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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

JULGAMENTO ADI 5322 – LEI DOS CAMINHONEIROS

O Supremo Tribunal Federal concluiu, no dia 30/06/2023, o julgamento da Ação Direta de


Inconstitucionalidade nº 5322, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Transportes Terrestres – CNTTT em 20/05/2015.

Esta ação questionava a constitucionalidade de vários artigos da Lei 13.103, de 02 de março


de 2015, que dispõe sobre o exercício da profissão de motorista e alterou, dentre outros,
dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho e do Código de Trânsito Brasileiro para
disciplinar a jornada de trabalho e tempo de direção do motorista.

O STF iniciou o julgamento desta ação em abril de 2020, sendo adiado por sucessivos pedidos
de vista, só concluindo a análise no dia 30/06/2023. Por maioria, foi julgada parcialmente
procedente a ação, conforme voto do relator, Ministro Alexandre de Morais, para:

Em relação à Consolidação das Leis do Trabalho:


(i) declarar a inconstitucionalidade parcial do § 6º do art. 168, com redução de texto a
fim de que permaneça vigente sem a seguinte passagem: [...] e por ocasião do
desligamento […];
(ii) declarar a constitucionalidade do art. 235-C, caput, dando-lhe interpretação
conforme à Constituição Federal de maneira a impossibilitar sua utilização como burla
à jornada conhecida como “12 por 36” (CLT, art. 235-F);
(iii) declarar a constitucionalidade do § 3º do art. 235-D, atribuindo-lhe interpretação
conforme à Constituição Federal de modo a excluir a possibilidade de reflexos
financeiros do tempo de espera previsto na norma, dada a inconstitucionalidade dos
§§ 8º e 9º do art. 235-C;
(iv) declarar a inconstitucionalidade do § 3º do art. 235-C; dos §§ 8º, 9º e 12 do art.
235-C; do caput e §§ 1º, 2º, 5º e 7º do art. 235-D; e do inciso III do art. 235-E; e

Quanto ao Código de Trânsito Brasileiro:


(v) declarar a inconstitucionalidade do § 3º do art. 67-C.

Estes artigos tratam de períodos à disposição e descanso do motorista. Abaixo, a transcrição


integral dos artigos para uma melhor visualização, sendo que as partes que foram declaradas
inconstitucionais estão destacadas em amarelo:

Código de Trânsito Brasileiro:


Art. 67-C. É vedado ao motorista profissional dirigir por mais de 5 (cinco) horas e meia
ininterruptas veículos de transporte rodoviário coletivo de passageiros ou de
transporte rodoviário de cargas.

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§ 1º Serão observados 30 (trinta) minutos para descanso dentro de cada 6 (seis) horas
na condução de veículo de transporte de carga, sendo facultado o seu fracionamento
e o do tempo de direção desde que não ultrapassadas 5 (cinco) horas e meia contínuas
no exercício da condução.
(...)
§ 3º O condutor é obrigado, dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, a observar
o mínimo de 11 (onze) horas de descanso, que podem ser fracionadas, usufruídas no
veículo e coincidir com os intervalos mencionados no § 1º, observadas no primeiro
período 8 (oito) horas ininterruptas de descanso.

Para os motoristas de carga em geral (não só os empregados) não é mais possível fracionar o
intervalo de 11h entre uma jornada e outra de trabalho, bem como não serão computados
nestas 11h os intervalos de 30min a cada 5h30 contínuas de direção.

Consolidação das Leis do Trabalho:


Art. 168 - Será obrigatório exame médico, por conta do empregador, nas condições
estabelecidas neste artigo e nas instruções complementares a serem expedidas pelo
Ministério do Trabalho: (...)
§ 6º Serão exigidos exames toxicológicos, previamente à admissão e por ocasião do
desligamento, quando se tratar de motorista profissional, assegurados o direito à
contraprova em caso de resultado positivo e a confidencialidade dos resultados dos
respectivos exames.

Foi retirada a obrigatoriedade da realização do exame toxicológico no momento da rescisão


contratual, por se entender desnecessária a verificação e de violação a vida privada, pois não
mais exerceria a atividade de motorista. Em sendo contratado por outra empresa,
obrigatoriamente será realizado o exame na admissão.

Art. 235-C. A jornada diária de trabalho do motorista profissional será de 8 (oito)


horas, admitindo-se a sua prorrogação por até 2 (duas) horas extraordinárias ou,
mediante previsão em convenção ou acordo coletivo, por até 4 (quatro) horas
extraordinárias.
(...)
§ 3º Dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, são asseguradas 11 (onze) horas
de descanso, sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos
de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei no 9.503, de 23 de
setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito)
horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16
(dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período.
(...)
§ 8º São considerados tempo de espera as horas em que o motorista profissional
empregado ficar aguardando carga ou descarga do veículo nas dependências do
embarcador ou do destinatário e o período gasto com a fiscalização da mercadoria

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transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias, não sendo computados como
jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias.
§ 9º As horas relativas ao tempo de espera serão indenizadas na proporção de 30%
(trinta por cento) do salário-hora normal.
(...)
§ 12. Durante o tempo de espera, o motorista poderá realizar movimentações
necessárias do veículo, as quais não serão consideradas como parte da jornada de
trabalho, ficando garantido, porém, o gozo do descanso de 8 (oito) horas ininterruptas
aludido no § 3º.

Foi considerado constitucional o caput deste artigo, para determinar a sua interpretação
conforme a constituição, ou seja, permitindo que em situações excepcionais seja a jornada
estendida em até 04 horas extras, não permitindo, contudo, que seja fixada a jornada
ordinária em 12 horas. Não é permitido, assim, fixar a jornada em escala de 12x36 ao
motorista.

O §3º foi julgado inconstitucional pois entendeu-se que não é possível fracionar o intervalo
de 11h entre o término de uma jornada e o início de outra, devendo este intervalo ser
contínuo.

Os §§8º e 9º foram julgados inconstitucionais, entendendo-se que o tempo à disposição


(carregamento, descarregamento, fiscalização) são tempo à disposição do empregador e
devem ser remunerados como hora normal de trabalho ou horas extras, caso ultrapassem o
limite diário de jornada. Não é possível, assim, a sua mera indenização em 30% da hora
normal, em espécie de analogia a horas de sobreaviso.

Por fim, o §12 considerado inconstitucional pois a realização de manobras importa em tempo
à disposição do empregador e deve ser computado na jornada.

Art. 235-D. Nas viagens de longa distância com duração superior a 7 (sete) dias, o
repouso semanal será de 24 (vinte e quatro) horas por semana ou fração trabalhada,
sem prejuízo do intervalo de repouso diário de 11 (onze) horas, totalizando 35 (trinta
e cinco) horas, usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu
domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do
referido repouso.
§ 1º É permitido o fracionamento do repouso semanal em 2 (dois) períodos, sendo um
destes de, no mínimo, 30 (trinta) horas ininterruptas, a serem cumpridos na mesma
semana e em continuidade a um período de repouso diário, que deverão ser
usufruídos no retorno da viagem.
§ 2º A cumulatividade de descansos semanais em viagens de longa distância de que
trata o caput fica limitada ao número de 3 (três) descansos consecutivos.
(...)
§ 3º O motorista empregado, em viagem de longa distância, que ficar com o veículo
parado após o cumprimento da jornada normal ou das horas extraordinárias fica
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dispensado do serviço, exceto se for expressamente autorizada a sua permanência
junto ao veículo pelo empregador, hipótese em que o tempo será considerado de
espera.
(...)
§ 5º Nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas trabalhando no
mesmo veículo, o tempo de repouso poderá ser feito com o veículo em movimento,
assegurado o repouso mínimo de 6 (seis) horas consecutivas fora do veículo em
alojamento externo ou, se na cabine leito, com o veículo estacionado, a cada 72
(setenta e duas) horas.
(...)
§ 7º Nos casos em que o motorista tenha que acompanhar o veículo transportado por
qualquer meio onde ele siga embarcado e em que o veículo disponha de cabine leito
ou a embarcação disponha de alojamento para gozo do intervalo de repouso diário
previsto no § 3º do art. 235-C, esse tempo será considerado como tempo de descanso.

O caput, § 1º e 2º tratavam da possibilidade de prorrogar o descanso semanal remunerado


nos casos de viagem de longa duração, assim compreendidas as que durassem mais de 7 dias.
Também era prevista a possibilidade de antecipação do gozo desde descanso, ou mesmo a
sua cumulação. Agora é obrigatória a concessão do descanso semanal remunerado ao
motorista (as 24h acrescidas das 11h do interjornada) da mesma forma que os empregados
em geral, ou seja, no máximo após o sexto dia consecutivo de trabalho.

Os §§ 5º e 7º foram considerados inconstitucionais, não sendo permitido ao motorista


descansar com o veículo em movimento, no caso de viagens em duplas de trabalho. O período
de descanso somente será considerado se for gozado fora do veículo ou com o mesmo parado.

Art. 235-E. Para o transporte de passageiros, serão observados os seguintes


dispositivos:
(...)
III - nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas no curso da mesma
viagem, o descanso poderá ser feito com o veículo em movimento, respeitando-se os
horários de jornada de trabalho, assegurado, após 72 (setenta e duas) horas, o repouso
em alojamento externo ou, se em poltrona correspondente ao serviço de leito, com o
veículo estacionado.

Seguindo a mesma linha dos §§ 5º e 7º do art. 235-D que trata dos motoristas de transporte
de carga, o inciso III do art. 235-E, que trata dos motoristas de transporte de passageiros
também foi considerado inconstitucional, devendo o período de descanso ser computado
apenas fora do veículo ou com o mesmo parado.

Estas declarações de inconstitucionalidade trarão grande impacto ao setor, uma vez que será
necessário grande ajuste a toda a programação de viagens, duração das mesmas e
organização das escalas dos motoristas, com consequente aumento de custos.

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Não houve a publicação da certidão de julgamento ou do acórdão referentes a esta ação. O
STF também não se pronunciou a respeito de possível modulação de efeitos desta decisão, ou
seja, se retroage a publicação da lei ou se só terá efeitos futuros a partir do julgamento, que
possivelmente será feito em sede de futuros embargos declaratórios das partes envolvidas.

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