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P R O F. B Á R B A R A D ’A L E G R I A
ABRIL/2022
Processos epidêmicos e epidemiologia das doenças infecciosas
APRESENTAÇÃO:
PROF. BÁBARA
D’ALEGRIA
Olá, Doutor(a)!
É um grande prazer encontrá-lo novamente em
mais um livro de Medicina Preventiva! Neste volume,
vamos conversar sobre os processos epidêmicos e a
epidemiologia das doenças infecciosas! Esses temas não
são muito prevalentes no INEP e na UFMT. Porém, como já
foram cobrados anteriormente e estiveram em alta durante
a pandemia de covid-19, aconselho que você conheça os
conceitos a seguir, pois é possível que eles apareçam em
sua prova.
Mas, antes de iniciarmos nossa aula, quero mostrar
como esse livro está estruturado. Para uma melhor
experiência de aprendizado, ele foi dividido em duas
partes. Na parte 1, abordaremos especificamente os
conceitos referentes aos processos epidêmicos – é nesse
trecho em que vamos aprender a diferença entre um surto
e uma pandemia e em que vamos também analisar curvas
epidêmicas.
Já na parte 2, falaremos sobre tópicos de
epidemiologia das doenças infecciosas, o que inclui a
definição de caso autóctone, caso alóctone, quarentena,
lockdown e assim por diante!
Como você sabe, temos edições limitadas do
REVALIDA INEP e do REVALIDA UFMT, o que faz com que
tenhamos apenas 5 questões disponíveis para este livro. Por
isso, para que você consiga treinar os conceitos de forma
satisfatória, eu separei algumas questões de Residência
Médica para que você entenda como esses assuntos
poderiam aparecer em sua prova!
Ah, também quero combinar algo muito importante
com você: eu estou à disposição. Minha missão é ajudá-
lo na conquista de seu CRM! Por isso, se você apresentar
qualquer dúvida ao longo da leitura, conte comigo! Pode
enviar quantas dúvidas forem necessárias, eu ficarei
muito feliz em ajudá-lo! Meu perfil no instagram é: @prof.
barbaradalegria.
Vamos começar? Vejo você na próxima página!
Um forte abraço,
Bárbara D’Alegria
@prof.barbaradalegria
t.me/estrategiamed /estrategiamed
Processos epidêmicos e epidemiologia das doenças infecciosas
SUMÁRIO
PARTE 1: PROCESSOS EPIDÊMICOS 5
1.0 ENGENHARIA REVERSA 5
2.0 PADRÕES DE DISTRIBUIÇÃO DAS DOENÇAS 6
2 .1 AS TRÊS DIMENSÕES DA EPIDEMIOLOGIA DESCRITIVA: ESPAÇO, PESSOA E TEMPO 6
2 .2 DISTRIBUIÇÃO DAS DOENÇAS NO ESPAÇO (VARIAÇÕES ESPACIAIS) 9
2 .3 DISTRIBUIÇÃO DAS DOENÇAS SEGUNDO GRUPOS DE PESSOAS
(VARIAÇÕES PESSOAIS) 11
2 .4 DISTRIBUIÇÃO DAS DOENÇAS NO TEMPO (VARIAÇÕES TEMPORAIS) 13
CAPÍTULO
Falando especificamente sobre os processos conceitos a seguir em mente, já que ainda estamos em
epidêmicos, que são o tema que estudaremos nesta vigência de uma pandemia de proporções incalculáveis.
parte, a engenharia reversa mostrou que eles ainda Logo, é possível que as bancas elaborem alguma
não foram cobrados na UFMT. Em contrapartida, o INEP questão sobre esses assuntos.
cobrou uma questão em 2015 sobre curvas epidêmicas. E então? Preparado para entrar no mundo das
Embora esses assuntos apresentem baixa epidemias?
prevalência nas provas de Revalidação, o time de Vejo você no próximo tópico.
Medicina Preventiva aconselha que você tenha os
CAPÍTULO
Vamos começar com a seguinte pergunta: por que é tão importante entendermos como uma doença se distribui
ao longo de um determinado espaço geográfico ou ao longo de um intervalo de tempo?
— Que pergunta profunda, professora! Nunca pensei sobre isso. Tem como você dar alguma dica?
Tem, sim! A resposta para essa pergunta tem relação com a função principal da epidemiologia descritiva.
Sem problemas! Vamos utilizar uma analogia. Suponha que um terrível inimigo está prestes a atacar a
humanidade. Digamos que você descobriu algumas informações privilegiadas sobre ele. Por exemplo, você conhece a
forma como ele se movimenta pelo globo terrestre e, dessa forma, identificou a próxima localidade que será atacada.
Além disso, você também descobriu que ele intensifica os ataques nos meses de outono. Por último, você entendeu
como é o perfil das vítimas: o monstro ataca preferencialmente as mulheres1. E agora, o que você faria?
1
A descrição acima é hipotética e não corresponde a uma doença ou agravo em específico. É apenas para que você consiga entender a importância de descrever o padrão de uma doença.
É por isso que as medidas de combate ao Aedes aegypti se intensificam no verão, pois o padrão da dengue é
aumentar sua incidência nessa época do ano.
2
O rastreamento de câncer de mama inicia aos 50 anos pelo Ministério da Saúde, mas aos 40 anos pela FEBRASGO.
— Certo, professora! Mas, afinal, que padrão de distribuição é esse? Quero dizer, como eu descrevo exatamente
esse padrão?
Vamos lá:
O padrão de distribuição de uma doença (ou agravo) é a descrição de sua variabilidade de frequência ao
longo de um determinado espaço geográfico, grupo humano ou intervalo de tempo.
Opa! Então, vamos ligar o tradutor: variabilidade da frequência nada mais é do que a diferença encontrada na
frequência de uma doença (seja incidência, prevalência ou mortalidade específica) ao compararmos dois espaços
geográficos diferentes, ou duas populações diferentes, ou, ainda, duas épocas diferentes.
Por exemplo, suponha que, no Brasil, a malária tenha maior incidência no Pará do que no Rio de Janeiro, no
verão do que no inverno, e incida mais nas crianças do que nos adultos.
Observe que, para descrevermos o padrão de distribuição da malária, foi preciso comparar sua incidência
entre duas regiões (Pará x Rio de Janeiro), dois grupos humanos (crianças x adultos) e duas épocas do ano (verão x
inverno). Portanto, foi preciso descrever como sua frequência variou (variabilidade da frequência) em três dimensões
fundamentais:
• Espaço – informa sobre o local ou onde a doença ocorre. Algumas doenças são mais frequentes em
determinadas regiões do que em outras, e essas diferenças são chamadas de variações espaciais.
• Pessoa – informa em quem ou em que grupo humano a doença ocorre com maior frequência. Isso porque
algumas enfermidades são mais frequentes em determinados grupos de indivíduos do que em outros.
Por exemplo, algumas doenças são mais comuns em mulheres do que em homens, outras, em idosos
do que em adultos jovens. Temos ainda enfermidades mais incidentes em alguns tipos de ocupações
profissionais, e assim por diante. Essas diferenças são chamadas de variações pessoais.
• Tempo – informa sobre a época (ou quando) em que a doença aparece. Por exemplo, algumas doenças
apresentam um aumento do número de casos no verão, enquanto outras se tornam mais frequentes
no inverno. Por exemplo, a dengue é mais comum no verão do que no inverno porque é no calor que
acontece a maior proliferação de mosquitos. A influenza é mais comum no inverno do que no verão. Essas
diferenças de incidência de acordo com uma determinada época são chamadas de variações temporais.
As variações espaciais ou geográficas são as Para isso, ele decide utilizar a própria divisão político-
diferenças que encontramos na frequência de uma administrativa do estado. Logo, ele vai comparar a
doença quando comparamos duas ou mais regiões incidência da doença Z entre os cinco municípios
de um determinado espaço, que é o território onde a supracitados.
doença se manifesta. Ao analisar a distribuição espacial, esse secretário
Podemos comparar tanto a incidência como a pode encontrar quatro padrões principais:
prevalência e a mortalidade específica. No entanto, a 1. Focal.
medida de frequência mais utilizada é a incidência. 2. Regular.
Dependendo de como uma doença se distribui 3. Aleatório.
em um determinado espaço, podemos encontrar 4. Clusterizado.
quatro padrões principais. Por exemplo, suponha que A distribuição focal, como o próprio nome
uma determinada unidade federativa, que apresenta 5 sugere, é aquela em que a doença se concentra em
municípios, foi acometida pela doença Z, uma terrível determinada parte do território. Por algum motivo,
enfermidade que vem assombrando os moradores que geralmente é descoberto durante a investigação
daquela localidade. epidemiológica, os casos da doença concentram-se em
O secretário municipal de saúde deseja entender uma determinada região (veja o número 1 da imagem
como essa doença se distribui ao longo de seu território. abaixo).
A distribuição regular é aquela em que a doença para a investigação etiológica (veja o número 3 da
se distribui de forma homogênea (ou uniforme) por imagem abaixo).
toda a localidade, com boa delimitação das regiões em Por último, temos a distribuição em clusters
que os casos foram registrados e distâncias iguais entre ou clusterizada, em que a doença se apresenta com
elas (veja o número 2 da imagem abaixo). aglomeração de casos, os quais podem até se distribuir
Em contrapartida, na distribuição aleatória por todo território, mas de forma agrupada. Em outras
(como o próprio nome sugere), o padrão é “não ter palavras, não conseguimos delimitar muito bem os
padrão”, já que os casos parecem se distribuir ao acaso pontos onde os casos começam e terminam, e é
ao longo do território. É um dos padrões mais difíceis possível, inclusive, visualizarmos “manchas” nos mapas.
Figura 4 – Tipos de variações geográficas: (1) distribuição focal; (2) distribuição regular; (3) distribuição aleatória; (4) distribuição em clusters.
Observe que a principal diferença entre o padrão regular e o clusterizado é que, no primeiro, conseguimos delimitar as regiões onde ocorre a
doença, o que não pode ser feito de forma precisa quando a distribuição é clusterizada.
A análise da distribuição espacial das doenças auxilia na formulação de hipóteses diagnósticas! Essa
metodologia é muito utilizada em muitos estudos ecológicos.
Variações pessoais são diferenças que Assim como precisamos dividir o espaço
encontramos na frequência de uma doença (ou agravo) geográfico para comparar as incidências entre as
quando comparamos grupos humanos diferentes. regiões, também precisamos dividir as pessoas em
Podemos comparar tanto a incidência como a grupos, para que possamos comparar as incidências
prevalência e a mortalidade específica. No entanto, a entre eles.
medida de frequência mais utilizada é a incidência.
Diversos critérios (ou variáveis) podem ser utilizados para essa divisão, como idade, sexo, cor, raça, etnia,
nível socioeconômico, ocupação/profissão, constituição física (estado imunitário e nutricional, genética) e até
mesmo determinados comportamentos, como os hábitos alimentares, a prática de atividade física, o uso de
drogas lícitas ou ilícitas, o uso de determinados medicamentos, entre outros.
(ROUQUAYROL et al., 2017).
Figura 5 – A distribuição da doença segundo grupos humanos auxilia na identificação da etiologia da doença e dos fatores de risco. Fonte:
Shutterstock.
Por exemplo, é notório que algumas doenças mais frequente no primeiro grupo.
são mais incidentes em determinadas faixas etárias. É De igual forma, algumas doenças apresentam
o caso da bronquiolite. Se tomarmos uma população de maior frequência em determinados gêneros, como é o
crianças e as separarmos em 2 grupos, de menores de 2 caso do lúpus eritematoso sistêmico (LES), que pode ser
anos e entre 2-12 anos, ficará claro que a bronquiolite é até três vezes mais incidente em mulheres.
Figura 6 – Divisão da população humana segundo variáveis biológicas, sociodemográficas ou de outra natureza. Assim como fizemos para o
espaço, também é necessário dividir a população humana em grupos, pois só assim poderemos fazer comparações e identificar quais são os
grupos que apresentam maior incidência da doença. No caso da bronquiolite, a doença ocorre majoritariamente em menores de 2 anos (painel
A). No caso do lúpus eritematoso sistêmico (LES), a doença apresenta maior frequência nas mulheres (painel B). Fonte: modificado a partir de
Shutterstock.
Por isso, entender as variações pessoais auxilia na identificação da etiologia da doença, bem como de seus
fatores de risco.
No entanto, é importante frisar que, além das variáveis biológicas, como idade e gênero, precisamos
estar atentos também às condições socioeconômicas e a outras variáveis que envolvam o perfil demográfico.
Isso porque a maior incidência de uma doença em determinados grupos pode auxiliar na elucidação de outros
aspectos importantes da enfermidade, como sua forma de transmissão.
Por exemplo, em 1981, o Centro de Controle Ao analisar o perfil demográfico dos pacientes,
de Doenças dos Estados Unidos (CDC) identificou verificou-se que a incidência da enfermidade era maior
dois conglomerados de casos de pneumonia por em profissionais do sexo. Portanto, provavelmente
Pneumocystis jirovecii nas cidades de Nova Iorque aquela enfermidade era transmitida por via sexual. Com
e Califórnia (veja que, primeiro, eles detectaram a isso, iniciou-se a trilha que levou à descoberta do HIV.
alteração espacial).
A engenharia reversa não detectou questões sobre as variações pessoais nas provas da UFMT e do INEP.
No entanto, estamos mencionando aqui para que você tenha a matéria de forma completa e porque esse
conceito será importante para outros temas.
Variações temporais são diferenças que Essa periodicidade ajuda (e muito) na previsão
encontramos na incidência de uma doença (ou agravo) do exato momento em que os casos vão aumentar
ao longo do tempo. É como se olhássemos uma espécie novamente. Por exemplo, suponha que a vigilância
de linha do tempo e analisássemos como o número de epidemiológica avaliou a doença Z por um período
casos novos variou ao longo das semanas, dos meses de 6 anos. Observou-se que a doença apresenta um
e dos anos. Existem dois tipos principais de variações aumento considerável no número de casos novos
temporais: (incidência) a cada 3 anos. Dessa forma, se a última
elevação do coeficiente de incidência foi em agosto de
• Variações cíclicas, regulares ou periódicas e
2019, o próximo aumento ocorrerá (provavelmente)
• Variações acíclicas, irregulares ou atípicas.
em agosto de 2022. Portanto, será possível preparar
A variação cíclica é aquela em que a frequência o sistema de saúde para lidar com o fenômeno ou até
da doença aumenta em intervalos de tempo regulares e mesmo impedir que ele ocorra se forem instituídas
superiores a 1 ano (> 12 meses). medidas preventivas adequadas.
Figura 7 – Variação cíclica. Nesse tipo de variação, a doença (ou agravo) apresenta aumento de sua frequência em intervalos iguais e superiores
a 1 ano. No exemplo acima, temos a enfermidade Z, cujo aumento do número de casos ocorre de forma regular a cada 3 anos. Para visualizar a
imagem com melhor resolução, amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
A variação sazonal é um tipo particular de variação cíclica em que o aumento da incidência ocorre em intervalos
de tempo de até 1 ano (≤ 12 meses). Por isso, é comum que essas elevações coincidam com as estações do ano,
respeitando o fenômeno da sazonalidade:
O exemplo clássico de doença sazonal é a gripe (influenza), que costuma apresentar aumento da incidência no
Brasil entre maio e agosto, isto é, nos meses do outono e inverno (ROUQUAYROL et al., 2017; MEDRONHO et al., 2009).
É por isso que a vigilância epidemiológica inicia a imunização para essa doença ainda no mês de abril, justamente para
controlar o aumento do número de casos no inverno.
Figura 8 – Variação sazonal. Nesse tipo de variação, a doença (ou agravo) apresenta aumento de sua frequência em intervalos de tempo iguais
e inferiores a 1 ano, o que faz com que tais elevações coincidam com a mesma estação do ano. Para visualizar a imagem com melhor resolução,
amplie o documento. O zoom ideal é de 170%.
Embora a definição de sazonalidade inclua a repetição do fenômeno nas estações do ano, existem variações
sazonais cujos ciclos se repetem com periodicidade semanal ou até diária. Por exemplo, segundo Rouquayrol, alguns
acidentes automobilísticos parecem aumentar periodicamente aos finais de semana (ROUQUAYROL et al., 2017).
— Professora, que interessante! Mas fiquei com uma dúvida: por que uma doença aumenta de forma cíclica
e de forma sazonal?
Existem muitas hipóteses que tentam explicar essas elevações periódicas da incidência. No caso das variações
cíclicas (> 1 ano), a principal hipótese é a renovação de indivíduos suscetíveis na comunidade ao longo do tempo.
Por exemplo, antes do advento da imunização, as elevações do sarampo ocorriam a cada três anos, justamente
porque novos indivíduos nasciam e acumulavam-se em número suficiente para favorecer uma nova circulação do vírus
(ROUQUAYROL et al., 2017). A imunização “freou” essa periodicidade, já que, atualmente, as crianças são imunizadas
ao completar o primeiro ano de vida.
Em contrapartida, a hipótese para as variações sazonais (≤ 1 ano) é diferente. Como o aumento de casos
acontece sempre na mesma época do ano, a possível explicação é o aumento da exposição dos indivíduos à fonte de
infecção ou agravo.
Resumindo:
¾ Se o aumento do número de casos acontece periodicamente em intervalos de tempo superiores a 1
ano, chamamos o aumento de variação cíclica. A principal hipótese para sua ocorrência é o acúmulo
de indivíduos suscetíveis.
¾ No entanto, se esse aumento ocorre dentro de um intervalo de 1 ano, coincidindo com as estações
do ano, receberá o nome de variação sazonal. A principal hipótese para sua ocorrência é a exposição
à fonte de infecção ou agravo.
Uma última observação: quando o examinador são aquelas que não seguem um padrão, uma vez que a
informar que a doença sofre um aumento periódico elevação do número de casos parece ocorrer ao acaso.
ou regular ao longo do tempo, mas não mencionar Dessa forma, é difícil prever quando haverá um novo
a periodicidade do evento (isto é, não mencionar o aumento da doença.
intervalo de tempo em que a frequência da doença Por exemplo, suponha que a vigilância
aumenta), então o examinador quer que você epidemiológica acompanha a evolução da doença
identifique a variação cíclica! As questões cujo gabarito Y em uma determinada localidade – Y é uma doença
é a variação sazonal pontuam que a periodicidade do típica daquele lugar, vem mantendo seu coeficiente de
evento é ≤ 1 ano (ou que coincide com as estações do incidência constante ao longo do tempo e não apresenta
ano). variações sazonais. Justamente por isso, ninguém
espera que aconteça um aumento da incidência.
— Certo! Entendi tudo! Só faltaram as variações
Porém, em 2020, os casos dessa enfermidade
irregulares.
aumentaram subitamente, sem qualquer prenúncio de
Ah! Ainda bem que você lembrou, eu quase
que isso poderia acontecer. Em outras palavras, foi um
esqueci. Veja só, essas são as variações mais importantes
aumento aleatório, isto é, “do nada”!
para este livro, porque elas dão origem aos processos
Quando isso acontece, dizemos que houve uma
epidêmicos!
variação irregular ou atípica, pois foi algo que fugiu ao
As variações irregulares (ou acíclicas ou atípicas)
padrão.
Figura 10 – Variação irregular. Nesse tipo de variação, a doença (ou agravo) apresenta aumento de sua frequência de forma inesperada. Portanto,
são fenômenos imprevisíveis e, se ultrapassarem o limite máximo, corresponderão aos processos epidêmicos (surto, epidemia e pandemia). Para
visualizar a imagem com melhor resolução, amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
CAPÍTULO
Existem muitos significados para o termo “processo epidêmico”, mas, para as provas de Revalidação do diploma
médico, usaremos este aqui:
É todo aumento repentino da incidência de uma doença (ou agravo), em um curto espaço de tempo,
ultrapassando o número máximo de casos que era esperado para aquela época do ano. Esse aumento ocorre
por um intervalo de tempo limitado, retornando à normalidade em seguida.
Em outras palavras, é uma variação da incidência que foge ao padrão normal, levando a um excesso de
casos.
Ainda, como vimos anteriormente, é uma variação temporal atípica, já que não pôde ser prevista.
Figura 11 – Diagrama de controle de uma doença hipotética mostrando uma variação epidêmica. Observe que o coeficiente de incidência vem
oscilando bem pouco ao longo do tempo, sempre dentro de uma faixa padrão e abaixo do limite máximo estabelecido. Em um determinado
momento, há o aumento súbito e inesperado do número de casos, ultrapassando o limite máximo (conhecido como limiar epidêmico). Essa
variação dura algum tempo, retornando à normalidade em seguida. Esse fenômeno é um processo epidêmico (também conhecido popularmente
como epidemia).
Por exemplo, suponha que a vigilância epidemiológica da fictícia cidade de Arumã esperava 100 casos da doença
Z para maio de 2020, já que esse foi o padrão observado nos anos anteriores. No entanto, algo aconteceu e, de
repente, houve o aumento súbito e inesperado dos casos da doença, chegando rapidamente a 500 doentes. O que
aconteceu em Arumã? Exatamente! Um processo epidêmico.
É importante frisarmos dois pontos:
¾ A percepção de que um processo epidêmico está acontecendo geralmente vem do excesso de notificações
de casos sintomáticos, pois são eles que vão procurar atendimento. Os casos assintomáticos geralmente
ficam em casa – afinal, por que procurariam uma unidade de emergência se estão gozando de boa saúde
(pelo menos aparentemente)? Por isso, o número de casos de uma epidemia sempre é bem maior do
que o número de casos registrados, já que os assintomáticos nem sempre são contabilizados.
¾ No capítulo anterior, vimos que o padrão de distribuição de uma doença pode ser descrito ao analisarmos
como a frequência da doença varia em um determinado espaço, grupo humano ou intervalo de tempo.
Ainda, vimos que essa frequência pode ser mensurada pela prevalência, pela incidência ou, até mesmo,
pela mortalidade específica. No entanto, para os processos epidêmicos, mensuramos apenas a
incidência! Não mensuramos prevalência ou mortalidade.
Os processos epidêmicos podem ser classificados em três tipos fundamentais, a depender da extensão
geográfica que alcançam: surtos, epidemias e pandemias.
EPIDEMIA
É um termo genérico utilizado para representar
qualquer processo epidêmico. Assim, pode ser
conceituada como toda elevação súbita e inesperada do
número de casos de uma doença (ou agravo) em uma
área geográfica mais ampla e de limites imprecisos.
Esse termo também pode ser utilizado para designar um processo epidêmico de extensão geográfica
intermediária, isto é, que ocorre em uma área mais ampla do que a de um surto, mas ainda menor do que a de uma
pandemia.
Embora a definição clássica de epidemia mencione excesso de casos, nem sempre esse excesso é
quantitativamente significativo. Tudo vai depender do padrão esperado para aquela comunidade.
Por exemplo, para regiões que estão há anos sem qualquer caso de uma determinada doença, um único caso
autóctone já pode representar uma epidemia. Isso porque o esperado era não ter nenhum caso; logo um único caso já
representa um excesso em relação ao que era esperado.
Além disso, o conceito de epidemia não está atrelado somente às doenças infecciosas. Ele pode ser utilizado
também para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), desde que (mais uma vez) o número de casos exceda
o padrão esperado. Por exemplo, a obesidade é uma DCNT que atingiu uma incidência alarmante nos últimos anos,
ultrapassando o padrão histórico. Por isso, atualmente é considerada como uma epidemia no Brasil.
PANDEMIA
É toda elevação súbita e inesperada do número apresentando um pequeno intervalo de tempo entre
de casos de uma doença (ou agravo) que ocorre em eles.
uma área geográfica muito extensa, mas tão extensa Além disso, uma doença que evolui em nível
que engloba diversas nações. pandêmico não é necessariamente uma enfermidade
Pode ser entendida também como “uma série grave ou letal. Nesse sentido, agentes etiológicos pouco
de epidemias localizadas em vários países”, sendo virulentos podem gerar pandemias se o aumento do
que essas epidemias ocorrem ao mesmo tempo ou número de casos apresentar extensão global. Isso
com uma pequena diferença no intervalo de tempo porque o conceito de pandemia está relacionado
(ROUQUAYROL et al., 2017; MEDRONHO et al., 2009). ao alcance geográfico da variação temporal, e não à
Por exemplo, a pandemia de covid-19 não atingiu gravidade da doença propriamente dita.
todo o globo terrestre ao mesmo tempo. Ela iniciou Agora, veja que interessante: uma pandemia
como um surto na China em novembro de 2019 e nunca começa como uma pandemia propriamente dita,
só chegou ao Brasil em fevereiro de 2020. Portanto, assim como uma epidemia não começa como epidemia.
veja que os focos epidêmicos não foram simultâneos,
Os processos epidêmicos geralmente começam como surtos. Porém, esse fenômeno pode avançar
geograficamente, alcançando, assim, o status de epidemia e, ao cruzar as fronteiras e os oceanos, pode alcançar o
status de pandemia. Foi assim que aconteceu com as pandemias de H1N1 em 2009 e com a própria covid-19 em 2020.
Figura 15 – Diferença entre surto, epidemia e pandemia. Observe o alcance geográfico de cada um desses processos epidêmicos: pandemia
> epidemia > surto.
Agora que você conheceu os processos epidêmicos, vamos falar sobre as endemias, que são o segundo tópico
mais cobrado desse tema.
3.2 ENDEMIAS
Uma endemia é uma doença que ocorre de forma habitual (ou usual) em uma determinada região, acometendo
a população de forma contínua ao longo do tempo. É como se fosse um prato típico daquela localidade.
Por exemplo, um indivíduo que viaja para a região amazônica sabe que a malária é uma doença comum naquele
lugar. Em contrapartida, se ele viajar para Minas Gerais, a doença típica daquele estado será a doença de Chagas.
Agora, olhe que interessante: vimos que os processos epidêmicos são variações da incidência que ocorrem por
um intervalo de tempo ou período limitado, certo? Isso não ocorre com uma endemia.
A palavra “endemia” significa “aquele que habita”. Veja bem: se a doença habita naquele local, ela não vai
embora! Ela permanecerá ali, como se também fosse uma moradora daquela localidade (ROUQUAYROL et al., 2017).
Por isso, fizemos a analogia com o prato típico, porque qualquer um que chegar à região poderá encontrá-la!
Figura 16 - Uma doença é endêmica quando ela ocorre habitualmente em determinada região, como se fosse um prato típico do local. Na
ilustração acima, temos, de forma lúdica, a malária sendo oferecida a um viajante que chega à região da Amazônia. Em contrapartida, a doença
de Chagas é o “prato típico” oferecido se o viajante chega a Minas Gerais.
Nesse sentido, como ela é a presença contínua da doença na localidade, seu coeficiente de incidência mantém-
se constante por um longo período, tão longo que costumamos dizer que a endemia ocorre por período ilimitado.
— Deixa eu ver se entendi direito! O coeficiente de incidência permanece constante por tempo indeterminado?
Exatamente! As endemias até admitem pequenas elevações na incidência em determinadas épocas do ano
(são as variações sazonais), mas tais alterações são pequenas e não ultrapassam o número máximo de casos que é
permitido para aquele período.
Por exemplo, observe no gráfico a seguir o coeficiente de incidência de uma determinada endemia. Observe
que ela tem sazonalidade no verão. Veja que o coeficiente permanece praticamente constante ao longo de todo ano,
aumentando um pouco mais durante o verão (variação sazonal), mas sem ultrapassar o limite máximo permitido
(limiar epidêmico).
Figura 17 – Definição de endemia: doença ou agravo usual em uma determinada localidade, cujo coeficiente de incidência permanece
constante por período ou tempo ilimitado. Para visualizar com melhor resolução, amplie para o zoom de 170%.
Outras definições clássicas de endemias, que também podem aparecer nas provas de Revalidação, estão
descritas abaixo. Observe que elas apresentam basicamente o mesmo significado: a doença é usual na localidade e
mantém seu coeficiente de incidência constante por tempo indeterminado.
“É uma ocorrência coletiva de determinada doença que, no decorrer de um largo período histórico,
acomete sistematicamente grupos humanos distribuídos em espaços delimitados e caracterizados, mantendo
sua incidência constante, permitidas variações sazonais”.
(ROUQUAYROL et al., 2017)
“Doença habitualmente presente entre os membros de determinado grupo, numa determinada área,
isto é, presente em uma população definida”.
(ROUQUAYROL et al., 2017)
“É a presença usual do agente etiológico naquela comunidade”. Observe que essa definição afirma que
o bioagente é usual. Como consequência, a doença também é.
(MEDRONHO et al., 2009)
Portanto, se o coeficiente de incidência não se altera ao longo do tempo (pois ele é constante!), a endemia não
pode ser uma variação temporal.
E se ela não é uma variação temporal, então ela não pode ser um processo epidêmico!
— Mas, professora, se uma endemia não é uma variação temporal da doença, então o que ela é?
Na verdade, a endemia é uma variação geográfica, uma vez que a enfermidade existe de forma habitual em
uma determinada localidade, mas pode não existir em outra. Mais uma vez, podemos citar a malária, que é frequente
no Pará, mas é rara no Rio de Janeiro. Como a incidência da doença é significativamente maior no primeiro estado do
que no segundo, fica claro que existe uma variação espacial da doença.
— Ah! Entendi! Mas, ainda estou intrigado, como uma doença consegue se manter ativa por tanto tempo em
uma comunidade? Não era para essa incidência diminuir em algum momento, já que a população deveria adquirir
imunidade?
1. Há uma constante renovação de suscetíveis na comunidade, o que permite que novos casos apareçam
de forma contínua.
2. Além disso, há uma exposição múltipla e repetida dos suscetíveis ao agente. Portanto, como eles são
sempre expostos, em algum momento contrairão à doença e
3. Existe um “isolamento relativo desses indivíduos sem deslocamento importante da população em uma
zona territorial”. Esses suscetíveis não emigram da localidade. Eles ficam na região, o que aumenta a
probabilidade de contato com o agente infeccioso.
(CARVALHO et al., 2017).
Figura 18 – Níveis de endemicidade possíveis para uma endemia. Dependendo da intensidade da transmissão da doença na localidade,
teremos uma endemia hiperendêmica, mesoendêmica ou hipoendêmica. Como os próprios prefixos sugerem, hiperendêmica é aquela em que a
transmissão é “hiper” ou intensa. Portanto, o coeficiente de incidência é elevado. A endemia mesoendêmica apresenta transmissão e incidência
moderadas. Por último, a endemia hipoendêmica é a de menor intensidade na transmissão, apresentando a menor incidência entre esses três
tipos.
O termo “hiperendemia” também pode ser conceituado como “transmissão intensa e persistente, atingindo
todas as faixas etárias” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2009). Justamente por isso, o coeficiente de incidência é elevado,
como vimos acima.
A determinação de uma epidemia não se baseia no valor absoluto de seu coeficiente de incidência,
lembra? Ela baseia-se no fato de o número de casos exceder o que era esperado para a localidade naquela
época do ano.
Por exemplo, suponha que, em todos os anos, o estado do Pará apresenta 100 casos de malária no mês de
dezembro. Em contrapartida, o Rio de Janeiro apresenta, tradicionalmente, apenas 2 casos naquele mesmo mês.
Agora, considere que o Pará apresentou 50 casos de malária em dezembro de 2020, enquanto o Rio de Janeiro
apresentou 4 casos. Em qual dessas unidades federativas temos uma epidemia?
— No Rio de Janeiro!
Exatamente! Nós já esperávamos os 50 casos no Pará (inclusive, esperávamos até mais). Portanto, está dentro
do padrão! Em contrapartida, o Rio de Janeiro apresentou um excesso de dois casos, pois esperávamos apenas 2!
Portanto, mesmo com uma incidência menor, esse último estado evoluiu com um processo epidêmico. Entendido?
Fique atento também aos outros termos relacionados às endemias. A engenharia reversa mostrou que eles já
foram cobrados em anos anteriores:
¾ Holoendemia – segundo Rouquayrol e colaboradores (2017), o referido termo significa que a doença
atinge a população “desde cedo”, isto é, desde faixas etárias precoces, ao ponto de a população adulta
apresentar poucos casos porque a exposição ocorre essencialmente na infância.
¾ Comportamento endêmico – é o fato de uma doença ter presença regular na comunidade, o que a torna
uma endemia.
¾ Enzootia – é uma doença (ou agente etiológico) que é habitualmente encontrada em animais de uma
determinada localidade. Em outras palavras, são doenças endêmicas em animais. A febre amarela, por
exemplo, é uma endemia que atinge macacos das principais regiões do país.
Agora, para fecharmos este tópico e finalmente resolvermos as questões, preciso contar uma coisa.
Apesar de não ser uma variação temporal, uma endemia pode evoluir como uma epidemia em alguns
momentos.
— Era só o que faltava, quando eu acho que já dominei a matéria, vem essa novidade!
Calma (risos), você vai entender! Considere o intervalo é chamado de faixa endêmica).
diagrama de controle abaixo, que se refere à doença Observe que, habitualmente, a enfermidade Z
Z, que é endêmica em uma localidade com 1.000 apresenta uma incidência média em torno de 15 casos
habitantes. por mês. Em outras palavras, em todos os meses,
A linha vermelha mostra o coeficiente de registramos cerca de 15 casos novos, o que faz sentido,
incidência que era esperado para os anos de 2018, 2019 já que uma endemia mantém sua incidência constante
e parte de 2020, enquanto a linha verde mostra como ao longo do tempo.
a doença realmente se comportou naquele intervalo de Agora, veja que, em agosto de 2018, a incidência
tempo. aumentou para 20 casos. Porém, esse aumento ainda
Ainda, observe que o diagrama apresenta uma está abaixo do limite máximo estabelecido (limiar
faixa na cor cinza, que é o intervalo de valores que a epidêmico). Ainda, veja que esse aumento também
incidência pode assumir sem que isso signifique um aconteceu após 1 ano (agosto de 2019), mostrando,
excesso ou um descontrole no número de casos (esse assim, periodicidade.
Essas pequenas elevações que ocorrem de forma periódica, sempre na mesma época do ano, e que
estão dentro do padrão esperado, são as variações sazonais (representadas pelos números 1 e 3 da imagem
abaixo).
No entanto, veja que o gráfico apresenta um mais que o previsto, o que gerou um excesso de casos.
aumento importante da incidência em fevereiro de Ainda, veja que a incidência diminuiu a seguir,
2019. Esse aumento não era esperado! Segundo a restabelecendo-se em cerca de 15 casos por mês e
linha vermelha, esperávamos os tradicionais 15 casos indicando que estávamos diante de um fenômeno
por mês. Porém, a localidade registrou um pouco mais limitado no tempo. Portanto, o que aconteceu em
de 25 ocorrências! Em outras palavras, foram 10 casos a fevereiro de 2019?
Figura 19 – Diagrama de controle que mostra uma doença endêmica, com suas variações sazonais, e com uma variação epidêmica. Observe a
linha tracejada em vermelho, que é o comportamento esperado da doença Z. Veja que a previsão é uma incidência média em torno de 15 casos
por mês, podendo chegar a 20 casos nos meses de inverno (variações sazonais). Agora, observe a linha contínua em verde, que é a incidência
real nos meses observados. Veja que, nos meses de verão, há uma discrepância entre o que era esperado e o que de fato ocorreu. Esperávamos
cerca de 15 casos por mês, mas foram registrados um pouco mais de 25, o que ultrapassou (inclusive) a incidência máxima permitida. Assim,
o que aconteceu foi uma variação temporal atípica do tipo epidemia. Portanto, a endemia evoluiu com uma variação epidêmica, voltando à
normalidade em seguida. Para visualizar a imagem com melhor resolução, amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
- Bom... foi uma variação temporal atípica, que gerou um excesso de casos e que foi limitada no tempo... já
sei! Aconteceu uma epidemia!
RESUMINDO
Processo epidêmico (surto, epidemia, pandemia) – elevação do coeficiente de incidência
de uma doença ou agravo de forma abrupta e inesperada, que ultrapassa o número máximo de
casos permitidos, mas ocorre apenas por um intervalo de tempo limitado. Portanto, é um aumento
temporário do número de casos.
Endemias – presença constante de uma doença ou agravo em uma determinada comunidade,
acometendo a população de forma contínua. O coeficiente de incidência não varia ao longo do tempo
(isto é, ele permanece constante por período ilimitado), exceto em algumas estações do ano, quando
apresenta pequenas elevações (variações sazonais), mas sempre sem ultrapassar o número máximo
permitido (limiar epidêmico).
HORA DE
PRATICAR!
Agora, sim! Que tal resolvermos uma questão inédita, só para você entender como esse tópico poderia ser
cobrado nas provas de Revalidação de diploma médico?
CAI NA PROVA
(QUESTÃO INÉDITA). A vigilância epidemiológica da cidade X registrou um aumento súbito e inesperado no número
de casos de gastroenterite em um asilo. Sabendo que outros locais da cidade não registraram casos novos da doença,
esse processo epidêmico é chamado de:
A) Surto.
B) Epidemia.
C) Pandemia.
D) Endemia.
COMENTÁRIO:
Doutor, observe que o aumento da incidência ficou restrito ao asilo. Portanto, trata-se de um processo epidêmico
bem localizado do ponto de vista geográfico e que acometeu uma população específica (a que reside ou trabalha
no asilo). Por isso, estamos diante de um surto.
Correta a alternativa A, sem ressalvas.
Incorreta a alternativa B. Para ser uma epidemia, o número de casos deveria aumentar em uma área mais ampla
e mal definida.
Incorreta a alternativa C. Para ser uma pandemia, o número de casos deveria aumentar em diversos países ao
mesmo tempo ou em intervalos de tempo próximos.
Incorreta a alternativa D. Uma endemia é uma doença típica de uma localidade e que mantém seu coeficiente de
incidência praticamente constante por tempo ilimitado. Portanto, se houve um aumento súbito e inesperado no
número de casos (isto é, se houve uma variação do coeficiente de incidência), então é porque houve um processo
epidêmico.
É importante que você esteja atento aos outros tipos de processos epidêmicos que podem aparecer em sua
prova.
EPIZOOTIA
“Animal ou grupo de animais encontrados doentes e/ou mortos, incluindo ossadas, sem causa definida,
que podem preceder a ocorrência de doenças em humanos”.
(ROUQUAYROL et al., 2017)
Conforme dito anteriormente, embora as epizootias sejam utilizadas como eventos-sentinela, nem
sempre são causadas por doenças que necessariamente ameaçarão a saúde pública. Grave isso, pois foi
cobrado recentemente em prova.
Além disso, observe que, apenas na epizootia, acontece nos demais processos epidêmicos, cuja
o conceito não se restringe ao aumento da incidência, definição se restringe à incidência.
incluindo também o aumento dos óbitos. Isso já não
EPIFITIA
De forma semelhante, a epifitia é a elevação do número de casos de uma doença em plantas. Em outras
palavras, é um processo epidêmico que ocorre em vegetações.
Resumindo:
3
“Amarílico” significa “próprio marela”.
Figura 20 – Epidemia, epizootia e epifitia. O prefixo “epi-“ vem do grego e significa “o que vem de fora” ou “o que visita”. Dessa forma, indica
que todos os processos epidêmicos são visitantes, portanto temporários (ou limitados no tempo). A epizootia refere-se ao aumento do número
de casos (ou óbitos) de uma doença ou agravo em animais. A epifitia refere-se ao aumento dos casos em vegetações. A epizootia admite que o
aumento dos óbitos faça parte da definição, ao contrário dos demais processos epidêmicos, em que utilizamos apenas a incidência.
SINDEMIA
O primeiro ponto fundamental para entendermos o significado de sindemia é relembrarmos o conceito de
sinergia:
Sinergia é o poder combinado de um grupo de fatores que, quando estão atuando em conjunto,
apresentam resultados mais intensos do que se esperaria com a mera soma deles (DICIONÁRIO DE CAMBRIDGE).
Na linguagem popular: o todo supera a soma das partes.
Em outras palavras, quando eles interagem, o resultado é maior do que a simples soma. É como se houvesse
multiplicação em vez de adição. Portanto, estamos falando de potencializar resultados, como uma bomba.
— Professora, mas qual é a relação entre sinergia e processo epidêmico? Ainda não entendi.
Pois bem! O termo “sindemia” é a junção de “sinergia” com “epidemia” e significa “epidemia sinérgica”.
Portanto, é um processo epidêmico que resulta da interação de outras epidemias e que, justamente por isso, tem seus
resultados potencializados.
Sindemia é a interação de duas ou mais epidemias, resultando em um fenômeno cujo impacto é maior
do que a simples soma das epidemias envolvidas. Uma das principais consequências é a carga excessiva de
doença no local ou na população onde ocorre (FRONTEIRA et al., 2021; SINGER, 2010).
Figura 21 – Sindemia é a interação de dois ou mais processos epidêmicos, resultando em fenômeno cujo impacto é maior do que a simples soma
das epidemias. Fonte da imagem de explosão: Shutterstock.
Esse termo ainda não apareceu nas provas de Revalidação do diploma médico. No entanto, foi muito
discutido em 2020 e em 2021! Por isso, fique ligado!
Os conglomerados, geralmente, aparecem como alternativas das questões, mas a engenharia reversa
não detectou nenhuma questão em que eles fossem o gabarito.
Uma curva epidêmica nada mais é do que o comportamento gráfico de uma epidemia. Observe que, quando
isso acontece, o traçado do diagrama de controle “muda” de formato, gerando uma espécie de curva em sino.
Figura 22 – A curva epidêmica e suas fases. Primeiro, temos um incremento inicial de casos (fase 1), seguido da progressão (fase 2) e da
regressão (fase 3, que corresponde à última fase). Após a regressão, a doença pode assumir dois comportamentos: seu coeficiente de incidência
pode estabilizar no mesmo nível de endemicidade anterior à epidemia (4) ou pode ser que ocorra decréscimo endêmico, que é quando a
incidência diminui, saindo da faixa endêmica. Para maiores detalhes sobre cada fase, leia o texto. Para visualizar a imagem com melhor resolução,
amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
Ainda, a “subida e a descida”, isto é, o formato em sino propriamente dito, é conhecido como egressão. A
“largura” da egressão é o tempo que a epidemia durou.
No entanto, lembre-se de que o tempo de duração de uma epidemia é uma observação que só pode
ser feita quando a epidemia acaba. Isso porque não é possível estabelecermos um tempo de duração para as
epidemias, tampouco para suas fases (incremento inicial, progressão e regressão). Inclusive, tais fases podem
apresentar durações diferentes, o que faz com que a curva em sino não fique tão simétrica como vimos.
O que sabemos é que, por serem eventos temporalmente limitados, o coeficiente de incidência diminuirá
em algum momento. No entanto, não é possível saber com precisão quando isso acontecerá.
Sim! O ponto de dificuldade está no fato de que sino, embora, independentemente da forma, ainda
a curva acima é a curva padrão, mas ela pode assumir consigamos identificar as fases acima, como progressão
diferentes formatos dependendo do tipo de epidemia e regressão.
em curso. Ou seja, nem sempre a curva vai ser um Veremos isso a seguir!
Antes de passarmos para o próximo tópico, vamos conversar sobre um conceito interessante!
Dependendo do intervalo de tempo em que a progressão ocorre, teremos uma epidemia explosiva (ou
maciça) ou uma epidemia lenta.
Epidemias maciças são aquelas em que o “pico” ou número máximo de casos é atingido rapidamente,
ou seja, o intervalo de tempo em que a progressão ocorre é muito curto – é como se o número de casos
“explodisse” em pouco tempo. Em contrapartida, uma epidemia lenta é aquela cujo tempo de progressão é
mais longo, isto é, demora-se mais para atingir o ápice da curva.
O grande problema das epidemias explosivas é a possibilidade de o número de casos ultrapassar a
capacidade de atendimento do sistema de saúde, já que muitos casos surgirão ao mesmo tempo. Nesse
sentido, se a doença for do tipo contagiosa, é possível retardar o tempo de progressão aplicando medidas
restritivas de contato, como quarentena, distanciamento social e lockdown (falaremos mais sobre elas na 2ª
parte do livro)
Nesse sentido, orienta-se a população a permanecer em casa se estiver doente ou a praticar o
distanciamento social, com o objetivo de retardar o aumento da incidência. Caso essas medidas sejam bem-
sucedidas, observaremos o “achatamento da curva”.
Foi o que aconteceu durante a pandemia de covid-19, em que houve a tentativa de transformar uma
epidemia maciça em lenta. Como dito, esse achatamento nada mais foi do que alterar o tempo de progressão
ou a velocidade da epidemia. Nesse sentido, o tempo de “subida” torna-se mais longo, e o pico de incidência
diminui, o que faz com que o sistema de saúde ganhe tempo para manejar seus leitos.
Observe que, nessa estratégia, o coeficiente de incidência ainda aumenta – ou seja, novos casos
continuarão surgindo a cada dia – porém, não mais na intensidade com que surgiam antes.
Figura 45 – O famoso achatamento da curva. Para visualizar a imagem com melhor resolução, amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
A engenharia reversa mostrou que a única questão que caiu no INEP sobre processos epidêmicos foi
justamente sobre tipos de curvas epidêmicas.
Existem diversos tipos disponíveis na literatura epidemiológica, mas o INEP trabalhou com as curvas
disponíveis no Guia de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (2019). Por isso, nosso estudo será baseado
nelas! Acompanhe a seguir!
Segundo o Guia de Vigilância em Saúde, existem quatro tipos principais de epidemias, a saber:
1. Epidemia maciça comum ou explosiva.
2. Epidemia maciça comum ou explosiva com casos secundários.
3. Epidemia maciça comum prolongada.
4. Epidemia propagada ou múltipla.
— Certo, Bárbara, agora que você já mostrou que sabe falar grego, traduza para o português, por favor!
Calma (risos), vou explicar. O primeiro ponto fundamental é você entender a diferença entre epidemia comum
e epidemia propagada.
A epidemia comum ou epidemia por fonte comum é aquela em que todos os casos são oriundos da mesma
fonte de infecção. É o que acontece quando um alimento estragado é servido em uma festa de casamento e muitos
convidados ingerem a comida ao mesmo tempo.
Figura 23 – Fonte comum: é aquela que dá origem a todos os casos do processo epidêmico.
No tópico anterior, comentamos que, dependendo do tempo de progressão, uma epidemia poderia ser
classificada como explosiva/maciça ou lenta. Agora, veja que interessante: é de praxe assumirmos que uma
epidemia comum também é, concomitantemente, uma epidemia maciça. Isso porque o fenômeno já começa
com muitos indivíduos adoecendo ao mesmo tempo, o que faz com que a incidência “suba” (ou “progrida”) de
forma muito rápida! Por isso, usamos o termo “epidemia maciça comum” para designar que aquele processo
epidêmico foi explosivo e originado por uma fonte comum.
Além disso, a fonte comum pode persistir no contaminação e que a população se contamine por um
ambiente por um curto intervalo de tempo (como longo período.
horas) ou prolongar-se no ambiente por alguns dias, Já a epidemia propagada ou epidemia por fonte
semanas, meses ou anos. No primeiro caso, ela será múltipla é aquela em que existem diferentes fontes de
chamada de fonte comum de curta duração (ou infecção no ambiente, sendo que cada uma delas inicia
pontual). Entretanto, se ela permanecer no ambiente, uma cadeia epidemiológica distinta.
será chamada de prolongada. Em outras palavras, cada fonte (ou caso primário)
Um exemplo comum de fonte de curta duração produz novos casos, que serão chamados de secundários.
é o alimento estragado que foi servido em uma festa Por sua vez, esses casos secundários produzirão outros
de casamento. Ele permanece no ambiente por novos casos e assim por diante (veja a imagem a seguir).
apenas algumas horas, sendo eliminado a seguir. Em A epidemia de covid-19 é um exemplo de epidemia
contrapartida, um exemplo de fonte prolongada é propagada, uma vez que diversos indivíduos com SARS-
uma rede de abastecimento de água contaminada CoV-2 iniciavam cadeias epidemiológicas distintas e
com dejetos fecais. Pode ser que demore algum tempo paralelas ao mesmo tempo.
até que se descubra o trecho da rede em que houve a
Figura 24 – Fonte múltipla ou propagada. Dizemos que uma epidemia tem fonte múltipla quando várias fontes de infecção atuam ao mesmo
tempo ou em intervalos de tempo próximos. Observe que, por ser uma epidemia em que o agente etiológico se propaga de pessoa a pessoa,
uma fonte de infecção deriva de outra.
— Mas, Bárbara, a covid-19 é uma doença que, até então não existia. Dizem que ela começou
em um mercado de peixes, será que a origem da pandemia foi uma fonte comum?
Veja: especula-se que a covid-19 seja uma zoonose, ou seja, uma doença que foi transmitida de
um animal para um determinado indivíduo, que seria o caso primário. Por sua vez, esse caso primário
teve contato com outras pessoas, que se tornaram casos secundários da doença e continuaram
“repassando” o SARS-CoV-2 adiante, propagando o patógeno (por isso o nome “propagada”).
No entanto, nada impede que, pelo menos no início, um grupo de pessoas tenha se contaminado
AO MESMO tempo no mercado de peixes, caracterizando, assim, uma epidemia comum. Mas olhe que
interessante: a partir desse primeiro surto, esses indivíduos transmitiram o vírus para outras pessoas,
gerando casos secundários. Por isso, pelo menos no início, é possível, sim, que o surto de covid-19 tenha
sido uma epidemia comum com casos secundários. E, então, conforme a epidemia foi aumentando
em extensão, assumiu o padrão de apenas epidemia propagada.
Figura 25 – Tipos de epidemias. Observe que primeiro realizamos a divisão em epidemia maciça comum e em epidemia propagada. E, dentro das
epidemias maciças, ainda temos a subdivisão em curta duração, com casos secundários e em prolongada. Fonte: Estratégia MED.
Agora que repassamos os principais conceitos acerca dos tipos de epidemias, vamos finalmente conhecer as
curvas epidêmicas!
Tais curvas representam as mesmas que vimos anteriormente! A diferença reside basicamente no tipo
de traçado das curvas: as que estão a seguir foram representadas por uma linha de tendência, enquanto as
curvas anteriores foram representadas por histogramas.
https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2019/junho/25/guia-vigilancia-saude-volume-unico-3ed.pdf.
Como dito anteriormente, esse tipo de epidemia bem, como muitos convidados terão acesso à fonte de
apresenta uma única fonte de infecção, que dura apenas infecção ao mesmo tempo – e apenas naquele momento
algumas horas no ambiente. O exemplo clássico é o do –, a grande maioria dos casos surgirá nas próximas
alimento estragado em um evento social. Por exemplo, horas, atingindo o pico de incidência rapidamente – por
suponha uma festa de casamento em que foi servida isso é uma epidemia maciça ou explosiva, com tempo
uma iguaria contaminada com Salmonella typhi. Pois de progressão curto.
Porém, logo após alcançar o pico da curva (ou apenas algumas horas). Por sua vez, o formato da curva
pico de incidência), acontecerá a regressão, já que não epidêmica será igual ao da curva padrão que vimos no
surgirão novos casos (afinal, a fonte de infecção durou início do capítulo, com formato em sino.
Figura 26 – Epidemia maciça comum de curta duração. Observe que o número de casos aumenta rapidamente e o pico da epidemia é alcançado
em pouco tempo. A seguir, temos a regressão, e a epidemia acaba. Não existem novas ondas epidêmicas (ou seja, novas progressões). A curva
assume o clássico formato em sino.
Fique atento: o tempo de duração desse tipo de epidemia é o período de incubação da doença infecciosa.
Em algumas ocasiões, os indivíduos infectados Observe que temos o mesmo formato de curva
por uma fonte comum de infecção podem ter contato acima, mas com uma espécie de “rebarba”. Em outras
com outras pessoas que não foram expostas à primeira palavras, a curva apresenta aspecto bimodal, com
fonte, mas que acabam por contrair a doença mediante uma segunda onda, mas de intensidade bem menor. O
esse contato com o indivíduo doente, o que gera tempo de epidemia ultrapassa o período de incubação
novos casos – são os casos secundários. Quando isso e pode ser difícil determinar a data da exposição à fonte
acontece, temos uma epidemia maciça comum com de infecção (OPAS, 2010).
casos secundários.
Figura 27 – Epidemia maciça comum com casos secundários. Observe que a primeira curva é idêntica à anterior (epidemia maciça comum de
curta duração), com a diferença de que temos uma espécie de “segunda onda”, com casos secundários, conferindo um aspecto bimodal à curva.
Sim. Suponha que os indivíduos da festa de casamento citada no tópico anterior (casos primários) tenham
transmitido o patógeno para outros indivíduos que não estavam na festa. Esses novos casos serão secundários, e
observaremos o segundo pico de incidência na curva.
A epidemia maciça comum prolongada é aquela pico, mas a regressão não acontece em seguida – ela
em que a fonte de infecção é comum a todos (ou seja, entra em uma espécie de platô, mantendo-se sem picos
fonte única), porém ela persiste na localidade por algum de incidência significativos ao longo do tempo. Isso
tempo, fazendo com que os casos apareçam de forma porque os casos aparecem continuamente, ao contrário
contínua. da epidemia explosiva, em que todos aparecem
Nesse sentido, a curva epidêmica apresentará um praticamente “de uma vez só”. Só depois do platô há
tempo de progressão mais longo quando comparado a regressão epidêmica. Essa epidemia apresenta um
ao da epidemia explosiva. Observe que ela atinge um tempo de duração maior do que o período de incubação.
Figura 28 – Epidemia maciça comum prolongada. Observe que, logo após atingir a incidência máxima, a epidemia entra em uma espécie de platô.
Isso acontece porque a fonte de infecção tem duração prolongada, o que mantém constante o surgimento de novos casos, pelo menos enquanto
a fonte durar. Logo após a retirada da fonte, a epidemia entra em regressão e não apresenta novas ondas epidêmicas.
Como exemplo, podemos citar um poço de água que vinham pelo ar, como o odor do lixo. Ninguém
que está contaminado com esgoto. Pode ser que leve desconfiava ainda que existissem bactérias e vírus e
algum tempo até que se perceba que aquela fonte é que o veículo de uma doença poderia ser a água.
a origem da infecção, o que produzirá casos por longa Por isso, demorou algum tempo até que John
data. Snow (que não é aquele personagem do famoso seriado
Foi o que aconteceu no século XIX, na cidade de Game of Thrones) percebesse que a doença tinha
Londres. Naquela época, a população não recebia água origem em um poço público. John, que era médico da
potável em suas casas, pois não havia uma rede de corte real, fez um intenso trabalho de investigação e
abastecimento encanada. Pelo contrário: era necessário percebeu que a maioria dos indivíduos com a doença
recorrer às fontes públicas, ou seja, poços espalhados residia próximo à fonte de água da “rua larga”.
pela cidade. Porém, em um determinado momento, Ao constatar que o poço era a fonte de infecção,
o lençol freático que abastecia uma dessas fontes foi John solicitou que ela fosse fechada pelo poder público,
contaminado com esgoto, o que gerou uma grande mas foi chamado de louco. Portanto, por suas próprias
epidemia de cólera. mãos, ele quebrou a alavanca que permitia que a
O problema é que isso aconteceu em 1853, e a população retirasse água do poço. Como a fonte ficou
teoria microbiológica das doenças ainda não tinha sido inutilizada, as pessoas não conseguiram mais retirar
postulada – ela só foi elaborada no final do século. água daquele local e, curiosamente, a epidemia de
Portanto, a humanidade acreditava que as doenças cólera cessou.
tinham origem nos miasmas, ou seja, nos cheiros
A epidemia propagada é aquela cujo tipo de múltiplas fontes, sendo que esses picos são cada vez
transmissão predominante ocorre de pessoa a pessoa, maiores, dando a ideia de uma epidemia que realmente
com várias cadeias de transmissão devido à existência se propaga aos poucos, mas que vai ganhando
de múltiplas fontes (isto é, um indivíduo infectado intensidade.
gera novos infectados, que, por sua vez, servem como Observe que, logo após atingir o pico de
fontes de infecção aos demais suscetíveis – lembre-se incidência, inicia a regressão, mas ela é interrompida
da imagem que vimos logo acima). Como exemplos, por uma nova progressão, levando a crer que o aumento
podemos citar a covid-19 e a gripe influenza. da incidência decorre de um novo grupo que se expôs
Observe que a curva epidêmica apresenta a uma outra fonte – por isso, falamos que existem
múltiplos picos de incidência, o que condiz com múltiplas fontes.
Ainda, cada ciclo com incidência máxima começa a acontecer, um outro grupo de suscetíveis
corresponde a uma onda pandêmica, e a distância expõe-se à outra fonte de infecção, e a epidemia entra
entre dois picos de incidência corresponde ao período em progressão novamente.
de incubação da doença – ou seja, como a regressão
Figura 30 – Epidemia por fonte múltipla ou propagada. Observe que a regressão inicia após a epidemia atingir o 1° pico de incidência. Porém, a
regressão não se completa. Ela é interrompida por uma nova progressão, dessa vez mais intensa, correspondendo a uma 2ª onda. Nesse sentido,
a incidência máxima (2° pico) é ainda maior. O processo repete-se: a regressão inicia novamente, mas é interrompida por uma nova progressão,
e que também apresenta pico maior do que o anterior (3° pico > 2° pico de incidência). Esse é o resultado de fontes múltiplas atuando ao mesmo
tempo (ou em intervalos de tempo próximos) e estabelecendo novas cadeias de transmissão. Por isso, a epidemia não termina, pois uma nova
fonte “aparece” e recomeça o processo epidêmico.
HORA DE
PRATICAR!
Vamos ver as questões de anos anteriores para que você entenda exatamente como esse assunto é cobrado
nas provas!
CAI NA PROVA
(REVALIDA – INEP – 2015). Em uma cidade, ocorreram vários casos de uma doença de notificação compulsória,
suficientes para ultrapassar o limite endêmico superior em determinado período. A equipe da Vigilância Epidemiológica,
após realizar investigação, elaborou o gráfico ilustrado a seguir, que considera a distribuição do número de casos
(eixo vertical) em função do tempo (eixo horizontal), além do período máximo de incubação desta doença (linha mais
espessa, abaixo do eixo horizontal). (VER IMAGEM) Com base nos dados apresentados, como deveria ser caracterizada
essa epidemia?
COMENTÁRIO:
Comentário. Estrategista, observe que a banca utilizou exatamente o painel de curvas que comentamos
anteriormente. Veja que temos um pico de incidência seguido de regressão completa, sem novas progressões.
Portanto, estamos diante de uma epidemia por fonte comum e pontual, ou epidemia maciça ou explosiva. Logo:
Incorreta a alternativa A, porque, apesar de a alternativa mencionar epidemias maciças e de fonte comum, não há
prolongamento do tempo de exposição à fonte (pois não há platô).
Correta a alternativa B, sem ressalvas.
Incorretas as alternativas C e D, porque não é exposição múltipla ou fonte múltipla, e sim exposição maciça ou fonte
comum pontual.
Gabarito: alternativa B.
Que tal uma pausa agora para um cafezinho com biscoitos? A seguir, voltaremos com tópicos de epidemiologia
das doenças infecciosas!
Nessa segunda parte de nosso LDI, vamos falar especificamente sobre a epidemiologia das doenças transmissíveis!
Esse é um tema muito interessante e que, geralmente, se encontra separado dos processos epidêmicos nos livros
de epidemiologia. Porém, é muito comum as bancas elaborarem questões que misturam esses assuntos, por isso
achamos melhor unificá-los em um só livro, para facilitar seus estudos.
Veja, a seguir, a engenharia reversa, para que você entenda como esse tema pode ser cobrado em sua prova de
Revalidação.
CAPÍTULO
A engenharia reversa mostrou que a UFMT já cobrou três questões sobre a epidemiologia das doenças
transmissíveis, enquanto o assunto ainda não foi cobrado no REVALIDA INEP.
— Professora, não é muito prevalente, né? Será que vale a pena o estudar?
Veja, eu aconselho que sim! Os tópicos a seguir despencam nas provas de Residência Médica e estão
em alta devido à pandemia de covid-19. Por isso, acredito que alguns dos conceitos a seguir possam aparecer
também nas provas de Revalidação do diploma médico!
Dos tópicos acima, aqueles que já foram cobrados pela UFMT foram justamente os dois últimos, isto é, de
números 6 e 7. Porém, como existe uma tendência de as provas de Revalidação seguirem as provas de Residência
Médica, estudaremos a matéria de forma mais completa para que você esteja preparado para qualquer questão. Mas
fique tranquilo, porque seremos bem objetivos para que você tenha uma boa gestão do tempo!
Então, vamos em frente! Mãos à obra!
CAPÍTULO
Por incrível que pareça, não. A infecção é a do agente infeccioso e do hospedeiro suscetível não
multiplicação do agente etiológico no organismo são condições suficientes para que a infecção aconteça.
do hospedeiro ao ponto de esse microrganismo ser Muitas vezes, é necessário que exista uma interação do
eliminado e propagado. Em contrapartida, a doença meio ambiente com o próprio hospedeiro para que a
é a manifestação de sinais e sintomas propriamente infecção seja estabelecida, principalmente nas doenças
ditos, que resultam das alterações fisiopatológicas que apresentam modos de transmissão que dependam
provocadas pela infecção. Toda doença causada por um do ambiente (falaremos sobre isso mais para frente).
microrganismo pressupõe uma infecção, mas nem toda Por exemplo, dependendo das condições
infecção gera doença; a prova disso é a existência dos climáticas e de outros fatores ambientais, a exposição
casos assintomáticos. ao agente etiológico pode ser maior ou menor, o
Para causar a infecção, o agente etiológico precisa que, por sua vez, facilitará ou dificultará a infecção. É
encontrar um hospedeiro suscetível, que é aquele que o que acontece com o vírus influenza. Em dias frios, a
se deixa penetrar pelo agente, permitindo que ele se aglomeração de pessoas aumenta o contato entre elas,
multiplique e cause a infecção. facilitando a dispersão daquele bioagente.
No entanto, olhe que interessante: a presença
4
Nesse LDI, utilizaremos o termo “microrganismo” para designar todos os agentes etiológicos, incluindo os vírus, apesar de eles não serem considerados organismos vivos.
De igual forma, doenças que são transmitidas de resistir à infecção. Porém, não precisamos chegar
por vetores (como a dengue) podem ser favorecidas a um nível molecular para explicar o poder que o
em épocas cuja temperatura favoreça a proliferação ambiente exerce em um indivíduo; basta olharmos
vetorial. Por exemplo, os casos de dengue aumentam para as condições socioeconômicas de algumas
no verão porque é a época em que há maior volume localidades. Em comunidades que apresentam alta
de chuvas e proliferação de mosquitos – estudamos vulnerabilidade social, com falta de saneamento básico,
isso em sazonalidade, lembra? Por isso, as condições com desemprego e insuficiência de outros fatores
ambientais podem criar as condições epidemiológicas básicos de vida, há elevada incidência de doenças
que favoreçam a transmissão. infecciosas – não é à toa que, quando as condições
Além disso, o ambiente também é capaz de do ambiente melhoram, aquela sociedade entra em
interferir no hospedeiro. Dependendo do ambiente transição demográfica e epidemiológica, diminuindo o
em que o hospedeiro está inserido, ele terá uma percentual de doenças infecciosas e aumentando o das
determinada expressão genética, o que pode ativar doenças crônicas não transmissíveis. Vimos isso no livro
genes que aumentem ou diminuam sua capacidade anterior, lembra?
Por isso, a interação ambiental é tão importante quanto a presença do agente etiológico e do hospedeiro
para que as infecções sejam estabelecidas.
AGENTE HOSPEDEIRO
MEIO AMBIENTE
Figura 32 – A tríade epidemiológica. A transmissão de uma doença infecciosa envolve basicamente três elementos: o agente etiológico, o
hospedeiro e o meio ambiente.
Enquanto a tríade epidemiológica pontua os elementos necessários para a transmissão de uma doença
infecciosa, a famosa história natural das doenças tenta explicar como a infecção evolui no hospedeiro infectado.
— Professora, isso foi visto no livro de processo saúde-doença!
Sim, exatamente! Que bom que você lembrou! condições favoráveis para o adoecimento: o hospedeiro
Vamos só relembrar alguns conceitos importantes suscetível, a exposição ao bioagente e o meio ambiente
para que você consiga entender alguns períodos com suas condições ideais (especialmente geográficas
epidemiológicos que podem aparecer nas provas. e climáticas).
De acordo com Leavell e Clark, uma doença Quando o hospedeiro suscetível encontra o
infecciosa pode ser dividida em dois períodos bioagente e a infecção se estabelece, inicia o período
primordiais: o pré-patogênico e o patogênico. patogênico. De acordo com a evolução clínica, esse
O período pré-patogênico é aquele em que a período pode ser subdividido em:
doença ainda não foi estabelecida, mas existem as
• período assintomático, que é aquele em que o indivíduo não apresenta quaisquer sinais ou
sintomas;
• período sintomático, que é quando a doença se manifesta de forma propriamente dita;
• e período de convalescência, que é quando há a recuperação do paciente (caso ele não evolua
para complicações ou para o óbito) – veja imagem a seguir.
No entanto, observe que a divisão proposta de doenças infecciosas, precisamos dividir a evolução da
por Leavell e Clark é uma divisão clínica que auxilia doença de uma maneira diferente para que possamos
na identificação dos momentos oportunos para entender a dinâmica da transmissão.
rastreamento, tratamento precoce, entre outros. Nesse sentido, existem quatro períodos que vão
A verdade é que, quando falamos em transmissão auxiliar em nossa missão. São eles:
• período de latência;
• período de incubação;
• período prodrômico; e
• período de transmissibilidade.
Figura 33 – A história natural das doenças infecciosas (Leavell & Clark) e os períodos de importância epidemiológica. O período patogênico é
tradicionalmente dividido em assintomático, sintomático e convalescência. Porém, é possível identificarmos outros intervalos de tempo de
grande importância epidemiológica dentro do período patogênico, como os períodos de latência, incubação, sindrômico e de transmissibilidade.
Para visualizar a imagem com melhor resolução, amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
Existem diversas definições para o período de de tempo que varia desde a exposição do indivíduo ao
latência. Por isso, é importante que você esteja atento patógeno (ou o momento em que ele contrai o agente)
ao contexto em que o termo foi aplicado. até que o momento em que o indivíduo se torna
Por exemplo, para as doenças infecciosas agudas, infectado de forma propriamente dita (OPAS, 2010).
como o sarampo, o período de latência é o intervalo
Em contrapartida, para as doenças infecciosas para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT).
de longa duração, como a sífilis, o período de latência Nesse sentido, o período de latência corresponde
é o intervalo de tempo em que os sintomas da doença ao intervalo de tempo desde a aquisição do fator de
desaparecem após o indivíduo ter passado por um risco até o estabelecimento da doença propriamente
período sintomático da doença. É como se, ao invés de dita. Esse período costuma ser muito longo nas DCNT,
evoluir para a cura ou óbito, ele entrasse novamente podendo durar anos. Por exemplo, o início da exposição
no período assintomático. No entanto, o indivíduo não ao asbesto e a ocorrência do mesotelioma pleural
está curado e pode transmitir a doença. costuma levar cerca de 30 anos.
Por último, esse termo também pode ser utilizado
É o intervalo de tempo que varia desde a Agora, suponha que o período de incubação mínimo da
exposição ao agente infeccioso até o primeiro sinal referida doença é igual a 3 dias, enquanto o período de
ou sintoma da doença (ROUQUAYROL et al., 2017). É incubação máximo é igual a 18 dias.
um período de grande importância epidemiológica, Durante a anamnese, o paciente informa que
pois é utilizado para a identificação da possível fonte de esteve no banco no dia 11 de março de 2021, em um
infecção. almoço na casa de sua irmã no dia 22 de março de 2021
Por exemplo, suponha que João iniciou os e em uma loja de ferramentas no dia 31 de março de
sintomas da doença Z (uma terrível doença de 2021. Em qual desses locais é possível que ele tenha
transmissão respiratória) no dia 1º de abril de 2021. adquirido a infecção?
— Bom, professora, se os sintomas iniciaram no dia 1º de abril e o período de incubação mínimo é de 3 dias,
então a exposição não pode ter ocorrido após o dia 29 de março. Caso contrário, não haveria o tempo mínimo
necessário para o bioagente produzir os primeiros sintomas.
— E, se o período máximo de incubação é igual a 18 dias, então o paciente não se expôs antes do dia 14 de
março. Caso contrário, ultrapassaríamos o período máximo.
Excelente! Então já sabemos que ele só pode ter sido exposto entre os dias 14 e 29 de março de 2021.
Figura 52 – Período de incubação. É possível identificarmos a data provável de exposição de um paciente com uma determinada doença infecciosa,
desde que conheçamos o período de incubação médio da doença e a data do primeiro sinal ou sintoma. Fonte: Estratégia MED.
Nesse sentido, em qual dos locais citados acima estaria a possível fonte de infecção?
— Na casa da irmã dele!
Perfeito! Veja que o paciente esteve nos outros locais (banco e loja de ferramentas) em datas que não se
enquadram no período de exposição! Portanto, o único local possível é a casa da irmã dele! Nesse sentido, é provável
que o indivíduo que transmitiu o agente etiológico também estivesse por lá!
Na prática, é assim que encontramos a cadeia de transmissão de uma determinada doença infecciosa!
É o intervalo de tempo desde o primeiro sinal (ou sintoma) da doença até o primeiro sinal que confere
especificidade à doença.
Em outras palavras, é o período em que ainda há quadro clínico inespecífico, o que pode dificultar o diagnóstico
em um primeiro atendimento, principalmente se não houver história epidemiológica positiva.
Por exemplo, suponha que um indivíduo com a mas dificilmente saberá qual é o tipo de infecção, já que
evolução clássica do sarampo procure atendimento o paciente ainda não apresenta sinais específicos.
médico nas primeiras horas da doença. Inicialmente, No entanto, se o paciente retornar no 1° dia de
ele apresentará sintomas inespecíficos, como febre, rash cutâneo morbiliforme (término dos pródomos e
mal-estar, coriza, tosse e, talvez, conjuntivite aquosa início da fase exantemática) e se o médico conseguir
bilateral. Nessa fase, a menos que o médico tenha alta visualizar as manchas de Koplik (que geralmente surgem
suspeição diagnóstica (como, por exemplo, o paciente é 24 horas antes do rash), ele entenderá que esse paciente
contato de alguém com sarampo), o referido profissional ainda estava no período prodrômico na ocasião de seu
até perceberá que existe uma infecção viral em curso, primeiro atendimento.
É o intervalo de tempo em que “o agente todo o período de infecção, mas apenas em parte dele.
infeccioso pode ser transferido, direta ou O período de transmissibilidade costuma compreender
indiretamente, de um indivíduo infectado a outro” uma parte do período de incubação, todo o período
(ROUQUAYROL et al., 2017; OPAS, 2010). Portanto, o sintomático e uma parte da convalescência.
indivíduo infectado não transmite o bioagente durante
Atenção para alguns intervalos de tempo que já foram cobrados em prova apenas para confundir o
candidato, uma vez que eles não apresentam nomes específicos ou importância epidemiológica. São eles:
• O intervalo entre o início da infecção e a primeira visita ao médico.
• O intervalo entre o início da infecção e a data do diagnóstico oficial.
• O intervalo entre o início da infecção e a data de notificação da doença.
• O intervalo entre a aplicação de uma vacina e a ocorrência de imunidade.
Nenhum dos períodos acima apresenta denominação própria.
Porém, fique atento ao termo “janela imunológica”, que é o intervalo de tempo entre o início da
infecção e a produção de anticorpos em quantidade suficiente para serem detectados nos exames sorológicos
(conversão sorológica).
As propriedades dos agentes etiológicos DESPENCAM nas provas de Residência Médica. Elas ainda não
apareceram no REVALIDA INEP nem no REVALIDA UFMT, mas percebe-se uma tendência de esses processos
seguirem aquilo que vem sendo cobrado para a Residência, por isso olho vivo!!! Se os conceitos a seguir
aparecerem nas provas, certamente você já estará por dentro de tudo!
As características dos bioagentes são muito algumas propriedades, que serão discutidas a seguir: (1)
importantes para entendermos tanto a transmissão dose infectante, (2) infectividade, (3) patogenicidade, (4)
como o impacto da doença na população. poder invasivo, (5) imunogenicidade, (6) antigenicidade
De forma geral, as bancas costumam cobrar e (7) virulência.
A engenharia reversa mostrou que, para elaborar as questões, a maioria dos examinadores retira, na
íntegra, os conceitos do livro de Maria Zélia Rouquayrol. É o que veremos a seguir.
A infectividade “é a capacidade de certos Além disso, por mais que o agente etiológico
organismos de penetrar e se desenvolver ou tenha condições de infectar o hospedeiro, é necessária
multiplicar no novo hospedeiro, ocasionando infecção” uma dose mínima para que a infecção possa ser
(ROUQUAYROL et al., 2017). Portanto, é a característica estabelecida. Nesse sentido, dose infectante é a
que determina a probabilidade de o indivíduo ter a “quantidade do agente etiológico necessária para iniciar
infecção a partir do contato com o bioagente. uma infecção” (ROUQUAYROL et al., 2017).
— Professora, mas isso só se o hospedeiro não for imune ao agente etiológico, certo?
Muito bem lembrado! Observe que a infecção penetração ou para a multiplicação do microrganismo),
só será possível se o hospedeiro for suscetível, que pode ser que a infecção não ocorra, apesar do
é a característica de se deixar penetrar pelo agente potencial do bioagente. Falaremos mais sobre isso em
infeccioso. No entanto, se o hospedeiro apresentar características do hospedeiro.
resistência (isto é, apresentar alguma barreira para a
5.3.2 PATOGENICIDADE
Observe que uma patogenicidade maior do que 50% significa que a infecção produz mais casos
sintomáticos do que assintomáticos.
— Professora, não brinca comigo que até aqui tem fórmula?
Sim, até aqui (risos)! Porém, a fórmula acima é só para que você entenda o conceito. Ela não é cobrada nas
provas, ok?
O termo “agressividade” é utilizado para descrever os diversos graus de patogenicidade induzidos por
um bioagente. Em outras palavras, essa característica descreve os diversos espectros clínicos.
No entanto, o referido termo também pode ser usado como sinônimo de ‘gravidade” da doença,
conforme vimos no LDI de indicadores de mortalidade. Nesse sentido, descreveria apenas um espectro da
doença (como o próprio nome sugere, apenas o mais grave).
— E agora? Como vou saber em qual sentido foi utilizado na questão?
Basta verificar se o assunto explorado pela questão é referente às propriedades dos bioagentes ou à
letalidade.
5.3.3 VIRULÊNCIA
Por definição, virulência “é a capacidade de um bioagente produzir casos graves ou fatais” (ROUQUAYROL et al.,
2017).
Veja, portanto, que o termo “virulência” traz consigo dois atributos diferentes: gravidade e letalidade.
— Eita, fiquei confuso! Poderia explicar novamente?
Claro! Veja bem: a capacidade de produzir casos graves refere-se especificamente à gravidade da doença, que
pode ser expressa pela seguinte fórmula:
5.3.5 TRANSMISSIBILIDADE
5.3.6 IMUNOGENICIDADE
RESUMINDO
Figura 34 – Propriedades dos bioagentes. Observe que, para que uma infecção ocorra, o agente etiológico precisa
estar na quantidade adequada (1 - dose infectante) e ser capaz de penetrar e multiplicar-se no hospedeiro (2 -
infectividade). Ainda, o agente etiológico pode causar infecção, mas só causará doença se apresentar patogenicidade
(3). Esse microrganismo pode ainda invadir outros sistemas e órgãos, demonstrando assim poder invasivo (4).
Felizmente, temos um sistema de defesa que consegue dar conta do recado em muitas ocasiões, desde que o agente
etiológico tenha imunogenicidade (5), que é a capacidade de induzir imunidade, e desde que ele tenha também
antigenicidade (6), que é a capacidade de induzir uma resposta imune específica, especialmente por meio de
anticorpos (resposta humoral). No entanto, mesmo com esse aparato todo, alguns bioagentes são muito virulentos,
isto é, apresentam a capacidade de provocar casos graves ou fatais – veja o paciente acoplado ao suporte de
medicamentos (7). Para visualizar a imagem com melhor resolução, amplie o documento. O zoom ideal é de 160%.
Como dito, esses conceitos ainda não foram cobrados no REVALIDA INEP nem no REVALIDA UFMT. Por
isso, coloquei algumas questões de outros processos seletivos na lista de questões deste livro, só para que você
veja como o assunto poderia aparecer nas provas de Revalidação.
Assim como é importante estudarmos as características do agente etiológico, também é importante estudarmos
as características do hospedeiro. Nesse sentido, precisamos entender dois conceitos principais: o de suscetibilidade e
o de resistência.
— Bárbara, mas já vimos isso anteriormente, não?
Sim, mas chegou a hora de falarmos com mais profundidade. Vamos lá?
Dizemos que um indivíduo é um hospedeiro suscetível a um determinado microrganismo quando ele não
apresenta resistência à penetração, ao desenvolvimento ou à multiplicação desse agente infeccioso. Dessa forma, se
esse indivíduo entrar em contato com esse agente, dependendo da dose infectante, a probabilidade de infecção é alta.
Ainda, o termo “hospedeiro suscetível” pode ser aplicado não só à espécie humana, mas também a outras
espécies (animais ou vegetais) que também se deixam infectar por aquele agente.
Sim! A engenharia reversa mostrou que algumas bancas utilizam o termo “vulnerabilidade” como sinônimo de
“suscetibilidade”. No entanto, isso ocorre apenas nas questões sobre esse tema. Por exemplo, é comum encontrarmos
o termo “vulnerabilidade social” nas provas de Medicina Preventiva, mas ele diz respeito à ausência de serviços
oferecidos pelo Estado, conforme vimos no livro de indicadores demográficos. Por isso, fique atento para não confundir
esses dois tipos de vulnerabilidades.
5.4.2 RESISTÊNCIA
Quando o hospedeiro tem como se defender da entrada do agente, ou até mesmo quando esse agente consegue
penetrar, mas não consegue se multiplicar, porque o indivíduo consegue se proteger de alguma forma, dizemos que
existe resistência.
Portanto, resistência é a capacidade que esse hospedeiro tem de se defender em relação à “difusão ou
[à] multiplicação” do bioagente. Existem dois tipos principais de resistência: a imunidade e a resistência natural
(ROUQUAYROL et al., 2017).
A imunidade é a resistência conferida pela atuação do sistema imune, geralmente por meio de anticorpos. Por
sua vez, a imunidade pode ser passiva ou ativa:
• Imunidade passiva – é aquela em que a proteção é conferida por meio de imunoglobulinas (anticorpos)
que são fornecidos prontos para o hospedeiro. Por exemplo, quando um indivíduo sofre algum acidente
com morcego e recebe soro antirrábico, ele está beneficiando-se da imunidade passiva (no caso, artificial).
O mesmo acontece quando um recém-nascido recebe anticorpos da mãe por meio do aleitamento
materno (no caso, natural). Porém, esse tipo de imunidade é passageiro.
• Imunidade ativa – é aquela em que o indivíduo produz ativamente sua própria forma de defesa, o que
inclui produzir seus próprios anticorpos. Por exemplo, quando um indivíduo adquire sarampo, ou quando
recebe vacina (moléculas do bioagente ou o próprio bioagente atenuado), seu sistema imune é induzido
a produzir anticorpos, que geralmente persistem a vida inteira. No primeiro caso, temos uma imunização
natural e, no segundo, artificial.
Em contrapartida, algumas espécies apresentam resistência natural à penetração e à multiplicação de um
determinado bioagente. Nesse caso, dizemos que essas espécies são refratárias àquele agente infeccioso.
É importante frisar que esse é um tipo de resistência que independe do sistema imune ou da reação específica
dos tecidos (como a inflamação, por exemplo) (ROUQUAYROL et al., 2017). É simplesmente uma incompatibilidade
do microrganismo em ser infectante para a espécie. Podemos citar como exemplo a gripe equina, que é causada pelo
vírus influenza A H3N8. Esse vírus foi detectado também em cães e gatos, mas não há evidências de infecções em seres
humanos.
No entanto, no caso dos vírus, nada impede que eles sofram mutações e gerem cepas que passem a ser
infectantes para espécies refratárias até então. Aliás, esse é um dos principais mecanismos de emergência de doenças
na humanidade – inclusive essa é a hipótese para a covid-19. Falaremos mais sobre isso no item 4.12, em emergência
e reemergência de doenças.
INFECÇÃO OU
RESISTÊNCIA ATIVA
VACINA
IMUNOGLOBULINAS/
IMUNIDADE PASSIVA
LEITE MATERNO
Figura 35 – Tipos de resistência: natural x imunidade. A imunidade, por sua vez, subdivide-se em ativa e passiva, sendo que a imunidade ativa é
duradoura (na grande maioria das vezes), e a passiva é temporária (ROUQUAYROL et al., 2017).
Dizemos que um hospedeiro está infectado quando ele alberga o bioagente em seu interior, podendo ser fonte
de infecção para hospedeiros suscetíveis. Nesse sentido, duas situações podem ocorrer:
• o hospedeiro infectado pode manifestar a doença (hospedeiro infectado doente) ou
• o hospedeiro infectado pode permanecer assintomático. Nesse sentido, ele apresenta a infecção, mas
não apresenta a doença, sendo um portador do bioagente (hospedeiro infectado portador).
Ainda, quando um hospedeiro infectado (seja doente ou portador) elimina microrganismos viáveis, os quais têm
potencial para infectar os suscetíveis, dizemos então que ele é um indivíduo infectante.
Vamos nos concentrar nos portadores, pois as bancas gostam de perguntar sobre eles:
Portadores são indivíduos que albergam agentes infecciosos, mas não apresentam doença clinicamente
discernível. No entanto, servem como potenciais fontes de infecção, apresentando grande importância na
disseminação da doença.
— Professora, que interessante! Mas esses indivíduos portadores deixam de ter o bioagente em algum
momento, certo?
• portadores ativos convalescentes (quando já estão se recuperando da doença e já não apresentam mais
os sinais clínicos, embora ainda transmitam o bioagente).
• portadores ativos incubados (quando estão no período de incubação e ainda apresentarão a doença,
mas já transmitem o bioagente).
Em contrapartida, os portadores inativos são aqueles que, apesar da infecção, não manifestarão a
doença. E é aí que mora o grande perigo! Eles são grandes desafios para os epidemiologistas, porque eles
dispersam o microrganismo de forma silenciosa, uma vez que é difícil detectar que eles são as fontes de
infecção.
ATIVO INCUBADO
PORTADOR CONVALESCENTE
INATIVO
Figura 36 – Tipos de portadores. Os portadores podem ser ativos ou inativos a depender da manifestação de sinais e sintomas. Como o próprio
nome sugere, os ativos são aqueles que apresentam infecção ativa (isto é, doença) e podem ser ainda subdivididos em incubados ou convalescentes
de acordo com a evolução natural da doença (isto é, se estão no período de incubação ou na convalescência). No entanto, os indivíduos de maior
importância epidemiológica são os portadores inativos, pois, como não apresentam doença, muitas vezes não são identificados.
A engenharia reversa mostrou que esse tópico já apareceu no REVALIDA UFMT, sob a forma de controle
vetorial. Por isso, fique atento aos conceitos a seguir! Vamos com tudo!
“Transmissão vertical é aquela que ocorre durante o processo de reprodução (por meio do esperma ou
do óvulo), ou durante o desenvolvimento do feto (isto é, de mãe para filho durante a gestação), no parto ou
ainda, durante a amamentação.”
(ROUQUAYROL et al., 2017).
Observe que o pai pode transmitir a infecção para congênita do zika e as infecções TORCH (toxoplasmose,
o filho durante a concepção dele, mas, durante o ciclo rubéola, citomegalovirose e herpes simples).
gravídico-puerperal (gestação, parto e amamentação), Agora que definimos o que é transmissão vertical,
a mãe é essencialmente a hospedeira infectante. ficou fácil entender a transmissão horizontal: são todos
Como exemplos de doenças que podem ser os tipos que não estão envolvidos na reprodução ou no
transmitidas dessa forma, podemos citar a sífilis, a ciclo gravídico-puerperal.
infecção pelo HIV e pelas hepatites B e C, a síndrome
“São considerados modos de transmissão horizontal aqueles em que o agente infeccioso é passado de
uma pessoa a outra num grupo de pessoas.”
(ROUQUAYROL et al., 2017).
Figura 38 – Transmissão vertical x transmissão horizontal. Na transmissão vertical, o agente etiológico é transferido dos genitores para a prole,
simulando realmente uma direção vertical, de onde vem seu nome. Em contrapartida, na transmissão horizontal, o microrganismo é transferido
de um indivíduo infectado para outro que está em um grupo de pessoas.
Aliás, será que você consegue adivinhar de que substratos vitais eu estou falando?
— Ah, professora! Que tal uma dica?
Já temos uma grande dica no texto acima: substratos vitais são materiais biológicos produzidos pelo hospedeiro.
Afinal, quais são os materiais biológicos que nós produzimos?
— Já sei! Se é produzido pelo hospedeiro e tem o bioagente, então é qualquer fluido corporal, como sangue,
saliva, urina, fezes...
Exatamente! Existe uma gama de substratos vitais. Além dos que você já citou, temos também exsudatos
oculares, mucos, escarros, esperma, secreções vaginais ou uretrais, secreções da orofaringe, leite materno e até
mesmo produtos de origem animal que podem atuar como substratos vitais, na medida em que foram produzidos
por esses animais, mas, como eles estavam infectados, tais produtos contêm agentes infectantes. Como exemplos,
podemos citar o leite de vaca, a carne bovina, entre outros (ROUQUAYROL et al., 2017).
Transmissão direta: não há interferência do meio ambiente (ou a interferência é mínima). O hospedeiro
infectante elimina o bioagente em um substrato vital, e o hospedeiro suscetível entra em contato com esse
substrato, adquirindo o microrganismo.
Existem dois tipos de transmissão direta: a infecções sexualmente transmissíveis (IST) e das
imediata e a mediata. doenças transmitidas por contato com mucosas ou
Na transmissão direta imediata, como o tecidos cutâneos (ROUQUAYROL et al., 2017), como a
próprio nome sugere, o microrganismo é transferido mononucleose infecciosa, que pode ser transmitida por
imediatamente para o hospedeiro suscetível (isto é, meio do beijo. Observe que essas são doenças em que
a transferência ocorre “na mesma hora”). Portanto, o substrato vital nem chega a ser eliminado no meio
é necessário um contato íntimo com o hospedeiro ambiente, sendo diretamente “depositado”, digamos
infectado para adquirir a infecção. Esse é o caso das assim, no indivíduo saudável.
5
O substrato vital também é conhecido como substrato de eliminação.
Na transmissão direta mediata, o hospedeiro pessoa tosse perto da outra sem a etiqueta respiratória,
infectado elimina o substrato vital próximo ao indivíduo lançando gotículas com o microrganismo no ar. Ainda,
suscetível – logo, o contato não precisa ser íntimo para observe que o substrato vital passa pelo meio ambiente,
que a transferência ocorra. Por exemplo, esse é o tipo mas essa passagem é mínima e não há interferências
de transmissão que pode ocorrer na gripe, quando uma sobre o bioagente.
As doenças de transmissão direta, seja de forma imediata ou mediata, são também chamadas de
doenças contagiosas (ROUQUAYROL et al., 2017).
— Professora, mas a gripe também pode ser transmitida por meio do beijo.
Sim! Aliás, cada doença pode ter mais de uma forma de transmissão. O exemplo da gripe foi apenas para que
você entendesse o mecanismo de transmissão, mas isso não significa que os outros modos não aconteçam.
Em contrapartida, a transmissão indireta é aquela em que o microrganismo necessitará do meio ambiente para
chegar até o hospedeiro suscetível. Em outras palavras, o agente etiológico precisa de um “transportador”, que pode
ser um veículo, um vetor mecânico ou até mesmo um vetor biológico.
• Veículo: são produtos de consumo (como água e alimentos), materiais da natureza (como ar e solo) ou
objetos inanimados (como canetas, maçanetas, dinheiro, entre outros) que podem conter e transportar o
bioagente. Nesse último caso, alguns autores chamam os objetos inanimados de fômites.
• Vetor mecânico: são aqueles que levam o microrganismo de um lugar para outro, mas sem interferir na
biologia dele. Podemos citar as baratas como exemplo (eu sei, nojento!).
• Vetor biológico: são aqueles em que o microrganismo sofre algum tipo de maturação em seu estágio evolutivo,
justamente para que tenha condições de infectar outro indivíduo suscetível. Por isso, tais vetores costumam
ser também hospedeiros intermediários. É o caso do Plasmodium falciparum e do Trypanosoma cruzi, que
necessitam de vetores biológicos (respectivamente, o mosquito do gênero Anopheles e triatomíneos da
família Triatominae) para que sejam transmitidos ao homem.
Dessa forma, na transmissão indireta, o bioagente “atravessa” o ambiente para alcançar o hospedeiro suscetível
e, em alguns casos, sofre modificações no ambiente para tornar-se infectante.
Transmissão direta
Transmissão vertical
imediata
MODOS DE
Transmissão direta
TRANSMISSÃO
Transmissão direta
A
Transmissão horizontal
mediata
Transmissão indireta
Agora, olhe que interessante: os conceitos são pouco cobrados em prova. A engenharia reversa mostrou que,
quando esse assunto aparece, os examinadores cobram a tabela abaixo!
— Oh, não! Preciso decorar isso?
Eu recomendo fortemente que sim, pois as bancas perguntam justamente os modos de transmissão das doenças
abaixo.
Tabela 2 – Lista de doenças com suas principais formas de transmissão segundo Rouquayrol e colaboradores
(2017).
Cabe lembrar, no entanto, que uma mesma de maior importância epidemiológica na visão de
doença pode ter mais de um modo de transmissão. Rouquayrol e colaboradores (2017), que é a principal
Por exemplo, o HIV pode ter transmissão vertical ou referência utilizada nas provas de acesso direto para
transmissão horizontal do tipo direta imediata. Nesse esse assunto.
sentido, a tabela acima mostra é o modo de transmissão
A engenharia reversa mostrou que esse assunto já foi cobrado no REVALIDA UFMT! Portanto, acompanhe
a seguir!
No tópico anterior, conversamos sobre a como os vetores. E olhe que interessante: a literatura
transmissão indireta de doenças, que é aquela em epidemiológica mostra que é possível impedirmos
que o microrganismo necessitará do meio ambiente a transmissão da enfermidade se atuarmos nesses
para chegar até o hospedeiro suscetível. Em outras elementos, ou seja, se realizarmos o controle vetorial.
palavras, haverá a necessidade de um “transportador”,
Controle vetorial nada mais é do que o controle de vetores no meio ambiente, de forma a impedir
ou reduzir a transmissão de uma determinada doença. Pode ser conceituado também como uma ação de
prevenção primária, já que contribui para a redução da incidência da enfermidade.
O controle biológico, como o próprio nome tem por objetivo reduzir as possíveis áreas potenciais
diz, é aquele que utiliza seres vivos para a redução para a reprodução dos vetores (ou seja, redução de
populacional dos vetores. Por exemplo, se um focos) ou reduzir o contato físico entre o homem e o
determinado vetor apresenta uma das fases de seu ciclo vetor. Por exemplo, é conhecida a recomendação de
de vida em ambiente aquático (como larvas aquáticas), não deixar “água parada” em pratos de plantas ou
a utilização de peixes propositalmente para a redução pneus devido à possibilidade de reprodução do Aedes
dessa população de larvas seria uma espécie de controle aegypti. Portanto, quando eliminamos esses focos,
de natureza biológica. Além de predadores, a literatura procedemos com controle vetorial do tipo mecânico.
também informa que patógenos como bactérias ou Outra recomendação que também se enquadra nesse
parasitas também podem ser utilizados para esse fim. tipo de controle é o uso de mosquiteiros ou repelentes,
Nesse caso, eles provocariam infecções nos vetores, uma vez que se reduziria o contato físico entre o
reduzindo, assim, a densidade populacional. hospedeiro suscetível e o vetor.
O controle mecânico ou ambiental é aquele que
O controle químico é aquele que utiliza inseticidas inseticidas do tipo adulticidas são aqueles que agem nas
para a redução da população vetorial, atuando nas populações adultas dos vetores, enquanto os larvicidas
fases de desenvolvimento do vetor. Por exemplo, os agem ainda na fase larval.
Figura 40 – Na imagem acima, é possível ver duas das três possibilidades de controle vetorial: (1) controle mecânico, como a retirada de pneus e
outros objetos que servem como áreas de proliferação de vetores e (2) controle químico, como o uso de inseticidas.
HORA DE
PRATICAR!
Agora que você já conhece as principais definições, que tal vermos como esse tópico foi cobrado na UFMT?
CAI NA PROVA
(UFMT – 2017). Sobre os métodos de controle de vetores transmissores de doença no Brasil, preconizados pelo
Ministério da Saúde, analise as afirmativas.
I - Controle mecânico é o uso de peixes e/ou bactérias para o controle de populações do vetor em ambiente aquático.
II - Controle biológico utiliza métodos que eliminam ou reduzem as áreas onde os vetores se desenvolvem.
III - Controle químico utiliza larvicidas ou inseticidas para controlar as diferentes fases de desenvolvimento do vetor.
IV - Controle mecânico preconiza medidas para reduzir o contato do homem com o vetor.
A. I e II.
B. II e III.
C. III e IV.
D. I e IV.
COMENTÁRIO:
Gabarito: alternativa C.
Esse tópico ainda não apareceu no REVALIDA INEP e no REVALIDA UFMT. Porém, como é
muito prevalente nas provas de Residência Médica, decidimos abordar aqui para que você fique
preparado para questões futuras! Mas fique tranquilo, porque serei bem objetiva para que você não
perca tempo! Venha comigo!
Para entendermos a classificação de casos, primeiro precisamos entender o que é um caso propriamente dito.
Um caso nada mais é do que um indivíduo que apresenta “uma doença em particular, uma desordem
de saúde ou uma condição sob investigação.”
(ROUQUAYROL et al., 2017).
Esse caso pode ser adjetivado de diversas formas, a depender de fatores como os locais de transmissão e de
diagnóstico, da confirmação laboratorial da doença, se é o primeiro caso a ser notificado na localidade, entre outros
aspectos. Portanto, os casos podem ser autóctones, alóctones, suspeitos, confirmados, primários, secundários, e
assim por diante. Sugiro que você entenda três tipos principais de classificação:
Segundo Rouquayrol e colaboradores (2017), um caso pode ser classificado em caso presuntivo, caso suspeito
ou caso confirmado a depender do grau de certeza que se tem em relação à presença da doença.
— Ah! Professora! Fiquei confuso, como assim “grau de certeza”?
O diagnóstico de uma doença infecciosa nada outras palavras, o paciente tem exame físico que sugere
mais é do que uma probabilidade de o indivíduo a doença, mas não existem outros elementos que
estar doente. Isso porque, a menos que seja utilizado fortaleçam essa hipótese (ROUQUAYROL et al., 2017).
algum método que permita a visualização direta do Em contrapartida, um caso suspeito é aquele
microrganismo, não vamos ter 100% de certeza da “cuja história clínica e sintomatologia indicam que pode
presença da doença, já que nem todo método é 100% estar acometido por alguma doença ou tê-la em período
acurado. de incubação” (ROUQUAYROL et al., 2017). Assim
Nesse sentido, a diferença entre os tipos de casos como o caso presuntivo, ainda não existe confirmação
supracitados é o grau de certeza do diagnóstico. laboratorial. Porém, observe que há história clínica
Por exemplo, um caso é considerado presuntivo compatível, isto é, a anamnese mostra que o indivíduo
quando o indivíduo apresenta apenas sinais e sintomas se expôs à fonte de infecção, o que faz com que exista
compatíveis com a doença, mas não há qualquer história epidemiológica positiva. Portanto, o grau de
confirmação laboratorial ou história epidemiológica certeza já é um pouco maior, afinal houve exposição.
(isto é, relato de exposição à fonte de infecção). Em
Veja que a diferença entre o caso presuntivo e o caso suspeito é a presença de exposição à fonte de
infecção (história epidemiológica positiva).
Por último, caso confirmado é aquele “de quem foi isolado e identificado o agente etiológico ou de quem
foram obtidas outras evidências laboratoriais da presença do agente etiológico (ROUQUAYROL et al., 2017). Em outras
palavras, é o “caso suspeito ou provável que foi confirmado por diagnóstico laboratorial” (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2018). Portanto, o agente etiológico foi visualizado (seja direta ou indiretamente), e temos a certeza do diagnóstico.
Cabe ressaltar que não é qualquer exame laboratorial, mas aquele que demonstre a presença do agente,
seja de forma direta (visualização) ou indireta (como presença de anticorpos de fase aguda, como os IgM).
Figura 41 – Classificação de casos quanto à certeza diagnóstica. Segundo Rouquayrol e colaboradores (2017), um caso presuntivo é aquele
que apresenta apenas sinais clínicos compatíveis; um caso suspeito é aquele que, além da clínica compatível, apresenta também história
epidemiológica positiva. Em contrapartida, um caso confirmado é aquele cuja presença do agente etiológico foi demonstrada de forma direta
(visualização do microrganismo) ou indireta.
Tabela 3 – Classificação de casos segundo a certeza diagnóstica por Rouquayrol e colaboradores (2017).
O Ministério da Saúde possui uma classificação Já o caso presumível é aquele que apresenta sinais e
diferente da que acabamos de ver. Para essa instituição, sintomas específicos para uma determinada doença
quando falamos em certeza do diagnóstico, os casos (diagnóstico clínico etiológico). E caso confirmado é
devem ser classificados em caso suspeito, caso aquele confirmado laboratorialmente.
presumível (ou possível) e caso confirmado. Veja, portanto, que o grau de certeza é
O caso suspeito é aquele que apresenta sinais e determinado pela diferença entre o tipo de diagnóstico:
sintomas compatíveis com uma síndrome (diagnóstico sindrômico, etiológico ou laboratorial, sendo que os
clínico sindrômico), mas o quadro clínico ainda não dois primeiros são essencialmente diagnósticos clínicos.
aponta especificamente para um diagnóstico etiológico.
Tabela 4 – Lista de doenças com suas principais formas de transmissão segundo Ministério da Saúde (2018).
Caso presumível
Caso suspeito Caso confirmado
ou provável
— Bárbara, compreendi o que é caso confirmado, mas devo dizer que, às vezes, o microrganismo está presente
e, mesmo assim, os exames laboratoriais são negativos.
Sim, muito bem lembrado! Por isso, tanto a classificação de Rouquayrol como a do Ministério da Saúde afirmam
que existe o caso confirmado por critério clínico-epidemiológico, que seria aquele que tem “clínica compatível com a
doença” e supostamente “foi causado pela mesma fonte que o caso confirmado por critério laboratorial” (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2018).
Em outras palavras: é um caso suspeito cuja fonte de infecção é um caso confirmado. Logo, se esse caso suspeito
não apresentar confirmação laboratorial, poderemos confirmá-lo indiretamente porque ele está ligado a um indivíduo
que teve confirmação laboratorial.
Os casos também podem ser classificados diagnosticado. Esse caso será considerado alóctone,
de acordo com a concordância entre os locais de já que o local de transmissão é diferente do local de
transmissão e de diagnóstico. diagnóstico.
Chamamos de caso alóctone (ou importado) Em contrapartida, os casos autóctones são
aquele em que o indivíduo contrai a doença em uma aqueles que tiveram origem no próprio local onde o
determinada localidade, mas ela só é diagnosticada diagnóstico foi feito, isto é, o local de transmissão da
em outra. Por exemplo, suponha que um determinado doença é o mesmo do diagnóstico. Por exemplo, se
indivíduo adquiriu covid-19 na China. Porém, durante um indivíduo contrai malária na região amazônica e é
o período de incubação, ele viajou até o Brasil, onde diagnosticado nessa mesma localidade, teremos um
manifestou os primeiros sinais e sintomas e foi caso autóctone.
Figura 42 – Caso importado (ou alóctone) x caso autóctone. O caso importado é aquele cujo local de transmissão é diferente do local onde o
diagnóstico foi realizado. Por exemplo, um paciente que contraiu covid-19 na China, mas que foi diagnosticado apenas no Brasil, é um caso
alóctone para nosso país. Em contrapartida, um indivíduo que contrai covid-19 no estado do Pará e é diagnosticado naquele estado é um caso
autóctone (“auto” = “próprio”, no sentido de “caso próprio daquele lugar”).
O Ministério da Saúde conceitua caso autóctone como aquele em que o indivíduo adquiriu a doença
em seu local de residência. Já o caso alóctone possui a mesma definição citada acima: o local de transmissão é
diferente do local de diagnóstico (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018).
Vamos conversar agora sobre a classificação dos casos segundo a ordem em que eles aparecem na cadeia de
transmissão.
— Como assim, professora? Existe isso? “Ordem em que aparecem”?
Sim, existe! Geralmente, essa classificação é utilizada na investigação epidemiológica de uma doença:
A partir do estabelecimento da ordem em história de contato com nenhum outro indivíduo doente
que os casos aparecem, é possível identificar a fonte ou história de exposição à fonte de infecção. Em outras
de infecção e prevenir novos casos. Nesse sentido, palavras, não há qualquer história epidemiológica. Por
dependendo da sequência em que eles aparecem, eles isso, é um caso que surge e que provavelmente é o
serão chamados de primários, secundários, terciários, primeiro de uma cadeia de transmissão. É importante
e assim por diante. frisar que Rouquayrol não define caso primário. Por isso,
Por exemplo, um paciente é considerado um as bancas costumam utilizar a definição do Ministério
caso primário quando ele tem a doença, mas não tem da Saúde:
Caso primário é “aquele que aparece sem que exista um contato direto conhecido com outro paciente”.
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018).
Em contrapartida, o caso secundário é aquele que manifestou a doença 24 horas após o aparecimento do caso
primário.
— Professora, eu ri! É porque parece meio óbvio! Afinal, é claro que o caso secundário só poderia derivar de
um caso primário.
Sim, é obvio mesmo (risos). Mas, lembre-se de que isso aqui é Medicina Preventiva! É claro que vai existir algo
para complicar. O grande problema é o candidato confundir caso secundário com caso coprimário.
— Ah! Não é possível! Caso coprimário? Nunca ouvi falar sobre isso!
“Caso primário: aquele que aparece sem que exista um contato direto conhecido com outro paciente.
Caso coprimário: aquele que surge nas primeiras 24 horas seguintes ao aparecimento de um caso dentro
de um grupo de contatos diretos.
Caso secundário: aquele que surge dentre os contatos de um caso primário, após 24 horas do
aparecimento do caso primário.”
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018)
Por exemplo, suponha que Thales e Álvaro despediram-se por volta das 22h. O que ninguém sabia
estavam de férias fora do Brasil. Thales foi para a Ilha de era que Thales estava com covid-19 e sintomático! Seu
Madagascar, enquanto Álvaro foi para o Caribe. Ambos quadro cínico iniciou naquele mesmo dia, com coriza,
chegaram a nosso país no mesmo dia e praticamente mas ele jura que nem desconfiou! Ele achou que fosse
no mesmo horário: dia 03 de janeiro de 2021 (segunda- “alergia”!
feira), às 19 horas. Agora, suponha que Ana e Marcelo
Nesse mesmo dia, Ana e Marcelo, que são desenvolveram os primeiros sintomas da doença no dia
grandes amigos dos dois viajantes, resolveram fazer 5 de janeiro de 2021, às 2 horas (isto é, um pouco mais
uma surpresa e foram recepcioná-los no aeroporto. de 24 horas após o contato com Thales).
Eles decidiram lanchar em uma cafeteria e os quatro
Em contrapartida, quando ligaram para Álvaro para saber se ele estava bem, ele informou que já estava com
febre, tosse e mialgia desde o dia 04 de janeiro de 2021, às 11 horas.
Supondo que Thales é o caso primário – afinal, ele era o único sintomático no dia do encontro –, a pergunta que
não quer calar é: como podemos classificar os casos de Ana, Marcelo e Álvaro em relação a Thales?
— Essa é fácil, professora! Ana e Marcelo são casos secundários, pois os sintomas apareceram após 24 horas
de contato; Álvaro é caso coprimário, pois o quadro clínico apareceu antes das 24 horas!
Perfeito! É isso mesmo! E olhe que interessante: se Álvaro é um caso coprimário, isso significa que, provavelmente,
não foi Thales que passou a infecção para ele. O mais provável é que Álvaro tenha contraído a doença ainda no Caribe
e que tenha chegado ao Brasil no período de incubação.
— Que interessante, Bárbara! Mas, se Álvaro chegou doente ao Brasil, será que ele é o caso primário de Ana
e Marcelo, ao invés de Thales? Afinal, ele já estava transmitindo o vírus!
Essa possibilidade existe, mas observe que Ana e Marcelo desenvolveram os sintomas em menos de 24 horas
após o surgimento dos sintomas de Álvaro – nesse caso, contamos as 24 horas a partir do momento em que Álvaro
adoeceu, e não a partir do dia em que eles tiveram contato, porque Álvaro estava assintomático no encontro, ao
contrário de Thales.
Portanto, na cadeia de transmissão supostamente iniciada por Álvaro, Ana e Marcelo seriam casos coprimários,
e não casos secundários. Isso significa que Álvaro não seria a fonte de infecção deles. Logo, a infecção teria sido
transmitida por Thales.
Além do método das 24 horas, podemos diferenciar um caso coprimário de um caso secundário pelo
período de incubação mínimo.
Em outras palavras, se esse período for de 5 dias para a covid-19, então Ana e Marcelo só poderiam ser
considerados casos secundários de Thales se eles desenvolvessem os sintomas após 5 dias do contato. Antes
disso, seriam casos coprimários, e a fonte de infecção seria outra.
No entanto, a engenharia reversa mostrou que esse método nunca foi cobrado nas provas de Revalidação,
nem nas provas de Residência Médica.
Figura 43 – Cadeia de transmissão da covid-19 entre os amigos Thales, Álvaro, Marcelo e Ana. Observe que Thales era o único sintomático no
dia do encontro, o que nos faz pensar que ele é o caso primário. Ana e Marcelo desenvolveram os sintomas após 24 horas. Portanto, são casos
secundários. Já Álvaro desenvolveu os sintomas em menos de 24 horas após o contato. Nesse sentido, ele é classificado como caso coprimário,
e sua fonte de exposição foi, provavelmente, outro caso primário.
• Caso-índice “é o primeiro entre vários casos de vários de natureza similar e epidemiologicamente relacionados.
O caso-índice é muitas vezes identificado como fonte de contaminação ou infecção” (ROUQUAYROL et al.,
2017; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018).
• Nem sempre o caso-índice é o caso primário.
— Professora, tem certeza dessa afirmação acima? Isso pode causar treta, hein!
Tenho, sim (risos)! O caso-índice é o primeiro caso da doença que foi oficialmente registrado em uma
determinada localidade. No entanto, isso não significa que ele é o caso primário, isto é, que foi ele quem iniciou a
cadeia epidemiológica naquele lugar.
- Que interessante! E se o caso primário, mesmo com sintomas leves, fosse ao hospital para atendimento?
Observe que tanto a definição trazida por Rouquayrol como a do Ministério da Saúde falam que em
“muitas vezes” o caso-índice é identificado como a fonte de infecção, mas não é sempre! Portanto, não é uma
obrigatoriedade!
Por isso, fique sempre atento para não confundir caso primário, que é de fato aquele que iniciou a
cadeia epidemiológica, com o caso-índice, que pode ser o caso primário ou não.
Além disso, existem ainda os casos esporádicos, encontramos casos posteriores que possam ter sido
que são aqueles que surgem em uma localidade, mas contaminados a partir dele. Portanto, não conseguimos
que não estão relacionados a outros casos já conhecidos. estabelecer uma cadeia de transmissão. Nesse sentido,
Em outras palavras, não encontramos casos anteriores caso esporádico seria sinônimo de caso isolado.
que possam ter sido a fonte de infecção, bem como não
Que tal um quadro que resume todas as informações acima? Pois bem! Elas estão resumidas no anexo
de seu livro. Quando quiser, é só dar uma “passadinha” no item 6.0. Ah, e como dito, esse assunto ainda
não apareceu no INEP ou na UFMT! Mas, aqui, nós pensamos em tudo! Por isso, também separei algumas
questões quentíssimas de outros concursos e disponibilizei-as em sua lista de questões! Tenho certeza de que
você estará bem treinado quando esse tópico aparecer pela primeira vez!
A engenharia reversa mostrou que tópico já havia sido cobrado pelo REVALIDA UFMT em 2014,
bem antes da pandemia de covid-19! Portanto, se a banca se interessou pelo tema antes mesmo da
pandemia, imagine agora? Portanto, vamos com tudo!
Existem diversas estratégias que podem O isolamento é uma medida aplicada aos
ser utilizadas para prevenir a transmissão de um indivíduos que já estão doentes, separando-os do
agente etiológico. Quando falamos sobre doenças restante da comunidade e evitando, assim, que os
infectocontagiosas de transmissão direta, uma dessas indivíduos suscetíveis adquiram a infecção. Geralmente,
estratégias é proceder com as medidas restritivas de o tempo de isolamento corresponde ao período de
contato pessoal, evitando, assim, o encontro de uma transmissibilidade da doença.
possível fonte de infecção com hospedeiros suscetíveis. O distanciamento social é a medida aplicada
Nesse sentido, podemos elencar quatro tipos a toda comunidade durante períodos de epidemia,
de medidas restritivas: a quarentena, o isolamento, o com o objetivo de diminuir o contato social entre os
distanciamento social e o lockdown. cidadãos, reduzindo, assim, o número de casos de uma
A quarentena é a medida instituída naqueles determinada doença.
indivíduos que podem ter sido expostos ao agente Podemos citar como exemplos de enfermidades
etiológico, porém ainda não estão doentes, seja porque que já utilizaram esse tipo de medida a covid-19 e a
eles realmente não se infectaram, seja porque ainda estão influenza H1N1 – inclusive, tais medidas foram aplicadas
no período de incubação (WILDER-SMITH; FREEDMAN, no mundo inteiro como estratégias de combate para as
2020; TELESSAÚDE RIO GRANDE DO SUL, 2020). pandemias dessas doenças.
Embora essa medida receba o nome de Além disso, o distanciamento pode ser horizontal
quarentena (o que remete a um isolamento de 40 dias), (ampliado) ou vertical (seletivo). Dizemos que estamos
na prática, ela dura o período de incubação máximo da diante de um distanciamento horizontal quando a medida
doença; se, após esse período, o indivíduo não manifestar é adotada por toda a comunidade, independentemente
quaisquer sinais ou sintomas, e seus exames laboratoriais de pertencerem a algum grupo de risco.
permanecerem negativos (já que ele pode fazer uma Em contrapartida, o distanciamento é vertical
infecção assintomática), ele poderá circular novamente quando apenas os grupos de risco para aquela doença
na população. Em outras palavras, a quarentena é o precisam aderir às medidas. Os demais indivíduos podem
isolamento dos contatos sadios de um caso suspeito ou circular, desde que estejam assintomáticos.
confirmado.
Figura 44 – Medidas restritivas de contato. No primeiro cenário, vemos a cidade funcionando normalmente. Temos duas pessoas visualizando a
cidade por suas janelas, uma em quarentena e a outra em isolamento: (1) quarentena – indivíduo que teve exposição à fonte de infecção e sobre o
qual não se sabe se adquiriu a doença. Observe que sua aparência ainda é a de uma pessoa saudável porque ele inda não tem sinais ou sintomas.
Geralmente, o tempo de quarentena dura o período de incubação. (2) Isolamento - a pessoa em isolamento já está doente e é isolada do resto
da população até o fim do período de transmissibilidade. Lembre-se de que “isolamento” é um termo aplicado aos doentes. No segundo cenário,
vemos a cidade sob efeito de medidas restritivas. (3) Distanciamento social horizontal: todos fazem o distanciamento, independentemente de
pertencerem a grupos de risco ou não. (4) Distanciamento social vertical: apenas os grupos de risco inserem-se nessa medida. Vemos uma idosa na
janela acenando para seu filho, que não precisa ficar em casa, digamos assim. Veja também que existem menos pessoas nas ruas, mais afastadas
entre si, e o restaurante aberto apenas para delivery. No terceiro cenário, temos o temido lockdown (5). Apenas o mercado aberto (atividade
essencial) e toda a população em casa. O comércio essencialmente fechado (lojas, bares/restaurantes/shoppings) e a circulação de carros e de
ônibus muito restrita.
Se a banca mencionar apenas a palavra “isolamento”, que é a grafia utilizada por Rouquayrol e
colaboradores e por outras referências epidemiológicas, provavelmente se referirá ao isolamento aplicado
em indivíduos doentes.
Entretanto, se ela utilizar a palavra “social” como adjetivo, isto é, “isolamento social”, então trata-se
da medida comunitária não obrigatória de distanciamento entre os cidadãos.
— Bárbara, e o lockdown? Ele foi muito comentado pela mídia durante a pandemia de covid-19.
O famoso lockdown, também conhecido como ponto de elevar a taxa de ocupação de leitos de UTI a
bloqueio total ou quarentena/contenção comunitária, níveis igualmente críticos, podendo ocasionar o colapso
é uma restrição severa à circulação de pessoas de uma do sistema de saúde. Segundo a Agência Nacional de
determinada localidade. Essa restrição pode incluir Saúde (ANS), a taxa supracitada não deve ultrapassar
bloqueios nas entradas e saídas da cidade, bem como os 85% de ocupação. Caso contrário, isso sinaliza que a
toques de recolher. procura por atendimento supera (e muito) a capacidade
Nesse tipo de estratégia, apenas os serviços de atendimento, e pode haver escassez de recursos,
essenciais, como emergências e mercados podem como medicações e ventiladores mecânicos.
ficar abertos. Portanto, é uma medida considerada Por isso, o lockdown tem por objetivo achatar a
extremista. curva epidêmica, diminuindo a velocidade com que os
Geralmente, é utilizada quando há elevações casos novos aparecem, para que dê tempo de o sistema
críticas no coeficiente de incidência da doença ao liberar os leitos que estão ocupados.
Resumindo:
Tabela 5 – Medidas restritivas de contato e suas características.
Medida restritiva Em que nível se aplica? Por quanto tempo? A quem se aplica?
Contatos sadios de
Tempo de incubação
Quarentena Individual* casos suspeitos ou
da doença
confirmados
Tempo de
Indivíduos doentes
Isolamento Individual* transmissibilidade da
doença
Distanciamento
Distanciamento ou
horizontal: todos
isolamento social (tem A depender do curso
Comunitário Distanciamento
que ter o adjetivo da epidemia
horizontal: apenas
“social”)
grupos de risco
A depender do
coeficiente de
Lockdown Comunitário incidência e da taxa Todos
de ocupação de leitos
de UTI
*Dependendo da quantidade de indivíduos um cruzeiro turístico onde havia uma pessoa com
expostos ou doentes, a quarentena ou o isolamento sarampo: pode ser necessário que todos os tripulantes
podem ser aplicados de forma coletiva. Por exemplo, fiquem de quarentena.
Pelo exposto acima, você já percebeu que o termo “quarentena” foi usado indevidamente durante a
pandemia de covid-19. A população não estava sob quarentena, e sim sob distanciamento social e, em alguns
momentos, sob lockdown.
Veja como foi a questão da UFMT sobre o assuinto que acabamos de estudar!
CAI NA PROVA
REVALIDA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MATO GROSSO (UFMT) – 2014. Considere o texto a seguir. As expressões
“quarentena” e “isolamento”, muito empregadas em saúde pública, têm significados diferentes PORQUE o isolamento
se aplica às restrições para os contatos sadios de um caso infeccioso e a quarentena é aplicada a pacientes durante o
período de transmissibilidade da doença. Sobre tal texto, assinale a alternativa correta.
COMENTÁRIO:
Estrategista, a primeira sentença afirma que os conceitos de isolamento e quarentena são diferentes, o que está
correto. No entanto, veja que há uma troca de conceitos na segunda sentença: o isolamento é aplicado em indivíduos
que já estão doentes durante o período de transmissibilidade da doença, enquanto a quarentena é aplicada nos
contatos sadios de um caso infeccioso. Portanto, a primeira sentença é verdadeira, enquanto a segunda é falsa.
Logo:
Incorretas as alternativas A, C e D, como justificado acima.
Correta a alternativa B, sem ressalvas.
Gabarito: B.
https://estr.at/FPQH
CAPÍTULO
Veja abaixo a lista de referências bibliográficas utilizadas para a escrita deste livro digital integrado.
1. ROUQUAYROL, M.Z.; GURGEL, M. Epidemiologia & Saúde. Editora Medbook, 8ª edição, 2017.
2. SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE. DEPARTAMENTO DE VIGILÂNCIA DAS DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS.
Guia para Investigações de Surtos ou Epidemias. Ministério da Saúde. Brasília-DF, 2018.
3. SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE. Guia de Vigilância em Saúde: volume único [recurso eletrônico] - 3ª
ed. Ministério da Saúde, Brasília-DF, 2019. Disponível em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2019/
junho/25/guia-vigilancia-saude-volume-unico-3ed.pdf. Acesso em 20/04/2021.
4. HORTON, R. Offline: COVID-19 is not a pandemic. The Lancet, volume 396, página 874, 2020. Disponível em
https://www.thelancet.com/action/showPdf?pii=S0140-6736%2820%2932000-6. Acesso em 29/04/2021.
5. Dicionário de Cambridge. Disponível em https://dictionary.cambridge.org/dictionary/english/synergy.
6. FRONTEIRA, I. et al. The SARS-Cov-2 pandemic: a syndemic perspective. One Health 12, 2021. Disponível em
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2352771421000185. Acesso em 29/04/2021.
7. SINGER, M. Pathogen-pathogen interaction. A syndemic model of complex biosocial processes
in disease. Virulence (1):10-18,2010. Disponível em https://www.tandfonline.com/doi/pdf/10.4161/
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8. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Guia de Vigilância Epidemiológica, 7ª edição – Série A: Normas e Manuais técnicos.
2009. Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_vigilancia_epidemiologica_7ed.pdf. Acesso
em 30/04/2021.
9. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Plano Brasileiro de Preparação para Enfrentamento de uma Pandemia de Influenza -
IV Versão. Distrito Federal, Brasília, 2010.
10. CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION. Lesson 1: Introduction to Epidemiology. Section 10: Chain
of Infection. Disponível em https://www.cdc.gov/csels/dsepd/ss1978/lesson1/section10.html.
11. ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS) 2010. Módulo de Princípios de Epidemiologia para o
Controle de Enfermidades (MOPECE). Módulo 2: Saúde e doença na população. Brasília, 2010. http://bvsms.saude.
gov.br/bvs/publicacoes/modulo_principios_epidemiologia_2.pdf. Acesso em 01/04/2020.
12. ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS) 2010. Módulo de Princípios de Epidemiologia para o
Controle de Enfermidades (MOPECE). Módulo 5: Investigação epidemiológica de campo: aplicação ao estudo de
surtos. Brasília, 2010. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/modulo_principios_epidemiologia_5.pdf.
Acesso em 01/04/2020.
13. ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS) 2010. Módulo de Princípios de Epidemiologia para o
Controle de Enfermidades (MOPECE) Módulo 6: Controle de doenças na população. Brasília, 2010. https://bvsms.
saude.gov.br/bvs/publicacoes/modulo_principios_epidemiologia_5.pdf. Acesso em 01/04/2020.
CAPÍTULO