Você está na página 1de 8

Blue Jasmine ou a tristeza cômica1

por Antonio Teixeira

Fiquei particularmente empolgado com a ideia de intervir sobre o filme Blue


Jasmine, neste seminário sobre Cinema e Psicanálise, pelo que a experiência de assistir a
essa película teve de arrebatador para mim. Pois embora eu tenha sido, por longo tempo,
um espectador obstinado dos filmes de Woody Allen, o apelo excessivo aos lugares
comuns de Midnigth in Paris, assim como o uso fácil da comédia açucarada de To Rome
with love, tiveram para mim um efeito tão decepcionante que quase desisti de continuar
a segui-lo. Foi, portanto, com o esforço de uma última tentativa que me apressei a ir ver
Blue Jasmine, assim que o filme chegou em Belo Horizonte, temendo que a simples
leitura de qualquer crítica depreciativa me fizesse abandonar essa ideia. E qual não foi
minha surpresa ao assistir a esse filme. Encontrei ali, e vou tentar explicar porque, um
Woody Allen lacaniano, que deixa de lado a futilidade da comédia romântica para
ressurgir com o humor cáustico e a inigualável ironia que não se via desde You will meet
a tal dark stranger..., de 2010, com o impagável Anthony Hopkins no papel de um
adolescente senil.
Blue Jasmine pode evidentemente ser visto, conforme nota o crítico de cinema
Inácio Araújo, como uma retomada do clássico A streetcar named desire, de Tennessee
Williams, em película dirigida pelo cineasta Elias Kazan, ainda que Woody Allen não
tenha declarado formalmente o uso dessa referência. Seja como for, assistam ao filme de
Elias Kazan, cujo título foi equivocadamente traduzido em português como Uma rua
chamada pecado, e façam vocês mesmos a comparação. Em ambos os casos, temos a
história de uma mulher requintada, mas arrasada emocional e financeiramente, saída de
uma grave decepção amorosa e acolhida pela irmã proletária que, por viver em condições
subalternas, encontra-se mais bem adaptada aos revezes de uma existência sem glamour.
Pois bem. Interessa-me destacar que tanto num filme como no outro, vocês assistem aos
efeitos subjetivos gerados pela experiência do que poderíamos chamar, do ponto de vista
de uma leitura psicanalítica, de uma ruptura dos semblantes sociais.

1
O presente texto é a transcrição de uma conferência apresentada na sessão “Cinema e Psicanálise”,
promovida pela seção Minas de Escola Brasileira de Psicanálise em parceria com a Fundação Clovis
Salgado do Palácio das Artes, no dia 14 de julho de 2017. Ele se encontra publicado em edição impressa
in: “A cidade com Lacan”, (F. Otoni, R. Botrel, S. de Castro e S. de Mattos –organizadores), Belo Horizonte,
EBP, 2018.
Para comentar, portanto, esse filme, faz-se necessário explicitar minimamente, ao
público leigo inteligente, o que entendemos com o termo semblante. Digamos, então, que
um semblante, na terminologia psicanalítica, é a dimensão que configura a realidade e
orienta nossa percepção do mundo, coisa que faz com que uma constelação no céu ganhe
mais relevo para aquele que pratica a navegação. É o que também nos faz, por exemplo,
afetar-nos mais pela cor da camisa de alguém, se ela estiver portando o uniforme de um
time em campo, do que se ela estiver apenas vestindo uma roupa usual. O semblante é,
nesse sentido, o fator que nos permite habitar o mundo, gerando relações de
intencionalidade numa realidade convertida em campo de significações, segundo nossa
maneira de inserção numa prática discursiva. Ele humaniza o que nos chega do real nos
dando o sentimento de realidade, ao distribuir os elementos que nela percebemos a partir
do modo em que nos sentimos convocados. O semblante permite, ademais, ligar coisas
sem parentesco natural, como se verifica no fato de que um vinho caro, servido numa taça
de cristal, ter mais sabor do que o mesmíssimo vinho servido num copo de plástico. O
semblante é, portanto, para resumir, o que configura a realidade para nós e nos conforta
na ideia de estar num mundo que faz sentido.
Mas para que o sujeito possa se estabilizar no semblante, na crença do laço que o
constitui, é preciso não se haver com aquilo que desfaz virtualmente esse laço, ou que
possa contradizê-lo. O semblante depende, portanto, para se consolidar, de um não querer
saber, o qual se traduz tanto clinicamente no fenômeno do recalque quanto socialmente
no comportamento frívolo, sendo a frivolidade aqui entendida como disposição desse não
querer saber que nos mantém entorpecidos na superficialidade cômoda dos laços sociais.
É o que vemos se apresentar no que foi a vida de Jasmine durante seu casamento com o
especulador magnata Hal, em história inspirada, como alguns aqui talvez saibam, na vida
da socialite Ruth Madoff, esposa do escroque nova-iorquino Bernard Macdoff, que se viu
repentinamente arruinada quando as investigações do FBI revelaram suas operações
fraudulentas. Woody Allen assim nos apresenta Jasmine no estereótipo da dondoca rica,
fútil e detestável, indiferente ao sofrimento dos demais. Ela é a madame esnobe, uma
espécie de Cláudia Cunha ou de Adriana Cabral, em nosso tempo provável eleitora de
Trump ou de Bolsonaro, se quiserem exemplos ainda mais próximos, imersa na volúpia
consumista das grandes grifes, que veste Prada, exibe relógio Cartier, usa bolsas Louis
Vuitton e passa seus dias entre academias de ginástica, coaching e conversações frívolas
com amigas ociosas.
O tempo dessa felicidade fútil coincide, como vimos, com o período de sua vida
conjugal junto ao milionário trapaceiro que há muito a enganava, cujos contratos de
transações duvidosas ela assinava sem examinar, mas que a cobria de objetos de consumo
e lhe permitia continuar entorpecida em sua existência frívola. Enquanto ele nada lhe
falasse, enquanto ela pudesse continuar vivendo como se nada estivesse acontecendo,
Jasmine aceitava fechar os olhos, sem nada querer saber. Contudo, chega o momento em
que ele se envolve com uma jovem e lhe diz que agora é diferente: ele ama uma outra e
quer dela se separar. O semblante então se desmorona, como se ilustra na cena dos objetos
que caem da bolsa subitamente erguida ainda aberta: Jasmine entra em crise e não suporta
mais a situação2. O não querer saber já não mais funciona. É o momento em que ela
denuncia seu marido ao FBI, colocando a perder tudo o que ela tinha e que dele provinha.
Importante, todavia, notar, como diz Clotilde Leguil, que esse ato de denúncia não
se reduz ao simples estereótipo de vingança da mulher abandonada.3 Ao delatar o homem
que ela agora odeia, mas em cuja órbita se organizava sua vida, é, como vocês vêm no
filme, seu próprio mundo que Jasmine termina perdendo. Seu universo de consumo se
desfaz e ela se encontra subitamente miserável, errante e perdida, obrigada a abandonar
o luxo de sua existência nova-iorquina para buscar refúgio junto à irmã pobre, que ela
tanto desprezava, em San Francisco, no litoral da Califórnia, no outro lado da costa
americana.
Eu gostaria, então, de convidar vocês a examinar de perto a estrutura desse
semblante que se rompe, assim como as consequências que derivam de sua dissolução.
Para tanto, necessitamos captar o que seria o elemento invariante, a estrutura comum aos
diversos semblantes sociais que se modificam conforme cada época. Cabe, então, antes
de tudo estabelecer que todos os semblantes derivam de um primeiro semblante que em
psicanálise chamamos de semblante fálico, semblante que nos permite significar a
realidade ao organizar a crença de que um objeto especial se coloca em resposta à
experiência de uma falta igualmente estrutural que acomete todo ser falante. Em que pese
o risco didático de toda simplificação, eu resumirei dizendo que a razão dessa falta
estrutural se deve ao fato de que o significante, que nos representa no nível da linguagem,
não comporta positividade própria: o significante somente comporta diferenças, tem
somente valor diferencial em relação aos demais significantes de um determinado
sistema. De maneira que ao se deixar representar pela linguagem, o sujeito somente

2
Agradeço à Lilaine Pacheco, que fez essa preciosa observação.
3
Leguil, C. L’Être et le genre. Paris : PUF, 2015.
encontra relações diferenciais e se vê privado da identidade do ser. Pois é justamente em
resposta a essa falta-a-ser engendrada pela linguagem que se organiza o semblante fálico,
acenando para uma positividade ilusória que se sustenta na percepção corporal de um
órgão cujo valor, por sua vez, reside menos na sua presença empírica do que na
possibilidade de sua ausência em um dos lados da divisão sexual.
Um objeto poderá, portanto, ser dito fálico, se for marcado pela possibilidade de
sua ausência, coisa que socialmente se apresenta na dificuldade circunstancial de sua
aquisição. Isso se revela, particularmente, no efeito risível de se assistir hoje a um filme
de 007 dos anos 60, em que vemos James Bond utilizando instrumentos obsoletos e
empunhando insígnias fálicas atualmente destituídas de valor. Mas, seja qual for a
particularidade do contexto, podemos resumir dizendo que dessa referência ao valor
fálico decorre os dois tipos de solução subjetiva à falta-a-ser, que se distribuem nos lados
masculino e feminino da sexuação. A solução masculina, para irmos rápido, é a de quem
exibe a medida da posse fálica, se colocando como detentor daquilo que pode faltar: é a
solução viril do triunfo, da ostentação e da busca pela admiração, caricaturalmente
representada pelo escroque Hal, encarnado magnificamente por Alec Baldwin. Já a
solução feminina da falta-a-ser passa por atribuir o valor fálico não ao ter, como no caso
masculino, mas ao próprio ser da mulher que se constitui pelo ocultamento da falta,
através das vias do parecer. A referência freudiana clássica ao véu explicita a
possibilidade feminina de se constituir como ser no ocultamento da falta, conforme se
observa no caráter emblemático dos artifícios cosméticos e no valor tradicionalmente
dado à reserva, ao pudor e ao respeito, por oposição à via masculina da ostentação.
Por se encontrar marcada pela falta do índice fálico assim ocultado, a mulher, no
dizer de Lacan, jamais se vê dotada de um justo padrão. Há sempre, no lado feminino,
segundo observa Jacques-Alain Miller, uma falta que se exprime em discordância com as
totalizações.4 Pois se o falo é o que dá a medida de conjunto ou de totalidade aos
semblantes sociais, definindo suas regras de pertencimento, haverá sempre algo da
condição feminina que se encontra excluído dessa totalidade, na forma de uma diferença
inassimilável por suas leis. Dali deriva ora a percepção difamante do feminino como um
ser não confiável e caprichoso, ora a versão heroica que faz do feminino a única
salvaguarda de uma singularidade que não se enquadra no Universo do Todo.

4
Miller, J.-A, Uma partilha sexual. Disponível em
http://www.opcaolacaniana.com.br/pdf/numero_20/Uma_partilha_sexual.pdf
É, aliás, nesse sentido que Lacan afirma que a condição feminina, por ser não toda,
ou seja, por não se deixar incluir integralmente no semblante do Universo, estaria mais
próxima do real que se manifesta, na experiência da angústia, sob a forma de algo que
nos desperta, que contraria nossa frivolidade estrutural, que desestabiliza nosso
entorpecimento no semblante. Mas isso, no entanto, não quer dizer que a posição feminina
não se circunscreva, ao menos em parte, no campo do semblante, no domínio delimitado
pelo Universo do todo. Temos também razões para se atribuir à mulher certo apego pelos
limites do semblante, numa visão que aproxima a condição feminina das virtudes da
sensatez e da ponderação. O termo bourgeoise pelo qual se designa, na língua francesa, a
mulher do trabalhador – cuja versão brasileira seria, em linguajar chauvinista, a referência
à “patroa” –, diz respeito, afirmava Lacan, não me lembro mais exatamente onde,
justamente a essa função, tradicionalmente atribuída à mulher, de ser quem se ocupa da
estabilidade e dos limites do lar, sempre pronta a frear o desejo de ostentação de seu
homem.
Tem seu interesse, todavia, notar, como já frisei em outros momentos, que tais
expressões normalmente se referem à mulher na condição de casada. É porque, se para
aquele que se posiciona como homem, o limite fálico lhe parece ser estrutural em razão
da ilusão gerada pela posse do órgão virtualmente faltante, para a mulher, e aqui eu sigo
um comentário de Jacques-Alain Miller, esse índice não é dado pela estrutura (Idem). A
mulher deve zelar por esse limite justamente porque, para ela, o índice fálico não é
estruturalmente dado. Diferentemente do homem, que acredita ser naturalmente dotado
da medida fálica que arrogantemente ostenta, o sujeito que ocupa a posição feminina não
desconhece que esse limite não é mais do que um semblante artificial. Trata-se de um
limite que a mulher pode ou não encontrar, e que, por conseguinte, adota de maneira
contingente a partir do encontro com o homem que a ama, desde que acorde importância
a esse amor.
Isso se ilustra, como vocês se lembram, na própria nomeação que Jasmine se dá,
recobrindo o nome original de Jeanette, que recusa por achar destituído de glamour, por
aquele que encontrou no título de uma música de jazz que escutara quando de seu primeiro
encontro com Hal. Por tomar de empréstimo o semblante desse limite no lado masculino,
a mulher, no dizer de Lacan, se mostra disposta a qualquer concessão para conservar sua
parceria com um homem. É nesse sentido, conforme dizíamos no início, que Jasmine
aceita fechar os olhos para todas as trapaças de seu marido, desde que ele mantenha o
semblante do laço conjugal. Mas no momento em que ele decide se separar, privando-a
do limite da conjugalidade que a estabilizava no semblante da esposa frívola, o que
Jasmine exibe, para Hal, tal como Medeia para Jasão, na tragédia de Eurípides, é
justamente o sem-limite que aponta para o que Lacan nomeia uma vraie femme, a mulher
de verdade que se manifesta justamente na ruptura do semblante fálico.
Vocês notam claramente no filme – que ali reflete o que encontramos na clínica
e, em observação mais atenta, na vida social – o quanto é difícil para um homem, esse ser
enfatuado e estúpido, estruturalmente adormecido na ilusão do semblante fálico,
aperceber-se do que significa estar diante de uma vraie femme. Assim como Jasão
pensava poder pacificar a revolta de Medeia, cedendo-lhe, como limite, as vantagens de
suas posses, o pobre Hal acredita poder negociar a separação com Jasmine,
desconhecendo que não há negociação com a mulher de verdade, tragicamente
emancipada dos limites negociáveis do semblante. Se me apraz, portanto, afirmar, como
dizia no início, que Blue Jasmine é o filme de um Woody Allen lacaniano, é justamente
porque ali assistimos aos efeitos do desencadeamento do que Lacan chama de uma vraie
femme.
Não por acaso, aqui empregamos o termo desencadeamento, normalmente
aplicado à clínica da psicose; existe de fato algo que se aproxima clinicamente da loucura
nessa irrupção de uma vraie femme. Isso se vê, de maneira clara, tanto nas cenas iniciais
quanto finais do filme, em que a palavra se encontra desligada da configuração do
semblante: o diálogo com a senhora do avião se revela patético monólogo; a tentativa de
se dirigir ao outro se converte em ruminação ruidosa, ou senão na tagarelice ansiosa de
quem perdeu a ordenação que o semblante produz sobre a fala destinada aos efeitos de
comunicação. Mas embora esse efeito de verdade surja na ruptura do real sobre o
semblante, é engano acreditar que se pode seguir vivendo emancipado do semblante, fora
de sua jurisdição. Servindo-se, como de hábito, de um jogo de palavras, Lacan irá nos
dizer que o que se mostra, quando se rompe o semblante, é o sang rouge da castração, ou
seja, o sang rouge da falta não mais encoberta, não mais pacificada pelo significante
fálico.5 Mas para acrescentar, logo em seguida, que o sang rouge não consegue desmentir
por muito tempo o semblante: basta jogar um pouco de serragem para que o circo
recomece, ou seja, para que o semblante fálico retome seu lugar. E é, de fato, a uma
retomada do circo o que assistimos na sequência tragicômica do árduo percurso em que
Jasmine tenta pateticamente reabilitar o espaço social do semblante, no mundo habitado

5
Lacan, [1971] 2006). D’um discours qui ne serait pas du semblante. Paris : Seuil, 2006.
por sua irmã. Vale, então, notar aqui, para retomar a comparação que propusemos no
início, uma diferença marcante que separa Blue Jasmine e A streetcar named desire. Ao
passo que em Um bonde chamado desejo, a revelação da verdade trágica de Blanche du
Bois, que a leva finalmente à loucura, pelo desnudamento progressivo do semblante, é a
tônica predominante, o que assistimos em Blue Jasmine são os efeitos
predominantemente cômicos dos esforços, por parte de Jasmine, em se orientar por
semblantes fálicos que não se sustentam para ela.
Jasmine sofre do que se chama, em psiquiatria, de um elevado grau de ajuste pré-
mórbido que dificulta o processo terapêutico de readaptação, ilustrado, residualmente,
nas malas usadas de grife Louis Vuitton que ela transporta, sem delas poder extrair algum
valor. Ao se voltar para Ginger, a irmã proletária que tanto desprezava, Jasmine terá que
se haver com os emblemas fálicos de uma existência sem glamour que não se ajustam
para a ex-socialite nova-iorquina. Vemos assim se desfilar, em tom de comédia burlesca,
a figura abrutalhada de Chili, esse namorado cafona de Ginger que mais lembra, por
comparação ao filme de Elias Kazan, uma corruptela de Marlon Brando, o qual, além de
insultá-la, ainda lhe oferece, como companhia, o não menos estúpido amigo Eddie. O
grotesco, nos diz Laura Rubião6 em seu livro sobre a comédia, assinala o destino do falo
na falência do semblante, como se revela no comportamento do obtuso dentista que a
assedia acintosamente em seu miserável emprego. Vocês percebem que o cômico, embora
nos faça rir, é, como diz Lacan, essencialmente triste, essencialmente desolador: o cômico
é fundamentalmente triste, na medida em que nos revela a verdade patética do que vem a
ser o falo na impotência do semblante, quando se perde a sustentação da crença que o
erigia como valor.
Será preciso aguardar a última parte do filme, no auge dessa triste evolução
cômica, para vermos Woody Allen finalmente romper com a comédia e retomar o drama
trágico de Um bonde chamado desejo. Ele se arma, para tanto, da expectativa do
desenrolar feliz, do happy end anunciado no encontro glamoroso com o milionário
Dwight, por quem Jasmine se apaixona, mentindo-lhe ao se apresentar como uma
decoradora bem-sucedida. No final, como vocês viram, o encontro fortuito com o ex-
marido de Ginger colocará tudo a perder, conduzindo Jasmine à loucura alucinatória. O
nome falso, a profissão, a história pregressa, o suicídio do ex-marido, a fraude, tudo isso
vem à tona, levando o promissor Dwight a recusar Jasmine, como Mitchey recusara

6
Rubião, L. A ética do bem dizer nos estudos lacanianos sobre a comédia. Editora UFMG, 2014.
Blanche em Um bonde chamado desejo. E, no entanto, saímos do cinema com a nítida
impressão de que havia uma sincera paixão de Jasmine que Dwight não foi capaz de
perceber. É que o homem ali não realiza, de tão imerso que se encontra na ilusão de
autenticidade do semblante fálico, que Jasmine não estava caprichosamente mentindo, na
via da frivolidade mundana. Ela enunciava ali, com toda sinceridade possível, a verdade
mentirosa da posição feminina, a qual consiste em reconstituir o ser pelas vias do parecer.

Referências

LEGUIL, C. L’Être et le genre : Homme/Femme après Lacan. Paris : PUF, 2015

LACAN, J. D’un discours qui ne serait pas du semblant. Paris : Seuil, 2006.

MILLER, J.-A. Uma partilha sexual (2012). Opção lacaniana on line n. 20. Disponível
em: http://www.opcaolacaniana.com.br/pdf/numero_20/Uma_partilha_sexual.pdf.

RUBIÃO, L. A ética do bem dizer nos estudos lacanianos sobre a comédia. BH: UFMG,
2014.

Você também pode gostar