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BELO HORIZONTE / MG
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SUMÁRIO
7.1 Balanço histórico das políticas “públicas” de educação do campo no Brasil ...........46
7.2 Cidadania e Educação do Campo: o “público” político dos movimentos sociais ......50
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1 CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO
Fonte: andes.org.br
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Em relação à educação do campo, é pertinente ressaltar que a concepção de
educação que vem sendo empregada pela cultura dominante e elitista, não tem
favorecido satisfatoriamente para combater o analfabetismo, elevar a escolaridade dos
sujeitos, sua cultura e seu padrão de vida. Há ainda insatisfação, ocasionada pelo acesso
tardio a escola que na maioria das vezes, nas regiões mais pobres do Brasil, são
oferecidas sem condições de oportunizar saberes para a criança, o adolescente, os
jovens e adultos devido à precariedade de investimentos dessa política pública. Isso
representa, sem dúvida, uma das maiores dívidas históricas para com as populações do
campo.
Enquanto Arroyo critica a sociedade brasileira por não oportunizar políticas
públicas de educação para as populações do campo, Durkheim (1998) com uma
concepção de sociedade elitista e classista, se refere a uma educação que deveria ser
diferente para as classes sociais. “A educação urbana não é a do campo, e a do burguês
não é a do operário”,(p. 39). Isso caracteriza, evidentemente, uma postura alienadora que
reforça uma educação para privilegiados. Marx também se reporta aos aspectos das
desigualdades remetendo essa situação a partir de uma ordem social que submete o
mundo ao poderio do capital. Relata que o trabalho humano nunca produziu tantos
objetos em toda história humana.
A condição de poder da burguesia é o crescimento do capital que submete o
homem ao trabalho assalariado, gerando uma base de competitividade e desigualdade
entre os trabalhadores. Isso canaliza para um índice absurdo de “pobreza que cresce
mais rápido do que a população e a riqueza”. (1998; p.28). O paradigma de produção
capitalista permite maior exploração entre as pessoas, causa a marginalização do
trabalhador do campo e, a mão de obra humana na fábrica ou no latifúndio, transforma-
se numa mercadoria a serviço da burguesia, do capitalismo que também se articula pelo
processo educativo.
Pensando nesta situação de exploração do trabalhador e nas condições que
oportunizam uma educação conscientizadora, Paulo Freire (2007) nos possibilita
observar o sistema educacional da sociedade brasileira, dentro do processo de mudança,
quando identifica a educação como elemento fundamental para o sujeito do campo ou da
cidade. E considera como necessidade primordial dessa mudança, a leitura de mundo
com o sujeito que aprende, mas que também ensina. Ele desenvolveu uma metodologia
de ensino para a alfabetização e conscientização do trabalhador do campo que partia
dessa leitura de mundo. Uma iniciativa surgida na década de 50, que continua presente
na ação educativa de muitos professores do campo e da cidade.
O camponês, o ribeirinho, o povo da floresta da Amazônia Paraense também tem
demonstrado que domina saberes. Conhecem as marés do rio que enche e vaza, do
tempo da piracema, sabem que grande área de floresta no chão torna o solo da Amazônia
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infértil, do período da coleta dos frutos na floresta, entendem a geografia do rio, da mata;
trazem consigo a cultura de seus antepassados impregnada em suas cantigas, danças e
lendas em seu jeito de ser homem, mulher caboclo sujeito de saberes amazônicas. Mas
a incorporação de sua cultura nos currículos escolares se processa por aspectos que
envolvem desde políticas públicas para a educação como também, a aproximação do
professor com o aluno e sua realidade por meio de situações problematizadoras. Quando
os saberes selecionados por especialista de currículo que representam os interesses da
cultura dominante, são questionados na escola se evidencia que, o ato de ensinar está
relacionado ao outro, como um ser ignorante.
Um sujeito que não sabe, precisa saber conhecer, para deixar de ser. Algumas
vezes não se compreende o sujeito que aprende como portador de uma outra cultura que
domina saberes tão relevantes quanto os saberes do professor. Não se identifica a base
do processo educativo como formação da consciência e no estabelecimento da relação
dialógica com o sujeito que aprende, interligando a dialética dos seus conhecimentos aos
da sociedade que conserva, mas também se modifica. Para Freire (2007) não existe
nenhuma estrutura exclusivamente estática, assim como, não há uma, absolutamente
dinâmica. Isso vale para a estrutura construída pelas sociedades e também para a
educação. Desde a Antiguidade até a contemporaneidade, as concepções de educação
sofrem alterações, modificações ou surgem novas.
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e cultura, Artigo 166; inciso III: “as empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que
trabalham mais de cem pessoas, são obrigadas a manter o ensino primário gratuito para
os seus servidores e os filhos destes”; (BALEEIRO E SOBRIDINHO; 2001; p. 108).
Quanto à obrigatoriedade do ensino, responsabiliza as empresas industriais e comerciais
em ministrarem a aprendizagem de trabalhadores menores em forma de cooperação e
exime desta responsabilidade as empresas agrícolas.
A partir de 1940 a educação brasileira incorporou a matriz curricular urbanizada e
industrializada. Caracterizou interesses sociais, culturais e educacionais das elites
brasileiras como fundamentalmente a mais relevante para todo povo do Brasil. Com a
Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional de 1969, permanece a obrigatoriedade
das empresas agrícolas e industriais com o ensino primário gratuito para empregados e
os filhos menores de 14 anos. Isso explica, porque o Brasil até 1970 esteve com uma
educação do campo, sob o gerenciamento das iniciativas privadas da produção do
campo, com a formação profissional próprios para esta realidade e devidamente
qualificada. Ocorre que, sucessivamente os governos brasileiros têm implantado uma
educação que não atende e não respeita às especificidades de cada realidade regional
e muito menos a diferenciação (geográfica, cultural, histórica, social, etc.) do campo.
Neste caso, a oferta de educação para o campo em alguns lugares da Amazônia
Paraense não tem garantido as alterações propostas pela Constituição de 1988, ou pelos
documentos supracitados, uma vez que se recorre a um padrão de educação urbano
Centrica.
Esse paradigma é marcado por contradições que de certa forma, vem interferindo
na implementação de políticas públicas de afirmação para as populações que vivem e
trabalham no campo. Segundo Elaine Furtado (2006), para compreender como a
sociedade brasileira produziu e reproduziu as desigualdades no campo, precisamos
entender três elementos: “O latifúndio, a industrialização e a financeirização da
economia”. Ao expor sobre a discussão, retrata Furtado (2006) de que o Brasil
desenvolveu uma estrutura fundiária baseada na grande propriedade rural que ainda se
configura, mas, se solidificou graças às contingências do mercado mundial favorável a
monocultura e também pela exploração da mão de obra escrava. Durando três séculos
“produziu-se concentração da terra, exclusão dos trabalhadores do campo, do acesso às
condições mínimas de sobrevivência, mesmo depois do término formal da escravidão”.
Com o processo da industrialização as necessidades da população do campo
foram mais uma vez renegadas, prevalecendo à produção em larga escala de grãos para
exportação e consumo, gerando concentração de renda nas mãos de poucos, em relação
à maioria. Acrescenta Furtado (2006), como elemento recente a financeirização da
economia, que marca essa construção história “somados as desigualdades produzidas
pela globalização, o avanço tecnológico e a abertura dos mercados com a financeirização
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da economia, fundada em taxas de juros mais altas do mundo, fez com que voltasse a
exclusão dos trabalhadores” (Ibidem; p. 48). Esses elementos determinaram uma
construção história resguardada pela exploração dos trabalhadores e durante séculos
fortaleceu a classe dominante do país favorecendo a apropriação e o empoderamento de
bens e de riquezas, bem como, o domínio de conhecimentos tecnológicos, culturais, no
qual a educação, na maioria das vezes, esteve a serviço dessa estrutura de dominação.
A principal preocupação desse período era a formação de mão de obra qualificada
que contemplasse os interesses e necessidades do espaço urbano para aceleração do
crescimento econômico industrial que gradativamente se fortalecia após Segunda Guerra
Mundial. Durante a Guerra Fria, instalou-se uma concepção de mercado que procurava
ampliar o número de consumidores, e aos Estados Unidos interessava consolidar essa
hegemonia. Por conta dessa disputa entre as potências mundiais (Estados Unidos e
União Soviética) que muitos países foram aderindo a uma das posições políticas e junto
com a adesão vinha o pacote de proposições educacionais para serem implementadas
em cada país. No caso do Brasil, optou-se por uma educação com currículos e
metodologias fundamentados no ideário norte-americano, numa perspectiva de
afirmação de uma escola essencialmente urbana. Então, a partir dos anos 30, a
escolarização para o trabalhador do campo, foi inserido também, com o intuito de conter
o êxodo rural, provocado pelo processo de industrialização do país, responsável pela
grande massa de migrações rurais de quase todas as regiões do país durante décadas
subsequentes.
Cláudia Passador (2006) expressa que para os camponeses, a escola não tinha
tanto significado, uma vez que, o aprendizado da profissão tinha sido adquirido com os
pais e não pela escola. De forma geral, a escola era compreendida como lugar da “contra
educação rural”, pautada em apenas instruir o homem do campo, para ler, escrever e
contar. Essa ideia de instrução do trabalhador nos remete a uma ideologia de que o
sujeito da roça não precisa estudar, pois, trabalhar com a enxada, por exemplo, requer
apenas esforço físico, não precisaria raciocinar refletir, questionar e sim, somente
manusear os instrumentos e saber utilizar a terra adequadamente. 1
1
Texto Extraído de http://www.anpae.org.br/congressos_antigos/simposio2007/289.pdf
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2 O DIREITO DOS POVOS CAMPESINOS À EDUCAÇÃO
Para que se possa refletir sobre o direito a educação aos homens e mulheres do
campo é necessário considerar o conjunto de forças sociais, políticas, econômicas e
culturais que foram se engendrando no decorrer da história do Brasil, sob os interesses
do capital, e que influenciaram sobre maneira a oferta de educação pública a esses
sujeitos. No Brasil, esse contexto é marcado pela educação dos jesuítas que aqui
chegaram chefiados pelo Padre Manoel da Nóbrega, com a missão de “educar” a nova
colônia portuguesa, instituindo a fase jesuítica da educação colonial, ligada estritamente
à política colonizadora europeia a favorecer o capitalismo de acumulação primitiva. O
processo de colonização do Brasil tem como marco importante as Capitanias
Hereditárias, cujo elemento fundamental é a posse da terra, sustentada pela lógica
produtiva das relações sociais sob o tripé latifúndio, religião e escravidão. Em síntese, a
educação ou sua negação ao povo, no período supracitado, inscreve-se no objetivo da
colonização: lucro, acumulação de riquezas, expropriação e exploração das novas terras
descobertas, traçando as marcas históricas daquilo que CHAUÍ (2000) chamou de mito
fundador (descobridor) que tem permanecido além daquela época.
Diferentemente da formação, a fundação se refere a um momento passado
imaginário, tido como instante originário que se mantém vivo e presente no curso do
tempo, isto é, a fundação visa a algo tido como perene (quase eterno) que traveja e
sustenta o curso temporal e lhe dá sentido. A fundação pretende situar-se além do tempo,
fora da história, num presente que não cessa nunca sob a multiplicidade de formas ou
aspectos que pode tomar (CHAUÍ, 2000, p. 9).
O fenômeno colonização é igual a exploração, associada ao submetimento dos
povos indígenas e negros às mais cruéis formas de relações sociais, o que trouxe
implicações para o modelo de educação a ser ofertado, distintamente, a cada classe
social. A educação brasileira passa a existir nesse contexto e dela não se aparta a
educação proposta ao trabalhador (a) rural. No Brasil colônia, não se pode falar de
educação propriamente, porque “até 1808, época em que aqui chegou a Família Real
portuguesa eram proibidos no Brasil: escolas, jornais, circulação de livros, associações,
discussão de ideias bibliotecas, fábricas, agremiações políticas e qualquer outra forma
de movimento cultural” (LIMA, 1968, p.19), ou seja, 308 anos como porto, fonte de
matéria-prima, controlado por feitorias e fortes. Propositalmente, Portugal mantinha a
colônia ignorante e analfabeta, condição necessária para manter o avanço do capitalismo
nesse país, porém, tendência seguida pelos governantes posteriores, que permitiram
constatar-se no final do século XX o baixo padrão de desenvolvimento da educação aos
povos do campo.
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O latifúndio cresceu nesse país fundado nos cem anos de escravidão e extermínio
dos povos indígenas e do século XVII ao século XIX (1888) com base na escravidão do
negro africano. Portanto, o Brasil podia isentar-se de oferecer educação. Esta não era
necessária ao modelo de acumulação de riquezas, apesar das revoltas dos povos
indígenas e da luta do povo negro, cuja expressão maior está nos quilombos. Em termos
políticos o Brasil “saiu” da condição de colônia, constituiu-se império, fez-se
“independente” e proclamou-se república. Tais contextos levaram, por sua própria
contradição, à reivindicação da educação, sob a responsabilidade do Estado. Mas,
demoraria muito a se configurar uma política de educação efetiva, pois da parte das elites
brasileiras, sempre houve um grande receio quanto aos ideais políticos de liberdade e de
direitos sociais que poderiam ser estimulados caso fosse ofertada aos trabalhadores.
Verifica-se que a educação pública brasileira, até os anos 30 do século XX, não
consegue sair do papel, constituindo-se de um leque muito amplo de leis anunciadas e
não materializadas como direito. O não assumir da educação como obrigação exclusiva
do Estado abriu historicamente o caminho à iniciativa privada, deixando mais distante o
acesso à educação, pelo povo. Assim, é que se chega ao século XXI e, ainda, o acesso
à educação configura-se como um problema nacional, sem que esta fosse garantida à
maioria da população brasileira em seus diversos níveis e modalidades, particularmente
à força de trabalho camponesa. É nesse sentido que se ressalta que a luta pela educação
do campo ocorre no palco dos conflitos decorrentes da luta pela terra, fato verificado
desde a aprovação da lei de terras, em 1850.
A referida Lei restringia o direito à terra aos ex escravos, aos brasileiros pobres,
posseiros e imigrantes, mas permitia que estes se tornassem mão de obra barata para o
latifúndio até os nossos dias quando se aprova o II Plano Nacional de Reforma Agrária,
no governo Lula. Casa-se, assim, o capitalismo com a propriedade da terra e, com esse
laço de união esta é transformada em uma mercadoria controlada por quem tem dinheiro
e poder político. É como se essas leis pudessem ser chamadas de a primeira cerca de
arame farpado ou a primeira semente concreta para a constituição do campesinato sem-
terra e sem acesso às políticas públicas, entre as quais a política educacional.
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anterior já havia indicado que apenas 10% da população em idade escolar se achava
matriculada nas escolas primárias e que as primeiras Escolas Normais, visando a
formação de educadores, para aquele nível de ensino, só seriam criadas em 1835. As
mentalidades dominantes no poder, durante séculos, foram indiferentes à educação
popular e feminina. Para eles a educação dos pobres e da mulher devia ser prática e
utilitária, daí que ao se chegar a Primeira República (1889), os índices de analfabetismo
da população brasileira eram em torno de 85% (RIBEIRO, 2001). Posteriormente, no
período pós-guerra (1914/1918) demarcaria o início do surto industrial e a tendência a
urbanização do país. Constituiu-se o operariado e aumentaram os movimentos
contestatórios: greves, Movimento Tenentista, Coluna Prestes, fundação do Partido
Comunista Brasileiro, Semana de Arte Moderna. Contudo, mais da metade da população
de quinze anos e mais, em 1920, estava fora da escola.
A população do país, em torno de 14.333.915 milhões de habitantes, tinha apenas
250 mil estudantes (RIBEIRO, 2001). A educação, pela primeira vez, passa a ser tratada
como uma questão nacional, por meio da edição da Constituição de 1934, que também
exigia a elaboração de Diretrizes e Bases para a educação nacional e a elaboração de
um Plano Nacional de Educação. Mas, tal anseio não se consolidou em decorrência do
Estado Novo de 1937. A Constituição do Estado Novo tomaria a educação rural como
fundamento para organizar a juventude no trabalho, promover disciplina moral e
adestramento físico “de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus deveres para
com a economia e a defesa da Nação”. Essa é a educação para os camponeses porque
para os filhos da burguesia agrária e industrial a educação haveria a educação
secundária, de caráter propedêutico, que tinha por objetivo educar as futuras elites
condutoras. A lei do Ensino primário só seria aprovada em 1946, época em que está no
poder o general Eurico Gaspar Dutra. A grande novidade da Lei foi o Artigo n.º 56,
Parágrafo Único:
Para realização do ensino nas zonas rurais, a União reservará, no
mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à educação no respectivo
orçamento anual. Quanto ao ensino agrícola, a estrutura implantada
pelo Decreto-Lei 9613/46 foi a de cursos de nível AURORA ano III
número 5 - DEZEMBRO DE 2009 ___ISSN: 1982-8004
www.marilia.unesp.br/aurora médio divididos em cursos de formação e
cursos pedagógicos. Os de formação se subdividiam em cursos de 1º
e 2º ciclos. O de 1º ciclo, por sua vez, se subdividia em básico (4 anos)
e de maestria (2 anos). O de 2º ciclo era constituído dos cursos técnicos
(3 anos), tais como: de agricultura, de horticultura, de zootecnia, de
práticas veterinárias, de indústrias agrícolas, de laticínios e de
mecânica agrícola. Os cursos pedagógicos se subdividiam em cursos
de (2 anos) para formar professores nas áreas de educação rural
doméstica e em cursos (1 ano) didática do ensino agrícola e
administração do ensino agrícola (RIBEIRO, 2001, p. 150).
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Será que a educação no meio rural passou a ser prioridade? Evidente que não.
Porém, interessava ao capitalismo conter e controlar a tensões existentes no campo e a
educação rural, assim chamada pelos legisladores, seria um dos instrumentos de
correspondência às práticas abusivas de poder. O ano de 1946 demarca a aprovação da
Lei Orgânica do Ensino Agrícola para a formação de trabalhadores da agricultura,
equiparando esses cursos as outras modalidades, mesmo assim, continuavam as
restrições àqueles que faziam opção por cursos profissionalizantes. O período do
chamado nacional desenvolvimentismo é marcado por intensas lutas políticas, em que
os movimentos sociais (operários e camponeses) passam a exigir reformas de base,
econômicas e sociais. Unem-se a eles estudantes, educadores, partidos de esquerda e
muitos movimentos populares. Porém, em outro extremo e contrários a estes interesses,
os empresários (norte-americanos e brasileiros), militares, latifundiários, partidos de
direita (União Democrática Nacional) e diversos segmentos das elites, setores da igreja
e da mídia unem-se em contraposição aos ideais socialistas veiculados, às reformas - da
reforma agrária à realização da campanha nacional de alfabetização do povo –
reivindicadas pelos trabalhadores.
A LDB nº. 4.024 foi aprovada em 1961, resultante dessas disputas, num processo
conflituoso entre os defensores da escola pública e da escola privada, culminando com
o consenso entre os projetos Mariani e Lacerda. Por sua vez, a realidade educacional
mostrava que 50% da população em idade escolar estavam fora da escola.
Paralelamente, fatos importantes no campo da cultura, da política e da educação popular
ocorreram, trazendo um novo significado para a educação rural e popular: os movimentos
políticos culturais no início dos anos 60, com destaque para os Centros Populares de
Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE); o Movimento de Cultura Popular
(MCP), em Pernambuco e o Movimento de Educação de Base (MEB), da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Esses movimentos promoviam a Alfabetização da população rural e urbana
marginalizadas, a partir dos referenciais teóricos constituídos da unidade entre a política
das lutas dos movimentos sociais e dos círculos de cultura idealizados por Paulo Freire,
os quais culminariam com a proposta da Pedagogia Libertadora, que tem nesse último o
seu maior expoente. Várias comunidades rurais adotaram a educação libertadora como
filosofia de luta e resistência ao capitalismo e como ferramenta de apoio à luta pela
transformação da realidade social produzida pelo mesmo. Esses movimentos foram alvo
de repressão e controle ideológico pelos governos militares, após 64, e suas reformas da
Educação a partir de 1968: a Reforma Universitária (Lei nº. 5.540/68), a Reforma do
Ensino de 1º e 2º graus (Lei nº. 5. 692/71) que estabelecia a profissionalização do Ensino
de 2.º grau e definia o ensino de 1.º grau num ciclo de oito séries. Outras medidas de
política educacional arrefeceram e deram nova dimensão ao ímpeto de se ofertar a
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educação rural em contraposição aos movimentos de base democrática. Os mecanismos
mais intensos se deram pela criação, em 1970, do Movimento Brasileiro de Alfabetização
(MOBRAL) - à época o Brasil tinha um percentual 33% de analfabetos.
Com os governos militares fecha-se mais um ciclo histórico marcado pelas ações
autoritárias e articulado do Estado brasileiro, associado ao capital internacional e
nacional, que culminou com o desmonte da educação pública, fortaleceu a iniciativa
privada, controlou ideologicamente as lutas sociais desmobilizando-as, caçou as
liberdades políticas individuais e coletivas, entre outras ações nefastas à construção da
educação no campo e na cidade. É nesse período que se publica o Estatuto da Terra,
um instrumento para desarticular os conflitos no campo e abri-lo para a empresa
capitalista no campo, numa forte aliança entre o capital internacional, a burguesia
nacional, militares e intelectuais a seu serviço2.
2
Texto Extraído de http://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasEletronicas/Aurora/COUTINHO.pdf
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3 A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO CAMPO.
Fonte: educador.brasilescola.uol.com.br
3
Texto Extraído de https://educador.brasilescola.uol.com.br/orientacoes/educacao-no-campo.htm
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4 A EDUCAÇÃO DO CAMPO ENQUANTO PRODUÇÃO DE CULTURA.
Fonte: catalogo.egpbf.mec.gov.br
Fonte: catalogo.egpbf.mec.gov.br
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conquista pela terra-educação, ou seja, consiste numa negação histórica do termo
educação rural, que impulsionou os movimentos sociais a ressignificarem a si mesmos
enquanto sujeitos coletivos.
Assim, entendemos que, para o Movimento, os conteúdos e as metodologias de
ensino estão voltados aos interesses e envolvimento da comunidade, e, assim,
direcionam suas atividades escolares em prol da emancipação dos trabalhadores e
trabalhadoras, a partir de valores como cooperação, parceria, solidariedade, autonomia
e outros. O contexto que o MST dialoga com o governo, envolve a relação entre
educação, escola e a questão agrária em toda sua complexidade histórica, ou seja, a
proposta pedagógica da educação do campo trata, dentre outros aspectos, da realidade
dos sujeitos de direitos. É neste sentido, que a educação do campo, tem intensificado o
diálogo com o governo em prol de melhores condições de vida e trabalho em seu espaço
de pertencimento, como resultado da luta em defesa da Educação Pública e de qualidade
para todos que ali vivem. Tratando da proposta pedagógica própria da educação do
campo: Os trabalhadores têm colocado em evidência a valorização da cultura dos povos
do campo, a exemplo das Conferências Nacionais – Por uma Educação Básica do Campo
(1998) e Por uma Política Pública de Educação do Campo (2004) −, o que resultou na
criação de um grupo permanente de Educação. Concatenando com as pesquisas de
Souza (2008, p.1092) entendemos que a educação do campo:
Fonte: vermelho.org.br
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O pensamento utilitarista incutido à escola rural, para o povo da roça, tem sido
pautado em saberes mínimos, úteis ao trabalho com a enxada; um percurso histórico que
vem marcando fortemente muitas escolas localizadas no meio rural. Se a discussão
principal das elites governantes é garantir que todas as pessoas tenham acesso a uma
educação de qualidade: De que forma a educação serve aos interesses da vida humana
e como é envolvida com a valorização do trabalhador? Para Beltrame (2002, p.132), as
relações dos professores, com o mundo rural, permitem lhes desenvolver uma prática em
várias dimensões: “produtiva, política e educativa” e afirma: ”em seu dia-a-dia, esses
homens e mulheres, no trabalho, no contato direto com a natureza, participam
intensamente dos ciclos da vida” e, nesta dinâmica, vão organizando conhecimentos e
afinidades que os enriquecem como professores. No intuito de justificar a emergência
deste trabalho; em dimensão exploratória de pesquisa nos servimos de uma entrevista,
desenvolvida junto a uma professora da escola, pois, nos inquietava a seguinte
interrogação: Quais atividades agrícolas e artesanais se mantêm na comunidade? A
professora em resposta ao nosso questionamento:
As atividades agrícolas das comunidades atendidas pela escola são o cultivo de
fumo, a avicultura, e a agricultura familiar sendo que nesta são cultivadas, milho, batata
salsa, e verduras para o próprio consumo e vendas para a comunidade local. Quanto ao
artesanato, algumas poucas famílias aproveitam os barbantes usados para amarrar fumo
para fazer crochê como toalhinhas, tapetes e enfeites para casa. (PROFESSORA).
Entendemos a transformação da natureza pelo trabalho e a manifestação deste
proceder pela invenção da cultura no exercício da prática social, aprendendo- ensinando
aprendendo, possibilita que a educação continue no homem e na mulher o trabalho da
natureza, fazendo-os evoluir e tornando-os mais humanos, pois, as contradições entre o
trabalho e a cultura no contexto de nossa pesquisa são evidentes. O trabalho como meio
produtivo de sobrevivência cotidiana, desenvolvese no meio rural, numa relação moldada
por ações repetitivas, pela exposição ao sol e todo tipo de intempérie, um contato direto
com a natureza. Subsequente ao questionamento anterior e para análise das relações
entre o projeto histórico e o projeto educacional de escolarização em consonância com
nossa intenção de pesquisa, outro questionamento faz-se fundamental: De que maneira
se relacionam com o trabalho? Para Marx (2004) a tendência histórica da acumulação
capitalista funda-se sobre o trabalho pessoal de seu possuidor, ou seja, certamente a
maneira de produção encontra-se entre a escravidão, o servilismo e outros estados de
dependência. A professora manifesta-se:
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julho/ agosto e vai até meados de abril a maio. Após o mês de Janeiros
muitos acabam saindo e procurando emprego em centros urbanos,
visto que o trabalho deixa de ser tão difícil podendo ser realizado pelas
próprias famílias (sem a necessidade de contratar um “camarada”, um
ajudante). As pessoas que trabalham por contrato (não há registro
algum em carteira, ou em cartório), ganham as refeições, e em alguns
casos dormem na estufa ou nos paióis junto com o fumo colhido ou
seco. (Professora).
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que ali residem, ou seja, uma educação no campo, que mantém o sentido extensionista
onde o destaque é dado a dimensão do localismo e particularismo. Para Frigotto (2010,
p. 35):
4
Texto Extraído de http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/6456_3956.pdf
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5 A EDUCAÇÃO DO CAMPO NA FORMAÇÃO DOS SUJEITOS
Fonte: folhavitoria.com.br
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Assim, a escola precisa possibilitar que os sujeitos do campo compreendam a
realidade em que estão inseridos no seu movimento histórico, nas suas contradições e
em relação ao contexto mais amplo, tanto no que se refere à articulação campo-cidade
quanto ao processo de desenvolvimento, de globalização, de lutas sociais. Para que a
escola do campo possa ter sua identidade reconhecida e assumida no trabalho
pedagógico escolar, coloca-se como fundamental reestruturar os currículos e a formação
de professores. Fazendo uma análise no currículo escolar revela-se que o trabalho, a
cultura e os saberes do campo geralmente são tratados de forma pejorativa,
ultrapassada, inferiorizada ou, ainda, estão ausentes no processo pedagógico. O modelo
de currículo historicamente adotado busca impor para o campo a cultura urbana e os
saberes produzidos nestes espaços como modelo. É neste sentido que a educação do
campo, por advir a partir de uma luta dos camponeses, os traz como sujeitos de políticas
e não meros consumidores de ações educativas, de modo que suas experiências, seu
contexto, sua cultura, seus conhecimentos e suas demandas sejam tomados como
referências para a formulação de políticas públicas.
O projeto político-pedagógico traduz a concepção e a forma de organização do
trabalho pedagógico da escola com vistas ao cumprimento de suas finalidades. As
finalidades têm caráter social, implicando na explicitação o tipo de sujeito que se deseja
formar, por isso, esse projeto vincula-se a um projeto histórico de sociedade (Freitas,
1995), ou seja, tem relação com a sociedade que se deseja construir, transformar. O
projeto político-pedagógico constitui-se em instrumento de ação político pedagógica, na
medida em que possibilita a manifestação dos desejos e aspirações da comunidade em
termos da educação das crianças e jovens e norteia todo o processo educativo
desencadeado pela escola. Nesse sentido, não pode ser visto apenas como produto ou
resultado de um trabalho de definição de finalidades e linhas de ação. O projeto político-
pedagógico é “processo permanente de reflexão e discussão dos problemas da escola,
na busca de alternativas viáveis à efetivação de sua intencionalidade” (Veiga, 2002, p.
13) e assenta-se numa dimensão de globalidade e totalidade da educação.
O projeto político-pedagógico não se resume no documento escrito que formaliza
as concepções, objetivos, conteúdos, metodologia de trabalho e sistemática de avaliação
de uma escola. Ele é exercício de construção permanente que acompanha e é
acompanhado pela prática pedagógica, cotidianamente se fazendo e refazendo. Daí a
necessidade de coesão e clareza política, condições nem sempre fáceis de serem
obtidas num espaço que congrega sujeitos com as mais diferentes experiências de vida,
concepções de educação e expectativas. Contudo, é de fundamental importância a
constituição do coletivo escolar, uma vez que projeto político pedagógico se refere
sempre a um coletivo, sendo inconcebível sem ele; jamais pode ser fruto de desejos e
aspirações individuais. Machado (2003) aponta que o trabalho pedagógico é o modo de
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organização que a escola assume na tarefa de pensar e produzir as relações de saber
entre sujeitos e o mundo concreto, o mundo do trabalho socialmente produtivo.
O trabalho pedagógico é norteado por um conjunto de princípios filosóficos,
políticos e epistemológicos definidores das normas e ações escolares e se apresenta
como condição de sustentação das relações estabelecidas entre os sujeitos que integram
o universo escolar. Pensar a organização do trabalho pedagógico implica pensar o que
será trabalhado - conteúdos, como - metodologia - e para que - finalidades. Em se
tratando das escolas do campo é preciso ter um olhar atento e cuidadoso para o contexto
em que estão inseridos, valorizando suas particularidades e singularidades, que são
características do seu entorno, bem como levar em conta o diagnóstico da realidade
sócio-político-econômica da localidade em que está inserida a escola. A educação do
campo nasceu colada ao trabalho e à cultura do campo e não pode perder isso em seu
projeto pedagógico.
O trabalho forma e produz o ser humano: a educação do campo precisa recuperar
uma tradição pedagógica de valorização do trabalho como princípio educativo, do vínculo
entre educação e processos produtivos e de discussão sobre as diferentes dimensões e
métodos de formação do trabalhador, de educação profissional, cotejando esse acúmulo
de teorias e de práticas com a experiência específica de trabalho e de educação dos
camponeses. O projeto da educação do campo precisa estar atento para os processos
produtivos que conformam o ser trabalhador do campo e participar do debate sobre as
alternativas de trabalho e opções de projetos de desenvolvimento locais e regionais que
possam devolver dignidade para as famílias e as comunidades camponesas. Isso
significa pensar a pedagogia sob um ponto de vista mais amplo, como processo de
humanização/desumanização dos sujeitos, e pensar como estes processos podem e
devem ser trabalhados nos diferentes espaços educativos do campo. A cultura também
forma o ser humano e dá as referências para o modo de educá-lo.
São os processos culturais que garantem a própria ação educativa do trabalho,
das relações sociais, das lutas sociais: a educação do campo precisa recuperar a tradição
pedagógica que nos ajuda a pensar a cultura como matriz formadora e que nos ensina
que a educação é uma dimensão da cultura, como uma dimensão do processo histórico,
e que processos pedagógicos são constituídos desde uma cultura e participam de sua
reprodução e transformação simultaneamente. Quando dizemos que os movimentos
sociais são educativos é exatamente compreendendo que estão provocando processos
sociais que, ao mesmo tempo, reproduzem e transformam a cultura camponesa,
ajudando a conformar um novo jeito de ser humano, um novo modo de vida no campo,
uma nova compreensão da história. A educação do campo precisa ser a expressão e o
movimento da cultura camponesa transformada pelas lutas sociais do nosso tempo.
Pensar a educação vinculada à cultura significa construir uma visão de educação em uma
25
perspectiva de longa duração, ou seja, pensando em termos de formação das gerações.
E isto tem a ver, especialmente, com a educação de valores.
A educação do campo, além de se preocupar com o cultivo da identidade cultural
camponesa, precisa recuperar os veios da educação dos grandes valores humanos e
sociais: emancipação, justiça, igualdade, liberdade, respeito à diversidade, bem como
reconstruir nas novas gerações o valor da utopia e do engajamento pessoal a causas
coletivas e humanas. O vínculo com as matrizes formadoras do trabalho e da cultura nos
remete a pensar em outro traço muito importante para a educação do campo: sua
dimensão de projeto coletivo e de concepção mais ampliada do que sejam relações
pedagógicas. O trabalho e a cultura são produções e expressões necessariamente
coletivas e não individuais. Raiz cultural, que inclui o vínculo com determinados tipos de
processos produtivos, significa pertença a um grupo, identificação coletiva.
As relações interpessoais são inerentes à concretização do ato educativo, mas se
trata de pensá-las não como relação indivíduo, indivíduo para formar indivíduos, mas sim
como relações entre pessoas culturalmente enraizadas para formar pessoas que se
constituem como sujeitos humanos e sociais. A educação do campo também se identifica
pela valorização da tarefa específica dos educadores. Sabemos que em muitos lugares
eles têm sido sujeitos importantes da resistência social no campo, especialmente nas
escolas, e que têm estado à frente de muitas lutas pelo direito à educação. A educação
do campo tem construído um conceito mais alargado de educador. Compreende-se que
educadora é aquela pessoa cujo trabalho principal é o de fazer e o de pensar a formação
humana, seja ela na escola, na família, na comunidade, no movimento social, seja
educando as crianças, os jovens, os adultos ou os idosos. Nesta perspectiva, todos
somos de alguma forma educadores, mas isto não tira a especificidade desta tarefa: nem
todos temos como trabalho principal educar pessoas e conhecer a complexidade dos
processos de aprendizagem e de desenvolvimento do ser humano, em suas diferentes
gerações.
Para Caldart (2002), construir a educação do campo significa formar educadores
para atuação em diferentes espaços educativos. Na medida em que se defende uma
formação específica é porque se entende que boa parte deste ideário que se está
construindo é algo novo em nossa própria cultura. Há uma nova identidade de educador
a ser cultivada, ao mesmo tempo em que há uma tradição pedagógica e um acúmulo de
conhecimentos sobre a arte de educar que precisam ser recuperados e trabalhados
desde esta intencionalidade educativa da educação do campo. Por isso, ao pensar no
projeto político e pedagógico da educação do campo deve-se incluir uma reflexão sobre
qual perfil do profissional de educação precisamos e sobre como se faz esta formação.
Faz se necessário pensar sobre como os educadores têm se formado nos próprios
processos de construção da educação do campo e como isso pode ser potencializado
26
pedagogicamente em programas e políticas de formação específicas. A educação do
campo não cabe em uma escola, mas a luta pela escola.
A escola terá tanto mais lugar no projeto político e pedagógico da educação do
campo se não se fechar nela mesma, vinculando-se com outros espaços educativos, com
outras políticas de desenvolvimento do campo, e com a própria dinâmica social em que
estão envolvidos os seus sujeitos. Compreender o lugar da escola na educação do campo
é ter claro que ser humano ela precisa ajudar a formar e como pode contribuir com a
formação dos novos sujeitos sociais que se constituem no campo. A escola precisa
cumprir a sua vocação universal de ajudar no processo de humanização, com as tarefas
específicas que pode assumir nesta perspectiva. Ao mesmo tempo é chamada a estar
atenta à particularidade dos processos sociais do seu tempo histórico e ajudar na
formação das novas gerações de trabalhadores e de militantes sociais. Não se trata de
propor algum modelo pedagógico para as escolas do campo, mas de construir
coletivamente referências para processos pedagógicos a serem desenvolvidos pela
escola, que lhe permitam serem obra e identidade dos sujeitos que ajuda a formar, com
traços que a identifiquem com o projeto político e pedagógico da educação do campo.
Para construir referências comuns às escolas vinculadas a este projeto de
educação do campo, precisa-se antes pensar em alguns aspectos principais do que é o
trabalho específico da escola ou quais as funções sociais que assume ou deve assumir,
já dialogando com a intencionalidade política e pedagógica do projeto da educação do
campo. E pensar ainda em aspectos ou tarefas gerais, que depois precisam ser
desdobradas e pensadas pedagogicamente a partir dos diferentes sujeitos que estão em
cada escola específica, bem como levar em conta as diferenças de cada ciclo da vida,
de cada modalidade de escola. A escola precisa ser vista como um espaço de
socialização. A escola costuma ser um dos primeiros lugares em que a criança
experimenta, de modo sistemático, relações sociais mais amplas das que vive em família
e de uma intencionalidade política e pedagógica nesta dimensão pode depender muitos
dos traços de seu caráter, muitos dos valores que venha a assumir.
Fonte: blogviniciusdesantana.com
27
Na escola sempre há socialização porque sempre há relações sociais. Mas nem
sempre isto integra o projeto pedagógico e a intencionalidade do trabalho dos
educadores. Neste aspecto é preciso ter presente que o principal componente curricular
da escola é que a experiência cultural de escola é pedagogicamente muito mais
significativa do que a tematização da socialização ou apenas a tentativa de transformar
determinadas relações sociais em conteúdo discursivo de sala de aula. A escola socializa
a partir das práticas que desenvolve, pelo tipo de organização do trabalho pedagógico
que seus sujeitos vivenciam, pelas formas de participação que constituem seu cotidiano.
São as ações que revelam as referências culturais das pessoas e é trazendo à tona estas
referências que elas podem ser coletivamente recriadas e reproduzidas.
A educação do campo precisa incluir em seu projeto pedagógico uma reflexão
cuidadosa e mais aprofundada sobre como acontecem no cotidiano da escola, os
processos de socialização, sua relação com a conservação e a criação de culturas,
fazendo também a reflexão específica sobre que traços de socialização são importantes
na formação dos sujeitos do campo hoje. Ela também precisa instigar a construção de
uma visão de mundo. Muitas vezes a escola trabalha conteúdos fragmentados, ideias
soltas, sem relação entre si ou com a vida concreta. São muitos estudos e atividades sem
sentido, fora de uma abordagem mais ampla, que deveria ser exatamente a de um projeto
de formação humana. Para que a escola cumpra esta tarefa é necessário que a escolha
dos conteúdos de estudo e a seleção de aprendizados a serem trabalhados em cada
momento não seja aleatória, mas feita dentro de uma estratégia mais ampla de formação
humana, bem como se busque coerência entre teoria e prática, entre o que se estuda e
o ambiente cultural da escola.
Na educação do campo é preciso refletir sobre como se ajuda a construir, desde
a infância, uma visão de mundo crítica e histórica, como se aprende e como se ensina
nas diferentes fases da vida a olhar para a realidade enxergando seu movimento, sua
historicidade e as relações que existem entre uma coisa e outra, como se aprende e como
se ensina a tomar posição diante das questões do seu tempo, como se aprendem e como
se ensinam utopias sociais e como se educam valores humanistas, como se educa o
pensar por conta própria e o dizer a sua palavra e como se respeita uma organização
coletiva. Ela precisa não deixar desflorar o cultivo de identidades. Esta também é uma
das funções da escola: trabalhar com os processos de percepção e de formação de
identidades, no duplo sentido de ajudar a construir a visão que a pessoa tem de si mesma
- autoconsciência de quem é e com o que ou com quem se identifica -, e de trabalhar os
vínculos das pessoas com identidades coletivas, sociais: identidade de camponês, de
trabalhador, de membro de uma comunidade, de participante de um movimento social,
identidade de gênero, de cultura, de povo, de Nação.
28
Compreende-se que este é um aprendizado humano essencial: olhar no espelho
do que somos e queremos ser, assumir identidades pessoais e sociais, ter orgulho delas,
ao mesmo tempo em que se desafiar no movimento de sua permanente construção e
reconstrução. Educar é ajudar a construir e a fortalecer identidades, desenhar rostos,
formar sujeitos. E isto tem a ver com valores, modo de vida, memória, cultura. As
identidades se formam nos processos sociais. O papel da escola será tanto mais
significativo se ela estiver em sintonia com os processos sociais vivenciados pelos seus
educandos e educadores, e se ela mesma consegue constituir um processo social -
cumprindo a tarefa da socialização de que tratamos antes - capaz de ajudar a construir e
fortalecer identidades. Pensando desde a intencionalidade política e pedagógica da
educação do campo, a escola deveria trabalhar com mais ênfase para ajudar no cultivo
de identidades aguçando a autoestima, memória e resistência cultural.
A escola tem um papel que não pode ser subestimado na formação da autoestima
de seus educandos e também de seus educadores. E isto é muito importante para a
educação do campo, já que em muitas comunidades camponesas existe um traço cultural
de baixa autoestima acentuado, fruto de processos de dominação e alienação cultural
muito fortes, e que precisa ser superado em uma formação emancipatória dos sujeitos
do campo. Para que a escola assuma a tarefa de fortalecer a autoestima dos seus
educandos, além de todo um trabalho ligado à memória, à cultura, aos valores do grupo,
é preciso pensar na postura dos educadores e na transformação das didáticas ou do jeito
de conduzir as atividades escolares.
A escola precisa ajudar a enraizar as pessoas em sua cultura, que pode ser
transformada, recriada a partir da interação com outras culturas, mas que precisa ser
conservada, porque não é possível fazer formação humana sem trabalhar com raízes e
vínculos. Isto quer dizer que a escola precisa trabalhar com a memória do grupo e com
suas raízes culturais e isto quer dizer também que se deve ter uma intencionalidade
específica na resistência à imposição de padrões culturais alienígenas e no combate à
dominação cultural. Ou seja, a escola pode ajudar os educandos a perderem a vergonha
de ser da roça, a aprender a ser camponês, e a ser de movimento social, a aprender a
valorizar a história dos seus antepassados, tendo uma visão crítica sobre ela, e a
aprender do passado para saber projetar o futuro pela Contação de histórias que tenham
a memória do grupo como referência, assim como trabalhar com que expressem a cultura
camponesa e a coloquem em diálogo com outras culturas.
A educação do campo precisa aprofundar a reflexão sobre como a escola pode
ajudar a cultivar utopias, respeitando a cultura camponesa e a própria fase da vida em
que se encontram os diferentes educandos. É preciso refletir permanentemente sobre a
intencionalidade educativa da escola nesta perspectiva e olhar para os detalhes do seu
ambiente educativo e trabalhar com diferentes saberes à qual cabe uma aproximação
29
crítica, nem tanto para tentar trazer estes saberes para o seu interior, o que nem sempre
é possível sem trair sua natureza, mas para provocar a inserção dos educandos em
processos sociais capazes de produzi-los. Ao mesmo tempo, cabe à escola ajudar na
reflexão coletiva sobre esses saberes, relacionando-os entre si e potencializando-os nos
processos de socialização dos educandos, de construção de sua visão de mundo e de
suas identidades, enfim, em seu processo mais amplo de humanização ou de formação
humana.
Entende-se que a educação do campo deve incluir em seu debate político e
pedagógico a questão de que saberes são mais necessários aos sujeitos do campo e
podem contribuir na preservação e na transformação de processos culturais, de relações
de trabalho, de relações de gênero, de relações entre gerações no campo e de que
saberes podem ajudar a construir novas relações entre campo e cidade. É necessário
discutir sobre como e onde estão sendo produzidos esses diferentes saberes, qual a
tarefa específica da escola em relação a cada um deles e, também, que saberes
especificamente escolares podem ajudar na sua produção e apropriação cultural. Esta é
uma reflexão que deve continuar. A educação do campo precisa aprofundar sua reflexão
sobre que formato de escola é capaz de dar conta destas tarefas indicadas e,
especialmente, dedicar-se ao estudo de didáticas e metodologias que traduzam esta
concepção de escola e projeto político e pedagógico em cotidiano escolar. 5
5
Texto Extraído de file:///C:/Users/Colaborador/Downloads/14603-64306-1-PB.pdf
30
6 A EDUCAÇÃO DO CAMPO COMO FORMAÇÃO HUMANA PARA O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
Fonte: envolverde.cartacapital.com.br
31
de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF; Programa de Aquisição de
Alimentos - PAA; Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE; Programa Nacional
de Educação na Reforma Agrária – PRONERA; dentre outros) que apontam para a
construção de novos projetos de desenvolvimento sustentável para o país através da
valorização da agricultura familiar e da cultura sócio-político-organizativa dos
camponeses.
Em meio aos debates acerca das políticas públicas para o campo, os movimentos
sociais perceberam que a construção de novos projetos de desenvolvimento sustentável
passa pela produção de novos saberes no e sobre o campo, que impulsione a agricultura
familiar através da produção de novos conhecimentos e tecnologias associadas à
produção sustentável. Daí a importância de lutar pela construção de um projeto de
educação do campo que possa, não só levar os conhecimentos aos jovens do campo,
mas fomentar a produção de saberes específicos inerentes às formas de viver e produzir
no campo, envolvendo os aspectos sociais, políticos, culturais e econômicos.
Diante desse contexto, os movimentos sociais vêm lutando por uma educação
capaz de reconhecer as diversidades socioculturais do campo, que possibilite a
valorização dos saberes e das culturas vivenciadas pelas populações campesinas ao
longo dos tempos. Uma educação que partisse dos saberes dos povos do campo,
problematizando-os a fim de construir novos olhares críticos acerca daquela realidade e
de suas possibilidades de desenvolvimento (LIMA, 2011). Ou seja, “A ideia era reivindicar
e simultaneamente construir um modelo de educação sintonizado com as
particularidades culturais, os direitos sociais e as necessidades próprias à vida dos
camponeses” (BRASIL, 2007, p. 11). Diante dos vários debates, manifestações e
ocupações, os movimentos sociais do campo obtiveram inúmeras conquistas, dentre
elas, destaca-se a instituição das Diretrizes Operacionais da Educação Básica para as
Escolas do Campo, em 2001. Essas diretrizes fazem parte das reivindicações históricas
dos movimentos sociais do campo, portanto trazem um conjunto de preocupações
relacionadas ao:
[...] reconhecimento e valorização da diversidade dos povos do campo,
a formação diferenciada de professores, a possibilidade de diferentes
formas de organização da escola, a adequação dos conteúdos às
peculiaridades locais, o uso de práticas pedagógicas contextualizadas,
a gestão democrática, a consideração dos tempos pedagógicos
diferenciados, a promoção, através da escola, do desenvolvimento
sustentável e do acesso aos bens econômicos, sociais e culturais
(BRASIL, 2007, p. 17).
37
Uma nova matriz produtiva e tecnológica, que combine produtividade do
trabalho com sustentabilidade socioambiental, o que inclui a opção pela
agroecologia;
O princípio da cooperação, em lugar da exploração, para organizar a
produção;
A mudança da matriz energética;
O avanço na organização política, econômica e comunitária dos
camponeses e pequenos agricultores.
38
Além disso, o estudo realizado pela INCRA/FAO demonstra que o simples acesso
à terra, somado a um apoio governamental mínimo, permite aos agricultores familiares
obterem um nível de vida muito superior aos trabalhadores assalariados do campo ou
cidade, tanto em termos de superação da pobreza rural como a situação de emprego
(INCRA/FAO, 1996). Entretanto, apesar dessas contribuições, a agricultura familiar
nunca foi prioridade no contexto das políticas de investimento no campo. No Plano Safra
2009/2010 foram destinados R$ 93 bilhões para o agronegócio e semente, além de 15
bilhões para a agricultura camponesa. Apesar do Censo Agropecuário de 1996
demonstrar que do total de 4.859.864 estabelecimentos rurais existentes no Brasil,
85,17% são estabelecimentos familiares.
Outro grande desafio referente à agricultura está relacionado ao acesso à terra,
pois apesar dos agricultores familiares representarem mais de 85% dos estabelecimentos
rurais, ocupam apenas 30,49% da área total (INCRA/FAO, 2000). Além disso, os
agricultores familiares convivem com a ausência de políticas de assessoria técnica para
o desenvolvimento de novos saberes e tecnologias que impulsionem os processos de
produção sem a utilização de agrotóxicos e a destruição do meio ambiente. Faltam-lhes
novos conhecimentos e tecnologias que permitam ampliar a produção sem destruir o
meio ambiente e as tradições culturais. É nesse contexto da produção de novos saberes
e tecnologias associado aos processos produtivos da agricultura familiar que a educação
do campo dará a sua maior contribuição, despertando nos jovens do campo a capacidade
de pensar o seu contexto como espaço viável no campo econômico, social e cultural.
39
vida das pessoas das classes populares e na biodiversidade do planeta, pois como
defende Duarte e Grigolo (2006, p. 109)
As propagandas levam a imaginar sempre uma vida melhor na cidade. Mas a
maioria recebe o salário e não tem para pagar as contas e ainda tem que gastar com a
imagem (moda) para ser reconhecido. [...] A pressão sobre o jovem no interior quanto à
imagem e à moda também existe, mas é menor. É preciso ter um olhar diferente sobre a
cidade na relação com o campo para melhor compreender a realidade. Não é só porque
é da cidade que é ruim e não é porque é do campo que é bom. Precisamos de um olhar
que mostre as contradições, tanto da cidade quanto do campo. No campo é difícil ter um
projeto claro, assumido, decidido. Parece que ao sair do campo superam-se os
problemas, como se na cidade não houvesse a mesma sociedade excludente, capitalista.
Cidade e campo precisam repensar-se, porque hoje são controlados pelas empresas que
definem o padrão de vida e de pensamento (DUARTE; GRIGOLO, 2006, p. 109).
Precisamos fazer um debate sobre o desenvolvimento sustentável que rompa com
essa dicotomia entre campo e cidade e apresente novas possibilidades de articulação
entre esses dois espaços enquanto complementares e interdependentes. Ambos
dependem um do outro para desenvolver-se e oferecer melhores condições de vida à
população. Nessa perspectiva, os desafios colocados às escolas do campo demonstram
que o campo e a cidade são espaços diferentes, com suas especificidades e
singularidades além dos seus problemas e contradições. É importante perceber que
ambos passam por profundas transformações que criam cada vez mais laços de
interligações e complementaridades. Além disso, precisamos demonstrar aos jovens que,
a partir do avanço tecnológico, inúmeras transformações estão ocorrendo nesses
espaços. E o campo não é mais aquele lugar subdesenvolvido e atrasado, já que a
população tem acesso às novas tecnologias e aos novos conhecimentos que permitem
o desenvolvimento de novas estratégias de produção cultural e econômica. Como
também a cidade não se enquadra mais naquele discurso de modernidade e
desenvolvimento, pois boa parte de sua população convive com inúmeros problemas
sociais relacionados com a insegurança, o desemprego, a falta de transporte, escolas,
dentre outros. Nesse caso, campo e cidade buscam através desse reencontro soluções
complementares para os seus problemas.
40
Fonte: google.com.br
Atualmente, convivemos com grupos que estão na cidade e querem voltar para o
campo reconstruindo suas vidas a partir de práticas saudáveis e sustentáveis, temos
também pessoas que buscam a cidade para a realização de sonhos profissionais, entre
outras opções. Dessa forma, acreditamos que o papel da educação do campo não é
impor aos alunos modelos ou projetos de vida, mas conscientizá-los das diferenças,
contradições e possibilidades que esses espaços oferecem para eles terem a opção de
fazer suas escolhas de forma madura e consciente. Além disso, a escola precisa oferecer
aos alunos conhecimentos e tecnologias, permitindo-os reinventar as formas de viver e
produzir no campo, garantido sustentabilidade e qualidade de vida.
A educação do campo comprometida com a construção de novas alternativas de
desenvolvimento sustentável deve criar projetos educativos que permitam a valorização
dos saberes socioculturais dos camponeses e a reflexão crítica acerca das
potencialidades e dos problemas vivenciados no campo, favorecendo a construção de
um olhar crítico acerca dos desafios e das possibilidades existentes na perspectiva do
desenvolvimento sustentável e solidário. Somente através do reconhecimento de seus
potenciais, enquanto protagonistas das políticas de desenvolvimento rural, os
camponeses poderão ampliar seus processos organizativos e buscar as condições para
a implementação de novas políticas e práticas voltadas à sustentabilidade do campo. Daí
a importância da parceria entre as escolas do campo, os movimentos sociais e as
instituições de assessoria técnica e extensão rural, pois através dessa articulação será
41
possível pensar práticas formativas associadas aos projetos de desenvolvimento local
que de fato promovam mudanças significativas nas comunidades rurais.
Como dizia Freire (1997), se a educação não é capaz de permitir a transformação
da realidade, sem ele torna-se ainda mais difícil as transformações ocorrerem. Neste
caso, a escola pode se colocar na condição de mobilizadora de conhecimentos,
tecnologias e saberes que fomentem processos organizativos e políticos voltados para a
articulação de novas parcerias entre os grupos e as organizações sociais com a finalidade
de promover o desenvolvimento sustentável. O conhecimento das potencialidades locais
e das possibilidades de desenvolvimento é uma das principais atividades a serem
explanadas pela escola comprometida com a sustentabilidade no meio rural. Ou seja, a
construção de projetos de desenvolvimento sustentável passa pelo trabalho de
reconhecimento dos aspectos socioculturais, ambientais e econômicos das comunidades
para que, através desse processo, se visualize os caminhos que serão trilhados na área
da formação e implementação das práticas de intervenção que possibilitará a gestão das
políticas de sustentabilidade. No entanto, esse não pode ser um processo autoritário e
impositivo, porque um dos princípios básicos da sustentabilidade é a construção coletiva
dos processos formativos e de intervenção.
Nesse aspecto, a sustentabilidade se constitui a partir dos sonhos, dos desejos
coletivos e através do reconhecimento e da potencialização das riquezas culturais,
sociais e ambientais dos grupos. Não há desenvolvimento sustentável se as atividades e
projetos não estiverem em sintonia com os processos organizativos e culturais das
pessoas. É importante a educação do campo ser construída enquanto prática social
alimentada pelos sonhos e desejos coletivos, além de ser um reflexo dos interesses dos
grupos sociais que atuam no contexto da escola. Logo a escola não está para determinar
os sonhos e projetos das pessoas, mas para contribuir na construção de saberes que
permitam a concretização dos sonhos e projetos coletivos.
Constitui-se numa ferramenta imprescindível na democratização de conhecimento
e tecnologias que auxiliarão as pessoas na compreensão do mundo e na produção de
novas perspectivas de vida. Nesse sentido, as diferentes áreas do conhecimento
trabalhadas nas escolas oferecerão aos jovens a possibilidade de produzir novos
conhecimentos que permitam desenvolver um olhar multidisciplinar sobre a realidade do
campo, compreendendo-o em sua complexidade e singularidade, consentindo a
produção de projetos que superem a lógica fragmentada que muitas vezes se
contrapunha aos princípios da sustentabilidade. A educação para o desenvolvimento
sustentável deve ser construída a partir dos saberes locais, tendo a realidade
sociocultural, ambiental e produtiva como ponto de partida e de chegada dos processos
educativos. Assim, o trabalho pedagógico necessita estar associado às práticas culturais
desenvolvidas pelos camponeses.
42
Desse modo, no ensino com pesquisa, os alunos serão desafiados a pesquisarem
e refletirem sobre as dinâmicas organizativas e produtivas da comunidade, identificando
os elementos que precisam de uma reflexão coletiva aprofundada na perspectiva de
redefinir práticas e ações, buscando assim o caminho para a sustentabilidade econômica,
socioambiental e cultural. Sendo assim, as práticas educativas construídas a partir dos
princípios da sustentabilidade devem articular-se a partir das seguintes dimensões:
A partir do trabalho com estas dimensões, as escolas irão fomentar nos jovens do
campo um olhar crítico acerca das alternativas de desenvolvimento e das possibilidades
de reinvenção dos processos organizativos e políticos, visando a conquista de políticas
públicas que deem conta das necessidades da comunidade no contexto da produção da
sustentabilidade. Entretanto, diante desse contexto, precisamos de uma escola do campo
que se constitua a partir dos princípios democráticos. Uma escola construída pelos
sujeitos do campo, que contemple nos projetos de formação os interesses, os sonhos e
as necessidades formativas dos grupos sociais do campo. Aberta aos saberes
socioculturais e à participação de todos os camponeses com suas diferenças e
singularidades.
Assim, as instituições de ensino situadas no contexto do campo devem adotar
práticas políticas e pedagógicas voltadas à mobilização e problematização da
comunidade, despertando-a para a construção de caminhos que possibilite a solução dos
problemas sociais e, consequentemente a consolidação das políticas de
sustentabilidade. Para tanto, as práticas educativas desenvolvidas no campo devem
reconhecer e despertar os camponeses para o exercício da cidadania. Além disso,
precisa conscientizá-los da importância da organização comunitária na construção das
43
alternativas de desenvolvimento e na conquista de políticas públicas voltadas para a
sustentabilidade no campo.
É notório o crescimento do debate sobre o desenvolvimento sustentável nos
últimos anos, envolvendo os mais variados setores da sociedade. No entanto, esse
debate não é linear nem homogêneo, mas se consolida a partir de bases conceituais e
interesses difusos e plurais. Até mesmo entre os movimentos sociais e setores mais
progressistas que atuam em defesa das políticas públicas do campo não há um consenso
em torno dos princípios e concepções acerca do projeto de desenvolvimento sustentável.
Dessa forma, a compreensão acerca dos princípios que norteiam as discussões sobre o
desenvolvimento e a sustentabilidade torna-se um dos desafios aos professores e às
escolas. Uma vez que o debate sobre a sustentabilidade nas escolas não pode limitar-se
às oficinas de materiais reciclados, aos estudos desenvolvidos nos livros didáticos, aos
projetos pontuais de reflorestamento e hortas escolares. Deve envolver discussões mais
amplas e profundas acerca do modelo de vida constituído pelos sujeitos do campo.
Diante da complexidade do tema, o debate sobre a sustentabilidade deve nortear
o projeto político pedagógico da escola, norteando todo o seu fazer educativo, pois tem
uma relação direta com o modelo de sociedade que se deseja construir e o perfil de
sujeito que se deseja formar. Passa pelos princípios políticos e filosóficos que norteiam
o currículo e, principalmente pelo processo de seleção dos conteúdos. Nessa
perspectiva, pensar um projeto educativo comprometido com o desenvolvimento
sustentável exige o enfrentamento de alguns desafios:
6
Texto Extraído de
http://www.educacaonosemiarido.xpg.com.br/Educa%C3%A7%C3%A3o%20do%20campo%20e%20desenvo
lvimento%20sustent%C3%A1vel.pdf
45
7 POLÍTICA E CIDADANIA NO CAMPO
47
formada. O método mais satisfatório de financiar essas empresas não
é através de empréstimos em quantia fixa, mas através de investimento
no capital social de ‘compra’ de ações na empresa com recebimento,
como retorno, de uma parte dos lucros. (FRIEDMAN, 1980. In.:
BIANCHETTI, 2005: p. 100).
48
Foi a negação da escolarização nacional, da cultura, do hábit, do
trabalho e dos valores da sociedade. Foi a cristalização de uma relação
de dependência e subordinação que, historicamente, vinha
acontecendo desde o período colonial. A concretização desses
impasses aconteceu por ocasião da promulgação da Lei 4.024, em
dezembro de 1961. (LEITE, 1999: p. 38).
49
7.2 Cidadania e Educação do Campo: o “público” político dos movimentos
sociais
A partir da década de 1990 em diante foi se criando aos poucos grupos de reflexão
acerca da problemática da escola rural, da escola do campo e no campo. Sabe-se que
desde os anos 1960, com a Educação Popular, tiveram-se alguns avanços na busca por
uma melhor conscientização política a respeito da educação oferecida aos trabalhadores
rurais. Por isso, precisa-se entender que os movimentos sociais do campo tiveram uma
grande importância neste cenário. Em toda e qualquer sociedade humana histórica
sempre se teve processos contra hegemônicos que resistem a determinadas imposições
por parte da classe dominante. A partir da década de 1990 começou-se a se pensar numa
resistência concretamente constituída por meio de debates, conferências e fóruns que
viessem ser um espaço da sociedade civil em estar trocando experiências e buscando
novas alternativas para os problemas mais agravantes do meio rural e a educação a ela
inserida.
Alguns movimentos sociais e organizações não-governamentais (ONGs) estão
rompendo com a visão unilateral construída ao longo desses 500 anos. Nos movimentos
de resistência cultural os camponeses/as assumem uma outra dimensão. Tornam-se
sujeitos históricos de uma nova ordem que se baseia em três princípios básicos: a
solidariedade, a partilha e a luta. Tais movimentos ainda sobrevivem diante da avalanche
de questionamentos realizados pela mídia e pelo marketing governamental a fim de
desqualificá-los. O Encontro Nacional dos Educadores/as da Reforma Agrária (ENERAs)
foi o primeiro espaço constituído pelos movimentos sociais e sindicais do campo como:
MST, CONTAG, CPT e outros. Estes encontros sempre foram apoiados por ONGs e por
organismos ligados a Igreja Católica (CNBB) e organizações ligadas a ONU como é o
caso da FAO, UNESCO e UNICEF.
Com os encontros foi formada uma equipe de articulação nacional que envolveu
os vários setores das entidades ligadas à luta pela Reforma Agrária que, também,
pensassem uma Conferência onde as discussões gerariam em torno da educação do
campo (NASCIMENTO, 2002). Surge assim, a Articulação Nacional Por Uma Educação
Básica do Campo, tendo como entidades promotoras a CNBB, o MST, a UNICEF, a
UNESCO e a UnB através do Grupo de Trabalho e Apoio à Reforma Agrária (GTRA).
Realizou-se em 1998, a I Conferência Nacional Por uma Educação Básica do Campo, na
cidade de Luziânia – GO. Muitas experiências alternativas foram sendo descobertas e
trazidas a público, principalmente, a partir deste espaço de debates. As experiências do
MAB (Movimento dos Atingidos pelas Barragens), do próprio MST com as escolas de
assentamentos e as escolas itinerantes que se fazem presente nos acampamentos, do
50
MOC (Movimento de Organização Comunitária) presentes na Bahia, o MEB (Movimento
de Educação de Base) importante na década de 1960 e 1970 e, hoje, continua
desenvolvendo atividades junto aos povos da floresta e no sertão nordestino com a
proposta de alfabetização de adultos tanto no Norte e Nordeste brasileiro. Enfim, os
próprios movimentos sociais e sindicais do campo que lutam pela posse da terra
constroem processos permanentes de educação popular e não-formal por meio de
encontros, conferências, debates, fóruns, marchas, romarias e cursos de capacitação
para os camponeses/as. Comprova-se assim, um processo contra hegemônico, um
sistema vivo que se faz presente nas comunidades.
Por um lado, sabe-se que de uns tempos para cá houve um enorme refluxo destas
práticas educativas, por outro, percebe-se o ressurgimento de movimentos sociais do
campo que estão construindo a história, a memória e a educação a partir das
experiências de lutas e a partir da conscientização como ato de libertação desse cativeiro
imposto pela hegemonia neoliberal que apresenta o deus mercado como única via, única
alternativa. Por isso, pensar a educação do campo significa assumir três compromissos
básicos: um compromisso ético/moral com a pessoa humana desumanizada
historicamente; um compromisso com a intervenção social e educar, neste sentido,
significa intervir para transformar as realidades de exclusão pedagógicas tão frequentes
nos municípios e estados da federação; e, por último, um compromisso com a cultura
camponesa em suas diversas facetas, seja para resgatá-la, seja para recriá-la, bem
como, para conservá-la.
A Educação Básica do Campo não pode ser vista sem a participação do
movimento social existente no campo. É a partir das pedagogias, dentre elas, a
Pedagogia da Alternância, construídas pelo movimento que se compreenderá o
fenômeno educativo camponês. As pedagogias dos gestos, do fazer, da construção
coletiva falam mais do que qualquer teoria pedagógica pensada pelo cientificismo das
estruturas educacionais. A característica do movimento social é exatamente falar pelos
gestos, ou seja, falar por meio da linguagem, das palavras, dos rituais, da mística. Isto
pode ser percebido claramente nos encontros e nas ações coletivas.
Para Arroyo (1999: p. 09):
53
Fonte: dsvc.com.br
54
7.5 Programa Saberes da Terra: a política do Governo Lula
Fonte: portalcgrn.com
55
A organização curricular do Pro Jovem Campo – Saberes da Terra está
fundamentada no eixo articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade. Este eixo
amplia suas dimensões de atuação na formação do jovem agricultor por meio dos
seguintes eixos temáticos:
Fonte: seminarioprocampo2014.blogspot.com
58
Fonte: conselhodeumbrasileiro.blogspot.com
7
Texto Extraído de file:///C:/Users/Colaborador/Downloads/3450-12685-1-PB.pdf
60
8 IGUALDADE E DIVERSIDADE NA EDUCAÇÃO DO CAMPO
61
Em função disso, ao tratar da identidade da escola do campo, as citadas diretrizes
contemplam o diverso sem descurar da perspectiva nacional, assegurando a unidade
mediante práticas, valores e discursos que enraízam o direito à igualdade, no seu
cotidiano. A propósito, transcrevemos alguns artigos da resolução que surgem de uma
crítica contundente às análises que procuram identificar problemas e sugerir soluções,
supondo incorretamente a homogeneização do espaço nacional e, portanto,
desconhecendo nos termos do pensamento de Dagnani (1994) que a afirmação da
diferença está vinculada à reivindicação do direito de que ela possa existir como tal, do
direito de que ela possa ser vivida sem que isso signifique o tratamento desigual, a
discriminação.
Art. 2°(...) Parágrafo único. A identidade da escola do campo é definida pela sua
vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e
saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de
ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de
projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da
vida coletiva do país.
Art. 3°. O Poder Público, considerando a magnitude da importância da
educação escolar para o exercício da cidadania plena e para o
desenvolvimento de um país cujo paradigma tenha como referências a
justiça social, a solidariedade e o diálogo entre todos, independentemente
de sua inserção em áreas urbanas ou rurais, deverá garantir a
universalização do acesso da população do campo à Educação Básica e à
Educação Profissional de Nível Médio.
Art. 4°. O projeto institucional das escolas do campo, expressão do trabalho
compartilhado de todos os setores comprometidos com a universalização
da educação escolar com qualidade social, constituir-se-á espaço público
de investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para
o mundo do trabalho, bem como para o desenvolvimento social,
economicamente justo e ecologicamente sustentável.
(...) Art. 10. O projeto institucional das escolas do campo, considerado o
estabelecido no artigo 14 da LDBEN, garantirá a gestão democrática,
constituindo mecanismos que possibilitem estabelecer relações entre a
escola, a comunidade local, os movimentos sociais, os órgãos normativos
dos sistemas de ensino e os demais setores da sociedade.
Como se vê, a diversidade é fundamento básico de uma política pública de
educação do campo que tem como pretensão maior assegurar a mais ampla condição
de igualdade e bem-estar coletivo. Isto pressupõe homens e mulheres que, independente
de geração, etnia, raça, e gênero, entre outros, são sujeitos de iniciativas em defesa da
62
humanização de todos e, portanto, capazes de submeter seus interesses individuais aos
que são constitutivos do bem comum. Neste particular, cabe destacar o artigo 2° da
LDBEN (1996) quando estabelece a inspiração da educação nacional no princípio da
liberdade e nos ideais da solidariedade humana e coloca a sua finalidade no pleno
desenvolvimento do educando.
Assim procedendo, estimula vínculos e indica como eixo do projeto educativo, a
emancipação do isolamento que é próprio de um mundo de estranhos, remetendo
diretamente ao processo permanente de aprendizagem que advém do protagonismo
exercido no interior das lutas sociais pelos direitos. Sobre isto, Chauí (2001) registra que
a liberdade é a consciência simultânea das circunstâncias existentes e das ações, que
suscitadas por tais circunstâncias nos permitem ultrapassá-las. Quanto ao direito,
reafirma que é geral e universal, válido para todos os indivíduos, grupos e classes sociais
e sua instituição, na sociedade democrática, é dada pela abertura do campo social à
criação de direitos reais, à ampliação de direitos existentes e à criação de novos direitos.
Nesta perspectiva, todos são convocados à vida enquanto um território de
possibilidades de criação e recriação de novos e surpreendentes elementos para a
existência da humanidade, admitindo-se a provisoriedade da verdade e a reafirmação do
vínculo entre a história e o direito a ter direitos. Neste caso, fala-se da história que não
se repete nem tampouco é pré-determinada. O amanhã é sempre novo e o presente, ao
valorizar a liberdade, requer escolhas e aponta futuros que emergem da capacidade de
invenção e reinvenção que mobiliza a humanidade. Efetivadas as escolhas, o futuro, sem
sombra de dúvida, passa a ser a esperança do presente que se viabiliza a partir da
superação das condições de existência e que, embora não tenham sido necessariamente
criadas por cada um, no seu interior que se processam e conduzem as transformações
do universo.
Esta é a inspiração acolhida pelos movimentos sociais do campo quando fazem o
registro de que a educação na perspectiva dos direitos humanos é essencialmente
solidária, é um direito humano em si e, ao mesmo tempo, base para a realização de
outros direitos. Neste particular, propugnam uma sociedade aberta ao diverso e ao novo
nos termos das proposições que constam das declarações finais das Conferências
Nacionais de Educação do Campo e, mais recentemente, das estaduais, todas assinadas
por um conjunto de entidades articuladas em torno da garantia da educação do campo
sob a ótica do direito. Observe-se, por exemplo, que as proposições presentes no texto
da Declaração Final da II Conferência Nacional de Educação do Campo CNEC/04,
denunciam a grave situação educacional vivida pela população camponesa, evidenciam
o respeito à diversidade e insistem no esforço de construir a unidade necessária à luta
social que se contrapõe a um modelo de desenvolvimento baseado na concentração de
privilégios e na exclusão da maioria dos brasileiros. Além disso, pautam a educação do
63
campo na agenda política do país, definindo seus protagonistas e formulando
concepções de campo, desenvolvimento, educação e de política pública que fortalecem
os sujeitos coletivos e movimentos sociais.
A nossa caminhada se enraíza nos anos 60 do século passado, quando
movimentos sociais, sindicais e algumas pastorais passaram a desempenhar papel
determinante na formação política de lideranças do campo e na luta pela reivindicação
de direitos (...) (p.3) Respeitando a diversidade dos sujeitos que aqui representamos e,
ao mesmo tempo, construindo a unidade necessária para a tarefa que nos colocamos,
queremos aqui reafirmar o nosso compromisso coletivo com uma visão de campo, de
educação e de política pública (p.6). (...) Defendemos um tratamento específico da
educação do campo com dois argumentos básicos: - a importância da inclusão da
população do campo na política educacional brasileira, como condição de construção de
um projeto de educação, vinculado a um projeto de desenvolvimento nacional, soberano
e justo; na situação atual está inclusão somente poderá ser garantida através de uma
política pública específica de acesso e permanência e do projeto político pedagógico; - a
diversidade dos processos produtivos e culturais que são formadores dos sujeitos
humanos e sociais do campo que precisam ser compreendidos e considerados na
construção do projeto de educação do campo. (...) (p.8).
É por este caminho que se encontra a afinidade entre o que estabelece o artigo 1°
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e as decisões a respeito dos espaços
de realização das ações educativas, agora definidos para além da chamada educação
doméstica e das instituições que integram os sistemas de ensino, nos seguintes termos:
Art.1°. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem
na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de
ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade
civil e nas manifestações culturais.
Isto posto, há que se atentar para uma política pública que propicie as mudanças
necessárias no quadro de atendimento escolar brasileiro, em especial, a superação das
desigualdades constatadas quando comparamos o perfil de escolarização da população
tomando como referência a sua residência no campo e na cidade. No primeiro, o
atendimento escolar na educação infantil e no ensino médio são insignificantes, acrescido
dos problemas decorrentes da ausência de condições de trabalho dos docentes, altos
índices de analfabetismo de jovens e adultos, baixos níveis de aprendizagem e
significativa taxa de distorção idade-série. A ausência de políticas públicas para
implementar a educação do campo como direito humano é evidente.
64
Fonte: redebrasilatual.com.br
8
Texto Extraído em
http://www.contag.org.br/imagens/f298Educacao_como_%20Direito_Edla%20Soares.pdf
65
9 A QUESTÃO AGRÁRIA E A EDUCAÇÃO DO CAMPO
Fonte: novaescola.org.br
66
É de comum acordo nos debates da corrente hegemônica que a posse o uso do
território nesse contexto era coletivo e que se vivia no comunismo primitivo. Sobre o
período que vai de 1500 d.C. a 1850 d.C. existem, segundo Stédile (2005), teses e
registros históricos de que missões de outros povos, seja dos fenícios, dos árabes, dos
africanos e até mesmo de europeus, que chegaram ao nosso continente antes de 1500,
informações para além do registro oficial da descoberta e empoderamento realizado por
Cristóvão Colombo, em 1492. Com a invasão europeia e com a dominação e aculturação
dos povos originais os bens naturais aqui presentes foram submetidos à lógica e às leis
do capitalismo mercantil (período histórico já dominante na Europa), bem como a força
de trabalho se tornou a escrava. Todos os bens foram transformados em mercadoria e
enviados à metrópole, em pouco tempo os europeus perceberam que a alta fertilidade de
nossas terras era a principal fonte de exploração de produtos que antes eram obtidos em
territórios que não estavam sob seu domínio e pelos quais pagavam-se altos valores; 2
surgiram então os ciclos de exploração da cana de açúcar, do algodão, do gado, do café,
da pimenta do reino e do cacau, inundando o mercado europeu através de um modelo
agroexportador.
Quanto à organização da produção, para Stédile (2005), apesar das polêmicas
sobre o assunto, existe um consenso de que o modelo adotado para organizar as
unidades de produção agrícola foi o da plantation, que se caracteriza pela organização
da produção agrícola em grandes fazendas de áreas contínuas, priorizando as
monoculturas como as citadas acimas e de boa localização no território para facilitar a
exportação pelos portos. Apesar da utilização da mão de obra escrava, em termos de
tecnologia os engenhos utilizavam o que havia me mais avançado para aumentar a
produção/lucros e diminuir os custos; a propriedade da terra era da Monarquia e
gerenciada pela coroa, o que não caracterizava a propriedade da terra como capitalista,
pois não havia propriedade privada. Para Stédile (2005) a relação desse sistema com o
capitalismo residia no modelo agroexportador que para estimular o investimento do
capital na produção das mercadorias, concedeu o uso de enormes extensões de terra
para a produção de mercadorias para exportação.
Para o autor, a “concessão de uso” era dada por direito hereditário, sendo que os
herdeiros do fazendeiro poderiam continuar com a posse das terras e com a sua
exploração, ao mesmo tempo não lhes era garantido o direito de vender as terras, ou
mesmo de comprar terras vizinhas, em suma não havia propriedade privada das terras e
as terras ainda não eram mercadorias (Stédile, 2005). Podemos notadamente afirmar
como demonstra Stédile (2005), que a adoção do modelo agroexportador sob a lógica da
plantation foi um genocídio do povo brasileiro, o autor mostra que em 1500 existiam
aproximadamente 5 milhões de pessoas em nosso território, ou seja, um grande
massacre da população indígena, da população negra trazida da África, pelo colonizador
67
europeu. Devido às pressões inglesas para a substituição do trabalho escravo por
trabalho assalariado e com a abolição da escravidão, surge em 1850 a primeira lei de
terras no país que garantia a propriedade privada, não permitindo que os negros libertos
se apossassem das mesmas, nem que se tornassem pequenos camponeses, pois para
a compra de propriedades no Brasil era necessário que se pagasse uma parcela para a
coroa.
Essa conjuntura refletia a crise do trabalho escravo e inaugurava o período que
vai de 1850 a 1930, no qual os escravos continuaram sob o domínio dos fazendeiros só
que agora como assalariados. Após a promulgação da Lei Áurea de 1888 estima-se que
quase dois milhões de ex-escravos (Stédile, 2005) abandonaram o trabalho agrícola e
migraram 3 para as cidades em busca de alternativas para vender a força de trabalho,
ao mesmo tempo que buscavam territórios nas cidades, os ex-escravos eram proibidos
pela lei de terras de se apossarem de terrenos que já eram propriedade privada dos
capitalistas, surgindo assim, as primeiras favelas presentes nas grandes cidades e suas
comunidades. Como estratégia para repor a mão de obra escrava, as elites realizaram
uma forte propaganda na Europa no período de 1875 a 1914 atraindo cerca de 1,6
milhões de camponeses renegados pelo avanço do capitalismo para o trabalho agrícola
das grandes propriedades, para Stédile (2005) o número de imigrantes europeus coincide
com as últimas estatísticas de trabalhadores escravizados. Parte desses imigrantes
foram para a região sul do país e outra parte para São Paulo e Rio de Janeiro,
estabelecendo o regime de produção sob a forma de colonato, no qual recebiam as
lavouras de café prontas, casa, direito de moradia e direito de plantar outros produtos
para sua subsistência, recebendo o pagamento em forma de café que poderia ser
vendido.
Fonte: redebrasilatual.com.br/
68
O campesinato brasileiro teve então sua origem em duas formações, a primeira
mencionada acima, inseriu milhares de camponeses pobres europeus no trabalho
agrícola nas regiões Sudeste e Sul, já a segunda formação é relativa à miscigenação das
populações branca, indígena, e negra presentes no processo de colonização. A crise do
modelo agroexportador e a migração de camponeses europeus seguiu até a primeira
guerra mundial, e foi nesse contexto que surgiu o campesinato brasileiro. No período
subsequente ocorreram mudanças significativas para a questão agrária no Brasil, a crise
da República Velha havia se prolongado ao longo da década de 1920, os seus expoentes
políticos vinham perdendo força com a mobilização do trabalhador industrial e com as
dissidências políticas que enfraqueceram as grandes oligarquias. Esses acontecimentos
ameaçaram a estabilidade da tradicional aliança rural entre os estados de São Paulo e
Minas Gerais (a política do café com leite) e no ano de 1930 setores da elite da nascente
burguesia industrial fizeram uma "revolução" política provocando a queda da republica
velha e tomando o poder da oligarquia rural exportadora e impondo um novo modelo
econômico para o país.
69
Fonte: slideplayer.com.br
70
populacional das áreas rurais e a possível oposição à movimentação progressista urbana
(Maia, 1982).
Essa corrente permaneceu até a década de 1930 ainda fortemente ligada às
origens coloniais e somente após as transformações mais profundas do modelo
agroexportador é que a educação no Brasil deu alguns sinais de mudanças. Frente as
forças liberais da década de 1930 algumas mudanças são incorporadas na sociedade
brasileira seguindo os moldes do estado de bem-estar social, onde o estado é o promotor
da vida social e organizador da economia, implementando a noção de direitos e
participação da população. Essas mudanças estão fortemente presentes na constituição
de 1934 e foram “incrementadas” de forma nacionalista no período Vargas, reforçando a
consolidação de um processo de industrialização de base, possibilitando o equilíbrio
social e sustentando a condução do Estado Novo.
Nesse contexto a escolarização ganha nova função, passa a ser suporte para a
industrialização, mas não tem olhares voltados para o processo de educação rural, ainda
está ligada ao desenvolvimento de sujeitos para o trabalho urbano (capacitação
profissional) e sujeitos que permaneçam no campo, ou seja, ainda era de caráter ruralista
pedagógica. Apesar da pouca atenção para a educação rural nesse período existem dois
momentos marcantes, foi criada em 1937 a Sociedade Brasileira de Educação Rural que
tinha como meta a preservação da cultura, da arte e do folclore rural e em 1942 durante
o VIII Congresso Brasileiro de Educação, foram reforçadas as tendências ruralistas
pedagógicas e as tendências nacionalistas-burguesas do Estado Novo. Com o fim da II
Guerra e do Estado Novo e com surgimento da tendência de redemocratização,
solidificou-se ainda mais a influência da política externa norte americana e criou-se no
Brasil a CBAR – Comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais
que tinha como programa a implantação de projetos na zona rural brasileira para o
desenvolvimento de comunidades camponesas, trazendo através de centros de ensino,
conhecimentos técnicos aos camponeses, criando conselhos, clubes e representações
camponesas. Esse tipo de ação tinha por finalidade organizar o campesinato brasileiro
de acordo com os padrões norte-americanos - nesse caso o padrão Farmer - no 6 qual
os camponeses passariam a produzir em grandes propriedades voltadas para a
exportação.
O governo brasileiro possuía fortes alianças com os Estados Unidos,
emblematicamente representadas pela Inter American Foundation Inc. que propunha a
criação de missões rurais, que segundo Ammann (1991) funcionavam como missões que
realizavam o adestramento de brasileiros naquele país e pela Associação de Crédito e
Assistência Rural (ACAR) a qual se transformou em EMATER após alguns anos, famosa
pelos programas de extensão rural. Observamos que a criação do novo modelo
econômico brasileiro ocorreu necessariamente segundo as coordenações políticas e
71
influencias intelectuais do modelo norte-americano, ligadas ao ideal de bem-estar social
e desenvolvimento assegurados pelo Estado, com o propósito de ensinar a “ajudar” as
famílias camponesas a “ajudarem” a si mesmas usando tecnologia para conseguir uma
maior produtividade e atingirem os padrões de bem-estar, incorporando
consequentemente o modelo liberal no Brasil.
A extensão rural tinha como princípio o combate à carência, às doenças, à
subnutrição e à ignorância dos classificados como desprovidos de valores, trabalho e de
integração à sociedade, assistindo e protegendo a população rural. Ampliar e melhorar
as condições de vida do campo é uma questão política e ideológica na medida em que
ela silencia as possíveis forças camponesas revolucionárias que nesse contexto
poderiam se rebelar frente ao imperialismo no Brasil. A partir dos anos 1950 crescem no
Brasil as atividades educacionais voltadas para a população rural, temos a Campanha
Nacional de Educação Rural (CNER) e o Serviço Social Rural (SSR) que continuam
seguindo o modelo extensionista visando construir um desenvolvimento comunitário no
campo e desconsiderando as contradições naturais dos grupos campesinos.
Para Leite (1999) apesar dos esforços dessas organizações para manter o homem
no campo, intensificaram-se os fluxos migratórios para as grandes cidades nos anos
subsequentes. Com a criação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nos
anos 1960, reforçou-se ainda mais as contradições da educação no Brasil, para Freitag
(1980) apesar da lei possuir elementos populistas ela não deixava seu caráter elitista de
lado e explicitava claramente a relação de dependência e subordina 7 populares que se
organizavam e se solidificavam enquanto grupos que lutavam por seus interesses. Em
todos os momentos em que surgia na sociedade brasileira uma nova força resistente no
campo ou na cidade, em contraposição, era criado e executado mais um programa norte
americano; nesse momento criou-se a Aliança para o Progresso que tinha como objetivo
reajustar a estrutura econômica da américa latina através de um programa assistencial
que não modificava nem um pouco a relação de dependência em relação aos Estados
Unidos.
O programa servia como ferramenta de controle para que o presidente norte
americano em exercício John F. Kennedy, conseguisse manter o nível de bem-estar
social no país e diminuísse as possíveis contradições sociais que impulsionavam as
ideologias comunistas. Nesse momento criou-se as superintendências para o
desenvolvimento do Nordeste e do Sul, SUDENE, SUDESUL, INBRA, INDA e o INCRA
e outros subprogramas que estavam preocupados com o desenvolvimento territorial das
áreas agrícolas, trabalhando questões políticas (como a educação e a organização de
camponeses) e questões econômicas (como o aumento da produção) que
fundamentalmente serviam para controlar os movimentos migratórios e as rebeliões
camponesas. A partir dos anos 1960 consolida-se então no Brasil uma agricultura
72
capitalista moderna e um setor camponês completamente subordinado aos interesses do
capital industrial. Esse período é marcado pelo caráter monopolista ou imperialista do
capital, no qual se desenvolveu de forma abrangente a tecnologia e a ciência, construindo
novos polos de concentração de renda e conhecimento, grandes indústrias ligadas a
grandes centros de estudo e pesquisa.
Com a formação de grandes conglomerados financeiros e industriais, aumentou-
se ainda mais a dependência dos países pobres através da dívida externa e o
endividamento gerado pela lógica da industrialização dependente, como mencionado
acima, para Florestan Fernandes (1973), a implantação de uma política neocolonial. Nos
anos subsequentes no Brasil temos a entrada do governo militar que solidificou ainda
mais a dependência e a aproximação brasileira ao fundo monetário internacional, temos
a agravação das ondas de migração e o desenvolvimento do milagre econômico, fatores
que coordenaram as ações voltadas para a construção do rural neste momento. A
extensão rural consolidou a sua ideologia e substituiu os professores do ensino formal no
campo, pelo técnico e pelo extensionista - subsidiados pela organização norte americana
Inter-American Foundation; esse cenário, tanto no campo quanto na cidade, demonstra
a 8 preocupação com a educação de sujeitos para minimamente operarem máquinas e
executarem tarefas técnicas para se inserirem no mercado de trabalho, retirando o
conteúdo de reflexão crítica e uma pedagogia na qual poderiam se criar sujeitos para
construir e modificar a sua sociedade.
Podemos dizer então que a nova estruturação curricular partiu das mesmas
premissas tanto para o campo quanto para a cidade, buscando educar os sujeitos para o
trabalho capitalista. A lei 5.692 elaborada pelos governos militares, conferia poderes
municipais para cuidar das escolas rurais e acentuava a profissionalização pelo ensino,
ou seja, considerava a formação de um exército de reserva para o processo produtivo
cada vez mais sofisticado e elaborado. Os movimentos sociais percebendo os problemas
da educação no Brasil buscaram outras formas de educação, utilizando-se da
metodologia de Paulo Freire o Movimento de Educação de Base (MEB) popularizou a
alfabetização de diversos sujeitos nas comunidades rurais utilizando seu próprio
repertório cultural e simbólico. Essa metodologia possuía também um forte caráter
combatente, conscientizando os sujeitos das pressões advindas do capitalismo
exploratório. Para a manutenção de um estado de bem-estar social o estado brasileiro
continuou criando programas para vincular capital, trabalho e educação.
73
Fonte: jornalistaslivres.org
74
A educação, neste quadro, foi colocada pelo governo como a “salvadora da pátria”
aquela que teria o poder de modificar a vida social brasileira, já que era vista como a
propulsora de ascensão social, mas que era enfatizada que dependia da força de vontade
de cada indivíduo. Sobre a educação durante o regime militar é claro, segundo Leite
(1999), que o sistema escolar controlado pela ideologia de caserna limitou-se aos
ensinamentos mínimos e necessários para a garantia do modelo capitalista-dependente
e dos elementos básicos de segurança nacional. No período subsequente, com o término
do regime militar, são importantes as mudanças trazidas pela LDB de 1996 para a
educação, que em partes, descolou o ensino rural do ensino urbano, tornando o
calendário escolar rural mais adequado às peculiaridades locais, climáticas, econômicas,
respeitando o sistema de ensino sem reduzir o número de horas previsto nessa lei e
favorecendo a escolaridade rural com base no tempo do plantio/colheita com as
dimensões sócio culturais do campo.
Para Leite (1999) essa nova concepção difere consubstancialmente do modelo
militar pela sua consciência ecológica, pelo seu interesse na preservação dos valores
culturais e das práxis rurais juntamente à ação política dos rurícolas. Para o autor, apesar
da legitimação através da lei de novos parâmetros para a educação rural, ainda existem
diversos problemas na escola rural até os dias de hoje, problemas que surgiram e que
permanecem desde o início do modelo urbano/industrial de educação, dentre esses
fatores estão as condições estruturais da escola no campo, a formação urbana dos
professores que não estão preparados para lidar com outras práticas culturais e
temporais, as distâncias percorridas pelos alunos para se locomoverem até as escolas,
a não participação dos rurícolas na elaboração do currículo das escolas – o que
consequentemente gera um currículo inadequado e inadaptado para essas realidades e
a ausência de recursos financeiros para a escola rural.9
9
Texto Extraído de
http://www.marilia.unesp.br/Home/Eventos/2014/jornadadeestudosagrarios/lacerra_bruno_simonetti_mir
ian.pdf
75
10 BIBLIOGRAFIA BÁSICA
HTTPS://EDUCADOR.BRASILESCOLA.UOL.COM.BR/ORIENTACOES/EDUCACAO-NO-CAMPO.HTM
ACESSO EM 07/07/2018
76
SOARES. E. EDUCAÇÃO E DIRETO: DIVERSIDADE E IGUALDADE NO CAMPO. DISPONÍVEL EM
HTTP://WWW .CONTAG.ORG.BR/IMAGENS/F298EDUCACAO_COMO_%20DIREITO_EDLA%20SOA
RES.PDF - ACESSO EM 10/07/2018
HTTP://WWW .MARILIA.UNESP.BR/HOME/EVENTOS/2014/JORNADADEESTUDOSAGRARIOS/LACERR
A _BRUNO_SIMONETTI_MIRIAN.PDF - ACESSO EM 10/07/2018.
77