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FISIOTERAPIA

REUMATOLÓGICA
E ONCOLÓGICA
Fisioterapia aplicada
ao câncer de
sistema digestório
Liliam Rosany Medeiros Fonseca Barcellos

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Identificar características gerais do câncer de sistema digestório.


>> Reconhecer a atuação hospitalar do fisioterapeuta em pacientes com
câncer de sistema digestório.
>> Explicar o papel da fisioterapia no ambulatório em pacientes com câncer
de sistema digestório.

Introdução
O câncer é uma doença que acomete o indivíduo em diversos aspectos, como
físico, social e emocional. O câncer de sistema digestório é, por vezes, de difícil
diagnóstico em suas fases iniciais, o que dificulta o seu rastreamento precoce,
tratamento e processo de cura. Por isso, é muito importante que profissionais
de saúde atuem de forma humanizada, acolhedora e resolutiva. O fisioterapeuta
tem papel primordial durante as fases de tratamento do indivíduo com câncer,
principalmente no alívio da dor e de desconfortos físicos, na diminuição da
incapacidade funcional e na melhora da qualidade de vida.
Neste capítulo, você estudará sobre o sistema digestório e os principais
tipos de câncer que acometem esse sistema, bem como a prevalência e mor-
talidade. Além disso, você verá como a fisioterapia pode ajudar no tratamento
de pacientes acometidos pelo câncer de sistema digestório e quais são as
2 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

abordagens do fisioterapeuta no tratamento hospitalar em cuidados paliativos


e no tratamento ambulatorial.

Câncer de sistema digestório


O sistema digestório é responsável pelo processo de digestão dos alimentos.
Esse processo se inicia na ingestão do alimento, passa para a etapa de quebra
e absorção dos nutrientes até a eliminação do conteúdo fecal. O sistema
digestório é formado pela cavidade bucal e anexos, esôfago, estômago e
duodeno, pâncreas, fígado, vias biliares, intestino delgado e intestino grosso
(ceco, cólon, reto e o ânus). Cada uma dessas estruturas é de extrema impor-
tância funcional durante o processo de digestão dos alimentos. Alterações
nessas estruturas poderão comprometer a ingestão, a quebra de nutrientes
e absorção, e/ou a eliminação do conteúdo que foi digerido e necessita ser
eliminado.
O câncer ocorre devido ao crescimento acelerado de células anormais.
Essas células não morrem e continuam a se desenvolver de forma de-
sordenada e acelerada, podendo se infiltrar em outros tecidos e órgãos.
As estruturas do sistema digestório mais acometidas pelo câncer, segundo
o Instituto Nacional do Câncer (INCA), são o estômago e o intestino grosso,
principalmente nas estruturas do cólon e reto. Contudo, o câncer também
poderá ocorrer em outros órgãos que compõem o sistema digestório, como
as que são descritas a seguir.

„„ Câncer de esôfago: o esôfago é a estrutura tubular que liga a garganta


ao estômago, e o câncer nessa estrutura é muito letal. Sua manifestação
clínica inicial é silenciosa, o que dificulta a descoberta e o tratamento
precoce. Essa neoplasia é mais comum em homens, principalmente
após os 50 anos de idade.
„„ Câncer de intestino delgado: o intestino delgado corresponde a maior
estrutura do sistema digestório. No Brasil, a manifestação tumoral
maligna nessa estrutura é muito rara. A manifestação clínica desse
câncer na fase inicial é muito inespecífica, o que dificultada ainda mais
o seu diagnóstico nas fases iniciais.
„„ Câncer de intestino grosso: também denominado de câncer colorretal,
na maioria da situações (90%) é um adenocarcinoma, que representa o
segundo câncer que mais acomete homens e mulheres, com incidência
de 19, 63 % para homens e 19,03% para mulheres no Brasil. Tanto para
homens quanto para mulheres, o câncer colorretal representa a segunda
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maior causa de óbitos no Brasil. A faixa etária em que a maioria dos


casos se manifesta é a partir dos 60 anos (INSTITUTO NACIONAL DE
CÂNCER, 2020). Lesões benignas e pólipos são comumente associados
à fase que precede o câncer colorretal, podendo se desenvolver na
parede do cólon e/ou do reto e levar muito tempo para se desenvolver e
começar a aparecer as primeiras manifestações. Diagnóstico de câncer
colorretal durante a sua fase inicial, na maioria dos casos, possibilita
que o tratamento seja curável, uma vez que as células cancerosas ainda
não se espalharam para outros órgãos.
„„ Câncer de pâncreas: o pâncreas é um órgão que se localiza logo
abaixo do estômago, e a maioria dos casos de câncer nesse órgão
acomete a região do lado direto (cabeça do pâncreas). Devido ao difícil
diagnóstico em suas fases iniciais, essa neoplasia possui alta letalidade.
Sua prevalência está mais presente a partir dos 60 anos de idade e em
indivíduos do sexo masculino.
„„ Câncer das vias biliares: as vias biliares são canais responsáveis por
transportar a bile do fígado para a vesícula biliar. Neoplasias malignas
nessa estrutura podem ser altamente letais, pois evoluem muito rápido.
Sua incidência é mais prevalente na faixa etária dos 70 aos 80 anos.
„„ Câncer de fígado: o fígado é uma glândula que se localiza no lado
direto do abdômen, logo abaixo do diafragma. Tumores malignos nessa
estrutura glandular podem se manifestar de forma primária quando o
câncer começa no próprio fígado; e de forma secundária ou metastático
quando a origem do tumor é em outra estrutura, mas acaba acome-
tendo o fígado. Possui alta letalidade, e, após o diagnóstico de câncer
no fígado, o indivíduo possui tempo de vida reduzido. Sua incidência
é mais comum na faixa etária de 35 a 45 anos e vem aumentando sua
incidência na faixa etária entre 55 e 75 anos.
„„ Câncer de estômago: também denominado de câncer gástrico, no Brasil,
o câncer de estômago possui uma alta incidência (excluindo o câncer
de pele não melanoma). Em indivíduos do sexo masculino a incidência
é de 12,81%, enquanto em indivíduos do sexo feminino a incidência é de
7,34%. O câncer de estômago, representa para a população brasileira
geral um dos cinco principais cânceres que mais levam a óbito (INSTI-
TUTO NACIONAL DE CÂNCER, 2020). O câncer gástrico, histopatológico
poderá ser do tipo adenocarcinoma, encontrado na maioria dos casos,
ou em linfomas ou sarcomas. Sua manifestação inicial poderá ser
assintomática assim como durante a sua evolução, o que dificulta
o diagnóstico precoce e contribui para que esse câncer se infiltre
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nos tecidos, diminuindo as chances de cura. Os principais sintomas


e sinais associados à manifestação do câncer gástrico são de dor ou
desconforto na parte superior do estômago (dispepsia), sensação de
saciedade precoce, perda de peso, queixa de dor na região do início do
estômago (dor epigástrica), episódios de vômitos, diminuição da força
física e quadro de anemia. Lauren (1965), classifica o adenocarcinoma
gástrico em:
■■ intestinal — é a manifestação de adenocarcinoma mais frequente
na população brasileira, predominantemente em indivíduos do sexo
masculino na faixa etária de 55 a 60 anos. Sua manifestação pode
estar associada em indivíduos que apresentam gastrite crônica.
Nessa classificação, Lauren (1965) destaca que as células cancerosas
se manifestam de forma coesa, dando origem à formação de estru-
turas glandulares. O adenocarcinoma gástrico intestinal acomete
com maior frequência a parte distal do intestino;
■■ difuso — sua incidência é igual para indivíduos dos sexos feminino e
masculino na faixa etária de 40 a 48 anos e podem se manifestar em
indivíduos que possuem o fator sanguíneo do tipo A. Apresenta um
padrão infiltrativo em que não há formação de estruturas glandula-
res. Devido ao seu perfil de células cancerosas infiltrativas, possui
pior prognóstico quando comparado ao intestinal, pois aumenta as
chances de metástases. O adenocarcinoma gástrico do tipo difuso
acomete com maior frequência a parte proximal do intestino.

Fatores de risco e formas de tratamento


Diversos fatores podem estar associados à ocorrência dos mais diversos tipos
de câncer. Os principais fatores de risco que contribuem para a manifestação
do câncer gástrico são os relacionados ao consumo de tabaco, dieta, predispo-
sição genética e doenças. Uma dieta rica em alimentos com grande quantidade
de sal ou que sejam conservados no sal, defumados, alimentos com nitrato e
carboidratos complexos possuem uma relação significativa com a ocorrência
do câncer gástrico. Dietas pobres em frutas, vegetais e proteínas também
podem contribuir para a manifestação desse câncer. Entretanto, a principal
doença que predispõe o adenocarcinoma gástrico é a infecção pela bactéria
Helicobacter pylori. Além disso, a infecção por essa bactéria associada a uma
dieta inadequada pode causar a doença (BRASIL, 2017).
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O tratamento para o câncer gástrico deverá ser sempre que possível de


abordagem cirúrgica e ter acompanhamento multidisciplinar. A cirurgia nos
casos descobertos de forma precoce poderá contribuir para a cura em até
90% das situações. Contudo, na maioria dos casos, o câncer gástrico é diag-
nosticado em estágios mais avançados, em que será necessária a utilização
de outras terapias para auxiliar no processo. A abordagem que irá envolver
questões cirúrgica, quimioterápica e radioterápica será decidida e aplicada
pelo médico (BRASIL, 2017).
O tratamento multidisciplinar irá oferecer ao indivíduo alternativas de
tratamento que possam atuar diretamente na doença, como, por exemplo,
a quimioterapia e a radioterapia, e também nos fatores que contribuam para a
melhora do quadro clínico, por meio de abordagens nutricional, fisioterapêu-
tica, psicológica, social, entre outras, conforme a necessidade do indivíduo.
É de extrema importância que, desde o diagnóstico clínico de câncer gástrico,
o indivíduo seja assistido por uma equipe de profissionais para lhe assegurar
assistência e suporte. Esses profissionais deverão trabalhar não somente com
o paciente, mas com o seu círculo familiar, de forma a trabalharem em conjunto
para um melhor estado de saúde do indivíduo acometido pelo câncer gástrico.
Já os fatores que influenciam o desenvolvimento do câncer colorretal não
são muito diferentes dos fatores que influenciam o câncer gástrico. Entre
esses fatores, temos os relacionados aos hábitos alimentares, como uma
dieta baseada no consumo exagerado de carnes vermelhas, processadas e
de churrasco (devido à exposição a altas temperaturas), alimentação rica em
gorduras e carboidratos e uma dieta com pouca ingestão de frutas, verduras
e legumes. O comportamento sedentário, a obesidade, histórico familiar,
doença inflamatória intestinal, síndrome de Lynch, uso de tabaco e etilismo
(uso combinado ou separado) também são fatores que poderão influenciar no
desenvolvimento do câncer colorretal (A.C. CAMARGO CANCER CENTER, 2020).

Uma alimentação com consumo exagerado de gordura e carboidratos


poderá contribuir para a manifestação do câncer de cólon, uma vez
que esses alimentos irão aumentar a densidade da microbiota anaeróbica do
cólon, levando à metabolização dos sais minerais que estão no conteúdo fecal,
fazendo com que se transformem em conteúdo carcinogênico.
6 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

A partir do diagnóstico de câncer colorretal, que deverá ser realizado pelo


médico, será analisado o estadiamento desse câncer, sua extensão e possí-
veis órgãos acometidos. Somente nos casos iniciais não há necessidade de
cirurgia. Contudo, nos casos em que o diagnóstico é realizado em um estágio
mais avançado é necessária a abordagem cirúrgica combinada ou não com
a quimioterapia e/ou radioterapia, conforme a necessidade do indivíduo.
A cirurgia curativa nesse câncer é possível mesmo em um estágio mais avan-
çado, mas é importante ressaltar que quanto mais cedo for realizado o diag-
nóstico, maiores serão as chances de cura.

Assim como no câncer gástrico, o tratamento para o câncer colorretal


necessita de uma abordagem multidisciplinar, que possa olhar para
o paciente como um todo, de forma integral. Por vezes, alguns profissionais
como o fisioterapeuta não atuarão diretamente no tratamento do câncer, mas
poderão contribuir para o seu bem-estar físico, mental e social.

Atuação hospitalar do fisioterapeuta em


pacientes com câncer de sistema digestório
No ambiente hospitalar, o fisioterapeuta pode atuar na prevenção e/ou recu-
peração das funções física e respiratória do indivíduo, no alívio de sintomas
e desconfortos, no tratamento de alguma doença, no pré e pós-operatório
e em situações de urgência e emergência. Além disso, no tratamento on-
cológico no âmbito hospitalar, o fisioterapeuta tem papel importante em
intervenções durante o pós-operatório de cirurgias para retirada de tumor
no sistema digestório e nos cuidados paliativos, juntamente com a equipe
multiprofissional.
Os diversos tipos de câncer que acometem o sistema digestório estão
entre os mais difíceis de diagnóstico, como o câncer gástrico. Devido a essa
dificuldade de diagnóstico nas fases iniciais, quando o tumor é descoberto
pode estar em uma fase mais avançada, comprometendo outros tecidos e
órgãos. Nesse contexto, o processo de cura pode ser improvável e, então,
pode-se adotar o tratamento paliativo.
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Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), “cuidados paliativos” são


cuidados promovidos por uma equipe multidisciplinar, que tem como foco a
melhoria da qualidade de vida do indivíduo doente e de seus familiares, a partir
da prevenção e do alívio do sofrimento, seja físico, social ou psicológico, diante
de uma doença que ameace a vida (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2002).
As alterações físicas e emocionas que o indivíduo com câncer enfrenta,
devido ao próprio tumor e à soma de tratamentos cirúrgicos e/ou medica-
mentosos, quimioterapia e/ou radioterapia, pode se estender para além
do período de tratamento. Disfunções físicas, fraqueza muscular, perda da
flexibilidade e de resistência são aspectos funcionais que, por vezes, ficam
comprometidos em indivíduos com câncer.
A maioria dos cânceres de sistema digestório acomete a população acima
dos 50 anos de idade, que já apresentam perdas funcionais advindas do próprio
processo de envelhecimento. Nesses casos, a idade e a fragilidade da própria
doença tornam o processo de tratamento e recuperação mais complicado.
Dessa forma, é necessário que alternativas que visem à funcionalidade sejam
adotadas de acordo com a saúde física e emocional do paciente.
O cuidado paliativo pode ser iniciado o mais breve possível juntamente com
o tratamento em busca da cura do câncer. Contudo, como o câncer de sistema
digestório possui uma alta taxa de letalidade, pode-se associar a assistência
pautada no cuidado paliativo com uma abordagem para aquele indivíduo que
não tem mais chances de cura. Entretanto, é importante destacar que o cuidado
paliativo é norteado por princípios que oferecem melhor qualidade de vida,
apoio e suporte familiar, respeitando as suas condições física, mental, social
e até mesmo espiritual, tanto para o indivíduo em tratamento em busca da
cura como para aquele que se encontra na fase terminal.
Para oferecer essa modalidade de cuidado, é necessário que os profis-
sionais de saúde sejam, além de capacitados, humanizados na assistência
integral e saibam trabalhar em equipe em prol de um bem comum: o indivíduo
com câncer. Por isso, é importante que o cuidado paliativo seja ofertado
por um equipe multiprofissional, formada por médicos das mais diversas
especialidades, bem como por paliativista, enfermeiro, fisioterapeuta, nutri-
cionista, assistente social, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, psicólogo,
entre outros profissionais, conforme a necessidade do indivíduo assistido.
Também, poderão fazer parte dessa equipe capelães, familiares, voluntários,
cuidadores e acompanhantes (INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER, 2018).
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A abordagem multidisciplinar no tratamento de indivíduo com câncer de


sistema digestório deverá ser pautada na dor e nos sintomas, na avaliação
social, física, mental e espiritual e na rede de apoio desse paciente, como a
família. Nesse contexto, deve-se discutir sobre o caso, prognóstico, opções
viáveis de tratamento, delineamento dos objetivos do cuidado sempre cen-
trados no paciente.
É de extrema importância que os profissionais da equipe de cuidados
paliativos possuam diálogo aberto e honesto com o indivíduo em tratamento
e com seus familiares, de forma a esclarecer a doença, o estágio em que
o indivíduo se encontra, as alternativas de tratamento e os prognósticos
da doença. Dessa forma, respeita-se a autonomia do indivíduo e o eduque
em relação à sua situação de saúde atual e às alternativas de tratamentos
e cuidados, e, assim, o paciente, juntamente com a equipe, poderá tomar
decisões que contribuam para um melhor estado de saúde.
O fisioterapeuta como um membro da equipe de cuidados paliativos para
paciente com câncer de sistema digestório deverá considerar todos os aspec-
tos que envolvem o indivíduo e não somente as questões físicas. Aspectos
sociais, ambientais e mentais devem ser analisados pelo fisioterapeuta para
que ele possa entender a realidade na qual o paciente se encontra e ofertar
um melhor atendimento.
Pacientes em ambiente hospitalar, principalmente em tratamento de
câncer, tendem a ser mais frágeis e deprimidos. Muitos podem não conseguir
realizar suas atividades básicas de vida diária, o que gera mais frustação e
desânimo. A dor é a principal queixa apresentada pelos pacientes em cuidados
paliativos, seguida por queixas de dispneia, sintomas que podem ou não estar
associados ao tumor ou ser advindos dos longos períodos em que o paciente
permanece deitado, além dos efeitos da quimioterapia e da radioterapia ou
do pós-operatório.
Mesmo após a discussão em equipe a respeito do paciente em cuidado,
é de extrema importância que o fisioterapeuta realize uma avaliação deta-
lhada, averiguando exames e laudos sobre quais estruturas ou órgãos foram
acometidos pelo câncer de sistema digestório, medicamentos em uso, cirurgias
realizadas, se está em respiração espontânea ao ar ambiente ou com suporte
de oxigênio e de que forma esse oxigênio está sendo ofertado. No caso de
dúvidas, é fundamental que o fisioterapeuta consulte o médico responsável
para demais esclarecimentos e que, dessa forma, possa prosseguir com o
delineamento da sua intervenção.
Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório 9

Após o estudo do prontuário do paciente, o fisioterapeuta deverá ir à


beira do leito realizar as demais avaliações. O diálogo com o paciente deve
ser sempre no intuito de reforçar a contribuição das intervenções em seu
benefício. Por isso, antes de iniciar a avaliação, o fisioterapeuta deve estreitar
laços com o paciente e com o familiar ou acompanhante.
Nas situações em que o paciente estiver em pós-operatório, como, por
exemplo, de gastrectomia, seja total ou parcial, o fisioterapeuta deverá
se atentar às principais complicações funcionais que esse indivíduo pode
apresentar. A dor é a queixa mais comum após o procedimento cirúrgico.
Devido a esse quadro álgico, o paciente tende a ficar mais tempo em uma
mesma posição contribuindo para a diminuição da força muscular, amplitude
de movimento e aumento da rigidez articular.
A dor após as cirurgias, principalmente abdominal alta, também poderá
contribuir para que o indivíduo apresente uma respiração mais superficial,
o que irá interferir negativamente na capacidade vital e funcional desse
indivíduo, resultando em maior acúmulo de conteúdo secretivo e em maiores
chances de desenvolvimento de atelectasia e pneumonia, além de perma-
necer por mais tempo em ventilação mecânica. Dessa forma, é de extrema
importância que o fisioterapeuta realize uma avaliação bem detalhada,
de forma a contribuir para que o tratamento seja eficaz.
Antes de qualquer inspeção ou exame físico, o fisioterapeuta deverá ex-
plicar os motivos de avaliar aquela estrutura, bem como explicar o que será
feito para aliviar e/ou tratar o desconforto apresentado. O fisioterapeuta
poderá pautar a sua investigação pelo método SOAP (subjetivo, objetivo,
avaliação e plano), descrito a seguir.

„„ Subjetivo: trata-se da entrevista clínica em que o paciente poderá rela-


tar a doença segundo a sua visão, queixas, sentimentos e a anamnese.
„„ Objetivo: trata-se de exames físicos, cirurgias e procedimentos que
foram realizados.
„„ Avaliação: trata-se da etapa em que o fisioterapeuta irá analisar tanto a
avaliação subjetiva como a objetiva para verificar possíveis diagnósticos
fisioterapêuticos e avaliar a funcionalidade do paciente.
„„ Plano: trata-se do local onde o fisioterapeuta irá definir o seu plano
de tratamento conforme a necessidade avaliada e apresentada pelo
paciente.
10 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

É importante destacar que nem todos os pacientes em cuidados paliati-


vos estarão responsivos e em condições de realizar o método SOAP, como,
por exemplo, aqueles com possíveis complicações ou em uso de ventilação
mecânica e de drogas sedativas. Nessas situações, o fisioterapeuta deverá
atuar na mobilização articular e muscular, na mudança de decúbito, na higieni-
zação brônquica (somente quando necessário) e em parâmetros ventilatórios,
no intuito de fornecer uma melhor ventilação ao indivíduo. Para melhorar a
funcionalidade pulmonar, o fisioterapeuta poderá executar exercícios respi-
ratórios para fortalecer os músculos respiratórios e melhorar a oxigenação,
técnicas de higienização brônquica e de expansão pulmonar, técnicas como
o estímulo verbal de tosse, incentivador respiratório, ventilação mecânica
não invasiva e exercícios de respiração profunda associados à tosse assistida
(OVEREND et al., 2001).
Segundo Perracini (2000), o tratamento do paciente deverá ser realizado
conforme a dependência e a progressão do indivíduo em tratamento paliativo,
classificadas em pacientes totalmente dependentes, dependentes, porém
com capacidade de deambulação e independentes, porém vulneráveis. Veja
sobre cada uma delas a seguir.

Pacientes totalmente dependentes

„„ Objetivos fisioterapêuticos: contribuir para a manutenção da amplitude


de movimento, posicionamento confortável; favorecer as trocas gaso-
sas e as demais funções fisiológicas; fornecer higienização; e adotar
medidas e mecanismos que evitem úlceras, edema e dor.
„„ Condutas para atingir os objetivos: posicionamento e orientações
para mudança de decúbito; mobilização articular e muscular global;
correção postural; orientação para o cuidador; prevenção de imobilismo
e deformidades; identificação de meios que facilitem a locomoção do
paciente; execução de exercícios respiratórios e manobras que con-
tribuam para melhor oxigenação e higienização brônquica; aspiração
traqueal, quando necessária; estímulo da tosse.
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Pacientes dependentes, porém com capacidade


de deambulação

„„ Objetivos fisioterapêuticos: contribuir para a manutenção da loco-


moção; contribuir para realização das atividades de vida diária e o
autocuidado.
„„ Condutas para atingir os objetivos: posicionamento e orientações para
mudança de decúbito, transferências e posturas a serem adotadas;
indicação de dispositivos que auxiliem a marcha para pacientes em
processo de adaptação devido às perdas funcionais; treino de marcha no
leito ou pelos corredores do hospital; mobilização muscular e articular
global; execução de exercícios motores e de equilíbrio; execução de
exercícios respiratórios e estímulo de tosse.

Pacientes independentes, porém vulneráveis

„„ Objetivo fisioterapêutico: contribuir para a manutenção ou ganho de


funcionalidade.
„„ Condutas para atingir o objetivo: proteção mioarticular e ganho mo-
tor; acompanhamento de possíveis perdas funcionais (musculares,
articulares e sensoriais), treino de marcha; treino de equilíbrio e treino
de coordenação; orientação postural; ganho de amplitude articular,
muscular e elasticidade por meio da cinesioterapia (respeitando a
condição clínica); cinesioterapia respiratória; treino de atividades mais
complexas que envolvem tarefas cotidianas; favorecimento da tole-
rância aos esforços físicos; adaptação dos dispositivos que possam
auxiliar na marcha; identificação de possíveis fatores que contribuam
para quedas e eliminá-los; encaminhamento para ambulatórios ou
centros especializados de fisioterapia.

Nos casos que o paciente, durante o atendimento fisioterapêutico, apre-


sentar aumento da pressão arterial sistêmica acima de 160 × 1 00 mmHg,
realizar manobra de valsava, apresentar vômitos, sangramentos, diminui-
ção da saturação de oxigênio, aumento da frequência cardíaca, as condutas
fisioterapêuticas, motoras e ou respiratórias deverão ser suspensas, e o
fisioterapeuta deverá informar a equipe sobre o episódio que aconteceu e
oferecer suporte até a estabilização do paciente.
12 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

Antes de iniciar a conduta, se o paciente apresentar aumento da tem-


peratura corporal (febre), nível de consciência rebaixado, curativo da ferida
operatória aberto ou sangrando, o fisioterapeuta deverá reservar condutas
e comunicar a equipe multiprofissional sobre a situação do paciente. Outro
ponto a se destacar é que todas as informações a respeito do paciente (como
foi encontrado, como foi a sessão, se houve intercorrência e qual tipo de
intercorrência) deverão ser registradas no prontuários do paciente.
No cuidado paliativo do indivíduo com câncer de sistema digestório, o
fisioterapeuta, juntamente com a equipe de profissionais, irá favorecer uma
melhor qualidade de vida e bem-estar. Visitas ao leito com a equipe multi-
profissional é de extrema importância e devem ser realizadas sempre que
possível, pois, nesse momento, as dúvidas e orientações serão sanadas, tanto
do paciente quanto do seu acompanhante/familiar/cuidador. Reuniões com
os profissionais para discussão dos casos também deverão ser realizadas
periodicamente, a fim de traçarem condutas que tratem o paciente como um
todo. Dessa forma, o cuidado paliativo poderá prolongar os dias de vida ou
até mesmo curar o indivíduo acometido pelo câncer.

Atuação ambulatorial do fisioterapeuta em


pacientes com câncer de sistema digestório
A assistência fisioterapêutica ambulatorial é destinada aos pacientes que não
necessitam de internação, mas que precisam de uma assistência contínua
e prolongada. A assistência ambulatorial fisioterapêutica ao paciente com
câncer de sistema digestório deverá ser iniciada na primeira consulta médica
do paciente, ao início de seu tratamento.
Nos casos em que há necessidade de internação, o paciente será acompa-
nhado pela equipe fisioterapêutica hospitalar e encaminhado para o acom-
panhamento ambulatorial. É importante que exista um fluxo de referência
e contrarreferência entre os profissionais da fisioterapia, tanto em âmbito
ambulatorial quanto na assistência hospitalar, e na atenção básica, com o
intuito de contribuir para a troca de informações a respeito da situação do
paciente.
Hospitais e centros especializados em oncologia devem ofertar serviços
ambulatoriais de diversas especialidades, de modo a assistir o paciente em
suas necessidades físicas, mas também mentais e sociais. Assim, logo após
o diagnóstico da doença e possível indicação do tratamento a ser realizado
(p.ex., radioterapia, quimioterapia e/ou cirurgia), o paciente será encami-
nhado ao ambulatório de fisioterapia, e o profissional responsável deverá
Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório 13

estar ciente do seu caso. A partir desse conhecimento, serão identificadas


as possibilidades de intervenção.
No primeiro contato com o paciente, é importante que o profissional se
apresente, reforce qual será a importância da fisioterapia para a sua evolução,
possíveis desconfortos que poderão surgir durante o tratamento e educar o
paciente a respeito da sua situação de saúde e da importância da autonomia
do paciente para a sua evolução. Esse primeiro momento é crucial para que o
paciente possa aderir ao tratamento fisioterapêutico e continuar a frequentar
o ambulatório de fisioterapia.
A quimioterapia pode causar desconfortos no paciente, como, por exemplo,
a fadiga, e muitos pacientes podem querer permanecer por mais tempo em
comportamento sedentário devido a esse cansaço extremo, o que contribuirá
para perda da função física e fisiológica. Contudo, o exercício físico assistido
melhora a resistência e contribui para a atenuação da fadiga e a melhora dos
efeitos causados pela terapia. Por isso, é importante que o fisioterapeuta, logo
no início do acompanhamento do paciente, oriente e realize exercícios que
possam prevenir tanto a fadiga como o encurtamento muscular, a diminuição
da amplitude de movimento, as alterações respiratórias e contribua para uma
resposta mais satisfatória ao tratamento e à qualidade de vida.
O paciente que já realiza acompanhamento fisioterapêutico desde o início
do seu diagnóstico, em necessidade de procedimento cirúrgico, terá uma
resposta mais satisfatória tanto muscular quanto respiratória durante o
pós-operatório, além do vínculo que já existirá e facilitará a continuidade do
cuidado. Nessa etapa, o fisioterapeuta deverá estar ciente das estruturas que
foram retiradas, as limitações do paciente e as contraindicações.
Conforme já mencionado, cânceres que acometem o sistema digestório
podem se espalhar para outras estruturas do corpo humano. Então, o fisio-
terapeuta deverá estar sempre em comunicação com o médico responsável
pelo tratamento e ter acesso aos prontuários e procedimentos realizados, no
intuito de proteger e oferecer o tratamento adequado à situação do paciente.
Pacientes com câncer de sistema digestório em cuidados paliativos tam-
bém podem necessitar de acompanhamento fisioterapêutico ambulatorial.
O tratamento com perspectiva de cura ou não deverá ser focado na qualidade
de vida, no bem-estar e na funcionalidade física para realizar suas atividades
de vida diária. O fisioterapeuta também deverá oferecer acolhimento aos
familiares e/ou aos cuidadores, estimulando a se manterem ativos e cuidarem
da sua saúde, pois muitos familiares também sofrem com o adoecimento do
parente. O principal objetivo do tratamento ambulatorial fisioterapêutico
em cuidados paliativos será de acolher, tratar, orientar e estimular uma vida
ativa conforme as limitações do paciente.
14 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

Seja na fase inicial, no pré-operatório, no acompanhamento da qui-


mioterapia ou da radioterapia, no pós-operatório ou nos cuidados
paliativos, o fisioterapeuta em âmbito ambulatorial deverá prestar uma assis-
tência humanizada, acolhedora, preventiva, promotora de saúde, protetiva e
reabilitadora. O olhar do fisioterapeuta oncológico deve ir além da manutenção
da funcionalidade e do alívio de sintomas, visando ao bem-estar de forma
geral do indivíduo. O vínculo deve ser estabelecido e mantido durante todo o
acompanhamento, de forma a contribuir para uma boa evolução. É importante
que o fisioterapeuta analise e avalie cada paciente e tenha suas condutas
traçadas conforme a necessidade específica de cada um, respeitando suas
limitações e crenças.

No Quadro 1, veja as intervenções fisioterapêuticas que podem ser reali-


zadas de acordo com o estágio de tratamento.

Quadro 1. Intervenção fisioterapêutica de acordo com o estágio de tratamento

Fase de Intervenção
Objetivos Tratamento
tratamento fisioterapêutica

Pré- Reabilitação Prevenir complicações Educação em


-operatório preventiva pulmonares, musculo- saúde; exercícios
esqueléticas e incapa- respiratórios;
cidade funcional. exercícios (ativo-
-assistido, ativo
e/ou resistido).

Pós- Reabilitação Tratar possíveis Educação


-operatório restauradora e complicações em saúde;
de suporte respiratórias e cinesioterapia
motoras devido ao para limitações
tempo de internação físicas;
e ao procedimento alongamentos;
cirúrgico; auxiliar exercícios;
no alívio da dor respirações
e no retorno às de expansão
condições funcionais, pulmonar e para
respiratórias e higienização
motoras. brônquica e
eletroterapia.
(Continua)
Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório 15

(Continuação)

Fase de Intervenção
Objetivos Tratamento
tratamento fisioterapêutica

Cuidados Reabilitação Manutenção e Educação


paliativos paliativa aumento do conforto em saúde;
e das funcionalidades cinesioterapia;
físicas e respiratórias; exercícios
controle da dor; proprioceptivos
diminuição de e de equilíbrio;
possíveis efeitos exercícios
deletérios de respiratórios;
longos períodos em massagem
imobilização e/ou relaxante e
restrição ao leito; eletroterapia.
ganho, manutenção
e aumento da
autonomia para
realizar as atividades
de vida diária.

Fontes: Adaptado de Vieira (2016).

A avaliação fisioterapêutica em qualquer fase de tratamento do paciente


com câncer de sistema digestório deverá ser realizada de forma minuciosa
e detalhada. O fisioterapeuta poderá utilizar instrumentos já validados para
o público e para o País. Antes de tudo, o fisioterapeuta deverá se atentar
à condição clínica, aos exames clínicos realizados (verificar se há anemia,
plaquetopenia, leucopenia, pois aumentam o risco de infecções e sangra-
mentos), verificar se há distúrbios de coagulação, presença de dor (tipo, local
e intensidade), tipo de câncer e estadiamento, se há metástases e quais são
as estruturas acometidas.
Segundo Matheus, Silva e Figueiredo (2018), o fisioterapeuta deverá realizar
uma anamnese minuciosa a fim de elaborar hipóteses que serão testadas em
exames físicos, bem como avaliar o paciente de maneira integral, identifi-
cando suas limitações e restrições, assim como fatores pessoais, ambientais,
facilitadores ou inibidores, de acordo com a Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF).
Para avaliação da dor, o fisioterapeuta poderá utilizar a Escala Visual
Analógica — EVA, que tem como intuito verificar a intensidade da dor. Trata-
-se de um instrumento de fácil execução e praticidade, que auxilia a verificar
a evolução do paciente referente ao tratamento proposto. A EVA pode ser
utilizada em todos os atendimentos, logo no início da sessão e após as con-
16 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

dutas realizadas, e o resultado deve ser registrado junto ao prontuário do


paciente. Sua aplicabilidade é fácil, basta que o fisioterapeuta pergunte ao
paciente qual é grau da sua dor naquele momento, sendo que 0 significa sem
dor e 10 significa a dor máxima.
Para a avaliação da funcionalidade, existem diversos instrumentos que são
capazes de mensurar a capacidade do indivíduo de realizar suas atividades
de vida diária. Um exemplo de instrumento que pode ser utilizado pelo fisio-
terapeuta é a Medida de Independência Funcional (MIF) (RIBERTO et al., 2001).
Esse instrumento consiste em verificar o grau de dependência para realizar as
atividades de vida diária por meio de um questionário que engloba 18 domínios,
divididos em: autocuidado (6); mobilidade/locomoção (5); controle esfincteriano
(2); comunicação (2); cognição (2); e participação social (1).
A pontuação dessa da MIF varia de 1 a 7 para cada questão, sendo que 1
equivale à dependência total para realizar determinada atividade e 7 equivale
à independência total para realizar determinada atividade. A pontuação final
irá variar de 18 a 126. Essa medida poderá ser aplicada já na primeira sessão
e após a determinação do fisioterapeuta. Após traçar cada objetivo (de curto,
médio e longo prazo), é importante que a MIF seja aplicada para verificar a
evolução da funcionalidade.
É comum que no ambiente ambulatorial pacientes com câncer de sistema
digestório apresentem fraqueza, dispneia e dor, o que muitas vezes dificulta
a adesão ao tratamento, pois durante as primeiras sessões esses sintomas
poderão aumentar devido ao próprio processo adaptativo do corpo. Dessa
forma, é importante que o fisioterapeuta eduque em saúde o paciente sobre
os benefícios que a fisioterapia motora e respiratória trará para ele.
Todas as condutas deverão ser realizadas de acordo com o limite do
paciente, pois muitos deles, nas primeiras sessões, principalmente no pós-
-operatório e em cuidados paliativos, terão dificuldade em realizar as ati-
vidades. Contudo, com o processo de evolução cinético-funcional, poderão
ser realizadas outras condutas, e o paciente poderá verificar sua melhora.
Após a avaliação minuciosa, os objetivos de tratamento deverão ser tra-
çados e determinados, bem como a escolha de quais técnicas e recursos
serão utilizados. Os principais objetivos a serem alcançados pelo tratamento
fisioterapêutico deverão ser do alívio da dor, melhora da função motora,
contribuindo para uma melhor qualidade de vida. Os objetivos de tratamento
fisioterapêutico secundários poderão ser de melhora frente ao enfretamento
da doença, participação em atividades de lazer e melhora no convívio familiar
e social. Para atingir os objetivos, o fisioterapeuta poderá utilizar das técnicas
e recursos que o paciente consiga realizar.
Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório 17

O exercício físico e a cinesioterapia, por exemplo, contribuem para a me-


lhora da força muscular, manutenção e ganho de amplitude de movimento,
da fadiga, da dispneia, da qualidade do sono e de aspectos mentais e sociais,
além da melhora da capacidade cardiopulmonar. A eletroestimulação e o
laser de baixa intensidade também poderão ser utilizados para o alívio da
dor e para a ação anti-inflamatória.
Muitos pacientes com câncer de sistema digestório podem adotar posturas
incorretas no intuito de diminuir a dor ou até mesmo por constrangimento em
casos de uso da bolsa de colostomia, por isso, técnicas de reeducação postural
devem ser realizadas e orientadas. As práticas integrativas e complementares
também poderão ser realizadas para o alívio das dores e para a melhora da
qualidade de vida (MATHEUS; SILVA; FIGUEIREDO, 2018).
Uma condição que pode ser apresentada pelos pacientes com câncer
colorretal após procedimento cirúrgico é a incontinência fecal (IF). A IF é a
incapacidade muscular do esfíncter anal para controlar a eliminação das
fezes e flatos. Essa disfunção poderá surgir em decorrência de procedimen-
tos cirúrgicos que causaram traumas nos músculos da região do reto ou do
ânus, contribuindo para danos à musculatura, diminuindo a funcionalidade
esfincteriana. Para esses pacientes, após a avaliação, o fisioterapeuta poderá
utilizar recursos que eduque o indivíduo a respeito da contração muscular
e do relaxamento por meio das técnicas de treinamento comportamental
associado ao biofeedback (pois permitirá que o paciente verifique de forma
visual e/ou adutiva a sua contração muscular) e exercícios de fortalecimento
para a musculatura do assoalho pélvico. Esses exercícios poderão ser realiza-
dos de forma ativa e com resistência, por meio dos cones anais, conforme a
evolução da força muscular. A eletroestimulação também poderá ser realizada,
associada ou não aos exercícios de fortalecimento.
Durante o momento da avaliação, o profissional deverá verificar se há
alguma contraindicação para realização da fisioterapia. Se o paciente apre-
sentar sinais vitais que não estejam dentro dos padrões de normalidade,
o fisioterapeuta deverá suspender o atendimento até a estabilização do
quadro e orientar que o paciente busque atendimento profissional.
Em indivíduos que já realizaram a cirurgia, o fisioterapeuta deverá se aten-
tar à ferida operatória e à sua cicatrização, de forma a não realizar condutas
que possam provocar o sangramento do local. Se, durante o atendimento,
o fisioterapeuta perceber situações em que o paciente está sentindo algum
desconforto (vertigem, tremores e falta de ar), a sessão deverá ser inter-
rompida e o paciente deverá procurar cuidados médicos para avaliação e
tratamento. Hemorragias, febre, vômitos, síncope, pressão arterial alterada,
18 Fisioterapia aplicada ao câncer de sistema digestório

frequência cardíaca e respiratória aumentadas também serão situações


em que o fisioterapeuta deverá suspender o atendimento e encaminhar o
paciente para cuidado médico.
Todas essas situações citadas e outras situações adversas que podem
ocorrer durante a sessão de fisioterapia deverão ser registradas no prontuário
do paciente. A data, horário, situação que foi apresentada pelo paciente e
que justifique a suspensão da sessão, os sinais vitais e as orientações para
que o paciente procure atendimento.
O tratamento ambulatorial fisioterapêutico do paciente com câncer de
sistema digestório deverá, dentre todas essas atividades orientadas, ser
humanizado, pois o paciente com câncer já é fragilizado por todo o contexto
que envolve a doença. O principal objetivo do tratamento fisioterapêutico
deverá ser reabilitar o paciente dentro da sua realidade física, mental e
social, respeitando a sua autonomia e estimulando um estilo de vida que
lhe traga bem-estar.

Referências
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Leituras recomendadas
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VITAL, F. M. R. Fisioterapia em oncologia: protocolos assistenciais. São Paulo: Atheneu,
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