Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Apostila Etica Profissional Na Sociedade Contemporanea
Apostila Etica Profissional Na Sociedade Contemporanea
CONTEMPORÂNEA
2
ÉTICA PROFISSIONAL NA SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA
DÚVIDAS E ORIENTAÇÕES
editorafamart@famart.edu.br
TUTORIA ONLINE
Segunda a Sexta de 09:30 às 17:30
Acesse a aba Tutoria EaD em seu portal do aluno.
3
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 3
2 ÉTICA COMO FUNDAMENTO SOCIAL .................................................. 10
3 ÉTICA PROFISSIONAL E SUAS TENDÊNCIAS SOCIAIS ..................... 17
3.1 Ética profissional: quando se inicia esta reflexão? ............................ 19
3.2 Ética profissional: como é esta reflexão? ............................................ 20
3.3 Ética profissional e relações sociais .................................................... 21
3.4 Ética profissional e atividade voluntária .............................................. 22
3.5 Ética profissional: pontos para sua reflexão ....................................... 22
3.6 Sigilo de Informações ............................................................................ 24
4 ÉTICA PROFISSIONAL NO CAMPO ARISTOTÉLICO ........................... 25
4.1 Ética na sociedade brasileira ................................................................ 27
4.2 O meio profissional e empresarial ........................................................ 29
5 ÉTICA DO DISCURSO EM JÜRGEN HABERMAS: A IMPORTÂNCIA DA
LINGUAGEM PARA UM AGIR COMUNICATIVO................................... 31
5.1 Significado do discurso para Habermas .............................................. 32
5.2 Ética do discurso e a importância do agir comunicativo.................... 33
5.3 Os valores morais na modernidade ...................................................... 39
5.4 Relação entre os valores vigentes na sociedade e os valores que regem
os grupos particulares .......................................................................... 42
5.5 Características da ética profissional hoje ............................................ 44
ENCERRAMENTO ................................................................................... 49
REFERÊNCIAS ........................................................................................ 50
1 INTRODUÇÃO
A ética tem sido um dos temas mais trabalhados nos últimos tempos, pois
a corrupção, o descaso social e os constantes escândalos políticos e sociais
expostos na mídia diariamente suscitam que a sociedade exija o resgate de
valores morais em todas as suas instâncias, sejam elas políticas, científicas ou
econômicas. Desse conflito de interesses pelo bem comum ergue-se a ética, tão
discutida pelos filósofos de toda a história mundial. Ética é uma palavra com duas
origens possíveis. A primeira advém do grego éthos, literalmente "com e curto",
que pode ser traduzida por "costume"; a segunda também se escreve éthos,
porém se traduz por "com e longo", que significa "propriedade do caráter". A
primeira serviu de base para a tradução latina moral, enquanto que a segundaé
a que, de alguma forma, orienta a utilização atual que damos à palavra ética. O
vocábulo foi assimilado à língua portuguesa por intermédio do latim.
O primeiro registro de seu uso é do século XV. Conceitua-se ética como
sendo o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana, do ponto
de vista do bem e do mal. É um conjunto de normas e princípios que norteiam a
boa conduta do ser humano. A ética é a parte da filosofia que aborda o
comportamento humano, seus anseios, desejos e vontades. É a ciência da
conduta humana perante o ser e seus semelhantes e de uma forma específica
de comportamento humano, envolvendo estudos de aprovação ou desaprovação
da ação dos homens. É a consideração de valor como equivalente de uma
medição do que é real e voluntarioso no campo das ações virtuosas. Ela ilumina
a consciência humana, sustenta e dirige as ações do homem, norteando a
conduta individual e social. Como um produto histórico-cultural, define em cada
cultura e sociedade o que é virtude, o que é bom ou mal, certo ou errado,
permitido ou proibido.
Segundo Heller (1999, p. 29), "ética é a ciência normativa dos
comportamentos humanos". Já Maximiano a define como:
3
em consideração os entendimentos presentes na sociedade ou em
agrupamentos sociais particulares. (MAXIMIANO, 1974, p. 28)
4
insistindo em sua política, enquanto aumentavam as pressões internacionais,
especialmente, dos países interessados em rastrear a lavagem de dinheiro das
drogas ou recuperar o que lhes havia sido roubado. Para as autoridades desses
países, a ética absoluta dizia que o sigilo era intrinsecamente errado, uma vez
que protegia dinheiro obtido de forma desonesta. Finalmente, as autoridades
suíças concordaram em revelar a origem dos depósitos e iniciar negociações
visando à devolução do dinheiro para os seus donos (ORIVES, 2008). É possível
perceber que os valores predominantes na sociedade brasileira, refletidos nas
práticas de seus governantes e políticos, são fatores determinantes para a
qualidade dos serviços públicos. Ilusões e esperanças têm se desmoronado e é
possível distinguir três fatores responsáveis por esta questão.
Antes de tudo, destaque-se que cada um carrega consigo mesmo uma
hierarquia abstrata de valores que orienta suas escolhas. Pode colocar no ápice
da cadeia hierárquica a solidariedade, a comunhão, o interesse público ou, em
vez disso, a rivalidade ostensiva, o individualismo exacerbado e o interesse
pessoal. Em segundo lugar, possui uma visão, mais ou menos esquemática, das
forças em competição, avaliando as que se sintonizam com seus valores,
opondo-se e rejeitando aquelas que se afastam de si. Esses dois fatores são
condicionados por um terceiro: o fluxo de informações que se registram no
cérebro humano. A globalização da informação pode conduzir à desinformação
à medida que a agilidade e a rapidez desse fluxo, além de sua quantidade em
prejuízo da qualidade, levem administradores públicos a filiar-se a forças
destruidoras de seus valores, impedindo sua realização.
A ética pode ser interpretada como um termo genérico que designa aquilo
que é frequentemente descrito como a "ciência da moralidade". Seu significado,
derivado do grego, quer dizer "Morada da Alma", isto é, suscetível de qualificação
do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinadasociedade,
seja de modo absoluto.
Em Filosofia, o comportamento ético é aquele que é considerado bom.
Sobre a bondade, os antigos diziam que o que é bom para a leoa, não pode ser
bom à gazela. E o que é bom à gazela, fatalmente não será bom para a leoa.
Este é um dilema ético típico. Portanto, no campo filosófico, a ética, ao lado da
5
metafísica e da lógica, não pode ser descrita de forma simplista. O objetivo de
uma teoria da ética é determinar o que é bom tanto para o indivíduo como para
a sociedade como um todo. Os filósofos antigos adotaram diversas posições na
definição do que é bom: como lidar com as prioridades em conflito dos indivíduos
versus o todo, e a universalidade dos princípios éticos versus a "ética de
situação". Nesta, o que está certo depende das circunstâncias e não de uma lei
geral qualquer. E ainda se a bondade é determinada pelos resultados da ação
ou pelos meios pelos quais os resultados são alcançados.
O homem vive em sociedade, convive com outros homens e, portanto,
cabe lhe pensar e responder à seguinte pergunta:
6
dada de uma vez para sempre, mas tem de considerá-la como um aspecto da
realidade humana mutável com o tempo. Mas a moral é histórica precisamente
porque é o modo de um ser - o homem - se comportar, uma vez que é histórico
por natureza, ou seja, é um ser cuja característica é a de estar-se fazendo ou se
autoproduzindo constantemente, tanto no plano de sua existência material,
prática, como no de sua vida espiritual (ibid.).
A moral independe das fronteiras geográficas, que garante uma
identidade entre pessoas que não se conhecem, mas utilizam o mesmo
referencial moral comum. "Nenhum homem é uma ilha." Esta famosa frase do
poeta inglês do século XVI John Donne ajuda-nos a compreender que a vida
humana é convívio. Para o ser humano, viver é conviver. É justamente na
convivência, navida social e comunitária, que o ser humano se descobre e se
realiza enquanto um ser moral e ético. É na relação com o outro que surgem os
problemas e as indagações morais: o que devo fazer? Como agir em
determinada situação? Como comportar-me perante o outro? Diante da
corrupção e das injustiças, o que fazer? Constantemente no nosso cotidiano nos
defrontamos com problemasmorais.
São problemas práticos e concretos da nossa vida em sociedade, ou seja,
problemas que dizem respeito às nossas decisões, escolhas, ações e
comportamentos - os quais exigem uma avaliação, um julgamento, um juízo de
valor entre o que é socialmente considerado pela moral vigente bom ou mal,
justo ou injusto, certo ou errado.
A sociedade brasileira é historicamente marcada pela injustiça
socioeconômica, pelo preconceito racial e sexual, pela exploração da mão-de-
obra infantil, pelo "jeitinho brasileiro", pela "Lei de Gerson", etc. Tal realidade,
nos coloca diante de problemas éticos bastante sérios. Contudo, já estamos por
demais acostumados com nossas misérias de toda ordem. Na vida pública,
exemplos não faltam na nossa história recente: anões do orçamento,
impeachment de presidente por corrupção, compra de parlamentares para a
reeleição e para apoio ao governo, compra de ambulâncias superfaturadas,
"caixa dois" de campanhas eleitorais, máfia do crime organizado, desvio de
dinheiro público, entre outros.
7
Os princípios éticos são normas que nos obrigam a agir em função do
valor do bem visado pela nossa ação, ou do objetivo final que dá sentido à vida
humana; e não de um interesse puramente subjetivo, que não compartilhamos
com comunidade. Esse valor objetivo deve ser considerado em todas as suas
dimensões: no indivíduo, no grupo ou classe social, no povo, ou na própria
humanidade. O alcance dos princípios éticos é ilimitado: na História, eles tendem
a alcançar uma vigência universal. A qualidade própria dos princípios éticos nada
mais é, na verdade, que uma decorrência lógica do fato de se fundarem na
dignidade da pessoa humana, vista como componente essencial para a vida
social. A classificação desses princípios obedece à sua ordem de abrangência.
O respeito à dignidade da pessoa humana deve abrangê-la em todas as
suas dimensões: em cada indivíduo, com a sua característica irredutível de
qualidade; em cada grupo social; no interior dos povos politicamente
organizados; em cada povo ou nação independente, nas relações internacionais;
na reunião de todos os povos do mundo numa unidade política suprema em
construção. É igualmente em todas as dimensões da pessoa humana que atuam
os princípios fundamentais da verdade, da justiça e do amor, desdobrando-se
especificamente, nos princípios de liberdade, igualdade, segurança e
solidariedade. A norma técnica se alicerça na dignidade da pessoa humana
como componente principal para a convivência em sociedade, diferenciando-se
de regra técnica, que diz respeito aos meios aptos a se conseguir determinado
resultado que, obviamente desejado pelo agente, pode ser bom ou mau para
outros indivíduos ou para a coletividade em geral. A regra técnica, considerada
em si mesma, é eticamente neutra.
Kant bem salientou que:
8
o fim último visado pelo agente e o seu valor, relativamente a outras pessoas
que com ele se relacionam, ou em relação à coletividade. Na perspectiva técnica,
o agente deve atuar de certa maneira para poder obter o efeito por ele desejado,
não necessariamente valioso à coletividade. No ambiente ético, o agente deve
agir em vista de determinadas finalidades consideradas obrigatórias para todos,
e o seu modo de agir há de adaptar-se ao valor ético dos fins visados.
Na presente apostila, iremos abordar a ética, como fundamento social, as
suas variações e possibilidades de uso no contexto da sociedade
contemporânea. Iremos também trabalhar, especificamente, o conceito de Ética
profissional, bem como a sua importância para as relações sociais consolidadas
no contexto em que o sujeito está inserido.
9
2 ÉTICA COMO FUNDAMENTO SOCIAL
Deve-se, pois, antes de tudo, estar de acordo sobre o gênero de vida que
todos os homens – para servir-me desta expressão – devem preferir, e depois
resolver se esse gênero de vida é o mesmo para os indivíduos em particular e
para sociedade em geral. (ARISTÓTELES, 2009, p. 229-230, grifo nosso).
Diremos, em princípio, os fundamentos culturais da sociedade são sua
essência elementar. Identificar essa essência faz com que consigamos observar
sedimentos de valores ou virtudes de outras épocas preservados na atualidade.
Ainda que não aprovemos esses valores ou virtudes como harmonias em relação
aquilo considerado por nós como moral ou ético, o comportamento ou a conduta
recorrente do povo pode revelar essa contradição. Daí a necessidade de se ter
em mente (ou se buscar) os motivos, a condição de mobilidade histórica como
registro dos fatos que mantiveram inalterado determinado comportamento em
detrimento da evolução material concreta e condicionada como elemento que dá
importância à preservação de certos fundamentos sociais, dentre eles, a ética.
10
dos quais se poderia ainda criar um simulacro de história, quando
muito. (MARX, 2006c, p. 103)
11
imanência é a representação da singularidade ligada a subjetividade humana
não pode ser indutiva para a coletividade sem que seja antes algo que opere na
realidade de valores como possibilidade comum, em que pesem as contradições
adstritas da sociedade capitalista. Contradições essas, cada dia maisacentuadas
e ascendentes.
O homem tem sua humanidade integrada quando o ente social incorpora
em si virtudes cujas características podem ser presenciadas em sua
individualidade. O significado dessa percepção faz que o homem se estabeleça
e seja notado a partir de si e daí se transforme juntamente de suas próprias
produções e transformações que o caracterizam como ser racional e
materializador da história. É no trabalho e com ele que essa condição vigora
como precursora e instrumento (ao mesmo tempo) de mudanças da natureza.
12
Com a desigualdade de bens tornou-se possível a apropriação privada
dos bens ou produtos do trabalho alheio, bem como o antagonismo
entre pobres e ricos. Do ponto de vista econômico, o respeito pela vida
dos prisioneiros de guerra, que eram poupados do extermínio para
serem convertidos em escravos, transformou-se numa necessidade
social. Com a decomposição do regime comunal e o aparecimento da
propriedade privada, foi-se acentuando a divisão de homens livres e
escravos. A propriedade – dos proprietários de escravos, em particular
– livrava da necessidade de trabalhar. O trabalho físico acabou por se
transformar numa ocupação indigna de homens livres. Os escravos
viviam em condições espantosas e arcavam com o trabalho físico,
particularmente o mais duro. […] Os escravos não eram pessoas, mas
coisas, e, como tais, seus donos podiam comprá-los, vendê-los,
apostá-los nos jogos de cartas ou inclusive matá-los. (SÁNCHEZ
VÁZQUEZ, 1993, p. 30).
13
irracionais. Como se as condições evolutivas do gênero humano se repetissem,
fossem estacionárias, primitivas, admitindo-se (ainda) que suas necessidades se
limitassem à nutrição e às sensações condizentes ao alívio da dor e ao estímulo
do prazer.
As virtudes têm a ver com ações e paixões e toda paixão e toda ação
são acompanhadas por prazer e dor, isso constitui uma demonstração
adicional de que a virtude diz respeito ao prazer e à dor. Os seres
humanos se corrompem através de prazeres e dores, a saber, quer
perseguindo e evitando os prazeres e dores equívocos, quer os
14
perseguindo e evitando no momento equívoco, ou da maneira
equívoca, ou em um dos outros meios equívocos entre os quais erros
de conduta podem ser logicamente classificados […]. A suposição de
que a virtude moral é a qualidade segundo a qual se age da melhor
forma em relação aos prazeres e dores e que o vício é o oposto.
(ARISTOTELES, 2002, p. 68-69)
15
levarmos em conta (pelo menos), às condições de subsistência, concordaremos
que a forma como certos trabalhadores são tratados, suas condições
degradadas de trabalho e de saúde, a invisibilidade social em que vivem, são
condizentes quando muito (direta e objetivamente) à (sub)existência nos polos
de exclusão ou 85 de indigência marginal consentida e mantida sob a
subserviência social do Estado regido pela lógica do poder capitalista. No
entanto, visando estabelecer uma primeira abordagem à ética como fundamento
social, é importante lançarmos um olhar naquilo que Aristóteles (2009, p. 253-
254) considera como as “três coisas fazem os homens bons e virtuosos: a
natureza, os costumes e a razão”.
16
3 ÉTICA PROFISSIONAL E SUAS TENDÊNCIAS SOCIAIS
O homem nem sempre pode o que quer, nem quer sempre o que pode.
Ademais, sua vontade e seu poder não concordam com seu saber.
Quase sempre as circunstâncias externas determinam a sua sorte.
(D’HONDT, 1966, p. 105).
17
a ética como condição essencial para o exercício de qualquer profissão. A ética
é indispensável ao profissional, porque na ação humana “o fazer” e “o agir” estão
interligados. O fazer diz respeito à competência, à eficiência que todo profissional
deve possuir para exercer bem a sua profissão. O agir se refere à conduta do
profissional, ao conjunto de atitudes que deve assumir no desempenho de sua
profissão. Tanto a moral como o direito baseiam-se em regras que visam
estabelecer certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, se
diferenciam. A moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como
uma forma de garantir o seu bem-viver. Independe das fronteiras geográficas e
garante uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam
este mesmo referencial moral comum.
O direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada
pelas fronteiras do Estado. As leis têm uma base territorial, que valem apenas
para a área geográfica onde uma determinada população ou seus delegados
vivem. A ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo
ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos seus objetivos é a busca de
justificativas para as regras propostas pela Moral e pelo Direito. Ela é diferente
de ambos – Moral e Direito – pois não estabelece regras. É extremamente
importante saber diferenciar a Ética da Moral e do Direito. Estas áreas de
conhecimento se distinguem, porém, têm grandes vínculos e até mesmo
sobreposições. Tanto a Moral como o Direito baseiam-se em regras que visam
estabelecer uma certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém,
se diferenciam. A Moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa,
como uma forma de garantir o seu bem-viver. A Moral independe das fronteiras
geográficas e garante uma identidade entre pessoas que sequer se conhecem,
mas utilizam este mesmo referencial moral comum.
O Direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada
pelas fronteiras do Estado. As leis têm uma base territorial, elas valem apenas
para aquela área geográfica onde uma determinada população ou seus
delegados vivem. Alguns autores afirmam que o Direito é um subconjunto da
Moral. Esta perspectiva pode gerar a conclusão de que toda a lei é moralmente
aceitável. Inúmeras situações demonstram a existência de conflitos entre a Moral
18
e o Direito. A desobediência civil ocorre quando argumentos morais impedem
que uma pessoa acate uma determinada lei. Este é um exemplo de que a Moral
e o Direito, apesar de referirem-se a uma mesma sociedade, podem ter
perspectivas discordantes.
A Ética é o estudo geral do que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo
ou injusto, adequado ou inadequado. Um dos objetivos da Ética é à busca de
justificativas para as regras propostas pela Moral e pelo Direito. Ela é diferente
de ambos, pois não estabelece regras. Esta reflexão sobre a ação humana é que
caracteriza a Ética.
19
apareceu como emprego”, por precisar trabalhar, o fato de exercer atividade
remunerada onde não pretende seguir carreira, não isenta da responsabilidade
de pertencer, mesmo que temporariamente, a uma classe, e há deveres a
cumprir. Um jovem que, por exemplo, exerce a atividade de auxiliar de
almoxarifado durante o dia e, à noite, faz curso de programador de
computadores, certamente estará pensando sobre seu futuro em outra profissão,
mas deve sempre refletir sobre sua prática atual.
20
disponível, talvez sorrir, ser agradável, a maioria das pessoas que você atende
também serão assim com você, e seu dia será muito melhor.
Muitas oportunidades de trabalho surgem onde menos se espera, desde
que você esteja aberto e receptivo, e que você se preocupe em ser um pouco
melhor a cada dia, seja qual for sua atividade profissional. E, se não surgir, outro
trabalho, certamente sua vida será mais feliz, gostando do que você faz e sem
perder, nunca, a dimensão de que é preciso sempre continuar melhorando,
aprendendo, experimentando novas soluções, criando novas formas de exercer
as atividades, aberto a mudanças, nem que seja mudar, às vezes, pequenos
detalhes, mas que podem fazer uma grande diferença na sua realização
profissional e pessoal. Isto tudo pode acontecer com a reflexão incorporada a
seu viver. E isto, é parte do que se chama empregabilidade: a capacidade que
você pode ter de ser um profissional que qualquer patrão desejaria ter entre seus
empregados, um colaborador. Isto é, ser um profissional eticamente bom.
21
fazem parte do comprometimento do profissional em ser eticamente correto,
aquele que, independente de receber elogios, faz a coisa certa.
22
Competência técnica, aprimoramento constante, respeito às pessoas,
confidencialidade, privacidade, tolerância, flexibilidade, fidelidade, envolvimento,
afetividade, correção de conduta, boas maneiras, relações genuínas com as
pessoas, responsabilidade, corresponder à confiança que é depositada em você.
Comportamento eticamente adequado e sucesso continuado são indissociáveis.
23
3.6 Sigilo de Informações
24
4 ÉTICA PROFISSIONAL NO CAMPO ARISTOTÉLICO
25
Então, seguindo a concepção do realismo aristotélico de que uma ordem
subjacente rege as coisas, a virtude aparece como a medida determinada por
esta ordem e pelos fins que a sobre determinam visando o desenvolvimento
pleno do ser humano.
Costuma-se dizer que nada há que acrescentar nem tirar nas coisas
bem-feitas, considerando-se que o excesso ou a falta destrói a
perfeição e a justa medida a conserva [...]. E a virtude que é mais
perfeita e melhor que toda a arte, do mesmo modo que a natureza,
tenderá para o meio. [...] Chamo meio da coisa o igualmente distante
dos extremos, que é um e idêntico para todos, meio a respeito de nós,
o que não é excesso nem falta. E este não é único nem idêntico para
todos. (ARISTÓTELES, 2009)
[...] a virtude está em nosso poder, do mesmo modo que o vício, pois
quando depende de nós o agir, também depende o não agir, e vice-
versa. de modo que quando temos o poder de agir quando isso é nobre,
também temos o de não agir quando é vil; e se está em nosso poder o
não agir quando isso é nobre, também está o agir quando isso é vil.
logo, depende de nós praticar atos nobres ou vis, e se é isso que se
26
entende por ser bom ou mau, então depende de nós sermos virtuosos
ou viciosos. (ARISTÓTELES, 2009)
27
particulares age dentro da mesma lógica, por exemplo, furar fila em bando? Ou
pagar propina para receber a carteira de motorista sem fazer o teste? Comprar
o voto de eleitores "inconscientes" ou "indecentes" por meio de programas
assistencialistas? Assim como, vender a sua cidadania e perder a sua dignidade
em prol de quantias irrisórias e ou a obtenção de uma subsistência pelo menor
esforço? Outro exemplo desta inversão: hoje, interpretar a criminalidade como
principal causa da exclusão social e da heterogeneidade na concentração de
renda é entender apenas parte da dimensão desta realidade, devido a estas não
serem causas e sim, consequências.
O problema da exclusão não é somente social, é, principalmente, moral.
Pois, vemos que, não é a vontade de seguir em conformidade com normas de
conduta ética ou leis estabelecidas para a sociedade que faz com que os
cidadãos brasileiros se comportem como espera o meio social, e sim, o medo de
sansões punitivas originárias de desvios de conduta.
Neste quadro, seguem "impregnados" na rotina dos brasileiros,
novamente sem generalismo, atos imorais e antiéticos, o que não concede
direitos de julgamento e crítica a transgressões corruptas em qualquer ordem
social, pois o "jeitinho brasileiro" também se configura inserido numa moral
oportunista, onde o individualismo ampara o interesse do triunfo conveniente em
detrimento do interesse do outro ou da coletividade. Passando o Brasil a carregar
consigo a imagem de uma sociedade corruptora e corruptível, descrente das
práticas virtuosas de seu povo e das suas instituições.
Contudo, existem os íntegros em que se pode confiar; àqueles que não
pensam egoisticamente, que se incomodam com o rompimento dos valores
éticos e morais na dinâmica das relações sociais. E, ainda, no íntimo ou
explicitamente, ninguém quer ser flagrado em desvios de conduta, transgredindo
a posturas esperadas pela coletividade a que está inserido, ou a valores culturais
preestabelecidos. É a partir desta moral da integridade que se emoldura o
homem virtuoso, honesto, leal, idôneo, amparado por uma postura ética
fundamentada nos princípios aristotélicos para a busca da convivência
harmônica do ser com seu meio em prol do bem individual e comum.
28
4.2 O meio profissional e empresarial
29
maximize a responsabilidade social e ambiental das organizações, a fim de
afirmar uma imagem de comprometimento com o futuro da coletividade e do bem
comum para desenvolvimento e sustentabilidade tanto da instituição quanto de
sua relação com o meio inserido.
Enfim, a ética empresarial condiz com um valor da organização que
proporciona sua reputação e, consequentemente, seus bons resultados. A ética
empresarial é "[...] o comportamento da empresa - entidade lucrativa - quando
ela age de conformidade com os princípios morais e as regras do bem proceder
aceitas pela coletividade (regras éticas)". (MOREIRA, 1999)
30
5 ÉTICA DO DISCURSO EM JÜRGEN HABERMAS: A IMPORTÂNCIA DA
LINGUAGEM PARA UM AGIR COMUNICATIVO
31
5.1 Significado do discurso para Habermas
O outro passo dado na Ética pensada por Habermas é tirar a razão como
sendo o centro do julgamento e colocando o diálogo como possibilidade de
entendimento para os debates. Isso para não se cair em uma filosofia da
consciência que incorre em solipsismo, quando uma consciência estaria
adequada para projetar normas. Para Habermas o sentido das tradições deve
ser antes de tudo, compartilhada em um diálogo consensual para que se chegue
a leis com validade universal.
É na argumentação que acontece a troca de ideias, no diálogo que surge
o consenso em meio a tantos pensamentos. Aqui conta basicamente a
intersubjetividade de entendimento que se desenvolve na rede comunicativa
política. E na busca pelo sentido da verdade na ética do discurso, o diálogo deve
32
estar isento de qualquer ato de dominação, pois o consenso deve ser racional
onde ambas as partes devem ser ouvidas. Vale ressaltar que a participação deve
ser ativa e não de meros participantes que se deixam conduzir por diálogos que
não condizem que a validade das normas éticas da comunidade. A
argumentação deve estar desprovida de qualquer barganha ou incentivo
negativo ligado à regalia. Dessa forma, a argumentação não está ligada com a
consciência subjetiva, mas com ideia coletiva, onde os participantes discutem
sobre o dever moral de maneira a facilitar a existência do consenso.
33
que tais argumentos tenham validade. O agir comunicativo por sua vez vai dar
possibilidades a existência da validade das normas dentro da comunidade e
possibilita uma ética ligada à linguagem. Assim, a ética discursiva de Habermas
se torna dependente da linguagem exercida pelos participantes, pois é diante da
linguagem coordenada que se compreende e se chega ao entendimento mútuo.
Habermas (1990, p. 72), coloca que “uma vez que o agir comunicativo
depende do uso da linguagem dirigida ao entendimento, ele deve preencher
condições mais rigorosas”. E a partir dessas condições os participantes discutem
suas ideias e fazem suas argumentações deliberando um planejamento de
ações e normas. Apesar de a linguagem ter participação na ética discursiva
habermasiana, não é qualquer discurso que se torna válido e nem muito menos
qualquer participação por parte dos falantes. Tal ação deve ser coordenada e
exercida racionalmente. Vale lembrar que a razão comunicativa aqui empregada,
não é mesma razão expressa por Kant, quando o mesmo coloca a ação moral
sobre a parte subjetiva. Em relação à maneira como deve ser apreendida à ação
exercida sobre as questões normativas, Habermas esclarece, e faz a distinção
entre o agir comunicativo e o agir estratégico:
34
mas na própria ação comunicativa que se desenrola em “força racional
motivadora de atos de entendimento” (HABERMAS, 1990, p. 72).
Diante disso, é na razão comunicativa que surge um acordo pautado no
consenso. Essas argumentações são desenvolvidas através do conhecimento
moderno de mundo, frente à existência de uma sociedade com seres coerentes,
mas com princípios segmentados pelo pluralismo desenvolvido dentro de cada
espaço, sendo dessa maneira não inevitável, mas às vezes acaba por ser
desejável, principalmente de acordo com modelos de vida específicos,
desenvolver um ponto de vista moral, onde os interlocutores possam definir as
ações de maneira cooperativa. De acordo com Lubenow:
35
força para a existência de uma ética do discurso mostra como deve agir os
participantes e como o entendimento mútuo através da linguagem acontece.
Essa razão comunicativa proporciona assim, por se dizer,
responsabilidade comunicativa por parte de cada indivíduo em relação ao outro.
É diante das falas dos participantes que dá sentido à validade das normas e
reconhecimento intersubjetivo. É cooperação e não em uma razão meramente
subjetiva que se encontra a válida ou critério de verdade das normas. A busca
pela validade da ação moral em Habermas não está em um sujeito isolado, mas
no sujeito se relacionando com outro sujeito, existindo assim, a
intersubjetividade. A ética do discurso não é embasada em um só individuo, mas
na coletividade e na cooperação entre os indivíduos.
Com isso, passa a se ter uma ideia de ética coletiva e normas escolhidas
por todos sem uma força externa à comunidade e sem espaço para que um
participante se interponha sobre o outro. Daí, pode-se dizer que existe na teoria
ética habermasiana cooperação, solidariedade e uma vida que tem como
pretensão o bem.
Quanto a isso, comenta Zanella (2012, p. 134), Habermas traz “uma
proposta de uma ética do viver bem, da felicidade e da solidariedade entre os
indivíduos capazes de linguagem e ação”. Assim, essa ética foge dos moldes de
uma ética meramente instrumental e passa a ser uma ética que tem a linguagem
como pressuposto importante para a ação e comunicação para se chegar a uma
moral dentro do agir comunicativo.
O pensamento de Habermas sobre a argumentação comunitária parte do
pensamento de Apel, visando uma fundamentação universalizada que possibilite
leis morais escolhidas dentro de um âmbito democrático, onde todos os sujeitos
poderão dar suas opiniões. Habermas retoma o pensamento sobre a ética do
discurso de Karl-Otto Apel, onde o discurso dentro de uma comunidade é levado
a sério. Assim, a linguagem tornaria o discurso de cada sujeito na ação prática,
sendo que, o que foi escolhido por todos não seria infligido. Segundo Zanella
(2012, p. 134) “Habermas defende a ideia de que a atividade argumentativa é
uma ocupação eminentemente comunicativa”.
36
Desta forma, não mais seguindo uma ética direciona racionalmente como
a proposta por Kant, mas uma ética que trabalhe a razão comunicativa abrindo
espaço para a intersubjetividade dentro das relações dos seres que participam
de determinados grupos. Assim, de acordo com Machado (1988, p. 36) “o sentido
da comunidade da comunicação tem como pressuposto o reconhecimento de
todos os membros com iguais direitos de discussão”, em que todos têm espaço
para se expressarem de maneira livre. A pragmática é levada em consideração
para Habermas, pois possibilita a ação do homem dentro dessa comunidade
usando a linguagem. Vale ressaltar que a comunidade é real, sendo que, o
discurso é entendido por todos do grupo.
A teoria do discurso de Habermas é desenvolvida a partir do pensamento
kantiano, com critérios morais racionais. Mas que depois passa por uma nova
roupagem deixando de lado o indivíduo e dando possibilidades para que se
pense o comunitário. Para Hamel (2011), a Ética do discurso de Habermas é
uma reconfiguração do pensamento “deontológica” da Ética de Immanuel Kant,
quando o dever está atrelado à razão de forma que agir racionalmente implica
cumprir com obrigações éticas, sendo a razão o campo justiceiro para quem não
cumpra com a moral.
Ainda de acordo com Hamel ao comentar sobre Kant (2011, p. 165), “o
estudo da ética deveria ser precedido da análise da metafísica da natureza e dos
costumes, ressaltando a necessidade desta última para a construção de uma
filosofia moral pura”. Habermas escreve sua teoria frente a um mundo pós-
metafísico do pensamento. A principal via escolhida por Habermas é do
universalismo moral kantiano, como uma saída possível diante de tantos debates
políticos, religiosos em um mundo com várias culturas. Habermas pretende uma
ética universal inserida no meio social, sendo que, neste espaço é passível de
erros, levando em consideração a própria ação que é exercida na comunidade.
Mas esses erros são corrigíveis dentro do entendimento mútuo. E nessa relação
de entendimento mútuo é possível se compreender o sentido pragmático
universal.
A abertura que o agir comunicativo faz, é convertida em ação entre os
participantes, sendo que tal ação torna possível a existência de dois perfis. A
37
ética do discurso de Habermas dá espaço à maneira com que a linguagem
possibilita uma forma pragmática de ação. Para Peres Filho (2012, p. 11),
Habermas propõe uma pragmática formal, diferente da pragmática científica que
analisava os contextos da linguagem, onde essa pragmática visa principalmente
a reconstrução da validade universal do discurso, sendo que essa pragmática
tem seu apoio principal em Kant.
Assim, Habermas ao romper com a tradição, cria uma teoria baseada na
pragmática ética, onde o espaço principal de fundamentação é a linguagem. É
com a comunicação entre os interlocutores que a ética do discurso de Habermas
ganha força e contribui para o consenso na comunidade. Dessa maneira, a
linguagem é responsável por traduzir o pensamento de todos os participantes da
comunidade, fazendo com que o espaço social se torne mais compreensível e
comunicativo. Dessa maneira, a linguagem torna-se importante no pensamento
de Habermas e faz com que todos os seres do espaço comunicativo participem
de forma ativa e esclarecedora dos fatos morais existentes na comunidade.
Vive-se hoje, no Brasil, um momento de redescoberta da ética, de ânsia
por incorporar valores morais nas nossas práticas cotidianas, nas atividades
científicas, políticas, econômicas, etc. Isto decorre do lamento geral de que
estamos vivendo uma grave crise, a qual é identificada pelo senso comum pela
falta de decoro e de compostura e pelos intelectuais, como uma anomia, ou seja
pela ausência de condições que garantam a interiorização do respeito às leis e
às regras sociais por parte dos indivíduos. Para muitos estudiosos, esta é uma
crise decorrente da pós-modernidade, onde se privilegia a heterogeneidade, a
diferença, a fragmentação e a descontinuidade.
Para outros, ela não ultrapassou a modernidade, ao contrário, se instalou
no seu seio apesar de alicerçar-se em novas bases, onde a prática pedagógica
do adestramento e da manipulação estão sendo questionadas, a supremacia da
razão e a adesão cega às leis já não encontram eco e onde os homens exigem
ser tratados como organismos vivos, capazes de pensar, sofrer, se organizarem
e construírem valores. Neste quadro de "crise" os cidadãos se organizam e
clamam por respeitabilidade, por seriedade, justiça social e por valores morais.
38
Também os indivíduos, enquanto membros de categorias profissionais,
investem em criar regras de conduta que possam garantir a convivência com
seus pares, seus clientes, com as instituições a que fazem parte. etc. Resta
saberem que bases essas regras acham-se alicerçadas, a que elas realmente
se propõem, a que elas servem. É disto que trataremos neste capítulo. Para tal
iniciaremos traçando um panorama dos valores morais que vigoram nas
sociedades contemporâneas; em seguida, buscaremos compreender a relação
existente entre os valores gerais da sociedade e os valores particulares que
regem as condutas dos indivíduos enquanto membros de grupos de trabalho,
identificaremos os pilares em que se embasam os atuais códigos profissionais
da ética e por último, buscaremos distinguir até onde eles podem ser tomados
como deontológicos - éticos - e até onde servem apenas aos interesses
instituídos.
Dois fatos podem ser ilustrativos das transformações por que passaram
os homens nas sociedades modernas. O primeiro diz respeito à evolução da arte
de retratar e o segundo, à substituição do ato de biografar. No que se refere ao
primeiro, havia uma tendência, até o advento da modernidade, a se retratar
apenas os "universais concretos" - deuses, heróis e santos - com ela inaugurou-
se a prática de retratar o homem em detrimento do seu nome sua condição social
e outros atributos. Do mesmo modo aconteceu no campo da literatura. Antes não
havia espaço para que se falasse do indivíduo singular, do homem comum e sim
do itinerário de figuras ilustres, da trajetória de uma alma brilhante.
Com a Modernidade dá-se uma inversão. Abre-se um espaço para as
autobiografias e até mesmo as biografias retratam o particular, o homem comum
pois o que se pretende é valorizar o ser pensante, o homem enquanto um ser
racional. Ambas as situações indicam o valor que a subjetividade e a razão
humanas ganharam no período transformando-se no novo parâmetro de
interpretação e explicação do mundo. Há como um desencantamento da
realidade, antes, explicada e entendida através de princípios religiosos e
39
místicos, para uma realidade que pode e deve ser desvelada através de
princípios racionais. O primeiro exemplo dessa "virada" foi a experiência do
cogito cartesiano, o qual se impôs "[...] como a primeira experiência absoluta,
anterior à experiência do absoluto". O homem estabelece-se no mundo
destituído de qualquer relação com a realidade superior, posição própria da
ideologia burguesa que surge como uma forma de libertação do indivíduo. Entre
as alterações que essa nova ideologia favoreceu identificam-se aquelas do
campo do conhecimento, da esfera política, econômica e social.
No que diz respeito ao conhecimento, há a demarcação do espaço do
sujeito separando-o do espaço do objeto pois entendiam que essa dicotomia era
necessária para que pudesse haver neutralidade no conhecimento produzido.
Isto caracterizava-se como a possibilidade de se elaborar uni saber objetivo e
isento. A desconfiança no saber intelectual já havia sido demonstrada por
Descartes, ao indicar que todos os dados deveriam ser submetidos a um
processo de análise. Com isto Descartes acenava para a dificuldade chegar a
um conhecimento onde não houvesse a ingerência da subjetividade. Esta é mais
uma constatação do poder que o homem moderno conquistou, da sua
autonomia, da sua liberdade e do seu poder de decisão. No plano político, o
elemento mais significativo é o advento do Estado, como uma instância de
dominação através do exercício de um poder impessoal e aparentemente,neutro.
A substituição da ideologia liberal clássica pela ideologia burguesa fez com que
o quadro político e social sofresse alterações significativas -educação,habitação,
saúde -, proporcionando aos sujeitos uma consciência da estrutura interna.
Esse desnudamento provocou um clima difícil na esfera social, como faz
ver o pensamento de alguns representantes da época. Hobbes não tinha dúvidas
ao afirmar que "o homem era o lobo do homem", e que a convivência entre eles
só seria possível mediante a imposição de valores rígidos capazes de frear o
excesso de individualismo reinante. Elaboração de novos valores éticos e uma
terceira que, em nome da liberdade humana, nega a necessidade de qualquer
código moral, deixando ao homem o direito e a condição de elaborar o seu
próprio caminho, sem nenhum parâmetro e sem qualquer responsabilidade.
40
Apesar das tendências explícitas serem essas, entendemos que, de fato,
a ética encontra-se acuada entre uma visão utilitarista, voltada para os interesses
econômicos e sociais do momento, e a possibilidade de criar, como fez Kant, um
mundo da liberdade onde os valores morais possam se dar e serem praticados,
separadamente do mundo empírico. Esse excesso de individualismo e de
desagregação constatados, é tido por muitos autores como decorrente do culto
à razão, à tecnologia, mas também da perda do referencial teórico pelos
indivíduos, entre eles, os de caráter religioso. Entendem que o individualismo é
filho do ateísmo e da falta de fé, elementos que funcionam como agregadores e
responsáveis pela coesão interna das sociedades. A perda da função social que
antes possuíam os universais e as formas metafísicas de explicação do mundo,
fizeram da modernidade um período de contínua tensão entre o eterno e o
efêmero. A tensão e a crise vividos pelo homem moderno conduziram-no à
instabilidade e à impaciência diante da vida, do trabalho, do crescimento e em
todas as demais instâncias. Vive-se uma verdadeira convulsão onde tudo tem
que acontecer no menor espaço de tempo possível. Deste modo, a técnica
tornou-se a única forma de construção, em virtude do que ela representa em
termos de objetividade e prontidão.
Neste processo de robotização, nem as normas e os valores morais saem
imunes, ao contrário, também elas são continuamente substituídas, saltando-se
de um polo ao outro e provocando uma grande instabilidade nos indivíduos que
não sabem o que devem seguir. Diante do conflito e do poder que o homem
moderno passou a possuir, a sua tendência é de acreditar que ele pode agir
como bem quiser e que não deve seguir nenhum tipo de princípio estabelecido.
Contudo, choca-se com as imposições colocadas pela sociedade, das quais não
pode fugir, pois é membro dela. Não tendo mais o ideal de felicidade perseguido
na antiguidade, nem o ideal cristão que vigorou na medieval idade, acaba tendo
que seguir as relações contratuais impostas pelo capitalismo. Diante do exposto,
acreditamos que a ética na modernidade tenta se estruturarem três direções:
uma de tradição teológica que teima em manter uma hierarquia de valores
absolutos, inspirados na orientação religiosa cristã; uma segunda que reconhece
a situação de crise em que a sociedade se acha mergulhada e que é preciso
41
alterar esse quadro a partir da ração de novos valores éticos e uma terceira que,
em nome da liberdade humana, nega a necessidade de qualquer código moral,
deixando ao homem o direito e a condição de elaborar o seu próprio caminho,
sem nenhum parâmetro e sem qualquer responsabilidade.
42
dos seus membros adultos que assumam as suas relações sociais. Tal
exigência, explica-se pelo papel que os valores morais exercem nas relações
sociais e de poder, enquanto formas de garantir a manutenção da sociedade,
através de um comportamento "adequado" dos seus membros. No caso das
sociedades modernas, de orientação capitalista, baseadas na exploração do
trabalho assalariado e no contraste entre classe operária e capital, a adequação
dos indivíduos aos princípios de obediência, assiduidade e aplicação, são
interpretados como sinônimos de uma vida correta e de uma postura moralmente
boa. Mas esta pode não ser a avaliação feita por outras sociedades. Por
exemplo, na sociedade medieval, essa dialética dos valores não existia.
Fundamentada na ideia de Deus e de um "juízo final", os valores possuíam um
caráter definitivo e maniqueísta. Essas ideias sobreviveram enquanto sobreviveu
aquela forma de sociedade e foram substituídas quando houve a substituição da
estrutura social e da forma de compreensão do mundo. Do mesmo modo que a
história é dialética e processual também a moral é um processo contínuo que
não cessa diante de nada nem de ninguém. A sua configuração vai se dando a
depender do "ethos" da sociedade, de forma que numa sociedade de classes
antagônicas as orientações morais correspondem aos seus ideais e interesses.
Entendidos desse modo, os valores morais perdem o seu ar de mistério e de
transcendência para serem vistos como produtos das práxis social. As ações
humanas também devem ser avaliadas a partir desse princípio, de forma "a
posteriori" e circunstancializada. Uma ação passa a ser boa se interpretada como
melhor do que outra a depender da sua concordância com os interesses sociais.
Dado o envolvimento dos valores com as variações histórico-sociais, a escolha
feita por um sujeito, mesmo pressupondo uma liberdade interna, não se dá
incondicionalmente, e sim a partir do seu envolvimento social, pois, como
dissemos, o indivíduo só se resolve nas relações sociais.
Assim, a liberdade interna que o ato moral pressupõe não significa
ausência de condicionamentos, mas "necessidade compreendida" como
entendia Hegel; ou como "consciência histórica da necessidade", conforme Marx
e Engels. Consciência para esses últimos não era uma forma de conciliação e
sim motivação para a ação em favor dos fins que o sujeito,
43
cincustancializadamente, projetou. A moralidade não exige uma liberdade
incondicional, pois, também ela faz parte da ideologia, ou seja, do conjunto de
representações, normas e regras de conduta necessárias ao homem e à
sociedade, a fim de garantir a coesão social e a adaptação dos indivíduos aos
seus papéis sociais. Os valores que orientam a conduta dos indivíduos enquanto
membros de uma determinada categoria profissional, também seguem esse
mesmo tipo de relação uma vez que não estão descolados do "ethos" da
sociedade.
As suas bases são as mesmas da ética geral, as condições materiais de
vida, as crenças religiosas, a moral oficial e o próprio conhecimento científico.
Assim, cada momento histórico com a sua forma de produção, suas relações
sociais, seus anseios e necessidades, erige o seu sistema de valores, o qual se
estende às relações sociais em geral e entre elas às relações mantidas pelos
membros de uma categoria profissional, entre esses e seus clientes, entre esses
e os seus auxiliares, enfim, todas as relações. A nossa prática social em geral e
a profissional, em específico são influenciados por fatores econômicos, políticos,
religiosos, entre outros; contudo, a maior influência que a estética profissional
recebe é da própria moral oficial, a qual, quase sempre de posse dos
mecanismos do poder - educação institucionalizada, meios de comunicação de
massa, etc. - consegue invadir os grupos e alargar o seu raio de ação. A incursão
desses valores gerais nos domínios da ética profissional faz-se de forma
"natural", através de uma ação política sutil. Assim, conhecer os princípios
normativos que orientam as condutas dos indivíduos enquanto membros de um
determinado "métier", requer não perder de vista a sua relação com as condições
em que foram produzidos, em síntese, com os valores vigorantes na sociedade.
44
em benefício próprio. Assim, ele a definia como a ciência dos deveres.
Etimologicamente, o termo vem do grego "déon" que quer dizer o obrigatório, o
justo, o adequado – ou de "déontos", também do grego, que significa
necessidade. Percebemos que em ambas as definições, fica evidenciado o
caráter finalista da deontologia, ou seja, o pressuposto de que é preciso seguir
normas para se atingir fins. A evolução desse entendimento levou a identificá-
las, presentemente, como "o tratado dos deveres" a ser seguidos em
determinadas relações sociais, principalmente nas de caráter profissional. A
necessidade de se erigir normas que orientem as relações humanas remonta à
origem da vida comunitária. Desde que os homens passaram a viver em
comunidades perceberam que assim como os animais irracionais, eles possuíam
impulsos e paixões nem sempre utilizados em seu proveito ou em proveito dos
seus semelhantes.
A inteligência indicava-lhes que era preciso canalizar esses impulsos
individuais a fim de promover uma adaptação aos desejos sociais e criar
condições para unia vida societária. Essa necessidade estende-se a qualquer
agrupamento social, como aqueles de caráter profissional, tão comuns nas
sociedades modernas. A deontologia ou clica profissional, caracteriza se como
um conjunto de normas e princípios que tem por fim orientar as relações dos
profissionais com os seus pares, destes com os seus clientes, com a sua equipe
de trabalho, com as instituições a que servem entre outros. Como a sua margem
de aplicação é limitada ao círculo profissional, faz com que essas normas sejam
mais específicas e objetivas. A praticidade que envolve os códigos de ética
profissional não os exime de um compromisso com os interesses da categoria e
com o projeto global da sociedade, fazendo com que os mesmos oscilem a
depender das oscilações sociais e, deste modo, eles seguem orientações
teóricas também diferentes.
Se a sociedade é regida por unia orientação metafisica, os códigos de
ética profissional tendem a seguir princípios também metafísicos. Se por outro
lado ela admite que o homem é um microcosmos capaz de construir, transformar
e criar, eles tendem a valorizar esses aspectos, se a sociedade segue uma
orientação individualista e egoísta, os códigos colocarão em prática esses
45
valores. Decorrente dessa vinculação, verificamos que os códigos de ética
profissional em vigor nas sociedades modernas, como a nossa, tendem a seguir
três orientações básicas, todas elas a serviço da manutenção das desigualdades
sociais, do culto ao capital e da tranquilidade das consciências de quem as
coloca em prática.
A primeira delas, e a mais difundida, é identificada por alguns teóricos
como mero exercício tautológico no sentido de servir apenas para sacralizar a
prática exercida. As normas são orientadas por uma posição positivista onde o
que vale são os fatos. Assim, se no dia a dia o profissional usa o seu cliente
como meio de ganhar dinheiro e não como o fim último da sua ação, essa prática
será vista como legítima e assegurada oficialmente. Esse tipo de código visa tão
somente apaziguar a consciência dos profissionais e protegê-los fazendo com
que os mesmos se sintam honestos, humanos e justos mesmo quando só
prestem seus serviços a quem possa paga-los. Outra tendência bastante comum
é aquela que se diz disposta a enfrentar as práticas estabelecidas e colocar-se
diante delas com olhar crítico e questionador. Alicerçando em um discurso lógico
e referendado na literatura mais avançada, essa tendência pretende ser séria e
verdadeira, todavia, o que se constata é uma total falta de objetividade e de
clareza no texto da norma, a ponto de não viabilizar, na prática, a sua execução,
como exemplifica o Profº. Andery., em relação a um código de ética da área da
saúde,
46
resta-nos saberem que essa tendência difere da anterior? Na nossa avaliação,
apenas no aspecto de escamotear a verdade. Pois, além de legitimar o
comportamento habitual ela se apresenta como diferente, como estando
comprometida com os princípios de justiça e honestidade e isto serve para
desarticular os possíveis focos de inconformismo, de crítica e de confronto que
poderiam proporcionar o salto. A terceira tendência não chega, ainda, a ter
grande repercussão e apresenta-se como uma ensaiar reticente e desconfiado.
A mesma consiste em uma tentativa real de avaliação dos códigos elaborados e
da prática cotidiana dos profissionais, tendo em vista verificar os seus méritos e
os seus defeitos a fim de sugerir as alterações necessárias.
Esse processo de análise parte do princípio que não existem verdades
absolutas, nem mesmo no campo da ciência, pois também ela é um fazer
humano comprometido ou, no mínimo, permeado pela subjetividade. Sua
preocupação não é fazer da norma um escudo para o profissional e sim um
instrumento paro o exercício correto da profissão e da descoberta da verdade.
Com esse fim, busca entender o exercício profissional nas suas relações
sociais e econômicas, desvelar o seu vínculo com o poder instituído, bem como
entender até que ponto essa prática está servindo para a manutenção das
relações sociais de manipulação. É fácil entender que essa terceira orientação
deveria ser aquela seguida por todas as éticas profissionais. Porém, longe de
ser, ainda é atacada pelo poder constituído, pelas lideranças conservadoras e
pelos seus pares. Isto porque, ela acena com a desarticulação da moral instituída
e com o advento de uma moral instituinte, elaborada a partir das relações sociais
de trabalho e das condições histórico-sociais e da consciência dos indivíduos.
Tal passagem só é possível quando se admite viver a contradição, quando se
permite viver a crise, pois só assim será possível realizar uma revisão nos
valores tradicionais e, se preciso, construir novos valores. Como a nossa prática
consiste em seguir fórmulas prontas e códigos morais cristalizados, podemos
dizer que a maioria dos tratados de deveres seguidos pelas categorias
profissionais são apenas normas de administração do mercado de trabalho e não
possuem um caráter verdadeiramente ético, deontológico.
47
Em síntese, se queremos ter uma sociedade mais justa, humana e menos
discriminatória, devemos ver os homens como seres vivos, capazes de pensar e
de criar valores e não como seres que devem ser modelados e manipulados.
Partindo deste princípio, os códigos de ética profissional devem assumir
um compromisso de vida e com a vida; enfrentando as práticas tradicionais e
inadequadas e colocando-se abertos ao novo, à revisão constante, pois só assim
eles se tornariam verdadeiras práticas deontológicas e deixariam de ser
subterfúgios para práticas desonestas e comportamentos moralmente
inadequados.
48
ENCERRAMENTO
49
REFERÊNCIAS