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PE N SA M E N T O A L IE N ÍG E N A

A pesquisa e o planejamento como funções


de govêrno e administração
H. S . P erson
Consultor em Economia Industrial
• e Organização
( Tradução de N . C. Ramalho)

O presente artigo, publicado no número de um parque público, mesmo então a permanência


outubro de 1940 da “Public Administration é relativa, pois variáveis imprevistos ocorrem
Reyiew ”, donde, data venia, o extraímos foi eventualmente e obrigam a um novo arranjo do
incluído na seleção de ensaios preparados, projeto inicial.
em colaboração, pela “American University” O planejamento de que vamos especialmente
e io Bureau de Orçamento do Govêrno Fe­ tratar neste artigo, ou seja, o de uma entidade
deral dos Estados Unidos e editado, em 1945, viva e ativa como uma emprêsa industrial ou um
sob o títu lo : “Orçamento, um instrumento órgão da administração pública, é dinâmico no
de planejamento e administração” . mais alto gráu, pois envolve o ajustamento con­
Nessa coletânea, o artigo vem precedido tínuo de duas infindáveis séries de variáveis, das
de uma nota editorial em que se recomenda quais algumas são imprevisíveis, e outras previsí­
ao leitor conservar em mente, durante n lei­ veis mas indeterminadas. Começamos realmente
tura, as seguintes perguntas: a compreender o que seja planejamento quando
nos capacitamos de que ele diz respeito a situa­
1 — Que ê planejamento, e quais são
ções dinâmicas e é um processo destinado a re­
os seus objetivos?
duzir atritos, confusões e perdas, decorrentes da
2 — Quais são os oito postulados do variabilidade das circunstâncias. O propósito do
planejamento, segundo o esquema do planejamento é substituir o acaso pela predeter-
autor, e até que ponto se relacionam minação, tanto quanto o permitirem as contingên­
com o processo orçamentário? cias específicas e a capacidade hum ana. Pela pre­
A Revista do Serviço Público, que já pu­ visão torna-se possível suprimir algumas variá­
blicou outros artigos incluídos na citada obra, veis, modificar outras e preparar a organização
recomenda o presente como uma contribui­ para enfrentar as restantes. .
ção especialmente valiosa pela clareza e es­
pírito de síntese. ( N . R .) POSTULADOS DO PLANEJAM ENTO

Isto posto, vamos dar a conhecer aos interessa­

N
O meu entender, o planejamento consiste em
definir o objetivo de uma emprêsa; em for­ dos em administração pública uma parte da expe­
mular as políticas que presidirão à realização do riência da indústria privada em m atéria de pla­
objetivo definido; em projetar um sistema de pro­ nejam ento. Acreditamos que com isso traremos
cessos pelos quais se possa atingir o fim colimado uma útil contribuição, pois, em última análise,
com precisão e com o mínimo de desperdício; e, não existem, entre o funcionamento de uma em­
com freqüência, em dirigir inicialmente a exe­ prêsa privada e o de uma emprêsa pública, maio­
cução, o que virtualmente eqüivale a executar. O res diferenças técnicas do que, em certos casos,
planejamento é dinâmico, é um processo contí­ entre o funcionamento de duas empresas priva­
nuo. E se bem que algumas vêzes aparentemente das, tais como, por exemplo, uma fábrica de auto­
se faça de maneira definitiva, como ao projetar-se móveis e uma companhia de seguros ou um ban­
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co. Evidentemente, e já o disse alhures, a Cons­ res de departam ento ou divisão, e assim, análoga
tituição, as leis e os costumes criaram outras dife­ mente, as autoridades subsequentes, até os níveis
renças, além das de ordem técnica. Mas se a in­ inferiores da organização. No entanto, é justa­
dústria privada foi capaz de generalizar sua expe­ mente numa melhor definição de objetivos que
riência a ponto de cobrir atividades tão diversas se encontra o ponto de partida para a introdução
como a fabricação de automóveis e o negócio de do planejamento eficiente e da administração ra­
seguros, tal experiência deverá ter grande valor cionalizada dos negócios públicos. Torna-se, pois,
para a empresa pública. Porque, afinal de contas, necessária a definição mais precisa de objetivos,
todo esforço para atingir um objetivo continua nas leis instituidoras de serviços públicos; subor-
sendo um esforço para atingir um objetivo, em­ dinadamente aos fins por lei determinados, torna-
bora varie a forma de que se revista ou o objetivo se ainda necessária a definição, pelos diretores
'perseguido. Vamos, pois, apresentar a experiên­ dêsses serviços, dos objetivos que concorrem para
cia da indústria privada em matéria de planeja­ a realização daqueles fins; e, analogamente, cabe­
mento; e atendendo à necessidade de sintetizar, rá às autoridades imediatas a definição dos sub-
procuraremos condensar a exposição sob a forma objetivos.
de postulados. Os órgãos da administração pública nos quais
1. 0 Princípio, a base, o “sine qua non” do se conseguiu introduzir, em gráu apreciável, pla­
planejamento eficiente reside na especificação nejamento e administração eficientes, são justa­
clara e completa do objetivo, pela administração mente aquêles cujos objetivos conduzem, de m a­
superior da emprêsa. O desconhecido não pode neira relativamente precisa, à sua própria defini­
ser planejado, e o que não foi bem compreendido ção; por exemplo, o Exército, a Marinha, as ativi­
não pode ser bem planejado. A eficiência do pla­ dades especiais dq Corpo de Engenheiros, a Orga­
nejamento varia na razão direta da clareza e ex­ nização do Vale do Tennessee (Tennessee Vallcy
tensão da idéia que se tem do seu objetivo. O Auihority), a Administração das Obras Públicas
bom planejamento geral principia pela clara de­ e a Administração da Eletrificação R ural. Con­
finição do objetivo e dela depende em tôda a sua tudo, é possível introduzir o planejam ento em
extensão. Só pode haver um bom planejamento todos os setores da administração pública, num
dos meios se houver, como sistema diretor, um gráu muito mais elevado do que o atingido até o
bom planejamento dos fins. presente. Acreditamos mesmo, que, por força das
circunstâncias, já existe um fermento de teoria e
Êsse postulado traz-nos imediatamente à me­
esforço em prol do planejamento, inclusive em
mória uma diferença básica entre a emprêsa e a
muitos órgãos nos quais, à primeira vista, o pla­
emprêsa particular. Esta define seu objetivo com
nejamento pode parecer impraticável.
um gráu considerável de precisão; assim, uma fá­
brica de automóveis visa a fabricar automóveis; 2. Definido o objetivo, cabe à administração
uma emprêsa textil, tecidos de determinados tipos; superior da emprêsa formular, em linhas gerais, as
urn banco, lucfos, derivados da custódia de fun-- políticas diretoras das atividades condvcentes à
dos, do câmbio, de empréstimos a curto prazo e realização d ê le . Tôda emprêsa tem, obrigatoria­
de investimentos. Leia-se, porém, uma lei insti­ mente, de estabelecer um sistema de relações com
tucional de qualquer repartição ou emprêsa pú­ o meio exterior; tais relações precisam ser ava­
blica e o contraste será notório. Tudo é vago. liadas, a fim de possibilitar o delineamento das
Muito se deixa à imaginação do primeiro diretor- políticas relativas à sua m anutenção ou modifi­
geral nomeado e de seus sucessores, com as mo­ cação. Por exem plo: uma vez decidida a fabri­
dificações decorrentes das interpretações e opi­ cação de um automóvel de baixo preço, qual a
niões do Tribunal de Cornas (1 ) e do Consultor política da emprêsa quanto às relações com os
Geral da República ( 2 ) . Mas não é só o dire- trabalhadores e o nível dos salários ? Ou, na hi­
tor-geral quem tem de concluir, mais ou menos pótese de resolvei o Governo construir uma bar­
' opinativamente, sôbre o que lhe cumpre fazer : na ragem a fim de facilitar a navegação e incidente­
mesma contingência se vêm colocados os direto- mente produzir energia elétrica, qual será a polí­
tica de relações com a indústria privada? Pode-
(1) General Accounting O lfice. se, talvez, dizer que essa segunda fase do planeja­
(2) A ttorney General. mento consiste em determinar e ajustar as rela­
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ções entre a emprêsa e os fatores ambientes que (standardízatíon) . Do procedimento descrito re­
afetam a realização do objetivo ou por ela são sultam objetivos integrantes padronizados; instru­
afetados. . * . mentos padronizados para produzí-los; processos
padronizados de manipulação, tudo com qualida­
3 . A terceira fase do planejamento é a aná­
des padronizadas, em quantidades padronizadas e
lise, em linhas gerais, pela administração superior
tempos padronizados. E ’ a fase em .que se proje­
e pela gerência da emprêsa, dos meios e modos
tam e articulam tôdas as engrenagens e eixos da
técnicos de alcançar-se o objetivo, mbordinada-
máquina administrativa por meio da qual funcio­
m ente às políticas formuladas. H á variáveis e
nará a gerência.
alternativas, maneiras diferentes de chegar-se ao
mesmo fim. Se determinada indústria decidiu 6. O passo seguinte consiste na distribuição
adotar métodos modernos de administração de de responsabilidades aos indivíduos. Certamente
pessoal, não mais caberá discutir a instituição do já antes houvera distribuição de responsabilida­
sistema de exigir-se o máximo dos operários e des individuais, quando se determinaram as fun­
substituí-los quando esgotados. Se o Governo re ­ ções e responsabilidades mais gerais, nos níveis
solveu m anter a liberdade de ação dos lavradores superiores; mas na fase presente é que se distri­
nos assuntos relativos à administração de suas fa­ buem responsabilidades a maioria dos indivíduos,
zendas, certos' meios e modos de assistí-los ficam de cuja capacidade qualitativa e quantitativa de­
eliminados. Se um Govêrno não acredita que a penderão, em última análise, a precisão e a eco­
melhor defesa consiste na capacidade para tomar nomia das operações. Da precisão e economia
a ofensiva, ou se rejeita essa noção pelos seus peri­ conseguidas no trabalho individual do pessoal das
gos imanentes, então os meios e modos de cons­ oficinas e escritórios é que resultam a precisão e
truir e operar um estabelecimento militar serão economia totais, na produção de qualquer emprê­
bem diversos do que seriam se a opinião contrária sa. Pode-se organizar, reorganizar e tornar a or­
prevalecesse. ganizar no tope ou atingindo a estrutura geral,
mas, exceto se o objetivo fôr modificado, por êsses
4 . Em seguida a essa análise geral dos meios
meios não se conseguirá éfetuar economia signi­
e modos vem a quarta fasè do planejamento, que
ficativas; isso só se alcançará pelo estudo e aná­
é um trabalho de síntese : a administração supe­
lise de cada atividade, pelo estabelecimento de
rior, com o conselho técnico da gerência, estabe­
um fluxo de trabalho padronizado e bem com­
lece a organização da emprêsa. A organização re­
preendido por todoò, e pela instituição de um sis­
sulta da análise dos meios e modos. E ’ uma es­
tema integrado de processos de execução. Arti­
trutura de relações de funções essenciais, básicas.
culação de processos de operação, organização
Ainda não diz respeito a indivíduos. E ’ o esque­ técnica e economias resultantes da soma de uni­
leto da estrutura de funções através da qual a ge­ dades de economia, tudo isso só se pode construir
rência terá de operar e que, ao mesmo tempo, de­ de baixo para cima.
limitará a área de funcionamento da gerência. A
7 . Uma vez distribuídas, da maneira descrita,
organização é um instrumento da gerência, como
as diversas responsabilidades individuais, a fôrça
disse Oliver Sheldon, mas também é uma delimi­
dominante passa a ser “o senso da responsabilida­
tação do campo de atividade da gerência. Obser­
de” de executar conforme o processo predetermi­
ve-se que a organização é precedida da análise
nado, em lugar da “autoridade” de executar se­
geral dos meios e modos, mas diz respeito a fun-
. . I gundo os caprichos e fantasias individuais. Onde
ções e antecede a designação de indivíduos para
aquêle senso de responsabilidade se torna domi­
as responsabilidades específicas.
nante, a necessidade de compreensão clara e com­
5. E m seguida vem a análise mais porme­ pleta também se torna dominante, passando a
norizada dos meios e modos, feita pela gerência, função da gerência a constituir-se principalmente
e subsequentemente nova síntese. Desta síntese do trabalho de promover compreensão clara.
resultam especificações do fluxo do trabalha e dos Nessas condições, a formação educacional dos tra ­
proóessos de trabalho. Aos processos de trabalhe balhadores assume importância especial, de vez
dão-se características qualitativas è de tem po. que à gerência caberá, como atribuição principal,
Êste é o setor do planejamento identificado na promover o treinamento e a instrução específicos.
literatura especializada pelo têrmo padronização As' instruções diárias relativas a “o que”, “como”,
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“quanto”, “quando” e “onde” — todos os proces­ gerência, fizemo-lo como se êle propriamente se
sos de tranSrAitir compreensão clara — constitui­ confundisse com administração e gerência. Isso
rão a parte essencial das funções da gerência. não fòi inteiramente acidental, pois planejamento,
Cada trabalhador se torna um executor que coope­ administraçfio e gerência de fato se interrelacio-
ra, porque, ao executar sua parte do trabalho total, nam tão vitalmente quanto gêmeos siameses.
compreende qual é a parte, e o que ela é. O tra­ Há um hábito muito generalizado de conside­
balhador se torna um elemento de um grupo que rar planejamento e execução como funções dis­
coopera, grupo no qual cada indivíduo se aplica a tintas; segundo essa concepção, os órgãos de pla­
uma atividade específica e no qual as atividades nejamento, uma vez traçados os planos de ação,
individuais se suplementam umas às outras e con­ podem esquecê-los, pois daí em diante a tarefa
tribuem precisa e economicamente para um resul­ compete aos órgãos executivos. T al modo de pen­
tado predeterminado; isso porque tôdas as ativi­ sar, todavia, não encontra apôio na realidade e
dades foram prèviamente coordenadas pelo pla­ conduz a erros.
nejam ento. A precisão e a maior economia resul Nesse ponto torna-se necessário estabelecer no­
tam de trabalhos minuciosos dêsse gênero, e não va distinção entre pesquisa para fins de planeja­
das manipulações gerais de estrutura. H á dois mento e projeto de um plano, e a realização ou
pontos nos quais se pode conseguir economias o planejamento em si mesmo. A pesquisa deve
substanciais : no nível da administração superior, ser destacada e objetiva; e os processos e padrões
quando se formulam decisões relativas aos obje­ estabelecidos em função dela devem ser os me­
tivos e se suprimem objetivos -indesejáveis, des­ lhores,. em têrmos dos fatores da situação, e im­
necessários ou demasiado caros; e no nível da ge­ pessoais. Os pesquisadores para fins de planeja­
rência, quando se estabelece um fluxo de traba­ mento podem assumir a atitude de que terão cum­
lho preciso e contínuo, no qual cada ato porme­ prido a sua tarefa desde que hajam estabelecido
norizado é em si mesmo, o mais econômico e pre­ . os padrões, em termos dos fatores da situação;
ciso possível, e no qual cada ato tomado isolada­ mas cedo descobrirão que uma situação dinâmica
mente se relaciona adequadamente com os de­ muda constantemente, e que precisarão acompa­
mais. n h a r as circunstância-, as quais tornam obrigató­
8. Finalmente, o planejamento deve prover ria a modificação dos padrões estabelecidos e fi­
os meios de mensuração das operações e publica­ xação de novos. Mas, uma vez estabelecidos os
ção c/os resultados — unidade pcir unidade, seção padrões, terão efetivamente cumprido sua tarefa,
por seção. T al contrôlé da execução é de grande no sentido de que a execução em si mesma não
importância por dois motivos. Primeiro, porque lhes diz respeito.
indica os pontos onde ocorrem as incompreensões ' Contudo, há uma parte da função de planejar
e assim proporciona à gerência a oportunidade de que ativamente se liga à execução, que de fato
corrigí-las antes que hajam atingido sèriamente a funcionalmente a recobre, embora no vulgar se
qualidade e o volume do trabalho. Segundo, por­
admita uma nítida distinção entre elas.’ Por exem­
que serve de estímulo à excelência qualitativa e
plo, as encomendas feitas a uma emprêsa indus­
quantitativa. A publicidade dos resultados da
trial (as quais, como documentos provocadores
execução, por meio de análises diárias da produ­
de ação, guardam analogia com os memoranda,
ção e documentos similares, desperta um dos mais
ofícios e outros documentos, num órgão da admi­
fortes impulsos humanos — o orgulho da realiza­
nistração pública) primeiro são encaminhadas à
ção. Na administração planejada, se os padrões
divisão de planejamento, de onde se transmitem
estabelecidos forem razoáveis e justos, e as me­
aos funcionários incumbidos da execução. De
didas objetivas, ver-se-á que o orgulho individual
acôrdo com o sistema de administração científica
de realização tomará o lugar da velha técnica de
(scientific management) os chefes de seção da
pressão dos capatazes, constituída de palavras cor­
divisão de planejamento classificam-se em cate­
tantes e gestos ameaçadores.
goria equivalente à dos capatazes, pois se situam
acima dos operários e no mesmo nível dos capa­
PLANEJAM ENTO E EXECUÇÃO
tazes de fato em serviço nas oficinas.
Admitimos que, por vezes, ao discutir o plane­ A função de planejar tem necessidade de assu­
jamento como lima função da administração e da mir êsse aspecto executivo pelo fato de as solici-
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tações à emprêsa se sujeitarem a muitas variá­ à sua capacidade de identificar e adotar os bons
veis, ao passo que o fluxo do trabalho e as opera­ planos, capazes de promover economias.
ções precisam variar o menos possível. A parte A solução conveniente, todavia, é organizar a
controladora da função de planejar continua sen­ função planejadora de modo que ao setor de pes­
do uma câmara de analisar e sincronizar, à qual quisas toquem exclusivamente as atribuições de
afluem encomendas ou documentos para o fim de pesquisas e padronização, entendendo-se, entre­
serem examinados, separados em grupos homo­ tanto, que o setor de controle constituirá o comêço
gêneos e transmitidos aos executores. Vejamos da execução — será a câmara na qual a variabili­
um exernplo muitíssimo simples : se os pedidos dade se- converterá em relativa estabilidade, para
de roupas feitas fôssem sendo diretamente enca­ fins de execução.
minhados à sala de corte, esta seção seria esma­
gada peía variedade e se transformaria numa PLANEJA M ENTO EM ÓRGÃOS PÚBLICOS
indústria do tipo “fabricação sob encomendas”
( johhing business) . Mas se todos os pedidos pas­ Começa-se a reconhecer que a introdução dc.
planejamento nos negócios públicos é uma neces­
sarem antes pela divisão de planejamento, pode­
sidade. Foi possível arranjarmo-nos sem êle du­
rão aí ser analisados e grupados, de maneira a
rante o período do pioneirismo, em que, com uma
possibilitar a transmissão de instruções à sala de
população dispersa e relações sociais ê institucio­
corte para cortar em lotes, de cem ou mais, ter­
nais relativamente simples, dispúnhamos de tre­
nos do mesmo estilo e tam anho. Ter-se-á anali­
menda reserva de recursos naturais e de uma ren­
sado e sintetizado a variabilidade, e a execução .
da nacional capaz de suportar qualquer desper­
começará sob a égide da função planejadora.
dício. Mas hoje somos 130.000.000 de ameri­
De fato, nunca pudemos encontrar planejamen­ canos; nossas relações e instituições se complica­
to eficiente onde se tomou ao pé da lçtra a reco­ ram; da divisão do trabalho e da especialização
mendação de separar-se o planejamento da exe­ resultaram equilíbrios delicados e instáveis; o ca­
cução, isto é, onde a gerência conferiu aos plane­ pital social disponível, constituído de recursos
jadores autoridade apenas para apresentar suges­ inexploradores, desapareceu; e posto que a renda
tões, deixando aos órgãos executores a faculdade nacional esteja em ascensão, mais rapidamente
de aceitá-las ou n ã o . J á vimos situações aparen­ • ainda ascendem os custos do govêrno. Temos
temente idêntica à descrita e em que, sem em­ agora de atentar para a relação entre o custo dos
bargo, havia planejamento eficiente. Mas trata­ serviços públicos e a renda nacional, e assim cum­
va-se apenas de aparências. Na realidade, o que pre-nos considerar não somente o aumento poten­
então se verificava era a confluência do planeja­ cial da renda, mas também o decréscimo poten­
mento e da execução na autoridade final de uma" cial dos custos do govêrno. A redução dos custos
só pessoa, a qual, dêsse modo, ficava apta a de­ do govêrno só se pode conseguir pelo planejamen­
term inar a observância dos planos pelos serviços to; pelo planejamento político, que seleciona, re­
executivos. Em tais circunstâncias o planejamen­ laciona e atribui prioridades aos objetivos, que
to eficiente costuma subsistir, pois a autoridade promove a realização das atividades executivas
final ou promove a substituição dos planejadores com o máximo de precisão e o mínimo de despe­
deficientes ou determina o cumprimento dos pla­ sa. Importa muito essa distinção entre planeja­
nos, se os julga satisfatórios; pois é claro que ne­ mento político ou governamental e planejamento
nhuma emprêsa gastará inconseqüentemente di­ administrativo. Há, realmente, extrema necessi­
nheiro com órgãos de planejamento, sem intenção dade de um plano geral de govêrno, que se refira
de aprcveitar-lhes as sugestões acertadas. Na ao govêrno federal como um todo e a cada estado-
aparência, portanto, pode-se encontrar planeja­ membro como parte do sistema federal. Igual­
mento eficiente em emprêsas nas quais aos órgãos mente, torna-se necessário um plano geral de ação,
planejadores se defere mero poder de apresentar de programas, para cada um dos órgãos federais
sugestões; mas quando isso se verifica, a realidade e estaduais mais importantes. E ’ preciso ainda
subjacente é que os funcionários executivos já instituir-se o planejamento minucioso do funcio­
foram prevenidos, por vêzes tàcitamente, de que namento de cada órgão do serviço federal e dos
sua permanência no emprego estará condicionada estados. E por fim, deverão coordenar-se natural­
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mente todos êsses planos, superpondo-se os pro­ cracia, desde, porém, que a democracia não espe­
gramas, articulando-se as organizações, ligando-se re, complacentemente, por muito tem po. Nossa
os diversos setores, à imagem de um jôgo orienta! sociedade está-se tornando tão complexa que a
de caixas precisamente contidas umas nas outras. manutenção do individualismo não planejado ser-
Ihe-á fatal. E mesmo talvez não baste a institui­
O planejamento é um fator vital de governo
ção de um planejamento superficial. E ’ possível
e administração. Se os objetivos forem avaliados
conciliar planejamento e democracia, mas não
e relacionados, se todos os programas se comple­
cremos que a democracia possa sobreviver se per­
tarem coerentemente, se o plano de operações de
manecermos na confusão e na instabilidade eco
cada órgão e de cada uma de suas sub-unidades
nômicas. Entrç a estabilidade do totalitarism o e
fôr convenientemente projetado — então coorde­
a instabilidade sob qualquer sistema político, o
nação e economia se tornarão pràticamente auto­
povo escolherá a prim eira. As contingências do
máticas . momento desafiam-nos, pois, a demonstrar às de­
Estamos convencidos de que o planejamento mocracias o valor do planejamento e a ensinar-
será um dos fatores vitais da salvação da demo­ lhes a técnica de planejar.

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