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Eventos extremos, que em muitas cidades incluem ondas de calor, secas, chuvas intensas e
inundações costeiras, são projectados para aumentar em frequência e intensidade (IPCC, 2014).
A urbanização tende a ser associada com o aumento na temperatura do ar, o efeito chamado de
“ilha urbana de calor”. Centros urbanos e cidades são por vezes vários graus mais quentes do que
as áreas circundantes devido à presença de materiais que absorvem calor, e com um resfriamento
evaporativo causado pela falta de vegetação ou corpos de água. Alguns eventos climáticos
extremos serão agravados em condições de aquecimento global. Desde o ano 1950, as regiões
Sudeste e Sul do Brasil experimentam aumento na frequência de dias com chuvas intensas, assim
como aumento na frequência de ondas de calor e de dias secos consecutivos, o que significaria
chuva intensa concentrada em poucos dias com períodos secos e quentes entre eventos chuvosos;
já no Nordeste, a frequência de dias secos consecutivos aumenta em extensão e intensidade
(Magrin et al., 2014). Em escala mundial, as zonas urbanas vivenciaram uma multiplicação das
ondas de calor nos últimos 40 anos. Segundo Mishra et al. (2015), cujo estudo não contempla
cidades costeiras no Brasil, entre 1973 e 2012, quase a metade (48%) das 217 aglomerações
estudadas passaram por um aumento dos dias muito quentes, e dois terços delas de noites
também de muito calor. O agravamento das ondas de calor em zonas urbanas se acelerou nos
últimos anos, ao mesmo tempo em que houve uma queda das ondas de frio (as mais importantes
datam de 1973, 1974, 1976, 1981 e 1983), e em 60% delas, os dias com ventos intensos também
diminuíram. Além disso, apenas 17% das zonas urbanas estudadas registraram um aumento dos
dias de fortes chuvas, e 10% das de caráter torrencial. Esse padrão também foi identificado em
São Paulo (Marengo et al., 2013) e Rio de Janeiro (Dereczynski et al., 2013). Uma onda de calor
que atingiu o litoral de São Paulo em fevereiro de 2010 provocou a morte de pelo menos 32
pessoas com idades entre 60 e 97 anos na cidade de Santos, em apenas dois dias (Secretaria
Municipal de Saúde da cidade de Santos - http:// oglobo.globo.com/brasil/onda-de-calor-
provocou-morte-de-32-idosos-em-santosem-sp-diz-prefeitura 3054640#ixzz3ZpBxPkTR).
Vulnerabilidade das cidades costeiras brasileiras frente às mudanças climáticas 2.2
Vulnerabilidades a perigos e desastres naturais nos cenários atuais e futuros de mudanças
climáticas 25 PBMC - Relatório impacto, vulnerabilidade e adaptação das cidades costeiras
brasileiras às mudanças climáticas Almeida et al. (2016) calcularam u
Almeida et al. (2016) calcularam um conjunto de índices que apontam a vulnerabilidade e o risco
actual de ocorrer desastres associados a quatro tipos de perigos naturais – enchentes/enchentes-
relâmpago, secas/estiagens, escorregamentos e elevação do NMM, para cada um dos 5.570
municípios do Brasil. Para tanto, os autores utilizaram o índice DRI (Disaster Risk Indicators),
que agrupa vários índices de vulnerabilidade – exposição (Figura 2.3), suscetibilidade (Figura
2.4), capacidade de lidar com o evento e capacidade adaptativa (Figura 2.5), para obter a
vulnerabilidade (Figura 2.6), sendo o risco final para o Brasil (DRIB), calculado em relação à
ocorrência dos quatro tipos de eventos extremos somados (Figura 2.7). Os resultados para a
região costeira do Brasil indicam que a exposição a enchentes é alta em praticamente todos os
estados; a exposição a secas é alta nos estados do Nordeste, no extremo sul da Bahia, no Espírito
Santo e Rio de Janeiro; e a exposição a escorregamentos é alta na costa de Santa Catarina, norte
de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Pernambuco. Em termos absolutos, a cidade do
Rio de Janeiro possui mais de 2 milhões de pessoas expostas a escorregamentos e 800 mil
expostas a secas e estiagens. Fortaleza tem mais do que 650 mil expostas a secas e estiagens. As
cidades de Vila Velha e Vitória (Espírito Santo), Salvador (Bahia) e Santos (São Paulo)
apresentam alta exposição à elevação do NRM. Praticamente toda costa Sul, Sudeste e Norte do
país possuem alto ou muito alto grau de exposição aos efeitos da elevação do NRM. Entre os 20
municípios com pior desempenho no índice DRIB nenhum deles está em zona costeira, 12 são da
região Norte, 6 do Nordeste e 2 do Sudeste. Esses municípios têm pequenas populações, entre 3
mil e 25 mil habitantes, alta exposição a desastres e baixa capacidade adaptativa. O estudo
aponta ainda que apenas 20% dos municípios brasileiros estão bem preparados para mitigar os
impactos e reagir imediatamente a eventos extremos, em especial os localizados no Sudeste e
Sul. Esses e os demais resultados exaltam as grandes desigualdades entre e dentro das diferentes
regiões do Brasil, incluindo a zona costeira, e que constituem grandes barreiras para a gestão do
risco. Os autores concluíram que o risco associado a esses desastres é extremamente dependente
das condições socioeconômicas e culturais das populações expostas, bem como com a
performance das instituições estatais em lidar com os desastres - em outras palavras, o risco é
dependente da vulnerabilidade.
As mudanças climáticas também estão afetando espécies e ecossistemas inteiros. Animais como
o sapo dourado e o melomys de Bramble Cay (um pequeno roedor) foram extintos pelo
aquecimento global. Outras espécies, como a raposa voadora, as aves marinhas e os corais, estão
morrendo em massa, enquanto outros milhares migraram para latitudes e altitudes mais altas.
Mesmo se o mundo passar por um rápido processo de descarbonização, os gases de efeito estufa
que já estão na atmosfera e as actuais tendências de emissões ainda terão impactos climáticos
inevitáveis significativos até 2040. O IPCC estima que, apenas ao longo da próxima década, as
mudanças climáticas vão colocar entre 32 milhões e 132 milhões de pessoas na pobreza extrema.
O aquecimento global colocará em risco a segurança alimentar e aumentará a incidência de
doenças cardíacas, dificuldades com a saúde mental e de mortes relacionadas ao calor.
Em um cenário de altas emissões, por exemplo, os riscos também mais altos de inundações
podem levar a um adicional de 48 mil mortes de crianças de até 15 anos em decorrência de
diarreia em 2030. Espécies e ecossistemas passarão por mudanças dramáticas, como as áreas de
mangue se tornando incapazes de conter o aumento do nível do mar, declínio das espécies
dependentes do gelo marinho e mortes de árvores em larga escala.
3. Os riscos vão aumentar rapidamente com as temperaturas mais altas, com frequência
gerando impactos climáticos irreversíveis.
O relatório mostra que cada décimo de grau de aquecimento aumenta as ameaças às pessoas,
espécies e ecossistemas. Mesmo o limite de 1,5°C – uma meta global do Acordo de Paris – não é
seguro para todos.
Por exemplo, com 1,5°C de aquecimento, muitas geleiras em todo o mundo vão desaparecer por
completo ou perder a maior parte de sua massa; um adicional de 350 milhões de pessoas
enfrentarão escassez de água até 2030; e até 14% das espécies terrestres estarão em risco de
extinção.
O IPCC prevê que esses riscos se misturem uns aos outros à medida que diversas catástrofes
ocorrerem ao mesmo tempo e nas mesmas áreas. Em regiões tropicais, por exemplo, os efeitos
combinados do calor e da seca podem desencadear perdas repentinas e significativas nos
rendimentos agrícolas. Ao mesmo tempo, a mortalidade relacionada ao calor aumentará ao passo
que a produtividade diminuirá, de forma que as pessoas não estarão aptas a trabalhar mais para
superar as perdas causadas pela seca. Juntos, esses impactos vão diminuir a renda das famílias ao
mesmo tempo em que aumentam os preços dos alimentos – uma combinação devastadora que
afeta a segurança alimentar e intensifica riscos de saúde como a desnutrição.
A exposição aos impactos climáticos subiu drasticamente nas cidades desde a publicação
do Quinto Relatório de Avaliação do IPCC, em 2014. Os aumentos mais rápidos na
vulnerabilidade urbana se deram em assentamentos informais, nos quais condições precárias de
habitação, acesso inadequado a serviços básicos e recursos limitados impedem esforços de
resiliência. O desafio é especialmente acentuado na África Subsaariana, onde 60% da população
urbana mora nesses assentamentos, e na Ásia, com 529 milhões de pessoas vivendo nas mesmas
condições.
Muitas comunidades rurais também enfrentam riscos climáticos crescentes, em particular povos
indígenas e as pessoas cujos meios de subsistência dependem de estores directamente expostos
aos riscos, como agricultura, pesca e turismo. À medida que os impactos climáticos se tornarem
mais intensos, algumas famílias podem não ter outra escolha a não ser migrar para os centros
urbanos.
O IPCC prevê que, até 2030, secas extremas na região amazónica vão impulsionar a migração
para as cidades, onde povos indígenas e comunidades tradicionais tendem a ser forçados a viver
à margem.
Esses padrões de desenvolvimento urbano e rural não apenas moldam experiências desiguais aos
riscos climáticos, mas também tornam os próprios ecossistemas mais vulneráveis. Mudanças no
uso da terra, fragmentação de habitats, poluição e exploração de espécies estão enfraquecendo a
resiliência ecológica. E a perda de ecossistemas, por sua vez, amplia a vulnerabilidade das
pessoas.
Cidades que se expandem por zonas úmidas costeiras, por exemplo, promovem a degradação de
ecossistemas que, de outra forma, ajudariam a proteger os bairros próximos a essas áreas da
elevação do nível do mar, de tempestades e de inundações. Essas ameaças podem ter efeitos
misturados e em cascata na saúde, na segurança alimentar, no acesso à agua potável e nos meios
de subsistência dos moradores, o que os torna ainda mais vulneráveis a riscos futuros.
5. A adaptação é essencial. Soluções viáveis já existem, mas mais apoio precisa chegar às
comunidades vulneráveis.
As políticas climáticas de pelo menos 170 países agora incluem a adaptação, mas muitos deles
ainda precisam passar do planejamento para a implementação. O IPCC mostra que os esforços
atuais ainda são, em grande parte, incrementais, reativos e de pequena escala, com a maioria
focada apenas nos impactos atuais ou nos riscos de curto prazo. A lacuna entre os níveis de
adaptação atuais e os necessários persiste, devido em grande parte ao apoio financeiro limitado.
O IPCC estima que a adaptação necessária apenas nos países em desenvolvimento vai chegar a
US$ 127 bilhões até 2030 e a US$ 295 bilhões até 2050. No momento, a adaptação representa
apenas entre 4% e 8% do financiamento climático mensurado, que totalizou US$ 579 bilhões
entre 2017 e 2018.
A boa notícia é que alternativas já existentes de adaptação podem reduzir os riscos climáticos se
obtiverem recursos suficientes e forem implementadas mais rápido. O relatório do IPCC de 2022
inova ao analisar a viabilidade, eficácia e potencial de diversas medidas de adaptação de gerar
cobenefícios, como melhores resultados de saúde ou redução da pobreza.
6. Mas alguns impactos das mudanças climáticas já são severos demais para pensar em
adaptação. O mundo precisa agir com urgência para lidar com as perdas e danos.
A ciência não deixa margem para dúvidas: as mudanças climáticas colocam em perigo o bem-
estar das pessoas e do planeta. Agir com atraso é um risco de deixar que aconteçam impactos tão
catastróficos que tornarão nosso mundo irreconhecível.
Os próximos poucos anos ainda oferecem uma janela estreita para um futuro sustentável e
habitável para todos. Mudar o rumo exige esforços imediatos, ambiciosos e coordenados para
reduzir emissões, construir resiliência, conservar os ecossistemas e aumentar drasticamente o
financiamento para adaptação e perdas e danos.
A COP27, que será realizada no Egito em novembro de 2022, é uma oportunidade crucial para os
governos avançarem nessas frentes e para os países desenvolvidos demonstrarem solidariedade
com as nações vulneráveis.
Enfrentar a crise climática não vai ser fácil. Os governos, a sociedade civil e o setor privado
devem todos se comprometer. Como o relatório do IPCC deixa claro, não há outra opção.