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REVISÃO | REVIEW 1199

Desafios para a efetiva participação popular


e controle social na gestão do SUS: revisão
integrativa
Challenges for effective popular participation and social control in
SUS management: integrative review

José Felipe de Freitas Gomes1, Nathalia Halax Orfão1

DOI: 10.1590/0103-1104202113118

RESUMO A participação da comunidade constitui um princípio constitucional orientador do sistema


público de saúde no Brasil, regulamentado pela Lei nº 8.142 de 1990. Objetivou-se compreender os
desafios enfrentados para a efetiva participação popular e o controle social na gestão do Sistema Único
de Saúde (SUS). Para isso, foi realizada revisão integrativa da literatura nas bases de dados do PubMed,
Lilacs, Scopus, Embase e Web of Science, a partir de descritores indexados e seus sinônimos, nos idiomas
português, inglês e espanhol. Como critérios de inclusão, foram considerados artigos completos pu-
blicados entre os anos de 1988 e 2020, nos idiomas supracitados. E, para exclusão, teses, dissertações,
monografias, manuais e artigos duplicados. Foram selecionados 64 artigos que abordavam como desafios
a luta por interesses próprios, a influência político-partidária, o distanciamento entre representantes e
representados, a falta ou inadequada capacitação permanente em saúde, a deficiência de infraestrutura
dos espaços deliberativos, entre outros. Nesse sentido, para a superação dos obstáculos, é fundamental
que seja garantida a pluralidade de membros, critérios transparentes na sua escolha, rotatividade de
conselheiros, desenvolvimento de gestão transparente, democratização da informação e capacitação dos
conselheiros de saúde, por meio de práticas de educação permanente.

PALAVRAS-CHAVE Gestão em saúde. Sistema Único de Saúde. Políticas de controle social. Participação
social.

ABSTRACT Community participation is a constitutional guiding principle of the public health system in
Brazil, regulated by Law No. 8.142, of 1990. The objective was to understand the challenges faced for effective
popular participation and social control in the management of the Unified Health System (SUS). For this
purpose, an integrative literature review was carried out in the databases of PubMed, Lilacs, Scopus, Embase
and Web of Science, using indexed descriptors and their synonyms, in Portuguese, English and Spanish. As
inclusion criteria, complete articles published between 1988 and 2020 were considered, in the aforementioned
languages. And, as exclusion, theses, dissertations, monographs, manuals and duplicate articles. The 64
articles selected addressed as challenges the struggle for their own interests, the political-party influence, the
distance between representatives and those represented, the lack or inadequate permanent health training,
the lack of infrastructure in deliberative spaces, among others. In this sense, in order to overcome obstacles, it
is essential to guarantee the plurality of members, transparent criteria in their choice, turnover of counselors,
development of transparent management, democratization of information and training of health counselors,
through educational practices permanent.
1 Fundação Universidade
Federal de Rondônia (Unir)
– Porto Velho (RO), Brasil. KEYWORDS Health management. Unified Health System. Social control policies. Social participation.
gomesjf@hotmail.com

Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative
Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer
meio, sem restrições, desde que o trabalho original seja corretamente citado. SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 45, N. 131, P. 1199-1213, OUT-DEZ 2021
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Introdução como a participação da população, através de


seus representantes, na definição, execução,
Internacionalmente, um dos marcos históricos no acompanhamento e no controle das ações
na defesa da participação comunitária ocorreu do Estado7,17,19-24. Possui como parte de sua
em 1978, através da Conferência de Alma Ata, estrutura Comissões Intersetoriais que asses-
que apresentou como uma de suas deliberações soram o plenário, resgatando e reiterando os
a necessidade de os países implementarem princípios do SUS e do controle social.
e aplicarem o princípio da participação da A participação popular é considerada uma
comunidade no processo de gestão em saúde, ferramenta de gestão pública que, no SUS,
fomentando a autorresponsabilidade entre os materializa-se através das instâncias colegia-
diferentes sujeitos sociais1. das, formais ou informais, permitindo, além
No Brasil, esse marco histórico resultou de da democratização, a corresponsabilização
intensas lutas democráticas envolvendo diver- entre Estado e sociedade civil. Através dos
sos atores sociais integrantes do Movimento espaços de controle social do SUS, garante-se
da Reforma Sanitária em 19702-8, e, posterior- também, a incorporação de demandas sociais
mente, com a VIII Conferência Nacional de vocalizadas por diferentes sujeitos coletivos.
Saúde, em 1986, na qual foram discutidos o No entanto, para que isso ocorra, é necessário
direito à saúde e a necessidade de um modelo que exista um efetivo controle social e uma
de saúde universal, alicerçado pela prática da gestão participativa, sendo fundamental que
participação social2,9. sejam (re)conhecidos os desafios enfrentados
As propostas incorporadas no relatório final nos diferentes canais de participação popular
da Conferência, contribuíram para a elabo- que, consequentemente, prejudicam o pleno
ração dos artigos 196 ao 198 da Constituição exercício do controle social, possibilitando,
Federal de 198810. Especificamente sobre o ainda, que, mediante esse (re)conhecimento,
princípio da participação da comunidade, este sejam traçadas estratégias que subsidiem a
foi reafirmado na Lei nº 8.080 de 199011, e re- superação dos diversos obstáculos.
gulamentado por meio da Lei nº 8.142 de 1990, Assim, o objetivo deste estudo consistiu em
que dispõe sobre a participação comunitária compreender os desafios enfrentados para a
na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) efetiva participação popular e o controle social
através das seguintes instâncias de partici- na gestão do SUS, nas diferentes instâncias
pação social: Conferências e Conselhos de colegiadas.
Saúde12, que se caracterizam como espaços
públicos deliberativos e de construção da
democracia nas três esferas de governo13,14. Material e métodos
Entretanto, a referida participação, apesar
de ser prevista legalmente, não constitui, ne- Trata-se de uma revisão integrativa realizada
cessariamente, a garantia de sua efetividade a partir da questão de pesquisa: ‘Como a lite-
nas instâncias colegiadas4, pois infere-se que ratura tem abordado a participação popular
muitos desses espaços institucionalizados e o controle social na gestão do SUS?’, na qual
não estejam alcançando um efetivo controle a estratégia de busca aplicada estabeleceu-
social9, o que inviabiliza a garantia de uma -se através do PICo25, em que o acrônimo ‘P’
gestão democrática e participativa no SUS15. (problema) considerou a gestão do SUS, ‘I’
O termo controle social, em caráter par- (fenômeno de interesse) o controle social e o
ticipativo e democrático, é considerado uma ‘Co’ (contexto) a participação popular.
realidade recente no processo histórico do Para tal, foram selecionados os descrito-
Brasil16, sendo dinâmico e encontrando-se res no Medical Subject Headings (MeSH),
em construção17,18. Pode ser compreendido Descritores em Ciência da Saúde (DeCS)

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e EMTREE, nos idiomas português, inglês dois pesquisadores independentes, sendo os


e espanhol, para cada conteúdo, a saber: conflitos sanados por um terceiro avaliador.
Gestão do SUS (“Gestão da saúde da popu- As etapas de identificação, seleção, ele-
lação”, “Política de Saúde”, “Sistema Único gibilidade e inclusão dos artigos científicos
de Saúde”, “Sistemas de Saúde”, “Gestão em foram apresentadas nos resultados através
saúde”, “Cursos de Capacitação” e “Educação de um fluxograma de quatro partes, cons-
Continuada”), Controle Social (“Conferências truído conforme a recomendação Preferred
de Saúde”, “Conselhos de Saúde” e “Políticas Reporting Items for Systematic Reviews and
de Controle Social”) e Participação Popular Meta-Analyses (Prisma)26.
(“Participação da Comunidade”, “Participação
Social”, “Planejamento Participativo” e
“Controle Social Formal”), sendo que os si- Resultados e discussão
nônimos foram combinados por meio do ope-
rador booleano OR e os acrônimos pelo AND. A partir da busca nas bases de dados, foram
A busca dos artigos científicos foi realizada encontrados 253 artigos científicos, dos
em novembro de 2020, nas bases de dados quais, 87 foram excluídos por não se carac-
da Literatura Latino-Americana e do Caribe terizarem como artigos completos (47) e pela
em Ciências da Saúde (Lilacs), US National duplicidade (40). Após a análise dos títulos
Library of Medicine (PubMed), Scopus, e dos resumos dos 166 artigos restantes, 88
Embase e Web of Science por meio do acesso foram excluídos por não atenderem ao cri-
remoto via CAFe no Portal de Periódicos da tério de elegibilidade, apresentando como
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal foco os modelos de controle social realizados
de Nível Superior (Capes). em outros países, as políticas públicas de
Foram considerados como critérios de in- saúde e a política de controle do tabagismo,
clusão os artigos completos publicados no álcool e obesidade. Totalizaram-se, assim, 78
período entre 1988 e 2020, nos idiomas por- artigos para leitura na íntegra, dos quais, 14
tuguês, inglês ou espanhol. E como critérios foram excluídos por abordarem o envolvi-
de exclusão, teses, dissertações, monografias, mento do público e do paciente no processo
manuais e artigos duplicados. de incorporação de tecnologias, as bases
Após selecionar os artigos científicos das socioculturais do controle social em saúde
bases de dados, foi utilizado o aplicativo de indígena, o processo de descentralização
revisão sistemática on-line Rayyan QRCI para do SUS, a vigilância sanitária na agenda do
remover os duplicados e analisar o critério de espaço de controle social, as estratégias de
elegibilidade, a partir dos títulos e resumos, capacitação dos conselheiros de saúde e
no qual foram considerados estudos que os aspectos estruturais e organizativos das
abordassem os desafios para a efetiva parti- instâncias colegiadas, resultando, portanto,
cipação popular e o controle social na gestão em 64 estudos que compõem esta revisão
do SUS. A avaliação aconteceu por meio de (figura 1).

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Figura 1. Fluxograma para seleção dos artigos incluídos nesta revisão de literatura, 2020

Identificação
PubMed (n = 15), Embase (n = 4), Lilacs (n = 98),
Web of Science (n = 15) e SCOPUS (n = 121)
N = 253

Artigos incompletos (n = 47)


Duplicados (n = 40)

Seleção
166 artigos

88 artigos após análise


por título e resumo
Elegibilidade

78 artigos

14 artigos após
leitura na íntegra
Incluídos

64 artigos

Fonte: Adaptado de Moher et al.26.

Nos estudos discutidos na presente revisão desafios das instâncias colegiadas, que in-
de literatura, detectam-se desafios à efetiva fluenciam negativamente o desempenho dos
prática do princípio constitucional de parti- órgãos de controle social, destaca-se a escassa
cipação da comunidade nos diferentes canais participação dos conselheiros de saúde nos
de participação e controle social, sejam eles colegiados28,29, a exemplo dos representantes
formais (Conselhos e Conferências de Saúde) do segmento de usuários30.
ou informais (Conselhos Locais de Saúde – Isso pode ser justificado pela falta de co-
CLS). Logo, diante das singularidades dos nhecimento dos atores sociais a respeito do
órgãos colegiados, esta discussão apresenta-se controle social17,20,23,31-34 e da própria função
estruturada em canais formais e informais de como conselheiros20,28,35, que, consequente-
participação popular. mente, resulta em comportamentos de omissão
ou até mesmo de conformismo36. Além disso,
Desafios das instâncias colegiadas verifica-se o escasso conhecimento a respeito
formais do regimento interno do próprio Conselho20,
o baixo compromisso dos conselheiros com a
A participação social efetiva constitui uma população que representam, as dificuldades
forma de fortalecer o sistema de saúde do em participar das reuniões, a falta e/ou inade-
Brasil27, exigindo, por vezes, que os diferentes quada capacitação18,22,33,34,37-39, o curto prazo
segmentos sociais exerçam oposição a práticas para a avaliação de propostas que exigiam
hegemônicas nas diferentes arenas públicas mais tempo de debate e mais dedicação ao
de disputa, especialmente no setor saúde4. estudo dos temas deliberados, a pressão para
Entretanto, estudos apontam que, entre os deliberação de determinados temas40, o medo

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dos conselheiros de se posicionarem nas instâncias colegiadas em que prevalecem o


reuniões e sofrerem represálias e punições29, autoritarismo, a dominação e a manipulação,
tal como ocorreu entre os trabalhadores da prejudicando a consolidação da participação
saúde41, deixando, inclusive, de verbalizar seus social democrática7,19,36, principalmente diante
pontos de vista e opiniões a fim de preserva- da manutenção de legislações restritivas, como
rem seu vínculo empregatício29, interferindo, ocorre em determinados municípios48.
dessa forma, no andamento das atividades A debilidade no processo participativo
nos Conselhos de Saúde e, consequente- também está relacionada com a desmotivação
mente, dificultando a atuação das instâncias dos conselheiros diante das práticas irregu-
participatórias6,15,34,42. lares na realização e/ou convocação para as
No que se refere à escassez de capacitações reuniões dos Conselhos15,37 e com o deses-
envolvendo os membros dos Conselhos de tímulo perante a dificuldade em exercerem
Saúde, isso pode ser explicado pela falta de influência nos processos de tomada de decisão
interesse dos gestores em qualificá-los e pela dos gestores14, bem como verifica-se a falta de
elevada rotatividade dos conselheiros38, cujo garantia de que a contribuição da sociedade
tempo de mandato, entre os diferentes cole- civil, através da participação nas discussões
giados, varia de dois a três anos; além da cen- e deliberações, será realmente efetivada39,
tralização de informações entre os segmentos assim como a escassez de quórum deliberativo
dos gestores e profissionais da saúde, uma vez nas reuniões22,34, que ocasionam descrenças
que, embora os usuários participem das reuni- entre os atores coletivos quanto à eficácia dos
ões, apresentam uma participação com pouca Conselhos de Saúde, principalmente entre os
qualidade4,14, inviabilizando ou prejudicando, sujeitos comprometidos e atuantes na busca
inclusive, a atuação e o processo de tomada do efetivo exercício do controle social34,39.
de decisão por parte desses atores sociais39,43. O estudo realizado por Pereira et al.33 apre-
Nesse sentido, os estudos reforçam que sentou determinados obstáculos ao exercí-
a educação permanente não tem recebido cio do controle social pelos promotores de
atenção suficiente na agenda e na rotina justiça do Ministério Público, entre os quais,
dos Conselhos de Saúde, comprometendo, citam-se o retrocesso e/ou estagnação do pro-
assim, a eficácia do monitoramento e do pro- cesso de interlocução com os Conselhos de
cesso deliberativo das políticas públicas, na Saúde diante das movimentações da carreira
medida em que o desconhecimento de temas (remoção e promoção), bem como a valori-
fundamentais interfere na discussão, no zação da atuação judicial em detrimento da
funcionamento e nas necessidades do setor intervenção extrajudicial, a falta de autono-
saúde6,7,14,15,20,34,38,41,43-45. mia financeira das instâncias colegiadas para
Todavia, quando ocorrem tais ações educa- articularem sua independência, ausência de
tivas, percebe-se que estas apresentam-se rela- planejamento institucional para a uniformi-
cionadas ao desenvolvimento de capacitações zação das estratégias em saúde e a relação
que utilizam métodos tradicionais, inviabili- republicana com o gestor.
zando a construção coletiva, cuja efetividade De modo complementar, percebe-se que,
requer práticas dialógicas e de escuta, prer- em muitos casos, há fortes influências políti-
rogativas indispensáveis do controle social44, cas, disputas entre os conselheiros de saúde,
possibilitando, dessa forma, o fortalecimento prevalecendo, eventualmente, práticas auto-
da autonomia de atuação dos conselheiros ritárias e revanchismo político entre grupos
e do próprio Conselho de Saúde28,46, assim oligárquicos rivais, principalmente entre os
como proporciona a luta contra a hegemonia membros que representam os usuários, que,
do poder sobre a política pública de saúde4 e na luta por interesses próprios, desconside-
a ‘prefeiturização’47, enraizadas em algumas ram os interesses coletivos em prol do bem

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comum2,5,15,18,22,31,36,37,39,40,49, apesar de haver só é possível quando as demandas da popula-


conselheiros de saúde conscientes a respei- ção são levadas aos Conselhos e quando, em
to da necessidade de prevalecer o interesse sentido oposto, as discussões e deliberações
público e coletivo nas decisões do colegiado, são repassadas à comunidade. A existência
em detrimento dos interesses particulares27. de vínculos sólidos entre conselheiros e as
Estudos abordam, ainda, a cooptação de próprias bases de apoio exige que os repre-
lideranças populares, que prejudicavam, por sentantes se façam cada vez mais presentes
consequência, as ações do segmento de usu- junto a seus representados14,17,50.
ários15, bem como tem sido evidenciado na Ventura et al. 34 identificaram tanto o
literatura que, em certos casos, os Conselhos escasso comprometimento das elites políticas
constituem espaços de conflitos, de envolvi- brasileiras com a democracia participativa
mento político-partidário em que, ocasional- quanto a forte influência da mídia televisiva
mente, prevalecem comportamentos baseados no Conselho de Saúde, que, em diversos casos,
em relações de camaradagem ou que servem funcionava como o meio utilizado pela popula-
apenas como ‘trampolim’ político7,49, o que ção para procurar resolver suas necessidades.
pode comprometer a autonomia decisória do Constatam-se ainda, em diversas arenas
Conselho e ocasionar danos à população49. públicas de decisão, algumas situações,
Com relação a essa problemática, Coelho4 tais como a ‘elitização’ dos conselheiros de
refere que cada instituição/organização, nos saúde, determinada pelos elevados níveis de
Conselhos de Saúde, luta para que seus membros escolaridade e renda desses sujeitos sociais,
se tornem conselheiros, despertando dúvidas quando comparados à média dos usuários do
quanto ao real interesse em participar dos órgãos SUS6,41,51,52, a ‘profissionalização’ dos membros
colegiados, cujas reivindicações da base de re- dos Conselhos de Saúde, caracterizada pela
presentação social dos conselheiros não podem sua falta de renovação devido à baixa rotativi-
sobressair ao interesse coletivo. A autora ainda dade e à ausência de limite para o número de
complementa afirmando que as disputas para mandatos, ocorrendo, eventualmente, apenas
ocupar esses espaços sociais são responsáveis a mudança de conselheiros com relação à ins-
pelo surgimento de conflitos que enfraquecem tituição representada23,34,41,51-53, sendo uma
a participação popular democrática. realidade detectada também nas Conferências
O distanciamento entre representantes e de Saúde, em que verifica-se repetitividade
representados também é um fator que pre- de representantes, dificultando a inserção de
judica a consolidação do controle social em novos membros e, consequentemente, de novas
saúde, interferindo na legitimidade da repre- pautas54, bem como a existência de ‘policon-
sentação2,5,8,15,18,22,23,30,50. Estudos complemen- selheiros’, como são conhecidos os cidadãos
tam, ainda, que muitos conselheiros de saúde, que participam de diversos Conselhos37, que
além de não compartilharem as decisões do implicam, por conseguinte, a perpetuação
Conselho com seus representados, também de práticas que resultam na insuficiência do
não possuem vínculos com suas bases sociais, exercício democrático20.
o que explica o reduzido interesse, a escassa Entre os aspectos de estrutura, funciona-
participação da comunidade nas discussões mento e organização das instâncias colegiadas
das políticas de saúde locais e a descrença que prejudicavam a prática do controle social
quanto ao potencial das instâncias participa- no SUS, destacam-se: deficiência de infraes-
tivas em melhorar a qualidade das condições trutura desses espaços públicos, incluindo
de saúde da comunidade6,14,18,23,45,47,49. sede própria e equipamentos básicos33,34,45;
De acordo com Serapioni e Romaní14, a re- falta de apoio administrativo, operacional e
presentatividade dos Conselhos, caracterizada financeiro8,19,33,34,39; horários das reuniões e
pelo vínculo entre conselheiros e comunidade, dificuldades do dia a dia (tal como o cansaço

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físico após a jornada de trabalho) que inviabi- governos locais (típicos de práticas autoritá-
lizavam a participação de muitos cidadãos34; rias que, além de limitarem as demais forças
disponibilidade de tempo, especialmente presentes no Conselho, interferem diretamente
entre os representantes de usuários4; precá- na autonomia financeira e administrativa dos
ria divulgação das ações desenvolvidas pelos colegiados); dificuldades na integração entre
Conselhos de Saúde, dificultando o vínculo o Conselho e o governo, além das fragilidades
com a comunidade pela falta de comunicação e no monitoramento, na fiscalização e no acom-
transparência8,28,47,52,55, prevalecendo debates panhamento das ações sobre as quais havia
centrados numa abordagem técnico-científica, deliberado15,18,30,34,39,48,56. O exercício financeiro
em detrimento da discussão relacionada à po- de muitas gestões não havia sido avaliado e, em
lítica social41; falta de acesso e/ ou interesse na alguns casos, mesmo diante de irregularidades
busca de informações20,37,40,45,50; repetição de e/ou superficialidade, sempre era consentido
pautas nas reuniões34; formulação das pautas pelos conselheiros, pressionados para que apro-
exclusivamente pelo presidente do Conselho31 vassem imediatamente os balancetes15, preva-
ou pelas Secretarias de Saúde e cujas decisões, lecendo o escasso tempo destinado à análise
em sua maioria, já estavam tomadas23,43,47,49. detalhada dos gastos e a reduzida discussão
A respeito dos segmentos sociais que sobre essa temática23,35. Nesse sentido, salienta-
compõem os Conselhos de Saúde, alguns -se que a capacidade de parte significativa dos
estudos apontam que nem sempre há parida- Conselhos de Saúde em controlar e participar
de nesses colegiados, prevalecendo a hiper- da administração dos recursos financeiros pode
-representação do segmento dos gestores, que ser considerada frágil50.
resulta no aumento da sua influência frente ao Gonçalves et al.57 revelam que a escassa
processo deliberativo47,48,53, bem como verifica- disponibilização dos relatórios de prestação
-se que, quanto às instituições representadas de contas em sítios eletrônicos prejudicava
nos Conselhos, a participação de instituições o controle social pela sociedade em geral e
que representam grupos da sociedade civil pelos próprios conselheiros de saúde, pois
bem organizados se sobressai, em detrimen- dificultava o amplo acesso às informações
to daquelas com menor organização e força econômico-financeiras, imprescindíveis para
social39, havendo, inclusive, a integração de um efetivo controle social, além da falta de
grupos historicamente marginalizados (de- padronização previamente estabelecida pelas
ficientes, idosos, afro-brasileiros e pessoas Secretarias de Saúde sobre como deveria ser
vivendo com HIV/Aids e hanseníase), agora feita a elaboração de informações de natureza
atuantes no planejamento de saúde nas arenas econômica e financeira.
públicas de decisão27. Nesse sentido, as instâncias participati-
No contexto dos Conselhos de Saúde, detec- vas funcionavam como órgãos de ‘enfeite’,
ta-se, também que nesses canais de participação prevalecendo a capacidade consultiva, em
prevaleciam: a existência de pauta apresentada vez da atuação deliberativa, e com postura
com significativa exposição técnica, além de centralizadora da gestão, refratária ao con-
tensões entre os diferentes segmentos, que trole social, com nítido descumprimento
transformavam a plenária em verdadeiros dos princípios fiscalizador e democrático,
campos de batalhas; ausência do segmento reduzindo os Conselhos de Saúde a meros
gestor nas reuniões, que, por vezes, era interpre- legitimadores de políticas públicas elaboradas
tada como ‘falta de compromisso do governo’22; pela gestão20,23,35,42,43,47,49,50, ocasionando sen-
deliberações do colegiado não homologadas ou timento de impotência e distanciamento dos
executadas pelo gestor; visão centralizadora conselheiros das discussões e deliberações15,23.
com o não reconhecimento dos Conselhos como Percebe-se, ainda, uma limitação significa-
espaços formais de participação social pelos tiva dos Conselhos de Saúde relacionada à

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ausência de autoridade legal em intervir nas Entre outras estratégias, é fundamental para
decisões governamentais, a fim de que fossem um efetivo controle social a parceria entre os
implementadas as deliberações referentes às Conselhos de Saúde e os gestores do SUS para
políticas de saúde39, justificando, assim, o re- a construção de projetos coletivos em que di-
duzido impacto sobre a reestruturação dos ferentes atores, conjuntamente, potencializem
serviços de saúde52. a cooperação, destinada ao desenvolvimento
Além do mais, ressalta-se que a participa- de políticas públicas de saúde conforme as
ção dos secretários de saúde como membros demandas populacionais locais, em oposição
natos, respaldados pelo regimento interno, às práticas de cooptação17,23.
desempenhando até mesmo ‘naturalmente’ a Somado a isso, salienta-se a importância
função de presidentes do colegiado47,58, mesmo da democratização da comunicação e da in-
diante de escolhas democráticas, por meio de formação para uma melhor articulação entre
eleição, ocasionava na sociedade civil uma falta governo, instâncias colegiadas e sociedade
de apropriação quanto à plenitude do exercício civil7,24, que pode ocorrer através de informa-
democrático do controle social48. tivos18, jornal2 e endereço eletrônico, sendo
A prática burocratizada das instâncias necessário considerar, nesse caso, as pessoas
participatórias surge no momento em que há que não possuem computador, acesso à in-
o desequilíbrio de poder entre os diferentes ternet ou que não dominem as tecnologias
segmentos sociais, ou seja, quando há uma de informação36 – o que caracteriza como
relação assimétrica de poder entre os conse- ‘iniquidade digital’ que inviabiliza a busca de
lheiros de saúde, resultando, dessa forma, em informações no ambiente virtual, ocasionando,
instâncias colegiadas inacessíveis e frágeis47, assim, dificuldades de atuação dos sujeitos
conforme verificado nas cúpulas das asso- sociais diante de discussões e deliberações
ciações nos Conselhos Distritais de Saúde dos órgãos colegiados38.
do município do Rio de Janeiro, nas quais Com relação aos instrumentos de gestão do
prevalecia a relação desarmônica de poder SUS, compreende-se que, em determinadas
que inviabilizava a participação do cidadão situações, também se caracterizem como de-
comum para assumir o cargo de conselheiro safios ao controle social devido à ausência de
distrital de saúde – caracterizando a ‘oligar- transparência dos gestores quanto à apresen-
quização’ das associações, representada pela tação dos referidos instrumentos, bem como
longa permanência das lideranças na direção devido à falta de conhecimento e à dificuldade
dessas instituições, bem como pelo controle dos conselheiros em analisá-los20,35,36,45,55, que
da cúpula sobre a escolha dos membros –, resulta, principalmente, dos diversos termos
refletindo, assim, o monopólio da governança, técnicos e contábeis que os caracterizam, in-
que, historicamente construída, caracterizou fluenciando, inclusive, na recomendação de
a trajetória política brasileira51. melhorias através dos pareceres elaborados,
A fim de que assimetrias relacionadas ao bem como devido às precárias infraestruturas,
processo decisório diminuam, é fundamental tal como disponibilidade de computador com
o conhecimento e o acesso à informação para internet e familiaridade para acessar infor-
que o Conselho de Saúde atue realmente como mações disponibilizadas, principalmente de
órgão deliberativo, com ampliação da capaci- forma virtual36,57.
dade de argumentação dos diferentes sujeitos Um exemplo disso é o estudo de Pacheco
coletivos, não exercendo meramente papel et al.35, em que, apesar de os conselheiros de
reivindicativo4,24,55, incluindo a divulgação das saúde compreenderem que o controle e a fis-
decisões para a população de forma clara, com calização da accountability das Organizações
linguagem próxima do universo conhecido Sociais em Saúde (OSS) constituem atribui-
por todos24. ções do Conselho, há entraves estruturais

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que impedem operacionalmente tais ações, os participantes daquelas instâncias54, preju-


como a insuficiência de informações ou de dicando o exercício democrático do princípio
transparência na forma como os recursos são constitucional da participação popular no SUS.
utilizados e a prestação de contas com lin-
guajar não acessível a todos, dificultando o Desafios das instâncias colegiadas
acompanhamento e a deliberação de processos informais
das OSS. Sobre isso,
Apesar de a Lei nº 8.142/90 regulamentar as
é necessário ter em mente que o controle social Conferências e os Conselhos de Saúde como
não se faz apenas a partir da abundância de instâncias colegiadas de participação social
informações, mas também do entendimento em saúde, nos diferentes níveis de governo,
que o cidadão dela faz35(8). há outras formas de gestão participativa no
SUS61, conforme estabelecido na Resolução
Ainda nesse sentido, outro estudo acrescenta nº 453/2012, do Conselho Nacional de Saúde,
que o Conselho não participava da elaboração por meio da criação de espaços descentraliza-
e da revisão das ações direcionadas ao planeja- dos para o controle social, tais como os CLS,
mento em saúde, assim como foi desconsidera- vinculados às unidades de saúde, que visam
da a incorporação das propostas aprovadas nas ao fortalecimento do exercício de cidadania e
Conferências de Saúde, que também deveriam consolidação do SUS3. Além disso, no processo
fazer parte da programação59, revelando que de descentralização, há os Conselhos Distritais
esse órgão colegiado funcionava mais como de Saúde Indígena, integrantes dos Distritos
‘simulador de participação’, com reduzida efe- Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), que
tividade política frente àquilo que era debatido possibilitam a participação e a governança
e acordado54, sendo inclusive identificada a indígena no processo de tomada de decisão62.
falta de deliberações propositivas de políticas Além de garantir a participação no processo
de saúde originadas pela plenária de conselhei- deliberativo, tais espaços públicos proporcio-
ros, sugerindo que o Conselho desempenhava nam, ainda, aos diferentes sujeitos coletivos a
predominantemente a aprovação de propostas possibilidade de acompanhamento, fiscaliza-
oriundas dos gestores56. ção, avaliação e indicação de prioridades em
Observa-se, também, na literatura que as saúde a serem aplicadas localmente3,61,63,64,
Conferências de Saúde caracterizavam-se, favorecendo o processo e o fortalecimento de
ainda, pela inexistência de vínculos fortes organização58 e proporcionando a participação
entre representantes e representados, falta social institucionalizada nas comunidades63.
de uma representação efetiva, escassa di- Entre os desafios enfrentados pelas arenas
vulgação e insuficiente comunicação para colegiadas descentralizadas, citam-se o in-
a população a respeito da mobilização para teresse pessoal dos usuários e conselheiros
participação, interferência político-partidária, de saúde, em detrimento do interesse cole-
repetitividade acentuada de pautas discutidas, tivo3,27,47,62,65-68, a falta de definição das atri-
predomínio da defesa dos interesses pessoais buições dos conselheiros – sobressaindo-se
(sejam eles individuais, de segmentos ou de tanto a insuficiência de clareza sobre as suas
grupos sociais), sendo verificado, também, que, reais funções dentro dos Conselhos quanto a
ocasionalmente, prevalecia o esquecimento dificuldade em se reconhecerem como con-
das deliberações geradas nas Conferências selheiros –, bem como o despreparo desses
de Saúde que, além de não serem efetivadas atores sociais quanto ao desenvolvimento
pela gestão governamental54,60, também não das próprias atribuições nas instâncias co-
eram retomadas pelos Conselhos, gerando a legiadas42,62,64-67, podendo esse despreparo
sensação de desmotivação e descrédito entre ser explicado pelas pausas prolongadas no

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funcionamento dos Conselhos criados há mais nos encaminhamentos do colegiado21,61, visto


tempo21, assim como verifica-se o reduzido que há uma reconhecida cultura de excessi-
preparo da população para participar de forma va valorização do saber técnico nos espaços
qualificada nos Conselhos64, prejudicando, deliberativos18.
consequentemente, a construção e efetivação Nesse sentido, Mittelbach e Perna68 relatam
do controle social nesses espaços3,32. que um desafio para um efetivo controle social
Diehl e Langdon62 complementam que, no no Brasil está relacionado à influência política
cenário dos Conselhos Locais e Conselhos enraizada historicamente em regimes cen-
Distritais Indígenas, muitos indígenas – além tralizados e autoritários, que resultam, por
de atuarem como conselheiros de saúde – eram exemplo, no afastamento de trabalhadores da
também funcionários da Fundação Nacional saúde dos processos da gestão participativa,
do Índio (Funai) ou Fundação Nacional de tendo como resultado a ausência de consci-
Saúde (Funasa), resultando, dessa forma, em ência política.
demandas individualizadas por parte desses Além de reduzidas ou ausentes organiza-
sujeitos sociais que, em geral, não refletiam ções comunitárias, vínculo frágil entre repre-
os interesses coletivos. sentantes e representados, não remuneração
Entre outros aspectos, estudos abordam a diante da dedicação e do tempo investido,
descrença da comunidade quanto às atividades prevalência de uma cultura de cooptação dos
desenvolvidas nos CLS, motivada, sobretudo, representantes de usuários que lutavam por
pelo histórico de frustrações da população interesses próprios, imediatismo, destaque
com relação à pouca resolutividade dessas associado ao cargo, relacionado à possível
instâncias participatórias32,65,67. Tais estudos facilitação de acesso a serviços e exames de
discorrem, também, sobre a falta de acesso saúde; e, por fim, profissionais de saúde com
da comunidade a informações sobre a finali- dupla jornada de trabalho e falta de estímulos
dade dos Conselhos69, justificando os baixos para participação efetiva3,61,68, em especial,
níveis de mobilização social e envolvimen- os enfermeiros dos CLS, que acreditam que
to comunitário3, além de serem detectados sua atribuição esteja centrada exclusivamente
outros aspectos: influência da política parti- na divulgação das ações e necessidades dos
dária, horário das reuniões, falta de compro- serviços da Atenção Primária à Saúde64 ou
misso/ pertencimento de alguns membros reconhecem que seu papel nessas instâncias
dos Conselhos66,67,70, cultura do clientelismo colegiadas tem sido de orientação dos usuários
(especialmente relacionada a interesses parti- para que participem delas, acreditando mais
dários ou políticos)64, falta de uma política de na eficácia dessa participação do que na sua
educação popular e capacitação permanente própria64,68, despertando, assim, a seguinte
em saúde, medo de discriminação, reduzida reflexão “como ‘convencer’ o outro dos bene-
assiduidade de conselheiros nas reuniões (re- fícios de algo que não se acredita para si?!”68.
sultando em baixa frequência de reuniões pela
falta de quórum), fragilidade na mobilização
social3,21,42,61,62,65,70, havendo, ainda, elevada Conclusões
rotatividade de conselheiros21 – inclusive
entre os conselheiros de saúde indígena62 –, Apesar da permanente tradição autoritária e da
dificuldade em utilizar computador e inter- baixa cultura participativa no Brasil, durante
net, desconhecimento técnico32, centraliza- os 30 anos de existência do SUS é possível
ção do poder, especialmente no segmento dos verificar avanços na descentralização e na
trabalhadores da saúde, devido ao domínio democratização das políticas públicas com
dos termos técnicos, potencializando a in- a participação popular na área da saúde, por
fluência desses sujeitos sociais nas decisões e meio dos Conselhos e Conferências de Saúde

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que constituem-se em canais de participação estabelecimento de relações horizontalizadas


e controle social que oportunizam a incor- entre Estado e sociedade. Para a superação dos
poração das demandas sociais verbalizadas diversos obstáculos, é fundamental que seja
por diferentes sujeitos, resultando, assim, na garantida a pluralidade dos membros, critérios
defesa dos interesses coletivos. transparentes na sua escolha, conhecimento
Compreende-se que somente através de da função a ser desempenhada nas instâncias,
uma efetiva participação popular tornar-se-á rotatividade e compromisso dos conselheiros,
possível a autonomia dos cidadãos, o desen- desenvolvimento de gestão transparente, de-
volvimento de consciência crítica, o fortale- mocratização da informação, além de vozes
cimento da cidadania, a proteção do direito à qualificadas, resultantes da capacitação dos
saúde, bem como a materialização de um SUS conselheiros de saúde através de práticas de
efetivo e resolutivo, pois segundo Duarte e educação permanente.
Machado17, “a consolidação do SUS passa pelo
fortalecimento do controle social”.
No entanto, os espaços institucionalizados Colaboradores
de participação – em especial, os Conselhos
de Saúde, considerados arenas públicas de Gomes JFF (0000-0001-9096-6930)* e Orfão
poder, conflito e negociação – vêm enfrentan- NH (0000-0002-8734-3393)* contribuíram
do desafios que influenciam negativamente o igualmente para a elaboração do manuscrito. s

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