras saírem de meus lábios depois que todos chegaram
alvoroçados bem na hora em que terminava os ovos, a fritura pipocando
anunciava que era hora de comer. Todos trocaram palavras com Mark e
comigo sobre Mark.

Mas finalmente a fome falou mais alto e eles se sentaram ao redor


da mesa na qual esbocei a ideia que Mark me havia dado na noite
anterior. Sabe, antes do sexo incrível, abraçando e adormecendo, a
sessão explosiva na banheira.

Nunca tive um homem dentro de mim sem proteção antes.


Primeiro, porque, bem, DST. Em segundo lugar, nem todos os
anticoncepcionais são infalíveis e eu não queria um bebê inesperado;
achei que minhas chances seriam inferiores a zero usando os
preservativos e o Anel. Em terceiro lugar, isso parecia um nível de
intimidade para ser com alguém especial.

Nunca tive alguém especial antes.

Mark era especial.

Que outro homem iria encontrá-la, discutir com você, dar-lhe


orgasmos incríveis, criar planos alternativos para você e dar-lhe
esperança?

— O quê? — Perguntei, me dando um frio na barriga, sabendo


que não deveria ter compartilhado minhas esperanças com eles.

— Disse que pode para por aí. Não preciso saber mais, — disse
Rush, pegando o suco de laranja. — Estou dentro. Navesink Bank foi
foda!

Tinha certeza de que estava ouvindo coisas. Sabe, tipo o que


queria ouvir.

~ 141 ~
— Tipo assim, aquele barraco não é uma fodida opção, —
continuou Atlas.

— E a gente precisa encontrar alguns trabalhos. Tipo, a gente tem


o estoque dos trabalhos que temos feito há uma década, mas dividido
por cinco, não vai durar muito tempo para qualquer um de nós. — Esse
foi Nixon.

E tinha certeza absoluta que naquele momento havia um


vazamento de gás na cabana e eu estava tendo alucinações antes de
cair morta.

Não seria uma maneira terrível de morrer - meus irmãos todos


concordando comigo, Mark ao meu lado, pegou minha coxa, me dando
um aperto reconfortante.

Muito bom.

— Parece que é unânime, fedelha, — acrescentou Kingston,


chamando minha atenção.

— O quê? — Perguntei, me sentindo completamente surpreendida


pelas suas reações.

— Pelo visto, depois de ficarmos escondidos aqui por um tempo,


podemos voltar para Navesink Bank e ajeitar as coisas.

— Tipo, a gente vai precisar ficar atento por um tempo, mas talvez
dê certo, — disse Nixon.

— De qualquer jeito, não queria ir pra porra da Rússia, —


acrescentou Rush. — Faz frio pra caralho lá.

Totalmente desconcertada, virei para Mark, minhas sobrancelhas


juntas. — Eles estão todos concordando?

— Acho que é a hora de eu falar “eu te disse”, né? — ele


perguntou, o sorriso diabólico. — Baby, eu te disse, caralho.

— Olha, — disse Nixon, apontando uma ponta da torrada para


Mark, — talvez ele não seja tão ruim. Acho que ele se encaixa aqui.

— E graças a vocês, seus merdas, — Mark disse, perfeitamente à


vontade chamando meus irmãos de merdas — ela não vai ter nenhum
problema em se defender de meus irmãos.

— Os agiotas, — disse Atlas. Se não estivesse enganada, ele disse


isso com interesse. Teria que ter uma conversa mais tarde, sozinhos.

~ 142 ~
Não estávamos negociando um negócio ilegal por outro. Se fôssemos
fazer isso, faríamos direito. Assunto encerrado. Eu não ligava se isso
significasse que eles tinham que ser frentistas ou fazer hambúrgueres
em lanchonete para ganhar a vida.

— Executores. Mas agora fazemos muito outros negócios do que


fazemos como executores.

E então ficaram quase uma hora discutindo os vários “negócios”


no quais os homens Mallick estavam metidos. Fizeram algumas
conexões. Jogaram algumas ideias no ar.

Tudo isso aconteceu enquanto eu limpava a mesa e lavava os


pratos. Porque, pelo jeito, era “papo de homem”. Não consegui dizer
uma palavra. E, francamente, fiquei muito feliz em vê-los todos se
dando tão bem com Mark que não queria estragar o momento.

Então, assim que terminei de limpar, saí silenciosamente pela


porta dos fundos e fui até a horta. — Eu não estou falando com você,
Nugget. Foi uma bagunça nojenta nesta manhã. Vou descobrir como
você continua escapando e então vai ter de passar seu tempo com sua
mamãe.

Ele claramente não prestou atenção nisso enquanto passava a


próxima hora bicando as folhas de couve e espinafre, piando e ciscando
ao meu redor.

— Acho que agora ele é seu, querida, — disse Mark, fazendo-me


pular, não acostumada a ser interrompida enquanto estava limpando a
horta. Principalmente porque meus irmãos tinham medo de eu fazê-los
trabalhar se me incomodassem.

— Não sei nada sobre galinhas, — protestei, olhando para o idiota


fofo, fingindo que meu coração não ficava todo derretido enquanto
picava em cima do meu sapato.

— Navesink Bank tem uma ótima biblioteca. Tenho certeza de que


Reese pode encontrar um livro sobre criação de frango ou algo assim.

— Não tenho onde guardá-lo, — eu disse, ouvindo talvez um


pouco de tristeza na minha voz. O que posso dizer? Nunca tive um
animal de estimação. A ideia talvez fosse um pouco mais atraente do
que eu já tinha percebido antes. Estava aprendendo muito sobre mim
agora que meu foco não era totalmente roubar lojas e vingar minha
mãe. Parecia querer muitas coisas que antes nunca imaginava que ia
gostar.

~ 143 ~
— Alguns pedaços de madeira e algumas telas, querida, e você
tem um galinheiro.

— Sim, mas não tenho onde colocar o referido galinheiro. Pelo


menos não ainda. Se eu o deixar, provavelmente se uniria com seus
amigos frangos e se esqueceria de mim. Não é para ser.

Houve uma pausa, uma que durou o suficiente para me fazer


olhar para cima. — Tudo bem, — ele disse, encolhendo os ombros. —
King pediu que eu viesse te falar que ele trouxe, nas palavras dele, “as
merdas de planta” que você pediu.

— Oh, bom, — eu murmurei, olhando ao redor, tentando


descobrir de qual planta eu queria tirar uma muda. Quando Mark ficou
ali parado, parecendo quase desconfortável, lentamente me levantei. —
Você, ah, está indo? — perguntei, tentando fingir que não fazia minha
barriga retorcer. Claro que mais cedo ou mais tarde ele precisaria ir. Ele
saiu numa pressa louca. Provavelmente deixou uma tonelada de serviço
sem fazer e as luzes todas acesas ou algo assim.

— Estava com pressa. Acho que nem mesmo tranquei a porra da


porta, — ele disse com um sorriso.

— Oh, hum, tudo bem. Bem... ah... acho que vou te ver...

— Nos fundos da casa? Depois, dentro de casa enquanto você faz


uma mala? Depois, de novo, no meu carro de volta a Navesink Bank?
Sim, acho que você vai me ver durante tudo isso. Tipo, você não
consegue tirar os olhos de mim.

Ele queria que eu voltasse com ele? Certo?

Sem palavras, tudo que consegui dizer foi um estúpido, — O quê?

— Não se preocupe, já acertei com seus guardiões. Eles estão bem


com isso, desde que eu garanta que nenhum tira esteja na sua cola.
Eles falaram que iriam ficar aqui e resolver algumas coisas, fazer
algumas pesquisas, procurar lugares para ficar.

— Mas eu preciso fazer tudo isso também e...

— E tenho esse pequeno aparelho chamado de roteador wireless


na minha casa. Você pode sentar sua bunda na minha cama, de
preferência nua, e procurar até que seu coração esteja contente.
Fazendo apenas pausas curtas para comer e me deixar te comer, boba.

~ 144 ~
Um grande e ridículo sorriso surgiu meus lábios por um minuto,
fazendo seus olhos mais quentes, antes de deixar minha boca em uma
linha reta, tentando me fingir de séria. — Bem, suponho que isso
poderia funcionar.

— Bom, então vá, — ele exigiu, me dando uma bofetada na bunda


para me fazer por um pé para a frente.

— Ow, — resmunguei, olhando por cima de meu ombro para ele


com olhos enviesados enquanto eu começava a me afastar.

— Você adorou, — ele revirou com um sorriso diabólico.

E, maldição, eu adorei.

Eu realmente adorei.

***

— Tudo bem, — falei num fôlego quando sentei no banco do


passageiro de sua caminhonete uma hora depois. Precisava conversar
com meus irmãos sobre o cultivo da horta e alimentar as galinhas e
deixá-las vagar, mas só até o crepúsculo. Você podia jurar que eu
estava tentando explicar mecânica quântica para eles pelo jeito como
pareciam assustados.

Pobre Kingston ficaria sobrecarregado com o trabalho na minha


ausência.

Mas eu me lembrei, antes que a culpa pudesse se estabelecer, que


era só até que todos encontrassem seus próprios lugares e caminhos na
vida. Em breve ele seria livre para fazer o que quisesse.

Eu queria muito o fim de semana prolongado com Mark.

E King, o santo de um homem que era, não iria ficar no caminho


disso.

Então, minhas coisas estavam escondidas atrás e nós estávamos


prontos para ir.

— Espere, o que é isso... — comecei a perguntar sobre um


estranho barulho no pequeno banco traseiro.

~ 145 ~
— Nugget estava tendo ansiedade de separação, — explicou Mark,
casual como poderia ser, quando alcançou atrás dele para pegar a
pequena caixa de papelão e me entregar. — Ele me disse que, já que
sou um grande, sarado e sexy proprietário de uma empreiteira, posso
com uma puta certeza construir um galinheiro para ele.

Eu sorri para isso, encantada mais do que achava ser possível. —


E tenho certeza de que essas eram suas exatas palavras.

— Absolutamente, — concordou Mark, afastando-se da entrada.


— Ele estava muito inflexível sobre a parte “grande, sarado e sexy”. Um
pouco estranho, mas oi, cada um na sua. Os pintinhos sempre
gostaram de mim, — ele acrescentou com uma piscadinha quando
começamos lentamente descer pela estrada traseira.

A viagem de volta ao Navesink Bank levou quase nove horas e


quando estacionamos, estávamos ambos doloridos, famintos, irritados e
cansados.

Mark me entregou um cardápio de algum lugar chamado Famiglia


e, em seguida, levou Nugget no andar de cima para lhe dar uma casa
temporária na banheira e um pouco de comida que ele foi inteligente o
suficiente para roubar na cabana.

Comemos, subimos na cama e, muito cansados para pensar em


sexo, caímos em um sono exausto abraçados, como se fosse uma coisa
que fazíamos há séculos em vez de há apenas alguns dias.

***

Eu não tinha certeza do que realmente me acordou na manhã


seguinte.

Tudo o que sabia era que em um minuto que eu estava feliz


dormindo. No seguinte, estava pulando da cama, completamente
acordada, completamente sozinha.

Como se respondesse a minha pergunta não feita, Mark veio


andando com apenas calças de pijama xadrez preto e branco
penduradas indecentemente abaixo de seus quadris e segurando uma
xícara de café fumegante.

~ 146 ~
— Estamos sendo invadidos, — ele me informou, fazendo meu
coração disparar na minha garganta.

— O quê! — gritei, imediatamente presumindo que ele queria dizer


pela polícia, embora por que ele estava tão calmo sobre isso estava
completamente além da minha compreensão.

— Não os tiras, — ele disse, entendendo a situação


imediatamente enquanto caminhava para se sentar ao lado da cama,
colocando o café sobre o criado. — Minha família, — ele esclareceu, não
conseguindo me acalmar um pouco. A família dele? Quer dizer... toda a
sua família? Ele me deu um olhar envergonhado, provavelmente
sacando meu medo. Nem sequer trouxe alguma coisa para “conhecer a
família”. — Burrice minha atender ao telefone esta manhã e mencionar
a Eli que você estava aqui. E, como sempre parece acontecer com a
minha família, passou de um para outro dos irmãos que agora têm
mulheres. Então, passa das mulheres para meus pais. E, para encurtar
a longa história, estamos sendo invadidos. Sim, por todos eles. E...
agora mesmo.

Como se para provar o que disse, houve uma batida na porta


abaixo de nós e, se você ouvisse atentamente, o som distinto de um
grupo bastante grande de pessoas.

— Ah, não, — reclamei, balançando a cabeça um pouco


freneticamente, sabendo que eu parecia uma louca com meus olhos
enormes e cabelos desarrumados e nem especialmente cuidada. — Não.
Não posso fazer isso hoje. Diga-lhes que fui embora. Já fiquei cansada
de você, — acrescentei, sem sorrir quando ele riu, porque não era
divertido para mim. — Por favor, — pedi, os ombros caíram.

— Nunca fez o lance de reunião-de-família, hein? — Ele


perguntou, aproximando-se para pousar uma mão na minha coxa nua,
nua porque dormi apenas com sua camiseta e minha calcinha. — Sei o
que parece, mas não é grande coisa. Eles são todos um tanto
barulhentos e loucos, mas são legais pra caralho. Não vão te massacrar
nem nada assim.

— Mark, você e eu mal estamos...

— Você me deixa te foder sem nada entre a gente. Para mim, isso
não é “mal estamos” qualquer coisa, e tenho certeza de que também não
é “mal estamos” para você. Então pegue sua xícara de café, beba-o,
tome banho, se recomponha. Quando terminar e estiver pronta, leve
sua bela bunda para baixo e conheça minha família louca, ok?

~ 147 ~
Havia uma espécie de intensidade, uma necessidade em seu rosto
naquele momento, que me fez perceber como era grande para ele me
apresentar para eles. Ouvi falar muito sobre a família Mallick, como ele
ouviu falar muito sobre meus irmãos. Toda vez que falava sobre eles,
mesmo que ele estivesse reclamando ou tirando sarro deles, era com
amor, com um vínculo profundo e inabalável. Entendia o quanto isso
significava porque era exatamente como eu falava de minha própria
família.

Também sabia que Mark nunca teve um relacionamento, que


nunca apresentou sua família a uma mulher do tipo “isso é sério”.

Então, isso era uma grande coisa para ele.

E ele precisava que eu não desse uma merda de chilique, que eu


fugisse.

Precisava que eu tomasse meu café, tomasse meu banho, me


acalmasse, me vestisse, descesse e conhecesse sua família, aguentasse
qualquer coisa que me jogarem, mesmo que ele estivesse errado e eles
quisessem me massacrar. Ele precisava disso de mim. Já que ele não
tinha sido nada além de bom para mim, eu devia isso a ele.

— Tudo bem, — concordei, respirando tão fundo, e peguei o café


quente. — Pode demorar um pouco, mas prometo que descerei.

Sua mão apertou minha coxa tranquilizando-me enquanto toda a


tensão deixava seu queixo e ombros, deixando-me saber que eu disse a
coisa certa.

— Sem pressa. Vai por mim, essa tempestade demora uma meia
hora. E aposto o meu braço esquerdo que Eli trouxe o vira-lata, o que
significa que ele e as meninas vão bajulá-lo. Posso mostrar-lhes seu
pintinho também se você demorar muito. — Ele se moveu para se
levantar, depois se virou, esticou-se, segurou-me pela nuca e me deu
um beijo duro e rápido. — Obrigado, baby.

Com isso, trazendo ao meu peito esse estranho aperto novamente,


ele se foi, fechando a porta atrás dele, deixando claro que levasse o meu
próprio tempo, que não estava me apressando.

No entanto, dois minutos depois, quando o clã encheu o andar de


baixo, a porta fechada não fez nada para abafar a intensidade desse
grupo particular de pessoas.

~ 148 ~
— Que merda é essa pequena merda penugenta? — Era uma
frase que me fez abrir um sorriso enorme sozinha na cama enquanto
terminava meu café.

Essa pequena merda penugenta devia ser Nugget.

E de repente, não estava mais preocupada. Não queria


interromper. Fui para o banheiro, tomei banho rapidamente e me tornei
apresentável, vestindo jeans skinny preta e uma camiseta branca
simples, checando meu cabelo mais uma vez, depois indo para a porta
para descer, percebendo o quanto eu realmente queria conhecê-los - as
pessoas que fizeram de Mark quem ele era. Tive a sensação de que
todos deviam ser bastante fantásticos para ajudar a moldar o homem
que ele era.

O homem pelo qual definitivamente eu começava a me apaixonar.

Não, nem sequer estava certo.

Tinha certeza de que estava mais que apaixonada. Já estava


amando.

Descaradamente ligada nisso.

Amor.

Oh Deus.

Esse conhecimento me fez congelar no fim da escada,


completamente incapaz de afastar os pensamentos e continuar me
movendo.

— Respire fundo, — uma voz feminina falou do nada, me fazendo


virar e encontrar uma das mulheres das fotos - loira, de olhos verdes,
de aparência doce - de pé em um canto atrás da porta da frente, ela
com a mão na barriga, seus olhos um pouco selvagens.

— Como? — perguntei, cabeça dobrada para o lado.

— Eles são esmagadores, — ela esclareceu. — Eu sei. Confie em


mim, eu sei, — ela disse, levantando as sobrancelhas. — Por isso, estou
de pé neste canto e respirando fundo. É só... muito cheio aqui. Ainda
não estou acostumada. Além do cachorro e do pintinho e... sim, eu
precisava de um minuto. Você pode demorar um minuto comigo. Eles
não virão nos procurar. Sabem que preciso sair às vezes.

— Você tem ataques de pânico? — perguntei, pensando que


explicava os olhos arregalados e a coisa de respiração profunda.

~ 149 ~
— Eu era agorafóbica, e agora, bem, é apenas... um processo.
Progresso e regressão. Como agora, estou regredindo um pouco, e então
vou progredir e volto a minha bunda lá outra vez. Eu sou Dusty, — Ela
disse, me oferecendo um sorriso gentil.

— Eu sou Scotti, — concordei, balançando a cabeça.

— Estou com Ryan, — ela explicou, me dando uma chance de


esclarecer algumas coisas antes de ser bombardeada por
personalidades fortes. — Ele será o único em um terno.

— Oh, sim, eu o vi no ginásio uma vez. Ele é o mais... sério. O


mais velho.

— Isso, — ela concordou, balançando a cabeça. — Ele não é tão


intimidador como parece a princípio. Nenhum deles é realmente. Eles
são apenas um pouco, ah, intensos. Mas eles têm sido legais para todas
as namoradas sérias.

— É bom saber. Quer entrar comigo ou ainda precisa de um


minuto? — ofereço, notando que ela tinha relaxado um pouco, mas sua
mão ainda estava em sua barriga enquanto respirava profundamente.

— Preciso de um minuto, — admitiu. — Mas vou entrar. Você


ficará bem.

Eu lhe dei um sorriso, talvez um pouco encantada que, no meio


de um ataque de pânico, sentiu a necessidade de tentar me consolar.

— Não estou dizendo isso, — disse outra voz feminina enquanto


eu voltava para a sala de estar. Parecia que todos estavam na área da
cozinha. — Estou dizendo que se você não parar de estragá-la, vai estar
no chá gelado com açúcar e mel.

— Chá gelado com açúcar e mel? — Perguntou um dos homens,


claramente soando divertido. — Você está preocupada com nossas
orelhas virgens, Fee?

— Becca gosta de palavrões agora, — Fee informa a todos. — E


ela gosta de repeti-los. Alto. Na escola. Então, todos terão que
intensificar o seu jogo de palavras até ela passar por esta pequena fase.

— Você espera que todos nós... ah, aí está ela. — Isso veio do que
conheci como Shane, o maior, o dono da academia. — Esperava que
você colocasse essa mer... — ele começou, apenas para cortar quando
Fee lhe deu um olhar duro, — este chá gelado com açúcar e mel por
pelo menos outros vinte minutos.

~ 150 ~
— Pessoal, — disse Mark, me dando um sorriso enquanto
caminhava em minha direção. — Esta é Scotti. Scotti, estes são, bem,
todos. Mas vamos começar com meus pais. Esta é Helen e Charlie, —
ele apresentou, levando-me a uma versão mais antiga de si mesmo e
uma mulher maravilhosa com um corpo muito bom para quem deu à
luz cinco filhos gigantes.

— Prazer em conhecê-los, — eu disse, apertando as mãos quando


foram oferecidas, sentindo-me estranha tanto quanto a isso o tempo
todo.

— Então você está no... — Helen começou, olhando para suas


netas, então voltou para mim, — no comércio de aquisições menos que
legais.

Se eu tomasse uma bebida na minha boca, isso teria sido um


verdadeiro momento de cuspir.

— Respire, — uma voz recém-familiar me chamou do outro lado


da sala enquanto as meninas levavam seu jogo de busca para fora no
quintal. Virei minha cabeça sobre meu ombro para encontrar Dusty
enrolada no lado de Ryan, seu braço possessivamente ao redor dela. —
Eu era uma enclausurada que escondia drogas para meu amigo
traficante quando Ryan me conheceu.

— E eu era uma operadora de sexo por telefone com um problema


de automutilação e uma fodida – Deus, como é bom dizer fodida - — a
outra loira, a pessoa com um monte de tatuagens disse — infância...
quando eles me conheceram pela primeira vez.

— E eu era uma operadora de sexo por telefone fugindo do MC em


que cresci, — a última mulher disse, era alta, morena de pernas longas
que talvez fosse apenas linda demais.

A questão é, — Helen disse com um sorriso — Não disse isso


como um julgamento, apenas uma observação. Sempre me perguntei
sobre o tipo de mulher que poderia controlar esse mulherengo, — disse
ela, dando um tapa na nuca do filho, mas dando-lhe um caloroso
sorriso. — Agora sei. Deveria ter adivinhado que seria alguma durona
assaltante com botas de combate. Isso soa exatamente o tipo dele.

— Obrigado, Mãe, — disse Mark, balançando a cabeça, parecendo


um pouco envergonhado. — E ela está vindo pra cá, — acrescentou.

— E morar aqui. — Era Charlie.

~ 151 ~
Não era uma pergunta, mas respondi de qualquer maneira. —
Parece um bom lugar para um criminoso se aposentar. Ou, um grupo
inteiro deles para ser exata.

— Sim, já sabemos sobre os irmãos, — Helen disse, balançando a


cabeça. — Tenho que ver como expandir minha sala de jantar. Hunt
também precisará me fazer uma mesa de jantar muito maior.

E aquela frase, ali mesmo, lembrou-me de algo que quase


esqueci.

Veja, estávamos tão ocupados vingando o mau tratamento de


nossa mãe que começamos a esquecer das coisas que mais sentimos
sobre ela. Maternidade. Esse coração enorme e aberto. Essa vontade de
abrir os braços e a sua mesa. Esse espírito generoso, eu estava
convencida de que você nunca encontraria verdadeiramente figuras
maternas.

Havia a mãe de Mark, uma mulher que gritava “força” de seus


cabelos incríveis até seus calcanhares, que só me conhecia há dois
minutos, que não conhecia nada sobre mim, minha vida ou meus
irmãos, mas estava disposta a convidar todos nós para dentro de sua
casa, cozinhar para nós, compartilhar a conversa do jantar conosco.

Não acho que já me senti mais acolhida na minha vida.

Não me deixava pensar frequentemente sobre o que perdi da


minha mãe. Sabendo, talvez, que perdi tudo, desde o modo como ela
abria todas as cortinas pela manhã para deixar entrar a luz do sol, ou o
modo como ela compraria grandes potes de sorvete quando um de nós
tivesse um dia difícil e se sentasse com a gente em frente da TV,
comendo-o no próprio pote, até o modo como manteve a ideia de
acreditar em Papai Noel até a nossa adolescência, embora soubesse
muito bem que todos deixamos de acreditar aos dez. Perdi a rabanada
na manhã de Natal e o recheio tradicional que ela fazia para o Dia de
Ação de Graças. Eu sentia falta de seu ouvir sem julgar, de seu coração
que me amava apesar de todos os meus defeitos, sua voz terrível
quando cantava e de sua determinação em manter todos nós por perto.
Talvez porque ela soubesse, como todos os pais sabiam, que ela iria
desaparecer um dia e tudo o que teria deixado é um ao outro.

— Você está bem? — Mark perguntou enquanto as meninas


voltavam correndo, atraindo a atenção de todos.

E porque senti isso, porque doía, porque sabia que a única


maneira de ter qualquer tipo de relacionamento era compartilhando

~ 152 ~
esse tipo de coisa, me inclinei mais perto, abaixei minha voz e admiti, —
Sinto falta da minha mãe.

Os braços dele rodearam-me, puxando-me para perto, segurando


um pouco apertado como se dissesse que não conseguia imaginar, mas
entendia.

— Você é convidada a compartilhar a minha, — ele ofereceu, me


dando um aperto antes de recuar um pouco.

Claro, não a conhecia. E, provavelmente, ela não tinha nada de


minha mãe. Mas, independentemente disso, isso significava algo para
mim. Algum dia, se as coisas progredissem, seria bom saber que
haveria uma figura materna na minha vida novamente. Inferno, mesmo
na vida de meus irmãos. Claro, fui uma substituta. Passei a roupa.
Limpei. Preocupei-me com eles quando estavam doentes ou feridos.
Cozinhei em ocasiões especiais. Mas sabia que não era a mesma coisa.

Eles precisavam de uma mãe, tanto quanto eu. E apesar de terem


tido mais tempo com ela do que eu, isso não significava que ainda não
precisavam. Não acho que você já tenha parado de precisar de sua mãe.

— Ela parece bastante durona, — admiti.

— Você não tem ideia, — disse ele, me dando um olhar perverso


que prometia muitas histórias futuras.

— Então, nós a estamos roubando, — declarou Fee de repente,


caminhado para ficar na frente de seu cunhado. Como se tivessem
coreografado, Lea também se mudou.

— Eu fingiria lutar por você, — disse Mark, soltando-me, — mas


não tenho uma chance contra elas.

— Viu como nós o treinamos bem? — Fee perguntou, acariciando


sua bochecha e me dando um sorriso. — Quer pegar um pouco de ar?
— Ela perguntou, dando meia volta antes mesmo de eu terminar de
assentir.

Estava vagamente consciente de que Dusty se separava de Ryan e


também vinha até nós.

— Becca, — Fee chamou quando nós saímos para encontrar suas


três filhas correndo pelo quintal. — Tio Mark disse que você poderia
pular loucamente na cama, — ela anunciou com uma voz dramática,
fazendo as garotas gritarem e correram para dentro para ver se era
verdade. Ela me deu um sorriso. — Esse é o troco por ele ter deixado as

~ 153 ~
minhas meninas animadas no mês passado com uma máquina de
karaokê. Amo minhas meninas, mas Deus do céu, nenhum delas é
capaz de cantar. Fizeram todos os cães no bairro gritarem de
sofrimento. Então, você é Scotti.

— Eu sou Scotti, — concordei, balançando a cabeça.

— Vou ser sincera com você, não pensei que Mark iria encontrar
uma garota. Ainda mais um assaltante fodona. Você realmente
aumentou nosso índice de popularidade. Navesink Bank tem muitas
mulheres fodásticas desde fabricantes de bombas até gurus da
autodefesa e assim por diante. Precisamos que todas as outras
saibam...

— Ninguém pode saber sobre o meu passado, — eu a cortei, a voz


talvez seja um pouco estridente considerando que ela era alguém com
quem queria me dar bem, mas minha necessidade de autopreservação
era tão forte que não havia maneira de não ser um pouquinho rude.

— Bem, duh, — ela disse, balançando os olhos um pouco. — Mas


só para os amigos de confiança, né? É legal ter uma doida varrida
fodona por perto. Quero dizer, Helen é foda e Lea costumava ser uma
motoqueira e outras coisas. Mas, enfim, Dusty e eu somos quase
dolorosamente normais. Desculpe, Dust. Sei que você tem o lance das
drogas e da agorafobia, mas antes disso era professora de escola. E
enquanto tenho essa história toda fodida e tenho um negócio de sexo
por telefone, agora sou meio que uma mãe chata e esposa.

— Você pode não fazer bombas, mas parece ser muito boa no que
faz do seu jeito. Quem mais poderia dominar os homens Mallick? —
perguntei.

Ela sorriu com isso quando Lea se virou para mim. — Então,
agora que você está se aposentando, o que planeja fazer? Porque, ah,
nós acabamos de perder outra garota para a licença de maternidade.
Sei lá, você fica bem dizendo aos homens que o pau minúsculo deles é a
coisa mais patética que você já viu e não é digno de sua linda e rosada
xaninha, certo?

— Lea! — Dusty estalou, corando por mim.

Mas não pude evitar, estava rindo. — Oh, sim, totalmente. Digo
isso o tempo todo.

— Na verdade, — disse Fee, revirando os olhos. — Esses seus


irmãos... todos eles vão precisar de emprego, certo?

~ 154 ~
— Todos mesmos, — eu disse, encolhendo os ombros.

— Sim, não. Escuta isso. Tivemos uma quantidade crescente de


chamadas femininas pedindo e perguntando se tínhamos algum homem
trabalhando. Nunca me dei conta de que havia um mercado para isso,
mas aparentemente é grande e crescente. Estava pensando em tentar
diversificar isso, mas não tenho ideia de onde encontrar homens que
estariam dispostos a falar coisas sujas com mulheres solitárias a noite
toda. — Ela deu um encolher de ombros. — Não conheço seus irmãos,
mas se algum deles estiver interessado, mande-os para mim.

Não conseguia ver Kingston, Nixon ou Atlas, mas por uma razão
estranha, pensei que talvez Rush achasse isso interessante. Talvez eu
mencionasse isso. Ele era o que mais me preocupava. Sabia que King
teria os pés no chão. Nixon e Atlas provavelmente ficarão perdidos por
um tempo, mas também encontrarão o caminho. Mas, como Rush era
um bom motorista, havia uma preocupação de que ele pudesse
considerar a possibilidade de usar essa habilidade, prestando serviços
para a quantidade aparentemente interminável de criminosos em
Navesink Bank. Ele era tão jovem que isso ainda podia o atrair. E o
dinheiro, bem, digamos que, uma vez que o motorista é o que te
mantinha fora da cadeia, eles pagavam bem.

Seria tentador para ele ir por esse caminho, assim que percebesse
as restrições de uma renda que recebe sendo correto e tendo muito
pouca experiência no trabalho tradicional.

Eu não queria que isso acontecesse.

Então, se ele precisasse falar sujo com mulheres solitárias em sua


casa com seus gatos, então, que seja assim.

— Posso ter um para mandar para você na verdade.

— Incrível. Isso já é algo. Agora, se Lea mudasse a sua maldita


ideia de desistir, — disse ela, com uma pequena atenção para Lea, que
apenas sacudiu a cabeça para ela. — Ela era a única das minhas
garotas que sabia o que era uma “moto de neve” quando um homem
ligou. Cadela estranha.

— E bem-vindo à família Mallick, — Dusty anunciou, as faces


rosadas. — Não parece haver uma grande variedade de limites que eles
não cruzarão. Acostume-se com isso. Tipo isso, — ela disse com um
sorriso um pouco tímido.

~ 155 ~
— Não deixe que ela te engane com sua doçura, — declarou Fee,
dando a Dusty um empurrão de ombro. — Quando a levamos num
sexyshop, ela se abasteceu. Na verdade, eu vi um par de...

Ela perdeu o resto da frase quando Dusty bateu sua mão na


boca. — Um par de panfletos de sexo seguro. Isso era o que ela iria
dizer.

— Claro, — concordei, rindo. — Eu pego folhetos de sexo seguro


em pares... você sabe... junto com minhas algemas, — terminei, dando
um enorme sorriso quando suas bochechas ficaram completamente
vermelhas.

Elas seriam divertidas.

Nunca me ocorreu pensar muito sobre irmãs. Eu costumava estar


muito ocupada com meus irmãos. Fui uma moleca. Gostava de fazer as
coisas que gostavam. E eu minha mãe durante minha adolescência
para fazer todas as coisas de garotas. Mas, notei quando ficava lá
ouvindo-as se revezando para provocar uma a outra que estava
perdendo a conexão feminina há muito tempo. Havia simplesmente uma
dinâmica completamente diferente com mulheres do que com homens.
Você poderia fluir numa conversa sobre o clima, sobre produtos de
cuidados com o cabelo, sobre anéis penianos, de um jeito que não
parecia estranho ou desconfortável.

Eu não tinha sido capaz de discutir sexo com alguém... bem...


nunca.

Minha mãe morreu antes de eu perder minha virgindade e nunca


conversei sobre sexo com meus irmãos.

Ai credo.

Então, sentia falta de todas essas conversas, os momentos de riso


que doem a barriga, como o que aconteceu vinte minutos depois,
quando todas começamos a trocar histórias.

— Não... então... — Lea estava tentando explicar, mas rindo tão


forte que ela teve que parar todos os segundos porque Fee ficava
cortando sua história de “perder a virgindade” com comentários
divertidos e atrevidos. — Ele, oh meu Deus, pare Fee, — ela disse,
empurrando a mão para a outra mulher que tropeçou de volta em uma
Dusty que também estava rindo. — Não, ele estava tentando falar sujo

~ 156 ~
comigo acabou me perguntando se eu gostava do seu doggy-dick4 em
vez de, acho, donkey-dick. O que é igualmente terrível, mas ri na cara
porque, bem, fala sério! E ele ficou puto, mole e puxou para fora, subiu
suas calças e saiu. E isso, minhas queridas senhoras, foi a minha
gloriosa primeira vez, — ela terminou, girando uma mão no ar enquanto
formava um arco.

— Tudo bem, tudo bem. Tivemos minha história meio triste, —


disse Fee, encolhendo os ombros. — E nós tivemos o tipo de história
doce da Dusty. E a história ridícula da Lea. Qual foi sua primeira
história?

— Não é hilária ou doce ou triste, — admiti, encolhendo os


ombros. — Eu tinha apenas um pouco mais de dezoito anos e ele tinha
dezenove anos. Ele me pegou no banco de trás, puxou minha saia, me
deu um sólido... trinta segundos. E voilá - eu não era mais virgem.

— Boo! Chata, — Fee afirmou, jogando pipoca invisível para mim.

— Confie em mim, eu sei, — admiti, rindo.

— Fee, — a voz de Mark interrompeu, quase me surpreendendo


porque eu estava tão envolvida com as garotas que quase esqueci
momentaneamente que ele estava lá. — Suas bestas infernais estão
tentando convencer o avô delas a deixá-las assistir Uma família da
pesada.

— Certo, como se precisassem estar expostas a mais bocas sujas,


— disse ela, revirando os olhos enquanto o seguia para dentro.

— Vou ver o que Mark tem aqui para cozinhar, — declarou Lea. —
Dusty, quer ajudar? — Ela perguntou com força. Não havia nada de
sutil ao entrar e fechar a porta para Mark e para mim.

— Fiquei por aqui por um tempo. Não tinha certeza se deveria


enviar uma equipe de resgate ou não, — ele comentou, aproximando-se
de mim e deslizando seus braços pela minha parte inferior das costas,
me aproximando.

— Não, estávamos bem. Estávamos discutindo como todas nós


perdemos nossa virgindade, — admiti.

— Merda, sinto falta de todas as coisas boas, — disse ele, me


puxando mais forte.

4Doggy-dick é uma gíria para pênis não circuncidado. Enquanto que donkey-dick (donkey=jumento) é uma
gíria para pênis excessivamente grande, tão grande que pode machucar alguém. Daí a confusão entre as
palavras que causou a graça.

~ 157 ~
— Eu gosto muito delas, — continuei querendo que ele soubesse,
querendo aliviar qualquer estresse que ele estivesse sentindo sobre eu
me dando bem com seu povo. — Fee vai entrevistar Rush para um
emprego como operador masculino de sexo por telefone para mulheres
solitárias.

Dito isso, uma risada baixa passou por ele. — Tenho que amar a
Fee, sempre procurando novas oportunidades de negócios. Odeio te dar
essa notícia, — disse ele, um pouco culpado. — Mas isso parece que vai
ser uma coisa de um dia inteiro. Geralmente é como minha família é.

—Está tudo bem, — falei, balançando a cabeça, perguntando por


que ele achava que precisava se desculpar por isso, sabendo como era
importante minha família para mim. — Estou feliz em conhecê-las um
pouco melhor. Não cheguei a conversar com seus irmãos ainda.

Então seu rosto se iluminou.

E embora ele fosse estupidamente bonito o tempo todo, naquele


momento ele era quase sobrenatural.

Queria saber o que teria que fazer para conseguir aquela


expressão dele novamente. Mas como o passar do dia (e da noite), eu o
peguei me dando aquele olhar muitas vezes. Quando ri de algo absurdo
que Shane disse, ou sentei-me e discuti sobre fazer uma tatuagem em
memória de minha mãe com Hunter, ou olhei algumas das obras de
arte impressionantes de Eli em seu telefone, ou discuti oportunidades
de negócios com Ryan.

Quando tudo terminou, estava escuro, as meninas de Fee


estavam chorosas e cobertas de chocolate da sobremesa que o avô delas
haviam feito, a cozinha estava uma bagunça, e eu estava num tipo de
esgotamento feliz.

— Deixe, — Mark disse, quando fui para pegar uns pratos na ilha
e levá-los para a pia. — Eles podem esperar. Eu não posso, — ele me
informou, agarrando minha mão e me puxando em direção ao seu peito.

— Ah não? — perguntei, jogando de tímida. — Não pode esperar


pelo quê?

A tímida sumiu pela janela assim que suas mãos desceram até a
minha bunda, apertando. Ele me levantou fora de meus pés, me
envolveu ao seu redor, me empurrou contra a parede e anunciou —
Para ter meu pau de volta na quente e apertada boceta que você tem.

~ 158 ~
Então, depois de um lindo dia conhecendo sua família, já me
sentindo quase parte dela, fazendo amigos, ele me fodeu contra a
parede da sua cozinha. Depois nos arrastamos até a cama onde ele caiu
sobre mim até que eu ter certeza de que acordei todo mundo na rua,
então ele me envolveu e dormimos.

Perfeito.

Foi tão perfeito que era doloroso.

E acordei para ver que Mark não fazia nada pela metade.

E, novamente, foi perfeito.

~ 159 ~
Treze
Scotti

— Mark, o que é esse estranho, floral... — Eu estava falando


enquanto descia as escadas, amarrando meus cabelos molhados. Mas
então, pisei no último degrau e o resto da frase foi interrompida porque
a resposta estava bem na minha frente. — Oh. — foi tudo que
conseguia dar conta quando descobri o que ele havia feito.

Você quer flores, querida? Eu vou te dar flores.

Era o que ele havia dito na cabana.

E Mark, quando fazia uma promessa, ele cumpria.

Dez vezes.

Ou talvez mil vezes.

Honestamente, não tinha certeza exatamente quantas flores havia


na sala de estar. Porque, francamente, elas cobriam cada polegada.
Estavam na parte de trás do sofá, nas almofadas, na mesa de café, no
chão, no peitoril da janela. Literalmente, o único espaço restante era
uma pequena passagem que levava à cozinha, como se estivessem me
fazendo sinal para ela.

Não havia como parar o sorriso enorme, suave, impressionado


que ameaçou dividir meu rosto enquanto entrava no cômodo,
escolhendo uma margarida aleatória de um vaso logo no pé da escada.
Peguei isso, respirando profundamente, decidindo que aquela flor tinha
que ser pressionada entre páginas de livros. Um gesto doce e grande
como esse merecia ser imortalizado para sempre.

Não eram todas margaridas.

Elas não poderiam ser.

Havia muito mais.

~ 160 ~
Teria que ter levado todas as margaridas de todas as floriculturas
em Jersey para fazer essa exibição. Em vez disso, havia flores de todo
tipo de cor e variedades. Rosas cor-de-rosa, lindos lírios brancos,
crisântemos no canto.

Estiquei a mão no meu bolso traseiro, puxei um celular


descartável com o qual estava há mais tempo que fiquei com um
telefone antes e tirei uma foto. Mesmo se eu tivesse que jogar fora o
telefone, poderia enviar a foto para mim mesma e tê-la para sempre.

— Mark? — Chamei, sem ouvir nada enquanto segui o pequeno


caminho através do meu jardim em direção à cozinha.

Sobre a mistura quase avassaladora de aromas de diferentes


flores, eu podia sentir o aroma inebriante do café, cuja promessa tinha
sido a única coisa a tirar-me da cama meia hora antes.

— Isso foi incrí... Oh. — Parei apenas dentro da cozinha,


encontrando-a vazia. Havia uma xícara e uma colher ao lado da
cafeteira para mim e uma folha de papel.

Que tipo de homem faz um gesto tão grande assim e não fica para
ver sua reação?

Coloquei a margarida no balcão enquanto pegava a nota.

S-

Disse-lhe que eu lhe daria flores.

Trabalho até seis.

Jantar mais tarde? Na cidade?

-M

PS: olhe lá fora

Ele deixou seu celular também e o liguei e enviei-lhe uma


mensagem de agradecimento enquanto me aproximava do café.

Quase não consegui colocar o açúcar na minha xícara antes do


telefone tocar. E, esperando ser ele, nem chequei a tela.

— Alô?

~ 161 ~
— Essa porra de arrancar ervas daninhas é para os pássaros. —
Nixon cumprimentou-me, trazendo um sorriso no meu rosto. Claro, ele
era grosseiro, como Nixon costumava ser, mas eu não o tinha visto em
quase dois dias completos. Literalmente nunca estive longe deles por
tanto tempo antes. Eu poderia ter desfrutado um pouco de paz, alguma
normalidade, algum relaxamento e diversão. Mas realmente senti falta
deles. Esta seria uma transição lenta, penso para todos nós, para poder
viver vidas totalmente independentes.

— Você se enfiou na sujeira? Pensei que iria jogar isso tudo no


King.

— O fodido está sendo teimoso sobre nós nos revezando.

— Deus nos livre de fazer a coisa justa, né?

— Sim, você está se divertindo e a gente tá preso fazendo o


trabalho.

— Certo porque eu fazia isso todos os dias... — completei.

— Sim, sim, sim, — ele me cortou, soando como se estivesse


sorrindo. — De qualquer forma, estou ligando porque queremos ir aí e
verificar alguns apartamentos. Você vai nos dar algumas horas?

Sorri para o meu café, sentindo um calor percorrer dentro de meu


corpo.

Mais uma vez, parecia... Certo.

Parecia certo estar na cozinha de Mark, olhando para uma nota,


respirando o cheiro de flores que ele me comprou, vivendo uma vida que
não girava em torno de planejar e fugir de crimes. Parecia certo
conversar com meu irmão sobre passar um tempo, e não toda nossa
vida, juntos. Parecia certo saber que eles estariam mais perto, estariam
seguindo em frente com suas próprias vidas, em breve sentiriam o tipo
de acerto que eu sentia.

— E a fazenda? — perguntei, pensando nas galinhas que


precisariam ser soltas, os ovos que precisariam ser colhidos.

O que me lembrou... Cadê o Nugget, porra?

Congelei, minha barriga se retorcendo, percebendo que ele não


estava na banheira ou no recipiente de plástico profundo que usamos
para ele quando precisávamos tomar banho.

~ 162 ~
— Atlas cobriu a horta com uma tela de arame extra ao redor. A
gente acha que, desde que a fique bem fechada, tudo bem se ficarmos
um dia fora.

— Sim, não vejo um problema com isso. — falei, apenas meio


prestando atenção quando andava pela casa, olhando em todos os
cantos e recantos, esperando que o pequeno criador de problemas não
estivesse perdido sob todas as flores em algum lugar.

— Tudo bem, então amanhã às dez. A gente se encontra perto do


barraco.

— Parece... Ok, então. — eu disse para o som de encerramento de


chamada. Nixon não era conhecido por falar demais. — Nugget. Nuggy-
Nuggy-Nugget. — Chamei pela a casa enquanto eu caminhava.

Até que me afastei das portas do quintal e vi algo estranho que


me fez voltar para a nota de Mark.

Ele me disse para olhar o quintal.

Por que, você pode se perguntar?

Porque, aparentemente, Mark era um louco que se levantou às 5


da manhã, teve o trabalho de pedir flores e depois saiu para o quintal
para construir um galinheiro épico para Nugget.

E era algum pequeno retângulo barato grampeado com arame


telado? Não, com certeza não era. Porque Mark Mallick, o agiota,
também era um empreiteiro. Conforme comprovado com sua casa,
quando ele fazia as coisas, ele as fazia bem.

Então, a nova casa de Nugget era um hotel cinco estrelas para


galinhas.

Havia duas partes no galinheiro. A primeira parecia um pequeno


celeiro. Era vermelho com janelas, falsas portas de celeiro e um telhado
inclinado. A outra parte era uma pista em forma de triângulo, metade
coberta, a outra metade aberta, bloqueada com telas de arame.

Nugget estava vivendo em um espaço grande o suficiente para dez


galinhas.

Eu podia vê-lo felizmente bicando a grama que parecia estar cheia


de algum tipo de alimento.

~ 163 ~
Mark até colocou algumas rosas cor-de-rosa dentro e em frente a
isso, outro pequeno presente inacreditável que mostrava a inegável
doçura que ele tinha para oferecer.

E compromisso, me dei conta, quando andei para ver Nugget.

Por que ele criaria um galinheiro para o meu pintinho de


estimação, e muito menos um galinheiro enorme e elaborado, a menos
que tivesse planos de ficar comigo por um tempo, né?

Perceber isso, por razões que estava escolhendo não analisar,


trouxe lágrimas aos meus olhos. Talvez simplesmente estivesse se
mostrando ser tão atencioso. Ou talvez fosse porque era a primeira vez
na minha vida que eu poderia ficar feliz e entusiasmada com o futuro.

E se nesse futuro pudesse estar com Mark Mallick, tudo bem,


melhor.

Então, me sentindo um pouco atrapalhada, voltei para dentro,


terminei meu café, peguei meus sapatos e carteira, e saí de casa, com a
intenção de encontrar uma roupa para o jantar mais tarde naquela
noite. Tudo o que trouxe foi uma variedade normal do dia-a-dia. E
depois de uma exibição como essa que ele me deu naquela manhã,
queria algo que demonstrasse como eu estava grata. Talvez uma lingerie
também fosse uma boa.

***

— Caralho. — Mark gemeu quando entrou em casa um pouco


depois das seis.

Veja, em algum momento entre sair de casa e voltar, tive uma


ideia que parecia gritar obrigada muito mais do que um vestido preto e
calcinha de renda.

Assim que consegui o que precisava e voltei para a casa dele,


organizei as flores por toda a casa para que pudéssemos realmente nos
mover (ou rolar) através dela a qualquer momento, sem se preocupar
em quebrar o vidro. Tomei banho novamente, me vesti, então, bem,
fiquei nua.

Porque não íamos sair ao jantar.

E eu não estava usando um vestido preto.

~ 164 ~
Mas nós estaríamos comendo.

E o prato de Mark, por acaso, era meu corpo nu, cuidadosamente


coberto de comida.

Talvez fosse estranho e desconfortável me deitar assim durante


vinte minutos esperando por ele? Oh, sim.

Mas valeu a pena ouvir o choque em sua voz e o desejo em seus


olhos? Inferno, sim.

E era a coisa mais erótica do mundo assistir a este homem


incrível, atencioso, habilidoso, sexy, voltado para a família e fodão
lentamente morder, chupar e lamber a comida em meu pescoço, seios,
barriga, coxas, e, finalmente, por último, mas não menos importante,
minha boceta?

Merda de merda, sim, sim.

Daí, bem, você pode adivinhar onde isso levou.

Em uma palavra, foi perfeito.

***

— Exatamente o que essas mulheres esperam que ele diga? —


Atlas perguntou, as sobrancelhas desenhadas juntas. — Quero dizer,
caras são bastante básicos...

— Não de acordo com a Fee. — eu o cortei, balançando a cabeça.


— Eles lidam com todos os tipos de, ah, personalidades interessantes.

— Sim, mas o cara médio só quer ouvir que ele tem um pau
monstro e que você quer que ele destrua sua boceta até você gozar mil
vezes. — disse Nixon, revirando os olhos.

— As mulheres também gostam de conversas sujas, — disse


Rush, encolhendo os ombros, não conseguindo olhar na minha direção,
algo pelo qual talvez estivesse agradecida, pois não estava muito
confortável com o assunto.

— Então você está considerando isso? — perguntei, quase me


encolhendo com a esperança em meu próprio tom enquanto
caminhávamos pela rua fora da área menos do que ideal de Navesink
Bank, onde estávamos nem um mês antes.
~ 165 ~
— Tenho que conversar sobre os detalhes, mas acho que seria
uma boa maneira de ganhar dinheiro até descobrir o que quero fazer a
longo prazo.

— Bom, — falei, não me importando com o alívio na minha voz. —


E quanto a vocês? Alguma ideia sobre o futuro?

— Você não pensou em nada, ou esteve muito ocupada com seu


namorado?

Não pude evitar. Eu me encolhi com essa palavra.

O que eu poderia dizer, nunca tive um namorado.

E parecia que eu era muito velha para ter um então.

Mas para isso eram os irmãos, certo? Para provocar você.

Ele também estava certo. Não tinha pensado em nada. Bem, eu


estava pensando muito, mas quase tudo isso tinha a ver com Mark e
como ele se encaixava na minha vida e como eu esperava em ter um
futuro possível com ele. Todas essas pequenas loucuras que eu nunca
poderia ter imaginado nem em um milhão de anos, eu estaria
considerando apenas algumas semanas antes.

Quando não estava pensando, bem, estava envolvida em outras


atividades que exigiam pouco ou nenhum pensamento e muita ação.

Ele estava certo.

Não poderia questioná-los se eu mesma também não considerava


minhas opções. E não era urgente. Todos nós tínhamos uma
quantidade razoável de dinheiro escondida. Mas sabíamos que era
prudente usar esse dinheiro para comparar carros e apartamentos ou
casas ou outras coisas importantes assim, para não desperdiçá-lo em
quartos de hotel por meses e meses.

Além das lojas, onde trabalhei em todos os cantos, não tinha


habilidades além do tipo que envolvia roubar os outros. Você não
poderia exatamente colocar isso em um currículo.

Eles poderiam se dar bem porque alguns deles tinham


habilidades que envolviam suas mãos. King, especialmente, poderia ser
segurança. Ele já fez isso quando se mudou aos dezoito. Apenas uma
falsificação em seu currículo e estava pronto.

Rush provavelmente faria o acordo com Fee, pelo menos


temporariamente. Ela deixou claro que se eu precisasse de um bom

~ 166 ~
trabalho, com horas fáceis e benefícios, que ficaria feliz em me ter. Mas
não me vi fazendo isso. Uma coisa era falar sujos no calor do momento.
Outra coisa era fazer isso em um ambiente de escritório. Mesmo se ela
oferecesse odontologia e oftalmo.

Nem tinha certeza de que tinha algum futuro para mim em


qualquer tipo de campo de jardinagem, mas precisava pelo menos
examinar isso. Talvez possa arranjar flores ou simplesmente trabalhar
em uma loja local de compras de jardinagem - conhecer os prós e
contras das coisas. Eu estaria rolando no dinheiro? Não, mas estava
tudo bem. De alguma forma, a ideia de normal era muito mais atraente
do que a ideia de riqueza. E riqueza nunca foi nosso plano de qualquer
maneira. Vivemos como desabrigados durante uma década. Não
compramos nada porque sempre houve uma chance de ter que fugir e
deixar algo para trás. Ou queimar.

Não seria estranho viver com um salário. Não seria difícil se tiver
paz e liberdade para fazer todas as coisas que sempre quis fazer.

— Vocês já viram algum lugar? — Perguntei enquanto


caminhávamos.

— Sim, estamos olhando três lugares diferentes hoje. — disse


Atlas, encolhendo os ombros. — A gente acha que no mínimo dá para se
esconder em um ou dois lugares até termos tempo de ver mais lugares.
A gente não pode continuar fazendo essa porra de viagem da cabana até
aqui. Essa merda é ridícula.

— Hey. — disse Nixon, soando sério de repente, fazendo com que


minha atenção se fixasse nele, encontrando seu maxilar trincado, o
cenho franzido.

— O quê?

— Mais alguém notou que o mesmo carro de polícia passou duas


vezes desde que caminhamos?

E naquele momento, naquele instante, era como se tudo dentro


de mim desmoronasse. Tudo de bom que permiti finalmente preencher-
me pareceu escorrer pelos meus pés, fazendo-me saber, em um
momento ofuscante de lucidez, o quão vazia sempre fui.

Porque eu me deixei viver em um mundo de fantasia onde novos


começos podiam ser revigorantes, onde quem nós éramos não era quem
nós éramos. Quando, na realidade, era isso. Nós éramos assaltantes.

~ 167 ~
Éramos criminosos. Estávamos fugindo da lei há uma década.
Nenhuma quantidade de pensamento ilusório poderia mudar isso.

As pessoas normais não ficavam com um frio na barriga quando


ouviam falar de policiais. As pessoas normais nem sequer percebiam
que carros de polícia passavam por elas, e muito menos tomava nota do
número no carro para que pudessem ver que o mesmo carro da polícia
passou por elas várias vezes. As pessoas normais não ouviam que os
policiais estavam obviamente vasculhando a área e achava que eram
por elas poderiam que estavam procurando. As pessoas normais não
pensavam - eles estão atrás de nós, precisamos correr.

Eu nunca seria normal.

Sempre estaria olhando por cima do meu ombro.

Meus olhos se dirigiram para meus irmãos.

E vi visões idênticas de conclusão lá.

Mesmo que o carro da polícia fosse apenas um acaso. Mesmo que


não estivessem nos procurando. Mesmo que fosse perfeitamente
inocente.

Nunca poderíamos nos sentir assim.

É por isso que decidimos sair, sabendo até então que não havia
maneira de realmente sermos livres se houvesse a menor chance de
sermos presos. E nos EUA, sempre haveria essa chance.

— Scott. — a voz de Kingston chamou, soando baixo,


compreensivo, reconfortante. — Não vá fazer...

— Terceira vez. — Nixon cortou-o, fazendo meu estômago cair


aparentemente em meus pés.

Uma vez era normal.

Duas era uma coincidência.

Três? Três parecia um padrão.

Nós conhecíamos as instruções.

Nós discutimos isso extensivamente.

Sabíamos o que devíamos fazer.

~ 168 ~
Enquanto nos olhávamos um para o outro, a realidade de ter que
fazê-lo esvaziou todos nós simultaneamente.

Mas não havia tempo para palavras, sem tempo para conforto,
para possíveis despedidas.

Observamos até que o carro deu mais uma volta, então


compartilhamos um último olhar e começamos a caminhar.

Em direções diferentes.

Porque se o pior cenário fosse o que poderia estar acontecendo,


sabíamos que a melhor aposta era nos separar, para não permitir que
todos fossem pegos de uma só vez.

Daí a sensação de vazio.

Porque mesmo que você não fosse preso, e se um dos outros


fosse? Eles não entregariam o resto de nós, é claro, mas estariam
oferecendo mais de uma década ou mais de sua vida. Não havia alívio
na liberdade se alguém com quem você passou todos os dias da sua
vida estivesse perdendo a dele.

Mas eu me virei e corri.

Porque esse era exatamente o plano.

Entrei em um beco e subi as costas dos edifícios, indo em direção


à saída mais próxima da cidade - o trem.

Meu coração estava disparado no meu peito. Por mais que eu


quisesse talvez culpar a corrida, sabia que na realidade não tinha nada
a ver com isso. A realidade era, estava doendo fugir. Mesmo ao comprar
a passagem e esperar pelo próximo trem para fora da cidade, indo para
Nova Iorque, não pude deixar de perceber que a principal fonte dos
batimentos rápidos não era necessariamente a preocupação com meus
irmãos – embora também fosse isso – mas foi perceber o que estava
deixando para trás.

Ou seja, Mark.

E também a chance de todas as coisas que tinha me permitido


esperar e acreditar que poderia ter.

Sentei-me no meu banco e me olhei pela janela, por algum motivo


querendo torturar-me e assistindo, enquanto o trem começava a se
movimentar, ao mundo que comecei a construir sendo deixado para
trás.

~ 169 ~
Talvez estivéssemos errados.

Talvez eles não estivessem nos procurando.

Onde quer que nós chegássemos, sempre fazíamos alguma


pesquisa, tentávamos encontrar alguma informação sobre o que estava
acontecendo em Navesink Bank naquele dia específico, se talvez havia
um Alerta Amber ou algum tipo de assalto local ou alguém que fugiu de
uma prisão ou estava no meio de uma onda de assassinatos em um dos
estados vizinhos. Todas essas coisas causariam uma maior presença
policial nas ruas.

Mas precisávamos ter certeza.

— Scott. — uma voz disse ao meu lado, fazendo minha cabeça


virar para encontrar Kingston se aproximando de mim do corredor,
olhando para baixo com olhos escuros e tristes.

E então o impensável aconteceu.

Explodi em lágrimas.

Estive bastante firme, durante a doença da minha mãe, depois


sua morte, e nunca chorei abertamente na frente de nenhum dos meus
irmãos.

Por isso não estranho que King parecesse completamente abalado


quando isso aconteceu. Seu corpo recuou. Seus olhos estavam quase
comicamente arregalados. Houve uma boa e longa pausa antes dele se
sentar ao meu lado. Então, mais um momento antes de eu sentir sua
ampla palma tirando minhas mãos do meu rosto. Mas foi apenas um
segundo para que eu o sentisse me puxando para seu peito e seus
braços fortes ao meu redor.

Ele não disse nada.

Não havia nada a dizer.

Ele apenas me segurou e me deixou encharcar sua camisa.

Foi quando finalmente desaceleramos para parar em Penn


Station, que o sinal do celular voltou e nossos telefones começaram a
tocar, fazendo com que eu me afastasse dele com um som
verdadeiramente feio, enquanto passava minhas mãos pelo meu rosto
para me livrar das lágrimas sobrando.

— Sim. — King respondeu, soando distraído, e eu podia sentir


seu olhar em mim. — Não. Sim, ela está comigo. Onde você está?

~ 170 ~
Sentada tão perto, conseguia ouvir a voz de Rush dizendo a King
que ele tinha entrado no trem atrás do nosso que estava levando para a
costa em vez da cidade. Nixon e Atlas aparentemente chegaram ao carro
e estavam voltando para a cabana.

Ninguém parecia ter sido seguido.

— Alarme falso? — perguntei quando King desligou e olhou para


a bagunça que eu tinha certeza de que parecia exatamente naquele
momento.

— Não sei. Parecia muito estranho. — ele disse objetivamente. —


Nós ficamos em Navesink Bank por semanas e nunca vi nada disso.
Eles com certeza estavam procurando alguém. E tendo em vista que a
maioria dos bandidos na cidade subornam os policiais, achei que era
esperto sair de lá até que possamos saber com certeza. Pode ser apenas
paranoia, mas vamos nos assegurar.

Assenti com a cabeça, incapaz de encontrar qualquer falha nessa


lógica. Algumas coisas não valiam o risco.

Como a prisão.

— Sim. Vamos nos encontrar na cabana?

— Acho que a gente pode relaxar na cidade, já que é para onde


estamos indo de qualquer jeito. Atlas e Nixon podem ir até a cabana e
arrumar. Precisamos limpá-la e sair de lá logo de qualquer maneira.
Rush pode ficar perto de Navesink Bank e investigar.

— Parece um plano. — concordei, forçando um sorriso; eu não


sentia nada.

— Ligue para ele. — disse King, a voz firme, mas doce ao mesmo
tempo.

— O quê?

— Ligue para Mark. Explique. Não faça isso.

Isso.

Era o que tinha que ser feito. Esta era a realidade da vida que eu
tinha escolhido viver. Não era algo com o qual ele devia lidar - a
incerteza, a possibilidade de eu acabar na prisão ou precisar fugir.

Não era justo fazer isso com ele.

Então isso era eu fazendo a única coisa certa.


~ 171 ~
Estava terminando antes que as coisas ficassem fora de controle,
antes que os sentimentos se intensificassem demais, antes de eu ter
que quebrar não só o meu coração (que era apenas uma pilha de cinzas
no meu peito naquele momento), mas também o dele.

Eu estava salvando-o do meu futuro incerto antes de se tornar o


dele também.

~ 172 ~
Quatorze
MARK

— Você deve estar brincando comigo. — gritei, chutando um vaso


contra a parede, disparando vidro e água em todos os lugares.

Admito, eu sabia que havia o risco de ela fugir.

Ela fugiu uma vez antes.

Mas agora era diferente.

Foi depois que passamos algum tempo juntos. Ela conheceu


minha família. Nós discutimos seu possível futuro.

Então, a próxima coisa que sei, ela fugiu de novo, caralho.

Por quê?

O porquê, no entanto, parecia ser uma coisa para a qual eu não


teria respostas porque seu telefone continuava indo para a maldita
caixa de mensagens de voz robótica.

Não havia uma única pista de que ela estava pensando em fugir.
Na verdade, ela nem sequer levou sua merda com ela. Pelo amor de
Deus, Nugget ainda estava lá. Quero dizer, não que seu estilo de vida
permitisse levar uma galinha com ela, mas era apenas mais alguma
coisa que não fazia sentido.

Tudo o que sabia era que ela estava se encontrando com seus
irmãos.

E daí ela nunca voltou para casa.

No começo, simplesmente dei de ombros, cozinhei e limpei um


pouco, vi um pouco de TV. Achei só que eles estavam ocupados olhando
os lugares ou apenas conversando. Não importava quão curta seria a
visita que eu pretendia fazer a um dos meus irmãos, sempre acabava
sendo por uma hora.

~ 173 ~
Mas ela nunca voltou para casa.

E já era a segunda noite e eu estava surtando, porra.

Porque isso apenas não parecia lógico.

E estava começando a pensar que deveria ir para a cidade


procurar por ela, ver se alguém a viu ou a seus irmãos, tentando
descobrir se ela apenas se assustou e fugiu novamente ou algo mais
aconteceu.

Esse foi o pensamento que finalmente interrompeu meu inútil


andar de um lado para o outro e me jogou para fora da minha porta e
me levou até a cidade. Eu tinha contatos em todos os lugares. E graças
a ela ter me deixado tirar algumas fotos na noite em que comi de seu
corpo antes de comer sua boceta até fazer o cachorro do vizinho latir
por causa de seus gritos, eu tinha algo para mostrar para todas as
pessoas que conhecia na cidade e conseguir informações.

Mal acabei de sair dos The Henchmen quando algo me impediu de


continuar. Em primeiro lugar, pensei que tinha sido um truque da luz,
ou ilusão.

Mas quando parei e me virei completamente, não havia dúvida.

Um dos irmãos de Scotti ainda estava em Navesink Bank.

E ele não parecia nervoso sugerindo que estava nas ruas


procurando por pistas de sua irmã desaparecida.

Não, na verdade, estava conversando com uma garota fora do bar


do meu fodido pai. Calmo como poderia ser.

Fiquei puto da vida, porra.

Atravessei rua sem sequer olhar, agarrando-o pela garganta ao


som da mulher gritando, e empurrando-o pelo beco traseiro onde o
segurei contra a parede.

— Cadê ela, porra? — exigi, puxando-o para frente ligeiramente,


depois batendo-o contra o tijolo outra vez.

— Foda-se, cara. — sibilou Rush, balançando a cabeça tanto


quanto a minha mão em volta da garganta permitiria.

— Você sabe o que faço para viver. Sabe que vou te foder pra
caralho se não abrir a porra da sua boca e me dar algumas respostas.
Estou preocupado todo o fodido dia. Cadê ela?

~ 174 ~
— Nova Iorque, — ele informou um pouco com facilidade. E eu
sabia que não tinha nada a ver com a ameaça de danos corporais
porque a) ele era um cara que poderia lidar com isso e b) era muito leal
para ceder com tanta facilidade. Provavelmente, ele sentiu o desespero
que escorreria de mim, direto do fundo dos meus ossos. — Ela está em
Nova Iorque com King.

— Por que diabos ela estaria em Nova Iorque com King sem
atender seu telefone quando ela deveria estar em casa comigo e com seu
frango?

Ok.

Isso pareceu ridículo.

O que explicou a risadinha divertida que Rush me deu, embora


eu estivesse cortando metade do seu ar.

Percebendo que já não era necessário, aliviei meu aperto e o


soltei, encostando-me na parede atrás de mim, exalando com força.

— Desembucha.

— A gente estava andando pela rua e Nixon notou que o mesmo


carro de polícia passou por nós lentamente duas vezes. Tentamos não
ligar. Mas depois eles voltaram pela terceira vez. A gente não sabia que
merda estava acontecendo, então entramos em pânico e fugimos.

Bem.

Isso explicava.

Não era exatamente estranho para eles serem um pouco


paranoicos quando os tiras estavam agindo como se dessem alguma
merda por seu trabalho. Eles não. Foi estranho vê-los patrulhando.

Então, por que não me ligar? Por que não compartilhar o plano?
Por que desaparecer e desligar o telefone?

— Ela acha que vai arrastá-lo para baixo de sua sujeira com ela.
— anunciou Rush, de alguma forma lendo meus pensamentos rebeldes.

— O quê? — girei, cabeça disparando.

Rush deu de ombros. — Olha, acho isso meio ridículo. Quero


dizer, puta que pariu, você é um maldito agiota. E isso não é
exatamente um segredo por aí. Não é como se a menosprezasse ou se

~ 175 ~
preocupasse de ela trazer a polícia pra cima de você. Mas é isso que ela
pensa. Acha que, ficando longe, está protegendo você.

— E você não? — realmente queria sua opinião. Seus irmãos


eram a maior parte da vida dela. Eles a conheciam como suas próprias
mãos. Suas opiniões provavelmente não eram apenas precisas, mas
necessárias.

— Olha, sinceramente não sei se isso é inteligente. Ficar nos EUA,


e muito menos ficar em uma cidade onde roubamos. Não sei. Só sei que
a gente queria ficar. O que sei, no entanto, é que nunca vi minha irmã
olhar como ela olhou antes de ontem. Se você é quem colocou aquele
olhar lá, então acho que ela é uma porra de idiota por abandonar a
fonte dele para “seu próprio bem”, ou seja lá o que ela pensa. Ao menos,
ela deveria ter conversado com você sobre isso.

— Então, por que ainda estou de pé aqui e não segurando um


endereço na minha mão e a caminho para Nova Iorque para conversar
com ela?

Ele riu com isso, balançando a cabeça. — Você sabe que vou
estar em apuros por isso, né? Mas ela está no Midtown Hilton. Quarto
142. Certamente King o deixará entrar. Ele contou que ela soluçava a
metade da viagem para a cidade. O que, agora que você a conhece, sabe
que ela não é assim. Ele está preocupado.

Engoli todas as outras perguntas que tinha sobre ela, querendo


saber o máximo de seu bem-estar como pude. Mas haveria tempo para
isso quando eu fosse à cidade. Em vez disso, precisava saber o que
descobriram.

— Então, se você está preocupado com os tiras, por que diabos


está caminhando pela rua?

— Porque não houve indícios de que a gente estava sendo


procurado. Minha melhor aposta era que foi um alerta antigo de duas
cidades daqui. Algum cara com demência fugiu da casa de seus velhos
e estava desaparecido. Poderia ter sido simplesmente isso.

— Então, por que eles ainda estão na cidade?

Rush olhou para os pés e suspirou. — Olha, ela queria um


término definitivo. King está apenas enrolando a merda para ver se
consegue conversar com ela para voltar e conversar com você,
explicando. Até agora, ela está teimosa como uma merda.

~ 176 ~
— Bem, ele não terá que se preocupar em tentar convencê-la a
voltar. Essa é a porra do meu trabalho. Obrigado, Rush.

— Ei. — ele chamou quando comecei a me afastar.

— Sim?

— Use o seu melhor jogo, ok? Eu meio que gosto aqui. Tenho
certeza de que é melhor que a Rússia.

— Vou dar o meu melhor. — falei com um sorriso enquanto eu


voltava para a minha casa. Joguei um pouco de comida extra para
Nugget e dirigi para a cidade.

Quando cheguei lá, era quase uma da manhã, havia uma dor
insistente na minha cabeça e estava tentando muito me convencer a
engolir o poço de incerteza que se encaixava na garganta.

Não era que eu duvidava do que estava fazendo. Eu precisava vê-


la. Precisava falar com ela. Precisava dizer-lhe que a merda de ir
embora era ridícula.

Eu apenas não tinha uma boa ideia do que dizer.

Mais de uma hora no carro também não ajudou.

Mas continuei me forçando para frente, através do lobby, de volta


para os elevadores, depois no corredor até o número 142, onde bati três
vezes.

Houve um barulho e passos, muito alto para ser Scotti, antes que
a corrente deslizasse e a porta fosse aberta.

E Kingston parecia mais desgrenhado do que o habitual e


cansado, preocupado, tenso. Ainda mais do que quando estavam
desaparecidos do golpe. O que era estranho pra caralho. Mas Rush
disse que estava preocupado com sua irmã.

— Até que enfim, porra. — ele disse com um grunhido, entrando


para pegar sua carteira, enfiando-a no bolso de trás. — Vou conseguir
outro quarto, — ele explicou, entrando no corredor, mas não deixando a
porta fechar. — Ajude-a. — ele pediu, me dando um olhar duro. — Eu
não posso mais vê-la assim.

Com isso, ele se afastou quando peguei a porta, respirei e


empurrei-a.

Não sei o que esperava.

~ 177 ~
Talvez, pela descrição de seu choro no caminho da cidade, eu a
imaginei enrolada na cama.

E ela estava na cama, com certeza. Mas ela não estava enrolada.
Ela não estava chorando.

Não, Scotti estava... Planejando?

Essa foi a primeira palavra que veio na cabeça ao encontrá-la


sentada com as pernas cruzadas no edredom bege de uma das camas
com uma enorme variedade de papelada e livros empilhados ao acaso
ao redor dela. Havia um fone na orelha, uma caneta atrás da outra, e
seu dedo estava rapidamente folheando as páginas de um livro bem na
frente dela. Seus longos cabelos escuros foram puxados para cima em
um nó alto, algumas mechas soltas, indicando que talvez ela tivesse
tido isso dessa maneira através de um ciclo de sono.

Ainda assim, mesmo um pouco maníaca, com privação de sono e


usando jeans simples e uma das camisetas de King, ela era a mais bela
vista que eu já tinha visto.

— Ty poluchil yeshche kofe?

Ah.

Está bem então.

Ela estava planejando sua eventual mudança para a Rússia.

— Você sabia que é frio na Rússia nesta época do ano. — falei,


sentindo um sorriso surgir meus lábios quando sua cabeça se levantou,
olhos arregalados, lábios se separando levemente. Precisei de todo meu
autocontrole para não ir lá e reivindicar aqueles lábios como meus
novamente. No caso de ela ter esquecido. — Na verdade, está frio na
Rússia praticamente todo o maldito ano.

Sua boca se abriu e fechou duas vezes antes de sacudir a cabeça


para limpá-la. Quando ela falou, ficou claro que iria tentar parecer não
afetada e desinteressada. Ela falhou em ambos. — O que você está
fazendo aqui?

— Então, coisa engraçada. — comecei, encostando-me contra a


cômoda, quando tudo em mim estava me implorando para ir até a cama
e trazê-la para dentro dos meus braços. Ela não precisava disso agora.
Ela precisava que eu fosse racional até o ponto em que ela parecia ser
irracional. Era a única maneira de passar pelo seu escudo. — Eu estava
a cerca de cinco minutos de colocar um anúncio para pessoas

~ 178 ~
desaparecidas ao redor de toda maldita Navesink Bank quando vi um
rosto familiar ao lado do Chaz’s.

— Merda. — ela sibilou. — Ele deveria estar disfarçado.

— Sim, querida, isso nunca vai acontecer. — eu disse com uma


risada. — E, como tenho certeza que ele ligou para você e para King
contando que não encontrou uma única razão para vocês se
esconderem. Não estão procurando por você, Scotti.

— Mas eles poderiam ter estado, Mark. — Ela estendeu a mão e


puxou o fone de ouvido, jogando-o em sua pilha de papelada. — Esse é
o verdadeiro problema. Nunca nos sentiremos livres aqui. Sempre
haverá essa preocupação de alguém procurando uma pista, alguém
conectando os pontos, alguém nos perseguindo.

— Acho que você está dando muito crédito à polícia. Isso acabou.
O seguro foi pago. Os policiais não estão desperdiçando seu precioso
tempo rastreando ladrões que nunca machucaram ninguém e só
roubaram uns dois mil dólares a cada vez. Eles têm estupradores e
chefes e assassinos para correr atrás. Não vão desperdiçar seu aparato
com sua família, Scotti. Isso não está acontecendo. O fato de você não
conseguir seguir em frente não tem nada a ver com enfrentar as
consequências de suas ações.

— Não quero acabar atrás...

— E você não vai. — eu a cortei. — Você não vai acabar na prisão.


Nem seus irmãos. Não por isso. Então, enquanto vocês se mantiverem
longe de problemas a partir de agora, não terão um problema. É só
você, sua cabeça, e, obviamente, a maneira como você enxerga a si
mesma e a seus irmãos.

— Isso não é uma coisa objetiva, Mark. Nós somos todos ladrões.
É isso que nós...

— Fizeram. — eu a cortei. — Isso foi o que você fez. Por uma


década. Não é quem você é. Ainda não precisa ser o que identifica você
no futuro. Você tem todas as chances de começar de novo se puder
mudar isso, a maneira como você se vê. E não venha me dizer que não
sei do que estou falando. Porque vivo nesta vida, Scotti. Ninguém sabe
melhor do que eu o que é viver preocupado com a polícia, me
perguntando se um executor é tudo o que alguém vê quando me olha.

— Você é muito mais do que isso, — disse ela, balançando a


cabeça. — Você é filho e irmão e tio e empresário e...

~ 179 ~
— E você pode ser uma irmã, uma esposa, uma tia, uma
empresária. Você pode ser todas essas coisas se conseguir parar de
pensar nos problemas ao seu redor e ver que não há nada de errado
com você querer e batalhar por eles. — Afastei-me da cômoda e andei
em direção à cama, erguendo-me sobre ela, de modo que ela teve que
inclinar a cabeça para cima para me olhar. Quando me olhou, podia ver
uma grande vulnerabilidade nos olhos dela, como se quisesse acreditar
em mim, como se quisesse acreditar em minhas palavras, mas não
conseguisse esquecer os dez anos em que se viu como nada além de
uma criminosa. — Você nem sequer deu uma fodida chance, baby. Na
primeira prova você fugiu morrendo de medo. Sei que não nos
conhecemos há tanto tempo, Scotti, mas acho que a conheço tempo
suficiente para saber que você é não é uma covarde. — Seus olhos
brilharam nisso, deixando claro que ela não queria ser vista como uma
covarde. — Então pare de agir assim.

— Não sou covarde. — retrucou imediatamente. — E, embora isso


em grande parte foi para proteger a mim a meus irmãos, eu também
não queria... — ela parou, balançando a cabeça.

— Não queria me arrastar junto. — completei quando ela se


recusou a continuar, sentindo um aperto estranho pra caralho no meu
peito que não sabia o que culpar, então fui em frente e chamei de
frustração mesmo que realmente soubesse que não era isso. — Tudo
bem. — falei, exalando quando abaixei para segurar seus braços,
puxando-a para ficar comigo ao lado da cama e, em seguida,
alcançando para enganchar o queixo em meus dedos, forçando-a a
manter contato visual. — Vamos deixar algumas merdas claras agora.

— Não há motivo. — replicou, voz vazia.

— Bem, de qualquer forma, me anime, porra. — sugeri com um


sorriso malicioso. — Acho que você sabe que essa merda de se fechar
nunca foi o meu estilo.

— E por “essa merda de se fechar” acho que você quis dizer


relacionamentos? — Ela perguntou, contraindo os lábios.

Não demorou muito para ultrapassar seus escudos e ver o que


estava protegendo. Toda doçura, suavidade e vulnerabilidade que ela
manteve escondida atrás deles.

— Sim, essa merda. — concordei com um sorriso, fazendo com


que outro se espalhasse pelo seu rosto também. — Mas também sou
alguém que sabe que uma coisa boa quando a vê e que sabe o que quer.
Você, Scotti, acreditando ou não, você é a porra de uma coisa boa. Você
~ 180 ~
é a melhor coisa já tive e decidi que quero você na minha vida. Agora,
você pode ser uma teimosa insuportável, — eu disse, me agachando um
pouco e sorrindo, — Mas sou mais teimoso e mais insuportável ainda.
Então, essa merda de ficar fugindo não vai colar. Você quer ser adulta e
se sentar e resolver essa merda, estou aqui pra isso. Mas não aceito
você apenas se levantar e sumir.

— Não é sua escolha, Mark. — disse ela, tentando parecer firme,


mas acabando por soar profundamente infeliz em vez disso. — Tenho
todo o direito de deixar você por qualquer motivo que considere
oportuno. E você não pode me impedir.

— Não. — concordei, balançando a cabeça. — Não posso impedir


você. Mas posso acompanhá-la. Até a maldita Rússia. Compro um
detestável casaco de pele e um chapéu combinando e sigo sua bunda
sexy pelas ruas até que você fique tão envergonhada de ser vista comigo
que inevitavelmente voltará comigo aos EUA e venha morar com o nosso
frango como uma família feliz.

— Nugget... — ela disse, ansiedade em sua voz.

— Ele está gostando da sua mansão. Pedi para Lea dar alguma
comida se não estiver de volta amanhã à tarde. Mas tenho a sensação
de que voltarei. — falei, braços deslizando em torno de seus quadris,
dobrando na parte inferior das costas, puxando-a mais perto. — E que
não estarei sozinho.

— Você parece muito seguro de si. — disse ela, suavizando já.

— E de você. —concordei, balançando a cabeça.

Acho que tinha que fazer isso. Talvez ela não achasse que eu
estivesse falando tão sério quanto eu sentia. Talvez não tivesse sido
claro com essa merda. Achei que minhas ações falavam muito - as
flores, o convite para que ficasse o tempo que quisesse, a construção do
galinheiro. Mas talvez ela fosse alguém que precisasse ouvir as
palavras.

Foi mancada minha

Eu precisava consertar isso.

Ela precisava de palavras. Eu estava cheio delas.

— Sei lá, entende? — Ela perguntou, tom acanhado, olhos


escuros dançando. — Quero dizer, estou indo muito bem com o meu
russo.

~ 181 ~
— Estou bem com crianças bilíngues. — falei, dando de ombros.
— O espanhol pode ser mais útil, mas o russo seria mais foda. Já ouviu
alguém falar com você em russo? Assustador.

— Bem, espero que nossos filhos não chateiem as pessoas. — ela


disse antes que seus olhos ficassem arregalados e sua boca fechada,
provavelmente percebendo o que acabara de dizer.

Talvez, normalmente, esse tipo de conversa, logo me assustaria.


Tinha certeza que supostamente me assustaria. Mas quis dizer o que eu
disse a ela. Eu era um homem que sabia o queria e sabia que era ela. E
se era ela, também sabia que queria uma porrada de filhos com ela. Ela
mesma vindo de uma grande família, tendo o enorme apoio de seus
outros quatro irmãos, provavelmente iria querer a mesma coisa.

Então, não era muito cedo para mim.

— Sei lá, baby. Você ouviu Fee sobre a Becca. Se acharmos que
nossos filhos não terão uma boca suja, estamos sonhando, porra.

— Bem, acho que é...

Sua frase foi interrompida pelo som do meu telefone gritando no


meu bolso traseiro. Normalmente, eu ignoraria isso.

Mas eram quase duas horas da manhã.

Ninguém me ligava tão tarde desde que Fee entrou em trabalho de


parto.

— Você deve atender isso. — ela disse, mesmo quando minhas


mãos se desdobraram ao redor dela e foram para o bolso, vendo o
número da minha mãe e sentindo meu estômago retorcer.

Chamadas às duas da manhã de sua mãe nunca era bom.

Então eu atendi.

E todo meu fodido mundo entrou em colapso.

— O que está errado? — perguntei, indo direto ao assunto.

— Eli.

Eu sabia.

Eu sabia, porra.

Nunca na minha vida me sentia tão completamente instável.

~ 182 ~
Caí na beira da cama, meu estômago em nós dolorosos, tendo que
engolir através de um nódulo do tamanho da fodida Rússia na minha
garganta. — Diga-me, — pedi, as palavras mal saíam com o meu
maxilar dolorosamente apertado.

Eu estava vagamente consciente de que Scotti olhava para mim


por um minuto antes de procurar freneticamente por sapatos, como se
soubesse que era sério, como se soubesse que precisava estar lá para
mim.

E, tão autossuficiente que eu poderia ser, neste caso, ela não


estava errada.

— Nós recebemos uma ligação há apenas quinze minutos. — ela


disse, e eu podia ouvir meu pai buzinando impacientemente ao fundo.
— Ele está na delegacia. Não conseguimos nada além disso. Mas, você
sabe... — ela disse, o tom pesado. E eu sabia.

Não era como quando ela recebia as ligações sobre Shane ou eu


quando éramos mais jovens e estúpidos. Esta não era uma merda por
embriaguez e desordem ou perturbando a paz.

Era de Eli que estávamos falando.

Nunca entrou em nenhuma treta idiota em que precisasse ser


socorrido.

Mas às vezes ele ficava completamente furioso e batia pra caralho


nas pessoas.

Então, se ele estava preso, estava preso por agressão grave.

— Eles o prenderam só agora? —perguntei, tentando ver o quadro


inteiro, enquanto estava de pé, dando a Scotti um aceno de cabeça, que
apontava para a bolsa com as sobrancelhas franzidas, perguntando-me
em silêncio se precisássemos sair.

— Não. Aparentemente eles o pegaram esta manhã. — minha mãe


surtou, obviamente irritada. E Helen Mallick irritada, bem, estava
prestes a agitar um monte de merda na delegacia.

— Porra, você quer dizer que ele está preso desde esta manhã? —
perguntei enquanto entramos no corredor. — Por que ele não ligou
antes?

— Esse é o problema, — continuou enquanto o elevador começava


a descer. — Ele não ligou para nada.

~ 183 ~
— Como assim ele não ligou? — Por que ela estava me dando
tudo em pedaços? Senti como se estivesse sendo despedaçado com cada
nova revelação.

Tudo o que conseguia pensar era: não Eli. Não Eli, porra. Não o
único merda de nós que, para começo de conversa, nunca deveria ter
entrado na porra negócio. Ele não era para isso. Ele foi forçado a entrar
nisso.

Assim que pensei assim, tudo o que podia imaginar era a culpa
que meus pais deveriam estar sentindo naquele momento, pois sabiam
como eu que ele não foi talhado para a vida de executor, e
dolorosamente conscientes de que foram os únicos a empurrá-lo para
isso.

— Ele recusou o seu telefonema. Nem sequer chamou um


advogado.

— Então, como vocês souberam que ele estava lá?

— Collings ligou. — disse ela, soando mais tensa por minuto. —


Ele disse que sabia que deveria respeitar seu direito de fazer uma
ligação, ou não, mas nos conhecia e sabia que queríamos pelo menos
saber.

Graças a Deus, porra, por Collings.

Juro que a cidade iria para o inferno sem ele.

— Você está muito longe?

— Uma hora e quinze, se eu fizer o limite de velocidade. —


respondi enquanto saímos do elevador.

— Então, trinta e cinco no máximo. — ela adivinhou.

— Exatamente.

— Estamos aqui agora, — ela disse, e eu podia ouvir as portas


batendo. — Assim como seus irmãos. — Houve uma pequena pausa,
então. — Não posso acreditar nisso.

Eu também não podia acreditar nisso.

~ 184 ~
Quinze
Scotti

No início, só estava pegando algumas partes.

Poderia dizer que, o que quer que fosse, era sério.

Quero dizer, claro que era naquela hora.

Mas quando eu digo que era sério, quero dizer o suficiente para
deixar um criminoso de carreira adulto e forte completamente sem
chão.

Então isso só significava uma coisa.

Família.

E então pude ouvir a voz de Helen na outra linha, dizer a frase


temida: DELEGACIA.

Alguém foi preso. E, dadas as suas profissões, assumi que era por
algo relacionado ao menos à agressão.

Eu queria perguntar. Eu queria saber.

Mas também sabia que a última coisa que ele precisava agora
eram mais perguntas. Ele precisava de respostas.

Assim fiquei em silêncio ao lado dele enquanto corríamos pelo


lobby, ele ainda conversando com sua mãe.

Vislumbrei King na recepção, as sobrancelhas juntas. Corri,


entregando-lhe o meu cartão-chave para o quarto e respondendo as
suas perguntas não formuladas. — Um de seus irmãos foi preso, —
falei, sabendo que ele sabia o que isso significava, sabendo que eu
poderia confiar nele para lidar com todos os detalhes do quarto e de
tudo mais quando eu saísse.

— Merda, — ele disse, me dando um olhar pesado.

~ 185 ~
— Eu sei, — concordei, partindo.

— Volte a ligar o telefone, — ele avisou enquanto eu batia em


retirada.

— Fazendo isso agora, — respondi, tirando-o da minha bolsa


mesmo enquanto caminhava pelas portas da frente e corri pela rua para
alcançar Mark quando ele finalmente desligou e guardou seu celular.

Nem sequer precisava perguntar quando fui para o lado dele,


sentindo-se perdido, então fiz a única coisa que sabia que podia fazer,
alcançando a sua mão e dando-lhe um aperto tranquilizador.

— Eli, — ele me disse, e senti a tensão na minha barriga.

Eli.

O calado, doce, artístico e recente pai de cachorrinho.

Eu não disse nada.

Não havia nada a dizer.

Porque não havia nenhuma palavra que tiraria sua preocupação,


que aliviaria a sua mente. Sabia disso porque eu tinha quatro irmãos
que significavam o mundo inteiro para mim e sabia que eles faziam
coisas ilegais que poderiam levá-los a serem presos também. Caso isso
se tornasse realidade, nada do que ele ou de alguém pudesse me dizer
ajudaria.

O que ele precisava era o trânsito ser leve, os policiais sumirem


do caminho de volta para Navesink Bank para ultrapassar os limites de
velocidade e chegar à delegacia assim que fosse possível para estar com
sua família e obter as respostas que ele tão desesperadamente
necessitava.

E foi exatamente o que aconteceu. Saímos com o seu carro da


garagem, amaldiçoamos a nossa saída através do trânsito da cidade,
chegamos às estradas principais onde Mark acelerou mais de cento e
trinta quilômetros durante todo o caminho de volta para o seu pequeno
canto do mundo.

Ele realmente pulou para fora e se esqueceu de desligar o motor


na delegacia, fazendo-me demorar um minuto extra para fazê-lo, então
tranquei, enquanto o segui, o meu próprio estômago tenso.

Tudo em mim se rebelou contra pisar lá dentro, provocando o


destino. Mas quando o seu homem que não foi nada além de

~ 186 ~
excepcional para você, precisava que você pisasse dentro da boca do
lobo, você só tinha que ser corajosa e fazer essa merda.

Então respirei tão profundamente, agarrei a porta e entrei.

Dizer que entrei no caos seria um eufemismo.

Porque entrei para não encontrar apenas Mark, Helen e Charlie


lá, mas também Hunter, Shane, Ryan, Lea e Fee. A única ausente era
Dusty, e eu tinha uma pequena suspeita de que era porque ela estava
sendo a babá, não porque não queria desesperadamente estar lá
também.

Todos estavam falando, falando um sobre o outro, praticamente


gritando com o homem que estava em frente a eles.

E quem era esse homem, você poderia perguntar?

Nada além do homem que me interrogou na loja de


departamentos após o assalto.

Porque claro que seria ele.

— E como eu disse antes, Charlie, este não é o meu caso.


Realmente não tenho mais nada para te dar.

— Quero saber por que ele iria recusar um maldito telefonema


para o advogado dele, — Shane falou, ele parecia uma mola tensa e
enrolada a ponto de quebrar. Lea se moveu, colocando uma mão em seu
braço, sem dizer nada, mas o contato parecia permitir que o seu peito
se expandisse com a respiração novamente.

— Não tenho essa resposta para você, Shane, — disse Collins,


claramente se desculpando, obviamente de alguma forma tendo um
fraquinho pela família, apesar de todos eles serem criminosos e,
portanto, supostamente seus inimigos.

— E por que ele não nos recebe, — Ryan colocou, a sua voz um
silvo baixo e ameaçador. Admito, não o conhecia assim tão bem, mas,
desde o momento em que partilhei com ele, sempre foi um pouco
distante. Conseguiu emitir uma aura de competência e controle. Mas
também não havia nada de controlado nele naquele momento. Ele
parecia como se fosse um engano conseguir a sua própria acusação de
agressão.

— Alguém colocou as mãos sobre ele durante o interrogatório? —


perguntou Hunter, parecendo ser o mais sob controle. Mas, julgando

~ 187 ~
pela forma como Fee moveu-se para mais perto quando ele falou, as
aparências estavam obviamente erradas. Se ela estava preocupada com
ele, indo para lá por via das dúvidas, ele estava obviamente perto de se
perder também.

— Tudo bem, tudo bem, — disse Collings, levantando uma mão.


— Não sei por que ele se recusa a ver todos vocês. Mas eu o vi com os
meus dois olhos, Helen, — disse ele, dirigindo-se a sua mãe com um
olhar que dizia que entendeu o quanto ela precisava das palavras que
se seguiriam — E juro pela vida da minha filha que seu filho não foi
agredido.

Não conhecia Collings. Ele nem parecia ser o tipo de homem que
tinha uma filha, parecia mais do tipo que se casou com o trabalho. Mas,
vendo como os ombros de Helen relaxaram um pouco enquanto ela se
inclinava para o marido, entendi que ele não só tinha uma filha, mas
que ela significava muito para ele. Os homens que amavam os seus
filhos não juram pelas suas vidas, a menos que tivessem cem por cento
de certeza.

— Pequeno milagre, isso, — murmurou Hunter.

— Ah, é detetive Jones agora, — anunciou Collings. Adivinhei que


devia ser o nome do detetive no caso porque, com o anúncio, todo o
grupo de pessoas andou na direção do homem em questão.

Mark voltou, meio distraído, mas seus olhos imploravam quando


ele disse — Espera por mim aqui, Scotti.

Acenei cabeça, mesmo quando meu estômago afundou em meus


pés.

Porque eu tinha dado a Collings uma licença que alegava que o


meu nome era Ângela.

Eu não poderia estar brava. Não poderia culpá-lo por esse deslize.
Ele estava fora de si de preocupação.

Mas assim que meus olhos se dirigiram para Collings, pude ver o
entendimento lá.

— Que tal você me ajudar a buscar café para todos eles? — Ele
sugeriu, acenando uma mão em direção ao outro lado da sala, onde um
sistema de quatro potes estava instalado. — Scotti, não é? — Ele
acrescentou, os lábios se contorcendo, sem parecer tão chateado pela
mentira, algo que de forma alguma aliviou a minha preocupação.

~ 188 ~
Mas o que eu poderia fazer? Não poderia recusá-lo. Isso
provavelmente só pioraria as coisas. — Claro, — concordei, dando-lhe
um aceno de cabeça enquanto ele me convidou para ficar ao lado dele
quando começamos a andar.

— Então, você e Mark voaram na estrada, hein?

E, apesar da ansiedade no meu estômago, tive que rir disso. —


Algo assim, — concordei quando caminhamos para o lado da cafeteira e
Collings pegou dez copos. Assumi que eram oito para os Mallicks e um
para cada um de nós.

— Não sei sobre as meninas, mas o resto bebe preto, — ele


explicou quando começou a derramar.

— Você os conhece bem, parece.

O sorriso de Collings foi caloroso. — Difícil não conhecê-los nesta


cidade. Inferno, frequentei a escola com Charlie naquela época. Tive
uma paixão perversa por Helen nos meus vinte e poucos anos. Ele foi
um otário de sorte por pegá-la. Mas sim. Esses meninos têm causado
todo o tipo de confusão durante toda a vida. Embora, nunca foi nada
assim antes. Eles são cuidadosos com o seu... trabalho, — ele disse,
levantando uma sobrancelha para mim. — Eli nunca fica para fazer um
trabalho sozinho.

Porque Eli tinha problemas de raiva, lembrei-me de que Mark me


contou. Se não tivesse alguém para puxá-lo de volta, às vezes apenas
continuaria indo e indo.

— Mas este não foi um trabalho tanto quanto posso dizer, — falou
Collings, me surpreendendo com a vontade de compartilhar enquanto
ele metia tampa em todos os copos. — Aconteceu há três dias numa
cidade vizinha. Demoraram até esta manhã para prendê-lo.

Há três dias.

Meu estômago retorceu de novo, percebendo pela primeira vez


que os carros que estavam patrulhando a área não estavam procurando
a mim ou aos meus irmãos, mas Eli.

De alguma forma, embora eu mal o conhecesse, isso era tão ruim.

— Então, Scotti, — disse Collings de repente, terminando com os


cafés e virando-se para apoiar-se de costas contra o balcão, olhando
para a delegacia. — Coisa engraçada. Pesquisei a sua licença alguns
dias atrás...

~ 189 ~
Merda.

Merda. Merda. Merda. Merda. Merda.

— Oh, eu...

— Obviamente, voltou falso, — ele falou casualmente, num tom


completamente desprovido de surpresa ou raiva. — Bom trabalho
aquele. Barney?

— Quem é Barney? — perguntei, as sobrancelhas se juntaram.

— Falsificador local. Não importa. Só me pareceu o nível de


trabalho dele. Enfim. Parece que você e Mark tem alguma coisa. Então,
isso significa que você provavelmente vai ficar em Navesink Bank.

— Eu, ah, talvez, — hesitei, me sentindo como se estivesse em


uma posição verdadeiramente instável, apesar do seu tom casual.

— Você vai fazer isso sob seu nome real? Seus irmãos também?

Oh Deus.

Ok.

Bem.

Eu precisava, ah, me lembrar de como respirar.

E procurar por saídas.

E não ser apanhada por uma dúzia ou menos de policiais e


detetives andando ao redor.

— Vou assumir que, se todos vocês fizerem isso, estarão


pendurando os seus chapéus de assalto à mão armada.

Puta merda.

Ok.

Pior cenário possível.

Pelo menos era apenas eu, certo? Meus irmãos poderiam sair
todos limpos.

— Relaxe, — disse Collings, com um tom calmo, tranquilizador. —


Não estou arrastando você ou eles para isso. O que penso é que,
ninguém nunca se machucou e essas lojas fazem mais mal do que bem
em toda a parte. Desde que tenham terminado, estou disposto a livrar

~ 190 ~
de toda a pesquisa que fiz sobre isso. E confie em mim, ninguém se
importou em fazer metade da investigação que fiz, então vocês não
precisam se preocupar com isso. — Quando não consegui imaginar um
pensamento consciente, muito menos fazer minha boca se mexer e fazer
algum som, ele encolheu os ombros. — Sei que eu não deveria dizer
isso, mas tenho homens nesta cidade que estupram violentamente as
mulheres. Tenho traficantes que estão distribuindo overdose como
doces no pátio da escola. Tenho merda muito mais importante para me
concentrar do que em vocês. Então, se você puder me dizer que vocês
estão se aposentando, posso fazer isso para que morem aqui em paz.
Todos vocês, — acrescentou.

Eu queria encontrar uma cilada ali.

Queria ver falsas promessas.

Mas tudo o que vi foi compreensão e sinceridade.

— Nós estamos todos, hum, explorando novas carreiras


profissionais. Eu, realmente, acho que gosto de horticultura.

Ele assentiu com a cabeça. — Só não comece a cultivar erva.


Quero dizer, por algum motivo, essa merda ainda é ilegal por aqui. Não
quero prender você por algo tão estúpido depois de sua carreira
bastante ilustre e sem prisão.

Eu sorri para isso. — Nenhuma erva, prometo.

— Bom, — ele disse, todo o seu rosto caindo enquanto olhava pela
sala em direção ao Mallicks. — Espero que eles possam passar por isto.
A situação não está boa. Eli realmente fodeu tudo, batendo no filho de
um político. Ele tinha que ir preso por isto. Não há chance de ele sair
daqui.

Oh Deus.

Meu coração doeu por todos eles.

Não imaginava ouvir esta notícia.

— Eles são fortes, — falei, sabendo que era verdade.

— Fortes, claro. Mas isso é um golpe. Eles não estarão bem por
um longo e longo tempo. Estou feliz que Mark tenha você ao seu redor,
— disse ele, virando-se para meter os cafés em bandejas, empilhando-
os e indo em direção ao grupo que estavam ficando muito barulhento,

~ 191 ~
arriscando as suas próprias chances de um telefonema. — Ele vai
precisar de você.

Não sabia o que isso significa. Eu não tinha experiência em ser


necessária fora minha família. Não sabia se ele me queria por perto, se
queria algum espaço, se queria conversar, se queria o silêncio.

Mas, seja lá o que ele quiser, eu darei a ele.

Porque ambos Collings e eu estávamos certos. Eles eram fortes,


mas este era o tipo de golpe que deixaria um dano permanente. Sabia
que se fosse King, Nixon, Atlas ou Rush na cela, sabendo que ele ficaria
encarcerado por dez anos, sério, não. Eu seria incapaz de me recuperar
disto. Seria uma ferida diária, constante, dolorida, sangrenta e
dolorosa.

Acabei de voltar para a sala de espera, enquanto um grupo de


policiais e detetives movia o clã Mallick inteiro para trás de mim,
quando a porta de uma das salas de interrogatório abriu.

E Eli caminhou para fora.

Algemado.

A cabeça dele estava erguida, olhando para onde estava indo, até
vislumbrar a sua família.

Talvez eu não o conhecesse bem, mas conhecia bem aquele olhar


para identificar isso quando eu o via.

Vergonha.

Ele estava envergonhado.

Talvez fosse por isso que não os havia chamado, porque ele não
havia chamado um advogado. Talvez pensasse que merecia o que estava
recebendo.

— Eli, — Helen chamou, seu tom tão dolorido que fez um disparo
por todo o meu peito.

Seus olhos se deslocaram para ver sua mãe, seus olhos ficando
tristes por um breve momento antes que parecesse puxar um escudo
sobre eles, bloqueando tudo, fazendo-o parecer assombrosamente vazio.

Então, ele simplesmente abanou a cabeça para ela, deixou cair os


olhos para o chão e seguiu o policial levando-o para trás.

~ 192 ~
Então aconteceu algo que ninguém que conhecesse Helen Mallick
pensaria que ela fosse capaz de fazê-lo.

Ela quebrou.

Eu mal a conhecia.

Mas, mesmo sendo uma quase estranha, assistindo a esta mulher


forte como aço desmoronar-se, perdendo literalmente a força nas
pernas, tendo que ser segurada por seu marido, igualmente arruinado,
meus olhos começaram a nadar em lágrimas por ela.

Pareceu ser demais para seus filhos também, quando Hunter


voltou-se para Fee, Shane virou-se para Lea, Ryan pegou o telefone para
entrar em contato com Dusty e Mark virou-se para mim.

Então ele não estava apenas olhando para mim, ele estava
caminhando em minha direção.

Não sei se foi porque ele viu as lágrimas e pensou que eu


precisava dele, ou porque ele precisava de mim, mas quando dei por
mim, estava esmagada contra o seu sólido peito, os seus braços fortes
me segurando com tanta força que a respiração era mais como um
desejo e uma oração do que uma realidade. O que quer que fosse,
parecia certo de estarmos lá um para o outro, de nos apoiar um ao
outro, de obter força um ao outro.

Meus braços se moveram ao redor de suas costas, segurando tão


apertado quanto a sua cabeça pressionava o meu lado.

— Eu não posso fazer nada, — ele admitiu, sua voz dura. — Eles
vão levá-lo... e não posso fazer nada, merda.

Fechei os olhos com força, sentindo as lágrimas correrem pelas


minhas faces, podendo apenas simpatizar com a absoluta impotência
que ele sentia naquele momento. Tinha a impressão de que os homens
Mallick não estavam acostumados a sentirem-se inúteis,
desamparados, completamente fora de controle. E os homens que não
estão acostumados a isso não devem lidar bem com a sensação.

— Vocês podem chamar seu advogado, certo? — perguntei,


querendo dizer algo que não fosse alguma merda trivial que ele não
precisava naquele momento. Porque não estava bem e não iria ficar
bem. Não ia alimentar essa falsa porcaria. Ele merecia melhor do que
isso. — Sei que ele recusou a chamar um. Mas ligue de qualquer
maneira, certo? Só porque ele está sendo teimoso não significa que

~ 193 ~
vocês não podem tentar forçá-lo. Ele deve ter um advogado para ir a
julgamento.

— Você está certa, — ele concordou, retrocedendo um pouco,


olhando para mim com uma pequena quantidade de alívio e mais do
que um pequeno propósito. Seus olhos se suavizaram quando ele soltou
o meu quadril para limpar suavemente as lágrimas das minhas
bochechas. — Obrigado, — ele acrescentou, inclinando-se para me dar
um beijo rápido e distraído mesmo quando ele alcançou o seu celular.

Enquanto ele falava, peguei os cafés de Collings que me deu um


olhar conhecedor e comecei a entregá-los àqueles que tinham forças o
suficiente para aceitar.

Foi quase uma hora mais tarde quando Fee e Lea caíram nos
banco ao meu lado, todos os homens ainda se apinhavam ao lado,
falando. Charlie confiou coisas aos seus filhos e levou para casa uma
Helen muito pálida e muito quebrada para tentar acalmá-la.

— Eu não posso, — disse Fee, balançando a cabeça que estava


inclinada até o teto enquanto ela piscava rapidamente, tentando
segurar as lágrimas. Todos nós sabíamos que era inútil, e um segundo
depois, elas também começaram a fluir.

Mesmo que eu não tivesse experiência em tais coisas, o meu


braço estendeu a mão e coloquei ao redor de seus ombros enquanto Lea
esticava através de mim para descansar a sua mão na perna de Fee.

— O que eu digo às meninas? — Ela perguntou impotente.

— Você diz a elas, — disse uma voz masculina desconhecida em


frente a nós, fazendo com que todas ficássemos em choque e
olhássemos para cima. Foi então que me dei conta de que conhecia a
voz, apesar de eu ter ouvido apenas uma vez antes, numa grande loja,
quando ele tinha uma arma apontada para Mark e para mim. Detetive
Lloyd, acho que era o nome dele. — Que o filho do senador Ericsson é
um pedaço nojento que bate na esposa, que nós nunca fomos capazes
de levar a cabo apesar de uma dúzia de chamadas de violência
doméstica da sua mansão que é paga pelo dinheiro dos contribuintes.
Você diz a elas que seu tio impediu esse bastardo de colocar sua esposa
cedo, mas provavelmente muito bem-vinda, numa sepultura. Diga-lhes
que ele não é aquele que pertence à prisão, mas que às vezes as pessoas
más ganham na vida. Diga-lhes que, se quiserem mudar, é melhor ter
uma educação e começar a tomar algumas dessas posições de poder
longe desses malditos canalhas. Isso é o que você diz a elas. Tirando
alguns foda-se, talvez, — ele acrescentou um pouco timidamente.
~ 194 ~
Com isso, e nem uma única coisa mais, o estranho e esquivo
detetive Lloyd desapareceu pelas portas da frente.

— Uau, sempre pensei que ele era um idiota, — comentou Lea na


porta fechada, fazendo com que eu e Fee bufássemos antes de
percebermos o quanto isso foi inapropriado.

— Seria estranho que eu esteja aliviada por isso não estar


relacionado com o trabalho? — Fee perguntou, olhando para nós. —
Tipo, eu não deveria ficar. Se fosse coisa do trabalho, tudo o que eles
precisariam era ir com tudo atrás do cara de cu de uma só vez até que
ele concordasse em retirar as acusações. Então tudo poderia acabar.
Mas, pelo bem de Eli, estou mais, hum, não sei... aliviada por ele ter
defendido pelos motivos certos? Acho que é isso que estou tentando
dizer.

— Não acho que ele está vendo isso dessa maneira, infelizmente,
— disse Lea, não tentando ser Debbie Downer5, apenas sendo sincera.
— Você conhece Eli. Ele entra em uma espiral descendente depois que
percebe que deixou a raiva vencer. Demora um pouco para sair da
depressão. Quero dizer... não sabemos o quanto ele machucou o idiota
que bate na mulher, — continuou ela. — Sua acusação é apenas lesão
corporal agravada, então ele não o matou. Mas ele esteve perto? Sei que
vendo um homem gritar com uma mulher foi provavelmente um gatilho
que ele nunca conheceu antes, de modo que não me surpreenderia.
Sem um dos seus irmãos para afastá-lo, isso poderia ter ido muito mal,
muito rápido. Por isso, ele não vai falar com nenhum de nós, quase
dificilmente irá olhar para qualquer um de nós.

— Vai passar, — disse Fee, exalando com força. — Sempre passa.

Lea assentiu, mas ficou em silêncio, e tive a sensação de que


talvez pensasse diferente. Ela simplesmente não queria deixar o clima
para baixo — Scotti, — ela disse de repente, fazendo-me saltar, sentindo
como seu eu tivesse sido mais uma espiã do que uma participante na
conversa até este ponto. — Você acha que Mark estaria disposto a
acolher a Coop? — Ela perguntou, olhando esperançosa. — Fee não
pode fazê-lo com todas as meninas. Ryan e Dusty têm o gato que odeia
Coop. Shane e eu não temos um quintal...

— Vou perguntar a ele, mas não acho que ele diria não.

5Personagem do programa televiso Saturday Night Live, virou meme e referência para dizer que a pessoa é
pessimista, sempre olhando o lado negativo da vida.

~ 195 ~
— Mas nos avise. Se Eli foi preso esta manhã, essa besta ficou
solta na sua casa durante quase um dia. Ele precisa sair para passear,
ser alimentado e ter um sério controle de danos feito em seu lugar.

— Tenho certeza de que não será um problema, — falei,


observando Mark. Como se estivesse sentindo o meu olhar, ele olhou
por cima de seu ombro para mim, e a área ao redor de seus olhos
suavizou ligeiramente.

— Oh, eu conheço esse olhar, — disse Lea, sorrindo


calorosamente.

— Essa é uma boa olhada de um homem Mallick, — Fee


concordou. — Embora eu goste muito mais em Hunter.

— Ele já te contou? — Lea pressionou.

Confusa, as minhas sobrancelhas se juntaram. — Me contou o


quê?

— Isso é um não, — respondeu Fee, inclinando-se para frente


para olhar para Lea do outro lado de mim.

— Logo, — Lea concordou.

— Esse parece ser o padrão, — disse Fee com um aceno de


cabeça e sorriu.

Completamente por fora, até mesmo me perguntando se o


estresse tinha chegado a elas um pouco, fiquei em silêncio. Na verdade,
todas nós ficamos até que os homens acabassem de conversar com o
homem que entrou às cinco da manhã, parecendo revigorante e bonito,
com cabelos um pouco grisalhos, com um terno preto ajustado e
exibindo traços muito clássicos e bonitos.

— Esse é Ellis. Ele é o advogado, — explicou Lea. — O melhor no


estado.

Bem, havia pelo menos isso.

Ellis conversou com os homens Mallick durante dez minutos


antes de ir conversar com um detetive. Foi nesse ponto que os homens
finalmente voltaram para nós, então andaram para nós como uma
unidade. Nós também ficamos como um, movendo-nos para os nossos
respectivos homens.

— Elas querem saber se você pode pegar Coop, — eu disse assim


que os outros se afastaram.

~ 196 ~
— É claro que vamos cuidar de Coop, — ele respondeu, colocando
um braço ao meu redor, e me puxando para perto para beijar a minha
testa. — Não há mais nada a fazer agora. Ellis precisa entrar para ver
Eli, então ele vai voltar para nós. Agora, devemos ir buscar Coop, limpar
a casa de Eli e conseguir algum alimento ou cafeína para nós.

Sem dormir.

Não fiquei surpresa.

Estava bastante segura de que ele teria muitas noites sem dormir
à sua frente.

Mas quando chegamos à casa de Eli, não havia Coop.

Na verdade, não havia sinais de que Coop tinha estado lá há


muito tempo. Sua coleira também estava fora do gancho. Como se
talvez estivesse com Eli quando ele foi preso. — Eu pedirei a Rush para
passar pelo abrigo, — ofereci enquanto dirigimos de volta para o lado da
cidade de Mark.

Ele não lutou contra isso, insistindo em fazê-lo ele mesmo. Acho
que o estresse estava chegando a ele. — Vou enviar-lhe uma foto de Eli
para enviar para ele, — ele concordou, então, fez exatamente isso.

Mas Coop não estava no abrigo.

E, apesar de inúmeros cartazes, chamadas e visitas a todos os


abrigos e veterinários da área, ele não estava em lugar nenhum.

Nunca descobrimos o que aconteceu com o Coop até... bem, isso


era uma história para outro dia.

E outra mulher.

Quanto a Mark e eu, bem, voltamos para a casa dele.

E então continuamos voltando para a casa dele.

E eu aprendi a chamá-lo de lar.

~ 197 ~
Epílogo
MARK

Dois dias

Lesão corporal qualificada acabou por ser a acusação oficial.

Quando cheguei a casa e vi a notícia, vi o vídeo do ataque que


vazou de um celular, fiquei realmente surpreso por não alegarem
tentativa de homicídio. Mas já que o bastardo estava batendo em sua
esposa, eles deixaram que fosse agressão.

Ellis precisou aguardar um dia inteiro antes de Eli concordar em


vê-lo, e mesmo assim, Ellis disse que mal conseguiu um punhado de
palavras de meu irmão.

Tive a sensação nítida e doentia de que não foi um incidente


isolado, algo tinha mudado em Eli, que ele pode nunca deixar nenhum
de nós entrar de novo.

Talvez fosse prematuro sentir assim, mas era apenas a sensação


que estive recebendo. Havia algo sobre aquele olhar em seu rosto
quando ele saiu da sala de interrogatório. Todos sentimos isso. Foi por
isso que minha mãe enlouqueceu.

Porque aquele homem, aquela casca vazia de um homem que


estava algemado, não era Eli Mallick. Era uma pessoa completamente
diferente.

E talvez nenhum de nós tivesse a certeza de que voltaríamos a ter


o velho de volta.

Era prematuro ter esse tipo de pensamento, mas também não


conseguia me livrar dele.

Apesar de tudo, através do meu ritmo, da minha fúria, das


minhas noites sem dormir, Scotti acabou... ficando lá. Ela não me
chateou para me abrir quando ficou claro que eu não queria. Ela não
exigiu que eu chegasse aos lençóis e dormisse um pouco quando ficou

~ 198 ~
claro que eu precisava disso. Ela fez comida, mas não me implorou para
comer. Apenas me deixou passar por isto, mas estava lá para mim
quando eu caía no sofá, completamente vazio. Ela se curvou. Ela porra
me segurou.

Se eu não tinha certeza antes, mesmo com o estresse e a


devastação, eu sabia disso.

Eu amava essa mulher.

Cedo demais? Talvez.

Mas era verdade, no entanto.

Às vezes acontece assim.

— Não tenho ideia do que você costuma comprar, — disse ela,


entrando na porta com cerca de quinze sacos nas mãos e pendurados
nos seus braços.

Eu ri quando me levantei e caminhei em sua direção para pegar a


maioria dos sacos. — Uma viagem, ou morra tentando, hein? — Eu
perguntei, beijando a sua têmpora. — Vou comer qualquer coisa,
querida. Obrigado por ir ao mercado.

— Agradeça a Rush. Ele foi o único que se arriscaria levar uma


multa por dirigir sem habilitação. — disse ela, sorrindo enquanto
colocava os sacos na ilha.

— O resto está chegando hoje? — perguntei, sabendo que eles


estavam falando sobre voltar, considerando a merda que aconteceu com
Collings, alguma coisa que ela meio divagou a falar, enquanto eu
passava por aquilo, achando que era uma informação importante. E
era. E tirou um enorme peso de meus ombros saber que ela se sentia
cerca de mil por cento mais confortável em ficar comigo.

— Mhm, — ela disse um pouco distraída quando ela começou a


colocar os itens frios longe. — Eu estava indo, um, encontrá-los para
um café ou algo assim, para que possamos recuperar o atraso e...

— Traga-os aqui, — eu a cortei, olhando enquanto ela congelava


por um instante antes de se virar.

— Está tudo bem. Podemos nos encontrar em algum lugar. Sei


que seus irmãos estão...

— Chegando mais tarde, sim, — concordei, balançando a cabeça.


Estávamos tentando descobrir como fazer Eli se abrir. — Esta é a sua

~ 199 ~
casa agora também, Scotti. Seus irmãos são importantes para você,
assim como os meus são para mim. Nenhuma razão pela qual eles não
podem estar todos aqui de uma vez.

Não era a maior casa do mundo, mas certamente caberíamos


todos.

— Você tem a certeza? — Ela perguntou, e não havia dúvidas da


excitação em sua voz.

— Positivo, — concordei, alcançando-a e puxando-a para perto.

Eu era homem o suficiente para admitir que não senti nada físico
desde que voltamos da delegacia. Estava muito cansado, por todo o
lado, muito zangado com o mundo para pensar em algo assim. Mas com
a dissipação do nevoeiro, com a aceitação da minha própria impotência
na situação, não havia como negar que eu estava tendo algumas ideias.

Essas ideias provavelmente envolviam deixar o sorvete no saco em


cima do balcão derreter enquanto eu a fodia duro e áspero até que nós
dois estivéssemos gastos demais para fazer qualquer coisa, exceto
enrolar na cama depois.

Isso foi exatamente o que aconteceu também.

Scotti

Trinta e Sete Dias

Fechei os olhos com força, querendo bloquear o mundo inteiro,


querendo desaparecer, querendo qualquer coisa menos ver o olhar de
devastação total nos rostos das pessoas que me rodeavam.

Porque o julgamento acabou.

O veredicto estava feito.

E a sentença foi proferida.

Não foi uma surpresa.

~ 200 ~
A evidência tinha sido condenatória. O testemunho de Eli tinha
sido robótico. As imagens da chamada “vítima” no hospital eram
horríveis, na melhor das hipóteses.

Tudo acrescentado fez o culpado.

E ele era o culpado.

Todos nós sabíamos disso. Esperávamos ganhar simpatia com o


testemunho da mulher que tinha ficado tão mal da surra do seu marido
que, obviamente, precisava de uma cirurgia plástica depois. Mas
quando ela tomou a posição, tudo o que saiu da boca foi em defesa do
marido, como ele era um bom homem, como ele não mereceu uma
surra tão brutal.

Não importa como ela não merecia uma surra brutal.

Acho que foi mais um horror de ser um homem rico e poderoso


em uma sociedade que lhes permitia fugir com o que quisessem. Eles
poderiam forçar suas vítimas a mentir sob juramento.

Eu, pessoalmente, não fiquei tão surpreendida com a sentença.


Como eu disse, a coisa toda só acabou de uma forma horrível. Se
apenas Eli tivesse saído de sua depressão e tivesse dado um
testemunho convincente como foi terrível a surra que ele havia
testemunhado, talvez pudesse ter conseguido tudo por um par de anos.

Como foi, ele pegou dez anos.

Benefício de liberdade condicional em 5 anos.

Mesmo que fosse apenas cinco, sabia que era demais para a
família Mallick. Cinco anos quando eles nunca ficaram cinco dias sem
se verem.

E, a julgar pelo fato de que Eli recusou visitas na cadeia, tinha


certeza de que todos estavam pensando o que eu também estava; ele
também não aceitaria visitantes na prisão.

Ele estava cortando laços.

Ele estava se afastando.

Ele estava matando todos que o amavam.

Quanto a Eli, quando olhei para ele depois da sentença, quando


ele foi puxado pelo oficial para ficar de pé, ele não mostrou nada. Sem
choque, sem raiva, sem devastação. Nem quando ouviu o choro de sua

~ 201 ~
mãe, Fee, Lea e Dusty. Nem mesmo quando o seu pai, o durão, o agiota
de carreira que ele era, teve que limpar algumas lágrimas. Nem quando
os seus irmãos o xingaram e o chamaram, praticamente implorando
que ele olhasse para eles.

Ele estava apenas... vazio.

Tudo o que eu poderia pensar era o quanto ele ia perder. Ele


sentiria falta de suas sobrinhas queridas. Ele sentiria falta do
nascimento dos filhos de Lea e de Dusty e talvez dos meus filhos.
Perderia nascimentos e aniversários e jantares de ação de graças e
natal. Haveria um buraco considerável em cada um dos eventos da vida
a partir deste ponto. Não havia como negar isso. Esse lugar nunca
poderia se sentir preenchido. A vida pareceria sempre faltando um
pedaço com ele fora.

Mesmo que ele tenha liberdade condicional em 5 anos. Que ainda


eram cinco anos. Cinco anos significavam que Becca iria para o ensino
fundamental. Isso significava que qualquer bebê nascido estaria na
escola primária antes mesmo de encontrá-lo.

Porque, não se iluda, ele não os encontraria.

Não conhecia bem Eli, mas eu tinha a sensação de que ele nunca
deixaria a sua família levar as crianças para uma prisão para vê-lo
encarcerado atrás do vidro. De jeito nenhum.

E isso, bem, isso era uma porra de tragédia.

Incapaz de segurar isso por mais tempo enquanto vejo Eli


desaparecer, me inclinei para a minha direita, descansando no ombro
de King, porque não sentia vontade de chorar em Mark nesse momento,
sabendo que ele era aquele que realmente estava perdendo algo, não eu,
mas precisava de um ombro, independentemente.

Era tão malditamente triste.

Meu coração doía por todos eles.

— Tome dois minutos, — disse King, me dando um aperto. —


Então acabe com essa merda e esteja lá para o seu homem.

Eu sorri porque era exatamente o que precisava ouvir e assenti


com a cabeça.

Então tomei dois minutos.

E eu estava lá para Mark na capacidade que ele permitiria.

~ 202 ~
Vivi tempo suficiente ao redor dos homens para saber que eles
não queriam você na sua bunda quando estavam lidando com algo. Sua
melhor aposta era apenas estar por perto, para estar lá quando eles
finalmente precisassem de uma opinião, ou um abraço, ou o que fosse.
Comecei a me preocupar que talvez o método não fosse o mesmo para
os namorados depois que deixamos a delegacia naquela primeira noite,
mas, por fim, provou ser o método certo. Depois que ele tinha se
enfurecido e se embriagado e resolvido tudo na sua cabeça, ele voltou
para mim, me segurou, me fodeu semiconsciente no chão da cozinha.

Isso, eu sabia, precisaria de mais tempo. Mas nós tínhamos


bastante. Ele valia os altos e baixos.

— Dois minutos acabaram, — declarou King, fazendo-me rir e


golpear as minhas bochechas, depois me movendo para colocar um
braço em volta de Mark, inclinando-se sobre ele enquanto conversava
com o seu pai.

Foram uns bons dois dias antes de conseguirmos falar sobre isto,
por tudo para fora. Mas era o que ele precisava, esses dois dias, então
foi o que eu lhe dei.

MARK

Um ano

Nunca me acostumaria com o sentimento.

Não importa quantas vezes aconteceu no ano passado.

Cada vez que algo maravilhoso acontecia, como Shane e Lea


trazendo Jason para o mundo e, logo depois, anunciaram que teriam
outro, mesmo quando Dusty e Ryan se casaram e começaram a
trabalhar para a sua família, também. Através de todos os aniversários
e feriados, não importa o quanto verdadeiramente estivéssemos felizes,
haveria uma tristeza por baixo de tudo.

Porque Eli nunca voltou para nós.

Quando o levaram para fora daquele tribunal, sem o


conhecimento de nós, eles o tiraram completamente de nossas vidas.

~ 203 ~
Não houve chamadas telefônicas.

As cartas foram devolvidas.

Visitas, não importava qual de nós subisse lá (e cada um de nós


tentou), foram negadas por ele.

Nós não sabíamos se ele estava bem.

Não sabíamos se ele estava tentando fazer o melhor, ou se ele


estava deixando essa vida consumi-lo completamente.

Mamãe não sabia se ele estava comendo, se estava dormindo, as


suas principais preocupações sendo uma mãe.

Meu pai e o resto de nós, não sabíamos se ele se meteu com uma
gangue, se ele estava sendo espancado, se ele estava deixando sair a
raiva e recebendo mais tempo adicionado à sua sentença ou passando
demasiado tempo na solitária.

Nós não sabíamos porra nenhuma.

Era como uma morte na família.

E deixou um vazio.

Então, ainda que toda a vez que olhava para baixo e via aquele
anel de diamante de corte quadrado na mão de Scotti, sabendo o
quanto era uma loucura insana ter uma mulher que esteve lá por mim
através do meu pior e ainda assim queria inscrever-se para mais, não
conseguia me sentir cem por cento feliz.

Scotti lançou a revista de noivas que Fee tinha deixado, junto com
cerca de cinquenta outras, com um bufar.

— O quê? — perguntei, observando enquanto ela balançava a


cabeça no quarto.

— O que diabos é uma “cintura alta”?

— Hum...

— Sim, exatamente, — ela disse, olhando como olhos arregalados


para mim como se eu estivesse envolvido em algo. O que, bem, porra
não estava.

— Por que você precisa saber o que é uma cintura alta?

~ 204 ~
— Porque, aparentemente, para o meu formato retangular, que é
realmente apenas uma maneira matemática de se dizer que eu não
tenho seios, quadris, ou bunda, — disse ela, revirando os olhos — esse
é um bom tipo de vestido para mim.

Eu sorri então, incapaz de segurá-lo.

Scotti era um monte de coisas.

Ela era bonita; ela era brilhante; ela era engraçada de uma
maneira sarcástica, que, por acaso, era meu favorito; ela se doava; ela
era leal; ela era incrível na cama; ela era uma boa cozinheira, além de
uma jardineira profissional. Uma coisa que absolutamente ela não era,
era uma menina feminina.

Fee perguntou uma vez a sua opinião sobre a sua roupa e


mostrou o seu vestido e depois, voltou um minuto mais tarde com um
olhar esperançoso para o qual Scotti respondeu: — Bem, você vai
mudar ou o quê?

Aparentemente, tinha sido um vestido completamente diferente,


apenas em um estilo diferente, mas da mesma cor.

Isso foi hilário para as meninas que nunca a deixariam se


esquecer.

Então, escolher um vestido de noiva, que era de suma


importância como eu fui informado, estava provando um tipo especial
de tortura para ela.

Como uma mulher que geralmente estava de jeans, camisetas ou


o ocasional vestido preto agradável, tinha certeza de que ela nunca
percebeu que certos estilos caberiam melhor na sua figura do que nos
outros. Ela acabou usando o que ela gostava ou o que a fazia se sentir
quente. Isso nunca a induziu ao erro no passado.

Dito isto, revistas de beleza (noivas incluídas) ganharam milhões


sobre as inseguranças de uma mulher.

Eles estavam transformando a minha mulher, geralmente muito


segura de si mesma, em uma pilha de nervos.

— Primeiro, — eu disse, abaixando a cabeça para pegar o seu


olhar, — você tem seios, quadris e uma bunda. E eles são todos
fantásticos pra caralho; não ligo para o que a revista diz. Segundo
lugar, não sei, nem me importo, e tampouco você, com o que diabos é
uma cintura alta. Tudo o que me interessa, e tudo o que você deveria se

~ 205 ~
preocupar, é que você escolha um vestido em que você se sinta bem. É
isso. Não me importo se é um maldito vestido de baile rosa choque que
passarei duas horas para tentar chegar debaixo para encontrar a sua
doce boceta. — Ela riu então, seu rosto perdeu toda a tensão em um
piscar de olhos.

— Havia um terceiro? — Ela perguntou quando a segui para fora.

— Espere, — falei, olhando para o teto e fechando os olhos. —


Estou imaginando a busca pela boceta por um segundo. — Ela golpeou
o meu ombro e eu sorri enquanto a olhava. — Em terceiro lugar, este é
o nosso casamento. É esperado que seja uma festa fodona para celebrar
que estaremos fodendo um ao outro para sempre e sempre amém.

— Sim, isso é totalmente o que está celebrando, — ela rastejou,


sorrindo.

— Meu ponto é, baby, não quero você nervosa com esta merda. É
para fazer-nos felizes, não em pânico. Não leia essa merda, — falei,
apontando para a pilha na mesa. — Apenas descubra o que você quer.
Você quer um juiz de paz? Tudo bem. Você quer um salão de festas e
todos os criminosos nesta cidade presentes, talvez precisaremos de
segurança privada, mas tudo bem também. Você quer voar para Las
Vegas... Bem, teríamos que levar a minha família e a sua, porque nunca
ouviríamos o fim se não o fizéssemos, mas também podemos fazer isso.
Tudo o que quiser.

— Também é o seu casamento, — disse ela, encolhendo os


ombros.

— Sim, e tudo o que quero é meu sobrenome depois do seu


primeiro, o meu anel em seu dedo, um sorriso em seu rosto e minha
busca pela boceta acima mencionada. É isso. Tudo o resto é ruído de
fundo.

Seu rosto ficou suave nisso.

— Você acha que talvez Charlie e Helen nos deixariam fazer o


casamento lá? — Ela perguntou, parecendo quase envergonhada por
perguntar. Porque significava demais para ela.

Eu sabia que ela tinha um ponto fraco pela casa de meus pais.
Talvez fosse porque era o primeiro lar de verdade, com uma mãe e um
pai que conhecia em uma década. Talvez fosse porque foi o primeiro
lugar onde sua família e a minha família compartilharam um Dia de

~ 206 ~
Ação de Graças juntos, depois Natal, Ano Novo. Foi um lugar onde
fizemos muitas memórias.

E ela também queria isto lá.

— Querida, eu não conseguiria terminar a pergunta antes que


eles concordassem, — respondi, observando como seu sorriso era quase
um pouco tímido. — Eles te amam pra caralho. Eles adoram os seus
irmãos pra caralho. Eles, obviamente, adoram todos nós, os fodidos.
Mamãe adoraria saber que você quer o seu casamento lá. Vou abordá-la
amanhã, mas estou te dizendo que vai correr bem. Então você pode
riscar locais fora de sua lista.

Quis dizer isso metaforicamente, mas ela realmente se afastou,


revirou as revistas, fazendo com que três caíssem no chão onde as
deixou e pegou um bloco de papel que, literalmente, tinha três colunas
diferentes e palavras até o final em cada coluna, e riscou o que assumi
que era “local”.

— King vai me levar, — disse ela, não conseguindo encontrar os


meus olhos. — Quero dizer, sei que Charlie é como um...

— Scotti, — eu a cortei, balançando a cabeça, — Papai não vai se


ofender que você não pediu para ele te levar. Não seja ridícula. King foi
o único pai que você já conheceu. — Na verdade, quando decidi que
precisava de Scotti de forma mais oficial e comprei o anel, King foi a
minha primeira parada no meu caminho de volta da joalheria.

Eu o encontrei em seu trabalho, arrebentando sua bunda para


deixar pronto para abrir. Meus irmãos e eu, junto com seus irmãos,
fizemos tudo o que pudemos para conseguir com que o pardieiro que ele
comprou ficasse em condições viáveis. Mas ele ainda estava a meses de
poder abrir a loja.

Quando entrei, ele estava marretando uma parede quebrada,


desfazendo o gesso. Ouvindo-me, ele olhou por cima do ombro para
mim. — Há apenas uma coisa que coloca esse olhar no rosto de um
homem, — ele disse, deixando cair a marreta e vindo em minha direção.
— Você vai pedir a ela.

— Não antes de te perguntar.

Seu sorriso ficou um pouco divertido com isso. — Sei que Scotti
não gostaria de ser discutida como um bem móvel, mas aprecio que
você tenha vindo aqui.

— Sei o que ela significa para você. É o certo.

~ 207 ~
Ele assentiu com a cabeça. — Não consigo pensar em nada que a
fez sorrir do jeito que você faz, Mark. Se isso for tudo o que você pode
oferecer, e vamos ser reais, nós dois sabemos que você tem muito mais
do que isso, mas se for tudo o que houver, fico feliz por ela ter isso pelo
resto de sua vida.

Então eu tive minha permissão.

E era justo que Kingston seja o único a entregá-la para mim.

Inferno, por tudo que juntei sobre o tempo em que eles passaram
na cabana quando Scotti estava numa depressão sobre fugir, King tinha
sido o único a tentar argumentar com ela.

Esse é um homem muito bom, meu pai havia dito depois de passar
uma noite conversando com Kingston, contando toda a história sobre
como assumiu o papel de pai de todos os seus irmãos mais novos,
sacrificando todas as coisas que ele talvez tivesse planejado para sua
própria vida. Hoje em dia, você não vê esse tipo de altruísmo.

E eu não poderia ter concordado mais. E enquanto trabalhamos


lado a lado em seu lugar, ficou cada vez mais claro exatamente o
quanto ele havia sacrificado, o quão duro ele estava lutando para
recuperar o tempo perdido. Mas dito isso, não havia uma única pinta de
ressentimento dentro dele. Ele nunca falou sobre a carreira, a esposa
ou os filhos que ele precisou adiar para cuidar de seus irmãos. Na
verdade, mesmo quando ele esforçou a sua bunda para começar o seu
novo negócio, ele ainda conseguiu tempo para ajudar Nixon e Atlas com
os seus. Quanto a Rush, bem, ele estava falando coisas obscenas com
mulheres no negócio de Fee e feliz pra caramba.

Sabia que neste momento o seu foco era o trabalho, arrumar a


sua vida, eu esperava que ele desejasse mais, eventualmente.

Seria um desperdício para um homem que é tão gostoso não ter


uma mulher. Isso foi Fee.

E ele é uma pessoa genuinamente boa também. Os garotos que são


quentes nunca são decentes. E essa foi a entrada de Lea.

Dê-lhe tempo. Isso era Dusty, sempre aquela que acreditava que
pouco de tempo, um pouco de fé, e talvez alguma respiração profunda
faziam maravilhas, não importava a situação.

— E sei que você tem Ryan, Shane e Hunter de pé com você, —


ela continuou, a ansiedade era uma coisa estranha de ver nela, e algo

~ 208 ~
que estava mostrando como isso era importante para ela. — Você acha
que Fee, Lea e Dusty vão...

— Mulher, — eu cortei-a, firmeza no tom, — você é a família delas


agora. Porra, é claro que elas estarão em pé com você. Apenas tente
detê-las. E todas as meninas vão querer ser meninas das flores. Toda
essa merda tradicional está resolvida. Você simplesmente escolhe o seu
vestido, a comida que deseja e a decoração. O resto vai lidar-se por si
só. E, se você não quer mesmo lidar com essa merda, contrate a Fee.
Ela ama isto.

Ela me observou por um longo minuto, olhos completamente


ilegíveis, algo que nunca mais aconteceu. Quando eu estava prestes a
perguntar o que estava errado, ela balançou ligeiramente a cabeça. —
Eu tenho muita sorte, — ela declarou, fazendo meu coração fazer a
porra de uma coisa estranha em meu peito. Ela pensou que era a
sortuda? — Quero dizer, você é incrível e tudo. E eu amo você, — ela
falou, os lábios se contorcendo. — Mas quero dizer... Tenho pais e irmãs
e, apesar de ter bastante dos meus próprios, tenho irmãos. Tenho
sobrinhas e um sobrinho e estabilidade e... e não sei o que diabos fiz
para merecer isso.

Seus olhos estavam nadando, e eu tive que lutar para manter um


sorriso subindo. Aprendi ao longo do ano passado que Scotti, enquanto
uma durona genuína de muitas maneiras, aparentemente tinha
também tendência a chorar praticamente por qualquer emoção.
Irritada? Lágrimas. Grata? Lágrimas. Feliz? Lágrimas. Achei que talvez
venha de uma década de tentar ser “um dos caras” e, portanto, não
permitir a si mesma deixar essa merda sair. Então agora estava saindo
o tempo todo. Achava isso cativante pra caralho.

— Algum dia, querida, você vai perceber que merece tudo de bom
que veio ao seu caminho, — eu disse a ela puxando-a contra o meu
peito para que ela pudesse se recompor. A coisa das lágrimas nem
sempre acabava conduzindo à imersão na minha camisa, embora
definitivamente acontecesse. Às vezes, ela só precisava ter um
momento.

— Oh, então, estava pensando, — ela falou um momento depois,


parecendo hesitante. — Sobre a lista de convidados.

— Ok... — indaguei quando ela não continuou.

— Apenas, ouça-me sobre isto, ok? — Ela perguntou, afastando-


se para olhar para mim. As lágrimas desapareceram e seus lábios
estavam em uma linha séria.
~ 209 ~
— Ok.

— Quero convidar Collings, — ela anunciou, fazendo-me virar de


volta.

— O quê?

— Olha, sei que ele é um policial. E se ele tivesse de fazer, ele


levaria qualquer um de nós presos, porque ele é um dos poucos bons
policiais na força. Mas ele também é alguém que enterrou algumas
provas incriminatórias que tinha sobre mim; deu a mim e a meus
irmãos a chance de começar de novo, me deixou voltar para você sem
estar sempre preocupada. E ele mesmo ligou para vocês sobre Eli, — ela
continuou, os olhos ficando tristes mesmo quando o nome dele enviou
um soco ao meu estômago. Nunca parou. Nunca faria. Eu quase
esperava que nunca fizesse realmente. Talvez ele tenha desistido de
nós, mas não desistimos dele. — Ele fez tanto bem por aqui e recebe
merda em cima só porque é um policial. Nós lhe devemos muito. O
mínimo que podemos fazer é convidá-lo para o nosso casamento.

Na verdade, ela tinha razão.

Houve muitas e muitas vezes ao longo dos anos, quando ele tinha
o suficiente para me arrastar ou aos meus irmãos para lá, mas nunca o
fez. E, inferno, depois de toda essa merda caiu com Lex Keith e The
Henchmen, ele tinha sido o único a ajudar Jstorm, tirar Wolf e salvar
pelo menos uma pequena dignidade no departamento de polícia.

— Você o quer lá, querida, ele está lá.

E seis meses depois, ele estava lá, desconfortável em um de seus


ternos de trabalho habituais, puxando a sua gravata, olhando para o
interessante grupo de criminosos que compunham o nosso casamento.
Ou seja, vários dos The Henchmen e os irmãos de Scotti, mas ele
apareceu e ele nos desejou boa sorte. Disse a Scotti que ela estava
linda. Ele me disse para não foder com tudo.

Scotti, por fim, escolheu uma “cintura alta”, o que,


aparentemente, significava que ela subia sob os seus seios. Tanto faz.
Ela estava malditamente de tirar o fôlego nele, com o cabelo comprido e
escuro deixado para baixo e uma coroa de flores brancas que ela
cultivou para si mesma que combinava com o buquê que ela também
cultivou.

E a garota louca que ela era aceitou a minha mão, tornando-me o


homem mais feliz do mundo.

~ 210 ~
Scotti

Dois anos

— Eu o odeio, — declarei a Evie que estava trabalhando na loja


comigo. — Esta é a segunda vez este mês que ele entra e pede um vaso
tanto para a sua esposa quanto para a sua namorada. As mesmas
flores, o mesmo vaso, a mesma nota. Adivinhe, torna mais fácil para ele
não foder com tudo quando levarem isso para ele.

Abri uma floricultura muito pequena, muito fofa e muito


movimentada na área principal de Navesink Bank. Só aconteceu a sorte
grande quando a única florista que tínhamos na cidade decidiu se
aposentar e ir para a Flórida. E já que moro com Mark e trabalho, e a
única verdadeira grande aquisição que precisei fazer foi o meu carro
depois que finalmente tirei minha habilitação, eu tinha a maior parte de
minha cota do dinheiro dos assaltos para fazer este sonho virar uma
realidade.

Estava trabalhando e amando, em uma estufa numa cidade


vizinha, aprendendo todos os prós e contras de cultivar e cuidar de
várias flores. E enquanto isso me deixava feliz, sempre quis ser meu
próprio chefe. Eu assisti a Kingston florescer com os seus negócios, e
isso me fez ver o quanto queria ter algo para chamar de meu também.

Então, levei os meus sonhos e planos de negócios para Charlie e


Ryan e pedi-lhes que me dessem a sua opinião honesta sobre a
viabilidade do meu plano, sendo eles os melhores chefes de negócios da
família. Para meu choque e alegria, ambos haviam sido otimistas,
insistindo em que precisávamos de uma florista e que, se os meus
objetivos fossem modestos, para não fazer fortuna, então eu ficaria feliz.

Com a aprovação deles, avancei. Segui adiante e assumi a antiga


floricultura vendo como eles tinham a instalação certa com frigoríficos
para flores e prateleiras para exposições. Tudo o que precisava era uma
pequena modernização e estava pronto para abrir. E, graças a Mark ser
um empreiteiro fodido, lidamos com esse trabalho em menos de dois
meses.

Então tive minha inauguração.

~ 211 ~
Dentro de duas semanas, precisei contratar ajuda.

Dentro de um mês, eu me senti como um sucesso real.

Charlie e Ryan estavam certos, nunca ficaria rica. Mas eu estava


ganhando o meu próprio dinheiro. Estava comandando. Tinha um
emprego normal e estável onde pago impostos e me sinto como um
membro produtivo da sociedade.

Minha mãe teria ficado orgulhosa.

Não apenas de mim, mas também de todos os meus irmãos.

Através de muitos altos e baixos e tentativas e erros, todos eles


também encontraram o seu caminho.

— Bem, bem, bem, — eu disse quando a porta se abriu e Rush


entrou. — Você veio para me levar para almoçar? — perguntei, a barriga
lembrando que era hora de comer. De fato, eu talvez estivesse
demasiado esfomeada e comecei a me perguntar se talvez estivesse
grávida. Nós não estávamos planejando isso, mas também não
tínhamos sido tão cuidadosos quanto costumávamos ser. Posso ou não
ter colocado o meu novo Anel exatamente no mesmo dia e, como
advertiu a embalagem, essa era a única maneira de ser efetiva.

— Não, eu, ah... — ele disse, parecendo quase... tímido. Rush?


Parecendo envergonhado? Que diabos.

— Você está aqui para comprar flores a uma mulher? —


perguntei, enorme sorriso revelando-se completamente incontrolável. —
Oh, meu Deus! Você está? — perguntei quando ele parecia ficar um
pouco vermelho.

— Ok. Esqueça. Não preciso disso. Vou pedir on-line, — disse ele,
levantando as mãos, dando meia volta em direção à porta.

— O quê? Então, você pode comprar um vaso quebrado e flores


murchas? Não, venha, venha escolher algo. Não vou te provocar mais.
— Ok, era uma mentira, mas primeiro eu ia esperar até pelo menos que
ele escolhesse as flores. Porque não havia forma de perder a chance de
provocá-lo quando ele teve a oportunidade de torturar completamente o
Mark com perguntas. E queria saber que tipo de mulher pode conseguir
com que um homem como Rush lhe comprasse flores.

Ela tinha de ser algo especial.

~ 212 ~
— Então, ela gosta de lilás, — ele disse, voz baixa. — Você tem
lilases?

— Claro, — falei, sorrindo. — No quintal da minha casa. Não está


à venda.

— Oh, — ele disse, o rosto caindo.

— Relaxe. Vou cortar alguns para você e torná-los bonitos.


Escolha um vaso, — pedi, acenando uma mão em direção à parede onde
eu os mantinha alinhados nas prateleiras. — Onde você a conheceu?

O olhar voltou, o quase estranhamente tímido. — No escritório.

— No escritório da Fee? — Perguntei, sabendo que a maioria de


suas mulheres eram mães ou avós. Foi uma ótima maneira de ganhar
grana com as mulheres cujos horários não permitiam das nove às cinco
com o salário mínimo. Além disso, Fee oferece grandes benefícios. —
Não são todas... espere... de jeito nenhum! — Eu disse, meu sorriso
ficando enorme.

Porque havia uma garota, uma garota solteira que trabalhava lá.
Mas ela não era uma operadora. Ah não. Ela era a garota doce, meio
tímida, muito fora do lugar, a garota da recepção.

Quando o rosto de Rush ficou vermelho novamente, eu sabia.

Oh, garoto, aposto que seria uma maldita boa história.

MARK

Três anos

Perdi uma aposta no sexo de minha própria filha.

Foi realmente apenas parte do percurso. Estava perdendo cada


aposta que fiz durante os últimos anos, especialmente no departamento
infantil. Lea teve três que eu errei. O rumor era, ela tinha outro a
caminho que errei também. E Dusty acabava de ter o seu primeiro.
Novamente, eu estava errado.

~ 213 ~
Mas quase apostei mil dólares que meu primeiro seria um
menino.

Acho que todos os meus irmãos apostaram em uma garota só


porque eu estava em uma maré de derrotas e era inteligente não
apostar da mesma maneira que eu.

Não fiquei desapontado por ser uma menina, é claro. Fiquei feliz,
não importava o que queríamos. Mas, porra, eu precisava de um fodido
retorno no departamento de apostas.

Scotti foi uma paciente, bem, terrível durante o parto, algo que
me deixou encantado. Era uma lutadora. Ela se irritou com minhas
cunhadas quando tentaram dizer-lhe para respirar. Ela disse a seus
irmãos para fazerem vasectomias porque nunca deveriam fazer isso com
uma mulher. Ela implorou às enfermeiras pelas drogas. Infelizmente,
estava avançado o trabalho de parto para as drogas.

Então ela apenas gritou e xingou tudo.

E então houve uma bebé muito pequena, muito saudável, muito


barulhenta em seus braços.

— Elizabeth, — ela declarou, me dando um sorriso. — Nós


podemos chamá-la de...

— Eli, — eu disse, sentindo aquela sensação de punhalada muito


familiar.

Ele já tinha cumprido mais que a metade, lembrei-me.

Ele iria conhecer seu homônimo antes mesmo de ela começar a


escola.

Se ele voltasse para nós, a voz pequena, amarga disse no fundo


da minha mente. Estava sendo difícil ser positivo depois de três anos
sem contato. Eli tinha dispensado Ellis, então não podíamos conseguir
que ele nos trouxesse informações. E não conhecíamos ninguém por
dentro. Nossos contatos não conheciam ninguém por dentro.

Foi um fodido silêncio de rádio.

Tudo o que sabíamos era que ele ainda estava vivo e que usava o
dinheiro para compras que depositávamos em sua conta a cada
semana. Para que ele usava - comida, itens para sua cela, subornos,
não tínhamos nenhuma fodida ideia. Mas ele usou. Então, pelo menos
era algo.

~ 214 ~
Eu também sabia que Fee, o gênio que era essa mulher, tinha
encontrado uma pequena lacuna em sua regra de “retorno ao
remetente” para todas as nossas cartas. Ele não devolveu as cartas
escritas na caligrafia de Becca ou Izzy ou as fotos da pequena Mayla.
Essas ele guardou. Essas conexões ele não foi capaz de colocar de lado.

Isso nos deu esperança.

Mas esses eram pensamentos para outro dia.

Este dia era sobre a pequena Elizabeth e a mulher incrível que a


trouxe para o mundo.

— Parabéns, sua estranha e molinha combinação de DNA, —


declarou Atlas, olhando para a bebê coberta com um cobertor em seus
braços, como se pudesse declarar um ataque nuclear e levá-la por todo
o hospital fora. Ele mostrou-se capaz de lidar com Becca, Izzy, Mayla e
Jason, já que eles eram mais velhos e ele poderia perguntar por que
estavam gritando, chorando ou lutando. Mas era uma merda com os
bebês. A primeira vez que ele segurou Danny, quase o deixou cair
quando o balançou forte e pulou fora da fralda.

— Você poderia simplesmente a chamar de Elizabeth, — Scotti


disse, sorrindo para o irmão. — Ou pequena menina ou pequena
dama...

— Sim, bem, onde está a originalidade em... oh, Deus, — ele


gemeu, os olhos se tornando enormes. — É, hum, é, — ele prosseguiu,
as suas sobrancelhas franzidas quando ele se levantou e foi em direção
à cama. — Parece que está engasgando ou alguma merda. Não sei.
Pegue. Pegue-a, droga, — ele implorou, tentando empurrar a bebê em
Scotti, que estava rindo e gemendo, ao mesmo tempo em que segurava
seu estômago e mais abaixo onde alegou que se sentia esfolada.

— Aqui, — eu disse, alcançando a bebê e salvando-a de qualquer


outro stress pós-traumático do incidente, entendendo esse pânico.
Também não segurei Becca tão bem no começo. Geralmente a amava...
de uma distância segura. Até que ela deixou de ser tão frágil. — Ela está
com fome, — expliquei para aliviar aquele olhar frenético em seu rosto.
— Não se preocupe. Em alguns meses, ela não será tão assustadora.

— Se você diz isso, cara. Antes eu do que você, é tudo o que posso
dizer.

Eu sorri para isso, lembrando-me de pensar o mesmo. No final


das contas, porém, ele e todos os seus irmãos estariam envolvidos em

~ 215 ~
torno de seu dedo mindinho e ela mudaria completamente tudo para
eles, até suas ideias sobre possível paternidade.

— King está chegando? — Perguntei enquanto caminhava em


direção à porta.

— Sim. Ele está acabando o dia. Conseguirá chegar antes da hora


acabar.

Kingston era um homem muito ocupado nos dias de hoje.

Mas sabia que ele talvez fosse o mais empolgado de todos eles por
ter uma sobrinha. Ficou claro que era um homem que queria filhos,
mas nunca teve a chance de tê-los ainda.

— Manda-me uma mensagem quando vocês voltarem para a casa.


Vou entrar e deixar alguma comida ou qualquer merda que parece que
devo trazer depois que um bebê nasce.

Com isso, ele se foi.

— Ele parecia verde, — Scotti declarou quando fui em direção à


cama. Ela segurou o robe que esteve vestindo e começou a cobrir-se
quando Elizabeth começou a choramingar, o seu rosto gordinho ficando
vermelho e irritado de indignação.

— Ele vai superar isso, — assegurei-lhe enquanto ela pressionava


Elizabeth ao peito.

— E eu achando que seria Nixon quem ficaria estranho com ela.

— Nós pensamos a mesma coisa sobre Ryan naquela época. Mas,


como Nixon, ele tinha um talento especial para bebês.

— Então, — disse ela enquanto a bebê começou a mamar,


olhando para mim com um sorriso cansado. — Um já veio.

— Faltam quatro, — concordei, sorrindo porque ambos viemos de


famílias de cinco filhos, e ambos concordamos que talvez fosse esse o
objetivo.

— Você tem algum trabalho a fazer nesta casa agora. Não temos
espaço para cinco.

— E uma galinha.

— E você sabe que eles vão implorar por um cachorro algum dia.

~ 216 ~
— Desde que não esteja relacionado com Coop, — concordei. —
Onde quer que esse vira-lata acabou.

— Então, seus irmãos estão fazendo apostas sobre a cor dos


olhos...

— Oh, merda, — eu disse com um sorriso.

Scotti

Seis anos

Ele não teve a condicional aos cinco, como esperávamos, por


razões que desconhecemos. Imaginei que tivesse entrado em uma
pequena quantidade de problemas em algum momento, entrou em
alguma briga, conseguiu outros dois meses colocados na sua sentença.

Mas hoje deveria ser o dia.

A única razão pela qual nós soubemos era porque quando Ryan
ligou para a prisão para depositar dinheiro de suas compras, ele foi
rejeitado.

A energia que nos rodeia era palpável. Os homens estavam


esperançosos. Eles queriam o seu irmão. Eles sentiam falta dele todos
os malditos dias em que ele se foi. Ficaram mortos de preocupação. Eles
se enfureceram e caminharam e caíram em lugares escuros, às vezes.
Como nas vésperas de feriados. Como em seu aniversário. Como cada
vez que uma carta era devolvida ao remetente.

Entendia porque eles estavam ansiosos.

Mas era por isso que o meu estômago estava em nós.

Porque eu tinha a sensação de que eles estavam muito


esperançosos, que este dia ia ser francamente doloroso para eles.

Olhei para Fee, Lea, e Dusty, vendo uma tensão semelhante em


seus olhos. As crianças, felizmente, a sua maioria não tinha consciência
disso. Tínhamos todas, em conjunto, decidido não fazer muito barulho
sobre isso para eles, não querendo deixá-los nervosos ou fazer suas
esperanças demasiado elevadas.

~ 217 ~
Becca tinha idade suficiente para se sentar e conversar sobre
isso. Na verdade, Fee e Hunter lhe contaram o que o detetive Lloyd lhes
contou, informação que ela aceitou com a sabedoria de uma criança
que cresceu em um mundo não tradicional. Izzy e Mayla não ficaram
muito atrás de Becca, mas não se lembravam tanto do tio Eli como
Becca.

Quanto ao grupo de Shane e Lea, Jason de seis anos, os gêmeos


de cinco anos, Jake e Joey, e Sam, de um ano, nunca conheceram o seu
tio. Nem o Danny de Ryan e Dusty, que acabava de completar quatro
anos, Ford, que tinha três anos, ou a recém-nascida Gia.

Meus filhos, bem, eles obviamente ainda não o conheceram. O


seu homônimo, Eli, tinha três anos. Jules, cujo nome verdadeiro era
Julia, nome do meio de Helen, tinha dois anos. Nossa mais nova, de
apenas algumas de semanas, nascida apenas dois dias depois de Gia de
Ryan e Dusty, era Natalie.

Três já foram, todas meninas.

Mark estava prestes a ter um ataque cardíaco.

Assim como todos os meus irmãos, que certamente nunca


pensariam em autorizá-las a namorar algum dia.

Eu esperava, pelo amor ao meu pobre marido, que os próximos e


últimos dois fossem meninos. Esperava isso para minhas meninas
também. Como uma menina que cresceu com os irmãos, queria isso
para elas. Admito, elas teriam Jason, Jake, Joey, Danny, e Ford para
cuidar delas. Portanto, não importa o que acontecesse, elas teriam um
pouco de proteção do mundo. O que era bom.

— Você acha que é uma má notícia não termos ouvido falar de


Charlie e Helen? — Dusty perguntou, os olhos um pouco inchados, Gia
estava sendo um pouco mais difícil do que os dois bebês anteriores, à
noite sempre com cólicas. Ela rapidamente defendeu sua insônia,
insistindo que Ryan a pegasse para que ela pudesse tentar recuperar o
atraso, mas disse que não havia jeito de ela dormir com seu bebê
chorando. Portanto, nenhum deles conseguiu dormir.

Charlie e Helen levantaram-se antes que o sol tivesse subido e


dirigiram todo o caminho até para a prisão, sem ter ideia de que horas
ele poderia ser libertado e não querendo perdê-lo.

Estávamos ao meio do dia.

Não parecia bom.

~ 218 ~
Se eles o tivessem, se ele estivesse com eles, eles teriam, pelo
menos, mandado uma mensagem de texto para que todos parassem de
se preocupar. E eu duvidava que a prisão solta alguém depois das cinco
ou seis da tarde.

— Seis anos, — disse Fee, olhando para as costas dos homens


que todas nós amamos tanto. — Tanta coisa mudou. Quero dizer, basta
olhar para isso, — ela disse, acenando com a mão para o quintal onde
as crianças estavam todas em vários níveis de jogo. — Quando ele saiu,
eram apenas as minhas meninas. Apenas as três. Agora, são treze. Não
acho que, mesmo se conseguirem trazê-lo de volta, que os vídeos que
fizemos de cada evento fará ele se sentir como se nunca tivesse sido
preso. Acho que uma parte dele sempre vai sentir como se este não
fosse seu lugar do jeito que ele costumava. Vocês conhecem Eli, — disse
ela, em seguida, me deu um olhar triste. — Acho que você realmente
não o conheceu também.

— Ele é apenas... ele tem a alma mais gentil, — Dusty insistiu. —


Sei que todos esses homens são bons e altruístas e doces. Mas Eli
sempre tinha algo um pouco mais. Ele era mais paciente, mais
introspectivo, mais... não sei... piegas sentimental?

— Pode ser piegas, certo, — Lea concordou com um sorriso. —


Mas também é verdade.

— Eu me preocupo com o que a prisão poderia ter feito para essa


parte dele, — Dusty continuou piscando duro para as lágrimas que
estavam nadando em seus olhos. — Não é nada. Apenas os hormônios,
— ela insistiu, sacudindo a cabeça.

Não era.

Todos nós sentimos isso.

Foi sempre o meu medo mais profundo. Não para mim. Eu sabia
que iria ficar bem o suficiente. Era que sempre me preocupei com o
meus irmãos. Eu me preocupava que seria difícil para Kingston,
retiraria a bondade. Eu me preocupava que roubaria o humor do Rush.
Eu me preocupava que iria transformar Nixon e Atlas, transformando-
os em criminosos realmente endurecidos.

Então, embora não conheci Eli por tempo suficiente antes de seu
encarceramento para realmente sentir como eles sentiam, eu poderia
comparar.

~ 219 ~
Vinte minutos depois o modelo SUV preto de Charlie e Helen
estacionou.

Houve uma mistura de esperança e medo na minha barriga,


fazendo com que parecesse que cai e girei, simultaneamente, enquanto
todas as mulheres pareciam avançar ao mesmo tempo com as pernas
dormentes.

Houve um longo período, em que não sabíamos nada. As janelas


estavam escuras. Nós quase não conseguimos distinguir Charlie e
Helen, e muito menos alguém, possivelmente, no banco de trás.

Mas, então, as portas da frente se abriram e vieram para fora


Charlie e Helen.

Um segundo.

Dois.

Três.

Cinco.

Ninguém estava no banco de trás.

— Oh, não, — disse Lea, soltou um silvo.

Charlie olhou para os seus filhos, o rosto vazio. Helen,


estranhamente, estava igualmente vazia. Ela não estava devastada
como nós que esperávamos se as coisas fossem de uma maneira
diferente da que todos esperávamos.

— Ele não estava lá, caralho, — Charlie sussurrou, parecendo


confuso. — Chegamos lá antes que as luzes da noite da prisão se
apagassem para o dia. Sentei bem na frente. Finalmente, fiquei
preocupado de que eles estivessem fechando, então entrei e eles
disseram que ele já tinha sido libertado, que devemos ter apenas
perdido ele.

— Nós observamos o dia todo, — disse Helen, sacudindo a


cabeça.

— Talvez ele estivesse contando com isso, — disse Ryan,


parecendo como se ele estivesse segurando isso a maior parte do tempo.
Mas isso era Ryan para você, forte, firme, calmo, capaz de se separar
das situações para que pudesse manter a cabeça limpa. — Se ele não
queria ser visto, talvez tenha raspado a cabeça. Talvez ele tenha
mudado o bastante para passar despercebido em um táxi ou ônibus.

~ 220 ~
— Aonde ele iria? — Helen perguntou. — Voltar para sua casa?

— Eu vou lá e checarei, — Shane declarou, dando uma olhada a


Lea.

Houve um zumbido alto no bolso traseiro de Charlie, fazendo


Shane congelar a meio do caminho e voltar enquanto Charlie, um
homem muito composto, se atrapalhava com seu telefone, esperança
clara em seu rosto.

— Mallick, — ele cortou ao telefone.

Nós não vimos o alívio embora.

Na verdade, foi talvez a primeira vez em seis anos que vi Charlie


Mallick entrar em modo agiota, modo criminoso. Em geral, os homens
mantinham esse lance longe das mulheres e das crianças, tanto quanto
possível. Eu tinha visto isso em Mark e Shane aqui e ali, quando
recebiam um telefonema sobre um trabalho que precisava ser tratado.
Até vi isso quando Mark voltou para casa depois de um trabalho,
queimando cuidadosamente as suas roupas, lavando todos os vestígios
de seu corpo, em seguida, limpando o banheiro.

Mas era algo bem diferente ver em Charlie, no homem que há


muito começara a ver como uma figura paterna.

Era quase chocante ver o avô doce, carinhoso e amoroso para os


meus filhos esfriar tão rápido.

— Lo? — Ele perguntou, não porque ele precisava dessa clareza


para si mesmo, não achei, mas porque ele queria que os seus filhos e as
suas esposas soubessem quem estava telefonando.

E eu, bem, tinha estado em Navesink Banco tempo suficiente


para finalmente entender a dinâmica cuidadosa do poder de todas as
associações da cidade.

Havia os The Henchmen MC, aliados, motoqueiros


contrabandistas de armas.

Havia Richard Lyon e a sua cocaína.

Uma vez houve Lex Keith e o seu inferno, e alguns distorcidos


fodidos, também conhecidos como V, ambos tratados já há muito
tempo.

Havia Breaker, o músculo contratado e Shooter, o atirador.

~ 221 ~
Havia os Grassis e suas docas.

Havia Third Street e as suas prostitutas e heroína.

Então, bem, havia Lo e Hailstorm que estavam em uma liga


própria. Eles tinham as mãos em um pouco de tudo. Mas eram esta
máquina, este item cheio de peças bem oleadas e pessoas altamente
treinadas.

Se Lo estava ligando pessoalmente, não poderia ser bom.

— O quê? Você deve estar brincando comigo, Lo.

Eu sabia a sensação que estava no meu estômago naquele


momento. Tinha vivido com ela todos os dias durante dez anos.

Medo.

— Marco? — Ele disse, mais uma vez, para os benefícios de seus


filhos.

Esse nome não significava nada para mim, e me virei, impotente,


para as mulheres ao meu lado.

Era Lea que parecia mais preocupada e Lea que falou pela
primeira vez.

— Pouco antes de Eli ir embora. E quero dizer pouco antes, —


disse ela, olhando para mim. — Houve essa merda que caiu com os
Henchmen e Lex Keith e toda essa porcaria que você deve de ter ouvido
histórias. O que talvez você pode não ter ouvido falar foi que Wolf, o
homem de Janie, protegida favorita de Lo, conseguiu se encrencar,
sendo preso por esse policial com a porra de um abuso de poder. E
Janie sentiu que algo sobre ele não estava certo. Ela estava
desesperada, então veio até Charlie para pedir-lhe ajuda para ele,
extraindo algumas informações.

Na porrada, quer dizer.

— Charlie disse que não, mas comecei a criar um escândalo sobre


o assunto e, em seguida, Eli entrou em cena e concordou em fazê-lo.
Então ele fez isso. E depois ficamos sabendo que o policial não era
realmente um policial. Sua lealdade era para a sua família. A família
Abruzzo de fora, em Long Island.

— E? — Perguntei enquanto Charlie apenas permaneceu em


silêncio, ouvindo o que quer Lo tivesse a dizer.

~ 222 ~
— E Janie foi para os Grassis uma vez que este é o território deles
e nenhuma outra gangue deveria entrar. Os Grassis pareciam cuidar
disso.

— Pelo que podemos dizer, — Charlie disse de repente, — eles


cuidaram. E Lo está apenas nos advertindo em nome da cautela. Parece
que essa merda que caiu com os Henchmen, — disse ele, e eu senti o
meu estômago virar mais, sabendo que essa merda era horrível além
das palavras, — pode estar relacionada. Ela só queria que ficássemos
atentos.

— Sim, se pudéssemos encontrar o pé no saco e avisá-lo, porra.

Isso foi Shane.

E foi uma coisa tão Shane dizer que eu me encontrei sorrindo,


apesar de uma situação tão séria.

— Nós vamos encontrá-lo, — disse Ryan, tom firme. — Shane vai


ao seu apartamento. As mulheres precisam voltar para suas casas, caso
ele apareça lá. O resto de nós vai vasculhar a cidade.

— Vou ligar para todos os camaradas locais que podem ficar de


olho, excluindo os Henchmen, uma vez que já tem o bastante de sua
própria merda para lidar, — disse Charlie, muito ainda no modo de
trabalho. — Scotti...

— Estou ligando agora, — concordei, alcançando em meu bolso


de trás para enviar um texto enorme para todos os meus irmãos para
manterem um olho atento, que era importante, que ele poderia estar em
perigo.

— Ele não pode ir longe, — Hunter argumentou. — Ele está em


liberdade condicional. Tem que ficar na cidade. E terá que entrar no
escritório de liberdade condicional entre hoje e amanhã de manhã. Ele
pode não querer ver qualquer um de nós agora, mas não é estúpido. Ele
não é um masoquista. Não quer voltar para a cadeia. Ele entrará. Mas
precisamos encontrá-lo para avisá-lo.

— Baby, — disse Mark, avançando para mim quando retirei o


celular para que a minha mão estivesse livre, a outra apoiando a parte
inferior da bebê em torno do meu peito.

— Está tudo bem, — falei, dando-lhe um sorriso encorajador. —


Vá. Você tem que ir.

~ 223 ~
— Prometo que estarei em casa na hora de dormir, não importa o
que, — disse ele, tocando o topo da cabeça de Natalie.

— Mark, demore o tempo que você...

— Vou estar em casa para ajudá-la a colocar as crianças na


cama, — ele me cortou, o tom suave e firme ao mesmo tempo. — Você
sabe que encontrar Eli é importante para mim, querida. Mas isso, —
disse ele, passando a mão no meu rosto, em seguida, sobre a cabeça de
Nat, — é tão importante. Então vou ver você em cerca de quatro horas
para ajudá-la a dar-lhes banho e colocá-las na cama. Não importa o
que. Ok?

Seis anos e ele ainda pode fazer meu coração fazer algo como
inchar, às vezes. — Ok, — concordei, inclinando-me quando ele me deu
um beijo na minha testa.

— Te amo, — disse ele, os seus olhos encontrando os meus, me


mostrando o quanto ele quis dizer isso.

— Eu também te amo. Agora vá. Você está perdendo tempo.

Ele me deu um sorriso e saiu correndo para o carro de Charlie,


todos eles se amontoando nele porque precisavam deixar os carros para
nós levarmos as crianças para casa.

— Tudo bem, — disse Helen enquanto todas nós assistimos aos


nossos homens correrem — que tal ter um almoço tardio antes de vocês
todas saírem?

E essa era Helen Mallick para você.

Talvez tenha vindo de mais de trinta anos naquela vida. Na


verdade, isso não estava mesmo certo. Sua vida inteira, infância
incluída, estava cheia de situações de stress e criminais. Mas ela havia
passado o seu casamento precoce à espera de um homem que poderia
voltar para casa ensanguentado e machucado ou não, enquanto ela
tinha que mantê-los juntos pelos cinco filhos jovens. Então, nesta
situação, ela estava tão calma como sempre enquanto sorria para os
seus netos e começava a arrebanhá-los para dentro de casa.

Ela os deixaria ajudar também.

Ela era esse tipo de avó.

~ 224 ~
Ela não se preocupava com todos os balcões, pisos e paredes
ficando cobertos de comida. Ela não se importava em ter que esfregar as
crianças depois.

Ela só queria que eles ajudassem, consequências que se lixem.

Era quase hora do jantar quando finalmente chegamos a casa.


Levei Elizabeth e Jules para o quarto com uma enorme pilha de
brinquedos, em seguida, coloquei Natalie em seu berço.

Foi a primeira vez durante todo o dia que consegui sair e respirar
por um momento. Então foi o que fiz. Saí e alimentei Nugget e seu
companheiro de galinheiro, Chicka. Chequei meu telefone, mas não
tinha nada de Mark ou dos meus irmãos.

Era quase oito, quase hora de dormir, fazendo-me pensar que ele
quebraria a sua promessa, quando vi as luzes de sua caminhonete
estacionando na garagem, seguida pelo golpe de sua porta, e então os
passos no caminho.

— Hey, — eu disse em um suspiro grato quando ele entrou. —


Está tudo bem?

— Tudo está bem, — disse ele, a voz calma. — Cadê as meninas?

— Natalie está dormindo, mas ela vai querer o seio daqui a meia
hora. Elizabeth e Jules estão brincando com blocos. Eu só... precisava
respirar.

Ele assentiu com a cabeça.

— Elas estão quietas. Vamos deixá-las por um minuto, — disse


ele, apontando para o sofá.

Fui com ele, sentando-me, o meu corpo um pouco tenso enquanto


ele parecia relaxar de alguma forma. O seu braço deslizou em torno de
meus ombros ao mesmo tempo em que me inclinei um pouco para o
lado para olhar para ele.

— Vocês encontraram Eli?

Foi então que aconteceu.

Seus olhos claros começaram a dançar.

Um sorriso ridículo começou a surgir em seus lábios.

— Sim.

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Era como se uma pedra fosse tirada dos meus ombros. Não
importava de repente que ele estivesse talvez quebrado de anos no
sistema, que ele estivesse ativamente tentando se distanciar de nós, a
sua família.

Ele estava fora.

Ele estava bem.

Eles sabiam onde ele estava.

O resto, eu tinha certeza, iria se encaixar no lugar.

— E? — indaguei, impaciente, enquanto ele continuava sorrindo


para mim.

— Baby, você não vai acreditar nesta merda...

Fim!!!

~ 226 ~

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