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Do amor teatral
Ler este texto é possível? Nós não queremos saber muito sobre o
corpo de troca onde a Lei se expõe ao amor. Sem dúvida
destacou-se desde muito tempo, do lado da psicanálise, o que se
convencionou chamar de uma simbologia sexual das danças,
comentário levemente psicologista de Robitsek numa
contribuição, hoje muito esquecida, na revista Imago (1925).
Ora, o assunto deve ser retomado desde mais atrás, pois se trata
de recapitular a conta legal, isto é, mítica, das coisas. O valor
orgásmico da dança, já identificado por Freud, define a
instituição, o lugar mesmo dos valores, isto é, o deus mesmo que
estipula o interdito. A divinidade da dança é demonstrável, tanto
para os ocidentais quanto para os outros. Mas saber disso, saber
esta selvageria, seria romper a cultura, colocar em dúvida
seriamente as propagandas, citar as crenças que são também a
parte do fogo num sistema de organização, em pleno regime
industrial. A este preço, ao preço de descobrir a radical
bestialidade da organização civilizada, marcando seu gado, a
antropologia não é suportável. As vezes em que não se
acreditaria mais , o que aconteceria?
Ao longo do meu trabalho, trataremos muito da Lei, conceito
eminentemente analítico pelo qual nós somos introduzidos no
funcionamento do mito, desta ordem textual onde se define o
dogma social que exprime o amor do poder. Na escala das
instituições e no estudo de um sistema tão estreitamente
dependente da acumulação histórica, uma tal referencia cria
dificuldade. Quase não se tem o hábito de raciocinar com este
instrumento jurídico, ou então este termo permanece impreciso.
O Outro da Lei não se vê nem se proclama por vozes ordinárias, e
seu reconhecimento é ainda menos fácil pelo fato que as
instituições não tem corpo; por consequência, não se poderia
contornar os problemas se agarrando ao inconsciente coletivo,
noção absurda. É necessário admitir nossa própria selvageria.
Para remediar a falta de corpo, as organizações se desenvolvem
pela prática da idolatria, graças às quais os sujeitos do desejo
inconsciente desembaraçam a desordem das coisas e acabam
por concordar sobre isto: o poder lhes fala, por mais desprovido
de corpo que seja. Assim nos tornamos sujeito das instituições.