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OBSERVAÇÃO DIRETA E OBSERVAÇÃO INDIRETA COMO MODOS DE

OBSERVAÇÃO DE UM FENÔMENO1, 2
Gabriel Gomes de Luca Nádia Kienen
Observar fenômenos é uma etapa necessária para produção de conhecimento científico e
para possibilitar intervenções profissionais em relação aos fenômenos. Em relação à produção de
conhecimento científico, Whaley e Surrat (1976) indicam o “empirismo” (observação) como uma
das características necessárias desse processo de conhecer. Esses dois autores definem o empirismo
como a necessidade de observar os fenômenos antes de chegar a qualquer conclusão sobre eles. E
destacam: sem observação, fazer Ciência se torna mera especulação, superstição ou “mexerico”. Em
relação às intervenções profissionais, a realização delas só parece ser possível com a clara
caracterização do fenômeno a sofrer intervenção. Em exemplo apresentado por Botomé e Kienen
(2008), por exemplo, modificar o comportamento de um organismo envolve caracterizar o
comportamento-problema a sofrer intervenção, os comportamentos já apresentados pelo organismo
e as situações em que tais comportamentos são apresentados. Os autores indicam que a
caracterização desses fenômenos é maximizada pelo processo observar. A necessidade de realizar o
processo observar, nesse sentido, envolve alto grau de clareza em relação a esse processo. Mas,
quais os modos como o processo observar pode ser realizado? A distinção entre observação direta e
indireta parece em algum grau responder a essa pergunta.
Há dois modos de observação: a observação direta e a observação indireta. Em algumas
situações, o cientista ou o profissional tem acesso direto ao fenômeno. Eles podem enxergá-lo,
podem ouvi-lo, etc. Em outras, o acesso ao fenômeno não pode ser realizado diretamente e o
cientista só tem acesso a ele por meio do que outras pessoas falam, por registros ou documentos ou
por produtos do fenômeno. A Figura 1 representa esses tipos de observação: o processo observar
pode ser realizado por meio de observação direta e indireta. A observação indireta pode ser
realizada por meio das observações por depoimento, por documento e por produto.

OBSERVAR

Observar Observar
diretamente indiretamente...

...por ...por ...por


depoimentos documentos produtos

Figura 1. Representação dos modos de observação. O processo observar é constituído


pelos processos: observar diretamente e observar indiretamente. O processo
observar indiretamente é constituído pelos processos: observar por depoimentos,
observar por documentos e observar por produtos

A observação direta é caracterizada pela observação em que o cientista ou profissional tem


acesso direto ao fenômeno a ser observado. Botomé e Kienen (2008) exemplificam esse modo de
observação por meio de um biólogo que, ao receber uma queixa sobre o sumiço dos peixes de um

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rio, se dirige até o local onde esse sumiço aconteceu e observa a água, a qualidade dela, os peixes
existentes no local, etc. Os mesmos autores indicam como exemplo de observação direta de um
comportamento, feita por um psicólogo, o caso em que esse profissional observa os
comportamentos de um atleta de vôlei, objetivando caracterizar tais comportamentos para melhorar
o desempenho desse atleta. Mesmo que o psicólogo treine outras pessoas para fazer a observação e
mesmo que ele registre os comportamentos desse atleta em uma fita, a observação é direta, visto o
profissional ter acesso direto ao fenômeno observado.
A observação indireta é realizada quando o cientista ou o profissional não tem acesso direto
ao fenômeno. Nesse modo de observação, o fenômeno é também observado, mas não na presença
dele. Isso é feito de três modos: por meio da observação indireta por depoimentos, por documentos
e por produtos. A observação indireta por depoimentos é realizada quando o cientista investiga
um fenômeno a partir de outras pessoas que tiveram acesso direto ao fenômeno. O biólogo que
recebeu a queixa sobre o sumiço dos peixes de um rio, realiza observação indireta por meio de
depoimentos ao fazer perguntas aos pescadores que têm informações acerca desse sumiço (Botomé
& Kienen, 2008). Outro exemplo é o psicólogo que, ao investigar os problemas de aprendizagem
dos alunos de uma escola, realiza observação indireta por depoimentos se pergunta, questiona aos
professores dessa escola quais são os problemas de aprendizagem apresentado pelos alunos. Se o
psicólogo se instalasse em uma sala dessa escola e observasse tais problemas acontecendo, ele
estaria realizando observação direta desse tipo de comportamento.
A observação indireta por documentos é realizada quando o cientista ou o profissional
observa o fenômeno a partir de registros do fenômeno. Um interessante exemplo é o realizado pelo
cientista que, ao investigar o tamanho das famílias norte-americanas em três épocas diferentes,
1916, 1936 e 1956, observou o tamanho das famílias em contos de oito revistas norte-americanas3.
Documentos acadêmicos, relatórios oficiais, documentos pessoais, registros numéricos (gráficos,
tabelas) e registros de comunicação de massa (jornais, programas de TV e de rádio, entre outros)
são alguns dos possíveis tipos de documentos a serem utilizados por um cientista ou profissional
realizar observação indireta por documentos4. O psicólogo, por exemplo, ao investigar o
desempenho acadêmico dos alunos de uma escola realiza observação indireta por documentos ao
observar as notas apresentadas nos boletins dos alunos da escola.
Já a observação indireta por produtos é realizada quando o cientista ou o profissional
observa o fenômeno a partir dos produtos do fenômeno. É, em geral, o que fazem os policiais ao
investigarem um crime policial. Se um policial está investigando um acidente de carro, ele realiza
observação por produtos ao observar alguns aspectos desse acontecimento: a marca de pneus na
estrada, os carros amassados, a direção dos carros, etc. Isso não é o acidente do carro, apenas os
produtos ou os resultados dele. Esse modo de observação foi o que Silva (2006) realizou ao
observar o comportamento denominado “delimitar problema de pesquisa”, apresentado por
estudantes de pós-graduação. Ela observou a Introdução das dissertações (os produtos dos
comportamentos) de estudantes de um programa de pós-graduação.
A observação direta e a observação indireta são os dois modos de observação de um
fenômeno, determinados pelo tipo de acesso que o cientista ou o profissional tem em relação ao
fenômeno investigado. No caso do psicólogo, esses modos de observação são relacionados ao
comportamento dos organismos. A distinção entre esses modos de observação é necessária para o
cientista ou o profissional, entre eles o psicólogo, tomar decisões mais acertadas e com maior grau
de possibilidade em relação às observações que vir a realizar. Com essa distinção, a probabilidade
de o cientista ou o profissional produzir conhecimento em relação aos fenômenos e, a partir disso,
realizar intervenções profissionais com maior grau de segurança e clareza são aumentadas.

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Referências

BOTOMÉ, S. S. & KIENEN, N. (2008) Análise e modificação do comportamento. Palhoça:


Unisulvirtual.

SILVA, K. L. (2006) Comportamentos que constituem a classe geral delimitar problema de


pesquisa no trabalho científico de alunos de pós-graduação em Psicologia. Dissertação de
Mestrado. Programa de Pós-graduação em Psicologia. Universidade Federal de Santa Catarina.
Florianópolis.

WHALEY, D. L. & SURRAT, S. L. (1976) O espírito científico: um programa para seminários


centrados no aluno. São Paulo: Editora Pedagógica Universitária.

1
Texto didático escrito para uso interno no Estágio Básico em Observação do Comportamento. Estágio realizado no
Curso de graduação em Psicologia da Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL.
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Os autores deste texto agradecem aos professores José Carlos Zanelli, José Gonçalves Medeiros, Narbal Silva, Olga
Mitsue Kubo, Suzana da Rosa Tolfo e Sílvio Paulo Botomé, do Programa de Pós-graduação em Psicologia da
Universidade Federal de Santa Catarina, Área Organizações, Trabalho e Aprendizagem.
3
Exemplo apresentado em texto intitulado O uso de documentos em pesquisa, sem autor e sem data, entregue aos
alunos do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina, em 2008.
4
Informação apresentada em texto intitulado Documentos como instrumento de coleta de dados, sem autor e sem data,
entregue aos alunos do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina, em
2008.

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