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SEMANA07

RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Sumário
META 1 ............................................................................................................................................................ 11
DIREITO PENAL: CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL ............................................................................... 11
1. DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL ............................................................................................... 12
1.1 Estupro (Art. 213, CP) ............................................................................................................................................. 12
1.1.1 Análise Do Caput .............................................................................................................................................. 12
1.1.2 Qualificadoras .................................................................................................................................................. 15
1.2 Violação Sexual Mediante Fraude (Art. 215) .......................................................................................................... 16
1.3 Importunação Sexual (Art. 215-A) .......................................................................................................................... 17
1.4 Assédio Sexual (Art. 216-A) .................................................................................................................................... 19
1.5 Da Exposição da Intimidade Sexual ........................................................................................................................ 20
2. DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEIS ............................................................................................ 23
2.1 Estupro de Vulnerável (Art. 217-A) ........................................................................................................................ 23
2.2 Mediação de Menor Vulnerável para Satisfazer a Lascívia de Outrem (Corrupção de Menores) (Art. 218) ......... 27
2.3 Satisfação de Lascívia Mediante Presença de Criança ou Adolescente (Art. 218-A) .............................................. 29
2.4 Favorecimento da Prostituição ou de Outra Forma de Exploração Sexual de Criança ou Adolescente ou de
Vulnerável (Art. 218-B) ................................................................................................................................................. 30
2.5 Divulgação de Cena de Estupro ou de Cena de Estupro de Vulnerável, de Cena de Sexo ou de Pornografia (Art.
218-C). (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018) ............................................................................................................. 33
2.5.1 Considerações importantes: ................................................................ ............................................................ 35
2.5.2 Aumento de pena ................................................................
................................................................
............ 36
2.5.3 Exclusão de ilicitude................................................................................................................................
......... 36
3. DISPOSIÇÕES GERAIS ................................................................................................................................... 37
3.1 Ação Penal nos Crimes Sexuais (Art. 225) .............................................................................................................. 37
3.2 Causas de Aumento de Pena (Art. 226) .................................................................................................................. 38
4. OUTROS TIPOS PENAIS ................................................................................................................................ 39
4.1 Mediação para Servir a Lascívia de Outrem (Art. 227) ........................................................................................... 39
4.2 Favorecimento da Prostituição ou Outra Forma de Exploração Sexual (Art. 228) ................................................. 40
4.3 Casa de Prostituição (Art. 229) ............................................................................................................................... 40
4.4 Rufianismo (Art. 230) ............................................................................................................................................. 41
5. DISPOSIÇÕES GERAIS ................................................................................................................................... 42
DIREITO PENAL: CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA .......................................................................................... 44
1. INCITAÇÃO AO CRIME (ART. 286) ................................................................................................................ 44
2. APOLOGIA DE CRIME OU CRIMINOSO (ART. 287) ....................................................................................... 46
3. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (ART. 288) .......................................................................................................... 49
4. CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA (ART. 288-A) ..................................................................................... 54
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DO INQUILINATO ...................................................................................... 58
LEI DE LOCAÇÕES – LEI DO INQUILINATO ........................................................................................................ 58
1. LOCAÇÃO EM GERAL ................................................................................................................................... 58
1.1 Deveres do locador e do locatário ......................................................................................................................... 61
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1.2 Benfeitorias ............................................................................................................................................................ 61


1.3 Garantias locatícias................................................................................................................................................. 61
1.4 Das penalidades criminais e civis ........................................................................................................................... 63
1.5 Aspectos gerais sobre as locações.......................................................................................................................... 64
1.6 Jurisprudência relevante ........................................................................................................................................ 67
META 2 ............................................................................................................................................................ 69
DIREITO PROCESSUAL PENAL: PRISÕES ........................................................................................................... 69
1. A TUTELA CAUTELAR NO PROCESSO PENAL ................................................................................................ 70
2. O FIM DA BIPOLARIDADE DAS MEDIDAS CAUTELARES DE NATUREZA PESSOAL PREVISTAS NO CPP ........ 71
3. O PODER GERAL DE CAUTELA NO PROCESSO PENAL .................................................................................. 72
4. PRINCIPIOLOGIA DAS PRISÕES CAUTELARES ............................................................................................... 73
4.1 Princípio da Presunção de Inocência ou da Não Culpabilidade.............................................................................. 73
4.2 Princípio da Jurisdicionalidade ............................................................................................................................... 73
4.3 Princípio da Motivação ........................................................................................................................................... 75
4.4 Princípio do Contraditório ...................................................................................................................................... 75
4.5 Princípio da Provisionalidade e o Princípio da Atualidade do Perigo ..................................................................... 75
4.6 Princípio da Excepcionalidade ................................................................................................................................ 76
4.7 Princípio da Proporcionalidade .............................................................................................................................. 76
4.7.1 Princípio da Homogeneidade ou da Proporcionalidade em Sentido Estrito ................................................... 76
............................................................................. 76
4.7.2 Princípio Tácito ou Implícito da Individualização da Prisão
5. PRESSUPOSTOS PARA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES DE NATUREZA PESSOAL .......................... 77
6. PROCEDIMENTO PARA A APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES DE NATUREZA PESSOAL ..................... 78
6.1 Aplicação Isolada ou Cumulativa das Medidas Cautelares..................................................................................... 78
6.2 Vedação à Decretação de Medidas Cautelares pelo Juiz de Ofício ou na Fase Investigatória ou na Fase Processual
...................................................................................................................................................................................... 79
6.3 Legitimidade para o Requerimento de Decretação de Medidas Cautelares .......................................................... 80
6.4 Contraditório Prévio à Decretação das Medidas Cautelares .................................................................................. 82
6.5 Descumprimento Injustificado das Cautelares Diversas da Prisão......................................................................... 83
6.6 Revogabilidade e/ou Substitutividade da Medidas Cautelares .............................................................................. 84
7. PRISÃO E SUAS ESPÉCIES ............................................................................................................................. 85
7.1 Prisão Civil .............................................................................................................................................................. 85
7.2 Prisão Militar .......................................................................................................................................................... 87
7.3 Prisão Penal ............................................................................................................................................................ 87
7.4 Prisão Cautelar (Carcer Ad Custodiam) .................................................................................................................. 89
7.5. Prisão Especial ................................
....................................................................................................................... 90
7.6 Prisão em Flagrante ................................ ................................................................................................................ 91
7.6.1 Flagrante nas Várias Espécies de Crimes ......................................................................................................... 98
7.6.2 Fases da Prisão em Flagrante........................................................................................................................... 99
7.6.3 Comunicação da Prisão ao Juiz Competente, ao Ministério Público e à Defensoria Pública......................... 102
7.6.4 Audiência de Custódia (Audiência de Apresentação) .................................................................................... 102
7.6.5 Convalidação Judicial da Prisão em Flagrante ............................................................................................... 107
7.6.6 Posturas da Autoridade Judicial Perante o Flagrante .................................................................................... 107
7.7 Prisão Preventiva .................................................................................................................................................. 110
7.8 Prisão Temporária (Lei N° 7.960/1989) ................................................................................................................ 122
7.9 Prisão Domiciliar ................................................................................................................................................... 126
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8. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO ........................................................................................... 130


META 3 .......................................................................................................................................................... 139
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA............................................................... 139
1. CONTEXTO HISTÓRICO .............................................................................................................................. 139
2. CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA: CRIME ORGANIZADO POR NATUREZA x CRIME ORGANIZADO POR
EXTENSÃO ...................................................................................................................................................... 142
3. TIPOS PENAIS PREVISTOS NA LEI Nº 12.850/13 ........................................................................................ 142
3.1. Art. 2º, caput ....................................................................................................................................................... 142
3.2. Art. 2º, §1º (figura equiparada) - Obstrução ou embaraço de investigação penal referente à organização criminosa
.................................................................................................................................................................................... 145
3.3. Causas de Aumento de Pena ............................................................................................................................... 146
3.4. Circunstância Agravante ...................................................................................................................................... 146
3.5. Participação do Funcionário Público na ORCRIM ................................................................................................ 146
3.6. Requisito a mais para a Concessão de Benefícios Incluído pelo Pacote Anticrime – Lei 13.964/2019. .............. 147
4. ASPECTOS PROCESSUAIS DA LEI DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ............................................................. 149
4.1 Colaboração Premiada ......................................................................................................................................... 149
4.2. Ação Controlada .................................................................................................................................................. 164
4.3. Infiltração De Agentes ......................................................................................................................................... 165
4.4. Do Acesso a Registros, Dados Cadastrais, Documentos e Informações .............................................................. 168
............................................. 169
5. DOS CRIMES OCORRIDOS NA INVESTIGAÇÃO E NA OBTENÇÃO DA PROVA
5.1. Revelação da Identidade do Colaborador ........................................................................................................... 169
5.2. Crime de Colaboração Caluniosa ou Fraudulenta ............................................................................................... 170
5.3 Quebra de Sigilo das Investigações ...................................................................................................................... 171
5.4. Sonegação de Informações Requisitas ................................................................................................................ 172
6. PROCEDIMENTO PARA OS CRIMES PREVISTOS NA LEI. ............................................................................. 173
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: ESTATUTO DO IDOSO ................................................................................... 174
1. APLICAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI 9.099/95 .................................................................................... 174
1.1 Ação penal e inaplicabilidade das escusas absolutórias (Art.95) ......................................................................... 175
2. CRIMES EM ESPÉCIE................................................................................................................................... 177
2.1 Discriminação da pessoa idosa ............................................................................................................................. 177
2.2 Omissão de socorro .............................................................................................................................................. 178
2.3 Abandono de pessoa idosa................................................................................................................................... 179
2.4 Maus-tratos à pessoa idosa .................................................................................................................................. 180
2.5 Outros crimes contra a pessoa idosa ................................................................................................................... 182
2.6 Desobediência de ordem legal proferida em ação envolvendo pessoa idosa ..................................................... 184
2.7 Apropriação indébita contra pessoa idosa ........................................................................................................... 185
2.8 Recusa de acolhimento ou permanência de pessoa idosa ................................................................................... 186
2.9 Retenção indevida de cartão magnético ou outro documento ........................................................................... 187
2.10 Exibição ou veiculação de dados depreciativos ou injuriosos da pessoa idosa.................................................. 187
2.11 Induzimento de pessoa idosa a outorgar procuração ........................................................................................ 188
2.12 Coação de pessoa idosa ..................................................................................................................................... 189
2.13 Lavratura do ato notarial sem representação legal do idoso ............................................................................. 189
2.14 Impedimento ou embaraço a ato dos órgãos fiscalizadores .............................................................................. 190
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SEMANA 07/12

META 4 .......................................................................................................................................................... 191


DIREITOS HUMANOS: DIREITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MENTAL, DIREITOS DOS GRUPOS VULNERÁVEIS E DAS
MINORIAS E DEFENSORES DE DIREITOS HUMANOS ..................................................................................... 191
DOCUMENTOS INTERNACIONAIS SOBRE DIREITOS HUMANOS .................................................................... 193
1. DIREITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL................................................................................................. 193
1.1 Direito À Integridade Física E Moral ..................................................................................................................... 193
1.2. Convenção Contra A Tortura E Outros Tratamentos Ou Penas Cruéis, Desumanos Ou Degradantes ................ 193
1.3 Protocolo Facultativo à Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou
Degradantes ............................................................................................................................................................... 195
1.4 Convenção Das Nações Unidas Contra O Crime Organizado Transnacional ........................................................ 197
1.4.1 Protocolo de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças,
complementar à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional ................................ 198
1.5 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos .............................................................................. 200
1.5.1 Convenção Interamericana Para Prevenir E Punir A Tortura ......................................................................... 200
1.6 Proteção Nacional ................................................................................................................................................ 201
1.6.1 Lei N° 9.455/97 (Lei De Tortura) .................................................................................................................... 201
2. DIREITOS DOS GRUPOS VULNERÁVEIS E DAS MINORIAS .......................................................................... 201
3. DIREITOS DAS MULHERES .......................................................................................................................... 202
3.1 Declaração E Plataforma De Ação De Pequim ................................
..................................................................... 202
3.2 Sistema Global De Proteção Dos Direitos Humanos ............................................................................................ 204
3.2.1 Convenção Sobre A Eliminação De Todas As Formas De Discriminação Contra A Mulher............................ 204
3.2.2 Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher
................................................................................................................................................................................ 205
3.3 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos ................................................................. 206
3.3.1 A Convenção Interamericana Para Prevenir, Punir E Erradicar A Violência Contra A Mulher ....................... 206
3.4. Proteção Nacional ............................................................................................................................................... 207
3.4.1 Lei N° 11.340/06 (Lei Maria Da Penha) .......................................................................................................... 208
4. DIREITO À NÃO DISCRIMINAÇÃO RACIAL .................................................................................................. 209
4.1. Sistema Global De Proteção Dos Direitos Humanos ........................................................................................... 209
4.1.1 Convenção Sobre A Eliminação De Todas As Formas De Discriminação Racial ............................................. 209
4.2 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos .............................................................................. 210
4.2.1 Convenção Interamericana Contra O Racismo, A Discriminação Racial E Formas Correlatas De Intolerância
................................................................................................................................................................................ 210
4.3 Proteção Nacional ................................................................................................................................................ 213
4.3.1 Constituição Da República Federativa Do Brasil De 1988 .............................................................................. 213
5. DIREITO À ORIENTAÇÃO SEXUAL E À IDENTIDADE DE GÊNERO ................................................................ 215
5.1 Direito à igualdade e à não discriminação ........................................................................................................... 215
5.2 Direito à Identidade de Gênero ............................................................................................................................ 216
5.3 Direito ao Nome ................................................................................................................................................... 217
5.4 Direito à Orientação Sexual .................................................................................................................................. 217
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SEMANA 07/12

5.5.1 Conceitos ....................................................................................................................................................... 218


5.5 Discriminação Histórica ........................................................................................................................................ 219
5.6 Soft Law ................................................................................................................................................................ 219
5.6.1 Princípios De Yogyakarta ............................................................................................................................... 219
5.6.2 Princípios De Yogyakarta+10 ......................................................................................................................... 222
6. DIREITOS DAS PESSOAS RECLUSAS ............................................................................................................ 222
6.1 Soft Law ................................................................................................................................................................ 222
6.1.1 Regras Mínimas Das Nações Unidas Para O Tratamento De Reclusos .......................................................... 222
6.1.2 Regras Das Nações Unidas Para O Tratamento De Mulheres Presas E Medidas Não Privativas De Liberdade
Para Mulheres Infratoras ........................................................................................................................................ 226
7. DIREITOS DOS REFUGIADOS ...................................................................................................................... 229
7.1 Introdução ............................................................................................................................................................ 229
7.2 Sistema Global De Proteção Dos Direitos Humanos ............................................................................................ 231
7.2.1 Estatuto Do Alto Comissariado Das Nações Unidas Para Refugiados ............................................................ 231
7.2.2 Convenção Relativa Ao Estatuto Dos Refugiados E Seu Protocolo Facultativo ............................................. 231
7.2.3 Deslocados Internos ...................................................................................................................................... 233
7.3 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos .............................................................................. 233
7.3.1 Declaração De Cartagena Sobre Os Refugiados............................................................................................. 233
7.4 Proteção Nacional ................................................................................................................................................ 234
7.4.1 Lei N° 9.474/97 ................................................................
.............................................................................. 234
7.5 Refúgio x Asilo ...................................................................................................................................................... 234
8. DEFENSORES DE DIREITOS HUMANOS ...................................................................................................... 235
8.1 Declaração Sobre O Direito E A Responsabilidade Dos Indivíduos, Grupos Ou Órgãos Da Sociedade De Promover
E Proteger Os Direitos Humanos E Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos ................................. 236
DIREITOS HUMANOS: DIREITOS DAS VÍTIMAS DE ABUSO DE CRIMINALIDADE E CONDUTA DOS
FUNCIONÁRIOS DA LEI................................................................................................................................
... 238
1. JUSTIÇA ÀS VÍTIMAS DA CRIMINALIDADE E ABUSO DE PODER ................................................................
. 238
1.1 A Declaração Dos Princípios Básicos De Justiça Relativos Às Vítimas Da Criminalidade E De Abuso De Poder ... 238
2. CONDUTA DOS FUNCIONÁRIOS RESPONSÁVEIS PELA APLICAÇÃO DA LEI ................................................ 239
2.1 Código De Conduta Para Os Funcionários Responsáveis Pela Aplicação Da Lei ................................................... 239
META 5 .......................................................................................................................................................... 243
DIREITO CIVIL: DAS COISAS ............................................................................................................................ 243
1. CARACTERÍSTICAS ...................................................................................................................................... 244
2. DIREITOS REAIS X DIREITOS PESSOAIS PATRIMONIAIS.............................................................................. 245
3. CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS REAIS ........................................................................................................ 246
4. POSSE ......................................................................................................................................................... 247
4.1 Teorias da Posse ................................................................................................................................................... 247
4.2 Posse x Detenção.................................................................................................................................................. 248
4.2.1 Hipóteses de detenção .................................................................................................................................. 249
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SEMANA 07/12

4.3 Classificação da Posse .......................................................................................................................................... 250


4.3 Efeitos da Posse .................................................................................................................................................... 252
4.4. Composse: (Art. 1.199, CC) .................................................................................................................................. 254
4.5 Formas de Aquisição, Transmissão e Perda da Posse .......................................................................................... 254
5. PROPRIEDADE ............................................................................................................................................ 255
5.1 Atributos: GRUD ................................................................................................................................................... 255
5.2 Classificação da propriedade: ............................................................................................................................... 256
5.3 Características ...................................................................................................................................................... 256
5.4 Função social da propriedade: ............................................................................................................................. 257
5.5 Propriedade resolúvel e propriedade fiduciária................................................................................................... 258
5.6 Formas de aquisição da propriedade imóvel e móvel:......................................................................................... 258
5.6.1 Modos de Aquisição de Bem Imóvel.............................................................................................................. 259
5.6.2 Modos de Aquisição da Propriedade Móvel .................................................................................................. 262
6. PERDA DA PROPRIEDADE MÓVEL OU IMÓVEL:......................................................................................... 263
7. DIREITOS REAIS DE GOZO OU FRUIÇÃO .................................................................................................... 264
7.1 Superfície .............................................................................................................................................................. 264
7.2 Uso ( = Usufruto Anão, Nanico Ou Reduzido) ...................................................................................................... 265
7.3 Habitação ............................................................................................................................................................. 265
CRIMINOLOGIA: CONCEITO, OBJETO, MÉTODO, CLASSIFICAÇÃO DA CRIMINOLOGIA E ESTATÍSTICA CRIMINAL
....................................................................................................................................................................... 266
1. CONCEITO CARACTERÍSTICAS, MÉTODO E FUNÇÕES
................................................................................ 266
1.1 Considerações Preliminares ................................................................................................................................. 266
1.2 Conceito ............................................................................................................................................................... 266
1.3 Criminologia X Direito Penal X Política Criminal ................................................................................................... 267
1.4 Características ...................................................................................................................................................... 269
1.5 Método ................................................................................................................................................................. 271
1.6 Funções ................................................................................................................................................................ 272
2. OBJETOS DA CRIMINOLOGIA ..................................................................................................................... 273
2.1 Delito .................................................................................................................................................................... 273
2.2 Criminoso ............................................................................................................................................................. 274
2.3 Vítima ................................................................................................................................................................... 275
2.4 Controle Social...................................................................................................................................................... 283
3. FINALIDADE DA CRIMINOLOGIA ................................................................................................................ 284
4. ESTATÍSTICA CRIMINAL .............................................................................................................................. 285
4.1 Cifras Ocultas/Negras ........................................................................................................................................... 286
4.2 Cifras Cinzas, Amarelas e Verdes .......................................................................................................................... 286
4.3 Técnicas de Investigação da Cifra Negra .............................................................................................................. 289
4.4 Prognóstico Criminológico ................................................................................................................................... 290
CRIMINOLOGIA: PREVENÇÃO CRIMINAL ....................................................................................................... 292
1. PREVENÇÃO CRIMINAL .............................................................................................................................. 292
1.1 Prevenção criminal no Estado Democrático de Direito ........................................................................................ 292
1.2 Prevenção Primária .............................................................................................................................................. 292
1.3 Prevenção secundária .......................................................................................................................................... 293
1.4 Prevenção terciária............................................................................................................................................... 293
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SEMANA 07/12

1.5 Reação social ........................................................................................................................................................ 295


1.6 Teoria da Pena e Prevenção Criminal ................................................................................................................... 296
1.6.1 Prevenção Geral (Positiva e Negativa) ........................................................................................................... 296
1.6.2 Prevenção Especial (Positiva e Negativa)....................................................................................................... 297
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SEMANA 07/12

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA SEMANA 07


META DIA ASSUNTO
DIREITO PENAL: Crimes Contra a Dignidade Sexual
1 SEG DIREITO PENAL: Crimes Contra a Paz Pública
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Lei do Inquilinato
2 TER DIREITO PROCESSUAL PENAL: Prisões
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Lei de Organização
Criminosa
3 QUA
LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Estatuto do Idoso
DIREITOS HUMANOS: Direito à Integridade Física e Mental, Direitos dos
Grupos Vulneráveis e das Minorias e Defensores de Direitos Humanos
4 QUI
DIREITOS HUMANOS: Direitos das Vítimas de Abuso de Criminalidade e
Conduta dos Funcionários da Lei
DIREITO CIVIL: Das Coisas
5 SEX CRIMINOLOGIA: Conceito, Objeto, Método, Classificação da Criminologia
e Estatística Criminal
REVISÃO SEMANAL (Anexo)
6 SÁB
LEITURA DO CADERNO DE JURISPRUDÊNCIA (Anexo)

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SEMANA 07/12

META 1

DIREITO PENAL: CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CÓDIGO PENAL
⦁ Art. 213 A 234-A

OUTROS DISPOSITIVOS:
⦁ Art. 5º, XL, CF/88
⦁ Art. 7º, II, Lei Maria da Penha
⦁ Art. 61, Lei de Contravenções Penais
⦁ Art. 65, Lei de Contravenções Penais (atualmente revogado)
⦁ Arts. 240, 241 e 244-A, ECA
⦁ Art. 1º, §1º, Lei 8072/90
ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

CÓDIGO PENAL
⦁ Art. 213 (análise comparativa com o art. 217-A)
⦁ Arts. 215 e 215-A
⦁ Art. 216-B
⦁ Arts. 218- e 218-C
⦁ Art. 226
⦁ Art. 228
⦁ Art. 233
⦁ Art. 234-A

OUTROS DISPOSITIVOS:
⦁ Art. 240, ECA
⦁ Arts. 241-A e 241-D, ECA
⦁ Art. 244-A, ECA
⦁ Art. 1º, §1º, inc. V, VI e VIII, Lei 8072/90

SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA


Súmula 593-STJ: O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato
libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do
ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.

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Súmula 608-STF: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada. (obs: Art.225 CP – lei 13.718/18 - Todos os crimes são de ação pública incondicionada)

O termo “dignidade sexual” foi utilizado neste título apenas após a Lei 12.015/2009 que, dentre de
uma série de mudanças, também o modificou. Antes, utilizava-se “Dos crimes contra os costumes”.
A doutrina criticava a antiga nomenclatura, tendo em vista que dá um sentido de maior ofensa à
sociedade do que à vítima violentada.
Sabe-se que costume é a “reiteração de um comportamento em face da crença na sua
obrigatoriedade”, de modo que buscava-se definir um padrão médio de sexualidade, utilizando expressões
preconceituosas contra as mulheres como “mulher honesta”.
A partir daí, reconheceu-se que a tipificação de tais delitos retira seu fundamento da dignidade da
pessoa humana.

1. DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL

1.1 Estupro (Art. 213, CP)

1.1.1 Análise Do Caput

a) Classificação: Crime de elevado potencial ofensivo, hediondo em todas as modalidades, comum,


comissivo, de forma livre, material, de dano, instantâneo, unissubjetivo e plurissubsistente.
b) Evolução legislativa: Antes de 2009 estupro era só conjunção carnal, sendo que os atos libidinosos diversos
consistiam em tipo penal autônomo, qual seja, atentado violento ao pudor (revogado formalmente, já que
houve continuidade normativo-típica ou transmudação geográfica do tipo penal, vez que a conduta migrou
para o estupro e continua sendo penalmente relevante).

ANTES DA LEI 12.015/09 DEPOIS DA LEI 12.015/09


Art. 213 que previa o estupro, o qual consistia na Reuniu os dois dispositivos anteriores à lei no art.
punição da conjunção carnal violenta, tendo como 213, que prevê o crime de estupro, o qual pune a
sujeito ativo o homem e passivo a mulher. conjunção carnal violenta ou a prática de atos
libidinosos diversos da conjunção carnal.
Art. 214 que previa o atentado violento ao pudor, o
qual punia atos libidinosos diversos da conjunção OBS.: Não houve abolitio criminis do art. 214, pois os
carnal, tendo como sujeito ativo e passivo qualquer atos libidinosos continuam puníveis, apenas com
pessoa. outra roupagem (princípio da continuidade
normativo-típica).

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Após a Lei n° 12.015/2009, quando o agente pratica, além da conjunção carnal (coito vaginal), outro ato
libidinoso independente (ex.: coito anal), no mesmo contexto fático e contra a mesma vítima, realiza mais
de um crime?
NÃO. Trata-se de CRIME ÚNICO. O STJ definiu que o art. 213 do CP, com redação dada pela Lei n° 12.015/2009
é tipo penal misto ALTERNATIVO.

O fato de o agente ter praticado coito vaginal e também outro ato libidinoso (exs.: coito anal, sexo oral)
pode ser utilizado pelo juiz para aumentar a pena do réu?
SIM. O juiz irá reconhecer que se trata de crime único, condenando apenas pelo art. 213 do CP com a nova
redação dada pela Lei n° 12.015/2009. No entanto, na 1ª fase da dosimetria da pena (análise das
circunstâncias judiciais do art. 59), o magistrado deverá aumentar a pena-base considerando que a
culpabilidade do agente é mais intensa e as circunstâncias em que o crime foi praticado são mais reprováveis
que o normal já que impuseram à vítima um nível de sofrimento ainda maior do que aquele que seria
necessário para a consumação do delito. Com efeito, a vítima foi obrigada a realizar dois atos sexuais
diferentes. Isso pode (e deve) ser valorado negativamente pelo julgador.

Por fim, uma última observação importante:


Se o agente pratica conjunção carnal e outros atos libidinosos contra vítimas diferentes ou, então, contra
uma só vítima, mas em contextos fáticos diferentes (ex.: em dois dias seguidos), haverá continuidade delitiva
ou até concurso material, a depender do caso concreto. (DIZER O DIREITO).

Obs.: Segundo o STF, os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, cometidos antes ou depois da edição
da Lei nº 12.015/2009, são considerados hediondos, ainda que praticados na forma simples, sendo
irrelevante que a prática de qualquer deles tenha causado, ou não, lesões corporais de natureza grave ou
morte (Info. 835).

Ainda há a figura do atentado violento ao pudor no ordenamento jurídico? Sim, no Código Penal
Militar (art. 233, CPM).

c) Sujeitos do delito: Antes o crime era bipróprio, pois somente homem poderia ser sujeito ativo e apenas
mulher figurava como sujeito passivo. Hoje é crime bicomum.
● Sujeito ativo: qualquer pessoa.
● Sujeito passivo: qualquer pessoa (no entanto, se for menor de 14 o crime será de estupro de
vulnerável, que será detalhado mais à frente).

Lembrando que:
Conjunção carnal (pênis/vagina): sexos opostos.

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Atos libidinosos (sexo oral, anal, toques íntimos, dentre outras práticas): indiferente o sexo dos envolvidos.

Antes adotava-se a tese de que não configurava o crime caso fosse cometido pelo marido contra a
esposa. Hoje não só configura, como é ainda causa de aumento de pena (art. 226, II do CP).
d) Objeto jurídico: Crime pluriofensivo:
✔ Liberdade sexual
✔ Integridade física (se praticado com violência)
✔ Liberdade individual (se praticado com grave ameaça).

e) Objeto material: Pessoa que sofre o constrangimento.


f) Tipo objetivo: Pune os atos de libidinagem com violência ou grave ameaça. A conduta incriminada no atual
tipo penal é constranger, ou seja, tolher a liberdade. O constrangimento de forma isolada configura o crime
de constrangimento ilegal, é o meio para a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso, sem o
consentimento da vítima.
Quando a lei diz “ou outro ato libidinoso diverso”, está autorizando interpretação analógica, ou seja, o
intérprete vai analisar se o ato praticado viola o bem jurídico do mesmo modo que a conjunção carnal.

● Para ser estupro, o meio de execução tem que ser violência ou grave ameaça! Ausentes tais meios
executórios, poderá caracterizar outro crime contra a dignidade sexual, mas não estupro.
● O constrangimento pode ocorrer de duas formas: violência (vis absoluta) violência real, o emprego
de força física, ou grave ameaça (vis relativa) sendo esta violência moral, consistente em promessa
de mal grave, capaz de aterrorizar a vítima, de modo a tolher sua liberdade sexual.
● A jurisprudência e doutrina majoritária entendem que o crime de estupro DISPENSA o contato físico
entre o sujeito ativo e passivo. Ex.: Comete crime o agente que, para satisfazer sua lascívia, obriga a
vítima a se masturbar enquanto a contempla.

Atenção! Stealthing (dissimulação) ocorre quando alguém retira o preservativo durante a relação sexual
sem o consentimento do parceiro.
Na Suíça há precedente capitulando como crime de estupro, tendo em vista que a retirada do preservativo
durante o ato sexual, sem que a outra pessoa percebesse, caracterizou um vício de consentimento tornando
a conduta criminosa.
No Brasil, é necessário analisar o caso concreto:
1) se o ato sexual é consentido e, durante o ato, o agente retira o preservativo e, mesmo diante da negativa
reiterada do parceiro, continua a prática sexual usando violência ou grave ameaça - estupro
2) se o ato sexual é consentido, desde que mediante o uso de preservativo, mas o agente sorrateiramente
retira a proteção e continua até a sua finalização, sem que o parceiro perceba, não há crime de estupro pois
ausente a V/GA, podendo caracterizar o art. 215, CP, em razão da fraude. (Estelionato sexual)

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g) Elemento subjetivo: Dolo + finalidade específica de agir (que é o que difere do delito de constrangimento
ilegal).
h) Consumação e tentativa:
● Crime material - O crime se consuma com a prática da conjunção carnal ou dos atos libidinosos.
● Tentativa: admite.

Inseminação artificial forçada: caso não haja prática sequer de ato libidinoso, não há estupro.
Restará configurado mero constrangimento ilegal, vez que o estupro exige conjunção carnal ou ato
libidinoso diverso. Assim, caso o ato resulte em gravidez, a situação não estaria inclusa na hipótese
em que não se pune o aborto.
Estupro X Impotência sexual: é possível a ocorrência do estupro mesmo que o sujeito ativo tenha
disfunção erétil, já que hoje atos libidinosos diversos da conjunção carnal também configuram
estupro.
A violência ou grave ameaça podem ser exercidas contra terceira pessoa, para obrigar a vítima a
ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso? A
doutrina majoritária entende que sim, por ser uma terrível forma de constrangimento.
Caso o agente obrigue a vítima a presenciar/assistir ato sexual seu com terceira pessoa será
caracterizado estupro? NÃO. Caso a vítima seja maior de 14 anos, o crime será de importunação
sexual (art. 215-A, CP), ou constrangimento ilegal (art. 146) se houver o emprego de violência ou
grave ameaça. Caso seja menor de 14, o crime será o do art. 218-A do CP: satisfazer a lascívia
mediante a presença de criança ou adolescente.
Dissenso da vítima: Caso o ato sexual se inicie contra a vontade da vítima, mas durante a vítima
concorde e termine consentido, resta desconfigurado o estupro. Por outro lado, caso o ato sexual se
inicie com o consentimento das duas partes, mas durante o ato, por uma razão qualquer um dos
envolvidos não queira continuar, exige-se da outra parte que seja cessada a sua atuação, sob pena
de caracterizar o tipo penal aqui estudado.

1.1.2 Qualificadoras

§1º - Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor


de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§2º - Se da conduta resulta morte: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

a) Estupro qualificado pela idade da vítima: Aqui o artigo refere-se à vítima maior de 14 anos e menor de 18
anos. Isso porque, se a vítima for menor de 14 anos, o crime praticado será estupro de vulnerável. Quanto à
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idade da vítima, para a caracterização qualificada do delito, é necessário que o agente tenha ciência da idade,
sob pena de não incidir a qualificadora, pois veda-se a responsabilidade objetiva.
b) Estupro qualificado pela lesão corporal grave ou morte: Em ambos os casos o resultado gravoso deve ser
preterdoloso. Se o agente teve dolo de realmente matar, por exemplo, responderá por estupro + homicídio
em concurso.

Lei 14.069/2020 - Cadastro Nacional de pessoas condenadas por crime de estupro


A lei nº 14.069/2020 instituiu o cadastro nacional de pessoas condenadas por crime de estupro,
com divulgação de dados das pessoas condenadas por esse crime, inclusive com divulgação de fotos. No
caso do livramento condicional, haverá divulgação do local de moradia e a atividade laboral desenvolvida
nos últimos três anos.

1.2 Violação Sexual Mediante Fraude (Art. 215)

a) Classificação: Crime de elevado potencial ofensivo, bicomum, material, de forma livre, comissivo,
instantâneo de dano, unissubjetivo e plurissubsistente.
b) Nomenclatura: Também chamado pela doutrina de “estelionato sexual”, justamente porque há o
emprego da FRAUDE.
● Ou seja: Aqui não há violência ou grave ameaça, mas apenas fraude ou outro meio que impeça ou
dificulte a livre manifestação de vontade da vítima.
● Mediante fraude: ardil, engodo, artifício: é o caso do sujeito que se passe por seu irmão gêmeo
univitelino para ter relação sexual com a namorada deste, a mantendo em erro.
● Por outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima: trata-se de uma
fórmula que permite a interpretação analógica, a partir do paradigma fraude.
● Quais seriam esses “outros meios” além da fraude?
Conforme a doutrina, pode ser a embriaguez moderada e o temor reverencial – que embora não
constitua ameaça, gere sensação de medo.
A violação mediante fraude exige que a vítima tenha capacidade de compreensão, consentindo com
a prática do ato libidinoso em virtude da fraude empregada pelo agente, o que torna a sua vontade viciada.

💣 Cuidado: A fraude utilizada não pode anular completamente a capacidade de resistência da vítima,
pois, caso assim ocorra, o delito será de estupro de vulnerável.

Violação sexual mediante fraude (art. 215) Estupro de Vulnerável (art. 217-A)
Vítima consciente, com capacidade de discernir, Ausência de capacidade de discernimento para a
porém, com falsa percepção da realidade. prática do ato.

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Há capacidade de resistência, que pode ser Não há capacidade de resistência.


manifestada quando compreendida a fraude.
Presumidamente capaz, porém, com consentimento Presumidamente incapaz de consentir.
falho. Consentimento inválido.

c) Objeto jurídico: liberdade sexual.


d) Elemento subjetivo: dolo + elemento subjetivo específico.
Ex.: irmão gêmeo que se faz passar pelo outro irmão para ter relação sexual com a namorada dele.
e) Consumação e tentativa:
● Crime material - O delito consuma-se com a prática do ato de libidinagem.
● Doutrina majoritária – é um tipo misto alternativo
● Admite-se a tentativa.

Obs.: Caso o agente busque com o ato auferir alguma vantagem econômica, aplica-se também a pena de
multa. Ex. dado por Nucci: mulher que deseje engravidar de um milionário, motivo pelo qual, embriagando-
o, não completamente, termina por manter a relação sexual, sem preservativo, buscando, sem dúvida,
vantagem econômica, ainda que por meio da criança (pensão alimentícia ou herança).

1.3 Importunação Sexual (Art. 215-A)

a) Introdução: Trata-se de tipo penal introduzido no CP em 2018, como forma de resposta mais grave que a
antiga contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor e menos grave que o estupro.
Abrange condutas intermediárias como os casos de homens que se masturbavam e ejaculavam em
mulheres em metrôs, por exemplo, que ganharam notoriedade nos veículos de comunicação recentemente.
Note que não há violência ou grave ameaça.
b) Classificação: Trata-se de crime de médio potencial ofensivo, bicomum, material, comissivo, de forma
livre, de dano, instantâneo, unissubjetivo e plurissubsistente. Não é hediondo.
c) Sujeitos do crime: trata-se de crime comum.
Cuidado: só pode anuir quem tem idade igual ou maior que 14 anos. Caso a vítima seja menor de 14,
o crime é de estupro de vulnerável.
Atenção para a majoração de pena prevista no art. 226, II, CP.
d) Conduta – Núcleo verbal é praticar ato libidinoso, contra alguém e sem sua anuência.
● O tipo penal contém subsidiariedade expressa: aplicam-se as penas da importunação sexual se a
conduta não caracteriza crime mais grave.
● O tipo exige que o ato libidinoso seja praticado contra alguém. Ou seja: pressupõe pessoa específica
a quem se dirige o ato de autossatisfação.
● Crime formal, por não exigir a satisfação da lascívia do agente ou de outrem para a consumação.

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Nesse sentido a doutrina de Victor Eduardo Rio Gonçalves: "o ato seja praticado contra alguém e não com
alguém, de modo que o contato físico não é imprescindível. É necessário, porém, que a conduta seja
direcionada especificamente a uma ou algumas pessoas”

● É essa pessoa determinada que diferencia o crime de importunação sexual do crime de ato obsceno:
Importunação sexual x Ato obsceno
O crime de ato obsceno que, no caso concreto, poderia ser confundido com a importunação sexual.
Vamos comparar os dois crimes:

IMPORTUNAÇÃO SEXUAL ATO OBSCENO

Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a suaArt. 233. Praticar ato obsceno em lugar público,
anuência ato libidinoso com o objetivo de ou aberto ou exposto ao público:
satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o multa.
ato não constitui crime mais grave.

O sujeito passivo é determinado (uma pessoa Sujeito passivo é a coletividade (crime vago).
determinada ou um grupo de pessoas
determinado).

Exige-se um elemento subjetivo especial. O O elemento subjetivo é o dolo, não se exigindo


agente pratica a conduta “com o objetivo de do sujeito nenhuma finalidade específica.
satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”.

A conduta não precisa ter sido praticada em Para que o crime se configure, é indispensável
lugar público, ou aberto ou exposto a público. Ex: que o ato obsceno tenha sido praticado em lugar
pode ser praticado no interior de uma casa. público, ou aberto ou exposto ao público.

Para que o crime se configure, é indispensável Não importa se houve ou não anuência das
que o ato libidinoso tenha sido praticado contra pessoas que estavam presentes. Se o ato
alguém que não concordou com isso. A análise obsceno foi praticado em lugar público, ou
da anuência ou não da pessoa atingida é aberto ou exposto ao público, haverá o crime.
fundamental.

Infração de médio potencial ofensivo. Infração de menor potencial ofensivo.

Caiu em prova Delegado SP/2014! “X”, em um cinema, durante a exibição de um filme que continha cenas
de sexo, é flagrado por policiais expondo e manipulando sua genitália. Tal conduta, em tese, tipifica o crime
de ato obsceno. (item correto).

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● Com sua introdução, foi revogado o artigo 61 da Lei de Contravenções Penais (continuidade
normativo-típica, mediante lei penal mais gravosa, que não retroage).

e) Elemento subjetivo: dolo genérico + dolo específico (o crime exige a finalidade específica de satisfazer a
própria lascívia ou de terceiro).
Fique atento à jurisprudência pertinente: Não é possível desclassificar crime de estupro de
vulnerável para o delito de importunação sexual. STJ. 3ª Seção. AgRg na RvCr 4.969/DF, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 26/06/2019.

1.4 Assédio Sexual (Art. 216-A)

a) Classificação: Crime de menor potencial ofensivo na modalidade simples. Crime de forma livre, comissivo,
instantâneo, de dano, unissubjetivo e pode ser unissubsistente ou plurissubsistente.
b) Bem jurídico tutelado: A liberdade sexual, bem como a intimidade e dignidade das pessoas que estão em
situação de desigualdade em face de inferioridade hierárquica ou descendência inerente ao exercício de
emprego, cargo ou função.
c) Tipo subjetivo: Tipo doloso, sem previsão de modalidade culposa.
● Dolo
● Elemento subjetivo especial do tipo -"com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual".
d) Sujeitos: crime bipróprio
● Sujeito ativo: superior hierárquico ou ascendente em relação profissional
● Sujeito passivo - subordinado ou empregado de menor escalão.

Obs.: Tanto o sujeito ativo como o passivo pode ser homem ou mulher

e) Tipo objetivo: O tipo penal consiste em constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência
inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Para o autor Rogério Sanches entende que o significado
de constrangimento aqui é a insistência inoportuna.
1. Relação líder espiritual x fiel
É pacífico na doutrina e jurisprudência que se trata de Fato atípico, não configurando crime de
assédio sexual. Apesar da relação de superioridade na esfera de liderança espiritual, não há assédio sexual
na relação entre líder espiritual (padre, pastor etc.). Para o autor Masson os líderes religiosos gozam do
respeito e até mesmo da subserviência irrestrita dos seus seguidores, proporcionados sobretudo pela fé.
Todavia, não há relação entre eles relação inerente a cargo, emprego ou função. Consequentemente o
constrangimento do líder religioso dirigido a um fiel, com intuito de obter vantagens ou favorecimento

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sexual, não acarreta o crime tipificado no art. 216-A do CP, sem prejuízo do delito de estupro a ser avaliado
no caso concreto.

2. Professor x Aluno?
É possível a configuração de delito de assédio sexual na relação entre professor e aluno (Resp.
1.759.135/SP, 6a Turma, julgado em 01/10/2019). "Por ocasião do julgamento do REsp n. 1.759.135/SP, que
manteve a condenação de um professor por assédio sexual contra uma aluna, concluiu-se ser "patente a
aludida ascendência, em virtude da função desempenhada pelo agente devido à atribuição que tem o
professor de interferir diretamente na avaliação e no desempenho acadêmico do discente, contexto que lhe
gera, inclusive, o receio da reprovação; [...] a ascendência constante do tipo penal objeto deste recurso não
deve se limitar à ideia de relação empregatícia entre as partes" (STJ, REsp 1730287/SC, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 19/12/2019)

f) Consumação: Ocorre a consumação do crime com a prática do ato constrangedor, independentemente da


obtenção de favor sexual.

Obs.: Doutrina minoritária entende ser crime habitual, que exige insistência para se consumar, mas não
prevalece.

Tentativa: admissível na forma plurissubsistente.

1.5 Da Exposição da Intimidade Sexual

Em que consiste o crime? O agente


✔ produz (cria, financia)
✔ ou registra (fotografa, filma, grava etc.)
✔ cena de nudez
✔ ou ato sexual ou libidinoso
✔ de caráter íntimo e privado
✔ sem autorização dos participantes.

a) Bem jurídico protegido: Tutela-se a dignidade sexual da vítima, especificamente no que concerne ao
seu aspecto da intimidade sexual, compreendendo o recato sobre a prática de atos sexuais e sobre a
própria nudez.
Na figura do parágrafo único, a honra da vítima também é protegida.
b) Sujeitos
● Tanto o sujeito ativo como o sujeito passivo podem ser qualquer pessoa

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● Pode, inclusive, ser praticado por uma das pessoas que teve sua imagem registrada
● Na hipótese de divulgação pornografia que envolva criança ou adolescente, haverá o crime do art.
240 do ECA (princípio da especialidade)
● Se houver pluralidade de vítimas registradas na mesma oportunidade – concurso formal perfeito de
crimes
c) Elemento subjetivo: É o dolo. Não se exige especial fim de agir.
Não admite modalidade culposa.
d) Tipo objetivo
● Núcleos do tipo: tipo misto alternativo
✔ Produzir – levar a efeito, dar origem, criar
✔ Fotografar – obter imagem pela fotografia
✔ Filmar – registrar em um filme, gravar
✔ Registrar
– gravar
3. CUIDADO - (NÃO ABRANGE AS CONDUTAS DE DIRIGIR E REPRODUZIR)

● Crime instantâneo e de forma livre


● Objeto material: cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado.
∘ A nudez pode ser total ou parcial
∘ Não há nudez em cenas meramente sensuais

Considerações importantes sobre o tipo objetivo:


1) Caráter íntimo e privado - A cena registrada deve ter sido praticada em caráter íntimo e privado. Se
o agente filma um casal mantendo relações sexuais em uma praça, por exemplo, não configura o
crime.
2) Sem autorização dos participantes - Se há autorização, o fato é atípico, salvo em se tratando de
criança ou adolescente, situação na qual configura o crime do art. 240 do ECA.
Vale ressaltar que, para não ser crime a autorização deve ter sido dada por todos os participantes. Se
faltar a autorização de um dos participantes do ato, haverá crime. Imagine que Rodrigo irá manter
relações sexuais com uma garota que conheceu na festa. Ele autoriza que seu irmão Ricardo,
escondido, filme a cena. Ocorre que a garota não autorizou o registro. Obviamente, haverá crime.
3) Art. 216-B x Art. 218-C – Divergência - Se o indivíduo, além de filmar, fotografar ou registrar sem
autorização, também DIVULGAR o conteúdo:
∘ 1ª posição – haverá concurso material, pois há bens jurídicos diversos.
∘ 2ª posição – haverá aplicação do princípio da consunção, se praticadas pelo mesmo agente e
sobre o mesmo objeto!
e) Consumação e Tentativa: Trata-se de crime formal, consumação antecipada ou resultado cortado
(Autor Masson)

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Crime plurissubsistente – cabe tentativa


∘ Exemplo: equipamento esteja instalado e, antes de ser fotografada, a vítima perceba e evite o
constrangimento.
∘ Lembre-se: Crime plurissubsistente é aquele no qual a execução pode ser fracionada em vários atos.
f) Princípio da especialidade: Rogério Sanches explica que, se o agente faz o registro indevido e
posteriormente divulga a cena, deve responder pelos crimes dos arts. 216-B e 218-C em concurso
material.
g) Ação penal: Trata-se de crime de ação pública INCONDICIONADA.

Atenção ao INFO 772 DO STJ: O delito de registro não autorizado da intimidade sexual (art. 216-B do CP)
possui a natureza de ação penal pública incondicionada. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro
Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 25/4/2023.

h) Infração de menor potencial ofensivo: Trata-se de infração de menor potencial ofensiva, de forma que
o rito é sumaríssimo (Lei nº 9.099/95), cabendo transação penal e suspensão condicional do processo.

i) Figura equiparada

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia,


vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de
nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo.

No caput, a cena registrada é verdadeira.


Neste parágrafo único, por outro lado, a fotografia, vídeo ou áudio não é verdadeiro. Foi feita uma
montagem, ou seja, foram acrescentados elementos que não ocorreram na realidade.
Ex.: o agente pega imagem de uma modelo nua e, por meio do programa de computador Adobe
Photoshop troca o rosto da modelo pelo da vítima.
Divulgar cena do sósia de uma pessoa famosa (pessoa muito parecida), importa no crime tipificado
no § único?
R.: A doutrina entende que NÃO! Pois essa divulgação é de uma cena verdadeira, e o §único exige
que haja, necessariamente, uma alteração ou falsificação na imagem divulgada.

Sujeitos: Tanto o sujeito ativo como o sujeito passivo podem ser qualquer pessoa.
Trata-se, portanto, de crime bicomum.

Elemento subjetivo: É o dolo. Não se exige especial fim de agir. Não se exige o agente tenha feito
isso para se vingar da vítima ou alguma outra motivação especial.
Não admite modalidade culposa.
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Intuito de brincadeira: O crime se consuma ainda que o agente tenha feito a montagem com o intuito
apenas de diversão, ou seja, com a intenção de “brincar” com a vítima.

Vigência: A Lei nº 13.772/2018 entrou em vigor na data de sua publicação (20/12/2018).


Por ser uma lei mais gravosa, ela não se aplica para fatos ocorridos antes de sua vigência.

2. DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEIS

De início, importante lembrar que é muito comum a configuração de erro de tipo quanto aos crimes
deste capítulo, como em situações em que as supostas vítimas não aparentam ser menores de 14 ou de 18
anos, a depender do caso, nem revelam suas idades, até mesmo frequentando locais proibidos para menores,
de modo que, em sendo o conhecimento da idade elementar do tipo e havendo erro razoável, a conduta será
atípica, já que os tipos penais não contemplam a modalidade culposa, nem pode haver responsabilidade
penal objetiva.

2.1 Estupro de Vulnerável (Art. 217-A)

Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)
anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
§1º - Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém
que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento
para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer
resistência.
§2º - (VETADO)
§3º - Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§4º - Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
§5º - As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-se
independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido
relações sexuais anteriormente ao crime. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

a) Classificação: Crime hediondo, de elevado potencial ofensivo, comum, material, de forma livre, comissivo,
instantâneo, de dano, unissubjetivo e plurissubsistente.
b) Sujeitos do delito:
● Sujeito passivo: Pessoa vulnerável.
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∘ Vítima menor de 14 anos – trata-se de vulnerabilidade absoluta, presumida na Lei. Assim, não
importa se houve consentimento, pois este consentimento é tido como viciado.

Súmula 593-STJ: O crime de estupro de vulnerável configura-se com a conjunção


carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante o
eventual consentimento da vítima para a prática do ato, experiência sexual anterior
ou existência de relacionamento amoroso com o agente

∘ Aquele que, por enfermidade ou doença mental, não tem o necessário discernimento para a
prática do ato ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência:
▪ Pessoa que não pode oferecer resistência: trata-se de vítima que, embora não padeça
de nenhuma anomalia mental, embriaga-se até a inconsciência e é submetida ao ato
sexual sem poder consentir.
▪ No caso do deficiente mental: não se pune a relação sexual pelo simples fato de ter
sido praticado com alguém nessa condição (aqui a vulnerabilidade não é absoluta
como ocorre com os menores de 14 anos), de modo que só é crime se o agente praticar
relação sexual ou outro ato libidinoso com alguém que NÃO TEM O NECESSÁRIO
DISCERNIMENTO PARA A PRÁTICA DO ATO SEXUAL
. Assim, nessa hipótese, é
imprescindível apurar se a pessoa portadora de enfermidade ou doença mental tinha
ou não discernimento para a prática do ato.
▪ O delito de estupro de vulnerável, previsto no artigo 217-A, independe da ocorrência
de quaisquer lesões na vítima, uma vez que a violência é presumida.
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa. (Inclusive mentor intelectual**). Admite coautoria e participação.
** O mentor intelectual dos atos libidinosos responde pelo crime de estupro de
vulnerável. O estupro de vulnerável se consuma com a prática de qualquer ato de
libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima. Para que se configure ato
libidinoso, não se exige contato físico entre ofensor e vítima. Assim, doutrina e
jurisprudência sustentam a prescindibilidade do contato físico direto do réu com a
vítima, a fim de priorizar o nexo causal entre o ato praticado pelo acusado,
destinado à satisfação da sua lascívia, e o efetivo dano à dignidade sexual sofrido
pela ofendida. STJ. 6ª Turma. HC 478310, Rel. Min. Rogério Schietti, julgado em
09/02/2021 (Info 685).
c) Objeto material: Pessoa vulnerável
d) Objeto jurídico: Liberdade sexual
e) Elemento subjetivo: Dolo + especial finalidade de agir.

ATENÇÃO! A qualidade vulnerável da vítima deve ser conhecida pelo agente.

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SEMANA 07/12

● Se desconhece a qualidade do sujeito passivo e o crime foi cometido com violência ou grave ameaça
– art. 213, CP
● Se desconhece a qualidade do sujeito passivo e o crime foi cometido com fraude – Art. 215, CP.
● Se desconhece a qualidade do sujeito passivo e o crime foi cometido mediante qualquer outro meio
(inclusive com consentimento) - fato atípico por se tratar de erro de tipo.
f) Conduta: A conduta é simplesmente “ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com vulnerável:
● Crime de execução livre: Pode ser utilizado qualquer meio executório, não se encontrando restrito
à violência, grave ameaça e fraude.
● Há uma presunção absoluta de violência, de acordo com o STJ. Basta a simples prática de ato sexual
com pessoa vulnerável.
g) Consumação e tentativa:
● Crime material - O delito consuma-se com a prática do ato de libidinagem.
● Doutrina majoritária – é um tipo misto alternativo
● Admite-se a tentativa.
h) Resultados qualificadores: devem ser preterdolosos.
Obs.: Exceção de Romeu e Julieta: Teoria criada nos estados unidos, segundo a qual não se deve
considerar estupro de vulnerável quando a relação sexual for consentida e ocorrer com uma pessoa com
diferença etária de até cinco anos, tendo em vista que ambas as partes se encontram na mesma etapa de
desenvolvimento sexual. Assim, não caracterizaria estupro, por exemplo, a relação sexual consentida entre
uma menina de 13 anos e seu namorado de 18. No entanto, trata-se de teoria não aceita no Brasil.
Nesse sentido, é a súmula 593 do STJ, que diz que “o crime de estupro de vulnerável se configura
com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual
consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de
relacionamento amoroso com o agente”.
E para sanar de vez a divergência, o próprio código penal foi alterado pela Lei nº 13.718, de 2018,
com a inclusão do §5º no art. 217-A, que diz expressamente que §5º as penas previstas no caput e nos §§1º,
3º e 4º do mencionado artigo aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de
ela ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime.
Ressalta-se que o tema foi um dos tópicos exigidos na dissertação da 2ª fase do concurso de
Delegado de São Paulo. Segue a parte referente no espelho:

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Não obstante, o STJ possui precedentes relativizando a previsão legal e entendimento


jurisprudencial, a depender de circunstâncias muito específicas de cada caso.

Atenção!!! Art. 217-A - Distinguishing (distinção entendimento firmado no Recurso Repetitivo nº 1.480.881
e da Súmula 593 do STJ (estupro de vulnerável)

☞ É possível a distinção do entendimento firmado no Recurso Repetitivo nº 1.480.881 e da Súmula 593


do STJ para reconhecer a atipicidade material do crime de estupro de vulnerável, conforme
particularidades do caso concreto. Acompanhe os julgados:

Admite-se o distinguishing quanto ao Tema 918/STJ (REsp 1.480.881/PI), na


hipótese em que a diferença de idade entre o acusado e a vítima não se mostrou
tão distante quanto do acórdão paradigma (o réu possuía 19 anos de idade, ao
passo que a vítima contava com 12 anos de idade), bem como há concordância
dos pais da menor somado a vontade da vítima de conviver com o réu e o
nascimento do filho do casal, o qual foi registrado pelo genitor. Processo em
segredo de justiça, Rel. Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do
TRF1), Rel. para acórdão Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por maioria,
julgado em 16/5/2023, DJe 25/5/2023 (Info 777 STJ).

É possível a distinção do entendimento firmado no Recurso Repetitivo nº 1.480.881


e da Súmula 593 do STJ para reconhecer a atipicidade material do crime do art.
217-A do Código Penal, no caso em que o réu iniciou namoro com menor de 14
anos e dessa relação sobreveio um filho com formação de núcleo familiar. Não se
mostra coerente impor à vítima uma vitimização secundária pelo aparato estatal
sancionador pois a fixação da pena privativa de liberdade ao autor, em processo
no qual a pretensão do órgão acusador se revela contrária aos anseios da própria
vítima, acabaria por deixar a jovem e o filho de ambos desamparados não apenas
materialmente, mas também emocionalmente, desestruturando entidade
familiar constitucionalmente protegida. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp n.
2.019.664/CE, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/12/2022,
DJe de 19/12/2022

A caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal,
satisfaz que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14
anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento
amoroso entre o agente e a vítima não interfere na ocorrência do crime.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Não obstante a necessidade de uniformização da jurisprudência pátria, por meio da fixação de teses
em recursos repetitivos, em incidentes de assunção de competência bem como por meio da edição de
súmulas, não se pode negligenciar o caso concreto, com as suas particularidades próprias, sob pena de a
almejada uniformização acarretar injustiças irreparáveis.
O legislador não consegue prever todas as variáveis possíveis da conduta incriminada, igualmente as
teses firmadas em repetitivos nem sempre albergam as peculiaridades do caso concreto. O caso deve ser
sopesado de acordo com sua gravidade concreta e com sua relevância social, e não apenas pela mera
subsunção ao tipo penal. É nesse ponto que reside o instituto da distinguishing ou distinção, que autoriza a
não aplicação de uma tese firmada, quando verificadas particularidades que impedem o julgamento
uniforme no caso concreto.

Após os julgados anteriores, o STJ trouxe novos casos, não admitindo a aplicação da tese por
tratarem de um relacionamento em que não houve consentimentos dos pais:

Não cabe a distinção realizada no julgamento do REsp 1.977.165/MS - caso de dois


jovens namorados, cujo relacionamento tinha aquiescência dos genitores da vítima,
sobrevindo um filho - na hipótese em que não há consentimento da responsável
legal - o que impossibilita qualquer relativização da presunção de vulnerabilidade
de menor de 14 anos no crime de estupro de vulnerável. STJ. Processo em segredo
de justiça, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 14/8/2023, DJe
21/8/2023. (Info 787)

Não se admite o distinguishing realizado no julgamento do AgRg no REsp


1.919.722/SP - caso de dois jovens namorados, cujo relacionamento foi aprovado
pelos pais da vítima, sobrevindo um filho e a efetiva constituição de núcleo
familiar - nas hipóteses em que não há consentimento dos responsáveis legais
somado ao fato do acusado possuir gritante diferença de idade da vítima - o que
invalida qualquer relativização da presunção de vulnerabilidade do menor de 14
anos no crime de estupro de vulnerável. Processo em segredo de justiça, Rel.
Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em
14/3/2023, DJe 17/3/2023

2.2 Mediação de Menor Vulnerável para Satisfazer a Lascívia de Outrem (Corrupção de Menores) (Art. 218)

☞ Também chamado de lenocínio (art.227, caput - CP) contra vítima menor de 14 anos.
* Não se confunde com a corrupção de menores do 244-B do ECA, que é para a prática de delitos.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

a) Classificação: Comum, material, de forma livre, comissivo, instantâneo, de dano, unissubjetivo e


plurissubsistente.
b) Conduta: Induzir é criar ideia que não existia. Instigar, reforçar ideia já existente (atípico). A conduta se
volta a quem é menor de 14 anos – sujeito passivo do delito.

Para alguns doutrinadores, a exemplo de Nucci, trata-se de uma exceção pluralista à teoria monista, vez que,
de acordo com o artigo 29 do CP, a participação moral, induzindo o menor à pratica do ato libidinoso
configuraria participação no estupro de vulnerável (crime pelo qual responderá o terceiro que tiver satisfeita
a sua lascívia pelo menor de 14 anos). Porém, aqui essa conduta seria punida de forma mais branda.
Para este doutrinador, trata-se de crime material, exigindo atitude por parte do menor para que se consume,
embora haja bastante divergência.
Além disso, entende ainda que prestar auxílio material, como analogia in bonam partem, também poderia
ser incluído aqui (ao invés do tipo do 217-A).
Contudo, a indução não pode ser com violência ou grave ameaça, sob pena de configurar o 217-A.
No entanto, para Sanches, a exceção pluralista à teoria monista não pode ter uma diferença tão grande entre
as penas, em atenção ao princípio da proporcionalidade, de modo que, aqui o ato deve ser diverso de ato de
libidinagem ou conjunção carnal, a exemplo de voyeurismo, satisfação de lascívia contemplativa, pois, caso
constitua em conjunção carnal ou ato libidinoso diverso o agente deve, de fato, responder por participação
em estupro de vulnerável.

c) Sujeitos do delito:
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa
● Sujeito passivo: Pessoa menor de 14 anos

Sujeito passivo maior de 18 anos - crime de lenocínio simples – art. 227, caput, do CP
Sujeito passivo maior de 14 anos e menor de 18 anos → crime de lenocínio qualificadoart.
– 227, §1º do CP
Obs.: Quando se trata da corrupção sexual de maior de 14 anos de idade, o entendimento do STJ é que
houve abolitio criminis: Segundo a jurisprudência deste Corte Superior, a corrupção sexual de maiores de 14
(quatorze) anos e menores de 18 (dezoito) deixou de ser tipificada no Código Penal, ensejando abolitio
criminis (STJ, RHC 37606/MT).

d) Objeto jurídico: Liberdade sexual


e) Elemento subjetivo: Dolo - vontade livre e consciente de induzir alguém menor de 14 anos a satisfazer a
lascívia de outrem.
● O agente deve ter ciência da idade da vítima.
● Caso o intuito do autor seja satisfazer a sua própria lascívia, haverá estupro de vulnerável (art. 217-
A do CP).

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SEMANA 07/12

f) Consumação e tentativa: há divergência na doutrina:


● 1ª posição – Bittencourt: O crime de corrupção de menores consuma-se com o efetivo induzimento,
ou seja, no momento em que a vítima é convencida pelo sujeito ativo a satisfazer a lascívia de outrem
● 2ª posição – Greco, Noronha, Mirabete: Para a consumação do delito de corrupção de menores não
basta o simples convencimento da vítima, sendo ainda necessária, por parte desta, a prática de ao
menos algum ato tendente à satisfação da lascívia de outrem.
● Tentativa: Admite.

g) Distinção com os crimes do ECA:


● Art. 244-B do ECA - corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele
praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la
● Art. 241-C do ECA - Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou
pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer
outra forma de representação visual:
● Art. 241-D do ECA - Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação,
criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso.

2.3 Satisfação de Lascívia Mediante Presença de Criança ou Adolescente (Art. 218-A)

a) Classificação: Crime de elevado potencial ofensivo, comum, formal, de forma livre, comissivo, instantâneo,
dano, unissubjetivo, plurissubsistente.
b) Sujeitos do delito:
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa.
● Sujeito passivo: Menor de 14 anos.

c) Objeto jurídico: Liberdade sexual, em especial no âmbito moral.


d) Elemento subjetivo: Dolo + especial finalidade de agir: satisfazer lascívia própria ou de outrem.
e) Tipo Objetivo: O crime consiste em praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-
lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem.
Condutas típicas:
✔ Praticar: O sujeito ativo pratica, na presença do menor, conjunção carnal ou atos libidinosos diversos
dela;
✔ Induzir a presenciar: O autor faz nascer, na mente do menor, a ideia de testemunhar atos libidinosos.

f) Consumação:
● Nucci – Efetiva prática do ato libidinoso.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Sanches e Bittencourt – “Praticar”: efetiva prática do ato. “Induzir”: com a indução,


independentemente da prática ou da satisfação da lascívia.

Caiu em prova Delegado SP/2018! No que concerne aos crimes contra a dignidade sexual, é correto afirmar
que: é fato típico induzir menor de 14 (quatorze) anos a presenciar ato libidinoso diverso da conjunção carnal,
a fim de satisfazer lascívia própria. (item correto).

g) Tentativa: Admite.
Obs.: Não há qualquer contato físico do agente com o menor neste tipo. Ademais, conforme a doutrina
majoritária, não se exige a presença física do menor, pode ser por exemplo, virtual. Há controvérsia.
Bitencourt exige a presença "in loco, e não, indiretamente, via qualquer mecanismo tecnológico, físico ou
virtual, como permitiria o mundo tecnológico".
Em sentido contrário está Guilherme Nucci sustentando que "a evolução tecnológica já propicia a presença -
estar em determinado lugar ao mesmo tempo em que algo ocorre - por meio de aparelhos apropriados.
A dúvida surge é se a prática do delito por meio de webcam, facetime etc configura o elemento constitutivo
do tipo "presença”. Isso porque, embora haja entendimentos distintos, parte considerável da doutrina
considera que o crime se verifica mesmo que o menor presencie o ato libidinoso à distância, por meio de
dispositivos eletrônicos ligados à internet. Nesse sentido, a doutrina de Rogério Greco:
O "tipo penal em
exame não exige a presença física do menor que foi, por exemplo, induzido a presenciar a conjunção carnal
ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer a lascívia própria ou de outrem. Com o avanço da tecnologia,
principalmente a da internet, nada impede que alguém induza um menor a assistir, via webcam, um casal
que se relaciona sexualmente. O casal, a seu turno, também pratica o ato sexual visualizando o menor
através de seu computador. Assim, embora à distância, o delito poderia ser perfeitamente praticado".
(GRECO, Rogério - Curso de Direito Penal, Volume 3, editado pela Impetus).

2.4 Favorecimento da Prostituição ou de Outra Forma de Exploração Sexual de Criança ou Adolescente ou


de Vulnerável (Art. 218-B)

a) Introdução: Esta figura não se confunde com a do art. 218 (mediação para servir a lascívia de outrem):
No art. 218, o agente induz a vítima a satisfazer a lascívia de pessoa(s) certa(s) e determinada(s)
No favorecimento (art. 218-B), o agente leva, atrai, propicia ou retém a vítima, visando desta o
exercício da prostituição, consistente em satisfazer a lascívia do premier passant, de maneira geral, pessoa
indeterminada.
A prostituição é a negociação de práticas sexuais em troca de vantagens, geralmente
financeiras. Exploração sexual é gênero, que envolve, por exemplo, a produção de filmes pornográficos.
b) Classificação: Crime comum (exceto na hipótese do § 2o, II), Por exigir resultado naturalístico para
consumação, é tido como delito material, de forma livre, instantâneo (“submeter”, “induzir”, “atrair” e

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

“facilitar”) ou permanente (“impedir” e “dificultar”), comissivo (excepcionalmente, omissivo impróprio),


unissubjetivo e plurissubsistente * Trata-se de crime hediondo em todas as suas modalidades.

c) Nomenclatura:
● Lenocínio principal – conduta em que o sujeito ativo toma a iniciativa pela corrupção ou prostituição
da vítima
● Lenocínio acessório – o sujeito ativo facilita ou explora a corrupção ou prostituição que já existe

d) Objeto jurídico: Liberdade sexual

e) Tipo objetivo: Há 6 núcleos verbais:


✔ Submeter
✔ Induzir
✔ Atrair
✔ Facilitar
✔ Impedir que abandone
✔ Dificultar que abandone
● À prostituição
● Ou qualquer forma de exploração sexual: A doutrina admite 4 modalidades de exploração sexual:
1. Prostituição: atividade na qual atos sexuais são negociados em troca de pagamento, não
apenas monetário;
2. Turismo sexual: é o comércio sexual, bem articulado, em cidades turísticas, envolvendo
turistas nacionais e estrangeiros e principalmente mulheres jovens, de setores excluídos de
Países de Terceiro Mundo;
3. Pornografia: produção, exibição, distribuição, venda, compra, posse e utilização de material
pornográfico, presente também na literatura, cinema, propaganda etc.; e
4. Tráfico para fim sexuais: movimento clandestino e ilícito de pessoas através de fronteiras
nacionais, com o objetivo de forçar mulheres e adolescentes a entrar em situações
sexualmente opressoras e exploradoras, para lucro dos aliciadores, traficantes.

Obs.: A conduta pode ser por ação ou omissão imprópria. Ex.: O agente, revestido do dever jurídico de
impedir que o agente ingresse na prostituição, nada faz, aderindo subjetivamente à sua conduta.

e) Sujeitos do delito
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa – normalmente chamado de PROXENETA.
● Sujeito passivo: Menor de 18 anos e maior de 14 ou a pessoa enferma ou deficiente mental.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

∘ Se houver pluralidade de vítimas – haverá concurso material, pois o bem jurídico tutelado é
de natureza individual.
∘ A prostituta pode ser sujeito passivo deste crime quando impedida de deixar a prostituição.

Configura o crime do art. 218-B do CP ainda que a vítima seja prostituta e que a
relação tenha sido eventual. O cliente que conscientemente se serve da
prostituição de adolescente, com ele praticando conjunção carnal ou outro ato
libidinoso, incorre no tipo previsto no inciso I do § 2º do art. 218-B do CP
(favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança
ou adolescente ou de vulnerável), ainda que a vítima seja atuante na prostituição e
que a relação sexual tenha sido eventual, sem habitualidade. STJ. 6ª Turma. HC
288374-AM, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 5/6/2014 (Info 543).

Obs.1: Este tipo penal revogou o artigo 244-A do ECA.


Obs.2: Enquanto a exploração da prostituição de adolescentes (não menor de 14 anos) está prevista como
crime no art. 218-B do CP (revogando, nesse tanto, o art. 244-A do ECA), a exploração da prostituição de
adultos está tipificada no art. 228 do CP.
Obs.3: Para o STJ, a vulnerabilidade, nesse caso, deve ser analisada no caso concreto.
Obs.4: O tipo penal não exige habitualidade, comportando continuidade delitiva.

A vulnerabilidade no caso do art. 218-B do CP é relativa. No art. 218-B do Código


Penal não basta aferir a idade da vítima, devendo-se averiguar se o menor de 18
(dezoito) anos ou a pessoa enferma ou doente mental, não tem o necessário
discernimento para a prática do ato, ou por outra causa não pode oferecer
resistência. STJ. 5ª Turma. HC 371633/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em
19/03/2019 (Info 645).

f) Elemento subjetivo: Dolo (só exigindo elemento subjetivo específico na forma do §1°).
É imprescindível que o participante do ato sexual saiba que a vítima é menor de 18 anos e maior que
14 anos, sexualmente explorada.
O proprietário, gerente ou responsável pelo local, por sua vez, deve saber que ali se realiza, as
práticas referidas no caput, de modo a evitar a responsabilidade objetiva.
g) Efeito da condenação (§3º)
Art.218-B §2 – incorre nas mesmas penas o proprietário, o gerente ou responsável pelo local em que se
verifiquem as práticas referidas nesse artigo – Nessa hipótese, constitui efeito obrigatório da condenação a
cassação da licença de localização e funcionamento do estabelecimento.
Aplica somente ao §2º!!! (CUIDADO COM PEGADINHA DE PROVA!)

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Trata-se de EFEITO SECUNDÁRIO (EXTRAPENAL) da sentença condenatório, semelhante aos artigos


91 e 92, CP.

2.5 Divulgação de Cena de Estupro ou de Cena de Estupro de Vulnerável, de Cena de Sexo ou de Pornografia
(Art. 218-C). (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

a) Introdução
Considerações iniciais realizadas pelo professor Sanches: Têm sido comuns, já há alguns anos,
situações em que pessoas são surpreendidas pela divulgação de imagens de sua intimidade na rede mundial
de computadores. Seja em decorrência de colaboração involuntária da própria pessoa, que se deixa
fotografar ou filmar, ou ainda envia imagens íntimas a alguém próximo, em caráter confidencial, e acaba
surpreendida pela deslealdade, seja por violação da intimidade sem o conhecimento do interessado (...). Há
ainda os casos de estupros registrados pelos próprios autores e depois divulgados, o que certamente acentua
a já gravíssima ofensa à dignidade sexual da vítima.
Um dos casos compreendendo uma personalidade de destaque inspirou a aprovação da Lei
12.737/12, que inseriu no Código Penal o art. 154-A para punir a invasão de dispositivo informático.
Denominado informalmente “Lei Carolina Dieckmann”, o diploma veio na esteira de uma conduta que
vitimara a conhecida atriz, que teve seu computador pessoal violado para a subtração e posterior divulgação
de fotos íntimas.
Ocorre, porém, que a variedade de condutas do mesmo gênero começou a demonstrar a
insuficiência do tipo penal que se restringe a punir a invasão de dispositivos eletrônicos, sem considerar
outras situações em que a intimidade é violada por outros meios tão ou mais eficazes.
No que concerne a crimes na esfera da dignidade sexual, não havia nada que pudesse indicar uma
conduta típica. Não obstante a divulgação ilícita de fotos de uma pessoa nua possa caracterizar ofensa à
dignidade sexual em sentido amplo, o certo é que, na situação anterior à Lei 13.718/18, não havia amparo
adequado a quem fosse vitimado por esta espécie de conduta (a maioria subsumia o comportamento apenas
ao tipo da injúria majorada na forma do art. 141, inc. III, do CP – em razão de ter sido cometida por meio
facilitador da divulgação da ofensa).
Pois o art. 218-C do Código Penal introduz a punição de quem promove a divulgação de cena de sexo,
nudez ou pornografia sem o consentimento dos envolvidos, bem como de quem possibilita a publicação de
cenas reais de estupro ou de estupro de vulnerável.
b) Classificação: Trata-se de crime de médio potencial ofensivo, bicomum, formal, de forma livre, comissivo,
misto alternativo (mais de um núcleo no mesmo contexto fático é crime único), instantâneo (na maioria dos
núcleos) ou permanente (transmitir, disponibilizar e expor à venda), de dano, unissubjetivo e
plurissubsistente. É também um tipo que traz subsidiariedade expressa.
c) Sujeitos do delito
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Sujeito passivo: é a pessoa que tem a sua intimidade, privacidade ou liberdade sexual atingida,
independentemente de qualidades especiais.
∘ Se for criança ou adolescente – art. 241 e 241-A do ECA (princípio da especialidade)
∘ Se a vítima é portadora de enfermidade ou deficiência mental, ou se sua imagem foi
registrada em um momento em que não poderia oferecer resistência, a divulgação
determina subsunção da conduta ao Código Penal – art. 218-C do CP.
d) Objeto jurídico: Dignidade sexual.
e) Elemento subjetivo: Dolo. Só exige finalidade específica na causa de aumento.
f) Conduta:
● Princípio da subsidiariedade expressa – o crime só vai subsistir se não houver crime mais grave.
Assim, se houver um estupro ou estupro de vulnerável com posterior divulgação do registro, o
estupro vai absorver o art. 218-C por expressa previsão legal.
● Tipo penal misto alternativo
● Núcleos verbais:
✔ Oferecer
✔ Trocar
✔ Disponibilizar
✔ Transmitir
✔ Vender
✔ Expor à venda
✔ Distribuir
✔ Publicar
✔ Divulgar

● Por onde? Por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de
informática ou telemática – é conceituado pela doutrina como crime de execução livre.
● O que? (Objeto material): Fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha o que?
✔ Cena de estupro ou de estupro de vulnerável,
✔ Ou que faça apologia ou induza a sua prática,
✔ Ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:
Obs.: O consentimento da vítima, se houver, exclui a tipicidade do delito, observa-se, a relevância do
consentimento da vítima se aplica apenas neste caso específico (cena de sexo, nudez ou pornografia), não
incluindo a cena de prática de crime nem apologia ao crime de estupro ou de estupro de vulnerável.
g) Consumação e tentativa:
● O crime se consuma no momento em que praticada uma das ações típicas, lembrando que algumas
delas podem ser permanentes.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Tentativa: Admite.
∘ No entanto, para Nucci, não será admitida na conduta de “oferecer”.
2.5.1 Considerações importantes:
⋅ Menor de 18 anos: pode caracterizar 241 ou 241-A do ECA, a depender das circunstâncias.
⋅ Termo “Estupro de vulnerável” mencionado no artigo: trata só dos vulneráveis em razão de
enfermidade ou deficiência mental. Se for o vulnerável menor de 14 anos o crime será um dos tipos
do ECA, acima mencionados (241 ou 241-A), em razão do princípio da especialidade.
⋅ Também consiste tipo especial em relação ao delito de apologia ao crime – e aqui não há restrição
de lugar ou de tempo.
⋅ O receptor das fotos ou vídeos também incorre neste delito? Não. O verbo “receber” não está nos
núcleos do tipo, é atípico. Aqui, o crime não se caracteriza nem mesmo se quem recebeu “salvar” a
foto (mas neste caso de armazenamento, pode consistir no tipo do art. 241-B se for de criança ou
adolescente). Para incorrer neste crime o agente deve praticar um dos verbos nele descritos.
⋅ Invasão de dispositivo informático (154-A) X Divulgação (218-C): Caso as imagens tenham sido
obtidas mediante invasão de dispositivo informático e depois tenham sido divulgadas em um grupo
de WhatsApp, por exemplo, o agente responderá pelos dois delitos em concurso material.
⋅ Registro x Divulgação: Ademais, como já vimos, se o agente faz o registro indevido e posteriormente
divulga a cena, deve responder pelos crimes dos arts. 216
-B e 218-C em concurso material:

LINK COM PROCESSO PENAL!


- Competência para julgar o delito do art. 241-A do ECA praticado por meio de Whatsapp ou chat do
Facebook: JUSTIÇA ESTADUAL
O STF fixou a seguinte tese: Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em
disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241, 241-A e 241-
B do ECA), quando praticados por meio da rede mundial de computadores (internet). STF. Plenário. RE
628624/MG, Rel. orig. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 28 e 29/10/2015
(repercussão geral) (Info 805). O STJ, interpretando a decisão do STF, afirmou que, quando se fala em
“praticados por meio da rede mundial de computadores (internet)”, o que o STF quer dizer é que a postagem
de conteúdo pedófilo-pornográfico deve ter sido feita em um ambiente virtual propício ao livre acesso. Por
outro lado, se a troca de material pedófilo ocorreu entre destinatários certos no Brasil, não há relação de
internacionalidade e, portanto, a competência é da Justiça Estadual. Assim, o STJ afirmou que a definição da
competência para julgar o delito do art. 241-A do ECA passa pela seguinte análise:
• Se ficar constatada a internacionalidade da conduta: Justiça FEDERAL. Ex: publicação do material feita em
sites que possam ser acessados por qualquer sujeito, em qualquer parte do planeta, desde que esteja
conectado à internet.
• Nos casos em que o crime é praticado por meio de troca de informações privadas, como nas conversas via
Whatsapp ou por meio de chat na rede social Facebook: Justiça ESTADUAL.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Isso porque tanto no aplicativo WhatsApp quanto nos diálogos (chat) estabelecido na rede social Facebook,
a comunicação se dá entre destinatários escolhidos pelo emissor da mensagem. Trata-se de troca de
informação privada que não está acessível a qualquer pessoa. STJ. 3ª Seção. CC 150564-MG, Rel. Min.
Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/4/2017 (Info 603).

STF: Compete à Justiça Federal julgar os crimes dos arts. 241, 241-A e 241-B do ECA, se a conduta de
disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente tiver sido praticada
pela internet e for acessível transnacionalmente: Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes
consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico, acessível transnacionalmente, envolvendo
criança ou adolescente, quando praticados por meio da rede mundial de computadores (arts. 241, 241-A e
241-B da Lei nº 8.069/1990). STF. Plenário. RE 628624 ED, Rel. Edson Fachin, julgado em 18/08/2020
(Repercussão Geral – Tema 393) (Info 990 – clipping).

2.5.2 Aumento de pena


§1º - A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é
praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com
a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação.

Trata-se da chamada “revenge porn” ou “pornografia de vingança”, já que se tornou cada vez mais
comum a situação em que ex namorados, por exemplo, divulgam imagens das antigas parceiras nuas ou em
cenas de sexo no intuito de delas se vingarem pelo fim da relação e, como já dito, a conduta não encontrava
tipo penal correspondente no ordenamento pátrio, no intuito de proteger sua dignidade sexual, cabendo a
ela buscar indenização cível.
Note que mesmo que o agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima
divulgue as imagens SEM o intuito de vingança ou humilhação a majorante restará configurada, já que o
termo “OU” denota situações autônomas, não exigindo da primeira especial finalidade.

Jurisprudência sobre o tema:


“É desnecessário que o rosto da vítima esteja evidenciado para a configuração de
pornografia de vingança (revenge porn) e o consequente reconhecimento de dano
moral indenizável”. STJ REsp 1735712.

2.5.3 Exclusão de ilicitude

§2º - Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste
artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com
a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua
prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Veja que o parágrafo traz duas situações: a divulgação com a adoção de recurso que impossibilite a
identificação da vítima e a divulgação com prévia autorização da vítima caso seja maior de 18 anos.
Em se tratando de menor de 18 anos, em nenhuma hipótese poderá ser identificada, sendo o
consentimento de seus representantes legais considerado nulo nesta situação.

Não se esqueça que a leitura dos demais artigos é imprescindível!

3. DISPOSIÇÕES GERAIS

3.1 Ação Penal nos Crimes Sexuais (Art. 225)

A ação penal nos crimes sexuais sofreu uma série de mudanças no decorrer dos anos. Para facilitar a
sistematização e compreensão, segue a tabela retirada do site Dizer o Direito - salvador dos concurseiros
perdidos com informativos e alterações legislativas:

*AÇÃO PENAL NOS CRIMES SEXUAIS


Regra: ação penal privada.
Exceções:
a) se a vítima ou seus pais não tivessem dinheiro para o processo: ação pública
condicionada à representação.
Redação
b) se o crime era cometido com abuso do poder familiar, ou da qualidade de padrasto,
originária
tutor ou curador: ação pública incondicionada.
do CP
c) se da violência resultasse lesão grave ou morte da vítima:
çãoa pública
incondicionada.
d) se o crime de estupro fosse praticado mediante o emprego de violência real: ação
pública incondicionada.

Regra: ação penal pública condicionada à representação.


Exceções:
Redação da a) Vítima menor de 18 anos: incondicionada.
Lei 12.015/09 b) Vítima vulnerável: incondicionada.
c) Se foi praticado mediante violência real: incondicionada (Súm. 608-STF).
d) Se resultou lesão corporal grave ou morte: polêmica, mas prevalecia que deveria ser
aplicado o mesmo raciocínio da Súmula 608-STF.
Ação pública incondicionada (SEMPRE).
Redação da Todos os crimes contra a dignidade sexual são de ação penal pública

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DELEGADO SÃO PAULO

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Lei 13.718/18 INCONDICIONADA. Não há exceções!


(quadro atual)

3.2 Causas de Aumento de Pena (Art. 226)

Este artigo traz causas de aumento, sendo que os incisos I e II se aplicam a todos os delitos anteriores
(capítulos I, I-A e II do título VI) e o inciso IV, às formas coletivas ou corretivas de estupro.

A pena é aumentada: (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)


I – De quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas
;
∘ ATENÇAO!!! Essa causa não se aplica ao estupro e nem do estupro de vulnerável (art. 213 ou 217-
A), pois eles têm uma causa de aumento específica do estupro coletivo.

II - De metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor,
curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela;

Caiu em prova Delegado BA/2018! A respeito dos crimes sexuais, previstos no Título VI, do Código Penal,
assinale a alternativa correta.
Não se tipifica crime de estupro se o agente é cônjuge da vítima, já que o casamento impõe aos cônjuges o
dever de prestação sexual. (item incorreto).

Pegadinha de prova objetiva!


∘ Ascendentes – engloba todos os parentescos em linha reta para cima, independentemente do grau.
Info 866/STF
∘ Descendentes – Não estão incluídos na causa de aumento, sob pena de caracterizar analogia in
malam partem.
∘ Colaterais – engloba somente TIOS E IRMÃOS, não prevendo outros parentes colaterais.

Bisavô é considerado ascendente para os fins da causa de aumento do art. 226, II,
do CP No caso de crimes contra a liberdade sexual (arts. 213 a 216-A) e crimes
sexuais contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B), se o autor do delito for ascendente
da vítima, a pena deverá ser aumentada de metade (art. 226, II, do CP).. STF. 2ª
Turma. RHC 138717/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 23/5/2017
(Info 866).
III – Revogado
IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado: (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

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DELEGADO SÃO PAULO

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Estupro coletivo (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)


a) mediante concurso de 2 (dois) ou mais agentes; (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Tendo em vista a previsão do inciso I, a do inciso IV, “a”, seria desnecessária? Não. A do inciso I não se
restringe ao estupro, sendo aplicável a todos os crimes dos c
apítulos I e II. Já a do inciso IV se direciona ao
estupro e tem fração de aumento maior, já que atinge de forma mais grave a dignidade sexual da vítima,
tanto fisicamente como emocionalmente.

Estupro corretivo (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)


b) para controlar o comportamento social ou sexual da vítima. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Por sua vez, a do inciso IV, “b”, direciona-se principalmente aos diversos casos em que o abusador,
muitas vezes até pais, irmãos ou familiares, estupra a vítima, geralmente lésbica, bissexual ou transexual,
para “corrigir” sua orientação sexual ou gênero (mas apesar do exemplo, é crime comum, que homens ou
mulheres podem ser autores ou vítimas). A pena mais grave se justifica na motivação do agressor para
violentar a vítima, que torna o ato ainda mais cruel.

4. OUTROS TIPOS PENAIS

4.1 Mediação para Servir a Lascívia de Outrem (Art. 227)

a) Classificação: Trata-se de crime de médio potencial ofensivo na modalidade do caput e elevado nas
demais, comum, material, de forma livre, comissivo, instantâneo, unissubjetivo e plurissubsistente. O núcleo
do tipo é de induzir, ou seja, encorajar.

Segundo a doutrina é denominado como lenocínio ou lenocínio principal, uma forma de mediação para que
se satisfaça o desejo sexual de outrem.

b) Sujeitos:
● Sujeito ativo: qualquer pessoa
● Sujeito passivo: qualquer pessoa; sociedade

OBS: Lembrando que se for menor de 14 o delito é do art.218 CP, com todas as implicações já elencadas na
explicação referente a ele.

c) Objeto material: pessoa induzida


d) Objeto jurídico: regramento e a moralidade na vida sexual

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

e) Elemento subjetivo: dolo + elemento subjetivo específico.


f) Consumação: O crime se consuma com a prática do ato que importa satisfação da lascívia da outra pessoa,
independentemente dessa pessoa se considerar satisfeita com o ato ou não.
g) Tentativa: Admite.

4.2 Favorecimento da Prostituição ou Outra Forma de Exploração Sexual (Art. 228)

a) Sujeitos: Crime comum.


* No entanto, se a vítima for pessoa menor de 18 anos, o crime será o do 218-B, que já foi explicado.
b) Consumação:
● Nas modalidades “induzir, atrair ou facilitar”, o crime se consuma no momento em que a vítima passa
a se dedicar à prostituição ou a outra forma de exploração sexual, ainda que não tenha efetivamente
se prostituído.
● Por sua vez, na modalidade impedir ou dificultar o abandono, a consumação ocorre no momento em
que a vítima quer sair e o autor dificulta a sua saída.
Obs.: Note que o ato de se prostituir não é crime. O que se pune é o aproveitamento desta conduta por
terceiros.
E quanto ao tratamento que o Estado confere à prostituição, há 3 sistemas:
1) Sistema da regulamentação: O Estado regulamenta a atividade profissional de prostituição;
2) Sistema da proibição: a conduta de se prostituir é criminalizada;
3) Sistema abolicionista: embora seja considerado imoral, o exercício da prostituição não é punido.
Apenas é penalizada a conduta daquele que se aproveita da prostituição. É este o sistema adotado
pelo Brasil.

4.3 Casa de Prostituição (Art. 229)

a) Classificação: Crime comum, formal, de forma livre, comissivo, habitual, unissubjetivo e plurissubsistente.
Trata-se de crime habitual, haja vista que o verbo é “manter”.
Segundo doutrina majoritária, é também crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo
enquanto o estabelecimento é mantido. Salienta-se que, neste ponto, há quem entenda que as duas
classificações são incompatíveis.

Crime habitual e prisão em flagrante:


1ªC – Entende não ser possível prisão em flagrante no crime habitual, tendo em
vista que este ocorre quando a conduta típica se integra com a prática de várias
ações que, isoladamente, são indiferentes legais. Assim, segundo esta corrente,
quando a polícia efetua a prisão em flagrante, na hipótese de crime habitual, está
surpreendendo o agente na prática de um só ato, o auto de prisão vai apenas e tão-
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DELEGADO SÃO PAULO

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somente retratar aquele ato insulado, de modo que aquele ato isolado constitui um
indiferente legal - Tourinho Filho, Guilherme Nucci, dentre outros.
2ªC – Entende ser cabível a prisão em flagrante em crimes habituais caso seja
possível, no ato, comprovar a habitualidade. Ex.: prisão de responsável por bordel
onde se encontram inúmeros casais para fim libidinosos; ou de pessoa que exerce
ilegalmente a medicina quando se encontra atendendo vários pacientes” –
Mirabete e Renato Brasileiro.
STF e STJ entendem não haver incompatibilidade entre o crime habitual e prisão
em flagrante.

b) Tentativa: Não admite, por ser habitual. (Há divergências)


c) Sujeitos
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa
● Sujeito passivo: Coletividade
d) Objeto material: Estabelecimento em que ocorre exploração sexual
e) Objeto jurídico: Moralidade sexual e os bons costumes
f) Elemento subjetivo: Dolo + especial finalidade de agir.
Casas de massagem, motéis, hotéis de alta rotatividade, saunas, bares ou cafés, drive-in, boates,
casas de relaxamento: Embora seja de conhecimento geral que muitos desses locais consistem em
verdadeiras casas de prostituição disfarçadas, prevalece que não configuram o tipo penal, segundo
jurisprudência e doutrina majoritárias, tendo em vista que não são lugares específicos para a exploração
sexual, de onde se destaca a prostituição, pois têm outra finalidade, como a hospedagem, o serviço de
massagem ou relaxamento, a sauna, o serviço de bar etc.
O STJ tem entendimento que não se aplica o princípio da adequação social aos crimes de
favorecimento da prostituição ou manutenção de casa de prostituição. (STJ, AgRg no REsp 1508423/MG)

4.4 Rufianismo (Art. 230)

Na modalidade do caput é infração de médio potencial ofensivo, cabendo suspensão condicional do


processo.
Veja, a conduta exige que o sujeito: 1. participe diretamente dos lucros da vítima, trata-se de
rufianismo direto, como por exemplo o rufião que recebe uma porcentagem do valor cobrado pela
prostituta. 2. Ou seja sustentado, no todo ou em parte, por quem a exerça. Denomina-se rufianismo indireto.
Trata-se de crime habitual, segundo doutrina majoritária, não se admitindo tentativa.

4. Diferença entre mediação para satisfazer a lascívia de outrem com o fim de lucro e rufianismo:
Enquanto no rufianismo a pessoa explorada exerce a prostituição, cuja configuração reclama
habitualidade, no caso da mediação para servir a lascívia de outrem a pessoa explorada não se
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

prostitui e o delito é instantâneo, ou seja, para sua consumação basta um único ato de induzir alguém
a satisfazer a lascívia alheia.
5. Diferença entre o delito de casa de prostituição para rufianismo: No primeiro delito o sujeito ativo
é o chamado proxeneta – aquele que pratica o lenocínio, mantendo locais destinados a encontros
libidinosos, ou serve de mediador para a satisfação do prazer sexual alheio, auferindo ou não lucro;
já no segundo, temos a figura do rufião, que é a pessoa de pessoa que vive da prostituição alheia,
fazendo-se sustentar pela(o) prostituta(o), com ou sem o emprego de violência.

Na verdade, a doutrina menciona que o rufianismo pode ser ativo/direto (que é o caso do cafetão,
que participa dos lucros) ou passivo/indireto (que é o caso do gigolô, que se sustenta pela prática alheia de
prostituição).
O primeiro parágrafo trata-se de forma qualificada do crime, com reclusão de 3 a 6 anos. O parágrafo
segundo do mesmo artigo prevê outra forma qualificada do delito, caso haja emprego de violência, grave
ameaça, fraude ou qualquer outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vítima (fórmula que
permite a interpretação analógica), com pena de reclusão de 2 a 8 anos.

5. DISPOSIÇÕES GERAIS

Causas de aumento de pena (art. 234-A)


De novo, mas agora aplicáveis a todos os crimes do Título. Há modificações recentes.

Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada:


I e II - Vetados.
III - De metade 1/2 a 2/3 (dois terços), se do crime resulta gravidez (Redação dada
pela Lei nº 13.718, de 2018: antes era só de metade)
IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o agente transmite à vítima doença
sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador, OU se a
vítima é idosa ou pessoa com deficiência.

Caiu em prova Delegado BA/2018! A respeito dos crimes sexuais, previstos no Título VI, do Código Penal,
assinale a alternativa correta.
Haverá aumento de pena se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou
deveria saber ser portador. (item correto).

(Redação dada pela Lei nº 13.718, de 2018)


Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão
em segredo de justiça.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● APLICABILIDADE - Aplica-se a todos os crimes contra a dignidade sexual

● INCISO III - de metade até 2/3, se do crime resultar gravidez;


∘ Temos uma lex gravior pois, antes da Lei de 2018, a causa de aumento era de apenas metade.
Agora pode aumentar até 2/3 – lei irretroativa

● INCISO IV - de 1/3 a 2/3, se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe
ou deveria saber ser portador OU se a vítima é idosa ou pessoa com deficiência
∘ Temos uma lex gravior, pois antes da Lei de 2018, a causa de aumento era de 1/6 à metade. Agora
pode aumentar até 2/3 – lei irretroativa
∘ Antes da Lei 2018, também não previa a hipótese de vítima idosa ou pessoa com deficiência
∘ Critério para dosar o quantum de aumento – Nucci afirma que o critério vai variar de acordo com
a tipologia da enfermidade (ex. enfermidade curável ou incurável). Pode variar também de acordo
com a atuação com dolo direto ou eventual.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

DIREITO PENAL: CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA

ARTIGOS RELACIONADOS PARA LEITURA:

Código Penal: Arts. 286 a 288.


Lei de Crimes Hediondos: art. 8º
Lei de Organizações Criminosas: Art. 1º
Lei de Drogas: art. 35

1. INCITAÇÃO AO CRIME (ART. 286)

Incitar, publicamente, a prática de crime:


Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
parágrafo único. Incorre na mesma pena quem incita, publicamente, animosidade
entre as forças armadas, ou delas contra os poderes constitucionais, as
instituições civis ou a sociedade. (lei 14197/2021).

a) Introdução: No art. 286 do Código Penal, assim como nos demais delitos contra a paz pública, o
legislador incriminou de forma autônoma comportamentos que, em princípio, representam atos
preparatórios de outros crimes. Excepcionou-se, dessa forma, a regra traçada no art. 31 do Código Penal: “O
ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se
o crime não chega, pelo menos, a ser tentado”.
Portanto, segundo ensina Cleber Masson, o art. 31 do CP não se aplica ao presente crime por 2
razões:
(1) A incitação ao crime não se confunde com a participação, pois tem em mira não um único sujeito,
mas diversas pessoas (“incitar publicamente”);
(2) O próprio dispositivo legal admite exceções, ao utilizar a expressão “salvo disposição expressa
em contrário”.

Forma equiparada: A lei nº 14.197/2021 incluiu o parágrafo ao artigo 286 do código penal.
Entretanto, houve previsão de vacatio legis de 90 dias de sua publicação oficial, o referido parágrafo origina
uma modalidade equiparada, consistente na incitação de animosidade, entre as forças armadas ou delas
contra os poderes constituídos, as instituições civis ou a sociedade.

Caiu em prova Delegado SP/2018! Aquele que faz, publicamente, apologia de fato criminoso pratica: crime
de “apologia de crime”. (item correto).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

b) Classificação: Crime de menor potencial ofensivo, comum, formal, de forma livre, comissivo,
instantâneo, de perigo abstrato, unissubjetivo e unissubsistente ou plurissubsistente (depende do caso).
⋅ Sujeito ativo: Qualquer pessoa;
⋅ Sujeito passivo: Sociedade;
⋅ Objeto material: Paz pública;
⋅ Objeto jurídico: Paz pública;
⋅ Elemento subjetivo: Dolo;
⋅ Tentativa: Admite, na modalidade plurissubsistente. Ex.: na utilização de cartazes, faixas, panfletos,
etc. O agente foi preso em flagrante no momento em que fixava uma faixa com conteúdo destinado
a incitar a prática de crime em uma praça pública.

c) Conduta: Incitar é apoiar, estimular, instigar.


O art. 286 não exige a efetiva prática do crime incitado. Basta o incentivo público à sua concretização,
pois a partir de então a paz pública já se encontra em perigo.
Se o instigado praticar o crime, eventualmente o instigador poderá praticar o crime cometido pelo
incitado na qualidade de partícipe.

d) Considerações importantes:
● A incitação deve ser à prática de CRIME DETERMINADO. Ou seja:
∘ Se for contravenção não configura o presente delito!!!
∘ Embora não se exija a indicação dos meios de execução a serem empregados ou as vítimas dos
delitos a serem perpetrados, deve ser um crime determinado, pois não se admite a incitação
genérica ao cometimento de crimes.
∘ Exemplo: “A” circula em via pública com um carro de som estimulando as pessoas a roubarem
os bancos para quitarem suas dívidas.
● O tipo exige que seja PUBLICAMENTE (atingindo um número indeterminado de pessoas,
normalmente em local público ou de acesso ao público.
∘ Pode configurar o crime em residência privada caso seja a ocasião de uma festa para várias
pessoas, por exemplo).
∘ Se for em particular, a um amigo ou uma situação mais íntima, por exemplo, não configura.

e) Incitação x Legislação Penal Especial


● Juizado Especial Criminal (Lei 9099/95): Em face do máximo da pena privativa de liberdade
cominada (detenção de seis meses), a incitação ao crime é infração penal de menor potencial
ofensivo, admitindo a transação penal e o rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995.
● Lei de Genocídio (Lei nº 2.889/56): Se a incitação tiver como objetivo a prática de genocídio, estará
caracterizado o crime tipificado no art. 3.º da Lei 2.889/1956:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Art. 3.º Incitar, direta e publicamente, alguém a cometer qualquer dos crimes de
que trata o art. 1.º:
Pena – Metade das penas ali cominadas.
§ 1.º A pena pelo crime de incitação será a mesma do crime incitado, se este se
consumar.
§ 2.º A pena será aumentada de 1/3 (um terço), quando a incitação for cometida
pela imprensa.

● Código Penal Militar (DL. 1001/69): O art. 155 do Decreto-lei 1.001/1969 – Código Penal Militar –
prevê o crime de incitamento

Art. 155. Incitar à desobediência, à indisciplina ou à prática de crime militar: Pena


– reclusão, de dois a quatro anos. Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem
introduz, afixa ou distribui, em lugar sujeito à administração militar, impressos,
manuscritos ou material mimeografado, fotocopiado ou gravado, em que se
contenha incitamento à prática dos atos previstos no artigo.

● Se a incitação ao crime possuir como finalidade


Lei de Preconceito e Discriminação (Lei nº 7716/89):
a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, estará
caracterizado o crime descrito no art. 20, caput, da Lei 7.716/1989:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor,


etnia, religião ou procedência nacional. Pena – reclusão de um a três anos, e multa.

Obs.: STJ já decidiu que o fato de a incitação ao crime ter sido praticada por meio da internet não
atrai a competência da Justiça Federal. STJ CC62949/PR
Obs2.: O STF expõe que não é necessário que se apregoe, verbal e literalmente, a prática de
determinado crime. O tipo penal do art. 286 do Código Penal abrange qualquer conduta apta a provocar
ou a reforçar a intenção da prática criminosa em terceiros. STF, Inq 3932/DF
Obs3.: Em julgado um pouco mais antigo, o STF já entendeu ser atípica a conduta se praticada em
reunião privada, em virtude da exigência de ser praticada publicamente.

2. APOLOGIA DE CRIME OU CRIMINOSO (ART. 287)

Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime:


Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

a) Classificação: Crime de menor potencial ofensivo, comum, formal, de forma livre, comissivo,
instantâneo, de perigo abstrato, unissubjetivo e unissubsistente ou plurissubsistente (depende do
caso).

b) Considerações sobre o crime:


⋅ Sujeito ativo: Qualquer pessoa
⋅ Sujeito passivo: Coletividade (crime vago)
⋅ Objeto material: Paz pública;
⋅ Objeto jurídico: Paz pública;
⋅ Elemento subjetivo: Dolo;
⋅ Crime formal: consuma-se no instante em que o agente faz, publicamente, apologia de fato
criminoso ou de autor de crime
⋅ Crime de perigo abstrato
⋅ Tentativa: Admite, na modalidade plurissubsistente. Exemplo: apologia veiculada em panfletos que
se extraviam antes de chegar a um número indeterminado de pessoas. Não cabe se for cometido de
forma oral!
⋅ Lei 9099/95: Em face do máximo da pena privativa de liberdade cominada (detenção de seis meses),
se em infração penal de menor potencial ofensivo,
a apologia de crime ou criminoso constitui-
sujeitando-se à transação penal e ao rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995.
⋅ Não exige fim específico de agir
⋅ Apologia ao crime culposo não é punível

c) Conduta:
⋅ Fazer apologia: elogiar, defender, louvar
⋅ Publicamente: A conduta deve ser praticada em local público, de modo a alcançar pessoas
indeterminadas. Não há crime, portanto, quando a apologia é realizada no interior de uma
residência, ou mesmo no âmbito de locais frequentados por poucos indivíduos
⋅ Fato criminoso: Não cabe se for contravenção penal. Existe controvérsia doutrinária se o fato
criminoso deve ser passado ou pode ser futuro:
∘ 1ª C – Hungria e Rogério Grecco: a elementar “fato criminoso” abrange crimes passados e
futuros.
∘ 2ª C – Magalhães Noronha: defende a aplicabilidade da expressão “fato criminoso” apenas
a delitos já concretizados, pois se for futuro é instigação ao crime.
⋅ Autor de crime: Aqui também há divergência. Veja:
∘ 1ª C - conforme a doutrina majoritária - deve ser alguém condenado com trânsito em julgado
pela prática de crime. Também não vale contravenção, tampouco pessoa acusada /
investigada, mas não condenada definitivamente, haja vista o princípio da presunção de
inocência e a redação do artigo.
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DELEGADO SÃO PAULO

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∘ 2ª C – Cleber Masson – Para o autor, a expressão “autor de crime” foi utilizada em sentido
amplo, devendo ser compreendida como toda e qualquer pessoa envolvida com a prática do
delito, na condição de autora, coautora ou partícipe. É indiferente se o autor do crime já foi
condenado, ou mesmo se contra ele foi ajuizada ação penal.

Anote-se que nem toda manifestação favorável ao autor do crime ou ao fato por ele praticado
configura o crime definido no art. 287 do Código Penal. Com efeito, só há falar em apologia de criminoso
quando o elogio diz respeito unicamente ao delito cometido. Se a exaltação relaciona-se à pessoa do agente
(exemplos: ao seu passado honesto, à sua origem humilde), o fato é atípico.
Embora exista o direito à liberdade de expressão, ela não deve englobar elogios a crimes ou
criminosos, que isso caracteriza uma incitação indireta à prática de delitos.
Inclusive, a doutrina menciona que a diferença entre os crimes de incitação X apologia, está
justamente no fato de que a incitação é uma instigação direta, enquanto a apologia é uma instigação indireta.

Obs.: Questões de assinalar a alternativa incorreta são maravilhosas para fazer uma revisão do conteúdo,
por isso, sempre foque nas informações trazidas nos itens das questões.

MARCHA DA MACONHA X INCITAÇÃO OU APOLOGIA AO CRIME


(Matéria retirada do site do STF1):
Em decisão unânime (8 votos), o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou a realização dos eventos
chamados “marcha da maconha”, que reúnem manifestantes favoráveis à descriminalização da droga. Para
os ministros, os direitos constitucionais de reunião e de livre expressão do pensamento garantem a realização
dessas marchas. Muitos ressaltaram que a liberdade de expressão e de manifestação somente pode ser
proibida quando for dirigida a incitar ou provocar ações ilegais e iminentes.
Pela decisão, tomada no julgamento de ação (ADPF 187) ajuizada pela Procuradoria-Geral da
República (PGR), o artigo 287 do Código Penal deve ser interpretado conforme a Constituição de forma a não
impedir manifestações públicas em defesa da legalização de drogas. O dispositivo tipifica como crime fazer
apologia de "fato criminoso" ou de "autor do crime".
O voto do decano da Corte, ministro Celso de Mello, foi seguido integralmente pelos colegas.
Segundo ele, a “marcha da maconha” é um movimento social espontâneo que reivindica, por meio da livre
manifestação do pensamento, “a possibilidade da discussão democrática do modelo proibicionista (do
consumo de drogas) e dos efeitos que (esse modelo) produziu em termos de incremento da violência”.
Além disso, o ministro considerou que o evento possui caráter nitidamente cultural, já que nele são
realizadas atividades musicais, teatrais e performáticas, e cria espaço para o debate do tema por meio de
palestras, seminários e exibições de documentários relacionados às políticas públicas ligadas às drogas, sejam
elas lícitas ou ilícitas.

1
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=182124
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Celso de Mello explicou que a mera proposta de descriminalização de determinado ilícito penal não
se confunde com o ato de incitação à prática do delito nem com o de apologia de fato criminoso. “O debate
sobre abolição penal de determinadas condutas puníveis pode ser realizado de forma racional, com respeito
entre interlocutores, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha,
extravagante, inaceitável ou perigosa”, ponderou.

d) Concurso de crimes: Se o agente, no mesmo contexto fático, fizer apologia de dois ou mais fatos
criminosos, ou então de dois ou mais autores de crimes, a ele serão imputados dois ou mais delitos tipificados
no art. 287 do Código Penal, em concurso formal impróprio ou imperfeito (CP, art. 70, caput, parte final).
Entretanto, se o sujeito ativo efetuar, com uma só conduta, a apologia de um fato criminoso e
também do seu autor, responderá por um só delito

Facilitando.: Qual a diferença entre Incitação e apologia?


Na incitação, o crime ainda não ocorreu e o estímulo é direto, com instigação. Ex: Em uma
manifestação uma pessoa grita para que o grupo quebre o patrimônio público de determinado local. Já na
prática da apologia, o crime já foi praticado e o estímulo é indireto, seja exaltando o delito ou o seu autor.

3. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (ART. 288)

Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes:


Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se
houver a participação de criança ou adolescente.

a) Classificação: Crime de médio potencial ofensivo na modalidade do caput, comum, formal, de forma
livre, comissivo, permanente, de perigo abstrato, plurissubjetivo e plurissubsistente.

b) Considerações sobre o crime:


⋅ Sujeito ativo: Qualquer pessoa (pelo menos três – tratando-se de crime plurissubjetivo, de concurso
necessário de condutas paralelas).
⋅ Sujeito passivo: Coletividade (crime vago)
⋅ Objeto material: Paz pública.
⋅ Objeto jurídico: Paz pública.
⋅ Elemento subjetivo: Dolo + especial finalidade de agir, que é o fim específico de cometer crimes,
independentemente da sua natureza e da pena cominada.
⋅ Crime formal ou de consumação antecipada: consuma-se no momento em que se concretiza a
convergência de vontades, independentemente se os delitos para os quais a associação foi

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SEMANA 07/12

constituída sejam realizados. Quanto a quem adere à associação depois de já constituída, o crime se
consuma no momento da adesão.
⋅ Crime de perigo abstrato: o momento associativo já apresenta perigo suficientemente grave para
alardear a população e tumultuar a paz pública.
⋅ Tentativa: Não admite, em razão da estabilidade e permanência requeridas (ou estão presentes e o
crime está consumado ou estão ausentes, sendo um fato penalmente irrelevante). A retirada de um
dos agentes, deixando o grupo com menos de três pessoas, cessa a permanência, mas não interfere
na existência do crime, já consumado para todos.

c) Mudança Legislativa:
Antes da modificação realizada pela Lei 12.850/13 (Lei de Organizações Criminosas), o tipo exigia
mais de três pessoas e se chamava formação de quadrilha ou bando.
Hoje, o nome iuris é “associação criminosa” e são exigidas 3 ou mais pessoas.

d) Requisitos:
1º requisito: pluralidade de agentes: 3 ou mais pessoas:
● Os membros não precisam se conhecer, tampouco viver no mesmo local. Mas devem saber
sobre a existência dos demais. Basta que o sujeito esteja consciente em formar parte de uma
associação cuja existência e finalidades lhe sejam conhecidas.
● O menor de 18 anos, desde que tenha discernimento para entender o que está fazendo, pode
integrar a associação criminosa, sendo contabilizado como integrante. Assim, podemos ter
dois maiores de idade e um menor.
● Para a doutrina majoritária, o agente infiltrado não pode ser computado, pois não age com o
necessário ânimo associativo.
2º requisito: Estabilidade e permanência
“Associação” pressupõe estabilidade e permanência, de modo que tanto a doutrina quanto a
jurisprudência entendem que estas são características exigíveis para a configuração do delito.
● É possível o agente pertencer a mais de uma associação criminosa. No caso, se o agente integra mais
de uma associação criminosa, praticou mais de uma vez o núcleo do tipo, respondendo pelas duas
associações em concurso material
● A união estável e permanente é o que diferencia a associação criminosa do concurso de pessoas
(coautoria ou participação) para a prática de delitos em geral.
⋅ Exemplo de associação criminosa: cinco pessoas se unem, sem previsão de data para a
dissolução do agrupamento, visando a concretização de furtos de automóveis no Paraná.
⋅ Exemplo de concurso de pessoas: cinco pessoas se reúnem para furtar dois automóveis no
Paraná. Alcançado o objetivo, os veículos são vendidos, reparte-se o dinheiro arrecadado e
os sujeitos retornam cada um às suas vidas.

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● A estabilidade e permanência dispensa ordem hierárquica e divisão de tarefas. Aliás, se tais


elementos estiverem presentes, serão indicativos da possibilidade de configuração de organização
criminosa (e não associação criminosa).

Não se pode confundir associação criminosa com organização criminosa.


ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim §1º - Considera-se organização criminosa a
específico de cometer crimes. associação de 4 (quatro) ou mais pessoas
estruturalmente ordenada e caracterizada pela
divisão de tarefas, ainda que informalmente, com
objetivo de obter, direta ou indiretamente,
vantagem de qualquer natureza, mediante a prática
de infrações penais cujas penas máximas sejam
superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de
caráter transnacional.

A diferença entre o crime de Organização Criminosa e Associação Criminosa está não apenas na
quantidade de agentes necessários, mas principalmente na necessidade de a organização ser
estruturalmente ordenada e contar com divisão de tarefas.
Além disso, na organização criminosa, os agentes cometem crimes com objetivo de obter vantagens
de qualquer natureza, sendo que na associação o objetivo é unicamente cometer crimes,
independentemente de auferirem qualquer vantagem.
No tipo da organização o legislador ainda limitou os crimes aos que possuem pena máxima superior
a 4 anos ou que sejam de caráter transnacional.
Importante não confundir também os delitos acima com o de associação para o tráfico, do art. 35 da
Lei de Drogas, que é especial em relação a eles. Sua característica principal é exigir a associação de 2 ou mais
pessoas.

ASSOCIAÇÃO PARA O ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA


TRÁFICO
2 ou mais pessoas 3 ou mais pessoas 4 ou mais pessoas

3º requisito – reunião para a prática de crimes (dolo específico)


O tipo exige fim específico para cometer CRIMES, no plural. Assim:
● Se for apenas um crime, será um concurso eventual de pessoas, não caracterizando associação
criminosa.
● O agrupamento de três ou mais pessoas para o fim de cometer contravenções penais não enseja o
reconhecimento da associação criminosa.
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e) Consumação: Lembrando que se trata de crime formal, de consumação antecipada, bastando a


associação com o fim de cometer crimes para que se consume, não exigindo que os crimes desejados
venham sequer a ser tentados. Basta que fique comprovado que era este o intuito.

Obs.: A doutrina classifica esse crime como um crime obstáculo: são aqueles em que o legislador antecipou
a tutela penal, incriminando de forma autônoma atos que representam a mera preparação de outros delitos.
Ex.: incitação ao crime (CP, art. 286), associação criminosa (CP, art. 288) e petrechos para a falsificação de
moeda (CP, art.291), entre outros

Obs.: A doutrina também entende ser crime permanente. Assim, enquanto não cessada a associação a
consumação persiste. No tocante ao crime permanente, recordar do art. 303 do CPP (o flagrante pode
acontecer a qualquer tempo enquanto durar a permanência) e o art. 111, III do Código Penal descreve que a
prescrição só começa a correr depois de cessada a permanência. Por fim, cumpre recordarmos o teor da
Súmula 711 do STF.

Súmula 711, STF. A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da
permanência

Importa dizer que é crime AUTÔNOMO, que além de não depender da prática dos demais crimes
para ser punido, caso estes efetivamente ocorram, os agentes responderão por eles em concurso material
com associação criminosa.

Exige-se a demonstração do elemento subjetivo específico do tipo com intuito de cometer crimes. Ademais,
faz-se necessário comprovar o caráter de durabilidade e estabilidade da associação, o que distingue do
concurso de pessoas, o dolo de associação, com demonstração de vínculo subjetivo e permanente entre os
associados, pela vontade consciente de cometerem crimes. STJ, RHC 98228/PA

Pergunta-se: Na hipótese em que três ou mais pessoas reúnem-se para a prática de crime
continuado, há associação criminosa ou mero concurso de pessoas?
R.: Conforme ensina Cleber Masson, existem duas posições sobre o assunto:
● 1.ª C (majoritária): Trata-se de associação criminosa, pois os indivíduos estão agrupados com
a finalidade específica de cometer crimes, ainda que venham a ser considerados, para efeito
de aplicação da pena, uma continuidade.

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SEMANA 07/12

● 2.ª C: Cuida-se de concurso de pessoas, uma vez que na continuidade delitiva não se verifica a
associação estável e permanente entre os envolvidos nos diversos crimes parcelares, razão
pela qual deve ser reconhecida a coautoria ou participação, dependendo do caso concreto.

Pergunta-se: A manutenção da associação criminosa após a condenação ou mesmo da denúncia


configura novo crime?
R.: De acordo com a doutrina, constitui novo crime, não se cogitando do “bis in idem”. A associação
criminosa cessa com o recebimento da denúncia, hipótese em que a associação posterior para o
cometimento de crimes deve ser considerada como um novo delito, não se cogitando bis in idem (sob pena
de impunidade, intervenção insuficiente/deficiente do Estado).
f) Qualificadora, majorante e minorante de pena:
1. Causa de aumento de pena (art. 228, §único):

Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se


houver a participação de criança ou adolescente.

Aumento de pena até a metade se:


(1) A associação for armada: a jurisprudência majoritária entende que não há bis in idem
na associação criminosa armada e por roubo qualificado pelo concurso de agentes,
tendo em vista que os momentos consumativos dos delitos são autônomos.
“Segundo a jurisprudência desta Corte, não há bis in idem na condenação pelo
crime de associação criminosa armada e pelo roubo qualificado pelo concurso de
agentes, pois os delitos são autônomos, aperfeiçoando-se o primeiro
independentemente do cometimento de qualquer crime subsequente. Ademais, os
bens jurídicos protegidos são distintos – no caso do art. 288 p.u CP, a paz pública e
do roubo qualificado, o patrimônio, a integridade física e a liberdade do indivíduo.
(STJ AgRg no Aresp 1425424)”
Obs.: concurso de agentes no crime de roubo trata-se de uma causa de aumento
de pena (CP - art.157§2 inciso II)
(2) Participação de criança ou adolescente: a participação de criança ou de adolescente
na associação criminosa, além de majorar a pena, também acarreta a caracterização
da corrupção de menores, disciplinada pelo art. 244-B do ECA. Este crime tem natureza
formal e independe de prova da efetiva deturpação moral do menor de 18 anos, pois
se constitui em crime de perigo.
2. Qualificadora (art. 8º, caput. Lei 8072/90):

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código
Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

O art. 8° da Lei 8.072/90 prevê uma circunstância qualificadora, que eleva a pena de reclusão para
três a seis anos, quando a associação visar a prática de crimes hediondos ou a eles equiparados.
Note-se que referido diploma legal somente tratou de cominar pena específica para estas hipóteses
de ocorrência do crime de associação criminosa, sem, contudo, submeter os agentes às regras previstas no
art. 2°, que somente irão incidir se sobrevier a prática de um dos delitos etiquetados como hediondos ou a
eles equiparados.

3. Causa de diminuição de pena (art. 8º, §único da Lei 8072/90):

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando


ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a
dois terços (1/3 – 2/3).

O parágrafo único do art. 8° da Lei 8.072/90 traz a possibilidade delação


da premiada com diminuição
de pena. A minorante, para ser reconhecida (direito subjetivo do réu), depende do preenchimento dos
seguintes requisitos:
a. Deve partir de integrante ou partícipe;
b. Deve ser eficaz, isto é, possibilitar o desmantelamento da associação, havendo nexo entre a delação
e a desorganização do bando.

💣 Lembrar que o crime de extorsão mediante sequestro cometido por associação criminosa é
qualificado (e conforme já explicamos, não é bis in idem condenar pelos

De olho na jurisprudência!

A configuração do crime de associação criminosa (art. 288 do Código Penal) não


ocorre pela inclusão de um número mínimo de pessoas no polo passivo da ação
penal, mas sim pelo intuito do agente de tomar parte em grupo criminoso formado
por um quantitativo mínimo legal de integrantes. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp
1789273/P, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 25/08/2020.

4. CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA (ART. 288-A)

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Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia


particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes
previstos neste Código: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.

a) Introdução e Crítica doutrinária: Parte da doutrina entende que o presente artigo consiste em um
tipo penal aberto, o que coloca em risco sua constitucionalidade frente ao princípio da reserva legal ou da
estrita legalidade. Nas palavras de Cleber Masson:

“Deveras, o tipo penal não contém as definições de “organização militar, milícia


particular, grupo ou esquadrão”. Certamente tais conceitos serão apresentados
pela doutrina e pela jurisprudência, como já aconteceu várias vezes no Código
Penal. Entre tantos outros exemplos, basta lembrar da “rixa” (art. 137) e do “ato
obsceno” (art. 233). Em tempos de crescente insegurança jurídica, com
interpretações cada vez mais confusas, especialmente em assuntos ligados ao
crime organizado, o legislador poderia ter evitado as polêmicas que sempre
acompanharão a aplicação prática do art. 288-A do Código Penal.”

b) Conceitos: A doutrina encontra dificuldade para dividir e diferenciar organização paramilitar, milícia
particular, grupo ou esquadrão.

1. Milícia privada: É um grupo armado de pessoas (civis ou não), que diz ter como objetivo a devolução
da segurança que é retirada da sociedade, sobretudo, das comunidades mais carentes, restaurando
a paz. No entanto, se utiliza de violência e grave ameaça para isso, ignorando o monopólio estatal de
controle social. (Direito Penal Paralelo)
2. Organização paramilitar: Organização paralela, desvinculada do Estado, de civis armados, como se
fosse um exército, ou seja, “imitando” a corporação militar oficial. Em outras palavras: a organização
paramilitar possui estrutura análoga às instituições militares, que utiliza táticas e técnicas policiais
ou militares para alcançar seus objetivos.
3. Lembre-se que a Constituição Federal, em seu art. 5.º, inc. XVII, proíbe expressamente as
organizações paramilitares: “é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter
paramilitar”.
4. Este mandamento se fundamenta na exclusividade do Estado no tocante ao uso do poder coercitivo
frente às pessoas em geral, razão pela qual não se autoriza a atuação bélica e a prestação da
segurança pública a entes particulares, o que colocaria em risco a ordem social e o regime
democrático
5. Grupo ou esquadrão (grupo de extermínio): É grupo de matadores ou justiceiros que vão aplicar
penas como bem entenderem e conforme o seu senso de justiça. Conceito residual.

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SEMANA 07/12

6. Também é importante nesse aspecto se recordar do Direito Penal Paralelo, já explicado acima, em
que o particular quer fazer as vezes do Estado e do Direito Penal Subterrâneo, segundo o qual os
próprios agentes estatais, por considerarem inefetivo o sistema oficial, passam a exercer atividades
voltadas ao extermínio ou ameaça de criminosos.

c) Classificação: Crime de elevado potencial ofensivo na modalidade do caput, comum, formal, de


forma livre, comissivo, permanente na maioria dos núcleos, mas habitual nas modalidades “manter e
custear”, de perigo abstrato, plurissubjetivo e plurissubsistente.

d) Considerações:
⋅ Sujeito ativo: Qualquer pessoa (mas é de concurso necessário).
▪ Nucci diz que é no mínimo duas.
▪ Outras correntes mencionam ser no mínimo 3, como associação criminosa e outros no
mínimo 4 como organização criminosa.
▪ Não há decisão no sentido de qual prevaleça.
⋅ Sujeito passivo: Sociedade.
⋅ Objeto material: Paz pública.
⋅ Objeto jurídico: Paz pública.
⋅ Elemento subjetivo: Dolo + especial finalidade de agir, que é o fim específico de cometer crimes
previstos no Código Penal.
⋅ Crime permanente
⋅ Crime formal
⋅ Crime de perigo abstrato
⋅ Consumação: se consuma quando é constituída a associação, ou seja, no momento de convergência
dos indivíduos para formar a associação.
⋅ Independe da prática de qualquer infração penal para a sua configuração.
⋅ Tentativa: Admite. Segundo Nucci, na modalidade habitual não.

Obs.: O art. 288-A não é crime hediondo, será hediondo o homicídio que for praticado em atividade tipifica
de grupo de extermínio.

e) Conduta: Veja que são vários os núcleos, desde apenas integrar até custear.
⋅ Constituir; criar;
⋅ Organizar, estruturar;
⋅ Integrar, fazer parte da milícia;
⋅ Manter, após a constituição da milícia privada, colabora para que prossiga em suas atividades;
⋅ Custear, colaborar financeiramente para a existência da organização.

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SEMANA 07/12

f) Finalidade (dolo específico): Para praticar crimes previstos no Código Penal.


⋅ Deve visar série indeterminada de crimes.
⋅ Somente se aplica aos crimes dolosos, uma vez que a constituição de milícia privada é logicamente
incompatível com o propósito de praticar crimes culposos ou preterdolosos
⋅ Não se aplica a contravenções penais;
⋅ O legislador optou em afastar a incidência do art. 288-A do Código Penal frente à união de pessoas
para a prática de crimes previstos em leis extravagantes. Exemplificativamente, se várias pessoas
constituírem uma organização paramilitar para a prática de delitos de tráfico internacional de
armas de fogo (Estatuto do Desarmamento, art. 18), não responderão pela constituição de milícia
privada. Mas o fato não será atípico, pois estará configurado o delito de associação criminosa
armada, na forma do art. 288, parágrafo único, do Código Penal

Não se exige a finalidade de obtenção de vantagem de qualquer natureza. É comum a finalidade de obtenção
de vantagem, mas, caso não haja, a configuração do crime não fica afastada por isso. Quanto a competência,
o STJ já decidiu não se tratar de crime militar, mas crime a ser julgado na justiça comum.

Pergunta-se: Quantas pessoas devem integrar a organização paramilitar, milícia, grupo de


extermínio?
● 1ª Corrente: defende que o art. 288-A deve ter o mesmo número do art. 288, ou seja, 3 ou mais
pessoas.
● 2ª Corrente: defende que deve ter o mesmo número de uma organização criminosa, ou seja, 4 ou
mais pessoas
● 3ª Corrente: defende que não demanda número mínimo de pessoas, diversamente do crime de
associação criminosa.

Pergunta-se: suponhamos que um grupo de extermínio (art. 288-A) executa um menor infrator
(art. 121, §6º do CP). Os executores respondem por quais crimes?
● 1ª Corrente: defende que o agente responde somente pelo art. 121, §6º do Código Penal. Para
esta corrente puni-lo também pelo art. 288-A seria bis in idem.
● 2ª Corrente: argumenta que o agente deve responder pelo delito do art. 121, §6º e art. 288-A,
sem que isso signifique bis in idem. São infrações autônomas e defendem bens jurídicos distintos.

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LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DO INQUILINATO

LEI DE LOCAÇÕES – LEI DO INQUILINATO

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!


Lei 8.245/91
Art. 1º
Art. 2º
Art. 8º
Art. 17
Art. 35
Art. 37
Art. 38
Art. 39
Art. 40
Art. 41
Art. 42
Art. 43
Art. 44

Código Civil
Arts. 565 ao 578

Dada a relevância da Lei 8.245/91 em concursos para Delegado de Polícia e a sua baixa incidência em
tais concursos, abordaremos aqui os principais artigos da Lei.
No entanto, e considerando
-se a previsão da Lei no edital do seu concurso, recomendamos que
separe um tempo para a leitura da lei seca.

1. LOCAÇÃO EM GERAL

A Lei 8.245/91 dispõe sobre a locação dos imóveis urbanos e os procedimentos a ela pertinentes. De
acordo com o art. 1º da referida Lei:

Art. 1º A locação de imóvel urbano regula - se pelo disposto nesta lei:


Parágrafo único. Continuam regulados pelo Código Civil e pelas leis especiais:
a) as locações:

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SEMANA 07/12

1. de imóveis de propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, de suas


autarquias e fundações públicas;
2. de vagas autônomas de garagem ou de espaços para estacionamento de
veículos;
3. de espaços destinados à publicidade;
4. em apart- hotéis, hotéis - residência ou equiparados, assim considerados
aqueles que prestam serviços regulares a seus usuários e como tais sejam
autorizados a funcionar;
b) o arrendamento mercantil, em qualquer de suas modalidades.

Atenção à jurisprudência:

As empresas públicas são dotadas de personalidade jurídica de direito privado e,


ressalvadas as hipóteses constitucionais, sujeitam-se ao regime jurídico próprio
das empresas privadas, inclusive nas relações jurídicas contratuais que venham a
manter.
Assim, se uma empresa pública realiza contrato de locação comercial de imóvel
de sua propriedade, sendo o imóvel locado bem de natureza privada, o contrato
locatício firmado também é de natureza privada, e não administrativa,
submetendo-se à Lei de Locações.
O art. 1º, “a”, “1” da Lei 8.245/91 somente exclui do seu âmbito as locações de
imóveis de propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, de suas
autarquias e fundações públicas. Logo, as empresas públicas e sociedades de
economia mista submetem-se à Lei 8.245/91.
STJ. 4ª Turma. REsp 1224007-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
24/4/2014 (Info 542). (via DoD)

Conforme estabelece o art. 2º, havendo mais de um locador ou mais de um locatário, entende-se
que são solidários se o contrário não se estipulou. Em relação aos ocupantes de habitações coletivas
multifamiliares presumem-se locatários ou sublocatários (parágrafo único).
Em relação ao prazo, a Lei prevê que o contrato de locação pode ser ajustado por qualquer prazo,
dependendo de vênia conjugal, se igual ou superior a dez anos. No entanto, uma vez ausente a vênia
conjugal, o cônjuge não estará obrigado a observar o prazo excedente.
Independentemente do fundamento do término da locação, a ação para reaver o imóvel é a de
despejo, exceto se a locação terminar em decorrência de desapropriação, com a imissão do expropriante na
posse do imóvel.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Para a retomada da posse direta por adquirente de imóvel objeto de contrato de


locação, o rito processual adequado é o da ação de despejo, sob pena de malferir
o direito de terceiro que regularmente ocupa o bem. STJ. 3ª Turma. REsp
1.864.878-AM, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 30/08/2022 (Info
751).

O art. 8º da Lei aborda a hipótese de alienação do imóvel durante o contrato de locação,


estabelecendo o seguinte:

Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar


o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for
por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de
alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.
§ 1º Idêntico direito terá o promissário comprador e o promissário cessionário, em
caráter irrevogável, com imissão na posse do imóvel e título registrado junto à
matrícula do mesmo.
§ 2º A denúncia deverá ser exercitada no prazo de noventa dias contados do
- se, após esse prazo, a
registro da venda ou do compromisso, presumindo
concordância na manutenção da locação.

⋅ Nos casos de morte do LOCADOR: a locação transmite-se aos herdeiros.


⋅ Quando se tratar de morte do LOCATÁRIO: ficarão sub-rogados nos seus direitos e obrigações:
i. as locações com finalidade residencial, o cônjuge sobrevivente ou o companheiro
e, sucessivamente, os herdeiros necessários e as pessoas que viviam na
dependência econômica do de cujus, desde que residentes no imóvel;
ii. nas locações com finalidade não residencial, o espólio e, se for o caso, seu sucessor
no negócio.
⋅ Em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da união estável, a locação
residencial prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no
imóvel.
Obs.: exceto nos casos de morte do locador, nas demais hipóteses acima previstas, a sub-rogação
será comunicada por escrito ao locador e ao fiador, se esta for a modalidade de garantia locatícia,
sendo possível ao fiador exonerar-se das suas responsabilidades no prazo de 30 (trinta) dias contado
do recebimento da comunicação oferecida pelo sub-rogado, ficando responsável pelos efeitos da
fiança durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Em relação ao aluguel, dispõe o art. 17 que será livre a convenção do aluguel, vedada a sua
estipulação em moeda estrangeira e a sua vinculação à variação cambial ou ao salário-mínimo. Além disso,
nas locações residenciais serão observados os critérios de reajustes previstos na legislação específica.

1.1 Deveres do locador e do locatário

Previstos nos arts. 22 ao 26 da Lei 8.245/91 – remetemos o aluno para a leitura da lei seca.

1.2 Benfeitorias

Salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo


locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão
indenizáveis e permitem o exercício do direito de retenção.
Por outro lado, as benfeitorias voluptuárias não serão indenizáveis, podendo ser levantadas pelo
locatário, finda a locação, desde que sua retirada não afete a estrutura e a substância do imóvel.

1.3 Garantias locatícias

Conforme estabelece o art. 37 da Lei:

Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes


modalidades de garantia:
I - caução;
II - fiança;
III - seguro de fiança locatícia.
(Incluído pela Lei nº
IV - cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.
11.196, de 2005)
Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de
garantia num mesmo contrato de locação.

Obs.1: a caução poderá ser em bens móveis ou imóveis. No primeiro caso, deverá ser registrada em
cartório de títulos e documentos; no segundo caso, deve ser averbada à margem da respectiva matrícula.
Obs.2: a caução em dinheiro não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel e será
depositada em caderneta de poupança, autorizada, pelo Poder Público e por ele regulamentada, revertendo
em benefício do locatário todas as vantagens dela decorrentes por ocasião do levantamento da soma
respectiva.
Atenção à jurisprudência:

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O imóvel dado em caução em contrato de locação comercial que pertence a


determinada sociedade empresária e é utilizado como moradia por um dos sócios
recebe a proteção da impenhorabilidade de bem de família.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.935.563-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
03/05/2022 (Info 735).

É impenhorável o bem de família oferecido como caução em contrato de locação


comercial.
Exemplo hipotético: em um contrato de locação comercial de terceiro, Ricardo
ofereceu sua casa como caução (garantia) da relação locatícia (art. 37, I, da Lei nº
8.245/91). O terceiro (locatário) não pagou os aluguéis e o locador executou o
locatário e Ricardo pedindo a penhora da casa objeto da caução. Ocorre que se
trata de bem de família onde Ricardo reside. Será possível a penhora?
Não. As hipóteses excepcionais nas quais o bem de família pode ser penhorado
estão previstas, taxativamente, no art. 3º da Lei nº 8.009/90. Tais hipóteses não
admitem interpretação extensiva.
O escopo da Lei nº 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, mas sim
a entidade familiar no seu conceito mais amplo, razão pela qual as hipóteses
permissivas da penhora do bem de família, em virtude do seu caráter excepcional,
devem receber interpretação restritiva.
A caução levada a registro, embora constitua garantia real, não encontra previsão
em qualquer das exceções contidas no art. 3º da Lei nº 8.009/90, devendo, em
regra, prevalecer a impenhorabilidade do imóvel, quando se tratar de bem de
família.
Assim, não é possível a penhora do bem de família mesmo que o proprietário tenha
oferecido o imóvel como caução em contrato de locação. STJ. 4ª Turma. REsp
1.789.505-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 22/03/2022 (Info 732). (explicação
via DoD)

Vale destacar que, salvo previsão contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se
estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado.
Além disso, é lícito ao locador exigir novo fiador ou que a modalidade de garantia seja substituída
quando ocorrer:

Art. 40 (...)
I - morte do fiador;
ausência, interdição, recuperação judicial, falência ou insolvência do fiador,
declaradas judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.112, de 2009)
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

III - alienação ou gravação de todos os bens imóveis do fiador ou sua mudança de


residência sem comunicação ao locador;
IV - exoneração do fiador;
V - prorrogação da locação por prazo indeterminado, sendo a fiança ajustada por
prazo certo;
VI - desaparecimento dos bens móveis;
VII - desapropriação ou alienação do imóvel.
VIII - exoneração de garantia constituída por quotas de fundo de
investimento; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)
IX - liquidação ou encerramento do fundo de investimento de que trata o inciso IV
do art. 37 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)
X – prorrogação da locação por prazo indeterminado uma vez notificado o locador
pelo fiador de sua intenção de desoneração, ficando obrigado por todos os efeitos
da fiança, durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador.

Em tais casos, é lícito ao locador a notificação do locatário para que apresente nova garantia locatícia
no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de desfazimento da locação.

1.4 Das penalidades criminais e civis

De acordo com a lição do Professor Silvio Venosa, os arts. 43 e 44 da Lei trazem as penalidades civis
e criminais decorrentes do inquilinato. Contudo, as “penas civis” só estão presentes realmente no parágrafo
único do art. 44, onde se admite a cobrança de multa em todas as situações em que ocorrer a tipificação de
crimes, definidos no corpo desse mesmo art. 44. Vejamos:

Art. 43. Constitui contravenção penal, punível com prisão simples de cinco dias a
seis meses ou multa de três a doze meses do valor do último aluguel atualizado,
revertida em favor do locatário:
I - exigir, por motivo de locação ou sublocação, quantia ou valor além do aluguel e
encargos permitidos;
II - exigir, por motivo de locação ou sublocação, mais de uma modalidade de
garantia num mesmo contrato de locação;
III - cobrar antecipadamente o aluguel, salvo a hipótese do art. 42 e da locação
para temporada.

Art. 44. Constitui crime de ação pública, punível com detenção de três meses a um
ano, que poderá ser substituída pela prestação de serviços à comunidade:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

I - recusar-se o locador ou sublocador, nas habitações coletivas multifamiliares, a


fornecer recibo discriminado do aluguel e encargos;
II - deixar o retomante, dentro de cento e oitenta dias após a entrega do imóvel, no
caso do inciso III do art. 47, de usá-lo para o fim declarado ou, usando-o, não o fizer
pelo prazo mínimo de um ano;
III - não iniciar o proprietário, promissário comprador ou promissário cessionário,
nos casos do inciso IV do art. 9º, inciso IV do art. 47, inciso I do art. 52 e inciso II do
art. 53, a demolição ou a reparação do imóvel, dentro de sessenta dias contados de
sua entrega;
IV - executar o despejo com inobservância do disposto no § 2º do art. 65.
poderá
Parágrafo único. Ocorrendo qualquer das hipóteses previstas neste artigo,
o prejudicado reclamar, em processo próprio, multa equivalente a um mínimo de
doze e um máximo de vinte e quatro meses do valor do último aluguel atualizado
ou do que esteja sendo cobrado do novo locatário, se realugado o imóvel.

Obs.: as previsões acima se aplicam às locações residenciais, não residenciais e para temporada.

1.5 Aspectos gerais sobre as locações

⋅ Locação residencial
Nas locações ajustadas por escrito e por prazo igual ou superior a trinta meses, a resolução do
contrato ocorrerá findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso. No entanto,
findo o prazo estipulado em contrato, permanecendo o locatário na posse do imóvel alugado por mais
de trinta dias, sem oposição do locador, será presumida a prorrogação da locação por prazo
indeterminado, preservadas as demais cláusulas e condições contratuais.
Nos casos em que haja prorrogação, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo,
concedido o prazo de trinta dias para desocupação (denúncia vazia).
Se a locação for ajustada verbalmente ou por escrito e com prazo inferior a trinta meses, ao final do
prazo estabelecido, haverá a prorrogação da locação automaticamente, por prazo indeterminado,
somente se admitindo a retomada do imóvel nas seguintes hipóteses:

I - Nos casos do art. 9º (mútuo acordo; em decorrência de prática de infração legal


ou contratual; em decorrência da falta de pagamento do aluguel e demais
encargos);
II - em decorrência de extinção do contrato de trabalho, se a ocupação do imóvel
pelo locatário relacionada com o seu emprego;

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

III - se for pedido para uso próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso
residencial de ascendente ou descendente que não disponha, assim como seu
cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio;
IV - se for pedido para demolição e edificação licenciada ou para a realização de
obras aprovadas pelo Poder Público, que aumentem a área construída, em, no
mínimo, vinte por cento ou, se o imóvel for destinado a exploração de hotel ou
pensão, em cinqüenta por cento;
V - se a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos. (denúncia vazia)

ATENÇÃO: são nulas de pleno direito as cláusulas do contrato de locação que proíbam a prorrogação acima
mencionada.

Atenção à jurisprudência:

O prazo máximo da renovação compulsória do contrato de locação comercial será


de cinco anos, ainda que a vigência da avença locatícia supere esse período.
STJ. 4ª Turma.REsp 1.990.552-RS, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 17/05/2022
(Info 737).

Obs.1: na hipótese do inciso II, deve haver demonstração judicial se:

a) o retomante, alegando necessidade de usar o imóvel, estiver ocupando, com a


mesma finalidade, outro de sua propriedade situado nas mesma localidade ou,
residindo ou utilizando imóvel alheio, já tiver retomado o imóvel anteriormente;
b) o ascendente ou descendente, beneficiário da retomada, residir em imóvel
próprio.

Obs.2: Nas hipóteses dos incisos III e IV, o retomante deverá comprovar ser proprietário, promissário
comprador ou promissário cessionário, em caráter irrevogável, com imissão na posse do imóvel e título
registrado junto à matrícula do mesmo.

⋅ Locação para temporada


É aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos,
tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de
determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o
imóvel.
Tratando-se de locação de imóvel mobiliado, o contrato deverá discriminar os móveis e utensílios
que o guarnecem, indicando o estado de conservação.
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Além disso, admite-se ao locador o recebimento de uma só vez e antecipadamente os aluguéis e


encargos, assim como a exigência das garantias contratuais já estudadas.

⋅ Locação não residencial

Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a
renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:
I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;
II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos
contratos escritos seja de cinco anos;
III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo
mínimo e ininterrupto de três anos.

O direito de renovação do contrato pode ser exercido pelos cessionários ou sucessores da locação.
No caso de sublocação total do imóvel, somente o sublocatário tem o direito de renovação.
Se o contrato permitir que o locatário use o imóvel para atividades de uma sociedade da qual faz
parte e o fundo de comércio seja transferido para essa sociedade, o direito de renovação pode ser
exercido pelo locatário ou pela sociedade.
Nos casos de dissolução de sociedade comercial devido à morte de um sócio, o sócio sobrevivente
tem o direito de renovação, desde que continue no mesmo ramo.
Além disso, o direito de renovação se aplica a locações feitas por indústrias e sociedades civis com
fins lucrativos, desde que atendam aos requisitos deste artigo.
Por fim, decai do direito à renovação se a ação não for proposta no período de um ano, no máximo,
até seis meses, no mínimo, antes da data de término do contrato vigente.

Art. 52. O locador não estará obrigado a renovar o contrato se:


I - por determinação do Poder Público, tiver que realizar no imóvel obras que
importarem na sua radical transformação; ou para fazer modificações de tal
natureza que aumente o valor do negócio ou da propriedade;
II - o imóvel vier a ser utilizado por ele próprio ou para transferência de fundo de
comércio existente há mais de um ano, sendo detentor da maioria do capital o
locador, seu cônjuge, ascendente ou descendente.
§ 1º Na hipótese do inciso II, o imóvel não poderá ser destinado ao uso do mesmo
ramo do locatário, salvo se a locação também envolvia o fundo de comércio, com
as instalações e pertences.
§ 2º Nas locações de espaço em shopping centers , o locador não poderá recusar a
renovação do contrato com fundamento no inciso II deste artigo.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

§ 3º O locatário terá direito a indenização para ressarcimento dos prejuízos e dos


lucros cessantes que tiver que arcar com mudança, perda do lugar e desvalorização
do fundo de comércio, se a renovação não ocorrer em razão de proposta de
terceiro, em melhores condições, ou se o locador, no prazo de três meses da
entrega do imóvel, não der o destino alegado ou não iniciar as obras determinadas
pelo Poder Público ou que declarou pretender realizar.

Ainda de acordo com a Lei, considera-se locação não residencial quando o locatário for pessoa
jurídica e o imóvel, destinar-se ao uso de seus titulares, diretores, sócios, gerentes, executivos ou
empregados.
Nos demais casos de locação não residencial, o contrato por prazo determinado cessa, de pleno
direito, findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso. Findo o prazo estipulado, se o
locatário permanecer no imóvel por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada
a locação nas condições ajustadas, mas sem prazo determinado (art. 56).
Por fim, o contrato de locação por prazo indeterminado pode ser denunciado por escrito, pelo
locador, concedidos ao locatário trinta dias para a desocupação (art. 57).

1.6 Jurisprudência relevante

Em ação renovatória do contrato de locação de espaço em shopping center a


dissonância entre o locativo percentual contratado e o valor de mercado não
autoriza, por si só, a alteração do aluguel.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.947.694-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 14/09/2021
(Info 709).

Existindo na Convenção de Condomínio regra impondo destinação residencial,


mostra-se indevido o uso de unidade condominial para fins de hospedagem
remunerada, com múltipla e concomitante locação de aposentos existentes nos
apartamentos, a diferentes pessoas, por curta temporada (ex: locação pelo
Airbnb).
Vale ressaltar que existe a possibilidade de os próprios condôminos de um
condomínio edilício de fim residencial deliberarem em assembleia, por maioria
qualificada (2/3 das frações ideais), permitir a utilização das unidades
condominiais para fins de hospedagem atípica, por intermédio de plataformas
digitais ou outra modalidade de oferta, ampliando o uso para além do
estritamente residencial e, posteriormente, querendo, incorporarem essa
modificação à Convenção do Condomínio.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

STJ. 4ª Turma. REsp 1.819.075-RS, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, julgado em
20/04/2021 (Info 693). (via DoD)

Não são exigíveis aluguéis no período compreendido entre o incêndio que


destruiu imóvel objeto de locação comercial e a efetiva entrega das chaves pelo
locatário
A locação consiste na cessão do uso ou gozo da coisa em troca de uma retribuição
pecuniária, isto é, tem por objeto poderes ou faculdades inerentes à propriedade.
Assim, extinta a propriedade pelo perecimento do bem, também se extingue, a
partir desse momento, a possibilidade de usar, fruir e gozar desse mesmo bem, o
que inviabiliza, por conseguinte, a manutenção do contrato de locação, já que o
locatório não terá como realizar a exploração econômica dessas faculdades da
propriedade.
STJ. 3ª Turma. REsp 1707405/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/
Acórdão Min. Moura Ribeiro, julgado em 07/05/2019 (Info 650). (via DoD)

A denúncia vazia não é admitida quando o prazo de 30 meses, exigido pelo art.
46 da Lei nº 8.245/91, é atingido com as sucessivas prorrogações do contrato de
locação de imóvel residencial urbano.
Em outras palavras, o art. 46 da Lei nº 8.245/91 somente admite a denúncia vazia
se um único instrumento escrito de locação estipular o prazo igual ou superior a
30 meses, não sendo possível contar as sucessivas prorrogações dos períodos
locatícios (accessio temporis) para se atingir esse prazo de 30 meses.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.364.668-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
07/11/2017 (Info 615).

Não é abusiva a mera previsão contratual que estabelece a duplicação do valor


do aluguel no mês de dezembro em contrato de locação de espaço em shopping
center.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.409.849
-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado
em 26/4/2016 (Info 582).

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

META 2

DIREITO PROCESSUAL PENAL: PRISÕES

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CF/88:
⦁ Art. 5º, LIV, LV e LVII.
⦁ Art. 5º, LXI, LXII, LXIII, LXIV, LXV, LXVI e LXVII.
⦁ Art. 22, I.

CPP:
⦁ Art. 3º-A.
⦁ Art. 3º-B.
⦁ Art. 125.
⦁ Art. 225.
⦁ Arts. 282 ao 320.
⦁ Arts. 323 e 324.
⦁ Art. 593, III.

Outros Dispositivos Legais:


⦁ Lei n° 7.960/89 (Lei da Prisão Temporária).
⦁ Art. 12, Lei n° 13.869/2019.
⦁ Arts. 5º, 7º, 19 e 24-A, Lei n° 11.340/06.
⦁ Arts. 20; 48, §2º; 56, §1º, Lei n° 11.343/06.
⦁ Art. 17-D, Lei n° 9.613/98.
⦁ Arts. 2º, §5º e 22, Lei n° 12.850/13.
⦁ Arts. 39, V e 50, VI, da LEP.
⦁ Art. 117, LEP.
⦁ Art. 99, Lei n° 11.101/05.
⦁ Art. 69, Lei n° 9.099/95.
⦁ Art. 30, Lei n° 7.492/86.
⦁ Art. 301, CTB.
⦁ Item 7º, CADH.

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

CF/88:
⦁ Art. 5º, LVII.
⦁ Art. 5º, LXI a LXVI (muito importante!).

CPP:
⦁ Art. 3º-B, I, II, V e VI.
⦁ Art. 282 (importantíssimo!!!).
⦁ Arts. 284 e 287.
⦁ Art. 292, parágrafo único.
⦁ Arts. 302 ao 304.
⦁ Arts. 306 e 308.
⦁ Art. 310 (importantíssimo!!!).
⦁ Arts. 311 ao 313.
⦁ Arts. 314 ao 316.
⦁ Arts. 317 e 318-B (análise comparativa do art. 318 com o art. 117 da LEP).
⦁ Art. 319.

Outros Dispositivos Legais:


⦁ Arts. 1º ao 4º, Lei n° 7.960/89 (Lei da Prisão Temporária).
⦁ Art. 12, Lei n° 13.869/2019.
⦁ Arts. 19 e 24-A, Lei n° 11.340/06.
⦁ Art. 60, Lei n° 9.099/95.

SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA


Súmula 64-STJ: Não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela
defesa.
Súmula 21-STJ: Pronunciado o réu, fica superada a alegação do constrangimento ilegal da prisão por
excesso de prazo na instrução.
Súmula 52-STJ: Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso
de prazo.
Súmula 347-STJ: O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão.

1. A TUTELA CAUTELAR NO PROCESSO PENAL

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Apesar de as medidas cautelares processuais penais estarem elencadas de forma atécnica no Código
de Processo Penal, por estarem previstas em vários capítulos de forma esparsa, é possível classificá-las como:
● Medidas cautelares de natureza pessoal: Tratam-se de medidas restritivas ou privativas de
liberdade de locomoção adotadas contra o imputado durante as investigações ou no curso
do processo, com o objetivo de assegurar a eficácia do processo (por exemplo: prisão
preventiva).

● Medidas cautelares de natureza patrimonial: Tratam-se de medidas relacionadas à


reparação do dano e ao perdimento de bens como efeito da condenação (por exemplo:
sequestro, arresto e hipoteca legal).

● Medidas cautelares probatórias: Tratam-se de medidas que visam à obtenção de provas


para o processo, com a finalidade de assegurar a utilização dos elementos probatórios por
ela revelados ou evitar o seu perecimento (por exemplo: busca domiciliar e busca pessoal).

Pode-se concluir que NÃO há um processo cautelar autônomo em sede processual penal, pois ela é
prestada através de medidas cautelares que são concedidas de maneira incidental, seja na fase
investigatória, seja na fase processual penal.

2. O FIM DA BIPOLARIDADE DAS MEDIDAS CAUTELARES DE NATUREZA PESSOAL PREVISTAS NO CPP

Antes do advento da Lei n° 12.043/11, o processo penal brasileiro adotava a bipolaridade cautelar.
Ou seja, originariamente no CPP, o acusado ou respondia ao processo com total privação de sua liberdade,
permanecendo preso cautelarmente, ou então lhe era deferido o direito à liberdade provisória, com ou sem
fiança, desde que cumpridas determinadas condições.
Com o objetivo de colocar fim à bipolaridade cautelar, a Lei n° 12.043/11 ampliou o rol de medidas
cautelares pessoais diversas da prisão, proporcionando ao juiz a escolha que mais se ajuste ao caso concreto,
observando sempre a legalidade e a proporcionalidade, de acordo com os arts. 319 e 320 do CPP.
As medidas cautelares diversas da prisão encontram-se previstas nos arts. 319 e 320 do CPP e podem
ser adotadas:
● Como instrumento de contracautela, substituindo anterior prisão em flagrante, preventiva
ou temporária: Quando o Juiz verificar a ausência de requisitos que autorizam a decretação
da prisão preventiva, pode impor tais medidas cautelares pessoais diversas da prisão,
observados os critérios de necessidade e adequação.
● Como instrumento cautelar ao acusado que estava em liberdade plena: As medidas
cautelares diversas da prisão podem ser aplicadas de maneira autônoma, sem guardar
qualquer relação com a prisão em flagrante, preventiva ou temporária decretada
anteriormente.
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

3. O PODER GERAL DE CAUTELA NO PROCESSO PENAL

O poder geral de cautela é amplamente utilizado e reconhecido no âmbito do processo civil, em que
o juiz pode utilizar, além das medidas cautelares nominadas, previstas em lei, as medidas cautelares
inominadas, aplicando-se ao caso concreto a forma e o meio que considere oportunos e apropriados, mesmo
não estando amparados legalmente, devendo ser utilizado de forma complementar. Encontra-se previsto no
art. 297 do CPC.
Nesse diapasão, indaga-se: É possível aplicar o poder geral de cautela no âmbito do processo penal?
Existem correntes doutrinárias acerca do tema, além de decisões dos Tribunais Superiores:
● 1ª Corrente (LFG, Aury Lopes Jr.): NÃO se pode admitir o poder geral de cautela no processo penal,
pois se trata de um instrumento limitador do poder punitivo estatal, devendo respeito aos limites e
formas estritamente legais. Assim, não existem medidas cautelares inominadas no processo penal,
tampouco o juiz criminal possui poder geral de cautela, uma vez que o Princípio da Legalidade é
fundante de toda a estrutura penal.
⮚ O STF reconheceu esse posicionamento no HC 188.888/MG. Contudo, trata-se de um
posicionamento garantista, com pertinência mais voltada aos concursos de Defensoria
Pública e não delegado de polícia civil. Porém, ainda que garantista, deve-se observar a
tendência de cobrança da banca.

● 2ª Corrente (Renato Brasileiro): O poder geral de cautela é admitido no processo penal, desde que
a medida cautelar inominada seja compatível e mais benéfica.
⮚ O STF reconheceu esse posicionamento no HC 94.147:
PROCESSUAL PENAL. IMPOSIÇÃO DE CONDIÇÕES JUDICIAIS (ALTERNATIVAS À PRISÃO
PROCESSUAL). POSSIBILIDADE. PODER GERAL DE CAUTELA. PONDERAÇÃO DE
INTERESSES. ART. 798, CPC; ART. 3°, CPC. A questão jurídica debatida neste habeas
corpus consiste na possibilidade (ou não) da imposição de condições ao paciente com
a revogação da decisão que decretou sua prisão preventiva. Houve a observância dos
princípios e regras constitucionais aplicáveis à matéria na decisão que condicionou a
revogação do decreto prisional ao cumprimento de certas condições judicias. Não há
direito absoluto à liberdade de ir e vir (CF, art. 5°, XV) e, portanto, existem situações
em que se faz necessária a ponderação dos interesses em conflito na apreciação do
caso concreto. A medida adotada na decisão impugnada tem clara natureza
acautelatória, inserindo-se no poder geral de cautela (CPC, art. 798; CPP, art. 3°). As
condições impostas não maculam o princípio constitucional da não-culpabilidade,
como também não o fazem as prisões cautelares (ou processuais). Cuida-se de
medida adotada com base no poder geral de cautela, perfeitamente inserido no
Direito brasileiro, não havendo violação ao princípio da independência dos poderes
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DELEGADO SÃO PAULO

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(CF, art. 2°), tampouco malferimento à regra de competência privativa da União para
legislar sobre direito processual (CF, art. 22, I). Ordem denegada. (STF, 2ª Turma, HC
94.147/RJ, Rel. Min. Ellen Gracie, Dje 107 12/06/2008).
DICA DD: Trata-se de um posicionamento menos conservador, que deve ser adotado nos concursos de
Delegado de Polícia, tendo em vista a sua pertinência temática com o cargo.

Assim veja que o tema é polêmico, no entanto, prevalece na jurisprudência do STJ TAMBÉM que se
aplica o poder geral de cautela no processo penal, pois o emprego de cautelares inominadas só é proibido
no processo penal se atingir a liberdade de ir e vir do indivíduo (como o caso mencionado no HC 186.421/SC
- Rel. Min. Celso de Mello). STJ. 6ª Turma. HC 469.453/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 19/09/2019.
Assim, conclui-se que SE APLICA O PODER GERAL DE CAUTELA NO PROCESSO PENAL SALVO SE
ATINGIR A LIBERDADE.

4. PRINCIPIOLOGIA DAS PRISÕES CAUTELARES

4.1 Princípio da Presunção de Inocência ou da Não Culpabilidade

O princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade pode ser conceituado como o direito
de não ser declarado culpado senão após o término do devido processo legal, durante o qual o acusado tenha
se utilizado de todos os meios de prova pertinentes para a sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da
credibilidade das provas apresentadas pela acusação (contraditório). É um princípio constitucional que se
encontra no art. 5°, inciso LVII, da CRFB/88: “LVII - Ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória.”
Entretanto, como qualquer outro princípio, a presunção de inocência não é absoluta e pode ser
relativizada pelo uso das prisões cautelares. O que permite a coexistência, além do requisito e fundamento
cautelar, são os princípios que regem as medidas cautelares.

4.2 Princípio da Jurisdicionalidade

Em razão do princípio da jurisdicionalidade, a decretação de qualquer medida cautelar de natureza


pessoal deve ser feita por ordem judicial, ou seja, está sujeita à cláusula de reserva de jurisdição, podendo
tal controle ocorrer previamente, como nos casos de prisão preventiva, ou em momento imediatamente
posterior, como nos casos de prisão em flagrante.
Esse princípio encontra-se intimamente ligado ao devido processo legal, conforme prevê o art. 5°,
inciso LIV, da CRFB/88: “LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
Ademais, está consagrado no ordenamento jurídico brasileiro no art. 5°, inciso LXI, da CRFB/88: “LXI
- ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”.
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DELEGADO SÃO PAULO

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A Lei n° 13.964/19 (Pacote Anticrime), em consonância com o sistema acusatório, positivou no art.
282, §2°, do CPP que o juiz não poderá decretar qualquer medida cautelar de natureza pessoal de ofício (ex
officio):

ANTES DO PACOTE ANTICRIME APÓS O PACOTE ANTICRIME


Serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a Serão decretadas pelo juiz a requerimento
requerimento das partes ou, quando no curso das partes ou, quando no curso da
da investigação criminal, por representação da investigação criminal, por representação da
autoridade policial ou mediante requerimento autoridade policial ou mediante
do Ministério Público. requerimento do Ministério Público.

Entretanto, existem exceções ao princípio da jurisdicionalidade:


1) Concessão de fiança pela autoridade policial (art. 322 do CPP): A autoridade policial poderá
conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4
(quatro) anos. A fiança de uma espécie de medida cautelar.

ATENÇÃO: A prisão em flagrante pode ser efetuada por qualquer pessoa. Além disso, a fiança poderá ser
concedida pela autoridade policial (apenas nos casos de prisão em flagrante para crimes com pena de até 4
anos, à exceção do crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência previsto na Lei Maria da
Penha).

2) Afastamento do agressor do lar por delegado de polícia ou por policial nos casos da Lei Maria da
Penha (art. 12-C, incisos II e III): Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à
integridade física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus
dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com
a ofendida pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou pelo policial,
quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da
denúncia.

É válida a atuação supletiva e excepcional de delegados de polícia e de policiais a


fim de afastar o agressor do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida,
quando constatado risco atual ou iminente à vida ou à integridade da mulher em
situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, conforme o
art. 12-C inserido na Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). STF. Plenário. ADI
6138/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 23/3/2022 (Info 1048).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Ademais, no ordenamento jurídico pátrio, é vedada a prisão cautelar ex lege. De acordo com Renato
Brasileiro, trata-se da prisão imposta por força de lei, de maneira automática e obrigatória,
independentemente da análise da necessidade pelo juiz. Suas hipóteses legais foram extintas pela Lei n°
11.689/08 e pela Lei n° 11.719/08.

4.3 Princípio da Motivação

Toda prisão cautelar depende de ordem escrita e fundamentada da autoridade judicial competente,
satisfazendo-se, assim, o princípio da motivação, conforme preceituado no art. 93, inciso IX, da CRFB/88 e
no art. 315 do CPP.

4.4 Princípio do Contraditório

O princípio do contraditório nas medidas cautelares encontra-se previsto no art. 282, §3°, do CPP:

§ 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz,


ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte
) dias, acompanhada de cópia do
contrária, para se manifestar no prazo de 5 (cinco
requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo, e os casos
de urgência ou de perigo deverão ser justificados e fundamentados em decisão que
contenha elementos do caso concreto que justifiquem essa medida excepcional.

Perceba que, em regra, o contraditório dá-se com a intimação da defesa para manifestação prévia à
decretação da medida cautelar, no prazo de 5 (cinco) dias. Entretanto, poderá o juiz deixar de efetivar o
contraditório nos “casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida”, devendo proferir uma decisão
justificando e fundamentando – em elementos do caso concreto – essa excepcionalidade.
Ademais, em casos de suspeita de descumprimento das condições impostas quando decretadas as
medidas cautelares diversas da prisão (art. 319 do CPP), deverá ocorrer o contraditório quando for pedida a
substituição, a cumulação ou a revogação da medida cautelar diversa e a decretação da prisão preventiva.

4.5 Princípio da Provisionalidade e o Princípio da Atualidade do Perigo

Uma vez que as prisões cautelares são espécies de medidas cautelares, verifica-se ínsito o princípio
da provisionalidade, pois tutelam uma situação fática. Desaparecendo-se o suporte fático, quais sejam, o
fumus comissi delicti e o periculum libertatis, deve-se cessar a prisão. Esse princípio encontra-se consagrado
no art. 282, §§ 4º e 5°, do CPP.

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DELEGADO SÃO PAULO

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Já em relação ao Princípio da Atualidade ou Contemporaneidade do Perigo deve-se considerar a


atualidade do risco, do periculum libertatis. Nessa linha, o § 2° do art. 312 do CPP exige que, para a decretação
da prisão preventiva, o perigo (necessidade cautelar) deve ter existência concreta em fatos novos ou
contemporâneos, que justifiquem a medida adotada.

4.6 Princípio da Excepcionalidade

De acordo com o princípio da excepcionalidade, a prisão preventiva deve ser decretada somente se
esgotadas as possibilidades de substituição pelas medidas cautelares diversas, tratando-se da ultima ratio,
de acordo com o preconizado no art. 282, §6, do CPP.

4.7 Princípio da Proporcionalidade

No que tange ao princípio da proporcionalidade, em sede de medidas cautelares de natureza


pessoal, tem-se que a medida somente será legítima quando o sacrifício da liberdade de locomoção do
acusado for proporcional à gravidade do crime e às respectivas sanções que previsivelmente venham a ser
impostas ao final do processo. Encontra-se preconizado no art. 282, inciso II, do CPP.
Esse princípio pode ser dividido em 3 subprincípios:
1) Adequação: A medida cautelar deve ser apta aos seus motivos e fins.
2) Necessidade: A medida cautelar não deve exceder o imprescindível para a realização do resultado
que almeja.
3) Proporcionalidade em sentido estrito: O juiz, ao decretar a medida cautelar, deve sopesar os bens
que possam ser restringidos.

4.7.1 Princípio da Homogeneidade ou da Proporcionalidade em Sentido Estrito

O princípio da homogeneidade ou proporcionalidade em sentido estrito impede que as prisões


cautelares imponham ônus mais grave do que o cabível em caso de eventual condenação. Deve-se, portanto,
ser feito um juízo de ponderação entre o bem que é lesionado ou posto em perigo e o bem de que pode
alguém ser privado.
Entretanto, a aplicação desse princípio não é pacífica na jurisprudência: há decisões favoráveis e
decisões desfavoráveis dos Tribunais Superiores!

4.7.2 Princípio Tácito ou Implícito da Individualização da Prisão

O princípio tácito ou implícito da individualização da prisão (não somente da pena) foi reconhecido
pelo STF no HC 106.963 e é conceituado por Guilherme de Souza Nucci como a premência do vínculo dentre
as medidas cautelares e a proporcionalidade, ou seja, tal como se fosse uma autêntica individualização da
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DELEGADO SÃO PAULO

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pena, devendo-se analisar o fato, seu autor, em detalhes, para aplicar a mais adequada medida cautelar
restritiva de liberdade.

5. PRESSUPOSTOS PARA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES DE NATUREZA PESSOAL

Primeiramente, antes de serem analisados os pressupostos para a aplicação das medidas cautelares
de natureza pessoal, é importante adequar as expressões a serem estudadas ao processo penal.
No direito processual civil, identificam-se como pressupostos da medida cautelar o fumus boni iuris
e o periculum in mora. Entretanto, tais expressões não revelam com propriedade os pressupostos das
cautelares pessoais no direito processual penal, sendo nominalmente adequadas as expressões fumus
comissi delicti e periculum libertatis.

● Fumus Comissi Delicti


As medidas cautelares de natureza pessoal nunca poderão ser adotadas como efeito automático da
prática de uma infração penal, devendo estar condicionada aos pressupostos cumulativos do fumus comissi
delicti e do periculum libertatis.
O fumus comissi delicti deve ser entendido como a plausibilidade de que se trata de um fato
criminoso, constatada por elementos de informação que confirmem:
1) A prova da existência do crime: juízo de certeza; e
2) Os indícios de suficiência de autoria: prognóstico positivo.

Encontra supedâneo legal na parte final do art. 312 do CPP, sendo indispensável tanto para a
decretação da prisão preventiva quanto para qualquer outra medida cautelar.

● Periculum Libertatis
O fundamento do periculum libertatis é o perigo que decorre do estado de liberdade do imputado.
Assim, é compreendido como o perigo concreto que a permanência do suspeito em liberdade acarreta para
investigação criminal, para o processo penal, para a efetividade do direito penal ou para a segurança social.
Nessa toada, o art. 282, inciso I, do CPP afirma que as medidas cautelares de natureza pessoal (em
geral) devem ser aplicadas observando-se:
1) A necessidade para a aplicação da lei penal;
2) A necessidade para a investigação ou a instrução criminal; e
3) Nos casos excepcionalmente previstos, para evitar a prática de infrações penais.

Em relação à prisão preventiva, o periculum libertatis encontra-se previsto no art. 312 do CPP,
podendo ser decretada:
1) Para assegurar a aplicação da lei penal;
2) Por conveniência da instrução criminal;
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

3) Como garantia da ordem pública; e


4) Como garantia da ordem econômica.

Insta salientar que o periculum libertatis deve ser atual, uma vez que as medidas cautelares tutelam uma
situação fática presente, satisfazendo-se o princípio da atualidade ou da contemporaneidade do perigo.
Por fim, compara-se a seguir os pressupostos para a aplicação da prisão preventiva e das medidas
cautelares diversas da prisão:

PRISÃO PREVENTIVA MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS


Fumus comissi delicti – Trata-se da Fumus comissi delicti – Trata-se da
plausibilidade do direito de punir. É evidenciada plausibilidade do direito de punir. É
pela presença da prova do crime e dos indícios evidenciada pela presença da prova do crime e
de autoria (art. 312 do CPP). dos indícios de autoria (art. 312 do CPP).
Periculum libertatis – É o perigo que a Periculum libertatis – É o perigo que a
permanência em liberdade do acusado permanência em liberdade do acusado
representa (art. 312 e art. 282, ambos do CPP); representa (art. 312 e art. 282, ambos do CPP);
Ultima ratio – Só deve ser adotada quando se Prima ratio – Deve-se tentar adotar sempre
verificar que as cautelares diversas da prisãoque possível, a fim de se evitar o
não vão atingir seus efeitos (art. 282, §6°, do encarceramento desnecessário.
CPP). Obs.: Para decretar a preventiva não há
necessidade de decretar medida cautelar
diversa da prisão antes, basta fundamentar que
não cabe nenhuma das referidas medidas.
Infração penal – A prisão preventiva é uma Infração penal - Deve haver cominação de pena
medida extrema (gravosa), por isso não são privativa de liberdade isolada, cumulativa ou
todos os crimes que admitem sua decretação. alternativamente (art. 283, §1°, do CPP).
Deve-se analisar o art. 313 do CPP.

6. PROCEDIMENTO PARA A APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES DE NATUREZA PESSOAL

6.1 Aplicação Isolada ou Cumulativa das Medidas Cautelares

De acordo com o previsto no art. 282, §1°, do CPP, as medidas cautelares poderão ser aplicadas
isolada ou cumulativamente, a depender da adequação da medida e da necessidade do caso concreto,
verificando-se a compatibilidade entre elas. Não são compatíveis, por exemplo, a cumulação de decretação
de prisão cautelar (ou internação provisória) com outra medida cautelar, por já ter sido imposto o grau
máximo de restrição cautelar.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

6.2 Vedação à Decretação de Medidas Cautelares pelo Juiz de Ofício ou na Fase Investigatória ou na Fase
Processual

Desde a entrada em vigor da Lei n° 13.964/19 (Pacote Anticrime), o juiz não pode decretar nenhuma
medida cautelar de ofício, independente do momento da persecução penal, em consonância com o sistema
acusatório (art. 129, inciso I, da CRFB/88 e art. 3°-A do CPP). Antes, o CPP vedava a decretação de medidas
cautelares de ofício pelo juiz apenas na fase investigatória, admitindo-a no curso do processo penal.

Antes da Lei n° 13.964/19 Após a Lei n° 13.964/19


● Não era admitida a decretação de ofício na ● Não é admitida a decretação de ofício na fase
fase investigatória. investigatória.
● Era admitida a decretação de ofício no curso ● Não é admitida a decretação de ofício no
do processo penal. curso do processo penal.

O que a Lei n° 13.964/19 não solucionou é se essa vedação se estende às medidas cautelares
probatórias e reais, haja vista que o art. 3°-A do CPP veda a substituição da atividade probatória do órgão de
acusação.
Em relação ao tema, existem duas correntes divergentes:
1) Corrente Majoritária: As tutelas cautelares probatórias (exs: art. 3° do CPP; Lei n° 9.296/96; art.
156, inciso I, do CPP; e art. 242 do CPP – busca e apreensão) e as tutelas cautelares reais (art. 127
do CPP – sequestro) podem ser impostas ex officio pelo juiz, justificando-se pelo princípio da
especialidade. O próprio legislador estabeleceu no art. 156, inciso I, do CPP, que é “facultado ao
juiz de ofício ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas
consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da
medida.” Ademais, positivou no art. 127 do CPP que “O juiz, de ofício (...) poderá ordenar o
sequestro, em qualquer fase do processo ou ainda antes de oferecida a denúncia ou queixa.”.
2) Corrente Minoritária: Entende-se que é imprescindível preservar a linearidade do sistema
processual cautelar, logo, o art. 282, §2º e o art. 311, ambos do CPP, alterados pela Lei n°
13.964/19, aplicam-se por analogia às demais tutelas cautelares, até porque “lex posterior derogat
anterior”.

Conforme visto, para a decretação da medida cautelar pessoal, portanto, é necessária a provocação
do magistrado, pois ele não pode agir de ofício. Contudo, no que tange à vinculação do juiz ao pedido, incide
divergência entre as Turmas do STJ (5ª e 6ª).
● 6ª Turma STJ: Na hipótese de requerimento pela imposição de específica medida cautelar, o
magistrado pode decidir pela imposição de outra que se mostre mais adequada e necessária
para o caso concreto, ainda que mais gravosa ao investigado ou acusado. Isso ocorre, pois,
ainda que o juiz imponha outra medida cautelar, a sua atuação foi provocada.
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DELEGADO SÃO PAULO

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● 5ª Turma STJ: Lado outro, em entendimento mais recente, diametralmente oposto, entende
que a decretação de medida mais gravosa importaria em atuação ex officio.

● COMO FICA A POSSIBILIDADE OU NÃO DE REDECRETAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES


DIANTE DA SUPERVENIÊNCIA DE RAZÕES QUE JUSTIFIQUEM?
A literalidade do §5º do art. 282 do CPP admite essa possibilidade. Contudo, esse dispositivo vem
sendo duramente criticado pela doutrina, notadamente à luz do disposto nos §§2º e 4º do art. 282, bem
como no art. 311, todos do CPP, dispositivos tais que têm em comum a provocação do juiz para a decretação
de medidas cautelares.

6.3 Legitimidade para o Requerimento de Decretação de Medidas Cautelares

FASE INVESTIGATÓRIA FASE JUDICIAL


Representação da autoridade policial Requerimento do MP

Requerimento do MP Requerimento do querelante nos crimes de ação penal


privada
Requerimento do ofendido nos crimes de ação penal Requerimento do assistente de acusação
privada
- Requerimento do acusado/defensor

● (DES)NECESSIDADE DE OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DIANTE DE REPRESENTAÇÃO DA


AUTORIDADE POLICIAL NA FASE INVESTIGATÓRIA:
Em relação à necessidade ou não da oitiva do Ministério Público diante de representação da Autoridade
Policial na fase investigatória não há consenso, havendo correntes conflitantes:
1ª Corrente: Não há necessidade, tendo em vista que a própria Lei confere ao Delegado de Polícia o
poder de representação.

Aprofundando para as provas discursivas: A autoridade policial possui legitimatio propter officium
(legitimidade do próprio ofício conferido por lei) para representar pela imposição de tutelas cautelares,
representação cognoscível pelo juiz independentemente do teor do parecer ministerial. Não há de se falar
em atuação oficiosa do juiz, pois houve provocação por parte da autoridade policial.

APROFUNDANDO O TEMA: CAPACIDADE POSTULATÓRIA IMPRÓPRIA CONFERIDA AO DELEGADO


DE POLÍCIA OU LEGITIMATIO PROPTER OFFICIUM.
Nas palavras de Sannini Neto:

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DELEGADO SÃO PAULO

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“Em outras palavras, a representação caracteriza-se como um meio de provocação


do Juiz, tirando-o da sua inércia e obrigando-o a se manifestar sobre alguma
questão sujeita à reserva de jurisdição. Desse modo, levando-se em consideração
que o Poder Judiciário não pode agir de ofício, a representação serve de
instrumento à preservação do próprio sistema acusatório. Trata-se, portanto, de
um ato jurídico-administrativo de atribuição exclusiva do Delegado de Polícia e
que pode ser traduzido como verdadeira capacidade postulatória imprópria.
Advertimos, todavia, que, para a maioria da doutrina, a Autoridade Policial não
dispõe de capacidade postulatória, uma vez que não teria legitimidade para
recorrer no caso de indeferimento da medida representada (CUNHA; PINTO, 2014.
Pp. 55-56). Com a “devida vênia”, discordamos frontalmente desse raciocínio. Ora,
o fato de o Delegado de Polícia não ter legitimidade para recorrer apenas
demonstra que ele não é parte no processo. Mas daí a negar a sua capacidade de
provocar o Poder Judiciário nos parece haver uma certa distância. Isto, pois,
conforme exposto, trata-se de uma capacidade postulatória imprópria, uma
verdadeira legitimatio propter officium, ou seja, uma legitimidade em razão do
ofício exercido pelo Delegado de Polícia. A regra, de fato, é a de que as medidas
cautelares sejam postuladas pelas partes. Contudo, nada impede que o legislador,
do alto da sua soberania, confira uma legitimação extraordinária a uma autoridade
que não seja parte no processo” (SANNINI NETO, 2015).2

2ª Corrente: Há necessidade, eis que o Ministério Público é o titular da ação penal pública (art. 129,
inciso I, da CRFB/88), e o Delegado de Polícia não seria dotado de capacidade postulatória.

● QUERELANTE E ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO


De acordo com o art. 311 do CPP, alterado pela Lei n° 12.403/11, o querelante ou o assistente
(novidade da referida lei) poderão requerer a decretação da prisão preventiva ao juiz, em qualquer fase da
investigação policial ou do processo penal.
Atualmente, em razão da redação do art. 311 do CPP, que passou a conferir ao assistente da acusação
essa legitimidade, é possível concluir que se operou, quanto à súmula 208 STF, o denominado overruling.

● INVESTIGADO OU ACUSADO
Os parágrafos do art. 282 do CPP nada dizem acerca da legitimidade do investigado ou do acusado
requererem a decretação das medidas cautelares. Entretanto, de acordo com Renato Brasileiro, tal hipótese

2
SANNINI, Francisco. Qual a natureza jurídica da representação do Delegado de Polícia? Revista Jus Navigandi, ISSN
1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4238, 7 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33925.

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DELEGADO SÃO PAULO

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não deve ser desprezada, uma vez que, considerando-se o contraditório prévio previsto no art. 282, §3°, do
CPP, é possível que o acusado, em contraposição a eventual pedido de prisão preventiva, postule a concessão
de liberdade provisória com ou sem fiança, cumulado com medida cautelar diversa da prisão.

6.4 Contraditório Prévio à Decretação das Medidas Cautelares

Antes da Lei n° 12.403/11, o contraditório era sempre diferido, uma vez que o indivíduo só tomaria
ciência da aplicação da medida cautelar após a sua decretação.
Com o advento da referida Lei, o contraditório passou a ser prévio. Com isso, antes de o juiz analisar
a medida cautelar, deverá intimar a parte contrária para se manifestar no prazo de 5 (cinco) dias, nos termos
do art. 282, §3º, do CPP.
Ressalta-se que excepcionalmente, em casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz
poderá, inaudita altera pars, decretar a medida cautelar desde que justificados e fundamentados em decisão
que contenha elementos do caso concreto que justifiquem essa medida excepcional.
O dispositivo sofreu nova alteração com o advento da Lei n° 13.964/19.

Antes da Lei n° 13.964/19 Depois da Lei n° 13.964/19


Art. 282. §3o Ressalvados os casos de urgência Art. 282. § 3º Ressalvados os casos de urgência ou
ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber
receber o pedido de medida cautelar, o pedido de medida cautelar, determinará a
determinará a intimação da parte contrária, intimação da parte contrária, para se manifestar
acompanhada de cópia do requerimento e das no prazo de 5 (cinco) dias, acompanhada de cópia
peças necessárias, permanecendo os autos em do requerimento e das peças necessárias,
juízo. permanecendo os autos em juízo, e os casos de
urgência ou de perigo deverão ser justificados e
fundamentados em decisão que contenha
elementos do caso concreto que justifiquem essa
medida excepcional.

Assim, a concessão de cautelar constritiva da liberdade inaudita altera pars tornou-se excepcional,
ou seja, se o juiz conceder uma tutela cautelar sem ouvir a parte contrária e sem justificar o porquê de está-
la concedendo liminarmente, sem se valer de elementos do caso concreto que justifiquem essa medida
excepcional, haverá uma tutela nula, por absoluta ofensa ao contraditório e a ampla defesa.
Nesse ponto, inclusive, cabe ressaltar que a lei não restringe a necessidade do contraditório prévio à
fase judicial, que deve ser observado mesmo no curso da investigação.

● O art. 19 da Lei n° 11.340/06 (Lei Maria da Penha) foi revogado tacitamente pela Lei n°
13.964/19 (Pacote Anticrime)?
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DELEGADO SÃO PAULO

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O art. 19 da Lei Maria da Penha dispõe que as medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas
pelo juiz de imediato, independente de audiência das partes e de manifestação do MP:

Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a
requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
§1° As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato,
independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério
Público, devendo este ser prontamente comunicado.

Percebe-se, portanto, que o legislador expressamente afirmou que as medidas protetivas de urgência
poderão ser concedidas sem o contraditório prévio do acusado.
Dessa forma, indaga-se: O art. 282, §3°, do CPP (com redação dada pela Lei n° 12.430/11 – posterior,
portanto, à Lei Maria da Penha) revogou tacitamente o art. 19 da Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340/06 –
anterior àquela)?
R.: O art. 282, §3º, do CPP não repercute no art. 19, caput e §1º da Lei n° 11.340/06 em apreço ao
princípio da especialidade, lembrando que o legislador permitiu ao juiz agir liminarmente, inclusive, sem
ciência prévia do Ministério Público. Portanto, conclui-se que não houve revogação tácita do respectivo
dispositivo.

6.5 Descumprimento Injustificado das Cautelares Diversas da Prisão

Antes da Lei ° 13.964/19 Depois da Lei n° 13.964/19


Art. 282. § 4o No caso de descumprimento de Art. 282. § 4º No caso de descumprimento de
qualquer das obrigações impostas, o juiz, de qualquer das obrigações impostas, o juiz,
ofício ou mediante requerimento do Ministério mediante requerimento do Ministério
Público, de seu assistente ou do querelante, Público, de seu assistente ou do querelante,
poderá substituir a medida, impor outra em poderá substituir a medida, impor outra em
cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão cumulação, ou, em último caso, decretar a
preventiva (art. 312, parágrafo único). prisão preventiva, nos termos do parágrafo
único do art. 312 deste Código.
§ 5º O juiz poderá, de ofício ou a pedido das
partes, revogar a medida cautelar ou substituí-
la quando verificar a falta de motivo para que
subsista, bem como voltar a decretá-la, se
sobrevierem razões que a justifiquem

No tocante ao §4º do art. 282 do CPP, assim como no §2º, as medidas cautelares, como regra, não
mais poderão ser decretadas pelo magistrado de ofício, exigindo requerimento das partes, representação da
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autoridade policial ou requerimento do Ministério Público. Nos termos previstos, nem mesmo no caso de
descumprimento de obrigações impostas será admitida a substituição ou nova decretação de ofício.
Trata-se de regra que admite exceção prevista no § 5º do art. 282, o qual aduz pela possibilidade da
decretação de medidas cautelares de ofício quando o magistrado houver revogado medidas anteriormente
decretadas ou quando verificar a falta de motivo que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem
razões que justifiquem a nova decretação.
Entretanto, a doutrina critica a redação desse dispositivo, no sentido de que não seria possível a
atuação ex officio do juiz nas situações previstas no § 5º do art. 282 do CPP, em violação ao sistema
acusatório.
O CPP estabelece medidas para o caso de descumprimento da medida cautelar:
i. Revogação da medida cautelar;
ii. Substituição da medida por outra;
iii. Imposição de outra medida em cumulação; ou
iv. Decretação da prisão preventiva.
Destaca-se que as medidas não são uma sequência de imposição obrigatória. Assim, pode-se decretar
a prisão preventiva de imediato, a depender do caso concreto.

ATENÇÃO: O STJ entendia que o descumprimento das protetivas de urgência não tipificava o crime de
desobediência, uma vez que a lei estabelecia as consequências e não se referia ao crime. Contudo, em 2018,
a Lei n° 13.641/18 inseriu o art. 24-A na Lei Maria da Penha, que tipificou o crime específico de
Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência (único crime previsto na Lei Maria da Penha, aliás).

ATENÇÃO: Renato Brasileiro ressalta que tal entendimento NÃO é aplicado para as demais medidas
cautelares diversas da prisão, mas sim APENAS para as protetivas de urgência da Lei Maria da Penha, eis que
seria uma analogia in malam partem. Por isso, quanto às outras medidas cautelares, continua válido o
posicionamento do STJ.

6.6 Revogabilidade e/ou Substitutividade da Medidas Cautelares

A decisão que decreta uma medida cautelar é baseada na cláusula rebus sic stantibus, ou seja,
mantidos os seus pressupostos que ensejaram a decretação da medida cautelar, quais sejam, o periculum
libertatis e o fumus comissi delicti, a decisão será mantida. Havendo, todavia, uma modificação dos
pressupostos fáticos ou jurídicos, poderá haver a revogabilidade e/ou a substitutividade da medida cautelar.
Assim o é, pois as medidas cautelares são situacionais, tutelando situações fáticas de perigo.
Nesse sentindo, encontra-se respaldo no CPP, em seu art. 282, §5º. Verifica-se, portanto, que não há
dispositivo no CPP que restrinja o prazo das medidas cautelares diversas da prisão, as quais podem perdurar
enquanto presentes os requisitos do art. 282 do CPP, devidamente observadas as peculiaridades do caso e

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do agente (STJ, 5ª Turma, AgRg no HC 737.657/PE Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 14.06.2022).
Em relação à competência, originariamente a autoridade competente para a revogação das
cautelares é o mesmo órgão jurisdicional que decretou as medidas. Porém, caso o mesmo conclua pela sua
manutenção, tal magistrado deixa de ser competente e torna-se autoridade coatora para fins da impetração
de habeas corpus.
No CPP, não há previsão legal acerca da periodicidade da análise da necessidade da medida cautelar
(reavaliação da medida). Há o prazo de revisão, entretanto, para a prisão preventiva, previsto no art. 316,
parágrafo único, do CPP:

Art. 316. Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da
decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias,
mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.

No que tange a esse dispositivo, o STF decidiu que a inobservância do prazo nonagesimal do art.
316 do Código de Processo Penal não implica automática revogação da prisão preventiva, devendo o juízo
competente ser instado a reavaliar a legalidade e a atualidade de seus fundamentos. (STF. Plenário. SL 1395
MC Ref/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 14 e 15/10/2020 -Info 995).

7. PRISÃO E SUAS ESPÉCIES

A prisão é a privação da liberdade de locomoção do indivíduo em virtude de seu recolhimento ao


cárcere, seja por flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada do juiz competente, seja em face de
transgressão militar ou crime propriamente militar.

CRFB/88. Art. 5º, LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

7.1 Prisão Civil

Em relação à prisão civil, a CRFB/88 dispõe da seguinte forma, em seu art. 5°, inciso LXVII:

CRFB/88. Art. 5º, LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável
pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do
depositário infiel.

Já a Convenção Americana de Direitos Humanos, dispõe sobre a prisão civil em seu art. 7.7:

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CADH. Art. 7.7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os
mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de
inadimplemento de obrigação alimentar.

Portanto, percebe-se que conforme a CRFB/88, é prevista a prisão civil para o devedor de alimentos
e para o depositário infiel. No entanto, a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), do qual o Brasil
é signatário, permite a prisão por dívidas apenas quanto ao alimentante.
A partir dos julgados RE 466.343 e HC 87.585, o STF definiu que os tratados internacionais de direitos
humanos que não tenham sido aprovados pelo rito das emendas constitucionais têm status normativo
supralegal. Dessa forma, todas as normas que tratavam da prisão do depositário infiel tiveram sua “eficácia
paralisada” (nas palavras do Min. Gilmar Mendes). Ocorre que a supralegalidade da CADH impede que seja
editada legislação ordinária, implementando-a.
Dessa forma, atualmente admite-se apenas a prisão do devedor de alimentos. Prova disso foi o
cancelamento da Súmula 619 do STF e a edição da Súmula Vinculante 25.

Súmula 619 STF: A prisão do depositário judicial pode ser decretada no próprio
processo em que se constituiu o encargo, independentemente da propositura de
ação de depósito (REVOGADA).

SV 25 - É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade


do depósito.

Súmula 419 STJ - Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel.

É possível prisão decretada pelo juízo falimentar?


R.: A lei de falências (Lei n° 14.112/2020) estabelece, em seu art. 99, uma prisão, nomeando-a de
preventiva.

Em relação ao tema, existem 2 correntes divergentes:


● 1ª Corrente (minoritária - Denilson Feitoza): É perfeitamente possível que a prisão
preventiva seja decretada pelo juiz da falência, pois ele é a autoridade competente para
tanto.
● 2ª Corrente (majoritária - Paulo Rangel): Essa prisão NÃO pode ser decretada pelo juízo
falimentar, pois violaria o art. 5º, inciso LVII, da CRFB/88, a qual preconiza que “ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Esse artigo
não é válido por conta do caput, isto porque esta prisão preventiva é determinada pelo juízo
falimentar, ou seja, cível. Contudo, ela só seria válida se decretada por um juiz criminal e
desde que previstos os pressupostos dos arts. 312 e 313 do CPP.
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7.2 Prisão Militar

A prisão militar encontra-se prevista na CRFB/88, em seu art. 5º, inciso LXI:

Art. 5º LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

ATENÇÃO: A prisão militar independe de prévia autorização judicial e de flagrante delito.

Só é possível, no entanto, em relação ao militar. Isso ocorre devido à sua finalidade peculiar, qual
seja, preservar a hierarquia e disciplina das corporações militares.
Os casos cabíveis são: transgressão militar e crime propriamente militar (infração específica e
funcional do militar). Exemplos: deserção, abandono de posto etc.

ATENÇÃO: O prazo máximo da prisão disciplinar é 30 dias.

De acordo com a doutrina e a jurisprudência, NÃO caberá habeas corpus em relação ao mérito das
punições disciplinares. Contudo, em aspectos relativos à legalidade da punição podem ser questionados
através de habeas corpus.

7.3 Prisão Penal

A prisão penal é aquela que resulta, em regra, de sentença condenatória com trânsito em julgado
que impôs pena privativa de liberdade.
Ao contrário da CRFB/88, o art. 283 do CPP prescreve em quais hipóteses poderá haver uma ordem
escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.
Essa modalidade de prisão será objeto de estudo do Direito Penal (Lei de Execução Penal – Teoria
Geral da Pena). No entanto, é importante tecer algumas considerações:
Os entendimentos acerca da execução provisória da pena passaram por diversas mudanças nos
últimos anos. A partir de 2019 (STF. Plenário. ADC 43/DF, ADC 44/DF e ADC 54/DF, Rel. Min. Marco Aurélio,
julgados em 7/11/2019 - Info 958), o STF voltou a entender não ser possível a execução provisória da pena.
Se não houve ainda trânsito em julgado, não se pode determinar que o réu inicie o cumprimento
provisório da pena. Não importa que os recursos pendentes possuam efeito meramente devolutivo (sem
efeito suspensivo). Não existe cumprimento provisório da pena no Brasil, porque ninguém pode ser
considerado culpado antes do trânsito em julgado (art. 5º, inciso LVII, da CRFB/88).

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O art. 283 do CPP, que exige o trânsito em julgado da condenação para que se inicie o cumprimento
da pena é constitucional, sendo compatível com o princípio da presunção de inocência, previsto no art. 5º,
inciso LVII, da CRFB/88.
Inclusive, a alteração promovida pelo Pacote Anticrime, de certa forma, positivou o entendimento
do STF exarado no Info 958, bem como o entendimento amplamente majoritário da doutrina, qual seja, a
impossibilidade de haver prisão antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, SALVO se
presentes os requisitos da prisão preventiva.

Art. 313. § 2º Não será admitida a decretação da prisão preventiva com a


finalidade de antecipação de cumprimento de pena ou como decorrência imediata
de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)

Contudo, a própria Lei n° 13.964/19, contrariando a posição do STF, cria hipótese de execução
provisória da pena nos casos de julgamento pelo tribunal no júri:

CPP. Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que:


I – no caso de condenação:
e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra,
se presentes os requisitos da prisão preventiva, ou, no caso de condenação a uma
pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução
provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem
prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos;
§ 3º O presidente poderá, excepcionalmente, deixar de autorizar a execução
provisória das penas de que trata a alínea e do inciso I do caput deste artigo, se
houver questão substancial cuja resolução pelo tribunal ao qual competir o
julgamento possa plausivelmente levar à revisão da condenação.
§ 4º A apelação interposta contra decisão condenatória do Tribunal do Júri a uma
pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão não terá efeito
suspensivo.

No entanto, em 2019, em decisão veiculada no Informativo 960, a 2ª Turma do STF entendeu que
não é possível a execução provisória da pena, mesmo em caso de condenações pelo Tribunal do Júri.
Pode-se notar que o legislador promoveu uma reversão legislativa, ao legislar de forma contrária à
jurisprudência do STF. No entanto, é importante ressaltar que esse dispositivo ainda será objeto de análise,
uma vez que o STF irá enfrentar o tema no RE 1.235.340 (Inclusão em pauta - minuta extraída para o
TRIBUNAL PLENO, publicada em 26/09/2023).

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Quanto à execução provisória das penas restritivas de direito, o tema também passou por uma
evolução jurisprudencial. No entanto, em novembro de 2019, em julgamento de Plenário, o STF “voltou
atrás” e passou a não admitir mais a execução provisória da pena restritiva de direitos, em consonância
com o entendimento do STJ e da doutrina majoritária.

Não é possível a execução da pena restritiva de direitos antes do trânsito em


julgado da condenação. STJ. 3ª Seção. EREsp 1.619.087-SC, Rel. para acórdão Min.
Jorge Mussi, julgado em 14/6/2017 (Info 609).

O cumprimento da pena somente pode ter início com o esgotamento de todos os


recursos. É proibida a chamada execução provisória da pena. STF. Plenário. ADC
43/DF, ADC 44/DF, ADC 54/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgados em 07/11/2019.

Assim, considerando que o indivíduo só pode ser preso após o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória, temos que:
● Indivíduo solto: em regra, permanecerá em liberdade, salvo se surgir alguma hipótese que autorize
sua prisão preventiva.
● Indivíduo preso: em regra, continuará preso e, caso o juiz entenda por manter a prisão, deverá
fundamentá-la, eis que pode ser que o motivo que autorizava sua prisão já não mais subsista.

)
7.4 Prisão Cautelar (Carcer Ad Custodiam

A prisão cautelar é aquela decretada antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória,
com o objetivo de resguardar a sociedade (cautelaridade social) ou assegurar a eficácia das investigações ou
do processo criminal (cautelaridade processual).
Indaga-se: Há compatibilidade entre a prisão cautelar e o princípio da presunção de inocência?
R.: Sim, há compatibilidade. Contudo, trata-se de uma medida de caráter excepcional, não podendo
ser usada, jamais, como cumprimento antecipado de pena (fim satisfativo). Convém lembrar que não deve
também ser usada como meio de satisfação dos interesses da mídia ou da população. Qualquer forma de
prisão cautelar deve ser motivada por situações específicas previstas em lei e o clamor popular não figura
entre as hipóteses que ensejam a referida medida excepcional.
Salienta-se que a prisão decorrente de pronúncia e a prisão decorrente de sentença condenatória
recorrível (antigas espécies de prisão cautelar) em que o indivíduo fosse reincidente ou tivesse maus
antecedentes, seria decretada automaticamente (presunção de fuga), não existentes mais como
modalidades autônomas de prisão cautelar. A prisão ainda pode ser efetuada por ocasião da pronúncia ou
de uma sentença condenatória recorrível, condicionada à observância dos requisitos dos arts. 312 e 313 do
CPP.
A doutrina aponta as seguintes hipóteses:
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● Prisão em flagrante (há controvérsia acerca de sua natureza jurídica: cautelar ou medida pré-
cautelar);
● Prisão Preventiva;
● Prisão Temporária;
● Prisão Domiciliar (em substituição à prisão preventiva).

7.5. Prisão Especial

O legislador, visando evitar que certas pessoas, em razão das funções que exercem ou de peculiar
situação cultural, permaneçam em contato com indivíduos que não ostentem essas mesmas condições,
previu a possibilidade de recolhimento em prisão especial (art. 295 do CPP), que, entretanto, consiste
exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum (art. 295, § 1º, do CPP). Em consequência
desse dispositivo, resta claro que não se deve admitir a concessão de qualquer outro privilégio ou regalia ao
beneficiário, já que a única nota distintiva permitida é o encarceramento do preso especial em local diverso
do reservado a outros presos.
Em relação aos demais direitos e deveres, não há diferença de tratamento entre o preso especial e o
comum (art. 295, § 5º, do CPP). A lei prevê, ainda, que, se não houver estabelecimento específico para o
preso especial, será ele recolhido em cela distinta no estabelecimento destinado aos demais presos (art. 295,
§ 2º).
Ao preso especial é garantido também o direito de não ser transportado com o preso comum (art.
295, § 4º, do CPP).
O art. 295, caput, do Código de Processo Penal estabelece que a prisão especial só é cabível até o
trânsito em julgado da sentença penal condenatória, e seus beneficiários são. Contudo, o STF entendeu
pela NÃO recepção do art. 295, VII, CPP, pela Constituição Federal de 1988. De acordo com a Corte:

É incompatível com a Constituição Federal de 1988 — por ofensa ao princípio da


isonomia (CF/1988, arts. 3º, IV; e 5º, “caput”) — a previsão contida no inciso VII
do art. 295 do Código de Processo Penal (CPP) que concede o direito a prisão
especial, até decisão penal definitiva, a pessoas com diploma de ensino superior.
A previsão do direito à prisão especial a diplomados em ensino superior não guarda
relação com qualquer objetivo constitucional, com a satisfação de interesses
públicos ou com a proteção de seu beneficiário frente a algum risco maior a que
possa ser submetido em virtude especificamente do seu grau de escolaridade.
Assim, a referida norma não protege categoria de pessoas fragilizadas e
merecedoras de tutela. Ao contrário, configura medida estatal discriminatória, que
promove a categorização de presos e fortalece as desigualdades, pois beneficia,
com base em qualificação de ordem estritamente pessoal (grau de instrução

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acadêmica), aqueles que já são favorecidos por sua posição socioeconômica, visto
que obtiveram a regalia de acesso a uma universidade. STF. ADPF 334/DF, relator
Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 31.3.2023.

7.6 Prisão em Flagrante

A) CONCEITO:
A prisão em flagrante é uma medida de autodefesa social, caracterizada pela privação da liberdade
de locomoção, independentemente de prévia autorização judicial, daquele que é flagrado durante o
cometimento de um delito ou momentos depois.

B) PREVISÃO CONSTITUCIONAL:

CRFB/88. Art. 5º, LXI: ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

C) NATUREZA JURÍDICA:
Há divergência, vejamos:
● Doutrina majoritária: Trata-se de prisão cautelar.
● Doutrina minoritária (Aury Lopes Júnior e Renato Brasileiro): Após o advento da Lei 12.403/11, trata-
se de uma medida pré-cautelar.
Se a prisão em flagrante for legal, poderá ser convertida em preventiva (medida cautelar) ou poderá
ser concedida liberdade provisória (medida contracautelar). Perceba que, em ambos os casos, a prisão em
flagrante será substituída por medidas cautelares. Portanto, a prisão em flagrante, por si só, não é uma prisão
cautelar e não justifica a manutenção de alguém na prisão.

D) ESPÉCIES:
▪ Flagrante Obrigatório/Coercitivo: Trata-se do flagrante da autoridade policial e de seus agentes, que
possuem o dever de efetuar a prisão em flagrante (dever de agir).
Em razão do dever de agir, ao prender alguém em situação de flagrância, procede-se acobertado pelo
estrito cumprimento do dever legal.
Além disso, de acordo com a doutrina e os regulamentos policiais, o dever de agir é válido para as
24h do dia. Contudo, ao dever de agir deve-se conjugar o poder agir.
▪ Flagrante Facultativo: É o flagrante feito por qualquer pessoa do povo, desde que ela não seja
autoridade policial e seus agentes.
Não há obrigação, qualquer pessoa do povo pode efetuar uma prisão em flagrante. Caso o faça, não
há responsabilidade penal, em razão de agir acobertado pelo exercício regular de direito.
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SEMANA 07/12

Legalidade da prisão em flagrante efetuada por guardas municipais. É válida a


prisão em flagrante efetuada por guarda municipal? SIM. Conforme prevê o art.
301 do CPP, qualquer pessoa pode prender quem esteja em flagrante delito. Desse
modo, não existe óbice à prisão em flagrante realizada por guardas municipais, não
havendo, portanto, que se falar em prova ilícita. STJ. 5ª Turma. HC 421.954/SP, Rel.
Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 22/03/2018.

Tanto o flagrante obrigatório quanto o facultativo estão previstos no art. 301 do CPP:

Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes


deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

● Flagrante Próprio/Perfeito/Real/Verdadeiro: art. 302, incisos I e II, do CPP.

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:


I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la;

Ocorre quando o agente está COMETENDO (consumando = atos executórios) a infração ou ACABOU
DE COMETÊ-LA (delito consumado). Essa forma de flagrante deve ser realizada no locus delicti.

● Flagrante Impróprio/Irreal/Imperfeito/Quase Flagrante: art. 302, inciso III, do CPP.

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer
pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

Ocorre quando o agente, já tendo consumado o delito, ou em meio aos atos executórios, é
interrompido por terceiros. Ao fugir, é perseguido e preso.
ATENÇÃO: Não se exige na perseguição o contato visual com o agente.
A perseguição deve ser ininterrupta (não pode sofrer solução de continuidade), não importando o
tempo de sua duração. “Logo após” é o tempo entre o acionamento da polícia e o seu comparecimento ao
local do crime para obtenção de informações quanto ao agente.

Perseguição ininterrupta (art. 290, §1º, alíneas ‘a’ e ‘b’, do CPP):


§1° - Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando:
a) Tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o
tenha perdido de vista;
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SEMANA 07/12

b) Sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado,


há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu
encalço.

Requisitos de validade do flagrante impróprio:


a) Circunstancial: deve ser perseguido em uma situação que faça presumir a autoria.
b) Atividade: situação de perseguição, devendo demonstrar sua existência, que não observa prazo.
c) Espacial: a captura deve ocorrer dentro do território nacional, pois se o sujeito transpassar a
fronteira, cessa a jurisdição do estado brasileiro, sendo necessário observar as regras do Direito
Internacional.

Obs.: Vítimas vulneráveis, a exemplo do estupro de uma criança de quatro anos às 13 horas e
acionamento da polícia às 19 horas. Há precedentes do STJ no sentido de que se o representante legal tomou
conhecimento e de imediato acionou a polícia, a prisão em flagrante seria cabível. (STJ - HC: 3496 DF
1995/0023759-8, Relator: Ministro CID FLAQUER SCARTEZZINI, Data de Julgamento: 21/06/1995, T5 -
QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJ 25.09.1995 p. 31114).

ATENÇÃO: Em se tratando de crimes contra menores de idade (v.g., estupro de vulnerável do art. 217
-A,
caput, do CP), há julgados do Superior Tribunal de Justiça conferindo maior elasticidade à expressão LOGO
APÓS conforme visto.

● Flagrante Ficto/Assimilado/Presumido: art. 302, inciso IV, do CPP.

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que


façam presumir ser ele autor da infração.

ATENÇÃO: Aqui, não há necessidade de perseguição.


O agente é apenas encontrado, posteriormente, com objetos que façam presumir sua autoria.
Indaga-se: Existe diferença entre o “LOGO APÓS” do inciso III e o “LOGO DEPOIS” do inciso IV?
R.: Prevalece que não há diferença.
Norberto Avena diz que o LOGO APÓS do inciso III significa um lapso de tempo menor do que o LOGO
DEPOIS (um lapso de tempo mais estendido) do inciso IV e, ao mesmo tempo, um lapso de tempo maior do
que o descrito nos incisos I e II (‘está cometendo’ ou ‘acaba de cometê-la’).

Flagrante Próprio / Propriamente dito / Real /


Art. 302, incisos I e II, do CPP
Verdadeiro / Perfeito
Flagrante Impróprio / Imperfeito/ Irreal / Art. 302, inciso III, do CPP

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SEMANA 07/12

Quase flagrante
Flagrante Presumido / Ficto / Assimilado Art. 302, inciso IV, do CPP

Obs.: Prisão em flagrante x Inviolabilidade domiciliar.

A CRFB/88 prevê a inviolabilidade domiciliar em seu art. 5°, inciso XI:

XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem


consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para
prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;

De acordo com o STF, a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em
período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas posteriormente, que
indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade e nulidade
dos atos praticados (RE 603.616).
Nesse sentido, o STJ, acompanhando o entendimento do STF, julgou a licitude ou ilicitude do ingresso
em domicílio em diversas situações. Vejamos:

Ingresso ILÍCITO, quando justificado em: Ingresso LÍCITO, quando justificado em:
1) Abordagem feita no quintal da residência sem prévia 1) Local não habitado e existência de informações de que
investigação que a justificasse (STJ, HC 586.474). esteja sendo utilizado para armazenar drogas (STJ, HC
2) Denúncia anônima isoladamente (STJ, Resp. 588.445).
1.871.856). 2) Policial, fora da casa, sentir forte cheiro de “maconha”
3) Fama de traficante do suspeito (STJ, RHC 126.092). no local (STJ, HC 423.838).
4) Cão farejador que, aleatoriamente, aponta a 3) Informações de que o morador poderia ser autor de
existência da droga na casa, sem prévia investigação (STJ, disparo de arma de fogo (STJ, HC 595.700).
HC 566.818).
5) Fuga do suspeito diante de abordagem policial na via
pública (STJ, HC 561.360).
6) A visualização de itens semelhantes a drogas dentro
de residência não é justificativa suficiente para o ingresso
forçado em domicílio por agentes policiais. (STJ, AgRg no
HC 735.572-RS)
7) A indução do morador a erro na autorização do
ingresso em domicílio macula a validade da manifestação
de vontade e, por consequência, contamina toda a busca
e apreensão (Info 725).

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Obs. A habitação em prédio abandonado de escola municipal pode caracterizar o conceito de domicílio em
que incide a proteção disposta no art. 5º, inciso XI da Constituição Federal (Info 755).

● Flagrante Preparado/Provocado/Crime de Ensaio/Delito Putativo por Obra do Agente Provocador

Caracteriza-se pelo induzimento à prática do crime pelo agente provocador que, ao mesmo tempo,
toma todas as medidas necessárias para tornar impossível a consumação do delito.
Nesse caso, o flagrante preparado é caracterizado como crime impossível quando o comportamento
do agente não tem condições de gerar o resultado delituoso, quer por total inadequação dos meios
empregados, quer por absoluta impropriedade do objeto material.

ATENÇÃO: Sinônimos de crime impossível - “crime oco”, “tentativa inidônea” e “quase crime”.

CP. Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou
por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

São necessários 2 requisitos para a sua verificação:


i. Indução à prática do crime pelo agente provocador (policial ou qualquer do povo); e
ii. Adoção de precauções para que o delito não se consume.

Trata-se, portanto, de uma hipótese de crime impossível, pela ineficácia do meio (tentativa inidônea).
Por isso, não há possibilidade de prisão em flagrante. Em sendo feita a prisão, deverá ser relaxada, tendo em
vista sua ilegalidade. Nesse sentido, a súmula 145 do STF:

Súmula 145 STF: Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna
impossível a sua consumação.

Ocorre que, no mesmo sentido, a doutrina, apesar da existência do flagrante preparado e do


consequente crime impossível, admite a prisão e a persecução penal em relação aos delitos já consumados
e preexistentes, os quais independem de qualquer intervenção do agente provocador.
Ex.: No caso de venda simulada de drogas, em relação ao verbo vender trata-se de flagrante
preparado, provocado. Porém, como o delito de tráfico de drogas é um crime de ação múltipla, nada impede
que o agente seja preso em flagrante por outro verbo núcleo, tal como ‘trazer consigo’, desde que a posse
da droga seja preexistente.
É justamente nesse sentido que o dispositivo do Pacote Anticrime foi incluído no art. 17, §2°, do
Estatuto do Desarmamento e no art. 33, inciso IV, da Lei de Drogas. Vejamos:

Estatuto do Desarmamento:
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Art. 17, §2° Incorre na mesma pena quem vende ou entrega arma de fogo, acessório
ou munição, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou
regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos
probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.

Lei de Drogas:
IV - vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico
destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a
determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando
presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.

Desse modo, se o infrator, apesar de incitado pelo agente policial a vender ou entregar a arma (ou
drogas), já houver praticado infração penal preexistente, como por exemplo ter os artefatos (ou
entorpecentes) em depósito, a prisão em flagrante pelo crime preexistente será possível, logicamente, desde
que presentes os elementos razoáveis da prática de delito preexistente.

● Flagrante Esperado
Há a espera da autoridade policial até o momento da prática do delito, não havendo nenhum tipo de
provocação ou intervenção. Valendo-se de investigação anterior, a autoridade policial toma conhecimento
de que um crime será praticado e, então, espera até o início de sua execução para prender o agente em
flagrante.
Trata-se de uma prisão válida
, legal, justamente por não haver a interferência de nenhum agente
provocador.

● Flagrante Retardado/Diferido/Ação Controlada


Trata-se do retardamento da intervenção policial que deve ocorrer em momento oportuno, em que
se obterá maiores informações para a investigação criminal ou maior e melhor colheita de provas.
Encontra-se previsto na Lei de Drogas, na Lei de Lavagem de Capitais e na Lei das Organizações
Criminosas:

Lei de Lavagem de Capitais (Lei n° 9.613/98):


Art. 1°, § 6º Para a apuração do crime de que trata este artigo, admite-se a utilização
da ação controlada e da infiltração de agentes.
● A lei não prevê a necessidade de autorização judicial.

Lei de Drogas (Lei n° 11.343/06):

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Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta
Lei, são permitidos, além dos previstos em lei, mediante AUTORIZAÇÃO JUDICIAL e
ouvido o Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:
II - não atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos
ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território
brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de
integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal
cabível.
● A lei prevê a necessidade de autorização judicial.

Lei das Organizações Criminosas (Lei n° 12.850/12):


Art. 8°. Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou
administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela
vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a
medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação de provas e
obtenção de informações.
§ 1º O retardamento da intervenção policial ou administrativa será previamente
comunicado ao juiz competente que, se for o caso, estabelecerá os seus limites e
comunicará ao Ministério Público.
§ 2º A comunicação será sigilosamente distribuída de forma a não conter
informações que possam indicar a operação a ser efetuada.
§ 3º Até o encerramento da diligência, o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao
Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das
investigações.
§ 4º Ao término da diligência, elaborar-se-á auto circunstanciado acerca da ação
controlada.
● O STJ, no HC 512.290-RJ (Info 680) decidiu que a ação controlada prevista na
Lei n° 12.850/2013 INDEPENDE de autorização, bastando sua comunicação
prévia à autoridade judicial.

Obs.: De acordo com a doutrina, o juiz poderá impor limites temporais (tempo
de duração) e limites materiais (delitos que seriam autorizados a continuar
sendo praticados pela organização criminosa).

Obs.: Entrega vigiada (espécie de ação controlada) - É a técnica que permite que remessas ilícitas ou
suspeitas de drogas, ou de outros produtos ilícitos, saiam do território de um país com o conhecimento e sob
o controle das autoridades competentes, com a finalidade de investigar infrações e identificar os demais
coautores e partícipes (Convenção de Palermo).
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● Flagrante Forjado/Fabricado/Urdido/ Maquinado


Ocorre quando o fato típico não é praticado, mas é simulado pela autoridade ou por qualquer do
povo com o objetivo de incriminar o suposto agente.
É uma prisão absolutamente ilegal, passível de responsabilização penal e administrativa dos
responsáveis.
Ex.: Plantar drogas na mochila do suspeito.

FLAGRANTE ESPERADO FLAGRANTE FORJADO FLAGRANTE PREPARADO


Agente quer delinquir. Agente não deseja delinquir. Agente quer delinquir.
Ausência de estímulo policial. O crime é fabricado. Polícia estimula o delito.
Prisão legal. Prisão ilegal. Prisão ilegal.

7.6.1 Flagrante nas Várias Espécies de Crimes

● Crime permanente: É o crime cuja ação se prolonga no tempo, durante todo o período o agente
continua dominando o fato, tendo o poder de cessar o ilícito. Enquanto não cessar a permanência, a
pessoa pode ser presa em flagrante (art. 303 do CPP).

Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito


enquanto não cessar a permanência.

● Crime habitual: É o delito que exige a reiteração de determinada conduta ilícita.


Ex.: Manter casa de prostituição e exercício ilegal da medicina.

Prevalece que não é possível a prisão em flagrante nesse caso, pois num ato isolado não seria possível
comprovar a reiteração da conduta criminosa.
Em sentido contrário, há doutrinadores que entendem (Renato Brasileiro, Mirabete) que,
dependendo do caso, pode ser possível a prisão a partir das circunstâncias fáticas verificadas.
Ex.: A polícia, ao tomar conhecimento do exercício irregular da medicina, quando do cumprimento
de uma diligência, percebe vários clientes na recepção, agenda com horários marcados, indicando que ele se
dedica ao exercício ilegal.

● Crimes de ação penal privada/ação penal pública condicionada à representação: É possível a prisão
em flagrante, ficando a lavratura do APFD condicionada à manifestação da vítima ou de seu
representante legal.
O prazo para que a vítima manifeste seu interesse na persecução penal seria de 24 horas, após a

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prática delituosa. Utiliza-se como fundamento o prazo que a autoridade policial tem para lavrar o APFD.

● Crime formal: É o crime de consumação antecipada, em que não é necessária a produção de um


resultado naturalístico.
Ex.: Concussão (art. 316 do CP), em que o recebimento indevido da vantagem é mero exaurimento.
A prisão em flagrante é possível, mas deve ser feita no momento da consumação (exigência da vantagem
indevida) e não no momento do exaurimento do delito (recebimento da vantagem).
Minoritariamente, Nilo Batista e Juarez Cirino dos Santos sustentam a possibilidade de prisão em
flagrante nos delitos formais até o momento em que o bem jurídico é violado. No exemplo da concussão, o
recebimento da vantagem seria consumação material do crime e o momento da prática da conduta seria
consumação formal.

● Crime continuado: Trata-se de uma ficção jurídica que beneficia o agente que pratica dois ou mais
crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a
pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso,
de um sexto a dois terços. Na continuidade delitiva, cabe flagrante em cada crime ISOLADAMENTE,
por isso é chamado de flagrante fracionado.

7.6.2 Fases da Prisão em Flagrante

A prisão em flagrante é composta por 4 fases:


1. Captura;
2. Condução;
3. Lavratura do auto; e
4. Recolhimento ao cárcere.

1) Captura: Verifica-se, aqui, se o agente está em situação de flagrância, nos termos do art. 302 do
CPP.
Quando houver resistência do agente, é possível o emprego da força, desde que o faça de maneira
moderada, bem como seja utilizado apenas dos meios necessários.
Salienta-se que, de acordo com a Súmula Vinculante 11, a regra é que o indivíduo, ainda que preso,
permaneça sem algemas, só podendo ser algemado quando houver resistência, fundado receio de fuga ou
perigo à integridade física própria ou alheia.

Súmula vinculante 11: Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de


fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte
do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito (auto de
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utilização de algemas), sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do


agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se
refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Críticas à Súmula Vinculante 11: Conforme Renato Brasileiro, a matéria não deveria ser disciplinada
por súmula vinculante, que deve limitar-se às questões de direito e desde que haja sucessivas controvérsias.
O uso de algemas é uma matéria eminentemente fática. Além disso, aqueles que sumularam a matéria não
possuem conhecimento do dia a dia dos fóruns criminais.

ATENÇÃO: Ocorre que agora o uso de algema é regulamentado através do Decreto 8.858/2016:

Art. 1º O emprego de algemas observará o disposto neste Decreto e terá como


diretrizes:
I - o inciso III do caput do art. 1º e o inciso III do caput do art. 5º da Constituição,
que dispõem sobre a proteção e a promoção da dignidade da pessoa humana e
sobre a proibição de submissão ao tratamento desumano e degradante;
II - a Resolução nº 2010/16, de 22 de julho de 2010, das Nações Unidas sobre o
tratamento de mulheres presasmedidas
e não privativas de liberdade para
mulheres infratoras (Regras de Bangkok); e
III - o Pacto de San José da Costa Rica, que determina o tratamento humanitário
dos presos e, em especial, das mulheres em condição de vulnerabilidade.
Art. 2º É permitido o emprego de algemas apenas em casos de resistência e de
fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, causado
pelo preso ou por terceiros, justificada a sua excepcionalidade por escrito.
Art. 3º É vedado emprego de algemas em mulheres presas em qualquer unidade
do sistema penitenciário nacional durante o trabalho de parto, no trajeto da
parturiente entre a unidade prisional e a unidade hospitalar e após o parto, durante
o período em que se encontrar hospitalizada.

Por fim, destaca-se o parágrafo único do art. 292 do CPP, que proíbe o uso de algemas em mulheres
grávidas.

Art. 292, parágrafo único: É vedado o uso de algemas em mulheres grávidas


durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto e
durante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de
puerpério imediato.

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2) Condução coercitiva: Após a prisão, a pessoa é conduzida de forma coercitiva até à autoridade
policial para verificar se há realmente crime e se está em estado flagrancial.
Há, em alguns dispositivos legais, a expressão “não se imporá prisão em flagrante (...)”, ou seja, não
será preso em flagrante. Isso significa que, embora não possa ser LAVRADO O AUTO DE PRISÃO EM
FLAGRANTE (que funciona como um título pré-prisional), o indivíduo em situação de flagrância PODE SER
CONDUZIDO ATÉ A DELEGACIA para que os fatos sejam melhor apurados.

Lei n° 9.503/97:
Art. 301. Ao condutor de veículo, nos casos de acidentes de trânsito de que resulte
vítima, não se imporá a prisão em flagrante, nem se exigirá fiança, se prestar pronto
e integral socorro àquela.

Lei n° 9.099/95:
Art. 69, parágrafo único: Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for
imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele
comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de
violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu
afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.

Lei n° 11.343/06:
Art. 48, § 2º: Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá
prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao
juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer,
lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames
e perícias necessários.

3) Lavratura do auto de prisão em flagrante: É a documentação da situação fática, em que se


verificam aspectos formais do flagrante, como a declaração a vítima, o depoimento do primeiro condutor e
segunda testemunha, demais testemunhas, o interrogatório do suposto autor do fato, expedição de nota de
garantias constitucionais (nota de culpa) e a devida comunicação ao juízo.
Lavrado o auto de prisão em flagrante, o indivíduo não será necessariamente recolhido à prisão,
tendo em vista que poderá ser cabível a fiança.
Salienta-se que o Delegado de Polícia só pode conceder fiança para quem for preso em flagrante no
caso de crime cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos, salvo nos casos
do art. 24-A da Lei Maria da Penha em que a fiança será concedida somente pelo juiz.

ATENÇÃO: Trata-se de cláusula de reserva de jurisdição para a concessão da fiança, na qual o delegado de
polícia não poderá conceder liberdade provisória com fiança.
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4) Recolhimento à prisão: Caso não seja concedida a fiança, haverá o recolhimento à prisão.

7.6.3 Comunicação da Prisão ao Juiz Competente, ao Ministério Público e à Defensoria Pública

Antigamente, a comunicação ocorria de maneira documental. Ou seja, a cópia do auto de prisão em


flagrante era enviado ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública (caso o autuado não constituísse
advogado), nos termos do art. 306 do CPP.
Atualmente, a comunicação acaba se concretizando na própria audiência de custódia.
A Lei também impõe que, ao indivíduo preso em flagrante, também seja entregue, mediante
recebido, a chamada nota de culpa. Trata-se de um documento, entregue ao indivíduo preso, cientificando-
o sobre os responsáveis por sua prisão, seguindo o disposto no art. 5º, inciso LXIV, da CRFB/88. O termo
“nota de ciência das garantias constitucionais” seria mais apropriado.

ATENÇÃO: Com o advento da Lei n° 13.869/2019, em seu art. 12, tipifica-se crime de abuso de autoridade a
não comunicação do flagrante à autoridade judiciária de forma injustificada:
Art. 12. Deixar injustificadamente de comunicar prisão em flagrante à autoridade judiciária no prazo legal:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

O art. 306 do CPP diz que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados
imediatamente ao juiz competente e, no parágrafo 1º, estabelece que em até 24 (vinte e quatro) horas
após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante.
Na prática, a remessa do auto constritivo no prazo de 24 (vinte e quatro) horas supre o que a lei
determina, posto não ser razoável que, a cada autuação em flagrante, a autoridade policial, no instante da
lavratura, faça contato com a autoridade judiciária apenas para cientificá-la do ato, cujo controle de
legalidade e viabilidade, ao menos naquele momento, não impende a ela.

7.6.4 Audiência de Custódia (Audiência de Apresentação)

A) CONCEITO: Trata-se da realização de uma audiência, sem demora, após a prisão, permitindo o
contato imediato do preso com o juiz, com um Defensor (público, dativo ou constituído) e com o Ministério
Público.
Preteritamente, a audiência de custódia só seria necessária nos casos de prisão em flagrante. Porém,
o art. 13 da Resolução n°. 213 do CNJ deixa claro que a audiência de custódia também deve ser feita em
outros casos, quais sejam, prisão cautelar ou prisão definitiva.
Assim, é certo dizer que a audiência de custódia NÃO se restringe aos casos de prisão em flagrante,
mas sim a todos os casos envolvendo a supressão da liberdade do indivíduo.
As finalidades principais da audiência de custódia são:
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● Verificar eventuais maus-tratos;


● Conferir mais elementos para a convalidação judicial do flagrante (restrita aos casos de prisão
em flagrante).

B) FUNDAMENTO LEGAL: Arts. 287 e 310 do CPP.

Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará
a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver
expedido o mandado, para a realização de audiência de custódia.

Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24
(vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover
audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou
membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa
audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: [...]

Há, na Convenção Americana de Direitos Humanos, dispositivo expresso quanto à audiência de


custódia, vejamos:

CADH, art. 7º, § 5º: Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora,
à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções
judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em
liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser
condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.

C) PRESIDÊNCIA: Destaca-se que a audiência de custódia é presidida pelo juiz (originalmente, a Lei
n° 13.964/19 estabeleceu a competência do juiz de garantias, entretanto o dispositivo encontra-se
suspenso).
ATENÇÃO: Há entendimento de que a audiência de custódia poderia ser presidida pelo Delegado de
Polícia, com base em uma interpretação da CADH (“presença de um juiz ou outra autoridade”). Contudo,
trata-se de posição não aceita, já que o Delegado de Polícia ou o Ministério Público não têm o poder de
exercer funções judiciais.

D) PARTICIPANTES: A audiência de custódia será realizada na presença do Ministério Público e da


Defensoria Pública, caso a pessoa detida não possua defensor constituído.
É VEDADA a presença dos agentes policiais responsáveis pela prisão ou pela investigação durante a
audiência de custódia.

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E) PRAZO PARA A REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: De acordo com a CADH, a audiência


de custódia deve ocorrer “sem demora”, respeitando as especificidades de cada país. O art. 3-B, §1º, do CPP,
por sua vez, que inicialmente havia sido vetado pelo Presidente, prevê a realização da audiência de custódia
em 24 horas.

Art. 3º-B. (...) (...) §1º. O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão
provisória será encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte
e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do
Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o
emprego de videoconferência.

Para o STJ (RHC n. 85.101), por mais que a audiência de custódia não tenha sido realizada, nada
impede a decretação da prisão preventiva ou da prisão temporária, as quais irão suprir a não realização da
audiência de custódia.
No julgamento das ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305, o STF determinou a interpretação conforme do
§1º do art. 3º-B, para estabelecer que o preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória
será encaminhado à presença do juiz das garantias no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, salvo
impossibilidade fática, momento em que se realizaráaudiência
a com a presença do ministério público,
defensoria pública ou de advogado constituído.

F) REALIZAÇÃO POR VIDEOCONFERÊNCIA: O art.3-B, §1º, do CPP, que retomou sua eficácia após a
derrubada do veto originário do Poder Executivo, VEDA a realização de audiência de custódia por
videoconferência.

Art. 3º-B. (...) (...) §1º. O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão
provisória será encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte
e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do
Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o
emprego de videoconferência.

Inicialmente, o art.
-B,3 §1º havia sido vetado pelo Presidente da República. Assim, levando-se em
consideração tal veto, bem como o período de restrição sanitária ocasionado pela pandemia, parte da
doutrina passou a admitir, então, exclusivamente em situações excepcionais, a realização da audiência de
custódia por videoconferência, desde que presente uma das hipóteses listadas nos diversos incisos do §2º
do art. 185 do CPP, e conquanto fosse possível constatar a plena observância dos direitos fundamentais do
preso
No entanto, uma vez que a realização da audiência de custódia por videoconferência já havia se
tornado uma rotina ao longo da pandemia, o Congresso Nacional deliberou, então, por derrubar os vetos do
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DELEGADO SÃO PAULO

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Presidente da República ao Pacote Anticrime, ressuscitando o art. 3º-B, §1º, do CPP, que é categórico ao
vedar a realização desse ato processual com o emprego da videoconferência.
Colocando fim a discussão, no julgamento das ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305, o STF determinou a
interpretação conforme do §1º do art. 3º-B, para estabelecer a ADMISSÃO, EXCEPCIONALMENTE, do
emprego de videoconferência, mediante decisão da autoridade judiciária competente, desde que este
meio seja apto à verificação da integridade do preso e à garantia de todos os seus direitos.

G) OITIVA DO FLAGRANTEADO DURANTE A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: Não deve ser questionado


quanto ao mérito da imputação. Verifica-se apenas aspectos formais do flagrante e a necessidade da
segregação aflitiva (prisão temporária/preventiva).
Não é um interrogatório judicial antecipado, visa-se apenas saber como o preso foi tratado, se seus
direitos foram respeitados.
Na audiência de custódia, a autoridade judicial entrevistará a pessoa presa em flagrante, devendo:
● Esclarecer o que é a audiência de custódia, ressaltando as questões a serem analisadas pela
autoridade judicial;
● Assegurar que a pessoa presa não esteja algemada, salvo em casos de resistência e de fundado receio
de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, devendo a excepcionalidade ser justificada
por escrito;
● Dar ciência sobre seu direito de permanecer em silêncio;
● Questionar se lhe foi dada ciência e efetiva oportunidade de exercício dos direitos constitucionais
inerentes à sua condição, particularmente o direito de consultar-se com advogado ou defensor
público, o de ser atendido por médico e o de comunicar-se com seus familiares;
● Indagar sobre as circunstâncias de sua prisão ou apreensão;
● Perguntar sobre o tratamento recebido em todos os locais por onde passou antes da apresentação
à audiência, questionando sobre a ocorrência de tortura e maus tratos e adotando as providências
cabíveis;
● Verificar se houve a realização de exame de corpo de delito, determinando sua realização nos casos
em que: a) não tiver sido realizado; b) os registros se mostrarem insuficientes; c) a alegação de
tortura e maus tratos referir-se a momento posterior ao exame realizado; d) o exame tiver sido
realizado na presença de agente policial; e
● Abster-se de formular perguntas com finalidade de produzir prova para a investigação ou ação penal
relativas aos fatos objeto do auto de prisão em flagrante. (Importante!)

Ao final da audiência de apresentação (custódia), o magistrado deve observância ao art. 310 do CPP,
como dever funcional.

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DELEGADO SÃO PAULO

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H) AUSÊNCIA DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: O §4º do art. 310 do CPP trouxe a previsão de que a não
realização da audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a ser
relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão
preventiva (dispositivo com eficácia suspensa).
A norma começou com uma boa intenção, mas depois criou o famigerado “jeitinho”, ou seja, mesmo
não sendo realizada a audiência de custódia, basta o juiz decretar a prisão preventiva do autuado para que
o vício pela não realização da audiência fique sanado, isto é, o novo título prisional não é maculado pelos
vícios da prisão em flagrante.
A atual jurisprudência dos Tribunais Superiores segue no mesmo sentido, ou seja, a ausência da
audiência de custódia é mera irregularidade que não conduz à automática revogação da prisão preventiva,
cabendo ao juízo da causa promover análise acerca da presença dos requisitos autorizadores da medida
extremas.
Ademais, tem se entendido que a conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a
alegação de nulidade relativamente à falta de audiência de custódia.
Vale ressaltar que a autoridade que deu causa à não realização da audiência estará sujeita à tríplice
responsabilização, nos termos do art. 310, § 3º, do CPP:

Art. 310 (...) § 3º A autoridade que deu causa, sem motivação idônea, à não
realização da audiência de custódia no prazo estabelecido no caput deste artigo
responderá administrativa, civil e penalmente pela omissão. (Incluído pela Lei nº
13.964/2019)

CUIDADO! Apesar de a ausência de audiência de custódia ser considerada mera irregularidade, a qual
pode ser suprida com posterior requerimento de pedido de prisão preventiva, posterior realização de AIJ
NÃO supre esta ausência.
A superveniência da realização da audiência de instrução e julgamento não torna
superada a alegação de ausência de audiência de custódia. STF. 2ª Turma. HC
202579 AgR/ES e HC 202700 AgR/SP, Rel. Min. Nunes Marques, redator do acórdão
Min. Gilmar Mendes, julgados em 26/10/2021 (Info 1036).

Vamos esquematizar?

ANTES DO PACOTE ANTICRIME APÓS O PACOTE ANTICRIME


Não havia previsão legal. Era prevista na Previsão de forma expressa no CPP.
Convenção Americana de Direitos Humanos
(CADH) e no Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Audiência de custódia consiste no direito Após receber o auto de prisão em flagrante,


que a pessoa presa possui de ser conduzida no prazo máximo de até 24 horas após a
(levada), sem demora (CNJ adotou o realização da prisão, o juiz deverá promover
máximo de 24h: Resolução 213/15), à AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA com a presença
presença de uma autoridade judicial do acusado, seu advogado constituído ou
(magistrado) que irá analisar se os direitos membro da Defensoria Pública e o membro
fundamentais dessa pessoa foram do Ministério Público, e, nessa audiência, o
respeitados (ex.: se não houve tortura) se a juiz deverá, fundamentadamente:
prisão em flagrante foi legal ou se deve ser I - relaxar a prisão ilegal; ou
relaxada (art. 310, I, do CPP) e se a prisão II - converter a prisão em flagrante em
cautelar (antes do trânsito em julgado) deve preventiva, quando presentes os requisitos
ser decretada (art. 310, II) ou se o preso constantes do art. 312 deste Código, e se
poderá receber a liberdade provisória (art. revelarem inadequadas ou insuficientes as
310, III) ou medida cautelar diversa da medidas cautelares diversas da prisão; ou
prisão (art. 319). III - conceder liberdade provisória, com ou
sem fiança
Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em
flagrante, que o agente praticou o fato nas flagrante, que o agente praticou o fato em
condições constantes dos incisos I a III do qualquer das condições constantes dos
caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de incisos I, II ou III do caput do art. 23 do
7 de dezembro de 1940 - Código Penal, Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
poderá, fundamentadamente, conceder ao 1940 (Código Penal) (legítima defesa),
acusado liberdade provisória, mediante poderá, fundamentadamente, conceder ao
termo de comparecimento a todos os atos acusado liberdade provisória, mediante
processuais, sob pena de revogação. termo de comparecimento obrigatório a
todos os atos processuais, sob pena de
revogação.

7.6.5 Convalidação Judicial da Prisão em Flagrante

É o procedimento a ser observado pelo juiz quando da apresentação de flagranteado, seguindo o


disposto no art. 310 do CPP.

7.6.6 Posturas da Autoridade Judicial Perante o Flagrante

A) RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE ILEGAL: A prisão em flagrante será ilegal e,


consequentemente, deverá ser relaxada quando houver:
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Inexistência de situação de flagrância (CPP, art. 302);


● Inobservância das formalidades constitucionais e/ou legais.

Salienta-se que a prisão em flagrante ilegal só pode ser relaxada pela autoridade judiciária
competente.
Obs.: Há quem entenda que o Delegado de Polícia também pode relaxar a prisão em flagrante ilegal.
No entanto, trata-se de termo atécnico, em razão do que prevê a própria Constituição Federal em seu art.
5º, inciso LXV: “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária.”
Há casos em que o Delegado de Polícia deixa de ratificar a prisão em flagrante, sobretudo quando há
indícios de que o indivíduo não se encontra em situação de flagrância, mas não é possível equipará-la ao
relaxamento da prisão em flagrante. Parte da doutrina chama isso de “relaxar a captura”.

B) CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PRISÃO PREVENTIVA: O CPP faz referência apenas


à prisão preventiva. A doutrina interpreta, porém, de maneira extensiva o inciso II, afirmando que a
conversão também pode se dar em prisão temporária (Lei n. 7.960/89), sobretudo porque ela é voltada
exclusivamente para a fase investigatória (mais próxima da prisão em flagrante).
Destaca-se que a prisão em flagrante, por si só, não mais justifica que o indivíduo permaneça preso.

Indaga-se: O art. 313 do CPP também precisa ser observado para fins de conversão do flagrante em
preventiva? Ou seja, seria possível converter em preventiva uma prisão em flagrante de crime com pena
máxima inferior a 4 anos?
R.: Há na doutrina duas correntes:
• 1ª Corrente (minoritária): Não há necessidade de observância. Trata-se de interpretação gramatical
do art. 310, inciso II, do CPP.
• 2ª Corrente (majoritária): Deve ser observado o art. 313 do CPP. Não há diferença entre quem foi
preso em flagrante e teve a prisão convertida em preventiva, para alguém que estava solto e teve
sua prisão preventiva decretada. Portanto, em última análise, trata-se de prisão preventiva.

Por fim, indaga-se: Ao receber o auto de prisão em flagrante pode o juiz, de ofício, converter a
prisão em preventiva?
R.: Esse tema passou por alteração jurisprudencial.
A jurisprudência em peso dos Tribunais Superiores era no sentido de que seria possível a conversão
da prisão em flagrante em prisão preventiva de ofício pelo juiz tendo em vista que, ao receber a cópia do
auto de prisão em flagrante, o magistrado já estaria sendo provocado, motivo pelo qual não se falaria em
ofensa ao princípio acusatório. Inclusive, em recente decisão, exarada no bojo do HC 583.995, prolatada pela
6ª Turma do STJ em 15.09.2020, entendeu-se ser possível a conversão da prisão em flagrante em prisão
preventiva, sem que houvesse a necessidade de pedido do MP ou do Delegado.

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DELEGADO SÃO PAULO

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No entanto, a 5ª Turma do STJ e a 2ª Turma do STF, acompanhando doutrina majoritaríssima sobre


o tema, passaram a entender que NÃO É POSSÍVEL A CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM
PREVENTIVA DE OFÍCIO PELO JUIZ, por significar ofensa ao Sistema Acusatório. Assim, para que haja a
conversão da prisão em flagrante em preventiva, é indispensável o requerimento do MP ou representação
da autoridade policial, ou, quando for o caso, provocação do querelante ou assistente de acusação.
Portanto, em regra, se houver a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva de ofício pelo
juiz, tal prisão deverá ser relaxada por se tratar de prisão ilegal. No entanto, se após a decretação a
autoridade policial ou o Ministério Público requererem a manutenção da prisão, o vício de ilegalidade que
maculava a custódia é suprido (convalidado) e a prisão não será relaxada.

C) CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA COM OU SEM FIANÇA: Aqui a liberdade provisória


funciona como medida de contracautela. A prisão em flagrante já seria, por si só, uma medida cautelar, mas
o juiz entende que não há necessidade de manter o indivíduo preso.
Assim, se o agente não preencher os requisitos da prisão preventiva será libertado, usufruindo da
liberdade provisória. Nesse caso, poderá o juiz aplicar as medidas cautelares do art. 319 do CPP.

PACOTE ANTICRIME:
A sistemática do art. 310 do CPP permanece a mesma. A novidade fica por conta da previsão expressa
do prazo de 24h da lavratura do auto de prisão em flagrante para a realização da audiência de custódia, sob
pena de responsabilidade civil, penal e administrativa do magistrado (§3º).
O §2º traz vedação absoluta à liberdade provisória quando o agente for reincidente ou que integrante
de organização criminosa armada ou milícia, ou portar arma de fogo de uso restrito. A hipótese nada mais é
do que a chamada prisão “ex lege”, já declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, por
constituir verdadeira antecipação da pena.

Alguns dos principais argumentos:


● Ao afastar a concessão de liberdade provisória de forma genérica, a norma retira do juiz a
oportunidade de, no caso concreto, analisar os pressupostos da necessidade ou não da prisão
cautelar.
● Proibir a liberdade provisória, representa uma antecipação de pena, o que é vedado pela
CRFB/88.
● A referida proibição estabelece um tipo de regime de prisão preventiva obrigatório, na
medida em que torna a prisão uma regra e a liberdade uma exceção. A CRFB/88, ao contrário,
prevê que a liberdade é a regra e a necessidade da prisão precisa ser devidamente
fundamentada.
● Cabe ao magistrado e, não ao legislador, verificar a configuração ou não, em cada caso, de
hipóteses que justifiquem a prisão cautelar.

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DELEGADO SÃO PAULO

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Assim, a prisão provisória sempre vai desempenhar um papel cautelar, nunca uma antecipação de
pena, para não ferir a presunção de não culpabilidade. Ou seja, ainda que interpretemos restritivamente o
art. 5º, inciso LVII, da CRFB/88, toda a restrição à liberdade deve desempenhar um papel cautelar e
provisório.

7.7 Prisão Preventiva

A) CONCEITO: Cuida-se de espécie de prisão cautelar, decretada pela autoridade judiciária


competente, mediante representação da autoridade policial ou requerimento do Ministério Público, do
querelante ou do assistente, em qualquer fase das investigações ou do processo criminal.
Ressalta-se que, à luz do sistema acusatório, a prisão preventiva NÃO pode mais ser decretada de
ofício pelo juiz, exigindo, portanto, representação da autoridade policial ou requerimento do Ministério
Público, e desde que se revelem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão
(CPP, art. 319).
Em outras palavras: essa prisão só caberá se não couberem outras medidas cautelares diversas da
prisão, tratando-se, pois, da medida mais severa que deve ser considerada a ultima ratio.

B) NATUREZA JURÍDICA: A prisão preventiva é espécie de prisão cautelar, não havendo, aqui,
nenhuma polêmica.
Destaca-se que há referência à prisão preventiva em outros diplomas normativos, a exemplo da Lei
Maria da Penha e da Lei de Falências. Contudo, sua decretação sempre estará condicionada à observância
dos requisitos do CPP.

C) MOMENTO: A prisão preventiva tem cabimento tanto na fase investigatória quanto na fase do
processo. Destaca-se que na fase processual poderá ser decretada até o trânsito em julgado.
Além disso, parte da doutrina entende que a prisão preventiva seria cabível na fase investigatória
apenas em relação aos crimes que não admitem prisão temporária. Isso porque a prisão preventiva é mais
ampla que a prisão temporária, uma vez que pode ser decretada na fase investigatória e na fase processual.
Assim, se durante o curso do inquérito couber prisão temporária e se o crime em investigação estiver contido
no rol do art. 1°, inciso III, da Lei n° 7.960/89, a prisão adequada é a temporária e não a preventiva.
Nesse sentido, Renato Brasileiro, ao exemplificar a situação do crime de homicídio qualificado. Trata-
se de crime hediondo, admitindo-se a decretação de prisão temporária, que pode perdurar por até 60 dias.
Assim, caso o crime admita a prisão temporária, ela seria a única prisão cautelar passível para esse delito
durante a fase investigatória. Por consequência, a prisão preventiva só seria cabível, durante a fase
investigatória, para os crimes que não admitem a prisão temporária.
De toda forma, essa interpretação dada pela doutrina NÃO possui previsão em lei, que estabelece
expressamente a possibilidade de prisão preventiva durante a investigação criminal.
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

D) DECRETAÇÃO: Com a alteração promovida pelo Pacote Anticrime, a prisão preventiva não pode
mais ser decretada de ofício, apenas mediante requerimento do MP ou representação da autoridade policial
(art. 311 do CPP).

ANTES DO PACOTE ANTICRIME APÓS O PACOTE ANTICRIME


Em qualquer fase da investigação policial ou do Em qualquer fase da investigação policial ou
processo penal, caberá a prisão preventiva do processo penal, caberá a PRISÃO
decretada pelo juiz, de ofício
, se no curso da ação PREVENTIVA decretada pelo juiz, a
penal, ou a requerimento do Ministério Público, requerimento do ministério público, do
do querelante ou do assistente, ou por querelante ou do assistente, ou por
representação da autoridade policial representação da autoridade policial.

Caiu em prova Delegado RR/2022! Com relação à prisão e às demais medidas cautelares, assinale a
alternativa correta.
A prisão preventiva poderá ser decretada, de ofício, pelo Juiz, em qualquer fase do processo ou da
investigação criminal, nos feitos em que o acusado ou investigado é reincidente.
(item incorreto).

Obs.: O juiz não poderá mais decretar a prisão preventiva de ofício, mas quando faltar motivo para
que subsista ou quando sobrevierem motivos que a justifique, o juiz poderá, de ofício, revogá-la ou substituí-
la, respectivamente.

Cuidado para não confundir!

EM CASO DE DESCUMPRIMENTO, o juiz não poderá mais, de ofício, substituir a medida, impor outra em
cumulação ou decretar a prisão preventiva.
QUANDO FALTAR MOTIVO para que subsista a medida cautelar imposta ou quando SOBREVIEREM RAZÕES
QUE A JUSTIFIQUE, o juiz poderá, de ofício, revogá-la ou substituí-la, respectivamente.

ANTES DO PACOTE ANTICRIME APÓS O PACOTE ANTICRIME


No caso de descumprimento de qualquer das No caso de descumprimento de qualquer das
obrigações impostas, o juiz, de ofício ou obrigações impostas, o juiz, mediante
mediante requerimento do Ministério requerimento do Ministério Público, de seu
Público, de seu assistente ou do querelante, assistente ou do querelante, poderá substituir
poderá substituir a medida, impor outra em a medida, impor outra em cumulação, ou, em
cumulação, ou, em último caso, decretar a último caso, decretar a prisão preventiva, nos

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). termos do parágrafo único do art. 312 deste
Código.
O juiz poderá revogar a medida cautelar ou O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes,
substituí-la quando verificar a falta de motivo revogar a medida cautelar ou substituí-la
para que subsista, bem como voltar a quando verificar a falta de motivo para que
decretá-la, se sobrevierem razões que a subsista, bem como voltar a decretá-la, se
justifiquem. sobrevierem razões que a justifiquem

Isso porque, uma vez provocado pelo órgão ministerial a determinar uma medida que restrinja a
liberdade do acusado em alguma medida, deve o juiz poder agir de acordo com o seu convencimento
motivado e analisar qual medida cautelar pessoal melhor se adequa ao caso, uma vez que lhe é permitido
atuar conforme os ditames legais, desde que previamente provocado, no exercício de sua jurisdição.

E) REQUISITOS E PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA:


Os requisitos da prisão preventiva encontram-se previstos no art. 312 do CPP:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem
pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para
assegurar a aplicação da lei penal (periculum libertatis), quando houver prova da
existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado
de liberdade do imputado. (fumus comissi delicti).
§ 2º A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada
em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que
justifiquem a aplicação da medida adotada.

Vamos entender o que significa cada um dos requisitos?

O fumus comissi delicti na prisão preventiva consiste na necessidade de haver prova da


materialidade e indícios mínimos de autoria. Ou seja, quando se exige a demonstração do fumus comissi
delicti, deve-se demonstrar que aquele crime realmente ocorreu (atestando a materialidade do delito) e que
há indícios de que aquela pessoa praticou o crime.
Obs.: Veja que quanto à existência do delito, o legislador exige a presença de prova (juízo de
certeza), sendo necessária a convicção do juiz. Em relação à autoria, o legislador usa a palavra “indício”, com
o significado de prova semiplena (prova de menor valor persuasivo).

O periculum libertatis consiste no perigo que a permanência do acusado em liberdade representa


para a aplicação da lei penal, para as investigações e para a segurança da própria coletividade. Ou seja, deve-
se demonstrar que o estado de liberdade do indivíduo representa perigo a um dos seguintes pressupostos:
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

1) Garantia da Ordem Pública;


2) Garantia da Ordem Econômica;
3) Garantia da Aplicação da Lei Penal; ou
4) Conveniência Instrução Criminal.

1) Garantia Da Ordem Pública


Há 3 (três) correntes sobre o que significa a garantia da ordem pública:
• 1ª Corrente (minoritária): Não possui natureza cautelar, eis que o legislador estaria emprestando à
prisão cautelar uma finalidade extraprocessual, qual seja, a segurança pública. Acabaria tendo uma
finalidade de prevenção geral.
• 2ª Corrente (majoritária): Entende que é o risco de reiteração delituosa, ou seja, caso não seja preso,
o agente irá continuar delinquindo. Ganhou reforço com a redação do art. 282, inciso I, do CPP, in
fine (“evitar a prática de infrações penais”).
• 3ª Corrente (minoritária): É o clamor social provocado pelo delito. O Poder Judiciário estaria
obrigado a decretar a prisão, porque a permanência do indivíduo em liberdade causaria o seu
descrédito (sentimento de impunidade perante a sociedade). No entanto, a jurisprudência não
compartilha desse entendimento, afirmando que o clamor social provado pelo delito NÃO autoriza,
por si só, a decretação da prisão preventiva.

ATENÇÃO! Os atos infracionais não podem ser considerados como antecedentes penais, já que o ato
infracional não é crime e medida socioeducativa não é pena. Apesar disso, os registros sobre o passado de
uma pessoa, seja ela quem for, não devem ser desconsiderados para fins cautelares. A avaliação sobre a
periculosidade de alguém impõe que se examine todo o seu histórico de vida, em especial o seu
comportamento perante a comunidade.
Logo, embora os atos infracionais praticados não sirvam como antecedentes penais e muito menos
para fins de reincidência, estes devem ser analisados para aferir se existe risco à garantia da ordem pública
com a liberdade do acusado, sendo fundamento idôneo para decretar a prisão preventiva.

ATENÇÃO! O STF vem entendendo que, em crimes praticados com especial violência ou grave
ameaça à pessoa, o ônus argumentativo em relação à periculosidade concreta do agente é menor.

ATENÇÃO! O STJ entende que é cabível a prisão preventiva no crime de embriaguez ao volante –
mesmo que possua pena máxima inferior a 4 anos - quando se tratar de réu reincidente com risco de
reiteração delitiva
, demonstrando, portanto, que o estado de liberdade do indivíduo acarreta perigo à ordem
pública o perigo de liberdade.

2) Garantia Da Ordem Econômica


Trata-se do risco de reiteração delituosa, porém em relação a crimes contra a ordem econômico-
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

financeira.
Enquadramento normativo: Esse fundamento será aplicado aos crimes previstos nas Leis nº
1.521/51, 7.492/86, 7.134/83, 8.078/90, 8.176/91, 9.279/96 e 9.613/98.
Atenção para o art. 30 da Lei n° 7.492/86:

Art. 30. Sem prejuízo do disposto no art. 312 do CPP, a prisão preventiva do acusado
da prática de crime previsto nesta Lei poderá ser decretada em razão da magnitude
da lesão causada.

A jurisprudência entende que a magnitude da lesão causada, por si só, NÃO autoriza a decretação da
prisão preventiva. Para ser decretada a prisão, a magnitude da lesão causada deve ser somada a uma das
hipóteses do art. 312 do CPP, somente assim a prisão será legítima.

3) Garantia De Aplicação Da Lei Penal


É o risco concreto de fuga do acusado, inviabilizando um futuro cumprimento de pena. Salienta-se
que os Tribunais Superiores exigem um risco concreto de que o acusado poderá fugir.
Ex.: O acusado tem histórico de fuga ou a acusação descobriu o plano de fuga. Com base nesses
e na
dados concretos, é possível decretar medidas cautelares com base na fiel aplicação da lei penal
conveniência da instrução criminal visto que, uma vez evadido, provavelmente haverá citação por edital e,
por conseguinte, aplicação do art. 366 do CPP, acarretando a suspensão do processo por tempo
indeterminado e do prazo prescricional.
Importante consignar que os Tribunais Superiores entendem que a ausência momentânea NÃO se
confunde com fuga, não sendo hipótese capaz de autorizar a prisão preventiva.
CUIDADO! Os Tribunais Superiores divergem sobre a possibilidade de decretar a prisão preventiva
em razão da fuga do distrito da culpa. Enquanto o STF possui precedente antigo entendendo pela
impossibilidade da decretação, o STJ entende que é motivação suficientemente idônea para decretar a
segregação cautelar.

Observações importantes:
● O fato de o agente ser primário e possuir condições favoráveis, NÃO impede a decretação da prisão
preventiva.
● Citação por edital NÃO é por si só indicativo de fuga, pois se trata de citação ficta, logo, não significa que
o réu esteja evadido, porque o réu não é obrigado a congelar a sua vida por causa de
uma persecução
penal.
● Evasão posterior ao decreto prisional NÃO o legitima, porque o réu não precisa se curvar ao comando
prisional para discutir o seu acerto ou desacerto, sendo um consectário lógico da garantia da não
autoincriminação (art. 8º, §2º, g do Pacto de São José da Costa Rica, inserido pelo Decreto 678/92).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Indivíduos em situação de rua merecem especial atenção quanto à sua hipossuficiência,


hipervulnerabilidade, proporcionalidade da medida diante do contexto e trajetória de vida, além das
possibilidades de cumprimento.

Na análise do cabimento da prisão preventiva de pessoas em situação de rua,


além dos requisitos previstos no CPP, o magistrado deve observar as
recomendações da Resolução CNJ 425/2021.
A questão referente a pessoas em situação de rua é complexa, demanda atuação
conjunta e intersetorial, e o cárcere, em situações como a que se apresenta nos
autos, não se mostra como solução adequada. Cabe aos membros do Poder
Judiciário, ainda que atuantes somente no âmbito criminal, um olhar atento a
questões sociais atinentes aos réus em situação de rua, com vistas à adoção de
medidas pautadas sempre no princípio da legalidade, mas sem reforçar a
invisibilidade desse grupo populacional.
STJ. 6ª Turma. HC 772380-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em
08/11/2022 (Info 757).

● Prisão de estrangeiros não residentes no Brasil nas hipóteses em que houver acordo de assistência
judiciária NÃO levam a prisão preventiva, por si só.

4) Conveniência Da Instrução Criminal


Visa preservar as fontes de prova, impedindo que o agente as destrua, através de ameaça às
testemunhas, destruição de documentos, HD’s, etc. Trata-se, portanto, de uma forma de evitar que o
investigado interfira e prejudique as investigações.
De acordo a doutrina, “conveniência” é uma terminologia inadequada, visto que não se pode prender
alguém porque a prisão é conveniente. O correto seria utilizar a expressão “necessidade”.

F) HIPÓTESES DE CABIMENTO DA PRISÃO PREVENTIVA (ART. 313 DO CPP)

Atente-se que, para que seja possível decretar a prisão preventiva, deve haver pelo menos um dos
pressupostos do art. 313 do CPP, um requisito do art. 312 do CPP, além do fumus comissi delicti e periculum
libertatis.
A seguir iremos analisar cada um dos incisos, bem como o parágrafo único.

● Crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos
O inciso I é claro ao dizer que a prisão preventiva será cabível em relação a crimes. Portanto, aqui,
NÃO é cabível em se tratando de contravenção penal.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Além disso, o crime deve ser DOLOSO. Assim, se o fato envolver crime culposo, NÃO se admitirá a
preventiva, pelo menos com base no inciso I.
O crime doloso deve ser punido com pena máxima superior a 4 anos. Desta forma, a pena máxima
NÃO pode ser igual a 4 anos. Isso ocorre porque, quando alguém é condenado e o crime em questão tem
pena máxima superior a 4 anos, não será cabível pena restritiva de direitos (CP, art. 44), o que se chama de
princípio da homogeneidade. Por isso, não faz sentido prender preventivamente, durante o processo, alguém
que ao final será beneficiado com pena restritiva de direito.
Cálculo da pena privativa de liberdade máxima:
. Leva-se em conta as qualificadoras;
. Leva-se em conta as causas de aumento e de diminuição de pena, devendo-se atentar ao
fato de que, nos termos do art. 313, inciso I, do CPP, o cabimento da prisão preventiva é
aferido com base no máximo da pena cominada ao delito. Logo, em se tratando de causas
de aumento de pena, leva-se em consideração o quantum que mais aumente a pena; quando
se tratar de causa de diminuição de pena, utiliza-se o quantum que menos diminua a pena;
. Descartam-se as atenuantes e as agravantes genéricas, pois só repercutem na pena em
concreto;
. Posição pacífica dos Tribunais Superiores: Computa-se igualmente o acréscimo decorrente
do concurso de crimes, somando-se as penas máximas no caso de cunho material ou formal
imperfeito, e elevando-a da metade e de dois terços no caso de cúmulo formal perfeito e
crime continuado. Temos, inclusive, diversas súmulas disciplinando nesse sentido,
relacionadas a institutos vinculados à pena máxima ou à pena mínima da infração penal: 723
do STF, 243 do STJ, 815 do STJ e 81 do STJ.

Caiu em prova Delegado RR/2022! Com relação à prisão e às demais medidas cautelares, assinale a
alternativa correta.
A prisão preventiva somente será concedida a crimes dolosos e punidos com pena privativa de liberdade
apenados com pena máxima superior a 4 anos. (item incorreto).

● Se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o
disposto no inciso I do caput do art. 64 do CP
O inciso II faz referência ao reincidente, ou seja, aquele que pratica um novo crime já tendo à época
uma sentença condenatória transitada em julgado, pouco importando a natureza dos crimes em questão.
Contudo, o legislador especificou que a natureza do crime deve ser dolosa. Assim, o indivíduo deve ser um
reincidente em crime doloso. Logo, se for reincidente em crime culposo, NÃO caberá a prisão preventiva.
À semelhança do inciso I, NÃO cabe prisão preventiva caso se trate de contravenção penal.
O inciso II não faz referência à pena máxima cominada ao delito, de modo que, se o indivíduo for
reincidente, pouco importa o quantum da pena.
Obs.: De acordo com o STF, reincidência é constitucional (RE n. 453.000). Pode ser usada, não apenas
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

como circunstância agravante, mas também como um critério que diferencia os acusados, inclusive para fins
de cabimento da prisão preventiva, em razão do juízo de periculosidade.

● Se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso,
enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência
Perceba que o inciso III conferiu maior grau de coercibilidade às medidas protetivas de urgência
contra pessoas vulneráveis, como criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, e não
apenas contra as mulheres (mas também a favor delas), não se restringindo, portanto, aos casos da Lei Maria
da Penha.
À semelhança dos incisos anteriores, NÃO é cabível quanto às contravenções penais.

Apesar de o inciso III não fazer nenhuma distinção quanto à natureza do crime, por mencionar
“violência doméstica e familiar”, conclui-se que o crime somente pode ser doloso. O agente aproveita-se da
situação de vulnerabilidade da vítima para praticar contra ela algum tipo de violência (física, patrimonial,
sexual, psicológica e moral).
Portanto, a violência doméstica e familiar pode ser cometida contra:
⋅ Mulher (Lei Maria da Penha);
⋅ Criança: Pessoa de até doze anos de idade incompletos (ECA);
⋅ Adolescente: Pessoa entre doze e dezoito anos de idade (ECA);
⋅ Idoso: Pessoa com idade igual ou superior a sessenta anos (Estatuto do Idoso);
⋅ Enfermo: Não há definição normativa, demanda interpretação;
⋅ Pessoa com deficiência: Aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas, nos termos do art. 2º da Lei n° 13.146/15.

Nesse caso, pouco importa o quantum de pena.


● Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa
ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado
imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção
da medida
Segundo Renato Brasileiro, o dispositivo refere-se à condução coercitiva para fins de identificação,
tanto que prevê que o preso será colocado imediatamente em liberdade após a identificação.
Como visto no estudo sobre interrogatório, a decisão do STF proibindo a condução coercitiva era
apenas para fins de interrogatório. Se o indivíduo está protegido pelo direito ao silêncio, não faz sentido
conduzi-lo coercitivamente para fins de interrogatório. Em nenhum momento, o Supremo vedou a condução
coercitiva para outras finalidades não protegidas pelo direito ao silêncio.
Diferentemente dos incisos anteriores, o §1º não faz nenhuma referência quanto à natureza do
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DELEGADO SÃO PAULO

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delito. Por isso, conforme a doutrina, a condução coercitiva para fins de identificação seria cabível tanto em
relação aos crimes dolosos ou culposos, como também em relação às contravenções penais,
independentemente do quantum de pena cominado. A condução coercitiva para fins de identificação tem
que ser cabível para todo e qualquer delito, uma vez que o Estado tem o dever de identificação.

G) NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO E CONTEMPORANEIDADE:


Nos requisitos exigidos pelo art. 312 do CPP para a decretação da prisão preventiva foi inserida a
necessidade de demonstração de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, o que deve ser
demonstrado em concreto, sendo vedadas fundamentações genéricas e abstratas.
Nesse sentido, exige-se, ainda, que a decisão esteja expressamente motivada e fundamentada na
existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a medida. Dessa forma, caso o crime
tenha ocorrido há anos, por exemplo, não é possível decretar sua segregação cautelar por ausência de
contemporaneidade.
A necessidade de fundamentação da sentença que concede a prisão preventiva, além de estar
embasada no princípio da motivação, que rege todas as decisões judiciais, à luz do art. 93, inciso IX, CRFB/88,
também foi expressamente inserida pelo Pacote Anticrime no CPP:

Art. 315, § 2º NÃO SE CONSIDERA FUNDAMENTADA QUALQUER DECISÃO JUDICIAL,


seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem
explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto
de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese,
infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus
fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta
àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado
pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a
superação do entendimento.

A própria jurisprudência dos Tribunais Superiores também já exigia a fundamentação precisa.

NÃO SE ESQUEÇA: A prisão preventiva só poderá ser decretada no caso em que não for adequada a
decretação de outra medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319 do CPP, tendo em vista que é
considerada ultima ratio. Trata-se de um critério equilibrado de hermenêutica.
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SEMANA 07/12

H) PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA:


Em regra, a prisão preventiva não tem prazo predeterminado, devendo perdurar enquanto mantidas
as circunstâncias que a autorizaram. Trata-se do que a doutrina chama de “cláusula rebus sic stantibus”.
Assim, com base nesta cláusula, se a situação que motivou a prisão mudar e não mais subsistirem os
fundamentos para a segregação cautelar, o juiz poderá revogar a prisão preventiva, inclusive de ofício, na
forma do art. 282, §5º, do CPP.

§ 5º O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a medida cautelar ou


substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar
a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. (Redação dada pela Lei nº
13.964, de 2019)

Obs.: Apesar de a lei afirmar que “o juiz poderá”, na verdade, trata-se de um poder-dever do
magistrado. Cessadas as causas que subsistam à prisão preventiva, o juiz deverá revogá-las.
Para evitar prisões que violem a razoável duração do processo, o Pacote Anticrime inseriu no CPP a
exigência de o juiz REVISAR, a cada 90 DIAS, A NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO, cuja obrigação
é imposta ao juiz ou tribunal que DECRETOU (órgão emissor) a prisão preventiva.

Art. 316, Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor
da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 dias, mediante
decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.

ATENÇÃO! O descumprimento do prazo de 90 dias para revisar a necessidade da prisão preventiva


NÃO IMPLICA EM SUA REVOGAÇÃO AUTOMÁTICA. Os ministros fixaram a seguinte tese:

“A inobservância do prazo nonagesimal do art. 316 do CPP, não implica automática


revogação da prisão preventiva, devendo o juiz competente ser instado a reavaliar
a legalidade e a atualidade dos seus fundamentos”.

Enunciado 19 da I Jornada de Direito Penal e Processo Penal CJF/STJ - A decisão de


revisão periódica da prisão preventiva deve analisar de modo motivado, ainda que
objetivo, se os motivos que a fundamentaram se mantêm e se não há excesso de
prazo, sendo vedada a mera alusão genérica à não alteração do quadro fático.

Veja a decisão do STF sobre o tema:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A reforma legislativa operada pelo chamado “Pacote Anticrime” (Lei nº


13.964/2019) introduziu a revisão periódica dos fundamentos da prisão preventiva,
por meio da inclusão do parágrafo único ao art. 316 do CPP. A redação atual prevê
que o órgão emissor da decisão deverá revisar a necessidade de sua manutenção a
cada noventa dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar
ilegal a prisão preventiva. Assim, a prisão preventiva é decretada sem prazo
determinado. Contudo, o CPP agora prevê que o juízo que decretou a prisão
preventiva deverá, a cada 90 dias, proferir uma nova decisão analisando se ainda
está presente a necessidade da medida. (...) STF. 2ª Turma. HC 179859 AgR/RS, Rel.
Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/3/2020 (Info 968).

Assim, conforme o entendimento do STF:


a) deve-se analisar a razoabilidade concreta da duração do processo, aferida à luz da
complexidade de cada caso, considerados os recursos interpostos, a pluralidade de réus,
crimes, testemunhas a serem ouvidas, provas periciais a serem produzidas etc.;
b) a Constituição Federal impõe o dever de motivação das decisões judiciais (art. 93, IX), que
devem sempre se reportar às circunstâncias específicas dos casos concretos submetidos a
julgamento, e não apenas aos textos abstratos das leis.

Indaga-se: Quando o acusado está foragido, deve o poder judiciário revisar a prisão preventiva em
90 dias, nos termos ao art. 316, parágrafo único, do CPP?
R.: Não. STJ. RHC 153.528 01/04/2022.

O art. 22 da Lei n° 12.850/13, contudo, prevê, implicitamente, um prazo máximo para a duração da
prisão preventiva:

Art. 22: Os crimes previstos nesta Lei e as infrações penais conexas serão apurados
mediante procedimento ordinário previsto no Código de Processo Penal,
observado o disposto no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. A instrução criminal deverá ser encerrada em prazo razoável, o
qual não poderá exceder a 120 dias quando o réu estiver preso, prorrogáveis por
igual período, por decisão fundamentada, devidamente motivada pela
complexidade da causa ou por fato procrastinatório atribuível ao réu.

Perceba que o parágrafo único não menciona explicitamente a prisão preventiva, mas a cita
implicitamente. A instrução criminal é a fase do processo destinada à colheita de provas e, portanto, a prisão
mencionada no dispositivo somente pode ser a preventiva, já que não cabe prisão temporária na fase
processual, bem como ninguém pode estar preso em flagrante durante a fase processual.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Portanto, se o indivíduo estiver preso preventivamente e o fundamento da prisão for a conveniência


da instrução criminal, essa prisão não poderá ultrapassar o prazo de 120 dias, prorrogáveis por igual período.
Nada obstante, devem ser observados os prazos previstos em lei para a prática dos atos processuais,
sob pena de excesso de prazo na formação da culpa e consequente relaxamento da prisão preventiva. Ou
seja, apesar de não haver prazo predeterminado, os Tribunais entendem que isso não significa dizer que o
indivíduo possa permanecer preso ad aeternum, tendo em vista que o CPP prevê prazos para a prática dos
diversos atos processuais, inclusive prazos menores quando o indivíduo está preso (inquérito policial,
oferecimento da denúncia etc.).
Quando esses prazos para o cumprimento dos atos processuais fossem descumpridos, dar-se-ia o
excesso de prazo na formação da culpa, ou seja, o Estado teria se excedido quanto ao prazo durante a
instrução processual (formação da culpa). Consequentemente, a prisão preventiva tornar-se-ia ilegal,
devendo ser objeto de relaxamento. Além disso, a própria CRFB/88 preceitua que a prisão ilegal deverá ser
imediatamente relaxada pela autoridade judiciária competente. Essa ideia ganhou reforço com a EC 45/04,
com o acréscimo da garantia da razoável duração do processo.
Sobre o excesso de prazo na formação da culpa, conforme o entendimento da jurisprudência, é
preciso observar situações em que não se configura:

Súmula 64 STJ - Não constitui


constrangimento ilegal o excesso de prazo na
instrução, provocado pela defesa.

Súmula 21 STJ - Pronunciado o réu, fica superada a alegação do constrangimento


ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução.

Súmula 52 STJ - Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de


constrangimento por excesso de prazo.

Entretanto, as Súmulas 21 e 52 vêm sendo relativizadas, eis que passam a impressão de que a
garantia da razoável duração do processo se estende até a pronúncia ou até o encerramento da instrução.
De acordo com os Tribunais, é possível o reconhecimento do excesso de prazo mesmo após a pronúncia ou
após o encerramento da instrução criminal.
Lado outro, vejamos hipóteses em que os Tribunais Superiores têm reconhecido o excesso de prazo
na formação da culpa:
● Mora processual causada por diligência suscitadas exclusivamente pela acusação;
● Mora processual causada pela inércia do Poder Judiciário;
● Mora processual incompatível com o princípio da razoabilidade (ex.: prisão há mais de 2 anos sem
que tivesse o julgamento em primeira instância).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Por fim, destaca-se que o STJ NÃO concede liberdade ao acusado preso preventivamente sob o
argumento de que, ao final, se condenado, ele receberá regime diverso do fechado. Não se aplica aqui,
portanto, o princípio da homogeneidade.
Ainda sobre o tema:

A Súmula Vinculante 56 é inaplicável ao preso provisório (prisão preventiva)


porque esse enunciado trata da situação do preso que cumpre pena (preso
definitivo ou em execução provisória da condenação).
Súmula vinculante 56: A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a
manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se
observar, nesta hipótese, os parâmetros fixados no Recurso Extraordinário (RE)
641320.

A SV 56 destina-se com exclusividade aos casos de cumprimento de pena, ou seja,


aplica-se tão somente ao preso definitivo ou àquele em execução provisória da
condenação. Não se pode estender a citada súmula vinculante ao preso provisório
(prisão preventiva), eis que se trata de situação distinta.
Por deter caráter cautelar, a prisão preventiva não sebmete
su à distinção de
diferentes regimes. Assim, sequer é possível falar em regime mais ou menos
gravoso ou estabelecer um sistema de progressão ou regressão da prisão.
STJ. 5ª Turma. RHC 99006-PA, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 07/02/2019 (Info
642).

I) MODALIDADES DE PRISÃO PREVENTIVA:


● Prisão preventiva substitutiva / subsidiária de medida cautelar (art. 282, §4º e art. 312, parágrafo
único, todos do CPP);
● Prisão preventiva autônoma (art. 312, caput, do CPP).

STJ: A decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva, para ser considerada devidamente
fundamentada, precisa manifestar-se sobre a impossibilidade de serem aplicadas outras medidas cautelares
diversas da prisão, conforme exigem os arts. 282, §6º e 321 do CPP. Com a lei n° 12.403/2011, o CPP passou
a capitular, no art. 319, diversas providências substitutivas à prisão, sendo esta imposta apenas quando
aquelas não se mostrarem suficientes à repressão e à reprovabilidade do delito (HC 219.201).

7.8 Prisão Temporária (Lei N° 7.960/1989)

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A) CONCEITO: A prisão temporária é uma espécie de prisão cautelar decretada pela autoridade
judiciária competente durante a fase preliminar de investigações, com prazo preestabelecido de duração,
condicionada a alguns pressupostos e condições, que serão estudados a seguir.
O principal objetivo da criação da prisão temporária foi colocar fim à famigerada prisão para
averiguações, que consiste no arrebatamento de pessoas pelos órgãos de investigação para aferir a
vinculação das mesmas a uma infração, ou para investigar sua vida pregressa, independentemente de
situação de flagrância ou de prévia autorização judicial. Essa prisão para averiguação é de todo ilegal,
caracterizando manifesto abuso de autoridade, nos termos do art. 9°, caput, da Lei n° 13.869/19.

B) (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA LEI N° 7.960/89: Em relação à constitucionalidade ou não da Lei


n° 7.960/89, existem 2 correntes:
● 1ª Corrente (posição majoritária na doutrina): Inconstitucionalidade da Lei n° 7.960/89.
Alguns doutrinadores, como Paulo Rangel, sustentam que a Lei n° 7.960/89, por ter sua
origem em uma Medida Provisória, estaria contaminada por uma inconstitucionalidade
formal, pois a competência para legislar sobre direito processual penal é privativa da União
(CF, art. 22, I), não podendo jamais ser objeto de Medida Provisória.
● 2ª Corrente (posição do STF): Constitucionalidade da Lei n° 7.960/89. A matéria foi
analisada pelo STF por meio da ADI 162, em que se decidiu que a tese de
inconstitucionalidade não prevalece, julgando prejudicada a ação em virtude da perda do
objeto, por considerar que a Lei n° 7.960/89 não foi originada da conversão da Medida
Provisória 111/1989.

C) REQUISITOS: De acordo com o art. 1° da Lei n° 7.960/89, são requisitos para a decretação da prisão
temporária:

Art. 1° Caberá prisão temporária:


I - quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;
II - quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos
necessários ao esclarecimento de sua identidade;
III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na
legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:

A posição majoritária da doutrina em relação aos requisitos que deveriam ser preenchidos para a
decretação da prisão temporária era a de que o inciso III deveria sempre estar presente, combinado com o
inciso I ou com o inciso II.
Entretanto, em 2022, no julgamento das ADIs 3.360 e 4.109, o Supremo Tribunal Federal reconheceu
a constitucionalidade da Lei n° 7.960/89 e, consequentemente, da prisão temporária, fixando-se o
entendimento de que a sua decretação somente poderá ser autorizada quando, cumulativamente:
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

(1) For imprescindível para as investigações do inquérito policial – periculum libertatis (art. 1, inciso
I, Lei n° 7.960/89), constatada a partir de elementos concretos, e não meras conjecturas, vedada
a sua utilização como prisão para averiguações, em violação ao direito à não autoincriminação,
ou quando fundada no mero fato de o representado não possuir residência fixa (inciso II);
(2) Houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado nos crimes previstos no art. 1°,
inciso III, da Lei n° 7.960/89 – fumus comissi delicti;
(3) For justificada em fatos novos ou contemporâneos que fundamentem a medida – princípio da
contemporaneidade, de acordo com o previsto no art. 312, §2°, CPP (que também fundamenta
a decretação e a manutenção da prisão preventiva);
(4) A medida for adequada à gravidade concreta do crime, às circunstâncias do fato e às condições
pessoais do indiciado (art. 282, inciso II, do CPP);
(5) Não for suficiente a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, previstas nos art. 319 e
320 do CPP (art. 282, §6°, do CPP) – prisão como ultima ratio.

Perceba, portanto, que após a fixação dos requisitos para a decretação da prisão temporária pelo
STF, o posicionamento doutrinário majoritário perdeu força, uma vez que, além de não ser mais possível a
sua decretação fundada no mero fato de o representado não possuir residência fixa (inciso II), também fixou
outros requisitos que antes eram exigidos, na legislação penal pátria, para a decretação da prisão preventiva.
Em relação ao requisito “houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado em crimes
previstos no art. 1°, inciso III”, há de se tecer algumas considerações:
● O art. 2°, § 4o, da Lei n° 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos) afirma que cabe “A prisão
temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes
previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso
de extrema e comprovada necessidade.”.
Ou seja, além dos crimes previstos no rol do art. 1°, inciso III, da Lei n° 7.960/89, também
cabe prisão temporária nos crimes hediondos e nos crimes equiparados a hediondos
(tortura, tráfico de drogas e terrorismo).
Observação: O rol de crimes que autorizam a decretação da prisão temporária é taxativo.

D) PROCEDIMENTO:
● MOMENTO:
APENAS na fase investigatória, portanto, pré-processual (tanto em relação ao Inquérito Policial
quanto a outros procedimentos investigatórios, como o PIC – Procedimento Investigatório Criminal, realizado
pelo Ministério Público).
Obs.: NÃO se admite na fase processual.

● PRAZO:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Regra: Crimes previstos na Lei de Prisão Temporária: Prazo de 5 (cinco) dias, prorrogável por igual
período em caso de extrema e comprovada necessidade (art. 2° da Lei n° 7.960/89).
Exceção: Crimes previstos na Lei de Crimes Hediondos: Prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por
igual período em caso de extrema e comprovada necessidade (art. 2°, § 4o, da Lei n° 8.072/90).
Obs.1: Decorrido o prazo contido no mandado de prisão, a autoridade responsável pela custódia
deverá, independentemente de nova ordem da autoridade judicial, por imediatamente o preso em
liberdade, sem necessidade de expedição de alvará de soltura, salvo se já tiver sido comunicada da
prorrogação da prisão temporária ou da decretação da prisão preventiva (art. 2°, § 7º, da Lei n°
7.960/89).
Obs.2: O mandado de prisão conterá necessariamente o período de duração da prisão temporária
estabelecido no caput deste artigo, bem como o dia em que o preso deverá ser libertado (art. 2°, §
4º-A, da Lei, n° 7.960/89).
Obs.3: Se a autoridade policial concluir que não há mais necessidade de se manter o indivíduo preso,
deverá representar à autoridade judiciária competente solicitando a revogação da prisão temporária.
Portanto, somente o Juiz poderá revogar a prisão temporária, jamais a autoridade policial.
Obs.4: Os prazos de 5 dias e de 30 dias, prorrogáveis, são considerados prazos máximos de duração
da prisão temporária, podendo, perfeitamente, ser decretado um prazo menor.

Cômputo dos prazos: De acordo com o art. 10 da Lei n° 7.960/89: O dia do começo inclui-se no
cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.
Obs.1: De acordo com Renato Brasileiro ao decretar a prisão temporária, deve o juiz ter a cautela de
fazer constar no respectivo mandado o período de duração da prisão temporária, bem como o dia
em que o preso deverá ser libertado, evitando-se assim, a possível tipificação do delito previsto no
art.12, §único, IV, da Lei de Abuso de Autoridade.

● DECRETAÇÃO: A prisão temporária será decretada pelo Juiz, em face da representação da


autoridade policial ou de requerimento do Ministério Público (art. 2°, caput, da Lei n° 7.960/89).
Na hipótese de representação da autoridade policial, o Juiz, antes de decidir, ouvirá o Ministério
Público (art. 2°, §2°, da Lei n° 7.960/89).
Obs.: Perceba que não há a possibilidade de decretação de prisão temporária de ofício (ex officio)
pelo Juiz, respeitando-se o sistema acusatório e o princípio da imparcialidade do Juiz.

● PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DE FUNDAMENTAÇÃO (art. 5°, LXI c/c art. 93, IX, da CRFB/88): A
decisão que decreta a prisão temporária deverá ser fundamentada, sob pena de nulidade, de acordo com o
disposto no art. 2°, § 2°, da Lei n° 7.960/89: O despacho que decretar a prisão temporária deverá ser
fundamentado e prolatado dentro do prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contadas a partir do recebimento
da representação ou do requerimento.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● RECURSO: Se o pedido de prisão temporária formulado pelo Ministério Público for indeferido pelo
Juiz, o recurso cabível será o Recurso em Sentido Estrito (art. 581, inciso V, do CPP).

E) PACOTE ANTICRIME E PRISÃO TEMPORÁRIA: De acordo com a Lei n° 13.869/2019 (Pacote


Anticrime), o art. 2º da Lei nº 7.960/89 passa a vigorar com a seguinte redação:

Art.2º. § 4º-A O mandado de prisão conterá necessariamente o período de duração


da prisão temporária estabelecido no caput deste artigo, bem como o dia em que
o preso deverá ser libertado.
§ 7º Decorrido o prazo contido no mandado de prisão, a autoridade responsável
pela custódia deverá, independentemente de nova ordem da autoridade judicial,
pôr imediatamente o preso em liberdade, salvo se já tiver sido comunicada da
prorrogação da prisão temporária ou da decretação da prisão preventiva.
§ 8º Inclui-se o dia do cumprimento do mandado de prisão no cômputo do prazo
de prisão temporária.

Os §§ 4º-A e 7º estabelecem que decorrido o prazo do mandado de prisão temporária, o preso deverá
de
ser posto em liberdade sem a necessidade de expedição de alvará de soltura, cabendo à autorida
responsável pela custódia colocar o preso em liberdade.
Positivou-se no §8º que o dia da prisão será computado, em consonância com o art. 10 do CP, tendo
em vista que as prisões obedecem a sistemática dos prazos penais.

7.9 Prisão Domiciliar

O Código de Processo Penal, ao tratar da prisão domiciliar, prevê a possibilidade de o réu, em vez de
ficar em prisão preventiva, permanecer recolhido em sua residência. Por se tratar de uma medida que
substitui a prisão preventiva pelo recolhimento da pessoa em sua residência, a doutrina afirma que a prisão
domiciliar possui natureza de medida cautelar.
Nesse sentido, a prisão domiciliar somente pode ser aplicada aos indivíduos que estão presos
cautelarmente, não podendo ser estendida àqueles que já tiveram o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória.

A prisão domiciliar do art. 318 do CPP só se aplica para os casos de prisão


preventiva, não podendo ser utilizado quando se tratar de execução definitiva de
título condenatório (sentença condenatória transitada em julgado). (STF, Info
967).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Obs.: O STJ possui alguns julgados admitindo a prisão domiciliar do art. 318 do CPP mesmo em caso
de prisão decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado (STJ. 3ª Seção. Rcl 40.676/SP,
Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/11/2020).
A prisão domiciliar pode SUBSTITUIR a prisão preventiva em algumas hipóteses, conforme previsto
no art. 318 do CPP:

Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o
agente for:
I - Maior de 80 (oitenta) anos;
II - Extremamente debilitado por motivo de doença grave;
III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade
ou com deficiência;
IV - gestante a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto
risco.
IV - gestante; (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016)
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; (Incluído pela Lei
nº 13.257, de 2016)
VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze)
anos de idade incompletos. (Incluído pela Lei nº 13.257, de 2016)
Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos
estabelecidos neste artigo.
Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou
responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão
domiciliar, desde que: (Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018).
I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; (Incluído
pela Lei nº 13.769, de 2018).
II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente. (Incluído pela Lei
nº 13.769, de 2018).

O art. 318, inciso II, do CPP é chamado de prisão domiciliar humanitária. Em um caso concreto, o
STF entendeu que deveria conceder prisão humanitária ao réu, tendo em vista o alto risco à saúde, a grande
possibilidade de desenvolver infecções no cárcere e a impossibilidade de tratamento médico adequado na
unidade prisional ou em estabelecimento hospitalar, conforme demonstração satisfatória em laudo pericial.
Considerou-se que a concessão da medida era necessária para preservar a integridade física e moral
do paciente, em respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). STF. 2ª Turma. HC 153961/DF,
Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/3/2018 (Info 895).

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Indaga-se: As hipóteses de prisão domiciliar previstas nos incisos do art. 318 do CPP são sempre
obrigatórias? Em outras palavras, se alguma delas estiver presente, o juiz terá que, automaticamente,
conceder a prisão domiciliar sem analisar qualquer outra circunstância?
R.: NÃO. O art. 318 do CPP, que traz as hipóteses de prisão domiciliar, deve ser aplicado de forma
restrita e diligente, verificando-se as peculiaridades de cada caso (Min. Gilmar Mendes, no HC 134069/DF,
julgado em 21/06/2016).

Indaga-se: É possível a substituição da prisão temporária pela prisão domiciliar?


Questão Objetiva: Não, tendo em vista o texto da lei. Deve-se adotar uma posição legalista, a qual
apenas possibilita a prisão domiciliar em substituição à prisão preventiva, não havendo previsão legal em
relação à prisão temporária.
Questão Discursiva: Após apresentar a falta de previsão legal para a substituição da prisão
temporária pela prisão domiciliar, pode-se argumentar que, apesar disso, é possível haver a substituição,
tendo em vista a aplicação analógica in bonan partem dos artigos 317 e 318 do CPP à prisão temporária. A
prisão temporária está expressamente compreendida no novo regramento das prisões provisórias, tanto que
mencionada no caput do art. 283 do CPP, lado a lado à preventiva e à prisão em flagrante. Cumpre lembrar
que, à semelhança da preventiva, a prisão temporária também é cautelar e importa privação integral da
Pretender diferentemente
liberdade, sujeitando o imputado a condições próprias do regime fechado.
importaria a seguinte perplexidade: melhor ser denunciado, com decretação da preventiva, do que
permanecer apenas indiciado. O mero investigado teria tratamento mais rigoroso do que o réu, ferindo o
princípio da proporcionalidade.

Obs.1: O simples fato de a mulher ser reincidente não faz com que ela perca o direito à prisão
domiciliar. STF. 2ª Turma. HC 143641/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/2/2018 (Info 891).
Obs.2: Os magistrados, membros do MP, da Defensoria Pública e da advocacia têm direito à prisão
cautelar em sala de Estado-Maior. Caso não exista, devem ficar em prisão domiciliar.
A prerrogativa conferida ao advogado da prisão em sala de Estado-Maior (art. 7º, inciso V, da Lei nº
8.906/94) continua existindo mesmo que já estejamos na fase de execução provisória da pena?

• Redação literal da Lei: SIM. O art. 7º, inciso V, afirma que o advogado terá direito
de ser preso em sala de Estado-Maior até que haja o trânsito em julgado.
• STJ e STF: NÃO. A prerrogativa conferida aos advogados pelo art. 7º, inciso V, da
Lei nº 8.906/94, refere-se à prisão cautelar, não se aplicando para o caso de
execução provisória da pena (prisão-pena). Assim, o advogado não tem direito à
sala de Estado-maior na execução provisória da pena. O direito à sala de Estado
Maior é apenas na prisão provisória, e não na execução penal provisória. STJ. 5ª
Turma. RHC 84.578/SC, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 22/08/2017. STJ. 6ª

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Turma. HC 356.158/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 19/05/2016.


STF. 2ª Turma. RHC 155360 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 25/05/2018.

PRISÃO DOMICILIAR x HC COLETIVO


Em 2018, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal concedeu HC coletivo (HC 143641) a todas as
mulheres presas grávidas e mães de crianças com até 12 anos de idade, bem como às adolescentes em
situação semelhante do sistema socioeducativo e mulheres que tenham sob custódia pessoas com
deficiência, para substituir a prisão preventiva pela prisão domiciliar, com exceção daquelas que tenham
cometido crimes mediante violência ou grave ameaça, contra os próprios filhos, ou, ainda, em situações
excepcionalíssimas — casos em que o juiz terá de fundamentar a negativa e informar ao Supremo a decisão.
Em 2020, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, também concedeu Habeas Corpus coletivo (HC
165704) para determinar a substituição da prisão cautelar por domiciliar dos pais e responsáveis por
crianças menores de 12 anos e pessoas com deficiência, desde que cumpridos os requisitos previstos no
artigo 318 do Código de Processo Penal (CPP) e outras condicionantes.
A Defensoria Pública da União (DPU), impetrante do habeas corpus, sustentou que a decisão
proferida pelo Supremo no HC 143641 em favor de todas as mulheres presas gestantes ou mãe de crianças
até 12 anos ou de pessoas com deficiência deveria ter seu alcance estendido a todos os presos que sejam os
únicos responsáveis por pessoas na mesma situação, pelas mesmas razões e pelos mesmos fundamentos.
Segundo a DPU, a decisão, ao tutelar direito das crianças filhas de mães presas, acabou por discriminar as
que não têm mãe, mas encontram, em outros responsáveis, o sentimento e a proteção familiar, ferindo,
assim, o princípio constitucional da igualdade.

PRISÃO DOMICILIAR (CPP) x REGIME DOMICILIAR (LEP)


Cuidado para não confundir prisão domiciliar do CPP com prisão domiciliar da LEP!

PRISÃO DOMICILIAR DO CPP PRISÃO DOMICILIAR DA LEP


Art. 317 e 318 do CPP. Art. 117 da LEP.
O CPP, ao tratar da prisão domiciliar, está se A LEP, ao tratar da prisão domiciliar, está se
referindo à possibilidade de o réu, em vez de ficar referindo à possibilidade de a pessoa já
em prisão preventiva, permanecer recolhido em condenada cumprir a sua pena privativa de
sua residência. liberdade na própria residência.
Trata-se de uma medida cautelar por meio da qual Trata-se, portanto, da execução penal
o réu, em vez de ficar preso na unidade prisional, (cumprimento da pena) na própria residência.
permanece recolhido em sua própria residência.
Continua tendo natureza de prisão cautelar.
Hipóteses (importante): Hipóteses (importante):
O juiz poderá substituir a prisão preventiva pela O preso que estiver cumprindo pena no regime

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

domiciliar quando o agente for: aberto poderá ficar em prisão domiciliar quando
I — maior de 80 anos; se tratar de condenado(a):
II — extremamente debilitado por motivo de I — maior de 70 anos;
doença grave; II — acometido de doença grave;
III — imprescindível aos cuidados especiais de III — com filho menor ou deficiente físico ou
pessoa menor de 6 anos de idade ou com mental;
deficiência; IV — gestante.
IV — gestante;
V — mulher com filho de até 12 (doze) anos de
idade incompletos;
VI — homem, caso seja o único responsável pelos
cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade
incompletos.
O juiz pode determinar que a pessoa fique usando O juiz pode determinar que a pessoa fique usando
uma monitoração eletrônica. uma monitoração eletrônica.

8. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO

Caiu em prova Delegado SP/2022! No que concerne às medidas cautelares previstas no Código de Processo
Penal, é correto afirmar que as medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes
ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante
requerimento do Ministério Público. (item correto).

A Lei n° 12.403/11 ampliou o rol de medidas cautelares pessoais diversas da prisão, que podem ser
aplicadas de forma isolada ou cumulativa, previstas nos arts. 319 e 320 do CPP, quais sejam:

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:


I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz,
para informar e justificar atividades;
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer
distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer
distante;
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente
ou necessária para a investigação ou instrução;

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o


investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza
econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática
de infrações penais;
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com
violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-
imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos
do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência
injustificada à ordem judicial;
IX - monitoração eletrônica.

Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às


autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-
se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e
quatro) horas.

Caiu em prova Delegado RR/2022! Com relação à prisão e às demais medidas cautelares, assinale a
alternativa correta.
A proibição de ausentar-se do país deverá ser comunicada às autoridades encarregadas de fiscalizar a saída
do território nacional e sujeita o acusado ou o indiciado a proceder a entrega do passaporte, em 24 horas,
após a intimação. (item correto).

Para a decretação de uma medida cautelar pessoal diversa da prisão, é imprescindível que sejam
preenchidos os seus pressupostos, quais sejam, o fumus comissi delicti e a presença de uma das hipóteses
que autorizam a prisão preventiva.
Ademais, a prisão preventiva é ultima ratio em relação às cautelares diversas, conforme o
preconizado no art. 282, § 6º, do CPP.
O STJ decidiu acerca de um assunto polêmico: o limite máximo de duração das medidas cautelares
diversas da prisão, afirmando que não há:

(...) 2. No caso, não se trata de imposição tardia de medidas cautelares, mas da


manutenção de medidas menos gravosas que a prisão decretadas com a presença
de fundamentos concretos e contemporâneos aos fatos imputados. 3. Conforme
ressaltado pela Corte de origem as circunstâncias do caso concreto, em que a
paciente é acusada de reiteradamente internalizar mercadorias importadas, de alto
valor, sem o correspondente pagamento de tributos, no contexto de
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

transnacionalidade, justificam a manutenção da medida cautelar de retenção do


passaporte. 4. Conquanto a paciente esteja cumprindo as referidas medidas
cautelares há tempo considerável, não é possível se reconhecer a existência de
retardo abusivo e injustificado, de forma a caracterizar desproporcional excesso
de prazo no cumprimento da medida. 5. Vale destacar que não há disposição legal
que restrinja o prazo das medidas cautelares diversas da prisão, as quais podem
perdurar enquanto presentes os requisitos do art. 282 do Código de Processo
Penal, devidamente observadas as peculiaridades do caso e do agente. 6. Agravo
regimental a que se nega provimento. Tendo em vista o tempo decorrido e o
quantitativo/regime de pena fixados, recomenda-se que o Juízo a quo reexamine a
cautelar imposta, no prazo de quinze dias, a contar da comunicação
correspondente. (AgRg no HC n. 737.657/PE, relator Ministro Reynaldo Soares da
Fonseca, Quinta Turma, julgado em 14/6/2022, DJe de 23/6/2022.)

● Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e
justificar atividades

Trata-se da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso I, do CPP, que tem o escopo
de garantir que o acusado permaneça à disposição da justiça para a prática de atos processuais, além de
monitorar o acusado em suas práticas rotineiras. Ademais, tal medida poderia respaldar a conveniência da
instrução criminal, uma vez que desparecido o acusado poderia dar azo à aplicação do art. 366 do CPP,
produzindo efeitos nocivos ao processo em razão da sua suspensão.
A frequência do comparecimento fica sujeita à discricionariedade do juízo.

● Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas


ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas
infrações

Trata-se da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso II, do CPP, que tem como
finalidade evitar que o acusado cometa novas infrações penais. Ademais, pode ter como escopo preservar e
proteger uma prova, como no caso de uma testemunha.
A fundamentação tem que perpassar por uma relação de causa e efeito entre a natureza da infração
penal e a natureza do estabelecimento cuja frequência está sendo vedada.
Por fim, é importante salientar que tal medida pode abranger o afastamento do acusado do lar, em
casos abrangidos pela Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340/06).

● Proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao
fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Trata-se da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso III, do CPP, que tem como
finalidade proibir o contato do acusado com pessoa determinada, que não necessariamente precisa ser a
vítima, devendo permanecer distante da mesma.
O referido dispositivo é omisso no sentido de estabelecer quais formas de contato poderiam ser
proibidas. Entretanto, é possível que o juiz fixe distância mínima de aproximação do acusado para com a
vítima ou sua residência, nos moldes da Lei Maria da Penha.

Inf. 601, 6ª T. STJ – 2017: Não é possível que o juiz determine, como medida
cautelar substitutiva da prisão, a incomunicabilidade do acusado com seu genitor,
também corréu. A proibição de que o acusado mantenha contato com seu genitor,
mesmo ele também sendo réu, é algo que afeta evidentemente a esfera da vida
privada e familiar de maneira grave. Vale ressaltar que mesmo as pessoas presas
continuam com o direito de receber visitas de seus familiares. A fixação da medida
restritiva substitutiva não deve se sobrepor a um bem tão caro como é a família,
sendo isso protegido inclusive pela Constituição Federal, em seu art. 226. Assim
como o magistrado permitiu que o réu tivesse contato com suas irmãs, deveria
também ter permitido a comunicação com oaipdo acusado, mesmo ele sendo o
líder da organização criminosa.

● Proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para


a investigação ou instrução

Trata-se da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso IV, do CPP, que tem como
finalidade proibir que o acusado se ausente da Comarca (incluindo-se, portanto, a impossibilidade de saída
do País), quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução – ou com o
objetivo de neutralizar outros riscos previstos no art. 282, inciso I, do CPP.
A proibição de ausentar-se do País será comunicada às autoridades encarregadas de fiscalizar as
saídas do território nacional, devendo o indicado ou acusado ser intimado para entregar o passaporte no
prazo de 24 horas, tudo visando à efetividade, de acordo com o art. 320 do CPP.
Esse inciso tem espaço para a aplicação da teoria dos poderes implícitos como respaldo para a
aplicação de medidas cautelares inominadas, de modo que seria possível ao magistrado modular essa
restrição espacial estabelecida no inciso IV com o intuito de adequá-la ao caso concreto.
Exemplo: Não raro, nas grandes cidades, o indivíduo mora em um município e trabalha na capital, de
modo que, se fosse aplicada a literalidade do inciso IV, o efeito transverso seria obrigar o acusado a largar o
emprego, sob pena de descumprimento da medida cautelar imposta. Nesse panorama, seria possível
modular essa restrição espacial

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado
tenha residência e trabalho fixos

Trata-se da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso V, do CPP, que pode ser
imposta quando for suficiente e necessário para garantir a aplicação da lei penal e a instrução processual.
Para a aplicação dessa medida cautelar é fundamental que o acusado tenha residência e emprego
fixos. Porém, é possível a sua aplicação nos casos em que o acusado tenha residência fixa e, apesar de não
tem emprego fixo, esteja estudando.
Os horários de recolhimento são determinados pelo juiz, em conformidade com o trabalho do
agente, de modo a não impossibilitar o exercício da atividade laboral.

● Suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira


quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais

Trata-se da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso VI, do CPP, em que o juiz
deve estabelecer uma relação de causa e efeito entre o réu (essencialmente funcionários públicos) e a função
por ele desempenhada com a natureza da infração (crimes contra a administração pública ou contra a ordem
econômico-financeira), com a finalidade de evitar o cometimento de novas infrações penais ou suprimir
provas.
Em uma leitura inicial do dispositivo, pode-se ter a impressão de que o legislador restringiu a sua
aplicação a uma finalidade específica: “quando houver justo receio de sua utilização para a prática de
infrações penais”).
Entretanto, indaga-se: Seria possível aplicar tal medida cautelar com base nas outras finalidades do
art. 282, inciso I, do CPP?
• 1ª Corrente: (Badaró): Se o art. 319, inciso VI, do CPP delimitou a utilização da cautelar nessa
hipótese, apenas será decretada com base em tal finalidade específica.
• 2ª Corrente (Andrei Borges, Renato Brasileiro): A intenção da lei não foi a de restringir a tal
finalidade específica, mas a de apontar a finalidade precípua da cautelar em espécie, como uma
forma de orientar o juiz na aplicação da medida, podendo ser usada para atingir os demais objetivos
do artigo 282, inciso I, do CPP.

Ademais, no caso de suspensão do exercício da função pública, também será suspensa a


remuneração do servidor?

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12
3
Tanto o STF quanto a doutrina majoritária, incluindo o Renato Brasileiro4, entendem que a
remuneração do servidor não deverá ser suspensa, em razão do princípio da presunção de inocência, pois
acarretaria verdadeira antecipação de pena.
Entretanto, há posicionamento divergente do STJ no Resp 413.398/RS, Rel. Min. Hamilton
Carvalhido, j. 04/06/2022, Dj 19/12/2002.

Observação: Há a mesma medida cautelar na Lei de Drogas, na Lei de Lavagem e na Lei de ORCRIM.

● Internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave
ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal)
e houver risco de reiteração

Trata-se da hipótese prevista no art. 319, inciso VII, do CPP. A internação provisória possui requisitos
adicionais, quais sejam: deve ser um crime (não cabe em contravenção penal) praticado com violência ou
grave ameaça, por indivíduo inimputável ou semi-imputável, na hipótese de risco de reiteração criminosa.
A aplicação dessa medida cautelar está condicionada à conclusão dos peritos em relação à
imputabilidade ou semi-imputabilidade do agente (art. 26 do CP). Deve ser cumprida em estabelecimento
hospitalar adequado, uma vez que tem também como finalidade a recuperação da saúde mental do acu
sado.
A internação provisória consiste em via extrema, tal qual a prisão preventiva?
O requisito específico “crimes praticados com violência ou grave ameaça” faz com que a internação
provisória se aproxime das mesmas categorias de crimes que admitem prisão preventiva (crimes dolosos
com PPL máxima superior a 4 anos). Até porque essa medida cautelar envolve privação libertária, em
princípio, integral. Assim, tal qual a prisão preventiva, a internação provisória deve ser a última ratio.

● Fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a
obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial.”

a) Natureza jurídica da fiança - Posição Majoritária e Tribunais Superiores: Tutela cautelar. A fiança
antes da Lei n° 12.403/11 tinha natureza de contracautela, pois o juiz conferia liberdade provisória, mas, em
contrapartida, exigia a fiança. A fiança hoje, entretanto, tem natureza de tutela cautelar, delineada no artigo
319, VIII, CPP.

b) Pressupostos para aplicar a fiança como medida cautelar diversa da prisão:


● Deve observar o art. 283, §1º, do CPP:

3
(STF, 2 Turma, Pet. 7.063/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 1/08/2017)
4
BRASILEIRO DE LIMA, Renato. Manual de Processo Penal. 2023.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Art. 283 § 1º - As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à


infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena
privativa de liberdade.

● Deve observar o art. 323 do CPP:

O art. 323 do CPP reitera o texto constitucional disposto no artigo 5º, incisos XLVII
a XLIV, da CRFB/88.

Art. 323. Não será concedida fiança:


I - nos crimes de racismo;
II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo
e nos definidos como crimes hediondos;
III - nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático.

● Deve observar o art. 324 do CPP:


No caso do art. 324 do CPP, para uma prova objetiva, deve-se afirmar que o referido
dispositivo é pressuposto de admissibilidade da fiança. No entanto, a doutrina adverte que, na
verdade, o art. 324 traz hipóteses em que a fiança será descabida ou insuficiente.

Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança:


I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida
ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts.
327 e 328 deste Código;
II - em caso de prisão civil ou militar;
III - (revogado); (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).
IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva
(art. 312).

c) Legitimados para o deferimento da fiança:


● Juiz; e
● Autoridade policial nas infrações penais com pena máxima até 4 anos (salvo no crime de
descumprimento de medida protetiva de urgência).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

ENUNCIADO 20 da I Jornada de DPP: Em caso de hipossuficiência, o não pagamento


da fiança não pode ser motivo legítimo a impedir a concessão da liberdade
provisória.

STJ confirma decisão que mandou soltar todos os presos do país que tiveram
liberdade condicionada à fiança (HC 568.693, de 14.10.2020).
Com base na Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e nas
medidas de contenção da pandemia do novo coronavírus, a Terceira Seção do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus coletivo para assegurar
a soltura de todos os presos aos quais foi concedida liberdade provisória
condicionada ao pagamento de fiança e que ainda se encontrem submetidos à
privação cautelar de liberdade por falta de capacidade econômica para pagar o
valor arbitrado. Os efeitos da decisão valem em todo o território nacional.
A medida já havia sido determinada em liminar pelo relator do habeas corpus,
ministro Sebastião Reis Júnior, em abril, ainda no início da crise sanitária.
Inicialmente, ele deu a liminar a pedido da Defensoria Pública do Espírito Santo,
para os presos daquele estado. Em seguida, atendendo a requerimento da
– habilitada nos autos como custus vulnerabilis –,
Defensoria Pública da União
estendeu a decisão para todo o país.
Fonte: Site STJ

Será feito com base no art. 322 do CPP que possui redação idêntica ao art. 313, I do CPP, ou seja, crimes
apenados até 4 anos vão desafiar fiança arbitrável pelo Delegado de Polícia.

Obs.1: Em havendo o arbitramento da fiança nas hipóteses em que ela não é admitida lei, a fiança
será considerada ilegal. Sendo assim, o pleito deverá ser de cassação da fiança, tendo em vista seu
descompasso com a lei.
Obs.2: A liberdade provisória pode ser concedida com ou sem fiança, bem como aplicada com ou
sem as cautelares diversas da prisão.

● Monitoração eletrônica

Trata-se de medida cautelar prevista no art. 319, inciso IX, do CPP. Uma vez que as cautelares podem
ser aplicadas de forma isolada ou cumulada, conforme o previsto no art. 282, §1º, do CPP. Aplicada de forma
isolada, a medida tem como finalidade evitar a fuga do acusado; se cumulado com outras cautelares, que
devem com ela serem compatíveis, tem como objetivo de reforçá-las e fiscalizar o seu cumprimento.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

De acordo com Renato Brasileiro5, o monitoramento eletrônico pode ser utilizado para a obtenção
de 3 finalidades:
● Detenção: o monitoramento tem como objetivo manter o indivíduo em lugar
predeterminado, normalmente em sua própria residência.
● Restrição: o monitoramento é usado para garantir que o indivíduo não frequente certos
lugares, ou para que não se aproxime de determinadas pessoas, em regra testemunhas,
vítimas e coautores; e
● Vigilância: o monitoramento é usado para que se mantenha vigilância contínua sobre o
agente, sem restrição de sua movimentação.

Obs.1: A tendência é que o monitoramento eletrônico seja aplicado cumulativamente com outras
tutelas cautelares, como instrumento de fiscalização, o que já tem se verificado no processo de execução
penal, haja vista o artigo 146-B da LEP.
Obs.2: De acordo com o STJ, a inobservância do perímetro estabelecido para monitoramento de
tornozeleira eletrônica configura falta disciplinar nos termos do art. 50, VI e art. 39, V da LEP. (AgRg no HC
537.620/SP – Dje: 13.12.2019)

5
BRASILEIRO DE LIMA, Renato. Manual de Processo Penal. 2023.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

META 3

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: LEI DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

TODOS OS ARTIGOS
⦁ Lei nº 12.694/12
⦁ Lei nº 12.850/13
⦁ Arts.35 e 53, I e II da Lei nº 11.343/06
⦁ Art. 2º, Lei 2.889/56
⦁ Arts. 1º, §6º e 17-B da Lei nº 9.613/98
⦁ Art. 190-A, ECA
⦁ Art. 3º-B, XVII, CPP
⦁ Art. 3º-C, §3º, CPP
⦁ Art. 13-A, CPP
⦁ Art. 282, §2º, CPP
⦁ Art. 288, CP
ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXAR DE LER!
⦁ Arts.35 e 53, I e II da Lei 11.343 (analisar comparativamente)
⦁ Art. 190-A do ECA (analisar comparativamente)
⦁ Art. 3º-B, XVII, CPP
⦁ Principais artigos da Lei nº 12.694/12: Arts. 1º e 1º-A
⦁ Principais artigos da Lei nº 12.850/13:
- Art. 1º, §1º
- Art. 2º (muito importante a leitura de todos os parágrafos)
- Arts. 3º-A a 3º-C
- Art. 4º (muito importante a leitura de todos os parágrafos)
- Art. 7º, §3º
- Art. 8º, caput
- Arts. 10 e 10-A
- Art. 15
Cuidado com os artigos que foram inseridos pelo Pacote Anticrime! Apesar de alguns não terem sido
mencionados aqui, merecem atenção redobrada! Fique atento!

1. CONTEXTO HISTÓRICO

● 1º MOMENTO: Lei nº 9.034/95

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A Lei nº 9.034/95 anunciou meios de investigação de organizações criminosas, dispondo sobre “a


utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações
criminosas”. Todavia, não definiu o que viria a ser organização criminosa.
Diante deste vácuo legislativo, parcela da doutrina e jurisprudência defendiam o uso da definição de
organização criminosa trazida pela Convenção de Palermo, que trata da criminalidade organizada
transnacional e foi ratificada pelo Brasil pelo Decreto nº 5.015/04, mas o STF, contudo, no julgamento do HC
96.007/SP, entendeu pela impossibilidade de utilização da Convenção de Palermo para suprir a omissão
legislativa quanto à definição jurídica de “organização criminosa”. Segundo o Supremo, isso seria
“acrescentar à norma penal elementos inexistentes, o que seria uma intolerável tentativa de substituir o
legislador, que não se expressou nesse sentido”, violando a taxatividade e a legalidade estrita.

● 2º MOMENTO: Lei nº12.694/12


Em face das seguidas decisões, o Congresso se viu obrigado a legislar sobre o assunto, e editou a Lei
nº 12.694/12, que trata da formação do juízo colegiado para o julgamento de crimes praticados por
organizações criminosas. O seu artigo segundo passou a conceituar organizações criminosas no seguinte
sentido:

Art. 2º, Lei nº 12.964/12. Para os efeitos desta Lei, considera-se organização
criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de
obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática
de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam
de caráter transnacional.

● 3º MOMENTO: Lei nº 12.850/13


Porém, a Lei nº 12.694 só abrangia os requisitos para a formação de órgão colegiado, não havendo
uma tipificação específica para os atos realizados pela organização criminosa, o que fez surgir novo conceito,
com a Lei nº 12.850/13:

Art. 1º, Lei nº 12.850/13. (...)


§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda
que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de
qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas
sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Art. 2º, Lei nº 12.850/13. Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente


ou por interposta pessoa, organização criminosa:
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas
correspondentes às demais infrações penais praticadas.

Nesse contexto, podemos identificar cinco objetivos para a Lei nº 12.850:


● Conceituar organização criminosa.
● Dispor sobre a investigação criminal das referidas organizações.
● Tratar dos meios de obtenção de prova.
● Criar infrações penais correlatas a organização criminosa.
● Tratar do procedimento criminal aplicável.

ATENÇÃO! A Lei 12.850/13 revogou completamente a Lei nº 9034/95 e apenas parcialmente a Lei nº
12.694/12 (ambas as leis coexistem atualmente).

O parágrafo §2º, do art. 1º, prevê a aplicação da Lei 12.850/13 a outras infrações penais:

Art. 1º, Lei nº 12.850/12. (...) § 2º Esta Lei se aplica também:


I - às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando,
iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no
estrangeiro, ou reciprocamente;

O simples fato de o delito estar previsto em tratado ou convenção internacional assinado pelo Brasil,
com a devida ratificação por meio de decreto legislativo do Congresso Nacional e decreto do Presidente da
República não enseja, por si só, a possibilidade de aplicação da Lei nº 12.850/13.
Para além disso, é imprescindível que se trate de delito à distância ou tráfico. Logo a infração deve
se revestir de caráter de internacionalidade, com o início da sua execução no país, e o resultado ocorrendo
ou devendo ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente. Somada a essa a hipótese de o delito ocorrer
em deslocamento entre três ou mais países.

II - às organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a prática


dos atos de terrorismo legalmente definidos.

CUIDADO! PACOTE ANTICRIME


A lei nº 13.964/19 incluiu o art. 1º-A à Lei nº 12.694/12, prevendo a criação de Varas Criminais Colegiadas
para julgamento de crimes envolvendo organizações criminosas.

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SEMANA 07/12

2. CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA: CRIME ORGANIZADO POR NATUREZA x CRIME ORGANIZADO POR
EXTENSÃO

O crime organizado por natureza refere-se à punição pelo crime de organização criminosa; já o crime
organizado por extensão refere-se às infrações penais praticadas pela organização criminosa.
● Organização criminosa por natureza – próprio crime de organização criminosa.
● Organização criminosa por extensão – crimes praticados pela organização criminosa.

Com a entrada em vigor da Lei nº 12.850/13, a figura da organização criminosa deixa de ser
considerada uma simples forma de se praticar crimes para se tornar um tipo penal incriminador autônomo,
sendo o “nomem juris” do crime denominado “ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA”.
Como se trata de “novatio legis” incriminadora, sua aplicação está restrita aos crimes praticados a
partir da vigência da Lei nº 12.850, que se deu em data de 19 de setembro de 2013, sob pena de violação ao
princípio da irretroatividade da lei penal incriminadora (art. 5°, XL, CR).
De todo modo, trata-se de CRIME PERMANENTE, cuja consumação se prolonga no tempo, detendo
o agente o poder de fazer cessar a prática delituosa a qualquer momento. Assim, considera-se que o crime
está em flagrante delito enquanto não cessar a permanência, sendo certo que o termo prescricional só tem
início a partir do momento em que é cessada a permanência.
Na hipótese de tal crime ter início antes do dia 19 de setembro de 2013, mas se prolongar na vigência
da Lei nº 12.850/13, é perfeitamente possível a responsabilização criminal pelo novo tipo penal, nos termos
da súmula nº 711 do STF:

Súmula 711-STF: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da
permanência.

3. TIPOS PENAIS PREVISTOS NA LEI Nº 12.850/13

3.1. Art. 2º, caput

Trata-se de norma penal em branco homogênea univitelina, já que o conceito de organização criminosa
está na própria Lei nº 12.850/13.
a) Bem jurídico tutelado: Sentimento coletivo de ordem e segurança – paz pública.
b) Condutas: Promover, Constituir, Financiar, e Integrar.

Cuida-se de tipo misto alternativo. Logo, se num mesmo contexto fático, o agente pratica mais de
um verbo nuclear, responderá por crime único (princípio da alternatividade), devendo, tal circunstância, ser
levada em consideração pelo juiz na dosimetria da pena.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Exceção: Se o indivíduo praticar tais condutas em mais de uma organização criminosa, teremos
concurso de crimes ou crime continuado, a depender do caso concreto.
c) Requisitos para o reconhecimento da organização criminosa:

● Associação de 04 ou mais pessoas

Deve haver PERMANÊNCIA E ESTABILIDADE, sob pena de caracterizar concurso eventual de pessoas.
Pouco importa que os componentes da organização criminosa não se conheçam reciprocamente,
que haja um chefe ou líder, que todos participem de cada ação delituosa ou que cada um desempenhe uma
tarefa específica. Na verdade, basta que o fim almejado pelo grupo seja o cometimento de infrações penais
com pena máxima superior a 4 (quatro) anos, ou de caráter transnacional.
Evidenciada a presença de pelo menos 4 (quatro) pessoas, é de todo IRRELEVANTE que um deles seja
inimputável, que nem todos os integrantes tenham sido identificados, ou mesmo que algum deles não seja
punível em razão de alguma causa pessoa de isenção de pena, pois o Brasil adotou a TEORIA DA
ACESSORIEDADE LIMITADA, não se levando em conta a culpabilidade dos partícipes e coautores na
imputação das questões atinentes ao concurso de agentes.
Entretanto, para o cômputo dos 4 agentes necessários para a tipificação do crime de organização
pois:
criminosa, não se pode querer incluir o agente infiltrado,
● A própria infiltração está condicionada à prévia existência de organização criminosa (Lei nº
12.850/13, art. 10, §2º);
● O agente infiltrado não age com o necessário animus associativo. Visa, na verdade, à identificação
de fontes de prova e à colheita de elementos de informação capazes de contribuir para o
desmantelamento da organização criminosa.

EM RESUMO: Computam-se: inimputáveis e integrantes eventualmente não identificados. Não se


computa o agente infiltrado.

CUIDADO COM A PEGADINHA!!!


Associação para o tráfico na Lei de Drogas (art.35, Lei nº 11.343/06) = mínimo de 2 pessoas.
Associação criminosa (art.288, CP) = mínimo de 3 pessoas.
Associação para fins de genocídio (art.2º, Lei nº 2.889/56) = mínimo de 4 pessoas.
Organização criminosa (art.1º, §1º, Lei nº 12.850/13) = mínimo de 4 pessoas.

● Estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente

Essa estrutura pode ser informal e não depende de nenhum tipo de sofisticação.

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SEMANA 07/12

#DICA DD: se aparecer na prova “estrutura hierárquica”, a afirmativa estará correta.

O critério distintivo essencial entre os tipos de associação criminosa (CP, art. 288) e organização
criminosa não é somente o número de agentes, mas sim o fato de a organização criminosa ser
estruturalmente ordenada e contar com divisão de tarefas. Sendo assim, é possível que um grupo que tenha
mais de três agentes e tenha por finalidade a prática de crimes com pena superior a quatro anos seja tratado
como associação criminosa (CP, 288), desde que não haja essa hierarquia estrutural e não conte com divisão
de tarefas.

● Finalidade de obtenção de vantagem de qualquer natureza mediante a prática de infrações penais cujas
penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou de caráter transnacional;

A vantagem a ser obtida pode ser de qualquer natureza, não precisa ser vantagem patrimonial.
O quantum superior a 4 anos não é exigido se estivermos diante de um crime de caráter
transnacional. Assim, a organização criminosa pode praticar duas “espécies” de crimes:
(1) Crimes com pena máxima superior a 4 anos (Cuidado: não pode ser pena = 4 anos).
(2) Crime de caráter transnacional, independentemente do quantum de pena.

d) Sujeito ativo:
Trata-se de crime comum, ou seja, o tipo penal não exige qualidade ou condição especial do agente.
No entanto, para a caracterização, é necessária a reunião de pelo menos 04 pessoas, logo, trata-se
de crime plurissubjetivo ou de concurso necessário, já que o número de agentes é uma condição elementar
do tipo.
e) Sujeito Passivo: Coletividade (crime vago).
f) Consumação e tentativa: Em se tratando de crime formal, de consumação antecipada ou de
resultado cortado, consuma-se o crime de organização criminosa com a simples associação de quatro ou
mais pessoas para a prática de crimes com pena máxima superior a 4 (quatro) anos, ou de caráter
transnacional, independentemente da efetiva prática dos crimes para os quais se associaram.
Trata-se, portanto, de crime de perigo abstrato cometido contra a coletividade (crime vago),
punindo-se o simples fato de se figurar como integrante do grupo. Assim, a doutrina majoritária entende
que não é cabível a tentativa no crime de organização criminosa.
Se os membros da organização criminosa praticarem as infrações penais para as quais se associaram,
deverão responder pelo crime do art. 2°, caput, da Lei nº 12.850/13, em concurso material (CP, art. 69) com
os demais ilícitos por eles perpetrados.
O delito é um exemplo do que a doutrina chama de “espiritualização do direito penal” ou
“antecipação da tutela penal”, voltada à proteção de bens jurídicos “pulverizados”, titularizados por um
conjunto indefinido de pessoas, criminalizando atos preparatórios, que não seriam punidos pelo direito penal
clássico.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

3.2. Art. 2º, §1º (figura equiparada) - Obstrução ou embaraço de investigação penal referente à
organização criminosa

O art. 2º, §1º da Lei 12.850/13 equipara o embaraço nas investigações de infração penal que envolve
organização criminosa ao próprio crime de compor organização criminosa, aplicando a ambos os agentes as
mesmas penas.
● O bem jurídico tutelado, nesse caso, é a Administração da Justiça (diferentemente da paz pública,
tutelada pelo caput do art. 2º).
● Diferente do crime de organização criminosa, pode ser praticado por uma única pessoa (crime
monossubjetivo), desde que não participe da organização criminosa, hipótese em que responderá
pelo crime do art. 2º, caput.
● Trata-se de crime material. Haverá embaraço ou impedimento à investigação se o agente conseguir
produzir algum resultado, ainda que momentâneo e reversível (Informativo nº 703/STJ).
● Trata-se de norma especial em relação ao crime de coação no curso do processo (princípio da
especialidade). O crime do art. 344 do CP exige a violência ou grave ameaça como elementares do
tipo. Assim, se uma organização criminosa empregar a violência ou grave ameaça para impedir ou
embaraçar as investigações, deve-se aplicar o art. 2º, §1º, da Lei nº 12.850/13
EM CONCURSO
MATERIAL com as penas relativas à violência empregada, em atenção ao Princípio da Especialidade.

O legislador não se refere expressamente à obstrução do processo judicial correspondente,


limitando-se à obstrução no curso das investigações. É possível abranger a obstrução no curso do processo?
Sim.

Crime de embaraçar investigação previsto na Lei do Crime Organizado não é


restrito à fase do inquérito. Se o agente embaraça o processo penal, ele também
comete este delito? SIM. A tese de que a investigação criminal descrita no art. 2º,
§ 1º, da Lei nº 12.850/2013 limita-se à fase do inquérito não foi aceita pelo STJ.
Isso porque as investigações se prolongam durante toda a persecução criminal, que
abarca tanto o inquérito policial quanto a ação penal deflagrada pelo recebimento
da denúncia. Assim, como o legislador não inseriu uma expressão estrita como
al”, compreende-se ter conferido à investigação de infração penal
“inquérito polici
o sentido de “persecução penal”, até porque carece de razoabilidade punir mais
severamente a obstrução das investigações do inquérito do que a obstrução da
ação penal. STJ. 5ª Turma. HC 487.962-SC, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em
28/05/2019 (Disponível no Informativo nº 650/STJ).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

3.3. Causas de Aumento de Pena

Art. 2º, Lei nº 12.850/13. (...)

§ 2º As penas aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa


houver emprego de arma de fogo.

§ 4º A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços):

I - se há participação de criança ou adolescente;

Aqui, a doutrina diverge se haveria ou não concurso de crimes entre o crime de organização
criminosa majorada pela participação de criança e adolescente e o crime de corrupção de menores (art. 244-
B, ECA). De acordo com o professor Gabriel Habbib, não é possível haver concurso de crimes, sob pena de
caracterizar bis in idem, já que tanto a majorante do art. 2º, §4º, I, da Lei nº 12.850/13 como o art. 244-B do
ECA tutelam o mesmo bem jurídico.
E, acerca da temática de causas de aumento de pena, apesar da doutrina criticar, o STJ já se
manifestou no sentido de que não há bis in idem no fato de, tanto no tráfico de drogas quanto na organização
criminosa, incidir a causa de aumento de pena pelo fato de haver transnacionalidade em ambos os crimes
ainda que cometidos em concurso. (HC 489.166)

3.4. Circunstância Agravante

Art. 2º, Lei nº 12.850/13. (...)


§ 3º A pena é agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da
organização criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução.

DICA DD: Para não confundir agravante com causa de aumento de pena, memorize: “quem comanda usa
gravata”.

3.5. Participação do Funcionário Público na ORCRIM

a) Medida Cautelar de Afastamento

Trata-se de medida cautelar já prevista no art. 319, VI, do CPP, com redação dada pela Lei 12.403/11
pressupondo o binômio periculum libertatis e fumus comissi delicti:
· Fumus comissi delicti – indícios suficientes de que o funcionário público integra organização
criminosa.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

· Periculum libertatis – o afastamento cautelar do servidor público será importante tanto para
aplicação da lei penal, como para evitar novas reiterações delituosas.

ATENÇÃO: O afastamento pode ser decretado em qualquer fase da persecução penal cautelar e será sem
prejuízo da remuneração.
CUIDADO! O texto da lei prevê que o juiz pode decretar, de ofício, a medida cautelar em qualquer
fase da persecução penal, em que pese ser majoritário na doutrina que essa atuação de ofício somente
poderia ocorrer durante a fase processual, e jamais durante a investigação criminal, em razão do princípio
da imparcialidade e observância ao sistema acusatório.
Ocorre que o Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) promoveu uma mudança acerca da decretação das
medidas cautelares (art. 282, §2º, CPP), e passou a prever que, para que o juiz decrete tais medidas, é
necessário haver:
(1) Requerimento das partes;
(2) Representação da autoridade policial;
(3) Requerimento do Ministério Público.
Ou seja: diante da mudança promovida pelo Pacote Anticrime, o juiz não poderia mais, de ofício,
decretar as medidas cautelares (o que inclui o afastamento cautelar do funcionário público),
independentemente de ser durante a investigação criminal ou durante a fase processual, em respeito ao
sistema acusatório, que passou a ser adotado de forma expressa pelo CPP.

CUIDADO! NA PROVA OBJETIVA, ASSINALE A OPÇÃO QUE CORRESPONDER AO TEXTO DA LEI!

b) Perda do cargo e interdição para exercer cargo ou função pública: Trata-se de um efeito extrapenal
e automático da sentença condenatória definitiva. Portanto, dispensa fundamentação do magistrado na
sentença. Independe do quantum de pena aplicado.

c) Participação Policial na ORCRIM: Trata-se de desdobramento lógico do controle externo da polícia


exercido pelo MP. Busca garantir a eficiência da investigação policial, impedindo o corporativismo. A
Corregedoria instaura investigação e comunica ao MP para que este indique membro para acompanhar as
investigações. O dispositivo apenas regulamentou a forma de se realizar a investigação em âmbito policial,
não excluindo a possibilidade de o MP instaurar procedimento criminal e realizar a investigação.

3.6. Requisito a mais para a Concessão de Benefícios Incluído pelo Pacote Anticrime – Lei 13.964/2019.

Art. 2º, Lei nº 12.850/13. (...)

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

§8º As lideranças de organizações criminosas armadas ou que tenham armas à


disposição deverão iniciar o cumprimento da pena em estabelecimentos penais de
segurança máxima.

Pegadinha de prova:
Não são todos os membros das organizações criminosas que iniciam o cumprimento de pena em
estabelecimentos de segurança máxima, mas apenas as LIDERANÇAS de organizações criminosas armadas
ou que tenham armas à disposição.

São características da inclusão em estabelecimento penal federal de segurança máxima (art. 3º, §1º,
da Lei nº 11.671/08:
● Recolhimento em cela individual;
● Visita do cônjuge, do companheiro, de parentes e de amigos somente em dias determinados, por
meio virtual ou no parlatório, com o máximo de 2 (duas) pessoas por vez, além de eventuais crianças,
separados por vidro e comunicação por meio de interfone, com filmagem e gravações;
● Banho de sol de até 2 (duas) horas diárias; e
● Monitoramento de todos os meios de comunicação, inclusive de correspondência escrita.

OBS.: Sugere-se a leitura da Lei 11.671/08.

DICA DD: Ao falar em organizações criminosas armadas, lembre-se:


- Há aumento da pena em até ½ para organização que utiliza arma de fogo – art. 2º, §2º, Lei 12.850/13;
- LÍDERES iniciam o cumprimento de pena em estabelecimentos de segurança máxima – art. 2º, §8º, Lei
12.850/13;
- São julgados pelas varas colegiadas (caso sejam criadas mediante resolução) – art. 1º-A, Lei 12.694/12.
- Veda-se a liberdade provisória, com ou sem cautelares – art. 310, §2º, CPP.

Art. 2º, Lei nº 12.850/13. (...)


§9º O condenado expressamente em sentença por integrar organização criminosa
OU por crime praticado por meio de organização criminosa não poderá progredir
de regime de cumprimento de pena ou obter livramento condicional ou outros
benefícios prisionais se houver elementos probatórios que indiquem a
manutenção do vínculo associativo.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O autor Renato Brasileiro de Lima assevera ser bem provável que a presente vedação suscite
questionamentos à luz do princípio da individualização da pena, à semelhança do que já foi decidido pelo STF
em relação ao regime integralmente fechado para os crimes hediondos e equiparados, entendimento
inclusive sumulado na súmula vinculante 26. Especificamente em relação ao § 9º, por se tratar de norma
processual penal com reflexos penais, seus efeitos incidirão apenas nas execuções de pena.

4. ASPECTOS PROCESSUAIS DA LEI DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Primeiro, é importante diferenciar as fontes de prova, meios de prova e meios de obtenção de prova.
Em síntese (já que o tema é tratado com profundidade no caderno de provas de processo penal):

a) FONTES DE PROVA: São todas as PESSOAS OU COISAS das quais se pode conseguir a prova.
b) MEIOS DE PROVA: São os instrumentos através dos quais as fontes de prova são introduzidas no
processo.
c) MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA: Consistem em procedimentos regulados por lei, geralmente
extraprocessuais, passíveis de execução por outros funcionários que não o juiz, que se desenrolam, em regra,
sob a autorização e fiscalização judiciais, cujo objetivo e a identificação de fontes de prova.
● Buscam assegurar a investigação do fato delituoso e a eficiência da atividade probatória, diante do
risco de que os efeitos deletérios do tempo e o comportamento do próprio investigado impeçam ou
dificultem que pessoas ou coisas possam servir como fonte de prova.
● Como são atividades extraprocessuais, o contraditório e ampla defesa são exercidos de maneira
diferida.
● No entanto, é preciso ter em mente que, para que haja a restrição das garantias fundamentais dos
investigados, é necessário que os meios de obtenção de prova cumpram três REQUISITOS:
(1) Reserva de Lei (desdobramento do princípio da legalidade) – os meios de obtenção de provas devem
estar previstos em lei formal.
(2) Reserva de jurisdição – meios de obtenção de prova, em regra, dependem de autorização judicial.
(3) Princípio da proporcionalidade – os meios de obtenção de prova devem observar os 3 subprincípios
da Proporcionalidade, quais sejam: (1) Necessidade, (2) Adequação, (3) Proporcionalidade em
sentido estrito.

O art. 3º arrola os meios de obtenção de provas previstos na lei de organizações criminosas.

4.1 Colaboração Premiada

a) Conceito: Trata-se de técnica de investigação especial por meio da qual o coautor ou o participe da
infração penal ALÉM DE CONFESSAR O SEU ENVOLVIMENTO no quadro delituoso, fornece aos órgãos

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

responsáveis pela persecução INFORMAÇÕES OBJETIVAMENTE EFICAZES para a consecução de um dos


objetivos previstos em lei, recebendo em CONTRAPARTIDA determinado PRÊMIO LEGAL.

b) Requisitos indispensáveis:
(1) tem que confessar seu envolvimento.
(2) tem que fornecer informações objetivamente eficazes.

c) Natureza jurídica: O art. 3º-A positivou a natureza jurídica da colaboração premiada: meio de obtenção
de prova e negócio jurídico processual.
No entanto, segundo Renato Brasileiro, devemos diferenciar:
▪ Colaboração premiada – meio de obtenção de prova (CUIDADO: Não é meio de prova!!!);
▪ Acordo de colaboração premiada – negócio jurídico processual;

Ressalta-se que o STF já tinha jurisprudência no sentido de que o acordo de colaboração premiada
consiste num NEGÓCIO JURÍDICO PROCESSUAL PERSONALÍSSIMO (Informativo 796/STF).
Nesse sentido, pode-se chegar a algumas consequências acerca da natureza jurídica do acordo de
colaboração premiada:
o delatado não pode participar da tomada de
1) Por se tratar de um negócio jurídico personalíssimo,
declarações do colaborador.
2) Não pode haver impugnação do acordo por delatado expressamente mencionado. Esse foi o
entendimento do STF no HC 127483 e na Rc 21258. EXCEÇÃO: O acordo de colaboração premiada
pode ser impugnado quando o delatado for detentor de foro por prerrogativa de função e atacar o
descumprimento das regras de competência.
3) O § 6º do art. 4º da Lei nº 12.850/2013 estipula que o acordo de colaboração premiada é celebrado
pelo investigado ou acusado. Assim, a vítima não pode ser colaboradora, porque lhe faltaria interesse
- haja vista que é a interessada na tutela punitiva (Info. 754, STJ).

VAMOS FAZER UM LINK COM O DIREITO ADMINISTRATIVO?


Com base na possibilidade de celebração do ANPC no âmbito da Improbidade Administrativa, e na
legitimidade ativa concorrente entre o órgão do Ministério Público e a pessoa jurídica de direito público
lesada para propositura da ação de improbidade administrativa, o STF firmou jurisprudência entendendo
pela constitucionalidade da utilização da colaboração premiada em ação civil pública por ato de improbidade
administrativa movida pelo MP, observando-se algumas diretrizes. (STF, Info 1101)

ATENÇÃO!
Embora o delatado não possa participar da tomada de declarações e, tampouco, possa impugnar o
acordo de colaboração premiada firmado por terceiro, em 2020 o STF decidiu que O DELATADO PODE TER
ACESSO ÀS DECLARAÇÕES PRESTADAS, desde que:
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Requisito positivo: o acesso deve abranger somente documentos em que o requerente é de fato
mencionado como tendo praticado crime (o ato de colaboração deve apontar a responsabilidade
criminal do requerente);
● Requisito negativo: o ato de colaboração não se deve referir a diligência em andamento (devem ser
excluídos os atos investigativos e diligências que ainda se encontram em andamento e não foram
consubstanciados e relatados no inquérito ou na ação penal em tramitação). SSTF. 2ª Turma. Pet
7494 AgR/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgado em 19/5/2020
(Info 978).

d) Novidades trazidas pelo Pacote Anticrime: Com o intuito de tornar a explicação mais didática, de modo a
facilitar a compreensão, o estudo não será realizado, necessariamente, na ordem dos artigos que aparecem
na Lei.
Conforme preconiza o art. 3º-C, a proposta de colaboração deverá ser instruída com procuração com
poderes específicos, ou ser firmada pessoalmente pelo proponente.
Ressalta-se que a presença do defensor é IMPRESCINDÍVEL durante toda a etapa do acordo de
colaboração premiada, sendo certo que, na eventualidade de um conflito de interesses (por exemplo, se o
advogado não concordar com a intenção do cliente de celebrar um acordo de colaboração premiada), ou na
sença de outro
hipótese de o colaborador ser pessoa hipossuficiente, o celebrante deve solicitar a pre
advogado ou de um defensor público.
O art. 4º, §15 corrobora a necessidade de estar assistindo pelo defensor.
Cabe, ainda, à DEFESA, com o intuito de convencer à autoridade policial ou ministerial da relevância
dos elementos de prova, instruir adequadamente a proposta, indicando as provas e os elementos de
corroboração dos fatos narrados.
Na hipótese de esses elementos de corroboração não evidenciarem, de plano, o grau de utilidade e
eficácia da colaboração, admite-se que a lavratura do acordo de colaboração premiada seja precedida por
uma instrução preliminar. É nesse sentido o §4º do art. 3-B.
As negociações são formalmente iniciadas com o RECEBIMENTO DA PROPOSTA para formalizar o
acordo de colaboração premiada. Isso é importante porque, é com o recebimento da proposta, que se inicia
o MARCO LEGAL DE CONFIDENCIALIDADE.

PEGADINHA DE PROVA OBJETIVA - Não é a lavratura do termo de confidencialidade que delimita o


início das negociações, mas sim o imediato recebimento da proposta.

Os termos de recebimento de proposta de colaboração e de confidencialidade serão elaborados pelo


celebrante, e assinados por ele, pelo colaborador e pelo advogado ou defensor público com poderes
específicos (§5º).

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O recebimento da proposta e a subscrição do Termo de Confidencialidade para prosseguimento das


tratativas NÃO IMPLICAM, POR SI SÓ, A SUSPENSÃO DA INVESTIGAÇÃO!

MEMORIZE: Recebimento da proposta → marco da confidencialidade → não houve indeferimento sumário


→ firmam termo de confidencialidade!

A proposta de colaboração poderá ser sumariamente indeferida, mediante justificativa e


cientificação do interessado. Assim, na eventualidade de a proposta não ser indeferida, as partes estarão
vinculadas ao termo de confidencialidade firmado, sendo vedado posterior indeferimento sem qualquer
justificativa. O dispositivo busca observar o dever de lealdade e boa-fé.
A contrário senso, seria possível concluir que, havendo justa causa, seria possível posterior
indeferimento. O autor Renato Brasileiro exemplifica: “é o que ocorre, por exemplo, se, a despeito do
oferecimento da proposta, o colaborador-proponente não cessar seu envolvimento com a conduta ilícita
relacionada ao objeto da proposta”.
Ressalta-se que o recebimento da proposta impõe a todos o respeito ao sigilo e boa-fé, sendo certo
que este sigilo só pode ser levantado mediante prévia autorização judicial, nos termos do art. 7º, §3º da Lei
(também incluído pelo Pacote Anticrime).
A previsão inserida no § 6º do art. 3º-B, até onde se nota, busca impedir que provas e informações
apresentadas sejam utilizadas para qualquer outra finalidade, no caso de o Ministério Público desistir da
celebração do acordo.
Dispôs o legislador que, no acordo de colaboração premiada, o colaborador deverá narrar todos os
fatos ilícitos para os quais concorreu e que tenham relação direta com os fatos investigados.
Esta previsão dá margem a interpretar-se de forma distinta do quanto se vinha entendendo,
admitindo-se, em tese, que o colaborador venha a omitir fatos dos quais tenha ciência, mas para os quais
não tenha concorrido ou que não tenham relação direta com os fatos investigados.
Ainda que assim se interprete, nada impedirá que o colaborador traga outros fatos não relacionados
à investigação. E isto até para fins de valoração das cláusulas premiais que merecerão estar presentes.

e) Benefícios a serem concedidos (prêmios legais): A Lei prevê ainda, no art. 4º, benefícios para os sujeitos
que colaboram com as investigações, desde que a colaboração seja frutífera.
Logo, poderá ser concedido, em acordo realizado pelas partes e com a homologação do juízo:
● Conceder perdão judicial, que funcionará como causa extintiva da punibilidade;
● Diminuição da pena em até 2/3;
● Diminuição da pena em até 1/2;
● Substituição da PPL por PRD;
● Conceder a progressão de regime independentemente da observância dos requisitos objetivos;
● Deixar de oferecer a denúncia em determinadas hipóteses (veremos adiante);
● Suspender o prazo de oferecimento da denúncia por até 6 meses – prorrogável por igual período.
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

CUIDADO!
- Colaboração até a sentença → redução em até 2/3
- Colaboração após a sentença → redução até a metade (1/2)

§ 5º Se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade ou será
admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos.

∘ Perdão judicial:

Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o


delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão
requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício
não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o CPP.
· Requerido pelo MP – a qualquer tempo;
· Representado pelo Delegado - durante a investigação, com oitiva prévia do MP;
· Ainda que o benefício não tenha sido previsto na proposta inicial;
· Deve-se levar em consideração a relevância da colaboração.

∘ Substituição da PPL por PRD:

Doutrina majoritária entende que não são necessários os requisitos do art. 44, CP, pois caso o fossem
o dispositivo não faria sentido de existir. Nesse sentido: Cleber Masson e Renato Brasileiro.

∘ Suspensão do prazo para oferecimento da denúncia:

Para o colaborador, o prazo para o oferecimento da denúncia poderá ser suspenso por até 06 meses,
prorrogáveis por igual período. Durante esse prazo, o transcurso da prescrição também será suspenso.
Ressalta-se que este benefício não se estende aos demais colaboradores.

∘ Não oferecimento da denúncia

O art. 4º, §4º foi alterado pelo Pacote Anticrime, que passou a condicionar o benefício de não
oferecimento de denúncia aos casos em que a colaboração se refira a fatos dos quais o Ministério Público
não tenha conhecimento prévio.
À luz do §4º-A, também inserido pelo Pacote Anticrime, considera-se existente este conhecimento
prévio quando houver inquérito policial ou procedimento investigatório instaurado para apuração dos fatos.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Lembre-se que o não oferecimento da denúncia consiste numa EXCEÇÃO ao princípio da obrigatoriedade da
ação penal pública incondicionada!

∘ Progressão de regime sem a observância dos requisitos objetivos

O dispositivo ainda prevê a possibilidade de haver a progressão de regime, mesmo que ausentes os
requisitos objetivos do referido benefício. Assim, é possível concluir que a progressão ainda depende da
observância dos requisitos subjetivos, ou seja, do bom comportamento carcerário do condenado.
Não se esqueça que o Pacote Anticrime alterou o patamar para a progressão de regime. Veja as novas
frações a serem utilizadas:

ANTES DA LEI 13.964/19 DEPOIS DA LEI 13.964/19


A PPL será executada em forma A PPL será executada em forma progressiva com a
progressiva com a transferência para transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada
regime menos rigoroso, a ser pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
determinada pelo juiz, quando o preso I - 16% da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido
tiver cumprido ao menos 1/6 da pena no cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
regime anterior e ostentar bom II – 20% da pena, se o apenado for reincidente em crime
comportamento carcerário, cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
comprovado pelo diretor do III - 25% da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido
estabelecimento, respeitadas as normas cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
que vedam a progressão. IV – 30% da pena, se o apenado for reincidente em crime
cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
V - 40% da pena, se o apenado for condenado pela prática de
crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI - 50% da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado,
com resultado morte, se for primário, vedado o livramento
condicional;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo,
de organização criminosa estruturada para a prática de crime
hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia
privada;
VII - 60% da pena, se o apenado for reincidente na prática de
crime hediondo ou equiparado;
VIII - 70% da pena, se o apenado for reincidente [específico] em

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

crime hediondo ou equiparado com resultado morte, VEDADO


O LIVRAMENTO CONDICIONAL.
Obs.: Não se esqueça que o Pacote Anticrime tornou crime
hediondo o crime de organização criminosa, quando
direcionado à prática de crime hediondo ou equiparado. (art.
1º, §1º, V, Lei 8.072/90).

É importante salientar que os benefícios estão condicionados à implementação de alguns


resultados:

(...) desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I - A identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das
infrações penais por eles praticadas;
II - A revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização
criminosa;
III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização
criminosa;
IV - A recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais
praticadas pela organização criminosa;
V - A localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

Restará inviabilizada a concessão do benefício nos casos em que:


- Somente for encontrado o cadáver da vítima;
- A vítima fugir por contra própria;
- A vítima for resgatada por terceiros.

§ 2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a


qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a
manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela
concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha
sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do CPP.
§ 3º O prazo para oferecimento de denúncia ou o processo, relativos ao
colaborador, poderá ser suspenso por até 6 (seis) meses
, prorrogáveis por igual
período, até que sejam cumpridas as medidas de colaboração, suspendendo-se o
respectivo prazo prescricional.

Critérios utilizados para a escolha do benefício: A Lei aponta os seguintes critérios para que o juiz
escolha quais benefícios serão aplicados ao colaborador:
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Art. 4º, Lei nº 12.850/13. (...) § 1º Em qualquer caso, a concessão do benefício


levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a
gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração.

OBS.1: A concessão dos benefícios varia conforme o grau e eficácia da colaboração.


OBS.2: Apesar do legislador falar em colaboração espontânea, a doutrina entende que a colaboração precisa
ser apenas voluntária, dispensando a espontaneidade.

APROFUNDANDO PARA PROVAS DISCURSIVAS


O que se entende por “causalidade hipotética às avessas”?
Um dos pressupostos para a incidência dos prêmios da Lei do Crime Organizado é que da colaboração resulte
a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa. Neste cenário, Vinicius
Marçal e Cleber Masson (em menção à obra de Bitencourt e Busato), destacam que: "A fim de viabilizar a
aferição dessa necessária relação de causa (colaboração) e efeito (prevenção), o ideal é que se realize um
juízo de causalidade hipotética, nos mesmos padrões que se faz com as imputações de crimes omissivos,
porém às avessas. Ou seja, a verificação de que caso não houvesse determinada intervenção derivada da
colaboração, um resultado delitivo teria sido produzido" (Masson, Cleber; Marçal, Vinicius. Crime
Organizado. 2 ed. São Paulo: Método, 2016, p.164).

f) Falta de legitimidade e de capacidade da Pessoa Jurídica para firmar acordo de colaboração


No julgamento do RHC 154.979, em agosto de 2022, a Sexta Turma do STJ estabeleceu que as
pessoas jurídicas não têm capacidade nem legitimidade para firmar o acordo de colaboração previsto na Lei
12.850/2013, pois o instituto da colaboração premiada tem, para o colaborador, o objetivo personalíssimo
de obter redução ou mesmo isenção de pena, o que, até mesmo pela excepcionalidade da norma, não se
aplica às pessoas jurídicas, cuja responsabilidade penal se limita aos crimes ambientais.

g) Papel do Juiz do acordo de colaboração premiada

Atenção redobrada aos artigos 7º, 7º-A, 7º-B e 7º-C, tendo em vista que foram inseridos pelo
Pacote Anticrime!

O juiz deve se abster de intervir no acordo de colaboração. Não deve participar, nem presenciar das
tratativas, deixando-as à cargo do MP e delegado, sob pena de violação ao sistema acusatório e mácula a
imparcialidade objetiva para o julgamento da causa.
Nesse sentido, possuem legitimidade para firmar acordo de colaboração premiada:
(1) Delegado de polícia – no curso da investigação

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

(2) Ministério Público - em qualquer fase da persecução penal

Apesar de haver posicionamento em sentido contrário, tem-se que o DELEGADO DE POLÍCIA PODE
CELEBRAR O ACORDO, sem a intervenção do MP, podendo, inclusive, representar pelo perdão judicial. O §6º
parece exigir apenas, uma manifestação ministerial posterior à formalização do acordo.
É nesse sentido o posicionamento do STF (STF, Info 907).
Agora, questiona-se: A anuência do Ministério Público deve ser posta como condição de eficácia do
acordo de colaboração premiada celebrado pela autoridade policial? A resposta é SIM!! De acordo com o
julgado de 31/05/2021 pelo STF: Considerada a estrutura acusatória dada ao processo penal conformado à
Constituição Federal, a anuência do Ministério Público deve ser posta como condição de eficácia do acordo
de colaboração premiada celebrado pela autoridade policial.
Ademais, em decisão veiculada no informativo 942, o STF entendeu que o Poder Judiciário não pode
obrigar o Ministério Público a celebrar o acordo de colaboração premiada.
Formalizado o acordo, os documentos serão encaminhados ao Juízo que, para fins de
HOMOLOGAÇÃO, ouvirá sigilosamente o colaborador e analisará a regularidade, legalidade, voluntariedade
e adequação dos benefícios e resultados.
Essa homologação é o que confere segurança jurídica ao acordo, sendo imprescindível para
transformar a mera expectativa de direito do colaborador em verdadeiro direito subjetivo.
Antes do Pacote Anticrime, o juiz analisava somente regularidade, legalidade e voluntariedade da
colaboração premiada. Com o advento da Lei 13.964/2019, o juiz passa a analisar também se os benefícios
oferecidos são condizentes com os resultados da colaboração.

ANTES DA LEI 13.964/19 DEPOIS DA LEI 13.964/19


Realizado o acordo na forma do § 6º, o respectivo Realizado o acordo na forma do § 6º deste artigo,
termo, acompanhado das declarações do serão remetidos ao juiz, para análise, o respectivo
colaborador e de cópia da investigação, será termo, as declarações do colaborador e cópia da
remetido ao juiz para homologação, o qual deverá investigação, devendo o juiz ouvir sigilosamente
verificar sua regularidade, legalidade e o colaborador, acompanhado de seu defensor,
voluntariedade, podendo para este fim, oportunidade em que analisará os seguintes
sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de aspectos na homologação:
seu defensor. I - regularidade e legalidade;
II - adequação dos benefícios pactuados àqueles
previstos no caput e nos §§ 4º e 5º deste artigo,
sendo NULAS as cláusulas que violem o critério de
definição do regime inicial de cumprimento de
pena do art. 33 do Código Penal, as regras de cada
um dos regimes previstos no Código Penal e na Lei

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

de Execução Penal e os requisitos de progressão


de regime não abrangidos pelo § 5º deste artigo;
III - adequação dos resultados da colaboração aos
resultados mínimos exigidos nos incisos I, II, III, IV
e V do caput deste artigo;
IV - voluntariedade da manifestação de vontade,
especialmente nos casos em que o colaborador
está ou esteve sob efeito de medidas cautelares

● São consideradas nulas:


1) As cláusulas que violem a definição de regime de cumprimento de pena ou relacionadas aos
requisitos de progressão não abrangidos pelo § 5º do art. 4º.
2) As cláusulas de renúncia ao direito de impugnar a decisão homologatória.

h) Competência para homologação: Quanto à competência, determina o art. 3º-B, CPP, que a homologação
do acordo de colaboração premiada deverá ser realizada pelo “juiz das garantias”, quando realizada durante
a investigação.
Não se esqueça que o dispositivo referente ao juiz das garantias foi declarado constitucional pelo STF
(ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305), que fixou o prazo de 12 (doze) meses, a contar da data da publicação da ata
do julgamento, para que sejam adotadas as medidas legislativas e administrativas necessárias à adequação
das diferentes leis de organização judiciária, à efetiva implantação e ao efetivo funcionamento do juiz das
garantias em todo o país, conforme diretrizes do CNJ.
Atenção! O prazo poderá ser prorrogado, uma única vez, por no máximo 12 (doze) meses, devendo
a justificativa ser apresentada em procedimento junto ao CNJ.

OBS.1: Caso a proposta de acordo aconteça entre a sentença e o julgamento pelo órgão recursal, a
homologação ocorrerá no julgamento pelo Tribunal e constará do acórdão. STF. 2ª Turma. HC 192063/RJ,
Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/2/2021 (Info 1004).
OBS.2: No caso de colaborador com foro por prerrogativa de função ou de delatado com foro por
prerrogativa de função, a competência para homologar o acordo de colaboração premiada será do respectivo
Tribunal! (STF, Info 895 e Info 870).

i) Recusa à homologação: Caso o juiz recuse a homologação do acordo, remeterá novamente às partes para
as adequações necessárias. Ou seja: com o Pacote Anticrime, em perfeita consonância com o Sistema
Acusatório, não pode mais o juiz fazer alterações para adequar as tratativas ao caso concreto!

ANTES DA LEI 13.964/19 DEPOIS DA LEI 13.964/19

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O juiz poderá recusar homologação à proposta que O juiz poderá recusar a homologação da proposta
não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao que não atender aos requisitos legais, devolvendo-
caso concreto. a às partes para as adequações necessárias.

Cabe recurso da decisão que recusar homologação à colaboração premiada?


R.: SIM! Mas cuidado, pois os Tribunais Superiores e a doutrina divergem acerca do recurso cabível.
Segundo o STF (Inf. 1004), da decisão que RECUSAR A HOMOLOGAÇÃO, será cabível HC!
Por outro lado, segundo o STJ (Inf. 683), da decisão judicial que RECUSAR A HOMOLOGAÇÃO, será
cabível APELAÇÃO!

j) Retratação do acordo

§10º As partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas


autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas
exclusivamente em seu desfavor.

Tanto o MP quanto o acusado podem se arrepender da proposta formulada. Em caso de retratação,


as provas que já foram apresentadas pelo colaborador
não podem ser utilizadas exclusivamente em
desfavor do colaborador, mas podem alcançar terceiras pessoas (ex.: extrato bancário apresentado pelo
colaborador que demonstra movimentações financeiras da organização).
Caiu em prova Delegado BA/2018! Considere o seguinte caso hipotético.

O criminoso “X”, integrante de uma determinada organização criminosa, após a sentença que o condenou
pela prática do crime, decide voluntariamente e na presença de seu defensor, colaborar com as
investigações. Nas suas declarações, “X” revela toda a estrutura hierárquica e a divisão de tarefas da
organização. Alguns dias após, arrepende-se e decide retratar-se das declarações prestadas. Diante do
exposto e nos termos da Lei no 12.850/2013, é correto afirmar que
na hipótese de retratação, as provas produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas em seu
desfavor, mas apenas em detrimento dos interesses dos coautores e partícipes. (item correto)

k) Momento para manifestação do réu delatado: O STF, ao apreciar o HC 157.627 AgR/PR, julgado em 2019,
havia entendido que o réu delatado teria o direito de apresentar suas alegações finais somente após o réu
delator. (STF, Info 949).
Esse entendimento jurisprudencial foi positivado pelo legislador do Pacote Anticrime no §10-A:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Art. 4º, Lei nº 12.850/13. (...) §10-A Em todas as fases do processo, deve-se garantir
ao réu delatado a oportunidade de manifestar-se após o decurso do prazo
concedido ao réu que o delatou.

Importante ressaltar que o §10-A não se refere somente à ordem de apresentação dos memoriais,
mas, genericamente, à todas as fases do processo, determinando que o acusado delatado deve ter a
oportunidade de se manifestar após o delator.

l) Registro das tratativas e dos atos de colaboração

O §13 teve sua redação alterada pelo Pacote Anticrime:

ANTES DA LEI 13.964/19 DEPOIS DA LEI 13.964/19


Sempre que possível, o registro dos atos de O registro das tratativas e dos atos de colaboração
colaboração será feito pelos meios ou recursos de deverá ser feito pelos meios ou recursos de
gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica
similar, inclusive audiovisual, destinados a obter similar, inclusive audiovisual, destinados a obter
maior fidelidade das informações. maior fidelidade das informações, garantindo-se a
disponibilização de cópia do material ao
colaborador

m) Não exercício do direito ao silêncio e compromisso legal

Art. 4º, Lei nº 12.850/13. (...)


§ 11. A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia.
§ 12. Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador
poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da
autoridade judicial. (...)
§14 Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu
defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a
verdade.

ATENÇÃO PARA A REDAÇÃO DO §14: O legislador utilizou uma expressão equivocada. O direito
constitucional ao silêncio é irrenunciável, pois trata-se de direito fundamental.

Esse dispositivo, portanto, deve ser relido. Na colabora


ção premiada HÁ UMA OPÇÃO VOLUNTÁRIA
E ASSISTIDA PELO NÃO EXERCÍCIO do direito ao silêncio.

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DELEGADO SÃO PAULO

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Em outras palavras: não há renúncia ao direito ao silêncio, mas uma mera opção do colaborador por
não o exercê-lo. Ademais, se se tratasse de renúncia, o caráter indisponível do direito ao silêncio conduziria
à nulidade absoluta do acordo de colaboração premiada, por ilicitude do objeto,

n) Valor probatório relativo da colaboração premiada: O Pacote Anticrime deu nova redação ao § 16 para
estabelecer que somente as declarações do colaborador não são suficientes para:
✔ Decretar medidas cautelares pessoais ou reais;
✔ Receber a denúncia ou queixa;
✔ Proferir sentença condenatória.

ANTES DA LEI 13.964/19 DEPOIS DA LEI 13.964/19


Nenhuma sentença condenatória será proferida Nenhuma das seguintes medidas será decretada
com fundamento apenas nas declarações de ou proferida com fundamento apenas nas
agente colaborador. declarações do colaborador:
I - medidas cautelares reais ou pessoais;
II - recebimento de denúncia ou queixa-crime;
III - sentença condenatória.

Isso significa dizer que a colaboração premiada tem valor probatório relativo. Não é possível
condenar única e exclusivamente com as informações prestadas pelo colaborador. A ela devem se somar
outros elementos probatórios.
Sem embargo, as declarações acompanhadas de outras provas e elementos de corroboração
fornecidos pelo colaborador podem ser suficientes a demonstrar a necessidade das medidas.
Segundo a doutrina a restrição imposta pelo §16 do art. 4º também é aplicável às ações em que o
acordo de colaboração funcionar como prova emprestada.

Enunciado 14 da I Jornada de Direito Penal e Processo Penal CJF/STJ - As restrições


previstas no § 16 do art. 4º da Lei n. 12.850/2013, com a redação dada pela Lei n.
13.964/2019, aplicam-se também aos processos penais para os quais a colaboração
premiada foi trasladada como prova emprestada.

o) Rescisão do acordo de colaboração premiada: O Pacote previu hipóteses em que o acordo poderá ser
rescindido:
1) No caso de omissão dolosa sobre os fatos objetos da colaboração;
2) No caso de o colaborador permanecer envolvido em práticas criminosas relacionadas ao
objeto da colaboração.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Da interpretação literal do dispositivo, extrai-se que a manutenção de envolvimento em condutas


criminosas não relacionadas ao objeto da colaboração não teria o condão de possibilitar a rescisão do acordo,
daí a importância de cláusula expressa nesse sentido.

p) Descumprimento da colaboração premiada: O descumprimento de acordo anterior invalida o pacto


atual atinente a fato delitivo diverso?
Essa questão já foi levada ao STF que entendeu que o descumprimento de acordo anterior não
significa que ele descumprirá novamente o acordo atual. A doutrina afirma que o ideal seria não agraciar
esse colaborador com o perdão judicial. Veja a jurisprudência sobre o tema:

Inf. 862, 1ª T. STF – 2017: O descumprimento de colaboração premiada não


justifica, por si só, prisão preventiva. Não se pode decretar a prisão preventiva do
acusado pelo simples fato de ele ter descumprido acordo de colaboração premiada.
Não há, sob o ponto de vista jurídico, relação direta entre a prisão preventiva e o
acordo de colaboração premiada. Tampouco há previsão de que, em decorrência
do descumprimento do acordo, seja restabelecida prisão preventiva anteriormente
revogada. Por essa razão, o descumprimento do que foi acordado não justifica. É
necessário verificar, no caso concreto, a presença dos requisitos da prisão
preventiva, não podendo o decreto prisional ter como fundamento apenas a
quebra do acordo.

Inf. 609, 6ª T. STJ – 2017: O descumprimento de acordo de delação premiada ou a


frustração na sua realização, isoladamente, não autoriza a imposição da
segregação cautelar. É preciso observar a presença dos requisitos delineados no
art. 312 do Código de Processo Penal. A prisão provisória, por esse motivo, somente
pode ser imposta se for necessária para garantir a ordem pública, a ordem
econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação
da lei penal.

q) Direitos dos colaboradores

Art. 5º, Lei nº 12.850/13. São direitos do colaborador:


I - Usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica (trata-se da
Lei nº 9.807-99);
II - Ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados;
III - ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes
(a intenção é preservar a incolumidade física do colaborador);
IV - Participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

V - Não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser
fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;
VI - Cumprir pena ou prisão cautelar em estabelecimento penal diverso dos
demais corréus ou condenados (alterado pelo Pacote Anticrime);

r) Sigilo da colaboração premiada

Art. 7º, Lei nº 12.850/13. O pedido de homologação do acordo será sigilosamente


distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o
colaborador e o seu objeto.
§ 1º As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente
ao juiz a que recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito)
horas.
§ 2º O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de
polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando
-se ao
defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que
digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de
autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento. (...)

O §2º se refere ao defensor do colaborador ou ao(s) defensor(es) dos demais integrantes da


organização criminosa?
Para o autor Renato Brasileiro de Lima, o art. 7º, §2º, se refere ao defensor responsável pela defesa
técnica dos demais integrantes da ORCRIM, eventualmente delatados na colaboração efetivada. Segundo o
autor, não faria sentido ser o defensor do próprio colaborador, pois é condição indispensável para a
legalidade do acordo, a participação da defesa técnica em todos os atos da celebração do acordo, tendo esta
o pleno acesso a todos os elementos de informação que digam respeito ao investigado colaborador.

§3º O acordo de colaboração premiada e os depoimentos do colaborador serão


mantidos em sigilo até o recebimento da denúncia ou da queixa-crime, sendo
vedado ao magistrado decidir por sua publicidade em qualquer hipótese.

O acordo de colaboração e seus documentos ficarão em sigilo até o recebimento da denúncia, não
sendo possível sua anterior publicidade em qualquer hipótese, sob pena de incorrer em crime previsto pela
Lei de Organização Criminosa.
Em outras palavras: recebida a denúncia, o acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso.
Caso o juiz descumpra o sigilo, responderá pelo crime de violação de sigilo funcional, previsto no art.
325 do Código Penal.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

ANTES DA LEI 13.964/19 DEPOIS DA LEI 13.964/19


O acordo de colaboração premiada deixa de Serão mantidos em sigilo até o recebimento da denúncia
ser sigiloso assim que recebida a denúncia, ou da queixa-crime, sendo vedado ao magistrado decidir
observado o disposto no art. 5º . por sua publicidade em qualquer hipótese.

4.2. Ação Controlada

Art. 8º, Lei nº 12.850/13. Consiste a ação controlada em retardar a intervenção


policial ou administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a
ela vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a
medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação de provas e
obtenção de informações.
§ 1o O retardamento da intervenção policial ou administrativa será previamente
comunicado ao juiz competente que, se for o caso, estabelecerá os seus limites e
comunicará ao Ministério Público.
§ 2o A comunicação será sigilosamente distribuída de forma a não conter
informações que possam indicar a operação a ser efetuada.
§ 3 o Até o encerramento da diligência, o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao
Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das
investigações.
§ 4o Ao término da diligência, elaborar-se-á auto circunstanciado acerca da ação
controlada.
Art. 9º, Lei nº 12.850/13. Se a ação controlada envolver transposição de fronteiras,
o retardamento da intervenção policial ou administrativa somente poderá ocorrer
com a cooperação das autoridades dos países que figurem como provável itinerário
ou destino do investigado, de modo a reduzir os riscos de fuga e extravio do
produto, objeto, instrumento ou proveito do crime.

Conhecida como flagrante postergado, a ação controlada consiste no retardamento de intervenção


policial ou administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa,
O instituto da ação controlada é previsto em outros diplomas normativos, a saber:
· Lei de Lavagem - art. 1º, §6º da Lei 9.613/98: - Introduzido expressamente pelo Pacote
Anticrime!
· Lei de Drogas - art. 53, II da Lei 11.343/06;
· Lei de Antiterrorismo - Art.16, Lei 13.260/16;
· Lei de repressão ao tráfico de pessoas - Art.9º, Lei 13.344/2016.

Considerações importantes:
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Na Lei de Organização criminosa, a ação controlada NÃO DEPENDE DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL,


bastando mera comunicação ao juiz competente. (Diferentemente da ação controlada na Lei de
autorização judicial e prévia oitiva do MP!)
Drogas e Lei de Lavagem, em que há necessidade de

A ação controlada prevista no § 1º do art. 8º da Lei nº 12.850/2013 independe de


autorização, bastando sua comunicação prévia à autoridade judicial. STJ. 6ª Turma.
HC 512.290-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 18/08/2020 (Info 677).

● O juiz pode estabelecer um prazo máximo de duração da ação controlada, findo o qual a autoridade
policial é obrigada a representar pela prorrogação da medida.
● A quebra do sigilo previsto no §2º faz incidir o crime previsto no art.20 da lei.
● Até o encerramento das diligências, o acesso aos autos é restrito ao juiz, MP e Delegado de Polícia.

4.3. Infiltração De Agentes

a) Conceito: Trata-se de técnica especial por meio da qual um agente de polícia é introduzido
dissimuladamente em uma organização criminosa, passando a agir como um dos seus integrantes,
ocultando sua identidade e agindo como objetivo precípuo a identificação de fontes de prova e obtenção
de informações capazes de permitir a desarticulação da referida associação.

Caiu em prova Delegado RR/2022! De acordo com o artigo 10 da Lei nº 12.850/2013 – Organização
Criminosa: “A _______ em tarefas de investigação, representada pelo delegado de polícia ou requerida pelo
Ministério Público, após manifestação técnica do delegado de polícia quando solicitada no curso de
________, será precedida de circunstanciada, motivada e sigilosa ________, que estabelecerá seus limites”.
Assinale a alternativa que preenche, correta e respectivamente, as lacunas.
infiltração de agentes de polícia … inquérito policial … autorização judicial. (item correto)

b) Autorização judicial: Demanda autorização judicial, mediante requerimento do MP ou representação


do delegado de polícia, sob pena de não serem lícitas as provas colhidas durante a empreitada.
∘ Requerimento do MP – exige a manifestação técnica do delegado, quando feita em sede de
inquérito policial.
∘ Representação do Delegado – antes de decidir, o juiz deve ouvir o MP!

O Juiz decidirá o pedido no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, após manifestação do MP na hipótese
de representação do delegado de polícia.
A decisão judicial acerca da infiltração deve:
✔ Ser prévia, circunstanciada, motivada e sigilosa.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

✔ Deve estabelecer os limites da infiltração


✔ Deve adotar as medidas necessárias para o êxito das investigações e a segurança do agente
infiltrado.

É importante deixar claro que são ilegais as provas obtidas por policial militar que, designado para
coletar dados nas ruas como agente de inteligência, passa a atuar, sem autorização judicial, como agente
infiltrado em grupo criminoso, ou seja, A MATÉRIA É AFETA À CLÁUSULA DE RESERVA DE JURISDIÇÃO, como
orienta o STF.
c) Prazo máximo: Possui o prazo máximo de 06 meses, prorrogáveis indefinidamente. A prorrogação não
é automática e exige decisão fundamentada no sentido de ser indispensável como meio de prova.

d) Características indispensáveis à infiltração de agentes:


· Ser agente policial –não se admite a infiltração de particulares.
· Atuação deve se dar de maneira disfarçada.
· Prévia autorização judicial
· Demonstração do fumus comissi delicti.
· Demonstração da indispensabilidade da infiltração.
· Anuência do agente policial.
· A inserção deve se dar de maneira estável. Trata-se de procedimento duradouro, longo.
· Agir com o objetivo de identificação de fontes de prova.

e) A infiltração de agentes é prevista em outros diplomas normativos:


· Lei de lavagem - art. 1º, §6º da L ei 9613/98: - Introduzido expressamente pelo Pacote Anticrime!
· Lei de drogas - art. 53, I da Lei 11.343/06.
· Lei antiterrorismo - art.16, Lei 13.260
· Lei tráfico de pessoas – art. 9º.
· Estatuto da Criança e do Adolescente – art. 190-A (infiltração virtual).

f) Agente infiltrado x agente de inteligência

Agente de INTELIGÊNCIA Agente INFILTRADO


Tem uma função preventiva e genérica, busca Age com finalidades repressivas e investigativas
informações de fatos sociais relevantes ao em busca da obtenção de elementos probatórios
governo. relacionados a fatos supostamente criminosos e
organizações criminosas específicas.
Sua atuação não precisa de autorização judicial. A infiltração somente pode ocorrer mediante
prévia autorização judicial.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

g) Responsabilidade penal do agente infiltrado

E os crimes que o agente infiltrado vier a ser obrigado a praticar? Quais são os limites?
O art. 13, §único prevê que os crimes praticados pelo agente infiltrado estarão acobertados por uma
causa de exclusão da culpabilidade, em razão da inexigibilidade de conduta diversa.
h) Modalidades de infiltração:
▪ Deep Cover – infiltração profunda, que normalmente dura mais de 6 meses (em razão das
renovações).
▪ Light Cover – infiltração mais branda, em que o agente não perde contato com familiares e,
normalmente, dura menos de meses (pode se resumir a um único encontro).

i) Agente infiltrado e ambiente cibernético


A infiltração virtual foi inserida pelo Pacote Anticrime!

Passa a ser admitida a infiltração virtual de agentes policiais para a investigação do crime de
organização criminosa e conexos quando houver indícios da infração penal de que trata o art. 1º desta Lei, e
a prova não puder ser produzida por outros meios.
▪ Em regra – o fumus comissi delicti significa indícios de autoria + prova de materialidade.
▪ Exceção - para a infiltração de agentes, o fumus comissi delicti se limita à indicação de meros
indícios da existência de uma OCRIM.

O requerimento da infiltração virtual deve conter:


● Demonstração da necessidade da medida
● Alcance das tarefas dos policiais – buscando conferir um maior conhecimento ao juiz, o que
permite um controle prévio em caso de eventual abuso de autoridade
● Indicar nome/apelido dos investigados
● Indicar local da infiltração
● Indicar dados de conexão (hora, data, endereço de IP) ou dados cadastrais (nome e endereço
do usuário do IP, por exemplo), que permitam a identificação dos investigados.

Características importantes:
● Possui prazo máximo de até 6 meses, renováveis.
● Não pode ultrapassar a duração total de 720 dias, sempre comprovada a necessidade,
sendo nula a prova que não observar o procedimento legalmente previsto.
● É obrigatória a oitiva do Ministério Público antes do deferimento da medida, em caso de

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

representação pelo Delegado de Polícia.


● Buscando dar maior segurança à utilização desta técnica investigatória, resta previsto que
todos os atos praticados durante a operação deverão ser registrados, gravados e
armazenados, e serem apresentados ao juiz ao final da medida.
● Por se tratar de medida de obtenção de prova irrepetível, neste caso, os autos deverão de
apensados aos principais quando da remessa ao juiz da instrução e julgamento (art. 3º-C, §3°,
CPP).
SUGERIMOS A LEITURA DOS DEMAIS DISPOSITIVOS ACERCA DA INFILTRAÇÃO DE AGENTES

4.4. Do Acesso a Registros, Dados Cadastrais, Documentos e Informações

A lei prevê a possibilidade de, sem autorização judicial prévia, o MP e o delegado a terem acesso a
dados cadastrais de pessoas investigadas.

Caiu em prova Delegado SP/2018! No que concerne às disposições da Lei no 12.850/2013 (Lei de Combate
às Organizações Criminosas), é correto afirmar que o Delegado de Polícia terá acesso, independentemente
de autorização judicial, apenas aos dados cadastrais do investigado que informem exclusivamente a
ituições
qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, inst
financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de crédito. (item correto)

CUIDADO:
● A lei permite o acesso exclusivo a qualificação pessoal, filiação e endereço. Não é possível utilizar esse
dispositivo para ter acesso a informações sobre informações bancarias, telefônicas, etc. Nesse caso,
haveria proteção constitucional da intimidade e privacidade
● Esse dispositivo é constitucional, pois são dados de conhecimento público, dados cadastrais trocados
pelas próprias empresas entre si. São dados não acobertados pelo sigilo da intimidade e privacidade.

Observações importantes:
● Esse dispositivo pode ser invocado para a apuração de qualquer delito. O legislador não teve a
intenção de limitar seu escopo à lavagem ou às infrações penais praticadas por organização criminosa
● Crime do art. 21 da Lei 12.850/13 em caso de recusa ou omissão de dados cadastrais requisitados.
● O art.17-B da Lei 9.613 (Lei de Lavagem de Capitais) tem redação praticamente idêntica ao art.15 da
Lei 12.850.
● O art.13-A, CPP, inserido pela Lei 13.344-16 traz uma peculiaridade em relação à previsão da lei de
ORCRIM. – prazo de 24 horas para atender à requisição.

ART. 15, LEI 12.850/13 ART. 13-A, CPP

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DELEGADO SÃO PAULO

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- O delegado pode requisitar dados cadastrais do - O delegado poderá solicitar dados tanto dos
investigado. suspeitos quanto da vítima.
- Não traz prazo para atendimento da requisição. - Prevê prazo de até 24h para que seja atendida a
solicitação.

5. DOS CRIMES OCORRIDOS NA INVESTIGAÇÃO E NA OBTENÇÃO DA PROVA

a) Considerações Iniciais: São infrações penais que buscam assegurar a eficácia, eficiência dos meios de
obtenção de prova.
b) Características comuns aos crimes: Esses crimes visam proteger as técnicas especiais de investigação
previstas no art. 3º.
Constituem ofensa à atividade persecutória do estado, então, o bem jurídico tutelado aqui é a
administração da justiça e não a paz pública.
Todos os crimes são de ação penal pública incondicionada.
O prazo para encerramento da instrução, estando o investigado preso, não poderá exceder 120 dias,
prorrogáveis por igual período.

5.1. Revelação da Identidade do Colaborador

Art. 18, Lei nº 12.850/13. Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador,


sem sua prévia autorização por escrito:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Trata-se de crime comum, uma vez que não se exige qualidade especial do agente.
O sujeito passivo será necessariamente o colaborador, que é exposto pelo agente. Se revelar a
identidade de agente infiltrado, poderá incorrer no crime do art. 20 da presente Lei.
Trata-se de tipo misto alternativo, visto que o núcleo do tipo é composto por três núcleos e a pratica
cumulativa deles não gera concurso de crimes, mas sim crime único.
Trata-se de crime formal, vez que não se exige o implemento de nenhum resultado naturalístico para
a consumação.
Trata-se de delito de médio potencial ofensivo, uma vez que em virtude da pena mínima cominada
é cabível suspensão condicional do processo.
É preciso que a conduta alcance terceiras pessoas?
Na ação de revelar sim, então, só há crime se essa conduta alcançar terceira pessoa. Nas ações de
fotografar e de filmar, não há necessidade de alcançar terceira pessoa, pois a própria ação já configura o
crime.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

5.2. Crime de Colaboração Caluniosa ou Fraudulenta

Art. 19, Lei nº 12.850/13. Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a
Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar
informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

a) Condutas:
● Colaboração caluniosa = consiste em imputar (atribuir) falsamente a pessoa (certa e determinada)
que sabe ser inocente a prática de infração penal relacionada à organização criminosa. Portanto, a
colaboração criminosa recai sobre a pessoa.

OBS.1: Não se confunde com a denunciação caluniosa (art. 339, CP), pois dispensa que da falsa imputação
ocorra a instauração de procedimento oficial em face do inocente imputado. Assim, se a partir da
colaboração inverídica for instaurado procedimento em face de pessoa que até então não estava sendo
investigada, migraremos do crime de colaboração caluniosa para o crime de denunciação caluniosa, cuja
pena é muito maior.

COLABORAÇÃO CALUNIOSA DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA


ART. 19, LEI 12.850/13 ART. 339, CP
Art. 19. Imputar falsamente, sob pretexto. de Art. 339, CP. Dar causa à instauração de inquérito
colaboração com a Justiça, a prática de infração policial, de procedimento investigatório criminal, de
penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar processo judicial, de processo administrativo
informações sobre a estrutura de organização disciplinar, de inquérito civil ou de ação de
criminosa que sabe inverídicas: improbidade administrativa contra alguém,
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou
ato ímprobo de que o sabe inocente:
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.
É crime formal – se aperfeiçoa independente de É crime material – se aperfeiçoa com a efetiva
qualquer providência oficial do estado contra instauração do processo em face de alguém.
alguém.

● Colaboração inverídica ou fraudulenta = consiste em revelar (dar conhecimento) informações que


sabe inverídicas acerca da estrutura da organização criminosa. Portanto, recai sobre a burocracia da
organização criminosa.
· Trata-se de crime comum, uma vez que não se exige qualidade especial do agente.
· O sujeito passivo é a administração da justiça, que recebeu falsamente a imputação.

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DELEGADO SÃO PAULO

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· Trata-se de tipo penal misto alternativo, visto que o núcleo do tipo é composto por dois
núcleos e a pratica cumulativa deles não gera concurso de crimes.
· Trata-se de crime formal, vez que não se exige o implemento de nenhum resultado
naturalístico para a consumação.
· Trata-se de delito de médio potencial ofensivo, uma vez que em virtude da pena mínima
cominada é cabível suspensão condicional do processo.

Observe que a utilização das expressões “sabe ser inocente” e “sabe inverídicas” inviabilizam a
punição do agente a título de dolo eventual.

5.3 Quebra de Sigilo das Investigações

Art. 20, Lei nº 12.850/13. Descumprir determinação de sigilo das investigações que
envolvam a ação controlada e a infiltração de agentes:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa

● Crime próprio - pessoa que atua na persecução penal do crime organizado, possuindo o dever de
guardar sigilo. A manutenção do sigilo é inerente ao seu emprego, cargo ou função. Pessoas que não
atuante na
tenham essa atribuição podem concorrer para o crime. Mas o autor tem que ser
persecução.
● O sujeito passivo é concorrentemente administração da justiça, e o agente infiltrado, que será posto
em situação de risco.
● Trata-se de crime formal, vez que não se exige o implemento de nenhum resultado naturalístico para
a consumação.
● Trata-se de delito de médio potencial ofensivo, uma vez que em virtude da pena mínima cominada
é cabível suspensão condicional do processo.
● O crime de violação de sigilo das investigações do art. 20 da Lei nº 12.850/13 é especial em relação
ao crime de violação de sigilo funcional previsto no art. 325, CP.

CP, Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva
permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime
mais grave.

CUIDADO!
Esse crime refere-se apenas ao descumprimento do sigilo atinente à infiltração policial e à ação
controlada, não englobando o sigilo da colaboração premiada, sob pena de configurar analogia in malan

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DELEGADO SÃO PAULO

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partem. Nesta hipótese, restará configurado o crime de violação de sigilo profissional, previsto no art. 325
do Código Penal.

5.4. Sonegação de Informações Requisitas

Art. 21, Lei nº 12.850/13. Recusar ou omitir dados cadastrais, registros,


documentos e informações requisitadas pelo juiz, Ministério Público ou delegado
de polícia, no curso de investigação ou do processo:
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem, de forma indevida, se apossa,
propala, divulga ou faz uso dos dados cadastrais de que trata esta Lei.

Aqui há uma infração penal de menor potencial ofensivo que se processa pelo rito ordinário. Essa
infração é compatível com os institutos despenalizadores, mas esse crime será processado pelo rito
ordinário, conforme art. 22.

● Trata-se de crime comum, uma vez que não se exige qualidade especial do agente.
● O sujeito passivo é a administração da justiça.
● Trata-se de crime formal, vez que não se exige o implemento de nenhum resultado naturalístico para
a consumação.

MOMENTO CONSUMATIVO TENTATIVA

Núcleo verbal recusar Consuma-se com a Plurissubjetivo – admite tentativa


exteriorização da recusa.
Núcleo verbal omitir Consuma-se com omissão – Crime omissivo próprio – não admite
inércia após um lapso tentativa.
temporal.

● Trata-se de delito de médio potencial ofensivo, uma vez que em virtude da pena mínima cominada
é cabível suspensão condicional do processo.

DIVULGAÇÃO INDEVIDA DOS DADOS CADASTRAIS


Art. 21, Lei nº 12.850/13. (...)
Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem, de forma indevida, se apossa,
propala, divulga ou faz uso dos dados cadastrais de que trata esta Lei.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O consentimento do titular dos dados cadastrais redunda na atipicidade da conduta ou na exclusão


da ilicitude?
R..: Esse consentimento não é válido, pois o bem jurídico que estamos aqui tratando é indisponível.
O saudável caminhar da persecução penal com base na sigilosidade é importante para o estado, por este
motivo, o consentimento não invalida o crime.

6. PROCEDIMENTO PARA OS CRIMES PREVISTOS NA LEI.

Art. 22, Lei nº 12.850/13. Os crimes previstos nesta Lei e as infrações penais
conexas serão apurados mediante procedimento ordinário previsto no Decreto-Lei
nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), observado o
disposto no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único. A instrução criminal deverá ser encerrada em prazo razoável, o


qual não poderá exceder a 120 (cento e vinte) dias quando o réu estiver preso,
prorrogáveis em até igual período, por decisão fundamentada, devidamente
motivada pela complexidade da causa ou por fato procrastinatório atribuível ao
réu.

Art. 23, Lei nº 12.850/13. O sigilo da investigação poderá ser decretado pela
autoridade judicial competente, para garantia da celeridade e da eficácia das
diligências investigatórias, assegurando-se ao defensor, no interesse do
representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao
exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial,
ressalvados os referentes às diligências em andamento.

Parágrafo único. Determinado o depoimento do investigado, seu defensor terá


assegurada a prévia vista dos autos, ainda que classificados como sigilosos, no
prazo mínimo de 3 (três) dias que antecedem ao ato, podendo ser ampliado, a
critério da autoridade responsável pela investigação.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: ESTATUTO DO IDOSO

Nos termos do art. 1° da Lei n° 10.741/03 modificado pela Lei 14.423/2022: É instituído o Estatuto da
Pessoa Idosa, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos em obediência aos mandamentos constitucionais, bem como em obediência ao princípio da
proteção integral à pessoa idosa. Por força do princípio da proteção integral à pessoa idosa, recai sobre o
Estado e à família o dever de garantir prioritariamente a preservação da saúde mental e física, da liberdade
e da dignidade da pessoa idosa.
Idoso é a pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. Este é, portanto, o sujeito passivo
dos delitos previstos no Estatuto do Idoso.

Logo, pessoa idosa é MAIOR ou IGUAL a 60 anos!


Obs.: Com o advento da Lei n° 13.466/2017, passou a vigorar a regra de que dentre os idosos, é
assegurada prioridade especial aos maiores de 80 anos.
Diante do aumento da expectativa de vida do brasileiro, o legislador criou uma espécie de prioridade
especial na concretização dos direitos e defesa dos interesses dos idosos. Com o advento da Lei n°
13.466/2017, passou a vigorar a regra de que dentre os idosos, é assegurada prioridade especial aos maiores
de oitenta anos, atendendo-se suas necessidades sempre preferencialmente em relação aos demais idosos.

1. APLICAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI 9.099/95

Importante!!!

Art. 94. Aos crimes previstos nesta Lei, cuja pena máxima privativa de liberdade
não ultrapasse 4 (quatro) anos, APLICA-SE o procedimento previsto na Lei
no 9.099, de 26 de setembro de 1995, e, subsidiariamente, no que couber, as
disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal. (Vide ADIN 3.096-5 -
STF)

Assim, o procedimento sumaríssimo cabível para as infrações penais de menor potencial ofensivo será,
excepcionalmente, aplicado aos crimes tipificados no Estatuto do Idoso cuja pena máxima não ultrapasse 4
(quatro) anos. De fato, é o procedimento mais célere possível no ordenamento jurídico brasileiro.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento nos autos da ADI n° 3096-


5, entendeu que o mencionado art. 94 é constitucional, todavia conferiu
"interpretação conforme a Constituição Federal do Brasil, com redução de texto,
para suprimir a expressão 'do Código Penal e'. Aplicação apenas do procedimento
sumaríssimo previsto na Lei n° 9.099/95: benefício do idoso com a celeridade
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

processual. Impossibilidade de aplicação de quaisquer medidas despenalizadoras e


de interpretação benéfica ao autor do crime" (ADI - 3096-5 STF).

ATENÇÃO! Aos crimes previstos no Estatuto do Idoso, mesmo que sujeitos a penas privativas de liberdade
superiores a dois anos e inferiores a quatro anos, aplicam-se os institutos despenalizadores previstos na Lei
n.º 9.099/1995 (Juizados Especiais Criminais).

Logo, funciona dessa forma:

Pena igual ou inferior a 2 (dois) anos Pena superior a 2 (dois) anos e que não ultrapasse
4 (quatro)
Aplica-se o procedimento sumaríssimo, bem como Aplica-se apenas o procedimento sumaríssimo,
as medidas despenalizadoras. NÃO se aplicando as medidas despenalizadoras.

RESUMO:

- Aplicação das normas exclusivamente processuais previstas na Lei n° 9.099/95:


com o objetivo de impor celeridade nas ações penais cujo objeto seja o processo
e julgamento de crimes contra idosos, apenas as normas de cunho puramente
processual cabíveis às infrações penais de menor potencial ofensivo serão
aplicadas aos crimes previstos na Lei n° 10.741/03;

- Impossibilidade de aplicação das normas materiais previstas na Lei n° 9.099/95:


como a aplicação do procedimento sumaríssimo tem como finalidade única impor
celeridade processual, o art. 94 da Lei n° 10.741/03 não poderia ter o condão de
viabilizar a aplicação de benefícios sobre quem vier a praticar crimes contra idosos.
Dessa forma, não será admitida a aplicação de benefícios despenalizadores
previstos na Lei n° 9.099/95 tais como a composição civil dos danos, a transação
penal, a suspensão condicional do processo, dentre outros, aos crimes contra
idosos.

1.1 Ação penal e inaplicabilidade das escusas absolutórias (Art.95)

Art. 95. Os crimes definidos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada,
não se lhes aplicando os arts. 181 e 182 do Código Penal.

Os crimes tipificados no Estatuto do Idoso serão perseguidos mediante ação penal pública incondicionada.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O artigo em comento prescreve ser inaplicáveis as chamadas escusas absolutórias (art. 181) relativas
(art. 182) Código Penal sobre os crimes patrimoniais contra idosos.

Vamos relembrar o que são escusas absolutórias?


● Imunidades absolutas
Prevalece ser causa extintiva da punibilidade ou causas pessoais de exclusão da pena.
Assim, apesar de o delito restar configurado (consistindo em um fato: típico, antijurídico e culpável),
por questões de política criminal é inviável o exercício da pretensão punitiva.
No entanto, alguns autores criticam o termo e dizem que seriam, na verdade, causas de exclusão da
punibilidade / causas negativas da punibilidade, pois impediria o próprio surgimento da punibilidade do
agente.
● Imunidades relativas:
Trata-se de condição específica de procedibilidade da ação penal pública, já que convertem a ação
penal pública incondicionada e condicionada à representação.

Art. 181, CP. É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste
título, em prejuízo:
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil
ou natural.

Art. 182, CP. Somente se procede mediante representação, se o crime previsto


neste título é cometido em prejuízo:
I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado;
II - de irmão, legítimo ou ilegítimo;
III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

EXCLUSÃO DAS IMUNIDADES


Art. 183, CP.
Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores:
I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de
grave ameaça ou violência à pessoa;
II - ao estranho que participa do crime.
III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos.

O próprio Estatuto do Idoso acrescentou o inciso III no art. 183 do Código Penal
para impossibilitar a aplicação das escusas previstas nos dois artigos anteriores
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

quando o crime tiver sido praticado contra pessoa com idade igual ou superior a
60 (sessenta) anos.

● Bem jurídico tutelado: preservação da saúde física e mental do idoso, além de seu aperfeiçoamento
moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

Importante!!! Cumpre destacar que, nos termos do art. 19 do Estatuto do Idoso, os casos de suspeita ou
confirmação de violência praticada contra idosos serão objeto de notificação compulsória (portanto,
obrigatória) pelos serviços de saúde públicos e privados à autoridade sanitária.

2. CRIMES EM ESPÉCIE

Foram tipificados treze delitos no Capítulo II do Título VI do Estatuto do Idoso e um delito previsto no
Título VII do mesmo diploma normativo em obediência ao mandado constitucional de criminalização
decorrente do princípio da proteção integral da pessoa idosa.

2.1 Discriminação da pessoa idosa

Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a


operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por
qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por
motivo de idade: Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
§ 1o Na mesma pena incorre quem desdenhar, humilhar, menosprezar ou
discriminar pessoa idosa, por qualquer motivo.
§ 2o A pena será aumentada de 1/3 (um terço) se a vítima se encontrar sob os
cuidados ou responsabilidade do agente.
§ 3º Não constitui crime a negativa de crédito motivada por superendividamento
da pessoa idosa. (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)

● Bem jurídico protegido: O exercício do direito de cidadania da pessoa idosa, corolário da dignidade
da pessoa humana.
● Sujeito ativo: Crime comum, qualquer pessoa.
● Sujeito passivo: É a pessoa idosa, definida como a pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta)
anos.
● Conduta: Discriminar, tratar de maneira desigual indevidamente.
Pode ocorrer de duas formas:

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

✔ Impedindo o exercício da cidadania: criar obstáculo completo o exercício da cidadania por pessoa
idosa;
✔ Dificultando o exercício da cidadania: dificultar o livre exercício da pessoa idosa, ou seja, o sujeito
passivo até conseguirá exercer seus direitos, todavia, com dificuldades diante do comportamento
discriminatório do sujeito ativo.

● Elemento subjetivo: Punido na modalidade dolosa. A finalidade específica no caput é por motivo de
idade, e na figura equiparada pessoa idosa por qualquer motivo.
● Figura equiparada: No §1° do art. 96 do Estatuto do Idoso, na mesma pena incorre quem desdenhar
tratar com desprezo, humilhar. Ou seja, constranger, menosprezar, diminuir a qualidade da pessoa
ou discriminar tratar de forma injusta pessoa idosa, por qualquer motivo.

Atenção!!! Cuidado para não confundir com o crime de injúria qualificada (art. 141, § 3°, do Código Penal).
No crime contra a honra, previsto no CP o fato de a vítima ser idosa é conditio sine qua non para a
configuração da ofensa. Já no delito de humilhação ao idoso o agente não se vale da condição de pessoa
idosa para ofender a vítima.

● Consumação: Na modalidade do caput trata-se de crime material, que se consuma no instante em


que o exercício da cidadania da pessoa idosa for efetivamente impedido ou dificultado.
● Tentativa: Em tese, é possível, todavia será de difícil configuração pois, na prática, os atos
executórios do impedimento poderão se manifestar em práticas que dificultem o livre exercício da
cidadania da vítima, configurando assim, a segunda modalidade do delito em estudo.

Já na modalidade prevista no §1° trata


-se de crime de mera conduta, consumando-se a partir da
prática de qualquer ato de desdém, humilhação, menosprezo ou discriminação de pessoa idosa, por qualquer
motivo. Sendo crime plurissubsistente, admite a tentativa.

● Excludente especial de ilicitude: Foi acrescentado §3° no delito em estudo para constar que "não
constitui crime a negativa de crédito motivada por superendividamento da pessoa idosa". Trata-se
de hipótese de excludente de ilicitude.

2.2 Omissão de socorro

Art. 97. Deixar de prestar assistência à pessoa idosa, quando possível fazê-lo sem
risco pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua
assistência à saúde, sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o socorro de
autoridade pública: (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)

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Pena – detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.


Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão
corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

● Bem jurídico protegido: De forma imediata o delito em estudo tutela de forma ampla a vida, a
integridade corporal e saúde da pessoa idosa. Também se protege a solidariedade humana.
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa, tratando-se de crime comum.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa em situação de iminente perigo ou que careça de assistência à saúde.
● Conduta: Trata-se de uma modalidade especial do delito de omissão de socorro previsto no art. 135
do Código Penal.

Atenção! O agente deverá conhecer a condição especial de pessoa idosa em iminente perigo ou necessitada
de socorro da vítima, sob pena de desclassificação de seu comportamento para o crime do art. 135 do CP.

A primeira conduta, de deixar de prestar assistência ao idoso, quando possível fazê-lo sem risco
pessoal, em situação de iminente perigo exige apenas a mera inação do sujeito, é modalidade de crime
omissivo próprio. Além disso, se não for possível a prestação de socorro sem risco pessoal (ex.: o agente
também se encontrar em risco), não haverá crime.
Já na conduta de recusar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem justa causa trata-se de
crime comissivo, onde exige uma ação por parte do agente, no sentido de recusar, retardar ou dificultar a
assistência à saúde.

● Causas de aumento de pena: O parágrafo único do art. 97 do Estatuto do Idoso que a pena é
aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a
morte. Tratando-se de modalidade de crime preterdoloso.
● Consumação: O crime consuma-se quando o agente deixa de prestar assistência a pessoa idosa em
situação de iminente perigo, ou mesmo com a prática de qualquer ato capaz de configurar a recusa, demora
ou empecilho na assistência à saúde da vítima, ou com a omissão em pedir socorro de autoridade pública.
Nas modalidades omissivas próprias não será possível a tentativa por se tratar de crimes unissubsistentes. Já
nas modalidades comissivas, a tentativa é admitida, apesar de difícil configuração.

2.3 Abandono de pessoa idosa

Art. 98. Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa


permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando
obrigado por lei ou mandado:
Pena - detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Bem jurídico protegido: Protege-se a vida e a saúde psíquica e física da pessoa idosa, dependente
de cuidados.
● Sujeito ativo: Crime próprio exigindo-se a condição de pessoa responsável pelos cuidados e/ou
sustento da pessoa idosa, seja por lei, seja por mandado judicial.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa necessitada de cuidados.
● Conduta: Temos duas modalidades omissivas próprias a saber:

✔ Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres:


apesar de ser crime omissivo a sua ocorrência pressupõe a prática de uma ação, pois tem o ato de
levar a pessoa idosa até um hospital, casa de saúde, entidade de longa permanência como um asilo
ou congêneres. Trata-se de crime de perigo abstrato;
✔ Não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado: hipótese limitada às
pessoas que estão obrigadas por lei ou por ordem judicial a prover as necessidades básicas de pessoa
idosa.

Atenção! É preciso que essa omissão seja voluntária, pois, por exemplo, se o agente não possuir condições
financeiras para prover as necessidades básicas da pessoa idosa necessitada ou que tenha esquecido
se de
efetuar o pagamento dos valores relativos aos alimentos não haverá crime.

● Consumação: Trata-se de crime de voluntariedade dolosa, sendo este crime omissivo próprio, se
consumando com a inatividade do agente em abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de
longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou
mandado. É um crime unissubsistente (característica dos crimes omissivos próprios ou puros), não se
admitindo a tentativa.

2.4 Maus-tratos à pessoa idosa

Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, da pessoa idosa,
submetendo-a a condições desumanas ou degradantes ou privando-a de alimentos
e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-a a trabalho
excessivo ou inadequado: (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)
Pena – detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa.
§ 1o Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 2o Se resulta a morte:
Pena – reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.

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● Bem jurídico protegido: Tutela-se a saúde física e psíquica e a vida da pessoa idosa.
● Sujeito ativo: Na primeira parte, a exposição a perigo da integridade e da saúde, física ou psíquica
da pessoa idosa submetendo-o a condições desumanas ou degradantes é crime comum, podendo
ser praticado por qualquer pessoa.

Na segunda parte, a conduta de expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica privando a
pessoa idosa de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ao contrário da modalidade
anterior, exige do sujeito ativo a condição especial de pessoa obrigada a prover alimentos à pessoa idosa
(crime próprio).
Na terceira parte, sujeitando a trabalho excessivo ou inadequado, novamente, admite-se a prática
por qualquer pessoa, tratando-se de crime comum.

● Sujeito passivo: Pessoa idosa.


● Conduta: A conduta criminalizada é a conduta de expor a perigo a integridade e a saúde, física ou
psíquica, podendo ser praticada de duas formas:

✔ Submetendo a pessoa idosa a condições desumanas ou degradantes: Por condições desumanas


devemos entender como situações que criam sofrimento físico ou mental. Nesse caso, o crime é
material, onde se exige a concretização da submissão da pessoa idosa a condições desumanas ou
degradantes para a consumação. Sendo crime plurissubsistente, admite-se a tentativa.
✔ Privando a pessoa idosa de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo: Nessa
conduta o sujeito ativo deve ter condição especial de pessoa obrigada a prover alimentos à pessoa
idosa, ou seja, trata-se de crime próprio. Tal privação de alimentos pode ser total ou parcial. Ambos
podem configurar o crime. No caso da privação de cuidados indispensáveis, deve-se entender como
sendo a omissão em relação aos cuidados mínimos e necessários para a subsistência e materialização
dos direitos fundamentais da pessoa idosa.

Tratando-se de crime omissivo próprio ou puro consuma-se no exato instante em que o idoso é
privado de alimentos e cuidados indispensáveis. É uma modalidade incompatível com a tentativa.

✔ Sujeitando a pessoa idosa a trabalho excessivo ou inadequado: Trabalho excessivo é aquele em


condições exageradas, que ultrapassam os limites físicos da pessoa idosa, enquanto o trabalho
inadequado pode ser aquele incompatível com a condição de pessoa idosa do trabalhador. Trata-se
de modalidade é crime material, consumando- se no momento em que ocorre a efetiva submissão
de pessoa idosa a trabalho excessivo ou inadequado, admitindo-se a tentativa

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SEMANA 07/12

● Qualificadoras: Os parágrafos 1° e 2° do art. 99 do Estatuto do Idoso prescrevem duas qualificadoras


preterdolosas.

✔ Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
A expressão natureza grave deve ser entendida em sentido amplo, abrangendo, dessa forma, as
hipóteses de lesão corporal grave e gravíssima previstas nos §§i° e 2°, respectivamente, do art. 129 do Código
Penal.
✔ Se resulta a morte: Pena – reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.

Importante!!! Voluntariedade: todas as modalidades previstas no art. 99 do Estatuto do Idoso são dolosas
(direto ou eventual), não existindo a previsão de modalidade de natureza culposa.

Em ambas as hipóteses será necessária a demonstração de previsibilidade, ou seja, que o resultado mais
grave era ao menos previsível ao sujeito ativo conforme as circunstâncias do caso concreto, evitando-se a
responsabilidade objetiva.

2.5 Outros crimes contra a pessoa idosa

Art. 100. Constitui crime punível com reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e
multa:
I – obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público por motivo de idade;
II – negar a alguém, por motivo de idade, emprego ou trabalho;
III – recusar, retardar ou dificultar atendimento ou deixar de prestar assistência à
saúde, sem justa causa, a pessoa idosa;
IV – deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de
ordem judicial expedida na ação civil a que alude esta Lei;
V – recusar, retardar ou omitir dados técnicos indispensáveis à propositura da ação
civil objeto desta Lei, quando requisitados pelo Ministério Público.

● Bem jurídico protegido: O artigo 100 do Estatuto do Idoso apresenta em seus incisos delitos
autônomos que protegem bens jurídicos diversos, punidos com pena de reclusão de 6 (seis) meses a
1 (um) ano e multa.

☞ Para facilitar o estudo, vamos analisar cada inciso deste artigo:

I – obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público por motivo de idade;

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SEMANA 07/12

Obstar significa impedir o acesso (entrada) de pessoa a cargo público unicamente por motivo de
idade.
O bem jurídico protegido é o direito da pessoa idosa de poder ocupar cargo público.
É crime próprio em relação ao sujeito ativo é crime próprio já que só pode ser praticado pelo sujeito
que ostenta poder para impedir o acesso de pessoa a cargo público.
O obstáculo criado pelo sujeito ativo deve estar desprovido de amparo legal, isso porque o STF firmou
o entendimento de que é possível a limitação de acesso a cargo público com base na idade, desde que com
previsão anterior em lei e o respectivo cargo, por sua natureza, justifique a medida, conforme Súmula 683
do STF:

O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do


art. 7°, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das
atribuições do cargo a ser preenchido.

Trata-se de crime formal, logo, há consumação do crime com a prática de ato capaz de configurar
obstáculo ao acesso de pessoa idosa a qualquer cargo público por motivo de idade, sendo irrelevante se
houver posterior investidura no cargo por ordem judicial. Sendo delito plurissubsistente, admite-se a
tentativa.

II – negar a alguém, por motivo de idade, emprego ou trabalho;


Neste delito se tutela o direito de trabalhar, todavia, com a diferença de se referir a trabalho perante
a iniciativa privada. O crime é próprio em relação ao sujeito ativo pois só pode ser praticado por quem ostente
a atribuição de negar acesso a determinado cargo ou emprego.
Negar significa recusar alguém para a vaga a cargo ou emprego na iniciativa privada, sendo necessário
que seja por motivo de idade, elemento normativo do tipo para sua configuração. É delito formal,
consumando-se com a prática de ato capaz de configurar a negativa de acesso de pessoa idosa a emprego
ou trabalho por motivo de idade, independentemente de futura investidura no cargo por ordem judicial.
Sendo delito plurissubsistente, admite-se a tentativa.

III – recusar, retardar ou dificultar atendimento ou deixar de prestar assistência à saúde, sem justa
causa, a pessoa idosa;
Tutela-se o direito à saúde da pessoa idosa. Pode ser praticado por qualquer pessoa (crime comum).
Não se confunde com o delito previsto no art. 97 do Estatuto do Idoso, na medida em que o delito previsto
no inciso III do art. 100 é genérico e subsidiário, alcançando os casos em que a pessoa idosa não se encontra
em situação de iminente perigo.
O crime se consuma com a recusa, retardo ou ato de dificuldade ou inação na prestação de assistência
à saúde a pessoa idosa sem justa causa, mesmo que a vítima seja posteriormente atendida por outra pessoa.
Com exceção dos comportamentos omissivos, a tentativa é cabível.
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SEMANA 07/12

IV – deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida
na ação civil a que alude esta Lei.
Trata-se de modalidade especial do delito de desobediência, tutelando a Administração da Justiça. O
sujeito ativo neste delito é o agente que deve cumprir diretamente a ordem judicial. O Estatuto do Idoso
possibilita a concretização dos direitos difusos, coletivos e individuais da pessoa idosa por meio de ações de
natureza civil. Comumente em ações desta natureza a autoridade judicial determina liminarmente a
concretização de direitos.
Caso a ordem judicial seja descumprida, retardada em seu cumprimento ou frustrada de forma
voluntária e sem justo motivo o agente responderá pelo crime em estudo.
A modalidade omissiva se consuma no instante da inação, não se admitindo a tentativa por se tratar
de crime omissivo próprio. Já as modalidades comissivas consumam-se com a prática de ato capaz de atrasar
indevidamente ou de tornar inútil o cumprimento de ordem judicial. Sendo modalidades delitivas
plurissubsistentes, admite-se a tentativa.

V – Recusar, retardar ou omitir dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil objeto desta
Lei, quando requisitados pelo Ministério Público:
Tutela-se a administração da justiça, especificamente em relação ao poder requisitório do Ministério
Público. O sujeito ativo é o destinatário da requisição ministerial. O Ministério Público é dotado de poder
requisitório, ou seja, poder de exigir o fornecimento de informações e documentos.
A recusa, retardo ou omissão indevida no atendimento de dados técnicos indispensáveis à propositura
da ação civil com objeto amparado pela Lei n° 10.741/03, quando requisitados pelo Ministério Público
configurará o delito em estudo. As modalidades recusar e omitir são delitos omissivos próprios.
Dessa forma, consumam-se com a inação do agente, não se admitindo a tentativa. Na modalidade
retardar consuma-se com a prática de ato capaz de atrasar indevidamente o atendimento da requisição
ministerial.
A tentativa é possível, apesar de difícil configuração.

As figuras típicas previstas no art. 100 do Estatuto do Idoso são punidas exclusivamente a título de dolo
(direto ou eventual), não se admitindo a punição de comportamentos culposos.

2.6 Desobediência de ordem legal proferida em ação envolvendo pessoa idosa

Art. 101. Deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de
ordem judicial expedida nas ações em que for parte ou interveniente a pessoa
idosa: (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

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SEMANA 07/12

● Bem jurídico protegido: Administração da justiça, no que diz respeito ao cumprimento as ordens
judiciais em que a pessoa idosa for parte ou interveniente.
● Sujeito ativo: O destinatário da ordem judicial ou responsável por seu cumprimento pode figurar
como sujeito ativo. Trata-se de crime próprio.
● Sujeito passivo: Figura o Estado, e mediatamente poderá figurar a pessoa idosa prejudicada.
● Conduta: Deixar de cumprir retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial
expedida nas ações em que for parte ou interveniente a pessoa idosa. Trata-se de um tipo penal
similar ao do inciso IV do art. 100 do Estatuto do Idoso.
● Consumação e tentativa: Modalidade omissiva, ou seja, deixar de cumprir consuma-se no instante
da inação, não se admitindo a tentativa por se tratar de crime omissivo próprio.
Nas modalidades comissivas, as condutas de retardar ou frustrar consumam-se com a prática de ato
capaz de atrasar indevidamente ou de tornar inútil o cumprimento de ordem judicial. Sendo modalidades
delitivas plurissubsistentes, admitem o conatus.

2.7 Apropriação indébita contra pessoa idosa

Art. 102. Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro


-lhes aplicação diversa da de sua
rendimento da pessoa idosa, dando
finalidade: (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)
Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa.

● Bem jurídico protegido: Patrimônio da pessoa idosa.


● Sujeito ativo: Qualquer pessoa, tratando-se de crime comum, porém, sujeito ativo precisará apenas
estar na posse de bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, o que, por si só,
não constitui condição pessoal especial do agente.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa.
● Conduta: Trata-se de modalidade especial do crime de apropriação indébita previsto no art. 168 do
Código Penal.
O verbo apropriar-se significa praticar qualquer ato de disposição, ou seja, como se dono fosse. Dessa
forma, o sujeito ativo, na posse de bens do idoso, os utiliza praticando qualquer ação que só o legítimo
proprietário poderia praticar.
No caso do verbo desviar, trata-se, em verdade, de exemplo de apropriação destacado de forma
expressa pelo legislador, consistente no ato de dar destinação diversa ao bem, provento, pensão ou qualquer
outro rendimento do idoso que não seja a sua finalidade original e sem a autorização da pessoa idosa.
É necessária a presença de dolo específico, consistente na vontade consciente de apropriar-se ou de
desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de
sua finalidade. Não há previsão legal para a modalidade culposa.

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SEMANA 07/12

● Consumação: Na modalidade apropriar-se, consuma-se com a prática de qualquer ato de disposição.


Já na modalidade de desviar, consuma-se com a aplicação dos bens, proventos, pensão ou qualquer outro
rendimento do idoso diversas da de sua finalidade.
Ambas as modalidades são plurissubsistentes, admitindo a tentativa.

No caso de voluntária reparação do dano ou restituição dos bens, proventos, pensão ou qualquer outro
rendimento do idoso apropriado ou desviado, ocorrendo até o recebimento da denúncia ou da queixa,
será cabível o benefício do arrependimento posterior (art. 16 do Código Penal), com a consequente
redução da pena de um a dois terços.

Se o funcionário do banco recebe o cartão e a senha da idosa para auxiliá-la a


sacar um dinheiro do caixa eletrônico e, aproveitando a oportunidade, transfere
quantias para a sua conta pessoal, tal conduta configura o crime previsto no art.
102 do Estatuto do Idoso. STJ. 6ª Turma. REsp 1358865-RS, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

2.8 Recusa de acolhimento ou permanência de pessoa idosa

Art. 103. Negar o acolhimento ou a permanência da pessoa idosa, como abrigada,


por recusa desta em outorgar procuração à entidade de atendimento: (Redação
dada pela Lei nº 14.423, de 2022)
Penadetenção
– de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

● Bem jurídico protegido: Dignidade da pessoa humana da pessoa idosa e o seu patrimônio.
● Sujeito ativo: Crime é próprio, figurando como sujeito ativo a pessoa responsável pela entidade de
atendimento de pessoa idosa.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa.
● Conduta: Existem duas condutas que são tipificadas:
✔ Negar o acolhimento do idoso, por meio da rejeição em se acolher o idoso em entidade de
atendimento;
✔ Negar a permanência do idoso, modalidade em que o idoso já está em entidade de atendimento, e
o sujeito ativo passa a não mais aceitar a sua permanência, suspendendo a estadia do idoso em
entidade de atendimento.

É imprescindível que o motivo do comportamento do sujeito ativo seja a recusa do idoso em outorgar
procuração à entidade de atendimento. Assim, qualquer outro motivo não configura o crime deste artigo.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O crime pune a coação indireta do sujeito ativo em ter acesso ao patrimônio de pessoa idosa. O sujeito ativo
usa a possibilidade de acolhimento e permanência da vítima em entidade de atendimento como condição
para receber da pessoa idosa procuração com a outorga permitindo acesso aos bens da vítima.
Importante destacar que não seria ilícita a pessoa idosa outorgar procuração ao responsável por entidade de
atendimento. Ocorre que a chantagem em obtê-la, contra a vontade da pessoa idosa, é imprópria.

● Consumação: O crime se consuma quando o sujeito ativo nega acolhimento ou a permanência do


idoso em entidade de atendimento. Por se tratar de crime unissubsistente, a tentativa é inadmissível.

2.9 Retenção indevida de cartão magnético ou outro documento

Art. 104. Reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios,


proventos ou pensão da pessoa idosa, bem como qualquer outro documento com
objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida: (Redação dada
pela Lei nº 14.423, de 2022)
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa.

● Bem jurídico protegido: Patrimônio da pessoa idosa e sua autonomia e liberdade em dispor de seus
benefícios, proventos e pensão.
● Sujeito ativo: Credor da dívida com pessoa idosa.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa em situação de dívida.
● Conduta: Trata-se de forma especial e específica de exercício arbitrário das próprias razões, isso
porque o sujeito ativo, ou seja, o credor retém o cartão magnético de conta bancária, ou de qualquer outro
documento, relativa a benefícios, proventos ou pensão da pessoa idosa, como chantagem visando assegurar
o recebimento ou ressarcimento de dívida.
Não é necessário que a vítima pague ou perca em seu patrimônio para a configuração do crime. O
legislador pune tão somente a retenção de cartão magnético de conta bancária ou qualquer outro
documento, independentemente de seu efetivo uso.
● Consumação: Trata-se de crime formal, consumando-se com a retenção de cartão magnético de
conta bancária ou qualquer outro documento, independentemente de seu efetivo uso.
É também crime permanente, protraindo a consumação do delito enquanto perdurar a retenção do
sujeito ativo de cartão magnético de conta bancária ou qualquer outro documento da vítima. Sendo crime
plurissubsistente, admite-se a tentativa.

2.10 Exibição ou veiculação de dados depreciativos ou injuriosos da pessoa idosa

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SEMANA 07/12

Art. 105. Exibir ou veicular, por qualquer meio de comunicação, informações ou


imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa idosa: (Redação dada pela Lei nº
14.423, de 2022)
Pena – detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.

● Bem jurídico protegido: A honra, intimidade e imagem da pessoa idosa


● Sujeito ativo: Qualquer pessoa, é um crime comum.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa.
● Conduta: Exibir significa mostrar a terceiros e veicular significa colocar em circulação pública.
O objeto do crime pode consistir em informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa
do idoso, ou seja, conteúdo de forma livre, como escrita, imagens, vídeos etc. que tenha o poder de depreciar
ou injuriar a pessoa idosa elemento normativo do tipo.
A conduta pode ser colocada em prática por qualquer forma escrita ou verbal e por qualquer meio
de comunicação internet, redes sociais, TV, rádio, correspondência etc.
● Consumação: O delito consuma-se no exato momento de exibição ou veiculação das informações
ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa idosa, não sendo necessário que a vítima tome
conhecimento do fato.
A tentativa é admitida apenas na forma escrita, ocasião em que o conteúdo é extraviado ou
interceptado pela autoridade competente, não chegando ao conhecimento de terceira pessoa.

2.11 Induzimento de pessoa idosa a outorgar procuração

Art. 106. Induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar
procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente:
Pena – reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.

● Bem jurídico protegido: Inviolabilidade patrimonial da pessoa idosa que se encontra sem
discernimento.
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa, é crime comum.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa.
● Conduta: Trata-se de conduta de induzir (entusiasmar, persuadir) pessoa idosa, sabendo que esta
encontra-se desprovida de discernimento de seus atos, a outorga de procuração.
O fim especial de agir do sujeito ativo deve ser para administrar ou dispor dos bens da vítima. O
delito é punido com pena de reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. O sujeito ativo se vale da condição de
vulnerabilidade da vítima para alcançar a disposição ou administração dos bens de pessoa idosa.
A procuração eventualmente outorgada pela vítima pode ser pública ou privada, devendo contar
com poderes especiais para a administração ou disposição de seus bens.

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SEMANA 07/12

● Consumação: O crime se consuma com o induzimento capaz de enganar a pessoa idosa sem
discernimento a outorgar procuração ao sujeito ativo, sendo dispensável a produção de resultado
naturalístico, tratando-se de crime formal. Dessa forma, a efetiva outorga de procuração com poderes
especiais para a administração ou disposição dos bens da vítima configurará mero exaurimento do delito.
A tentativa é possível na forma escrita, hipótese em que o induzimento não chega ao conhecimento
da vítima idosa sem discernimento, seja por ter sido extraviada, seja por ter sido interceptada.

2.12 Coação de pessoa idosa

Art. 107. Coagir, de qualquer modo, a pessoa idosa a doar, contratar, testar ou
outorgar procuração: (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)
Pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

● Bem jurídico protegido: Liberdade individual e a inviolabilidade patrimonial da pessoa idosa


desprovida de discernimento de seus atos.
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa, crime comum.
● Sujeito passivo: Pessoa idosa.
● Conduta: Coação deve ser entendida como o ato de constranger, intimidar, forçar a vítima a realizar
algo, compeli-la contra a sua vontade. Por força da expressão "de qualquer modo", a coação poderá
ser física (vis absoluta) ou moral (vis compulsiva).
● Consumação: Trata-se de crime formal, consumando-se com a prática de qualquer ato configurador
da coação, independentemente da produção de resultado naturalístico (que, se ocorrer, será mero
exaurimento).
A tentativa é possível apenas na forma escrita, já que a coação direta perante a vítima antecipará o
momento consumativo do delito.

2.13 Lavratura do ato notarial sem representação legal do idoso

Art. 108. Lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa sem discernimento de seus
atos, sem a devida representação legal:
Pena – reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos

● Bem jurídico protegido: Se tutela a inviolabilidade patrimonial da pessoa idosa desprovida de


discernimento.
● Sujeito ativo: Trata-se de crime próprio em relação ao sujeito ativo, só podendo ser praticado pelo
sujeito competente para a lavratura de ato notarial (ex.: tabelião).
● Sujeito passivo: O Estado e a pessoa idosa sem discernimento para o ato.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Conduta: Os responsáveis com função para lavrar ato notarial, diante da responsabilidade que
ostentam, devem sempre se certificar que as partes estão em plenas faculdades mentais.
Nesse sentido, o delito em estudo pune o agente notarial que leva a efeito a lavratura de ato notarial
que envolva pessoa idosa desprovida de discernimento de seus atos, sem a devida representação legal, ou
seja, sem a assistência de advogado, defensor, curador ou procurador com poderes especiais para assisti-lo
em tal ato.
● Consumação: Trata-se de crime formal, consumando-se com a lavratura do ato notarial, sendo
dispensável a ocorrência de prejuízo patrimonial à vítima idosa.
A tentativa é possível, como no caso em que a celebração do ato notarial é interrompida por
circunstâncias alheias à vontade do agente notarial.

2.14 Impedimento ou embaraço a ato dos órgãos fiscalizadores

Art. 109. Impedir ou embaraçar ato do representante do Ministério Público ou de


qualquer outro agente fiscalizador:
Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

● Bem jurídico protegido: Tutela-se a Administração da Justiça, no que se refere a atuação do


Ministério Público ou de qualquer outro agente fiscalizador responsáveis pela fiscalização dos
direitos da pessoa idosa.
● Sujeito ativo: Qualquer pessoa, trata-se de crime comum.
● Pessoa idosa.
Sujeito passivo:
● Conduta: O delito pune ato de impedir ou embaraçar ato do representante do Ministério Público ou
de qualquer outro agente fiscalizador. Trata-se de tipo misto alternativo, na medida em que mesmo
sendo praticado ambos os verbos típicos, o crime será único.
● Consumação: Sobre o verbo impedir, por ser crime material exige-se para a consumação que o ato
de fiscalização seja efetivamente obstado. Em relação à modalidade embaraçar o crime é formal,
dispensando a ocorrência de resultado naturalístico.
Dessa forma, o crime se consuma com a prática de qualquer ato capaz de atrapalhar as ações
fiscalizatórias.
A tentativa é admitida, muito embora de improvável ocorrência na medida em que os atos
executórios visando impedir fiscalização naturalmente terão o condão de configurar atos de embaraço da
medida.

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META 4

DIREITOS HUMANOS: DIREITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MENTAL, DIREITOS DOS GRUPOS VULNERÁVEIS E
DAS MINORIAS E DEFENSORES DE DIREITOS HUMANOS

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES


DIREITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MENTAL

CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUEIS, DESUMANOS OU


DEGRADANTES:
. Arts. 1° ao 4°, 13, 16 ao 20.

PROTOCOLO FACULTATIVO À CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS


CRUÉIS, DESUMANOS OU DEGRADANTES:
. Arts. 1°, 2°, 4° e 11.

CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL:


. Arts. 2° e 5°.

PROTOCOLO DE PREVENÇÃO, SUPRESSÃO E PUNIÇÃO DO TRÁFICO DE PESSOAS, EM ESPECIAL


MULHERES E CRIANÇAS, COMPLEMENTAR À CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME
ORGANIZADO TRANSNACIONAL:
. Arts. 2°, 3° e 5°.

CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR E PUNIR A TORTURA:


. Arts. 2°, 3°, 10, 13 e 17.

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES


DIREITOS DAS MULHERES

CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER:


. Arts. 1°, 3° ao 6°, 10 ao 12, e 17.

PROTOCOLO FACULTATIVO À CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE


DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER:
. Art. 2°.

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CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER:


. Arts. 4°, 7° 8°, 10 e 12.

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES


DIREITO À NÃO DISCRIMINAÇÃO RACIAL

CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL:


. Preâmbulo, Arts. 1°, 9° 14 e 21.

CONVENÇÃO INTERAMERICANA CONTRA O RACISMO, A DISCRIMINAÇÃO RACIAL E FORMAS


CORRELATAS DE INTOLERÂNCIA:
. Arts. 1°, 4° e 15.

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES


DIREITOS DAS PESSOAS RECLUSAS

REGRAS MÍNIMAS DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O TRATAMENTO DOS PRESOS:


. Regras 1, 2, 11, 12, 28, 29, 43, 47, 51, 109 e 111.

REGRAS DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O TRATAMENTO DE MULHERES PRESAS E MEDIDAS NÃO
PRIVATIVAS DE LIBERDADE PARA MULHERES INFRATORAS:
. Regras 1, 4, 5, 19, 20, 22, 40, 41, 42, 49, 50, 52 e 59.

ARTIGOS MAIS COBRADOS


DIREITOS DOS REFUGIADOS

CONVENÇÃO RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS:


. Arts. 1°, 2°, 4°, 7°, 10, 12, 28 e 33.

PROTOCOLO FACULTATIVO À CONVENÇÃO RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS:


. Preâmbulo.

CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE A PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE TODOS OS TRABALHADORES


MIGRANTES E DOS MEMBROS DAS SUAS FAMÍLIAS:
. Arts. 1° ao 7°, 22, 64 e 72.

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DOCUMENTOS INTERNACIONAIS SOBRE DIREITOS HUMANOS

1. DIREITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL

1.1 Direito À Integridade Física E Moral

Em relação ao Direito à Integridade Física e Moral, é importante o estudo do:


● Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos:
- Convenção contra a Tortura e outro Tratamento ou Penas Cruéis, Desumanos ou
Degradantes (1991).
- Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outro Tratamento ou Penas Crueis,
Desumanos ou Degradantes (2002).
- Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (2000).
- Protocolo de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres
e Crianças, complementar à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado
Transnacional (2000).
● Direitos Humanos:
Sistema Interamericano de Proteção dos
- Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (1989).
● Proteção Nacional:
- Lei n° 9.455/97 (Lei de Tortura).

1.2. Convenção Contra A Tortura E Outros Tratamentos Ou Penas Cruéis, Desumanos Ou Degradantes

A Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes


foi adotada pela Resolução n° 39/46 da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1984.
No Brasil foi aprovada pelo Decreto Legislativo n° 4, de 23 de maio de 1989 e promulgada pelo Decreto n°
40, de 15 de fevereiro de 1991.
Na mesma linha do que já estava disposto na Declaração Universal de Direitos Humanos (art. V), no
PIDCP (art. 7º) e na Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e outros Tratamentos
ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, a Convenção veio também determinar que ninguém será
sujeito à tortura ou a pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante (preâmbulo).
A Convenção define, no art. 1º, a tortura como qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos,
físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa, (i) a fim de obter, dela ou de uma terceira
pessoa, informações ou confissões ou (ii) para castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha
cometido ou seja suspeita de ter cometido ou (iii) para intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas ou
(iv) por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza, quando tais dores ou sofrimentos

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SEMANA 07/12

são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua
instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência.
Para a Convenção, há quatro elementos que definem o conceito de tortura:
● Natureza do ato: Há vários tipos de atos, tanto comissivos quanto omissivos, que podem
caracterizar tortura, pelo grau de sofrimento físico e mental.
● Dolo do torturador: Exige-se que o agente queira o resultado ou assuma o risco de produzi-lo.
● Finalidades: A Convenção traz quatro finalidades, quais sejam, obter informação ou confissão,
punição, intimidação ou coação e por qualquer outro motivo baseado em discriminação de qualquer
espécie.
● Envolvimento direto ou indireto de agente público: A Convenção exige que haja no mínimo a
instigação, consentimento ou aquiescência de funcionário público.

A proibição de tortura é absoluta na Convenção, de modo que circunstâncias excepcionais, tais


como ameaça ou estado de guerra, instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública, não
poderão ser invocadas como justificação de tortura em nenhum caso (art. 2°).
É vedada, portanto, a utilização da teoria da bomba relógio, teoria utilistarista que parte da ideia
de que seria possível torturar uma pessoa para obter informações que salvariam dezenas, centenas ou
milhares de pessoas. A pessoa, digna em si mesmo, não pode ser utilizada como meio para a proteção da
coletividade.
A Convenção, em suas disposições, assegura, entre outros, os seguintes direitos a que os Estados-
partes se obrigam:
1) proibição total da tortura e a proteção contra atos de tortura e outras formas de tratamento cruel,
desumano ou degradante, conclamando os Estados a adotarem as medidas necessárias para impedir essas
práticas;
2) proibição de expulsão, devolução ou extradição de pessoas para Estados quando houver risco
efetivo de virem a ser torturadas;
3) criminalização, na legislação penal de cada Estado- parte, das condutas que configurem tortura
(nas formas consumada e tentada e em coautoria);
4) cooperação com outros Estados para a prisão, detenção e extradição de torturadores;
5) investigar prontamente alegações de tortura, examinando toda denúncia de maneira imparcial;
6) direito de que a declaração obtida mediante tortura não seja invocada como prova em qualquer
processo; e
7) direito, às vítimas de tortura, à reparação e indenização justa e adequada, inclusive à completa
reabilitação.

O art. 3º veda a expulsão, devolução ou extradição de uma pessoa para outro Estado quando
houver razões substanciais para crer que ela corre perigo de ali ser submetida a tortura (princípio do non
refoulement).
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SEMANA 07/12

A regra com relação ao torturador, por outro lado, é de possibilitar a sua extradição, considerando
que o objetivo da Convenção é garantir que o torturador seja responsabilizado no seu Estado de origem.
A Convenção traz, também, mandados de criminalização, determinando que os Estados
tipifiquem os atos de tortura. Ademais, para garantir que as pessoas não sejam submetidas a atos cruéis,
desumanos ou degradantes, o artigo 16 da Convenção deixa estabelecido que os Estados-Partes deverão
coibir atos dessa natureza, ainda que não considerados atos de tortura, nos termos do artigo 1°, enfatizando
que os dispositivos deverão merecer interpretação ampla, de molde a não restringir outros de qualquer
instrumento internacional ou lei nacional que proíba os tratamentos ou as penas cruéis, desumanos ou
degradantes.

A Convenção possui quatro mecanismos de controle de monitoramento, que são:


i. Petições Individuais;
ii. Relatórios;
iii. Comunicações Interestatais; e
iv. Comitê contra a Tortura.

Quanto às Comunicações Individuais e Interestatais, noticiando violação a direito reconhecido pela


-parte fizer uma
Convenção contra a Tortura, somente podem ser encaminhadas ao Comitê se o Estado
declaração habilitando-o a recebê-las.
O Comitê contra a Tortura, recebendo tais comunicações, coleta informações e formula sua decisão,
e, se concluir pela ocorrência da violação, solicita ao Estado-parte que informe as medidas adotadas para dar
cumprimento e efetividade à decisão. Embora as decisões dos Comitês (Comitê contra a Tortura, Comitê de
Direitos Humanos e Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Racial) não sejam legalmente vinculantes e
obrigatórias, tais decisões têm efetivamente auxiliado o exercício dos direitos humanos reconhecidos no
plano internacional.
O Comitê contra a Tortura apresenta uma peculiaridade em relação aos demais Comitês
estabelecidos pelas diversas Convenções. No caso de denúncia fidedigna de prática sistemática de tortura
em um Estado-Parte, detém a competência caso haja concordância do Estado-Parte envolvido de realizar
uma visita para investigação no próprio território.

1.3 Protocolo Facultativo à Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos
ou Degradantes

O Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis,


Desumanos ou Degradantes foi adotado por Resolução da Assembleia Geral da ONU em 18 de dezembro
de 2002, em Nova Iorque. No Brasil, foi aprovado pelo Decreto Legislativo n° 483, de 20 de dezembro de
2006 e promulgado pelo Decreto n° 6.085, de 19 de abril de 2007.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Teve por objetivo estabelecer um sistema de visitas regulares de órgãos nacionais e internacionais
independentes a lugares onde as pessoas são privadas de liberdade, com o intuito de prevenir a tortura e
outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Os mecanismos de monitoramento do protocolo são:


(i) Criação do Subcomitê de Prevenção da Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis,
Desumanos ou Degradantes;
(ii) Órgão Nacional para prevenir a prática da tortura; e
(iii) Visitas tanto do órgão internacional quanto do nacional a qualquer lugar sob sua jurisdição
onde pessoas são ou podem ser presas, por força de ordem dada por autoridade pública.

O Subcomitê de Prevenção é guiado pelos princípios da confidencialidade, imparcialidade, não


seletividade, universalidade e objetividade. Na sua composição, deverá ser dada consideração devida à
distribuição geográfica equitativa e à representação de diferentes formas de civilização e de sistema jurídico
dos Estados-Membros.
De acordo com o seu art. 4°, cada Estado-Parte deverá permitir visitas, de acordo com o presente
Protocolo, a qualquer lugar sob sua jurisdição e controle onde pessoas são ou podem ser privadas de sua
liberdade, quer por força de ordem dada por autoridade pública quer sob seucitamento
in ou com sua
permissão ou concordância (doravante denominados centros de detenção). Essas visitas devem ser
empreendidas com vistas ao fortalecimento, se necessário, da proteção dessas pessoas contra a tortura e
outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.
Para os fins do presente Protocolo, privação da liberdade significa qualquer forma de detenção ou
aprisionamento ou colocação de uma pessoa em estabelecimento público ou privado de vigilância, de onde,
por força de ordem judicial, administrativa ou de outra autoridade, ela não tem permissão para ausentar-
se por sua própria vontade.

Dessa forma, durante o mandato do Subcomitê de Prevenção, deverá:


a) Visitar os lugares referidos no artigo 4° e fazer recomendações para os Estados-Partes a respeito
da proteção de pessoas privadas de liberdade contra a tortura e outros tratamentos ou penas
cruéis, desumanos ou degradantes;
b) No que concerne aos mecanismos preventivos nacionais:
(i) Aconselhar e assistir os Estados-Partes, quando necessário, no estabelecimento desses
mecanismos;
(ii) Manter diretamente, e se necessário de forma confidencial, contatos com os
mecanismos preventivos nacionais e oferecer treinamento e assistência técnica com vistas
a fortalecer sua capacidade;

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

(iii) Aconselhar e assisti-los na avaliação de suas necessidades e no que for preciso para
fortalecer a proteção das pessoas privadas de liberdade contra a tortura e outros
tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes;
(iv) Fazer recomendações e observações aos Estados-Partes com vistas a fortalecer a
capacidade e o mandato dos mecanismos preventivos nacionais para a prevenção da tortura
e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes;
c) Cooperar para a prevenção da tortura em geral com os órgãos e mecanismos relevantes
das Nações Unidas, bem como com organizações ou organismos internacionais, regionais
ou nacionais que trabalhem para fortalecer a proteção de todas as pessoas contra a tortura
e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.

As competências do Subcomitê são de realizar visitas onde haja pessoas privadas de liberdade com
o intuito de prevenir a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, além de
fazer recomendações aos Estados a respeito da proteção das pessoas privadas de liberdade.

1.4 Convenção Das Nações Unidas Contra O Crime Organizado Transnacional

A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo)
é o principal instrumento global de combate ao crime organizado transnacional. Foi adotada pela Assembleia
Geral da ONU em 15 de novembro de 2000, aprovada pelo Brasil a partir do Decreto Legislativo n° 231, de
29 de maio de 2003 e promulgado pelo Decreto n° 5.015, de 12 de março de 2004. O objetivo da presente
Convenção consiste em promover a cooperação para prevenir e combater mais eficazmente a criminalidade
organizada transnacional.

Cada Estado Parte adotará as medidas legislativas ou outras que sejam necessárias para caracterizar
como infração penal:
i. A criminalização da participação em um grupo criminoso organizado;
ii. A criminalização da lavagem do produto do crime;
iii. A criminalização da corrupção; e
iv. A criminalização da obstrução à justiça.

A Convenção também prevê as seguintes definições:


i. Assistência judiciária recíproca: Em que os Estados-Partes prestarão reciprocamente toda a
assistência judiciária possível nas investigações, nos processos e em outros atos judiciais relativos
às infrações previstas pela presente Convenção;
ii. Investigações conjuntas: Em que os Estados-Partes considerarão a possibilidade de celebrar
acordos ou protocolos bilaterais ou multilaterais em virtude dos quais, com respeito a matérias

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

que sejam objeto de investigação, processos ou ações judiciais em um ou mais Estados, as


autoridades competentes possam estabelecer órgãos mistos de investigação.
iii. Técnicas especiais de investigação: Se os princípios fundamentais do seu ordenamento jurídico
nacional o permitirem, cada Esta
do-Parte, tendo em conta as suas possibilidades e em
conformidade com as condições prescritas no seu direito interno, adotará as medidas
necessárias para permitir o recurso apropriado a entregas vigiadas e, quando o considere
adequado, o recurso a outras técnicas especiais de investigação, como a vigilância eletrônica ou
outras formas de vigilância e as operações de infiltração, por parte das autoridades competentes
no seu território, a fim de combater eficazmente a criminalidade organizada.
iv. Medidas para intensificar a cooperação com as autoridades competentes para a aplicação da
lei: Cada Estado-Parte tomará as medidas adequadas para encorajar as pessoas que participem
ou tenham participado em grupos criminosos organizados.
v. Cooperação entre as autoridades competentes para a aplicação da lei: Os Estados Partes
cooperarão estreitamente, em conformidade com os seus respectivos ordenamentos jurídicos e
administrativos, a fim de reforçar a eficácia das medidas de controle do cumprimento da lei
destinadas a combater as infrações previstas na presente Convenção.
vi. Coleta, intercâmbio e análise de informações sobre a natureza do crime organizado: Cada
Estado Parte considerará a possibilidade de analisar, em consulta com os meios científicos e
universitários, as tendências da criminalidade organizada no seu território, as circunstâncias em
que opera e os grupos profissionais e tecnologias envolvidos.
vii. Formação e assistência técnica: Cada Estado Parte estabelecerá, desenvolverá ou melhorará, na
medida das necessidades, programas de formação específicos destinados ao pessoal das
autoridades competentes para a aplicação da lei, incluindo promotores públicos, juízes de
instrução e funcionários aduaneiros, bem como outro pessoal que tenha por função prevenir,
detectar e reprimir as infrações previstas na presente Convenção.
viii. Prevenção: Os Estados Partes procurarão elaborar e avaliar projetos nacionais, bem como
estabelecer e promover as melhores práticas e políticas para prevenir a criminalidade organizada
transnacional. Em conformidade com os princípios fundamentais do seu direito interno, os
Estados Partes procurarão reduzir, através de medidas legislativas, administrativas ou outras que
sejam adequadas, às possibilidades atuais ou futuras de participação de grupos criminosos
organizados em negócios lícitos utilizando o produto do crime.

1.4.1 Protocolo de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças,
complementar à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional

A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional é complementada por três
protocolos que abordam áreas específicas do crime organizado:

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i. Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial


Mulheres e Crianças;
ii. Protocolo Relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea; e
iii. Protocolo contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças e componentes e
munições.

Insta salientar que para as provas de Concursos da Carreira de Delegado de Polícia é suficiente o
estudo do Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial
Mulheres e Crianças.
Foi adotado pela Resolução n° 55/25 da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, em 15 de
novembro de 2000, aprovado pelo Brasil a partir do Decreto Legislativo n° 231, de 29 de maio de 2003 e
promulgado pelo Decreto n° 5.017, de 12 de março de 2004.

Os objetivos do presente Protocolo são os seguintes:


a) Prevenir e combater o tráfico de pessoas, prestando uma atenção especial às mulheres e às crianças;
b) Proteger e ajudar as vítimas desse tráfico, respeitando plenamente os seus direitos humanos; e
c) Promover a cooperação entre os Estados Partes de forma a atingir esses objetivos.

O Protocolo possui 20 artigos, divididos em 4 partes: disposições gerais (arts. 1° ao 5°), proteção de
vítimas de tráfico de pessoas (arts. 6° ao 8°) e prevenção, cooperação e outras medidas (arts. 9° ao 13) e
disposições finais (arts. 14 a 20).

As definições previstas no art. 3° são de suma importância, o qual prevê que para efeitos do
Protocolo:

i. Tráfico de pessoas:
● Significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas,
recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano,
ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos
ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para
fins de exploração.
● Abrange o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de uma
criança para fins de exploração, mesmo que não envolvam nenhum acima descritos.
● O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração
será considerado irrelevante, mesmo que não envolva nenhum dos meios acima descritos.
● A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de
exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura,
a servidão ou a remoção de órgãos;
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RETA FINAL

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SEMANA 07/12

ii. Criança:
● Significa qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos.
De acordo com o art. 5° do Protocolo, cada Estado-Parte adotará as medidas legislativas e outras que
considere necessárias de forma a estabelecer como infrações penais os atos descritos como tráfico de
pessoas, quando tenham sido praticados intencionalmente.
Em 6 de outubro de 2016 foi promulgada no Brasil a Lei n° 13.344/16 (Lei do Tráfico de Pessoas),
que dispõe sobre prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de
atenção às vítimas, em que foram tipificadas diversas condutas como agenciar, aliciar, recrutar, transportar,
transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso) e
finalidades do tráfico de pessoas, como o tráfico para fins de remoção de órgãos, submissão a trabalho
escravo, servidão, adoção ilegal ou exploração sexual.

1.5 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos

1.5.1 Convenção Interamericana Para Prevenir E Punir A Tortura

A Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura integra o Sistema Interamericano de


Proteção dos Direitos Humanos e foi adotada pela Assembleia Geral da OEA em Cartagena das Índias, na
Colômbia, em 9 de dezembro de 1985. No Brasil, foi adotada pelo Decreto Legislativo n° 5, de 31 de maio
de 1989 e promulgada pelo Decreto n° 98.386, de 10 de dezembro de 1989.
O art. 2º estabelece a definição de tortura como todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente
a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais com fins de investigação criminal ou como meio de
intimidação ou como castigo pessoal ou medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim.
Entende-se como tortura, também, a aplicação sobre uma pessoa de métodos tendentes a anular a
personalidade da vítima ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou
angústia psíquica. Esta figura específica de tortura não consta expressamente na Convenção internacional.
São responsáveis pela tortura os empregados ou funcionários públicos que, nesta condição,
ordenem sua comissão ou instiguem ou induzem a ela ou, ainda, não impeçam (art. 3º).
A Convenção, ainda, prevê o princípio do non-refoulement em seu art. 13, ao afirmar que não se
concederá a extradição nem se procederá à devolução da pessoa requerida quando houver suspeita fundada
de que corre perigo sua vida, de que será submetida à tortura, tratamento cruel, desumano ou degradante,
ou de que será julgada por tribunais de exceção ou ad hoc, no Estado requerente.
Prevê, ainda, em seu art. 10 que: Nenhuma declaração que se comprove haver sido obtida mediante
tortura poderá ser admitida como prova num processo, salvo em processo instaurado contra a pessoa ou
pessoas acusadas de havê‐la obtido mediante atos de tortura e unicamente como prova de que, por esse
meio, o acusado obteve tal declaração.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A Convenção interamericana contém, de igual modo, mandado de criminalização. Por fim, os


Estados-Partes se comprometem a informar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre as
medidas legislativas, judiciais, administrativas e de outra natureza que adotarem em sua aplicação. A
Comissão procurará analisar, em seu relatório anual, a situação prevalecente nos Estados-Membros da OEA,
no que diz respeito à prevenção e supressão da tortura, em conformidade com suas atribuições.

1.6 Proteção Nacional

1.6.1 Lei N° 9.455/97 (Lei De Tortura)

A Lei n° 9.455, de 7 de abril de 1997, define os crimes de tortura e dá outras providências no


ordenamento jurídico brasileiro.
O direito à integridade física consiste na intangibilidade física do ser humano, que merece proteção
contra tratamento cruel, degradante, desumano ou tortura. O direito à integridade psíquica ou moral
implica a vedação do tratamento desonroso ou que cause sofrimento psíquico desnecessário ou odioso.
A Lei n. 9.455/97 define tortura como sendo constranger alguém com emprego de violência ou
grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental com o fim de obter informação, declaração,
confissão, para provocar ação ou omissão de natureza criminosa, em razão de discriminação racial ou
religiosa.

Há subtipos de tortura:
i. Submeter alguém sob sua guarda, poder ou autoridade, mediante violência ou grave
ameaça, sofrimento físico ou mental com o fim de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
ii. Submeter pessoa presa ou em medida de segurança a sofrimento físico ou mental pela
prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

A lei interna não exige a qualidade de funcionário público. Inclusive, se for, é aplicada causa de
aumento.
Assim, para a lei brasileira, a tortura exige: (i) sofrimento físico ou mental causado a alguém; (ii)
emprego de violência ou grave ameaça; (iii) para obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de
terceira pessoa; (iv) ou para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; (v) ou em razão de
discriminação racial ou religiosa.

2. DIREITOS DOS GRUPOS VULNERÁVEIS E DAS MINORIAS

Para se iniciar os estudos acerca dos Grupos Vulneráveis e Minorias, é importante fazer a sua
conceituação, para consequentemente se fazer a sua diferenciação:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Grupos Vulneráveis: Pessoas que por diversas razões, como deficiência, gênero, idade, orientação
sexual ou condição social, encontram-se mais suscetíveis às violações de seus direitos.
Exemplos: Pessoas com deficiência, mulheres, idosos, membros da comunidade LGTBQIAPN+ e
pessoas em situação de rua.
● Minorias: Pessoas em posição não dominante no Estado, apresentando características históricas,
étnicas, linguísticas, culturais ou religiosas que o diferem da maioria da população.
Exemplos: Índios, muçulmanos, negros e ciganos.

3. DIREITOS DAS MULHERES

Em relação aos Direitos das Mulheres, é importante o estudo acerca do:


● Soft Law:
- Declaração e Plataforma de Ação de Pequim (1995)
● Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos:
- Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher
(1979).
- Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher (1999).
● Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos:
- Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher
(1994).
● Proteção Nacional:
- Lei n° 11.340/06 (Lei Maria da Penha).

3.1 Declaração E Plataforma De Ação De Pequim 6

A IV Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em Pequim, em setembro de 1995,


consubstanciou na Declaração e na Plataforma de Ação de Pequim. Trata-se de um guia abrangente para
orientar governos e sociedade no aperfeiçoamento do marco legal, na formulação de políticas e na
implementação de programas para promover a igualdade e para evitar a discriminação das mulheres.
Portanto, é um documento internacional de soft law.
Intitulada “Ação para a Igualdade, o Desenvolvimento e a Paz”, a Conferência de Pequim partiu de
uma avaliação dos avanços obtidos desde as conferências anteriores (Nairobi, 1985; Copenhague, 1980; e
México, 1975) e de uma análise dos obstáculos a superar para que as mulheres possam exercer plenamente
seus direitos e alcançar seu desenvolvimento integral como pessoas.

6
https://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2013/03/declaracao_beijing.pdf

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Identificaram-se doze áreas de preocupação prioritária, a saber:


I. a crescente proporção de mulheres em situação de pobreza (fenômeno que passou a ser
conhecido como a feminização da pobreza);
II. a desigualdade no acesso à educação e à capacitação;
III. a desigualdade no acesso aos serviços de saúde;
IV. a violência contra a mulher;
V. os efeitos dos conflitos armados sobre a mulher;
VI. a desigualdade quanto à participação nas estruturas econômicas, nas atividades produtivas
e no acesso a recursos;
VII. a desigualdade em relação à participação no poder político e nas instâncias decisórias;
VIII. a insuficiência de mecanismos institucionais para a promoção do avanço da mulher;
IX. as deficiências na promoção e proteção dos direitos da mulher;
X. o tratamento estereotipado dos temas relativos à mulher nos meios de comunicação e a
desigualdade de acesso a esses meios;
XI. a desigualdade de participação nas decisões sobre o manejo dos recursos naturais e a
proteção do meio ambiente; e
XII. ecificamente para os direitos da menina.
a necessidade de proteção e promoção voltadas esp

A Plataforma de Ação de Pequim consagrou três inovações dotadas de grande potencial


transformador na luta pela promoção da situação e dos direitos da mulher:
a) o conceito de gênero;
b) a noção de empoderamento; e
c) o enfoque da transversalidade.

O conceito de gênero permitiu passar de uma análise da situação da mulher baseada no aspecto
biológico para uma compreensão das relações entre homens e mulheres como produto de padrões
determinados social e culturalmente e, portanto, passíveis de modificação. As relações de gênero, com seu
substrato de poder, passam a constituir o centro das preocupações e a chave para a superação dos padrões
de desigualdade.
O empoderamento da mulher – um dos objetivos centrais da Plataforma de Ação – consiste em
realçar a importância de que a mulher adquira o controle sobre o seu desenvolvimento, devendo o governo
e a sociedade criar as condições para tanto e apoiá-la nesse processo.
A noção de transversalidade busca assegurar que a perspectiva de gênero passe efetivamente a
integrar as políticas públicas em todas as esferas de atuação governamental.
A essas inovações conceituais veio juntar-se a ênfase no tratamento da situação da mulher sob a
perspectiva de direitos, o que implica reconhecer que a desigualdade entre homens e mulheres é uma

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SEMANA 07/12

questão de direitos humanos, e não apenas uma situação decorrente de problemas econômicos e sociais a
serem superados.
O Brasil teve participação ativa na Conferência de Pequim e em seu seguimento. A participação
brasileira beneficiou-se de intenso diálogo entre Governo e sociedade civil, assim como de interação
construtiva com os demais Poderes do Estado, em especial parlamentares e representantes de conselhos
estaduais e municipais sobre a condição feminina. A forte articulação com o movimento de mulheres,
estabelecida desde então, tornou-se elemento essencial à formulação das políticas públicas no Brasil, que
hoje incorporam a perspectiva de gênero de forma transversal, e não mais em ações pontuais.

3.2 Sistema Global De Proteção Dos Direitos Humanos

3.2.1 Convenção Sobre A Eliminação De Todas As Formas De Discriminação Contra A Mulher

A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW)


foi adotada pela Resolução n° 34/180 da Assembleia Geral da ONU, em 18 de dezembro de 1979. Foi assinada
pelo Brasil em 31 de março de 1981, com reservas (arts. 15.4 e 16.1, alíneas a, c, g e h), aprovada pelo Decreto
Legislativo n° 93, de 14 de novembro de 1983 e promulgada pelo Decreto n° 4.377, de 13 de setembro de
2002.
Em seu art. 1°, a conceitua discriminação contra a mulher como: Toda distinção, exclusão ou
restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo,
exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher,
dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil
ou em qualquer outro campo.
A discriminação da mulher viola os princípios de igualdade de direitos e respeito à dignidade humana,
constitui um obstáculo para o aumento do bem-estar da sociedade e da família e entorpece o pleno
desenvolvimento das possibilidades da mulher para prestar serviços a seu país e à humanidade.
A Convenção determina, portanto, a erradicação de toda discriminação contra as mulheres, para
garantir-lhes o pleno exercício de seus direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais. Estabelece a
Declaração Universal em relação direta com a indivisibilidade dos direitos humanos.
Apesar de sua abrangência e de sua importância, essa Convenção apresenta, ainda, omissões graves,
como a da violência doméstica, a não objetividade em relação às questões ligadas à sexualidade e
reprodução. Esses temas são, apesar de todos os avanços técnicos e humanitários, considerados tabus para
os Estados signatários.
A Convenção tem por escopo, portanto, extirpar toda discriminação e todas as causas da
discriminação contra a mulher e promover situações em que exista absoluta igualdade entre ambos os sexos.

São direitos expressamente previstos na Convenção que devem ser realizados e promovidos em
condições de igualdade com relação aos homens:
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SEMANA 07/12

i. Direitos civis e políticos;


ii. Direito à educação (nas mesmas condições de orientação em matéria de carreiras e
capacitação profissional, acesso aos estudos e obtenção nas instituições de ensino, em todos
os níveis de educação e em todos os tipos de capacitação profissional, eliminação
da
estereotipização dos papéis masculino e feminino);
iii. Direito ao emprego (com direito às mesmas oportunidades, aos mesmos critérios de seleção,
direito à promoção e à estabilidade no emprego, direito à igual remuneração, direito à
igualdade de tratamento com respeito à avaliação da qualidade do trabalho, direito à
seguridade social);
iv. Direito ao acesso a serviços médicos (com assistência apropriada em relação à gravidez, ao
parto e aos períodos pós-parto);
v. Direitos da vida econômica e social; e
vi. Direito de reconhecimento de igual capacidade jurídica em matérias civis e das mesmas
oportunidades para seu exercício.

As principais medidas a serem adotadas pelos Estados são:


i. Adoção de política destinada a eliminar a discriminação contra a mulher;
ii. Medidas apropriadas para assegurar o pleno desenvolvimento e o progresso da mulher, para
garantir-lhe o exercício e o gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais em
igualdade de condições com o homem;
iii. Medidas especiais, de caráter temporário, para acelerar a igualdade de fato entre homens
e mulheres, que deverão cessar quando os objetivos de igualdade de oportunidade e
tratamento forem alcançados (ações afirmativas);
iv. Medidas apropriadas para alterar os padrões socioculturais de conduta; e
v. Medidas para suprimir todas as formas de tráfico de mulheres e exploração da prostituição
da mulher.

A Convenção institui o Comitê das Nações Unidas para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Contra a Mulher e estabelece, como mecanismo de implementação e monitoramento dos
direitos humanos, a sistemática do procedimento de Relatórios Periódicos. Assim sendo, os Estados-
Membros devem encaminhar relatórios periódicos ao Comitê, que tem como finalidade examinar os
progressos alcançados na sua aplicação.

3.2.2 Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a
Mulher

O Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação


contra a Mulher, adotado por Resolução da Assembleia Geral da ONU, em 6 de outubro de 1999, teve por
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objetivo aperfeiçoar o sistema de monitoramento da Convenção, adotando o direito de Petição Individual


quanto às violações dos direitos nela garantidos, apresentada por indivíduos ou grupo de indivíduos que se
encontrem sob a jurisdição do Estado-Parte e que sejam vítimas de violações de quaisquer direitos
estabelecidos na Convenção.

3.3 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos

3.3.1 A Convenção Interamericana Para Prevenir, Punir E Erradicar A Violência Contra A Mulher

A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher


(Convenção de Belém do Pará) foi concluída pela Assembleia Geral da OEA em Belém do Pará, no Brasil, em
9 de junho de 1994. Foi aprovada pelo Brasil a partir do Decreto Legislativo n° 107, de 31 de agosto de 1995
e promulgado pelo Decreto n° 1.973, de 1° de agosto de 1996.
A Convenção é composta por 25 artigos, divididos em 5 capítulos: definição e âmbito de aplicação
(arts. 1° e 2°), direitos protegidos (arts. 3° ao 6°), deveres dos Estados (7° ao 9°), mecanismos interamericanos
de proteção (arts. 10 e 12), disposições gerais (arts. 13 a 25).
Em seu art. 1°, a violência contra a mulher é definida como: qualquer ato ou conduta baseada no
gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública
como na esfera privada.
Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por
todos os meios apropriados e sem demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a
empenhar-se em incorporar na sua legislação interna normas penais, civis, administrativas e de outra
natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como
adotar as medidas administrativas adequadas que forem aplicáveis. O Brasil editou, portanto, a Lei n°
11.340/2006, a Lei Maria da Penha, que criou mecanismos internos para coibir a violência doméstica e
familiar contra a mulher.
Dessa forma, os Estados-Partes condenam a discriminação contra a mulher em todas as suas formas,
concordam em seguir, por todos os meios apropriados e sem dilações, uma política destinada a eliminar a
discriminação contra a mulher, e com tal objetivo se comprometem a:

a) Consagrar, se ainda não o tiverem feito, em suas constituições nacionais ou em outra legislação
apropriada o princípio da igualdade do homem e da mulher e assegurar por lei outros meios
apropriados a realização prática desse princípio;
b) Adotar medidas adequadas, legislativas e de outro caráter, com as sanções cabíveis e que proíbam
toda discriminação contra a mulher;
c) Estabelecer a proteção jurídica dos direitos da mulher numa base de igualdade com os do homem
e garantir, por meio dos tribunais nacionais competentes e de outras instituições públicas, a proteção
efetiva da mulher contra todo ato de discriminação;
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

d) Abster-se de incorrer em todo ato ou prática de discriminação contra a mulher e zelar para que as
autoridades e instituições públicas atuem em conformidade com esta obrigação;
e) Tomar as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher praticada por
qualquer pessoa, organização ou empresa;
f) Adotar todas as medidas adequadas, inclusive de caráter legislativo, para modificar ou derrogar
leis, regulamentos, usos e práticas que constituam discriminação contra a mulher; e
g) Derrogar todas as disposições penais nacionais que constituam discriminação contra a mulher.

Toda mulher tem direito ao reconhecimento, desfrute, exercício e proteção de todos os direitos
humanos e liberdades consagrados em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos
humanos. Estes direitos abrangem, entre outros:

a) direito a que se respeite sua vida;


b) direito a que se respeite sua integridade física, mental e moral;
c) direito à liberdade e à segurança pessoais;
d) direito a não ser submetida a tortura;
e) direito a que se respeite a dignidade inerente à sua pessoa e a que se proteja sua família;
f) direito a igual proteção perante a lei e da lei;
g) direito a recurso simples e rápido perante tribunal competente que a proteja contra atos que
violem seus direitos;
h) direito de livre associação;
i) direito à liberdade de professar a própria religião e as próprias crenças, de acordo com a lei; e
j) direito a ter igualdade de acesso às funções públicas de seu país e a participar nos assuntos
públicos, inclusive na tomada de decisões.

Os mecanismos de proteção previstos são:

i. Informes à Convenção Interamericana de Mulheres;


ii. Pedido de opinião consultiva sobre a interpretação da Convenção à Corte Interamericana de
Direitos Humanos;
iii. Petição de qualquer pessoa, grupo de pessoas, ou entidade não governamental legalmente
reconhecida em um ou mais Estados-Membros da OEA, à Comissão Interamericana de Direitos
Humanos; e
iv. Caso cabível, a Comissão pode processar o Estado infrator perante à Corte IDH.

3.4. Proteção Nacional

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3.4.1 Lei N° 11.340/06 (Lei Maria Da Penha)

A CEDAW determina que os Estados-Partes devem tomar as medidas apropriadas para combater as
diversas formas de exploração, violência e discriminação contra a mulher. A Convenção de Belém do Pará,
por sua vez, foi explícita em estabelecer mandados de criminalização de condutas de violência contra a
mulher em seu art. 7°.
O combate penal à violência contra a mulher foi reforçado pelo importante precedente da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos no caso brasileiro “Maria da Penha Maia Fernandes”. Neste caso, a fim
de impedir a repetição das condutas, a Comissão IDH recomendou que o Brasil adotasse medidas legislativas
que protegessem efetivamente a mulher contra a violência.
A Lei n° 11.340, de 7 de agosto de 2006, Lei Maria da Penha, cria mecanismos para coibir e prevenir
a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados
internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres
em situação de violência doméstica e familiar.

São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher na referida lei, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e
diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise
degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz,
insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir
e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou
a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força;
que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar
qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição,
mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus
direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração,
destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens,
valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Por fim, de acordo com o seu art. 6°, a violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma
das formas de violação dos direitos humanos.

4. DIREITO À NÃO DISCRIMINAÇÃO RACIAL

Em relação ao Direito à Não Discriminação Racial, são importantes os estudos acerca do:
● Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos:
- Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965).
● Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos:
- Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas
de Intolerância (2013).
● Proteção Nacional:
- Lei n° 7.716/89 (Lei do Crime Racial).

4.1. Sistema Global De Proteção Dos Direitos Humanos

4.1.1 Convenção Sobre A Eliminação De Todas As Formas De Discriminação Racial

A Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial foi


adotada pela Resolução n° 2.106 (XX) da Assembleia Geral da ONU, em dezembro de 1965. No Brasil, foi
aprovada pelo Decreto Legislativo n° 23, de 21 de junho de 1967 e promulgada pelo Decreto n° 65.810, de
8 de dezembro de 1969.
Em seu preâmbulo, a Convenção condena todas as práticas de segregação e discriminação. Nesse
sentido, qualquer doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa,
moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, em que não existe justificação para a discriminação
racial, em teoria ou na prática, em lugar algum.
O foco da Convenção é o combate à discriminação racial, tendo sido adotada em um contexto
histórico no qual ainda existiam Estados com políticas internas oficiais de segregação racial, a exemplo da
África do Sul, que vivia o auge do apertheid.

A definição de discriminação racial é apontada pela Convenção em seu art. 1°:


(i) toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou
origem nacional ou étnica (ii) que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento,
gozo ou exercício em um mesmo plano (em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades
fundamentais (iii) nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida
pública.
Os Estados comprometem-se a adotar uma política de eliminação da discriminação racial, devendo
cada Estado abster-se de praticar ato de discriminação racial contra pessoas, grupos de pessoas ou
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

instituições e de abster-se de encorajar, defender ou apoiar a discriminação racial praticada por uma pessoa
ou organização qualquer.
Em relação às ações afirmativas, a Convenção, em seu art. 1.4, afirma que
são legítimas as medidas
especiais tomadas com o único objetivo de assegurar o progresso adequado de certos grupos raciais ou
étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais
grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que
tais medidas não conduzam, em consequência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos
raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos.

Já em relação ao mecanismo de monitoramento, a Convenção determinou a criação do Comitê


para a Eliminação da Discriminação Racial, que exerce as seguintes competências:
a. Exame de relatórios periódicos, que devem ser apresentados no prazo de um ano da entrada
em vigor da Convenção e, a partir de então, a cada dois anos e sempre que o Comitê solicitar.
b. O Comitê elabora um relatório contendo recomendações aos Estados, sem força vinculante;
c. Exame de comunicações interestatais; e
d. Exame de comunicações individuais ou de grupos de indivíduos que se consideram vítimas
de violações de direitos nela protegidos.

O art. 14 da Convenção prevê que: Todo Estado parte poderá declarar a qualquer momento que
reconhece a competência do Comitê para receber e examinar comunicações de indivíduos ou grupos de
indivíduos sob sua jurisdição que se consideram vítimas de uma violação pelo referido Estado Parte, de
qualquer um dos direitos enunciados na presente Convenção.
Por meio do Decreto n° 4.738, de 12 de junho de 2003, o Brasil promulgou a Declaração Facultativa
prevista no art. 14 da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Racial, reconhecendo a competência do Comitê Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial para
receber e analisar denúncias de violação dos direitos humanos cobertos na mencionada Convenção.

4.2 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos

4.2.1 Convenção Interamericana Contra O Racismo, A Discriminação Racial E Formas Correlatas De


Intolerância

A Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de


Intolerância foi firmada na 43ª Sessão Ordinária da Assembleia Geral da Organização dos Estados
Americanos, na Guatemala, em 5 de junho de 2013, e se trata do Tratado Internacional do Sistema
Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos que protege o direito à não discriminação racial. No Brasil,
foi aprovada a partir do Decreto Legislativo n° 1, de 18 de fevereiro de 2018 e promulgada pelo Decreto n°
10.932, de 10 de janeiro de 2022.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Considerando que o Congresso Nacional aprovou a Convenção por meio do Decreto Legislativo nº 1,
de 18 de fevereiro de 2021, conforme o procedimento de que trata o § 3º do art. 5º da CRFB/88, ela possui
status de Emenda Constitucional.

Importante! São Tratados Internacionais de Direitos Humanos com status de Emenda


Constitucional:
⮚ Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Decreto n°
6.949/2009);
⮚ Protocolo Facultativo à Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com
Deficiência (Decreto n° 6.949/2009);
⮚ Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas às Pessoas Cegas,
com Deficiência Visual ou com Outras Dificuldades para Ter Acesso ao Texto Impresso
(Decreto n° 9.522/2018); e
⮚ Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas
Correlatas de Intolerância (Decreto n° 10.932/2022).

A Convenção estabelece o dever de todos os Estados de erradicar total e incondicionalmente o


racismo, a discriminação racial e toda forma de intolerância. Fica estabelecido, ainda, que o Estado
Democrático deve fomentar a igualdade jurídica efetiva e ainda criar mecanismos que favoreçam a igualdade
de oportunidades, combatendo a discriminação racial em todas as suas manifestações individuais, estruturais
e institucionais.

É de suma importância saber identificar definições


as estabelecidas pelo art. 1° da Convenção:

● Discriminação Racial: qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, em qualquer área da


vida pública ou privada, cujo propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou
exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais
consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes. A discriminação racial
pode basear-se em raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica.

● Discriminação Racial Indireta: É aquela que ocorre, em qualquer esfera da vida pública ou privada,
quando um dispositivo, prática ou critério aparentemente neutro tem a capacidade de acarretar uma
desvantagem particular para pessoas pertencentes a um grupo específico, com base nas razões
estabelecidas no Artigo 1.1, ou as coloca em desvantagem, a menos que esse dispositivo, prática ou
critério tenha um objetivo ou justificativa razoável e legítima à luz do Direito Internacional dos
Direitos Humanos.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Discriminação Múltipla ou Agravada: É qualquer preferência, distinção, exclusão ou restrição


baseada, de modo concomitante, em dois ou mais critérios dispostos no Artigo 1.1, ou outros
reconhecidos em instrumentos internacionais, cujo objetivo ou resultado seja anular ou restringir o
reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e
liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes,
em qualquer área da vida pública ou privada.

● Racismo: Consiste em qualquer teoria, doutrina, ideologia ou conjunto de ideias que enunciam um
vínculo causal entre as características fenotípicas ou genotípicas de indivíduos ou grupos e seus
traços intelectuais, culturais e de personalidade, inclusive o falso conceito de superioridade racial. O
racismo ocasiona desigualdades raciais e a noção de que as relações discriminatórias entre grupos
são moral e cientificamente justificadas. Toda teoria, doutrina, ideologia e conjunto de ideias racistas
descritas neste Artigo são cientificamente falsas, moralmente censuráveis, socialmente injustas e
contrárias aos princípios fundamentais do Direito Internacional e, portanto, perturbam gravemente
a paz e a segurança internacional, sendo, dessa maneira, condenadas pelos Estados Partes.

● Medidas Especiais ou de Ação Afirmativa: São aquelas adotadas com a finalidade de assegurar o
gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades
fundamentais de grupos que requeiram essa proteção não constituirão discriminação racial, desde
que essas medidas não levem à manutenção de direitos separados para grupos diferentes e não se
perpetuem uma vez alcançados seus objetivos.

● Intolerância: É um ato ou conjunto de atos ou manifestações que denotam desrespeito, rejeição ou


desprezo à dignidade, características, convicções ou opiniões de pessoas por serem diferentes ou
contrárias. Pode manifestar-se como a marginalização e a exclusão de grupos em condições de
vulnerabilidade da participação em qualquer esfera da vida pública ou privada ou como violência
contra esses grupos.

A Convenção, portanto, é composta por 22 artigos, que abordam as seguintes temáticas:


● Art. 1°: Definições;
● Art. 2° e 3°: Direitos protegidos;
● Art. 4°: Reconhecimento do dever do Estado em prevenir, eliminar, proibir e sancionar todos os
atos de racismo, discriminação racial e formas correlatas de intolerância;
● Arts. 5° e 6°: Adoção de políticas e ações afirmativas;
● Art. 7°: Mandados de criminalização;
● Arts. 8° ao 14: Adoção de leis contra o racismo;
● Art. 15: Mecanismos de proteção e acompanhamento;
● Arts. 16 ao 22: Disposições gerais.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Assim como na Convenção Internacional, não se considera discriminação odiosa as medidas especiais
ou ações afirmativas adotadas para assegurar a igualdade material e o exercício de direitos por parte de
determinados grupos.

Em relação aos mecanismos de proteção e monitoramento, são eles:


● Petição Individual, encaminhada à Comissão IDH;
● Petição Interestatal, encaminhada à Comissão IDH;
● Assessoria e Assistência Técnica da Comissão IDH;
● Competência contenciosa da Corte IDH; e
● Comitê Interamericano para a Prevenção e Eliminação do Racismo, Discriminação Racial e Todas as
Formas de Discriminação e Intolerância.

O Comitê Interamericano para a Prevenção e Eliminação do Racismo, Discriminação Racial e Todas


as Formas de Discriminação e Intolerância será constituído por um perito nomeado por cada Estado-Parte,
que exercerá suas funções de maneira independente e cuja tarefa será monitorar os compromissos
assumidos nesta Convenção. O Comitê também será responsável por monitorar os compromissos assumidos
pelos Estados que são partes na Convenção Interamericana contra Toda Forma de Discriminação e
Intolerância.
Ademais, o Comitê será o foro para intercambiar ideias e experiências, bem como examinar o
progresso alcançado pelos Estados-Partes na implementação desta Convenção e qualquer circunstância ou
dificuldade que afete seu cumprimento em alguma medida. Os Estados-Partes comprometem-se a
apresentar relatório ao Comitê, a cada 4 anos, devendo constar dados e estatísticas desagregados sobre os
grupos vulneráveis.

4.3 Proteção Nacional

4.3.1 Constituição Da República Federativa Do Brasil De 1988

É um objetivo da República Federativa do Brasil, no art. 3°, inciso IV, da CRFB/88, o combate ao
racismo, assim como é um princípio das relações internacionais, previsto no art. 4°, inciso VIII, da CRFB/88.
O racismo consta como um mandado de criminalização. A CRFB/88 é clara ao estipular que o racismo
é inafiançável, imprescritível e sujeito à pena de reclusão, em seu art. 5°, inciso XLII, da CRFB/88. Traz, ainda,
a proteção das manifestações culturais múltiplas em seu art. 216, §5º.
De igual modo, a CRFB/88 teve uma preocupação expressa na proteção dos diversos grupos étnicos
e raciais que formam o Brasil, com destaque para os indígenas e afrodescendentes, no art. 216, de modo que
todas as formas de viver, agir e se expressar oriundas da formação cultural afrodescendente no Brasil estão
protegidas, sendo os documentos e sítios detentores de reminiscências automaticamente tombados.
213
RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

4.3.1.1 Lei Do Crime Racial (Lei N° 7.716/89)

A proteção de direitos humanos impõe limites materiais e formais ao direito penal e à persecução
criminal, mas, ao mesmo tempo, exige que o Estado estabeleça a tutela penal contra condutas de violação
de direitos humanos.
Assim, o direito penal não é só limitado pela Constituição e pelos tratados, mas em algumas
situações, sua aplicação é exigida como instrumento essencial de proteção de bens jurídicos. Isto é, ao
mesmo tempo em que se proíbe o excesso, proíbe-se a proteção insuficiente (princípio da vedação da
proteção deficiente).
Em um Estado Democrático de Direito, o Poder Público não pode se omitir na promoção dos direitos
humanos, devendo protegê-los inclusive com o instrumento penal.
No âmbito de proteção do ordenamento jurídico brasileiro, o art. 5°, inciso XLII, da CRFB/88 traz um
verdadeiro mandado constitucional de criminalização, tendo sido editada a Lei n° 7.716 (Lei do Crime
Racial), em 5 de janeiro de 1989, a qual afirma em seu art. 1° que: Serão punidos, na forma desta Lei, os
crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

4.3.1.2 Lei N° 14.532/2023

A Lei n° 14.532, de 11 de janeiro de 2023, altera a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 (Lei do Crime
Racial), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para
tipificar como crime de
racismo a injúria racial, prever pena de suspensão de direito em caso de racismo praticado no contexto de
atividade esportiva ou artística e prever pena para o racismo religioso e recreativo e para o praticado por
funcionário público.
Dessa forma, a partir da edição da Lei n° 14.532/2023, o crime de injúria racial será considerado
espécie do gênero racismo, consequenciando a sua imprescritibilidade, inafiançabilidade, além de sua ação
penal tornar-se pública incondicionada.

4.3.1.3 Jurisprudência Nacional

4.3.1.3.1 Caso Ellwanger

Em 2003, o STF julgou o HC 82.424-2, também conhecido como Caso Ellwanger, que tratou de um
dos principais marcos da temática do racismo no Brasil. Ellwanger era um homem gaúcho que editava livros
antissemitas, tendo sido acusado pelo crime de racismo. Em sua defesa, alegou que judeus não eram uma
raça, razão pela qual não poderia ser processado por essa conduta.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O STF, no entanto, definiu que a noção de raça não é biológica, mas sim um constructo sociocultural.
Não há, de fato, diferenças biológicas entre os seres humanos, sendo certo que na essência todos são iguais,
de modo que a divisão em raças resulta de um processo de conteúdo político e social.
Desse modo, o crime de discriminação por religião concretiza o crime de racismo e, com isto, está
sujeita ao regime constitucional punitivo da inafiançabilidade, imprescritibilidade e determinação de pena
de reclusão previsto no art. 5º, inciso XLII, da CRFB/88.

4.3.1.3.2 Homofobia e Transfobia

Em 2019, o STF julgou procedentes os pedidos formulados na ADO 26 e no MI 4.733, para determinar
que i) até que o Congresso Nacional edite lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou
supostas, se enquadram nos crimes previstos na Lei 7.716/2018 e, no caso de homicídio doloso, constitui
circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe; ii) a repressão penal à prática da homotransfobia
não alcança nem restringe o exercício da liberdade religiosa, desde que tais manifestações não configurem
discurso de ódio; e iii) o conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e
alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis.
Portanto, verifica-se que o STF enquadrou as condutas homofóbicas e transfóbicas ao crime de
racismo, em sua dimensão social.

5. DIREITO À ORIENTAÇÃO SEXUAL E À IDENTIDADE DE GÊNERO

Primeiramente, insta salientar que não há nenhum Tratado Internacional de proteção à orientação
sexual e à identidade de gênero, havendo apenas documentos de soft law, como os Princípios de Yogyakarta
e os Princípios de Yogyakarta+10, que têm apenas caráter de recomendação.

5.1 Direito à igualdade e à não discriminação

A noção de igualdade depreende-se diretamente da natureza de gênero humano e é inseparável da


dignidade essencial da pessoa, de modo que é incompatível toda situação que, por considerar um grupo
superior, o trate com privilégio ou, por considerá-lo inferior, o trate com hostilidade ou de qualquer forma o
discrimine de gozar direitos reconhecidos a quem não está na mesma situação.
Os Estados devem abster-se de realizar ações que de qualquer maneira sejam dirigidas, direta ou
indiretamente, a criar situações de discriminação de direito ou de fato.
O princípio da igualdade e da não discriminação ingressou no domínio de jus cogens, sendo
apresentado no art. 1.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos:

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Art. 1.1, CADH: Os Estados Partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos
e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja
sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, idioma,
religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição
econômica, nascimento ou qualquer outra condição social.

Os tratados internacionais de direitos humanos são instrumentos vivos, cuja interpretação deve
acompanhar a evolução do tempo e as condições de vida atuais. Nesse sentido, ao interpretar a expressão
qualquer outra condição social é necessário eleger a alternativa mais favorável para a tutela dos direitos
protegidos pelo tratado, à luz do princípio do pro homine.
Os critérios trazidos pelo art. 1.1 da CADH não constituem um rol taxativo, mas meramente
exemplificativo, de modo que a expressão final incorpora outras categorias não explicitamente indicadas.
Assim, a expressão deve ser interpretada na perspectiva de opção mais favorável à pessoa e da
evolução dos direitos fundamentais no direito internacional contemporâneo.
De igual modo, o Comitê de Direitos Humanos qualificou a orientação sexual e a identidade de gênero
como categorias de discriminação proibida no art. 2.1 do PIDCP. O Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais pronunciou-se no mesmo sentido em relação ao art. 2.2 do PIDESC.
do que a orientação sexual e a identidade
A Corte IDH, na Opinião Consultiva n° 24, deixou estabeleci
de gênero são categorias protegidas pela CADH, estando prescrita qualquer norma, ato ou prática
discriminatória baseada na orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero da pessoa.

5.2 Direito à Identidade de Gênero

A identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal,


cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la, nunca de constituí-la.
A CADH protege um dos valores mais fundamentais da pessoa humana, que é o reconhecimento de
sua dignidade, sendo certo que um aspecto central do reconhecimento da dignidade é a possibilidade de
todo ser humano de se autodeterminar e escolher livremente as opções e circunstâncias que dão sentido à
sua existência, conforme suas próprias convicções.
O papel fundamental da autonomia é vedar a atuação estatal que procure a instrumentalização da
pessoa, convertendo-a em um meio para fins estranhos às suas próprias escolhas dentro dos limites que
impõe sua própria convicção.
A falta de reconhecimento da identidade de gênero pode resultar em uma censura indireta às
expressões de gênero que se distanciam do padrão cisnormativo e heteronormativo, enviando uma
mensagem generalizada de que as pessoas que se afastam do referido padrão não contam com proteção
legal e reconhecimento de seus direitos em igualdade de condições e respeito.
A identidade de gênero é um elemento constitutivo e constituinte da identidade das pessoas, o que
faz com que seu reconhecimento seja de vital importância para garantir o pleno gozo dos direitos humanos
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

da pessoa transgênero, incluindo a proteção contra a violência, tortura, maus tratos, direito à saúde, à
educação, ao emprego etc.
O direito de as pessoas definirem de maneira autônoma sua própria identidade sexual e de gênero é
efetivada quando as definições concordam com os dados de identificação consignados nos registros de
identidade.
Deve ser assegurado o direito de cada pessoa de que os atributos de personalidade anotados nos
registros de identificação coincidam com as definições de identidade que as pessoas têm de si mesmo e, caso
não exista tal correspondência, deve ser assegurado o direito de se modificar.

5.3 Direito ao Nome

O nome é o direito da personalidade que funciona como elemento designativo da pessoa, com a
finalidade de afirmar a identidade da pessoa diante da sociedade.
A mudança de nome, a adequação da imagem, assim como a retificação à menção do sexo ou gênero
nos registros e nos documentos de identidade para que estejam de acordo com a identidade de gênero auto
percebida é direito protegido pela CADH, nos arts. 18, 3º, 7.1, 11.2.
Os Estados devem respeitar a integridade física e psíquica das pessoas, reconhecendo a identidade
de gênero auto percebida sem que existam obstáculos ou requisitos abusivos que possam constituir violações
a direitos humanos.
Por certo, as pessoas transgênero são submetidas a obstáculos para alcançar o respeito e
reconhecimento de sua identidade de gênero que as pessoas cisgênero não devem enfrentar.
No cenário judicial brasileiro, a pretensão de alteração da identidade civil recebe um tratamento
patologizante, não sendo rara a imposição de cirurgia como condição para o acesso à identidade civil
compatível com a auto percepção de gênero.
Fato é que submeter o reconhecimento à identidade de gênero de uma pessoa transgênero a uma
cirurgia ou a um tratamento de esterilização que não deseja implicaria condicionar o pleno exercício da vida
privada, entre eles o da vida privada (art. 11.2, CADH), a escolher livremente as opções que dão sentido à
sua existência (art. 7º, CADH) e implicaria na renúncia ao pleno gozo de seu direito à integridade pessoal.

5.4 Direito à Orientação Sexual

Na atualidade, existem diversas formas de se materializarem vínculos familiares que não se limitam
às relações fundadas no matrimônio.
Apesar de o art. 17.2 da CADH tratar literalmente do direito do homem e da mulher contraírem
matrimônio e fundar uma família, a Corte IDH entende que esta não seria a única forma de constituição de
uma família, mas apenas uma das opções protegidas pela própria CADH, devendo os tratados de direitos
humanos serem interpretados como instrumentos vivos que devem acompanhar a evolução dos tempos e
das condições de vida atuais.
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SEMANA 07/12

Nesse passo, uma interpretação que exclui a proteção interamericana do vínculo afetivo de pessoas
do mesmo sexo frustraria o objeto e a finalidade da Convenção, que são os direitos fundamentais dos seres
humanos sem distinção alguma.
A Corte IDH e a Corte Europeia coincidem ao tratar da impossibilidade de interpretar que um casal
do mesmo sexo não pode gozar de um vínculo familiar como poderia fazer um casal heterossexual.

5.5.1 Conceitos

a. Sexo: Refere-se às diferenças biológicas entre homem e mulher, às suas características fisiológicas, à
soma de características que definem o espectro de pessoas como homens e mulheres ou à construção
biológica que se refere às características genéticas, hormonais, anatômicas e fisiológicas sobre como
uma pessoa é classificada como macho ou fêmea.
b. Sexo atribuído ao nascer: Esta ideia transcende o conceito de sexo como feminino e masculino e está
associado à determinação de sexo como uma construção social, com base na percepção que outros têm
sobre a genitália.
c. Sistema binário de sexo/gênero: Modelo social e cultural dominante na cultura ocidental, considerando
que o gênero e o sexo abarcam apenas duas categorias rígidas: homem/masculino e mulher/feminino.
d. Intersexualidade: Situações em que a anatomia sexual de uma pessoa não se ajusta fisicamente aos
padrões culturalmente definidos para o corpo masculino e feminino. A pessoa intersexual nasce com
uma anatomia sexual, órgãos reprodutivos ou padrões cromossômicos que não se ajustam à definição
típica de homem ou de mulher.
e. Gênero: Refere-se às identidades, às funções e aos atributos construídos socialmente de mulher e
homem e ao significado social e cultural que se atribui a estas diferenças biológicas.
f. Identidade de gênero: Experiência interna, individual e profundamente sentida que cada pessoa tem
em relação ao gênero, que pode, ou não, corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo-se
aí o sentimento pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou
função corporal por meios médicos, cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive o
modo de vestir-se, o modo de falar e maneirismos.
g. Transgênero: Ocorre quando a identidade ou expressão de gênero de uma pessoa é diferente daquele
que tipicamente é associado ao sexo designado no nascimento.
h. Pessoa transexual: Sentem-se e concebem-se como pertencentes ao gênero oposto ao que social e
culturalmente designa-se ao seu sexo biológico, adequando sua aparência física/biológica à sua
realidade psíquica, espiritual e social.
i. Pessoa travesti: Manifesta uma expressão de gênero, seja de maneira transitória, seja de maneira
permanente, mediante a utilização de roupas e atitudes do gênero oposto que social e culturalmente
são associados ao sexo.
j. Pessoa cisgênero: A identidade de gênero da pessoa corresponde com o sexo designado ao nascer.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

k. Orientação sexual: Capacidade de cada pessoa de experimentar uma profunda atração emocional,
afetiva ou sexual por indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero, assim
como de ter relações íntimas e sexuais com essas pessoas;
l. Homofobia: Temor, ódio, aversão irracional contra pessoas gays, lésbicas e bissexuais.
m. Transfobia: Temor, ódio, aversão irracional contra pessoas transexuais.
n. Cisnormatividade: Ideia ou expectativa de que todas as pessoas são cisgênero e que aquelas que são
designadas como sexo masculino ao nascer sempre crescem para ser homens e aquelas designadas com
o sexo feminino crescem sempre para serem mulheres.
o. Heteronormatividade: Viés cultural a favor das relações heterossexuais, consideradas normais, naturais
e ideais, preferidas em relação às relações do mesmo sexo ou gênero.
p. LGBTQIAPN+: Lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queers, intersexuais, assexuais, pansexuais, não
binários e outros, não se tratando de um rol taxativo, finito em si.

5.5 Discriminação Histórica

O grupo de pessoas LGBTQIAPN+ historicamente são vítimas de discriminação estrutural,


estigmatização e diversas formas de violência e de violação aos seus direitos fundamentais, encontrando-
ar e
se particularmente expostos ao risco de violência física, psicológica e sexual no âmbito famili
comunitário.
Fato é que o grupo de pessoas LGBTQIAPN+ também sofrem discriminações oficiais, na forma de lei
e políticas públicas que tipificam penalmente a homossexualidade, proíbem certas formas de emprego,
negam acesso a benefícios públicos e discriminações extraoficiais, na forma de estigma social, exclusão e
preconceito, inclusive no trabalho, na escola, em casa e nos estabelecimentos de saúde.

Atualização: Sigla LGBTQIAPN+ abrange as lésbicas, os gays, os bissexuais, os transexuais, os


queers, os intersexuais, os assexuais, os pansexuais, os não binários e mais (ou seja, não se
trata de um rol taxativo, finito em si).

5.6 Soft Law

5.6.1 Princípios De Yogyakarta

Conforme já dito não existe, até o presente momento, um tratado internacional de direitos
humanos que trate sobre os direitos das pessoas LGBTQIAPN+, aplicando-se a estes grupos as normativas
gerais – CADH, PIDCP, PIDESC – que trazem obrigações gerais dos Estados de não discriminação.
Trata-se de Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação
à orientação sexual e identidade de gênero, derivados de uma reunião de especialistas estudiosos da
orientação sexual, sendo uma declaração feita por especialistas sem força cogente sobre os Estados.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O caráter é de soft law, servindo como um vetor de interpretação dos direitos humanos para lidar
com os conflitos envolvendo direitos das pessoas LGBTQIAPN+. Foram extraídos direitos civis, políticos,
econômicos e sociais e realizado um recorte para os direitos de orientação sexual e identidade de gênero.
O foco dos princípios é reconhecer a identidade de gênero e a orientação sexual como elementos
necessários à dignidade da pessoa humana, bem como combater a discriminação.
Os princípios trazem a obrigação dos Estados de adotarem medidas legislativas, administrativas e de
qualquer outra espécie que sejam necessárias para respeitar plenamente e reconhecer legalmente o direito
de cada pessoa à identidade de gênero que ela defina para si.
Os fundamentos da edição dos Princípios são a preocupação com a violência, assédio, discriminação,
exclusão, estigmatização e preconceito dirigidos contra pessoas em todas as partes do mundo por causa de
sua orientação sexual ou identidade de gênero.
Além disto, estipulam que ninguém será obrigado a se submeter a procedimentos médicos, incluindo
esterilização, cirurgia de redesignação de sexo e terapia hormonal como requisito para o reconhecimento
legal de sua identidade de gênero.

São direitos tutelados neste documento internacional, no corpo dos seus 29 artigos:

PRINCÍPIO 1. Direito ao Gozo Universal dos Direitos Humanos;


PRINCÍPIO 2. Direito à Igualdade e a Não-Discriminação;
PRINCÍPIO 3. Direito ao Reconhecimento Perante a Lei;
PRINCÍPIO 4. Direito à Vida;
PRINCÍPIO 5. Direito à Segurança Pessoal;
PRINCÍPIO 6. Direito à Privacidade;
PRINCÍPIO 7. Direito de Não Sofrer Privação Arbitrária da Liberdade;
PRINCÍPIO 8. Direito a um Julgamento Justo;
PRINCÍPIO 9. Direito a Tratamento Humano durante a Detenção
PRINCÍPIO 10. Direito de Não Sofrer Tortura e Tratamento ou Castigo Cruel, Desumano e Degradante;
PRINCÍPIO 11. Direito à Proteção Contra todas as Formas de Exploração, Venda ou Tráfico de Seres
Humanos;
PRINCÍPIO 12. Direito ao Trabalho;
PRINCÍPIO 13. Direito à Seguridade Social e outras Medidas de Proteção Social;
PRINCÍPIO 14. Direito a um Padrão de Vida Adequado;
PRINCÍPIO 15. Direito à Habitação Adequada;
PRINCÍPIO 16. Direito à Educação;
PRINCÍPIO 17. Direito ao Padrão mais Alto Alcançável de Saúde;
PRINCÍPIO 18. Proteção contra Abusos Médicos;
PRINCÍPIO 19. Direito à Liberdade de Opinião e Expressão;
PRINCÍPIO 20. Direito à Liberdade de Reunião e Associação Pacíficas;
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SEMANA 07/12

PRINCÍPIO 21. Direito à Liberdade de Pensamento, Consciência e Religião;


PRINCÍPIO 22. Direito à Liberdade de Ir e Vir;
PRINCÍPIO 23. Direito de Buscar Asilo;
PRINCÍPIO 24. Direito de Constituir uma Família;
PRINCÍPIO 25. Direito de Participar da Vida Pública;
PRINCÍPIO 26. Direito de Participar da Vida Cultural;
PRINCÍPIO 27. Direito de Promover os Direitos Humanos;
PRINCÍPIO 28. Direito a Recursos Jurídicos e Medidas Corretivas Eficazes; e
PRINCÍPIO 29. Responsabilização (“Accountability”).

CAIU EM PROVA:

→ (VUNESP/2022/PC-SP/Delegado de Polícia) Um grupo eminente de especialistas em direitos humanos


preparou um documento preliminar, desenvolveu, discutiu e refinou. Depois de uma reunião de
especialistas, realizada na Universidade Gadjah Mada, entre 6 e 9 de novembro de 2006, 29 eminentes
especialistas de 25 países, com experiências diversas e conhecimento relevante das questões da legislação
de direitos humanos, adotaram por unanimidade regras sobre a Aplicação da Legislação Internacional de
Direitos Humanos em relação à Orientação Sexual e Identidade de Gênero. O relator da reunião, professor
Michael O’Flaherty, deu uma contribuição imensa. Tais regras possuem um amplo espectro de normas de
direitos humanos e de sua aplicação a questões de orientação sexual e identidade de gênero. É correto
afirmar que o enunciado se refere
a) aos Princípios de Yogyakarta.
b) às Regras de Bangkok.
c) ao Estatuto de Roma.
d) às Regras de Tóquio.
e) à Convenção Americana de Direitos Humanos.

Comentários:
a) Correta. Trata-se dos Princípios Sobre A Aplicação Da Legislação Internacional De Direitos Humanos Em
Relação À Orientação Sexual E Identidade De Gênero.
b) Incorreta. Trata-se das Regras Das Nações Unidas Para O Tratamento De Mulheres Presas E Medidas Não
Privativas De Liberdade Para Mulheres Infratoras.
c) Incorreta. O Estatuto de Roma tutela o Tribunal Penal Internacional.
d) Trata-se de Regras Mínimas Padrão Das Nações Unidas Para A Elaboração De Medidas Não Privativas De
Liberdade.
e) Incorreta. Trata-se da principal Convenção do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos.

Gabarito: Alternativa a.
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RETA FINAL

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SEMANA 07/12

5.6.2 Princípios De Yogyakarta+10

Em 10 de novembro de 2017 foram aprovados, em Genebra, os Princípios de Yogyakarta + 10, que


se tratam de 10 Princípios e Obrigações Estatais Adicionais aos Princípios de Yogyakarta originais, que se
consubstanciam em:
PRINCÍPIO 30: Direito à Proteção do Estado;
PRINCÍPIO 31: Direito ao Reconhecimento Legal;
PRINCÍPIO 32: Direito à Integridade Corporal e Mental;
PRINCÍPIO 33: Direito de Viver Livre de Qualquer Forma de Criminalização ou Sanção baseadas na
orientação sexual, na identidade de gênero, na expressão de gênero e nas características sexuais;
PRINCÍPIO 34: Direito à Proteção contra a Pobreza;
PRINCÍPIO 35: Direito ao Saneamento;
PRINCÍPIO 36: Direito de Desfrutar dos Direitos Humanos em relação às Tecnologias da Informação
e da Comunicação;
PRINCÍPIO 37: Direito à Verdade; e
PRINCÍPIO 38: Direito de Praticar, Proteger, Preservar e Viver a Diversidade Cultural.

6. DIREITOS DAS PESSOAS RECLUSAS

Em relação aos Direitos dos Reclusos, não existem Tratados Internacionais que os tutelem
especificamente. Entretanto, há documentos de soft law, que são consideradas meras recomendações e não
têm força vinculante.

6.1 Soft Law

6.1.1 Regras Mínimas Das Nações Unidas Para O Tratamento De Reclusos

As Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos (Regras de Mandela) foram
adotadas pelo I Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e para o Tratamento de
Delinquentes, realizada em Genebra, em 31 de agosto de 1955. Em maio de 2015, foram atualizadas pela
Comissão das Nações Unidas sobre Prevenção do Crime e Justiça Criminal, tendo tais atualizações sido
aprovadas pela Assembleia Geral da ONU.
As Regras Mínimas possuem natureza de soft law, que consiste no conjunto de normas não
vinculantes de Direito Internacional, mas que podem ser transformadas em normas vinculantes
posteriormente. Dessa forma, servem como meras recomendações aos Estados, não possuindo caráter
vinculante.
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SEMANA 07/12

São compostas por 122 artigos, que estão divididos em 3 seções: observações preliminares, regras
de aplicação (Parte I, Regras 1 a 85) e regras aplicáveis a categorias especiais (Parte II, Regras 86 a 122).
Em relação às observações preliminares, afirma-se que as regras não pretendem descrever em
pormenor um modelo de sistema prisional. Procuram unicamente, com base no consenso geral do
pensamento atual e nos elementos essenciais dos sistemas contemporâneos mais adequados, estabelecer o
que geralmente se aceita como sendo bons princípios e práticas no tratamento dos reclusos e na gestão dos
estabelecimentos prisionais.
Em relação às regras de aplicação, a primeira parte trata de matérias relativas à administração geral
dos estabelecimentos prisionais e é aplicável a todas as categorias de reclusos, dos foros criminal ou civil, em
regime de prisão preventiva ou já condenados, incluindo os que estejam detidos por aplicação de “medidas
de segurança” ou que sejam objeto de medidas de reeducação ordenadas por um juiz.
Já a segunda parte contém as regras que são especificamente aplicáveis às categorias de reclusos de
cada secção. Contudo, as regras da secção A, aplicáveis aos reclusos condenados, serão também aplicadas às
categorias de reclusos a que se referem as secções B, C e D, desde que não sejam contraditórias com as regras
específicas destas secções e na condição de representarem uma melhoria de condições para estes reclusos.
Em relação aos princípios básicos, a aplicação das Regras deve ser feita de modo imparcial, pois não
haverá discriminação alguma com base em raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra, origem
nacional ou social, meios de fortuna, nascimento ou outra condição.
Os objetivos de uma pena de prisão ou de qualquer outra medida restritiva da liberdade são,
prioritariamente, proteger a sociedade contra a criminalidade e reduzir a reincidência. Estes objetivos só
podem ser alcançados se o período de detenção for utilizado para assegurar, sempre que possível, a
reintegração destas pessoas na sociedade após a sua libertação, para que possam levar uma vida
autossuficiente e de respeito para com as leis.
Em relação à separação por categorias, as diferentes categorias de reclusos devem ser mantidas em
estabelecimentos prisionais separados ou em diferentes zonas de um mesmo estabelecimento prisional,
tendo em consideração o respetivo sexo e idade, antecedentes criminais, razões da detenção e medidas
necessárias a aplicar. Assim:

(a) Homens e mulheres devem ficar detidos em estabelecimentos separados; nos estabelecimentos
que recebam homens e mulheres, todos os locais destinados às mulheres devem ser completamente
separados;
(b) Presos preventivos devem ser mantidos separados dos condenados;
(c) Pessoas detidas por dívidas ou outros reclusos do foro civil devem ser mantidos separados dos
reclusos do foro criminal;
(d) Os jovens reclusos devem ser mantidos separados dos adultos.

No que tange ao alojamento, as celas ou locais destinados ao descanso noturno não devem ser
ocupados por mais de um recluso. Se, por razões especiais, tais como excesso temporário de população
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

prisional, for necessário que a administração prisional central adote exceções a esta regra deve evitar-se que
dois reclusos sejam alojados numa mesma cela ou local.
Em relação aos serviços médicos, nos estabelecimentos prisionais para mulheres devem existir
instalações especiais para o tratamento das reclusas grávidas, das que tenham acabado de dar à luz e das
convalescentes. Desde que seja possível, devem ser tomadas medidas para que o parto tenha lugar num
hospital civil. Se a criança nascer num estabelecimento prisional, tal facto não deve constar do respetivo
registo de nascimento. A decisão que permite à criança ficar com o seu pai ou com a sua mãe no
estabelecimento prisional deve ser baseada no melhor interesse da criança. Nos estabelecimentos prisionais
que acolhem os filhos de reclusos, devem ser tomadas providências para garantir:

(a) Um infantário interno ou externo, dotado de pessoal qualificado, onde as crianças possam
permanecer quando não estejam ao cuidado dos pais; e
(b) Serviços de saúde pediátricos, incluindo triagem médica no ingresso e monitoração constante de
seu desenvolvimento por especialistas.

As crianças que se encontram nos estabelecimentos prisionais com os pais nunca devem ser tratadas
como prisioneiras.
Em relação às restrições, disciplina e sanções
, em nenhuma circunstância devem as restrições ou
sanções disciplinares implicar tortura, punições ou outra forma de tratamentos cruéis, desumanos ou
degradantes. As seguintes práticas, em particular, devem ser proibidas:

(a) Confinamento solitário indefinido;


(b) Confinamento solitário prolongado;
(c) Detenção em cela escura ou constantemente iluminada;
(d) Castigos corporais ou redução da alimentação ou água potável do recluso; e
(e) Castigos coletivos.

Em relação aos instrumentos de coação, o uso de correntes, de imobilizadores de ferro ou de outros


instrumentos de coação considerados inerentemente degradantes ou penosos deve ser proibido. Outros
instrumentos de coação só devem ser utilizados quando previstos em lei e nas seguintes circunstâncias:

(a) Como medida de precaução contra uma evasão durante uma transferência, desde que sejam
retirados logo que o recluso compareça perante uma autoridade judicial ou administrativa; e
(b) Por ordem do diretor, depois de se terem esgotado todos os outros meios de dominar o recluso,
a fim de o impedir de causar prejuízo a si próprio ou a outros ou de causar danos materiais; nestes
casos o diretor deve consultar o médico com urgência e apresentar um relatório à autoridade
administrativa superior.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Em relação à revista aos reclusos e inspeção de celas, as revistas íntimas invasivas, incluindo o ato
de despir e de inspecionar partes íntimas do corpo, devem ser feitas apenas quando forem absolutamente
necessárias. As administrações prisionais devem ser encorajadas a desenvolver e a utilizar outras alternativas
apropriadas em vez de revistas íntimas invasivas. As revistas íntimas invasivas devem ser conduzidas de forma
privada e por pessoal treinado do mesmo sexo que o recluso inspecionado. Já as revistas das partes íntimas
devem ser conduzidas apenas por profissionais de saúde qualificados, que não sejam os principais
responsáveis pelos cuidados de saúde do recluso, ou, no mínimo, por pessoal adequadamente treinado por
um profissional de saúde em relação aos padrões de higiene, saúde e segurança.
Em relação aos reclusos com transtornos mentais e/ou com problemas de saúde, as pessoas
consideradas inimputáveis, ou a quem, posteriormente, foi diagnosticado uma deficiência mental e/ou um
problema de saúde grave, em relação aos quais a detenção poderia agravar a sua condição, não devem ser
detidas em prisões. Devem ser tomadas medidas para as transferir para um estabelecimento para doentes
mentais o mais depressa possível.
Em relação aos reclusos detidos ou a aguardar julgamento, as pessoas detidas preventivamente
presumem-se inocentes e como tal devem ser tratadas. As pessoas detidas preventivamente devem ser
mantidas separadas dos reclusos condenados. Os jovens detidos preventivamente devem ser mantidos
separados dos adultos e ser, em princípio, detidos em estabelecimentos prisionais separados.

CAIU EM PROVA!
(VUNESP/2018/PC-SP/DELEGADO DE POLÍCIA) Nos moldes das Regras Mínimas das Nações Unidas para o
Tratamento dos Presos (Regras de Mandela), na hipótese de haver uma presa em estado de gravidez ou com
filhos em determinado estabelecimento prisional,
a) após o nascimento da criança, esta poderá ficar com a mãe no estabelecimento prisional, no máximo, até
completar dois anos de idade.
b) os exames pré e pós-natais não devem ser realizados no próprio estabelecimentoisional,
pr devendo a
presa ser conduzida a hospital ou clínica especializada sempre que necessitar.
c) devem-se adotar as medidas para que o nascimento ocorra em hospital fora da unidade prisional, mas se
a criança nascer no próprio estabelecimento prisional, este fato deve constar de sua certidão de nascimento.
d) providências devem ser tomadas para garantir creches internas ou externas dotadas de pessoal
qualificado, onde as crianças poderão ser deixadas quando não estiverem sob o cuidado de seu pai ou sua
mãe.
e) se a mãe, após o nascimento do filho, quiser manter a criança com ela no estabelecimento prisional, essa
decisão deve se basear no melhor interesse da mãe e deve ser tomada pelo Diretor da unidade prisional.

Comentários:
a) Incorreta. As regras não trazem limite de idade.
b) Incorreta. Nas regras, não há óbice que os exames possam ser realizado no estabelecimento prisional.

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DELEGADO SÃO PAULO

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c) Incorreta. De acordo com a regra 28: Se a criança nascer num estabelecimento prisional, tal facto não deve
constar do respetivo registo de nascimento.
d) Correta. De acordo com a regra 29: Nas unidades prisionais que abrigam filhos de detentos, providências
devem ser tomadas para garantir: (a) creches internas ou externas dotadas de pessoal qualificado, onde as
crianças poderão ser deixadas quando não estiverem sob o cuidado de seu pai ou sua mãe.
e) Incorreta. De acordo com a regra 29: A decisão de permitir uma criança de ficar com seu pai ou com sua
mãe na unidade prisional deve se basear no melhor interesse da criança.

Gabarito: Alternativa d.

6.1.2 Regras Das Nações Unidas Para O Tratamento De Mulheres Presas E Medidas Não Privativas De
Liberdade Para Mulheres Infratoras

As Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas Não Privativas de
Liberdade para Mulheres Infratoras (Regras de Bangkok) resultam do trabalho de um grupo de especialistas,
realizado em Bangkok, em novembro de 2009. São consideradas como complementares às Regras de
Mandela e, portanto, todas as provisões pertinentes contidas nesses dois instrumentos continuam a ser
aplicadas a todos as pessoas e infratores sem discriminação. Foram aprovadas pela Assembleia Geral da ONU,
na Resolução n° 65/229, de 21 de dezembro de 2010.
Trata-se de um conjunto de normas de soft law, portanto, não possui força vinculante aos Estados,
mas serve de interpretação a normas nacionais e internacionais sobre direitos humanos que possam incidir
sobre as mulheres presas.

Possui 70 regras divididas em 4 seções:


A Seção I das presentes regras, que compreende a administração geral das instituições, é aplicável a
todas as categorias de mulheres privadas de liberdade, incluindo casos penais e civis, mulheres presas
provisoriamente ou condenadas, assim como mulheres submetidas a medidas disciplinares ou medidas
corretivas ordenadas por um juiz.

A Seção II contém regras aplicáveis apenas a categorias especiais tratadas em cada subseção. Apesar
disso, as regras da subseção A, que se aplicam a presas condenadas, aplicam-se igualmente à categoria de
presas relacionadas na subseção B sempre que não se contraponham às normas relativas a essa categoria de
mulheres e que seja em seu benefício. As subseções A e B contêm regras adicionais para o tratamento de
adolescentes privados de liberdade. É importante notar, porém, que políticas e estratégias distintas, em
conformidade com padrões internacionais, em particular as Regras mínimas das Nações Unidas para a
administração da justiça da infância e da juventude (Regras de Beijing) as Diretrizes das Nações Unidas para
a prevenção da delinquência juvenil (Diretrizes de Riad), as Regras das Nações Unidas para a proteção de
jovens privados de liberdade e as Diretrizes para a ação sobre crianças no sistema de justiça criminal,
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

precisam ser construídas para o tratamento e reabilitação dessa categoria de pessoas presas, enquanto a sua
internação em instituições deve ser evitada ao máximo.

A Seção III contém regras que contemplam a aplicação de sanções não privativas de liberdade e
medidas para mulheres adultas infratoras e adolescentes em conflito com a lei, incluindo no momento da
prisão e nos estágios de pré-julgamento, sentença e após a sentença do processo criminal.

A Seção IV contém regras sobre pesquisa, planejamento, avaliação, sensibilização pública e


compartilhamento de informações, e é aplicável a todas as categorias de mulheres infratoras compreendidas
nessas regras.

As Regras de Bangkok pautam-se em 2 pressupostos:


(i) As necessidades específicas das mulheres, as quais incluem, entre outras, idade, orientação
sexual, identidade de gênero, nacionalidade, situação de gestação e maternidade; e
(ii) O reconhecimento de que parcela das mulheres infratoras não representa risco à sociedade,
de modo que o encarceramento pode dificultar a sua reinserção social.

Em relação ao princípio básico, a fim de que o princípio de não discriminação, incorporado na regra
6 das Regras mínimas para o tratamento de reclusos, seja posto em prática, deve-se ter em consideração as
distintas necessidades das mulheres presas na aplicação das Regras. A atenção a essas necessidades para
atingir igualdade material entre os gêneros não deverá ser considerada discriminatória.
Em relação à alocação, as mulheres presas deverão permanecer, na medida do possível, em prisões
próximas ao seu meio familiar ou local de reabilitação social, considerando suas responsabilidades como
fonte de cuidado, assim como sua preferência pessoal e a disponibilidade de programas e serviços
apropriados.
Em relação aos serviços de cuidado à saúde, se uma mulher presa solicitar ser examinada ou tratada
por uma médica ou enfermeira, o pedido será atendido na medida do possível, exceto em situações que
exijam intervenção médica urgente. Se um médico conduzir o exame, de forma contrária à vontade da
mulher presa, uma funcionária deverá estar presente durante o exame.
Em relação à segurança e vigilância, medidas efetivas deverão ser tomadas para assegurar a
dignidade e o respeito às mulheres presas durante as revistas pessoais, as quais deverão ser conduzidas
apenas por funcionárias que tenham sido devidamente treinadas em métodos adequados e em
conformidade com procedimentos estabelecidos. Deverão ser desenvolvidos outros métodos de inspeção,
tais como escâneres, para substituir revistas íntimas e revistas corporais invasivas, de modo a evitar os danos
psicológicos e possíveis impactos físicos dessas inspeções corporais invasivas.
iplinar a mulheres gestantes,
Ademais, não se aplicarão sanções de isolamento ou segregação disc
nem a mulheres com filhos/as ou em período de amamentação. Instrumentos de contenção jamais deverão
ser usados em mulheres em trabalho de parto, durante o parto e nem no período imediatamente posterior.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Em relação às presas condenadas, administradores de prisões deverão desenvolver e implementar


métodos de classificação que contemplem as necessidades específicas de gênero e a situação das mulheres
presas, com o intuito de assegurar o planejamento e a execução de programas apropriados e individualizados
para a reabilitação, o tratamento e a reintegração das presas na sociedade.

A avaliação de risco e a classificação de presas que tomem em conta a dimensão de gênero deverão:
(a) Considerar que as mulheres presas apresentam, de um modo geral, menores riscos para os
demais, assim como os efeitos particularmente nocivos que podem ter para as presas medidas
disciplinares rigorosas e altos graus de isolamento;
(b) Possibilitar que informações essenciais sobre seus antecedentes, como situações de violência que
tenham sofrido, histórico de transtorno mental e consumo de drogas, assim como responsabilidades
maternas e de cuidados, sejam levadas em consideração na distribuição das presas e na
individualização da pena;
(c) Assegurar que o regime de pena das mulheres inclua serviços e programas de reabilitação
condizentes com as necessidades específicas de gênero; e
(d) Assegurar que as reclusas que necessitam de atenção à saúde mental sejam acomodadas em
locais não restritivos e cujo nível de segurança seja o menor possível, e que recebam tratamento
adequado ao invés de serem colocadas em unidades com elevados níveis de segurança apenas
devido a seus problemas de saúde mental.

Ademais, mulheres presas deverão ter acesso a um programa amplo e equilibrado de atividades que
considerem as necessidades específicas de gênero. O regime prisional deverá ser flexível o suficiente para
atender às necessidades de mulheres gestantes, lactantes e mulheres com filhos/as. Nas prisões serão
oferecidos serviços e instalações para o cuidado das crianças a fim de possibilitar às presas a participação em
atividades prisionais. Haverá especial empenho na elaboração de programas apropriados para mulheres
ecial empenho na prestação de serviços adequados
gestantes, lactantes e com filhos/as na prisão. Haverá esp
para presas que necessitem de apoio psicológico, especialmente aquelas que tenham sido submetidas a
abusos físicos, mentais ou sexuais.
Em relação às mulheres gestantes, com filhos/as e lactantes na prisão, as decisões para autorizar
os/as filhos/as a permanecerem com suas mães na prisão deverão ser fundamentadas no melhor interesse
da criança. Crianças na prisão com suas mães jamais serão tratadas como presas. Mulheres presas cujos/as
filhos/as estejam na prisão deverão ter o máximo possível de oportunidades de passar tempo com eles. A
decisão do momento de separação da mãe de seu filho deverá ser feita caso a caso e fundada no melhor
interesse da criança, no âmbito da legislação nacional pertinente.
Em relação às medidas não restritivas de liberdade, deverão ser desenvolvidas, dentro do sistema
jurídico do Estado membro, opções específicas para mulheres de medidas despenalizadoras e alternativas à
prisão e à prisão cautelar, considerando o histórico de vitimização de diversas mulheres infratoras e suas
responsabilidades de cuidado. Em geral, serão utilizadas medidas protetivas não privativas de liberdade,
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SEMANA 07/12

como albergues administrados por órgãos independentes, organizações não governamentais ou outros
serviços comunitários, para assegurar proteção às mulheres que necessitem.

CAIU EM PROVA!

(VUNESP/2022/ PC-SP/DELEGADO DE POLÍCIA) Trata-se de normatização das Nações Unidas para o


tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. Essas
normas propõem olhar diferenciado para as especificidades de gênero no encarceramento feminino, tanto
no campo da execução penal, quanto também na priorização de medidas não privativas de liberdade, ou
seja, que evitem a entrada de mulheres no sistema carcerário. É correto afirmar que o enunciado se refere
a) às Regras de Tóquio.
b) à Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder.
c) à Convenção Americana dos Direitos das Mulheres.
d) ao Pacto Internacional do Direito da Mulher.
e) às Regras de Bangkok.

Gabarito: Alternativa e.

7. DIREITOS DOS REFUGIADOS

Em relação à proteção dos Direitos dos Refugiados, é importante o estudo acerca do:
● Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos:
- Estatuto do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (1950).
- Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados (1951) e seu Protocolo Facultativo (1967).
● Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos:
- Declaração de Cartagena sobre os Refugiados (1984).
● Proteção Nacional:
- Lei n° 9.474/97.

7.1 Introdução

O Direito dos Refugiados é um dos três eixos da proteção do ser humano no plano internacional e
visa cuidar das pessoas que estão em deslocamento forçado que são obrigadas a deixar o seu território por
questões de perseguição política, étnica e religiosa.

Historicamente, o direito dos refugiados pode ser analisado segundo duas fases:
(i) Fase Histórica: De 1921 a 1951; e
(ii) Fase Contemporânea: De 1951 até os dias atuais.
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SEMANA 07/12

● Fase Histórica:
A fase histórica de proteção aos refugiados, sobretudo em consequência do surgimento da Liga das
Nações Unidas, é um antecedente histórico da própria internacionalização dos direitos humanos, que
começa em 1948.
A Liga das Nações surgiu em 1921, após a 1ª Guerra Mundial, com o intuito de união dos Estados
para a promoção de direitos. Neste contexto histórico, houve a primeira leva de refugiados do século XX,
quais sejam, os refugiados Russos que fugiam da Revolução Russa.
Dentro da Liga das Nações, em 1921, foi criado um órgão próprio para cuidar destes refugiados russos
que não tinham documentos e precisavam transitar na Europa para sobreviverem.
Na sequência, o segundo grupo de refugiados eram da Armênia, que foram o primeiro povo a sofrer
genocídio no século XX, o que fez com que o tema dos refugiados ganhasse importância.
Foi criado, portanto, dentro da Liga das Nações o chamado Alto Comissariado dos Refugiados Russos,
cujo responsável era o diplomata Nassen, sendo, neste cenário, criado o primeiro documento que
possibilitou que os refugiados pudessem transitar. Este documento foi chamado de Passaporte Nassen,
considerado o primeiro documento jurídico da história para reconhecer a condição de refugiado.
O Alto Comissariado foi criado com prazo de duração de dez anos e quando ele encerrou seus
trabalhos, foi criado o Escritório Internacional Nassen, em 1931, para cuidar dos refugiados também no
contexto da Liga das Nações.
Ocorre que na fase de preparação para a Segunda Guerra Mundial começou a ocorrer uma grande
leva de refugiados da Alemanha, especialmente judeus, tendo sido criado o Alto Comissariado para os
Refugiados da Alemanha.
Em 1938, o Escritório Internacional Nassen e o Alto Comissariado para os Refugiados da Alemanha
foram fundidos e foi criado o Alto Comissariado da Liga das Nações para Refugiados, em 1938, sendo o
primeiro órgão geral de tutela e cuidado dos refugiados.
Em 1946, entretanto, encerrou-se a Liga das Nações. A partir de 1948, iniciou-se a discussão dentro
da ONU, recém criada, para o surgimento do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados
(ACNUR). O órgão nasceu em 1949.
A Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, também tratou dos direitos das pessoas que
necessitam de refúgio (arts. 9°, 15 e 13), prevendo que ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou
exilado, bem como que todo indivíduo tem direito a ter nacionalidade e que toda pessoa tem direito de
livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado.

● Fase Contemporânea:
Em 1951, depois da Declaração Universal de Direitos Humanos e da criação do ACNUR, foi concluído
o primeiro Tratado Internacional que trata especificamente dos refugiados, dando início à fase
contemporânea do direito dos refugiados.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

7.2 Sistema Global De Proteção Dos Direitos Humanos

7.2.1 Estatuto Do Alto Comissariado Das Nações Unidas Para Refugiados

O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados ou Agência da ONU para Refugiados
(ACNUR) é uma agência da ONU que atua para assegurar e proteger os direitos das pessoas em situação de
refúgio em todo o mundo. Foi adotado pela Assembleia Geral da ONU por meio da Resolução n° 428 (V), de
14 de dezembro de 1950.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, atuando sob a autoridade da Assembleia
Geral, assumirá a função de proporcionar proteção internacional, sob os auspícios das Nações Unidas, aos
refugiados que se enquadrem nas condições previstas no presente Estatuto, e de encontrar soluções
permanentes para o problema dos refugiados, prestando assistência aos governos e, com o consentimento
de tais governos, prestando assistência também a organizações privadas, a fim de facilitar a repatriação
voluntária de tais refugiados ou a sua integração no seio de novas comunidades nacionais. O trabalho do Alto
Comissariado terá um caráter totalmente apolítico; será humanitário e social e, como regra geral, estará
relacionado com grupos e categorias de refugiados.

7.2.2 Convenção Relativa Ao Estatuto Dos Refugiados E Seu Protocolo Facultativo

A Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados foi formalmente adotada em
28 de julho de 1951 para resolver a situação dos refugiados na Europa após a Segunda Guerra Mundial. Esse
tratado global define quem vem a ser um refugiado e esclarece os direitos e deveres entre os refugiados e
os países que os acolhem.
O fundamento legal que está nos pilares do trabalho do ACNUR permitiu que a agência ajudasse
milhões de pessoas deslocadas a recomeçar suas vidas. Atualmente, a Convenção continua sendo a pedra
angular da proteção a refugiados.
Introdutoriamente, insta salientar que a Convenção possuía limitação temporal (para
acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951) e geográfica (somente para os eventos ocorridos
na Europa).
Em 1967, foi adotado o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, que eliminou as limitações,
tendo sido firmado com a finalidade de se aplicar a proteção da Convençãooutras
a pessoas que não apenas
aquelas que se tornaram refugiadas em resultado de acontecimentos anteriores a 1º de janeiro de 1951.
A Convenção foi aprovada pelo Brasil a partir do Decreto Legislativo n° 11, de 7 de julho de 1960 e
promulgada pelo Decreto n° 50.215, de 28 de janeiro de 1961. Entretanto, em 19 de dezembro de 1989, foi
editado o Decreto n° 98.602, que deu nova redação ao Decreto n° 50.215/61.
Já o Protocolo Facultativo foi aprovado de acordo com o Decreto Legislativo n° 93, de 30 de
novembro de 1971 e promulgado pelo Decreto n° 70.946, de 7 de agosto de 1972.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Para os fins da Convenção, o termo refugiado é definido como: (i) pessoa que é perseguida ou tem
fundado temor de perseguição (ii) por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões
políticas e encontra-se fora do país de sua nacionalidade ou residência e (iii) que não pode ou não quer voltar
a tal país em virtude de perseguição ou fundado temor de perseguição.
Assim, de acordo com a Convenção, no caso de um refugiado que foi deportado no curso da Segunda
Guerra Mundial, transportado para o território de um dos Estados Contratantes e aí resida, a duração dessa
permanência forçada será considerada residência regular nesse território. No caso de um refugiado que foi
deportado do território de um Estado Contratante no curso da Segunda Guerra Mundial e para ele voltou
antes da entrada em vigor desta Convenção para aí estabelecer sua residência, o período que precede e o
que segue a essa deportação serão considerados, para todos os fins para os quais é necessária uma residência
ininterrupta, como constituindo apenas um período ininterrupto.

● Refugiado ambiental?
O refugiado ambiental não tem previsão normativa, inexistindo tratado internacional que o
proteja. Entretanto, há um caso da Nova Zelândia no qual um indivíduo do Kiribati teve seu visto de
trabalho expirado e pediu para permanecer na Nova Zelândia, porque o seu país de origem estava sendo
coberto pelas águas do mar em razão do aquecimento global. Contudo, este caso foi julgado
improcedente, uma vez que a condição de refugiado ambiental não possui proteção normativa.
Na seara dos direitos humanos, porém, os defensores dos direitos humanos defendem a
extensão dos conceitos de refugiado para o refugiado ambiental em vista do princípio pro homine.

A Convenção não se aplica a pessoas que cometeram crime contra a paz, crime de guerra ou crime
contra a humanidade (conforme determinem os instrumentos internacionais), que cometeram crime grave
de delito comum fora do país de refúgio antes de serem nele admitidas como refugiados e que se tornaram
culpadas de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas.
Os Estados-Partes proporcionarão aos refugiados em seu território um tratamento ao menos tão
favorável quanto o que é proporcionado aos nacionais no que concerne à liberdade de praticar a sua religião
e no que concerne à liberdade de instrução religiosa dos seus filhos (art. 4°). Trata-se da garantia de a pessoa
em situação de refúgio de continuar exercendo a sua religião. Se o Estado é integrante desta Convenção, ele
não pode receber uma pessoa refugiada e impedir a pessoa de exercer a sua liberdade de religião.
Em relação à dispensa de reciprocidade, ressalvadas as disposições mais favoráveis previstas por
esta Convenção, um Estado Contratante concederá aos refugiados o regime que concede aos estrangeiros
em geral. Após um prazo de residência de três anos, todos os refugiados se beneficiarão, no território dos
Estados Contratantes, da dispensa de reciprocidade legislativa. Cada Estado Contratante continuará a
conceder aos refugiados os direitos e vantagens de que já gozavam, na ausência de reciprocidade, na data
de entrada em vigor desta Convenção para o referido Estado.
Em relação ao estatuto pessoal de um refugiado, ele será regido pela lei do país de seu domicílio, ou,
na falta de domicílio, pela lei do país de sua residência.
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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

No que tange aos documentos de viagem, os Estados Contratantes entregarão aos refugiados que
residam regularmente no seu território documentos de viagem destinados a permitir-lhes viajar fora desse
território, a menos que a isto se oponham razões imperiosas de segurança nacional ou de ordem pública; as
disposições do Anexo a esta Convenção se aplicarão a esses documentos. Os Estados Contratantes poderão
entregar tal documento de viagem a qualquer outro refugiado que se encontre no seu território; darão
atenção especial aos casos de refugiados que se encontre em seu território e que não estejam em condições
de obter um documento de viagem do país de sua residência regular.
O princípio do non-refoulement encontra-se previsto na Convenção, ao afirmar que nenhum dos
Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de maneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos
territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da
sua nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas opiniões políticas. O benefício da presente
disposição não poderá, todavia, ser invocado por um refugiado que por motivos sérios seja considerado um
perigo para a segurança do país no qual ele se encontre ou que, tendo sido condenado definitivamente por
crime ou delito particularmente grave, constitui ameaça para a comunidade do referido país.

7.2.3 Deslocados Internos

O refugiado é a pessoa que é obrigada a sair do território dende


o é nacional ou de onde residia com
habitualidade em razão de questão de raça, religião, grupo social ou opinião política. O deslocado interno,
por outro lado, é aquele que também sofre perseguições em um determinado território pelos mesmos
motivos, mas ele não consegue transpassar a fronteira do Estado. É um perseguido que continua dentro das
mesmas fronteiras do Estado.
O ACNUR já se reuniu e percebeu que a questão do deslocado interno é anterior à própria condição
de refugiado: cuidar do deslocado interno provavelmente implica em evitar que ele se torne refugiado no
futuro. A proteção do deslocado interno é importante porque ele é um potencial refugiado. Entretanto, não
há norma internacional que trate do deslocado interno, apesar de o ACNUR já atuar na defesa dos deslocados
internos.
A ACNUR editou uma Carta de Princípios dos Deslocados Internos. Esta carta traz o conceito de
deslocado interno: Deslocados internos são pessoas, ou grupos de pessoas, forçadas ou obrigadas a fugir ou
abandonar as suas casas ou seus locais de residência habituais, particularmente em consequência de, ou com
vista a evitar, os efeitos dos conflitos armados, situações de violência generalizada, violações dos direitos
humanos ou calamidades humanas ou naturais, e que não tenham atravessado uma fronteira
internacionalmente reconhecida de um Estado.

7.3 Sistema Interamericano De Proteção Dos Direitos Humanos

7.3.1 Declaração De Cartagena Sobre Os Refugiados

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A Declaração de Cartagena sobre Refugiados, de 22 de novembro de 1984, foi resultado dos


encontros de representantes governamentais e especialistas de dez países latino-americanos
em Cartagena de Índias, Colômbia, para considerar a situação dos refugiados na América Latina.
Trata-se, portanto, de um documento de soft law, tendo caráter meramente interpretativo e
recomendativo aos Estados da América.

7.4 Proteção Nacional

7.4.1 Lei N° 9.474/97

A Lei n° 9.474, de 22 de julho de 1997, define mecanismos para a implementação do Estatuto dos
Refugiados de 1951, e determina outras providências.
De acordo com o seu art. 1°, será considerado refugiado todo indivíduo que:
● devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social
ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira
acolher-se à proteção de tal país;
● não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa
ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;
● devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de
nacionalidade para buscar refúgio em outro país.
O conceito de refugiado da Lei n° 9474/97 é bem próximo ao apresentado pela Convenção de 1951.
A legislação brasileira também exclui pessoas que não serão beneficiadas pela condição de refugiado,
tratando-se daquele que:
● já desfrutem de proteção ou assistência por parte de organismo ou instituição das Nações
Unidas que não o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados - ACNUR;
● sejam residentes no território nacional e tenham direitos e obrigações relacionados com a
condição de nacional brasileiro;
● tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime
hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas;
● sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas.

7.5 Refúgio x Asilo

O asilo e o refúgio se aproximam na questão da perseguição por opinião política. Contudo, o refúgio
é motivado pelo temor ou pela efetiva perseguição por razões étnico racionais, religiosas, de nacionalidade,
grupo social e opinião política, enquanto o asilo é motivado pela efetiva perseguição por opinião política.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

CARACTERÍSTICAS REFÚGIO ASILO


ALCANCE Universal Regional (América Latina)
ÂMBITO DE PROTEÇÃO Individual (Excepcionalmente, coletivo) Sempre individual
PERSEGUIÇÃO Fundado temor Efetiva perseguição
NATUREZA DA DECISÃO Declaratória, já que a condição é Constitutiva, pois decorre de
predeterminada. uma deliberação política.
NATUREZA JURÍDICA Ato vinculado (STF). Embora o STF entenda Ato discricionário, uma vez
ser ato vinculado, há doutrina que sustenta que só ocorre por motivos
que é um ato discricionário. políticos, possuindo o Estado
que irá receber uma
liberalidade para analisar se
trata de efetiva perseguição
política ou não.
Por ter previsão em tratados
também, há quem diga que
é ato vinculado.
NATUREZA IDEOLÓGICA Humanitária Política

LOCAL DO ASILO Território estrangeiro Território do próprio país


(Embaixada de outro país) –
asilo diplomático -;
Aeronave, navio de guerra
ou acampamento militar;
território estrangeiro.
CAUSAS DE EXCLUSÃO Sim (Não pode cometer crimes de guerra, Não tinha até o recente art.
crime contra a paz, contra a humanidade, 28 da Nova Lei de
contra os fins da ONU) Migração.* Não se
concederá asilo a quem tiver
cometido crime de
genocídio, crime contra a
humanidade, crime de
guerra ou crime de agressão

8. DEFENSORES DE DIREITOS HUMANOS

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

8.1 Declaração Sobre O Direito E A Responsabilidade Dos Indivíduos, Grupos Ou Órgãos Da Sociedade De
Promover E Proteger Os Direitos Humanos E Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos

A Declaração sobre o Direito e a Responsabilidade dos Indivíduos, Grupos ou Órgãos da Sociedade


de Promover e Proteger os Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos
foi instituída a partir da Resolução n° 53/144 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 9 de dezembro de
1998.
Em seu Preâmbulo, destaca que todos os membros da comunidade internacional devem cumprir,
conjunta e separadamente, sua obrigação solene de promover e fomentar o respeito dos direitos humanos
e das liberdades fundamentais de todos, sem distinção alguma, em particular sem distinção por motivos de
raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou outra índole, origem nacional ou social, posição
econômica, nascimento ou qualquer outra condição social, e reafirma a importância particular de lograr a
cooperação internacional para o cumprimento desta obrigação. Reconhece, ainda, o direito e o dever dos
indivíduos, dos grupos e das instituições de promover o respeito e o conhecimento dos direitos humanos e
das liberdades fundamentais no plano nacional e internacional.
Dessa forma, destacando-se os seus principais artigos, preconiza que toda pessoa tem direito,
individual ou coletivamente, de promover e procurar a proteção e a realização dos direitos humanos e das
liberdades fundamentais nos planos nacional e internacional.
Os Estados têm a responsabilidade primordial e o dever de proteger, promover e tornar efetivos
todos os direitos humanos, e as liberdades fundamentais, entre outras coisas, adotando as medidas
necessárias para criar as condições sociais, econômicas, políticas e de outra índole, assim como as garantias
jurídicas requeridas para que toda pessoa submetida a sua jurisdição, individual ou coletivamente, possa
desfrutar na prática de todos esses direitos e liberdades, devendo adotar as medidas legislativas,
administrativas e de outra índole que sejam necessárias para assegurar que os direitos e liberdades referidos
na Declaração estejam efetivamente garantidos.
O direito interno, enquanto concorda com a Carta das Nações Unidas e outras obrigações
internacionais do Estado na esfera dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, é o marco jurídico
no qual devem se materializar e exercer os direitos humanos e as liberdades fundamentais e no qual devem
ser levadas a cabo todas as atividades a que se faz referência nesta presente Declaração para a promoção,
proteção e realização efetiva desses direitos e liberdades.
Com fins de promover e proteger os direitos humanos e as liberdades fundamentais, toda pessoa
tem como direito, individual ou coletivamente, no plano nacional e internacional:

a) A reunir-se ou manifestar-se pacificamente;


b) A formar organizações, associações ou grupos não governamentais, e a afiliar-se a esses ou
participar em esses; e
c) A comunicar-se com as organizações não-governamentais e intergovernamentais.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Incumbe ao Estado a responsabilidade de adotar medidas legislativas, judiciais, administrativas ou


de outra índole apropriadas para promover em todas as pessoas submetidas a sua jurisdição a
compreensão de seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais.

Incumbe ao Estado a responsabilidade de promover e facilitar o ensino dos direitos humanos e das
liberdades fundamentais em todos os níveis de ensino, e de garantir que os que tenham a seu cargo a
formação de advogados, funcionários encarregados do cumprimento da lei, pessoal das forças armadas e
funcionários públicos incluam em seus programas de formação elementos apropriados do ensino dos direitos
humanos.
Os particulares, as organizações não-governamentais e as instituições pertinentes têm a importante
missão de contribuir na sensibilização do público sobre as questões relativas a todos os direitos humanos e
as liberdades fundamentais mediante atividades educativas, capacitação e investigação nessas esferas com
o objetivo de fortalecer, entre outras coisas, a compreensão, a tolerância, a paz e as relações de amizade
entre as nações e entre todos os grupos raciais e religiosos, tendo em conta as diferentes mentalidades das
sociedades e comunidades em que levam a cabo suas atividades.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

DIREITOS HUMANOS: DIREITOS DAS VÍTIMAS DE ABUSO DE CRIMINALIDADE E CONDUTA DOS


FUNCIONÁRIOS DA LEI

1. JUSTIÇA ÀS VÍTIMAS DA CRIMINALIDADE E ABUSO DE PODER

1.1 A Declaração Dos Princípios Básicos De Justiça Relativos Às Vítimas Da Criminalidade E De Abuso De
Poder

A Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de


Poder foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua Resolução n° 40/34, de 29 de novembro
de 1985, que visa ajudar os Governos e a comunidade internacional nos esforços desenvolvidos, no sentido
de fazer justiça às vítimas da criminalidade e de abuso de poder e no sentido de lhes propor necessária
assistência.
Afirma a necessidade de adoção, a nível nacional e internacional, de medidas que visem garantir o
reconhecimento universal e dos direitos das vítimas da criminalidade e de abuso de poder.
Solicita aos Estados membros que tomem as medidas necessárias para tornar efetivas as disposições
da Declaração e que, a fim de reduzir a vitimização, a que se faz referência daqui em diante, se empenhem
em:
a) Aplicar medidas nos domínios da assistência social, da saúde, incluindo a saúde mental da
educação e da economia, bem como medidas especiais de prevenção criminal para reduzir a vitimização e
promover a ajuda vítimas em situação de carência;
b) Incentivar os esforços coletivos e a participação dos cidadãos na prevenção do crime;
c) Examinar regularmente a legislação e as práticas existentes, a fim de assegurar a respectiva
adaptação à evolução das situações, e adotar e aplicar legislação que proíba atos contrários às normas
internacionalmente reconhecidas no âmbito dos direitos do homem, do comportamento das empresas e de
outros atos de abuso de poder;
d) Estabelecer e reforçar os meios necessários à investigação, à prossecução e à condenação dos
culpados prática de crimes;
e) Promover a divulgação de informações que permitam aos cidadãos a fiscalização da conduta dos
funcionários e das empresas e promover outros meios de acolher as preocupações dos cidadãos;
f) Incentivar o respeito dos códigos de conduta e das normas éticas, e, nomeadamente, das normas
internacionais, por parte dos funcionários, incluindo o pessoas encarregado da aplicação das leis, o dos
serviço penitenciários, o dos serviços médicos e sociais e o c forças armadas, bem como por parte do pessoal
c empresas comerciais;
g) Colaborar com os outros Estados, no quadro de acordos de auxílio judiciário e administrativo, em
domínios como o da investigação e o da prossecução penal dos delinquentes, da sua extradição e da penhora
dos seus bens para os fins de indenização às vítimas.

238
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Recomenda que, aos níveis internacional e regional, sejam tomadas todas as medidas apropriadas
para:
a) Desenvolver as atividades de formação destinadas a incentivar o respeito pelas normas e princípios
das Nações Unidas e a reduzir as possibilidades de abuso;
b) Organizar trabalhos conjuntos de investigação, orientados de forma prática, sobre os modos de
reduzir a vitimização e de ajudar as vítimas, e para desenvolver trocas de informação sobre os meios mais
eficazes de o fazer;
c) Prestar assistência direta aos Governos que a peçam, a fim de os ajudar a reduzir a vitimização e a
aliviar a situação de carência em que as vítimas se encontrem;
d) Proporcionar meios de recurso acessíveis às vítimas, quando as vias de recurso existentes a nível
nacional possam revelar-se insuficientes.
A Declaração conceitua o termo “vítimas”:
1. Entendem-se por "vítimas" as pessoas que, individual ou coletivamente tenham sofrido um
prejuízo, nomeadamente um atentado à sua integridade física e um sofrimento de ordem moral, uma
perda material, ou um grave atentado aos seus direitos fundamentais, como consequência de atos
ou de omissões violadores das leis vigor num Estado membro, incluindo as que proíbem o abuso de
poder.
2. Uma pessoa pode ser considerada como "vitima"
, no quadro da Declaração, quer o autor seja ou
não identificado, preso, processado ou declarado culpado, e qualquer que sejam os laços de
parentesco deste com a vítima.
3. O termo vítima, inclui, conforme o caso, a família próxima ou as pessoas a cargo da vítima e as
pessoas que tenham sofrido um prejuízo ao intervirem para prestar assistência às vítimas em
situação de carência ou para impedir a vitimização.
As disposições em relação à conceituação de vítimas aplicam-se a todos, sem nenhum tipo de
discriminação, nomeadamente de raça, cor, sexo, idade, língua, religião, nacionalidade ou outras, crenças ou
práticas culturais, situação econômica, nascimento familiar, origem étnica ou social ou capacidade física.
Por fim, em relação à obrigação de restituição e de reparação, os autores de crimes ou os terceiros
responsáveis pelo seu comportamento, se necessário, devem reparar de forma equitativa o prejuízo causado
às vítimas.

2. CONDUTA DOS FUNCIONÁRIOS RESPONSÁVEIS PELA APLICAÇÃO DA LEI

2.1 Código De Conduta Para Os Funcionários Responsáveis Pela Aplicação Da Lei

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei foi adotado pela
Assembleia Geral das Nações Unidas na sua Resolução n° 34/169, de 17 de dezembro de 1979. Possui apenas
8 artigos, que foram plenamente comentados na plataforma digital do Ministério Público do Maranhão7:

Artigo 1º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem sempre cumprir o dever
que a lei lhes impõe, servindo a comunidade e protegendo todas as pessoas contra
atos ilegais, em conformidade com o elevado grau de responsabilidade que a sua
profissão requer.

Comentário
O termo "funcionários responsáveis pela aplicação da lei" inclui todos os agentes da
lei, quer nomeados, quer eleitos, que exerçam poderes policiais, especialmente
poderes de detenção ou prisão. Nos países onde os poderes policiais são exercidos
por autoridades militares, quer em uniforme, quer não, ou por forças de segurança
do Estado, será entendido que a definição dos funcionários responsáveis pela
aplicação da lei incluirá os funcionários de tais serviços.

Artigo 2º
No cumprimento do dever, os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem
respeitar e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os direitos humanos de
todas as pessoas.

Artigo 3º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só podem empregar a força
quando estritamente necessária e na medida exigida para o cumprimento do seu
dever.

Comentário
O emprego da força por parte dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei
deve ser excepcional. Embora se admita que estes funcionários, de acordo com as
circunstâncias, possam empregar uma força razoável, de nenhuma maneira ela
poderá ser utilizada de forma desproporcional ao legítimo objetivo a ser atingido.
O emprego de armas de fogo é considerado uma medida extrema; devem-se fazer
todos os esforços no sentido de restringir seu uso, especialmente contra crianças.
Em geral, armas de fogo só deveriam ser utilizadas quando um suspeito oferece

7
http://www.mp.ma.gov.br/site/centrosapoio/DirHumanos/codConduta.htm
240
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

resistência armada ou, de algum outro modo, põe em risco vidas alheias e medidas
menos drásticas são insuficientes para dominá-lo. Toda vez que uma arma de fogo
for disparada, deve-se fazer imediatamente um relatório às autoridades
competentes.

Artigo 4º
Os assuntos de natureza confidencial em poder dos funcionários responsáveis pela
aplicação da lei devem ser mantidos confidenciais, a não ser que o cumprimento do
dever ou necessidade de justiça estritamente exijam outro comportamento.

Artigo 5º
Nenhum funcionário responsável pela aplicação da lei pode infligir, instigar ou
tolerar qualquer ato de tortura ou qualquer outro tratamento ou pena cruel,
desumano ou degradante, nem nenhum destes funcionários pode invocar ordens
superiores ou circunstâncias excepcionais, tais como o estado de guerra ou uma
ameaça de guerra, ameaça à segurança nacional, instabilidade política interna ou
qualquer outra emergência pública, como justificativa para torturas ou outros
tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.

Comentário
A Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos
ou Degradantes define tortura como: "...qualquer ato pelo qual dores ou
sofrimentos agudos, físicos ou mentais são infligidos intencionalmente a uma
pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões;
de castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja
suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou
por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais
dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no
exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento
ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que
sejam consequência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais
sanções ou dela decorram."

Artigo 6º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem garantir a proteção da
saúde de todas as pessoas sob sua guarda e, em especial, devem adotar medidas
imediatas para assegurar-lhes cuidados médicos, sempre que necessário.
241
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Artigo 7º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem cometer quaisquer
atos de corrupção. Também devem opor-se vigorosamente e combater todos estes
atos.

Comentário
Qualquer ato de corrupção, tal como qualquer outro abuso de autoridade, é
incompatível com a profissão dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei. A
lei deve ser aplicada com rigor a qualquer funcionário que cometa um ato de
corrupção. Os governos não podem esperar que os cidadãos respeitem as leis se
estas também não foram aplicadas contra os próprios agentes do Estado e dentro
dos seus próprios organismos.

Artigo 8º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar a lei e este
Código. Devem, também, na medida das suas possibilidades, evitar e opor-se com
rigor a quaisquer violações da lei e deste Código. Os funcionários responsáveis pela
aplicação da lei que tiverem motivos para acreditar que houve ou que está para
haver uma violação deste Código, devem comunicar o fato aos seus superiores e, se
necessário, a outras autoridades competentes ou órgãos com poderes de revisão e
reparação.

Comentário
As disposições contidas neste Código serão observadas sempre que tenham sido
incorporadas à legislação nacional ou à sua prática; caso a legislação ou a prática
contiverem disposições mais limitativas do que as deste Código, devem observar-se
essas disposições mais limitativas. Subentende-se que os funcionários responsáveis
pela aplicação da lei não devem sofrer sanções administrativas ou de qualquer
outra natureza pelo fato de terem comunicado que houve, ou que está prestes a
haver, uma violação deste Código; como em alguns países os meios de comunicação
social desempenham o papel de examinar denúncias, os funcionários responsáveis
pela aplicação da lei podem levar ao conhecimento da opinião pública, através dos
referidos meios, como último recurso, as violações a este Código. Os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei que cumpram as disposições deste Código
merecem o respeito, o total apoio e a colaboração da sociedade, do organismo de
aplicação da lei no qual servem e da comunidade policial.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

META 5

DIREITO CIVIL: DAS COISAS

TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA

CF/88
⦁ Arts. 183, §3º e 191, §único

CÓDIGO CIVIL
⦁ Art. 516
⦁ Arts. 1196 ao 1224
⦁ Arts. 1225 ao 1227
⦁ Arts. 1228 ao 1259
⦁ Arts. 1260 ao 1313
⦁ Arts. 1314 ao 1377
⦁ Arts. 1378 ao 1510-E

OUTROS DISPOSITIVO LEGAIS


⦁ DL nº 911/69
⦁ Lei nº 9.514/97
⦁ Lei nº 271/67

ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!

CÓDIGO CIVIL
⦁ Arts. 1193 a 1209 (importantíssimo)
⦁ Arts. 1210, 1212
⦁ Arts. 1214 a 1222 (importantíssimo)
⦁ Arts. 1225 a 1227
⦁ Arts. 1228 e 1229
⦁ Arts. 1238 a 1244
⦁ Arts. 1248 e 1254
⦁ Arts. 1260 a 1262
⦁ Arts. 1267 e 1268
⦁ Art. 1275
⦁ Arts. 1314 a 1320
⦁ Arts. 1358-A a 1358-U (inovação legislativa)

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SEMANA 07/12

⦁ Arts. 1361, 1365, 1366 e 1368


⦁ Arts. 1368-C a 1368-F (inovação legislativa)
⦁ Arts. 1369 a 1372 e 1375
⦁ Arts. 1390, 1393 e 1410
⦁ Arts. 1412 a 1416
⦁ Arts. 1419, 1421, 1425, 1428 e 1430
⦁ Arts. 1433 a 1437
⦁ Arts. 1473 a 1475
⦁ Arts. 1479, 1481, 1487, 1489, 1490 e 1491
⦁ Arts. 1499 a 1501
⦁ Arts. 1510-A a 1510-E

SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA


Súmula 637-STJ: O ente público detém legitimidade e interesse para intervir, incidentalmente, na ação
possessória entre particulares, podendo deduzir qualquer matéria defensiva, inclusive, se for o caso, o
domínio.
Súmula 619-STJ: A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária,
insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias.
Súmula 487-STF: Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela
disputada.
Súmula 263-STF: O possuidor deve ser citado, pessoalmente, para a ação de usucapião.
Súmula 340-STF: Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não
podem ser adquiridos por usucapião.
Súmula 237-STF: O usucapião pode ser arguido em defesa.
Súmula 391-STF: O confinante certo deve ser citado pessoalmente para a ação de usucapião.

1. CARACTERÍSTICAS

⦁ Oponibilidade erga omnes;


⦁ Existência do direito de sequela;
⦁ Direito de preferência do titular de direito real;
⦁ Viabilidade de incorporação da coisa pela posse;
⦁ Usucapião como um dos meios de aquisição;
⦁ Rege o princípio da publicidade dos atos;
⦁ Obediência a rol taxativo (tipicidade dos Direitos Reais):

São Direitos Reais (art. 1225, CC):

244
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

∘ Propriedade;
∘ Superfície;
∘ Laje;
∘ Servidões;
∘ Usufruto;
∘ Uso;
∘ Habitação;
∘ Direito do promitente comprador do imóvel;
∘ Penhor;
∘ Hipoteca;
∘ Anticrese;
∘ Concessão de uso especial para fins de moradia;
∘ Concessão de direito real de uso;
∘ Os direitos oriundos da imissão provisória na posse, quando concedida à União, aos Estados,
ao Distrito Federal, aos Municípios ou às suas entidades delegadas e a respectiva cessão e
promessa de cessão.

Esse rol do art. 1225 é taxativo (numerus clausus


) ou exemplificativo (numerus apertus)?
A visão clássica ainda é MAJORITÁRIA, no sentido de que o rol é taxativo. Esse é o posicionamento
que devemos adotar em provas de primeira fase. Caio Mário, Orlando Gomes, MHD, Carlos Roberto
Gonçalves. Contudo, há uma visão mais contemporânea que entende que o rol é exemplificativo. Podemos
desenvolvê-la em provas de segunda fase ou no exame oral.

2. DIREITOS REAIS X DIREITOS PESSOAIS PATRIMONIAIS

Direitos Reais Direitos Obrigacionais


Numerus clausus Numerus apertus
Direito de sequela NÃO há sequela
Eficácia erga omnes Eficácia inter partes (relativa)
Registrabilidade e publicidade Forma livre, em regra
Pessoa x coisa Pessoa x pessoa (pessoas determináveis ou
determinadas)
Encerra direito de gozo, fruição ou garantia Encerra direitos de crédito a uma prestação,
sobre a coisa corpórea entre sujeitos
Caráter permanentes ou perpétuo Caráter transitório

ATENÇÃO: FIGURAS HÍBRIDAS ENTRE DIREITO REAL E OBRIGACIONAL

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12


Obrigações propter rem: Aderem à coisa (e não à pessoa), transmitindo-se automaticamente ao seu
novo titular, desde que haja transferência da propriedade. São obrigações que NÃO emanam da
vontade, mas do registro da propriedade. Ex.: IPTU, IPVA, Taxas condominiais.

Obrigações de ônus real: Limitam o uso e gozo da propriedade, constituindo um gravame. Limitam-
se ao valor da coisa e desaparecem com o perecimento da coisa. Ex.: Penhor, hipoteca, anticrese.

Obrigações de eficácia real: Sem perder o caráter de direito pessoal, ou direito a uma prestação,
ganham oponibilidade a terceiros, que adquiram direitos sobre determinados bens, tendo em vista
o seu registro. Ex.: Direito de preferência em contrato de locação.

ÔNUS REAIS OBRIGAÇÕES PROPTER REM


A responsabilidade pelo ônus real é Na obrigação propter rem responde o devedor com todos
limitada ao bem onerado. os seus bens, ilimitadamente, pois é este que se encontra
vinculado.
O ônus real desaparece, perecendo Os efeitos da obrigação propter rem podem permanecer,
o objeto. mesmo havendo perecimento da coisa.
Os ônus reais implicam sempre As obrigações propter rem podem surgir com uma
uma prestação positiva. prestação negativa.

3. CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS REAIS

Os Direitos reais na coisa alheia, que nos interessa por ora, podem ser classificados de acordo com a
tabela abaixo:

DIREITO REAL DE GOZO OU DIREITO REAL DA COISA


DIREITO REAL A AQUISIÇÃO
FRUIÇÃO ALHEIA DE GARANTIA

Permitir que uma pessoa Não terá a coisa consigo. É - Busca-se através do domínio
tenha consigo os poderes de vedada a utilização da coisa. ser proprietário.
utilização da coisa. Credor tem o direito real. - O exercício dos poderes do
domínio viabiliza a aquisição
da propriedade.
Permitir que terceiro retire as
ASSEGURAR CUMPRIMENTO
utilidades da coisa.
DE OBRIGAÇÃO.

UTILIDADE

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SEMANA 07/12

6 HIPÓTESES 4 HIPÓTESES 1 HIPÓTESE (OU 2)

1. Enfiteuse (código 16) 1. Hipoteca


1. Promessa irretratável de
2. Superfície 2. Penhor
compra e venda
3. Servidão predial 3. Anticrese
2. Direito de preferência
4. Usufruto 4. Alienação fiduciária
(não unânime)
5. Uso em garantia.
6. Habitação

4. POSSE

A posse é o fenômeno fático que a pessoa exerce sobre uma coisa, e o conceito varia conforme a
teoria adotada.
Pelo art. 1.196 do CC, considera-se possuidor aquele que tem, pelo menos, um dos atributos da
propriedade.

4.1 Teorias da Posse

a) Teoria Subjetiva (Savigny): A posse seria o poder direto da pessoa de dispor fisicamente do bem
com a intenção de tê-lo para si e defendê-lo da agressão de quem quer que seja. Elementos:
● Corpus: Poder físico ou de disponibilidade da coisa (elementos objetivo). Poder físico é a
possibilidade de exercer influência imediata sobre a coisa.
● Animus domini: Intenção de ter a coisa para si, exercer o direito de propriedade (elemento
subjetivo).
Em razão do segundo elemento, o locatário, o comodatário, o depositário, entre outros, não seriam
considerados possuidores, mas sim meros detentores, pois não há qualquer intenção de tornarem-se
proprietários.

b) Teoria Objetiva (Ihering): Para a constituição da posse, basta que a pessoa disponha fisicamente
da coisa, ou que tenha a mera possibilidade de exercer esse contato e exerça sua função social. Ou seja, para
a Teoria Objetiva, ao contrário da Teoria Subjetiva, para ser possuidor não é necessária a intenção de ser
dono. Para essa teoria, a posse seria formada por dois elementos: o corpus e o affectio tenendi.
● Corpus – Poder físico de disponibilidade sobre a coisa, dentro do qual inclui a intenção de
explorar a coisa com fins econômicos
● Affectio tenendi - Significa utilizar-se do bem como se proprietário fosse. Isso quer dizer destinar
o bem à sua função econômico-social.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A teoria objetiva do IHERING tem a característica singular de que há hierarquia entre posse e
propriedade. Essa concepção de hierarquia, contudo, hoje vem sendo refutada pela teoria sociológica da
posse.

c) Teoria Sociológica: A teoria sociológica da posse consagra a função social da posse. Não possui
previsão expressa, mas é extraída implicitamente do sistema.
Essa teoria não desmente por completo a teoria objetiva; os elementos estruturais/ estáticos da
posse não são repudiados (corpus e affectio tenendi) – apenas desmente no que tange à relação de
hierarquia entre posse e propriedade. A posse é protegida em si mesma, não em decorrência da
propriedade.

Qual foi a teoria adotada pelo Código Civil?


R.: O CC/02 adotou a Teoria Objetiva de IHERING, conforme art. 1196. O art. 1.196 define o possuidor
como aquele que tem de fato o exercício pleno ou não de algum dos poderes inerentes à propriedade.
Ademais, é possuidor todo aquele que atua como se proprietário fosse (exercício de algum dos
poderes inerentes à propriedade), que é a definição de affectio tenendi. O art. 1.228, caput, trata dos
poderes inerentes à propriedade: uso, gozo, disposição e reivindicação (vale a remissão do art. 1.196).

4.2 Posse x Detenção

Detenção é a desqualificação jurídica da posse. Há o poder físico sobre a coisa, mas o sistema retira
a qualidade de possuidor. Ou seja: o detentor tem a coisa apenas em virtude econômica ou vínculo de
subordinação (mera custódia). É uma desqualificação da posse
O detentor exerce sobre o bem a posse em nome de outrem, e em cumprimento de ordens ou
instruções suas, de modo que NÃO pode invocar, em nome próprio, as ações possessórias, embora possa se
valer da autotutela.
Atenção às considerações importantes:
(1) É admitida a conversão da detenção em posse, se rompida a subordinação.
(2) O detentor NÃO tem direito à usucapião, nem às benfeitorias e acessórios.
STJ: A ocupação irregular de área pública NÃO induz posse, mas ato de mera
detenção => Como consequência, NÃO há direito à indenização em face do poder
público.
Súmula 619 - A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de
natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e
benfeitorias.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

4.2.1 Hipóteses de detenção


a) Fâmulo (servo da posse): Quem exerce o poder de fato sobre a coisa, mas sem autonomia (em nome
de outrem, recebendo ordens e instruções de seu superior). Ex.: caseiro.
b) Atos de mera permissão ou tolerância (art. 1208, 1ª parte)
Atos de mera permissão ou de tolerância não induzem posse.
● Permissão – há consentimento prévio
● Tolerância – sem consentimento prévio
c) Atos violentos ou clandestinos, antes do convalescimento: (art. 1208, 2ª parte)
Doutrina majoritária: Entende que, enquanto houver atos de violência ou clandestinidade, não
haverá posse, mas mera detenção; somente depois de cessada a violência ou a clandestinidade é que haverá
posse. A transmudação de detenção em posse ocorrerá nos termos do art. 1.200 (fundamental a remissão).
· Clandestinidade - é o poder de fato exercido às escondidas, de maneira imperceptível. A partir do
momento em que o sujeito exerce o poder de fato de modo natural, há transmudação para posse
injusta.
⋅ Posse violenta - não é a exercida durante atos violentos, mas aquela que proveio de atos violentos,
pressupondo que esses tenham cessados. De igual modo com a posse clandestina: pressupõe a
cessão dos atos.
d) Bens públicos: De acordo com o STJ, não cabe posse sobre qualquer bem público, seja ele de uso
comum, de uso especial ou bens dominicais. Assim, particular que ocupa bem público é mero
detentor, não tem posse.

Súmula 619-STJ: A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de


natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e
benfeitorias.

ATENÇÃO: Se o particular que ocupa bem público não tem posse e sim, detenção, logo, não há proteção
possessória em face do Poder Público.
Exceção – Inf. 594, 2016, STJ: É possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares
sobre bem público dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à posse (STJ, Info 594).

Em ação possessória entre particulares é cabível o oferecimento de oposição pelo ente público,
alegando-se incidentalmente o domínio de bem imóvel como meio de demonstração da posse. STJ. Corte
Especial. EREsp 1.134.446-MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 21/03/2018 (Info 623)

Súmula 637-STJ: O ente público detém legitimidade e interesse para intervir,


incidentalmente, na ação possessória entre particulares, podendo deduzir qualquer
matéria defensiva, inclusive, se for o caso, o domínio.
e) Esbulhador, enquanto o esbulhado não toma ciência do esbulho – art. 1224. CC.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

O art. 1.224 traz uma posse ficta em favor do possuidor que não presenciou o esbulho. A posse só
será considerada perdida quando o possuidor deixar de tentar recuperar a coisa ou, tentando recuperá-la,
for repelido. Durante o tempo em que o esbulhado não toma conhecimento, haverá mera detenção para
os esbulhadores.
Enquanto o esbulhado não toma ciência do esbulho, os esbulhadores são meros detentores, por isso
esse lapso temporal não será computado para considerar a posse como nova ou velha.

CONVERSÃO DA DETENÇÃO EM POSSE:


É possível que o ato de mera detenção se torne posse, quando houver o seu convalescimento. A conversão
da mera detenção em posse se dará com a ruptura da relação jurídica originária. O convalescimento, também
chamado de interversão, ocorrerá quando cessada a causa que lhe originou ou quando passado ano e dia.

Enunciado 301 da IV Jornada de Direito Civil: É possível a conversão da detenção em posse, desde que
rompida a subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessórios.

4.3 Classificação da Posse

a) Quanto à relação pessoa – coisa (desdobramento da posse):


▪ Posse direta ou imediata: Exercida por quem tem a coisa materialmente. Ex: Locatário,
depositário, comodatário;
▪ Pode indireta ou mediata: Exercida por meio de outra pessoa. Ex: Locador, depositante, nu-
proprietário.

Observações:
✔ A posse direta NÃO anula a indireta;
✔ O possuidor direto tem direito de defender sua posse contra o indireto, e este contra aquele.
Caiu em prova Delegado SP/2018! Com relação à posse, assinale a alternativa correta.
A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal,
ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse
contra o possuidor indireto. (item correto)

b) Quanto à presença de vícios objetivos:


▪ Posse justa (= posse limpa): NÃO apresenta vícios da violência, clandestinidade e precariedade.
Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.
▪ Posse injusta: Possui vícios, bastando um dos três:

250
RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

(1) Violência: Esbulho, violência física ou moral. A posse violenta pressupõe violência à pessoa,
não à coisa (o fato de ter quebrado janela ou porta não faz com que a posse seja violenta).
Ex.: roubo.
(2) Clandestinidade: é a posse que se adquire às ocultas de quem exerce a posse atual, sem
publicidade ou ostensividade. Ex.: furto
(3) Precariedade: o possuidor recebe a coisa coma obrigação de restituí-la e, abusando da
confiança, deixa de devolvê-la. Ex.: Apropriação indébita.

Consequências da presente classificação:


∘ Usucapião: somente o possuidor justo (pode ter se tornado justo depois de um ano e um dia)
pode obter propriedade por usucapião
∘ Ações possessórias: o possuidor justo sempre tem ação possessória. O possuidor injusto só
tem contra terceiro e não contra o possuidor justo.

OBS.: A posse injusta não é a exercida durante atos violentos/clandestinos/precários, mas sim em
decorrência deles. Ou seja: enquanto perdurar a violência, precariedade ou clandestinidade, não
haverá posse, e sim detenção (art. 1.208 CC). Cessadas, surge a posse. Essa posse será injusta em
– já que pode praticar atos de
relação a quem a perdeu, porém será justa em relação à comunidade
defesa da posse em face de terceiros. Trata-se da dualidade de configuração da posse.
OBS.: Segundo o entendimento majoritário, a posse injusta passa a ser justa depois de um ano e dia,
por interpretação do art. 924, do CPC (parâmetro para saber se cabe ação de força velha ou nova –
cabe liminar).

c) Quanto à boa-fé subjetiva ou intencional:


▪ Posse de boa-fé: é de boa-fé a posse se o possuidor ignora/desconhece o vício ou obstáculo que
impede a aquisição da coisa. A posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o momento
em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não mais ignora que sua posse é
indevida.

Obs.1: A prova da boa-fé é extremamente difícil, porque se trata de elemento subjetivo, por isso o
art. 1.201, § único, prevê que o possuidor com justo título é presumidamente possuidor de boa-fé. Trata-se
de uma presunção relativa.
Obs.2: Esse justo título não deve ser confundido com o justo título do art. 1.242, que trata de
usucapião ordinária (título hábil à aquisição de propriedade), enquanto o art. 1.201, § único, é justo título de
aquisição da posse (p.e., contrato de comodato, de locação, de usufruto).
▪ Posse de má-fé: Conhecedor do vício que paira sobre a coisa. Ainda que de má-fé, esse possuidor
NÃO perde o direito de ajuizar ação possessória competente para se proteger do ataque de
terceiro.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Consequências da presente classificação:


∘ Possuidor de boa-fé:
✔ Só responderá pela perda ou deterioração da coisa se der causa.
✔ Tem direito aos frutos percebidos enquanto durar a boa-fé, bem como direito à
restituição dos frutos pendentes e dos frutos colhidos por antecipação, ao tempo que
cessou a boa-fé.
✔ Possui direito de retenção e indenização em relação às benfeitorias necessárias e úteis,
e direito de indenização e levantamento em relação às benfeitorias voluptuárias.

∘Possuidor de má-fé
✔ Em regra, possui responsabilidade objetiva pela perda ou deterioração da coisa, anda
que não tenha dado causa. Salvo se comprovar que de igual modo teria acontecido
caso estivesse na posse do reivindicante.
✔ Responde pelos frutos colhidos, percebidos e os que deixou de perceber por sua culpa,
só tendo direito às despesas de produção e custeio.
✔ Só possui direito à indenização em relação às ben
feitorias necessárias.

4.3 Efeitos da Posse

a) FRUTOS:
I) Posse de boa-fé: O possuidor tem direito, enquanto durar, aos frutos percebidos. Devem ser restituídos:
⋅ Frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé, depois de deduzidas as despesas com produção
e custeio;
⋅ Frutos colhidos com antecipação;
⋅ Frutos naturais e industriais: colhidos e percebidos logo que são separados;
⋅ Frutos civis: reputam-se percebidos por dia.
II) Posse de má-fé: Responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelo que, por culpa
sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé, mas tem direito às
despesas de produção e custeio.

b) BENFEITORIAS:
I) Posse de boa-fé: Possui direito à indenização por benfeitorias necessárias e úteis, bem como pelas
acessões (plantações e construções);
⋅ Se não indenizado, possui direito à retenção das benfeitorias, até que receba o que lhe é devido;
⋅ Se benfeitorias voluptuárias, tem direito ao seu levantamento, se não forem pagas, desde que não
gerem prejuízo à coisa.

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DELEGADO SÃO PAULO

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II) Posse de má-fé: São ressarcidas apenas as benfeitorias necessárias, não lhe assistindo o direito de
retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

RESPONSABILIDADE
FRUTOS BENFEITORIAS
(PERDA)
- Tem direito às benfeitorias
necessárias e úteis. obs2.
Tem direito, com
(indenização e retenção) obs3. Responde por culpa (perda
BOA-FÉ exceção dos frutos
- Pode levantar as voluptuárias que der causa).
pendentes. Obs1.
se não houver prejuízo para o
bem principal.
Não tem direito e
Responde ainda que a
responde pelos frutos Tem direito às benfeitorias
MÁ-FÉ perda seja acidental, em
colhidos e pelos que necessárias (indenização).
regra.
deixou de colher.

c) FACULDADE DE INVOCAR OS INTERDITOS POSSESSÓRIOS:

Ameaça Interdito proibitório


Turbação Ação de manutenção de Há fungibilidade entre as
posse três ações!
Esbulho Reintegração de posse

Obs.: Não obsta a manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito
sobre a coisa.
Obs.: STJ: Em ação possessória entre particulares é cabível o oferecimento de oposição pelo ente público,
alegando-se incidentalmente o domínio de bem imóvel como meio de demonstração da posse. (ERESP
1.134.446-mt, INFO 623)

d) LEGÍTIMA DEFESA DA POSSE E DESFORÇO IMEDIATO: O proprietário pode se valer da autotutela,


independente de ação judicial, contanto que o faça logo. Os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir
além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.
Duas são as hipóteses de autotutela: legítima defesa e desforço imediato. Ambas com fundamento
material no art. 1210, § 1º, do CC:

art. 1210, § 1º, do CC - “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou


restituir-se por sua própria força, contando que o faça logo; os atos de defesa, ou

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SEMANA 07/12

de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção ou restituição da


posse”.

Enunciado 239 do CJF: “Art. 1210: Na falta de demonstração inequívoca de posse


que atenda à função social, deve-se utilizar a noção de melhor posse, com base nos
critérios previsto no parágrafo único do art. 507 do CC/1916”.

4.4. Composse: (Art. 1.199, CC)

É a situações em que duas ou mais pessoas exercem, simultaneamente, poderes possessórios sobre
a mesma coisa, e pode existir tanto na posse direta quanto na indireta, por ato inter vivos ou mortis causa.
⋅ Na composse, todos possuem a mesma posse sobre a mesma coisa, independente de sua fração
ideal. Logo, todos podem exercer todos os poderes sobre a coisa como um todo.
⋅ STJ: Nos casos de composse NÃO se admite a usucapião de um compossuidor sobre o bem, já que
todos os compossuidores exercem, cada um, poderes sobre a coisa como um todo, SALVO no casso
de um compossuidor estabelecer posse com exclusividade, afastando os demais.

⋅ contra terceiros. Porém,


O STJ entende que qualquer herdeiro pode ingressar com ação possessória
também cabe ação possessória de um herdeiro contra o outro, se houver um esbulho praticado
entre ambos. (REsp. 537.363/RS. Informativo 431 STJ).
⋅ A composse leva em conta o aspecto subjetivo e não objetivo. Ou seja, leva em conta se duas ou
mais pessoas são possuidoras do bem (e não a natureza da posse).

4.5 Formas de Aquisição, Transmissão e Perda da Posse

a) Aquisição: Com o CC/02, passou a ser rol aberto, e pode ser:


● Aquisição originária: Há um contato direto entre a pessoa e a coisa;
● Aquisição derivada: Há intermediação pessoal. Ex.: Tradição.
⋅ Tradição real: Ocorre pela entrega efetiva ou material da coisa;
⋅ Tradição simbólica: Há um ato representativo da entrega da coisa. Ex.: Entrega das chaves
do apartamento => TRADITIO LONGA MANU;
⋅ Tradição ficta: Ocorre por presunção, em que o possuidor detinha em nome alheio e passa
a possuir em nome próprio (Ex.: Locador que compra o imóvel => TRADITIO BREVI MANU)
ou o inverso (ex.: proprietário vende o imóvel e nele permanece como locatário =>
CONSTITUTO POSSESSÓRIO).
Quem pode adquirir a posse?
R.: A posse pode ser adquirida:
⋅ Pelo próprio sujeito;
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⋅ Por seu representante legal ou convencional;


⋅ Por terceiro que não tenha mandato, se houver confirmação posterior, com efeitos ex tunc.

b) Transmissão: A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres
=> PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO CARÁTER DA POSSE:
● Sucessão universal (herança legítima): continuação da posse
● Sucessão singular: união de posses.

c) Perda: Numerus apertus:


● Abandono da coisa;
● Tradição;
● Destruição: perecimento do objeto;
● Colocação da coisa fora do comércio (inconsutibilidade jurídica);
● Posse de outrem;
● Constituto possessório;
● “Traditio brevi manu”;
● “Supressio”.

Obs.: Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se
abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, e violentamente repelido.

5. PROPRIEDADE

É um feixe de poderes complexos, é o direito que a pessoa tem, dentro dos limites normativos, de
usar, gozar, dispor de um bem corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o
possua ou detenha.

5.1 Atributos: GRUD

⋅ Gozar ou fruir: Retirar os frutos da coisa (naturais ou civis);


⋅ Reaver: Reivindicar a coisa contra quem injustamente a possua (elemento externo da propriedade);
⋅ Usar: dar destinação como bem entender. Esse atributo hoje encontra fortes limitações: Limitado
pelo direito de vizinhança e leis específicas, a exemplo do Estatuto das Cidades;
⋅ Dispor: Ex.: Compra e venda, doação, testamento.

O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e
sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a

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fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a
poluição do ar e das águas.

São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam
animados pela intenção de prejudicar outrem.

5.2 Classificação da propriedade:

● Propriedade plena ou alodial: O proprietário tem todos os atributos do GRUD. Ademais, a


propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário.
● Propriedade limitada ou restrita: Ocorre quando recai algum ônus sobre a propriedade (ex.:
hipoteca, servidão ou usufruto) OU quando a propriedade for resolúvel, dependente de condição ou
termo.
O proprietário que reúne todos os poderes/atributos da propriedade (GRUD), é titular da
propriedade plena ou alodial. Quando essa propriedade é limitada ou restrita, ou seja, se parte dos atributos
passa a ser de outrem, o direito de propriedade pode se dividir em 2 partes:
⋅ Nua-propriedade: Corresponde à titularidade do domínio, e está despida dos atributos de gozar e
usar;
⋅ Domínio útil: Corresponde aos atributos de gozar, usar e dispor.

5.3 Características

● Direito absoluto: sentido de eficácia erga omnes. A propriedade não é absoluta no sentido de
prevalência em relação a qualquer outro direito. Ela deve ser ponderada com outros direitos
fundamentais.
● Direito exclusivo: NÃO pode pertencer a mais de uma pessoa, salvo o domínio ou copropriedade.
● Direito perpétuo: O direito permanece independente do seu exercício; a propriedade é contínua até
que surja um fato modificativo ou extintivo.
● Direito elástico: A propriedade pode ser distendida ou contraída quando ao seu exercício;
● Direito fundamental.

Obs.1: A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e


profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas,
por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las. No
entanto, a propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de
energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais, podendo o
proprietário explorar os recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que não
submetidos a transformação industrial.
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Obs.2: Condomínio comum: Diz-se que existe um condomínio geral quando duas ou mais pessoas possuem
direito de propriedade em relação a determinado bem (móvel ou imóvel). Este instituto encontra-se
disciplinado nos arts. 1.314 a 1.330 do Código Civil. Ex.: dois amigos resolvem comprar, em conjunto, uma
casa de praia. Haverá aí um condomínio geral.

5.4 Função social da propriedade:

“ A propriedade já não é direito subjetivo do indivíduo, mas uma função social a ser
exercida pelo detentor da riqueza” (Leon Duguit).

A função social da propriedade faz com que a propriedade envolva a situação jurídica de mão dupla,
ou seja, o proprietário tem direitos e deveres em relação ao não proprietário, que da mesma forma os tem
em relação ao proprietário. Não há definição apriorística da função social da propriedade, ou seja, trata-se
de um conceito indeterminado. A CF/88 sinalizou o que seja a função social nos artigos 182 e 186, quando,
respectivamente, afirma que atendem à função social:
1) IMÓVEL URBANO – quando atende às exigências do Plano Diretor Urbano; mas se, por exemplo,
-de-obra
mesmo cumprindo as exigências do PDU, um imóvel for ocupado para uma atividade que utiliza mão
escrava, não estará sendo atendida a função social. O Estatuto da Cidade (artigo 5o) afirma que o proprietário
que não cumprir a função social ao imóvel urbano pode ser obrigado a ocupar, parcelar ou construir em seu
imóvel, dentro do prazo (01 ano para apresentação do projeto e 02 anos para início), sob pena de
PROGRESSIVIDADE DO IPTU (artigo 7o), em até 15%, ao longo de 05 anos. Essa progressão não tem natureza
fiscal, tem natureza EXTRAFISCAL, funciona como sanção de proteção ambiental. Se ainda assim o
proprietário não der função social ao imóvel, sofrerá DESAPROPRIAÇÃO, cuja indenização será feita nos
seguintes termos:
⋅ Em títulos da dívida pública,
⋅ Por valor venal (e não de mercado),
⋅ Retira-se o valor de possível valorização que o imóvel tenha sofrido em decorrência de obra pública,
⋅ Não cabe restituição por lucro cessante e
⋅ Não cabe o pagamento de juros compensatórios.

Obs.: proprietário que é punido NÃO pode ser indenizado da mesma forma que o proprietário que não está
sendo punido.

2) IMÓVEL RURAL – quando há aproveitamento racional e adequado da propriedade (Lei 8.629/93


estabelece os percentuais de aproveitamento das áreas rurais); utilização adequada que preserva os recursos
naturais e o meio ambiente; observa as disposições que regulamentam as relações de trabalho (proteção
contra o trabalho escravo ou o proprietário rural que costumeiramente descumpre as exigências
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trabalhistas); favorece o bem-estar do proprietário e dos trabalhadores. Caso não cumprida a função social,
pode haver a desapropriação da propriedade rural: pagamento com títulos da dívida agrária. É proibida a
desapropriação da pequena propriedade rural e da propriedade produtiva. Há imóvel que pode ser
economicamente produtivo, mas, socialmente improdutivo, EXEMPLO: fazenda toda plantada,
informatizada, com as relações trabalhistas em ordem e dá enorme lucro, mas a sua cultura é de maconha;
nesse caso não será nem a desapropriação, é caso de perdimento do bem, como previsto na própria CF/88.

A função social da propriedade tem dupla função (José de Oliveira Ascensão):

a) Função limitadora: impõe um não fazer. Ex.: a propriedade não pode ser exercida em abuso de
direito. Art. 1228, §2º, do CC – vedação dos atos emulativos ou chicaneiros.
b) Função impulsionadora: impõe condutas. A coisa cumpre a sua função social quando é utilizada em
um sentido positivo. “Usa o bem para o bem” (Lucas Abreu Barroso).

5.5 Propriedade resolúvel e propriedade fiduciária

● Propriedade resolúvel: É aquela que pode ser extinta, quer pela condição (evento futuro e incerto)
sula especial de venda com reserva de domínio;
ou pelo termo (evento futuro e certo). Ex.: Cláu
● Propriedade fiduciária: É a propriedade resolúvel da coisa móvel infungível que o devedor, com
escopo de garantia, transfere ao credor.

Em outras palavras: a propriedade fiduciária ocorre quando o credor fiduciário adquire a


propriedade resolúvel e a posse indireta de bem móvel recebido em garantia de financiamento efetuado
pelo alienante, que se mantém na posse direta da coisa, resolvendo-se o direito fiduciário com a solução da
dívida garantida
O objeto é BEM MÓVEL, por natureza, INFUNGÍVEL, DURÁVEL e INCONSUMÍVEL. É PACÍFICO que o
bem que já integre o patrimônio do devedor pode ser objeto de propriedade fiduciária (Súmula 28 do STJ).

5.6 Formas de aquisição da propriedade imóvel e móvel:

PROPRIEDADE IMÓVEL
Forma Originária Forma Derivada
Contato direito entre pessoa e coisa. A Intermediação pessoal.
propriedade é zerada, ou seja, os seus A propriedade continua com os mesmos
acessórios (tributos, dívidas de condomínio, atributos, em razão da solução de continuidade
hipoteca, propter rem) são extintos. STF –
Re 94596-6/RS.

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● Acessão: é a incorporação natural ou ● Registro imobiliário;


artificial. ● Sucessão hereditária.
- Ilhas; ● Compra e venda
- Aluvião;
- Avulsão;
- Álveo abandonado;
- Plantações;
- Construção.

● Usucapião

PROPRIEDADE MÓVEL
Forma Originária Forma Derivada
● Ocupação e achado de tesouro; ● Especificação;
● Usucapião. ● Confusão;
● Comistão;
● Adjunção;
● Tradição;
● Sucessão.

Obs.: Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor. Não
o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada a
autoridade competente. Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo antecedente, terá direito
a uma recompensa não inferior a cinco por cento do seu valor, e a indenização pelas despesas que houver
feito com a conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la.

* Atenção: Outras formas de aquisição que não estão delineadas no resumo


devem ser complementadas com a leitura do Código Civil.

Alguns temas relevantes sobre as formas de aquisição da propriedade:

5.6.1 Modos de Aquisição de Bem Imóvel

A) USUCAPIÃO: É o modo originário de aquisição da propriedade pela posse qualificada prolongada no


tempo.
Se a propriedade é adquirida de forma originária, o novo proprietário NÃO é responsável pelos
Tributos que recaiam sobre o imóvel
Se imóvel gravado por hipoteca, posteriormente adquirido por usucapião: o gravame de extingue.
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NÃO correrão os prazos de usucapião entre cônjuges na constância da sociedade conjugal, a exceção
da usucapião conjugal.

Não correm os prazos:


⋅ Contra o absolutamente incapaz;
⋅ Contra os ausentes do país a serviço público;
⋅ Contra os que se acham servindo nas forças armadas, em tempo de guerra;
⋅ Pendendo condição suspensiva;
⋅ Não estando vencido o prazo para a aquisição do direito;
⋅ Pendendo ação de evicção.

Modalidades de usucapião:

MODALIDADE FUNDAMENTO REQUISITO REMISSÕES


Decurso do tempo que causa -Posse ad usucapionem; Art. 1.238, caput
EXTRAORDINÁRIA 1 a prescrição aquisitiva. -15 anos ininterruptos. do CC.
- Independe de título e boa

Prescrição diminuída por ter -Posse ad usucapionem; Art. 1.238, §
o possuidor dado destinação -10 anos ininterruptos; único, do CC
que atende à função social. -Ter o possuidor constituído
EXTRAORDINÁRIA 2 sua morada OU realizado
obras OU serviços
produtivos.
Prescrição aquisitiva -Posse ad usucapionem; Art. 1.242, caput,
- 10 anos contínuos; do CC.
ORDINÁRIA 1 - Justo título;
- Boa- fé.
Prescrição aquisitiva -Posse ad usucapionem; Art. 1.242, §
- 05 anos contínuos; único.
- Aquisição onerosa do
imóvel com base em
ORDINÁRIA 2 registro irregular
posteriormente cancelado;
-Ter o possuidor constituído
sua moradia OU realizado

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RETA FINAL

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investimentos de interesse
social e econômico.
Prescrição extintiva pelo -Posse ad usucapionem; Art. 1.239, CC
proprietário não dar função - 05 anos contínuos; +
social e prescrição aquisitiva, - Máximo de 50 Hc em zona Art. 191, CF/88
ESPECIAL RURAL benefício ao possuidor que a rural; +
CONSTITUCIONAL atendeu. - Tornar a propriedade Lei nº 6.969/81
RURAL PRO LABORE produtiva;
-Ter o possuidor constituído
a sua morada;
- NÃO ser proprietário ou
possuidor de outro imóvel
urbano ou rural.
Sanção ao proprietário por -Posse ad usucapionem; Art. 1.240, CC
não dar cumprimento à - 05 anos contínuos;
função social da propriedade - Área urbana de até 250
urbana. m²;
ESPECIAL URBANA - Moradia própria ou da
CONSTITUCIONAL família;
- Não ser possuidor ou
proprietário de outro
imóvel urbano ou rural;
- Não ter recebido o
benefício antes.
Sanção ao proprietário por -Posse ad usucapionem; Lei nº 10.257/01
não dar cumprimento à - 05 anos contínuos; *Com redação
função social da propriedade - Área total dividida pelo dada pela Lei n°
urbana e benefício aos número de possuidores; 13.465/2017.
possuidores que a - Área urbana com menos
ESPECIAL URBANA atenderam. de 250 m² por possuidor;
COLETIVA - Destinada à moradia da
população posseira;
- NÃO ser proprietário ou
possuidor de outro imóvel
urbano ou rural.
Busca impedir que os imóveis -Posse ad usucapionem; Art. 1.240-A, do
vinculados ao programa CC.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

“Minha casa, minha vida” - 02 anos ininterruptos e


possam ficar em situação de sem oposição;
CONJUGAL, incerteza de propriedade. - Imóvel urbano de até 250
PRO-FAMÍLIA m²;
- Dividia a propriedade com
ex-cônjuge ou companheiro
que abandonou o lar;
- Moradia sua ou da família.

Súmula 263-STF: O possuidor deve ser citado, pessoalmente, para a ação de


usucapião.
Súmula 237-STF: O usucapião pode ser arguido em defesa.

Jurisprudências relevantes sobre o tema:


▪ O STJ decidiu que o bem furtado pode ser objeto de usucapião, desde que tenha cessado a
clandestinidade.
▪ O STJ decidiu que NÃO cabe oposição em ação de usucapião.
▪ A destinação de parte do imóvel para fins comerciais não impede o reconhecimento da usucapião
especial urbana sobre a totalidade da área.
▪ O interesse jurídico no ajuizamento direto de ação de usucapião independe de prévio pedido na
via extrajudicial
▪ É possível o reconhecimento da usucapião de bem imóvel com a implementação do requisito
temporal no curso da demanda
▪ Se o juízo criminal decretou a perda do imóvel que está sendo pleiteado em ação de usucapião,
esta decisão produzirá efeitos no juízo cível, devendo a ação ser extinta por perda do objeto.

5.6.2 Modos de Aquisição da Propriedade Móvel

A) OCUPAÇÃO: É o modo ORIGINÁRIO por excelência de aquisição da propriedade móvel, pelo qual alguém
imediatamente apropria-se de coisas SEM DONO, seja porque nunca foram apropriadas (RES NULLIUS),
seja porque foram abandonadas (RES DERELICTAE).
As coisas abandonadas não se confundem com as perdidas, pois aqui há apenas um temporário
afastamento do corpus, mas é mantido o animus. Para estas, há a descoberta.
Tem como objeto seres vivos (caça e pesca) e seres inanimados

B) CONFUSÃO X COMISTÃO X ADJUNÇÃO:

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Confusão (= confusão real): É a mistura entre coisas líquidas (ou gases), em que não é possível a
separação;
● Comistão: Mistura de coisas sólidas ou secas, NÃO permitindo a separação;
● Adjunção: Justaposição de uma coisa sobre a outra, impedindo a separação.

C) USUCAPIÃO
● Ordinária: Art. 1.260, CC – posse mansa e pacífica, ininterruptamente e sem oposição, durante TRÊS
ANOS, exercida com animus domini, JUSTO TÍTULO e BOA-FÉ.
● Extraordinária: Art. 1.261, CC – posse ininterrupta e pacífica com animus domini pelo prazo de CINCO
ANOS.

6. PERDA DA PROPRIEDADE MÓVEL OU IMÓVEL:

● Alienação: ato pelo qual o proprietário, por vontade própria, gratuita ou onerosamente, transfere a
outrem seu direito sobre a coisa;
● Renúncia: ATO UNILATERAL pelo qual o proprietário declara formal e explicitamente o propósito de
despojar-se do direito de propriedade. Só se aplica aos BENS IMÓVEIS, com exceção do patrimônio
o de abdicação pelo herdeiro;
móvel que se encerra no direito hereditário objet
● Abandono: é o ATO MATERIAL pelo qual o proprietário desfaz-se da coisa porque não quer mais ser
seu dono. Por não ser um ato expresso como a renúncia, a derrelição deve resultar de ATOS
EXTERIORES que atestem a manifesta intenção de abandonar.
✔ O mero desuso não implica em abandono, tem que haver o elemento psicológico
✔ O imóvel urbano que o proprietário abandonar, com a intenção de não mais o conservar em
seu patrimônio, e que se não encontrar na posse de outrem, poderá ser arrecadado, como
bem vago, e passar, tres anos depois, a propriedade do município ou a do distrito federal, se
se achar nas respectivas circunscrições.
● Perecimento da coisa: dá-se pela perda das qualidades essenciais da coisa
● Transmissão da propriedade: Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título
transitivo no Registro de Imóveis. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua
a ser havido como dono do imóvel.
● Perda involuntária: pela arrematação, adjudicação, implemento de condição resolutiva, usucapião,
casamento pela comunhão universal e confisco
● Desapropriação: modo ORIGINÁRIO de aquisição e perda da propriedade, em face da intervenção
estatal na propriedade privada.
✔ O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou
utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público
iminente.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

✔ O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em


extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável
número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente,
obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

7. DIREITOS REAIS DE GOZO OU FRUIÇÃO

Caiu em prova Delegado RR/2022! Acerca do usufruto, uso e habitação, é correto afirmar: a percepção dos
frutos da coisa é livre pelo usufrutuário, limitadamente às necessidades do usuário e de sua família pelo
usuário e vedada ao titular do direito de habitação. (item correto)

7.1 Superfície

O proprietário concede a outrem, por tempo determinado ou indeterminado, gratuita ou


onerosamente, o direito de construir ou plantar no seu terreno, mediante escritura pública devidamente
registada no Cartório de Registro de Imóveis.
O CC/02 NÃO contempla a possibilidade de sobrelevação ou da superfície de segundo grau, que
consiste na concessão feita a terceiro, pelo superficiário, de construir sobre a sua propriedade superficiária.
No entanto, a doutrina admite o direito de superfície de segundo grau.
A propriedade superficiária pode ser autonomamente objeto de direitos reais de gozo e garantia,
cujo prazo não exceda a duração da concessão do direito real de garantia.
São partes:
● Proprietário
● Superficiário.

Considerações:
✔ O direito de superfície NÃO autoriza obras no subsolo, salvo se a utilização for inerente à concessão.
✔ É possível hipotecar (e adquirir por usucapião) o direito do superficiário pelo prazo de vigência do
direito real.
✔ O superficiário deve zelar pelo imóvel como se fosse seu.

Direito de superfície do CC/02 Direito de Superfície dos Estatuto das Cidades


- Imóvel urbano ou rural - Imóvel urbano
- Exploração restrita: construção e plantações - Exploração ampla: qualquer utilização de acordo
com a política urbana
- Em regra, NÃO há autorização para utilização - Em regra, é possível utilizar o subsolo ou o espaço
do subsolo e espaço aéreo aéreo

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SEMANA 07/12

- Cessão somente por prazo determinado - Cessão por prazo determinado ou indeterminado

7.2 Uso ( = Usufruto Anão, Nanico Ou Reduzido)

É o direito de usar a coisa móvel ou imóvel, podendo o usuário perceber frutos dentro dos limites
das necessidades pessoais suas e de sua família.
● Pode ser gratuito ou oneroso;
● Pode ser constituído por ato inter vivos ou mortis causa;
● Há apenas o direito de usar a coisa, seja móvel ou imóvel;
● Direito personalíssimo.

7.3 Habitação

Consiste em utilizar gratuitamente imóvel alheio para fim de moradia. Portanto, é cedida apenas
parte do atributo de usar.
O titular NÃO pode alugar ou emprestar, só pode ocupar o imóvel com a família.
● Direito personalíssimo;
● O imóvel é impenhorável;
● Temporário;
● Pode recair sobre o imóvel ou parte dele;
● Caso haja mais de um titular, qualquer um pode habitar a casa sem pagar aluguel ao outro.

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CRIMINOLOGIA: CONCEITO, OBJETO, MÉTODO, CLASSIFICAÇÃO DA CRIMINOLOGIA E ESTATÍSTICA


CRIMINAL

1. CONCEITO CARACTERÍSTICAS, MÉTODO E FUNÇÕES

1.1 Considerações Preliminares

Criminologia é um nome genérico designado a um grupo de temas estreitamente ligados: o estudo e


a explicação da infração legal; os meios formais e informais de que a sociedade se utiliza para lidar com o
crime e com os atos desviantes; a natureza das posturas que as vítimas desses crimes serão atendidas pela
sociedade; e, por derradeiro, o enfoque sobre o autor desses atos desviantes (Shecaria, 2014).
Antes de analisarmos o conceito da Criminologia, convém fazer uma observação importante: a
análise da Criminologia esbarra nas diferentes perspectivas existentes nas ciências humanas. Definir
criminologia sob a perspectiva crítica é algo totalmente diferente do que definir a mesma criminologia sob a
perspectiva do positivismo.
Segundo (Carvalho, 1973), o objeto da Criminologia é o estudo da criminalidade, ou seja, do crime e
do criminoso. Objeto também utilizado pelo Direito Penal e pela Política Criminal, o que leva a alguns autores
ma perfeitamente
como (Seelig, 1957) a afirmar que a Criminologia ainda não é uma ciência autôno
constituída.
Para (Shecaria, 2014), a Criminologia não é uma ciência, uma vez que não tem objeto de estudo e
teorias próprios, sendo, na verdade, um campo de conhecimentos interligados (interdisciplinaridade),
transitando pela sociologia, histórica, psicanálise, antropologia e filosofia, todos focados no fenômeno
criminal.

☠ Cuidado:
Majoritariamente, no Brasil, a Criminologia é considerada uma ciência autônoma e interdisciplinar, que
possui objeto próprio analisado sob uma perspectiva particular.

1.2 Conceito

Etimologicamente, Criminologia deriva do latim crimen (crime, delito) e do grego logo (tratado). Foi
o antropólogo francês, Paul Topinard (1830-1911), o primeiro a utilizar este termo no ano de 1879. Todavia,
o termo só passou a ser aceito internacionalmente com a publicação da obra “Criminologia”, já no ano de
1885, de Raffaele Garofalo (1851-1934). Além disso, cabe destacar que a obra “O homem deliquente” de
Cesare Lombroso (1876) é considerada o marco científico da Criminologia, pois, como será estudado a diante,
o estudioso inaugura a Escola Positivista.

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SEMANA 07/12

☠ Cuidado:
O histórico da Criminologia é cobrado em provas. Nesse sentido, a Banca VUNESP, em concurso da PC-SP
(ano 2014) questionou quando a expressão foi utilizada pela primeira vez, sendo que a alternativa correta
estabelecia que foi por Paul Topinard e divulgada internacionalmente por Raffaele Garofalo, em sua obra
intitulada “Criminologia”.

Para (Molina, 1999), a Criminologia é a ciência empírica e interdisciplinar que tem por objeto o
crime, o delinquente, a vítima e o controle social do comportamento delitivo; e que aporta uma informação
válida, contrastada e confiável, sobre a gênese, dinâmica e variáveis do crime - contemplado este como
fenômeno individual e como problema social, comunitário assim como sua prevenção eficaz, as formas e
estratégias de reação ao mesmo e as técnicas de intervenção positiva no infrator.
A criminologia é uma ciência do “ser”, empírica, na medida em que seu objeto (crime, criminoso,
vítima e controle social) é visível no mundo real e não no mundo dos valores, como ocorre com o direito, que
é uma ciência do “dever-ser”, portanto, normativa e valorativa.
Nesse sentido, o domínio do saber criminológico possibilita um conhecimento efetivo mais próximo
da realidade que o cerca, concedendo acesso a dados e estudos que demonstram o funcionamento correto
ou não da aplicação da lei penal.
Destaca-se que toda ciência possui método, objeto e função e, no contexto da Criminologia podemos
destacar que:
a) Seu MÉTODO é empírico, indutivo e interdisciplinar;
b) Tem como OBJETO o estudo do crime, pessoa do infrator, vítima e controle social;
c) As suas FUNÇÕES incluem estabelecer programas de prevenção eficaz, técnicas de intervenção
positiva no homem delinquente e modelos ou sistemas de resposta ao delito.

Aprofundando a temática...

Há doutrina que divide a Criminologia em duas dimensões:


1. Criminologia Geral: sistematização, comparação e classificação dos resultados obtidos no âmbito
das ciências criminais acerca do crime, criminoso, vítima, controle social e criminalidade.
2. Criminologia CLÍNICA: aplicação dos conhecimentos teóricos para o tratamento dos criminosos,
incidindo no exame da personalidade do culpado.

1.3 Criminologia X Direito Penal X Política Criminal

A Criminologia, o Direito Penal e a Política Criminal são as três vertentes das denominadas Ciências
Criminais. Logo, é preciso ter atenção na distinção entre os conceitos:

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● CRIMINOLOGIA
→ É a ciência empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime, do criminoso, da vítima e do
controle social.
→ É uma ciência do SER.
→ “Ciência que tem por objeto o estudo causal-explicativo do delito”. (Rafaelle Garófalo). Ou seja, é
voltada para a etiologia do delito (as causas da criminalidade).
→ Utiliza o método indutivo, empírico e interdisciplinar.
→ Análise do crime enquanto fato.

● DIREITO PENAL
→ É uma ciência normativa, lógica e abstrata.
→ É uma ciência do DEVER-SER.
→ Utiliza o método dedutivo (parte da regra geral para depois enfrentar uma regra particular).
→ Análise do crime enquanto norma.

● POLÍTICA CRIMINAL:
→ Oferece diretrizes e soluções práticas para o enfrentamento da criminalidade. Ou seja, trabalha
estratégias e meios de controle social da criminalidade.
→ Crime enquanto valor.
→ Oferece aos poderes públicos as opções científicas concretas mais adequadas para controle do
crime, de tal forma a servir de ponte eficaz entre o direito penal e a criminologia. Ou seja: são
diretrizes e soluções práticas para o fenômeno da criminalidade no campo da prevenção.
→ A política criminal interpreta a realidade, ao passo que a criminologia transforma esta realidade.
→ Para parte da doutrina, a política criminal não possui método próprio, motivo pelo qual não tem
autonomia de ciência.

☠ Cuidado:
Na Prova de Delegado do Estado de Roraima (2022), da Banca VUNESP, foi considerada correta a assertiva
que tratava a Política Criminal enquanto ciência autônoma. Vejamos:

Pode-se afirmar que a Criminologia é a ciência que se ocupa do delito, do delinquente, da vítima e do controle
social, centrando-se nos estudos das causas dos delitos, ou seja, em explicá-lo. A Política Criminal ocupa-se
de estudar e implementar medidas de prevenção e controle do delito. Posto isso, assinale a alternativa
correta.

Resposta: A Política Criminal é uma ciência autônoma e independente; não é uma parte da Criminologia.

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SEMANA 07/12

DIREITO PENAL CRIMINOLOGIA POLÍTICA CRIMINAL

Analisa os fatos humanos Ciência empírica que estuda o Trabalha as estratégias e meios
indesejados, define quais crime, o criminoso, a vítima e o de controle social da
devem ser rotulados como comportamento da sociedade. criminalidade.
crime ou contravenção
anunciando as penas.
Ocupa-se do crime enquanto Ocupa-se do crime enquanto fato. Ocupa-se do crime enquanto
norma. valor.
Exemplo: define como crime Exemplo: quais fatores contribuem Exemplo: estuda como diminuir a
lesão no ambiente doméstico e para a violência doméstica e violência doméstica e familiar.
familiar. familiar.

☠ Cuidado:
Criminologia → Método Indutivo, Empírico.
Direito Penal → Método Dedutivo, Lógico, Abstrato.

1.4 Características

A criminologia possui como principais características o EMPIRISMO e a INTERDISCIPLINARIDADE.

a) Ciência Criminal Empírica X Dogmática


As ciências criminais podem ser dogmáticas/normativas e empíricas. Ciência é todo o conhecimento
a partir do qual é possível observar uma questão e contestar.
Direito Penal, Processo Penal e Execução Penal são matérias da ciência dogmática, enquanto a
Criminologia é uma ciência empírica. A diferença entre elas diz respeito à METODOLOGIA:

● CIÊNCIAS DOGMÁTICAS: partem de uma lógica dedutiva (geral → particular), sendo esta a lógica da
subsunção.
De acordo com Nilo Batista, o Direito Penal serve para a aplicação da lei penal dentro de um sentido
garantidor.
Parte-se da lei, que é um dogma. Está-se deduzindo a realidade a partir de um paradigma que é o da
lei.

● CIÊNCIAS EMPÍRICAS: partem de um raciocínio indutivo (particular → geral).


A criminologia é uma ciência do “ser”, empírica, na medida em que seu objeto (crime, criminoso,
vítima e controle social) é visível no mundo real e não no mundo dos valores, como ocorre com o direito, que
é uma ciência do “dever-ser”.
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SEMANA 07/12

Trata-se de método empírico, mas não necessariamente experimental. A observação é necessária,


pois o objeto da investigação pode tornar inviável ou ilícita a experimentação. Dessa forma, considerando a
complexidade do fenômeno delitivo, é possível completar o método empírico com outros métodos de
natureza qualitativa, não incompatíveis com aquele.

Conclusão: Os juristas partem de hipóteses que consideram corretas para delas deduzirem as consequências.
Os criminólogos, por sua vez, partem de dados para induzirem correspondentes conclusões. Antes de tentar
explicar o fenômeno do crime, a Criminologia pretende conhecê-lo.

b) Interdisciplinaridade
A interdisciplinaridade da criminologia decorre de sua própria consolidação histórica como ciência
dotada de autonomia, à vista da influência profunda de diversas outras ciências, tais como a Sociologia, a
Psicologia, o Direito, a Medicina Legal etc. Em outras palavras: A criminologia se socorre de uma forte
interlocução com outras ciências para induzir suas respostas.
Na interdisciplinaridade, as ciências comunicam-se estreitamente, fornecendo e recebendo
resultados das demais ciências em um modelo de retroalimentação.
O esquema apresentado por Nestor Penteado Filho em sua obra representa a interdisciplinaridade:

Para (Luiz Flávio Gomes; Antônio Garcia-Pablos de Molina, 2008) as características da moderna
criminologia são:
· O crime deve ser analisado como um problema com sua face humana e dolorosa.
· Aumenta o espectro de ação da criminologia, para alcançar também a vítima e as instâncias de
controle social.
· Acentua a necessidade de prevenção, em contraposição à ideia de repressão dos modelos
tradicionais.
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SEMANA 07/12

· Substitui o conceito de “tratamento” (conotação clínica e individual) por “intervenção” (noção mais
dinâmica, complexa, pluridimensional e próxima da realidade social).
· Empresta destaque aos modelos de reação social ao delito como um dos objetos da Criminologia.
· Não afasta a análise etiológica do delito (desvio primário).

CONCEITO TRADICIONAL CONCEITO MODERNO


Estudo do crime e do delinquente Incorpora o estudo da vítima e do
OBJETO
controle social
ORIENTAÇÃO Orientação repressiva Orientação “prevencionista”
- Intervenção no cenário do crime
- Delito nasce na comunidade e deve
INTERVENÇÃO Tratamento do criminoso ser enfrentado no âmbito da
comunidade

Análise dos modelos de reação ao


Análise etiológica: estuda as delito (processos de criminalização),
PARADIGMA
causas/raízes da criminalidade sem renunciar à análise etiológica do
crime

1.5 Método

Enquanto ciência empírica e experimental, conforme visto anteriormente, a Criminologia utiliza-se


da metodologia experimental, naturalística e indutiva para estudar o seu objeto.
Além disso, para delimitar as causas da criminalidade, a Criminologia busca auxílio dos métodos
estatísticos, históricos, sociológicos e biológicos.
Vale citar a existência de métodos empíricos consagrados:

● Estudos comparativos ou de cotejo de réplicas, chamados de diacrônicos e sincrônicos: o diacrônico


busca averiguar em que se difere (objetivo, elementos, técnicas e conclusões) de estudos anteriores,
tendo forte teor histórico, podendo retratar uma evolução do contexto estudado; o sincrônico busca
averiguar em que se difere estudos realizados em diversas localidades (outras cidades, outros
países), o que pode viabilizar um uma “sintonia fina” entre esses estudos.
● Inquéritos sociais (Social surveys): constituídos por realização de interrogatórios diretos em número
considerável de pessoas, colhendo-se respostas a respeito de dados criminologicamente relevantes,
o que resulta na formação de diagramas, e, dessa forma, no mapeamento da criminalidade,
ferramenta extremamente útil à formação das políticas e estratégias criminais.

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● Estudo biográfico de casos individuais (Case studies): estudo descritivo e analítico de indivíduos e
suas experiências na delinquência – é busca de porquês (causas) pessoais do cometimento de delitos.
Temos aqui um enfoque microcriminal.
● Observação participante: pesquisa que se opera mediante a inclusão do pesquisador no local, no
contexto em que realidade é examinada. Essa pesquisa pode ser realizada da seguinte forma: viver
em uma comunidade onde a criminalidade tem alta incidência; trabalhar no seio da administração
da justiça, penitenciária ou policial; passar pela experiência de estar preso.
● Técnica de grupos de controle: comparação estatística entre dois grupos com algum traço distintivo,
objetivando obter conclusões a respeito da relevância dessa variável nos indivíduos. Exemplo:
acompanhar o grau de reincidência entre grupos condenados criminais, tendo como traço distintivos
a aplicação ou não da pena privativa de liberdade.

Além disso, a doutrina (Molina) aponta técnicas de investigação:


● Quatitativas: estatística (método por excelência), questionário, métodos de medição, que explicam
a etiologia, a gênese e o desenvolvimento. Por si só, é insuficiente.
● observação participante e entrevista, com interpretações valorativas e relacionais.
Qualitativas:
Permite compreender as chaves profundas de um problema e, não obstante o caráter subjetivo (por
conta do observador), mostra-se lógica e coerente, uma vez que se verifica a luz dos
atos
f
observados.
● Transversais: tomam uma única medição da variável ou do fenômeno examinado (ex.: dados
estatísticos).
● Longitudinais: tomam várias medições, em diferentes momentos temporais. Apresenta grande
relevância para a criminologia atual (ex.: biografias criminais, case studies).

1.6 Funções

A função prioritária da Criminologia, como ciência interdisciplinar e empírica, a partir do estudo do


crime, da pessoa do delinquente, da vítima e do controle social, subministrar uma informação válida,
contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime – contemplado este como problema
individual e como problema social -, assim como sobre os programas de prevenção eficaz do mesmo e
técnicas de intervenção positiva no homem delinquente e nos diversos modelos ou sistemas de resposta ao
delito.
A investigação criminológica, enquanto atividade científica, reduz ao máximo a intuição e o
subjetivismo, ao submeter o fenômeno criminal a uma análise rigorosa, com técnicas adequadas e empíricas.
Sua metodologia interdisciplinar permite coordenar os conhecimentos obtidos setorialmente nos distintos
campos de saber pelos respectivos especialistas, eliminando contradições e completando as inevitáveis
lacunas. Oferece, pois, um diagnóstico qualificado e de conjunto do fato criminal mais confiável (Calhau,
2009).
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SEMANA 07/12

2. OBJETOS DA CRIMINOLOGIA

Objeto de estudo da criminologia é o delito, o delinquente, a vítima e o controle social do delito.


Cada um desses objetos recebe um conceito próprio e, em cada momento da história criminológica,
há o protagonismo de algum objeto. Por exemplo, na Escola Clássica, o delito teve o seu papel como
protagonista. No positivismo criminológico, foi o delinquente.

2.1 Delito

O delito é um problema social, um fenômeno comunitário, ligado à violação das expectativas sociais,
questionando os parâmetros (“critérios”) para a sociedade estabelecer que determinada conduta mereça ser
taxada como criminosa.
Trata-se de conceito distinto daquele conferido pelo Direito Penal, segundo o qual o delito é uma
ação ou omissão típica, ilícita e culpável. Trata-se de conceito que tem como base o juízo de subsunção de
um fato individualmente considerado perante a norma.
Segundo (Shecaria, 2014), os critérios para que o fato seja considerado crime (para a Criminologia)
são:

(1) Incidência massiva na população (a conduta rejeitada não é fato isolado): Não basta que um fato gere
sofrimento, ele também precisa se repetir, não pode ser um fato isolado. Ex.: Molestar cetáceo. Um dia
na praia do RJ uma baleia encalhou e um garoto colocou o palito de sorvete na baleia e isso criou uma
comoção na época. Disso surgiu uma lei falando que era crime molestar cetáceo. Ou seja, é uma lei penal
inútil.
(2) Incidência aflitiva do fato (a conduta rejeitada tem relevância social): Quando o legislador quer
criminalizar algo isto deve gerar sofrimento, em maior ou menor grau, ofender alguma pessoa, causar
dor. Ex.: É criticada, sob esse viés, a criminalização do uso da expressão “couro sintético”.
(3) Persistência espaço-temporal do fato: É necessário que essa conduta se repita ao longo do tempo e não
só em uma determinada região, mas em todo território. Ex.: Lei geral da Copa trouxe tipos penais
específicos como o de falsificar o logo da FIFA. Essa lei traz uma previsão normativa que tem vigência até
dezembro 2014. A COPA não tem persistência espaço-temporal nem é algo que vai ficar ao longo do
tempo.
(4) Inequívoco consenso a respeito de que a criminalização do fato é o meio mais eficaz para repressão
da conduta: Para ser considerado crime, teria que gozar de consenso na relevância desse tipo penal, ou
seja, a sociedade deveria entender pelo desvalor da conduta e necessidade de penalização.

Atenção! É nesse ponto que incide o debate em relação à criminalização das drogas.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Existe o inequívoco consenso quanto ao tráfico de drogas? Não. Se existisse, não haveria a Marcha da
Maconha (com decisão do STF no sentido de ser uma manifestação legítima). Sendo assim, do ponto de vista
criminológico, o crime de porte de drogas para uso pessoal não deveria ser criminalizado. (Lembrando que o
STF decidiu que houve apenas uma despenalização quanto ao referido delito, mas não uma
descriminalização).

Segundo as Escolas da Criminologia, que serão detalhadamente abordadas adiante, o delito possui
distintas definições:
Escola Clássica: Ente jurídico.
Escola Positiva: Fato humano e social.

2.2 Criminoso

A doutrina (Shecaria, 2014) conceitua o criminoso como “um ser histórico, real, complexo e
enigmático. Embora seja, na maior parte das vezes, um ser absolutamente normal, pode estar sujeito às
influências do meio (não aos determinismos). Se for verdade que é condicionado, tem vontade própria e uma
assombrosa capacidade transcender, de superar o legado que recebeu e construir seu próprio futuro”.
O conceito de criminoso pode ser dividido em perspectivas:

● Autores clássicos – O criminoso é uma pessoa que optou cometer o delito, embora pudesse e devesse
obedecer a lei, tudo com base na ideia do livre arbítrio, e de que o mal causado pelo criminoso deveria
ser punido de forma proporcional (equivalência entre crime e pena). Trata-se de um ser normal, que fez
mau uso da sua liberdade.
● Autores positivistas - O criminoso, na verdade, é “um prisioneiro de sua própria patologia (determinismo
biológico), ou de processos causais alheios (determinismo social)”, considerando a noção de livre arbítrio
uma ilusão, de modo que a consequência jurídica do crime pode estar mais associada à cura,
restabelecimento ou contenção do indivíduo, mas não necessariamente à uma punição proporcional
(medida de segurança), embora houvesse também positivistas que defendem-se a aplicação da pena
proporcional. Trata-se de um ser anormal, influenciado por fatores externos, físicos ou antropológicos.
● Visão correlacionista – O criminoso é um ser inferior, deficiente, incapaz de dirigir por si mesmo a sua
vida, de modo que é uma pessoa que precisa ser tutelada pelo Estado, e este deveria adotar uma postura
pedagógica e piedosa.
● Marxismo – O culpado pelo crime é a própria sociedade, já que o crime seria decorrente de certas
estruturas econômicas. Assim, o criminoso é considerado fruto da exploração capitalista patrocinada
pelas classes dominantes.

Vamos esquematizar?

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

ESCOLA CONCEITO DE CRIMINOSO


Examina a pessoa do infrator como alguém que fez mau uso da sua
ESCOLA CLÁSSICA liberdade, embora devesse respeitar a lei
Criminoso é um pecador que escolheu o mal (atuação do criminoso
pautada no livre arbítrio).
Criminoso é um prisioneiro de sua própria patologia (determinismo
ESCOLA POSITIVISTA biológico) ou de processos causais alheios (determinismo social). Não
foi aceita a tese da Escola clássica do livre-arbítrio, mas sim a ideia do
criminoso nato (determinismo biológico de Lombroso) e do
determinismo social de Ferri e Garófalo.
Criminoso é um ser inferior, incapaz de guiar livremente a sua
ESCOLA CORRECIONALISTA conduta, por haver debilidade em sua vontade, de modo a merecer
intervenção estatal para corrigi-la. Para a escola correcionalista, o
criminoso não é um ser forte e embrutecido, como diziam os
positivistas, mas sim um débil, cujo ato precisa ser compreendido e cuja
vontade necessita ser direcionada.
ESCOLA MARXISTA/ESCOLA Criminoso como vítima da
sociedade e das estruturas econômicas. A
CRÍTICA responsabilidade do crime é da sociedade e o delinquente é convertido
em vítima, pois este é produto da estrutura econômica do Estado.
Criminoso é homem real e normal que viola a lei penal por razões
ESCOLA ATUAL diversas (elementos biológicos, psicológicos e sociais), que merecem
ser investigadas e nem sempre são compreendidas.

Caiu em prova Delegado RR/2022! Para Escola Clássica da Criminologia, o criminoso é um ser que pecou,
que optou pelo mal, embora pudesse e devesse escolher o bem. (item correto)

2.3 Vítima

A doutrina dominante, adota o conceito de vítima trazido por Edgard de Moura Bittencourt, que
considera vítima a “pessoa que sofre diretamente a ofensa ou ameaça ao bem tutelado pelo Direito.”
Nesse contexto, cabe destacar a Vitimologia, definida como o estudo científico da extensão,
natureza e causas da vitimização criminal, suas consequências para as pessoas envolvidas e as reações
àquela pela sociedade, em particular pela polícia e pelo sistema de justiça criminal, assim como pelos
trabalhadores voluntários e colaboradores profissionais.
Nesse sentido, a Vitimologia é um campo de estudo orientado para a ação ou formulação de políticas
públicas, e não deve ser definida em termos de direito penal, mas de direitos humanos, enquanto estudo das
consequências dos abusos contra os direitos humanos, cometidos por cidadãos ou agentes do governo.

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

A ONU (1985), adotou a Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da
Criminalidade e de Abuso de Poder, que abarca um conceito amplo de vítima:

São vítimas as pessoas que, individual ou coletivamente, tenham sofrido um


prejuízo, atentado à sua integridade física ou mental, sofrimento de ordem moral,
perda material, grave atentado aos DF, como consequência de atos ou de omissões
violadores das leis penais em vigor em um Estado, incluindo as que proíbem o abuso
de poder. São vítimas, ainda, a família próxima ou as pessoas a cargo da vítima
direta e as pessoas que tenham sofrido um prejuízo ao intervirem para prestar
assistência às vítimas em situação de carência ou para impedir a vitimização.

a) Evolução Histórica da Vitimologia

Desde meados dos anos 50, a vítima vem assumindo um importante papel dentro do sistema penal.
Isso vem na contramão do longo período de ostracismo, anteriormente verificado, no qual a vítima era
totalmente estranha ao sistema penal.
Constata-se que a vítima passou por três principais fases na história da civilização ocidental:

● 1ª fase: “Idade de Ouro”


A Fase de Ouro vai desde os primórdios da civilização até o fim da Idade Média, período em que se
destaca a autotutela e a vingança privada.
Em um contexto de vingança privada, a vítima era muito valorizada e tinha para si a persecução penal.
A “justiça” possuía caráter essencialmente privado e todo delito produzia um dano à vítima, considerada não
apenas aquela atingida diretamente, mas toda a coletividade.

● 2ª fase: Neutralização do poder da vítima


O Estado, ao assumir o monopólio da aplicação da pretensão punitiva, diminui a importância da
vítima no conflito, que perde espaço tanto no âmbito do sistema legal quanto no criminológico.
As ciências criminológicas passaram a centrar a investigação na figura do criminoso, enquanto o
direito penal, ao estruturar o seu sistema a partir de um projeto de legitimação material à luz da violação do
bem jurídico, conduziu a vítima a um papel meramente neutro e figurativo no cenário da resolução do
conflito. Nesse período, inclusive, importantes institutos foram suprimidos, a exemplo da legítima defesa.
Como as consequências jurídicas do ato delituoso passam a ser da responsabilidade dos poderes
públicos, que, por sua vez, “esquecem” da vítima, o sistema passou a ser denominado de vingança pública.
Este fenômeno de mudança de resolução dos conflitos de forma horizontal – entre os particulares –
para uma forma vertical – entre o Estado e os particulares, é chamado por Foucault de confisco do conflito.

● 3ª fase: Revalorização da vítima


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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Possui como marco o fim da 2ª Guerra Mundial, quando aparecem os primeiros estudos sobre
vitimologia, com destaque aos realizados por Benjamim Mendelsohn (1947) e Hans Von Hentig (1948).

☠ Cuidado:
A relação entre Benjamim Mendelsohn e a Vitimologia já foi cobrada em provas. Nesse sentido, a Banca
VUNESP, em concurso da PC-SP, indicou Benjamim como responsável por cunhar o termo.
Além disso, são citados outros nomes vinculados a Vitimologia: Hans Von Hentig, Hans Gross (primeiros
trabalhos em 1901) e Israel Drapkin (1973).

É uma resposta ética e social ao fenômeno multitudinário da macrovitimização, que atingiu


especialmente judeus, ciganos, homossexuais, e outros grupos vulneráveis. Esse redescobrimento não
persegue o retorno à vingança privada, nem quebra das garantias para os delinquentes: a vítima quer justiça.
A recuperação da importância da vítima no fenômeno criminal traz repercussões no âmbito
criminológico e também no processo penal e no direito penal material.

b) Classificação das Vítimas


Há dois autores que contribuíram de forma pioneira para o estudo da Vitimologia: Hentig e
Mendelsohn, principais responsáveis pela etapa clássica.

Hentig (1940/1941):
Com o artigo “Observações sobre a interação entre autor e vítima” rompeu com o tradicional foco
das investigações sobre a origem do crime que, àquela altura, ainda estava concentrado somente no
criminoso, o único protagonista do crime.
Com a obra “O criminoso e sua vítima”, Hentig passou a ser considerado o primeiro criminólogo a
tentar sistematizar o estudo da vitimologia e sua obra considerada o ponto de partida dos estudos
científicos sobre a vítima do delito. A partir de então, a vítima do crime não seria mais um mero sujeito
passivo do processo de criminalização, mas um sujeito ativo.
O autor buscou questionar o ideário popular de brilhante pureza da inocência da vítima e
indisfarçável crueldade do criminoso, demonstrando que, em determinados casos, a vítima contribui de
forma decisiva na cadeia causal do crime, razão pela qual em relação a muitos crimes deve ser levada em
consideração também a conduta da vítima.

Mendelsohn:
A grande contribuição do autor foi a elaboração da classificação de vítimas com base na correlação
da culpabilidade entre vítima e o infrator, sustentando que há uma relação inversa entre a culpabilidade do
agressor e a do ofendido, de modo que a maior culpabilidade de um representa menor culpabilidade do
outro.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Vítima completamente inocente ou vítima ideal: é a vítima inconsciente que se colocaria em 0% de


culpabilidade conforme a escala de Mendelsohn. É a que nada fez ou nada provocou para desencadear
a situação criminal, pela qual sofre um dano. Em outras palavras: a vítima ideal não tem
responsabilidade ou culpa no acontecimento criminoso. Ex.: incêndio.
● Vítima de culpabilidade menor ou vítima por ignorância: neste caso se dá um certo impulso
involuntário ao delito. O sujeito, com certo grau de culpa, ou por meio de um ato pouco reflexivo, causa
sua própria vitimização. Ex.: mulher que provoca um aborto por meios impróprios pagando com sua
vida, sua ignorância.
● Vítima tão culpável como o infrator ou vítima voluntária: aquelas que, ao mesmo tempo, atuam como
vítima e como criminoso, de modo que sua participação ativa é imprescindível para a caracterização do
crime. Ex.: roleta russa, suicídio por adesão vítima que sofre de enfermidade incurável e que pede que
a matem, não podendo mais suportar a dor (eutanásia) a companheira (o) que pactua um suicídio; os
amantes desesperados; o esposo que mata a mulher doente e se suicida.
● Vítima mais culpável que o infrator:
· Vítima provocadora: aquela que, por sua própria conduta, incita o infrator a cometer a infração.
· Vítima por imprudência: é a que determina o acidente por falta de cuidado. Ex.: quem deixa o
automóvel mal fechado ou com as chaves no contato.
∘ Vítima mais culpável ou unicamente culpável:
· Vítima infratora: aquela que comete uma infração e, em seguida, se torna uma vítima. Ex.:
legítima defesa.
· Vítima simuladora: aquela que premedita e irresponsavelmente joga a culpa ao acusado,
recorrendo a qualquer manobra com a intenção de fazer justiça em um erro judiciário.

Em sua obra (Mendelsohn, 2002), o autor conclui que as vítimas podem ser classificadas em três
grandes grupos para efeitos de aplicação da pena ao infrator:

Vítima inocente: não há provocação nem outra


PRIMEIRO GRUPO forma de participação no delito, mas sim
puramente vitimal.

Estas vítimas colaboraram na ação nociva e existe


SEGUNDO GRUPO uma culpabilidade recíproca, razão pela qual a
pena deve ser menor para o agente do delito
(vítima provocadora).

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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Nestes casos são as vítimas as que cometem por si


TERCEIRO GRUPO a ação nociva e o não culpado deve ser excluído
de toda pena.

COMPLEXO CRIMINÓGENO DELINQUENTE E VÍTIMA

Conforme leciona (Filho, 2012), é de suma importância analisar a relação entre criminoso e vítima
(par penal) para aferir o dolo e a culpa daquele, bem como a responsabilidade da vítima ou sua contribuição
involuntária para o fato crime. Isso repercute na adequação típica e na aplicação da pena (art. 59 do CP). É
inegável o papel da vítima no homicídio privilegiado, por exemplo.
Da mesma maneira que existem criminosos reincidentes, é certa para a criminologia a existência de
vítimas latentes ou potenciais. Trata-se do potencial de receptividade vitimal.
Determinadas pessoas padecem de um impulso fatal e irresistível para serem vítimas dos mesmos
crimes, impulso este ligado, muitas vezes, à sentimentos, paixões e outros estados da mente que influenciam
no comportamento humano.

c) Iter victimae – Processo de Vitimização


Como aponta Edmundo de Oliveira, "Iter Victimae é o caminho, interno e externo, que segue um
indivíduo para se converter em vítima, o conjunto de etapas que se operam cronologicamente no
desenvolvimento de vitimização. (Oliveira, 2001).

O Iter Victimae possui as seguintes etapas:

● Intuição (intuito) – é a primeira fase, quando se planta na mente da vítima a ideia de ser prejudicada,
hostilizada ou imolada por um ofensor.
● Atos preparatórios (conatus remotus) - depois de projetar mentalmente a expectativa de ser vítima,
revela-se a preocupação de tomar as medidas preliminares para defender-se ou ajustar o seu
comportamento, de modo consensual ou com resignação, às deliberações de dano ou perigo articulados
pelo ofensor.
● Início da execução (conatus proximus) - oportunidade em que a vítima começa a operacionalização de
sua defesa, aproveitando a chance que dispõe para exercitá-la, ou direcionar seu comportamento para
cooperar, apoiar ou facilitar a ação ou omissão aspirada pelo ofensor.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

● Execução (executio) - em seguida, ocorre a autêntica execução, distinguindo-se pela definitiva resistência
da vítima para então evitar, a todo custo, que seja atingida pelo resultado pretendido por seu agressor,
ou então se deixar por ele vitimizar.
● Consumação (consummatio) ou tentativa (crime falho ou conatus proximus) - há o advento do efeito
perseguido pelo autor, com ou sem a adesão da vítima e, quando a prática do fato demonstrar que o
autor não alcançou seu propósito (finis operantis) em virtude de algum impedimento alheio à sua
vontade, configura-se a tentativa. (Oliveira, 2001)

d) Vitimização Primária, Secundária e Terciária


A Vitimologia Crítica caracteriza-se por investigar a construção social de estereótipos e papéis, bem
como por denunciar a seletividade dos processos de vitimização. Nesse sentido, trabalha com a tentativa de
encarar e minimizar o desconhecimento produzido pela cifra oculta, incentivando a vítima a procurar as
agências oficiais.
Nesse contexto, dispõe sobre os processos de vitimização primária, secundária e terciária,
demonstrando como cada um contribui, ainda mais, para o sofrimento da vítima.

● VITIMIZAÇÃO PRIMÁRIA
efeitos diretos e indiretos da
São os danos psíquicos, físicos, sociais e econômicos, enquanto
conduta criminosa.
A vitimização primária é normalmente entendida como aquela provocada pelo cometimento do
crime, pela conduta violadora dos direitos da vítima, que pode causar danos variados, materiais, físicos,
psicológicos, de acordo com a natureza da infração, a personalidade da vítima, sua relação com o agente
violador, a extensão do dano, entre outros fatores.
Logo, é aquela que corresponde aos danos à vítima decorrentes do crime.
Ex.: Em um crime de roubo a subtração patrimonial (efeito direto) e o trauma psicológico (efeito
indireto).

● VITIMIZAÇÃO SECUNDÁRIA
A revitimização – vitimização secundária ou sobrevitimização - é o sofrimento adicional que a
dinâmica da Justiça Criminal (Poder Judiciário, Ministério Público, Polícias e sistema penitenciário), com suas
mazelas, provoca normalmente nas vítimas.
No processo penal ordinário e na fase de investigação policial, a vítima é tratada com descaso e,
muitas vezes, com desconfiança pelas agências de controle estatal da criminalidade, motivo pelo qual alguns
autores chegam a afirmar que a revitimização é uma forma de violência institucional cometida pelo Estado
contra a vítima.
Nesse sentido, a vitimização secundária diz respeito aos custos adicionais causados à vítima em razão
da necessária interferência das instâncias formais de controle social.

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RETA FINAL

DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Podemos citar, como exemplo, as inúmeras vezes que a vítima precisa reviver o fato criminoso: Ela é
submetida a prestar depoimento em sede policial, novamente prestar depoimento em juízo, declarações
extraoficiais, reconhecimento do investigado, exames de corpo de delito, etc. Sem esquecer o fato de que,
muitas vezes, precisa lidar com todo o aparato estatal desconfiando e contestando sua versão dos fatos.
Considerando que a vitimização secundária consiste no sofrimento causado à vítima em razão do
próprio funcionamento do sistema punitivo, deve o Poder Público agir para evitar isso, como, por exemplo:
· Adotar providências a fim de que a vítima não seja ouvida repetidas vezes sobre o mesmo tema;
· Fazer com que o ambiente em que os depoimentos são prestados seja acolhedor;
· Evitar perguntas que invadam a vida privada da vítima ou que induzam à ideia de que ela teve
“culpa” pelo fato, transformando a investigação ou o processo em um “julgamento” sobre o
comportamento da vítima.

A VITIMIZAÇÃO NA LEGISLAÇÃO PENAL: RELAÇÃO COM O DIREITO PENAL


É neste contexto – de evitar a revitimização – que vem surgindo inúmeras modificações na Lei Maria
da Penha, com o intuito de preservar e ajudar cada vez mais as vítimas de violência doméstica e familiar
contra a mulher, a fim de que elas não precisem passar pela vitimização secundária.
Ex.1: A Lei 13.431/17, que trouxe o chamado depoimento sem dano às crianças e adolescentes testemunhas
ou vítimas de violência, é um exemplo de tentativa legislativa de reduzir ou extinguir a vitimização
secundária.
Ex.2: Da mesma forma, a Lei 13.505/2017 determinou algumas medidas de modo a evitar a revitimização.
Veja o que dispõe o art. 10-A, §2º:
I - A inquirição será feita em recinto especialmente projetado para esse fim, o qual conterá os equipamentos
próprios e adequados à idade da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou testemunha e ao
tipo e à gravidade da violência sofrida;
II - Quando for o caso, a inquirição será intermediada por profissional especializado em violência doméstica
e familiar designado pela autoridade judiciária ou policial;
III - o depoimento será registrado em meio eletrônico ou magnético, devendo a degravação e a mídia integrar
o inquérito.

● VITIMIZAÇÃO TERCIÁRIA
Decorre da falta de amparo dos órgãos públicos (além das instâncias de controle) e da ausência de
receptividade social em relação à vítima.
Especialmente diante de certos delitos considerados estigmatizadores, que deixam sequelas graves,
a vítima experimenta um abandono, não só por parte do Estado, mas, muitas vezes, também por parte do
seu próprio grupo social.
Isto porque a própria sociedade não se preocupa em ampará-la, chegando, muitas vezes, a incentivá-
la a manter-se no anonimato, contribuindo para a formação da cifra oculta - crimes que não chegam ao
conhecimento do sistema penal.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

Dentre os movimentos que defendem o resgate da importância da vítima está o da justiça


restaurativa. Esta justiça, contudo, não visa obter o perdão da vítima, nem fazer com que o autor se
arrependa de seu ato. Seu objetivo é abrir um espaço de comunicação e diálogo entre acusado e vítima, para
que se possa, por meio de um mediador, perceber o que aconteceu, e encontrar a melhor forma de ajudar
quem sofreu com o crime.

VITIMIZAÇÃO QUATERNÁRIA:
Apontada por parte da doutrina, refere-se aos impactos negativos produzidos pelos veículos de
imprensa e pelas redes sociais, consubstanciando na sensação de medo que atinge a sociedade. Nas palavras
de Oliveira (1999), “tal sentimento vai além do temor de tornar-se vítima, sendo algo incutido em meio social
hodierno.”

Em acréscimo à classificação tradicional, Sumariva (2007) fala ainda em:

● VITIMIZAÇÃO INDIRETA – trata-se do sofrimento suportado por pessoas intimamente relacionadas com
a vítima direta do delito, que, embora não sejam diretamente lesadas pela conduta criminosa, partilham
do sofrimento em razão da relação de afeto mantida com a vítima. Ex.: sofrimento suportado por amigos
e familiares.
● HETEROVITIMIZAÇÃO – corresponde à “autorecriminação da vítima” pelo crime, que busca razões que
poderiam responsabilizá-la pela prática delituosa. Ex.: vítima se culpa por ter deixado a porta do carro
destrancada.

e) Teorias Vitimológicas
Na tentativa de responder por que algumas pessoas se tornam vítimas de crimes, foram
desenvolvidas teorias sobre a vitimização, que associam diagnósticos empíricos sobre a distribuição dos
riscos de vitimização na população e suas causas.
As principais teorias são:

● Teoria do Desamparo Aprendido – Para essa teoria, experiências traumatizantes ou consequências


decorrentes de eventos incontroláveis podem ter como resultado um déficit na conduta da vítima. Ou
seja: a vítima não pode se livrar da situação de perigo porque não aprendeu a evitá-la de modo exitoso.
Esta teoria supostamente explica as razões pelas quais a pessoa é reiteradamente vítima, mas é
insuficiente para explicar o porquê alguém se torna vítima uma vez ou ocasionalmente.
● Teoria Interacionista – Para essa teoria, o processo de vitimização pode ser explicado em razão de um
contato prévio, uma interação/relação entre autor e vítima.
● Modelos Teóricos de Orientação Situacional - Para este modelo, tornar-se vítima de um crime pode ser
resultado de uma convergência de fatores: estar o indivíduo em determinado lugar, em determinado
momento e sob determinadas circunstâncias.
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

∘ Modelo teórico do estilo de vida - Parte do pressuposto de que a vitimização é explicada a partir dos
diferentes estilos de vida que há entre vítimas e não vítimas, sendo certo que o risco de vitimização
está atrelado, não a fatores pessoais da vítima, mas sim a fatores sociais. Nesse sentido, o risco de
vitimização é seletivo: a probabilidade de ser vítima baseia-se na exposição do indivíduo a lugares e
horários de alto risco, assim como nos contatos que podem existir com possíveis criminosos.
∘ Perspectiva de atividades rotineiras - Defende que as taxas de criminalidade não se relacionam com
fatores pessoais ou sociais do criminoso ou da vítima, mas sim com as oportunidades que se
desdobram das atividades cotidianas, como o trabalho, as férias, o lazer, etc.

2.4 Controle Social

Por fim, chegamos ao controle social do delito, o qual é definido como “o conjunto de mecanismos
e sanções sociais que pretendem submeter o indivíduo aos modelos e normas comunitárias”, e é dividido em
duas espécies: controle social informal e controle social formal.

a) Controle Informal
O controle informal é operado no meio da sociedade civil através da família, escola, ambiente de
– estes elementos agem de forma
trabalho e demais espaços de convivência, além da própria opinião pública
mais sutil, por meio da educação e socialização do indivíduo, acompanhando-o em toda sua existência.
Esse controle tem maior influência em sociedades menos complexas, onde os laços comunitários são
fortalecidos pela proximidade, pelo cotidiano, pelo compartilhamento de ideais e valores comunitários
unidades rurais). Já nas sociedades mais
(exemplo disso seria um espirito de amizade e vizinhança nas com
complexas, onde o outro é desconhecido, e as oportunidades são transitórias, esses laços não teriam efetiva
oportunidade de serem formados (ex.: anonimato urbano), de modo que o controle informal é menos
presente, o que deixa grande margem de manobra para controle social formal.

b) Controle Formal
O controle social formal é formado pelas instâncias das quais o Estado pode lançar mão para
controlar a criminalidade: polícia, administração penitenciária, Ministério Público, juiz.
“Quando as instâncias informais de controle social falham ou são ausentes, entram em ação as
agências de controle formais” (Shecaria, 2014), sendo estas marcadas pelo formalismo e coerção, quer dizer,
uso organizado (racional) da força, operando através das polícias, do Ministério Público, do Poder Judiciário
e da Administração Penitenciária, os quais tem como norte a pena (repressão) como instrumento ordenador
da conduta dos indivíduos.
A efetividade do controle formal é sempre relativa e, além disso, opera de forma seletiva e
discriminatória, de modo que é recomendável que a atuação do controle social formal opere de forma
articulada com o informal – exemplo das polícias comunitárias – e baseado no direito penal mínimo (pena,
principalmente a privativa de liberdade, como ultima ratio).
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DELEGADO SÃO PAULO

SEMANA 07/12

CONTROLE SOCIAL INFORMAL CONTROLE SOCIAL FORMAL


Família, escola, religião, clubes Polícia, Ministério Público, Poder
AGENTES recreativos, opinião pública etc. Judiciário, administração
penitenciária.
Disciplina o indivíduo por meio de Entra em funcionamento quando
um largo e sutil processo de as instâncias informais de controle
MOMENTO socialização, interiorizando falham.
ininterruptamente no indivíduo as
pautas e conduta.
Distintas estratégias (prevenção, Atua de modo coercitivo
repressão, ressocialização etc.) e (violento) e impõe sanções mais
diferentes modalidades de sanções estigmatizantes, que atribuem ao
ESTRATÉGIAS
(positivas, como recompensas, e infrator da norma um singular
negativas, como punições). status (de desviado, perigoso ou
delinquente).
Costuma ser mais efetivo, porque é A eficaz prevenção do crime não
ininterrupto e onipresente, o que depende tanto da maior
ajuda a explicar os níveis mais efetividade do controle social
baixos de criminalidade nas formal, senão da melhor
pequenas cidades do interior, onde integração do controle social
é mais forte. formal e informal.
EFETIVIDADE
Contudo, o atual enfraquecimento O controle razoável e eficaz da
dos laços familiares e comunitários criminalidade não pode depender
explica em boa medida a escassa exclusivamente da efetividade das
confiança depositada na sua instâncias do controle social, pois
efetividade. a intervenção do sistema legal não
incide nas raízes do delito.

3. FINALIDADE DA CRIMINOLOGIA

Os fins básicos da Criminologia são:


✔ Informar a sociedade e os poderes constituídos acerca do crime, do criminoso, da vítima e dos
mecanismos de controle social.
✔ Lutar contra a criminalidade (controle e prevenção criminal).

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Dentro das finalidades declaradas da Criminologia está a prevenção de crimes. A doutrina, classifica
a prevenção em primária, secundária e terciária.
a) Prevenção primária: medidas de médio e longo prazo que atingem a raiz do conflito criminal. Ex.:
investimentos em educação, trabalho, bem-estar social.
b) Prevenção secundária: atua onde o crime se manifesta ou se exterioriza. As chamadas “zonas
quentes de criminalidade”. A prevenção secundária tem em suas principais manifestações na
atuação policial. Outros exemplos: programas de ordenação urbana, controle dos meios de
comunicação e melhora do aspecto visual das obras arquitetônicas.
c) Prevenção terciária: possui um destinatário específico, o recluso. Além disso, possui objetivo certo:
ressocialização do preso, evitando a reincidência.

4. ESTATÍSTICA CRIMINAL

Diante das mudanças impostas pela nova forma de pensar ocorridas no século XIX, a criminalidade e
suas causas passaram a ser também uma preocupação e objeto de estudo. Nesse sentido, importante
contribuição do matemático belga Quetelet, autor da Escola Cartográfica (verdadeira ponte entre clássicos e
positivistas), que estabeleceu o conceito de homem médio e alertou para a questão dos crimes não
comunicados ao Poder Público (cifra negra).
Os criminólogos sustentam que, por intermédio das estatísticas criminais, pode-se conhecer o liame
causal entre os fatores de criminalidade e os ilícitos criminais praticados.
Destarte, as estatísticas criminais servem para fundamentar a política criminal e a doutrina de
segurança pública quanto à prevenção e à repressão criminais. No entanto, é preciso ter cuidado ao analisar
as estatísticas criminais oficiais, na medida em que há uma quantidade significativa de delitos não
comunicados ao Poder Público, quer por inércia ou desinteresse das vítimas, quer por outras causas, dentre
as quais os erros de coleta e a manipulação de dados pelo Estado. Várias são as razões que as levam a essas
ocorrências:
· A vítima omite o ato criminoso por vergonha ou medo (crimes sexuais);
· A vítima entende que é inútil procurar a polícia, pois o bem violado é mínimo (pequenos furtos);
· A vítima é coagida pelo criminoso (vizinho ou conhecido);
· A vítima é parente do criminoso;
· A vítima não acredita no aparato policial nem no sistema judicial.

Lado outro, cabe apontar que muitos delitos são registrados erroneamente, por falha da polícia, além
da manipulação às avessas, isto é, reduz-se o índice de criminalidade por meio do aumento de casos
esclarecidos e da diminuição de casos registrados oficialmente.

Nesse sentido, convém diferenciar criminalidade real, criminalidade revelada e cifra negra:
● Criminalidade Real - é a quantidade efetiva de crimes perpetrados pelos delinquentes;
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RETA FINAL

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SEMANA 07/12

● Criminalidade Revelada/Registrada/Aparente - é o percentual que chega ao conhecimento do


Estado;
● Cifras Negras - a porcentagem não comunicada ou elucidada.

Assim, é possível concluir que as estatísticas indicam apenas uma pequena parte do que realmente
ocorre, haja vista que a imensa maioria dos delitos fica na obscuridade, compondo a chamada “cifra negra
da criminalidade” (ou cifra oculta). A criminalidade registrada é, portanto, um percentual da criminalidade
real.
A denominada atrição (processo de atrição) consiste no distanciamento progressivo entre as cifras
da criminalidade, ou seja, entre a criminalidade aparente e a real.

4.1 Cifras Ocultas/Negras

O termo CIFRA NEGRA (zona obscura, "dark number" ou "ciffre noir") refere-se à porcentagem de
crimes não solucionados ou punidos, à existência de um significativo número de infrações penais
desconhecidas "oficialmente". (Rosa, 2019)
Isso traz, por consequência, uma espécie de eleição de ocorrências e de infratores. O sistema penal,
assim, acaba por se "movimentar" apenas em determinados casos, de acordo com a classe social a que
pertence o autor do crime.
Em se tratando especificamente da criminalidade das classes privilegiadas, surge a CIFRA DOURADA.
Trata-se dos crimes denominados de "colarinho branco", tais como as infrações contra o meio ambiente,
contra a ordem tributária, o sistema financeiro, entre outros, que se contrapõem aos considerados "crimes
de rua", como furto, roubo, etc.
Sustenta Eduardo Luiz Santos Cabette (As estatísticas criminais sob um enfoque criminológico crítico,
2007), com apoio em vasta doutrina, a existência de uma cifra dourada, que “representa a criminalidade de
‘colarinho branco’, definida como práticas antissociais impunes do poder político e econômico (a nível
nacional e internacional), em prejuízo da coletividade e dos cidadãos e em proveito das oligarquias
econômico financeiras”.
Teríamos assim, duas falhas em nossas estatísticas:
● CIFRA NEGRA - representada pela ausência de dados dos crimes que, por silêncio da vítima e da
população, não chegam ao conhecimento do Estado.
● CIFRA DOURADA – ausência de registro específica, dos crimes políticos, ambientais, de
corrupção etc. Representa a criminalidade de 'colarinho branco', definida como práticas
antissociais impunes do poder político e econômico (a nível nacional e internacional), em prejuízo
da coletividade e dos cidadãos e em proveito das oligarquias econômico-financeiras.

4.2 Cifras Cinzas, Amarelas e Verdes

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SEMANA 07/12

As cifras mais corriqueiras em provas de concurso são, sem dúvidas, as cifras negras e douradas.
Entretanto, tentando esgotar o tema, trouxemos as outras cifras utilizadas pela doutrina pátria para mapear
o fenômeno da criminalidade.

a) Cifras Cinzas
As CIFRAS CINZAS são resultados daquelas ocorrências que até são registradas, mas não chegam ao
processo ou ação penal por serem solucionadas na própria Delegacia de Polícia, seja por existir a
possibilidade de conciliação das partes, evitando assim uma futura denúncia, processo ou condenação
elucidando ou solucionando o fato, como também por desistência da própria vítima em não querer das
continuidade a persecução penal.
A cifra cinza, por seu turno, representou a orientação de pesquisas e de relatórios policiais para a
afirmação do poder policial como estrutura mediadora ou rede horizontal de resolução de conflitos e
instância de decisão jurídica e exercício do poder soberano de subtração de vida, independente do controle
do Estado e da Sociedade.
Conforme a ideia do professor Rogério Renó:

É quando a denúncia foi realizada, porém não foi terminada, por exemplo: foi
denunciada, foi feito um Inquérito, mas por algum procedimento aleatório o
processo acaba não sendo concluído, não acaba sendo levado a frente.

b) Cifras Amarelas
As CIFRAS AMARELAS são aquelas em que as vítimas são pessoas que sofreram alguma forma de
violência cometida por um funcionário público e deixam de denunciar o fato aos órgãos responsáveis pela
fiscalização por receio, medo de represália das vítimas.

Defende-se aqui a hipótese de que há uma cifra amarela, um número considerável


de violências policiais contra a sociedade que, por temor de retaliações ou de uma
prática vingativa por parte da corporação, não realizam as denúncias. A cifra
amarela seria a somatória entre as denúncias feitas na Corregedoria da Polícia
Militar e/ou Ministério Público e o número de ações violentas cometidas pela
polícia contra a sociedade e não explicitadas, inscrevendo pessoas infames
(FOUCAULT,1990) no cruzamento com o poder como violentados (PASSETTI, 1995).

c) Cifras Verdes
As CIFRAS VERDES consistem nos crimes não chegam ao conhecimento policial e que o bem jurídico
lesado é o meio ambiente, como exemplo: maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domesticados,
pichações de paredes, monumentos históricos, prédios públicos

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Isto porque, quando se percebe o dano causado, o fato consumado, há grande dificuldade de se
identificar a autoria por não se encontrar mais no local dos fatos quem o praticou, estando, assim, isento da
punição pelo crime praticado.

d) Cifras Rosas
As CIFRAS ROSAS envolvem os crimes praticados em razão de discriminação por orientação sexual,
com viés homofóbico e que não chegam ao conhecimento do Estado.

Em resumo:

Refere-se à porcentagem de crimes não


solucionados ou punidos, à existência de um
significativo número de infrações penais
CIFRA NEGRA desconhecidas "oficialmente". É a “mãe” de
todas as cifras.

Trata-se especificamente da criminalidade


cometida pelas classes privilegiadas,
referindo-se também a expressão “crimes de
CIFRA DOURADA colarinho branco”. Como exemplo pode-se
citar crimes como: sonegação fiscal, lavagem
de dinheiro, crimes eleitorais.
Tratam-se dos crimes que chegam ao
CIFRA CINZA conhecimento da autoridade policial,
entretanto não prosperam na fase processual.
São os crimes cometidos por funcionários
CIFRA AMARELA públicos, onde geralmente a vítima deixa de
denunciar o fato às autoridades competentes
por medo de represálias.
Dizem respeito aos crimes ambientais que não
CIFRA VERDE chegam ao conhecimento das autoridades.
Contrapõem-se aos chamados “crimes do
colarinho branco”, dizem respeito aos
pequenos crimes comuns praticados por
CIFRA AZUL pessoas economicamente desabastadas e se
verifica como uma alusão aos macacões azuis
utilizados nas fábricas dos Estados Unidos.

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CIFRA ROSA Tratam-se dos crimes com viés homofóbico.

4.3 Técnicas de Investigação da Cifra Negra

As cifras negras, ou campo obscuro da criminalidade, são uma preocupação histórica dos
criminólogos.
Desde a criminologia tradicional já se acentuava a necessidade de investigar os delitos que não eram
comunicados às instâncias de controle do Estado. A maior crítica feita à criminologia tradicional, de cunho
positivista, direcionava-se no sentido de que os estudos estatísticos levavam em conta apenas a população
de encarcerados.
Assim, o erro maior era procurar atribuir ao criminoso “fichado” os índices reais de delinquência.
Ocorre que isso fugia à realidade sensível, pois inúmeros delitos deixavam de ser comunicados ou apurados
pelos órgãos do Estado.
Acentua, com severa crítica, Alessandro Baratta (Cervini, 2002) que:

O sistema só pode aplicar sanções penais previstas pela leium


a percentual dos
reais infratores que, numa média relativa a todas as figuras delitivas, nas
sociedades centrais, não é superior a um por cento.

É evidente que os estudos sobre criminosos incidem, majoritariamente, nas populações carcerárias,
e isso facilita uma visão distorcida da realidade criminal, conduzindo o pesquisador aos erros decorrentes do
labelling approach (os criminosos são etiquetados ou rotulados como tais pela sociedade).
Na verdade, o crime é um fenômeno generalizado na sociedade, mas a maioria das condenações
penais recai sobre os “etiquetados”. Assim, existem grupos sociais que usufruem de uma impunidade virtual.
Diante desse cenário, numerosos estudos foram realizados para detectar a real cifra negra de
criminalidade. Os processos empregados são variados, na medida em que se pretende reduzir ao máximo a
margem de erro. Assim, segundo (Filho, 2012) são propostas as seguintes técnicas de investigação da cifra
negra:
· Investigação em face dos autores ou técnica de autodenúncia;
· Investigação em face de vítimas;
· Investigação em face de informantes criminais;
· Sistema de variáveis heterogêneas;
· Técnica do segmento operativo destinado aos agentes de controle formal (polícia e tribunais).

A investigação em face de autores de crime (autodenúncia) realiza-se com o interrogatório de


pessoas em geral acerca dos fatos criminosos cometidos, resultando deles ou não o processo penal. As falhas

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DELEGADO SÃO PAULO

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aqui existentes levam em conta a amostragem populacional e o grau de sinceridade dos interrogados,
variando de acordo com o grau de cultura e cidadania do povo.
Já a investigação em face de vítimas de delitos traz uma vertente diferenciada, pois são interrogadas
pessoas em geral que tenham suportado algum tipo de crime. Aqui também se procura a causa da não
comunicação ou não indiciação dos investigados, variando da tipologia penal (estupros) à participação da
vítima (jogos de azar) e mesmo à cumplicidade (favorecimento pessoal), o que pode induzir o investigador a
erro. Aliás, é sabido que muitas vítimas não denunciam certos crimes por medo de represálias, por não
considerar grave a conduta lesiva, por não confiar na polícia e na justiça; por serem novamente vitimizadas
pelo sistema etc.
A investigação em face de informantes criminais tem a vantagem de apresentar uma amostragem
de terceiras pessoas de forma muito desinibida e confiável. Todavia, da mesma maneira que a autodenúncia,
muitos informantes são criminosos que vivem da delação alheia, alimentados pela mecânica do sistema, de
sorte que esse método pode muitas vezes significar um exercício de revanchismo ou retraimento (cúmplices).
O sistema de variáveis heterogêneas impõe três níveis de controle informático, quais sejam: a
análise da cifra negra dos delitos leves, que é maior em razão dos crimes graves; a tendência à
autocomposição das vítimas nos delitos leves, a variação dos métodos de análise de país para país.
Por derradeiro, a técnica do segmento operativo dos agentes de controle formal
(Polícia e Tribunais)
muda o foco e direciona seus estudos no sentido de pesquisar as causas reais de vulnerabilidade e de
disfunções do Sistema Criminal.
Todos os órgãos do Sistema Criminal intervêm em um processo de filtração por etapas, pois grande
parcela de vítimas não denuncia os crimes que sofreram à polícia; esta, por sua vez, não instaura todas as
investigações necessárias, não transmitindo a juízo tudo o que apurou; e os tribunais, por seu turno,
arquivam boa parte das investigações sob o manto do garantismo penal. (Filho, 2012)

4.4 Prognóstico Criminológico

O prognóstico criminológico orienta o estudo das causas da reincidência, que será sempre
contingente, pode ocorrer ou não.
Segundo a classificação proposta por (Filho, 2012), os prognósticos criminais podem ser clínicos e
estatísticos.

a) Prognósticos Clínicos
São aqueles em que se faz um detalhamento do criminoso, por meio da interdisciplinaridade:
médicos; psicólogos, assistentes sociais etc.

b) Prognósticos Estatísticos
São aqueles baseados em tabelas de predição, que não levam em conta certos fatores internos e só
servem para orientar o estudo de um tipo específico de crime e de seus autores (condenados). Nesse
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contexto, é preciso avaliar o índice de criminalidade (vários fatores), pois devem ser levados em conta os
fatores psicoevolutivos, jurídico-penais e ressocializantes (penitenciários).

● Fatores psicoevolutivos - levam em conta a evolução da personalidade do agente, compreendendo:


a) doenças graves infanto-juvenis com repercussão somático-psíquica; b) desagregação familiar; c)
interrupção escolar ou do trabalho; d) automanutenção precoce; e) instabilidade profissional; f)
internação em instituição de tratamento para menores; g) fugas de casa, da escola etc.; h) integração
com grupos improdutivos; i) distúrbios precoces de conduta; j) perturbações psíquicas.
● Fatores jurídico-penais - desenham a vida delitiva do indivíduo, compreendendo: a) início da
criminalidade antes dos 18 anos; b) muitos antecedentes penais e policiais (“folha corrida”); c)
reincidência rápida; d) criminalidade interlocal; e) quadrilhas (facções criminosas), qualificadoras ou
agravantes; f) tipo de crime (contra o patrimônio, os costumes, a pessoa).
● Fatores ressocializantes - dizem respeito ao aproveitamento das medidas repressivas, embora no
Brasil as instituições penitenciárias sejam, em regra, verdadeiras pocilgas, que funcionam como
“universidade criminosa”, tamanho o desrespeito aos direitos mínimos do homem. Registrem-se: a)
inadaptação à disciplina carcerária e às regras prisionais; b) precário ou nulo ajuste ao trabalho
interno; c) péssimo aproveitamento escolar e profissional na cadeia; d) permanência nos regimes
iniciais de pena.
Prognósticos criminais

Fatores
Clínicos
psicoevolutivos
Fatores jurídico-
Estatísticos
penais
Fatores
ressocializantes

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CRIMINOLOGIA: PREVENÇÃO CRIMINAL

1. PREVENÇÃO CRIMINAL

1.1 Prevenção criminal no Estado Democrático de Direito

Enquanto a Criminologia Clássica vê o delito como um enfrentamento do delinquente contra a


sociedade, uma luta do bem contra o mal, numa forma reducionista de encarar o problema, a Criminologia
Moderna o encara de forma dinâmica, destacando o papel do delinquente, da vítima, do crime e do controle
social.
O crime é visto como um ato complexo e os custos da reação estatal são também computados. Todo
o processo criminal (causas, formas, consequências da repressão etc.) é analisado de forma prudente. Dentro
desse contexto, a prevenção do delito é um assunto recorrente em todas as esferas do poder público.
Prevenção de crime é um conceito aberto. Para alguns é dissuadir o delinquente a não cometer o
ato, para outros é mais, importa inclusive na modificação de espaços físicos, novos desenhos arquitetônicos,
aumento da iluminação pública com o intuito de dificultar a prática do crime e para um terceiro grupo é
apenas o impedimento da reincidência.
Para Eduardo Viana8, prevenção é

“O conjunto de medidas destinadas a impedir ou a diminuir o cometimento de


delitos. Do ponto de vista menos intuitivo e mais científico, seria defensável afirmar
que a ideia de prevenção abarca a integralidade das políticas das políticas sociais
que visam impedir ou reduzir a delinquência”.

1.2 Prevenção Primária

A prevenção primária é a prevenção genuína. Ela se dirige a toda população, é geral, demorada, com
altos custos, mas se sustenta com o passar dos anos ou das administrações (realiza-se de médio a longo
prazo), ou seja, ataca a raiz do conflito (educação, emprego, moradia, segurança etc.); aqui desponta a
inelutável necessidade de o Estado, de forma célere, implantar os direitos sociais progressiva e
universalmente, atribuindo a fatores exógenos a etiologia delitiva.9
Para Antonio García-Pablos de Molina10, os programas de prevenção primária se orientam para as
causas mesmas, a raiz do conflito criminal, para neutralizar este antes que o próprio problema se manifeste.
Nesse sentido, educação, trabalho, socialização, qualidade de vida, bem-estar social são
importantes para que os cidadãos possam se munir de repertórios comportamentais que lhes qualifiquem a

8
(Viana, 2018, p. 396)
9
(Filho, 2018, p. 88)
10
(Molina, 1999, p. 882)
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resolver conflitos sociais sem o uso de violência. A prevenção primária é a mais eficiente, mas possui um
grande problema para os administradores públicos, que são eleitos periodicamente (ex.: de quatro em quatro
anos) e cobram resultados imediatos das agências de controle social. Há, então, um permanente conflito
entre as medidas de prevenção primária e a cúpula das administrações públicas que exigem resultados
rápidos de controle da criminalidade, porquanto a segurança pública no Brasil tem cobrado o seu preço em
época de eleições.11

1.3 Prevenção secundária

A prevenção secundária atua nos locais onde os índices de criminalidade são mais avançados. Busca uma
ação concentrada e com foco em áreas de maior violência, como comunidades carentes dominadas pelo
tráfico, em especial.
Segundo Nestor Sampaio12

“Destina-se a setores da sociedade que podem vir a padecer do problema criminal


e não ao indivíduo, manifestando-se a curto e médio prazo de maneira seletiva,
ligando-se à ação policial, programas de apoio, controle das comunicações etc.”

Para Antonio García-Pablos de Molina13, os programas de prevenção secundária atuam mais tarde
em termos etiológicos: não quando nem onde o conflito criminal se produz ou é gerado, mas quando e onde
o mesmo se manifesta, quando e onde se exterioriza. Opera a curto e médio prazo, e se orienta de forma
seletiva a concretos e particulares setores da sociedade: aqueles grupos e subgrupos que exibam maior risco
de padecer ou protagonizar o problema criminal.
A prevenção secundária se plasma em uma política legislativa penal e em ação policial. Programas
de prevenção policial (policiamento ostensivo em locais de maior concentração de criminalidade), de
controle dos meios de comunicação, de ordenação urbana e utilização do desenho arquitetônico como
instrumento de autoproteção, desenvolvidos em bairros localizados em terrenos mais baixos, são exemplos
de prevenção secundária.

1.4 Prevenção terciária

Os programas de prevenção terciária possuem apenas um destinatário: a população carcerária e


buscam evitar a reincidência. São programas que atuam muito tardiamente no problema criminal e

11
Muitos governadores preferem comprar viaturas policiais a investir em programas de prevenção primária, que, segundo os mesmos, não dá retorno.
Há um pensamento no meio político de que a população gosta de ver "a polícia na rua”. Isso fica patente com as costumeiras e midiáticas solenidades
de entrega de viaturas. Desviam o foco da população, enquanto setores como as perícias forenses no Brasil recebem parcos recursos e impossibilitam
a prestação de uma solução definitiva por parte do Estado.
12
(Filho, 2018, p. 98)
13
(Molina, 1999)
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possuem, salvo raras exceções, elevados níveis de ineficácia14. Portanto, pode-se afirmar que assume um
caráter punitivo e ressocializador a fim de afastar a reiteração criminosa.
Nas palavras de Nestor Sampaio15:

“Voltada ao recluso, visando sua recuperação e evitando a reincidência (sistema


prisional); realiza-se por meio de medidas socioeducativas, como a laborterapia, a
liberdade assistida, a prestação de serviços comunitários etc.”

Os programas de prevenção terciária atuam somente quando o mal já se instalou e possui um grande
inimigo direto que é o conjunto informal de regras existentes no universo prisional, tanto por parte da
população carcerária, como também por parte da Administração Penitenciária. Através de punições formais
e informais, ataques, violações morais e físicas, esse conjunto de regras busca despersonalizar o preso.
O indivíduo que supera esse calvário de dor e sofrimento ao fim da pena encontra outro obstáculo
para os que frequentam esses programas. A sociedade não lhe dá emprego. Por mais que ele tenha se
qualificado em oficinas nos presídios, o estigma de ex-presidiário lhe implica uma marca moral e o impede
de conseguir um emprego, ou melhores oportunidades sociais.
A prevenção terciária vem se revelando indeficiente na prática uma vez que sua atuação é tardia e
que as circunstâncias da vida carcerária e do universo prisional acaba despersonalizando os criminosos. De
acordo com a Professora Natacha Alves de Oliveira16:

“O caráter criminógeno do cárcere pode ser evidenciado pela análise do índice de


reincidência e da constatação da ocorrência de delitos até mesmo durante o
período de encarceramento, como homicídios e lesões corporais entre os presos,
tráfico de drogas, extorsão etc., tendo-se por pano de fundo, muitas vezes, a
corrupção estrutural que permeia o ambiente carcerário”.

Em resumo:

PREVENÇÃO PRIMÁRIA PREVENÇÃO SECUNDÁRIA PREVENÇÃO TERCIÁRIA

Atuam na raiz do problema, Atua onde o crime se manifesta, se Medidas de execução penal.
antes da sua ocorrência. exterioriza, após a ocorrência do
crime ou em sua iminência →
zonas quentes de criminalidade, ou
seja, de forma concentrada.

14
(Calhau, Resumo de Criminologia, 2009)
15
(Filho, 2018, p. 89)
16
Oliveira, Natacha Alves de, Criminologia, p. 164.
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Destinadas a conscientização de Dirigidas a grupos que apresentam Incide sobre o apenado, visando
toda a sociedade, assegurando maior risco de sofrer ou praticar o impedir a reincidência e permitir
aos cidadãos direitos e garantias delito. a sua ressocialização.
fundamentais.
Medidas de médio e longo Medidas de médio e curto prazo
prazo.

1.5 Reação social

A ocorrência de ação criminosa gera uma reação social (estatal) em sentido contrário, no mínimo,
proporcional àquela. Da evolução das reações sociais ao crime prevalecem hodiernamente três modelos:
dissuasório, ressocializador e restaurador (integrador).

1. Modelo Dissuasório (Clássico ou Retributivo): repressão por meio da punição ao agente


criminoso, mostrando a todos que o crime não compensa e gera castigo. A finalidade da pena
é exclusivamente retributiva. Aplica-se a pena somente aos imputáveis e semi-imputáveis,
pois aos inimputáveis se dispensa tratamento
psiquiátrico. Não se preocupa com a
ressocialização ou reparação dos danos. Para esse modelo, o Estado e o delinquente
protagonizam a situação, deixando a vítima e a sociedade em posição secundária.
2. Modelo Ressocializador: intervém na vida e na pessoa do infrator, não apenas lhe
aplicando uma punição, mas também lhe possibilitando a reinserção social. É considerado um
modelo humanista. A pena tem caráter utilitário (prevenção especial positiva). Aqui a
participação da sociedade é relevante para a ressocialização do infrator, prevenindo a
ocorrência de estigmas.
3. Modelo Restaurador (Integrador, Consensual de Justiça Penal ou Justiça Restaurativa):
procura restabelecer, da melhor maneira possível, o status quo ante, visando a reeducação
do infrator, a assistência à vítima e o controle social afetado pelo crime. Gera sua restauração,
buscando-se a composição de interesses mediante a reparação do dano causado através do
acordo, consenso, transação, conciliação mediação ou negociação. Tal modelo se baseia na
confissão do delito pelo ofensor e na exposição dos fatos e sentimentos pela vítima.
Convém destacar que existe uma divergência na doutrina em relação
ao alcance da Justiça
Restaurativa. Para uma primeira corrente, a conciliação e mediação do conflito criminal é
plenamente possível, amplamente considerada. Para outra corrente, tal modelo se restringe
aos autores primários e aos crimes de menor gravidade, não se admitindo a sua aplicação,
por exemplo, em relação ao homicídio.

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1.6 Teoria da Pena e Prevenção Criminal

É importante analisarmos alguns aspectos da passagem de uma concepção retributiva da pena a uma
formulação preventiva desta. Justifica-se, por isso, um exame das diversas teorias que explicam o sentido,
função e finalidade das penas, pelo menos das três vertentes mais importantes: teorias absolutas, teorias
relativas ou unitárias (prevenção geral e prevenção especial) e teorias unificadoras ou ecléticas.

1. Teorias absolutas, da retribuição ou da expiação (Stahl, Bekker, Kant, Hegel): a pena é um


imperativo de justiça, negando fins utilitários; pune-se porque se cometeu o delito (punitur quia
peccatum est). Subdividem-se em:
a) retribuição divina, para a qual o Estado desempenha uma delegação divina (Stahl, Bekker);
b) retribuição moral, onde a pena visa a atender um imperativo moral categórico, há uma
necessidade absoluta de justiça (Kant);
c) retribuição jurídica, em que a pena é uma exigência da razão (Hegel).
Obs.: as teorias absolutas são criticadas pela doutrina penal contemporânea, tendo em vista que não são
capazes de explicar quando deve haver punição e não estabelecem limites ao poder punitivo, violando a
dignidade da pessoa humana. Além disso, concentram todo o controle social na pena e se contrapõem
ao Direito Penal moderno (penas alternativas, transações, despenalização e etc).
2. Teorias relativas: atribuem um fim utilitário para a punição, sustentando que o crime não é causa da
pena, mas ocasião para que seja aplicada; baseia-se na necessidade social (punitur ne peccetur). Seus
fins são duplos: prevenção geral (intimidação de todos) e prevenção particular (impedir o réu de
praticar novos crimes; intimidá-lo e corrigi-lo). Portanto, verifica-se a finalidade preventiva da pena
(instrumento preventivo de garantia social).
3. Teorias unificadoras ou ecléticas: conjugam as duas primeiras, sustentando o caráter retributivo da
pena, mas acrescentam a este os fins de reeducação do criminoso e intimidação.

A Penologia é a disciplina integrante da criminologia que cuida do conhecimento geral das penas
(sanções) e castigos impostos pelo Estado aos violadores da lei.

1.6.1 Prevenção Geral (Positiva e Negativa)

As teorias da prevenção geral têm como fim a prevenção de delitos incidindo sobre os membros da
coletividade social. Se destinam a todos os integrantes da sociedade (e não apenas ao autor do delito).
Quanto ao modo de alcançar este fim, as teorias da prevenção geral são classificadas atualmente em duas
versões:

a) Prevenção geral negativa (Feuerbach e Bentham): assume a função de dissuadir os possíveis


delinquentes da prática de delitos futuros através da ameaça de pena, ou predicando com o exemplo
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do castigo eficaz; se ampara na função pedagógica ou formativa do Direito Penal; visa evitar a prática
de infrações penais a partir da coação psicológica (efeito intimidatório);
b) Prevenção geral positiva: assume a função de reforçar a fidelidade dos cidadãos à ordem social a
que pertencem. A pena é tida como um instrumento de estabilização normativa e de integração
social.
De acordo com a doutrina (Luis Regis Prado), existem três efeitos principais da fundamentação da
pena em tal teoria, quais sejam: aprendizagem, confiança e pacificação social.

Obs.: a doutrina critica a teoria da prevenção geral uma vez que ausente a comprovação empírica e ausente
a proporcionalidade da pena em relação à gravidade do fato.

1.6.2 Prevenção Especial (Positiva e Negativa)

A teoria da prevenção especial, cujo principal representante é Von Liszt, procura evitar a prática do
delito, mas, ao contrário da prevenção geral, dirige-se exclusivamente ao delinquente em particular,
objetivando que este não volte a delinquir.
Obs.: a prevenção geral atua na fase de cominação da pena ao passo que a prevenção especial atua
na fase de execução da pena.
De acordo com a classificação sugerida por Ferrajoli, as teorias da prevenção especial podem ser
formalmente divididas em:
a) Prevenção especial positiva: dirigida à reeducação (ressocialização ou reinserção social) do
delinquente. Deve se nortear através do princípio da dignidade da pessoa humana. Para que os
objetivos da prevenção especial positiva se concretizem, é necessário que se estruture uma equipe
administrativa interdisciplinar, observados os requisitos do art. 77 da LEP, gerida pela direção da
unidade prisional. Além disso, deve ser garantida a fiscalização da execução penal, nos moldes dos
arts. 67 e 68 da LEP.
As críticas feitas à teoria podem ser sintetizadas da seguinte maneira: a realidade prisional está muito
distante do que se faz necessário para efetivar a ressocialização, ausência de limites à atuação
estatal, ausência de critérios para orientar a intervenção estatal e a “violação da dignidade da pessoa
humana ao se considerar a reinserção social como um fim legítimo a ser perseguido por meio da
violência da pena”17.
b) Prevenção especial negativa: voltada à eliminação ou neutralização do delinquente perigoso. Aqui,
a eficácia neutralizadora da pena de prisão é relativizada uma vez que a pena não impede a prática
de delitos no período de encarceramento (exemplos: homicídios e tráfico de drogas praticados
intramuros pelos detentos).

17
Oliveira, Natacha Alves de, Criminologia, p. 191.
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Vale ressaltar que essas vertentes da prevenção especial NÃO foram apresentadas de forma
contraposta e NÃO se excluem entre si, podendo concorrer mutuamente para o alcance do fim preventivo,
de acordo com a personalidade corrigível ou incorrigível daquele que delinque.
A prevenção especial NÃO busca a intimidação do grupo social e NÃO visa a retribuição do fato
praticado.
Os partidários da prevenção especial preferem falar de medidas e não de penas. A pena, segundo
dizem, implica a liberdade ou a capacidade racional do indivíduo, partindo de um conceito geral de igualdade.
Já medida supõe que o delinquente é um sujeito perigoso ou diferente do sujeito normal, por isso, deve ser
tratado de acordo com a sua periculosidade. Como o castigo e a intimidação não têm sentido, o que se
pretende, portanto, é corrigir, ressocializar ou inocuizar.
Assim como acontece com a prevenção geral, também a prevenção especial é alvo de grandes
objeções doutrinárias. Com efeito, uma pena fundamentada exclusivamente em critérios preventivo-
especiais termina por infringir importantes princípios garantistas, especialmente a necessidade de
proporcionalidade entre o delito e a pena, e implica em um Direito Penal de autor difícil de sustentar. Com
efeito, os pressupostos sobre os quais se apoiam as medidas de ressocialização são imprecisos, as técnicas
de prognóstico são mutáveis e inseguras, sem que até hoje se haja demonstrado a eficácia empírica do fim
reeducacional.
Além disso, os fins da prevenção especial seriam ineficazes diante daquele delinquente que, apesar
da gravidade do fato delitivo por ele praticado, não necessite de intimidação, reeducação ou inocuização, em
razão de não haver a menor probabilidade de reincidência, o que, nestes casos, levaria à impunidade do
autor.
Em resumo:

PREVENÇÃO GERAL PREVENÇÃO ESPECIAL


se dirige à sociedade, intimidando os
A pena Atenta para o fato de que o delito é instado
propensos a delinquir. por fatores endógenos e exógenos, de modo
que busca alcançar a reeducação do
indivíduo e sua recuperação.
✓ Negativa: função de dissuadir os ✓ Negativa: voltadas à eliminação ou
possíveis delinquentes da prática de neutralização do delinquente
delitos futuros através da ameaça de perigoso.
pena, ou predicando com o exemplo
do castigo eficaz.
✓ Positiva: que assume a função de ✓ Positiva: dirigidas à reeducação do
reforçar a fidelidade dos cidadãos à delinquente.
ordem social a que pertencem.

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