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Criminalidade Criminalização Direitos Humanos e Movimentos Sociais
Criminalidade Criminalização Direitos Humanos e Movimentos Sociais
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 2
4 CRIME ...................................................................................................... 23
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1 INTRODUÇÃO
Prezado aluno,
Bons estudos!
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2 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS (DUDH)
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O processo teve início em 1945, por meio da Carta das Nações Unidas (1930),
com uma norma internacional “[...] destinada a fornecer a base jurídica para a
permanente ação conjunta dos Estados em defesa da paz mundial” (DALLARI, 1993,
p. 178), que serviu de pano de fundo para, em 1948, ser aprovada a DUDH -
Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Segundo Silva (2000), os princípios da universalidade e da indivisibilidade dos
direitos individuais são os ideais da DUDH - Declaração Universal dos Direitos
Humanos, que acabou por divulgá-los em todo o mundo e por ressaltar a condição de
pessoa como requisito para a dignidade de todos. Portanto, com a DUDH, surgiu um
novo conceito de proteção dos direitos humanos e iniciou-se, por consequência, o
desenvolvimento da positivação internacional das normas relativas à proteção desses
direitos mediante inúmeros tratados internacionais. Assim surgiu o chamado sistema
normativo positivo global de proteção dos direitos humanos, composto por
instrumentos de abrangência internacional específicos e gerais.
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Direito Internacional da Cooperação e da Solidariedade, no lugar do Direito da Paz e
da Guerra. Zarca (1997, p. 9) explica que a DUDH:
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2.3.1 Preâmbulo
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Artigo 6º - Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os
lugares, da sua personalidade jurídica.
Artigo 7º - Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito à igual
proteção da lei. Todos têm direito à proteção igual contra qualquer
discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento
a tal discriminação (ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009,
documento on-line).
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Artigo 13º - Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a
sua residência no interior de um Estado. Toda a pessoa tem o direito de
abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar
ao seu país (ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009, documento on-
line).
Artigo 15º - Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. Ninguém
pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de
mudar de nacionalidade (ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009,
documento on-line).
Artigo 16º - A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar
e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou
religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm
direitos iguais. O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno
consentimento dos futuros esposos. A família é o elemento natural e
fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado
(ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009, documento on-line).
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Os arts. 18 e 19 explicitam o direito à liberdade de pensamento, opinião,
expressão, crença e consciência também como um direito humano e universal:
Artigo 21º - Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direção dos
negócios públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de
representantes livremente escolhidos.
Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções
públicas do seu país.
A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e
deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar-se periodicamente
por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo
equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.
Artigo 22º - Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à
segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos
econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e
à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos
de cada país (ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009, documento on-
line).
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justa e satisfatória, de liberdade de associação em sindicatos, bem como o direito a
repouso e lazer, a uma jornada limitada e a férias periódicas e remuneradas.
Artigo 23º - Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho,
a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o
desemprego.
Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho
igual.
Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que
lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade
humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção
social.
Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se
filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.
Artigo 24º - Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres,
especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e às férias
periódicas pagas (ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009, documento
on-line).
Artigo 25º - Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe
assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à
alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda
quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no
desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos
de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua
vontade.
Artigo 26º - Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser
gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O
ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser
generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em
plena igualdade, em função do seu mérito.
A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao
reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve
favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e
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todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das
atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.
Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o gênero de educação
a dar aos filhos.
Artigo 27º - Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida
cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico
e nos benefícios que deste resultam.
Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a
qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.
Artigo 28º - Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano
internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e
as liberdades enunciadas na presente Declaração.
Artigo 29º - O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual
não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade.
No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito
senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a
promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros
e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do
bem-estar numa sociedade democrática.
Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos
contrariamente e aos fins e aos princípios das Nações Unidas
(ORGANIZAÇÃO DA NAÇÕES UNIDAS, 2009, documento on-line).
O art. 30, último dispositivo da DUDH, assegura uma interpretação ampla das
proteções asseguradas nessa Declaração pelos Estados, proibindo de forma
expressa a utilização das garantias e liberdades como forma de destruição dos direitos
assegurados na própria Declaração:
3.1 Estado
O Estado é uma organização social soberana que possui poder supremo sobre
os indivíduos em uma sociedade, tendo legitimidade para exercê-lo, inclusive com a
força física, se necessária for. Dessa forma, entende-se que somente as organizações
estatais são reconhecidas pelo povo para ditar regras que todos devem seguir e
possuem autoridade e poder para regular o funcionamento da sociedade em um
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território. O exercício do poder ao qual se refere é a capacidade de o Estado influenciar
a ação e o comportamento das pessoas, de forma decisiva. Apesar das características
citadas, definir Estado não é fácil, uma vez que na ciência política sua definição ainda
é imprecisa, levando as pessoas a confundirem Estado com governo, país, regime
político ou sistema econômico (MARIA FONSECA AFFONSO, 2021)
O conceito de Estado é dinâmico, porém, pode-se dizer que desde sua origem
até os dias atuais certos aspectos prevalecem, como a existência do território e do
povo. Alguns autores afirmam que o conceito de Estado não é universal, servindo
apenas para indicar e descrever uma forma de ordenamento político. O que se pode
afirmar é que “o Estado não admite concorrência e exerce de forma monopolista o
poder político, que é o poder supremo nas sociedades contemporâneas” (COELHO,
2009, p. 16). Nesse contexto, Estado e poder são termos que não se dissociam. O
Estado tem três funções fundamentais, das quais decorrem todas as suas ações:
legislativa: elabora as leis e o ordenamento jurídico, necessários à vida em sociedade;
executiva: assegura que as leis sejam cumpridas; e judiciária: julga a adequação ou
não dos atos particulares sob as leis existentes (COELHO, 2009).
3.2 Sociedade
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Por ter a capacidade de organização e cumprimento de normas, vive-se em
sociedade, na qual a relação estabelecida se constitui por constantes trocas, não
apenas sob a lógica do lucro, mas também sob a forma simbólica, por meio da criação
e manutenção de laços de solidariedade que dão significado à sociedade. Dessa
forma, o comportamento humano é permeado por grande complexidade, em que os
indivíduos são influenciados pelo meio em que vivem, formando-se e agindo conforme
sua formação, influenciando também a sociedade. O comportamento das pessoas
sofre influências culturais e históricas, e para que possam se desenvolver, elas têm
como referência o comportamento ditado pela sociedade (MARIA FONSECA
AFFONSO, 2021)
Quando se fala em sociedade, não se pode deixar de mencionar a sociedade
civil, que é a forma como ela se organiza politicamente para influenciar o Estado e
suas políticas públicas. Não é fácil conceituar sociedade civil, uma vez que ela possui
grande diversidade de significados e é produto de uma construção histórica, cultural,
geográfica, social e política, sofrendo variações à medida que mudam os autores, as
épocas, os contextos históricos e as perspectivas políticas que a influenciam e a
enriquecem (LAVALLE, 1999; SCHOLTE, 2002).
A sociedade civil é uma parte importante da história, uma vez que abrange uma
dimensão ampla da vida social. No Brasil, sua reorganização foi estimulada pela
rápida urbanização quando deslocou pessoas de baixa renda do campo para as
cidades urbanas, em locais onde os serviços públicos eram incipientes, o que as fez
se organizarem para lutar por eles (SANTOS, 1979; CALDEIRA, 2000); e pela
modernização econômica do país, que transformou as políticas de planejamento
urbano, saúde e educação em questões tecnocráticas, fazendo os atores de classe
média (economistas, médicos, advogados, professores universitários) reagirem a
esse projeto, organizando meios de ação coletiva e associação para disputar os
elementos tecnocráticos (BOSCHI, 1987; ESCOREL, 1999; AVRITZER, 2002).
A liberdade, a justiça e a proteção do ambiente, bem como a ideia da divisão
em classes sociais, grupos de interesse e indivíduos centrados na própria realização,
são alguns dos objetivos universais da sociedade civil, na qual todos os membros
correspondem ao seu capital, ao seu conhecimento e à sua capacidade de se
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organizar e se comunicar. Nesse contexto, as pessoas se unem de modo voluntário
em torno de valores ou iniciativas com objetivos específicos, geralmente na forma de
organizações, associações, institutos, fundações etc. Pode-se entender a sociedade
civil como o local em que a sociedade e o Estado interagem socialmente por meio das
famílias, associações, movimentos sociais e meios de comunicação pública
(TESSMANN, 2007).
Na sociedade civil, os conflitos acontecem e precisam ser administrados pelo
Estado. Nesse contexto, ela atua como uma organização de interesses materiais e
ideais; já o Estado como a organização da autoridade, sendo que ambos são
indivisíveis e interdependentes. No entanto, o motor da história é a sociedade civil,
que firma seu papel em lutas sociais, criação de consenso e ampliação do Estado,
pois quanto maior for a organização popular em uma sociedade, maior é a chance de
o Estado se ampliar, no sentido de abarcar os interesses da coletividade. Dessa forma,
a relação entre eles pode garantir as condições necessárias para enfrentar, romper e
construir uma nova ordem social, que possibilite ao Estado acolher as demandas da
sociedade organizada (MARIA FONSECA AFFONSO, 2021)
Nesse contexto, a participação social é fundamental, uma vez que contribui
para a construção do consenso em relação ao interesse público, orientando o Estado
no atendimento às demandas da sociedade, sejam públicas ou privadas. O
atendimento a essas demandas configura-se como forma de legitimação do Estado,
porque quanto maior for a capacidade de resposta às demandas da população, mais
ele se tornará legítimo como agente de regulação social, apesar de sua essência
política (BEZERRA, 2016).
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sem discriminação. Eles são garantidos por lei e visam proteger os indivíduos e grupos
contra quaisquer ações que possam interferir no gozo das liberdades fundamentais e
na dignidade humana. São características importantes dos direitos humanos
(DIREITOS..., s.d.):
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conflitos entre os pedidos por justiça, e discutir sobre os direitos humanos não cria
mecanismos para a resolução dessas questões. No entanto, enquanto se discute,
cria-se um espaço de interação e diálogo entre todos os envolvidos em determinado
problema, podendo, sim, se chegar à resolução de alguns deles.
• Tornar a injustiça pública: a sociedade civil contribui para a consolidação dos
direitos humanos quando leva a injustiça à esfera pública. Para que isso seja possível,
é preciso que a associação e o diálogo estejam abertos e com o mínimo de
intervenção. Dessa forma, os grupos que atuam em questões sobre os direitos
humanos tornam pública a injustiça ao defender mudanças ou exercer pressão para
que elas aconteçam. Essa pressão pode ocorrer por meio do fornecimento de
informações, educação para o público e outros grupos, propondo políticas públicas e
encaminhando ações legais.
• proteger o espaço privado: os grupos de direitos humanos protegem o espaço
no qual os indivíduos se expressam e se desenvolvem quando buscam as
condições necessárias para essa ação, reforçando os limites de atuação do
Estado e do mercado.
• intervir e interagir diretamente nos sistemas legais e políticos: hoje existem
muitas leis e políticas voltadas para os direitos humanos. No entanto, essas normas
apenas se efetivam de acordo com sua prática, refinamento e aprovação, sendo
validadas pela sociedade civil. Grupos de direitos humanos participam de forma ativa
nesse processo quando levam casos legais aos tribunais, fornecem informações e
dados essenciais para o refinamento das políticas públicas e propõem novos
mecanismos capazes de criar um sistema que apoie os direitos humanos. Essa deve
ser uma intervenção estratégica focada na mudança de paradigma e na pressão sobre
a política governamental, para que seja mais consistente com o seu discurso.
• promover a inovação social: a inovação social precisa ser factível, e o diálogo,
o feedback e os resultados devem estar abertos e serem justificáveis a diversas
perspectivas. A inovação social surge como uma resposta direta às injustiças
localizadas na sociedade civil. Os inovadores são os que possuem profunda
consciência, estão envolvidos com aqueles que são afetados pela injustiça e,
trabalhando com eles, experimentam e criam outras formas de encontrar soluções.
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A sociedade civil é o principal ator para criar condições a fim de que os direitos
humanos sejam efetivados. Ela promove o discurso que legaliza as normas dos
direitos, voltados principalmente aos grupos esquecidos e imperceptíveis, e que pode
variar de acordo com as diferentes estratégias e meios, os quais permitem a
efetivação da lógica dos direitos humanos na sociedade. Porém, se ela é um agente
tão importante para a consolidação dos direitos humanos, por que isso não acontece?
Para Vieira e DuPree (2004), a sociedade não está protegida contra o Estado e o
mercado, nem possui poder sobre eles, pois é fragmentada, não possui recursos e
necessita de financiamentos. Desse modo, ao mesmo tempo em que flexibilidade,
diversidade e voluntariado são potencialidades da sociedade civil, são também sua
fraqueza, uma vez que ainda são um desafio para os movimentos de direitos humanos
(MARIA FONSECA AFFONSO, 2021)
A fragmentação, a neutralização do discurso e a dependência de recursos são
barreiras que dificultam o avanço dos aspectos citados anteriormente. No entanto,
estratégias como a melhoria da capacidade de comunicação e educação, o
investimento em modelos socialmente inovadores e a construção de redes de direitos
humanos que cessem a fragmentação e fortaleçam a utilização dos recursos podem
possibilitar um maior impacto e melhores resultados na efetivação dos direitos
humanos (VIEIRA; DUPREE, 2004).
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constitucionais dos Estados Unidos e da França, defendendo a imunidade dos direitos
civis e políticos. No entanto, com a criação do poder moderador que dava ao
Imperador poderes constitucionais ilimitados, inclusive o de interferir no exercício dos
demais poderes, a efetivação desses direitos foi prejudicada (DIMOULIS; MARTINS,
2007).
A Constituição Republicana de 1891 manteve os direitos fundamentais
declarados na Constituição de 1824, e no rol de direitos e garantias fundamentais,
instituiu o habeas corpus, antes concedido somente em nível de legislação ordinária;
garantiu a liberdade de culto a todas as pessoas, motivada pela separação entre o
Estado e a Igreja; e ampliou a titularidade dos direitos fundamentais aos estrangeiros
que residiam no país, ao contrário da Constituição de 1824 que os estendia apenas a
cidadãos brasileiros (DIMOULIS; MARTINS, 2007).
A Constituição de 1934 manteve uma série de direitos fundamentais similares
aos especificados na de 1891, mas inovou estabelecendo normas de proteção ao
trabalhador, como a proibição da diferença de salário em virtude de sexo, idade,
nacionalidade ou estado civil; a proibição de trabalho para menores de 14 anos; o
repouso semanal remunerado; a jornada de trabalho limitada a 8 horas diárias; a
determinação de um salário mínimo; e a criação dos institutos do mandado de
segurança e da ação popular (DIMOULIS; MARTINS, 2007).
A Constituição de 1937 instituiu o Estado Novo, reduziu os direitos e as
garantias individuais, destituiu o mandado de segurança e da ação popular, instituídos
na Constituição de 1934, que foram novamente restaurados e ampliados na
Constituição de 1946, assim como os direitos sociais (BULOS, 2003). Em seguida,
com a ditadura militar, a Constituição de 1946 foi derrubada e a de 1967 apresentou
grandes retrocessos, como a supressão da liberdade de publicação, restringindo o
direito de reunião, estabelecendo foro militar para os civis, mantendo todas as
punições e arbitrariedades decretadas pelos Atos Institucionais (AI), entre outros.
Outras modificações foram a redução da idade mínima do trabalho para 12
anos, a restrição ao direito de greve, a eliminação da proibição de diferença de salário
por motivos de idade e nacionalidade, e a cessão de vantagens mínimas ao
trabalhador, como o salário-família. Em 1969, a Constituição de 1967 passa por
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reformas significativas por meio de emendas aditivas e supressivas, ficando em vigor
até o final de 1968, quando o AI-5 foi decretado, repetindo todos os poderes descritos
no AI-2. Além disso, ampliou a margem de arbítrio, deu poder ao governo para
confiscar bens e suspendeu a garantia do habeas corpus para casos de crimes
políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia
popular. Dessa forma, o AI-5 não se associa à doutrina dos direitos humanos e muito
menos à Emenda de 1969, que incorporou em seu texto as medidas autoritárias dos
AI (DIMOULIS; MARTINS, 2007).
Por fim, a Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, é
promulgada, garantindo a proteção dos direitos humanos, sendo considerada uma das
Constituições mais avançadas do mundo nesse sentido. Ela faz referência aos direitos
fundamentais em várias partes de seu texto e garante aos cidadãos, por exemplo, os
direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais em seu art. 1 e o direito à vida,
à privacidade, à igualdade, à liberdade e a outros direitos fundamentais, individuais
ou coletivos em seu art. 5, entre outros.
Para garantir a cidadania e a dignidade humana, a Constituição de 1988
defende princípios como (MARCHINI NETO, 2012): igualdade de gêneros;
erradicação da pobreza, da marginalização e das desigualdades sociais; promoção
do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, gênero, idade ou cor; racismo
como crime imprescritível; direito à saúde, à previdência, à assistência social, à
educação, à cultura e ao desporto; reconhecimento de crianças e adolescentes como
pessoas em desenvolvimento; estabelecimento da política de proteção ao idoso, ao
portador de deficiência e aos diversos agrupamentos familiares; orientação de
preservação da cultura indígena.
Com os direitos humanos garantidos na Constituição de 1988, o Governo
Federal passou a ter compromisso com eles e, hoje, estes são geridos como uma
política pública, o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNHD), instituído pelo
Decreto nº 7.037, de 21 de dezembro de 2009, atualizado pelo Decreto nº 7.177, de
12 de maio de 2010.
No entanto, após décadas da promulgação da Constituição de 1988, ainda são
muitas as dificuldades existentes para tirar esses princípios do papel. Os direitos
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humanos no Brasil são uma questão marcada por contradições, pois, apesar de
assegurar conquistas inéditas concedidas aos direitos sociais, sobretudo em relação
às questões sociais, apresenta grandes desigualdades sociais, nos âmbitos racial e
regional, e precariedade quanto à segurança individual, à integridade física e ao
acesso à justiça, que comprometem o usufruto desses direitos. Para Neves (1997),
ainda existe um hiato significativo no Brasil em relação ao mundo real e legal.
Apesar de o texto constitucional vigente estimular a cidadania ativa, o país está
perdendo o ponto de partida para superar a distância entre o mundo real e o formal.
Dessa forma, um país no qual a sociedade civil tenha real importância; e o Estado,
efetiva função garantidora e implementadora de direitos sociais, ainda é um desafio a
ser superado (MARIA FONSECA AFFONSO, 2021).
De acordo com o relatório estado dos direitos humanos no mundo (2017), o
Brasil ainda apresenta falhas em direitos humanos com a ocorrência de problemas
como (ANISTIA INTERNACIONAL BRASIL, 2017): alta taxa de homicídios,
principalmente entre jovens negros; abusos policiais e execuções extrajudiciais,
efetuados por policiais em operações formais ou paralelas; situação do sistema
prisional; vulnerabilidade dos defensores de direitos humanos, sobretudo em áreas
rurais; violência sofrida pela população indígena, principalmente em decorrência de
falhas nas políticas de demarcação de terras; várias formas de violência contra as
mulheres.
Há grande preocupação com a persistência desses problemas, e muitos
direitos humanos ainda são violados, mesmo com o avanço em questões como a
redução da pobreza. No entanto, apesar das falhas do governo na melhoria dessa
situação, a sociedade tem trabalhado para mudar esse cenário, por meio de
mobilização das periferias e favelas, principais vítimas das violações de direitos
humanos, e de diversas manifestações de pessoas saindo às ruas ou lançando
campanhas para reivindicar seus direitos (MARIA FONSECA AFFONSO, 2021).
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3.5 Movimentos sociais em defesa dos direitos humanos
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de acordo com gênero, idade, etnia, raça, etc. (RAMÍREZ, 2003). Nesse contexto,
depois da publicação da Declaração Universal de 1948, aconteceram as convenções
sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial, eliminação da
discriminação contra a mulher, direitos da criança, entre outros instrumentos
importantes para essa questão (PIOVESAN, 2009).
Em relação às políticas públicas, deve-se destacar o lançamento do PNDH I,
em 1996, que trouxe diretrizes para orientar a atuação do poder público no âmbito dos
direitos humanos, com o objetivo principal de garantir os direitos civis e políticos. O
PNDH foi relançado em 2002, como PNDH II, que aceita as demandas dos
movimentos sociais, contemplando os direitos econômicos, sociais e culturais. Em
2010, o PNDH é atualizado como PNDH III, sintetizando as principais reivindicações
apresentadas pelos movimentos sociais, unindo as resoluções aprovadas nas
conferências territoriais, estaduais e nacionais, realizadas pelo Governo Federal,
desde 2003, em conjunto aos governos municipais, estaduais, aos movimentos
sociais e à sociedade civil, nos 27 estados da Federação (PEREIRA, 2015).
A implementação de ações que visam promover o direito à igualdade, o
combate à discriminação e a promoção da equidade, encontram proteção em
propostas de ações do governo relacionadas à educação, à conscientização e à
mobilização, que estão presentes no Plano Nacional de Políticas para as Mulheres
(2004), no Programa Brasil sem Homofobia (2004), no Plano Nacional de Educação
em Direitos Humanos (2006) e no Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com
Deficiência (2011), gerados com os ativistas. Essas iniciativas são uma demonstração
do reconhecimento do Estado sobre as reivindicações dos movimentos sociais por
cidadania, que são transformadas em políticas públicas (PEREIRA, 2015).
4 CRIME
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categorias, dependendo da gravidade da ofensa, da idade dos criminosos, da punição
potencial e do tribunal que tem jurisdição sobre o caso.
Mais de 1,4 milhão de crimes violentos foram denunciados nos Estados Unidos
em 2000, inclusive mais de 15.500 homicídios. Os ingredientes-chave na incidência
dos crimes de rua parecem ter sido o uso de drogas e a presença difundida de armas
de fogo. Segundo o FBI, 19% de todos os ataques graves denunciados, 42% dos
roubos informados e 67% dos assassinatos em 2002 envolveram uma arma de fogo.
Mesmo com o recente declínio nos crimes mais graves nos Estados Unidos, os níveis
atuais excedem os da década de 1960 (Department of Justice, 2002c, p. 23, 35, 38).
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negócio dos ladrões profissionais é roubar. Eles devotam todo o seu tempo de trabalho
para planejar e executar crimes, e às vezes viajam por todo o País para executar seus
“deveres profissionais”. Como outras pessoas em seu trabalho normal, os ladrões
profissionais consultam seus colegas a respeito de demanda de “trabalho”, tornando-
se parte de uma subcultura de indivíduos com o mesmo tipo de ocupação. Eles trocam
informações sobre lugares para arrombar, receptadores de mercadorias roubadas e
maneiras de garantir fiança se forem presos.
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começaram a desempenhar um papel importante nas atividades do crime organizado
(Chin, 1996; Kleinknecht, 1996).
Sempre houve um elemento global no crime organizado. Mas os policiais e
legisladores agora reconhecem a emergência de uma nova forma de crime organizado
que tira vantagem dos avanços da comunicação eletrônica. O crime organizado
transnacional inclui tráfico de drogas e armas, lavagem de dinheiro e tráfico de
imigrantes ilegais e mercadorias roubadas, como automóveis (Lumpe, 2003; Office of
Justice Programs, 1999).
No Brasil as duas maiores facções do crime organizado em São Paulo e no Rio
de Janeiro se autodenominam Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando
Vermelho (CV), respectivamente. Ordenam rebeliões em presídios, execução de
bandidos rivais e de policiais, fechamento do comércio e de escolas, incêndios em
ônibus, provocando pânico na população constantemente ameaçada pelo fogo
cruzado da verdadeira guerra entre traficantes e entre traficantes e autoridades
policiais. Seu poder de enfrentamento das autoridades ficou demonstrado nos
acontecimentos de maio de 2006, em São Paulo, quando foram executados mais de
40 policiais e registrados 293 atentados – (82) contra ônibus, (56) casas de policiais,
(17) bancos e caixas eletrônicos, (1) estação de metrô, a (CET, 1) Companhia de
Engenharia de Trânsito e (136) outros, além de 73 rebeliões em presídios paulistas,
com nove presos mortos, segundo o jornal O Estado de S. Paulo de 19 de maio de
2006, Caderno C, p. 9. A repressão ao crime organizado é a causa dessa reação das
facções criminosas.
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Um novo tipo de crime do colarinho branco surgiu nas últimas décadas: crimes
de computador. O uso da alta tecnologia permite que os criminosos deem desfalques
ou cometam fraudes eletronicamente, em geral deixando poucas pistas, ou que
ganhem acesso aos estoques de uma companhia sem sair de casa. Segundo um
estudo de 2002 feito pelo FBI e pelo Computer Security Institute, 90% das companhias
que contam com sistemas de computador detectaram quebras de segurança nos
computadores no ano anterior, mas apenas 34% informaram os ataques às
autoridades. Recentemente, uma proporção crescente de tais ataques – 65% em 2003
– tem chegado de fora dos Estados Unidos (Cha, 2003; R. Power, 2002).
Sutherland (1940) cunhou a expressão crime do colarinho branco em 1939 para
se referir a atos executados por indivíduos, mas ela teve seu significado ampliado para
incluir crimes cometidos por negócios e corporações também. Crime corporativo, ou
qualquer ato praticado por uma corporação que seja punível pelo governo, toma
muitas formas e inclui indivíduos, organizações e instituições entre suas vítimas. As
corporações podem ter um comportamento adverso à concorrência, poluir o ambiente,
sonegar impostos, fraudar e manipular ações, fraudar a contabilidade, produzir
mercadorias não-seguras, subornar e corromper, e cometer infrações relacionadas à
saúde e à segurança (Hansen, 2002; Jost, 2002a).
Durante muitos anos, os malfeitores de corporações se livraram com penas
leves nos tribunais documentando sua longa história de contribuições caritativas e
concordando em ajudar os policiais a encontrar outros criminosos do colarinho branco.
Em 2003, nos Estados Unidos, dez companhias de investimentos e dois analistas de
mercado coletivamente pagaram um acordo de US$ 1,4 bilhão por darem informações
fraudulentas aos investidores. A magnitude da multa ganhou as manchetes em toda
a nação, mas o que significa isso comparado com os milhões de investidores que
foram atraídos a comprar bilhões de dólares em ações de companhias que o acusado
sabia que estavam em dificuldade ou à beira do colapso? O fato é que ninguém foi
preso como parte do acordo, e nenhuma companhia perdeu sua licença para fazer
negócios. Os promotores em outras investigações de escândalos corporativos dizem
que pedem sentenças de prisão para criminosos do colarinho branco, mas até hoje a
maioria dos réus foi apenas multada (Labaton, 2003; J. O’Donnell e Willig, 2003).
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Bancos e empresas envolvidos nos escândalos de corrupção que abalaram o
Brasil em 2005/2006 continuam a desenvolver suas atividades e ninguém foi preso.
A condenação por crime corporativo em geral não fere a reputação e as
aspirações de carreira de uma pessoa, como uma condenação por crimes de rua.
Aparentemente, o rótulo de “criminosos do colarinho branco” não carrega o estigma
do rótulo “condenado por um crime violento”. Os teóricos do conflito não consideram
que tal diferença de tratamento seja uma surpresa. Dizem que o sistema penal não
leva a sério os crimes cometidos pelos ricos e focalizam apenas nos crimes cometidos
pelos pobres. Em geral, se um réu tem status e influência, seu crime é tratado como
menos sério do que os cometidos por outros, e a sanção é muito mais suave (MARIA
FONSECA AFFONSO, 2021).
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sociólogas feministas dizem que a prostituição, bem como os aspectos mais
perturbadores da pornografia, reforça o conceito errado de que as mulheres são
“brinquedos” e podem ser tratadas como objetos e não como pessoas. De acordo com
os críticos da descriminalização, a sociedade não pode dar sua aprovação tácita a
condutas que têm consequências tão danosas (Flavin, 1998; Jolin, 1994; National
Advisory Commission on Criminal Justice, 1976; Schur 1968, 1985).
A controvérsia sobre a descriminalização nos lembra importantes insights dos
teóricos do rótulo e do conflito apresentados anteriormente. Subjacentes a esse
debate há duas perguntas: quem tem o poder de definir o jogo, a prostituição e a
bebedeira em público como “crimes”? E quem tem o poder de rotular tais
comportamentos como “sem vítimas”? A resposta é: em geral os legisladores
estaduais e, em alguns casos, a polícia e os tribunais (MARIA FONSECA AFFONSO,
2021)
O direito penal não é simplesmente um padrão universal de comportamento
combinado por todos os membros da sociedade. Ao contrário, ela reflete uma luta
entre indivíduos e grupos concorrentes para ganhar o apoio governamental para os
seus valores morais e sociais. Por exemplo, organizações como Mães Contra Dirigir
Alcoolizado (Mothers Agains Drunk Driving – MADD) e Estudantes Contra Dirigir
Alcoolizado (Students Against Drunk Driving – SADD) conseguiram modificar, nos
últimos anos, as atitudes públicas em relação à bebida. Em vez de ser visto como um
crime sem vítima, a embriaguez está sendo associada cada vez mais a perigos
potenciais advindos do dirigir alcoolizado. Como resultado, os meios de comunicação
de massa estão dando mais atenção (e fazendo mais críticas) às pessoas que são
consideradas culpadas por dirigir depois de beber, e muitos estados já instituíram
multas pesadas e períodos de prisão para uma ampla variedade de ofensas
praticadas em estado de embriaguez.
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5 PROCESSO DE CRIMINALIZAÇÃO
31
Há, portanto, uma seletividade que se institui como forma de melhor organizar
a vontade social, mantendo a conformidade com aquilo que é juridicamente possível
de modo que se resguardem os direitos tutelados. Todavia, faz-se mister ressaltar
uma crítica com relação a este aspecto, posto que cabe ao legislativo e ao executivo
(como responsáveis pela sanção e pelo veto) apreciar as leis em trâmites, verificando
sua real aplicabilidade para que tenha, de fato, uma utilidade pública. Neste viés,
pede-se uma atuação mais eficaz desses órgãos no sentido de propor garantias
viáveis aos direitos protegidos (AYRES,2017).
Ademais, o que se recomenda neste ponto é uma atuação mais jurídica e
menos política como meio de se criar um sistema penal mais coerente, evitando assim
o chamado populismo punitivo tratado por Mauricio Martínez na obra “Depois do
grande encarceramento‟ de Abramovay e Malaguti (2010). Este é caracterizado pelo
oferecimento de penas altas como forma de se alcançar a ressocialização que se
acredita ser capaz de diminuir os altos índices de violência na sociedade, para deste
modo angariar votos políticos.
Posto isto, Araújo (2010) destaca que a elaboração de novas leis penais propõe
a instituição de novos crimes e, por conseguinte, cria um novo grupo de criminosos.
Ressalta ainda que nessa primeira etapa:
32
Neste diapasão, Baratta (2002, p. 98) explica que a criminalização secundária
é exercida pelas agências do sistema penal tais como: “a polícia, a magistratura,
órgãos de controle da delinquência juvenil” que serão os responsáveis pela execução
da lei penal. Complementa tal entendimento, Zaffaroni et al (2015) ao analisar que a
atuação das agências policiais também está condicionada ao trabalho de outras
agências, como as políticas (que estão em busca de votos) e as de comunicação
social.
A polícia é, supostamente, a primeira instância a realizar a criminalização
secundária, posto que na maioria dos casos é quem identifica a prática dos delitos e
passa a investigá-los para encontrar seu autor. Atua, bem como as outras agências
do sistema penal, de forma a selecionar aqueles que serão punidos, visto que a
demanda é demasiadamente grande e não há como atender a todos com igualdade.
Observa-se que a seletividade exercida em ambos os processos de
criminalização recai sobre objetos diferentes. Na primária incide sobre os direitos que
serão tutelados e na secundária sobre os indivíduos, sendo, portanto, uma
seletividade mais objetiva. Deste modo, a seleção não atua apenas sobre os
criminosos, mas inclusive sobre os vitimizados (AYRES,2017).
A seletividade é, portanto, uma característica marcante do sistema penal
brasileiro e consiste na identificação do indivíduo como criminoso, ou seja, como o
responsável pela prática de delitos. Tal rotulação do sujeito delinquente, como bem
explica Penteado Filho (2012), foi bastante trabalhada na teoria do labelling approach
(etiquetamento), instituída nos Estados Unidos nos anos 1960. Essa teoria, entende
que a diferença entre o homem comum e o criminoso consiste na rotulação e
estigmatização sofrida por este último. Sendo assim, a estigmatização pode tanto
estereotipar o sujeito como delinquente quanto influenciá-lo a praticar novos crimes.
A rotulação mencionada confere ao sujeito uma característica de difícil retirada,
proporcionando-lhe uma nova identificação, que é negativa e lhe insere no ramo da
criminalidade. Isto porque, a partir deste ponto ele passa a ser visto apenas como
delinquente, e mesmo após cumprir sua pena será ele estigmatizado pela sociedade.
Desta forma, demonstra-se o quanto é forte o etiquetamento e o quanto ele pode
mudar a vida de alguém.
33
Neste diapasão tem-se o seguinte entendimento:
No entanto, ninguém é atingido pelo poder punitivo por causa desse estado,
mas sim pela situação de vulnerabilidade, que é a posição concreta de risco
criminalizante em que a pessoa se coloca. Em geral, já que a seleção
dominante corresponde a estereótipos, a pessoa que se enquadra em alguns
deles não precisa fazer esforço muito grande para colocar-se em posição de
risco criminalizante (e, ao contrário, deve esforçar-se muito para evitá-lo),
portanto se encontra em um estado de vulnerabilidade sempre significativo
(ZAFFARONI et al, 2015, p. 49).
Por fim, e para uma conclusão mais adequada com relação ao processo de
criminalização na sua mais ampla percepção, ressalta-se que sua importância
consiste na intenção de punir a prática dos delitos, para manter a ordem e defender
os direitos da coletividade. O ponto de reflexão a respeito desse cenário é entender
que a criminalidade e a criminalização são práticas sociais, e que, portanto, são
problemas da coletividade e não apenas do Estado. Ademais, tal problema social afeta
não só a segurança pública, mas também a situação econômica e financeira do país,
influenciando na ordem política e social (AYRES,2017).
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que contraria princípios morais, regras sociais de convivência e normas jurídicas.
Quando tal comportamento promove indignação moral e revolta coletivos tem-se uma
reação social que, a depender da gravidade do ocorrido, pode influenciar
demasiadamente na punição do criminoso.
No entanto, a simples conduta desviante do indivíduo não suscita de imediato
uma reação social, é necessário que se interprete tal comportamento para concluir se,
de fato, trata-se de uma conduta repulsiva digna de punição. Ao analisar os
pressupostos da definição do senso comum Kitsuse (1962 apud BARATTA, 2002, p.
94) aduz que a criminalização é realizada por meio de um mecanismo onde,
primeiramente o comportamento é identificado como desviante, em seguida a
sociedade, interpretando o caso, define aquele indivíduo como parte da categoria
desviante, e por fim, põe em prática uma punição apropriada para essa pessoa.
Neste sentido McHugh (1970 apud BARATTA, 2002), para melhor esclarecer
esse processo, apresenta ainda os requisitos da reação social. Ele explica que é
necessário haver: primeiramente a violação da norma, depois a consciência da
conduta e, por fim, a vontade do indivíduo em praticar o delito. Desta forma, ressalta-
se que não é satisfatório a conduta ferir apenas a lei ou a moral, é necessário também
que a sociedade (imbuída do senso comum) a interprete como desviante para haver
sua criminalização (AYRES,2017).
Faz-se mister esclarecer que, nos dizeres de Motta Filho (1945), senso comum
corresponde a um conjunto de princípios e regras nas quais a sociedade assenta seus
motivos e fundamentos para aquilo que entende ser permitido ou não. Aduz ainda que
o senso comum influencia na sociabilidade e na individualidade, posto que quando há
opiniões iguais apela-se para o contrato e quando divergentes, recorre-se à lei.
Para melhor compreender e considerar o senso comum é imprescindível
lembrar-se da ideia do determinismo biológico proposto por Lombroso que, nos
dizeres de Andrade (2003) foi o responsável por elaborar a tese do criminoso nato.
Isso significa dizer que o criminoso é a causa do crime, ou ainda como aduz Baratta
(2002), que o crime é um evento natural causado por fatores biológicos (genéticos).
Sendo assim o indivíduo já nasce com uma predisposição de cometer delitos e
adquire essa característica de forma hereditária. Este entendimento foi posteriormente
36
superado, no entanto exerce influência demasiada no senso comum atual. Isto porque
é comum associar o criminoso a pessoas que se vestem ou se comportam de uma
determinada forma, ou que usem tatuagens, ou ainda que andem de roupas rasgadas.
É, então, criada a imagem do delinquente que já está pronto para cometer crimes.
Ao se verificar o comportamento delinquente observa-se que sua origem está
nas questões sociais, culturais e inclusive psicológicas do indivíduo, o qual ao ser
criminalizado apresenta uma tendência maior de praticar outros crimes, sendo este
processo denominado por Lemert (1967 apud BARATTA 2002) de condutas
desviantes sucessivas.
As consequências da criminalização, mesmo depois da aplicação da pena, se
perpetuam de forma que o indivíduo encontra muitos problemas para se inserir
novamente no meio social, não somente pelo preconceito de ser ex-detento, mas
também pelo estigma que advém da própria criminalização, limitando muito esse
retorno. Ocorre então o seu isolamento, que é uma das sequelas mais comuns da
pena (AYRES,2017).
Demonstra-se desta forma que a sociedade atua não só no processo de
criminalização da conduta primária como também influencia no exercício da conduta
desviante secundária. A teoria do labelling approach explica bem o etiquetamento
promovido pela reação social diante de uma conduta considerada desviante. Os mais
diversos setores da sociedade atuam nesse sentido, ainda que de forma inconsciente,
tais como as escolas, as igrejas, e as próprias famílias, são os chamados por Andrade
(2003) de mecanismos de controle social informal. Essa discriminação realizada por
eles contribui no modo como a sociedade tratará esses indivíduos e na forma como
eles se comportarão no futuro (AYRES,2017).
De acordo com Araújo (2010), o labelling approach surgiu no final do século
XIX e foi fortemente influenciado pelas correntes fenomenológicas, com o
interacionismo simbólico e a etnometodologia. A referida autora segue o entendimento
de que o interacionismo simbólico foi inspirado em George Herbert Mead (1953),
filósofo que colaborou para a criação de uma Psicologia Social responsável por melhor
captar a relação existente entre o indivíduo e a sociedade, explicando que o meio
social é constituído por meio das relações nele estabelecidas. Isso significa que este
37
ambiente é mutável de acordo com a realidade em que se encontra e que o sujeito é
moldado por este meio. Dessa forma são os próprios indivíduos que tipificam as
condutas praticadas.
Ademais, Mead (1953 apud ARAÚJO 2010) aduz que o meio social existe de
forma autônoma, mas que determinados caracteres seus se devem à sua relação com
os sujeitos. Posto isto, entende-se que o homem, por meio de suas experiências
adquiridas em sociedade, contribui para o estabelecimento de certos atributos do
ambiente com o qual interage. Ressalta-se, portanto, que é necessário haver um
diálogo entre os indivíduos e o meio para que seja possível o desenvolvimento de uma
relação social (AYRES,2017).
Todavia, a etnometodologia, nos dizeres de Schutz (1962 apud BARATTA,
2002) explana que a sociedade é uma construção social, ou seja, tudo que se
desenvolve na sociedade e que a forma, é obra dos indivíduos que a compõe. Sob
esse aspecto, analisa-se que o comportamento desviante é, portanto, uma criação do
meio social, corroborando a ideia que o labelling approach manifesta, a criminalidade
é algo extrínseco, é uma atribuição que se dá a alguém pela prática de uma conduta
interpretada como inadequada pela sociedade (AYRES,2017).
Posto isto, Araújo (2010) ressalta que pelo fato de a realidade social ser vista
como uma construção social não é possível caracterizá-la objetivamente, ou seja, para
tal finalidade é preciso ser feita uma análise levando-se em consideração o contexto
em que se encontra o meio.
Neste sentido:
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para garantir que a ordem emanada seja, sobretudo, constitucional e não apenas uma
resposta ao clamor social ofertada para calar o grito da maioria. Observa-se, portanto,
que o senso comum presente no seio da comunidade deve ser entendido como o
modo pelo qual a sociedade vê a si própria.
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Quando essa ideia sobre o sistema penal é promovida (neste ponto faz-se
mister esclarecer que essa promoção é contínua) há uma cobrança social
considerável para que ele cumpra com suas funções, buscando garantir a justiça e a
segurança pública, condenando os criminosos para que lhes sejam aplicadas
punições à altura dos crimes cometidos. Por conseguinte, tal reação servirá de
exemplo aos outros indivíduos (caráter preventivo) de modo que se evite a execução
de novos crimes ao demonstrar como o Estado é forte em controlar os delitos.
Durante o cumprimento da pena deverá esse indivíduo ser ressocializado o que
facilitará sua reintegração ao meio social. Ademais o criminoso é visto como o mal da
sociedade, como o causador do perigo e da insegurança e, por isso, deve ser
capturado e tratado pelo sistema. Esta é a ideologia penal dominante.
Nas palavras de Andrade (2003, p. 132):
A lei penal estabelece as regras que deverão ser cumpridas tanto pela
sociedade quanto pelo sistema, no entanto, na prática, é observado que este último
tem certa liberdade de atuação o que caracteriza a sua seletividade. Por um olhar
crítico essa seleção não é de todo mal, visto que, não seria possível punir todos que
cometem delitos (AYRES,2017).
Para demonstrar tal ideia, cita-se a Política da Tolerância Zero, adotada nos
Estados Unidos nos anos 90, entendida por Lopes (2001) como um reflexo do direito
penal máximo que consiste na punição de todo e qualquer crime, desde os mais
brandos aos mais graves. Essa medida diminuiu os índices de crimes em Nova York,
mas aumentou demasiadamente o número de reclamações contra a atuação
agressiva da polícia. Além disso, seria necessário também um sistema penal mais
rápido para atender a demanda, o que implicaria na supressão de garantias
processuais dos indivíduos em prol do interesse estatal.
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O Brasil ainda tentou aplicar tal política, mas não houve um resultado eficaz na
redução da criminalidade. Nas palavras de Lopes (2001):
Além das leis penais há também um rol de princípios que norteiam a ideologia
penal dominante anteriormente explicada. Baratta (2002) faz uma análise desses
princípios que permite uma maior dimensão do raciocínio pertencente a esta ideologia,
esclarecendo e norteando esse conjunto de ideias. São eles: o princípio da
legitimidade, legalidade, igualdade, culpabilidade, o princípio do bem e do mal, do
interesse social e do fim (AYRES,2017).
O referido autor explica que pelo princípio da legitimidade o Estado, como
detentor do poder, é o responsável legítimo para fazer aplicar as leis penais por meio
do sistema penal, reprimindo a criminalidade e punindo os causadores dessa
desordem. Já o princípio da legalidade, como o nome bem sugere, entende que o
Estado, como legitimado, deverá cumprir com as determinações legais. Ressalta-se
que essas ideias aqui estabelecidas norteiam a ideologia dominante, portanto, quando
se trata da legalidade impõe-se ao Estado mais que um dever, uma obrigação de
cumprir a lei penal, punindo aqueles que cometem delitos para garantir a ordem social
(AYRES,2017).
Com relação ao princípio da igualdade, Baratta (2002) entende de que o direito
penal é aplicado de forma igual a todos. Sabe-se que na prática tal juízo não se
aproveita, visto que o sistema penal realiza um processo seletivo de criminalização,
não tratando a todos com uniformidade. Isso causa uma significativa sensação de
impunidade no meio social porque passa a imagem de que o Estado não está
cumprindo com seu dever, e a partir dessa percepção nasce a opinião de que o
sistema está decadente (AYRES,2017).
Quanto ao princípio da culpabilidade, o autor compreende que ele ataca a
reprovabilidade do ato delituoso, não só porque fere normas penais, mas porque
atinge regras morais. Este último ponto é de relevante importância, posto que, ainda
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que a ação seja tipificada como crime é o grau de reprovabilidade social que indicará
o nível de culpa daquele indivíduo, ou seja, é preciso que a sociedade interprete tal
ato como, de fato, inadmissível, para que seja aquele indivíduo etiquetado como
criminoso (AYRES,2017).
Ainda nesta senda, Baratta (2002) destaca o princípio do bem e do mal, que
identifica a sociedade como o “bem” e o criminoso como o “mal”, porque este é o
causador da desordem, do perigo, da insegurança social e aquela é a vítima, que sofre
com a violência e está a esperar pela proteção do Estado. Entretanto, ver o
delinquente como o “mal” é colocá-lo como o causador único dos problemas e não
atribuir, a esse cenário que se cria, a influência de fatores externos (sociais,
econômicos e políticos) dificulta a análise das ocorrências (AYRES,2017).
No que se refere ao princípio do interesse social, o autor destaca que os bens
protegidos pelo Direito Penal são de interesse de todos, isso talvez explique o porquê
da revolta social face à prática de crimes, ainda que o indivíduo não seja a vítima do
ocorrido. São protegidos os direitos à vida, à dignidade sexual, ao patrimônio, etc.
Observa-se que quando não há uma atitude firme do Estado em garantir essa
proteção a sociedade busca agir por conta própria e, neste ponto, tem- se a ocorrência
de situações como o linchamento. Surge um retrocesso, posto que o homem busca
solucionar a violência usando-a como arma de combate (AYRES,2017).
Também chamado de princípio da prevenção, Baratta (2002) explica que o
princípio do fim entende que a finalidade da pena é de prevenir a prática de outros
crimes. Ao punir aquele delinquente ele será ressocializado e não mais cometerá
outros delitos, e concomitantemente, servirá de exemplo para que outros não tenham
a mesma atitude delituosa que ele (AYRES,2017).
Nesse diapasão, ao se refletir sobre a ideologia penal dominante e seus
princípios, verifica-se que há uma visão utópica do sistema penal, que não demonstra
suas reais funções e objetivos. Essa imagem distorcida do sistema faz surgir na
sociedade cobranças baseadas em fundamentos falhos, mas que exerce uma
influência considerável nas mudanças realizadas nas leis penais e no próprio
processo de criminalização dos indivíduos. A mídia atua de modo a colaborar com as
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exigências sociais, de forma que tais ideias se propagam como absolutamente
corretas e válidas (AYRES,2017).
Diante desse cenário, constata-se que de um lado tem-se a coletividade
cobrando uma melhor atuação do Estado frente ao sistema avaliado como falho e
incompetente e de outro, o Estado realizando por meio do sistema penal ora suas
funções reais, ora suas funções declaradas. Isto porque não há como se manter inerte
diante da atuação da população que vai às ruas, que protesta e reage àquilo que
chama de impunidade e injustiça, o que explica a tentativa do sistema de realizar, vez
por outra, suas funções declaradas (AYRES,2017).
Afinal, quando se fala da coletividade, é pensado não só na massa, mas nos
juízes que julgam as causas, nos professores que lecionam essas ideologias nas
salas de aula, nos doutrinadores que propalam essas ideias em suas obras etc. Há,
portanto, um conjunto muito forte que alimenta e apregoa essa ideologia,
pressionando demasiadamente o sistema, tornando mais difícil sua compreensão e
assentando essa relação num ciclo vicioso de conflitos (AYRES,2017).
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