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CEDERJ – CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA

DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE AULA PARA EAD


(MATERIAL DIDÁTICO IMPRESSO)

CURSO: Engenharia de Produção


DISCIPLINA: Humanidades e Ciências Sociais
CONTEUDISTA: Clarissa Brandão e Arthur Kowarski
Design Instrucional: Felipe M. Castello-Branco

Aula 2 – A Formação do Povo Brasileiro


Meta

 Apresentar uma breve história sobre a formação do povo brasileiro e da história


da organização social e política brasileira.
 Compreender o desenvolvimento do Brasil e da realidade que vivemos
atualmente.

Objetivos

Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:

1. Descrever conceitos preliminares sobre a formação do povo brasileiro;


2. Distinguir aspectos culturais relacionados às heranças dos povos indígenas e
africanos;
3. Reconhecer os movimentos políticos e sociais que contribuíram para a
formação política do Brasil;

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Introdução

1. A Formação do Povo Brasileiro

O povo é um dos três elementos que compõe o Estado, junto com o território e a
soberania. O estudo de sua formação permite compreender o desenvolvimento do
Brasil e da realidade que vivemos atualmente.
Conforme falamos no início, Todo Estado ou país é composto por três elementos: pela
população, pelo território e pela sua soberania, ou seja, o exercício do seu poder. Para
avançarmos na compreensão dos demais conteúdos que compõem esta disciplina,
vamos fazer um breve retrospecto de como chegamos até aqui, ok? Vem comigo!

INÍCIO DO BOX CURIOSIDADE


Nação x Povo x Cidadania
Estes conceitos parecem sinônimos, mas não são!
Quando nos referimos à nação, queremos dizer aquele grupo social que possui
características culturais, étnicas e linguísticas semelhantes. A Nação não precisa de
um Estado para existir, podendo haver várias nações dentro de um mesmo Estado,
como por exemplo, os Bascos que vivem na Espanha ou os Curdos que vivem entre o
Iraque, a Síria, o Irã e a Turquia.
Povo corresponde a todos os nacionais de um determinado Estado, podendo ou não
estar dentro do seu território. Por exemplo, os brasileiros que vivem no exterior ainda
que não estejam dentro de nosso território não perdem sua condição de nacional,
devendo inclusive cumprir com suas obrigações civis, como votar, pagar tributos, etc.
Já o conceito de cidadania entra na esfera jurídico-constitucional, pois corresponde a
uma série de direitos e deveres atribuídos aos nacionais de cada país.
FIM DO BOX DA CURIOSIDADE.

1.1 História e cultura indígena

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De acordo com estudos genéticos e linguísticos, acredita-se que os povos indígenas
das Américas sejam provenientes do Leste Asiático.

Figura 2.1: Há cerca de 35 a 30 mil anos, teria se iniciado uma migração desta região
para o continente americano, pelo Estreito de Bering, durante a Era Glacial, na qual as
camadas de gelo e o nível mais baixo dos oceanos teria permitido a travessia dos
povos migratórios de um continente ao outro.
Fonte:http://blogs.diariodonordeste.com.br/diariocientifico/wp-
content/uploads/2012/07/nature-nativos-americanos-corte.jpg
Autoria: Emiliano Belini/ Pesquisa Fapesp

As teorias mais aceitas sobre a origem da ocupação humana das Américas sugerem
que os ancestrais dos índios brasileiros e do resto do continente espalharam-se do
Norte para o Sul.
Contudo, alguns estudos mais recentes apontam para a existência de grupos
humanos em diversas partes do continente, incluindo o Brasil, de idade mais antiga do
que a data fixada pela Teoria do Estreito de Bering. Além disso, foi achado no sítio
arqueológico de Lagoa Santa, em Minas Gerais, o fóssil daquela que é considerada a
“brasileira mais antiga” que se tem notícia, apelidada pelos arqueólogos de “Luzia”.

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Segundo estes, ela teria vivido há cerca de 12 a 10 mil anos, mas a reconstituição
física de seu rosto lhe dá feições próximas a povos aborígenes da Austrália e a Nova
Guiné e não a dos índios brasileiros, cuja origem teria sido o Leste Asiático.

INÍCIO DO BOX DA CURIOSIDADE


Quem foi Luzia?
Ela está no Museu Natural do Rio de Janeiro, dentro da Quinta da Boa Vista: seu
crânio e seu molde facial refletem a nossa herança genética. De acordo com os
arqueólogos e pesquisadores, ela teria cerca de 25 anos e a reconstituição em argila
de seu rosto foi feita na Inglaterra.

Fonte: http://www.museunacional.ufrj.br/guiaMN/Guia/paginas/2/19luzia.htm
Autor: Museu Nacional

FIM DO BOX DA CURIOSIDADE.

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Durante séculos, até a chegada dos europeus, os povos indígenas foram colonizando
as Américas e se dividindo em diversas etnias, cada qual falando seu idioma e
desenvolvendo seus próprios costumes.

Figura 2.2: No ano de 1500, data oficial da chegada das primeiras caravelas
portuguesas ao que veio se tornar o território brasileiro, mais de um milhão de índios
habitavam a costa brasileira, em milhares de aldeias que comportavam de trezentos a
dois mil habitantes.
Fonte:
http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://img.historiadigital.org/2011/12/Indios-
Tupi-Guarani-
e1326247907209.jpg&imgrefurl=https://plus.google.com/110647706981724197972/ab
out&h=394&w=600&tbnid=QiJiJQ5o-
_7UkM&zoom=1&tbnh=182&tbnw=277&usg=__kTQT0ZHtz28fh6EUlADLLSC8Joc=&d
ocid=DVZ734Zw_bAMSM
Autoria: Debret

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Os habitantes originais da terra dividiam-se em diversas nações e tribos, que
envolviam-se frequentemente em conflitos umas com as outras. No entanto, dois
grupos principais se sobressaíam: os povos Tupi-Guarani, que praticavam a
agricultura, e os povos Jê, caçadores e coletores.

Nas aldeias dos Tupi-Guarani, não havia propriedade privada – a terra era cultivada
coletivamente e o produto desta era partilhado de maneira igualitária – e todos
habitavam grandes habitações de palha, denominadas ocas, que reuniam de dezenas
a centenas de famílias sob o mesmo teto.

Desde cedo, os meninos aprendiam com os pais o manejo do arco e flecha, usado na
caça e no combate. As meninas aprendiam com as mães, a tecer cestos de palha
para armazenar seus produtos. Os homens cuidavam da caça e as mulheres do
ambiente doméstico e ambos participavam da agricultura.

Beneficiados por recursos naturais abundantes, principalmente se aldeia estivesse


situada próxima a rios repletos de peixes, os índios não dedicavam todo seu tempo ao
sustento: também realizavam seus cultos, festividades e mesmo guerras entre aldeias.
Acreditavam em espíritos da floresta e em outras criaturas mágicas, que, com o
tempo, foram incorporadas ao folclore brasileiro, e que você já deve ter ouvido, como
o Curupira, a Iara e a lenda do Boto.

As festividades eram ordenadas pelos pajés e os anciões, que guardavam a forte


tradição oral dos índios, já que estes não conheciam a escrita. Os tuxauas (chefes
temporais) e caciques exerciam liderança política e na guerra, apesar de dentro da
aldeia, não ser um tipo de poder tirânico, pois eram escolhidos às vezes por
hereditariedade – liderança que passa de pai para filho – outras vezes em função do
carisma ou outra qualidade especial do líder.

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As guerras entre aldeias tinhamcomo motivação, em geral, vingança por ataques
anteriores da aldeia inimiga e em disputas territoriais por recursos naturais, sobretudo
a partir do período da colonização, pois os índios começaram a ser expulsos da costa
e das regiões mais ricas em recursos em direção ao interior.

Conforme afirma Darcy Ribeiro, a colonização do Brasil pelos portugueses


representou um choque de mundos. De um lado, os europeus que cruzavam o
oceano em busca de riquezas em expedições comerciais, deparando-se com uma
terra exótica, de clima, fauna e flora muito diferente, mas que propiciava produtos
tropicais bastante procurados na Europa. De outro, povos indígenas que viviam
isolados em um imenso território, e que se depararam com povos desconhecidos, de
barbas e pele clara, que vinham do mar em grandes barcos nunca vistos - pois os
índios só tinham pequenas canoas para pesca, portando armas e armaduras feitas de
metal - além de outras “maravilhas” como espelhos e outros objetos de uso pessoal,
que faziam os viajantes parecerem deuses aos olhos dos nativos.

Neste choque de mundos, os colonizadores fizeram valer o seu projeto. A Igreja


Católica, após a confirmação da descoberta da América por Colombo em 1492, dividiu
as terras do Novo Continente entre os reinos de Portugal e Espanha. Assim, Portugal
ficou com uma faixa de terra que vai do território do atual Estado do Maranhão até o
litoral de Santa Catarina. Posteriormente, a Coroa Portuguesa dividiu este território
concedido em capitanias hereditárias, que seriam controladas por donatários
responsáveis pela colonização e administração da capitania.

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Figura 2.3: De início, buscaram-se nas capitanias recursos naturais como o pau-
brasil, do qual se extraía uma tinta natural usada como corante. Com o tempo,
passaram a ser construídos engenhos para a produção de açúcar, assim como o
cultivo do tabaco, empreendimentos estes que exigiam farta mão-de-obra.

Dessa maneira, iniciou-se o processo de escravização do índio, que marca o declínio


dos povos indígenas no território do Brasil colonial. Aldeias inteiras foram dizimadas e
os sobreviventes escravizados para trabalhar nas lavouras de cana e nos primeiros
engenhos. Assim, como a demanda por mão-de-obra escrava cresceu também o
comércio de escravos, que passou a ser feito pelos primeiros bandeirantes,
descendentes dos primeiros colonos, estabelecidos na Vila de São Paulo, que
montavam grandes expedições, compostas muitas vezes por caboclos mestiços -
frutos do cruzamento entre brancos e índios - com o objetivo de capturar índios para o
mercado de escravos.
Por outro lado, a Igreja, por meio da Companhia de Jesus, adotou uma postura
diferente em relação ao índio. Se em um primeiro momento ela mesma apoiou
iniciativas contra as aldeias indígenas, uma vez que os índios não tinham conheciam a
religião cristã, nem a disciplina do trabalho dos colonizadores, com o tempo ela
passou a defender os índios da escravidão mais crua por meio do estabelecimento de

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aldeamentos missionários, nos quais se ensinava aos índios os princípios do
Cristianismo e os costumes europeus.

Figura 2.4: Os jesuítas passaram a defender os índios contra a escravidão,


estabelecendo aldeamentos missionários onde os nativos aprendiam costumes
europeus e a catequese.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Florian_Paucke_-
_Passagem_de_um_rio.jpg?uselang=pt-br
Autoria: Kitzmantel, Angelika. Escaneamento de Die Jesuitenmissionare Martin
Dobrizhoffer und Florian Paucke und ihre Beiträge zur Ethnographie des Gran Chaco

A cidade de São Paulo foi fundada em 1555 por jesuítas na confluência de aldeias
tupiniquins entre os rios Pinheiros e Tietê.
Até o início do século XVIII foram fundadas missões jesuíticas ao longo do território
brasileiro, sobretudo na Região Sul, que foram sendo destruídas por expedições de
colonos, em busca de riquezas e escravos indígenas. A Coroa Portuguesa permitia as
missões jesuíticas para conversão de índios à fé cristã, por um lado, mas também

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permitia a “guerra justa” contra os índios que atacassem, de qualquer forma, a
colonização do Brasil, por outro.

Entretanto, não foram só armas e outros produtos a serem trocados com os nativos
que os navegantes trouxeram ao novo continente, mas também germes para os quais
os índios não possuíam defesas imunológicas. O fator fundamental para o declínio da
população indígena foram as doenças trazidas pelos colonizadores. Assim, doenças
como a gripe e a varíola, principalmente, dizimaram aldeias inteiras, sem que fosse
preciso derramar sangue por meio de armas. Os colonizadores cientes disso, usaram
“armas biológicas” durante um bom período de tempo contra os povos indígenas. Há
registro de uso de doação de roupas e tecidos infectados a povoações indígenas
mesmo no século XIX. Historiadores e antropólogos apontam que a partir da segunda
metade do século XVI iniciou-se uma rápida e grande redução da população indígena.

Expulsos de suas terras desde o Descobrimento, sujeitos à escravidão e ao


extermínio, só no século XX é que foram sendo instituídas políticas públicas de auxílio
aos índios. Em 1910, foi estabelecido o Serviço de Proteção ao Índio, que, em 1967,
se tornou a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), organismo que procurou demarcar e
garantir a posse das terras pelas tribos indígenas remanescentes, assim como a
preservação da integridade cultural indígena.

A atual população indígena, segundo o censo do IBGE de 2010, situa-se na faixa dos
800 mil. Estes concentram-se em vários povoamentos dentro das terras indígenas
garantidas por lei, situadas, sobretudo, nas regiões Norte e Centro-Oeste, ainda que
uma minoria habite centros urbanos nestas regiões. Apesar de a população indígena
estar aumentando desde o início do século XX, em função das políticas de apoio do
Estado brasileiro, os índios remanescentes ainda vivem em conflito com o “homem
branco” e migrantes em torno da posse da terra, à medida que os interesses dos
posseiros, em busca de terras para pastoreio, garimpeiros e madeireiros avançam
pela Região Norte. Assim, frequentemente os índios se acham em posição mais fraca

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perante a disputa com estes grupos, tendo em vista a dificuldade do Estado brasileiro
garantir, de fato, a integridade das terras indígenas.

Sem contato com o índio, provavelmente os portugueses não teriam conseguido


colonizar efetivamente o Brasil. O índio nos legou o cultivo de produtos tão básicos na
dieta do brasileiro como a mandioca, o feijão, o milho, a batata-doce, entre outros.
Ensinou-nos técnicas de cultivo por meio de queimadas, pelas quais se abriam terras,
antes ocupadas por matas, para serem usadas na agricultura. Outro hábito importante,
que também é herança dos índios, são os nossos banhos diários, que são vistos por
estrangeiros como uma verdadeira excentricidade.

1.2 História e cultura afro-brasileira

Estima-se que mais de cinco milhões de africanos foram trazidos para o Brasil na
condição de escravos, na época da escravidão e do Brasil Colônia. Eles foram
trazidos durante o período de formação do Estado Brasileiro de diversas partes do
continente africano, abaixo da região do Saara. Eles integravam diversos povos, com
etnias, línguas e culturas distintas.
Para a economia do Brasil, a intensificação da exploração da mão-de-obra escrava
era crucial. Para os africanos, a venda ou o escambo de outros africanos era a
atividade mais lucrativa da época.

Reginaldo Prandi tem uma explicação detalhada sobre os africanos que vieram para o
Brasil:
“Os povos da África negra são classificados, grosso modo, em dois
grandes grupos linguísticos: sudaneses e bantos. Os sudaneses
constituem os povos situados nas regiões que hoje vão da Etiópia ao
Chade e do Sul do Egito a Uganda, mais o norte da Tanzânia. Ao norte
representam a subdivisão do grupo sudanês oriental e abaixo o grupo
sudanês central, formado por inúmeros grupos linguísticos e culturais

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que compuseram diversas etnias que abasteceram de escravos o Brasil,
sobretudo os localizados na região do Golfo da Guiné e que, no Brasil,
conhecemos pelos nomes genéricos de nagôs ou iorubas, os fon-jeje, os
haussás, famosos, mesmo na Bahia, por sua civilização islamizada.(...)
Os bantos, povos da África Meridional, estão representados por povos
que falam entre 700 e duas mil línguas e dialetos aparentados,
estendendo-se para o sul, logo abaixo dos limites sudaneses,
compreendendo as terras que vão do Atlântico ao Índico até o cabo da
Boa Esperança.” (PRANDI, 2000, p. 53)

O destino dos negros no Brasil variava de acordo com o desenvolvimento da


economia colonial brasileira. Inicialmente, eles foram trazidos para as fazendas de
açúcar, na Bahia, mas a partir do século XVII, ocorreu um deslocamento do tráfico
para a mineração, em Minas Gerais.

Figura 2. 5: A distribuição das tribos africanas no Brasil ocorria de acordo com os


tratados do tráfico estabelecido entre os africanos e os portugueses e, em geral, os
escravos oriundos do Golfo da Guiné vinham para a Bahia, enquanto que os da costa
meridional da África vinham para o Rio de Janeiro.

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Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Debret_-
_Diferentes_Nacoes_Negras.jpg?uselang=pt-br
Autoria: Debret

O historiador Pierre Verger estabeleceu 04 ciclos de chegadas dos negros no Brasil:

“1º) Ciclo da Guiné durante a segunda metade do século XVI;


2º.) Ciclo de Angola e do Congo, no século XVII;
3º.) Ciclo da Costa da Mina durante os três primeiros quartos do
século XVIII;
4º.) Ciclo da Baía de Benin, entre 1770 e 1850”
(PRANDI, 2000, p. 6)

INÍCIO DO Box Curiosidade


Pierre Verger
Foi um fotógrafo e etnólogo francês que se dedicou ao estudo sobre a África e os
africanos, tendo se convertido ao candomblé. Foi tema de carnaval da escola União
da Ilha do Governador, em 1998.
Para saber mais, clique na entrevista do fotógrafo:
http://socialistamorena.cartacapital.com.br/pierre-verger-o-parisiense-que-virou-
babalao/

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Link:
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Verger_1952.jpg#mediaviewer/File:Verger_195
2.jpg
Autor: Charles Mallison
FIM DO BOX CURIOSIDADE

Os negros que nasceram no Brasil já não mantinham os costumes de seus povos, não
falavam sua língua das terras de origem de seus pais e estavam interessados em
integrar a sociedade brasileira. O casamento e a miscigenação foram apagando os
traços mais marcantes das culturas africanas e criando uma nova cultura abrangendo
os descendentes dos brancos, índios e negros brasileiros.
Com o fim do tráfico e da escravidão, as origens étnicas e linguísticas foram caindo
em desuso, sendo preservadas, de modo mais notável, as referências de origem
religiosa, como o candomblé, no Brasil.

Nas palavras de Reginaldo Prandi,


“A cultura africana que assim vai se diluindo na formação da
cultura nacional corresponde a um vastíssimo elenco de itens que

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abrangem a língua, a culinária, a música e artes diversas, além de
valores sociais, representações míticas e concepções religiosas”
(PRANDI, 2000, p 58-59)

Início de Verbete
Candomblé
O candomblé é uma das religiões africanas trazidas com os negros para o Brasil.
Trata-se de uma palavra da origem bantu e significa: ca: uso, costume; ndomb: negro
e lé: lugar, casa, terreiro. Assim, “lugar de costume dos negros”.

É curioso notar que, hoje em dia, o candomblé também perdeu a sua identidade
exclusivamente com os negros que, de um modo geral, aderiram a religiões
protestantes.
Fim de Verbete

Até hoje utilizamos diversas palavras advindas do iorubá - língua nígero-congolesa do


grupo kwa, falada pelos iorubas - como, por exemplo, moleque, cochilo, chamego, axé
e oxalá, dentre outras. Na culinária, também absorvemos diversos gostos trazidos pela
cultura africana: leite de coco, azeite de dendê, feijão preto, quiabo, além da utilização
de panelas de barro e colher de pau.

Podemos verificar que, hoje em dia,é concedida uma necessária proteção aos negros,
seja por meio das políticas de cotas oferecidas em cursos superiores ou de vagas
específicas destinadas aos negros em concursos públicos.

O artigo 5º, da CF que proíbe quaisquer distinções entre os indivíduos baseadas em


raça, cor, origem visam garantir o tratamento igualitário de todos dentro do Estado.
Por meio da criminalização do preconceito racial também é uma resposta do Estado e
uma ação na tentativa de extirpar de nossa sociedade o preconceito contra os negros.

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ATIVIDADE 1
Você com certeza notou a riqueza cultural que o povo brasileiro possui depois da
nossa leitura. Para consolidarmos os conceitos aprendidos até aqui, gostaria que você
relatasse uma experiência pessoal, que você tenha vivenciado, na qual você se
perceba como um descendente de nossos povos, identificando um aspecto cultural
específico dentre os que foram expostos em nosso estudo.

Comentário:
O aluno deverá descrever algo pessoal, alguma experiência de vida, cultural que
tenha afinidade com os povos indígenas ou africanos e que demonstre uma relação
direta da herança dos mesmos.
Por exemplo, eu adoro dormir em rede. Em todas as casas que eu morei, sempre
busquei um espaço onde pudesse pendurar uma rede, seja no meu quarto, no quarto
dos meus filhos ou mesmo numa varanda e acredito que este ritual de se balançar na
rede remonta de nosso passado indígena, uma vez que os mesmos utilizavam tal
artefato no seu cotidiano.

10 linhas para resposta dos alunos.

2. Formação histórico-política do Brasil

Apesar de o Descobrimento ter ocorrido no ano de 1500, o Reino de Portugal só


desenvolveu um plano de colonização do Brasil trinta anos depois, já que antes o
território era ocupado, além das inúmeras aldeias indígenas, por pequenas feitorias
nas quais se praticava o escambo do pau-brasil com os índios.
Em 1532, o rei D. João III dividiu o território em doze capitanias, a partir de uma linha
reta, concedidas a figuras proeminentes do Reino, como nobres, grandes
comerciantes e altos funcionários. Os donatários ficavam responsáveis pela
colonização e exploração econômica da capitania, na condição de capitães e

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governadores, com a prerrogativa de fundar vilas, doar sesmarias, ou seja, doar terras
a terceiros e administrar a justiça na capitania.
De fato, a colonização das capitanias foi bastante complicada, em função das
dificuldades que a empreitada oferecia, como falta de interesse dos donatários em
investir nas terras, ataques frequentes de índios e a distância das capitanias em
relação a Portugal.

Das doze capitanias, apenas duas prosperaram: São Vicente, que veio a se tornar o
embrião da Capitania de São Paulo e a Capitania de Pernambuco.

Ciente dos problemas, o Rei decidiu mudar o sistema político da colônia e instituir o
Governo-Geral. Assim, retomou a Capitania da Bahia de seu antigo donatário e
instituiu lá a sede do governo, com a fundação de Salvador, em 1549. O governador-
geral ficava responsável pela administração da colônia, com auxílio do capitão-mor
(defesa), do provedor-mor (arrecadação e fazenda) e do ouvidor-mor (justiça).
Contudo, as distâncias entre as sedes das capitanias e a falta de comunicação entre
elas, devido a dificuldades nos transportes, faziam com que o poder efetivo do
governador-geral fosse limitado. Contudo, esse cargo permaneceu até a chegada da
Corte Portuguesa ao Rio de Janeiro em 1808.

Em 1580, com a vacância do trono português, Portugal passa para o controle da


Coroa Espanhola, configurando o período da União Ibérica (1580-1640). Os reis
espanhóis redefinem o mapa político da colônia a dividi-la em duas: o Estado do
Brasil, mantendo a capital em Salvador, e o Estado do Maranhão, com capital em São
Luís e, posteriormente em Belém. Enquanto que o primeiro contemplava as capitanias
de Pernambuco até Santa Catarina, a segunda, as capitanias do Maranhão e do Grão-
Pará, quando os colonizadores, de fato, começaram a se interessar pelo território
virgem amazônico. Desse modo, enquanto que de São Paulo partiam expedições
rumo ao continente, ignorando o meridiano de Tordesilhas, denominadas entradas e
bandeiras, a ocupação do Sul se deu no rastro das missões jesuíticas, que agrupavam

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índios – o mesmo ocorreu na Amazônia, em que as missões jesuítas desenvolveram a
exploração de frutos, plantas e matérias-primas em encontradas nas matas, com mão-
de-obra indígena, conhecidas historicamente por “drogas do sertão”.
Entre os séculos XVII e XVIII configurou-se, em linhas gerais, o atual território
brasileiro, em função desses movimentos de colonização.

Com a ascensão da Dinastia de Bragança ao trono, em 1640, Portugal separou-se do


domínio espanhol e passou a ter um rei português. Em 1645, este rei concedeu ao
Brasil o status de principado, ainda que permanecesse colônia. No final desse século,
inicia-se a corrida do ouro, com a descoberta do ouro na região das Minas. Esse fato
altera sensivelmente a vida da colônia, cujo efeito é a ocupação rápida da região, com
influxo migratório, tanto da própria colônia, como de Portugal.

Com a riqueza do ouro, a região das minas se separa da Capitania de São Paulo e
passa a constituir a Capitania das Minas Gerais, onde florescem os centros urbanos
de Vila Rica, Mariana, São João D´El Rey e outros, interiorizando a ocupação do
Brasil, antes restrita ao litoral.

Em 1755, o Rei de Portugal nomeia o nobre Marquês de Pombal primeiro-ministro.


Este institui uma série de reformas não só na metrópole, como também na colônia,
que vieram a ser denominadas pelos historiadores como reformas pombalinas: a fusão
do Estado do Brasil com o Estado do Maranhão, a extinção das capitanias
hereditárias; a transferência da capital de Salvador para o Rio de Janeiro, mais
próxima ao centro dinâmico da colônia, com a opulência de Minas Gerais e a
ocupação do Rio Grande, ao sul; a criação de duas companhias de comércio, com
monopólio do comércio com a colônia; a expulsão dos jesuítas da metrópole e da
colônia e a proibição do uso da língua-geral do Brasil, muito falada em São Paulo, com
base no tupi-guarani, o nheengatu. Os objetivos de Pombal eram consolidar o controle
econômico de Portugal sobre o Brasil, reforçando o Pacto Colonial, no qual o propósito
da colônia era garantir o bem-estar da metrópole por meio da exploração econômica.

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Em meio à eclosão dos primeiros conflitos sérios entre a colônia e a metrópole, das
quais a principal foi a Inconfidência Mineira, a primeira sofre uma reviravolta com a
chegada da Corte Portuguesa ao Rio de Janeiro, em 1808. Fugido do exército de
Napoleão e protegido pela marinha britânica, o Rei D. João VI estabelece-se na capital
da colônia com sua imensa corte de nobres e funcionários e transforma esta, de fato,
na capital do Reino. Assim, logo os portos brasileiros tornam-se abertos às nações
amigas, revoga o alvará de proibição de manufaturas no Brasil e cria instituições como
o Banco do Brasil, a Biblioteca Nacional e a Faculdade de Direito de Recife. Em 1815,
o Brasil é alçado à condição de Reino, constituindo-se o Reino Unido de Portugal,
Brasil e Algarves. As antigas capitanias passam à condição de províncias.

Em 1820, irrompe uma revolução em Portugal, influenciada por ideias liberais, que
questionavam o poder absoluto do rei. D. João IV, a contragosto, regressa a Lisboa,
sem antes deixar seu filho Pedro no Brasil. Ainda que os revoltosos em Portugal
pedissem mais liberdades, o plano deles para o Brasil era fazer o país regressar ao
status de colônia, o que, logicamente, desagradou os interesses brasileiros, que se
aproveitavam do novo dinamismo que o país vivia com a sede da Corte. Dessa forma,
surge um conflito entre os interesses brasileiros e os dos portugueses, defensores da
recolonização.
D. Pedro é chamado pelas cortes portuguesas de volta, mas recusa e declara sua
intenção de permanecer no Brasil, em 1822. No mesmo ano é proclamada a
independência e o Brasil se torna um império. No ano seguinte, é convocada uma
assembleia constituinte para redigir o ordenamento jurídico do novo Estado. Receoso
das elites locais e de perder o poder centralizador, D. Pedro I dissolve a constituinte e
outorga a Constituição de 1824. Com base na divisão dos poderes, o Legislativo
passava a ser composto por uma Câmara de Deputados, eleitos por via indireta por
voto censitário, com base na renda, e por um Senado, cujos membros eram
nomeados pelo Imperador. Este também exercia o Poder Moderador, a prerrogativa
de nomear os chefes do Executivo e de dissolver o Legislativo, para convocar novas

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eleições. Ou seja, o poder de “corrigir” os outros poderes do Estado, conforme
achasse conveniente. Politicamente, essa constituição manteve o poder centralizador,
ao conceder ao imperador a faculdade de nomear os governadores das províncias. A
escravidão foi mantida, assim como a união entre a Igreja Católica e o Estado.

O Primeiro Reinado (1822-1831) foi um período muito turbulento. A situação financeira


do Brasil deteriorou-se em função das dívidas contraídas com Portugal, por
“reparação” pela independência, e pelos custos da guerra na Província Cisplatina, que
se tornou independente do país, como República Oriental do Uruguai. Internamente, o
Império encarou uma revolta de secessão no Nordeste, com a proclamação da
Confederação do Equador, com sede em Pernambuco. A rebelião foi contida, mas a
muito custo, o que valeu a popularidade do jovem imperador, que acabou abdicando
em 1831, para lutar pelo trono de Portugal, na mão de seu irmão mais novo, D.
Miguel.
Com a abdicação de D. Pedro I, foram nomeados três regentes, para zelar pelo trono
até que o jovem príncipe Pedro II tivesse idade suficiente para assumi-lo. Em 1834, a
regência trina passou a ser una, passando para o Padre Feijó e, posteriormente, ao
Marquês de Olinda.

As revoltas regionais se intensificaram, cuja mais célebre foi a Revolução


Farroupilha, no Rio Grande do Sul, que se tornou uma república independente entre
1836 e 1845. As elites políticas leais ao Império, cientes de que a vacância do trono
prejudicava a legitimidade do Estado, promoveram a coroação de Pedro II como
imperador em 1840, apesar deste ter apenas quatorze anos, na época.

No Segundo Reinado (1840-1889), prevaleceu um ambiente de estabilidade política,


ajudado pela melhoria nas finanças nacionais, possibilitado pela expansão da
economia cafeeira no Rio de Janeiro, Minas e São Paulo. Começaram a ser
construídas, nessa época, as primeiras estradas de ferro, para escoar a produção
cafeeira. A imigração europeia ganhou força e foi mudando a genética da população,

20
embranquecendo-a, na medida em que o tráfico de escravos passa ser finalmente
proibido em 1850.
Em 1864, estoura a Guerra do Paraguai, conflito que envolveu Brasil, Argentina e
Uruguai contra o Paraguai. Liderando o esforço de guerra, o exército brasileiro derrota
seu inimigo em 1870, o que passa a por evidência o prestígio da instituição e as
demandas dos militares.
Por volta de 1870, a Província de São Paulo vai assumindo o centro dinâmico da
economia nacional, com a expansão das lavouras do café, aonde o trabalho livre dos
imigrantes vai se sobrepondo ao uso da mão-de-obra escrava. No Rio de Janeiro,
crescem os movimentos republicanos e abolicionistas, contra ordem escravocrata sob
o qual o país se assenta. O exército, por sua vez, que contava, a partir da Guerra do
Paraguai, com ex-escravos como soldados, não via com bons olhos a escravidão,
passando a se recusar a perseguir escravos fugidos, o que aumentou a fuga de
escravos das fazendas. As províncias do Nordeste, como o Ceará e o Maranhão,
cujas propriedades perdiam escravos em função da economia mais frágil, aboliram a
escravidão antes da promulgação da Lei Aurea pela Princesa Isabel em 1888, apesar
da oposição de proprietários de terra no interior do Rio de Janeiro.
O fim da escravidão não significou uma resolução para a questão da desigualdade
social no Brasil, depois de séculos de regime servil de produção. Os ex-escravos
ganharam sua liberdade, mas não ganharam terras, e, expulsos das terras
disponíveis, mas sob a posse de senhores, acabaram a se aglomerar em vilas pobres
e nas grandes cidades, formando o embrião das atuais favelas. A concentração de
terras nas mãos de poucos permaneceu a norma, pois a Lei de Terras de 1850
estipulava que as terras não poderiam ser divididas por reforma agrária, mas somente
adquiridas pela compra. Essa lei afastou tanto os escravos libertos como os imigrantes
da posse da terra. Apenas no Sul do Brasil essa situação não se repetiu, pois havia o
interesse do Estado na ocupação da terra por pequenos produtores rurais, em regiões
que não serviam para cultivo de produtos tropicais. O que explica a presença de
colonos italianos e alemães nas serras gaúcha e catarinense.

21
Com o fim da escravidão, o Império perdeu o apoio de uma parte significativa da elite
agrária, que não foi indenizada pela perda de sua “propriedade” em escravos,
conforme desejava.
O movimento republicano ganhava força entre a intelectualidade urbana, no Partido
Republicano Paulista e no Exército. Assim, em 1889, um golpe liderado pelo Marechal
Deodoro da Fonseca derrubou o imperador lançando-o, juntamente com o resto da
Família Real, no exílio.
Convocada uma Constituinte no ano seguinte, em 1891, foi promulgada a primeira
constituição republicana. Abolia-se o Poder Moderador e o Estado assumia a forma
federativa, dividido em Estados da federação, cada qual com sua própria constituição,
sua assembleia e seus presidentes eleitos. Assim, o Império deu lugar aos Estados
Unidos do Brasil. A influência norte-americana entre os legisladores e políticos é
evidente, não só no nome, como no modelo federativo e na instituição do Supremo
Tribunal, guardião da constituição. Foi estabelecido o voto universal masculino,
excluindo os analfabetos. Consumou-se a separação entre Estado e Igreja, tornando
possível o casamento civil - pois antes só eram válidos os casamentos no âmbito da
Igreja Católica. Do mesmo modo, a liberdade oficial de culto, permitiu a difusão de
denominações religiosas protestantes, assim como de outras religiões, como o
judaísmo.

Após os breves governos de Deodoro (1889-1891) e do Marechal Floriano Peixoto


(1891-1894), estabeleceu-se um regime político republicano que os historiadores
vieram, mais tarde, a apelidar de “República Velha” ou “República Café com Leite”. O
modelo federativo, ao contrário do Império centralizador, fortaleceu as oligarquias
regionais dos Estados mais fortes econômica e politicamente, que passaram a
influenciar a escolha do presidente da república. São Paulo vivia o apogeu da riqueza
do café e era controlada pelo Partido Republicano Paulista, que conseguiu eleger os
presidentes Prudente de Morais (1894-1898), Campos Sales (1898-1902), Rodrigues
Alves (1902-1906) e Washington Luís (1926-1930). Minas Gerais era controlada pela
oligarquia assentada na criação de gado e derivados do leite, logrando eleger os

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presidentes Afonso Pena (1906-1909), Venceslau Brás (1914-1918) e Artur Bernardes
(1922-1926). Oligarquias regionais menos poderosas, mas com sua importância, eram
o Rio Grande do Sul, representado pelo presidente Hermes da Fonseca (1910-1914),
assim como as nordestinas, que viviam período de decadência econômica, em função
da baixa dos preços do açúcar.
Apesar da forma democrática, a “República Velha” não o era no conteúdo. As fraudes
eleitorais eram frequentes, assim como a compra de votos dos “coronéis” da política
junto aos eleitores pobres do campo, que eram dependentes desses - fenômeno
analisado por Vitor Nunes Leal na obra “Coronelismo, Enxada e Voto”, na década de
1950. No meio urbano, cresceu, ao longo do período, a insatisfação com o quadro
político nacional, sobretudo entre os militares, críticos da corrupção generalizada, e da
classe operária, que crescia em número na medida em que aumentava, de maneira
gradual, o número de indústrias no país. Neste tempo, São Paulo já se consolidava
como centro industrial, cujo operariado tinha boa presença de imigrantes, sobretudo
italianos, com ideias anticapitalistas e anarquistas. A política econômica da República
Velha favorecia os interesses das oligarquias exportadoras, sobretudo a cafeeira
paulista, em detrimento dos interesses das massas urbanas, prejudicadas pela
inflação e alto custo de vida.

Na década de 1920, a insatisfação dos jovens militares ganha corpo, e estes resolvem
pegar em armas para desafiar o governo federal. Irrompe o levante do Forte de
Copacabana (1922). Houve também um levante em São Paulo, dois anos depois, que
viria a se tornar o embrião da Coluna Prestes, movimento armado que percorreu o
Brasil, de Norte a Sul, desafiando as autoridades locais, liderada por um jovem oficial
chamado Luís Carlos Prestes. Em 1922, é fundado o Partido Comunista Brasileiro,
agrupando militantes operários, influenciados pela Revolução Russa contemporânea.
Devido ao clima político instável, o Presidente Artur Bernardes governou quase seus
quatro anos de mandato sob Estado de Sítio.

23
Em 1929, o crash da Bolsa de Nova York leva o mundo a uma depressão econômica,
que afeta diretamente a economia exportadora brasileira. O preço do café despenca e
a oligarquia paulista se vê em uma situação financeira complicada. No quadro político
interno, ocorre uma briga entre as oligarquias paulista e mineira, quebrando o “pacto”
oligárquico. Assim, ainda que o paulista Júlio Prestes tenha sido eleito em 1930, um
movimento político apoiado pelas oligarquias gaúcha, mineira e paraibana, liderada
pelo estanceiro gaúcho Getúlio Vargas, ex-Ministro da Fazenda do Presidente
Washington Luís depõe este presidente e coloca o próprio Vargas no poder. Este
movimento veio a ser conhecido como a Revolução de 1930.
Empossado no Rio de Janeiro, aonde chegou de cavalo com os revolucionários,
marchando desde seu estado natal, Vargas decreta o início do Governo Provisório,
que se estendeu por quatro anos. Durante este período, o presidente governou por
decreto, nomeando diretamente os governadores dos Estados, denominados
interventores. Esta medida desagradou especialmente os paulistas, fato agravado pela
incompatibilidade com o interventor João Alfredo. Assim, em 1932, São Paulo pegou
em armas contra o governo federal, no que veio a ser conhecida como a Revolução
Constitucionalista - uma vez que a principal demanda dos revoltosos era a volta da
ordem constitucional rompida dois anos antes.
No ano seguinte, em 1933, é convocada uma assembleia constituinte, que promulga a
Constituição de 1934. Esta incorpora o voto feminino e estabelece como dever do
Estado o respeito aos direitos sociais. No mesmo ano, Vargas é eleito presidente, por
voto direto. No entanto, dada a força de grupos fascistas internos, como o
Integralismo, e o levante comunista malsucedido de 1935, colocam o governo em
choque com os ideais democráticos que ajudou a defender. Assim, em 1937, o
presidente dá um golpe e outorga uma nova ordem constitucional, inspirada na
constituição polonesa. De corte fortemente autoritário e próximo do fascismo, o Estado
Novo (1937-1945), decretado por Vargas, marcava-se pelo caráter centralizador do
poder federal, com a prerrogativa de nomeação dos governadores, e pela extinção dos
partidos políticos. Vigorou durante o Estado Novo a censura aos meios de
comunicação e a repressão aos opositores do regime, como Luís Carlos Prestes,

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agora líder do Partido Comunista, e do escritor Graciliano Ramos, que, na prisão,
escreveu a famosa obra “Memórias do Cárcere”.

Apesar do caráter autoritário do regime varguista, sobretudo durante o Estado Novo, a


ascensão de Vargas ao poder representou uma nova ordem social, política e
econômica. A partir de 1930, o Estado passa a assumir o papel de apoio à
industrialização do país, devido aos problemas econômicos reforçados pela
dificuldade do país em obter rendas suficientes com o valor das exportações de
produtos agrícolas.
Em 1932, é criado o Ministério do Trabalho, da Indústria e do Comércio, responsável,
entre outras atividades, pela regulação do mercado de trabalho urbano, uma vez que,
até então, era inexistente a regulação do trabalho.
Em 1938, é criado o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP),
responsável pela profissionalização da administração pública crescente. Em 1940,
estabelece-se o salário mínimo e, em 1942, a Consolidação das Leis Trabalhistas
(CLT) e a Justiça do Trabalho. Para apoiar a industrialização, no mesmo ano é criada
a Companhia Vale do Rio Doce, mineradora, e, em 1945, a Companhia Siderúrgica
Nacional (CSN), para suprir a demanda por insumos para a indústria nacional. Neste
mesmo período, foi estabelecido o modelo sindical que vigora até os dias de hoje, em
que o Estado reconhece um sindicato por categoria profissional e por unidade
administrativa, para regular os conflitos entre capital e trabalho, por meio da Justiça do
Trabalho.

Com a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial, ao lado dos Aliados, contra
o nazi-fascismo, cresceram as pressões internas pela redemocratização do país.
Assim, no final de 1945, Vargas é forçado a renunciar, pelas Forças Armadas, e é
convocada uma nova assembleia constituinte, para uma nova ordem democrática. Em
1946, é empossado o presidente eleito, General Eurico Dutra (1946-1951), e é
promulgada a Constituição de 1946, que reestabelece a eleição direta para o
Executivo e o Legislativo e a plena vigência do modelo federativo. Surgem, pela

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primeira vez na história do país, partidos nacionais fortes, cujos principais eram a
União Democrática Nacional (UDN), com forte apoio das classes médias urbanas, o
Partido Social-Democrático (PSD), com base nas oligarquias regionais, o Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB), apoiado pelos trabalhadores organizados nos sindicatos
e com a liderança de Vargas, e o Partido Comunista Brasileiro, posto, pela primeira
vez na legalidade, desde sua fundação. Assim, mesmo com o exílio forçado, Vargas
conseguiu eleger-se o senador mais votado daquela eleição, seguido por Prestes.

No plano das relações internacionais, o Brasil passou a viver sob influência mais forte
dos Estados Unidos, a partir de 1945. A Guerra Fria dos Estados Unidos com a União
Soviética, que se deflagrou a partir de 1947, teve impactos na política interna. As
forças conservadoras, entre as elites civis e militares, passam a suspeitar de influência
soviética nas forças políticas nacionais de Esquerda - tanto no Partido Comunista,
como nos meios sindicais e trabalhistas - para revolucionar a ordem política. Do
mesmo modo, temia-se a influência do governo argentino de Juan Domingos Peron
(1946-1955), sobre as elites políticas brasileiras, pouco afeitas ao Trabalhismo. Temia-
se a implantação no Brasil de uma “república sindicalista”, de corte peronista. Assim,
em 1947, o PCB foi novamente posto na ilegalidade e seus congressistas tiveram
seus mandatos cassados. Por outro lado, as ideias desenvolvimentistas lançadas por
Vargas, de fazer avançar a industrialização e modernizar o país, com o sem apoio do
Estado, estavam arraigadas em dirigentes políticos de diversas correntes.
Após o exílio em sua terra natal, São Borja, Vargas é eleito presidente e assume em
1951. Desagradando os conservadores, eleva o salário mínimo em 100%, para fazer
este recuperar o seu poder de compra, devido a perdas inflacionárias. Fortalece a
agenda desenvolvimentista com a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento
Econômico (BNDE, atual BNDES), com o intuito de financiar o desenvolvimento, e
com a criação, após uma campanha nacional, que envolveu militares, estudantes e
intelectuais, da Petrobrás, em 1953. Estabelece-se o monopólio da produção do
petróleo no Brasil.

26
Apesar disso, denúncias de corrupção e a oposição ferrenha de setores da UDN,
liderados pelo futuro Governador da Guanabara, Carlos Lacerda, que culminaram no
escândalo do assassinato de um militar. Vargas vê-se acossado e forçado a renunciar.
Recusando esta alternativa, comete suicídio em agosto de 1954, pondo fim à Era
Vargas.

Após o breve o governo do vice Café Filho, o mineiro Juscelino Kubichek de Oliveira,
do PSD, assumiu a presidência (1956-1961). Adota como bandeira a intensificação da
modernização do país, fazendo-o avançar “cinquenta anos em cinco”. Estabelece um
plano de metas, que inclui a construção de rodovias para integração do território:
política que culminou com a interiorização da capital, com a construção de Brasília -
que veio a se tornar a capital federal, em 1960. A política de apoio ao automóvel
ganha força com a implantação das primeiras montadoras estrangeiras. De fato,
houve aceleração das taxas de crescimento da economia, o que ajudou a consolidar a
popularidade do presidente, apesar dos problemas causados pelo aumento da
inflação.

Em 1960, o ex-prefeito de São Paulo e candidato da oposição, Jânio Quadros é eleito


presidente pela UDN. Em conflito com os próprios correligionários e com vistas a
ampliar seus poderes, Jânio renuncia, em 1961, com menos de um ano de mandato.
Seu sucessor natural era João Goulart, o Jango, conterrâneo de Vargas, eleito vice-
presidente pelo PTB, pois a constituição de 1946 permitia eleições distintas para
presidente e vice. Contudo, Goulart sofria forte oposição das forças conservadoras,
que temiam sua forte aproximação com os meios trabalhistas e sindicais e viam
mesmo influência de comunistas em seu entorno. Assim, após missão diplomática na
China comunista, aonde se encontrava durante a renúncia de Jânio, em agosto de
1961, Goulart acaba por aceitar a pressão dos militares e tornar-se presidente em um
sistema parlamentarista, em que a chefia do Executivo era dividida com um primeiro-
ministro. Por isso, seu governo, que durou menos de três anos, viu-se enfraquecido

27
desde o início, apesar de recuperar plenos poderes com o fim do parlamentarismo em
1963.
Durante seu governo, foi criada a Eletrobrás e projeto da Telebrás.
Goulart presidiu sob o conflito da oposição parlamentar e dos setores militares
conservadores com os grupos de esquerda, que pleiteavam as chamas “Reformas de
Base”, de avanço de benefícios sociais para as massas urbanas. Ao fim de seu
mandato, sancionou a Lei de Remessa de Lucros, que desagradava os interesses das
indústrias transnacionais instaladas no país, e assumiu a luta pelas Reformas de
Base. Contudo, um movimento militar, em 1964, derrubou seu governo e Jango foi
mandado ao exílio, junto com seus correligionários mais próximos. Iniciava-se assim o
Regime Militar (1964-1985).

Um dos líderes do movimento de 1964, o Marechal Humberto Castello Branco foi


empossado presidente da república, em caráter provisório. Logo de início, políticos
foram cassados e funcionários públicos perderam o emprego, iniciando-se a
perseguição daqueles que o regime via como “simpatizantes do comunismo” ou da
“subversão”. Desta perseguição não se livraram sequer o ex-presidente Juscelino
Kubitchek e lideranças civis do golpe conta Jango, como Carlos Lacerda, ambos vindo
a ter seus direitos políticos cassados. Governando por meio de decretos,
denominados “atos institucionais”, o AI-2 extinguiu, em 1965, todos os partidos
políticos e estabeleceu como legítimos apenas dois: a Aliança Renovadora Nacional
(ARENA), base de sustentação do regime, e o Movimento Democrático Brasileiro
(MDB), a oposição permitida. As eleições marcadas por este ano foram adiadas e a
Constituição de 1946 foi substituída pela Carta de 1967, composta por juristas
próximos aos militares.
No que se refere ao Estado brasileiro, o Governo Castello Branco fez mudanças
significativas, sobretudo na área econômica. Criou o Banco Central, responsável pela
emissão da moeda, e instituiu o Sistema Financeiro Nacional, composto por
instituições públicas como o Ministério da Fazenda, do Planejamento, a Caixa
Econômica Federal, o Banco do Brasil, entre outras. Acabou com a estabilidade do

28
emprego após dez anos e criou como compensação o Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço (FGTS), assim como instituiu a correção monetária para aplicações
bancárias, para minimizar perdas inflacionárias. A Lei de Remessa de Lucros foi
revogada. Em termos sociais, intensificou-se o processo de corrosão do salário
mínimo.

Com a escalada autoritária, foi crescendo o movimento de descontentamento com o


regime militar na sociedade civil, sobretudo entre os estudantes e os trabalhadores
organizados. Antigos desafetos, como Jango, Juscelino e Lacerda juntaram seus
esforços em um movimento de oposição, denominado Frente Ampla. Começam a
surgir, ainda de maneira tímida, movimentos armados contra o regime. Em meio à
efervescência política, o governo do Marechal Artur Costa e Silva (1967-1969), eleito
indiretamente pelo Congresso Nacional, decretou o AI-5, instituindo a censura prévia
nos meios de comunicação, o fechamento temporário do Congresso, além de mais
cassações a políticos e magistrados. Iniciou-se o período chamado “Anos de
Chumbo”, marcado pela forte repressão do Estado a grupos guerrilheiros, que surgiam
na época, apesar da falta de apoio formal do Partido Comunista a essas iniciativas, e
pela censura, que motivou o exílio de artistas, intelectuais etc.
Contudo, durante esse mesmo período, como outra face da moeda, o país passou por
um período de alto crescimento econômico, impulsionado pelo consumo da classe
média. Assim, os “Anos de Chumbo” também foram os anos do “Milagre Brasileiro”,
em que se atingiram taxas de crescimento de dez a quatorze por cento ao ano, até
meados da década de 1970, sobretudo durante o governo do General Emílio Médici
(1969-1974). Seu sucessor, Ernesto Geisel (1974-1979) tentou manter a mesma linha,
ao promover uma política de crescimento econômico por meio de grandes obras de
infraestrutura, como a Usina de Itaipu, a maior hidrelétrica do mundo, na época, e pelo
financiamento público ao desenvolvimento e por empresas estatais. Ainda que se
tenha obtido altas taxas de crescimento, durante ambos os governos, o processo se
deu pelo financiamento externo, já que havia bastante liquidez na economia
internacional, em meados da década de 1970. Isso, posteriormente, veio a

29
comprometer o endividamento do país. Não menos importante, o aumento
internacional dos preços do petróleo a partir de 1973 passou a comprometer a balança
de pagamentos e a inflação, causando certo desencanto com o “Milagre”.

Na medida em que se deterioravam as condições econômicas, ganhava força o


descontentamento com o regime, que se via diante de uma alternativa: abrandar o
caráter repressivo, rumo a uma abertura política, “lenta”, mas “irrestrita” ou endurecer
a repressão. Geisel seguiu pela primeira via, afastando os setores mais ligados à
repressão direta aos opositores do regime.

No final da década de 1970, a oposição crescia no MDB, na Igreja Católica, sobretudo


pelo Arcebispo de São Paulo, Dom Evaristo Arns, e também no meio sindical. Em
1978, depois de dez anos de proibição a greves, com sindicatos controlados pelo
governo, aconteceu a greve dos metalúrgicos em São Bernardo do Campo, sob a
liderança do sindicalista Luís Inácio da Silva, o Lula. Ainda que não houvesse eleições
diretas para presidente, as eleições para o Congresso sinalizavam para o
fortalecimento do MDB sobre a ARENA.

Com a passagem da presidência de Geisel para o General João Figueiredo (1979-


1985), consolida-se o processo de abertura. O AI-5 é revogado e os exilados pelo
regime começam a voltar ao Brasil. O pluripartidarismo é instituído e o MDB
transforma-se em PMDB, enquanto que a antiga ARENA dissolve-se no Partido
Democrático Social (PDS) e no Partido da Frente Liberal (PFL). Nas eleições para
governadores de 1982, a oposição conquista o governo de São Paulo, com Franco
Montoro, PMDB, Minas Gerais, com Tancredo Neves, PMDB, e o Rio de Janeiro, com
Leonel Brizola. Este, cunhado de Jango e antigo representante das alas mais radicais
do Trabalhismo, funda o Partido Democrático Trabalhista e se coloca junto aos
sindicalismo engajado de Lula, reunido no Partido dos Trabalhadores (PT) e na
Central Única dos Trabalhadores (CUT), como as alternativas mais radicais ao regime
militar, em sua fase final.

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Durante o Governo Figueiredo, cresce o movimento pelo fim do Regime Militar, por
meio da convocação de eleições diretas para presidente. O instrumento legal era
Emenda do congressista Dante de Oliveira, apoiada por um movimento popular.

Figura 2.6: Movimento popular das Diretas Já reuniu milhões de pessoas nas grandes
cidades brasileiras, lideradas por figuras de ponta do PMDB, como Tancredo Neves,
Ulisses Guimarães, Pedro Simon, Fernando Henrique Cardoso e também por Leonel
Brizola.
Fonte: https://www.flickr.com/photos/agenciasenado/12745267283/in/photolist-
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Autor: Alfonso Abraham

31
O Regime Militar chegou ao fim com o término do mandato de Figueiredo, em 1985.
Apesar do autoritarismo e de outros problemas sociais que se agravaram durante o
período, como o aumento da desigualdade de renda e o crescimento urbano
desordenado, com impacto no processo de favelização, o país desenvolveu
infraestrutura no sistema elétrico, com o fortalecimento da Eletrobrás, e para o setor
de telecomunicações, por meio da Telebrás. A Petrobrás, com o monopólio da
produção e do refino do petróleo, desenvolveu a produção em águas profundas, na
Bacia de Campos. Assim, com a ajuda do Estado no setor de insumos básicos e de
infraestrutura, o desenvolvimento industrial atingiu um grau de maturidade, avançado
em relação aos vizinhos latino-americanos.
Contudo, foi o cenário econômico que comprometeu a popularidade da “Nova
República”, que surgia das cinzas do Regime Militar. A emenda Dante de Oliveira foi
rejeitada pelo Congresso, de modo que a eleição, em 1985, deu-se pela via indireta,
conforme era regra até então. Tancredo Neves, político experiente e conciliador, ex-
primeiro-ministro de Jango, venceu o candidato do PDS, Paulo Maluf, ex-governador
de São Paulo, mas, por questão de saúde, viu-se impossibilitado de tomar posse. Seu
vice, José Sarney assumiu a presidência em março e no cargo ficou até março de
1990. No entanto, em 1982, após um ano de recessão, o Brasil decretou moratória de
sua dívida externa, que explodia com o aumento dos juros internacionais. Da mesma
maneira, a inflação alcançava dois dígitos ao mês, comprometendo o poder de compra
das classes populares, que não tinham aplicações com o mecanismo da correção
monetária para minimizar os efeitos da inflação. Diante desse cenário desfavorável,
Sarney viu-se compelido a adotar uma série de planos econômicos para controlar a
economia.

Em 1986, institui-se o Plano Cruzado, baseado na conversão dos antigos Cruzeiros


em Cruzados e no congelamento de preços. Inicialmente, consegue garantir uma
queda brusca da inflação, o que turbina a popularidade do governo e garante ao
PMDB o controle do Congresso e dos Governos Estaduais nas eleições de 1986. Mas,
no fim do mesmo ano, o plano começa a falhar, com a retomada da inflação. Mesmo

32
com outros planos durante o período 1987-1989, incluindo o Plano Verão, que institui
o Cruzeiro Novo, a substituir o precocemente velho Cruzado, o Governo Sarney se vê
impossibilitado de refrear a crise econômica, com a inflação passando de mais de mil
por cento ao ano, no fim de seu mandato. Em 1987, uma nova moratória é decretada
e o Brasil passa a viver sob a fiscalização do Fundo Monetário Internacional e do
Banco Mundial, que passam a ditar os termos da economia brasileira no que tange à
sua organização interna, para que o país voltasse a ter acesso a crédito internacional.

No plano político, a Legislatura de 1986 viu-se incumbida de redigir uma nova


constituição. Assim, em outubro de 1988, o Presidente da Câmara, Ulisses
Guimarães, promulgou a atual constituição brasileira, garantindo o voto universal,
incluindo o dos analfabetos, a integridade do modelo federativo, reconhecendo-o como
composto pela União, Estados e municípios e os direitos e garantias fundamentais do
indivíduo, elencadas no Artigo 5º. Além disso, garantiu a universalização dos serviços
de saúde, por meio do Sistema Único da Saúde (SUS) e os direitos dos povos
indígenas e quilombolas à sua integridade cultural e a suas terras originais.

Em meio à crise econômica, o Governo Sarney chegou desacreditado às eleições


diretas de 1989, a primeira desde a eleição de Jânio, em 1960. Assim, os principais
candidatos ao pleito eram o governador de Alagoas, Fernando Collor de Melo, apoiado
por um partido minúsculo, e Luís Inácio da Silva, do PT, apoiado pela oposição de
esquerda. Collor ganhou a eleição e assumiu em 1990, num cenário de agravamento
da crise econômica e política. Suas primeiras medidas antiinflacionárias foram o
congelamento de poupanças e a volta do Cruzeiro, medidas que reduziram, em parte,
a inflação, mas aprofundaram a crise, com a economia brasileira retraindo-se em
quatro por cento no mesmo ano. A crise política aprofundou-se durante seu breve
mandato, na medida em que apareciam denúncias de corrupção e a base aliada do
governo no Congresso se via incapaz de contornar a crise política. Assim, em 1992,
com apoio do Congresso e das ruas, Collor sofreu um processo de impeachment,
vendo-se obrigado, em setembro, a renunciar à presidência.

33
No mesmo ano, o vice Itamar Franco viu-se na obrigação de assumir a presidência.
Buscando apoio político, Itamar buscou alianças com diversas forças políticas, para
garantir legitimidade a seu governo, dentre os quais o Partido da Social-Democracia
Brasileira (PSDB), dissidência do PMDB, sob a liderança de Mário Covas e Fernando
Henrique Cardoso. Este, primeiramente assumiu o posto de Ministro das Relações
Exteriores, para depois assumir a Fazenda, em 1993, com o objetivo de garantir apoio
para um novo plano de estabilização econômica. Engendrou-se, assim, o Plano Real,
que foi implementado por etapas, de 1993 a 1994, que culminou na instituição do
Real, em julho daquele ano.
Ao contrário dos planos econômicos anteriores, o Plano Real não se baseou no
congelamento de preços, mas na abertura econômica, iniciada no Governo Collor, e
no fortalecimento do real perante o dólar, por meio do fluxo de recursos externos para
o mercado financeiro brasileiro, resolvidas as questões com o FMI e o Banco Mundial.
Dessa forma, impulsionado pelo sucesso do Real, que derrubou a inflação e fortaleceu
o poder de compra dos mais pobres. Fernando Henrique elegeu-se presidente em
1994, coligado ao conservador PFL, derrotando Lula nas eleições, em primeiro turno.

De fato, o que ocorreu nos anos 1990 foi uma reordenação somente comparável à Era
Vargas. Contudo, enquanto que aquela implementou um modelo de Estado orientado
para o apoio direto ao desenvolvimento, por meio de criação de mecanismos estatais,
a diretriz surgida no fim do século XX seguiu em direção contrária. O Governo Collor
implementou o Plano Nacional de Desestatização (PND), já em seu primeiro ano, cujo
objetivo era reduzir o papel do Estado na economia, elencando uma série de estatais
que deveriam ser privatizadas. Assim, estatais da indústria de base, como a Siderbrás
e a Usiminas foram privatizadas ainda por Collor, enquanto que Itamar passou para a
iniciativa privada um símbolo da Era Vargas, a CSN. No Governo Fernando Henrique
Cardoso (1995-2002) foi criado o Conselho Nacional de Desestatização,
contemplando a privatização de boa parte das empresas estatais de diversos setores:
mineração (Vale do Rio Doce), telecomunicações (Sistema Telebrás) e as empresas

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do setor elétrico reunidas no Sistema Eletrobrás. A Petrobrás teve subsidiárias
passadas à iniciativa privada, assim como a negociação de ações na Bolsa de Nova
York.
O Governo Fernando Henrique, além da continuação do Plano Real, assumiu como
bandeira também o Plano Nacional de Reforma do Estado, a cargo do Ministro Luís
Carlos Bresser Pereira, com a incumbência de reformar a administração pública. Com
a abertura ao setor privado dos setores de produção e distribuição de energia,
telecomunicações e exploração de petróleo, entre outros, foi necessária a criação de
agências reguladoras, órgãos de Estado responsáveis pela regulação da exploração
dessas atividades. Além disso, o governo tomou para si a tarefa de implementar
mudanças na previdência social, sob o argumento de redução de déficits que
comprometiam as contas públicas.

Sobre as privatizações, diz-se a favor destas que as mesmas melhoraram a qualidade


dos serviços públicos, sobretudo no setor de telecomunicações, que depende de
tecnologia de ponta para seu funcionamento, e que as estatais leiloadas estão em
situação financeira e operacional muito melhor após as privatizações, sobretudo a
Vale do Rio Doce. Contudo, o argumento central de que a venda das estatais serviria
para reduzir o endividamento do Estado brasileiro não se confirmou. Ainda que a
dívida externa tenha sido renegociada no final da década de 1980, a dívida interna, ao
contrário, cresceu ao longo do Governo Fernando Henrique. Explicam-se melhor as
reformas desse período pela prevalência de ideais neoliberais, que estipulavam que,
ao Estado, cabia cuidar das tarefas mais essenciais, como assistência à saúde e
educação, interferindo na economia apenas na definição dos marcos regulatórios,
deixando a iniciativa privada tocar toda a atividade produtiva.
Assim, ainda que não tenha sido privatizada, permanecendo uma sociedade de
economia mista, a Petrobrás teve suas ações negociadas na Bolsa de Nova York, com
o Estado ainda controlando a maioria das ações com direito a voto. Outro marco
importante, na reforma do Estado e da administração da época foi a Lei de
Responsabilidade Fiscal, que estipulou metas e limites de gastos, em áreas

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fundamentais, da União, Estados e Municípios, de forma a conter o endividamento
descontrolado dessas unidades nos três níveis.

Nas eleições de 2002, após a derrota em três eleições presidenciais anteriormente,


Lula conseguiu se eleger para o cargo máximo do Poder Executivo, derrotando José
Serra, ex-ministro de ponta do Governo Fernando Henrique. Abrandando o discurso,
conquistou a eleição com mais de 60% dos votos, no segundo turno. Seu governo
caracterizou-se pela continuidade das políticas econômicas do seu antecessor,
fortalecendo, contudo, as políticas sociais. Manteve o chamado “tripé
macroeconômico”, obtido pelos acordos de Fernando Henrique com o FMI, em
1998/99, ou seja, as metas de superávit primário (diferença entre as receitas e as
despesas da União, sem contar os juros da dívida pública), a política de metas de
inflação e o câmbio flutuante. Por outro lado, fortaleceu as políticas de renda iniciadas
no governo anterior por meio do Bolsa Família.
O Governo Lula (2003-2010) beneficiou-se de um cenário internacional favorável, em
que o crescimento acelerado da economia chinesa provocou um aumento da renda
das exportações dos produtos primários que o país exportava e ainda exporta em
grande quantidade, como minério de ferro e soja e seus derivados. Isso ajudou a
turbinar as políticas de transferência de renda (Bolsa Família) e aos aumentos do
salário-mínimo acima da inflação, com impacto na renda da população. De fato, após
a queda vertiginosa a partir do início do Regime Militar, o salário-mínimo, referência
para boa parte de nossa população, passou a reverter a queda, a partir do início da
década de 1990. Dessa maneira, passou a se falar, no final da década de 2000, do
surgimento de uma “nova classe-média”, composta por famílias que tiveram ganhos
de renda e passaram a se incluir no mercado de consumo, buscando melhor
qualificação profissional e educacional.
Em seu segundo mandato, Lula tentou alavancar uma política de investimentos
públicos e privados, através da “Política de Aceleração do Crescimento”, assim como
esboçou uma política habitacional, para famílias de baixa renda, com o “Minha Casa,
Minha Vida”. No campo político, seu governo foi manchado por escândalos de

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corrupção, por meio da compra de votos da base aliada, que agrupava mais de cinco
partidos, além do PT de Lula. O escândalo do “Mensalão”, como ficou conhecido na
imprensa, terminou por afastar da vida pública o ex-Ministro da Casa Civil, José
Dirceu, e o ex-presidente do PT, José Genoíno, abrindo caminho para que a protegida
de Lula e sucessora de Dirceu na pasta, Dilma Rousseff, que também foi ministra de
Minas e Energia, no mesmo governo, fosse indicada a eleita presidente da república
em 2010, derrotando mais uma vez José Serra.

A atual estrutura política do Brasil é fruto da instauração de um regime republicano,


com base no Federalismo, ou seja, na divisão política e administrativa do Estado
Brasileiro na União, Estados e Municípios – estes últimos reconhecidos como entes
federativos plenos pela Constituição de 1988.
Baseia-se na divisão dos poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, garantindo a
harmonia entre eles. A estrutura social é marcada por uma sociedade de contrastes,
apesar dos ganhos de boa parte da população, nos últimos anos, sobretudo no acesso
ao consumo. Para mitigar os efeitos da desigualdade de renda, o Estado vê-se
responsável em políticas de renda e outras políticas públicas secundárias, como pelo
subsídio a remédios essenciais, por exemplo. Ainda assim, quanto à repartição da
renda, o Brasil continua a ser um dos países mais desiguais do mundo.

Atividade 2
Após o término dessa leitura, aponte qual dos movimentos revolucionários foi
marcante para você, descreva o contexto histórico que o mesmo ocorreu e sua
contribuição para a formação política do Brasil.

Resposta Comentada:

Você deverá citar o evento e correlacioná-la com desdobramentos políticos e sociais


que contribuíram para que nos tornássemos a nação que somos na atualidade.

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Veja um exemplo de resposta possível: “Para mim, a revolta mais marcante foi a
Revolução Farroupilha pelo papel exercido pela revolucionária Anita Garibaldi,
chamada por alguns historiadores da “Joana D´Arc brasileira”. Essa revolta declarou a
independência do Rio Grande do Sul, formando a República Rio Grandense,
contribuiu para questionar o Império e estabeleceu as bases para o federalismo
brasileiro. Além disto, tal movimento tem defensores até os dias atuais, que abraçam a
ideia separatista para tornar independente o Rio Grande do Sul e muitos carregam
com orgulho a bandeira desse estado do Sul como se fosse a bandeira nacional.”

Atividade Final

Com base nos conceitos aprendidos nesta aula, rediga um parágrafo utilizando
argumentos sólidos para comparar os movimentos sociais virtuais, presentes nas
redes sociais, com os movimentos ocorridos no passado. De que forma esse
movimentos políticos se aproximam e se afastam dos demais estudados nessa
apostila?

Resposta comentada:

O estudo dos movimentos sociais permite compreender as demandas da sociedade.


Ainda que nem todas as demandas possam ser atingidas, o conhecimento das
mesmas permite ao profissional mais atento aprender com o passado para
revolucionar no futuro.
As redes sociais, apesar de todas as críticas que recebem, correspondem hoje ao
meio mais rápido de comunicação e, por esse motivo, potencializa seus efeitos. O que
outrora poderia ser insignificante, de uma hora para outra pode “viralizar” e criar
“vilões” e “mocinhos”, nessa grande arena popular.
Os movimentos sociais do passado viviam em outra dinâmica temporal que
eventualmente permitia certos ajustes ideológicos das questões políticas e
possibilitava a maturação das demandas. O imediatismo das redes sociais torna em
grande medida todas as contestações e demandas em questões efêmeras, ao

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contrário dos movimentos políticos do passado que tinham muito mais embasamento
ideológico e teórico, exatamente porque eram mais maturados. Mas tanto um, quanto
o outro, ainda tem o mérito de auxiliar na construção política brasileira.

Conclusão

Você estudou nesta aula as idas e vindas da formação política do Brasil, passando da
condição de colônia a império, de monarquia a república e do regime ditatorial para a
democracia.

Esses eventos políticos e sociais do passado ajudam a entender os conflitos políticos


do presente e para modificar o futuro. Esse desenvolvimento constante da sociedade
vai se refletir especialmente no Direito e na elaboração de suas leis, que assim como
a sociedade, vai evoluindo com o decurso do tempo.

Na próxima aula estudaremos os reflexos desses movimentos políticos históricos no


âmbito do Direito Constitucional.

Referências Bibliográficas

PRANDI, Reginaldo. De africano a afro-brasileiro: etnia, identidade, religião. In:


REVISTA USP, São Paulo, n.46, p. 52-65, junho/agosto 2000.

RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: a Formação e o Sentido do Brasil. São Paulo:


Ed Companhia das Letras, 1995.

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