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I.

Racionalidade argumentativa da
Filosofia e a dimensão discursiva do
trabalho filosófico
(De acordo com as Aprendizagens Essenciais)

1.1. Tese, argumento, validade, verdade e solidez


Modo de proceder do Filósofo:
Teses, teorias e argumentos

Para responder aos problemas que colocam, os filósofos apresentam teses e desenvolvem
teorias.

Uma tese corresponde a uma ideia que se quer afirmar a propósito de um dado problema.

Para defender uma ideia, ou tese, é necessário construir bons argumentos.

Para assegurar a qualidade e o rigor dos argumentos que apoiam as suas teses e teorias, os
filósofos recorrem à lógica.
Lógica

Estuda a distinção entre argumentos corretos e incorretos, mediante a identificação


e a compreensão dos processos que conduzem da verdade de certas crenças à
verdade de outras.

Lógica formal Lógica informal

Estuda, sobretudo, a validade Estuda, sobretudo, a força dos


formal dos argumentos argumentos
dedutivos. não-dedutivos.
O argumento
ARGUMENTO

Conjunto de proposições devidamente articuladas

Premissa(s) Conclusão (tese)

A(s) premissa(s) procura(m) defender, sustentar ou justificar a


conclusão.
Os alunos das turmas do 10º ano são
estudantes de Filosofia.
Tomás e Miguel são alunos da turma
Exemplo 1 10ºX.
Logo, Tomás e Miguel são estudantes de
Filosofia.
Explicação do exemplo 1

Premissa Os alunos das turmas 10º ano são estudantes de Filosofia.


ANTECEDENTE
Premissa Tomás e Miguel são alunos da turma 10ºX.
CONSEQUENTE Conclusão Logo, Tomás e Miguel são estudantes de Filosofia.

Indicador de Nexo lógico


conclusão

Um argumento tem subjacente uma inferência ou raciocínio, uma operação


mental através da qual chegamos a uma conclusão, partindo de determinadas
razões e efetuando a transição lógica entre proposições.
A experiência sensível é enganadora
porque tem por base os dados dos
sentidos e estes enganam-nos.
Exemplo 2
Explicação dos exemplo 2

Premissa Os dados dos sentidos são enganadores.


ANTECEDENTE
Premissa A experiência sensível tem por base os dados dos sentidos.

CONSEQUENTE Conclusão Logo, a experiência sensível é enganadora.

Indicador de
Nexo lógico
conclusão

Os argumentos nem sempre aparecem na sua forma canónica ou padrão, pelo que é
necessário reescrevê-los.
O que não são argumentos?

- meros conjuntos de proposições sem qualquer conexão lógica entre si.

Exemplos

1 2
Os rapazes são giros. Todos os deuses são imortais.
As cerejas fazem bem à saúde. Alguns carros funcionam a gasolina.
Logo, as férias devem continuar. Logo, as palavras são indispensáveis.
O que acontece quando, num argumento, a transição lógica falha?

Exemplo

Os alunos da turma 10ºX são estudantes de Filosofia.


Tomás e Miguel são estudantes de Filosofia.
Logo, Tomás e Miguel são alunos da turma 10ºX.

Neste exemplo, compreendemos facilmente que o facto de Tomás e Miguel serem estudantes de Filosofia
não implica que façam parte da turma 10ºX. Quando isto acontece, cometemos um erro de raciocínio (uma
falácia), tornando o argumento inválido e, portanto, nada convincente.

Estes argumentos no interessam à Filosofia.


E neste caso?

Exemplo

Todos os repteis são astronautas.


Os astronautas são cães.
Logo, os cães são repteis.

Neste exemplo, nada se passa com a estrutura do argumento, é estabelecido um nexo


lógico entre as premissas e a conclusão, sendo, por isso válido.
Contudo, argumentos cujo conteúdo é absurdo também não interessam à Filosofia.
- No nosso discurso quotidiano, formulamos constantemente argumentos. Usamos expressões
que indicam a presença de premissas e de conclusões.

Alguns indicadores de premissa Alguns indicadores de conclusão


Porque… Logo…
Pois… Então…
Admitindo que… Por conseguinte…
Pressupondo que… Portanto…
Considerando que… Por isso…
Partindo do princípio de que… Consequentemente…
Sabendo que… Segue-se que…
Dado que… Infere-se que…
Uma vez que… Conclui-se que…
Devido a… É por essa razão que…
Como… Daí que…
Ora… Assim…
Em virtude de… Isso prova que…

Consultar pág. 39, manual


- Identifica a(s) premissa(s) e a conclusão dos argumentos e reescreve-os na sua forma canónica ou padrão.

1-
Uma vez que é uma atividade física, o desporto é
saudável. Como se sabe, a atividade física é saudável.

2-
O Universo não é infinito. Com efeito, se o
Universo fosse infinito, a força da gravidade não
existiria. Ora, a força da gravidade existe.
Indicadores de premissa e de conclusão – exemplos

Uma vez que é uma atividade física, o desporto é Proposição 1 – O desporto é atividade física.
saudável. Como se sabe, a atividade física é Proposição 2 – O desporto é saudável.
saudável. Proposição 3 – A atividade física é saudável.

Indicadores de premissa A atividade física é saudável.


O desporto é atividade física.
Logo, o desporto é saudável.

Indicador de conclusão

Argumento na forma canónica


Proposição 1 – O Universo não é infinito.
O Universo não é infinito. Com efeito, se o Universo
Proposição 2 – Se o Universo fosse infinito, a força da
fosse infinito, a força da gravidade não existiria.
gravidade não existiria.
Ora, a força da gravidade existe.
Proposição 3 – A força da gravidade existe.

Se o Universo fosse infinito, a força da gravidade não


Indicadores de premissa existiria.
A força da gravidade existe.
Logo, o Universo não é infinito.

Indicador de conclusão
Exercício:

- Identifica a(s) premissa(s) e a conclusão dos argumentos e reescreve-os na sua forma canónica ou
padrão.

1- Os asiáticos são crentes. Além disso, os asiáticos são corajosos. Por isso, os crentes são
corajosos.

2- “Uma vez que o universo existe e não pode ter sido criado a partir do nada, teve de ser criado
por uma força inteligente.”

3- Se tudo está determinado, então não há livre-arbítrio. Mas há livre-arbítrio. Por conseguinte
nem tudo está determinado.

4- Os filósofos querem ser justos, pois são pessoas bondosas, e todas as pessoas bondosas
querem ser justas.
Correção
1- 1-
Premissas: Os asiáticos são crentes / os asiáticos são corajosos Premissas: Se tudo está determinado, então não há livre-arbítrio / há livre-
arbítrio.
Conclusão: Os crentes são corajosos
Conclusão: Nem tudo está determinado

Forma canónica:
Forma canónica:
(Todos) os asiáticos são corajosos.
Se tudo está determinado, então não há livre-arbítrio.
(Todos) os asiáticos são crentes.
há livre-arbítrio.
Logo, (todos) os crentes são corajosos.
Logo, nem tudo está determinado.

2-
1-
Premissas: O universo existe / o universo não foi criado a partir do nada.
Premissas: Os filósofos são pessoas bondosas / todas as pessoas bondosas
Conclusão: O universo foi criado por uma força inteligente querem ser justas.
Conclusão: Os filósofos querem ser justos.
Forma canónica:
Tudo o que existe foi criado por uma força inteligente. Forma canónica:
O universo existe. Todas as pessoas bondosas querem ser justas.
Logo, o Universo foi criado por uma força inteligente. Os filósofos são pessoas bondosas.
Logo, os filósofos querem ser justos.
Clarificar argumentos

Identificar premissas omitidas:


 Se alguma proposição relevante para a análise
do argumento estiver omitida, deves revelá-la.

• A filosofia exige reflexão crítica,


portanto promove a nossa autonomia

Um argumento com premissa omissa, designa-se entimema.


Clarificar argumentos

Identificar premissas omitidas:


 Se alguma proposição relevante para a análise do argumento estiver
omitida, deves revelá-la.

• A filosofia exige reflexão crítica, a 1) A filosofia exige reflexão crítica.


reflexão crítica promove a nossa 2) A reflexão crítica promove a nossa
autonomia, portanto promove a nossa autonomia.
3) Logo, a filosofia promove a nossa
autonomia.
autonomia.

Realiza o exercício 1 da página 41, do manual.


Tipos de
argumentos
Tipos de argumentos

Argumentos dedutivos Argumentos não-dedutivos

Argumentos em que se pretende que as premissas Argumentos em que se pretende que as premissas
forneçam um apoio decisivo ou uma garantia para a forneçam um apoio provável – mas não decisivo –
conclusão. Podem ser válidos ou inválidos. para a conclusão. Podem ser fortes ou fracos.

A validade ou invalidade depende essencialmente da A força ou fraqueza depende de aspetos que


forma lógica dos argumentos. ultrapassam a forma lógica dos argumentos.

Exemplo:
Exemplo:
Todos os animais respiram.
Todos os cães que observámos até hoje ladravam.
Os cães são animais.
Logo, o próximo cão que observarmos ladrará.
Logo, os cães respiram.
Argumentos dedutivos

Argumento válido Argumento inválido

Argumento em que as premissas fornecem um Argumento em que as premissas não apoiam a


apoio decisivo ou uma garantia para a conclusão, isto é, não a garantem, sendo possível
conclusão, sendo impossível que as premissas que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão
sejam verdadeiras e a conclusão falsa (regra). falsa.

Exemplo: Exemplo:
Todos os jovens são estudantes. Todos os jovens são estudantes.
Todos os escuteiros são jovens. Todos os escuteiros são estudantes.
Logo, todos os escuteiros são estudantes. Logo, todos os escuteiros são jovens.

Todos os F são G. Todos os F são G.


Forma Forma
válida
Todos os H são F. Todos os H são G. inválida
Logo, todos os H são G. Logo, todos os H são F.
Pode haver argumentos dedutivos válidos com premissas e conclusão falsas.

Todos os portugueses são pintores.


Bertrand Russell é português. Neste caso, a verdade é presumida.
Logo, Bertrand Russell é pintor.

Pode haver argumentos dedutivos inválidos com premissas e conclusão


verdadeiras.

Todos os naturais de Lisboa são portugueses.


Fernando Pessoa é português. Neste caso, falha o nexo lógico entre
Logo, Fernando Pessoa é natural de Lisboa. premissas e conclusão.
Argumentos não-dedutivos

Argumento forte Argumento fraco

Argumento em que as premissas oferecem um Argumento cujas premissas não têm força
forte apoio à conclusão, sendo improvável, suficiente para apoiar a conclusão, sendo
mas não impossível, haver premissas improvável que a conclusão seja verdadeira
verdadeiras e conclusão falsa. mesmo que as premissas sejam verdadeiras.

Exemplo: Exemplo:
Até agora, a Terra girou sempre em redor do seu Algumas pessoas gostam de ler Camões e Eça
próprio eixo. de Queirós.
Logo, também amanhã a Terra girará em redor Logo, todas as pessoas gostam de ler Camões e
do seu próprio eixo. Eça de Queirós.
ARGUMENTOS NÃO
DEDUTIVOS

A sua força depende de aspetos que vão para lá da forma lógica do argumento.

Argumentos indutivos Argumentos de


Argumentos por analogia
(generalizações e previsões) autoridade
Argumentos bons

Argumento dedutivo bom Argumento não-dedutivo bom


(argumento sólido) (argumento cogente)

Argumento válido constituído por premissas Argumento forte constituído por premissas
verdadeiras (sólido) e mais plausíveis do verdadeiras e mais plausíveis do que a
que a conclusão. conclusão.

Exemplo: Exemplo:
Todos os lisboetas são europeus. Todos os seres humanos observados até hoje eram
Fernando Pessoa é lisboeta. mamíferos.
Logo, Fernando Pessoa é europeu. Logo, todos os seres humanos são mamíferos.
Argumentos maus

Argumento (dedutivo ou não-dedutivo) que não cumpre algum dos requisitos que caracterizam
os argumentos bons.

Muitos maus argumentos são considerados falácias.

Falácia
Formais Informais
Argumento que parece correto
ou adequado, do ponto de vista
formal ou informal, mas de
Resultam de aspetos
Resultam apenas da facto não é correto nem
informais, sendo
forma lógica, sendo adequado.
cometidas ao nível dos
cometidas ao nível dos Sofisma – se a falácia for intencional. argumentos dedutivos e
argumentos dedutivos.
não-dedutivos.
Paralogismo – se a falácia não for
intencional.
Exercício 1:
1- Considera os seguintes enunciados.
A. É verdade que alguns políticos usam argumentos falaciosos. Isto porque os bons oradores são políticos, e alguns bons
oradores usam argumentos falaciosos.
B. O paradoxo do relógio é um paradoxo da teoria da relatividade geral e restrita.
C. Sabe-se que as sardinhas vivem no mar e são peixes. Por isso, todos os animais que vivem no mar são peixes.
D. Muitas pessoas perguntam se a vida tem sentido. A relva é verde. Logo à noite vou ler o Timeu.
E. É certo que as pessoas que são a favor da criogenia querem ser imortais; mas nem todas as pessoas são a favor da
criogenia. Daí haver pessoas que não queiram ser imortais.

1.1. Indica, justificando, quais dos enunciados apresentados expressam


argumentos e quais os que não expressam argumentos.

1.2. Identifica, colocando-as na sua forma canónica, as premissas e a conclusão


dos argumentos indicados na questão 2.1.
Exercício 2:
1- Pronuncie-se sobre a validade e a solidez dos argumentos dedutivos que se seguem. Justifique a sua
resposta.
Argumento 1
Todos os portugueses são engenheiros.
Todos os parisienses são portugueses.
Logo, todos os parisienses são engenheiros.

Argumento 2
Pavarotti é um cantor.
Todos os tenores são cantores.
Logo, Pavarotti é italiano.

Argumento 3
Todos os homens são mortais.
O Cristiano é homem.
Logo, o Cristiano é mortal.

2- Todo o argumento válido é sólido? Justifica, apresentando exemplos.

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