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A proteção dos direitos humanos no plano internacional por meio de sistemas internacionais.
PROPÓSITO
Compreender como funcionam os vários sistemas internacionais de proteção dos direitos
humanos existentes na atualidade é de absoluta importância nos âmbitos nacionais e
internacional, considerando um mundo cada vez mais globalizado e internacionalizado.
PREPARAÇÃO
Antes de iniciar este conteúdo, tenha em mãos um dicionário jurídico para entender
determinados termos específicos da área. Tenha, também, a Convenção Europeia de Direitos
Humanos e a Convenção Americana de Direitos Humanos.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
MÓDULO 2
MÓDULO 3
INTRODUÇÃO
Entre os estudiosos, é comum a afirmação de que os horrores da Segunda Guerra Mundial
(1939-1945) e toda a barbárie perpetrada contra a vida e a dignidade humana durante esse
triste período da história da humanidade constituem o ponto de partida para a consagração dos
direitos humanos tais como são conhecidos atualmente.
Neste conteúdo, estudaremos sobre o surgimento da Organização das Nações Unidas (ONU)
e, por meio desse organismo internacional de caráter global, o estabelecimento de um sistema
global de proteção dos direitos humanos.
MÓDULO 1
Neste módulo, aprenderemos como está estruturado e como opera o sistema universal de
proteção dos direitos humanos, também conhecido como sistema onusiano (Default tooltip)
ou sistema global de proteção dos direitos humanos.
O objetivo do módulo é proporcionar a compreensão da arquitetura existente na área da ONU
para a proteção dos direitos humanos, notadamente por meio da análise de seus principais
instrumentos normativos e da estrutura organizacional especificamente relacionada à proteção
de tais direitos.
(CASSIN, 1951)
É nesse contexto que nasce a Organização das Nações Unidas (ONU), criada por meio da
Carta das Nações Unidas (ou Carta de São Francisco), um tratado internacional assinado em
São Francisco (EUA), em 26 de junho de 1945, por ocasião da Conferência de Organização
Internacional da Nações Unidas.
A Carta das Nações Unidas dispôs que uma das principais finalidades da organização é a
promoção dos direitos humanos e sua efetivação em nível global, assim como a manutenção
da paz e da segurança internacional (arts. 1º; 13.1, b; 55, c; 62, 2; 68 e 76, c). Desse modo,
logo após a sua instituição, a ONU passou a desenvolver trabalhos específicos para o alcance
de tais objetivos. O primeiro resultado desses esforços foi a proclamação da Declaração
Universal dos Direitos Humanos (DUDH), adotada e proclamada pela Assembleia Geral das
Nações Unidas (Resolução 217 A III) em 10 de dezembro de 1948.
Não há dúvida de que a DUDH constitui um documento marco na história mundial dos direitos
humanos, sendo responsável pela gênese e pelo desenvolvimento da proteção internacional
desses direitos, hoje consubstanciada em um ramo específico do Direito Internacional,
denominado e conhecido globalmente como Direito Internacional dos Direitos Humanos
(DIDH), que visa proteger e promover a dignidade humana em todo o mundo ao consagrar uma
série de direitos (universais, indivisíveis e interdependentes) dirigidos a todas as pessoas, sem
distinção de qualquer natureza, inclusive de nacionalidade ou do Estado em que o indivíduo se
encontre.
A DUDH inaugurou uma nova era na história internacional, dando origem à concepção
moderna ou contemporânea dos direitos humanos, especialmente por ser um instrumento que
transcendeu as fronteiras nacionais, ultrapassando os espaços soberanos em que a precária
proteção dos direitos se encontrava confinada até então, dando voz a uma herança cultural de
toda a humanidade e alçando a proteção desses direitos ao nível internacional.
CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS
Esta Carta foi incorporada ao sistema jurídico-legislativo brasileiro pelo Decreto n.º
19.841, de 22 outubro de 1945.
Nas palavras de René Cassin (1951, p. 277, tradução nossa, grifo nosso), um dos grandes
juristas responsáveis pela redação do texto final, a DUDH teve como mérito constituir o
“pórtico de entrada do grande templo dos direitos humanos que foi construído a partir dela”.
O ARCABOUÇO NORMATIVO DE PROTEÇÃO
DOS DIREITOS HUMANOS NO ÂMBITO DA ONU
Com a criação da ONU e, mais especificamente, com a proclamação da DUDH, aos poucos o
sistema global de proteção dos direitos humanos foi ganhando forma e contornos cada vez
mais específicos. Impulsionados pela ONU, os Estados-membros da organização
sucessivamente passaram a adotar uma série de tratados internacionais, juridicamente
vinculantes para os Estados, bem como outros instrumentos de caráter não vinculante (por
exemplo, resoluções, declarações, regras mínimas, princípios etc.), todos eles voltados
genérica ou especificamente para a proteção universal dos direitos humanos.
Dois tratados de grande importância no âmbito da ONU são o Pacto Internacional dos
Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e o Pacto Internacional dos Direitos Sociais,
Econômicos e Culturais (PIDSEC), ambos adotados pela Assembleia Geral da ONU em
1966, responsáveis por complementar material e processualmente a DUDH, e que em conjunto
com ela receberam o nome de Carta Internacional dos Direitos Humanos.
Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou
Degradantes (1984).
Segundo Protocolo Adicional ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1989).
Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo
Facultativo (2007).
Outras regras que não são juridicamente vinculantes, mas que servem de diretrizes e princípios
para a atuação dos Estados-membros da ONU no tocante à proteção dos direitos humanos
são:
As Regras Mínimas da ONU para Proteção dos Jovens Privados de Liberdade, de 1990.
As Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas não
Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras (Regras de Bangkok), de 2010.
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DE
PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NO
ÂMBITO DA ONU
Ao lado da proteção de caráter normativo, que se dá por meio dos tratados internacionais e por
textos de outra natureza, conforme elencados anteriormente, o sistema global de proteção dos
direitos humanos conta ainda com órgãos e mecanismos internacionais de proteção e
monitoramento dos direitos humanos, que são responsáveis pela aplicação e efetivação das
normas internacionais relativas a esses direitos e por prestar auxílio aos Estados no tocante ao
fomento e efetivação dos direitos humanos em seus respectivos territórios.
O que os une tais órgãos é a atuação da ONU, quer diretamente, por meio daqueles da própria
organização; ou indiretamente, mediante a atuação de organismos independentes, previstos
em tratados elaborados sob seu patrocínio e que recebem apoio técnico e administrativo da
organização. Vamos conferir quais são os principais deles.
Outro importante órgão da ONU é o Conselho de Direitos Humanos, criado em 2006, por
meio da Resolução n.º 60/251 da Assembleia Geral da ONU. O Conselho substituiu a antiga
Comissão de Direitos Humanos (1946-2006), que havia sido criada pelo Conselho Econômico
e Social da ONU (ECOSOC).
Sua principal função é promover o respeito universal aos direitos humanos por meio da
supervisão do cumprimento dos compromissos internacionais celebrados pelos entes estatais
na matéria. É composto por 47 Estados-membros, escolhidos por votação secreta da
Assembleia Geral da ONU, para um mandato de três anos. Tem competência para promover e
fiscalizar a observância da proteção de direitos humanos pelos Estados da ONU e fazer,
atualmente, a gestão do Sistema de Procedimentos Especiais e do Mecanismo da Revisão
Periódica Universal (RPU), que são instrumentos pelos quais fiscaliza o cumprimento e a
proteção dos direitos humanos por parte dos Estados-membros da ONU.
Tais órgãos podem ser unipessoais ou coletivos e a denominação é variada, isto é, nos casos
unipessoais, há o uso da expressão “Relator Especial” ou ainda “Especialista Independente”;
no caso dos órgãos colegiados, utiliza-se a expressão “Grupo de Trabalho”.
Conforme explica André de Carvalho Ramos (2021), o trabalho desses órgãos “consiste em
realizar visitas aos países, em missões de coleta de dados (fact-finding missions), bem como
em agir diante de violações de direitos humanos solicitando (não podem exigir) atenção do
Estado infrator sobre os casos. Seus relatórios não vinculam, apenas contêm recomendações,
que são enviadas aos Estados e também ao Conselho de Direitos Humanos e Assembleia
Geral da ONU”.
Por fim, importante também mencionar os comitês criados por tratados internacionais de
âmbito universal, que têm como principal atribuição monitorar o cumprimento das obrigações
assumidas pelos Estados dentro do sistema global ao aderirem ou ratificarem determinado
tratado. Estão voltados, portanto, a assegurar a observância das normas convencionais, seja
de um único tratado ou de uma restrita série de acordos específicos.
São exemplos desses comitês: o Comitê de Direitos Humanos; o Comitê de Direitos Sociais,
Econômicos e Culturais; o Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial; o Comitê sobre
a Eliminação da Discriminação contra a Mulher; o Comitê contra a Tortura; o Comitê para os
Direitos da Criança; o Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência; e o Comitê
contra Desaparecimentos Forçados.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
A) Visando à proteção global dos direitos humanos, a ONU possui órgãos próprios e também
relações de apoio técnico e administrativo com vários órgãos criados por tratados
internacionais elaborados sob seu patrocínio.
B) O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos é o principal órgão da
ONU encarregado de promover e proteger os direitos humanos em nível global.
A) A Carta Internacional dos Direitos Humanos é formada pelo Pacto Internacional dos Direitos
Civis e Políticos e pelo Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais.
B) Integram o corpus juris universal de proteção dos direitos humanos apenas os tratados
internacionais celebrados sob o patrocínio da ONU.
C) A Carta das Nações Unidas é considerada o pórtico de entrada do grande templo dos
direitos humanos.
D) As Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos, conhecidas como as
Regras de Mandela, de 1955, têm a natureza jurídica de tratado internacional, razão pela qual
devem ser obedecidas pelos Estados-membros da ONU, sob pena de sanção.
GABARITO
Tais procedimentos são operacionalizados pelo Conselho de Direitos Humanos, e não pelo Alto
Comissariado.
2. Sobre o corpus juris universal de proteção dos direitos humanos, assinale abaixo a
alternativa correta:
O corpus juris universal de direitos humanos é composto por tratados e vários outros
instrumentos que promovem os direitos humanos.
MÓDULO 2
Rhona K. M. Smith (2014, p. 87), ao apontar algumas vantagens dos sistemas regionais,
destaca que, “na medida em que um número menor de Estados está envolvido, o consenso
político se torna mais facilitado, seja com relação aos textos convencionais, seja quanto aos
mecanismos de monitoramento. Muitas regiões são ainda relativamente homogêneas, com
respeito à cultura, à língua e às tradições, o que oferece vantagens”.
O ARCABOUÇO NORMATIVO
A CEDH também determina a submissão dos países europeus ao Tribunal Europeu dos
Direitos do Homem (TEDH), órgão criado para atuar jurisdicionalmente caso haja o
desrespeito às normas impostas pela Convenção, julgando e condenando os Estados
violadores de suas disposições e de outras normas integrantes do sistema europeu de
proteção.
Além do texto principal da CEDH, vários outros instrumentos normativos foram criados para a
consagração desses direitos no continente europeu, com destaque para os protocolos relativos
à Convenção, que ampliaram o rol dos direitos protegidos. A seguir, estão destacados os
protocolos mais importantes:
Protocolo n.º 1 (1952), que dispôs sobre o direito de propriedade; o Protocolo n.º 2
(1993), que trata do direito à educação.
Protocolo n.º 6 (1983), que dispôs sobre a abolição da pena de morte em tempo de paz.
Protocolo n.º 13 (2002), que trata da abolição da pena de morte em tempo de guerra.
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
Junto à CEDH e aos seus protocolos, o sistema europeu conta atualmente com mais de 185
instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, todos adotados pelo Conselho
da Europa. Dentre eles, merecem destaque a Convenção Europeia para a Prevenção da
Tortura e de Tratamentos Desumanos e Degradantes (1987), a Carta Europeia para as Línguas
Regionais ou de Minorias (1992) e a Convenção para a Proteção de Minorias Nacionais (1995).
Enquanto um dos órgãos inicialmente criados pela CEDH, a Comissão tinha uma competência
política e “semijudicial”. Sua função era analisar as queixas ou comunicações apresentadas
pelos Estados-membros do sistema europeu e também pelos indivíduos (ONGs ou grupos de
indivíduos), acerca de uma violação da Convenção, buscando resolver o problema de uma
maneira mais informal e conciliatória, privilegiando-se a busca pela solução rápida.
Nesse contexto, vale ressaltarmos que o sistema europeu também se destaca por ser o único
sistema regional de proteção dos direitos humanos que permite o acesso direto de indivíduos,
ONGs e grupos de indivíduos ao TEDH (jus standi), a fim de que possam, por meio do
exercício do direito de petição (CEDH, art. 34), exigir uma reparação devido à violação de
direitos por um Estado-parte na CEDH. Essa alteração ocorreu por meio do Protocolo n.º 11;
antes dele, somente Estados e a extinta Comissão eram legitimados para provocar a Corte.
JUS STANDI
Quanto à sua estrutura interna de funcionamento, o TEDH atua por meio de um Tribunal
Singular, comitês, seções e Tribunal Pleno (art. 26). As decisões, quando proferidas pelo
Tribunal Pleno, são definitivas (art. 44) e têm força vinculante para os Estados condenados,
que devem cumprir integralmente as condenações fixadas nas sentenças proferidas (art. 46).
Na mesma Conferência em que foi adotada a Carta da OEA, os Estados americanos também
proclamaram a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), que foi o
primeiro instrumento regional americano específico sobre direitos humanos.
em Washington em 1943.
O ARCABOUÇO NORMATIVO
A Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (CADH), também conhecida como Pacto
de San José da Costa Rica, é o tratado-regente do sistema interamericano de proteção dos
direitos humanos. Foi adotada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos
Humanos, ocorrida em San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, e entrou em vigor
internacional em 18 de julho de 1978.
Trata-se do texto de direitos humanos mais importante e expressivo das Américas, tornando-se
um dos pilares da proteção dos direitos humanos, ao consagrar direitos políticos e civis, bem
como os relacionados à integridade pessoal, à liberdade e à proteção judicial. Em seu art. 1º,
estabelece a obrigação geral de os Estados-partes respeitarem os direitos e as liberdades nela
reconhecidos e garantirem seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua
jurisdição, sem discriminação de qualquer natureza.
Além de prever um amplo rol de direitos civis e políticos, a principal finalidade da CADH é
estabelecer as diretrizes referentes à proteção dos direitos da pessoa humana, garantindo
importantes mecanismos para sua aplicação. Ela também institucionaliza um compromisso dos
Estados-partes em cumprir efetivamente as normas protetivas nela previstas, não adotando
quaisquer concepções contrárias em seus respectivos ordenamentos jurídicos internos.
A segunda parte (arts. 33 a 73) diz respeito à estrutura interna e funcionamento dos órgãos de
proteção dos direitos humanos componentes do sistema. Por fim, a terceira parte (arts. 74 a
82) trata das disposições transitórias, abordando tópicos como assinatura, ratificação, reserva,
emenda, protocolo e denúncia à Convenção, bem como disposições gerais sobre a Comissão
e a Corte.
Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas
(2015).
Dentre os instrumentos que não possuem força jurídica vinculante para os Estados, podemos
destacar a Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão (2000), a Carta
Democrática Interamericana (2001), e a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos
Indígenas (2016).
Visando garantir a promoção, fiscalização e efetiva proteção dos direitos humanos previstos na
CADH e nos demais instrumentos normativos do sistema interamericano, foram instituídos dois
importantes órgãos: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Corte
Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), previstos no art. 33 da CADH e
disciplinados especialmente em outros dispositivos da Convenção.
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Sede da Corte Interamericana de Direitos Humanos,
A Comissão é um órgão criado inicialmente pela OEA para “promover o respeito e a defesa dos
direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização” sobre a matéria (Carta da
OEA, art. 106 e CADH, art. 41). Por determinação da norma prevista na Carta da OEA, a
CADH regulamentou a Comissão, dispondo sobre a sua organização, suas funções, sua
competência e seu procedimento em seus arts. 34 a 51 (salvo disposição em contrário, os
artigos citados a seguir estão previstos na CADH). Além dessas previsões, a Comissão conta
também com um Estatuto e um Regulamento.
Situada em Washington, D.C. (EUA), a Comissão realiza pelo menos dois períodos ordinários
de sessões por ano, no lapso determinado previamente, bem como tantas sessões
extraordinárias quantas considerem necessárias.
É composta por sete membros, denominados comissários ou comissionados, que devem ser
pessoas de alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria de direitos humanos (art.
34). Esses membros são eleitos a título pessoal (não como representantes dos seus Estados
de origem), pela Assembleia Geral da OEA, de uma lista de candidatos propostos pelos
governos dos Estados-membros, sendo que cada governo pode propor até três candidatos,
nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado-membro da OEA. Quando
for proposta uma lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser de Estado diferente
do proponente (CADH, art. 36). No tocante ao mandato de seus membros, eles serão eleitos
por quatro anos e só poderão ser reeleitos uma única vez, não podendo fazer parte da
Comissão mais de um comissário de um mesmo Estado (art. 37).
Para que um procedimento de petição individual contendo uma denúncia ou queixa de violação
dos direitos humanos previstos na CADH possa ser iniciado junto à Comissão, devem estar
presentes algumas condições de admissibilidade, conforme o estabelecido pelo art. 46 da
Convenção. Em suma, são elas: (i) o esgotamento dos recursos internos (local remedies
rule (Default tooltip) ); (ii) a ausência do decurso do prazo de 6 meses, contados do
esgotamento dos recursos internos, para a apresentação da petição; (iii) ausência de
litispendência internacional; (iv) ausência de coisa julgada internacional; e (v) identificação do
peticionário.
A Comissão já apreciou diversos casos envolvendo várias espécies de violação de direitos
humanos pelo Estado brasileiro, sendo que um deles resultou em uma recomendação ao país
para elaboração de uma lei voltada à prevenção e ao combate à violência doméstica, que
resultou na edição da Lei n.º 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha.
De acordo com o art. 1º do seu estatuto, a Corte “é uma instituição judiciária autônoma cujo
objetivo é a aplicação e a interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos”,
exercendo suas funções em conformidade com as disposições da Convenção e do seu
Estatuto. Trata-se, portanto, de um tribunal “com o propósito primordial de resolver os casos
que lhe são apresentados por supostas violações aos direitos humanos protegidos pela
Convenção Americana” (GUERRA, 2015, p. 166).
Em relação ao seu funcionamento, de acordo com o art. 22.1 do seu estatuto, a Corte pode
realizar sessões ordinárias e extraordinárias (pois não é um tribunal permanente como o
TEDH), sendo que os períodos ordinários de sessões serão determinados regularmente pela
própria Corte (art. 22.2) e os períodos extraordinários de sessões serão convocados pelo
presidente ou por solicitação da maioria dos juízes (art. 22.3).
No tocante à sua composição, conforme dispõe o art. 52.1 da CADH, a Corte IDH é composta
de sete juízes, nacionais dos Estados membros da OEA, eleitos a título pessoal, que devem
ser pessoas de alta autoridade moral e de reconhecida competência em matéria de direitos
humanos, reunindo as condições requeridas para o exercício das mais elevadas funções
judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam nacionais, ou do Estado que os
propuser como candidatos.
Seus juízes são eleitos por um período de seis anos e só poderão ser reeleitos uma vez (art.
54.1). A eleição ocorre por meio de votação secreta e pelo voto da maioria absoluta dos
Estados-partes da Convenção, na Assembleia Geral da OEA, de uma lista de candidatos
propostos pelos mesmos Estados (CADH, art. 53.1). Cada governo pode propor até três
candidatos, nacionais do Estado que os propuser ou de qualquer outro Estado membro da
OEA. Quando for proposta uma lista de três candidatos, pelo menos um deles deverá ser
nacional de Estado diferente do proponente (CADH, art. 53.2). Não deve haver dois juízes da
mesma nacionalidade compondo a Corte simultaneamente (CADH, art. 52.2).
De acordo com a CADH, a Corte IDH pode exercer uma função consultiva (art. 64), segundo
a qual emite pareceres ou opiniões em resposta às consultas que lhe são dirigidas pelos
Estados, bem como uma função contenciosa (arts. 61, 62 e 63), de acordo com a qual
analisa e julga os casos de violações de direitos humanos que lhe são submetidos.
Acerca da legitimidade para provocar a Corte IDH, de acordo com o art. 61 da CADH, somente
os Estados-partes (que tenham também reconhecido a jurisdição da Corte) e a Comissão têm
o direito de submeter casos para sua apreciação e julgamento. Contrariamente ao que ocorre
no âmbito do sistema europeu, no SIDH os indivíduos dependem da Comissão ou de outro
Estado (actio popularis (Default tooltip) ) para que suas vindicações possam chegar à Corte
IDH, pois até o presente momento lhe é vedado o direito de ação internacional (jus standi).
As sentenças proferidas pela Corte IDH são de cumprimento obrigatório por parte dos Estados-
partes na CADH em todo caso em que forem partes, conforme disposto no art. 68.1 da CADH.
O art. 67 da CADH determina que a sentença é definitiva e inapelável, sendo que no caso de
divergência sobre o sentido ou alcance da decisão, a Corte deverá interpretá-la, a pedido de
qualquer das partes.
Desde o ano de 2006, a Corte IDH já julgou dez casos envolvendo o Brasil, sendo que apenas
em um deles o país não foi condenado. São eles: Caso Ximenes Lopes vs. Brasil (2006); Caso
Nogueira de Carvalho e outros vs. Brasil (2006); Caso Escher e outros vs. Brasil (2009); Caso
Garibaldi vs. Brasil (2009); Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil
(2010); Caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde vs. Brasil (2016); Caso Cosme Rosa
Genoveva, Evando de Oliveira e outros (“Favela Nova Brasília”) vs. Brasil (2017); Caso do
Povo Indígena Xucuru e seus membros vs. Brasil (2018); Caso Herzog e outros vs. Brasil
(2018); e Caso Empregados da Fábrica de Fogos de Santo Antônio de Jesus e seus
familiares vs. Brasil (2020).
Além dos casos já julgados, até o presente momento outros três casos envolvendo o país
encontram-se pendentes de julgamento. São eles: Caso Barbosa de Souza e outros vs. Brasil
(2019), Caso Barbosa de Souza e outros vs. Brasil (2020) e Caso Tavares Pereira e outros vs.
Brasil (2021).
A execução forçada das decisões da Corte IDH, em sentido próprio, não existe. Os casos de
não cumprimento dessas decisões por parte de um Estado condenado podem ser levados ao
conhecimento da Assembleia Geral da OEA por meio de um relatório anual. Desse modo, é
ativado um shaming mechanism (mecanismo da vergonha), visando motivar o Estado
envolvido à execução da decisão.
O sistema regional africano de proteção dos direitos humanos está estruturado no âmbito da
União Africana (UA) e nasceu somente em 1981, com a adoção da Carta Africana dos
Direitos Humanos e dos Povos (CADHP), também conhecida como Carta de Banjul. A Carta
foi aprovada na Conferência Ministerial da então Organização da Unidade Africana (hoje
denominada União Africana), em Banjul, Gâmbia, entrou em vigor internacional em 1986, e
constitui-se o tratado-regente do referido sistema.
EM UMA ESCALA DE DESENVOLVIMENTO, O SISTEMA
EUROPEU É O MAIS DESENVOLVIDO E O SISTEMA
INTERAMERICANO SE ENCONTRA EM UMA POSIÇÃO
INTERMEDIÁRIA. JÁ O SISTEMA AFRICANO É AINDA
INCIPIENTE E SE ENCONTRA EM PROCESSO DE
CONSTRUÇÃO, EVOLUÇÃO E AMADURECIMENTO.
O ARCABOUÇO NORMATIVO
A CADHP está estruturada em três partes. A primeira (arts. 1º a 29) elenca os direitos e os
deveres dos cidadãos, contemplando-se, inclusive, além dos direitos de 1ª e 2ª geração,
também os direitos de 3ª geração, tais como o direito ao meio ambiente sadio, ao
desenvolvimento e à paz. A segunda parte (arts. 30 a 63) estabelece as medidas de
salvaguarda da Carta, dispondo sobre a composição e a organização da Comissão Africana
dos Direitos Humanos e dos Povos (Comissão ADHP), sobre o processo perante a Comissão,
além dos princípios aplicáveis. Por fim, a última parte (arts. 64 a 68) fixa disposições diversas,
tais como a entrada em vigor da Carta e o processo para emenda ou revisão do texto.
A Comissão é composta por onze membros, que devem ser escolhidos entre personalidades
africanas que gozem da mais alta consideração, conhecidas pela sua alta moralidade, sua
integridade e sua imparcialidade, e que possuam competência em matéria dos direitos
humanos e dos povos (art. 31). São eleitos, a título individual (para uma atuação com
independência), por escrutínio secreto pela Conferência dos Chefes de Estado e de Governo,
de uma lista de pessoas apresentadas para esse efeito pelos Estados-partes na Carta ADHP
(art. 33). Os membros da Comissão são eleitos para um mandato de seis anos, sendo
renovável (art. 36).
A Comissão ADHP exerce sua função de proteção dos direitos humanos mediante aceitação (i)
de petições individuais, que lhe são enviadas por indivíduos ou ONGs, denunciando
violações de direitos previstos na Carta ADHP, bem como (ii) de comunicações estatais,
feitas pelos Estados-partes da Carta, nas quais igualmente denunciam tais violações.
A Corte ADHP foi criada pelo Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos
Povos (art. 1º), adotado em 10 de junho de 1998, por ocasião da 34ª Sessão Ordinária da
Conferência dos Chefes de Estado e de Governo da Organização de Unidade Africana (atual
União Africana), reunida em Ouagadougou, no Burkina Faso. O Protocolo entrou em vigor
internacional em 25 de janeiro de 2004 e a Corte foi oficialmente inaugurada em 2006, tendo a
sua sede permanente em Arusha, República Unida da Tanzânia.
Conforme dispõe o próprio preâmbulo do Protocolo, a criação da Corte ADHP tem como
finalidade o fortalecimento da proteção dos direitos humanos e dos povos consagrados na
Carta ADHP, visando conferir maior eficácia à atuação da Comissão.
A Corte é composta por onze juízes, que devem ser nacionais dos Estados-membros da UA.
São eleitos por sua capacidade individual e devem ter elevada reputação moral e reconhecida
competência em matéria de direitos humanos e dos povos, não podendo haver dois juízes
nacionais do mesmo Estado (Protocolo, art. 11). Os juízes são eleitos para um mandato de seis
anos e podem ser reeleitos uma única vez (Protocolo, art. 15.1).
Podem submeter casos à Corte ADHP: (i) a Comissão ADHP; (ii) o Estado-parte que submeteu
o caso perante a Comissão; (iii) o Estado-parte contra o qual o caso na Comissão foi
submetido; e, (iv) as organizações africanas intergovernamentais (Protocolo, art. 5.1).
O Protocolo também prevê que a Corte “poderá conferir a relevantes organizações não
governamentais com status de observadora perante a Comissão e a indivíduos a prerrogativa
de submeter-lhe casos diretamente, de acordo com o art. 34 (6) do Protocolo” (art. 5.3). Esse
dispositivo convencional revela a previsão de acesso direto de indivíduos e ONGs à Corte
ADHP (jus standi), ainda que tal fato esteja condicionado ao aceite do Estado, conforme prevê
o art. 34.6 do Protocolo.
Tal como ocorre com a Corte IDH, a Corte ADHP tem uma competência consultiva e também
contenciosa.
COMPETÊNCIA CONSULTIVA
No exercício de sua competência consultiva, a pedido de um Estado-membro da União
Africana, da própria UA, de um de seus organismos ou de uma organização africana
reconhecida pela UA, a Corte ADHP pode emitir pareceres ou opiniões consultivas sobre a
interpretação da Carta ADHP ou de outro instrumento de direitos humanos (Protocolo, art. 4º).
COMPETÊNCIA CONTENCIOSA
No tocante à sua competência contenciosa, a Corte ADHP tem competência por todos os
casos e litígios que lhe forem apresentados relativos à interpretação e aplicação da Carta
ADHP, do Protocolo sobre o estabelecimento da Corte e de outros instrumentos de direitos
humanos que tenham sido ratificados pelos Estados envolvidos (Protocolo, art. 3º).
As decisões da Corte ADHP são vinculativas para os Estados-partes envolvidos no litígio, que
estão obrigados a garantir a execução da decisão em seus respetivos territórios (Protocolo, art.
30). O monitoramento da execução de uma decisão é responsabilidade de um Conselho de
Ministros (Protocolo, art. 29.2). A execução forçada das decisões da Corte em sentido próprio
não existe. Os casos de não cumprimento dessas decisões por parte de um Estado podem ser
levados ao conhecimento da Assembleia dos Chefes de Estado e de Governo em um relatório
anual. Desse modo, deve ser ativado um shaming mechanism (mecanismo da vergonha),
visando motivar o Estado envolvido à execução da decisão.
Em 2008, foi adotado o Protocolo Relativo aos Estatutos do Tribunal Africano de Justiça e
dos Direitos Humanos, mediante o qual se faz uma fusão do Tribunal Africano dos Direitos do
Homem e dos Povos e do Tribunal de Justiça da União Africana (este último, criado pelo
Protocolo do Tribunal de Justiça da União Africana, adotado pela Conferência da União em
Maputo, Moçambique, em 2003).
VERIFICANDO O APRENDIZADO
A) Que o sistema europeu, constituído pela Comissão Europeia de Direitos Humanos e pela
Corte Europeia de Direitos Humanos, atualmente é o mais desenvolvido dentre os sistemas
regionais.
C) Que o sistema africano possui dois importantes órgãos de proteção dos direitos humanos
que são a Comissão e a Corte Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, embora não conte
ainda com um tratado-regente para a completa regulação do sistema.
D) Que esses sistemas não guardam nenhuma relação com o sistema onusiano de proteção
dos direitos humanos, não atuando de maneira complementar a este último.
A) Que a Comissão Interamericana é composta por sete comissários que devem ser pessoas
de alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria de direitos humanos.
B) Que juízes da Corte Interamericana são eleitos por um período de sete anos e só poderão
ser reeleitos uma única vez.
D) Que a Corte Interamericana é uma instituição judiciária autônoma cujo objetivo é a aplicação
e a interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
E) Que o Brasil aderiu à Convenção Americana sobre Direitos Humanos e também reconheceu
a jurisdição da Corte Interamericana, razão pela qual pode ser julgado por ela.
GABARITO
1. Acerca dos sistemas regionais de proteção dos direitos humanos, é correto afirmar:
A alternativa A está incorreta, pois o sistema europeu tem hoje apenas um órgão, que é o
TEDH. A alternativa C está incorreta, visto que o sistema africano tem como tratado regente a
CADHP; a alternativa D está incorreta, pois os sistemas regionais e onusiano são
complementares e não excludentes; a alternativa E está incorreta, dado que o indivíduo não
pode acessar diretamente a Corte, apenas a Comissão Interamericana.
Justificativa: Estando todas as demais alternativas corretas, a alternativa “b” está incorreta
porque os juízes da Corte Interamericana são eleitos para um mandato de seis anos, permitida
uma reeleição.
MÓDULO 3
A história da humanidade é marcada por incontáveis guerras através dos séculos, sendo esse
um de seus aspectos mais sombrios. Como é de conhecimento geral, o mundo já presenciou
duas grandes guerras mundiais, sendo que a Segunda Guerra constituiu o mais sangrento e
brutal conflito armado já ocorrido. Milhões de vidas foram ceifadas, tanto combatentes como
civis. O número exato nunca saberemos.
É nesse contexto que surge a conhecida expressão genocídio, aqui entendido como o
extermínio em massa de pessoas ou, mais tecnicamente, como uma ação coordenada para
exterminar uma nação, um povo ou um grupo étnico. A história humana é marcada por
genocídios, tais como os que ocorreram na Circássia (1864 a 1867), na Armênia (1915 a
1922), no Holocausto (1939 a 1945), no Camboja (1975 a 1979), em Ruanda (1994) e na
antiga Iugoslávia (1995), que conjuntamente a muitos outros, vitimaram milhões de pessoas.
de Buchenwald, na Alemanha.
Surge assim o Direito Internacional Penal (DIP), entendido como um ramo do Direito ou das
Ciências Jurídicas que se ocupa de assuntos criminais em uma esfera global, mediante o
estabelecimento de normas jurídicas voltadas à tipificação de condutas que configuram graves
crimes que atingem a consciência da humanidade. Essas normas criam e regulamentam a
jurisdição e a competência para o julgamento e a aplicação de sanções penais por órgãos
internacionais de natureza penal, vinculados à Justiça Internacional, tal como reconhecida pela
sociedade internacional. Nas palavras de Kai Ambos (2005, p. 1), trata-se do “conjunto de
todas as normas de Direito Internacional que estabelecem consequências jurídico-penais”.
Esses tribunais, que são conhecidos como tribunais de exceção ou tribunais ad hoc, sempre
foram muito criticados, especialmente por serem constituídos em caráter temporário ou
excepcional, após a ocorrência dos fatos (e não ex post facto). Outra crítica preponderante se
deve à sua composição por juízes que, em tese, não teriam a imparcialidade necessária para o
julgamento, uma vez que não são previamente investidos de jurisdição de acordo com leis
estabelecidas, ofendendo-se com isso o princípio do juiz natural, consagrado no Direito
Internacional e no âmbito do Direito interno dos Estados.
É nesse cenário que a sociedade internacional viu a necessidade de criar um Tribunal Penal
Internacional de caráter permanente e com competência legalmente instituída para o
julgamento dos graves e bárbaros crimes que atentam contra a consciência coletiva de toda a
humanidade. Ademais, seria até mesmo falacioso falar-se na proteção internacional dos
direitos humanos (global e regional), conforme estudamos nos módulos anteriores, sem a
contrapartida da instituição da responsabilidade criminal dos indivíduos no plano
internacional (MAZZUOLI, 2019).
O Estatuto de Roma do TPI é composto por 128 artigos que abrangem um preâmbulo e 13
partes assim divididas:
I – Criação do Tribunal
VI – O julgamento
VII – As penas
X – Execução da pena
XI – Assembleia dos Estados-partes
XII – Financiamento
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
O Tribunal, que é independente e tem personalidade jurídica internacional (Estatuto, art. 4.1), é
“uma instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de
maior gravidade com alcance internacional (...) e será complementar às jurisdições penais
nacionais” (Estatuto, art. 1º), sendo que a competência e o funcionamento do Tribunal são
regidos pelo seu Estatuto constitutivo. Precisamos destacar, portanto, que a sua atuação é
subsidiária, pois de acordo com o próprio Estatuto, atua “complementarmente” à jurisdição
dos Estados soberanos, não visando substituir esta última.
ATENÇÃO
É importante salientarmos que o TPI julga indivíduos (pessoas físicas) pelo cometimento dos
crimes de sua competência, diferentemente das demais cortes internacionais de direitos
humanos estudadas nos módulos anteriores, competentes para julgar Estados por violações de
direitos humanos.
COMPETÊNCIA
Os crimes de competência do TPI, que são imprescritíveis (Estatuto, art. 29), estão previstos
no art. 5º do Estatuto, sendo eles: o crime de genocídio; os crimes contra a humanidade; os
crimes de guerra; e o crime de agressão.
CRIME DE GENOCÍDIO
De acordo com o Estatuto, o genocídio é entendido como qualquer ato praticado com intenção
de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, o que
compreende segundo o art. 6º:
Sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua destruição
física, total ou parcial.
Homicídio
Extermínio
Escravidão
Deportação ou transferência forçada de uma população
Prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas
fundamentais de direito internacional
Tortura
Crime de apartheid
Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
CRIMES DE GUERRA
Conforme dispõe o Estatuto, os crimes de guerra são entendidos como graves violações às
Convenções de Genebra, consistentes nos atos enumerados no art. 8.2(a) do Estatuto,
dirigidos contra pessoas ou bens protegidos nos termos. Destacam-se as Convenções de
Genebra que estabelecem o Direito Internacional Humanitário, isto é, o Direito aplicável na
guerra – jus in bello, notadamente para a proteção dos direitos humanos.
Ainda conforme estabelece o art. 8.2(b) do Estatuto, também são considerados crimes de
guerra “outras violações graves das leis e costumes aplicáveis em conflitos armados
internacionais no âmbito do direito internacional”, conforme os atos enumerados no referido
dispositivo convencional.
O Estatuto determina que, no caso de conflitos armados que não sejam de índole internacional,
também são considerados crimes de guerra as graves violações do artigo 3º comum às quatro
Convenções de Genebra, consistentes nos atos descritos no art. 8.2(c) do Estatuto, cometidos
contra pessoas que não participem diretamente nas hostilidades, incluindo os membros das
forças armadas que tenham deposto armas e os que tenham ficado impedidos de continuar a
combater devido à doença, lesão, prisão ou a qualquer outro motivo, assim como outras graves
violações das leis e costumes aplicáveis aos conflitos armados que não têm caráter
internacional, no quadro do Direito Internacional, conforme os atos enumerados no art. 8.2(e)
do Estatuto.
CRIME DE AGRESSÃO
Inicialmente, não havia no Estatuto de Roma uma definição do que seria o crime de agressão.
Previa-se somente que o Tribunal poderia exercer a sua competência em relação a tal crime
desde que, nos termos dos arts. 121 e 123 do Estatuto, fosse aprovada uma disposição
definindo o crime em questão — obrigatoriamente compatível com as disposições pertinentes
da Carta das Nações Unidas (art. 5.2) — e que se enunciassem as condições em que o
Tribunal teria competência relativamente a esse crime.
A definição do crime foi adotada por meio da emenda do Estatuto de Roma do TPI, na primeira
Conferência de Revisão do Estatuto em Kampala, Uganda, em 2010, de modo que o crime de
agressão foi definido como “o uso de força armada por um Estado contra a soberania,
integridade ou independência de outro Estado”. Em 15 de dezembro de 2017, a Assembleia
dos Estados-partes adotou, por consenso, uma resolução sobre a ativação da jurisdição do
Tribunal sobre o crime de agressão a partir de 17 de julho de 2018.
COMPOSIÇÃO E FUNCIONAMENTO
O TPI é composto atualmente por 18 juízes, eleitos pela Assembleia dos Estados-partes no
Estatuto. Seus membros devem ser pessoas de elevada idoneidade moral, imparcialidade e
integridade, que reúnam os requisitos para o exercício das mais altas funções judiciais nos
seus respectivos países, e têm mandatos de nove anos não renováveis (Estatuto, art. 36). No
âmbito de suas atividades, garantem julgamentos justos e proferem suas sentenças, emitem
mandados de prisão ou intimações para o comparecimento perante o Tribunal, autorizam as
vítimas a participar dos julgamentos e ordenam medidas de proteção às testemunhas, dentre
outras atividades. Também elegem, entre si, o presidente do Tribunal e dois vice-presidentes.
O Tribunal possui três divisões judiciais, que julgam as matérias em diferentes fases do
processo: pré-julgamento, julgamento e recursos.
Os juízes de julgamento (geralmente três juízes por caso) conduzem julgamentos justos,
decidindo se há evidências suficientes para provar, além de qualquer dúvida razoável, que o
acusado é culpado da acusação e, em caso afirmativo, os julgam pronunciado a sentença em
público, momento no qual emitem ordens de reparação às vítimas, incluindo a restituição, a
compensação e a reabilitação.
Por fim, os juízes de recursos (cinco juízes) apreciam os recursos apresentados pelas partes,
podendo confirmar, reverter ou alterar uma decisão sobre a culpa ou inocência, ou sobre a
sentença e, se necessário, solicitam um novo julgamento perante uma Câmara de Julgamento
diferente.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
A) Estabelece o TPI como uma instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas
responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, e substituirá as
decisões eventualmente proferidas pelas jurisdições penais nacionais.
D) Prevê como crime contra a humanidade qualquer ato cometido no quadro de um ataque,
generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse
ataque, compreendendo especificamente os vários atos descritos no próprio Estatuto.
E) Determina que os crimes contra a humanidade também são conhecidos como crimes contra
as leis e costumes aplicáveis em conflitos armados.
A) Seus juízes são eleitos para mandatos de nove anos, permitida uma reeleição.
B) Seus juízes são eleitos para mandatos de cinco anos, não renováveis.
C) Seus juízes são eleitos para mandatos de nove anos, não renováveis.
D) Seus juízes são eleitos para mandato de seis anos, permitida uma reeleição.
E) Seus juízes são eleitos para mandato de seis anos, não renováveis.
GABARITO
1. “Foi a criação do TPI, por meio do Estatuto de Roma de 1998, que efetivamente
impulsionou a teoria da responsabilidade penal internacional dos indivíduos, na medida
em que se previu punição individual àqueles praticantes dos ilícitos elencados no
Estatuto” (MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 12. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2019. E-book.).
Os juízes são eleitos para o exercício de um mandato de nove anos que não é renovável, nos
termos do art. 36.9(a) do Estatuto de Roma.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final deste estudo, podemos concluir que os direitos humanos atualmente não apenas são
tutelados pelos ordenamentos jurídicos internos dos países, mas também contam com
sofisticados esquemas de proteção no âmbito internacional.
Conforme estudamos, o sistema global de proteção dos direitos humanos, instituído no âmbito
da ONU, conta com um amplo arcabouço normativo e com uma rede integrada de órgãos e
mecanismos destinados à promoção, fiscalização e tutela dos direitos e da dignidade humana
para todas as pessoas do globo, sem discriminação de qualquer natureza.
Além do sistema onusiano, vimos que a proteção dos direitos humanos se dá também por meio
dos sistemas regionais, que hoje são três — europeu, interamericano e africano — e estão
estruturados no âmbito de organizações internacionais específicas, buscando tutelar os direitos
humanos em distintas regiões do globo, considerando as características e peculiaridades de
cada região.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
AMBOS, K. A construção de uma parte geral do Direito Penal Internacional. In: AMBOS,
K.; JAPIASSÚ, C. E. A. Tribunal Penal Internacional: possibilidades e desafios. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005, p. 1-31.
COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS. Carta Africana dos
Direitos Humanos e dos Povos. Consultado na internet em: 9 mai. 2021.
GUERRA, S. Direitos Humanos: curso elementar. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
MAZZUOLI, V. de O. Curso de Direito Internacional Público. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2019. E-book.
RAMOS, A. de C. Curso de Direitos Humanos. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2021. E-book.
EXPLORE+
Que tal aprofundar o seu estudo sobre direitos humanos e os sistemas que os protegem?
Para um estudo sobre a história da Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua
importância para a construção dos direitos humanos, leia o artigo de autoria de Luciano
Meneguetti Pereira, intitulado A Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua Importância
na Gênese, Desenvolvimento e Consolidação do Direito Internacional dos Direitos Humanos,
disponível no site Academia.edu.
Acerca da força jurídica da Declaração Universal dos Direitos Humanos, veja artigo de autoria
de Luciano Meneguetti Pereira, intitulado Reflexões sobre a Natureza Jurídica e a Força
Vinculante da Declaração Universal dos Direitos Humanos aos 70 (1948-2018), disponível no
site Academia.edu.
Sobre a importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos, você ainda pode assistir
no YouTube ao vídeo intitulado Há 70 anos: adotada a Declaração Universal dos Direitos
Humanos.
Ainda sobre a proteção dos direitos humanos no continente europeu, leia o artigo de autoria de
Luciano Meneguetti Pereira e Ana Paula Grossi, intitulado A Proteção dos Direitos Humanos no
Continente Europeu: Breves Apontamentos, disponível na Revista Fides.
Para conhecer os demais casos brasileiros que foram julgados na Corte Interamericana de
Direitos Humanos, busque pelo portal da Corte IDH.
Por fim, para complementar os seus estudos, acesse o material sobre os sistemas
internacionais de proteção dos direitos humanos, desenvolvido pela Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão.
CONTEUDISTA
Luciano Meneguetti Pereira
CURRÍCULO LATTES