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2020/2021

METABOLISMO DO COLESTEROL
E ÁCIDOS BILIARES
O colesterol é uma substância cuja estrutura contém um núcleo ciclo-pentano-peridro-
fenantreno hidroxilado em C3, com uma dupla ligação em C5, uma cadeia alifática
ramificada com 8 carbonos em C17 e dois grupos metilo, um ligado ao carbono 10 e outro
ao carbono 13. No total são 27 carbonos.

O colesterol do organismo pode estar na forma livre ou pode estar esterificado com
ácidos gordos - ésteres de colesterol. O colesterol presente nas membranas, na bílis e na
periferia das lipoproteínas plasmáticas é colesterol não esterificado. Já o que está presente
nas gotículas de gordura do citoplasma das células ou no miolo das lipoproteínas
plasmáticas está esterificado com ácidos gordos e misturado com triacilgliceróis.

Para além dos seus papeis estruturais o colesterol é o precursor dos sais biliares, das
hormonas esteroides (sexuais e do córtex suprarrenal) e da vitamina D.

O colesterol plasmático é um componente de lipoproteínas, maioritariamente das LDL,


mas também das HDL, das VLDL e das outras lipoproteínas. Cerca de 75% do colesterol
plasmático encontra-se esterificado com ácidos gordos no miolo das lipoproteínas. O
restante está na forma não esterificada sendo um dos componentes da monocamada
exterior.

Em condições normais a quantidade de colesterol total do organismo mantém-se


relativamente constante, pois a quantidade que é transformada (em sais biliares,
hormonas sexuais, corticosteroides e vitamina D) ou excretada nas fezes é reposta, quer
pela dieta, quer por síntese endógena. Do ponto de vista quantitativo a via mais
importante de eliminação do colesterol é a sua conversão em sais biliares.

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SÍNTESE DO COLESTEROL

A síntese de colesterol ocorre em todas as células nucleadas do organismo, mas é mais


importante no fígado.

Na tabela abaixo conseguimos perceber, sistematicamente e mjito resumidamente a via


da síntese do colesterol:

1. Na formação de uma molécula de colesterol gastam-se 18 moléculas de acetil-


CoA, que levam à formação de 6 moléculas de hidroximetilglutaril-CoA (6C
no resíduo hidroximetilglutarilo)
2. As moléculas de HMG-CoA convertem-se, por sua vez, em 6 moléculas de
mevalonato.
3. De seguida, as 6 moléculas de mevalonato (6C) são convertidas em 6 unidades
isoprenoides (5C) ativadas: primeiro, 6 moléculas de isopentenil-pirofosfato,
sendo que, de seguida, 2 destas moléculas se convertem no isómero dimetilalil-
pirofosfato.
4. A partir de 2 moléculas de dimetilalil-pirofosfato e 2 de isopentenil- pirofosfato
formam-se 2 moléculas de geranil-pirofosfato (10C) sobrando 2 moléculas de
isopentenil- pirofosfato.
5. Estas 2 moléculas de isopentenil-pirofosfato vão reagir com as 2 moléculas de
geranil-pirofosfato formando 2 moléculas de farnesil-pirofosfato (15C).
6. Duas moléculas de farnesil-pirofosfato vão reagir entre si para formar o
esqualeno (30C) que, de seguida, se converte em lanosterol (30C).
7. O lanosterol vai depois, numa série de reações, converter-se em colesterol (27C).

1. TRANSPORTE DE ACETIL-COA

O acetil-CoA é formado na matriz mitocondrial, através do decurso do catabolismo de


nutrientes. Assim, como a síntese do colesterol se dá no citoplasma e o acetil-CoA é
substrato desta via, este tem de ser transportado da matriz mitocondrial para o citoplasma.

Este transporte envolve:

a. A ação da síntase do citrato dentro da matriz mitocondrial


(acetil-CoA + oxalacetato → citrato + CoA (matriz da mitocôndria)
b. A saída do citrato para o citoplasma

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c. A ação da líase do ATP-citrato já no citoplasma


citrato + CoA + ATP → acetil-CoA + oxalacetato + ADP + Pi (citoplasma)

2. SÍNTESE DE HMG-COA

A partir de 3 moléculas de acetil-CoA forma-se hidroximetilglutaril-CoA (HMG-CoA)


por ação sequenciada de duas enzimas presentes no citoplasma:

1. A tiólase
2 acetil-CoA → acetoacetil-CoA + CoA
2. A síntase do HMG-CoA
acetoacetil-CoA + acetil-CoA → HMG-CoA + CoA

Embora a sequência reativa seja a mesma, estas enzimas são isoenzimas das que, nas
mitocôndrias hepáticas, estão envolvidas na síntese dos corpos cetónicos. Formado a
partir de 3 resíduos acetilo (2C) do acetil-CoA, o resíduo hidroximetilglutarilo do HMG-
CoA contém 6 carbonos.

3. SÍNTESE DE MEVALONATO

O passo limitante da velocidade da síntese do colesterol é a síntese do mevalonato (6C)


que é catalisada pela redútase do HMG-CoA, uma enzima que está presente na
membrana do retículo endoplasmático.

HMG-CoA + 2 NADPH → mevalonato + CoA + 2 NADP+

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4. SÍNTESE DE ESQUALENO

Em 3 passos reativos, o mevalonato é fosforilado por ação de duas cínases e


descarboxilado gerando-se o isopentenil-pirofosfato.

mevalonato + 3 ATP → isopentenil-pirofosfato + 3 ADP + Pi + CO2

O isopentenil-pirofosfato é de seguida isomerizado a dimetilalil-pirofosfato.

isopentenil-pirofosfato ↔ dimetilalil-pirofosfato

O isopentenilo e o dimetilalilo são álcoois monoinsaturados e ramificados com 5


carbonos e são coletivamente designados por unidades isoprenoides. As formas ligadas
ao pirofosfato são as formas “ativadas” e participam como substratos em reações
catalisadas por uma transférase, designada por síntase do farnesil-pirofosfato. Esta
transférase catalisa a síntese de geranil-pirofosfato (10C) a partir de uma molécula de
dimetilalil-pirofosfato e outra de isopentenil-pirofosfato.

isopentenil-pirofosfato + dimetilalil-pirofosfato → geranil-pirofosfato + PPi

Além disso, a síntase do farnesil-pirofosfato também catalisa a reação da síntese de


farnesil-pirofosfato (15C) quando uma molécula do geranil-pirofosfato formado reage
com outra molécula de isopentenil-pirofosfato.

geranil-pirofosfato + isopentenil-pirofosfato → farnesil-pirofosfato + PPi

O esqualeno (30C) forma-se a partir de duas moléculas de farnesil-pirofosfato. A síntase


do esqualeno é uma redútase dependente do NADPH que está presente no retículo
endoplasmático.

farnesil-pirofosfato + NADPH → esqualeno + 2 PPi + NADP+

O pirofosfato libertado nas ações catalíticas da síntase do farnesil-pirofosfato e da


síntase do esqualeno vai ser hidrolisado pela ação catalítica da pirofosfátase inorgânica
(o que confere um caráter irreversível a ambas as reações):

PPi + H2O → 2 Pi

A equação soma que descreve a síntese do esqualeno a partir do acetil-CoA


citoplasmático é a seguinte:

18 acetil-CoA + 18 ATP + 13 NADPH → esqualeno + 18 CoA +


18 ADP + 18 Pi + 6 CO2 + 13 NADP+

NOTA: Doze das treze moléculas de NADPH que se oxidam neste processo são oxidadas
pela ação da redútase do HMG-CoA e a restante pela ação catalítica da síntase do
esqualeno.

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5. SÍNTESE DE LANOSTEROL E DE COLESTEROL

O esqualeno sofre a ação sequenciada de duas enzimas levando à formação do primeiro


composto cíclico da via metabólica: o lanosterol.

As reações envolvidas na transformação do lanosterol (30C) em colesterol (27C) são


muito complexas e mal conhecidas no que se refere à ordem em que ocorrem, mas
envolvem a libertação de três carbonos na forma de formato e CO2. No processo estão
envolvidas oxídases e oxigénases de função mista em que ocorre a oxidação do
NADPH, de uma desidrogénase dependente do NAD+ e de várias redútases
dependentes do NADPH. A equação soma que descreve a síntese do colesterol a partir
de esqualeno é a seguinte:

esqualeno + 16 NADPH + 2 NAD+ + 11 O2 →


colesterol + formato + 2 CO2 + 16 NADP+ + 2 NADH

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A seguinte equação corresponde ao processo global da síntese de colesterol a partir de 18


moléculas de acetil-CoA:

18 acetil-CoA + 18 ATP + 29 NADPH + 2 NAD+ + 11 O2 → colesterol + formato +


8 CO2 + 18 ADP + 18Pi + 18 CoA + 29 NADP+ + 2 NADH

Dos 36 átomos de carbono existentes nos resíduos de acetato das 18 moléculas de acetil-
CoA donde se partiu, apenas 27 passam a fazer parte do colesterol. Os nove átomos de
carbono sobrantes perdem-se na forma de CO2 (8 moléculas) e de formato (uma
molécula).

Com exceção da redútase do HMG-CoA, todas as enzimas envolvidas na conversão de


acetil-CoA em farnesil-pirofosfato são enzimas do citoplasma. Tal como a redútase do
HMG-CoA, todas as enzimas envolvidas na conversão do farnesil-pirofosfato em
colesterol são enzimas da membrana do retículo endoplasmático.

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FARNESIL-PIROFOSFATO E UNIDADES ISOPRENOIDES

O farnesil-pirofosfato (15C), para além de poder originar o esqualeno, também pode


reagir com uma ou mais moléculas de isopentenil-pirofosfato (5C) formando unidades
poli-isoprenoides ativadas com um número de carbonos que é um múltiplo de 5.

Estas unidades estão na origem de compostos como, por exemplo, a ubiquinona (da
cadeia respiratória), o dolicol (álcool envolvido na N-glicosilação de proteínas no retículo
endoplasmático) e também participa na formação do grupo heme a dos citocromos a e
a3 do complexo IV da cadeia respiratória.

Além disso, as unidades poli-isoprenoides ativadas podem ser transferidas para


proteínas que passam a designar-se por proteínas preniladas. As cadeias isoprenoides
são hidrofóbicas e têm um papel na ligação (não covalente) das moléculas de que fazem
parte às membranas das células.

DIGESTÃO E ABSORÇÃO DO COLESTEROL

Os ésteres de colesterol da dieta são hidrolisados no lúmen intestinal por ação de uma
hidrólase de origem pancreática (estérase de ésteres de colesterol). Para a absorção do
colesterol é indispensável a presença de sais biliares no lúmen intestinal - sem formação
das micelas mistas o colesterol não entra em contacto com a membrana celular do polo
apical dos enterócitos.

O transporte de colesterol para dentro dos enterócitos é mediado pelo transportador


NPC1L1, mas uma parte do colesterol que entra para os enterócitos acaba por sair para o
lúmen do intestino via ação (transporte ativo) dos transportadores ABCG5 e ABCG8.

Nos enterócitos, o colesterol é reesterificado por ação da ACAT (acil-colesterol-acil-


transférase):

acil-CoA + colesterol → éster de colesterol + CoA

Os ésteres de colesterol formados e o colesterol não esterificado são depois incorporados


nos quilomicra que acabam por aparecer no plasma sanguíneo a seguir às refeições. Os
ésteres de colesterol, juntamente com os triacilgliceróis, fazem parte do miolo dos
quilomicra. Já o colesterol livre fica, juntamente com fosfolipídeos, na monocamada
exterior destas partículas.

O colesterol presente no fígado pode ter tido origem:

a. Na dieta, aquando da endocitose dos quilomicra remanescentes, que ocorre


através da ligação das apoE presentes na periferia destas partículas aos recetores
das LDL e aos LRP
b. Na sua síntese nos hepatócitos
c. Na captação endocítica das IDL e LDL
d. Na captação dos ésteres de colesterol das HDL2 via ligação destas partículas aos
recetores de limpeza B1 hepáticos (transporte reverso de colesterol)

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O fígado excreta colesterol na bílis (também exreta colesterol não esterificado, sais
biliares formados a partir do colesterol), mas parte do colesterol hepático passa para a
corrente sanguínea incorporado nas VLDL. As VLDL contêm colesterol não esterificado
e esterificado. Tal como em todas as células do organismo, a esterificação hepática do
colesterol ocorre por ação da ACAT (acil-colesterol-acil-transférase). Como já sabemos,
as VLDL podem (via IDL) dar origem às LDL.

O principal mecanismo pelo qual o colesterol plasmático (esterificado e não esterificado)


é captado para os tecidos envolve a ação dos recetores das LDL que se ligam às LDL
(e também às IDL e quilomicra remanescentes) permitindo a sua endocitose. Enquanto
os recetores são recuperados e regressam à membrana celular, dentro das células os
ésteres de colesterol são hidrolisados nos lisossomas levando à formação de colesterol
livre. Uma parte deste colesterol e uma parte do que é sintetizado pelas células é
esterificado com ácidos gordos gerando ésteres de colesterol (ação da ACAT) que se
agrupam (juntamente com triacilgliceróis) em gotículas intracelulares, constituindo uma
reserva de colesterol.

NOTA: A importância das LDL resulta do facto de fornecerem colesterol às células onde
este composto tem papeis biológicos relevantes.

REGULAÇÃO DA SÍNTESE E DA CAPTAÇÃO DE COLESTEROL

O colesterol não esterificado intracelular está maioritariamente nas membranas das


células: é este colesterol que regula negativamente, quer a síntese de colesterol, quer a
captação das LDL plasmáticas.

Estes efeitos do colesterol devem-se à inibição da transcrição de genes codificadores de


enzimas da via da síntese de colesterol, como, por exemplo, os que codificam a síntase
do HMG-CoA, a redútase do HMG-CoA e o gene do recetor das LDL.

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O mecanismo de regulação envolve um fator de transcrição denominado SREBP-2 que,


para ter ação ativadora da transcrição dos genes acima referidos, tem de ser
primeiramente ativado por proteólise: um dos fragmentos proteicos resultantes desta
proteólise é a forma ativa do fator de transcrição SREBP-2.

A proteólise é ativada por uma proteína denominada SCAP (proteína ativadora da


clivagem do SREBP) que é sensível ao nível de colesterol nas membranas da célula.

• A clivagem proteolítica e a consequente ativação do SREBP-2 estão aumentadas


quando os níveis de colesterol baixam nas células.
• Quando os níveis de colesterol celular estão aumentados este processo hidrolítico
não acontece e não ocorre a ativação da transcrição dos genes codificadores da
síntase HMG-CoA, da redútase do HMG-CoA e do recetor das LDL.

O SREBP-2 é um componente de um mecanismo homeostático que promove a síntese e


a captação celular de colesterol do plasma quando este baixa nas células. Ao provocar
aumento da atividade dos recetores de LDL, a diminuição do colesterol nas células faz
baixar a concentração de LDL no plasma.

Transporte para o Golgi, onde se dará a


a proteólise do SREBP-2, fazendo com
que este se desloque para o núcleo.

Algumas hormonas também têm efeitos no metabolismo do colesterol.

• No fígado, a insulina ativa e a glicagina inibe a atividade da redútase de HMG-


CoA (ver esquema abaixo).
• As hormonas tiroideias estimulam simultaneamente a síntese de colesterol (via
aumento da transcrição do gene da redútase de HMG-CoA) e a síntese de recetores
de LDL.

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NOTA: O efeito das hormonas tiroideias nos recetores de LDL permite compreender que
estas hormonas baixem a concentração plasmática de LDL. Assim, no hipotiroidismo os
doentes têm o colesterol plasmático (associado às LDL) aumentado.

Como podemos observar na figura acima, a insulina ativa a redútase do HMG-CoA por
2 meios:

1. Ativa a fosfátase de proteínas que desfosforila a redútase do HMG-CoA,


ativando-a
2. Ativa a fosfátase de proteínas que vai também desfosforilar a AMPK. Ao
desfosforilar a AMPK, esta vai ficar inativa, não fosforilando a redútase do
HMG-CoA, fazendo com que esta se mantenha ativa.

Já a glicagina, ao ativar a cíclase do adenilato, aumenta a concentração de cAMP, o que


vai ativar a PKA. A PKA, por sua vez, vai fosforilar o inibidor-1 da fosfátase de
proteínas, o que vai fazer com que a fosfátase de proteínas fique inibida. Assim, a
cínase da AMPK já pode fosforilar a AMPK, o que a vai ativar. Com a AMPK ativa, esta
vai fosforilar a redútase do HMG-CoA, inativando-a.

Através destes mecanismos, conseguimos concluir que a insulina estimula e a glicagina


inibe a síntese de colesterol.

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ELIMINAÇÃO DO COLESTEROL

Ao contrário do que acontece com os glicídeos, os triacilgliceróis (e outros lipídeos) e as


proteínas em que em que os carbonos são eliminados nos pulmões na forma de CO2, o
colesterol é eliminado nas fezes na forma de colesterol não esterificado e de sais
biliares, que passaram para o lúmen intestinal incorporados na bílis.

Nos tecidos extrahepáticos, o colesterol que vai sendo sintetizado e o que é captado do
plasma também acaba eliminado na bílis através do chamado transporte reverso do
colesterol.

O colesterol dos tecidos extra-hepáticos é transportado para o fígado via HDL e, no


processo de captação do colesterol dos tecidos pelas HDL, participam os transportadores
ABC-A1 e ABC-G1 e também o recetor de limpeza B1 (SR-B1). À medida que o
colesterol vai passando dos tecidos para as HDL, vai sendo esterificado (ação da LCAT
- lecitina colesterol acil-transférase) e incorporado no miolo das HDL que, à medida que
aumentam de tamanho, passam a designar-se primeiro por HDL3 e depois por HDL2.

Na chamada via direta do transporte reverso do colesterol, os ésteres de colesterol do


miolo das HDL2 vão sendo captados no fígado e neste processo também participa o
recetor de limpeza B1 (SR-B1) que, aqui, permite a entrada de colesterol para as células,
ao contrário do que acontece nas células dos tecidos extra-hepáticos. Após verterem o
colesterol no fígado, as HDL2 originam partículas mais pequenas, as HDL3 e as HDL pré-
β que permanecem no plasma sanguíneo e vão iniciar um novo ciclo de captação de
colesterol.

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Na chamada via indireta do transporte reverso do colesterol, os ésteres de colesterol


do miolo das HDL são transferidos para o miolo das LDL, VLDL e quilomicra em troca
por triacilgliceróis destas partículas (ação da CETP - proteína de transferência de ésteres
de colesterol ). Os ésteres de colesterol que passaram para as LDL, VLDL e quilomicra
acabam captados pelo fígado aquando da endocitose das LDL (via recetores das LDL)
ou das VLDL remanescentes e quilomicra remanescentes (via recetores das LDL e LRPs).

SAIS BILIARES

Os sais biliares são esteroides (contêm ciclopentanoperidrofenantreno hidroxilado) e são


sintetizados no fígado a partir do colesterol. No polo canalicular (voltado para os
canalículos biliares) dos hepatócitos existem transportadores (transporte ativo) que
catalisam a excreção dos sais biliares para a bílis. Depois de excretados na bílis e
chegarem ao lúmen do duodeno (durante a digestão), uma parte dos sais biliares acaba
por se perder nas fezes.

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No entanto, em grande parte, os sais biliares são reabsorvidos na parte terminal do


intestino delgado, sendo de novo excretados no fígado. Este processo designa-se por ciclo
entero-hepático dos sais biliares (ver figura acima) e envolve transportadores situados
nos polos apical e basal dos enterócitos (íleo) e nos polos capilares e canaliculares dos
hepatócitos.

A bílis, além de conter sais biliares, contém também colesterol (excretado no polo
canalicular dos hepatócitos por transporte ativo) e fosfolipídos.

O colesterol mantém-se solúvel na bílis devido à presença dos sais biliares e dos
fosfolipídos mas, quando há alterações nas proporções dos componentes da bílis, o
colesterol pode precipitar dentro da vesícula biliar dando origem a cálculos.

Tal como acontece com os sais biliares, uma parte do colesterol excretado na bílis acaba
por se perder nas fezes. Uma outra parte do colesterol da bílis é, juntamente com o
colesterol da dieta, reabsorvida e incorporada nos quilomicra.

SÍNTESE DE SAIS BILIARES

Os sais biliares costumam classificar-se em:

• Primários (originam-se diretamente a partir de colesterol)


• Secundários (resultam da transformação dos primários pelo microbiota durante a
sua passagem pelo intestino)

1. SAIS BILIARES PRIMÁRIOS

Os sais biliares são sintetizados nos hepatócitos e esta síntese é muito complexa. Os
ácidos biliares primários são o glicocólico, o taurocólico, o glicoquenodesoxicólico e o
tauroquenodesoxicólico. O prefixo glico significa que contêm um resíduo de glicina e o
prefixo tauro que contêm um resíduo de taurina (derivado da cisteína).

A reação limitante da velocidade da síntese dos sais biliares é a catalisada pela 7-α-
hidroxílase do retículo endoplasmático, uma mono-oxigénase de função mista da
família dos citocromos P450 também designada por CYP7A1.

colesterol + NADPH + O2 → 7-α-hidroxicolesterol + NADP+ + H2O

O ácido biliar sintetizado em maior quantidade é o ácido cólico, que contém 24 carbonos
e que, para além do grupo hidroxilo em C3 (o que já existia no colesterol) e C7 (formado
pela ação da 7-α-hidroxílase), contém um grupo hidroxilo em C12. No decurso da
síntese do ácido cólico a partir do 7-α-hidroxicolesterol, ocorre uma hidroxilação no
carbono 12 e liberta-se propionil-CoA. O ácido cólico, por ação de uma sintétase com
uma atividade similar à sintétase de acil-CoA que envolve os ácidos gordos, é
tioesterificado com a coenzima A.

colato + CoA + ATP → colil-CoA + AMP + PPi

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Seguidamente ocorre a transferência do resíduo colilo da colil-CoA formada para a


glicina ou para a taurina gerando, respetivamente, os ácidos glicocólico ou taurocólico.

colil-CoA + glicina ou taurina → glicocolato ou taurocolato + CoA

O processo de síntese do ácido quenodesoxicólico é semelhante mas, neste caso, não


ocorre a hidroxilação em C12. A conjugação com a glicina e a taurina também tem lugar
gerando os ácidos glicoquenodesoxicólico e tauroquenodesoxicólico.

quenodesoxicolil-CoA + glicina ou taurina → glicoquenodesoxicolato ou


tauroquenodesoxicolato + CoA

2. SAIS BILIARES SECUNDÁRIOS

Os ácidos biliares secundários resultam da ação das bactérias intestinais que promovem,
quer a rotura das ligações com a taurina e a glicina, quer a redução do hidroxilo em C7.
Estas reações geram os ácidos desoxicólico (derivado do ácido cólico e contendo dois
grupos hidroxilo, um em C3 e outro em C12) e o litocólico (derivado do ácido
quenodesoxicólico e contendo apenas um grupo hidroxilo em C3).

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REGULAÇÃO DA 7-Α-HIDROXÍLASE

A síntese de sais biliares é regulada ao nível da transcrição do gene da 7-α-hidroxílase.


A síntese da 7-α-hidroxílase é estimulada quando a concentração intracelular de sais
biliares baixa no fígado ou a de colesterol aumenta.

O efeito inibidor dos sais biliares é mediado por um fator de transcrição denominado
FXR. O FXR liga-se aos sais biliares e esta forma ligada tem efeito inibidor na transcrição
do gene da 7-α-hidroxílase.

A colestiramina é um fármaco que pode ser usado para baixar o colesterol plasmático.
O seu mecanismo de ação baseia-se na sua capacidade de se ligar aos sais biliares no
lúmen do intestino impedindo a sua reabsorção. A diminuição dos sais biliares no
fígado provoca diminuição da forma ligada do FXR o que estimula (desinibição) a síntese
da 7-α-hidroxílase e, consequentemente, o catabolismo do colesterol (ou seja, a sua
conversão em sais biliares).

CURIOSIDADE: TRATAMENTO DA HIPERCOLESTEROLEMIA

Existe uma correlação positiva entre a concentração de colesterol total plasmático (e o


colesterol das LDL) e desenvolvimento de lesões ateroscleróticas nas artérias. No caso
do colesterol das HDL, a correlação é negativa.

O enriquecimento da dieta em ácidos gordos poli-insaturados pode ser útil no


tratamento da hipercolesterolemia pois provoca inibição da transcrição de genes de
enzimas da via da síntese de colesterol como a redútase do HMG-CoA e a síntase do
farnesil-pirofosfato.

Atualmente, os medicamentos mais usados para baixar o colesterol das LDL são os
inibidores da redútase da HMG-CoA (as estatinas): o efeito inibidor das estatinas
deve-se ao facto de competirem com o substrato fisiológico (o HMG-CoA) pelo centro
ativo da enzima.

Um outro medicamento que pode ser usado no tratamento da hipercolesterolemia (quando


esta resulta de aumento das LDL) é o ezetimibe que inibe, nos enterócitos, o transportador
NPC1L1.

A inibição da síntese endógena de colesterol ou a diminuição da sua absorção intestinal


provoca diminuição da sua concentração intracelular e, consequentemente, aumento (via
SREBP-2) da atividade dos recetores das LDL (nomeadamente no fígado) e
consequente diminuição da concentração plasmática das LDL.

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