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ISSN: 1984-6444 | http://dx.doi.org/10.

5902/1984644438111

Panorama do processo de avaliação na Educação de


Jovens e Adultos em Vila Velha, Espírito Santo
Panorama of the evaluation process in Youth and Adult Education in Vila
Velha, Espírito Santo

Antonio Carlos dos Santos Cruz


Pesquisador de Avaliação na Educação de Jovens e Adultos na Universidad Autónoma de Asunción
(UAA), Asunción, Paraguai
antoniocscruz@gmail.com .- http://orcid.org/0000-0002-2810-5483
Recebido em 11 de maio de 2019
Aprovado em 30 de setembro de 2019
Publicado em 20 de novembro de 2019

RESUMO
A partir do cenário da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, decidiu-se realizar
uma investigação do sistema avaliativo na EJA, considerando a cidade de Vila
Velha, no Espírito Santo, buscando-se detectar a adequação do procedimento
avaliativo na perspectiva de professores e estudantes. Tomou-se como objetivo
geral, portanto, estabelecer um panorama de como estudantes e professores das
escolas investigadas compreendem a avaliação, se entendem que os métodos são
satisfatórios e adequados para a construção de uma formação plena e crítica.
Metodologicamente, a pesquisa teve caráter misto, ou seja, em parte abordou o
tema de forma qualitativa e bibliográfica, e, em parte, ofereceu análise quantitativa,
descritiva e interpretativa. Empreendeu-se a pesquisa através de questionários, bem
como realização de entrevistas, com amostra de 200 estudantes e 50 docentes.
Constatou-se que embora os educadores tenham claras concepções em torno das
especificidades de trabalho com a EJA, dificuldades e de todo o ambiente dos
alunos, no que toca ao processo avaliativo, continuam mantendo a distribuição de
60% dos pontos por meio de prova escrita. Além disso, 60% dos estudantes pensam
com certa frequência em desistir dos estudos por medo das notas e provas, apesar
de considerarem que o sistema avaliativo é justo. Concluiu-se que há uma
necessidade, para o desenvolvimento da EJA, de se abandonar a metodologia
avaliativa quantitativa, partindo-se para um novo modelo, que envolva efetivamente
o aluno, fomentando a avaliação mediadora do ensino-aprendizagem, como
diagnóstico do que deve ser melhorado por todos os envolvidos no processo
educativo.
Palavras-chave: Ensino-Aprendizagem; Procedimentos Avaliativos; Educação
Mediadora.

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ABSTRACT
Based on the scenario of Youth and Adult Education in Brazil, it was decided to
investigate it, considering the city of Vila Velha, in Espírito Santo, seeking to detect
the appropriateness of the evaluation from the perspective of students and teachers.
The general objective was to establish an overview of the students and the teachers,
about how they comprise the evaluation, if it is appropriate for a critical formation of
students. Methodologically, this paper had mixed characteristics; that is, we
approached the subject in a qualitative and bibliographical way, and, in part, offered
the quantitative, descriptive and interpretative analysis. The investigation was
conducted through questionnaires, as well as interviews, with a sample of 200
students and 50 teachers. It was found that, although educators understand well the
specificities of working with Youth and Adult Education, the difficulties and the
environment of the students, they continue to distribute 60% of the points by means
of proof writing. In addition, 60% of students often think about dropping out of school
for fear of grades and tests, even though they believe the system is fair. It was
concluded that there is an important task for the development of Youth and Adult
Education, to abandon a quantitative methodology, starting with a new model, which
involves the students, promoting a mediating evaluation of teaching-learning, such as
a diagnosis of which must be improved by all those involved in the educational
process.
Keywords: Teaching-Learning; Evaluation Procedures; Moderator Education.

Introdução

Diferentes tipos de necessidades impulsionam o ingresso na Educação de


Jovens e Adultos – EJA – e esse fato tem relação com o quotidiano, com motivações
diversificadas, com ânsia por assimilação do código de linguagem, com
sobrevivência e estabelecimento no mercado de trabalho, com acessibilidade social,
com contextos culturais, dentre tantos outros fatores. No decorrer da História do
Brasil, o público da EJA tem sido o mesmo, como apontou Arroyo (2005). São
pessoas de classes sociais mais baixas, de periferias, negros, sempre os excluídos
e os mais vulneráveis na sociedade urbana ou campesina. Em suma, são os
oprimidos.
Freire (2008), ao olhar para esses sujeitos, descreve-os não apenas como
seres históricos, mas como seres culturais, sociais, reflexivos e críticos, dotados de
potencial e conhecimentos, pois já trazem consigo uma bagagem de vida capaz de

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desenvolver não apenas atividades impostas, mas a si mesmos, haja vista serem
dotados de consciência, capazes de tomar suas próprias decisões, e que intervêm,
pensam, que se refazem e (re)constroem tornando-se seres éticos.
Nesse contexto, o significado da avaliação dos estudantes deveria deixar de
ser um reduzido instrumento de verificação do rendimento para se tornar um dos
principais elementos que norteiam o processo de ensino-aprendizagem. Como
apontou Luckesi (1995), o recurso avaliativo precisa incidir sobre os aspectos
globais da educação, tanto mensurando o desenvolvimento e aprendizado do aluno,
quanto a eficácia do trabalho docente, sua metodologia e estratégias pedagógicas, o
que gera uma nova percepção de que o aluno não é mais o único a ser avaliado.
O passo inicial em prol de uma compreensão mais coesa da avaliação escolar
é a busca por teorias mais amplas, que procurem explicar as relações entre
indivíduos, educação e sociedade. Como afirma Soares (1991, p. 67), “é nessa
direção que se situam críticas denunciando a função de controle social que a
avaliação educacional exerce, reforçando e justificando a seleção e discriminação
sociais inerentes à sociedade capitalista”. Reconhecer isso significa reconhecer que
a avaliação é um objeto social e que todo o seu processo está, portanto, socialmente
determinado. O reconhecimento da determinação social da avaliação é, pois, o
primeiro passo em direção à construção de uma nova lógica da avaliação, e abre
outras alternativas para a produção do conhecimento nessa área, o que justifica o
presente trabalho social e academicamente.
Foi a partir desse cenário inicial que se decidiu realizar uma investigação mais
ampla do sistema avaliativo na EJA, considerando a cidade de Vila Velha, no
Espírito Santo, fundamentando a pesquisa em uma pergunta norteadora: Os
procedimentos avaliativos utilizados na EJA em Vila Velha são satisfatórios e
adequados para a construção de uma formação plena de seus estudantes?
Ao todo, 21 escolas do município oferecem EJA, das 18:20 às 22 horas,
funcionando com turmas divididas por faixa etária, em salas com capacidade de
atendimento de 35 a 40 alunos. Com relação ao currículo escolar, as instituições se
organizam seguindo o padrão estipulado pela Secretaria Municipal de Educação. Os
professores se reúnem e planejam suas aulas, sem seguir uma tendência

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específica. Tais planejamentos ocorrem duas vezes por semana e têm duração de
50 minutos. Nesse período, os alunos ficam sozinhos em sala, concluindo alguma
atividade. Não há participação de pais ou alunos na seleção e desenvolvimento do
currículo.
Para que fosse possível delimitar melhor o estudo, optou-se por direcionar a
pesquisa para a Região V do município de Vila Velha, abarcando as seguintes
escolas: Umef Alger Ribeiro, Cidade da Barra; Umef Governador Christiano Dias
Lopes, São Conrado; Umef Aylton de Almeida, Terra Vermelha; Umef Professor
Darcy Ribeiro, Morada da Barra, e Umef Professor Paulo Cesar Vinha, Terra
Vermelha. Participaram da investigação 200 alunos e 50 professores.
Metodologicamente, esta pesquisa tem caráter misto, ou seja, em parte aborda
o tema de forma qualitativa, e, em contrapartida, também oferece análise
quantitativa, descritiva e interpretativa. Assim, optou-se, em primeiro momento, por
uma investigação bibliográfica, empreendida através da análise de livros, revistas,
publicações diversas, bem como demais meios de informações que dizem respeito à
avaliação educacional e à EJA. Posteriormente, empreendeu-se uma pesquisa de
campo, através de questionários direcionados a professores e alunos, bem como
realização de entrevistas.
Procurou-se analisar tanto as práticas pedagógicas, quanto o processo de
avaliação no escopo da EJA. Entretanto, como a pesquisa se desenvolveu no
âmbito do doutoramento, entende-se necessário, para o presente artigo, uma maior
delimitação, e, dessa forma, tomou-se como objetivo geral, neste trabalho,
estabelecer um panorama de como estudantes e professores das escolas
investigadas compreendem a avaliação, se entendem que os métodos são
satisfatórios e adequados para a construção de uma formação plena e crítica.
Perpassaram-se os seguintes objetivos específicos: i. Discorrer sobre o ensino-
aprendizagem na EJA; ii. Abordar a teoria em torno do processo avaliativo; iii.
Apresentar dados e informações colhidas na Região V do município de Vila Velha
em torno, especificamente, dos procedimentos avaliativos nas escolas, entrelaçando
as percepções de estudantes e professores com o que os estudiosos afirmam sobre
o tema. Este artigo está disposto na ordem dos objetivos específicos, para, nas

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considerações finais, retomar o objetivo geral proposto.


Resta, finalmente, acrescentar, que não se pretende esgotar tão amplo
assunto, uma vez que o escopo de análise é restrito se for pensada a extensão
territorial do Brasil, e, inclusive, se comparado também com a tese doutoral que deu
origem a este artigo. Não se viu possibilidade de apresentar todo o conteúdo das
respostas extraídas durante a investigação, mas foram selecionadas as questões
mais relevantes para a apresentação de um texto capaz de aportar novos
questionamentos. Portanto, o que se espera, essencialmente, é contribuir para o
melhor entendimento e desenvolvimento da EJA.

Ensino-aprendizagem na EJA

Todo processo educacional deverá ter como base a didática, compreendendo


que as teorias educacionais são elaboradas com vistas a explicar, de forma
sistemática, determinados fenômenos, exigindo-se o discernimento na sua
aplicação, para que se estabeleçam parâmetros entre o real e o ideal, entre a teoria
e a prática. Além disto, deve-se empreender, na EJA, uma análise criteriosa, com
criticidade, da práxis pedagógica, haja vista que ação e reflexão compõem um todo
inseparável, já que a secção entre a teoria e a prática, entre o que fazer e o como
fazer conduz a distorções complexas na educação, o que envolve um preparo do
professor, e seu aperfeiçoamento, visando ao ensino como uma prática social. Ou
seja, é preciso considerar a importância dos elementos socioculturais na constituição
das características da idade adulta.
Paulo Freire se dedicou fortemente à luta contra o analfabetismo, priorizando o
conhecimento global, por meio de projetos sociais, abarcando também a formação
dos profissionais, a necessidade de infraestrutura, a permanência dos estudantes
nas escolas, alterando significativamente o cenário educacional do país, e, por outro
lado, tornando-se uma referência internacional nos estudos sobre a educação
(ARANHA, 1996). Num cenário de massificação, de exclusão, de desarticulação da
escola com a sociedade, Freire presta uma efetiva contribuição para a formação de
uma sociedade democrática ao construir um projeto educacional radicalmente

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democrático e libertador.
Pese ao direito constitucional de acesso à educação enquanto direito universal
à aprendizagem e ampliação de conhecimentos e saberes, encontra-se, agora, a
percepção da EJA no escopo da educação pública gratuita não apenas como uma
imposição em torno da escolarização, mas da própria formação do sujeito. A
mediação pedagógica não dever ter como pressuposto os moldes utilitaristas,
imediatistas, mas é preciso entender que a busca do conhecimento deve partir de
um processo de aprendizagem, ou seja, dos princípios reais de vida do aluno
(LAFFIN, 2011).
As experiências e circunstâncias culturais, históricas e sociais contribuem para
promover constantemente situações de aprendizagem e do desenvolvimento
psicológico. É fundamental perceber quem é esse sujeito com o qual se lida, para
que os conteúdos a serem trabalhados façam sentido, tenham significados, sejam
elementos concretos na sua formação, instrumentalizando-o para uma intervenção
significativa na sua realidade. Entende-se, assim, que é através da história de vida
que se pode analisar o processo de escolarização dos alunos da EJA. Por meio do
contexto social, das experiências de vidas desses sujeitos, tanto professores, quanto
educandos traçam objetivos para que esse processo de aprendizagem seja
construído. Nesse sentido, Piconez (2002) pontua que:
Importa trazer para a sala de aula as vivencias do aluno, colhidas em seu
meio ambiente e que estão relacionadas com os conteúdos escolares.
Poder-se-ia, dessa forma, enriquecer os meios didáticos usualmente
empregados, além de atingir a tão almejada valorização e priorização do
aluno. Isso tem mostrado que a qualidade de ensino pode trazer no seu
bojo a melhoria da auto-estima do aluno, que é mais uma condição para sua
efetiva autonomia no processo de aprendizagem. (PICONEZ, 2002, p. 50)

Nos dizeres de Paulo Freire (2008), a educação deve ser permeada pela
contextualização do mundo. Deve-se ensinar a partir da vivência e da realidade do
aluno, em sua diversidade. Observa-se que a metodologia de ensino desenvolvida
pelo educador foi inovadora, na medida em que ensinava através da palavra
mediatizada pelo mundo. Nessa perspectiva, Laffin (2011) declara que somente por
meio da mediação do professor haverá possibilidades de aprimorar os
conhecimentos ditos do mundo letrado, entendendo que essa mediação não permite

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o imediatismo e o utilitarismo, como já foi apontado. Segundo afirmou Paulo Freire


(2008), o processo de aprendizagem:

[...] não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem


escrita, mas que se antecipa ou se alonga na inteligência do mundo. A
leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura
desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele (FREIRE,
2008, p.11).

Vygotsky (2008, p. 103) afirma que “o aprendizado é um aspecto necessário e


universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente
organizadas e especificamente humanas”. Ademais, “o sujeito não é um sujeito
apenas passivo, mas um sujeito que está sempre num constante processo de
interação, sendo dessa forma um indivíduo ativo” (VYGOTSKY, 2008, p. 26), que,
por meio da sua interação, está construindo conhecimentos com outros do seu meio,
através de suas constantes relações interpessoais.
Nesse sentido, Vieira Pinto (1989, p. 113) sustenta que, “o educador ingênuo
não reconhece no aluno sua qualidade de sujeito e por isso julga ser o único sujeito
do ato pedagógico. Com isso, corrompe e deixa incompreendido tudo o que é essen-
cial a este ato: o encontro de consciências”. Por outro lado, quando o educador se
torna mediador, “o aluno será levado a refletir sobre sua situação, suas condições de
vida e sua inserção nesta realidade, para a partir daí conseguir conscientizar-se do
que acontece no seu mundo e mudar o que lhe for possível” (VIEIRA PINTO, 1989,
p. 37). O professor precisa identificar essas experiências de vida, a capacidade de
fala de seus alunos, a capacidade que cada um revela ao discorrer sobre suas
vivências, e incorporar a realidade vivida no ensino de línguas, de Matemática, de
História, de Geografia e de Ciências Físicas, possibilitando ao aluno progredir no
conhecimento, a partir do reconhecimento de sua própria realidade, não através de
um currículo fechado, conteudista, tradicional, formal, construído de regras sobre
regras, no qual o educador é o dono da verdade e do saber.
Ao mencionar tais conteúdos e práticas pedagógicas é imprescindível que os
docentes verifiquem o conhecimento prévio de seus alunos a respeito do que se
pretende estudar, porque esses conhecimentos serão utilizados na realização das
novas aprendizagens. O sucesso da aprendizagem encontra-se intimamente

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relacionado às ligações que os educandos conseguem realizar entre seus


conhecimentos prévios da temática proposta e os novos saberes que o professor
está apresentando. Piconez (2002) afirma a importância de:

[...] que se conheça esse aluno adulto, sua história de vida, suas
experiências e necessidades, seus processos operatórios de aprendizagem;
que se considere toda e qualquer bagagem anterior à escola – seus
conhecimentos prévios adquiridos em sua cultura de origem, valores,
crenças, em seu ambiente de trabalho etc.; que se considere que sua
capacidade de aprendizagem é potencialmente capaz de apropriação dos
conteúdos científicos e formais; que se tenha como resultado a ampliação
das capacidade de estabelecer relações entre sua bagagem e o
conhecimento novo, com significado, e que respeite o direito que ele tem de
utilizar tanto o conhecimento novo como o anterior, na lida de seu cotidiano
(PICONEZ, 2002, p. 98).

Quando há essa troca de mediações com outros indivíduos e com o meio no


qual está inserido, passa-se a desenvolver funções sociais, que no decorrer do
processo de aprendizagem vão sendo internalizadas, canalizadas, possibilitando a
construção de novos saberes, a partir dos quais se desenvolverá nesse sujeito uma
personalidade interativa, sociocultural e consciente. O professor, mediante uma
reflexão da teoria/prática no cotidiano escolar, deve reconhecer que ele não é o
controlador da aprendizagem dos alunos, mas um facilitador do ensino através da
mediação, inclusive com relação às dificuldades das tarefas e à familiaridade do
aluno com o ensino, criando condições para o sucesso da aprendizagem e a
progressão das atividades.
Entende-se que a aprendizagem acontece a todo o momento. Todo esse
processo é mais profundo na EJA, especialmente porque se trata de pessoas que
recorrem à educação devido a necessidades particulares de suas vidas, e não como
acontece regularmente, quando a inserção nas escolas segue um ritmo de
obrigatoriedade legal. Os estudantes da EJA, na maioria das vezes, persistem a
partir do seu próprio interesse na aprendizagem, ou almejando suprir suas
necessidades e conflitos. Isso deve ser levado em consideração e precisa ser mais
explorado tanto academicamente, quanto nas escolas.

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Procedimento Avaliativo

Hoffmann (1998, p. 17) afirma que “a avaliação é essencial à educação.


Inerente e indissociável enquanto concebida como problematização,
questionamento, reflexão sobre a ação”. Toda a gama de comportamentos que
compõem a rotina escolar concorre para educar, formam o caráter, desenvolvem
conceitos éticos e políticos, desde a simples composição do horário até a recepção
da merenda, passando pela realização de festas, promoções cívicas e orientações
de especialistas. Ainda assim, Luckesi (2002) aponta que:

A característica que de imediato se evidencia na nossa prática educativa é


de que a avaliação da aprendizagem ganhou um espaço tão amplo nos
processos de ensino que nossa prática educativa escolar passou a ser
direcionada por uma pedagogia do exame (LUCKESI, 2002, p. 17).

A escolha do sistema do registro depende da orientação da escola. É possível


conjugar dois sistemas, primeiro atribuindo notas e depois localizando-as na escala
de conceitos. Luckesi (2002) prossegue, afirmando:

A avaliação pode ser caracterizada como uma forma de ajuizamento da


qualidade do objeto avaliado, fator que implica uma tomada de posição a
respeito do mesmo, para aceitá-lo ou para transformá-lo. A definição mais
comum adequada, encontrada nos manuais, estipula que a avaliação é um
julgamento de valor sobre manifestações relevantes da realidade, tendo em
vista uma tomada de decisão (LUCKESI, 2002, p. 33).

Saul (2000) afirma que na década de 70, o foco principal da avaliação da


aprendizagem era o objeto. Sob esse prisma foram desenvolvidos diversos sistemas
de controle, dentre os quais é possível citar o controle do currículo e do
planejamento, que objetivavam especialmente a manipulação de dados. O autor
destaca, ademais, que a invasão destas ideias no pensamento educacional
brasileiro reporta-se à concepção behaviorista americana, que subordinava a
avaliação a uma série de quesitos comportamentais desdobrados em tecnologias
diversas, dentre as quais a instrução programada e a prova objetiva. Por sua parte,
como declara Luckesi (2002):
A nota e o conceito têm legitimidade quando a maioria ou todos os alunos
experimentam a satisfação do êxito e a alegria do bom aproveitamento,
condição para que fortaleçam o gosto pelo estudo. As notas devem ser
comunicadas aos alunos de forma que as recebam como diagnóstico do
seu progresso escolar (LUCKESI, 2002, p. 96).

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A dinâmica do ato de verificar encerra-se com a obtenção do dado ou


informação que se busca. Assim, tanto as notas como os conceitos têm caráter
relativo, podendo não corresponder ao nível real de aproveitamento escolar. Se o
trabalho docente é conduzido criteriosamente, com a articulação de objetivos,
conteúdos, métodos, voltados às condições de aprendizagem dos alunos, o uso de
notas ou conceitos pode se tornar irrelevante, posto que se alcança uma estreita
relação entre o que se aprende na teoria, com o que se vive, com a prática
(LUCKESI, 2002). É indispensável entender a relação entre teoria e prática como
processo através do qual se constrói o conhecimento. O conhecimento não se dá à
margem da prática social dos homens. A prática é o ponto de partida e de chegada
no processo de avaliação, e os trabalhos teóricos devem ser construções que deem
conta de compreender e explicar a avaliação escolar e que, ao mesmo tempo,
possibilitem sua transformação.
No entanto, a elaboração de uma teoria de avaliação ainda está em seus
primeiros passos. No momento, visando a contribuir para a construção dessa nova
avaliação pode-se apontar algumas alternativas. Nesse contexto:

A primeira delas é considerar que a avaliação é uma atividade social e não


meramente uma atividade técnico-instrumental, como propõe a pedagogia
tecnicista. Essa pedagogia, seguindo o modelo da ciência positivista,
preocupa-se com os produtos da aprendizagem, restringindo seu
conhecimento ao estudo dos comportamentos que podem ser observados e
manipulados (HOFFMANN, 1993, p. 23).

A avaliação deve servir como diagnóstico também do trabalho do professor,


com vistas a avaliar seus aspectos didático-pedagógicos. Seguindo-se a ideia de
Diaz Barriga (1992), não se pode reduzir êxitos e fracassos dos estudantes a
problemas de aptidão. É necessário reconhecer as determinações sociais que
afetam a avaliação. Cabe perguntar: qual o papel da avaliação na sociedade atual?
Todas as evidências levam a reconhecer que as avaliações realizadas (exames)
cumprem o papel de controle social, não podendo ser analisadas unicamente como
uma proposta técnica. Entretanto, para a proposta neoliberal, o lugar social do
indivíduo é justificado por suas aptidões naturais e por seu esforço (mérito). Como
afirma Diaz Barriga (1992)

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Na sociedade capitalista, a prática da avaliação fomenta o individualista e a


competição como condição básica para triunfar na escola e na sociedade.
Contribui, dessa forma, para que o estudante perca a consciência de si
mesmo, de sua própria situação, dado que o importante é se sobressair, é
alcançar a nota maior. Nessa visão, o estudante dificilmente reflete sobre o
seu processo de aprendizagem, sobre o “para que aprendeu” e “como o
conseguiu”, criando um falso mito sobre a sua aprendizagem (DIAZ
BARRIGA, 1992, p. 98).

Há que se mencionar, ademais, uma outra lógica, vinculada ao questionamento


do processo avaliativo, reduzido à quantificação, ou, mais especificamente, à prova,
que faz o professor perder de vista tanto a totalidade do processo de avaliação como
do processo de aprendizagem. Neste sentido, Andrade (1999) ressalta que:

Equanto a avaliação escolar funcionar a partir da ótica da resposta certa,


cobrando dos alunos a simples reprodução da resposta que o professor
definiu como correta, não estaremos formando pessoas autônomas,
reflexivas, questionadoras, responsáveis pela transformação social
(ANDRADE, 1999, p. 32)

O que se objetiva é o momento de atribuir uma expressão aos alunos,


principalmente os educandos jovens e adultos, de acordo com a quantidade de
perguntas respondidas corretamente. Para superar essa prática avaliativa objetivista
começa-se indagando por uma nova concepção de ensino e de aprendizagem. Na
nova perspectiva pedagógica, o ensino não mais é concebido como transmissão e
apreensão de conhecimentos, nem como uma programação de estímulos capazes
de produzir determinados resultados, mas como uma maneira de orientar os
estudantes para a obtenção do conhecimento em suas fontes disponíveis, de uma
forma crítica e criativa, levando-os, assim, a se tornarem aptos para a expansão
desse conhecimento.
Segundo Pernalete (1977, p. 28), “tudo deve ser avaliado. Deve-se considerar
tanto o resultado final como o processo. Assim sendo, deve-se avaliar
cuidadosamente as atitudes, os valores, as capacidades e não mais se restringir ao
desempenho cognitivo do estudante”. Avalia-se para compreender e explicar o
processo de aprendizagem, para entender por que esse processo se deu de
determinada maneira, para identificar seus problemas e avanços e encontrar
caminhos para superá-los. Dessa forma, a avaliação subsidia a construção do
processo de ensino porque fundamenta novas decisões. A avaliação não se limita a

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classificar o estudante, a aprová-lo ou reprová-lo. Resgata-se a função da avaliação


como parte integrante do processo de aprendizagem, em contraposição à sua
função classificatória.
É importante assinalar que a assunção de uma nova concepção de avaliação
implica a ressignificação de todos os elementos constitutivos do processo de ensino-
aprendizagem. Isso porque a avaliação escolar é o conjunto de ações dirigidas a
coletar uma série de informações sobre o processo de aprendizagem do estudante,
identificando avanços e dificuldades, para emitir um juízo de valor, em função de
alguns critérios prévios, e tomar decisões. Concebida dessa forma, a avaliação
escolar busca proporcionar informações a respeito do processo de ensino-
aprendizagem, e não somente o produto da aprendizagem, não apenas o
desempenho cognitivo, e não exclusivamente o estudante. A mudança da
perspectiva possibilita emitir um juízo de valor (não-quantitativo), considerando tanto
as circunstâncias do objeto avaliado, como os critérios estabelecidos previamente. É
nesse sentido que Hoffmann (1993) declara que:

A avaliação deve, pois, substituir a função classificatória da aprendizagem


do aluno pela função formativa, uma vez que seu objetivo principal é
promover o processo de ensino-aprendizagem. Tal processo deve ser
assumido conjuntamente pelo professor e pelos estudantes. Desse modo,
os resultados não pertencem ao professor, mas devem ser compartilhados
com os estudantes. Além disso, a avaliação não deve ocorrer ao lado do
processo de aprendizagem, mas penetrar no processo, fazendo parte dele
(HOFFMANN, 1993, p. 89)

Diante desses pressupostos apresentados, percebe-se uma concepção de


avaliação voltada para o levantamento das dificuldades dos alunos com vistas à
correção de rumos e à reformulação de procedimentos didático-pedagógicos, bem
como de objetivos e metas. O que se aproxima do pensamento de Romão (1998):
A avaliação é vista como um processo contínuo e paralelo ao processo de
ensino-aprendizagem. Por isso, ela é permanente, permitindo-se a
periodicidade apenas no registro das dificuldades e avanços do educando
relativamente às suas próprias situações pregressas (ROMÃO, 1998, p. 62)

Portanto, por um lado, a avaliação deve oferecer ao docente as bases para as


decisões iniciais, em seu caráter de diagnóstico, já que possibilita uma descrição,
uma interpretação e uma explicação da situação concreta sobre a qual se vai operar.
Por outro, ao longo do processo, deve atuar como permanente retroalimentadora,

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permitindo identificar o desenvolvimento da proposta, novas necessidades e seu


redimensionamento. Além disso, os estudantes devem participar dessas discussões,
pois não se trata mais de avaliar, exclusivamente, a aprendizagem deles, mas todo o
processo de ensino. Nesse sentido, para os estudantes, a avaliação perde seu
caráter de vigilância crítica, exercida por todos os atores sociais envolvidos no
processo de ensino-aprendizagem. A avaliação, em suma, deve estar presente em
todas as etapas do processo de ensino-aprendizagem.

Resultados colhidos na Região V de Vila Velha

A Pesquisa foi desenvolvida através de questionários formais estruturados com


perguntas objetivas e entrevistas. Os dados foram coletados e, posteriormente, foi
executada a análise para a efetiva elaboração do resultado percentual. Reitera-se
que participaram da investigação 200 alunos e 50 professores que atuam nas
escolas da Região V de Vila Velha.
Constatou-se que dos 200 alunos da amostra, 40% têm idades compreendidas
entre os 21 e 26 anos, 20% entre os 27 e 32 anos, 20% entre os 41 e 46 anos, 10%
acima dos 47 anos e 10% com menos de 20 anos de idade, sendo que 60% são do
gênero feminino.
É importante observar que apenas 40% declararam que sentem liberdade para
recorrer ao professor quando encontram alguma dificuldade com a disciplina
estudada. Ainda assim, 70% afirmaram que os professores utilizam diferentes
estratégias para auxiliar alunos com dificuldades, e na maioria das aulas
demonstram domínio do que ensinam.
No que tange ao sistema avaliativo, propriamente dito, foco do presente artigo,
é relevante pensar que 30% dos alunos pensam em desistir do curso, devido à
pouca disponibilidade para estudar para as provas, e outros 30% pensam em
desistir por terem medo de não conseguirem nota suficiente para aprovação,
restando 40% que não encontram nenhum problema no método avaliativo utilizado.
Ou seja, 60% dos estudantes pensam constantemente em desistir, porque podem
não conseguir alcançar a nota necessária para avançar nos estudos, seja nas

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provas, seja na avaliação de um modo geral.


Nesse contexto, como os próprios alunos declararam, 60% da avaliação
acontece por meio de prova escrita, 30% através de trabalhos em grupo e 10% em
trabalhos individuais. Por outro lado, há que se considerar que 40% dos estudantes
afirmaram não realizar as atividades avaliativas propostas pelos professores em sala
de aula, ao passo que outros 40% declararam realizá-las em quase todas as aulas,
e 20%, em algumas aulas. Não houve nenhum educando que tenha apontado
realizar integralmente as atividades avaliativas. Ainda assim, 80% consideraram que
a avaliação feita pelo professor é justa.
Nesse sentido, segundo afirmou Laffin (2011), refletir sobre a avaliação e o
processo de escolarização dos alunos da EJA, faz voltar à história de vida desses
sujeitos, rever o que foi desenvolvido por eles ao longo de suas trajetórias e
perceber a exclusão a que esses sujeitos foram submetidos. São pessoas que
fazem parte da sociedade, que estão inseridas no mercado de trabalho, e que agora
querem retornar aos estudos alguma melhora em suas vidas. Trata-se de sujeitos de
contextos urbanos e rurais, dotados de direitos. Hoffman (2000) acrescenta que:

A ação avaliativa deve partir do fazer do aluno, essa ação intenciona


principalmente, a compreensão dos fenômenos e dos objetos. Cabe
observar se o professor está atento a provocação necessária ao processo
de compreender. Mais especificamente, uma ação avaliativa mediadora
envolveria um complexo de processos educativos (que se desenvolveriam a
partir da análise das hipóteses formuladas pelo educando, de suas ações e
manifestações) visando essencialmente o entendimento. Tais processos
mediadores objetivariam encorajar e orientar os alunos à produção de um
saber qualitativamente superior, pelo aprofundamento às questões
propostas pela oportunidade de novas vivências, leituras ou quaisquer
procedimentos enriquecedores ao tema em estudo (HOFFMANN, 2000, p.
72)

É relevante pensar, especialmente a partir das considerações de Hoffman


(2000), que os estudantes das escolas analisadas não participam ativamente de
hipóteses formuladas em torno de seu processo avaliativo. Os dados recolhidos
demonstraram que falta encorajamento, e, sobretudo, que essa falta de
encorajamento se relaciona estreitamente com o receio de que os estudantes
possuem de não alcançar nota suficiente. Encontram na escola uma oportunidade
de avanço, mas, por outro lado, não se entendem como participantes ativos de sua

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evolução educacional, senão como sujeitos submetidos a um sistema que lhes


imputa uma nota, provocando insegurança e, ademais, subjugando todo o processo
de aprendizagem ao alcance de notas. A aprendizagem assume o segundo plano,
sendo que no primeiro, está a nota de aprovação. Mesmo que não atuem ou
questionem as notas e o processo avaliativo em si mesmo, consideram-no justo.
Aceitam o funcionamento do sistema avaliativo que provoca ansiedade e tensão
constante.
Além disso, o fato de 40% dos alunos tenha declarado que não realiza as
atividades propostas pelos professores, pode indicar que existe uma falha no
sistema avaliativo, ou que os estudantes não têm consciência plena do que o
processo avaliativo representa diariamente no contexto da EJA. E, ainda, esse
percentual também pode apontar para um problema no próprio sistema avaliativo e
para a didática e metodologia utilizada pelos professores no percurso.
Com relação aos professores, detectou-se que 70% possuem Graduação, 30%
possuem Pós-Graduação lato sensu, sendo que 50% atuam na EJA há mais de 5
anos, e 90% se declararam muito satisfeitos com o magistério na EJA, utilizando
como principal metodologia de ensino as aulas expositivas.
Dos 50 professores participantes da investigação, 70% concordam com o
modelo de avaliação na EJA implementado nas escolas públicas de Vila Velha, e,
por muito incrível que possa parecer, os outros 30% afirmaram não conhecer a
proposta avaliativa da EJA no município. Além disso, 60% dos professores
apontaram que avaliam principalmente por meio de provas escritas, 30% através
dos trabalhos em equipe e 10% distribuem notas nos trabalhos individuais, o que
coincidiu perfeitamente com as respostas aportadas pelos estudantes. Ou seja, 70%
dos professores concordam que a maior parte da avaliação deve ser feita por meio
de prova escrita.
No contexto da EJA é interessante observar que 40% dos professores
declararam nunca discutir as avaliações em sala de aula junto aos alunos, ao passo
que outros 40% afirmaram discutir o tema na maioria das aulas, 20% em algumas
aulas, e nenhum professor disse que levanta a discussão em todas as suas aulas.
Esse dado é relevante se for considerado que 80% dos professores afirmaram que

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os estudantes realizam as atividades avaliativas propostas na maioria das aulas, e


20% em todas as aulas. Dois pontos precisam ser repensados nessa perspectiva:
Primeiro, que 80% dos professores propõem atividades avaliativas na maioria das
aulas, mas apenas 40% tendem a discutir o procedimento avaliativo; e, ademais,
20% propõem atividades avaliativas em todas as aulas e nenhum declarou discutir
as avaliações em todas as aulas. Segundo, os professores afirmaram que os alunos
realizam as atividades avaliativas com uma grande frequência em sala de aula,
enquanto 40% dos estudantes afirmaram que não realizam as atividades, como já foi
apontado, o que denota incoerência nas respostas de professores e alunos, que, por
sua vez, pode significar que os alunos não fazem realmente as atividades, ou, em
contrapartida, que não têm conhecimento de que se trata de atividade avaliativa. O
fato de que a maioria dos professores não discute com os estudantes o processo
avaliativo denota a ausência da avaliação mediadora abordada por Hoffmann
(2000), excluindo-se dos alunos as possibilidades de interação e de análise do seu
processo educacional.
Um dos professores entrevistados respondeu, acerca da prática avaliativa, que
estabelece as notas apenas a partir da participação dos estudantes nas aulas.
Outros professores esclareceram que:

Professor 13: Na sala de aula é feito muitos exercícios, a gente, eu


particularmente, procuro não passar atividades pra casa, porque a maioria
trabalha, né, e não vai ter tempo de fazer, então as avaliações são todas
feitas em sala de aula, acompanhamento, e eu procuro sempre tá fazendo
várias atividades pra que eles componham a nota, não há prova com valor
alto.

Professor 25: A avaliação é feita diariamente. E depois no final do semestre,


mas todo dia eles são avaliados como um todo. O aluno não é só avaliado
somente nas classes de alfabetização, dessa primeira parte de ensino
fundamental, eles são avaliados como um todo. Todo dia tem uma produção
de texto, a participação, confecção de cartazes, de trabalhos que são feitos
dentro da sala, porque aluno da EJA, você não pode dar dever de casa,
vamos dizer assim!

A utilidade da avaliação deve ser reconhecida pelo aluno, porque ele precisa
ser visto como um ser crítico e social, sujeito do seu próprio desenvolvimento.
Hoffmann (1998, p. 23), afirma que “a função seletiva e eliminatória da avaliação é
responsabilidade de todos. A avaliação, na perspectiva de uma pedagogia

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libertadora, é uma prática coletiva que exige a consciência crítica e responsável de


todos na problematização das situações”. Percebe-se que, na perspectiva dos
professores, o processo avaliativo leva em consideração a realidade dos alunos, na
medida em que entende a dificuldade do estudante em realizar atividades e tarefas
extraclasse. Por outro lado, as respostas obtidas apontam para o fato de que está
presente sempre a ideia da mensuração da aprendizagem a partir das notas, mas
não a mensuração do ensino. Ou seja, a necessidade de se compor uma nota
submete também o professor a um processo ausente da crítica do sistema e da
própria didática e metodologia.
Neste contexto, “a avaliação está a serviço de um projeto de ação e se
configura como um ato de investigar a qualidade da aprendizagem dos educandos, a
fim de diagnosticar impasses e se necessário, propor soluções que viabilizem os
resultados satisfatórios desejados” (LUCKESI, 2011, p. 408). O problema é que os
estudantes se declaram satisfeitos com o processo avaliativo, consideram-no justo,
embora a maioria pense em desistir por causa do sistema avaliativo; e a maioria dos
professores está de acordo com esse sistema. Professores utilizam uma avaliação
diária, declaram buscar a avaliação do aluno como um todo, mas o que realmente
significa avaliar o aluno como um todo? Significa oferecer oportunidades diárias de
nota?
A EJA surgiu com objetivo de facilitar a vida dos jovens e adultos que não
puderam concluir seus estudos no tempo certo, e, por isso, o aluno da EJA tem um
grande desafio. Diante de suas dificuldades e necessidades, a maioria das pessoas
acaba desistindo. Observou-se uma participação intensa dos alunos em projetos que
envolviam criatividade e originalidade, o que facilita o desenvolvimento de suas
potencialidades. Contudo, acerca do desenvolvimento acadêmico, ainda existe uma
grande lacuna entre as competências a serem desenvolvidas e a realidade
vivenciada pela escola na realização das atividades escolares. Os estudantes
frequentam a biblioteca no horário de aula com atividades planejadas pelos
professores, que buscam despertar o prazer pela leitura, atingir o letramento e
proporcionar novos conhecimentos. Nas entrevistas, os professores afirmam que
procuram analisar a falta de sucesso dos alunos, procuram fazer com que eles se

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sintam estimulados, mas esse estímulo viria da prática avaliativa constante, sem que
os próprios estudantes tenham a oportunidade de discutir suas notas, de interagir
com seu processo avaliativo? Não se pode ignorar que os professores, em sua
maioria, declararam que não discutem o processo avaliativo em sala. A
aprendizagem não é uma tarefa fácil. Os alunos da EJA são pessoas que já têm
certas experiências de vida, experiências que contribuem para o seu aprendizado.
Ainda assim, essas experiências não são suficientes para mantê-los na escola, pois
os fatores externos (família, trabalho), além da diversidade em sala de aula,
influenciam diretamente no ensino e na aprendizagem. Quando esses estudantes
pensam em abandonar os estudos porque têm medo de não conseguir alcançar nota
de aprovação suficiente, não se está deixando de lado a avaliação mediadora e
recorrendo à velha pedagogia, colocando o professor como uma espécie de juiz da
aprendizagem?

Considerações finais

O presente artigo partiu da análise das práticas pedagógicas voltadas para o


processo avaliativo na EJA. O primeiro objetivo específico foi discorrer sobre o
ensino-aprendizagem na EJA. A proposta de Freire (2008) trouxe um pensamento
inovador, pois se baseava no contexto vivenciado pelo indivíduo, em sua realidade,
auxiliando esses sujeitos a adquirirem consciência de si mesmos. Freire (2008)
pretendia que aprendessem não apenas a ler e escrever, mas a lutar contra sua
realidade, tornando-se sujeitos ativos da própria história, vertendo-se em agentes
transformadores em busca de uma sociedade mais justa e igualitária. O descaso e a
opressão desses sujeitos acaba por prendê-los às alternativas impostas pelas
classes dominantes (elites), já que sofrem e sempre sofreram a exclusão social. O
educador, nesse contexto, precisa atuar como um direcionador do aluno, ensinando-
lhe a construir seu conhecimento e a ser um agente pensante, questionador e crítico
da realidade que o cerca, o que exigirá a existência, entre educando e educador, de
um diálogo e uma troca de experiências mútuas.

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No segundo objetivo específico, buscou-se abordar a teoria em torno do


processo avaliativo. Uma nova concepção de avaliação envolve deixar de lado o
objetivismo da nota, seu caráter quantitativo, haja vista que esse procedimento
mensurador não estabelece uma avaliação mediadora e transformadora do aluno. A
avaliação é constituída de um conjunto de regras que coletam informações sobre o
que o aluno aprendeu, na maioria das vezes sem levar em consideração se esse
aluno articula sua própria aprendizagem de forma crítica, colocando-se na sociedade
como integrante dela. A emissão de juízos de valores através das notas alcançadas
é muito mais uma arma nas mãos do professor, que um instrumento até mesmo de
autoavaliação. Notas baixas dos estudantes não tendem a induzir o professor a se
questionar quanto à sua metodologia e didática. Isso acontece porque ainda se
ensina com a perspectiva do professor transmissor de conhecimento e não como
mediador. A avaliação precisa implicar a ressignificação dos elementos constitutivos
do processo educacional, e não mais funcionar como uma régua que mede as
possibilidades de avanço do estudante. Ela deve funcionar, inclusive para o próprio
aluno, como um diagnóstico do que precisa ser melhorado, e isso se aplica a todos
os atores da educação. Uma educação que desenvolve plenamente o sujeito, e uma
avaliação mediadora somente é possível quando todos os sujeitos participam desse
processo de maneira crítica e construtiva.
O terceiro objetivo específico foi apresentar dados e informações colhidas na
Região V do município de Vila Velha em torno, especificamente, dos procedimentos
avaliativos nas escolas. Percebeu-se, fundamentalmente, que a maioria dos alunos
pensa em desistir dos estudos por ter medo de não alcançar nota suficiente, ou por
não ter tempo para estudar para as provas. Considerando-se que tanto alunos,
quanto professores declararam que 60% da avaliação acontece através de provas
escritas, pode-se constatar que a imposição das provas escritas continuam sendo
uma ferramenta de controle, que, no escopo da EJA, pode favorecer a evasão
escolar. Além disso, os estudantes não participam do processo avaliativo, a não ser
como agentes passivos. Eles realizam as atividades e recebem uma nota pelo que
fazem. Outra informação importante pode ser obtida da percepção de que, por um
lado, os professores entendem que os alunos fazem atividades avaliativas na

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maioria das aulas, ao passo que muitos estudantes afirmaram não realizar. E, além
disso, mostra-se um problema a ser solucionado o fato de a grande maioria dos
professores não discutirem a avaliação com os alunos. Caso o docente não saiba
como conduzir a educação e avaliação de jovens e adultos, fazendo com que eles
participem de todo o contexto, desde a sua definição e concepção até o resultado
final, acaba-se incorrendo nas mesmas práticas que se repetem, ao longo da
história, mas que não solucionam o grave problema que é ser excluído do direito à
educação plena e crítica.
Tomou-se, tal qual foi apontado inicialmente, como objetivo geral, estabelecer
um panorama de como estudantes e professores das escolas investigadas
compreendem a avaliação, se entendem que os métodos são satisfatórios e
adequados para a construção de uma formação plena e crítica. Constatou-se que os
professores se esforçam para cumprir sua parte e ofertar um ensino de qualidade ao
alunado da EJA, nas palavras deles mesmos, para recuperar o tempo perdido. A
EJA existe porque as questões sociais e econômicas nunca foram solucionadas,
porque os pobres sempre foram marginalizados, usados como mera mão-de-obra
para suprir as demandas econômicas, e, ainda hoje, com um ensino voltado à
profissionalização. Embora os educadores envolvidos na EJA, dentro das escolas
investigadas, tenham uma clara concepção em torno desses fatos, no que toca ao
processo avaliativo, continuam mantendo o sistema designado pela proposta
metodológica determinada pelo município, e distribuindo 60% dos pontos por meio
de prova escrita. Mesmo que 60% dos estudantes pensem com certa frequência em
desistir dos estudos por medo das notas, consideram que o sistema avaliativo é
justo, o que pode indicar ausência de um pensamento mais profundo e crítico acerca
do que se vive no próprio ambiente escolar e acerca do sistema a que se está
submetido. Ou seja, professores e estudantes entendem que o sistema avaliativo é
justo, mas esse pensamento, especialmente por parte dos estudantes, não parece
auxiliar na formação plena e crítica, inclusive porque não percebem que consideram
justo algo que lhes impulsiona a abandonar os estudos, ao menos para 60% deles.
Por sua parte, os professores demonstram se importar com o processo avaliativo,
com o entrosamento com os estudantes, mas, ainda assim, estão submetidos às

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normas das quais não têm como fugir.


Se é certo que os professores estão também submetidos às imposições das
secretarias e ao estabelecimento das próprias escolas, incluindo direcionamento
dados por supervisores, coordenadores e demais atores educacionais, assim como
ao próprio Projeto Político Pedagógico das instituições, não seria necessário
considerar a importância da participação dos estudantes na elaboração das
metodologias avaliativas impostas? O que se conclui desse panorama é que os
ajustes mais importantes e necessários para o desenvolvimento da EJA precisam
partir dos estudiosos em educação e dos órgãos governamentais, chegando às
escolas, aos professores e aos maiores interessados, os discentes jovens e adultos.
É necessário abandonar a metodologia avaliativa quantitativa, partindo-se para um
novo modelo, que envolva efetivamente o aluno na avaliação da sua própria
aprendizagem, e, dessa forma, a avaliação passará a ser mediadora do ensino-
aprendizagem, diagnóstico do que deve ser melhorado, e não mais ferramenta que
aprova ou reprova o estudante.
Os governos implantaram um processo educativo que, longe de privilegiar o
conhecimento e a emancipação dos sujeitos, privilegia os interesses econômicos e a
formação de mão-de-obra para suprir as demandas do mercado de trabalho. É
necessário perceber que, mesmo com todos os esforços dos professores, o método
avaliativo na EJA ainda está longe de ser considerado mediador. Ainda que o
próprio professor tenha uma visão da sua função em sala de aula como mediador, o
procedimento avaliativo não o é, e isso pode ser um fator excludente para jovens e
adultos, um fator que fomenta a evasão e que os mantém nas periferias sociais. O
instrumento avaliativo deve ser entendido como instrumento de apoio. O ato de
avaliar serve para dar ao docente um direcionamento da efetividade de seu trabalho,
bem como de quais conhecimentos o aluno conseguiu adquirir, e com qual
profundidade o fez. Portanto, avaliar, longe de ser meramente uma quantificação,
deve ser uma ação vista como um processo de mão dupla. Não basta atribuir notas,
mensurar valores ou mesmo atribuir conceitos. O estudo da realidade não se limita à
simples coleta de dados e fatos, mas deve, acima de tudo, compreender como o
educando sente sua própria realidade, superando a simples constatação dos fatos.

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Correspondência

Antonio Carlos dos Santos Cruz — Universidad Autónoma de Asunción — Jejuí


667, entre O’leary y 15 de agosto, C.P. 1255, Asunción, Paraguai.

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