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XLVI Encontro da ANPAD - EnANPAD 2022

On-line - 21 - 23 de set de 2022


2177-2576 versão online

Processo Decisório e Gestão de Crises: estudo de caso em uma indústria multinacional


no cenário da COVID-19

Autoria
Fernanda Yanaze Watanabe Sena Maia - fernandayanazemaia@gmail.com
Programa de Pós Graduação em Gestão de Organizações, Liderança e Decisão / UFPR - Universidade Federal do Paraná

Maria Carolina Lippi Scherner - mcarolinascherner@gmail.com


PPGOLD - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO GESTÃO DE ORGANIZAÇÕES, LIDERANÇA E DECISÃO / UFPR
- Universidade Federal do Paraná

Simone Cristina Ramos - simone.crisr@gmail.com


PPGOLD - Programa de Pós Graduação em Gestão, Organizações, Liderança e Decisão / UFPR - Universidade Federal do
Paraná

Resumo
As crises desencadeadas pela Covid-19 exigiram de organizações e governos a adoção célere
de medidas inéditas, em meio a um cenário turbulento e com alta incerteza. Visando
aprender com este momento histórico, o objetivo deste artigo é compreender os elementos
relevantes no processo decisório de grupos no contexto organizacional durante períodos de
crise. Para tanto, foi realizado um estudo de caso único de um grupo de gestão de crises de
uma indústria multinacional durante a pandemia. A coleta de dados ocorreu por meio de
entrevistas em profundidade e análise documental. Os resultados sugerem que a tomada de
decisão do grupo é bem caracterizada considerando os limites cognitivos dos envolvidos,
assim como elementos políticos. O processo de tomada de decisão do comitê de crise oscilou
entre cautela e risco, já que a prioridade estava em garantir um ambiente seguro e, ao mesmo
tempo, minimizar os danos financeiros diante da crise sanitária. Táticas políticas como
utilização estratégica de informações e interferência externa permearam as decisões. O
estudo traz contribuições teóricas ao ampliar o entendimento de como crises impactam o
processo decisório de grupos no contexto organizacional e propor caminhos de investigação
para a temática.
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Processo Decisório e Gestão de Crises: estudo de caso em uma indústria


multinacional no cenário da COVID-19

RESUMO

As crises desencadeadas pela Covid-19 exigiram de organizações e governos a


adoção célere de medidas inéditas, em meio a um cenário turbulento e com alta
incerteza. Visando aprender com este momento histórico, o objetivo deste artigo
é compreender os elementos relevantes no processo decisório de grupos no
contexto organizacional durante períodos de crise. Para tanto, foi realizado um
estudo de caso único de um grupo de gestão de crises de uma indústria
multinacional durante a pandemia. A coleta de dados ocorreu por meio de
entrevistas em profundidade e análise documental. Os resultados sugerem que
a tomada de decisão do grupo é bem caracterizada considerando os limites
cognitivos dos envolvidos, assim como elementos políticos. O processo de
tomada de decisão do comitê de crise oscilou entre cautela e risco, já que a
prioridade estava em garantir um ambiente seguro e, ao mesmo tempo,
minimizar os danos financeiros diante da crise sanitária. Táticas políticas como
utilização estratégica de informações e interferência externa permearam as
decisões. O estudo traz contribuições teóricas ao ampliar o entendimento de
como crises impactam o processo decisório de grupos no contexto
organizacional e propor caminhos de investigação para a temática.

1 INTRODUÇÃO
O Coronavírus, que se disseminou pelo mundo em menos de três meses
em 2020, tornou-se sinônimo de uma crise sem precedentes e seus reflexos
ainda serão sentidos por muitos anos. Para Singh et al. (2020), a Covid-19
mudou o cenário de negócios da noite para o dia, impactando a saúde e o bem-
estar de todos. Os tomadores de decisão das organizações foram colocados à
prova diante de problemas complexos, condições de incerteza e escassez de
informações.
Diante de um cenário pouco conhecido, sabendo-se apenas do alto risco
de letalidade do vírus, as empresas tiveram de adequar plano de contingência,
implementar protocolos de prevenção, buscar medidas para assegurar a saúde
e segurança dos funcionários e a manutenção dos negócios, além de adotar
estratégias para redução de custos. Segundo Tourish (2020), os líderes
enfrentaram, durante a pandemia, parâmetros ambíguos para a avaliação de
suas decisões. Enquanto uma atitude prevencionista poderia ser classificada
como danosa aos negócios, a ação tardia seria avaliada como irresponsabilidade
frente a vida dos envolvidos.
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A tomada de decisão de indivíduos e grupos em organizações alcançou


então altos níveis de complexidade na pandemia de 2020. Foram elementos
desta complexidade a existência de objetivos conflitantes e ambíguos, a
participação dispersa dos decisores, o alto risco, a indisponibilidade de
informações históricas e a extrema incerteza. Tal cenário resultou, então, em
uma oportunidade para melhor compreender os processos decisórios complexos
de grupos no ambiente organizacional durante períodos de crise.
Desta forma, foi delimitado como objetivo para este artigo compreender
os elementos relevantes no processo decisório de grupos no contexto
organizacional durante períodos de crise. Justificativas teóricas e práticas podem
ser associadas à presente produção acadêmica. Do ponto de vista teórico, a
investigação atende a demanda de pesquisadores do campo de processo
decisório que recomendam a realização de estudos voltados a compreender a
ação dos decisores sem escolha antecipada de um frame teórico explicativo
(EISENHARDT; ZBARACKI, 1992; NUTT, 2011). Já na dimensão prática, a
compreensão dos elementos presentes no processo decisório de grupos pode
dar base a políticas organizacionais e ações de desenvolvimento que permitam
melhor acurácia das decisões.

2 REVISÃO DE LITERATURA

A revisão da literatura foi empreendida para discriminar, frente a


produção teórica sobre processo decisório organizacional, as linhas de
investigação e elementos já descritos como influentes na tomada de decisão e a
relação deles com a gestão de crises. Desta forma nas próximas seções são
apresentados os pressupostos da teoria da racionalidade limitada e da escola
política sobre processo decisório e da gestão de crises.
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2.1 PROCESSO DECISÓRIO E A RACIONALIDADE LIMITADA


Como crítico da teoria tradicional econômica, Herbert Simon foi um dos
pioneiros no aprofundamento das teorias do processo decisório, principalmente
a partir da década de 1970, por considerar a limitação da racionalidade humana.
March e Simon (1958 apud CLEGG et al. 2007) duvidavam que os tomadores de
decisão realmente buscassem soluções ideais; em vez disso, eles sugeriram
procurar soluções “satisfatórias”. Devido à capacidade limitada de
processamento de informações humanas, ninguém seria capaz de considerar
todas as soluções e depois decidir qual era a melhor.
No entanto, para Clegg et al. (2007), a alta gerência, por causa de suas
amplas experiências, tem uma série de casos comparáveis para recorrer para a
maioria das situações de decisão, e são capazes de ser racionais dentro dos
limites de suas próprias experiências. Para os autores, uma análise cuidadosa
de todas as informações disponíveis seria impossivelmente demorada, uma vez
que o tempo é um recurso assustador, e a motivação para usá-lo em reflexão e
pesquisa sem fim ainda mais limitada. Enfrentando a “racionalidade limitada” dos
seres humanos, Simon e March descobriram que os tomadores de decisão
trabalham sob restrições que tornam as decisões ideais impossíveis e as
decisões satisfatórias viáveis.
De acordo com Simon (1947 apud CRISTOFARO, 2017), na base do
comportamento humano, existem três restrições à cognição: informação
incompleta, dificuldade na antecipação das consequências de ações futuras, e
escasso conhecimento de todos os comportamentos humanos possíveis. A
racionalidade limitada ocorre, portanto, quando as empresas não têm
informações perfeitas, recursos ilimitados e estão restritas à sua capacidade de
processamento de informações. Sob essas condições, as empresas são
forçadas a tomar decisões com base nos dados disponíveis, recursos e
capacidades de processamento de informações que possuem (Simon, 1979).

2.2 PROCESSO DECISÓRIO E A ESCOLA POLÍTICA


A política sempre está presente na tomada de decisão. Por muitas vezes
vista de maneira negativa, o comportamento político pode ser benéfico à
organização. O estudo deste aspecto no campo da gestão teve início nos anos
1950.
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O objetivo era entender como pessoas ou grupos usavam o poder e a


influência na tomada de decisão. Para os primeiros autores da área, os
tomadores de decisão sempre possuem diferentes objetivos, porém, formam
alianças para buscá-los e dar preferência àqueles objetivos dos mais poderosos
(Eisenhardt; Zbaracki, 1992).
As primeiras análises colocavam em voga uma visão para a
administração pública. Na sequência passou a se analisar esse comportamento
nas organizações: as empresas são arenas políticas e o indivíduo se afasta da
racionalidade por conta da natureza política do seu comportamento (Dalton,
1959, apud CHILD; ELBANNA; RODRIGUES, 2010). Em uma organização, com
muitas pessoas, interesses distintos e poucos recursos, o comportamento
político é essencialmente gerado pela combinação da diferenciação e
interdependência entre esses grupos. Por meio de táticas políticas, grupos de
interesses influenciam decisões que afetam suas posições e interesses na
organização.

No modelo político, as pessoas são individualmente racionais, mas


não coletivamente. O pressuposto principal é que as organizações são
coalizões de pessoas com interesses conflitantes. Embora esses
indivíduos possam compartilhar alguns objetivos como o bem-estar da
empresa, eles também têm conflitos. Por exemplo, algumas pessoas
em uma empresa podem favorecer o crescimento enquanto outras
podem favorecer a rentabilidade ou serviço público. Esses conflitos de
preferências surgem de diferentes apostas na forma do futuro, vieses
induzidos pela posição dentro a organização, e confrontos pessoais em
ambições e interesses (Allison, 1971, apud EISENHARDT; ZBARACKI,
1992, p.23).

Ao decorrer dos anos seguintes as pesquisas no campo político da


tomada de decisão se basearam em estudos de caso e dedutivos. Autores como
Pfeffer (1973), Petigrew (1973), Baldridge (1971), Quinn (1980) ao analisarem
universidades, organizações privadas e governo apontaram que nesses
ambientes era notória as divergências de opinião que geraram conflitos para a
tomada de decisão. O comportamento político era demonstrado pela
manipulação e controle de informações e agendas e por práticas de pressão em
grupo, o chamado lobby.
Quinn (1980, apud EISENHARDT; ZBARACKI, 1992) utilizou o termo
“incrementalismo lógico” para apontar que executivos se aproveitavam de
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situações de tomadas de decisão pontuais para aos poucos construir uma rede
de apoio em torno das suas vontades. Ao ter essa base criada se tornaria mais
fácil controlar o tempo para aplicar suas ideias, além de dar mais flexibilidade e,
se necessário, mudanças de estratégia.
Os autores Child, Elbanna e Rodrigues (2010) sintetizaram em um
modelo de estudo quatro maneiras de como o comportamento político é visto
nas organizações: o comportamento político derivado do poder hierárquico;
politicagem entre unidades organizacionais orientada para decisões
estratégicas; exercício de influência ascendente sobre as decisões estratégicas
e influência política interorganizacional em decisões estratégicas.
O comportamento político derivado do poder hierárquico se faz presente
na autoridade dentro da organização. Há uma determinação de premissas para
se tomar decisão, controle dos recursos financeiros para a implementação,
controle sobre apontamentos chave e poder geral de veto. Nestas situações é
comum se ter um gestor do alto escalão na organização que orienta as equipes
abaixo sobre quais caminhos seguir para a tomada de decisão.
A politicagem entre unidades organizacionais orientada para decisões
estratégicas é reforçada em organizações que diferenciam departamentos ou
unidades. Quando cada área decide puxar para si recursos, a atividade política
é ascendente (Pettigrew, 1973, apud CHILD; ELBANNA; RODRIGUES, 2010).
Porém, não é necessariamente apenas uma disputa. Se houver afinidade de
interesses e a possibilidade de união para ganho de poder na tomada de decisão
a aliança pode ser feita. As táticas políticas utilizadas geralmente estão
relacionadas ao uso de informação e conhecimento e a manipulação da
reputação e credibilidade.
O exercício de influência ascendente sobre as decisões estratégicas
aponta para uma tomada de decisão que transita entre mais atores. Com o
crescimento, as organizações formam novos níveis hierárquicos e divisões de
unidades de negócio. Isso tende a aumentar o escopo do processo estratégico
de tomada de decisão. Para a alta gestão tomar decisão, ela irá contar com os
conhecimentos e informações fornecidas pelos gestores em cargos abaixo e
nesse ambiente surge a influência ascendente.
Por último, a influência política interorganizacional em decisões
estratégicas se refere às influências externas que a tomada de decisão nas
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organizações pode sofrer. Neste caso os tomadores procuram moldar condições


externas por meio de ações políticas.
Organizações são estruturas baseadas no poder, portanto, o
comportamento político sempre estará presente em uma tomada de decisão. Os
mais poderosos tendem a conseguir o que querem. Os seres individuais que
possuem suas próprias preferências passam a então utilizar de táticas políticas
para atender as suas necessidades.
Essas táticas vão ao encontro do que foi dito por Child, Elbanna e
Rodrigues (2010) e anteriormente apresentada por Eisenhardt e Bourgeois
(1988) como coalizão; cooptação; utilização estratégica de informações e
influência externa.

QUADRO 1 – TÁTICAS POLÍTICAS DO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO


Coalizão Aliança de pessoas a fim de obter maior poder para a busca de um
mesmo objetivo ou ponto de vista
Cooptação Tentativa velada de mudar a posição do tomador de decisão
Utilização estratégica Influência a partir do controle ou manipulação de informações
de informações estratégicas para a tomada de decisão
Influência externa Interesse de atores externos a organização que podem impactar na
tomada de decisão
Fonte: Eisenhardt e Bourgeois (1988)

2.3 GESTÃO DE CRISE


É inerente à maior parte das organizações planejar as suas atividades.
A descrição dos processos, definição dos objetivos e metas a serem alcançadas
demanda tempo e análise de muitos atores dentro das empresas. É papel desses
atores apresentarem em suas análises questões futuras, na tentativa de
identificar e prever cenários que podem prejudicar ou beneficiar seus negócios.
Mintzberg (2004) aponta que por mais que o planejamento seja pensar
no futuro, não é possível controlá-lo. “Que atividade organizacional, seja de curto
prazo ou reativa, não considera o futuro?” É necessário então buscar entender
em como fazê-lo.
Colocar em prática um planejamento envolve a tomada de decisão.
Novamente Mintzberg (2004) aponta que as decisões consideram o futuro por
ser uma promessa de ação. Porém, qualquer situação que simplesmente
acontece e foge do campo de domínio do planejador pode ser considerada crise.
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Para Hermann (1972, p.10) a crise é “uma situação que cria uma
mudança abrupta ou repentina em uma ou mais das variáveis sistêmicas
básicas”. Os sistemas são as nações, organizações internacionais, atores e
assim por diante que mantêm uma interação. O autor (HERMANN, 1972, p. 13)
ainda complementa afirmando que a crise “[...] (1) ameaça objetivos altamente
prioritários da unidade de decisão, (2) restringe o tempo disponível para resposta
antes de a decisão ser transformada, e (3) surpreende os membros da unidade
de decisão pela sua ocorrência”.
Os desencadeadores de uma crise corporativa podem ter origem interna
ou externa a uma organização. Estudos como o de Mitroff, Shrivastava e
Udwadia (1987) as classificam como técnica/econômica, dando como exemplo
defeitos do produto/serviço, defeitos da planta/acidentes industriais e falência
(internas) e destruição ambiental generalizada, desastres naturais e crises
governamentais (externas). Também podem ser de âmbito
social/organizacional/pessoas como sabotagem, atividades ilegais e doenças de
saúde ocupacional (internas) e terrorismo, boicotes e adulterações de produtos
fora da planta produtiva (externas).
A crise traz um alto risco ao negócio e acelera a tomada de decisão: ela
precisa ser feita em um curto espaço de tempo. Os planos de contingência e a
gestão de crise em si não impedem que ela ocorra, mas podem servir de
aprendizado já que “[...] tais esforços a ajudam a aprender a ‘acompanhar os
golpes’” (Mitroff, Shrivastava e Udwadia, 1987, p.285). Visando contribuir com
este aprendizado a partir de crises, na próxima seção são descritos os
procedimentos metodológicos do presente estudo.

3 METODOLOGIA
A presente pesquisa pode ser enquadrada como qualitativa, de corte
transversal com abordagem longitudinal e com propósito descritivo. Trata-se de
um estudo de caso único, no qual são analisadas as características do processo
decisório de um Comitê de Crise instalado para tratar das ações decorrentes em
uma organização durante a pandemia da Covid-19.
A escolha do caso justifica-se em função da complexidade da
organização e o potencial de aprendizado a partir de sua análise. A organização
estudada é privada, multinacional e considerada como essencial nos decretos
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governamentais durante a pandemia da COVID-19. Ela constituiu um comitê


para gerenciamento de crise já no início da pandemia, em março de 2020. Com
cerca de 1500 empregados, a empresa possui operações nos estados do Paraná
e São Paulo e comercializa produtos nos mercados interno e externo. Como em
seu mercado existem poucas organizações no país, será omitido o ramo de
atuação visando preservar a confidencialidade dos dados e anonimato dos
participantes.
Os participantes do estudo são quatro integrantes do comitê de crise
foram escolhidos de forma propositada (MERRIAM, 2009). As entrevistas foram
realizadas em janeiro de 2022 e foram gravadas e transcritas para subsidiar a
análise de conteúdo empreendida. A grade de codificação foi mista,
contemplando categorias já descritas na literatura e emergentes no campo. A
quantidade de participantes foi delimitada em função de saturação teórica.
Também foram coletados dados a partir de documentos relacionados às
decisões tomadas pelo Comitê de Crise, entre eles, o plano de contingência
apresentado a órgãos legais de saúde das cidades em que a empresa atua e
comunicados produzidos pela área de Comunicação Interna aos empregados.
Desta forma, conforme apontado por Rowley (2002), o método de estudo de caso
propiciou uma investigação mais profunda e detalhada para responder às
perguntas de pesquisa “como e por que”.
O estudo priorizou a análise das principais decisões tomadas no primeiro
semestre de 2020, período em que muitas medidas foram adotadas em
decorrência do impacto da pandemia no funcionamento das atividades, no
cuidado com as pessoas, na atividade comercial e no resultado financeiro.
Algumas outras decisões adotadas em 2021, pela relevância para a discussão
também serão citadas, conforme descrito no quadro a seguir.
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QUADRO 2 – PRINCIPAIS AÇÕES TOMADAS PELO COMITÊ DE CRISE

Data Ação analisada

27/02/2020 Recebimento das primeiras orientações corporativas a nível mundial

28/02/2020 Início do processo de comunicação e de orientação a todos os


colaboradores sobre a doença

09 a Participação da empresa em feira do segmento


13/03/2020

12/03/2020 Início da adoção dos protocolos de prevenção à doença conforme plano


de contingência

16/03/2020 Adoção de protocolo preventivo aos colaboradores que estiveram na Expo


Revestir

19/03/2020 Afastamento dos colaboradores do grupo de risco das atividades

20/03/2020 Início do regime de home office a um grupo de colaboradores

23/03/2020 Confirmação dos primeiros casos de Covid-19 entre colaboradores

24/03/2020 Adoção de medidas gerais nos setores para a redução de custos

Entre 03 e Doação de materiais de saúde para os municípios em que a empresa


05/2020 possui operação para apoiar o atendimento

Entre 04 e Redução temporária de produção nas fábricas e desligamento de


06/2020 empregados

08/04/2020 Falecimento do presidente em decorrência da Covid-19

14/04/2020 Mudança na presidência da empresa

16/04/2020 Adoção da redução de jornada e salários para grupo de colaboradores

19/06/2020 Apresentação de proposta para redução temporária no valor do vale-


alimentação dos colaboradores

24/08/2020 Início da campanha de ideias para a redução de custos

A partir de Orientação e controle sobre vacinação dos empregados contra a Covid-19


06/2021

A partir de Retorno dos colaboradores do grupo de risco ao trabalho


06/2021

FONTE: As autoras (2022).

Este comitê foi criado no mês de março de 2020, assim que a pandemia
teve início no Brasil. Os membros deste grupo fazem parte da presidência e de
todos os subsistemas que compõem a área de Recursos Humanos da
organização, principalmente a Medicina Ocupacional. A partir deste grupo, as
decisões eram tomadas e implementadas. Profissionais de outras áreas eram
envolvidos nas ações relacionadas ao tema, porém, com função de
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operacionalizar decisões tomadas pelo comitê e, portanto, não são o foco desta
análise.

4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS


Em relação ao perfil dos entrevistados, três possuem cargos de gestão
(presidência, diretoria e gerência de recursos humanos) e tempo de empresa
acima de 20 anos. O quarto respondente ocupa a função de médico do trabalho
e atua na organização há três anos. Os profissionais compunham o comitê de
crise instaurado pela empresa para a discussão das ações relacionadas à
pandemia da Covid-19.
Hillyard (2000) aponta que o gerenciamento eficaz de uma crise iminente
é precedido pelo reconhecimento entre os executivos seniores de que medidas
coletivas de preparação e resposta sejam tomadas. Esse ato foi percebido na
empresa deste estudo de caso, já que o comitê de crise se reunia diariamente
com o início da pandemia em março de 2020 e depois de definidos os protocolos
e o plano de contingência, os encontros semanais tinham o objetivo de analisar
o cenário mundial, brasileiro, local e da própria empresa.
As discussões eram realizadas com base nos números divulgados pelos
órgãos competentes e o levantamento interno do médico do trabalho. Com isso,
o grupo tratava das medidas a serem implementadas a partir das necessidades
e dificuldades, sempre orientados pelos pilares estabelecidos. A busca pelas
informações disponíveis e o reconhecimento de incerteza demonstram que o
comitê de crise se esforçou para minimizar os efeitos da racionalidade limitada
para evitar decisões abaixo do ideal.
Os relatos dos entrevistados mostram a unanimidade sobre a dificuldade
de lidar com o desconhecido, a falta de experiência prévia, bibliografia ou
repertório sobre uma crise sanitária mundial sem precedentes (Figura 01).
Segundo o presidente, o início da pandemia foi como navegar em um mar novo,
no escuro e sem equipamento nenhum.

Era um sentimento de não enxergar um palmo à sua frente e ter de


tomar decisões rápidas, muito fortes e duras, decisões tomadas de
maneira diferente do que a gente aprendeu na academia ou na vida
profissional, para nos basear em informações, fatos e dados. Isso não
existia e mesmo assim a gente precisava tomar a decisão.
(PRESIDENTE, 2022)
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O relato acima corrobora para a visão de Moynihan (2008), que aponta


diferenças entre a aprendizagem durante as crises e as situações rotineiras. O
escopo do aprendizado necessário durante as crises é inerentemente maior,
exigindo uma nova compreensão dos aspectos mais básicos das causas,
consequências e soluções. Para Simon (1991, apud MOYNIHAN, 2008), mesmo
em situações rotineiras, o aprendizado é incompleto por causa da racionalidade
limitada, já que muitas informações são recebidas com cognição humana
limitada que restringe os processos de pesquisa e avaliação. No entanto,
Moynihan (2008) defende que os ambientes de rotina, por meio do aprendizado
por tentativa e erro, facilitam a compreensão cumulativa dos fatores de causa e
efeito.

QUADRO 3: PRINCIPAIS DIFICULDADES DO COMITÊ DE CRISE NO PROCESSO


DECISÓRIO

Entrevistado Dificuldades
Presidente - Falta de informação, de conhecimento e experiência
anterior.
Diretor (a) Recursos Humanos - Falta de repertório, bibliografia.
- Pressão externa (órgãos governamentais e sindicatos).
Gerente Recursos Humanos - Não ter todas as respostas que os gestores buscavam junto
ao RH.
- Falta de preparo para gerenciamento de equipe remota.
- Eleger quem ficaria ou não em trabalho remoto.
Médico (a) do Trabalho - Conflitos das informações (orientações OMS, decretos
municipais, estaduais).

Uma crise cria a necessidade de informação. Coombs (2007) ressalta


que a incerteza de uma crise produz estresse para as partes interessadas. Para
lidar com isso, elas precisam de informações sobre o que acabou de acontecer,
pois querem saber o que está sendo feito para protegê-las de crises semelhantes
no futuro e quais ações corretivas estão sendo tomadas. Relativo a esse ponto,
o diretor de recursos humanos comenta que a questão humana, de preservar a
saúde e não colocar as pessoas em risco, sempre esteve em evidência nas
discussões do comitê de crise.
Dessa forma, o grupo estabeleceu como pilares para a tomada de
decisão a preservação da saúde dos empregados e a manutenção dos negócios,
visando o menor impacto financeiro possível diante do cenário de paralisação
econômica de vários setores devido ao lockdown decretado pelos órgãos
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governamentais para evitar a circulação de pessoas e minimizar,


consequentemente, a transmissão do vírus.
Quanto às decisões mais complexas, os entrevistados citaram as
situações relacionadas às pessoas, que envolviam mudança repentina de
processos e até mesmo de reestruturação de quadro funcional (Figura 1). O
processo decisório para as questões humanas continha o peso emocional e foi
outro fator de dificuldade citado pelos entrevistados. Um agravante neste período
inicial da pandemia foi a perda do então presidente, que fazia parte do quadro
funcional e havia assumido o novo cargo havia três meses e faleceu em abril de
2020 por complicações da Covid-19. Esse fato fez com que o grupo tomasse
medidas ainda mais acirradas de controle e cuidado com as pessoas, sendo que
o trabalho da área médica foi protagonista para analisar as informações e discutir
as diretrizes e os cuidados necessários.

Figura 01: Decisões mais complexas apontadas pelo comitê de crise

Trabalho
remoto

Afastamento
Desligamentos Pessoas grupo de risco

Redução
de
jornada

Há dois conceitos apresentados por Simon (1979) que apontam como


racionalidade limitada se traduz na prática: busca e satisfação. O tomador de
decisão busca as alternativas de escolha caso elas não tenham sido dadas
anteriormente. Assim que ele encontra uma alternativa que satisfaça o seu
desejo, a busca é encerrada e se atinge o nível de satisfação.
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Esse caminho, por exemplo, foi seguido pelo médico do trabalho ao


definir quais seriam os protocolos de atendimento aos casos e prevenção da
Covid-19 entre os funcionários da empresa.

No primeiro momento me debrucei na ciência para entender o que era


a doença. [...] Procurava artigos e revistas que tinha certeza da
idoneidade daquelas informações e em cima daquilo teria minha base
de raciocínio para tomar a decisão. O segundo ponto eram as questões
legais. A gente está em uma empresa e não poderia se desligar das
questões legais. Nos debruçamos nas questões governamentais e que
estavam sendo preconizadas naquele momento no nosso país. Em
terceiro lugar, o que ajudou muito na tomada de decisão, foram as
orientações nacionais da medicina do trabalho. Por exemplo, a gente
se baseou muito na ANAMT (Associação Nacional de Medicina do
Trabalho) que trazia coisas mais específicas de como lidar com a
doença dentro do ambiente de trabalho, o que fazer e o que não fazer.
Eram questões exemplificadas de como tomar uma decisão (MÉDICO
DO TRABALHO, 2022)

Outra limitação ao comportamento humano descrita por Simon (1979) é a


incapacidade de calcular as consequências. Uma das medidas adotadas na
empresa para reduzir a circulação de pessoas nas plantas foi de implementar o
home office aos colaboradores administrativos e de apoio que poderiam naquele
momento atuar de maneira remota. Segundo o gerente de recursos humanos,
foi uma das decisões mais complexas que a empresa tomou na pandemia. O
regime de trabalho era inédito e foi implementado sem um planejamento prévio.

Se colocou o computador debaixo do braço e foi para casa. Foi uma


decisão difícil, que precisava ser feita. Nós tivemos que tomar essa
decisão mesmo sem saber se iria ou não funcionar e com muitas
inquietações naquele momento. Não se tinha respostas. A gente tinha
que tomar aquela decisão para minimizar a quantidade de pessoas em
circulação, sem saber que dificuldades técnicas nós enfrentaríamos [...]
(GERENTE DE RECURSOS HUMANOS, 2022).

Mesmo que houvesse a falta de informações e de vivência numa


pandemia, a larga experiência dentro da empresa, o conhecimento sobre o
funcionamento do negócio e o tempo de vivência profissional foram citados como
norteadores das tomadas de decisão do comitê de crise, que se preocupava em
ter uma visão ampla.
Do ponto de vista do comportamento político é possível identificar nos
entrevistados um espaço de debate saudável no comitê de crise, em que a maior
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parte das decisões foram tomadas levando em consideração informações e


opiniões dos membros. Todos possuíam responsabilidades, especialmente a de
procurar conhecimento para embasar as discussões. Estratégias de negociação
são percebidas em vários momentos em que a alta gestão da empresa precisou
tomar decisões, utilizando argumentos como o de que o risco de contaminação
precisava ser reduzido, levando em conta que não seria possível a paralisação
total das atividades produtivas.
Todos os entrevistados apontaram o espírito colaborativo do comitê,
portanto não fica claro a tática de coalizão para a tomada de decisão. O grupo
era formado por um número reduzido de pessoas que discutiam as
possibilidades de acordo com diferentes pontos de vistas. Entretanto, as
decisões que saíam destes encontros eram aplicadas na empresa sem a
contribuição ou opinião de outros membros da organização. Um claro exemplo
de como esse grupo ganhou poder hierárquico em todo o processo de gestão de
crise.
Algumas medidas – muitas vezes vistas como impopulares aos olhos
dos funcionários – tiveram de ser adotadas para não causar danos ainda maiores
à situação financeira da companhia, já que não havia indícios de quanto tempo
a pandemia iria durar. O que se imaginava era uma crise de poucos meses, mas
não foi o que ocorreu e ela se estende até hoje: no início da pandemia, a
adequação da produção gerou corte de postos de trabalho, redução de jornada
e de salário, além de desligamentos de parte dos trabalhadores que mesmo
aposentados ainda continuavam na ativa, mas integravam o grupo de risco pela
avaliação médica.
A utilização estratégica das informações foi a “arma” adotada pela
equipe de saúde ocupacional para que abrisse um espaço respeitado pela
presidência da empresa nas tomadas de decisão do comitê. O médico do
trabalho, mesmo não possuindo um cargo de gestão, como os demais membros,
atuou em um claro exercício de influência na tomada de decisão sobre os
protocolos médicos adotados. Uma de suas referências foi a de afastamento das
atividades dos funcionários que pertenciam ao chamado grupo de risco para a
Covid-19.
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Para tomar as decisões existiram situações que eram inegociáveis, que


a gente não poderia abrir mão. [...] E eu levava isso para a tomada de
decisão com a gestão e tinha que mostrar com fatos e dados que era
algo inegociável e nós precisávamos fazer a qualquer preço. Eu não
tinha como ceder aqui (MÉDICO DO TRABALHO, 2022).

Em relação ao posicionamento médico e a gestão da empresa, os


entrevistados afirmam que em alguns momentos houve divergência de opinião.
Dentre essas situações esteve a suspensão ou não das atividades produtivas
logo quando a pandemia foi decretada.

[...] parar a fábrica na visão da área médica era uma coisa que deveria
ser executada. Mas quando você olha do lado da gestão, parar a
fábrica naquele momento representava um prejuízo a ponto de não
sabermos se teríamos no futuro uma fábrica para ‘tocar’. [...] lembro
que em um momento quando trouxemos a decisão de que não
poderíamos parar a produção, a área médica então questionou o que
com este cenário precisaria ser feito e a gente foi desenrolando as
estratégias a partir dali. Com certeza a gente divergiu em alguns
momentos e cada qual se posicionou dentro daquilo que era o melhor
a se fazer de acordo com a sua linha de atuação, mas no final tinha
que se pensar no todo (GERENTE DE RECURSOS HUMANOS, 2022).

A interferência externa também foi um aspecto citado pelos


entrevistados. A empresa recebeu solicitações de órgãos como Ministério do
Trabalho para adotar práticas que, na visão da equipe médica, não eram efetivas
para o controle da pandemia. As medidas não foram acatadas sem negociação
com os órgãos e foram aplicadas com ajustes, de forma a responder à exigência
legal e respeitando as opiniões da equipe médica.

Muitas vezes fomos forçados a comprar lotes de exames para testar a


fábrica inteira. Havia algumas solicitações que tinham grandes
impactos e vinham direto da orientação de saúde do próprio Ministério
do Trabalho, como essa. A gente da área de saúde sabia que não tinha
nenhum embasamento científico para isso (MÉDICO DO TRABALHO,
2022).

Apesar das dificuldades, um contraponto levantado foi a união da equipe


em torno das orientações. O presidente ressalta que a equipe soube andar junta,
não necessariamente concordando com a direção decidida, mas foi entendido
que estar junto naquele momento era melhor que escolher outro caminho.
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A cooptação não foi verificada nas análises das entrevistas dos membros
do comitê de crise. Qualquer tentativa de mudança de opinião para a tomada de
decisão ocorreu de maneira aberta durante os encontros do grupo.
Segundo Hillyard (2000), um dos objetivos da gestão de crises é
acumular sabedoria “aprendendo juntos com o evento, a fim de prevenir, diminuir
a gravidade ou melhorar as respostas a crises futuras”. Esse processo foi
detectado na entrevista do presidente (2022, não p.): “a gente foi encontrando
práticas que eram comuns a outros gestores de outras empresas e fomos vendo
mesmo que tinham resultados bons e começamos a navegar com maior
segurança”.
O presidente relata que à medida que o tempo passava, além da troca
de práticas entre empresas similares e da busca por informações e medidas em
outros países, como na Europa, onde está situada a matriz da empresa, o comitê
de crise local conseguia avaliar melhor as possibilidades para a tomada de
decisões. Outro fator citado foi que ter a possibilidade de verificar práticas
adotadas e adaptá-las à realidade local já que o vírus demorou mais para chegar
ao Brasil se comparado à Ásia ou Europa.
Os autores Child et al (2010) defendem que o comportamento político se
manifesta no uso do poder e no exercício da influência, além de ser inevitável
durante a tomada de decisões estratégicas, pois as organizações são formadas
por coalizões de indivíduos. Apesar desse entendimento, o relato dos
entrevistados mostra que em momentos de crise as pessoas estão mais
predispostas a sacrificarem sua opinião pessoal em prol do bem comum.
Dessa forma, é muito mais desafiador quando não há mais a pressão da
crise de ter de participar e contribuir para encontrar a decisão mais satisfatória
em benefício do grupo. Para o presidente da empresa (2022), quando você não
tem opção, “você vai se esforçar porque é a sua única saída. Quando você tem
muitas opções para decidir algo, a tendência é fracionar a energia, havendo o
risco de, na dúvida, não fazer bem nenhuma coisa nem outra”.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pandemia do coronavírus gerou uma crise global, com consequências
importantes para as sociedades e suas organizações. O cenário com alto risco,
elevada incerteza, ausências de modelos preditivos anteriores e necessidade de
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interação entre múltiplos atores para a tomada de decisão, formou um contexto


relevante para o estudo de processos decisórios em organizações. Assim, a
presente produção buscou compreender os elementos relevantes no processo
decisório de grupos no contexto organizacional durante períodos de crise.
O estudo de caso permitiu a eliciação de elementos racionais e políticos
relevantes para os processos decisórios analisados. A partir do estabelecimento
de objetivos conflitantes (preservar a saúde das pessoas e o negócio), o grupo
trabalhou pela busca de informações visando minimizar a incerteza e apresentou
dificuldades em estimar as consequências de suas ações. Já os elementos
políticos identificados foram as negociações, o uso de posição hierárquica, o uso
estratégico de informações e a pressão de atores externos.
Algumas contribuições podem ser associadas ao presente trabalho. Do
ponto de vista empírico ou gerencial, a compreensão do processo de tomada de
decisão em um cenário de crise pode auxiliar na promoção de medidas
adequadas para o enfrentamento de crises. Considerando o presente caso,
visando subsidiar bons resultados em gestão de crises, recomenda-se
especialmente a adoção da máxima diferença entre os componentes de um
comitê de crise; a horizontalização do poder entre os membros deste grupo,
independentemente de seu cargo de origem; e amplo acesso a informações
internas e externas para os envolvidos na decisão e para os atores
organizacionais impactados pelo processo decisório. Estas recomendações se
justificam por permitirem a promoção de mais conteúdo informativo para o
processo decisório e a menor ocorrência de processos políticos que
prejudicariam a tomada de decisão, como a centralização de poder e
manipulação de informações.
Do ponto de vista teórico, a pesquisa realizada contribui para preencher
lacunas de entendimento sobre processos decisórios organizacionais em
momentos de crise. O desenho da pesquisa permitiu que emergissem do campo
os elementos relevantes para a compreensão do caso, sem que eles fossem
estabelecidos a priori em função do modelo teórico explicativo escolhido pelos
pesquisadores. A identificação de elementos racionais e políticos relevantes traz
melhor entendimento sobre o processo de tomada de decisão de grupos em
contextos de crise.
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Para estudos futuros recomenda-se a realização de um estudo de caso


múltiplo, visando a comparação entre organizações para identificação de
padrões de comportamento na tomada de decisão durante a pandemia da Covid-
19. Outra contribuição relevante seria a de análise contínua desse processo até
o fim da pandemia, para avaliar possíveis mudanças no cenário dos comitês ao
decorrer da evolução da doença. Recomenda-se ainda a realização de
pesquisas naturalísticas que utilizem metodologias associadas a análise
cognitiva da tarefa, visando melhor compreender a cognição dos participantes e
os entendimentos gerados a partir de sua interação.

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