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Economia e Administração dos Sistemas

de Produção Agroindustrial (LES0202)

Nicole Rennó Castro


Professora LES-ESALQ

nicole.castro@usp.br

nicole-rennó-castro

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Antes, a atividade agrícola poderia ser caracterizada como um setor
autárquico, com equilíbrio interno próprio. A inserção de novos
métodos/equipamentos no sistema de produção e o desenvolvimento
das agroindústrias integraram o setor agrícola ao restante do sistema
econômico, a tal ponto que não é mais possível separá-lo dos setores
fornecedores de insumos e/ou compradores de seus produtos. Talvez
não seja mais possível tratar a atividade agrícola ou o mundo rural
identificando-o apenas com as atividades estritamente ditas rurais
(GRAZIANO DA SILVA, 2002).

SILVA, J. G. da O novo rural brasileiro. 2. ed. rev. Campinas: Instituto de Economia da Unicamp, 2002. (Coleção
Pesquisas, 1).
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1.2) Definições sistema agroindustrial,
complexo agroindustrial, cadeia de
produção agroindustrial e agronegócio

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1 Introdução

Commodity System Approach e Análise de


2
filières

3 Níveis de análise do sistema agroindustrial

4 Aplicações do conceito de cadeia

5 Gerenciamento de Sistemas Agroindustriais

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1 Introdução

Commodity System Approach e Análise de


2
filières

3 Níveis de análise do sistema agroindustrial

4 Aplicações do conceito de cadeia

5 Gerenciamento de Sistemas Agroindustriais

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INTRODUÇÃO
• Dois principais conjuntos de ideias geraram metodologias de
análise de problemas relacionados ao sistema agroindustrial:
1) Davis e Goldberg, no âmbito da escola de negócios de Harvard,
criaram o conceito de agribusiness (A concept of agribusiness, 1957)
e, posteriormente, usaram a noção de commodity system approach
(CSA).
2) Durante os anos 1960, no âmbito da escola industrial francesa, se
difundiu a noção de analyse de filière (cadeia de produção) – muito
utilizada por economistas agrícolas e pesquisadores ligados ao rural e
às agroindústrias (cadeia de produção agroindustrial - CPA).
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• No Brasil, essas ideias de um caráter sistêmico das atividades
agroindustriais ganharam maior importância nos meios
acadêmicos, empresariais e políticos no final dos anos 1980.

• O conceito de cadeia produtiva é uma ferramenta de análise


e proporciona um arcabouço teórico bastante útil para
aplicações diversas em problemas reais, possibilitando a
proposição de políticas públicas e privadas e de melhorias de
gestão empresarial visando a eficiência da cadeia e a
competitividade sustentada das empresas que a compõem.

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Por que é importante olhar para a cadeia produtiva como um
todo? Fica mais fácil entender por meio de alguns exemplos:
i) Para manter/ampliar sua participação em mercados mais exigentes, como os
Europeus, as indústrias do abate precisarão garantir que a carne exportada
não tem conexão com desmatamento. Isso não é possível sem uma
coordenação com os elos anteriores da cadeia produtiva, onde ocorre a
produção do boi (cria, recria e engorda do boi).
ii) Ferramentas de gestão da qualidade na indústria de laticínios também
devem ultrapassar as fronteiras da firma e se situar no nível da cadeia.
iii) Indústrias como a de açúcar e álcool e de suco de laranja, para garantir o
controle do fornecimento da matéria-prima, têm adotado estratégias de
verticalização – essa estratégia da indústria afeta sobremaneira a produção
agrícola também.
iv) Há discussões sobre como o poder de mercado nas indústrias de insumos
pode estar capturando as margens de lucro da produção dentro da porteira.
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1 Introdução

Commodity System Approach e Análise de


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filières

3 Níveis de análise do sistema agroindustrial

4 Aplicações do conceito de cadeia

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COMMODITY SYSTEM APPROACH E ANÁLISE DE FILIÈRES
Commodity System Approach:
• O conceito de agribusiness surgiu nos anos 1950 na Universidade
de Harvard, com os trabalhos de Davis e Goldberg.
• O objetivo era analítico: entender as relações e vínculos
intersetoriais – a análise separadamente dos setores primário,
secundário e terciário não era mais suficiente para explorar vários
dos problemas práticos naquele momento.
• O ambiente nos EUA era de especialização produtiva nas fazendas e
crescimento das indústrias de alimentos e isso pedia novas ferramentas de
análise, novas perspectivas.

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Commodity System Approach:
• Agribusiness: soma das operações de produção e
distribuição de suprimentos agrícolas, das operações de
produção nas unidades agrícolas, do armazenamento,
processamento e distribuição dos produtos agrícolas e
itens produzidos a partir deles.

Consideravam as atividades agrícolas como parte de uma rede


extensa de agentes econômicos – da produção de insumos, passando
pela transformação industrial até a armazenagem e distribuição de
produtos agrícolas e derivados.

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Commodity System Approach:
• Em 1968, Goldberg usou a noção de commodity system
approach para estudar o comportamento dos sistemas de
produção da laranja, trigo e soja nos EUA.
• Pela simplicidade e coerência do aparato teórico com
resultados uteis e certeiros: a aplicação foi um sucesso.

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Análise de filières:
• A análise de cadeias de produção é uma das ferramentas da
escola francesa de economia industrial.
• Há grande variedade de definições e conceitos. Mas, há três
elementos que estariam ligados a uma cadeia produtiva:
1) é uma sucessão de operações de transformação dissociáveis, mas
ligadas entre si por um encadeamento técnico;
2) é um conjunto de relações comerciais e financeiras que estabelecem
um fluxo de troca entre todos os estados de transformação;
3) é um conjunto de ações econômicas que presidem a valoração dos
meios de produção e asseguram a articulação das operações.
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Análise de filières:
• Uma cadeia de produção agroindustrial (CPA) pode ser
segmentada, de modo geral, em três macro-segmentos:

Comercialização Industrialização Produção de


Empresas em contato Empresas responsáveis
matérias-primas
com o cliente final pela transformação Empresas que
(supermercados, das matérias-primas fornecem as matérias-
padarias, restaurantes, em produtos finais ao primas iniciais para que
etc.) e empresas consumidor (final ou outras avancem no
responsáveis somente outra agroindústria). processo produtivo do
pela logística de produto final.
distribuição.
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Análise de filières:
• A seguir, teremos a representação esquemática de duas
CPA quaisquer. Três pontos de atenção:
• Podem ser não lineares - em geral não são, e operações a
montante podem alimentar várias outras a jusante;
• Há também casos em que várias operações a montante
darão origem a um número menor de operações a jusante.
• Cadeias têm sobreposições – um complexo agroindustrial
pode ter operações intermediárias de produção comuns a
várias CPA que o compõem.

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CPA 1 CPA 2

PRODUÇÃO
INSUMOS INSUMOS INSUMOS

MP Operação 1 Operação 2 Operação 3


Operação 4 Operação 5 Operação 6
INDUSTRIALIZAÇÃO

Operação 7 Operação 8

Operação 9 Operação 10 Operação 11


COMERCIAL.

Operação 12 Operação 13

PRODUTO 1 PRODUTO 2 PRODUTO 3


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Análise de filières:
• Dentro de uma CPA típica, há em geral no mínimo quatro
mercados com diferentes características:
• Mercado entre produtores de insumos e produtores rurais;
• Mercado entre produtores rurais e agroindústria;
• Mercado entre agroindústria e distribuidores;
• Mercado entre distribuidores e consumidores finais.
• O estudo das características destes mercados representa
uma ferramenta poderosa para compreender a dinâmica de
funcionamento da CPA.
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NÍVEIS DE ANÁLISE DO SISTEMA AGROINDUSTRIAL
• Na literatura no Brasil ainda há confusão entre as
expressões Sistema Agroindustrial, Complexo
Agroindustrial, Cadeia de Produção Agroindustrial e
Agronegócio.
• São expressões relacionadas mas que refletem níveis de
análise diferentes do Sistema Agroindustrial.

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Sistema agroindustrial (SAI):

• É o conjunto de atividades que concorrem para a produção de


produtos agroindustriais - da produção dos insumos (sementes,
adubos, máquinas agrícolas etc.) à chegada do produto final
(queijo, biscoito, massas etc.) ao consumidor.
• Não está associado a nenhuma matéria-prima agropecuária
ou produto final específico.
• Aproxima-se bastante da definição inicial de agribusiness (ou
agronegócio) de Davis e Goldberg.

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Sistema agroindustrial (SAI):
• Representação esquemática do SAI (modificado da versão do livro):

Indústrias agroalimentares (IAA)


Abate e laticínios; Óleos e gorduras
vegetais e animais; Açúcar; Café; Distribuição
PRODUÇÃO Conservas; outros (panificação, biscoitos,
massas, derivados do cacau, etc) Transportes
Agricultura Varejo
Pecuária Indústrias não agroalimentares (INA) Atacado
Pesca/Aquicultura Restaurantes
Florestal (madeira, móveis, papel e
Padarias
celulose); Indústria do fumo; Têxtil,
vestuário e calçados; Agroenergia

Indústrias de apoio
Combustíveis; Indústria química; Indústria mecânica; Ind. Eletrodomésticos; Embalagens; Serviços
financeiros, jurídicos, contábeis, entre outros.
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Sistema agroindustrial (SAI):
• Sobre o macro segmento industrial: em geral, assume-se que
engloba empresas de 1ª, 2ª e 3ª transformação:
• 1ª transformação: responsáveis pelos primeiros processos de
transformação (como trituração e moagem de matérias primas
vegetais, por exemplo). Seus produtos podem ser fornecidos
ao consumidor final ou servir como matérias-primas para as
indústrias de 2ª e 3ª transformação.
• 2ª transformação e 3ª transformação: promovem a geração
de produtos mais elaborados (tortas, pizzas, refrigerantes,
doces, vestuários, móveis, etc.)

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Complexo agroindustrial (CAI):
• Tem como ponto de partida determinada matéria-prima
agropecuária.
• Exemplos: complexo soja, complexo leite, complexo cana-de-
açúcar, complexo café.
• A arquitetura do CAI é ditada pela da matéria-prima principal
que o originou, passando pelos diferentes processos
industriais e comerciais que ela pode sofrer até se
transformar em diferentes produtos finais.
• Assim, o CAI pode exigir a participação de um conjunto de
cadeias de produção.

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Cadeia de produção agroindustrial (CPA):
• Diferentemente do complexo agroindustrial, é definida a partir
do produto final.
• Após esta identificação, encadeia-se de jusante a montante as
várias operações técnicas, comerciais e logísticas necessárias a
sua produção.

Observação: na prática, os termos Complexo agroindustrial e


Cadeia de produção agroindustrial são usualmente usados de
forma intercambiável.

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4 Aplicações do conceito de cadeia

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APLICAÇÕES DO CONCEITO DE CADEIA

• Pode-se resumir os principais usos do conceito de cadeia


de produção (que se sobrepõem):
• Metodologia de divisão setorial do sistema produtivo;
• Formulação e análise de políticas públicas e privadas;
• Ferramenta de descrição técnico-econômica;
• Metodologia de análise da estratégia das firmas;
• Análises de competitividade.

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Metodologia de divisão setorial do sistema produtivo:

• Este enfoque usa métodos estatísticos para tentar explicar a


formação de ramos e setores, dentro do sistema produtivo.
• A regra para a formação dos complexos é simples: as
cadeias de produção que pertencem ao mesmo complexo
agroindustrial possuem relações comerciais mais próximas
do que as que não pertencem a ele.

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Formulação e análise de políticas públicas e privadas:
• Nesse enfoque, o conceito é usado fundamentalmente para
identificar os elos fracos de uma cadeia de produção e
incentivá-los através de uma política adequada.
• Embasado na visão de que o sucesso de uma CPA depende do
desenvolvimento harmonioso de todos seus agentes.
• O enfoque de cadeia permite : i) uma visão global do sistema,
evidenciando a importância da articulação entre os agentes
privados, o poder público e os consumidores; ii) uma melhor
coordenação entre os agentes envolvidos diretamente com as
atividades da CPA e os agentes “de apoio”, entre os quais se
destaca o governo.
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Ferramenta de descrição técnico-econômica:

• Conceito como ferramenta de descrição técnica: uma


cadeia de produção apresenta-se como uma sucessão de
operações técnicas de produção.
• Conceito como ferramenta de descrição econômica: estudo
das relações econômicas que se estabelecem entre os
agentes formadores da cadeia.
• Esses dois níveis de leitura da cadeia produtiva se
complementam.

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Metodologia de análise da estratégia das firmas:
• Agentes econômicos buscam maximizar os lucros: a relação
da firma com seu ambiente concorrencial é essencial na
definição de estratégias.
• Esse é um dos pontos fortes da análise de CPA: entender
as relações tecnológicas e econômicas da firma e então os
posicionamentos estratégicos.
• Exemplo de estratégia – diversificação: após avaliar as
vantagens ligadas à entrada em outro setor em função das
ligações comerciais e tecnológicas com a atividade atual da
empresa, uma usina de açúcar e álcool decide atuar na
produção de cana-de-açúcar a montante.
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Análises de competitividade:
• Abordagens usuais de competitividade focam na competividade
das firmas; a competitividade de um setor ou nação seria a
soma da competitividade dos seus agentes (firmas).
• Nos agronegócios, um conjunto de especificidades resulta na
definição de um espaço de análise diferente: a CPA.
• A competitividade nesses casos não pode ser vista como a
simples soma da competitividade individual dos seus agentes.

Existem ganhos de coordenação (arranjos contratuais adequados às


condições dos vários mercados de uma CPA) que devem ser
considerados na análise de competitividade do conjunto do sistema.
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4 Aplicações do conceito de cadeia

5 Gerenciamento de Sistemas Agroindustriais

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GERENCIAMENTO DE SISTEMAS AGROINDUSTRIAIS
• Um sistema agroindustrial deve ser gerido de forma
eficiente e eficaz:
• Eficácia: capacidade e atender às necessidades do
consumidor.
• Eficiência: capacidade de disponibilizar produtos com nível
adequado de qualidade e preço.
• Gestão interna: controle de custos, qualidade, logística,
planejamento e controle da produção, compras, vendas
etc., devem ser geridas eficientemente.
• Entre agentes da CPA: a eficiência é dependente de uma
coordenação adequada dos agentes produtivos.
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GERENCIAMENTO DE SISTEMAS AGROINDUSTRIAIS
• Naturalmente, as condições para atingir patamares aceitáveis
de eficiência e eficácia existem num contexto mais amplo que
envolve aspectos legais, sociais, culturais, tecnológicos e
econômicos (revelam ameaças e oportunidades).
• Essa discussão não é exclusiva de sistemas agroindustriais
(SAI); mas, os SAI possuem especificidades que ressaltam a
importância do desenvolvimento de um ferramental próprio
de modelos e técnicas de gerenciamento.
• Há inadequação de grande parte das ferramentas modernas de
gestão desenvolvidas para setores outros que o agroindustrial.
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Especificidades dos sistemas agroindustriais de produção:
• Sazonalidade de disponibilidade de matéria-prima:
aprovisionamento de matérias-primas sujeito a regimes de
safra e entressafra; gera dificuldades para a rentabilidade,
planejamento e controle da produção industrial.
• Variações de qualidade de matéria-prima: agropecuária
está sujeita a variações climáticas e de técnicas de manejo,
o que pode ter impactos profundos na qualidade final do
produto industrial; padronização e regularidade de padrões
de qualidade podem ficar comprometidas.

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Especificidades dos sistemas agroindustriais de produção:
• Perecibilidade da matéria-prima: produtos agropecuários
perecíveis devem ser transformados rapidamente; gera
dificuldades de logística, de planejamento da produção;
• Sazonalidade de consumo: há algumas importantes variações
de demanda ao longo do ano (Ex. Páscoa (chocolates); Dia da mulher
(Flores); Quaresma (Ovos); Verão (Laranja)).

• Perecibilidade do produto final: nesses casos, a qualidade do


produto final depende da velocidade de disponibilização ao
consumidor; questões ligadas à logística de distribuição
assumem importância vital (ex. cadeia do frio).
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Especificidades dos sistemas agroindustriais de produção:
• Importância de assegurar à população alimentos em
quantidade e qualidade aceitáveis: setor é objeto de
vigilância acentuada do governo.
• Controle sanitário: alimentos devem estar próprios para
o consumo e critérios de segurança são rígidos (afetam o
gerenciamento dos sistemas produtivos).
• Governo vigilante quanto ao preço dos alimentos: em
épocas passadas, mas não tão distantes, o governo
recorria sistematicamente ao controle de preços.

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REFERÊNCIAS

BATALHA, M.O. Gestão agroindustrial : GEPAI : Grupo de


estudos e pesquisas agroindustriais / coordenador Mário
Otávio Batalha. – 3. ed. – 8. reimpr. – São Paulo : Atlas,
2014. Capítulo 1

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