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A&C R. de Dir. Administrativo e Constitucional, Belo Horizonte, ano 4, n.17, p. 1-255, jul./set. 2004
A&C REVISTA DE DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL
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Ensaio sobre a Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e o Regime Jurídico dos Direitos Fundamentais 87
1 Considerações preliminares
Tem-se buscado implementar, no campo da dogmática jurídica,
discurso de pré-compreensão no sentido de que o sistema constitucional
legitima-se a partir da proteção de um núcleo de direitos fundamentais que
ubica no centro da totalidade do Direito.
Parte-se da idéia de que são os direitos fundamentais, de certa maneira
fundados na noção de dignidade da pessoa humana, que justificam a exis-
tência do Estado e suas diversas formas de atuação. Assim, não há Estado,
ou ao menos o Estado Democrático de Direito, desvinculado de uma
justificação ética. Ele não é e nem pode ser, destarte, um fim em si mesmo.
Nada obstante tem-se observado, em considerável e relevante grupo
da produção teórica do Direito Administrativo nacional, a prevalência de
certas idéias fundantes do chamado regime jurídico-administrativo que,
mesmo partindo de pensadores extremamente vinculados com a efetividade
da Constituição e com os valores democráticos, podem justificar a emer-
gência de manipulações discursivas negadoras dos direitos fundamentais
e de seu regime jurídico-constitucional.
É o que se observa quando, em sede doutrinária, os administrativistas
buscam fundar o seu sítio de investigação a partir do chamado princípio
da supremacia do interesse público sobre o privado.
A questão que se pretende colocar, com o presente texto, insere-se,
de certo modo, na linha de pensamento daqueles que vêm, recentemente,
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88 Paulo Ricardo Schier
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mormente p. 116 usque 133) é o maior exemplo, hoje, da assertiva.
3
missas para o desenvolvimento da tese de doutoramento apresentada por este pesquisador na Universidade
Federal do Paraná.
4
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Demonstramos, em outro texto de nossa autoria (SCHIER, Paulo Ricardo. Filtragem Constitucional, especialmente
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18
Konrad Hesse. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha, p. 38 et seq.
19
NOVAIS, Jorge Reis, op. cit., p. 82-122;
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92 Paulo Ricardo Schier
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Ibid.
27
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para o manejo de mandado de segurança, de restrição ou conformação de garantia fundamental.
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28
Todos os topoi apresentados foram extraídos de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira (op. cit., p. 121-
126 e 133-135).
29
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, p. 230.
30
CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital, op. cit., p. 121.
31
Manuel Afonso Vaz. Lei e Reserva da Lei – a Causa da Lei na Constituição Portuguesa de 1976, p. 316-317.
32
CLÈVE, Clèmerson Merlin. Atividade Legislativa do Poder Executivo no Estado Contemporâneo e na
Constituição de 1988, p. 234 et seq.
33
CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital, op. cit., p. 122.
34
VAZ, Manuel Afonso, op. cit., p. 327.
35
MENDES, Gilmar Ferreira. Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais, p. 241 et seq.
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eles são, embora não sozinhos, força movente, sem a qual a transformação histó-
rica não iria se efetuar. Se eles faltam, ou se eles são reprimidos, então isso pode
conduzir ao imobilismo de uma estabilização do existente, isto é, porém, à incapa-
cidade de ajustar-se às condições transformadas e produzir novas configurações:
a ruptura com o existente torna-se um dia então inevitável e o estremecimento
tanto mais profundo. Sobretudo, não só tem importância que haja conflitos, mas
também, que sejam regulados e vencidos. O conflito como tal ainda não contém
a nova configuração, senão somente o resultado ao qual ele conduz. E sozinho o
conflito não é capaz de possibilitar vida e convivência humana. Por isso é impor-
tante tanto dar lugar ao conflito e seus efeitos como, — não em último lugar, pelo
modo da regulação de conflitos —, garantir a produção e conservação da unidade
política, nem ignorar ou reprimir o conflito por causa da unidade política, nem
abandonar unidade política por causa do conflito.43
43
Id., p. 30.
44
SCHEIDER, Hans Peter, op. cit., p. 44.
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Além de abertura e mobilidade, que não serão aqui abordados.
48
MÜLLER, Friedrich. Métodos de Trabalho do Direito Constitucional, p. 84.
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6 Reflexões finais
Nota-se, a partir do exposto, que no plano da dogmática de
realização constitucional não se sustenta, portanto, a tese indiscriminada
de existência de um princípio da supremacia do interesse público sobre
o privado. A idéia de supremacia do público só se verifica em algumas
situações específicas e sempre dentro de condições definidas e limitadas
constitucionalmente.
Nada obstante, em sentido contrário, a doutrina do Direito Admi-
nistrativo brasileiro e a práxis jurisprudencial têm trabalhado na perspectiva
de existência de um pressuposto princípio de supremacia do interesse
público. E mais, não se tem levado em consideração as diversas hipóteses e
limitações às quais, quando se manifesta, deve se vincular. Tem-se olvidado
que, ainda quando referida supremacia do interesse público se manifesta,
constitucionalmente, legalmente ou mediada pelo juiz, como critério de
solução de colisão de interesses ou bens constitucionais, ela não poderá
ser absoluta, eis que utilizada como medida de ponderação (e, logo, mais
uma vez, não poderá ser absoluta).
Destarte, a tese inicial de Humberto Bergmann Ávilla58 no sentido
de que o discutido princípio da supremacia do interesse público sobre o
privado explicita, antes, uma regra de preferência, também a partir da
abordagem sugerida no presente trabalho, parece ser verdadeira. Como
se nota, contudo, o presente texto chega em idêntica conclusão a partir de
uma metodologia e de referenciais dogmáticos diversos. Trata-se, assim,
da proposta de outra abordagem para corroborar com a reflexão colocada
em pauta pelo Professor gaúcho.
Com isso tem-se que a inexata compreensão da categoria analisada,
vista como verdadeiro princípio geral de Direito Público, tem proporcio-
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ÁVILLA, Humberto Bergmann, op. cit., p. 101.
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Bibliografia citada
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104 Paulo Ricardo Schier
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Ensaio sobre a Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e o Regime Jurídico dos Direitos Fundamentais 105
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