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COMPONENTE CURRICULAR: Fundamentos Teóricos e

Metodológicos do Ensino de Língua Portuguesa


DOCENTE: Helânia Thomazine Porto
DISCENTE: Natália Freitas Ribeiro TURMA: Pedagogia VII

CONSIDERAÇÕES ACERCA DO LIVRO “QUARTO DE DESPEJO: DIÁRIO DE


UMA FAVELADA” EM DIALÉTICA COM OBRA “A LÍNGUA DE EULÁLIA:
NOVELA SOCIOLINGUÍSTICA”

Carolina Maria de Jesus nasceu no dia 14 de março de 1914 em Sacramento, Minas Gerais.
Neta de avós escravizados e filha de pais pobres e analfabetos, teve uma infância difícil, sofria
maus tratos. Aos 7 anos frequentou a escola, gostava muito de estudar, aprendeu a ler e tomou
gosto pela leitura. Mudou-se para a favela de Canindé aos 33 anos, grávida e desempregada.
Trabalhava como catadora de papel, em uma entrevista publicada em seu livro, a mesma diz
que quando sentia fome e não tinha o que comer, ao invés de xingar, ela escrevia. Carolina
escrevia sobre o seu dia-a-dia nas folhas de caderno que encontrava quando catava papel. Essas
escritas deram origem ao seu primeiro livro, O Quarto de Despejo – Diário de uma favelada.

Em uma entrevista, ao ser questionada sobre o porquê do título da obra Quarto de Despejo –
diário de uma favelada, Carolina Maria de Jesus respondeu que, em 1948, quando começaram
a demolir as casas para construir edifícios, os pobres que residiam no local, foram despejados
e passaram a morar debaixo da ponte, em situação de miséria. Por isso a autora escolheu o
nome Quarto de Despejo como título da obra, para ela, a favela é o quarto de despejo da cidade.
O livro fez sucesso, e consequentemente, Carolina Maria de Jesus conseguiu sair da vida de
miséria, saiu de Canindé e foi morar em um bairro de classe média na capital de São Paulo.
Pedaços de Fome e Provérbios foram os seus outros livros publicados em vida. Morreu em
1977, de insuficiência respiratória, outras seis obras póstumas foram publicadas após a sua
morte.

A obra foi publicada no gênero literário diário, essa escolha foi de grande significado, pois,
assim, Carolina pôde expressar a real forma que o povo enxerga o seu mundo. O livro foi
publicado no português padrão e não padrão, em respeito a linguagem da autora. A linguagem
não padrão presente no livro não contraria a língua portuguesa, uma vez que a mesma não é
neutra, não existe uma só língua, estática e imutável.

Na obra de Marcos Bagno (2006), a personagem Irene diz que:

O português não-padrão é a língua da grande maioria pobre e dos analfabetos do nosso


povo, Verinha. É também, consequentemente, a língua das crianças pobres e carentes
que frequentam as escolas públicas.” (BAGNO, 2006, p.31).

A linguagem de Carolina está carregada de valor social e cultural, e isso foi respeitado na
publicação da obra.

Na obra, é possível perceber que Carolina Maria de Jesus troca o uso do L pelo R. É importante
ressaltar que isto não é um erro. “Dizer pranta no lugar de planta não é um erro: é um fenômeno
chamado rotacismo, que acontece nas mais diversas regiões do país e que participou da
formação da língua portuguesa padrão ao longo dos séculos.” (BAGNO, 2006 P.38).

A obra Quarto de Despejo – Diário de uma favelada, traz uma linguagem corporificada na
escrita, e é por meio dela que a autora apresenta os seus discursos, fazendo uma alusão à sua
vida difícil na favela, ao descaso político em relação aos pobres, negros e favelados, ao mundo
de trabalho dos indivíduos marginalizados, a situação econômica da época, sua percepção
acerca do amor, família, amizades, o desejo de sair da favela para viver em um lugar melhor.

Carolina Maria de Jesus usa da linguagem como uma válvula de escape, uma distração em meio
a dureza do cotidiano. A obra apresenta denúncia social e resistência, alguns trechos vêm
trazendo essa denúncia e resistência, como: “Quem não conhece a fome há de dizer: ‘quem
escreve isso é louco’. Mas quem passa fome há de dizer: ‘muito bem, Carolina’. Os gêneros
alimentícios de ser ao alcance de todos” (JESUS, 2014, p38), “Eu classifico São Paulo assim:
o palácio é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é quintal onde jogam os lixos”
(JESUS. 2014, p.32), “Estou residindo na favela. Mas se Deus me ajudar hei de mudar daqui.
Espero que os políticos estingue as favelas.” (JESUS, 2014, p.17), “É que eu estou escrevendo
um livro, para vendê-lo. Viso com esse dinheiro comprar um terreno para eu sair da favela.”
(JESUS, 2014 (p.24).

A obra de Carolina Maria de Jesus é atemporal, pois, apesar de ter sido publicado em 1960, há
63 anos atrás, a realidade da favela e a vida de miséria dos pobres não mudou. Os mesmos
problemas ainda são enfrentados, ainda existem muitos pobres que criam os seus filhos com
dificuldade, as favelas ainda são negligenciadas e marginalizadas, os alimentos ainda estão com
os custos elevados, as crianças ricas ainda brincam com seus brinquedos preferidos enquanto
os pobres acompanham os pais no trabalho, a solidão da mulher preta ainda é latente. Essas e
outras problemáticas apresentadas na obra, ainda perduram nos dias de hoje.

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