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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 3

1- CÓDIGO DE ÉTICA 4

2- A PSICOTERAPIA 10

3- AJUDA PSICOLÓGICA 22

4- COMO FACILITAR UMA TERAPIA DE GRUPO 29

REFERÊNCIAS

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

INTRODUÇÃO

Prezados (as) alunos (as)

O conteúdo do curso é básico e introdutório com temas relacionados às funções do


conselheiro terapêutico.

O papel do conselheiro terapêutico, acima de tudo, é transmitir paz ao paciente. Paz


no sentido de que, em que algumas situações, este paciente não necessita de
remédios e sim da companhia de um profissional habilitado para estar em situações
do dia-a-dia, auxiliando na organização da sua vida.

Exemplos: pessoas que necessitam ir ao dentista, ao médico, reabilitação de


dependentes químicos, etc.

O perfil profissional mais recorrente é o de um trabalhador com 37 anos, ensino


médio completo, do sexo masculino que trabalha 44h semanais em empresas do
segmento de Assistência psicossocial a portadores de distúrbios psíquicos, deficiência
mental e dependência química.

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1- CÓDIGO DE ÉTICA

CÓDIGO DE ÉTICA E CONDUTA


7° Edição

Os princípios Éticos contidos neste Código, assim como a evolução técnica que a
FEBRACT alcançou, apresentam expressa relação de gratidão com seus fundadores,
Padre Haroldo Joseph Rahm e Professor Saulo Monte Serrat.

Desde a sua fundação, a FEBRACT tem como Finalidade Institucional:

 Capacitar os profissionais de Comunidades Terapêuticas


 Congregar as Comunidades Terapêuticas do Brasil
 Promover encontros, congressos e eventos científicos
 Participar na construção de Políticas Públicas
 Desenvolver pesquisas
 Representar as CTs nacional e internacionalmente

Visando os princípios evidenciados pela ciência, propiciou no Brasil um imensurável


avanço na qualidade dos serviços que atendem dependentes químicos. O olhar para
a ciência, baseado nos princípios da dignidade humana, congrega inevitavelmente
com a Ética.

Palavras Iniciais

As diferentes profissões, particularmente as que trabalham com problemas


relacionados ao ser humano, estabeleceram Códigos de Ética, com a finalidade
primordial de assegurar aos seus clientes um tratamento eficaz, respeitoso e digno.
Ao buscar garantir um ambiente de respeito e harmonia entre as partes envolvidas, o
Código beneficia principalmente o cliente, foco principal de todo processo. Essa
preocupação já encontramos no Juramento de Hipócrates, que data de 400 A.C., e
que trazia em si o embrião dos Códigos de Ética que viriam a surgir ao longo do tempo.

A Federação Mundial de Comunidades Terapêuticas elaborou um documento no qual


abordou os seguintes tópicos: “Código de Ética da Equipe de Assistência” e
“Declaração de Direitos para Membros e Clientes”. Ao iniciar suas atividades em 31
de janeiro dei 1994, o Centro de Formação e Treinamento elegeu como uma de suas
prioridades o debate a respeito dos princípios éticos que devem presidir o
relacionamento entre os participantes de uma Comunidade Terapêutica.

Na 13ª turma de cursistas iniciou-se a reflexão sobre o Código da Federação Mundial,


buscando adequá-lo à nossa realidade. Com os subsídios coletados nos debates com
todas as turmas do ano 1994, foi elaborado o projeto inicial e apresentado à
Assembleia Geral da FEBRACT, realizada no dia 21 de janeiro de 1995, que o aprovou
por unanimidade. Remetido para aprovação à Federação Mundial, recebeu uma
apreciação elogiosa de seu Presidente Mons. William B. O’Brien.

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Todas as Comunidades Terapêuticas, ou outras OSC – Organizações da Sociedade


Civil filiadas, recebem o Código de Ética, cujo cumprimento é condição imprescindível
para que permaneçam vinculadas à FEBRACT. As pessoas que se dedicam à
resolução de problemas associados ao uso abusivo e dependência de álcool e outras
drogas agem de um modo geral, impulsionadas por sentimentos generosos de
solidariedade humana. Que esses sentimentos, mais do que qualquer disposição
impositiva, sejam a garantia da fiel observância do Código de Ética.

Desde a fundação da FEBRACT, as versões do Código de Ética que a Federação


produziu e validou, influenciaram o desenvolvimento de princípios técnicos e éticos
em centenas de Comunidades Terapêuticas e fomentou junto ao Poder Público a
implantação das Legislações sobre o assunto, entre elas as Legislações Sanitárias –
RDC 101 e RDC 29, assim como inúmeros Editais de Financiamento e Resoluções
Estaduais; inclusive, nos documentos citados, observa-se a menção à participação da
FEBRACT.

Desde o ano 2015, a pedido do próprio Padre Haroldo, assim como por força
estatutária, o senhor Luis Roberto Chaim Sdoia, então Vice-Presidente, assumiu a
Presidência da FEBRACT, que por meio da criação do Conselho Deliberativo, ampliou
significativamente a participação de lideranças do Brasil na gestão executiva e técnica
da FEBRACT.

As reuniões do Conselho Deliberativo e o trabalho desenvolvido pela FEBRACT,


especialmente no que se refere ao desenvolvimento científico, culminaram no estudo
de parâmetros atualizados e na revisão do Código de Ética, visando proteger o modelo
essencial da Comunidade Terapêutica, sem deixar de considerar as peculiaridades
sociais, legais e políticas da atualidade.

CÓDIGO DE ÉTICA DA FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE COMUNIDADES


TERAPÊUTICAS

INTRODUÇÃO

O Código de Ética subordina-se às Leis vigente no país, naquilo que lhe for aplicável,
ao Código de Ética da Federação Mundial de Comunidades Terapêuticas e ao
Estatuto da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas.

1. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

1.1 Todas as atividades desenvolvidas nas Comunidades Terapêuticas devem ser


baseadas no respeito à dignidade da pessoa humana.
1.2 A permanência na Comunidade Terapêutica deve ser voluntária e decidida após
o acolhido ser informado sobre a orientação a ser seguida e as normas em vigor.
1.3 Nas Comunidades Terapêuticas deve ser assegurado, a todos que dela
participam, um ambiente livre de drogas e violência.
1.4 As atividades realizadas devem ser orientadas por Equipe Técnica,
comprovadamente capacitada, condizente com a quantidade de acolhidos/residentes.
1.5 Reconhecimento da espiritualidade, como recurso terapêutico que poderá ser
desenvolvido nos acolhimentos, como elemento edificante no processo terapêutico,
sem a imposição de crenças religiosas.
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1.6 Promoção do desenvolvimento pessoal, pautado na construção de um novo estilo


de vida.
1.7 Conscientização dos acolhidos/residentes sobre dependência química por meio
de atividades educativas.
1.8 Promoção da inserção ou reinserção do acolhido no mercado de trabalho através
da promoção de atividades de capacitação e formação.
1.9 Auxílio no desenvolvimento de habilidades para superação de padrões
comportamentais nocivos para si mesmo e/ou para outros.
1.10 Projeto Terapêutico baseado em evidências científicas.

2 DA COMUNIDADE TERAPÊUTICA

2.1 A Comunidade Terapêutica deve apresentar Projeto Terapêutico coerente, no qual


constem:

2.1.1 Critérios de admissão, readmissão e permanência.


2.1.2 Critérios que caracterizem a reinserção social como objetivo principal.
2.1.3 Critérios específicos de conclusão do Projeto Terapêutico, que avaliem a
evolução do acolhido/residente em todos os sentidos.

2.2 Apresentar programa de capacitação e treinamento de sua Equipe Técnica, em


cursos reconhecidos pela Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas (SENAD) e
ou outras instituições devidamente habilitadas.
2.3 Manter com as outras Organizações filiadas, relacionamento baseado na
colaboração e no respeito.
2.4 Proporcionar aos acolhidos/residentes, em ambiente saudável e relacionamento
digno e respeitoso, independente de raça, credo religioso ou político, nacionalidade,
orientação sexual, antecedentes criminais ou situação financeira.
2.5 Zelar pelo bem-estar físico, psíquico e espiritual do acolhido/residente
proporcionando a ele alimentação nutritiva, alojamento adequado, tratamento
eficiente e assistência espiritual que não conflite com suas crenças.
2.6 Propiciar aos acolhidos/residentes todos os meios possíveis de acesso aos
recursos disponíveis na Rede Social (equipamentos disponíveis no território), tais
como serviços públicos, atividades de lazer, acesso a grupos de mútua ajuda e à
família.
2.7 Elaborar o PAS – Plano de Atendimento Singular, de acordo com as necessidades
específicas do acolhido/residente.
2.8 Desenvolver ações específicas com os familiares do acolhido/residente, visando
a inclusão destes no processo terapêutico, assim como contribuir com a melhora da
qualidade de vida de todo o grupo familiar, o que será de grande importância durante
o processo final de reinserção social.
2.9 Prestar orientações técnicas e desenvolver estratégias em conjunto com o
acolhido/residente visando o resgate de valores e hábitos salutares e melhoria da
qualidade de vida.
2.10 Realizar atividades que promovam autonomia, organização e senso de
responsabilidade dos acolhidos/residentes.
2.11 Realizar avaliações periódicas da Equipe Técnica, da infraestrutura e da
administração da Comunidade Terapêutica, sempre visando a capacitação dos
profissionais, a adequação e acessibilidade dos espaços físicos, bem como a

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eficiência e lisura da gestão.


2.12 A Comunidade Terapêutica não poderá utilizar-se de sanções que incluam
castigos físicos, constrangimento moral, restrição de alimentos, sono ou higiene
pessoal.
2.13 O Projeto Terapêutico deverá estar pautado na convivência entre os pares, em
ambiente residencial e comunitário.
2.14 Em caso de infração grave ou de reincidência, relativas às determinações deste
Código de Ética, os órgãos diretores da Organização Social deverão afastar o
responsável, de acordo com as normas estatutárias.

3 DO ACOLHIDO/RESIDENTE

O acolhido/residente da Comunidade Terapêutica tem o direito de:

3.1 Receber, por escrito, a orientação e os objetivos do Projeto Terapêutico e as


regras existentes na Comunidade Terapêutica, declarando, de modo explícito, sua
concordância, assim como, sua voluntariedade na adesão. Qualquer modificação nas
determinações acima deverá ser comunicada com antecedência.
3.2 Estar protegido em relação a castigos físicos e violências psíquicas ou morais.
3.3 Ter acesso a recursos externos, em caso de doença ou outras necessidades das
quais tenha direito, quando a Comunidade Terapêutica não dispuser de meios para
atendê-lo.
3.4 Ter conhecimento antecipado das exigências financeiras para o acolhimento e dos
procedimentos afins, quando aplicável.
3.5 Ter possibilidade de encaminhar à pessoa responsável ou local apropriado,
queixas e sugestões relacionadas com a vida na Comunidade Terapêutica.
3.6 Ter liberdade para desligar-se da Comunidade Terapêutica a qualquer momento,
sem sofrer nenhum constrangimento por parte da Equipe Técnica ou dos
acolhidos/residentes.
3.7 Contribuir para que haja um clima de cordialidade e de respeito mútuo dentro da
Comunidade Terapêutica.
3.8 Ter acesso, sempre que precisar, às normas estabelecidas nas Normas de
Moradia, livremente aceitas no ato do acolhimento.
3.9 Participar ativamente das decisões da vida diária da Comunidade Terapêutica,
como também da formulação e reformulação das normas de moradia, garantindo
assim, que o grupo seja a unidade auto reguladora da vida da CT.
3.10 Participar ativamente da construção do seu Plano de Atendimento Singular,
garantindo assim, o desempenho do papel de agente de seu próprio processo de
recuperação.
3.11 Ser orientado a desempenhar papeis de relevância na vida diária e organização
da Comunidade Terapêutica, de acordo com as fases propostas no Projeto
Terapêutico e segundo a evolução do seu Plano de Atendimento Singular.
3.12 Ter acesso a atendimento psicossocial.

4 DA EQUIPE TÉCNICA

A Equipe Técnica da Comunidade Terapêutica deve:

4.1 Manter relacionamento profissional com o acolhido/residente, respeitando em


todas as circunstâncias, sua dignidade e singularidade.
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4.2 Evitar qualquer tipo de envolvimento amoroso e/ou sexual com o


acolhido/residente.
4.3 Evitar receber presentes ou semelhantes, do acolhido/residente assim como de
seus familiares, a fim de evitar distorções no relacionamento profissional.
4.4 Abster-se da utilização do trabalho do acolhido/residente, ainda que remunerado,
em proveito pessoal.
4.5 Atuar apenas dentro dos limites de sua competência, procurando ampliar estes
limites por meio de treinamento e de cursos de formação.
4.6 Atuar junto à família do acolhido/residente procurando fazer com que participe
ativamente do PAS – Plano de Atendimento Singular.

5 DO SIGILO PROFISSIONAL

5.1 As informações sobre o acolhido/residente, obtidas pela Equipe Técnica em


decorrência de sua atividade profissional, devem ser mantidas em sigilo, incluindo
prontuários e todas as formas de registro existentes.
5.2 No caso de encaminhamento/transferência para outra Organização Social e/ou
atendimento por profissional, ambos obrigados à observação do sigilo profissional por
Código de Ética, as informações confidenciais sobre o acolhido/residente somente
poderão ser remetidas, com o prévio consentimento por escrito, do mesmo.
5.3 As informações pessoais dos acolhidos, não podem ser reveladas a terceiros,
exceto em cumprimento a ordem judicial. Informações confidenciais dos
acolhidos/residentes somente poderão ser remetidas a outros profissionais em
atendimento à solicitação expressa do titular das informações. As quebras de sigilo
serão discutidas e decididas em conjunto pela Equipe Técnica da Comunidade
Terapêuticas.

6 DAS SANÇÕES

6.1 Em caso de descumprimento às disposições deste Código de Ética, a Comunidade


Terapêutica filiada estará sujeita às seguintes sanções:

a) Advertência individual.
b) Advertência em boletim da FEBRACT, através de meios de comunicação e
divulgação da FEBRACT, impressos ou eletrônicos.
c) Suspensão provisória da filiação.
d) Desfiliação definitiva.

6.2 O membro da Comunidade Terapêutica filiada que pertencer aos Órgãos Diretivos
da FEBRACT, em caso de infração aos princípios éticos poderá ser:

a) Advertido individualmente.
b) Destituído de seu cargo ou função.

6.3 O membro da Equipe Técnica que cometer infração grave aos princípios éticos
contidos neste Código de Ética, além das sanções impostas pela Comunidade
Terapêutica na qual presta serviços, pode ter cancelado seu Certificado de
Coordenador fornecido no curso da FEBRACT, por meio de comunicação por e-mail
e registro no site da FEBRACT.

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6.4 As penas de desfiliação e de destituição do cargo ou função serão aplicadas pelo


Conselho Deliberativo. As demais, pela Diretoria Executiva da FEBRACT.

O Código de Ética da FEBRACT norteará as ações das OSC – Organizações da


Sociedade Civil e/ou Entidades de outra natureza, desde que sem fins lucrativos e que
atuem na modalidade de Comunidade Terapêutica.

Texto base aprovado pela Federação Mundial de Comunidades Terapêuticas em 24


de abril de 1995.

Texto da 7ª Edição aprovado pela Assembleia do Conselho Deliberativo em 16 de


junho de 2018.

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2- A PSICOTERAPIA

A psicoterapia (do grego psykhē - mente, e therapeuein - curar; primeira


referência ca. 1890) é um tipo de terapia cuja finalidade é tratar os problemas
psicológicos, tais como depressão, ansiedade, dificuldades de relacionamento, entre
outros problemas de saúde mental.[1] É um processo dialético efetuado entre um
profissional, o psicoterapeuta, que pode ser um psicólogo ou psiquiatra, e o paciente
ou cliente.

Por ser uma área da saúde mental, a psicoterapia é a principal linha de tratamento
para qualquer assunto referente ao psiquismo. Para isso, propõem intervenções
psicológicas, cujos objetivos centrais são:

 restabelecer o funcionamento psíquico ótimo do paciente;


 permitir que o paciente compreenda as causas do que lhe acomete, para que
possa encontrar recursos psíquicos para lidar com suas dificuldades, problemas,
etc.;
 desenvolver meios de agir no mundo, redefinindo seus traços de personalidade;
 solucionar problemas pontuais, que o afligem, bem como observar questões de
cunho mais existencial.

A psicoterapia:

 É executada por profissionais qualificados para prover tratamentos aos distúrbios


e transtornos mentais, melhorar o auto conhecimento, melhorar a convicção nas
decisões do cotidiano, caminhar em busca da autonomia existencial, entre outras.
As modalidades possíveis são: psicoterapia extensa, psicoterapia breve e
aconselhamento psicológico clínico. Outros profissionais podem prover apenas
aconselhamento não clínico;
 é comumente precedida de um psicodiagnóstico, sendo a definição do diagnóstico,
apresentada em codificação internacional, sendo utilizada preferencialmente
a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados

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com a Saúde -10 da Organização Mundial da Saúde, por se tratar de uma


linguagem comum entre profissionais de saúde. Em situações de crise, como
no luto ou na perda de um emprego, procede-se a uma entrevista inicial, que pode
durar até no máximo três sessões, para que se verifique a demanda e a queixa do
paciente;
 é um tratamento efetuado em ambiente clínico através de consultas de 50 minutos
(normalmente 1 vez por semana), porém a gravidade do paciente pode determinar
um número maior de sessões, tendo o profissional autoridade para isto;
 pode usar testes e técnicas psicológicas para atingir o objetivo, que varia desde a
diminuição do sofrimento (distresse, burn-out, crises de raiva etc.),
restabelecimento de uma capacidade perdida, e até a compreensão de si mesmo.
Neste caso, as técnicas e testes usados são determinados pela formação de
origem do profissional, lembrando que se usarem testes psicológicos estes são de
uso exclusivo de psicólogos, regulamentados por leis federais no Brasil;
 baseia-se no corpo teórico-científico das ciências psicológicas, que fazem parte
das neurociências;
 é aplicado em um determinado contexto formal (individual, casal, grupal, individual
com a presença de familiares, mediação de conflitos, de acordo com a
indicação).[2]

Em linguagem técnica, o termo "psicologia" refere-se à ciência e "psicoterapia" ao


uso clínico do conhecimento obtido por ela. Da mesma forma, costuma haver
confusão entre os termos "psicoterapia" e "psicanálise": enquanto psicoterapia refere-
se ao trabalho psicoterapêutico baseado no corpo teórico da ciência
da psicologia como um todo, psicanálise refere-se exclusivamente ao trabalho
baseado nas teorias oriundas do trabalho de Sigmund Freud; "psicoterapia" é, assim,
um termo mais abrangente, englobando todas as linhas teóricas-científicas (com
métodos e resultados) da psicologia moderna.

Estrutura básica da psicoterapia

Os vários tipos de psicoterapia, em todas as suas diferentes formas e métodos,


possuem uma série de características em comum. Somente tendo em mente tais

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características, se pode compreender o funcionamento da psicoterapia em geral e as


qualidades que definem cada uma das diferentes escolas.

Orlinsky e Howard[3] procuraram descrever a interação dinâmica dos diferentes fatores


que influenciam a psicoterapia, independentemente da linha específica.
Primeiramente, as condições da terapia são organizadas por certas circunstâncias
sociais que determinam, por um lado, a oferta de terapeutas, as instituições que
oferecem terapia, o acesso (físico e financeiro) da população (estrutura do sistema de
saúde), e, por outro, a formação dos psicoterapeutas e a aceitação de terapia por
parte da população (fatores socioculturais). Sobre esse pano de fundo, filtrado pela
presença de outras partes interessadas (pais, família, supervisores etc.), se
desenrola, então, o processo terapêutico: entre o terapeuta e o paciente (em
determinadas escolas, chamado cliente), cada um dos quais possuindo determinadas
características profissionais e de personalidade, se fecha um contrato terapêutico, que
define as regras do trabalho terapêutico para ambas as partes. Dois elementos, a
técnica terapêutica e o relacionamento terapêutico, representam a base de trabalho e
são ambas influenciadas por atributos tanto do terapeuta como do paciente. O
trabalho técnico do terapeuta, por outro lado, só poderá dar frutos se o paciente
mostrar abertura a esse trabalho. Os efeitos da terapia se apresentam em diferentes
níveis, tanto em relação aos padrões de funcionamento do indivíduo quanto em
relação a seus relacionamentos interpessoais.[2]

Efetividade da psicoterapia

A disciplina que se dedica ao estudo - desenvolvimento, avaliação, melhoramento,


explicação teórica - da psicoterapia é a pesquisa psicoterapêutica
(Psychotherapieforschung). A pesquisa empírica (ou seja, usando métodos
científicos) sobre a psicoterapia começou nos anos 1950, depois de o psicólogo
britânico Hans Eysenck (1952) ter afirmado que psicoterapia não tinha efeito nenhum,
ou seja, que era melhor ficar em casa do que buscar um terapeuta. Essa afirmação
de Eysenck, de que ele próprio mais tarde (1993) se distanciou, foi o impulso
necessário, para que a busca de uma compreensão mais aprofundada do processo
terapêutico começasse.

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A pesquisa dos efeitos da psicoterapia, baseada nos padrões da


pesquisa farmacêutica, busca diferenciar o efeito da terapia em si, por um lado, e
o efeito placebo (ou seja, a melhora nos sintomas devido à expectativa do paciente, e
não à terapia em si) e a remissão espontânea (ou seja, a cura dos sintomas por si
sós), por outro lado. Uma resposta à questão do efeito da psicoterapia não se dá no
entanto, com apenas meia dúzia de estudos; pelo contrário, são necessários muitos
deles, que são então reunidos em uma meta-análise, ou seja, um estudo que reúne e
resume um grande número de estudos. Com base em várias meta-análises, pode-se
afirmar, hoje, que a psicoterapia, pelo menos em suas formas tradicionais, é realmente
efetiva - ou seja, tem efeitos mais fortes sobre a saúde psíquica do que o efeito
placebo e a remissão espontânea.[4][5] Cabe, no entanto, observar, com Klaus
Grawe (1998),[6] que a questão do efeito placebo se apresenta de maneira diferente
em psicoterapia e em farmácia, pois, enquanto nesta se trata de um efeito indesejável
(se quer de fato que o medicamento funcione por si mesmo), em psicoterapia trata-se
de um forte efeito psicológico, que deve ser compreendido e que pode ser utilizado
como parte da própria terapia.

O funcionamento da psicoterapia

Uma vez confirmado o efeito positivo da psicoterapia sobre a saúde mental dos
pacientes, a pesquisa empírica começou a voltar a sua atenção a uma pergunta muito
mais difícil de ser respondida: como, com que mecanismos, é que ela funciona?

Fases de mudança do paciente

O processo terapêutico começa, para o paciente, antes da terapia em si e termina


somente muito depois de sua conclusão formal. Prochaska, DiClemente e Norcross
(1992)[7] propuseram um modelo em seis fases que descreve esse processo:

1. Fase "pré-contemplativa" (precontemplation stage): é a fase da


despreocupação. O paciente não tem consciência de seu problema e não tem
a intenção de modificar o seu comportamento - apesar de as pessoas a sua
volta estarem cientes do problema. Nesta fase, os pacientes só procuram
terapia se obrigados;

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2. Fase "contemplativa" (contemplation stage): é a fase da tomada de


consciência. O paciente se dá conta dos problemas existentes, mas não sabe
ainda como reagir. Ele ainda não está preparado para uma terapia: está ainda
pesando os prós e os contras;
3. Fase de preparação (preparation): é a fase da tomada de decisão. O paciente
se decide pela terapia - nesta fase, o meio social pode desempenhar um papel
muito importante;
4. Fase da ação (action): o paciente investe - tempo, dinheiro, esforço - na
mudança. É a fase do trabalho terapêutico propriamente dito;
5. Fase da manutenção (maintenance): é a fase imediatamente após o fim da
terapia. O paciente investe na manutenção dos resultados obtidos por meio da
terapia e introduz as mudanças no seu dia a dia;
6. Fase da estabilidade (termination): é a fase da cura. Nesta fase, o paciente
solucionou o seu problema e o risco de uma recaída não é maior do que o risco
de outra pessoa para esse transtorno específico.

De acordo com o desenvolvimento do paciente através das diferentes fases, se


classificam quatro tipos de progressão: (1) o transcurso estável, em que o paciente se
estagna em uma fase; (2) o transcurso progressivo, em que o paciente se movimenta
de uma fase para a próxima; (3) o transcurso regressivo, em que o paciente se
movimenta para uma fase em que já esteve, e (4) o transcurso circular (recycling), em
que o paciente muda a direção do movimento pelo menos duas vezes.

Fases da terapia

A terapia em si pode se desenvolver em fases, cada qual com objetivos próprios: [2]

1. Definição do diagnóstico, quando feita por médico ou psicólogo (ambos têm


habilitação para isto), decisão que define a prescrição terapêutica a ser
desenvolvida (medicamentosa, que é exclusiva do psiquiatra no Brasil; sendo
que o psicodiagnóstico é exclusivo do psicólogo no Brasil);
2. Estabelecimento de um contrato de trabalho verbal: promoção de um
relacionamento terapêutico e trabalho de clarificação do problema. A
estruturação dos papéis (terapeuta e paciente), desenvolvimento de uma

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

expectativa de sucesso, promoção do relacionamento entre paciente e


terapeuta, transmissão de um modelo etiológico do problema;
3. Desenvolvimento do trabalho psicoterapêutico: no que se refere às abordagens
teóricas: aquisição de novas competências (terapia cognitivo-
comportamental), análise e experiência de padrões de relacionamento
(psicanálise), reestruturação da autoimagem (terapia centrada na pessoa),
mas é preciso observar que, particularmente na psicologia, existem as
especialidades psicológicas, que se sobrepõem às abordagens, como
psicologia do organizacional ou do trabalho, psicologia do trânsito (inclui porte
de armas), psicologia clínica, neuropsicologia, emergência e urgência
psicológicas (ainda não reconhecida pelo Conselho Federal de Psicologia, mas
plenamente operante no Brasil), psicologia hospitalar, etc.;
4. Avaliação: verificação do atingimento dos objetivos propostos, estabilização
dos resultados alcançados, fim formal da terapia e da relação paciente-
terapeuta.

As decisões tomadas na fase 1 não devem necessariamente permanecer imutáveis


até o fim da terapia. Pelo contrário, o terapeuta deve estar atento a mudanças no
paciente, a fim de adaptar seu métodos e suas decisões de trabalho à situação do
paciente, que nem sempre é clara no começo da terapia. A isso, se dá o nome
de indicação adaptável.

Lembrando que quando se trata de psicoterapia em sua expressão mais genérica não
há que se falar em definição de diagnóstico na fase inicial, ou até em nenhuma fase,
uma vez que muitas vezes o foco do tratamento pode ser simplesmente mitigar um
sofrimento ou um sentimento, auto conhecimento, desenvolver habilidades para se
superar um problema, ou outros, de modo que não se fala em diagnóstico, muito
menos em cura.

Mecanismos de mudança em psicoterapia

Vários autores se dedicaram à questão do funcionamento da psicoterapia: o que é


que leva à mudança no paciente.

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K. Grawe (2005)[8] descreve cinco mecanismos básicos de


mudança (Grundmechanismen der Veränderung) comuns a todas as escolas
psicoterapêuticas:

1. Relacionamento terapêutico (therapeutische Beziehung): a qualidade do


resultado de uma terapia é, em grande parte, influenciada pela qualidade do
relacionamento entre o terapeuta e o paciente.
2. Ativação de recursos (Ressourcenaktivierung): a psicoterapia auxilia o paciente
a mobilizar a força interna que ele possui para realizar a mudança necessária
e estabilizá-la;
3. Atualização do problema (Problemaktualisierung): a psicoterapia expõe o
paciente ao seu padrão normal de comportamento, como modo de tornar esses
padrões conscientes e, assim, modificáveis. Exemplos são o trabalho com
meios teatrais, como no psicodrama; os treinamentos de competências sociais,
que podem ser contados como parte integrante da terapia comportamental; a
técnica de focusing de Gendlin, e o trabalho com transferência e
contratransferência, típico da psicanálise e de outras escolas psicodinâmicas;
4. Esclarecimento motivacional (Motivationale Klärung) ou Clarificação e
transformação de interpretações (Klärung und Veränderung der Bedeutungen):
a psicoterapia auxilia a clarificação de ambiguidades e obscuridades na
experiência pessoal do paciente, ajudando-o a encontrar um sentido para
aquilo que ele experiencia. Exemplos são os métodos de clarificação típicos
da terapia centrada no cliente e os métodos de reestruturação cognitiva
da terapia cognitiva;
5. Competência na superação dos problemas (Problembewältigung): a
psicoterapia capacita o paciente a adquirir a capacidade de adaptação à
realidade psíquica e social, capacidade esta que costuma estar ausente nos
transtornos psíquicos. Exemplo típico de métodos que usam esse mecanismo
de maneira explícita são os métodos de exposição, comuns à terapia
comportamental.

Uma outra abordagem do problema oferecem Prochaska et al. (1992),[7] ao


descreverem dez processos de mudança diferentes. Tais processos são definidos

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como atividades e experiências pessoais que o paciente, de maneira direta ou indireta,


realiza na tentativa de modificar seu comportamento problemático. Esses processos
são: (1) Autoexploração ou autorreflexão (conscious raising), ou seja, o paciente
procura se conhecer melhor, o que leva a uma (2) autorreavaliação,
(3) autolibertação da convicção de que uma mudança não é possível,
(4) contracondicionamento, ou seja, a substituição do comportamento problemático
por outro, mais adequado, (5) controle dos estímulos, ou seja, o evitar ou combater
estímulos que levam ao comportamento problemático, (6) Administração de reforços,
ou seja, o paciente se dá uma recompensa cada vez em que se comporta da maneira
desejada (ver condicionamento operante), (7) relacionamentos auxiliadores, ou seja,
o paciente se abre à possibilidade de falar sobre seus problemas com uma pessoa de
confiança (de maneira especial, o terapeuta), (8) alívio emocional através da
expressão de sentimentos em relação ao problema e às suas soluções,
(9) reavaliação ambiental, ou seja, o paciente percebe como o seu problema
provoca estresse não apenas para si mas também para as pessoas à sua volta, e
(10) libertação social, ou seja, o paciente realiza gestos construtivos para seu
ambiente social (família, amigos, sociedade em geral).

Em seu modelo transteórico da psicoterapia, Prochaska et al. (1992) unem os


processos acima descritos a seu modelo das fases de mudança (ver acima): os
diferentes processos estão intimamente relacionados às diferentes fases e
determinados processos são completamente inócuos se realizados em uma fase
inadequada.

Efeitos da psicoterapia

Ainda sob um ponto de vista geral, ou seja, comum a todas as escolas


psicoterapêuticas, os efeitos da psicoterapia podem ser analisados sob dois
aspectos:[2]

 O aspecto processual, isto é, que se refere ao trabalho terapêutico em si. Aqui,


podem se observar os seguintes efeitos: o fortalecimento do relacionamento
terapêutico, a intensificação da expectativa de sucesso do paciente, sensibilização
do paciente a fatores que ameaçam sua estabilidade psíquica, um mais profundo

17
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

conhecimento de si mesmo (autoexploração) e a possibilidade de novas


experiências pessoais;
 O aspecto final, isto, que se refere às consequências da terapia na vida do
paciente. Aqui, se diferenciam os microefeitos dos macroefeitos.
Os microefeitos referem-se aos pequenos progressos que acontecem durante a
terapia, entre as sessões: o paciente experiencia novas situações, emoções,
novas facetas de si, novas formas de comportamento. Já os macroefeitos dizem
respeito às consequências a longo prazo e às mudanças mais profundas,
relacionadas às estruturas mais centrais da personalidade e do funcionamento
psíquico: a pessoa adquire novas posturas em relação a si mesma e aos demais,
adquire novas capacidades e competências. Sobretudo, uma terapia realizada
com sucesso conduz a um aumento da autoeficácia (self-efficacy), ou seja, da
convicção do paciente de ser capaz de lidar com os problemas que o faziam sofrer,
o que leva a um aumento da autoestima. Outros efeitos são ainda uma
compreensão maior dos problemas que afligem o paciente e da história de vida,
que conduziu a eles.

Tanto os micro como os macroefeitos se podem dar em três níveis: (1) melhora do
bem-estar, (2) modificação dos sintomas e (3) modificação da estrutura da
personalidade. Mudanças na estrutura da personalidade só são possíveis depois de
uma melhora do bem-estar e dos sintomas.[9]

Tipos de psicoterapia

Apesar de terem tanto em comum, os diferentes tipos de psicoterapia se diferenciam


na ênfase que dão em cada um desses aspectos comuns. Antes de serem
concorrentes, os diferentes tipos de psicoterapia possibilitam uma maior
adaptabilidade do tratamento às características individuais do paciente e podem ser
classificados sob diversos pontos de vista:[2]

Classificações sob aspectos formais

 De acordo com o número de pessoas: psicoterapia individual, de casal, familiar ou


de grupo;

18
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

 De acordo com a duração: terapias curtas (ca. 6-15 sessões) e longas (até três ou
mais anos);
 De acordo com o setting (contexto): online ou pessoalmente;
 De acordo com a delegação do "poder terapêutico": terapias diretivas (power to
the terapist), em que o terapeuta trabalha com apenas um paciente; terapias de
mediação (power to the mediator), em que o auxílio não é direcionado ao paciente
diretamente, mas a pessoas relevantes para ele (pais, parceiro, etc.); grupos de
autoajuda (power to the person), em que pessoas com os mesmos problemas
procuram, juntas, se ajudar mutuamente na superação do problema;
 Alguns métodos têm por objetivo mudanças intrapessoais (nas funções psíquicas
do indivíduo), outros têm por fim mudanças em sistemas interpessoais
disfuncionais (pares, famílias, grupos de trabalho…);
 De acordo com o fim da terapia: alguns tipos de psicoterapia têm, por fim,
a superação de um problema (problembewältigungsorientiert); outras, objetivam
uma clarificação dos motivos e objetivos pessoais do paciente (motivational-
klärungsorientiert); por fim, outras buscam enfatizar as potencialidades do
paciente, dando atenção mais às partes saudáveis da pessoa.

Classificação de acordo com a perspectiva teórica

M. Perrez e U. Baumann (2004),[2] baseados em trabalhos anteriores, classificam


quatro grande famílias psicoterapêuticas:

 Psicoterapias psicodinâmicas: explicam os problemas psíquicos com base


em conflitos inconscientes originados na infância e seu objetivo é superação de
tais conflitos. Para isso elas procuram compreender o presente a partir do passado
e trabalham com métodos interpretativos. Objetos de interpretação podem ser
as livres-associações, os fenômenos transferenciais, os atos falhos, os sonhos etc.

Ver também psicanálise e psicologia analítica; ou, ainda, Sigmund Freud, Anna
Freud, Melanie Klein, Lacan, Bion, Winnicott, Carl G. Jung, Alfred Adler, Erik Erikson

 Psicoterapias cognitivo-comportamentais: explicam os transtornos mentais


baseadas na história de aprendizado do indivíduo e nas interações dele com seu
meio, e têm por objetivo o restabelecimento das competências do paciente de

19
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

controlar seu comportamento e de influenciar suas emoções e percepções. Apesar


de também ter um olho voltado para o passado, este grupo de terapias se
concentra sobretudo no presente e trabalha com métodos como
treinamentos, condicionamento operante, habituação, reestruturação cognitiva,
o diálogo socrático, métodos psicofisiológicos, entre outros.

Ver também: Terapia cognitivo-comportamental; neurofeedback, ou ainda Aaron


Beck.

 Psicoterapias existencial-humanistas: Esse tipo de terapia parte do princípio de


que todo ser humano possui em si uma força interna que, se não for impedida por
influência externa, o conduz à sua plena realização. Elas explicam assim os
transtornos psíquicos como fruto da incongruência entre a autoimagem e a
experiência pessoal e buscam fomentar as forças de autorrealização
(selfatualisation) do indivíduo. Esse grupo de terapias se concentra na experiência
atual da pessoa e procuram métodos de trabalho que possibilitem ao cliente (como
é chamado por elas a pessoa que busca a terapia) desenvolver-se de maneira
congruente a suas necessidades.

 Psicoterapias orientadas na comunicação: consideram os transtornos do


comportamento como expressão de estruturas de comunicação disfuncionais e
buscam uma reorganização de tais estruturas ou a formação de novas, mais
construtivas. Também tais terapias preocupam-se sobretudo com a situação
presente e trabalham com métodos que possam gerar novas formas de
compreensão da realidade e de si mesmo.

Essa classificação, apesar de possibilitar uma visão geral da área da psicoterapia, é


no entanto muito genérica para englobar todas as formas existentes, sobretudo
porque muitas são formas híbridas, que juntam em si elementos de diferentes
tendências.

A página anexa Lista de psicoterapias oferece uma lista de diferentes tipos de


psicoterapia e conduz aos respectivos artigos,

Abordagens transteóricas
20
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Apesar de toda a complementariedade das diferentes escolas e linhas da psicoterapia


- e apesar de muitos psicoterapeutas fazerem usos de ideias e técnicas de diferentes
linhas - a relação entre elas está longe de ser amigável. As escolas psicodinâmicas e
existencial-humanistas são muitas vezes atacadas por não serem suficientemente
empiricamente fundamentadas[10][11] enquanto as cognitivo-comportamentais são
acusadas de serem mecânicas, cansativas e superficiais.[12] A tentativa de
proporcionar à prática psicoterapêutica uma base comum é feita por diferentes autores
de diferentes maneiras:

 Integração: é a busca de uma unificação da base teórica das diferentes escolas


(Arkowitz, 1992);
 Ecletismo: é uma posição mais prática. O objetivo é reunir os elementos efetivos
das diferentes escolas, sem levar em conta possíveis diferenças teóricas;
 A busca de variáveis transteóricas, que são os fatores comuns a todas as escolas,
mas que recebem em cada uma delas um papel mais ou menos central. Ver acima
"Mecanismos de mudança em psicoterapia";
 A busca de uma psicoterapia geral (allgemeine Psychotherapie, Grawe et al.,
1997[13]), que é a formação de uma estrutura teórica básica, que oferece uma
possibilidade de localizar e descrever as diferentes escolas; [14]
 No curso de graduação de medicina, existe uma cadeira que estuda a contribuição
da Psicologia nas doenças, e nos processos de recuperação da saúde, a qual dá-
se o nome de Psicologia Médica.

Ainda não existe uma teoria geral que abarque todas as formas de psicoterapia. A
moderna psicoterapia é um sistema aberto que tem ainda muito a se desenvolver por
meio da pesquisa científica. Um importante papel na pesquisa atual desempenham os
tratamentos voltados para transtornos específicos e não terapias
genéricas.[2] Exemplos de trabalhos transteóricos podem ser encontrados em
diferentes novas abordagens de terceira geração da terapia comportamental bem
como em grupos de pesquisa em diferentes países europeus, entre eles a Suíça.[15]

21
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

3- AJUDA PSICOLÓGICA

5 razões que provam por que todo mundo deveria fazer terapia

Buscar por ajuda psicológica é algo temido por muitas pessoas, que a consideram
uma escolha de “gente maluca”. Na verdade, é bem pelo contrário: a terapia auxilia
qualquer pessoa que deseja ter uma relação mais saudável consigo mesmo e
com outras pessoas ao seu redor.

Cada vez mais presentes em um mundo acelerado, com diversas mudanças ao


longo dos anos, muitas pessoas sentem-se frustradas, ansiosas ou, até mesmo,
depressivas. Por isso, é mais do que necessário dar a devida atenção à nossa saúde
mental.

Quer saber por que você e todo mundo deveria fazer terapia? Acompanhe a leitura!

O que é a terapia?

Terapia é como popularmente chamamos a psicoterapia psico (mente) + terapia


(curar).

A psicoterapia consiste em um conjunto de práticas terapêuticas entre um paciente


e psicólogo com a intenção de diminuir sofrimentos, interpretar os eventos e
acontecimentos da vida de uma pessoa.

Ao contrário do que se pode pensar, a terapia é recomendada para qualquer


pessoa que deseja melhorar aspectos emocionais em sua vida e não somente para
quem tem algum tipo de transtorno mental. O terapeuta tem a função de auxiliar o
paciente na busca por respostas, fazendo-o entender o porquê do surgimento de
certos pensamentos e atitudes.

22
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

O psicoterapeuta pode lhe auxiliar na promoção de saúde mental, independente do


grau de adoecimento psíquico. Muitos esperam chegar em uma situação limite para
buscar ajuda. Porém pode-se diminuir muito sofrimento se a pessoa ao perceber certo
sofrimento psicológico, como tristeza e angústia, buscasse ajuda com um profissional
qualificado.

Logo, o papel do psicólogo é criar uma facilitação para que a pessoa verbalize e tenha
autoconsciência de si mesma. Vale lembrar que sua função não é a de dar conselhos
e sim, percepções e caminhos de acordo com a situação.

Fazer psicoterapia possibilita o autoconhecimento, a solução de conflitos e a melhora


da saúde mental. É nela que o paciente olha para si mesmo e pensa nas razões que
levam à determinados pensamentos ou atitudes em relação a uma área de sua vida.
A partir de conversas e abordagens, a terapia torna possível a conscientização do
passado de uma pessoa, o que geralmente influencia em quem ela é hoje.

Para a psicóloga especializada em saúde mental do Hospital Santa Mônica, Danielle


Bevilaqua, “vejo que mais que uma abordagem psicanalítica ou comportamental, por
exemplo, é fundamental que o paciente tenha um vínculo terapêutico de confiança
com o profissional. Isso poderá determinar o grau de sucesso do tratamento. Quanta
confiança precisamos para dividir nossas intimidades e despir nossa alma diante de
uma pessoa. Não é, mesmo? Pois bem, quando isto acontece podemos vincular o
paciente a sua própria história e ajudar para que ele possa escrevê-la de forma mais
saudável, satisfatória e adequada à sua realidade.”

A psicoterapia também concretiza a autoaceitação da situação do paciente, que com


o autoconhecimento pode tomar atitudes e ter comportamentos mais
assertivos, possibilitando uma maior qualidade de vida.

1. Livrar-se de dependências

Um dos motivos mais importantes para justificar o porquê de fazer terapia são os
transtornos mentais, como muitas pessoas já conhecem. A terapia é altamente
indicada para tratar tipos diversos de patologias clínicas, como a dependência

23
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

química, depressão ou esquizofrenia.A prática auxilia na recuperação desse tipo de


sofrimento mental permanente ou temporário. Muitas vezes, os psicólogos,
responsáveis pelas interações terapêuticas, trabalham em conjunto com psiquiatras
que podem receitar medicamentos se for necessário.

2. Aumentar a autoconfiança

O medo do novo pode levar muitas pessoas a terem uma certa dificuldade de se
adaptarem à novas situações. Uma mudança de cidade ou trabalho pode gerar
grandes inseguranças, que são capazes de se transformarem em angústias,
ansiedades e sofrimento.

Para amenizar essas sensações e aumentar a confiança, o processo terapêutico entra


como um trabalho que envolve diversos fatores para transformar os sentimentos
negativos em positivos.

3. Conviver com o Medo

Inteligência e maturidade emocional são consequências positivas que algumas


sessões de terapia podem trazer para uma pessoa. Alguém que convive com muitos
medos e não sabe bem como lidar com situações do passado pode sofrer com
isso, talvez sem se conscientizar.

Bevilaqua complementa que “O medo pode ser utilizado para sermos mais cautelosos,
porém a medida que ele limite a qualidade de vida de uma pessoa podemos ter um
adoecimento. É fundamental podermos nos aproximar deste limitador e pensarmos:
qual o papel que ele ocupa na minha vida? Para então podermos saber como mudar.”

4. Lidar com sentimentos

Ocasiões que têm relação com o luto e com separações, por exemplo, são bastante
delicadas pelo fato de deixarem marcas emocionais em alguém que vivenciou alguma
delas. Perder uma pessoa querida ou se separar de alguém após muitos anos é
geralmente muito doloroso.

24
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Muitas pessoas não conseguem superar esse momento de suas vidas sozinhas. Logo,
um profissional terapêutico pode ajudá-las a seguir com suas vidas e com as
mudanças que virão a surgir. Uma mágoa pode surgir após muito tempo por conta de
um fato que ocorreu anos atrás. Isso pode abalar a vida dessa pessoa, que ao fazer
terapia aprenderá a conviver com a sua própria história e ainda poderá aproveitar
novas possibilidades que surgirem.

5. Criar relações saudáveis

Não é preciso ter um motivo bem definido para fazer terapia. Se alguém deseja se
relacionar melhor consigo mesmo ou com outras pessoas, isso já é motivo suficiente
para fazê-la. Muitas pessoas são inseguras em certas áreas da vida, outras são
tímidas e carregam um sentimento de culpa sem motivo aparente.

Com a terapia, essas pessoas conseguem se tornar conscientes de que o


aprendizado é constante em relação à autoaceitação, autocrescimento e ao
desenvolvimento geral como ser humano.

Ainda segundo a psicóloga Danielle Bevilaqua, “a psicologia tem um nicho que estuda
as habilidades sociais. Podemos ver claramente quais são as habilidades aprendidas,
como falar, andar e correr e quais podemos treinar para que possam nos apoiar em
relações mais saudáveis. Chamamos de Treinamento de Habilidades Sociais,
atrelado ao processo de psicoterapia, sempre que se faz necessário utilizo este
recurso com meus pacientes”.

Quando procurar por ajuda?

A saúde mental é responsável pelos resultados daquilo que uma pessoa vive. Se
existe uma ou mais áreas da vida que não vão bem, é bem provável que existam
fatores internos que precisam ser repensados. Estes podem desencadear diversos
sentimentos negativos, como mudanças repentinas de humor, ansiedade e até
distúrbios alimentares.

25
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Os transtornos mentais podem ter vários desencadeadores e sintomas como: tristeza,


ansiedade e culpa. Se você tem alguns desses sintomas, certamente um bom
psicólogo poderá auxiliá-lo.

No momento em que uma pessoa, com o auxílio de um psicólogo, começa a fazer


terapia ela começa a criar novas atitudes e comportamentos que começam a
desenvolver a felicidade, confiança em si mesma, controle sobre as relações próximas
e seus pensamentos.

Saiba identificar os principais sinais que indicam a necessidade de fazer terapia:

Depressão

A depressão provoca profunda tristeza de modo prolongado e perda de interesse nos


prazeres diários. Ela é considerada um transtorno de humor que afeta como uma
pessoa se sente, pensa e se comporta, o que pode levar a vários problemas
emocionais e físicos.

Muito longe de ser um sinônimo de fraqueza ou frescura, a depressão merece atenção


e pode ser melhor identificada com a terapia, que é realizada de acordo com as
necessidades de cada pessoa.

Muitas pessoas se acostumam com o sofrimento. No caso da depressão, alguns


acham até bonito – quase romanceiam o temperamento melancólico. Mas não é
bonito! A depressão também pode matar.

Ansiedade

A vida acelerada e corrida pode causar ansiedade em seus vários momentos. Porém,
quando estes sentimentos começam a ser intensificar pode ocorrer um transtorno de
ansiedade e até levar à síndrome do pânico.

A ansiedade pode ser o problema central de um paciente, mas pode ser mais um
sintoma dentro de seu processo de adoecimento. Pode, por exemplo, aumentar em

26
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

um início de um surto na Esquizofrenia. Ou seja, uma ansiedade elevada indica um


adoecimento psicológico. Não adianta se automedicar ou camuflar o sintoma, nem
muito menos se acostumar com ela. Temos sim que nos conhecer para saber o porquê
da ansiedade e como lidar com a causa desta na nossa vida. Não adianta ir pelo que
o vizinho sente ou diz. Temos que buscar, na psicoterapia, no nosso intimo o que nos
aflige e utilizar recursos disponíveis na ciência para melhora como: acupuntura,
massagens, exercícios físicos, meditação e se necessário, medicação (prescrita por
um psiquiatra).

Transtornos de humor

Existem vários tipos de transtornos de humor que incluem os depressivos e bipolares.


Geralmente as pessoas com estes tipos de transtorno apresentam picos de humor, se
tornando eufóricos ou depressivos.

Com isso, uma pessoa pode se afastar de pessoas queridas ou se sentir facilmente
distraída. A terapia entra como um fator de controle deste sinal, sendo eficaz para
modificar pensamentos negativos e estimular os positivos.

Distúrbios alimentares

Os distúrbios alimentares geralmente trazem consequências sérias para o organismo


e para a saúde mental. Transtornos como a bulimia nervosa e a anorexia nervosa são
consideradas doenças biopsicossociais, ou seja, envolvem diversos fatores que
podem ocasionar o seu desenvolvimento.

A terapia entra como um tratamento de reeducação e transformação, de modo a


reduzir comportamentos compulsivos. A psicoterapia e a terapia familiar também são
importantes, variando de acordo com o quadro clínico de cada pessoa.

27
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

4- COMO FACILITAR UMA TERAPIA DE GRUPO

Terapia comportamental de grupo e suas peculiaridades

Quando falamos em terapia de grupo, na maioria das vezes, nos vem à cabeça grupos
de atendimentos como os de alcoólicos anônimos (AA), o MADA (Mulheres que amam
demais anônimas) e outros existentes. Portanto, pode-se formar grupos bem
parecidos quanto a sua formação, ou seja, o trabalho realizado com várias pessoas
ao mesmo tempo vai depender de qual modelo e qual objetivo o criador do grupo está
interessado. É possível formar grupos terapêuticos, grupos psicoeducativos e grupos
de autoajuda que é o modelo mais conhecido do grande público. Ao considerar que o
modelo de análise do comportamento no qual a interação entre as ações de um
indivíduo e seu ambiente especialmente o social é muito importante, trabalhar com
grupos terapêuticos parece ser bastante sensato (Banaco, 2008). Um indivíduo
funciona como ambiente social para o outro indivíduo, ou seja, produz mudanças no
responder do outro, e isso se parece com o modelo natural do funcionamento dos
grupos na sociedade.

A psicoterapia de grupo é uma modalidade de atendimento dentro da psicologia que


oferece aos indivíduos mais condições de interação da vida em sociedade. Podemos
dizer que um grupo é formado de acordo com a demanda em comum entre os
participantes do grupo ou com objetivos semelhantes. Para participar de um grupo
terapêutico os participantes precisam se dispor a trocar opiniões sobre seus valores,
atitudes e comportamentos e, realmente, expor-se a uma crítica construtiva (Delitti,
2008). Algumas pessoas podem não se beneficiar tanto do trabalho de grupo, ou
podem obter benefícios somente após um certo período de terapia individual.

Então, a terapia de grupo pode ajudar o cliente? De acordo com Yalom (2006), a
psicoterapia em grupo oferece benefícios significativos aos indivíduos, bem como a

28
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

terapia individual. O terapeuta analítico-comportamental, assim como na terapia


individual, utilizará princípios da análise do comportamento em suas observações e
intervenções, irá estabelecer vínculos, ouvir relatos, observar e interpretar
comportamentos emitidos durante as sessões a fim de fazer com que o cliente
discrimine quais as variáveis ele está sob controle e que lhe traz sofrimento. Entre as
técnicas utilizadas durante as sessões de terapia, estão o reforçamento, a extinção, o
treino discriminativo, a modelagem, a modelação, o treino de auto-observação, além
da utilização de recursos como fotos, textos, vídeos, exercícios, e etc.

Os benefícios do atendimento em grupo estão associados com a aproximação do


ambiente social e natural dos participantes. Ou seja, existe uma procura em aproximar
a terapia de grupo de uma situação natural, facilitando a aprendizagem de
comportamentos exigidos em situações de interação e generalização do que foi
aprendido (Kerbauy, 2008). A maior vantagem da terapia de grupo é se beneficiar de
momentos onde situações como estas são reproduzidas, porém, de uma forma
gradual e controlada, facilitando a aquisição e treino de comportamentos que não
seriam emitidos em ambiente real (Derdyk, 2006).

Os grupos podem ser formados de maneira homogênea e heterogênea, com mulheres


ou homens, com queixas semelhantes e diferentes, depende da função de cada grupo
e qual o objetivo a ser alcançado. Encontra-se na literatura uma variação na
quantidade recomendada de participantes, mas quando se estabelece esse número é
preciso pensar na desistência de alguns membros no decorrer do grupo e mesmo em
um número que facilite a participação individual de cada um. Podem ser criados
grupos abertos, que não têm tempo determinado para encerrar, e grupos fechados,
que já começam com a quantidade de sessões predeterminadas. As sessões em
grupo, na maioria das vezes, variam entre 90 minutos e 2 horas.

Os objetivos do grupo terapêutico têm que ficar claro para cada participante, havendo
a possibilidade de mudança no decorrer do grupo. Vale ressaltar, que assim como na
terapia individual, o sigilo é algo a ser lembrado a fim de favorecer com que os
indivíduos do grupo se sintam à vontade para exporem aquilo que sentem e fazem. A
seleção dos membros para o grupo também é de grande importância. É preciso que
29
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

o terapeuta faça entrevistas anteriores ao início do funcionamento do grupo para que


os participantes interessados sejam avaliados e direcionados para o grupo que mais
atende às suas demandas ou a princípio para uma terapia individual.

Durante o desenvolver de um grupo é possível observar as mudanças nas relações e


a evolução comportamental dos participantes, na medida em que estão sendo
modelados, reforçados e, muitas vezes, punidos pelos próprios membros do grupo, o
comportamento vai respondendo às contingências em vigor e alterando muitas vezes
a demanda ou a queixa da terapia. A maior parte do funcionamento do grupo, segundo
Kerbauy (2008), é destinado a manutenção de alguns comportamentos já obtidos
durante o processo terapêutico do grupo. Comportamentos estes que são evocados
e modelados durante os encontros realizados, afim de que estes sejam generalizados
para o ambiente natural do cliente.

De acordo com alguns autores, ensinar análise funcional ao cliente é um dos melhores
procedimentos terapêuticos. No grupo terapêutico a história de vida dos diferentes
indivíduos pode ser evidenciada, questionada e utilizada como modelos para novos
repertórios dos participantes do grupo, portanto, torna-se uma oportunidade de o
indivíduo observar e refletir sobre suas próprias habilidades sociais e discriminar seus
comportamentos, utilizando a análise funcional para adquirir autoconhecimento e,
assim, beneficiando-se de suas próprias análises.

Outro ponto importante que deve ser analisado é que ao se propor ser um terapeuta
de grupo, o profissional passa também a ser membro do grupo, com papel diferente,
mas, parte do grupo, só que agora mais exposto, já que é alvo não só de um, mas de
vários clientes. Para se tornar um terapeuta de grupo é preciso ficar atento aos dois
aspectos que influenciam e determinam o seu desempenho: o conhecimento teórico
e seu repertório de vida adquirido ao longo dos anos (Deryk & Sztamfater, 2008). A
habilidade mais importante para quem quer ser um terapeuta de grupo, assim como
na terapia individual, certamente é a audiência não punitiva. Muitas outras
características são necessárias, como tentar favorecer a auto observação e
autoconhecimento, o fornecimento de feedbacks. É preciso também que o terapeuta
tenha uma postura segura para não produzir nos participantes sentimentos
30
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

semelhantes ao que está sendo expressado. Porém, existem habilidades que são
imprescindíveis ao terapeuta que irá conduzir o grupo como saber facilitar a
participação e interação dos membros, fazer com que o grupo mantenha o foco,
mediar conflitos e assegurar que as regras estabelecidas pelo grupo sejam cumpridas.
Apesar de tantos “critérios” para assumir esse papel, na maioria das vezes, o próprio
grupo se reforça, diferencialmente, de maneiras negativa, positivamente, natural e
espontânea. O atendimento em grupo é um processo que torna o cliente ativo e
participante, levando-se em conta que o próprio grupo movimenta o processo.

A coterapia acontece quando dois terapeutas atendem ao mesmo tempo, geralmente


um conduz e outro observa e vice e versa, mas é possível que os dois façam
intervenções durante a sessão, além disso, é necessário entrosamento e afinidade
para que isso ocorra sem interferência no processo e no papel de cada um durante a
sessão, um sempre vai conduzir e outro observar e fazer anotações sobre o grupo. A
coterapia é algo que precisa ser decido antes que o grupo comece a trabalhar. A
depender do tamanho do grupo, é possível conduzir um grupo sozinho, mas as
vantagens em se ter uma coterapia são maiores, tendo em vista a quantidade de
estímulos que o terapeuta está exposto numa sessão com muitos clientes. São muitos
comportamentos verbais e não verbais para se ficar atento. Quando existe uma
coterapia os papéis são divididos, enquanto um terapeuta conduz ou intervém, o outro
fica sobre controle de outros estímulos do grupo e vice versa. Portanto, essa
modalidade de atendimento promove muitos ganhos no grupo envolvido.

Vimos até agora como planejar, montar, conduzir, se tornar um terapeuta de grupos,
mas não falamos das dificuldades existentes ou possíveis dentro desse processo. Na
literatura se fala em muitas vantagens e desvantagens do atendimento em grupo e
cita sempre como a única desvantagem a falta de acesso ao conteúdo individual de
cada participante do grupo.

Algumas dificuldades podem acontecer na organização, na elaboração dos objetivos,


na determinação dos temas, na seleção dos participantes, no relacionamento
interpessoal do grupo, entre terapeutas e clientes, clientes e clientes e terapeutas e
terapeutas. Talvez as dificuldades apresentadas sejam devidas à falta de experiência
31
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

na organização e planejamento do grupo, à falta de exigências em alguns critérios


para que aconteça o grupo e na falta de experiência e habilidade do (s) terapeuta (s).
Por isso, são detalhes que precisam ser avaliados com muito critério e durante todo o
processo. O terapeuta e o coterapeuta podem estabelecer que sejam feitas avaliações
constantes sobre todo o processo, desde a captação de cliente até os ganhos obtidos
pelos participantes. No entanto, não existe um formato pronto de uma condução
adequada.

Então é de grande importância haver preparo para lidar com tantos estímulos que o
atendimento em grupo coloca sob – responsabilidade do terapeuta. Preparo técnico e
teórico, habilidade e disposição podem ser a chave para o sucesso dessa modalidade
de atendimento.

Benefícios

A terapia de grupo é uma prática terapêutica ainda pouco difundida e praticada, mas
que apresenta bons resultados e tem ajudado muitas pessoas a superar problemas.
Ela é feita em grupos de no mínimo 4 pessoas que se encontram semanalmente por
aproximadamente 1 hora e 30 minutos para trocar experiências, compartilhar dores e
sofrimentos e procurar apoio em momentos difíceis.
A dificuldade em procurar uma terapia de grupo é a vergonha de expor seus
problemas para outras pessoas.Porém é importante entender que todos que estão ali
presentes estão dispostos a ouvir, apoiar e trocar experiências.
O papel do terapeuta consiste em auxiliá-los com suas questões e garantir a
privacidade do grupo.
Um dos benefícios da terapia de grupo, é estar em contato com pessoas que estão
passando por situações parecidas com as suas.. Através da troca, todos começam a
se sentir mais fortes para enfrentar o problema e passam a vê-lo de uma forma
diferente.
A oportunidade de conhecer e estar em contato com novas pessoas, principalmente
pessoas que podem ter algo em comum com você.
Certeza que está sendo ouvido e compreendido
Muitas pessoas reclamam da dificuldade em poder ser ouvido e compreendido por
32
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

alguém, encontrar alguém em que se possa confiar totalmente e principalmente, não


ser julgado..
Sentir que existem pessoas que se importam com você e com a sua dificuldade
O principal benefício é estar em contato com pessoas que estão passando por
situações parecidas com as suas.
Ao interagir e trocar experiências com pessoas que estão vivendo situações iguais ou
semelhantes às suas, as pessoas ficam mais próximas e preocupadas umas com as
outras.
Ter um custo menor
Cada sessão de terapia de grupo geralmente tem o valor mais baixo que a terapia
individual, o que torna a terapia acessível a um maior número de pessoas.
Os grupos podem ser livres ou ter como objetivo , trabalhar temas específicos
Nos grupos livres, as questões, problemas e interesses variam de pessoa para
pessoa. Nos grupos temáticos, as questões são específicas como, por
exemplo, obesidade, álcool, drogas, depressão, terceira idade, gravidez, luto e etc..
Psicodrama de Casal, dirigido por Jacob Levy Moreno
Definição

A terapia de grupo é uma forma de psicoterapia onde um grupo pequeno,


cuidadosamente selecionado de indivíduos se reúne regularmente com um terapeuta.
Propósito

O objetivo da terapia de grupo é ajudar cada indivíduo em seu crescimento emocional


e na resolução de problemas pessoais.

Descrição

A terapia de grupo abrange muitos tipos diferentes de grupos com diferentes


orientações teóricas que existem para fins variados. Todas as modalidades ajudam
as pessoas a crescer emocionalmente e a resolver seus problemas pessoais. Todos
utilizam a energia do grupo, bem como a do terapeuta, que o conduz neste processo.

33
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Ao contrário do simples relacionamento de duas pessoas entre paciente e terapeuta


na terapia individual, a terapia de grupo oferece múltiplas relações de forma a auxiliar
o indivíduo em seu crescimento. O psiquiatra Irvin D. Yalom, em seu livro " Teoria e
Prática da Terapia de Grupo" identificou alguns "fatores de cura", que são os "agentes
primários da mudança" neste tipo de terapia:

Estímulo de esperança

Todos os pacientes entram na terapia com a esperança de diminuir o seu sofrimento


e melhorar suas vidas. Cada membro de um grupo da terapia está, inevitavelmente,
em um ponto diferente em sua busca, assim como se desenvolve em uma taxa
diferente. Os novos membros ou aqueles em desespero podem ser particularmente
encorajados pelos resultados positivos dos outros.

Universalidade

Um sentimento comum entre os membros de terapia de grupo, especialmente quando


um grupo está apenas começando, é a de estar isolado. Muitas das pessoas que
entram no grupo têm grande dificuldade em manter relacionamentos interpessoais. A
terapia é uma maneira possível de transformar estes sentimentos. Para muitos,
poderá ser a primeira vez em que se sentem realmente compreendidos por outras
pessoas. O enorme alívio enorme muitas vezes acompanha o reconhecimento de que
eles não estão sozinhos; este é um benefício especial do grupo.

Altruísmo

A terapia de grupo oferece aos seus membros uma oportunidade única: a


oportunidade de ajudar os outros. O processo de ajudar os outros é uma poderosa
ferramenta terapêutica que melhora muito a auto-estima e o sentimento de auto-
estima dos membros.

Habilidades sociais melhoradas

34
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

A aprendizagem social ou o desenvolvimento de habilidades sociais básicas é um


fator terapêutico que ocorre em todos os grupos. Os membros do grupo oferecer a
possibilidade de um "feedback" uns aos outros sobre a adequação do comportamento
dos outros. Embora isso possa ser doloroso, a franqueza e a honestidade com a qual
ele é oferecido pode fornecer uma correção comportamental necessária e, assim,
melhorar as relações dentro e fora do grupo.

Comportamento imitativo

Pesquisas mostram que os terapeutas exercem uma poderosa influência sobre os


padrões de comunicação dos membros do grupo, modelando determinados
comportamentos. Por exemplo, através de sua escuta ativa, dando feedbacks sem
julgamento, e oferecendo apoio. Ao longo do tempo, os membros desenvolvem esses
comportamentos. Isto lhes possibilita uma atitude mais positiva com os outros,
aumentando a sua auto-estima e sua vida emocional.

Aprendizagem interpessoal

Os seres humanos são animais sociais. Nossas vidas são caracterizadas por relações
intensas e persistentes, e grande parte da nossa auto-estima é desenvolvida através
de comentários julgamentos de outras pessoas as quais consideramos importantes.
No entanto, todos nós desenvolvemos distorções na forma como vemos os outros, e
essas distorções podem danificar até mesmo nossos relacionamentos mais
importantes. A terapia de grupo pode proporcionar uma oportunidade para os
membros de melhorar a sua capacidade de se relacionar com os outros e viver uma
vida muito mais gratificante.

A coesão do grupo

Pertencimento, aceitação e aprovação estão entre as necessidades humanas mais


importantes. Muitas pessoas com problemas emocionais, no entanto, na terapia de
grupo podem se sentir verdadeiramente aceitas e valorizadas. Isso pode ser um fator

35
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

de cura poderoso, de forma a substituir os seus sentimentos de isolamento e


separação por um de pertencimento.

Catarse

A Catarse é um experiência emocional poderosa que promove a liberação de


sentimentos conscientes ou inconscientes e que traz uma sensação de grande alívio.
Ela está presente na maioria das terapias, incluindo a terapia de grupo. É um tipo de
aprendizagem emocional, ao contrário do entendimento intelectual, e que pode levar
a uma mudança imediata e de longa duração.

O que é o Psicodrama?

Desenvolvido por Jacob Moreno, psiquiatra austríaco. Esta técnica facilita os


membros a trabalharem conteúdos significativos de suas vidas ajudando-os a resolver
os seus conflitos. O Psicodrama traz o conflito (situação conflitiva crônica ou
traumática) para o presente e, através de técnicas específicas, ajuda os membros do
grupo a resolver suas questões. O trabalho com a catarse assume um papel
importante. Esta abordagem é particularmente útil para pessoas que têm dificuldade
em expressar seus sentimentos em palavras.

O Psicodrama é uma abordagem de psicoterapia criada pelo psiquiatra Jacob


Levy Moreno no início do século XX. Possui como base fundações
psicodinâmicas, sistêmicas e existencialistas e se orienta por uma visão
holística dos participantes, valorizando seus comportamentos,
pensamentos, emoções e atitudes corporais.

É uma forma de terapia (modalidade individual ou em grupo) onde os participantes


têm a possibilidade de explorar suas emoções, assuntos e eventos conflituosos
através de técnicas apropriadas e sob a supervisão do psicoterapeuta.

36
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

O terapeuta auxilia os participantes a alcançarem insights mais profundos sobre as


suas questões, o que possibilita, por sua vez, uma maior capacidade de lidar melhor
com as questões em sua vida.

A abordagem psicodramática possui uma metodologia criativa, sendo trabalhada tanto


em grupos como individualmente. É um método que vai além do campo estrito da
psicoterapia, pois é também aplicado ao campo educacional, em empresas, em
comunidades e, de uma maneira geral, em qualquer ambiente onde sejam formados
grupos (ambientes de trabalho em geral, hospitais, prisões, reformatórios, asilos, etc.)

O tratamento psicodramático é uma forma de terapia em grupo em que os pacientes


exploram emocionalmente assuntos e eventos conflituosos através de técnicas
apropriadas e sob a supervisão do psicoterapeuta. Este, o terapeuta, auxilia os
pacientes a alcançarem insights mais profundos sobre os seus problemas, o que
possibilita, por sua vez, numa maior capacidade de lidar melhor com as questões em
sua vida.

Além disso, consideramos o trabalho em grupo valioso, pois, como se pode constatar
pela experiência prática, há uma grande força curativa durante estes trabalhos o que
possibilita, muitas vezes, em processos terapêuticos mais profundos e rápidos.

Por fim, pode-se afirmar que o psicodrama é particularmente eficaz também no


tratamento de perturbações crônicas de ordem emocional bem como eventos
pontuais na vida do cliente (trauma). Os bloqueios que impedem que o estresse
crônico ou o trauma sejam elaborados são o foco central ao longo do processo
terapêutico, de modo que as questões que deram origem a estar perturbações
possam ser re-vivenciadas e trabalhadas.

Terapia de Grupo e Construcionismo Social

O construcionismo social consiste em um conjunto variado de diferentes contribuições


teóricas produzidas na Psicologia nos últimos anos (Gergen, 1997; Shotter, 1993;

37
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Spink, 1999). De forma geral, tais contribuições enfatizam a especificidade cultural e


histórica das formas de conhecermos o mundo e reconhecem a primazia dos
relacionamentos na produção e sustentação do conhecimento. Podem ser divididas
em dois subgrupos, quais sejam, "light constructionism" e "dark constructionism"
(Danzinger, 1997). O primeiro se refere a aqueles autores para os quais a vida pode
ser transformada através de uma abertura à multiplicidade do discurso, e assim,
privilegiam o nível microssocial no estudo da construção do conhecimento. O segundo
associa os autores que enfatizam os aspectos não-discursivos dos relacionamentos
humanos, buscando analisar como o corpo e as estruturas sociais se constituem como
locais de produção de poder, e privilegiam as estruturas macrossociais no estudo da
produção do conhecimento.

As contribuições do construcionismo, especialmente do "light constructionism", se


espalharam para o campo da Psicoterapia (Gergen &Warhuus, 2001; Grandesso,
2000; McNamee & Gergen, 1998), no qual têm influenciado algumas propostas
terapêuticas tais como a terapia narrativa de White e Epston (1990), os processos
reflexivos de Andersen (1999) ou a abordagem colaborativa de Anderson (1997), entre
outras.

Estas propostas enfatizam, de diferentes formas: a análise do processo social de


construção dos sentidos; uma postura de co-construção entre terapeuta e cliente,
redimensionado a postura de especialista (Andersen, 1999; Anderson, 1997); o olhar
sobre os relacionamentos nos quais o cliente está envolvido e nos quais constrói
determinados sentidos; uma atenção aos valores e aos resultados pragmáticos dos
discursos que são construídos no contexto terapêutico (White & Epston, 1990); a
multiplicidade de formas de descrever um problema (Andersen, 1999); e um discurso
de potencialidades positivas e de construção de realidades futuras (White & Epston,
1990).

Tais propostas não devem ser consideradas como "... técnicas ou formas
instrumentais de conversar, mas como uma postura filosófica através da qual
buscamos ao mesmo tempo estar informados pelas idéias construcionistas, e
mantermo-nos abertos às condições momentâneas da conversação e ao significado
de certas negociações" (Rasera, 2004, p.56).
38
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

No campo da terapia de grupo também encontramos algumas contribuições


construcionistas (Becvar, Canfield, & Becvar, 1997; Green & Stiers, 2002; Guanaes,
2004; O'Leary, 2001; Rasera & Japur, 2001, 2003) em propostas de utilização de
equipes reflexivas em grupo (Chen & Noosbond, 1999), de terapia grupal narrativa
com pessoas com depressão (Laube & Trefz, 1994) ou abusadas sexualmente na
infância (Adams-Westcott & Isenbart, 1996), bem como o uso de cartas em grupos
psicoterápicos (Chen, Noosbond & Bruce, 1998).

No Brasil, em uma tentativa de trazer o convite construcionista ao campo da terapia


de grupo, Rasera (2004) propôs uma redescrição da terapia de grupo, definindo o
grupo como uma prática discursiva, ou seja, uma forma de criar realidades relacionais
através da linguagem. Esta redescrição teórica está associada a outras redescrições
práticas, tais como: o contrato grupal como o meio de delimitar algumas condições de
produção de sentido; a composição grupal como um processo de negociação entre
terapeuta e participantes; o problema e a mudança como construídos na linguagem;
o terapeuta como um parceiro conversacional; e a duração do grupo sendo definida a
partir do entendimento do grupo como uma intervenção ético-política.

A questão da preparação dos participantes e a composição do grupo

Tradicionalmente, a sessão de preparação é descrita como uma forma de promover


uma participação mais produtiva dos participantes, diminuindo expectativas irrealistas
e conseqüentemente, o nível de atrito e ansiedade grupal, e a taxa de abandono dos
participantes. Segundo Salvendy (1996), esta preparação pode ser realizada de
diferentes formas, desde a aplicação de questionários sobre o participante, a
apresentação de vídeos ou a distribuição de folhetos sobre psicoterapia de grupo, bem
como sessões nos quais o terapeuta esclarece sobre o contrato grupal.

Em uma revisão das pesquisas sobre preparação para a terapia de grupo Kaul e
Bednar (1994) apontam a eficácia de diferentes formas de preparação para o grupo.
Contudo, se por um lado, parece haver um consenso quanto à necessidade de realizar
algum tipo de procedimento de preparação para o grupo, por outro lado, resta
compreender como ele contribui para os resultados obtidos. De forma geral, os
estudos avaliados, baseados em um modelo experimental, apresentam uma ênfase
39
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

na análise de resultados, desprivilegiando uma análise dos processos microssociais


que sustentam a relação entre o terapeuta e os participantes.

A perspectiva construcionista, ao focalizar os modos como as pessoas constróem e


dão sentido ao mundo em que vivem, pode contribuir em termos teóricos e práticos
para este entendimento. Segundo Rasera (2004), a partir da redescrição do grupo
como uma prática discursiva, a distinção entre o processo de composição e
preparação do grupo é redimensionada. Pautado pela idéia que o processo grupal é
um processo de negociação, este se inicia na preparação e composição do grupo. A
partir de uma indicação inicial do terapeuta, a entrada de um participante no grupo
deve ser discutida com cada participante. Neste momento, busca-se que cada
participante se coloque de forma compromissada com o outro, numa posição que
possa facilitar tais negociações no grupo. As ações de preparação consistem assim
numa forma de criar uma arena conversacional na qual seja possível o diálogo.

Esta forma de pensar a composição grupal não é orientada por critérios sócio-
demográficos ou diagnósticos privilegiados pelo terapeuta, mas enfatiza a atenção
aos sentidos dados por cada participante às características dos outros.. Trata-se de
um processo de negociação que evita uma definição a priori dos processos de
inclusão/exclusão, bem como da homo/heterogeneidade grupal. Esta passa a ser
entendida como um processo de construção das descrições de si dos participantes,
que se inicia num diálogo com o terapeuta e se desenvolve através da interação ativa
entre os mesmos.

Objetivo

O objetivo deste trabalho é compreender como determinadas formas de conversar


contribuem para o processo de preparação e composição de um grupo de apoio
fechado, de curta duração, para pessoas portadoras do HIV em uma ONG/Aids de
Ribeirão Preto, a partir das propostas do construcionismo social.

Método

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

O Grupo Estudado

O grupo de apoio de curto prazo para pessoas portadoras do HIV aqui estudado teve
como objetivo promover conversas dialógicas que permitissem a construção de outras
formas de viver com HIV. O terapeuta buscou construir uma parceria conversacional
marcada pela reflexão, negociação e co-responsabilização com os outros
participantes. Além de 2 ou 3 sessões individuais de seleção e preparação para o
grupo, o grupo teve 10 sessões grupais semanais de 1h30 de duração, uma conversa
final e uma conversa de seguimento após três meses do término do grupo, com cada
participante. Ele foi composto por 4 participantes e o terapeuta: Pedro, 45 anos, sabia
de sua soropositividade há 9 meses, buscou o grupo para ter com quem conversar,
'colocar suas coisas pra fora' e se sentir melhor; Marina, 53 anos, profissional liberal
de nível superior, sabia-se portadora há 5 meses, e necessitava conversar sobre a
revelação de sua soropositividade para sua família; Tiago, 30 anos, sabia-se portador
há 9 anos, e buscava um jeito mais feliz de viver com HIV; Ricardo, 31 anos, sabia-se
portador há 4 meses, e precisava saber mais sobre a doença, como enfrentar o
preconceito e contar para sua família sobre a soropositividade; e o terapeuta, 29 anos,
psicólogo-pesquisador, há 6 anos atendia pessoas portadoras do HIV, é o primeiro
autor deste artigo.

As Sessões de Preparação

As primeiras conversas com cada participante potencial do grupo consistiram em


sessões de acolhimento, de uma hora de duração, na qual o terapeuta buscou
identificar o motivo pela procura do atendimento, entender a forma de enfrentamento
existente até então, e discutir as possibilidades de cuidado com o participante. Estas
conversas serviam também como uma oportunidade do participante conhecer o
terapeuta, a instituição, sua estrutura, objetivos e regras, para então decidirem
conjuntamente o encaminhamento a ser tomado. A partir das decisões de
encaminhamento decorrentes destas conversas é que se foi compondo o grupo. Estas
conversas iniciais tinham duas funções simultâneas: criar um contexto de diálogo e
preparar para o grupo. O participante trazia os sentidos sobre sua vida e sua busca
de mudanças julgados relevantes de serem apresentados ao terapeuta e ele buscava
refletir com cada um as implicações sobre estas descrições da vida, da mudança e do
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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

grupo. Este processo visava promover descrições do participante sobre o atendimento


escolhido e seu projeto de mudança. Através destas conversas se iniciava a
construção do grupo como uma realidade negociada entre cada participante e o
terapeuta. Esta construção foi pautada por sentidos relativos ao que o grupo poderia
ser e produzir.

A Constituição e Análise do Corpus

Os dois passos metodológicos utilizados na constituição do corpus correspondem à


gravação em fita cassete de todos os momentos do grupo, bem como o registro em
um diário de campo a respeito da vivência do primeiro autor deste trabalho neste
processo. A análise do corpus consistiu em: 1) Transcrição e edição de todas as
conversas do grupo estudado; 2) Leitura flutuante, curiosa e intensiva da transcrição;
3) Seleção de momentos das sessões de preparação: considerando o objetivo de
compreender como determinadas formas de conversar contribuem para o processo
de preparação e composição de um grupo, escolhemos analisar trechos da
transcrição de uma sessão de preparação, cuja riqueza facilita a visualização de
diversos aspectos relativos à compreensão do grupo como uma prática discursiva - a
sessão de preparação de Pedro. Além disso, trechos da sessão de preparação de
Marina serão analisados, visando explorar aspectos específicos discutidos a partir da
análise da sessão com Pedro; e, 4) Análise dos momentos selecionados. O processo
de análise dos momentos selecionados buscou apontar o contexto que se construía a
partir dessas conversas e as negociações aí necessárias, tentando respeitar a
seqüência das conversas e a troca de turnos entre os participantes. Baseados em
uma teoria relacional do significado (Gergen, 1997) buscamos rastrear o processo de
suplementação dos enunciados e as ontologias relacionais que se construíam nas
relações entre os participantes.

Pedro e Marina: Preparando-se para/o Grupo

A escolha das sessões de Pedro e Marina se deve ao caráter peculiar das mesmas e
as diferentes tarefas de preparação demandadas. Pedro era um participante que
exigia uma preparação cuidadosa para o grupo: tratava-se de uma pessoa com vários
comportamentos auto-destrutivos, muito deprimido, que não sabia ao certo como sua
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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

participação em um grupo poderia ajudá-lo, nem estava, inicialmente, muito disposto


a falar no grupo. Era necessário assim promover seu envolvimento com a terapia e a
vida. Marina, por sua vez, dado o conjunto de participantes no momento de início do
grupo, seria a única mulher do grupo, situação esta contra-indicada pela literatura.
Sua preparação implicava lidar com o risco do isolamento no grupo dada a diferença
de gênero existente. A análise dessas duas sessões dará visibilidade ao processo
pelo qual se deu a negociação que tornou possível que Pedro e Marina se tornassem
membros do grupo.

Acolhendo e Posicionando Pedro para a Terapia

A sessão de preparação de Pedro escolhida para essa análise é a sua terceira sessão
individual, a última antes do início das sessões grupais. Esta sessão de preparação
em específico pode ser entendida como uma conversa de negociação explícita, ou
seja, ambas as partes oferecem suas descrições da situação e então passam a
investigar, uma junto a outra, as possibilidades de barganha, para uma conseqüente
redefinição da situação, suas possibilidades e limites. O primeiro momento da sessão
consiste no acolhimento e investigação de situações recentes ocorridas com Pedro.
Ele conta como tem tido menos dor de cabeça, como tem conversado mais com os
profissionais de saúde e falado menos sobre aids com sua esposa.

Terapeuta: Entendi. Da primeira semana, você falou assim, "Ah, que eu saí daqui,
fiquei pensando, depois entrou a outra semana, já pensou outra coisa. "... O que que
você ficou pensando? Você lembra?
Pedro: Ah, pensando besteira de novo...
Terapeuta: Voltou a pensar besteira? Que tipo de besteira que você voltou a pensar,
Pedro?
Pedro: Ah, mesma besteira que sempre dá. (Tosse) Que, que eu falo, né? Que eu
pego meu, meu (???) de noite, os outro pede pra sarar e eu peço pra Deus me levar
eu embora, só isso aí.
...
Terapeuta: Entendi. É, e a Milene [esposa de Pedro] tá sabendo que você continua
pedindo isso?
Pedro: Não. Num falei mais nada pra ela, não. Eu peço sozinho, quieto, num canto. ...
43
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

(ele conta como a mulher continua 'sem paciência')


Terapeuta: É... o Pedro, mas apesar disso, hoje eu tô achando você mais sorridente,
você sabia?
Pedro: É?
Terapeuta: Da outra vez que você veio aqui estava mais...
Pedro: Mais derrubado?
Terapeuta: É, mais derrubado. Aconteceu alguma coisa pra você ficar menos
derrubado?
Pedro: Não, isso aí, eu sei lá, né?
Terapeuta: Por que que você acha que você tá menos derrubado?
Pedro: Sei lá eu, é por Deus.
...
Terapeuta: Né? É... que que você está, esperando do grupo?
Pedro: Eu, eu peço pra Deus, ou saro duma vez ou morre duma vez, num fica aí
infernizando os outros, né? Fica dando, fazendo trapaiada, os outros sofrendo por
causa da gente, ou sara ou... ou morre. Que venha falar pra mim, falar que ele quer
fazer, o que ele fazer tá bom.
Terapeuta: É? Então, é, e você, o que que você tem feito pra ajudar Deus tomar essa
decisão?
Pedro: Ah, eu tenho feito, eu, não, eu só peço pra ele, né?
Terapeuta: Você só tá rezando?
Pedro: Só, eu só peço pra ele, só.
Terapeuta: E num tem mais nada que você faz além de rezar pra ajudar a Deus?
Pedro: Não, eu, o que que eu vou fazer mais?
Terapeuta: Que que você acha que você poderia? Vamos pensar sobre isso?
Pedro: (silêncio curto) Vamos...
Terapeuta: Que tipo de coisa você acha que você pode ajudar Deus? Primeiro, você
tem interesse em ajudar Deus a tomar essa decisão, se te leva ou se te cura?
Pedro: Claro que eu tenho, né? Que se num tiver, eu também num tiver, também,
também num... Precisando, se a gente num vê, num fazer um pedido, também, num
querer ajudar, também, também, como diz a moda do outro, "Ele também lava a mão",
né?
Terapeuta: Ele lava as mãos? Então, tem, as coisas também dependem de você?
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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Pedro: Depende.
Terapeuta: É, e nessas coisas que dependem de você, que que você, é, qual que é a
coisa mínima que você acha que você está disposto a fazer pra ajudar Deus? (SP de
Pedro, pp.1-2)

Nesta conversa, podemos ver como Pedro mudou sua relação com o que era seu
problema. No começo da conversa ele reclamava e pedia a Deus para morrer. Ele
estava em uma posição passiva, esperando pelo desejo divino. Seu próprio desejo de
viver estava ameaçado. É como se toda a sua vida estivesse saturada pelo problema
com nenhuma possibilidade de transformação. Esta posição de Pedro está claramente
baseada em uma narrativa dominante (White & Epston, 1990) sobre o viver com
HIV/aids na qual a pessoa com aids morrerá rapidamente, podendo ser salva apenas
por um milagre, por Deus.

Neste momento, algumas posturas terapêuticas logo tentariam mostrar-lhe a


importância de viver. Contudo, considerando uma postura construcionista (Anderson,
1997), o terapeuta não buscou trabalhar visando certos resultados específicos neste
momento, mas focalizar o processo, o relacionamento com Pedro e suas decisões.
Não foram investigados os detalhes de sua história que justificasse tal decisão. Não
se trata de não valorizar a vida e a importância de um projeto de vida. Ao contrário,
este é um dos compromissos ideológicos que perpassam as atividades da ONG na
qual este grupo de apoio foi realizado, mas sim, da forma como se conversar sobre
isso. Neste momento, o terapeuta buscou estar aberto a outros aspectos que percebia
além do conteúdo de morte trazido por Pedro, como sua postura na sessão, sorridente
e aparentemente menos depressiva, diferente da sessão anterior. Tentando focalizar
desta diferença, o terapeuta pergunta sobre ela. Era um convite a considerar outros
aspectos de sua vida que talvez ele não estivesse reconhecendo. Naquele instante,
ele não percebia que parecia melhor.

Neste momento de acolhimento de Pedro, o exercício de perguntar se torna


fundamental. Trata-se de uma postura de curiosidade, que busca abertura, que se
interessa por outras histórias, e respeitando seu vocabulário favorece a construção de
outras descrições sobre as questões trazidas por ele.

45
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Conversando com Pedro sobre sua postura na sessão naquele momento, o terapeuta
busca construir a oportunidade para que ele fale como era capaz de enfrentar aquelas
dificuldades, promovendo um senso de ação e potência em Pedro. Novamente, ele se
refere ao ''desejo de Deus''. O terapeuta pergunta então sobre o desejo de Deus e
novamente, tentando colocá-lo em uma perspectiva diferente, uma posição mais ativa
em sua relação com Deus, pergunta a ele o que ele poderia fazer para ajudar Deus.

Esta questão pode parecer paradoxal se pensada em relação à crença religiosa na


qual Deus decide sobre a vida humana - como Pedro descrevia. Desta forma, Deus e
Pedro estavam completamente separados. Mas também era possível ver que Pedro,
desde sua primeira fala sobre esta questão percebia duas possibilidades para a
decisão divina, e também, que de alguma forma ele poderia influenciar este processo
através de suas rezas. Fazendo esta questão, o terapeuta busca ampliar a conversa
sobre estas diferenças, atentando para não introduzir 'diferenças muito incomuns'
(Andersen, 1999). A análise desta questão também é um exemplo do dialogismo na
conversa, na qual tanto Pedro como o terapeuta contribuíram para seu
desenvolvimento: as perguntas do terapeuta incluíram as palavras de Pedro e
convidaram a um novo movimento em direção a outra possibilidade de significação.

Inicialmente, ele ficou um pouco confuso, dizendo que poderia apenas rezar. A
questão do terapeuta era um convite a ver o mundo de uma maneira diferente. O
terapeuta tenta então ir um passo adiante, abrindo a possibilidade de Pedro pensar
em fazer algo mais. Neste momento, trata-se de colocá-lo em uma posição mais ativa
em relação a seu próprio cuidado e a vida. E então, ele se descreve como alguém que
queria seriamente ajudar Deus e de que ele era um agente importante na decisão
divina.

Esta forma de descrever a relação com Deus e sua relação com sua vida mudou: de
uma posição na qual ele não sabia o que fazer para um entendimento comprometido
de como as coisas dependiam também de sua decisão. Ele não apenas esperava pela
decisão divina sobre sua vida/morte, mas começava a pensar sobre sua
responsabilidade por ela. E então, Pedro e o terapeuta começam a conversar, no
momento seguinte, sobre como ele poderia ajudar a Deus, iniciando pelas coisas mais
simples de serem feitas. Este cuidado em escolher o que fazer também se relaciona
46
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

à construção de ações que possam ser uma evidência de seu potencial e um convite
a outras ações. É uma forma de fortalecer seu senso de ação pessoal.

Conversar sobre Deus e morte pode trazer vários desafios, mas à medida que se
enfatiza os sentidos dados pelo cliente, se aceita seu entendimento, e se conversa
com ele em seus próprios termos, novas possibilidade de vida podem ser
conjuntamente construídas. Esta conversa sobre o que ele poderia fazer para auxiliar
Deus em sua decisão foi a primeira de outras que ocorreram nas sessões do grupo
sobre as suas próprias ações e seu senso de controle sobre sua própria vida - uma
questão muito significativa para muitas pessoas que vivem com HIV/aids.

Através destas conversas, constrói-se uma posição de co-responsabilização de Pedro


por sua vida, desenhando assim um certo pedido para o trabalho terapêutico. É a partir
da construção do pedido de Pedro e de sua posição de querer se cuidar que se torna
possível o tipo de conversa proposta em um grupo de apoio.

Esta conversa sobre mudanças ocorridas a partir das duas sessões iniciais combate
uma visão estereotipada das sessões de preparação como algo que existe apenas
para preparar para algo que virá. Não se trata de pensar a conversa sobre o contrato
grupal como uma forma de garantir como as coisas serão. As sessões de preparação
são elas próprias um contexto de negociação e construção de si e do grupo. Neste
sentido, as sessões de preparação não são diferentes de qualquer outra sessão do
processo grupal. A especificidade destas sessões se refere a um tema da conversa
intencionalmente trazido pelo terapeuta como uma forma de promover determinadas
relações entre os participantes consigo próprios e com os outros, inclusive o
terapeuta.

Negociando a participação de Pedro no grupo

Dando continuidade à sessão, após certo posicionamento de Pedro, o terapeuta


investiga com Pedro quais suas expectativas sobre o que vem a ser o grupo. A partir
de suas falas, busca compreender quais as antecipações de Pedro relativas ao papel
dos participantes e as formas de relação entre eles. Em seguida, o terapeuta

47
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

apresenta as regras do contrato grupal e investiga as impressões de Pedro a respeito


do mesmo.

O objetivo desta conversa é criar uma oportunidade na qual o participante possa


conversar com o terapeuta, em um contexto de escuta atenta, de foco nos sentidos
trazidos pelo participante, sobre suas possíveis reações sobre o proposto como forma
de funcionamento do grupo, bem como a respeito dos outros participantes e as formas
de lidar com eles. Trata-se do exercício de refletir sobre a ação frente a um
determinado contexto, podendo contar com as contribuições do terapeuta não apenas
sobre os conteúdos que o levam à terapia, mas inclusive sobre o próprio grupo
proposto pelo terapeuta como o contexto apropriado de ajuda para o participante. É o
jogo de abertura e negociação dos sentidos sobre o contrato promovido pelo
entendimento do grupo como uma prática discursiva.

Apesar desta preparação ser uma conversa na qual não havia um roteiro de instruções
sobre o grupo, ela possuía uma intenção geral que fez com que a conversa tivesse
uma certa lógica de funcionamento. Ela se pautava pela construção de um
entendimento comum sobre o que poderia vir a ser o grupo, a identificação de
dificuldades imaginadas no cumprimento do contrato e a exploração de possíveis
formas de solução destas dificuldades. Esta conversa se colocava como uma abertura
para redimensionar determinados organizadores práticos do grupo.

Neste momento da sessão, a negociação explícita relativa ao contrato do grupo


acontece. Em relação a Pedro, a principal questão se refere às condições de
expressão de suas opiniões. O contrato proposto especificava que todos os
participantes deviam compartilhar seus pensamentos no grupo. Em seu exercício de
adaptar as regras às suas possibilidades, Pedro, a partir das perguntas do terapeuta,
vai aos poucos tornando problemática essa regra a qual tem então, neste momento,
que ser negociada na conversa. Frente às características das restrições apresentadas
por Pedro, foram construídas outras possibilidades de lidar com esta regra.

Terapeuta: É, você acha que vai ser fácil você dar a sua opinião e falar das coisas, ou
você acha que não, como que você acha isso, ô Pedro?
Pedro: Bom, quando eu achar que eu devo falar, e eu falo, quando eu ver que num,
48
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

que num, num tem nada que falar eu abaixo minha cabeça, eu fico quieto e deixo os
outros falar.
Terapeuta: É, que situação você acha que não vai dar pra você falar, que você vai ter
que abaixar a cabeça?
Pedro: Hum, depende do meu, se eu converso isso na hora, se tá, se eu estou de
acordo, se eu num estou, pra aí que eu vou falar. Depois que eles falar eu falo. Até
que eles estão conversando, minha cabeça está pensando no que eles estão falando.
Terapeuta: Hum? E, mas depois você vai poder falar, ou você num vai poder falar?
Pedro: Ah, aí depende o, conforme que for eu posso falar ou num posso falar, né?
Terapeuta: O que que faria você não falar? Você imagina numa situação, assim, que
você acha melhor não falar nada? (SP de Pedro, p.17)

Pedro continua a especificar as condições nas quais não expressará sua opinião
claramente, mantendo-se calado frente à conversa dos outros participantes. Se esta
era uma condição que Pedro colocava em suas contribuições, era necessário explorar
como se poderia possibilitar uma forma de participação na qual pudesse expressar
suas opiniões verbalmente, facilitando a conversa entre os participantes. Se por um
lado, processos de reflexão e diálogos internos são parte fundamental do grupo, a
interação verbal constitui uma forma de comunicação entre as pessoas fundamental
ao processo de negociação.

Terapeuta: É, deixa eu te perguntar uma outra coisa: você acha que você seria capaz,
assim, que você, ficaria numa boa, sem ter dor de cabeça, nem nada, se você falasse
para o grupo porque que você acha que a conversa num é boa?
Pedro: Não, mais é, sei lá, né? O que, que eu posso falar, sempre, vou ter que escutar,
ficar escutando primeiro depois eu vou ver, né, sempre vou escutar primeiro, prestar
atenção primeiro, pra depois...
Terapeuta: O Pedro, nessas situações, é, talvez, tenha dois jeitos que a gente pode
agir, né. Se numa conversa que a gente acha que num, a gente pode tanto, falar,
porque que a gente acha que essa conversa não tem que tomar esse caminho e falar..
...
Terapeuta: Entendi, mas então, é, e daí, assim, uma coisa que pode fazer também,
Pedro, é propor um outro assunto, porque senão, se você acha que um tá falando

49
CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

palhaçada, o outro fala palhaçada, o outro fala palhaçada, você vai sair daqui falando
"Ah credo, aquele povo lá só fala palhaçada" (SP de Pedro, pp. 17/18).

Contudo, estas alternativas não constituem recursos adequados para Pedro.

Pedro: Às vezes, lá em casa mesmo, eu chego em casa e falo assim, a pessoa me


conta uma coisa lá, eu chego em casa falo "Oh, é, assim, assim, assim". Chega aquela
pessoa perto de mim, fala pra mim "não, é mentira sua, você, num é assim não". A
pessoa, "é assim, assim, assim." Eu num, eu num sou esse que já vai discutindo, bri,
fica bravo porque uma pessoa falou pra mim. Então eu falo, falo pra minha mulher,
"Você viu um burro falando? é melhor passar de, como mentiroso do que eu, caçar
confusão. Então deixa eu como mentiroso aqui. Passou, num passou? Se é pra
arrumar confusão fica pior".
Terapeuta: Eu entendi. Eu entendi. É durante o grupo a gente vai tentar prestar
atenção nessas coisas, tá bom? ... Daí, eu vou fazer o que? Eu vou falar pro grupo "
Oh gente, hoje, que que tá acontecendo? Hoje parece que só um que está falando, o
resto está tudo quieto. Que que será? Está todo mundo discordando ou está todo
mundo concordando e pensando? (SP de Pedro, p.19).

A regra de partilhar os pensamentos no grupo não é possível de ser seguida sempre


a partir de seu modo de ver as coisas. Não se trata de algo que possa ser
simplesmente aceito, pois é algo que em sua vida cotidiana não é utilizada. Para ele,
a expressão de sua opinião é algo que pode gerar confusão, sendo a discordância na
conversa percebida como potencialmente perigosa, o que o faz evitar se pronunciar
em determinados momentos. Esta negociação explicita o caráter peculiar das
conversas em grupos terapêuticos, nos quais se busca uma nova organização da
conversa, diferente daquela proposta em outros contextos. No grupo se propõe um
tipo de conversa que é diferente. Aqui a discordância e o conflito são vistos como
momentos que podem ser úteis nos processos de mudança, levando a novos
posicionamentos dos participantes. Contudo, aceitando sua condição peculiar de se
colocar no grupo, e os limites desta regra, o terapeuta se propõe a zelar pelo tipo de
conversa que se propõe como adequada pelo contrato.

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

A organização desta conversa aponta que à medida que Pedro colocava posições que
não traduziam diretamente a regra de expressar suas opiniões, isto demandava outras
questões, até que fosse possível formular uma alternativa na qual a regra fosse
respeitada bem como seu senso de bem-estar preservado.

Curiosamente, nesta preparação de Pedro, de negociação do contrato, construiu-se


uma nova postura, não de Pedro, mas do terapeuta. Não se trata de avaliar uma
postura como certa ou errada a partir de um olhar externo sobre o contrato grupal,
mas uma negociação que considerando as diferenças entre os participantes, a partir
das suas possibilidades, possa promover as condições para a construção de novos
sentidos através das conversas no grupo. É esta abertura para a ressignificação do
contrato que traz para primeiro plano o aspecto construído do grupo nesta sessão de
preparação. Como podemos ver, a conversa sobre o contrato grupal exigiu
negociações que envolviam tanto as posturas de Pedro quanto as minhas. Esta
sessão não constitui assim, apenas um momento de preparação de Pedro, mas do
próprio terapeuta. É a dimensão relacional do processo de preparação que exige uma
atenção para todos os envolvidos na conversa. Trata-se de um momento de
construção não só do grupo, mas de um relacionamento, de uma conexão entre as
inúmeras de uma rede de identidades recíprocas formada neste contexto, a do
terapeuta com a de Pedro.

Em relação a Pedro, mais do que o foco no respeito às suas restrições sobre a


participação no grupo, da não consideração destas restrições como um critério de
exclusão da participação de Pedro, esta forma de compreender a sessão de
preparação enfatiza o aspecto produtivo deste tipo de conversa, ou seja, da
possibilidade de Pedro se colocar de forma ativa na negociação das relações nas
quais participa. É uma conversa específica de sua relação com o terapeuta, mas que
cria a oportunidade dele se posicionar de forma ativa na construção de projetos de
vida. A relação de Pedro com o contrato não é de algo que lhe é externo, sobre o qual
lhe cabe apenas aceitar. Nesta negociação, cria-se a oportunidade para que Pedro
coloque em questão sua possibilidade de seguir o contrato, redimensionando-o.

Conversando com Pedro sobre os outros Participantes

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Após esta negociação sobre o contrato, outro momento na conversa de preparação


se refere à apresentação dos outros participantes do grupo. A partir de dados como
idade, sexo, tempo que se sabe portador, e motivo de buscar o grupo, o terapeuta
apresenta a Pedro a sua descrição dos outros três participantes do grupo.

Esta apresentação tem por objetivo convidar Pedro a conversar sobre as relações
imaginadas com estas pessoas. Por um lado, a apresentação de Pedro se baseia em
recortes que enfatizam uma conversa sobre descrições soropositivas dos
participantes, produzindo, neste contexto de um grupo de apoio para pessoas
portadoras, recortes já antecipados mas que confirmam um certo modo de olhar e se
descrever os participantes. Por outro lado, estas negociações sobre o contrato e os
participantes têm como base uma postura do terapeuta orientada para o futuro. Este
convite permite explorar as dificuldades antecipadas, impressões iniciais, bem como
aumentar o conjunto de descrições de si em relação aos outros participantes do grupo,
num processo de responsabilização e familiarização com o diferente.

Esta postura se pauta pelo abandono de uma visão de um self essencial e verdadeiro
que se revela nas interações, a qual contra-indicaria este tipo de procedimento que
'contaminaria' as descrições de self dos participantes com os recortes utilizados pelo
terapeuta para sua apresentação, circunscrevendo outras possibilidades de sentido.

Inicialmente, Pedro não se manifesta sobre as pessoas, mas os problemas por elas
vividos. É como se ele não aceitasse o convite a pensar uma relação com estas
pessoas. Sua primeira reação frente a esta apresentação é a de relatar suas respostas
pessoais aos dilemas comuns enfrentados por outros participantes, especificamente
à revelação da condição de soropositividade para familiares e amigos. Mais do que
isso, ao descrever suas posturas Pedro mostra o caráter adequado e necessário das
mesmas, questionando aqueles que não fizeram o mesmo que ele. É curioso observar
que Pedro que não expressa suas opiniões, suas discordâncias, ou oposições,
também pode se apresentar como Pedro que expressa suas opiniões de forma direta
e imediata. Trata-se de um exemplo da construção situacional de si, a partir de uma
mudança no tópico da conversa na sessão.

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Terapeuta: Que que você achou dessas coisas que você ouviu?
Pedro: Essas, é o que eu te falei "Oh, cada um acha, que, pensa, eu, eu, sei lá, eu já
assumi, já contei pra todo mundo, que, num adianta eu esconder uma coisa que é
realidade ... Num dianta... (troca de fita) Falei, que eu tenho um problema desse. Eu,
eu escondo de você. Amanhã, depois, você vê eu subindo na cadeira, o sujeito que
nunca viu eu de costas, ele fala assim, ''Desgraçado do Pedro. Ele tinha os po, ele
tinha os problema dele, que amigo que eu sou dele, que ele num teve confiança de
chegar em mim e falar pra mim?''
Terapeuta: É, Pedro, você acha que você consegue por essa tua opinião no grupo?
Pedro: Tá certo.
Terapeuta: Tá?
Pedro: Eu consigo... (Pedro conta como contou para um amigo sobre sua
soropositividade e foi acolhido) Agora, vamos, vamos supor, eu moro, vamos supor,
eu moro com a minha mulher... eu chegava lá no médico, falava assim pra mim, e eu
chegava em casa, eu escondia dela. Eu tava certo? Não, num tava. Eu acho que não,
na minha cabeça eu num tava certo...
Terapeuta: Ô Pedro, você consegue imaginar porque que essas pessoas, têm dois
que num contaram né, que querem conversar sobre isso, porque que esses dois, é,
porque que eles ainda não contaram? Você consegue entender isso?
Pedro: Ah, eu sei lá. É a cisma, a cisma da pessoa ver que a pessoa num, num
compreende ele, né, deve ser isso (SP de Pedro, pp.23-24).

A primeira resposta de Pedro à apresentação dos outros participantes não é curiosa,


nem reflexiva, nem explicitamente de ajuda. Ele busca imediatamente justificar porque
tomou uma atitude diferente daqueles. Neste momento, o terapeuta não o questiona
a partir das diferenças das situações, mas busca entender os conteúdos do que ele
falava a partir de uma posição particular. O terapeuta tenta conversar sobre como ele
poderia colocar isso na conversa com os outros participantes investigando como seria
possível conversar sobre esta diferença. Pedro insiste em seu ponto de vista. A partir
disto, o terapeuta o convida a se colocar no lugar do outro e imaginar os motivos para
que não tivessem feito o mesmo. Trata-se de um exercício que busca colocar o
participante de forma aberta a poder conversar e conhecer o outro. É o caráter
preparatório da sessão. Tal como o bem-estar consigo próprio, uma preocupação com
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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

o bem-estar dos outros participantes deve ser buscada. Se através destas sessões,
destas conversas iniciais, se constrói a possibilidade dele estar aberto aos sentidos
trazidos pelo terapeuta, é preciso também criar espaços discursivos para a construção
de sua relação com os outros participantes.

Após este momento, o terapeuta continua a questionar Pedro sobre como imagina
participar de um grupo com estas pessoas. Ele acredita que será fácil pois estão "...
tudo eles no mesmo barco, com, com o mesmo problema. Eu vou achar estranho o
que? Esconder uma coisa deles pra quê? Se nós está tudo no mesmo, na mesma
canoa?" (SP de Pedro, p.24) Através desta fala afirma-se a homogeneidade grupal
para Pedro - o que poucos minutos antes era diferente, agora se torna parecido.

Parece haver tensões e ambigüidades no discurso de Pedro a respeito dos outros


participantes, ora visto como iguais, ora como diferentes, bem como em sua forma de
participar, ora não sendo capaz de dizer o que pensa, em outras, que poderia dizer
tudo. Tais ambigüidades apontam para o caráter múltiplo e situacional das descrições
de Pedro sobre si mesmo e o grupo. É nas brechas e ambigüidades existentes nestas
descrições, ou melhor, na possibilidade permanente de ressignificação que se
desenvolvem as conversas do grupo.

Nesta sessão de preparação, ao mesmo tempo em que se buscava investigar as


dificuldades, e negociar alternativas, também se buscava promover as
potencialidades de cada participante a partir de sua história pessoal.

Pedro: ... Eu cheguei, ontem, ontem-ontem, na casa dum amigo meu, que ele tava,
bem, bem pior que eu, desempregado, eu falei, falei, "Eu, eu num posso te ajudar
mas, amanhã vou sair cedo, vou, vou arrumar quem possa te ajudar". E fui no, no cara
que tomava conta de mim... Fui num, no outro, fui na M., no O, um monte, falei "Oh,
fulano lá, que tava com nós, tá assim, assim, assim. Você que pode ajudar ele, eu
num posso". "Não Pedro, nós vai ajudar". E tentei, e tentou resolver o problema dele,
ele ficou contente.
...
Terapeuta: Então, entende como, você fez a sua parte, que era ir avisar os outros...
Então, eu acho que isso, num grupo, é, isso é muito importante Pedro, que é o que?
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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

No fundo, no fundo, Pedro, todo mundo tem como ajudar. É que as pessoas num
podem ajudar do mesmo jeito, né. Cada um pode ajudar de um jeito. (SP de Pedro,
p.27)

Frente ao relato de Pedro, de como ajudou um amigo que estava em dificuldades, o


terapeuta ressalta a capacidade de Pedro ajudar, e considerando a particularidade da
contribuição de cada participante em um grupo, aponta como tal capacidade de Pedro
pode ser útil no contexto grupal que irá participar. Trata-se de uma autodescrição de
Pedro que através desta conversa é incluída no processo de construção de Pedro
como participante do grupo. Esta busca de investigar dificuldades imaginadas e
promover potencialidades de ação está relacionada à tentativa de promover um
posicionamento ativo de Pedro em relação ao grupo, um discurso sobre seu
envolvimento com o mesmo, de sua possibilidade de participação, e sua capacidade
de construir novos projetos em sua vida.

Conversando com Marina sobre os outros Participantes do Grupo

Se através da análise de trechos da sessão de preparação de Pedro é possível discutir


a sessão de preparação como uma prática discursiva situada, a análise da
composição grupal pode ser enriquecida se considerarmos alguns trechos da sessão
de preparação de Marina. Marina é a única mulher do grupo. Tradicionalmente, isto
seria contra-indicado pela literatura sobre composição dos grupos (Salvendy, 1996).
Esperar-se-ia, no mínimo, a participação de mais uma outra mulher no grupo.
Contudo, assumindo a homogeneidade como algo construído (Rasera, & Japur,
2003), quais os sentidos dados pelos participantes, especialmente por Marina, sobre
a composição do grupo?

O trecho a seguir é parte da sessão de preparação de Marina. Tal como na sessão


realizada com Pedro, após negociarem o contrato, o terapeuta apresenta as
descrições dos outros participantes do grupo e investiga as impressões de Marina
sobre o mesmo.

Terapeuta: É isto, né, o grupo...


Marina: São essas pessoas...

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Terapeuta: ...são essas 4 pessoas e eu, por enquanto, é isso...


Marina: Só essas?
Terapeuta: ... que a gente vai ter. Você imaginava um monte de coisa e agora...
Marina: É...
Terapeuta: ... o concreto das coisas, são, é isso né. É claro que é...
Marina: Só tem eu de mulher?
Terapeuta: Só tem você de mulher.
Marina: (riso)
Terapeuta: Que...
Marina: E pelo que dá pra perceber é a mais velha de todos... (rindo)
Terapeuta: Hum... E o que que você acha disso tudo?
Marina: Bom... Vai ser bom... Com certeza. Eu acho que a gente num vem pra ajudar,
eu acho que, a gente precisa de ajuda, né, e se eu falo que eu vinha ajudar, aí já seria,
assim, muita pretensão minha, né, pretensiosa. Eu acho que, é trabalhando, um
falando, um ajudando, um empurra de cá, uma cotovelada e quem sabe a gente fica
um pouco mais forte, não tão vulnerável, né. (SP de Marina, p.23)

A reação inicial de Marina, tal como Pedro, não tem a ver com os outros participantes
em si, mas consigo própria. Ela busca confirmar seu entendimento como sendo a
única mulher e ressaltando que ela era a mais velha. Quando a questiono de maneira
aberta sobre a composição grupal, ela faz comentários sobre a possibilidade de ajuda
deste grupo, enfatizando a possibilidade de apoio e ajuda que pode existir no grupo.
No trecho a seguir, esta possibilidade de apoio faz outras diferenças entre os
participantes terem um caráter secundário.

Terapeuta: ... Quais você acha que vão ser? Eu queria saber como que você
imaginaria, tanto quais vão ser as tuas facilidades nesse grupo, é, como, bem como
as dificuldades que você encontraria.
Marina: Ah, eu num penso assim. Eu num devo pensar assim.
...
Marina: Se eu tiver aí dentro e ouvir falar, ''Ah, você é Pedro, eu sou Tiago''. Não vai
funcionar, né? Então eu acho que a, a gente tem que ter, além de querer ajudar, a
dignidade de respeitar, seja ele quem for. É um grupo de 5 pessoas, com dificuldades

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

e sofrimento e fim de papo... Pra mim, aqui num tem idéia, num tem, sexo, num tem
nada. É, são pessoas precisando, de uma forma ou de outra, tornar mais fácil, como
lidar com essa doença. Eu acho que isso que é mais importante.
Terapeuta: É, eu achei engraçado na hora, no que eu acabei de falar da composição,
você falou assim, ''Ai, eu sou a única mulher...
Marina: (riso)
Terapeuta: ... e mais velha... (riso)
Marina: Mais velha, ainda... (rindo) Não, eu já sei que eu sou a mais velha, mais tudo
bem...
Terapeuta: É...
Marina: Não, num tem nada. Mais isso também, é pra eu, só nós aí, que tá tudo... E
são, é sexo masculino. Num quer dizer nada. É aquilo que eu falo pra você, ''A partir
do momento que você é soropositivo...'' Ai, foi isso que o doutor P. falava: ''Num
escolhe cor, sexo, profissão''. E a partir do momento que ela existe, são mil reações
diferente, ela é dolorosa, ela machuca. E, e ela que fez isso, num importa. Não, eu só
notei que no grupo é só eu. Mais num tem nada a ver, e, é aquilo que eu falo, ''Aqui
eu num vou ser uma mulher. Eu vou ser uma pessoa com o mesmo problema dele,
né? A mesma dificuldade, tudo, né?'' (SP de Marina, p.24)

Quando questionada sobre as possíveis dificuldades a serem enfrentadas, ela se


recusa a pensar o grupo nestes termos. Novamente, ressalta a importância de cuidar
do sofrimento vivido pelas pessoas, buscando fazer de qualquer outra característica
pessoal algo insignificante.

As diferenças de gêneros podem ter valores diferentes para pessoas diferentes em


contexto específicos.

Através destas falas, enfatiza-se a vivência da soropositividade, borrando outras


diferenças entre os participantes. Trata-se de uma conversa que promove a
construção ativa da homogeneidade grupal.

Estes movimentos na produção dos sentidos sobre a composição do grupo nos fazem
repensar os chamados critérios de tal composição. Parece que os participantes se

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

esforçam discursivamente para construir o grupo como um contexto adequado para a


expressão e participação de cada um deles.

Um Jeito de Compor o Grupo

As conversas iniciais, ou sessões de preparação deste grupo de apoio, como uma


prática discursiva situada, possibilitam a criação de uma realidade relacional entre
terapeuta e participantes através de três processos: a) co-responsabilização do
participante e construção inicial do pedido; b) co-responsabilização do terapeuta e
negociação do contrato; e c) aproximação discursiva das descrições dos participantes,
ou a construção da homogeneidade.

O processo de co-responsabilização do participante consiste no primeiro passo de


construção do mesmo como participante de um grupo de apoio. É necessário,
conjuntamente, operar recortes situacionais sobre as possibilidades de conversar no
grupo. A partir da curiosidade do terapeuta, circunscrita pelos objetivos do grupo, e
das histórias selecionadas pelo participante é construído um pedido do mesmo sobre
o que conversar no grupo, de forma tal que ambos se responsabilizem pelos sentidos
aí produzidos. Esta co-responsabilização do participante implica o terapeuta em um
processo semelhante, levando-o inclusive a uma redescrição dos termos do contrato
e sua forma de participação. Este processo de redescrição de si e do grupo a partir
dos processos anteriores está associado num grupo de apoio para pessoas
portadoras do HIV a um processo de aproximação discursiva das descrições dos
participantes, promovendo o acolhimento dos participantes através da ênfase na
vivência comum da soropositividade.

Ao mesmo tempo em que se propõe uma abertura para a negociação da composição


grupal, parece haver um certo limite para a mesma. Os trechos das sessões de
preparação de Marina e Pedro iluminam este processo. Apesar do espaço para
discutir sobre a composição, Pedro e Marina não o fazem no sentido de discutir a
participação de um participante potencial. Podem fazer críticas a determinadas
posturas de alguns participantes, mas parecem partir do pressuposto que esse é o
grupo.

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

Talvez porque tendo o terapeuta indicado estes participantes, deve haver uma lógica
para ser assim e manifestar qualquer oposição a isto é questionar o saber do
terapeuta. As inúmeras situações em que Marina utiliza a expressão ''né'' parecem ser
tentativas de buscar a concordância e apoio do terapeuta, buscando sempre monitorar
a aceitação de seus modos de entender sobre o que conversavam. Os
questionamentos em voz alta de Pedro, sobre o que ele iria falar frente aos convites
de negociação, podem também ter este mesmo sentido. A quase ausência de
comentários sobre o contrato quando da primeira sessão do grupo, pode ter um
sentido muito semelhante. Além disso, talvez por perceberem os outros como
precisando de ajuda, questionar a participação de qualquer um deles seria posicionar-
se como uma pessoa cruel. Em ambas as situações, questionando o terapeuta, ou
colocando-se de forma crítica e severa em relação ao outro, o participante pode ter
ameaçado o seu próprio lugar no grupo.

Parece, assim, que o convite a conversar sobre o grupo, refletir sobre possíveis
dificuldades e formas de enfrentar, é produtivo à medida que gera um tipo de relação
entre terapeuta e participante, e deste consigo próprio. Através desta conversa,
entende-se que o próprio grupo pode ser objeto da conversa. Apesar de uma
descrição trazida pelo terapeuta sobre o grupo e o contrato, ela não é completamente
fechada, sendo possível sua negociação. Há uma tensão criativa que faz com que
terapeuta e participantes sejam postos como responsáveis pela relação construída.

Por outro lado, tal convite enfrenta um limite em suas possibilidades de abertura e
negociação, marcado pelos sentidos sobre a divisão institucional dos papéis sociais,
reafirmada pelos participantes durante a sessão de preparação, pela qual, em última
instância, cabe ao terapeuta a responsabilidade de definir quem participa do grupo e
aos participantes serem acolhedores e apoiadores.

Frente a tal tensão, a resposta dos participantes à apresentação dos outros


participantes é no sentido de, como disse Pedro, considerar que ''todos estão no
mesmo barco'', buscando apagar inclusive outras diferenças que fazem parte de suas
vidas, como a diferença de sexo e idade. Na fala mais enfática de Marina: ''Aqui eu
num vou ser uma mulher. Eu vou ser uma pessoa com o mesmo problema dele, né, a

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

mesma dificuldade, tudo, né?''. Trata-se da produção ativa da homogeneidade a partir


das negociações do próprio contrato e composição grupal.

Através desta análise podemos ver que a inserção de um participante implica uma
série de negociações que explicitam o caráter construído do grupo e seus
participantes. Nas quatro negociações aqui analisadas - sobre a participação de
Pedro, sobre o contrato grupal, sobre a relação dele com os outros participantes, na
sessão de preparação de Pedro; e sobre o contrato na sessão de preparação de
Marina - podemos ver um jogo no qual o terapeuta busca definir as formas de
participação e relacionamento no grupo, e o participante se esforça por redefinir tais
descrições do terapeuta. Este processo implica o terapeuta e os participantes em
outras redefinições e acordos.

A negociação das regras do grupo, das formas específicas de se descrever como


participando do mesmo, consiste num exercício de 'engajamento relacional'
(McNamee, in press) no qual conjuntamente se aposta na possibilidade de estar juntos
num grupo. Assim, as condições de inclusão no grupo não estão ditadas a priori a
partir de características do indivíduo (homem/mulher, heterossexual/homossexual,
usuário de droga/não usuário), nem das regras estabelecidas unilateralmente pelo
terapeuta (o contrato grupal), mas implica um plano de mútua responsabilidade
assumido de forma pessoal entre terapeuta e cada participante, no qual se constroem
descrições partilhadas sobre a participação no grupo, as quais podem ser objeto da
conversa novamente ao longo das sessões. O foco destas conversas iniciais não está
no já dado, mas no processo de construção da realidade grupal promovido pelas
conversas entre terapeuta e participantes.

As formas de se descrever do participante na sessão de preparação, bem como seus


projetos, não determinam de forma completa e linear, as conversas futuras no grupo,
nem seu modo específico de participar. Isto estará necessariamente circunscrito pelas
condições imediatas do contexto conversacional. Contudo, a partir de uma definição
da identidade pessoal como uma descrição existente numa rede de identidades
recíprocas, as descrições de um participante, bem como se tornam recursos
contextuais na construção de determinadas justificativas em outras conversas nas
quais participam. É a dimensão relacional desta conversa que se expande
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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

potencialmente como contexto de outras conversas. Assim, as descrições negociadas


nesta sessão podem ser novamente utilizadas nas conversas de outras sessões,
circunscrevendo-as e talvez exigindo novas negociações, que as fazem novamente
abertas a outros sentidos.

Contudo, se as descrições de si e dos outros não devem ser consideradas como


critério da composição do grupo, o que o deveria ser então? Tipo de pedido, questão,
queixa ou demanda? Compromisso com a tarefa? Mas tudo isto também não é algo
que se constrói? Porque buscar a homogeneidade de algum tipo se a entendemos
como construída nas relações presentificadas entre os participantes? O foco que se
propõe aqui não é considerar as experiências anteriores dos participantes como fatos
dados, determinantes lineares da tomada de decisão de um terapeuta distanciado,
mas chamar a atenção para o modo como através das conversas o terapeuta e os
participantes vão construindo realidades relacionais, seja sustentando descrições
anteriores, fortalecendo-as, seja destacando algumas nuances, pequenas diferenças
que convidam a novas descrições, e sentidos sobre pessoas e histórias já narradas.

A partir destas análises, abandona-se uma preocupação do terapeuta sobre a


composição do grupo como uma forma a priori de garantir um melhor desenvolvimento
grupal. Convida-se, então, a uma atenção permanente do terapeuta ao processo
conversacional em todos os seus momentos de construção do grupo. Nestas
conversas iniciais sobre conversas grupais futuras, o grupo começa a existir enquanto
realidade relacional entre terapeuta e participantes, tanto como uma prática - uma
forma específica de conversar, como uma identidade - uma forma específica de se
descrever como participante do grupo.

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CONSELHEIRO TERAPÊUTICO

REFERÊNCIAS

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https://www.salario.com.br/profissao/conselheiro-de-dependente-quimico-cbo-
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https://hospitalsantamonica.com.br/5-razoes-que-provam-por-que-todo-mundo-
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