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UBERABA, MG
2022
BEATRIZ MANTOANI MASSON
UBERABA, MG
2022
Logo no início do filme há uma cena de repreensão à uma criança por alimentar seu
cachorro com carne pois a situação financeira da família não está boa e a justificativa é que o
animal precisa passar fome para que faça a vigilância da casa com mais esmero e seus
instintos animais estejam mais aguçados. Isso, junto às imagens reais de miséria e violência
financeiras, não demonstrando anseios de se movimentarem para que possam mudar essa
Sendo assim, quando os personagens são apresentados como pessoas sem perspectivas
perceber que essa alienação e conformação em relação à sociedade civil é uma resposta para a
estigmatização e privação social de uma população fechada nos limites de uma cidade sem
contato com o exterior, isolada por montanhas, com apenas uma entrada ou saída
(GOFFMAN, 1987).
apresentada aos moradores, que lhe dão o prazo de 2 semanas para que prove ser “digna” de
morar na cidade e se juntar à comunidade, as reações que pode-se perceber dos moradores
com a nova inquilina são de estranhamento e repulsa, explicitados no modo como eles
observam ela passear pela cidade e como negam prontamente a sua ajuda, quando a mesma
põe em prática o plano de Tom Edison de oferecer ajuda braçal aos moradores, para que seja
comunidade para com Grace – se apoia no fato de que essa nova pessoa não atende a um
objeto, construindo uma discrepância entre a identidade social real de Grace e a identidade
estigmatizada dela pela cidade. Sendo assim, em vez de ser facilmente recebida em Dogville,
O suplício, explicado por Foucault (1987), é uma punição física exercida através da
violação do corpo, para hierarquizar e tornar infame a vítima, como uma maneira de o Estado
com aqueles que ousem desafiar as leis ou seu poder. Isso fica explícito nas cenas em que
Grace sofre violação sexual, desde a tentativa de beijo indevido, até as cenas explícitas de
estupro, e, principalmente, quando ela recebe a sentença de carregar uma roda de ferro
extremamente pesada pela rua de Dogville, enquanto todos assistem ao seu sofrimento como
um triunfo da cidade.
As cenas em que Tom dita cada passo que Grace deve dar na cidade, monta a sua
rotina como se exercesse um controle sobre sua vida e a submete a constantes provações de
seu merecimento de residir em Dogville para os moradores, pode ser associado com o
conceito de disciplina de Foucault (1987), no qual o controle do tempo e das atividades é uma
das etapas para transformar alguém em um “corpo dócil”, que pode ser facilmente
manipulável, disciplinável e subjugável para fazer aquilo que seja de maior interesse de quem
exerce esse poder sobre ele. Além disso, por ser uma pessoa nova adentrando essa
comunidade tão fechada, Grace se encontra no foco dos moradores, recebendo muita
visibilidade e sendo repreendida por eles quando faz algo errado, o que pode ser associado ao
deixando claro para ela que não deve se comportar como uma moradora da cidade pois está
ali apenas para servi-los, ou ainda, quando lhe é tirado seu salário e aumentada a carga horária
das “prestações de ajuda” que ela oferece a comunidade, há explicitamente uma analogia à
escravidão pois eles conseguem explorá-la de todas as maneiras possíveis através da constante
coerção e ameaça de entregá-la à polícia ou aos mafiosos que a estão buscando, além de
Assim, ao passo que Grace sofre todas essas violências, ela vai gradativamente
perdendo sua identidade, acreditando ter feito algo para merecer tudo o que está vivendo e
passando a não reagir mais contra as agressões e violências sofridas, em partes pelo desejo de
sentido em reagir. Portanto, o filme tem essa representação da comunidade como uma
cidadãos de Dogville se mostram tão impessoais que desumanizam e exploram uma pessoa
que se mostrou um alvo mais fácil de ser atingido, através de seus medos.
Essa perda da identidade real de Grace, que passa a agir de acordo com a identidade
estigmatizada que a cidade projetou sob ela, pode estabelecer uma relação com as instituições
totais que Goffman (1987) explica como um lugar que utiliza da tensão persistente como uma
regras de conduta do local, levando o indivíduo a sofrer uma perda dos equipamentos de
identidade. Neste sentido, a comunidade seria uma instituição total que coloca Grace sob
constante tensão, controlando seus horários e suas ações, a humilhando, até mesmo a
acorrentando para que ela não possa sair mais da cidade e consequentemente levando-a a
perda de sua identidade real para se enquadrar na identidade que os moradores propuseram
Como mostrado no fim do filme, todas essas humilhações e exploração que foram
características ferozmente criticadas por seu pai – sobressaindo apenas a raiva e o desejo de
vingança por todos aqueles que lhe fizeram sofrer, para que – assim como ela diz – nenhuma
pessoa inocente que venha a se perder em Dogville novamente, precise passar por tudo o que
ela passou. Sendo assim, ela utiliza de seu poder para queimar a cidade e matar todos os
E o filme acaba com as linhas - que representam as paredes e casas de toda a cidade –
sendo apagados e sobrando apenas o cachorro, mostrando que já não existe mais qualquer
traço de humanidade em Dogville, apenas o instinto animal do cachorro que sobreviveu a tudo
isso.
REFERÊNCIAS
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