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SEMANA 01

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Sumário
META 1 ............................................................................................................................................................ 10
DIREITO PENAL: NOÇÕES INICIAIS E PRINCÍPIOS ............................................................................................. 10
1. CONCEITO, CARACTERÍSTICAS, OBJETO, FUNÇÕES E DIVISÕES DO DIREITO PENAL ................................... 10
2. ENCICLOPÉDIA DAS CIÊNCIAS PENAIS ......................................................................................................... 15
2.1 Direito Penal X Criminologia X Política Criminal ..................................................................................................... 15
2.2 Seletividade - Criminalização Primária e Secundária (Zaffaroni) ............................................................................ 16
3. DIREITO PENAL DO AUTOR E DIREITO PENAL DO FATO .............................................................................. 17
4. GARANTISMO PENAL (FERRAJOLI)............................................................................................................... 18
4.1 Conceito ................................................................................................................................................................. 18
4.2. Garantias primárias e secundárias ........................................................................................................................ 18
4.3 Máximas do garantismo ......................................................................................................................................... 18
5. DIREITO PENAL DO INIMIGO ....................................................................................................................... 20
5.1 Velocidades do Direito Penal (Jesús-Maria Silva Sánchez) ..................................................................................... 21
6. FONTES DO DIREITO PENAL ........................................................................................................................ 21
7. PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL ................................................................................................................... 25
7.1 Princípios Relacionados com a Missão Fundamental do Direito Penal .................................................................. 25
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7.1.1 Princípio da Exclusiva Proteção de Bens Jurídicos ........................................................................................... 25
7.1.2 Princípio da Intervenção Mínima ..................................................................................................................... 26
7.1.3 Princípio da Insignificância ou da Bagatela ...................................................................................................... 28
7.2 Princípios Relacionados com o Fato do Agente ..................................................................................................... 42
7.2.1 Princípio da Ofensividade/Lesividade .............................................................................................................. 42
7.2.2 Princípio da Alteridade .................................................................................................................................... 43
7.2.3 Princípio da Exteriorização ou Materialização do Fato .................................................................................... 43
7.2.4 Princípio Da Legalidade Estrita Ou Reserva Legal ............................................................................................ 43
7.2.5 Princípio da Anterioridade ............................................................................................................................... 46
7.2.6 Princípio da Vedação ao Bis In Idem ................................................................................................................ 46
7.2.7 Princípio da Adequação Social ......................................................................................................................... 46
7.3 Princípios Relacionados com o Agente do Fato ..................................................................................................... 47
7.3.1 Princípio da Responsabilidade Pessoal / Da Pessoalidade / Da Intranscendência Da Pena ............................ 48
7.3.2 Princípio da Responsabilidade Subjetiva ......................................................................................................... 48
7.3.3 Princípio da Culpabilidade ............................................................................................................................... 48
7.3.4 Princípio da Proporcionalidade ........................................................................................................................ 48
7.3.5 Princípio da Limitação das Penas ou da Humanidade ..................................................................................... 49
7.2.6 Princípio da Confiança ..................................................................................................................................... 49
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DE RACISMO ............................................................................................. 51
1. RACISMO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ....................................................................................................... 51
2. O BEM JURÍDICO TUTELADO PELA LEI Nº 7.716/89 .................................................................................... 52
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3. CONCEITOS E ALCANCE DA LEI Nº 7.716/89................................................................................................ 52


4. DESDOBRAMENTOS DA ADOÇÃO DO CONCEITO SOCIOCULTURAL/AMPLIADO DE RACISMO ................... 54
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SEMANA 01/12

5. CONSIDERAÇÕES INICIAIS GERAIS SOBRE OS CRIMES PREVISTOS NA LEI Nº 7.716/89 .............................. 55


6. CRIMES EM ESPÉCIE..................................................................................................................................... 57
Art. 2º-A – Injúria Racial – NOVIDADE LEGISLATIVA! ................................................................................................... 57
6.1. Art. 3º - Acesso a cargo público............................................................................................................................. 58
6.2. Art. 4º - Emprego em empresa privada ................................................................................................................. 58
6.3. Art. 5º - Acesso a estabelecimento comercial ....................................................................................................... 59
6.4. Art. 6º - Ingresso em instituição de ensino ........................................................................................................... 59
6.5. Art. 7º - Acesso ou hospedagem em hotéis e similares ........................................................................................ 60
6.6. Art. 8º - Acesso a restaurantes e similares ............................................................................................................ 60
6.7. Art. 9º - Acesso a locais de diversão ou clubes sociais .......................................................................................... 60
6.8. Art. 10 – Acesso a salões de cabeleireiros ou similares ........................................................................................ 61
6.9. Art. 11 – Acesso a entrada ou elevador social ...................................................................................................... 61
6.10. Art. 12 – Acesso ou uso de transportes públicos ................................................................................................ 61
6.11. Art. 13 – Acesso ao serviço público militar.......................................................................................................... 62
6.12. Art. 14 – Casamento ou convívio familiar e social............................................................................................... 62
6.13. Art. 20. ................................................................................................................................................................. 63
META 2 ............................................................................................................................................................ 66
DIREITO PROCESSUAL PENAL: NOÇÕES INICIAIS E PRINCÍPIOS ....................................................................... 66
1. PROCESSO PENAL CONSTITUCIONAL........................................................................................................... 66
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2. PRETENSÃO PUNITIVA ................................................................................................................................. 67


3. SISTEMAS DO PROCESSO PENAL .................................................................................................................
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4. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO PROCESSO PENAL ................................................................................... 72
4.1 Princípios Constitucionais Explícitos....................................................................................................................... 72
4.1.1 Princípio da Presunção da Inocência ............................................................................................................... 72
4.1.2 Princípio da Igualdade Processual ou Paridade de Armas ............................................................................... 78
4.1.3 Princípio da Ampla Defesa ............................................................................................................................... 78
4.1.4 Princípio da Plenitude da Defesa ..................................................................................................................... 80
4.1.5 Princípio do In Dubio Pro Reo .......................................................................................................................... 80
4.1.6 Princípio do Contraditório ou Bilateralidade da Audiência ............................................................................. 82
4.1.7 Princípio da Publicidade................................................................................................................................... 83
4.1.8 Princípio da Vedação das Provas Ilícitas .......................................................................................................... 85
4.1.9 Princípio da Economia Processual, Celeridade Processual e Duração Razoável Do Processo ......................... 86
4.1.10 Princípio do Devido Processo Legal ............................................................................................................... 87
4.1.11 Juiz Imparcial ou Natural ............................................................................................................................... 87
4.2 Princípios Constitucionais Implícitos ...................................................................................................................... 88
4.2.1 Princípio do Nemo Tenetur Se Detegere (Princípio De Que Ninguém Está Obrigado A Produzir Prova Contra Si
Mesmo) ..................................................................................................................................................................... 88
4.2.2 Princípio da Iniciativa das Partes ..................................................................................................................... 94
4.2.3 Duplo Grau de Jurisdição ................................................................................................................................. 95
4.2.4 Princípio da Oficialidade .................................................................................................................................. 95
4.2.5 Princípio da Oficiosidade ................................................................................................................................. 95
5. OUTROS PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL ................................................................................................ 95
5.1 Princípio da Oralidade ............................................................................................................................................ 95
5.2 Indivisibilidade da Ação Penal Privada ................................................................................................................... 96
5.3 Comunhão da Prova ............................................................................................................................................... 96
5.4 Impulso Oficial ........................................................................................................................................................ 96
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SEMANA 01/12

6. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL ................................................................................................................. 96


6.1 Aplicação da Lei Processual no Tempo................................................................................................................... 96
6.2 Aplicação da Lei Processual no Espaço:.................................................................................................................. 98
6.3 Aplicação da Lei Processual em Relação às Pessoas .............................................................................................. 98
7. INTERPRETAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL ........................................................................................... 102
8. FONTES ...................................................................................................................................................... 103
8.1 Fonte Material, Substancial ou de Produção ....................................................................................................... 104
8.2 Fonte Formal, Cognitiva ou de Cognição .............................................................................................................. 104
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ........................................................... 105
1. OBJETO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ................................................................................................ 105
2. NATUREZA JURÍDICA DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. .......................................................................... 105
3. COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS DE QUALQUER NATUREZA ...................................................................... 107
4. QUEBRA DO SIGILO DE DADOS TELEFÔNICOS ........................................................................................... 107
5. QUEBRA DE ESTAÇÃO RÁDIO BASE ........................................................................................................... 109
6. MOMENTO DE DECRETAÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA .............................................................. 110
7. DA NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO ..................................................................................................... 112
8. REQUISITOS PARA A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA: .................................................................................
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9. SIGILO PROFISSIONAL DO ADVOGADO ..................................................................................................... 117
10. ENCONTRO FORTUITO DE ELEMENTO PROBATÓRIO EM RELAÇÃO A OUTROS FATOS DELITUOSOS
(SERENDIPIDADE): ......................................................................................................................................... 118
11. PROCEDIMENTO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ................................................................................ 119
11.1 Fundamentação da decisão judicial: .................................................................................................................. 120
11.2. Duração da interceptação ................................................................................................................................. 121
12. EXECUÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ......................................................................................... 122
13. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E AUTORIDADES COM FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO ............ 123
14. INTERCEPTAÇÃO DAS COMUNICAÇÕES AMBIENTAIS ............................................................................. 124
14.1 Cláusula de Reserva de Jurisdição ...................................................................................................................... 126
14.2 Captação Ambiental Clandestina e Figura Criminosa Respectiva ...................................................................... 127
14.3 Causa de Ausência de Tipicidade........................................................................................................................ 128
META 3 .......................................................................................................................................................... 129
DIREITO CONSTITUCIONAL: DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS ......................................................... 129
1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS..................................................................................................................
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2. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS .................................................................................................. 132
2.1 Direitos x Garantias x Remédios Constitucionais ................................................................................................. 133
2.2 Direitos Fundamentais x Direitos Humanos ......................................................................................................... 133
2.3 Geração dos direitos fundamentais ..................................................................................................................... 135
2.4 Características dos direitos fundamentais ........................................................................................................... 139
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SEMANA 01/12

2.5 Dimensão dos Direitos Fundamentais .................................................................................................................. 141


2.5.1 Desdobramentos da dimensão objetiva dos Direitos Fundamentais ............................................................ 141
2.6 Direitos individuais implícitos e explícitos ............................................................................................................ 143
2.7 Destinatários ........................................................................................................................................................ 144
2.8 Os Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988................................................................................ 145
2.8.1. Não taxatividade dos direitos fundamentais e tratados de direitos humanos............................................. 145
2.8.2. Hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos ..................................................................... 146
2.9 Deveres Fundamentais ......................................................................................................................................... 147
2.10 Alguns direitos individuais – rol do art. 5º da CF/88 ..........................................................................................
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3. DIREITOS SOCIAIS ...................................................................................................................................... 178
META 4 .......................................................................................................................................................... 185
DIREITO ADMINISTRATIVO: NOÇÕES INICIAIS E PRINCÍPIOS ........................................................................ 185
1. ORIGEM, NATUREZA JURÍDICA E OBJETO DO DIREITO ADMINISTRATIVO ................................................ 186
2. EVOLUÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO ............................................................................................... 186
3. INFLUÊNCIAS DO DIREITO ESTRANGEIRO .................................................................................................. 187
4. CRITÉRIOS DA ADMINISTRAÇÃO ................................................................................................................ 188
5. SENTIDOS DA ADMINISTRAÇÃO ................................................................................................................ 189
5.1 Administração Pública Extroversa e Introversa ....................................................................................................
45119 190
5.2 Tendências atuais do Direito Administrativo ....................................................................................................... 190
5.3 Transadministrativismo ........................................................................................................................................ 191
6. FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO..................................................................................................... 191
7. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO ...................................................................................... 193
8. SISTEMAS DE CONTROLE DA ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA ....................................................................... 194
9. REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO ........................................................................................................ 194
9.1 Princípios x Regras ................................................................................................................................................ 195
9.2 Princípios Explícitos do Direito Administrativo .................................................................................................... 196
10. PRINCÍPIOS DO DIREITO ADMINISTRATIVO ............................................................................................. 196
10.1 Legalidade (Juridicidade) .................................................................................................................................... 196
10.2 Princípio Da Impessoalidade .............................................................................................................................. 198
10.3 Princípio da Moralidade ..................................................................................................................................... 199
10.4 Princípio da Publicidade ..................................................................................................................................... 202
10.5 Princípio da Eficiência ......................................................................................................................................... 203
11. OUTROS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS ................................................................................................ 205
11.1 Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade ................................................................................................ 205
11.2 Princípio da Supremacia do Interesse Público Sobre o Privado (Princípio da Finalidade Pública) ..................... 206
11.3 Princípio da Autotutela ou Sindicabilidade ........................................................................................................ 206
11.4 Princípio Da Continuidade Do Serviço Público ................................................................................................... 209
11.5 Princípio da Motivação ....................................................................................................................................... 212
11.6 Princípio da Ampla Defesa e Contraditório ........................................................................................................ 213
11.7 Princípio da Segurança Jurídica e Legítima Confiança ........................................................................................ 213
11.8 Princípio da Intranscendência Subjetiva das Sanções ........................................................................................ 214
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SEMANA 01/12

DIREITO ADMINISTRATIVO: ENTES DA ADMINISTRAÇÃO ............................................................................. 216


1. PRINCÍPIOS INERENTES À ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA (art. 6º, DL 200/67) .................................... 217
2. DESCENTRALIZAÇÃO X DESCONCENTRAÇÃO ............................................................................................ 218
2.1 Espécies de Descentralização ............................................................................................................................... 219
3. ÓRGÃOS PÚBLICOS .................................................................................................................................... 220
3.1 Teorias sobre a relação Estado x agentes ............................................................................................................ 221
3.2 Criação e Extinção de Órgãos Públicos ................................................................................................................. 222
3.3 Classificação dos Órgãos ...................................................................................................................................... 222
4. DESCENTRALIZAÇÃO .................................................................................................................................. 223
5. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA ....................................................................................................................... 223
5.1. Características comuns ........................................................................................................................................ 223
5.2 Entes da Administração Indireta .......................................................................................................................... 224
5.2.1 Autarquias ...................................................................................................................................................... 224
5.2.2 Agências Reguladoras .................................................................................................................................... 225
5.2.3 Agências Executivas ....................................................................................................................................... 229
5.2.4 Fundações Públicas ................................................................................................................................... 230
5.3 Empresas Estatais (Lei 13.303/2016) ................................................................................................................... 232
6. ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR ..............................................................................................................
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6.1 Serviço Social Autônomo - Sistema “S” ................................................................................................................ 240
6.2 Entidades ou Fundações de Apoio ....................................................................................................................... 241
6.3 Organizações Sociais - OS (Lei 9637/98)............................................................................................................... 242
6.4 Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP (Lei 9790/99) ....................................................... 243
6.5 Organizações da Sociedade Civil - OSC (Lei 13.019/14) ....................................................................................... 245
META 5 .......................................................................................................................................................... 253
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI MARIA DA PENHA ................................................................................... 253
1. FINALIDADES DA NORMA .......................................................................................................................... 254
2. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E IGUALDADE MATERIAL ............................................................................ 255
3. INTERPRETAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA ............................................................................................... 256
4. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER......................................................................... 256
5. SUJEITO PASSIVO ....................................................................................................................................... 260
6. SUJEITO ATIVO ........................................................................................................................................... 262
7. ELEMENTO SUBJETIVO .............................................................................................................................. 263
8. HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA .................................................................... 264
9. FORMAS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER ............................................................................................ 266
10. FORMAS DE PREVENÇÃO NA LEI MARIA DA PENHA ............................................................................... 268
11. DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA FAMILIAR .................................................... 269
12. DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL ................................................................................... 271
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SEMANA 01/12

13. MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA ..................................................................................................... 276


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13.1. Considerações Iniciais: ...................................................................................................................................... 276


13.2. Legitimidade para conceder as medidas protetivas de urgência: ..................................................................... 281
13.3. Das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor .......................................................................... 284
13.4. Das Medidas Protetivas De Urgência À Ofendida ............................................................................................. 286
13.5. Vias impugnativas.............................................................................................................................................. 287
13.6. Descumprimento das medidas protetivas de urgência ..................................................................................... 287
14. PRISÃO PREVENTIVA ................................................................................................................................ 292
15. RETRATAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO NOS CRIMES PRATICADOS NO CONTEXTO DA LEI 11.340/06 ........ 293
16. VEDAÇÕES PREVISTAS NA LEI MARIA DA PENHA .................................................................................... 295
16.1 Vedação à pena de cesta básica, prestação pecuniária ou pagamento isolado da multa ................................. 295
16.2. Vedação às penas restritivas de direito............................................................................................................. 296
16.3. Vedação à aplicação do Princípio da Insignificância.......................................................................................... 297
17. AÇÃO PENAL NOS CRIMES DA LEI MARIA DA PENHA .............................................................................. 298
18. COMPETÊNCIA NA LEI MARIA DA PENHA ................................................................................................ 300
19. REPARAÇÃO DE DANOS NO ÂMBITO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER ..... 304
20. LEI N. 14.022/2020 .................................................................................................................................. 305
21. LEI N. 14.232/2021 .................................................................................................................................. 309
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SEMANA 01/12
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CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA SEMANA 01


META DIA ASSUNTO
DIREITO PENAL: Noções Iniciais e Princípios
1 SEG
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Lei de Racismo
DIREITO PROCESSUAL PENAL: Noções Iniciais e Princípios
2 TER
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Lei de Interceptação Telefônica
3 QUA DIREITO CONSTITUCIONAL: Direitos e Garantias Fundamentais
DIREITO ADMINISTRATIVO: Noções Iniciais e Princípios
4 QUI
DIREITO ADMINISTRATIVO: Entes da Administração
5 SEX LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Lei Maria da Penha
REVISÃO SEMANAL (Anexo)
6 SÁB
LEITURA DO CADERNO DE JURISPRUDÊNCIA (Anexo)

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SEMANA 01/12

META 1

DIREITO PENAL: NOÇÕES INICIAIS E PRINCÍPIOS

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CF/88
⦁ Art. 5º, II
⦁ Art. 5º, XLI, XLII, XLIII, XLIV, XLV e XLVII
⦁ Art. 5º, XXXIX
⦁ Art. 5º, §3º
⦁ art. 7º, X
⦁ Art. 22, I e §único
⦁ art. 227, § 4º

CP
⦁ Art. 1º
⦁ Art. 59
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⦁ Art. 71

OUTROS DIPLOMAS LEGAIS


⦁ Art. 8°, itens 2 e 5, CADH 45119

⦁ Art. 8º, item 4 do Pacto de São José da Costa Rica

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

⦁ Art. 5º, XLI, XLII, XLIII, XLIV, XLV e XLVII, CF/88


⦁ Art. 5º, XXXIX, CF/88
⦁ Art. 22, I e §único, CF/88
⦁ Art. 1º, CP

1. CONCEITO, CARACTERÍSTICAS, OBJETO, FUNÇÕES E DIVISÕES DO DIREITO PENAL

A) CONCEITO
Conjunto de normas que objetiva definir os crimes, proibindo ou impondo condutas, sob a ameaça
de imposição de pena ou medida de segurança, e a criar normas de aplicação geral. Segundo Cleber Masson
(2017, p. 3) é “o conjunto de princípios e regras destinados a combater o crime e a contravenção penal,
mediante a imposição de sanção penal”.

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SEMANA 01/12

Importa salientar que “sanção penal” é gênero, do qual são espécies as penas e as medidas de
segurança.

#DICA DD: Diz-se que a pena é a 1ª via do direito penal, a medida de segurança é a 2ª e a reparação do dano
é a 3ª.

Ainda sobre o conceito de direito penal:


● Aspecto Formal: o direito penal é um conjunto de normas que qualifica certos comportamentos
humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções as lhe serem aplicadas.
● Aspecto Material: o Direito Penal se refere a comportamentos considerados altamente reprováveis
ou danosos ao organismo social, afetando bens jurídicos indispensáveis à própria conservação e
progresso da sociedade.
● Aspecto Sociológico: o direito penal é mais um instrumento do controle social de comportamentos
desviados, visando a assegurar a necessária disciplina social.

B) CARACTERÍSTICAS
De acordo com Cleber Masson (2017, p. 5), o Direito Penal é uma ciência cultural, normativa,
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valorativa, finalista, de natureza predominantemente sancionatória, e fragmentária. Esquematizando:
⦁ I – Ciência: suas regras estão contidas em normas e princípios que, por sua vez, formam a dogmática
jurídico-penal;
⦁ II – Cultural: o Direito Penal é uma ciência do “dever ser”, ao contrário das ciências naturais, que
cultuam o “ser”;
⦁ III – Normativa: o objeto principal é o estudo da lei penal (Direito positivo);
⦁ IV – Valorativa: sua aplicação não está pautada em regras matemáticas de certo ou errado, mas sim
em uma escala de valores que são sopesados a partir de critérios e princípios próprios do Direito
Penal. Dessa forma, esse ramo do direito valoriza hierarquicamente as suas normas;
⦁ V – Finalista: o objetivo do direito penal é a proteção
45119 de bens jurídicos fundamentais, o que torna a
sua missão prática, e não simplesmente teórica;
⦁ VI – Sancionatória: o Direito Penal é predominantemente sancionador porque não cria bens
jurídicos, mas acrescenta proteção penal aos bens jurídicos disciplinados por outros ramos do
Direito. No entanto, é possível que ele seja também constitutivo, quando protege interesses não
regulados por outras áreas do Direito;
⦁ VII – Fragmentária: o Direito Penal não tutela todos os valores ou interesses, mas somente os mais
importantes para a manutenção e o desenvolvimento dos indivíduos e da sociedade.

C) OBJETO DE PROTEÇÃO DO DIREITO PENAL

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SEMANA 01/12

O legislador seleciona os bens jurídicos a serem defendidos pelo Direito Penal. No entanto, NÃO se
pode falar em discricionariedade ampla e irrestrita, pois os bens jurídicos mais importantes são tratados na
Constituição. Logo, a Constituição possui a seguinte missão:
⦁ Orienta o legislador, ao eleger valores considerados indispensáveis à manutenção da sociedade;
⦁ Impede que o legislador viole direitos fundamentais atribuídos a toda pessoa humana (Visão
Garantista Do Direito Penal).

D) FUNÇÕES DO DIREITO PENAL


Na atualidade, a doutrina divide a missão do direito penal em duas, quais sejam:

a) Missão mediata:
● Instrumento de Controle Social ou de preservação da paz pública (Papel intimidador);
● Limitação ao poder de punir estatal ou Função de Garantia – garantia dos cidadãos contra o arbítrio
estatal, vez que só podem ser punidos por atos previstos como infração penal e por pena também
determinada em lei.
✔ Para Franz Von Liszt “o Código Penal é a Magna Carta do delinquente”.

Obs.: Se, de um lado, o Estado controla o cidadão, impondo-lhe


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limites para a vida em sociedade, de outro
lado, é necessário também limitar o seu próprio poder de controle, evitando a punição abusiva (fugindo da
hipertrofia da punição).

b) Missão imediata:
Aqui, é necessário lembrar do funcionalismo penal, que trará as duas correntes de mais destaque
acerca do tema (muita atenção):
● Funcionalismo teleológico (moderado) – Claus Roxin (Predomina)
⋅ A missão do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos mais relevantes;
⋅ Se a proteção de determinado bem jurídico não é indispensável ao indivíduo e à manutenção
da sociedade, não deve incidir o direito penal, mas outros ramos do direito;
⋅ Para Roxin, o Direito Penal não veio para
45119 trazer valores éticos, morais;
⋅ Ele entende que essa seria a função exclusiva;
⋅ É chamado teleológico porque busca a finalidade do direito penal.

● Funcionalismo sistêmico (radical) – Günter Jakobs


⋅ A missão do Direito Penal é assegurar a vigência do sistema, protegendo o império da
norma;
⋅ Ele discorda de Roxin por entender que, quando o indivíduo é punido pela infração penal
praticada, o bem jurídico já foi violado, ou seja, não está protegido, não sendo esta, portanto,

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a função do direito penal. Sua função seria a de demonstrar que a norma continua vigorando
e deve ser obedecida;
⋅ Assim, “o bem não deve ser representado como um objeto físico ou algo do gênero, e sim,
como norma, como expectativa garantida”. (Direito Penal e Funcionalismo, 2005, p.33-34);
⋅ E, ainda, entende ele que quem deliberada e reiteradamente viola a lei penal, de forma grave
e duradoura, deve ser tratado como “não-cidadão”, como inimigo da sociedade, por não
cumprir sua função no corpo social, não fazendo jus às garantias previstas pela norma a qual
tal sujeito infringe;
⋅ Ao delinquente-cidadão, seria aplicado o direito penal do cidadão, ao passo que ao
delinquente inimigo, seria aplicado o Direito Penal do Inimigo (tópico específico mais à
frente).

APROFUNDANDO: vamos a uma tabelinha com mais características das duas vertentes do
45119
funcionalismo para fixar as diferenças?

FUNCIONALISMO PENAL

● Finalidade
45119
do Direito Penal: proteção de bens
jurídicos indispensáveis. Não veio para trazer
valores éticos, morais;
● Moderado: o direito penal tem limites impostos
FUNCIONALISMO pelo próprio direito penal e demais ramos do
TELEOLÓGICO direito;
(Características: Moderado, ● Dualista: convive em harmonia com os demais
dualista, de política criminal ramos do Direito. Reconhece o sistema jurídico em
ou racional teleológico) geral;
ROXIN ● De política criminal: aplica a lei de acordo com os
anseios da sociedade. Se adapta à sociedade em que
ele se insere;
● Racional teleológico: movido pela razão e em busca
de sua finalidade.
● Finalidade do Direito Penal: é a proteção das
FUNCIONALISMO SISTÊMICO normas penais, assegurar o império da norma. É
(Características: punir. Aplicar a lei;
Radical, monista e sistêmico) ● A sociedade que deve se ajustar ao Direito Penal;
JAKOBS ● Para ele, o Direito Penal é:
Direito Penal do Inimigo - Radical: só reconhece os limites impostos por ele

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mesmo;
- Monista: é um sistema próprio de regras e de
valores que independe dos demais;
- Sistêmico: é autônomo (independe dos demais
ramos), autorreferente (todas as referências e
conceitos que precisa buscar do próprio direito
penal) e se autoproduz;
● Quem viola reiterada e deliberadamente a norma =
não-cidadão / inimigo = não tem direitos.

B) CLASSIFICAÇÕES DO DIREITO PENAL


1. Direito Penal Fundamental (Primário): é o conjunto de normas e princípios do Direito Penal
aplicáveis genericamente, inclusive às leis penais especiais. É composto pelas normas da Parte Geral
do Código Penal e, excepcionalmente, algumas normas de amplo conteúdo previstas na Parte
Especial, como os conceitos de domicílio (art. 150, §§4º e 5º) e funcionário público (art. 327);
2. Direito Penal Complementar (Secundário): corresponde à legislação penal extravagante;

3. Direito Penal Comum: é o conjunto de normas45119


penais aplicável indistintamente a todas as pessoas,
como o Código Penal;
45119
4. Direito Penal Especial: é o conjunto de normas penais aplicável apenas a pessoas determinadas que
preencham certas condições legais. São exemplos o Código Penal Militar e o Decreto-lei nº 201/1967
(crimes de responsabilidade dos prefeitos);

5. Direito Penal Geral: é o conjunto de normas penais aplicáveis em todo o território nacional. Essas
normas são produzidas privativamente pela União (art. 22, I, da CF);
6. Direito Penal Local: é o conjunto de normas penais aplicáveis somente a determinada parte do
território nacional. A existência dessas normas somente é possível se houver autorização da União
por lei complementar para que os Estados legislem sobre questões específicas de Direito Penal (art.
22, parágrafo único, da CF);

7. Direito Penal Objetivo: é o conjunto de leis penais em vigor;


8. Direito Penal Subjetivo: é o direito de punir (ius puniendi), que pertence exclusivamente ao Estado
e nasce quando uma lei penal é violada;

9. Direito Penal Substantivo: é o direito penal material, propriamente dito. É o que consta no Código
Penal;
10. Direito Penal Adjetivo: também chamado de “formal” (grave as nomenclaturas), é o direito
processual penal.
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2. ENCICLOPÉDIA DAS CIÊNCIAS PENAIS


45119

O estudo do crime, do criminoso e da sanção penal é o objeto de várias ciências, tendo sido chamadas
por José Cerezo Mir de “enciclopédia de ciências penais”. A doutrina não é uníssona acerca de quantas ou
quais exatamente seriam elas, mas, para o nosso estudo, as mais importantes são a dogmática, a criminologia
e a política criminal.

I – DOGMÁTICA PENAL: tem por objetivo interpretar de forma sistemática o direito penal, entendendo o
sentido das normas e aplicando-o de forma lógico-racional (não emocional).

Obs.: Dogmática ≠ Dogmatismo: Dogmatismo é a aceitação cega de verdades tidas como absolutas e
imutáveis (deve ser desprezado). Se opõe à ideia de ciência, que admite flexibilização, na qual estaria
enquadrada a dogmática.

II – CRIMINOLOGIA: A criminologia, de acordo com Luiz Flávio Gomes e Antônio Molina, é uma ciência
empírica (estuda o que “é”, ao contrário do direito penal, que estuda o que “deve ser” – caracterizando-se
como uma ciência valorativa e normativa) e interdisciplinar
45119
(observa diversos fatores: econômicos, políticos,
sociais, religiosos etc.), a qual estuda o crime, a vítima, o criminoso e o controle social. Suas constatações se
dão a partir da observação daquilo que acontece na realidade social, na experiência.

III – POLÍTICA CRIMINAL: trabalha com estratégias e mecanismos de controle social da criminalidade, para
que os bens jurídicos relevantes sejam protegidos. Possui a característica de vanguarda, pois orienta a criação
e a reforma das leis, a partir de uma análise crítica acerca destas estarem ou não cumprindo os fins a que se
propõem, considerando dados obtidos por outros ramos (como a criminologia).
Funciona como “filtro” entre a letra fria da lei e a realidade social. Revela as leis que “pegam” e as que não.

2.1 Direito Penal X Criminologia X Política Criminal

O ponto mais cobrado desse tópico é, sem dúvidas, a diferença entre direito penal, criminologia e
política criminal. Esquematizando:

DIREITO PENAL CRIMINOLOGIA POLÍTICA CRIMINAL


Ciência normativa e valorativa, que Ciência empírica e
Trabalha as estratégias e meios
analisa os fatos humanos interdisciplinar, que estuda o
de controle social da
indesejados e define quais devem crime, o criminoso, a vítima e o
criminalidade.
ser tipificados como crime ou controle social.

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contravenção.
45119
Ocupa-se do crime enquanto Ocupa-se do crime enquanto Ocupa-se do crime enquanto
norma. fato. valor.
Ex.: Quais fatores contribuem Ex.: Estuda como diminuir os
Ex.: Define o crime de roubo.
para o crime de roubo. casos de roubo.

2.2 Seletividade - Criminalização Primária e Secundária (Zaffaroni)

Sobre a seletividade, define Zaffaroni:

“Ao menos em boa medida, o sistema penal seleciona pessoas ou ações, como
também criminaliza certas pessoas segundo sua classe e posição social. [...] Há
uma clara demonstração de que não somos todos igualmente ‘vulneráveis’ ao
sistema penal, que costuma orientar-se por ‘estereótipos’ que recolhem os
caracteres dos setores marginalizados e humildes, que a criminalização gera
fenômeno de rejeição do etiquetado como também daquele que se solidariza ou
contata com ele, de forma que a segregação se mantém na sociedade livre. A
posterior perseguição por45119parte das autoridades com rol de suspeitos
permanentes, incrementa a estigmatização social do criminalizado (ZAFFARONI;
PIERANGELI, 2011, p. 73).” (Guarda relação com o movimento do labeling
approach/ teoria da reação social / da rotulação social / do etiquetamento social –
tema que deve ser estudado de modo mais aprofundado na matéria de
criminologia).

Nesse contexto, o processo de criminalização pode ser dividido em dois:


a) Criminalização primária: É a elaboração e sanção das leis penais, introduzindo formalmente no
ordenamento jurídico a tipificação de determinadas condutas.
b) Criminalização secundária: É a ação punitiva que recai sobre pessoas concretas. Quando recai sobre
o indivíduo a persecução penal após ser a ele atribuída a prática de um ato primariamente
criminalizado. É praticada pela Polícia e Poder Judiciário.

* ATENÇÃO: Além do momento da elaboração e aplicação da norma, a seletividade também vai se mostrar
presente no momento da execução da pena.

#DICA DD: Você sabe o que é Direito Penal Subterrâneo e Direito Penal Paralelo? Referem-se aos sistemas
penais paralelos e subterrâneos. De acordo com Zaffaroni, “sistema penal é o conjunto das agências que
operam a criminalização primária e a criminalização secundária ou que convergem na sua produção”.

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Direito Penal Paralelo: Como o sistema penal formal do Estado não obtêm êxito em grande parte da
aplicação e exercício do poder punitivo, outras agências apropriam-se desse espaço e o exercem de modo
paralelo ao estado (criando sistemas penais paralelos). Ex.:médico que aprisiona doentes mentais;
institucionalização pelas autoridades assistenciais dos morados de rua etc.).
Direito Penal Subterrâneo: ocorre quando as instituições oficiais atuam com poder punitivo ilegal,
acarretando abuso de poder. Ex.: institucionalização de pena de morte (execução sem processo),
desaparecimentos, torturas, extradições mediante sequestro, grupos especiais de inteligência que atuam
fora da lei etc.

3. DIREITO PENAL DO AUTOR E DIREITO PENAL DO FATO

Direito Penal do Fato – Adotado pelo Ordenamento Penal Brasileiro – consiste que o direito penal
deve punir condutas, ou seja, fatos, praticados pelos indivíduos que sejam lesivas a bens jurídicos de
terceiros. Pune-se o fato. A base para esse princípio está no Estado de Direito.
Está atrelado ao Princípio da exteriorização ou materialização do fato, pelo qual o Estado só pode
incriminar condutas humanas voluntárias (fatos). Assim, ninguém pode ser castigado por seus pensamentos,
desejos ou meras cogitações ou estilo de vida. 45119

O princípio da exteriorização serviu para o legislador acabar com as infrações penais que
desconsideravam esse mandamento. Ex.: Mendicância (art. 60 L.C.P. – abolido), tal infração adotava o direito
45119
penal do autor.
Por sua vez, o direito Penal do autor consiste na punição do indivíduo baseada em seus
pensamentos, desejos e estilo de vida, condições pessoais, do modo de ser, grau de culpabilidade
(reprovabilidade), antecedentes do autor, está interligado ao Direito Penal do Inimigo. Aqui teríamos uma
inobservância do princípio da exteriorização do fato.

Obs.: Coculpabilidade e coculpabilidade às avessas (Zaffaroni)


COCULPABILIDADE é corresponsabilidade do Estado no cometimento de determinados delitos, praticados
por cidadãos que possuem menor âmbito de autodeterminação diante das circunstâncias do caso concreto,
principalmente no que se refere a condições sociais e econômicas do agente, o que enseja menor reprovação
social. Segundo o princípio da coculpabilidade, o Estado-juiz haveria de considerar como atenuante as
condições socioeconômicas do réu no momento na aplicação da pena. Veja que o artigo 66 do Código Penal
autoriza ao Juiz esse postulado, através da, chamada pela doutrina, atenuante inominada.
A outra face da teoria da coculpabilidade pode ser identificada como a COCULPABILIDADE ÀS AVESSAS, por
meio da qual defende-se a possibilidade de reprovação penal mais severa no tocante aos crimes praticados
por pessoas dotadas de elevado poder econômico, e que abusam desta vantagem para a execução de delitos,

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em regra, prevalecendo-se das facilidades proporcionadas pelo livre trânsito nos centros de controle político
45119
e econômico.

4. GARANTISMO PENAL (FERRAJOLI)

4.1 Conceito

Para o autor Ferrajoli, “o garantismo é entendido no sentido do ESTADO CONSTITUCIONAL DE


DIREITO, isto é, aquele conjunto de vínculos e de regras racionais imposto a todos os poderes na tutela dos
direitos de todos, representa o único remédio para os poderes selvagens”.

4.2. Garantias primárias e secundárias

O autor distingue as garantias em duas grandes classes: as garantias primárias e as garantias


secundárias:
● Garantias primárias – limites e vínculos normativos: Consistem nas proibições e obrigações, formais
e substanciais, impostos na tutela dos direitos, ao exercício de qualquer poder;
● Garantias secundárias – diversas formas de 45119
reparação: Subsequentes às violações das garantias
primárias, diz respeito à anulabilidade dos atos inválidos e a responsabilidade pelos atos ilícitos.
- Ex.: a CF prevê como garantia primária que não haverá pena de banimento. O legislador não a
observa e comina tal pena a determinado crime. Neste caso, será utilizado o controle de
constitucionalidade, previsto na própria constituição como garantia secundária, julgando o ato nulo.

* ATENÇÃO: Para o garantismo de Ferrajoli, o juiz não é um mero aplicador da lei, um mero executor da
vontade do legislador ordinário. Ele é, antes de tudo, o guardião de direitos fundamentais.

4.3 Máximas do garantismo

● Nulla poena sine crimine: somente será possível a aplicação de pena quando houver, efetivamente, a
prática de determinada infração penal;
● Nullum crimen sine lege: a infração penal deverá sempre estar expressamente prevista na lei penal;
● Nulla lex (poenalis) sine necessitate: a lei penal somente poderá proibir ou impor determinados
comportamentos, sob a ameaça de sanção, se houver absoluta necessidade de proteger determinados
bens, tidos como fundamentais ao nosso convívio em sociedade, (direito penal mínimo);
● Nulla necessitas sine injuria: as condutas tipificadas na lei penal devem, obrigatoriamente, ultrapassar
a sua pessoa, isto é, não poderão se restringir à sua esfera pessoa, à sua intimidade, ou ao seu

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particular modo de ser, somente havendo possibilidade de proibição de comportamentos quando


estes vierem a atingir bens de terceiros;
● Nulla injuria sine actione: as condutas tipificadas só podem ser exteriorizadas mediante a ação do
agente, ou omissão, quando previsto em lei;
● Nulla actio sine culpa: somente as ações culpáveis podem ser reprovadas;
● Nulla culpa sine judicio: é necessário adoção de um sistema nitidamente acusatório, com a presença
de um juiz imparcial e competente para o julgamento da causa;
● Nullum judicium sine accustone: o juiz que julga não pode ser responsável pela acusação;
● Nulla accusatio sine probatione: fica a cargo do acusador todo o ônus probatório, que não poderá ser
transferido para o acusado da prática de determinada infração penal;
● Nulla probatio sine defensione: deve ser assegurada ao acusado a ampla defesa, com todos os
recursos a ela inerentes.

#ATENÇÃO! Em que consiste o GARANTISMO PENAL INTEGRAL?


O Direito penal deve se prestar a garantir não somente os direitos e garantias dos acusados, mas todos os
direitos e deveres previstos na Constituição. Em que pese não se possa tolerar violações arbitrárias e
desproporcionais aos direitos
45119 daquele sob o qual recai o jus puniendi estatal, não se pode também deixar de
45119
proteger outros bens que também são juridicamente relevantes para a sociedade. Tudo isso deve passar pelo
crivo da proporcionalidade.
Desse modo, o garantismo divide-se em:
a) Garantismo negativo: visa limitar a função punitiva do Estado, que deve ser aplicada estritamente aos
casos necessários e em medida adequada, consistindo na proibição de excesso.
b) Garantismo positivo: busca evitar a impunidade e garantir que os bens jurídicos relevantes à sociedade
sejam efetivamente protegidos, caracterizando-se pela proibição da proteção insuficiente/deficiente.

Caiu em prova Delegado PC-AM/2022 da banca FGV! Fruto da herança dos postulados iluministas, a partir
da segunda metade dos anos 1970, um novo modelo normativo de garantia aos direitos sociais, civis e
políticos é lapidado na Itália como sinônimo de Estado constitucional democrático, surgindo o garantismo.

Sobre esse modelo, é correto afirmar que: o princípio da proteção suficiente, numa perspectiva garantista
positiva, endossa a função estatal de proteção suficiente de direitos fundamentais a partir do Direito Penal.

Quando apenas o garantismo negativo é observado, surge o chamado “garantismo hiperbólico monocular”
(grave este nome). Hiperbólico: por ser aplicado de modo desproporcional e exagerado. Monocular: por
enxergar apenas um lado, opondo-se ao garantismo integral.

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5. DIREITO PENAL DO INIMIGO

a) Conceito: Aquele que viola o sistema deve ser considerado e tratado como inimigo. O
delinquente, autor de determinados
45119 crimes, não é ou não deve ser considerado como cidadão, mas como
um “cancro societário”, que deve ser extirpado (Munhoz Conde). O autor Jakobs fomenta o Direito Penal do
inimigo para o terrorista, traficante de drogas, de armas e de seres humanos e para os membros de
organizações criminosas transnacionais (vide lei n. 12.850/2013).

b) Características do direito penal do inimigo:


● Antecipação da punibilidade com a tipificação de atos preparatórios: O legislador é impaciente, não
aguarda o início da execução para punir o agente);
● É um direito penal prospectivo e não retrospectivo, na medida em que se pune o inimigo pelo que
ele poderá fazer, em razão do perigo que representa;
● O inimigo não é visto como um sujeito de direitos, pois perdeu seu status de cidadão;
● Pune-se o inimigo pela sua periculosidade e não pela sua culpabilidade, como é no direito penal
comum;
● Criação de tipos de mera conduta;

45119
Previsão de crimes de perigo abstrato: normalmente, pode haver crimes de perigo abstrato, mas
sem abusos, flexibilização o princípio da lesividade;
● As garantias processuais aplicadas ao inimigo são relativizadas ou até mesmo suprimidas;
● Flexibilização do Princípio da Legalidade: é a descrição vaga dos crimes e das penas. A descrição
genérica de um crime permite a punição de mais condutas/comportamentos;
● Inobservância dos Princípios da Ofensividade: relação com a criação de crimes de perigo abstrato)
e da Exteriorização do Fato (relação com o direito penal do autor);
● Preponderância do Direito Penal do autor: Flexibilização do princípio da exteriorização do fato;
● Desproporcionalidade das penas;
● Surgimento das chamadas “leis de luta ou de combate”: Exemplo - Lei n. 8.072/90 e Lei n.
12.850/2013. Alguns doutrinadores sustentam que tais leis têm predicados de direito penal do
inimigo;
● Endurecimento da Execução Penal: O regime disciplinar diferenciado é um resquício do direito penal
do inimigo;

*ATENÇÃO: O Direito Penal do inimigo também é conhecido como a “terceira velocidade do Direito Penal”.
Isto porque se aplica a pena de prisão e também por ser extremamente célere, já que suprime direitos e
garantias.

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5.1 Velocidades do Direito Penal (Jesús-Maria Silva Sánchez)

Segundo, Cleber Masson (2017, p. 111) a teoria das velocidades do direito penal “parte do
pressuposto de que o Direito Penal, no interior de sua unidade substancial, contém dois grandes blocos,
distintos, de ilícitos: o primeiro das infrações penais às quais são cominadas penas de prisão (direito penal
nuclear), e o segundo, daqueles que se vinculam aos gêneros diversos de sanções penais (direito penal
periférico)”.
● Primeira velocidade: Direito Penal “da prisão”, aplicando-se penas privativas de liberdade como
resposta aos crimes praticados, com a rígida observância das garantias constitucionais e processuais.
Aplicada a delitos graves.
● Segunda velocidade: Direito penal reparador. São aplicadas aqui penas alternativas à prisão, como
restritivas de direitos ou pecuniárias, de forma mais rápida, sendo admissível, para tanto, uma
flexibilização proporcional dos princípios e regras processuais. Aplicável a delitos de menor
gravidade.

45119
Terceira velocidade: Novamente temos aqui a prisão por excelência. Contudo, difere-se da primeira
por permitir a flexibilização e até a supressão de determinadas garantias. Aplicada aos delitos de
maior gravidade. Remete ao direto penal do inimigo, já explicado acima.
● Quarta velocidade: Neopunitivismo. Ligada45119ao direito internacional. É o processamento e
julgamento pelo TPI de chefes de Estado que violarem tratados e convenções internacionais de tutela
de Direitos Humanos e praticarem crimes de lesa-humanidade, de modo que, por esta razão, se
tornarão réus perante o referido tribunal e terão, dentro do contexto, suas garantias penais e
processuais penais diminuídas.
● Quinta velocidade: hodiernamente, já se fala em Direito Penal de 5ª (quinta) velocidade, que trata
de uma sociedade com maior assiduidade do controle policial, o Estado com a presença maciça de
policiais na rua, no cenário onde o Direito Penal tem o escopo de responsabilizar os autores, diante
da agressividade presente em nossa sociedade de relações complexas e, muitas vezes,
(in)compreensíveis. #PERTINÊNCIATEMÁTICA

6. FONTES DO DIREITO PENAL

São as formas pelas quais o direito penal é criado e, posteriormente, manifestado.

a) Fonte Material: Diz respeito à criação do Direito Penal. Via de regra, é a União, art.22, I, da CF/88, pois
“compete privativamente à União legislar sobre direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário,
marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho”.

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SEMANA 01/12

*Atenção: O artigo 22, parágrafo único, CF/88, prevê que “Lei Complementar poderá autorizar os Estados a
legislar sobre questões específicas relacionadas neste artigo”, o que permite entender que abarca, inclusive,
o Direito Penal. Então podemos ter uma lei complementar autorizando o estado a legislar sobre questões
específicas de direito penal. É chamada DELEGAÇÃO EM PRETO – pois essa lei complementar não pode
delegar genericamente. Têm que ser pontos específicos/questões específicas.

Obs.: Medida provisória pode versar sobre direito penal?


R.: A EC 32/01 inseriu dispositivo expresso na CF/88 vedando a edição
45119
de medida provisória versando
sobre direito penal. Até 2001 não existia regra expressa na CF/88 vedando a edição de medida provisória
sobre matéria penal. Tanto que o próprio STF, antes dessa EC 32, apreciou o RE 254.818/PR – 2000,
especificando que MP não poderia versar sobre direito penal, exceto se favorável ao réu.
Esse julgado (2000), anterior à EC 32/2001, que estabeleceu ser possível a edição de medida
provisória quando favorável ao réu, subsistiria após a EC 32/01, considerando que, com essa EC, passou-se a
vedar, de forma abstrata, a edição de medida provisória sobre matéria penal?
R.: A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que é possível a edição de medida
provisória versando sobre direito penal quando favorável ao réu, de modo que o entendimento exarado no
bojo do RE 254.818 subsistiria após a edição da EC 32/01.
45119

Segundo explica o autor Cleber Masson, "É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria relativa a
Direito Penal (CF, art. 62, § 1.º, I, alínea b), seja ela prejudicial ou mesmo favorável ao réu. Nada obstante, o
Supremo Tribunal Federal historicamente firmou jurisprudência no sentido de que as medidas provisórias
podem ser utilizadas na esfera penal, desde que benéficas ao agente". (MASSON, Cleber. Direito Penal.
Parte Geral. Volume 1. 13ª edição. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2019, p. 97).

b) Fonte Formal: Diz respeito à aplicação do Direito Penal. Esse ponto varia um pouco de doutrinador para
doutrinador.

DOUTRINA CLÁSSICA DOUTRINA MODERNA


Imediata: Imediata:
● Lei (Desdobramento do princípio da ● Lei
reserva legal, que prevê a criação de ● Constituição Federal
crime e cominação de penas como ● Tratados Internacionais de Direitos Humanos
um monopólio da lei. Aqui, estamos ● Jurisprudência
falando em lei ordinária). ● Princípios
● Atos administrativos (complementos de normas
penais em branco).

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SEMANA 01/12

*Porém, até mesmo aqui, a única fonte formal que pode


criar tipos penais e culminar penas é a lei (reserva legal).
O restante é fonte não-incriminadora.
45119

Mediatas: Mediatas:
● Costumes ● Doutrina
● Princípios gerais do Direito
● *Alguns colocam atos
administrativos.
Fonte informal:
● Costumes

i. Lei - É o único instrumento normativo capaz de criar infração penal e cominar sanção penal (única
fonte formal imediata incriminadora).
ii. Constituição Federal – Não cria infração penal e não comina sanção penal (nem pena, nem medida
de segurança). Contudo, a Constituição Federal fixa alguns patamares abaixo dos quais a intervenção
penal não se pode reduzir. São os chamados “mandados constitucionais de criminalização”
(patamares mínimos). Exemplos de mandados constitucionais de criminalização: Art. 5º, XLI, CF, Art.
45119
5º, XLII, CF, e Art.5º, XLIII, CF.

☞ Pergunta de Concurso: Existe mandado constitucional de criminalização implícito ou tácito?


R: De acordo com a maioria, existem mandados constitucionais de criminalização implícitos, com a
finalidade de evitar a intervenção insuficiente do Estado (imperativo de tutela). Por exemplo, a Constituição,
ao garantir o direito à vida, está, implicitamente, determinando a criminalização do homicídio (se todos
têm direito à vida, não se pode permitir que o homicídio não seja crime).

iii. Tratados Internacionais de Direitos Humanos (TIDH)


Como é sabido, os TIDH entram no ordenamento interno podendo ostentar 02 status:
⦁ Se recepcionados com quórum de emenda constitucional, têm status de emenda;
⦁ Se o TIDH for recepcionado com quórum comum, terá status infraconstitucional, porém supralegal.

ATENÇÃO: Os tratados internacionais podem ser classificados como fonte do direito penal apenas quando
incorporados ao direito interno. Se versar sobre direitos humanos e for aprovado seguindo o rito de
emendas constitucionais, terá força normativa de emendas constitucionais (art. 5º, §3°, CF). Caso não siga
tal rito, terá força de norma supralegal.
Contudo, antes do advento das Leis 12.694/12 e 12.850/13 (que definiram, sucessivamente, organização
criminosa), o STF já havia se manifestado pela inadmissibilidade da utilização do conceito de organização

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criminosa dado pela Convenção de Palermo, trancando a ação penal que havia dado origem à impetração,
em face da atipicidade da conduta. HC nº 96.007/SP, rel. min. Marco Aurélio, 1ª Turma, j. 12/06/2012.
No REsp 1.798.903/RJ (j. 25/09/2019), o STJ decidiu que o Estatuto de Roma, que conceitua os crimes contra
a humanidade, não tem efeitos penais no Brasil, onde impera o pressuposto da lei penal em sentido estrito
para a tipificação de crimes.

iv. Jurisprudência
Não cria crime; não comina pena. Mas, na prática, às vezes, a jurisprudência
45119
cria o direito penal.
Ademais, revela Direito Penal podendo inclusive ter caráter vinculante. Um exemplo disso é o caso do crime
continuado, em que a jurisprudência define o que são condições de tempo e lugar para fim de definição da
continuidade delitiva. A condição de tempo é de 30 dias de intervalo entre as infrações; a condição de lugar
também é definida pela jurisprudência.
Obs.: Súmulas vinculantes – Elas também são fontes do direito penal.

a. Princípios - Não criam crime nem cominam pena. Mas vários são os julgados absolvendo ou
reduzindo pena com base em princípios. Ex.: Princípio da Insignificância – causa de atipicidade
material.
b. Atos administrativos - Fonte formal imediata 45119
quando complementam norma penal em branco. Ex.:
Lei de drogas é complementada por uma Portaria da ANVISA.
c. Doutrina: Para alguns autores, a doutrina não é fonte do direito penal por não ter força cogente, ou
seja, não ser revestida de obrigatoriedade.
d. Costumes
● Costume é a repetição de um comportamento (elemento objetivo) em face da crença na sua
obrigatoriedade (elemento subjetivo).
≠ de hábito, que consiste na mera repetição de comportamento (elemento
objetivo), mas sem a crença na sua obrigatoriedade.
● Costume não cria crime, não comina pena, só a Lei pode criar crimes e cominar penas, em razão do
princípio da legalidade (veda-se o costume incriminador).

Princípio da Legalidade x Costumes:


A lex scripta, uma das funções de garantia do princípio da legalidade proíbe que se utilize dos costumes
como fonte incriminadora do direito penal (impossibilidade de utilizar costumes para incriminar condutas
ou cominar penas). Portanto, os costumes não têm o condão de criminalizar condutas e nem cominar penas.

Qual a função dos costumes no direito penal?


De acordo com Nilo Batista e Zaffaroni, os costumes têm uma função integrativa ou integradora. Trata-se
de uma função interpretativa/hermenêutica. Por exemplo: Art. 233, CPP – crime de ato obsceno. Quem vai

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determinar o sentido de ato obsceno? Vai ser determinado pelo sentido compartilhado pela sociedade, de
forma reiterada. É um conceito normativo porque exige um juízo de valor, e esse juízo de valor é um juízo
temperado e contextualizado de acordo com a prática social da comunidade. Portanto, a função integrativa
dos costumes atua de forma muito mais efetiva nos elementos normativos do tipo (que exigem valoração).

● Espécies de costumes:
i. Costume secundum legem (costume interpretativo): possui a função de auxiliar o intérprete
a entender o conteúdo da lei.
ii. Costume contra legem (costume negativo): é chamado de DESUETUDO. É aquele que
contraria uma lei, mas não a revoga. Ex.: Venda de CDs piratas.
iii. Costume praeter legem (costume integrativo): é aquele usado para suprir as lacunas da lei.
É válido, mas só pode ser usado no campo das normas penais não incriminadoras e apenas
para favorecer o agente. Ex.: a circuncisão em meninos de determinadas religiões não é
considerada crime.

#DICA DD: Existe costume abolicionista? PREVALECE que não existe costume abolicionista. Enquanto não
revogada por outra lei, a norma tem plena eficácia. É a que prevalece e está de acordo com a lei de introdução
às normas do direito brasileiro. Ex.: Jogo do bicho continua
45119 tipificado como contravenção penal, sendo
aplicável no caso concreto.

* ATENÇÃO: Para aqueles que não adotam a tese do costume abolicionista, é possível o uso do costume
segundo a lei (costume interpretativo), que vai servir para aclarar o significado de uma palavra, de um texto.

45119
7. PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL

Princípios são os valores fundamentais que inspiram a criação e a manutenção do sistema jurídico.
No caso dos princípios penais, eles vão orientar a atuação do legislador na elaboração da legislação penal e
do operador do direito em sua aplicação. A função dos princípios é limitar o poder de punir do Estado. Isso
porque, o Estado, por natureza, é arbitrário, pois invade a esfera de liberdade do indivíduo.

7.1 Princípios Relacionados com a Missão Fundamental do Direito Penal

7.1.1 Princípio da Exclusiva Proteção de Bens Jurídicos


O Direito Penal deve servir apenas e tão somente para proteger bens jurídicos relevantes (Roxin).
Ademais, nenhuma criminalização é legítima se não busca evitar a lesão ou o perigo de lesão a um bem
juridicamente determinado. Impede que o Estado utilize o Direito Penal para a proteção de bens ilegítimos.

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Assim, não pode incriminar pensamentos ou intenções, questões morais, éticas, ideológicas,
religiosas ou finalidades políticas. Para a teoria constitucional do Direito Penal, aliás, a referida eleição de
bens jurídicos deve refletir os valores constitucionais, a exemplo do homicídio, que tutela o direito
fundamental à vida.
Dessa forma, o princípio da proteção aos bens jurídicos defende que o direito penal deve servir
apenas para proteger bens jurídicos relevantes, bens jurídicos indispensáveis ao convívio em sociedade.
Mas o que é bem jurídico?
R.: Trata-se de um tema extremamente controvertido, de modo que vamos tentar simplificá-lo de
forma objetiva para melhor compreensão:
Para Luiz Regis Prado, bem jurídico é um ente material ou imaterial, haurido do contexto social, de
titularidade individual ou metaindividual, reputado como essencial para a coexistência e o desenvolvimento
do homem em sociedade.
Por sua vez, Luis Greco e Roxin se filiam ao mesmo conceito, mas usam expressões diferentes.
● Roxin – bem jurídico será a relação real da pessoa com um valor concreto, reconhecido pela
comunidade.
● Luís Greco – bem jurídico são dados fundamentais para a realização pessoal dos indivíduos ou para
a subsistência do sistema social nos limites da ordem constitucional.
Nesse sentido, para conceituar bem jurídico, é45119
imprescindível levar 2 pontos em consideração:
1) Fundamento do bem jurídico: o conceito de bem jurídico tem que ter como ponto central,
como fundamento, a importância do bem àquela pessoa. Tem que ser um bem de
importância vital, fundamental, de modo que a existência dessa pessoa ou seu bem-estar
estejam ameaçados sem a criminalização daquela conduta.
2) Titularidade do bem jurídico: É importante saber quem é o titular desse bem jurídico. Para
quem o BJ tem essa importância fundamental? 45119

Obs. Espiritualização, desmaterialização ou liquefação dos bens jurídicos: é a inclusão no direito penal de
proteção a interesses metaindividuais e não apenas relativos ao ser humano. Por esta razão, a lei penal
passou a prever mais crimes de perigo nos últimos tempos, destinados a proteger bens metaindividuais. Ex.:
crimes ambientais (MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado - Parte Geral. 14ª Ed. São Paulo: Método,
2020, p. 52).

7.1.2 Princípio da Intervenção Mínima


No art. 8º da Declaração dos direitos do homem e do cidadão (1789), tem-se a imposição de que o
direito penal deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias. Isso, de certa forma, traz a ideia
originária do princípio da intervenção mínima, pois o Direito Penal só deve intervir quando for estrita e
evidentemente necessária.
Em outras palavras: O direito penal em um Estado Democrático de Direito atua como última
ratio/ultima razão/ultima saída. O direito penal é o último grau de proteção jurídica.
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45119

Obs.: Trata-se de um princípio um implícito na CF/88, que pode ser retirado, principalmente, do
princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88).

a) Destinatários de finalidade: dois são os destinatários do referido princípio:


● Legislador (no plano abstrato);
● Aplicador do direito (no plano concreto).
Nessa linha, temos que a intervenção mínima deve ser observada tanto pelo legislador, no momento
de selecionar as condutas que passaram a ser tuteladas pelo Direito Penal, como também, deve ser
observado pelo aplicador do direito no caso em concreto.

b) Finalidade do princípio da intervenção mínima: trata-se de um reforço ao princípio da reserva legal,


posto que não é suficiente que tenha lei prevendo aquela conduta como criminosa, é necessário
ainda que a intervenção penal cominada pela lei seja efetivamente necessária.

Do princípio da intervenção mínima decorrem dois outros princípios:

7.1.2.1 Fragmentariedade
O direito penal é fragmentário pois é visto como
45119 um sistema descontínuo de ilicitudes. Ou seja: o

direito penal não pode e nem tem como criminalizar todas a condutas existentes, mesmo que sejam ilícitos
do direito (não só ilícitos penais, mas ilícitos civis também).
Nesse contexto, a fragmentariedade prevê que somente devem ser tutelados pelo direito penal os
casos de relevante lesão ou perigo de lesão aos bens jurídicos fundamentais para a manutenção e o progresso
do ser humano e da sociedade.

O princípio da fragmentariedade deve ser utilizado no plano ABSTRATO, para o fim de permitir a criação de
tipos penais somente quando os demais ramos do Direito tiverem falhado na tarefa de proteção de um bem
jurídico. Refere-se, assim, à atividade legislativa.

#DICA DD: Em que consiste a fragmentariedade às avessas? Ocorre nas situações em que o direito penal
perde o interesse em uma determinada conduta, inicialmente tida por criminosa, por entendê-la
desnecessária, com a evolução da sociedade e modificação de seus valores, ocorrendo a abolitio criminis,
sem prejuízo de sua tutela pelos demais ramos do direito. É um juízo negativo, o crime existia e deixa de
existir. Ex.: Adultério, que era crime tipificado no art. 240 do CP e deixou de ser em 2005, quando a Lei nº
11.106 revogou o tipo penal.

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7.1.2.2 Subsidiariedade
A subsidiariedade é corolário da intervenção mínima e está ligada à autonomia do Direito Penal.
Somente após se constatar que outros meios de solução social dos conflitos não são aptos a dirimi-los, é que
serão utilizados modelos coercitivos de que dispõe o Direito Penal.
Assim, a intervenção penal fica condicionada ao fracasso dos demais ramos do direito, funcionando
como um soldado de reserva.
Direciona-se ao aplicador do direito, no PLANO CONCRETO, devendo ser aplicado apenas quando
todos os demais ramos se revelarem impotentes. O crime já existe, mas precisamos saber se a aplicação da
lei penal é necessária no caso concreto.

Aprofundando...
Conflito aparente de normas: Segundo Rogério Greco, o conflito aparente de normas penais é aquele
que ocorre quando duas normas aparentam incidir sobre o mesmo fato. Ele é dito aparente, pois na verdade
não existe conflito algum – efetivamente, não existe um conflito ao se aplicar a norma ao caso concreto.
Existem princípios, capazes de solucionar os conflitos aparentes de normas penais:
a) Subsidiariedade - Temos uma norma subsidiária e uma norma primária, e só se aplica a norma
subsidiária caso a norma primária não possa ser aplicada, ou seja, uma norma menos grave
(subsidiária), que descreve um crime autônomo,
45119
e uma norma mais grave (primária), que descreve
uma segunda conduta e que prevalecerá sobre aquela.
b) Especialidade - Estaremos diante de dois tipos penais, um específico e um genérico, ambos
aparentemente adequados para o caso concreto. Entretanto, pela regra da especialidade,
prevalecerá o tipo penal específico. 45119

c) Consunção - O princípio da consunção está diretamente relacionado com a absorção de um delito


por outro. Ou seja, existe uma relação de fins e meios (um delito é o meio para que se chegue ao
outro) ou mesmo de necessidade (um crime é uma fase para o outro, sendo necessária sua execução
para que se pratique o segundo tipo penal).
d) Alternatividade - Temos o chamado princípio da alternatividade, que, por sua vez, é bastante
simples. Aqui temos um tipo penal chamado de misto alternativo (cuja conduta possui várias formas,
ou seja, vários verbos). Nesses casos, mesmo que o agente pratique vários dos núcleos em um
mesmo contexto, responderá por apenas um crime.

7.1.3 Princípio da Insignificância ou da Bagatela

a) Introdução, Origem e Conceito


Inicialmente, cumpre destacar que o referido princípio não encontra previsão na legislação, mas
pacificamente admitido pela Jurisprudência do STF e do STJ.

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45119
Segundo Cleber Masson (Direito Penal Esquematizado): “Em outras palavras, o Direito Penal não
deve se ocupar de assuntos irrelevantes, incapazes de lesar o bem jurídico legalmente tutelado. Na década
de 70 do século passado, foi incorporado ao Direito Penal pelos estudos de Claus Roxin”.
Ressalta-se que o princípio da Insignificância decorre da fragmentariedade, de modo que o Direito
Penal só vai intervir nos casos de relevante lesão, quando for indispensável para a proteção de determinado
bem jurídico, e quando não houver como proteger o bem jurídico como os outros ramos do direito.
Nesse sentido, o princípio da insignificância traduz a ideia de que não há crime quando a conduta
praticada pelo agente é insignificante, não é capaz de ofender ou colocar em perigo o bem jurídico tutelado
pela norma penal.

b) Finalidade
O STF expressamente reconhece como finalidade desse princípio a “interpretação restritiva da lei
penal”, ou seja, o princípio da insignificância deve diminuir a intervenção penal, no sentido de ignorar as
condutas irrisórias que não se revelam capazes de ofender o bem jurídico tutelado pelo tipo penal.

c) Natureza Jurídica: Causa de Exclusão da tipicidade (atipicidade) material. Isto é: torna o fato atípico
por ausência de tipicidade material.
45119

TRADUZINDO:
TIPICIDADE PENAL = tipicidade formal + tipicidade material.
Tipicidade formal: juízo de adequação do fato à norma (analisa se o fato praticado na vida real, se amolda,
se encaixa ao modelo de crime descrito na lei penal). Ex.: Sujeito subtrai um iogurte de um hipermercado.
Como subtraiu coisa alheia móvel, o fato se adequa ao tipo penal de furto.
Tipicidade material: é a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico protegido.
No exemplo acima, em que pese tenha havido a tipicidade formal, o ato praticado não foi capaz de causar
lesão relevante ao bem protegido, vez que o valor de um iogurte não faria a menor diferença no patrimônio
de um hipermercado, não havendo, portanto, tipicidade material.

Mas atenção: NÃO É SÓ O VALOR que deve ser analisado para que seja reconhecida a insignificância
da conduta! Existem outros requisitos que devem ser observados, conforme jurisprudência consolidada da
Suprema Corte.
Ademais, valor insignificante e pequeno valor não são sinônimos. Por vezes, em casos de furto, por
exemplo, a questão apresenta um bem de um valor baixo, mas não irrisório/insignificante, que servirá apenas
para caracterizar a causa de diminuição de pena do furto privilegiado, mas não excluirá a tipicidade material,
seja pelo fato de o valor ser pequeno, mas não irrisório, seja por não preencher algum outro requisito.
Sobre os valores, não há nenhuma tese fixa sobre. É necessário analisar o contexto. Porém,
analisando as decisões proferidas, o STF tem aceitado como insignificantes normalmente valores que giram
em torno de 10% do salário-mínimo, com variações para mais e para menos (é só uma ideia). Já como
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pequeno valor, para o privilégio, admite-se o valor de até 1 salário-mínimo integral (raciocínio aplicável aos
demais delitos que admitem o privilégio).

É inviável a aplicação do princípio da insignificância ao furto praticado quando,


para além do valor da res furtiva exceder o limite de 10% do valor do salário-
mínimo vigente à época dos fatos, o acusado é multirreincidente, ostentando
diversas condenações anteriores por crimes contra o patrimônio.Processo sob
segredo de justiça. Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, por unanimidade,
45119
julgado em 14/11/2022, DJe 22/11/2022.

ATENÇÃO! JURISPRUDÊNCIA EM TESES – EDIÇÃO nº 219 - PRINCÍPIO DA


INSIGNIFICÂNCIA A aplicação do princípio da insignificância requer a presença
cumulativa das seguintes condições objetivas:
a) mínima ofensividade da conduta do agente;
b) nenhuma periculosidade social da ação;
c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do agente;
d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
45119

Vejamos algumas casuísticas importantes em relação ao princípio da insignificância:

a) PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA x AGENTE REINCIDENTE


Em regra, o STF e o STJ afastam a aplicação do princípio da insignificância aos acusados reincidentes
ou de habitualidade delitiva comprovada. Vale ressaltar, no entanto, que há julgados em que afirmam que
a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à
luz dos elementos do caso concreto
Ao criminoso habitual, tanto o STF como o STJ, costumam negar a aplicação. Vale ressaltar, no
entanto, que há julgados em que afirmam que é aplicável o referido princípio se, analisando as
peculiaridades do caso concreto, entender que a medida é socialmente recomendável.
Vale o conhecimento da jurisprudência em Teses do STJ (ed. 47):

Tese 7: O princípio da insignificância deve ser afastado nos casos em que o réu
faz do crime o seu MEIO DE VIDA, ainda que a coisa furtada seja de pequeno
valor.

Ainda, na edição nº 219 - Jurisprudência em teses (STJ):

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Tese 2: A reiteração delitiva, a reincidência e os antecedentes, em regra, afastam a


aplicação do princípio da insignificância, por ausência de reduzido grau de
reprovabilidade do comportamento do agente.
Tese 3: É possível aplicar, excepcionalmente, o princípio da insignificância,
inclusive nas hipóteses de reiteração delitiva, reincidência ou antecedentes, se as
peculiaridades do caso concreto evidenciarem inexpressividade da lesão jurídica
provocada e reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento do agente.

Pergunta: e ao MULTIRREINCIDENTE, é possível aplicação do princípio da insignificância? Em regra,


NÃO.
A multirreincidência específica somada ao fato de o acusado estar em prisão
domiciliar durante as reiterações criminosas são circunstâncias que inviabilizam
a aplicação do princípio da insignificância. REsp 1.957.218-M, G Rel. Min. Olindo
Menezes. Sexta Turma, por maioria, julgado em 23/08/2022.É certo que há
precedentes do Supremo Tribunal Federal em que se afasta a tipicidade material
da conduta criminosa quando o furto é praticado para subtrair objeto de valor
irrelevante, ainda que o paciente seja reincidente na prática delitiva. Entretanto, a
Corte também tem precedentes
45119 que apontam a relevância da análise da
reincidência delitiva para afastar a tipicidade da conduta, conforme se verifica no
julgamento do Habeas Corpus 123.108/MG, da Relatoria do Ministro Roberto
Barroso, no qual, o Plenário do STF decidiu, por maioria de votos, que a "aplicação
do princípio da insignificância envolve um juízo amplo (conglobante), que vai
além da simples aferição do resultado material da conduta, abrangendo também
a reincidência ou contumácia do agente, elementos que, embora não
determinantes, devem ser considerados". Após a análise dos precedentes desta
Corte Superior e do STF, é razoável concluir que a reincidência não impede, por si
só, que se reconheça a insignificância penal da conduta à luz dos elementos do caso
concreto, mas pode ser um dos elementos que justificam a tipicidade material da
conduta. Informativo 746 (29/08/2022).

Mas há julgado do STJ permitindo excepcionalmente (19/05/22):


45119

A multirreincidência específica, via de regra, afasta a aplicação do princípio da


insignificância no crime de furto. Entretanto, em casos excepcionais, nos quais é
reduzidíssimo o grau de reprovabilidade da conduta, tem esta Corte Superior
admitido a incidência do referido princípio, ainda que existentes outras
condenações. (AgRg no AREsp 1899839/MG, Rel. Ministro OLINDO MENEZES

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(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), Rel. p/ Acórdão Ministra


LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 19/04/2022, DJe 19/05/2022)

É possível a aplicação ao réu reincidente quando o crime anterior tutelava bem jurídico distinto patrimônio,
é o que o STF chamou de TEORIA DA REITERAÇÃO NÃO CUMULATIVA DE CONDUTAS DE GÊNEROS
DISTINTOS (*termo de prova).

Entendendo a fonte da expressão acima que foi utilizada no seguinte julgado do STF:

TURMA HABEAS CORPUS 114.723, MINAS GERAIS


RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI
FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. VALOR DOS BENS
SUBTRAÍDOS. INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO. CONTUMÁCIA DE INFRAÇÕES
PENAIS CUJO BEM JURÍDICO TUTELADO NÃO É O PATRIMÔNIO.
DESCONSIDERAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. (...) 4. À luz da teoria da reiteração não
cumulativa de condutas de gêneros distintos, a contumácia de infrações penais
que não têm o patrimônio como bem jurídico tutelado pela norma penal não
pode ser valorada, porque
45119
ausente a séria lesão à propriedade alheia
(socialmente considerada), como fator impeditivo do princípio da insignificância.

Ressalta-se ainda que, em 2018 e 2019, os Tribunais Superiores tinham encontrado uma espécie de
“meio termo” entre a aplicação do princípio da insignificância e a reincidência do agente.
Isso porque, no caso concreto, o juiz via que, pelo critério objetivo, o réu faria jus à insignificância,
mas que os critérios subjetivos não estariam preenchidos, em razão da reincidência. Então, considerando a
proporcionalidade, o STF criou um “meio termo”: ao invés de absolver por atipicidade material da conduta,
aplicou outros institutos mais benéficos, como a substituição da pena privativa de liberdade por pena
restritiva de direitos, como nos informativos 913 e 938.

Justificativas:
A favor da aplicação da insignificância ao reincidente/habitual: se a natureza jurídica é de causa de exclusão
de tipicidade, deve ser analisado o FATO e não os atributos do agente, sob pena de se utilizar o direito penal
do autor. O fato não poderia ser típico para uma pessoa e atípico para outra. Ou é típico ou não é. O momento
de analisar as condições pessoais do agente é apenas em eventual e futura fixação de pena.
Contra a aplicação da insignificância ao reincidente/habitual: Se o agente é infrator contumaz, com
45119
personalidade voltada a práticas delitivas, fazer uso da insignificância seria incentivá-lo ao contínuo
descumprimento da norma, fazendo do crime um meio de vida. O valor de um bem, isoladamente, até
poderia ser insignificante, mas o “todo” não seria e isso caracterizaria reprovabilidade e ofensividade. O

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intuito do princípio não é legitimar esse tipo de conduta, mas afastar do campo de incidência do direito penal,
desvios mínimos e isolados.

b) INSIGNIFICÂNCIA x FURTO QUALIFICADO


STF/STJ: Via de regra, entendem não ser possível a aplicação do princípio da insignificância no furto
qualificado, pois falta o requisito do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento. No entanto, o
Plenário do STF analisou a questão e entendeu que não há como fixar tese sobre isso, que também deve ser
analisado caso a caso (STF-HC 123108/MG).

Caiu em prova Delegado PC-AM/2022 da banca FGV! O princípio da insignificância é compatível com o furto
praticado por clandestinidade. (Item considerado correto pela banca.)

Veja a Tese nº 6, constante da Edição nº 47 da Jurisprudência em Teses do STJ, e a analise por exclusão: "6)
A prática do delito de furto qualificado por escalada, destreza, rompimento de obstáculo ou concurso de
agentes indica a reprovabilidade do comportamento do réu, sendo inaplicável o princípio da insignificância".

c) INSIGNIFICÂNCIA x BENS JURÍDICOS DIFUSOS/COLETIVOS


Em regra, se o bem jurídico é difuso ou coletivo,
45119
os tribunais superiores vêm entendendo pela NÃO
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, pois se estaria atingindo a coletividade e, portanto, não
caberia a insignificância da lesão.
Além disso, normalmente os crimes contra bens jurídicos difusos/coletivos são crimes de perigo
abstrato, motivo pelo qual, de “perigo presumido” pelo legislador.

▪ Tráfico de drogas – não aplicação do princípio, por se tratar de crime de perigo abstrato (perigo
presumido, de acordo com a jurisprudência do STJ), sendo irrelevante a quantidade de droga
apreendida (HC 318926, STJ – 2015).
▪ A apreensão de munições em quantidade não considerada insignificante, aliada a condenação
concomitante pelo delito de tráfico de entorpecentes, impõe o afastamento da aplicação do princípio
45119
da insignificância. REsp 1.978.284-GO, julgado em 14/06/2022.
▪ Porte de drogas para consumo pessoal – tema controvertido.
· Amplamente majoritário + jurisprudência do STJ – impossibilidade da insignificância em razão de se
tratar de crime de perigo abstrato. STJ, 6ª T, RHC 35920-DF (INFO 541)
· STF tem um precedente admitindo a aplicação da insignificância (o que não indica posição
consolidada do STF, pois O julgado foi decidido por EMPATE (2x), razão pela qual foi concedido o HC
(STF. 2ª Turma. HC 202883).

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▪ Crime de moeda falsa: Inaplicabilidade do princípio, AINDA QUE SEJA 1 ÚNICA NOTA DE PEQUENO
VALOR, uma vez que se trata de crime contra a fé pública, havendo o interesse do Estado e da
coletividade em não ter a fé pública abalada por aquela falsificação. Considerando que se trata de
um bem jurídico coletivo difuso “fé pública”, não se leva em consideração somente o aspecto
material/patrimonial do bem falsificado, mas sim um bem coletivo. Essa argumentação se aplica aos
outros crimes contra a fé pública.
Obs. EXCEPCIONALMENTE, admite-se o princípio da insignificância nos crimes contra a fé pública
(USO DE ATESTADO FALSO) em casos que o dolo do réu revela, de plano, "a mínima ofensividade da
conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de
reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada", a demonstrar
a atipicidade material da conduta e afastar a incidência do Direito Penal, sendo suficientes as sanções
previstas na Lei trabalhista (STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1816993/B1, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
julgado em 16/11/2021).

▪ Crimes ambientais: Em regra, nos crimes com bem jurídico difuso/coletivo, não se aplica o princípio
da insignificância, pois a lesividade/exposição a perigo transcende o aspecto individual. No entanto,
nos crimes ambientais, essa regra é invertida, uma vez que os tribunais superiores adotam como
regra a possibilidade de aplicação do princípio
45119da insignificância em crimes ambientais, devendo

ser analisadas as circunstâncias específicas no caso concreto para verificar a atipicidade da conduta
em exame/verificar se aquela conduta não gerou efetivamente um perigo ao meio ambiente (Info
816).

· Exceção à regra específica dos crimes ambientais: pela jurisprudência amplamente


dominante, não se pode aplicar o princípio da insignificância ao crime de pesca ilegal (STF, 1ª
TURMA, HC 122560/SC 2018 – Info 901).

Obs.: apesar de a redação utilizada no informativo original ter sido bem incisiva (“O princípio da bagatela
não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98”), existem julgados
tanto do STF como do STJ aplicando, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o delito de pesca
ilegal. Deve-se ficar atenta(o) para como isso será cobrado no enunciado da prova. 45119
Fonte: dizer o Direito

Veja as hipóteses em que a própria jurisprudência flexibiliza a exceção da pesca ilegal, como, por
exemplo:

● O STJ (Info 602 – 6ª Turma. RESP 1409051 – 2017) afirmou, de forma excepcional, pela aplicação do
princípio da insignificância no caso de pesca ilegal, na hipótese em que o indivíduo pescou 1 único
peixe e devolveu esse peixe vivo ao rio, não havendo um prejuízo efetivo ao meio ambiente.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Se a pessoa é flagrada sem nenhum peixe efetivamente pescado, mas portando consigo
equipamentos de pesca, em um local onde essa atividade é proibida. Nessa hipótese
pontual/casuística, temos discussão nos tribunais superiores, pois há 2 julgados da mesma turma em
sentidos opostos:
45119

· SIM (possibilidade de aplicação da insignificância) - STF (Info 816).


· NÃO (não pode aplicar) - STF (Info 845).

d) INSIGNIFICÂNCIA x CRIMES TRIBUTÁRIOS E DESCAMINHO


Em regra, o princípio da insignificância se aplica aos crimes tributários federais e de descaminho
[também é um crime tributário] quando o crédito tributário não ultrapassar o limite de 20.000 reais, a teor
do disposto no art. 20 da Lei 10.522/02 com as atualizações efetivadas pelas portarias nº 75 e 130 do
Ministério da Fazenda.

Caiu em prova Delegado PC-AM/2022 da banca FGV! O princípio da insignificância é admitido na doutrina e
na jurisprudência em relação ao delito de descaminho. (Item considerado correto pela banca.)

Observações importantes:
45119

1) O valor máximo para aplicar o princípio da insignificância é de 20 mil reais (STF e STJ).
Explicação para adotar o valor de 20 mil reais: (Fonte: Dizer o Direito)
⋅ Esse valor foi fixado pela jurisprudência tendo como base a Portaria MF nº 75, de 29/03/2012, na
qual o Ministro da Fazenda determinou, em seu art. 1º, inciso II, “o não ajuizamento de execuções
fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$
20.000,00 (vinte mil reais).”
⋅ Em outros termos, essa Portaria determina que, até o valor de 20 mil reais, os débitos inscritos como
Dívida Ativa da União não serão executados.
⋅ Com base nisso, a jurisprudência construiu o seguinte raciocínio: ora, não há sentido lógico permitir
que alguém seja processado criminalmente pela falta de recolhimento de um tributo que nem sequer
será cobrado no âmbito administrativo-tributário. Se a própria “vítima” não irá cobrar o valor, não
faz sentido aplicar o direito penal contra o autor desse fato.
⋅ Vale lembrar que o direito penal é a última ratio. Se a Administração Pública entende que, em razão
do valor, não vale a pena movimentar a máquina judiciária para cobrar a quantia, com maior razão
também não se deve iniciar uma ação penal para punir o agente.

2) O valor de 20 mil reais para aplicação do princípio da insignificância será somente aos crimes
tributários FEDERAIS!!! Não se aplica o parâmetro dos tributos federais aos crimes tributários estaduais,

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devendo ser observada a lei estadual vigente em razão da autonomia do ente federativo (STJ. 5ª Turma.
AgRg-HC 549.428-PA. Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 19/05/2020).

Atenção! Edição 219º - Jurisprudência em teses (STJ):


Tese 5: Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito
tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20
da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da
Fazenda (Tese revisada sob o rito do art. 1.046 do CPC/2015 - TEMA 157).
Tese 6: É possível aplicar o parâmetro estabelecido no Tema n. 157/STJ, para fins de incidência do princípio
da insignificância no patamar estabelecido pela União aos tributos dos demais entes federados, quando
existir lei local no mesmo sentido da lei federal.

3) Não se aplica o princípio


45119 da insignificância ao crime de contrabando! (Somente se aplica ao crime
de descaminho)
Não se aplica porque o objeto sobre o qual recai a conduta proibida no crime de contrabando é
“mercadoria proibida”, e não a mera sonegação. Assim, o bem jurídico tutelado não é apenas a questão
financeira do ente estatal, mas também a saúde pública/incolumidade pública, uma vez que o estado, por
motivos de saúde pública/incolumidade pública, proíbe
45119
a importação ou exportação de determinada
mercadoria (Crime pluriofensivo).

Exceção: No STJ, há um precedente ISOLADO em sentido contrário, admitindo a aplicação do


princípio da insignificância ao crime de contrabando de pequena quantidade de medicamento destinada a
uso próprio. Trata-se de um caso extremamente específico em que o STJ reconheceu a mínima ofensividade
da conduta do agente, ausência periculosidade da ação, reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada, autorizando excepcionalmente a aplicação
do princípio da insignificância (STJ. 5ª Turma. EDcl no AgRg no REsp 1708371/PR, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
julgado em 24/04/2018).

INSIGNIFICÂNCIA x CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


● STF - Antes não admitia, mas possui decisões recentes admitindo, como por exemplo, em caso de
peculato.
● STJ – Possui entendimento sumulado negando a aplicação (súmula 599).
Súmula 599-STJ: O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração
pública.

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Porém, STF e STJ admitem nos crimes contra a Administração Pública praticados por particulares, a
exemplo do descaminho, que, apesar de ser um crime tributário, topograficamente, estão inseridos no título
dos Crimes contra a Administração Pública, então cuidado em prova!

ATENÇÃO: 45119

Informativo 742 - Admite-se, excepcionalmente, a aplicação do princípio da


insignificância a crime praticado em prejuízo da administração pública quando for
ínfima a lesão ao bem jurídico tutelado. RHC 153.480-SP, Rel. Min. Laurita Vaz,
Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 24/05/2022, DJe 31/05/2022. Logo, em
determinadas hipóteses, nas quais for ínfima a lesão ao bem jurídico tutelado -
como na espécie -, admite-se afastar a aplicação do entendimento sedimentado na
Súmula n. 599/STJ, pois "a subsidiariedade do direito penal não permite tornar o
processo criminal instrumento de repressão moral, de condutas típicas que não
produzam efetivo dano".

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS:


1. STF/STJ: para aplicação do princípio da insignificância, considera-se a capacidade econômica da
vítima (STJ-Resp. 1.224.795). 45119

2. STF/STJ: admitem a aplicação a atos infracionais.


2. STF: O princípio da insignificância pode ser reconhecido mesmo após o trânsito em julgado da
sentença condenatória (STF-HC 95570).
3. “Flanelinha” e exercício da profissão sem registro competente: STF admite a aplicação (Info. 699).
4. STF/STJ NÃO admitem o princípio da insignificância nos crimes contra a fé pública, mais
precisamente, nos crimes de moeda falsa (STF-HC105.829).
5. STF/STJ: Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência
doméstica (STJ-HC 33195/MS; STF-RHC 133043/MT).
6. STF/STJ: Ao Tráfico internacional de armas e munições não se aplica o princípio da insignificância
(STF-HC 97777), de igual modo é inaplicável aos crimes de posse e porte de arma de fogo (STJ-HC
338153/RS). Obs.: É atípica a conduta daquele que porta, na forma de pingente, munição
desacompanhada de arma. (STF - HC 133984/MG).
7. Crimes contra a vida, lesões corporais, crimes praticados com violência ou grave ameaça à pessoa,
crimes sexuais, tráfico de drogas – nenhum admite.
8. Porte de drogas para uso (art. 28 da LD) – Majoritariamente, o STF e o STJ não aplicam a
insignificância, nem mesmo em se tratando de quantidades ínfimas, pelo fato de ser crime de
perigo presumido e o bem tutelado ser a saúde pública. No entanto, há julgado isolado do STF
permitindo a aplicação.
9. Violação de direito autoral – não se aplica. STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1380149/RS.

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10. Apropriação indébita previdenciária:


ANTES: havia divergência entre o STJ e o STJ.
AGORA: tanto o STF como o STJ afirmam que é inaplicável o princípio da insignificância ao crime de
45119

apropriação indébita previdenciária. STF. 1ª Turma. HC 102550, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20/09/2011.
STF. 2ª Turma. RHC 132706 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/06/2016. STJ. 3ª Seção. AgRg na
RvCr 4.881/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 22/05/2019.
11. Crimes ambientais:
STJ: É possível a aplicação do princípio da insignificância aos crimes ambientais, devendo ser analisadas as
circunstâncias específicas do caso concreto para se verificar a atipicidade da conduta em exame (STJ AgRg
no AREsp 654.321/SC).
STF: Já negou em situação de pesca ilegal, a um indivíduo flagrado junto a outras três pessoas, POR TRÊS
VEZES CONSECUTIVAS, em embarcação motorizada, praticando pesca em local proibido e com redes de
arrasto de fundo (HC 137652).
- Já negou em caso de realização de pesca de 7kg de camarão em período de defeso com o uso de método
não permitido (HC 122560/SC).
- A partir do caso acima, publicou a seguinte redação no Info 901:: O princípio da bagatela não se aplica
ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98 (pesca ilegal).
- No entanto, existem julgados tanto do STF como 45119
do STJ aplicando, excepcionalmente, o princípio da
insignificância para este delito. Atente-se ao comando da questão!
12. É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de manter rádio clandestina?
• No STJ: é pacífico que NÃO.
Súmula 606-STJ: não se aplica o princípio da insignificância aos casos de transmissão clandestina de
sinal de internet via radiofrequência que caracterizam o fato típico previsto no artigo 183 da lei
9.472/97.
• No STF: o tema ainda é controverso.
-1ª Turma do STF: é inaplicável o princípio da insignificância no crime de transmissão clandestina de
sinal de internet, por configurar o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, que é crime formal, e,
como tal, prescinde de comprovação de prejuízo para sua consumação. STF. 1ª Turma. HC 124795 AgR,
Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 23/08/2019.
-2ª Turma do STF: O princípio da insignificância também se aplica ao fornecimento clandestino de
internet tipificado no art. 183 da Lei nº 9.472/97 desde que (i) a conduta seja minimamente ofensiva
do agente, (ii) não haja risco social da ação, (iii) seja reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento e (iv) inexpressiva a lesão jurídica. A expressividade da lesão jurídica deve ser
verificada in concreto à luz do alcance do alcance dos aparelhos consignado em laudo da autoridade
regulatória.Ausente laudo que ateste a expressividade concreta da lesão e havendo indícios de sua
inexpressividade, deve incidir o princípio da insignificância, a autorizar a concessão da ordem. STF. 2ª
Turma. HC 161483 AgR, Rel. Edson Fachin, julgado em 07/12/2020. STF. 2ª Turma. HC 165577 AgR, Rel.

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Min. Gilmar Mendes, Rel. p/ Acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 08/09/2021.
13. STJ – Info 672/2020: Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de
estelionato qualificado por médico que, no desempenho de cargo público, registra o ponto e se retira
do hospital.
Cinge-se a controvérsia a saber acerca da possibilidade do trancamento de ação
penal pelo reconhecimento de crime bagatelar no caso de médico que, no
desempenho de seu cargo público, teria registrado seu ponto e se retirado do
local, sem cumprir sua carga horária. A jurisprudência desta Corte Superior de
Justiça não tem admitido, nos casos de prática de estelionato qualificado, a
incidência do princípio da insignificância, inspirado na fragmentariedade do
Direito Penal, em razão do prejuízo aos cofres públicos, por identificar maior
reprovabilidade da conduta delitiva. Destarte, incabível o pedido de trancamento
da ação penal, sob o fundamento de inexistência de prejuízo expressivo para a
vítima, porquanto, em se tratando de hospital universitário, os pagamentos
45119 aos
médicos são provenientes de verbas federais. STJ. AgRg no HC 548.869-RS, Rel.
Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020,
DJe 25/05/2020.
14. Juris em teses ed. 219: É inaplicável o princípio
45119 da insignificância nos crimes ou contravenções

penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas (Súmula n. 589/STJ).
15. Juris em teses ed. 219: Os delitos de porte ou posse de munição, de uso permitido ou restrito, são
crimes de mera conduta e de perigo abstrato, em que se presume a potencialidade lesiva e, por isso,
em regra, não é aplicável o princípio da insignificância.
16. Juris em teses ed. 219: É possível aplicar o princípio da insignificância aos delitos de porte ou posse
de munição de uso permitido ou restrito, desde que a quantidade apreendida seja pequena e esteja
desacompanhada de armamento apto ao disparo e as circunstâncias do caso concreto demonstrem a
ausência de lesividade da conduta.
17. Juris em teses ed. 219: Não é possível aplicar o princípio da insignificância aos delitos de porte ou
posse de munição, de uso permitido ou restrito, ainda que em pequena quantidade e desacompanhada
de armamento apto ao disparo, se a apreensão acontecer no contexto do cometimento de outro crime.

#ATENÇÃO: Delegado pode aplicar o princípio da insignificância?

Para o STJ NÃO! Apenas o juiz pode. HC 154.949/MG. Assim, a autoridade policial estaria obrigada a
efetuar a prisão em flagrante, submetendo a questão à análise de autoridade judiciária.
No entanto, parte da doutrina, a exemplo de Cleber Masson, posiciona-se contra tal entendimento,
pelo fato de tratar a insignificância de afastamento da tipicidade do fato. E ora, se o fato não é típico para
o juiz, também não será para delegado!
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Para esta segunda corrente, principalmente na análise da legalidade da prisão em flagrante, o


delegado não só poderia, como DEVERIA analisar a presença dos elementos que traduzem a insignificância,
vez que não seria razoável ratificar a prisão de quem subtraiu um pão de queijo de uma padaria, por exemplo,
sob pena de inobservância de vários princípios, como lesividade, proporcionalidade, subsidiariedade,
intervenção mínima.

A solução para que você, caro aluno, resolva a questão, é analisar a forma como isso está sendo
questionado.

Para finalizar o estudo deste princípio, precisamos ainda fazer uma última diferenciação: BAGATELA
PRÓPRIA X BAGATELA IMPRÓPRIA, o que faremos com a ajuda do Dizer o Direito.

INFRAÇÃO BAGATELAR PRÓPRIA INFRAÇÃO BAGATELAR IMPRÓPRIA


= PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA = PRINCÍPIO DA IRRELEVÂNCIA PENAL DO FATO

A situação nasce penalmente relevante. O fato é


A situação já nasce atípica. típico do ponto vista formal e material.
O fato é atípico por atipicidade material. 45119
Em virtude de circunstâncias envolvendo o fato e o
seu autor, consta-se que a pena se tornou
45119

desnecessária.

O agente tem que ser processado (a ação penal


O agente não deveria nem mesmo ser processado deve ser iniciada) e somente após a análise das
já que o fato é atípico. peculiaridades do caso concreto, o juiz poderia
reconhecer a desnecessidade da pena.

Não tem previsão legal no direito brasileiro. Está previsto no art. 59 do CP, conforme a doutrina.

Enquanto para a infração bagatelar própria já nasce irrelevante por se tratar de conduta
materialmente atípica, “a infração bagatelar imprópria é aquela que nasce relevante para o Direito penal,
mas depois se verifica que a aplicação de qualquer pena no caso concreto apresenta-se totalmente
desnecessária” (GOMES, Luiz Flávio; Antonio Garcia-Pablos de Molina. Direito Penal Vol. 2, São Paulo: RT,
2009, p.305)”.
Segundo LFG, este instituto possui fundamento legal no direito brasileiro (porém, de forma implícita
e “genérica” – termos nossos). Trata-se do art. 59 do CP que prevê que o juiz deverá aplicar a pena “conforme
seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.

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Dessa forma, se a pena não for mais necessária, ela não deverá ser imposta (princípio da
desnecessidade da pena conjugado com o princípio da irrelevância penal do fato).
A bagatela imprópria foi acolhida, excepcionalmente, pela 5ª Turma do STJ, confirmando decisão da
1ª e 2ª instâncias judiciais no AgRg no AREsp 1423492 / RN (decisão publicada 29/05/2019):

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. POSSE ILEGAL


DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. CRIME SEM
VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. DELITO COMETIDO HÁ MAIS DE 12 ANOS.
INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA BAGATELA IMPRÓPRIA. REQUISITOS
PREENCHIDOS. DESNECESSIDADE DA PENA. REEXAME DO CONJUNTO
PROBATÓRIO. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA –
STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Entendo as instâncias ordinárias ser
desnecessária a punição do acusado, porque presentes os requisitos para a
aplicação do princípio da bagatela imprópria, para se concluir de forma diversa,
seria imprescindível o reexame do conjunto probatório dos autos, o que não é
viável em recurso especial. Incidente a Súmula n. 7/STJ. 2. Agravo regimental
desprovido.
45119

SIMPLIFICANDO:
- Princípio da insignificância ou da bagatela própria – O fato já nasce atípico, por atipicidade material.
- Natureza jurídica bagatela própria: Causa Supralegal de extinção de tipicidade material, devendo ser
analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima.

- Princípio da insignificância imprópria: pressupõe uma análise do que ocorreu após a prática do crime até
o momento do julgamento. Exemplo: o réu se casou, teve filhos, tem uma empresa com mais de 50
funcionários. Nesses casos o juiz reconhece a existência do crime, mas conclui que a pena não é necessária.
Aqui não há causa supralegal de exclusão de tipicidade, há causa supralegal de extinção de punibilidade. O
Estado reconhece o crime, mas conclui pela desnecessidade da punição, ela não é mais vantajosa para a
sociedade.
A análise da pertinência da bagatela imprópria há de ser realizada, obrigatoriamente, na situação fática,
jamais no plano abstrato. Atente-se também para a necessidade de se observar que a bagatela imprópria
tem como pressuposto inafastável a não incidência do princípio da insignificância (próprio). Afinal, se o fato
não era merecedor da tutela penal em decorrência da sua atipicidade, descabe enveredar pela discussão
acerca da necessidade ou não da pena.
- Natureza jurídica bagatela imprópria: Causa supralegal de extinção de punibilidade. O estado reconhece o
crime, mas conclui pela desnecessidade da pena, a punição não é vantajosa para a sociedade.

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7.2 Princípios Relacionados com o Fato do Agente

7.2.1 Princípio da Ofensividade/Lesividade


Não pode haver crime sem que haja conteúdo ofensivo a bens jurídicos. A doutrina mais
especializada aponta uma fundamentação implícita ao princípio da lesividade na ideia de dignidade da
pessoa humana, no sentido de que não se pode instrumentalizar ou objetificar o homem. Então, quando o
Estado criminaliza condutas sem que haja ofensa ou ao menos perigo de ofensa a um bem jurídico tutelado,
está colocando o homem (que está recebendo aquela reprimenda) como instrumento para a consecução de
outra finalidade que não a proteção do próprio homem (ex.: um controle social que não é legítimo).
Nesse contexto, para que ocorra o delito, é imprescindível a efetiva lesão ou perigo de lesão ao bem
jurídico tutelado.

45119

Crime de dano: exige efetiva lesão ao bem jurídico. (Ex.: homicídio, exige a lesão morte).
Crime de perigo: contenta-se com o risco de lesão ao bem jurídico. (Ex. abandono de incapaz/omissão de
socorro).
a. crime de perigo concreto - o risco de lesão deve ser demonstrado.
b. perigo abstrato: o risco de lesão é absolutamente presumido por lei.
Há doutrina entendendo que o crime de perigo abstrato
45119 é inconstitucional, pois o perigo não pode ser
presumido, mas comprovado. Presumir-se prévia e abstratamente o perigo, significa, em última análise, que
o perigo não existe. Para os adeptos dessa corrente, os crimes de perigo abstrato violariam o princípio da
lesividade. Essa tese, no entanto, hoje não prevalece no STF. No HC 104.410, o Supremo decidiu que a
criação de crimes de perigo abstrato não representa, por si só, comportamento inconstitucional, mas
proteção eficiente do Estado.
Ex.: Embriaguez ao volante – STF decidiu que o ébrio não precisa dirigir de forma anormal para configurar o
crime – bastando estar embriagado (crime de perigo abstrato).

Nesse sentido, considerando que o princípio da ofensividade exige que, do fato praticado, ocorra
lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado, é certo concluir que o direito penal não deve se ocupar de
questões éticas, morais, religiosas, políticas, filosóficas. Assim, em razão do princípio da lesividade, PROÍBE-
SE:
⋅ A criminalização de pensamentos e cogitações (direito à perversão);
⋅ A criminalização de condutas que não tenham caráter transcendental (vedação à autolesão);
⋅ A criminalização de meros estados existenciais (criminalização da pessoa pelo que ela é – ex:
revogação da contravenção de mendicância).

Aprofundando...

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O princípio da lesividade está diretamente ligado à ideia de bem jurídico, com a chamada teoria do bem
jurídico. Na vertente do funcionalismo teleológico e racional (Roxin), a teoria do BJ ganha um destaque muito
45119
grande em toda a sistemática penal como uma forma de limitar o poder de punir do estado, ou seja, como
uma forma de limitar a incidência de tipos penais
São de 4 ordens/ funções e garantias do princípio da lesividade:
1) Proibição de incriminar uma atitude interna – motivo pelo qual não se pune a cogitação (fase interna do
inter criminis);
2) Proibição de incriminar condutas que não excedam o âmbito do autor – motivo pelo qual não se pune a
autolesão;
3) Proibição de incriminar simples estados ou condições existenciais - tendo em vista que nosso ordenamento
Jurídico adota o direito penal do fato – e não direito penal do autor;
4) Proibição de incriminar condutas desviadas que não afetam qualquer bem jurídico - motivo pelo qual não
se pune o crime impossível e, em regra, os atos preparatórios.

7.2.2 Princípio da Alteridade


Subprincípio do princípio da lesividade. Dispõe que a conduta deve necessariamente atingir, ou
ameaçar atingir, bem jurídico de terceiro para ser criminalizada. Deve transcender a esfera do próprio
agente. Por isso, o direito penal não pune a autolesão. Ex.: o artigo 28 da Lei 11.343/06 NÃO tipifica o USO
45119

de drogas porque apenas afetaria o usuário. Tipifica o porte ou similares (guardar, ter em depósito,
transportar etc.).

7.2.3 Princípio da Exteriorização ou Materialização do Fato


O Estado só pode incriminar condutas humanas voluntárias, fatos, atos lesivos. Ninguém pode ser
castigado por seus pensamentos, desejos ou meras cogitações ou estilo de vida. Esse princípio busca impedir
o direito penal do autor. Decorrência do princípio da lesividade.

7.2.4 Princípio Da Legalidade Estrita Ou Reserva Legal


Encontra previsão no art. 5º, XXXIX da CFRB/88 e no art. 1º do CP: “Não há crime sem lei anterior
que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Assim, a lei em sentido estrito tem o monopólio na
criação de crimes e cominação de penas – que só serão aplicados a condutas posteriores à sua vigência, não
podendo haver criação de crimes e penas por costumes ou analogias, tampouco tipificação de condutas
genéricas.
Ademais, a lei precisa ser anterior, escrita, estrita, certa (taxativa) e necessária.
A legalidade subdivide-se em:

o Legalidade formal: corresponde à obediência aos trâmites procedimentais previstos pela CF para
que determinado diploma legal possa vir a fazer parte do ordenamento jurídico.

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o Legalidade material: pressupõe não apenas a observância das formas e procedimentos impostos
pela Constituição Federal, mas também, e principalmente, o seu conteúdo, respeitando-se as suas
proibições e imposições para a garantia dos direitos fundamentais por ela previstos.

A doutrina trabalha com uma dupla face do princípio da legalidade. Ora legitimando o Estado, ora
limitando esse poder de punir. Veja:

1) Funções constitutivas - em que se garante ao Estado a possibilidade de criminalizar condutas e


cominar penas. Aqui trabalha-se com o plano da legalidade no sentido de legitimar o Estado a exercer
seu direito de punir através da criminalização de conduta e cominação de penas.
Quando se fala em legalidade na função constitutiva, abrange a legalidade não só na pena cominada,
mas na pena aplicada e pena executada também.
● Princípio da legalidade direcionado ao legislador – ao cominar as penas;
● Princípio da legalidade direcionado ao aplicador do direito – quando o juiz veda que se aplique um
regime de cumprimento de pena mais severo do que o previsto pelo legislador, por exemplo;
● Princípio da legalidade direcionado à Administração Penitenciária - Os órgãos não podem executar
pena diversa daquela prevista em lei e aplicada pelo juiz.
45119

Enunciado da I Jornada de Direito Penal e Processo Penal CJF/STJ


Enunciado 13: O princípio da legalidade impõe que se observe, quando da soma
das penas, o cálculo diferenciado para fins de progressão de regime.
45119

2) Funções de garantia (face de garantia) – busca limitar o poder de punir do estado trazendo garantias
mínimas ao cidadão perante o estado. Exclui penas ilegais, por exemplo. Nesse ponto, o princípio da
legalidade se desdobra em 4 máximas:
I. Lex scripta: A lex scripta proíbe que se utilize dos costumes como fonte incriminadora do direito
penal;
II. Lex stricta: proibição do emprego da analogia in malan partem;
III. Lex Praevia: Representa o princípio da anterioridade penal: veda a criminalização ex post facto;
IV. Lex certa (aspecto material do princípio da legalidade): A lex certa materializa a proibição de o
legislador formular tipos penais genéricos, vazios, vagos etc. (Princípio da taxatividade).

Segundo o autor Masson, o princípio da reserva legal possui dois fundamentos, quais sejam:
- Fundamento jurídico: é a taxatividade, certeza ou determinação, pois implica, por parte do legislador, a
determinação precisa, ainda que mínima, do conteúdo do tipo penal e da sanção penal a ser aplicada, bem
como da parte do juiz, na máxima vinculação ao mandamento legal. Como desdobramento lógico da
taxatividade, o Direito Penal não tolera a analogia in malam partem.

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- Fundamento político: é a proteção do ser humano em face do arbítrio do Estado no exercício do seu poder
punitivo. Enquadra-se, destarte, entre os direitos fundamentais de 1° geração (ou dimensão). (MASSON,
2017, p. 25).

* ATENÇÃO: os princípios da reserva legal (estrita legalidade) e o da legalidade são considerados como
sinônimos por parte da doutrina, enquanto outra corrente defende que se diferenciam nos seguintes
aspectos:

RESERVA LEGAL (estrita legalidade) 45119 LEGALIDADE


Art. 5°, XXXIX, CF, “não há crime sem lei Art. 5, II, CF, “ninguém será obrigado a fazer
anterior que o defina, nem pena sem prévia ou deixar de fazer alguma coisa senão em
cominação legal”. virtude de lei”.

Exige lei em sentido estrito (no caso do Exige lei em sentido amplo (abrange qualquer
direito penal, lei ordinária) - a lei deve ser espécie normativa, ou seja, lei delegada,
criada de acordo com o processo legislativo medida provisória, decreto, etc.).
previsto na CF e deve tratar de matéria
constitucionalmente reservada à lei 45119

7.2.4.1 Mandados de Criminalização e Reserva Legal


Em que pese a criação de crimes e cominação de penas seja exclusiva da lei em sentido estrito, a
Constituição Federal estabelece mandados explícitos e implícitos de criminalização, ou seja, situações em
que é obrigatória a intervenção do legislador penal.
Conforme já afirmado pelo STF, “A Constituição de 1988 contém significativo elenco de normas que,
em princípio, não outorgam direitos, mas que, antes, determinam a criminalização de condutas (CF, art. 5º,
XLI, XLII, XLIII, XLIV; art. 7º, X; art. 227, § 4º)” (HC 102.087/MG).
Podem ser de duas espécies:

MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO EXPRESSOS MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO


IMPLÍCITOS/TÁCITOS
A ordem está explícita no texto constitucional. A ordem está implícita no texto constitucional. É
retirada da do “espírito” do texto da CF, de sua
interpretação sistemática.
Ex.: Art. 5º, XLII: “a prática do racismo constitui Ex.: combate à corrupção no poder público.
crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena Embora a CF não tenha determinado
de reclusão, nos termos da lei”. expressamente a criminalização dessa conduta,
isso pode ser extraído dos valores que ela traz,

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como por exemplo, do artigo 1º (por ser República,


que significa “coisa pública”) e do art. 37, dos
princípios da Adm. Pública (LIMPE).

#DICA DD: O que seria mandado de criminalização por omissão? Consiste na hipótese do art. 5º, XLIII da CF,
que determina que a omissão, nos casos de crimes hediondos e equiparados, deve ser punida.

A título de conhecimento, há ainda os “mandados internacionais de criminalização”, que também podem


ser expressos, quando essa “ordem” está presente em tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil,
e implícitos, quando advém de uma decisão/sentença de tribunal internacional.

7.2.5 Princípio da Anterioridade

Exteriorizado nos mesmos dispositivos que se pode extrair o princípio da reserva legal.
De acordo com o princípio da anterioridade, a lei penal apenas se aplica a fatos praticados após a sua
entrada em vigor.
Daí, por consequência lógica, deriva a sua irretroatividade, não se aplicando a fatos pretéritos, nem
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mesmo os praticados durante a vacatio legis, SALVO se benéfica ao acusado.
Nesse sentido, temos o art. 5º XL da CF, dispondo que “a lei penal não retroagirá, salvo para
beneficiar o réu”.

7.2.6 Princípio da Vedação ao Bis In Idem


Tem previsão no art. 8º, 4 do Pacto de São José da Costa Rica, incorporado ao nosso ordenamento
jurídico pelo Dec. 678/1992.
Proíbe que o agente seja punido duas vezes pelo mesmo fato, inclusive sopesando a mesma situação
ou circunstância para agravar a pena em mais de um momento da dosimetria. Como exemplo, temos a
Súmula 241 do STJ que proíbe o uso de uma única reincidência como circunstância judicial desfavorável e
como agravante, pois haveria violação a este princípio.

7.2.7 Princípio da Adequação Social


Idealizado por Hans Welzel, este princípio traz a ideia de que as condutas tidas por socialmente
adequadas não poderiam constituir delitos, pois o tipo penal implica em uma seleção de comportamentos
reprováveis cuja sociedade realiza um desvalor da ação e do resultado. Dessa forma, não caberia a
criminalização de comportamentos nos quais não há esse desvalor.
Comporta duas vertentes, reduzindo a abrangência do tipo penal.
1. Se o fato está de acordo com 45119
a norma, mas não está de acordo com o interesse social, a conduta
deverá ser tida como atípica.

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2. Também deve ser direcionado ao legislador. Isso porque, se a conduta está de acordo com a
sociedade, o legislador não pode criminalizar esta conduta, orientando o parlamentar a como
proceder na definição dos bens jurídicos a ser tutelados.

Há 3 correntes sobre a natureza jurídica do princípio da adequação social:

1. Excludente da tipicidade (doutrina majoritária): A adequação social exclui a tipicidade material


da conduta, não seria crime uma vez que a conduta não é socialmente reprovável/é socialmente
adequada. De acordo com Toledo, "a adequação social exclui desde logo a conduta em exame
do âmbito de incidência do tipo, situando-a entre os comportamentos normalmente permitidos,
isto é, materialmente atípicos". O autor cita o exemplo de lesões corporais causadas por um
pontapé em partidas de futebol.
2. Excludente da ilicitude - Há doutrinadores minoritários dizendo que seria uma excludente da
ilicitude (no plano da ilicitude material). O problema é que hoje não se divide mais ilicitude
material e ilicitude formal. Então a tipicidade material da conduta acaba antecipando algumas
análises que seriam feitas na ilicitude.
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3. Regra geral de hermenêutica/princípio geral de interpretação: A jurisprudência caminha de
forma tranquila e dominante no sentido de
45119que a adequação social deve sofrer uma aplicação

restritiva no direito penal, comportando 2 vertentes:


● 1ª vertente – voltada ao legislador (função seletiva) – vertente meramente
orientadora, pois busca orientar o legislador para que esse não selecione condutas
socialmente adequadas para serem criminalizadas.
● 2ª vertente – voltada ao intérprete (função interpretativa limitadora) – traduz uma
regra geral de hermenêutica/ princípio geral de interpretação. Assim, em havendo várias
interpretações possíveis, pela adequação social, exclui a incidência do tipo penal das
hipóteses que são socialmente adequadas.

Há forte crítica na doutrina acerca deste princípio, pelo fato de adotar um critério impreciso, inseguro
e relativo. Importante saber que, segundo o STJ, o princípio da adequação social não afasta a tipicidade da
conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas, como se verifica do enunciado da Súmula 502 do STJ: Súmula
502 - "Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, § 2°,
do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas".

7.3 Princípios Relacionados com o Agente do Fato

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7.3.1 Princípio da Responsabilidade Pessoal / Da Pessoalidade / Da Intranscendência Da Pena


De acordo com esse princípio, a responsabilidade penal é sempre uma responsabilidade pessoal, que
não pode ultrapassar a pessoa do autor do crime, motivo pelo qual se proíbe o castigo penal pelo fato de
outrem. Somente o condenado é que terá de se submeter à sanção que lhe foi aplicada pelo Estado.
No entanto, os efeitos secundários extrapenais da sentença penal condenatória (obrigação de
reparar o dano e decretação de perdimento de bens), podem se estender aos sucessores até o limite da
herança. 45119

Desse princípio decorre:


● OBRIGATORIEDADE DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA ACUSAÇÃO: É proibida a denúncia genérica, vaga ou
evasiva, embora nos Crimes Societários, os Tribunais flexibilizam essa obrigatoriedade;
● OBRIGATORIEDADE DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA.

7.3.2 Princípio da Responsabilidade Subjetiva


Não basta que o fato seja materialmente causado pelo agente, o agente somente pode ser
responsabilizado se o fato tiver sido querido, assumido ou previsto. Não há responsabilidade penal sem dolo
ou culpa.

● 1ª Embriaguez voluntária - Crítica: A teoria da45119


actio libera in causa que permite a punição do agente
completamente embriagado, não sendo a embriaguez acidental, exige não somente uma análise
pretérita da imputabilidade, mas também da consciência e vontade do agente. Exige
responsabilidade subjetiva.
● 2ª Rixa qualificada. *qualificado pela lesão grave e morte. Independentemente de quem tenha
causado a lesão ou morte, todos responderão pela rixa qualificada. Crítica: só responde pelo
resultado agravador, isto é, o crime de lesão, quem atuou com dolo, evitando-se responsabilidade
penal objetiva.

7.3.3 Princípio da Culpabilidade


Só pode o Estado impor sanção penal ao agente imputável (penalmente capaz), com potencial
consciência da ilicitude (possibilidade de conhecer o caráter ilícito do comportamento), quando dele exigível
conduta diversa (podendo agir de outra forma).

7.3.4 Princípio da Proporcionalidade


Exige que se faça um juízo de ponderação sobre a relação existente entre o bem que é lesionado ou
posto em perigo (gravidade do fato) e o bem de que alguém pode ser privado (gravidade da pena). Toda vez
que, nessa relação, houver um desequilíbrio acentuado, haverá desproporção. Ou seja, a pena deve ser
proporcional à gravidade do fato.

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O presente princípio apresenta uma dupla face, pois de um lado proíbe o excesso (garantismo
negativo), enquanto de outro lado não admite a proteção insuficiente (garantismo positivo).
Ressalta-se que o princípio da proporcionalidade incide no plano legislativo, judicial e no da execução
da pena. Segundo tal princípio, a sanção penal deve ser vantajosa para o corpo social, e trazer mais vantagens
do que desvantagens (proporcionalidade em sentido estrito); além disso, deve ser adequada e necessária à
finalidade do direito penal.

7.3.5 Princípio da Limitação das45119


Penas ou da Humanidade
Princípio da humanidade ou princípio da humanidade das penas, nada mais é do que o princípio da
dignidade da pessoa humana no Direito Constitucional. Este princípio é transportado para o Direito Penal, e
ganha uma nomenclatura diferente: humanidade.
Assim, a CF prevê, em seu art. 5º, XLVII, que não haverá penas de morte (salvo em caso de guerra
declarada), de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento ou cruéis.

A Constituição da República proíbe as penas de morte (salvo em caso de guerra declarada) e as consideradas
cruéis (art. 5º, inc. XLVII, alíneas ‘a’ e ‘e’, respectivamente), além de assegurar às pessoas presas o respeito à
integridade física e moral (art. 5º, inc. XLIX). Tais preceitos constitucionais expressam o princípio penal da
HUMANIDADE 45119

7.2.6 Princípio da Confiança


O princípio da confiança, abordado por parte da doutrina, surgiu na Espanha, com aplicação inicial
aos crimes de trânsito. Segundo este princípio, quem atua observando as regras de trânsito, possui o direito
acreditar que as demais pessoas irão agir também de acordo com as normas. Assim, quando aquele que
continua avançando no sinal verde e acaba colidindo com outro veículo que avançou no sinal vermelho, agiu
amparado pelo princípio da confiança, não tendo culpa, já que dirigia na expectativa de que os demais
respeitariam as regras de sinalização.
Atualmente é aplicado no Brasil para os crimes em geral.

Princípio da fraternidade

Com base nesse princípio, o STJ já determinou a progressão de pena (STJ HC 562.452) julgado em
23/04/2020: O princípio da Fraternidade foi usado como fundamentação para decidir pelo cômputo da pena
de maneira mais benéfica ao condenado que é mantido preso em local degradante. Pelo princípio da
fraternidade, foi considerado computar pena em dobro para os presos que estão em situação degradante.
STJ. 5ª Turma. AgRg no RHC 136.961/RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares Da Fonseca, julgado em 15/06/2021.
Esse cômputo da pena em dobro se aplica para todo e qualquer crime? NÃO. O cômputo em dobro foi vedado
para os seguintes crimes: a) crimes contra a vida; b) crimes contra a integridade física; c) crimes sexuais.

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“O Estado deverá arbitrar os meios para que, no prazo de seis meses a contar da presente decisão, se
compute em dobro cada dia de privação de liberdade cumprido no IPPSC, para todas as pessoas ali alojadas,
que não sejam acusadas de crimes contra a vida ou a integridade física, ou de crimes sexuais, ou não
tenham sido por eles condenadas, nos termos dos Considerandos 115 a 130 da presente resolução”. STJ.
5ª Turma. AgRg no RHC 136961-RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 15/06/2021, DJe
21/06/2021 (Info 701).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

- Direito Penal – Parte Geral – Volume 1 – 13ª edição – Cleber Masson;


- Sinopse nº1 – Direito Penal – Parte geral – 7ª edição – Alexandre Salim e Marcelo André de Azevedo;
- Aulas do módulo do professor Delegado de Polícia Marcus Montez;
- Dizer o Direito (https://www.dizerodireito.com.br/);

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LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DE RACISMO

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

Lei 7.716/89 – inteira

● CF/88
⦁ Art. 3º, IV
⦁ Art. 4º, VIII
⦁ Art. 5º, XLII
⦁ Art. 109, V

● OUTROS DIPLOMAS LEGAIS


⦁ Art. 140, §3º, CP
⦁ Art. 310, III, CPP
⦁ Arts. 96, 100 e 15 da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso)
⦁ Art. 1º, parágrafo único, I, 12.288/10
⦁ Art. 8º, da Lei nº 7.853 e art. 88 da Lei 13.146.
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⦁ Art. I, n°1 e art. IV, “a”, Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de
Discriminação Racial (Promulgada pelo Decreto nº 65.810/69)
ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

⦁ Art. 5º, XLII, CF/88


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⦁ Art. 140, §3º, CP
⦁ Art. 310, III, CPP
⦁ Art. 4º, §2º, da Lei nº 7.716/89
⦁ Art. 20, §§2º, 3º e 4º, da Lei nº 7.716/89

1. RACISMO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

É possível conceituar racismo como uma discriminação baseada em percepções sociais e diferenças
biológicas, como ocorre no racismo negro, a partir da esteriotipização de um fenótipo, e sociais.
Em virtude da aversão que tal conduta recebe do ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição
achou por bem colocar, tanto como um dos objetivos fundamentais da República, como em um de seus
princípios regentes das relações internacionais, o repúdio ao terrorismo e racismo e, ainda, um mandado de
criminalização indicando o tratamento que deve ser dado para os crimes de racismo (art. 5°, XLI – a lei punirá
qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdade fundamentais; XLII- a prática do racismo constitui
crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei).

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Diante do exposto, podemos extrair as seguintes conclusões:


✓ O racismo deve ser criminalizado (mandado constitucional de criminalização), não podendo
ser tratado como mera contravenção penal;
✓ O crime de racismo deve ser punido com pena de reclusão;
✓ O crime de racismo deve ser imprescritível;
✓ O crime de racismo deve ser insuscetível de liberdade provisória com fiança.

2. O BEM JURÍDICO TUTELADO PELA LEI Nº 7.716/89

O legislador, em respeito ao comando do constituinte, que impõe a necessidade de um mandado de


criminalização, pretendeu proteger a dignidade da pessoa humana, bem como a igualdade dos indivíduos,
de modo a punir as condutas que visem inviabilizar direitos em razão de discriminação ou preconceito de
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raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

3. CONCEITOS E ALCANCE DA LEI Nº 7.716/89

Art. 1º. Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação
ou preconceito de raça, cor, 45119
etnia, religião ou procedência nacional.

Primeiro, devemos diferenciar dois conceitos importantíssimos: discriminação e preconceito. Apesar


de estarem interligados, são expressões que não se confundem. Veja:

● PRECONCEITO: é um conceito ou sentimento (pré)concebido sem exame crítico ou razão. No


contexto da Lei 7716/89, são concepções (pré)criadas por alguém de modo a desqualificar pessoas
em razão de sua raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Ex.: A julga que B é menos
inteligente e indigno de direitos por ser procedente de determinada região do país.
● DISCRIMINAÇÃO [L.12.288/10 – Estatuto da Igualdade Racial –, art. 1º, parágrafo único, I]: toda
distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional
ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em
igualdade de condições, de Direitos Humanos e liberdades fundamentais nos campos político,
econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada. Portanto, a
discriminação é uma atitude dinâmica, atitude de segregação. É a manifestação do preconceito que
reflete em efetiva diferenciação, sempre em razão dos motivos proibidos em lei. É o preconceito na
forma ativa.
Assim, enquanto o preconceito é estático, sendo apenas um conceito pré-concebido sem um exame crítico,
a discriminação é a própria materialização do preconceito.

a) Raça:
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● Historicamente: raça se traduz como um conceito atrelado às características físicas e biológicas,


como por exemplo, a conformação do crânio, tipo de cabelo, cor da pele etc., coincidentes entre os
indivíduos, que serve para alocá-los em um ou outro grupo. Essa definição é antropológica-biológica
ou restritiva.
● Hodiernamente: O Supremo decidiu que não existem várias raças, existe apenas uma raça, que é a
raça humana.

Em decorrência disso, foi necessário promover uma adequação terminológica pela jurisprudência,
pois, como existe apenas uma raça, é impossível praticar o crime mediante a raça (justamente porque todos
pertencem à mesma raça: humana). No HC 82.424 do STF, julgado histórico que trata da publicação de livros
antissemitas, o STF adotou uma definição jurídica ampliativa do conceito de raça.
Já Convenção Interamericana de Combate ao Racismo, que possui status de emenda constitucional,
se aproxima de uma concepção antropológico-biológica, portanto, restritiva. Contudo, hoje, o melhor
encaminhamento em concursos é posicionar-se ao lado da compreensão ampliativa já adotada pelo STF.
b) Etnia: coletividade de indivíduos que se diferencia por sua especificidade sociocultural,
apresentando relativa homogeneidade cultural, linguística e nas maneiras de agir. Ex.: de grupo social que
apresenta homogeneidade cultural e linguística: comunidade
45119 indígena.
c) Cor: expressão cromática da pele de um indivíduo. A presente lei pune a
discriminação/preconceito fundada na cor da pele. Ex: negros – brancos - amarelos (asiáticos).
d) Religião: crença em uma existência sobrenatural ou em uma existência divina que rege o universo
e/ou as ações humanas, do ponto de vista metafísico, com manifestação por meio de rituais ou cultos. Ex:
católico, protestante etc.

A discriminação baseada no ateísmo é abrangida pela L.7716?


O entendimento majoritário na doutrina é que “ateísmo” não é religião, com isso, essa discriminação
fundada na religião não está correta. Ou seja, o ateu pode ser sujeito ativo da discriminação fundada na
religião, mas não pode ser vítima
45119
dela. Entretanto, depois do posicionamento ampliativo do conceito de
“racismo”, numa visão sociocultural, adotada pelo STF, é certo que o ateu está protegido pela Lei nº 7.716/89.

e) Procedência nacional: exprime a discriminação e o preconceito em relação à origem nacional ou


regional. Logo, XENOFOBIA É RACISMO.
● Formas que pode se manifestar:
⋅ Contra nacionais de Estado-membro diverso, reconhecíveis pelo modo de falar, pela aparência física.
Ex.: cariocas x paulistas x goianos x gaúchos x nordestinos;
⋅ Contra pessoas de região diversa dentro do mesmo estado ou cidade, ainda que de mesma
naturalidade. Ex.: Dono de badalado restaurante na Zona Sul x cliente morador de comunidade.
⋅ Em razão de nacionalidade. Ex.: brasileiro x paraguaio x argentino. Veja abaixo um caso emblemático:
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Procedência nacional – 5ªT.STJ (RHC 19.166, DJ 20/11/2006)


Caso: Voo NY para RJ > desentendimento: passageiro e 2 comissários em razão do
assento. Já em solo nacional, o passageiro solicitou os nomes dos comissários, que
não portavam crachá. Um dos comissários falou para a vítima: “Amanhã vou
acordar jovem, bonito, orgulhoso, rico e sendo um poderoso americano, e você vai
acordar como safado, depravado, repulsivo, canalha e miserável brasileiro”.

STJ: “[...] a intenção dos réus, em princípio, não era precisamente depreciar o
passageiro (a vítima), mas salientar sua humilhante condição em virtude de ser
brasileiro, i.e., a ideia foi exaltar a superioridade do povo americano em
contraposição à posição inferior do povo brasileiro, atentando-se, dessa maneira,
contra a coletividade brasileira. Assim, suas condutas, em tese, subsumem-se ao
tipo legal do art. 20, da Lei 7.716/86”.

f) Orientação Sexual: Se refere ao sentimento de atração de um indivíduo por outras pessoas,


podendo ser do mesmo sexo, do sexo oposto, de ambos os sexos ou ainda sem referência ao sexo ou ao
gênero. 45119

O STF estendeu a aplicação da Lei nº 7.716 às condutas homofóbicas e transfóbicas. A decisão é objeto de
forte crítica doutrinária de alguns, em razão da flexibilização45119do princípio da legalidade em virtude da
permissão de uma analogia “in malam partem” em direito penal, mas também recebe fortes elogios de
outros, em virtude da aplicação da proporcionalidade em sua faceta de vedação a proteção ineficiente.

Conclusão: Apesar de o legislador ter previsto a punição das condutas resultantes de preconceito de
raça, cor, etnia, religião e procedência nacional, o STF estendeu o conceito de raça para realizar a tutela de
condutas perpetradas de forma preconceituosa contra homossexuais e transexuais.

g) Identidade de gênero: identificação dos indivíduos como homem, mulher ou alguma categoria
diferente do masculino e feminino (não binário). É como a pessoa se vê, é a identidade cultural daquele
indivíduo, pouco importando o seu sexo biológico.

4. DESDOBRAMENTOS DA ADOÇÃO DO CONCEITO SOCIOCULTURAL/AMPLIADO DE RACISMO

Art. 5º, CR. (...)


XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à
pena de reclusão, nos termos da lei;

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Para o STF é plenamente possível que a Constituição estabeleça que determinados crimes sejam
imprescritíveis. Isso porque: (i) a CF prevê tal possibilidade no rol dos direitos e garantias individuais, e (ii)
tendo em vista a tamanha a gravidade desse crime, não se pode deixar que fatos delituosos como estes
caíssem em esquecimento. Não se pode apagar da memória do povo.
Parte da doutrina defendia que a imprescritibilidade e a inafiançabilidade impostas pela CR somente
alcançariam o crime de racismo praticado em razão de raça, cor e, para alguns, de etnia. O STF, no julgamento
do HC 82.424/RS determinou que essa aplicabilidade recai sobre quaisquer das formas pelas quais o crime
de racismo seja praticado (raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, orientação sexual e identidade de
gênero).
Importante recordar que, além do racismo, também é imprescritível a ação de grupos armados, civis
ou militares contra a ordem constitucional e estados democráticos (art.5º LXIV da CF). Segundo a maioria da
doutrina, são os crimes previstos na lei de segurança nacional, Lei nº 7.170/83.

● E os atos discriminatórios determinados pelas outras leis (pessoa com deficiência, idoso)?
São imprescritíveis? Se essas condutas forem enquadradas no conceito de racismo, serão
imprescritíveis e inafiançáveis. Não há decisão do STF nesse sentido, portanto, por ora, essas
condutas não devem ser consideradas como racismo.
45119

Em relação ao delito de racismo não é cabível a liberdade provisória com fiança. Se a pessoa foi presa
em flagrante, não cabe pagamento de fiança para a liberdade provisória. No entanto, prevalece o
entendimento de que é cabível a liberdade provisória sem fiança, cumulada ou não com as medidas
cautelares diversas da prisão. Deve-se aplicar o art. 310, III do CPP.

5. CONSIDERAÇÕES INICIAIS GERAIS SOBRE OS CRIMES PREVISTOS NA LEI Nº 7.716/89

a) Condutas: Os verbos utilizados pelo legislador são: Obstar; Impedir; Negar; e Recusar

OBSTAR/IMPEDIR NEGAR/RECUSAR
Impedir é negar o acesso, proibir, obstruir. Negar é recusar-se a atender a pedido ou solicitação,
Obstar é criar obstáculos ou dificuldades, opor-se, ou ainda deixar de prestar serviço ou entregar bem.
causar embaraço. Recusar, igualmente, consiste em deixar de fornecer
serviço ou entregar bem.

b) Elemento subjetivo: Todos os tipos penais da lei são dolosos. Ademais, todos os tipos penais
possuem um especial fim de agir, consistente na discriminação de alguém em razão de raça, cor, etnia,
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religião, procedência nacional, além de orientação sexual e identidade de gênero, por força de orientação
jurisprudencial.

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Ausente o especial fim de agir, a conduta será atípica, como na hipótese de uma brincadeira feita
entre amigos, em que não há a vontade específica de discriminar.

c) Bem Jurídico Tutelado: igualdade.

d) Consumação: Os delitos descritos nos arts. 3º a 14 são formais, ou seja, dispensam a ocorrência do
resultado naturalístico para fins de consumação. Em outras palavras: mesmo que a vítima não se sinta
ofendida o crime estará consumado.

e) Ação penal: Todos os crimes da lei são de ação penal pública incondicionada.

f) Competência: Estadual ou federal, a depender do caso concreto.


Será da Justiça Estadual nos casos dos delitos dos arts. 4º, 5º, 7º a 12 e 14, que se dão,
necessariamente, no âmbito de relações privadas. Por outro lado, a competência será da Justiça Federal, por
exemplo, nos casos adiante mencionados:
∘ No caso do art. 3º (acesso a cargo público), quando o delito ocorrer em órgão federal da
administração direta, bem como em autarquia ou empresa pública federal;
∘ No caso do art. 6º (acesso a estabelecimento de
45119ensino), se a instituição de ensino for federal;
45119
∘ Nos casos do art. 13, que envolve as Forças Armadas;
∘ No caso de internacionalidade do delito (CF, art. 109, V), uma vez que se trata de crime que o Brasil
se obrigou a reprimir, nos termos do art. IV, “a”, da Convenção Internacional Sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial (Decreto n. 65.810/69);

Info. 515-STJ – Conexão probatória (competência) - Em regra, a competência para


processar e julgar o crime de racismo praticado pela internet é do local de onde
partiram as mensagens com base no art. 70 do CPP, tendo em vista que, quando o
usuário da rede social posta a manifestação racista, ele, com esta conduta, já
consuma o crime. Logo, se as condutas delitivas foram praticadas por diferentes
pessoas a partir de localidades diversas, a princípio, a competência para julgar seria
das Justiças localizadas nos locais de onde partiram as mensagens racistas. Todavia,
tais condutas contaram com o mesmo modus operandi, qual seja, troca e postagem
de mensagens de cunho racista e discriminatório contra diversas minorias. Dessa
forma, estando interligadas as condutas, constata-se a existência de conexão
probatória a atrair a incidência dos arts. 76, III, e 78, II, do CPP. Será competente
para julgar conjuntamente os fatos o juízo prevento, ou seja, aquele que primeiro
conheceu dos fatos.

g) Efeitos da condenação: Constituem efeitos NÃO AUTOMÁTICOS, da condenação por crimes da


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presente lei: Perda do cargo ou função pública, para o servidor público e a suspensão do funcionamento do
estabelecimento particular por prazo não superior a três meses (art. 16).
Os efeitos da Lei nº 7.716/89 não excluem a aplicação dos efeitos previstos no Código Penal, desde
que compatíveis.

OBS.1: Todos os crimes têm pena de reclusão até mesmo por mandamento constitucional (art. 5°, XLII - a
prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da
lei), com a seguinte EXCEÇÃO: “Ficará sujeito às penas de multa e de prestação de serviços à comunidade,
incluindo atividades de promoção da igualdade racial, quem, em anúncios ou qualquer outra forma de
recrutamento de trabalhadores, exigir aspectos de aparência próprios de raça ou etnia para emprego cujas
atividades não justifiquem essas exigências.”
OBS.2: Há quem defenda ser incabível a aplicação da suspensão condicional do processo, pois a motivação
da conduta seria incompatível com o benefício. Da mesma forma, defende-se a impossibilidade de aplicação
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do acordo de não persecução penal, pois tal medida seria inadequada e insuficiente para a repressão e
combate a esse tipo de criminalidade.

6. CRIMES EM ESPÉCIE
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Art. 2º-A – Injúria Racial – NOVIDADE LEGISLATIVA!

Novo tipo penal Injúria Racial (deslocamento do conteúdo criminoso para outro tipo penal)

Foi alterado o antigo parágrafo 3° pela Lei n. 14.532/2023 que retira a injúria consistente na utilização
de elementos referente a raça, cor, etnia. Houve aplicação do princípio da continuidade normativo-
típica que significa a manutenção do caráter proibido da conduta, porém com o deslocamento do conteúdo
criminoso para outro tipo penal, ainda que topologicamente ou normativamente diverso do originário. A
intenção é que a conduta permaneça criminosa. Logo, agora é tipificado como racismo a injúria racial,
estando prevista na Lei n. 7.716/89.
Considerações:
● Alteração no quantum da pena: antes era 1 a 3 anos previsto no Código Penal, agora a pena é de
reclusão 2 a 5 anos.
● Trata-se de uma novatio legis in pejus. A Lei 14.532/23 é irretroativa, não alcançando fatos pretéritos,
em estrita obediência ao art. 1º do CP.

Não há mais dúvida, portanto, de que essa forma de injúria deve sofrer as mesmas
consequências do crime de racismo: imprescritibilidade, inafiançabilidade e incondicionalidade da ação
penal pública!!!

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Lei n. 14.532/23, Art. 2º-A Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o


decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional. (Incluído pela Lei
nº 14.532, de 2023)
Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº
14.532, de 2023)
Parágrafo único.
45119
A pena é aumentada de metade se o crime for cometido
mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas. (Incluído pela Lei nº 14.532, de
2023)
Atente-se que a pena é AUMENTADA de METADE se o crime for cometido mediante concurso de 2
(duas) ou mais pessoas!

E a injúria praticada por homotransfobia? Onde se situa nesse contexto? De acordo com autores
e delegados Bruno Gilaberte e Francisco Sanini, apesar da ausência de previsão expressa, cuida-se de
situação atinente ao art. 2º-A, da Lei 7.716, conclusão é inexorável, face ao decidido pelo STF na ADO 26 e
no MI 4.733.

6.1. Art. 3º - Acesso a cargo público 45119

No delito de “Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da


Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos” há um elemento
normativo do tipo: pessoa devidamente habilitada. O juiz vai verificar se o sujeito estava habilitado e a recusa
se deu por conta da discriminação.
A lei menciona apenas em cargo, não mencionando emprego ou função pública. Nesse caso temos
divergência possibilitando dois entendimentos.

⋅ 1ª corrente: (Victor Eduardo Rios Gonçalves + José Paulo Baltazar Jr. e Gabriel Habib): Essa corrente
entende que emprego público não está abrangido pelo art. 3º, pois seria uma analogia in malam
partem. Assim, permaneceria um crime subsidiário - art. 20, na modalidade praticar;
⋅ 2ª corrente: (Nucci): Essa segunda posição defende que o dispositivo abrange o emprego público,
far-se-á uma interpretação extensiva, porque o espírito da lei é o mesmo.

6.2. Art. 4º - Emprego em empresa privada

Art. 4º Negar ou obstar emprego em empresa privada.

a) Art. 4º, caput - Emprego em empresa privada: obstar ou negar emprego, não abrangendo uma prestação
de serviço eventual, empreitada etc., pois exige a relação de emprego. Por “empresa privada” entende-se
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sociedade ou individual, comercial ou civil, ainda que irregular ou de fato. Inclui profissionais liberais. Não
inclui: sindicatos, cooperativas, fundações, condomínios e serviços domésticos.

b) Art. 4º, §1º, I - É crime próprio, (pessoa encarregada do fornecimento dos equipamentos indispensáveis,
e que os dispensa por critérios “racistas”). O empregador negro que deixa de fornecer equipamento ao
empregado branco, em razão de critérios de raça, cor, etnia, religião, etc., comete o delito.

c) Art. 4º, §1º, II - Um crime próprio, portanto será a pessoa que tem o poder de permitir ou não a ascensão.

d) Art. 4º, §1º, III - Não significa que é somente quanto ao salário, pode ser outro tipo de diferenciação.

e) Art. 4º, §2º - Anúncios e recrutamento


Crime próprio (responsável pelo recrutamento). 45119

As penas previstas são multa e prestação de serviços à comunidade, incluindo atividades de


promoção da igualdade racial. Parte da doutrina sustenta que o §2º do art. 4º padece de
inconstitucionalidade, pois violou o mandado constitucional de criminalização que impõe o apenamento
obrigatório com pena de reclusão.
O art. 4º, §2º, da Lei nº 7.716/89 prevê penas restritivas
45119 de direitos autônomas (quebrando a tradição
de serem substitutivas das penas privativas de liberdade). Não conversibilidade em PPL (nem em caso de
recalcitrância conversão em multa).

6.3. Art. 5º - Acesso a estabelecimento comercial

Art. 5º Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a


servir, atender ou receber cliente ou comprador.

É um tipo alternativo misto, pois há uma negativa de receber, servir. É um crime subsidiário em
relação aos arts. 7º-10, pois ele não especifica quais são esses estabelecimentos.

ATENÇÃO: A lei não dá preferência a grupos historicamente estigmatizados. Ela vale para todos. Logo,
também é crime impedir a entrada de um branco num estabelecimento por discriminação, por exemplo.

6.4. Art. 6º - Ingresso em instituição de ensino

Art. 6º Recusar, negar ou impedir a inscrição ou ingresso de aluno em


estabelecimento de ensino público ou privado de qualquer grau.

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Com relação à elementar normativa, “estabelecimento público ou privado de ensino de qualquer


grau” são aquelas instituições inseridas no sistema nacional de ensino (Lei nº 9.394/96 – Lei de Diretrizes e
Bases da Educação), bem como as instituições que participem do processo de formação intelectual das
pessoas, tais como cursos de idiomas, cursos preparatórios para concurso, dentre outros.

6.5. Art. 7º - Acesso ou hospedagem em hotéis e similares

Art. 7º Impedir o acesso ou recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem, ou


qualquer estabelecimento similar.

Tipo alternativo misto. Ex.: A impede o acesso de B a determinado hotel. Após a resistência inicial, A
consente com o ingresso de B, mas recusa-lhe hospedagem.
Sujeitos: próprio (recusar hospedagem - quem detém poder suficiente para recusar a hospedagem.
Ex.: proprietário, gerente etc.) e comum (impedir hospedagem – pode ser praticado por qualquer pessoa).
Crime formal: O mero impedimento de acesso ou a recusa de hospedagem em hotel já configura o
tipo.
Qualquer estabelecimento similar: albergue, hostel, motel, pousada, pensionatos.
E residências alugadas para temporada, por exemplo,
45119 por meio do Booking ou Airbnb? NÃO, porque
NÃO têm as mesmas características, mas pode se enquadrar no dispositivo subsidiário (art. 20).

6.6. Art. 8º - Acesso a restaurantes e similares


45119

Art. 8º Impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurantes, bares,


confeitarias, ou locais semelhantes abertos ao público.
Pena: reclusão de um a três anos.

É um tipo alternativo misto. Ex.: A impede o acesso de B a determinado bar. Após a resistência inicial,
A consente com o ingresso de B, mas recusa-lhe atendimento.
Interpretação analógica [ex.: cafeteria, sorveteria]. Aplicável para serviços de “delivery”, “takeaway”
e “drive thru”, pois a expressão “atendimento” tem acepção mais ampla.

6.7. Art. 9º - Acesso a locais de diversão ou clubes sociais

Art. 9º Impedir o acesso ou recusar atendimento em estabelecimentos esportivos,


casas de diversões, ou clubes sociais abertos ao público.
Pena: reclusão de um a três anos.

Tipo alternativo misto.


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Obs.: clubes sociais abertos ao público são os de livre acesso de qualquer pessoa, mediante
pagamento de ingresso.

Cuidado, pois esse crime não abrange os clubes mantidos por associações. [Ex: Associação Goiana do MP]
ou clubes sociais privados, pois a frequência somente pode ser feita por sócios previamente selecionados
(ex.: só ingressa quem for indicado por outro sócio. A seleção que pode levar em conta múltiplos critérios,
mas jamais fatores de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional. (RHC 12.809/MG, Rel. Min. Hamilton
Carvalhido, 6ªT. STJ, DJ 11/04/2005).

OBS.1: “Face control” e “dress code”: A princípio não é crime, salvo se esse controle estiver vinculado a
algum elemento racial.

6.8. Art. 10 – Acesso a salões de cabeleireiros ou similares

Art. 10. Impedir o acesso ou recusar atendimento em salões de cabeleireiros,


barbearias, termas ou casas de massagem ou estabelecimento com as mesmas
finalidades.
Pena: reclusão de um a três anos.
45119

6.9. Art. 11 – Acesso a entrada ou elevador social

Art. 11. Impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e


elevadores ou escada de acesso aos mesmos:
Pena: reclusão de um a três anos.

45119

Cuidado 1: O art. 11 não é aplicado ao fato de uma placa ser colocada elevador social com os dizeres:
“empregadas domésticas, apenas no elevador de serviço”, pois não há ofensa à raça, cor, etnia, religião,
procedência nacional. Isso ocorre porque a lei não criminaliza o preconceito de classe social ou preconceito
profissional.
Cuidado 2: “negros, apenas no elevador de serviço”. Nesse caso temos uma segregação coletiva, de
modo que se aplica o art. 11 da Lei.
Não há crime:
✓ Restrição de acesso às entradas sociais ou uso do elevador social, com base em outros
critérios [mudanças; carrinhos de compras; animais; trajes de banho];
✓ Se for em relação a edifícios comerciais, aplica-se o art. 20.

6.10. Art. 12 – Acesso ou uso de transportes públicos

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Art. 12. Impedir o acesso ou uso de transportes públicos, como aviões, navios
barcas, barcos, ônibus, trens, metrô ou qualquer outro meio de transporte
concedido.
Pena: reclusão de um a três anos.

OBS.1: No caso de Táxi? Haverá o crime? Sim, pois dada a autorização do poder público: “qualquer
outro meio de transporte concedido”.
OBS.2: Não incide esse crime quanto ao transporte privado, por exemplo Uber (nesse caso, aplica-se
o art. 20). Também não incide esse dispositivo quanto ao impedimento de acesso ao meio de transporte
público em razão de lotação ou de ausência de dinheiro para pagar a passagem.

6.11. Art. 13 – Acesso ao serviço público militar

Art. 13. Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das
Forças Armadas.
Pena: reclusão de dois a quatro anos.

Sujeito ativo: é um crime próprio, quem possua


45119 incumbência de admitir o ingresso de alguém ao

serviço militar. Pode ser tanto um funcionário subalterno, encarregado da seleção, como um alto dirigente
das Forças Armadas.
Esse tipo incriminador abrange as carreiras militares (polícia militar e bombeiros) estaduais?
Sobre esse questionamento temos 2 correntes.
⋅ 1ª corrente: Não, essa corrente se fundamenta na CF, no art. 142 dizendo que as Forças Armadas,
são constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, sendo que polícia militar e bombeiro
não estão englobados. Sendo que para essas pessoas serão aplicados
45119
os art. 3º ou 20. Essa primeira
corrente é majoritária.
⋅ 2ª corrente: Sim, essa corrente se fundamenta na CF, art. 144, §6º, diz que as polícias militares e
corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, portanto engloba bombeiros
e a polícia militar.

6.12. Art. 14 – Casamento ou convívio familiar e social

Art. 14. Impedir ou obstar, por qualquer meio ou forma, o casamento ou


convivência familiar e social.
Pena: reclusão de dois a quatro anos.

∘ Por “Meio”: entende-se como o impedimento de frequência a casa ou a imposição de condições que
impeçam o casamento. Como exemplo o não consentimento em razão de o sujeito ser negro.
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∘ “Forma”: entende-se a ação praticada mediante violência ou ameaça, coação, fraude e, mesmo,
remoção física, como no caso em que a vítima é levada por familiares a outro país, de modo a impedir
o casamento ou o convívio com pessoa de etnia diversa.
∘ “Convivência familiar”: abrange a união estável - inclusive homoafetiva.
∘ “Convivência social”: abrange qualquer forma de contato mais próximo, fora do âmbito familiar.
Exemplo, a amizade.

6.13. Art. 20.

Atenção! Alteração no art. 20 da Lei com acréscimo da qualificadora para crimes cometidos por
intermédio de publicação em redes sociais e da rede mundial de computadores e, ainda, no contexto de
atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público.

Art. 20. Praticar,


45119
induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor,
etnia, religião ou procedência nacional.
Pena: reclusão de um a três anos e multa.
§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas,
ornamentos, distintivos ou propaganda
45119
que utilizem a cruz suástica ou gamada,
para fins de divulgação do nazismo.
Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.
§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos
meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza:
§ 2º Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido por intermédio dos
meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de
computadores ou de publicação de qualquer natureza: (Redação dada pela Lei nº
14.532, de 2023) (novidade legislativa!)
Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.
§ 2º-B Sem prejuízo da pena correspondente à violência, incorre nas mesmas penas
previstas no caput deste artigo quem obstar, impedir ou empregar violência
contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas. (Incluído pela Lei nº
14.532, de 2023) (novidade legislativa!)
§ 3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério
Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de
desobediência: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)
§ 3º No caso do § 2º deste artigo, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério
Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de
desobediência: (Redação dada pela Lei nº 14.532, de 2023) (novidade
legislativa!)
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I - o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material


respectivo;
II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou
da publicação por qualquer meio;
III - a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede
mundial de computadores.
§ 4º Na hipótese do §2º, constitui efeito da condenação, após o trânsito em julgado
da decisão, a destruição do material apreendido.

Alteração do parágrafo 2º

Parágrafo 2° 45119
Parágrafo 2°
ANTES DA LEI DEPOIS DA LEI
§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é § 2º Se qualquer dos crimes previstos neste artigo
cometido por intermédio dos meios de for cometido por intermédio dos meios de
comunicação social ou publicação de qualquer comunicação social, de publicação em redes
natureza: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de sociais, da rede mundial de computadores ou de
15/05/97) publicação de qualquer natureza:
45119 (Redação dada
pela Lei nº 14.532, de 2023)

O § 2º do art. 20 já existia antes mesmo da Lei 14.532/2023. A partir da novidade legislativa da Lei
14.532/2023 o que houve foi um acréscimo de elementos na qualificadora (especificamente): “de publicação
em redes sociais, da rede mundial de computadores”.
Para uma parcela da doutrina esse artigo 20 é inócuo, motivo pelo qual ele fere o princípio da
taxatividade. Apesar dessa crítica, esse dispositivo é majoritariamente aceito e aplicado com alguma
frequência, pois é tido como um TIPO SUBSIDIÁRIO.
Ou seja: deve ser utilizado quando a conduta não se subsumir a nenhum dos tipos penais
anteriores, mas ainda assim caracterizar crime de preconceito)
Note que os verbos “induzir” e “incitar (instigar)” são crimes autônomos. Assim, se A induz B a
impedir o acesso de alguém a ônibus público, em virtude da cor de sua pele (art. 12), A será autor do delito
do art. 20, em vez de partícipe no crime de B.

Art. 20- A e Art.20-B: Novas de causas de aumento em contexto ou com intuito de descontração, diversão
ou recreação ou praticados por funcionário público

NOVIDADE LEGISLATIVA!
Art. 20-A. Os crimes previstos nesta Lei terão as penas aumentadas de 1/3
(um terço) até a metade, quando ocorrerem em contexto ou com intuito de
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descontração, diversão ou recreação. (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)


Art. 20-B. Os crimes previstos nos arts. 2º-A e 20 desta Lei terão as penas
aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade, quando praticados por funcionário
público, conforme definição prevista no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
1940 (Código Penal), no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-
las. (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

Considerações:
● Nova causa de aumento do art. 20-A dispõe: “os crimes previstos nesta lei...”. Isso quer dizer
que inclusive na injúria racial tal causa de aumento pode ser aplicável. Não se trata de causa
de aumento específica do art. 20, mas sim de toda Lei do Crime Racial (Lei 7.716/1989).
● Os crimes previstos nos arts. 2º-A (injúria racial) e 20 (racismo – tipo genérico) desta Lei terão
as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade (1/2), quando praticados por
funcionário público, conforme definição prevista no Código Penal (ou seja, conforme o art.
327 do CP), no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las.

Atenção! Contexto ou intuito de brincadeira: Animus Jocandi está tipificado na Lei do Crime Racial
(Lei 7.716/1989)? SIM, inclusive com causa de aumento!
45119 Antes existia uma divergência.

Art. 20-C e art. 20- D: Interpretação da lei e obrigatoriedade de advogado ou defensor público nos atos
processuais cíveis e criminais para as vítimas de crimes de racismo

NOVIDADE LEGISLATIVA!

Art. 20-C. Na interpretação desta Lei, o juiz deve considerar como


discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos
minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou
exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão
da cor, etnia, religião ou procedência. (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)
Art. 20-D. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a vítima dos crimes
de racismo deverá estar acompanhada de advogado ou defensor
público. (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023)

45119
Por fim, a Lei nº 14.532 que modificou a lei 7.716 entra em vigor na data de sua publicação, qual
seja, 11.01.2023.

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META 2

DIREITO PROCESSUAL PENAL: NOÇÕES INICIAIS E PRINCÍPIOS

Olá pessoal, antes de começar o estudo do material, é importante destacar que, em 2023, o STF
julgou as ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305 que questionavam alterações no Código de Processo Penal (CPP)
pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019).

No julgamento, a Corte estabeleceu:

1) Implantação do juiz das garantias cuja competência será limitada até o OFERECIMENTO da denúncia,
sendo o juiz INVESTIDO na função e cabendo-lhe determinar a realização de diligências suplementares,
para o fim de dirimir dúvida relevante no julgamento do mérito, NÃO se aplicando aos processos de
competência originária dos tribunais, tribunal do júri, violência doméstica e infrações de menor
potencial ofensivo (art. 3ª-A, 3ºB, 3º-C, art. 3º-E);

2) Controle judicial dos atos praticados pelo Ministério Público, sob pena de nulidade (art. 3º-B), incluindo
a submissão do arquivamento à análise da autoridade45119
judicial, que poderá submeter à revisão da instância
ministerial em caso de patente ilegalidade (art. 28 e art. 28-A);

3) Videoconferência poderá ser utilizada de forma excepcional para realização da audiência de custódia
(art. 3º-B e art. 310);

4) Prorrogação do inquérito policial, mediante decisão judicial, mesmo estando o investigado preso,
sendo que a inobservância dos prazos, não implica na revogação automática da prisão (art. 3º-B, §2º);

5) Encaminhamento dos autos ao juiz da instrução (art. 3º-D);

6) NÃO haverá alteração do juiz sentenciante que conheceu de prova declarada inadmissível (art. 157,
§5º).

1. PROCESSO PENAL CONSTITUCIONAL


45119

O Processo Penal Brasileiro deve observância às normas previstas na Carta Magna. Devem as normas
processuais serem interpretadas a partir de uma filtragem constitucional. Nesse sentido, é possível falar em
algumas características decorrentes da constitucionalização:
● O juiz não pode requisitar provas, depois da manifestação pelo arquivamento feita pelo MP (STF);

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● O juiz não pode substituir o MP em sua função probatória, em que pese, certa liberdade de produção
conferida ao juiz pelo CPP;
● O interrogatório do réu deve perder a sua característica de prova, passando a ser fundamentalmente
meio de defesa.

Se a perspectiva teórica do Código de Processo Penal era nitidamente autoritária, prevalecendo


sempre a preocupação com a segurança pública, como se o Direito Penal constituísse verdadeira política
pública, a Constituição da República de 1988 caminhou em direção diametralmente oposta.
Enquanto a legislação codificada pautava-se pelo princípio da culpabilidade e da periculosidade do
agente, o texto constitucional instituiu um sistema de amplas garantias individuais, a começar pela afirmação
da situação jurídica de quem ainda não tiver reconhecida a sua responsabilidade penal por sentença
condenatória passada em julgado: "Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença
penal condenatória” (art. 5º, LVII, CF).
Nesse sentido, a constituição deve passar a ser a pré-compreensão valorativa do intérprete o dever
ser normativo do mundo real, que é o ser. Nesta direção é o que o professor Rubens Casara propõe a
interpretação prospectiva do processo penal, ou seja, toda a interpretação deve ter por objetivo a
construção do projeto constitucional, deve buscar a radical e incansavelmente, a realização de valores
consagrados na constituição. 45119

Como decorrência da interpretação prospectiva do processo penal, há uma preocupação com a


tutela de direitos fundamentais, o que dá espaço ao garantismo penal. Ressalta-se que o autor Ferrajoli é o
ícone do garantismo. Princípios do sistema garantista:
● Jurisdicionalidade (nulla poena, nulla culpa sine iudicio): representa a exclusividade do poder
jurisdicional, direito ao juiz natural, independência da magistratura e exclusiva submissão à lei.
● Inderrogabilidade do juízo: no sentido de infungibilidade e indeclinabilidade da jurisdição.
45119
● Separação das atividades de julgar e acusar (nullum iudicium sine accusatione);
● Presunção de inocência;
● Contraditório (nulla probatio sine defensione): é um método de confrontação da prova e
comprovação da verdade entre acusação e defesa.

2. PRETENSÃO PUNITIVA

● Conceito: No momento em que alguém pratica a conduta delituosa prevista no tipo penal,
este direito de punir desce do plano abstrato e se transforma no jus puniendi in concreto. O Estado, que até
então tinha um poder abstrato, genérico e impessoal, passa a ter a pretensão concreta de punir o suposto
autor do fato delituoso.

Surge então a pretensão punitiva: que é o poder do Estado de exigir de quem comete um delito a
submissão à sanção penal, tornando efetivo o ius puniendi.
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45119
Ex.: art. 121, CP → pena de 6 a 20 anos (direito de punir em abstrato).
A partir do momento que alguém pratica o delito, o direito de punir deixa o plano abstrato e entra
no plano concreto, de modo que surge para o Estado o direito de punir o indivíduo. Nasce a pretensão
punitiva.

Infrações penais de menor potencial ofensivo: o fato de ser admitida transação penal, com a imediata
aplicação de penas restritivas de direito ou multas não quer dizer uma imposição direta da pena. Trata-se de
uma forma distinta da tradicional para a resolução da causa, sendo admitida a solução consensual com
supervisão jurisdicional – privilegiando a vontade das partes.

● Função do Processo Penal: É o instrumento que se vale o Estado para a imposição de sanção penal
ao possível autor do fato delituoso.
- Finalidades do Processo Penal:
⋅ Pacificação social obtida com a solução do conflito;
⋅ Viabilizar a aplicação do direito penal;
⋅ Garantir ao acusado, presumidamente inocente, meios de defesa diante de uma
acusação. 45119

3. SISTEMAS DO PROCESSO PENAL

De modo geral, a doutrina costuma separar o sistema processual inquisitório do acusatório pela
titularidade atribuída ao órgão da acusação: inquisitorial seria o sistema em que as funções de acusação e de
julgamento estariam reunidas em uma só pessoa (ou órgão), enquanto o acusatório seria aquele em que tais
papéis estariam reservados a pessoas (ou órgãos) distintos.

a) SISTEMA INQUISITÓRIO: As funções de acusar e julgar estão concentradas em um mesmo sujeito


processual.
Nesse sistema há a perda da imparcialidade do magistrado, o qual, simultaneamente, exerce todas
as funções (acusa, defende e julga). Além disso, verifica-se o risco de eventual abuso de poder (crítica).
Ademais, no sistema inquisitório a gestão da prova cabe ao juiz, podendo fazê-lo tanto na fase
inquisitorial quanto na fase do processo. Nesse sentido, verifica-se a inexistência do contraditório.
São características, ainda, o caráter escrito e sigiloso da instrução processual.

Características:
i. As funções de acusar, defender e julgar se encontram concentradas em uma única pessoa, o
chamado de juiz inquisidor;

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SEMANA 01/12

ii. Não há que se falar em contraditório, o qual nem sequer seria concebível em virtude da falta de
contraposição entre acusação e defesa;
iii. O juiz inquisidor é dotado de ampla iniciativa probatória, de modo que possui liberdade para
determinar, de ofício, a colheita de provas, seja no curso das investigações, seja no curso do processo
45119

penal, independentemente de sua proposição pela acusação ou pela defesa, de modo que a gestão
das provas compete ao juiz que, a partir da prova do fato e tomando como parâmetro a lei, podia
chegar à conclusão que desejasse;
iv. Vigora o princípio da verdade real/material e, em decorrência dele, o acusado não era considerado
sujeito de direito, sendo tratado, em verdade, como mero objeto do processo, daí por que se admitia,
inclusive, a tortura como meio de se obter a verdade absoluta.

Na atualidade, a concentração de poderes nas mãos do juiz e a iniciativa probatória dela decorrente
é incompatível com a ordem constitucional e convencional, notadamente ao sistema acusatório (CF, art. 129,
I) e à garantia da imparcialidade (CADH, art. 8º, n. 1). Com a reforma (Lei 13.964/19), o STF, por maioria,
decidiu dar INTERPRETAÇÃO CONFORME ao art. 3º-A do CPP para assentar que o juiz, pontualmente, nos
limites autorizados, pode determinar a realização de diligências suplementares, para o fim de dirimir dúvida
relevante no julgamento do mérito (ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305).
45119

b) SISTEMA ACUSATÓRIO: As funções serão exercidas por partes distintas. As funções de acusar,
defender e julgar são atribuídas a pessoas diversas. No referido sistema haverá respeito ao contraditório.
O acusado deixa de ser considerado mero objeto e passa a configurar como sujeito de direitos.
A gestão da prova cabe às partes e, em um sistema acusatório puro, o juiz não poderia produzir
qualquer prova de ofício. Porém, parte da doutrina aduz que o juiz pode produzir prova de ofício, restrito a
fase processual e de forma residual, não sendo permitida a produção, contudo, na fase investigatória.
São características, ainda, a prevalência do caráter público e oral da instrução processual.

Características:
i. Caracteriza-se pela presença de partes distintas, contrapondo-se acusação e defesa em igualdade de
condições e ambas se sobrepondo um juiz, de maneira equidistante e imparcial. Aqui, há uma
separação das funções de acusar, defender e julgar. O processo caracteriza-se, assim, como legítimo
actum trium personarum.
ii. A gestão da prova recai precipuamente sobre as partes. Na fase investigatória, o juiz só deve intervir
quando provocado.

Obs. O STF declarou, por maioria, a CONSTITUCIONALIDADE do caput do art. 3º-B, e, por unanimidade, fixou
o prazo de 12 (doze) meses, a contar da data da publicação da ata do julgamento, para que sejam adotadas
as medidas legislativas e administrativas necessárias à adequação das diferentes leis de organização

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judiciária, à efetiva implantação e ao efetivo funcionamento do juiz das garantias em todo o país, conforme
diretrizes do CNJ.

iii. Oralidade, publicidade, aplicação do princípio da presunção de inocência, atividade probatória


pertence às partes, separação rígida entre juiz e acusação, paridade entre acusação e defesa.

Antes do advento da Lei 13.964/19, havia divergência na doutrina:


● Geraldo Prado - afirma que, em um sistema acusatório puro, o juiz não pode produzir provas de ofício
de maneira nenhuma, independentemente de ser na fase investigatória ou na fase processual.
● Eugênio Paccelli, Gustavo Badaró (posição majoritária e Jurisprudência) - juiz pode produzir prova de
ofício, mas apenas na fase processual e desde que de forma residual.

Em outras palavras: O magistrado não será o protagonista na produção de provas, sua atuação deve
ter caráter complementar e subsidiário. Nesse sentido, o art. 212 do CPP:

Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha,


não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação
com a causa ou importarem 45119
na repetição de outra já respondida. Parágrafo único.
Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição.

No entanto, o Pacote Anticrime retirou do juiz a iniciativa probatória (Art.3º-A do CPP), entregando
ao juiz de garantias a competência para decidir sobre a produção de provas cautelares durante a
investigação.

CPP. Art. 3º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do
juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de
acusação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)
45119

Contudo, no julgamento das ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305, o STF conferiu interpretação conforme
ao dispositivo, para assentar que o juiz, pontualmente, nos limites autorizados, pode determinar a realização
de diligências suplementares, para o fim de dirimir dúvida relevante no julgamento do mérito.

iv. O princípio da verdade real é substituído pelo princípio da busca da verdade, devendo a prova ser
produzida com fiel observância ao contraditório e a ampla defesa;
v. A separação das funções e a iniciativa probatória residual à fase judicial preserva a equidistância que
o magistrado deve tomar quanto ao interesse das partes, sendo compatível com a garantia da
imparcialidade e com o princípio do devido processo legal;
vi. O sistema acusatório é o adotado pela Constituição Federal e pelo CPP.
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A função de acusar nas ações penais públicas é do Ministério Público, materializando assim o sistema
45119
acusatório, haja vista que a própria CF outorgou a titularidade da persecução penal ao referido órgão, por
excelência.

SISTEMA INQUISITÓRIO SISTEMA ACUSATÓRIO


Não há separação das funções de acusar, defender e Separação das funções de acusar, defender e julgar. Por
julgar, que estão concentradas em uma única pessoa, consequência, caracteriza-se pela presença de partes
que assume as vestes de um juiz inquisidor. distintas (actum trium personarum), contrapondo-se
acusação e defesa em igualdade de condições,
sobrepondo-se a ambas um juiz, de maneira
equidistante e imparcial.

Como se admite o princípio da verdade real, o O princípio da verdade real é substituído pelo princípio
acusado não é sujeito de direitos, sendo tratado da busca da verdade, devendo a prova ser produzida
como mero objeto do processo, daí por que se admite com fiel observância ao contraditório e à ampla defesa.
inclusive a tortura como meio de se obter a verdade 45119

absoluta.

O juiz inquisidor é dotado de ampla iniciativa A gestão da prova recai precipuamente sobre as partes.
acusatória e probatória, tendo liberdade para Na fase investigatória, o juiz só deve intervir quando
determinar de ofício a colheita de elementos provocado, e desde que haja necessidade de intervenção
informativos e de provas, seja no curso das judicial.
investigações, seja no curso da instrução processual.

Durante a instrução processual, o juiz tem iniciativa A separação das funções e a iniciativa probatória residual
probatória, podendo determinar a produção de restrita à fase judicial preserva a equidistância que o juiz
provas de ofício. Há disparidade de poderes entre deve tomar quanto ao interesse das partes, sendo
acusação e defesa e verifica-se o caráter escrito e compatível com a CF/88. Além disso, deve ser
secreto da instrução. assegurada a paridade entre acusação e defesa.

c) SISTEMA MISTO, ACUSATÓRIO FORMAL OU FRANCÊS: É uma fusão dos dois modelos anteriores.
Segundo Renato Brasileiro, é chamado de sistema misto porquanto o processo se desdobra em duas
fases distintas: a primeira fase é tipicamente inquisitorial, com instrução escrita e secreta, sem acusação e,
por isso, sem contraditório. Nesta, objetiva-se apurar a materialidade e a autoria do fato delituoso. Na
segunda fase, de caráter acusatório, o órgão acusador apresenta a acusação, o réu se defende e o juiz julga,
vigorando, em regra, a publicidade e a oralidade.
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#DICA DD: Quando o CPP entrou em vigor, havia o entendimento de que ele era misto, sendo o inquérito
policial a primeira fase. Porém, com o advento da CF/88 e do Pacote Anticrime deixou de maneira expressa
o sistema acusatório, além da separação das funções de acusar, defender e julgar, assegurando o
contraditório e a ampla defesa, e o princípio da presunção de não culpabilidade, trata-se de um sistema
acusatório.

4. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO PROCESSO PENAL

4.1 Princípios Constitucionais Explícitos

4.1.1 Princípio da Presunção da Inocência

a) Previsão legal: art. 5°, LVII, CF/88 e art. 8°, §2°, CADH.

Observações:
● CADH possui status normativo supralegal, ou seja, está abaixo da CF, mas acima da legislação
infraconstitucional; 45119

● Sempre que se faz uma leitura da legislação infraconstitucional, deve-se sujeitá-la tanto ao controle
de constitucionalidade quanto ao controle de convencionalidade;
● Ao contrário da CF/88, a Convenção Americana fala em presunção de inocência, e o faz de maneira
45119

muito semelhante aos outros tratados internacionais de direitos humanos.

#DICA DD: Há quem utilize como sinônimos as expressões: presunção de inocência, presunção de não
culpabilidade e estado de inocência.

b) Conceito: Segundo o autor Renato Brasileiro, o princípio da presunção de inocência: “consiste no


direito de não ser declarado culpado, senão após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, ao
término do devido processo legal, em que o acusado tenha se utilizado de todos os meios de prova
pertinentes para a sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas
pela acusação (contraditório)”.
Segue explicando o doutrinador: “No ordenamento pátrio, até a entrada em vigor da CF/88, esse
princípio somente existia de forma implícita, como decorrência da cláusula do devido processo legal. Com a
CF 88, o princípio da presunção de não culpabilidade passou a constar expressamente do inciso LVII do art.
5º” (LIMA, 2017, p. 43).

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c) Dimensões: O princípio da presunção de inocência (ou presunção de não culpabilidade) compreende


duas regras fundamentais:

1. Dimensão INTERNA ao processo: O princípio da presunção de inocência se manifestando dentro do


processo.
I- Regra probatória (in dubio pro reo): A parte acusadora tem o ônus de demonstrar a
culpabilidade do acusado além de qualquer dúvida razoável, logo, não é o acusado que deve
comprovar sua inocência;
II- Regra de tratamento: o Poder Público está impedido de agir e de se comportar em relação
ao acusado como se ele já houvesse sido condenado.

2. Dimensão EXTERNA ao processo: O princípio da presunção de inocência se manifestando fora do


processo. Essa dimensão é especialmente destacada no tratamento dado pela imprensa. O princípio
da presunção de inocência e as garantias constitucionais da imagem, dignidade e privacidade
demandam uma proteção contra a publicidade abusiva e a estigmatização do acusado, funcionando
como limites democráticos à abusiva exploração midiática em torno do fato criminoso e do próprio
processo judicial.
45119

Caso J. vs. Peru

Esse caso foi decisão da Corte Interamericana de Direitos


45119
Humanos. Nesse, a Corte responsabilizou
o Peru por violação ao estado de inocência, previsto no art. 8.2 da CADH.
A Sra. J. foi presa durante o cumprimento de medida de busca e apreensão residencial. Foi
processada por terrorismo e associação ao terrorismo, em virtude de suposta vinculação com o grupo
armado Sendero Luminoso. Foi absolvida em junho de 1993. Logo após ser solta, deixou o território peruano.
Em dezembro do mesmo ano, a Corte Suprema Peruana cassou a sentença absolutória, determinou um novo
julgado e decretou sua prisão.
Para a CIDH, os distintos pronunciamentos públicos das autoridades estatais, sobre a culpabilidade
de J. violaram o estado de inocência, princípio determinante que o Estado não condene, nem mesmo
informalmente, emitindo juízo perante a sociedade e contribuindo para formar a opinião pública, enquanto
não existir decisão judicial condenatória.
Para a Corte, a apresentação da imagem da acusada para a imprensa, escrita e televisiva, ocorreu
quando ela estava sob absoluto controle do Estado, além de as entrevistas posteriores também terem sido
levadas a cabo sob conhecimento e controle do Estado, por meio de seus funcionários. A Corte acentuou não
impedir o estado de inocência que as autoridades mantenham a sociedade informada sobre investigações
criminais, mas requer que isso seja feito com a discrição e a contextualização necessárias, de tal modo a
garantir o estado de inocência.

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Assim, fazer declarações públicas, sem os devidos cuidados, sobre processos penais, gera na
sociedade a crença sobre a culpabilidade do acusado.

Consequências de tais regras:


● Ônus da prova: em regra da acusação.
45119

● Prisões cautelares: a privação cautelar da liberdade de locomoção somete se justifica em hipóteses


estritas, ou seja, a regra é que o acusado permaneça em liberdade durante o processo, enquanto
que a imposição de medidas cautelares pessoais é a exceção.

d) Limite temporal: Até quando o sujeito é presumidamente inocente?


Em 2016, no bojo do HC 126.292, o Plenário do STF entendeu que, a partir do momento que um
acórdão condenatório fosse proferido por um Tribunal de 2ª Instância, a pena já poderia ser executada,
mesmo na pendência de REsp ou RE. Essa prisão a que o indivíduo estaria sendo submetido seria uma prisão
penal, e não prisão cautelar.
Ou seja, o STF passou a defender que a execução provisória da pena após a confirmação da sentença
em segundo grau não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência. Isso porque a
manutenção da sentença condenatória pela segunda instância encerra a análise de fatos e provas que
assentaram a culpa do condenado, o que autoriza o45119
início da execução da pena, até mesmo porque os
recursos extraordinários ao STF e ao STJ comportam exclusivamente discussão acerca de matéria de direito.
A decisão do STF acima foi muito criticada pela doutrina, tendo em vista que a CF é clara ao prever
“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado (...)”, não havendo margens para outra
interpretação.
Em 2019 houve overruling e o STF decidiu que o cumprimento da pena somente pode ter início com
o esgotamento de todos os recursos. Portanto, atualmente, é proibida a execução provisória da pena.
Vale ressaltar que é possível que o réu seja preso antes do trânsito em julgado (antes do esgotamento
de todos os recursos), no entanto, para isso, é necessário que seja proferida uma decisão judicial
individualmente fundamentada, na qual o magistrado demonstre que estão presentes os requisitos para a
prisão preventiva previstos no art. 312 e art. 313 do CPP.
Dessa forma, o réu até pode ficar preso antes do trânsito em julgado, mas cautelarmente
(preventivamente), e não como execução provisória da pena.

Atenção! A nova decisão do STF é vinculante? SIM. A decisão do STF foi proferida em ADC, que declarou a
constitucionalidade do art. 283 do CPP.

Para o STF, é possível o início do cumprimento da pena caso somente reste o julgamento de recurso sem
efeito suspensivo (ex.: só falta julgar Resp ou RE)? É possível a execução provisória da pena?

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Até fevereiro de 2009, o STF entendia que era possível


a execução provisória da pena.
1ª PERÍODO Assim, se o réu estivesse condenado e interpusesse
ATÉ FEV/2009: recurso especial ou recurso extraordinário, teria que
SIM iniciar o cumprimento provisório da pena enquanto
É POSSÍVEL A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA aguardava o julgamento.

No dia 05/02/2009, o STF, ao julgar o HC 84078


(Rel. Min. Eros Grau), mudou de posição e passou a
entender que não era possível a execução provisória da
pena.
Obs.: o condenado poderia até aguardar o julgamento
do REsp ou do RE preso, mas desde que estivessem
previstos os pressupostos necessários para a prisão
2ª PERÍODO preventiva (art. 312 do CPP).
DE FEV/2009 A FEV/2016: Dessa forma, ele poderia ficar preso, mas
NÃO cautelarmente (preventivamente), e não como
NÃO É POSSÍVEL A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA execução
45119 provisória da pena.
PENA Principais argumentos:
• A prisão antes do trânsito em julgado da condenação
somente pode ser decretada a título cautelar.
• A execução da sentença após o julgamento do recurso
de apelação significa restrição do direito de defesa.
• A antecipação da execução penal é incompatível com
o texto da Constituição.
Esse entendimento durou até fevereiro de 2016.
No dia 17/02/2016, o STF, ao julgar o HC 126292 (Rel.
Min. Teori Zavascki), retornou para a sua primeira
posição e voltou a dizer que era possível a execução
provisória da pena.
Principais argumentos:
• É possível o início da execução da pena condenatória
após a prolação de acórdão condenatório em 2º grau e
isso não ofende o princípio constitucional da presunção

45119
da inocência.
• O recurso especial e o recurso extraordinário não
possuem efeito suspensivo (art. 637 do CPP). Isso

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SEMANA 01/12

significa que, mesmo a parte tendo interposto algum


desses recursos, a decisão recorrida continua
produzindo efeitos. Logo, é possível a execução
provisória da decisão recorrida enquanto se aguarda o
3º PERÍODO: julgamento do recurso.
DE FEV/2016 A NOV/2019: • Até que seja prolatada a sentença penal, confirmada
SIM em 2º grau, deve-se presumir a inocência do réu. Mas,
É POSSÍVEL A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA após esse momento, exaure-se o princípio da não
culpabilidade, até porque os recursos cabíveis da
decisão de segundo grau ao STJ ou STF não se prestam
a discutir fatos e provas, mas apenas matéria de direito.
• É possível o estabelecimento de determinados limites
ao princípio da presunção de não culpabilidade. Assim,
45119 a presunção da inocência não impede que, mesmo
antes do trânsito em julgado, o acórdão condenatório
produza efeitos contra o acusado.
• A execução da pena na pendência de recursos de
natureza
45119 extraordinária não compromete o núcleo
essencial do pressuposto da não culpabilidade, desde
que o acusado tenha sido tratado como inocente no
curso de todo o processo ordinário criminal,
observados os direitos e as garantias a ele inerentes,
bem como respeitadas as regras probatórias e o
modelo acusatório atual.
• É necessário equilibrar o princípio da presunção de
inocência com a efetividade da função jurisdicional
penal. Neste equilíbrio, deve-se atender não apenas os
interesses dos acusados, como também da sociedade,
diante da realidade do intrincado e complexo sistema
de justiça criminal brasileiro.
• “Em país nenhum do mundo, depois de observado o
duplo grau de jurisdição, a execução de uma
condenação fica suspensa aguardando referendo da
Suprema Corte”.

No dia 07/11/2019, o STF, ao julgar as ADCs 43, 44 e 54


(Rel. Min. Marco Aurélio), retornou para a sua segunda

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SEMANA 01/12

posição e afirmou que o cumprimento da pena somente


45119

4º PERÍODO: pode ter início com o esgotamento de todos os


recursos.
ENTENDIMENTO ATUAL: Assim, é proibida a execução provisória da pena.
NÃO Vale ressaltar que é possível que o réu seja preso antes
NÃO É POSSÍVEL A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA do trânsito em julgado (antes do esgotamento de todos
PENA os recursos), no entanto, para isso, é necessário que
seja proferida uma decisão judicial individualmente
fundamentada na qual o magistrado demonstre que
estão presentes os requisitos para a prisão preventiva
previstos no art. 312 do CPP.
Dessa forma, o réu até pode ficar preso antes do
trânsito em julgado, mas cautelarmente
(preventivamente), e não como execução provisória da
pena.
Principais argumentos:
• O art. 283 do CPP, com redação dada pela Lei nº
12.403/2011,
45119 prevê que “ninguém poderá ser preso
senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada da autoridade judiciária competente,
em decorrência de sentença condenatória transitada
em julgado ou, no curso da investigação ou do
processo, em virtude de prisão temporária ou prisão
preventiva.”. Esse artigo é plenamente compatível com
a Constituição em vigor.
• O inciso LVII do art. 5º da CF/88, segundo o qual
“ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória”, não deixa
margem a dúvidas ou a controvérsias de interpretação.
• É infundada a interpretação de que a defesa do
princípio da presunção de inocência pode obstruir as
atividades investigatórias e persecutórias do Estado. A
repressão a crimes não pode desrespeitar e transgredir
a ordem jurídica e os direitos e garantias fundamentais
dos investigados.

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SEMANA 01/12

• A Constituição não pode se submeter à vontade dos


poderes constituídos nem o Poder Judiciário embasar
suas decisões no clamor público.

Tabela via @dizerodireito para facilitar a compreensão sobre evolução jurisprudencial deste tema.

4.1.2 Princípio da Igualdade Processual ou Paridade de Armas

As partes devem ter em juízo as mesmas oportunidades de atuação no processo e devem ser tratadas
de forma igualitária, na medida da sua igualdade. Segundo Norberto Avena (2017, p. 53): “Tal princípio
constitui desdobramento da garantia constitucional assegurada no art. 5.º, caput, da Constituição Federal,
ao dispor que todas as pessoas serão iguais perante a lei em direitos e obrigações. Não obstante o sistema
constitucional vigente seja proibitivo de discriminações, em determinadas hipóteses é flexibilizado o
princípio da igualdade”.

4.1.3 Princípio da Ampla Defesa

Segundo Renato Brasileiro (2017, p. 54), a ampla


45119 defesa pode ser vista como um direito sob a ótica

de que privilegia o interesse do acusado, todavia, sob o enfoque publicístico, no qual prepondera o interesse
geral de um processo justo, é vista como garantia.
A ampla defesa divide-se em autodefesa e defesa técnica:
45119

● AUTODEFESA: é aquela exercida pelo próprio acusado, em momentos cruciais do processo.


Compreende:
1. Direito de audiência;
2. Direito de presença;
3. Capacidade postulatória autônoma.

1. Direito de audiência: É o direito de ser ouvido no processo. Ou seja: é o momento que o acusado
tem para apresentar a sua versão dos fatos e tentar formar a convicção do magistrado quanto a sua
inocência.

Obs.: Quando estudarmos o interrogatório judicial, veremos que, hoje, na visão da doutrina, o interrogatório
judicial tem natureza jurídica de meio de defesa. Isso porque, no interrogatório, ele tem o direito de ficar em
silêncio.

2. Direito de presença: Direito de estar presente/acompanhar os atos processuais.

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SEMANA 01/12

E se o acusado estiver preso em outra unidade da federação. Ainda assim ele tem assegurado o
direito de presença? R.: SIM! O direito de presença é universal. O direito não deixa de valer só porque o
acusado está preso em outro lugar.
45119
Atualmente, o art. 185, §2°, CPP, permite a realização de audiência mediante videoconferência.
Assim, a videoconferência preserva o direito de presença, ao mesmo tempo que evita o deslocamento do
preso.
Ressalta-se que, embora a doutrina garantista entenda que a inobservância deste direito deveria
acarretar nulidade absoluta, a jurisprudência vem entendendo que se trata de nulidade relativa, devendo-se
comprovar o prejuízo.

Obs.: O direito de presença tem natureza relativa. Ou seja, há situações em que o direito de presença pode
causar constrangimento à vítima ou às testemunhas. Nesse caso, se não for possível realizar a audiência
mediante videoconferência, o acusado será retirado da audiência. Se for essa a decisão do magistrado, deve
haver fundamentação, e essa fundamentação deve constar da ata da audiência para evitar futura nulidade.

Revela-se lícita a retirada dos acusados da sala de audiências, se as testemunhas


de acusação demonstram temor e receio em depor na presença dos réus. Se o
patrono do paciente não apresentou
45119 nenhuma irresignação quanto aos termos da
assentada, havendo assinado e concordado com seu conteúdo, resulta preclusa a
arguição de qualquer vício a macular o ato de ouvida das testemunhas de acusação.
Ordem denegada”. (STF, 1ª Turma, HC 86.572/PE, Rel. Min. Carlos Britto, j.
06/12/2005, DJ 30/03/2008)

3. Capacidade postulatória autônoma do acusado: Devido à importância da liberdade de locomoção,


o ordenamento jurídico confere ao acusado uma capacidade postulatória autônoma para praticar
certos atos processuais, ainda que ele não seja profissional da advocacia. Ou seja: mesmo que o
acusado não seja advogado, ele pode praticar alguns atos processuais.
Ex.: o acusado pode interpor recursos; provocar incidentes da execução (livramento condicional,
progressão de regime, etc.); impetrar habeas corpus.

● DEFESA TÉCNICA: Direito de ser representado por advogado.


A defesa técnica é indisponível e irrenunciável. Mesmo que o acusado, desprovido de capacidade
postulatória, queira ser processado sem defesa técnica, e ainda que seja revel, deve o juiz providenciar a
nomeação de defensor.

Aspectos da ampla defesa:

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Positivo: representa a efetiva utilização dos instrumentos, dos meios e modos de produção,
esclarecimento ou confrontação de elementos de prova relacionados à materialidade da infração
criminal e à autoria;
● Negativo: impede a produção de elementos probatórios de elevado risco ou com potencialidade
danosa à defesa do réu.

Consequências da ampla defesa:


● Apenas o réu tem direito à revisão criminal, nunca a sociedade;
● O juiz deve sempre fiscalizar a eficiência da defesa do réu.

Há possibilidade de o acusado exercer sua própria defesa técnica? R.: Desde que o acusado seja
profissional da advocacia, ou seja, desde que esteja regularmente inscrito nos quadros da OAB.
É possível o patrocínio da defesa técnica de dois ou mais acusados pelo mesmo defensor. Em outras
palavras: Um único advogado pode defender 2 ou mais acusados? R.: SIM! Mas desde que não haja
colidência de teses pessoais. Ex.: A e B estão sendo acusados do mesmo crime. Um único advogado pode
defendê-los, mas desde que as teses de defesa sejam semelhantes. Se A ou B negarem ser autor do delito,
há colidência de interesses pessoais. Obs.: Cabe ao juiz e ao MP fiscalizarem isso.
45119

4.1.4 Princípio da Plenitude da Defesa

Aplicado especificamente ao Tribunal do Júri.


● A atenção do juiz com a efetividade da defesa do réu deve ser ainda maior;
● É possível apresentar nova tese na tréplica;
45119
● Ampliação do tempo de defesa nos debates sem que igual direito seja concedido ao MP.

4.1.5 Princípio do In Dubio Pro Reo

Envolve regra de tratamento que milita em favor do acusado. O juiz só pode proferir decreto
condenatório se não existirem dúvidas acerca da autoria e materialidade do delito, sendo indispensável um
juízo de certeza para a condenação.
Se houver dúvida na interpretação de determinado artigo de lei processual penal, deve ser
privilegiada a interpretação que beneficie o réu.

🡺 É possível a pronúncia do acusado baseada exclusivamente em elementos informativos obtidos na


fase inquisitorial?

- STJ: NÃO. Haverá violação ao art. 155 do CPP. Além disso, muito embora a
análise aprofundada seja feita somente pelo Júri, não se pode admitir, em um
80
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Estado Democrático de Direito, a pronúncia sem qualquer lastro probatório


colhido sob o contraditório judicial, fundada exclusivamente em elementos
informativos obtidos na fase inquisitorial. STJ. 5ª Turma. HC 560.552/RS, Rel. Min.
Ribeiro Dantas, julgado em 23/02/2021. STJ. 6ª Turma. HC 589.270, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 23/02/2021 (Info 638).

-STJ: SIM. Na pronúncia opera o princípio in dubio pro societate, porque é a favor
da sociedade que se resolvem as dúvidas quanto à prova, pelo Juízo natural da
causa. Constitui a pronúncia, portanto, juízo fundado de suspeita, que apenas e
tão somente admite a acusação. Não profere juízo de certeza, necessário para a
condenação,
45119 motivo pelo qual a vedação expressa do art. 155 do CPP não se aplica
à referida decisão. STJ. 5ª Turma. AgRg no AgRg no AREsp 1702743/GO, Rel. Min.
Joel Ilan Paciornik, julgado em 15/12/2020. STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp
1609833/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 06/10/2020.

Para o professor Renato Brasileiro, deve ser adotado o primeiro posicionamento (LIMA, Renato
Brasileiro de. Manual de Processo Penal: volume único. 8ª ed. rev. atual. e ampl. Editora JusPodivm. Salvador.
2020. p. 1471): 45119

Destarte, a nosso ver, havendo dúvidas quanto à existência do crime ou quanto à


presença de indícios suficientes, deve o juiz sumariante impronunciar o acusado,
aplicando o in dubio pro reo. Nesse contexto, como já se pronunciou o Supremo, o
aforismo in dubio pro societate jamais vigorou no tocante à existência do próprio
crime, em relação à qual se reclama esteja o juiz convencido. Por isso, diante da
conclusão dúbia de laudo pericial, que concluiu pela impossibilidade de se
determinar a causa da morte investigada, somada à contradição entre a versão
apresentada pelo acusado e a da irmã da vítima, concluiu o Supremo que, diante
da dúvida do juiz sumariante acerca da existência de homicídio, não seria possível
que o acusado fosse pronunciado sob o pálio do in dubio pro societate.

Esquematizando
STJ. 5ª Turma. HC 560.552/RS, Rel. Min. STJ. 5ª Turma. AgRg no AgRg no AREsp
Ribeiro Dantas, julgado em 23/02/2021. 1702743/GO, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
STJ. 6ª Turma. HC 589.270, Rel. Min. julgado em 15/12/2020.
Sebastião Reis Júnior, julgado em STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 1609833/RS,
23/02/2021 (Info 638). Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em
06/10/2020.

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NÃO: É ilegal a sentença de pronúncia SIM. É possível admitir a pronúncia do


fundamentada exclusivamente em acusado com base em indícios derivados do
elementos colhidos no inquérito policial. inquérito policial, sem que isso represente
afronta ao art. 155.

#DICA DD QUE VAI CAIR:

Na fase de pronúncia deve-se adotar a teoria RACIONALISTA da prova, na qual não deve haver critérios de
valoração das provas rigidamente definidos na lei, no entanto, por outro lado, o juízo sobre os fatos deve
ser pautado por critérios de lógica e racionalidade, podendo ser controlado em âmbito recursal ordinário.
Para a pronúncia, não se exige uma certeza além da dúvida razoável, necessária para a condenação.
Contudo, a submissão de um acusado ao julgamento pelo Tribunal do Júri pressupõe a existência de um
lastro probatório consistente no sentido da tese acusatória. Ou seja, requer-se um standard probatório
um pouco inferior, mas ainda assim dependente de uma preponderância de provas incriminatórias. STF.
2ª Turma. ARE 1067392/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 26/3/2019 (Info 935).

Atenção! Não se afirma que o STF abandonou a aplicação


45119
do princípio do in dubio pro societate na fase de
pronúncia. Ocorre que, nesse julgado em análise, segundo o voto do Min. Gilmar Mendes, as testemunhas
que incriminavam o réu eram apenas testemunhas de “ouvir dizer”. A jurisprudência entende que a
testemunha de “ouvir dizer” – conhecida no direito norte-americano como hearsayrule – não produz um
depoimento confiável e, portanto, não serve como indício de autoria.
O testemunho por ouvir dizer (hearsayrule), produzido somente na fase inquisitorial, não serve como
fundamento exclusivo da decisão de pronúncia, que submete o réu a julgamento pelo Tribunal do Júri. STJ.
6ª Turma. REsp 1373356-BA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

4.1.6 Princípio do Contraditório ou Bilateralidade da Audiência

É o direito de ser intimado e se manifestar sobre fatos e provas.

Art. 5º, LV, da CF: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios
e recursos a ela inerentes”.

Elementos: 45119

● Direito à informação – parte adversa deve estar ciente da existência da demanda ou dos argumentos
da parte contrária.

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● Direito de participação – possibilidade de a parte oferecer reação, manifestação ou contrariedade à


pretensão da parte contrária.
● Direito e obrigatoriedade de assistência técnica de um defensor

Nesse sentido, a parte tem direito à informação (por isso a grande importância dos atos de
comunicação, citação, intimação e notificação) e o direito à participação (a parte precisa ter o direito de
contrariar). Portanto, o contraditório seria a necessária informação às partes e a possível reação a atos
desfavoráveis.

Espécies:
● Contraditório para a prova (contraditório real): É o contraditório realizado na formação do elemento
de prova, sendo indispensável que sua produção ocorra na presença do órgão julgador e das partes.
⋅ Ex.: Prova testemunhal. A prova testemunhal é produzida em contraditório real, pois ambas
as partes estarão presente para acompanhar a produção da prova, podendo questionar as
testemunhas, não apenas quanto a sua credibilidade, mas também quanto aos fatos.
● Contraditório sobre a prova (contraditório diferido/postergado): É a atuação do contraditório após
a formação da prova.
⋅ Ex.: Interceptação telefônica. É claro 45119
que o acusado e seu advogado jamais podem tomar
ciência antecipada quanto a uma interceptação telefônica em curso. Nesse caso, o
contraditório será conferido quando concluída a interceptação. Portanto, concluída a
interceptação, a mídia será juntada aos autos, assim como eventual relatório e laudo de
gravação. É nesse momento que a defesa poderá exercer o contraditório.

4.1.7 Princípio da Publicidade

Trata-se de um princípio claramente ligado ao caráter democrático do processo penal. Isso porque,
a partir do momento que se assegura o princípio da publicidade, a ideia é de que a publicidade vai
proporcionar o controle da sociedade sobre a atividade jurisdicional.
Alguns doutrinadores dizem que o princípio da publicidade funciona como uma garantia de segundo
grau ou garantia de garantia (Ferrajoli). Garantia de segundo grau porque, na verdade, a publicidade
proporciona o controle sobre outras garantias. Assim, a partir do momento em que se dá publicidade ao
processo, analisa-se se as outras garantias também foram respeitadas (ex.: juiz natural, contraditório, ampla
defesa, etc.).

45119
● Previsão legal: art. 93, IX, CF/88, art. 5°, LX, CF/88, art. 8°, 5, CADH, art. 792, CPP.

● Regra: Publicidade ampla, permitindo a todos o acesso ao processo e não apenas às partes e aos
procuradores.
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Dessa publicidade ampla se extrai 3 direitos:


1) Direito de assistência à realização dos atos processuais: o público, as partes e os advogados
podem acompanhar os atos processuais;
2) Direito de narração dos atos processuais: da mesma forma que pode assistir, pode descrever
os atos processuais;
3) Consulta dos autos: qualquer pessoa pode acessar os autos.
Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! Maria, advogada de João, compareceu à Delegacia de
Polícia da Circunscrição XX, e requereu vista do Inquérito Policial nº 123, no qual seu cliente figurava como
um dos investigados. O requerimento foi negado pelo delegado de polícia sob o argumento de que a
investigação dizia respeito a uma perigosa organização criminosa, o que levou à decretação do sigilo, para
que fosse assegurado o êxito das investigações.
A decisão está: incorreta, pois deveria ser assegurado o direito de acesso aos elementos já documentados,
associados ao direito de defesa.

#DICA DD: Súmula vinculante N. 14- STF: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso
amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão
com competência de polícia judiciária, que digam respeito
45119 ao exercício do direito de defesa.

Art. 7º, XIV, EOAB. É direito do advogado (...) XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por
conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza,
findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos,
em meio físico ou digital.
§ 10. Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar procuração para o exercício dos direitos de que
trata o inciso XIV.
§ 11. No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos
elementos de prova relacionados a diligências em andamento45119
e ainda não documentados nos autos, quando
houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências.

● Exceção: Publicidade restrita, com fundamento na própria CF/88 que prevê, em algumas situações,
a possibilidade de restrição da publicidade. Será uma publicidade restrita apenas às partes e a seus
advogados ou, apenas, a seus advogados. Pois, vez ou outra, o direito à intimidade deve prevalecer
sobre o direito à informação.

Atenção! Na visão dos Tribunais Superiores o segredo de justiça está dentro da cláusula de reserva de
jurisdição (STF: MS 27.483/DF), ou seja, quando o segredo de justiça for decretado pelo juiz, somente o
próprio juiz ou uma autoridade jurisdicional superior poderá remover esse segredo de justiça.

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Ex.: CPI dos grampos. A CPI quis ter acesso a todos os processos que tinham interceptação telefônica. O STF
não deixou, pois, se há interceptação telefônica, é uma hipótese de publicidade restrita, então somente uma
autoridade jurisdicional pode remover o segredo de justiça.

STF - MS 27.483/DF: “Comissão


45119
Parlamentar de Inquérito não tem poder jurídico
de, mediante requisição, a operadoras de telefonia, de cópias de decisão nem de
mandado judicial de interceptação telefônica, quebrar sigilo imposto a processo
sujeito a segredo de justiça. Este é oponível a Comissão Parlamentar de Inquérito,
representando expressiva limitação aos seus poderes constitucionais”. (STF,
Tribunal Pleno, MS 27.483/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 192 09/10/2008).

4.1.8 Princípio da Vedação das Provas Ilícitas

É vedado o uso de provas ilícitas no processo.

Art. 5º, LVI, da CF: São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios
ilícitos. 45119

O reconhecimento da prova ilícita ou da prova ilegítima que enseja a nulidade absoluta tem como
consequência imediata o desentranhamento dos autos e sua inutilização, para que não se possa influenciar
indevidamente o convencimento do magistrado.

Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! No curso da instrução processual penal, verifica-se que
uma das provas colhidas fora obtida de forma ilegal. Essa ilegalidade é alegada pela defesa, e o Ministério
Público manifesta-se concordando com a ilegalidade apontada. O juízo reconhece a ilegalidade da prova em
decisão fundamentada. Com base no exposto, é correto afirmar que o juízo: deverá determinar o
desentranhamento da prova ilícita, assim como aquelas direta e exclusivamente decorrentes dela e, uma vez
preclusa a decisão, determinar a destruição das provas, prosseguindo nos demais atos processuais. (Item
considerado correto pela banca).

#DICA DD: Aproveitando a temática, no julgamento das quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs
6298, 6299, 6300 e 6305) que questionavam alterações no Código de Processo Penal (CPP) pelo Pacote
Anticrime (Lei n. 13.964/2019), entre elas a criação do juiz das garantias, o STF declarou o art. 157 do CP
INCONSTITUCIONAL por maioria: § 5º do art. 157 do CPP, incluído pela Lei n. 13.964/2019.
Obs.: vencido, em parte, o Ministro Cristiano Zanin, que propunha interpretação conforme ao dispositivo.

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Cuidado! O que deve ser desentranhado dos autos é a PROVA, e não os autos processuais que fazem
menção à prova ilícita. Assim já decidiu o STF:

As peças processuais que fazem referência à prova declarada ilícita não devem
ser desentranhadas do processo. Se determinada prova é considerada ilícita, ela
deverá ser desentranhada do processo. Por outro lado, as peças do processo que
fazem referência a essa prova (exs.: denúncia, pronúncia etc.) não devem ser
desentranhadas e substituídas. A denúncia, a sentença de pronúncia e as demais
peças judiciais não são "provas" do crime e, por essa razão, estão fora da regra que
determina a exclusão das provas obtidas por meios ilícitos prevista art. 157 do CPP.
Assim, a legislação, ao tratar das provas ilícitas e derivadas, não determina a
45119
exclusão de "peças processuais" que a elas façam referência. STF. 2ª Turma. RHC
137368/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 29/11/2016 (Info 849).

Contudo, a prova ilícita NÃO será inutilizada quando:


1) Pertencer licitamente a alguém;
2) Prova ilícita consistir no próprio corpo de delito em relação àquele que praticou um crime para obtê-
la. 45119

Obs.: O STF começou a admitir, excepcionalmente, a utilização da prova ilícita em benefício do réu inocente
que produziu prova para a sua absolvição.

A temática será aprofundada quando tratarmos da Teoria Geral das Provas.

4.1.9 Princípio da Economia Processual, Celeridade Processual e Duração Razoável Do Processo

Trata-se do princípio que ensejou a edição da EC 45/04, responsável por introduzir a razoável
duração do processo enquanto direito fundamental no art. 5, LXXVII, CF.
Assim, a duração razoável do processo corresponde à busca pelo equilíbrio: o processo não pode ser
moroso ao ponto de ensejar a impunidade, mas também não tão célere de modo a inobservar as garantias
do acusado.
Apresenta algumas consequências:
● As prisões cautelares devem persistir por tempo razoável, enquanto presentes as necessidades;
● Possibilidade de utilizar a carta precatória itinerante;
● A suspensão do processo, havendo questão prejudicial, só deve ser feita quando há caso de difícil
solução.

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SEMANA 01/12

4.1.10 Princípio do Devido Processo Legal

É um princípio expressamente previsto na Constituição Federal.

Art. 5, LIV, da CF - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal.

“O devido processo legal é o estabelecido em lei, devendo traduzir-se em sinônimo


de garantia, atendendo assim aos ditames constitucionais. Com isto, consagra-se a
necessidade do processo tipificado, sem a supressão e/ou desvirtuamento de atos
essenciais” (TÁVORA, 2017, p. 68).

Subdividido em:
45119

● Aspecto material ou substancial: Ninguém será processado, senão por crime previsto em lei;
● Aspecto processual ou procedimental: Atrelado à possibilidade de produzir provas.

4.1.11 Juiz Imparcial ou Natural


45119

a) Previsão constitucional: art. 5°, XXXVII e LIII, CF/88.

Art. 5º, XXXVII, da CF: não haverá juízo ou tribunal de exceção;


Art. 5º, LIII, da CF: ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridade competente;

b) Conceito: Consiste no direito que cada cidadão possui de conhecer antecipadamente a autoridade
jurisdicional que o processará e o julgará. A ideia do juiz natural está relacionada com a imparcialidade. Isso
porque, a partir do momento em que a competência é estabelecida de maneira prévia e abstrata, de certa
forma é possível proteger a imparcialidade daquele magistrado.

c) Regras de Proteção que derivam do Juiz Natural: Do princípio do juiz natural derivam 3 regras
fundamentais:
● Só podem exercer jurisdição os órgãos instituídos pela Constituição;
● Ninguém pode ser julgado por órgão instituído após o fato;
● Entre os juízes pré-constituídos vigoram regras de competência que excluem qualquer tipo de
discricionariedade.

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Obs.1: Convocação de juízes de 1º grau para substituir desembargadores não viola o princípio do juiz
natural desde que observadas as diretrizes legais federais ou estaduais, conforme o caso (STJ, 5ª Turma, HC
111.919/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 18/11/2008, Dje 02/02/2009).

Obs.2: Julgamento por turma (ou câmara) composta, em sua maioria, por juízes convocados não viola o
princípio do juiz natural (STF, Pleno, HC 96.821/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 08/04/2010).

O tema será aprofundado na temática de Competência, tendo em vista que são assuntos
diretamente ligados entre si.

4.2 Princípios Constitucionais Implícitos

4.2.1 Princípio do Nemo Tenetur Se Detegere (Princípio De Que Ninguém Está Obrigado A Produzir Prova
Contra Si Mesmo)

a) Conceito: A garantia da não autoincriminação consiste no direito de não produzir prova contra si
próprio, essa garantia vem sendo muito cobrada em prova no termo em latim “nemo tenetur se detegere”
que está positivado no artigo 8º, “g”, do Pacto de São45119
José da Costa Rica, garantindo à pessoa o “direito de
não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada”.

b) Previsão Normativa:

Na CF/88 (art. 5º, LXIII), através da menção ao direito ao silêncio, que é um dos desdobramentos do
princípio do nemo tenetur se detegere:

Art.5º, LXIII, CF - O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de


permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

Na CADH (art.8º, item 2, alínea “g”):

Artigo 8º, item 2, CADH – (...) durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena
igualdade, às seguintes garantias mínimas:(...) g) direito de não ser obrigado a
depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada; e

c) Titularidade: A CF faz referência ao preso, mas como se trata de um direito fundamental, a


interpretação deve ser feita de maneira extensiva. Desta forma, o titular é o indivíduo suspeito, investigado,
indiciado pela autoridade policial bem como o acusado pelo MP, pouco importa se está preso ou solto.
● Abrange o suspeito, investigado, indiciado ou o acusado.
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Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! O direito processual penal é regido por diversos
princípios, dentre os quais o do nemo tenetur se detegere, pelo qual ninguém será obrigado a produzir prova
contra si mesmo.
45119
Com base no princípio em questão e na jurisprudência dos Tribunais Superiores: apenas o
preso poderá valer-se do direito ao silêncio, não se estendendo tal proteção aos investigados.(Item
considerado incorreto pela banca).

● A testemunha tem a obrigação de dizer a verdade, sob pena de responder pelo crime de falso
testemunho. Entretanto, se das perguntas a ela formuladas puder resultar uma autoincriminação,
também poderá invocar este princípio (Info 754 STF).
● O imputado deve ser advertido acerca do direito de não produzir prova contra si mesmo, sob pena
de ilicitude das provas obtidas.

Art. 5º, LXIII, da CF - O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de
permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.

O exercício do direito ao silêncio não pode servir de fundamento para


descredibilizar o acusado 45119
nem para presumir a veracidade das versões
sustentadas por policiais, sendo imprescindível a superação do standard
probatório próprio do processo penal a respaldá-las. STJ. REsp 2.037.491-SP, Rel.
Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 6/6/2023.
(Info 780)

d) Desdobramentos do Princípio da Não Autoincriminação

1) Direito ao silêncio: Consiste no direito de não responder às perguntas formuladas pela


autoridade, funcionando como espécie de manifestação passiva de defesa. É uma forma de se
exercer a autodefesa.

2) Inexigibilidade de dizer a verdade ou direito de mentir: Cuidado! Mentiras defensivas são


toleradas pelo ordenamento jurídico, porém mentiras agressivas, incriminadoras de terceiro
NÃO estão sob o manto do direito de defesa.

3) Direito de não praticar qualquer comportamento ativo que possa incriminá-lo: Consiste no
direito de não adotar comportamentos ativos que colaborem com a atividade persecutória do
Estado.

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Por comportamento ativo, entende-se um “fazer” por parte do acusado, a exemplo do fornecimento
do padrão vocal para realização de exame de espectrograma; fornecimento de material escrito para exame
grafotécnico; exame de bafômetro.
Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! O direito processual penal é regido por diversos
princípios, dentre os quais o do nemo tenetur se detegere, pelo qual ninguém será obrigado a produzir prova
45119

contra si mesmo. Com base no princípio em questão e na jurisprudência dos Tribunais Superiores: as provas
que exijam comportamento passivo do investigado não poderão ser produzidas sem sua concordância; (Item
considerado incorreto pela banca).

Atualmente, há teste de bafômetro ativo (não é obrigado a realizar, pois pode acarretar
autoincriminação) e teste de bafômetro passivo, em que é colocado um objeto próximo ao agente, capaz de
captar, por meio da respiração, o teor alcoólico. Este último, por não demandar qualquer comportamento
do agente, pode ser realizado, mesmo contra sua vontade.
Tratando-se de comportamentos passivos, em que o agente se sujeita a prova, não há proteção do
referido princípio, a exemplo do reconhecimento de pessoas e coisas.

O STF entendeu que o direito a não autoincriminação não assegura ao acusado o direito de ocultar ou falsear
a sua identidade (1ªT, RE n2 561.704, Rel. Min. Ricardo45119
Lewandowski, DJe 64 02/04/2009).

No mesmo sentido, o STJ, possui entendimento sumulado. SUM 522: A conduta de atribuir-se falsa
identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa.

Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! O direito processual penal é regido por diversos
princípios, dentre os quais o do nemo tenetur se detegere, pelo qual ninguém será obrigado a produzir prova
contra si mesmo. Com base no princípio em questão e na jurisprudência dos Tribunais Superiores: atribuição
de falsa identidade pelo suspeito ou investigado, ainda que em situação de autodefesa, configura fato típico.
(Item considerado correto pela banca).

4) Direito de não produzir nenhuma prova incriminadora invasiva: O direito de não se


autoincriminar (nemo tenetur se detegere) é garantia fundamental de um Estado Democrático de Direito e
deve ser observado de forma que, caso violado, a prova obtida será considerada ilícita. As intervenções
corporais (investigação corporal ou ingerência humana) são medidas de investigação que se realizam sobre
o corpo das pessoas, sem a necessidade do consentimento destas.
Os exemplos de intervenções corporais são diversos, como exame de sangue, ginecológico,
identificação dentária, endoscopia, exame do reto, entre outras tantas perícias como o exame de matérias
fecais, de urina, de saliva, exames de DNA usando fios de cabelo, identificações datiloscópicas de impressões
dos pés, unhas e palmar e também a radiografia.

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DELEGADO SANTA CATARINA

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Ocorre que, para que a prova seja considerada lícita, deve-se observar a forma de coleta da mesma:
invasiva ou não invasiva à luz do direito de não produzir prova contra si mesmo.
● Invasivas: são as intervenções corporais que pressupõem penetração no organismo humano, por
instrumentos ou substâncias, em cavidades naturais ou não, implicando na utilização (ou extração)
de alguma parte dele ou na invasão física do corpo humano, tais como os exames de sangue, o exame
ginecológico, a identificação dentária, a endoscopia (usada para localização de droga no corpo
45119

humano) e o exame do reto.


● Já as provas não invasivas consistem numa inspeção ou verificação corporal. São aquelas em que
não há penetração no corpo humano, nem implicam a extração de parte dele, como as perícias de
exames de materiais fecais, os exames de DNA realizados a partir de fios de cabelo encontrados no
chão, etc.

Desta forma, conclui-se que a prova não invasiva (inspeções ou verificações corporais), mesmo que
o agente não concorde com a produção da prova, esta poderá ser realizada normalmente, desde que não
implique colaboração ativa por parte do acusado, observando-se, assim, o nemo tenetur se detegere.

Caso Glória Trevi: O caso da Gloria de los Angeles Treviño Ruiz que chegou ao STF gerou polêmica
pela seguinte indagação: poderia ter sido a placenta coletada
45119 para realização do exame de DNA? O STF, na
ocasião, confirmou a legalidade da determinação de coleta da placenta no procedimento médico do parto
da cantora mexicana visando dirimir a dúvida quanto a quem era o pai da criança.
Conforme o professor Renato Brasileiro de Lima, “nessa situação, a intervenção médica era
necessária e não houve a coleta à força da placenta, uma vez que esta é expelida do corpo humano como
consequência natural do processo de parto.”
Outro exemplo trazido pelo doutrinador de admissibilidade em caso de repercussão:

“Situação semelhante ocorreu em caso envolvendo a descoberta do episódio em


que uma criança recém-nascida foi retirada do berçário da maternidade por uma
mulher que passou a assumir perante todos ser a verdadeira mãe. Como a suposta
mãe não aceitou submeter-se à coleta de material genético, esperou-se uma
oportunidade para arrecadar uma ponta de cigarro descartada pela filha, contendo
partículas das glândulas salivares, o que permitiu, após a análise do DNA, ter-se a
certeza de que ela, de fato, não era filha da investigada. Essa prova foi considerada
válida, porquanto o que torna a prova ilícita é a coação por parte do Estado,
obrigando o suspeito a produzir prova contra si mesmo. Como a prova foi produzida
de maneira involuntária pela suposta filha, a prova então obtida foi considerada
lícita."

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DELEGADO SANTA CATARINA

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Ressalta-se que o raio-x, segundo o STJ (HC 149.146/SP), é considerado prova não invasiva. Logo,
poderá ser realizado mesmo contra a vontade do indivíduo.
Nesse sentido, Renato Brasileiro explica que no caso das chamadas “mulas”, que transportam drogas
no organismo humano, não é possível obrigar a pessoa a realizar uma cirurgia para retirada ou que ela
consuma algum tipo de remédio para expelir o conteúdo da droga. É possível, no entanto, a realização de um
raio-x, que é modalidade de prova não invasiva.
45119

ATENÇÃO! Nemo tenetur se detegere e a prática de outros ilícitos.


O princípio nemo tenetur se detegere não tem natureza absoluta, podendo constituir conduta
criminosa, determinados comportamentos empregados a pretexto de estarem amparados pelo referido
princípio. Assim, apesar de ninguém ser obrigado a produzir provas contra si mesmo, nenhum direito pode
ser usado como escudo protetor para a realização de atividades ilícitas. Nesse sentido, vejamos alguns
exemplos.

Ex1.: Crime de Fraude Processual (art. 347, CP).

Fraude processual Art. 347 - Inovar artificiosamente, na pendência de processo civil


ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a
45119

erro o juiz ou o perito: Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa.
Parágrafo único - Se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal,
ainda que não iniciado, as penas aplicam-se em dobro.

Foi o que aconteceu no caso do Casal Nardoni, acusado e condenado por fraude processual. A defesa,
no caso deste crime específico (alteração da cena do crime), alegou o princípio do nemo tenetur se detegere,
afirmando que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Entretanto, tal princípio não dá
direito à pessoa de cometer outras infrações para se eximir da anterior.

O Superior Tribunal de Justiça assim se pronunciou no habeas corpus impetrado em


favor de A. N. e A. C. J, denunciados pelo homicídio triplamente qualificado de
Isabela Nardoni, e também por fraude processual, em decorrência da alteração do
local do crime: (...) O direito à não auto-incriminação não abrange a possibilidade
de os acusados alterarem a cena do crime, inovando o estado de lugar, de coisa ou
de pessoa, para, criando artificiosamente outra realidade, levar peritos ou o próprio
Juiz a erro de avaliação relevante (...). (STJ, 5 Turma, HC 137.206/SP, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho, j. 01/12/2009, DJe 01/02/2010).

Ex2.: Fuga do local de ocorrência de trânsito (art. 305 do CTB).

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à


responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída: Penas - detenção, de
seis meses a um ano, ou multa.

No caso de crimes de trânsito, o afastamento do condutor do local do acidente enseja algumas


divergências. Alguns doutrinadores consideram que tal crime seria inconstitucional. Entretanto, no fim de
2018, o STF considerou este crime constitucional, afirmando que o45119
condutor tem o dever de permanecer no
local, mas não é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Vejamos:

(...) “A regra que prevê o crime do art. 305 do CTB é constitucional posto não
infirmar o princípio da não incriminação, garantido o direito ao silêncio e as
hipóteses de exclusão de tipicidade e de antijuridicidade”. À semelhança do que
já fora decidido pelo Supremo no julgamento do RE 640.139, quando se afirmou
que o princípio constitucional da autoincriminação não alcança aquele que atribui
falsa identidade perante autoridade policial com o intuito de ocultar maus
antecedentes, prevaleceu o entendimento de que não há direitos absolutos e que,
no sistema de ponderação de valores, há de ser admitida certa mitigação, até
mesmo do princípio da não 45119
autoincriminação. Na visão da Corte, a exigência de
permanência no local do acidente e de identificação perante a autoridade de
trânsito não obriga o condutor a assumir expressamente sua responsabilidade civil
ou penal e tampouco enseja que seja aplicada contra ele qualquer penalidade caso
assim não o proceda. Na verdade, a depender do caso concreto, a sua permanência
no local pode até constituir um meio de autodefesa, na medida em que terá a
oportunidade de esclarecer, de imediato, eventuais circunstâncias do acidente que
lhe sejam favoráveis. (STF, Pleno, RE 971.959/RS, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/11/2018).

O tema será aprofundado na temática de Teoria Geral da Prova.

Obs1.: O Aviso de Miranda é uma construção do direito norte-americano, segundo o qual, o policial, no
momento da prisão, deve relatar para o preso os seus direitos, sob pena de invalidação do que por ele for
dito. Conforme leciona Renato Brasileiro (2017, p. 71), os “Miranda Warnings” têm origem no julgamento
Miranda V. Arizona, em que a Suprema Corte americana firmou o entendimento de que nenhuma validade
pode ser conferida às declarações feitas pela pessoa à polícia, a não ser que antes tenha sido claramente
informada de:
I- Que tem o direito de não responder;
II- Que tudo o que disser pode vir a ser utilizado contra ela;
III- Que tem o direito à assistência de defensor escolhido ou nomeado.

93
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DELEGADO SANTA CATARINA

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45119

Não se admite condenação baseada exclusivamente em declarações informais


prestadas a policiais no momento da prisão em flagrante.
Esse alerta sobre o direito ao silêncio deve ser feito não apenas pelo Delegado,
durante o interrogatório formal, mas também pelos policiais responsáveis pela voz
de prisão em flagrante. Isso porque a todos os órgãos estatais impõe-se o dever de
zelar pelos direitos fundamentais. A falta da advertência quanto ao direito ao
silêncio torna ilícita a prova obtida a partir dessa confissão.
STF. 2ª Turma. RHC 170843 AgR/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 4/5/2021
(Info 1016).

Obs2.: O art. 2º, §6º, da Lei nº 7.960/89 (prisão temporária) prevê que, efetuada a prisão, a autoridade
policial informará o preso dos direitos previstos no art. 5º da Constituição Federal, por meio de uma nota de
ciência.

Há na jurisprudência diversas manifestações acerca do dever de advertência. Como exemplo, os casos em


que policiais gravaram conversa informal com o preso, sem que lhe fosse avisado acerca do seu direito ao
silêncio.
45119

Em relação à imprensa, há duas correntes:


▪ 1ªC: Há doutrinadores que afirmam que este dever de advertência vale para todos, inclusive
para os particulares, seria a aplicação da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Portanto, a imprensa teria a obrigação de advertir o agente acerca do seu direito de
permanecer calado.
▪ 2ºC: STF, no entanto, não adota tal posicionamento. Assim, o dever de advertência vale
apenas para o Estado. Nesse sentido:

(...) Alegação de ilicitude da prova, consistente em entrevista concedida pelo


paciente ao jornal “A Tribuna”, na qual narra o modus operandi de dois homicídios
perpetrados no Estado do Espírito Santo, na medida em que não teria sido
advertido do direito de permanecer calado. Entrevista concedida de forma
espontânea. Constrangimento ilegal não caracterizado. Ordem denegada. (STF, 2ª
Turma, HC 99.558/ES, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 14/12/2010).

4.2.2 Princípio da Iniciativa das Partes

É vedada a propositura de ação penal pelo magistrado, reservando-se essa iniciativa apenas à parte.
Em conformidade com o sistema acusatório, o juiz não pode iniciar um processo penal sem provocação
anterior (nemo judex actore ou ne procedat judex ex officio).
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DELEGADO SANTA CATARINA

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Entretanto, a doutrina aponta duas exceções ao princípio da iniciativa das partes. O juiz pode agir de
ofício:
a) Quando a situação disser respeito ao direito de liberdade do agente, o que se verifica na expedição
de habeas corpus de ofício (art. 654, § 2º, CPP); e
b) Quando se tratar do início da execução penal (art. 195, Lei 7.210/84).

4.2.3 Duplo Grau de Jurisdição

NÃO é 45119
princípio constitucional expresso, embora exista doutrina que defenda ser decorrência da
ampla defesa. Além disso, decorre de direitos previstos em tratados de direitos humanos, como o já
mencionado Pacto de São José da Costa Rica que, em seu art. 8.2, h, dispõe que: “(...) durante o processo,
toda pessoa tem, em plena igualdade, o direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.”

4.2.4 Princípio da Oficialidade

A atividade de persecução criminal deve ocorrer por órgão oficial. Aplicável à ação penal pública.

4.2.5 Princípio da Oficiosidade 45119

As autoridades incumbidas da persecução penal devem agir de ofício, ou seja, independentemente


de provocação, salvo exceções. Ex.: crimes de ação penal condicionada ou de ação penal de iniciativa privada.

Será aprofundado no tema Ação Penal.

Cuidado! NÃO confunda os princípios da oficialidade e oficiosidade, visto que, apesar da denominação
similar, possuem conceituações distintas conforme apontado acima.

5. OUTROS PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL

5.1 Princípio da Oralidade

A prova oral prevalece sobre a escrita. Desse princípio decorrem:

● Princípio da Concentração: Toda a colheita de prova e julgamento devem ocorrer em uma única
audiência.
● Princípio da Imediaticidade: O magistrado deve ter contato direto com a prova produzida.
● Princípio da Identidade Física do Juiz: O juiz que instrui o processo deve julgá-lo.

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SEMANA 01/12

5.2 Indivisibilidade da Ação Penal Privada

NÃO pode o ofendido escolher contra qual agente ofertará a ação penal privada.

Atenção! Para o STF, a ação penal pública é divisível, pois o MP pode, até sentença final, incluir novos agentes
por aditamento à denúncia ou oferecer nova ação penal, caso já prolatada sentença no feito. Todavia, para
doutrina majoritária, prevalece a indivisibilidade.

Será aprofundado
45119 no tema Ação Penal.

5.3 Comunhão da Prova

Uma vez produzida, a prova não pertence mais à parte que a produziu, mas ao processo. Nesse
sentido, o magistrado pode valer-se de uma prova produzida pela parte para proferir decisão em seu
desfavor, de acordo com o seu livre convencimento motivado.

45119
5.4 Impulso Oficial

Atrelado aos princípios da obrigatoriedade e indeclinabilidade da ação penal.


Uma vez iniciado, o processo tem curso por impulso oficial, ou seja, o juiz, de ofício, dará andamento
ao processo até o seu fim, objetivando a prolação de uma decisão final. Assim, não é possível a paralisação
do procedimento pela inércia ou omissão das partes, caminhando-se para a resolução do litígio de forma
definitiva, enquanto objetivo do processo.

6. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL

Será aprofundado no tema Competência.

6.1 Aplicação da Lei Processual no Tempo

É o estudo do direito intertemporal, ou seja, o direito que regula a sucessão de leis no tempo.

a) Normas de Direito Penal: Princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa, do qual deriva o
princípio da ultratividade da lei penal mais benéfica. A lei nova só vai valer para os crimes praticados
a partir daquele momento.

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Art. 5, XL, da CF – a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

b) Normas de Direito Processual Penal: Existem duas espécies de normas de Direito Processual Penal.
● Norma genuinamente processual;
● Norma processual material, mista ou híbrida.
Dependendo da espécie de norma processual penal os critérios de aplicação serão diferentes.

1) Norma genuinamente processual - São aquelas que cuidam de procedimentos, atos processuais,
técnicas do processo. Ou seja, não dizem respeito a pretensão punitiva. Nesse caso, o critério a ser
aplicado é o previsto no art. 2°, CPP (princípio da aplicação imediata).
45119

Art. 2º. A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos
atos realizados sob a vigência da lei anterior.

Pelo princípio do efeito imediato, a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da
validade dos atos praticados sob a vigência da lei anterior. Como consequência, a lei processual penal será
aplicada de imediato, seja benéfica ou maléfica (não se aplica o princípio da retroatividade da lei benéfica,
como ocorre no Direito Penal). 45119

Portanto, do princípio da aplicação imediata derivam 2 regras fundamentais:


1ª - A lei genuinamente processual tem aplicação imediata;
2ª - A vigência dessa nova lei não invalida os atos processuais anteriores. Se o ato processual
já foi praticado e foi em consonância com a lei processual vigente, significa que o ato é válido,
não devendo ser anulado só porque houve a superveniência de uma nova lei.
Assim, o ordenamento jurídico brasileiro adota o sistema do isolamento dos atos do processo
(tempus regit actum), segundo o qual a lei será aplicada unicamente em relação ao ato processual e, uma
vez praticado este, a nova lei processual já poderá ter incidência sobre os atos futuros.

2) Norma processual material (mista ou híbrida) - São aquelas que possuem caráter dúplice, de direito
penal e de processo penal.
Norma processual material (mista) = norma de direito penal + norma de direito processual penal.
● Normas Penais - São aquelas que cuidam do crime, da pena, da medida de segurança, dos efeitos da
condenação e do direito de punir do Estado. Ex.: causas extintivas da punibilidade.
● Normas Processuais Penais - São aquelas que versam sobre o processo desde o seu início até o final
da execução ou extinção da punibilidade.
Assim, se um dispositivo legal, embora inserido em lei processual, versa sobre regra penal, de direito
material, a ele serão aplicáveis os princípios que regem a lei penal, de ultratividade e retroatividade da lei
mais benigna.

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SEMANA 01/12

Conclusão: Quando se tratar de norma processual mista, o critério a ser aplicado é o critério do
direito penal, ou seja, irretroatividade da lei mais grave e ultratividade da lei mais benigna.
● Se o aspecto penal for benéfico: prevalece o aspecto penal, e a lei retroage por completo;
● Se o aspecto penal for maléfico: a lei NÃO retroage.

Atenção! Normas heterotópicas são aquelas em que, apesar de seu conteúdo conferir-lhe uma determinada
natureza, encontra-se prevista em diploma de natureza distinta. Ou seja, é uma norma penal colocada no
CPP, ou então norma processual penal colocada no CP.

6.2 Aplicação da Lei Processual no Espaço:

“Ao contrário do que ocorre no Direito Penal, onde se trava longa e complexa
discussão sobre a extraterritorialidade da lei penal, no processo penal a situação é
mais simples. Aqui vige o princípio da territorialidade. As normas processuais
penais brasileiras só se aplicam no território nacional, não tendo qualquer
possibilidade de eficácia extraterritorial” (LOPES, 2018. p. 72).

Pelo art. 1º, CPP, há o princípio da territorialidade


45119
absoluta, decorrência da45119
soberania, razão pela
qual o CPP vale em todo território nacional, SALVO nas hipóteses excludentes da jurisdição criminal brasileira,
casos em que o CPP possui aplicação subsidiária.

APROFUNDANDO:

Parte da doutrina sustenta a relativização da lex fori (aplicação da lei local) em matéria processual penal,
permitindo a aplicação da lei pátria fora do território nacional, nas hipóteses de:
1) Terra de ninguém (território nullius);
2) Estado onde será praticado o ato processual autorizar a aplicação de lei diversa (território estrangeiro);
3) Em casos de guerra (território ocupado).

6.3 Aplicação da Lei Processual em Relação às Pessoas

Conforme art. 1º, do CPP, é possível que sejam instituídas imunidades da lei processual penal, seja
em virtude de tratados internacionais (imunidade diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros) ou por
regras constitucionais (imunidades e regras de competência).

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DELEGADO SANTA CATARINA

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I. Imunidades Diplomáticas: Objetivam garantir o livre exercício dos representantes diplomáticos, e são
atribuídas em função do cargo, e não da pessoa. O Tratado de Viena assegura a imunidade de jurisdição penal
do diplomata e seus familiares, para que se sujeitem à jurisdição do Estado que representa.

Abrangência:
● Chefes de governo ou Estado estrangeiro, sua família e membros de sua comitiva;
● Embaixador e família: Imunidade absoluta;
● Funcionários das organizações internacionais (ONU) quando em serviço;
● Agentes consulares, apenas quanto aos crimes relacionados com a sua função (Cuidado!).

ATENÇÃO:
1. A imunidade não subtrai o diplomata da investigação, mas do processo e julgamento em território
brasileiro.
2. As embaixadas NÃO são extensão do território que representam, mas são invioláveis.
3. É possível o país renunciar à imunidade do agente
45119
diplomático, mas o agente não pode renunciar
por iniciativa pessoal, já que a imunidade se fundamenta no interesse da função.

II. Imunidades Parlamentares: É uma prerrogativa 45119


para o desempenho das funções de deputados e
senadores de legislar e fiscalizar o Poder Executivo. Podem ser absolutas ou relativas.

● Imunidade absoluta (material, substancial, real, inviolabilidade ou indenidade): Prevê o art. 53, da
CF/88, que deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas
opiniões, palavras e votos.
1. Para o STF, a imunidade é causa de atipicidade.
2. A abrangência dessa imunidade deve ser analisada:
∘ Se ofensa proferida nas dependências da casa legislativa, o nexo funcional é
presumido, há imunidade1;
∘ Se a ofensa é proferida fora das dependências da casa legislativa, o nexo funcional NÃO
é presumido, deve ter relação com o exercício do mandato e o ofendido deve
comprovar a inexistência de nexo com o mandato.

● Imunidade relativa (formal): É possível subdividi-la:

1
Sobre a presunção da imunidade por palavras e expressões proferidas dentro da Casa Parlamentar, o STF, no Inq
3932/DF e Pet 5243/DF, de Relatoria do Min. Luiz Fux, julgado em 21/06/2016 (INF 831), recebeu denúncia contra o
Dep. Jair Bolsonaro, pela incitação ao crime, ao pronunciar, em acalorada discussão no plenário, que a também Dep.
Federal Maria do Rosário “não merecia ser estuprada”. Para melhor compreensão de interessante julgado, sugerimos a
leitura:
http://www.dizerodireito.com.br/2016/07/entenda-decisao-do-stf-que-recebeu.html
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DELEGADO SANTA CATARINA

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(1) Para a prisão: Relacionada à prisão dos parlamentares e ao processo. Os parlamentares passam a ter
imunidade formal para a prisão a partir do momento em que são diplomados pela Justiça Eleitoral
(antes da posse), configurando o termo inicial para a atribuição de imunidade formal para a prisão.
∘ Os parlamentares só poderão ser cautelarmente presos nas hipóteses de flagrante de crime
inafiançável (“estado de relativa incoercibilidade pessoal dos congressistas” – Celso de Melo)
→ Nesse caso, os autos deverão ser encaminhados à Casa Parlamentar respectiva, no prazo
de 24h para que, pelo voto (aberto) da maioria absoluta de seus membros, resolva sobre a
prisão.
∘ Nota-se que a aprovação pela Casa é condição necessária para a manutenção da prisão em
flagrante delito de crime inafiançável. Logo, há duas hipóteses:
1) Se a Casa decidir pela não manutenção do cárcere, a prisão deverá ser
45119
imediatamente relaxada;
2) Se a Casa mantiver a prisão em flagrante, os autos deverão ser encaminhados, no
prazo de 24h, ao STF.

(2) Para o processo: Oferecida denúncia, o Ministro do STF poderá recebê-la sem prévia licença da Casa
Parlamentar. Após o recebimento da denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido
após a diplomação, o STF dará ciência à Casa 45119
respectiva que, por iniciativa de partido político nela
representado e pelo voto da maioria absoluta de seus membros, decidirá sustar o andamento da
ação.
O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de 45 dias do seu
recebimento pela mesa diretora, e a sustação do processo suspende a prescrição enquanto durar o
mandato.
Obs.: NÃO há mais imunidade formal para crimes praticados ANTES DA DIPLOMAÇÃO.

● Prerrogativa de foro: Desde a expedição de diploma, deputados e senadores serão julgados pelo STF
pela prática de qualquer tipo de crime. Casos:
i. Infração cometida durante o exercício da função parlamentar: A competência será do STF,
sendo desnecessário pedir autorização a Casa respectiva, bastando dar ciência ao Legislativo,
que poderá sustar o andamento da ação.

Se os fatos criminosos que teriam sido supostamente cometidos pelo Deputado


Federal não se relacionam ao exercício do mandato, a competência para julgá-los
não é do STF, mas sim do juízo de 1ª instância. Isso porque o foro por prerrogativa
de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e
relacionados às funções desempenhadas (STF AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto
Barroso, julgado em 03/05/2018). STF. 1ª Turma. Inq 4619 AgR-segundo/DF, Rel.
Min. Luiz Fux, julgado em 19/2/2019 (Info 931).
100
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DELEGADO SANTA CATARINA

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ii. Infração cometida antes ou após o encerramento do45119


mandato: NÃO há foro por prerrogativa
de função.
As normas da Constituição de 1988 que estabelecem as hipóteses de foro por prerrogativa de função
devem ser interpretadas restritivamente, aplicando-se apenas aos crimes que tenham sido praticados
durante o exercício do cargo e em razão dele.
Assim, por exemplo, se o crime foi praticado antes de o indivíduo ser diplomado como Deputado
Federal, não se justifica a competência do STF, devendo ele ser julgado pela 1ª instância mesmo ocupando o
cargo de parlamentar federal. Além disso, mesmo que o crime tenha sido cometido após a investidura no
mandato, se o delito não apresentar relação direta com as funções exercidas, também não haverá foro
privilegiado.
Foi fixada, portanto, a seguinte tese:

O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante
o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. STF. Plenário. AP
937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018.

ATENÇÃO! No caso de Natan Donadon, entendeu-se que


45119a renúncia ao cargo, para que haja prescrição, seria

fraude processual inaceitável, frustrando a atuação jurisdicional do Estado, razão pela qual NÃO haveria a
problema em ser julgado pelo STF. A prorrogação do foro, nesse contexto, visa evitar a denominada Ciranda
de Processos.

O assunto será aprofundado em competência.

ESQUEMA SOBRE IMUNIDADES:

PARLAMENTAR IMUNIDADE JULGAMENTO

Deputados Federais e Imunidade absoluta e Julgados pelo STF, inclusive


Senadores relativa. nos crimes dolosos contra a
vida.
Deputados estaduais Imunidade absoluta e Julgados pelo TJ, inclusive nos
relativa. crimes dolosos contra a vida.

Atenção!!! Não existe foro de prerrogativa para vereadores e vice-prefeitos:

A CF/88 não previu foro por prerrogativa de função aos Vereadores e aos Vice-
prefeitos. O foro por prerrogativa de função foi previsto apenas para os prefeitos

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(art. 29, X, da CF/88). Diante disso, é inconstitucional norma de Constituição


Estadual que crie foro por prerrogativa de função para Vereadores ou Vice-
Prefeitos. A CF/88, apenas excepcionalmente, conferiu prerrogativa de foro para
as autoridades federais, estaduais e municipais. Assim, não se pode permitir que
os Estados possam, livremente, criar novas hipóteses de foro por prerrogativa de
função. STF. Plenário. ADI 558/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 22/04/2021.

7. INTERPRETAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL 45119

● Previsão legal: art. 3°, CPP

Art. 3° do CPP - A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação


analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

● Considerações importantes sobre o art. 3°, CPP:

(1) O que é interpretar?


R.: É buscar o sentido da lei, é descobrir o seu significado.
45119 Não interessa a vontade do legislador, mas
sim o sentido da lei.

(2) Interpretação quanto ao resultado


Quanto ao resultado, trabalha-se com ao menos 4 (quatro) espécies de interpretação:
a) Declaratória - O intérprete não amplia e nem restringe o significado da lei, ou seja, o significado da
lei corresponde à sua literalidade.
b) Restritiva - Conclui-se que a lei disse mais do que pretendia dizer, por isso ela deve sofrer uma
restrição na hora de sua interpretação.
c) Extensiva - A lei disse menos do que pretendia dizer, por isso ela deve ser interpretada
extensivamente para abranger outras situações (art. 3, CPP).

Art. 3o - A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação


analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

Ex.: hipóteses de cabimento do RESE do art. 581, CPP. Essas hipóteses, hoje, estão desatualizadas.
Então as hipóteses de cabimento do RESE devem ser interpretadas de maneira extensiva para abranger
outras situações.

d) Progressiva - Busca adaptar o texto da lei à realidade social vigente naquele determinado momento.

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SEMANA 01/12

O art. 68, CPP prevê que o MP pode promover a ação civil ex delito em favor de vítima pobre. Quando
a CF/88 entrou em vigor, houve quem dissesse que esse artigo era inconstitucional, pois o MP não poderia
pleitear interesses individuais disponíveis.
O STF entendeu que o artigo estaria sujeito a uma inconstitucionalidade progressiva. Logo, enquanto
não houver defensoria pública em todos os estados, o artigo continua válido.

(3) Analogia
A analogia está no art. 3°, CPP na expressão: “aplicação analógica”. Assim, no âmbito processual
penal a analogia é admitida. Então, quando se trata de uma norma genuinamente processual penal, a
analogia pode ser usada, independentemente de ser em bonam partem ou em malam partem (≠ direito
penal, em que só é admitida a analogia in bonam partem).

Obs.: Analogia ≠ Interpretação Extensiva.


● Analogia - É um método de integração (busca suprir lacunas);
● Interpretação extensiva - É um método de interpretação.
Na analogia, há uma lacuna na norma. Por isso, busca-se suprir tal 45119
lacuna valendo-se de um
dispositivo pensado para um caso semelhante. Enquanto na interpretação extensiva existe norma legal, que,
no entanto, será interpretada de norma extensiva. 45119

(4) Aplicação supletiva e subsidiária do novo CPC ao processo penal.


O CPC 2015 pode ser aplicado no Processo Penal? R.: SIM.
O art. 15 do CPC diz que, na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou
administrativas, aplica-se o CPC. Porém, o CPC não fez menção à possibilidade de utilizá-lo no processo penal.
Entretanto, o art. 15 pode ser objeto de interpretação extensiva, para que possamos entender que
o NCPC pode ser aplicado supletiva e subsidiariamente aos processos criminais.

Art. 15, CPC - Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas
ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e
subsidiariamente.

Obs.: Só pode aplicar o CPC no processo Penal quando houver lacuna. Pois é diante da omissão que se pode
valer da analogia com o CPC. Assim, se houver disposição legal expressa no CPP, não é possível aplicar o
CPC!

8. FONTES

As fontes correspondem à origem do direito processual penal, que se dividem em espécies.

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SEMANA 01/12

8.1 Fonte Material, Substancial ou de Produção

As fontes materiais dizem respeito ao órgão responsável pela criação de normas jurídicas sobre
determinada matéria. Conforme estabelecido no art. 22, I, CF compete privativamente à União legislar sobre
Processo Penal. Contudo, nos termos do art. 22, §único, CF, lei complementar federal pode autorizar Estados
e o Distrito Federal a legislar sobre questões específicas.
A União, os Estados e o Distrito Federal possuem competência concorrente para legislar sobre
procedimentos em matéria processual, conforme preconiza o art. 24, XI, CF.

8.2 Fonte Formal, Cognitiva ou de Cognição

As fontes formais dizem respeito ao instrumento de exteriorização da regulamentação de


determinada matéria. Nesse sentido, no âmbito do processo penal, podem ser:
● Imediata ou Direta: Constituição Federal, leis infraconstitucionais e os tratados, convenções e regras
de direito internacional.
● Mediata ou Indireta: analogia, costumes e princípios gerais de direitos (art. 3, CPP).

Autonomia do Direito
45119Processual Penal

O primeiro passo para compreender a autonomia científica do direito processual penal é deixar de
denominá-lo, irregularmente, como direito adjetivo ou direito secundário, dentre outros nomes, buscando
apontar como o direito substantivo ou direito principal o corpo de normas, que dele necessita para fazer
valer a lei: o direito penal, no tocante ao processo penal; o direito civil, no tocante ao processo civil. Não há
nenhum direito adjetivo, termo de nítido conteúdo voltado a inferiorizá-lo. O processo penal é tão
substantivo quanto o direito penal, porém atua sob outros princípios e busca diversos objetivos. (NUCCI,
2020, p. 89).

45119

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SEMANA 01/12

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

TODOS OS ARTIGOS
⦁ Lei 9296/96
⦁ Art. 5º, XII, CF/88

45119
Art. 3º-A, CPP
⦁ Art. 13-A e 13-B, CPP
⦁ Art. 15, lei 12850/2013
ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

⦁ Art. 5º, XII, CF/88


⦁ Art. 3º-A, CPP
⦁ Principais artigos da Lei 9296/96: Arts. 1º, 2º, 3º, 5º, 8º-A e 10º.

1. OBJETO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

A Lei n°. 9.296/1996 regulamenta a autorização e os limites para o procedimento de interceptação


45119
telefônica como meio de obtenção de prova no processo penal, seja na etapa investigatória ou na instrução
processual penal.
A maior parte de seu conteúdo é processual, tratando de temas como a autorização para a realização,
as hipóteses de incidência e de não incidência da interceptação como meio de prova e dos requisitos a serem
demonstrados para que a interceptação seja realizada e do destinatário do objeto de prova.
O diploma possui dois tipos penais, sendo um referente à realização da interceptação de
comunicações telefônicas, de informática ou telemática, promover escuta ambiental ou quebrar segredo da
Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei e outro em realizar a captação
ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos para investigação ou instrução criminal sem
autorização judicial.

2. NATUREZA JURÍDICA DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA.

Deve se entender que as comunicações telefônicas são FONTES DE PROVA e a interceptação


telefônica, por sua vez, funciona como MEIO DE OBTENÇÃO DE PROVA, mais especificamente como medida
cautelar processual, de natureza real, consubstanciada em uma apreensão imprópria.
Por sua vez, “interceptar” significa “cortar” o fluxo de algo, logo, pode-se entender a interceptação
telefônica como o ato de interromper o fluxo de comunicação entre duas pessoas diferentes do receptador.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Link com o Processo Penal: Destaca-se pelo fato de não possuir previsão específica no rol de provas previstas
no Código de Processo Penal (Título VII), os resultados obtidos legalmente pelas interceptações de
comunicações telefônicas, de informática, telemática e proveniente de captação ambiental, serão exemplos
de provas inominadas.

Esquematizando:
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA ESCUTA TELEFÔNICA GRAVAÇÃO TELEFÔNICA
Ocorre quando um terceiro Ocorre quando um terceiro Ocorre quando o diálogo telefônico travado
capta o diálogo telefônico capta o diálogo telefônico entre duas pessoas é gravado por um dos
travado entre duas pessoas, travado entre duas pessoas, próprios interlocutores, sem o
sem que nenhum dos sendo que um dos consentimento ou a ciência do outro.
interlocutores saibam. interlocutores sabe que está Também é chamada de GRAVAÇÃO
sendo realizada a escuta. CLANDESTINA (obs.: a palavra
Há o consentimento deste “clandestina” está empregada no sentido
interlocutor de “feito às ocultas”, não na acepção de
“ilícito”, mas sim).
Ex.: polícia, com autorização Ex.: polícia grava a conversa Ex.: mulher grava a conversa telefônica no
judicial, grampeia os telefones telefônica que o pai
45119
mantém qual o ex-marido ameaça matá-la.
dos membros de uma quadrilha com o sequestrador de seu
e grava os diálogos mantidos filho.
entre eles.
Para que a interceptação seja Para que seja realizada é A gravação telefônica é válida mesmo que
válida é indispensável a indispensável a autorização tenha sido realizada SEM autorização
autorização judicial judicial (posição majoritária). judicial.
(entendimento pacífico). A única exceção em que haveria ilicitude se
dá no caso em que a conversa era
amparada por sigilo (ex.: advogados e
45119
clientes, padres e fiéis).

Em relação à ESCUTA TELEFÔNICA, é importante notar que o consentimento dado por um dos
interlocutores não pode estar viciado. Em se tratando de consentimento viciado, envolvendo suposto
consentimento de um suspeito e gravação de conversas telefônicas por viva-voz, o STJ entendeu que o
consentimento não foi válido e declarou a ilicitude da prova (STJ, Info 603).
À luz do entendimento do STJ, no Info 543, quando um dos interlocutores é absolutamente incapaz,
o consentimento para a interceptação (escuta) será dado por seu representante (Info 543).

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3. COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS DE QUALQUER NATUREZA

Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para


prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o
disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob
segredo de justiça.

A expressão “comunicação telefônica” não deve se restringir às comunicações por telefone, mas deve
também abranger a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons
ou informações de qualquer natureza, por meio de telefonia, estática ou móvel. Entretanto, os tribunais
superiores divergem quanto à aplicação da Lei n°. 9.296/1996 em algumas hipóteses:

✓ STJ – Conversas realizadas em salas de bate-papo da Internet não estão amparadas pelo sigilo das
comunicações, tendo em vista que o ambiente virtual é de acesso irrestrito e destinado a conversas
informais. (RHC 18116)
✓ STJ - As informações obtidas por monitoramento de e-mail corporativo de servidor público não
configuram prova ilícita quando relacionadas com aspectos "não pessoais" e de interesse da
Administração Pública e da própria coletividade,
45119 especialmente quando exista, nas disposições
normativas acerca do seu uso. (RMS 48.665)
✓ STJ – É ilícita a devassa de dados, bem como das conversas de whatsapp, obtidas diretamente pela
polícia em celular apreendido
45119
no flagrante, sem prévia autorização judicial. Recurso ordinário em
habeas corpus provido, para declarar a nulidade das provas obtidas no celular do paciente sem
autorização judicial, cujo produto deve ser desentranhado dos autos. (RHC 51531)
✓ STJ - Não há ilegalidade na perícia de aparelho de telefonia celular pela polícia, sem prévia
autorização judicial, na hipótese em que seu proprietário - a vítima - foi morto, tendo o referido
telefone sido entregue à autoridade policial por sua esposa. STJ. 6ª Turma. RHC 86076-MT, Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. Acd. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 19/10/2017 (Info 617).
Cuidado para não confundir: Sem prévia autorização judicial, são nulas as provas obtidas pela
polícia por meio da extração de dados e de conversas registradas no Whatsapp presentes no celular
do suposto autor de fato delituoso, ainda que o aparelho tenha sido apreendido no momento da
prisão em flagrante. STJ. 5ª Turma. RHC 67379-RN, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 20/10/2016
(Info 593). STJ. 6ª Turma. RHC 51531-RO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 19/4/2016 (Info 583).
✓ O acesso ao chip telefônico descartado pelo acusado em via pública não se qualifica como quebra
de sigilo telefônico. STJ, 5ª Turma, HC 720.605, julgado em 09.08.2022.

4. QUEBRA DO SIGILO DE DADOS TELEFÔNICOS

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A interceptação das comunicações telefônicas NÃO se confunde com a quebra de sigilo de dados
telefônicos:
● A interceptação de comunicação telefônica diz respeito a algo que está acontecendo.
● A quebra do sigilo de dados telefônicos está relacionada aos registros documentados e armazenados
pelas companhias telefônicas, tais como data da chamada telefônica, horário da ligação, número do
telefone chamado, duração do uso, ou seja, se refere a registros pretéritos.

Como já manifestou a jurisprudência, a Lei n° 9.296/96 é aplicável apenas às interceptações


telefônicas (atuais, presentes), não alcançando os registros telefônicos relacionados às comunicações
passadas. Isso, contudo, não significa dizer que o Delegado de Polícia e o Ministério Público podem requisitar
o registro telefônico diretamente, pois se trata de matéria que exige autorização judicial, mas sim que a
proteção do sigilo de dados não se fundamenta na Lei de Interceptação Telefônica, mas na proteção
constitucional relativa à intimidade, constante do art. 5, inc. X, CF/88. CUIDADO! O fundamento
constitucional é o inciso X da CF/88! E não o inciso XII!
Ressalta-se que parte da doutrina afirma que a quebra do sigilo de dados telefônicos não está
submetida à cláusula de reserva de jurisdição absoluta pois, além da autoridade judiciária competente,
45119
Comissões Parlamentares de Inquérito também podem determinar a quebra do sigilo de dados telefônicos
com base em seus poderes de investigação (CF, art. 58,45119
§3°), desde que o ato deliberativo esteja devidamente
fundamentado (MS 23.452/RJ).

Esquematizando:
● Tanto o sigilo de dados telefônicos como o sigilo das comunicações telefônica exigem a autorização
judicial, mas baseadas em fundamentos diversos.
● O sigilo de dados telefônicos não se confunde com dados cadastrais, os quais o delegado de polícia
e o ministério público podem ter acesso, independentemente de autorização judicial.

OBS.: Cuidado para não confundir o registro de ligações armazenado pelas empresas de telefonia, cujo
acesso depende da autorização judicial, com o registro de ligações presentes no próprio celular do indivíduo
preso em flagrante. Nessa hipótese, os Tribunais consideram lícita a prova obtida através do acesso às últimas
chamadas efetuadas e recebidas, bem como à agenda telefônica do indivíduo. Confira:

STJ - O inciso XII do art. 5º da Constituição veda o acesso a dados decorrentes de


interceptação telefônica ou telemática, ainda que armazenados no aparelho
celular, sem a correspondente autorização judicial. No caso, como autorizado pelo
Código de Processo Penal – CPP foi apreendido o telefone celular de um acusado
e analisados os dados constantes da sua agenda telefônica, a qual não tem a
garantia de proteção do sigilo telefônico ou de dados telemáticos, pois a agenda
é uma das facilidades oferecidas pelos modernos aparelhos de smartphones a seus
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usuários. Assim, deve ser reconhecida como válida a prova produzida com o
acesso à agenda telefônica do recorrido, com o restabelecimento da sentença
condenatória, determinando-se que a Corte a quo continue a apreciar a apelação
(Resp. 178.2386).

STJ - O fato de ter sido verificado o registro das últimas chamadas efetuadas e
recebidas pelos dois celulares apreendidos em poder do co-réu, cujos registros se
encontravam gravados nos próprios aparelhos, não configura quebra do sigilo
telefônico, pois não houve requerimento à empresa responsável pelas linhas
telefônicas, no tocante à lista geral das chamadas originadas e recebidas, tampouco
conhecimento do conteúdo das conversas efetuadas por meio destas linhas. É
dever da Autoridade policial apreender os objetos que tiverem relação com o fato,
o que, no presente caso, significava saber se os dados constantes da agenda dos
aparelhos celulares teriam alguma relação com a ocorrência investigada (HC
66.368).
45119

5. QUEBRA DE ESTAÇÃO RÁDIO BASE


45119

Por meio da estação rádio base (ERB), é possível saber a localização aproximada de qualquer aparelho
celular ligado, desde que este esteja em uso, seja enviando ou recebendo uma mensagem, seja efetuando
ou recebendo uma ligação, e, consequentemente, de seu usuário. Note, portanto, que essa quebra não
permite acesso ao conteúdo da comunicação, mas somente o local aproximado onde se encontra
determinado aparelho.

Há divergência acerca da necessidade ou não de autorização judicial para obter o acesso a tais dados.
● 1ª C (STJ) – Dispensa prévia autorização judicial. Não se pode confundir a interceptação das
comunicações telefônicas com a obtenção de informações quanto ao posicionamento das ERBs,
verdadeira espécie de dados telefônicos. O STJ tem precedente afirmando ser desnecessária a
autorização judicial para quebra de ERB. (HC 247331)

● 2ª C (Doutrina + CPP) – Depende de autorização judicial. A obtenção das informações colhidas pela
quebra da ERB permite obter informações acerca da localização aproximada de uma pessoa, fato que
guarda relação e tangencia o direito à intimidade e à vida privada:

CPP. Art. 13-B. Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados


ao tráfico de pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia
poderão requisitar, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de
serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os
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SEMANA 01/12

meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a


localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso.
§ 1o Para os efeitos deste artigo, sinal significa posicionamento da estação de
cobertura, setorização e intensidade de radiofrequência.
§ 2o Na hipótese de que trata o caput, o sinal:
I - não permitirá acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza, que
dependerá de autorização judicial, conforme disposto em lei;
II - deverá ser fornecido pela prestadora de telefonia móvel celular por período não
superior a 30 (trinta) dias, renovável por uma única vez, por igual período;
III - para períodos superiores àquele de que trata o inciso II, será necessária a
apresentação de ordem judicial.
§ 3o Na hipótese prevista neste artigo, o inquérito policial deverá ser instaurado no
prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado do registro da respectiva
ocorrência policial.
§ 4o Não havendo manifestação judicial no prazo de 12 (doze) horas, a autoridade
competente requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados –
como sinais, informações e outros
45119 – que permitam a localização da vítima ou dos
suspeitos do delito em curso, com imediata comunicação ao juiz.

Atente-se à jurisprudência pertinente sobre o tema:

A determinação judicial para identificação dos usuários que operaram em


determinada área geográfica, suficientemente fundamentada, não ofende a
proteção à privacidade e à intimidade A quebra do sigilo de dados armazenados
não obriga a autoridade judiciária a indicar previamente as pessoas que estão
sendo investigadas, até porque o objetivo precípuo dessa medida é justamente de
proporcionar a identificação do usuário do serviço ou do terminal utilizado. Logo, a
ordem judicial para quebra do sigilo dos registros, delimitada por parâmetros de
pesquisa em determinada região e por período de tempo, não se mostra medida
desproporcional, porquanto, tendo como norte a apuração de gravíssimos
crimes, não impõe risco desmedido à privacidade e à intimidade dos usuários
possivelmente atingidos por tal diligência. STJ. 3ª Seção. RMS 61302-RJ, Rel. Min.
Rogerio Schietti Cruz, julgado em 26/08/2020 (Info 678). 45119

6. MOMENTO DE DECRETAÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

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A interceptação telefônica para fins de investigação criminal pode ser efetivada


independentemente da prévia instauração de inquérito policial e pode ser decretada durante o curso da
instrução processual penal:

● Investigação Criminal (medida cautelar preparatória): por investigação criminal se compreende


toda a fase pré-processual de apuração de crime, não se limitando apenas ao inquérito policial (aliás,
nada impede que a interceptação telefônica seja autorizada antes mesmo da instauração do
inquérito, desde preenchidos os requisitos legais).

● Curso da Instrução Processual Penal (medida cautelar incidental): é a fase no processo penal com
objetivo de colher provas, iniciando-se a partir do oferecimento da peça acusatória e findando-se
45119
com eventual pedido de diligências cuja necessidade tenha surgido a partir de circunstâncias ou fatos
apurados na fase de instrução (art. 402 do CPP).

Apesar de a decretação da interceptação telefônica ser mais comum durante a fase investigatória, é
perfeitamente possível o deferimento da medida durante a instrução processual penal. Com efeito, podem
surgir, no curso do processo, circunstâncias novas, desconhecidas, que recomendem a realização imediata
da interceptação telefônica. 45119

Como a Constituição Federal e a Lei n° 9.296/96 dispõem que a interceptação telefônica só pode ser
autorizada para fins de investigação criminal ou instrução processual penal -cláusula de reserva de jurisdição
qualificada-, não é possível que essa medida seja determinada no curso de um processo de natureza cível,
comercial, trabalhista, administrativa etc.
Apesar de haver precedentes de Tribunais Estaduais em sentido contrário, uma vez decretada a
realização de uma interceptação telefônica para fins de investigação criminal ou instrução processual penal,
nada impede que os elementos probatórios aí obtidos sejam utilizados em outro processo, a título de prova
emprestada.
A jurisprudência dos tribunais superiores entende que dados obtidos em interceptação de
comunicações telefônicas e em escutas ambientais, judicialmente autorizadas para produção de prova em
investigação criminal ou em instrução processual penal, podem ser usados em procedimento administrativo
disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em relação às quais foram colhidos, ou contra outros
servidores cujos supostos ilícitos teriam despontado à colheita dessa prova.

Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! Tramita no âmbito interno da Polícia Civil do Estado do
Rio Grande do Norte processo administrativo disciplinar (PAD) que apura eventual falta funcional praticada
por certo delegado de polícia. Durante a instrução do PAD, foi verificada pela autoridade competente que o
conduz a necessidade de obtenção de prova emprestada, consistente em interceptação telefônica realizada
no bojo de processo criminal. De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, o compartilhamento

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de prova pretendido é: VIÁVEL o uso de interceptação telefônica como prova emprestada é possível, desde
que tenha advindo de processo penal, com a devida autorização judicial e respeitado o contraditório e a
ampla defesa.

Veja a súmula 591 do STJ: “Súmula 591-STJ: É permitida a “prova emprestada" no processo administrativo
disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo competente e respeitados o contraditório e a
ampla defesa."

STF - A prova colhida mediante autorização judicial e para fins de investigação ou


processo criminal pode ser utilizada para instruir procedimento administrativo
punitivo. Assim, é possível que as provas provenientes de interceptações
telefônicas autorizadas judicialmente em processo criminal sejam emprestadas
para o processo administrativo disciplinar. STF. 1ª Turma. RMS 28774/DF.

Além disso, há decisão do Supremo Tribunal arguindo a possibilidade de compartilhamento das


provas obtidas em outro processo penal: O fato de a interceptação telefônica ter visado elucidar outra
prática delituosa não impede a sua utilização em persecução criminal diversa por meio do
compartilhamento da prova (STF, 1º Turma, HC128102).
45119

Ressalta-se que, em 2019, a 6ª Turma do STJ, no informativo 648, entendeu que é dever do Estado
disponibilizar a integralidade das conversas avindas nos autos de forma emprestada (prova emprestada).
Veja: A defesa deve ter acesso à integralidade das conversas advindas nos autos de forma emprestada,
sendo inadmissível que as autoridades de persecução façam a seleção dos trechos que ficarão no processo
e daqueles que serão extraídos.

7. DA NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO

Em regra, haverá o que a doutrina convencionou chamar de “contraditório diferido”, ante a própria
natureza da interceptação telefônica como medida cautelar inaudita, ora, avisar ao investigado
45119 que seu

telefone se encontra interceptado esvaziaria a possibilidade de êxito da cautelar, o sujeito simplesmente


deixaria de usar o telefone e passaria a usar linha desconhecida pelas autoridades.

Acesso do advogado às interceptações já realizadas: O advogado não pode acompanhar as interceptações


em andamento (pois ainda não documentadas), mas pode consultar as interceptações já encerradas e
juntadas aos autos do apenso do IP em atendimento à Súmula vinculante 14 do STF.

8. REQUISITOS PARA A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA:

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SEMANA 01/12

A) INDÍCIOS RAZOÁVEIS DE AUTORIA E PARTICIPAÇÃO:

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando


ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:
I - Não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;

É preciso reiterar, a interceptação telefônica é medida cautelar apta ao procedimento investigatório


e a instrução processual penal, no que pese a possibilidade de sua utilização como prova emprestada, ela só
poderá ser deferida como meio de obtenção de prova de crime.
O procedimento de interceptação telefônica possui natureza cautelar, razão pela qual devem estar
presentes o “fumus comissi delicti” e o “periculum in mora/libertatis”.
● Fumus comissi delicti - comprovação da existência de um crime e indícios suficientes de autoria. É a
fumaça da prática de um fato punível. A prova, no limiar da ação penal, pode ser entendida como
grande aproximação à probabilidade da ocorrência do delito, ela não precisa ser uma prova plena.
● Periculum in mora/libertatis - presente quando a liberdade do acusado oferece perigo, sendo uma
razão premente para a decretação de medidas cautelares pessoais (aqui falaremos em periculum in
libertatis), ou Reais (aqui falaremos em periculum in45119
mora), que possam subsidiar lastro para
eventual medida pessoal, como a prisão preventiva,
45119 que tem como requisitos a certeza de
materialidade e indícios de autoria.

Não é possível interceptação telefônica para verificar se uma determinada pessoa, contra a qual
inexiste qualquer indício, está ou não cometendo algum crime. É absolutamente proibida a chamada
INTERCEPTAÇÃO DE PROSPECÇÃO, desconectada da realização de um fato delituoso, sobre o qual ainda não
se conta com indícios suficientes.

B) QUANDO A PROVA NÃO PUDER SER FEITA POR OUTROS MEIOS DISPONÍVEIS:

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando


ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:
II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

A interceptação telefônica deve ser utilizada como medida de última ratio, sob pena de ilicitude da
prova, sendo inegável o caráter subsidiário esta possui como meio de prova.
Ou seja, a medida é exceção, e não regra, só podendo ser manejada quando não houver outro meio
para apurar o fato, nesse sentido;

STF – A interceptação telefônica é subsidiária e excepcional, só podendo ser


determinada quando não houver outro meio para se apurar os fatos tidos como
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SEMANA 01/12

criminosos, nos termos do artigo 2, inc. II da lei n° 9296/1996 (STF 2° Turma.


HC108147/PR).

Considerando seu caráter subsidiário, uma vez que a interceptação telefônica somente deve ser
utilizada diante da insuficiência dos meios de obtenção de prova tradicionais, é certo que não deve ser
adotada, de imediato, pela autoridade policial, ao receber uma denúncia anônima.
É necessário, como em qualquer hipótese de “denúncia anônima” (noticia criminis inqualificada),
que o delegado de polícia proceda à verificação das informações para analisar a plausibilidade e veracidade
das informações obtidas.
Assim, se após a denúncia anônima houver a investigação preliminar, poderá ser decretada a
interceptação telefônica. Nesse sentido, Info 855: “O STJ e o STF entenderam que a decisão do magistrado
foi correta considerando que a decretação da interceptação telefônica não foi feita com base unicamente
na "denúncia anônima" e sim após a realização de diligências investigativas por parte do Ministério Público
e a constatação de que a interceptação era indispensável neste caso.” STJ. 6ª Turma. RHC 38566/ES, Rel.
Min. Ericson Maranho (Des. Conv. do TJ/SP), julgado em 19/11/2015. STF. 2ª Turma. HC 133148/ES, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, julgado em 21/2/2017.

C) CRIME PUNIDO COM RECLUSÃO: 45119

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando


ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:
III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de
detenção.

Aqui o legislador limitou o uso da interceptação telefônica em razão da natureza da pena, só sendo
possível manejá-la caso o crime seja punido com pena de reclusão, estando os crimes punidos com detenção,
e as contravenções, que são punidas com prisão simples, excluídas das hipóteses de incidência de
interceptação telefônica.
Uma questão interessante se dá quanto à possibilidade Interceptação telefônica e crimes de
responsabilidade: Na medida em que o art. 2°, inciso III, da Lei n° 9.296/96, demanda que a infração penal
seja punida com pena de reclusão, depreende-se que não é possível a decretação de interceptação
telefônica para investigar crimes de responsabilidade em sentido estrito (Lei n° 1.079/50 e Decreto-Lei n°
201/67). Afinal, tais crimes não têm natureza jurídica de infração penal, mas sim de infração político-
administrativa, passível de sanções político-administrativas, aplicadas por órgãos jurisdicionais políticos
(normalmente órgãos mistos, compostos por parlamentares ou por parlamentares
45119
e magistrados).
Logicamente, se ao crime de responsabilidade corresponder uma infração penal comum, punida com pena
de reclusão, não haverá qualquer óbice à autorização para a interceptação telefônica, respeitada a
competência legalmente atribuída para o deferimento da medida cautelar.
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SEMANA 01/12

OBS.1: DELIMITAÇÃO DO OBJETO DA INVESTIGAÇÃO: será sempre obrigatória a descrição com clareza da
situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo
impossibilidade manifesta, devidamente justificada.
OBS.2: ORDEM JUDICIAL DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA: O deferimento da interceptação é matéria afeta
à reserva de jurisdição, onde o judiciário tem a última e a primeira palavra, uma vez que o tema tem proteção
diferenciada por ser direito fundamental, conforme se depreende do artigo 5°XII, CF/88.
O entendimento do STJ é no sentido de que eventual consentimento posterior de um dos
interlocutores não supre a falta de autorização judicial prévia (STJ. 5ª Turma. HC 161053-SP, Rel. Min. Jorge
Mussi, julgado em 27/11/2012).

Considerações importantes:

(1) JUIZ DAS GARANTIAS


Com o implemento do pacote anticrime, as decisões sobre interceptação telefônica no inquérito
policial ficarão a cargo do juiz das garantias.
(2) TEORIA DO JUÍZO APARENTE:
Para a TEORIA DO JUIZO APARENTE, se, no 45119
momento da decretação da medida, os elementos
informativos até então obtidos apontavam para a competência da autoridade judiciária responsável pela
decretação da interceptação telefônica, devem ser reputadas válidas as provas assim obtidas, ainda que,
posteriormente, seja reconhecida a incompetência do juiz inicialmente competente para o feito.

STF - Determinado juiz decreta a interceptação telefônica dos investigados


45119
e,
posteriormente, chega-se à conclusão de que o juízo competente para a medida
era o Tribunal. Esta prova colhida é ilícita? Não necessariamente. A prova obtida
poderá ser ratificada se ficar demonstrado que a interceptação foi decretada pelo
juízo aparentemente competente. Não é ilícita a interceptação telefônica
autorizada por magistrado aparentemente competente ao tempo da decisão e
que, posteriormente, venha a ser declarado incompetente. Trata-se da aplicação
da chamada “teoria do juízo aparente (STF. 2ª Turma. HC 110496/RJ).

(3) DECRETAÇÃO DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA DE OFÍCIO PELO JUIZ

Art. 3° A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo


juiz, de ofício ou a requerimento:
I - da autoridade policial, na investigação criminal;
II - do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução
processual penal.
115
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De acordo com a doutrina majoritária, o magistrado NÃO pode atuar de ofício na fase pré-processual,
por caracterizar ofensa ao Sistema Acusatório (consagrado expressamente no art. 3ª-A, CPP). Logo, em tese,
não pode decretar de ofício a interceptação telefônica fora da instrução processual. No entanto, uma vez em
curso o processo, a autoridade judiciária passaria a deter poderes inerentes ao próprio exercício da função
jurisdicional, podendo determinar a interceptação telefônica de ofício.
Ressalta-se que a atuação de ofício do magistrado na fase processual não foge às diversas críticas
doutrinárias, uma vez que o juiz deixa de estar em posição equidistante das partes, atuando como
interessado na instrução processual, o que acabaria ferindo o processo penal contraditório, maculando-o
com traços de inquisitoriedade.

(4) REQUERIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO


O Ministério Público, como “dominus litis” da ação penal, poderá realizar o requerimento de
interceptação telefônica tanto na etapa pré-processual, seja qual for o procedimento de investigação
adotado, quanto na instrução processual, em virtude de sua posição processual.

(5) REPRESENTAÇÃO DO DELEGADO DE POLÍCIA


Já a autoridade policial, em cumprimento de45119
sua função de presidir o inquérito policial, poderá
representar pela interceptação das comunicações telefônicas durante o procedimento investigatório,
quando for a única hipótese possível para carear eventual justa causa contra o investigado, em respeito à
subsidiariedade da interceptação como meio de prova.
Assim, prevalece na doutrina que a autoridade policial possui legitimatio propter officium
(legitimidade do próprio ofício conferido por lei) para representar pela imposição de tutelas cautelares,
representação cognoscível pelo juiz independentemente do teor do parecer ministerial. Nessa hipótese, não
há de se falar em atuação oficiosa do juiz, pois houve provocação por parte da autoridade policial.

(6) INTERCEPTAÇÃO DECLARADA POR JUIZ DA CENTRAL DE INQUÉRITOS CRIMINAL

STF - O art. 1º da Lei nº 9.296/96 não fixa regra de competência, mas sim reserva
de jurisdição para quebra do sigilo das comunicações. Em outras palavras, ele não
trata sobre qual juízo é competente, mas apenas quer dizer que a interceptação
deve ser decretada pelo magistrado (Poder Judiciário). Segundo o entendimento
do STF, admite-se a divisão de tarefas entre juízes que atuam na fase de inquérito
45119
e na fase da ação penal. Assim, um juiz pode atuar na fase pré-processual
decretando medidas que dependam da intervenção do Poder Judiciário, como a
interceptação telefônica, mesmo que ele não seja o competente para julgar a
ação penal que será proposta posteriormente (STF. 2ª Turma. HC 126536/ES)

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DELEGADO SANTA CATARINA

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9. SIGILO PROFISSIONAL DO ADVOGADO

A conversa pessoal e reservada entre advogado e cliente tem toda a proteção da lei, porquanto,
entre outras reconhecidas garantias do advogado, está a inviolabilidade de suas comunicações. Como estão
proibidas de depor as pessoas que, em razão de profissão, devem guardar segredo, é inviolável a
comunicação entre advogado e cliente.
No entanto, o STJ já decidiu que o simples fato de o advogado do investigado ter sido interceptado
não é causa, por si só, para gerar a anulação do processo
A anulação do processo e da condenação imposta ao réu só ocorrerá se for indevida e violar as
prerrogativas da defesa, podendo gerar consequências processuais distintas:
● Cassação ou invalidação do ato judicial que determinou a interceptação;
● Invalidação dos atos processuais subsequentes ao ato atentatório com ele relacionado;
● Afastamento do magistrado caso de demonstre que, ao agir assim, atuava de forma parcial.

As conversas entre investigado e seu advogado, obtidas mediante interceptação telefônica judicialmente
autorizada, seria válida ou a prova deverá ser considerada ilícita?

- Conversas entre investigado e seu advogado sobre 45119


estratégias de defensa: se o investigado interceptado
estiver em conversa com seu advogado tratando, por exemplo, de estratégias relativas à sua defesa o
respectivo conteúdo não poderá ser utilizado como prova para incriminá-lo. A conversa estará acobertada
pelo sigilo profissional do advogado (desdobramento lógico do devido processo legal).

- Advogado como autor, coautor ou partícipe de crime: O sigilo profissional do advogado não poderá ser
invocado como uma espécie de blindagem indiscriminada capaz de imunizá-lo da prática de crimes. Dessa
forma, se o advogado estiver envolvido na prática de crimes autorizadores da medida excepcional da
interceptação telefônica, eventuais conversas gravadas nesse contexto poderão ser utilizadas como prova
de crime.

A decisão deixa claro, que em respeito ao princípio do “pas nullité sans grief”, não haverá nulidade
sem prejuízo, logo, se o próprio juiz, ao perceber que o advogado do investigado foi indevidamente
“grampeado”, anula as gravações envolvendo o professional e, na sentença, não utiliza nenhuma dessas
conversas nem qualquer prova derivada delas, não há motivo para se anular a condenação imposta.
Se o próprio juiz, ao perceber que o advogado do investigado foi indevidamente "grampeado",
anula as gravações envolvendo o profissional e, na sentença, não utiliza nenhuma dessas conversas nem
45119
qualquer prova derivada delas, não há motivo para se anular a condenação imposta. STF. 2ª Turma. HC
129706/PR

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10. ENCONTRO FORTUITO DE ELEMENTO PROBATÓRIO EM RELAÇÃO A OUTROS FATOS DELITUOSOS


(SERENDIPIDADE):

Fala-se em encontro fortuito de provas, “crime achado” ou Serendipidade quando a prova de


determinada infração penal é obtida a partir de diligência regularmente autorizada para a investigação de
outro crime. Nesses casos, a validade da prova inesperadamente obtida está condicionada à forma como foi
realizada a diligência: se houve desvio de finalidade, a prova não deve ser considerada válida; se não houve
desvio de finalidade, a prova é válida.
Atente-se à jurisprudência sobre o45119
tema:

Descobertos novos crimes durante a interceptação, a autoridade deve apurá-los,


ainda que sejam punidos com detenção
Se a autoridade policial, em decorrência de interceptações telefônicas legalmente
autorizadas, tem notícia do cometimento de novos ilícitos por parte daqueles cujas
conversas foram monitoradas ou mesmo de terceiros, é sua obrigação e dever
funcional apurá-los, ainda que não possuam liame algum com os delitos cuja
suspeita originariamente ensejou a quebra do sigilo telefônico. Tal entendimento
é aplicável ainda que as infrações
45119 descobertas fortuitamente sejam punidas com
detenção, pois o que a Lei nº 9.296/96 veda é o deferimento da quebra do sigilo
telefônico para apurar delito que não seja apenado com reclusão, não proibindo,
todavia, que o referido meio de prova seja utilizado quando há, durante a
implementação da medida, a descoberta fortuita de eventuais ilícitos que não
atendem a tal requisito. No caso dos autos, as interceptações telefônicas foram
inicialmente autorizadas para apurar os crimes de corrupção ativa e passiva e
organização criminosa, sendo que, no curso da medida, logrou-se descobrir que os
investigados também eram responsáveis por fraudes à licitações em diversos
Municípios, não havendo que se falar, assim, em nulidade das provas obtidas com
a quebra de sigilo telefônico. STJ. 5ª Turma. AgRg no RHC 114973/SC, Rel. Min.
Jorge Mussi, julgado em 19/05/2020.

STJ – O fato de elementos indiciários acerca da prática de crimes surgirem no


decorrer da execução de medida de quebra de sigilo bancário e fiscal determinada
para a apuração de outros crimes não impede por si só, que os dados colhidos
sejam utilizados para averiguação da suposta prática daquele delito. Com efeito
pode ocorrer o que se chama de fenômeno da SERENDIPIDADE, QUE CONSISTE NA
DESCOBERTA FURTUITA DE DELITOS QUE NÃO SÃO OBJETO DA INVESTIGAÇÃO.
(STJ.6° Turma. HC 282.096- SP)

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No mesmo sentido se posiciona o Supremo Tribunal Federal, que vai além ao considerar a prova
lícita, ainda que o “crime achado” não tenha relação de conexão com o delito que estava sendo investigado,
desde que respeitados os requisitos legais para a interceptação, e que não tenha havido fraude ou desvio de
finalidade:

STF - O réu estava sendo investigado pela prática do crime de tráfico de drogas.
Presentes45119os requisitos constitucionais e legais, o juiz autorizou a interceptação
telefônica para apurar o tráfico. Por meio dos diálogos, descobriu-se que o
acusado foi o autor de um homicídio. A prova obtida a respeito da prática do
homicídio é LÍCITA, mesmo a interceptação telefônica tendo sido decretada para
investigar outro delito que não tinha relação com o crime contra a vida. Na
presente situação, tem-se “crime achado”, ou seja, uma infração penal
desconhecida e não investigada até o momento em que, apurando-se outro fato,
descobriu-se esse novo delito. (STF. 1ª Turma. HC 129678/SP)

A serendipidade pode ser objetiva ou subjetiva:


a) Serendipidade objetiva - Ocorre quando, no curso da medida, surgirem indícios da prática
de OUTRO CRIME que não estava sendo investigado.
45119

b) Serendipidade subjetiva - Ocorre quando, no curso da medida, surgirem indícios do


envolvimento criminoso DE OUTRA PESSOA que inicialmente não estava sendo investigada.
Ex.: durante a interceptação telefônica instaurada para investigar João, descobre-se que um
de seus comparsas é Pedro (Deputado Federal).

A serendipidade pode ser em 1º e 2º grau.


a) Serendipidade de primeiro grau - A prova obtida fortuitamente, quando houver relação de
conexão ou continência.
b) Serendipidade de 2º Grau – Aqui, os fatos descobertos não guardam relação de conexão ou
continência.

11. PROCEDIMENTO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

Art. 4° O pedido de interceptação de comunicação telefônica conterá a


demonstração de que a sua realização é necessária à apuração de infração penal,
com indicação dos meios a serem empregados.
§ 1° Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado
verbalmente, desde que estejam presentes os pressupostos que autorizem a
interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua redução a termo.
§ 2° O juiz decidirá no prazo máximo de vinte e quatro horas.
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SEMANA 01/12

Nesse ponto, é objeto frequente de questionamento a possibilidade de excepcionalmente, o pedido


de interceptação ser realizado oralmente ao juiz, bem como o prazo para a manifestação da autoridade
judiciária, que terá 24 horas para decidir sobre o pedido.
Esse prazo possui natureza imprópria, não gerando qualquer nulidade para a prova.

11.1 Fundamentação da decisão judicial:

Art. 5° A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a


forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias,
renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de
prova.

É indispensável que o magistrado aponte, de maneira concreta, as circunstâncias fáticas que indicam
a adoção da medida cautelar, sob pena de manifesta ilegalidade da decisão e, por consequência, ilicitude da
prova assim obtida.
Requisitos da decisão judicial:
● Quais são os concretos indícios de autoria ou de
45119participação (art. 2., I);

● Quais são as provas existentes a respeito da infração penal (materialidade) (art. 2º, I);
● Que se trata de infração punida com reclusão (art. 2°, III);
● Que a interceptação é necessária em virtude da inexistência de outros meios disponíveis para a
obtenção da prova (art. 2°, II, e art. 4°);
● A descrição com clareza da situação objeto da investigação (delimitação fática da medida, isto é, qual
é o crime, onde está ocorrendo, desde quando vem ocorrendo etc.) (art. 2., parágrafo único); f)
indicação e, se possível, a qualificação do sujeito passivo da medida (identificação do investigado ou
dos investigados (art. 2°, parágrafo único);
● A individualização da linha telefônica que servirá de fonte para a captação da comunicação;
● Quais meios serão empregados para a execução da medida (quais recursos tecnológicos, quais
operações serão feitas etc.) (art. 4°);
● Qual será a forma de execução da diligência — recursos próprios da polícia, recursos da
concessionária, técnicos da concessionária etc. (art. 5°);
● Qual é a duração da medida (o prazo não pode exceder quinze dias);
● Qual é a intensidade da medida (captação
45119de todas as comunicações ou só das chamadas feitas ou

só das chamadas recebidas, ou ambas, apenas constatação das chamadas sem importar o conteúdo
etc.);
● Que a interceptação é proporcional no caso concreto, em razão da gravidade da infração, da
necessidade da prova, dos interesses afetados etc.;
● Que tudo deve ser feito "sob segredo de justiça" (art. 10).
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11.2. Duração da interceptação

Em regra, a execução da diligência não pode ultrapassar o limite de 15 (quinze) dias, a partir do dia
em que a medida é efetivada.
Havendo necessidade de renovação do prazo da interceptação, esta deve se dar antes do decurso do
prazo fixado na decisão originária, mediante decisão judicial motivada, evitando-se uma solução de
continuidade na captação das comunicações telefônicas.
Atenção RE 625.263 – Plenário STF – julgado em 17.03.2022!
São lícitas as sucessivas renovações de interceptações telefônicas desde que:
i) verificados os requisitos do art.2 da Lei 9296/96;
ii) demonstrada a necessidade da medida diante de elementos concretos e a complexidade da
investigação, a decisão judicial inicial e as prorrogações sejam devidamente motivadas, com justificativa
legítima, ainda que sucinta, a embasar a continuidade das investigações.

STJ (RHC 124.057/2020) – De acordo com o STJ, exige-se a fundamentação, não


apenas da decisão que decreta a interceptação telefônica, mas também da que
autoriza as suas sucessivas prorrogações.
45119

Em 2018 o STJ considerou inconstitucional parte da Resolução do CNJ (Resolução nº 59/2008), que
proibia o juiz de prorrogar a interceptação telefônica durante o plantão judiciário ou durante o recesso do
fim de ano (Info 899).

OBS.1: Em 15.09.2020, o45119STJ, no bojo do AgRg no AREsp 1.861.383, entendeu que a captação de
áudio em interceptação telefônica fora do período autorizado resulta na nulidade apenas da gravação
realizada no dia excedente, e não na nulidade de toda a gravação!
OBS.2: A limitação temporal somente é necessária para o fluxo das comunicações, não sendo
requisito indispensável quando se tratar de quebra de sigilo que envolva dados estáticos/já armazenados.

→ Como visto acima, a interceptação pode ser prorrogada sucessivas vezes, desde que fundamentada a
decisão. Desse modo, tanto o deferimento como a prorrogação precisam ser fundamentadas, dito isto,
questiona-se:

ATENÇÃO! O que é fundamentação per relationem? Trata-se de uma forma de motivação por meio da qual
se faz remissão ou referência às alegações de uma das partes, a precedente ou a decisão anterior nos autos
do mesmo processo. É chamada pela doutrina e jurisprudência de motivação ou fundamentação per
relationem ou aliunde. Também é denominada de motivação referenciada, por referência ou por remissão.

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É válida a decisão judicial que se utiliza de fundamentação per relationem para decretar a interceptação
telefônica? Sim! Admite-se o uso da motivação per relationem para justificar a quebra do sigilo das
comunicações telefônicas. No entanto, as decisões que deferem a interceptação telefônica e respectiva
prorrogação devem prever, expressamente, os fundamentos da representação que deram suporte à decisão
– o que constituiria meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação reportada
como razão de decidir – sob pena de ausência de fundamento idôneo para deferir a medida cautelar. STJ. 6ª
Turma. HC 654131-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/11/2021 (Info 723).

Em decisões que autorizem a interceptação das comunicações telefônicas de


investigados, é inválida a utilização da técnica da fundamentação per
relationem (por referência) sem tecer nenhuma consideração autônoma, ainda
que sucintamente, justificando a indispensabilidade da autorização de inclusão
ou de prorrogação de terminais em diligência de interceptação telefônica. RHC
119.342-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade,
julgado em 20/09/2022.

Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! Quanto ao uso da fundamentação per relationem, na
jurisprudência do STJ, na interceptação telefônica é correto
45119 afirmar que: a utilização da técnica, seja para fim
de reafirmar a fundamentação de decisões anteriores, seja para incorporar à nova decisão os termos de
manifestação ministerial anterior, não implica vício de fundamentação. (Item considerado correto pela
45119
banca).

12. EXECUÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

Segundo o STJ (RHC 80.773/2020), o artigo 6º, ao atribuir à autoridade policial a competência para
conduzir a interceptação, não pode ser interpretado de forma totalmente estrita. Isso porque admite-se a
legitimidade de órgão da Secretaria de Segurança Pública para conduzir o trabalho de interceptação.
Ademais, há desnecessidade de degravação integral das conversas efetuadas desde que
assegurado às partes o acesso à integralidade dos registros. Não há na lei qualquer exigência no sentido de
que a degravação seja submetida à perícia. Além disso, é desnecessário que a transcrição das gravações
resultantes da interceptação telefônica seja feita por peritos oficiais: cuidando-se de tarefa que não exige
conhecimentos técnicos especializados, pode ser realizada pelos próprios policiais que atuaram na
investigação.
Por fim, a conversão do conteúdo das interceptações telefônicas em formato escolhido pela defesa
não é ônus atribuído ao Estado (Info 731).

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Art. 7° Para os procedimentos de interceptação de que trata esta Lei, a autoridade


policial poderá requisitar serviços e técnicos especializados às concessionárias de
serviço público.

Art. 8° A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá


em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo
criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições
respectivas.
Parágrafo único. A apensação somente poderá ser realizada imediatamente antes
do relatório da autoridade, quando se tratar de inquérito policial (Código de
Processo Penal, art.10, § 1°) ou na conclusão do processo ao juiz para o despacho
decorrente do disposto nos arts. 407, 502 ou 538 do Código de Processo Penal.

É importante frisar que a ausência de autos apartados configura mera irregularidade, sem o condão
de macular a prova, uma vez que, dessa ausência, não se pode auferir prejuízo em concreto à nenhuma das
partes.

Art. 9º. A gravação que não interessar


45119 à prova será inutilizada por decisão judicial,
durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de
requerimento do Ministério Público ou da parte interessada.
Parágrafo único. O incidente de inutilização será assistido pelo Ministério Público,
sendo facultada a presença do acusado ou de seu representante legal.

a) Momento: O incidente de inutilização das conversas telefônicas que poderá ser instaurado ao longo
de toda a persecução penal, inclusive após a instrução processual, mas até a prolação da sentença,
já que exaurido a sua competência, não podendo reconhecer esse incidente. O terceiro pode
requerer o desarquivamento da condenação ao juízo da condenação originária sendo um exemplo
de jurisdição voluntária. Isso pode ocorrer quando um terceiro vê sua vida exposta.
45119

b) Legitimidade: Quem pode requerer é o MP ou a parte interessada. Utilizar o termo “parte


interessada” foi proposital do legislador para gerar um termo amplo que envolve o ofendido e
terceiros interessados.
c) Presença do acusado: A presença é facultativa, mas a notificação pessoal do imputado é obrigatória
sob pena de nulidade de toda a interceptação telefônica. Isso porque a defesa não terá à sua
disposição todo o material interceptado e, sim, apenas material editado, não sendo possível aferir se
foram ou não destruídas conversas telefônicas que poderiam ser exploradas pelo réu em seu prol.

13. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E AUTORIDADES COM FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO

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O entendimento do STJ é pacífico no sentido de que, na hipótese de o interceptado manter contato
telefônico com autoridade detentora de foro por prerrogativa de função, sendo a interceptação deferida por
juízo de 1ª instância, a gravação dessas conversas NÃO é nula por violação ao foro por prerrogativa de
função, considerando que não era a autoridade quem estava sendo interceptada.
No entanto, é importante ressaltar que a gravação não será nula se a presença da autoridade
detentora de foro for descoberta fortuitamente, hipótese em que a autoridade judicial não deve demorar a
declinar a competência. Assim, a partir do momento em que surgem indícios de participação de detentor de
prerrogativa de foro nos fatos apurados, cumpre à autoridade judicial declinar da competência, e não
persistir na prática de atos objetivando aprofundar a investigação.

14. INTERCEPTAÇÃO DAS COMUNICAÇÕES AMBIENTAIS

A par da interceptação das comunicações telefônicas, a Lei n°. 9296/96 também disciplina a
interceptação das comunicações ambientais, que já era disciplinada pela doutrina brasileira. Note que, com
o advento do Pacote Anticrime, a captação ambiental passou a ser tratada expressamente na Lei n°.
9296/96.
● Até o advento da Lei 13.964/2019 (PAC), a captação ambiental era um meio de obtenção de prova
nominado atípico: 45119

∘ Nominado - estava previsto na Lei 12.850/2013 como um dos meios de obtenção de provas
disponíveis para a persecução penal de tais delitos;
∘ Atípico - não existia diploma normativo que dispusesse, expressamente, acerca dos seus
requisitos. Aplicava-se por analogia, então, o procedimento descrito na Lei 9296/96 acerca da
interceptação telefônica.
● Com a inserção do art. 8º-A, a captação ambiental se tornou um meio de obtenção de prova
nominado e típico.

Vejamos os conceitos:
a) Comunicação ambiental: De acordo com Renato Brasileiro, “é aquela realizada diretamente no
meio ambiente, sem transmissão e recepção por meios físicos, artificiais, como fios elétricos, cabos óticos
etc. Enfim, trata-se de conversa mantida entre duas ou mais pessoas sem a utilização do telefone, em
qualquer recinto, privado ou público”.
b) Interceptação ambiental: é a captação sub-reptícia de uma comunicação no próprio ambiente
dela, por um terceiro, sem conhecimento dos comunicadores. Não difere, substancialmente, da
interceptação em sentido estrito, pois, em ambas as hipóteses, ocorre violação do direito à intimidade,
porém, no caso da interceptação ambiental, a comunicação não é telefônica. A título de exemplo, suponha-
se que, no curso de investigação relativa ao crime de tráfico de drogas, a autoridade policial realize a
filmagem de indivíduos comercializando drogas em uma determinada praça, sem que os traficantes tenham
ciência de que esse registro está sendo efetuado.
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SEMANA 01/12

c) Escuta ambiental: é a captação de uma comunicação, no ambiente dela, feita por terceiro, com o
consentimento de um dos comunicadores. Por exemplo, imagine-se a hipótese de cidadão vítima de
concussão que, com o auxílio da autoridade policial, efetue o registro audiovisual do exato momento em que
funcionário público exige vantagem indevida para si em razão de sua função.
d) Gravação ambiental: é a captação no ambiente da comunicação feita por um dos
comunicadores (ex. gravador, câmeras ocultas etc.).
Muito sempre se questionou a respeito da possibilidade de a comunicação ambiental ser objeto de
escuta e de servir ou não como prova para fins de persecução penal. A doutrina e jurisprudência admitiam a
captação ambiental como meio de obtenção de prova, normalmente, acompanhada de autorização judicial,
essencialmente, naqueles casos em que houvesse qualquer tipo de sigilo ou restrição em relação às
conversas travadas.
É justamente nesse sentido que as alterações implementadas pelo PACOTE ANTICRIME operam,
buscam trazer regulamentação para que ocorra a interceptação de comunicações ambientais e estas sejam
utilizadas de forma legítima à instrução processual penal. Vejamos abaixo as novidades trazidas pela Lei
13.964/2019:
Foi incluído o artigo 8-A na Lei 9.296/96, nos seguintes termos:

Art. 8º-A. Para investigação ou


45119instrução criminal, poderá ser autorizada pelo juiz,

a requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, a captação


ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, quando: (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes;
e (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em
infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou
em infrações penais conexas. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º O requerimento deverá descrever circunstanciadamente o local e a forma de
instalação do dispositivo de captação ambiental. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019) § 2º A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada,
quando necessária, por meio de operação
45119
policial disfarçada ou no período
noturno, exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do art. 5º da
Constituição Federal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) havia sido
inicialmente vetado pelo Presidente da República, seguido de posterior cassação
do veto pelo Congresso Nacional
§ 3º A captação ambiental não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias,
renovável por decisão judicial por iguais períodos, se comprovada a
indispensabilidade do meio de prova e quando presente atividade criminal
permanente, habitual ou continuada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
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SEMANA 01/12

§ 4º A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio


conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser
utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) havia sido inicialmente vetado pelo
Presidente da República, seguido de posterior cassação do veto pelo Congresso
Nacional
§ 5º Aplicam-se subsidiariamente à captação ambiental as regras previstas na
legislação específica para a interceptação telefônica e telemática. (Incluído pela
45119
Lei nº 13.964, de 2019)

Desse modo, a partir da entrada em vigor da Lei 13.964/2019, passa-se a exigir autorização judicial,
com o objetivo de investigação ou instrução criminal, para a captação ambiental de sinais eletromagnéticos,
ópticos ou acústicos.
À semelhança do art. 1º da Lei 9.296/96, que abrange tanto a interceptação telefônica em sentido
estrito quanto a escuta telefônica, o art. 8º faz uso da expressão “captação ambiental” em sentido amplo,
englobando a interceptação ambiental em sentido estrito e a escuta ambiental, pois ambas consistem em
processos de captação da conversa alheia.
Ressalta-se ainda que a doutrina e jurisprudência
45119 apontam que a interceptação ambiental está
tutelada no inciso X do art. 5º da CF/88 – garantia constitucional da intimidade e vida privada.

14.1 Cláusula de Reserva de Jurisdição

Inicialmente, observa-se que se trata de hipótese sujeita à cláusula de reserva de jurisdição. Assim,
será decretada judicialmente a captação ambiental para fins de investigação criminal ou instrução processual
penal.
É interessante observar que a captação ambiental não poderá ser decretada de ofício, nem mesmo
na fase processual, já que exige:
(a) Representação da autoridade policial (curso da investigação);
(b) Requerimento do membro do Ministério Público (curso da investigação ou no curso do processo).

PEGADINHA DE PROVA OBJETIVA (LETRA DA LEI)


- Interceptação telefônica – juiz poderia atuar oficiosamente;
- Captação ambiental – juiz não pode determinar de ofício.

Quais os requisitos para que a autorização judicial seja deferida?


1 - Demonstração da extrema necessidade da medida, ou seja, a prova não pode ser passível de
produção por outro meio menos lesivo à disposição das autoridades.

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

2 - Elementos probatórios razoáveis de autoria ou participação em infrações penais cuja pena seja
superior a 04 anos ou em infrações penais conexas cuja soma das penas sejam superiores a esse
quantitativo (O critério é quantitativo, de modo que pode ser crime apenado com detenção ou
reclusão).
3 - Descrição circunstanciada do local e da forma que o dispositivo de captação ambiental será instalado.

Qual é o prazo em que ocorrerá a captação ambiental?


A captação ambiental será autorizada inicialmente pelo prazo de até 15 dias, sem prejuízo de
sucessivas prorrogações por meio de decisão judicial nos casos de:
(a) Indispensabilidade dos meios de prova.
(b) Atividade criminal permanente, habitual ou continuada.
O referido dispositivo determina a aplicação das demais regras a respeito da interceptação telefônica
naquilo que não houver regramento específico.

14.2 Captação Ambiental Clandestina e Figura Criminosa Respectiva

Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de


informática ou telemática, promover
45119 escuta ambiental ou quebrar segredo da
Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em
lei: (Redação dada pela Lei nº 13.869. de 2019)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº
13.869. de 2019)
Parágrafo único. Incorre na mesma pena a autoridade judicial que determina a
execução de conduta prevista no caput deste artigo com objetivo não autorizado
em lei. (Incluído pela Lei nº 13.869. de 2019)
Art. 10-A. Realizar captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou
acústicos para investigação ou instrução criminal sem autorização judicial, quando
esta for exigida: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 1º Não há crime se a captação é realizada por um dos
interlocutores. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
45119
§ 2º A pena será aplicada em dobro ao funcionário público que descumprir
determinação de sigilo das investigações que envolvam a captação ambiental ou
revelar o conteúdo das gravações enquanto mantido o sigilo judicial.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

A captação promovida por um dos interlocutores, mesmo sem o conhecimento dos demais, não depende
de autorização judicial, sendo, portanto, fato atípico (conclusão reforçada pelo §i» do art. 10-A da Lei n°
9.296/96).
- A captação promovida em lugares públicos também independe de autorização judicial. Sendo assim, se
colocada em prática não haverá crime e a prova obtida será considerada lícita.

✓ Condutas punidas apenas à título de dolo;


✓ Crime de ação penal pública incondicionada em razão do silêncio legal;
✓ Em regra, competência da Justiça Comum Estadual. Pode ser competência da Justiça Federal caso se
enquadre no rol do art. 109, CF (Ex.: crime perpetrado por funcionário público federal no exercício
da função).

O legislador foi cuidadoso a ponto de estabelecer conduta criminosa específica na hipótese de:
1) Captação ambiental sem autorização judicial, quando ela for exigida.
2) Funcionário público descumprir a determinação de sigilo das investigações que envolvam
captação ambiental ou revelar o conteúdo das gravações enquanto mantido o sigilo judicial.

14.3 Causa de Ausência de Tipicidade 45119

Não haverá enquadramento no referido delito se a captação for realizada por um dos interlocutores.
Dessa forma, podemos observar que o referido dispositivo legal somente se adequa aquelas situações em
que a captação ambiental é realizada por terceiro, não participante das conversas realizadas.
45119

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META 3

DIREITO CONSTITUCIONAL: DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CF/88
⦁ Art. 1º, III
⦁ Art. 3º
⦁ Arts. 4º, 5º, 6º e 7º
⦁ Art. 8º a 11º

OUTROS DIPLOMAS LEGAIS


⦁ Lei nº 9.296/96 (Lei de interceptação telefônica)
⦁ Lei nº 9.455/97 (Lei de tortura)
⦁ Lei nº 7.716/90 (Lei de racismo)
⦁ Lei nº 12.037/2009 (Lei de Identificação criminal)
⦁ Lei nº 12.016/2009 (Lei do mandado de segurança)
45119
⦁ Lei nº 13.300/2016 (Lei do mandado de injunção)

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

PRINCIPAIS INCISOS DO ART. 5º, CF/88:


⦁ Inc. I, II, IV
⦁ Inc. III e XLII (leitura conjunta com a Lei nº 7.716/90)
⦁ Inc. VIII (leitura conjunta com o art. 15, IV, CF/88)
⦁ Inc. XI (leitura conjunta com os arts. 3-B, XI; 240, §1º e 243 do CPP)
⦁ Inc. XII (leitura conjunta com a Lei nº 9.296/96)
⦁ Inc. XVI a XXI (muito cobrados em prova objetiva!) 45119

⦁ Inc. XXXIII a XXXV


⦁ Inc. XXXVII (leitura conjunta com o inc. LIII – princípio do juiz natural)
⦁ Inc. XXXIX e XL (leitura conjunta com o art. 1º e 2º do CP)
⦁ Inc. XLIII a LV (leitura obrigatória!)
⦁ Inc. LVI (leitura conjunta com o art. 157, CPP)
⦁ Inc. LVII e LX
⦁ Inc. LVIII (leitura conjunta com o art. 3º, 4º e 5º da Lei nº 12.037/2009)
⦁ Inc. LXI a LXVII (leitura conjunta com os art. 301 a 310, CPP)
⦁ Inc. LXVIII

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⦁ Inc. LXIX e LXX (leitura conjunta com a Lei nº 12.016/2009)


⦁ Inc. LXXI (leitura conjunta com a Lei nº 13.300/2016)
⦁ Inc. LXXII a LXXVIII
⦁ §§1º e 3º

1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

São decididos antes da elaboração do texto, no momento de construção das normas. Têm natureza
de vetores interpretativos que imprimem coesão, harmonia e unidade ao sistema.
Subdividem-se em:
a) princípios constitucionais sensíveis: aqueles expressos na Constituição, também denominados
princípios apontados/enumerados;
b) estabelecidos/organizatórios: limitam, vedam ou proíbem que o Poder Constituinte decorrente
atue de forma indiscriminada e podem ser extraídos a partir da interpretação do conjunto de normas
centrais, dispersas no texto constitucional;
c) extensíveis: de acordo com Bulos, são aqueles que integram a estrutura da federação brasileira,
relacionando-se, por exemplo, com a forma de investidura dos cargos eletivos, o processo legislativo,
orçamentos e preceitos ligados 45119
à Administração Pública.
45119

O QUE É O PREÂMBULO E QUAL A SUA NATUREZA JURÍDICA?

O preâmbulo é a parte precedente da CF. Segundo o STF, adotando a tese da irrelevância jurídica, é mero
vetor interpretativo do que se acha inscrito no texto constitucional. Não possui força normativa, logo, não
pode ser parâmetro nem objeto de controle de constitucionalidade.

* ATENÇÃO – PRINCÍPIOS QUE REGEM AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS (ART. 4º): leitura


obrigatória.

OUTROS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: Os Princípios Constitucionais estão presentes não só no art.


5º, mas em diversos dispositivos, a exemplo dos princípios tributários, previstos no art. 150, e dos princípios
expressos da Administração Pública (art. 37, caput). Assim, atente-se brevemente aos princípios da dignidade
da pessoa humana, legalidade e isonomia, sem prejuízo dos demais que se inserem na Carta Magna – e
serão tratados nas matérias específicas:

a) Dignidade da pessoa humana: Define Luís Roberto Barroso que o “princípio da dignidade humana
expressa um conjunto de valores civilizatórios que se pode considerar incorporado ao patrimônio da
humanidade. Dele se extrai o sentido mais nuclear dos direitos fundamentais, para tutela do mínimo
existencial e da personalidade humana, tanto na dimensão física como na moral”. Decorre do aludido
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princípio, por exemplo, a impenhorabilidade do bem de família e a união estável entre pessoas do mesmo
sexo. É considerado um “super-princípio”.

O fato de a dignidade humana ser positivada na Constituição como princípio fundamental


45119
da
República confere-lhe a natureza de norma jurídica, seja como princípio ou como regra, mas, de todo modo,
como norma. Ela é também um valor constitucional relevante. Isso significa que ela passa a ter ao menos
eficácia negativa contra normas infraconstitucionais e contra atos que se contraponham à dignidade
humana, isto é, tais normas e atos podem ser reconhecidos como inválidos (antijurídicos), no que forem
contrários a ela. Além disso, como princípio fundamental da República, a dignidade deve ser considerada na
interpretação das demais normas do ordenamento jurídico, uma vez que é também objetivo a ser alcançado
na atuação do Estado brasileiro. A dignidade humana tem sido frequentemente adotada com essas funções
pelo Supremo Tribunal Federal, na interpretação do direito.

b) Legalidade: o princípio da legalidade significa que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo
que não esteja previamente estabelecido na própria CF/88 e nas normas jurídicas dela derivadas. O princípio
da legalidade, desta forma, se converte em princípio da constitucionalidade (Canotilho), subordinando toda
atividade estatal e privada à força da Constituição. No direito brasileiro encontra-se previsto nos arts. 5º, II;
37; e 84, IV, da CF/88. 45119

I. Legalidade x Reserva Legal: o princípio da reserva legal é um desdobramento da legalidade, que impõe e
vincula a regulação de determinadas matérias constantes na constituição à fonte formal do tipo lei.

II. Acepções do princípio da legalidade:

1) Para particulares: somente a lei pode criar obrigações, de forma que a inexistência de lei proibitiva
de determinada conduta implica ser ela permitida. Vigora a autonomia da vontade.
2) Para a Administração Pública: O Estado se sujeita às leis, e deve atuar em conformidade à previsão
legal. O administrador público só poderá agir dentro daquilo que é previsto e autorizado por lei. Obs.
Sob esta acepção, o princípio da legalidade vem sofrendo uma releitura pela doutrina moderna, que
defende a necessidade de conformação da atividade do administrador ao Direito (e não apenas à lei).
Assim, fala-se atualmente em princípio da juridicidade (o assunto é aprofundado em Direito
Administrativo).

c) Isonomia: O princípio da igualdade compreende a igualdade formal e igualdade material, a primeira


abrange a igualdade na lei, isto é, que nas normas jurídicas não pode haver distinções que não sejam
autorizadas pela Constituição e que tem por destinatário o legislador e a igualdade perante a lei tem como
destinatário os aplicadores da lei, segundo o qual deve se aplicar igualmente a lei, ainda que crie uma
desigualdade. (JUNIOR, 2020, p.p. 620/621)
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Logo, é possível extrair:


● Isonomia formal: igualdade perante a lei;
● Isonomia material: tratar os desiguais na medida de sua desigualdade.

É POSSÍVEL ESTABELECER CRITÉRIOS DIFERENCIADORES PARA ADMISSÃO DE CANDIDATO EM


CONCURSOS PÚBLICOS?

A jurisprudência vem admitindo algumas hipóteses de discriminação, podendo ocorrer em relação à idade,
sexo, altura, etc., desde que sejam observados dois requisitos:
1) Previsão legal anterior definindo os critérios de admissão para o cargo; e
2) Razoabilidade da exigência, decorrente da natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.

É constitucional a remarcação do teste de aptidão


45119
física de candidata que esteja grávida à época de sua
realização, independentemente da previsão expressa em edital do concurso público. STF. Plenário. RE
1058333/PR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 21/11/2018 (repercussão geral).

AÇÕES AFIRMATIVAS
45119

A Carta Magna busca a igualdade material. Para aplicação do princípio da isonomia, são necessárias as ações
afirmativas, também denominadas discriminações positivas, cuja finalidade é proteger certos grupos sociais
que demandam tratamento diverso. Tais ações consideram a realidade histórica de marginalização ou
hipossuficiência e, assim, funcionam como medidas de compensação com o fim de concretizar uma
igualdade de oportunidades. A exemplo, podemos citar: mercado de trabalho da mulher, cotas de vagas sem
serviços públicos, cotas em universidades (PROUNI), cotas, Lei Maria da Penha.

2. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS2

A CF/88 no Título II classifica o gênero direitos e garantias fundamentais em importantes grupos.


Veja:
- Direitos e Deveres individuais e coletivos;
- Direitos sociais;
- Direitos de nacionalidade;
- Direitos políticos;

2
Para aprofundamento no assunto, consultar:
http://www.stf.jus.br/repositorio/cms/portaltvjustica/portaltvjusticanoticia/anexo/joao_trindadade__teoria_geral_d
os_direitos_fundamentais.pdf

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- Partidos políticos.

2.1 Direitos x Garantias x Remédios Constitucionais

● Direitos: são normas de conteúdo declaratório da existência de um interesse, de uma vantagem, isto
é, imprimem a existência legal. Ex.: direito à vida, à propriedade;
● Garantias: normas de conteúdo assecuratório, que servem para assegurar o direito declarado. As
garantias são estabelecidas pelo texto constitucional como instrumento45119
de proteção dos direitos
fundamentais e writs constitucionais. São também chamadas de instrumentos de tutela das
liberdades e ações constitucionais.

DIREITOS FUNDAMENTAIS GARANTIAS FUNDAMENTAIS


NORMAS QUE PROTEGEM os bens jurídicos INSTRUMENTOS que buscam proteger os
fundamentais de uma sociedade direitos fundamentais
Tem valor intrínseco, nele mesmo Tem valor instrumental

Ilustrando: é inviolável a liberdade de consciência e de crença (direito), garantindo-se na forma da lei a


proteção aos locais de culto e suas liturgias (garantia).45119

● Remédios Constitucionais: embora todo remédio constitucional seja uma garantia, nem toda
garantia é um remédio constitucional, porque este é um instrumento processual que tem por
objetivo assegurar o exercício de um direito. Ex.: Habeas Corpus, Mandado de Segurança. Pode-se
dizer que os remédios constitucionais são espécies do gênero garantia.

ATENÇÃO: alguns dispositivos constitucionais contêm direitos e garantias no mesmo enunciado. O art. 5º, X,
estabelece a inviolabilidade do direito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, assegurando,
em seguida, o direito à indenização em caso de dano material ou moral provocado pela sua violação.

2.2 Direitos Fundamentais x Direitos Humanos

Embora materialmente ambos objetivem a proteção e a promoção da dignidade da pessoa humana,


não se confundem. Assim, convém destacar que a doutrina estabelece duas distinções entre os direitos
humanos e os direitos fundamentais.
o Direitos Humanos: são direitos reconhecidos no âmbito internacional; nem sempre exigíveis
internamente.
o Direitos fundamentais: são direitos reconhecidos no plano interno de um determinado
Estado. Preferencialmente, positivados na CF; passíveis de cobrança judicial.

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DIREITOS FUNDAMENTAIS DIREITOS HUMANOS


FORMAL Encontram previsão formal Encontram fundamento
FUNDAMENTO DE nas constituições nos Tratados
VALIDADE/JURÍDICO Internacionais;
Exemplo: Declaração
Universal dos Direitos
Humanos da ONU

MATERIAL Estabelecem o conjunto de Buscam a proteção da


LIGADA AO CONTEÚDO bens jurídicos básicos, pessoa humana
FINALIDADE DE CADA UM DOS essenciais de uma (exclusivamente).
INSTITUTOS sociedade, não se limitando Não há que se falar em
à proteção da pessoa física direito

Como se classificam as normas constitucionais de direitos


45119 fundamentais quanto à eficácia e aplicabilidade?

Pela classificação de José Afonso da Silva e considerando não haver direito fundamental absoluto, as normas
podem possuir eficácia plena, e podem apresentar, conforme a hipótese, eficácia contida (ou restringível)
ou limitada.

O que significa os efeitos negativo e positivo das normas constitucionais de direitos fundamentais? O efeito
positivo diz respeito ao fato de que, pelo simples fato de surgir uma nova Constituição, ela revoga tudo do
ordenamento anterior que for contrário a ela. As normas constitucionais têm, assim, efeitos positivos, no
sentido de proativo, pois revogam (não recepcionam) tudo do ordenamento anterior que for contrário a elas.
Já o efeito negativo, por sua vez, tem o sentido de vedar/negar ao legislador ordinário a possibilidade de
produzir normas infraconstitucionais contrárias a ela (norma constitucional); e, acaso o poder legiferante
fizer, o judiciário, entendendo que houve contrariedade, extirpa a norma do ordenamento jurídico por
intermédio do controle de constitucionalidade.

A Carta Magna de 1988 é um


45119marco na história constitucional brasileira, pois a sua abertura aos

direitos foi baseada também nos tratados internacionais celebrados pelo Brasil. Dessa forma, ela introduziu
o mais extenso rol de direitos de diversas espécies, incluindo direitos civis, políticos, econômicos, sociais e
culturais, além de prever várias garantias constitucionais.
Ademais, o art. 5°, §2°, da CRFB/88 prevê o princípio da não exaustividade dos direitos
fundamentais, ou seja, que o rol desses direitos não é taxativo, ao afirmar que os direitos e garantias

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expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes: i) do regime e dos princípios por ela adotados
e ii) dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

2.3 Geração dos direitos fundamentais

As dimensões ou gerações dos direitos humanos são cobrados com frequência nos Concursos
Públicos. O tema foi apresentado pela primeira vez por Karel Vasak, em sua forma clássica chamada de
Gerações dos Direitos Humanos, desdobrando-se em 1ª, 2ª e 3ª gerações.
Trata-se de classificação dos direitos fundamentais
45119 que tem como critério o contexto histórico em

que surgiram, a ordem cronológica de reconhecimento e afirmação dos direitos fundamentais.

#DICA DD: Classificar os direitos em gerações sugere a ideia de superação de que


as gerações mais novas suplantam as anteriores. Assim, e visando afastar essa
concepção substitutiva de uma geração sobre a outra bem como a impressão de
que existe uma relação de antiguidade ou posteridade dos direitos, a doutrina
moderna entende que o mais adequado é falar em dimensões, uma vez que
inexiste cronologia nesses direitos.
45119

Direitos fundamentais são indivisíveis. Possuem relação entre si de fortalecimento mútuo e não de
exclusão mútua. O surgimento de uma nova geração de direitos tem o viés de fortalecer a geração já
existente. Ex.: direito à educação fortalece o direito de liberdade de expressão.

1) DIREITOS DE PRIMEIRA GERAÇÃO OU PRIMEIRA DIMENSÃO (individuais ou negativos):


Surgem no contexto histórico das revoluções liberais, burguesas, diante do nascimento do
constitucionalismo liberal – Séc. XIX. Marcam a passagem de um Estado autoritário para um Estado de
Direito. Grandes Marcos dos direitos de 1ª dimensão:
· Inglaterra – 1.215 – Magna Carta, assinada pelo Rei “João Sem Terra”
· EUA – 1.776 – Declaração de Independência Americana
· EUA – 1.787 – Constituição Americana
· França – 1.789 – Revolução Francesa
· França – 1.791 – Constituição Francesa

Estão relacionados à luta pela liberdade e segurança diante do Estado. Trata-se de impor ao Estado
obrigações de não-fazer (absenteísmo estatal) e se relacionam às pessoas, individualmente. Ex: propriedade,
igualdade formal (perante a lei), liberdade de crença, de manifestação de pensamento, direito à vida etc.
Obs.1: são chamados também de direitos negativos ou direitos de defesa.
Obs.2: o fundamento dos direitos de 1ª geração/dimensão é a IGUALDADE FORMAL.

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2) DIREITOS DE SEGUNDA GERAÇÃO OU SEGUNDA DIMENSÃO (sociais, econômicos e culturais ou


direitos positivos):
Surgem no final do século XIX e início do século XX, diante do fenômeno do constitucionalismo social
(ligado ao movimento do socialismo). Grandes Marcos:45119
· Constituição Mexicana de 1917
· Constituição Alemã de Weimar de 1919
· Tratado de Versalhes, de 1919 (OIT)
· Rússia – 1.917/18 – Declaração do Povo Oprimido e Trabalhador – Revolução Russa
· Constituição Brasileira de 1934.

São os direitos de grupos sociais menos favorecidos, e que impõem ao Estado uma obrigação de
fazer, de prestar (por isso são chamados de direitos prestacionais). Buscam viabilizar, através do Estado, a
satisfação das necessidades básicas dos indivíduos como forma de lhes proporcionar uma vida digna. Ex.:
saúde, educação, moradia, segurança pública.

Observação: A teoria da reserva do possível é uma limitação fática e jurídica oponível à realização dos direitos
fundamentais, sobretudo os de cunho prestacional. Como é cediço, o Estado não possui recursos materiais
ilimitados, o que leva os administradores a realizarem45119
escolhas trágicas, alocando esses recursos em ações
prioritárias. O limite da reserva do possível é o mínimo existencial, núcleo da dignidade da pessoa humana.
Nesse contexto, a reserva do possível deve ser analisada sob três aspectos:

I - Disponibilidade fática dos recursos para efetivação dos direitos fundamentais.


II - Disponibilidade jurídica dos recursos, mediante autorização orçamentária.
III - Razoabilidade e proporcionalidade da prestação, levando-se em consideração a universalização da
demanda, não apenas o indivíduo. Nesse sentido, não se pode exigir judicialmente do Estado uma prestação
que não possa ser concedida a todos os indivíduos que se encontrem em situação idêntica, sob pena de
violação do princípio da isonomia.

Contudo, conforme reiterada jurisprudência do STF, o fundamento da reserva do possível pelo Estado não
é tese apta a fundamentar a não execução de políticas públicas. Com efeito, prepondera-se a tese do
mínimo existencial. A exemplo, é a ADPF de n° 347 que, em seu bojo, aplicou a tese do estado de coisas
inconstitucional em razão da massiva violação de direitos fundamentais em seu sentido objetivo.

Inclusive, o STF no tema 365 da repercussão geral fixou a seguinte tese: “Considerando que é dever do
Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade
previsto no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, §6°, da Constituição
Federal, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em
decorrência da falta de ou insuficiência das condições legais de encarceramento” (RE 580.252, 16.02.2017).
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Assim, a Corte entendeu que não sendo assegurado o mínimo existencial, não se poderia sustentar a
aplicação da cláusula de reserva financeira do possível para o Estado deixar de indenizar.

Obs.1: o fundamento dos direitos de 2ª dimensão é a IGUALDADE MATERIAL.


Obs.2: o efeito bipolar dos direitos de 2ª dimensão e princípio da vedação ao retrocesso:
Os direitos de 2ª dimensão (direitos sociais) não possuem apenas um viés positivo, mas também um
viés negativo.

● Viés negativo – Fruto da vedação ao retrocesso


45119 (efeito cliquet) → Uma vez implementado o direito
de 2ª dimensão por medida estatal, o próprio Estado passa a ter o dever de se abster de retornar ao
status quo de quando o direito ainda não tinha efetividade. Ex.: 13º salário.
● Viés positivo – Aqui a ideia não é só manter o status quo, mas também implementar/desenvolver
novos direitos sociais. E, enquanto não for implementado, o indivíduo possui o direito de exigir um
atuar do Estado com o intuito de realizá-lo (ideia de direitos prestacionais).

3) DIREITOS DE TERCEIRA GERAÇÃO OU TERCEIRA DIMENSÃO (difusos e coletivos):


Surgem na 2º metade do séc. XX, no pós 2ª Guerra,
45119 ligados aos movimentos de melhoria da qualidade

de vida dos cidadãos. São direitos transindividuais, isto é, direitos que são de várias pessoas, mas não
pertencem a ninguém isoladamente. Transcendem o indivíduo isoladamente considerado. Necessidade de
preservacionismo ambiental e as dificuldades para proteção dos consumidores. Possuem caráter indivisível
e são titularizados por toda a coletividade. Ex.: direito ao meio ambiente.
São também conhecidos como:
● DIREITOS DE FRATERNIDADE
● Direitos metaindividuais (estão além do indivíduo)
● Direitos supraindividuais (estão acima do indivíduo isoladamente considerado).

Vamos esquematizar?
Direitos de 1ª Direitos de 2ª Direitos de 3ª
GERAÇÃO/DIMENSÃO GERAÇÃO/DIMENSÃO GERAÇÃO/DIMENSÃO
Surgem com revoluções Surgem no final do século XIX e 2ª metade do séc. XX, no pós 2ª
CONTEXTO liberais, burguesas, diante do início do século XX, diante do Guerra, ligados aos
HISTÓRICO nascimento do fenômeno do movimentos de melhoria da
constitucionalismo liberal. – constitucionalismo social. qualidade de vida dos cidadãos
Séc. XIX.

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MARCOS Inglaterra – 1.215 – Magna Constituição Mexicana de 1917


Carta Constituição Alemã de Weimar
EUA – 1.776 – Declaração de de 1919
Independência Americana Rússia – 1.917/18 – Declaração
EUA – 1.787 – Constituição do Povo Oprimido e
Americana Trabalhador – Revolução Russa
França – 1.789 – Revolução Constituição Brasileira de
Francesa 1934.
França – 1.791 – Constituição
Francesa
SINÔNIMOS direitos negativos, direitos de direitos sociais, econômicos e difusos e coletivos
abstenção. culturais direitos metaindividuais
direitos positivos, direitos direitos supraindividuais
prestacionais
FUNDAMENTO Igualdade FORMAL Igualdade MATERIAL FRATERNIDADE
CONCEITO Buscam limitar o poder estatal, São direitos que impõem ao São direitos transindividuais,
impondo ao Estado obrigações Estado uma obrigação de fazer, isto é, titularizados por toda a
de não-fazer
45119 e se relacionam às de prestar.
45119 coletividade, não pertencendo
pessoas, individualmente. Buscam viabilizar, através do a uma pessoa isoladamente.
Estado, a satisfação das
necessidades básicas dos Possuem caráter indivisível.
indivíduos como forma de lhes
proporcionar uma vida digna.
EXEMPLOS Propriedade, igualdade formal Saúde, educação, moradia, Direito ao meio ambiente,
(perante a lei), liberdade de segurança pública. direito ao desenvolvimento,
crença, de manifestação de direito de propriedade sobre o
pensamento, direito à vida, patrimônio da humanidade,
direito de locomoção direito de comunicação

Há ainda quem aponte outras gerações apesar de crítica de parcela da doutrina (Ingo Salert), pois
seriam direitos já existentes aplicados, hoje, a um novo contexto social, diante da evolução da sociedade.
Ex.: questões de bioética trabalham com direitos básicos como direito à integridade, ao próprio corpo e
dignidade.
Contudo, veja o quadro sinóptico – Segundo Paulo Bonavides:

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(Mazzuoli, 2018)

2.4 Características dos direitos fundamentais

● Historicidade: o que se entende por direitos fundamentais varia de acordo com o momento histórico,
45119
não são conceitos herméticos e fechados, variando no tempo e no espaço. Emergem progressivamente
das lutas que o homem trava por sua própria emancipação.
● Inalienabilidade: são direitos sem conteúdo econômico patrimonial, não podem ser comercializados ou
permutados.
● Imprescritibilidade:
45119 são sempre exigíveis, ainda que não exercidos.
● Irrenunciabilidade: o indivíduo pode não exercer os seus direitos, mas não pode renunciá-los, de modo
geral. OBS: O STF admite, excepcionalmente, a renúncia temporária aos direitos que não ferem o núcleo
da dignidade da pessoa humana, como no caso de participação em reality show.
● Relatividade: não são direitos absolutos. Se houver um choque entre os direitos fundamentais, serão
resolvidos por um juízo de ponderação à luz da razoabilidade e da concordância prática ou harmonização
levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos
conjugando-a com a sua mínima restrição (limitabilidade).

Apesar da limitabilidade inerente à natureza dos direitos humanos, a doutrina contemporânea


sustenta que existem Direitos Fundamentais Absolutos:
a) Direito a Não Tortura (apontado por Norberto Bobbio) - (art. 5° da DUDH);
b) Direito a Não Escravidão (art. 4° da DUDH);
c) Direito a Não Extradição do Brasileiro Nato (art. 5º, LI, CF/88) → apontado por Carlos Ayres Britto.

TEORIA DA RESTRIÇÃO DAS RESTRIÇÕES (= LIMITAÇÃO DAS LIMITAÇÕES)

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- É teoria alemã, adotada no Brasil pelo STF;


- Uma das características dos direitos fundamentais é que eles são relativos, ou seja, podem sofrer limitações.
Porém, essas restrições devem ser feitas com critérios e de forma excepcional a não esvaziar o seu núcleo
essencial.
- Só podem ser impostas restrições se obedecerem aos seguintes requisitos:
Requisito formal: os direitos fundamentais só podem ser restringidos em caráter geral por meio de normas
elaboradas por órgãos dotados de atribuição legiferante conferido pela CF/88. A restrição deve estar
expressa ou implicitamente autorizada.
Requisitos materiais: para a restrição ser válida, deve observar aos seguintes princípios:
- Não retroatividade; 45119

- Proporcionalidade;
- Generalidade e abstração;
- Proteção do núcleo essencial.

A teoria dos limites dos limites (Schranhen- Schranken), ou seja, limites (com base em determinados
parâmetros) para a limitação (restrição) dos direitos fundamentais adota, portanto, critérios (limites) para
que tais limitações ocorram foram estabelecidos”.
45119

Por fim, os direitos fundamentais podem ser restringidos, em primeiro lugar, pela própria Constituição,
seja em nome de outros direitos fundamentais (a liberdade de expressão não inclui o direito de caluniar
alguém – cf. art. 5º, IV e X) seja para promover valores e interesses coletivos (a liberdade de ir e vir pode ser
limitada no estado de sítio – art. 139, I). Podem ser restringidos, também, pela lei, tanto em hipóteses nas
quais a Constituição expressamente preveja a limitação (a inviolabilidade das comunicações telefônicas pode
ser excepcionada por lei para fins de investigação criminal ou instrução processual penal – art. 5º, XII –, e a
liberdade de trabalho pode estar sujeita a qualificações impostas por lei) quanto com base nos limites
imanentes.

● Personalidade: não se transmitem.


● Concorrência e cumulatividade: são direitos que podem ser exercidos ao mesmo tempo.
● Universalidade: são universais, destinando-se a todos os seres humanos, indiscriminadamente.
Independentemente de as nações serem signatárias da declaração universal dos direitos humanos,
devem ser reconhecidos em todo o planeta, independentemente, da cultura, política e sociedade. Ex.
aplicação dos direitos fundamentais aos apátridas, e aos estrangeiros não residentes no país.

Obs. Embora haja alguns desses direitos que não necessariamente possam ser exercidos por todas as
pessoas. Os direitos políticos, por exemplo, em alguns casos pressupõem a condição de nacionalidade de um
país, de modo que estrangeiros não podem exercê-los plenamente.

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● Proibição de retrocesso: não se pode retroceder nos avanços históricos conquistados. Destaca-se que
há várias manifestações no STF sobre esse princípio, especialmente do Min. Celso de Mello, para quem
“o princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social,
que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele
vive.” (STF, ARE n.º 639.337 AgR/SP, 2.ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, j. 23.08.2011, DJe 15.09.2011.).

2.5 Dimensão dos Direitos Fundamentais

a) Dimensão subjetiva: os direitos fundamentais conferem aos seus titulares o poder de exigir algo, seja
ação ou omissão.
Ex.: omissão - respeitar a autonomia da vontade, sem interferir na religião, política, etc.
Ex.: ação - exigir do Estado uma atuação comissiva, exigir ações para garantir educação, saúde, etc.

b) Dimensão objetiva: os direitos fundamentais encarnam valores que permeiam toda a ordem jurídica,
condicionam e inspiram a interpretação e aplicação de outras normas (EFICÁCIA IRRADIANTE) e criam
dever geral de proteção sobre os bens salvaguardados. Assim, a dimensão objetiva dos direitos
fundamentais consiste em atribuir a estes importância máxima dentro do ordenamento jurídico: eles
são a base, o eixo axiológico de todo o ordenamento
45119 jurídico.

2.5.1 Desdobramentos da dimensão objetiva dos Direitos Fundamentais


45119

A dimensão objetiva atribui força aos direitos fundamentais, que passam a ser a diretriz para a
aplicação e interpretação das normas:

1) Eficácia interpretativa dos direitos fundamentais


Com a dimensão objetiva, os direitos fundamentais ganham um reforço na sua juridicidade,
ganhando força no ordenamento jurídico e, além disso, se tornam normas de eficácia irradiante, que, tendo
como base o princípio da dignidade da pessoa humana, se espalham para todo o ordenamento jurídico,
vinculando os 3 Poderes do Estado, seja para o Legislativo ao elaborar a lei, seja para a Administração
Pública ao “governar”, seja para o Judiciário ao resolver eventuais conflitos.

2) Eficácia horizontal dos direitos fundamentais:


Com a evolução da teoria dos direitos fundamentais, atualmente é reconhecida a incidência também
na relação entre particulares, em igualdade de armas. Logo, pode se definir a incidência e necessidade de
observância de todos os direitos fundamentais nas relações privadas (PARTICULAR X PARTICULAR). O STF já
reconheceu a aludida eficácia. Em outras palavras: a eficácia horizontal dos direitos fundamentais consiste
na possibilidade de aplicação dos direitos fundamentais nas relações jurídicas estritamente privadas.
Precedentes em que o STF reconheceu a eficácia horizontal dos direitos fundamentais:
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SEMANA 01/12

· RE 160.222 – Entendeu que constitui constrangimento ilegal a revista íntima em mulheres em fábrica
de lingerie.
· RE 175.161 – Contrato de consórcio que prevê devolução nominal de valor já pago em caso de
desistência viola o devido processo legal substantivo - proporcionalidade e razoabilidade.
· RE 158.215 – Violação ao princípio do devido processo legal na hipótese de exclusão de associado de
cooperativa sem direito à defesa.
· RE 639.138 – É inconstitucional, por violação ao princípio da isonomia (art. 5º, I, da Constituição da
República), cláusula de contrato de previdência complementar que, ao prever regras distintas entre
homens e mulheres para cálculo e concessão de complementação de aposentadoria, estabelece
valor inferior do benefício para as mulheres, tendo em conta o seu menor tempo de contribuição.
· ADI 2572 – Constitucionalidade da reserva de vagas para pessoas obesas – O STF entendeu que não
há inconstitucionalidade material, tendo em vista que se trata de política inclusiva que não afronta
a liberdade de iniciativa, principalmente se considerada a eficácia horizontal dos direitos
fundamentais.

A eficácia dos direitos fundamentais pode também pode ser:


● Vertical: aplica-se à tradicional ideia de limitação
45119 de poder do Estado e respeito aos direitos dos
indivíduos, conferindo direitos básicos e garantias aos indivíduos. Há um poder superior (Estado), em
face do indivíduo, em posições diferentes (ESTADO X PARTICULAR);

TEORIA DOS QUATRO STATUS DE JELLINEK


São as possíveis relações do indivíduo com o Estado:
● Passivo ou “subjectionis”: o indivíduo encontra-se em posição de subordinação com relação aos
poderes públicos;
● Ativo (direitos políticos): é o poder do indivíduo de interferir na formação da vontade do Estado,
sobretudo através do voto;
● Negativo: o indivíduo pode agir livre da atuação do Estado, podendo autodeterminar-se sem
ingerência estatal (abstenção estatal);
● Positivo ou “civitatis”: é a possibilidade de o indivíduo exigir atuações positivas do Estado em seu
favor.

45119
● Diagonal: teoria desenvolvida por Sérgio Gamonal, e consiste na incidência e observância dos
direitos fundamentais nas relações privadas marcadas por desigualdade de forças, ante a
vulnerabilidade de uma das partes. Na hipótese, embora as partes teoricamente estejam em posição
equivalente (PARTICULAR X PARTICULAR), na prática há império do poder econômico, por exemplo,
nas relações envolvendo crianças, pessoas com deficiência, trabalhadores, consumidores etc. O TST
já adotou a eficácia diagonal em alguns julgados, inclusive.
142
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EFICÁCIA VERTICAL EFICÁCIA HORIZONTAL EFICÁCIA DIAGONAL

A aplicação dos direitos A aplicação dos direitos Há hipossuficiência de uma


fundamentais às relações entre fundamentais às das partes. É uma relação
Estado e particulares, a relação de relações entre os entre particulares onde não há
subordinação que o particular tem próprios particulares. uma igualdade fática.
com o Estado.

2.6 Direitos individuais implícitos e explícitos

Os direitos individuais podem ser explícitos ou implícitos.

● Explícitos: são aqueles previstos expressamente no texto da Constituição Federal. Como exemplo,
os contidos no art. 5° da CF/88 e seus incisos, em especial os previstos no caput do mencionado
artigo, como a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
● Implícitos: o reconhecimento decorre de interpretação
45119
do 45119
texto da Lei. Isto se evidencia pela leitura
do art. 5º, § 2º, da CF/88, que reconhece a existência de outros direitos individuais "decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais de que a República
Federativa do Brasil seja parte".

● Eventual novo direito individual criado por meio de emenda constitucional é considerado cláusula
pétrea?
NÃO. Segundo Gilmar Mendes, deve-se ter em mente que as cláusulas pétreas “se fundamentam na
superioridade do poder constituinte originário sobre o de reforma”, de maneira que somente o primeiro
pode criar obstáculos à atuação do segundo. Não faz sentido, do ponto de vista lógico, permitir que o poder
reformador crie limites invencíveis a si mesmo.
Assim, conclui Gilmar Mendes que “não é cabível que o poder de reforma crie cláusulas pétreas.
Apenas o poder constituinte originário pode fazê-lo”. Caso EC crie um novo direito fundamental, este não
será cláusula pétrea.
É preciso distinguir, contudo, a situação em que uma EC apenas especifica, detalha ou incrementa
um direito fundamental já criado, sem inovar no rol de direitos. Nesse caso, ainda que introduzida por EC, a
novidade é considerada cláusula pétrea. Para Gilmar Mendes “é o que se deu, por exemplo, com o direito à
prestação jurisdicional célere somado ao rol do art. 5º da Constituição pela EC 45/04. Esse direito já existia,
como elemento necessário do direito de acesso à justiça – que há de ser ágil para ser efetiva – e do princípio
do devido processo legal, ambos assentados pelo constituinte originário”.

143
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Classificação dos direitos fundamentais explícitos:


● Direitos individuais e coletivos: direitos ligados ao conceito de pessoa humana e sua própria
personalidade, com, por exemplo, vida, dignidade da pessoa humana, honra, liberdade, etc. Estão
espalhados pela CF/88, mas uma grande parte concentra no art. 5º;
● Direitos sociais: caracterizam-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória
em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos
hipossuficientes;
● Direitos de nacionalidade: nacionalidade é o vínculo jurídico-político que visa ligar um indivíduo a
certo e determinado Estado fazendo deste indivíduo um componente do povo, da dimensão pessoal
deste Estado, capacitando-o a exigir sua proteção e sujeitando-o ao cumprimento de deveres
impostos;
● Direitos políticos: conjunto de regras que disciplina as formas de atuação da soberania popular. São
direitos públicos subjetivos que permitem ao indivíduo o exercício concreto da liberdade de
participação nos negócios políticos do Estado;
● Direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos: a Constituição
Federal regulamentou os partidos políticos como instrumentos necessários e importantes para
preservação do Estado Democrático de Direito, assegurando-lhes autonomia e plena liberdade de
atuação, para concretizar o sistema representativo.
45119

2.7 Destinatários

Os destinatários das normas dos direitos individuais, que são os direitos fundamentais, são os seres
humanos, os indivíduos. Isso porque os direitos fundamentais surgiram com o intuito de proteção do
indivíduo em face das arbitrariedades do Estado. Segundo dispõe o art. 5º, caput, da CF/88 são: os brasileiros
e os estrangeiros residentes no Brasil.

● E os estrangeiros não residentes no Brasil que apenas se encontram em trânsito no solo nacional?
R.: Para a doutrina, os estrangeiros não residentes no Brasil também são destinatários de direitos
fundamentais conforme interpretação sistemática/ extensiva. Há, portanto, direitos que se asseguram a
todos, independentemente da nacionalidade do indivíduo, porquanto são considerados emanações
necessárias do princípio da dignidade da pessoa humana.

● Pessoas jurídicas são titulares de direitos fundamentais?


R.: Para a maioria da doutrina e para o STF, SIM! Pessoa Jurídica de Direito Privado e Pessoa Jurídica
de Direito Público podem ser titulares, bastando analisar casuisticamente quais direitos fundamentais se
compatibilizam com a condição de pessoa
45119 jurídica.
Naturalmente que o direito fundamental deve estar em harmonia com a natureza jurídica da pessoa
jurídica. Ex. podem sofrer dano moral (súmula 227 do STJ), mas não podem ser pacientes de HC.
144
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Atenção (1): existem direitos fundamentais catalogados na CF que são concebidos especificamente
para as pessoas jurídicas. – art. 5º, XIX, XXI, etc.
Atenção (2): pessoas jurídicas de direito público, apesar de integrarem o Estado (polo passivo dos
direitos fundamentais), gozam de direitos fundamentais, desde que compatíveis com a sua condição.

2.8 Os Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988

A CF de 88 estabeleceu um rol compromissório de direitos fundamentais que condensa diversas


ideologias consagradas em direitos de 1º, 2ª e 3ª dimensões. Aproximou-se do denominado liberalismo
igualitário, que busca se equilibrar entre a proteção das liberdades civis e a redução das desigualdades
sociais.

Obs.1: princípio da indivisibilidade - os direitos das diferentes gerações não se excluem, na verdade,
se interpenetram, sofrendo influência mútua. Ou seja, uma geração fortalece o advento da outra. Isto porque
compõem um conjunto único de direitos que se relacionam entre si de forma harmônica. De acordo
45119
com
este princípio, todos os direitos humanos devem contar com a mesma proteção jurídica.
Obs.2: não há hierarquia entre os direitos fundamentais, pois a Constituição brasileira não permite
hierarquização prévia e abstrata entre os direitos fundamentais.
45119

2.8.1. Não taxatividade dos direitos fundamentais e tratados de direitos humanos

O ordenamento jurídico brasileiro adotou um sistema aberto de direitos fundamentais, não se


podendo considerar taxativo o rol do seu artigo 5º (Art. 5º, § 2º Os direitos e garantias expressos nesta
Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte).

Ingo Sarlet faz a seguinte divisão:


a) Direitos formalmente constitucionais → os incluídos pelo Poder Constituinte originário no catálogo
de direitos fundamentais (estão presentes no art. 5º ou no título II da CF/88).
b) Direitos materialmente constitucionais → direitos que não se encontram no rol formal da CF/88,
mas possuem status de fundamentais haja vista seu conteúdo jusfundamental (não importando o
local de positivação). A baliza para saber qual conteúdo confere à norma status de direito
fundamental é a dignidade da pessoa humana (princípio-matriz de todos os direitos fundamentais
e fundamento da República Federativa do Brasil). A fundamentalidade material dos direitos
fundamentais decorre da abertura da Constituição a outros direitos fundamentais não
expressamente constitucionalizados. O aspecto material dos direitos fundamentais nasce da
essência do seu conteúdo substancial normativo. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito
constitucional e teoria da constituição. 4º ed. Coimbra: Almedina.
145
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Conforme ensina André de Carvalho Ramos, a abertura dos direitos humanos pode se dar de forma
nacional ou internacional. A abertura internacional ocorre quando são editados novos tratados ou mesmo
com os avanços na proteção internacional dos direitos humanos. Por sua vez, a abertura nacional ocorre
através da inclusão de novos direitos fundamentais em nosso ordenamento e também com a interpretação
evolutiva e ampliativa dos tribunais nacionais.
A cláusula materialmente aberta prevista no §2º do art. 5º da CF/88 decorre do reconhecimento da
dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (art. 1º, III). A consequência disso é que o rol de
direitos fundamentais é meramente exemplificativo.

2.8.2. Hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos

45119
O art. 5º, §3º da CF/88 foi introduzido pela EC 45/2004 (conhecida como reforma do Poder
Judiciário).
Esse dispositivo prevê que os tratados internacionais sobre direitos humanos que observarem o
procedimento de incorporação análogo ao das Emendas Constitucionais terão paridade normativa, isto é:
terão status normativo de emendas constitucionais.
Que procedimento de incorporação é esse? 45119

● Aprovação em cada Casa do Congresso Nacional;


● Em 2 turnos de votação;
● Com pelo menos 3/5 dos votos dos respectivos membros.

● E os tratados internacionais de direitos humanos que não observarem o procedimento especial do


art. 5º, §3º da CF, não sendo aprovados pelo quórum constitucional?
R.: Segundo a doutrina majoritária e o Supremo Tribunal Federal, os Tratados Internacionais de
Direitos Humanos internalizados sem a observância do procedimento estabelecido no art. 5, §3º, da CF/88
terão hierarquia normativa supralegal: acima das leis e abaixo da Constituição. Esse status tem o efeito de
“bloquear” a legislação infraconstitucional que com eles seja incompatível, análise de compatibilidade que é
chamado de controle de convencionalidade pela doutrina especializada.
Os Tratados Internacionais que não versam sobre direitos humanos terão hierarquia
infraconstitucional, com status normativo equivalente à lei ordinária.

RESUMINDO:
Tratado internacional SOBRE DIREITOS
HUMANOS, aprovado pelo mesmo rito da
Emenda Constitucional (art. 5º, §3º) Status normativo de emenda constitucional.

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Tratado internacional SOBRE DIREITOS


HUMANOS, aprovado com quórum Status normativo de supralegalidade: superior
diverso das emendas constitucionais às leis e inferior à Constituição.

Tratados Internacionais QUE NÃO Independente do procedimento e quórum de


VERSAM SOBRE DIREITOS HUMANOS votação terão status normativo de leis
ordinária.

2.9 Deveres Fundamentais

Além de direitos fundamentais, há os deveres fundamentais. A doutrina é vasta em discorrer sobre


os direitos fundamentais, porém, pouca atenção se dá aos deveres fundamentais. Conforme o professor
Pedro Lenza “diante da vida em sociedade, devemos pensar, também, a necessidade de serem observados
os deveres, pois muitas vezes o direito de um indivíduo depende do dever do outro em não violar ou impedir
a concretização do referido direito” (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, pg. 1154).
Pode-se esquematizar alguns deveres fundamentais:
-Dever de efetivação dos direitos fundamentais Estado prestacionista;
-Deveres específicos do Estado diante dos indivíduos
45119 - ex. dever de indenizar o condenado por erro
judiciário;
-Deveres de criminalização do Estado - ex. art. 5°, XLIII, da CRFB;
- Deveres dos cidadãos e da sociedade - ex. serviço militar obrigatório;
- Dever de exercício do direito de forma solidária e levando em consideração os interesses da
sociedade - ex. direito de propriedade que se leva em consideração o exercício conforme a sua função social;
- Deveres implícitos - o direito de uma pessoa pressupõe o dever de todas as demais.

2.10 Alguns direitos individuais – rol do art. 5º da CF/88

45119

A. DIREITO À VIDA:

CRFB, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:

Está relacionado à existência física de um ser humano. O art. 5º, caput, da CF assegura a
inviolabilidade do direito à vida em relação ao Estado e em relação aos demais indivíduos.

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Inviolabilidade difere de irrenunciabilidade: a inviolabilidade diz respeito à proteção de um direito


em face de outras pessoas, enquanto que a irrenunciabilidade diz respeito à proteção de um direito em face
do próprio titular.
O direito à vida compreende o direito ao mínimo necessário a uma existência digna, que abrange:
45119

1. Direito à integridade física: direito à saúde, vedação de pena de morte, proibição do aborto,
etc.;
2. Direito a condições materiais e espirituais mínimas necessárias a uma existência digna.

● Dupla acepção do direito à vida (NOVELINO, 2017, p. 325):

1. Acepção positiva: está associada ao direito à existência digna, que assegura o acesso a bens
e utilidades indispensáveis para isso. Ela não se limita ao mínimo existencial, pois garante
também pretensões de caráter material e jurídico, de modo que os poderes públicos devem
adotar medidas positivas de proteção da vida, de amparo material e de emissão de normas
protetivas;
2. Acepção negativa: é o direito assegurado a todo e qualquer ser humano de permanecer vivo.
É um direito de defesa e um pressuposto
45119 elementar para o exercício de todos os demais
direitos. Uma decorrência dessa acepção é a proibição da pena de morte (art. 5º, XLVII, “a”,
da CF).

A ponderação de direitos depende de uma análise no caso concreto (nunca em abstrato) que deve
sempre levar em consideração o princípio pro homine (pro persona), em que o intérprete prefira a
interpretação dos direitos humanos que seja mais favorável à pessoa e a máxima efetividade, de modo que
se alcance o maior proveito possível para o titular, com o menor sacrifício aos titulares dos demais direitos.
Contudo, considerando-se que são inevitáveis algumas colisões de direitos fundamentais, é possível
que estes sofram limitações diante de outros que sejam igualmente relevantes. Assim, de forma excepcional,
pode haver a restrição ou mesmo a derrogação de alguns direitos. Exemplo de que o direito à vida não é um
direito absoluto: existência da pena de morte no ordenamento jurídico brasileiro.
Obs. vale ressaltar que nem mesmo o poder constituinte originário poderia ampliar as
hipóteses de pena de morte diante da observância do princípio da continuidade e proibição do retrocesso.

DESACORDOS MORAIS RAZOÁVEIS

Segundo o professor Pedro Lenza: Desacordos morais razoáveis surgem em razão de inexistência de consenso
em relação a temas polêmicos e com entendimentos antagônicos e diametralmente opostos e que se fundam
em conclusão racional, como, por exemplo, a interrupção da gravidez. Assumir uma das posições significa

148
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SEMANA 01/12

negar a outra, e essa realidade é marca de uma sociedade plural, característica das democracias modernas
(posições religiosas, morais, filosóficas etc.).
Nessas matérias, como regra geral, o papel do direito e do Estado deve ser o de assegurar que cada pessoa
possa viver sua autonomia da vontade e suas crenças. Exemplos: interrupção de gestação, pesquisas com
células-tronco embrionárias, eutanásia/ortotanásia, uniões homoafetivas, etc.

JURISPRUDÊNCIA SOBRE DIREITO À VIDA:

1) ADI 3510 – Pesquisa em Células Tronco Embrionárias


O art. 5º da Lei de Biossegurança autoriza a utilização do material biológico para fins de pesquisa,
terapia, etc., desde que sejam embriões inviáveis, ou, ainda que embriões viáveis, com mais de três anos de
armazenamento. Tal dispositivo foi impugnado na sua constitucionalidade porque se chegou a cogitar
eventual violação da dignidade da pessoa humana, por considerar que o ser humano estaria sendo tratado
como coisa.
O STF, contudo, concluiu, por votação bastante apertada, que as pesquisas com célula-tronco
embrionária, nos termos da lei, não violam o direito à vida. A constatação de que a vida começa com a
existência do cérebro (segundo o STF e sem apresentar qualquer análise axiológica ou filosófica) estaria
estabelecida, também, no art. 3.º da Lei de Transplantes,
45119 que prevê a possibilidade de retirada de tecidos,

órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento depois da morte desde que se
constate a morte encefálica. Logo, para a lei, o fim da vida dar-se-ia com a morte cerebral, razão pela qual é
nessa linha que o conceito de vida está ligado ao surgimento do cérebro).
Conclusão: O art. 5° da Lei nº 11.105/2005 (Lei de Biossegurança) é plenamente constitucional, não
havendo qualquer violação ao direito à vida. Isso porque o art. 5° toma os cuidados necessários, usa
efetivamente as pesquisas científicas para fins terapêuticos, etc., sem trazer nenhum efeito deletério ou
coisificante para a pessoa que forneceu o material biológico.

2) ADPF 54 – Aborto de Feto Anencéfalo


Desconsiderando os aspectos moral, ético ou religioso, tecnicamente, em relação à interrupção da
gravidez de feto anencéfalo, desde que se comprove, por laudos médicos, com 100% de certeza, que o feto
não tem cérebro e não há perspectiva de sobrevida.
Nessa linha de desenvolvimento, o STF, para seguir a lógica do julgamento anterior (célula-tronco),
teria de autorizar a possibilidade de antecipação terapêutica do parto. A imposição estatal da manutenção
de gravidez cujo resultado final será irremediavelmente a morte do feto vai de encontro aos princípios
basilares do sistema constitucional, mais precisamente à dignidade da pessoa humana, à liberdade, à
autodeterminação, à saúde, ao direito de privacidade, ao reconhecimento pleno dos direitos sexuais e
reprodutivos de milhares de mulheres.
45119

O STF, então, julgou procedente o pedido formulado para declarar a inconstitucionalidade de


interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos arts. 124,
149
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SEMANA 01/12

126 e 128, I e II, todos do Código Penal. Em outras palavras: o STF excluiu qualquer interpretação no sentido
de que a interrupção da gestação de feto anencéfalo pudesse ser catalogada como aborto. Justamente por
isso fala-se que não se trata de aborto, mas sim de uma interrupção da gestação em razão da inexistência
de uma vida possível. Os fundamentos foram, dentre outros, direito à dignidade da pessoa humana, à
liberdade no campo sexual, à autonomia, à privacidade, à integridade física, psicológica e moral e à saúde.

3) HC 124.306 - Interrupção voluntária da gestação no primeiro trimestre


O STF conferiu interpretação conforme à Constituição aos arts. 124 a 126 do Código Penal para excluir
do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. Os
Ministros entenderam que a criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher,
bem como o princípio da proporcionalidade, nos termos do voto do Min. Barroso (HC 124.306, j. 29.11.2016,
DJE de 17.03.2017). Os fundamentos também foram, dentre outros, direito à dignidade da pessoa humana,
à liberdade no campo sexual, à autonomia, à integridade física, psicológica e moral e à saúde.
Mas atenção, diante do exposto, a interrupção da gravidez no primeiro trimestre não deixou de ser
considerada crime, já que a questão decidida pela 1 a Turma do STF foi na concessão de HC e, portanto, sem
caráter vinculante.

4) Distanásia, eutanásia, suicídio assistido e ortotanásia


45119

Distanásia: também chamada de obstinação terapêutica ou medical futility, trata-se de conduta onde
não se prolonga a vida propriamente dita, mas o processo de morrer. No Brasil, a exposição de motivos da
45119

Resolução nº 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina permite ao médico limitar ou suspender


procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e
incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal. De acordo com Jean Robert Debray,
são procedimentos terapêuticos cujos efeitos são mais nocivos do que o próprio mal a ser curado e acabam
por negar a dignidade da vida humana.
Eutanásia: conhecida como “morte serena”, “morte doce” ou “boa morte”, tem o fim de abreviar a
vida do doente terminal. É uma ação médica intencional com exclusiva finalidade benevolente de pessoa que
se encontre em situação irreversível e incurável, padecendo de intensos sofrimentos físicos e psíquicos. De
acordo com o professore Lenza:

“Atualmente, não tendo ainda o STF apreciado a matéria, a eutanásia enseja a


prática do crime previsto no art. 121, § 1.º, CP, qual seja, homicídio privilegiado, já
que praticado por motivo de relevante valor moral e, por esse motivo, a prescrição
normativa da causa de diminuição de pena. Alguns autores o denominam
‘homicídio por piedade’.”

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Acrescente-se que a eutanásia ativa não se confunde com a eutanásia passiva. Esta última consiste
na omissão de um tratamento que poderia garantir a continuidade da vida ao passo que a primeira é a ação
deliberada de matar (seja ministrando medicamento ou suprimindo tratamento já iniciado).
Suicídio assistido: em algumas situações, a pessoa doente em estágio terminal quer pôr fim ao seu
sofrimento, contudo, em virtude das suas debilidades, não tem condições de o fazer sem auxílio.
Ortotanásia: é uma prática sensível ao processo de humanização da morte, consistindo em uma
aceitação desta, permitindo que ela siga seu curso. Visa aliviar as dores sem incorrer em prolongamentos
abusivos que imponham sofrimentos adicionais. Para a doutrina, seria uma forma de eutanásia ativa indireta
em que os mecanismos de sustentação artificial da vida são retirados ou de eutanásia passiva, onde não se
inicia uma ação médica. De acordo com Ingo Sarlet: “A ideia de bom senso, prudência e razoabilidade deve
ser considerada, deixando claro não haver, ao menos explicitamente, qualquer vedação constitucional ao
dito ‘direito de morrer com dignidade’ (...).”

B. DIREITO À IGUALDADE:

Está previsto no art. 5º, caput e inciso I, da CF/88:

Todos são iguais perante a lei,


45119sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se

aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à


45119
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...).

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta


Constituição;

a) Concepções da igualdade:

IGUALDADE FORMAL IGUALDADE MATERIAL


É a igualdade perante a lei e perante o É o tratamento igual dos iguais e o
Estado, impedindo que os indivíduos sejam tratamento desigual aos desiguais na medida
tratados pelos poderes públicos de maneira em que se desigualam.
diversa
Deve adotar critérios distintivos justos e
razoáveis, de modo que os poderes públicos
devem adotar medidas concretas para
reduzir ou compensar desigualdades

b) Dimensões da igualdade (NOVELINO, 2017, p. 340):


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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Dimensão objetiva: é a igualdade compreendida como princípio material estruturante do Estado


brasileiro que impõe o tratamento igual para os iguais e desigual para os desiguais, bem como ações
voltadas à redução das desigualdades sociais e regionais;
● Dimensão subjetiva: confere a indivíduos e grupos posições jurídicas de caráter negativo (proteção
contra diferenciações ou igualizações arbitrárias) e de caráter positivo (direito a exigir determinadas
prestações materiais e jurídicas destinadas à redução de desigualdades).

Certo é que, no atual Estado Democrático de Direito, deve-se buscar, não somente a igualdade formal
(consagrada no liberalismo clássico), mas, principalmente, a igualdade material. Isso porque, no Estado social
45119
ativo, efetivador dos direitos humanos, imagina-se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa
daquela apenas formalizada em face da lei.
Vejamos alguns exemplos de ações afirmativas (discriminações positivas/medidas de compensação)
reconhecidas pelo STF:

◘ Cotas raciais:
O STF, na ADPF 186, considerou constitucional a política de cotas étnico-raciais para seleção de
estudantes da Universidade de Brasília (UnB). Além
45119 disso, o STF declarou o reconhecimento da
proclamação na Constituição da igualdade material, sendo que, para assegurá-la, “o Estado poderia lançar
mão de políticas de cunho universalista — a abranger número indeterminado de indivíduos — mediante
ações de natureza estrutural; ou de ações afirmativas — a atingir grupos sociais determinados — por meio
da atribuição de certas vantagens, por tempo limitado, para permitir a suplantação de desigualdades
ocasionadas por situações históricas particulares.
Ainda, o STF declarou que “é constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos
públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública
direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de
heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a
ampla defesa”. STF. Plenário. ADC 41/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 8/6/2017 (Info 868).

◘ PROUNI – Programa Universidade para Todos:


O STF julgou constitucional o PROUNI, como importante fator de inserção social e cumprimento do
art. 205 da CF/88, que estabeleceu ser a educação direito de todos e dever do Estado e da família. Ainda, o
programa encontra-se em sintonia com diversos dispositivos da Constituição que estabelecem a redução de
desigualdades sociais.

◘ Lei Maria da Penha:

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

O STF julgou procedente a ADC 19, para declarar a constitucionalidade dos arts. 1.º, 33 e 41 da Lei n.
11.340/2006 (Lei Maria da Penha), tendo por fundamento o princípio da igualdade, bem como o combate ao
desprezo às famílias, sendo considerada a mulher a sua célula básica.
Na mesma assentada, por maioria e nos termos do voto do Relator, o STF julgou procedente a ADI
4.424, para, dando interpretação conforme os arts. 12, I, e 16, ambos da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da
Penha), declarar a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão, pouco importando a
extensão desta, praticado contra a mulher no ambiente doméstico.

C. DIREITO À DIGNIDADE HUMANA:


É um valor, um princípio, servindo como parâmetro para a definição dos direitos formal e
materialmente fundamentais.

ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL3


- Inspiração: Corte Constitucional Colombiana.
- Definição: Quadro insuportável de violação massiva de direitos fundamentais, agravado pela inércia
continuada das autoridades.
- Pressupostos:
● Violação generalizada e sistêmica de direitos fundamentais;
45119

● Inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em modificar a


conjuntura;
● Situação que exige a atuação de uma pluralidade de autoridades públicas.
● encontra fundamento nos casos de inadimplemento reiterado de direitos fundamentais pelos
poderes do Estado, sem que haja possibilidade de remédio para vias tradicionais, ocasião em que
o tribunal assume o papel de coordenador de políticas públicas por meio da denominada tutela
estruturante.

Análise pelo STF em ADPF (PSOL X União e Estados) – Concessão parcial de liminar para:
● Obrigar a União a liberar o saldo acumulado no FUNPEN;
● Implementação pelos juízes e Tribunais da audiência de custódia, no máximo em 90 (noventa) dias.
● 45119

● Responsabilidade dos três poderes e de todos os entes Federativos.


● No julgado, entendeu-se que incumbiria ao STF retirar os demais poderes da inércia, coordenando ações
para resolver os problemas e monitorar resultados. Porém, NÃO cabe ao Judiciário definir o conteúdo
dessas políticas públicas (ex.: medidas judiciais para abater o tempo de prisão).

3
Para aprofundamento do julgado: http://www.dizerodireito.com.br/2015/09/entenda-decisao-do-stf-sobre-
o-sistema.html
153
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Ainda sobre a violação de direitos humanos e o estado de coisas inconstitucional, o STF decidiu (ADPF
976 MC-Ref./DF, Info 1105), em relação à população em situação de rua, que: estão presentes os
pressupostos necessários para a concessão da medida cautelar (fumaça do bom direito e perigo da demora
na efetivação de uma decisão judicial), eis que: (i) a discussão acerca das condições precárias de vida da
população em situação de rua no Brasil demanda uma reestruturação institucional que decorre de um quadro
grave e urgente de desrespeito a direitos humanos fundamentais; e (ii) a violação maciça de direitos humanos
— a indicar um potencial estado de coisas inconstitucional — impele o Poder Judiciário a intervir, mediar e
promover esforços para estabelecer uma estrutura adequada de enfrentamento.
Nesse sentido, a Corte afirmou que atenção à população em situação de rua deve ser realizada com
o intuito de: (i) evitar a entrada nas ruas; (ii) garantir direitos enquanto o indivíduo está em situação de rua;
e (iii) promover condições para a saída das ruas.
No âmbito da medida cautelar em análise, também se consideraram, entre outros fatores: (i) os
desafios do retorno da população em situação de rua à educação escolar, que vão além da falta de acesso a
programas; (ii) os obstáculos relacionados à reinserção no mercado de trabalho; (iii) a “aporofobia”,
entendida como violadora dos objetivos fundamentais, em especial o relacionado ao combate a todas as
formas de discriminação (CF/1988, art. 3º, IV); (iv) o direito à identidade além do mero registro; (v) o
acolhimento institucional e o direito fundamental à moradia; (vi) a presença de atos comissivos e omissivos,
imputados a agentes públicos e pessoas privadas, que atentam flagrantemente contra a dignidade dessa
45119

população; (vii) a necessidade de medidas paliativas que impulsionem a construção de respostas estatais
duradouras; e (viii) a necessidade de elaboração de um estudo capaz de delinear todas as nuances que
permeiam o problema crônico social em debate, para evitar políticas desassociadas do espaço e do tempo
de aplicação.
Nesse contexto, os estados, o Distrito Federal e os municípios devem, de modo imediato, observar,
45119

obrigatoriamente e independentemente de adesão formal, as diretrizes contidas no Decreto federal


7.053/2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua, em conjunto e nos moldes
das determinações estabelecidas na decisão da Corte.

Sistema prisional brasileiro: estado de coisas inconstitucional decorrente da violação grave e massiva
de direitos fundamentais - ADPF 347/DF (Info 1111, STF)

De acordo com o STF, há um estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro,


responsável pela violação massiva de direitos fundamentais dos presos. Tal estado de coisas demanda a
atuação cooperativa das diversas autoridades, instituições e comunidade para a construção de uma solução
satisfatória. Diante disso, União, Estados e Distrito Federal, em conjunto com o Departamento de
Monitoramento e Fiscalização do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ), deverão elaborar planos a serem
submetidos à homologação do Supremo Tribunal Federal, especialmente voltados para o controle da
superlotação carcerária, da má qualidade das vagas existentes e da entrada e saída dos presos.

154
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Ainda de acordo com o que decidiu a Corte, o CNJ realizará estudo e regulará a criação de número
de varas de execução penal proporcional ao número de varas criminais e ao quantitativo de presos.
A situação de grave violação em massa de direitos fundamentais dos presos enseja o reconhecimento
de um estado de coisas inconstitucional do sistema prisional brasileiro. A superação desse problema de
natureza estrutural exige do Poder Público a elaboração de um plano nacional e de planos locais que
prevejam um conjunto de medidas e a participação de diversas autoridades e entidades da sociedade.
Conforme ressaltou a Corte, a proteção dos direitos fundamentais é inerente à condição humana.
Assim, tem-se que tanto as normas constitucionais como os tratados internacionais de direitos humanos
de que o Brasil é parte proíbem a existência de penas cruéis, garantem ao preso o respeito à sua integridade
física e moral, bem como preveem que a pena será cumprida em estabelecimentos distintos de acordo com
a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado.
A LEP estabelece, em seus arts. 40, 41 e 126, devem ser asseguradas ao condenado assistência
material, jurídica, educacional, social, religiosa, além do acesso à saúde, aos alojamentos com ocupação e
dimensões adequadas, ao trabalho e ao estudo.
Assim, considerando que a superlotação dos presídios, o descontrole na entrada e as condições da
saída do sistema prisional, e a má qualidade das vagas disponibilizadas impedem a prestação de serviços
45119
bens essenciais que integram o mínimo existencial comprometem a capacidade do sistema em cumprir
seus fins de ressocialização e de funcionar a favor45119da segurança pública, a ADPF 347/DF foi julgada
parcialmente procedente para reconhecer o estado de coisas inconstitucional do sistema carcerário
brasileiro e determinar outras medidas, como a realização (preferencialmente presencial) das audiências
de custódia de modo a viabilizar o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária em até 24
horas contadas do momento da prisão; que seja fundamentada a não aplicação de medidas cautelares e
penas alternativas à prisão, sempre que possível, tendo em conta o quadro dramático do sistema
carcerário; a liberação e o não contingenciamento dos recursos do FUNPEN; e a elaboração de plano
nacional e de planos estaduais e distrital para a superação do estado de coisas inconstitucional, com
indicadores que permitam acompanhar sua implementação.

IMPORTANTE: Transexuais e travestis com identificação com gênero feminino poderão optar por cumprir
pena em presídio feminino ou masculino. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)
527: De acordo com Barroso, e mencionando os Princípios de Yogyakarta (número 9), no Brasil, o direito
das transexuais femininas e travestis ao cumprimento de pena em condições compatíveis com a sua
identidade de gênero decorre, em especial, dos princípios constitucionais do direito à dignidade humana,
à autonomia, à liberdade, à igualdade, à saúde, e da vedação à tortura e ao tratamento degradante e
desumano. Decorre também da jurisprudência consolidada no STF no sentido de reconhecer o direito desses
grupos a viver de acordo com a sua identidade de gênero e a obter tratamento social compatível com ela.
Fonte: Site do STF

D. DIREITO À SAÚDE
155
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

A saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196 da CF/88), sendo assegurada por meio de
políticas sociais e econômicas que busquem:
● A redução do risco de doença e de outros agravos; e
● O acesso universal e igualitário às ações e serviços voltados à sua promoção, proteção e
recuperação.

Quando se fala na dimensão objetiva do direito à saúde, isso significa que, independentemente de
um caso concreto, existe um dever jurídico geral do Poder Público de concretizar medidas para garantir as
políticas públicas de saúde.
De acordo com o autor Lenza, assim como os demais direitos sociais, tal direito possui duas vertentes.
Uma positiva, onde se fomenta um Estado prestacionista para implementar o direito social; e outra negativa,
onde o Estado ou particular devem se abster da prática de atos que sejam prejudiciais a terceiros.
Cuidar da saúde da população é uma competência COMUM que deve ser exercida por todos os entes
federados (CRFB, Art. 23, II) de forma que abrange, obviamente, adotar medidas para salvar vidas e garantir
a higidez física das pessoas ameaçadas ou acometidas pelo novo coronavírus (Covid-19).
Nesse sentido, considerando a imensa relevância sobre o tema, é importantíssimo ficar atento às
jurisprudências pertinentes:
◘ São atípicas as condutas de submeter-se à vacinação
45119 contra covid-19 em local diverso do agendado
e/ou com aplicação de imunizante diverso do reservado e/ou de submeter-se à vacinação sem a
realização de agendamento. STJ. 5ª Turma. AgRg no RHC 160.947-CE, Rel. Min. João Otávio de Noronha,
julgado em 27/09/2022 (Info 752) - (Caso Wesley Safadão)

◘ Em ação que pretende o fornecimento de medicamento registrado na ANVISA, ainda que não
incorporado em atos normativos do SUS, é prescindível a inclusão da União no polo passivo da
demanda. STJ. RMS 68.602-GO, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade,
julgado em 26/04/2022, DJe 29/04/2022. (Info 734)

◘ Não se pode utilizar verbas do Fundeb para combater à pandemia da Covid-19. STF. Plenário. ADI
45119
6490/PI, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 18/2/2022 (Info 1044).

◘ Estados, Distrito Federal e Municípios podem importar vacinas?

Nas exatas palavras do STF: os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no caso


de descumprimento do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra
a Covid-19 ou na hipótese de cobertura imunológica intempestiva e insuficiente,
poderão dispensar às respectivas populações: a) vacinas das quais disponham,
previamente aprovadas pela Anvisa; e b) no caso não expedição da autorização
competente, no prazo de 72 horas, vacinas registradas por pelo menos uma das
156
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

autoridades sanitárias estrangeiras e liberadas para distribuição comercial nos


respectivos países, bem como quaisquer outras que vierem a ser aprovadas, em
caráter emergencial. STF. Plenário. ADPF 770 MC-Ref/DF e ACO 3451 MC-Ref/MA,
Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 24/2/2021 (Info 1006).

◘ Poder Público pode determinar a vacinação compulsória contra a Covid-19 (o que é diferente de
vacinação forçada) 45119

A tese fixada foi a seguinte: (A) A vacinação compulsória não significa vacinação
forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário, podendo, contudo, ser
implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre
outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de
determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e (i) tenham
como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, (ii) venham
acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações
dos imunizantes, (iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das
pessoas; (iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, e (v)
sejam as vacinas distribuídas45119
universal e gratuitamente; e (B) tais medidas, com as
limitações acima expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos
Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de
competência. STF. Plenário. ADI 6586, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em
17/12/2020.

◘ É ilegítima a recusa dos pais à vacinação compulsória de filho menor por motivo de convicção filosófica

É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que,


registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa
Nacional de Imunizações ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei
ou (iii) seja objeto de determinação da União, estado, Distrito Federal ou município,
com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação
à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem
tampouco ao poder familiar. STF. Plenário. ARE 1267879/SP, Rel. Min. Roberto
Barroso, julgado em 16 e 17/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 1103) (Info 1003).

◘ STF determinou que governo deveria detalhar a ordem de preferência na vacinação dentro dos grupos
prioritários (quem deveria ser vacinado primeiro dentro do grupo prioritário). STF. Plenário. ADPF 754
TPI-segunda-Ref/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 27/2/2021 (Info 1007).

157
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12
45119
◘ É dever do Poder Público elaborar e implementar plano para o enfrentamento da pandemia COVID-
19 nas comunidades quilombolas. STF. Plenário. ADPF 742/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do
acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 24/2/2021 (Info 1006).

◘ STF determina que governo federal adote medidas para conter o avanço da Covid-19 entre indígenas.
STF. Plenário. ADPF 709 Ref-MC/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 3 e 5/8/2020 (Info 985).

Ademais, o Poder Judiciário pode determinar, ante injustificável inércia estatal, que o Poder
Executivo adote medidas necessárias à concretização de direitos constitucionais dos indígenas: Não
procede o argumento de ingerência indevida do Poder Judiciário nas diretrizes de políticas públicas,
notadamente quando se cuida de reconhecer a omissão estatal na adoção de providências específicas (arts.
26 e 27 da Lei n. 6.001/1973) para a concretização de direitos constitucionais dos indígenas (art. 231 da
CF/1988). Com efeito, segundo a jurisprudência do STJ, quando configurada hipótese de injustificável inércia
estatal e não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira do ente público, o Poder
Judiciário pode determinar que o Poder Executivo adote medidas necessárias ao cumprimento dos direitos
e garantias fundamentais, nos termos previstos no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. STJ. REsp
1.623.873-SE, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 26/04/2022, DJe
28/04/2022. (Info 734) 45119

E. DIREITO À INTEGRIDADE

A Carta Magna proíbe a prática de lesões, psíquica e moral (provocação de dor interna e sofrimento).
Ademais, veda a prática da tortura, bem como qualquer tipo de comercialização de órgãos, tecidos e
substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento (art. 199, §4º).

F. PROIBIÇÃO DA TORTURA

Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante


(art. 5º, III, da CF/88).

● Não esquecer que parcela da doutrina defende que o direito de não ser torturado é um exemplo de
direito fundamental absoluto, sendo uma exceção à característica da relatividade dos direitos
fundamentais.
● Uso de algemas e a Súmula Vinculante 11: “o uso legítimo de algemas não é arbitrário, sendo de
natureza excepcional, a ser adotado nos casos e com as finalidades de impedir, prevenir ou dificultar a
fuga ou reação indevida do preso, desde que haja fundada suspeita ou justificado receio de que tanto
venha a ocorrer, e para evitar agressão do preso contra os próprios policiais, contra terceiros ou contra
si mesmo. O emprego dessa medida tem como balizamento jurídico necessário os princípios da
158
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

proporcionalidade45119e da razoabilidade” (HC 89.429, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 22.08.2006, DJ de


02.02.2007).

G. DIREITO À PRIVACIDADE – DIMENSÕES

Art. 5°, X, da CRFB - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação;

● Intimidade: é o direito de estar só (right to be alone) e o direito de ser deixado em paz.


● Vida privada: é o direito do indivíduo de ser do modo que quiser, sem a intervenção de outrem.
● Honra: ligada à honra objetiva (visão da sociedade) e honra subjetiva (visão da própria pessoa).
● Imagem: é a representação da pessoa, por meio de desenhos, fotografias.

É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim


entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação
de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de
comunicação social analógicos
45119 ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no
exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a
caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à
proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as
expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível. STF. Plenário. RE
1010606/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 11/2/2021 (Repercussão Geral –
Tema 786) (Info 1005).

O direito à retratação e ao esclarecimento da verdade possui previsão na


Constituição da República e na Lei Civil, não tendo sido afastado pelo Supremo
Tribunal Federal no julgamento da ADPF 130/DF. O princípio da reparação integral
(arts. 927 e 944 do CC) possibilita o pagamento da indenização em pecúnia e in
natura, a fim de se dar efetividade ao instituto da responsabilidade civil. Dessa
forma, é possível que o magistrado condene o autor da ofensa a divulgar a sentença
condenatória nos mesmos veículos de comunicação em que foi cometida a ofensa
à honra, desde que fundamentada em dispositivos legais diversos da Lei de
Imprensa. STJ. 3ª Turma. REsp 1771866-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 12/02/2019 (Info 642). Fonte: Dizer o Direito

É legítimo, desde que observados alguns parâmetros, o compartilhamento de


dados pessoais entre órgãos e entidades da Administração Pública federal, sem
159
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

qualquer prejuízo da irrestrita observância dos princípios gerais e mecanismos de


proteção elencados na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº
13.709/2018) e dos direitos constitucionais à privacidade e proteção de dados. STF.
Plenário. ADI 6649/DF e ADPF 695/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em
15/9/2022 (Info 1068).

● Privacidade e sigilo bancário e fiscal: o STF admite a quebra do sigilo pelo Judiciário ou por CPI (federal
ou estadual, mas não municipal), mas resiste a que o MP possa requisitá-la diretamente, por falta de
autorização legal específica, salvo a hipótese de existir procedimento administrativo investigando
utilização indevida de patrimônio público.

É constitucional a requisição, sem prévia autorização judicial, de dados bancários


e fiscais considerados imprescindíveis pelo Corregedor Nacional de Justiça para
apurar infração de sujeito determinado, desde que em processo regularmente
instaurado mediante decisão fundamentada e baseada em indícios concretos da
prática do ato. STF. Plenário. ADI 4709/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em
27/5/2022 (Info 1056).
45119

45119 Dados obtidos com a quebra de sigilo bancário não podem ser divulgados
abertamente em site oficial. Os dados obtidos por meio da quebra dos sigilos
bancário, telefônico e fiscal devem ser mantidos sob reserva. Assim, a página do
Senado Federal na internet não pode divulgar os dados obtidos por meio da quebra
de sigilo determinada por comissão parlamentar de inquérito (CPI). STF. Plenário.
MS 25940, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 26/4/2018 (Info 899).

● Privacidade, produção de relatórios de inteligência e vinculação ao interesse público – ADPF


722/DF:

Os órgãos do Sistema Brasileiro de Inteligência, conquanto necessários para a


segurança pública, segurança nacional e garantia de cumprimento eficiente dos
deveres do Estado, devem operar com estrita vinculação ao interesse público,
observância aos valores democráticos e respeito aos direitos e garantias
fundamentais. Nesse contexto, caracterizam desvio de finalidade e abuso de poder
a colheita, a produção e o compartilhamento de dados, informações e
conhecimentos específicos para satisfazer interesse privado de órgão ou de agente
Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou procedente o
pedido para confirmar a medida cautelar e declarar inconstitucionais atos do
Ministério da Justiça e Segurança Pública de produção ou compartilhamento de
160
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

informações sobre a vida pessoal, as escolhas pessoais e políticas, e as práticas


cívicas de cidadãos, servidores públicos federais, estaduais e municipais
identificados como integrantes de movimento político, professores universitários e
quaisquer outros que, atuando nos limites da legalidade, exerçam seus direitos de
livremente expressar-se, reunir-se e associar-se. STF, ADPF 722, Plenário, Rel. Min.
Cármen Lúcia, julgamento 13.5.2022.

H. INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO:

Art. 5°, XI, da CRFB - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo
penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou
desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial

● A casa é asilo inviolável. Qual é o conceito de casa?


R.: Segundo o STF e doutrina, casa abrange não só o domicílio como também todo lugar privativo,
ocupado por alguém, com direito próprio e de maneira exclusiva, mesmo sem caráter definitivo ou habitual.

STF - “Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5.º, XI, da Constituição
45119

da República, o conceito normativo de ‘casa’ revela-se abrangente e, por estender-


se a qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, §
4.º, II), compreende, observada essa específica limitação espacial, os quartos de
hotel (...)” (RHC 90.376)

A abrangência do conceito alcança:


▪ O escritório de trabalho

Caiu em prova DISCURSIVA Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! O Delegado de Polícia da Circunscrição XX
recebeu uma informação anônima, desacompanhada de qualquer elemento probatório, no sentido de que
um crime de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes estava sendo praticado no interior do escritório de
um profissional liberal.
Com base exclusiva nessa informação, compareceu ao local, arrombou a porta e constatou a existência de
uma grande quantidade de substâncias
45119
entorpecentes no escritório, bem como que o seu proprietário estava
vendendo parte desse entorpecente a um terceiro. Em razão desses fatos, prendeu ambos.
À luz do direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, esclareça se foi correta a ação do delegado de
polícia, abordando os seguintes tópicos:
1 - O conceito constitucional de casa é extensivo a um escritório profissional?
2 - O ingresso na casa, sem consentimento do morador ou ordem judicial, é justificado com a só descoberta,
após esse ingresso, de uma situação de flagrante delito?
161
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Obs. A temática será abordada pelo DD em profundidade em estudo específico no tema prisões.

▪ O estabelecimento industrial
▪ Clube recreativo
▪ Quarto de hotel

Obs. É lícita a entrada de policiais, sem autorização judicial e sem o


consentimento do hóspede, em quarto de hotel, desde que presentes fundadas
razões da ocorrência de flagrante delito. STJ. 6ª Turma. HC 659.527-SP, Rel. Min.
Rogerio Schietti Cruz, julgado em 19/10/2021 (Info 715).

▪ Quarto de motel
▪ Automóveis quando usados para fins de moradia
▪ Barcos quando usados para fins de moradia.

Atenção:
O STJ possui jurisprudência entendendo que a habitação em prédio abandonado
de escola municipal pode caracterizar
45119 o conceito de domicílio em que incide a
proteção disposta no art. 5º, inciso XI da Constituição Federal (AgRg no HC 712.529-
SE).

STJ: A abordagem policial em estabelecimento comercial, ainda que a diligência


tenha ocorrido quando não havia mais clientes, é hipótese de local aberto ao
público, que não recebe a proteção constitucional da inviolabilidade do domicílio.
(HC 754.789-RS, Rel. Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF
1ª Região), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 6/12/2022).

▪ Bens públicos de uso especial não abertos ao público como gabinetes de prefeitos, gabinete do
delegado de polícia
45119

Inf. 549 do STJ (2014): Afirmou que o gabinete do delegado de polícia encontra-se
inserido no conceito de “casa” previsto no inciso III do §4º do art. 150 do CP. Logo,
invasão ao seu gabinete constitui crime de violação de domicílio.

CP, Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a


vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas
dependências:
§ 4º - A expressão "casa" compreende:
162
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

I - qualquer compartimento habitado;


II - aposento ocupado de habitação coletiva;
III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou
atividade
45119

* ATENÇÃO - Exceções ao direito à inviolabilidade do domicílio:


(1) Em caso de flagrante delito, a qualquer momento;
(2) Em caso de desastre ou para prestar socorro;
(3) Através de autorização judicial, durante o dia.

Fique atento à jurisprudência:

O ingresso regular da polícia no domicílio, sem autorização judicial, em caso de


flagrante delito, para que seja válido, necessita que haja fundadas razões (justa
causa) que sinalizem a ocorrência de crime no interior da residência. A mera
intuição acerca de eventual traficância praticada pelo agente, embora pudesse
autorizar abordagem policial, em via pública, para averiguação, não configura, por
si só, justa causa a autorizar o45119
ingresso em seu domicílio, sem o seu consentimento
e sem determinação judicial. STJ. 6ª Turma. REsp 1574681-RS, Rel. Min. Rogério
Schietti Cruz, julgado em 20/4/2017 (Info 606).

C) Direito às Liberdades

Abrange as liberdades física, de pensamento, de locomoção.

I. LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO – Art. 5º, IV e V, da CRFB

A Constituição assegurou a liberdade de manifestação do pensamento, vedando o anonimato. Se


durante a manifestação do pensamento se causar dano material, moral ou à imagem, assegura-se o direito
de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização.
Conforme salienta o autor Pedro Lenza, o inciso IV estabelece uma espécie de “cláusula geral” que,
em conjunto com outros dispositivos, asseguram a liberdade de expressão nas suas diversas manifestações:
a) liberdade de manifestação do pensamento (incluindo a liberdade de opinião);
b) liberdade de expressão artística;
c) liberdade de ensino e pesquisa;
d) liberdade de comunicação e de informação (liberdade de “imprensa”);
e) liberdade de expressão religiosa.

163
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● “Hate speech” (discurso de ódio) – a liberdade de expressão não é absoluta. O modelo, portanto, de
solução é a ponderação, pautada pelo princípio da proporcionalidade. O STF, embora adote a tese
preferencial pela liberdade de expressão, certo é que não se trata de direito absolutamente infenso a
limites e restrições, desde que eventual restrição tenha caráter excepcional, seja promovido por lei e/ou
decisão judicial e tenha por fundamento a salvaguarda da dignidade da pessoa humana (que aqui se
opera como limite e aos limites de direitos fundamentais) e de direitos e bens jurídicos-constitucionais
individuais e coletivos fundamentais observados o critério da proporcionalidade e da preservação do
núcleo essencial dos direitos em conflito - LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, pg. 1183.

● Marcha da Maconha (ADPF 187) – as marchas da maconha vinham sendo reprimidas pela polícia, sob a
ótica de que elas geravam apologia ao crime, vez que o uso de maconha é criminalizado. Este
entendimento viola a liberdade de expressão, porque não se confunde a apologia à droga e o seu uso
45119

com a defesa da descriminalização ou ainda da inconstitucionalidade da criminalização. Em um Estado


Democrático de Direito se entender que o povo não possa se manifestar pela descriminalização de
uma conduta, evidentemente é se viver em um Estado que não pode ser chamado de Democrático de
Direito. Fundamentos trazidos pelo STF: livre manifestação de pensamento, reunião e direito das
minorias. Ademais, nas garantias dos direitos à informação e de liberdade de expressão, viabilizados pelo
direito de reunião e como emanação da dignidade45119
da pessoa humana, da democracia e da cidadania.

● Delação anônima (Inq. 1957) – o STF já decidiu não ser possível a utilização da denúncia anônima, pura
e simples, para a instauração de procedimento investigatório, por violar a vedação ao anonimato,
prevista no art. 5.º, IV, da CRFB. Nada impede, contudo, que o Poder Público provocado por delação
anônima adote medidas informais - com prudência e discrição - destinadas a apurar, previamente, em
averiguação sumária, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com
o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados, em ordem a promover, então, em
caso positivo, a formal instauração da persecutio criminis, mantendo-se, assim, completa desvinculação
desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas”.

● Tatuagem e o concurso público – “as pigmentações de caráter permanente inseridas voluntariamente


em partes dos corpos dos cidadãos configuram instrumentos de exteriorização da liberdade de
manifestação do pensamento e de expressão, valores amplamente tutelados pelo ordenamento jurídico
brasileiro (CRFB/88, art. 5.°, IV e IX)”. Assim, “o Estado não pode desempenhar o papel de adversário da
liberdade de expressão, incumbindo-lhe, ao revés, assegurar que minorias possam se manifestar
livremente”.

Tema 838 da repercussão geral, fixou as seguintes teses: “(i) os requisitos do edital
para o ingresso em cargo, emprego ou função pública devem ter por fundamento
lei em sentido formal e material; (ii) os editais de concurso público não podem
164
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

estabelecer restrição a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais em


razão de conteúdo que viole valores constitucionais” (RE 898.450, Plenário, Rel.
Min. Luiz Fux, j. 17.08.2016, DJE de 31.05.2017).

● Liberdade de expressão e imunidade parlamentar – Ressalta-se que os direitos fundamentais não


possuem caráter absoluto. A Segunda Turma do STF reafirmou esse entendimento ao entender que
a liberdade de expressão não alcança a prática de discursos dolosos, com intuito manifestamente
difamatório de juízos depreciativos de mero valor, de injúrias em razão da forma ou de críticas
aviltantes. A garantia da imunidade parlamentar não alcança os atos praticados sem claro nexo de
vinculação recíproca entre o discurso e o desempenho das funções parlamentares. Pet 8242
AgR/DF, Pet 8259 AgR/DF, Pet 8262 AgR/DF, Pet 8263 AgR/DF, Pet 8267 AgR/DF e Pet 8366 AgR/DF,
relator Min. Celso de Mello, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgamento em 3.5.2022.

● A liberdade de expressão existe para a manifestação de opiniões contrárias, jocosas, satíricas e até
mesmo errôneas, mas não para opiniões criminosas, discurso de ódio ou atentados contra o Estado
Democrático de Direito e a democracia. STF. AP 1044/DF, relator Min. Alexandre de Moraes,
julgamento em 20.4.2022 (Info 1051).
45119

II. LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA, CRENÇA E CULTO – ART 5º, VI a VIII, da CRFB)

Assegura-se a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, sendo garantido o livre


exercício dos cultos religiosos
45119
e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.

▪ Liberdade de crença: é a liberdade de pensamento de foro íntimo em questões de natureza


religiosa, incluindo o direito de professar ou não uma religião, de acreditar ou não na existência
de um, em nenhum ou em vários deuses (art. 5º, VI); e
▪ Liberdade de consciência em sentido estrito: é a liberdade de pensamento de foro íntimo em
questões não religiosas.

Obs.: o art. 5º, VII, da CF/88 também assegura, nos termos da lei, a prestação de assistência
religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva.

É constitucional a instituição, por lei municipal, de feriado local para a


comemoração do Dia da Consciência Negra, a ser celebrado em 20 de novembro,
em especial porque a data representa um símbolo de resistência cultural e
configura ação afirmativa contra o preconceito racial. ADPF 634/SP, relatora
Ministra Cármen Lúcia, julgamento finalizado em 30.11.2022

165
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

É inconstitucional norma que proíbe proselitismo em rádios comunitárias, ou seja,


a transmissão de conteúdo tendente a converter pessoas a uma doutrina, sistema,
religião, seita ou ideologia. O STF entendeu que essa proibição afronta os arts. 5º,
IV, VI e IX, e 220, da Constituição Federal. A liberdade de pensamento inclui o
discurso persuasivo, o uso de argumentos críticos, o consenso e o debate público
informado e pressupõe a livre troca de ideias e não apenas a divulgação de
informações. STF. Plenário. ADI 2566/DF, rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, red.
p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 16/5/2018 (Info 902).

A incitação de ódio público feita por líder religioso contra outras religiões pode
configurar o crime de racismo, pois não está protegida pela cláusula constitucional
que assegura a liberdade de expressão. STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min.
Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/3/2018 (Info 893).

É inconstitucional lei estadual que obriga que as escolas e bibliotecas públicas


tenham um exemplar da Bíblia. STF. Plenário. ADI 5258/AM, Rel. Min. Cármen
45119

Lúcia, julgado em 12/4/2021. (Info 1012)


45119

É constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade


religiosa, permite o sacrifício ritual de animais em cultos de religiões de matriz
africana. RE 494601/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Edson
Fachin, julgado em 28/3/2019. (Info 935)

#DICA DD: Não confundir- o STF entendeu que a CF/88 não proíbe que sejam
oferecidas aulas de uma religião específica, que ensine os dogmas ou valores
daquela religião. Não há qualquer problema nisso, desde que se garanta
oportunidade a todas as doutrinas religiosas. STF. Plenário. ADI 4439/DF, rel. orig.
Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em
27/9/2017 (Info 879). Lembre-se que a “neutralidade do ensino religioso não
existe. O que deve existir é o respeito às diferenças”.

Transfusão de sangue nas Testemunhas de Jeová


Tema que gera muita discussão. O Ministro Barroso sustenta que a dignidade da pessoa humana
apresenta duas acepções:
- Dignidade como autonomia: tutela a capacidade de autodeterminação e a responsabilidade moral
do indivíduo por suas escolhas, notadamente as de catéter existencial, dentre as quais se inclui a
liberdade religiosa;

166
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

- Dignidade como heteronomia: envolve a imposição de padrões sociais externos ao indivíduo, o que,
no caso concreto, significa a proteção objetiva da vida humana, mesmo contra a vontade do titular
do direito.
As acepções se complementam, mas é possível afirmar a prevalência da dignidade
45119 como
autonomia, o que significa dizer que devem prevalecer as escolhas individuais (LENZA, Pedro. Direito
constitucional esquematizado, pg. 1195). Assim, a escolha da pessoa - e aqui inclui a recusa pela transfusão
de sangue - é válida desde que o consentimento seja dado pelo titular do direito, manifestado de forma
válida e inequívoca por pessoa capaz e com discernimento, ou seja, consentimento inequívoco,
personalíssimo, expresso e atual. Ademais, deverá também ser livre e informado.
Apesar do tema ser polêmico, acerca de necessidade de transfusão de sangue em menores com risco
de vida, como não se pode exigir que exprimem consentimento, o médico deverá realizar todos os
tratamentos médicos alternativos sem sangue e, se mesmo assim não resolver, diante da vida ou morte do
menor, poderá então realizar a transfusão de sangue não respondendo o médico por constrangimento ilegal.

III. LIBERDADE DE ATIVIDADE INTELECTUAL, ARTÍSTICA, CIENTÍFICA OU DE COMUNICAÇÃO – ART. 5º, IX,
CF/88

É livre a expressão da atividade intelectual,


45119 artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença. Veda-se a censura de natureza política, ideológica e artística (art.
220, § 2.º), porém, apesar da liberdade de expressão acima garantida, lei federal deverá regular as diversões
e os espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que
não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada.

IV. LIBERDADE DE PROFISSÃO – ART. 5º, XIII da CRFB

Assegura a liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as


qualificações profissionais que a lei estabelecer. Trata-se de norma constitucional de eficácia contida,
podendo a legislação infraconstitucional limitar o seu alcance, fixando condições ou requisitos para o pleno
exercício da profissão.

O STF entendeu desnecessária a exigência de diploma de jornalista (RE 70563),


bem como a exigência de inscrição em Conselho Profissional, como condição ao
exercício de profissão artística de músico (RE 635023).

A exigência de que o leiloeiro preste caução para o exercício da profissão é


compatível com a Constituição, não havendo ofensa ao art. 5º, XIII, tendo em
vista que a garantia é necessária para resguardar eventuais danos ao patrimônio
de terceiros. STF. Plenário. RE 1263641/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o
167
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 9/10/2020 (Repercussão Geral – Tema


455) (Info 994).

A restrição imposta pela Lei 13.021/2014, no sentido de que apenas


farmacêuticos legalmente habilitados podem figurar como responsáveis técnicos
de farmácias e drogarias, não é incompatível com o 5º XIII, da Constituição
Federal. STF. Plenário.RE 1156197, Rel. Marco Aurélio, julgado em 24/08/2020
(Repercussão Geral – Tema 505) (Info 991 – clipping).

Cuidado - a jurisprudência do STF admite a regulamentação por lei de atividades que possam trazer danos a
terceiros, atividades profissionais cuja falta de técnica traga o risco de “atingir negativamente a esfera pública
de outros indivíduos ou de valores ou interesses da própria sociedade” (ADI 3.870, 2019). Nessas situações,
a lei poderá disciplinar, restritivamente, impondo regras ao exercício da profissão.

E) LIBERDADE DE INFORMAÇÃO – ART. 5º, XIV e XXXIII da CRFB

▪ Liberdade de informação jornalística:


A CF/88 consagrou expressamente o princípio45119
da publicidade como um dos vetores imprescindíveis
à Administração Pública, conferindo-lhe absoluta prioridade na gestão administrativa e garantindo pleno
acesso às informações a toda a sociedade.
A consagração constitucional de publicidade e transparência corresponde à obrigatoriedade do
Estado em fornecer as informações necessárias à sociedade. O acesso às informações consubstancia-se em
verdadeira garantia instrumental ao pleno exercício do princípio democrático.
Assim, salvo situações excepcionais, a Administração Pública tem o dever de absoluta transparência
na condução dos negócios públicos, sob pena de desrespeito aos arts. 37, caput, e 5º, XXXIII e LXXII, CF/88,
pois “o modelo político-jurídico, plasmado na nova ordem constitucional, rejeita o poder que oculta e o poder
que se oculta”.

45119

A irresponsabilidade da imprensa ao exibir, em rede nacional, programa que


veicule matéria ofensiva à honra e à dignidade de cidadão enseja dano moral
indenizável e este deve ser suficiente para reparar o dano, servir de sanção da
conduta praticada e coibir novos abusos. STJ. Processo em segredo de justiça, Rel.
Ministro Antonio Carlos Ferreira, Rel. para acórdão Ministro João Otávio de
Noronha, Quarta Turma, por maioria, julgado em 22/11/2022, DJe 2/2/2023. (Info
762).
É necessária a manutenção da divulgação integral dos dados epidemiológicos
relativos à pandemia da Covid-19. A interrupção abrupta da coleta e divulgação de
168
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

importantes dados epidemiológicos, imprescindíveis para a análise da série


histórica de evolução da pandemia (Covid-19), caracteriza ofensa a preceitos
fundamentais da Constituição Federal, nomeadamente o acesso à informação, os
princípios da publicidade e da transparência da Administração Pública e o direito à
saúde. STF. Plenário. ADPF 690/DF, ADPF 691/DF e ADPF 692 /DF, Rel. Min.
Alexandre de Moraes, julgados em 13/03/2021 (Info 1009).

STF determina que Ministério da Saúde faça a divulgação integral de dados sobre
Covid-19. STF. Plenário. ADPF 690 MC-Ref/DF, ADPF 691 MC-Ref/DF e ADPF 692
MC-Ref/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 20/11/2020 (Info 1000).

É inconstitucional o art. 6º-B da Lei nº 13.979/2020, incluído pela MP 928/2020,


porque ele impõe uma série de restrições ao livre acesso do cidadão a
informações. STF. Plenário. ADI 6351 MC-Ref/DF, ADI 6347 MC-Ref/DF e ADI 6353
MC-Ref/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgados em 30/4/2020 (Info 975).

A liberdade de informação jornalística não legitima a utilização de informações


sigilosas obtidas por meios ilícitos.
45119 8. Agravo regimental interposto por Infoglobo
45119
Comunicações Ltda. do qual não se conhece. 9 Agravo regimental interposto por
Globo Comunicação e Participações S/A ao qual se nega provimento. (RE 638360
AgR-segundo, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 27/04/2020,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-131 DIVULG 27-05-2020 PUBLIC 28-05-2020
REPUBLICAÇÃO: DJe-161 DIVULG 25-06-2020 PUBLIC 26-06-2020)

Violam a CF/88 os atos de busca e apreensão de materiais de cunho eleitoral e a


suspensão de atividades de divulgação de ideias em universidades públicas e
privadas. São inconstitucionais os atos judiciais ou administrativos que determinem
ou promovam:
• o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas;
• o recolhimento de documentos (ex: panfletos);
• a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes
universitários;
• a realização de atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de
depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e
divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob
a administração de universidades públicas e privadas. STF. Plenário. ADPF 548 MC-
Ref/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 31/10/2018 (Info 922).

169
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Cabe reclamação contra decisão judicial que determina retirada de matéria


jornalística de site. A retirada de matéria de circulação configura censura em
qualquer hipótese, o que se admite apenas em situações extremas. Assim, em
regra, a colisão da liberdade de expressão com os direitos da personalidade deve
ser resolvida pela retificação, pelo direito de resposta ou pela reparação civil.
Diante disso, se uma decisão judicial determina que se retire do site de uma revista
determinada matéria jornalística, esta decisão viola a orientação do STF, cabendo
reclamação. STF. 1ª Turma. Rcl 22328/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em
6/3/2018 (Info 893).

Mesmo sentido: Cabe reclamação contra decisão judicial que determina retirada
de matéria jornalística de blog. STF. 1ª Turma. Rcl 28747/PR, Rel. Min. Alexandre
de Moraes, red. p/ ac. Min. Luiz Fux, julgado em 5/6/2018 (Info 905). Sobre o
mesmo tema: STF. 1ª Turma. Rcl 22328/RJ, Rel. Min.
45119Roberto Barroso, julgado em

6/3/2018 (Info 893).

Jornal poderá acessar dados sobre mortes registradas em ocorrências policiais.


De acordo com o STJ, não cabe
45119 à administração pública ou ao Poder Judiciário
discutir o uso que se pretende dar à informação de natureza pública. A informação,
por ser pública, deve estar disponível ao público, independentemente de
justificações ou considerações quanto aos interesses a que se destina. Não se pode
vedar o exercício de um direito – acessar a informação pública – pelo mero receio
do abuso no exercício de um outro e distinto direito – o de livre comunicar. Em
suma: veículo de imprensa jornalística possui direito líquido e certo de obter dados
públicos sobre óbitos relacionados a ocorrências policiais. STJ. 2ª Turma. REsp
1852629-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 06/10/2020 (Info 682).

▪ Liberdade de informação x direito ao esquecimento


O direito ao esquecimento é o direito que uma pessoa possui de não permitir que um fato, ainda que
verídico, ocorrido em determinado momento de sua vida, seja exposto ao público em geral, causando-lhe
sofrimento ou transtornos.
A discussão quanto ao direito ao esquecimento envolve um conflito aparente entre a liberdade de
expressão/informação e atributos individuais da pessoa humana, como a intimidade, privacidade e honra,
passando por evolução jurisprudencial. Veja:
O STJ reconheceu o direito ao esquecimento em dois julgados principais: O caso “Aída Curi” (REsp
1.335.153-RJ) e a situação da “chacina da Candelária” (REsp 1.334.097-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgados em 28/5/2013), hipótese em que entendeu que tal direito que deveria ser exercido de forma
compatível com a intimidade e da honra das pessoas. Ressalta-se, contudo, que o deferimento ou não do
170
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

direito ao esquecimento sempre dependeu da análise do caso concreto e da ponderação dos interesses
envolvidos.

Em março de 2013, na VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, foi aprovado um


enunciado defendendo a existência do direito ao esquecimento como uma
expressão da dignidade da pessoa humana. Veja: “Enunciado 531: A tutela da
dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao
esquecimento”.

Vale ressaltar, ainda, que o STJ possui o entendimento no sentido de que, quando os registros da
folha de antecedentes do réu são muito antigos, admite-se o afastamento de sua análise desfavorável, em
aplicação à teoria do direito ao esquecimento. Isso porque não se pode tornar perpétua a valoração negativa
dos antecedentes, nem perenizar o estigma de criminoso para fins de aplicação da reprimenda, pois a
transitoriedade é consectário natural da ordem das coisas. STJ. 6ª Turma. HC 452.570/PR, Rel. Min. Antonio
Saldanha Palheiro, julgado em 02/02/2021.
No entanto, o tema passou por uma EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Isso porque o STJ passou a
relativizar o direito ao esquecimento, ao passo que o STF passou a entender pela sua incompatibilidade
com a Constituição Federal. Confira: 45119

O chamado direito ao esquecimento, apesar de ser reconhecido pela


jurisprudência, não possui caráter absoluto.
Em caso de evidente interesse social no cultivo à memória histórica e coletiva de
delito notório, não se pode proibir a veiculação de matérias jornalísticas
relacionados com o fato criminoso, sob pena de configuração de censura prévia,
vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. Em tal situação, não se aplica o direito
ao esquecimento. STJ. 3ª Turma. REsp 1.736.803-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, julgado em 28/04/2020 (Info 670).

Também importante:

O direito ao esquecimento não justifica a exclusão de matéria jornalística. O


direito ao esquecimento é considerado incompatível com o ordenamento jurídico
brasileiro. Logo, não é capaz de justificar a atribuição da obrigação de excluir a
publicação relativa a fatos verídicos. STJ. 3ª Turma. REsp 1961581-MS, Rel. Min.
Nancy Andrighi, julgado em 07/12/2021 (Info 723).

45119

Jurisprudências pertinentes:

171
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

◘ É inconstitucional a resolução do Conselho Federal de Psicologia que proíbe a comercialização e o uso


dos testes psicológicos para indivíduos que não sejam psicólogos: ofende os postulados constitucionais
relativos à liberdade de manifestação do pensamento (art. art. 5º, IV, IX e XIV, da CF/88) e de liberdade
de acesso à informação (art. 220, da CF/88). STF. Plenário. ADI 3481/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 6/3/2021 (Info 1008).

◘ Viola a liberdade de expressão a decisão de retirar da Netflix o especial de Natal do Porta dos Fundos
porque seu conteúdo satiriza crenças e valores do cristianismo: não encontra fundamento em uma
sociedade democrática e pluralista como a brasileira. STF. 2ª Turma. Rcl 38782/RJ, Rel. Min. Gilmar
Mendes, julgado em 3/11/2020 (Info 998).

◘ A proibição da entrevista com Adélio Bispo, autor da facada contra Jair Bolsonaro, não significou
censura nem restrição indevida à liberdade de imprensa: A decisão judicial impediu a entrevista com o
objetivo de proteger as investigações e evitar possíveis prejuízos processuais, inclusive quanto ao direito
ao silêncio do investigado. Além disso, a decisão teve como finalidade proteger o próprio custodiado,
que autorizou a entrevista, mas cuja sanidade mental era discutível na época, tendo sido,
posteriormente, declarado inimputável em razão de “transtorno delirante persistente”. STF. 1ª Turma.
Rcl 32052 AgR/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado
45119 em 14/4/2020 (Info 973).

45119

◘ Biografias não autorizadas: O STF entendeu na ADI 4815 que, para ser publicada uma biografia, NÃO é
necessária autorização prévia do indivíduo biografado, das demais pessoas retratadas, nem de seus
familiares, porque a autorização prévia seria uma forma de censura, incompatível com a liberdade de
expressão consagrada pela CF/88.

▪ Liberdade artística e os veículos de comunicação social: É ampla liberdade na produção da arte.

* ATENÇÃO: Embora exista a liberdade artística, o Poder Público poderá estabelecer faixas etárias
recomendadas, locais e horários para a apresentação. Ao mesmo tempo, lei federal deverá estabelecer meios
para que qualquer pessoa ou família possa defender-se de programações de rádio e televisão que atentem
contra os valores éticos vigentes (art. 220, §3º, I e II).

V. LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO:

É o direito de ir e vir, amparado por habeas corpus. A liberdade de locomoção no território nacional é
livre NOS TEMPOS DE PAZ.
Existem 4 hipóteses de exceção a liberdade de locomoção:

172
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

(1) Em caso de prisão em flagrante ou prisão por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária
competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar (art. 5º, LXI,
CF/88);
(2) Durante o estado de defesa (art. 136, 3º, I, CF/88) o decreto poderá estabelecer restrição ao direito
de reunião, ainda que exercida no seio das associações;
(3) Durante o estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I,CF/88, poderão ser tomadas
contra as pessoas as medidas de obrigação de permanência em localidade determinada (art. 139, I,
CF/88); detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns (art. 139,
II, CF/88); suspensão da liberdade de reunião (art. 139, IV, CF/88);
(4) Declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira (hipóteses de
decretação de estado de sítio – art. 137, II, CF/88), a liberdade de locomoção também poderá ser
restringida ou suspensa (art. 138, caput, CF/88).

VI. LIBERDADE DE REUNIÃO:

É o agrupamento organizado de pessoas de caráter transitório, com uma determinada finalidade. O


exercício válido do direito de reunião deve satisfazer os requisitos constitucionais, a saber:
✓ Reunião pacífica 45119

✓ Sem armas
✓ Em locais abertos ao público
✓ Dispensa autorização, mas deve haver aviso prévio aviso à autoridade competente
✓ Não pode frustrar outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local

O que se entende por aviso prévio para os fins do direito de reunião do art. 5º,
XVI, da CF/88? O STF fixou a seguinte tese: A exigência constitucional de aviso
45119
prévio relativamente ao direito de reunião é satisfeita com a veiculação de
informação que permita ao poder público zelar para que seu exercício se dê de
forma pacífica ou para que não frustre outra reunião no mesmo local. STF.
Plenário. RE 806339, Rel. para acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 14/12/2020
(Repercussão Geral – Tema 855).

O entendimento foi fixado porque não se pode exigir o aviso prévio como condicionante ao exercício
do direito de reunião.

VII. LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO:


Agrupamento de pessoas, organizado e permanente, para fins lícitos. Abrange:
∘ Direito de associar-se a outras pessoas para a formação de uma entidade;
∘ Aderir a uma associação já formada;
173
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

∘ Desligar-se da associação;
∘ Autodissolução das associações.

Atenção (1): o direito de associação somente é livre se:


● For para fins lícitos
● Não tiver caráter paramilitar.

Art. 5°, XVII, CRFB - é plena a liberdade de associação para fins


45119
lícitos, vedada a de
caráter paramilitar;

Atenção (2):
● Associações são criadas independentemente de autorização, já as cooperativas devem ser criadas na
forma da lei, mas independem de autorização;

Atenção (3): A CF/88 veda qualquer interferência estatal no funcionamento das associações e cooperativas.

XVIII – a criação de associações


45119 e, na forma da lei, a de cooperativas independem

de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

Atenção (4): As associações:


● Podem ser dissolvidas de forma compulsória por decisão judicial, mas apenas após o trânsito em
julgado.
● Podem ter suas atividades suspensas por decisão judicial, não sendo exigido o trânsito em julgado.

XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas


atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito
em julgado;

XX - Ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;


XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus
filiados judicial ou extrajudicialmente;

Obs.: É inconstitucional o condicionamento da desfiliação de associado à quitação de débito referente a


benefício obtido por intermédio da associação ou ao pagamento de multa. STF. Plenário. RE 820823/DF, Rel.
Min. Dias Toffoli, julgado em 30/9/2022 (Repercussão Geral – Tema 922) (Info 1070).

VIII. DIREITO DE PROPRIEDADE


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É garantido pela Constituição, mas não é absoluto, uma vez que a propriedade poderá ser
desapropriada. É necessário também que a propriedade cumpra sua função social, atendendo aos interesses
da coletividade e não apenas do proprietário.
● É garantido o direito de propriedade (art. 5º, XXII).
● A propriedade atenderá a sua função social (art. 5º, XXIII).
● A lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por
interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos na
Constituição (art. 5º, XXIV).
● No caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular,
assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano (art. 5º, XXV).

Obs.: Impenhorabilidade da pequena propriedade rural.


Dispõe o art. 5º, XXVI da CRFB que “a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que
trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua
atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento”.
Quanto ao tema, decidiu o STJ que a pequena propriedade rural é impenhorável mesmo que o imóvel
não sirva de moradia ao executado e a sua família. Ou45119
seja, o devedor não precisa morar lá, bastando que
sua família ali labore. Tal impenhorabilidade se presta não apenas a garantir o direito à moradia, mas também
tem por objetivo assegurar o direito fundamental de acesso aos meios geradores de renda, porquanto a
pequena propriedade.
Ademais, também entendeu-se que a pequena propriedade é impenhorável, mesmo
45119
que a dívida
executada não seja oriunda da atividade produtiva do imóvel. Se o sujeito usar o dinheiro para comprar um
carro ou financiar outra atividade, ainda assim permanece a impenhorabilidade. Entendeu o Tribunal que,
por se tratar de direito fundamental, deve ser dada a interpretação que garanta a máxima efetividade do
direito discutido. Se a CF não permite a penhora para dívidas oriundas da própria atividade produtiva, com
mais razão também será impenhorável com débitos de outra natureza (REsp. 1.591.298/RJ – 2015).

IX. DIREITO DE PETIÇÃO E DE OBTENÇÃO DE CERTIDÕES

XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:


a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade
ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e
esclarecimento de situações de interesse pessoal;

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SEMANA 01/12

Caso o pedido de certidão não seja atendido, o remédio constitucional cabível será o mandado de
segurança e não o habeas data. O direito de certidão não é absoluto, pois pode ser negado em caso de o
sigilo ser imprescindível à segurança da sociedade ou do Estado.

X. INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO

A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art.
5º, XXXV, CF/88).

Não se confunde com o direito de petição, já que este consiste em um direito de participação política
que não demanda a demonstração de interesse processual ou lesão a direito pessoal.
Exceção à regra da inafastabilidade da jurisdição: O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à
disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em
lei (art. 217, §1º, da CF).

XI. IRRETROATIVIDADE DA LEI

A lei não prejudicará o direito


45119adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada

(art. 5º, XXXVI,CF/88).

Conceitos (art. 6º da LINDB):


I- Direito adquirido: direito que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aquele cujo
começo do exercício tenha termo prefixo ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem;
II- Ato jurídico perfeito: ato já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou;
III- Coisa julgada: decisão judicial de que não caiba mais recurso.

Súmula 654-STF: A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art. 5º, XXXVI, da


Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha
editado.
45119

XII. PRINCÍPIO DA PESSOALIDADE

Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a


decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles
executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido (art. 5º XLV, CF/88).

O princípio da pessoalidade tem duas dimensões:

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1) Dimensão negativa: impede que sanções de natureza penal extrapolem o âmbito estritamente
pessoal do infrator, vedando a imposição de pena a terceiros;
2) Dimensão positiva: impõe o dever de expor circunstancialmente as condutas responsáveis pelo
ilícito, bem como de narrar com clareza o grau de participação dos acusados.

A veiculação de matéria jornalística sobre delito histórico que expõe a vida


cotidiana de terceiros não envolvidos no fato criminoso, em especial de criança e
de adolescente, representa ofensa ao princípio da intranscendência
Matéria jornalística que, sob o pretexto de noticiar crime histórico, expõe a
intimidade do atual marido e dos filhos da condenada, pessoas que não têm relação
direta com o fato, ofende o princípio da intranscendência ou da pessoalidade da
pena, descrito no art. 5º, XLV, da CF/88 e no art. 13 do Código Penal. Isso porque,
ao expor publicamente a intimidade dos referidos familiares em razão do crime
ocorrido, a reportagem compartilhou dimensões evitáveis e indesejáveis dos
efeitos da condenação então estendidas à atual família da ex-condenada.
Especificamente quanto aos filhos, menores de idade, ressalta-se a Opinião
Consultiva n. 17, de 28 de agosto de 2002 da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, que entende que 45119
o melhor interesse das crianças e dos adolescentes é
reconhecido como critério regente na aplicação de normas em todos os aspectos
da vida dos denominados “sujeitos em desenvolvimento”. STJ. 3ª 45119
Turma. REsp
1736803-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 28/04/2020 (Info 670).

É inconstitucional lei estadual que proíba a Administração Pública de contratar


empresa que tenha tido empregado condenado por crime ou contravenção
relacionados com a prática de atos discriminatórios. STF. Plenário. ADI 3092, Rel.
Marco Aurélio, julgado em 22/06/2020 (Info 987 – clipping).

XIII. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA:

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:


a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;

A aplicação do princípio ocorre em três âmbitos:

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● Plano legislativo: dirige-se ao legislador no momento da fixação dos limites mínimos e máximos da pena,
do regime de cumprimento e dos benefícios que podem ser concedidos ao infrator.
● Plano judicial: o magistrado, ao aplicar a pena, deve definir, fundamentadamente, a sua quantidade
conforme os parâmetros legais, o regime inicial e os benefícios aplicáveis;
● Plano executório: no momento da execução penal, deverá ser definido o estabelecimento prisional de
cumprimento da pena, tendo em conta a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado (art. 5º, XLVIII,
CF/88).

* Obs.: Súmula Vinculante nº 56: A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do
condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados
no RE 641.320/RS.

3. DIREITOS SOCIAIS

São direitos de 2ª geração/dimensão. A Constituição define no art. 6º quais são os direitos sociais:

CRFB, Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a


moradia, o transporte, o lazer,
45119 a segurança, a previdência social, a proteção à

maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta


Constituição.

a) Direitos dos trabalhadores


Direitos dos trabalhadores nas suas relações individuais de trabalho: são os direitos dos trabalhadores do
art. 7º da CF, cujo dispositivo deve 45119
ser lido atentamente. Dentre esses direitos, destaca-se:
· Direito ao trabalho: infere-se do valor social do trabalho como fundamento da República
(art. 2º) e demais dispositivos constitucionais;
· Garantia do emprego: é a proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária ou
sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória,
entre outros direitos, impedindo-se, dessa forma, a dispensa injustificada, sem motivo
socialmente relevante.

ATENÇÃO: A EC 72/2013 ampliou os direitos dos empregados domésticos!

● É possível a efetivação de direitos sociais pelo poder judiciário?


R.: Embora seja prerrogativa dos Poderes Legislativo e Executivo formular e executar políticas
públicas, o STF entende possível a efetivação de direitos sociais via Poder Judiciário, excepcionalmente,
sobretudo nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição.
Vejamos algumas jurisprudências (importantíssimas) sobre o tema:
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◘ STF determinou que governo deveria detalhar a ordem de preferência na vacinação dentro dos grupos
prioritários (quem deveria ser vacinado primeiro dentro do grupo prioritário). STF. Plenário. ADPF 754
TPI-segunda-Ref/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 27/2/2021 (Info 1007).

◘ Judiciário pode determinar a realização de obras de acessibilidade em prédios públicos a fim de


permitir a sua utilização por pessoas com deficiência. STJ. 2ª Turma. REsp 1607472-PE, Rel. Min. Herman
Benjamin, julgado em 15/9/2016 (Info 592).

◘ Judiciário pode determinar a realização de obras emergenciais em estabelecimento prisional para dar
efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua
integridade física e moral, nos termos do que preceitua o art. 5º, XLIX, da CF, não sendo oponível à
decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes. STF. Plenário.
RE 592581/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 13/8/2015 (repercussão geral) (Info 794).

◘ Judiciário pode obrigar administração pública a manter quantidade mínima de medicamento em


45119
estoque utilizado no combate a certa doença grave, de modo a evitar novas interrupções no
tratamento. Não há violação ao princípio da separação
45119 dos poderes no caso.STF. 1ª Turma. RE
429903/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 25/6/2014 (Info 752).

◘ Implementação de políticas públicas pelo Poder Judiciário para garantir o direito à saúde

“1. A intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas à realização


de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço,
não viola o princípio da separação dos Poderes. 2. A decisão judicial, como regra,
em lugar de determinar medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem
alcançadas e determinar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os
meios adequados para alcançar o resultado; 3. No caso de serviços de saúde, o
déficit de profissionais pode ser suprido por concurso público ou, por exemplo, pelo
remanejamento de recursos humanos e pela contratação de organizações sociais
(OS) e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP)”. RE 684.612/RJ,
relator Ministro Ricardo Lewandowski, redator do acórdão Ministro Roberto
Barroso, julgamento virtual finalizado em 30.6.2023 (sexta-feira), às 23:59 – Info
1101, STF

DIREITOS COLETIVOS DOS TRABALHADORES: Exercidos pelos trabalhadores coletivamente ou no interesse


de uma coletividade deles, previstos nos arts. 8-11. Destacamos:

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SEMANA 01/12

▪ Organização sindical: o art. 8º, CF/88, institui ampla autonomia coletiva para a fundação e direção
desse ente associativo, não podendo o Estado intervir ou condicionar o exercício desse direito. Pode,
contudo, ser exigida a inscrição do sindicato em órgão próprio (Ministério do Trabalho), bem como
admite-se que a lei disponha genericamente sobre regras básicas de organização sindical.

O art. 522 da CLT, que prevê um número máximo de empregados que podem ser
dirigentes sindicais, é compatível com a CF/88 e não viola a garantia da liberdade
sindical. A liberdade sindical tem previsão constitucional, mas não possui caráter
absoluto. A previsão legal de número máximo de dirigentes sindicais dotados de
estabilidade de emprego não esvazia a liberdade sindical. Essa garantia
constitucional existe para que possa assegurar a autonomia da entidade sindical,
mas não serve para criar situações de estabilidade genérica e ilimitada que violem
a razoabilidade e a finalidade da norma constitucional garantidora do direito. Logo,
o art. 522 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. STF. Plenário.
ADPF 276, Rel. Cármen Lúcia, julgado em 15/05/2020.

▪ Direito de substituição processual: a CF/88 previu a possibilidade de os sindicatos ingressarem em


juízo na defesa de direitos e interesses coletivos
45119 e individuais da categoria, em hipótese de
substituição processual, pois o sindicato ingressa em nome próprio na defesa de interesses alheios.

▪ Greve: previsto no art. 9º, cabe aos trabalhadores decidir a oportunidade de exercê-lo e os interesses
que devam por meio dele defender. Outrossim, prevê que a lei definirá os serviços ou atividades
essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, inclusive
responsabilizando os abusos cometidos.

Cuidado! Policial não pode fazer greve!!!


O exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou modalidade, é vedado aos
policiais civis e a todos os servidores públicos que atuem diretamente na área de
segurança pública. É obrigatória a participação do Poder Público em mediação
instaurada pelos órgãos classistas das carreiras de segurança pública, nos termos
do art. 165 do CPC, para vocalização dos interesses da categoria. STF. Plenário. ARE
654432/GO, Rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 5/4/2017 (repercussão geral) (Info 860).

ATENÇÃO - Para servidores públicos civis: como não existe lei específica sobre o assunto para servidores
45119

públicos civis, o STF conferiu efeitos concretos aos Mandados de Injunção ajuizados pelos Sindicatos de
Servidores Civis. Por maioria, conheceu dos mandados de injunção e propôs a solução para a omissão

180
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

legislativa com a aplicação, no que couber, da Lei nº 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de
greve na iniciativa privada.

IMPORTANTE:
O estudo da jurisprudência acerca do tema: “Direitos Fundamentais” é imprescindível, diante da elevada
cobrança em provas. Nesse sentido, abaixo algumas jurisprudências cuja leitura é importantíssima!

Informativo 163 do STF: não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou


garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante
interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das
liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos
estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde
que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição.
45119

O art. 5º, XL, da Constituição da República prevê a possibilidade de retroatividade


da lei penal, sendo cabível extrair-se do dispositivo constitucional princípio
implícito do Direito Sancionatório, segundo o qual a lei mais benéfica retroage no
caso de sanções menos graves,
45119 como a administrativa. AgInt no REsp 2.024.133-

ES, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado
em 13/3/2023, DJe 16/3/2023.

Cota de tela para filmes nacionais nos cinemas é constitucional porque a norma
é um mecanismo que protege a indústria nacional do audiovisual e amplia o
acesso à cultura. RE 627432 e RE 1070522, com repercussão geral (Temas 704 e
1013).

Não é possível atrelar-se ao salário mínimo o valor alusivo a benefício social e os


respectivos critérios de admissão. O STF afirmou que seria possível conferir
interpretação conforme a Constituição e dizer que o dispositivo previu que o valor
do benefício seria igual ao salário mínimo vigente na época em que a lei foi editada
(R$ 545). Após isso, mesmo o salário mínimo aumentando nos anos seguintes, o
valor do benefício não pode acompanhar automaticamente os reajustes realizados
sobre o salário mínimo, considerando que ele não pode servir como indexador. STF.
Plenário. ADI 4726/AP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/11/2020 (Info 998).

A EC 20/98 ampliou a proibição do trabalho infantil ao elevar de 14 para 16 anos


a idade mínima permitida para o trabalho; essa alteração é constitucional e tem

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

por objetivo proteger as crianças e adolescentes. STF. Plenário. ADI 2096/DF, Rel.
Min. Celso de Mello, julgado em 9/10/2020 (Info 994).

É inconstitucional lei municipal que proíba a divulgação de material com


referência a “ideologia de gênero” nas escolas municipais. Compete
privativamente à União legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional (art.
22, XXIV, da CF), de modo que os Municípios não têm competência para editar lei
proibindo a divulgação de material com referência a “ideologia de gênero” nas
escolas municipais. Existe inconstitucionalidade formal. Há também
inconstitucionalidade material nessa lei. Lei municipal proibindo essa divulgação
viola: • a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte
e o saber (art. 206, II, CF/88); e • o pluralismo de ideias e de concepções
pedagógicas (art. 206, III). Essa lei contraria ainda um dos objetivos fundamentais
da República Federativa do Brasil, que é a promoção do bem de todos sem
preconceitos (art. 3º, IV, CF/88). Por fim, essa lei não cumpre com o dever estatal
de promover políticas de inclusão e de igualdade, contribuindo para a manutenção
da discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero. STF.
Plenário. ADPF 457, Rel. Alexandre
45119 de Moraes, julgado em 27/04/2020.

A educação básica em todas as suas fases — educação infantil, ensino


fundamental e ensino médio — constitui direito fundamental de todas as crianças
e jovens, assegurado por normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade
direta e imediata. A educação infantil compreende creche (de zero a 3 anos) e a
pré-escola (de 4 a 5 anos). Sua oferta pelo Poder Público pode ser exigida
individualmente, como no caso examinado neste processo. O Poder Público tem o
dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à
educação básica. STF. Plenário. RE 1008166/SC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em
22/9/2022 (Repercussão Geral – Tema 548) (Info 1069).

Se o indivíduo possui contra si uma condenação criminal transitada em julgado,


45119
ele não poderá ser vigilante, mesmo que já tenha cumprido a pena há mais de 5
anos
Viola o princípio da presunção de inocência o impedimento de participação ou
registro de curso de formação ou reciclagem de vigilante, por ter sido verificada a
existência de inquérito ou ação penal não transitada em julgado. Assim, não
havendo sentença condenatória transitada em julgado, o simples fato de existir um
processo penal em andamento não pode ser considerado antecedente criminal
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para o fim de impedir que o vigilante se matricule no curso de reciclagem. STJ. 2ª


Turma. REsp 1597088/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 15/08/2017. A
existência de condenação criminal transitada em julgado impede o exercício da
atividade profissional de vigilante por ausência de idoneidade moral. STJ. 2ª Turma.
REsp 1666294-DF, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 05/09/2019 (Info 658).

Quando o delito imputado envolve o emprego de violência contra a pessoa ou


demonstre comportamento agressivo incompatível com as funções de vigilante,
é válida a recusa de pedido de inscrição em curso de reciclagem para vigilantes
profissionais, porquanto configurada, em regra, a ausência de idoneidade do
indivíduo. STJ. 1ª Turma. REsp 1952439-DF, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em
26/04/2022 (Info 734).

A existência de condenação criminal transitada em julgado impede o exercício da


atividade profissional de vigilante por ausência de idoneidade moral, mesmo que
tenha cumprido a pena há mais de 5 anos. REsp 1.952.439-DF, Rel. Min. Sérgio
Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 26/04/2022, DJe
28/04/2022. 45119

O STJ, através da sua 2° Turma – informativo de n° 666 – decidiu que: “A omissão


injustificada da Administração em providenciar a disponibilização de banho
quente nos estabelecimentos prisionais fere a dignidade de presos sob sua
custódia.”

O fornecimento recíproco de dados investigatórios e o intercâmbio de


informações entre a Polícia Federal e as polícias estaduais são medidas que se
45119
legitimam em face do modelo constitucional de federalismo cooperativo.
A razão disso encontra-se na forma de distribuição de competência dentro de uma
forma de estado federalista cooperativa. Isto é, há um ponto convergente entre a
União e os entes estaduais sobretudo em suas atividades investigativas (polícia civil
e federal).

Neste sentido, informativo de n° 755 do STF: “Cabe salientar que a mútua


cooperação entre organismos policiais, o intercâmbio de informações, o
fornecimento recíproco de dados investigatórios e a assistência técnica entre a
Polícia Federal e as Polícias Estaduais, com o propósito comum de viabilizar a mais
completa apuração de fatos delituosos gravíssimos, notadamente naqueles casos
em que se alega o envolvimento de policiais militares na formação de grupos de
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SEMANA 01/12

extermínio, encontram fundamento, segundo penso, no próprio modelo


constitucional de federalismo cooperativo (RHC 116.000/GO, Rel. Min. CELSO DE
MELLO), cuja institucionalização surge, em caráter inovador, no plano de nosso
ordenamento constitucional positivo, na Constituição Federal de 1934, que se
afastou da fórmula do federalismo dualista inaugurada pela Constituição
republicana de 1891, que impunha, por efeito da outorga de competências
estanques, rígida separação entre as atribuições federais e estaduais.”

45119

45119

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META 4

DIREITO ADMINISTRATIVO: NOÇÕES INICIAIS E PRINCÍPIOS

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CRFB/88
⦁ Art. 5º, X, XXXIII e LX
⦁ Art. 5º, LV
⦁ Art. 37, caput e §1º 45119

⦁ Art. 37, VII


⦁ Art. 93, IX
⦁ Art. 41
⦁ Art. 169, §3º

OUTROS DIPLOMAS LEGAIS


⦁ Art. 11, IV, Lei 8429/92
⦁ Arts. 6º, 32 e 37 da lei 8987/95
45119
⦁ Arts. 3º e 58, da Lei 8666/93 c.c. arts. 5º e 104 da Lei 14133/21
⦁ Arts. 2º, 50, 53 e 54 da Lei 9784/99
⦁ Lei 12.527/11 (Lei de Acesso à Informação)
⦁ Lei 14.129/21 (princípios, regras e instrumentos para aumento da eficiência pública)

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!


⦁ Art. 37, caput e §1º, CF/88 (importantíssimo!)
⦁ Art. 5º, LV e LX
⦁ Art. 6º, §1º e §3º lei 8987/95
⦁ Art. 2º, caput da Lei 9784/99 (análise comparativa com o art. 37, caput, da CF/88 e art. 3º da Lei
8666/93 c.c. art. 5º da Lei 14133/21)
⦁ Art. 53 da Lei 9784/99

SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA


Súmula 633-STJ: A Lei nº 9.784/99, especialmente no que diz respeito ao prazo decadencial para a revisão
de atos administrativos no âmbito da Administração Pública federal, pode ser aplicada, de forma
subsidiária, aos Estados e municípios, se inexistente norma local e específica que regule a matéria.
Súmula vinculante 13-STF: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou
por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa
jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão

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SEMANA 01/12

ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em qualquer
dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante
designações recíprocas, viola a Constituição Federal.
Súmula 473-STF: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam
ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade,
respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Súmula 346-STF: A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
Súmula 6-STF: A revogação ou anulação, pelo Poder Executivo, de aposentadoria, ou qualquer outro ato
aprovado pelo Tribunal de Contas, não produz efeitos antes de aprovada por aquele tribunal, ressalvada a
competência revisora do judiciário.

1. ORIGEM, NATUREZA JURÍDICA E OBJETO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

O Direito Administrativo compõe o ramo do Direito Público, pois tem como características e
princípios marcantes a supremacia do interesse público (relações jurídicas verticalizadas), a
indisponibilidade do interesse público e a legalidade.
Rafael Carvalho aponta que o nascimento do Direito Administrativo se relaciona diretamente à
consagração dos ideais da Revolução Francesa de 1789
45119e ao surgimento do Estado de Direito. A partir dos

45119
ideais liberais revolucionários da burguesia (separação de poderes, princípio da legalidade e Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão), o poder estatal é limitado e o Direito Administrativo é concebido como
ramo especial do Direito, ao lado do Direito Privado, regulador das relações envolvendo o Estado e o exercício
das atividades administrativas.
Nesse sentido, o Estado é pessoa jurídica de direito público, ainda quando atue na seara do direito
privado. Logo, o Estado pode atuar tanto no direito público quanto no direito privado, no entanto, sempre
ostenta a qualidade de PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO.
O Direito Administrativo tem por objeto as relações por ele disciplinadas, a saber:
a) relações internas entre órgãos e entidades administrativas;
b) relações entre a administração e seus agentes;
c) relações entre a administração e os seus administrados;
d) atividades administrativas exercidas por prestadores de serviços públicos.

2. EVOLUÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

● Administração Patrimonialista: Não havia diferença entre os interesses pessoais dos agentes
públicos e os interesses da própria administração.
● Administração Burocrática: Superou o patrimonialismo ao adotar o princípio da impessoalidade.
Foram criados rígidos controles sobre a atuação dos agentes públicos. Formou-se a burocracia, em

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DELEGADO SANTA CATARINA

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que os agentes públicos devem obedecer aos procedimentos determinados, à rígida hierarquia e à
separação de funções.
● Administração Gerencial: É o modelo adotado na Administração moderna. Busca superar o modelo
burocrático por meio da adoção do princípio da eficiência, que tem as seguintes consequências
principais:
∘ Utilização do controle de resultados substituindo o controle de meios;
∘ Maior autonomia dos agentes/órgãos/entidades públicas;
∘ Serviço orientado para o cidadão;
∘ Utilização de indicadores de desempenho.

Administração Pública Dialógica: Segundo Ronny Charles, Administração pública dialógica é uma tendência
identificada em algumas atividades administrativas, notadamente na prestação de serviços públicos e
contratações de grandes empreendimentos, que consiste na abertura de diálogo com os administrados,
permitindo que eles colaborem para o aperfeiçoamento ou a legitimação da atividade administrativa.

3. INFLUÊNCIAS DO DIREITO ESTRANGEIRO

Como é um tema que, às vezes, cai em prova e 45119


45119 ajuda a resolver determinadas questões, é importante
abrir um tópico rápido acerca das influências do direito estrangeiro no direito administrativo brasileiro.

● Direito alemão - o direito administrativo brasileiro herdou a inspiração para aplicação do princípio da
segurança jurídica, especialmente sob o aspecto subjetivo da proteção à confiança.

● Direito francês - herdou o conceito de serviço público, a teoria dos atos administrativos com o atributo
da executoriedade, as teorias sobre responsabilidade civil do Estado, o princípio da legalidade, a teoria
dos contratos administrativos, as formas de delegação da execução de serviços públicos, a ideia de que
a Administração Pública se submete a um regime jurídico de direito público, derrogatório e exorbitante
do direito comum, que abrange o binômio autoridade/liberdade.

● Direito italiano - recebeu o conceito de mérito, o de autarquia e entidade paraestatal (dois vocábulos
criados no direito italiano). Os autores italianos (ao lado dos alemães) também contribuíram para a
adoção de um método técnico-científico.

● Direito inglês (sistema da common law) - o direito administrativo brasileiro herdou o princípio da
unidade de jurisdição, o mandado de segurança e o mandado de injunção, o princípio do devido
processo legal, inclusive, mais recentemente, em sua feição substantiva, e que praticamente se
confunde com o princípio da razoabilidade. No fim do século XX, também herdou do sistema common
law o fenômeno da agencificação e a própria ideia de regulação.
187
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4. CRITÉRIOS DA ADMINISTRAÇÃO

O direito administrativo é ramo jurídico, e como tal, se dedica ao estudo das regras e normas, sendo
caracterizada como ciência normativa e impositiva, que define os limites dentro dos quais a gestão pública
pode ser executada. Várias foram as correntes/teorias que buscaram definir o direito administrativo. Nessa
linha, vejamos as principais delas:

a) Corrente Legalista/Exegética/Empírica: O direito administrativo seria o conjunto da legislação


administrativa existente no país. Limitava-se a fazer compilação de leis que tratassem da função
administrativa e desconsiderava doutrina e jurisprudência.

Crítica: A grande crítica do critério legalista foi desconsiderar a carga normativa dos princípios. Dessa forma,
só era valorado o que estivesse em lei.

b) Critério do Poder Executivo/Italiano/Subjetivista: O Direito Administrativo seria um complexo de leis


disciplinadoras da atuação do poder executivo. Assim, o objeto do direito administrativo seria toda
atuação do Poder Executivo. 45119

45119

Crítica: O Direito Administrativo não se resume à disciplina do Poder Executivo, afinal, todos os Poderes
administram, embora, para alguns, isso constitua missão atípica. E mais: no Poder Executivo, nem tudo é
objeto do Direito Administrativo, a exemplo das funções de governo, regidas pelo Direito Constitucional.

c) Critério das Relações Jurídicas: O Direito Administrativo é a disciplina das relações jurídicas entre a
Administração e o particular. Assim, todas as relações entre o Estado e o administrado seriam função
administrativa.

Crítica: Outros ramos do direito, de igual modo, regulam a relação jurídica entre particular e Estado, por
exemplo, os contratos privados pactuados que são regidos pelo direito civil.

d) Critério do Serviço Público (França): O Direito Administrativo teria por objetivo a disciplina jurídica dos
serviços públicos. Ou seja, a função administrativa seria a instituição, organização e prestação do serviço
público. → Escola do Serviço Público (Leon Duguit).
● Sentido amplo (Leon Duguit): Inclui todas as atividades do Estado;
● Sentido estrito (Gaston Jeze): Inclui apenas atividades materiais (leia-se: aquelas de dentro para
fora, com a finalidade de satisfação das necessidades coletivas).

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Crítica: O referido conceito é bastante restrito, porque, na atualidade, a ideia de prestação de serviço público
vem sofrendo restrições, de modo que a administração pública não se limita tão somente à execução dessa
prestação. O Estado faz muitas atividades além da mera prestação do serviço público, sendo este último
apenas uma das facetas. Por exemplo, atua na exploração de atividade econômica na busca do interesse
público.

e) Critério Teleológico ou Finalístico: O Direito Administrativo é sistema de princípios jurídicos que regula
as atividades do Estado para o cumprimento dos seus fins. Assim, o Direito Administrativo deve ser
conceituado como toda atuação do Estado com finalidade pública.

Crítica: Essa posição apresenta-se como a mais correta, porém não consegue abranger integralmente o
conceito da matéria, de forma que não é adotada de forma majoritária.

f) Critério Negativista: Esse critério surgiu da dificuldade de identificar o objeto do Direito Administrativo.
Assim, o Direito Administrativo seria conceituado por exclusão, abrangendo tudo que não era função
legislativa e jurisdicional.

45119
Crítica: Não é adequado definir algo pelo que ele não é. Embora não tenha um erro grosseiro, este critério
não pode ser usado como forma de conceituação do direito administrativo

g) Critério Funcional: O Direito Administrativo é ramo jurídico que estuda e analisa a disciplina da função
administrativa, esteja ela sendo exercida pelo Executivo, Legislativo, Judiciário ou por delegação estatal.

Segundo Hely Lopes Meirelles, o direito administrativo pode ser definido como conjunto harmônico
de princípios que regem os órgãos, os agentes e a atividade pública para realização dos fins desejados pelo
Estado de forma DIRETA, CONCRETA e IMEDIATA.
● Direta: Não se confunde com a função jurisdicional, que é indireta por depender de provocação.
Desse modo, ao se falar que a atuação é direta, quer-se dizer que ela atua de ofício, não dependendo
de provocação. Reitero: NÃO depende de provocação para que haja atuação administrativa, ela é
DIRETA.
● Concreta: Diferente da legislativa, que é geral e abstrata (não atinge pessoas específicas), a função
administrativa é concreta porque se materializa em casos concretos.
● Imediata: Realiza os fins do Estado (necessidades do Estado). Quem define os fins do Estado, por sua
vez, é o Direito Constitucional.

5. SENTIDOS DA ADMINISTRAÇÃO

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A expressão Administração Pública pode ser analisada sob seu aspecto formal/subjetivo/orgânico ou
sob seu aspecto material/objetivo/funcional.

a) Formal, Orgânico ou Subjetivo: É o conjunto de órgãos, agentes públicos e pessoas jurídicas no


exercício da função administrativa. Importa apenas quem realiza a atividade, sendo irrelevante qual
a atividade por eles desempenhada. É a máquina administrativa.

b) Material, Funcional ou Objetivo: Se confunde com função administrativa, sendo a atividade


administrativa exercida pelo Estado, designando a atividade consistente na defesa
45119
concreta do
interesse público.

● A Administração Pública, em sentido amplo, objetivamente considerada, compreende a função


política + função administrativa. Já em sentido estrito, envolve tão somente a função administrativa
propriamente dita.

Resumindo...
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM SENTIDO ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM SENTIDO
FORMAL, ORGÂNICO OU SUBJETIVO 45119 MATERIAL, FUNCIONAL OU OBJETIVO
Conjunto de órgãos e agentes no exercício da É a própria atividade administrativa
função administrativa. desempenhada pelo Estado.

5.1 Administração Pública Extroversa e Introversa

O autor Diogo de Figueiredo Moreira Neto diferencia esses termos da seguinte forma:
I- Administração Introversa: corresponde à atividade-meio da Administração. É instrumental, atende
ao interesse público secundário e não atinge diretamente os cidadãos. Logo, envolve as relações entre a
Administração e seus agentes. Também é atribuída a todos os órgãos administrativos;
II- Administração Extroversa: corresponde à atividade-fim da Administração. É finalística, atende ao
interesse público primário e atinge diretamente os cidadãos. Logo, envolve as relações entre a Administração
e os particulares. É atribuída apenas aos entes políticos. Exemplo: poder de polícia.

5.2 Tendências atuais do Direito Administrativo

Para o professor Rafael Oliveira (2018, p. 58), o Direito Administrativo tem sofrido profundas
transformações, cabendo destacar as seguintes mutações e tendências:
a) Constitucionalização e aplicação do princípio da juridicidade (vinculação positiva do administrador à
Constituição e ao ordenamento como um todo e não somente à lei);

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b) Relativização de formalidades e ênfase nos resultados (ideia de substituição da Administração


burocrática pela Administração Gerencial);
c) Elasticidade do Direito Administrativo, mediante o diálogo com outras disciplinas;
d) Consensualidade e participação (busca pela legitimidade democrática da Administração, com
instrumentos de participação dos cidadãos na tomada de decisões administrativas);
e) Processualização e contratualização da atividade administrativa;
f) Publicização do Direito Civil e privatização do Direito Administrativo; e
g) Aproximação entre a Civil Law e a Common Law.
45119

5.3 Transadministrativismo

O autor Diogo de Figueiredo Moreira Neto adota a tese de que existe um novo ramo do Direito
Administrativo denominado transadministrativismo que é a disciplina jurídica das relações assimétricas de
poder que se institucionaliza consensualmente fora e além do Estado.
Trata-se de um direito administrativo transnacional, fenômeno semelhante ao
transconstitucionalismo.
Para o referido doutrinador, o direito administrativo global é um gênero, do qual o direito
administrativo transestatal (transadministrativismo)45119é espécie. O transadministrativismo refere-se
exclusivamente ao produto normativo desses centros de poder transestatais: aqueles que se originam de
necessidades ordinatórias das diversas sociedades, que não são providas pelos Estados.

6. FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO

A doutrina costuma apontar a existência de cinco fontes principais deste ramo do Direito, quais
sejam: a lei, a jurisprudência, a doutrina, os princípios gerais e os costumes.

▪ LEI – Fonte Primária – qualquer espécie normativa (lei em sentido amplo);


· A lei é a fonte primária do direito administrativo, pois inova no ordenamento jurídico. A
atuação administrativa tem que ser pautada pela lei, pois só existe a atuação do
administrador se houver permissivo legal nesse sentido (princípio da legalidade).
· Em se tratando de Direito Administrativo, a lei deve ser interpretada em sentido amplo, de
modo a abarcar não só a lei em sentido estrito, mas também as normas constitucionais, os
regulamentos administrativos e os tratados internacionais. O administrador público deve
obediência à lei e ao Direito (princípio da juridicidade).

▪ JURISPRUDÊNCIA – Fonte Secundária – julgamentos reiterados no mesmo sentido. Súmula é a


consolidação da jurisprudência.

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· A jurisprudência se traduz na reiteração de julgados dos órgãos do judiciário, travando uma


orientação acerca de determinada matéria. Trata-se de fonte secundária do Direito
Administrativo, de grande influência na construção e consolidação desse ramo.

▪ DOUTRINA – Fonte Secundária – forma o sistema teórico de princípio aplicável ao Direito Positivo.
· É fonte secundária. Refere-se à lição dos mestres e estudiosos da matéria, ensejando a
formação de arcabouço teórico. É fonte interpretativa. Expõe uma interpretação sobre
determinada matéria ou lei, ao estabelecer o que provavelmente buscava, ou seja, sua
razão/sentido.

▪ PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO – estão na base da disciplina (alicerce). Ex..: Ninguém pode causar
dano a outrem. É vedado o enriquecimento ilícito. Ninguém pode se beneficiar da própria torpeza.

▪ COSTUMES – Práticas reiteradas da autoridade administrativa. Lembre-se que o costume não cria e
nem exime obrigação. 45119

· Elementos do costume:
- Elemento objetivo: repetição de condutas;
- Elemento subjetivo: convicção de sua obrigatoriedade.
45119

· Espécies de costumes:
- Secundum legem: previstos ou admitidos pela lei;
- Praeter legem: preenchem as lacunas normativas, possuindo caráter subsidiário;
- Contra legem: se opõem à norma legal.

Obs.: Para o autor Rafael Carvalho, “ressalvado o costume contra legem, o costume é fonte
autônoma do Direito Administrativo. A releitura do princípio da legalidade, com a superação do positivismo,
a textura aberta de algumas normas jurídicas e a necessidade de consideração da realidade social na
aplicação do Direito demonstram que os costumes devem ser considerados como fontes do Direito
Administrativo”, pg. 25.

COSTUME SOCIAL COSTUME ADMINISTRATIVO


De acordo com o autor Matheus Carvalho, “os Na dicção do autor Matheus Carvalho: “o costume
costumes sociais se apresentam como um administrativo é caracterizado como prática
conjunto de regras não escritas, que são, reiteradamente observada pelos agentes
todavia, observadas de modo uniforme por administrativos diante de determinada situação
determinada sociedade, que as considera concreta. A prática comum na Administração Pública é
obrigatórias. Ainda considera-se fonte admitida em casos de lacuna normativa e funciona como
fonte secundária de Direito Administrativo, podendo

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relevante do Direito Administrativo, tendo em gerar direitos para os administrados, em razão dos
vista a deficiência legislativa na matéria”. princípios da lealdade, boa-fé, moralidade
administrativa, entre outros”.

E, ainda, os precedentes administrativos:


▪ PRECEDENTES ADMINISTRATIVOS – Pressupõem a prática reiterada e uniforme de atos
administrativos em situações similares. A teoria dos precedentes administrativos é aplicada em
relações jurídicas que, apesar de distintas, apresentam identidade subjetiva e objetiva.

Resumindo...
FONTE PRIMÁRIA 1) Lei - em sentido material/amplo: qualquer espécie normativa
1) Jurisprudência
FONTES 2) Doutrina
SECUNDÁRIAS 3) Costumes - secundum legem e praeter legem
45119

4) Princípios Gerais do Direito

1) Constituição
FONTES FORMAIS 2) Lei 45119

3) Regulamento e outros atos normativos da Administração


Pública
5) Jurisprudência (sem efeito vinculante)
FONTES MATERIAIS 6) Doutrina
7) Costumes - secundum legem e praeter legem
8) Princípios Gerais do Direito

7. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

A interpretação do Direito Administrativo deve se pautar em 3 (três) pressupostos básicos, quais


sejam:

(1) Desigualdade entre a administração e o particular (desigualdade jurídica) - Toda vez que se
interpreta uma norma do direito administrativo, deve-se recordar que existe uma desigualdade
jurídica, visto que a Administração atua com supremacia em face ao particular (princípio da
supremacia do interesse público sobre o privado).
(2) Presunção de legitimidade dos atos praticados pela Administração - Os atos praticados pela
Administração são presumivelmente legítimos, ou seja, presume-se que foram praticados em

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conformidade com o ordenamento jurídico (lembre-se: a presunção de legitimidade e veracidade é


atributo do ato administrativo). Trata-se de presunção relativa.
(3) Necessidade de discricionariedade – A discricionariedade é indispensável para que o administrador
possa concretizar a norma geral e abstrata prevista. Contudo, é uma discricionariedade
regrada/mitigada, pois exercida dentro dos limites da lei.

Obs.: A analogia NÃO pode ser utilizada para fundamentar a aplicação de sanções ou gravames aos
particulares, especialmente no campo do poder de polícia e do poder disciplinar.

8. SISTEMAS DE CONTROLE DA ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA


45119

a) Sistema Francês (contencioso administrativo)


● Dualidade de jurisdição;
● Proíbe o conhecimento, pelo Poder Judiciário, de atos ilícitos praticados pela Administração, ficando
os atos sujeitos à jurisdição especial do contencioso administrativo.

b) Sistema Inglês (jurisdição única)


● Todos os litígios podem ser resolvidos na justiça comum;
45119

● Sistema adotado pelo Brasil (princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, art. 5º, XXXV, da
CF/88). Obs. Já houve a previsão do tribunal constitucional de contencioso no Brasil na EC 7/77, mas
nunca foi implementado.

9. REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO

É o conjunto de regras e princípios que regem a Administração Pública. O autor Celso Antônio
Bandeira de Mello defende a existência de verdadeiras “PEDRAS DE TOQUE” no Direito Administrativo, quais
sejam:

● Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado: Os interesses coletivos devem


prevalecer ao interesse particular;
● Princípio da indisponibilidade do interesse público: O interesse público não se encontra à livre
disposição do administrador.

Vamos aprofundar um pouco?


Conforme o doutrinador Rafael Carvalho, o fenômeno da constitucionalização do ordenamento jurídico
abalou alguns dos mais tradicionais dogmas do Direito Administrativo, a saber a redefinição da ideia de
supremacia do interesse público sobre o privado e a ascensão do princípio da ponderação de direitos

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fundamentais. A partir dessa distinção, a doutrina tradicional sempre apontou para a superioridade do
interesse público primário (e não do secundário) sobre o interesse privado. Atualmente, no entanto, com a
relativização da dicotomia público x privado, a democratização da defesa do interesse público e a
complexidade (heterogeneidade) da sociedade atual, entre outros fatores, vem ganhando força a ideia de
“desconstrução” do princípio da supremacia do interesse público em abstrato. Portanto, não existe um
interesse público único, estático e abstrato, mas sim finalidades públicas normativamente elencadas que não
estão necessariamente em confronto com os interesses privados, razão pela qual seria mais adequado falar
em “princípio da finalidade pública”, em vez do tradicional “princípio da supremacia do interesse público”,
o que reforça a ideia de que a atuação estatal deve sempre estar apoiada em finalidades públicas, não
egoístas, estabelecidas no ordenamento jurídico. A atuação do Poder Público não pode ser pautada pela
supremacia do interesse público, mas, sim, pela ponderação e máxima realização dos interesses envolvidos.

Interesse público primário x Interesse público secundário


O interesse público primário é aquele relacionado à satisfação das necessidades coletivas (justiça,
segurança, bem comum do grupo social etc.), perseguido pelo exercício das atividades-fim do Poder Público,
enquanto o interesse público secundário corresponde ao interesse individual do próprio Estado, estando
relacionado à manutenção das receitas públicas e à defesa do patrimônio público, operacionalizadas
mediante exercício de atividades-meio do Poder Público
45119(Ricardo Alexandre, 2018).

45119

9.1 Princípios x Regras

a) Princípios: Hoje são considerados normas jurídicas primárias.


· Possuem grau de abstração maior do que as regras, pois admitem uma série indefinida de
aplicações.
· São mandamentos de otimização, que determinam a realização de algo na maior medida
possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, admitindo aplicação
gradativa.
· Colisão de princípios: ponderação de interesses no caso concreto.
· Condensam os valores fundamentais da ordem jurídica e se irradiam sobre todo o sistema
jurídico, garantindo-lhe harmonia e coerência.
· Categorias:
✓ Princípios fundamentais: Representam decisões políticas estruturais do Estado,
servindo de matriz para todas as demais normas constitucionais.
✓ Princípios gerais: Em regra, são importantes especificações dos princípios
fundamentais, possuindo menor grau de abstração e irradiando-se sobre todo
ordenamento jurídico. Ex.: Princípio da isonomia e da legalidade.
✓ Princípios setoriais ou especiais: Aplicam-se a determinado tema, capítulo ou título
da Constituição. Ex.: L.I.M.P.E – Art. 37 CF (princípios explícitos da Constituição/88).
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b) Regras:
· Direcionam-se a situações determinadas.
· O conflito de regras é resolvido na dimensão da validade (“tudo ou nada”), ou seja, a regra é
válida ou inválida, a partir45119
dos critérios de especialidade, hierarquia e cronológico (Dworkin).
· Em alguns casos, o conflito entre regras pode ser resolvido pela dimensão do peso e, não
necessariamente, pelo critério de validade. Ex: vedação à concessão de liminar contra a
Fazenda que esgote o objeto do litígio.

9.2 Princípios Explícitos do Direito Administrativo

São denominados de princípios explícitos do Direito Administrativo aqueles que constam


expressamente no art. 37 da CF/88. São eles: [LIMPE]
● Legalidade
● Impessoalidade
● Moralidade
● Publicidade
● Eficiência
45119

Obs.: Além dos princípios expressos pelo Direito Administrativo, existem princípios implícitos extraídos pela
interpretação sistemática e reconhecidos pela jurisprudência e doutrina.

PRINCÍPIOS EXPRESSOS PRINCÍPIOS IMPLÍCITOS


● Legalidade ● Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade
● Impessoalidade ● Princípio da Supremacia do Interesse Público Sobre o
● Moralidade Privado (Princípio da Finalidade Pública)
● Publicidade ● Princípio da Autotutela ou Sindicabilidade
● Eficiência ● Princípio Da Continuidade Do Serviço Público
● Princípio da Motivação
● Princípio da Ampla Defesa e Contraditório
● Princípio da Segurança Jurídica e Legítima Confiança
● Princípio da Intranscendência Subjetiva das Sanções

10. PRINCÍPIOS DO DIREITO ADMINISTRATIVO

10.1 Legalidade (Juridicidade)

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Pelo princípio da legalidade, a atuação da administração pública subordina-se à lei, de modo que o
agente público somente poderá fazer o que proclama a lei. Assim, não havendo previsão legal, está proibida
a atuação do ente público e qualquer conduta praticada de forma arbitrária por ele.
Ressalta-se que a legalidade no âmbito do direito administrativo não se confunde com a legalidade
privada em que é permitido fazer tudo que não é proibido (autonomia privada). Ex.: O princípio da legalidade
veda à administração a prática de atos inominados, embora estes sejam permitidos aos particulares.

LEGALIDADE ADMINISTRATIVA LEGALIDADE PRIVADA


A atuação da administração pública subordina- Vigora a autonomia privada. Por isso, o particular
se à lei, de modo que o agente público somente pode fazer tudo aquilo que a lei não proibir. Só deve
poderá fazer o que proclama a lei. deixar de fazer se estiver expressamente proibido
em lei.

Note a flagrante diferença entre os regimes jurídicos de direito público e direito privado, uma vez
que, neste último, é possível realizar tudo o que a lei não proíbe, ao passo que, no primeiro, o administrador
somente pode atuar mediante prévia autorização legal.
O princípio da legalidade comporta dois desdobramentos:
(1) Supremacia da lei: A lei prevalece e tem preferência
45119 sobre os atos da Administração.
· Relaciona-se com a doutrina da NEGATIVE BINDUNG (VINCULAÇÃO NEGATIVA), segundo a
qual a lei representa uma limitação à vontade do Administrador.
(2) Reserva de lei: o tratamento de certas matérias deve ser formalizado necessariamente pela
legislação.
· Relaciona-se com a POSITIVE BINDUNG (VINCULAÇÃO POSITIVA), que condiciona a validade
da atuação dos agentes45119
públicos à prévia autorização legal.
Atualmente, prevalece a ideia da vinculação positiva da Administração à lei, ou seja, a atuação do
administrador depende de prévia habilitação legal para ser legítima.

Considerações importantes:
● A legalidade deve ser reinterpretada a partir da constitucionalização do Direito Administrativo.
● Por ser submissa ao princípio da legalidade, a Administração não pode levar a termo interpretação
extensiva ou restritiva de direitos, quando a lei assim não o prever de modo expresso.
● A legalidade encontra-se inserida no denominado PRINCÍPIO DA JURIDICIDADE, que exige a
submissão da atuação administrativa à lei e ao Direito → Exige-se compatibilidade com o BLOCO DE
LEGALIDADE. Pelo princípio da juridicidade, deve-se respeitar, inclusive, a noção de legitimidade do
Direito.

ATENÇÃO AOS CONCEITOS:

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I) Juridicidade: Compatibilidade com todo ordenamento jurídico;


II) Legalidade: Compatibilidade com as exigências formais ou padrões materiais da lei;
45119

III) Legitimidade: É o ato que observa não só as formalidades prescritas ou não defesas em lei, mas se há
adequação aos princípios da boa administração, dentro de padrões razoáveis e morais, e aos princípios
constitucionalmente reconhecidos.
IV) Economicidade: Foco no binômio custo/ benefício em face do meio utilizado para satisfação social, junto
ao controle de eficiência da gestão financeira, para atingir melhor índice de resultado.

O que é o PRINCÍPIO DA RESPONSIVIDADE?


Consoante entendimento do doutrinador Diogo de Figueiredo, a responsividade é um dos princípios
modernos que norteia a atuação da Administração Pública. Determina que, ao atuar, a Administração não
obedeça apenas à legalidade, mas também à legitimidade e ao princípio democrático, ou seja, que atue de
modo a atender os anseios da população. É, então, inegavelmente, um dever jurídico autônomo dos agentes
do Poder Público para, ao perfazerem suas escolhas discricionárias, observarem as demandas da sociedade.

10.2 Princípio Da Impessoalidade

Pelo princípio da impessoalidade, a atuação da45119


administração pública deve ser imparcial, não visando
beneficiar ou prejudicar pessoa determinada, tendo em vista que a sua atuação está voltada à busca do
interesse público em geral.
O princípio da impessoalidade possui duas acepções:

i. Igualdade ou Isonomia: A Administração deve dispensar tratamento impessoal e isonômico aos


particulares para atender a finalidade pública, vedada a discriminação odiosa ou desproporcional.
Ex.: realização de concurso público é uma forma de observar o princípio da igualdade ou isonomia e
o princípio republicano.

ii. Proibição de promoção pessoal: Vedação do exercício da máquina pública para atingir interesses
particulares. Veja o art. 37, §1º da CF/88 (Atenção! Esse artigo despenca em prova!):

“A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos


públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não
podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção
pessoal de autoridades ou serviços públicos”.

Sobre o tema, destaca-se a jurisprudência do STF:

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O § 1º do art. 37 da CF/88 não admite flexibilização por norma infraconstitucional


ou regulamentar. Está em desconformidade com a Constituição Federal a previsão
contida na Lei Orgânica do Distrito Federal que autoriza que cada Poder defina, por
norma interna, as hipóteses pelas quais a divulgação de ato, programa, obra ou
serviço públicos não constituirá promoção pessoal. Essa delegação conferida viola
o § 1º do art. 37 da CF/88, que não admite flexibilização por norma
infraconstitucional ou regulamentar. É de se conferir interpretação conforme a
Constituição ao § 6º do art. 22 da Lei Orgânica do Distrito Federal para que a
divulgação de atos e iniciativas de parlamentares seja tida como legítima apenas
quando efetuada nos ambientes de divulgação do mandatário ou do partido
político, não se havendo de confundi-la com a publicidade do órgão público ou
entidade. STF. Plenário. ADI 6522/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em
14/5/2021 (Info 1017).

10.3 Princípio da Moralidade 45119

O princípio da moralidade traduz a ideia de honestidade, obediência a princípios éticos, boa-fé,


lealdade, boa administração, correção de atitudes. É45119
diferente da moralidade comum (certo e errado do
convívio social) por ser mais rígida, exigindo a correção de atitudes e a boa administração. Trata-se, portanto,
da atuação segundo padrões éticos de probidade e decoro.
Nessa esteira, segundo o professor Matheus Carvalho (Manual de D. Administrativo, 2014), “trata-se
de princípio que exige a honestidade, legalidade, boa-fé de conduta no exercício da função administrativa,
ou seja, a atuação não corrupta dos gestores públicos, ao tratar com a coisa de titularidade do Estado”.

A prática do nepotismo na Administração Pública viola o princípio da moralidade?


R.: De acordo com o STF, o nepotismo é vedado em qualquer dos Poderes da República por força dos
princípios constitucionais da impessoalidade, eficiência, igualdade e moralidade, independentemente de
previsão expressa em diploma legislativo. Assim, o nepotismo não exige a edição de uma lei formal proibindo
a sua prática, uma vez que tal vedação decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da
CF/88 (STF Rcl. 6.702/PR-MC-Ag).
No entanto, o STF tem afastado a aplicação da SV 13 (que veda o nepotismo) a cargos públicos de
natureza política. Assim, a jurisprudência do STF, em regra, tem excepcionado a regra sumulada e garantido
a permanência de parentes de autoridades públicas em cargos políticos, sob o fundamento de que tal prática
não configura nepotismo. Exceção: poderá ficar caracterizado o nepotismo, mesmo em se tratando de cargo
político, em 2 casos:
1) Caso fique demonstrada a inequívoca falta de razoabilidade na nomeação por manifesta ausência de
qualificação técnica ou inidoneidade moral do nomeado. STF. 1ª Turma. Rcl 28024 AgR, Rel. Min.
Roberto Barroso, julgado em 29/05/2018.
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DELEGADO SANTA CATARINA

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2) Em casos de fraude à lei.

Súmula vinculante 13-STF: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em


linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade
nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção,
chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança
ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em
qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios,
compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição
Federal. (MUITO IMPORTANTE!)

Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! A Lei Orgânica da Polícia Civil do Estado Alfa foi alterada
pela Assembleia Legislativa, de maneira que foi inserido um artigo dispondo que é vedado ao servidor público
ocupante de cargo efetivo ou comissionado servir sob a direção imediata de cônjuge ou parente até segundo
grau civil. De acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a norma mencionada é:
inconstitucional em relação aos ocupantes de cargos efetivos eis que normas inibitórias do nepotismo não
têm como campo próprio de incidência os cargos efetivos sob pena de violação ao concurso público.
45119

Dissecando a Súmula Vinculante 13 para facilitar a memorização:

Quem não pode ser nomeado?


R: Cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive,
da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou
assessoramento.

Não haverá nepotismo se a pessoa nomeada possuir um parente no órgão, mas


sem influência hierárquica sobre a nomeação. A incompatibilidade da prática
enunciada na SV 13 com o art. 37 da CF/88 não decorre diretamente da existência
de relação de parentesco entre pessoa designada e agente político ou servidor
público, mas de presunção de que a escolha para ocupar cargo de direção, chefia
ou assessoramento tenha sido direcionado à pessoa com relação de parentesco
com quem tenha potencial de interferir no processo de seleção. STF. 2ª Turma. Rcl
18564/SP, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, red.
45119
p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, julgado
em 23/2/2016 (Info 815).

Não pode ser nomeado para o quê?

200
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

R.: Para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração
Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
municípios.

Vamos relembrar...
CARGO EM COMISSÃO CARGO EM CONFIANÇA ou FUNÇÃO DE
CONFIANÇA
Cargo baseado na confiança, de livre Cargo também baseado na confiança,
nomeação e livre exoneração para atividades de direção, chefia e
(exoneração ad nutum), para assessoramento. No entanto, somente
atividades de direção, chefia e quem ocupa cargo efetivo pode ser
assessoramento. Pode ser ocupado por nomeado.
qualquer pessoa, mas deve ser
guardado um percentual para quem já
é de carreira.

CF, Art. 37, V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores


ocupantes de cargo efetivo,45119
e os cargos em comissão, a serem preenchidos por
45119

servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei,


destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

E o nepotismo cruzado? Também é vedado?


A parte final da súmula proíbe o nepotismo no ajuste mediante designações recíprocas. Não pode
na mesma pessoa jurídica, mas também não pode trocar de parentes, não pode nepotismo cruzado. A União
concede um cargo comissionado para um primo do governador, e o governador para um irmão do
presidente. Designações recíprocas é o nepotismo cruzado, o que é vedado.

O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política,


como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal.
Mesmo em caso de cargos políticos, será possível considerar a nomeação
indevida nas hipóteses de nepotismo cruzado; fraude à lei e inequívoca falta de
razoabilidade da indicação, por manifesta ausência de qualificação técnica ou por
inidoneidade moral do nomeado. STF. 1ª Turma. Rcl 29033 AgR/RJ, rel. Min.
Roberto Barroso, julgado em 17/9/2019. (Info 952)

A Lei nº 14.230/2021 passou a prever expressamente que a prática do nepotismo configura ato de
improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública.
201
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios
da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de
honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das
seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
(...)
XI - nomear cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por
afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da
mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento,
para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função
gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste
mediante designações recíprocas; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

10.4 Princípio da Publicidade

O princípio da publicidade impõe a divulgação e exteriorização dos atos do poder público,


guardando relação com o princípio democrático, ao possibilitar
45119 o controle social sobre os atos públicos. Em
outras palavras: a atuação da Administração pública deve ser sempre o mais transparente possível.
Ressalta-se, ainda, que a publicidade também representa condição de eficácia dos atos
administrativos, de modo que estes só começam a produzir efeitos a partir de sua publicidade. Assim,
enquanto o ato não é publicado, o particular não toma conhecimento deste, e sem tomar ciência, não pode
praticar e/ou observá-lo. Daí porque se fala que a publicidade é um pressuposto de eficácia.

Requisito de eficácia dos atos administrativos = capacidade de produção de seus efeitos


Excepcionalmente, é possível restringir a publicidade em determinados casos, conforme preceitua o
art. 5º da CF/88: 45119

● Art. 5º, X (são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas). O
administrador não pode, com fundamento na publicidade, violar tais valores, sob pena de indenizar
os lesados.
X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação;

● Art. 5º, XXXIII (segurança do Estado ou da sociedade).


XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu
interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo

202
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja


imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

● Art. 5º, LX (processos que correm em sigilo). Em processos tanto judiciais quanto administrativos.
Ex. Em processo administrativo no âmbito do CRM sobre erro médico, só há publicação quando se
tem o resultado.
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa
da intimidade ou o interesse social o exigirem;

Frise-se que a Lei nº 12.527/11 (Lei de Acesso à informação) prevê a possibilidade de restrição ao
fornecimento de informações, se imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado.
Caiu em prova Delegado PC-AM/2022 da banca FGV! João, brasileiro com vinte anos de idade e que jamais
solicitara o seu alistamento
45119
eleitoral, requereu, à Secretaria de Estado de Segurança Pública do Estado Alfa,
informações a respeito de auditoria realizada pelo órgão competente de controle interno nas contratações
realizadas pelo órgão. Acresça-se que, no bojo desse requerimento, João não indicou a finalidade em que
essas informações seriam utilizadas.

À luz da sistemática vigente, é correto afirmar que 45119


o requerimento de João deve ser: deferido, sendo
irrelevante o fato de João não ser cidadão e de não indicar a finalidade das informações.

#DICA DD: O art. 10 da Lei nº 12.527/2011 informa que: “Qualquer interessado poderá apresentar pedido
de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1º desta Lei, por qualquer meio legítimo,
devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida".

Por fim, o STF decidiu que:

É nulo — por violar o princípio da publicidade, bem como por restringir o direito
à informação — ato público que estabelece, genericamente e sem
fundamentação válida e específica, que todos os processos do Sistema Eletrônico
de Informações da Polícia Federal (SEI-PF) sejam cadastrados com nível de acesso
restrito. STF. ADPF 872/DF, relatora Ministra Cármen Lúcia, julgamento virtual
finalizado em 14.8.2023. (Info 1103)

10.5 Princípio da Eficiência

O princípio da eficiência foi inserido pela EC 19/98 para substituir a Administração Pública burocrática
pela gerencial, tendo em vista a necessidade de efetivação célere das finalidades públicas elencadas no
ordenamento jurídico.
203
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Nesse sentido, o princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com
presteza, perfeição e rendimento funcional. Sua aplicação orienta e serve de fundamento para a construção
de uma concepção de Administração Pública Gerencial. 45119

Exemplos de aplicação determinando a observância da aplicação da eficiência: O art. 41 da CF


demonstra a exigência da eficiência na atividade administrativa, ao exigir avaliação especial de desempenho,
assim como a avalição periódica, que depende de regulamentação por lei, pendente ainda.
- avaliação especial de desempenho (art. 41, §4º): “como condição para aquisição da estabilidade, é
obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para esse fim”.
- avaliação periódica de desempenho (art. 41, III, da CF): “mediante procedimento de avaliação
periódica de desempenho, na forma da lei complementar, assegurada ampla defesa”.
- regra limitadora com gastos de pessoal (art. 169 da CF).
A concretização dos resultados, na medida do possível, deve ser realizada por meio de processo
político-participativo. A implementação da eficiência administrativa depende, por exemplo, da adoção de
medidas de desburocratização, de inovação, de transformação digital e da participação do cidadão, na forma
indicada na Lei 14.129/2021 que dispõe princípios, regras e instrumentos para o Governo Digital e para o
aumento da eficiência pública.
Lei nº 14.129/21: Trata-se de legislação federal aplicável às administrações direta e indireta das três
esferas da federação, bem como os três poderes, incluindo
45119 Tribunal de Contas e Ministério Público. Não se
aplica a empresas públicas e sociedades de economia mista, suas subsidiárias e controladas, que não prestem
serviço público.
São princípios e diretrizes do Governo Digital e da eficiência pública, entre outros (art. 3):

I - a desburocratização, a modernização, o fortalecimento e a simplificação da


relação do poder público com a sociedade, mediante serviços digitais, acessíveis
inclusive por dispositivos móveis;
II - a disponibilização em plataforma única do acesso às informações e aos serviços
públicos, observadas as restrições legalmente previstas e sem prejuízo, quando
indispensável, da prestação de caráter presencial;
III - a possibilidade aos cidadãos, às pessoas jurídicas e aos outros entes públicos de
demandar e de acessar serviços públicos por meio digital, sem necessidade de
solicitação presencial;
IV - a transparência na execução dos serviços públicos e o monitoramento da
qualidade desses serviços;
(...)
VIII - o uso da tecnologia para otimizar processos de trabalho da administração
pública;
(...)

204
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

X - a simplificação dos procedimentos de solicitação, oferta e acompanhamento


dos serviços públicos, com foco na universalização do acesso e no autosserviço;
XI - a eliminação de formalidades e de exigências cujo custo econômico ou social
seja superior ao risco envolvido;
(...)
XIV - a interoperabilidade de sistemas e a promoção de dados abertos;
(...)
XXVI - a promoção do desenvolvimento tecnológico e da inovação no setor
público.

11. OUTROS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS

11.1 Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade

O princípio da razoabilidade surgiu no direito norte-americano a partir da evolução jurisprudencial


da cláusula do devido processo legal, a qual deixou de lado seu caráter apenas procedimental (procedural
due process of law – garantias processuais do contraditório, ampla defesa etc.) para incluir seu caráter
substantivo (substantive due process of law – proteção45119
das liberdades e direitos dos indivíduos contra abusos
do Estado).
A razoabilidade é a coerência, lógica, congruência, equilíbrio, tendo sempre por base o padrão do
homem médio. O administrador tem que agir com bom senso, com equilíbrio. Ela proíbe os excessos, mas
45119

também veda a proteção deficiente.


Para os administrativistas, o princípio da proporcionalidade está embutido no princípio da
razoabilidade, pois prevalece a tese de fungibilidade dos princípios.
A proporcionalidade subdivide-se em 03 subprincípios:
i. Adequação ou idoneidade: o ato estatal deverá contribuir para a realização do resultado pretendido.
ii. Necessidade ou exigibilidade: caso existam duas medidas adequadas para alcançar o fim perseguido,
o Poder Público deve adotar a medida menos gravosa aos direitos fundamentais (ex. invalidade da
sanção de demissão ao servidor que pratica infração leve).
iii. Proporcionalidade em sentido estrito: é a ponderação, no caso concreto, entre o ônus imposto pela
atuação estatal e o benefício por ela produzido, razão pela qual a restrição ao direito fundamental
deve ser justificada pela importância do princípio ou direito que se quer efetivar.

ATENÇÃO!
O princípio da proporcionalidade é, ainda, um limite à discricionariedade do legislador, que, muitas vezes,
ultrapassa uma linha tênue e se torna arbitrariedade (a qual é vedada no ordenamento jurídico brasileiro).
Assim, mesmo que se trate de um ato administrativo discricionário, se tal ato não obedecer ao princípio da
proporcionalidade/razoabilidade, será possível a interferência do Poder Judiciário sem que isso acarrete
205
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

violação à Separação de Poderes. Isso porque tais princípios, embora implícitos, são princípios
constitucionais que decorrem do devido processo legal. Nesse caso, o Poder Judiciário realiza o controle de
legalidade em sentido amplo, isto é, o controle do ato em relação a leis infraconstitucionais e à própria CF.
Por esse motivo, a doutrina trata desses princípios como limitadores da liberdade e discricionariedade do
administrador.

11.2 Princípio da Supremacia do Interesse Público Sobre o Privado (Princípio da Finalidade Pública)

O interesse público divide-se em (doutrina italiana):

i. Interesse público primário: Necessidade de satisfação das necessidades coletivas. É o interesse em


dar cabo às necessidades sociais;
45119

ii. Interesse público secundário: É o interesse do próprio Estado, enquanto sujeito de direitos e
obrigações, ligando-se à noção de interesse do erário. É o interesse do Estado com si próprio, como
pessoa jurídica de direito público que é.

Assim, pelo princípio, há uma primazia de soluções e decisões que atendam ao interesse coletivo, em
detrimento do interesse de um único indivíduo ou grupo
45119 seleto de indivíduos.

Parcela da doutrina sustenta a desconstrução do referido princípio pelos seguintes fundamentos: a)


a CF, em diversas passagens, protege a esfera individual (art. 1º, III), não sendo lícito afirmar que o interesse
público irá sempre prevalecer sobre o privado; b) “interesse público” é conceito indeterminado e abstrato;
c) o interesse público é indissociável do interesse privado, sendo ambos consagrados pela CF e incluídos nas
finalidades do Estado; d) incompatibilidade da supremacia do interesse público com postulados normativos
como o da proporcionalidade e o da concordância prática; e) não há um confronto dicotômico entre interesse
público e privado. A ponderação deve, portanto, ser sempre efetuada em concreto.

11.3 Princípio da Autotutela ou Sindicabilidade

Pelo princípio da autotutela, também denominado de sindicabilidade, a administração pública tem a


prerrogativa de rever os seus próprios atos independentemente de provocação, seja para revogá-los ou para
anulá-los. Este controle pode ser de legalidade ou de mérito. Quando ilegal, o ato será anulado; quando
inoportuno ou inconveniente, será revogado.
Ressalta-se que o princípio da autotutela não afasta a possibilidade de controle de legalidade pelo
Poder Judiciário, em razão do Sistema de Jurisdição Una.

- Ato ilegal → ANULAÇÃO → efeitos ex tunc;


- Ato inconveniente/inoportuno → REVOGAÇÃO → efeitos ex nunc;

206
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Art. 53 da Lei 9.784/99: A Administração deve anular seus próprios atos, quando
45119

eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou


oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.

Súmula 346 STF: A administração pública pode declarar a nulidade dos seus
próprios atos.

Súmula 473 STF: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados
de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-
los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

Enunciado 20 da I Jornada de Direito Administrativo CJF/STJ: O exercício da


autotutela administrativa, para o desfazimento do ato administrativo que produza
efeitos concretos favoráveis aos seus destinatários, está condicionado à prévia
intimação e oportunidade de contraditório aos beneficiários do ato.

Cuidado (1): Não confundir autotutela com autoexecutoriedade!


45119

● Autotutela: Designa o poder-dever de corrigir ilegalidades e de garantir o interesse público dos atos
editados pela própria Administração;
● Autoexecutoriedade: Prerrogativa de imposição da vontade administrativa, independentemente de
recurso ao Poder Judiciário.

Cuidado (2): Não confundir autotutela com tutela!


● Autotutela: o princípio da autotutela autoriza a administração a realizar controle dos seus atos,
podendo anular os ilegais e revogar os inconvenientes ou inoportunos, independentemente de
decisão do Poder Judiciário.
● Tutela: pelo princípio da tutela, a administração exerce controle sobre pessoa jurídica por ela
instituída, com o objetivo de garantir a observância de suas finalidades institucionais. (= supervisão
ministerial = controle finalístico).

A Administração Pública deve observar algum requisito quando for anular atos ilegais?
O STF possui entendimento no sentido de que, a despeito deste poder-dever de anular os atos ilegais,
se a invalidação do ato administrativo repercutir no campo de interesses individuais, faz-se necessária a
instauração de processo administrativo que assegure o devido processo legal e a ampla defesa (Informativo
763 do STF).

207
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Além disso, o art. 54 da lei 9.784/99 estipula que o direito da Administração de anular os atos
administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários decai em 5 anos, contados da data em
45119
que foram praticados, salvo comprovada má fé.
Trata-se, portanto, de um prazo para o exercício da autotutela. Ressalta-se que, em princípio, a Lei
nº 9.784/99 deveria regular apenas e unicamente o processo administrativo no âmbito da Administração
Federal direta e indireta. O processo administrativo na esfera dos Estados e dos Municípios deve ser tratado
por meio de legislação a ser editada por cada um desses entes, em virtude da autonomia legislativa que
gozam para regular a matéria em seus territórios.
No entanto, o STJ entende que, se o Estado ou o Município não possuir em sua legislação previsão
de prazo decadencial para a anulação dos atos administrativos, deve-se aplicar, por analogia integrativa, o
art. 54 da Lei nº 9.784/99. Essa conclusão é baseada nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
O entendimento acima resultou na edição da Súmula 633 do STJ:

Súmula 633 STJ: A Lei 9.784/99, especialmente no que diz respeito ao prazo
decadencial para revisão de atos administrativos no âmbito da administração
pública federal, pode ser aplicada de forma subsidiária aos Estados e Municípios se
inexistente norma local e específica regulando a matéria.
45119

Há, contudo, julgados que mitigam esse prazo decadencial de 5 anos, a exemplo:

Mesmo depois de terem se passado mais de 5 anos, a Administração Pública pode


anular a anistia política concedida quando se comprovar a ausência de
perseguição política, desde que respeitado o devido processo legal e assegurada
a não devolução das verbas já recebidas. STJ. 1ª Seção. MS 19070-DF, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. Acd. Min. Og Fernandes, julgado em 12/02/2020
(Info 668).

Ademais, o prazo decadencial do art. 54 da Lei nº 9.784/99 não se aplica quando o ato a ser anulado
afronta diretamente a Constituição Federal. Veja:

Não existe direito adquirido à efetivação na titularidade de cartório quando a


vacância do cargo ocorre na vigência da CF/88, que exige a submissão a concurso
público (art. 236, § 3º). O prazo decadencial do art. 54 da Lei nº 9.784/99 não se
aplica quando o ato a ser anulado afronta diretamente a Constituição Federal. O
art. 236, § 3º, da CF é uma norma constitucional autoaplicável. Logo, mesmo antes
da edição da Lei 8.935/1994, ela já tinha plena eficácia e o concurso público era
obrigatório como condição para o ingresso na atividade notarial e de registro. STF.
Plenário. MS 26860/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 2/4/2014 (Info 741).
208
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Além disso, o STF decidiu que, em regra, o prazo decadencial para que a Administração anule atos
administrativos inválidos é de 5 anos, aplicável a todos os entes federativos, por força do princípio da
isonomia, ou seja:

É inconstitucional lei estadual que estabeleça prazo decadencial de 10 (dez) anos


para anulação de atos administrativos reputados inválidos pela Administração
Pública estadual. STF. Plenário. ADI 6019/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do
acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 12/4/2021 (Info 1012).

Por fim, em decisão na qual se evidencie não acarretar lesão ao interesse público nem prejuízo a
terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria
Administração.

11.4 Princípio Da Continuidade Do Serviço Público

A atuação administrativa, buscando atender da melhor forma o interesse público, preconiza que a
atividade do Estado deve ser prestada de forma contínua,
45119 ou seja, sem interrupções, motivo pelo qual o
princípio da continuidade veda a interrupção na prestação dos serviços públicos.
Está expressamente previsto no art. 6º, § 1º, da Lei n. 8.987/95 (Lei de Serviços Públicos), e seu
fundamento reside no fato de a prestação de serviços públicos ser um dever constitucionalmente
45119

estabelecido (art. 175 da CF/88), localizando-se, portanto, acima da vontade da Administração Pública, que
não tem escolha entre realizar ou não a prestação.
Entretanto, o art. 6º, § 3º, da Lei n. 8.987/95, de acordo com o entendimento doutrinário majoritário
e da jurisprudência do STJ, autoriza o corte no fornecimento do serviço em caso de emergência ou, após
prévio aviso, nas hipóteses de:
a) razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e
b) inadimplemento do usuário.
Obs.: O aviso prévio dado através de comunicado em rádio de amplo alcance satisfaz as condições de aviso
prévio, haja vista se tratar de um dos meios mais populares e o de maior alcance público, motivo pelo qual
há de se reconhecer a validade e eficácia do ato administrativo. Veja a jurisprudência do STJ nesse sentido:

Em regra, o serviço público deverá ser prestado de forma contínua, ou seja, sem
interrupções (princípio da continuidade do serviço público). Excepcionalmente,
será possível a interrupção do serviço público nas seguintes hipóteses previstas
no art. 6º, § 3º da Lei n.º 8.987/95: a) Em caso de emergência (mesmo sem aviso
prévio); b) Por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações, desde que
o usuário seja previamente avisado; c) Por causa de inadimplemento do usuário,
209
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

desde que ele seja previamente avisado. Se a concessionária de energia elétrica


divulga, por meio de aviso nas emissoras de rádio do Município, que haverá, daqui
a alguns dias, a interrupção do fornecimento de energia elétrica por algumas horas
em virtude de razões de ordem técnica, este aviso atende a exigência da Lei nº
8.987/95? SIM. A divulgação da suspensão no fornecimento de serviço de energia
elétrica por meio de emissoras de rádio, dias antes da interrupção, satisfaz a
exigência de aviso prévio, prevista no art. 6º, § 3º, da Lei nº 8.987/95. STJ. 1ª
Turma. REsp 1270339-SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 15/12/2016 (Info
598).

Obs.: A interrupção por inadimplemento do usuário não pode paralisar serviços essenciais, como, por
exemplo, corte de energia elétrica do hospital público/iluminação pública. Nos chamados “serviços
essenciais”, mantém-se o serviço e prossegue com a cobrança paralelamente.

Podem ser apontados diversos desdobramentos normativos decorrentes do princípio da


continuidade dos serviços públicos, dentre os quais:

a. O direito de greve dos servidores públicos será45119


exercido nos termos e nos limites definidos em lei
específica (art. 37, VII, da CF). Lembre-se que o exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou
modalidade, é vedado aos policiais civis e a todos os servidores públicos que atuem diretamente na
área de segurança pública. (STF, Info 860). Isso porque a greve dos policiais é proibida por conta do
45119
direito de toda a sociedade à garantia da segurança pública, à garantia da ordem pública e da paz social
b. Restrição à aplicabilidade da exceptio non adimpleti contractus, pois o contratado só pode
interromper a execução do contrato após atraso superior a 2 (dois) meses, contado da emissão da
nota fiscal, dos pagamentos ou de parcelas de pagamentos devidos pela Administração por despesas
de obras, serviços ou fornecimentos (art. 137, §2º, IV, da Lei n. 14.133/2021);
c. Possibilidade de intervenção na concessionária para garantia de continuidade na prestação do serviço
(art. 32 da Lei n. 8.987/95);
d. Ocupar provisoriamente bens móveis e imóveis e utilizar pessoal e serviços vinculados ao objeto do
contrato nas hipóteses de: i) risco à prestação de serviços essenciais; ii) necessidade de acautelar
apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, inclusive após extinção do contrato.
(art. 104, V, da Lei n. 14.133/2021);
e. Reversão de bens do concessionário indispensáveis à continuidade do serviço (art. 36 da Lei n.
8.987/95);
f. Encampação do contrato de concessão mediante a retomada do serviço pelo concedente (art. 37 da
Lei n. 8.987/95);
g. Necessidade de institutos como a suplência, a delegação e a substituição para preencher as funções
públicas temporariamente vagas.
210
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

JURISPRUDÊNCIA EM TESE – STJ

É legítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais quando


inadimplente o usuário, desde que precedido de notificação.

É legítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais por razões de


ordem técnica ou de segurança das instalações, desde que precedido de
notificação.

É ilegítimo o corte no fornecimento de energia elétrica quando puder afetar o


direito à saúde e à integridade física do usuário.

É legítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais quando


inadimplente pessoa jurídica de direito público, desde que precedido de notificação
e a interrupção não atinja as unidades prestadoras de serviços indispensáveis à
população.
45119

É ilegítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais quando


inadimplente unidade de saúde, uma vez que prevalecem os interesses de proteção
à vida e à saúde.

É ilegítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais quando a


inadimplência do usuário decorrer de débitos pretéritos, uma vez que a interrupção
pressupõe o inadimplemento de conta regular, relativa ao mês do consumo.

É ilegítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais por débitos de


usuário anterior, em razão da natureza pessoal da dívida.

É ilegítimo o corte no fornecimento de energia elétrica em razão de débito irrisório,


por configurar abuso de direito e ofensa aos princípios da proporcionalidade e
razoabilidade, sendo cabível a indenização ao consumidor por danos morais.

É ilegítimo o corte no fornecimento de serviços públicos essenciais quando o débito


decorrer de irregularidade no hidrômetro ou no medidor de energia elétrica,
apurada unilateralmente pela concessionária.
45119

211
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

O corte no fornecimento de energia elétrica somente pode recair sobre o imóvel


que originou o débito, e não sobre outra unidade de consumo do usuário
inadimplente.

11.5 Princípio da Motivação

Impõe à Administração Pública o dever de indicação dos pressupostos de fato e de direito que
determinaram a prática do ato (art. 2º, parágrafo único, VII, da Lei n. 9.784/99). Assim, a validade do ato
administrativo está condicionada à apresentação por escrito dos fundamentos fáticos e jurídicos
justificadores da decisão adotada.
Trata-se de um mecanismo de controle sobre a legalidade e legitimidade das decisões da
Administração Pública.
Está previsto no art. 93, X, da CF/88 e no art. 50 da Lei 9.784/99.
45119 Apesar de haver divergência, a
corrente majoritária defende que a motivação é obrigatória tanto nos atos vinculados quanto nos atos
discricionários.
A motivação deve ser apresentada simultaneamente ou no instante seguinte à prática do ato.
Motivação intempestiva (posterior) ou extemporânea (anterior) causa nulidade do ato administrativo. Ainda,
a motivação deve ser explícita, clara e congruente. 45119

O princípio da motivação comporta exceção, por exemplo, nomeação ou exoneração (exoneração


"ad nutum") de cargos comissionados. A exoneração "ad nutum" refere-se àquela aplicável aos ocupantes
de cargo em comissão, e prescinde (abstrai/não precisa) de motivação da Administração.
No entanto, se mesmo essa motivação sendo “desnecessária”, a Administração optar por motivá-la,
estará vinculada aos motivos que explicitou no ato, em decorrência da chamada: TEORIA DOS MOTIVOS
DETERMINANTES. Isso porque os motivos vinculam todo o ato, e se não forem respeitados, o ato torna-se
nulo.

Observações importantes:
● Motivação aliunde ou per relationem – É aquela indicada fora do ato, consistente em concordância com
fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas. Ocorre todas as vezes que
a motivação de um determinado ato remete à motivação de ato anterior que embasa sua edição. Ex.:
parecer opina pela possibilidade de prática de ato de demissão de servidor; ao demitir o servidor, a
autoridade não precisa repetir os fundamentos explicitados pelo parecer, bastando, na fundamentação
do ato de demissão, declarar a concordância com os argumentos expedidos no ato opinativo.

● Motivação x Motivo x Móvel:


· Motivo = fato que autoriza a realização do ato administrativo;
· Motivação = exigência de enunciação dos motivos.
· Móvel = intenção declarada pelo agente como justificativa para a prática do ato.
212
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

11.6 Princípio da Ampla Defesa e Contraditório

Por força do princípio do contraditório, as decisões administrativas devem ser tomadas considerando
a manifestação dos interessados. Para isso, é necessário dar oportunidade para que os afetados pela decisão
sejam ouvidos antes do resultado final do processo.
O princípio da ampla defesa assegura aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, a
utilização dos meios de prova, dos recursos e dos instrumentos necessários para defesa de seus interesses
perante o Judiciário e a Administração.
Ao garantir o direito à ampla defesa “com os meios e recursos a ela inerentes”, o art. 5º, LV, da
Constituição Federal incluiu, no bojo do dispositivo, o princípio do duplo grau, verdadeiro desdobramento da
ampla defesa.
Sobre os princípios do contraditório e da ampla defesa, foi editada a Súmula Vinculante 3 do STF:

“Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o


contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou
revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a
apreciação da legalidade do 45119
ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e
pensão”.

45119

11.7 Princípio da Segurança Jurídica e Legítima Confiança

Segundo a autora Maria Di Pietro, o direito administrativo brasileiro herdou do direito alemão a
inspiração para aplicação do princípio da segurança jurídica, especialmente sob o aspecto subjetivo da
proteção à confiança.

● Segurança jurídica: abarca dois sentidos:


· Objetivo: estabilização do ordenamento jurídico (proteção à coisa julgada, ao direito
adquirido e ao ato jurídico perfeito).
· Subjetivo: proteção à confiança das pessoas em relação às expectativas geradas por
promessas e atos estatais. É um princípio autônomo.

● Segurança jurídica x Legítima confiança


· Segurança jurídica: possui caráter amplo, aplicado às relações públicas e privadas;
· Legítima confiança: tutela apenas a esfera jurídica do particular, protegendo-o da atuação
arbitrária do Estado.

213
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

A noção de proteção da confiança legítima aparece como uma reação à utilização abusiva de normas
jurídicas ou atos administrativos que surpreendam bruscamente o seu destinatário. Um exemplo de
aplicação do princípio da legítima confiança diz respeito à impossibilidade de devolução de valores recebidos
de boa-fé por servidores públicos, em virtude de errônea interpretação da lei pela Administração.

Requisitos para configurar a confiança legítima:


● Ato da administração suficientemente conclusivo para gerar no administrado confiança:
· De que a Administração atuou corretamente;
· De que a conduta do afetado é lícita na relação jurídica que mantém com a Administração;
· De que as suas expectativas são razoáveis.
● Presença de signos externos que orientam o cidadão a adotar determinada conduta;
● Ato da administração que reconhece ou constitui uma situação jurídica individualizada, cuja
durabilidade é confiável;
● Causa idônea para provocar a confiança do afetado;
● Cumprimento, pelo interessado, dos seus deveres e obrigações no caso.

Quando NÃO se aplica o princípio da confiança legítima:


● Hipóteses de má-fé do administrado; 45119

● Quando existir mera expectativa de direitos pelo interessado (ex. concessão de liminar, de caráter
precário, que possa ser revista).

11.8 Princípio da Intranscendência Subjetiva das Sanções

O princípio da intranscendência subjetiva significa que não podem ser impostas sanções e restrições
que superem a dimensão estritamente pessoal do infrator e atinjam pessoas que não tenham sido as
causadoras do ato ilícito.
Na jurisprudência do STF, há dois exemplos de aplicação desse princípio em casos envolvendo
inscrição de 45119
Estados e Municípios nos cadastros de inadimplentes da União:

● 1ª acepção: quando a irregularidade foi praticada pela gestão anterior.


Existem julgados do STF afirmando que se a irregularidade no convênio foi praticada pelo gestor
anterior e a gestão atual, depois que assumiu, tomou todas as medidas para ressarcir o erário e corrigir as
falhas (ex.: apresentou todos os documentos ao órgão fiscalizador, ajuizou ações de ressarcimento contra o
antigo gestor etc.), neste caso, o ente (Estado ou Município) não poderá ser incluído nos cadastros de
inadimplentes da União.
Assim, segundo esta acepção, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções proíbe a
aplicação de sanções às administrações atuais por atos de gestão praticados por administrações

214
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SEMANA 01/12

anteriores. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. AC 2614/PE, AC 781/PI e AC 2946/PI, Rel. Min. Luiz Fux, julgados
em 23/6/2015 (Info 791).
O STJ comunga também desse entendimento, exigindo sempre que a gestão sucessora tenha tomado
as providências cabíveis à reparação dos danos eventualmente cometidos. Por isso, editou a súmula 615.
Vejamos:
Súmula 615 STJ: Não pode ocorrer ou permanecer a inscrição do município em
cadastros restritivos fundada em irregularidades na gestão anterior quando, na
gestão sucessora, são tomadas as providências cabíveis à reparação dos danos
eventualmente cometidos.

● 2ª acepção: quando a irregularidade foi praticada por uma entidade do Estado/Município ou pelos
outros Poderes que não o Executivo
Além do caso acima explicado, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções pode ser
45119

aplicado também nas situações em que uma entidade estadual/municipal (ex.: uma autarquia) descumpriu
as regras do convênio e a União inscreve não apenas essa entidade, como também o próprio ente
(Estado/Município) nos cadastros restritivos: Poder Executivo não pode ser incluído nos cadastros de
inadimplentes da União por irregularidades praticadas pelos outros Poderes ou órgãos autônomos. (Info
991 – STF). 45119

Referências bibliográficas:

- Rafael Carvalho Resende Oliveira. Curso de Direito Administrativo.


- Matheus Carvalho: Manual de Direito Administrativo.
- José Santos Carvalho Filho. Curso de Direito Administrativo.

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DIREITO ADMINISTRATIVO: ENTES DA ADMINISTRAÇÃO


45119

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CF/88
⦁ Art. 33
⦁ Art. 37, XIX, XX e XXI
⦁ Art. 37, §§ 6º, 8º
⦁ Art. 48, XI
⦁ Arts. 51, IV e 52, XIII, da CF
⦁ Art. 61 § 1º, II, "e"
⦁ Art. 84, IV, VI, "a"
⦁ Arts. 173, §1º e §2º e 174

Outros Diplomas Legais


⦁ Art. 51 da Lei nº 9.649/98
⦁ Art. 1º, §2º, I Lei 9.784/99
⦁ Lei 9637/98
45119
⦁ Lei 13.303/16
⦁ Lei 13.019/14
⦁ Lei 9986/2000
⦁ Lei 13.848/2019

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!


CF/88
⦁ Art. 37, XIX, XX e XXI, CF/88
⦁ Art. 37, §§ 6º, 8º, CF/88
⦁ Art. 48, XI, CF/88 (criação de ministérios deve ser por lei)
⦁ Art. 84, IV, VI, "a", CF/88

Lei 13.303/16 (lei das empresas públicas e sociedades de economia mista)


⦁ Art. 1º, caput e §§5º e 6º
⦁ Art. 2º, §§1º e 2º
⦁ Arts. 3º, 4º e 5º
⦁ Art. 8º
⦁ Arts. 27 a 30
⦁ Arts. 47 e 49
⦁ Arts. 85 e 86

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Lei 9637/98 (lei das organizações sociais - OS)


⦁ Arts. 1º e 2º
⦁ Arts. 5º, 6º, 7º e 9º
⦁ Arts. 11º e 12º
⦁ Arts. 14 e 17

Lei 9.790/99 (lei das organizações 45119


da sociedade civil de interesse público - OSCIP)
⦁ Art. 1º e 2º (atenção ao §único do art. 2º)
⦁ Art. 3º
⦁ Art. 10, §1º
⦁ Arts. 11, 14 e 16

Lei 13.019/2014 (lei das organizações da sociedade civil - OSC)


⦁ Art. 1º
⦁ Art. 2º, inc. I, II, VII, VIII e VIII-A
⦁ Art. 3º
⦁ Art. 16 a 21 45119

⦁ Art. 30, 31 e 35-A


⦁ Art. 39, 40 e 42, XX
⦁ Art. 69 e 73
⦁ Art. 84-B

Lei 13.848/2019 (lei das agências reguladoras)


⦁ Art. 3º e 5º
⦁ Art. 10, 14 e 15
⦁ Art. 34 e 35

SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA


Súmula 525-STJ: A Câmara de vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade
judiciária, somente podendo demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais.
Súmula 8-STF: Diretor de sociedade de economia mista pode ser destituído no curso do mandato.

1. PRINCÍPIOS INERENTES À ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA (art. 6º, DL 200/67)

● Planejamento: compreende a elaboração e atualização de planos de governo, bem como previsão


de gastos em orçamento;

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● Coordenação: vinculada diretamente à hierarquia, visa a garantir uma maior eficiência na execução
das atividades públicas;
● Descentralização administrativa: consiste na transferência da prestação de serviços do ente
federativo para outras pessoas jurídicas especializadas na execução dessas atividades;
● Delegação de competência: extensão de uma competência administrativa entre agentes públicos,
dentro de uma mesma estrutura hierárquica de forma expressa e transitória;
● Controle: exercido em todos os níveis e órgãos do governo.

2. DESCENTRALIZAÇÃO X DESCONCENTRAÇÃO

É importante relembrar que Administração Pública é uma expressão plurissignificativa. Possui dois
sentidos:

● Subjetivo / Formal / Orgânico: conjunto de órgãos e entidades que integram a estrutura do Estado
e tem como função satisfazer o interesse público, a vontade política governamental. Nesse sentido,
é grafada com letras maiúsculas, pois se refere aos sujeitos.
● Objetivo / Material / Funcional: é o conjunto de atividades que esses órgãos e entidades
desempenham. Nesse sentido, é grafada com
45119letras minúsculas, pois se refere às funções. Ex.:

fomentar iniciativa privada, prestar serviço público, exercer poder de polícia.

Assim, o exercício das atividades administrativas pode se dar tanto de forma centralizada quanto de
forma descentralizada.

a) Desconcentração:Na desconcentração, o que o Estado faz é distribuir, dentro da sua estrutura, as


atividades estatais. Há uma especialização de funções dentro da mesma pessoa jurídica. Haverá a criação
dos órgãos públicos/órgãos estatais, sem que haja a criação de uma nova pessoa jurídica, pois se trata de
mera divisão interna.
Características da Desconcentração:
● Consiste na distribuição de competência dentro da mesma pessoa jurídica45119
(criam centros de
competência em seu interior);
● A desconcentração administrativa pode ocorrer tanto na Administração Direta quanto na
Administração Indireta (uma autarquia pode desconcentrar parte de sua atribuição através de
criação de órgãos);
● A desconcentração decorre do poder hierárquico (relação de subordinação).
● Teoria Da Institucionalização (Marçal Justen): os órgãos públicos, embora NÃO contem com
personalidade jurídica, podem adquirir “vida” própria. Ex.: Exército brasileiro.

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b) Descentralização: Na descentralização, o Estado vai transferir a execução da atividade para outra


pessoa, seja física ou jurídica, integrante ou não da Administração.
O Estado pode criar a pessoa jurídica para transferir a atividade (administração indireta) ou pode
realizar um contrato de concessão (com pessoa jurídica já existente) ou permissão de serviço público (com
pessoa jurídica ou pessoa física). Em outras palavras: Enquanto a desconcentração ocorre dentro de apenas
uma pessoa jurídica, na descentralização, há mais de uma pessoa envolvida.

Características da Descentralização:
● Deslocamento para uma nova pessoa (física ou jurídica);
● Transferência para pessoa da Administração indireta ou particulares;
● NÃO existe hierarquia, mas há controle e fiscalização (relação de vinculação, mas NÃO de
subordinação).

STF: É dispensável a autorização legislativa para a criação de empresas subsidiárias, desde que haja previsão
para esse fim na própria lei que instituiu a empresa estatal, visto que a lei criadora é a própria medida
autorizadora. É dispensável a autorização legislativa para a alienação de controle acionário de empresas
subsidiárias, pois a lei que autoriza a criação da empresa estatal matriz é suficiente para viabilizar a criação
de empresas controladas e subsidiárias, não havendo
45119 se falar em necessidade de autorização legal
específica para essa finalidade. ADPF 794/DF, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em
21.5.2021.

OBS.: A centralização consiste na execução das tarefas administrativas pelo próprio Estado, por meio
de órgãos internos integrantes da administração direta.

2.1 Espécies de Descentralização

a) Outorga (descentralização legal, por serviços ou funcional)


⦁ Transfere a execução e a titularidade (doutrina majoritária);
⦁ Destina-se às pessoas jurídicas de direito público especializadas;
⦁ Requer lei específica;
⦁ Dá origem às entidades da Administração Indireta.

b) Delegação (descentralização por colaboração):


⦁ Só transfere a execução (e não a titularidade);
⦁ Entidades de direito privado;
⦁ Formalizada por ato unilateral ou contrato; 45119

⦁ Dá origem às concessionárias e permissionárias.

219
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Vamos esquematizar?
DESCENTRALIZAÇÃO DESCONCENTRAÇÃO
Transferência da atividade administrativa para Distribuição interna de atividade dentro de uma
outra pessoa, física ou jurídica, integrante ou não do mesma pessoa jurídica, resultando na criação de
aparelho estatal. centros de competências, denominados órgãos
públicos, dentro de uma mesma estrutura
hierárquica.
Há mais de uma pessoa jurídica. Ocorre dentro da mesma pessoa jurídica.
Não há hierarquia, apenas controle e fiscalização. Há hierarquia e decorre do Poder Hierárquico.
Há uma relação de vinculação. Há uma relação de subordinação.
Pode ser: Dá origem aos órgãos públicos.
1) Descentralização por outorga, que dá origem às
entidades da Administração Indireta;
2) Descentralização por colaboração, na qual há
delegação à pessoa já existente, através de
concessão ou permissão.

3. ÓRGÃOS PÚBLICOS 45119

Órgãos públicos são centros de atribuições que resultam da desconcentração administrativa. Sua
criação se justifica pela necessidade de especializar as funções, com o intuito de tornar a atuação estatal mais
eficiente. A principal característica dos órgãos é que eles NÃO possuem personalidade jurídica própria.
Outras características:
● Órgãos são centros especializados de competências.
● Criação e extinção devem ser feitas por meio de lei.
● Competência do órgão é intransferível e irrenunciável, mas pode ser delegada ou avocada.
● Presentes tanto na Administração direta como na Administração indireta.
● NÃO possuem patrimônio próprio.
● NÃO podem ser sujeitos de direitos ou de obrigações (uma vez que não possuem personalidade
jurídica). Ex.: uma morte ocorrida dentro de escola pública municipal será de responsabilidade
do Município, pois a escola e a prefeitura são órgãos públicos e, portanto, não são sujeitos de
obrigações.
● NÃO celebram contrato, contudo, o órgão realiza licitação, gestão e exercício do contrato,
ficando a cargo do ente personalizado a celebração do contrato.
45119

Exceção: Contrato de gestão/de desempenho.


Embora os órgãos públicos não possam celebrar contratos por não possuírem personalidade jurídica
e, consequentemente, capacidade contratual, o art. 37, §8º, da CF/88 admite a celebração de
220
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

“contrato de gestão” ou “contrato de desempenho” entre órgãos públicos e administradores ou


entes federativos, que tem como objetivo ampliar a autonomia gerencial orçamentária e financeira
dos órgãos, que deverão, em contrapartida, cumprir determinadas metas de desempenho.

💣 ATENÇÃO: Em regra, os órgãos, por NÃO terem personalidade jurídica, NÃO têm capacidade
processual, ou seja, não podem figurar em juízo por si próprios, mas sim por meio do ente a que se
subordinam.

Exceções:
1) Previsão legal. Ex.: Órgão público na defesa dos consumidores (art. 82, inc. III, CDC).

2) Órgãos titulares de direitos subjetivos, o que lhes confere capacidade processual para a defesa
das prerrogativas, bem como competências para defesa de atribuições institucionais. Ex:
Órgãos independentes e autônomos podem figurar em juízo, desde que (i) sejam órgãos de
cúpula de hierarquia administrativa; (ii) atuem na defesa de suas prerrogativas institucionais.

3.1 Teorias sobre a relação Estado x agentes


45119

1. Teoria do Mandato: O agente público é mandatário da pessoa jurídica, sendo a relação construída
em função de um contrato de mandato.
Crítica: NÃO se admite que um Estado que NÃO tem vontade própria e nem tem como exteriorizá-la
possa assinar um contrato, instrumento que depende da autonomia da vontade. Ademais, essa teoria
permitiria a irresponsabilidade estatal pelos atos praticados pelos agentes com abuso de poder.

2. Teoria
45119
da Representação: O agente público seria representante do Estado por força de lei,
equiparando-se ao tutor ou curador, representando os incapazes.
Crítica: A pessoa jurídica ficaria equiparada a um incapaz, sendo absurda a ideia de que o incapaz
confere representante de si mesmo. Além disso, o incapaz NÃO pode ser civilmente responsabilizado, o que
NÃO ocorre com o Estado.

3. Teoria do Órgão (Teoria da Imputação Volitiva) – Otto Von Gierke – Por essa teoria, a manifestação
do órgão público é atribuída à pessoa jurídica ao qual ele pertence. Ou seja: quando um agente
público, integrante de um órgão público, manifesta a sua vontade, na realidade, é a própria pessoa
estatal que está agindo. Por esse motivo, é possível imputar, ao Estado, os danos causados por seus
agentes.

Explica a teoria do funcionário de fato putativo, que é aquele cuja investidura foi irregular ou viciada,
mas cuja situação tem aparência de legalidade. Para a Teoria, consideram-se válidos os atos praticados por
221
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

um funcionário de fato putativo, em nome da boa-fé dos administrados, segurança jurídica e legalidade dos
atos, pois o ato é do órgão (e, consequentemente, da pessoa jurídica ao qual pertence), não do agente.

3.2 Criação e Extinção de Órgãos Públicos

A regra é que os órgãos públicos sejam criados e extintos por lei ordinária. E, em regra, a lei será de
iniciativa do chefe do Executivo. Existem algumas exceções em relação à iniciativa da lei. Vejamos:
1) Iniciativa do Congresso Nacional (art. 48, XI).
2) Para a criação de órgãos no Poder Judiciário, a iniciativa será do presidente do próprio TJ (art. 96,
II, “c” e “d”).
3) No âmbito do MP, a iniciativa para a criação de órgãos será do chefe da instituição, ou seja, PGJ ou
PGR (art. 127, §2º).

É possível criar órgãos por ato administrativo? R.: Parte da doutrina (Carvalho Filho, Rafael Oliveira,
Fernando Barbalho) entende que a CF/88 admite, excepcionalmente, no âmbito do Senado Federal e Câmara
dos Deputados (art. 51, IV, e art. 52, XIII, da CF), que a própria casa disponha sobre a sua organização
administrativa, como a criação de órgãos. Em outras palavras: a criação de órgãos dentro da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal pode ser feita mediante
45119 resolução das respectivas casas, não se exigindo a

sanção presidencial, pois não se trata de lei. Por simetria, isso pode ser levado para os Estados e Municípios.

3.3 Classificação dos Órgãos

a) Quanto à hierarquia:
▪ Independentes: NÃO estão hierarquicamente subordinados a nenhum outro órgão, se
sujeitando apenas ao controle dos poderes estruturais do Estado (sistema de freios e
contrapesos). Têm origem na CF e ocupam o comando de cada um dos Poderes. Ex.: Presidência
da República, Congresso Nacional, STF.
▪ Autônomos: órgãos imediatamente subordinados aos órgãos independentes. São órgãos
diretivos que desempenham funções de coordenação, planejamento, supervisão e controle.
Possuem ampla autonomia administrativa, financeira e técnica (NÃO possuem autonomia
política). Ex.: Ministério da Fazenda, Secretaria do Estado, AGU.
▪ Superiores: NÃO possuem autonomia e independência, embora conservem o poder de decisão
e controle sobre assuntos específicos de sua competência. Ex.: Secretaria da Receita Federal,
Polícias, Procuradorias.
▪ Subalternos: órgãos com reduzido poder de decisão, destinados à mera execução de atividades
45119
administrativas. Ex.: zeladoria, almoxarifado etc.

b) Quanto à atuação funcional/manifestação de vontade:


222
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

▪ Singular: atua pela manifestação de vontade de um único agente. Ex.: Prefeitura, juízo de 1º
grau, presidência.
▪ Colegiado (ou pluripessoal): a tomada de decisão é feita de forma coletiva. Ex.: casas
legislativas, STF.

c) Quanto à estrutura:
▪ Simples (ou unitário): atua sozinho (um único centro de competência), sem subdivisões em seu
interior. Ex.: Gabinete.
▪ Composto: há mais de um órgão atuando em sua estrutura, mais de um centro de competência.
Ex.: Congresso Nacional é formado pela Câmara dos Deputados e Senado Federal.

d) Quanto às funções:
▪ Ativos: execução de atividades administrativas.
▪ Consultivos: assessoramento (pareceres).
▪ De controle: fiscalização dos demais órgãos e agentes públicos.
45119

e) Quanto ao âmbito de atuação:


▪ Central: atribuição em toda a área da45119
pessoa jurídica que integram (federal, estadual e
municipal).
▪ Local: atribuição para atuar em determinado local.

4. DESCENTRALIZAÇÃO

a) Descentralização Política: Feita pela CF, ao dividir a competência entre os entes federativos;
b) Descentralização Administrativa: Feita aos entes da administração indireta (descentralização por
outorga) e a particulares (descentralização por delegação).

5. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

5.1. Características comuns

● Gozam de personalidade jurídica própria.


● Possuem patrimônio próprio. No momento da sua criação, a entidade responsável transfere parte de seu
patrimônio ao novo ente, o qual terá liberdade para usá-lo.
● Possuem capacidade de autoadministração (autonomia técnica + administrativa). Cuidado! Essa
capacidade de autoadministração NÃO significa que elas podem definir regras para se organizarem
(matéria já foi objeto de questão do CESPE).

223
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DELEGADO SANTA CATARINA

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● Devem ter finalidade pública. NÃO poderão ter finalidade lucrativa, mas o lucro poderá ser uma
consequência da atividade.
● Sujeitas à supervisão ministerial (e NÃO ao poder hierárquico). Forma de controle que pode ocorrer por
meio de 3 hipóteses:
1) Controle Finalístico: deve-se assegurar que as entidades da Administração Indireta não estão
se desviando dos fins previstos nas leis instituidoras;
2) Controle Político: a Administração Direta pode nomear e exonerar livremente os dirigentes das
entidades administrativas. Exceção: dirigentes das agências reguladoras;
3) Controle Financeiro: exercido pelo Poder Legislativo com auxílio do TCU. Para a doutrina, além
das autarquias e fundações públicas, as estatais também se submetem ao controle financeiro,
desde que prestem serviço público.
● Necessidade de lei específica para criação das autarquias e autorização para criação dos demais entes da
administração indireta, neste caso, sendo imprescindível o registro dos atos constitutivos no cartório de
pessoas jurídicas ou na junta comercial para empresas estatais.
45119

OBS.: Criação de subsidiárias também exige lei.


⦁ NÃO precisa ser lei específica. A própria lei que institui a entidade pode autorizar.
⦁ A lei deve ser minuciosa, trazendo todas as45119
áreas de atuação da entidade de forma específica
(princípio da especialidade). Já a organização pode ser feita através de ato administrativo.

5.2 Entes da Administração Indireta

5.2.1 Autarquias

a) Conceito: São pessoas jurídicas de direito público interno, pertencentes à Administração Indireta,
criadas por lei específica para o exercício de atividades típicas, próprias do Estado (ou seja: atividades que
só podem ser desempenhadas por pessoas jurídicas de direito público). Possuem regime muito semelhante
ao dos entes da Administração Direta. Ex.: INSS, INCRA, conselhos de classe, Universidades Federais, IBAMA,
Banco Central, autarquias territoriais, agências reguladoras, associações públicas de regime público (lei
11.107/05).

b) Características:
● NÃO possuem autonomia política, mas possuem autonomia financeira e de autorregulação.
● Possuem regime jurídico de Direito Público.
● São CRIADAS por lei específica (competência do chefe do Poder Executivo), através da
descentralização por outorga ou descentralização legal. (art. 37, XIX da CF).
● Possuem personalidade jurídica própria.
● Possuem patrimônio próprio.
224
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Bens autárquicos são bens públicos que, portanto, se sujeitam à impenhorabilidade, à


imprescritibilidade e à inalienabilidade relativa.
● Praticam atos administrativos.
● Precisam fazer licitação quando firmarem contratos administrativos, podendo haver a
previsão de cláusulas exorbitantes.
● Sujeitas a controle financeiro do Tribunal de Contas.
● Sujeitas ao regime estatutário, razão pela qual NÃO se admite o ingresso de servidores
celetistas para a prestação dos serviços nos entes da administração direta, autárquica e
fundacional.
● Submetem-se ao regime de precatórios, SALVO os conselhos profissionais.
● Possuem imunidade tributária recíproca em relação aos IMPOSTOS.
● Possuem prerrogativas processuais. Ex.: prazo em dobro, reexame necessário.

c) Responsabilidade Civil: As autarquias possuem responsabilidade civil objetiva, com fundamento


na Teoria do Risco Administrativo (art. 37, §6º, da CF/88).
Por possuírem personalidade jurídica própria e patrimônio próprio, as autarquias respondem
diretamente com o seu patrimônio. No entanto, caso não consigam arcar, o Estado responde
subsidiariamente. Ou seja: há responsabilidade subsidiária
45119
45119 do ente criador.

d) Regime Jurídico: Estatutário (art. 39, CF/88).


● Na promulgação da CF/88: Obrigatoriedade do regime jurídico único.
● Com a Reforma Administrativa (EC 19/98): Fim da obrigatoriedade do Regime Jurídico Único.
● Decisão liminar do STF em ADI: Retorno da obrigatoriedade do RJU, liminar com efeitos ex
nunc.

Consequências da adoção do regime estatutário:


● Exige concurso público (art. 37, II, da CF);
● Submetem-se ao teto remuneratório (art. 37, XI, da CF);
● Submetem à proibição de cumulação de cargos (art. 37, XVI, da CF).

e) Controle da Administração Indireta: A Administração indireta se submete a um controle


meramente finalístico, tendo em vista que NÃO HÁ SUBORDINAÇÃO ENTRE OS ENTES DA ADMINISTRAÇÃO
INDIRETA E DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA.
Estão sujeitas também ao controle financeiro do Tribunal de Contas.

5.2.2 Agências Reguladoras

225
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12 45119

a) Origem: De inspiração norte-americana, foram instituídas no Brasil a partir da década de 90, para
estabelecer novo modelo regulatório brasileiro.

b) Definição: São autarquias em regime jurídico especial, dotadas de autonomia reforçada em relação
ao ente central, com base em dois fundamentos:
● Despolitização (desgovernamentalização): busca retirar do âmbito político e conferir um
tratamento técnico ao setor regulado (o que acarreta, consequentemente, maior segurança
jurídica).
● Necessidade de celeridade na regulação de determinadas atividades técnicas: teoricamente,
a agência reguladora, quando baixa normas para o setor, teria maior velocidade para se
adaptar à realidade econômica e tecnológica, que muda rapidamente.

c) Funções: Exercem funções executivas, normativas e judicantes de Estado, NÃO desempenhando


funções de governo. Podem exercer as seguintes atividades:
∘ Administrativas clássicas, ex: poder de polícia;
∘ Poder normativo;
∘ Judicante, resolvendo conflitos entre os judicados.
45119

d) Características:
✔ AUTONOMIA ADMINISTRATIVA:
∘ Nomeação diferenciada dos dirigentes – Nomeados pelo Presidente da República após
aprovação prévia do Senado para cumprir mandato certo (demais autarquias: demissíveis
ad nutum e comissionados);
▪ Obs.1: NÃO é possível exigir a aprovação prévia do Senado para a exoneração dos
dirigentes.
▪ Obs.2: NÃO se submetem à exoneração ad nutum.

∘ Período de quarentena dos dirigentes (art. 8º da Lei 9986/2000, com redação dada pela
Lei 13.848/2019) – Durante o prazo de 6 meses ficam impedidos de exercer atividade no
setor regulado, contados da exoneração ou término do mandato, sendo assegurada
remuneração compensatória.
▪ Lei específica pode estabelecer prazo diferenciado. Ex.: 1 ano para ANEEL, ANS,
ANP. Nesse período, ficará o antigo dirigente vinculado à agência, fazendo jus à
remuneração compensatória equivalente à do cargo que exerceu.

∘ Estabilidade forçada dos dirigentes - É estabilidade diferenciada. Possuem mandato


certo de 5 anos, vedada a recondução (Art. 6º da Lei 9986/2000).

226
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

▪ Obs.: Antes da Lei 13.848/2019, que alterou a redação do art. 6º da Lei 9986, o
mandato dos dirigentes não poderia ultrapassar o mandato do presidente. Com
a novel lei, o mandato passou a ter prazo certo de 5 anos, não coincidindo mais
com o mandato presidencial, justamente para conferir maior autonomia técnica
à agência.

✔ AUTONOMIA DECISÓRIA:
∘ Impossibilidade de manejar recurso hierárquico impróprio - O objetivo é assegurar que
a decisão final na esfera administrativa seja da autarquia, em razão da sua autonomia
decisória. Ressalta-se que a impossibilidade de manejar recurso hierárquico impróprio
não afasta a apreciação pelo Poder Judiciário.

Enunciado 25 da I Jornada de Direito Administrativo CJF/STJ - A ausência de tutela


a que se refere o art. 3º, caput, da Lei 13.848/2019 impede a interposição de
recurso hierárquico impróprio contra decisões finais proferidas pela diretoria
colegiada das agências reguladoras, ressalvados os casos de previsão legal expressa
e assegurada, em todo caso, a apreciação judicial, em atenção ao disposto no art.
5º, XXXV, da Constituição Federal.
45119

✔ AUTONOMIA FINANCEIRA:
∘ Possuem recursos próprios e recebem dotações orçamentárias:
▪ Recursos próprios - Podem instituir as taxas regulatórias;
▪ Recebimento de dotações orçamentárias - Enviam proposta orçamentária ao
Ministério ao qual estão vinculadas, para receber recursos que serão geridos pela
própria agência reguladora.

✔ AUTONOMIA NORMATIVA: Gozam de poder normativo/regulatório.


∘ O fundamento do poder normativo das agências reguladoras baseia-se na técnica da
deslegalização ou delegificação, segundo a qual o próprio legislador retira
determinadas matérias do âmbito da lei e as passa para o âmbito do regulamento. Nesse
caso, por se tratarem de matérias tão específicas de ordem técnica, elas não poderiam
ser disciplinadas pela lei.
∘ NÃO é poder legislativo, devendo se ater a aspectos técnicos, subalternos à lei.
∘ As agências reguladoras NÃO inovam no ordenamento jurídico, ou seja, NÃO expedem
atos normativos primários. 45119

∘ O poder normativo só obriga o prestador de serviços, jamais o particular.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

💣 CUIDADO: não se trata de poder regulamentar!

e) Poder normativo e deslegalização: A legislação confere autonomia às agências reguladoras para


editar atos administrativos normativos, dotados de conteúdo técnico e respeitados os parâmetros
legais no setor regulado. Há controvérsias em relação à constitucionalidade, existindo duas
correntes:
● 1ª Corrente: Inconstitucionalidade do poder normativo amplo das agências reguladoras,
por violar a separação de poderes e a legalidade, sendo vedada a criação de direitos e
obrigações por meio de atos regulatórios editados com fundamento em delegação legislativa
inominada. Nesse sentido: Celso Antônio e Di Pietro (Di Pietro só excepciona dessa vedação
a ANATEL e a ANP, por possuir previsão constitucional).
● 2ª Corrente: Constitucionalidade do poder normativo técnico ampliado reconhecido às
agências reguladoras que poderão editar atos normativos, em razão da deslegalização, que
constitui o fundamento normativo desse poder. Na doutrina: José dos Santos, Diogo de
Figueiredo.

45119

DESLEGALIZAÇÃO (DELEGIFICAÇÃO) / DESLEGIFERAÇÃO / REBAIXAMENTO DO GRAU HIERÁRQUICO


LEGISLATIVO 45119

É a retirada, pelo próprio legislador, de certas matérias do domínio da lei, passando-as ao domínio do
regulamento.
Com a deslegalização, opera-se uma degradação da hierarquia normativa de determinada matéria que, por
opção do legislador, deixa de ser regulada por lei e passa para a seara do ato administrativo normativo.
A lei deslegalizadora NÃO chega a determinar o conteúdo material da futura normatização administrativa,
limitando-se a estabelecer standards e princípios a serem respeitados na atividade administrativo-
normativa.
Limites constitucionais à deslegalização:
a) Casos de reserva legislativa específica previstos na CF, que devem ser veiculados por lei formal;
b) Matérias a serem reguladas por lei complementar NÃO admitem deslegalização, pois são reservas
legislativas específicas.

Agências Reguladoras Estaduais → Na ADI 1949/RS, entendeu o STF:


• Constitucional a nomeação de dirigentes, possuindo como etapas prévias a
indicação do Governador do Estado e aprovação pela Assembleia Legislativa =>
Modelo simétrico ao previsto na CF/88.
• Inconstitucional a exoneração dos dirigentes ANTES do termo final, por decisão
da Assembleia Legislativa, por alijar a participação do executivo.

228
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

ATENÇÃO! FENÔMENO DA CAPTURA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

A "captura" descreve a situação em que o ente regulador passa a atuar sem imparcialidade, favorecendo
sistematicamente uma das partes envolvidas com a atividade regulada ou passa a ser uma estrutura
inoperante, meramente figurativa. Pode significar o risco de concussão (corrupção dos dirigentes), como
também a captura por contaminação de interesses, em que o órgão regulador assume os valores e interesses
do regulado como se fossem interesses da coletividade, a captura por insuficiência de meios, que ocorre
quando a atuação do agente regulador é inviabilizada pela ausência ou má qualidade de seus recursos e a
captura pelo poder político, situação que ocorre quando não existem os instrumentos legais capazes de
assegurar a efetiva autonomia da agência reguladora e ela passa a ser um mero agente dos interesses
político-partidários dos governantes.

5.2.3 Agências Executivas

a) Conceito: É uma autarquia ou fundação que recebeu esta qualificação por ter celebrado um contrato
de gestão com a Administração Pública (art. 37, §8º, CF/88) e por possuir um plano de reestruturação
(art. 51 da Lei nº 9.649/98). 45119

💣 Atenção! A Lei 13.934/2019 regulamenta o contrato de desempenho, previsto


no § 8º do art. 37 da Constituição Federal.

Há muitas autarquias e fundações ineficientes, de modo que o contrato de gestão é uma tentativa
de modernização. São exemplos de agências executivas: INMETRO e SUDENE.

b) Requisitos:
i. Autarquia ou fundação ter plano estratégico de reestruturação e desenvolvimento em
andamento;
ii. Celebração de contrato de gestão com Ministério Supervisor com periodicidade mínima de 01
ano.
45119

Obs.1: O Presidente da República expede decreto, concedendo a qualidade de agência executiva.


Obs.2: A desqualificação da fundação como agência executiva é realizada por decreto, por iniciativa
do Ministério Supervisor.

c) Características

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Gozam de dispensa de licitação para celebração de contratos, cujos limites de valor são
duplicados em relação aos do art. 75, I e II, da Lei 14133/21, cf. §2º do mesmo artigo.

ATENÇÃO! Os valores do artigo 75, I e II, da Lei 14133/21 foram atualizados pelo Decreto 11317, que entrou
em vigor em 1º/01/2023:
a) Art. 75, caput, inciso I - R$ 114.416,65 (cento e quatorze mil quatrocentos e dezesseis reais e sessenta e
cinco centavos) – obras e serviços de engenharia ou serviços de manutenção de veículos automotores;
b) Art. 75, caput, inciso II - R$ 57.208,33 (cinquenta e sete mil duzentos e oito reais e trinta e três centavos)
– outros serviços e compras.

● Podem ter natureza de autarquia ou de fundação pública.


● As autarquias ou fundações temporariamente serão agências executivas, enquanto durar o
contrato de gestão. É apenas um status temporário. Não se pode falar em conversão, mas mera
qualificação (José dos Santos).
● Busca mais eficiência e redução de custos.

5.2.4 Fundações Públicas


45119

a) Definição: Pessoas jurídicas sem fins lucrativos, cujo elemento essencial é a utilização do patrimônio
para a satisfação de objetivos sociais, definidos pelo instituidor.

Em outras palavras: a fundação é um patrimônio afetado (destinado) à realização de um fim,


possuindo, por essa razão,
45119
personalidade jurídica própria distinta de seu instituidor. Desse modo, o
instituidor da fundação separa (destaca) um determinado patrimônio (dinheiro, imóveis, créditos etc.)
declarando que esses bens serão utilizados para a realização de um objetivo específico.

b) Criação:
● Fundações públicas de direito público - são criadas por lei ordinária específica, mas seu objeto
de atuação deve ser definido por lei complementar.
● Fundações públicas de direito privado - a criação é autorizada por lei ordinária específica, sendo
criadas após o registro no cartório competente, mas seu objeto de atuação deve ser definido
por lei complementar.

c) Possuem regime híbrido ou misto:


● Direito Público: Autarquias fundacionais cuja criação ocorre por lei específica.
● Direito Privado: Fundações governamentais (regime híbrido ou misto) cuja criação é autorizada
por lei.

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

OBS.1: Para Celso Antônio, as fundações são pura e simplesmente autarquias.


OBS.2: Para Rafael Oliveira, a ausência de lucro NÃO afasta a necessidade de eficiência por parte da entidade.
Na hipótese de resultados financeiros
45119 positivos, quando os créditos superam as despesas, os valores,
considerados superávit (e não lucro), deverão ser reinvestidos nas finalidades da entidade, não sendo
permitida a sua distribuição ou repartição entre seus administradores.

Quadro via @DizeroDireito:


FUNDAÇÃO PÚBLICA DE DIREITO PÚBLICO FUNDAÇÃO PÚBLICA DE DIREITO PRIVADO
Estão sujeitas ao regime público. Estão sujeitas ao regime privado.
São criadas por lei específica (são uma espécie de Deve ser editada uma lei específica autorizando que
autarquia, por isso também chamadas de o Poder Público crie a fundação. Em seguida, será
“fundações autárquicas”). necessário fazer a inscrição do estatuto dessa
fundação no Registro Civil de Pessoas Jurídicas,
quando, então, ela adquire personalidade jurídica.

d) Atividade:
● Fundação Pública de Direito Público: atividades típicas de Estado;
● Fundação Pública de Direito Privado:45119
atividades de conteúdo econômico passíveis de
delegação.

e) Patrimônio:
● Fundação Pública de Direito Público: bens públicos;
● Fundação Pública de Direito Privado: bens privados (em regra).
Obs.: Bens privados afetados ao serviço público, ou seja, empregados diretamente na
prestação de serviços públicos, sujeitam-se às regras de direito público.

f) Regime de pessoal:
● Fundação Pública de Direito Público: Estatutário;
● Fundação Pública de Direito Privado: Celetista.
Obs.: Ambas se sujeitam à vedação ao acúmulo de cargos; necessidade de realizar concurso público;
teto remuneratório previsto na CF/88.

Fundação pública com personalidade jurídica de direito privado pode adotar o


regime celetista para contratação de seus empregados. (Info 997, STF).

Observações importantes:

231
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

▪ Tanto as fundações públicas de direito público quanto as de direito privado possuem imunidade
tributária de impostos sobre rendas, bens ou serviços, conforme dispõe o artigo 150, inciso VI, alínea
“a” e §2º, da Constituição Federal.
▪ Somente as fundações públicas de direito público:
· Possuem prerrogativas processuais;
· Submetem-se ao regime de precatório.
▪ As fundações estatais NÃO se submetem ao controle do MP, pois a previsão do art. 66 do CC se refere,
exclusivamente, às fundações privadas, instituídas por particulares, bem como o DL 200/67 afasta a
aplicação do CC às fundações estatais.

5.3 Empresas Estatais (Lei 13.303/2016)

a) Conceito
As Empresas Públicas (EP) e Sociedades de Economia Mista (SEM) são pessoas jurídicas de direito
privado integrantes da Administração Pública Indireta.
45119

São regidas por um regime predominantemente privado, chamado por alguns de regime híbrido, sui
generis. Isso porque, por mais que sejam influenciadas pelo regime privado, possuem características do
regime de direito público. 45119

Obs.: NÃO serão titulares de serviço público, recebendo apenas sua descentralização para a execução (NÃO
há outorga do serviço).

A Lei 13.303/16 estabelece o estatuto jurídico das empresas estatais (empresas públicas, SEM e suas
subsidiárias e demais empresas privadas controladas pelo Estado). O diploma normativo regulamenta o art.
173, §1º, da CRFB/88, que impõe a fixação, por meio de estatuto (lei ordinária), de regras sobre licitações e
contratos, questões societárias, função social das estatais e sua fiscalização pelo poder público e pela
sociedade civil, além da aplicação das mesmas normas de direito privado às empresas estatais, no que
couber. Assim, foi editada a Lei 13.303/16.

b) Criação das Estatais


Em regra, a estatal precisa de lei autorizativa para a sua criação, bem como para a criação de suas
subsidiárias e participação em outras empresas privadas, conforme art. 37, XIX e XX, da CRFB/88 e art. 2º,
§§1º e 2º, da Lei 13303/16 (ressalvadas as exceções do §3º).
O art. 37, XIX, da CRFB/88 define que somente por lei específica poderá ser autorizada a instituição
de estatais. Havia uma controvérsia quanto à parte final desse inciso, que determina que “cabe à lei
complementar definir as áreas de sua atuação”. Nunca houve polêmica quanto ao fato de a lei ordinária
específica criar autarquia e autorizar a criação de estatais.

232
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Contudo, o que significa “neste último caso”? Parte da doutrina entendia que essa ressalva apenas
se aplicaria às fundações e outros entendiam que a lei complementar também definiria a área de atuação
das empresas estatais, além das fundações.
A tese majoritária sempre foi no sentido que a expressão “neste último caso” apenas se refere às
fundações (Rafael Oliveira). Logo, a própria lei ordinária que autoriza a criação da estatal já deve definir qual
vai ser a sua área de atuação, não necessitando de lei complementar. A própria Lei 13.303/16 não exige lei
complementar, apenas lei.
Ressalta-se que, quanto às empresas subsidiárias, o STF entende pacificamente que não seria
necessária uma lei específica autorizando a criação de cada subsidiária, bastando uma autorização legal
genérica. Vale lembrar, contudo, que é necessária uma lei específica para a criação de cada estatal
(“empresa-mãe”). 45119

É dispensável a autorização legislativa para a criação de empresas subsidiárias,


desde que haja previsão para esse fim na própria lei que instituiu a empresa de
economia mista matriz, tendo em vista que a lei criadora é a própria medida
autorizadora. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. STF.
Plenário. ADI 1649, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgado em 24/03/2004.
45119

A alienação do controle acionário de empresas públicas e sociedades de


economia mista exige autorização legislativa e licitação. Por outro lado, não se
exige autorização legislativa para a alienação do controle de suas subsidiárias e
controladas. (Info 943, STF).

Petrobrás pode criar subsidiárias e, em seguida, alienar o controle acionário delas


sem licitação e sem autorização legislativa específica. (...) A específica autorização
legislativa somente é obrigatória na hipótese de alienação do controle acionário de
sociedade de economia mista (empresa-mãe). Não há necessidade dessa prévia e
específica anuência para a criação e posterior alienação de ativos da empresa
subsidiária, dentro de um elaborado plano de gestão de desinvestimento, voltado
para garantir maiores investimentos e, consequentemente, maior eficiência e
eficácia da empresa-mãe. (Info 993, STF)

É desnecessária, em regra, lei específica para inclusão de sociedade de economia


mista ou de empresa pública em programa de desestatização. (Info 1004, STF).

c) Finalidades: Pode ter duas finalidades:


1) Prestadora de serviço público;
2) Exploradora de atividade econômica.
233
RETA FINAL

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SEMANA 01/12

Enunciado 8 da I Jornada de Direito Administrativo CJF/STJ - O exercício da função


social das empresas estatais é condicionado ao atendimento da sua finalidade
pública específica e deve levar em conta os padrões de eficiência exigidos das
sociedades empresárias atuantes no mercado, conforme delimitações e
orientações dos §§ 1º a 3º do art. 27 da Lei 13.303/2016.

d) Capital:
● Empresas Públicas: capital 100% público;
● Sociedade de Economia Mista: capital misto (maior parte público).

e) Forma Societária:
● Empresas Públicas: Qualquer forma societária. Há a possibilidade, inclusive, de empresas públicas
com um único sócio, a exemplo da CEF, assim como na forma de sociedade anônima.
● Sociedade de Economia Mista: Somente sociedade anônima.

f) Competência:
● Empresa Pública Federal: Justiça Federal; 45119

● Sociedade de Economia Mista Federal: Justiça Estadual.


Exceções (serão processadas na Justiça Federal):
▪ Se a União intervier como assistente ou opoente;
▪ MS contra ato ou omissão do dirigente da sociedade de economia mista federal, investido em
função administrativa.

Súmula 517 STF: As sociedades de economia mista só têm foro na justiça federal,
quando a União intervém como assistente ou opoente.
Súmula 556 STF: É competente a Justiça Comum para julgar as causas em que é
parte sociedade de economia mista.

g) Regime de pessoal: Celetista (CLT), mas, por possuírem um regime jurídico híbrido, se sujeitam a
algumas prerrogativas e regras da Administração Pública:
45119
● Concurso público (art. 37, II, da CF);
● Teto remuneratório (art. 37, XI e §9º, da CF);
● Regras de cumulação de empregos públicos (art. 37, XVI, da CF);
● Lei de improbidade administrativa (Lei 8.429/92);
● Obediência aos princípios administrativos (art. 37, caput, da CF).

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

OBS.1: O regime varia de acordo com a finalidade da empresa estatal. Se presta serviço público, o regime se
aproxima mais daqueles das pessoas jurídicas de direito público. Se for exploradora de atividade econômica,
se aproxima das empresas privadas que estão fora da Administração.
OBS.2: Se as empresas estatais e subsidiárias NÃO receberem recursos dos entes federativos para custeio e
manutenção de pessoal, pode haver pagamentos acima do teto remuneratório.
OBS.3: É necessário motivar a dispensa de seus empregados.

h) Administradores: Os administradores das SEM e EP devem ser (art. 17 da Lei 13303/16):


● Cidadãos de reputação ilibada e notório conhecimento;
● Tempo mínimo de experiência profissional;
● Formação acadêmica compatível;
● Não ser inelegível.

i) Patrimônio: Bens privados, mas sofre modulações de direito público, especificamente no tocante à
alienação, que depende do cumprimento das exigências do art. 49 da Lei 13303/16, com redação dada
pela Lei 14.002/20.

j) Controle: 45119

Sujeição ao controle do Tribunal de Contas. O STF entendeu existir esse controle, pois na instituição
das empresas estatais haveria contribuição do erário (patrimônio público).
Se há empresas estatais com mais de um Ente Federado participando, o controle será exercido
apenas pelo Tribunal de Contas responsável pelo controle das contas do ente federado administrador da
45119
estatal, conforme decidiu o STF.

k) Licitação e contratos:
A Lei das Estatais passou a disciplinar a realização de licitações e contratos no âmbito das empresas
públicas e sociedades de economia mista, independentemente da natureza da atividade desempenhada
(prestadora de serviço ou exploradora de atividade econômica).
Nesse sentido, a Lei 8.666/93 deixou de ser aplicada a essas entidades, salvo nos casos
expressamente descritos na própria Lei 13.303/16 (normas penais e parte dos critérios de desempate). Além
disso, com o advento da Lei 14.133/21, que revogou a Lei 8.666/93 (art. 193, Lei 14.133/21), a disciplina
especial da Lei 13.303/16 permanece em vigor.
Os contratos terão prazo máximo de 5 anos, salvo:
i. Projetos contemplados no plano de negócios e investimentos;
ii. Prática rotineira de mercado e a imposição desse prazo inviabilize ou onere excessivamente o
negócio.

l) Imunidade tributária:
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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Se atuam em regime concorrencial: NÃO gozam de imunidade;


● Se prestadoras de serviços públicos não remunerados por preços públicos ou tarifas OU se estatais
que exercem atividades monopolizadas: Gozam de imunidade.

ATENÇÃO: O art. 173, §2º, da CF assim dispõe: § 2º As empresas públicas e as sociedades de economia mista
não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.
Entretanto, segundo a doutrina majoritária, em que pese não haver menção expressa ou distinção entre
as empresas públicas e sociedades de economia mista exploradoras de atividades econômicas e
prestadoras de serviços públicos, tal vedação se aplica somente às empresas públicas e sociedades de
economia mista exploradoras de atividades econômicas.
Vejamos o que diz Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo sobre o tema: “(...) é amplamente majoritário o
45119
entendimento de que a vedação alcança somente as empresas públicas e sociedades de economia mista
exploradoras de atividades econômicas – e não as prestadoras de serviço públicos.” (Direito Administrativo
Descomplicado. 24ª Edição. Pág. 87).
Ressalta-se, por fim, que essa concessão de benefício fiscal exclusivo deve obedecer a natural observância
dos princípios constitucionais pertinentes.

ATENÇÃO! Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos


45119
- ECT, embora seja empresa pública, possui
tratamento diferenciado, uma vez que:
● Submete-se ao regime de Fazenda Pública;
● Possui imunidade tributária;
● Submete-se ao regime de precatório;
● Seus bens são impenhoráveis.

Obs.: NÃO configura irregularidade a transferência de atividades auxiliares da atividade postal. Ex.: Entrega
de encomendas e impressos podem ser delegados, por NÃO serem considerados serviços postais
propriamente ditos.

m) Precatório: Somente as empresas públicas e sociedades de economia mista que prestam serviços
públicos submetem-se ao regime de precatórios.

n) Falência: A lei de falências exclui as estatais (art. 2º, I, da Lei 11101/05), mas a doutrina é divergente:
1ª Corrente: Sujeitam-se à falência, tendo em vista o disposto no art. 173, §1º, II da CF, sendo
inconstitucional o dispositivo da lei de falências.
2ª Corrente: Interpretação conforme a Constituição, para compatibilizar a lei de falências com o art.
173 da CF, de modo que apenas empresas estatais prestadoras de serviços públicos são afastadas
da falência. Celso Antônio, José dos Santos, Diógenes Gasparini e Di Pietro.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

3ª Corrente: Não se sujeitam à falência. Rafael Oliveira.

ATENÇÃO: Excluem-se da Administração Indireta e do conceito de empresas estatais as entidades


privadas que possuem participação minoritária do Estado, ainda que recebam influência estatal em razão
de classe especial (GOLDEN SHARES).

GOLDEN SHARE: Prevista expressamente na lei do Programa Nacional de Desestatização (art. 8º da Lei
9491/97) – sempre que houver razões que justifiquem, a União deterá, direta ou indiretamente, ação de
classe especial do capital social da empresa ou instituição financeira objeto de desestatização, que lhe
confira poderes especiais em determinadas matérias, as quais deverão ser caracterizadas nos seus
estatutos sociais. Ex.: EMBRAER e VALE.

6. ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR

Em direito administrativo, além da clássica divisão entre Administração direta e indireta, os autores
dividem o Estado em setores:
a) Primeiro setor: composto pela administração direta e indireta;
b) Segundo setor: para a professora Di Pietro, seria
45119
o mercado, o qual é formado pelas concessionárias
e permissionárias de serviço público;
c) Terceiro setor: composto pelo que a doutrina chama de particulares em colaboração com o Estado.

São subdivisões do Terceiro Setor:


● Sistema ‘S’: Serviços sociais autônomos, tais como o SESI, SESC, SENAI e SENAC;
● Sistema ‘OS’: Organizações sociais, regidas pela Lei 9.637/98;
● OSCIP’s: Organizações da sociedade civil de interesse público, regidas pela Lei 9.790/99;
● OSC’s: Organizações da sociedade civil, regidas pela Lei 13.019/14;
45119

● Fundações de apoio.

a) Introdução:
As entidades do 3º Setor são particulares em colaboração, sem fins lucrativos, que atuam ao lado do
Estado na prestação de serviços públicos e atividades de interesse social, mediante vínculo formal de parceria
com o Estado. Em outras palavras: são entidades privadas que não integram a estrutura da Administração
Pública Direta ou Indireta!
Tais entidades recebem incentivos do Poder Público, mediante dotação orçamentária, cessão de
bens públicos, e se submetem, consequentemente, às restrições de controle impostas ao ente estatal,
sujeitos ao controle do Tribunais de Contas.

Características principais:
237
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● São criadas pela iniciativa privada (“particulares em colaboração”);


● Não integram formalmente a Administração Pública;
● A criação depende de lei autorizativa;
● Possuem vínculo legal ou negocial com o Estado;
● Não possuem finalidade lucrativa;
● Recebem benefícios públicos;
● Possuem regime jurídico de direito privado;
● Adquirem personalidade jurídica com a inscrição do estatuto em cartório próprio;
● Prestam atividades privadas de interesse social (serviços não exclusivos de Estado).

Principais consequências por serem entidades privadas (pessoa jurídica de direito privado):
● Bens privados;
● Regime CLT;
● NÃO exige concurso público;
● NÃO possuem prerrogativas processuais;
● NÃO se submetem a precatórios;
● NÃO se submetem ao teto remuneratório previsto na CF/88;
● NÃO precisam fazer licitação (doutrina majoritária);
45119

● NÃO precisam ter a remuneração fixada por lei.

b) Espécies:
1) Sistema S - Serviço Social Autônomo;
2) Sistema OS - Organização Social
3) Sistema OSCIP - Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público;
4) Sistema OSC - Organizações da Sociedade Civil;
5) Fundações de apoio.
45119

c) Foro processual:
● É a Justiça Estadual, inclusive para as entidades que formalizam parcerias com a União.
● Serviços sociais autônomos que recebem recursos federais: Justiça Estadual (Súm. 516 STF).

d) Controle: Para a doutrina amplamente majoritária, sujeitam-se ao controle do TCU.

Cuidado com o entendimento do STF sobre o tema:

Os recursos geridos pelos serviços sociais autônomos não são considerados


recursos públicos. Os recursos geridos pelos serviços sociais autônomos são
considerados recursos públicos? NÃO. Segundo entende o STF, os serviços sociais
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SEMANA 01/12

autônomos do denominado sistema “S”, embora compreendidos na expressão de


entidade paraestatal, são pessoas jurídicas de direito privado, definidos como entes
de colaboração, mas não integrantes da Administração Pública. Assim, quando o
produto das contribuições ingressa nos cofres dos Serviços Sociais Autônomos,
perde o caráter de recurso público. STF. Plenário. ACO 1953 AgR, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, julgado em 18/12/2013.

e) Regime de Pessoal: Empregados celetistas (submetem-se à CLT).


NÃO se aplica as regras de concurso público. No entanto, doutrina majoritária e STF entendem que
deve haver um processo seletivo público, objetivo e impessoal, de modo que a contratação obedeça aos
princípios constitucionais da impessoalidade e moralidade.

f) Patrimônio: Bens privados.


No entanto, os bens privados adquiridos com recursos públicos sofrerão influxos do regime de direito
público. Ex.: Em determinadas hipóteses, podem ser considerados impenhoráveis, em razão da necessidade
de continuidade das atividades sociais. Ou, ainda, após o término da parceria, os bens devem ser transferidos
ao patrimônio de outra entidade similar ou ao patrimônio do Estado, sob a alegação de necessidade de
continuidade das atividades sociais. 45119

g) Licitação
● Licitação entre o Estado e as entidades do 3º setor: Embora haja divergência, a doutrina majoritária
entende que não há necessidade de licitação. Isso porque os contratos de gestão e termos de
parceria firmados entre o 3º Setor e a Administração possuem natureza jurídica de convênio (que
busca o interesse comum entre os partícipes), e não de contrato administrativo que exige licitação.
● Licitação entre o 3º setor e a contratação com terceiros utilizado dinheiro público: Há forte
divergência doutrinária sobre o tema. Veja:
1ªC (José dos Santos): Exige a licitação, tendo em vista que a hipótese se subsome à
expressão “demais entidades controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público”,
45119
constante do art. 1º, p.ú, da Lei 8666 c.c. art. 1º, II, da Lei 14133/21.
2ª C (Diogo Moreira): Não exige licitação, pois não é possível ampliar, mediante lei ordinária,
o rol de destinatários da licitação previsto no art. 37, XXI, da CF/88. Haveria, no caso, uma
inconstitucionalidade por vício formal.
3ª C (Rafael Oliveira e TCU): Não exige licitação, mas é necessário um procedimento
simplificado e objetivo para as contratações realizadas com dinheiro público, de modo a
atender aos princípios constitucionais, sobretudo o da impessoalidade. Ressalta-se que essa
foi a posição adotada pelas leis da OS (art. 17) e OSCIP (art. 14).

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h) Responsabilidade civil das entidades do 3º setor: Trata-se de tema com grande divergência doutrinária,
de modo que é importante atentar-se às 3 posições para eventual prova discursiva:
1ª C (Cristiana Fortini): Haverá responsabilidade objetiva das entidades do 3º setor, pois as
atividades sociais por elas desenvolvidas podem ser qualificadas como serviços públicos, atraindo a
incidência do art. 37, §6º, da CF/88.
2ª C (José dos Santos): Depende da parceria. Em se tratando dos sistemas sociais autônomos
(Sistema “S”), que desempenham atividades de caráter meramente social e podem ser qualificadas
como serviços públicos, a responsabilidade será objetiva, na forma do art. 37, §6º, da CF/88. Por
outro lado, em se tratando de organizações sociais (“OS”) ou organizações sociais da sociedade civil
de interesse público (“OSCIP”), a responsabilidade será subjetiva, pois tais entidades exercem
parceria meramente desinteressada.
3ª C (Rafael Oliveira e Villela Souto): Trata-se de responsabilidade subjetiva, em razão da inexistência
de serviço público. Embora tenham relevância social, são atividades privadas prestadas em nome
próprio, motivo pelo qual devem seguir o regramento da legislação civil. E, segundo a lei civil,
somente haverá responsabilidade objetiva em casos previstos expressamente por lei, ou quando a
natureza da atividade desempenhada implicar risco para as pessoas, na forma do art. 927 do CC.
☞ Para essa 3ª corrente, haverá ainda responsabilidade subsidiária do Estado pelos danos
causados pelo 3º setor no desempenho das atividades que são objeto de parceria.
45119

6.1 Serviço Social Autônomo - Sistema “S”

São entidades criadas mediante autorização legal para a realização da atividade de fomento, auxílio
45119

e capacitação de determinadas categorias profissionais, seja indústria ou comércio. É o chamado SISTEMA


“S” (SESI, SENAI, SENAC, SENAR).
NÃO atuam na prestação de serviços públicos exclusivos de Estado por meio de delegação de
atividades, mas executam atividades particulares de cunho social, sem a intenção de auferirem qualquer
espécie de lucro. A atuação é de fomento e não de prestação de serviço público.
Estas entidades são particulares, criadas por autorização legal para a execução de atividades de
interesse do Estado, admitindo-se que sejam constituídas sob a forma de associação ou fundação ou, ainda,
por meio de estruturas não previstas no direito civil e reguladas pela lei específica da entidade.
Para auxiliar na execução de suas atividades, o Poder Público lhes transfere a capacidade tributária
ativa, de modo que os entes do serviço social autônomo gozam de parafiscalidade, que é a transferência do
poder de cobrar e fiscalizar tributos.
Não obstante a concessão da capacidade tributária, tratam-se de entidades privadas e, por isso, NÃO
gozam de privilégios administrativos, sejam fiscais, processuais ou contratuais.
As ações propostas em face desses entes deverão tramitar na Justiça Estadual (Súm. 516 STF).

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O regime de pessoal se submete à CLT e NÃO dependem de concurso público para ingresso em suas
atividades. No entanto, os empregados são considerados agentes públicos (conceito mais amplo) e se
submetem à LIA (Lei 8.429/92).
Por constituírem pessoas jurídicas privadas, NÃO se submetem ao regime de precatório em relação
ao pagamento de seus débitos oriundos de sentença judicial, conforme decidiu o STF (ADI 1.923-DF).

Fique atento à jurisprudência sobre o tema:

Serviços sociais autônomos NÃO devem figurar no polo passivo de ação proposta
pelo contribuinte discutindo a exigibilidade das contribuições sociais. (Info 646,
STJ).

Serviços sociais autônomos gozam de imunidade tributária. (Info 720, STF).


45119

Os serviços sociais autônomos não gozam das prerrogativas processuais inerentes


à Fazenda Pública. Os serviços sociais autônomos gozam das prerrogativas
processuais inerentes à Fazenda Pública (ex.: prazo em dobro para recorrer)? NÃO.
As entidades paraestatais não
45119 gozam dos privilégios processuais concedidos à

Fazenda Pública. STF. AI 841548 RG, julgado em 09/06/2011.

Competência para julgar as causas envolvendo os serviços sociais autônomos.


Súmula 516-STF: O Serviço Social da Indústria (SESI) está sujeito a jurisdição da
justiça estadual.

6.2 Entidades ou Fundações de Apoio

As entidades ou fundações de apoio são instituídas por servidores públicos, em nome próprio, sob a
forma de fundação, associação ou cooperativa, sempre sem finalidade lucrativa, para prestação, em caráter
privado, de serviços sociais não exclusivos do Estado.
As fundações de apoio são instituídas por particulares com o objetivo de auxiliar a Administração
Pública, por meio da elaboração de convênios ou contratos, não se confundindo com a entidade estatal.
Atuam, em especial, ao lado de hospitais e universidades Públicas, auxiliando no exercício da
atividade destas entidades, através da realização de programas de pesquisa e extensão.
O vínculo com o poder público decorre da assinatura de convênio, que lhe garante a destinação de
valores públicos, com dotação orçamentária específica, além da possibilidade de cessão de bens públicos e,
até mesmo, a cessão de servidores.
Possuem personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio e administração próprios, NÃO
fazendo parte da Administração Indireta, sendo suas demandas julgadas pela Justiça Estadual.
241
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As entidades de apoio, quando tiverem natureza jurídica de fundação, deverão estar constituídas sob
a forma de fundações de direito privado, sem fins lucrativos, regidas pelo Código Civil.
Essas fundações se sujeitam à fiscalização do MP, à legislação trabalhista e ao prévio registro e
credenciamento no Ministério da Educação, e no Ministério da Ciência e tecnologia, renovável bienalmente.
Na execução dos vínculos jurídicos (convênios, contratos, acordos e/ou ajustes), que envolvam a
aplicação de recursos públicos, as fundações de apoio sujeitam-se às seguintes obrigações:
● Observância da legislação de licitações e contratos administrativos;
● Prestação de contas de recursos aplicados aos órgãos públicos financiadores;
● Submissão ao controle finalístico e de gestão pelo órgão máximo da Instituição Federal de ensino;
● Fiscalização da execução dos contratos pelo TCU e órgão de controle interno competente.
Podem se utilizar de servidores públicos federais, que NÃO possuirão vínculo empregatício com a
fundação e poderão receber bolsas de ensino, pesquisa e extensão, respeitadas condições e limites fixados
no regulamento.

6.3 Organizações Sociais - OS (Lei 9637/98)

São entidades privadas, sem fins lucrativos, qualificadas na forma da Lei 9.637/98, que celebram
contrato de gestão com o Estado para o cumprimento de
45119metas de desempenho e recebimento de benefícios

públicos, através da prestação de serviços públicos NÃO exclusivos de estado, como ensino, pesquisa
científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente etc.
É importante lembrar que tais entidades NÃO integram a estrutura da administração, de modo que
sua criação independe de lei. No entanto, por executarem atividades de interesse social, sem escopo de
lucro, e receberem auxílio do ente estatal de diversas formas, sujeitam-se a algumas restrições impostas à
Fazenda Pública.

a) Qualificação como ‘OS’


A qualificação de entidade privada como OS é temporária, somente sendo vigente enquanto durar o
vínculo firmado. Trata-se, ainda, de ato discricionário, e depende de 2 requisitos:
(1) Comprovação do registro do seu ato constitutivo;
(2) Aprovação da qualificação pelas autoridades competentes: i) Ministro de Estado da Administração
Federal e Reforma do Estado e ii) titular do órgão supervisor da área de atividade correspondente.
A desqualificação pode ocorrer quando houver o descumprimento das disposições previstas no
contrato de gestão, devendo ser precedida de processo administrativo em que se assegure a ampla defesa.
Segundo a lei, a desqualificação enseja a reversão automática dos bens permitidos e dos valores entregues
à OS.

b) Contrato de gestão

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O vínculo da OS com o Poder Público ocorre pelo contrato de gestão, instrumento firmado que visa
ao fomento e à execução de atividades relacionadas ao estudo, pesquisa, desenvolvimento tecnológico,
cultura, meio ambiente e saúde.

Requisitos para a validade do contrato de gestão:


(1) Discriminar atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da organização
social;
(2) Especificar programas de trabalho, metas, prazos de execução e critérios objetivos de avaliação
de desempenho;
(3) Estipular limites e critérios para despesas com remuneração e vantagens de qualquer natureza;
(4) Observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
economicidade.

c) Remuneração e fiscalização
Durante a execução do contrato de gestão, a OS receberá sua contraprestação em função do
atingimento da meta de desempenho fixada, e NÃO das atividades realizadas.
Para os servidores estatais cedidos, o pagamento de sua remuneração será feito pelos cofres
públicos e NÃO será incorporado aos vencimentos 45119
de origem do servidor cedido qualquer vantagem
pecuniária que vier a ser paga pela organização social, com recursos provenientes do contrato de gestão.
Ante os benefícios concedidos, estas entidades se submetem a controle, efetivado pelo Ministério
supervisor daquela atividade executada, e pelo TCU, com submissão à Lei de Improbidade Administrativa
(NÃO há fiscalização por agência reguladora).
Os resultados atingidos com a execução do contrato de gestão devem ser analisados,
45119
periodicamente, por comissão de avaliação, indicada por autoridade supervisora. Além disso, as OS devem
ter um Conselho de Administração, nos moldes da Lei, com participação obrigatória de representantes do
povo e do poder público, nos percentuais estipulados em lei.

6.4 Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP (Lei 9790/99)

Primeiramente, perceba que a OSCIP não é uma pessoa jurídica, mas sim uma qualificação especial
concedida pelo Estado às entidades privadas sem fins lucrativos, em funcionamento há pelo menos 3 anos,
e criadas para a prestação de serviços públicos não exclusivos do Estado, a exemplo de:
● Promoção de assistência social;
● Cultura;
● Defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;
● Educação;
● Saúde;
● Segurança alimentar e nutricional;
243
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● Defesa, preservação e conservação do meio ambiente;


● Desenvolvimento sustentável etc.

a) Qualificação como OSCIP


Ao contrário da qualificação em “OS”, que é um ato discricionário, a qualificação em OSCIP é um ato
vinculado do Ministério da Justiça. Assim, em regra, se preenchidos os requisitos previstos
45119
em lei, deve-se
conceder a qualificação.
O art. 2º da Lei traz algumas hipóteses em que a entidade NÃO poderá receber a qualificação de
OSCIP, ainda que preencha todos os requisitos.

b) Termo de parceria
O vínculo firmado entre a OSCIP e o Poder Público ocorre mediante a celebração de termo de
parceria, que, além de estabelecer metas de desempenho, discriminará direitos, responsabilidades e
obrigações das partes signatárias.
O termo de parceria permite a destinação de valores públicos às instituições privadas, mediante
dotação orçamentária, com liberação destes recursos em conta bancária específica. Ou seja: após a
celebração do termo de parceria, as entidades estarão aptas a receber recursos orçamentários do Estado.
O termo de parceria deve conter as seguintes 45119
cláusulas:
● Objeto;
● Definição de metas;
● Critérios objetivos de avaliação de desempenho;
● Previsão de receitas e despesas;
● As obrigações da OSCIP;
● Obrigatoriedade de publicação na imprensa oficial do Município, Estado ou União, de extrato
de termo de parceria e de demonstrativo de execução física e financeira.

Para a celebração de termo de parceria, NÃO há a necessidade de realizar licitação, ante o vínculo
de convênio. No entanto, caso haja mais de um interessado na celebração do termo de parceria, e todos
cumpram os requisitos legais, a Administração deverá realizar procedimento simplificado que justifique a
escolha de uma entidade em detrimento de outra.

c) Fiscalização
As entidades se sujeitam ao controle financeiro e orçamentário exercido pelo Tribunal de Contas,
além do acompanhamento e fiscalização do termo de parceria por órgão do Poder Público.
As OSCIP devem constituir Conselho Fiscal ou órgão equivalente, dotado de competência para opinar
sobre os relatórios de desempenho financeiro e contábil e sobre as operações patrimoniais realizadas.
Servidores Públicos podem participar da composição do conselho de uma OSCIP, sendo vedada a
percepção de remuneração ou subsídio a qualquer título.
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SEMANA 01/12

Vamos esquematizar as principais diferenças entre OS e OSCIP?


ORGANIZAÇÕES SOCIAIS OSCIP
ENTIDADES Entidades privadas sem fins Entidades privadas sem fins
lucrativos. lucrativos em regular
funcionamento há pelo menos
3 anos.
QUALIFICAÇÃO Ato discricionário do Poder Ato vinculado do Poder
Público. Público
COMPETÊNCIA PARA A Ministério ou Órgão regulador Ministério da
45119Justiça.

QUALIFICAÇÃO responsável pela área de


atuação da entidade
ÓRGÃO DE DELIBERAÇÃO Presença obrigatória do Presença facultativa de
SUPERIOR DA ENTIDADE representante do Poder Público. servidor público na
composição do Conselho da
entidade.
VÍNCULO JURÍDICO Contrato de gestão. Termo de parceria.
(PARCERIA) 45119

É mais ampla do que a das


organizações sociais, porque
Ensino, pesquisa científica,
ÁREA DE ATUAÇÃO abrange, além de todo o
desenvolvimento tecnológico,
campo de atuação destas
proteção e preservação do meio
últimas, diversas outras áreas
ambiente, cultura e saúde.
previstas no art. 3º da Lei
9.790/1999.
CONSELHO OBRIGATÓRIO Conselho de Administração Conselho Fiscal
Perde-se a qualificação de
Perde-se a qualificação de OS a OSCIP, a pedido ou mediante
pedido ou se descumprido o decisão proferida em processo
DESQUALIFICAÇÃO contrato de gestão, mediante administrativo ou judicial, de
processo administrativo, em que iniciativa popular ou do
seja assegurado o direito ao Ministério Público, em que
contraditório e à ampla defesa. sejam assegurados o
contraditório e a ampla defesa.

6.5 Organizações da Sociedade Civil - OSC (Lei 13.019/14)

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SEMANA 01/12

A Lei 13.019/14 foi um novo marco regulatório para as parcerias formalizadas entre a Administração
Pública e as Organizações da Sociedade Civil, que são entidades privadas sem fins lucrativos e que
desempenham atividades socialmente relevantes.
Nesse sentido, a Lei busca regular, em âmbito nacional, o regime jurídico das parcerias voluntárias,
envolvendo ou não a transferência de recursos financeiros, firmados entre a Administração e as
organizações da sociedade civil sem fins lucrativos.

OBS.: Para a doutrina majoritária, trata-se de norma NACIONAL (e não federal), que estabelece normas gerais
aplicadas a todos os entes federativos (e não apenas à União).

a) Aplicabilidade e inaplicabilidade da Lei: Aplica-se às parcerias entre Administração direta e indireta


e organizações da sociedade civil.
Mas quem seria, aqui, a Administração Pública? R.: Na teoria, Administração Pública engloba a
Administração direta (entes federativos e seus órgãos) e a Administração indireta (autarquias, estatais e
fundações).
No entanto, tenha cuidado: o art. 2º da Lei 13.019/14 oferece uma série de conceitos para fins de
interpretação e aplicação da própria norma e, segundo o legislador, tal lei NÃO SE APLICA às empresas
estatais: a) exploradoras de atividades econômicas
45119e; b) prestadoras de serviço público, mas não

dependentes do orçamento público.


45119

A sociedade civil, por sua vez, é composta por:


● Entidades (privadas) sem fins lucrativos;
● Sociedades cooperativas;
● Organizações religiosas.

Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se:

I - ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL: (Redação dada pela Lei nº 13.204, de


2015)

a) entidade privada sem fins lucrativos que não distribua entre os seus sócios ou
associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais
resultados, sobras, excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos,
isenções de qualquer natureza, participações ou parcelas do seu patrimônio,
auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os aplique integralmente
na consecução do respectivo objeto social, de forma imediata ou por meio da
constituição de fundo patrimonial ou fundo de reserva;

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Entenda: o excesso de arrecadação é superávit e a lei diz que ele tem que ser
reinvestido na própria atividade da entidade.

b) as sociedades cooperativas previstas na Lei nº 9.867, de 10 de novembro de


1999 ; as integradas por pessoas em situação de risco ou vulnerabilidade pessoal
ou social; as alcançadas por programas e ações de combate à pobreza e de geração
de trabalho e renda; as voltadas para fomento, educação e capacitação de
trabalhadores rurais ou capacitação de agentes de assistência técnica e extensão
rural; e as capacitadas para execução de atividades ou de projetos de interesse
público e de cunho social. (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)

c) as organizações religiosas que se dediquem a atividades ou a projetos de


interesse público e de cunho social distintas das destinadas a fins exclusivamente
religiosos; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)

Entenda: não se trata de fomentar a atividade religiosa, e sim a atividade social


desenvolvida por entidade religiosa.
45119

b) Formas de seleção das organizações: A Lei 13.019/14 estabelece, como regra geral, o procedimento
de chamamento público. Assim, quando a Administração Pública for celebrar parceria com uma OSC, ela
deve fazer um procedimento objetivo com regras impessoais para a escolha da entidade privada que vai se
beneficiar da parceria. Note que não há necessidade de licitação, mas sim de um procedimento
administrativo com regras simplificadas que garantam uma escolha impessoal da entidade privada.
Além do chamamento público, a lei também menciona o Procedimento de Manifestação de
Interesse Social (PMIS), cuja definição está prevista pelo art. 18:

Art. 18. É instituído o Procedimento de Manifestação de Interesse Social como


instrumento por meio do qual as organizações da sociedade civil, movimentos
sociais e cidadãos poderão apresentar propostas ao poder público para que este
avalie a possibilidade de realização de um chamamento público objetivando a
celebração de parceria.

O chamamento público busca selecionar, de forma objetiva e impessoal, a entidade que firmará
termo de fomento ou termo de colaboração com o Poder Público.

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ATENÇÃO! Só há necessidade de chamamento público quando o vínculo com o Estado for celebrado
mediante termo de fomento ou termo de colaboração. Isso porque, como no acordo de cooperação NÃO há
transferência de recursos públicos, não há necessidade de realizar o chamamento público.

O PMIS, por sua vez, visa selecionar um projeto para eventual chamamento público futuro. Ou seja:
após o procedimento de manifestação de interesse social (PMIS), o projeto poderá ser selecionado e, caso
efetivamente seja, deve o Estado realizar o chamamento público. Fala-se em “poderá”, pois a apresentação
do projeto pela entidade NÃO vincula o Estado, que está livre para realizar ou não o chamamento público.
Em outras palavras: o PMIS NÃO visa selecionar a entidade que irá firmar a parceria, mas sim avaliar
os projetos apresentados pelas entidades interessadas. Tanto é que:
(i) O PMIS é facultativo, não vincula o Estado e nem dispensa a necessidade de realizar o futuro
chamamento público. Na realidade, o PMIS precede o chamamento público. Após o PMIS, o
Estado poderá realizar ou não o chamamento público, sem direito à indenização caso não o faça.
(ii) A entidade que apresentou o projeto eventualmente selecionado no PMIS ou que dele participou
45119

não está impedida de participar do chamamento público.


No chamamento público da Lei 13.019/14, primeiro, o poder público seleciona a proposta mais
vantajosa da entidade privada sem fins lucrativos. Depois, o poder público avalia o que chamamos de
requisitos de habilitação, isto é, se a entidade cumpre45119
os requisitos legais para ser beneficiada com o termo
de fomento ou termo de colaboração. Além desse julgamento antes da habilitação, a Lei 13.019/14
estabelece outros critérios submetidos à avaliação (que não são os tradicionais da Lei 8666/93 e da Lei
14133/21). Ex. grau de adequação da proposta aos objetivos específicos objeto da parceria e, quando for o
caso, ao valor de referência constante do chamamento público.
1. Julgamento/seleção da proposta mais vantajosa através de critérios de julgamentos
próprios/específicos;
2. Análise do preenchimento dos requisitos de habilitação.

As regras do chamamento público aparecem a partir do art. 23 da Lei n° 13.019/14.

c) Exceção ao chamamento público: parcerias diretas


A Lei 13.019/14 vai trazer a regra do chamamento público, mas também traz casos de dispensa e
inexigibilidade do chamamento público. As hipóteses são mais restritas, mas elas têm inspiração em
hipóteses previstas na Lei 8.666/93 e agora na Lei 14.133/21.
● Dispensa de chamamento público (art. 30)
● Hipóteses relacionadas à necessidade proeminente/guerra/calamidade;
● Trata-se de rol TAXATIVO;
● A atuação da Administração pública é discricionária (ou seja: pode dispensar o chamamento
público ou não).

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● Inexigibilidade de chamamento público (art. 31)


● Hipóteses de impossibilidade de competição;
● Trata-se de rol EXEMPLIFICATIVO;
● A atuação da Administração Pública é vinculada. Ainda que queira realizar o chamamento
público, não poderá fazê-lo.

● Requisitos para as parcerias diretas


O art. 32 da Lei 13.019/14 estabelece algumas exigências para a formalização das parcerias diretas
(tanto para a dispensa quanto para a inexigibilidade).
45119

Depois de realizado o chamamento público, o poder público vai selecionar a entidade privada
interessada que apresentou a melhor proposta e com ela vai celebrar o vínculo jurídico (a parceria). A Lei
13.019/14 traz 03 parcerias distintas: termo de colaboração, termo de fomento e acordo de colaboração. O
art. 2º da Lei 13.019/14 define cada um desses instrumentos.

d) Instrumentos públicos de parceria:


● Termo de colaboração - Instrumento de parceria para consecução de finalidades públicas propostas
pela administração. Envolve transferência de recursos.
● Termo de fomento - Instrumento de parceria para
45119 consecução de finalidades públicas propostas pela

sociedade civil. Envolve transferência de recursos.


● Acordo de cooperação – Instrumento de parceria que NÃO envolve a transferência de recursos.

VII - TERMO DE COLABORAÇÃO: instrumento por meio do qual são formalizadas as


parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade
civil para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco propostas
pela administração pública que envolvam a transferência de recursos
financeiros; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)

VIII - TERMO DE FOMENTO: instrumento por meio do qual são formalizadas as


parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade
civil para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco propostas
pelas organizações da sociedade civil, que envolvam a transferência de recursos
financeiros; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)

VIII-A - ACORDO DE COOPERAÇÃO: instrumento por meio do qual são formalizadas


as parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da
sociedade civil para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco
que não envolvam a transferência de recursos financeiros; (Incluído pela Lei nº
13.204, de 2015)
249
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DELEGADO SANTA CATARINA

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Por fim, segundo a lei, os instrumentos só passam a produzir efeitos jurídicos após a publicação em
meio oficial de publicidade (diário oficial).

Art. 38. O termo de fomento, o termo de colaboração e o acordo de cooperação


somente produzirão efeitos jurídicos após a publicação dos respectivos extratos no
meio oficial de publicidade da administração pública. (tem que ser publicizado no
DO).

Parceria para a consecução de


TERMO DE COLABORAÇÃO planos de trabalho de
iniciativa da AP e envolve
recursos financeiros

Parcerias para a consecução de


Três Parcerias planos de trabalho propostos por
TERMO DE FOMENTO organizações da sociedade civil
(Instrumentos Jurídicos) que envolvam a transferência de
recursos financeiros.

Não envolve a transferência


ACORDO DE COOPERAÇÃO de recursos financeiros
45119

e) Parcerias “ficha limpa”.


O autor Rafael Oliveira apelida as hipóteses do art. 39 de “parcerias ficha limpa” porque há várias
vedações fortemente influenciadas pela Lei da Ficha Limpa.

f) Contratações
A doutrina majoritária sempre defendeu que a entidade privada do 3º setor não precisa fazer uma
licitação formal, bastando um processo objetivo com regras impessoais, garantindo a observância dos
princípios constitucionais.
Portanto, as contratações de bens e serviços realizadas pelas entidades da sociedade com recursos
públicos devem observar procedimento que atenda aos princípios da Administração Pública.
A seleção da equipe de trabalho deve ser precedida de processo seletivo, com regras transparentes,
impessoais e objetivas para a seleção dos empregados. A remuneração NÃO gera vínculo com a
Administração.

g) Prestação de contas e accountability


Foi publicada a Lei nº 14.309/2022 para permitir a realização de reuniões e deliberações virtuais
pelas organizações da sociedade civil. Vejamos:

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RETA FINAL

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45119 Art. 4º-A. Todas as reuniões, deliberações e votações das organizações da


sociedade civil poderão ser feitas virtualmente, e o sistema de deliberação remota
deverá garantir os direitos de voz e de voto a quem os teria em reunião ou
assembleia presencial.

h) Responsabilidade e sanções
A OSC possui responsabilidade exclusiva pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e
comerciais relativos ao funcionamento da instituição e ao adimplemento do termo de colaboração ou de
fomento, inexistindo responsabilidade solidária ou subsidiária da Administração na hipótese de
inadimplemento.
Ou seja: aqui, a lei estabelece que o Estado NÃO terá qualquer responsabilidade pela parceria, seja
solidária, seja subsidiária.

CRÍTICA DA DOUTRINA: Essa ausência de responsabilidade parece ser inconstitucional porque se o Estado
formaliza uma parceria, ele não pode abrir mão de suas obrigações. E ele tem a obrigação de fiscalizar a
parceria. Então, se o Estado é omisso, é razoável se falar em responsabilidade (seja subsidiária, como é a
regra, seja solidária, como se opera nos encargos previdenciários).
45119

Para uma prova de concurso, deve-se observar a letra da lei: o Estado não tem qualquer
responsabilidade.

Art. 42. As parcerias serão formalizadas mediante a celebração de termo de


colaboração, de termo de fomento ou de acordo de cooperação, conforme o caso,
que terá como cláusulas essenciais:
XX - a responsabilidade exclusiva da organização da sociedade civil pelo pagamento
dos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais relacionados à
execução do objeto previsto no termo de colaboração ou de fomento, não
implicando responsabilidade solidária ou subsidiária da administração pública a
inadimplência da organização da sociedade civil em relação ao referido pagamento,
os ônus incidentes sobre o objeto da parceria ou os danos decorrentes de restrição
à sua execução.

Em relação às sanções, a lei comina 3 espécies: advertência, suspensão temporária de


participação/impedimento e inidoneidade. ATENÇÃO! NÃO há a cominação de multa.

Art. 73. Pela execução da parceria em desacordo com o plano de trabalho e com
as normas desta Lei e da legislação específica, a administração pública poderá,

251
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DELEGADO SANTA CATARINA

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garantida a prévia defesa, aplicar à organização da sociedade civil as seguintes


sanções:
I - advertência;
II - suspensão temporária da participação em chamamento público e impedimento
de celebrar parceria ou contrato com órgãos e entidades da esfera de governo da
administração pública sancionadora, por prazo não superior a dois anos;
III - declaração de inidoneidade para participar de chamamento público ou celebrar
parceria ou contrato com órgãos e entidades de todas as esferas de governo,
enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja
promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade,
que será concedida sempre que a organização da sociedade civil ressarcir a
administração pública pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da
sanção aplicada com base no inciso II.

Perceba que a lei diferenciou o âmbito de aplicação da suspensão e da idoneidade:


● No que toca à suspensão - a lei fala em “AP sancionadora”. Ex. Estado aplicou suspensão à OSC,
logo, ela não poderia participar nesse Estado do chamamento público e parcerias. Contudo, em
outros Estados poderia participar. 45119

● No que toca à inidoneidade – a sanção valeria em todas as esferas de governo. Uma entidade
declarada inidônea por um Estado não poderia ser participante de chamamento
45119 e parcerias não
apenas com o Estado que sancionou, mas também com nenhum outro ente federativo. Assim,
é mais grave que a suspensão.
Para prova de concurso público, vale a letra da lei!

252
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DELEGADO SANTA CATARINA

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45119

META 5

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI MARIA DA PENHA

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA


⦁ Lei 11.340/06
⦁ Lei 14.022/2020
⦁ Lei 14.541/2023
⦁ Lei 14.232/2021
⦁ Art. 226, §8º, CF/88
⦁ Art. 88, Lei 9.099/95 (inaplicabilidade da Lei 9.099/95 à Maria da Penha)

CPP
⦁ Arts. 312 e 313, III
⦁ Art. 322
⦁ Art. 581, V

CP 45119

⦁ Art. 44, §2º


⦁ Art. 45, §1º e 2º
⦁ Art. 129, §9º
⦁ Arts. 138 a 140 (os crimes contra a honra configuram violência moral contra a mulher)
⦁ Art. 330

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

Lei 11.340/06
⦁ Art. 5º e Art. 7º
⦁ Art. 8º, §4º
⦁ Art. 9º, §4º a §8º
⦁ Art. 10-A (importantíssimo)
⦁ Arts. 11, 12 e 12-C (importantíssimos)
⦁ Art. 14-A
⦁ Arts. 16 e 17 (importantíssimos)
⦁ Arts. 18 e 19
⦁ Art. 20
⦁ Art. 22, VI e VII

253
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

⦁ Art. 24-A (importantíssimo)


⦁ Art. 38-A
⦁ Art. 41

CPP
⦁ Arts. 312 e 313, III, CPP
⦁ Art. 322, CPP

SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA


Súmula 600-STJ: Para a configuração da violência doméstica e familiar prevista no artigo 5º da Lei nº
11.340/2006 (Lei Maria da Penha) não se exige a coabitação entre autor e vítima.
Súmula 588-STJ: A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça
no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos.
Súmula 589-STJ: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados
contra a mulher no âmbito das relações domésticas.
45119

Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de
delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. 45119

Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra
a mulher é pública incondicionada.

1. FINALIDADES DA NORMA

A Lei Maria da Penha possui natureza multidisciplinar, pois, além do caráter penal material e
procedimental, cria também mecanismos de natureza civil, de proteção à mulher, e trata até mesmo temas
afetos às políticas públicas. Ou seja, cuida-se de diploma direcionado à proteção da mulher frente a diversas
áreas do direito.
São quatro as finalidades da lei:
✓ Prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher;
✓ Estabelecimento de medidas de assistência;
✓ Estabelecimento de medidas de proteção;
✓ Criação de Juizados Especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Cuidado! O juizado mencionado, não se confunde com os Juizados Especiais Criminais


criados pela Lei nº 9.099/95. Ademais, o art. 41 da Lei nº 11.340/06, afasta a aplicação da
Lei dos Juizados no caso de aplicação da Lei Maria da Penha.

254
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DELEGADO SANTA CATARINA

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Os arts. 2° e 3° da Lei nº 11.340/06 enumeram direitos e garantias fundamentais inerentes à pessoa


humana que devem ser assegurados a toda e qualquer mulher, independentemente de classe, raça, etnia,
orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião:

Art. 2º Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual,


renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais
inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades
para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento
moral, intelectual e social.
Art. 3º Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos
direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à
45119
moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à
liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
§ 1º O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos
das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de
resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão.
§ 2º Cabe à família, à sociedade
45119 e ao poder público criar as condições necessárias

para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.

2. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E IGUALDADE MATERIAL

Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...)
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

A Lei nº 11.340/06 foi criada, não apenas para atender ao disposto no art. 226, §8°, da Constituição
Federal, que considerou ser dever do Estado assegurar a igualdade substancial nas relações domésticas, em
razão da necessidade de proteção específica e da continuada relação de submissão experimentada pelas
mulheres, mas também para dar cumprimento a diversos tratados internacionais ratificados pela República
Federativa do Brasil.
Nesse sentido, é dever do Estado, por meio de prestações positivas (ações afirmativas), extirpar a
desigualdade histórica que existe entre homens e mulheres, construindo uma igualdade para além da
meramente formal, estabelecida no art.5º, I, da CRFB, ou seja, uma igualdade materialmente perceptível no
âmbito das relações sociais.
Ressalta-se que esses programas de ações afirmativas não se colocam em rota de colisão com o
princípio da igualdade, potencializando, pelo contrário, expectativas compensatórias e de inserção social de

255
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

parcelas historicamente marginalizadas. Não violam o princípio da igualdade, pois há uma discriminação
positiva e não negativa.
Inf. 654 do STF - Não há violação do princípio constitucional da igualdade no fato
de a Lei n. 11.340/06 ser voltada apenas à proteção das mulheres.
45119

3. INTERPRETAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA

Art. 4º - Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se
destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de
violência doméstica e familiar.

Cuida o dispositivo da famigerada “interpretação teleológica”, aquela que parte das finalidades da
norma.
Segundo o art. 4º, a interpretação da Lei deve levar em conta os fins sociais a que se destina, ou seja,
deve tutelar a mulher que se encontra em uma situação de vulnerabilidade no âmbito de uma relação
doméstica, familiar ou íntima de afeto.

4. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER


45119

O conceito de violência doméstica e familiar contra a mulher é extraído do art. 5º, conjugado com o
art. 7º, ambos da Lei 11.340/06.

Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a
mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: (Vide Lei
complementar nº 150, de 2015)
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio
permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente
agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por
afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de
orientação sexual.

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
256
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

I – A violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade
ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano
emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno
desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos,
crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação,
isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem,
violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir
e vir45119
ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à
autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante
intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a
utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer
método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à
prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite
ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV – A violência patrimonial,
45119entendida como qualquer conduta que configure

retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de


trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos,
incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V – A violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia,
difamação ou injúria.

De forma genérica, são exigidos três requisitos para a configuração de violência doméstica:

1) A vítima deve ser mulher.


Aqui, vale destacar a jurisprudência do STJ, que entende que as medidas protetivas previstas na
Lei n. 11.340/2006 são aplicáveis às minorias, como transexuais, transgêneros, cisgêneros e
travestis em situação de violência doméstica, afastado o aspecto meramente biológico.

2) Deve ocorrer uma das hipóteses do artigo 5º da referida lei:


2.1. A violência deve ter ocorrido âmbito da unidade doméstica, compreendida como o
espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive
as esporadicamente agregadas;
2.2. No âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos
que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou
por vontade expressa
257
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

2.3. Em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido
com a ofendida, independentemente de coabitação.

Atenção à súmula 600 do STJ, segundo a qual a configuração da violência familiar não exige a
coabitação entre autor e vítima. Tal entendimento visa estender o grau de proteção da norma de modo a
abarcar um conjunto de relações fluídas, percebidas em grande parte na sociedade brasileira.

Caiu em prova Delegado PC-AM/2022 da banca FGV! Após conturbada e conflitiva separação, um casal com
filhos de 15 e 10 anos de idade, realizou divórcio judicial, oportunidade em que, dentre outros temas, foi
fixada a questão da pensão a ser paga para os filhos que ficariam sob os cuidados maternos.
Sem que a relação marital fosse retomada em qualquer momento, quando o filho mais velho completou 21
anos, o genitor informou à ex-esposa que ingressaria com o pedido de exclusão do dever alimentar, o que
gerou novo atrito.
A genitora afirmou que o préstimo de alimentos deveria prosseguir, pois o filho estava tentando o ingresso
no ensino superior. O genitor, então, respondeu de forma agressiva, que o filho não teria futuro, pois seguia
o modelo materno de incapacidade laboral e cognitiva, sendo fadado, portanto, a ser um “zé ninguém”, tal
qual a ex-esposa era. Acrescentou que ela ficava infantilizando os filhos, não permitindo que ganhassem
independência e ela que se virasse para bancar aquela45119
situação vergonhosa.

Sobre a possibilidade de configuração de ilícito penal, assinale a afirmativa correta: Embora o relacionamento
entre os dois tenha se encerrado, as agressões verbais decorreram da relação havida.

3) Produção de forma de violência prevista nos incisos do art. 7º, Lei 11.340/06:
a. Violência física
b. Violência patrimonial
c. Violência sexual
d. Violência moral
e. Violência psicológica

Obs.: A Lei nº 13.772/2018 promoveu uma mudança na Lei nº 11.340/2006 para deixar expresso que a
violação da intimidade da mulher é uma forma de violência doméstica, classificada como violência
psicológica.

Considerações importantes:
(1) Não há necessidade de habitualidade. O art. 5º, caput refere-se apenas à ação ou omissão.
45119
(2) É indispensável que ocorra uma violência de gênero, tal qual expresso no caput do art.5º. Ausente
esta violência de gênero, não se aplica a Lei Maria da Penha. Segundo o professor Renato Brasileiro:

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

“O objetivo da Lei Maria da Penha não foi o de conferir uma proteção


indiscriminada a toda e qualquer mulher, mas apenas àquelas que efetivamente se
45119
encontrarem em uma situação de vulnerabilidade em razão de gênero. É
indispensável, portanto, que a vítima esteja em uma situação de hipossuficiência
física ou econômica, enfim, que a infração tenha como motivação a opressão à
mulher”.

(3) Para o STJ há presunção legal da hipossuficiência da mulher vítima de violência doméstica:

Apesar de haver decisões em sentido contrário, prevalece o entendimento de que


a hipossuficiência e a vulnerabilidade, necessárias à caracterização da violência
doméstica e familiar contra a mulher, são presumidas pela Lei nº 11.340/2006. A
mulher possui na Lei Maria da Penha uma proteção decorrente de direito
convencional de proteção ao gênero (tratados internacionais), que o Brasil
incorporou em seu ordenamento, proteção essa que não depende da
demonstração de concreta fragilidade, física, emocional ou financeira. Ex:
agressão feita por um homem contra a sua namorada, uma Procuradora da AGU,
que possuía autonomia financeira
45119 e ganhava mais que ele. STJ. 5ª Turma. AgRg no
AREsp 620.058/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 14/03/2017. STJ. 6ª Turma.
AgRg nos EDcl no REsp 1720536/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em
04/09/2018. STJ. 5ª Turma. AgRg no RHC 92.825, Rel. Min. Reynaldo Soares da
Fonseca; Julg. 21/08/2018.

O fato de a vítima ser figura pública renomada não afasta a competência do Juizado
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para processar e julgar o delito.
Isso porque a situação de vulnerabilidade e de hipossuficiência da mulher,
envolvida em relacionamento íntimo de afeto, revela-se ipso facto, sendo
irrelevante a sua condição pessoal para a aplicação da Lei Maria da Penha. Trata-se
de uma presunção da Lei. STJ. 5ª Turma. REsp 1416580-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz,
julgado em 1º/4/2014 (Info 539).

APROFUNDANDO PARA AS PROVAS DISCURSIVAS...


Em provas subjetivas, além de apresentar o entendimento do STJ, é importante demonstrar conhecimento
acerca dos entendimentos doutrinários sobre o tema. Para parte da doutrina, somente haveria presunção
absoluta de vulnerabilidade da mulher quando o sujeito ativo fosse homem. Em sendo uma mulher, essa
presunção de vulnerabilidade deveria ser relativa, a ser demonstrada no caso concreto. Confira a explicação
do professor Renato Brasileiro:

259
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

“A nosso ver, não há como se afastar a aplicação da Lei Maria da Penha às hipóteses de violência doméstica
e familiar perpetrada por um homem contra a mulher. Nesse caso, parece haver verdadeira presunção
absoluta de vulnerabilidade. Em tais situações, a desigualdade entre os gêneros feminino e masculino que
justifica o tratamento desigual contemplado pela Lei Maria da Penha pode ser facilmente constatada, seja
pela maior força física do homem, seja pela posição de superioridade que geralmente ocupa no seio familiar
e social. Todavia, quando esta mesma violência é perpetrada por uma mulher contra outra no seio de uma
relação doméstica, familiar ou íntima de afeto, não há falar em presunção absoluta de vulnerabilidade do
gênero feminino. Cuida-se, na verdade, de presunção relativa. A título de exemplo, possamos pensar numa
violência física praticada por uma irmã contra a outra. Como o sujeito ativo de tal crime não se apresenta
supostamente mais forte, ameaçador e dominante que a vítima, não há nenhum critério razoável capaz de
justificar a aplicação dos ditames gravosos da Lei nº 11.340/06. Afinal, o objetivo da Lei Maria da Penha não
foi o de conferir uma proteção indiscriminada a toda e qualquer mulher, mas apenas àquelas que
efetivamente se encontrarem em uma situação de vulnerabilidade”.

5. SUJEITO PASSIVO

Exclusivamente a mulher (violência de gênero), independentemente da orientação sexual, sendo


perfeitamente possível que o agressor e a vítima sejam45119
do sexo feminino (art.5 º, p.ú., Lei nº 11.340/06).
Ademais, é irrelevante a idade da vítima. De acordo com o autor Renato Brasileiro:

(...) A Lei n. 11.340/2006 nada mais objetiva do que proteger vítimas, contra quem
os abusos aconteceram no ambiente doméstico e decorreram da distorção sobre a
relação familiar decorrente do pátrio poder, em que se pressupõe intimidade de
afeto, além do fato essencial de ela ser mulher (de qualquer idade), elementos
suficientes para atrair a competência da vara especializada em violência doméstica.
A prevalecer o entendimento em sentido contrário, crianças e adolescentes vítimas
de violência doméstica - segmento especial e prioritariamente protegido pela
Constituição da República (art. 227) - passariam a ter um âmbito de proteção
menos efetivo do que mulheres adultas. (Legislação Criminal Especial Comentada,
pg. 1275).

Ressalta-se, novamente, que, para a doutrina majoritária e os Tribunais Superiores, é possível que os
transgêneros e transexuais sejam vítimas no contexto da violência doméstica e familiar contra a mulher.
45119

APROFUNDANDO PARA PROVAS DISCURSIVAS...


Aplica-se a Lei Maria da Penha aos transexuais?
Há duas correntes sobre o tema.
1ª Corrente: não seria possível, pois seria uma analogia in malan partem.
260
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

2ª Corrente: É possível conferir a proteção da Lei Maria da Penha, mesmo sem realizar a cirurgia de
transgenitalização. A Lei Maria da Penha não distingue orientação sexual e identidade de gênero das vítimas
mulheres. O fato de a ofendida ser transexual feminina não afasta a proteção legal, tampouco a competência
do Juizado de Violência Doméstica e Familiar. Nesse sentido posicionou-se o STJ:

RECURSO ESPECIAL. MULHER TRANS. VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. APLICAÇÃO DA LEI N. 11.340/2006,
LEI MARIA DA PENHA. CRITÉRIO EXCLUSIVAMENTE BIOLÓGICO. AFASTAMENTO. DISTINÇÃO ENTRE SEXO E
45119
GÊNERO. IDENTIDADE. VIOLÊNCIA NO AMBIENTE DOMÉSTICO. RELAÇÃO DE PODER E MODUS OPERANDI.
ALCANCE TELEOLÓGICO DA LEI. MEDIDAS PROTETIVAS. NECESSIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. A aplicação da Lei Maria da Penha não reclama considerações sobre a motivação da conduta do agressor,
mas tão somente que a vítima seja mulher e que a violência seja cometida em ambiente doméstico, familiar
ou em relação de intimidade ou afeto entre agressor e agredida.
3. A vulnerabilidade de uma categoria de seres humanos não pode ser resumida tão somente à objetividade
de uma ciência exata. As existências e as relações humanas são complexas e o Direito não se deve alicerçar
em argumentos simplistas e reducionistas.
4. Para alicerçar a discussão referente à aplicação do art. 5º da Lei Maria da Penha à espécie, necessária é a
diferenciação entre os conceitos de gênero e sexo, assim como breves noções de termos transexuais,
transgêneros, cisgêneros e travestis, com a compreensão
45119 voltada para a inclusão dessas categorias no abrigo

da Lei em comento, tendo em vista a relação dessas minorias com a lógica da violência doméstica contra a
mulher.
5. A balizada doutrina sobre o tema leva à conclusão de que as relações de gênero podem ser estudadas
com base nas identidades feminina e masculina. Gênero é questão cultural, social, e significa interações
entre homens e mulheres. Uma análise de gênero pode se limitar a descrever essas dinâmicas. O
feminismo vai além, ao mostrar que essas relações são de poder e que produzem injustiça no contexto do
patriarcado. Por outro lado, sexo refere-se às características biológicas dos aparelhos reprodutores
feminino e masculino, bem como o seu funcionamento, de modo que o conceito de sexo, como visto, não
define a identidade de gênero. Em uma perspectiva não meramente biológica, portanto, mulher trans
mulher é. STJ, REsp 1.977.124/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, DJE 22/04/2022).

Atenção: O homem pode ser vítima de violência doméstica e familiar, porém sem a possibilidade de
aplicação da Lei Maria da Penha. Isso porque a Lei Maria da Penha exige uma qualidade especial, qual seja,
ser mulher.
Se a violência doméstica sofrida pelo sujeito do sexo masculino qualificar o crime de lesão corporal,
aplica-se art.129, §9º, do CP.
No tocante à possibilidade de aplicação das medidas protetivas de urgência a vítimas homens, em
que pese homem vítima de violência doméstica não poder figurar como sujeito passivo da Lei Maria da
Penha, bem como o art. 22 da lei protetiva fazer referência à adoção de tais medidas apenas quando
constatada violência contra a mulher, diante da nova redação conferida no art. 313, inciso III, do CPP (pela
261
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Lei n°12.403/2011) há parcela da doutrina que admite a aplicação de medidas protetivas de urgência à vítima
do sexo masculino, pois a expressão textual é de que tais medidas também podem ser concedidas de modo
a coibir a violência doméstica e familiar contra a criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com
deficiência (LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Criminal Especial Comentada, pg. 1301).
Note que, por exemplo, inobstante o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do idoso,
preverem medidas de natureza cautelar a favor das vítimas, essas não possuem a mesma eficácia das
Medidas Protetivas, pois seu descumprimento não acarreta sanções ao agressor, bem como o ECA determina
o acolhimento da vítima, quando a medidas recomendada seria o afastamento do agressor tal como previsto
pela Lei Maria da Penha. Desta forma, tendo em vista a vulnerabilidade da criança, do adolescente e do idoso,
do gênero masculino, vítima de crime de violência doméstica, é possível a aplicação subsidiária das medidas
protetivas de urgência aos mesmos.
Contudo, outra parte da doutrina aponta que, em se tratando de vítima do sexo masculino,
inaplicável a Lei Maria da Penha, podendo a vítima requerer a decretação de medidas cautelares diversas da
prisão, especialmente aquelas arroladas nos incisos II e III do art. 319 do Código de Processo Penal.
45119

Atenção: ATUALMENTE NO TOCANTE À CRIANÇA E ADOLESCENTE, HÁ A LEI Nº 14.344, DE 24 DE MAIO DE


2022 que cria mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a
criança e o adolescente e dispõe no art. 20 e seguintes45119
a possibilidade de aplicação de medidas protetivas de
urgência.

6. SUJEITO ATIVO

Pode ser tanto o homem quanto a mulher (art. 5º, parágrafo único, Lei 11.340/06).
Logo, a violência doméstica baseada em razão de gênero havida entre companheiras se submete à
Lei Maria da Penha, não sendo o fato de se tratar de relação homoafetiva suficiente para afastar sua
aplicação. Também é possível que em um conflito percebido mãe e filha, irmãs, ou mesmo sogra e nora esteja
sujeito à aplicação da Lei 11.340/06.

Violência praticada por filha contra a mãe


Aplica-se a Lei Maria da Penha. O agressor também pode ser mulher. STJ. 5ª Turma.
HC 277561/AL, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 06/11/2014.

Constatada situação de vulnerabilidade, aplica-se a Lei Maria da Penha no caso


de violência do neto praticada contra a avó
A Lei Maria da Penha objetiva proteger a mulher da violência doméstica e familiar
que, cometida no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação
íntima de afeto, cause-lhe morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, e
dano moral ou patrimonial. Estão no âmbito de abrangência do delito de violência
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

doméstica e podem integrar o polo passivo da ação delituosa as esposas, as


companheiras ou amantes, bem como a mãe, as filhas, as netas do agressor e
também a sogra, a avó ou qualquer outra parente que mantém vínculo familiar ou
afetivo com ele. STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1626825-GO, Rel. Min. Felix Fischer,
julgado em 05/05/2020 (Info 671).

Vamos esquematizar?

SUJEITO ATIVO SUJEITO PASSIVO

Homem ou mulher; Há exigência de uma qualidade especial: ser mulher.

7. ELEMENTO SUBJETIVO

Para a doutrina amplamente majoritária: apenas crimes dolosos podem atrair a aplicação da Lei
Maria da Penha.
Deve-se frisar que, no que tange à modalidade de culpa consciente, aplica-se a incidência da Lei nº
11.340/06. Isso porque, na culpa consciente, existe vontade
45119
e nítido liame subjetivo entre o agente e o
resultado, na medida em que o sujeito reconhece que ultrapassa os limites do risco autorizado, ou seja, ele
tem ciência de que está lesando um dever de cuidado por meio de sua conduta. Isso é: Quando atua com
culpa consciente, o agente prevê a ocorrência do resultado penalmente relevante, em que pese acreditar,
firmemente, que não irá se verificar.
Já no tocante à culpa inconsciente, a doutrina entende não ser possível aplicar a Lei Maria da Penha
para os crimes culposos (nos casos em que a culpa é inconsciente, o agente não possui conhecimento de que
infringe um dever de cuidado, tampouco prevê a ocorrência do45119
resultado danoso, razão pela qual sua
ação/omissão não poderá ter qualquer base no gênero, implicando o afastamento do artigo 5º da Lei Maria
da Penha).
Cuidado! Apesar de o Supremo não ter enfrentado diretamente a questão por ocasião do julgamento
da ADI 4.424/DF (Rei. Min. Marco Aurélio, j. 09/02/ 2012), o Plenário do Supremo concluiu que o crime de
lesão corporal praticada contra a mulher em âmbito doméstico será de ação penal pública incondicionada,
mesmo que de natureza leve ou culposa. Logo, por via oblíqua as infrações penais culposas também se
sujeitam à incidência da Lei Maria da Penha. O mesmo se aplica no caso da contravenção penal de vias de
fato:

Em caso de vias de fato, se praticada em contexto de violência doméstica ou


familiar, não há falar em necessidade de representação da vítima para a
persecução penal. STJ, AgRg no HC 713415, j. em 22/02/2022.

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SEMANA 01/12

8. HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA


45119

Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a
mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

A ação ou omissão da qual resulta a violência doméstica não precisa ser necessariamente uma
infração penal, ações que não são típicas, ou são praticadas no bojo de alguma excludente de ilicitude ou
culpabilidade, podem ser consideradas violência doméstica, mesmo não sendo punidas criminalmente.

I - No âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas,


com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

A lei é clara no sentido de que não se exige o vínculo familiar para a caracterização do âmbito de
unidade doméstica, sendo necessário apenas que o espaço seja de convivência permanente incluindo-se as
pessoas agregadas esporadicamente.
Nesse sentido, é possível aplicar a Lei Maria da Penha em relações de amigos que moram juntos, ou,
ainda, em violência perpetrada contra empregada doméstica,
45119 desde que presentes os demais requisitos,
sobretudo a situação de vulnerabilidade.

II - No âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se
consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

Nesta hipótese, sim, o determinante é a existência de vínculo familiar, de origem biológica ou não. A
violência não precisa ser praticada no âmbito da unidade doméstica, podendo ocorrer dentro ou fora do
espaço habitado pelos familiares.
Lembrando que não basta a relação de parentesco, sendo imprescindível a presença dos requisitos:
motivação de gênero e situação de vulnerabilidade.

Obs.: Vínculo de natureza familiar é jurídico. Logo, pode ser um vínculo conjugal, vínculo de parentesco ou
um vínculo por vontade expressa (adoção).

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida,
independentemente de coabitação.

A Lei nº 11.340/2006, denominada Lei Maria da Penha, em seu art. 5.º, inc. III, caracteriza como
violência doméstica aquela em que o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida,
independentemente de coabitação (STJ, CC 100654).
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Contudo, necessário se faz salientar que a aplicabilidade da mencionada legislação a relações


íntimas de afeto como o namoro deve ser analisada em face do caso concreto. Não se pode ampliar o termo
- relação íntima de afeto - para abarcar um relacionamento passageiro, fugaz ou esporádico. Em miúdos, o
STJ afasta a aplicação da Lei para as relações de afeto que sejam meras “ficadas” eventuais entre pessoas
que não tem efetiva conexão afetiva.

STJ: “(...) LEI MARIA DA PENHA. VIOLÊNCIA PRATICADA EM DESFAVOR DE EX-


NAMORADA. (...) a aplicabilidade da mencionada legislação a relações íntimas de
afeto como o namoro deve ser analisada em face do caso concreto. Não se pode
ampliar o termo - relação íntima de afeto - para abarcar um relacionamento
passageiro, fugaz ou esporádico. In casu, verifica-se nexo de causalidade entre a
conduta criminosa e a relação de intimidade existente entre agressor e vítima, que
estaria sendo ameaçada de morte após romper namoro de quase dois anos,
situação apta a atrair a incidência da Lei n.º 11.340/2006. (...)”. (STJ, 3ª Seção, CC
100.654/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 13/05/2009).

Violência praticada por companheiro da mãe ("padrasto") contra a enteada. Aplica-


se a Lei Maria da Penha. Obs.: a agressão foi motivada por discussão envolvendo o
45119

relacionamento amoroso que o agressor possuía com a mãe da vítima (relação


íntima de afeto). STJ. 5ª Turma. RHC 42092/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em
25/03/2014.

STJ: “(...) AMEAÇA. SOGRA E NORA. (...) A incidência da Lei n.º 11.340/2006 reclama
situação de violência praticada contra a mulher, em contexto caracterizado por
relação de poder e submissão, praticada por homem ou mulher sobre mulher em
situação de vulnerabilidade. Precedentes. No caso não se revela a presença dos
requisitos cumulativos para a incidência da Lei nº 11.340/06, a relação íntima de
afeto, a motivação de gênero e a situação de vulnerabilidade. Concessão da
ordem. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido de ofício, para declarar
competente para processar e julgar o feito o Juizado Especial Criminal da Comarca
de Santa Maria/RS”. (STJ, 5ª Turma, HC 175.816/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze,
j. 20/06/2013, DJe 28/06/2013).

Vamos esquematizar?

ÂMBITO
45119DA UNIDADE ÂMBITO DA FAMÍLIA QUALQUER RELAÇÃO ÍNTIMA DE
DOMÉSTICA AFETO

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SEMANA 01/12

Espaço de convívio permanente Indivíduos que são ou se Em qualquer relação íntima de


de pessoas, COM OU SEM consideram aparentados, afeto, na qual o agressor conviva
VÍNCULO FAMILIAR, inclusive as unidos por laços naturais, por ou tenha convivido com a
esporadicamente agregadas. afinidade ou por vontade ofendida, INDEPENDENTEMENTE
expressa DE COABITAÇÃO.
Não se exige o vínculo familiar. Aqui importam os laços, pouco Aqui, o importante é que haja um
Leva em conta apenas o aspecto importando o lugar, pouco relacionamento entre duas
espacial. importando se há coabitação. pessoas, seja baseado na amizade
45119
ou em qualquer outro
sentimento, desde que não seja
uma relação passageira.

#DICA DD: foi editada a lei 14.550/2023 que altera a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 e garante que a
Lei Maria da Penha seja aplicada em todos os casos de violência doméstica e familiar “independentemente
da causa ou da motivação” e da condição do agressor ou da vítima.
Note que o art. 40-A determina que a Lei será aplicada a todas as situações previstas no seu art. 5º
(Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão
baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento
45119
físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial).
Conclui-se, portanto, que a lei continuou, acertadamente, delimitando a aplicação nas hipóteses de
violência de gênero definidas pelo art. 5°.

9. FORMAS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

O conceito de violência doméstica e familiar é divorciado do conceito de violência existente na esfera


penal (emprego de força física sobre o corpo da vítima). O termo “violência”, na Lei Maria da Penha, abarca:
a violência física, a violência psicológica, a violência sexual, a violência patrimonial e a violência moral.
As violências, como já exposto anteriormente, devem ser praticadas a título de dolo. Lembrando que
há entendimento admitindo também na prática do crime culposo consciente.
Note que o art. 7° faz uso da expressão "entre outras", portanto não se trata de um rol taxativo,
mas sim exemplificativo. Logo, é perfeitamente possível o reconhecimento de outras formas de violência
doméstica e familiar contra a mulher. Tem-se aí verdadeira hipótese de interpretação analógica.

● Violência física– Entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal
● Violência psicológica – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuição da autoestima, lhe prejudique o pleno desenvolvimento, ou que
vise degradar ou controlar suas ações de maneira geral

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Lei 13.772/2018: acrescenta um novo crime ao Código Penal - Crime de registro não
autorizado da intimidade sexual (art. 216-B).4
Promoveu ainda uma pequena mudança na Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) para
deixar expresso que a violação da intimidade da mulher é uma forma de violência
doméstica, classificada como violência psicológica.

● Violência sexual - entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou
a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da
força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao
aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite
ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
● Violência patrimonial - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho,
documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a
satisfazer suas necessidades
45119

APROFUNDANDO PARA PROVAS DISCURSIVAS

Há divergência doutrinária se há a aplicação das escusas absolutórias, das imunidades absoluta e relativa
previstas no CP nos casos de violência patrimonial no âmbito doméstico e familiar.

1ª posição – Maria Berenice Dias: NÃO. Defendem a inaplicabilidade das escusas absolutórias por ser uma
medida de política criminal incompatível com a mens legis da Lei Maria da Penha. Permitir a incidência das
imunidades é enfraquecer a proteção (que deveria ser mais intensa) à mulher vítima de violência patrimonial
no seio das relações domésticas, familiares e íntimas de afeto.

2ª posição- Nucci e Renato Brasileiro: SIM. Diante do silêncio da Lei, o ideal é concluir pela aplicação das
escusas absolutórias no caso de crimes patrimoniais perpetrados no contexto da violência doméstica e
familiar contra a mulher. Estender a vedação expressa presente no estatuto do idoso constitui verdadeira
analogia in malam partem, colocando-se em rota de colisão com o princípio da legalidade.

● Violência moral - entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou
injúria. 45119

4
https://www.dizerodireito.com.br/2018/12/lei-137722018-crime-de-registro-nao.html

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SEMANA 01/12

Logo, é importante perceber que as agressões da qual a lei protege não são necessariamente físicas,
podendo ser objeto do procedimento previsto na Lei 11.340 atos de disposição ilegítima
45119 de patrimônio e

crimes contra a honra, caso presentes das hipóteses já estudadas no art. 5°.

10. FORMAS DE PREVENÇÃO NA LEI MARIA DA PENHA

Art. 8o A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a
mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais,
tendo por diretrizes:
I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da
Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde,
educação, trabalho e habitação;
II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações
relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas,
às consequências e à frequência da violência doméstica e familiar contra a mulher,
para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação
periódica dos resultados das 45119
medidas adotadas;
III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da
pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou
exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso
III do art. 1o, no inciso IV do art. 3o e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal;

O MP tem instaurado ACPs contra programas de TV que violam este dispositivo.

IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em


particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher;
V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência
doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em
geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos
das mulheres;
VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos
de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades
não-governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de
erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher;
VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal,
do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas
enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia;
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SEMANA 01/12
45119

VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de


irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de
raça ou etnia;
IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os
conteúdos relativos aos direitos humanos, à equidade de gênero e de raça ou etnia
e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.

Merece destaque o inciso IV, que trata da implementação de Delegacias especializadas no


atendimento à mulher vítima de violência doméstica e familiar (em alguns locais chamada de Deam). A vítima
deve ser encaminhada a esta Delegacia especializada para que lá seja adequadamente atendida e para que
sejam tomadas todas as providências em relação a essa espécie de delito.

#DICA DD: foi editada a Lei nº 14.541/2023, dispondo sobre a criação e funcionamento ininterrupto de
Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam).
De acordo com o referido diploma, além das funções de atendimento policial especializado para as
mulheres e de polícia judiciária, o Poder Público deverá prestar, por meio da Deam, e mediante convênio
com a Defensoria Pública, os órgãos do Sistema Único de Assistência Social e os Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher ou varas criminais
45119 competentes, a assistência psicológica e jurídica à

mulher vítima de violência (art. 2º).


A Lei ainda estabelece que a finalidade da Deam é atender todas as mulheres vítimas de violência
doméstica e familiar, crimes contra a dignidade sexual e feminicídios.
A Deam deverá funcionar ininterruptamente, inclusive em feriados. Além disso, as mulheres deverão
ser atendidas em sala reservada e, preferencialmente, por policiais do sexo feminino. Destaca-se, ainda, que
os policiais encarregados de atendimento às vítimas deverão receber treinamento adequado visando o
acolhimento das vítimas de maneira eficaz e humana.
Nos municípios onde não houver Deam, a delegacia existente deverá atuar de forma a priorizar o
atendimento da mulher vítima de violência por agente feminina especializada.
Por fim, a Deam deverá disponibilizar número de telefone ou outro mensageiro eletrônico destinado
ao acionamento imediato da polícia em casos de violência contra a mulher.

11. DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA FAMILIAR

Ao tratar sobre a assistência à mulher em condição de violência doméstica o legislador possibilitou a


decretação judicial de diversas ações e programas de auxílio por prazo determinado para a vítima, dentre as
quais:
● Possibilidade de remoção prioritária da servidora pública, integrante da administração direta e
indireta.

269
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● Manutenção do vínculo trabalhista pelo prazo de até seis meses quando necessário o afastamento
da vítima de seu local de trabalho.
Obs.: Segundo o STJ, o INSS deverá arcar com a subsistência das mulheres que precisaram se afastar
do trabalho para se proteger de violência doméstica. Para o colegiado, tais situações ofendem a integridade
física ou psicológica da vítima, o que justifica o direito ao “auxílio-doença”:

A medida de afastamento do local de trabalho, prevista no art. 9º, § 2º, da Lei é


de competência do Juiz da Vara de Violência Doméstica, sendo caso de
interrupção do contrato de trabalho, devendo a empresa arcar com os 15
primeiros dias e o INSS com o restante. STJ. 6ª Turma. REsp 1757775-SP, Rel. Min.
Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20/08/2019 (Info 655).

● Encaminhamento à assistência judiciária, quando for o caso, inclusive para eventual ajuizamento
da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união
estável perante o juízo competente.

A Lei nº 13.894/2019 acrescentou um novo inciso ao § 2º do art. 9º prevendo que, se a vítima e o agressor
forem casados ou viverem em união estável, a mulher
45119
deverá ser encaminhada à assistência judiciária
para que possa ter a oportunidade de, assim desejando, desvincular-se formalmente do
marido/companheiro agressor por meio da ação judicial própria.

Atenção aos parágrafos 4º ao 8º:


O autor de violência doméstica praticada contra mulher terá que ressarcir os custos relacionados
com os serviços de saúde prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) às vítimas de violência doméstica e
familiar e com os dispositivos de segurança utilizados pelas vítimas para evitar nova violência.

45119

A Lei nº 13.894/2019 acrescentou o § 4º e §5º e 6º do art. 9º prevendo que o autor de violência doméstica
praticada contra mulher terá que ressarcir os custos relacionados com:
• os serviços de saúde prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) às vítimas de violência doméstica e
familiar: Quando se fala em ressarcir todos os danos causados, isso significa que o agressor tem o dever,
inclusive, de pagar ao Sistema Único de Saúde (SUS) as despesas que foram realizadas com os serviços de
saúde prestados para o total tratamento da vítima em situação de violência doméstica e familiar. Ex: custos
com cirurgia, com medicamentos, com atendimento de psicóloga etc. Assim, mesmo o SUS sendo um
serviço oferecido gratuitamente à população, o agressor tem o dever de ressarcir os gastos que o poder
público teve com isso.

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RETA FINAL

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SEMANA 01/12

• com os dispositivos de segurança utilizados pelas vítimas para evitar nova violência: como por exemplo:
“Botão do Pânico”5; tornozeleira eletrônica com dispositivo de aproximação que fica com a mulher.

Observações importantes sobre o ressarcimento previsto no §6º:


- O ressarcimento não poderá importar ônus de qualquer natureza ao patrimônio da mulher e dos seus
dependentes;
- O fato de o agressor ter feito o ressarcimento não configura atenuante (art. 65, III, b, CP);
- O ressarcimento não enseja possibilidade de substituição da pena aplicada (art. 17 desta lei e Súmula 588
STJ).

● Prioridade para matricular seus dependentes em instituição de educação básica mais próxima de
seu domicílio, ou transferi-los para essa instituição, mediante a apresentação dos documentos
comprobatórios do registro da ocorrência policial.

A Lei nº 13.882/2019 amplia esse rol de assistência e prevê que a mulher vítima da violência doméstica terá
prioridade para matricular ou para transferir seus filhos ou outros dependentes para escolas próximas de seu
domicílio. E se não houver vaga na escola próxima, ainda assim, o dependente da vítima terá direito de ser
matriculado como um excedente, ou seja, mesmo fora do número de vagas. É nesse sentido a previsão da
45119

medida protetiva de urgência constante do art. 23, V:


45119

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: V – “determinar a matrícula dos
dependentes da ofendida em instituição de educação básica mais próxima do seu domicílio, ou a
transferência deles para essa instituição, independentemente da existência de vaga.”

Obs.: a informação de que o aluno foi transferido ou matriculado por conta de violência doméstica sofrida
por sua mãe deverá ficar em sigilo, sendo de conhecimento apenas do juiz, do MP e dos órgãos competentes
do poder público (ex.: diretora da escola).

● Concessão de auxílio-aluguel, com valor fixado em função de sua situação de vulnerabilidade social
e econômica, por período não superior a 6 (seis) meses (art. 23, VI, LMP, incluído pela Lei nº 14.674,
de 2023).

12. DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL

5
http://www.tjes.jus.br/botao-do-panico-dispositivo-de-seguranca-que-ajuda-a-proteger-mulheres-vitimas-de-violencia-
domestica-completa-6-anos/

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Art. 10. Na hipótese da iminência ou45119


da prática de violência doméstica e familiar
contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência
adotará, de imediato, as providências legais cabíveis.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de
medida protetiva de urgência deferida.
Art. 10-A. É direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar o
atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado por
servidores - preferencialmente do sexo feminino - previamente capacitados.

Trata-se de tema rotineiramente abordado em prova de carreiras policiais, uma vez que é direito da
mulher ser atendida de forma especializada, ininterrupta e preferencialmente, por servidoras do sexo
feminino. Como se depreende do texto legal, não há uma necessidade absoluta de que o atendimento seja
realizado por Mulher:

§ 1º A inquirição de mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de


testemunha de violência doméstica, quando se tratar de crime contra a mulher,
obedecerá às seguintes diretrizes: (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
I - salvaguarda da integridade45119
física, psíquica e emocional da depoente, considerada
a sua condição peculiar de pessoa em situação de violência doméstica e
familiar; (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
II - garantia de que, em nenhuma hipótese, a mulher em situação de violência
doméstica e familiar, familiares e testemunhas terão contato direto com
investigados ou suspeitos e pessoas a eles relacionadas; (Incluído pela Lei nº
13.505, de 2017)
III - não revitimização da depoente, evitando sucessivas inquirições sobre o mesmo
fato nos âmbitos criminal, cível e administrativo, bem como questionamentos
sobre a vida privada. (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
§ 2º Na inquirição de mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de
testemunha de delitos de que trata esta Lei, adotar-se-á, preferencialmente, o
seguinte procedimento: (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
I - a inquirição será feita em recinto especialmente projetado para esse fim, o qual
conterá os equipamentos próprios e adequados à idade da mulher em situação de
violência doméstica e familiar ou testemunha e ao tipo e à gravidade da violência
sofrida; (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
II - quando for o caso, a inquirição será intermediada por profissional especializado
em violência doméstica e familiar designado pela autoridade judiciária ou
policial; (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

III - o depoimento será registrado em meio eletrônico ou magnético, devendo a


degravação e a mídia integrar o inquérito. (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
45119

Em linhas gerais, busca-se por meio do estabelecimento de diretrizes especiais à polícia judiciária
evitar a vitimização secundária, bem como a heterovitimização, impedindo que a vítima seja objeto de
sucessivas inquirições e procedimentos que possam potencializar as sequelas das violências sofridas.
Os arts. 11 e 12 da Lei Maria da Penha tratam das providências que devem ser tomadas pela
autoridade policial que tenha atuação na Delegacia especializada no atendimento à mulher vítima de
violência doméstica e familiar contra a mulher, ou da Delegacia de Polícia comum, nos locais em que não
houver delegacia especializada.
Algumas providências são de caráter obrigatório, como, por exemplo, a oitiva da vítima, lavratura do
boletim de ocorrência, atermação da representação e a verificação se o agressor possui registro de porte ou
posse de arma de fogo; outras, no entanto, têm sua realização condicionada à discricionariedade da
autoridade policial, que deve determinar sua realização de acordo com as peculiaridades do caso concreto.

💣 Artigos importantíssimos de alta incidência nas provas de delegado de


polícia!
45119

Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a


autoridade policial deverá, entre outras providências:

Trata-se de rol exemplificativo, pois o caput fala “entre outras”.

I - Garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao


Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II - Encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico
Legal;

O encaminhamento ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico


Legal decorre da necessidade de realização de perícia, para que se forme
o conjunto probatório ligado à prova de existência da infração penal, nos
moldes do art. 158 do Código de Processo Penal ("Quando a infração
deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou
indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado")

III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local
seguro, quando houver risco de vida;

273
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

IV - Se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus


pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V - Informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços
disponíveis, inclusive os de assistência judiciária para o eventual ajuizamento
perante o juízo competente da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação
de casamento ou de dissolução de união estável. (Redação dada pela Lei nº 13.894,
de 2019);
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito
o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os
seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo
Penal:
I - Ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a
termo, se apresentada;
II - Colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas
circunstâncias;
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz
com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;
IV - Determinar que se proceda
45119 ao exame de corpo de delito da ofendida e
requisitar outros exames periciais necessários;
V - Ouvir o agressor e as testemunhas;
VI - Ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de
antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro
de outras ocorrências policiais contra ele;
VI-A - verificar se o agressor possui registro de porte ou posse de arma de fogo e,
na hipótese de existência, juntar aos autos essa informação,
45119 bem como notificar

a ocorrência à instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão


do porte, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 (Estatuto do
Desarmamento); (Incluído pela Lei nº13.880, de 2019);
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério
Público.
§ 1º O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá
conter:
I - Qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida;
IV - Informação sobre a condição de a ofendida ser pessoa com deficiência e se da
violência sofrida resultou deficiência ou agravamento de deficiência
preexistente. (Incluído pela Lei nº 13.836, de 2019);
274
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

§ 2º A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1º o boletim


de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.
§ 3º Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos
fornecidos por hospitais e postos de saúde.

Aqui é importante ficar atento, pois se trata de dispositivo diretamente voltado à autoridade policial,
em especial para o dever de remessa dos autos para o magistrado no prazo de 48 horas, bem como para a
inovação legislativa que orienta a verificação do registro de posse ou porte de arma de fogo por parte do
agressor.
Note que a autoridade policial não tem legitimidade para aplicar diretamente a medida protetiva ou
representar por ela. O delegado apenas encaminha ao juiz, em 48 horas, quando há pedido da ofendida!
Não há que se falar em representação pelos procedimentos legais.
O inciso VI determina que a autoridade policial deve fazer juntar aos autos do procedimento
investigatório a folha de antecedentes criminais do agressor, indicando a existência de mandado de prisão
ou registro de outras ocorrências policiais contra ele. Nessa toada, é igualmente importante que o delegado
verifique se há, no banco de dados criado pela Lei n. 13.829/19 (que inseriu o art. 38-A na Lei), eventual
registro de medida protetiva de urgência anteriormente determinada em detrimento do agressor.
45119

Art. 38-A. O juiz competente providenciará o registro da medida protetiva de


urgência. Parágrafo único. As medidas protetivas de urgência serão registradas em
banco de dados mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça,
garantido o acesso do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos órgãos de
segurança pública e da assistência social, com vistas à fiscalização e à efetividade
das medidas protetivas".

ATENÇÃO: CONFORME ESTABELECE A LEI Nº 14.310/2022


Parágrafo único. As medidas protetivas de urgência serão, após sua concessão,
imediatamente registradas em banco de dados mantido e regulamentado pelo
Conselho Nacional de Justiça, garantido o acesso instantâneo do Ministério Público,
da Defensoria Pública e dos órgãos de segurança pública e de assistência social,
com vistas à fiscalização e à efetividade das medidas protetivas. (Redação dada Lei
nº 14.310, de 2022)

A consulta em questão é de fundamental importância, não apenas para fins de verificação de


eventual tipificação do crime do art. 24-A
45119 (descumprimento das medidas protetivas), mas também no sentido

de evidenciar a necessidade de representação ao juiz pleiteando a decretação da prisão preventiva do


agressor (Lei n. 11.340/06, art. 20).

275
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

De forma semelhante com o que ocorre na Lei 9.099/95, há possibilidade de utilização de laudos e
boletins de atendimentos médicos fornecidos fora do Instituto Médico Legal. Essa possibilidade consiste em
uma espécie de mitigação da obrigatoriedade do exame de corpo de delito, porquanto laudos ou
prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde poderiam ser utilizados para embasar a
denúncia e, até mesmo, eventual condenação. Nas palavras de Renato Brasileiro:

“Ora, se a própria Lei Maria da Penha faz referência a tais documentos como
verdadeiros meios de prova, ou seja, a um instrumento por meio do qual as fontes
de prova são introduzidas no processo, é evidente que, nos mesmos moldes do que
ocorre no âmbito dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº 9.099/95, art. 77, § 1 °),
os laudos ou prontuários médicos também podem ser utilizados na sentença
condenatória para a formação do convencimento do juiz acerca da materialidade
de uma violência doméstica e familiar contra a mulher, e não apenas para fins de
oferecimento da peça acusatória ou decretação de medidas cautelares.”

Atenção à jurisprudência:

O exame de corpo de delito45119


poderá, em determinadas situações, ser dispensado
para a configuração de lesão corporal ocorrida em âmbito doméstico, na hipótese
45119
de subsistirem outras provas idôneas da materialidade do crime. STJ. AgRg no
AREsp 2.078.054-DF, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por
unanimidade, julgado em 23/5/2023, DJe 30/5/2023. (Info 777, STJ)

Outra inovação ocorreu no §1º, inciso IV. A Lei 13.836/2019 estabeleceu que uma das providências
do Delegado de Polícia é informar à autoridade judicial caso a mulher vítima da violência seja pessoa com
deficiência.
Por questões didáticas, analisaremos o art. 12-C juntamente com
o estudo acerca das medidas protetivas de urgência, no tópico
abaixo

13. MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

13.1. Considerações Iniciais:

Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo
de 48 (quarenta e oito) horas:
I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de
urgência;
276
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SEMANA 01/12

II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária,


quando for o caso, inclusive para o ajuizamento da ação de separação judicial, de
divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável perante o
juízo competente; (Redação dada pela Lei nº 13.894, de 2019)
III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.
IV - determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor.
(Incluído pela Lei nº 13.880, de 2019).

Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a
requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
§ 1º As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato,
independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério
Público, devendo este ser prontamente comunicado.
§ 2º As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou
cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de
maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou
violados.
§ 3º Poderá o juiz, a requerimento
45119 do Ministério Público ou a pedido da ofendida,
conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se
entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu
patrimônio, ouvido o Ministério Público.
⮚ Lei 14.550/2023:
§ 4º As medidas protetivas de urgência serão concedidas em juízo de cognição
sumária a partir do depoimento da ofendida perante a autoridade policial ou da
45119
apresentação de suas alegações escritas e poderão ser indeferidas no caso de
avaliação pela autoridade de inexistência de risco à integridade física, psicológica,
sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes.
§ 5º As medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da
tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência
de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência.
§ 6º As medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à
integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus
dependentes.” (NR)

a) Conceito e Natureza jurídica


Prevalecia, na doutrina e jurisprudência, que as medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria
da Penha detinham natureza jurídica de MEDIDA CAUTELAR.
De acordo com o STJ:
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SEMANA 01/12

As medidas de urgência, protetivas da mulher, do patrimônio e da relação familiar,


somente podem ser entendidas por seu caráter de cautelaridade - vigentes de
imediato, mas apenas enquanto necessárias ao processo e a seus fins". AgRg no
REsp 1.769.759/SP, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em
07/05/2019, DJe de 14/05/2019.
45119

As medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do art. 22 da Lei


Maria da Penha têm natureza de cautelares penais, não cabendo falar em citação
do requerido para apresentar contestação, tampouco a possibilidade de
decretação da revelia, nos moldes da lei processual civil. REsp 2.009.402-GO, Rel.
Min. Ribeiro Dantas, Rel. Acd. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por maioria,
julgado em 08/11/2022, Info 756.

Entendia o STJ que deveria ser aplicado às medidas protetivas de urgência o regramento previsto
pelo Código de Processo Penal no que tange às medidas cautelares. Dessa forma, não caberia falar em
instauração de processo próprio, com citação do requerido, tampouco com a possibilidade de decretação de
sua revelia em caso de não apresentação de contestação
45119 no prazo de cinco dias.

Contudo, em reação legislativa, a partir da Lei 14.550/2023, que alterou a lei Maria da Penha, as
medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do
ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de
ocorrência. Isso significa que, visando uma maior proteção à vítima, ou seja, desvinculando a aplicação das
medidas protetivas de qualquer procedimento ou ação penal, A LEGISLAÇÃO DEFINE A NATUREZA
AUTÔNOMA das medidas protetivas.
No entanto, O ENTENDIMENTO MAIS RECENTE DA SEXTA TURMA DO STJ passou a afirmar que a
natureza jurídica das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha é de tutela inibitória
e não cautelar, inexistindo prazo geral para que ocorra a reavaliação de tais medidas, sendo necessário que,
para sua eventual revogação ou modificação, o Juízo se certifique, mediante contraditório, de que houve
alteração do contexto fático e jurídico (STJ. REsp 2.036.072-MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma,
julgado em 22/8/2023, DJe 30/8/2023, Info 789).

Portanto, as medidas protetivas ostentam natureza de tutela inibitória, são autônomas, ou seja, não
dependem de um processo principal, possuindo, desse modo, conteúdo satisfativo.
A tutela inibitória tem a definitividade como característica. Além disso, decorre de cognição judicial
exauriente, a partir da análise das circunstâncias fáticas e das provas produzidas mediante a instauração de
processo de conhecimento.

Esquematizando a decisão, tem-se o seguinte:


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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

1. As medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha buscam preservar a integridade
física e psíquica da vítima, prescindindo, assim, da existência de ação judicial ou inquérito policial.
2. As medidas protetivas têm validade enquanto perdurar a situação de perigo. A decisão judicial que
as impõe submete-se à cláusula rebus sic stantibus, ou seja, para sua eventual revogação ou
modificação, mister se faz que o Juízo se certifique de que houve a alteração do contexto fático e
jurídico.
3. Torna-se imperiosa a instauração do contraditório antes de se decidir pela manutenção ou revogação
do referido instrumento protetivo, em obediência ao princípio do contraditório (art. 5.º, inciso LV,
da Constituição da República).
4. Não pode ser admitida a fixação de um prazo determinado para a vigência das medidas aplicadas
(revogação automática), sem qualquer averiguação acerca da manutenção daquela situação de risco
que justificou a imposição das medidas protetivas, expondo a mulher a novos ataques.
5. A fim de evitar a inadequada perenização das medidas, nada impede que o juiz, caso entenda
prudente, revise periodicamente a necessidade de manutenção das medidas protetivas impostas,
garantida, sempre, a prévia manifestação das partes.
6. É descabida, no entanto, a fixação de um prazo geral para que essa reavaliação das medidas ocorra,
devendo ser afastada a analogia com o prazo de
4511990 dias para revisão das prisões preventivas.

#DICA DD: de acordo com o STJ, “é necessária a oitiva da mulher vítima de violência doméstica para a
revogação da medida protetiva de urgência anteriormente concedida”. STJ, REsp 1775341, julgado em
12/04/2023 (Informativo 770).

b) Autonomia das medidas protetivas:

A partir da Lei 14.550/2023, que alterou a lei Maria da Penha, as medidas protetivas de urgência
serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou
cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência.
✓ da tipificação penal da violência;
✓ do ajuizamento de ação penal ou cível;
✓ da existência de inquérito policial;
✓ de registro de boletim de ocorrência.
45119

Isso significa que, visando uma maior proteção à vítima, ou seja, desvinculando a aplicação das
medidas protetivas de qualquer procedimento ou ação penal, a legislação define a natureza autônoma das
medidas protetivas. Neste sentido, o STJ tem posicionamento publicado na edição n° 205 da Jurisprudência
em Teses com a seguinte redação:

279
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

“As medidas protetivas impostas pela prática de violência doméstica e familiar


contra a mulher possuem natureza satisfativa, motivo pelo qual podem ser
pleiteadas de forma autônoma, independentemente
45119
da existência de outras ações
judiciais”.

Conforme a Lei n. 14.550/2023, a proteção continuará válida enquanto permanecerem os riscos à


vítima ou aos seus dependentes justamente pela natureza autônoma. Ademais, as medidas protetivas de
urgência serão concedidas quando houver riscos à:
✔ integridade física;
✔ psicológica, sexual;
✔ patrimonial;
✔ moral da vítima ou de seus dependentes.

De encontro ao que prevê a Lei 14.550/2023, conforme visto acima, as medidas protetivas possuem
natureza de tutela inibitória, não dependem de um processo principal (são autônomas) e possuem conteúdo
satisfativo. Diante disso, ainda que ausente inquérito policial ou processo penal em curso, é possível a
concessão, manutenção ou revogação das medidas protetivas de urgência. Neste sentido, o STJ tem
45119
posicionamento publicado na edição n° 205 da Jurisprudência em Teses com a seguinte redação:

“As medidas protetivas impostas pela prática de violência doméstica e familiar


contra a mulher possuem natureza satisfativa, motivo pelo qual podem ser
pleiteadas de forma autônoma, independentemente da existência de outras ações
judiciais”.

As medidas protetivas de urgência poderão ser INDEFERIDAS no caso de avaliação pela autoridade
de inexistência de risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de
seus dependentes!

A mudança na legislação também garante que a Lei Maria da Penha seja aplicada em todos os casos
de violência doméstica e familiar “independentemente da causa ou da motivação” e da condição do agressor
ou da vítima.

c) Possibilidade de aplicação de mais de uma medida protetiva concomitantemente:


As medidas protetivas de urgência poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. Ex:
determinação para que o agressor se afaste do lar (inciso II do art. 22) e não se aproxime da vítima (inciso III
do mesmo artigo).

280
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Além disso, as medidas protetivas de urgência poderão ser aplicadas em conjunto com as medidas
cautelares do CPP. Ex: determinação para que o agressor se afaste do lar (inciso II do art. 22 da LMP) e que
compareça periodicamente em juízo (inciso I do art. 319 do CPP).

d) Atenção para as seguintes modificações legislativas:


▪ Inciso II - Encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária:
⦁ Uma dessas medidas protetivas de urgência que a vítima poderá pedir é justamente a
assistência judiciária (art. 18, II, da Lei nº 11.340/2006).
⦁ A Lei nº 13.894/2019 alterou esse inciso II do art. 18 para deixar claro que essa assistência
judiciária abrange o direito de ajuizar ações de separação judicial, de divórcio, de anulação
de casamento ou de dissolução de união estável.

▪ Inciso IV – Apreensão imediata da arma de fogo em posse do agressor


⦁ Lei nº 13.880/2019 inseriu o inciso IV ao artigo 18, estabelecendo que o juiz, ao receber os
autos pela autoridade policial, constatando que o suposto agressor possui registro de porte
ou posse de arma de fogo, deverá determinar, como medida cautelar, a apreensão desta
arma.
45119

13.2. Legitimidade para conceder as medidas protetivas de urgência:

As medidas protetivas de urgência, em regra, são concedidas pela autoridade judicial (Juiz ou
Desembargador), após requerimento do Ministério Público ou da ofendida – cujo pedido é formulado
perante a autoridade policial.
Note, portanto, que as medidas protetivas de urgências não podem ser objeto de representação
pela autoridade policial. Como vimos na análise do art. 12, §1º, o que o delegado de polícia pode fazer é
apenas tomar a termo a declaração da ofendida pela concessão das medidas protetivas, ou seja, somente
pode transcrever esse pedido e encaminhá-lo ao Poder Judiciário.
Ressalta-se que, até a edição
45119 da Lei nº 13.827/2019, a regra que exigia cláusula de reserva de
jurisdição não possuía exceções. A referida Lei, no entanto, inovou e trouxe uma hipótese em que uma das
medidas protetivas de urgência poderia ser concedida pelo Delegado de polícia, ou até mesmo pelo policial,
em determinadas situações.
O art. 12-C, inserido pela Lei nº 13.827/2019 e posteriormente atualizado pela Lei 14.188/2021,
permite que a medida protetiva de AFASTAMENTO DO LAR seja concedida pelo Delegado de Polícia, se o
Município não for sede de comarca ou até mesmo pelo policial, caso também não haja Delegado de Polícia
no momento, devendo o juiz ser comunicado no prazo máximo de 24 horas.

💣 Cuidado para não confundir com o prazo de 48 horas previsto no art. 12, III e
art. 18!
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Art. 12-C. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade


física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou
de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou
local de convivência com a ofendida: (Redação dada pela Lei nº 14.188, de 2021)
I - Pela autoridade judicial;
II - Pelo delegado de polícia, quando ou Município não for sede de comarca; ou
III - Pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver
delegado disponível no momento da denúncia. (Incluído pela Lei nº 13.827, de
2019)
45119
§ 1º Nas hipóteses dos incisos II e III do caput deste artigo, o juiz será comunicado
no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas e decidirá, em igual prazo, sobre a
manutenção ou a revogação da medida aplicada, devendo dar ciência ao Ministério
Público concomitantemente. (Incluído pela Lei nº 13.827, de 2019).
§ 2º Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida
protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso. (Incluído
pela Lei nº 13.827, de 2019).

Explicação via dizer o direito: 45119

Verificada a existência de...


∘ Risco atual ou iminente à vida ou à integridade física ou psicológica da mulher em situação
de violência doméstica e familiar,
∘ Ou de seus dependentes,
∘ O agressor deverá ser imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com
a ofendida.

Quem determina esse afastamento?


∘ 1º) em primeiro lugar, a autoridade judicial.
∘ 2º) se o Município não for sede de comarca: o Delegado de Polícia poderá determinar essa
medida.
∘ 3º) se o Município não for sede de comarca e não houver Delegado disponível no momento:
o próprio policial (civil ou militar) poderá ordenar o afastamento.

Se a medida for concedida por Delegado ou por policial (situações 2 e 3), o Juiz será comunicado no
prazo máximo de 24 horas e decidirá, em igual prazo, sobre a manutenção ou a revogação da medida
aplicada, devendo dar ciência ao Ministério Público concomitantemente!
O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou válida a alteração promovida pela Lei nº 13.827/19,
que passou a permitir que, em casos excepcionais, a autoridade policial afaste o suposto agressor do
domicílio ou do lugar de convivência quando for verificado risco à vida ou à integridade da mulher, mesmo
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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

sem autorização judicial prévia. A decisão foi proferida no bojo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
6138: STF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Julgado em 23/03/2022.

CONCLUSÃO: Em regra, as medidas protetivas de urgência somente podem ser concedidas pela
autoridade judiciária, por se tratar de medida submetida à cláusula de reserva de jurisdição, após o
requerimento do MP ou da ofendida. No entanto, em havendo risco à vida ou integridade física ou
psicológica da ofendida ou de seus dependentes, poderá o Delegado de Polícia ou o próprio policial
determinarem o AFASTAMENTO IMEDIATO DO LAR, nas hipóteses previstas em lei!

PEGADINHA DE PROVA:
* REGRA: O delegado tem 48 horas para enviar a representação da vítima ao juiz (art. 12, III), e o juiz
também possui 48 horas para tomar as devidas providências (art. 18, caput)
* EXCEÇÃO: Em caso de medida protetiva de afastamento do lar concedida pelo Delegado de Polícia ou
pelo Policial, nas hipóteses previstas em lei, a comunicação ao juiz deve ser feita em 24 horas, tendo este
o mesmo prazo de 24 horas para decidir sobre ela. (Art. 12-C, §1º).

As medidas protetivas podem ser concedidas de ofício pelo juiz?



45119
1ª C – NÃO! Em observância ao Sistema Acusatório, que inclusive foi reforçado com o advento do
Pacote Anticrime, não pode o juiz, de ofício, decretar as medidas protetivas de urgência, sendo
necessário prévio requerimento das partes.

⮚ Obs.: há quem defenda que, nas hipóteses de afastamento imediato do lar (art. 12-C, inc.
I) ou decretação da prisão preventiva, o juiz poderia agir de ofício, tendo em vista que há
autorização expressa na Lei nesse sentido, devendo-se invocar, para tanto, o princípio da
especialidade. (Tema extremamente controverso que será analisado adiante)

● 2ª C – SIM! Apesar de o dispositivo não prever expressamente, seria possível que as medidas
protetivas fossem concedidas pelo Juiz de ofício. Isso porque o juiz, ao conceder medidas protetivas
de urgência de ofício, não estaria promovendo a persecução penal contra o acusado, mas apenas
tomando medidas que visam a beneficiar a vítima de violência doméstica. Inclusive, o próprio
parágrafo primeiro determina que as medidas devem ser concedidas de imediato,
independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, confirmando
a possibilidade de o Juiz poder concedê-las de ofício.
45119

CUIDADO! Embora o art. 19, §1º autorize o juiz a apreciar as medidas protetivas sem a prévia oitiva do MP,
o mesmo não ocorre nas hipóteses de alteração ou reforço das medidas já concedidas, em que se exigirá a
prévia oitiva do MP, à luz do art. 19, §3º.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

CONCESSÃO DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE CONCESSÃO DE NOVAS MEDIDAS PROTETIVAS OU


URGÊNCIA REVISÃO
Art. 19, §1º Art. 19, §3º
Dispensam prévia oitiva do MP Exigem prévia oitiva do MP

§ 1º - As medidas protetivas de urgência poderão ser § 3º - Poderá o juiz, a requerimento do Ministério


concedidas de imediato, independentemente de Público ou a pedido da ofendida, conceder novas
audiência das partes e de manifestação do medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já
Ministério Público, devendo este ser prontamente concedidas, se entender necessário à proteção da
comunicado ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio,
ouvido o Ministério Público.

Atenção à jurisprudência:

45119

O juízo do domicílio da vítima em situação de violência doméstica é competente


para processar e julgar o pedido de medidas protetivas de urgência,
independentemente de as supostas
45119 condutas criminosas que motivaram o pedido
terem ocorrido enquanto o autor e a vítima encontravam-se em viagem fora do
domicílio desta. STJ. 3ª Seção. CC 190.666-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em
8/2/2023. (Info 764)

13.3. Das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos
termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou
separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão
competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite
mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de
comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida;

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12 45119

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe


de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
VI – comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação;
e (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)
VII – acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento
individual e/ou em grupo de apoio. (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

Atenção à jurisprudência:

É ilegal a fixação ad eternum de medida protetiva, devendo o magistrado avaliar


periodicamente a pertinência da manutenção da cautela imposta. HC 605.113-SC,
Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em
08/11/2022. O Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento segundo o qual
"as medidas de urgência, protetivas da mulher, do patrimônio e da relação familiar,
somente podem ser entendidas por seu caráter de cautelaridade - vigentes de
imediato, mas apenas enquanto necessárias ao processo e a seus fins" (AgRg no
REsp 1.769.759/SP, relator45119Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe de
14/05/2019).
Desse modo, levando em conta a impossibilidade de duração ad eternum da
medida protetiva imposta - o que não se confunde com a indeterminação do prazo
da providência -, bem como a necessidade de que a proteção à vítima perdure
enquanto persistir o risco que se visa coibir, aplica-se, por analogia, o disposto no
art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal, devendo o magistrado
singular examinar, periodicamente, a pertinência da preservação da cautela
imposta, não sem antes ouvir as partes.

Além disso, sobre a duração da medida protetiva, vale destacar a jurisprudência do STJ (informativo
770, de 18/04/2023):
Independentemente da extinção de punibilidade do autor, a vítima de violência
doméstica deve ser ouvida para que se verifique a necessidade de
prorrogação/concessão das medidas protetivas. (...) Assim, antes do
encerramento da cautelar protetiva, a defesa deve ser ouvida, notadamente para
que a situação fática seja devidamente apresentada ao Juízo competente, que,
diante da relevância da palavra da vítima, verifique a necessidade de
prorrogação/concessão das medidas, independentemente da extinção de
punibilidade do autor. STJ. REsp 1.775.341-SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior,
Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 12/4/2023, DJe 14/04/2023.
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Decisão que fixa alimentos em razão da prática de violência doméstica pode ser
executada sob o rito da prisão civil. A decisão proferida em processo penal que fixa
alimentos provisórios ou provisionais em favor da companheira e da filha, em razão
da prática de violência doméstica, constitui título hábil para imediata cobrança e,
em caso de inadimplemento, passível de decretação de prisão civil. STJ. 3ª Turma.
RHC 100446-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/11/2018 (Info
640).

A Lei 13.984/2020 acrescentou duas45119


novas medidas protetivas de urgência a serem cumpridas pelo
agressor (frequentar centro de educação e de reabilitação e ter acompanhamento psicossocial). Isso é
possível porque o rol das medidas protetivas previsto na Lei Maria da Penha é meramente exemplificativo,
podendo ser concedidas outras providências que não estejam ali elencadas.
Ressalta-se que, mesmo antes da Lei nº 13.984/2020, tais medidas já poderiam ser determinadas.
Trata-se daquilo que a doutrina denominou de princípio da atipicidade das medidas protetivas de urgência
(LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada. 4ª ed., Salvador: Juspodivm, 2016, p.
931).
45119

13.4. Das Medidas Protetivas De Urgência À Ofendida

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário
de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo
domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos
relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
V - determinar a matrícula dos dependentes da ofendida em instituição de
educação básica mais próxima do seu domicílio, ou a transferência deles para essa
instituição, independentemente da existência de vaga. (Incluído pela Lei nº
13.882, de 2019)
VI – conceder à ofendida auxílio-aluguel, com valor fixado em função de sua
situação de vulnerabilidade social e econômica, por período não superior a 6
(seis) meses. (Incluído pela Lei nº 14.674, de 2023)

A Lei 13.882/2019 garante a matrícula dos dependentes da mulher vítima de violência doméstica e
familiar em instituição de educação básica mais próxima de seu domicílio. Mesmo se não houver vaga na
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escola próxima, ainda assim, o dependente da vítima terá direito de ser matriculado como um excedente, ou
seja, mesmo fora do número de vagas (já explicado acima).
Sobre a concessão do auxílio-aluguel, importa destacar que a medida foi inserida pela Lei
14.674/2023, sendo pertinente destacar que as despesas com o pagamento do auxílio-aluguel poderão ser
custeadas com recursos oriundos de dotações
45119 orçamentárias do Sistema Único de Assistência Social a serem

consignados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios para os benefícios eventuais da
assistência social.

Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles
de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as
seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e
locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos
materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a
ofendida. 45119

13.5. Vias impugnativas

a) Indeferimento ou revogação de medida já imposta: RESE, através de interpretação ontológica e


evolutiva do art. 581, V do CPP, posto que são medidas constritivas da liberdade.
b) Deferimento: Habeas corpus ao Tribunal de Justiça, câmara criminal. Além de ser uma restrição
libertária, há risco ao direito ambulatorial na medida em que eventual descumprimento da Medida
protetiva de urgência posta pode acarretar a decretação da prisão preventiva ou a detenção
cominada pelo art. 24-A.

Cabe habeas corpus para apurar eventual ilegalidade na fixação de medida


protetiva de urgência consistente na proibição de aproximar-se de vítima de
violência doméstica e familiar. STJ. 5ª Turma. HC 298499-AL, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 1º/12/2015 (Info 574).

13.6. Descumprimento das medidas protetivas de urgência

Quais as consequências caso o indivíduo descumpra a decisão judicial que impôs a medida
protetiva de urgência?
● É possível a execução da multa imposta;
287
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

● É possível a decretação de sua prisão preventiva (art. 313, III, do CPP) – caso presentes também os
indícios do art. 312, CPP (analisaremos adiante)
● O agente responderá pelo crime do art. 24-A da Lei nº 11.340/2006:

Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência
previstas nesta Lei:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos
§ 1º A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz
que deferiu as medidas.
§ 2º Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá
conceder fiança.
§ 3º O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis.

A conduta de descumprir medida protetiva de urgência


prevista na Lei Maria da Penha configura crime?
Antes da Lei nº 13.641/2018: NÃO Depois da Lei nº 13.641/2018 (atualmente): SIM
Antes da alteração, o STJ entendia que o Foi inserido novo tipo penal na Lei Maria da Penha
45119
descumprimento de medida protetiva de urgência prevendo como crime essa conduta:
prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere
11.340/2006) não configurava infração penal. medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:
O agente não respondia nem mesmo por crime de Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.
45119
desobediência (art. 330 do CP).

O art. 24-A, inserido pela Lei 13.641/2018, é o único delito tipificado na Lei nº 11.340/2006.
Em verdade, trata-se de um delito de desobediência, em que o agressor, ao descumprir a medida
restritiva imposta pelo juízo a título de medida protetiva, está violando a administração da justiça por conta
de seu desprezo à decisão judicial. Portanto, é sujeito ativo do delito, o agressor destinatário da medida. Já
o sujeito passivo é a administração da justiça e, secundariamente, a vítima.

a) Sujeito ativo: Comete este delito a pessoa que descumpre a medida protetiva de urgência imposta
com base na Lei Maria da Penha.
● Homem ou mulher: aqui cabe uma interessante observação: ao contrário do que muitos
imaginam, o autor da violência doméstica não precisa ser necessariamente um homem. Assim,
existem casos de violência doméstica praticados por mulheres. Ex: filha contra mãe (STJ HC
277.561/AL). A exigência é de que a vítima seja mulher, mas o agressor pode ser homem ou
mulher. Isso significa que o sujeito ativo do crime do art. 24-A da Lei Maria da Penha pode ser
homem ou mulher. É o caso, por exemplo, da nora que agride a sogra. Se o juiz impuser que a

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nora não se aproxime da sogra e a nora descumprir essa ordem, responderá prelo crime do
art. 24-A.
● Partícipes: o indivíduo poderá responder por este delito, na qualidade de partícipe, mesmo
sem ser o autor da violência doméstica. Ex.: o juiz determina que João mantenha distância
mínima de 500 metros de Maria (sua ex-esposa) e não tente nenhum contato com ela por
qualquer meio de comunicação (art. 22, III, “a” e “b”). O irmão de João, mesmo sabendo dessa
proibição, envia para Maria, pelo seu número do whatsapp, um áudio do agressor no qual ele
tenta a reconciliação com a vítima.

b) Sujeito passivo: o sujeito passivo é o Estado. Em relação à vítima mediata ou secundária, há


divergência: uns defendem que a vítima secundária é a mulher vítima da violência doméstica,
enquanto outros entendem que é o juiz que expediu a ordem.

c) Tipo objetivo:

● Descumprir: consiste em desobedecer, ou seja, não atender, não cumprir a decisão judicial.
● Ação ou omissão: vale ressaltar que esse crime poderá ser praticado mediante conduta
comissiva (ex.: aproximar-se da vítima mesmo
45119
havendo uma proibição) ou omissiva (ex: não
pagar os alimentos provisórios fixados pelo juiz como medida protetiva).
● Decisão judicial: deve-se entender em sentido amplo, abrangendo tanto decisões
interlocutórias como eventualmente uma sentença ou acórdão no qual seja fixada a medida
45119

protetiva. A decisão pode ser de 1ª instância ou de Tribunal (colegiada ou monocrática). Obs.:


O fato de a medida em questão ter sido decretada por um juízo cível não afasta a tipificação
do delito do delito. É nesse sentido, aliás, o teor do art. 24-A, §1º, da LMP.
● Medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha: as medidas protetivas de
urgência estão previstas nos arts. 22 a 24 da Lei nº 11.340/2006.Esse rol é exemplificativo e o
juiz poderá aplicar outras medidas não expressamente listadas na Lei Maria da Penha. Vale
ressaltar, no entanto, que o crime do art. 24-A somente se verifica se o agente descumprir uma
medida protetiva prevista na Lei nº 11.340/2006. Se o sujeito descumprir medida protetiva
atípica, ou seja, não prevista expressamente na Lei Maria da Penha, não haverá o crime do art.
24-A.
● Reserva de jurisdição: importante esclarecer que apenas o juiz (ou Tribunal) pode impor as
medidas protetivas de urgência. A autoridade policial ou o membro do Ministério Público não
gozam dessa possibilidade.
● Desobediência: o art. 24-A é um tipo especial de desobediência (art. 330 do CP).

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Obs.1: Não se exige violência ou grave ameaça: o crime do art. 24-A pode se consumar mesmo que
o sujeito ativo não tenha agido com violência ou grave ameaça. Ex.: o juiz determinou que João, acusado de
violência doméstica, não se aproxime menos que 500m da ex-mulher. O autor do fato, arrependido, procura
a vítima chorando e com um buquê de rosas. Ele terá cometido o crime do art. 24-A. Se houver violência ou
grave ameaça, o agente poderá responder pelo delito do art. 24-A em concurso com outros delitos. Ex.: se o
agente, que estava proibido de se aproximar da ex-mulher, procura-a e a ameaça de morte, ele responderá
pelo delito do art. 24-A da Lei nº 11.340/2006 em concurso com o art. 147 do Código Penal.

Muita ATENÇÃO! De acordo com o STJ (Info 785), a aproximação do réu com o consentimento da
vítima torna atípica a conduta de descumprir medida protetiva de urgência.

Obs.2: Inexigibilidade de conduta diversa: uma das medidas protetivas de urgência previstas na Lei
é a “prestação de alimentos provisionais ou provisórios” à mulher (art. 22, V). Se o agente não cumpre essa
medida em virtude de impossibilidade econômica, não poderá ser punido pelo crime do art. 24-A,
considerando que se trata de hipótese de inexigibilidade de conduta diversa, que consiste em causa
excludente de culpabilidade.

d) Tipo subjetivo: o crime é punido a título de dolo.


45119

O dolo, no caso, consiste na vontade livre e consciente de descumprir decisão judicial que defere
medida protetiva de urgência baseada na Lei Maria da Penha. Obviamente, para que haja o crime, é
indispensável que o agente saiba da existência da decisão judicial deferindo a medida protetiva.
Não há crime se o sujeito age com culpa. Ex: vai a uma festa de aniversário de amigos em comum e
ali encontra a ex-mulher sendo que havia uma ordem de não aproximação.

e) Consumação e tentativa: a medida protetiva pode consistir em uma ordem para que o agente faça
alguma coisa ou para que não faça (não adote determinado comportamento).
Desse modo, o crime se consuma no momento em que o agente faz45119
a conduta proibida na decisão
judicial (ex.: entra em contato com a ex-mulher, mesmo isso tendo sido proibido) ou, então, no instante em
que termina o prazo que havia sido fixado para que o sujeito adotasse determinado comportamento (ex: juiz
fixou o prazo de 24h para que o agressor deixasse a casa; após isso, sem cumprimento, o crime já terá se
consumado).
A tentativa, em tese, é possível na modalidade comissiva. Ex: o ex-marido, mesmo estando proibido
de entrar em contato com a ex-mulher, envia-lhe uma carta, que é interceptada pela sogra.

f) Considerações gerais sobre o crime do art. 24-A:

✔ Trata-se de crime próprio, pois exige característica especial do agente.

290
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✔ Formal, pois se consuma independentemente da existência de um resultado material bastando


a conduta de desrespeitar a medida protetiva.
✔ Doloso, pois não está presente a tipicidade específica exigida pelos crimes culposos.
✔ Instantâneo, pois se aperfeiçoa de imediato.
✔ Plurissubsistente, pois sua conduta é fracionável, admitindo-se a tentativa
✔ Ação penal: A ação penal é pública incondicionada.

Observações importantes:
● § 1º: A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as
medidas: as medidas protetivas de urgência da Lei nº 11.340/2006 não são exclusivas do processo
penal. Isso significa que podem ser aplicadas em processos cíveis, independentemente da existência
de inquérito policial ou processo criminal contra o suposto agressor.

● § 2º Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança: a Lei
nº 13.641/2018, ao incluir esse § 2º, criou uma exceção à regra do art. 322 do CPP. Isso porque o §
2º proíbe que o Delegado de Polícia conceda fiança para o crime do art. 24-A, a despeito desse delito
ter pena máxima de 2 anos.
45119 45119

CUIDADO! Veda-se a concessão de fiança pela autoridade policial somente no delito do art. 24-A! Caso seja
praticado outro delito, com pena máxima de 4 anos, ainda que no âmbito da Lei Maria da Penha, será
possível a concessão da fiança, nos moldes do art. 322 do CPP! Em outras palavras: o mero fato de o crime
ter sido praticado no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher, por si só, não afasta a
concessão da fiança!
O autor Renato Brasileiro explica:
“(...) Se o art. 322 do CPP dispõe que a autoridade policial poderá conceder fiança às infrações penais cuja
pena máxima não seja superior a 4 (quatro) anos, não se pode estabelecer qualquer outro requisito para a
concessão do referido benefício, sob pena de indevida violação ao princípio da legalidade. De mais a mais, o
simples fato de um crime estar sujeito à decretação da prisão preventiva não é óbice à concessão da fiança
pela autoridade policial.”

● § 3º O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis: descumprimento de
medida protetiva pode ensejar a execução da multa eventualmente imposta e a decretação da prisão
preventiva do autor. O que este § 3º explicita é que tais consequências continuam acontecendo
mesmo agora com a existência de um tipo penal específico para essa conduta.

● Lei nº 9.099/95 para o crime do art. 24-A da Lei Maria da Penha

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A pena máxima do art. 24-A não ultrapassa dois anos, razão pela qual parte da doutrina entende que
se trata de infração de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei nº 9.099/95) 6. Diante disso, indaga-se a
possibilidade da transação penal, da suspensão condicional do processo e dos demais benefícios da Lei nº
9.099/95 para o autor do crime do art. 24-A da Lei 45119
nº 11.340/2006.
A jurisprudência é extremamente refratária à aplicação de qualquer medida despenalizadora em se
tratando de delitos que envolvam violência doméstica. Nesse sentido, a título de exemplo, as súmulas 536,
542 e 588, todas do STJ:

Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se


aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.

NÃO CONFUNDA: Em se tratando de crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher
NÃO SE APLICA A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO, ENTRETANTO É POSSÍVEL A CONCESSÃO DA
SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (Código Penal).

14. PRISÃO PREVENTIVA

Art. 20. Em qualquer fase do45119


inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a
prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do
Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.

A prisão preventiva na Lei Maria da Penha é um tema bastante controvertido na doutrina. Isso porque
a Lei prevê a possibilidade de decretação da cautelar, pelo juiz, de ofício, em qualquer fase da persecução
penal, o que, para a doutrina amplamente majoritária, violaria do Sistema Acusatório. Na realidade, antes
mesmo do advento do Pacote Anticrime, que veio para reforçar a imparcialidade do juiz, já havia acirrada
discussão sobre o tema.
⦁ Prova objetiva – Verificar se a assertiva contempla a letra da lei ou a jurisprudência do STJ.
Pois na lei admite a possibilidade de o juiz decretar a prisão preventiva de ofício, seja em
fase de inquérito policial ou instrução penal. Já em decisão do STJ, não cabe preventiva de
ofício.

ATENÇÃO! STJ decidiu que NÃO cabe decretação de prisão de ofício nem no rito da Lei Maria da Penha:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS.


OMISSÃO. VÍCIO INEXISTENTE. CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM

6
Renato Brasileiro discorda e afirma que, a despeito de a pena máxima cominada não ser superior a 2 anos, o art. 24-A é crime
comum, de competência do juízo comum, aplicando-se o procedimento comum sumário.

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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

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PREVENTIVA DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2. A prisão preventiva de ofício,


não mais admitida no sistema do CPP, norma processual geral, depois da Lei
13.964/2019, com as alterações promovidas no art. 311, reconduz o sistema mais
ainda aos ditames do princípio acusatório, não podendo conviver com normas de
leis esparsas que ainda a contemplem, como a do art. 20 da Lei 11.340/2006. (STJ
- EDcl no AgRg no HC: 705436 RS 2021/0359211-4, Relator: Ministro OLINDO
MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), Data de
Julgamento: 19/04/2022, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe
22/04/2022)

⦁ Prova discursiva – é imprescindível trazer os dois posicionamentos sobre o tema, no sentido


de que, para uma primeira corrente, é possível a decretação de ofício pelo juiz, em razão do
princípio da especialidade, enquanto para uma segunda corrente, é inviável tal decretação,
sob pena de violar o Sistema Acusatório.

Obs.: Prisão preventiva em razão do descumprimento das medidas protetivas de 45119


urgência

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da
45119

prisão preventiva: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).


III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução
das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

A possibilidade de decretação da prisão preventiva em face do descumprimento injustificado das


medidas protetivas de urgência decretadas decorre da necessidade de emprestar, a estas, força coercitiva.
Se tais medidas não surtirem efeito almejado, a prisão preventiva pode ser decretada como soldado de
reserva, a fim de se evitar a reiteração de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Ressalta-se que não basta o mero descumprimento das medidas protetivas de urgência, sendo
imprescindível, ainda, preencher os requisitos previstos no art. 312, CPP.
ATENÇÃO! Segundo a jurisprudência do STJ, NÃO É POSSÍVEL a decretação de prisão preventiva do
autor de contravenção penal, mesmo que tenha praticado o fato no âmbito de violência doméstica, mesmo
que ele tenha descumprido medida protetiva imposta (STJ. 6ª turma. HC437.535).
O sentido da vedação a cautelar pessoal nesta hipótese é simples: a redação do art. 313, III, do Código
de Processo Penal fala em CRIME, não abarcando a contravenção penal, logo, em respeito ao princípio da
legalidade não há possibilidade de aplicar a prisão preventiva nessa hipótese.

15. RETRATAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO NOS CRIMES PRATICADOS NO CONTEXTO DA LEI 11.340/06

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DELEGADO SANTA CATARINA

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Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de


que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em
audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da
denúncia e ouvido o Ministério Público.

ATENÇÃO!! A interpretação no sentido da obrigatoriedade da audiência prevista


no artigo 16 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), sem que haja pedido de sua
realização pela ofendida, viola o texto constitucional e as disposições
internacionais que o Brasil se obrigou a cumprir, na medida em que discrimina
injustamente a própria vítima de violência. STF.ADI 7.267/DF, relator Ministro
Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 21.8.2023. (Info 1104)
45119

A realização da audiência prevista no art. 16 da Lei n. 11.340/2006 somente se faz


necessária se a vítima houver manifestado, de alguma forma, em momento
anterior ao recebimento da denúncia, ânimo de desistir da representação. A
audiência prevista no art. 16 da Lei n. 11.340/2006 tem por objetivo confirmar a
retratação, não a representação, e não pode ser designada de ofício pelo juiz. Sua
realização somente é necessária
45119 caso haja manifestação do desejo da vítima de se

retratar trazida aos autos antes do recebimento da denúncia. STJ. 5ª turma. AgRg
no REsp 1.946.824-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por
unanimidade, julgado em 14/06/2022, DJe 17/06/2022. (Info 743) e REsp
1.977.547-MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, por
unanimidade, julgado em 8/3/2023. (Info 766 e Tema 1167).

Percebe-se aqui que há uma exceção à regra geral trazida pelo Código de Processo Penal, podendo
haver retratação da representação após oferecimento da denúncia.

CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEI 11.340/06

A retratação poderá ocorrer até o oferecimento da A retratação poderá ocorrer antes do recebimento
denúncia (art. 25) da denúncia (art. 16)

Se a mulher vítima de crime de ação pública condicionada comparecer ao cartório da vara e


manifestar interesse em se retratar da representação, ainda assim o juiz deverá designar audiência para que
ela confirme essa intenção e seja ouvido o MP, nos termos do art. 16.
Não atende ao disposto neste art. 16 a retratação da suposta ofendida ocorrida em cartório de Vara,
sem a designação de audiência específica necessária para a confirmação do ato. Em outras palavras, se a
vítima comparece ao cartório e manifesta interesse em se retratar, ainda assim o juiz deverá designar a

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DELEGADO SANTA CATARINA

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audiência para ouvir a ofendida e o MP, não podendo rejeitar a denúncia sem cumprir esse procedimento.
STJ. 5ª Turma. HC 138143-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Caiu em prova Delegado PC-RN/2021 da banca FGV! Noeli compareceu à delegacia de polícia para registrar
boletim de ocorrência contra seu companheiro Erson pelo crime de ameaça. Após chegar em casa, Noeli ouve
pedido de desculpa de seu companheiro e apelos para que desista da representação. Considerando o
disposto na legislação aplicável, quanto à possibilidade de retratação da representação apresentada, Noeli:
poderá se retratar perante o juiz, em audiência especial, até o recebimento da denúncia.

16. VEDAÇÕES PREVISTAS NA LEI MARIA DA PENHA

16.1 Vedação à pena de cesta básica, prestação pecuniária ou pagamento isolado da multa

Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a
mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a
substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.
45119

Esse dispositivo proíbe que o juiz aplique as 45119


seguintes penas restritivas de direitos à pessoa que
praticou violência doméstica e familiar contra a mulher:
● Pena de "cesta básica";
● Quaisquer espécies de prestação pecuniária (art. 45, §§ 1º e 2º);
● Pagamento isolado de multa (art. 44, § 2º do CP).

Tal vedação se presta a não atribuição de um caráter meramente patrimonial à punição do agressor,
o que de certa forma incentivaria um processo discriminatório em que agressores abastados financeiramente
se eximiriam de sua responsabilidade com o mero pagamento de indenizações e prestações pecuniárias.

A vedação constante do art. 17 da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) obsta


a imposição, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de pena
de multa isoladamente, ainda que prevista de forma autônoma no preceito
secundário do tipo penal imputado. A intenção do legislador ao impedir a
aplicação exclusiva da pena de multa foi a de ampliar a função de prevenção geral
das penas impostas nos casos de crimes cometidos nesse contexto. Dessa forma,
pretende-se demonstrar à sociedade que a prática de agressão contra a mulher
acarreta consequências graves para o autor, que vão além do aspecto financeiro.
STJ. REsp 2.049.327-RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por
unanimidade, julgado em 14/6/2023 (Tema 1189). (Info 779).

295
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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

16.2. Vedação às penas restritivas de direito7

Alguns doutrinadores começaram a sustentar a tese de que o art. 17, ao proibir apenas esses tipos
de penas, teria, a contrario sensu, permitido que fossem aplicadas outras espécies de penas restritivas de
direitos.
Essa interpretação foi aceita pela jurisprudência? É possível a aplicação de penas restritivas de
direito para os crimes cometidos contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico?
R.: NÃO. A jurisprudência entende que não cabe a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos nos crimes cometidos contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente
doméstico. O STJ editou a súmula 588 para espelhar essa sua posição consolidada:

Súmula 588 – A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com


violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da
45119
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. (Dje 18/09/2017)

STF concorda com o teor da súmula 588 do STJ?


R.: Em parte. Em caso de CRIMES praticados45119
contra a mulher com violência ou grave ameaça no
ambiente doméstico: o STF possui o mesmo entendimento do STJ e afirma que não cabe a substituição por
penas restritivas de direitos. Nesse sentido:

Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de


direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em
ambiente doméstico (art. 129, § 9º do CP). A substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos pressupõe, entre outras coisas, que o crime não
tenha sido cometido com violência ou grave ameaça (art. 44, I, do CP). STF. 2ª
Turma. HC 129446/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 20/10/2015 (Info 804).

Por outro lado, em caso de CONTRAVENÇÕES PENAIS praticadas contra a mulher com violência ou
grave ameaça no ambiente doméstico há uma discordância. Ex.: imagine que o marido pratica vias de fato
(art. 21 da Lei de Contravenções Penais) contra a sua esposa; ele poderá ser beneficiado com pena restritiva
de direitos?
● STJ e 1ª Turma do STF: NÃO. Não é possível a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos tanto no caso de crime como contravenção penal praticados contra a
mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico. É o teor da Súmula 588-STJ. A

7
Explicação via Dizer o Direito.

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45119

1ª Turma do STF também comunga do mesmo entendimento: HC 137888/MS, Rel. Min. Rosa
Weber, julgado em 31/10/2017.
● 2ª Turma STF: SIM. Afirma que é possível a conversão da pena privativa de liberdade por
restritiva de direito, nos moldes previstos no art. 17 da Lei Maria da Penha, aos condenados pela
prática de contravenção penal. Isso porque a contravenção penal não está na proibição contida
no inciso I do art. 44 do CP, que fala apenas em crime. Logo, não existe proibição no
ordenamento jurídico para a aplicação de pena restritiva de direitos em caso de contravenções.
Nesse sentido: STF. 2ª Turma. HC 131160, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 18/10/2016.
Relembre o que diz o inciso I do Código Penal:

#DICA DD! Em concursos, se o enunciado não estiver fazendo qualquer distinção, fiquem com a posição
exposta na súmula e que também é adotada pela 1ª Turma do STF.

16.3. Vedação à aplicação do Princípio da Insignificância

Não se aplica o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a
mulher no âmbito das relações domésticas. Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à
expressiva ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade
45119
do comportamento e lesão jurídica causada,
perdem a característica da bagatela e devem submeter-se ao direito penal.
Assim, o STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da insignificância aos crimes e
contravenções praticados com violência ou grave ameaça contra a mulher, no âmbito das relações
domésticas, dada a relevância penal da conduta.

Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de


violência doméstica. Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à
expressiva ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade do comportamento
e lesão jurídica causada, perdem a característica da bagatela e devem submeter-se
ao direito penal. O STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da
insignificância e da bagatela imprópria aos crimes e contravenções praticados com
violência ou grave ameaça contra a mulher, no âmbito das relações domésticas,
dada a relevância penal da conduta. Vale ressaltar que o fato de o casal ter se
reconciliado não significa atipicidade material da conduta ou desnecessidade de
pena. STJ. 5ª Turma. HC 333.195/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em
12/04/2016. STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 318849/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
julgado em 27/10/2015. STF. 2ª Turma. RHC 133043/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia,
julgado em 10/5/2016 (Info 825).

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Súmula 589-STJ: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou


contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações
domésticas

Obs.: Princípio da Insignificância x Princípio da Bagatela Imprópria


Aplica-se o princípio da bagatela imprópria à infração que nasce relevante para o Direito Penal, ou
seja, é uma infração típica, antijurídica e culpável, mas, em momento posterior, verifica-se que a aplicação
de qualquer pena, ao caso concreto, seria totalmente desnecessária.
Nesse sentido, surgiu uma tese defensiva afirmando que, se o casal se reconciliasse durante o curso
do processo criminal, o juiz poderia absolver o réu com base no chamado “princípio da bagatela imprópria”.
No entanto, essa tese NÃO É ACEITA pelos Tribunais Superiores? Assim como ocorre com o princípio
da insignificância, também não se admite a aplicação do princípio da bagatela imprópria para os crimes ou
contravenções penais praticados contra mulher no âmbito das relações domésticas, tendo em vista a
relevância do bem jurídico tutelado.

O fato de o casal ter se reconciliado ou de a vítima ter perdoado não importará na


absolvição do réu. Nesse sentido: O princípio da bagatela imprópria não tem
aplicação aos delitos praticados
45119 com violência à pessoa, no âmbito das relações

domésticas, dada a relevância penal da conduta, não implicando a reconciliação do


casal em desnecessidade da pena. STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1463975/MS, Rel.
Min. Nefi Cordeiro, julgado em 09/08/2016.

45119
No mesmo sentido: STJ. 6ª Turma. AgInt no HC 369.673/MS, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, julgado em 14/02/2017.

17. AÇÃO PENAL NOS CRIMES DA LEI MARIA DA PENHA

Inicialmente, cumpre salientar que não são todos os crimes praticados no contexto de violência
doméstica e familiar contra a mulher que são de ação penal pública incondicionada. Veja: a regra prevista
pelo Código Penal é que os crimes serão de ação penal pública incondicionada, inclusive quando não houver
previsão expressa nesse sentido. Ou seja: quando o Código não falar nada, o crime será de ação penal pública
incondicionada (essa regra vale para todos os crimes!). Assim, para que o crime seja de ação penal privada
ou pública condicionada, deve haver disposição expressa nesse sentido.
Ocorre que havia divergência doutrinária sobre o crime de LESÃO CORPORAL LEVE e LESÃO
CORPORAL CULPOSA no âmbito da Lei Maria da Penha. Isso porque, por um lado, a Lei 9.099/95 afirma que
os crimes de lesão corporal culposa e leve são de ação penal pública condicionada à representação (art. 88),
enquanto, por outro lado, o art. 41 da Lei Maria da Penha expressamente afasta a incidência da Lei 9.099/95
aos crimes cometidos no âmbito da Violência Doméstica e familiar contra a mulher.
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Assim surgiu a seguinte divergência: aplica-se o disposto na Lei 9099/95, que prevê a ação penal
pública condicionada à representação para as lesões corporais leves e culposas, ou se aplica o disposto na
Lei 11.340/06, que veda a aplicação da Lei 9099/95 aos crimes da Lei?
A doutrina e jurisprudência dominantes são no sentido de que deve prevalecer o art. 41 da Lei Maria
da Penha, em razão do princípio da especialidade. Assim, embora a regra geral seja de que as lesões
corporais leves e culposas dependam de representação, SE OCORREREM NO ÂMBITO DA LEI MARIA DA
PENHA, SERÃO CRIMES DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. Não porque a Lei 11.340/06 dispõe
dessa forma, mas sim porque veda a aplicação da Lei 9.099/95.
Portanto, o queremos dizer é:
∘ Se o crime praticado no âmbito de violência doméstica e familiar contra a mulher estiver
previsto no CÓDIGO PENAL como um crime condicionado à representação, como é o caso
da ameaça,
45119assim será. As ameaças no contexto de violência doméstica precisarão de

representação da ofendida pois esta é a regra geral do Código Penal - e a Lei Maria da Penha
não afasta a incidência do Código Penal.
∘ Por outro lado, se o crime praticado no âmbito de violência doméstica e familiar contra a
mulher estiver previsto NA LEI DE JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS como um crime
condicionado à representação, como é o caso da lesão corporal leve e culposa, essa regra
não será aplicada aos crimes praticados
45119 no contexto de violência doméstica pois a própria

Lei Maria da Penha afasta a incidência da Lei 9.099/95.

Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 1995.

Informativo 654 do STF - Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar
contra a mulher não se aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95), mesmo
que a pena seja menor que 2 anos.

Súmula 542 - STJ: a ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de
violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

Veja a explicação do professor Renato Brasileiro sobre o tema (2020, Pg. 1281):

"Lado outro, o art. 41 da Lei nº 9.099/95 dispõe que, aos crimes praticados com
violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena
prevista, não se aplica a Lei nº 9.099/95. Ora, se a Lei dos Juizados não é aplicável
às situações de violência doméstica e familiar contra a mulher, e se é a Lei nº
9.099/95 que dispõe que os crimes de lesão corporal leve e de lesão corporal
culposa são de ação penal pública condicionada à representação (art. 88), conclui-
299
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DELEGADO SANTA CATARINA

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se que, se acaso praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a


mulher, tais delitos seriam de ação penal pública incondicionada.".

18. COMPETÊNCIA NA LEI MARIA DA PENHA

Art. 13. Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais


decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-
se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação
específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com o
estabelecido nesta Lei.

Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da


Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União,
no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento
e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar
contra a mulher.
Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno,
conforme dispuserem as normas
45119 de organização judiciária.
45119
Art. 14-A. A ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de
união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher. (Incluído pela Lei nº 13.894, de 2019)
§ 1º Exclui-se da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher a pretensão relacionada à partilha de bens. (Incluído pela Lei nº
13.894, de 2019)
§ 2º Iniciada a situação de violência doméstica e familiar após o ajuizamento da
ação de divórcio ou de dissolução de união estável, a ação terá preferência no
juízo onde estiver. (Incluído pela Lei nº 13.894, de 2019)

Primeiramente, vale destacar que o STF atribuiu INTERPRETAÇÃO CONFORME, por unanimidade, à
primeira parte do art. 3º-C do CPP, para esclarecer que as normas relativas ao juiz das garantias não se
aplicam aos casos de violência doméstica e familiar.
Em que pese a redação original do dispositivo excetuar apenas as infrações de menor potencial
ofensivo, a Corte entendeu que a nova sistemática implementada pelo denominado “Pacote Anticrime” não
seria aplicável também aos casos de violência doméstica e familiar, pois a violência doméstica é um
fenômeno dinâmico, caracterizado por uma linha temporal que inicia com a comunicação da agressão.
Depois dessa comunicação, sucede-se, no decorrer do tempo, ou a minoração ou o agravamento do quadro.
Uma cisão rígida entre as fases de investigação e de instrução/julgamento impediria que o juiz conhecesse
toda a dinâmica do contexto de agressão.
300
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DELEGADO SANTA CATARINA

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Portanto, pela sua natureza, os casos de violência doméstica e familiar exigem disciplina processual
penal específica, que traduza um procedimento mais dinâmico, apto a promover o pronto e efetivo amparo
e proteção de violência doméstica.

a) Ato infracional: 45119

Ato infracional continua a ser da competência do juizado da infância e da juventude, mesmo


quando cometido contra a mulher no âmbito familiar.

b) Execução penal:
Embora, o artigo 13 aluda à execução, a competência para tanto continua sendo regida pelo artigo
65 da Lei 7210/84 (lei de execuções penais). Não se aplica ao pé da letra o artigo 13 da lei 11.340, sendo a
competência da execução penal regida pelo referido art. 65 da LEP.

LEP. Art. 65. A execução penal competirá ao Juiz indicado na lei local de
organização judiciária e, na sua ausência, ao da sentença.

c) Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher


Conforme já mencionado, o Juizado de Violência
45119 Doméstica e Familiar contra a Mulher não se
confunde com os Juizados Especiais Criminais (cuja aplicação, inclusive, é expressamente vedada pela Lei
Maria da Penha).
O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher é um órgão fracionário do Poder
Judiciário que teve a sua criação autorizada por esta lei. Cabe aos Tribunais de Justiça dos Estados a criação
desse órgão dentro das suas estruturas, de acordo com as normas de organização judiciária da cada Estado.
Ressalta-se que sua criação é facultativa, estando inserida no âmbito da autonomia política de cada ente
federativo.
O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher tem competência mista, ou seja, cível
e criminal. Ao mesmo tempo em que se julga o delito praticado em situação de violência doméstica e familiar
contra a mulher, praticam-se atos de natureza cível, como a separação judicial, entre outros.
Ademais, nos locais em que ainda não tiverem sido estruturados os Juizados de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para as causas
decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher.

STJ HC 158/615: (…) configurada a conduta praticada como violência doméstica


contra a mulher, independentemente de sua classificação como crime ou
contravenção, deve ser fixada a competência da Vara Criminal para apreciar e julgar
o feito, enquanto não forem estruturados os Juizados de Violência Doméstica e
Familiar contra a mulher.

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DELEGADO SANTA CATARINA

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Inf. 550 do STJ - Juizado da Violência Doméstica possui competência para executar
alimentos por ele fixados. O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher tem competência para julgar a execução de alimentos que tenham sido
fixados a título de medida protetiva de urgência fundada na Lei Maria da Penha em
favor de filho do casal em conflito.

Inf. 572 do STJ - Competência para julgar ação de divórcio advinda de violência
suportada por mulher no âmbito familiar e doméstico. A extinção de medida
protetiva de urgência diante da homologação de acordo entre as partes não afasta
a competência da Vara Especializada de Violência
45119 Doméstica ou Familiar contra a
Mulher para julgar ação de divórcio fundada na mesma situação de agressividade
vivenciada pela vítima e que fora distribuída por dependência à medida extinta.

Inf. 617 do STJ -A Vara Especializada da Violência Doméstica ou Familiar Contra a


Mulher possui competência para o julgamento de pedido incidental de natureza
civil, relacionado à autorização para viagem ao exterior e guarda unilateral do
infante, na hipótese em que a causa de pedir de tal pretensão consistir na prática
de violência doméstica e familiar
45119 contra a genitora. STJ. 3ª Turma. REsp 1.550.166-

DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/11/2017

Obs.: Quem julga o crime de estupro de vulnerável praticado por pai contra filha de 4 anos: vara
criminal “comum” ou vara de violência doméstica e familiar contra a mulher?

Se o fator determinante que ensejou a prática do crime foi a tenra idade da vítima fica afastada a
vara de violência doméstica e familiar? Ex: estupro de vulnerável praticado por pai contra a filha, de 4 anos.

● SIM. Posição da 5ª Turma do STJ: Se o fato de a vítima ser do sexo feminino não foi determinante
para a caracterização do crime de estupro de vulnerável, mas sim a tenra idade da ofendida, que
residia sobre o mesmo teto do réu, que com ela manteve relações sexuais, não há que se falar
em competência do Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. STJ. 5ª
Turma. AgRg no AREsp 1020280/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/08/2018.

● NÃO. Julgado recente da 6ª Turma do STJ: A idade da vítima é irrelevante para afastar a
competência da vara especializada em violência doméstica e familiar contra a mulher e as
normas protetivas da Lei Maria da Penha. STJ. 6ª Turma. RHC 121813-RJ, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, julgado em 20/10/2020 (Info 682).

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DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

d) Crimes dolosos contra a vida praticados no contexto da violência doméstica e familiar contra a
mulher
Em um primeiro momento cumpre recordarmos que o Tribunal do júri é composto por duas fases,
uma primeira chamada de Iudicium Accusationis, a segunda conhecida como Iudicium Causae.
Na primeira fase temos a participação apenas do Juiz Sumariante, que pode pronunciar,
impronunciar, absolver sumariamente ou desclassificar. Apenas na segunda fase é que entra a atuação do
Júri sendo composto pelo Juiz Presidente e por mais 25 jurados, 7 dos quais irão compor o Conselho de
sentença.
Em alguns Estados essa primeira fase do Tribunal do Júri vem tramitando nos Juizados de violência
doméstica e familiar contra a Mulher, enquanto que, em outros, a primeira fase tramita nas varas privativas
do júri. Isso é possível, dependendo da Lei de Organização judiciária local, pois o que a Constituição
45119
Federal
obriga é o Julgamento propriamente dito do crime doloso contra a vida pelo Tribunal do Júri.
Nesse sentido, contemplamos que a Constituição Federal exige que o julgamento ocorra no Tribunal
do Júri, de forma que nada impede que a Lei de Organização Judiciária delegue a primeira fase a outro juízo,
como por exemplo, ao Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

STF - A Lei de Organização Judiciária poderá prever que a 1° fase do procedimento


do júri seja realizada na Vara45119de Violência Doméstica em caso de crimes dolosos
contra a vida praticados no contexto de violência doméstica. Não haverá usurpação
da competência constitucional do júri. Apenas o julgamento propriamente dito é
que, obrigatoriamente, deverá ser feito no Tribunal do Júri. STF. 2a Turma. HC
102150/SC, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 27/5/2014.

Obs.: Em caso de ameaça por redes sociais ou pelo Whatsapp, o juízo competente para deferir as medidas
protetivas é aquele no qual a mulher tomou conhecimento das intimidações.

Em caso de ameaça proferida contra a mulher por meio de redes sociais (ex:
Facebook) ou por aplicativos como o WhatsApp, o juízo competente para deferir as
medidas protetivas é aquele onde a vítima tomou conhecimento das intimidações,
por ser este o local de consumação do crime previsto pelo art. 147 do Código
Penal. O art. 147 do CP é crime formal, de modo que se consuma no momento em
que a vítima toma conhecimento da ameaça. Segundo o art. 70, primeira parte, do
CPP, "a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a
infração". Ex: o ex-marido, residente em Curitiba, ameaçou a vítima por meio de
mensagens no Facebook e no Whatsapp. Quando a vítima recebeu as mensagens
já estava morando em Naviraí (MS). Diante disso, a competência para julgar as
medidas protetivas em favor da mulher é o juízo da comarca de Naviraí (MS). STJ.
3ª Seção. CC 156.284/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 28/02/2018.
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RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

19. REPARAÇÃO DE DANOS NO ÂMBITO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

A sentença penal condenatória, depois de transitada em julgado, produz diversos efeitos. Um deles
é que a condenação gera a obrigação do réu de reparar o dano causado. Inclusive, à luz do CPC (art. 515), a
sentença condenatória constitui-se em título executivo judicial:

CP. Art. 91. São efeitos da condenação:


I — Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

CPC. Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo
com os artigos previstos neste Título: VI - a sentença penal condenatória transitada
em julgado;

Assim, a vítima (ou seus sucessores), na posse da sentença que condenou o réu, após o seu trânsito
em julgado, dispõe de um título que poderá ser executado no juízo cível para cobrar o ressarcimento
45119 pelos
prejuízos sofridos em decorrência do crime.
O art. 387, IV, do CPP prevê que o juiz, ao condenar
45119 o réu, já estabeleça na sentença um valor mínimo
que o condenado estará obrigado a pagar a título de reparação dos danos causados. Veja:

Art. 387.O juiz, ao proferir sentença condenatória: IV — fixará valor mínimo para
reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos
pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº 11.719/2008)

Acerca da fixação desse valor mínimo, atente-se à algumas considerações:


✔ Para que seja fixado o valor da reparação deverá haver pedido expresso e formal do MP ou do
ofendido;
✔ Não é necessário que o MP ou o ofendido, ao fazer o pedido, apontem o valor líquido e certo
pretendido;
✔ A reparação dos danos abrange tanto os danos materiais como os danos morais:
a) Danos materiais - o juiz somente poderá fixar a indenização se existirem provas nos autos
que demonstrem os prejuízos sofridos pela vítima em decorrência do crime.
b) Danos morais - Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e
familiar, o valor mínimo a ser fixado a título de danos morais independe de instrução
probatória. (O dano moral é in re ipsa)

Veja a jurisprudência sobre o tema:

304
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar,


é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde
que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não
especificada a quantia, independentemente de instrução probatória. STJ. 3ª
Seção. REsp 1.643.051-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 28/02/2018
(Info 621).

A posterior reconciliação entre a vítima e o agressor não é fundamento suficiente


para afastar a necessidade de fixação do valor mínimo previsto no art. 387, inciso
IV, do CPP, seja porque não há previsão legal nesse sentido, seja porque compete
à própria vítima decidir se irá promover a execução ou não do título executivo,
sendo vedado ao Poder Judiciário omitir-se na aplicação da legislação processual
penal que determina a fixação do valor mínimo em favor da ofendida. CPP/Art. 387.
O juiz, ao proferir sentença condenatória:(...) IV - fixará valor mínimo para
reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos
pelo ofendido; STJ. 6ª Turma. REsp 1819504-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em
10/09/2019 (Info 657). 45119

20. LEI N. 14.022/2020

Vimos que, embora a Lei Maria da Penha não possa ser aplicada aos homens, ainda que em situação
de vulnerabilidade, é possível aplicar a eles as medidas protetivas de urgência.
Nesse sentido, e considerando que, durante a pandemia do Covid-19, verificou-se que o
confinamento social gerou um aumento no número de casos de violência doméstica e familiar contra as
45119
mulheres, crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência, foi editada a Lei nº 14.022/2020, que
prevê medidas para enfrentamento da violência doméstica e familiar contra essas pessoas durante o período
de pandemia.
Por se tratar de um tema extremamente recente, aconselhamos a leitura detalhada da lei!
Veja, abaixo, um resumo das mudanças efetuadas8.

1) Serviços de atendimento a essas pessoas são considerados essenciais


O art. 3º da Lei nº 13.979/2020 prevê, em seus incisos, nove medidas para enfrentamento do
coronavírus. Ex.: isolamento, quarentena, restrição excepcional e temporária da locomoção interestadual ou
intermunicipal, requisição de bens e serviços, entre outros.

8
Dizer o Direito

305
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

O § 8º do art. 3º faz, contudo, uma ressalva e afirma que essas medidas previstas nos incisos, quando
adotadas, deverão resguardar o exercício e o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais.
A Lei nº 14.022/2020 acrescenta um novo parágrafo ao art. 3º da Lei nº 13.979/2020 afirmando que
são essenciais os serviços e atividades voltados ao atendimento de:
⦁ Mulheres em situação de violência doméstica e familiar;
⦁ Crianças e adolescentes vítimas de crimes previstos no ECA ou no CP;
⦁ Pessoas idosas vítimas de crimes previstos no Estatuto do Idoso ou no CP;
⦁ Pessoas com deficiência vítimas de crimes previstos no Estatuto da Pessoa com Deficiência ou no CP.

Veja o dispositivo inserido:

Art. 3º, § 7º-C Os serviços públicos e atividades essenciais, cujo funcionamento


deverá ser resguardado quando adotadas as medidas previstas neste artigo,
45119
incluem os relacionados ao atendimento a mulheres em situação de violência
doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, a
crianças, a adolescentes, a pessoas idosas e a pessoas com deficiência vítimas de
crimes tipificados na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do
Adolescente), na Lei nº 10.741,
45119 de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), na

Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e no


Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).

Para garantir que esse serviço essencial seja mantido, foi acrescentado o art. 5º-A à Lei nº
13.979/2020 prevendo que:
⦁ Os prazos processuais, a apreciação de matérias, o atendimento às partes e a concessão de medidas
protetivas devem continuar normalmente;
⦁ O registro de ocorrências relacionadas com essas infrações penais poderá ser feito por telefone ou
meio eletrônico.

Art. 5º-A Enquanto perdurar o estado de emergência de saúde internacional


decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019:
I - os prazos processuais, a apreciação de matérias, o atendimento às partes e a
concessão de medidas protetivas que tenham relação com atos de violência
doméstica e familiar cometidos contra mulheres, crianças, adolescentes, pessoas
idosas e pessoas com deficiência serão mantidos, sem suspensão;
II - o registro da ocorrência de violência doméstica e familiar contra a mulher e de
crimes cometidos contra criança, adolescente, pessoa idosa ou pessoa com
deficiência poderá ser realizado por meio eletrônico ou por meio de número de
telefone de emergência designado para tal fim pelos órgãos de segurança pública;
306
RETA FINAL

DELEGADO SANTA CATARINA

SEMANA 01/12

Parágrafo único. Os processos de que trata o inciso I do caput deste artigo serão
considerados de natureza urgente.

2) Poder público deverá adotar medidas para garantir o atendimento presencial


A Lei nº 14.022/2020 prevê que o poder público deverá adotar as medidas necessárias para que,
mesmo durante a pandemia, seja mantido o atendimento presencial de mulheres, idosos, crianças ou
adolescentes em situação de violência.
Se for necessário, poderá haver a adaptação dos procedimentos estabelecidos na Lei Maria da Penha
(Lei nº 11.340/2006) às circunstâncias emergenciais do período de pandemia. A adaptação dos
procedimentos deverá assegurar a continuidade do funcionamento habitual dos órgãos do poder público
descritos na Lei nº 11.340/2006, no âmbito de sua competência, com o objetivo de garantir a manutenção
dos mecanismos de prevenção e repressão à violência doméstica e familiar contra a mulher e à violência
contra idosos, crianças ou adolescentes.
Se, por razões de segurança sanitária, não for possível manter o atendimento presencial a todas as
demandas relacionadas à violência doméstica e familiar contra a mulher e à violência contra idosos, crianças
ou adolescentes, o poder público deverá, obrigatoriamente, garantir o atendimento presencial para
situações que possam envolver, efetiva ou potencialmente, os ilícitos previstos:
I - No Código Penal, na modalidade consumada45119
ou tentada:
a) feminicídio (art. 121, § 2º, VI);
b) lesão corporal de natureza grave (art. 129, § 1º);
c) lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2º);
d) lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º);
e) ameaça praticada com uso de arma de fogo (art. 147);
f) estupro (art. 213);
g) estupro de vulnerável (art. 217-A);
h) corrupção de menores (art. 218);
i) satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente (art. 218-A);
II - na Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha): o crime de descumprimento de medidas protetivas
de urgência (art. 24-A);
III - no ECA;
IV - no Estatuto do Idoso.

3) Realização prioritária do exame de corpo de delito


Mesmo durante a vigência da Lei nº 13.979/2020, ou mesmo durante o estado de emergência de
caráter humanitário e sanitário em território nacional, deverá ser garantida a realização prioritária do exame
de corpo de45119
delito quando se tratar de crime que envolva:
I - Violência doméstica e familiar contra a mulher;
II - Violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.
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Nos casos de crimes de natureza sexual, se houver a adoção de medidas pelo poder público que
45119
restrinjam a circulação de pessoas, os órgãos de segurança deverão estabelecer equipes móveis para
realização do exame de corpo de delito no local em que se encontrar a vítima.

4) Disponibilização de canais de comunicação


Os órgãos de segurança pública deverão disponibilizar canais de comunicação que garantam
interação simultânea, inclusive com possibilidade de compartilhamento de documentos, desde que gratuitos
e passíveis de utilização em dispositivos eletrônicos, como celulares e computadores, para atendimento
virtual de situações que envolvam violência contra a mulher, o idoso, a criança ou o adolescente, facultado
aos órgãos integrantes do Sistema de Justiça - Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública, e aos
demais órgãos do Poder Executivo, a adoção dessa medida.
Vale ressaltar que a disponibilização de canais de atendimento virtuais não exclui a obrigação do
poder público de manter o atendimento presencial de mulheres em situação de violência doméstica e
familiar e de casos de suspeita ou confirmação de violência praticada contra idosos, crianças ou adolescentes.
Nos casos de violência doméstica e familiar, a ofendida poderá solicitar quaisquer medidas protetivas
de urgência à autoridade competente por meio dos dispositivos de comunicação de atendimento on-line.
45119

5) Concessão das medidas protetivas de urgência de forma eletrônica


A Lei prevê que, se as circunstâncias do fato justificarem, a autoridade competente poderá conceder
qualquer uma das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha, de forma eletrônica.
A autoridade poderá considerar provas coletadas eletronicamente ou por audiovisual, em momento
anterior à lavratura do boletim de ocorrência e a colheita de provas que exija a presença física da ofendida.
É possível ainda que o Poder Judiciário faça a intimação da ofendida e do ofensor da decisão judicial por meio
eletrônico.
Após a concessão da medida de urgência de forma eletrônica, a autoridade competente,
independentemente da autorização da ofendida, deverá:
⦁ I - se for autoridade judicial, comunicar à unidade de polícia judiciária competente para
que proceda à abertura de investigação criminal para apuração dos fatos;
⦁ II - se for delegado de polícia, comunicar imediatamente ao Ministério Público e ao Poder
Judiciário da medida concedida e instaurar imediatamente inquérito policial, determinando
todas as diligências cabíveis para a averiguação dos fatos;
⦁ III - se for policial, comunicar imediatamente ao Ministério Público, ao Poder Judiciário e à
unidade de polícia judiciária competente da medida concedida, realizar o registro de boletim
de ocorrência e encaminhar os autos imediatamente à autoridade policial competente para
a adoção das medidas cabíveis.

6) Prorrogação automática das medidas protetivas


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As medidas protetivas deferidas em favor da mulher serão automaticamente prorrogadas e vigorarão


durante a vigência da Lei nº 13.979/2020, ou durante a declaração de estado de emergência.
O juiz competente providenciará a intimação do ofensor, que poderá ser realizada por meios
eletrônicos, cientificando-o da prorrogação da medida protetiva.
Obviamente, essas medidas poderão ser revistas ou cessadas pelo Poder Judiciário caso se entenda
necessário.

7) Denúncia recebidas deverão ser repassadas para os órgãos competentes


As denúncias de violência recebidas na esfera federal pela Central de Atendimento à Mulher - Ligue
180 e pelo serviço de proteção de crianças e adolescentes com foco em violência sexual - Disque 100 devem
ser repassadas, com as informações de urgência, para os órgãos competentes.
O prazo máximo para o envio dessas informações é de 48 horas, salvo impedimento técnico.
45119

8) Autoridade de segurança pública deverá assegurar atendimento ágil


Em todos os casos, a autoridade de segurança pública deve assegurar o atendimento ágil a todas as
demandas apresentadas e que signifiquem risco de vida e a integridade da mulher, do idoso, da criança e do
adolescente, com atuação focada na proteção integral.
45119

9) Realização de campanhas informativas


O poder público promoverá campanha informativa sobre prevenção à violência e acesso a
mecanismos de denúncia durante a vigência da Lei nº 13.979/2020, ou durante a vigência do estado de
emergência decorrente da Covid-19.

10) Vigência
A Lei nº 14.022/2020 entrou em vigor na data de sua publicação (08/07/2020).

21. LEI N. 14.232/2021

No ano de 2021 foi editada a Lei 14.232, que cria a Política Nacional de Dados e Informações
relacionadas à Violência contra as Mulheres (PNAINFO), com a finalidade de reunir, organizar, sistematizar
e disponibilizar dados e informações atinentes a todos os tipos de violência contra as mulheres.
As diretrizes da PNAINFO são:
● a integração das bases de dados dos órgãos de atendimento à mulher em situação
de violência no âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário;
● a produção e gestão transparente das informações sobre a situação de violência
contra as mulheres no País;

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● o incentivo à participação social por meio da oferta de dados consistentes,


atualizados e periódicos que possibilitem a avaliação crítica das políticas públicas de
enfrentamento à violência contra as mulheres.

Os objetivos da PNAINFO, por sua vez, estão elencados no art. 3º da Lei:

Art. 3º São objetivos da PNAINFO:


I - subsidiar a formulação, o planejamento, a implementação, o monitoramento e
a avaliação das políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres;
II - produzir informações com disponibilidade, autenticidade, integridade e
comparabilidade sobre todos os tipos de violência contra as mulheres;
III - manter as informações disponíveis em sistema eletrônico para acesso rápido e
pleno, ressalvados os dados cuja restrição de publicidade esteja disciplinada pela
legislação;
IV - integrar e subsidiar a implementação e avaliação da Política Nacional de
Enfrentamento à Violência contra as Mulheres e do Pacto Nacional pelo
Enfrentamento à Violência contra as Mulheres;
V - atender ao disposto no inciso
45119 II do caput do art. 8º e no art. 38 da Lei nº 11.340,

de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);


VI - padronizar, integrar e disponibilizar os indicadores das bases de dados dos
organismos de políticas para as mulheres, dos órgãos da saúde, da assistência
social, da segurança pública e do sistema de justiça, entre outros, envolvidos no
atendimento às mulheres em situação de violência;
VII - padronizar, integrar e disponibilizar informações sobre políticas públicas de
enfrentamento à violência contra as mulheres;
VIII - atender ao disposto nos acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário,
no que tange à produção de dados e estatísticas sobre a violência contra as
mulheres. 45119

Vale dizer que, para o alcance de tais objetivos, o poder público deverá instituir, por meio eletrônico
e na forma de regulamento, o Registro Unificado de Dados e Informações sobre Violência contra as Mulheres.
O registro deverá conter informações e dados sobre os registros administrativos referentes ao tema, sobre
os serviços especializados de atendimento às mulheres em situação de violência e sobre as políticas públicas
de enfrentamento à violência contra as mulheres.
No cadastro do Registro Unificado de Dados e Informações sobre Violência contra as Mulheres
deverão conter, no mínimo:

Lei 14.232/2021, Art. 4º, § 2º (...)


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I - local, data, hora da violência, meio utilizado, descrição da agressão e tipo de


violência;
II - perfil da mulher agredida, incluídas informações sobre idade, raça/etnia,
deficiência, renda, profissão, escolaridade, procedência de área rural ou urbana e
relação com o agressor;
III - características do agressor, incluídas informações sobre idade, raça/etnia,
deficiência, renda, profissão, escolaridade, procedência de área rural ou urbana e
relação com a mulher agredida;
IV - histórico de ocorrências envolvendo violência tanto da agredida quanto do
agressor;
V - ocorrências registradas pelos órgãos policiais;
VI - inquéritos abertos e encaminhamentos;
VII - quantidade de medidas protetivas requeridas pelo Ministério Público e pela
mulher agredida, bem como das concedidas pelo juiz;
VIII - quantidade de processos julgados, prazos de julgamento e sentenças
proferidas;
IX - medidas de reeducação e de ressocialização do agressor;
X - atendimentos prestados 45119
à mulher pelos órgãos de saúde, de assistência social
e de segurança pública, pelo sistema de justiça e por outros serviços especializados
de atendimento às mulheres em situação de violência; e
XI - quantitativo de mortes violentas de mulheres.

Obs.: o art. 5º da referida Lei estabelece que a implantação


45119
da PNAINFO será acompanhada, em nível federal,
por comitê formado por representantes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, sendo que o comitê
será coordenado por órgão do Poder Executivo federal, nos termos do regulamento. Tal dispositivo foi
vetado pelo então Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro. Contudo, houve a derrubada dos vetos
pelo Congresso Nacional, e a consequente promulgação do texto.

Ainda de acordo com a Lei, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão aderir à PNAINFO
mediante instrumento de cooperação federativa, conforme dispuser o regulamento, sendo certo que as
despesas decorrentes da execução do disposto nesta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias de
cada órgão que aderir à PNAINFO.

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