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1. INTRODUÇÃO
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O ensino da língua materna ganhou uma nova perspectiva por Volochinov (2010), que se
contrapôs à concepção Saussuriana de língua como um sistema próprio e acabado. O autor sugere
que a língua é um sistema estritamente social, que coloca o indivíduo como um ser ativo no
processo de comunicação.
A partir de correntes derivadas do estudo de Volochinov, o autor brasileiro Geraldi (1984)
destaca a linguagem sob três concepções: a expressão do pensamento (isto é, se as pessoas não se
expressam bem, é porque não pensam), um instrumento de comunicação (associada diretamente à
gramática descritiva) e a visão interacionista (que possibilita a ação do falante sobre o ouvinte).
Neste sentido, a língua só tem existência no jogo que se joga na
sociedade, na interlocução, e é no interior de seu funcionamento que se pode
procurar as regras de tal jogo. (GERALDI, 1984).
Com base neste conjunto de concepções de Geraldi, podemos vislumbrar o estudo e o ensino
da língua materna com base na concepção interativa da linguagem. Desta forma, considerando a
língua como uma ação dos indivíduos sobre o ambiente, interagindo entre si, concebe-se a
linguagem sob constante transformação, que consequentemente organiza-se em formas estáveis de
comunicação social. Estas formas de comunicação podem ser chamadas de gêneros discursivos, que
estão onipresentes na sociedade e, desde um tempo, no ensino de português em sala de aula.
Volochinov (2010, p.130), afirma que os “diferentes tipos de discurso” formam a
“modelagem das enunciações” (p.43), que são colocados em prática em situações corriqueiras do
dia a dia. Estas formas reforçam-se pelo uso e pelas conjunturas, como numa conversa espontânea
com um colega, amigo etc. Ou seja, todas as esferas sociais utilizam discursos organizados por
gêneros da fala.
Os gêneros discursivos organizam as relações sociais. Portanto, inevitavelmente, carregam
os aspectos textuais e discursivos que caracterizam uma série de atividades sociais. É importante
aprendê-los na escola e possibilitar, desde cedo, o contato do aluno com as mais diversas práticas
sociais.
Porém, à esta altura da discussão, nos deparamos com um desafio. Qual gêneros discursivos
devemos ensinar na sala de aula, considerando que Bakhtin tratou de gêneros primários e
secundários?
Schneuwly (2011), defende que os gêneros secundários sejam ensinados na escola, porque
eles caracterizam uma divisão essencial em dois níveis: primeiro, reproduzem uma construção
complexa, conectada a vários outros gêneros que definem a comunicação corriqueira, além de
serem independentes do contexto imediato; e segundo, significa que o indivíduo se vê diante de
situações que não estão ligadas de forma orgânica a um gênero, e vice-versa.
Inicialmente, Geraldi (2006b) propôs que o ensino de língua portuguesa fosse pautado em
práticas de linguagem substituídas por outras nomenclaturas como a de eixos de ensino, observadas
nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa. Nesta época, o objetivo era as
relações com os textos, por isso essa preposição inicial foi relacionada de forma equivocada ao
trabalho com mecanismos textuais. Porém, mais recentemente, observamos diversos autores,
inclusive Geraldi, fortalecer o uso de gêneros em sala de aula, de forma a articulá-los às práticas de
linguagem.
A entrada de gêneros discursivos no ensino, considerando as variedades dos meios de
circulação, traz aos professores do ensino fundamental e médio novos desafios, tanto nos objetivos
a serem ensinados como nos processos metodológicos utilizados.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa foram elaborados de modo a
servir como referencial para o trabalho do professor em sala de aula, respeitando, obviamente, a
concepção pedagógica própria e a pluralidade cultural de todos os brasileiros. Foram lançados
originalmente em 1997, e tiveram como organizador a Secretaria de Educação Fundamental do
Ministério da Educação e do Desporto da época.
A produção dos PCN foi concebida a partir da discussão teórica de diversos consultores, e
está baseada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96.
O documento apresenta de maneira clara os gêneros discursivos considerados adequados
para o trabalho com a linguagem oral e com a linguagem escrita. Ele estabelece, no eixo
resguardado aos conteúdos gerais do ciclo, os seguintes gêneros considerados adequados para
emprego na educação fundamental:
Gêneros discursivos adequados para o ensino de Língua Portuguesa no ensino fundamental
Linguagem oral Linguagem escrita
Contos (de fadas, de assombração etc.), Receitas, instruções de uso, listas;
mitos e lendas populares; Textos impressos em embalagens,
Poemas, canções, quadrinhos, rótulos, calendários;
parlendas, adivinhas, trava-línguas, Cartas, bilhetes, cartões (de aniversário,
piadas; de Natal etc.), convites, diários
Saudações, instruções, relatos; (pessoais, de classe, de viagem etc.);
Entrevistas, notícias, anúncios (via Quadrinhos, textos de jornais, revistas e
rádio e televisão); suplementos infantis: títulos, lides,
Seminários, palestras. notícias, classificados etc.;
Anúncios, slogans, cartazes, folhetos;
Parlendas, canções, poemas,
quadrinhas, adivinhas, trava-línguas,
piadas;
Contos (de fadas, de assombração etc.),
mitos e lendas populares, folhetos de
cordel, fábulas;
Textos teatrais.
(Fonte: BRASIL, 1997, p. 72)
Ao vislumbrarmos os gêneros discursivos sugeridos pelos PNC, observamos que o
documento procura autenticar algumas ideias dos autores citados na nossa pesquisa teórica, que
desde a década de 1980 apontam para a variação linguística em todas as suas dimensões internas
(fonologicamente, morfossintaticamente, semanticamente etc.), a partir de vertentes externas.
Desta forma, a partir da visão interacionista da língua, podemos perceber que o gênero é um
instrumento para o ensino de língua materna.
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. M. Estética da criação verbal. 2. ed. Trad.: Maria Ermantina Galvão G. Pereira.
São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 277-326.
DOLZ, J.; SCHNEUWLY, B. Os gêneros escolares – das práticas de linguagem aos objetos de
ensino. In: DOLZ, J.; SCHNEUWLY, B. et al. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e org.:
Roxane Rojo e Glais Sales Cordeiro. 3. ed. Campinas: Mercado das Letras, 2011, p. 81-108.