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Sexo - é um conceito biológico, que se pode constituir como variável de pesquisa,

baseado em características físicas e biológicas.


Género - é um conceito a ser definido e explicitado, não podendo constituir-se como
variável de pesquisa, que se considera como sendo uma construção social e como sendo a
elaboração cultural do sexo.

“O género refere-se a uma estrutura de relações sociais centrada na esfera reprodutiva


e num conjunto de práticas que trazem as diferenças inscritas no corpo para os processos
sociais” - Connell
“O género não é simplesmente um sistema de classificação através do qual homens e
mulheres são separados e socializados com base no seu sexo biológico. O género também
ilustra a desigualdade universal entre homens e mulheres. Quando falamos de género,
falamos também de hierarquia, de poder e de desigualdade, não só de diferenças.” - Connell

 é a experiência e a prática social que criam diferenças entre homens e mulheres, e não
a parte biológica
 os contributos da sociologia e dos estudos do género passam por tornar o género e
sexo como tema transversal às ciências e à realidade social

Importância de estudar o género?


- compreender como é que o género é construído num contexto socio-histórico ao
nível global; desconstruir mitos e essencialismos
- dar conta de um conjunto muito diversificado de experiências vividas por pessoas
muito distintas nas nossas sociedades e em diferentes partes do mundo; dar voz a quem
habitualmente não tem
- construção social com efeitos na vida das pessoas; o género é também um sistema
de desigualdade que distribui de forma diferenciada recursos e poder

Importância do género para a sociologia?


- princípio organizador do mundo social que atravessa todas as dimensões da vida
- contribui para explicar comportamentos e assimetrias de poder nas sociedades
porque configura/molda identidades e sistemas de disposição dos indivíduos
- configura/molda interações sociais
- organiza instituições e estruturas sociais, por exemplo: regras da vida

A sociologia tem pais fundadores, mas não tem mães fundadoras:


- a sociologia foi inicialmente concebida como uma ciência desenvolvida por
homens brancos, europeus de classe alta e heterossexuais
- Marx, Durkheim e Weber assumiam como sendo universais certas experiências e
comportamentos sociais, independentemente do género ou orientação sexual dos
indivíduos
- as mulheres e os seus problemas específicos na sociedade sempre estiveram
presentes na construção e consolidação da sociologia enquanto ciência social e olhar
específico sobre a realidade, mas contudo, essa presença era fortemente condicionada; era
uma presença silenciosa e subalternizada: quer enquanto objeto de estudo, quer enquanto
sujeitos produtos do conhecimento e de fundação da sociologia
- no momento da sua função (final do século XIX) e consolidação, a sociologia era
uma ciência denominada por homens; as mulheres não tinham voz direta na produção e
consolidação sociológica na produção do pensamento sociológico
Limitações sociológicas:
- assumir os homens como ponto de referência de todos os seres humanos: o
falso neutro
- dificuldade em assumir as mulheres como objeto de estudo legítimo ou a
limitação do estudo sobre as mulheres no mundo social a aspetos da vida social limitados
(ex.: estudos sobre as mulheres apenas no domínio privado; sociologia da família surge
como a principal área de visibilidade das questões de género, contrariamente à sociologia do
trabalho, das organizações, etc.)

Os clássicos da Sociologia e o género:


 Engels: “The conditions of the working class in England”
- publicado em Inglaterra em 1845
- baseado na sua experiência na cidade de Manchester
- apresenta, ainda que de forma incipiente e relativamente lateral, a
preocupação específica com as condições de trabalho e de vida das mulheres e das crianças
- o autor percebe que a mulher tem um papel fundamental no fator
reprodução das classes sociais
 Comte: “System of Positive Polity”
- publicado em 1851
- primeiro “tratado da Sociologia”
- as mulheres eram percebidas por este fundador do positivismo como uma
importante base da sociedade, desempenhando mesmo um papel determinante na sua
transformação, mas apenas se se mantivessem na sua esfera natural e específica como
cuidadoras dos homens
 Stuart Mill: “The Subjection of Women”
- publicado em 1869
- uma visão radical, para a época, sobre a condição das mulheres
- advoga a igualdade
- a desigualdade não será uma questão natural, nem uma questão de
superioridade moral dos homens - que lhes advém do facto de serem homens e terem
nascido homens
- identifica como razão para a desigualdade entre homens e mulheres a
força física
- uma questão de dominação masculina enredada na questão da força, da
violência, como formas de imposição da subalternidade
 Engels: “A origem da família, da propriedade privada e do Estado”
- publicado em 1884
- a subalternização das mulheres e a dominação das mulheres como forma
de garantir a passagem e a reprodução da propriedade privada entre diferentes gerações da
família
- as mulheres e o papel reprodutivo da família e da riqueza
- a dominação das mulheres e a subalternização - a remissão para a esfera
doméstica e afastamento da esfera pública - teria a ver com a necessidade dos homens
(donos da esfera pública e produtiva)
 Simmel: “On the sociology of the family”
- publicado em 1895
- primeira visão sobre a origem da família
- discute o papel da mulher na família, alternando para a sua continuada
subalternização e dominação
- a questão do dote da mulher é considerado um aspeto fundamental
para a perpetuação da sua condição subalternizada: objetivação da mulher, lugar passivo,
tutelada e mercadonizada por e entre os homens
- problematiza o lugar da mulher na sociedade contemporânea durante
aquela época
- a mulher é objeto de transição das famílias

Estereótipos - teorias automáticas


- representações simbólicas dos sexos
- se estes não existirem, nós não sabemos como agir no dia-a-dia, pois
estes permitem-nos viver o quotidiano porque conhecemos e sabemos o que se passa
- podem ser positivos ou negativos
- são interiorizados através da socialização

Feminismo - é um movimento que luta contra a opressão exercida nas mulheres e que
luta a favor da igualdade entre géneros
Impacto fundamental do feminismo:
- reformulação pela igualdade entre mulheres e homens e contra outras
formas de descriminação
- na reformulação teóricas das disciplinas das ciências socais e na sociologia
(pôs na agenda sociológica as questões do género e da sexualidade)

1ª Vaga Feminista
 Ocorre entre 1840 e final da década de 1920
 Cruza-se com a emergência da sociologia
 A luta das mulheres passa fundamentalmente pela conquista de direitos cívicos iguais
para mulheres e homens: participação na esfera pública, nomeadamente o direito ao
voto
 Identificar o género e as desigualdades
 Fica conhecido como “sufragista”
 Este movimento/vaga também esteve atenta ao acesso à educação e ao ensino superior,
à intimidade, à conjugalidade, à sexualidade, etc.
 A sexualidade como desejo e a importância do desejo no feminismo: um desejo que não
fosse apenas físico
 Vínculo entre sexualidade e amor, contrapondo com uma sexualidade meramente física
considerada fama da dominação masculina
 O importante era as mulheres terem controlo no seu corpo e sexualidade
 Identifica-se claramente que as desigualdades entre homens e mulheres não são
naturais, mas sim socialmente construídas e, portanto, um lugar de intensa luta política
e um palco para transformação social
Impacto do feminismo de 1º vaga na Sociologia:
- Weber nunca escreveu sobre feminismo ou sobre as mulheres, pelo
menos diretamente. Na fase final da sua vida, escreveu sobre a intimidade, o amor e o
erotismo. Nesses textos revelou algumas proximidades concorrentes do feminismo, na
medida em que percebia a intimidade e o erotismo como formas de se atingir uma verdade
antológica do ser humano
- Algumas correntes do feminismo contrapunham esta visão do amor e
da sexualidade a uma outra dominação, da vidência e da obrigação - dominação masculina
na esfera do amor e da sexualidade
- Weber tem um papel ativo na defesa do acesso das mulheres ao
grau de doutoramento na sua universidade; defende que as mulheres podem e têm o direito
a doutorar-se, a seguirem a carreira académica
-Os fundadores da Sociologia estavam envolvidos indiretamente nas
lutas pela igualdade
- Simmel, ao contrário de Weber, vivendo a modernidade
fortemente marcada pelos movimento feministas e pela vida das mulheres por uma
cidadania plena (participação política e acesso ao mercado de trabalho), pretende integrar
as mulheres no seu pensamento sociológico), sendo considerado o primeiro sociólogo a
transformar as mulheres num objeto de estudo legítimo. Mas esta integração é feita à custa
de muitas contradições na sua obra, ou pelo menos aparentes contradições
» por um lado, mantém em muitos textos a ideia que
vincula diferenças biológicas com funções ou papéis distintos para homens e mulheres.
Mostra-se preocupado com as mudanças e transformações que os movimentos feministas
trouxeram e com a crescente participação das mulheres na esfera pública e o que podem
trazer para uma tradicional organização quotidiana da vida social e familiar. Reforça o papel
das mulheres como cuidadores e responsáveis pela família e como destinadas às tarefas
emocionais
» por outro lado, preocupa-se legitimamente com o
problema da subalternização das mulheres na sociedade moderna, nomeadamente no seio
da família; as mulheres como objeto de estudo primordial; a questão biológica dos homens e
das mulheres contribui para a reprodução da desigualdade

Parsons e o seu modelo sobre a família:


- papéis de género
- teoria funcionalista, ou seja, funções pré-determinadas
Recusa do modelo Parsoniano da família:
 Betyy Friedan: “Feminine Mystique”
- desperdício que é para as sociedades modernas e avançadas remeter as mulher a
uma única esfera da vida social, a doméstica
 Christine Delphy: “The Main Enemy”
- centra-se na divisão do trabalho e chama a atenção para as situações de
exploração económica que as mulheres estão sujeitas
- trabalho pago = homens; trabalho doméstico e não pago = mulheres
 Gayle Rubin: “The Traffic in Women”
- integra o feminismo e antropologia na construção de um modelo sofisticado de
explicação do sistema sexo/género

2ª Vaga Feminista
Esta segunda vaga inicia-se na década de 60 nos EUA. Simone Beauvior foi uma grande
influência, tendo em conta que a sua visão assentava no facto de ser mulher se tratar de
uma construção a nível do tempo histórico bem como do tempo biográfico.
A afirmação de Charlott Bunch marca esta fase do feminismo: “Não há domínio da
esfera privada que não seja política, e nenhum que não seja radicalmente pessoal” - isto é,
não há esferas que diferenciam homens de mulheres, caso isto exista encontramos
desigualdade.
A segunda vaga apresenta-se como movimento influenciado pelo estruturalismo
(estruturas regem o nosso quotidiano que afeta diretamente o individual e o coletivo), ou
seja, rejeição da ideia da liberdade humana radical.
 Feminismo Liberal:
- as desigualdades são fundadas pela distinção entre esfera pública e privada
- a esfera privada pertence às mulheres associadas ao trabalho doméstico e à
educação dos filhos, que conduz as mulheres a uma dominação emocional, económica e
social dos homens, visto que as recompensas da vida social como o dinheiro, o estatuto, o
poder, etc. estão presentes na esfera pública à qual as mulheres não teriam acesso
- o que produz as desigualdades de género é uma ideia de sexismo, que limita as
mulheres desde a infância até à idade adulta deixando-a dependentes e subjugadas aos
papéis de género
- modelo parsoniano da família: mulher trata da casa, homem trabalha; foi atribuído
ao homem o papel instrumental e à mulher um papel emocional/efetivo que desempenha as
atividades domésticas
 Feminismo Marxista:
- algo profundamente contemporâneo
- combina a análise marxista das classes socais com a protesta social feminista, o
que deriva numa teoria da desigualdade entre os géneros
- estas feministas enquadram todas as relações de género no que consideram ser a
estrutura fundamental do sistema de classes socais, isto é, todas as experiências dos
indivíduos são um reflexo, em primeiro lugar, da sua posição de classe, em segundo, do seu
género
- as mulheres de classes sociais diferentes (porque têm acesso a recursos e poderes
diferentes) têm entre elas menos experiências de vida em comum do que mulheres e
homens da mesma classe social
- dentro da mesma classe social, as mulheres estão sempre em desvantagem face
aos homens relativamente ao estatuto social, ao poder e das possibilidades de
auto-realização
- as causas das desigualdades entre homens e mulheres residem, em grande parte,
no sistema capitalista, que organiza as relações sociais/as estruturas sociais
- a única solução encontrada para acabar com as desigualdades de género passam
pela revolução, visto que esta eliminaria a opressão na classe social
- ser-se homem ou mulher varia de classe social para classe social
 Feminismo no cruzamento entre a psicanálise e o estruturalismo:
- esta junção tem a ver no sentido em que a psicanálise é propensa às
desigualdades, visto que as mulheres pertencem à parte sentimental e o homem à parte
económica (estereótipos)
- reavaliam os possíveis contributos da psicanálise para a compreensão das
desigualdades de género e para as relações de género
- os contributos da psicanálise são contextualizados atualmente
- não se perde a influência das estruturas sociais (como sucede com a terceira
vaga e o cultural turn)
- enquadram-se nas teorias da opressão: as mulheres encontram-se numa
situação em que os homens as usam, controlam, submetem e oprimem
 Feminismo Radical:
- nasce na altura que começa a luta pelos direitos LGBT
- profunda indignação perante a sua opressão
- as integrantes deste movimento querem acabar com a opressão
(desigualdades) que provém da dominação, conflito e poder
- para estas feministas, a sociedade caracterizar-se pela opressão das mulheres
- a estrutura fundamental dessa opressão é o género baseado no sistema do
patriarcado
- a violência é um aspeto fundamental para a reprodução da opressão das
mulheres pelos homens e a dominação masculina
- a violência, a opressão e dominação masculina é feita nas seguintes “áreas”:
» trabalho
» sexualidade (prostituição e pornografia - abolição)
» recursos económicos
- para acabar com o conflito, as mulheres teriam que se fazer ver

3ª Vaga Feminista
 A influência do pós:
- fortemente influenciada pelo pensamento pós-moderno, pós-estruturalista
e pós-colonialista
- associa-se fortemente ao movimento do cultural turn
- as classes sociais perdem importância para os estilos de vida (passagem das
desigualdades de acesso a recursos para a lógica de opção livre)
- existe uma visão periférica do género em que este se produz da forma como
os homens e as mulheres se encontram de acordo com as expectativas (diferenças)
atribuídas, visto que o género se faz pela ação
- a visão estruturalista dá lugar a olhares que percebem a existência de
sociedades líquidas, de sociedades individualizadas
- há uma centralidade da sexualidade em que as mulheres são livres de ter
desejos bem como de escolher a sua orientação sexual, visto que se cria um identidade
através da sexualidade, ou seja, há uma perda do ideal de opressão para passar a uma esfera
de interação
- há uma importância no pós-colonialismo com a questão racial, visto que
ser mulher em Portugal é diferente de ser mulher na Tailândia e é dever dar-se voz a essas
diferenças pelas experiências de vida dessas mulheres, de modo a espalhar as características
de cada tipo de mulher
- a sexualidade é uma fonte de emancipação, uma dimensão da vida sexual
 A emergência do pós-estruturalismo:
- rejeição do estruturalismo
- a linguagem não se limita a transmitir pensamentos ou significados
- não há qualquer existência fundamental básica, essencial ou ontológica
fora da linguagem
- a base da realidade é feita à base de discursos, visto que é impossível não
usar linguagem, assim, a realidade é formada por esta, que ao longo do tempo fica extensa
- as nossas identidades são reguladas por discursos já existentes, em que
sabemos a posição em que se encontram homens e mulheres
- as nossas identidades são produto da forma como a linguagem nos
posiciona, nos descreve, ou nos define - como nos limita a existência
- não há uma verdade absoluta e que esta realidade pode ser alterada
com os discursos
 A importância de Michel Foucault:
- centralidade da linguagem
- poder do discurso
- nada existe fora do enquadramento da linguagem e do discurso
- a linguagem que usamos serve como enquadramento para
compreender a interação com a realidade
- os discursos regulam a realidade e de como esta influencia a nossa
atuação dentro dela
- os discursos definem, também, o que deve ser o homem e a mulher,
visto que constroem a realidade e alguns dos estereótipos existentes face às expectativas
esperadas de acordo com o género
Judithe Butler - Visão Performativa do Género:
 Pretende dissolver a dicotomia sexo vs género, que fornece às feministas possibilidades
de problematização da “natureza biológica” de homens e de mulheres
 Para Butler, na sociedade contemporânea, estamos perante uma “ordem compulsória”
que exige a coerência total entre um sexo biológico, um género e um desejo/prática
sexual
 A sua ideia é desmontar as ligações; o género e o desejo tornam-se mais flexíveis,
líquidos e não determinados ou causados por outros fatores
 O género, mais do que um atributo fixo de um indivíduo, deve ser entendido como uma
variável fluída e pode mudar em diferentes contextos e ao longo do tempo (histórico) e
do tempo biográfico
 A performance de género também não é exclusivamente automática ou mecânica; pelo
contrário, responde a um desejo dos indivíduos serem reconhecidos pelos outros, ao
desejo de não serem marginalizados
 O género, bem como os projetos individuais de existência, formam-se através de atos
de repetição e de imitação, e não resulta de uma essência antológica que existe antes
da repetição
 Todos nós colocamos em prática performances de género
 O género produz-se e reproduz-se na exata medida em que homens e mulheres
desempenham aquilo que deles é esperado enquanto homens e mulheres
 O género faz-se na ação:
- performance conservadora: reprodução das identidades e dos papéis de género
e das expectativas normativas da feminilidade e masculinidade
- performance disruptiva: criação de novas formas de feminilidade e
masculinidade, nomeadamente aquelas associadas à orientação sexual; formas de
identidade que questionam e desafiam as expectativas normativas que definem o que é ser
homem e mulher
 Pretende romper com a ideia de que o sexo biológico seja a base das desigualdades e
com o que significa ser-se homem ou ser-se mulher
 Sexo: biológico e físico; nascemos com um determinado sexo
 Género: é culturalmente construído; expectativas com características normativas de
modo a nós nos comportarmos de uma certa forma; resulta do sexo biológico
 Sexualidade: incorpora regras inseridas, bem como as expectativas
 A autora tenta desconstruir este aspeto porque há exceções a este modelo, visto que
alguém pode nascer homem, incorporar comportamentos de mulher e ser homossexual;
por isto mesmo, não devemos ficar restringidos a um modelo, mas sim regular o nosso
caminho
 Baseia-se na teoria de Foucault, que afirma na obra “The history of sexuality”, que a
construção de sexo é produzida e regulada através de um serviço social e pelo controlo
da sexualidade, em que está em causa a satisfação dos desejos sexuais do homem e da
mulher que são formulados por discursos; de forma sucinta, o género resulta de
discursos
 Género como performance: a repetição é feita através dos limites estabelecidos pelos
discursos reguladores normativos, ou seja, realidade; se rompermos com isto, não
somos válidos para o típico ideal

A centralidade da sexualidade:
- a sexualidade enquanto esfera da vida onde se jogam relações de poder,
passando a ser vista como uma esfera de potencial emancipação das mulheres -
emancipação através da afirmação dos seus desejos e da sua sexualidade
- a sexualidade deixa de ser vista como uma estrutura de opressão das
mulheres e dominação masculina
- emergência das “sex wars” (década de 1980) que ainda hoje perdura entre
diferentes correntes do feminismo - confronto entre as feministas de terceira vaga que
percebem o sexo como prazer e emancipação vs feministas de segunda vaga (sobretudo as
radicais) que entendem o sexo como perigo e opressão/objetivação

 papéis de género produzem homogeneização dos homens e das mulheres pois existe
apenas duas possibilidades de papéis
 noção de papel sexual deriva do conceito de papel social formado na
estrutural-funcionalista (Parsons)
 a alternativa às teorias dos papéis de género são os conceitos de masculinidade e de
feminilidade de Connell e Kimmel

Perspetivas Individuais - teorias dos papéis de género:


- o género é localizado nos indivíduos com propriedade específica
- a noção de papéis de género exclui a dimensão do poder da análise do género
- a noção de papéis de género exclui a dimensão relacional para conceber o género
- as teorias de papéis de género simplifica ao extremo os processos de constituição
de homens e mulheres na sociedade contemporânea

 o modelo de ser homem ou mulher muda temporalmente e geograficamente


 as teorias dos papéis de género estão em certa medida ultrapassadas
 somos homens e mulheres num determinado contexto e gerimos esse mesmo contexto

Pierre Bourdieu - Dominação Masculina:


- não trabalhou o conceito de género de forma direta
- o seu pensamento e a sua tese em torno da dominação masculina e a ativação da
noção de violência simbólica como forma de reprodução da dominação é similar ao
feminismo de segunda vaga
- o sistema de dominação deve ser entendido como sistema cultural
- estruturalista: como é que a estrutura afeta o quotidiano do indivíduo
- violência simbólica, isto é, a incorporação pelo dominado das regras e das
práticas que o dominante lhe impõe, reproduzindo, desta forma, a sua condição de
oprimidas, de dominado
- é através deste tipo de violência simbólica que a dominação masculina se
reproduz
- a dominação dos homens é justificada pelo corpo, pela biologia

Raewyn Connell - Género como estrutura social:


“O género refere-se a uma estrutura das relações sociais centrada na esfera reprodutiva
e num conjunto de práticas que trazem as diferenças inscritas no corpo para os processos
sociais” - Connell, 2002
- mais importante técnica e pensamento das questões de género
- o genital com que se nasce condiciona o nosso processo social

Sistema de Género:
- ordem de género: dimensão cultural; privilégios, vantagens e desvantagens
atribuídos a uns e a outros; têm variações nas diferentes instituições
- regime de género: ordem de género nas diferentes instituições
Níveis de análise nas relações sociais de género:
- existem relações de poder (político), de produção (trabalho), emocionais e
simbólicas (família, relações intimas sexuais)
- estas relações fazem-se através da masculinidade hegemónica e feminilidade
enfatizada
- contraria a queer theory
-afasta-se de de uma visão que percebe o género como uma simples diferença
cultural entre homens e mulheres, que teria origem na divisão biológica
- o género não se pode referir apenas ao indivíduo, como se todas as questões do
género girassem simplesmente em torno das identidade e da performance
- o género é uma estrutura das relações sociais, não é uma mera expressão da
biologia nem um fixo do carácter humano
- o conceito de género não deve deixar o corpo de lado, como se esse fosse apenas
um produto de construções sociais

Masculinidade Hegemónica:
- é um tipo específico de masculinidade que subordina as outras e é entendida
como um padrão de práticas contínuas que possibilita a dominação do homem sobre as
mulheres
- é normativa também sobre os homens, sendo que “incorpora a forma mais
honrada de ser homem”, exigindo que todos os outros homens se posicionem a relação
a ela
- não significa violência, mas imposição através da cultura e das instituições sociais
Feminilidade Enfatizada:
- é um tipo de feminilidade que encaixa totalmente nas exigências da
masculinidade hegemónica
- implica uma hierarquia de feminilidades subjugadas/subalternadas

 o género não é uma dimensão identitária ou individual, mas sim estrutural


 a fluidez do conceito é inevitável, visto que estamos a falar de um conceito com práticas
e atividades altamente mutáveis

Teoria Queer:
- crítica a Judithe Butler
- traduz-se numa teoria de género que defende que a orientação sexual e
identidade sexual dos indivíduos deriva de uma construção social e, assim, não existem
papéis sexuais ou biologicamente inscritos na natureza humano, mas sim diferentes
formas de desempenhar um ou vários papéis sexuais

 a homofobia é um princípio fundamental de organização da masculinidade; é mais do


que o simples medo irracional dos homem gay, é mais o medo dos homens serem
percebidos como gays
 a homofobia represente o medo que os outros desmascarem aquilo que os homens são,
que os outros revelem ao mundo o facto de eles não serem capazes de ser verdadeiros
homens - incapazes de cumprir com os preceitos de uma qualquer masculinidade
hegemónica
 é o medo que considerem um homem maricas, que domina, condiciona e organiza a
definição do que é ser-se homem, ou seja, a definição de masculinidade hegemónica
 as masculinidades são construídas não só pelas relações de poder, mas também pela
sua interrelação com a divisão do trabalho e com padrões de ligação emocional
Masculinidade será um esforço permanente para manter uma fachada:
- aquilo que vestimos
- a forma como falamos/andamos
- aquilo que bebemos/comemos
- todos os movimentos do corpo e as gestualidades

Michael Kimmel - Men’s Studies:


 Para o autor, o género varia:
- de sociedade para sociedade
- com o tempo histórico
- com momentos do ciclo da vida
- dentro da mesma sociedade no mesmo tempo histórico e no mesmo momento
do ciclo da vida com a classe social
 Os significados atribuídos ao género não são representados pela socialização que se
coloca aos indivíduos em organizações e instituições diferentes onde as normas de
género predominam e operam, a partir das quais os indivíduos são avaliados e julgados
 Na sua obra “The Gendered Society” defende uma igualdade de género tanto no espaço
familiar como no mercado de trabalho, indicando que a maior participação feminina no
espaço laboral não contribui para um aumento igualitário em casa

O que significa ser homem?


Segundo Kimmel, nunca houve resposta. “Os homens encontram-se muitas vezes reféns
das expectativas sociais exageradas e ilusórias, praticamente inalcançáveis, em torno do
poder e do domínio que devem caracterizar o papel dos homens.” - Kimmel
“Para a larguíssima maioria das pessoas, ser homem é fundamentalmente não ser
mulher e ter um corpo que apresenta órgãos genitais masculinos. A complexidade
encontra-se precisamente na ingenuidade de remeter para caracteres físicos do corpo uma
questão de identidade pessoal e social. Isto porque, “ser homem”, no dia a dia, na interação
social, nunca se reduz aos caracteres sexuais, mas sim a um conjunto de atributos morais de
comportamento, socialmente sancionados e constantemente reavaliados, negociados e
relembrados”.
Dimensões fundamentais de masculinidade:
- ter poder
- deve ser forte
- obter cargos de poder
- confiante e confiável
- deve ser bem sucedido
- deve ter controlo de si e da situação
 existe uma hierarquia para ver quem está mais próximo do tipo-ideal
 ser homem é um conjunto de atributos que os afasta de ser mulher, ou seja, a
masculinidade funde-se como oponente à feminilidade
 masculinidade é um teste constante praticado pelos homens de modo a “provar” que
são homens e não mulheres ou gays
 o modelo dominante de ser homem cria-se devido às interações sociais e às dimensões
de masculinidade e é medido pelo sucesso e posse social
 em contexto atual, o homem ideal é alguém que tem recursos escolares, que se afirma
na representação do mundo social com trabalho e dinheiro, que tenha poder e força,
bem como aparência física ou um corpo atlético jovem
 um homem com poder sexual maior, tem mais prestígio
O que significa ser mulher?
- prende-se com o arquétipo de feminilidade enfatizada
- a mulher é mais recatada tanto a nível social como a nível sexual
- a mulher pertence à esfera privada em que tem o deve de tomar conta da casa,
dos filhos e da família
- a mulher deve cumprir com determinadas normas e valores institucionalizados
socialmente, bem como estar sujeito à dominação do homem, sendo subalternizadas a
essa dominação
- apesar disto tudo, são arquétipos (estereótipos) e, ou seja, a mulher pode fugir às
expectativas que lhe são impostas

Masculinidade Hegemónica:
- o conceito foi pela primeira vez usado por Connell em 1982 no seu primeiro
trabalho sobre género
- ideal típico de ser homem
- trata-se da capacidade de impor uma definição específica sobre outros tipos de
masculinidade, o que significa que o modelo exaltado corresponde, na realidade, a
muitos poucos homens
- as masculinidades alteram-se na história e no contexto scio-espacil, e as mulheres
têm um grande peso na criação do conceito
- surgiu com o estudo das desigualdades sociais na escola de Austrália,
apresentando várias hierarquias de género, hierarquias que se relacionam
profundamente com a construção do mesmo
- um dos traços importantes da masculinidade hegemónica, junto com a sua
conexão com a dominação, é o facto de ser heterossexual
- é a referência apesar de ser inatingível; é o que se deve ambicionar
-masculinidade cúmplice: são formas de querer ser homem que pretenda atingir,
mas não conseguem alcançar aos pressupostos da masculinidade hegemónica
- masculinidade desafiante: são formas que questionam as preceitas normativas
da masculinidade hegemónica (tradicional); ex.: homens que assumam ativamente a
sua parentalidade
- “é entendida como um padrão de práticas continuadas (isto é, coisas que são
feitas e não apenas uma série de expectativas de papéis ou uma identidade), que
possibilita a dominação dos homens sobre as mulheres e sobre outros homens”
- as masculinidades dizem respeito à posição dos homens na ordem do género
- as masculinidades dizem respeito à posição relativa dos homens entre si, isto é, à
posição relativa que cada homem ocupa no campo competitivo das masculinidades
- as masculinidades podem ser definidas como um padrão de práticas que
permitem a reprodução de um sistema de dominação dos homens sobre as mulheres
- a masculinidade hegemónica em poder normativo, ela determina o que deve ser
o homem, o homem adequado
- a hegemonia só se cria através de arquétipos que vão mudando, visto que é
historicamente construída, ou seja, é um processo histórico
Feminilidade Enfatizada:
- corresponde à masculinidade hegemónica mas nas mulheres
- desejam cumprir uma normatividade de género que sublinha a aceitação da
ligação direta e restritiva das mulheres com os domínios do privado, da domesticidade e
do quarto (Connell, 1987)
- esforçam-se na manutenção de uma feminilidade formada pela aceitação da
subordinação e orientada para a acomodação aos interesses e desejos dos homens
(Connell, 1987)
NOTA: é a relação entre masculinidade hegemónica e feminilidade enfatiza que permite
a reprodução de um sistema de desigualdades entre homens e mulheres e que privilegia os
homens

Sexualidade:
- é socialmente construída e o principal eixo de estruturação é o género
- a sexualidade, os comportamentos sociais ou os modelos gerais de organização e
significação da sexualidade funcionam como uma confirmação da identidade de género
- será através da exploração da masculinidade e/ou feminilidade que o homem e a
mulher se constroem enquanto seres sexuais
- a forma como vivem/experimentam reforça o seu determinado tipo de
masculinidade; rutura com o comportamento expectável e adequado, originando uma
masculinidade alternativa
- a sexualidade é construída tendo em consideração normatividades de género
- o género é confirmado através do comportamento sexual (Kimmel)
- o sexo assume um estatuto simultaneamente central na identidade de género e
na afirmação da sexualidade
- nos homens: os homens são reféns de um sistema ideológico que imagina o sexo
como um instrumento classificatório da masculinidade e do cumprimento de requisitos
normativos. Ao mesmo tempo, ficam aprisionados e pressionados por um modelo de
masculinidade incansável que hipertrofiam a sexualidade enquanto dimensão
constituída daquilo que é ser-se homem. Em suma, a sexualidade é o palco de
performance, manifestação e consolidação da masculinidade
- nas mulheres: as mulheres ficam aprisionadas a um modelo de feminilidade que
prescreve a hipotrofia da sexualidade feminina. Estas ficam limitadas por uma estrutura
ideológica e por uma organização normativa do género que implica uma sexualidade
invisível, silenciosa, passiva e recatada. O sexo é problema para elas, pela persistência
do controlo da hipotrofia da sexualidade que torna inexistente uma linguagem de
prazer e do desejo sexual feminino
- duplo padrão sexual:
» sexualidade expansiva - homem (quantas mais mulheres melhor)
» sexualidade recatada - mulher (quantos mais homens pior se torna a sua
imagem)
- imperativo da heterossexualidade:
» a masculinidade define-se pela negação da homossexualidade
» o objetivo será colocar distância não só às mulheres ou às emoções, mas
também formas de masculinidades subalternizadas (ex.: homossexuais),
permitindo a afirmação de uma masculinidade em contraposição
» a dicotomia heterossexual/homossexual revela-se um eixo estratificador
central, em torno do qual se classificaram diferentes tipos de homens
- diversidade sexual:
» corresponde à imagem do homem com poder sexual
» a masculinidade tradicional será atingida por desempenhos que pretendem
obter a aprovação de outros homens que depende, por sua vez, das conquistas
sexuais
» as mulheres são utilizadas como indicadores do cumprimento dos preceitos
normativos da masculinidade e são fundamentais na conquista e estatuto dos
homens hierarquizados
- imperativo do homem ativo:
» corresponde ao arquétipo do homem no poder aplicado à esfera social da
sexualidade
»o homem percebido como único responsável pelos acontecimentos que
ocorrem na interação sexual e pelo sucesso do encontro
» a masculinidade afirma-se pelo distanciamento do feminino, pelo que não
pode permitir comportamentos que se aproximem ou se assemelhem à
passividade sexual tradicionalmente atribuída às mulheres
» o homem com o lugar da atividade, o ativo, o penetrador vs a mulher com o
lugar de passividade, a passiva, a penetrada; os homens enquanto produtores do
que se passa no encontro sexual e as mulheres enquanto recetoras

Feminilidade Provocada:
- percebem-se como mulheres provocadores, como agentes de transformação,
como mulheres vanguardistas, que pelo seu comportamento sexual desafiam aquilo
que delas seria expectável (ex.: acompanhantes de luxo)
- são autoras de uma feminilidade que quebra as partilhas morais em torno de uma
forma enfatizada de feminilidade e de uma sexualidade contida
- trata-se de uma feminilidade que se afirma pela contestação prática ao duplo
padrão sexual que lhes condicionaria a experimentação da sexualidade

O género estrutura várias dimensões da vida social:


- sexualidade
- trabalho
- dinâmica familiar
- conjugalidade
- etc.

Ideologia de género ≠ Ideologia do género


Ideologia de género: remete para a construção social da desigualdade; matriz moral que
produz desigualdades
Ideologia do género: visão crítica sobre o conceito e de que o género existe em si
mesmo em conceito, e em realidade/visão que não acredita no género

Reitificação e cristalização das desigualdades:


- o género é uma questão relacional
- para a generalidade das pessoas, para o senso comum, e na vida de todos os dias
em sociedade, as diferenças binárias do sexo biológico correspondem a diferenças
entre homens e mulheres
- correspondem a diferenças entre homens e mulheres:
» diferenças que são percebidas como naturais
» diferenças que são reificadas

Diferenças culturais:
- a forma como homens e mulheres são constituídos varia de acordo com os
contextos culturais
- os comportamentos e atitudes expectáveis ao homem e à mulher são diferentes
consoante a cultura
- ex.: para algumas culturas (ocidental, europeia, norte-americana) o lugar da
mulher é subaternizado
Matriarcado ≠ Patriarcado
Patriarcado:
- a hegemonia ou a dominação são invisíveis
- existência na segunda vaga do feminismo
- baseia-se na passividade das mulheres e a agencialidade dos homens

 há integração progressiva das mulheres no mercado de trabalho e uma aceitação do


trabalho profissional como uma dimensão fundamental para a vida dos homens e das
mulheres
 apesar da visão próxima dos homens e das mulheres a nível do trabalho, persistem
desigualdades de género profundas: desigualdades salariais e tetos de vidro
 a cultura inclui o seu sistema de crenças e de práticas que são transmitidos de geração
em geração e é por isto mesmo que certas ideologias de género se estabelecem
 a cultura tem género, os produtos todos têm género
 a forma como o género estrutura a cultura revela-se num espaço de expressão e
consolidação do género e das desigualdades das tendências igualitárias e das relações
sociais de género: reprodução e mudança social

Plataformas culturais que fornecem as desigualdades de género:


- Linguagem
» primeiro vínculo para a construção e transmissão de cultura
» através da linguagem, os indivíduos aprendem os valores, as crenças e
percebem os fenómenos socais existentes na sua cultura
» as ideias sobre os géneros encontram-se relacionadas com palavras
específicas associadas a um sexo ou a outro
» a língua não é neutra
» a construção da linguagem inclusiva é algo necessário
- Media
» também são vínculos importantes da transmissão da cultura de género
» a sua influência faz-se sentir tanto através de programas de entretenimento
como informativos (didáticos, educativos)
- Publicidade
- Moda

Socialização:
- processo de aprendizagem de regras e normas sociais de um grupo ou de uma
cultura
- esta aprendizagem envolve a interiorização de valores e comportamentos
socialmente aceitáveis
- ao cumprirem os papéis sociais transmitidos pela socialização, os indivíduos estão
a conformar-se às normas do grupo e a evitar comportamentos que violem as normas
instituídas
- funciona como mecanismo de controlo, de produção e de reprodução “mágica”
(automático) social e de ideologias de género
- as pessoas não recebem a socialização de forma acrítica
- círculos de socialização:
» família
» escola
» amigos
» trabalho
» amor

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