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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Faculdade de Educação

Atividade final da disciplina “Gestão Democrática da Educação”: uma reflexão


sobre o PPP da Escola Indígena de Educação Básica Whera Tupã Poty Dja

Juliana Gonçalves Tavares de Sousa


I) O Projeto Político Pedagógico da Escola Indígena Whera Tupã Poty Dja traz em
documento características que envolvem com prioridade a cultura do seu povo,
como também explicita os direitos que uma escola indígena tem na construção de
um currículo. Como características gerais explicitadas no PPP, considero como
mais importante:

 Necessidade de currículo atrativo: a LDB (título III, artigo 4º) traz como
obrigatória e gratuita a educação básica, garantindo o acesso de alunos de 4 aos
17 anos. Esse artigo considera a maioridade civil e o compromisso dos
responsáveis e do Estado para com a criança/jovem. Contudo, para os povos
indígenas, o Guarani atinge a idade adulta em torno dos seus 12 anos, “podendo
casar-se e constituir um novo núcleo familiar [...] que deverá provir a subsistência”
(página 6), o que reforça a evasão escolar desses mesmos alunos por já serem
vistos como adultos em sua comunidade. Como sugestão, os professores
entendem a necessidade de transformar o curso em integral concomitantemente
com o pagamento de bolsas de estudos. Entretanto, em uma breve reflexão sobre
a sugestão abordada e sobre a cultura dos povos indígenas, entende-se que seria
necessário produzir um currículo que realmente usufruísse do tempo de um curso
integral para então implementar as bolsas. A Base Nacional Comum Curricular, por
exemplo, incentiva o tempo integral para capacitação técnica dos seus alunos do
Ensino Médio com o mesmo objetivo, mas por não produzir uma organização
universal de habilidades que serão ensinadas ou por não ter capacitação técnica
oferecida aos professores, o segmento curricular se rompe e beneficia as
instituições privadas por terem capital para investir nessas ações. No caso da
Escola Whera Typã Poty Dja, é interessante pensar em um currículo atrativo, mas
é necessário entender que a escola, por falta de capacitação de professores
indígenas, ainda não possui um quadro técnico completamente Guarani. É
necessário que haja desenvolvimento de políticas públicas para que a organização
pedagógica de escolas indígenas seja estruturada pelo seu próprio povo e, a partir
dessa construção, crie-se um currículo feito da comunidade para a comunidade.

 Cultura e qualidade de ensino: a Escola Indígena Where Tupã Poty Dja incentiva
e oferece a educação bilíngue, isto é, que garante o ensino da língua materna
(guarani) e o ensino da língua portuguesa. No PPP, quando os tópicos sobre
ensino, aprendizagem e currículo são mencionados, é explicitado que a escola
segue sua alfabetização em língua guarani, mas posteriormente promove o ensino
da língua portuguesa por entender que a convivência com um não-indígena é
inevitável. Contudo, a língua materna permanece no currículo durante o trajeto
pedagógico do aluno, juntamente com a língua portuguesa, para que sua cultura
seja preservada. Já em relação à qualidade de ensino, apesar da escola
apresentar compromisso assíduo com as relações socioculturais, ainda não
consegue desenvolver a melhor qualidade de ensino. Como maiores necessidades
da escola, o PPP aborda a falta de materiais didáticos específicos que consigam
atender o propósito escolar, de antenas via satélite para conexão com a internet e
visibilizam a situação de professores sem formação no ensino superior.

 Educação Infantil: apesar de se autodenominar como uma escola de Educação


Básica, ainda não é. A Escola Indígena Where Tupã Poty Dja trabalha com os
ensinos Fundamental e Médio, mas tem como sonho trabalhar com a Educação
Infantil. O que não permite que esse sonho se realize, de acordo com o PPP, é a
dificuldade de implantar os moldes da cultura dentro de um currículo universal na
fase da infância. O documento explica que, mesmo que não exista Educação
Infantil na escola, muitas crianças dessa fase frequentam o ambiente por diversos
motivos, entre eles, a falta de adultos que se responsabilizem por essas crianças
em casa, então estas acabam acompanhando seus irmãos e até seus pais na
rotina escolar, dificultando a organização do local, já que a escola não possui um
ambiente ou atividades adequadas para se responsabilizar por essa demanda da
comunidade.

II) A identidade cultural e social do PPP da escola em questão é bem demarcada,


inclusive, sobrepondo a cultura acima de qualquer outro valor. De acordo com
Fernandez (2015), que traz uma citação de Celso Vasconcellos (1995), o PPP
necessariamente deve ter uma filosofia educacional demarcada por passos. São
eles:

a) como entendemos o mundo em que vivemos; b) quais são as


utopias que nos movem neste mundo; c) qual a escola dos nossos
sonhos; d) qual o retrato da escola que temos; e) o que faremos na nossa
escola. Os três primeiros passos completam o necessário marco
referencial do projeto. Trata-se de explicitar melhor qual a visão de
mundo, os valores e compromissos que a escola está assumindo hoje e que
expressa a sua própria “cara”, sua identidade e a direção, o rumo
que deseja tomar daqui para a frente (p. 77).

O objetivo da Escola Indígena Where Tupã Poty Dja fica explícito durante a leitura do
documento. Por exemplo, o tabaco, por ser sagrado para o povo indígena, pode ser
usado no interior do espaço escolar. Isso não seria possível dentro de outro modelo
escolar por violar a proibição da planta em espaços fechados, mas é um ponto
opositor que documenta a priorização dos valores, compromissos e visão de mundo
da escola indígena, reforçando um costume cultural que não pode ser interferido pela
instituição escolar. Outro exemplo que o PPP traz é a estrutura de um Opy, que é
uma casa de reza dos indígenas Guaranis, mas que na estrutura escolar é o local de
educação oral, de ensino da tradição e, por mais sagrado que seja, também é o local
onde as lideranças (de dentro e fora da aldeia) tomam decisões. As interações
socioculturais são bem trabalhadas no documento.

III) O PPP da Escola Indígena Where Tupã Poty Dja traz como um desejo a
participação ativa da comunidade na construção de um projeto pedagógico atrativo
e funcional. De acordo com o PPP da escola,

As lideranças comunitárias, bem como os funcionários, professores e alunos


precisam destinar um tempo específico para planejar a escola, e este
planejamento se dá na confecção e aprovação de um PPP que garanta a
escola indígena [...] um calendário diferenciado, currículo próprio, merenda
diferenciada, entre outras coisas (pág. 13).

O PPP é iniciado, nas primeiras páginas, dizendo que foi construído com muitas
mãos, mas não especifica quem ou como auxiliou nesse processo. Para considerar a
participação ativa no Projeto Político Pedagógico, porém, seria necessário encontrar
clareza no que Veiga (1995) chama de mecanismos institucionais, como a o processo
eletivo para a escolha de diretores, representação de alunos em órgãos escolares,
associação de professores e pais e processos de avaliação continuada dos serviços
oferecidos pela escola (Paro, 1993, p.34). Infelizmente não foi clarificado em nenhum
momento do projeto o uso destes mecanismos exemplificados acima.

IV) Não foi mencionado, em nenhum momento, como funcionava a ocupação dos
cargos diretivos. A única informação relevante sobre o tópico mencionada é que o
diretor da escola não é indígena.
V) A concepção de currículo da Escola Indígena Where Tupã Poty Dja segue de
maneira explícita as diretrizes curriculares nacionais emanadas pelos poderes
públicos. Inclusive, o documento menciona que o Ensino Médio da escola segue o
modelo integrado e profissionalizante, sendo a primeira escola Guarani a cumprir
esse currículo. Durante todo o processo curricular, apesar de seguir as normas dos
poderes públicos (tendo em vista que existem exames avaliativos de grande escala
desse ensino que retiram a autonomia da escola na montagem de um currículo
diferenciado), eles promovem como prioridade sua cultura com um planejamento
curricular baseado na gestão ambiental e sustentabilidade e também no ensino
continuado da língua Guarani, a língua materna de todas as crianças e jovens
matriculados na escola Where Tupã Poty Dja.
Referências Bibliográficas

Estado de Santa Catarina: Secretaria de Estado da Educação, 2012. Projeto Político


Pedagógico da Escola Indígena de Educação Básica Whera Tupã Poty Dja.

FERNANDEZ, Silvina Julia. Projeto político-pedagógico questões sobre planejamento na


interseção das políticas públicas e contexto escolar. 37ª Reunião Nacional da ANPEd – 04 a 08
de outubro de 2015, UFSC – Florianópolis.

VEIGA, Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: uma construção
possível. 14 a edição Papirus, 2002.

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