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Procedimentos metodológicos na

psicologia social

Apresentação
A psicologia social estuda o ser humano em suas relações, as quais são dinâmicas e construídas
socialmente. Na atualidade, há uma diversidade metodológica a fim de compreender a
complexidade dessas relações e os seus processos subjetivos. Método e prática profissional estão
intimamente conectados, pois o método não deve ser algo apenas a ser aplicado, mas sim
praticado. Assim, os procedimentos metodológicos na psicologia social refletem também a prática
profissional.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar sobre os recursos multimetodológicos da


intervenção prática da psicologia social. Para tanto, vai aprender sobre as principais perspectivas de
estudo em psicologia social e vai identificar os métodos de pesquisa que se aproximam de cada
uma delas. Por fim, você vai contemplar as possibilidades de intervenções práticas da psicologia
social em diferentes contextos.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Analisar as principais perspectivas de pesquisa em psicologia social.


• Identificar os principais métodos de estudo da psicologia social.
• Avaliar as técnicas de intervenção da psicologia social nos contextos educacional, social e do
trabalho.
Desafio
O serviço público tem se constituído como uma das principais portas de entrada para a atuação do
psicólogo social, que pode atuar em diversas políticas públicas, como saúde, educação, assistência
social, área jurídica, entre outros.

A política de assistência social tem, entre os seus objetivos, a prevenção de situação de risco, por
meio do desenvolvimento de potencialidades e do fortalecimento de vínculos familiares e
comunitários. O trabalho social com famílias acontece mediante a atuação em equipe
interdisciplinar – com profissionais de ensino médio e superior, como do serviço social, da
pedagogia, das ciências sociais, etc.

O trabalho do psicólogo não consiste no atendimento de cunho terapêutico, mas de compreender


as demandas das famílias a fim de contribuir para o fortalecimento do desenvolvimento da
autonomia e da cidadania dos sujeitos.

Acompanhe a situação a seguir:

Diante do caso, qual é a sua sugestão para iniciar o trabalho de psicólogo social nesse Cras?
Infográfico
A psicologia social tem três perspectivas de pensamento que embasaram sua forma de estudar a
relação entre homem e sociedade. À medida que, ao longo da história, questionamentos sobre essa
relação foram surgidos, novas formas de pensar e intervir em psicologia social emergiram.

Neste Infográfico, você vai identificar a diferença de objeto de estudo, objetivo de pesquisa e
principal metodologia utilizada em cada uma das três perspectivas: psicológica, sociológica e crítica.
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Conteúdo do livro
Para a ciência, o método diz respeito ao caminho percorrido para alcançar um determinado
objetivo. Há diferentes metodologias em pesquisas que dependem de pressupostos científicos
(dedutivo e indutivo), técnicas (qualitativas e quantitativas) e instrumentais variados. Na psicologia
social não há um engessamento da escolha do método, mas se reconhece essa pluralidade de
caminhos a serem percorridos, em que é possível escolher a técnica mais adequada a partir dos
questionamentos e dos objetivos da pesquisa.

No capítulo Procedimentos metodológicos na psicologia social, base teórica desta Unidade de


Aprendizagem, você vai percorrer um caminho histórico para compreender o surgimento das três
perspectivas dentro da psicologia social: psicológica, sociológica e crítica, e vai diferenciar seus
principais questionamentos e objetos de estudo. Em seguida, você vai identificar os procedimentos
metodológicos que se aproximam de cada uma delas e entender sua relação com a prática. Por fim,
você vai aprender sobre os principais aspectos que estão relacionados à intervenção psicossocial
dentro de diferentes contextos.
PSICOLOGIA SOCIAL
Procedimentos
metodológicos na
psicologia social
Anne Voss

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

> Analisar as principais perspectivas de pesquisa em psicologia social.


> Identificar os principais métodos de estudo da psicologia social.
> Avaliar as técnicas de intervenção da psicologia social nos contextos
educacional, social e do trabalho.

Introdução
As referências metodológicas são os fundamentos para a pesquisa e para a
prática profissional. Na psicologia social, há um reconhecimento da diversidade
metodológica de pesquisa e atuação que depende do objeto de estudo e dos
objetivos que se pretendem alcançar.
Neste capítulo, em um primeiro momento você vai conhecer e diferenciar
as três perspectivas em psicologia social: psicológica, sociológica e crítica.
Essas perspectivas procuram responder aos questionamentos do homem
em sociedade a partir de objetos de estudo distintos e, portanto, utilizando
métodos de estudo e práticas que consideram mais adequadas para os seus
questionamentos.
A pluralidade do método em psicologia social permite que sua escolha
dependa dos objetivos a serem alcançados. A proposta do texto está em iden-
tificar os principais métodos utilizados por cada perspectiva e compreender as
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implicações na atuação prática da psicologia social. Por fim, serão apresentadas


possibilidades de intervenção dentro dos contextos social, educacional e do
trabalho.

Perspectivas de estudo em psicologia social


As questões teóricas e metodológicas orientam o pensamento da pesquisa
e da prática profissional. Tradicionalmente a cultura sobre os processos
metodológicos científicos tem como perspectiva a racionalidade advinda
das ciências naturais. Assim, frequentemente o entendimento de ciência é
associado a uma avaliação objetiva, com critérios rigorosos de medição e
quantificações, que busca uma ideia universalizante sobre o assunto pes-
quisado (FONSECA, 2012).
No processo de reconhecimento da psicologia enquanto ciência, houve
a separação dos estudos sobre corpo e mente, e os comportamentos e os
processos mentais eram estudados de forma fragmentada, por meio da
valorização de pesquisas e intervenções quantitativas que fossem capazes
de medir e predizer o comportamento humano (FONSECA, 2012). Dentro da
própria história da psicologia social, é possível identificar que até meados
da década de 1960 o principal método de pesquisa utilizado estava baseado
em um modelo científico-natural, com a comprovação de hipóteses em ex-
perimentos laboratoriais (ÁLVARO; GARRIDO, 2017).
Nesse momento histórico, a perspectiva denominada psicologia social
psicológica era predominante, e seu objeto de estudo se concentrava sobre
aspectos intraindividuais. Esses fenômenos eram estudados por meio da
reprodução em laboratório da vida social, em que as pessoas eram colocadas
a realizar diferentes atividades de maneira artificial, desconsiderando o papel
que as estruturas sociais exercem sobre os indivíduos. Temáticas como atitude,
obediência e percepção social foram amplamente pesquisadas e ganharam
robustez teórica (ÁLVARO; GARRIDO, 2017; FERREIRA, 2010).
No entanto, por volta de 1970, fortes críticas a esse modelo experimental
foram surgindo, em especial sobre a relevância social e a fragmentação dos
estudos experimentais laboratoriais, questionando sua neutralidade e a
ética dos pesquisadores. Nesse momento histórico de pós-guerra, outros
questionamentos sobre a vida em sociedade passaram a emergir, ganhando
relevância o contexto e os problemas sociais. Com essa “crise da psicologia
social”, o objeto de estudo da psicologia social foi alterado — e, com isso,
houve a necessidade de novos métodos para conhecê-los (ÁLVARO; GARRIDO,
2017; FONSECA, 2012).
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Dentro desse contexto, a perspectiva da psicologia social sociológica


ganha espaço — principalmente na Europa —, uma vez que o foco do estudo
está na experiência social (FERREIRA, 2010). A partir da necessidade de estudar
os fenômenos subjetivos e sua relação com a sociedade, a psicologia preci-
sava de outras formas de interpretar a realidade. Os métodos de pesquisa
qualitativos, de observação e em profundidade passaram a ter cada vez mais
relevância; entre eles, a pesquisa-ação e a pesquisa participante começaram
a ser utilizadas a fim de estudar os fenômenos relacionados aos processos
grupais e socioculturais (ÁLVARO; GARRIDO, 2017; FERREIRA, 2010).
Na América Latina, os estudos e a prática em psicologia social, por muito
tempo, utilizaram e replicaram as teorias americanas e europeias, tendo
como modelo uma ciência neutra e universal. Os estudos e intervenções eram
realizados a partir de temáticas pré-definidas e em modismos teóricos (LANE,
2009; SANDOVAL, 2009). Acontece que, dentro do contexto cultural e social na
América Latina da década de 1970, questões de estrutura social e histórica
específicas estavam sendo problematizadas, como a desigualdade social e
a ditadura militar. O sofrimento humano passou a ter outras perspectivas,
e as teorias e modelos importados não davam mais conta dessa realidade.
Então, os psicólogos começaram a se organizar a fim de buscar novas res-
postas com abordagens mais contextualizadas, adequadas à realidade de
pobreza, exclusão, opressão e mudança social (FERREIRA, 2010; LANE, 2009;
SANDOVAL, 2009).
Como consequência dessa nova perspectiva, o processo de reflexão deixa
de ser copiado e transposto e passa a ser um processo crítico da realidade.
Há um rompimento com as tradições das perspectivas psicológicas e socio-
lógicas para ter um referencial próprio baseado em uma psicologia social
crítica, comprometida com a realidade social latino-americana (FERREIRA,
2010; LANE, 2009; SANDOVAL, 2009).
O cotidiano passa ser o objeto de análise, e as elaborações teóricas passam
a ser construídas concomitantemente à aplicação prática, a partir da análise
e da sistematização das experiências em campo. A intervenção psicossocial
é entendida como um processo científico, em que o conhecimento sobre a
realidade social é construído ao mesmo tempo que se atua sobre ela. Assim,
a psicologia na América Latina ganhou relevância e reconhecimento, estando
a serviço do desenvolvimento humano e da mudança social (LANE, 2009;
SANDOVAL, 2009).
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É importante ressaltar que essas perspectivas não se sobrepuseram


umas às outras, mas, à medida que novos questionamentos foram
surgindo ao longo da história, houve a necessidade de buscar novas formas
para responder a diferentes objetos de estudo.

Na atualidade, a forma de pensar e estudar a psicologia social continua


seguindo a tendência dos padrões históricos. Assim, no contexto norte-ame-
ricano, a maioria dos psicólogos sociais permanece estudando sobre temas
tradicionais dentro da perspectiva da psicologia social psicológica, utilizando
pesquisas experimentais para conhecer os processos intrapsíquicos na relação
entre indivíduo e meio. Atualmente, além das temáticas tradicionalmente
estudadas, como atitude e preconceito, houve uma ampliação dos estudos,
principalmente nas áreas da neurociência e da psicologia evolucionista (FER-
REIRA, 2010; GOUVEIA, 2015).
Na Europa, há uma tradição de estudos dentro da perspectiva da psicologia
social sociológica, com uso de metodologias experimentais e não experimen-
tais a fim de conhecer as relações intra e intergrupais. Na América Latina e
no Brasil, há uma tendência de estudos e práticas dentro da psicologia social
crítica, utilizando-se de metodologias de cunho qualitativo a fim de desen-
volver um saber questionador sobre os problemas sociais (FERREIRA, 2010).
A partir da história da psicologia social, é possível observar que essa
perspectiva de estudo é a base que direcionará todo o processo de pesquisa
e a atuação prática, refletindo valores éticos e filosóficos dessa atuação.

A dimensão multimetodológica da
psicologia social
As perspectivas da psicologia social partem de processos de conhecimento
distintos, ou seja, de questionamentos e visão de homem diferentes. Impli-
cam, portanto, diferentes caminhos para estudar e pesquisar os fenômenos
psicossociais. O método a ser utilizado dependerá do olhar do psicólogo
social sobre o seu objeto de estudo.
Álvaro e Garrido (2017) descrevem que as técnicas metodológicas utiliza-
das estão, tradicionalmente, relacionadas a cada uma das perspectivas em
psicologia social. Assim, pesquisas de cunho quantitativo, que exigem maior
rigor metodológico, são mais apreciadas por adeptos da psicologia social
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psicológica, em que o objetivo desse tipo de método está em “generalizar o


conhecimento científico e estabelecer leis universais sobre o comportamento
humano” (ÁLVARO; GARRIDO, 2017, p. 360).
Myers (2014), em seu livro sobre psicologia social, detalha como os estudos
dentro da perspectiva psicológica são realizados. Como ponto de partida,
há a necessidade de uma teoria de antemão que deve ser capaz de predizer
o fato a ser analisado. A maioria das pesquisas é de cunho correlacional ou
experimental. O objetivo da pesquisa correlacional é saber se duas coisas
(variáveis) estão naturalmente relacionadas. E as pesquisas experimentais
tentam identificar causa e efeito; para tanto, os participantes são divididos
de forma aleatória em dois grupos: um que vai receber uma intervenção
experimental e outro que não receberá intervenção alguma. A partir das
diferenças observadas entre os grupos é possível identificar como essas
variáveis afetam o comportamento.
Tendo em vista que o objetivo dentro da perspectiva da psicologia social
sociológica é compreender a dimensão simbólica da realidade social, me-
todologias qualitativas de cunho indutivo estão entre as alternativas mais
coerentes para esse fim. Nesse modelo metodológico, não há uma teoria prévia
para análise, mas primeiro há o contato em profundidade com o fenômeno
estudado por meio de técnicas como entrevista detalhada, história de vida
e observação participante (ÁLVARO; GARRIDO, 2017).
Por sua vez, a psicologia social crítica traz alguns questionamentos sobre
as metodologias tradicionais de ciência enquanto ideal e universalizante.
Na busca pela objetividade, métodos positivistas acabam fragmentando o
conhecimento, conformando a realidade psicológica a padrões de normalidade
(FONSECA, 2012). Assim, aspectos como neutralidade, separação entre teoria
e prática, distanciamento com o objeto a ser estudado são problematizados
nessa perspectiva, pois não condizem com seu objeto de estudo (MONTERO,
2000; TITTONI; JACQUES, 2013).
Tittoni e Jacques (2013) entendem que a concepção de ciência na perspec-
tiva crítica assume peculiaridades. Entre as características epistemológicas
dessa perspectiva está a relação entre sujeito-objeto, em que ambos são
tanto reprodutores como transformadores das condições sociais, portanto,
a investigação será também uma intervenção.
Os resultados da pesquisa não têm como pretensão serem universali-
zantes; entende-se que o social tem caráter dinâmico, portanto a pesquisa é
um recorte histórico e social da realidade. Assim, a pesquisa tem um caráter
investigativo, a análise dos resultados é realizada por meio da discussão de
categorias relevantes.
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Feitas tais considerações, essa perspectiva entende que a escolha meto-


dológica é uma estratégia para integrar teoria e prática. É possível propor uma
pluralidade no processo teórico-metodológico de autocrítica da metodologia
e retorno à própria teoria. Há aspectos tanto técnico-científicos relacionados
à escolha da metodologia quanto éticos, visto que há uma relação entre o
pesquisador e a sociedade (TITTONI; JACQUES, 2013). Assim, é possível utilizar
abordagens qualitativas e quantitativas, desde que sua aplicação não se refira
a uma mera replicação, mas à ação crítica e reflexiva sobre o processo, reco-
nhecendo o caráter dialético e dinâmico da realidade social (MONTERO, 2000).
Técnicas de pesquisa-ação e pesquisa participante são modos de pesquisar
bastante difundidos nessa perspectiva (MONTERO, 2000; TITTONI; JACQUES,
2013). Ambas as modalidades têm como característica a participação ativa dos
sujeitos — objetos de estudo — em todas as etapas do processo, desde a for-
mulação de problemas, a definição dos objetivos, o planejamento, o trabalho
de campo e a análise dos dados. Para coleta de dados, é possível lançar mão
de diferentes técnicas: questionários, entrevistas, grupos focais, entre outros.
Não há um modelo pronto a ser seguido, a escolha metodológica deve estar
de acordo com o que se está buscando conhecer (TITTONI; JACQUES, 2013).
Álvaro e Garrido (2017) compreendem que, durante muito tempo, houve uma
polarização metodológica, em que, se há a utilização exclusiva de uma, logo
excluem-se todas as possibilidades de utilização da outra. Assim, propõem
que a articulação entre metodologias qualitativas e quantitativas seja uma
boa opção para aprofundar o conhecimento da realidade social. Nas palavras
dos autores:

O delineamento de uma pesquisa deve ser guiado, portanto, pela ideia de que
nenhuma técnica é, por si mesma, apropriada ou inapropriada, mas a adequação
de cada uma delas depende da forma em que se ajusta à natureza do objeto (ÁL-
VARO; GARRIDO, 2017, p. 364).

Independentemente da metodologia ou da técnica a ser utilizada, há


vantagens e desvantagens. Enquanto métodos quantitativos oferecem uma
perspectiva macroestrutural da realidade social, métodos qualitativos per-
mitem compreender em profundidade aspectos de cunho subjetivo (ÁLVARO;
GARRIDO, 2017).
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A implicação da escolha metodológica na


atuação prática
O enfoque metodológico proposto por cada perspectiva em psicologia social
impacta diretamente a prática e a proposição de intervenções, tendo em vista
que os resultados da pesquisa são repassados para a realidade.
Assim, a perspectiva da psicologia social psicológica produziu um denso
embasamento teórico conceitual, cuja proposta estava em predizer o com-
portamento humano em sociedade. A aplicação desses conceitos estava
voltada a uma regularidade estatística e ao desenvolvimento de instrumentos
de medida que contemplassem a universalidade desses conceitos (ÁLVARO;
GARRIDO, 2017). Entre as principais temáticas estudadas nessa perspectiva
estão as atitudes, a percepção e a dinâmica de grupos. O enfoque está em
conhecer os processos que levavam o sujeito a agir de determinada forma
(FERREIRA, 2010).
Myers (2014), ao discutir sobre os processos cognitivos que acompanham os
problemas de comportamento social encontrados na clínica, sugere técnicas
de indução cognitiva, entendendo que a mudança interna acontece por meio
de comportamento externo. Entre as técnicas, ele descreve o treinamento
de assertividade, a terapia relacional-emotiva, grupos de autoajuda, entre
outros; a justificativa para essa intervenção está baseada em pesquisas de
cunho experimental que “confirmam que o que dizemos sobre nós mesmos
pode afetar como nos sentimos” (MYERS, 2014, p. 418).
A psicologia social sociológica está inclinada a conhecer e atuar na ex-
periência social do indivíduo nos grupos sociais de que participa. Assim, as
temáticas estudadas preconizam o estudo dos grupos e da coletividade,
entre elas, a identidade social nas relações intergrupais e as representações
sociais (FERREIRA, 2010).
Nessa perspectiva, os grupos são considerados estratégicos para a inter-
venção. O grupo operativo de aprendizagem, segundo o conceito de Pichon-
-Rivière, é um lugar de relacionamento e o encontro com outro que produz
aprendizagem. Pode ser entendido tanto como uma unidade de análise quanto
como uma proposta de intervenção. É uma unidade de análise pois é uma pro-
posta de investigação ativa, em que é possível compreender as contradições,
as relações sociais, a construção do processo grupal, entre outros. Já enquanto
proposta de intervenção tem como objetivo desenvolver as possibilidades
de aprendizagem do grupo, proporcionando bem-estar entre os membros a
partir da realização de uma tarefa (CASTANHO, 2012; PEREIRA, 2013).
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Considerando que a psicologia social crítica parte de um novo paradigma


de ciência, entendendo-o em contínuo processo de construção social, o
processo de intervenção e investigação é concomitante ao processo teó-
rico (FONSECA, 2012). Há, portanto, um processo de práxis, entendida como
prática transformadora da realidade que serve como crítica a ela mesma.
A teoria por si só não tem a capacidade de predizer a prática, mas a partir da
prática é possível questionar, elaborar e repensar a teoria (MAYORAL, 2006).
Ou seja, a conceituação teórica se dá a partir da análise e da sistematização
das experiências (FONSECA, 2012).
O homem é entendido enquanto ser histórico e cultural, em que ele é ao
mesmo tempo produto e produtor das relações sociais. A intervenção tem
como objetivo uma práxis comprometida com a transformação social, na
construção de relações sociais mais justas (FONSECA, 2012; MONTERO, 2000).
Assim, há um processo de diálogo e reflexão crítica da realidade social, per-
mitindo reconhecer sentidos e significados, reconstruir uma nova subjetiva,
desvelando aspectos ideológicos e das relações de poder (SARRIERA et al.,
2000; STAMATO, 2008). O papel do psicólogo é de mediador do processo, de
maneira dialógica e horizontal. Há uma relação dialética entre o mediador
e os sujeitos que incide diretamente nos espaços cotidianos, que tenham
sentido e significado para as pessoas (SARRIERA et al., 2000).
A fim de sistematizar o processo de intervenção psicossocial, Sanchez-Vidal
(apud SARRIERA et al., 2000) sugere alguns passos: definição de análise do
tema, avaliação inicial, planejamento e organização da intervenção, implanta-
ção, avaliação e disseminação. Cabe salientar que esta é uma sistematização e
que devem ser considerados aspectos, como a participação ativa e cooperativa
do grupo-alvo em todos os níveis (SARRIERA et al., 2000).

1. Definição e análise do tema: é importante que o psicólogo delimite o


que será objeto de intervenção, bem como seu objetivo. É preciso ter
conhecimento prévio da realidade a ser estudada: suas delimitações,
seus problemas, suas relações e interesses na intervenção, entre outros.
Isso pode ser feito por meio de consultas a documentações, visitas e
conversas prévias à realização da intervenção.
2. Avaliação inicial: momento de levantamento das necessidades, que
darão subsídio para o planejamento da intervenção. O profissional
deve ter uma visão geral do seu objeto de intervenção que contemple
a organização, dificuldades e potencialidades, recursos, entre outros.
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3. Planejamento e organização da intervenção: a partir dos dados da


avaliação inicial é possível delimitar os objetivos a serem atingidos e
estabelecer as estratégias que serão utilizadas. Nesse momento são
definidos o cronograma e os recursos necessários para a execução da
intervenção. Cabe destacar que é necessário considerar o contexto
social, cultural e econômico em que a será realizada a intervenção; as
técnicas e os instrumentos a serem utilizados devem ser aplicados de
forma crítica, e não apenas replicada. Ou seja, é um processo único
baseado naquela realidade e no seu momento histórico.
4. Implantação: trata-se da aplicação do planejamento, porém ele deve
ter flexibilidade para que sejam feitas modificações de acordo com o
que o público traz do processo de intervenção.
5. Avaliação: momento em que há a validação da intervenção. Aqui devem
ser identificadas dificuldades no desenvolvimento da intervenção e
verificar se os objetos foram alcançados. Essa fase pode acontecer de
maneira concomitante a todas as outras fases do processo; é impor-
tante ter um retorno avaliativo para remodelar a intervenção.
6. Disseminação: após todo o processo de intervenção, sugere-se que o
conhecimento sobre a intervenção seja compartilhado, proporcionando
um retorno à teoria.

Outra proposta bastante difundida dentro da perspectiva da psicologia


social crítica é do trabalho a partir de grupos. Lane (1984) entende que a ação
transformadora da sociedade só acontece por meio do agrupamento dos
indivíduos. Nessa proposta, o grupo é condição necessária para conhecer
as determinações sociais que agem sobre o indivíduo. Para compreender
o grupo é necessário compreender seu processo histórico (determinantes
econômicos, institucionais, ideológicos), assim como para compreender o
indivíduo é necessário remeter ao grupo a que ele pertence.
O termo “processo grupal” é utilizado para compreender que o grupo é
decorrente de um processo histórico, em que os integrantes constroem o
seu próprio processo de grupo. Esse processo só é possível quando há forte
vinculação entre os membros, ou seja, quando eles de fato se entendem
enquanto grupo. O objetivo não é chegar a algum objetivo específico, mas
promover discussões e trocas de relevância para sua realidade social e, a
partir delas, gerar conscientização e transformação social (LANE, 1984).
10 Procedimentos metodológicos na psicologia social

Práticas de intervenção em psicologia social


O termo “intervenção” pode ser entendido como a interferência na realidade do
outro a fim de modificá-la. No contexto da psicologia social, essa intervenção
diz respeito a ações dentro do espaço coletivo, possibilitando melhoria na
qualidade de vida e no cotidiano das pessoas (SARRIERA et al., 2000).
Como você viu anteriormente, o processo de intervenção é multideter-
minado e dinâmico e depende dos objetivos e de como serão executadas
suas propostas e estratégias (SARRIERA et al., 2000). Nesse sentido, você vai
conhecer algumas atuações e a prática de intervenção em psicologia social no
Brasil nos contextos social/comunitário, educacional e do trabalho. É preciso
ponderar que as propostas interventivas citadas neste texto são um recorte
da imensa gama de estudos, pesquisas e perspectivas em psicologia social.

Contexto social
A psicologia social aplicada ao contexto social está historicamente vinculada
à prática do psicólogo em contextos sociais menos favorecidos: bairros de
periferia, assentamentos, grupos marginalizados (situação de rua, idosos,
jovens, mulheres), entre outros. Para entendermos por que isso acontece,
é preciso considerar o processo histórico de surgimento dessas práticas de
atuação em comunidades (FREITAS, 2010).
Freitas (2010) descreve uma linha cronológica dessa atuação no Brasil.
Entre as décadas de 1940 e 1950 havia uma busca do Estado por prestadores
de serviços que amparassem a população menos favorecida. Na década de
1960 houve uma aproximação da psicologia com a população, na tentativa
de descaracterizar a profissão como elitista, passando a ser ofertado todo
tipo de serviço psicológico na comunidade. A atuação profissional estava
baseada na replicação de modelos da psicologia tradicional para dentro da
comunidade. É por volta de 1970 que a psicologia passa a contribuir direta-
mente com os processos de formação de consciência e participação política
da população, a partir, principalmente, dos movimentos populares, em que
foi possível estabelecer um contato mais próximo com as problemáticas
vividas pela população, divulgando e propondo alternativas. Já na década de
1980 a classe profissional de psicologia amplia a discussão e o olhar sobre
o psicólogo em comunidade, passando a ser denominada como psicologia
comunitária, ganhando status de prática da psicologia social (FREITAS, 2010).
Procedimentos metodológicos na psicologia social 11

Álvaro e Garrido (2017) entendem que o surgimento da psicologia comu-


nitária fez parte do processo de construção da psicologia social. Assim, o
advento da perspectiva da psicologia social crítica se mistura com os processos
históricos da prática do psicólogo social comunitário.
Andery (1984) refere que o trabalho do psicólogo comunitário pretende
se aproximar das classes populares por meio de trabalho educativo e social.
Para tanto, parte do pressuposto da interdisciplinaridade, ou seja, reconhece
outros profissionais no processo de conscientização da comunidade. Enquanto
técnica de intervenção, é importante retomar que o trabalho da psicologia
social comunitária tem como objeto de estudo não apenas a comunidade,
mas o sujeito ativo, como um ator social, construtor de sua própria realidade
dentro dessa comunidade (MONTERO, 2004).
Freitas (1998) entende que a intervenção no contexto comunitário deve
considerar alguns aspectos: obtenção de informações, definição de objetivos,
escolha de instrumentais, estratégias de intervenção, constituição de grupos
e avaliação. Todas essas etapas devem ser trabalhadas junto à comunidade; a
decisão se dá de forma conjunta com a população, a partir de discussões sobre
esses objetivos junto aos sujeitos, seres ativos no processo de intervenção.
A intervenção não é um processo rígido; é preciso considerar o seu dina-
mismo. A intervenção tem como objetivo a produção de conhecimento em
conjunto com a população, possibilitando a construção de relações mais
justas e solidárias. Este é um processo da comunidade e não do profissional
que está intervindo (FREITAS, 1998). A atuação do psicólogo é apenas de
mediação, pois auxiliará a comunidade na busca de respostas frente às suas
necessidades sociais, tendo em vista que as pessoas têm papel ativo no seu
processo de mudança (FREITAS, 2010; MONTERO, 2004).

O artigo “Intervenção psicossocial com imigrantes venezuelanos


em Manaus: um relato de experiência” (CARDOSO; OLIVEIRA, 2019)
possibilita reconhecer o processo de práxis na intervenção em psicologia co-
munitária. As autoras utilizaram estratégias de grupos em formato de oficinas
temáticas para discutir temas de relevância para os migrantes e possibilitaram
reconhecer suas memórias, as dificuldades enquanto condição de migrante, e
construir projetos de futuro como estratégias de enfrentamento frente à situação.
12 Procedimentos metodológicos na psicologia social

Contexto educacional
A inserção da psicologia dentro do contexto da educação se deu, historica-
mente, por meio do diagnóstico de distúrbios e como uma atuação voltada
para a correção ou prevenção das dificuldades de aprendizagem. Ou seja, parte
de uma perspectiva individualista, em que as dificuldades de aprendizagem
dizem respeito apenas ao sujeito e em uma atuação baseada no ajustamento
(ZANELLA, 2013).
A partir da perspectiva da psicologia social, há um questionamento sobre
as concepções positivistas. O objeto de estudo deixa de ser os problemas
de aprendizagem do indivíduo e passa a ser os fenômenos escolares em sua
multidimensionalidade (institucional, pedagógica e relacional). A prática pre-
cisou ser repensada a partir da aproximação e do conhecimento da demanda
escolar/educacional e não apenas das queixas individuais (SOUZA, 2009).
Nesse sentido, é possível identificar alguns aspectos importantes para
uma práxis da psicologia escolar, que deve permitir ação e reflexão sobre a
intervenção. O ponto de partida deve ser a realidade concreta, ou seja, con-
siderando os determinantes históricos e sociais tanto da instituição quanto
dos profissionais e, principalmente, dos alunos (LIBANEO, 1984; SOUZA, 2009).
Os processos tanto de intervenção quanto de sua análise são participativos
e uma produção coletiva; a partir das relações sociais é possível promover
consciência e novos significados para o processo de ensinar e aprender (SOUZA,
2009; ZANELLA, 2013). O objetivo da intervenção está em superar a visão de
culpabilização do indivíduo — aluno ou professor — para o enfrentamento
dos desafios encontrados (SOUZA, 2009).
Souza (2009) entende que a partir dessa nova concepção foi possível
ampliar o campo de atuação da psicologia escolar, saindo dos muros da
escola e se dedicando aos processos educacionais nas mais diversas áreas,
entre elas: projetos de inclusão social (com crianças, adolescentes, idosos,
mulheres); área da saúde na prevenção de doenças; formação de educadores;
e educação inclusiva.

Mezzalira et al. (2019) sistematizaram a intervenção psicossocial


em uma escola de educação infantil ao longo de seis anos, em que
foram desenvolvidas algumas estratégias frente às demandas apresentadas
pela escola. Uma das estratégias foi o “mapeamento escolar e social de vida”,
realizado anualmente com base nos prontuários escolares, com o objetivo de
conhecer a realidade vivenciada pelas crianças. Como proposta de intervenção,
Procedimentos metodológicos na psicologia social 13

houve a construção de um mapeamento pelas crianças da região onde moravam;


com o auxílio de um mapa do bairro, foi possível que as crianças explorassem
a região (MEZZALIRA et al., 2019).
Diante das demandas dos professores, os psicólogos envolvidos no processo
promoveram reuniões junto aos docentes, que se configuraram como espaço de
escuta dos professores e promotor de discussões coletivas que contribuíssem
para o enfrentamento das situações apresentadas. Já em relação às demandas
das famílias foram propostos encontros cuja finalidade era estreitar as relações
entre a família e a escola. Inicialmente foram realizados encontros temáticos
para que houvesse trocas de experiências e ampliação do conhecimento sobre
desenvolvimento infantil. No decorrer dos encontros, um grupo de pais passou
a assumir esse processo, convidando órgãos públicos e definindo temáticas de
acordo com aquilo que entendia ser importante.

A partir de novos questionamentos sobre a psicologia no contexto escolar, a


psicologia social tem contribuído para que os processos de ensinar e aprender
ganhem novos contornos, permitindo uma atuação voltada às demandas reais
e na perspectiva preventiva.

Contexto do trabalho
A temática do trabalho é tradicionalmente reconhecida e conceituada por
teorias da administração, que se debruçam sobre aspectos racionais e com foco
em aumento da capacidade produtiva e do lucro. Nesse processo, couberam à
psicologia os estudos em busca de normatizações do comportamento humano:
aplicação de testes, seleção, treinamento. Os serviços psicológicos prestados
eram para os empregadores e não aos trabalhadores (ZILIOTTO, 2008).
Partindo da perspectiva de que ao psicólogo social cabe questionar os
processos vigentes, fez-se necessário repensar sua atuação dentro desse
contexto e enquanto sujeito ativo nesse processo, com implicação ética nas
atividades realizadas (ZILIOTTO, 2008). Assim, as propostas de atuação no
contexto do trabalho dentro da psicologia social entendem a necessidade
de superar a atuação tradicional de dualidade entre trabalhador e empresa-
riado, reconhecendo os aspectos relacionais e dinâmicos das relações sociais
(ESTEVES; BERNARDO; SATO, 2017; ZILIOTTO, 2008). As práticas da psicologia
social no contexto do trabalho devem permitir espaços de escuta e troca
entre os trabalhadores, promovendo consciência crítica da sua situação.
A utilização de técnicas deve ser pensada dentro de seu contexto histórico,
cultural, organizacional e envolvendo as pessoas de todos os níveis de tra-
balho (ZILIOTTO, 2008).
14 Procedimentos metodológicos na psicologia social

Quando pensamos no contexto do trabalho formal, identificamos pouco


— ou nenhum — espaço para escuta e troca entre os trabalhadores. E as
estratégias que poderiam proporcionar essa relação, como na aplicação de
dinâmicas de grupo e integrações, têm como fim a adaptação do indivíduo
ao contexto e à regulação de situações indesejadas no ambiente de trabalho.
De fato, foram os meios não formais de trabalho que proporcionaram es-
paço para a atuação da psicologia social do trabalho. Por volta de 1980 e 1990,
sindicatos e organizações cooperativas passaram a demandar da psicologia
problemáticas sociais e de saúde que afetavam os indivíduos. A psicologia do
trabalho em sua perspectiva tradicional não respondia aos questionamentos
dessa nova demanda, sendo necessário recorrer à psicologia social e aos seus
aspectos teórico-metodológicos para um novo fazer no mundo do trabalho
(ESTEVES; BERNARDO; SATO, 2017).
A psicologia social do trabalho passou a realizar suas pesquisas e inter-
venções de maneira articulada a partir das demandas concretas vivenciadas
pelos trabalhadores, visando tanto à reação quanto ao enfrentamento aos
problemas cotidianos. Os trabalhadores têm papel ativo no processo de
intervenção, passando de meros expectadores e vítimas de um sistema a
sujeitos ativos e críticos do sistema (ESTEVES; BERNARDO; SATO, 2017).
Entre os campos de estudo e intervenção da psicologia social do trabalho
está a saúde do trabalhador. Há a perspectiva tanto de compreender os proces-
sos de adoecimento no trabalho quanto de propor formas de enfrentamento
juntamente com os trabalhadores. Outro campo de atuação da psicologia social
do trabalho é a economia solidária: uma forma de trabalho autônoma em que
trabalhadores se reúnem com o objetivo de, juntos, buscar alternativas para
sobreviver e superar o desemprego, bem como se articular para reivindicar
condições de retorno ao trabalho. A partir da intervenção da psicologia social
do trabalho junto à economia solidária, foi possível desenvolver categorias
de análise teórico-práticas, como cooperativismo popular e autogestão do
trabalho (ESTEVES; BERNARDO; SATO, 2017).

Esteves, Bernardo e Sato (2017) compilam uma experiência de


intervenção junto à economia solidária. Uma empresa contratou
profissionais para cadastrar grupos de coleta seletiva na grande São Paulo. O
objetivo era organizar um banco de dados sobre o perfil social e econômico dos
trabalhadores. Com a finalidade de se aproximar da realidade, a equipe parti-
cipou do Fórum Lixo e Cidadania, em que pôde entrar em contato com diversas
instâncias atuantes no âmbito do meio ambiente, o que viabilizou o cadastro
Procedimentos metodológicos na psicologia social 15

inicial dos profissionais. Após esse momento, foram sugeridas reuniões junto a
representantes dos grupos de coletores para formular propostas de organização
da atividade. As reuniões foram realizadas em formato de plenárias, em que
os trabalhadores apresentavam e discutiam problemas vinculados à área, bem
como potencialidades e sugestões de solução. No início de cada reunião era
repassada aos participantes a sistematização da reunião anterior. O resultado
dessas reuniões foi a elaboração de propostas para estruturação do setor de
autoria de todos os envolvidos, relativas à auto-organização da coleta seletiva,
à comercialização dos produtos e ao empreendimento dos trabalhadores.
Esteves, Bernardo e Sato (2017) ressaltam alguns pontos importantes sobre
o trabalho do psicólogo nesse exemplo. O primeiro é com relação à postura
profissional; houve um processo de aprendizagem da equipe — que não co-
nhecia a temática —, a fim de reconhecer a realidade da população. O trabalho
realizado permitiu discutir aspectos de relevância para os trabalhadores, que
se posicionavam sobre seus valores, preconceitos e a realidade em que vivem.
Outra questão diz respeito à participação efetiva dos trabalhadores no processo,
pois as decisões eram tomadas em conjunto, compartilhando, inclusive, sua
autoria no processo final.

A psicologia social do trabalho passa a pensar estratégias que estão


comprometidas com as necessidades dos trabalhadores — e não dos em-
pregadores — e assume frentes de trabalho muitas vezes renegadas pelas
perspectivas tradicionais da psicologia, com objetivos também distintos.
A psicologia social do trabalho pretende buscar relações sociais mais justas
e solidárias e que o outro seja visto como apoio, não como competidor.

Este capítulo contemplou um olhar sobre as questões metodológicas na


psicologia social a partir de seu contexto de intervenção. Para além de listar
os métodos e técnicas de pesquisa, esses recursos devem ser pensados a
partir da realidade vivenciada, do objeto de estudo e da perspectiva de su-
jeito. O método é algo a ser praticado, e os conceitos teóricos são categoria
de análise das intervenções realizadas, que também trazem subsídios para
fortalecer o referencial teórico.
A psicologia social no Brasil alterou seu objeto de estudo, adequando-se
a uma realidade contextualizada no país, passando a se preocupar com as
questões sociais e as relações humanas. As propostas de intervenção e as
metodologias adotadas estão mais comprometidas com a sociedade, a fim
de proporcionar espaço de escuta e processos de conscientização e eman-
cipação do sujeito.
16 Procedimentos metodológicos na psicologia social

Referências
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ZILIOTTO, D. M. Demandas e ofertas da psicologia do trabalho hoje. In: PLONER, K. S.
et al. Éticas e paradigmas na psicologia social. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de
Pesquisas Sociais, 2008. p. 207-215.

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Dica do professor
A intervenção em psicologia social é um processo coletivo que propõe mudanças em um
determinado contexto, na perspectiva de melhoria na qualidade de vida das pessoas.
Historicamente há uma tradição de intervenção psicossocial em áreas sociais, da educação e do
trabalho, por exemplo. Atualmente, o contexto das políticas públicas tem ganhado espaço e
notoriedade nos processos de intervenção-investigação em psicologia social.

Nesta Dica do Professor, você vai conhecer como é realizada a intervenção psicossocial nas
políticas públicas. Para tanto, vamos repassar um breve conceito sobre políticas públicas e
apresentar alguns aspectos importantes para a intervenção na psicologia social.

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Exercícios

1) Dentro da psicologia social há três perspectivas de estudo e pesquisa: a psicológica, a


sociológica e a crítica. Cada uma dessas perspectivas parte de paradigmas e concepções
acerca dos fenômenos psicossociais.

Relacione as colunas:

I. Psicologia social psicológica

II. Psicologia social sociológica

III. Psicologia Social crítica.

( ) Propõe uma psicologia social voltada para a realidade e o cotidiano social.

( ) As pesquisas têm como objetivo predizer o comportamento em sociedade.

( ) Surge como crítica ao modelo vigente, questionando a relevância dos estudos


laboratoriais em psicologia social.

Assinale a alternativa que indica a sequência correta.

A) I – II – III.

B) III – I – II.

C) II – I – III.

D) III – II – I.

E) I – III – II.

2) Na psicologia social, a questão metodológica é definida de acordo com os objetivos que se


pretende atingir e pode ser considerada como multimetodológica. Assim, cada perspectiva
tem seus métodos para estudar de forma mais condizente com o seu objeto de estudo.

Sobre esse assunto, assinale a alternativa correta:.

A) Métodos quantitativos são bastante difundidos nas pesquisas, como forma de estudar
aspectos subjetivos das relações sociais.
B) Tanto métodos de natureza qualitativa quanto quantitativa têm vantagens e desvantagens, ao
escolher uma exclui-se a outra.

C) A pluralidade metodológica auxilia na universalização do conhecimento da realidade social


estudada.

D) Na perspectiva da psicologia social crítica, a metodologia em pesquisa tem implicações na


intervenção prática.

E) O método de pesquisa na perspectiva da psicologia social psicológica deve propor um estudo


em profundidade das relações sociais.

3) O conceito de práxis é amplamente utilizado na perspectiva da psicologia social crítica como


metodologia para a intervenção e a investigação. Esse conceito pode ser entendido como
uma ação consciente do psicólogo social que tem como objetivo a transformação social de
forma objetiva.

Assinale a alternativa verdadeira sobre a práxis em psicologia social.

A) Práxis compreende que os processos teórico e prático são momentos distintos.

B) Práxis envolve um processo de ação e reflexão, de retorno à própria teoria.

C) Entende-se práxis como prática da intervenção.

D) Práxis é um modelo teórico a ser aplicado.

E) A práxis propõe que a teoria seja aplicada no contexto prático.

4) A intervenção psicossocial no contexto educacional se diferencia da intervenção tradicional,


já que compreende um olhar psicopatológico da educação e parte para uma perspectiva de
práxis que compreende um processo de ação e reflexão da intervenção.

Assinale a alternativa correta que contempla os objetivos da intervenção psicossocial dentro


do contexto educacional.

A) No contexto da educação, a intervenção psicossocial é feita a partir da queixa dos


professores sobre as dificuldades individuais dos alunos.

B) A função da intervenção psicossocial no contexto educacional é apontar os erros dos


professores quanto às queixas escolares.
C) O processo de ensino e aprendizagem é o principal objeto de estudo e intervenção
psicossocial.

D) Contempla instituições de ensino formais, nas instituições de ensino informais é


recomendado outros tipos de intervenção.

E) Entre as possibilidades de intervenção psicossocial escolar está a prevenção de dificuldades


de aprendizagem.

5) O contexto social/comunitário é tradicional na intervenção psicossocial e se confunde com


os processos históricos da psicologia social crítica no Brasil. É possível considerar que a
psicologia social comunitária abriu espaço para uma atuação crítica, ou seja, mais
comprometida socialmente.

Sobre a intervenção no contexto social/comunitário, assinale as afirmativas a seguir como V


(verdadeira) ou F (falsa):

( ) Os objetivos da intervenção devem ser discutidos com a comunidade e selecionados pela


equipe que vai realizar a intervenção.

( ) A psicologia social no contexto social/comunitário atua com as problemáticas sociais


vividas pela comunidade.

( ) A obtenção de informações sobre a comunidade é um processo contínuo na pesquisa e na


intervenção.

( ) O psicólogo social no contexto social/comunitário parte do pressuposto da oferta dos


serviços à comunidade.

Assinale a alternativa que indica a sequência correta.

A) F – V – V – F.

B) V – F – F – V.

C) V – V – V – F.

D) F – V – V – V.

E) F – V – F – F.
Na prática
O processo de intervenção psicossocial na psicologia social crítica pode ser sistematizado em
alguns passos: definição e análise do tema; avaliação inicial; planejamento e intervenção;
implementação; avaliação; e disseminação.

Confira, Na Prática, o relato de uma intervenção psicossocial com adolescentes do programa jovem
aprendiz.
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Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Grupo como dispositivo socioeducativo: pesquisa-intervenção


com adolescentes em cumprimento de prestação de serviço à
comunidade
A partir de um relato de pesquisa, este artigo proporciona um exemplo de como ocorrem os
processos de investigação-intervenção em psicologia social. O relato apresenta um caso específico
de atuação do psicólogo social na política pública de assistência social.

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Psicologia social, representações sociais e métodos


No artigo a seguir, visa contribuir para o debate sobre alternativas metodológicas no estudo das
representações sociais situando a discussào num contexto da pesquisa em psicologia social.

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Psicologia social: perspectivas psicológicas e sociológicas


Este livro aprofunda as discussões sobre as perspectivas em psicologia social, proporporcionando
uma concepção bastante ampla sobre o surgimento dessa disciplina até a atualidade. O Capítulo 5
contempla a perspectiva multimetodológica como um diferencial da psicologia social atual.

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