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2020

© Todos os direitos autorais desta obra são reservados e protegidos à Editora Sanar Ltda. pela Lei
nº 9.610, de 19 de Fevereiro de 1998. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume ou
qualquer parte deste livro, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios
(eletrônico, gravação, fotocópia ou outros), essas proibições aplicam-se também à editoração da obra,
bem como às suas características gráficas, sem permissão expressa da Editora.
Título: Manual de Clínica Médica 2ª Edição
Editor: Guilherme Melo
Revisão ortográfica: Thaís Nacif
Diagramação: GALLETI | Marketing 360 Graus
Capa: Mateus Machado
Conselho Editorial: Caio Vinicius Menezes Nunes, Paulo Costa Lima, Sandra de Quadros Uzêda,
Sheila de Quadros Uzêda e Silvio José Albergaria da Silva
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo-SP)
F475m Figueiredo, Estevão Tavares (org.).
Manual de Clínica Médica / Organizador: Estevão Tavares Figueiredo. - 2. ed. - Salvador, BA :
Editora Sanar, 2020. 1216 p.; 16x23 cm.

ISBN 978-65-87930-40-4

1. Clínica. 2. Manual. 3. Médica 4. Medicina. I. Título. II. Assunto. III. Figueiredo, Estevão
Tavares.
CDD: 617
CDU: 616

ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO


1. Medicina: diversos campos da Medicina - Clínicas.
2. Medicina clínica.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
FREIRE, Thayná Araújo (coord.) et al. Manual de Semiologia Médica. 1. ed. Salvador: Editora
Sanar, 2020.

Ficha Catalográfica: Pedro Anizio Gomes - CRB-8 8846


Editora Sanar Ltda.
Rua Alceu Amoroso Lima, 172
Caminho das Árvores
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CEP: 41820-770 – Salvador/BA
Telefone: 0800 337 6262
sanarsaude.com
atendimento@sanar.com
Sumário

Módulo 1 - Cardiologia
1.1 Eletrocardiograma

1.2 Hipertensão Arterial Sistêmica

1.3 Dislipidemias
1.4 Síndromes Coronarianas Agudas

1.5 Insuficiência Cardíaca Crônica


1.6 Insuficiência Cardíaca Descompensada

1.7 Taquiarritmias

1.8 Bradiarritmias

1.9 Parada Cardiorrespiratória e Ressuscitação

1.10 Febre Reumática

1.11 Anticoagulantes

Módulo 2 - Endocrinologia
2.1 Cetoacidose Diabética

2.2 Estado Hiperglicêmico Hiperosmolar

2.3 Insuficiência Adrenal Aguda


2.4 Crise Tireotóxica
2.5 Coma Mixedematoso

2.6 Corticoides - Doses e Equivalências

2.7 Controle Glicêmico Intra - Hospitalar

Módulo 3 - Gastroenterologia
3.1 Ascite
3.2 Abdome Agudo

3.3 Diarreia Aguda

3.4 Doença Calculosa das Vias Biliares

3.5 Hepatite Aguda e Insuficiência Hepática Fulminante

3.6 Pancreatite Aguda

3.7 Encefalopatia Hepática


3.8 Hemorragia Digestiva Alta

3.9 Hemorragia Digestiva Baixa

Módulo 4 - Infectologia
4.1 Dengue

4.2 Tuberculose
4.3 HIV / AIDS
4.4 Influenza
4.5 Endocardite Infecciosa
4.6 Leptospirose
4.7 Leishmaniose Tegumentar Americana

4.8 Leishmaniose Visceral


4.9 Meningite

4.10 Hanseníase
4.11 Rotina após Exposição Ocupacional com Material Biológico
4.12 Acidentes por Animais Peçonhentos

4.13 COVID-19

Módulo 5 - Nefrologia
5.1 Cólica Nefrética

5.2 Injúria Renal Aguda


5.3 Distúrbio de Água e Sódio

5.4 Distúrbios do Metabolismo do Potássio


5.5 Distúrbio do Metabolismo do Cálcio
5.6 Interpretação da Gasometria Arterial e Distúrbios Ácidos Básicos

5.7 Síndrome Nefrótica


5.8 Síndrome Nefrítica

Módulo 6 - Pneumologia
6.1 Exacerbação de Asma
6.2 Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC)
6.3 Tromboembolia Pulmonar Aguda

6.4 Derrame Pleural


6.5 Pneumonia Adquirida na Comunidade
6.6 Pneumonia Nosocomial

6.7 Insuficiência Respiratória Aguda

6.8 Ventilação Mecânica

Módulo 7 - Reumatologia
7.1 Lúpus Eritematosos Sistêmico (LES)

7.2 Síndrome Antifosfolípide (SAF)


7.3 Artrite Reumatoide

7.4 Artrites Agudas

7.5 Gota
7.6 Osteoporose

7.7 Fibromialgia

Módulo 8 - Neurocirurgia / Neurologia

8.1 Traumatismo Cranioencefálico

8.2 Traumatismo Raquimedular


8.3 Hidrocefalia
8.4 Cefaleias

8.5 Doenças Vasculares Cerebrais


8.6 Síndromes Epiléticas

8.7 Malformações na Infância

8.8 Síndromes Infecciosas do SNC


8.9 Sedação e Analgesia

8.10 Coma

8.11 Delirium

8.12 Encefalopatia Metabólica


8.13 Síndromes Degenerativas

8.14 Síndromes Demenciais

8.15 Morte Encefálica

Módulo 9 - Hematologia
9.1 Investigação Inicial das Anemias

9.2 Anemia Ferropriva


9.3 Anemia da Inflamação

9.4 Anemia Megaloblástica

9.5 Anemias Hemolíticas


9.6 Anemia Falciforme

9.7 Neutropenia Febril

9.8 Indicações e Reações Transfusionais


Módulo 10 - Psiquiatria
10.1 Surto Psicótico

10.2 Risco de Suicídio

10.3 Ataques de Pânico

Módulo 11 - Oftalmologia

11.1 Ceratites
11.2 Celulite Pré-septal e Pós-septal

11.3 Conjuntivites

11.4 Edema Palpebral


11.5 Glaucoma Agudo

11.6 Hérpes Zóster Oftálmico


11.7 Hordéolo e Calázio

11.8 Trauma de Órbita


APRESENTAÇÃO

Quando interferimos na vida de quem nos procura como médicos, precisamos de ações
fundamentadas no que há de melhor e mais ético para a realização da beneficência – não
maleficência –, justiça e respeito à autonomia. Quem nos procura chega vulnerável, inocente,
esperando de nós o mínimo de respeito, retidão e eficácia. Precisamos, além do atendimento
humanizado e individualizado, pautar nossas decisões no que há de mais robusto na literatura médica
para que todos sejam tratados correta e igualitariamente.
Em tempos obscuros nos quais a ciência é questionada, menosprezada e refutada por opiniões
rasas e sem fundamentações, temos o dever, como médicos e cidadãos, de propagar o conhecimento
advindo de randomizações e comprovações científicas. Esse é um dos objetivos do nosso livro,
embora todo ele tenha sido feito para que o paciente seja beneficiado.
O Estevão acreditou na perpetuação do projeto – bem como a Sanar – e todos nós o
desenvolvemos com muita responsabilidade e seriedade para que todos tenham acesso à medicina
baseada em evidências. Com este livro, pretendemos pulverizar conhecimentos de qualidade,
minimizando barreiras e embasando condutas para que a boa prática médica beneficie a todos, sem
distinção.
O livro aborda temas pertinentes e rotineiros na prática clínica de graduandos e médicos
generalistas, e convida os colegas a se manterem preparados e atualizados, consolidando sempre a
qualidade e a empatia nos atendimentos.
Vamos em frente, juntos!

Iara Baldim Rabelo - Editora


Autores Coordenadores
Estevão Tavares de Figueiredo
Editor Chefe
Doutorando em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo (USP). Títulos de Especialista em Cardiologia e Ecocardiografia pela SBC e AMB. Título
de Especialista em Clínica Médica pela SBCM e AMB. Graduado em Medicina pela Universidade
José do Rosário Vellano (UNIFENAS). Professor de Semiologia e Clínica Médica do Curso de
Medicina da Fundação Educacional de Penápolis (FUNEPE).

Débora Gonçalves da Silva


Editora
Médica Endocrinologista e Clínica Médica. Especialista pela SBEM. Residência em Clínica Médica
pelo Hospital João XXIII e Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Belo Horizonte. Mestre
e Doutoranda em Ciências da Saúde – Universidade de Brasília. Graduada em Medicina pela
Faculdade de Medicina de Barbacena. Professora do Departamento de Clínica Médica e
coordenadora do Ambulatório de Endocrinologia do Hospital Ensino Centro Univeristário
UniAtenas.

Felipe Marques da Costa


Editor
Pneumologista pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Doutorando em
Doenças Pulmonares Intersticiais pela Disciplina de Pneumologia da FMUSP. Líder da equipe de
Pneumologia do Hospital Beneficiência Portuguesa de São Paulo.

Gabrielly Borges Machado


Editora
Médica Infectologista pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Graduada em
Medicina pela Universidade de Uberaba. Especialização em Dermatologia clínica. Docente de
Clínica médica e Infectologia do Centro Universitário Atenas (UniAtenas). Preceptora do
ambulatório de Infectologia do Hospital Universitário Atenas. Preceptora da residência de Clínica
médica do Centro Universitário Atenas. Atua no Controle de Infecção Hospitalar e em centro de
referência em Doenças Infecciosas e Parasitárias, com ênfase em endemias, HIV/AIDS,
leishmanioses, tuberculose e hanseníase.

Iara Baldim Rabelo


Editora
Médica hematologista, professora da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL) e da Universidade
José do Rosário Vellano (UNIFENAS), em Alfenas-MG. Doutora em Medicina (Hematologia) pela
UNIFESP/EPM.

Jean Bryally Peres


Editor
Médico Cardiologista do CTI Geral e da UCO / Pós-operatório de Cirurgias Cardíacas do Hospital do
Coração de Poços de Caldas - MG (Hospital Santa Lúcia). Preceptor de Clínica Médica da
Residência - MEC do Hospital do Coração de Poços de Caldas - MG. Médico do CTI e Coordenador
do Setor de Urgências e Emergências do Hospital Santa Casa de Poços de Caldas - MG. Título de
Especialista em Cardiologia pela SBC e AMB. Graduado em Medicina pela Universidade José do
Rosário Vellano (UNIFENAS).

Lenita Adriana Mazzi Gaino


Autora
Graduada em Medicina pela PUC-SP; residência de Clínica Médica pelo Hospital do Servidor
Público Municipal de São Paulo; residência de Reumatologia pelo Hospital Heliópolis e título de
especialista em Reumatologia pela Sociedade Brasileira de Reumatologia.

Lívia de Almeida Costa


Editora
Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Residência em Clínica Médica
pela Santa Casa de Belo Horizonte. Gastroenterologista e Endoscopista pela Universidade Federal de
São Paulo. Título de Especialista em Gastroenterologia pela FBG. Título de especialista em
endoscopia digestiva pela SOBED. Mestre e doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal
de São Paulo. Doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal de São Paulo. Médica
gastroenterologista e preceptora da residência de Gastroenterologia da UFJF. Professora na pós-
graduação de Gastroenterologia do IPEMED.

Milena Tenório Cerezoli


Editora
Pneumologista pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-
Unifesp). Doutoranda em Doenças Pulmonares Intersticiais pela Disciplina de Pneumologia EPM-
Unifesp. Assistente da Unidade de Terapia Intensiva da Pneumologia da EPM-Unifesp.

Nícollas Nunes Rabelo


Editor
Graduado pelo Centro Universitário de Medicina UniAtenas, Paracatu-MG. Pós-Graduado em
Neurointensivismo pelo Hospital Sírio Libanês - SP. Subespecialista (Fellowship). Pesquisador
adjunto e Doutorando Neurologia - FMUSP. Pesquisador Adjunto do Departamento de Neurologia
FMUSP e Membro titular discente da comissão de Pós Graduação de Neurologia - FMUSP.
Aperfeiçoamento em Neurocirurgia em Tübingen, Hannover e Dresden na Alemanha. Neurocirurgião
pelo Hospital Santa Casa de Passos-MG. Professor do Centro Universitário UniAtenas. Gestor de
pesquisa e publicações da Brain4Care e membro Titular da SBN, ABNC, AANS, CNS.

Robson Eugênio da Silva


Editor
Mestre em Biociências aplicadas à saúde pela Universidade Federal de Alfenas. Médico Nefrologista
do Hospital Universitário Alzira Velano. Professor de Clínica Médica na Universidade José do
Rosário Vellano (UNIFENAS). Professor de Clínica Médica, Semiologia Médica e Nefrologia na
Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL). Graduado em Medicina pela Universidade José do
Rosário Vellano.
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes
Editora
Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Ceará. Residência em Clínica Médica pela
Universidade Federal do Ceará. Residência em Gastroenterologia pela Universidade Federal de São
Paulo. Residência em Endoscopia Digestiva pela Universidade Federal de São Paulo. Título de
Especialista em Gastroenterologia da Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG). Título de
Especialista em Endoscopia Digestiva da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED).
Mestrado em Gastroenterologia pela Universidade Federal de São Paulo.

Valéria Garcia Caputo


Editora
Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA). Residência Médica em
Psiquiatria pela FAMEMA. Título de especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Doutorado em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Docente e
Chefe da Disciplina de Psiquiatria da FAMEMA.

Victor Ferreira Schuwartz Tannus


Editor
Graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina de Teresópolis - RJ. Especialização em
Oftalmologia pela Fundação Hilton Rocha (BH-MG). Título de especialista em Oftalmologia pelo
Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Fellow de Retina pela Fundação Hilton Rocha e Fellow de
Uveíte pelo Hospital São Geraldo
- UFMG. Professor do Departamento de Oftalmologia da F.A.M.E.S.C. Bom Jesus do Itabapoana-RJ.
Membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia e da Sociedade Brasileira de Uveite.

Autores - Módulo 1 - Cardiologia


Andressa Mayumi Matucuma
Autora
Médica graduada pelo Centro Universitário Atenas - UniAtenas.

Bianca Tavares de Figueiredo


Autora
Acadêmica do curso de Medicina da Universidade José do Rosário Vellano (UNIFENAS).

Carlos Eduardo Lins Franca Piau


Autor
Formado Medicina em 2017 pela Uniatenas. Especialista em Clínica Médica pelo Hospital Estadual
de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (HUGOL). Residente de Cardiologia pelo
Hospital Geral de Goiânia (Alberto Rassi).

Carolina Limongi de Oliveira


Autora
Médica, Residente de Cirurgia Cardiovascular do Hospital Santa Casa de Curitiba - PR.
Estevão Tavares de Figueiredo
Editor
Doutorando em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo (USP). Títulos de Especialista em Cardiologia e Ecocardiografia pela SBC e AMB. Título
de Especialista em Clínica Médica pela SBCM e AMB. Graduado em Medicina pela Universidade
José do Rosário Vellano (UNIFENAS). Professor de Semiologia e Clínica Médica do Curso de
Medicina da Fundação Educacional de Penápolis (FUNEPE).

Jade Rodrigues Lino de Oliveira


Autora
Graduação em medicina pelo UniAtenas - 2019.

Jean Bryally Peres


Editor
Médico Cardiologista do CTI Geral e da UCO / Pós-operatório de Cirurgias Cardíacas do Hospital do
Coração de Poços de Caldas-MG (Hospital Santa Lúcia). Preceptor de Clínica Médica da Residência
- MEC do Hospital do Coração de Poços de Caldas-MG. Médico do CTI e Coordenador do Setor de
Urgência e Emergência do Hospital Santa Casa de Poços de Caldas-MG. Título de Especialista em
Cardiologia pela SBC e AMB. Médico Graduado pela FCM da Unifenas, Alfenas-MG.

José Tasca
Autor
Coordenador do Centro de Terapia Intensiva do Hospital do Coração de Poços de Caldas (Hospital
Santa Lúcia) e Santa Casa de Misericórdia de Poços de Caldas. Título de Especialista em Cardiologia
pela SBC. Título de Especialista em Medicina Intensiva pela AMIB. Título de Especialista em
Endocrinologia e Metabologia pela SBEM. Preceptor da Residência de Cardiologia do Hospital do
Coração de Poços de Caldas. Professor da Faculdade de Medicina da PUC - Poços de Caldas.

Leonardo Jordan Hansen Vizzotto


Autor
Interno do curso de Medicina da Universidade de Marília.

Lucas Campos Barbosa e Silva


Autor
Graduando em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (FM-
UFMG). Integrante do grupo de pesquisa Valvuloplastia Mitral Percutânea na Estenose Mitral
Reumática.

Marcelo Zanini de Oliveira e Silva


Autor
Graduado em Biomedicina pela PUC-GO, pós-graduado em Ciências Ambientais e Saúde pela PUC-
GO, graduado em medicina pela UNICEPLAC, residência em clínica médica pela Unievangélica
(Hospital Evangélico Goiano), residente de cardiologia no Hospital Alberto Rassi (HGG).

Maria Cecília Landim Nassif


Autora
Graduanda em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (FM-
UFMG). Integrante do grupo de pesquisa Valvuloplastia Mitral Percutânea na Estenose Mitral
Reumática.

Maria do Carmo Pereira Nunes


Autora
Professora Associada IV do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Minas Gerais e Coordenadora do Setor de Ecocardiografia do Hospital das
Clínicas da UFMG (HC-UFMG).

Nader Alziro Kassem Fares


Autor
Formado em Medicina pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Residente de Clínica Médica
do Hospital Geral de Goiânia.

Rafael Pereira Marinho


Autor
Graduação em Universidade José do Rosário Vellano, Medicina.

Valéria Vieira da Silva Gomes


Autora
Médica. Residente de Cardiologia do Hospital Estadual Geral de Goiania Dr Alberto Rassi .

Vitória de Cássia da Silva Moreira


Autora
Graduada em Medicina pela Universidade José do Rosário Vellano (Unifenas).. Pós-graduada em
Psiquiatria pelo Instituto Superior de Medicina, Campus São Paulo. Cursando Residência de Clínica
Médica do Hospital do Coração de Poços de Caldas-MG. Médica da UTI e do Setor de Urgência e
Emergência do Hospital do Coração de Poços de Caldas-MG. Médica do Setor de Urgência e
Emergência do Hospital Santa Casa de Poços de Caldas-MG.

Autores - Módulo 2 - Endocrinologia


Beatriz Francisco Barbosa Rodrigues
Autora
Graduanda de medicina no Centro Universitário Atenas - UNIATENAS. Diretora científica da liga
Acadêmica de Endocrinologia e Metabologia - 2017. Presidente da liga Acadêmica de
Endocrinologia e Metabologia - 2018.

DÉBORA GONÇALVES DA SILVA


Editora
Médica Endocrinologista e Clínica Médica. Especialista pela SBEM. Residência em Clínica Médica
pelo Hospital João XXIII e Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Belo Horizonte. Mestre
e Doutoranda em Ciências da Saúde – Universidade de Brasília. Graduada em Medicina pela
Faculdade de Medicina de Barbacena. Professora do Departamento de Clínica Médica e
coordenadora do Ambulatório de Endocrinologia do Hospital Ensino Centro Univeristário
UniAtenas.

Autores - Módulo 3 - Gastroenterologia


Drielly Morais Sá Ferreira
Autora
Médica pela Fundação Educacional Serra dos Órgãos - UNIFESO. Especialista em Clínica Médica
pelo Hospital Universitário da Universidade de Juiz de Fora. Residente de Gastroenterologia no
Hospital Universitário da Universidade de Juiz de Fora.

Elaine Jéssica Laranjeira Lima


Autora
Médica pelas Faculdades Unidas do Norte de Minas - FUNORTE. Especialista em Clínica Médica
pelo Hospital Regional de Barbacena Dr. José Américo. Residente em Gastroenterologia no Hospital
Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF.

Edivan Fernandes Frota Filho


Autor
Graduação em Medicina pelo Centro Universitário FIPMoc - UNIFIPMoc. Residência em Clínica
Médica pela Santa Casa de Montes Claros. Residente de Gastroenterologia pela Universidade Federal
de Juiz de Fora.

Fernanda Ramos da Costa


Autora
Médica pela Universidade Presidente Antônio Carlos - Juiz de Fora. Residente Gastroenterologia-
Hospital Universitário de Juiz de Fora.

Gabriel Gonçalves Lopes


Autor
Médico pela Universidade Federal de Viçosa – UFV. Especialista em Clínica Médica pelo Hospital e
Maternidade Therezinha de Jesus – HMTJ, em Juiz de Fora. Residente em Hepatologia no Hospital
Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF.

Gabriela Castro de Rezende


Autora
Médica pela Universidade Federal de Juiz de Fora, clínica médica pelo Instituto de Previdência dos
Servidores do Estado de Minas Gerais - Ipsemg, residente de gastroenterologia pelo HU UFJF.

Isaac Nilton Fernandes Oliveira


Autor
Graduado em Medicina pela Universidade Presidente Antônio Carlos de Juiz de Fora, MG.
Residência em Clínica Médica pela Associação Beneficente Católica - Hospital Santa Isabel, Ubá,
MG. Residência em Gastroenterologia pelo Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz
de Fora, MG.

Isadora Brandão Pelucio


Autora
Médica graduada pela Faculdade de Medicina de Barbacena, Minas Gerais. Residência de Clínica
médica pela Santa Casa de Misericórdia de São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais. Residente em
Gastroenterologia pelo Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas
Gerais.

Lívia de Almeida Costa


Editora
Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Residência em Clínica Médica
pela Santa Casa de Belo Horizonte. Gastroenterologista e Endoscopista pela Universidade Federal de
São Paulo. Título de Especialista em Gastroenterologia pela FBG. Título de especialista em
endoscopia digestiva pela SOBED. Mestre e doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal
de São Paulo. Doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal de São Paulo. Médica
gastroenterologista e preceptora da residência de Gastroenterologia da UFJF. Professora na pós-
graduação de Gastroenterologia do IPEMED.

Marcella Motta Lucindo Duarte


Autora
Médica pela Universidade Federal de São João Del-Rei. Especialista em Clínica Médica pelo
Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Residente em
Gastroenterologia no Hospital Universitário da UFJF.

Sandyelle da Silva Rocha


Autora
Médica pela Faculdade de Medicina de Campos - FMC. Especialista em Clínica Médica pelo
Hospital Escola Alvaro Alvim - HEAA, em Campos dos Goytacazes - RJ. Residente em Hepatologia
no Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF.

Tárcia Nogueira Ferreira Gomes


Editora
Gastroenterologista e endoscopista, formada pela Universidade Federal de São Paulo (residências de
Gastroenterologia e Endoscopia Digestiva) e Universidade Federal do Ceará (residência de clínica
médica e graduação em Medicina). Títulos de especialista em Gastroenterologia (FBG) e Endoscopia
Digestiva (SOBED). Mestrado em Gastroenterologia pela Universidade Federal de São Paulo.
Membro titular do Grupo de Estudos em Doenças Inflamatórias Intestinais do Brasil (GEDIIB).

Autores - Módulo 4 - Infectologia


Ana Luiza Santos Pereira
Autora
Médica pelo Centro Universitário Atenas – Uniatenas, Paracatu- MG. Residente de Clínica Médica
pela Uniatenas.

Gabrielly Borges Machado


Editora
Médica Infectologista pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Graduada em
Medicina pela Universidade de Uberaba. Especialização em Dermatologia clínica. Docente de
Clínica médica e Infectologia do Centro Universitário Atenas (UniAtenas). Preceptora do
ambulatório de Infectologia do Hospital Universitário Atenas. Preceptora da residência de Clínica
médica do Centro Universitário Atenas. Atua no Controle de Infecção Hospitalar e em centro de
referência em Doenças Infecciosas e Parasitárias, com ênfase em endemias, HIV/AIDS,
leishmanioses, tuberculose e hanseníase.

Isabela Rodrigues de Oliveira


Autora
Médica pelo Centro Universitário Atenas – Uniatenas, Paracatu- MG. Residente de Clínica Médica
pela Uniatenas.

Isaias Nery Ferreira


Autor
Enfermeiro da Funasa / MS. Professor da Faculdade Tecsoma. Pesquisador associado do núcleo
CEAM/NESPRON – UnB – DF. Duas Especializações em Saúde Pública pela PUC-MG e UFMG.
Mestrado e Doutorado em Ciências da Saúde / Hanseníase. Pós-Doutorado em Promoção da Saúde -
Hanseníase - pela CEAM-NESPROM/ UnB-DF.

Luciana de Almeida Silva Teixeira


Autora
Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Uberlândia (1997), mestrado em Medicina
Tropical e Infectologia pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (2002) e doutorado em
Medicina Tropical e Infectologia pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (2007).
Especialista em Educação para Profissões da Saúde pelo Instituto Regional FAIMER Brasil (2013).
Atualmente é professor associado da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, atua no Programa
de Pós-graduação em Medicina Tropical e Infectologia e é Coordenadora do Curso de Medicina da
UFTM. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Doenças Infecciosas e Parasitárias,
atuando principalmente nos seguintes temas: diagnóstico de endemias, leishmaniose visceral, dengue,
tuberculose e educação médica.

Rodrigo Juliano Molina


Autor
Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (2001), residência médica
em Infectologia (2005), Mestrado em Medicina Tropical e Infectologia (2008). Atualmente cursa
doutorado em Medicina Tropical e Infectologia na UFTM onde também é Professor Assistente do
Departamento de Clínica Médica da UFTM e Médico Assistente do Hospital de Clínicas da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro atuando como infectologista responsável da Comissão de
Uso e Controle de Antimicrobianos. Atua também como médico infectologista responsável pelo
ambulatório de HIV multi-experimentados e ambulatório de hepatites virais e co-infecções. Membro
do Sub-Comitê de Resistência em AIDS da Sociedade Brasileira de Infectologia. Membro da Câmara
Técnica Autorizadora de Liberação de Anti-Retrovirais de Terceira Linha do Estado de Minas Gerais.
Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Doenças Infecciosas e Parasitárias, atuando
principalmente nos seguintes temas: AIDS, Resistência a Anti-retrovirais, Hepatites Virais, Co-
infecção HIV/hepatites virais, Infecção Hospitalar e Uso Racional de Antimicrobianos.

Autores - Módulo 5 - Nefrologia


Anna Luiza Souza
Autora
Médico formado pela Unifenas residente de Clínica Médica

Felipe Silva de Oliveira


Autor
Graduado em medicina pela universidade José do Rosário Vellano UNIFENAS campus Alfenas MG
em 2019. Cursando residência em clínica médica no Hospital Universitário Alzira Velano HUAV
Alfenas MG início em 2020.

Lucas Augusto Cecilio Chagas da Silva


Autor
Graduação: Universidade José do Rosário Vellano - Alfenas, MG - 2013/2018. Residência em
Clínica Médica: Hospital Universitário Alzira Vellano 2020/2022.

Lucas Horta de Pádua da Silva


Autor
Médico formado pela UNIFENAS e residente de clínica médica no HUAV (Alfenas-MG).

Patricia Vas Tostes Mendes


Autora
Graduação: Faculdade de Medicina de Itajubá - 2012/2017. Residência em Clínica Médica: Hospital
Universitário Alzira Velano - 2019/202. Pós-Graduanda em Medicina de Urgência e Emergência:
Hospital Israelita Albert Einstein - 2020/2021.

Robson Eugênio da Silva


Editor
Graduado em Medicina pela Universidade José do Rosário Velano (UNIFENAS- MG), Residência
Médica em Clínica Médica e Nefrologia no hospital Universitário Alzira Velano, Mestre em
Biociências Aplicadas a saúde pela Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL- MG). Professor de
Terapêutica Clínica, Semiologia Médica, Clínica Médica e Nefrologia nas universidades UNIFENAS
e UNIFAL. Preceptor das residências médicas de Clínica Médica e Nefrologia no hospital
Universitário Alzira Velano.

Rodolfo Pereira Espíndola


Autor
Acadêmico de medicina da Universidade José do Rosário Vellano cursando 6° ano
Autores - Módulo 6 - Pneumologia
Ana Carolina Lima Resende
Autora
Pneumologista pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-
Unifesp). Doutoranda em Doenças Pulmonares Intersticiais pela Disciplina de Pneumologia da EPM-
Unifesp. Especialista em cuidados paliativos pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Sírio Libanês.

André Bezerra Botelho


Autor
Residência em pneumologia pela EPM-UNIFESP, especialização em broncoscopia pela EPM-
UNIFESP, doutorado em pneumologia pela EPM-UNIFESP. Professor do curso de medicina da
Faculdade Santo Agostinho e preceptor da residência de clínica médica do Hospital Geral de Vitória
da Conquista-BA,

Camila Melo de Oliveira Costa


Autora
Pneumologista e Doutora pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo -
EPM-Unifesp, Pneumologista na Universidade Federal de Campina Grande - UFCG.

Felipe Marques da Costa


Editor
Pneumologista pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Doutorando em
Doenças Pulmonares Intersticiais pela Disciplina de Pneumologia da FMUSP. Líder da equipe de
Pneumologia do Hospital Beneficiência Portuguesa de São Paulo.

Fernanda Maria Machado Nogueira Acerbi


Autora
Graduação em Medicina pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Residência em Clínica
Médica pelo Hospital Municipal Carmino Caricchio (HMCC Tatuapé). Pneumologista pela Escola
Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP). Título de especialista
em Pneumologia pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.

Gustavo Frazatto Medeiros de Miranda


Autor
Graduação em Medicina e residência em Clínica Médica pela Universidade Estadual de Londrina-
UEL. Pneumologista pela Universidade Federal de São Paulo-UNIFESP/EPM, com título pela
Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia-SBPT. Doutorando em Doenças Pulmonares
Intersticiais pela UNIFESP/EPM.

Milena Tenório Cerezoli


Editora
Pneumologista pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-
Unifesp). Doutoranda em Doenças Pulmonares Intersticiais pela Disciplina de Pneumologia EPM-
Unifesp. Assistente da Unidade de Terapia Intensiva da Pneumologia da EPM-Unifesp.

Rafaela Boaventura Martins


Autora
Graduada em Medicina pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública - BA (2010), residência de
Clínica Médica no Hospital anto Antônio - BA, Residência em Pneumologia pela Unifesp - SP,
Especialização em Medicina do Sono pelo Instituto do Sono - SP (2015), Doutora em Pneumologia
pela Unifesp (2020).

Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde


Autor
Residência Médica em Pneumologia pelo Instituto do Coração-HCFMUSP. Residência Médica em
Medicina do Sono pelo HCFMUSP. Médico Preceptor em Clínica Médica e Pneumologia do Centro
Universitário Pessoense (UNIPE). Médico Preceptor do Serviço de Pneumologia do Hospital Geral
Otávio de Freitas/PE. Médico Assistente do Complexo Hospitalar Clementino Fraga-PB. Médico
colaborador do ambulatório de Sono do Serviço de Pneumologia – HULW/UFPB. Presidente da
Associação Brasileira do Sono – Regional PB.

Autores - Módulo 7 - Reumatologia


Lenita Adriana Mazzi Gaino
Editora
Graduada em Medicina pela PUC-SP; residência de Clínica Médica pelo Hospital do Servidor
Público Municipal de São Paulo; residência de Reumatologia pelo Hospital Heliópolis e título de
especialista em Reumatologia pela Sociedade Brasileira de Reumatologia.

Yanne Franca Montino


Autora
Médica reumatologista, professora auxiliar do curso de medicina da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia- jequie. Título de especilista pela sociedade brasileira de reumatologia (SBR) .
Residência de Reumatologia no Hospital Heliópolis-SP . Residência de Clínica Médica pelo Hospital
Universitário Alzira Vellano.

Autores - Módulo 8 - Neurocirurgia e Neurologia


Breno Araújo Barbosa
Autor
Médico pelo Centro Universitário Atenas - UniAtenas. Residência em Neurocirurgia pelo Hospital
Estadual Geral de Goiânia, Dr. Alberto Rassi.

Isadora Dias Moreira


Autora
Médica pelo Centro Universitário Atenas - UniAtenas.
Jonas Silva Paes
Autor
Acadêmico de Medicina da Faculdade Atenas - campus Passos e presidente da Liga Acadêmica de
Neurologia e Neurocirurgia da Faculdade Atenas - campus Passos- MG.

Josué da Silva Brito


Autor
Acadêmico de Medicina do UniAtenas- campus Paracatu.

Leidiane Santos Ribeiro


Autora
Médica pelo Centro Universitário Atenas - UniAtenas. Médica Residente de Clínica Médica - Santa
Casa de Misericórdia Nossa Senhora do Patrocínio.

Mateus Gonçalves de Sena Barbosa


Autor
Acadêmico de medicina da Faculdade Atenas, Passos-MG, estagiário de neurocirurgia no Hospital
Santa Casa Da Misericórdia De Passos, membro da Liga Acadêmica De Urgência E Emergência da
Faculdade Atenas, vice presidente da liga de Neurologia e Neurocirurgia da Faculdade Atenas de
Passos-MG. participante da Iniciação científica e projeto de extensão de diabetes mellitus e depressão
da Faculdade Atenas.

Maycon Cristian Gomes de Paula


Autor
Acadêmico de Medicina da Universidade do Vale do Sapucaí. Presidente da Liga de Gestão e
Inovação em Saúde (2020-2021). Diretor do Encontro de Líderes e Acadêmicos de Medicina (2020).
Diretor científico da Liga de Cirurgia Geral (2019-2020). Vice-presidente da Liga de Neurocirurgia
(2018-2019).

Millena Nogueira Oliveira


Autora
Acadêmica de Medicina da Uniatenas - campus paracatu, membro da Liga Acadêmica de
Ginecologia e Obstetrícia do Uniatenas, membro da Liga Acadêmica de Anestesiologia do Uniatenas,
Ex-secretária da Liga Acadêmica de Endocrinologia e Metabologia do Uniatenas, Organizadora do
Congresso Acadêmico de Medicina e Saúde V do Uniatenas.

Neiffer Nunes Rabelo


Autora
Oftlamologia Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte.

Nicollas Nunes Rabelo


Editor
Graduado pelo Centro Universitário de Medicina UniAtenas, Paracatu-MG. Pós-Graduado em
Neurointensivismo pelo Hospital Sírio Libanês-SP. Subespecialista (Fellowship), Pesquisador
adjunto e Doutorando de Neurocirurgia Vascular e Base de Crânio da FMUSP. Aperfeiçoamento em
Neurocirurgia em Tübingen e Hannover na Alemanha. Professor da Faculdade Atenas-Passos-MG,
consultor em gestão de educação e publicação da Brain4Care. Neurocirurgião Titular pela Sociedade
Brasileira de Neurocirurgia.
Pedro Henrique Silveira Chaves
Autor
Acadêmico de Medicina da UniAtenas- campus Paracatu.

Autores - Módulo 9 - Hematologia


Aline Bonora de Oliveira
Autora
Graduação em Medicina pela Universidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-MG.
Especialização em Medicina de Família e Comunidade pela Universidade Federal de Alfenas –
UNIFAL-MG. Residência em Clínica Médica pelo Hospital Universitário Alzira Velano – Alfenas-
MG. Professora adjunta de Semiologia Médica da PUC Poços de Caldas-MG.

Amanda Lopes de Maia Rodrigues


Autora
Graduanda do curso de Medicina na Universidade do Estado do Pará.

Andressa Peloso Rabelo


Autora
Graduação em Medicina e residência de Clínica Médica pela Universidade José do Rosário Velano –
UNIFENAS-MG. Preceptora e médica do corpo clínico do pronto socorro do Hospital Universitário
Alzira Velano em Alfenas-MG.

Carlos Eduardo Engel Velano


Autor
Médico hematologista e hemoterapeuta pela Universidade de São Paulo - USP-RP. Professor de
Hematologia da Univesidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-MG. Médico do serviço de
Hematologia e Hemoterapia do Hospital Universitário Alzira Velano – Alfenas-MG.

Celso Arrais Rodrigues da Silva


Autor
Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília. Residência de Clínica Médica, Hematologia e
Doutorado pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP/EPM. Pós-doutorado pela
Universidade de Paris VII. Professor adjunto de Hematologia e Coordenador do serviço de
transplante de medula óssea da UNIFESP/EPM. Médico do serviço de Hematologia e transplante do
Centro de Oncologia do Hospital Sírio Libanês em São Paulo-SP.

Cristiano Martins Trindade


Autor
Graduação em Medicina pela Universidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-MG. Residência
de Clínica Médica no Hospital das Clínicas Samuel Libânio em Pouso Alegre-MG. Professor adjunto
da Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG.

Daniel Macêdo do Nascimento


Autor
Graduando do curso de Medicina na Universidade do Estado do Pará.

Daniela Passos Garcia Campos


Autora
Graduação em Medicina pela Universidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-MG. Residente de
Clínica Médica Clínica do Hospital Universitário Alzira Velano – Alfenas-MG.

Eduardo de Sousa Santos


Autor
Graduação em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora-MG.
Residente de Clínica Médica Clínica do Hospital Universitário Alzira Velano – Alfenas-MG.

Fernanda Aparecida Tranches


Autora
Graduação em Medicina e residência de Clínica Médica pela Universidade José do Rosário Velano –
UNIFENAS-MG. Preceptora e médica do corpo clínico da unidade de terapia intensiva e do pronto
socorro do Hospital Universitário Alzira Velano em Alfenas-MG.

Giovana Aparecida Rufino


Autora
Graduanda do curso de Farmácia da Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG.

Hugo Edgar Silva


Autor
Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Residência de Clínica
Médica pela Santa Casa de Passos-MG. Residência de Nefrologia pelo Hospital Universitário Alzira
Velano – Alfenas-MG. Professor adjunto do curso de Medicina da Universidade Federal de Alfenas -
MG.

IARA Baldim Rabelo


Editora
Graduação e residência de Clínica Médica pela Universidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-
MG. Residência de Hematologia e Doutorado pela Universidade Federal de São Paulo –
UNIFESP/EPM. Professora adjunta do curso de Medicina da UNIFENAS e da UNIFAL - MG.

Iracema Esteves
Autora
Especialista em Hematologia e Hemoterapia. Doutora pela UNIFESP/EPM em transplante de
células-tronco hematopoéticas. Médica hematologista do corpo clínico do Hospital Israelita Albert
Einstein e da Beneficência Portuguesa em São Paulo-SP.

Lays Fernandes Mesquita


Autora
Graduação em Medicina e residência de Clínica Médica pela Universidade José do Rosário Velano –
UNIFENAS-MG. Residência de Reumatologia no Hospital do Servidor Público Estadual de São
Paulo-SP. Especialista pela Sociedade Brasileira de Reumatologia. Professora adjunta do curso de
Medicina da Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG.
Martha Mariana Arruda
Autora
Hematologista e Hemoterapeuta pela Escola Paulista de Medicina (EPM/UNIFESP) e Associação
Brasileira de Hematologia e Hemoterapia. Doutorado em Medicina (Hematologia) pela
EPM/UNIFESP. Professora de Clínica Médica e Hematologia do curso de Medicina do Centro
Universitário do Planalto Central (UNICEPLAC) e médica hematologista do Hospital Sírio Libanês
Brasília-DF.

Patrícia Eiko Yamakawa


Autora
Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília. Especialização em Hematologia e
Hemoterapia pela USP-SP. Doutorado em Hematologia pela UNIFESP/EPM.

Patrícia Vas Tostes Mendes


Autora
Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina de Itajubá-MG. Residente de Clínica Médica
Clínica do Hospital Universitário Alzira Velano – Alfenas-MG.

Thiago Xavier Carneiro


Autor
Médico hematologista e hemoterapeuta pela Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.
Doutor em Medicina (Hematologia) pela EPM/UNIFESP. Professor auxiliar de Medicina da
Universidade do Estado do Pará. Chefe do serviço de Hematologia do Hospital Ophir Loyola e
coordenador do programa de residência médica em Hematologia do Hospital Ophir Loyola –
HEMOPA.

Thomaz Almeida Vargas


Autor
Graduação em Medicina pela Universidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-MG. Residente de
Clínica Médica Clínica do Hospital Universitário Alzira Velano – Alfenas-MG.

Yala Maria de Oliveira Figueiredo


Autora
Graduanda do curso de Medicina da Universidade José do Rosário Velano – UNIFENAS-MG.

Autores Módulo 10 - Psiquiatria


Álvaro Tavares de Figueiredo
Autor
Médico formado pela Universidade de Marília (UNIMAR). Residente em Psiquiatria pela Faculdade
de Medicina de Marília (FAMEMA).

Juliane de Souza Cavazzana


Autora
Gradução em medicina na Famema, residência de psiquiatria na Famema.

Renata Paola Parenti Freitas


Autora
Formada em Medicina na Faculdade de Medicina de Jundiaí em 2013. Residência Médica em
Psiquiatria na Faculdade de Medicina de Marilia (FAMEMA) de 2014 a 2017. Formação em
Psicoterapia Psicanalítica entre 2018 e 2019,pelo Núcleo de Psicanálise de Marilia e Região.

Valéria Garcia Caputo


Editora
Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA). Residência Médica em
Psiquiatria pela FAMEMA. Título de especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Doutorado em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Docente e
Chefe da Disciplina de Psiquiatria da FAMEMA.

Autores - Módulo 11 - Oftalmologia


Andreia Couto de Morais
Autora
Especialização em Oftalmologia pela Policlínica de Botafogo-RJ(conclusão 2021). Graduada em
Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Andressa Mayumi Matucuma


Autora
Clínica Geral na UAI de Uberlândia-MG. Graduada em Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Ayesca Terra Cardoso


Autora
Acadêmica do 7º período de Medicina da F.A.M.E.S.C. de Bom Jesus do Itabapoana-RJ.

Bruna Bonzi
Autora
Acadêmica do 7º período de Medicina da F.A.M.E.S.C. de Bom Jesus do Itabapoana-RJ.

Bruna Sá Eduardo
Autora
Acadêmica do 7º período de Medicina da F.A.M.E.S.C. de Bom Jesus do Itabapoana-RJ.

Camila Ishi Iguma


Autora
Cursando Fellow em Galucoma pelo Hospital de Olhos de Brasília-DF.Especialização em
Oftalmologia pelo Hospital de Olhos de Brasília-DF. Graduada em Medicina pela UniAtenas-
Paracatu-MG.

Carolina Schuwartz Tannus Belisário


Autora
Acadêmica do 2º período de Medicina da UniFeso de Teresópolis-RJ.

Emerson Alexandre de Sales Junior


Autor
Cursando Especialização em Oftalmologia pelo Hospital Monumento em São Paulo-SP.Graduada em
Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Henrique Araújo Cenci


Autor
Cursando Residência em Cirurgia na Santa Casa de Belo Horizonte-MG. Graduado em Medicina
pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Isabela Ferreira Melli


Autora
Cursando Residência em Oftalmologia na Fundação Banco de Olhos de Goiás-GO. Graduada em
Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Marcelo Paraíba Cavalcanti


Autor
Cursando Fellowship de Plástica e Órbita na Santa Casa de Belo Horizonte-MG. Residência Médica
pela Fundação Ciência e pesquisa Maria Ione Xerez Vasconcelos,Fortazela-CE. Graduado em
Medicina Pela Faculdade Éstacio de Juazeiro do Norte-CE.

Mylena Maíssa Cunha Simões


Autora
Clínica na Emergência do Pronto Socorro de Buritis-MG.Graduada em Medicina pela UniAtenas-
Paracatu-MG.

Neiffer Nunes Rabelo


Autor
Cursando Especialização em Oftalmologia na Santa Casa de Belo Horizonte - MG. Graduado em
Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Paula Denoni Gomes


Autora
Residência em Clínica Médica pelo Hospital Geral do Estado(HGE),Maceio - AL.Graduada em
Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Pedro Henrique Bernardo Mendonça


Autor
Clínica Médica no SESDF - DF. Graduado em Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Rayssa Tavares
Autora
Cursando Especialização em Dermatologia pela Faculdade ISMD, Belo Horizonte-MG.Graduada em
Medicina pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Rebecca Martins Oliveira Tannus


Autora
Especialização em Oftalmologia pelo Visão Hospital de Olhos. Brasília -DF.Graduado em Medicina
pela UniAtenas-Paracatu-MG.

Victor Ferreira Schuwartz Tannus


Editor
Graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina de Teresópolis - RJ. Especialização em
Oftalmologia pela Fundação Hilton Rocha (BH-MG). Título de especialista em Oftalmologia pelo
Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Fellow de Retina pela Fundação Hilton Rocha e Fellow de
Uveíte pelo Hospital São Geraldo - UFMG. Professor do Departamento de Oftalmologia da
F.A.M.E.S.C. Bom Jesus do Itabapoana-RJ. Membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia e da
Sociedade Brasileira de Uveite.
1.1
ELETROCARDIOGRAMA
Autores:
Andressa Mayumi Matucuma
Carolina Limongi de Oliveira
Jean Bryally Peres
Estevão Tavares de Figueiredo

introdução
O eletrocardiograma (ECG) básico possui doze derivações clássicas, sendo seis no plano frontal
(aVR, aVL, aVF, DI, DII, DIII) (Figura 1), representando as extremidades aferidas nos membros, e as
demais no plano horizontal, localizadas no precórdio (V1, V2, V3, V4, V5, V6) (Figura 2). Williem
Einthoven ganhou o Nobel de Medicina em 1924 por ter realizado o ECG propriamente dito. Porém,
sabe-se que apenas em 1931 o médico Frank Norman Wilson criou o sistema de seis derivações
precordiais, ou plano horizontal, padronizadas pela American Heart Association em 1938 (Figura 2).
Figura 1. Eixos e ângulos cardíacos frontais.
Fonte: Elaborado pelos autores
Figura 2. Eixos cardíacos precordiais.
Fonte: Elaborado pelos autores.

O ECG é representado pelas ondas P, QRS, T, U; seguimentos PR, ST; intervalos PRi, QTi (Figura
3), e suas diversas morfologias variam de acordo com a derivação analisada, respeitando-se o
posicionamento dos eletrodos no paciente (Tabela 1).1-3
Figura 3. Eletrocardiograma normal.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Derivação Posicionamento do eletrodo

DI MSD e MSE

DII MSD e MIE

DIII MSE e MIE

aVR MSD

aVL MSE

aVF MIE

V1 4o EIC linha paraesternal direita

V2 4o EIC linha paraesternal esquerda

V3 5o EICE, entre V2 e V4

V3R 5o EICD linha paraesternal direita

V4 5o EICE na linha hemiclavicular esquerda

V4R 5o EICD linha hemiclavicular direita

V5 5o EICE na linha axilar anterior

V6 5o EICE na linha axilar média

V7 5o EICE na linha axilar posterior

V8 5o EICE na linha escapular posterior

MSD – membro superior direito. MSE – membro superior esquerdo. EIC – Espaço Intercostal.
EICD – Espaço intercostal direito. EICE – Espaço intercostal Esquerdo.

Tabela 1. Posicionamento dos eletrodos e sua respectiva derivação.


Fonte: Adaptado de Piegas.1

As representações miocárdicas eletrocardiográficas de cada conjunto de derivações


preestabelecidas anteriormente são (Tabela 2):1-4

Derivação Representação no miocárdio


DII, DIII, aVF Parede inferior

V1 – V4 Superfície anterior (septo interventricular incluso)

DI, aVL, V5 – V6 Parede lateral

DI e aVL Parede lateral alta

V1R – V6R Ventrículo direito

V7 – V8 Face dorsal – Parede posterior

Tabela 2. Representação das derivações no miocárdio.


Fonte: Adaptado de Piegas.1

O ritmo fisiológico do coração, denominado de sinusal, origina-se no átrio direito alto. Para saber
se o ritmo é sinusal deve-se preencher os seguintes critérios:1-3,5

• P → QRS (Toda onda P gera um QRS?).


• QRS ← P (Todo QRS é precedido de uma onda P?).
• QRS → T (Todo QRS gera uma onda T?).
• T ← QRS (Toda onda T é precedida de um QRS?).
• O eixo de P deve estar entre 0° e 90°.
A onda P representa a despolarização atrial, decorrente do potencial de ação elétrico advindo das
células autoexcitatórias do nó sinoatrial. Sua morfologia normal possui amplitude máxima de 2,5 mm
e duração inferior a 120 ms. Alterações de onda P ocorrem dependendo da frequência cardíaca, da
presença de distúrbios de condução elétrica, sobrecargas ou por má formação cardíaca. O complexo
QRS corresponde à despolarização ventricular. A onda Q é a primeira onda negativa, e a onda R, a
primeira positiva (tabela 3).1-3,5
A onda T representa a repolarização ventricular. Em condições normais é assimétrica, de início
mais lento e final mais rápido, e positivo em quase todas as derivações (Tabela 2). A
Onda U é geralmente visível em frequências cardíacas baixas, representando potenciais tardios, que
podem ser normais ou aparecerem em alguns distúrbios, como hipocalemia. Quando presente, está
normalmente após a onda T e antes da P. Pode representar a repolarização tardia das fibras de
Purkinje, a repolarização demorada dos músculos papilares, os potenciais residuais tardios do septo, o
acoplamento eletromecânico, a atividade das células M ou o pós-potencial de atividade gatilho.1-3,5,6
O segmento ST é o intervalo entre a despolarização e a repolarização ventricular, sendo,
normalmente isoelétrico. Estar atento ao supra ou infradesnivelamento desse segmento em relação ao
ponto J (Figura 3).1-3,5,6
O intervalo PR representa a velocidade de condução do impulso elétrico desde o nó sinusal,
passando pelo nó atrioventricular, até o início da despolarização ventricular (Tabela 3). O intervalo QT
é utilizado para identificar a duração de atividade elétrica ventricular. Altera-se de acordo com a
frequência cardíaca, sendo prático utilizar o QT corrigido (QTc):

• Fórmula de Bazzet , em que QTc = QT medido.


7

√RR

Como a Fórmula de Bazzet sofre muita influência da frequência cardíaca, devemos limitar o seu
uso a frequências entre 60 e 100 bpm. Em casos fora dessa faixa, existem outras fórmulas mais
adequadas (ver abaixo), especialmente a de Fridericia, por ser mais acurada). Além do mais, em
pacientes que apresentem QRS alargado (como BRE ou uso de marca-passo), o QT deve sofrer uma
correção adicional (Fórmula de Bogossian) antes do uso dessas fórmulas.

• Fórmula de Bogossian: 8

QT medido = QT em BRE ou MP - duração do QRS (ms)


2

• Fórmula de Hodges: 9

QT corrigido = QT medido + 1,75 x (FC - 60)

• Fórmula de Framingham:
QT corrigido = QT medido + 0,154 (1 - RR)

• Fórmula de Fridericia: 10

QT corrigido = QT medido
(RR)1/3

A duração do QTc deve ser menor ou igual a 440-460 ms, podendo variar com o gênero.
Pode-se traçar uma linha média entre o complexo QRS. Caso a onda T ultrapasse essa linha
imaginária, o QTi é considerado longo (Figura 4):1-3,6

Figura 4. Representação da análise do intervalo QT.


Fonte: Adaptado de Lapa.6
O intervalo entre duas ondas P corresponde à frequência de despolarização atrial. Já o intervalo
entre duas ondas R indica a frequência de despolarização ventricular, sendo diretamente relacionado à
frequência cardíaca, obtida pelo cálculo FC = 1500/RR.1-4

Onda / Intervalo / Eixo Duração Amplitude

Onda P < 120 ms Máximo de 2,5 mm

Intervalo PR 120 – 200 ms -

5-20 mm (frontal)
Complexo QRS < 110 – 120 ms
10-30 mm (precordiais)

Intervalo QT ≤ 440 – 460 ms -

SÂP 0º a 90º paralelo ao plano frontal -

SÂQRS -30º a + 90º para trás -

SÂT Paralelo ao SÂQRS no plano frontal -

Tabela 3. Interpretação do ECG normal.


Fonte: Adaptado de Piegas.1

a. SOBRECARGA ATRIAL ESQUERDA


As modificações eletrocardiográficas da sobrecarga atrial esquerda são o aumento da duração da
onda P > 120 ms, associado ao aparecimento de entalhe (onda P mitrale) na derivação DII (em geral,
apresentando-se com dois ápices, referentes à despolarização do átrio direito e do átrio esquerdo,
respectivamente). No plano horizontal (precordial), a alça de P tende para trás e para a esquerda, o que
determina negatividade tardia e de maior duração em V1 e/ou V2 (Tabela 4).
Essa área da fase negativa de pelo menos 40 ms x 0,1 mV (1x1 mm²) constitui o índice de
Morris. Se houver crescimento atrial esquerdo, o SÂP tende a desviar-se para a esquerda entre os
eixos de (-30º) e (-45º).1-3 Na Figura 5, observamos o eixo de P desviado para a esquerda, presença
de onda P mitrale em DII e sinal de Morris.

Figura 5. Sobrecarga atrial esquerda.


Fonte: Elaborado pelos autores.

b. SOBRECARGA ATRIAL DIREITA


A sobrecarga atrial direita é representada por uma onda P apiculada com amplitude acima de 0,25
mV em DII (Tabela 4). Em V1, a onda P apresenta porção inicial positiva com área maior que 60 ms.
Peñaloza e Tranchesi descreveram uma forma de sinal indireto de sobrecarga atrial direita, pela
presença de complexos QRS de baixa voltagem em V1, no máximo 1/3 da amplitude de V2, com a
maior voltagem em outras derivações. É provável que essa baixa voltagem captada se deva à
interposição da câmara atrial direita.1-3 Na Figura 6, observamos a presença de onda P pulmonale,
aumento da porção positiva da onda P em V1 e sinal de Peñaloza-Tranchesi.

Figura 6. Sobrecarga atrial direita.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Sobrecarga atrial esquerda Sobrecarga atrial direita

DII: onda P > 120 ms Amplitude de P > 0,25 mV (P pulmonale)

DII: entalhe na onda P > 40 ms (P mitrale) Peñaloza-Tranchesi (QRS V1 < 1/3 QRS V2)

V1: porção final da onda P negativa com área V1: porção inicial da onda P positiva com área
> 40 ms x 0,1 mV (sinal de Morris) > 0,06 ms

SÂP desviada para esquerda entre -30º e - 45º SÂP desviada para a direita e para cima (75º)

Tabela 4. Interpretação do ECG em situações de sobrecarga atrial esquerda e/ou direita.


Fonte: Adaptado de Piegas. 1

c. SOBRECARGA VENTRICULAR ESQUERDA


Está relacionada com a hipertrofia e a dimensão do ventrículo esquerdo (VE). Porém, não é correto
conceituar em hipertrofia atrial ou ventricular, do ponto de vista eletrocardiográfico, pois não é
possível diferenciar entre hipertrofia concêntrica ou excêntrica, apenas se inferindo sobrecarga ou não.
A sobrecarga do VE gera um QRS com um desvio à esquerda, dando origem à onda S profunda. Além
disso, a sobrecarga do VE prolonga a duração do QRS e o tempo entre o começo e o ponto máximo do
QRS nas derivações precordiais esquerdas.1-3,6,11
Critérios diagnósticos de Sobrecarga Ventricular Esquerda:1-3,6,11

• Índice de Sokolow – Lyon: Utiliza-se a amplitude da onda S na derivação V1 somada à


onda R na derivação V5 ou V6 (a maior entre elas). Nota-se a presença de SVE caso o
resultado seja ≥ 35 mm. Em indivíduos < 30 anos, o valor é controverso. Em crianças,
adolescentes e adultos jovens são comuns ondas R aumentadas, porém não necessariamente
há uma sobrecarga. Em idosos, esse critério é dificultado devido às comorbidades, que
afluem para a diminuição da amplitude do complexo QRS. Em resumo, o índice de
Sokolow-Lyon é positivo se SV1 + (RV5 ou V6) > 3,5 mV.

• RaVL > 1,1 mV: Este é um critério isolado, em que apenas se verifica se a onda R de aVL é
maior que 11 mm (1,1 mV).

• Critérios de Romhilt-Estes (Tabela 5): Resultado igual a quatro pontos significa uma
provável sobrecarga. Se acima de cinco pontos, o diagnóstico é definitivo.

Sokolow-Lyon positivo. 3 pontos

Sinais de Morris presente. 3 pontos

Anormalidade de ST-T (sem terapia digitálica). 3 pontos

Anormalidade de ST-T (com terapia digitálica). 1 ponto

Desvio do eixo para esquerda (além de -30°). 2 pontos

Duração do QRS > 120 ms. 1 ponto

Tabela 5. Critérios de Romhilt-Estes.


Fonte: Adaptado de Piegas.1

• Critérios de Cornell: A soma onda R em aVL com S da derivação precordial em V3 é um


critério de sexo-específico. Nos homens é positivo com valores superiores a 28 mm e nas
mulheres superiores a 20 mm, estabelecendo assim a SVE. Portanto, em resumo, considera-
se:

SV3 + RaVL ≥ 2,8 mV (para homens).

SV3 + RaVL ≥ 2,0 mV (para mulheres).

• Critério de Peguero Lo-Prest: em 2017, Peguero, Lo Presti et al. propuseram um novo


critério eletrocardiográfico para a hipertrofia ventricular esquerda, levando em consideração
as alterações dinâmicas de voltagem que ocorrem no ECG. A soma da amplitude da onda S
mais profunda em qualquer derivação (SD) com a da onda S em V4 (SV4) proporciona uma
maior sensibilidade no diagnóstico por ECG da HVE comparado com os critérios existentes.
Nos casos nos quais a SD se encontra na derivação V4, duplica-se a amplitude da onda S
para obter o valor de SD + SV4. Um valor de SD + SV4 ≥ 2,3 mV em mulheres e ≥ 2,8 mV
em homens é considerado positivo para HVE.12

Figura 7. Representação eletrocardiográfica de sobrecarga ventricular esquerda.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos, na figura 7, o QRS desviado para a esquerda (além de -30°), SAE com sinal de
Morris e SVE com RaVL > 11 mV, Cornell positivo, Sokolw-Lyon positivo e Romhilt (Estes oito
pontos pelos traçados representados.

d. SOBRECARGA VENTRICULAR DIREITA


O aumento da resistência vascular e a arteriopatia podem ocasionar, ao longo do tempo, sobrecarga
de ventrículo direito (SVD) e diminuição da contração e do fluxo sanguíneo ao músculo cardíaco.
Alguns critérios para definir se há uma SVD são:1-4,6,11

• R em V1 ≥ 0,7 mV;
• R/S em V1 > 1 com R > 0,5 mV;
• R/S em V5 ou V6 < 1;
• S em V5 ou V6 > 0,7 mV;
• R em V5 ou V6 ≥ 0,4 mV com S em V1 ≥ 0,2 mV;
• QR em V1;
• Desvio do eixo para a direita (≥ +90°);
• Padrão S1Q3;
• Padrão S1S2S3;
• P pulmonale (sobrecarga de átrio direito sugere sobrecarga de ventrículo direito).

Figura 8. Sobrecarga ventricular direita.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na Figura 8 o eixo do QRS desviado para a direita (>90°) e SVD pelos critérios de R
em V1 > 7 mV e S em V6 > 5 mV com R de V1 > 1 mV.

e. BLOQUEIOS UNIFASCICULARES
O ramo esquerdo origina-se contíguo ao ponto onde o feixe de His surge do corpo central fibroso.
Subdivide-se em anterior, médio e posterior com grande variabilidade. Como o bloqueio situa-se após
os ramos esquerdo e direito, o QRS não se alarga, porém há desvio do SÂQRS.1-3,5,6,11,13
Os critérios para definir se há bloqueio unifascicular podem ser vistos na Tabela 6.

Bloqueio anterossuperior esquerdo Bloqueio posteroinferior esquerdo

SÂQRS de -30° a -90° SÂQRS > 120°

Padrão rS em DII, DIII e aVF (SD3>SD2) Padrão RS em DI e aVL

Padrão qR em aVL Padrão qR em DII, DIII e aVF


Duração do QRS < 120 ms Duração do QRS < 120 ms

Exclusão de causadores desse desvio SÂQRS

Tabela 6: Interpretação dos bloqueios anterossuperior esquerdo e bloqueio posteroinferior esquerdo.


Fonte: Adaptado de Piegas.1

Figura 9. ECG de paciente com bloqueio divisional anterossuperior (BDAS)


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na Figura 9 o BDAS. Eixo do QRS desviado para esquerda, duração do QRS < 0,12 s,
SDIII > SDII.

Figura 10. ECG de paciente com bloqueio divisional posteroinferior (BDPI).


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na Figura 10 o BDPI se excluídas outras causas de desvio para direita. Eixo do QRS
desviado para a direita, duração do QRS < 0,12 s, RDIII > RDII.

f. BLOQUEIOS DE RAMO COMPLETOS


Os bloqueios de ramo esquerdo (BRE) ou direito (BRD) ocorrem quando há dificuldade na
condução do impulso elétrico pelo feixe em determinado lado do coração. Essa alteração pode causar
mudanças na morfologia e duração do complexo QRS. Os bloqueios podem ser genéticos ou
intermitentes, ou seja, aparecem e desaparecem nos eletrocardiogramas, e na maioria dos casos estão
associados a doenças de base. Os critérios analisados em um BRE ou BRD são (Tabela 7):1-3,11,13

Bloqueio de ramo esquerdo Bloqueio de ramo direito


Duração do QRS > 120 ms Duração do QRS > 120 ms

Ondas R amplas, entalhadas em precordiais Ondas S amplas e profundas nas derivações


laterais (V5 e V6) e geralmente em DI e aVL precordiais laterais (V5 e V6)

Ondas R iniciais pequenas ou ausentes em V1 e V2


seguidas por ondas S profundas Ondas R amplas, entalhadas
(padrões rsr’, rsR’ ou rSR’ nas precordiais direitas)
Ausência de ondas q septais em V5 e V6
(V1 e V2)
Deflexão intrinsecoide > 60 ms em V5 e V6

Tabela 7. Interpretação dos bloqueios de ramo esquerdo e direito


Fonte: Adaptado de Piegas.1

Figura 11. ECG de paciente com bloqueio completo de ramo esquerdo.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na figura 11 duração do QRS > 0,12 s, onda R entalhada em D1 e V6, além de
pequena onda R em V1 com onda S profunda.

Figura 12. ECG de paciente com bloqueio completo de ramo direito.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Na figura 12 o eixo do QRS desviado para direita, duração do QRS > 0,12 s, há presença de
meseta (rsR’) em V1 e onda S alargada em V6.

g. ELETROCARDIOGRAMA NAS SÍNDROMES CORONARIANAS


O paciente que chega ao hospital com quadro de dor torácica, seja por uma angina pectoris ou dor
atípica, além dos procedimentos no boxe de emergência, necessita da fundamental realização de um
eletrocardiograma. Esse exame é de baixo custo, de simples realização, com resultado imediato, e
auxilia o médico na estratificação de risco do paciente.1,4,5,13,14
Por apresentar alta prevalência e morbimortalidade, em pacientes com dor torácica aguda, o
médico deve estar atento às Síndromes Isquêmicas Miocárdicas Instáveis (SIMI). Comumente os
pacientes apresentam dor torácica súbita e aguda, com duração de minutos a horas, nas últimas 24
horas. Portanto, é imprescindível afastar SIMI de outras doenças potencialmente graves, como a
dissecção de aorta, a embolia pulmonar (EP) e a pericardite/miocardite.1,3-5,13,14
O ECG de admissão pode reduzir em 34% o tempo porta-agulha e em 18% o tempo porta-balão,
quando laudado por profissional capacitado, além de interferir positivamente na mortalidade intra-
hospitalar em pacientes com Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) com supradesnivelamento de ST. A
interpretação do ECG nestes casos visa identificar o supradesnivelamento do segmento de ST, apesar
de apresentar sensibilidade de apenas 45% a 60% para diagnóstico de IAM. O médico deve estar alerta
para quaisquer desvios do segmento ST (≥ 0,5 mm), inversão da onda T (≥ 2 mm), presença de onda Q
ou inversão de onda T com onda R dominante. O ponto J é a representação final da inscrição do QRS,
sendo referência para os desníveis do segmento ST. É válido ressaltar que se preconiza que o ECG
deve estar pronto em 10 minutos a partir da chegada do paciente ao serviço hospitalar. Caso não
mostre sinais de isquemia miocárdica, deve-se repetir o ECG em 15-30 min.1-4,11,13,14
Para o emergencista, a elevação do segmento ST à direita (V3R e V4R) possui alto valor preditivo
eletrocardiográfico, pois representa pacientes com potencial de isquemia do ventrículo direito (VD).
Este achado pode ser ao acaso, considerando que em 50% dos pacientes não se evidencia a elevação
de ST. A leitura criteriosa do ECG corrobora a identificação do IAM de VD, sendo sugestivo quando:
maior elevação do segmento ST na derivação DIII do que em DII, presença de bloqueio de ramo
direito (BRD) e BAV de segundo e terceiro graus. Em suma, caso haja supradesnivelamento do
segmento ST em parede inferior (DII, DIII e aVF), solicitar também V3R e V4R para descartar infarto
de ventrículo direito e contraindicar o uso de nitratos. Outra consideração que deve ser feita é que, se
existe um infradesnivelamento de V1 e/ou V2, é obrigatório solicitar V7 e V8, pois provavelmente se
trata de um infarto de parede posterior.1,3,5,14
O ECG direciona o diagnóstico das Síndromes Coronarianas Agudas (SCA), seja ela com
supradesnivelamento do segmento de ST, sem supradesnivelamento de ST ou angina instável. Deve-se
realizar exames laboratoriais bioquímicos como dosagem de CK-MB, CPK, mioglobina, DHL, e/ou
TROPONINA I em conjunto com a clínica do paciente para o diagnóstico diferencial entre IAM sem
supra de ST ou angina instável.1,5,14
A Tabela 8 mostra algumas das possíveis alterações eletrocardiográficas em caso de SCA em
ventrículo esquerdo (mais comuns):1-4,13,14

ECG nas Síndromes coronarianas agudas


VENTRÍCULO ESQUERDO

Subepicárdio Onda T invertida (V1 a V6)


ISQUEMIA
Subendocárdio Onda T positiva apiculada assimétrica (V1 a V6)

CORRENTE DE Subepicárdio Supra de ST (DII, DIII, V3 a V6)


LESÃO
Subendocárdico Infra de ST (DII, DIII, V3 a V6)

Amplitude > 1/3 do QRS


NECROSE Indicativo de infarto antigo
Duração > 40 ms

Tabela 8. ECG nas síndromes coronarianas agudas.


Fonte: Adaptado de Piegas.1

A Figura 13 mostra a visão ecocardiográfica do coração, assim como o nome das respectivas
paredes e a visão da vascularização dessas áreas. Também é possível observar o posicionamento das
derivações em cada região do miocárdio.

Figura 13. Representação anatômica do miocárdio de acordo com as derivações analisadas.


Fonte: Adaptado de Lang.5

Deve-se considerar o diagnóstico diferencial de isquemia subepicárdica nos casos de alteração de


repolarização ventricular com sobrecarga de ventrículo esquerdo e bloqueio de ramo, em que há
assimetria de onda T. O IAM deve ser diferenciado de pericardite (apresenta elevação do segmento ST
em precordiais esquerdas, com concavidade superior preservada), miocardite, IAM antigo com área
lesionada e supradesnivelamento persistente, quadros de abdome agudo, repolarização precoce,
hiperpotassemia e síndromes catecolaminérgicas.1,5

h. ELETROCARDIOGRAMA NO HOSPITAL GERAL


• Hipercalemia (hiperpotassemia)
A representação no ECG depende da concentração de potássio sérico. “O potássio mora embaixo
da onda T.” Portanto, espera-se:1-3,13,14

• Aumento da amplitude da onda T, se K > que 5,5 mEq/L


+
;

• Alargamento do complexo QRS, se K > que 6,5 mEq/L


+
;

• Desaparecimento de onda P, se K > que 8,5 mEq/L


+
;

• Supradesnivelamento de segmento ST (Supra de STs), se K > que 11 mEq/L


+
;

• Bradiarritmias, fibrilação ventricular ou parada cardiorrespiratória (PCR), se K > 12


+

mEq/L.

Figura 14. ECG de paciente com hiperpotassemia.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na Figura 14 a presença de ondas T apiculadas e discreto alargamento do complexo


QRS visto em V3.

• Hipocalemia (hipopotassemia)
Assim como na hipercalemia, a representação no ECG depende da concentração de potássio sérico.
Portanto, as alterações que são esperadas quando os níveis de potássio sérico estiverem abaixo do
limite inferior, ou seja, < 3,5 mEq/L, são:1-3,13,14
• Diminuição da amplitude da onda T ;

• Infradesnivelamento do segmento ST (infra de STs) ;

• Presença de onda U ;

• Aumento do QTc ;

• PCR por bradiarritmia.

Figura 15. ECG de paciente em hipopotassemia.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Na figura 15 percebemos as ondas T com amplitude diminuída.

• Hipercalcemia
Deve-se notar que o intervalo QTc diminui à medida que aumentam os níveis séricos de cálcio.
Pode-se observar onda J ou O de Osborn, que significa uma discreta onda positiva ao final do
complexo QRS.1-3,13,14
Figura 16. ECG de paciente em hipercalcemia.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Na figura 16 percebemos a presença de positividade ao final do QRS (ondas de Osborn) e


diminuição do intervalo QT.

• Hipocalcemia
Observar que o intervalo QTc aumenta à medida que diminuem os níveis séricos de cálcio, além de
alterações como a retificação do segmento ST, aumento da onda T e sobrecarga ventricular esquerda.1-
3,13,14

Figura 17. ECG de paciente em hipocalcemia.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Na figura 17 observar-se a retificação do segmento ST, aumento do intervalo QT, sinais sugestivos
de sobrecarga ventricular e atrial esquerdas, vistos nas derivações aVL e V1, e onda T apiculada em
V1.

• Hipotermia
As alterações estão presentes no ECG a partir de temperaturas axilares abaixo de 35°C. Como
consequência imediata, ocorre bradicardia sinusal. O estado de hipotermia pode gerar onda J ou O de
Osborn, prolongamento do intervalo QT (QTi) e o clássico miopotencial de ação por tremor
muscular.1-3,13,14
Figura 18. ECG de paciente em hipotermia.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na figura 18 o ECG com ondas de Osborn, aumento do QTi e presença de


interferências devido miopotencial.

• Intoxicação digitálica
O ECG poderá apresentar ondas T achatadas, infradesnivelamento de STs, QTi diminuído,
intervalo PR (PRi) aumentado e segmento ST em forma de “pá ou colher de pedreiro”. As
extrassístoles são o tipo de arritmia mais comum.
Deve-se ficar atento à taquicardia juncional não paroxística (ausência de onda P e ritmo regular,
porém com frequência cardíaca entre 100 e 120 bpm) e à dissociação atrioventricular.

Figura 19. ECG de paciente em intoxicação digitálica. 1,2,13-15


Fonte: Elaborado pelos autores.

Na figura 19 percebemos uma frequência cardíaca aproximada de 100 bpm, PRi aumentado, QTi
diminuído, ondas T achatadas, leve infradesnivelamento de ST em aVF, presença do “sinal da pá” em
V3.
• Hipotireoidismo
Observar, no ECG, baixa voltagem (< 5 mm em derivações periféricas, e < 10 mm nas derivações
precordiais). Frequentemente, pode coexistir alternância elétrica em resposta ao possível derrame
pericárdico presente, como visto na figura a seguir:

Figura 20. ECG de paciente com hipotireoidismo.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na Figura 20 derivações com baixa voltagem, alternância elétrica demonstradas em


DI e aVF.

• Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)


Paciente com DPOC geralmente apresenta os critérios de sobrecarga de átrio direito (onda p
pulmonale) e de ventrículo direito. A taquicardia atrial multifocal é a arritmia mais comumente
observada. Porém, deve-se ficar atento à taquicardia juncional não paroxística.1,2,4,11,13-15 Na Figura 21
percebemos a presença de onda P pulmonale, sinais de sobrecarga atrial direita e ventricular direita.

Figura 21. ECG de paciente com DPOC.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Tromboembolismo pulmonar (TEP)


O aumento da frequência cardíaca, devido à taquicardia sinusal, é a manifestação mais comum.
Também podemos observar em alguns pacientes a presença de inversão de onda T de V1 a V4.
Embolia maciça pode ocorrer, o que leva à sobrecarga de ventrículo direito (SVD) e à sobrecarga de
átrio direito (SAD). Em 3 a 5% dos casos de TEP, pode aparecer no ECG o padrão S1Q3T3.1,2,4,11,13-15
Na Figura 22, observamos o padrão S1Q3T3, sobrecarga de átrio direito e de ventrículo direito.

Figura 22. ECG de paciente com TEP.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Miocardite
A taquicardia sinusal com extrassístoles ventriculares são os achados mais comuns. Porém, pode
ocorrer bloqueio atrioventricular com necessidade de marca-passo. Se o pericárdio também for
comprometido, esperam-se alterações dos segmentos ST e de onda T. Observamos na Figura 23
taquicardia sinusal com extrassístoles ventriculares sem comprometimento pericárdico.

Figura 23. ECG de paciente com miocardite.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Pericardite
Neste tipo de doença, ocorre supra de ST difuso, exceto em aVR e V1, com possível
infradesnivelamento do segmento PR. Também podem estar presentes taquicardia sinusal e arritmias
supraventriculares. Nas primeiras horas, observa-se supradesnivelamento dos segmentos ST, seguido
por normalização dos STs em dias, porém aparecendo inversão de onda T caso o quadro dure semanas.
Mesmo sem tratamento adequado, espera-se normalização do eletrocardiograma após meses de
evolução.1,2,4,11,13,14
Figura 24. ECG de paciente com pericardite.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Na Figura 24 observamos o ECG mostrando infra de PR, onda T apiculada e supradesnivelamento


do segmento ST em DI e exemplificando aVR e V1 apenas com infradesnivelamento do segmento ST,
por se tratarem de derivações predominantemente direitas. Com dias de evolução, nota-se apenas
permanência de infra de PR. Ao passar de semanas, está presente uma onda T invertida. Caso haja
meses de evolução, o ECG pode vir a se normalizar.1,2,4,11,13,14

• Derrame pericárdico
Observa-se como características principais a taquicardia sinusal e a baixa voltagem do QRS (≤ 10
mm nas derivações precordiais e ≤ 5mm nas derivações periféricas). Devido ao movimento do coração
envolto em líquido, pode ocorrer o fenômeno de alternância elétrica em que o QRS em V1 ora está
aumentado, ora diminuído. Já em V2 pode estar ora positivo, ora negativo. Observamos na Figura 25 o
traçado eletrocardiográfico de paciente com derrame pericárdico, sendo possível evidenciar
alternância elétrica em DI e derivações precordiais.
Figura 25. ECG de paciente com derrame pericárdico.
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Febre reumática
O diagnóstico clínico é soberano e requer evidência de contato com estreptococos do grupo A. O
ECG complementar pode apresentar um aumento do PRi (≥ 20 ms) que, pelos critérios de Jones
modificados, é um dos critérios menores para febre reumática, sendo um bloqueio atrioventricular
(BAV) de primeiro grau.1,2,4,6-10 Observamos na Figura 26 o ECG com aumento do PRi, configurando
um BAV de primeiro grau, sendo um dos critérios menores para febre reumática.

Figura 26. ECG de paciente com febre reumática.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Doença de Chagas
É uma parasitose causada pelo Tripanossoma cruzi. A doença provoca uma disautonomia cardíaca
por inflamação crônica, com alteração do funcionamento normal dos plexos autonômicos cardíacos,
sendo a fibrose local o achado mais comum. Em relação à apresentação eletrocardiográfica, as
arritmias são comuns, assim como os bloqueios. O ECG característico da doença de chagas é
composto por:1-3,6,13-15

• Bloqueio de ramo direito (BRD): meseta em V1-V3;


• Bloqueio divisional anterossuperior esquerdo (BDASE): SD3 > SD2;
• SÂQRS além de -30°.
Observamos na Figura 27 o ECG com eixo do QRS desviado para a esquerda, BRD e BDAS.

Figura 27. ECG de paciente com Doença de Chagas.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Hemorragia subaracnoidea
Observar um padrão de onda T invertida difusamente. Tais ondas isquêmicas estão presentes
devido ao alto nível de catecolaminas circulantes liberadas em decorrência da hiperativação do sistema
nervoso autônomo simpático, em resposta às alterações de pressão intracraniana e possíveis lesões
cerebrais. Deve-se estar atento à positivação dos marcadores de necrose miocárdica também pela
concentração elevada de catecolaminas. Onda T cerebral é aquela com voltagem > 10 mm (1 mV).1-
3,6,13,14 Observamos na Figura 28 o padrão de onda T invertida nas 12 derivações e Onda T cerebral
em V4 e V5, aumento do intervalo QT em precordiais.
Figura 28. ECG de paciente em resposta a hemorragia subaracnoidea.
Fonte: Elaborado pelos autores.

i. TAQUIARRITMIAS
As taquiarritmias podem ser divididas em dois subgrupos, as supraventriculares e as ventriculares.
Adiante será relatado brevemente sobre as principais taquiarritmias.1-3,6,13,14
• Taquicardia sinusal
Caracteriza-se por apresentar ritmo cardíaco regular com onda P, precedendo todo o complexo
QRS. Como se trata de uma taquicardia, a frequência cardíaca (FC) é > 100 bpm.1-3 Observamos na
Figura 29 eixo de P normal, eixo do QRS normal, ritmo sinusal, regular, FC de aproximadamente 150
bpm.

Figura 29. ECG de paciente em taquicardia sinusal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia atrial unifocal


Nessa situação, o ritmo cardíaco é regular, com onda P precedendo todo o QRS, porém com desvio
do eixo de P. A FC está, geralmente, entre 110 a 180 bpm.1-3,6,13,14 Observamos na Figura 30 o eixo
de P desviado para a direita, eixo do QRS normal, ritmo não sinusal, regular, FC aproximada de 150
bpm.

Figura 30. ECG de paciente em taquicardia atrial unifocal.


Fonte: Elaborado pelos autores.
• Taquicardia atrial multifocal
Destaca-se o ritmo cardíaco irregular, com onda P e PRi variável. O QRS pode estar normal ou
desviado para a esquerda. Geralmente está associado a doenças respiratórias, como o enfisema
pulmonar.1-3,6,13,14 Observamos na Figura 31 um ritmo cardíaco irregular, várias morfologias de onda P,
FC média > 100 bpm.

Figura 31. ECG de paciente em taquicardia atrial multifocal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia paroxística supraventricular (TPSV) por reentrada nodal


Corresponde à maior parte das taquicardias juncionais, sendo causada por uma microrreentrada
devido à presença de vias de condução lenta e rápida com diferentes períodos refratários. A principal
queixa é de palpitação, com um relato de “passava mal, mas quando vomitava parava”. Nota-se nesse
relato a melhora após o vômito por ação do sistema nervoso parassimpático. O ECG apresenta-se sem
onda P, com um QRS regular, pseudo-S em D2, D3 e aVF e pseudo-R em V1.1-4,6,13,14 Observamos na
Figura 32 uma FC aproximada de 176 bpm, ausência de onda P e intervalo RR regular. Presença de
pseudo-S em DII (seta) e pseudo-R em V1 (ponta de seta).
Figura 32. ECG de paciente em TPSV por reentrada nodal.
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia paroxística supraventricular (TPSV) por via anômala


Ocorre devido à comunicação anômala entre o átrio e o ventrículo, formando uma
macrorreentrada. Frequentemente o ECG apresentará onda P retrógrada e alternância da amplitude do
QRS por mudança da onda R. Este complexo pode ser estreito ou alargado, respectivamente, e dito
ortodrômico ou antidrômico. Um exemplo clássico desse tipo de taquicardia é a Síndrome de Wolff-
Parkinson-White (SWPW), que apresenta PRi diminuído e presença de onda delta, uma “pré-
excitação”. É considerada uma TPSV por via anômala, nesse caso o feixe de Kent, por uma via
ortodrômica. A fibrilação atrial pode surgir em até 30% desses casos.1-4,6,13,14

Figura 33. ECG de paciente em TPSV por via anômala.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Na Figura 33, observamos no primeiro ECG uma FC aproximada de 158 bpm, RR regular,
ausência de onda P e variabilidade da amplitude do QRS, o que sugere uma TPSV por reentrada AV.
Após cardioversão elétrica, observa-se no segundo ECG presença de ritmo sinusal, com PRi
diminuído e presença de onda delta, o que caracteriza o paciente com síndrome de Wolff-Parkison-
White, confirmando a taquicardia paroxística por vias anômalas.

• Fibrilação atrial (FA)


É a arritmia sustentada mais comum, causada por reentrada atrial com perda das características
sinciciais da musculatura atrial. Os átrios podem atingir frequência de 400 a 600 bpm. Porém, devido
à filtragem feito pelo nodo atrioventricular, a frequência ventricular geralmente está entre 90 e 170
bpm, embora existam casos ditos de baixa resposta ventricular, em que a FC e menor que 60 bpm. Não
se observa onda P e o intervalo RR é irregular (RRi). Uma dica que se dá é: “Se estiver na dúvida se a
onda P está presente e um eletro com ritmo irregular, pensar em FA”.1-4,6,13,14 Observamos na Figura 34
FC variada, RR irregular, ausência de onda P.
Figura 34. ECG de paciente em FA.
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Flutter atrial
Diferentemente da FA, este ritmo apresenta frequência atrial fixa, geralmente 300 bpm, sendo
causado por uma única macrorreentrada no átrio direito. Devido à filtragem atrioventricular, a
frequência cardíaca tem um padrão, podendo ser 2:1, 3:1 ou 4:1. Assim como na FA, as principais
causas são cardiopatias hipertensivas e coronariopatias. Ao observar o eletrocardiograma, deve-se
ficar atento às ondas F de flutter (“dente de serra”) em D2, D3 e aVF. O intervalo RR é regular e não
há intervalos isoelétricos entre os complexos QRS. Observamos na Figura 35 FC aproximada de 270
bpm e presença de ondas F de flutter.

Figura 35. ECG de paciente em flutter atrial.1-3,6,13,14


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia ventricular não sustentada


Apresenta ritmo cardíaco acima de 100 bpm com três ou mais complexos QRS consecutivos
(monomórfico ou polimórfico). Este tipo de taquicardia dura menos que 30 segundos. Observamos na
Figura 36 ECG com complexo QRS alargado e ritmo regular.

Figura 36. ECG de paciente em taquicardia ventricular. 1-3,6,13,14


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia ventricular monomórfica sustentada


Apresenta ritmo cardíaco acima de 100 bpm com três ou mais complexos QRS consecutivos do
tipo monomórfico. O ECG é o mesmo da taquicardia ventricular não sustentada; porém, com duração
maior que 30 segundos. Ficar atento ao comprometimento hemodinâmico dado pelos critérios de
instabilidade dor, dispneia, hipotensão e alteração do nível de consciência.1-3,6,13,14

• Taquicardia ventricular polimórfica – Torsades de pointes


Eletrocardiograma com ritmo é irregular e há inversão da amplitude do QRS. Geralmente está
associado a um intervalo QT/QTc longo, drogas como haloperidol, tricíclicos e cocaína ou síndromes
que causam o alongamento do QT, como Romano-Ward e Jervell-Lange-Nielsen. Nota-se variação da
amplitude e morfologia dos complexos QRS.1-3,6,13,14 Observamos na Figura 37 ECG com amplitude e
morfologia de QRS polimórfico e ritmo irregular.

Figura 37. ECG de paciente em Taquicardia Ventricular Polimórfica.


Fonte: Elaborado pelos autores.

j. BRADIARRITMIAS
• Arritmia sinusal (fisiológica)
Nessas situações, a onda P está positiva em DI e aVF. Há aumento do RRi na inspiração e
diminuição na expiração devido à ocorrência de alteração do volume de sangue que chega ao coração
e consequente resposta do sistema nervoso autônomo, denotando seu bom funcionamento e
variabilidade.1-3,6,14 Percebemos na Figura 38 o ritmo sinusal e a presença de variabilidade respiratória
fisiológica (aumento da FC na inspiração).

Figura 38. ECG de paciente com arritmia fisiológica.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Bradicardia sinusal
Situação em que a frequência cardíaca está abaixo de 50 bpm, com onda P positiva em DI e aVF.
Geralmente desencadeada por droga bradicardizante, como betabloqueadores e bloqueadores dos
canais de cálcio, ou situações que induzam resposta vagal.1-4,6,11,13,14 Percebemos na Figura 39 o ritmo
sinusal e FC de aproximadamente 44 batimentos.

Figura 39. ECG de paciente em bradicardia sinusal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Pausa sinusal
Observa-se ritmo cardíaco normal com um intervalo sem atividade elétrica. Esse intervalo é
suficiente para conter um complexo QRS. Se a pausa for > 2,5 segundos, o coração produzirá um
escape para evitar síncope.1-4,6,13,14 Na Figura 40, percebemos o ritmo sinusal, eixo de P e do QRS
normais, presença de pausa sinusal, sem escape juncional ou ventricular, visto em DII, não sendo
múltiplo da FC.

Figura 40. ECG de paciente apresentando pausa sinusal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Síndrome bradi-taqui
Observa-se taquiarritmia (FA ou TPSV) e bradiarritmia alternadas. Está associada à doença do nó
sinusal e tem como tratamento definitivo a colocação de marca-passo. A doença do nó sinusal, além
da síndrome bradi-taqui, também pode gerar bradicardia sinusal e pausa sinusal.

Figura 41. ECG de paciente com síndrome bradi-taqui. 1-3,6,8,9


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos no exemplo 1: ECG alternando entre períodos de FA e bradicardia sinusal


(apresentação mais comum da síndrome bradi-taqui). E no exemplo 2: ECG alternando entre períodos
de TPSV e bradicardia sinusal.

• Bloqueios sinoatriais (BSA)


São períodos sem onda P e complexo QRS. Se subdivide em dois tipos, vistos a seguir:
Tipo I – Wenckebach: caracterizado por diminuição do intervalo PP (PPi),
progressivamente, até que ocorra uma parada sinusal.1-3

Figura 42. ECG de paciente com BSA tipo 1.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Na figura 42 observa-se diminuição progressiva do intervalo PP, com pausa sinusal, não múltipla
da FC, e retorno dos batimentos persistindo a variabilidade entre os intervalos PP.

Tipo II: é uma parada sinusal com duração múltipla de um intervalo RR. Nesse caso não
há alteração do intervalo PP. 1-3

Figura 43. ECG de paciente apresentando BSA tipo 2.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Bloqueio atrioventricular (BAV)


Como o nome diz, é aquele em que há uma interrupção da transmissão do impulso elétrico dos
átrios para os ventrículos, fazendo com que ocorra, em alguns casos, escape ventricular. Pode ser
dividido em supra-hissiano e infra-hissiano, sendo que neste último caso o paciente necessitará
obrigatoriamente de marca-passo, diferentemente dos casos de bloqueio acima do feixe de His, em que
a indicação para colocação de marca-passo é relativa. Os bloqueios atrioventriculares podem ser:1-
3,6,13,14

BAV 1º grau: BAV supra-hissiano, em que toda onda P gera um QRS, porém há um
intervalo PR (PRi) > 200ms. Pode ser patológico, como em paciente com febre reumática,
ou não, como em atleta aeróbico durante o sono.1-3
Figura 44. ECG de paciente com BAV de 1º grau
Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na figura 44 o ECG de ritmo sinusal regular e aumento do PRi.

BAV 2º grau: é subdividido em dois tipos:1-4


→ Mobitz I: existe um aumento progressivo do PRi até que uma onda P não gere um QRS. O
PRi após o bloqueio é menor que o PRi que antecede o bloqueio (fenômeno de
Wenckebach). Assim como o BAV de 1º grau, é um BAV supra-hissiano.

Figura 45. ECG de paciente com BAV de 2º grau Mobitz I.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na figura 45 ECG de ritmo sinusal regular e aumento progressivo do PRi até que
ocorra um bloqueio obrigatório.
→ Mobitiz II: existem ondas P sem gerar QRS, na proporção 2:1, 3:1, ou mais, quando é dito
avançado. O PRi é fixo. Diferentemente dos bloqueios atrioventriculares mencionados
anteriormente, este é um bloqueio infra-hissiano.

Figura 46. ECG de paciente com BAV 2º Mobitz II.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na figura 46 o ECG de ritmo sinusal regular com PRi fixo e presença de BAV de 2º
grau Mobitz II de proporção 2:1.

BAV total: aquele em que ocorre completa dissociação atrioventricular. P e QRS


assumem frequências próprias e independentes. O intervalo PP permanece sinusal e o
RRi regular com frequência autônoma. Os escapes podem ser de dois tipos:1-3,6,8,9
→ Escape juncional: o QRS geralmente é estreito e tem uma FC > 40 bpm.
→ Escape ventricular: o QRS é largo e tem uma FC < 40 bpm.

Como ocorre dissociação dos batimentos atriais e ventriculares, em certos momentos será
observado um batimento de fusão, com átrio e ventrículo batendo ao mesmo tempo. Nesse instante
o exame físico mostrará onda “a” do pulso venoso “em canhão”.
Assim como o BAV de segundo grau Mobitz II, esse é um bloqueio infra-hissiano.

Figura 47. ECG de paciente com BAV total.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Observamos na figura 47 ECG característico de BAV total, com dissociação entre onda P e
complexos QRS.

REFERÊNCIAS
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7. ed. St. Louis: Mosby; 201
1.2
HIPERTENSÃO ARTERIAL
SISTÊMICA
Autores:
Bianca Tavares de Figueiredo
Rafael Pereira Marinho
Jean Bryally Peres
Estevão Tavares de Figueiredo

DEFINIÇÕES
• HAS (Hipertensão Arterial Sistêmica): condição clínica
multifatorial caracterizada por elevação sustentada dos níveis
pressóricos ≥ 140 e/ou 90 mmHg. Frequentemente se associa a
distúrbios metabólicos, alterações funcionais e/ou estruturais de
órgãos-alvo, sendo agravada pela presença de outros fatores de
risco (FR), como dislipidemia, obesidade abdominal, intolerância à
glicose e diabetes mellitus (DM).

• Efeito do avental branco (EAB): diferença de pressão entre as


medidas obtidas no consultório e fora dele, desde que essa
diferença seja igual ou superior a 20 mmHg na PAS e/ou 10 mmHg
na PAD.

• Hipertensão do avental branco (HAB): valores anormais da PA


no consultório, porém com valores considerados normais pela
MAPA ou MRPA.
• Hipertensão mascarada (HM): valores normais da PA no
consultório, porém com PA elevada pela MAPA ou medidas
residenciais.

• Hipotensão ortostática: redução da PAS > 20 mmHg ou da PAD


> 10 mmHg em relação à medida sentado após o paciente estar 3
minutos em posição ortostática.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

• No Brasil, HAS atinge 32,5% (36 milhões) de indivíduos adultos,


mais de 60% dos idosos, contribuindo direta ou indiretamente
para 50% das mortes por doença cardiovascular (DCV). Em
sua grande parte, está associado a idade, sexo, etnia, obesidade,
ingestão de sal e álcool, sedentarismo, genética e fatores
socioeconômicos. Já a HAS secundária tem prevalência de 3-5% e
seu tratamento da causa pode curar ou melhorar o controle da PA.

• A fisiopatologia da HAS baseia-se no inadequado equilíbrio


entre débito cardíaco (DC) e na resistência periférica (RVP),
que podem ser desencadeados por fatores neurais, fatores locais,
humorais, cardíacos, volume sanguíneo, vasoconstritores e
vasodilatadores.

• Hipertensão essencial ou primária: quando não é identificada


doença de base causadora do estado hipertensivo, ou seja, condição
multifatorial. Ocorre em 95% dos casos.

• Hipertensão secundária: quando são identificadas doenças


responsáveis pela gênese da hipertensão (como doença
parenquimatosa renal, estenose de artéria renal ou síndrome de
Cushing), ocorrendo em aproximadamente 5% dos casos.
QUADRO CLÍNICO
• Normalmente, o sintoma mais frequente e específico num
indivíduo hipertenso é a cefaleia suboccipital pulsátil, também
chamada de nucalgia. Além disso, epistaxe, zumbidos, turvação
visual, precordialgia e escotomas cintilantes também podem estar
presentes no quadro clínico. Em uma evolução crônica da HAS,
pode ocorrer comprometimento dos órgãos-alvo (coração, cérebro,
rim, olhos e vasos arteriais) e consequente sintomatologia
específica.

• No entanto, a maioria dos pacientes é assintomática e acaba se


descobrindo portadora de hipertensão arterial, quando sobrevém
uma lesão de órgão-alvo ou um evento cardiovascular agudo,
como uma SCA ou um AVC.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: não pode faltar a medição da PA nos dois braços,
além da verificação peso, altura, IMC, FC e circunferência
abdominal.

• Pesquisa de lesões de órgão-alvo (LOA): cerebrais (déficits


motores ou sensoriais), retinianas (lesões à fundoscopia), arteriais
(ausência de pulsos, assimetrias ou reduções, lesões cutâneas,
sopros), cardíacas (desvio do ictus, presença de B3 ou B4, sopros,
arritmias, edema periférico, crepitações pulmonares).

• Pesquisa de sinais que sugerem etiologia secundária:


características cushingoides, palpação abdominal (rins aumentados
– rim policístico), sopros abdominais ou torácicos (renovascular,
coartação de aorta, doença da aorta ou ramos), pulsos femorais
diminuídos (coartação de aorta, doença da aorta ou ramos),
diferença da PA nos braços (coartação de aorta e estenose de
subclávia).

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Rotina básica (indicada para todos os pacientes): análise de
urina, ritmo de filtração glomerular estimada (RFG-e),
eletrocardiograma convencional, glicemia de jejum, colesterol total,
HDL-c, triglicérides, creatinina plasmática, potássio e ácido úrico.
b. MAPA (Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial):
permite o registro indireto e intermitente da PA durante 24 horas ou
mais, enquanto o paciente realiza suas atividades habituais durante os
períodos de vigília e sono. Capacidade de identificar as alterações
circadianas da PA, com implicações prognósticas consideráveis. Tem
como indicações específicas a discordância importante entre a PA no
consultório e domiciliar, avaliação do descenso durante e sono, suspeita
de HAS ou falta de queda da PA durante o sono habitual em pessoas
com apneia de sono, DRC ou diabetes e avaliação da variabilidade da
PA.
c. MRPA (Monitorização Residencial da Pressão Arterial):
medição realizada com protocolo específico, consistindo na obtenção de
três medições pela manhã, antes do desjejum e da tomada da
medicação, e três à noite, antes do jantar, durante cinco dias. Outra
opção é realizar duas medições em cada uma dessas duas sessões,
durante sete dias.
d. Tanto a MAPA quanto a MRPA são indicadas na suspeita de
HAB, suspeita de HM, identificação de EAB em hipertensos, grande
variação da PA no consultório na mesma consulta ou em consultas
diferentes, hipotensão postural, pós-prandial, na sesta ou induzida por
fármacos, PA elevada de consultório ou suspeita de pré-eclâmpsia em
mulheres grávidas e confirmação de hipertensão resistente.
e. Ecocardiograma: indicado na presença de indícios de HVE ao
ECG ou pacientes com suspeita clínica de IC.
f. Radiografia de tórax: acompanhamento de pacientes com
suspeita clínica de comprometimento cardíaco e/ou pulmonar, bem
como avaliação de hipertensos com comprometimento da aorta quando
o ecocardiograma não está disponível.
g. Albuminúria: pacientes hipertensos diabéticos, com síndrome
metabólica ou com dois ou mais fatores de risco.
h. US das carótidas: presença de sopro carotídeo, sinais de doença
cerebrovascular ou presença de doença aterosclerótica em outros
territórios.
i. US renal com Doppler: pacientes com massas abdominais ou
sopro abdominal.
j. HbA1C: quando glicemia de jejum > 99 mg/dL, história familiar
de DM tipo 2 ou diagnóstico prévio de DM tipo 2 e obesidade.
k. Teste ergométrico: suspeita de doença arterial coronariana
(DAC) estável, diabetes mellitus ou antecedente familiar de DAC em
pacientes com PA controlada.
l. Velocidade de onda de pulso (VOP): hipertensos de médio e alto
risco.
m. RNM de cérebro: pacientes com distúrbios cognitivos e
demência.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Os valores de referência para o diagnóstico de HAS no cenário de cada
abordagem, bem como sua classificação em estágios podem ser observados
nas Tabelas 1 e 2. Para o estabelecimento adequado do diagnóstico de
hipertensão, observar a Figura 1. Também é imprescindível classificar todos
os pacientes de acordo com o risco cardiovascular (Figura 2 e Tabela 3) para
se estabelecer as metas de tratamento.

Categoria PAS (MMHG) PAD (mmHg)

CONSULTÓRIO ≥ 140 e/ou ≥ 90

MAPA

VIGÍLIA ≥ 135 e/ou ≥ 85

SONO ≥ 120 e/ou ≥ 70

24 HORAS ≥ 130 e/ou ≥ 80

MRPA ≥ 135 e/ou ≥ 85

Tabela 1. Valores de referência para a definição de HAS segundo o método.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

Classificação PAS (mmHg) PAD (mmHg)

NORMAL ≤ 120 ≤ 80

PRÉ-HIPERTENSÃO 121-139 81-89

HIPERTENSÃO ESTÁGIO I 140-159 90-99

HIPERTENSÃO ESTÁGIO II 160-179 100-109

HIPERTENSÃO ESTÁGIO III ≥ 180 ≥ 110

HIPERTENSÃO SISTÓLICA ISOLADA ≥ 140 < 90

Quando a PAS e a PAD situam-se em categorias diferentes, a maior deve ser


utilizada para classificação da PA. A hipertensão sistólica isolada deve ser
reclassificada entre os estágios I e III.

Tabela 2. Classificação da pressão no adulto.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

• Fatores de risco cardiovascular adicionais: idade (homem > 55


e mulheres > 65 anos), tabagismo, dislipidemias, triglicérides >
150 mg/dL, LDL-c > 100 mg/dL, HDL-c < 40 mg/dL, DM,
história familiar prematura de DCV (homens < 55 anos e mulheres
< 65 anos).

• Fatores agravantes de risco cardiovascular: história familiar de


DAC prematura em parente de primeiro grau (homem < 55 anos ou
mulher < 65 anos); diagnóstico de síndrome metabólica (SM) –
Tabela 5, conforme critérios IDF (International Diabetes
Federation); microalbuminúria (30-300 mg/g creatinina) ou
albuminúria > 300 mg/g creatinina; hipertrofia ventricular
esquerda (HVE); proteína C-reativa ultrassensível > 2 mg/L; EMI
(espessura mediointimal) de carótidas > 1,0 mm; escore de cálcio
coronário > 100 (maior que 10 em diabéticos) ou > percentil 75
para idade e sexo; ITB (índice tornozelo-braquial) < 0,9.
• Lesões de órgão-alvo (LOA): hipertrofia ventricular esquerda
(índice Sokolow-Lyon [SV1 + RV5 ou RV6] ≥ 35 mm, R em aVL
> 11 mm, índice de Cornell > 20 mm em mulheres ou 28 mm em
mulheres, ECO com índice de massa do VE > 115 g/m² nos
homens ou > 95 g/m² nas mulheres), EMI da carótida > 0,9 mm ou
placa carotídea, VOP carótido-femoral > 10 m/s, ITB < 0,9, doença
renal crônica estágio 3 (RFG-e 30-60 mL/min/1,73 m²),
albuminúria entre 30 e 300 mg/24 h ou relação albumina-creatinina
urinária 30 a 300 mg/g.

MAPA: Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial; MRPA: Monitorização Residencial da Pressão Arterial.

Figura 1. Fluxograma para diagnóstico de hipertensão arterial.


Fonte: Adaptado de Malachias.1
HFam: história familiar; DCV: doença cardiovascular.

Figura 2. Fluxograma para estimativa do risco cardiovascular global.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

PAS 130-139
HAS Estágio 1 HAS Estágio 2 HAS Estágio 3
OU PAD 85-89
Sem fator de Risco Sem Risco Adicional Risco Baixo Risco Moderado Risco Alto

1-2 fatores de risco Risco Baixo Risco Moderado Risco Alto Risco Alto

≥ 3 fatores de risco Risco Moderado Risco Alto Risco Alto Risco Alto

Presença de LOA,
Risco Alto Risco Alto Risco Alto Risco Alto
DCV, DRC ou DM

PA: pressão arterial; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; HAS: hipertensão arterial sistêmica; DCV:
doença cardiovascular.

Tabela 3. Estratificação de risco no paciente hipertenso.


Fonte: Adaptado de Malachias.1
É sempre importante estar atento para achados clínicos que possam
remeter à possibilidade de hipertensão arterial secundária (Tabela 4). Diante
destes achados, estudos adicionais devem ser solicitados.

Suspeita Diagnóstica Achados Clínicos Estudos adicionais

Questionário de Berlim,
polissonografia ou poligrafia
SAHOS Ronco, sonolência diurna residencial com 5 ou mais
episódios de apneia e/ou
hipopneia por hora de sono

Determinações de aldosterona
(>15 ng/dL) e atividade/
concentração de renina
plasmática; cálculo da relação
Hiperaldosteronismo primário HAR e/ou com hipopotassemia (não
aldosterona/renina > 30.
(hiperplasia ou adenoma) obrigatória) e/ou com nódulo adrenal
Testes confirmatórios
(furosemida e captopril).
Exames de imagem:
TC com cortes finos ou RNM

Edema, anorexia, fadiga, creatinina e Exame de urina, cálculo


Doença renal parenquimatosa ureia elevados, alterações do sedimento do RFG-e, US renal, pesquisa
urinário de albuminúria/proteinúria

Sopro abdominal, EAP súbito, alteração


US com Doppler renal e/ou
da função renal
Doença renovascular renograma, angiografia por
por medicamentos que
RNM ou TC, arteriografia renal
bloqueiam o SRAA

Pulsos em femorais ausentes ou de


amplitude diminuída,
Ecocardiograma e/ou angiografia
Coarctação de aorta PA diminuída em membros
de tórax por TC
inferiores, alterações na
radiografia de tórax

Ganho de peso, diminuição da libido,


fadiga, hirsutismo, Cortisol salivar, cortisol urinário livre de 24h e
Síndrome de Cushing
amenorreia, “fácies em lua cheia”, “giba teste de supressão: cortisol matinal (8h) e 8h
(hiperplasia, adenoma e
dorsal”, estrias após administração de dexametasona (1 mg) às
excesso de produção de ACTH)
purpúreas, obesidade central, 24h. RNM
hipopotassemia

HA paroxística com cefaleia, sudorese e Metanefrinas plasmáticas livres, catecolaminas


Feocromacitoma
palpitações séricas e metanefrinas urinárias. TC e RNM

Fadiga, ganho de peso, perda de cabelo,


Hipotireoidismo TSH e T4 livre
fraqueza muscular
Suspeita Diagnóstica Achados Clínicos Estudos adicionais

Intolerância ao calor,
perda de peso, palpitações,
Hipertireoidismo exoftalmia, hipertermia, TSH e T4 livre
reflexos exaltados,
tremores, taquicardia

Litíase urinária, osteoporose, depressão,


Hiperparatireoidismo letargia, fraqueza ou espasmos
Cálcio sérico e PTH
(hiperplasia ou adenoma) musculares,
sede, poliúria

Cefaleia, fadiga, problemas visuais,


IGF-1 e GH basal e durante teste
Acromegalia aumento de mãos,
de tolerância oral à glicose
pé e língua

SAHOS: síndrome da apneia e hipopneia obstrutiva do sono; HAR: hipertensão arterial resistente;
RFG-e: ritmo de filtração glomerular estimado; EAP: edema agudo de pulmão; SRAA: sistema
renina-angiotensina-aldosterona; TC: tomografia computadorizada; ACTH: adrenocorticotropina;
TSH: hormônio tireoestimulante; PTH: paratormônio; IGF-1: fator de crescimento
insulina-símile tipo 1; GH: hormônio do crescimento.

Tabela 4. Principais causas de HAS secundária e sinais indicativos.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

Homens ≥ 94 cm
OBESIDADE ABDOMINAL
Mulheres ≥ 80 cm

Homens < 40 mg/dL


HDL-COLESTEROL
Mulheres < 50 mg/dL

TRIGLICERÍDEOS
≥ 150 mg/dL
(OU TRATAMENTO PARA HIPERTRIGLICERIDEMIA)

PAS ≥ 130 mmHg


PA
e/ou
(OU TRATAMENTO PARA HIPERTENSÃO ARTERIAL)
PAD ≥ 85 mmHg

GLICEMIA
≥ 100 mg/dL
(OU TRATAMENTO PARA DM)

PA: pressão arterial; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica;
DM: diabetes mellitus.

Tabela 5. Critérios diagnósticos de síndrome metabólica (definida com 3 ou


mais critérios).
Fonte: Adaptado de Malachias.1

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Controle do peso (modificação do estilo de vida com maior


impacto na PA).

• Reeducação alimentar (aconselhada a dieta DASH).


• Restrição do consumo de sódio, sendo o máximo de 2 g/dia de
sódio ou 5 g de sal.

• Moderação no consumo de bebidas alcoólicas, com máximo de


30 g/dia de etanol para homens e 15 g para mulheres (15 g de
etanol correspondem aproximadamente a 1 lata de cerveja, 1 taça
de vinho ou 1 dose de destilado).

• Atividade física de leva a moderada intensidade, supervisionada


por profissional habilitado, com meta de 150 min/semana.

• Cessação do tabagismo (embora a abstenção ao tabagismo não


promova redução dos níveis tencionais, ela deve ser encorajada por
ser um importante fator de risco cardiovascular).

b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Objetivos do tratamento: O tratamento da HA não visa apenas à


redução da PA, mas principalmente a redução da morbimortalidade
cardiovascular (Tabelas 6 e 7). As classes e peculiaridades dos
anti-hipertensivo podem ser observadas nas Tabelas 6 a 16.
Abrangência
Situação Recomendações
(medida casual)

Início de intervenções no estilo Todos os estágios de hipertensão e PA 135-139/85-89


Ao diagnóstico
de vida mmHg

Início de terapia Hipertensos estágio 2 e 3 Ao diagnóstico


farmacológica
Hipertensos estágio 1 e alto risco CV Ao diagnóstico

Hipertensos idosos com idade até 79 anos PAS ≥ 140 mmHg


Abrangência
Situação Recomendações
(medida casual)
Hipertensos idosos com idade ≥ 80 anos PAS ≥ 160 mmHg

Hipertensos estágio 1 e risco Aguardar 3 a 6 meses


CV moderado ou baixo Por MEV

Indivíduos com PA 130-139/85-89 mmHg e DCV


Ao diagnóstico
preexistente ou alto risco CV

Indivíduos com PA 130-139/85-89 mmHg sem DCV


pré-existente e risco Não recomendado
CV baixo ou moderado

PA: pressão arterial; PAS: pressão arterial sistólica; CV: cardiovascular; DCV: doença cardiovascular;
MEV: modificação de estilo de vida.

Tabela 6. Recomendações para início de terapia anti-hipertensiva.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

Categoria Meta recomendada

Hipertensos estágios 1 e 2, com risco


< 140/90 mmHg
CV baixo e moderado e HA estágio 3

Hipertensos estágios 1 e 2 com risco


< 130/80 mmHg*
CV alto

CV: cardiovascular; HA: hipertensão arterial. * Para pacientes com doenças coronarianas, a PA não deve ficar < 120/70 mmHg,
particularmente com a diastólica abaixo de 60 mmHg pelo risco de hipoperfusão coronariana, lesão miocárdica e eventos
cardiovasculares.

Tabela 7. Metas pressóricas.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

Diuréticos de alça

• Furosemida 40 mg (cp) 20 mg * 1-2x/dia

• Bumetanida 1 mg (cp) 0,5 mg * 1-2x/dia

Diuréticos tiazídicos

• 25 mg e 50 mg 12,5 mg 25 mg 1x/dia
Hidroclorotiazida

• Clortalidona 12,5 mg, 25 mg e 50 mg 12,5 mg 25 mg 1x/dia


1,5 mg e 2,5 mg 2,5 mg 5 mg 1x/dia
• Indapamida

Indicação: efeitos natriuréticos com diminuição do volume extracelular.


Efeitos colaterais: diuréticos de alça (ototoxicidade, hipocalemia, hipomagnesia), tiazídicos (hipocalemia, hipomagnesemia,
hiperuricemia, hipercalcemia e dislipidemia).
Contraindicações: IC descompensada, bloqueios AV e sinoatriais, marca-passo, doença do nó sinusal e fibrilação atrial.

* Dose máxima variável de acordo com a indicação médica.

Tabela 8. Diuréticos (DIU).


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

• Alfametildopa 250 mg e 500 mg 500 mg 1500 mg 2-3x/dia

0,100 mg, 0,150 mg e


• Clonidina 0,200 mg
0,2 mg 0,6 mg 2-3x/dia

Indicação: associação a síndrome das pernas inquietas, retirada de opioides, flushes da menopausa, diarreia associada a neuropatia
diabética e hiperatividade simpática em pacientes com cirrose alcoólica.
Efeitos colaterais: reações autoimunes, como febre, anemia hemolítica, galactorreia e disfunção hepática.
Contraindicações: portador de doença do nódulo sinusal.

Tabela 9. Agentes alfa-agonistas.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

25 mg, 50 mg
• Atenolol e 100 mg
25 mg 100 mg 1-2x/dia

1,5 mg, 2,5 mg,


• Bisoprolol 5 mg, e 10 mg
1,5 mg 10 mg 1-2x/dia

3,125 mg, 6,25 mg, 12,5


• Carvedilol mg e 25 mg
12,5 mg 50 mg 1-2x/dia

25 mg, 50 mg
• Metoprolol e 100 mg
50 mg 200 mg 1-2x/dia

10 mg, 40 mg
• Propranolol e 80 mg
40 mg 240 mg 2-3x/dia

Indicação: propranolol é útil em pacientes com tremor essencial, síndromes hipercinéticas, cefaleia de origem vascular e hipertensão
portal.
Efeitos colaterais: bradicardia, BAV, hipotensão e broncoespasmo.
Contraindicações: BAVs avançados, FC < 50 bpm, hipotensão e broncoespasmo (neste caso, dar preferência para bisoprolol ou
metoprolol, que são cardiosseletivos).
Tabela 10. Betabloqueadores (BB).
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

• Doxazosina 2 mg e 4 mg 1 mg 16 mg 1x/dia

• Prazosina 1 mg, 2 mg e 4 mg 20 mg 20 mg 2-3x/dia

Indicação: associação com hipertrofia prostática benigna.


Efeitos colaterais: hipotensão sintomática, incontinência urinária em mulheres.
Contraindicações: gravidez.

Tabela 11. Alfabloqueadores.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

• Hidralazina 25 mg e 50 mg 50 mg 150 mg 2-3x/dia

Indicação: atua diretamente relaxando a musculatura lisa arterial.


Efeitos colaterais: cefaleia, flushing, taquicardia reflexa e reação lúpus-like.
Contraindicações: lúpus eritematoso sistêmico idiopático, insuficiência cardíaca de ventrículo direito.

Tabela 12. Vasodilatadores diretos.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

• Amlodipino 5 mg e 10 mg 2,5 mg 10 mg 1x/dia

20 mg, 30 mg
• Nifedipino Oros e 60 mg
30 mg 60 mg 1x/dia

• Nifedipino 10 mg e 20 mg 20 mg 60 mg 2-3x/dia
Retard

• Manidipino 10 mg e 20 mg 10 mg 20 mg 1x/dia

Indicação: alternativa no local dos betabloqueadores em situação de doença arterial coronariana.


Efeitos colaterais: edema maleolar, cefaleia latejante, tonturas.
Contraindicações: gravidez (antes de 20 semanas).

Tabela 13. Bloqueador dos canais de cálcio.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia


5 mg, 10 mg
• Enalapril e 20 mg
5 mg 40 mg 1-2x/dia

2,5 mg, 5 mg
• Ramipril e 10 mg
2,5 mg 10 mg 1x/dia

• Perindopril 4 mg e 8 mg 4 mg 8 mg 1x/dia

5 mg, 10 mg
• Lisinopril e 20 mg
5 mg 20 mg 1x/dia

Indicação: eficazes no tratamento da HAS e reduz morbimortalidade.


Efeitos colaterais: tosse seca (10% dos pacientes), angioedema, hipotensão e hipercalemia.
Contraindicações: potássio > 5,5 mEq/L, creatinina > 3,5 mg/dL, clearance < 20 mL/min/m2, angioedema, estenose bilateral de artérias
renais ou unilateral em rim único e gestantes.

Tabela 14. Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina (IECA).


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

12,5 mg, 25 mg,


• Losartana 50 mg e 100 mg
25 mg 100 mg 1x/dia

8 mg, 16 mg
• Candesartana e 32 mg
8 mg 32 mg 1x/dia

80 mg, 160 mg
• Valsartana e 320 mg
80 mg 320 mg 1x/dia

Indicação: opção para aqueles que são intolerantes aos IECA (tosse e angioedema).
Efeitos colaterais: hipotensão e hipercalemia.
Contraindicações: mesmas dos IECA, exceto angioedema.

Tabela 15. Bloqueadores do Receptor de Angiotensina II (BRA).


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose Mínima Dose Máxima Posologia

• Alisquireno 150 mg e 300 mg 150 mg 300 mg 1x/dia

Indicação: tem boa eficácia em monoterapia, de redução da PA, porém não há evidências de benefícios sobre morbimortalidade.
Efeitos colaterais: rash cutâneo, diarreia, aumento de CPK e tosse.
Contraindicações: gestantes.

Tabela 16. Inibidores diretos da renina.


Fonte: Elaborado pelos autores.
FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
A associação de anti-hipertensivos pode constituir um verdadeiro desafio
clínico, tendo em vista que devem ser respeitas combinações preferenciais e
lembrar que também existem combinações inadequadas (Figura 3).

Figura 3. Esquema preferencial de associações de medicamentos.


Fonte: Adaptado de Malachias.1
RCV: risco cardiovascular; TNM: tratamento não medicamentoso; DIU: diuréticos; IECA: inibidores da enzima de
conversão da angiotensina; BCC: bloqueador dos canais de cálcio; BRA: bloqueador do receptor
de angiotensina; BB: betabloqueadores.

Fluxograma 1 . Fluxograma de tratamento.


Fonte: Adaptado de Malachias.1

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 55 anos, etilista e
tabagista há 30 anos, portador de hiperuricemia há 15 anos (sem
histórico de gota) e DM tipo 2 há 10 anos. Faz uso regular de
Metformina de 850 mg 3x ao dia. Vem para avaliação anual de rotina,
assintomático. Em seu prontuário foi anotada PA 150 x 90 mmHg há 6
meses, sem exames complementares. Nega estar praticando atividade
física e não tentou cessar o tabagismo, mantendo dieta hiperglicídica e
hipercalórica.
b. Ectoscopia: PA 160 x 90 mmHg (duas aferições), FC 90 bpm, FR
10 rpm. Peso 100 kg e altura 1,70 m.

• Aparelho cardiovascular: BNRF em 2T, com a presença de B4.


Ausência de sopros, cliques ou estalidos.

• Aparelho respiratório: tórax atípico, MVF sem ruídos


adventícios.

• Abdome: globoso, flácido, indolor, RHA presentes, sem sopros


ou visceromegalias palpáveis.

• Demais aparelhos sem alterações.


c. Exames complementares: eletrocardiograma e radiografia de
tórax sem alterações, glicemia de jejum 180 mg/dL, glicemia pós-
prandial 146 mg/dL, colesterol total 254 mg/dL, HDL 29 mg/dL,
triglicérides 168 mg/dL, creatinina 0,8 mEq/L, ácido úrico 15 mg/dL,
potássio 3,5 mEq/L e sódio 138 mEq/L.
Trata-se de um paciente diabético que não se encontra na meta de
glicemia de jejum, não é aderente às modificações do estilo de vida,
apresentando níveis tensionais sustentados, além de dislipidemia mista.
Através da fórmula de Friedewald (vide capítulo de Dislipidemia),
encontramos um LDL-c 191 de mg/dL. Trata-se, portanto, de um paciente de
alto risco cardiovascular, tendo como metas: PA < 130 x 80 mmHg, glicemia
de jejum até 110 mg/dL, glicemia pós-prandial até 140 mg/dL, triglicérides <
150 mg/dL, LDL-c < 70 mg/dL e colesterol não LDL < 100 mg/dL. Como
sua PA está em estágio II, iremos associar medicações, sendo a nossa escolha
a Losartana (visando à nefroproteção e à redução secundária do ácido úrico)
e um DIU tiazídico (não está contraindicado pela presença hiperuricemia,
sendo que apenas o histórico de gota o seria). Além disso, está indicado o
uso de estatina de alta potência e adição do segundo antidiabético.
d. Prescrição sugerida:
1. Clortalidona 12,5 mg VO 1x ao dia.
2. Losartana 25 mg VO 1x ao dia.
3. Rosuvastatina 20 mg x ao dia.
4. Gliclazida 30 mg VO 2x ao dia.
5. Metformina 850 mg VO 3x ao dia
6. Modificações do estilo de vida: cessar tabagismo, dieta com
nutricionista, perder peso, atividade física, abando do etilismo.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Deve-se seguir rigorosamente as recomendações para a
adequada aferição da pressão arterial, como seleção do
manguito de tamanho adequado, posição, alimentação, uso de
cafeína ou fumo, bexiga vazia etc.

• A hipotensão ortostática é mais comum em idosos, diabéticos,


portadores de disautonomia e naqueles em uso de medicações anti-
hipertensivas.

• Sempre utilizar preferencialmente as classes que atuam na


redução de desfechos cardiovasculares.

• Para início de tratamento com monoterapia, a escolha da classe


tem a seguinte preferência: 1º IECA ou BRA, 2º BCC, 3º DIU
tiazídicos, 4º Espironolactona, 5º Clonidina ou betabloqueadores
com propriedades vasodilatadoras.

• Importante ressaltar que os BCC ou DIU tiazídicos podem ser a 2ª


escolha, lembrando que, se o tiazídico não for a segunda, tem que
ser a terceira.

• Espironolactona é sempre a 4ª droga.


• Os IECA e BRA são considerados os medicamentos de primeira
escolha para pacientes diabéticos porque retardam o declínio da
função renal em pacientes com nefropatia diabética, sendo
nefroprotetores.

• A Losartana é o único BRA capaz de ter como efeito colateral a


hipouricemia.

• Os diuréticos de alça terão benefício naqueles com TFG inferior


a 30 mL/min e/ou apresentem edema.

• O uso de DIU deve ser muito bem avaliado devido aos seus
efeitos colaterais, como diuréticos de alça (ototoxicidade,
hipocalemia, hipomagnesia), tiazídicos (hipocalemia,
hipomagnesemia, hiperuricemia, hipercalcemia e dislipidemia).

• O uso de DIU tiazídicos pode ser benéfico em idosos com


osteoporose.

• Os BB não são medicações de primeira escolha, mas, apesar disso,


é uma boa medicação para jovens, portadores de tremor
essencial, hipertensão portal e enxaqueca (desde que sejam
lipossolúveis).

• Em portadores de asma, DPOC e bloqueios AV de 2º ou 3º grau,


os betabloqueadores de primeira e segunda geração não devem ser
utilizados. Efeito adversos inconvenientes destas primeiras
gerações são alterações dos níveis glicêmicos e dislipidemia. Já os
BB de 3ª geração não afetam o metabolismo lipídico ou
glicídico, podendo, inclusive, contribuir para melhora.

• IECA e BRA não devem ser associados, pois os efeitos


colaterais são potencializados.

• Não se deve administrar a combinação IECA e BRA em


pacientes em uso de antagonistas de aldosterona, pelo risco de
efeitos colaterais, em especial de hipercalemia.
REFERÊNCIAS
1. Malachias MVB, Souza WKSB, Plavnik FL, Rodrigues CIS, Brandão AA, Neves MFT, et al.
7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Arq Bras Cardiol. 2016; 107(3Supl.3): 1-83.
2. Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT, Afiune Neto A et al.
Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017.
Arq Bras Cardiol. 2017; 109 (2Supl.1): 1-76.
3. Mann DL, Zipes DP, Libby P, Bonow RO. (ed.). Braunwald: Tratado de Doenças
Cardiovasculares. 10. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2018.
4. Scala LC, Magalhães LB, Machado A. Epidemiologia da hipertensão arterial sistêmica. In:
Moreira SM, Paola AV; Sociedade Brasileira de Cardiologia. Livro Texto da Sociedade
Brasileira de Cardiologia. 2. ed. São Paulo: Manole; 2015. p. 780-5.
5. James PA, Oparil S, Carter BL, Cushman WC, Dennison-Himmelfarb C, Handler J, et al.
2014 Evidence-based guideline for the management of high blood pressure in adults: report
from the panel members appointed to the Eighth Joint National Committee (JNC 8). JAMA.
2014; 311(5): 507-20.
6. Qaseem A, Wilt TJ, Rich R, Humphrey LL, Frost J, Forciea MA; et al. Pharmacologic
treatment of hypertension in adults aged 60 years or older to higher versus lower blood
pressure targets: a clinical practice guideline from the American College of Physicians and
the American Academy of Family Physicians. Ann Intern Med. 2017; 166(6): 430-7.
1.3
DISLIPIDEMIAS
Autores:
Estevão Tavares de Figueiredo
Carlos Eduardo Lins França Piau
Bianca Tavares de Figueiredo
Jean Bryally Peres
José Tasca

DEFINIÇÕES E CLASSIFICAÇÕES
CLASSIFICAÇÃO LABORATORIAL:

• Hipercolesterolemia isolada: aumento isolado do LDL-c (LDL-c


≥ 160 mg/dL).

• Hipertrigliceridemia isolada: aumento isolado dos triglicérides


(TG ≥ 150 mg/dL ou ≥ 175 mg/dL, se a amostra for obtida sem
jejum).

• Hiperlipidemia mista: aumento do LDL-c (LDL-c ≥ 160 mg/dL)


e dos TG (TG ≥ 150 mg/dL ou ≥ 175 mg/dL, se a amostra for
obtida sem jejum). Se TG ≥ 400 mg/dL, o cálculo do LDL-c pela
fórmula de Friedewald é inadequado, devendo-se considerar a
hiperlipidemia mista quando o não HDL-c ≥ 190 mg/dL.

• HDL baixo: redução do HDL-c (homens < 40 mg/dL e mulheres


< 50 mg/dL) isolada ou em associação ao aumento de LDL-c ou de
TG.

CLASSIFICAÇÃO ETIOLÓGICA:
• Causas primárias: distúrbio lipídico é de origem genética
(familiar).

• Causas secundárias: dislipidemia é decorrente de estilo de vida


inadequado, de certas condições mórbidas (IRC, síndrome
nefrótica, hepatopatia crônica, DM tipo 2, síndrome de Cushing,
hipotireoidismo, obesidade, bulimia, anorexia, tabagismo, etilismo,
ingesta excessiva de gorduras trans, sedentarismo), ou de
medicamentos (diuréticos, betabloqueadores de 1ª e 2ª geração,
anticoncepcionais, corticosteroides, anabolizantes, inibidores da
protease, isotretinoína, ciclosporina, estrógenos, progestágenos e
tibolona).

CLASSIFICAÇÃO FENOTÍPICA (FREDRICKSON):

• Não será abordada neste capítulo, pois embora se reconheça a


grande contribuição desta classificação, ela é hoje muito pouco
utilizada, pois pouco colabora para o conhecimento da etiologia
(exceto na disbetalipoproteinemia) ou da decisão terapêutica.

QUADRO CLÍNICO
• Um evento coronário agudo é a primeira manifestação da
doença aterosclerótica em pelo menos metade dos indivíduos que
apresentam esta complicação. Desta forma, a identificação dos
indivíduos assintomáticos que estão mais predispostos é crucial
para a prevenção efetiva, com a correta definição das metas
terapêuticas individuais.

• Algumas lesões cutâneas são características das dislipidemias, em


especial as de origem genética (familiar): xantomas eruptivos e
lipemia retinalis (TGL > 2.000 mg/dL), arco corneano e
xantelasmas (podem ocorrem também em indivíduos sem
dislipidemia), xantomas tendinosos (quase patognomônicos de
hipercolesterolemia familiar), xantoma palmar (muito típicos de
disbetablipoproteinemia) e xantomas tuberosos.

MARCADORES DE RISCO
CARDIOVASCULAR
ESTRATIFICADORES DE RISCO (ER)
Idade ≥ 48 anos no homem e ≥ 54 anos na mulher

Tempo de diagnóstico do diabetes > 10 anos

História familiar de parente de 1º grau com DCV prematura*

Tabagismo (pelo menos um cigarro no último mês)

Hipertensão arterial sistêmica

Síndrome metabólica

Albuminúria > 30 mg/g de creatinina e/ou retinopatia

Taxa de filtração glomerular (< 60 mL/min)

DOENÇA ATEROSCLERÓTICA SUBCLÍNICA (DASC)


Presença de placa > 1,5 mm na USG de carótida

Índice tornozelo braquial (ITB) < 0,9

Escore de CAC > 100

Presença de placa aterosclerótica na angiotomografia de coronárias

LDL-c entre 70 e 189 mg/dL, com risco calculado pelo ERG > 20% (H) ou > 10% (M)

*Antes dos 55 anos para homens e antes dos 65 anos para mulheres;
CAC: cálcio arterial coronariano; H: homem; M: mulher.

Tabela 1. Estratificados de risco (ER) e Doença aterosclerótica subclínica


(DASC).
Fonte: Adaptado da V Diretriz Brasileira sobre Dislipidemias e Prevenção da
Aterosclerose da SBC, 2017.

• Dentre os diversos algoritmos existentes, a Sociedade Brasileira


de Cardiologia recomenda a utilização do Escore de Risco Global
(ERG), que estima o risco de infarto do miocárdio, acidente
vascular encefálico, ou insuficiência cardíaca, fatais ou não fatais,
ou insuficiência vascular periférica em 10 anos. Deve ser usada na
avaliação inicial, ou mesmo em pacientes já em uso de estatina,
que não foram enquadrados em condição de muito alto risco ou
alto risco.

• Determinantes de Muito Alto Risco: indivíduos que apresentem


doença aterosclerótica significativa (coronária, cerebrovascular,
vascular periférica), com ou sem eventos clínicos, ou obstrução ≥
50% em qualquer território arterial.

• Determinantes de Alto Risco: portadores de aterosclerose na


forma subclínica documentada (US de carótidas com presença de
placa; Índice Tornozelo-Braquial < 0,9; escore de Cálcio Arterial
Coronariano > 100 ou a presença de placas ateroscleróticas na
angiotomografia de coronárias), aneurisma de aorta abdominal,
DRC com TFG < 60 mL/min (em fase não dialítica), pacientes
com LDL-c ≥ 190 mg/dL, DM tipos 1 ou 2 (com LDL-c entre 70 e
189 mg/dL ou doença aterosclerótica subclínica), pacientes com
LDL-c entre 70 e 189 mg/dL, do sexo masculino com risco
calculado pelo ERG >20% e nas mulheres >10%, pacientes com
LDL-c entre 70 e 189 mg/dL, do sexo masculino com risco
calculado pelo ERG >20% e nas mulheres >10%.

• Determinantes Risco Intermediário: indivíduos com ERG entre


5 e 20% no sexo masculino e entre 5 e 10% no sexo feminino ou
ainda os diabéticos sem os critérios de DASC (doença
aterosclerótica subclínica) ou ER listados anteriormente.

• Determinantes de Baixo Risco: pacientes do sexo masculino e


feminino com risco em 10 anos < 5%, calculado pelo ERG.

ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO CARDIOVASCULAR

• O primeiro passo é avaliar se há ou não a presença de fatores que


já classifiquem o paciente em muito alto risco. Se sim, este já é de
muito alto risco. Na ausência destes fatores, vamos para o segundo
passo.
• O segundo passo é verificar se o paciente é portador de diabetes
mellitus tipo 1 ou 2. Em caso positivo, utilizar os estratificadores
de risco (ER) e de doença aterosclerótica subclínica (DASC). A
presença de ER ou DASC classifica o paciente como sendo de alto
risco. Se ausentes, risco intermediário. A presença de DASC em
não portadores de DM classifica estes pacientes como sendo de
alto risco.

• Caso o paciente não se enquadre em nenhuma das situações


acima, deve-se calcular o risco. Para isso utilizamos tabelas de
pontuação ou, de maneira mais prática nos dias de hoje, o ERG
pode ser encontrado pelo aplicativo obtido no site do
Departamento de Aterosclerose da SBC para os sistemas Android
e IOS.

ER: estratificadores de Risco; DASC: doença aterosclerótica subclínica; ERG: escore de risco global.

Figura 1. Estratificação do risco cardiovascular.


Fonte:

METAS DE TRATAMENTO
• Muito alto risco: o LDL-c < 50 mg/dL e o não HDL-c < 80
mg/dL.

• Alto risco: o LDL-c < 70 mg/dL e o não HDL-c < 100 mg/dL.
• Risco intermediário: o LDL-c < 100 mg/dL e o não HDL-c <
130 mg/dL.

• Baixo risco: meta de LDL-c deve ser < 130 mg/dL e o não HDL-c
< 160 mg/dL.

• Triglicérides: caso estejam em valores ≥ 500 mg/dL, e somente


neste caso, o objetivo primário do tratamento deve ser a sua
redução (pelo risco de pancreatite), deixando para um segundo
plano as metas de LDL-c e não HDL-c. Sua meta são valores
abaixo de 150 mg/dL.

• HDL-c: não são propostas metas para o HDL-c e não se


recomenda tratamento medicamentoso visando à sua elevação (até
o momento, estudos de intervenção falharam em demonstrar
benefício clínico por meio da elevação do HDL-c). Sua meta são
valores ≥ 50 mg/dL.

TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Indicado para todos os pacientes, independente do risco


cardiovascular. No entanto, podemos tentar apenas tratamento não
farmacológico por 3 meses em pacientes de risco intermediário e
por 6 meses naqueles de baixo risco. Os demais, já devem receber
medidas farmacológicas deste o início.

• Redução: do peso, da ingestão de bebidas alcoólicas, da ingestão


de açúcares simples, da ingestão de carboidratos.
• Cessar tabagismo.
• Substituição (parcial) ácidos graxos saturados por mono e poli-
insaturados.

• Aumento da ingestão de fibras.


• Consumo ≥ 2 porções de peixes ricos em ômega 3 por semana.
• Atividade física.
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Indicações: pacientes de alto e muito alto risco (desde o início,


associados à tratamento não medicamentoso) e naqueles com falha
das modificações de estilo de vida por 3 meses (risco
intermediário) ou 6 meses (risco baixo).
Estatinas Apresentações Potência

• Sinvastatina 10, 20, 40 e 80 mg 20-80 mg (intermediária)

• Pravastatina 10, 20 e 40 mg 40 mg (intermediária)

• Fluvastatina 20, 50 e 80 mg 80 mg (intermediária)

• Pitavastatina 1, 2 e 4 mg intermediária

• Atorvastatina 10, 20, 40 e 80 mg 40-80 mg (alta)

• Rosuvastatina 5, 10, 20 e 40 mg 20-40 mg (alta)

Recomendações: são primeira opção na prevenção primária e secundária. Dosagem de CK deve ser avaliada no início do
tratamento, principalmente em indivíduos de alto risco de eventos musculares. A dosagem rotineira de CK não é recomendada,
exceto se ocorrerem sintomas musculares ou na introdução de fármacos que interajam com as estatinas, ou ao se elevar a dose
destas. Dosagem de enzimas hepáticas (AST e ALT) deve ser realizada no início do tratamento. Dosagem de enzimas hepáticas
durante o tratamento apenas se sinais e sintomas de hepatotoxicidade.
Potência: as estatinas podem reduzir o LDL-c em > 50% (alta potência), entre 30-50% (intermediária potência) e até 30% (baixa
potência). Após esta redução inicial, a cada vez que dobramos dose da mesma estatina, obtemos uma redução adicional de LDL-c
de 6 a 7%.
Mecanismo de ação: inibidores da HMG-CoA redutase, com consequente diminuição do colesterol intracelular e aumento da
expressão de receptores de LDL-c. Assim, diminuem o LDL-c em até 55% e os triglicérides em 7 a 28%, podendo elevar o HDL-c
de 2 a 10%.
Suspensão: se houver aumento da CPK > 10 vezes o LSN e sinais de hepatotoxicidade (icterícia, hepatomegalia, aumento da
bilirrubina direta e do INR). Em caso de elevações das transaminases em mais de 3 vezes o LSN, é recomendada a investigação de
outras etiologias e a suspensão fica a critério médico.

Ezetimiba Apresentações Potência

• Ezetimiba 10 mg 1 x ao dia

Recomendações: adição quando a meta do LDL-c não é atingida com estatina em dose máxima tolerada em pacientes em
prevenção secundária; quando a meta do LDL-c não é atingida com estatina em dose máxima tolerada na prevenção primária;
isolada ou associada a estatinas em paciente que não tolerem doses recomendadas de estatinas; esteatose hepática.
Mecanismo de ação: inibe a absorção de colesterol na borda em escova do intestino delgado, atuando seletivamente nos
receptores NPC1-L1 e inibindo o transporte intestinal de colesterol. De maneira isolada podem reduzir de 10 a 25% do LDL-c.
Cuidados: Raros efeitos colaterais têm sido apontados e estão em geral relacionados com o trânsito intestinal. Por precaução,
recomenda-se que ela não seja utilizada em casos de dislipidemia com doença hepática aguda.

Resinas Apresentações Potência

• Colestiramina 4 g/envelope 2x ao dia (até 24 g/dia)

Recomendações: em adição ao tratamento com estatina quando a meta de LDL-c não é atingida. Único fármaco liberado para
mulheres em período reprodutivo, amamentação e gestação.
Mecanismo de ação: redução da absorção enteral de ácidos biliares, causando depleção do colesterol celular hepático,
estimulando síntese de LDLR (receptor de LD-c) e de colesterol endógeno. Como consequência deste estímulo à síntese, pode
ocorrer aumento da produção de VLDL e, consequentemente, de TGL plasmáticos.
Cuidados: interfere muito na absorção de outras medicações, devendo ser ingerida em horário distinto. A suplementação de
vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) e ácido fólico pode ser necessária em alguns casos. Evitar em paciente com TG aumentados
(especialmente se níveis maiores de 400 mg/dL).

Tabela 2. Medicamentos com maior ação nas taxas de colesterol.


Fonte: Elaborado pelos autores.

FIBRATOS APRESENTAÇÕES POTÊNCIA

• Genfibrozila 600 e 900 mg 1 a 2 x ao dia (máx. 1200 mg)

• Fenofibrato 160, 200 e 250 mg 1 x ao dia

• Bezafibrato 200 mg 2 a 3x ao dia

• Ciprofibrato 100 mg 1x ao dia

Recomendações: TGL > 500 mg/dL ou em pacientes com TGL > 204 mg/dL e HDL-c < 34 mg/dL, isolado ou associado a
estatinas.
Mecanismo de ação: estimulação dos receptores PPAR-α, aumentado a produção e ação da lipase lipoproteica, com consequente
redução dos triglicérides em 30 a 60% (quanto maior o valor basal, maior a redução) e aumento de HDL-c em 7 a 11%. Os valores
de LDL-c podem se manter, diminuir ou até aumentar.
Cuidados: interfere muito na absorção de outras medicações, devendo ser ingerida em horário distinto. A suplementação de
vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) e ácido fólico pode ser necessária em alguns casos. Evitar em paciente com TGL
aumentados (especialmente se níveis maiores de 400 mg/dL). Não é recomendada a associação de genfibrozila com estatinas,
devido ao elevado risco de rabdomiólise.
ÁCIDO NICOTÍNICO APRESENTAÇÕES POTÊNCIA

• Niacina 500 mg 1 x ao dia (máx. 2 g)

Recomendações: HDL-c baixo isolado, e como alternativa aos fibratos e estatinas, ou em associação a estes fármacos em
portadores de hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia ou com dislipidemia mista resistente.
Mecanismo de ação: reduz a ação da lipase tecidual nos adipócitos, levando à menor liberação de ácidos graxos livres para a
corrente sanguínea. Como consequência, reduz-se a síntese de TGL pelos hepatócitos. Reduz ainda o LDL-c em 5 a 25%; aumenta
o HDL-c em 15 a 35%; e diminui o TGL em 20 a 50%.
Cuidados: preferir formulações de liberação prolongada pela menor incidência de efeitos colaterais como rubor e prurido.
Ingestão de bebidas alcoólicas não é recomendada e pode ser associado AAS antes da sua ingestão para também reduzir efeitos
indesejáveis.

Tabela 3. Medicamentos com maior ação nas taxas de triglicérides.


Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 42 anos, previamente
hipertenso em uso de Losartana 25 mg/dia, assintomático, comparece
em consulta para avaliação de rotina. Nega tabagismo e etilismo. Dieta
hipercalórica. Sedentário. Ectoscopia: PA 130 x 80 mmHg, FC 85 bpm,
FR 15 rpm, acianótico, anictérico. 92 Kg, altura 1,73 m (IMC = 30,7).
Exame físico geral e específico sem alterações. ECG de 12 derivações
dentro dos limites de normalidade.
b. Exames laboratoriais: hemograma e função renal normais. TGO
29 mg/dL, TGP 52 mg/dL, glicemia jejum 98 mg/dL, HbA1C 5,5%,
colesterol total 283 mg/dL, HDL-c 26 mg/dL, triglicérides 206 mg/dL.
c. Conduta: através da fórmula de Friedewald, encontramos o
LDL-c (215 mg/dL). Trata-se de um paciente com obesidade grau I,
sedentário e portador de hiperlipidemia mista (vide classificação
laboratorial no início deste capítulo). Através da calculadora de ERG ou
mesmo pelo valor de LDL-c já classificamos tal paciente como sendo
de alto risco. Assim, deve receber orientações para tratamento não
farmacológico, bem como para tratamento farmacológico. Temos por
objetivo uma meta de LDL-c < 70 mg/dL, bem como um colesterol não
HDL-c < 100 mg/dL e triglicérides < 150 mg/dL. Como temos metas
bem apertadas, será necessária estatina de alta potência.
d. Prescrição sugerida:
1. Atorvastatina 40 a 80 mg/dia ou
2. Rosuvastatina 20 a 40 mg/dia ou
3. Associação de Sinvastatina 40 mg + Ezetimiba 10 mg.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Fórmula de Friedewald: LDL = CT - HDL - TGL .
5

• O perfil lipídico completo pode ser coletado sem jejum,


mantendo-se o estado metabólico estável e dieta habitual.

• Os valores de colesterol total, HDL-c, não HDL-c e LDL-c não


sofrem influência do estado alimentar. Os níveis de triglicérides
são diferentes no estado com e sem jejum.

• Na maioria dos laboratórios, o LDL-c é calculado pela fórmula de


Friedewald ou analisado por dosagem. Em paciente com valores
de triglicérides > 400 mg/dL a fórmula perde sua acurácia, mas
utilizando fatores de correção.

• Nos pacientes que apresentem TGL > 400 mg/dL, o cálculo do


colesterol não HDL é preferível à análise do LDL. Colesterol não
HDL = CT - HDL.

• A dosagem de Lp(a) não é recomendada de rotina na avaliação


do risco cardiovascular, podendo ser solicitada na estratificação de
risco na hipercolesterolemia familiar e naqueles com alto risco de
doença coronária prematura.

• A dosagem da proteína C-reativa ultrassensível pode ser


empregada na estratificação de risco cardiovascular e possui
capacidade de reclassificação nos indivíduos de risco
intermediário.

• Para a estratificação de risco cardiovascular em pacientes em uso


de estatinas deve-se multiplicar o colesterol total por 1.43, como
utilizado em alguns ensaios clínicos que tomam por base uma
redução média de 30% do colesterol total com estatinas.

• Para indivíduos de alto e muito alto risco cardiovascular,


sempre que possível e tolerado, deve-se dar preferência para o uso
de estatina de alta intensidade ou ezetimiba associada à estatina
(sinvastatina 40 mg ou outra estatina com potência pelo menos
equivalente).

• O escore de risco é dinâmico, pois o controle dos fatores de risco,


por meio de intervenções não farmacológicas ou farmacológicas,
reduz o risco calculado do paciente. Portanto, na vigência de
medicamentos hipolipemiantes, mesmo que o valor absoluto de
LDL-c alcançado seja muito menor do que a meta atual
preconizada pelo ERG, a dose e a intensidade de tratamento não
devem ser modificadas. A objetivo não é a redução dos valores
do exame e sim diminuir eventos cardiovasculares.

• Desde 2011, após recomendação da FDA, não se utiliza mais a


sinvastatina em doses de 80 mg.

• Pela meia vida mais longa, a rosuvastatina e atorvastatina não


necessitam ser ingeridas após o jantar, podendo serem
administradas a qualquer horário.

• Não se recomenda fibratos em uso isolado ou associado a


estatina para redução de risco cardiovascular. Porém o uso de
fibratos associados a estatina reduziu doenças microvasculares.

• Em pacientes com doença renal crônica adultos em diálise, o


início da estatina ou a combinação de estatina/ezetimibe não é
recomendado.

• No Brasil, as formulações disponíveis de ômega-3 têm


concentrações baixas e distantes daquelas utilizadas em estudos
que recomendaram a suplementação.

• Novas drogas, algumas já aprovadas para uso no Brasil, tem uso


recente e sua recomendação ainda não foi feita formalmente em
diretrizes nacionais. Exemplos promissores são: inibidores da
CETEP e inibidores da PCSK-9.

REFERÊNCIAS
1. Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT, Afiune Neto A et al.
Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017.
Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76.
2. Mann DL, Zipes DP, Libby P, Bonow RO. (ed.). Braunwald: Tratado de Doenças
Cardiovasculares. 10. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
3. Grundy SM, Stone NJ, Bailey AL, et al. AHA, ACC, AACVPR, AAPA, ABC, ACPM,
ADA, AGS, APhA, ASPC, NLA and PCNA. Guideline on the Management of Blood
Cholesterol: Executive Summary: a report of the American College of Cardiology/American
Heart Association Task Force on clinical practice guidelines. J Am Coll Cardiol.
2019;73(24):3168–3209.
4. Karlson BW, Palmer MK, Nicholls SJ, et al. A VOYAGER meta-analysis of the impact of
statin therapy on low-density lipoprotein cholesterol and triglyceride levels in patients with
hypertriglyceridemia. Am J Cardiol. 2016;117(9):1444–1448.
5. Wang D, Liu B, Tao W, et al. Fibrates for secondary prevention of cardiovascular disease and
stroke. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(10):CD009580.
6. Aung T, Halsey J, Kromhout D, et al. Associations of omega-3 fatty acid supplement use
with cardiovascular disease risks: meta-analysis of 10 trials involving 77917 individuals.
JAMA Cardiol. 2018;3(3):225–234.
1.4
SÍNDROMES CORONARIANAS
AGUDAS
Autores:
Estevão Tavares de Figueiredo
Leonardo Jordan Hansen Vizzotto
Jean Bryally Peres
Vitória de Cássia da Silva Moreira

DEFINIÇÕES
• Na metade do século XIX a OMS (Organização Mundial da
Saúde) apresentou a primeira definição de infarto do miocárdio
(IM), com a introdução de novas tecnologias que melhoraram a
abordagem clínica foram elaboradas outras definições para o IM. A
definição em vigência desde 2018 – quarta definição mundial de
IM – caracteriza essa situação como a presença de lesão aguda
miocárdica associada a níveis anormais dos biomarcadores
cardíacos com quadro clínico que evidencie isquemia
miocárdica aguda. Neste capítulo o IM será abordado
minuciosamente de acordo com esta definição.

• Síndromes coronarianas agudas são um conjunto de sinais e


sintomas secundários a obstrução completa ou parcial de uma
ou mais artérias coronárias, surgimento em repouso, duração
prolongada e com piora progressiva dos sintomas. Clinicamente
podem ser classificadas pelo eletrocardiograma e marcadores
de necrose miocárdica:

• Síndrome coronariana aguda com supradesnivelamento do


segmento ST (SCACSST): representada por alterações
importantes no ECG de admissão – e representada pelo infarto
agudo do miocárdio com supradesnivelamento de segmento ST
(IAM CSST).

• Síndrome coronariana aguda sem supradesnivelamento do


segmento ST (SCASSST): representada pela Angina Instável e
Infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do
segmento ST (IAM SSST). A diferença entre elas consiste na
elevação dos biomarcadores miocárdicos que ocorre no IAM
SSST e está ausente na angina instável.

ETIOLOGIA, FISIOPATOLOGIA E
CLASSIFICAÇÃO
• De acordo com a quarta definição mundial de IM (2018) as
categorias de SCACSST e SSST são complementadas com a
classificação dos tipos de IM (1 a 5), os quais são fundamentados
nas diferenças clínicas, fisiopatológicas, prognósticas e de
tratamento.

• IM tipo 1: causado por doença aterotrombótica coronariana


(DAC) e precedido por instabilização de placa aterosclerótica,
formação de trombo associada a embolização distal coronariana
e consequente evento isquêmico miocárdico. É imprescindível
classificar o IM tipo 1 dentre as modalidades de SCA por meio de
avaliação eletrocardiográfica e biomarcadores cardíacos –
principalmente com curva de troponina (cTn) definir
abordagem terapêutica adequada.

SCACSST: ocorre oclusão total da coronária, que define IAM


CSST, e formação de trombo “vermelho” – composto em
grande parte por fibrina – por isso, o tratamento com
fibrinolíticos está indicado.

SCASSST: oclusão subtotal ou total com circulação


colateral efetiva. Caso ocorra necrose miocárdica e
consequente alteração de biomarcadores miocárdicos
caracteriza-se o IAM SSST, caso a isquemia seja transitória e
não resulte em necrose está definida angina instável.

• IM tipo 2: lesão miocárdica isquêmica aguda secundária ao


desequilíbrio entre a oferta tecidual cardíaca e consumo
miocárdico de oxigênio que pode ser precipitada por agente
estressor. A magnitude e ocorrência do IM tipo 2 varia de acordo
com a presença de alterações cardíacas estruturais, DAC,
presença e intensidade de agente estressor. Esse desequilíbrio
entre oferta/demanda de O2 é de etiologia multifatorial como
podemos observar na tabela a seguir.

CAUSAS DE IM TIPO 2

• Aterosclerose com estenose e sem ruptura; • Hipertensão severa associada ou não a


hipertrofia ventricular;

• Vasoespasmo coronariano; • Bradiarritmia severa;


• Disfunção microvascular coronariana; • Insuficiência respiratória;
• Embolismo coronariano não associado com • Anemia severa;
ruptura de placa aterosclerótica;

• Dissecção coronariana; • Hipotensão/ choque.


• Taquiarritmia sustentada;
Tabela 01: Causas de desequilíbrio entre oferta e consumo de oxigênio pelo
miocárdio e consequentes etiologias do IM do tipo 2.
Fonte: Fourth universal definition of myocardial infarction (2018), european
Societyof cardiology. European Heart Journal (2019) 40, 237–269.

• IM tipo 3: morte súbita de origem cardíaca associado a quadro


clínico sugestivo de isquemia miocárdica e alterações
eletrocardiográficas ou fibrilação ventricular. Nestes casos os
pacientes evoluem para óbito sem tempo hábil para que ocorra
coleta de troponina ou apesar da coleta não ocorre alteração
desses marcadores. O diagnóstico do IM tipo 3 é realizado em
autópsia.

• IM tipo 4: secundária à procedimentos de intervenção


miocárdica para reperfusão. IM relacionado com o procedimento
ou reflexo a complicações mais tardias em dispositivos utilizados,
como por exemplo trombose do stent. Clinicamente é identificada
com:

cTn superior ao percentil 99 > 5 que vezes o limite de


referência (P99 ALR) em pacientes com valores abaixo do
P99 ALR antes do procedimento;

cTn anterior ao procedimento elevada acima do P99 ALR em


linha de base estável, porém apresenta nova elevação > 20%
após o procedimento.

• Possui as subclassificações a seguir:


4 A: após intervenção coronariana percutânea (ICP). Devem
haver evidências de isquemia miocárdica: alterações
eletrocardiográficas, exames de imagem ou complicações
relatadas no procedimento.

4 B: IM após trombose de stent ou prótese, segue os mesmos


critérios que o IM 4 A.

4 C: IM secundário a reestenose de stent ou de área com


angioplastia prévia por balão.

• IM tipo 5: ocorre após revascularização miocárdica com


bypass. Clinicamente identificado com elevação cTn > que 10
vezes do P99 ALR quando o paciente apresenta valores pré
revascularização normais ou elevação > 20% quando apresenta
elevação de cTn estabilizada. Também deve apresentar evidência
de isquemia miocárdica por meio de alterações eletrocardiográficas
ou em exames de imagem.

Imagem 01: IM tipo 1 e tipo 2 e as prováveis causas.


Fonte: Adaptado de Fourth universal definition of myocardial infarction
(2018), european Society of cardiology. European Heart Journal (2019) 40,
237–269.
QUADRO CLÍNICO
• Dor torácica: principal sintoma sugestivo de síndrome
coronariana aguda. Deve ser avaliada cuidadosamente, pois
apresenta uma gama de diagnósticos diferenciais (tabela 01).

• Características da dor torácica que sugerem isquemia


miocárdica: dor prolongada - duração entre 20 a 30 minutos;
intensa, em aperto, constrição, peso ou queimação. Pode ter
início em repouso ou após estresse físico. Diminui a intensidade
com repouso e uso de vasodilatadores coronarianos. Pode
irradiar para epigástrio, membros superiores, pescoço e
mandíbula.

• Equivalentes isquêmicos: dispnéia, náusea, êmese, diaforese,


palpitações e parada cardiorrespiratória, podem ser a única
forma de manifestação da SCA. Cerca de 30% dos casos de
isquemia miocárdica não apresentam dor torácica, principalmente
em idosos, diabéticos, mulheres, usuários de marcapasso e
transplantados cardíacos.
Patologia Diferencial

ESTENOSE AÓRTICA Sopro sistólico em foco aórtico

Melhora da dor na posição sentada com inclinação para frente e evidência


PERICARDITE
de atrito pericárdio ao exame físico.

Semelhante à pericardite, porém associado a arritmias ventriculares e


MIOCARDITE
insuficiência cardíaca.

DISSECÇÃO AGUDA DA AORTA Dor intensa dissecante com irradiação para o dorso.

Dor retroesternal intensa com piora após deglutição e inspiração


RUPTURA ESOFÁGICA E MEDIASTINITE
profunda.

Pirose retroesternal ascendente, podendo estar acompanhada de


DOENÇA DO REFLUXO GE
regurgitação.

EMBOLIA PULMONAR Dor pleurítica acompanhada de dispnéia.

HIPERTENSÃO PULMONAR Dor em aperto retroesternal após esforço.


PNEUMONIA Dor pleurítica associada a febre, tosse e expectoração.

Tabela 02: principais diagnósticos diferenciais das síndromes coronarianas


agudas com dor torácica.
Fonte: Adaptado de Santos, E. D. S. D., & Timerman, A. (2018). Dor
torácica na sala de emergência: quem fica e quem pode ser liberado? Rev.
Soc. Cardiol. Estado de Säo Paulo, 394-402.

Característica Alta Intermediária Baixa

Dor como principal sintoma,


QUADRO Antecedente de doença arterial Sintomas de isquemia na ausência
idade >70 anos; diabetes
CLÍNICO crônica, angina prévia. de características intermediárias.
mellitus.

Hipotensão, edema pulmonar,


EXAME Doença vascular extra
diaforese, estertores Dor torácica à palpação.
FÍSICO coronariana.
pulmonares.

Tabela 03: probabilidade de a dor torácica representar SCA


Fonte: Adaptado de Santos, E. D. S. D., & Timerman, A. (2018). Dor
torácica na sala de emergência: quem fica e quem pode ser liberado? Rev.
Soc. Cardiol. Estado de Säo Paulo, 394-402.

Classificação da dor torácica:

• Tipo A – definitivamente anginosa: início em repouso ou após


estresse, em aperto ou queimação, com irradiação para ombro,
mandíbula e face interna do membro superior, apresenta alívio com
repouso e nitrato.

• Tipo B – provavelmente anginosa: a isquemia miocárdica é a


principal hipótese, porém diferentemente da dor tipo A são
necessários exames complementares para definição diagnóstica.

• Tipo C – possivelmente anginosa: neste tipo de dor a isquemia


miocárdica deixa de ser a principal hipótese, no entanto ainda são
necessários exames laboratoriais para excluir esta etiologia.

• Tipo D – definitivamente não anginosa: dor torácica atípica,


insuficiência coronariana não é possibilidade diagnóstica. Recebe
alta hospitalar caso eletrocardiograma não apresente alterações.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia e sinais vitais: presença de cianose de extremidades,
queda na saturação de pulso, hipotensão ou hipertensão
arterial, alterações do estado mental, pele diaforética. Parâmetros
importantes, pois, permitem estabelecer o estado geral do
paciente e a condição hemodinâmica.

• Aparelho respiratório: Ausculta pode ser normal, apresentar


estertores finos que, a depender da gravidade, podem se estender
das bases aos ápices pulmonares; macicez à percussão e redução
ou ausência de murmúrio vesicular.

• Aparelho cardiovascular: pode apresentar-se normal ou com


ritmo irregular, presença de 3ª (disfunção ventricular severa) e 4ª
bulha; sopro cardíaco (insuficiência mitral por disfunção/ruptura
do músculo papilar ou comunicação interventricular pós-IAM);
atrito pericárdico (grandes infartos transmurais).

• Maior parte dos achados no exame físico são inespecíficos e


podem estar ausentes.

• No IAM com supradesnivelamento de ST é possível realizar a


classificação de killip-kimball:

I – Sem dispneia, estertores ou B3

II – Dispneia, estertores discretos, B3 ou turgência jugular


patológica.

III – Edema agudo de pulmão


IV – Choque cardiogênico

DIAGNÓSTICO
Abordagem inicial da dor torácica ou sintoma equivalente isquêmico:

• Monitorização completa (ECG, PA, FC, SatO ); 2

• Oxigenoterapia, se saturação de pulso < 90%;


• Veia (acesso venoso);
• Eletrocardiograma em 10 minutos: permitirá diferenciar SCA
CSST de SCA SSST e dessa forma a conduta adequada para cada
situação, caso o ECG não apresente alterações deve ser realizado
de maneira seriada, pois aumenta a sensibilidade na detecção de
eventos coronarianos.
Alterações eletrocardiográficas da SCA CSST:

• Bloqueio de ramo esquerdo novo ou supostamente novo.


Avaliação por meio dos critérios de Sgarbossa em bloqueios de
ramo esquerdo (BRE):

Elevação de SST associada a BRE ≥ 1 mm concordante com


QRS: 5 pontos;

Depressão de SST ≥ 1 mm associada a BRE em V1, V2 e V3:


3 pontos;

Elevação de SST ≥ 5 mm associado a BRE discordante com


o QRS: 2 pontos.

Resultado ≥ 3 pontos: 98% de especificidade e 36% de


sensibilidade para IAM CSST.
• Supradesnivelamento do segmento ST em duas ou mais
derivações contíguas: elevação do SST acima de 1,5mm em
mulheres, acima de 2mm em homens com mais de 40 anos, acima
de 2,5 mm em homens com menos de 40 anos nas derivações V2 e
V3. Nas demais derivações considera-se elevações com 1mm ou
mais. Mais detalhes sobre o ECG e síndrome coronariana estão no
capítulo “Eletrocardiograma”.
Alterações eletrocardiográficas da SCA SSST:

• Onda T apiculada e simétrica, com ST retificado


• Onda T invertida e simétrica, com ST retificado
• Infradesnivelamento do segmento ST
• Em até 50% dos casos de SCA SSST o ECG é inespecífico. Ou
seja: ECG normal não exclui IM!
Biomarcadores cardíacos: solicitadas em todos os suspeitos de SCA e
repetidas após 6 e 12 horas. Com o advento das troponinas ultrassensíveis,
podemos descartar IM em até 3 horas.

• Troponinas (cTn): biomarcadores de injúria miocárdica de


escolha, Troponina I (cTnI) – não se elevam com lesão de tecidos
extra cardíacos. Troponina T (cTnT), o teste laboratorial pode
detectar proteínas marcadoras de lesão de músculo esquelético e
resultar em resultado falso positivo.

• Troponinas ultrassensíveis (hs-cTn): maior sensibilidade na


detecção de lesão miocárdica cerca de dez a cem vezes, permite
diagnóstico precoce. São recomendadas para utilização em
investigação de rotina.

• CKMB: amplamente disponível, porém menos específica e menos


sensível.
Imagem 02: conduta no paciente com dor torácica aguda de acordo com os
níveis de troponina ultrassensível.
Fonte: Adaptado de ESC Guidelines for the management of acute coronary
syndromes in patients presenting without persistent ST-segment elevation.

O critério que marca lesão miocárdica, consiste na elevação dos valores


de troponina acima do P99 do ALR. Caso ocorra ascensão abrupta nos
níveis séricos da cTn o evento é definido como agudo. Para ser classificado
como IM deve estar associado a outros critérios (clínicos ou
eletrocardiográficos) que sugiram isquemia miocárdica. Eventos de lesão
miocárdica crônica são marcados por níveis persistentemente elevados de
cTn e sem variações significativas.

Imagem 03: curva de troponina na injúria miocárdica aguda e crônica em


gráfico relacionando tempo de sintomatologia e níveis séricos de troponina.
Fonte: Adaptado de Fourth universal definition of myocardial infarction
(2018), European Society of Cardiology. European Heart Journal (2019) 40,
237–269.

Critérios gerais

Alteração dos níveis de troponina com pelo menos 1 valor acima do P99 ALR associado a pelo menos 1 dos seguintes
achados:

Sintomatologia sugestiva de isquemia miocárdica;


Alterações eletrocardiográficas correspondentes à isquemia;

Surgimento de ondas Q patológicas do eletrocardiograma;

Evidência em exames de imagem de perda aguda de cardiomiócitos viáveis ou zona de mobilidade da parede ventricular
inadequada supostamente nova.

IM tipo 1: identificação de tromboembolismo coronariano em angiografia ou autópsia.

IM tipo 2: identificação de achado sugestivo de desequilíbrio entre a oferta e consumo de oxigênio miocárdico.

Tabela 04: critérios para diagnóstico de IM do tipo 1 e tipo 2:


Fonte: Adaptado de Fourth universal definition of myocardial infarction
(2018), european Society of cardiology. European Heart Journal (2019) 40,
237–269.

Causas de elevação de troponina:


Etiologia por injúria miocárdica:

• Ruptura de placa aterosclerótica com evento • Desequilíbrio entre oferta e consumo de O2


tromboembólico associado; (descritos nas causas de IM tipo 2).

Outras etiologias de origem cardíaca:

• Insuficiência cardíaca; • Síndrome de Takotsubo;


• Miocardite; • Desfibrilação;
• Qualquer tipo de cardiomiopatia; • Ablação cardíaca por cateter;
• Contusão cardíaca; • Procedimentos cardíacos em geral;
Etiologias de origem sistêmica:

• Distúrbios infecciosos e sepse; • Tromboembolismo pulmonar, hipertensão


pulmonar;

• Exercício extenuante; • Agentes quimioterápicos;


• Acidente vascular encefálico, hemorragia • Doenças infiltrativas;
subaracnóidea;

• Insuficiência renal crônica • Doentes críticos.


Tabela 05: causas de elevação de troponina cardíaca de etiologia cardíaca e
sistêmica.
Fonte: Adaptado de Fourth universal definition of myocardial infarction
(2018), european Society of cardiology. European Heart Journal (2019) 40,
237–269.
ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO
• Escore GRACE: permite estimar o risco de mortalidade intra-
hospitalar na SCA e contribui para a tomada de decisões da
equipe médica e exames complementares. A estratificação de
risco não deve atrasar a terapêutica inicial.
Variável pontos

<29 0
30-39 8
40-49 18
IDADE 50-59 36
(ANOS) 60-69 55
70-79 73
80-89 91
>90 100

I 0
II 20
KILLIP-KIMBALL
III 39
IV 59

<79 24
80-99 22
PRESSÃO ARTERIAL 100-119 18
SISTÓLICA 120-139 14
(MMHG) 140-159 10
160-199 4
>200 0

<49 0
50-69 3
FREQUÊNCIA 70-89 9
CARDÍACA 90-109 14
(BPM) 110-149 23
150-199 35
>200 43

0-0,39 1
0,4-0,79 3
0,8-1,19 5
CREATININA 1,2-1,59 7
1,6-1,99 9
2,0-3,99 15
>4 20

PARADA
Sim 39
CARDIORRESPIRATÓRIA
Não 0
(PCR) NA ADMISSÃO
Variável pontos

DESVIO DO Sim 28
SEGMENTO ST Não 0

ENZIMAS CARDÍACAS Sim 14


POSITIVAS Não 0

Tabela 06. Escore de Grace para classificação de risco na SCA:


Fonte: Adaptado de V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre
tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnível do segmento
ST (2015).

• Resultado:
<108: baixo risco para óbito hospitalar – <1%;

Entre 109 e 140: risco intermediário – mortalidade entre 1% e


3%;

>140: alto risco – mortalidade > 3%.


HISTÓRIA / APRESENTAÇÃO CLÍNICA PONTUAÇÃO

Idade ≥ 65 anos 1

≥ 3 fatores de risco para doença arterial coronariana 1

Estenose coronária conhecida ≥ 50% 1

Uso de AAS últimos 7 dias 1

2 ou + episódios de dor torácica nas últimas 24h 1

Troponina positiva 1

Infradesnivelamento do SST ≥ 0,5mm 1

Tabela 07. Escore de TIMI para classificação de risco na SCASSST:


Fonte: Adaptado da Atualização da Diretriz de Ressuscitação
Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade
Brasileira de Cardiologia – 2019.
• Resultado:
≤ 2 pontos: baixo risco - outros escores de risco devem ser
utilizados para avaliar manejo mais agressivo ou invasivo;

3 a 4 pontos: risco intermediário - pode exigir estratégia


invasiva precoce;

> 4 pontos: alto risco - estratégia invasiva precoce.

Vale a pena relembrar os fatores de risco para doença arterial


coronariana (DAC): tabagismo, hipertensão arterial, dislipidemia, história
familiar de DAC precoce – homens antes dos 55 anos e mulheres anterior
aos 65 anos, diabetes mellitus.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Laboratoriais: indicados para todos os pacientes com suspeita
de SCA - glicemia, eletrólitos, função renal, hemograma,
coagulograma.

• Radiografia de tórax: avaliar diagnósticos diferenciais como


dissecção aguda de aorta e complicações como edema pulmonar,
também indicada a todo paciente suspeito de SCA.

• Teste Ergométrico: indicado para pacientes de baixo risco,


assintomáticos e com marcadores bioquímicos normais. Deve
ser realizado, idealmente, até 12 horas na mesma
hospitalização, antes da alta. A ecocardiografia com estresse é
uma alternativa aos pacientes de baixo risco que não podem
realizar o teste ergométrico.
• Cintilografia em repouso: pode auxiliar no diagnóstico
diferencial de dor torácica vigente e alternativa ao teste
ergométrico.

• Ecocardiograma: indicado para realizar diagnóstico diferencial


com outras doenças (valvopatias, pericardiopatias, embolia
pulmonar) quando houver suspeita e para avaliar também
complicações do IAM como CIV, ruptura de parede livre,
tamponamento cardíaco, insuficiência mitral aguda, ruptura de
músculo papilar, além de detectar novas alterações de
contratilidade o que poderia servir para diagnóstico de reinfarto.

• Angiotomografia de Coronárias: pacientes com dor torácica e de


risco baixo a intermediário, MNM negativos e ECG
inespecífico.

• Cineangiocoronariografia: padrão-ouro no estudo da anatomia


coronariana. Indicada juntamente com intervenção coronária
percutânea nos casos de SCCSST com evolução < 12 horas e
idealmente em 90 minutos. Na SCASSST é indicada de acordo
com os critérios da tabela 03.

Cineangiocoronariografia Cineangiocoronariografia
imediata precoce

Realizada em até 2 horas do início dos sintomas. Realizada em até 24 horas.

Angina refratária ou recorrente, mesmo com Nenhum dos achados que indiquem
tratamento adequado. intervenção imediata.

Alterações dinâmicas ou recorrentes do SST


Escore GRACE >140.
e onda T.

Arritmias ameaçadoras ou PCR. Escore TIMI ≥ 5.

Insuficiência cardíaca aguda. IAM CSST.

Instabilidade hemodinâmica ou choque


Alterações dinâmicas do SST ou onda T.
cardiogênico.

Complicações mecânicas da SCASSST.

Tabela 08: indicações para terapia intervencionista nas SCASSST:


Fonte: Elaborado pelos autores
Imagem 04: indicações gerais de Cineangiocoronariografia (cateterismo)
nas síndromes coronarianas agudas.
Fonte: Adaptado de ESC Guidelines for the management of acute coronary
syndromes in patients presenting without persistent ST-segment elevation.

TRATAMENTO
Após a abordagem inicial da dor torácica e evidência de SCA CSST
iniciam-se as condutas gerais e específicas para promover conforto e
melhor prognóstico.
1. Oxigenioterapia: reduz a hipóxia no território isquêmico. Indicada
quando saturação de oxigênio < 90%.
2. Nitratos: promove melhora sintomática, sem benefício
prognóstico. Não deve ser usada em hipotensos ou após uso de
inibidores da fosfodiesterase (sildenafil e tadalafil). Se não houver
melhora sintomática recomenda-se o uso de opioides. Não utilizar
em IM de VD.
3. Morfina: promove redução da dor e do consumo de oxigênio.
Não utilizar em IM de VD.
4. Antiagregantes plaquetários: fundamental no manejo da SCA.
Ácido acetilsalicílico associado com as novas classes de
Antiagregantes (clopidogrel, prasugrel, ticagrelor).
5. Anticoagulantes: reduz a progressão de eventos trombóticos,
podem ser usados: heparina não fracionada e heparina de baixo
peso molecular.
6. Inibidores do sistema renina-angiotensina-aldosterona: reduzem
a mortalidade após IAM, independente da terapia de reperfusão.
Maior benefício em IAM de parede anterior, evolução com
congestão pulmonar e fração de ejeção do VE < 40%. Não devem
ser utilizados se PAS < 100 mmHg na admissão. Primeira opção
IECA, caso haja intolerância pode ser utilizado bloqueadores dos
receptores da angiotensina (BRA).
7. Betabloqueadores: Promovem a diminuição da FC, contratilidade e
consequente redução do consumo de oxigênio pelo miocárdio.
Contraindicações: disfunção moderada a grave de VE, edema
pulmonar, bradicardia, hipotensão, perfusão de extremidades
diminuída, bloqueios atrioventriculares, hiper-reatividade de vias
aéreas. Recomenda-se utilizar, na ausência das contraindicações,
com início nas primeiras 24 horas.
8. Antagonistas dos canais de cálcio: reduzem a contratilidade
miocárdica, tônus vascular, velocidade de condução
atrioventricular e atividade do nodo sinusal. Indicado quando
existem contraindicações aos betabloqueadores, angina de
Prinzmetal e isquemia refratária ao tratamento com nitratos e
betabloqueadores sem disfunção de VE. Preferir cardiosseletivos:
verapamil ou diltiazem.
9. Estatinas e hipolipemiantes: reduzem a incidência de eventos
cardiovasculares maiores, indicação de início nas primeiras 24
horas. Caso o paciente já esteja em uso desses medicamentos estes
não devem ser interrompidos na hospitalização. Preferência para
estatinas de alta potência como: Rosuvastatina, Atorvastatina,
Sinvastatina + Ezetimiba.
10. Terapias de reperfusão: Indicação de reperfusão química ou
mecânica: IAM CSST < 12 horas de evolução ou 12-24 h com
persistência de sintomas e SST.
Trombolíticos: idealmente iniciados em até 30 minutos.
Podem ser utilizados: estreptoquinase (preferido para > 75
anos), alteplase e tenecteplase (eleição).

Angioplastia primária: tempo ideal em até 90 minutos,


realizada reperfusão mecânica com angioplastia se estenose
coronariana.
11. Em IAM de parede inferior é comum ocorrer IAM de VD
associado: nesses casos ocorre hipotensão e constitui
contradinicação importante para o uso de nitrato e morfina. No IAM
de VD a hipotensão deve ser manejada com reposição volêmica.
12. Manejo após angioplastia: avaliar risco de eventos
tromboembólicos e de sangramentos na vigência de anticoagulantes
orais para decisão do manejo da antiagregação plaquetária.
Recomenda-se instituir dupla antiagregação plaquetária por no
mínimo 12 meses após angioplastia por SCA. Em pacientes com
risco hemorrágico muito elevado pode ser modificada para um
tempo mínimo de 6 meses.
FÁRMACOS
Droga Dose Inicial
Nitratos

• Ataque: 5mg SL 2 a 3 doses a cada 5 minutos


• Mononitrato de Isossorbida
• Manutenção: 0,8mg/Kg a cada 8 a 12 horas.
• Nitroglicerina • 5μg/min.
Opioides

• Morfina • 2 a 4mg a cada 15 minutos.


• Meperidina • 20 a 50 mg/dia a cada 3-4 horas.
Tabela 09. Nitratos e opioides e doses recomendadas
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose
Nitratos

• Ataque: 300 mg VO
• Ácido Acetilsalicílico (AAS)
• Manutenção: 100mg/dia VO
Inibidores do Receptor P2Y12

• Ataque: 300-600 mg VO
• Clopidogrel • > 75 anos: 75 mg VO
• Manutenção: 75 mg/dia por até 12 meses VO
• Ticagrelor • Ataque: 180 mg VO
• Primeira escolha, se disponível. • Manutenção: 90 mg 12/12h VO
• Prasugrel • Ataque: 60 mg VO
• Não indicado de rotina – alto risco de • Manutenção: 10 mg/dia VO
sangramento;
• ≥ 75 anos: ½ dose
• Indicado durante ou após angioplastia com
stent.
• < 60Kg: ½ dose
Inibidores da Glicoproteína IIb/IIIa

• Ataque: 0,25 mg/Kg EV in bolus


• Abciximab
• Manutenção: 0,125 μg/Kg/min
• Tirofiban • Ataque: 25μg/Kg EV in bolus
• Manutenção: 0,15μg/min
Análogo ATP

• Ataque: 30 mcg/kg em bolus.


• Cangrelor
• Manutenção: 4mcg/kg/ minute em BIC.
Tabela 10. Antiagregantes plaquetários e doses recomendadas
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose

• Ataque: 60-70 UI/Kg EV in bolus


• (Máximo: 4.000 UI)
• Heparina Não Fracionada (HNF)
• Manutenção: 12 UI/Kg/h
• (Máximo: 1.000 UI/h)
• Ataque: 30mg/Kg EV in bolus
(IAMCSST trombolisado)

• Heparina de Baixo Peso Molecular (HBPM) • Manutenção: 1mg/Kg SC 12/12h


• > 75 anos: 0,75mg SC 12/12h
• TFG < 30mL/min: 1mg/dia
• Ataque: 2,5mg EV (IAMCSST)
• Fondaparinux
• Manutenção: 2,5mg SC ao dia
Tabela 11. Anticoagulantes e doses recomendadas.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose inicial Dose alvo

• Captopril • 6,25 mg VO 8/8h • 50 mg VO 8/8h


• Enalapril • 2,5 mg VO 12/12h • 20 mg VO 12/12h
• Ramipril • 1,25 mg VO /dia • 10 mg VO /dia
• Perindopril • 2 mg VO /dia • 16 mg VO /dia
• Lisinopril • 2,5 mg VO /dia • 40 mg VO /dia
Contraindicações: potássio > 5,5 mEq/L, creatinina > 3,5 mg/dL, clearance
< 20 mL/min/m2, angioedema, estenose bilateral de artérias renais ou unilateral
em rim único e gestantes. Essa classe de drogas atua como inibidora
do sistema renina-angiotensina-aldosterona.
Tabela 11. Anticoagulantes e doses recomendadas.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose recomendada

• Verapamil • 80 a 100 mg VO de 8/8 horas


• Diltiazem
• 60 mg VO 3 a 4 vezes ao dia.
• Preferência na angina instável
Tabela 13. Antagonistas dos canais de cálcio cardiosseletivos e doses
recomendadas:
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose inicial Dose alvo

• Bisoprolol • 1,25 mg VO/dia • 10 mg VO /dia


• Metoprolol • 25 mg VO /dia • 200 mg VO /dia
• Carvedilol • 3,125 mg VO 12/12h • 50 mg VO 12/12h
Tabela 14. Betabloqueadores e doses recomendadas:
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose

• Sinvastatina + Ezetimiba • 40 mg + 10 mg VO dia


• Rosuvastatina • 20 a 40mg/dia
• Atorvastatina • 40 a 80 mg VO/dia
Meta: fração LDL do colesterol entre 50 – 70 mg/dl.

Tabela 15. Estatinas e doses recomendadas:


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Dose

• Estreptoquinase (SK) • 1.500.000 UI em 100mL SF0,9% EV


em 30-60 minutos.

• 15mg EV in bolus, seguido de 0,75 mg/kg EV


• Alteplase (tPA) em 30 minutos e 0,5 mg/Kg EV
em 60 minutos.
• Tenecteplase (TNK-tPA) • <60Kg: 30 mg EV
• Escolha • 60-70Kg: 35 mg EV
• 70-80Kg: 40 mg EV
• 80-90Kg: 45 mg EV
• >90Kg: 50 mg EV
• >75 anos: ½ dose pelo peso
Tabela 16. Agentes Fibrinolíticos
Fonte: Elaborado pelos autores.

Contraindicações Absolutas Contraindicações Relativas

• História de AVC isquêmico > 3 meses ou


• Qualquer sangramento intracraniano prévio doenças intracranianas não listadas nas
contraindicações absoluta

• AVC isquêmico nos últimos 3 meses • Gravidez

• Dano ou neoplasia no sistema • Uso atual de antagonistas da vitamina K:


quanto maior o INR maior o risco de
nervoso central
sangramento

• Trauma significante na cabeça ou rosto nos


• Sangramento interno recente < 2-4 semanas
últimos 3 meses

• Sangramento ativo ou diátese hemorrágica • Ressuscitação cardiopulmonar traumática e


prolongada ou cirurgia de grande porte <3
(exceto menstruação)
semanas

• Qualquer lesão vascular cerebral conhecida • Hipertensão arterial não controlada


(malformação arteriovenosa) (PAS>180mmHg ou PAD>110mmHg)

• Dissecção aguda de aorta • Punções não compressíveis


• Discrasia sanguínea • Discrasia sanguínea
- • História de hipertensão arterial crônica
importante e não controlada

- • Úlcera péptica ativa


- • Exposição prévia à estreptoquinase
(somente para estreptoquinase)

Tabela 17. Contraindicações aos fibrinolíticos


Fonte: V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento
do Infarto Agudo do Miocardiocom Supradesnivel do Segmento ST. Arq
Bras Cardiol. 2015; 105(2):1-105.

• Intervenção Coronariana Percutânea (ICP)


ICP primária: pacientes com IAMCSST com “tempo de
porta-balão” inferior a 90 minutos. Melhor opção para a
obtenção da reperfusão coronária, quando disponível. Indicada
quando há contraindicação à trombólise ou em caso de choque
cardiogênico.

ICP de resgate: quando a terapia fibrinolítica falha em


atingir a reperfusão miocárdica - evidência de isquemia
miocárdica persistente e/ou ausência de 50% de redução do
supradesnivelamento do ST.

ICP após fibrinólise eficaz: paciente estável


hemodinamicamente e reperfusão farmacológica de sucesso:
entre 3 e 24h após fibrinolítico.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma de diagnóstico e tratamento das síndromes coronarianas agudas.
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente H.W.P., 63 anos, masculino, chega ao P.S.
trazido pelo SAMU, após ter sido reanimado por 8 ciclos de RCP +
Desfibrilação (FV/TV) em sua residência. Familiares relatam que o
paciente se deitou após o almoço, assintomático, porém, após cerca de
aproximadamente 40 minutos, quando um dos familiares entrou no
quarto, notou que ele não respondia aos estímulos, acionando o SAMU.
b. Antecedentes: Hipertenso sem controle adequado. Tabagista há
46 anos (40 cigarros/dia). Fazia uso esporádico de Diazepam 5 mg
quando estava muito nervoso. Pai era valvulopata e faleceu aos 58 anos
devido complicações de ICC descompensada. Negaram alergias.
c. Exame físico: Sedado, pupilas mióticas e fotorreativas, IOT +
VM, Sat. O2: 92%, FC = 100 bpm, PA = 100 / 60 mmHg, em uso de
Noradrenalina (1 mcg/Kg/min) e Dobutamina (12 mcg/Kg/min). Na
avaliação cardiopulmonar foi evidenciado estertores creptantes
bilaterais até 1/3 médio, BRNF 2T, s/ sopros, cliques e estalidos e
presença de B4. Pulsos palpáveis e simétricos bilateralmente. Melhora
da perfusão após emprego das Drogas Vasoativas.
d. Exames complementares: ECG de admissão evidencia ritmo
rinusal, sem desvio de eixo, e presença de Supradesnivelamento do
Segmento ST de V1 – V6. Sem outras alterações.
e. Hipótsese diagnóstica: IAMCST ANTERIOR EXTENSO +
CHOQUE CARDIOGÊNICO
f. CONDUTA: Como o hospital possui serviço de hemodinâmica, o
paciente foi encaminhado à este setor, recebendo rapidamente, por
SNG, dose de ataque de AAS 300mg + clopidogrel 600mg. Foi
submetido à Coronariografia + Angioplastia Primária com implante de
stent em segmento proximal de ADA (artéria descendente anterior), não
possuía outras lesões coronarianas e então posteriormente encaminhado
à UTI/UCO, onde permaneceu por 5 dias. Realizou ecocardiograma
transtorácico, foram administradas medicações que reduzem
morbimortalidade, algumas delas ainda em otimização. Recebeu alta
para enfermaria onde se recupera bem.
g. Prescrição sugerida para otimização clínica na enfermaria:
1. Dieta oral;
2. Enoxaparina 1 mg/Kg de 12/12h;
3. AAS 100 mg VO após o almoço;
4. Clopidogrel 75 mg VO após o almoço;
5. Enalapril 10 mg VO de 12/12h;
6. Metoprolol 50mg VO pela manhã;
7. Atorvastatina 40 mg VO 1x ao dia;
8. Considerar uso de benzodiazepínicos se abstinência ou
insônia/agitação.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Diante de dor torácica ou sintomas equivalentes isquêmicos
deve-se ter atenção redobrada, pois SCA é o principal
diagnóstico e confere alto risco de mortalidade ao paciente,
principalmente se não for abordada da maneira adequada.

• Caso o ECG de admissão do paciente suspeito para SCA não


apresente anormalidades é importante que ele seja repetido após
20 minutos e caso ainda persista sem anormalidades deve ser
seriado, juntamente com os marcadores de necrose miocárdica.

• A classificação de risco deve ser realizada, pois permite indicar


exames complementares e terapêutica de forma mais acurada,
porém não deve atrasar o manejo terapêutico da SCA.

• Em casos em que existe suspeita de dissecção aguda de aorta


esse diagnóstico deve ser excluído antes de iniciar a terapia para
IM, pois a antiagregação plaquetária e anticoagulação pioram
significativamente o quadro desta situação clínica. Sempre
verificar se os pulsos estão simétricos, caso contrário deve ser
realizado angiotomografia para descartar dissecção de aorta.

• O D-dímero estará elevado em dissecção de aorta e


tromboembolismo pulmonar.
• A irradiação da dor em pacientes com SCA não ocorre para o
trapézio e abaixo do umbigo, devendo ser pesquisado
diagnósticos diferenciais.

• Na anamnese dos pacientes suspeitos para SCA devem ser


investigados medicamentos de usos diários, uso de drogas,
antecedentes familiares para eventos cardiovasculares e fatores
que contraindicam o tratamento fibrinolítico.

• O uso de inibidores da fosfodiesterase (sildenafil e tadalafil)


contraindicam o uso dos nitratos por pelo menos 48 horas da
última dose.

• Quando o tempo para realizar angioplastia percutânea for maior


que 90 minutos deve ser realizada fibrinólise e referenciamento
do paciente para serviço que possua essa modalidade de
intervenção até no máximo 24 horas.

• A utilização de oxigênio complementar em pacientes que não


apresentam indicação pode piorar o quadro de isquemia
devido a espasmo coronariano.

• Sempre que ocorrer supra de SST nas derivações de parede


inferior deve ser realizado ECG com derivações V3R e V4R
para descartar IM de VD.

REFERÊNCIAS
1. Piegas, L. S., Timerman, A., Feitosa, G. S., Nicolau, J. C., Mattos, L. A. P., Andrade, M. D.,
... & Mansur, A. P. (2015). V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre
tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnível do segmento ST. Arquivos
brasileiros de cardiologia, 105(2), 1-121.
2. Santos, E. D. S. D., & Timerman, A. (2018). Dor torácica na sala de emergência: quem fica e
quem pode ser liberado? Rev. Soc. Cardiol. Estado de Säo Paulo, 394-402.
3. V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento do Infarto Agudo do
Miocárdio com Supradesnível do Segmento ST. Arq Bras Cardiol. 2015; 105(2):1-105.
4. Pesaro et al. Síndromes coronarianas agudas: como fazer um diagnóstico correto na sala de
emergência. Einstein. 2007; 5(1):80-84
5. Thygesen, K., Alpert, J. S., Jaffe, A. S., Chaitman, B. R., Bax, J. J., Morrow, D. A., & White,
H. D. (2018). Fourth universal definition of myocardial infarction (2018). Journal of the
American College of Cardiology, 72(18), 2231-2264.Macias M, Peachey J, Mattu A, Brady
WJ. The electrocardiogram in the ACS patient: high-risk electrocardiographic presentation
lacking anatomically oriented ST-segment elevation. Am J Emerg Med. 2015
6. BassanF & Bassan R. Revista da Sociedade de Cardiologia do Rio Grande do Sul – Ano XV
nº 07 Jan/Fev/Mar/Abr 2006
7. Bernoche, C., Timerman, S., Polastri, T. F., Giannetti, N. S., Siqueira, A. W. D. S., Piscopo,
A., ... & Quilici, A. P. (2019). Atualização da Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e
Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia-2019.
Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 113(3), 449-663.
8. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Angina Instável e Infarto Agudo do
Miocárdio sem Supradesnível do Segmento ST (II Edição, 2007) –Atualização 2013/2014.
Arq Bras Cardiol 2014; 102(3Supl.1):1-61
9. Authors/Task Force Members, Hamm, C. W., Bassand, J. P., Agewall, S., Bax, J., Boersma,
E., ... & Huber, K. (2011). ESC Guidelines for the management of acute coronary syndromes
in patients presenting without persistent ST-segment elevation: The Task Force for the
management of acute coronary syndromes (ACS) in patients presenting without persistent
ST-segment elevation of the European Society of Cardiology (ESC). European heart
journal, 32(23), 2999-3054.
1.5
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
CRÔNICA
Autores:
Estevão Tavares de Figueiredo
Bianca Tavares de Figueiredo
Jean Bryally Peres

DEFINIÇÕES
• IC (Insuficiência Cardíaca): síndrome decorrente da
incapacidade do coração em ofertar um débito cardíaco adequado
às demandas metabólicas ou o faz às custas de altas pressões de
enchimento. Estes sinais e sintomas vem acompanhados da
elevação de peptídeos natriuréticos e alterações ecocardiográficas
(disfunção sistólica, disfunção diastólica e alterações estruturais).

• ICFER: IC com fração de ejeção Reduzida (< 40%).


• ICFEP: IC com fração de ejeção Preservada (≥ 50%).
• ICFEI: IC com fração de ejeção intermediária (40-49%).
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• No Brasil as etiologias mais comuns de são: isquêmica (30%),
hipertensiva (20%), chagásica (11%) e alcoólica (2%). Outras
causas menos comuns são as miocardites, arritmias, valvopatias,
doenças infiltrativas (amiloidose, hemocromatose), idiopática e
causada por agentes quimioterápicos (p. ex.: doxorrubicina,
ciclofosfamida, transtuzumabe).

• A fisiopatologia da IC baseia-se a ativação de eixos neuro-


hormonais que, a princípio mantem o paciente assintomático, mas
a longo prazo se mostram como mecanismos que desencadeiam
apoptose dos miócitos e remodelamento cardíaco.

• Ativação do SRAA: maior retenção de sódio e água, com


aumento do volume sistólico e débito cardíaco a curto prazo. A
longo prazo, a aldosterona é deletéria.

• Ativação do sistema adrenérgico: aumento da frequência


cardíaca e do débito cardíaco a curto prazo. A longo prazo a
adrenalina é tóxica aos miócitos.

• Aumento da produção de ADH: maior retenção de água.


QUADRO CLÍNICO
• Quadro decorrente de baixo débito: intolerância a exercícios,
fadiga, adinamia, anorexia, hipotensão, taquicardia, má perfusão
periférica (extremidades frias), síncope ou pré-síncope, diminuição
do débito urinário, cianose.

• Quadro decorrente da congestão (por disfunção de câmaras


esquerdas): dispneia aos esforços, ortopneia, dispneia paroxística
noturna, tosse.

• Quadro decorrente de congestão (por disfunção de câmaras


direitas): edema de membros inferiores, aumento do volume
abdominal por ascite e hepatomegalia, dor em hipocôndrio direito,
plenitude pós-prandial, inapetência.
EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: cianose, taquicardia, pressão percentual de pulso (PA
sistólica – PA diastólica/PA sistólica) < 25%, sugerindo baixo
débito cardíaco, baixa oxigenação periférica (medida na oximetria
de pulso), aumento do tempo de enchimento capilar, edema de
membro inferiores com sinal do cacifo ou mesmo anasarca.

• Aparelho respiratório: estertores finos, que podem se estender


das bases (quadros iniciais ou cronificados) aos ápices pulmonares
(em descompensações agudas ou edema agudo de pulmão), sibilos
(“asma cardíaca”), macicez à percussão e diminuição ou ausência
de murmúrio vesicular em derrames pleurais.

• Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular ou irregular


(fibrilação atrial é a arritmia mais comum), sopros sistólicos em
geral regurgitativos (insuficiência mitral e tricúspide secundárias à
dilatação das câmaras), B3 na ICFER (por disfunção sistólica), B4
na ICFEP (por disfunção diastólica).

• Aparelho gastrointestinal: aumento do volume abdominal,


macicez móvel ou sinal do piparote presentes (a depender do nível
de ascite), dor à palpação do hipocôndrio direito, refluxo
hepatojugular.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Eletrocardiograma (ECG): fibrilação atrial, taquicardia sinusal,
sinais de sobrecargas ventriculares e atriais (vide capítulo de
ECG), ondas Q (área inativa devido infarto prévio), baixa
voltagem (derrame pericárdico e doenças infiltrativas), BRD +
BDAS (cardiopatia chagásica), BRE (valor prognóstico).
• Radiografia de tórax: aumento da área cardíaca, sinais de
congestão pulmonar (linhas B de Kerley, borramento peri-hilar),
derrame pleural.

• Biomarcadores: BNP > 35 pg/mL e/ou NT-pró-BNP > 125


pg/mL. Os pontos de corte dos peptídeos natriuréticos são
diferentes na IC aguda:

BNP > 400 pg/mL indica IC, de 100 a 400 pg/mL não afasta IC
e BNP < 100 pg/mL sugere outra etiologia para dispneia.

NT-pró-BNP > 450 pg/mL (até 50 anos), 900 pg/mL (50-75


anos) ou 1.800 pg/mL (acima de 75 anos) indica IC e NT-pró-
BNP < 300 pg/mL sugere outra etiologia.

• Bioquímica: hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio,


função hepática, TSH, glicemia, HbA1C, sorologia para Chagas (2
metodologias), perfil do ferro, urina rotina (EAS).

• Holter: pesquisa de arritmias e isquemia silenciosa.


• Ecocardiograma: método de eleição por determinar a função
sistólica, além de fornecer informações relativas a etiologia.

• Cintilografia de perfusão miocárdica: avalia função


ventricular, viabilidade miocárdica, pesquisa de isquemia e
inflamação.

• Ergoespirometria: pesquisa de coronariopatia, estima


prognóstico (através do VO2), indicando candidatos ao transplante,
auxilia da diferenciação entre dispneia cardiogênica e pulmonar.

• Cineangiocoronariografia: na suspeita de doença arterial


coronariana.
• Outros exames (indicações mais restritas e específicas):
ressonância magnética cardíaca e biópsia endomiocárdica.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Maiores Menores

• Dispneia paroxística noturna • Edema de tornozelos bilateral


• Turgência jugular • Tosse noturna
• Crepitações pulmonar • Dispneia aos esforços habituais
• Cardiomegalia (RX tórax) • Hepatomegalia
• Edema agudo de pulmão • Derrame pleural
• Perda de Peso > 4,5 Kg (5 dias de tratamento) • Taquicardia (FC > 120 bpm)
• PVC > 16 cmH2O • Diminuição da capacidade vital em 1/3
• Refluxo hepatojugular -

• Terceira bulha (B3) -

De acordo com os critérios de Framinghan, o diagnóstico de IC é estabelecido pela presença simultânea de 2 critérios
maiores ou 1 critério maior + 2 critérios menores.

Tabela 1. Critérios de Framingham para o diagnóstico de Insuficiência


Cardíaca.
Fonte: Adaptado de Comitê organizador da Diretriz de Insuficiência
Cardíaca.¹

A Paciente com fatores de risco, mas sem doença estrutural cardíaca

B Lesão estrutural, sem sintomas de insuficiência cardíaca

C Lesão estrutural, com sintomas atuais ou prévios de insuficiência cardíaca

D Insuficiência cardíaca refratária ao tratamento convencional

Tabela 2. Estágios da Insuficiência Cardíaca conforme a American Heart


Association.
Fonte: Adaptado de Yancy³
I Paciente não apresenta sintomas nas atividades cotidianas

II Sintomas leves em atividades cotidianas

III Sintomas em atividades menos intensas que as cotidianas ou pequenos esforços

IV Sintomas em repouso ou aos mínimos esforços

NYHA: New York Heart Association.

Tabela 3. Classificação da IC de acordo com sintomas conforme a NYHA.


Fonte: Adaptado de Yancy³

TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO


• Dieta saudável com restrição do consumo de sal em até 7 gramas
por dia.

• Abandono do tabagismo e etilismo, pesagem diária e evitar uso


de AINEs.

• Restrição hídrica até 1.500 mL (se NYHA III ou IV, Na+ < 135
mEq/L ou anasarca).

• Reabilitação cardiovascular em centro especializado.


• Vacinação anual contra Influenza e a cada 5 anos contra
Pneumococo.

• Tratamento adequado de todas as comorbidades.


TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
• Objetivos do tratamento: alívio dos sintomas, prevenção de
hospitalização e prevenção de morte prematura. O tratamento
farmacológico é a pedra angular na ICFEP (as evidências para uma
terapia eficaz em pacientes com ICFER são limitadas).
CONTROLE DE SINTOMAS E MORBIDADE:
Droga Apresentações Dose Inicial
Diuréticos de alça

• Furosemida 40 mg (cp) e 20 mg (amp) 20 a 240 mg/dia

• Bumetanida 1 mg (cp) 0,5 a 2 mg/dia

Diuréticos tiazídicos

• Hidroclorotiazida 25 mg e 50 mg (cp) 12,5 a 50 mg/dia

• Clortalidona 12,5 mg, 25mg e 50mg (cp) 12,5 a 50 mg/dia

• Indapamida 1,5 mg e 2,5 mg (cp) 2,5 a 5 mg/dia

• Indicação: alívio de sintomas relacionado à congestão pulmonar e sistêmica.


• Efeitos colaterais: diuréticos de alça (ototoxicidade, hipocalemia, hipomagnesia), tiazídicos (hipocalemia,
hipomagnesemia, hiperuricemia, hipercalcemia e dislipidemia).
• Contraindicações: IC descompensada, bloqueios AV e sinoatriais, marcapasso, doença do nó sinusal e
fibrilação atrial.

Tabela 4. Diuréticos.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo

• Ivabradina 5 mg e 7,5 mg (cp) 5 mg 12/12 h 7,5 mg 12/12 h

• Indicação: pacientes com FE ≤ 35%, sintomáticos a despeito de tratamento ótimo com a maior dose de BB
tolerada, em ritmo sinusal e FC ≥ 70 bpm.
• Efeitos colaterais: fosfenos (aparecimento de luzes no campo visual) e bradicardia.
• Contraindicações: IC descompensada, bloqueios AV e sinoatriais, marcapasso, doença do nó sinusal e
fibrilação atrial.

Tabela 5. Bloqueador do cálcio


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo


0,25 mg (cp) 0,125 a 0,5 mg 1x/dia 0,5 a 0,9 ng/mL
• Digoxina
• Indicação: pacientes com FE < 45%, sintomáticos apesar do tratamento otimizado. Também tem permanece
razoável a indicação em pacientes com FA sintomáticos, apesar de terapêutica otimizada (incluindo BB), para
controle de frequência ventricular.
• Efeitos colaterais: náuseas, inapetência, vômitos, anorexia, xantopsia, arritmias (extrassístoles ventriculares,
bloqueios e taquicardias atriais).
• Contraindicações: bloqueios AV, doença do nó sinusal, pré-excitação e hipocalêmicos.
Tabela 6. Digitálicos.
Fonte: Elaborado pelos autores.

DIMINUIÇÃO DA MORTALIDADE:
Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo

1,25 mg, 2,5 mg, 5 mg e 10


• Bisoprolol mg
1,25 mg 1x/dia 10 mg 1x/dia

25 mg, 50 mg
• Metoprolol e 100 mg
25 mg 1x/dia 200 mg 1x/dia

3,125 mg, 6,25 mg,


• Carvedilol 12,5 mg e 25 mg
3,125 mg 2x/dia 50 mg 2x/dia

• Indicação: todos os pacientes com disfunção do VE estável sintomática, havendo benefício também para
assintomáticos. Visar uma FC (frequência cardíaca) alvo entre 50 e 60 bpm. Iniciar em doses baixas, com aumento
progressivo a cada 2 semanas.
• Efeitos colaterais: piora transitória da IC, bradicardia, BAV, hipotensão e broncoespasmo.
• Contraindicações: BAVs avançados, FC < 50 bpm, hipotensão e broncoespasmo (neste caso dar preferência
para bisoprolol ou metoprolol, que são cardiosseletivos).

Tabela 7. Betabloqueadores (BB).


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo

12,5 mg, 25 mg
• Captopril e 50 mg
6,25 mg 3x/dia 50 mg 3x/dia

5 mg, 10 mg
• Enalapril e 20 mg
2,5 mg 2x/dia 20 mg 2x/dia

2,5 mg, 5 mg
• Ramipril e 10 mg
1,25 mg 1x/dia 10 mg 1x/dia

• Perindopril 4 mg e 8 mg 2 mg 1x/dia 16 mg 1x/dia

5 mg, 10 mg
• Lisinopril e 20 mg
2,5 mg 1x/dia 40 mg 1x/dia

• Indicação: pacientes disfunção do VE sintomática.


• Efeitos colaterais: tosse seca (10% dos pacientes), angioedema, hipotensão e hipercalemia.
• Contraindicações: potássio > 5,5 mEq/L, creatinina > 3,5 mg/dL, clearance < 20 mL/min/m2, angioedema,
estenose bilateral de artérias renais ou unilateral em rim único e gestantes.

Tabela 8. Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina (IECA).


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo

12,5 mg, 25 mg, 50 mg e


• Losartana 100 mg
25 mg 1x/dia 150 mg 1x/dia

8 mg, 16 mg
• Candesartana e 32 mg
4 mg 1x/dia 32 mg 1x/dia

80 mg, 160 mg
• Valsartana e 320 mg
40 mg 1x/dia 320 1x/dia

• Indicação: opção para aqueles que são intolerantes aos IECA (tosse e angioedema).
• Efeitos colaterais: hipotensão e hipercalemia.
• Contraindicações: mesmas dos IECA, exceto angioedema.
Tabela 9. Bloqueadores do Receptor de Angiotensina II (BRA).
Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo

• 25 mg, 50 mg
25 mg 1x/dia 50 mg 1x/dia
e 100 mg
Espironolactona

• Indicação: disfunção de VE sintomática, associado ao tratamento padrão com IECA e BB.


• Efeitos colaterais: hipercalemia, ginecomastia e mastodinia.
• Contraindicações: pacientes com insuficiência renal avançada (creatinina > 2,5 mg/dL) e em pacientes com
hipercalemia persistente (em geral potássio > 5,5 mEq/L).

Tabela 10. Antagonistas da Aldosterona.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Droga Apresentações Dose inicial Dose alvo

• Sacubitril / 24/26 mg, 49/51 mg


24/26 mg 2x/dia 97/103 mg 2x/dia
e 97/103 mg
Valsartana

• Indicação: em substituição do IECA (ou BRA), para disfunção de VE sintomática, já em uso de terapêutica
otimizada com terapia tripla (BB, IECA ou BRA e Espironolactona).
• Efeitos colaterais: hipotensão ortostática.
• Contraindicações: concomitantemente ou dentro de 36 horas da última dose de IECA, histórico de angioedema
com IECA, clearance de creatinina < 30 mL/Kg/1,73 m2, potássio < 5,4 mEq/L e gestação.

Tabela 11. Inibidor da neprilisina e dos receptores de angiotensina (INRA).


Fonte: Elaborado pelos autores.

DROGA APRESENTAÇÕES DOSE INICIAL DOSE ALVO

• Hidralazina 25 mg e 50 mg 25 mg 3x/dia 100 mg 3x/dia

• Isossorbida 5 mg e 10 mg 20 mg 3x/dia 40 mg 3x/dia

• Indicação: a disfunção sistólica sintomática com contraindicação à IECA ou a BRA (insuficiência renal e/ou
hipercalemia) ou naqueles com disfunção sistólica sintomática em classe funcional III-IV (NYHA), apesar de
terapêutica otimizada.
• Efeitos colaterais: hipotensão postural, taquicardia reflexa, cefaleia (nitrato), lúpus induzido (hidralazina).
• Contraindicações: naqueles que em uso de inibidores da fosfodiesterase 5, como sildenafil.
Tabela 12. Hidralazina + Dinitrato de Isossorbida.
Fonte: Elaborado pelos autores.

DISPOSITIVOS DE ESTIMULAÇÃO ARTIFICIAL E TRANSPLANTE:

• Terapia de Ressincronização cardíaca (TRC): as indicações


clássicas são para (1) IC sintomática, com FEVE ≤ 35%, em ritmo
sinusal, com morfologia de bloqueio completo de ramo esquerdo e
duração de QRS ≥ 150 ms, apesar de terapêutica otimizada, para
reduzir morbidade e mortalidade e (2) TRC para IC sintomática,
com FEVE ≤ 35%, em ritmo sinusal, com morfologia de bloqueio
completo de ramo esquerdo e duração de QRS entre 130-150 ms,
apesar de terapêutica otimizada.

• Cardioversor-desfibrilador implantável (CDI): como


prevenção secundária de morte subida naqueles (1) sobreviventes
de parada cardíaca devido à fibrilação ou TVS com instabilidade
hemodinâmica grave, excluindo-se causa totalmente reversível ou
(2) na presença de doença cardíaca estrutural e documentação de
TVS espontânea estável ou instável. Já como prevenção primária
na (3) disfunção sistólica (FEVE ≤ 35%) sintomática em classe
funcional II-III (NYHA), de etiologia isquêmica, pelo menos 40
dias após infarto e 90 dias após cirurgia de revascularização
miocárdica, com terapêutica otimizada e com boa expectativa de
vida em 1 ano ou na (4) disfunção sistólica (FEVE ≤ 35%)
sintomática em classe funcional II-III (NYHA), de etiologia não
isquêmica, com terapêutica otimizada e com mais de 6 meses de
evolução.

• Transplante cardíaco: (1) IC avançada na dependência de drogas


inotrópicas e/ou suporte circulatório mecânico, (2) IC avançada
classe funcional III persistente e IV com tratamento otimizado na
presença de outros fatores de mau prognóstico (3) IC avançada e
VO2 de pico ≤ 12mL/kg/minuto em pacientes em uso de
betabloqueadores e (4) IC avançada e VO2 de pico ≤ 14
mL/kg/minuto em pacientes intolerantes a betabloqueadores.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1:
Fonte: Adaptado de Comitê organizador da Diretriz de Insuficiência
Cardíaca.¹

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 32 anos, com passado
de miocardite viral, nega uso de qualquer medicação, evoluindo com
dispneia aos pequenos esforços, edema de membros inferiores e
aumento do volume abdominal.
b. Ectoscopia: PA 130 x 80 mmHg, FC 105 bpm, FR 20 rpm,
turgência jugular patológica.
Tórax: MV com estertores finos em bases pulmonares, RCR
em 2T, com bulha acessória (B3) e sopro sistólico 2+/6+,
regurgitativo, em foco mitral.

Abdome: RHA presentes, abdome livre, com macicez móvel,


refluxo hepatojugular.

Membros: edema de MMII 2+/4+, pulsos pediosos presentes e


simétricos.
c. Exames complementares: : ECG mostra taquicardia sinusal, FC
102 bpm, com sinais de sobrecarga de câmaras esquerdas. Radiografia
mostra aumento do índice cardiotorácico, com sinais congestão peri-
hilar e linhas B de Kerley. Ecocardiograma com FE de 35%,
miocardiopatia dilatada do VE (hipocinesia difusa), com regurgitação
mitral leve. Exames laboratoriais não revelaram anormalidades, exceto
BNP de 1.342 pg/mL.
d. Prescrição sugerida:
1. Dieta balanceada com limitação de sal (até 7 gramas/dia).
2. Vacinação contra Influenza e Pneumococo.
3. Reabilitação Cardiovascular.
4. Bisoprolol 1,25 mg VO 1x ao dia.
5. Captopril 12,5 mg VO de 8/8 horas.
6. Espironolactona 25 mg VO 1x ao dia.
7. Furosemida 40 mg VO pela manhã.
8. Pesar diariamente e anotar.
9. Reavaliação em 1 semana.

DICAS DO ESPECIALISTA
• A nova classificação da IC não adota mais os termos IC sistólica
ou diastólica.
• Em pacientes acamados por qualquer motivo, o edema
decorrente da disfunção de câmaras direitas não será mais evidente
em membros inferiores. Por ação da gravidade, será notável em
região sacral, bolsa escrotal e grandes lábios.

• O derrame pleural da IC tem uma frequência muito maior à


direita.

• Na presença de fibrilação atrial, mesmo que o paciente tenha


disfunção diastólica, B4 não será mais audível por não haver mais
contração atrial.

• Um ECG sem qualquer alteração tem um valor preditivo


negativo > 90%, de modo que a possibilidade de IC diante de um
ECG normal é muito pequena.

• Pacientes em uso de INRA (inibidores da neprilisina e receptores


de angiotensina) tem o BNP elevado, mas não por piora da IC e
sim pela sua atuação farmacológica. Nestes pacientes, o ideal é
dosar apenas NT-pró-BNP.

• Bloqueadores do canal de cálcio não di-hidropiridínicos


(verapamil e diltiazem) são contraindicados na ICFER.

• Preferir o uso de diuréticos por via endovenosa quando o


paciente estiver muito edemaciado. Pois pode haver também
edema de alças intestinais, diminuindo a absorção e
biodisponibilidade da droga.

• A digoxina possui uma janela terapêutica muito estreita, de modo


que não são raros os casos de intoxicação. Portanto, em idosos
e pacientes de baixo peso, utilizar sempre doses menores. Efeitos
colaterais são náuseas, vômitos, anorexia, xantopsia e arritmias
cardíacas. Fique de olho no potássio e magnésio.
• No caso do metroprolol, apenas o succinato de metoprolol
mostrou benefícios. Assim, não deve ser prescrito o tartarato de
metoprolol.

• Aceita-se aumento de até 50% da creatinina basal, ou valor


absoluto de até 3 mg/dL, ou clearance da creatinina estimado > 25
mL/min/m2, sem necessitar reduzir a dose de IECA ou BRA.

• A associação de diurético de alça, tiazídicos e antagonista da


aldosterona promove o chamado bloqueio sequencial do
néfron. Este bloqueio potencializa a diurese, protege contra a
hipertrofia do túbulo distal e previne hipocalemia.

• Não se deve administrar a combinação IECA e BRA em


pacientes em uso de antagonistas de aldosterona, pelo risco de
efeitos colaterais, em especial de hipercalemia.

• Para evitar o desenvolvimento de tolerância aos nitratos


(taquifilaxia), recomenda-se um período de 12 horas sem a
medicação. Portanto, um exemplo de tomada seria às 8, 14 e 20
horas. Ou seja, de 6/6 horas, pulando a última dose.

• Em pacientes com IC NYHA II e III que desenvolvam anemia


ferropriva, com ferro sérico < 100 ng/mL ou entre 100 e
300 ng/mL e saturação de transferrina < 20%, está indicado o uso
de ferro parenteral, com o objetivo de melhorar a classe funcional
e a qualidade de vida.

• Paciente em estágio A (ou seja, portadores de fatores de risco para


desenvolvimento de IC), devem dosar BNP. Se este for > 50
pg/mL, está indicada a realização de Ecocardiograma transtorácico
e iniciar tratamento com IECA ou BRA precocemente para reduzir
o risco de desenvolver IC.
• Os inibidores SGLT2, utilizados no tratamento do diabetes
mellitus tiveram, com Dapagliflozina, seu primeiro
ensaio clínico conduzido exclusivamente em pacientes com
ICFER, mostrando importante benefício na morbimortalidade. No
entanto, este efeito cardioprotetor (com diminuição
de desfechos cardiovasculares) também foi visto em outros estudos
com empagliflozina, liraglutida e canagliflozina. Está terapêutica
com os inibidores SGLT2 parece ser bastante promissora, inclusive
em cardiopatas não diabéticos e pode figurar já nas próximas
diretrizes como tratamento de primeira linha.

• Vericiguat é outra medicação promissora que pode entrar nas


próximas diretrizes. Estimula o GMP cíclico, aumentando o óxido
nítrico endógeno, com ação tanto no miocárdio, quanto nos vasos,
promovendo diminuição do espessamento miocárdico e
remodelamento ventricular, assim com vasodilatação.

• Apesar destas novidades terapêuticas, o custo tendo a aumento


muito. Isso será um fator limitante. Ademais, ainda não houve um
posicionamento das principais sociedades quanto ao “time” ideal
para a introdução destas medicações e elas serão colocadas à frente
de velhos conhecidos de nosso receituário.

REFERÊNCIAS
1. Comitê Coordenador da Diretriz de Insuficiência Cardíaca. Diretriz Brasileira de
Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. Arq Bras Cardiol. 2018; 111(3):436-539.
2. Ponikowski P, Voors AA, Anker SD, Bueno H, Cleland JG, Coats AJ, et al. 2016 ESC
Guidelines for the diagnosis and treamente of acute and chronic heart Failure: The Task
Force for the diagnosis and treatment of acute and chronic heart Failure of the European
Society of Cardiology (ESC). Developed with the special contribution of the Heart Failure
Association (HFA) of the ESC. Eur Heart J. 2016;37(27):2129-2200. doi:
10.1093/eurheartj/ehw128.
3. Yancy CW, Jessup M, Bozkurt B, Butler J, Casey DE, Colvin MM, et al. 2017
ACC/AHA/HFSA Focused Update of the 2013 ACCF/AHA Guideline for the Management
of Heart Failure: A Report of the American Task Force on Clinical Practice Guidelines and
the Hear Failure Society of America. Circulation. 2017 Aug 8;136(6):e137-e161. doi:
10.1161/CIR.0000000000000509.
4. McMurray JJV, Solomon SD, Inzucchi SE, et al. Dapagliflozin in patients with heart Failure
and reduced ejection fraction. N Engl J Med 2019; 381:1995-2008.
5. Armstrong PW, Pieske B, Anstrom KJ, et al., on behalf of the VICTORIA Study Group.
Vericiguat in Patients With Heart Failure and Reduced Ejection Fraction. N Engl J Med
2020;Mar 28:[Epub ahead of print].
6. Butler J et al. Comparing the benefit of novel therapies across clinical trials: Insights from the
VICTORIA Trial. Circulation 2020.
1.6
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
DESCOMPENSADA
Autores:
Leonardo Jordan Hansen Vizzotto
Jean Bryally Peres
Estevão Tavares de Figueiredo

DEFINIÇÕES
• Insuficiência Cardíaca Aguda (ICA): Síndrome clínica de
insuficiência cardíaca (IC) com instalação aguda em pacientes
sem antecedentes de IC. Secundária a eventos clínicos variados e,
geralmente, agudos.
• Insuficiência Cardíaca Crônica Descompensada (ICCD):
Situação clínica de IC com instalação insidiosa ou abrupta.
Pacientes com diagnóstico prévio de IC. As causas de
descompensação são múltiplas.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Tanto a ICA quanto a ICCD são resultantes do desequilíbrio
hemodinâmico originado por disfunções diastólicas e/ou
sistólicas, alterações nas pressões de enchimento das câmaras
cardíacas (pré-carga e pós-carga) e do ritmo cardíaco.

• O principal fator que diferencia essas situações é o diagnóstico


prévio de IC. Além disso, na ICA ocorre congestão pulmonar,
sem congestão sistêmica e volemia normal. Na ICCD ocorre
congestão pulmonar e sistêmica com aumento da volemia
decorrente da ativação de eixos neuro-hormonais específicos (vide
capítulo de Insuficiência Cardíaca).

• As principais causas de ICA são: síndrome coronariana aguda,


ruptura de cordoalha tendínea da valva mitral, emergências
hipertensivas, miocardites.

• Já na ICCD, as causas etiológicas mais prevalentes são: Má


aderência ao tratamento de IC, infecções, arritmias (flutter e
fibrilação atrial, principais), ingesta de água e sódio elevadas e
valvopatias de instalação aguda.

QUADRO CLÍNICO
• Sinais e sintomas secundários a disfunção de ventrículo
esquerdo: acometimento pulmonar - dispneia progressiva
(classificação da NYHA); dispneia paroxística noturna: sensação
de sufocamento, opressão torácica, associada a despertar noturno;
ortopnéia; edema agudo de pulmão, aumento do esforço
respiratório.

• Sinais e sintomas secundários a disfunção do ventrículo


direito: Manifestações sistêmicas - Aparecimento ou aumento da
turgência de jugulares; hepatomegalia, ascite, edema de membros
inferiores e presença de terceira bulha (B3) em ritmo de galope.

• Sinais e sintomas secundários à síndrome de baixo débito


cardíaco: Fadiga, lentificação da perfusão das extremidades
(palidez, diaforese), desorientação, lactato elevado, síndrome
cardiorrenal.
• Sinais e sintomas decorrentes da doença que causou a
desestabilização da IC.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: cianose, taquicardia, baixa oxigenação periférica
(medida na oximetria de pulso), aumento do tempo de enchimento
capilar, edema de membros inferiores, alterações do nível de
consciência (confusão) e oligúria (débito urinário < 0,5
ml/kg/hora).

• Aparelho respiratório: estertores crepitantes (congestão


pulmonar, que podem se estender das bases aos ápices pulmonares,
sibilos, uso de musculatura respiratória acessória, retração de
fúrcula esternal (esforço respiratório).

• Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular ou irregular,


sopros sistólicos em geral regurgitativos (insuficiência mitral e
tricúspide), B3 em galope, relação entre a pressão de pulso
(sistólica-diastólica) e pressão sistólica menor que 25%; pulsos
finos, extremidades frias; PAS < 90 mmHg;

• Aparelho gastrointestinal: aumento do volume abdominal,


macicez móvel ou sinal do piparote presentes (a depender do
nível de ascite), dor à palpação do hipocôndrio direito, refluxo
hepatojugular.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Eletrocardiograma (ECG): recomenda-se ECG de 12 derivações
na admissão desses pacientes no cenário de emergência, pois
auxiliam no diagnóstico diferencial e abordagem apropriada.
Exemplos: arritmias, mais prevalentes flutter e FA, áreas de
inatividade miocárdica; alterações no segmento ST.

• Radiografia de tórax: aumento da área cardíaca, sinais de


congestão pulmonar (linhas B de Kerley, borramento peri-hilar),
derrame pleural.
• Biomarcadores: BNP: auxilia no diagnóstico diferencial entre as
causas de dispneia na emergência: > 400 pg/ml sugere IC como
causa. < 100 pg/ml sugere outra etiologia. Valores entre 100 e 400
pg/ml não excluem a IC como etiologia. - NT-pró-BNP > 450
pg/mL (até 50 anos), 900 pg/mL (50-75 anos) ou 1.800 pg/mL
(acima de 75 anos) indica IC e NT-pró-BNP < 300 pg/mL
sugere outra etiologia para a dispneia.

• Bioquímica: hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio,


atenção para os distúrbios hidroeletrolíticos que podem
estar associados; marcadoras de necrose miocárdica (troponina,
CKMB).

• Ecocardiograma: método de eleição para determinar a função


sistólica, sugere possibilidades etiológicas. Fácil acesso, baixo
custo, sendo ótimo no cenário da emergência.

• Cintilografia de perfusão miocárdica: avalia função ventricular,


viabilidade miocárdica, pesquisa de isquemia e inflamação.

• Cineangiocoronariografia: na suspeita de instabilização por


doença arterial coronariana.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Maiores Menores

• Dispneia paroxística noturna • Edema de MMII bilateral


• Turgência jugular a 45º • Derrame pleural
• Estertores crepitantes pulmonares • Dispnéia aos mínimos esforços (NYHA III)
• Edema agudo de pulmão • Taquicardia
• B3 em galope
• Refluxo hepatojugular
• Cardiomegalia ao RX de tórax
Para diagnóstico são necessários dois critérios maiores e um maior ou um critério maio e dois menores.

Tabela 1. Critérios de Framingham para o diagnóstico de Insuficiência


Cardíaca Descompensada
Fonte: Adaptado de Diretriz Brasileira de Insuficiencia Cardiaca Cronica e
Aguda. Arq Bras Cardiol. 2018

“quente e seco” “quente e úmido”

PERFIL A PERFIL B

Sem sintomas de baixo débito e sem Sem sintomas de baixo débito,


sintomas de congestão. com sintomas de congestão.

“frio e seco” “frio e úmido”

PERFIL L PERFIL C

Com sintomas de baixo débito, sem Com sintomas de baixo débito e de


sintomas de congestão. congestão.

Categorização conforme sinais e sintomas da presença/ausência de baixo débito cardíaco e de congestão.

Imagem 1. Avaliação e classificação do perfil hemodinâmico


Fonte: Elaborado pelos autores

TRATAMENTO
• Avaliação clínica hemodinâmica: A divisão conforme o perfil
hemodinâmico referida anteriormente, irá nortear as medidas
terapêuticas.

Perfil A: paciente hemodinamicamente estável, apresentando


boa perfusão, sem congestão pulmonar. IC compensada. Deve
manter seguimento ambulatorial.

Perfil B: paciente com boa perfusão, débito cardíaco adequado,


sem hipotensão, porém apresenta sintomas congestivos. É o
perfil mais comum. A primeira linha de tratamento é utilização
de diuréticos de alça (furosemida 0,5 a 1 mg/kg em bolus),
preferencialmente em via endovenosa. Caso ocorra resistência a
essa terapêutica inicial pode ser associado diurético tiazídico.
Além disso, utilização de vasodilatadores reduz a pré e pós-
carga e diminui o consumo de oxigênio pelo miocárdio.

Perfil C: paciente com débito cardíaco reduzido e presença


de congestão. A abordagem inicial deve ser feita com
diuréticos e caso persista com baixo débito é prudente
introduzir fármacos inotrópicos. Pacientes com PAS < 90 mmHg
tem indicação de inotrópicos adrenérgicos (Dobutamina);
Pacientes com PAS ≥ 90 mmHg são manejados conforme o uso
basal de betabloqueadores. Caso façam uso dessa medicação,
estão indicados inotrópicos não adrenérgicos (Milrinona). No
grupo que não utiliza betabloqueadores pode ser introduzido
qualquer classe de inotrópico. Outra possibilidade para os que
ainda permanecem com PAS ≥ 90 mmHg é a utilização de
vasodilatadores de forma oral (IECA, BRA, hidralazina) ou
endovenosa (nitroglicerina ou nitroprussiato), essas medicações
promovem melhora na pós-carga.

Se a despeito dessas medidas o débito cardíaco persistir baixo é


indicado introduzir noradrenalina e epinefrina e considerar
utilização de suporte mecânico.

Perfil L: prova com volume controlado de SF 0,9% 250 ml e


reavaliações clínicas seriadas e cuidadosas com o objetivo de
melhorar a volemia, redefinir o perfil hemodinâmico e a
abordagem adequada. Se após a prova de volume ocorrer
melhora do DC deve ser mantido volume EV e monitorização
de sinais de baixo débito. Caso seja realizada prova de volume
obtendo volemia adequada, porém sem melhora do DC devem
ser iniciados fármacos inotrópicos de acordo com a PAS e
utilização de betabloqueadores como instituído nos pacientes do
perfil b.

• Garantir oxigenação e ventilação adequadas: apresenta


indicação de instituição conforme necessidade do paciente.
Dispositivos de ventilação não invasiva (VNI) com pressão
positiva (CPAP ou BiPAP) apresentam redução da mortalidade e
índices de taxa de ventilação invasiva. A VNI pode ser prescrita
com PEEP (pressão positiva) de 10 cmH2O por 30 minutos
conforme critério médico. Objetiva-se saturação de oxigênio > 95
% ou > 90% nos pacientes retentores de CO2.

• Controle de frequência cardíaca e arritmias: monitorização


cardíaca contínua não invasiva. Atenção para flutter e fibrilação
atriais e arritmias ventriculares que devem ser prontamente
revertidas conforme protocolo (vide capítulo de Taquicardias).

• Medicações rotineiras não devem ser suspensas:


betabloqueadores devem ter a dose ajustada, suspensão fica restrita
aos casos de instabilidade hemodinâmica grave, bloqueios
atrioventriculares e bradicardias severas. IECA, BRA e
espironolactona devem ser suspensos caso exista insuficiência
renal em piora ou creatinina > 3 mg/dl ou hiperpotassemia > 5,5
meq/L.

• Profilaxia de eventos tromboembólicos: estes eventos


contribuem significativamente para o aumento da mortalidade dos
pacientes com insuficiência cardíaca descompensada. Por esse
motivo, deve ser instituída terapia com heparina em dose
profilática.

FÁRMACOS
Droga Dose (inicial/máxima)
Tiazídicos

• Hidroclorotiazida • 25 a 100 mg/ 24 horas


• Indapamida • 2,5 a 5 mg/ 24 horas
• Clortalidona • 12,5 a 50 mg/ 24 horas
De alça
• Furosemida • 20 a 240 mg/ 24 horas
Poupadores do Potássio

• Espironolactona • 25 a 50 mg/ 24 horas


• Amilorida • 2,5 a 20 mg/ 24 horas
Tabela com os principais diuréticos e suas doses iniciais e máximas. Essa classe de fármacos é a primeira opção para o
tratamento da congestão na IC descompensada. Diuréticos de alça contribuem para alívio significativo dos sintomas e do
quadro congestivo. Os tiazídicos contribuem para o controle pressórico e potencializam o efeito dos de alça. A
espironolactona possui efeitos significativos no bloqueio dos efeitos mineralocorticóides da aldosterona.

Tabela 2. Diuréticos.
Fonte: Elaborado pelos autores.

DROGA DOSE (INICIAL/MÁXIMA)

Adrenérgico

• Dobutamina
• 2,5 a 20 mcg/kg/minuto
• Avaliar ajuste da droga a cada 10 minutos
Não adrenérgicos

• Ataque*: 6-12mcg/kg em 10 minutos


• Furosemida
• Manutenção: 0,05 a 0,10 mcg/kg/minuto
• Ataque*: 50 mcg/kg em 10 minutos
• Milrinone • Manutenção: 0,375 mcg/kg/minutos
(correção de dose de acordo com
insuficiência renal)
*dose de ataque dos inotrópicos adrenérgicos deve ser realizada com cautela devido ao risco de hipotensão
e evitada quando PAS< 110 mmHg. Além disso, a dose de manutenção da Milrinone precisa
ser corrigida de acordo com a função renal.

Tabela 3. Inotrópicos.
Fonte: Elaborado pelos autores.

DROGA DOSE (INICIAL/MÁXIMA)

Vasodilatadores

• 0,3 mcg/kg/minuto a valores que


• Nitropussiato de sódio atinjam melhora ou PAS < 90 mmHg
(titulação)

• 0,2 mcg/kg/minuto a valores que


• Nitroglicerina atinjam melhora ou PAS < 90 mmHg
(titulação)
Vasopressores

• Noradrenalina • 0,05 a 0,2 mcg/kg/minuto


• Epinefrina • 2 a 10 mcg/minuto
Estas medicações costumam apresentar tempo de início rápido e tempo de meia vida curto. Dessa forma, é
importante avaliação a cada 10 minutos com titulação de dose de forma cuidadosa e dinâmica de
acordo com os níveis pressóricos.

Tabela 4. Drogas vasoativas.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Indicação: choque cardiogênico refratário

Ponte para decisão: necessidade imediata de suporte circulatório sem uma estratégia final de tratamento.

Ponte para recuperação: existe perspectiva de melhora da função ventricular após insulto agudo.

Ponte para transplante cardíaco: os dispositivos fornecem suporte hemodinâmico até o momento da realização do
transplante.

Alguns dispositivos que podem ser usados: balão intra-aórtico, circulação extracorpórea,
assistência circulatória mecânica direita ou esquerda.

Tabela 5. Situações para uso de assistência circulatória mecânica.


Fonte: Elaborado pelos autores.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Fluxograma adaptado da Atualização da Diretriz de Ressuscitação
Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade
Brasileira de Cardiologia – 2019.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 54 anos, com passado
de hipertensão arterial não tratada e dislipidemia. Apresentou dor
torácica de característica anginosa com mais de 48 horas sem buscar
atendimento médico. Evolui com nova dor, com as mesmas
características há 4 horas. Procurou pronto atendimento com queixa de
dispneia em repouso, letargia e extremidades frias.
b. Ectoscopia: Peso: 88kg, PA 80 x 60 mmHg, FC 120 bpm, FR 30
rpm, turgência jugular patológica, perfusão periférica > 3 segundos,
extremidades frias e cianóticas, saturação de oxigênio de 91%.
Tórax: MV com estertores crepitantes em todo o tórax, RCR
em 2T com duas bulhas rítmicas e hipofonéticas.

Abdome: RHA presentes, flácido, indolor, sem


visceromegalias.
Membros: ausência de edema, pulsos pediosos presentes e
simétricos, porém filiformes.
c. Exames complementares: ECG mostra taquicardia sinusal, FC
120 bpm, supradesnivelamento de segmento ST em aVL, V5 e V6, com
sinais de sobrecarga de câmaras esquerdas. Radiografia mostra sinais
congestão peri-hilar e linhas B de Kerley. Enzimas marcadoras de
isquemia cardíaca positivas.
d. Hipótese diagnóstica: Infarto agudo do miocárdio tardio (> 48
horas), insuficiência cardíaca aguda em perfil C com evolução para
choque cardiogênico.
e. Prescrição sugerida:

1. Jejum
2. Furosemida 80 mg EV em bolus
3. Furosemida 40 mg EV de 12/ 12 horas
4. Dobutamina 20 ml (250 mcg) + SG 5% 230 ml em Bomba de
infusão contínua (BIC) à critério médico – iniciar com 5 ml/h e
titular a dose conforme níveis pressóricos.
5. Noradrenalina 16 ml (16 mg) + SG 5% 234 ml em BIC à critério
médico – iniciar com 10 ml/h e titular dose conforme níveis
pressóricos.
6. AAS 300 mg VO
7. Clopidogrel 300 mg VO
8. Ventilação Não Invasiva com PEEP de 10 cm H20, por 30 minutos
de 8/8 horas ou se necessário.
9. Enoxaparina 80 mg SC 12/12 horas.
10. Paciente encaminhado para estudo hemodinâmico.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Drogas vasopressoras, como a noradrenalina, podem ser
iniciadas em veia periférica nos casos de emergência e
instabilidade hemodinâmica grave. Porém, devem ser usadas nesta
modalidade por pouco espaço de tempo (até conseguir acesso
venoso em veia central).

• Lembrar os critérios de instabilidade hemodinâmica: PAS < 90


mmHg, queda de mais de 40 mmHg na PAS, pele diaforética,
alterações do nível de consciência e taquicardia. É importante
reconhecer essa situação clínica para que medidas de
ressuscitação sejam tomadas precocemente, podendo reduzir a
morbimortalidade.

• Atenção para o excesso de volume em pacientes com IC, pode


gerar descompensação ou piora da congestão em pacientes
descompensados. Quando for necessária, a reposição volêmica
deve ser cuidadosa com ausculta pulmonar seriada para avaliar o
aparecimento de crepitações pulmonares e outros sinais de
congestão pulmonar.

• Tomar nota das medicações de uso diário do paciente, estas não


devem ser retiradas abruptamente. As doses precisam ser
corrigidas se necessário e suspensas caso exista indicação. Atenção
para os betabloqueadores, pois o uso prévio destes modifica a
conduta na introdução dos inotrópicos. Investigar sobre o uso de
tabaco, álcool ou drogas ilícitas; número de internações
prévias; presença de diagnóstico de IC anterior e os sintomas
associados.

• Buscar os antecedentes do paciente, visto que podem auxiliar na


definição da etiologia do quadro de ICA ou da descompensação
da ICCD. Portadores de pneumopatias retentoras de CO2
cronicamente como asma e DPOC apresentam menor tolerância à
oxigenioterapia, podem fazer quadros de depressão respiratória e
narcose por oxigênio.

• A instituição de ventilação mecânica não invasiva (CPAP ou


BiPAP) reduz a taxa de mortalidade e necessidade de
ventilação invasiva. São bem indicadas aos pacientes com
congestão pulmonar e saturação <90% no grupo de
pneumopatas citado acima ou <95% nos demais perfis de
pacientes.

• Lembrar da terapia de IC que modifica a mortalidade nessa


classe de pacientes: IECA ou BRA, betabloqueadores
(bisoprolol, carvedilol e metoprolol) e bloqueadores dos efeitos
mineralocorticóides da aldosterona (espironolactona). Os
diuréticos de alça (Furosemida) reduzem a morbidade, porém não
reduzem mortalidade, assim como os digitálicos (Digoxina).

• A associação de Hidralazina e Nitrato também se mostrou eficaz


na redução de mortalidade, especialmente em pacientes que
permanecem sintomáticos a despeito do tratamento medicamentoso
otimizado.

• Pressão arterial < 110/70 mmHg e creatinina sérica > 2mg/dl são
fatores preditores de prognóstico desfavorável na IC
descompensada.

• De acordo com escore ADHERE, a presença associada de ureia >


92 mg/dL, PAS < 115 mmHg e creatinina > 2,75 mg/dL conferem
um risco de 21,94% de mortalidade.

REFERÊNCIAS
1. Comitê Coordenador da Diretriz de Insuficiência Cardíaca. Diretriz Brasileira de
Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. Arq Bras Cardiol. 2018; 111(3):436-539.
2. Bernoche C, Timerman S, Polastri TF, Giannetti NS, Siqueira AWS, Piscopo A et al.
Atualização da Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados de Emergência da
Sociedade Brasileira de Cardiologia – 2019. Arq Bras Cardiol. 2019; 113(3):449-663.
3. Mann DL, Zipes DP, Libby P, Bonow RO. (ed.). Braunwald: Tratado de Doenças
Cardiovasculares. 10. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
4. Yancy CW, Jessup M, Bozkurt B, et al. 2017 ACC/AHA/HFSA focused update of the 2013
ACCF/AHA guideline for the management of heart failure: a report of the American College
of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines and
the Heart Failure Society of America. Circulation. 2017;136(6):e137–e161.
1.7
TAQUIARRITMIAS
Autores:
Leonardo Jordan Hansen Vizzotto
Carolina Limongi de Oliveira
Andressa Mayumi Matucuma
Jade Rodrigues Lino de Oliveira
Jean Bryally Peres
Estevão Tavares de Figueiredo

DEFINIÇÕES
• Ritmo taquicárdico: frequência cardíaca (FC) superior a 100
batimentos por minuto (bpm), secundário à alteração na condução
do impulso elétrico no miocárdio. As taquicardias apresentam um
amplo espectro de apresentação, que serão abordados neste
capítulo.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Taquicardias supraventriculares (TSV): alterações do ritmo
cardíaco provenientes do nodo sinusal (SA), miocárdio atrial,
nodo atrioventricular (AV) ou de vias acessórias (Figura 1).

• Taquicardias ventriculares (TV): estímulos elétricos originado


nos ventrículos, abaixo do feixe de His. Frequentes em pacientes
com cardiopatia estrutural. Caracterizadas por QRS alargado
(>120 ms).
Figura 1. Anatomia do sistema de condução elétrico cardíaco relacionada aos
principais tipos de taquiarritmias de acordo com a divisão entre TSV e TV.
Fonte: Adaptado de Alencar Neto.1

QUADRO CLÍNICO
• Assintomáticos: nesses indivíduos, as taquiarritmias podem não
necessitar de tratamento específico imediato, caso não
determinem alterações clínicas. No entanto, precisam ser
documentadas, se possível, para reavaliações no futuro.

• Sintomáticos: devem ser estabelecidas a intensidade dos


sintomas e a relação causal com a taquicardia. Podem apresentar:
palpitações, vertigem, síncope, dispneia, sudorese e
acometimento hemodinâmico por redução severa do débito
cardíaco.

• Instabilidade hemodinâmica: dor torácica anginosa, congestão


pulmonar, alterações no nível de consciência, pressão arterial
sistólica (PAS) < 90 mmHg ou choque circulatório com perfusão
periférica lentificada – definição importante, pois determina o
manejo da taquiarritmia. Taquicardia estável: sem instabilidade
hemodinâmica. Taquicardia instável: presença de um ou mais
fatores definidores de instabilidade hemodinâmica.

EXAME FÍSICO
• Nas taquiarritmias, o exame físico é basicamente marcado pela
frequência cardíaca maior ou igual a 100 bpm. Achados
adicionais de instabilidade podem ocorrer, principalmente se a
frequência cardíaca ultrapassar 150 batimentos por minuto ou o
paciente já apresentar alguma cardiopatia estrutural prévia.

• Não há sinais ou sintomas ao exame físico patognomônicos


para o diagnóstico das arritmias; no entanto, podem sugerir
etiologias específicas. O sinal de frog (sensação de palpitação na
próxima à fúrcula esternal) denota ativação atrial e ventricular
simultâneas, sugerindo taquicardia por reentrada nodal. A presença
de ritmo cardíaco irregular à ausculta e pulso irregularmente
irregular deve lembrar fibrilação atrial ou flutter atrial com
condução atrioventricular variável. A dissociação
atrioventricular que ocorre na taquicardia ventricular pode gerar a
onda A em canhão, além de alterações na pressão de enchimento.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Eletrocardiograma (ECG): principal componente da avaliação
complementar dos sinais e sintomas sugestivos de taquiarritmia.
Na vigência do episódio, permite o diagnóstico de certeza,
diferenciação entre os subtipos existentes e correta abordagem
terapêutica.

• Sistemas de monitorização prolongada do ECG: úteis quando


os episódios de taquiarritmia são recorrentes, com início e fim
súbitos e não puderam ser documentados no ECG comum.
• Sistema Holter: registro contínuo dos sinais eletrocardiográficos
informa a quantidade de arritmias apresentadas, relação com o
ciclo circadiano e sintomas específicos.

• Monitor de eventos sintomáticos (looper): indicado quando os


sintomas são de ocorrência esporádica. O paciente deve acionar
o sistema de monitorização quando apresentar sintomas.

• Teste ergométrico (TE): indicado quando os eventos arrítmicos


ocorrem durante ou logo após estresse físico ou emocional.

• Estudo eletrofisiológico clínico invasivo: indicado em episódios


súbitos e recorrentes de palpitações taquicardíacas ou síncope
não esclarecidas pelos métodos não invasivos.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
a. TAQUICARDIAS SUPRAVENTRICULARES
• Taquicardia sinusal
Características gerais: resposta exacerbada aos estímulos
simpáticos, hiperestimulação do nodo sinusal (principal causa),
alta sensibilidade à adrenalina.

Características gráficas: ritmo sinusal (todo QRS precedido


por onda P), intervalo RR regular, sem alterações
morfológicas, FC >100 bpm (Figura 2).
Figura 2. ECG de paciente em taquicardia sinusal.
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia atrial unifocal


Características gerais: comum no adulto jovem sem
comorbidades (forma paroxística), no qual o estímulo não
advém do nó sinusal (ectópico). Relacionada à libação
alcoólica, hipoxemia e intoxicação digitálica.

Características gráficas: onda P negativa em aVL e positiva


em V1, o foco de despolarização estará no átrio esquerdo. Onda
P positiva em aVL e negativa em V1, o foco estará no átrio
direito. Ritmo não sinusal, regular FC de 100 a 250 bpm (Figura
3).
Eixo de P desviado para a direita, eixo do QRS normal, ritmo não sinusal, regular, FC
aproximada de 150 bpm.

Figura 3. ECG de paciente em taquicardia atrial unifocal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia atrial multifocal


Características gerais: característica do paciente com Doença
Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), geralmente associada
à descompensação do quadro pulmonar na fase avançada da
pneumopatia com cor pulmonale.

Características gráficas: três morfologias diferentes da onda


P na mesma derivação (D2, D3, V1). É causada por
mecanismo de hiperautomotismo do miocárdio, no qual surgem
múltiplos focos ectópicos nos átrios, gerando ondas P de
morfologia diversas e ritmo irregular (Figura 4).

Ritmo cardíaco irregular, morfologias variadas de onda P e FC > 100 bpm.

Figura 4. ECG de paciente em taquicardia atrial multifocal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia paroxística supraventricular (TPSV)


• Taquicardia por reentrada nodal:
Características gerais: corresponde a 70% dos casos de
TPSV, sendo mais prevalente em mulheres jovens hígidas. Esse
tipo é caracterizado pela presença de uma dupla via nodal. O
início da taquicardia geralmente sucede uma extrassístole
atrial. Paciente pode apresentar palpitação intensa no peito e
no pescoço, dispneia, tontura e síncope.

Características gráficas: ECG apresentará uma FC em torno


de 120 – 220 bpm, QRS estreito, RR regular, sem onda P
aparente (Figura 5).

FC aproximada de 176 bpm, ausência de onda P, intervalo RR regular, presença de pseudo-S em D2 (seta) e pseudo-
R em V1 (ponta de seta).

Figura 5. ECG de paciente em TPSV por reentrada nodal.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia por reentrada em via acessória ortodrômica


Características gerais: presença de via acessória (feixe de
Kent) em que o impulso elétrico normal segue o sentido
anterógrado e a via acessória segue o sentido retrógrado.
Características gráficas: QRS < 120 ms e a onda P
retrógrada, próxima ou sob o segmento ST, e não possui
morfologia definida. QRS aberrante com pré-excitação
ventricular (onda delta) comum na Síndrome de Wolff-
Parkinson-White (Figura 6).

No primeiro traçado, FC aproximada de 158 bpm, RR regular, ausência de onda P e variabilidade da amplitude do
QRS, o que sugere uma TPSV por reentrada AV. Após cardioversão elétrica, observa-se no segundo traçado a
presença de ritmo sinusal, com PR diminuído e presença de onda delta.

Figura 6. ECG de paciente em TPSV por via anômala.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia por reentrada em via acessória antidrômica: nesses


casos, a via normal segue o sentido retrógrado e a via acessória
segue a via anterógrada. Pode também ser encontrada nos
pacientes portadores do feixe de Kent ou outras vias anômalas, e
tem apresentação ao ECG com um QRS aberrante.
Nota: Via de condução Anterógrada – condução do estímulo na direção
do átrio para o ventrículo. Retrógrada – direção do ventrículo para o átrio.
- Fibrilação Atrial

• Características gerais: pode se apresentar de forma


assintomática e também pode causar palpitações, dispneia,
desconforto torácico, tontura, sudorese, urgência urinária.
Taquiarritmia crônica mais comum, e sua incidência aumenta com
a idade; portanto, os idosos, os cardiopatas e portadores de
hipertireoidismo são mais susceptíveis. Secundária à contração
atrial desorganizada por estímulos elétricos anárquicos.

• Características gráficas: a FC pode alcançar entre 90 e 170 bpm.


Não se observa onda P e o intervalo RR é irregular (Figura 7).
Se o intervalo RR for regular, observar FA associado a BAV de
terceiro grau. Outra associação delicada é a de FA com SWPW
devido ao risco de FV.

• Classificação da FA:
Paroxística: autolimitada e com duração menor que 7 dias,
geralmente menor que 24h e se resolve espontaneamente.

Recorrente: é a FA paroxística com dois ou mais episódios.

Persistente: duração maior que 7 dias, sem resolução


espontânea.

Permanente: arritmia mais comum, se mantém por mais de 1


ano ou é refratária à cardioversão.

FC variada, RR irregular, ausência de onda P.


Figura 7. ECG de paciente em FA.
Fonte: Elaborado pelos autores.

- Flutter Atrial

• Características gerais: manifestações clínicas e causas-base


semelhantes a FA.

• Características gráficas: impulsos elétricos são originados de


uma única macrorreentrada, gerando um ritmo regular, ou seja, o
intervalo RR é preservado e rítmico, ausência de linha
isoelétrica dando o aspecto de “dente de serra”, chamada onda F
de flutter (Figura 8).

Ritmo regula, Intervalo RR preservado, presença de ondas F.

Figura 8. ECG de paciente em flutter atrial.


Fonte: Elaborado pelos autores.

b. TAQUICARDIAS VENTRICULARES
• Taquicardia ventricular não sustentada (TVNS)
Características gerais: duração menor do que 30 segundos e
não cursa com instabilidade hemodinâmica. Investigar nestes
pacientes doença arterial coronariana (DAC), cardiomiopatias,
valvopatias ou causas não estruturais. Fator de risco para TV
sustentada com evolução para morte súbita.

Características gráficas: três ou mais batimentos consecutivos


advindos abaixo do nó AV com frequência > 120 bpm, não
precedidos de onda P e com QRS alargado.

• Taquicardia ventricular monomórfica sustentada


Características gerais: duração maior que 30 segundos e/ou
que causa instabilidade hemodinâmica. A causa mais comum
é a DAC relacionada, principalmente, à fase tardia do IAM de
grande tamanho.

Características gráficas: Ritmo ventricular, FC maior que


100 – 120 bpm, QRS > 120 ms e aberrante, ao menos três
batimentos sucessivos e, necessariamente, com uma morfologia
padrão, uniforme, não precedido de onda P (Figura 9).

ECG com complexo QRS alargado e ritmo regular.

Figura 9. ECG de paciente em taquicardia ventricular.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia ventricular polimórfica


Características gerais: geralmente secundária à isquemia
miocárdica aguda grave. O mecanismo é de reentrada no
miocárdio isquêmico e, por isso, deve-se realizar
coronariografia no paciente que apresenta esse tipo de
taquicardia é obrigatório.

Características gráficas: ritmo ventricular, QRS > 120 ms e


morfologia totalmente variável, não precedido de onda P,
podendo ser sustentada ou não sustentada.

• Torsades des Pointes


Características gerais: Variação de amplitudes do QRS, ocorre
devido à repolarização anormal lenta. Associada a
bradicardias severas, BAVT ou focos ectópicos simples.

Características gráficas: QRS alargado, variável, com forma


crescente, seguido de decrescente (Figura 10).

Amplitude e morfologia de QRS polimórfico e ritmo irregular.

Figura 10. ECG de paciente em TV polimórfica do tipo Torsades des


pointes.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Uma maneira didática de determinar o diagnóstico é através de uma


sequência de perguntas, como ilustrado no seguinte fluxograma (Fluxograma
1).
Fluxograma 1. Diagnóstico das taquiarritmias.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Um ponto importante é a diferenciação das taquicardias


supraventriculares com aberrância da taquicardia ventricular. Para isso,
podem ser utilizados os critérios de Brugada e Vereckei (Fluxograma 2).
Como esses dois critérios são difíceis de se memorizar, uma forma mais
prática foi criada baseada nos estudos de Pava et al.: observa-se o complexo
QRS em DII, avaliando o tempo entre o início do QRS até o pico de R, se
≥ 50 ms sugere TV e se < 50 ms sugere TSV.
Critérios de Brugada ou Vereckei negativos sugerem TSV com aberrância de condução.

Fluxograma 2. Critérios de Brugada (precordiais) e Vereckei (aVR).


Fonte: Adaptado de Vereckei, Brugada.2,3

TRATAMENTO
• Tratamento inicial das taquicardias com QRS estreito (<120
ms): os pacientes hemodinamicamente instáveis ou que
desenvolvam instabilidade durante atendimento devem ser
submetidos, no tempo mais breve possível, à cardioversão
elétrica. A análise eletrocardiográfica deve ser reservada a um
momento mais oportuno. Nos instáveis, é suficiente o
reconhecimento da presença de taquiarritmia; já nos estáveis,
a regularidade ou irregularidade do intervalo RR. O
fluxograma a seguir (Fluxograma 3) sintetiza a abordagem
terapêutica que pode ser instituída.
Fluxograma 3. Tratamento da taquiarritmia com QRS estreito.
Fonte: Adaptado de Bernoche.4
• Tratamento inicial das taquicardias com QRS largo (≥ 120
ms): frequentemente os pacientes com este tipo de arritmia se
apresentam com instabilidade hemodinâmica ou desenvolvem-na
durante o curso clínico. Por isso, medidas de terapêutica imediata
são comumente empregadas. Em pacientes instáveis, a
cardioversão elétrica é a terapia de escolha, energia de 100 a
200 J se monofásico ou 100 J, bifásico, iniciais com aumento da
carga se necessário, em modo sincronizado. O fluxograma a seguir
(Fluxograma 4) aborda detalhadamente a terapêutica sugerida.

Em pacientes com TV refratária, uma opção é o uso de


Lidocaína. Deve ser utilizada a apresentação de 2%, sem
vasoconstritor. A dose de ataque é de 1 a 1,5 mg/Kg, podendo
ser repetido novo ataque com dose de 0,5 a 1 mg/Kg (dose
máxima de 3 mg/Kg). A dose de manutenção é de 0,02 a 0,05
mg/Kg/min.
Fluxograma 4. Tratamento da taquiarritmia com QRS largo.
Fonte: Adaptado de Bernoche.4
• Tratamento Flutter e Fibrilação atrial: caso ocorra instabilidade
hemodinâmica, assim como nas demais taquiarritmias, deve ser
realizada CVE. Para os estáveis, o tratamento depende do início da
arritmia.

Início menor que 48 horas: pouca probabilidade de possuir


trombo intracavitário. Por isso, podem ser cardiovertidos
elétrica ou quimicamente. Previamente à cardioversão,
preconiza-se dose inicial de heparina 80 UI/kg em bolus
seguida de 18 UI/kg/h por 6-12 horas; após, é importante
manter a anticoagulação por, no mínimo, 4 semanas ou por
tempo indeterminado.

Início maior que 48 horas: alta probabilidade de apresentar


trombos intracardíacos. Com a cardioversão poderiam ocorrer
eventos tromboembólicos. Por isso, indica-se a realização de
um ecocardiograma transesofágico (ETE). Se não forem
evidenciados trombos, pode ser realizada a cardioversão com
os mesmos cuidados de anticoagulação. Caso exista a presença
de trombo, ou o ETE não for disponível, é indicada
anticoagulação por três semanas e, após esse período,
realizada cardioversão.

Tempo de anticoagulação após reversão: baseado no escore


CHA2DS2-VASc (Tabela 1). Escore de 1 ponto: antiagregação
plaquetária com AAS 100 mg/dia; 2 pontos ou mais:
anticoagulação plena. Aplicada tanto para início menor de 48
horas quanto maior que esse período.

Mais detalhes são abordados no Fluxograma 5.

Critérios Pontos
Insuficiência Cardíaca 1

Hipertensão arterial 1

Idade > 75 anos 2


Critérios Pontos
Diabetes Mellitus 1

Acidente Vascular Encefálico 2

Doença vascular periférica 1

Idade > 65 anos 1

Sexo feminino 1

Tabela 1. Escore CHA2DS2-VASc.


Fonte: Adaptado de Magalhaes.5
Fluxograma 5. Conduta na fibrilação atrial e flutter.
Fonte: Adaptado de Magalhaes.5

a. FÁRMACOS
Adenosina: dose inicial de 6mg EV em bolus rápido. Caso não
haja resposta, realizar dose de 12 mg EV em bolus rápido. Após
realizar adenosina, deve ser feito 20 mL de SF0,9% com
elevação do membro onde o acesso venoso está alocado.

Betabloqueadores: Metoprolol 5 mg EV lento até 15 mg ou


Propranolol 1 mg EV a cada 5 min até 5 mg. Pode gerar
bradicardia. É contraindicado em IC, bloqueios
atrioventriculares avançados, hipotensão arterial,
broncoespasmo.

Bloqueadores dos canais de cálcio: Verapamil 2,5 a 5 mg EV


lento. Pode repetir 5 a 10 mg após 15 a 30 minutos da primeira
dose até total de 20 mg. Diltiazem 0,25 mg/kg EV em 2
minutos. Pode-se repetir 0,35 mg/kg após 15 minutos da
primeira dose. É contraindicado em IC, bloqueios
atrioventriculares avançados, hipotensão arterial.

Amiodarona: ataque 150 mg em 100 mL EV em 10 a 20


minutos. Manutenção 1 mg/minuto nas primeiras 6 horas e 0,5
mg/ minuto nas 18 horas consecutivas. Dose máxima: 2,2g/24
horas. Em pacientes em parada cardiorrespiratória, as doses são
diferentes das apresentadas (vide capítulo de PCR).

Sulfato de magnésio: 1 a 2 g EV + 20 mL SF 0,9%.

Procainamida: 20mg/minuto até que ocorra resolução da


arritmia ou hipotensão, alargamento do QRS maior que
50% do basal, dose máxima de 17 mg/kg. Dose de manutenção
de 1 a 4 mg/minuto.
Antes de cardioverter o paciente, indica-se analgesia e sedação.
Algumas opções de medicamentos estão disponíveis na tabela abaixo
(Tabela 2).

Analgesia

Medicação Dose
• Morfina • 1 – 2 mg EV
• Fentanil • 1 – 2 mcg/kg EV
Sedação

Medicação Dose

• Etomidato • 0,3 mg/kg EV


• Midazolam • 0,1 – 0,3 mg/kg EV
• Propofol • 2 mg/kg EV
Tabela 2. Drogas disponíveis para analgesia e sedação pré-cardioversão.
Fonte: Adaptado de Magalhaes.5

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Adaptado de Magalhaes.5

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, 63 anos, 70 kg, comparece ao pronto-
socorro com quadro clínico de palpitação de início há duas horas,
associada à sudorese profusa. Nota-se que está pálido e com leve
dispneia. Hipertenso e diabético de longa data, com uso contínuo de
losartana, clortalidona e metformina. Iniciadas medidas de
monitorização cardíaca, oximetria de pulso e solicitado um
eletrocardiograma – apresentado a seguir.
b. Exames complementares: Laudo do ECG: ritmo cardíaco
irregular, com oscilações em linha de base e ausência de onda P.
c. Prescrição sugerida: Realizada cardioversão elétrica com 200 J
bifásico, após preparação prévia, conforme prescrição abaixo.

1. Jejum
2. Heparina não fracionada (HNF) 5000 UI/mL – 5600 UI EV em
bolus
3. HNF 5000Ui/mL - 1260 UI EV a cada hora por 6 horas
4. Fentanil 70 mcg EV em bolus lento.
5. Etomidato 21 mcg EV em bolus lento.
Paciente é revertido para ritmo sinusal e tem alta após 48 horas de
observação, sendo encaminhado para acompanhamento ambulatorial. Em
consulta posterior, mantém recidivas do quadro, porém com resolução
espontânea. Opta-se, então, por tratamento com estratégia pill in the pocket,
com propafenona 300 mg, dois comprimidos em crises. Em consulta após
três meses, apresenta dificuldade em manter o ritmo sinusal e iniciada
abordagem com controle da frequência cardíaca. Escore CHA2DS2-VASc
com dois pontos (HAS + Diabetes). Definido uso do carvedilol 3,125 mg
1x/dia e rivaroxabana 20 mg 1x/dia (anticoagulação plena), associado a
medicações prévias.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Sempre tratar o indivíduo − e não o eletrocardiograma.
Relacionar o exame com a clínica do paciente. Muitas vezes a
taquicardia é decorrente de situações que não necessitam de
reversão, como nas taquicardias sinusais reflexas a estados de
choque.
• Em todas as situações, é mandatória uma história clínica breve,
de modo a estabelecer a relação causa-efeito.

• Antecedentes mórbidos, uso de álcool, tabaco e drogas ilícitas,


bem como medicações de uso regular, são importantes, pois
podem sugerir causa etiológica da arritmia.

• Em situações de instabilidade hemodinâmica, a equipe de saúde


deve estar preparada para agir de maneira eficaz, rápida e
coordenada.

• Lembrar sempre: instabilidade hemodinâmica é igual a


cardioversão elétrica.

• No cenário de emergência, no primeiro momento, a


determinação específica da arritmia pode não ser possível e
atrapalhar a abordagem inicial que deve ser imediata. Por isso, é
suficiente determinar a regularidade do ritmo cardíaco e
duração com complexo QRS.

REFERÊNCIAS
1. Alencar Neto AJ. Manual de Eletrocardiograma. 1. ed. Salvador: Sanar Editora; 2019.
2. Vereckei A, Duray G, Szénási G, Altemose GT, Miller JM. New algorithm using only lead
aVR for differential diagnosis of wide QRS complex tachycardia. Heart Rhythm. 2008; 5(1):
89-98.
3. Brugada P, Brugada J, Mont L, Smeets J, Andries EW. A new approach to the differential
diagnosis of a regular tachycardia with a wide QRS complex. Circulation. 1991; 83(5):
1649-59.
4. Bernoche C, Timerman S, Polastri TF, Giannetti NS, Siqueira AWDS, Piscopo A, et al.
Atualização da Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de
Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia-2019. Arq Bras Cardiol. 2019; 113(3):
449-663.
5. Magalhães LP, Guimarães ICB, Melo SL, Mateo EIP, Andalaft RB, Xavier LFR, et al.
Diretriz de Arritmias Cardíacas em Crianças e Cardiopatias Congênitas SOBRAC e DCC -
CP. Arq Bras Cardiol. 2016; 107(1): 1-71.
1.8
BRADIARRITMIAS
Autores:
Leonardo Jordan Hansen Vizzotto
Valéria Vieira da Silva Gomes
Jean Bryally Peres
Estevão Tavares de Figueiredo

DEFINIÇÕES
• Bradiarritmias: distúrbios de condução elétrica em que a
frequência cardíaca (FC) é inferior a 50 bpm. Este limite é
individual, frequências menores podem ser consideradas
fisiológicas para alguns pacientes.

• Bradicardia relativa: frequência cardíaca inferior à esperada


para determinada condição. Por exemplo, em quadros febris, sem
uso de inibidores do nó sinusal, é esperado aumento de
aproximadamente 10 bpm na FC a cada grau Celsius acima da
normalidade, quando não ocorre existe bradicardia relativa.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Etiopatogenia: dividida em dois grandes grupos: não cardíacas
(extrínseca) ou de origem cardíaca (intrínseca). Causas
específicas mais detalhadas na tabela 01.
Causas intrínsecas Causas extrínsecas
Doença degenerativa primária elétrica Estímulo sistema nervoso autônomo:

Isquemia miocárdica Estímulo vagal

Cardiopatia valvar Hipersensibilidade do seio carotídeo

Infecciosa (endocardite/doença de Chagas) Medicamentosas:


Betabloqueadores; BCC, clonidina, digoxina,
Infiltrativa (amiloidose/sarcoidose)
antiarrítmicos; Lítio

Esclerodermia Metabólicas:

Alterações do potássio; hipotermia.

Neurológicas:

Hipertensão intracraniana.

Tabela 1. Causas de bradiarritmias


Fonte: Adaptado de Mangrum e DiMarco. N Engl J Med: 2000.

• Fisiopatologia: bradiarritmias são resultantes de anormalidades


na formação (diminuição na frequência de disparo) ou condução
(interrupção) do impulso elétrico cardíaco. Devido a esses
mecanismos, pode ocorrer perda da capacidade de despolarização e
queda da FC. Secundário a esse fenômeno, a FC é determinada
pela estrutura que tenha o maior ritmo de despolarização –
ritmo de escape.

QUADRO CLÍNICO
• Sinais e sintomas das disfunções sinusais: frequentemente são
assintomáticas, quando existem manifestações as mais comuns:
astenia, intolerância ao esforço, dispnéia, mal- estar
indefinido, vertigem e, menos frequente, lipotimia e síncope.

• Sinais e sintomas nas disfunções atrioventriculares: variáveis,


não raro assintomáticos. Quando presentes, são semelhantes aos
das disfunções sinusais e caracterizados pelo baixo débito
cardíaco. Na maioria das vezes, os bloqueios de localização
intranodais AV costumam ter evolução benigna, com complexos
QRS estreitos, de evolução lenta; menos frequentemente
apresentam síncopes.

EXAME FÍSICO
• Nas taquiarritmias o exame físico é marcado pela frequência
cardíaca menor ou igual a 50 bpm. Achados adicionais de baixo
débito cardíaco podem ocorrer, principalmente, se a frequência
cardíaca for inferior a 50 bpm. Não há sinais ou sintomas ao
exame físico patognomônicos para o diagnóstico das arritmias.

• Baixo débito cardíaco: hipotensão (PAS < 90 mmHg); pulsos


filiformes, extremidades com perfusão lentificada, queda da
saturação de O2, alterações no nível de consciência (torpor),
crepitação pulmonar bilateral, queda da pressão venosa
central.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Eletrocardiograma (ECG): importante fazer sempre um D2
longo.

• Sistemas de monitorização: Holter (24 horas) ou Looper


(registro intermitente) permitem observar o grau e frequências
dos episódios, bem como a sua correlação com sintomas.

• Estudo eletrofisiológico clínico invasivo: método mais completo


para avaliar o nível e a severidade da disfunção. Porém, é um
exame invasivo e não disponível em todos os locais.

• Laboratoriais: auxiliam no diagnóstico etiológico ou rastreio de


complicações associadas. Devem ser realizados de acordo com
critério clínico. Podem ser solicitados: eletrólitos, marcadores de
necrose miocárdica, sorologia para doença de Chagas e outros.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
As bradiarritmias são classificadas de acordo com o local de origem da
disfunção da formação ou condução do estímulo elétrico: nodo sinusal e
nodo atrioventricular, que serão abordados com mais detalhes a seguir.
Disfunções do nodo sinusal Disfunções do nodo atrioventricular

Bradicardia sinusal Bloqueios atrioventriculares

Bloqueios sinoatriais

Tabela 02: classificação das bradiarritmias


Fonte: Elaborado pelos autores.

a. DISFUNÇÕES do nodo sinusal


• Bradicardia sinusal
Características gerais: pode ser resultado de
condicionamento físico (fisiológico). Ou patológico,
secundária à queda da FC por de uso excessivo de drogas ou
presença de distúrbios (bloqueadores do canal de cálcio,
betabloqueadores, digitálicos e amiodarona; ou degeneração do
sistema de condução, coronariopatias e outras).

Características gráficas: onda P sinusal, portanto, positiva nas


derivações DI e aVF, única alteração o aumento do intervalo
RR e diminuição da FC.

Ritmo sinusal, FC de aproximada de 44 batimentos.

Figura 01. ECG de bradicardia sinusal.


Fonte: Elaborado pelos autores.
• Bloqueios sinoatriais (BSA)
Características gerais: geralmente, resulta de uma doença do
nó sinusal caracterizada por destruição das células P
marcapasso que leva a pausas sinusais, com ou sem
batimentos de escape.

Características gráficas: 1º grau: atraso em todas as saídas


do impulso do nodo sinusal (não diagnosticado pelo ECG), sem
pausas; 2º grau: dividido em 2 subtipos, descritos abaixo; 3º
grau: perda de controle total do impulso pelo nodo sinoatrial
– não distinguido da pausa sinusal pelo ECG comum.

• 2º grau subdivido em dois subtipos:


I - BSA tipo 1, ou Wenckebach, no qual existe uma
diminuição progressiva do intervalo PP até o surgimento de
uma pausa sinusal;

II - BSA tipo 2, apresenta pausa súbita com duração múltipla


do intervalo PP basal.

Diminuição progressiva do intervalo PP, com pausa sinusal, não múltipla da FC, e retorno dos batimentos
persistindo a variabilidade entre os intervalos PP.

Figura 02. ECG com BSA tipo 1.


Fonte: Elaborado pelos autores.
ECG com ondas de intervalos regulares, sem variabilidade, e presença de pausa de duração múltipla do intervalo
PP, sem escape juncional ou ventricular.

Figura 03. ECG com BSA tipo 2.


Fonte: Elaborado pelos autores.

b. DISFUNÇÕES do nodo atrioventricular


• Bloqueios atrioventriculares (BAV)
Juntamente com a doença do nó sinusal, está entre os principais
diagnósticos diferenciais das bradiarritmias. É subdivido em
1º, 2º e 3º graus.

• BAV de 1º grau
Características gerais: benigno, pois suas causas são
geralmente reversíveis.

Características gráficas: intervalo PR (iPR) é maior que 0,2s


de duração (> 200ms), porém toda onda P gera um QRS.

ECG de ritmo sinusal regular e aumento do iPR.


Figura 04. ECG com BAV de 1º grau.
Fonte: Elaborado pelos autores.

• BAV de 2º grau
Características gerais: nem toda onda P gera um complexo
QRS.

Características gráficas: Se subdivide em outros dois tipos,


Tipo 1 (Mobtiz 1 ou Wenckebach) e Tipo 2 (Mobtiz 2).
I - Tipo 01: aumento progressivo do iPR até o
aparecimento obrigatório de um bloqueio, onde uma onda P
não gera um QRS, com posterior retorno do ritmo sinusal,
com iPR pós-bloqueio menor que o iPR pré-bloqueio.

Ritmo sinusal regular e aumento progressivo do PRi até que ocorra um bloqueio obrigatório.

Figura 05. ECG com BAV de 2º grau tipo 1 (Mobitz I).


Fonte: Elaborado pelos autores.

II- Tipo 02: iPR constante, com falha de condução da


onda P regular, em proporções 2:1, 3:1, ou maiores (tipos
malignos), ou irregular.
Ritmo sinusal regular com PRi fixo e presença de BAV de 2º grau Mobitz II de proporção 2:1. Bloqueio na condução
da onda P regular (flecha).

Figura 06. ECG com BAV 2º tipo 02 (Mobitz II).


Fonte: Elaborado pelos autores.

• BAV de 3º grau (BAV total)


Características gerais: existe um descompasso entre os átrios
e ventrículos.

Características gráficas: onda P e complexo QRS estão


presentes com intervalos regulares e se apresentando de forma
independente, não sincrônica. Pode ser definido frequência atrial
e frequência ventricular.

BAV total dissociação entre onda P e complexos QRS.

Figura 07. ECG com BAV total.


Fonte: Elaborado pelos autores.

TRATAMENTO
Se sintomático, a conduta inicial é a estabilização e monitorização do
paciente, haja visto que pode evoluir para choque devido à bradicardia.
Realizar ECG com 12 derivações para estabelecer o ritmo cardíaco.
A terapia medicamentosa tem como droga de escolha a atropina,
medida temporária até o implante de um marcapasso transcutâneo.
Deve-se fazer uso cauteloso em bradicardias pós infarto agudo do miocárdio,
evitando aumento da área de lesão. Outras drogas que podem ser utilizadas
são a dopamina e a adrenalina, em associação ou isoladamente.
Se mesmo após as medidas farmacológicas acima citadas os sintomas de
instabilidade hemodinâmica permanecerem está indicado o marcapasso
transcutâneo. Nos casos em que o este não é eficaz deve-se colocar um
marcapasso transvenoso, considerando nesses casos o auxílio de
profissional previamente capacitado.
Todos os pacientes devem ser acompanhados e avaliados para a
necessidade de colocação de um marcapasso definitivo.
O Fluxograma 01, sintetiza o manejo das bradiarritmias.

FÁRMACOS
Fármacos Doses (mínima/máxima)

• 0,5 mg em bolus EV – repetir a


• Atropina cada 3 a 5 minutos – máximo de 3
mg

• Dopamina • 5-10 mcg/kg/min em BIC EV


• Adrenalina • 2-10 mcg/min em BIC EV
Tabela 4. Drogas vasoativas.
Fonte: Elaborado pelos autores.

FLUXOGRAMA DE TRATAMENTO
Fluxograma 01: Manejo das bradiarritmias
Fonte: Fluxograma adaptado da Atualização da Diretriz de Ressuscitação
Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade
Brasileira de Cardiologia – 2019.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Homem, 62 anos, portador de miocardiopatia
chagásica, deu entrada em emergência trazido pelos familiares após
síncope. No atendimento inicial: PA: 80 x 60 mmHg, saturação de O2:
93%, perfusão periférica > 3 segundos, cianose de extremidades e
torporoso. Realizado ECG, com registro de DII longo abaixo:

Dissociação entre ondas P e complexo QRS, ritmo regular de escape, FC


aproximada de 60 bpm. Sugestivo de BAV total. Flechas maiores marcam
ondas P bloqueadas, flechas menores marcam QRS de origem por batimento
de escape, sem estímulo atrial, triângulos identificam locais onde ocorre
sobreposição de ondas P e complexos QRS.

b. Medidas iniciais:
1. Jejum;
2. Atropina 0,5 mg EV em bolus;
3. Sedação (etomidato 0,3mg/kg EV);
4. Marcapasso transcutâneo;
5. Máscara de O2 - 4 litros/minuto;
6. Monitorização cardíaco, pressórica e de oximetria contínuas;
7. Encaminhado para colocação de marcapasso transvenoso.

DICAS DO ESPECIALISTA
• A padronização da análise do ECG é muito útil, pois facilita e
agiliza o atendimento inicial do paciente. Sugerimos a análise nas
bradiarritmias seguindo: identificação do paciente, FC, ritmo e
intervalo PR.
• Caso o fator desencadeante da arritmia for identificado no
atendimento inicial, este deve ser prontamente tratado.

• Sempre é importante lembrar os fatores que definem


instabilidade hemodinâmica – 4 Ds – diminuição da PA,
diminuição da consciência, dispnéia, dor torácica.

• Realizar anamnese completa quando o paciente estiver fora de


risco. Investigar doenças de base, medicamentos de uso diário,
uso de drogas, IAM prévio, procedência remota ou atual em
região endêmica de doença de Chagas, episódios semelhantes.

REFERÊNCIAS
1. Bernoche, C., Timerman, S., Polastri, T. F., Giannetti, N. S., Siqueira, A. W. D. S., Piscopo,
A., ... & Quilici, A. P. (2019). Atualização da Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e
Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia-2019.
Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 113(3), 449-663.
2. GONZALEZ, Maria Margarita et al. Sociedade Brasileira de Cardiologia: I Diretriz de
Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade
Brasileira de Cardiologia. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 101, n. 2, ago. 2013.
3. LENÈGRE, Jean. Etiology and pathology of bilateral bundle branch block in relation to
complete heart block. Progress in Cardiovascular Diseases, n. 6, p.409-444, mar. 1964.
4. LOPES, Antonio Carlos. Tratado de Clínica Médica. 3. ed. São Paulo: Roca Ltda, 2015.
5. MANGRUM, J. Michael; DIMARCO, John. The Evaluation and Management of
Bradycardia. New England Journal of Medicine, v. 342, n. 10, p.703-709, mar. 2000.
6. MARTINS, Herlon Saraiva et al. Medicina de Emergência: abordagem prática. 12. ed.
Barueri-SP: Manole Ltda, 2017.
7. MASON, Jay W. et al. Electrocardiographic reference ranges derived from 79,743
ambulatory subjects. Journal of Electrocardiology, v. 40, n. 3, p.228-234, mai. 2007.
8. PASTORE, Carlos Alberto et al. Sociedade Brasileira de Cardiologia: III Diretrizes da
Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Análise e Emissão de Laudos
Eletrocardiográficos. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 106, n. 4, abr. 2016.
9. YANG, Xing Sheng; BECK, Gerald; WILKOFF, Bruce. 749-1 Redefining Normal Sinus
Heart Rate. Journal of the American College of Cardiology, v. 25, n. 2, p.193A, fev. 1995.
1.9
PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA
E RESSUSCITAÇÃO
Autores:
Leonardo Jordan Hansen Vizzotto
Nader Alziro Kassem Fares
Estevão Tavares de Figueiredo

DEFINIÇÕES
• Parada Cardiorrespiratória (PCR): estado de deterioração
absoluta da estabilidade hemodinâmica com débito cardíaco
incapaz de manter perfusão tecidual. Pode ser revertido pela
pronta intervenção ou evoluir para óbito.

• Suporte Básico de Vida Cardiovascular (BLS): atendimento


pré-hospitalar a uma vítima de PCR. Pode ser realizada por
qualquer indivíduo treinado (sendo este da área da saúde ou
não).

• Suporte Avançado de Vida Cardiovascular (ACLS):


atendimento intra-hospitalar a vítimas de PCR, foco deste
capítulo.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Fisiopatologia: Com a PCR, ocorre interrupção da oxigenação e
consequente lesão tecidual. Inicialmente, ocorre desorganização
elétrica cardíaca e ritmo desorganizado (p. ex.: fibrilação
ventricular), caso não revertida, as células consomem
praticamente todas as reservas metabólicas necessárias para
manutenção de suas atividades basais. Como repercussão, ocorre
acidose metabólica e disfunção tecidual grave com queda
drástica da sobrevida.

• Etiologia: causas reversíveis devem ser prontamente tratadas.


Para facilitar a memorização elas foram separadas em 5 Hs e 5 Ts
descritas na tabela 01:
Principais causas de PCR Agentes comuns
5 Hs

ASMA; DPOC; edema agudo de pulmão; pneumonia.


• Hipóxia
• Hidrogênio (acidose)
• Hipo ou hipercalemia
• Hipotermia
Hemorragia; desidratação; sepse.
• Hipovolemia
5 Ts

• Trombose coronária Infarto agudo do miocárdio (IAM)

• TEP Tromboembolismo pulmonar (TEP)

• Tensão no tórax Pneumotórax hipertensivo

• Tamponamento cardíaco
Antiarrítmicos; digitálicos; betabloqueadores; bloqueadores dos
• Tóxicos canais de cálcio; antidepressivos tricíclicos; cocaína; heroína;
crack.

Tabela 01: 5 Hs e 5 Ts, principais causas de PCR.


Fonte: Adaptado de Gonzalez. Arq Bras Cadiol: 2013.

QUADRO CLÍNICO E EXAME FÍSICO


• Ausência de resposta verbal e motora: deve ser avaliada de
forma vigorosa, chamar o paciente em voz alta com toques nos
ombros.
• Ausência de respiração ou respiração irregular (gasping).
• Ausência de pulso central - carotídeo ou femoral: palpar os
pulsos por 10 segundos. Se houver dúvida, ou se não for detectado
considerar como ausente.

• Se o pulso estiver presente, porém com respiração irregular ou


ausente é considerada parada respiratória, devendo garantir
ventilação adequada.

• O reconhecimento precoce da PCR é de extrema importância


para o sucesso da ressuscitação.

• A PCR pode ter manifestação de início súbito ou ser precedida


por manifestação de uma causa de base (p. ex.: taquiarritmias,
IAM, TEP).

• Quando for de início súbito e repercutir em óbito esse é tido como


morte súbita cardiovascular.

EXAMES COMPLEMENTARES
• O diagnóstico é eminentemente clínico. A identificação dos
eventos eletrocardiográficos como taquicardia ventricular sem
pulso, fibrilação ventricular, atividade elétrica sem pulso ou
assistolia, em um paciente em PCR é fundamental, pois
determina o manejo dessa condição clínica.

• Após a reversão da PCR podem ser necessários exames para


identificar o fator desencadeante e devem ser solicitados
conforme critério clínico. Rotineiramente: ECG, hemograma,
gasometria arterial, lactato, eletrólitos, ureia, creatinina,
radiografia de tórax e marcadores de necrose miocárdica.
CLASSIFICAÇÃO: RITMOS DE PARADA
• O ritmo cardíaco durante a PCR pode ser dividido entre chocáveis
e não chocáveis, que serão abordados com mais detalhes a seguir.

• Ritmos chocáveis
• Tratados com desfibrilação. São os principais encontrados nos
pacientes que sofrem PCR no ambiente pré-hospitalar.

Fibrilação Ventricular: ocorre pela presença de múltiplos


focos elétricos ventriculares. Apresenta-se no eletrocardiograma
como ondas irregulares, sem ritmo definido. A frequência
das ondas costuma variar entre 400-600 bpm.

Traçado de FV grosseira: grande amplitude de ondas, morfologia anárquica.


Indica FV de início recente, melhor resposta à desfibrilação.

Imagem 01: fibrilação ventricular grosseira


Fonte: Elaborado pelos autores.

Traçado de FV fina: amplitude isoelétrica de ondas, morfologia anárquica.


Indica FV de início tardio e pior prognóstico.
Imagem 02: fibrilação ventricular fina
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Taquicardia ventricular sem pulso: taquicardia com complexos


QRS alargados. A frequência cardíaca está tipicamente acima de
100bpm. Não existem ondas P.

Traçado de TV sem pulso: presença de complexos QRS alargados monomórficos, sem ondas P.

Imagem 03: taquicardia ventricular sem pulso


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Ritmos não chocáveis


• Pacientes neste ritmo não se beneficiam de desfibrilação.
Assistolia: Não existe atividade elétrica cardíaca. Quando
identificamos essa condição é necessário checar os cabos do
monitor, ganho (zoom) e derivações (inversão dos eletrodos)
para diferenciar da FV fina. Para facilitar a memorização pode
ser usado o mnemônico: CA-GA-DA.
Traçado evidenciando ausência de atividade elétrica cardíaca.

Imagem 04: assitolia.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Atividade Elétrica Sem pulso (AESP): presença de estímulo


elétrico adequado, porém ausência de pulso central. O miocárdio
não tem capacidade contrátil efetiva.

Traçado evidenciando complexo QRS, ondas P e T com morfologia adequada associado a bradicardia gráfica
severa, porém paciente sem pulsos.

Imagem 05: AESP


Fonte: Elaborado pelos autores.

TRATAMENTO
Diante de um paciente em PCR a conduta imediata é iniciar a
Ressuscitação Cardiopulmonar (RCP). Devendo-se posicionar o paciente
em decúbito dorsal em superfície plana e rígida, chamar por ajuda e
iniciar a RCP. O mais rapidamente possível iniciar as compressões
torácicas, priorizando a qualidade, respeitando a frequência de 100 a 120
compressões por minuto, deprimir o tórax entre 5 e 6cm e,
impreterivelmente, retornar completamente ao ponto inicial. Realizar
ciclos de 30 compressões para cada duas respirações (30:2) com
dispositivo bolsa-valva-máscara com reservatório e oxigênio adicional.
É importante checar o ritmo de parada, pois pode ser necessário dar
prioridade ao uso do desfibrilador elétrico em ritmos chocáveis. Os
choques devem ser administrados na potência máxima do desfibrilador,
sendo 360J para monofásico e 200J para bifásico. Importante solicitar que
todos se afastem do contato com o paciente e logo após a desfibrilação
reiniciar imediatamente a RCP e apenas após novo ciclo de 2 minutos checar
pulso e ritmo.
Em ritmos não chocáveis a desfibrilação é contraindicada, devendo-se
manter a RCP com repetidas verificações do pulso e ritmo de parada.
Para casos de assistolia é importante a realização do protocolo da linha
reta e descartar a presença de uma fibrilação ventricular fina. Portanto
deve-se verificar a adequada conexão dos cabos e eletrodos, aumentar o
ganho de sinal no monitor cardíaco (amplitude/potência de sinal) e
checar o ritmo em outra derivação. Se assistolia confirmada, manter-se
nos ciclos de RCP sem uso do desfibrilador.
Deve-se, simultaneamente, obter acesso venoso periférico ou intraósseo
(IO) para possibilitar administração das medicações. As drogas utilizadas
diferem entre os ritmos chocáveis e não chocáveis. Em ambos é indicado o
uso da epinefrina (adrenalina) EV ou IO na dose de 1mg/dose a cada 3 a
5 minutos, seguida por bolus de 20mL de solução fisiológica e subsequente
elevação do membro.
Para os ritmos chocáveis, por se tratar de arritmias, o uso de
antiarrítmicos está firmado. Podem ser feitas duas doses de amiodarona
com intervalo de 3 a 5 minutos, sendo a primeira dose EV ou IO de
300mg e a segunda de 150mg, sempre seguidas pelo bolus de 20mL de
solução fisiológica e elevação do membro. Outra opção é a lidocaína,
também EV ou IO, nas dosagens de 1-1,5mg/kg para a primeira
aplicação e 0,5-0,75mg/kg na segunda (após 5 minutos), também seguidas
pelo bolus de solução fisiológica e elevação do membro. Em casos de PCR
secundária à hipomagnesemia ou taquicardia ventricular polimórfica
(Torsades de Pointes) deve-se administrar sulfato de magnésio 1 a 2g EV
ou IO diluído em 10 a 20mL de glicose a 5%.
Para todos os pacientes em PCR realizar concomitantemente os
procedimentos para garantir uma via aérea avançada, preferencialmente a
intubação orotraqueal (IOT), mas considerar o uso de máscara laríngea no
caso de intubação difícil, para não retardar a realização das compressões de
boa qualidade. Após assegurado uma via aérea avançada manter a
compressões no mesmo ritmo (100-120/min), sem pausas para
insuflações, e oferecer 10 insuflações por minuto (uma a cada 6 segundos
não sincronizadas com as compressões torácicas).
É considerável a necessidade de tentar-se realizar um diagnóstico
diferencial, procurando tratar as causas reversíveis identificáveis, conforme
tabela 01.
Não existe consenso a respeito do momento de cessação da
ressuscitação, este deve ser determinado em conjunto com os membros da
equipe levando em conta critérios clínicos no momento e fatores
prognósticos.

FÁRMACOS
• Adrenalina: 1 mg EV em bolus a cada 3 a 5 minutos, seguido
de 20 ml de SF 0,9% com elevação do membro.

• Amiodarona: dose inicial de 300 mg EV em bolus, seguida de 20


ml de SF 0,9% e elevação do membro e segunda dose de 150 mg.
Deve ser usada somente nos ritmos chocáveis após a primeira
dose de adrenalina e intercalada coma segunda dose de adrenalina.

• Lidocaína: dose inicial de 1 a 1,5 mg/kg e segunda dose de 0,5


a 0,75 mg/kg. Deve ser realizada da mesma forma que a
amiodarona em substituição desta.

• Vasopressina: contraindicada no manejo de rotina da PCR.


FLUXOGRAMA DE TRATAMENTO
Fluxograma 01: Manejo das bradiarritmias
Fonte: Fluxograma adaptado da Atualização da Diretriz de Ressuscitação
Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade
Brasileira de Cardiologia – 2019.
Fluxograma 02: manejo da PCR de ritmo não chocável:
Fonte: Fluxograma adaptado da Atualização da Diretriz de Ressuscitação
Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade
Brasileira de Cardiologia – 2019.

CASO CLÍNICO
Paciente feminina, 76 anos, admitida em UTI após estudo hemodinâmico
de coronárias decorrente de IAM tardio. Exame de admissão: consciente,
orientada, escala de coma de Glasgow 15, perfusão periférica adequada, PA:
90x60 mmHg com noradrenalina. Após 30 minutos da admissão, evolui com
síncope. Detectada ausência de pulso ou respiração espontânea. Iniciado
manobras de ressuscitação cardiorrespiratória. Checado ritmo de parada,
visto no ECG abaixo:

Inicialmente caso conduzido como assistolia. Simultaneamente às


manobras de RCP e uso de adrenalina EV, iniciado protocolo de linha reta.
Após aumento do ganho de sinal no monitor do desfibrilador identifica-se
novo ECG:

Constatado tratar-se de fibrilação ventricular fina, foi realizado


desfibrilação com 200J (bifásico) e uso de dose inicial de amiodarona EV.
Após novo ciclo de reanimação consta-se a presença de pulso carotídeo, bem
como ritmo organizado ao eletrocardiograma. Paciente é então submetido à
cuidados pós-RCP.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Quando for atender uma vítima de PCR não esqueça de antes
atentar a segurança da cena, retirando, por exemplo, o paciente de
vias públicas, e usando equipamentos de proteção individual.
Sempre chame ajuda!

• O rápido início das compressões torácicas e a desfibrilação


precoce são os pontos chave para uma RCP adequada.

• Não interrompa as compressões por períodos maiores do que


10 segundos.

• O exame físico auxiliará a determinar as possíveis etiologias da


PCR, para assim realizar um tratamento guiado.

• É fundamental estarmos atentos as informações passadas pelos


familiares, socorristas e pela equipe de atendimento pré
hospitalar (APH).

• Dados importantes de serem obtidos: tempo de parada, ritmo


inicial, o que o paciente estava fazendo, se a PCR foi
presenciada, comorbidades, medicações em uso, alergias e qual
tratamento já foi realizado.

• Em cenários de PCR é imprescindível que a equipe atue de


maneira organizada e efetiva. Para isso é necessário distribuir as
funções e encarregar alguém de comandar a ressuscitação.
Além disso, não podemos esquecer de encarregar um membro da
equipe para acionar o cronômetro.

• Nesses cenários de emergência é importante manter a calma e


tomar decisões com confiança.

REFERÊNCIAS
1. Bernoche, C., Timerman, S., Polastri, T. F., Giannetti, N. S., Siqueira, A. W. D. S., Piscopo,
A., ... & Quilici, A. P. (2019). Atualização da Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e
Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia-2019.
Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 113(3), 449-663.
2. Braunwald - Tratado de Doenças Cardiovasculares (10a). (2018).
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1.10
FEBRE REUMÁTICA
Autores:
Maria Cecília Landim Nassif
Lucas Campos Barbosa e Silva
Maria do Carmo Pereira Nunes

DEFINIÇÕES
• Febre reumática aguda: doença causada por uma resposta
autoimune à infecção pelo estreptococo beta-hemolítico do grupo
A, ocasionando manifestações cardíacas, articulares, neurológicas,
cutâneas e subcutâneas.

• Cardite reumática: inflamação ativa dos tecidos cardíacos,


principalmente das valvas mitral e/ou aórtica, que se manifesta
predominantemente com insuficiência valvar, causadas pela febre
reumática aguda.

• Cardiopatia reumática crônica: lesão valvar crônica


caracterizada principalmente por estenose mitral, que se manifesta
por dispneia aos esforços (síndrome congestiva pulmonar) e fadiga
(síndrome de baixo débito). Suas complicações incluem
insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral isquêmico,
endocardite infecciosa e fibrilação atrial.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• A febre reumática é uma complicação não supurativa da
faringoamigdalite causada pelo estreptococo beta-hemolítico do
grupo A (Streptococcus pyogenes), decorrente de resposta imune
tardia a esta infecção em indivíduos geneticamente predispostos. A
cardiopatia reumática (CR), por outro lado, consiste em uma
complicação da FR aguda, caracterizada por lesão valvar
permanente induzida pelo processo reumático.

• Estima-se que existam 33 milhões de casos de CR, com mais de


275.000 mortes diretamente atribuíveis à CR a cada ano no mundo.

• A patogênese da doença é composta pela tríade: presença do


estreptococo do grupo A, hospedeiro geneticamente susceptível e
resposta imune exacerbada. Foi evidenciado que a associação das
manifestações clínicas da FR e a hiper-responsividade imune a um
antígeno estreptocócico pode ser atribuída a um gene associado aos
alelos DR2 e DR4 do locus HLA-DR no cromossomo seis.

QUADRO CLÍNICO
• A FR aguda ocorre três semanas após a faringoamigdalite
estreptocócica e pode afetar as articulações (poliartrite), a pele
(eritema marginatum e nódulos subcutâneos), os gânglios da base
(coreia de Sydenham) e o coração. A incidência do surto inicial de
FR aguda é maior entre 5 e 14 anos, acometendo igualmente
homens e mulheres. No entanto, a CR ocorre mais comumente em
mulheres, na proporção de 1,6:2 do sexo feminino em relação ao
masculino.

• A artrite é a manifestação mais precoce e mais comum, presente


em 60 a 80% dos casos, com caráter migratório, acometendo
grandes e médias articulações, com um curso autolimitado e
recuperação completa em cerca de quatro semanas.

• A coreia de Sydenham é uma manifestação mais tardia, meses


após a infecção estreptocócica, com surto durando entre dois e três
meses e um ano e, isoladamente, faz o diagnóstico de FR. Ocorre
predominantemente em crianças e adolescentes do sexo feminino,
manifestando-se por movimentos rápidos, involuntários e
incoordenados dos membros e da face.

• As manifestações cutâneas, que incluem o eritema marginatum e


os nódulos subcutâneos, são mais raras e de difícil diagnóstico.

• A cardite reumática é a manifestação mais grave da FR,


correndo em mais de 50% dos casos de FR aguda. É caracterizada
por pancardite, envolvendo o pericárdio, o miocárdio e
endocárdio, causando valvulite da valva mitral (regurgitação
mitral) e, menos frequentemente, da valva aórtica (regurgitação
aórtica). As lesões valvares representam as complicações mais
graves, responsáveis pelo quadro clínico e pelo prognóstico.
Apesar de ser possível que apenas um quadro agudo de FR já seja
capaz de evoluir para doença valvar grave, a cardiopatia reumática
normalmente é decorrente de dano cumulativo secundário às
repetidas infecções estreptocócicas. Esse dano resulta em lesão das
valvas cardíacas com alterações morfológicas e funcionais,
resultando no desenvolvimento de insuficiência cardíaca. O
intervalo entre o episódio inicial de FR e a evidência clínica da
cardiopatia reumática varia entre poucos anos e até mais de 20
anos.

EXAME FÍSICO
• Sistema osteoarticular: artropatia assimétrica, poliarticular e
migratória, com acometimento preferencial de grandes articulações
periféricas (tornozelos, joelhos, cotovelos e punhos) e presença de
sinais flogísticos. Ao exame físico, observa-se limitação ativa e
passiva da amplitude do movimento, associada à exuberante
quadro álgico. Não ocorrem deformidades irreversíveis.

• Sistema cardiovascular: na fase aguda, o principal achado do


exame físico é o sopro da regurgitação mitral, caracterizado por ser
holossistólico, de média a alta frequência, com irradiação para
axila e dorso. Além disso, poderão estar presentes o sopro de
Carey-Coombs (estenose mitral funcional secundária à valvulite) e
sopro da insuficiência aórtica (sopro protodiastólico aspirativo,
mais audível em foco aórtico acessório). Caso ocorra
acometimento concomitante do pericárdio e/ou do miocárdio,
poderão ser observados taquicardia, disfunção ventricular (edema
pulmonar agudo, turgência jugular patológica e hepatomegalia
congestiva) e dor torácica do tipo pleurítica. Na fase crônica, o
principal achado do exame físico é o sopro da estenose mitral, que
se caracteriza por ruflar diastólico, som grave, associado à
hiperfonese de B1 e estalido de abertura mitral.

• Sistema neurológico: presença de movimentos coreicos,


geralmente iniciados em mãos, com posterior acometimento de
pés. Podem estar associados contorções, movimentos involuntários
da face (“caretas” e “sorriso largo”), disartria, labilidade emocional
e fasciculações da língua. O exame sensitivo não costuma
apresentar alterações.

• Pele e anexos: o exame dermatológico pode evidenciar o clássico


eritema marginatum, rash eritematoso maculopapular não
pruriginoso, com margens serpiginosas avermelhadas e centro
claro, que costuma apresentar formato centrífugo. Além disso,
podem estar presentes nódulos subcutâneos firmes, indolores,
móveis e sem sinais flogísticos associados, em superfícies
extensoras, sobre proeminências ósseas ou tendões.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Exames laboratoriais: elevação da proteína C reativa (PCR), da
velocidade de hemossedimentação (VHS) e de mucoproteínas. O
fator antinuclear (FAN) costuma ser negativo. A avaliação da
infecção estreptocócica pode ser realizada pela dosagem dos
anticorpos antiestreptolisina O (ASLO), anti-DNAse B e anti-
hialuronidase. Pode ocorrer leucocitose neutrofílica e anemia
normocítica e normocrômica.
• Ecodopplercardiograma: a avaliação ecocardiográfica da CR
baseia-se nos achados morfológicos do acometimento reumático
das valvas mitral e aórtica e no comprometimento funcional valvar
(Tabela 1). Baseado nos critérios da WHF, as crianças e
adolescentes menores de 20 anos podem ser classificados em três
categorias: normal, borderline ou CR definitiva, com suas
subcategorias conforme as alterações ecocardiográficas (Tabela 2).

Alterações morfológicas
Valva mitral Valva aórtica

Espessamento do folheto anterior ≥ 3mm Espessamento focal ou irregular

Espessamento do aparato subvalvar Defeito de coaptação

Restrição de mobilidade dos folhetos Mobilidade restrita dos folhetos

Movimentação excessiva do folheto anterior Prolapso

Regurgitação patológica Regurgitação patológica

Jato regurgitante visto em duas incidências Jato regurgitante visto em duas incidências

Jato regurgitante ≥ 2cm em pelo menos uma Jato regurgitante ≥ 1cm em pelo menos uma
incidência incidência

Velocidade ≥ 3m/s em pelo menos um registro Velocidade ≥ 3m/s em pelo menos um registro
do Doppler do Doppler

Jato holossistólico em pelo menos um registro


Jato holodiástólico em pelo menos um registro do Doppler
do Doppler

Tabela 1. Características morfológicas do acometimento reumático valvar e


critérios para regurgitação valvar patológica, conforme as recomendações da
World Health Federation (WHF).
Fonte:

CATEGORIA DEFINITIVA BORDERLINE

Regurgitação mitral patológica e, pelo menos, duas Pelo menos duas alterações morfológicas da valva
SUBGRUPO A características morfológicas de lesão reumática na mitral, sem regurgitação patológica ou estenose
valva mitral mitral

Estenose mitral com gradiente médio


SUBGRUPO B Regurgitação mitral patológica
≥ 4mmHg

Regurgitação aórtica patológica e, pelo menos, duas


SUBGRUPO C características morfológicas de lesão reumática na Regurgitação aórtica patológica
valva aórtica

SUBGRUPO D Doença borderline de ambas as valvas


Tabela 2: Critérios ecocardiográficos para diagnóstico CR em crianças e
adolescentes com idade ≤ 20 anos na ausência de história prévia de FR
aguda ou CR crônica, segundo os critérios estabelecidos pela WHF.
Fonte:

• A avaliação da resposta terapêutica baseia-se na resolução da


febre e na diminuição dos marcadores inflamatórias (PCR e VHS),
devendo ser monitoradas quinzenalmente. Nos casos de cardite,
uma avaliação ecocardiográfica deverá ser realizada após quatro
semanas do início do quadro.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• O diagnóstico de FR é baseado em critérios clínicos, denominados
critérios de Jones, após exclusão de outros diagnósticos
diferenciais. Os critérios são divididos em manifestações maiores
e menores (Tabela 3). O diagnóstico de FR agudo é feito quando o
paciente apresenta dois critérios maiores, ou um critério maior e
pelo menos dois menores. Além disso, para o diagnóstico, é
necessário ter evidências de infecção recente estreptocócica da
orofaringe, o que geralmente é feito usando sorologias. As
exceções a esses critérios são os pacientes que apresentam coreia
ou cardite indolente, pois essas manifestações podem tornar-se
aparentes apenas meses após a infecção estreptocócica causal e,
portanto, manifestações adicionais podem não estar presentes e o
teste de sorologia estreptocócica pode ser normal.

População Baixo risco* Moderado/alto risco Recorrência

CRITÉRIOS PARA 2 maiores ou 1 maior 2 maiores ou 1 maior 2 maiores; 1 maior


DIAGNÓSTICO e 2 menores e 2 menores e 2 menores ou 3 menores
População Baixo risco* Moderado/alto risco Recorrência

Cardite (clínica ou Cardite (clínica ou


Cardite (clínica ou
subclínica); coreia; subclínica); coreia;
subclínica); coreia;
nódulos subcutâneos; nódulos subcutâneos;
MAIORES nódulos subcutâneos;
eritema marginatum; eritema marginatum;
eritema marginatum;
poliartrite, monoartrite poliartrite, monoartrite
poliartrite
e/ou poliartralgia e/ou poliartralgia

Febre ≥ 38,5oC;
Febre ≥ 38oC; VHS ≥ 30mm; PCR Febre ≥ 38oC; VHS ≥ 30mm; PCR
VHS ≥ 60 mm;
MENORES ≥ 3mg/dl; intervalo PR prolongado; ≥ 3mg/dl; intervalo PR prolongado;
PCR ≥ 3mg/dl; intervalo PR
monoartralgia monoartralgia
prolongado; poliartralgia

*Na tabela 1, foi considerada população de baixo risco aquela com incidência de febre reumática aguda ≤ 2 por 100.000 crianças em
idade escolar (5-14 anos) ou prevalência de cardiopatia reumática em todas as idades ≤ 1 por 1.000 indivíduos por ano. Em relação à
cardite subclínica, considerou-se os casos nos quais não se ausculta sopro de disfunção valvar, mas com sinais de valvulite ao
ecodopplercardiograma.

Tabela 3: Critérios para o diagnóstico de febre reumática aguda (revisão dos


critérios de Jones utilizando o ecodopplercardiograma) para os indivíduos
com evidências de infecção estreptocócica prévia.
Fonte:

• Os principais diagnósticos diferenciais são:


Artrite: artrite idiopática juvenil, artrite séptica, artropatia viral,
artropatia reativa, doença de Lyme, doença falciforme,
endocardite infecciosa, gota ou pseudogota.

Cardite: regurgitação mitral fisiológica, prolapso de valva


mitral, espessamento mixomatoso da valva mitral, cardiopatia
congênita, miocardite viral ou idiopática, doença de Kawasaki.

Coreia: intoxicação medicamentosa, doença de Wilson, coreias


familiares e doença autoimunes.

TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO


• As manifestações osteoarticulares, dermatológicas e neurológicas
são autolimitadas e geralmente não evoluem com sequelas.
• Na coreia leve e moderada, estão indicados repouso e
permanência do paciente em ambiente calmo, evitando-se
estímulos externos. Os suportes psicológico e social, incluindo o
apoio às necessidades educacionais da criança, são elementos
importantes do manejo clínico.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
• A erradicação do estreptococo é feita com a penicilina G
benzatina (600.000 a 1.200.00UI) em dose única. Nos pacientes
alérgicos à penicilina é recomendada a eritromicina na dose de 20 a
40 mg/kg/dia durante 10 dias, podendo-se utilizar azitromicina ou
clindamicina.

• Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) constituem


medicamentos de escolha para febre e para alívio das dores
articulares. O ácido acetilsalicílico (AAS) é considerada a
primeira opção, com posologia infantil de 80-100 mg/kg/dia
dividida em quatro vezes ao dia. Deve-se atentar para a
possibilidade de efeitos colaterais com o uso de AAS, como
hiperventilação espontânea, zumbido auditivo e síndrome de Reye
(encefalopatia hepática). Os corticosteroides não são
frequentemente usados porque não oferecem benefícios
terapêuticos e podem mascarar a presença de outras doenças que
causam artrite.

• O corticoide está indicado nos casos de cardite moderada e grave.


O esquema recomendado é a prednisona (1 a 2 mg/kg/dia) por via
oral, na dose máxima de 80mg/dia. A dose plena deve ser mantida
por duas a três semanas, reduzindo-se de 20% a 25% da dose a
cada semana, com tempo total de tratamento de 12 semanas. A
pulsoterapia endovenosa com metilprednisolona (30 mg/kg/dia)
está indicada em casos de cardite muito grave refratária ao
tratamento inicial com corticoide ou nos casos de insuficiência
cardíaca por lesão valvar, especialmente quando há ruptura de
cordas tendíneas causando insuficiência mitral grave com
indicação cirúrgica.

• Para as coreias de difícil manejo e com comprometimento das


atividades de vida diária, os seguintes fármacos podem ser
indicados: a) haloperidol 1 mg/dia duas vezes ao dia, aumentando
0,5 mg a cada três dias até a dose máxima de 5 mg ao dia; b) ácido
valproico 10 mg/kg/dia, aumentando 10 mg/kg a cada semana até
dose máxima de 30 mg/kg/dia (contraindicado para mulheres em
idade fértil, pelo risco de teratogenicidade); e c) carbamazepina
7-20 mg/kg/dia três vezes ao dia. Em casos moderados a graves, o
uso de corticoide (prednisona 1-2 mg/kg/dia) constitui uma opção
terapêutica e pode reduzir a duração dos sintomas.

• Prevenções:
Primária: previne a colonização, a infecção e a transmissão do
agente, objetivando principalmente a eliminação da bactéria
antes da instalação da resposta imunológica do hospedeiro. As
faringoamigdalites devem ser tratadas com uma dose
intramuscular de penicilina G benzatina ou 10 dias de
penicilina V oral, iniciados em até 9 dias da instalação da
infecção. Cefalosporinas de primeira geração ou macrolídeos
estão indicados para os pacientes alérgicos à penicilina.

Secundária: previne reinfecção por S. pyogenes em pacientes


previamente diagnosticados com FR ou CR que se tornam
susceptíveis a novos surtos da doença. Consiste na
administração de penicilina G benzatina (600.000 a 1.200.000
UI) a cada três semanas. Os seguintes esquemas são
recomendados: 1) FR sem cardite: profilaxia secundária até 21
anos ou até cinco anos após o último surto; 2) FR com cardite
prévia, insuficiência mitral leve residual ou resolução da lesão
valvar: profilaxia até 25 anos ou 10 anos após o último surto
prevalecendo o que cobrir o maior período; 3) FR com cardite
prévia e lesão valvar residual moderada a grave: a profilaxia será
mantida até os 40 anos ou por toda a vida em casos especiais.

Terciária: previne morbimortalidades referentes às


complicações relacionadas à CR crônica já estabelecida,
incluindo manejo da insuficiência cardíaca, arritmias,
anticoagulação, prevenção de endocardite infecciosa,
complicações relacionadas à gravidez e intervenções cirúrgicas
conforme a lesão valvar.

FLUXOGRAMA DE TRATAMENTO

Fluxograma 01: Abordagem terapêutica da febre reumática aguda.


Fonte: Medscape, 1999 (adaptada).

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: LFS, 25 anos, sexo feminino, casada, procura
atendimento médico com queixa de dispneia aos esforços, iniciada nos
últimos três meses com caráter progressivo. Paciente relata estar
previamente assintomática quando notou cansaço para andar mais
rápido e subir uma rua mais íngreme, com queda gradual da tolerância
aos esforços. Mais recentemente, ela precisa parar quando está
caminhando no plano e não consegue acompanhar seu marido de
mesma idade. Relata ser sedentária e estar ganhando peso e acha que a
dispneia apresentada pode ser decorrente dos hábitos de vida. Refere
faringoamigdalites de repetição na sua infância, tendo sido internada
uma vez com poliartrite. Quando interrogada, referiu episódios de
´´batedeira no peito´´, sem relação com esforço físico. Na história
pregressa, relatou ter nascido no interior de Minas Gerais, em uma casa
pequena, morando com os pais e mais seis irmãos. Ao exame físico:
PA: 120/80 mmHg; FC: 92 bpm; B1 facilmente palpável e
hiperfonética, sopro iniciado logo após B2, com configuração
crescente-decrescente, precedido por estalido de abertura mitral e mais
intenso antes de B1 (ruflar diastólico com reforço pré-sistólico).
Exames laboratoriais trazidos pela paciente sem anormalidades. O
eletrocardiograma evidenciou ritmo sinusal com FC de 86 bpm e sinais
de sobrecarga atrial esquerda.
b. Condutas:

1. Beta-bloqueador para melhora da tolerância ao exercício físico.

2. Diurético de alça para melhora da congestão pulmonar.

3. Solicitar exames laboratoriais para avaliação de outros fatores contribuintes para a intolerância ao exercício físico.

4. Solicitar ecodopplercardiograma para quantificação da gravidade da lesão, para estimativa da pressão sistólica na
artéria pulmonar e para avaliação da morfologia valvar mitral e definição da melhor estratégia terapêutica.

5. Profilaxia secundária com penicilina G benzatina 1.200.000 UI IM a cada 21 dias até a idade de 40 anos.

6. Orientação em relação à anticoncepção para evitar os riscos decorrentes de uma eventual gestação.

7. Considerar anticoagulação com varfarina pelo provável quadro de fibrilação atrial paroxística.

8. Procurar atendimento de urgência diante de qualquer agravamento da dispneia ou aparecimento de outros sintomas.

9. Orientações gerais em relação à dieta e às atividades físicas, que podem ser mantidas conforme a tolerância da
paciente.
• Paciente retornou relatando permanecer sintomática e o
ecodopplercardiograma confirmou estenose mitral grave com
hipertensão pulmonar e anatomia valvar favorável ao procedimento
percutâneo (Imagem 1), sendo encaminhada para realização de
valvoplastia mitral por cateter-balão. As imagens do
ecodopplercardiograma estão mostradas abaixo:

Imagem 1. Ecocardiograma bidimensional e tridimensional evidenciando


achados clássicos de estenose mitral secundária à cardiopatia reumática
crônica.
Fonte: imagem fornecida pela Dr. Maria do Carmo Pereira Nunes.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Os critérios de Jones para o diagnóstico de FR aguda foram
atualizados, considerando a cardite subclínica detectada pelo
ecocardiograma como critério maior.

• A presença de cardite subclínica prediz alto risco de progressão


para cardiopatia reumática crônica com disfunções valvares.

• O termo cardiopatia reumática subclínica ou latente emergiu


após os estudos com ecocardiograma de screening para detecção
precoce de alterações valvares.

• A prevalência atual de cardiopatia reumática subclínica é maior


que os casos com manifestações clínicas.

• A avaliação ecocardiográfica da cardiopatia reumática é


baseada nos achados morfológicos do acometimento reumático das
valvas mitral e aórtica, bem como do comprometimento funcional
dessas valvas.

• A coreia de Sydenham isoladamente faz o diagnostico de FR


aguda.

• O tempo entre o episódio inicial de FR aguda e a manifestação


clinica das lesões valvares é variável, em geral superior a 20 anos.

• A ausculta cardíaca apresenta baixa sensibilidade para


diagnosticar precocemente a cardiopatia reumática crônica.

• A manifestação clínica da cardiopatia reumática crônica


depende da lesão valvar predominante.

• A prevenção de novos surtos de FR aguda é a medida mais eficaz


no controle da doença.
• O tratamento da FR aguda visa suprimir o processo inflamatório,
minimizando as manifestações cardíacas, articulares e
neurológicas, além de erradicar a infecção estreptocócica.

• Os anti-inflamatórios constituem medicamentos de escolha para


febre e alívio das dores articulares. Os corticosteroides não são
frequentemente usados no tratamento da artrite porque não
oferecem benefícios terapêuticos e podem mascarar a presença de
outras doenças que causam artrite.

• A vacina contra S. pyogenes é promissora para prevenção


primária da FR aguda.

• Prevenção secundária está indicada em pacientes previamente


diagnosticados com FR aguda ou cardiopatia reumática
crônica que são suscetíveis a novos surtos da doença.

• Prevenção terciária consiste em prevenir morbidade e


mortalidade das complicações relacionadas à cardiopatia
reumática crônica estabelecida, incluindo manejo da insuficiência
cardíaca, arritmias, anticoagulação, prevenção de endocardite
infecciosa, complicações relacionadas à gravidez e intervenções
cirúrgicas conforme a lesão valvar.

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1.11
ANTICOAGULANTES
Autores:
Estevão Tavares de Figueiredo
Jean Bryally Peres
José Tasca
Vitória de Cássia da Silva Moreira

Breve histórico
• 1271 - Relatos literários descrevendo Trombose Venosa;
• 1628 - Willian Harvey, médico inglês, descreve as leis que regem
a Circulação Sanguínea;

• 1835 - Andrew Buchaman, médico escocês, traz o conceito


revolucionário do Fator Tissular iniciando o processo de
coagulação;

• 1856 - Rudolf Virchow, médico alemão, considerado o pai da


patologia moderna, elucida o mecanismo do tromboembolismo,
cujos fatores centrais são conhecidos até hoje como a tríade de
Virchow;

• 1882 - Giulio Bizzozero, médico e biólogo italiano, descobre a


função das plaquetas na coagulação sanguínea;

• 1905 - Paul Morawitz, médico e fisiologista alemão, propõe a


primeira teoria para explicar o fenômeno de coagulação
sanguínea incluindo alguns fatores como o cálcio, o fibrinogênio, a
protombina e a tromboquinase. Fornecendo assim, a base da
cascata de coagulação;
• 1916 - Jay McLean, médico americano, descobriu acidentalmente,
quando ainda era aluno do 2º ano de Medicina, a Heparina à
partir do tecido hepático de cães;

• 1920 - Herik Dam, bioquímico dinamarquês, descobriu a vitamina


K;

• 1931 - Karl Link, bioquímico americano, descobre a coumarina,


antagonista da vitamina K;

• 1939 - Karl Link sintetiza o dicoumarol e uma série de congêneres


antagonistas da vitamina K, o mais potente dos quais
denominou de varfarina, sendo liberada para uso clínico na década
de 50. Por curiosidade o nome é derivado da Sigla WARF
(Wiscosin Alumini Research Foudation) + arin (derivado da
palavra coumadin);

• 1939 - Olav Egeberg, hematologista norueguês, descreve a


primeira causa de trombofilia em razão da deficiência de
antitrombina;

• 1953 - R.D.Langdell, R.H.Wagner e K.M.Brinkhous,


pesquisadores americanos, descobriram o TTPa “Tempo de
Tromboplastina Parcial Ativada” com o objetivo de diferenciar o
plasma de pacientes com diagnóstico de hemofilia dos plasmas
normais, uma vez que a TP não era capaz;

• 1954 - Com a maioria dos fatores de coagulação descobertos,


consolida-se a denominação pelos Algarismos Romanos a fim de
simplificar e universalizar seu uso;

• 1960 - Angiografia e Cintilografia de V/Q para diagnóstico de


Embolia Pulmonar;
• 1964 - Conceito de Cascata da Coagulação com ativação
sequencial dos diferentes fatores culminando com a formação do
coágulo de fibrina;

• 1970 - Descoberta das proteínas C e S;


• 1980 - Descoberta do Dímero-D;
• 1993 - Descoberta a mutação do fator V de Leiden;
• 2008 - Lançamento dos Anticoagulantes orais diretos, como
alternativa aos antagonistas da vitamina K.

INTRODUÇÃO
Os anticoagulantes são drogas essenciais tanto para a prevenção quanto
tratamento de inúmeras situações clínicas de alta incidência e prevalência no
dia a dia do Médico moderno. Este, por sua vez, deve assumir o papel que
lhe cabe, e encarar com mais seriedade e atenção esse tema, a fim de adquirir
mais recursos técnicos e ampliar seu raciocínio clínico prático.
Percebe-se, infelizmente, que, grande parcela dos pacientes acometidos
por fenômenos tromboembólicos evitáveis, acabam por ser vítimas da
omissão de quem teria o dever de protegê-los: “o Médico”. Estes pacientes
sim serão penalizados por essa negligência e ou imperícia, elevando o
número das estatísticas de morte, invalidez, redução da perspectiva de vida e
prejuízo socioeconômico irreparável, tanto para si quanto para suas famílias
e o próprio Estado.
Pensando nisso, o manual vem com a proposta de desmistificar o tema e
incutir no leitor, maior familiaridade e tranquilidade ao indicar,
contraindicar, manejar e reconhecer sinais de alerta, conferindo ao colega
prescritor, maior habilidade para escolha e manuseio destas armas
terapêuticas. O objetivo é de fato, dar segurança ao colega médico e seus
pacientes.
É importante que tenhamos em mente, que estas drogas, podem variar
suas dosagens e posologias, além de seus ajustes particulares, nas mais
variadas situações.
Recomendamos que antes de iniciarmos a condução de situações
específicas, é fundamental que entendamos e revisemos rapidamente sobre
os fundamentos fisiológicos da Hemostasia e coagulação sanguínea,
relacionando-os à farmacocinética e farmacodinâmica das drogas em
questão.

FISIOLOGIA DA COAGULAÇÃO
No sangue há um grande número de substâncias que promovem a
coagulação, chamadas de pró-coagulares, e outras que inibem a coagulação,
chamadas de anticoagulantes. Ele não coagula enquanto circula porque há
predominância das substâncias anticoagulantes. O nome que se dá a este
mecanismo é hemostasia. Por um corte, ruptura de um vaso ou mesmo em
situações patológicas, a hemostasia é provocada e podem ocorrer diversos
mecanismos para a sua manutenção, como: constrição vascular, formação de
tampão de plaquetas, formação de coágulo sanguíneo, crescimento de tecido
fibroso para fechamento do vaso. Após um trauma do vaso sanguíneo há um
breve período de vasoconstrição por espasmo muscular e substâncias
vasoconstritoras, com subsequente ativação e aderência das plaquetas pelo
contato com a parede lesada do vaso, formando um tampão plaquetário. Se a
lesão for grande há a necessidade da formação de um coágulo sanguíneo,
para completar a hemostasia. O mecanismo da coagulação pode ocorrer por
duas vias, a via extrínseca e a via intrínseca.
A via extrínseca é ativada quando ocorre lesão do endotélio vascular,
havendo liberação da tromboplastina tecidual ou fator III, que se combina
com o fator VII (acelerador da protrombina) na presença do fator IV (cálcio)
e atua enzimaticamente sobre o fator X (anti-hemofílico), para formar o fator
X ativado. Na via intrínseca, o fator XII (Hageman) ao contato com
qualquer superfície que não seja o endotélio vascular, é ativado, em seguida
ativa o fator XI (precursor da tromboplastina plasmática). Estes dois fatores
ativados estimulam a ativação do fator IX (anti-hemofílico B), o fator IX
ativado, converte o fator VIII (anti-hemofílico A) à forma ativa. O fator VIII
ativado se liga ao cálcio e ao fosfolipídio plaquetário, formando um
complexo ativador do fator X.
Estímulos diferentes iniciam as vias extrínsecas e intrínsecas, mas a
partir da ativação do fator X, as duas vias seguem uma via comum. O fator
X ativado se combina com o fator IV (cálcio), com o fator V (pró-acelerina)
e com as plaquetas ou com os fosfolipídios teciduais para formar o complexo
ativador da protrombina e convertem o fator II (protrombina) em trombina.
A trombina, por sua vez, é uma enzima proteolítica, que atua sobre o fator I
(fibrinogênio), formando moléculas de monômero de fibrina, essas
moléculas se polimerizam, formando longas fibras de fibrina. Assim o
tampão de plaquetas, formado inicialmente, mais as fibras de fibrina, células
sanguíneas e plasma, formam o coágulo sanguíneo.

Figura 1. Cascata de Coagulação e ação das drogas: Cascata De Coagulação


e Ação das Drogas:
Fonte: Elaborado pelos autores.

DROGAS
I) DROGAS ANTICOAGULANTES PARENTERAIS:

A. DE AÇÃO INDIRETA:

HEPARINAS:
A heparina não fracionada (HNF) possui peso molecular de 15.000
Daltons (Da). Tem como mecanismo de ação, a inibição indireta da
Trombina (Fator IIa) atuando como co-fator da antitrombina (AT),
aumentando sua atividade e, consequentemente, seu efeito anticoagulante
sob a trombina, o Fator Xa, e, em menor grau, os Fatores XII, XI e IX
ativados, além de também inibir o complexo ‘Fator tecidual – Fator VIIa’,
promovendo alterações laboratoriais do Tempo de Protrombina (TP), do
Tempo de Tromboplastina Parcial ativado (TTPa) e do Tempo de Trombina
(TT). A despolimerização da HNF levou à obtenção de compostos de menor
peso molecular (inferior a 8.000 Da), que receberam o nome genérico de
heparinas de baixo peso molecular.
As heparinas de baixo peso molecular (HBPM) têm baixa atividade
antitrombínica mas mantém a capacidade de inativar o Fator Xa. Exerce sua
atividade antitrombótica por inibição seletiva do Fator Xa mediada pela
antitrombina III (ATIII). Laboratorialmente, somente alteram o TTPa quando
utilizadas em altas doses e, devido às suas características farmacológicas,
permitem dispensar a monitorização na maioria dos pacientes, exceto
grávidas, obesos e pacientes com disfunção renal, onde nestes casos, se
disponível, é indicado a dosagem do Fator anti-X ativado (anti-Xa). Os
níveis terapêuticos da atividade anti-Xa oscilam entre 0,5 e 1,0 UI/ml. A
média da atividade anti-Xa, mensurada 3 a 5 horas após injeção SC, é
proporcional à dose administrada: 0,2, 0,4, 1,0, 1,3 UI anti-Xa/ml nas doses
únicas de 20mg, 40mg, 1mg e 1,5mg/Kg respectivamente.
Apresentações:

• HNF: Solução injetável IV (5.000 UI/ml) – Frascos-ampolas de 5


ml;

Solução injetável SC (5.000 UI/0,25 ml) – Ampolas de 0,25 ml;

• Dose Profilática: 5.000 UI SC, 12/12h;


• Dose Terapêutica com Heparinização em infusão contínua:
HNF Dose inicial: 80 UI/Kg em bolus, seguido de 18 UI/Kg/h

TTPa Bolus Interrupção Mudança na infusão


< 35 seg (1,2 x controle) 80 UI/Kg não Aumentar 4 UI/Kg/h

35-45 seg (1,3 a 1,5 x controle) 40 UI/Kg não Aumentar 3 UI/Kg/h

46-60 seg (1,6 a 2,0 x controle) 30 UI/Kg não Aumentar 2 UI/Kg/h

61-85 seg (2,1 a 2,5 x controle) não não Manter a infusão

86-110 seg (2,6 a 3,0 x controle) não não Reduzir 2 UI/Kg/h

Diluição sugerida: Heparina sódica (5.000 UI/mL) 5 mL + Solução glicosada 5% 245 mL.
Concentração final: 100 UI/mL.

Tabela 1. Esquema de ajuste da heparina não fracionada pelo TTPa.


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

• Enoxaparina: Solução injetável IV ou SC - Ampolas de 20


mg/0,2 ml, 40 mg/0,4 ml, 60 mg/0,6 ml, 80 mg/0,8 ml e 100
mg/1,0 ml.

• Dose profilática: 40 mg/Kg SC, 1x / dia.


• Dose terapêutica: 1 mg/Kg SC, 12/12h. (0,75 mg/Kg SC, 12/12h,
se > 75 anos, e 1 mg/Kg SC, 1x dia, se ClCr < 30 ml/min/1.73m²);

• (No IAMCST submetidos à Fibrinólise e ≤ 75 anos, administrar


bolus de 30 mg IV após 15 min, 1 mg/Kg SC 12/12h; se > 75 anos,
não administrar bolus e administrar 0,75 mg/Kg SC 12/12h).

• Fondaparinux: Solução injetável IV – Ampola (2,5 mg/0,5 ml);


Solução injetável SC – Ampolas (2,5 mg/0,5 ml) e (7,5 mg/0,6
ml);

• Dose profilática: 2,5 mg SC, 1x / dia;


• Dose terapêutica: < 50 Kg: 5 mg/dia SC; 50 a 100 Kg: 7,5
mg/dia SC; > 100 Kg: 10 mg/dia SC.

• (No IAMCST, a primeira dose deve ser IV, as próximas SC).


B. DE AÇÃO DIRETA (INIBIDOR DA TROMBINA):

BIVALIRUDINA:
Anticoagulante parenteral de ação de inibição direta da trombina. Tem
como mecanismo de ação, o bloqueio da atividade da trombina em dois
sítios, ou seja, livre no plasma e ligada ao trombo. Consequentemente
impedindo a conversão de fibrinogênio em fibrina, interferindo sobre as
fases de amplificação e propagação estabelecidas pelo modelo celular da
coagulação pela diminuição da geração de trombina. Possui resultados
semelhantes aos da Enoxaparina em estudos que demonstram redução da
incidência de sangramentos graves. Pode ser empregada em SCA. Porém,
ainda indisponível para uso no Brasil.

II) DROGAS ANTICOAGULANTES ORAIS:

A. VARFARINA (ANTAGONISTA DA VITAMINA K - AVK):


Tem como mecanismo de ação antagonizar a vitamina k, interferindo
principalmente, sobre os fatores da coagulação II, VII, IX e X, e das
proteínas C e S que são sintetizados no fígado, e são biologicamente
inativos. Para que estes fatores da coagulação se convertam à forma ativa, é
necessária a presença da vitamina K, na sua forma hidroquinona ativa,
durante a y-carboxilação dos resíduos de ácido glutâmico destes fatores.
Sempre que um resíduo de glutamato é carboxilado, a vitamina K é oxidada,
originando epóxido de vitamina K. Este metabólito é convertido à sua forma
ativa hidroquinona pela ação da enzima epóxiredutase de vitamina K,
disponibilizando-a para novos processos de carboxilação. Sendo assim, age
inibindo a carboxi-redutase, tendo como resultado o antagonismo à vitamina
K, por bloquear sua interconversão cíclica. Como a ação é competitiva, são
necessários alguns dias para o aparecimento do efeito anticoagulante, até o
desaparecimento dos fatores presentes na circulação sanguínea, que já
sofreram carboxilação. E, para que a atividade de cada fator plasmático
atinja um novo equilíbrio dinâmico, dependerá da taxa de depuração
individual. Após o início da terapia, o tempo de meia-vida de cada fator em
horas, é: fator VII, 6h; fator IX, 24 h; fator X, 36 h; fator II, 50 h.
• Reações adversas e acompanhamento do paciente:
O risco de complicações hemorrágicas (principalmente intracraniana) ou
a ocorrência de eventos tromboembólicos são a grande preocupação em
pacientes sob terapia com anticoagulantes. Dependendo de fatores genéticos,
ambientais, alimentícios, sócioculturais, patologias de base, interações
medicamentosas, que influenciam na absorção, farmacocinética e
farmacodinâmica, o efeito dos AVK varia de indivíduo para indivíduo. Com
isso, o monitoramento do efeito dos AVK sobre a coagulação deve ser
realizado, sendo o exame laboratorial de TP o mais indicado. Este teste
avalia a via extrínseca da coagulação e, indiretamente a via comum, tendo
seus valores expressos pelo índice internacional normalizado ou razão
normalizada internacional (INR ou RNI), critério de padronização proposto
pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 1982.
Para iniciar uma terapia com anticoagulantes orais, deve-se fazer um
questionário sobre medicamentos utilizados pelo paciente, alimentação e
doenças que podem inibir ou potencializar sua ação. Alguns medicamentos
como antidepressivos tricíclicos, antiácidos, barbitúricos (exceto os
tiobarbitúricos), carbamazepina, rifampicina, diuréticos em geral, estrógenos
para reposição hormonal ou anticoncepção, inibem a ação dos
anticoagulantes. Além de algumas medicações como as sulfas,
hipoglicemiantes e fenitoína agem potencializando os derivados
cumarínicos.
Também a ingestão de alimentos ricos em vitamina K como, brócolis,
alface, couve-flor, aspargo, agrião, repolho, fígado de boi, e outros, faz com
que a ação dos AVKs seja reduzida por promoverem a síntese de fatores da
coagulação dependentes da vitamina K (“fatores K dependentes”). Dietas
gordurosas diminuem a absorção da vitamina K. Plantas medicinais podem
interferir na coagulação, o “ginseng” inibe os AVKs, de modo contrário a
“sálvia” potencializa, pois possuem derivados cumarínicos que interferem
nos níveis de RNI. Ainda, além de medicamentos e ingestão de determinados
alimentos, muitos outros fatores de risco de hemorragia foram identificados
como, idade avançada, anemia, infarto do miocárdio, doença
cerebrovascular, história de hemorragia prévia.

Diminuem o efeito da Varfarina (aumentam risco de sangramento)


Aminoglicosídeos Antifúngicos Azitromicina
Alopurinol Amiodarona Ampicilina

AINEs Aspirina (AAS) Álcool

Betalactâmicos Contraceptivos orais Antiagregantes

Quinolonas Cefalosporinas Betabloqueadores

Corticoides Metotrexate Morfina

Hipoglicemiantes orais Ciclofosfamida Corticoides

Ticlopidina ISRS Estatinas

Propiltiouracil Propafenona Quinidina

Quetiapina Ranitidina Omeprazol

Oseltamivir Vacina Influenza Paracetamol

Aumentam o efeito da Varfarina (diminuem a eficácia anticoagulante)


Colestiramina Diuréticos tiazídicos Carbamazepina

Vitamina C Azatioprina Barbitúricos

Fenitoína Espironolactona Ciclofosfamida

Aumentam o efeito da Varfarina (diminuem a eficácia anticoagulante)


Nistatina Haloperidol Fenobarbital

Ritonavir Vitamina K Rifampicina

Tabela 2. Interações medicamentosas com a Varfarina:


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

Manejo clínico inicial:


Se a anticoagulação imediata for desejada, como por exemplo nos casos
de TEV (TVP, TEP) é recomendado o início do seu uso ainda em ambiente
hospitalar, concomitantemente com HNF ou HBPM, em doses terapêuticas,
por pelo menos 4 a 5 dias, até que o INR esteja na faixa terapêutica, quando,
então, a heparina pode ser suspensa. Nas demais condições, a varfarina pode
ser iniciada em regime ambulatorial, sem a necessidade de heparina
concomitante.
A dose de varfarina é guiada pelo valor inicial do INR. Caso este se
encontre acima de 1,3, avaliar possíveis causas antes de iniciar a varfarina.
Recomenda-se que no controle inicial da anticoagulação oral, se repita o
INR após a terceira dose de varfarina, ou seja, no 4° dia de tratamento e
também logo após, no 7° dia. Não se deve aumentar a dose de anticoagulante
na 1ª semana. Após, repetir os controles nos 14° e 21° dias e continuar
semanalmente até que o valor terapêutico seja atingido por duas medidas
consecutivas. Após esse período, o INR pode ser medido menos
frequentemente, não ultrapassando uma vez a cada 4 a 8 semanas.

Paciente iniciando o uso de Varfarina


Dia da coletA INR DOSE DE VARFARINA
1º dia 1 – 1,3 1 comprimido (5 mg)

1 – 1,3 1 comprimido (5 mg)

1,4 – 1,9 ¾ comprimido (3,75 mg)

4º dia 2,0 – 2,5 ½ comprimido (2,5 mg)

2,6 – 3,0 ¼ comprimido (1,25 mg)

3,1 – 4,0 Suspender dose do dia - ¼ cp. dia seguinte

7º dia Avaliar e ajustar conforme regrar anteriores

Manejo de níveis elevados de INR (com ou sem sangramento)


Situação clínica Conduta clínica

Suspender a próxima dose, monitorar INR 24-48h:


- Checar fatores causais (interação medicamentosa, dieta):
INR acima da faixa terapêutica mas inferior
reduzir dose até retirar a causa e após, retornar com dose
a 5, sem sangramento ou sangramento menor*
habitual.
- Sem fator causal: diminuir dose.

Manejo de níveis elevados de INR (com ou sem sangramento)


Situação clínica Conduta clínica

Suspender as próximas 2 doses, monitorar INR 24-48h:


- Baixo risco para sangramento: checar fatores causais
INR entre 5,0 e 9,0 sem sangramento (interação medicamentosa, dieta), reduzir dose até retirar a
ou sangramento menor* causa e após, retornar com dose menor.
- Alto risco para sangramento: vitamina K#, 1 a 2,5 mg via
oral e reduzir a dose.

INR > 9,0 sem sangramento - Suspender Varfarina, monitora INR 24-48 h;
ou sangramento menor* - Administrar Vit. K# 3 a 5 mg VO (via oral).

- Suspender Varfarina e internar;


INR > 9 com sangramento maior** - Administrar Vit. K# 10 mg, IV, lento
- PFC e/ou Complexo protrombínico se necessário

- Suspender Varfarina e internar;


INR > 9 com risco de óbito - Administrar Vit. K# 10 mg, IV, lento
- PFC e Complexo protrombínico

*sangramento menor: não fatal; basicamente epistaxe e hematomas.


**sangramento maior: necessita hospitalização e/ou necessita de transfusão e/ou resulta em alta morbidade e grande risco de
óbito, como hemorragia intracraniana ou intra-articular. #Altas doses de vitamina K podem provocar efeito rebote, com
persistência de INR elevado por determinado período, necessitando do uso de heparina até que seus valores normalizem.

Tabela 3. Esquema de ajuste da dose Varfarina segundo valor de INR:


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

B. DROGAS ANTICOAGULANTES ORAIS DE AÇÃO DIRETA


(DOAC’S):

INIBIDOR DIRETO DA TROMBINA:

1.1) DABIGATRANA:
O Etexilato de Dabigatrana (pró-droga sem atividade farmacológica),
após administração, é rapidamente absorvido e convertido em Dabigatrana
no plasma e no fígado por meio de hidrólise catalisada por esterases. É um
inibidor direto da trombina, potente, competitivo, reversível e é o principal
princípio ativo no plasma. Visto que a trombina possibilita a conversão de
fibrinogênio em fibrina durante a cascata de coagulação, a sua inibição
previne a formação do trombo.
Droga Apresentação
Dabigratana Comprimidos de 75 mg, 110 mg e 150 mg

• Indicações: AVC, prevenção TVP em cirurgia ortopédica, tratamento TVP/TEP, prevenção de AVC em FA
não valvar.
• Contraindicações: ClCr ≤ 30 ml/min, sangramento ativo ou condições de alto risco de sangramento,
TGO/TGP acima de duas vezes o nível normal, história de hipersensibilidade a Dabigatrana. AVC Hemorrágico
nos últimos 6 meses e portadores de próteses valvares cardíacas.
• Efeitos colaterais: sangramentos, anemia, dor abdominal, diarreia, dispepsia, náuseas.
* Interações medicamentosas: Uso concomitante de diversos antifúngicos, anticonvulsivantes e antiarrítmicos (Amiodarona,
Verapamil, cetoconazol, rifampicina, carbamazepina, fenitoína, fenobarbital);

INDICAÇÕES DE CORREÇÃO DA DOSE DOSE

• Idade acima de 80 anos 110 mg de 12/12h

• Tratamento concomitante com Verapamil 110 mg de 12/12h

Se 2 ou + dos seguintes: 110 mg de 12/12 h

• Idade entre 75 e 80 anos; peso < 60 kg;


• ClCr entre 30-49 ml/min (se 2 ou + desses
fatores);
• Corticóides;
• Trombocitopenia;
• História ou sangramento gastrointestinal não
severo ativo;
• HAS BLED ≥ 3 (Corrigir fatores de risco
para sangramento).

Observações (Doses padronizadas)

• Trombose venosa aguda, EP:


• 150 mg, 2X ao dia após 5 dias de uso de um anticoagulante parental.
• TVP após cirurgia de prótese de joelho ou quadril (14 ou 30 dias, respectivamente):
• Iniciar com 110 mg 1 a 4 h após o término da cirurgia. Após, tomar 220 mg (2 cápsulas de 110 mg) VO 1X ao
dia por mais 28 a 35 dias se cirurgia de quadril ou por mais de 10 dias, se joelho. Se IR (CICr 30-50 ml/min),
utilizar 150 mg (2 cápsulas de 75 mg) 1 X ao dia.

* FA: fibrilação atrial, AVCi: acidente vascular cerebral isquêmico; ClCr: Clearance de creatinina;
Cr: Creatinina; EP: embolia pulmonar; TVP: trombose venosa profunda

Tabela 4. Dabigatrana:
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Cuidados: Pode ser ingerido com ou sem alimentos. O


medicamento não pode ser aberto e armazenado em recipientes
(tomada imediata) ou mastigado. Caso seja mastigada, partida ou
aberta a absorção da droga pode aumentar em até 75%, causando
assim aumento substancial do risco de sangramento.
Troca de anticoagulantes:

• AVK para dabigatrana: se o paciente estiver tomando algum


antagonista da vitamina K (por exemplo, varfarina), suspender a
medicação e iniciar dabigratana assim que o INR estiver ≤ 2,0.

• Dabigatrana para AVK: se CICr > 50ml/min, iniciar AVK 3 dias


antes de descontinuar a dabigatrana. Se CICr entre 30-50 ml/min,
iniciar AVK 2 dias antes de descontinuar a dabigatrana.

• Heparina não fracionada (HNF) EV para dabigatrana: iniciar


dabigatrana 0 a 2 h antes de desligar a bomba de infusão contínua
de heparina.

• Heparina de baixo peso molecular (HBPM) SC para dabigatrana:


iniciar dabigatrana 0 a 2 h antes do horário da próxima dose de
HBPM.

• Dabigatrana para heparina: iniciar heparina (HNF ou HBPM) 12 h


após a última dose da dabigatrana (ou 24 h, se CICr < 30 ml/min).

• Uso na gravidez: C. Não deve ser utilizada na gravidez ou


durante o período de amamentação, a não ser por indicação
médica, pensando o risco/benefício.

• Nome comercial: Pradaxa.

INIBIDOR DIRETO DO FATOR X ATIVADO (FATOR Xa):

2.1) RIVAROXABANA:
Droga Apresentação
Rivaroxabana Comprimidos de 2,5mg, 10 mg, 15 mg ou 20 mg

• Indicações: FA não valvar com escore de risco para AVC que indique prevenção de AVCi, tratamento e
prevenção de TVP, prevenção de EP
• Contraindicações: ClCr ≤ 15ml/min, sangramento patológico ativo ou contraindicações de alto risco de
sangramento, doença hepática crônica (Child-Pugh B/C) ou doença hepática com coagulopatia, história de
hipersensibilidade a rivaroxabana, gravidez, lactação, uso concomitante de outras drogas (cetoconazol,
itraconazol, voriconazol, posoconazol, inibidores de protease (lopinavir, ritonavir e indinavir)
• Efeitos colaterais: sangramento, anemia. Cefaleia, boca seca, urticária
Indicações de correção da dose Dose

• Idade acima de 80 anos 110 mg de 12/12h

• Tratamento concomitante com Verapamil 110 mg de 12/12h

Se ≥ 2 dos seguintes: 15 mg 1X ao dia


• Idade ≥ 75 anos
• Peso < 60 kg
• HAS BLED ≥ 3
• Tratamento concomitante com alguns anticonvulsivantes, antifúngicos ou antibióticos como por exemplo
fluconazol, fenobarbital, fenitoína, macrolídeos...

Observações (Doses padronizadas):

• Prevenção de AVCi em portadores de FA não valvar: 20 mg 1 x ao dia ou 15 mg 1 x ao dia


se CICr entre 30 e 50 ml/min).
• Trombose venosa aguda e EP: 15 mg 2 x ao dia nos primeiros 21 dias; a partir daí 20 mg 1 x ao dia.
• Prevenção de TVP depois de cirurgia de prótese de joelho ou quadril
(14 ou 30 dias, respectivamente): 10 mg ao dia.

* FA: fibrilação atrial, AVCi: acidente vascular cerebral isquêmico; ClCr: Clearance de creatinina;
Cr: Creatinina; EP: embolia pulmonar; TVP: trombose venosa profunda

Tabela 5. Rivaroxabana:
Fonte: Elaborado pelos autores.

• Cuidados: Tomar sempre após se alimentar. O comprimido pode


ser triturado e misturado com água se dificuldade para deglutir ou
se sondas gástricas.

• Em caso de cirurgia, interromper 24-48 h antes do procedimento.


• Em profilaxia de cirurgia ortopédica, reiniciar o uso da
rivaroxabana 6 a 10 h após o término da cirurgia, contanto que
tenha sido estabelecido a hemostasia.
Troca de anticoagulantes:

• AVK para rivaroxabana: se o paciente estiver tomando algum


antagonista da vitamina k (por exemplo, varfarina), suspender a
medicação e iniciar rivaroxabana assim que o INR estiver ≤ 3,0 se
prevenção de AVC ou ≤ 2,5 para profilaxia de TVP ou TEP
recorrentes.

• Rivaroxabana para AVK: nos primeiros dias tomar junto


rivaroxabana e AVK. Suspender rivaroxabana quando INR ≥ 2,0.

• Heparina não fracionada (HNF) EV para rivaroxabana: iniciar


rivaroxabana assim que desligar a bomba de infusão contínua de
heparina.

• Heparina de baixo peso molecular (HBPM) SC para rivaroxabana:


iniciar rivaroxabana 0 a 2 h antes do horário da próxima dose de
HBPM.

• Rivaroxabana para heparina: iniciar heparina (HNF ou HBPM) no


horário da próxima dose da rivaroxabana.

• Uso da gravidez: C. Não deve ser utilizada na gravidez ou


durante o período de amamentação. Dados em animais sugerem
que rivaroxabana atravessa a barreira placentária e é secretada em
pequenas quantidades no leite materno.

• Nome comercial: Xarelto.


2.2) APIXABANA:
DROGA APRESENTAÇÃO

Apixabana Comprimidos de 2,5 e 5 mg

• Indicações: FA não valvar com escore de risco para AVC que indique prevenção de AVCi, tratamento e
prevenção de TVP, prevenção de EP.
• Contraindicações: ClCr ≤ 15 ml/min, sangramento patológico ativo ou condições de alto risco de
sangramento, doença hepática crônica (Child-Pugh B/C) ou doença hepática com coagulopatia, história de
hipersensibilidade a apixabana, TGO ou TGP acima de 2 x o nível de normalidade, uso concomitante de
algumas drogas (cetaconazol, itraconazol, voriconazol, posoconazol, indinavir, rifampicina, carbamazepina,
fenitoína, fenobarbital, inibidores de protease – lopinavir, ritonavir e indinavir).
• Efeitos colaterais: sangramento, anemia, náuseas.
INDICAÇÕES DE CORREÇÃO DA DOSE DOSE

Clcr entre 15 e 29 ml/min ou na presença de 2 ou + dos


seguintes:
• Idade ≥ 80 anos 5 mg de 12/12h
• Cr acima de 1,5 mg/dL
• Peso ≤ a 60 Kg
OBSERVAÇÕES (DOSES PADRONIZADAS):

• Trombose venosa aguda e EP: 10 mg 2 x ao dia nos primeiros 7 dias; a partir daí 5 mg de 12/12 h.
• Prevenção de TVP depois de cirurgia de joelho ou quadril (14 ou 30 dias, respectivamente): 2,5 mg de 12/12
h. Iniciar o uso da apixabana 12 a 24 h após o término da cirurgia, contanto que tenha sido estabelecido
hemostasia.

*FA: fibrilação atrial, AVCi: acidente vascular cerebral isquêmico; ClCr: Clearance de creatinina;
Cr: Creatinina; EP: embolia pulmonar; TVP: trombose venosa profunda.

Tabela 6. Apixabana:
Fonte: Elaborado pelos autores.
Troca de anticoagulantes:

• AVK para apixabana: se o paciente estiver tomando algum


antagonista da vitamina k (ex.: varfarina), suspender a medicação,
e iniciar apixabana assim que o INR estiver menor ou igual a 2,0.

• Apixabana para AVK: continuar a administração de apixabana


associada à varfarina até INR maior que 2,0.

• Heparina de baixo peso molecular (HBPM) SC para apixabana:


iniciar apixabana no horário da próxima dose da HBPM.

• Apixabana para heparina: iniciar heparina (HNF ou HBPM) no


horário da próxima dose de apixabana.

• Cuidados: Pode tomar a medicação com ou sem alimentos. O


comprimido pode ser triturado e misturado com água se
dificuldade para deglutir ou se sondas gástricas.

• Uso na gravidez: não deve ser utilizada na gravidez ou durante o


período de amamentação, a não ser por indicação médica,
analisando o risco/benefício.

• Nome comercial: Eliquis.


2.3) EDOXABANA:
Droga Apresentação
Edoxabana Comprimidos de 15 mg, 30 mg e 60 mg

• Indicações: FA não valvar com escore de risco para AVC que indique prevenção de AVCi, tratamento e
prevenção de TVP e EP.
• Contraindicações: Edoxabana é contraindicada em pacientes com sangramento ativo clinicamente
significativo e em pacientes com doenças hepática associada à coagulopatia e a risco de hemorragia
clinicamente relevante.
• Efeitos colaterais: anemia, epistaxe, hemorragia do trato gastrointestinal superior, hemorragia do trato
gastrointestinal inferior, hemorragia oral / faríngea, hemorragia em tecido subcutâneo, rash, hematúria
macroscópica /uretral, hemorragia vaginal, hemorragia no local da punção, provas de função hepática anormais,
aumento de bilirrubina sanguínea, aumento de gamaglutamil transferase (GGT), tontura, cefaleia, dor
abdominal, náusea e prurido.

Indicações de correção da dose Dose


Pacientes com um ou mais dos seguintes fatores:
• IR moderada a grave (CrCL de 15-50
mL/min);
• Peso ≤ 60 kg;
30 mg 1x ao dia

• Uso concomitante de inibidores da P-


glicoproteína (P-gp),
• Exceto a amiodarona.
Observações (Doses padronizadas):

• Prevenção de AVCi em portadores de FA não valvar: 60 mg VO 1 x ao dia.


• Trombose venosa aguda e EP: 60 mg VO 1 x ao dia.
*FA: fibrilação atrial, AVCi: acidente vascular cerebral isquêmico; ClCr: Clearance de creatinina;
Cr: Creatinina; EP: embolia pulmonar; TVP: trombose venosa profunda.

Tabela 7. Edoxabana:
Fonte: Elaborado pelos autores.

Troca de anticoagulantes:

• AVK para edoxabana: se o paciente estiver tomando algum


antagonista de vitamina K (p. ex., varfarina), suspender a
medicação, e iniciar edoxabana assim que o INR estiver menor ou
igual a 2,0.

• Edoxabana para AVK: diminuir a dose para 30 mg e continuar a


administração de edoxabana associada a varfarina até INR maior
que 2,0.

• Heparina de baixo peso molecular (HBPM) SC para edoxabana:


iniciar edoxabana no horário da próxima dose da HBPM.

• Edoxabana para heparina: iniciar heparina (HNF ou HBPM) no


horário da próxima dose de edoxabana.
• Cuidados: Edoxabana deve ser utilizada por via oral, engolida
com água, com ou sem alimentos.

• Uso na gravidez: Existem dados limitados do uso de edoxabana


em mulheres grávidas.

• Categoria de risco na gravidez: D.


• Nome comercial: Lixiana.
Dessa forma, a melhor relação de eficácia e segurança ocorreu no regime
de alta dose, enquanto o regime de baixa dose tende a perder em eficácia,
conferindo maior segurança quanto aos riscos de sangramentos maiores e
AVC hemorrágicos.
Edoxabana
Características e Dabigatrana Rivaroxabana Apixabana
ENGAGE-AF
Fármaco/Estudo RE-LY ROCKET-AF ARISTOTLE
TIMI

Número de pacientes 18.113 14.264 18.201 21.105

Randomizado Randomizado Randomizado Randomizado


Desenho do estudo
Estudo aberto Duplo-cego Duplo-cego Duplo-cego

Inibição alvo Fator Xa Fator Xa Fator Xa Fator Xa

60 mg 1x ao dia
Prevenção 150 mg 2x ao dia ou
20 mg 1x ao dia 5 mg 2x ao dia ou
AVC/Embolia 110 mg 2x ao dia
30 mg 1x ao dia

2,5 mg 2x/dia se 2 ou 30 mg (ou 15 mg) 1x ao


mais dos critérios: dia se:
Idade > 75 anos: 15 mg 1x ao dia se ClCr
Ajuste de dose Idade ≥ 80 anos ClCr ≤ 50 mL/min
110 mg 2x ao dia 15-49 mL/min
Peso ≤ 60 Kg Peso ≤ 60 Kg
Cr ≥ 1,5 mg/Dl Uso de Verapamil

ClCr < 15 ou > 95


Não utilizar ClCr < 15 mL/min ClCr < 15 mL/min ClCr < 15 mL/min
mL/min

Portadores DRC 20% com ClCr 30-49 21% com ClCr 30-49 15% com ClCr 30-50 19% com ClCr < 50

80% renal 35% renal 25% renal 50% renal


Excreção
20% hepática 65% hepática 75% hepática 50% hepática

Meia-vida 12 a 17 horas 5 a 13 horas 9 a 14 horas 10 a 14 horas

Antídoto Idarucizumabe Adexanet Alfa Adexanet Alfa Adexanet Alfa

Eficácia e Segurança dos DOACS x Varfarina em FA não valvar


AVCi Superior (150 mg) Não inferior Não inferior Não inferior
Não inferior (110 mg)

Superior (150 mg)


AVCi ou embolia Não inferior Não inferior Não inferior
Não inferior (110 mg)

AVCh Superior Superior Superior Superior

Sangramento maior Superior Superior Superior Superior

Tabela 8. Quadro comparativo de estudos de referência e doses para DOACS


(ensaios fase III):
Fonte: adaptado de Connolly (2009), Patel (2011), Granger (2011) e
Gilgiano (2013).

INDICAÇÕES
DOACS VARFARINA (INR ALVO)

TROMBO EM AE NÃO SIM, INR = 2,5 (2-3)

MIOCARDIOPATIAS C/
TROMBOS INTRACAVITÁRIOS NÃO SIM, INR = 2,5 (2-3)
E EMBOLIA PRÉVIA

HIPERTENSÃO PULMONAR NÃO SIM, INR = 2,5 (2-3)

PÓS-IAM (3 MESES INICIAIS) NÃO SIM, INR = 2,5 (2-3)

SIM, INR = 2,5 (2-3).


PRÓTESES MECÂNICAS OBS: PRÓTESES MECÂNICAS
VALVARES NÃO AÓRTICAS DE ÚLTIMA
GERAÇÃO PODEM
MANTER INR = 2,5 (2-3)

PREVENÇÃO PRIMÁRIA
SIM SIM, INR = 2,5 (2-3)
DE TEV

SIM. OBS:
FA SIM, INR = 2,5 (2-3)
FA NÃO VALVAR

DOENÇAS VALVARES
ASSOCIADAS
A FA E PÓS-OPERATORÓRIO SIM SIM, INR = 2,5 (2-3)
DE BIOPTÓTESES MITRAL
(3 MESES INICIAIS)

(ENTENDE-SE POR FA VALVAR, QUANDO COEXISTE PRÓTESES VALVARES BIOLÓGICAS OU MECÂNICAS, REPARO
VALVAR MITRAL, ESTENOSE MITRAL REUMÁTICA OU ESTENOSE MITRAL MODERADA A IMPORTANTE. NESTES CASOS
USE APENAS VARFARINA!).

Tabela 9. Indicações de anticoagulante oral:


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.
INÍCIO E CONTROLE:

1. VARFARINA:
Em casos onde a anticoagulação imediata é indicada (EX: TVP, TEP), é
recomendado o início da Varfarina intrahospitalar juntamente a HNF OU
HBPM em doses terapêuticas por um tempo mínimo de 4 a 5 dias até que se
atinja o alvo terapêutico do INR, e só então suspender a heparina. A
Varfarina pode ser iniciada ambulatorialmente nas demais condições, sem
necessidade de uso de heparina concomitante.

• É indicado no cuidado de controle inicial da anticoagulação oral


com Varfarina repetir o exame do INR após a terceira dose, no 4º
dia de tratamento, e após no 7º dia.

• Não é recomendado aumentar a dose na 1ª semana. É indicado


repetir os exames de INR para controle no 14º e 21º dias, e manter
semanalmente até o valor terapêutico ser atingido por duas
medidas consecutivas. Após esse período pode-se espaçar as
medições do INR, tendo o cuidado de não ultrapassar o período de
4 a 8 semanas.

• Alteração da dose de Varfarina segundo INR: (VER TABELA 3).


2. DOAC’s:
Recomendações gerais:

• Avaliar a aderência do paciente ao tratamento (nível


socioeconômico e cognitivo);

• Avaliar função renal (fórm. Cockcroft-Gault) para adequação da


dose inicial de dabigatrana e rivaroxabana. No caso da apixabana,
a dose é determinada pela avaliação dos seguintes critérios: idade ≥
80 anos, peso corporal ≤ 60 kg ou creatinina sérica ≥ 1,5 mg/dL;

• Decidir sobre a necessidade do uso de inibidores da bomba de


prótons;
• Realizar exames basais: hemoglobina, função renal e hepática;
• Avaliar o uso de outros fármacos com potencial interação
medicamentosa.

• *O retorno do paciente deve ocorrer inicialmente, após o 1° mês e, posteriormente, a

cada 3 meses ou, no máximo 6 meses.

A monitorização de rotina da coagulação não é necessária. Uma


avaliação quantitativa da exposição do fármaco pode ser realizada em
situações de emergência:

• Sangramento maior e eventos tromboembólicos;


• Cirurgia de urgência;
• Insuficiência renal ou hepática;
• Interações medicamentosas;
• Suspeita de overdose.
É fundamental saber exatamente qual o tempo entre a última dose de
DOAC e a coleta de sangue. O efeito máximo plasmático desses fármacos é
de aproximadamente 3 horas após a ingestão.

MANEJO DE SANGRAMENTO:

1. VARFARINA:
A Tabela 3 descreve o manejo do paciente em uso de varfarina com
sangramento e a conduta mais adequada no paciente com níveis elevados de
INR sem sangramento (vide tabela).

2. DOAC’s:
A pós interrupção do tratamento, a restauração da hemostasia ocorre em
12 a 24 horas após a última dose tomada.
O manejo dos pacientes em uso de DOAC com sangramento sem e com
risco de morte está demonstrado nas “Tabelas 10 e 11”.
DABIGATRANA RIVAROXABANA E APIXABANA

• Horário da última dose + regime da dose


• Estimas normalização da coagulação: • Horário da última dose + regime da dose
• FR normal: 12 a 24h • Normalização da coagulação: 12 a 24 h
• Clcr 50 a 80 mL/min: 24 a 36h • Hemostasia local
• ClCr 30 a 50 mL/min: 36 a 48h • Reposição hídrica (se necessário, colóides)
• ClCr < 30 mL/min: > ou = a 48h • Concentrado de hemácias (avaliar
necessidade)

• Preservar diurese • Plaquetas (< 60.000)


• Hemostasia local • Plasma fresco congelado (expansor e não
conversor)
• Reposição hídrica (se necessário, colóides) • Ácido transexâmico (considerar como
• Concentrado de hemácias (avaliar necessidade) adjuvante)
• Plaquetas (< 60.000) • Desmopressina (coagulopatia ou
• Plasma fresco congelado (como expansor e não plaquetopenia)
conversor)
• Ácido transexâmico (considerar como adjuvante)
• Desmopressina (coagulopatia ou plaquetopenia)
• Considerar diálise (evidência 65% após 4 horas)
• Carvão ativado para hemoperfusão (considerado
baseado em dados pré-clínicos)

Tabela 10. Manejo de paciente em uso de DOAC com sangramento sem


risco de morte:
Fonte: adaptado de Oliveira.

DABIGATRANA RIVAROXABANA E APIXABANA

• Todas medidas adotadas no sangramento sem risco • Todas medidas adotadas no sangramento sem
de morte risco de morte
• Concentrado complexo protrombínico 50U/Kg • Concentrado complexo protrombínico
(25U/Kg a mais se clinicamente houver necessidade); 50U/Kg (25U/Kg a mais se clinicamente
(sem dados clínicos) houver necessidade); (sem dados clínicos)
• Concentrado complexo protrombínico 50U/Kg, com • Concentrado complexo protrombínico
máximo de 200U/Kg dia 50U/Kg, com máximo de 200U/Kg dia
• Fator VII ativado (FVII recombinante 90 mcg/Kg), • Fator VII ativado (FVII recombinante
sem dados sobre benefício e alto custo 90 mcg/Kg), sem dados sobre benefício
• Idarucizumab 5g, endovenosa. e alto custo.
Tabela 11. Manejo de paciente em uso de NOAC com sangramento e risco
de morte:
Fonte: adaptado de Oliveira.

MANEJO PERIOPERATÓRIO:
Para recomendação do manejo perioperatório de pacientes em uso de
anticoagulantes orais, deve-se previamente classificá-los de acordo com sua
estratificação de risco tromboembólico (Tabela 12) e de sangramento
(Tabela 13).

INDICAÇÃO DE ACO RISCO BAIXO MODERADO RISCO ALTO RISCO

• CHAD2DS2-VASc • CHAD2DS2-VASc • CHAD2DS2-VASc


2-3 ou CHADS2 0-2 4-5 ou CHADS2 3-4. ≥ 6 ou CHADS2 5-6;

FA
(sem AIT/AVE • AIT/AVE recentes
prévio).
(3 meses);
• Estenose mitral
(reumática) / FA.

• Prótese mecânica • Prótese mecânica • Qualquer outra


aórtica duplo disco aórtica e FA, AIT/AVE prótese mecânica
sem FA ou fator de prévio ou fator de risco mitral;
risco para TE; para TE; • Qualquer prótese
• Bioprótese com • Bioprótese recente mecânica aórtica de
DOENÇAS E reoperação valvar (cirurgia a menos de 3 “gaiola” ou disco
PRÓTESES aórtica. meses); único;
VALVARES
CARDÍACAS • Bioprótese com FA. • Qualquer prótese
mecânica com
AIT/AVE recente ou
evento cardioembólico
(dentro de 6 meses);
• Estenose mitral e
FA.

• TEV há mais de 12 • TEV entre 3 a 12 • TEV em 3 meses;


meses e sem nenhum meses; • Trombofilia grave;
fator de risco • Trombofilia não • TEV não provocada.
(transitório ou
grave;
provocado).
TEV
• TEV recorrente;
• CA ativo
(diagnosticado a
menos de 6 meses ou
paliativo).

ARTÉRIAS
CORONÁRIAS • Prevenção primária • Doença arterial • SCA;
de doença arterial crônica estável pós • Cirurgia de
crônica. IAM;
Revascularização do
• Cirurgia de miocárdio há menos de
Revascularização do 1 ano;
miocárdio há + de 1 • ICP.
ano.

* TE: tromboembolismo; TEV: tromboembolismo venoso; SCA: síndrome coronariana aguda;


ICP: intervenção coronariana percutânea; IAM: infarto agudo do miocárdio;
AIT: acidente isquêmico transitório; AVE: acidente vascular encefálico.

Tabela 12. Estratificação de risco tromboembólico:


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

Intervenções que não requerem


suspensão do uso de ACO Intervenções com baixo Intervenções com alto
(mínimo risco de risco de sangramento: risco de sangramento:
sangramento):

• Procedimento dentário: • Endoscopia, • Anestesia epidural ou medular;


Extração de 1 a 3 dentes;
Cirurgia periodontal;
colonoscopia, broncoscopia • Punção lombar;
com biópsia;
Incisão de abcesso;
Implante; • Biópsia próstata ou • Cirurgia torácica;
• Oftalmologia: bexiga; • Cirurgia abdominal;
• Catarata ou glaucoma; • Estudo • Cirurgia abdominal;
• Endoscopia sem biópsia; eletrofisiológico/ablação; • Cirurgia ortopédica grande;
• Cirurgia Superficial; • Angiografia; • Biópsia hepática;
• Incisão abcesso; • Implante de CDI ou • Ressecção transuretral de
Marca-passo;
• Excisões dermatológicas • Artroscopia;
próstata;

pequenas. • Biópsia renal;


• Cirurgia de hemorróida; • Ablação complexa: apresenta
• Cirurgias de pequeno, alto risco trombótico, como
moderado porte de mão, isolamento de veias pulmonares,
pé e ombro. ablação de taquicardia ventricular.

*CDI: cardiodesfibrilador implantável

Tabela 13. Classificação cirúrgica ou procedimento eletivo com relação ao


risco de sangramento:
Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

1. VARFARINA:
A decisão de se realizar a ponte com heparina em pacientes em uso de
varfarina dependerá do risco tromboembólico do paciente e do risco de
sangramento do procedimento, segundo Tabela 14.
O esquema de suspensão da varfarina está descrito na Tabela 15.

Risco Risco
hemorrágico tromboembólico
BAIXO MODERADO ALTO

Não interromper Não interromper Não interromper


MÍNIMO
Varfarina Varfarina Varfarina

Interromper Varfarina e até INR < 2;


Interromper
Avaliar individualizadamente Interromper Varfarina; Indicado
Varfarina;
BAIXO necessidade de ponte com realizar ponte com heparina em dose
Não realizar ponte
heparina em dose profilática** terapêutica***
com heparina
ou terapêutica***

Interromper Varfarina
Interromper Interromper Varfarina (INR
(INR < 2); Avaliar
Varfarina; < 1,5); Indicado realizar
ALTO individualizadamente a necessidade
Não realizar ponte ponte com heparina em
de ponte com heparina em dose
com heparina dose terapêutica***
profilática**

*A depender dos fatores de risco e características individualizadas de cada paciente; ** Dose profilática de heparina: enoxaparina 0,5
mg/kg via subcutânea 2x ao dia ou 40 mg subcutânea 2x ao dia, ou HNF 5.000 a 7.500

Tabela 14. Risco tromboembólico do paciente em relação ao risco de


sangramento do procedimento:
Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

Coletar INR e realizar ponte com Heparina se


necessário. (A suspensão da Varfarina dependerá
DIA 7
do valor do INR, se > 3 serão necessário mais
dias de suspensão).

DIA 5 Suspender Varfarina.

Iniciar HBPM ou HNF em casos de alto a moderado risco de


DIA 4 tromboembolismo. Em casos de baixo risco não é necessário o
uso de heparina.

Realizar última dose de Heparina 24h antes do


procedimento.
Em casos de alto risco de sangramento, liberar para realização
DIA 1 de procedimento ou cirurgia se INR < 1,5.
Em casos de baixo risco de sangramento INR < 2,0.
Obs: Se INR > 1,5, pode ser prescrito baixa dose
de vitamina K via oral (1 a 2,5 mg).

DIA DO PROCEDIMENTO / CIRURGIA Se controle de hemostasia e hemostasia


E PÓS-PROCEDIMENTO adequados, reiniciar Varfarina após 12 a 24h.
Se hemostasia inadequada, reiniciar Varfarina
após 48 a 72h.
Obs: Manter heparina até INR atingir faixa
terapêutica (o que geralmente se consegue
em 4 a 7 dias).
*HBPM: Heparina de baixo peso molecular; HNF: Heparina não fracionada

Tabela 15. Esquema para suspensão de Varfarina:


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

2. DOAC’s:
Os DOAC’s apresentam excreção renal significativa e, portanto, um
passo importante no manejo perioperatório desses pacientes é a avaliação
da função renal.
Em virtude de sua relativa meia-vida de eliminação curta, não é
necessária a ponte perioperatória com a heparina.
Em cirurgias ou procedimentos de baixo ou mínimo risco de
sangramento, não há necessidade de suspensão do uso dos DOAC, mas o
procedimento deve ser realizado preferencialmente no vale plasmático do
fármaco, ou seja, no mínimo, 24 horas após a última dose. Em cirurgias ou
procedimentos moderados ou alto risco de sangramento, os DOAC devem
ser suspensos por pelo menos 48 horas, dependendo da função renal do
paciente segundo a Tabela 16.
DABIGATRANA RIVAROXABANA APIXABANA

•ClCr ≥ 80 ml/min: • ClCr ≥ 80 ml/min: • ClCr ≥ 80 ml/min:


BAIXO RISCO: ≥ 24h BAIXO RISCO: ≥ 24h BAIXO RISCO: ≥ 24h
ALTO RISCO: ≥ 48h ALTO RISCO: ≥ 48h ALTO RISCO: ≥ 48h
•ClCr 50 a 80 ml/min: • ClCr 50 a 80 ml/min: • ClCr 50 a 80 ml/min:
BAIXO RISCO: 24 a 48h BAIXO RISCO: ≥24h BAIXO RISCO: ≥24h
ALTO RISCO: 48 a 72h ALTO RISCO: ≥ 48h ALTO RISCO: ≥ 48h
•ClCr 30 a 50 ml/min: • ClCr 30 a 50 ml/min: • ClCr 30 a 50 ml/min:
BAIXO RISCO: 48 a 72h BAIXO RISCO: ≥ 24h BAIXO RISCO: ≥ 24h
ALTO RISCO: ≥ 96h ALTO RISCO: ≥ 48h ALTO RISCO: ≥ 48h
• ClCr 15 a 30 ml/min • ClCr 15 a 30 ml/min: • ClCr 15 a 30 ml/min:
BAIXO RISCO E ALTO RISCO: BAIXO RISCO: ≥ 36h BAIXO RISCO: ≥ 36h
Contraindicado ALTO RISCO: ≥ 48h ALTO RISCO: ≥ 48h
• ClCr≤15ml/min: • ClCr≤15ml/min: • ClCr≤15ml/min:
Contraindicado Contraindicado Contraindicado

* ClCr: clearance de creatinina

Tabela 16. Última ingesta do fármaco antes de procedimento/cirurgia eletivo:


Fonte: Elaborado pelos autores.

Em procedimentos com imediata e completa hemostasia, os DOAC’s


podem ser reiniciados 6 a 8 horas após a intervenção. Naqueles em que o
risco de sangramento dentro de 48 a 72 horas após o procedimento for maior
do que o risco de tromboembolismo, principalmente se associado com
imobilização, deve-se prescrever tromboprofilaxia com 0,5 ou 1 mg/kg/dia
de enoxaparina, 6 a 8 horas após a cirurgia de reiniciar DOAC assim que a
hemostasia estiver adequada.
Em casos de cirurgia de emergência, o uso dos DOAC deve ser suspenso
e, se possível, o procedimento adiado por no mínimo 12 horas e,
preferencialmente, durante 24 horas após a última ingestão do fármaco. Se a
cirurgia não puder ser adiada, deve-se considerar a reversão do efeito
anticoagulante. O complexo protrombínico foi avaliado somente em
pacientes saudáveis e demonstrou reverter o efeito anticoagulante dos
DOAC. No Brasil, somente a dabigatrana tem antídoto disponível
atualmente (idarucizumab).

ATUAÇÃO DOS ANTICOAGULANTES ORAIS EM SUAS PRINCIPAIS


INDICAÇÕES:

I) FIBRILAÇÃO ATRIAL (FA):


Devemos sempre decidir se trataremos ou não o paciente com FA,
realizando uma estratificação baseada no tipo de FA e na utilização de
escores de risco de evento tromboembólico (CHA2DS2VASc) e de risco de
sangramento (HAS-BLED). Tabelas 17 e 18.
Os pacientes com escore CHA2DS2VASc ≥ 2 devem usar anticoagulantes
orais, exceto se houver alguma contraindicação. Pacientes com escore = 1
podem utilizar anticoagulante oral ou ácido acetilsalicílico, porém com
preferência para o uso do primeiro fármaco.
Pacientes com escore HAS-BLED alto (≥ 3) não contraindica o uso de
anticoagulantes orais, mas esses pacientes devem ter seus fatores de risco
para sangramento controlados de maneira mais rigorosa.
CHA2 DS2-VASc PONTUAÇÃO
1
• Congestive heart failure/ventricular dysfunction
(IC/disfunção ventricular esquerda)

• Hypertension (Hipertensão arterial) 1

• Age > ou = 75 yrs (Idade > ou =a 75 anos)


2
• Diabetes Mellitus (Diabetes Mellitus) 1

• Stroke/Transiente Ischaemic Attack (Histótico 2


AVE/AIT)
1
• Vascular Disease (prior myocardial infarction,artery
disease
or aortic plaque) (Doença vascular)

• Age 65-74 yrs (Idade entre 65-74 anos) 1


1
• Sex Category (i.e, famele gender) (Sexo feminino)
* IC: insuficiência cardíaca; AVE: acidente vascular encefálico; AIT: acidente isquêmico transitório;
Hipertensão arterial maior ou igual a 140/90 mmHg

Tabela 17. Escore de CHA2 DS2-VASc:


Fonte: Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 2016.

Caraterísticas Clínicas Escore


1
• Hypertension (Hipertensão Arterial)
• Abnormla Renal or Liver Funcion 1 ou 2
(Função Renal e Hepática Anormal)

• Stroke (AVE) 1
1
• Bleeding (Sangramento)
1
• Labile INR (Variação do INR) 1

• Elderly (Idade)
1 ou 2
• Drugs or alcohol (Fármacos ou álcool) MÁXIMO 9

* H: pressão arterial sistólica >160 mmHg; A: função renal alterada (diálise, transplante renal ou creatinina sérica maior ou
igual a 2,3 mg/dL) ou função hepática alterada (cirrose, bilirrubina > 2 vezes o limite superior da normalidade em associação
a TGO ou TGP > 3 vezes o limite superior da normalidade); S: AVE prévio, se especialmente se profundo/lacunar; B: história
prévia de sangramento, anemia ou predisposição a
sangramentos; L: INR instável ou alto ou tempo na faixa terapêutica< 60%; E: idade maior que 65 anos; D: uso de
medicações antiplaquetárias ou anti-inflamatórias não hormonais e consumo de 8 ou mais doses de bebidas alcoólicas por
semana.

Tabela 18. Escore para risco de sangramento (HAS-BLED):


Fonte: Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 2016.

II) VALVOPATIAS:
Grandes estudos randomizados que mostram um alto grau de
reconhecimento no tratamento antitrombótico dos pacientes com doenças e
próteses valvares ainda é carente. A Varfarina é a principal terapia
antitrombótica nos portadores de valvulopatias. O uso de DOAC’S é
contraindicado em casos de próteses mecânicas e estenose mitral moderada a
grave, em especial de causa reumática. Entretanto, as diretrizes mais recentes
descrevem o uso de DOAC como alternativa razoável em FA e pacientes
com outras doenças valvares, como estenose aórtica, insuficiência aórtica e
insuficiência mitral. Porém, apesar disso deve-se sempre avaliar
individualmente seus riscos e benefícios.

Recomendações para o uso de Varfarina em pacientes com doenças valvares:

A. LESÕES MITRAIS:

1. Doença reumática mitral e FA ou tromboembolismo prévio:


Varfarina, INR = 2,5 (2-3);
2. Doença reumática mitral e FA com tromboembolismo prévio que
apresenta evento tromboembólico com INR na faixa: Associar
ácido acetilsalicílico (75-100 mg/dia); Observação: deve-se
avaliar o risco de sangramento x benefício da terapia.
3. Estenose mitral e trombo em átrio esquerdo: Varfarina, INR = 2,5
(2-3);
4. Paciente com indicação de valvotomia mitral percutânea e
presença de trombo em átrio esquerdo: deve-se considerar adiar o
procedimento na tentativa de resolução do trombo com
anticoagulante oral (a depender do quadro clínico). Varfarina, INR
= 2,5 (2-3);
5. Pacientes com estenose mitral em ritmo sinusal e aumento do átrio
esquerdo > 55 mm: Varfarina, INR = 2,5 (2-3);
6. Pacientes com AVE criptogênico associado a presença de forame
oval patente e aneurisma septal atrial, já em uso de ácido
acetilsalicílico: Varfarina, INR = 2,5 (2-3).

B. PORTADORES DE PRÓTESES MECÂNICAS:

1. Todas as próteses mecânicas: Varfarina


2. Tipos de próteses:

Próteses aórticas de duplo disco sem fatores de risco:


Varfarina, INR = 2,5 (2-3);

Próteses mitrais ou aórticas com fatores de risco ou próteses


de 1ª e 2ª geração: Varfarina, INR = 3 (2,5 – 3,5).
3. Próteses mecânicas com tromboembolismo e INR na faixa
terapêutica: Aumentar o nível do INR (até 4) e/ou adição de ácido
acetilsalicílico (75 a 100 mg/dia). Observação: deve-se avaliar o
risco de sangramento x benefício da terapia.
IMPORTANTE: Recomenda-se o uso de Heparina não fracionada ou
heparina de baixo peso molecular até 48 horas após INR atingir a faixa
terapêutica.

C. PORTADORES DE BIOPRÓTESES:
Neste cenário é de suma importância considerar o tempo de realização do
implante.

1. Primeiros 3 a 6 meses:

Bioprótese mitral: Varfarina, INR = 2,5 (2-3);

Bioprótese aórtica: Varfarina, INR = 2,5 (2-3);

Biopróteses com tromboembolismo prévio ou bioprótese com


trombo em átrio esquerdo intraoperatório: Varfarina, INR = 2,5
(2-3)
IMPORTANTE: Deve-se prescrever Heparina não fracionada ou
heparina de baixo peso molecular a partir do 1º dia de pós-operatório
até 48 horas após INR atingir a faixa terapêutica.

2. Após 3 a 6 meses:

• Bioprótese com fator de risco: Varfarina, INR = 2,5 (2-3);

• Bioprótese em ritmo sinusal sem fator de risco: ácido


acetilsalicílico 75 a 100 mg/dia.
IMPORTANTE: Implante percutâneo de valva aórtica (TAVI):
Varfarina, INR = 2,5 (2-3) por tempo mínimo de 3 meses, em paciente com
baixo risco de sangramento. Na impossibilidade do uso de varfarina,
recomenda-se a associação entre Clopidogrel 75 mg/dia e ácido
acetilsalicílico 75 a 100 mg/dia durante os 6 primeiros meses e após,
monoterapia com ácido acetilsalicílico.

Recomendações do uso de DOAC em pacientes com doenças valvares:

1. FA (CHA2DS2VASC ≥ 2) em pacientes com: insuficiência mitral,


insuficiência tricúspide, insuficiência aórtica, estenose aórtica, o
uso de anticoagulantes orais de ação direta pode ser usado como
alternativa a varfarina.

III) TROMBOEMBOLISMO VENOSO – TEV (TVP / TEP):


É recomendado pelas diretrizes o uso de Varfarina e DOAC para
prevenção e tratamento do tromboembolismo venoso, indicações e
recomendações da terapia antitrombótica em pacientes com TEV agudo
serão descritas a seguir:

a. Pacientes com TVP proximal ou TEP sem câncer:


É recomendado a anticoagulação oral durante 3 meses, se possível com
DOAC’s (dabigatrana, rivaroxabana, apixabana) ou varfarina. Observação:
é necessário a anticoagulação parenteral antes do uso de dabigratana
exclusivamente.
b. Pacientes com TVP ou TEP com câncer:
Recomendado o uso de HBPN em comparação à varfarina e DOAC.
c. Pacientes com um primeiro episódio de TVP proximal não
provocada ou TEP:
O que difere o tratamento de tais situações é a classificação do risco de
sangramento das mesmas, se considerado baixo ou moderado risco, a terapia
deverá ser a longo prazo (> 3 meses). Porém se considerado alto risco o uso
de anticoagulante oral deverá ocorrer durante 3 meses apenas.
IMPORTANTE: Deverá ser medido o nível de D-dímero após 1 mês do
término do uso de anticoagulante oral, isso influenciará na decisão sobre a
suspensão ou aumento do tempo de tratamento. Em paciente que fizeram uso
de anticoagulante oral a longo prazo deve-se ser feito a mesma avaliação
anualmente.
d. Pacientes com TEP associada a hipotensão:
Opta-se por terapia trombolítica.
e. Doses preconizadas dos anticoagulantes orais em pacientes com
TEV agudo:

1. Varfarina: INR = 2,5 (2,0 – 3,0), deve-se associar a heparina até


INR atingir faixa terapêutica.
2. Dabigatrana: 150 mg, 2x ao dia, sendo que idosos acima de 80
anos, pacientes com um ou mais fatores de risco como idade ≥ 75
anos, comprometimento renal moderado (ClCr entre 30 – 50
ml/min), concomitante com potentes inibidores de Gp P,
antiagregantes plaquetários ou com sangramento gastrointestinal
prévio, a dose recomendada é de 110 mg 2x ao dia, após
tratamento com anticoagulante parenteral por no mínimo 5 dias.
3. Rivaroxabana: 15 mg 2x ao dia nas 3 primeiras semanas, mesmo
no paciente com insuficiência renal, e após este período, 20 mg 1x
ao dia. Em pacientes com insuficiência renal moderada (ClCr < 50
ml/min) a dose corrigida será de 15 mg 1x ao dia.
4. Apixabana: 10 mg, 2x ao dia nos primeiros 7 dias, mesmo no
paciente com insuficiência renal, e após este período 5 mg 2x ao
dia, em pacientes com pelo menos duas das seguintes
características: idade ≥ 80 anos, peso corporal ≤ 60 kg ou
creatinina sérica ≥ 1,5 mg/dL, a dose corrigida será de 2,5 mg 2x
ao dia.

f. Prevenção de TEV em cirurgia ortopédica de grande porte:

1. Pós-operatório de artroplastia total de joelho e quadril:

Dabigatrana: 2 cps de 110 mg, 1 x ao dia ou 2 cps de 75 mg, 1x


ao dia em pacientes idosos acima de 80 anos, pacientes com um
ou mais fatores de risco como idade ≥ 75 anos,
comprometimento renal moderado (ClCr entre 30 – 50 ml/min),
concomitante com potentes inibidores de Gp P, antiagregantes
plaquetários ou com sangramento gastrointestinal prévio,
durante 10 dias (joelho) ou 28 a 35 dias (quadril).
Rivaroxabana: 10 mg, 1x ao dia durante 2 semanas (joelho) ou
5 semanas (quadril).

Apixabana: 2,5 mg, 2 x ao dia durante 10 a 14 dias (joelho) ou


32 a 38 dias (quadril).

IV) SÍNDROME CORONARIANA AGUDA EM PACIENTES EM USO


DE ANTICOAGULANTES ORAIS:
Até o momento, as evidências para embasar a prescrição da melhor
terapia antitrombótica em pacientes em uso de anticoagulantes orais que
apresentam SCA concomitante ainda são escassas. Grandes estudos clínicos
randomizados estão em andamento, porém, até que sejam concluídos ou nos
forneçam mais dados com robustez, as recomendações são baseadas
principalmente em consensos de especialistas.
Devemos então, individualizar as recomendações sempre baseadas no
quadro clínico e nas características dos pacientes quanto ao risco de
isquemia ou eventos tromboembólicos, bem como uma avaliação dinâmica
do risco de sangramento (Tabela 19).
Aumento do risco isquêmico e de trombose de Aumento do risco de
stent* sangramento**
Aumento do risco isquêmico:
• História de sangramento prévio;
• Idade Avançada;
• Terapia com ACO;
• Apresentação da SCA;
• Sexo feminino;
• Vários IAM prévios;
• Idade avançada;
• Doença coronariana de múltiplos
vasos; • Baixo peso;
• DM; • DRC;
• DRC. • DM;
Aumento do risco de trombose de stent:
• Anemia;
• Apresentação da SCA; • Uso cônico de esteroides ou anti-
inflamatórios não hormonais.
• DM;
• FE do VE < 40%;
• Stents farmacológicos de 1ª
geração;
• Stent pequeno ou mal
posicionado;
• Diâmetro do stent pequeno ou
espessura do stent maior;
• Reestenose intra stent.
* Favorece o maior tempo de uso de dupla antiagregação plaquetária; ** Favorece uma redução do tempo
de uso de dupla antiagregação plaquetária;SCA: síndrome coronariana aguda; IAM: infarto agudo do
miocárdio; DM: Diabetes Mellitus; DRC: doença renal crônica; FE: fração de ejeção;
VE: ventrículo esquerdo; ACO: anticoagulante oral.

Tabela 18. Escore para risco de sangramento (HAS-BLED):


Fonte: adaptado de Meneghelo, 2017.

A. Varfarina:
O manejo da varfarina em pacientes com SCA e submetidos à
intervenção coronária percutânea (ICP) está descrito a seguir:

• Pré-procedimento: se possível, é preferível um período de


suspensão da varfarina até que o INR esteja menor que 2, se o
procedimento for realizado por via radial ou INR < 1,5, se a via de
acesso for a femoral. Nesse caso, não é necessário realizar ponte
com heparina. Não se deve adiar o procedimento em caso de
urgência ou emergência e uma reversão da anticoagulação é
raramente necessária. Só utilizar fibrinólise se o INR estiver < 1,5.

• Durante o procedimento: dar preferência ao acesso radial e


utilizar, se possível, stents farmacológicos de última geração ou
não farmacológicos.

• Após procedimento: reiniciar a varfarina mantendo um INR entre


2 e 3 (idealmente entre 2 e 2,5). A duração da terapia antiagregante
plaquetária associada à varfarina é a mesma abordada no
fluxograma 1, referente aos DOAC.

B. DOAC´s:
O manejo da terapia na fase aguda e em longo prazo dos pacientes com
SCA e em uso de DOAC está descrito no Fluxograma 1.
*Fluxograma representativo das indicações de associação de terapas antitrombóticas de acordo com o risco
isquemico ou hemorrágico. ACO:anticoagulantes orais; C: clopidogrel.

Fluxograma 1. Indicação do uso de anticoagulantes orais em pacientes


submetidos a ICP:
Fonte: Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 2019.

V) PÓS INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO:


A Varfarina, INR = 2,5 (2-3) é preconizada em pacientes com
características emboligênicas e com presença de trombo no ventrículo
esquerdo e em pacientes com alteração da contratilidade (acinesia ou
discinesia) apical anterior, a qual envolve extensamente a parede miocárdica,
nos 3 primeiros meses.
Ainda não existem recomendações estabelecidas sobre o uso de DOAC
nesse perfil de pacientes.

VI) HIPERTENSÃO PULMONAR:


Existem grandes diferenças no uso de anticoagulação entre os países e/ou
centros hospitalares pelo fato das recomendações serem baseadas em estudos
não prospectivos ou comparativos. Segundo as últimas diretrizes é indicado
o uso de Varfarina, INR = 2,5 (2-3) em portadores de hipertensão pulmonar
idiopática, hereditária, pelo fato do uso de anorexígenos, nas doenças do
tecido conectivo e nos shunts cardíacos congênitos sem hemoptise
importante com nível de evidência de recomendação baixa.
Na hipertensão pulmonar crônica tromboembólica a Varfarina também
pode ser indicada com alvo de INR = 2,5 (2-3).
Ainda não existem estudos realizado com DOAC nesse perfil de
pacientes.

VII) TROMBO EM ÁTRIO ESQUERDO:


É recomendado o uso de Varfarina, com alvo de INR = 2,5 (2-3) até a
resolução completa do trombo.
Porém existem dados de pequenos estudos observacionais e prospectivos
não apresentam diferença tanto na segurança quanto na eficácia em pacientes
tratados com Varfarina x DOAC na resolução de trombo em átrio esquerdo.
Existem atualmente estudos em andamento sendo assim ainda não existe
uma indicação formal para o uso de DOAC´s.

VIII) MIOCARDIOPATIA:
É recomendado o uso de Varfarina, INR = 2,5 (2-3) em pacientes com
miocardiopatias associadas a FA, embolia prévia ou trombos intracavitários.
Existem estudos em andamento avaliando o uso de DOAC em pacientes
com insuficiência cardíaca.

IX) PÓS ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO:


Primeiramente será descrito sobre a terapia trombolítica com uso de
Varfarina em pacientes com AVE isquêmico tromboembólico e hemorrágico
para posteriormente a abordagem do uso de DOAC´s nos mesmos cenários.

a. Varfarina:

1. Varfarina no AVE isquêmico tromboembólico:


Não deve ser utilizado e não é recomendado o uso de varfarina em
pacientes com INR >1,5. Heparina de preferência de baixo peso molecular
como transição está correlacionada a um aumento do risco de sangramento,
portanto seu uso deve ser feito apenas em doses profiláticas, dentro das
primeiras 48 horas do AVE e deve ser mantida durante todo o período de
hospitalização.
No caso de pacientes com AIT, a Varfarina pode ser utilizada e mantida,
e a aderência ao tratamento pelo paciente deve ser avaliada periodicamente
de acordo com o valor do INR.
Sobre o tempo mais adequado para o retorno do uso da varfarina em
pacientes com AVE isquêmico, ainda não há estudos que possam precisar o
momento certo. Portanto recomenda-se avaliar o risco de sangramento x
risco tromboembólico individualizado de cada paciente. De modo geral,
entretanto, preconiza-se iniciar anticoagulação oral:

• 3 a 4 dias após infarto de tamanho pequeno (cerca de 1,5 cm em


circulação anterior ou posterior)

• 7 dias após infarto de tamanho moderado (> 1,5 cm, porém


menor que a metade do território da Artéria Cerebral Média ou
Artéria Cerebral Anterior

• 14 dias após um infarto de tamanho grande (mais do que a


metade da Artéria Cerebral Média ou Artéria Cerebral Anterior, ou
maior que 1,5 cm na circulação posterior.
*Em portadores de prótese mecânica mitral, deve ser reiniciado a
anticoagulação assim que possível, quando o risco de transformação
hemorrágica for pequeno.

2. Varfarina no AVE hemorrágico:


Deve-se interromper o uso de Varfarina imediatamente diante pacientes
diagnosticados com AVE hemorrágico, e preconizando a administração de
plasma fresco congelado e/ou complexo protrombínico e vitamina k
intravenosa, na tentativa de evitar progressão de piora do quadro.
Após o controle e cessação do sangramento evidenciada com segurança,
a heparina de baixo peso molecular ou heparina não fracionada, via
subcutânea, devem ser utilizadas para prevenção de tromboembolismo
venoso em pacientes que não possuem condições de mobilização após 48
horas do início do quadro.
Sobre o tempo para reiniciar a anticoagulação, ainda não existem estudos
que precisam o tempo exato após episódio de hemorragia intracraniana. É
recomendado evitar o uso de varfarina por um período de 4 semanas no
mínimo, com exceção de pacientes portadores de próteses mecânicas, onde
preconiza-se o retorno da anticoagulação em até 2 semanas devido o alto
risco tromboembólico.

B. DOAC´s:

1. DOAC no AVE isquêmico tromboembólico:


Não é recomendado e não deve ser feita a terapia trombolítica dentro de
24 a 48 horas da última administração dos anticoagulantes orais de ação
direta. Quando não for possível identificar com precisão o último horário da
dose do DOAC, também não recomenda-se o uso de trombolíticos. Uma
alternativa a ser considerada ao tratamento trombolítico é a trombectomia
mecânica.
É sempre importante avaliar a aderência do paciente que apresenta AVE
isquêmico em vigência do tratamento com DOAC´s, pois quando adequada,
é importante pensar e investigar causas alternativas do AVE como AVE
lacunar, doenças de grandes vasos, entre outras.
A indicação de manutenção ou suspensão do DOAC irá depender do
tamanho do infarto e da gravidade do quadro. Quando pequeno o AVE e
tiver baixo risco de transformação hemorrágica, pode-se manter o uso do
DOAC, pois estes apresentam meia-vida de eliminação curta. Não existe
necessidade de realizar ponte com heparina devido ao seu rápido início de
ação.

2. DOAC`s no AVE hemorrágico:


É recomendado interromper o uso do DOAC imediatamente e iniciar as
medidas de Manejo de Sangramento já descritas neste capítulo.
Caso haja disponível o antídoto deve-se administrá-lo assim que
possível. Somente o antídoto da dabigatrana (Idarucizumabe) é
comercializado no Brasil atualmente.
Pode ser utilizado carvão ativado se a última ingestão do DOAC tiver
ocorrido em um período menor que 2 horas.
Sobre o retorno ou suspensão definitiva do DOAC deve-se analisar caso
a caso de maneira individual. Em vias gerais, o retorno do DOAC poderá ser
realizado em 4 a 8 semanas se houver alto risco cardioembólico e se houver
baixo risco de um novo sangramento intracraniano. Deve-se reconsiderar o
uso de anticoagulantes orais em pacientes com baixo risco tromboembólico e
alto risco de sangramento.
Sobre o tempo para reiniciar a anticoagulação, ainda não existem estudos
que precisam o tempo exato e por consenso de especialistas sugere-se a regra
descrita a seguir:

*TC: Tomografia Computadorizada; RM: Ressonância Magnética; AVE: acidente vascular encefálico; AIT: acidente
isquêmico transitório; FR: fatores de risco; NIHSS: National Institute of Health Stroke Scale

Fluxograma 2. Indicação para reiniciar anticoagulação em AIT/AVE


isquêmico ou hemorrágico:
Fonte: Elaborado pelos autores.

Para avaliar a gravidade do AVE é utilizado o escore NIHSS (National


Institute of Health Stroke Score).

X) CARDIOVERSÃO ELÉTRICA (CVE):

A. Varfarina:
Em paciente sob o uso de varfarina a recomendação de cardioversão
elétrica (CVE) no cenário de FA/Flutter, se realiza como abaixo descrito:
FA presente por tempo > 48 horas, devemos avaliar as condições clínicas
do paciente, havendo dois caminhos a serem seguidos:
1. Paciente estável em acompanhamento ambulatorial: Varfarina, INR
= 2,5 (2-3), deve-se manter o INR em faixa terapêutica por mais de 3
semanas e realizar a cardioversão, se a mesma for bem sucedida, manter a
Varfarina por 1 mês (INR 2-3). Considerar se paciente estava em uso de
heparina na época da cardioversão, caso isso aconteça, deve-se manter o uso
da Varfarina até INR atingir faixa terapêutica.
Se cardioversão não for bem sucedida manter o uso de Varfarina (INR 2-
3).
2. Paciente instável, que não tem condições de aguardar cardioversão
por 3 semanas, internado: Recomenda-se o uso de heparina IV com meta de
TTPa alvo = 60s (entre 50 a 70s), realização de ecocardiograma
transesofágico, em caso de evidência de trombo, deve-se adiar a CVE e
manter heparina até o INR atingir a faixa terapêutica, e considerar repetir
ecocardiograma transesofágico antes de realizar CVE.
Se Ecocardiograma TE revelar ausência de trombo, recomenda-se
realizar a CVE. E o manejo após o procedimento deverá ser o mesmo do
paciente estável ambulatorial a depender do sucesso da CV.

B. DOAC`s:
Em pacientes sob o uso de DOAC a recomendação de cardioversão
elétrica ou farmacológica, deve ser avaliada em dois tipos de pacientes:
1. Pacientes em uso de DOAC por mais que 3 semanas:
Verificar aderência ao tratamento. Se boa adesão, indicado realizar CVE
e manter uso de DOAC por 4 semanas no mínimo (> 4 semanas baseado no
CHA2DS2 -VASc).
Em caso de não aderência, dúvidas sobre a adesão ou alto risco para
trombo em átrio esquerdo deve-se realizar ecocardiograma transesofágico.
Se confirmado trombo em átrio esquerdo, deve-se adiar CVE e realizar
anticoagulação por períodos mais longos e após, repetir ecocardiograma
transesofágico. Obs: Ainda não existem dados de melhor estratégia em
converter para heparina IV associada a Varfarina até atingir faixa terapêutica
ou manter uso de DOAC.
Realiza-se a CVE após esse período estendido de anticoagulação, e
manter uso de DOAC por 4 semanas no mínimo (> 4 semanas baseado no
CHA2DS2 -VASc);

2. Paciente não anticoagulado:

• FA ≤ 48 horas com dados insuficientes na alteração segura de


HNF/HBPM por DOAC, recomenda-se HNF e/ou HBPM, com ou
sem ecocardiograma transesofágico e devemos seguir o mesmo
esquema descrito anteriormente na presença de trombo em átrio
esquerdo.

• FA ≥ 48 horas, deve-se avaliar o objetivo principal, se CVE


precoce indica iniciar DOAC com tempo maior ou igual a 4 horas
antes. Se o objetivo for CVE tardia deve-se tratar com DOAC por
um período ≥ 3 semanas, e então realizar CVE e manter o uso de
DOAC por tempo mínimo de 4 semanas (baseado no CHA2DS2-
VASc).

XI) ANTICOAGULAÇÃO EM GESTANTES:

A. USO DE HEPARINAS DURANTE A GESTAÇÃO:


1. HBPM:

• Profilática: Enoxaparina 40 mg 1x ao dia via SC


• Deltaparina 5.000 UI 1x ao dia via SC
• Intermediária: Enoxaparina 40 mg SC 1x ao dia e aumentar a
medida que a gestação progredir para 1mg/kg 1x ao dia via SC

• Deltaparina 5.000 UI 1x ao dia, e aumentar a medida que a


gestação progredir para 100UI/kg 1x ao dia via SC

• Terapêutica: Enoxaparina 1mg/kg a cada 12 horas via SC


Deltaparina 100 UI/kg a cada 12 horas via SC
2. HNF:
• Pofilática: 5.000 UI a cada 12 horas via SC
• Primeiro trimestre: 5.000 a 7500 UI a cada 12 horas via SC
• Segundo trimestre: 7.500 a 10.000 UI a cada 12 horas via SC
• Terceiro trimestre: 10.000 UI a cada 12 horas via SC
• Terapêutica: Pode ser administrada em infusão contínua IV, ou
uma dose IV a cada 12 horas, sendo titulada para manter o PTTa na
faixa terapêutica

B. ANTICOAGULAÇÃO TERAPÊUTICA COM MONITORIZAÇÃO


CONTÍNUA:
1. PRIMEIRO TRIMESTRE:

• Dose de varfarina ≤ 5mg ao dia:


Manter varfarina com monitorização do INR ou dose ajustada de HBPM
≥ 2x ao dia (anti-Xa 0.8 U/ml a 1.2 U/ml de 4 a 6 horas após dose) ou dose
ajustada de HNF em infusão contínua IV ou SC (PTTA > 2x controle)

• Dose de varfarina ≥ 5mg ao dia:


Dose ajustada de HBPM ≥ 2x ao dia (anti-Xa 0.8 U/ml a 1.2 U-ml de 4 a
6 horas após dose) ou dose ajustada de HNF em infusão contínua IV ou SC
(PTTa > 2x controle)
OBS: 1mg/kg HBPM de 12/12 horas equivale a 250 UI HNF/Kg SC de
12/12 horas
2. SEGUNDO E TERCEIRO TRIMESTRES:

• É indicado o uso de Varfarina para se obter o INR desejado, e


orientado a suspender e administrar HNF (PTTa > 2x controle)
antes do parto vaginal planejado.

XII) ANTICOAGULAÇÃO EM PACIENTES ONCOLÓGICOS:


Câncer e tromboembolismo Venoso:
O câncer aumenta grandiosamente o risco para eventos e complicações
tromboembólicas, o que está diretamente relacionado às condições clínicas,
comorbidades e alguns fatores relacionados ao tumor: tipo, estágio e
extensão, e seu momento de tratamento, além dos agentes antineoplásicos
utilizados.
Sempre que indicado o tratamento com anticoagulantes nesse perfil de
paciente, deve-se levar em consideração o risco de sangramento (eventos
hemorrágicos, cerca de duas vezes mais na vigência do uso de
anticoagulantes) e a recorrência de TVP (cerca de três vezes mais em
comparação à população sem câncer).
O tromboembolismo venoso pode acontecer em diversos e diferentes
momentos da evolução clínica desse paciente, ou seja, antes do diagnóstico
confirmado, surgindo como primeiro sintoma ou sinal do câncer, durante o
tratamento e ainda no período de internação do paciente. Nos casos de
metástase o risco aumenta significantemente, assim como pode ser um sinal
precoce de recidiva da doença, quando o paciente está em controle clínico. É
sabidamente, reduzido o risco de TEV no período de remissão da doença.
O uso dos DOAC’s diante dos estudos de prática clínica e coorte
observacionais, teve como foco a eficácia, avaliando a recorrência de
trombose assim como a segurança em relação a possíveis sangramentos
críticos nesses pacientes. Outro fator relevante é a interação dos DOAC’s
com os agentes quimioterápicos que podem alterar a farmacodinâmica dos
DOAC’s, elevando o risco tanto de eventos trombóticos quanto
hemorrágicos. A maioria dos estudos mostraram diminuição da recorrência
em grupos tratados com DOAC’s em relação aos que usaram HBPM, porém
com aumento do sangramento;
Por fim, a partir da avaliação individualizada de cada paciente é sugerido
o uso de DOAC específicos para pacientes com câncer e trombose, com a
ressalva de que em pacientes com trombose aguda e com risco hemorrágico
alto, bem como pacientes com tumores luminais gastrointestinais intactos,
tumores do trato geniturinário, nefrostomias, úlceras digestivas ativas, colite
ou esofagite, é sugerido ainda o uso de HBPM.
Já em paciente com extremos de peso e alteração da função renal
importante é necessário o cuidado para o uso de ambos (DOAC E HBPM).
A. Anticoagulação em pacientes com Câncer e tromboembolismo
venoso conforme estudos:
1. Hokusay-VTE Câncer: Confrontou o uso de Enoxaparina por 5 dias
como ponte, após iniciar Edoxabana 60 mg 1x ao dia durante 3 a 12
meses X Deltaparina 200 UI/150UI. Desfecho: Edoxabana foi
associada a uma recorrência relativamente baixa da TVP, entretanto,
com aumento do sangramento.
2. SELECT-:D: Confrontou o uso de Rivaroxabana 15mg 2x ao dia
durante 21 dias e após 20 mg 1x ao dia X Deltaparina 200 UI/150 UI.
Desfecho: Rivaroxabana foi associada a uma recorrência
relativamente baixa da TVP, ainda menores que a Edoxabana, em
especial paciente com câncer do trato GI.
3. ADAM-VTE: Confrontou o uso de Apixabana 10 mg 2x ao dia por
07 dias e após 5mg 1x ao dia X Deltaparina200 UI/ 150 UI.
Desfecho: Apixabana foi associada a uma recorrência relativamente
baixa da TVP, entretanto, com aumento do sangramento.
CONSIDERAÇÕES DROGA INDICAÇÃO

• Baixo risco de sangramento;


• Facilidade no tratamento
oncológico; DOAC INDICADO
• Baixa interação
medicamentosa; Ausência de
neoplasias GI;

• Terapias associadas a
náuseas e vômitos;
• Extremo de pesos (<50 DOAC
e>150); NÃO INDICADO

• História de sangramento GI
prévio ou neoplasia GI ativa;

• Terapias com náuseas e


vômitos importantes;
• Interações medicamentosas
entre DOAC e Varfarina; HBPM INDICADO

• Risco de sangramento
conhecido ;
• Alterações da absorção GI
HBPM NÃO INDICADO
• IR;
• Negação do paciente a
terapia parenteral;
• CA + TVP durante a
anticoagulação;
• Extremos de peso (<50 e
>150);

• IRC avançada;
• Extremos de peso (<50 e
>150);
• Situações que exigem VARFARINA INDICADO
monitoramento da
anticoagulação (alterações
metabólicas, alterações de
absorção e risco de
sangramento);

• Falta de controle da VARFARINA NÃO INDICADO


anticoagulação (vigilância).

*CA: câncer; GI: gastrointestinal; IR: insuficiência renal; IRC: insuficiência renal crônica; TVP; trombose venosa profunda;
DOAC: anticoagulantes orais de ação direta; HPBM: heparina de baixo peso molecular.

Considerações clínicas para escolha de terapia anticoagulante em pacientes


com CA.:
Fonte: Revista Brasileira de Cancerologia, 2019.

Em suma, em pacientes com câncer do trato gastrointestinal,


geniturinário e pacientes que não toleram o uso de medicações orais está
indicado o uso de heparina de baixo peso molecular. Em paciente com
disfunção renal importante, obesos mórbidos e que haja interação
medicamentosa está indicado o uso de varfarina.

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2.1
CETOACIDOSE DIABÉTICA
Autora:
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• CAD (Cetoacidose Diabética): emergência clínica decorrente de
deficiência relativa ou absoluta de insulina, com consequente
prejuízo na captação de glicose plasmática. Para gerar energia,
ocorre a quebra de gordura, em um processo bioquímico chamado
lipólise. A incapacidade de metabolizar a glicose leva ao aumento
da glicemia, geralmente acima de 250 mg/dL, e a lipólise leva à
produção de cetoácidos com consequente acidose. Tais alterações
metabólicas compõem a tríade de hiperglicemia, cetonemia e
acidose metabólica.

• CAD euglicêmica: situação bioquímica em que ocorre CAD sem


elevação importante da glicemia (menor que 250 mg/dL). Está
associada ao uso de uma nova classe de antidiabéticos orais, os
inibidores do cotransportador sódio-glicose tipo 2 (ISGLT2), cujo
mecanismo de ação é a inibição da reabsorção tubular renal de
glicose com consequente glicosúria e redução da glicemia sérica.
Pode ocorrer CAD em pacientes com diabetes mellitus tipo DM1
(indicação não respaldada em bula) e em diabetes mellitus tipo 2
DM2 com insulinopenia. Por se tratar de um quadro atípico de
CAD, o diagnóstico pode ser tardio. Dados de estudos
randomizados com inibidores do SGLT2 relataram baixa
incidência de CAD em pacientes com DM2 (cerca de 0,07%).
Dessa forma, os pacientes em uso de ISGLT2 apresentam um
pequeno, mas significante, risco de CAD e seu uso não está
indicado em pacientes com DM1.
ETIOLOGIAS
A CAD é mais comum em diabéticos tipo 1 jovens e em mulheres. Sua
incidência nos EUA é de aproximadamente 4,6 a 8 episódios por 1000
admissões hospitalares. Em aproximadamente 25% dos casos esse quadro irá
abrir o diagnóstico do paciente com diabetes mellitus tipo 1.

a. Deficiência absoluta de insulina: em pacientes diabéticos tipo 1


ou tipo 2 de longa data com falência pancreática (insulinopenia), a
omissão de dose de insulina pode levar ao quadro de CAD. Há também
um risco maior em pacientes em uso de sistema de infusão contínua de
insulina (bombas de insulina) por defeitos no dispositivo ou uso
incorreto, levando à rápida diminuição do fornecimento de
insulinoterapia (devido ao uso de insulina ultrarrápida com tempo de
duração de ação menor).
b. Deficiência relativa de insulina e Situações de estresse:
condições clínicas em que há aumento da necessidade de insulina e/ou
aumento dos hormônios contrarreguladores de insulina: IAM, TEP,
AVE, pancreatite aguda, infecções, uso de medicamentos
(glicocorticoides, dobutamina, betabloqueadores, antipsicóticos
atípicos, fenitoína, bloqueadores H2) podem desencadear CAD.
c. Hormônios contrarreguladores de insulina: a elevação das
concentrações plasmáticas de glucagon, catecolaminas, cortisol e
hormônio do crescimento ocasiona aumento da produção hepática e
renal de glicose e diminuição da utilização da insulina nos tecidos
periféricos sensíveis. Tais alterações promovem o aumento da glicemia,
levando a um estado de hiperosmolaridade, diurese osmótica,
desidratação e alterações eletrolíticas.
d. Lipólise: pela dificuldade em utilizar a glicose, o corpo recorre à
quebra de gordura (lipólise) para gerar energia. Essa quebra leva à
produção excessiva de ácidos graxos livres e glicerol, os quais, no
fígado, serão oxidados em corpos cetônicos – ácidos beta-
hidroxibutírico (principal) e acetoacético – que resultam em cetonemia
e acidose metabólica.
e. Acidose metabólica: decorre do aumento da relação
glucagon/insulina e diminuição da atividade da malonil coenzima A,
responsável por modular o transporte dos ácidos graxos livres para
dentro da mitocôndria dos hepatócitos para oxidação no sistema
microssomal. Esse processo resulta em cetonemia e acidose metabólica.

QUADRO CLÍNICO
• Quadro decorrente de hiperglicemia: intolerância a exercícios,
fadiga, adinamia, poliúria, polidipsia, perda de peso súbita e
intensa, taquipneia, dor abdominal.

• Quadro decorrente da acidose metabólica: hálito cetônico.


EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: taquipneia, hálito cetônico, hipotonia muscular.
• Aparelho respiratório: padrão de respiração profunda seguido de
apneia e expiração rápida, denominado respiração de Kussmaul
(sinal de gravidade). Se infecção pulmonar associada, além de
taquipneia, podem estar presentes estertores macicez à percussão e
diminuição ou ausência de murmúrio vesicular em casos de
pneumonia.

• Aparelho cardiovascular: taquicardia e hipotensão arterial


secundária à desidratação. Se grave, pode levar a choque
hipovolêmico.

• Aparelho gastrointestinal: dor abdominal de grande intensidade,


inclusive simulando a dor do abdome agudo.

• Neurológico: obnubilação, torpor ou coma de acordo com a


gravidade.
EXAMES COMPLEMENTARES
a. Bioquímica: glicemia sérica, gasometria arterial, hemograma,
ureia, creatinina, sódio, potássio, cloro, PCR, urina rotina (EAS),
fósforo, magnésio.
Ânion GAP: Na+ − (Cl− + HCO3− ) VR: 8 a 10 mEq/L; CAD
>10 mEq/L

Osmolaridade plasmática: (2xNa+) + Glicose/18 + Ureia/2,8

Sódio: Glicemia muito elevada pode levar à pseudo-


hipernatremia. Nesses casos, utilizar fórmula de Katz para
calcular o sódio corrigido:

Sódio corrigido = Na + [1,6 x (glicose-100/100)] VR: 135


-145mEq/L

• Potássio: é esperado que se encontre baixo em razão da acidose


metabólica. A concentração sérica de K+ deve ser > 3,3 mEq/L
antes do início da terapêutica com insulina. Se menor, infundir
suplemento de potássio por via intravenosa, conforme Tabela 2.

• Leucócitos: esperam-se elevações entre 10.000 a 25.000.


Considerar a possibilidade de quadro infeccioso se > 25.000.

• Bicarbonato: quanto menor, maior a gravidade, conforme Tabela


2.
b. Eletrocardiograma (ECG): deve ser solicitado para todos os
diabéticos tipo 2 ou tipo 1 com mais de 10 anos de diagnóstico, devido
à possibilidade de o desencadeante do quadro poder ser um episódio
IAM sem dor.
c. Radiografia de tórax: solicitar se houver suspeita clínica de
infecção ou fator desencadeante não identificado.
d. Outros exames (indicações mais restritas e específicas):
tomografia de crânio se houver sinais de rebaixamento do sensório.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Os principais diagnósticos diferenciais estão resumidos no quadro 1 e
classificação da gravidade do quadro está descrita na tabela 1.

Intercorrências clínicas
Pancreatite aguda Insuficiência renal crônica ou agudizada

Cetoacidose alcoólica Jejum prolongado ou dieta cetogênica

Acidose lática Acidose urêmica

Rabdomiólise Estado hiperglicêmico hiperosmolar

Quadro1. Diagnósticos diferenciais.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Critério / Gravidade Leve Moderada Grave


Glicemia >250 mg/dL >250 mg/dL >250 mg/dL

pH arterial 7,30-7,25 7-7,24 <7

Bicarbonato 18-15 mEq/L 14-10 mEq/L <10 mEq/L

Ânion Gap >10 >12 >12

Osmolaridade Variável Variável Variável

Cetonemia Positiva Positiva Positiva

Cetonúria Positiva Positiva Positiva

Neurológico Alerta Alerta-obnubilado Torporoso-Coma

Tabela 1. Classificação de gravidade da Cetoacidose Diabética.


Fonte: Ramos AJS et al. 2016

TRATAMENTO
a. Objetivos do tratamento: Hidratação, correção da acidose, da
hiperglicemia e dos desequilíbrios hidroeletrolíticos. A hidratação por si
só reduz a glicemia em 17 a 80% durante 12 a 15 horas, atingindo uma
taxa média de redução de 25 a 50 mg/hora.
No entanto, a resolução da CAD não é a resolução da hiperglicemia, que
pode ocorrer muito mais cedo no decorrer da terapia. Em vez disso, a
resolução da CAD é a correção da acidose metabólica e a normalização do
bicarbonato, ânion gap e recuperação para o sensório normal.
Uma vez atingidos esses parâmetros, os fluidos intravenosos são
interrompidos, é liberada uma refeição oral e a primeira dose de insulina
subcutânea é administrada. A infusão de insulina é interrompida meia hora
depois ou 2 horas depois em adultos. A transição para insulina subcutânea,
com os vários tipos disponíveis, entra no âmbito do manejo do controle
hiperglicêmico intra-hospitalar (veja esse capítulo).

Reposição Volêmica

- Infusão salina isotônica de cloreto de sódio (NaCl) a 0,9% ou ringer lactato na primeira hora, em média 15 a 20
mL/kg/h ou 1 L/h. Em crianças e muito desidratados, realizar 20 mL/kg em fase de expansão em 30-60 minutos.
- Caso o paciente apresente hipernatremia (Na ≥ 150 mEq/L), usa-se solução de NaCl a 0,45% de 10 a 15 mL/kg/h.
- Para lactentes, usar NaCl 0,9% + água destilada (1:1). Crianças maiores devem receber solução de NaCl 0,9% + água
destilada na proporção 2:1.

Correção eletrolítica: Potássio

- K+ < 3,3 mEq/L: infusão de cloreto de potássio (KCl) 19,1% a 40 mEq/L.


- 3,3 ≥ K+ < 5,0 mEq/L: infusão de 20 a 30 mEq/L em SF 0,9% 250-500 mL/h para manter o K+ entre 4 e 5 mEq/L,
caso o paciente apresente diurese normal.
- Em crianças: infusão de 2 a 4 mEq/kg de KCl nas primeiras 24 h.
Observação: realizar monitorização com ECG em pacientes que apresentem hipocalemia ou portadores de qualquer
anormalidade arrítmica cardíaca durante o tratamento.

Correção eletrolítica: Bicarbonato

- pH < 6,9 ou com hiperpotassemia grave: infundir 100 mEq/L de bicarbonato de sódio diluídos em 400 mL de água
destilada, sendo 200 mL/hora, até que o pH atinja valores superiores à 7.
- pH > 7: a infusão de NaHCO3 não melhora o prognóstico.
- Em crianças: infundir bicarbonato de sódio apenas se pH arterial for < 7,0. Iniciar após ter começado reidratação e
insulinoterapia, na dose de 1 a 2 mEq/kg durante 2 h.

Correção eletrolítica: Fosfato

Repor apenas quando o paciente apresentar disfunção cardíaca, anemia ou depressão respiratória e fosfato < 1 mg/dL.
- Infundir 20-30 mEq/L de fosfato ácido de potássio (KH2PO4).

Correção eletrolítica: Magnésio


Se < 1,8 mEq/L ou tetania: infundir 5 g de sulfato de magnésio diluídos em 500 mL de solução salina a 0,45%, durante
5 h.

Tabela 2. Reposição hidroeletrolítica.


Fonte: Adaptado de Ramos AJS et al. 2016
Insulina Endovenosa

Sempre Insulina Regular EV em bolus diluída em SF 0,9%: quanto maior a diluição, maior a segurança e hidratação.
Exemplos de diluição: Insulina Regular 25 unidades em 250 mL SF 0,9% de SF 0,9% ou 50 unidades em 500 mL de
SF 0,9% (diluição de 0,1 unidade por mL ou 1 unidade/10 mL da diluição).

A diluição de 100 unidades em 100 mL de SF 0,9% não é recomendada para crianças e, pelo desperdício de insulina e
necessidade de dose de velocidade de infusão muito baixa, deve ser reservada apenas para cardiopatas ou doentes
renais crônicos que não toleram volume.

Dose de 0,1 U/kg/h (adultos) e 0,05 U/kg/h (crianças), com meta de redução da glicemia de 50-75 mg/dL por hora.

Glicemia menor 250 mg/dL: reduzir para 0,05 U/kg/h de insulina regular e iniciar soro glicosado. Repetir gasometria.

Em casos leves, pode-se utilizar insulina regular SC de 1/1 h, ou análogos ultrarrápidos subcutâneos de hora em hora
ou a cada duas horas; porém, não se trata do método ideal de tratamento.

A suspensão da insulinoterapia só deverá ser feita quando corrigida a cetoacidose (pH e bicarbonato) e quando houver
redução da glicemia, que invariavelmente ocorrerá antes.

Tabela 3. Insulinoterapia.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Glicemia capilar a cada hora enquanto em insulinoterapia venosa.

Sinais vitais a cada 2 horas: frequência cardíaca, respiratória e pressão arterial.

Avaliar sinais neurológicos de alerta e sintomas de edema cerebral (agitação, irritabilidade, aumento da
sonolência).

Balanço hídrico: anotar diurese 1/1 hora.

Gasometria arterial a cada 2 ou 4 horas, assim como eletrólitos de acordo com a reposição.

Ureia, creatinina e hemograma: avaliar com intervalo de 6-12 h.

Tabela 4. Monitorização do tratamento.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Bicarbonato sérico ≥ 18 mEq/L

pH ≥ 7,3

Ânion gap < 10-12

Controle glicêmico estável com glicemia < 200 mg/dL

Tabela 5. Critérios para suspensão de insulinoterapia venosa.


Fonte: Elaborado pelos autores.

b. Complicações:
Hipopotassemia, hiperglicemia, hipoxemia, edema agudo de pulmão
acometendo geralmente doentes renais crônicos ou pacientes com IC.
A rabdomiólise pode ocorrer devido à hiperosmolaridade e hipoperfusão.
Hipercloremia e edema cerebral podem ocorrer devido à rápida redução
da osmolaridade sérica em pacientes adultos jovens. Manifesta-se com sinais
de cefaleia, letargia, alterações pupilares ou convulsões.
Edema cerebral: as crianças apresentam maior incidência de edema
cerebral sintomático em comparação aos adultos, principalmente naqueles
com diabetes de início recente. Apresenta-se com uma taxa de mortalidade
de 10 a 25%. O edema cerebral geralmente ocorre algumas horas após o
início da terapia com CAD, com sintomatologia variada, variando de
cefaleia a deterioração neurológica abrupta e coma. Portanto, é necessário
um alto índice de suspeita em pacientes com sinais neurológicos sutis
precoces, sensório alterado persistente, apesar da melhora da acidose (pH >
7,3) e hiperglicemia (glicemia < 300 mg/dL). Quando há suspeita de edema
cerebral, é essencial monitorar rigorosamente glicemia e eletrólitos para
evitar desequilíbrio osmótico. Em tratamentos com manitol deve ser
considerada a ocorrência de edema cerebral. O volume de fluido
administrado deve ser reduzido e demais medidas para controle da pressão
intracraniana devem ser tomadas, quando necessárias.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1: Suspeita clínica e Manejo prático da CAD
Fonte: Elaborado pelos autores.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Sexo feminino, 13 anos, 40 kg, procura PS
queixando-se de fadiga e indisposição há 2 dias. Pais referem que há 1
mês vem apresentando polidipsia, poliúria e perda de 4 kg nos últimos
14 dias. Apresentou 1 episódio de vômito hoje. Nega patologias,
internações prévias ou uso de medicação contínua. Pais hígidos.
b. Exame físico: REG, afebril, hipocorada, sudoreica. Aparelho
cardiorrespiratório e abdominal sem alterações.
c. Exames laboratoriais:

• Glicemia: 480 mg/dL; pH 7,2; PaCO : 20; PaO : 130; BIC: 3; BE:
2 2

-19; SatO2: 98%; Hb: 10; K+: 4,0 mEq/L; Na+: 140 mEq/L; Cl−:
112 mEq/L, HCO3−:15 mEq/L;

• Leucócitos: 10.000;
• Ânion GAP: Na − (Cl + HCO3 ); AG = 140 - (112 + 15) = 13.
+ − −

d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral suspensa


2. Glicemia capilar 1/1 hora
3. Dados vitais 2/2 horas
4. SF 0,9% 500 mL/h em 2 horas (15 mL/kg/h)
5. Insulina regular: 4 U/h EV (0,1 U/kg/h) em BIC. Diluir 25 UI de
insulina regular em SF 0,9% 250 mL e infundir 40 mL/h EV em
BIC
6. Monitorar diurese 1/1 hora
7. Comunicar glicemia a cada hora

DICAS DO ESPECIALISTA
• CAD é uma emergência e a principal causa de morte em
diabéticos jovens.
• Solicitar vaga e realizar a transferência para terapia intensiva se
possível.

• Muita atenção na diluição da insulina regular: pode causar


hipoglicemia grave se pouco diluída ou se não houver controle da
glicemia a cada hora.

• Muitos pacientes apresentam-se inicialmente assintomáticos e


evoluem para gravidade muito rapidamente. Não negligencie e
monitore pH e eletrólitos.

• O uso de insulina ultrarrápida subcutânea deve ser reservado para


casos leves e para médicos experientes no manejo de CAD.

• Esteja ao lado do paciente, ajuste a glicemia a cada hora.


• Idealmente, a consulta com equipe especializada (endocrinologia,
nutrição e psicologia) deve ser realizada antes da alta hospitalar.

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Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan Ltda; 2016.
10. Buse JB, Wexler DJ, Tsapas A, Rossing P, Mingrone G, Mathieu C, et al. 2019 Update to:
Management of Hyperglycemia in Type 2 Diabetes 2018 A Consensus Report by the
American Diabetes Association (ADA) and the European Association for the Study of
Diabetes (EASD). Diabetes Care. 2020; 43(2): 487-93.
2.2
ESTADO HIPERGLICÊMICO HIPEROSMOLAR
Autora:
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• EHH (Estado Hiperglicêmico Hiperosmolar): emergência endocrinológica em pacientes
diabéticos e acomete, quase exclusivamente, os diabéticos do tipo 2.

• Caracteriza-se por acentuada hiperglicemia (acima de 600 mg/dL), hiperosmolaridade plasmática


(acima de 320 mOsm/kg), desidratação grave e, em geral, sem acidose metabólica, embora pequenos
graus de cetose possam surgir. A perda hídrica é duas vezes superior quando comparada à CAD.

• A maioria dos casos ocorre em pacientes com diabetes tipo 2 e idosos. Mas raramente pode
ocorrer em crianças com diabetes tipo 2, especialmente na última década, devido à epidemia de
obesidade em crianças e consequente diabetes tipo 2 nesse grupo.

• EHH é responsável por cerca de 1% das admissões hospitalares. Em até 20% dos casos, o paciente
não apresenta o diagnóstico prévio de diabetes, evento que fará o diagnóstico.

• A mortalidade é elevada, com taxa até 20% e 10 vezes maior quando comparada à cetoacidose
diabética.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
As etiologias mais comuns são os fatores que levam à descompensação do quadro de diabetes preexistente
ou gatilho para abrir o diagnóstico: infecções, AVE, IAM, queimaduras, desidratação (idosos acamados que
não têm acesso à hidratação adequada), embolia pulmonar e demais fatores predisponentes listados abaixo.
A fisiopatologia do EHH é a soma de dois fatores: decréscimo da insulina sérica e aumento de seus
hormônios contrarregulatórios (glucagon, epinefrina/norepinefrina, cortisol e hormônio do crescimento). Essas
alterações levam ao aumento da gliconeogênese e da glicogenólise e ao uso inadequado da glicose,
principalmente a nível muscular.

• Hiperglicemia severa causa o aumento da osmolalidade extracelular com consequente aumento


do gradiente osmolar e desidratação celular. Conforme a glicosúria se intensifica, a hipovolemia se
instala, agravando a hiperglicemia.

• Ausência de acidose metabólica ou quadro discreto: como não há deficiência absoluta de insulina,
a pequena concentração circulante de insulina é suficiente para impedir a lipólise e, com isso,
prevenir o surgimento da cetogênese, mas é insuficiente para a metabolização da glicose (a
quantidade de insulina requerida para suprimir a lipólise é um décimo menor que a requerida para
estimular a utilização periférica de glicose).
O déficit de água total no EHH é estimada em 9 a 12 litros, mais expressiva do que nos casos de
cetoacidose. É válido ressaltar que a osmolalidade plasmática é calculada com os valores séricos de sódio,
glicose e ureia. No entanto, a osmolalidade plasmática efetiva não considera o valor absoluto de bases
nitrogenadas (ureia) em sua fórmula, pois ele encontra-se distribuído igualitariamente pelo corpo, não
interferindo no gradiente osmótico das membranas celulares; portanto, não é significativo quando comparado
às concentrações de glicose e sódio.
A propedêutica visa identificar o fator etiológico que precipitou o EHH, correlacionando com a
suspeita clínica individual, com foco especial nas infecções respiratórias e urinárias e nos eventos
cardiovasculares em idosos.

• Pacientes idosos são propensos a prolongar a imobilização e têm alteração em resposta à sede,
dificultando seu estado de hidratação e aumentando o risco de EHH.

• Estado de hipercoagulabilidade: a hiperglicemia pode alterar a hidratação e a agregação


plaquetária dificulta os níveis de óxido nítrico derivados do endotélio, levando a um estado de
hipercoagulação. Estados de hipercoagulabildade aumentam o risco de coagulopatia, eventos
cardiocerebrovasculares e tromboembolismo venoso.

• O quadro 1 resume as principais etiologias e fatores predisponentes para o EHH.


Fatores predisponentes
Infecções (ITU) IAM/AVE

Embolia pulmonar Obstrução intestinal / Trombose mesentérica

Tireotoxicose Síndrome de Cushing

Insuficiência Renal / diálise peritoneal Insolação

Queimaduras graves Hipotermia

Pancreatite aguda Hematoma subdural

Cetoacidose alcoólica Medicamentos: olanzapina/fenitoína

Acidose lática Medicamentos: esteroides

Rabdomiólise Nutrição parenteral exclusiva

Quadro 1. Etiologias do EHH.


Fonte: Adaptado de Ramos AJS et al. 2016

QUADRO CLÍNICO
• Quadro decorrente de hiperglicemia: mal-estar, fadiga, indisposição, fraqueza em membros
inferiores, turvação visual, poliúria, polidipsia, polifagia.

• Quadro decorrente de desidratação: pele seca, enoftalmia acentuada.


• Quadro decorrente de hiperosmolaridade: sonolência, obnubilação e torpor.
EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: extremidades frias, desidratação, taquicardia, hipotensão, baixa oxigenação periférica,
aumento do tempo de enchimento capilar.

• Aparelho respiratório: taquipneia, respiração de Kussmaul.


• Aparelho cardiovascular: taquicardia, pulso fino e filiforme, hipotensão.
• Aparelho nervoso: sonolência, obnubilação e torpor.
EXAMES COMPLEMENTARES
a. Bioquímica: glicemia sérica, gasometria arterial, hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio,
cloro, PCR, urina rotina (EAS), fósforo, magnésio.

• Ânion GAP: Na − (Cl + HCO


+ −
3

) VR: 8 a 10 mEq/L; CAD >10 mEq/L

Osmolaridade plasmática efetiva: (2xNa+) + Glicose/18 . VR: 290

Sódio: Glicemia muito elevada pode levar a falso-positivo de hipernatremia. Nesses casos, utilizar
fórmula de Katz para calcular o sódio corrigido:

Sódio corrigido = Na + [1,6 x (glicose-100/100)] VR: 135 -145mEq/L

• Potássio: só é esperado que se encontre baixo se houver acidose metabólica, K deve ser > 3,3
+

mEq/L antes do início da terapêutica com insulina. Se menor, realizar a reposição de potássio por via
intravenosa, conforme descrito no capítulo de CAD.
b. Eletrocardiograma (ECG): deve ser solicitado para todos diabéticos tipo 2 ou tipo 1 com mais de
10 anos de diagnóstico, uma vez que pode haver infarto sem dor.
c. Radiografia de tórax: solicitar se houver suspeita clínica de infecção ou fator desencadeante não
identificado.
d. Outros exames (indicações mais restritas e específicas): tomografia de crânio se sinais de
deterioração neurológica ou se o paciente não apresentar a osmolalidade plasmática elevada, pois o coma
com valores baixos de osmolalidade plasmática deve alertar para a pesquisa de outras causas neurológicas
(p.ex., AVC ou meningite).

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é essencialmente clínico. A propedêutica laboratorial deve ser realizada conforme sugerido
acima. A agilidade diagnóstica e a precisão do manejo clínico determinam o desfecho do paciente. A tabela 1
descreve os critérios diagnósticos para EHH.

Critérios laboratoriais
Glicemia sérica acima de 600 mg/dL

pH > 7,3

Bicarbonato > 15

Osmolalidade plasmática acima de 320 mOsm/L

Cetonemia ou Cetonúria leve ou negativa

Ânion Gap < -10-12

Tabela 1. Critérios Diagnósticos para EHH.


Fonte: Adaptado de Ramos AJS et al. 2016

TRATAMENTO
a. Objetivos do tratamento: o objetivo principal é restabelecer a hidratação e o osmolalidade
plasmática. A redução da hiperglicemia e da hiperosmolaridade deve ser lenta para não haver dano
neurológico.

• Tipo de cristaloide: há uma lacuna na literatura se há diferenças na mortalidade geral de pacientes


com CAD ou EHH solução salina a 0,9% e outros fluidos cristaloides não tamponados.

• A recomendação ainda é priorizar o SF 0,9%, pois a solução salina na 0,45%, devido à relativa
hipotonicidade, grande parte do volume de 0,45% infundido pode ser perdido no espaço
extravascular.

• Embora a solução salina a 0,45% seja raramente usada como fluido de ressuscitação em adultos,
vários estudos examinaram seu uso como fluido de ressuscitação e manutenção em populações
pediátricas com CAD.
A reposição volêmica é essencial para o sucesso do tratamento, para correção do grande volume perdido.
Em adultos, sugerem-se 1000-1500 mL de SF0,9% nas primeiras 2 horas e 500-1000 mL nas 2 horas
subsequentes. Nas 20 horas seguintes é feita a reposição do restante das perdas previamente calculadas,
acrescido de perdas futuras previstas. Caso o paciente não tolere volume (idosos, cardiopatas e doentes renais
crônicos), a hidratação deverá ser feita de forma cautelosa, com SF 0,9% - 250mL em bolus e reavaliação para
evitar edema agudo de pulmão.
• Em crianças, é recomendada uma fase inicial de expansão, de cerca de 4 horas, com 20 mL/kg de
SF0,9% a cada 20 minutos até que os sinais de desidratação sejam revertidos. Mas é muito raro o EHH
nessa população.
Para o controle da hiperglicemia, utilizar insulina regular endovenosa contínua, em bomba de infusão
contínua, desde que o potássio sérico esteja ≥ 3,3 mEq/L, devido ao risco de arritmia severa em casos de
hipopotassemia.

• A solução para a bomba de infusão pode ser preparada com diluições como: 50 unidades de insulina
regular em 500 mL de SF 0,9% OU 25 UI de insulina regular em 250 mL de SF 0,9%, desprezando-
se os 50 mL iniciais. Nessa solução cada 10 mL correspondem a 1 unidade de insulina.

• Caso o paciente apresente IRC dialítica ou ICC com restrição hídrica, pode-se utilizar a diluição de
100 unidades de insulina regular em 100 mL de SF 0,9%. Nessa solução, cada 1 mL corresponde a 1
unidade de insulina. Lembrando que nessa diluição se perde muita insulina e há maior risco de erro
na velocidade de infusão e hipoglicemia severa.

• A dose recomendada é de 0,1 U/kg/hora em adultos e 0,05 U/kg/hora em crianças.


• O objetivo é a redução lenta da glicemia, 50-75 mg/dL/hora.
• A dieta oral é suspensa até estabilização do quadro e, antes de se desligar a bomba de infusão
contínua de insulina (ao atingir glicemia 200 mg/dL), a aplicação de insulina subcutânea (SC) é
indicada e a suspensão da bomba de insulina é realizada 1-2 horas após.

• Ao atingir glicemia 250 mg/dL, acrescenta-se a reposição de soro glicosado.


• A redução da osmolalidade plasmática e do sódio sérico deve ser lenta (redução de 8–12 mEq/L de
sódio a cada 24 h), a fim de evitar edema cerebral.

• A cada 2-4 h verificar eletrólitos, ureia/creatinina séricas e pH venoso ou arterial de acordo com o
quadro respiratório. A glicemia capilar deve ser mensurada a cada hora enquanto estiver na bomba de
infusão contínua.
• Idealmente, esse paciente deverá ser encaminhado para Centro de Terapia Intensiva, sempre que
possível.

• Déficits eletrolíticos graves podem ser observados, principalmente potássio, fosfato e magnésio. Eles
podem ser mais extremos do que na CAD.
A suplementação de potássio deve ser iniciada em 10-20 mEq/L, mesmo se as concentrações de potássio
estiverem dentro da faixa normal, como dose de manutenção em pacientes com função renal preservada.

• A hipofosfatemia severa pode levar à rabdomiólise e paralisia, e é um importante preditor da


mortalidade associada à CAD/EHH.

• Recomenda-se que a hipofosfatemia seja tratada; no entanto, deve-se estar ciente de que essa terapia
pode contribuir para a hipocalcemia. São utilizadas soluções intravenosas de uma mistura 50: 50 de
fosfato de potássio e cloreto de potássio, resultando em suplementação adequada de fosfato com
baixo risco de hipocalcemia clinicamente significativa.
A hipomagnesemia pode contribuir para a hipocalcemia durante o tratamento; portanto, a suplementação
deve ser considerada em pacientes com hipomagnesemia e hipocalcemia (25 a 50 mg/kg de magnésio por dose,
três a quatro doses administradas a cada quatro a seis horas, com uma taxa de infusão máxima de 150 mg/min e
2 g/h).

fluxdia.jpgFLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


10102

Fluxograma 1: Suspeita e Manejo Clínico do EHH.


Fonte: Elaborado pelos autores.

precri.jpgEXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, E.R.T, masculino, 72 anos, 70 kg, diabético tipo 2 há 20 anos, hipertenso,
trabalhador rural, sem utilizar a medicação há 1 semana (insulina NPH/regular e Metformina 850 mg).
Nega febre, vômitos, diarreia ou convulsão.
b. Exame físico: taquidispneico, anictérico, acianótico, afebril, corado. PA = 100 x 55 mmHg, pulso
célere e filiforme, FC = 108 bpm, FR = 26 irpm, SatO2 = 92%, panturrilhas livres. Pupilas isocóricas e
foto reagentes.

• Ectoscopia: mau estado geral, confuso, sonolento, sudorese profusa, desidratado 4+/4+.
• Glicemia capilar = (HIGH)
c. Exames complementares: glicemia sérica: 700 mg/dL, pH arterial: 7,43, bicarbonato sérico: 28
mEq/L, Sódio: 152 mEq/L, Cloro: 110 mEq/L, Potássio: 4,2 mEq/L, Ureia: 35 mg/dL, Creatinina: 1
mg/dL.
d. Cálculos:

• Sódio Corrigido = Sódio (mEq/L) + 1,6 x glicose (mg/dL) – 100 /100


SC = 161,6 mEq/kg

• Ânion Gap = [Sódio – (Cloro + Bicarbonato)]


AG = [152 – (110 + 28)]
AG = 14 mmol/L (V.R.: 12 ± 2)

• Osmolaridade Plasmática Efetiva= ((2xNa ) + Glicose)/18


+

OP = (2 x 152) + 700/18
OP = 342,8 mOsm/kg (V.R.: 290 ± 5)

e. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral suspensa


2. Glicemia capilar 1/1 hora
3. Dados vitais 2/2 horas
4. NaCl 0,45% 1500 ml EV a 750 ml/h nas primeiras 2 horas e reavaliar Na corrigido. Se Na < 160:
manter com SF 0,9% a 500 ml/h 2 horas e 250 ml/h de acordo com cálculos para corrigir 10-12
litros em 24 horas
5. Insulina regular: 7 U/h EV (0,1 U/kg/h) em BIC. Diluir 50 UI de insulina regular em SF 0,9% 500
mL e infundir 70 mL/h EV em BIC
6. Monitorar diurese 1/1 hora
7. Comunicar glicemia a cada hora

discesp.jpgDICAS DO ESPECIALISTA
• A hidratação vigorosa só pode ser realizada em pacientes que toleram volume, ou seja, sem
insuficiência renal ou cardíaca.

• Tanto a redução da hiperglicemia quanto da osmolaridade devem ser lentas para evitar complicações
neurológicas.

• Houve aumento de 0,3% para 0,5% na taxa de internações descompensadas relacionadas ao diabetes
entre os diabéticos mais velhos (≥ 65 anos), e esse grupo merece atenção especial, já que há altas
taxas de mortalidade hospitalar em comparação à idade jovem, o que reflete o aumento da gravidade
da descompensação e comorbidades associadas em diabéticos idosos.

• A descompensação do diabetes pode aumentar de forma independente aos eventos de acidente


vascular cerebral em pacientes com diabetes; portanto, se houver piora neurológica mesmo com a
correção da glicemia e osmolaridade, é necessária a avaliação da equipe de neurologia.

• Vários estudos recentes mostraram que o controle intensivo da glicose (Hemoglobina glicada menor
que 6,5%) pode gerar mais danos do que benefícios em idosos. Cada vez mais, a importância de
cuidados e manejo especializados para a população geriátrica requer maiores cuidados clínicos, e a
abordagem de tratamento utilizada no DM2 na população idosa deve diferir da dos pacientes mais
jovens.

• Demência, depressão, uso de insulina e HbA1C estão associados a um risco aumentado de


hospitalização relacionada à hiperglicemia. Esses quadros podem levar à pouca adesão ou
incapacidade de acessar medicamentos.

• Por outro lado, pacientes com excesso de peso tiveram um risco reduzido de hospitalização
relacionada à hiperglicemia. Provavelmente isso pode ser explicado pelo fato de que o controle
glicêmico aprimorado está associado ao ganho de peso.

• O uso de insulina e o aumento da HbA1C também foram fatores de risco para hospitalizações
hiperglicêmicas. Isso pode ocorrer devido a uma associação com complicações do diabetes
(nefropatia, retinopatia), maior prevalência de comorbidades pelos pacientes e suas complicações
associadas e baixa adesão.

refere.jpg REFERÊNCIAS
1. Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2019-2020. São Paulo: Editora Clannad; 2020.
2. American Diabetes Association. Classification and Diagnosis of Diabetes: Standards of Medical Care in Diabetes - 2020. Diabetes Care
2020; 43(1): S14-31.
3. Ramos AJS, Coral MHC, Souza TBS, Fonseca MM, Araújo D, Araújo LA, et al. Emergências em Diabetes. In: Vilar L. Endocrinologia
clínica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan Ltda; 2016.
4. Zubkiewicz-Kucharska A, Chrzanowska J, Noczyńska A. Hyperosmolar hyperglycaemic state (HHS) as the first manifestation of type 2
diabetes in a child. Pediatr Endocrinol Diabetes Metab. 2019; 25(2): 85-9.
5. Desai R, Singh S, Syed M, Dave H, Haisnan M, Zahid D, et al. Temporal Trends in the Prevalence of Diabetes Decompensation (Diabetic
Ketoacidosis and Hyperosmolar Hyperglycemic State) Among Adult Patients Hospitalized with Diabetes Mellitus: A Nationwide Analysis
Stratified by Age, Gender, and Race. Cureus. 2019; 11(4): e4353.
6. Kaewput W, Thongprayoon C, Varothai N, Sirirungreung A, Rangsin R, Bathini t, et al. Prevalence and associated factors of hospitalization
for dysglycemia among elderly type 2 diabetes patients: A nationwide study. World J Diabetes. 2019; 10(3): 212-23
7. Gershkovich B, English SW, Doyle M-A, Menon K, McIntyre L. Choice of crystalloid fluid in the treatment of hyperglycemic
emergencies: a systematic review protocol. Syst Rev. 2019; 8: 228.
8. Leite SAO, Umpierrez MCLG. Controle glicêmico no ambiente hospitalar. In: Vilar L. Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan Ltda; 2016.
9. Buse JB, Wexler DJ, Tsapas A, Rossing P, Mingrone G, Mathieu C, et al. 2019 Update to: Management of Hyperglycemia in Type 2
Diabetes 2018 A Consensus Report by the American Diabetes Association (ADA) and the European Association for the Study of Diabetes
(EASD). Diabetes Care. 2020; 43(2): 487-93.
2.3
INSUFICIÊNCIA ADRENAL AGUDA
Autora:
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• Insuficiência Adrenal Aguda (IAA): emergência clínica decorrente da diminuição abrupta na
secreção de hormônios esteroides produzidos pelo córtex adrenal (glicocorticoides,
mineralocorticoides e precursores androgênicos suprarrenais), cujo déficit predominante e de ameaça
à vida é o déficit de glicocorticoides.

• A crise adrenal é frequentemente a primeira apresentação em IA não diagnosticada. Trata-se de um


quadro abrupto e pode ser precipitada por situações de estresse. Seu diagnóstico é essencialmente
clínico.

• Epidemiologia: 5,2 a 8,3 por 100 pacientes-ano. A incidência de crise adrenal parece aumentar com
a idade, com um estudo relatando uma taxa de 24,3 admissões por milhão por ano em pacientes com
60-69 anos

• IAA primária: disfunção intrínseca da glândula adrenal.


• IAA secundária: causada por ruptura do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal com estimulação
insuficiente da glândula adrenal devido à secreção ou síntese inadequada de ACTH. Trata-se,
portanto, de doenças hipofisárias ou hipotalâmicas.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Entre as principais causas, além das doenças primárias e secundárias descritas abaixo, há a suspensão
brusca do tratamento com administração de glicocorticoides por um longo período de tempo (IA secundária).
A IA primária é rara (40 a 110 casos por milhão de habitantes).

• IA primária ou doença de Addison: causada por doença primária da adrenal, resultante de


destruição de 90% ou mais do córtex adrenal, mas pode advir de condições que reduzam a síntese dos
esteroides adrenais, levando à produção subnormal de cortisol, aldosterona e androgênios. Causas
mais frequentes: adrenalite autoimune, infecções (em particular a tuberculose), metástases
suprarrenais bilaterais ou hemorragia e trombose. Pode ocorrer isoladamente ou ser parte da síndrome
poliglandular autoimune (SPA), ou secundária a fármacos que inibem a esteroidogênese adrenal
(cetoconazol, fluconazol, itraconazol, etomidato) e doenças genéticas (p.ex., adrenoleucodistrofia).
Laboratorialmente, caracteriza-se por redução do cortisol basal (< 3 mcg/dL) e elevação do ACTH
(VN = até 46 pg/mL, invariavelmente se eleva para valores superiores a 100 pg/mL) devido a
feedback positivo.

• IAA secundária: causada por doenças ou situações que comprometam o eixo hipotálamo-
hipofisário, caracterizada por baixa produção de ACTH e, consequentemente, de cortisol. A diferença
laboratorial para IAA primária é o valor de ACTH que, na IAA secundária, apresenta-se baixo ou
inapropriadamente normal, mas nunca elevado acima de 100.

• A causa mais comum de IA secundária é a suspensão brusca do tratamento com administração de


glicocorticoides de uso crônico (mais de 3 semanas), o que induz a downregulation de células
corticotrópicas e supressão do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal (HHSR). É importante notar que
não apenas a administração oral de glicocorticoides, mas também intramuscular, intra-articular, tópica
e inalatória podem desencadear uma supressão significativa do eixo HHSR. Outras causas: tumores
da região hipotálamo-hipofisária ou seus tratamentos (radioterapia ou cirurgia), traumatismo
craniano, necrose hipofisária pós-parto (síndrome de Sheehan), apoplexia hipofisária, anorexia
nervosa, pan-hipopituitarismo e causas congênitas (mutações de genes envolvidos no
desenvolvimento hipofisário).

• Hemorragia adrenal aguda bilateral: causa com pior prognóstico, sendo muitas vezes fatal. Deve-
se atentar para esta etiologia em casos de meningococcemia (síndrome de Waterhouse-Friedrichsen),
septicemia por outras bactérias (Pseudomonas aeruginosa), uso de anticoagulantes, trauma ou cirurgia
abdominal.

QUADRO CLÍNICO
• Quadro decorrente da deficiência de cortisol: instabilidade hemodinâmica refratária à reposição
de fluidos, hiperpirexia, náuseas e vômitos, hipoglicemia ou coma, intolerância a exercícios, fadiga,
adinamia, anorexia, dor lombar.

• Quadro decorrente da deficiência de aldosterona (apenas na IA primária): confusão mental e


rebaixamento do sensório por hiponatremia e hiperpotassemia podem ocorrer como consequência da
deficiência de mineralocorticoides.

• Quadro clínico de hiponatremia na IAA secundária: o principal mecanismo de hiponatremia é a


redução do limiar osmolar que estimula a secreção de vasopressina secundária ao hipocortisolismo e
a incapacidade de excretar uma carga de água livre. É indistinguível clinicamente da síndrome da
antidiurese inadequada (SIAD).

• Outras alterações bioquímicas na IA: insuficiência renal secundária à hipovolemia, hipoglicemia


e, raramente, hipercalcemia, devido à diminuição da excreção renal de cálcio e aumento da
reabsorção óssea.

• Quadro decorrente de deficiência de precursores androgênicos (apenas na primária): redução


dos pelos axilares e pubianos em mulheres e baixa libido. No entanto, esses sintomas não são
referidos na crise.

• Quadro decorrente de hemorragia adrenal aguda bilateral: hipotensão grave e refratária a drogas
vasoativas e reposição volêmica.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: palidez, fraqueza muscular, hiperpigmentação cutânea (apenas na IA primária devido ao
aumento de ACTH com estímulo aos melanócitos).

• Aparelho cardiovascular: taquicardia e hipotensão arterial refratária à reposição volêmica.


• Aparelho gastrointestinal: dor abdominal ou de flanco sem etiologia definida, vômitos.
• Neurológico: obnubilação, torpor ou coma de acordo com a gravidade.
EXAMES COMPLEMENTARES
O diagnóstico é essencialmente clínico e não se deve protelar o tratamento para os testes diagnósticos.
O objetivo é restabelecer o equilíbrio hemodinâmico e hidroeletrolítico e, posteriormente, buscar a etiologia.
Porém, uma série de testes diagnósticos podem ser executados para confirmação do hipocortisolismo

• Cortisol basal e ACTH séricos colhidos entre 8 e 9 h: Permite diferenciar os pacientes saudáveis
daqueles com IA, assim como diferenciar pacientes com IA primária e secundária.

• Cortisol basal <3 mcg/dL confirma o diagnóstico de IA (acima de 18 mcg/dL praticamente exclui o
diagnóstico, exceto na sepse, que requer valores acima de 32 para exclusão).

• ACTH acima de 100 mcg/dL sela o diagnóstico de IAA primária, e concentrações normais ou
reduzidas estabelecem a IA de causa secundária.

• Teste de estimulação com cortrosina (teste de estimulação rápida): um instrumento seguro e


confiável. Consiste na administração intramuscular ou intravenosa de 250 mcg de cortrosina e
dosagem do cortisol sérico basal em amostras obtidas 30 a 60 minutos após a estimulação com
cortrosina. O ponto de corte para insuficiência é habitualmente definido com cortisol abaixo de 18 a
20 μg/dL.

• Teste de tolerância a insulina: padrão-ouro para o diagnóstico de IA em pacientes com IA


secundária recente, em que o teste de estimulação com cortrosina pode apresentar resultado falso-
negativo, em razão de haver produção residual de cortisol. Com este teste, a indução de hipoglicemia
provoca uma situação de grande estresse que rapidamente ativa o eixo HHSR. Este teste está
contraindicado para indivíduos com diabetes mellitus, doença cardiovascular ou história de crises
convulsivas e em casos agudos. Só poderá ser realizado após a estabilização da crise aguda.

• Definição da causa subjacente: posteriormente à crise, para reconhecer doenças que serão tratáveis
após a estabilização do quadro. Se primária, solicitar TC de abdome para avaliar adrenais e, se
secundária, solicitar RNM de hipófise/sela túrcica.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Embora o diagnóstico seja essencialmente clínico, a classificação após a estabilização do paciente é
importante para o seguimento do paciente.

Testes Primária Secundária


Cortisol basal < 3 mcg/dL < 3 mcg/dL

ACTH basal Alto > 100 mcg/dL Normal ou baixo

Teste cortrosina Cortisol < 18-20 mcg/dL < 18-20 mcg/dL

Teste de tolerância a insulina Cortisol < 3 mcg/dL < 3 mcg/dL

Tabela 1. IAA primária ou secundária.


Fonte: Adaptado de Silva RC et al. 2016

TRATAMENTO
a. Objetivos do tratamento: Restabelecer o equilíbrio hemodinâmico e hidroeletrolítico, corrigir
hipoglicemia.

• A preferência para o tratamento da suspeita de crise renal é a reposição venosa imediata de


Hidrocortisona 100 mg (50 mg/m2 para crianças), seguida de reanimação hídrica adequada e 200 mg
(50-100 mg/m2 para crianças) de hidrocortisona/24 horas (via terapia EV contínua ou a cada 6
horas); é necessária uma dose adequada à idade e à superfície corporal em crianças (8 mg/ m2).

• Se a hidrocortisona não estiver disponível, pode-se ter como alternativa a prednisolona. A


dexametasona é a alternativa menos preferida e deve ser administrada apenas se nenhum outro
glicocorticoide estiver disponível.
A tabela 2 resume os principais manejos da reposição volêmica, eletrolítica e glicocorticoides.

Reposição volêmica imediata

Infusão salina deve ser iniciada rapidamente por via endovenosa, com soro fisiológico (SF) a 0,9% em uma velocidade
inicial de 1-2 L/h, com monitorização cardíaca contínua e solução glicosilada a 5%. Após a melhora da hipotensão, a
taxa de infusão pode retornar para 3 a 4 L de solução salina isotônica por dia.

Cuidado em pacientes idosos e cardiopatas que podem não tolerar volume; avaliar cardiorrespiratório após cada
infusão de 250 mL de SF 0,9%.

Correção da hipoglicemia

Glicemia abaixo de 60 mg/dL: iniciar o soro glicofisiológico, pois estes pacientes vêm de períodos longos de anorexia.

Reposição de glicocorticoides

Hidrocortisona 100 mg EV em bolus seguida por 50 mg a cada 6 h nas primeiras 24 h em infusão contínua. Se o
diagnóstico de insuficiência adrenal estiver correto, haverá uma dramática melhora em 12 h após o início do
tratamento, e a dose de hidrocortisona poderá ser reduzida progressivamente. Em 24-72 horas, manter hidrocortisona
50 mg EV 8/8 horas e, em sequência, iniciar corticoterapia oral.

Tabela 2. Reposição hidroeletrolítica e glicocorticoides.


Fonte: Elaborado pelos autores.

fluxdia.jpgFLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


10588

Fluxograma 1: Suspeita clínica e Manejo inicial da IAA.


Fonte: Elaborado pelos autores.

precri.jpg EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO


a. Caso clínico: sexo feminino, 54 anos, 58 kg, sabidamente portadora de doença de Addison, evolui
com quadro de dor abdominal inespecífica, náuseas.
b. Exame físico: REG, afebril, hipocorada, FC: 120 bpm, PA: 70x 40 mmHg sem melhora após 1 litro
de SF 0,9% reposição volêmica. Aparelhos cardiorrespiratório e abdominal sem alterações.
c. Exames Laboratoriais: Glicemia: 50 mg/dL; Cortisol basal em andamento.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral suspensa


2. Dados vitais 2/2 horas
3. SF 0,9% 1500 mL/h
4. SGI 5% 1000 mL EV a 100 mg EV bolus e depois manter a 50 mg a cada 6 horas nas primeiras 24
horas
5. Hidrocortisona 100 mg EV a cada 6 horas por 24 horas (no dia seguinte, 50 mg EV a cada 8 horas).
6. Glicemia capilar a cada hora
7. Monitorar diurese a cada hora
8. Comunicar glicemia a cada hora

discesp.jpg DICAS DO ESPECIALISTA


• O tratamento para o precipitante da crise adrenal deve ser iniciado, assim como profilaxia do
tromboembolismo venoso. É recomendado avaliar um tempo curto de terapia com inibidores da
bomba de prótons para evitar potencial úlcera gástrica por estresse.

• Recomenda-se uma revisão urgente pela equipe de endocrinologia para orientar a redução segura da
hidrocortisona para doses de manutenção, além de orientar investigações adicionais em um paciente
com IA desconhecida.

• Se o paciente for clinicamente estável, a redução gradual da hidrocortisona para doses de reposição
pode ser iniciada geralmente dentro de 24 a 72 horas.

• Educação do paciente: é o componente mais importante na prevenção de crises adrenais. Os


pacientes precisam ser capacitados para fazer ajustes relevantes em seus próprios medicamentos, na
ausência de seu médico assistente, e para adaptar sua dose de acordo com as necessidades
individuais.

• É necessário fornecer o cartão de aviso PORTADOR DE INSUFICIÊNCIA ADRENAL e o paciente


o portar plastificado em sua carteira.

• É importante que pacientes, cuidadores e familiares estejam cientes dos sintomas de uma crise
iminente. Os pacientes devem ter um limiar baixo para administrar uma injeção de emergência de
hidrocortisona e procurar atendimento médico urgente se desenvolverem esses sintomas.

• Conselhos sobre administração de estresse: as regras do “dia da doença”


• Regra do dia 1: avaliar a necessidade de dobrar a dose oral de glicocorticoide de rotina quando o
paciente tiver febre ou doença que exija repouso; quando necessitar de antibióticos para uma
infecção; ou antes de um pequeno procedimento ambulatorial (por exemplo, trabalho odontológico).
O paciente deve garantir que eles tenham um suprimento adicional de comprimidos de hidrocortisona
para que possam dobrar sua dose por pelo menos 7 dias, se necessário.

• Regra do dia 2: necessidade de injetar uma preparação de glicocorticoides IM/IV em caso de doença
grave, trauma, vômito persistente, em jejum para um procedimento (colonoscopia) ou durante
intervenção cirúrgica hospitalar.

• Em casos em que não se consegue determinar uma causa definitiva para a descompensação, deve ser
elucidada uma história abrangente de medicamentos, incluindo preparações à base de plantas e sem
receita. A investigação da presença de esteroides nessas preparações deve ser considerada quando os
pacientes persistirem com insuficiência adrenal secundária, apesar da descontinuação dos
medicamentos esteroides prescritos.
refere.jpg REFERÊNCIAS
1. Silva RC, Vilar L, Kater CE. Insuficiência adrenal: diagnóstico e tratamento. In: Vilar L, Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan Ltda; 2016.
2. Bornstein SR, Allolio B, Arlt W, Barthel A, Don-Wauchope A, Hammer GD, et al. Diagnosis and Treatment of Primary Adrenal
Insufficiency: An Endocrine Society Clinical Practice Guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2016; 101(2): 364-89.
3. Dineen R, Thompson CJ, Sherlock M. Adrenal crisis: prevention and management in adult patients. Ther Adv Endocrinol Metab. 2019; 10:
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4. Kempegowda P, Quinn L, Shepherd L, Kauser S, Johnson B, et al. Adrenal insufficiency from steroid-containing complementary therapy:
importance of detailed history. Endocrinol Diabetes Metabol Case Rep. 2019: (1): 1-4.
5. Saverino S, Falorni A. Autoimmune Addison’s Disease. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab. 2020; 34(1): 101379.
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Chim Acta. 2020; 505: 148-59.
7. Manosroi W, Kosachunhanan N, Atthakomol P. Clinical and biochemical factors to predict biochemical adrenal insufficiency in
hospitalized patients with indeterminate cortisol levels: a retrospective study. BMC Endocr Disord. 2020; 20(1): 24.
2.4
CRISE TIREOTÓXICA
Autora:
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• Crise Tireotóxica ou Tempestade tireoidiana: síndrome clínica decorrente do excesso de
hormônios tireoidianos circulantes, associada ou não ao hipertireoidismo.

• Caracteriza-se por exacerbação do quadro clínico de tireotoxicose associada à descompensação de


um ou mais órgãos, com elevado risco de morte.

• É mais comum em mulheres adultas jovens.


• Rara, responde por 1 a 2% das admissões hospitalares por tireotoxicose.
• É considerada emergencial, com alta taxa de mortalidade que varia de 8-25% dos casos.
eti.jpgETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
As etiologias mais comuns associadas ao hipertireoidismo são doença de Basedow-Graves (80%) e bócios
nodulares tóxicos.
As etiologias não associadas ao hipertireoidismo são geralmente leves e transitórias e representadas por:
tireoidite silenciosa, tireoidite pós-parto ou tireoidite dolorosa subaguda ou pós-terapia ablativa com radioiodo.
Nesses casos, a destruição de tireócitos leva à liberação de hormônios pré-formados na circulação. Lítio,
interferon α e amiodarona são comumente envolvidos na disfunção tireoidiana induzida por drogas e têm
mecanismo semelhante às tireoidites.
A tireotoxicose exógena é fictícia ou iatrogênica, se desenvolve após a ingestão de quantidades excessivas
de hormônio tireoidiano e está associada a baixas concentrações séricas de tireoglobulina.
O hipertireoidismo ectópico é extremamente raro, sendo as causas principais as metástases funcionais do
câncer de tireoide ou o estroma ovariano, um tumor ovariano que contém tecido tireoidiano funcional.
A tireoidite pós-parto é mais comum em mulheres com diabetes tipo 1, doença de Graves em remissão e
hepatite viral crônica. É maior que na população em geral, e a triagem por TSH é recomendada aos 3 e 6 meses
após o parto.
Os fatores desencadeantes incluem: cessação abrupta das drogas antitireoidianas, cirurgias tireoidianas e
não tireoidianas e enfermidades agudas graves (infecções, cetoacidose diabética, eventos vasculares).
A fisiopatologia da CT baseia-se no excesso de hormônios tireoidianos circulantes, seja por excesso de
produção pela tireoide (hipertireoidismo) ou liberação excessiva por tireoide ou induzida por fármacos.

• Existe uma interação complexa de fatores na homeostase da triiodotironina intracelular (T3) no


cérebro, incluindo os níveis circulantes de T4 e T3, a atividade de proteínas transportadoras de
hormônios tireoidianos específicos, mediando o transporte do pró-hormônio T4 pelo cérebro-sangue
barreira e as atividades das deiodinases tireoidianas, em especial D2 e D3. Quando o metabolismo
cerebral da da tiroxina é alterado, os sistemas cruciais de neurotransmissores cerebrais podem ser
afetados, com consequências neuropsiquiátricas.

• Os hormônios tireoidianos exercem seus efeitos nos miócitos cardíacos, no músculo liso vascular e
no endotélio vascular por ações genômicas (fT3) e não genômicas (fT3 e fT4). Enquanto esses
mecanismos controlam efeitos sobre a frequência e ritmo cardíacos, outros efeitos, como alterações
na função autonômica, também podem contribuir para as ações cardiovasculares. Esses últimos
efeitos são mediados pela ativação de genes que controlam a função do músculo cardíaco e a
cronotropia.

• A contratilidade cardíaca melhora a curto prazo, e a longo prazo a massa cardíaca aumenta. No
entanto, se a tireotoxicose for prolongada ou grave, a insuficiência cardíaca pode se desenvolver
frequentemente quando ocorre uma taquiarritmia, como fibrilação atrial (FA). Aumento da idade e
doença cardíaca coronária e valvular preexistente são fatores de risco para FA e suas complicações.
Indivíduos jovens que não têm doença cardíaca previamente conhecida também podem ser
acometidos, embora seja menos frequente.
A apresentação clínica da crise tireotóxica não depende da concentração sérica dos hormônios tireoidianos,
uma vez que eles são semelhantes aos encontrados na tireotoxicose compensada. A crise é decorrente o
aumento súbito de suas concentrações e não de seu valor absoluto.
Dessa forma, acredita-se que a crise ocorra por:

• Súbita elevação das concentrações dos hormônios tireoidianos livres, decorrentes de alterações nas
concentrações de proteínas carreadoras desses hormônios ou da produção de inibidores de ligação do
hormônio tireoidiano a essas proteínas.

• Ativação do sistema nervoso adrenérgico.


• O quadro 1 subdivide os fatores desencadeantes associados ou não ao hipertireoidismo para a Crise
Tireotóxica.
Por hipertireoidismo Não associada ao hipertireoidismo

Autoimune Doenças inflamatórias tireoidianas


Doença de Basedow-Graves Tireoidite subaguda/viral
Fase aguda da Tireoidite Hashimoto
Secreção inapropriada de TSH Uso de amiodarona
Adenoma hipofisário produtor de TSH Radioiodoterapia
Resistência a hormônios tireoidianos Abscessos tireoidianos (raros)

Estímulo extrínseco Origem extratireoidiana


Mola hidatiforme Tireotoxicose factícia ou exógena
Autonomia tireoidiana intrínseca Tecido tireoidiano ectópico (metástase
Adenoma tóxico (Plummer) struma ovarii)
Bócio multinodular tóxico

Quadro 1. Fatores Desencadeantes para Crise Tireotóxica


Fonte: Adaptado de Freitas MC, et al. 2016.

quadc.jpg QUADRO CLÍNICO


• Quadro decorrente do hipertireoidismo: perda de peso (90% dos casos) súbita e expressiva,
exoftalmia e hiperemia conjuntival (doença de Graves), hipertermia, poliúria e polidipsia, bócio com
sopro em topografia de tireoide, cansaço, fraqueza muscular, queda de cabelos, aumento do número
de evacuações, alteração do estado de humor (mania ou depressão), distúrbios menstruais (oligo ou
hipermenorreia).

• Quadro decorrente da hiperestimulação adrenérgica: taquicardia, hipertensão sistólica, tremor


fino de extremidades, palpitações, intolerância ao calor, sudorese, nervosismo, ansiedade,
hiperatividade, pele quente e úmida, dispneia.

• Quadro clínico relacionado ao sistema nervoso central: Sintomas leves como ansiedade e
depressão são comumente observados em pacientes com tireotoxicose. Na crise tireotóxica,
apresentações dramáticas do SNC, que variam de apatia, psicose e status epilético ao coma, já foram
descritas em vários relatos de casos. O prognóstico do coma relacionado à CT é ruim, e tanto o
despertar quanto a morte ocorrem mais comumente nos primeiros 2 dias do início do coma.

examf.jpgEXAME FÍSICO
• Ectoscopia: pele fria e úmida, exoftalmia/proptose ocular, edema periorbital e bócio difuso são
característicos da doença de Graves. Olhar fixo e brilhante é característico da tireotoxicose e não
específico para doença de Graves.

• Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular ou irregular (fibrilação atrial é a arritmia mais
comum), hipertensão sistólica, taquicardia.

• Aparelho neurológico: irritabilidade, olhar fixo e brilhante.


exac.jpgEXAMES COMPLEMENTARES
a. Bioquímica: hemograma, ureia, creatinina, TSH, T4 livre, T3T total, sódio, potássio, função
hepática. Os anticorpos para definição de etiologia de doença de Graves não precisam ser solicitados na
urgência, uma vez que a presença de bócio difuso e exoftalmia já são suficientes para o diagnóstico. É
importante a avaliação da função hepática, pois é comum elevação de transaminases e bilirrubinas.

• Dosagem do TRAb: os ensaios de TRAb tornaram-se mais confiáveis e com menor custo nos
últimos anos. Embora não seja necessária para o diagnóstico, sua dosagem é útil para prever
pacientes em risco de recidiva após a descontinuação de medicamentos antitireoidianos e para
detectar tireotoxicose fetal ou neonatal em mulheres com doença de Graves, uma vez que esses
anticorpos atravessam a placenta.
b. Eletrocardiograma (ECG): fibrilação atrial, taquicardia sinusal.
c. Ultrassonografia de tireoide com doppler: não é necessária na urgência. Mas é o exame que
diferencia a doença de Graves (hipervascularização sanguínea ao doppler, aumento difuso da glândula) da
tireotoxicose induzida pela destruição (diminuição do fluxo sanguíneo).
d. Cintilografia de tireoide: não é feita na urgência, mas distingue nódulos frios de quentes e
caracteriza a etiologia. Doença de Graves irá se apresentar como uma captação difusamente aumentada.
No bócio multinodular tóxico, a captação radioativa de iodo seria normal ou alta com padrão assimétrico e
irregular, e padrão localizado e focal no adenoma tóxico, com captação suprimida no restante tecido
tireoidiano.

diag.jpgDIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico da crise ou tempestade tireotóxica é essencialmente clínico. Não existe um teste laboratorial
específico que identifique tal condição.
Os critérios diagnósticos de crise tireotóxica de Burch e Wartofsky e seus pontos somados apresentam a
seguinte probabilidade:

• Score ≥ 45: diagnóstico de crise tireotóxica


• Score entre 25 e 44: compatível com crise tireotóxica iminente
• Score < 25: diagnóstico de crise tireotóxica pouco provável
A tabela 1 descreve cada critério e sua respectiva pontuação de acordo com Burch e Wartofsky.

Disfunção termorregulatória (T0C) pontos Taquicardia bpm pontos


37,2 – 37,7 5 99-109 5
37,8 – 38,2 10 110-119 10
38,3 – 38,8 15 120-129 15
38,8 – 39,4 20 130-139 20
39,5 – 39,9 25 ≥ 140 25
≥ 40 30

Disfunção gastrointestinal /
Efeitos no SNC pontos pontos
hepática
Ausentes 0 Ausente 0
Leve (agitação) 10
Moderados (delírio, psicose, letargia extrema) 20 Moderada (diarreia / náuseas / dor 10
Graves (convulsões, coma) abdominal) 20
30

Insuficiência Cardíaca Congestiva pontos Fibrilação atrial pontos

Ausente 0 Presente 10
Leve 5
Moderada 10
Grave (edema agudo pulmão) pulmão 15

História precipitante pontos


Negativa 0
Positiva 10

Tabela 1. Critérios diagnósticos de Burch e Wartofsky.


Fonte: Adaptado de Swee DS et al. 2015

trat.jpgTRATAMENTO
a. Objetivos do tratamento: abordagens para a crise tireotóxica são:

1. tratamento direcionado à síntese e secreção do hormônio tireoidiano pela glândula tireoide;


2. redução da distribuição e ação dos hormônios da tireoide já presentes na circulação periférica;
3. identificação da causa precipitante sempre que possível e garantir que não haja contribuição contínua
para a exacerbação da tireotoxicose;
4. terapia de suporte e sintomática para a descompensação sistêmica presente.
O controle da frequência cardíaca e a estabilização hemodinâmica são os pilares iniciais. Quanto mais
precoce a instituição da terapêutica, melhor é o prognóstico dos pacientes com crise tireotóxica. Se o paciente
apresentar história e quadro clínicos compatíveis, não se deve retardar o início do tratamento por aguardar
testes laboratoriais.
Mulheres com hiperêmese gravídica e diagnosticadas com hipertireoidismo de Graves (T4 livre acima do
intervalo de referência ou T4 total acima 150% do valor normal da gravidez, TSH menor 0,01 UI / L e presença
de TRAb) necessitarão de tratamento com drogas antitireoidianas.

b. Opções:

• Betabloqueadores: proporcionam o controle dos sintomas induzidos pela hiperativação adrenérgica


e são de grande importância no tratamento, pois o controle da frequência cardíaca levará à melhora da
função cardíaca global. Entretanto, deverão ser observadas outras situações nas quais existe
contraindicação para o seu uso, como, por exemplo, asma brônquica. Em pacientes com
contraindicações ao uso de betabloqueadores, o diltiazem pode ser uma alternativa. Propranolol é o
medicamento de escolha.

• Tionamidas: essa classe de medicamentos chamados antitireoidianos (DAT) de síntese tem como
objetivo bloquear a formação de hormônios tireoidianos, e possui dois representantes: metimazol
(MMZ) e o propiltiouracil (PTU). Sua ação se inicia cerca de uma a duas horas após sua
administração por via oral, a mais disponível. O propiltiouracil (PTU) é considerado a droga de
escolha na crise tireotóxica (dose 200 mg 8/8 horas), devido ao seu efeito adicional no bloqueio da
conversão periférica do T4 para o T3. Os dois medicamentos podem ser administrados por via
alternativa (retal) quando os pacientes não tiverem a via oral disponível. São indicados apenas
quando a crise tireotóxica tiver como causa o hipertireoidismo. A dose de metimazol recomendada é
40 mg/dia.

• Contrastes radiológicos ou soluções iodadas: ácido iopanoico ou outro contraste radiológico.


Bloqueiam simultaneamente a liberação dos hormônios tireoidianos e a conversão periférica de T4
para T3. Devem ser administrados pelo menos 1 h após a administração das tionamidas.

• Glicocorticoides: administrados com objetivo de reduzir a conversão de T4 a T3. Para pacientes


com hipertireoidismo grave, sem ameaça à vida, esta terapia não é indicada.

• Plasmaférese: tem sido utilizada quando o tratamento tradicional não é bem-sucedido,


especialmente em casos de coma. Isso se justifica porque, com a plasmaférese, também podem ser
removidos outros agressores do SNC (p. ex., autoimune, catecolamina, citocina), além dos hormônios
da tireoide. Os efeitos desta terapia não devem ser avaliados apenas pela redução das concentrações
séricas de T4, uma vez que pode haver extravasamento do plasma para o extravascular com redução
importante ou do extravascular para o plasma com pouca redução. A melhora clínica neurológica e do
choque cardiogênico podem ser melhores preditores de resposta a esta terapêutica.

• Tireoidectomia total: deve ser considerada naqueles pacientes que não respondem ao tratamento e
após estabilização cardiovascular.
A febre deve ser tratada com paracetamol. Os salicilatos devem ser evitados porque aumentam a
concentração livre de T3 e de T4.
Fatores desencadeantes devem ser identificados e tratados, após a estabilização do quadro agudo.
Após a melhora da função tireoidiana, que geralmente ocorre em 24 h, o iodo pode ser gradualmente
descontinuado e os glicocorticoides, diminuídos. DAT e betabloqueadores devem ser ajustados de acordo com
a função tireoidiana. O tratamento definitivo com tireoidectomia ou iodo radioativo é sugerido depois que o
paciente se torna eutireoideo (função tireoidiana normal) ou naqueles que não respondem ao tratamento.

fluxdia.jpgFLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


11209

Fluxograma 1: Resume o quadro clínico e manejo inicial da Crise Tireotóxica.


Fonte: Elaborado pelos autores.

precri.jpgEXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: sexo feminino, 32 anos, 55 kg, apresenta-se ao PS com quadro de hipertermia,
palpitações intensas, agitação e tremores de extremidades em domicílio, durante a madrugada, sendo
conduzida por familiares à unidade de pronto-atendimento. Segundo os familiares, tratava-se de paciente
portadora de doença de Graves, sem tratamento medicamentoso regular.

b. Exame físico: confusa, mal orientada, taquidispneica, com taquicardia e vômitos.

• Ectoscopia: paciente hipocorada, hidratada, anictérica, acianótica, febril (Tax: 38ºC), edema de
membros inferiores e exoftalmia evidente.
• Tireoide: glândula aumentada de tamanho, bócio difuso, sem nódulos à palpação, com presença de
frêmito.

• Aparelho cardiorrespiratório: taquicardia (FC = 140 bpm) e pressão arterial 150 x 80 mmHg.
c. Exames complementares: ECG: taquicardia sinusal, FC: 142 bpm, sem sinais de sobrecarga de
câmaras esquerdas. Exames laboratoriais: hemograma, glicemia e função hepática sem anormalidades.
Função tireoidiana após 12 horas do início do tratamento mostrou: TSH: 0,01, T4 livre: 5,03 e T3T: 2,70
(T4 e T3T aumentados em 3x e 2x o limite superior da normalidade).

d. Prescrição sugerida:

1. Dieta suspensa até melhora neurológica


2. Propranolol 40 mg VO 6 / 6 horas
3. Propiltiuracil 600 mg VO em dose de ataque, seguido por 200 mg 8 / 8 horas
4. Hidrocortisona 100 mg EV 8 / 8 horas
5. Paracetamol 500 mg VO 6 / 6 horas se Tax maior ou igual a 37,8ºC).

discesp.jpgDICAS DO ESPECIALISTA
• A crise tireotóxica tem como sua principal causa a doença de Basedow-Graves e um tratamento
definitivo para esta deve ser oferecido, especialmente se o paciente apresentar quadros recorrentes
desta emergência. As opções de tratamento definitivo para a doença de Graves são terapia com iodo
radioativo e cirurgia.

• O bócio nodular tóxico também merece atenção especial para um tratamento definitivo, já que é alta
a taxa de recidiva de tireotoxicose após a descontinuação da medicação.

• Embora a doença de Graves continue sendo a principal causa de hipertireoidismo em todo o mundo,
a tireotoxicose associada à amiodarona também é uma causa importante devido ao alto uso mundial
dessa medicação. As recomendações atuais enfatizam que a função tireoidiana seja monitorada
regularmente após a prescrição de amiodarona.

• A escolha do tratamento para a doença de Graves difere entre os países. A terapia com iodo
radioativo é frequentemente usada como a primeira terapia na América do Norte. Fora dos EUA, as
tionamidas são preferidas como tratamento primário, enquanto a terapia definitiva é reservada apenas
para pacientes com hipertireoidismo persistente ou recorrente.

• O acidente vascular cerebral embólico relacionado à fibrilação atrial secundária ao hipertireoidismo


é significativamente mais prevalente do que o acidente vascular cerebral embólico relacionado à
fibrilação atrial por causas não tireoidianas. No entanto, a terapia anticoagulante em pacientes com
fibrilação atrial secundária ao hipertireoidismo ainda é debatida. A fibrilação atrial também é
considerada um preditor independente do desenvolvimento de insuficiência cardíaca congestiva em
pacientes com hipertireoidismo.

• Existem várias controvérsias quanto ao manejo ideal da tireotoxicose grave causada por Tireoidite
Subaguda, uma vez que os medicamentos antitireoidianos raramente são eficazes. A administração de
corticosteroides é a alternativa mais recomendada no manejo da maioria dos pacientes. Em situações
agudas, a principal linha de tratamento é a reidratação, betabloqueadores e esteroides.
• O choque cardiogênico parece estar fortemente associado a resultados fatais, sugerindo a necessidade
de monitoramento cardíaco rápido, e a terapia plasmaférese com o objetivo de reduzir rapidamente as
concentrações circulantes de hormônios tireoidianos deve ser considerada para esses pacientes.

refere.jpg REFERÊNCIAS
1. Freitas MC, Mota VC, Souza TBB, Cardoso LRA, Vilar L. Diagnóstico e tratamento da Doença de Graves. In: Vilar L. Endocrinologia
clínica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan Ltda; 2016.
2. De Groot L, Abalovich M, Alexander EK, Amino N, Barbour L, Cobin RH, et al. Management of Thyroid Dysfunction during Pregnancy
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5. De Leo S, Lee SY, Braverman LE. Hyperthyroidism. Lancet. 2016; 388: 906-18.
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in previously healthy young adults. Endocrinol Diabetes Metab Case Rep. 2020; 2020: 19-0132.
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9. Bourcier S, Coutrot M, Kimmoun A, Sonneville R, Montmollin E, Persichini R, et al. Thyroid Storm in the ICU: A Retrospective
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Consideration of Its Distribution Into the Extravascular Space. J Endocr Soc. 2020; 4(4): bvaa023.
2.5
COMA MIXEDEMATOSO
Autora:
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• Coma Mixedematoso (CM): trata-se de uma redução intensa das
concentrações séricas de tetraiodotironina (T4) e sua conversão em
sua forma mais ativa triiodotironina (T3), que geralmente acomete
indivíduos com hipotireoidismo prévio conhecido,
inadequadamente tratados, ou precipitado por eventos agudos ou
ainda como abertura do diagnóstico.

• Trata-se de entidade clínica rara, com incidência de cerca de 0,22


casos/milhão/ano.

• A crise mixedematosa ou CM é definida por sinais e sintomas de


hipotireoidismo acentuados, associados ao rebaixamento do nível
de consciência e hipotermia.

• Apresenta-se com alto índice de mortalidade, podendo atingir até


25 a 60% a despeito do tratamento adequado.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A etiologia mais comum é a Tireoidite de Hashimoto, uma doença
autoimune, em que há uma perda de função das células tireoidianas para a
produção hormonal, gerando uma redução de suas concentrações séricas.
Outras etiologias mais raras são: pós-tireoidectomia e tireoidite de Riedel.
Para que ocorra o CM deve haver um fator desencadeante, situações
clínicas descritas no Quadro 1 ou em pacientes acima dos 65 anos que
habitam ou viajam para áreas de clima frio, onde o aumento do trabalho
metabólico do indivíduo gera sobrecarga de tireoide em mau funcionamento.
Dessa forma, após algum evento precipitante, ocorre redução das
concentrações séricas de T4 e a concentração intracelular de T3.

• A não ativação de triiodotironina (T3) desregula a manutenção da


temperatura corporal, causando disfunção cardíaca e distúrbios na
produção de eritrócitos, associada à redução do metabolismo, da
temperatura corporal, perda do apetite e intolerância ao frio.

• Associado, há alterações em todos os sistemas: diminuição do


débito cardíaco, redução na taxa de metabolismo cardíaco e
neuronal, alteração da permeabilidade vascular, depressão
respiratória, seja por disfunção muscular ou distúrbio do centro
respiratório no controle da concentração de oxigênio e gás
carbônico séricos.
A ocorrência de convulsões no CM pode ter vários mecanismos, embora
o próprio CM possa precipitar a atividade convulsiva. A causa da atividade
epiléptica no hipotireoidismo é desconhecida; acredita-se que o edema
cerebral secundário à expansão do volume de líquido extracelular seja um
dos mecanismos. Isso pode estar relacionado à secreção inadequada do
hormônio antidiurético (ADH) e hiponatremia ou hipoventilação com
encefalopatia pós-anóxica, o que pode precipitar ainda mais a atividade
convulsiva.
A hiponatremia é relatada em até 10% dos pacientes com
hipotireoidismo, embora seja geralmente leve e raramente cause sintomas.
Pacientes com hipotireoidismo têm uma capacidade diminuída de excretar
água livre e não conseguem atingir a diluição máxima da urina. Embora
alguns estudos tenham relatado aumento de ADH em pacientes com
hipotireoidismo, a literatura ainda é inconsistente.

Fatores precipitantes do CM
Hipotermia Insuficiência adrenal

Infecções/sepse Sangramento intestinal

Insuficiência cardíaca Medicações sedativas/trauma


IAM ou AVC Interrupção do tratamento

Quadro 1. Fatores precipitantes do Coma Mixedematoso.


Fonte: Adaptado de Freitas MC et al. 2016

QUADRO CLÍNICO
• Quadro decorrente de redução do metabolismo basal:
intolerância a exercícios, fadiga, adinamia, hipotermia, intolerância
ao frio, síncope ou pré-síncope, diminuição do débito urinário,
cianose.

• Quadro decorrente de comprometimento neurológico:


rebaixamento do sensório, confusão mental, coma nos estágios
graves. Reflexos tendinosos profundos lentificados ou abolidos,
transtornos psiquiátricos como bradipsiquismo, déficit de atenção e
memória, labilidade emocional e depressão, simulando um quadro
de depressão senil. Crises convulsivas focais ou generalizadas
podem decorrer de hiponatremia, hipoglicemia ou hipoxemia.

• Quadro decorrente de comprometimento cardiovascular:


edema de membros inferiores, bradicardia, hipotensão.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: pele infiltrada, carotenêmica e fria, macroglossia,
fácies edemaciada, pseudomadarose, rarefação de pelos corporais e
voz rouca (sinais de hipotireoidismo prévio).

• Aparelho cardiovascular: bradicardia e redução do inotropismo


cardíaco, hipertensão diastólica, redução do volume sanguíneo
efetivo total.

• Aparelho respiratório: disfunção muscular, redução do volume


pulmonar, hipopneia, hipoxemia e hipercapnia, derrame pleural.
• Aparelho gastrointestinal: redução da motilidade intestinal e
constipação, atonia gástrica, megacólon, ascite.

• Aparelho genitourinário: retenção hídrica, hiponatremia e


redução da taxa de filtração glomerular.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Bioquímica: hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio,
função hepática, TSH, T4L, glicemia, perfil lipídico.
b. Eletrocardiograma (ECG): bradicardia sinusal, baixa voltagem,
alterações inespecíficas no segmento ST.
c. Radiografia de tórax: para descartar infecção pulmonar e
derrame pleural.
d. Outros exames (indicações mais restritas e específicas): o
anticorpo mais sensível para o diagnóstico de Tireoidite de Hashimoto é
o Anti-TPO; porém, na urgência, nem sempre está disponível. Deverá
ser levado a posteriori do quadro agudo ao especialista.
Ultrassonografia de tireoide só será solicitada para acompanhamento
posterior pelo especialista.

• A dosagem das concentrações séricas de ACTH e cortisol deve ser


considerada em vista da probabilidade, embora rara, de uma
etiologia hipofisária para hipotireoidismo ou insuficiência adrenal
primária coincidente (síndrome de Schmidt).

DIAGNÓSTICO
• A tríade clássica é o principal critério diagnóstico do coma
mixedematoso: rebaixamento do nível de consciência, hipotermia e
fatores desencadeantes.

• A manifestação cardinal do coma por mixedema é uma


deterioração do estado mental do paciente, variando de confusão a
letargia e, possivelmente, obnubilação.

• O diagnóstico definitivo de coma devido a mixedema não pode ser


feito apenas com base em exames laboratoriais, mas em aspectos
da história, achados físicos e sintomas, a fim de objetivar um
diagnóstico e diferenciar entre os presença de hipotireoidismo
evidente ou grave e CM.

• A hipotermia absoluta (35°C) ou relativa (ausência de febre na


presença de infecção) ocorre por termorregulação deficiente em
quase todos os pacientes, sendo sua intensidade relacionada com a
mortalidade.

• Outros fatores que podem desencadear o CM: medicamentos que


interrompem o resgate de iodo pela tireoide, como o lítio e os
tiocianetos, períodos de inverno rigoroso, hipoglicemia e o uso de
medicamentos que alteram a absorção de levotiroxina, tais como
sulfato ferroso, hidróxido de alumínio, carbonato de cálcio,
colestiramina, sucralfato e inibidores da bomba de prótons.

• Não há regras para o diagnóstico do coma mixedematoso;


portanto, deve-se pressupor quando o paciente apresentar alteração
da consciência com diminuição da temperatura corpórea. É
importante ressaltar que muitos pacientes que desenvolvem o coma
mixedematoso desconhecem o diagnóstico de hipotireoidismo e
que cicatriz cervical, história de radioiodoterapia ou exposição à
radiação elevam o grau de suspeita clínica. Deve-se realizar o
diagnóstico precocemente devido à alta letalidade do quadro.

• A análise laboratorial caracteriza-se por um aumento sérico de


TSH. Porém, este achado pode não ser encontrado em indivíduos
em uso de corticosteroides ou dopamina e em pacientes que
realizam hemodiálise, haja vista que nesses casos pode ocorrer
redução do TSH, assim como em indivíduos com hipotireoidismo
secundário (alteração hipofisária) ou terciário (alteração
hipotalâmica). O T4 total e livre estão reduzidos, enquanto o T3
pode estar normal ou baixo.

TRATAMENTO
a. Objetivos do tratamento: resgatar o estado neurológico, corrigir
desequilíbrio hidroeletrolítico, controlar a temperatura corporal e
restaurar as concentrações séricas dos hormônios tireoidianos.

• As principais considerações sobre a reposição hormonal da


tireoide em pacientes com CM são: a absorção e distribuição da
preparação hormonal administrada, o início da ação e a eficácia e
segurança do regime de tratamento. Comparado com a
administração de T3, a terapia T4 proporciona um início de ação
mais estável, suave e lento, o que deve reduzir os efeitos colaterais
cardiovasculares adversos. Portanto, a terapia T4 é considerada o
tratamento principal do CM. A administração parenteral de T4 é a
via preferida de administração devido ao comprometimento da
função gastrointestinal por edema e ao comprometimento do nível
de consciência nesses pacientes.

• No Brasil, a formulação venosa de levotiroxina não é facilmente


disponível. Caso esteja disponível, a dose de ataque deverá ser de
200 e 500 μg IV e a dose de manutenção de 50-100 μg/dia IV.

• No entanto, a reposição de levotiroxina (LT4) via oral é a mais


utilizada, 300 a 500 μg/dia, ou duas vezes a dose de manutenção
(por 4 a 7 dias). Em todos os esquemas deve haver substituição da
LT4, assim que alcançada estabilidade clínica, para a dose usual de
manutenção (adulto 1-2 μg/kg/dia, média 1,6 μg/kg/dia).

• Devido à possibilidade da existência de um estado de


hipocortisolismo por redução da função do eixo hipotálamo-
hipofisário-adrenal, deve-se utilizar conjuntamente a
hidrocortisona 50-100 mg por via endovenosa a cada 6 ou 8 horas
para evitar a precipitação de uma crise adrenal, com retirada
gradual após aproximadamente 7 dias.

• A terapia concomitante com hidrocortisona deve ser administrada


até que a insuficiência adrenal seja descartada.
b. Tratamento de suporte: regulação da temperatura, estabilização
ventilatória e hemodinâmica, normalização dos eletrólitos e da
glicemia, através de hidratação com solução glicosada a 5-10% e
solução fisiológica 0,9%, ou salina hipertônica em casos de
hiponatremia. As drogas vasoativas e inotrópicas não são de escolha,
pois podem provocar disfunção rítmica.

• Em casos de instalação lenta do coma, o suporte ventilatório é


feito com o uso de máscaras de oxigênio. Em casos mais graves,
pode ser necessária intubação orotraqueal (IOT) e ventilação
mecânica (VM).
c. Outras medidas de suporte: leito em posição de Trendelemburg
ou horizontal, evitar broncoaspiração e controlar a função cardíaca após
a reposição hormonal tireoidiana.

• Em pacientes idosos, com arritmias ou doenças coronarianas, as


doses de levotiroxina devem ser aumentadas gradualmente, sendo
importante a monitorização cardíaca adequada.

• Se a suspeita de infecção for evidente, pode-se iniciar a terapia


com antibióticos de amplo espectro de forma prévia até que se
encontre o foco infeccioso. A temperatura corporal deve ser
corrigida de forma gradual, e o uso de cobertores é válido para a
manutenção; porém, deve-se atentar para evitar a vasodilatação,
que poderá agravar a hipotensão arterial.

• Quando a concentração sérica de sódio é inferior a 120 mEq /L, a


administração lenta de solução salina hipertônica é justificada com
cuidadosa monitoração contínua. Uma correção muito rápida pode
resultar em piora da função do sistema nervoso central devido à
mielinólise pontina central. Na maioria dos casos, somente solução
salina fisiológica ou com glicose consegue abranger e repor a
depleção de volume.

• Ainda permanece controverso se o CM deve ser tratado com a


administração de LT4 isoladamente ou com uma combinação de
LT4 e LT3. O tratamento com LT4 tem um início de ação lento,
com relativamente poucos eventos adversos, enquanto T3 é um
hormônio ativo no corpo com ação imediata, porque sua afinidade
pelo receptor nuclear é 10 a 20 vezes maior que a de T4, e também
porque T3 atinge um nível máximo em 2 a 4 horas após a
administração. Efeitos benéficos desse tratamento combinado
sobre sintomas neuropsiquiátricos são esperados, porque o T3 pode
atravessar a barreira hematoencefálica. Infelizmente no Brasil
temos T3 disponível apenas por manipulação.

• Doses altas de LT3 (> 75 mg/dia) foram associadas a resultados


fatais, porém poucos estudos utilizaram a administração de LT4 e
LT3, sendo a dose recomendada e segura de T3 ainda
desconhecida.

• Particularmente em pacientes idosos, a terapia de reposição


hormonal da tireoide parece ser mais segura em doses mais baixas
do que as convencionais, cerca de metade da dose usada
habitualmente no CM com a mesma eficácia.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1: Resume o quadro clínico e manejo inicial do CM.
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: 70 anos, sexo feminino, 62,5 kg, com
hipotireoidismo de longa data em uso inconstante de levotiroxina 100
μg VO uma vez por dia, em jejum. Acompanhante relata que a paciente
estava em tratamento há 5 dias para pneumonia, porém sem adesão à
terapêutica. Esse diagnóstico foi firmado pela presença do quadro
clínico de tosse purulenta por 3 dias, T de 38,7°C (aferida), RX de tórax
evidenciando opacificação em lobo médio do pulmão direito e
linfocitose de 15600/mm3 com desvio à esquerda. A terapêutica
ambulatorial prescrita foi amoxicilina 500 mg VO por 7 dias +
azitromicina 1 g VO 1x/dia por 5 dia.

b. Exame físico: estado de confusão mental, porém responsiva,


temperatura de 35,2°C, FC de 52 bpm, PA: 105 x 85 mmHg e FR de 10
ipm, apresentando SatO2 de 88%.

c. Prescrição sugerida:

1. Dieta suspensa, passar SNE


b. Dados vitais de 2/2 horas
c. Levotiroxina 200 mcg VO em dose de ataque
d. Hidrocortisona 100 mg + SF 0,9% 100 mL EV e depois
Hidrocortisona 50 mg EV 8/8 horas
e. SF 0,9% 1000 mL + SGH 50% 40 mL – EV a 60 gotas/minuto.
f. Levofloxacino 500 mg VO 1 cp ao dia por 14 dias (D1).
g. Dipirona 2 mL + ABD 10 mL EV 6/6 horas se dor ou febre

DICAS DO ESPECIALISTA
• A reposição de iodo, amplamente difundida na mídia leiga como
lugol, não tem indicação no hipotireoidismo ou qualquer evidência
científica para seu uso como medida preventiva ou tratamento de
patologias tireoidianas.

• Pacientes com hipotireoidismo já diagnosticado que desejam


engravidar devem ser orientadas a uma ingestão média de iodo de
150 µg/ d. Tanto quanto possível antes da gravidez e durante a
gravidez e a amamentação, as mulheres devem aumentar sua
ingestão diária de iodo para 250 µg, em média, pela alimentação
ou suplementação, quando indicada por médico especialista.
• As vitaminas pré-natais devem conter de 150 a 200 µg de iodo na
forma de iodeto ou iodato de potássio. Idealmente, a
suplementação deve ser iniciada antes da concepção. As
preparações contendo suplementos de ferro devem ser separadas da
administração do hormônio tireoidiano por pelo menos 4 horas.

• A apresentação típica do CM é em mulheres, na faixa etária de 60


a 85 anos, tipicamente no inverno, quando as temperaturas são
baixas. O clima severamente frio é apenas um dos muitos fatores
precipitantes possíveis que podem converter o estado clínico do
paciente de hipotireoidismo em CM.

• As doenças cardiovasculares são as comorbidades mais frequentes


observadas nos pacientes com CM. O rápido aumento das
concentrações séricas de hormônio tireoidiano no hipotireoidismo
de longa duração está associado a altos riscos de indução de infarto
do miocárdio ou arritmia. Dessa forma, recomenda-se que seja
feito o aumento gradual das concentrações plasmáticas de T4 e T3.

• Em idosos que serão submetidos a cirurgias, a avaliação pré-


operatória do hipotireoidismo é crucial para reduzir as
complicações cirúrgicas e anestesiológicas. O trauma cirúrgico
pode influenciar a atividade do eixo hipófise-tireoide, e os
hormônios tireoidianos são secretados após a cirurgia como
resposta ao estresse. Além disso, os agentes anestésicos, em vez do
estresse cirúrgico, podem ser considerados a principal causa das
alterações nas concentrações plasmáticas de hormônio tireoidiano
durante o período intraoperatório.

REFERÊNCIAS
1. Freitas MC, Lima LCH. Diagnóstico e tratamento do hipotireoidismo. In: Vilar L,
Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan Ltda; 2016.
2. Freitas MC, Torres MR, Nobrega MBN, Ramos AJS. Tireoidites: diagnóstico e tratamento.
In: Vilar L, Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan Ltda; 2016.
3. De Groot L, Abalovich M, Alexander EK, Amino N, Barbour L, Cobin RH et al.
Management of Thyroid Dysfunction during Pregnancy and Postpartum: An Endocrine
Society Clinical Practice Guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2012; 97: 2543-65.
4. Ylli D, Klubo‐Gwiezdzinska J, Wartofsky L. Thyroid emergencies. Pol Arch Intern Med.
2019; 129: 526-34.
5. Sihindi S, Gunatilake C, Bulugahapitiya U. Myxedema Crisis Presenting with seizures. A
Rare Life-Threatening Presentation—A Case Report and Review of the Literature. Case Rep
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6. Ueda K, Kiyota A, Tsuchida M, Okazaki M, Ozaki N. Successful treatment of myxedema
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7. Ono Y, Ono S, Yasunaga H, Matsui H, Fushimi K, Tanaka Y. Clinical characteristics and
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8. Vacant M, Biondi A, Basile F, Ciun R, Luca S, Di Saverio S, et al. Hypothyroidism as a
Predictor of Surgical Outcomes in the Elderly. Front. Endocrinol. 2019; 10: 258.
9. Charoensri S, Sriphrapradang C, Nimitphong H. Split high-dose oral levothyroxine treatment
as a successful therapy option in myxedema coma. Clin Case Rep. 2017; 5(10): 1706-11.
10. Gish DS, Loynd RT, Melnick S, Nazir S. Myxoedema coma: a forgotten presentation of
extreme hypothyroidism. BMJ Case Rep. 2016; 2016: bcr2016216225.
2.6
CORTICOIDES – DOSES E
EQUIVALÊNCIAS
Autoras:
Beatriz Francisco Barbosa Rodrigues
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• Adrenais ou suprarrenais: são duas glândulas localizadas no
retroperitônio, ocupando o pólo superior dos rins bilateralmente,
peso médio estimado em 8 a 10 gramas em um indivíduo adulto,
histologicamente constituídas por duas estruturas principais, o
córtex e a medula.

• Córtex: dividida em zona glomerular (15% do córtex – produtora


de mineralocorticoides), zona fasciculada (75% do córtex –
produtora de glicocorticoides) e zona reticulada (10% do córtex –
produtora de androgênios).

• Medula: possui apenas 1 camada e é responsável pela produção


das catecolaminas.

• Corticoides (CT): são hormônios esteroides produzidos no córtex


das adrenais essenciais para a manutenção de várias funções
metabólicas e homeostáticas. Estão divididos em ação
mineralocorticoide, glicocorticoide e mista.

• Ação mineralocorticoide: participam do equilíbrio


osmorregulador.
• Ação glicocorticoide: controlam o metabolismo de proteínas e
lipídeos, reação inflamatória e resposta ao estresse.

EFEITOS DOS GLICOCORTICOIDES


Os glicocorticoides são hormônios que possuem ações metabólicas,
como estímulo ao catabolismo lipídico, produção hepática de glicose,
atuações sobre o crescimento, atividade anti-inflamatória e metabolismo do
cálcio. Eles são secretados na forma livre, mas circulam no plasma ligado a
proteínas: globulina ligadora de corticosteroides (CBG) e albumina, e as
ligações a esses transportadores têm a função de carrear as moléculas aos
órgãos-alvo. Cerca de 96% do cortisol circulante está ligado à CBG.
Os glicocorticoides promovem a gliconeogênese no fígado, enquanto no
músculo esquelético e no tecido adiposo branco promovem a diminuição da
captação e utilização de glicose, exercendo ação contrarreguladora à
insulina, ou seja, causando resistência insulínica. Os glicocorticoides
também influenciam as reações imunes e inflamatórias, a regulação da
pressão arterial e a função cognitiva.
A secreção de maiores concentrações de cortisol durante o estresse
fisiológico é um mecanismo protetor vital e é essencial para a
sobrevivência.
Os glicocorticoides endógenos e farmacológicos exercem efeitos
importantes nos processos inflamatórios e imunológicos. Os seus receptores
são expressos por quase todas as células do corpo humano; contudo, os
efeitos variam de acordo com cada célula. Os glicocorticoides são capazes
de inibir a inflamação, promover resolução da resposta inflamatória e
regular a imunidade adaptativa.

EFEITOS SOBRE O EIXO HIPOTÁLAMO-


HIPÓFISE-ADRENAL
Os glicocorticoides (cortisol e corticosterona) são hormônios esteroides
secretados em grandes quantidades (10 a 15 mg de cortisol/dia) da zona
fasciculada do córtex adrenal. O cortisol, o glicocorticoide primário em
humanos, é secretado do córtex adrenal para a circulação periférica, sob o
controle do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), de maneira circadiana
e relacionada ao estresse. As alças clássicas de retroalimentação endócrina
modulam a secreção de glicocorticoides (GC) através de um mecanismo
fortemente regulado, envolvendo as três glândulas.
O controle hormonal da suprarrenal inicia-se com ação do Hormônio
Liberador de Corticotrofina (CRH), hormônio hipotalâmico que, através do
sistema porta hipofisário, chega à hipófise (ou glândula pituitária anterior) e
a estimula a produção de Hormônio Adrenocorticotrófico (ACTH). O
ACTH é transportado até os receptores adrenais, onde estimula a produção
dos corticosteroides.
Os glicocorticoides exercem uma atividade supressora sobre o CRH e
ACTH pelo mecanismo de feedback negativo. Entretanto, é complicado
prever o desenvolvimento do grau da supressão de cada organismo.
Considera-se a ocorrência de supressão clínica significativa do eixo HHA
em pacientes que receberam corticosteroides em doses equivalentes a 10-20
mg de prednisona/dia, no período de 21 dias ou mais.

INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES
a. Indicações: afecções dermatológicas, asma brônquica, doenças
linfoproliferativas, insuficiência adrenal, inflamações oculares, HIV,
doenças do colágeno, síndrome da angústia respiratória (pré-parto),
estabilização hemodinâmica na sepse, imunossupressão intencional
(p.ex., transplantados), artrite reumatoide, distúrbios neuromusculares
(paralisia facial, polirradiculopatias), trauma raquimedular, doença de
Crohn e outras.

• Choque séptico: embora vários estudos e metanálises importantes


tenham avaliado o uso de corticosteroides no choque séptico,
muitas questões permanecem em aberto, devido à heterogeneidade
dos resultados, principalmente em relação à mortalidade.
A maioria dos guidelines recomenda a terapia com hidrocortisona em
baixas doses em pacientes com choque séptico associado a outro fator
adicional (não cardiovascular) indicador de falência do órgão e que estejam
em uso de vasopressores em doses moderadas a altas (superior a 30 μg/min
de noradrenalina), para manter a estabilidade hemodinâmica.
Se a indicação for comprovadamente necessária, sugere-se
hidrocortisona (isolada) em doses de 50 mg IV a cada 6 horas por 7 dias ou
até que os vasopressores não sejam mais necessários para manter a
estabilidade hemodinâmica (ou redução importante da dose de vasopressor).
A mesma dose de corticosteroides pode ser cautelosamente considerada
para reduzir a duração do choque em pacientes com choque séptico de
duração prolongada, embora não seja recomendado o uso rotineiro, devido à
ausência de benefício consistente da mortalidade associado à redução da
duração do choque.

• Gestação e lactação: prednisona e prednisolona são preferidas


quando se faz necessário o uso de corticosteroides, pois
quantidades mínimas são transferidas para o feto devido ao
extenso metabolismo placentário. Além disso, cruzam-se para o
leite materno em baixas concentrações e podem ser usados em
mulheres que amamentam. É recomendado evitar a amamentação
dentro de 4 horas após a administração do medicamento, quando a
dose for superior a 20 mg/dia.
Glicocorticoides como a betametasona e dexametasona são reservados
para o tratamento fetal porque atravessam facilmente a placenta. O uso
desses medicamentos durante a gravidez aumenta o risco de complicações,
incluindo parto prematuro, RCIU, hipertensão materna e diabetes
gestacional.

b. Contraindicações: pacientes com infecção fúngica sistêmica.

• Cuidados com a imunossupressão (vacinas): usuários que fazem


uso de terapia com CT devem ser vacinados com intervalo de,
pelo menos, três meses após a suspensão da droga, quando
considerada dose imunossupressora (> 2 mg/kg/dia de prednisona
– crianças, e acima de 20 mg/kg/dia – adultos) por tempo
superior a 14 dias. O uso de corticoides por via inalatória não
constitui contraindicação para vacinação.

EFEITOS COLATERAIS
O uso dos corticosteroides em altas doses, por longos períodos de tempo
ou repetidamente, pode aumentar o risco de complicações.
Além disso, o uso concomitante de outras drogas pode interferir nos
níveis séricos de CT. Cetoconazol e eritromicina aumentam sua
concentração sérica e sua ação por inibição do metabolismo hepático
(citocromo P 450), enquanto os anticonvulsivantes e a rifampicina
diminuem sua concentração e ação por indução das enzimas hepáticas.
Outras drogas como antiácidos, anti-histamínicos H2 (cimetidina) e
inibidores da bomba de prótons podem prejudicar a absorção dos
corticosteroides orais.

a. Efeitos no Metabolismo Intermediário

• Estímulo da gliconeogênese hepática ao sensibilizar enzimas


gliconeogênicas (fosfoenolpiruvato carboxinase e glicose-6-
fosfatase).

• Aumento da resposta hepática ao glucagon (hormônio


gliconeogênico) e aumento da liberação de substratos para a
gliconeogênese a partir dos tecidos periféricos, principalmente
músculos.

• Inibição da captação periférica de glicose no músculo e no tecido


adiposo resultando em um estado de resistência insulínica.

• Aumento da lipólise, com liberação de glicerol e ácidos graxos


livres. Apesar de os glicocorticoides serem lipolíticos, quando em
excesso, levam classicamente ao aumento da deposição de
gordura, o que pode ser explicado por maior apetite, provocado
pela presença de níveis elevados desses esteroides e pelos efeitos
lipogênicos da hiperinsulinemia que ocorre nessa situação.

• Elevação dos níveis séricos de colesterol e triglicérides


decorrente da elevação das lipoproteínas de baixa densidade
(VLDL e LDL).
• Redução da síntese proteica corporal devido à ação desses
fármacos sobre a expressão do DNA e RNA.

• Agravamento dos fatores relacionados à aterosclerose, incluindo


hipertensão arterial, resistência à insulina, intolerância à glicose,
hiperlipidemia e obesidade centrípeta.

• Pacientes com síndrome de Cushing sem tratamento têm taxa de


mortalidade quatro vezes maior por complicações vasculares,
como doença coronariana, insuficiência cardíaca e infarto do
miocárdio. Os fatores de risco para aterosclerose persistem por
pelo menos cinco anos após a normalização do cortisol sérico na
síndrome de Cushing, efeito que parece ser o mesmo em pacientes
tratados com corticosteroides por longos períodos.

b. Efeitos no balanço hidroeletrolítico

• Cálcio: O metabolismo do cálcio sofre ação dos corticosteroides


em diferentes localizações, como intestino, rins e remodelação
óssea.

• No intestino, há diminuição da absorção do cálcio por inibição do


transporte ativo transcelular, devido à diminuição da síntese de
proteínas ligadoras do cálcio.

• Aumento da excreção, devido à maior carga filtrada de cálcio


(por aumento da reabsorção óssea ou ao efeito vasodilatador dos
corticosteroides, levando ao aumento do fluxo sanguíneo renal e
da taxa de filtração glomerular), e/ou a redução das proteínas
ligadoras de cálcio, dependente de vitamina D, presentes nas
células tubulares. Esse efeito renal associado ao intestinal induz
ao hiperparatireoidismo secundário.
• Sobre a remodelação óssea, ocorre o aumento da reabsorção
devido ao hiperparatireoidismo secundário e, também, um efeito
estimulante dos glicocorticoides sobre a função e a produção
(transitória) de osteoclastos; a formação óssea sofre redução de
30% em cada ciclo. A osteoporose é mais frequente em indivíduos
que tomam doses superiores a 7,5 mg de prednisona/dia por
período superior a três meses ou outros corticosteroides em doses
equivalentes. A osteoporose ocorre em aproximadamente 40% dos
indivíduos tratados com corticosteroide por longos períodos. É
mais comum em crianças, adolescentes e mulheres pós-
menopausadas.

• Sódio e potássio: Aumento da excreção, devido aos efeitos na


produção do peptídeo atrial natriurético e no fluxo glomerular
renal (vasodilatação das arteríolas aferentes). A aldosterona, um
mineralocorticoide, tem ação de absorção de sódio e excreção de
potássio. Dentre os glicocorticoides, o maior efeito
mineralocorticoide é obtido com a fludrocortisona.

c. Efeitos no tecido conjuntivo


Inibição dos fibroblastos, ocasionando diminuição do colágeno.
Consequentemente, pode gerar adelgaçamento da pele, púrpuras,
equimoses, estrias e distúrbios de cicatrização.

d. Efeitos cardiovasculares
Pacientes com hipercortisolismo, endógeno ou exógeno (iatrogênico),
demonstram alta morbimortalidade cardiovascular, principalmente se o
diagnóstico for atrasado. As comorbidades cardiovasculares e metabólicas
induzidas pelo hipercortisolismo incluem hipertensão, resistência insulínica,
dislipidemia e obesidade.
A alta prevalência de fatores de risco cardiovascular leva ao aumento da
taxa de eventos cardiovasculares e mortalidade. Esse risco é reduzido,
embora não revertido, mesmo após o tratamento bem-sucedido do
hipercortisolismo.
A hipertensão induzida pelo hipercortisolismo é uma doença
multifatorial que envolve principalmente a ativação dos receptores
mineralocorticoides e glicocorticoides, sistema renina-angiotensina, sistema
nervoso simpático e comprometimento do equilíbrio entre vasodilatadores e
vasoconstritores. A aldosterona e o cortisol têm uma afinidade semelhante
ao nível dos receptores mineralocorticoides, que são expressos
principalmente nos rins.

e. Necrose avascular
Os efeitos ósseos acarretam hipertensão intraóssea, levando à isquemia e
necrose, provavelmente por hipertrofia dos lipócitos locais.
Associadamente, ocorre apoptose dos osteoblastos. Vários pacientes ainda
apresentam trombofilia ou hipofibrinólise, resultando na oclusão trombótica
do retorno venoso do osso, diminuição da perfusão arterial e infarto,
consequentemente. Clinicamente, manifesta-se com dor e limitação do
movimento em uma ou mais articulações.

f. Alterações imunológicas gerais de imunossupressão

• Tuberculose: Os corticosteroides alteram as reações de


hipersensibilidade tardia pela inibição dos linfócitos e monócitos.
Doses mínimas diárias de 15 mg de prednisona suprimem a
resposta ao teste tuberculínico (PPD), que deve ser realizado antes
de iniciar o uso do corticosteroide, assim como a contagem de
células CD4 e radiografia de tórax. Está bem documentada a
associação da tuberculose com o uso de corticosteroides em doses
imunossupressoras (iguais ou superiores a 2 mg/kg/dia), e em
doses baixas a incidência aumentada de infecções estaria mais
relacionada quando esse uso é associado ao de outros
medicamentos imunossupressores (metotrexate, por exemplo).

• Estrongiloidíase: As complicações são mais frequentes nas


formas generalizadas. Uma vez que a infecção pelo Strongyloides
stercoralis pode permanecer assintomática por décadas após a
exposição, é importante lembrar que uma alteração no estado
imunológico pode transformar uma infecção previamente
assintomática em infecção disseminada. Portanto, deve-se
descartar a presença de infecção por Strongyloides stercoralis nos
pacientes em programação de corticoterapia sistêmica prolongada
e, quando diagnosticada, deve ser prontamente tratada.
A eosinofilia é achado frequente, mas sua ausência não descarta a
doença, visto que em pacientes imunossuprimidos essa alteração
laboratorial está mascarada.
Sorologias para o diagnóstico, em populações de alta prevalência, são
pouco úteis devido à baixa especificidade e, portanto, não utilizadas. O
método mais sensível no Brasil é a cultura das fezes em placa de Ágar, o
qual demonstrou eficácia em 93,9% dos casos da infecção, sendo esta
técnica a de escolha, especialmente nos indivíduos imunossuprimidos.

g. Efeitos em outros sistemas

• Gastrointestinais: aumento da cloridria, risco de úlcera péptica.


• Oculares: aumento da pressão intraocular e catarata (se uso por
longo prazo e altas doses), devido à ligação às proteínas do
cristalino.

• Neurológicos: euforia, labilidade emocional e depressão. Outras


alterações menos comuns são déficits cognitivos (memória e
concentração) e, raramente, psicose e comportamento
hipercinético ou maníaco.

• Endocrinológicos: pode ocorrer por efeito central na supressão


do eixo tireoidiano e periférico na inibição da conversão de T4 em
T3 ativo (inibição da 5’deiodinase). Também como ação central
inibem o feedback do FSH e LH e do Hormônio Liberador de
Gonadotrofinas (GnRH), podendo causar amenorreia.

• Cushing iatrogênico: ocasionado pelo uso crônico de doses altas


e excessivas, manifesta-se por: redistribuição lipídica (aumenta da
gordura abdominal), edema de face (fácies Cushingoide),
distúrbios hidroeletrolíticos, insuficiência cardíaca, hipertensão
arterial, imunossupressão indesejada, calciúria, osteoporose,
osteopenia, raquitismo (em crianças), hiperparatireoidismo
secundário, degradação de massa muscular, sintomas
gastrointestinais, distúrbios do humor e psiquismo, inibição de
fibroblastos, hipersensibilidade, e o uso ocular pode levar à
glaucoma e/ou catarata.
O Cushing iatrogênico é clinicamente indistinguível do Cushing
endógeno.

ACOMPANHAMENTO CLÍNICO
Deve-se investigar histórico pessoal e familiar de diabetes, hipertensão,
hiperlipidemia, glaucoma, tuberculose e doenças que cursam com
imunossupressão ou infecções sistêmicas.
Anamnese e exame físico detalhados para afastar infecções e possíveis
reativações de quadros em latência. Avaliar pressão arterial e peso do
paciente, glicemia em jejum, colesterol e triglicerídeos.
Avaliação oftalmológica, PPD, raio X de tórax, hemograma, eletrólitos,
densitometria óssea e fezes com cultura em placas de Ágar devem sempre
ser realizadas quando for necessário tratamento prolongado, pois diminui
e/ou minimiza efeitos adversos ou iatrogênicos.
Durante o tratamento com os corticoides, deve sempre ser realizada uma
avaliação oftalmológica para detecção de catarata e glaucoma, inicialmente
a cada três a seis meses no primeiro ano, e depois a cada seis a doze meses
ou segundo orientação do oftalmologista. Alterações oculares podem surgir
principalmente em pacientes com corticoterapia por mais de um ano com
doses superiores a 10 mg/dia de prednisona. Deve-se questionar o paciente
sobre sintomas de poliúria, polidipsia, dor abdominal, febre, distúrbios do
sono e efeitos psicológicos; avaliar curvas de crescimento em crianças a
cada três meses; dosar eletrólitos, glicemia, colesterol, triglicerídeos e
pesquisa de sangue oculto nas fezes após um mês de tratamento e, depois, a
cada três a seis meses. Realizar densitometria óssea nos pacientes com
tratamento por três meses ou mais, a cada seis a doze meses.

ESQUEMA DE SUSPENSÃO
O desmame deve ser realizado de acordo com a doença de base e o grau
de supressão gerada sobre o eixo HHA. Suspensão abrupta não pode ser
realizada, devido ao risco potencial de insuficiência adrenal se o paciente
estiver em uso por mais de 3 semanas. Orienta-se que o esquema de
suspensão ou desmame (redução da dose) seja individualizado de acordo
com o paciente, embora existam algumas recomendações gerais a serem
seguidas:

1. Quanto à escolha do corticosteroide apropriado para a doença:

• Use corticosteroides de duração intermediária de ação


(prednisona) ou curta (hidrocortisona).

• Se for utilizada prednisona, são preferíveis doses com esquemas


únicos de manhã ou de dia, alternando os dias para promover a
recuperação.

• Quando a hidrocortisona é usada e principalmente quando atingir


doses fisiológicas, deve ser dividida em 2 doses (2/3 da manhã e
1/3 da dose tarde noite)

2. A doença subjacente determina a taxa de desmame de


corticosteroides até atingir doses fisiológicas:

• Sempre que disponível, use diretrizes ou recomendações


específicas para doença subjacente.

• Se não houver diretrizes específicas, considere o risco de


reativação: se houver um risco ou não puder ser descartado, os
corticosteroides devem ser reduzidos 25% por semana com
monitoramento de parâmetros de controle de doenças e em
conjunto com o especialista.

• Se não houver risco, pode-se reduzir para doses fisiológicas mais


rápidas. A partir de sintomas de insuficiência, aumentar a dose ao
mínimo que possa evitá-los, mantendo essa dose por uma semana
e depois continuar um declínio mais lento (20-25% a cada 4-7
dias).

3. Da dose fisiológica à suspensão:

• Uma vez atingida a dose fisiológica, mantenha por 7-10 dias.


• O próximo passo é reduzir a dose pela metade: hidrocortisona
fracionada em 2 doses com maior porcentagem de manhã (2/3);
prednisona: mesma dose em dias alternados.

• Nesta fase, o monitoramento de sintomas compatíveis com


insuficiência adrenal é muito importante.

• Se o paciente tolerar bem a dose, pode ser suspenso após 7-10


dias.

4. Se o paciente apresentar sintomas de insuficiência adrenal durante


o desmame, a dose deve ser restabelecida antes de 7 a 10 dias. Em
seguida, reiniciar a redução mais lentamente com monitoramento
de sintomas.

5. Se o paciente apresentar sintomas de insuficiência antes de


interromper o tratamento com corticosteroide, o tratamento deve
ser restabelecido em doses fisiológicas.

6. Quanto à avaliação da função adrenal ao interromper o


tratamento:

• A avaliação bioquímica é recomendada em qualquer paciente


com sintomas de insuficiência adrenal (mal-estar geral, letargia,
tonturas, astenia, artralgia, cefaleia, mudanças de humor e
labilidade emocional) e/ou insuficiência adrenal e em pacientes
com patologias de base com grande comorbidade.
• Considerar avaliação bioquímica, especialmente em pacientes
que receberam tratamento com alto risco de supressão do eixo
HHA (ver capítulo de Insuficiência Adrenal).

DOSES E EQUIVALÊNCIAS
Dose Meia-Vida
Atividade Atividade
Fármaco Equivalente biológica
Glicocorticoide Mineralocorticoide
(mg) (horas)

Curta ação
Cortisona 25 0,8 2+ 8 - 12

Hidrocortisona 20 1 2+ 8 - 12

Média ação
Prednisona 5 4 1+ 24-36

Prednisolona 5 4 1+ 24-36

Metilprednisolona 4 5 0 24-36

Triancinolona 4 5 0 24-36

Fludrocortisona 2 10 400 12-36

Deflazacort 6 3,5 0,25 24-36

longa ação
Dexametasona 0,75 20-30 0 36-54

Betametasona 0,75 20-30 0 36-54

Tabela 1. Descreve os fármacos disponíveis, suas doses e características


farmacocinética.
Fonte: Adaptado de Vilar.11

DICAS DO ESPECIALISTA
• Todos pacientes devem portar cartões de emergência quando
estiverem em uso crônico de CT.

• Pulseiras/colares de identificação de alerta médico também são


necessários para alertar os profissionais médicos sobre a
necessidade de tratamento imediato com glicocorticoide
parenteral no caso de uma crise adrenal e consciência reduzida.

REFERÊNCIAS
1. Akalestou E, Genser L, Rutter GA. Glucocorticoid Metabolism in Obesity and Following
Weight Loss. Front Endocrinol. 2020; 11: 59.
2. Cain DW, Cidlowski JA. Immune regulation by glucocorticoids. Nat Rev Immunol.
2017;17(4): 233-47.
3. Leong SH, Shander S, Ratnasingam J. Predicting recovery of the hypothalamic-pituiatary-
adrenal axis after prolonged glucocorticoide use. Endocr Pract. 2018; 24(1): 14-20.
4. Ministério da Saúde (BR). Manual de Normas e Procedimentos para Vacinação / Ministério
da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância das Doenças
Transmissíveis. Brasília: Ministério da Saúde; 2014.
5. Sammaritano LR. Management of Systemic Lupus Erythematosus During Pregnancy.
Annual Review of Medicine. 2017; 68(1): 271-85.
6. Constanzo M. Corticoterapia prolongada. Recomendaciones para la suspensión de los
glucocorticoides sistémicos. Med Infant. 2019; 26(3): 327-31.
7. Dineen R, Martin-Grace J, Thompson CJ, Sherlock M. The management of glucocorticoid
deficiency: Current and future perspectives, Clin Chim Acta. 2020; 505: 148-59.
8. Manosroi W, Kosachunhanan N, Atthakomol P. Clinical and biochemical factors to predict
biochemical adrenal insufficiency in hospitalized patients with indeterminate cortisol
levels: a retrospective study. BMC Endocr Disord. 2020; 20: 24.
9. Li D, El Kawkgi OM, Henriquez AF, Bancos I. Cardiovascular risk and mortality in patients
with active and treated hypercortisolism. Gland Surg. 2020; 9(1): 43-58
10. Yerke J, Strnad K, Bauer SR. Corticosteroids for Septic Shock: Another Chapter in the
Saga. Hosp Pharm. 2020 Apr;55(2):135-142. .
11. Vilar L, Czepieleweski MA, Faria TMM, Bruno OD. Diagnóstico e diagnóstico diferencial
da Síndrome de Cushing. In: Vilar L, Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan Ltda; 2016.
2.7
CONTROLE GLICÊMICO INTRA-
HOSPITALAR
Autoras:
Beatriz Francisco Barbosa Rodrigues
Débora Gonçalves da Silva

DEFINIÇÕES
• Hiperglicemia intra-hospitalar: caracteriza-se a hiperglicemia
intra-hospitalar por uma glicemia aleatória, com valor máximo de
até 180 mg/dL, uma complicação comum e por vezes
negligenciada. Hiperglicemia intra-hospitalar aguda é uma
condição comum nos doentes críticos e não críticos, com ou sem
diagnóstico prévio de diabetes mellitus.

• Tal alteração se desenvolve principalmente devido ao estresse


metabólico agudo da doença ou do trauma, após procedimentos
cirúrgicos ou efeito hiperglicemiante de medicamentos em uso.
Entretanto, a elevada prevalência de hiperglicemia em pacientes
hospitalizados pode ser reflexo de outros fatores, como o alto
índice de diabéticos não diagnosticados, ou relacionada ao próprio
diabetes, que cursa com complicações cardiovasculares, acidente
vascular cerebral e insuficiência renal, ou seja, condições que
cursam com maior necessidade de internações.

• Hipoglicemia: é definida como um valor de glicemia < 70


mg/dL, severa quando < 50 mg/dL, geralmente com sintomas
como taquicardia, tremores, sudorese, pele fria e pálida, letargia e
estado comatoso.
• Representa uma condição clínica adversa, potencialmente fatal;
porém, se diagnosticada e tratada rapidamente, apresenta boa
resolução do quadro e bom prognóstico.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
a. HIPERGLICEMIA
O aumento da glicemia em doenças agudas é uma resposta fisiológica à
maior demanda metabólica nesses pacientes e está associada à liberação de
hormônios contrarreguladores: o hormônio do crescimento (GH), a
epinefrina, o cortisol, o glucagon. Associado a tal condição fisiológica, há
uso de corticoides, dietas enterais e parenterais, e liberação de citocinas
inflamatórias se na vigência de sepse e em pós-operatório.
A liberação de hormônios promove glicogenólise e gliconeogênese no
fígado, aumentando a produção endógena de glicose e inibindo,
concomitantemente, a liberação de insulina. As citocinas inflamatórias
prejudicam a ação da insulina nos tecidos periféricos, aumentando a
resistência à sua ação.
A hiperglicemia persistente resulta em alteração hemodinâmica,
distúrbio hidroeletrolítico, desidratação, estresse oxidativo com formação
de superóxidos, hipercoagulabilidade, piora de isquemia miocárdica e
cerebral, aumento de fatores inflamatórios, redução da imunidade, da
quimiotaxia e fagocitose, predisposição a quadro de sepse em pacientes
críticos, prejuízo à cicatrização e disfunção endotelial.
Essas alterações primariamente se associam ao excesso de glicose
intracelular nos tecidos que não dependem de insulina para transportá-la
para dentro da célula, e o fazem através dos GLUT 1, 2 e 3, tais como os
epitélios, células endoteliais, SNC, hepatócitos e células inflamatórias. A
hiperglicemia hospitalar, então, deixa de ser vista puramente como uma
resposta metabólica exacerbada e passa a ser responsável por piores
prognósticos e aumento da morbidade e da mortalidade nos pacientes.
A hiperglicemia aguda após lesão traumática induz a secreção de
cortisol e glucagon, promovendo estresse oxidativo e resistência à insulina,
e resultando em hiperglicemia. A glicemia na admissão representa um
preditor clinicamente útil da mortalidade e resposta à infecção em pacientes
traumatizados. Dessa forma, alcançar a normoglicemia no período pós-
traumático precoce melhora a recuperação.
O grande desafio é o paciente sem o diagnóstico prévio de diabetes
mellitus e com a glicemia aleatória entre 180-220 mg/dL, e devemos avaliar
a hipótese de hiperglicemia por estresse.
A definição de hiperglicemia por estresse é difícil no momento do
evento. Sem evidências de diabetes anterior, a hiperglicemia durante
eventos agudos também pode:

1. resultar de diabetes não diagnosticado; ou


2. ser uma resposta ao estresse.

• Definição de hiperglicemia por estresse (HPE): pode ser feita


pela razão de hiperglicemia de estresse, isto é, glicemia de
admissão dividida pela glicose média estimada derivada da
hemoglobina glicosilada.
Esta é uma ferramenta para detectar a hiperglicemia de estresse, porém
pouco validada. Parece ser particularmente útil, pois fornece uma avaliação
da hiperglicemia induzida pelo estresse também na presença de diabetes
subjacente, o que pode confundir a resposta ao estresse. Na proposta
original, demonstrou-se que HPE está independentemente associada a uma
doença crítica em uma extensão muito maior que a hiperglicemia absoluta,
em grande parte causada pelo tratamento com diabetes.
O ponto de corte da HPE para definir a hiperglicemia por estresse ainda
não foi definitivamente validado. Sugere-se que o valor de 1,14, ou seja, o
valor médio, esteja associado a um aumento da taxa de eventos adversos.
b. HIPOGLICEMIA
No ambiente hospitalar, tal condição geralmente é uma consequência do
controle glicêmico intensivo instituído ou de jejum prolongado não
programado. Portanto, é preciso pormenorizar o tratamento de cada
paciente, adequar a dose diária de insulina de acordo com seus níveis
glicêmicos, fazer as refeições prontamente nos horários determinados,
observar se o paciente está fazendo a descontinuação de alguma medicação
e ajustar suas doses de insulina diariamente.
Se houver programação de procedimento cirúrgico, as recomendações
são:
1. Evitar jejum por um período prolongado;
2. Priorizar o agendamento da cirurgia pela manhã.
A definição da meta glicêmica muito rigorosa é um fator associado ao
maior risco de hipoglicemia. O controle intensivo da glicose (meta de 80-
110 mg/dL) pode reduzir potencialmente o risco de morte por todas as
causas, infecção e sepse adquirida. No entanto, os benefícios da mortalidade
por todas as causas são limitados às configurações médicas e cirúrgicas da
UTI, enquanto não há nenhuma diferença significativa para a mortalidade
por todas as causas entre o controle intensivo da glicose e os cuidados
usuais em um ambiente misto da UTI clínico-cirúrgica.
Além disso, os efeitos benéficos do controle intensivo da glicose sobre a
mortalidade em outras fases do acompanhamento, incluindo 90 dias, 180
dias e acompanhamentos na UTI, são evidenciados.
Por outro lado, encontramos um aumento de aproximadamente 6 vezes
na ocorrência de hipoglicemia grave em pacientes críticos que receberam
controle intensivo da glicose. Dessa forma, acreditamos que o controle
intensivo com meta de glicemia entre 80-110 mg/dL só deve ser meta de
equipes experientes no manejo do diabetes mellitus.

QUADRO CLÍNICO
a. HIPERGLICEMIA
Os sintomas consistem em poliúria, polidipsia, fraqueza generalizada,
dificuldade em cicatrização de feridas, infecções recorrentes.
b. HIPOGLICEMIA
Os sintomas típicos são taquicardia, tremores, sudorese, pele fria e
pálida (desencadeadas por descarga adrenérgica) e, em casos graves,
letargia e estado comatoso, crises convulsivas. A hipoglicemia severa pode
levar a alterações cardíacas, como arritmias, crises de angina, além de
promover liberação de fatores pró-inflamatórios.

EXAME FÍSICO
• Alterações pela hiperglicemia: geralmente sem sintomas
típicos, mas glicemias acima de 300 mg/dL geralmente podem
cursar com comprometimento do sensório, agitação ou letargia,
taquicardia, tremores, sudorese e dificuldade para cicatrizar
feridas.

• Alterações pela hipoglicemia: taquicardia, tremores, sudorese,


pele fria e confusão mental.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. HIPERGLICEMIA

• Glicemia aleatória: > 180 mg/dL.


• Hemoglobina glicada (HbA1c): primordial para saber se a
hiperglicemia é recente ou se o paciente já é portador de diabetes,
admitindo a existência de doença prévia em valores acima de
6,5% naqueles não diagnosticados com diabetes. Atentar-se para
excluir previamente anemia falciforme ou hemoglobinopatias
nesses pacientes, para não interferir na avaliação da HbA1c.

• Para cálculo da Razão da Hiperglicemia por Estresse, utiliza-se a


glicemia média estimada pelo valor de Hemoglobina glicada
através da equação glicose média estimada = 28,7 x HbA1c - 46,7.

• A Razão da Hiperglicemia por Estresse é obtida pela: glicemia


sérica na admissão dividida pela glicose média estimada.
b. HIPOGLICEMIA

• Glicemia aleatória: < 70 mg/dL, severa se menor que 50 mg/dL.


DIAGNÓSTICO, CLASSIFICAÇÃO E METAS
a. HIPERGLICEMIA
• O valor máximo tolerado é até 180 mg/dL para se iniciar o
tratamento. Além disso, é necessário avaliar a hemoglobina
glicada, excluindo doença prévia não diagnosticada, e excluir
demais patologias que possam interferir na condição clínica do
paciente.

• O objetivo é manter a glicemia antes das refeições entre 110 e


140 mg/dL e a glicemia pós-prandial entre 140 e 180 mg/dL,
sendo a via de administração de escolha para a insulina a
subcutânea, exceto nas emergências, como CAD e EHH (veja
nesses capítulos).

• Metas glicêmicas com valores de 110 a 140 mg/dL podem ser as


mais indicadas para pacientes estáveis, que estavam em controle
rígido anteriormente e que não tenham risco de hipoglicemia.
Metas menos rigorosas são mais recomendadas em pacientes
idosos, com doenças graves, em fase terminal ou com alto risco de
desenvolver um quadro hipoglicêmico.

• Para pacientes cardiopatas e diabéticos, ou seja, com alto risco


cardiovascular, o valor de HbA1c na admissão, TG, hemoglobina,
história de DM e classe Killip estão associados à morte por todas
as causas no seguimento de 24 meses. Esses pacientes necessitam
de metas de controle glicêmico estabelecidas em conjunto pelo
cardiologista e endocrinologista, em geral entre 120-180 mg/dL.

TRATAMENTO
• Deverão ser avaliados: condições clínicas do paciente, diabetes
prévio e tratamento em uso antes da internação; uso atual de
corticosteroides e antipsicóticos; tipo de dieta do paciente;
horários das refeições; necessidade de jejum ou recebendo soro
glicosado.
• O esquema terapêutico deverá ser de fácil compreensão e
aplicação, aliado a uma boa preparação da equipe de enfermagem,
atenta às variações da glicemia, à técnica de aplicação de insulina
e capacidade para reconhecer sinais de hipoglicemia (glicemia
inferior a 70 mg/dL ou grave quando < 40 mg/dL; enquanto, em
pacientes não diabéticos, valores glicêmicos < 50 mg/dL já são
suficientes para provocar alterações cognitivas).

• Esclarecer ao paciente o propósito da insulinoterapia durante seu


período de internação e orientar quanto à adequação e
continuidade do tratamento após a alta hospitalar.
a. HIPERGLICEMIA
A medicação de escolha para o controle glicêmico intra-hospitalar é a
insulina, pois sua ação é rápida, tem melhor manuseio em pacientes graves
do que as medicações orais, pode ser usada em qualquer situação clínica e
responde rapidamente de acordo com as titulações da dose.

1. TERAPIA INTRA-HOSPITALAR NO PACIENTE NÃO CRÍTICO


Para os pacientes previamente com diagnóstico de diabetes, recomenda-
se suspender o uso da metformina, preferencialmente 48 horas antes de
alguma intervenção cirúrgica ou para realização de exames com contrastes
radiológicos, levando em consideração que tal medicação pode provocar
acidose láctica e falência renal após o uso do contraste.
Em quadros clínicos mais leves, outros anti-hiperglicemiantes orais (tais
como os inibidores de DPP-4, acarbose) podem ser mantidos ou associados
à insulina.
A ocorrência de CAD euglicêmica, uma nova apresentação da CAD,
descrita neste capítulo, aumenta no período peri e pós-operatório, se
algumas medicações não forem interrompidas no perioperatório ou
reiniciadas muito em breve no pós-operatório. Dessa forma, é importante a
atenção sobre esse quadro quando o paciente está em uso de inibidores de
cotransportador de sódio e glicose (ISGLT2).
Discorremos a seguir sobre as orientações dos principais anti-
hiperglicemiantes orais:
1.1 Anti-hiperglicemiantes orais
• Metformina: A American Diabetes Association (ADA) propõe a
manutenção de metformina no dia da cirurgia, enquanto nos
últimos anos era orientado suspender 48 horas antes. A
reintrodução pode ser feita 48 horas após o procedimento
principal, desde que a função renal esteja preservada.

• Sulfonilureias: As sulfonilureias são os anti-hiperglicemiantes


orais usados há mais de 70 anos no tratamento do diabetes, e a
suspensão no dia do procedimento é a estratégia usual
recomendada, pois está associada a um maior risco de
hipoglicemia assintomática, em comparação com outros
medicamentos anti-hiperglicêmicos.

• Medicações disponíveis desta classe: gliclazida, glimepirida,


glibenclamida.

• Inibidores da dipeptidil peptidase 4 (DPP4): São medicações


seguras quanto a efeitos colaterais e pode-se optar por manter ou
interromper o tratamento no perioperatório, pois é improvável que
produza complicações significativas e o risco de hipoglicemia é
muito baixo.

• Medicações disponíveis dessa classe: vildagliptina, sitaglitptina,


linagliptina, saxagliptina, alogliptina.

• Inibidores do cotransportador de sódio-glicose 2 (ISGLT2):


No momento, não há acordo sobre a suspensão de ISGLT2 antes
da cirurgia, mas a estratégia geral é interrompê-lo antes de 24 a 72
horas ou mais. Pode ser seguro reiniciar 48 horas após o
procedimento principal, desde que a função renal esteja
preservada e o paciente não apresente sinais de desidratação.

• Medicações disponíveis dessa classe: dapagliflozina,


empagliflozina, canagliflozina.
• Agonistas do peptídeo semelhante ao glucagon do tipo 1
(GLP1): Os efeitos adversos gastrointestinais (náuseas e vômitos)
e um pequeno risco de pancreatite podem se tornar fatores
limitantes ao seu uso. Portanto, deve-se pensar em suspender
durante o procedimento e nos dias subsequentes.

• Medicações disponíveis: liraglutida, exenatida, dulaglutida,


semaglutida.
1.2 Insulinoterapia
É o esquema terapêutico de escolha para pacientes em ambiente
hospitalar.

• O Regime de insulinização recomendado consiste no esquema


basal/bolus: as insulinas basal, prandial e de correção, que,
quando somadas, fornecem a dose total diária de insulina (DTD)
demandada durante o dia, sob a condição de que a dieta do
paciente esteja apropriada.

• A DTD (0,5-1 U/kg/dia) é fracionada em 50% de insulina basal e


a outra metade de insulina prandial, ao passo que a insulina para
correção fica reservada para quando o esquema de insulinas basal
e prandial, em vigência, não estiver atingindo os níveis esperados.
Idosos > 70 anos, magros e doentes renais crônicos
podem necessitar de menor dose devido à maior meia-vida da
insulina neste contexto (em geral, recomenda-se iniciar com 0,3
U/kg).

• A dose de insulina para correção deve ser calculada de acordo


com a DTD, encontrando, dessa forma, o fator de sensibilidade de
cada paciente.

• Fator de sensibilidade indica quanto 1 unidade de insulina reduz a


glicemia daquele paciente individual e pode ser calculado da
seguinte forma: 1800 divididos pela DTD (se utilizar insulina
ultrarrápida) ou 1500 divididos pela DTD (se utilizar insulina
regular).

• Insulinas basais disponíveis: insulina Glargina, a insulina


Detemir, insulina NPH, insulina Degludeca.

• Insulinas rápidas/ultrarrápidas: para bolus de alimentação


(prandial), pode ser utilizada insulina Regular (rápida) ou
análogos de ação ultrarrápida (Lispro, Asparte ou Glulisina),
sendo estes aplicados logo antes da refeição ou até 15 minutos
após. A insulina Regular possui início de ação mais lento,
fazendo-se necessária sua administração 30 minutos antes da
refeição.
Obs.: A insulina Asparte de ação em 5 minutos chegou ao Brasil em
maio/2020 e está disponível como o nome comercial de Fiasp.

A tabela descreve as principais insulinas disponíveis no Brasil e suas


características.
INSULINAS
PICO DE
DURAÇÃO
AÇÃO
Glargina Nenhum 20 a 24 h

Detemir 6a8h 18 a 22 h

NPH 4 a 10 h 10 a 18 h

Degludeca Nenhum 24 a 42 h

Regular 2 a 3h 5a8h

Asparte 30 min a 2 h 3a5h

Lispro 30 min a 2 h 3a5h

Glulisina 30 min a 2 h 3a5h

Tabela 1. Tipos de insulina e tempo de ação .


Fonte: Adaptado de Sociedade Brasileira de Diabetes 2020.

Entretanto, se a dose de correção estiver sendo administrada


constantemente, significa que as doses de insulina basal e prandial estão
ineficazes e necessitam ser ajustadas. Para tal, usa-se a metade da dose de
insulina de correção empregada no dia anterior para racioná-la entre as
insulinas basal e prandial que serão usadas no outro dia. Os ajustes podem
ser feitos conforme a tabela abaixo (Tabela 2):

Glicemia Jejum e Antes do Jantar (mg/dL) Correção com insulina

< 70 Diminuir 20%

70 a 99 Diminuir 10%

100 a 140 Mantém a dose

141 a 180 Aumenta 10%

> 180 Aumentar 20%

Tabela 2. Ajustes de insulinoterapia conforme glicemias.


Fonte: Adaptado de Sociedade Brasileira de Diabetes 2020.

2. TERAPIA INTRA-HOSPITALAR NO PACIENTE CRÍTICO


Abordado na CAD e EEH, deve-se seguir o esquema de insulina regular
em bomba de infusão contínua com os mesmos objetivos.
a. HIPOGLICEMIA

• Pacientes com nível neurológico preservado em hipoglicemias


leves (50-69 mg/dL), a hipoglicemia pode ser revertida com a
administração oral de 15 g de carboidrato líquido até que se
obtenha uma glicemia de 100 mg/dL, necessitando conferir a
glicemia capilar a cada 15 minutos após a ingesta do carboidrato.

• Pacientes com comprometimento cognitivo ou hipoglicemia


grave, impossibilitados de ingesta por via oral, ou pacientes em
restrição de dieta, preconizam-se 40 mL de glicose hipertônica a
50% por via endovenosa e/ou glucagon 1 mg via intramuscular
em casos de acesso venoso difícil ou refratariedade ao tratamento
com glicose, com controle da glicemia capilar a cada 5 minutos.

• Se o paciente ainda necessita ficar em jejum ou se ainda continua


com rebaixamento do nível de consciência, prescreve-se um soro
glicosado para manutenção até mudança da dieta ou até
normalização do quadro neurológico. A glicemia ainda deve ser
feita a cada 15 minutos até atingir valores glicêmicos normais.
b. TECNOLOGIAS EM DIABETES
A evolução da tecnologia de diabetes durante as últimas décadas levou
ao aumento do uso de monitorização contínua com sensores de glicemia
(CGMS) e sistema de infusão contínua (bomba de insulina) no ambiente
ambulatorial para o gerenciamento de DM1 e DM2. As novas métricas de
controle glicêmico derivadas dos sensores mostra a necessidade de mais
evidências sobre a continuação dessas terapias durante a hospitalização.
Dados recentes em pacientes hospitalizados mostraram progresso
notável no uso da tecnologia do diabetes no hospital, incluindo (1) maior
precisão e confiabilidade da CGMS, (2) segurança do sistema de infusão
contínua em populações hospitalares apropriadas, (3) melhoria do controle
glicêmico com controle computadorizado de sistemas de gerenciamento
glicêmico em ambientes de UTI e não UTI; e (4) viabilidade de sistemas
fechados de sensores-sistema de infusão contínua para controle glicêmico
de pacientes internados.
No ambiente hospitalar, a manutenção do uso dos CGM e bomba de
insulina deve ser encorajado e o contato com a equipe especializada
assistente deverá ser realizado assim que possível.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. HIPERGLICEMIA
Exemplo para início de insulinização, em esquema intensivo
(basal/bolus), para paciente de 80 kg, usando 0,6 U/kg. Portanto, DTD de
48U e fator de sensibilidade 30. Foram utilizadas como exemplo as duas
insulinas que estão mais frequentemente disponíveis nos hospitais do
Sistema Único de Saúde.
A tabela 3 mostra o esquema de insulinização inicial.
1) Dieta oral para Diabetes.

2) Glicemia capilar às 6, 11, 14, 17, 22 e 3 h.

3) Insulina Basal: Insulina NPH 16 unidades às 7 h e 8 unidades às 22 horas.

4) Insulina Prandial: Insulina Regular 8 unidades 30 minutos antes do café da manhã, almoço e jantar.

5) SGH 50% 40 mL EV ou VO (se paciente consciente) se glicemia menor que 70 mg/dL. Repetir glicemia capilar 15
minutos após.

6) Se glicemia maior que 140 mg/dL, corrigir a dose de insulina Regular, acrescentando a esta:
• 141-170: 1 unidade 291-320: 6 unidades
• 171-200: 2 unidades 321-350: 7 unidades
• 201-230: 3 unidades 351-380: 8 unidades
• 231-260: 4 unidades 381-410: 9 unidades
• 261-290: 5 unidades > 410: 10 unidades
Tabela 3. Modelo de Prescrição para início de Insulinoterapia Esquema
Basal-Bolus
Fonte: Elaborado pelos autores.

DICAS DO ESPECIALISTA
• A alta hospitalar requer orientações detalhadas, principalmente
para aqueles que não usavam insulina antes da hospitalização. É
fundamental que os pacientes com primodiagnóstico de diabetes
sejam avaliados pelo especialista, para verificar o tipo de diabetes
e a estratégia de tratamento que será mantida ambulatorialmente.

• Para pacientes previamente diabéticos, o tratamento na alta se


baseia na medida da hemoglobina glicada (HbA1c):

• Hemoglobina Glicada (HbA1c) < 7%: deve-se retomar a terapia


que era feita antes da hospitalização.

• Hemoglobina Glicada (HbA1c) entre 7 e 9%: continua a


administração de hipoglicemiantes orais e introduz, antes de
deitar-se, a aplicação de 50 a 80% da dose de insulina basal usada
durante a internação.

• Hemoglobina Glicada (HbA1c) > 9%: a ocasião da alta será feita


ou com a administração de insulina basal-bolus na mesma dose
que estava usando na internação, ou reintroduzir os
hipoglicemiantes orais e incluir de 50 a 80% da dose de insulina
basal usada durante a internação.

REFERÊNCIAS
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2020. São Paulo: Editora Clannad; 2020.
2. American Diabetes Association. Classification and Diagnosis of Diabetes: Standards of
Medical Care in Diabetes - 2020. Diabetes Care 2020; 43(1): S14-31.
3. Hamblin PS, Wong R, Ekinci EI, Fourlanos S, Shah S, Jones AR et al. SGLT2 Inhibitors
Increase the Risk of Diabetic Ketoacidosis Developing in the Community and During
Hospital Admission. J Clin Endocrinol Metab. 2019; 104(8): 3077-87.
4. Ramos AJS, Coral MHC, Souza TBS, Fonseca MM, Araújo D, Araújo LA, et al.
Emergências em Diabetes. In: Vilar L. Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan Ltda; 2016.
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Endocrinologia clínica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan Ltda; 2016.
6. Di Luzio R, Dusi R, Mazzotti A, Petroni MA, Marchesini G, Bianchi G. Stress
Hyperglycemia and Complications Following Traumatic Injuries in Individuals
With/Without Diabetes: The Case of Orthopedic Surgery. Diabetes Metab Syndr Obes.
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7. Zaidi S, Khan Y, Razak B S, Malik BHe) Insight Into the Perioperative Management of
Type 2 Diabetes. Cureus. 2020; 12(2): e6878.
8. Roberts GW, Quinn, SJ, Valentine N, Alhawassi T, O’Dea H, Stranks S, et al. Relative
Hyperglycemia, a Marker of Critical Illness: Introducing the Stress Hyperglycemia Ratio J
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9. Yao R, Ren C, Wu G, Zhu Y, Xia Z, Yao Y. Is intensive glucose control bad for critically ill
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10. Buse JB, Wexler DJ, Tsapas A, Rossing P, Mingrone G, Mathieu C, et al. 2019 Update to:
Management of Hyperglycemia in Type 2 Diabetes 2018 A Consensus Report by the
American Diabetes Association (ADA) and the European Association for the Study of
Diabetes (EASD). Diabetes Care. 2020; 43(2): 487-93.
11. Davis GM, Galindo RJ, Migdal AL, Umpierrez GE. Diabetes Technology in the Inpatient
Setting for Management of Hyperglycemia. Endocrinol Metab Clin N Am. 2020; 49: 79-93
12. Li Y, Li X, Zhang Y, Zhang L, Wu Q, Bai Z, et al. Impact of glycemic control status on
patients with ST-segment elevation myocardial infarction undergoing percutaneous
coronary intervention. BMC Cardiovasc Disord. 2020; 20: 36.
3.1
ASCITE
Autores:
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes
Lívia de Almeida Costa
Bruno Mendes Galvão
Sandyelle da Silva Rocha
Gabriel Gonçalves Lopes

DEFINIÇÕES
A ascite consiste no acúmulo patológico de líquido na cavidade
peritoneal e tem como principal etiologia a cirrose hepática, responsável por
cerca de 80% dos casos.
A história natural da cirrose é caracterizada por duas fases: a primeira, é
compensada e assintomática, seguida por uma fase descompensada, marcada
pelo desenvolvimento de complicações como ascite, a principal delas. Essa
manifestação está associada a mau prognóstico e acomete 5% a 10% dos
pacientes cirróticos anualmente e, em 10 anos, até 70% deles.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Existem várias causas de ascite, sendo a principal delas a hipertensão
portal por cirrose hepática. É necessário estabelecer o diagnóstico diferencial
com outras etiologias como a cardiogênica, as doenças peritoneais, além de
condições sistêmicas que ocasionam hipoalbuminemia. A avaliação clínica
associada à propedêutica complementar permite identificar a etiologia na
maioria dos casos e instituir terapêutica específica.
A ascite pode ser classificada de acordo com a fisiopatologia (Tabela 1):

Doença Outras
Hipertensão Portal Cardiogênica Hipoalbuminemia
Peritoneal Causas

Cirrose Síndrome Ascite


Insuficiência Cardíaca Malignidade
Hepática Nefrótica Quilosa
Doença Outras
Hipertensão Portal Cardiogênica Hipoalbuminemia
Peritoneal Causas

Enteropatia
Hepatite Pericardite Ascite
Tuberculose perdedora de
Alcoólica Constrictiva Pancreática
proteínas

Cor Infecção Desnutrição


Mixedema
Pulmonale Fúngica grave

Síndrome de Budd- Gastroenterite


Valvopatias Hemoperitônio
Chiari Eosinofílica

Peritonite
Veno-oclusiva
Granulomatosa

Diálise
Peritoneal

Tabela 1. Causas de ascite.


Fonte: Elaborado pelos autores.

O principal mecanismo do acúmulo de líquido ascítico no paciente


cirrótico é a retenção renal de sódio e água devido à ativação do sistema
renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) e sistema nervoso simpático,
gerando um balanço positivo de fluidos que leva à expansão do volume de
fluido extracelular. Além disso, ocorre redução da volemia efetiva
secundária à hipoalbuminemia e vasodilatação arterial esplâncnica,
associada à hipertensão portal, que favorece o extravasamento de plasma
para a cavidade peritoneal. Em fases mais avançadas da doença, alterações
na função renal associadas à síndrome da resposta inflamatória sistêmica
(SIRS) também contribuem para essa complicação (Figura 1).
*SIRS: Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica.

Figura 1. Fisiopatologia do desenvolvimento da ascite.


Fonte: Adaptado de Adebayo.9

A ascite de etiologia não cirrótica apresenta diferentes mecanismos,


dependendo da causa. Na cardiogênica, ocorre aumento retrógrado da
pressão na veia porta, enquanto na etiologia nefrótica há hipoalbuminemia
com redução da pressão oncótica. As de causa neoplásica podem ter
diferentes mecanismos: na carcinomatose peritoneal, decorre de produção de
líquido proteináceo pelas células tumorais que revestem o peritônio,
enquanto nas metástases hepáticas e no carcinoma hepatocelular ocorre
aumento na pressão portal em decorrência de alterações no parênquima ou
por alterações vasculares, como trombose de veia porta. Na ascite quilosa
secundária ao linfoma, ocorre por obstrução de linfonodos pelo tumor e
ruptura de linfáticos. Já a ascite pancreática ou biliar decorre de
extravasamento do suco pancreático ou biliar para a cavidade peritoneal.

QUADRO CLÍNICO
Pacientes com ascite tipicamente apresentam distensão abdominal, que
pode ser assintomática ou associada com desconforto, plenitude pós-
prandial, dispneia e ganho de peso. O tempo do surgimento da ascite, assim
como alguns achados específicos, podem estar associados à causa de base.
Aqueles com infecção do líquido ascítico podem apresentar febre, dor
abdominal, taquicardia, dispneia e alteração do estado mental.
A avaliação clínica detalhada permite identificar a provável etiologia:

• Cirrose hepática: investigar fatores de risco, como etilismo,


exposição para hepatites virais B e C (transfusão sanguínea,
atividade sexual de risco, uso de drogas e tatuagem), histórico
familiar de doença hepática e fatores metabólicos associados à
esteato-hepatite não alcoólica (NASH). Sinais clínicos de
hipertensão portal e disfunção hepatocelular, como circulação
colateral em abdome, rarefação de pelos, ginecomastia, eritema
palmar, atrofia muscular, telangiectasias e atrofia testicular, podem
corroborar com o diagnóstico. Outras formas de descompensação,
como hemorragia do trato gastrointestinal e encefalopatia hepática,
podem estar presentes. Pacientes sabidamente cirróticos que
desenvolvem ascite subitamente devem ser investigados para
possíveis complicações, como infecção, trombose de veia porta e
carcinoma hepatocelular.

• Insuficiência cardíaca: pesquisar história de hipertensão arterial,


valvopatia, tabagismo crônico (cor pulmonale), coronariopatia,
doença de Chagas e sinais como anasarca, estase de jugular,
refluxo hepatojugular, dispneia e ortopneia.

• Síndrome nefrótica: história de doença autoimune, presença de


anasarca, hematúria, proteinúria.

• Neoplasia: perda ponderal, astenia, linfonodomegalias e massa


palpável.

• Ascite quilosa: linfonodomegalias, visceromegalias, febre.


EXAME FÍSICO
O diagnóstico de ascite é realizado através de anamnese e exame clínico,
com a realização de manobras semiológicas cuja acurácia depende do
volume de líquido acumulado e da técnica utilizada.
O teste de macicez móvel apresenta sensibilidade alta, porém é
necessário acúmulo de pelo menos 1.500 mL de líquido ascítico para sua
detecção. Consiste na percussão do abdome, no sentido transversal, da linha
média até os flancos, com o paciente em decúbito dorsal, observando a
transição do som timpânico, na região periumbilical, para o maciço, nos
flancos, onde líquidos se acumulam pelo fator gravitacional. Em seguida,
com o paciente em decúbito lateral, observa-se que a região abdominal sobre
a qual o paciente está apoiado apresenta som maciço à percussão, enquanto a
região do flanco que não está apoiada apresenta-se timpânica. Se não houver
macicez móvel, a chance de o paciente apresentar ascite é menor que 10%.
Essa manobra ajuda a diferenciar ascite de distensão gasosa, obesidade ou
abdominal. A distensão gasosa apresenta timpanismo em região
periumbilical e flancos. Obesos podem ter macicez em todo o abdome, sendo
às vezes necessária a ultrassonografia para a diferenciação. Nos casos de
massa abdominal, a macicez está restrita a esse ao local.
Outras manobras como Sinal do Piparote (Morgani) e o Teste de
Semicírculos de Skoda têm menor sensibilidade, só conseguindo detectar
ascite volumosa.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Paracentese abdominal: técnica e exames laboratoriais
pertinentes serão detalhados no tópico a seguir.

• Avaliação laboratorial: função hepática, função renal e


eletrólitos.

• Ultrassonografia de abdome com doppler: demonstra a


presença do líquido ascítico, mesmo em pequeno volume, e revela
alterações no parênquima hepático, no sistema venoso portal e em
outras vísceras.
• Tomografia Computadorizada de abdome ou Ressonância
Nuclear Magnética de abdome: complementam a investigação da
etiologia da ascite, especialmente na suspeita de causa neoplásica.

CLASSIFICAÇÃO
A ascite pode ser graduada de acordo com o exame clínico em:

• Grau 1: ascite leve, detectada apenas através da ultrassonografia;


• Grau 2: ascite moderada, identificada como distensão moderada e
simétrica do abdome;

• Grau 3: ascite volumosa, com distensão abdominal significativa.


A ascite pode ser classificada quanto à evolução em:

• Ascite não complicada


• Ascite complicada: presença de infecção do líquido ascítico ou
disfunção renal associada

• Ascite recidivante: ocorre pelo menos três vezes em um período


de 12 meses, apesar da restrição dietética de sódio e terapia
diurética adequada

• Ascite refratária: caracterizada pela perda de peso inferior a 800


g em 4 dias e excreção urinária de sódio menor que a ingesta após
restrição adequada de sódio (até 88 mEq/dia), em uso de
diureticoterapia em dose máxima por pelo menos 1 semana. Pode
ser subdividida em:

“Diurético resistente”: não controlada com doses máximas de


diuréticos (espironolactona 400 mg/dia e furosemida 160
mg/dia)
“Diurético intratável”: apresenta complicações relacionadas
aos diuréticos, impedindo seu uso.
Após desenvolver ascite refratária, a sobrevida média do paciente é de 6
meses.

PARACENTESE DIAGNÓSTICA
A paracentese diagnóstica com análise do líquido ascítico é fundamental
em todos os doentes investigados por ascite para identificar a etiologia e
descartar peritonite bacteriana espontânea (PBE) nos cirróticos, reduzindo as
taxas de mortalidade nesse subgrupo de pacientes.
É o método mais rápido e custo-efetivo, sendo realizado à beira do leito,
com retirada de pequena quantidade de líquido ascítico para análise. A
paracentese de alívio é terapêutica ao remover grandes volumes de líquido,
visando ao alívio dos sintomas associados ao aumento da pressão intra-
abdominal.

a. Indicações:

• Investigação de ascite de início recente.


• Paciente cirrótico com deterioração clínica, como encefalopatia
hepática e disfunção renal, buscando identificar precocemente um
fator infeccioso de descompensação, como a peritonite bacteriana
espontânea.

• Paciente cirrótico com nova descompensação em ascite.


b. Contraindicações relativas:
Os benefícios da paracentese superam os baixos riscos do procedimento.

• Trombocitopenia e os distúrbios de coagulação: não são


contraindicações e, dessa forma, não é necessária hemotransfusão
rotineira, exceto naqueles com coagulação intravascular
disseminada (CIVD) ou fibrinólise primária clinicamente evidente,
indicando transfusão de plasma fresco congelado e plaquetas na
CIVD e ácido aminocaproico ou tranexâmico na fibrinólise.

• Cicatriz cirúrgica: pode estar associada a aderências de alças


intestinais e risco de perfuração intestinal, devendo-se realizar a
punção em local distante da região da cicatriz.

• Distensão importante de alças intestinais: risco de perfuração


intestinal se punção inadvertida.

c. Técnica:

1. Preparação do paciente: não é necessário jejum.


2. Posição do paciente: decúbito dorsal. Pode ser útil que, nos casos
de líquido ascítico em menor volume, o paciente faça discreta
rotação do abdome para a esquerda a fim de acumular o líquido
nessa região.
3. Local de inserção da agulha: o quadrante inferior esquerdo é o
local preferível para a punção, pois a parede abdominal nessa
região é mais fina, além de apresentar menos cicatrizes cirúrgicas
quando comparado ao quadrante inferior direito (apendicectomia,
por exemplo). Para definir o ponto exato de punção, deve-se
localizar a espinha ilíaca anterossuperior e puncionar cerca de 3 cm
cranial e 3 cm medial a esse ponto anatômico. É importante
confirmar que o sítio de punção não apresenta cicatrizes cirúrgicas,
que não é maciço à percussão e que não apresenta esplenomegalia
volumosa. Pacientes obesos podem apresentar dificuldade de
punção devido ao tecido subcutâneo espesso e à dificuldade de
identificar ascite em abdome globoso. Nesses casos, a
ultrassonografia de abdome pode ser útil para auxiliar a punção.
4. Assepsia: o uso de campos estéreis, capote, gorro e máscara é
opcional, sendo obrigatório o uso de luva estéril. A assepsia da
pele deve ser realizada com povidona-iodo (PVPI) ou clorexidina.
5. Anestesia local: o anestésico indicado é a Lidocaína 1%, 3 a 5
mL. A técnica de Z-track cria uma entrada não linear da pele até a
cavidade peritoneal, para diminuir as chances de vazamento do
líquido. Deve-se tracionar a pele para baixo com uma mão durante
todo o tempo em que a agulha e a seringa são inseridas com a outra
mão. Na inserção da agulha, aspirar a cada 5 mm de penetração e
injetar anestésico caso não aspire sangue. É importante chegar até a
cavidade peritoneal (geralmente quando se aspira um fluido
amarelo) para ter uma noção de profundidade do líquido ascítico.
6. Inserção da agulha para paracentese: a escolha da agulha
baseia-se no volume de líquido ascítico a ser retirado e no biotipo
do paciente. É preferível utilizar agulhas de menor calibre para
minimizar complicações como perfuração de vasos sanguíneos ou
alças intestinais. Na paracentese diagnóstica, pode ser usado jelco
número 22 de 1 ou 1,5 polegadas em paciente magro; nos obesos,
optar pelo jelco 22 de 3,5 polegadas. Na paracentese de alívio,
opta-se por uma agulha mais calibrosa (jelco 15 ou 16) para
facilitar a remoção do líquido.
7. Remoção do líquido para análise laboratorial (paracentese
diagnóstica):

• Amostra para a citologia total e diferencial: armazenada em um


tubo anticoagulante.

• Amostra para análise bioquímica: o tubo não precisa conter


anticoagulante.

• Amostra para cultura do líquido: 10 mL em frasco de


hemocultura.
Outros testes adicionais podem ser acrescentados, de acordo com a
suspeita quanto à etiologia da ascite.
8. Paracentese de alívio: realizada através da mesma técnica de
punção, porém com agulha de maior calibre para permitir fluxo
mais rápido do líquido ascítico. O material aspirado deve ser
conectado a um frasco, podendo utilizar dispositivo a vácuo para
facilitar a aspiração. A remoção de volume superior a 5 litros de
líquido ascítico deve ser seguida de reposição de albumina, 8 g
para cada litro de líquido ascítico retirado.
d. Complicações (são raras):

• Vazamento do líquido ascítico: Se disponível, uma bolsa de


ostomia sobre o local do vazamento ajuda a quantificar a perda de
fluido, além de ser mais prática que a troca frequente de curativos.
Se o paciente não é refratário aos diuréticos, o fluxo de líquido vai
reduzindo no decorrer dos dias. Quando resistente a essa terapia,
pode ser necessária nova paracentese terapêutica para cessar o
vazamento. Pode ocorrer uma celulite no local do vazamento.

• Sangramento: O sangramento decorrente da perfuração de artéria


ou veia durante a punção geralmente é autolimitado. Raramente
pode ser grave e potencialmente fatal, com a necessidade de
intervenção cirúrgica. O risco é maior em portadores de doença
renal crônica.

• Perfuração intestinal: Ocorre em 1 a cada 6.000 punções.


Geralmente não há peritonite e nem repercussão clínica. O
tratamento é indicado apenas se houver sinais infecciosos.

• Mortalidade: Muita rara, com taxa de mortalidade próxima de


zero.

1. ANÁLISE MACROSCÓPICA DO LÍQUIDO ASCÍTICO


A aparência do fluido ascítico pode fornecer informações quanto à
etiologia:

• Amarelo citrino ou claro: é a aparência mais frequente em


cirróticos sem complicações.

• Turvo: suspeita de PBE.


• Leitoso: denominada ascite quilosa, possui alta concentração de
triglicérides, indicativo de malignidade ou, menos comumente,
cirrose.
• Sanguinolento: geralmente a concentração de hemácias no
líquido supera 10.000/mm3. As principais causas são sangramento
espontâneo, punção traumática de um vaso durante o procedimento
(o líquido é inicialmente sanguinolento e ao longo da punção vai
clareando; coagula rapidamente se a amostra não for colocada em
tubo anticoagulante), malignidade (ocorre em 50% dos casos de
carcinoma hepatocelular) ou cirrose. A carcinomatose peritoneal
apresenta líquido ascítico sanguinolento em apenas 10% dos casos.

• Marrom: alta concentração de bilirrubina. Acontece na icterícia


severa, porém, quando a concentração de bilirrubina no líquido for
superior à dosagem sérica, a causa provavelmente é perfuração de
víscera, em especial da vesícula biliar ou duodenal.

2. ANÁLISE MICROSCÓPICA DO LÍQUIDO ASCÍTICO


Os exames laboratoriais realizados rotineiramente no líquido ascítico são
a dosagem de albumina, proteínas totais, citologia total e diferencial e
cultura. Testes adicionais devem ser direcionados de acordo com a suspeita
de etiologia da ascite. Veja mais detalhes no quadro a seguir (Tabela 2):
Testes de Rotina Testes Adicionais
Contagem total e diferencial de células Glicose Citologia oncótica

Proteínas totais e albumina DHL Triglicerídeos

Cultura Fosfatase Alcalina ADA

Amilase Bilirrubina

Gram CEA

Esfregaço e cultura para BAAR

Tabela 2. Análise microscópica do líquido ascítico.


Fonte: Elaborado pelos autores.

2.1 Dosagem de albumina e proteínas totais


A investigação inicial da causa da ascite é realizada através do GASA
(gradiente albumina soro-ascite), isto é, da diferença entre os valores da
albumina sérica com a albumina no líquido, permitindo dividir os fatores
etiológicos em dois grupos (Tabela 3). Apresenta excelente acurácia, mesmo
na presença de infecção, paracentese prévia e reposição de albumina.

• GASA ≥ 1,1 g/dL: hipertensão portal (97% de precisão). A


dosagem de proteínas total no líquido permite diferenciar entre
causas hepáticas (proteína de líquido ascítico < 2,5 g/dL) e causas
cardiogênicas (proteína do líquido ascítico ≥ 2,5 g/dL).

• GASA < 1,1 g/dL: outras causas que não sejam decorrentes de
hipertensão portal.
GASA ≥ 1,1 GASA < 1,1
Cirrose Hepática Carcinomatose peritoneal

Hepatite Alcoólica Síndrome nefrótica

Síndrome de Budd-Chiari Ascite pancreática

Síndrome de obstrução sinusoidal Tuberculose peritoneal

Ascite cardiogênica Serosites (doença do tecido conjuntivo)

Tabela 3. Gradiente albumina soro-ascite


Fonte: Elaborado pelos autores.

2.2 Celularidade e culturas


A contagem de leucócitos no líquido ascítico na cirrose não complicada
geralmente é inferior a 500 células/mm3, com polimorfonucleares (PMN)
em níveis inferiores a 250 células/mm3. Qualquer processo inflamatório no
líquido ascítico pode elevar a celularidade. Na peritonite bacteriana
espontânea ocorre aumento de PMN (ver adiante), enquanto na peritonite
tuberculosa e na carcinomatose peritoneal, aumento de linfócitos.
Nos casos de punção traumática ocorre extravasamento de sangue,
ocasionando elevação nos níveis de leucócitos no líquido ascítico, em
especial de PMN, que correspondem à maior proporção de células. Dessa
forma, deve-se corrigir o número de PMN através da subtração de 1 PMN
para cada 250 hemácias, a partir de 10000 hemácias. A contagem de
polimorfonucleares corrigida > 250/mm3 confirma infecção do líquido
ascítico, ou seja, peritonite bacteriana.
Testes adicionais podem ser realizados no intuito de diferenciar peritonite
bacteriana primária da secundária (ver adiante). A cultura do líquido ascítico
pode ser negativa em até 60% dos casos. Quando positiva, os agentes
patogênicos mais comuns incluem bactérias Gram-negativas, geralmente
Escherichia coli (25% dos casos), e cocos Gram-positivos, espécies de
Streptococcus e Enterococcus (50-70% dos casos).
2.3 Análise bioquímica
Não é realizada rotineiramente, sendo direcionada ao possível fator
etiológico da ascite (Tabela4):

• Glicose: a concentração de glicose no líquido ascítico é


semelhante à sérica. Níveis baixos indicam consumo por
leucócitos, bactérias ou células neoplásicas.

• LDH: relação da LDH líquido ascítico/soro é em torno de 0,4 nos


casos não complicados de cirrose. Quando o valor se aproxima ou
supera 1,0, deve-se suspeitar de infecção do líquido ou
malignidade.

• Amilase: a relação amilase líquido ascítico/sérica em torno de 0,4


ou concentração próxima de 40 U/L acontece na cirrose não
complicada, enquanto relação próxima de 6,0 ou valores absolutos
aproximados de 2000 U/L apontam para ascite pancreática ou
perfuração intestinal.

• Gram: detecta bactérias em concentrações maiores que 10.000


bactérias/mL, o que ocorre geralmente nos casos avançados de
peritonite bacteriana espontânea.

• Baciloscopia para tuberculose: raramente é positiva, devido à


baixa concentração de micobactérias no fluido ascítico na
peritonite tuberculosa. Nesses casos, a biópsia de peritôneo através
da laparoscopia tem sensibilidade próxima de 100%.

• Adenosina desaminase (ADA): quando > 40, pode ser útil na


suspeita de tuberculose peritoneal.
• Citologia oncótica: a sensibilidade é de quase 100% para
carcinomatose peritoneal.

• Triglicerídeos: útil quando a aparência do líquido ascítico é


leitosa/quilosa, cuja confirmação é feita se triglicerídeos do líquido
ascítico estiverem > 200 mg/dL e acima do nível sérico.

• Bilirrubina: útil na ascite com coloração marrom ou na suspeita


de perfuração de biliar ou de intestino delgado, cujo achado
bioquímico apresenta bilirrubina > 6 mg/dL e superior ao nível
sérico.
Celularidade GASA Proteínas totais Gram
Etiologia Inspeção
(/mm3) (g/dL) (g/dL) / Cultura

Cirrose não Amarelo Leucócitos


≥ 1,1 < 2,5 Negativo
complicada citrino < 250

Amarelo Leucócitos
ICC ≥ 1,1 > 2,5 Negativo
citrino < 1000

Turvo ou Sensibilidade do gram 10%,


PBE PMN > 250 ≥ 1,1 < 1,0
purulento Sensibilidade da cultura 90%

Peritonite Turvo ou Gram usualmente


PMN > 10000 < 1,1 > 2,5
secundária purulento demonstra bactérias

Esfregaço para BAAR


Claro, turvo,
Peritonite Linfócitos (+) < 5%,
hemorrágico, < 1,1 > 2,5
Tuberculosa 250 - 4000 Cultura BAAR
quiloso
(+) 20%

Citologia (+)
Peritonite Pode ser Leucócitos > 1000
< 1,1 > 2,5 Negativo
Carcinomatosa hemorrágico (às custas de PMN e
linfócitos)

Tabela 4. Características do líquido ascítico de diferentes diagnósticos.


Fonte: Adaptado de Ferraz 8

TRATAMENTO
O manejo clínico envolve o tratamento da ascite e a resolução, se
possível, da condição de base, a fim de evitar a recorrência do quadro. Os
pacientes portadores de hepatopatia devem manter abstinência alcoólica,
mesmo que esta não seja a causa primária da doença, pois o álcool atua
diretamente na hipertensão portal. O uso de substâncias (medicamentos,
ervas, suplementos) hepatotóxicas também deve ser interrompido. O
tratamento da causa da cirrose hepática é fundamental, pois evita a
progressão da deteriorização funcional do fígado.
A restrição de sódio adequada, junto à terapia diurética, leva ao controle
da ascite em 90% dos casos. Quando esse controle não é obtido, a
determinação da excreção urinária de sódio deve ser realizada, a fim de
verificar se o paciente está transgredindo a dieta ou se está evoluindo com
disfunção renal e, assim, não respondendo à terapia. Quando a ascite é
controlada, a redução progressiva e proporcional dos diuréticos deve ser
realizada, até a suspensão ou manutenção da menor dose possível que leva
ao controle da ascite.

a. Restrição de sódio:
Não é recomendada restrição de sódio rotineira em pacientes que nunca
tiveram ascite. Nos casos leves, após o primeiro episódio, essa medida pode
levar à resolução da ascite em 10% dos pacientes. A restrição extrema desse
íon, além de pouco palatável, favorece o desenvolvimento de hiponatremia e
é frequentemente associada à redução da ingestão de calorias, prejudicando o
estado nutricional.
A ingestão máxima de sódio por dia é controversa. O AASLD (American
Association for the Study of Liver Diseases) recomenda 2 g de sal por dia (=
88 mEq), enquanto a EASL (European Association for the Stydy of Liver
Diseases) considera a ingestão adequada até 4,6-6,9 g de sal por dia.

b. Diuréticos:
Os diuréticos não estão associados a desfecho de mortalidade, sendo
úteis apenas para controle sintomático. Como o hiperaldosteronismo
secundário desempenha um papel fundamental na retenção renal de sódio
nos cirróticos, antagonistas da aldosterona como a Espironolactona (100-400
mg/d) representam um papel importante no tratamento clínico da ascite. A
Amilorida (10-40 mg/d) atua no ducto coletor, porém é menos eficaz e deve
ser usada apenas naqueles que desenvolvem efeitos colaterais graves com
antagonistas da aldosterona. A reabsorção tubular proximal promove
retenção renal de sódio por vários mecanismos, como o aumento da
angiotensina II, hiperatividade adrenérgica simpática e redução da perfusão
renal, com benefício na associação de diuréticos de alça como a Furosemida
(40-160 mg/d).
O objetivo durante o tratamento é a perda de 0,5 kg/dia nos pacientes
sem edema periférico e 1 kg/dia naqueles com edema de membros inferiores,
devendo evitar perdas rápidas e superiores para não ocasionar contração do
volume plasmático e consequente insuficiência renal e hiponatremia. A
longo prazo, objetiva-se manter os doentes sem ascite com a menor dose
necessária de diuréticos, devendo suspendê-los sempre que possível.
As principais complicações da terapia diurética são disfunção renal,
distúrbios hidroeletrolíticos (hipocalemia, hipomagnesemia, hiponatremia e
hipercalemia), encefalopatia hepática, ginecomastia (pela espironolactona) e
câimbras. Dosagens periódicas de eletrólitos e função renal são
recomendadas. Se houver piora da função renal ou hiponatremia grave (Na+
< 125 mmol/L), deve-se descontinuar os diuréticos; se hipocalemia grave
(K+ < 3 mmol/L), suspender os diuréticos de alça; se hipercalemia grave
(K+ > 6 mmol/L), interromper os antagonistas da aldosterona. A restrição
hídrica não é recomendada rotineiramente, sendo indicada nos pacientes com
sódio sérico abaixo de 125 mmol/L.
Nos cirróticos com ascite não complicada, a abordagem baseia-se no
grau de ascite:

• Ascite grau 1: Controle da ingestão de sódio


Esses pacientes têm baixa excreção de sódio, sendo o objetivo do
tratamento regular o excesso de sódio corporal através da restrição moderada
da ingestão de sódio (2 g de sal/dia, pela recomendação AASLD; 4,6-6,9 g
de sal por dia, pela recomendação EASL), o equivalente à dieta sem sal,
evitando alimentos pré-preparados.
Nos casos de ascite graus 2 ou 3, é necessária terapia farmacológica:

• Ascite grau 2: Controle da ingestão de sódio + diuréticos


Os diuréticos antagonistas da aldosterona (Espironolactona) são
recomendados por serem mais eficazes do que os diuréticos de alça
(Furosemida), porém podem ser associados.

• Espironolactona: dose inicial de 100 mg/dia, com aumento


gradual a cada 72 horas, se necessário, até a dose máxima de 400
mg/dia.
• Furosemida: pode ser associada na dose inicial de 40 mg/dia,
com ajuste, se necessário, até a dose máxima de 160 mg/dia.
O ajuste da dose de diuréticos é baseado na perda de peso do paciente,
que é o objetivo a curto prazo, monitorizada pela função renal, eletrólitos e
quadro clínico.

• Ascite grau 3: Controle da ingestão de sódio + diuréticos +


paracentese de alívio
O tratamento baseia-se na paracentese de alívio com infusão de
albumina, se necessário, para prevenir a disfunção circulatória pós-
paracentese, recomendada se retirada superior a 5 litros. Deve ser feita da
seguinte forma:

• Albumina humana (1 frasco = 50 mL, 10 g - 20%): infundir EV,


na dose 6-8 gramas por litro de líquido ascítico removido (se
paracentese superior a 5 litros). Nesses casos, a reposição deve ser
contabilizada considerando cada litro drenado.
Posteriormente, se possível, deve-se iniciar terapia com diuréticos para
evitar a recidiva da ascite.

1. ASCITE REFRATÁRIA
A ascite refratária é aquela que não responde ao tratamento de
mobilização ou que recidiva de forma precoce. A sobrevida média nesse
grupo de pacientes é de aproximadamente 6 meses, sendo considerada uma
indicação ao transplante hepático. Pode ser subdividida em:

• Resistente à ação dos diuréticos: não responde à dose máxima.


• Intratável com diuréticos: apresenta complicações incompatíveis
com a manutenção do tratamento, como insuficiência renal,
distúrbios hidroeletrolíticos e encefalopatia.
O tratamento de primeira linha na ascite refratária é a paracentese de
alívio com a reposição a albumina. Outras formas de manejo incluem a
terapia diurética (se excreção de sódio urinária > 30 mEq/dia), colocação de
shunt portossistêmico intra-hepático transjugular (TIPS) e transplante
hepático. O TIPS é a opção em pacientes que necessitam de paracenteses
frequentes, com retirada de grande volume de líquido ascítico, ou naqueles
em que a paracentese não é efetiva. Não deve ser recomendado em pacientes
com bilirrubina sérica > 3 mg/dL e plaquetopenia inferior a 75000,
encefalopatia hepática atual grau ≥ 2 ou encefalopatia hepática crônica,
infecção ativa concomitante, insuficiência renal progressiva, disfunção
sistólica ou diastólica grave ou hipertensão pulmonar.

2. PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA (PBE)


A PBE é uma infecção frequente em cirróticos com ascite, com
prevalência de 1,5 a 3,5% em pacientes ambulatoriais e 10% nos
hospitalizados.

a. Clínica
Os pacientes podem ser assintomáticos ou apresentar dor,
hipersensibilidade abdominal e vômitos, além de sinais de infecção
sistêmica, como febre, calafrios e taquicardia. Os cirróticos podem
apresentar descompensação da função hepática, encefalopatia hepática,
disfunção renal ou instabilidade hemodinâmica em decorrência da infecção
do líquido ascítico.

b. Diagnóstico
O diagnóstico é realizado através da análise do líquido ascítico, que
apresenta características de hipertensão portal (GASA ≥ 1,1) e proteína do
líquido ascítico < 2,5, associadas a:

• PBE: ≥ 250 PMN/mm3 e cultura positiva.


• Ascite neutrofílica: ≥ 250 PMN/mm3 e cultura negativa. Esses
pacientes têm apresentação semelhante àqueles com PBE e devem
ser tratados da mesma forma.

• Bacterascite: < 250 PNM/mm3 e cultura positiva. Pode


corresponder à colonização espontânea e transitória do líquido
ascítico. Se houver sinais clínicos e sintomas de PBE, deve ser
tratada como tal. Do contrário, deve-se repetir a paracentese para
reavaliar o líquido ascítico, pois em 40% dos casos evoluem para
PBE.

c. Tratamento da Peritonite Bacteriana Espontânea


A antibioticoterapia resolve a PBE em 90% dos doentes e deve ser
iniciada empiricamente após o diagnóstico, antes do resultado da cultura,
visando à cobertura das bactérias mais comumente envolvidas (Gram-
negativas, principalmente E. coli, e cocos Gram-positivos, como
Streptococcus e Enterococcus).
O tratamento de 1a linha é realizado com as Cefalosporinas de 3a
geração, tendo como alternativa amoxicilina + clavulanato e quinolonas.
Para pacientes que já estavam em uso de quinolona profilática, nos casos de
infecção hospitalar e nos locais de alta prevalência de resistência a essas
drogas, não se recomenda manter essa classe de antibiótico para tratamento.
Veja a tabela a seguir para as opções de antibioticoterapia (Tabela 5).

ANTIBIOTICOTERAPIA PARA PBE


Ceftriaxona, 2 g, EV, 1x dia, 5 dias.

Cefotaxima, 2 g, EV, 8/8 horas, 5 dias.

Amoxicilina-clavulanato, 1,2 g, EV, 8/8h, por dois dias + 500/125 mg, VO, 8/8 horas, por até 8-14 dias.

Ciprofloxacino 200 mg, EV, 12/12h, por 2 dias, seguido de 500 mg, VO, 12/12 horas, por 7 dias.

Tabela 5. Antibioticoterapia para PBE


Fonte: Elaborado pelos autores.

O controle do tratamento pode ser realizado através de nova paracentese


após 48 horas do início dos antibióticos, com evidência de queda na
contagem de PMN no líquido ascítico para < 250/mm3. Culturas estéreis (se
positivas no momento do diagnóstico) representam resolução da PBE. Se a
contagem de neutrófilos no líquido ascítico não diminuir para menos de 25%
do valor de pré-tratamento ao fim de 2 dias de antibioticoterapia ou se
houver persistência ou piora dos sinais e sintomas clínicos, deve-se avaliar
resistência bacteriana ou peritonite secundária.
A PBE pode precipitar disfunção circulatória e síndrome hepatorrenal
(SHR), com alta taxa de mortalidade. Dessa forma, recomenda-se nos
pacientes com PBE a reposição de albumina (1,5 g/kg de peso corporal ao
diagnóstico, seguido de 1 g/kg no terceiro dia), o que diminui
significativamente a incidência do SHR de 30 para 10%, com redução nas
taxas de mortalidade.

d. Profilaxia para PBE


Existem situações em que o risco de desenvolver PBE é alto, sendo
recomendada a profilaxia.

• Profilaxia primária
Hemorragia digestiva: Norfloxacino 400 mg 12/12 h por 7 dias.
Se doença hepática avançada (Child B ou C) ou uso prévio de
quinolonas, preferir Ceftriaxona (1 g/dia, EV, 7 dias).

Proteína total do líquido ascítico < 1 g/dL para pacientes


internados ou proteína total do líquido ascítico < 1,5 g/dL e
doença hepática avançada para pacientes ambulatoriais:
Norfloxacino 400 mg/dia, contínuo.

• Profilaxia secundária
História prévia de PBE: Norfloxacino via oral 400 mg/dia,
contínuo. Como alternativa, Ciprofloxacino (750 mg uma vez
por semana, por via oral) ou Sulfametoxazol + Trimetoprim
(800/160 mg ao dia, 5 dias/semana por via oral).

3. PERITONITE BACTERIANA SECUNDÁRIA


A peritonite bacteriana secundária decorre de perfuração ou inflamação
de órgãos intra-abdominais. Deve ser suspeitada em pacientes com sinais ou
sintomas abdominais localizados, cuja análise do líquido ascítico demonstra
flora polimicrobiana, contagem bastante elevada de neutrófilos e alta
concentração de proteínas. Nesse contexto, devem ser submetidos à
investigação radiológica com a tomografia computadorizada de abdome.
A contagem de polimorfonucleares corrigida > 250 mm³ confirma
peritonite bacteriana. Testes adicionais devem ser realizados no intuito de
diferenciar peritonite bacteriana primária da secundária.
Quando preenchidos 2 dos 3 critérios abaixo, a suspeita é de causa
secundária:
• glicose < 50 mg/dL;
• proteínas totais > 1 g/dL;
• desidrogenase lática (LDH) no líquido ascítico maior que os níveis
séricos.
Outros parâmetros que também sugerem esse diagnóstico: fosfatase
alcalina > 240 U/L, relação amilase ascite/soro > 0,4, bilirrubina maior que a
dosagem sérica e cultura polimicrobiana.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1: Paracentese diagnóstica.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Fluxograma 2: Diagnóstico e Tratamento da Peritonite Bacteriana
Espontânea (PBE).
Fonte: Adaptado de Ferraz. 8

Fluxograma 3: Manejo da ascite. *Espironolactona 100-400 mg/dia;


Furosemida 40-160 mg/dia.
Fonte: Adaptado de Ferraz 8
Fluxograma 4: Manejo da Ascite Refratária
Fonte: Adaptado de Ferraz 8

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: J.P.M., masculino, 50 anos, 60 kg, dá entrada ao
pronto-atendimento com queixa de dor abdominal difusa, vômitos e
febre há 3 dias, além de aumento progressivo do volume abdominal. É
portador de cirrose hepática de etiologia alcoólica em uso de
Furosemida 40 mg/dia e Espironolactona 100 mg/dia.

b. Exame físico: Ao exame, apresenta-se ictérico (2+/4+), FC de 84


bpm, FR de 16 irpm, SatO2 de 95%, PA de 100 x 60 mmHg e febril
(Tax. de 38,1°C). Abdome globoso, doloroso difusamente à palpação,
teste da macicez móvel positivo.

c. Exames Laboratoriais: O paciente foi submetido à paracentese


diagnóstica, que revelou:

• Aspecto: turvo
Exame microscópico
Contagem total de células 842

PMN 410

Proteínas totais 1 g/dL

Albumina 0,5 g/dL

Cultura E. coli +

Exame bioquímico
Glicose 80 mg/dL

LDH 240 U/L

Os exames séricos mostraram LDH (280 U/L), leucócitos (14.000/mm3),


bilirrubina total (4 mg/ dL), albumina (3,0 g/dL) e o GASA calculado (2,5
g/dL).
d. Diagnóstico: peritonite bacteriana espontânea

e. Prescrição Sugerida: internação hospitalar

1. Dieta para hepatopata + hidratação oral.


2. Sinais vitais e monitorização de 6/6 horas.
3. Suspender diuréticos (em vigência de quadro infeccioso e risco de
disfunção renal).
4. Ceftriaxona, 1 g, EV, 12/12 h – por 5 dias (guiar pela cultura e
evolução clínica e laboratorial).
5. Albumina humana a 20%, 10 g (50 mL), fazer 3 frascos, EV, de
8/8 horas (90 g EV = 1,5 g/kg, para a prevenção de síndrome
hepatorrenal. No terceiro dia, fazer 60 g EV = 1,0 g/Kg).

DICAS DO ESPECIALISTA
• A ascite é uma manifestação clínica tanto de doenças hepáticas
quanto de doenças peritoneais e sistêmicas.

• A avaliação do líquido ascítico é fundamental para a propedêutica


e devem sempre constar: níveis de proteína e albumina +
celularidade total e diferencial + cultura.

• GASA ≥ 1,1 indica hipertensão portal ou causa cardiogênica.


GASA < 1,1 indica doença peritoneal.

• A contagem de PMN > 250 e cultura do líquido ascítico positiva:


PBE, sendo recomendado antibioticoterapia + reposição de
albumina no 1° e 3° das para prevenir SHR; profilaxia secundária
de PBE, com antibiótico, após a resolução do quadro agudo.

• A PBS decorre de perfuração ou inflamação de órgãos intra-


abdominais. Deve ser suspeitada se líquido ascítico celularidade
elevada, cultura polimicrobriana, e dois dos três critérios: glicose <
50 mg/dL; proteínas totais > 1 g/dL; LDH no líquido ascítico
maior que os níveis séricos.

• Tratamento da ascite: restrição moderada de sódio associada a


diuréticos e paracentese de alívio, se necessário. Atentar aos efeitos
adversos do tratamento: disfunção renal, distúrbio hidroeletrolítico
e encefalopatia hepática.

• Nos casos refratários, paracenteses de repetição, TIPS e


transplante hepático devem ser considerados.
REFERÊNCIAS
1. Associação europeia para o estudo do fígado (EASL). Recomendações de orientação clínica
da EASL para a abordagem da ascite, da peritonite bacteriana espontânea e da síndrome
hepatorrenal na cirrose. J Hepatol. 2010; 53: 397-417.
2. Runyon BA. Spontaneous Bacterial Peritonitis in Adults: Treatment and Prophylaxis.
UpToDate. [Internet]; 2016. [acesso em 12/05/2020]. Disponível em:
https://www.uptodate.com/contents/spontaneous-bacterial-peritonitis-in-adults-treatment-
and-prophylaxis.
3. Runyon BA. Evaluation of Adults With Ascites. UpToDate. [Internet]; 2016. [acesso em
12/05/2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/evaluation-of-adults-with-
ascites.
4. Runyon BA. Diagnostic and Therapeutic Abdominal Paracentesis. UpToDate. [Internet];
2016. [acesso em 12/05/2020]. Disponível em:
https://www.uptodate.com/contents/diagnostic-and-therapeutic-abdominal-paracentesis.
5. Olmos RD, Dos Santos MSC, Martins HS, Lopes RDA. Ascite no pronto-socorro. In:
Martins HS, Neto RAB, Neto AS, Velasco IT. Emergências clínicas: abordagem prática. 9.
ed. Manole: Barueri, 2014.
6. Lopes AC. Tratado de clínica médica: volume 1. 2. ed. São Paulo: Roca; 2009.
7. Associação europeia para o estudo do fígado (EASL). Diretrizes de Prática Clínica da EASL
para o manejo de pacientes com cirrose descompensada. J Hepatol. 2018 vol. XXX.
8. Ferraz MLG, Silva AEB, Schiavon JLN, Monteiro MM, Sammarco GN, Almeida VB.
Manual De Hepatologia Para Clínicos e Residentes. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Atheneu;
2018.
9. Adebayo D, Neong SF, Wong F. Refractary ascitis. Am J Gastroenterol. 2019; 114(1): 40-7.
3.2
ABDOME AGUDO
Autores:
Edivan Fernandes Frota Filho
Ana Claudia Rocha Sales
Géssyka Soares Castro
Lívia de Almeida Costa
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes

DEFINIÇÕES
• Abdome agudo: caracteriza-se por uma síndrome clínica que
apresenta como principal manifestação dor abdominal de início
abrupto ou de evolução progressiva.
Devido ao extenso rol de diagnósticos diferenciais, com condições
potencialmente ameaçadoras à vida, o abdome agudo é um desafio para o
médico no setor de emergência. Alguns grupos de pacientes representam
desafios diagnósticos especiais: idosos e diabéticos, por apresentarem
sintomas atípicos; imunossuprimidos, pelas condições incomuns que
podem apresentar; e gestantes, que cursam com alterações fisiológicas e
anatômicas que afetam a apresentação das doenças.
A dor intensa de início súbito e a dor constante, de forte intensidade,
com duração superior a 6 h, sugerem patologias com necessidade de
abordagem rápida, com indicação cirúrgica em poucas horas na maioria dos
casos devido à alta morbimortalidade. Portanto, o principal elemento de
diagnóstico é uma boa anamnese com exame físico completo, os quais
podem propor supostas causas e direcionar os métodos complementares a
serem realizados.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O abdome agudo pode exibir cinco principais etiologias:
• Inflamatória: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite,
diverticulite aguda, abscesso hepático, doença inflamatória
intestinal (fístulas e abscessos) etc.

• Obstrutiva: obstrução do intestino delgado ou grosso relacionada


à aderência, volvo do sigmoide, volvo do ceco, hérnias
encarceradas, neoplasias, doença inflamatória intestinal (estenoses)
etc.

• Perfurativa: úlcera gastrointestinal perfurada, câncer


gastrointestinal perfurado, divertículo perfurado etc.

• Isquêmica: trombose mesentérica, torção de ovário, colite


isquêmica, hérnias estranguladas etc.

• Hemorrágica: gravidez ectópica rota, ruptura de cistos, ruptura


de aneurismas, trauma de órgãos sólidos, pancreatite hemorrágica
etc.
Além das causas abdominais, o abdome agudo pode ter diagnóstico
diferencial de origem extra-abdominal, sendo elas:

• Torácica: infarto agudo do miocárdio, embolia pulmonar,


pneumotórax.

• Hematológicas: crise falciforme, leucemia aguda.


• Neurológicas: herpes zoster, tabes dorsalis.
• Metabólicas: cetoacidose diabética, hiperlipoproteinemia.
• Relacionadas e tóxicas: intoxicação por chumbo, picadas de
cobras ou insetos, abstinência de narcóticos.
• Etiologia desconhecida: fibromialgia.
As principais causas de abdome agudo são: apendicite aguda,
colecistite aguda, obstrução de intestino delgado, doença ginecológica e
pancreatite aguda. Apendicite aguda é a causa mais frequente de abdome
agudo de todas as possíveis etiologias.

QUADRO CLÍNICO
O principal sintoma do abdome agudo é dor abdominal, cujas
características podem variar conforme a etiologia:

• Inflamatório: dor inicialmente leve a moderada, difusa ou


referida em topografia diferente do local inflamado, que evolui
com aumento de intensidade e limitação da dor no sítio anatômico
do órgão inflamado. Passa a apresentar resistência abdominal
voluntária e involuntária à palpação, descompressão brusca
dolorosa e diminuição dos ruídos hidroaéreos, além de sintomas
gerais como febre e taquicardia.

• Perfurativo: dor de início abrupto e forte intensidade,


apresentando defesa abdominal, irritação peritoneal, abdome em
tábua, diminuição de ruídos hidroaéreos por mais de 2 minutos e
sinal de Jobert (percussão com timpanismo na região
hemiclavicular direita, onde normalmente há macicez hepática,
denotando grande pneumoperitônio). A principal causa é úlcera
gástrica ou duodenal perfurada.

• Obstrutivo: dor do tipo cólica, frequentemente periumbilical,


associada a náuseas, vômitos, distensão abdominal e parada da
eliminação de flatos e fezes. Pode aparecer peristaltismo visível e
aumento dos ruídos hidroaéreos com som metálico. Toque retal
deve ser realizado, podendo ser observado fecaloma, tumor ou
mesmo ausência de fezes na ampola retal, denotando uma
obstrução acima do reto. A principal causa é a obstrução por
aderências.
• Isquêmico: dor disseminada e pouco definida se caracteriza
principalmente pela desproporção entre a dor e o exame físico,
ruídos hidroaéreos diminuídos ou ausentes e sinal de Lenander
(temperatura retal pelo menos 1°C maior que a temperatura axilar).
As principais causas são embolia e trombose mesentérica.

• Hemorrágico: dor acentuada com abdome em tábua e dor à


descompressão. É associado a sinais de hipovolemia. Toque retal
deve ser realizado para avaliação de melena ou enterorragia. Entre
as principais causas estão gravidez ectópica rota, ruptura de cistos,
ruptura de aneurismas e ruptura de baço.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: Pacientes inquietos, agitados, trocando de posição na
tentativa de aliviar a dor, sugerem, por exemplo, cólica renal ou
obstrução intestinal. Já pacientes que se encontram imóveis no
leito, em posição fetal, evitando falar e fáscies de dor intensa,
provavelmente têm peritonite.

• Sinais vitais: Avaliar sinais de instabilidade hemodinâmica


(hipotensão, taquicardia, taquipneia) que irão interferir na
abordagem diagnóstica e tratamento.

• Avaliação de sistemas: A dor abdominal pode ter causas extra-


abdominais (pneumonia, infarto agudo do miocárdio), tornando
essencial a ausculta pulmonar e a avaliação cardíaca. O exame
cutâneo não pode ser esquecido, buscando alterações sugestivas de
herpes zoster ou sinais de hemorragia intra-abdominal e
retroperitoneal que podem se manifestar através dos sinais de
Cullen (equimose periumbilical) e Gray Turner (equimose nos
flancos).

• Exame abdominal:
Inspeção: presença de cicatrizes cirúrgicas aumentam a
suspeita sobre aderências; presença de distensão e peristaltismo
visível sugerem obstrução intestinal.

Ausculta: ausência de ruídos intestinais são sugestivos de


peritonite. Sons abdominais aumentados, intermitentes,
associados à piora da dor, sugerem obstrução intestinal.

Percussão: abdome distendido, hipertimpânico, sugere


obstrução intestinal. Presença de dor à percussão pode indicar
presença de peritonite.

Palpação: Inicialmente a palpação deve começar no ponto mais


distante do local apontada pelo paciente como de maior
intensidade da dor. A presença de rigidez, tensão abdominal e
defesa sugere peritonite. Os sinais do iliopsoas, obturador,
Rovsing e Blumberg sugerem apendicite. O sinal de Murphy
(interrupção abrupta de uma inspiração profunda durante a
palpação do hipocôndrio direito) sugere colecistite aguda.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Exames laboratoriais: Hemograma completo e análise de
sedimentos da urina (EAS, sumário de urina ou urina tipo 1)
devem ser solicitados para a maioria dos pacientes, porém são
inespecíficos. Solicitar teste de gravidez em todas as mulheres em
idade fértil. Paciente com dor em abdome superior deve ter
enzimas hepáticas e amilase solicitados. Outros testes devem ser
avaliados conforme a hipótese diagnóstica.

• Radiografia: exame de baixo custo e ampla disponibilidade. Deve


ser solicitado radiografia de abdome em decúbito dorsal,
ortostatismo e tórax. Útil na detecção de corpos estranhos,
obstrução e perfuração intestinal.
• Ultrassonografia: exame de escolha em pacientes instáveis pela
possibilidade de ser realizado à beira do leito. Útil nos casos
suspeitos de: aneurisma de aorta abdominal, cólica biliar,
colecistite, gravidez ectópica, abscesso tubo-ovariano, litíase renal
e possivelmente na apendicite.

• Tomografia de abdome: é o exame de escolha na dor abdominal


indiferenciada. Permite identificar pneumoperitônio, lesões
obstrutivas, inflamatórias, vasculares, neoplasias e hemorragia
intra-abdominal. Deve ser evitada em caso de instabilidade
hemodinâmica.

DIAGNÓSTICO
A combinação de uma história cuidadosa e exame físico é crucial para
criar um diagnóstico focado e apropriado (Tabela 1).

Dor abdominal Sintomas associados Antecedentes

Início e progressão Náuseas e/ou vômitos Trauma abdominal


Localização Febre Abuso de bebidas alcoólicas
Característica Tontura/hipotensão Imunossupressão
Intensidade Sangramentos Neoplasia
Fatores de melhora Alteração do hábito intestinal Doença ulcerosa péptica
Fatores de piora Doença inflamatória intestinal
Cirurgias abdominais prévias
Doença cardiovascular
Diabetes mellitus

Tabela 1. Características a serem detalhadas em uma anamnese.


Fonte: Elaborado pelos autores.

A realização de exames complementares deve primeiramente avaliar a


estabilidade hemodinâmica do paciente. Pacientes instáveis não devem
ser submetidos a exames como tomografia de abdome e arteriografia, sendo
indicada cirurgia logo que identificada uma possível causa cirúrgica, após
estabilização hemodinâmica inicial.
Análise bioquímica inicial deve ser direcionada pela etiologia provável
de acordo com a anamnese. Hemograma completo, análise de urina, proteína
C reativa, amilase, lipase, aminotransferases e provas de coagulação, além
de beta-HCG para mulheres em idade fértil, são os principais exames a
serem solicitados.
Exames de imagem podem ser úteis na investigação, devendo ser
solicitada inicialmente a radiografia de abdome com rotina para abdome
agudo (tórax PA, abdome em decúbito e ortostase), na suspeita de abdome
agudo perfurativo (presença de pneumoperitôneo). Caso não seja feito o
diagnóstico na avaliação inicial, outros exames podem ajudar na
investigação, tais como ultrassonografia, tomografia computadorizada e
arteriografia de abdome, devendo sempre ser direcionados para a etiologia
mais provável do abdome agudo.
Para diagnóstico definitivo, utiliza-se videolaparoscopia ou
laparotomia exploradora, sendo realizadas quando os outros exames
complementares foram insuficientes, servindo como ferramenta
diagnóstica e terapêutica. Veja o algoritmo para diagnóstico do abdome
agudo ao final deste capítulo.

TRATAMENTO
O primeiro passo para avaliar um paciente com dor abdominal aguda é
definir se está hemodinamicamente instável ou estável:

• Instável: monitorização rigorosa e estabilizar o paciente seguindo


os passos ABCDE do Advanced Trauma Life Support (ATLS)
(Airways, Breathing, Circulation, Disability, Exposure), além de
que o diagnóstico deve ser precoce através da ultrassonografia
FAST (Focused Assessment with Sonography for Trauma) ou da
laparotomia exploradora.

• Estável: deve-se fazer uma anamnese completa, exame físico


minucioso e solicitar exames complementares direcionados para a
possível etiologia. Estabelecida a causa do abdome agudo, o
tratamento deve ser instituído de acordo com a etiologia: analgesia,
hidratação venosa, correção de distúrbios hidroeletrolíticos e
acidobásicos, antibioticoterapia, drenagem de coleções por
radiointervenção, abordagem endovascular, videolaparoscopia ou
laparotomia. Na indefinição do diagnóstico, o paciente deverá
permanecer em observação clínica e continuar com a propedêutica
voltada para as causas mais prováveis de acordo com a anamnese.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO

Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: P.S.M, masculino, 29 anos, comparece ao pronto-
socorro relatando dor epigástrica há dois dias, evoluindo com piora e
migração para região de fossa ilíaca direita (FID). No momento,
apresenta dor intensa em todo o abdome, febre e vômitos. Nega
diarreia, icterícia, colúria ou acolia fecal. Ao exame físico, apresenta
FC de 115 bpm, Tax 38,9°C, PA de 140x80 mmHg, EG Regular,
abdome em tábua, dor à descompressão brusca em todo o abdome,
porém mais intensa em FID e Sinal do obturador e Rovsing positivos.
b. Exames complementares: leucocitose com desvio à esquerda e
FAST demonstrando a presença de líquido na cavidade abdominal.
c. Diagnóstico: apendicite aguda perfurada.
d. Prescrição Sugerida: paciente foi submetido à laparotomia com
lavagem de cavidade e apendicectomia. Prescrito ciprofloxacina 400
mg EV 12/12 h e metronidazol 500 mg EV 8/8 h no intra e no pós-
operatório. A evolução foi boa, recebendo alta após 7 dias da cirurgia.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Anamnese e exame físico cuidadosos são essenciais para um
diagnóstico diferencial focado e para direcionar sua propedêutica.

• Apendicite aguda é a principal causa de abdome agudo.


• Pacientes idosos, diabéticos, imunossuprimidos e gestantes são
os que podem apresentar sintomas atípicos e devem ser conduzidos
com maior cautela.

• Pacientes com dor que já se inicia de intensidade máxima e


aquelas que aumentam de intensidade e duram mais de 6 horas
sugerem patologias de maior morbimortalidade e provavelmente
necessitarão de uma abordagem cirúrgica de urgência.

• Lembre-se de que patologias extra-abdominais podem se


apresentar com dor abdominal, e devem ser buscadas durante a
avaliação desses pacientes.

• Toda mulher em idade fértil deve realizar um teste de gravidez.


• Pacientes instáveis devem seguir protocolo do ATLS e ter
avaliação precoce do cirurgião.
REFERÊNCIAS
1. Brunetti A, Scarpelini S. Abdômen agudo. Simpósio: cirurgia e trauma. Ribeirão Preto. 2007
jul/ set; 40(3): 358-67.
2. Martins MA, Carrilho FJ, Alves VA, Castilho EA, Cerri GG. Clínica médica, volume 4:
doenças do aparelho digestivo, nutrição e doenças nutricionais. 2. ed. Barueri, SP: Manole;
2016.
3. Feres O, Parra RS. Abdômen agudo. Simpósio: fundamentos em clínica cirúrgica. Ribeirão
Preto. 2008 ago/out; 41(4): 430-6.
4. Kendall JL, Moreira ME. Evaluation Of The Adult With Abdominal Pain In The Emergency
Department. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em 15/05/2020]. Disponível em:
https://www.uptodate.com/contents/evaluation-of-the-adult-with-abdominal-pain-in-the-
emergency-department.
5. Martins, Herlon Saraiva; Brandão Neto, Rodrigo Antonio; Velasco, Irineu Tadeu. Medicina
de emergência: abordagem prática. Capítulo 22. Dor abdominal. 11ª Ed. Barueri: Manole,
2016.
6. Meneghelli UG. Elementos para o diagnóstico do abdômen agudo. Simpósio: emergências e
urgências digestivas, Ribeirão Preto, 2003 abr/dez;36(2):283-293.
7. Penner RM; Fishman MB; Majumdar SR. Evaluation Of The Adult With Abdominal Pain.
UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em 15/05/2020]. Disponível em:
https://www.uptodate.com/contents/evaluation-of-the-adult-with-abdominal-pain.
8. SABISTON, D.C.Jr., ed. et al. Tratado de cirurgia: A base Biológica da prática Cirúrgica
Moderna. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
3.3
DIARREIA AGUDA
Autores:
Isadora Brandão Pelucio
Vitor Negreiro Leão
Lívia de Almeida Costa
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes

DEFINIÇÕES
• Diarreia aguda: alteração do hábito intestinal, devido ao aumento
de água e eletrólitos nas fezes, ocasionando a redução da
consistência, aumento na frequência e no volume fecal (mais de
250 g por evacuação). Em resumo, é a presença de 3 ou mais
evacuações aquosas, diminuídas de consistência, em um período
igual ou maior que 24 horas.

EPIDEMIOLOGIA
A doença diarreica tem alta prevalência e morbimortalidade,
principalmente nos países em desenvolvimento que possuem recursos
limitados, falta de higiene por grande parte da população e saneamento
básico precário, com a presença de água e alimentos contaminados, os quais
compreendem as mais importantes fontes de transmissão.
É uma das principais causas de mortalidade infantil; já nos adultos,
apesar de os dados quanto à diarreia serem escassos, sabe-se que, na maioria,
o quadro é autolimitado e com curta duração.
Atualmente, nos países desenvolvidos, como os EUA, tem sido estimado
um aumento nos casos de diarreia, uma vez que os recursos financeiros
criam possibilidades de transmissão como: viagens, importação de
alimentos, maiores aglomerações e um maior acesso e uso da automedicação
com antibioticoterapia.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A maioria dos casos de diarreia aguda é de origem infecciosa, incluindo
vírus (norovírus, rotavírus, adenovírus e outros), bactérias (Salmonella,
Campylobacter, Shigella, Escherichia coli, Clostridioides difficile e outros),
fungos (Candida albicans) e protozoários (Cryptosporidium, Giardia,
Cyclospora, Entamoeba e outros), sendo a origem viral responsável pela
maioria dos casos e as bactérias por grande parte dos quadros graves.
Deve-se atentar para o fato de que as infecções por protozoários
geralmente cursam com diarreia persistente.
Eventualmente, outras causas podem iniciar o quadro como diarreia
aguda, tais como: dietéticas (sorbitol, frutose, intolerâncias alimentares [a
lactose, sacarose, feijão, frutas, pimenta] etc.), medicamentosas
(antibióticos, laxativos), alérgicas (alergia ao leite de vaca, soja e outros),
inflamatórias (Crohn, RCU), funcionais (síndrome do intestino irritável),
dentre outras (apendicite aguda, doença celíaca, intoxicação por metais
pesados e etc.).

QUADRO CLÍNICO
É pertinente atentar-se a uma história clínica cuidadosa, determinando a
duração dos sintomas, a frequência e as características das fezes e
sintomas associados (febre, náuseas, vômitos, dor abdominal). Além disso,
deve-se questionar sobre a ingestão alimentar, o uso de qualquer
medicação (laxativos, antibióticos), história de viagem recente e diarreia
em familiares próximos, especialmente naqueles que ingeriram alimentos
semelhantes.

EFEITOS COLATERAIS
a. Sinais de alerta

• Sangue ou pus nas fezes


• Febre
• Sinais de desidratação (como micção reduzida, letargia ou apatia,
sede extrema e boca seca)

• Diarreia crônica (mais de 1 mês de duração)


• Diarreia noturna
• Perda de peso
b. Classificações (descritas nas tabelas abaixo):
Diarreia alta Diarreia baixa
• Acomete o intestino delgado. • Acomete o intestino grosso.
• Fezes tipicamente aquosas, de maior volume e menor • Pequena quantidade, muito frequentes, com movimentos
frequência. peristálticos dolorosos, frequentemente acompanhado de
• Associada a dor e distensão abdominal, odor fétido, podendo febre.
ter a presença de restos alimentares. • É comum a presença de urgência e tenesmo.
• Sangue oculto ou células inflamatórias nas fezes e febre • Fezes sanguinolentas (disenteria) ou mucoides ocorrem mais
raramente são identificados. frequentemente que na diarreia alta.

Tabela 1. Classificação das diarreias quanto à origem.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Diarreia • Pode durar até 14 dias e determina perda de grande volume de fluidos, podendo causar desidratação.
• Pode ser causada por bactérias e vírus, na maioria dos casos.
aguda • A desnutrição eventualmente pode ocorrer se a alimentação não é fornecida de forma adequada e se
aquosa episódios sucessivos acontecem.

Diarreia
• Caracterizada pela presença de sangue nas fezes. Representa inflamatória lesão na mucosa intestinal.
aguda • Pode associar-se com infecção sistêmica e outras complicações, incluindo desidratação.
com sangue • Bactérias do gênero Shigella são as principais causadoras.
(Disenteria)

• Estende-se por 14 dias ou mais.


Diarreia • Pode provocar desnutrição e desidratação.
persistente • Grupo com alto risco de complicações e elevada letalidade.

Tabela 2. Classificação das diarreias quanto ao tempo.


Fonte: Elaborado pelos autores.

EXAME FÍSICO
Exame físico deve ser detalhado, procurando sinais de desidratação e
desnutrição.

• Sinais e sintomas de hipovolemia:


Leve: sinais e sintomas podem estar ausentes;

Moderada: sede, turgor alterado;

Grave: diminuição do nível de consciência, oligúria/anúria,


extremidades úmidas e frias, pulso fraco, hipotensão, cianose
periférica.

• Deve-se atentar para alterações respiratórias, cardíacas, renais e do


estado mental.

• O exame abdominal deve avaliar os achados que podem sugerir


uma peritonite, que incluem dor abdominal, descompressão
brusca dolorosa e rigidez abdominal, além da presença ou não de
ruídos hidroaéreos.

EXAMES COMPLEMENTARES
Deve ser lembrado que os laboratórios, em geral, não dispõem de
recursos para diagnosticar todas as bactérias e vírus causadores de diarreia
aguda.

• Exames e indicações:
Fluxograma 1: Exames complementares na investigação de diarreia aguda.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Correlações entre clínica, alterações laboratoriais e possíveis causas:

• Leucocitose com desvio à esquerda (às vezes, com reação


leucemoide) sugere infecção bacteriana e serve de fator
prognóstico para infecção por C. difficile.

• Eosinofilia aumenta a suspeita de infecção por parasitas de ciclo


extraintestinal (por exemplo, Strongyloides sp.)
Alteração de função renal e distúrbio hidroeletrolítico são comuns em
infecções graves.

DIAGNÓSTICO, CLASSIFICAÇÃO E METAS


O diagnóstico é clínico, associado aos dados coletados na anamnese e
exame físico do paciente. Pode-se lançar mão de exames laboratoriais para
auxiliar na investigação quanto às complicações, etiologia e diagnósticos
diferenciais.
Diagnósticos diferenciais que merecem destaque:

a. Enterocolite por Clostridioides difficile

• A doença ocorre por alteração da microbiota intestinal, devido ao


uso de antibióticos (principalmente fluorquinolonas, clindamicina
e cefalosporinas), uso de inibidores de bomba de prótons,
presença de imunossupressão e hospitalização ou
institucionalização, o que favorece a colonização e proliferação
do C. difficile. Em alguns casos, pode cursar com colite
pseudomembranosa.

• Os sintomas podem surgir na vigência ou após o uso de


antibiótico, e as manifestações clínicas mais frequentes incluem
diarreia (pode estar associada a muco ou sangue), dor abdominal,
náuseas, vômitos, febre, anorexia e leucocitose.
• O diagnóstico é clínico-laboratorial, sendo indicada a pesquisa
das toxinas A e B do Clostridioides difficile no exame de fezes,
naqueles pacientes graves com diarreia ou com epidemiologia para
a suspeição (imunossuprimidos, institucionalizados e com história
de uso de antibioticoterapia recente). Caso seja realizado exame
endoscópico para o diagnóstico diferencial, algumas alterações,
desde enantema leve e friabilidade até uma colite
pseudomembranosa com placas branco-amareladas aderidas à
mucosa, podem sugerir e corroborar a etiologia.

• O tratamento inicial é cessar o uso do antibiótico em uso o mais


rápido possível, caso o paciente esteja sintomático. Medicações
que inibam a motilidade, tais como antidiarreicos, escopolamina e
opioides, devem ser evitados pelo risco aumentado de
desenvolvimento de megacólon tóxico. (Vide Tabela 3)

• Não se faz necessária a solicitação de exame para controle pós-


tratamento; o teste pode continuar positivo em até seis semanas
após o término.

Gravidade Medicação Dose


Leves Metronidazol 500 mg de 8/8 h VO por 10 dias.

Moderados a graves Vancomicina 125-500 mg 6/6h VO 10-14 dias

Íleo ou distensão colônica Enema de


500 mg + SF0,9% 100 mL via retal, 6/6h.
significativa Vancomicina

Tabela 3. Tratamento de colite por Clostridioides difficile.


Fonte: Elaborado pelos autores.

b. Doença Inflamatória Intestinal (DII)

• Pacientes com diarreia crônica e sanguinolenta, apresentando


predomínio noturno com despertar, associado à perda ponderal,
dor abdominal e febre, devem ter como diagnóstico diferencial
doenças inflamatórias intestinais (retocolite ulcerativa idiopática
ou doença de Crohn). As DIIs têm pico bimodal, com maior
prevalência em torno da 2ª a 3ª década, seguida da 6ª década de
vida.

• A avaliação inicial do paciente com suspeita de DII em atividade


deve incluir (Fluxograma 2):

Fluxograma 2: Diagnóstico inicial de DII em atividade.


Fonte: Elaborado pelos autores.

• Tratamento inicial da atividade inflamatória da DII (Fluxograma


3):
Fluxograma 3: Tratamentos iniciais de DII em atividade.
Fonte: Elaborado pelos autores.

Avaliação especializada do gastroenterologista é de fundamental importância para


seguimento desses pacientes.

TRATAMENTO
A conduta inicial para pacientes com diarreia aguda é a reposição
hidroeletrolítica (preferencialmente por via oral) e a manutenção da nutrição,
independentemente da severidade do quadro diarreico.

• Terapia de reposição via oral (TRO): via de escolha, com menor


custo e altas taxas de sucesso na correção da desidratação.

• Hidratação endovenosa: utilizada em pacientes graves, com


desidratação grave, sinais de choque, vômitos incoercíveis ou
falência da TRO. Ringer lactato ou soro fisiológico podem ser
utilizados com uma rápida expansão inicial de 20 mL/kg em 10 a
15 minutos.

• Recomendações dietéticas: facilita a renovação dos enterócitos.


Podem ser ingeridos: arroz, batata, aveia, macarrão, trigo, biscoito,
sopa, banana e legumes cozidos. Alimentos com alto teor de
gorduras e produtos lácteos devem ser evitados.

• Sintomáticos descritos na tabela 4.


DROGA APRESENTAÇÃO POSOLOGIA
ANTIDIARREICO

2 mg Ataque: 2 comprimidos VO
• Loperamida
(comprimido) Manutenção: 1 comprimido VO após cada evacuação¹

ANTI-SECRETORES

• Racecadotrila 100 mg (cápsula) 1 cápsula VO 8/8 h até melhora da diarreia²

SINTOMÁTICOS

• Metoclopramida 10 mg/2mL (ampola) 1 ampola até 8/8h se náuseas ou vômitos IV³

4 mg/2mL ou
• Ondansetron 8 mg/4mLl 1 ampola até 8/8h se náuseas ou vômitos IV³
(ampola)

PROBIÓTICOS

• Saccharomyces boulardii 200 mg 1 cápsula ou sachê de 12/12h VO até melhora do quadro diarreico
• Lactobacillus reuteri (pó oral ou
• Lactobacillus acidophilus cápsulas) (em média de 3 a 5 dias)4

¹ Antidiarreicos: reduzem a frequência das evacuações. Podem ser utilizados na ausência de febre e disenteria. Não exceder dose
maior que 16 mg/dia. Riscos: megacólon tóxico nos casos de enterocolite por C. difficile.
² Antissecretores: o inibidor da encefalinase age diminuindo a secreção de líquidos induzida pelo patógeno sem afetar a motilidade
intestinal. Não afeta o curso clínico da gastroenterite.
³ Sintomáticos: em caso de vômitos, suspender TRO e administrar um antiemético.
4 Probióticos: tem valor limitado no tratamento da diarreia aguda, tendo benefício mais bem comprovado na prevenção da diarreia
relacionada a antibiótico.

Tabela 4. Principais fármacos sintomáticos utilizados no tratamento da


diarreia aguda.
Fonte: Elaborado pelos autores à partir das referencias bibliográficas 1 e 5.

• • Antibioticoterapia: não é utilizada corriqueiramente. Está


indicado para pacientes com diarreia grave ou em situações de
risco (febre, hipovolemia, bacteremia, imunocomprometidos,
comorbidades, idade > 70 anos, doença prolongada, diarreia
refratária a medidas conservadoras). Tabela 5.

DROGA APRESENTAÇÃO POSOLOGIA


ESCOLHA

• Ciprofloxacina 500 mg (comprimido) 1 comprimido 12/12h VO, por 3 dias¹

• Levofloxacina 500 mg (comprimido) 1 cápsula VO, única, por 3 dias¹

SINTOMÁTICOS

• Sulfametoxazol-trimetoprima 800 mg/160 mg (comprimido) 1 comprimido VO 12/12h, por 7 dias¹

• Azitromicina 500 mg (comprimido) 1 comprimido VO, único, por 3 dias¹

• Ceftriaxone 1 g (ampola) 1 g 12/12h IV por 7 dias

¹ Escolha, exceto para diarreia por Clostridioides difficile

Tabela 5. Principais antibióticos utilizados no tratamento da diarreia aguda.


Fonte: Elaborado pelos autores à partir das referencias bibliográficas 1 e 5.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO

Fonte: Elaborado pelos autores.


EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: N.L, sexo masculino, 26 anos, comparece ao PS
com queixa de diarreia intensa há 5 dias. Refere evacuações líquidas (6
episódios/dia) com presença de muco. Evoluiu com piora há 2 dias,
apresentando fezes sanguinolentas associada à febre (38,9°C), dor
abdominal e prostração. Nega comorbidades e uso recente de
medicamento.

b. Exame físico: 50 kg, REG, desidratado (2+/4+), febril (38,6°C),


hipocorado (2+/4+), FC de 120 bpm, FR de 20 irpm e SpO2 de 98%.
ACV e AR sem alterações. ABD: RHA +, flácido, doloroso
difusamente à palpação profunda, ausência de sinais de irritação
peritoneal e VCM.

c. Conduta inicial:

1. SF 0,9% 1000 mL EV em 15 min.


2. Dipirona 1 amp + ABD EV.
Após conduta inicial, paciente evoluiu bem, com melhora do estado
geral, taquicardia e febre.

d. Exames Laboratoriais: Hemograma revelou leucocitose com


desvio, aumento da proteína C reativa, sem alterações de função renal
ou distúrbios hidroeletrolíticos. Colhida hemocultura, coprocultura e
protoparasitológico de fezes.

e. Prescrição Sugerida:

1. Alta hospitalar.
2. Dieta leve e obstipante, sem alimentos com gordura ou lactose.
3. SRO (1 a 2 L por dia) + aumentar a ingestão de líquidos por VO.
4. Ciprofloxacino 500 mg 1 cp (VO) 12/12 h por 5 dias (empírico).
5. Dipirona 500 mg 1 cp (VO) 6/6 h se dor ou febre (> 38,5 °C).
6. Metoclopramida 10 mg 1 cp (VO) 8/8 h se náuseas ou vômitos.
7. Retorno para reavaliação clínica, após resultados das culturas e
PPF, ou antes, em caso de piora dos sintomas.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Apesar de a definição de diarreia aguda considerar o limite
máximo de duração de 14 dias, a maioria dos casos são
autolimitados e resolvem-se em até 7 dias. Porém, pode ter
consequências graves como desidratação, desnutrição energético-
proteica e óbito.

• Noventa porcento dos casos são infecciosos, e a ocorrência de


surtos de diarreia é comum devido à alta infectividade de alguns
patógenos (norovírus, rotavírus, Shigella, E. coli produtora de
toxina Shiga, Giardia e Cryptosporidium), especialmente em
populações situadas em ambientes fechados (institucionalizados,
hospitalizados, viajantes em navios etc.).

• Quando os vômitos são achados predominantes, gastroenterite


viral e intoxicação alimentar são as principais causas.

• O tempo de incubação pode ajudar a diferenciar a etiologia: na


gastroenterite viral, os sintomas se iniciam após 14 h,
normalmente entre 24 a 48 h da contaminação; já na intoxicação
alimentar, os sintomas ocorrem entre 2 a 7 horas da exposição.

• Atenção especial deve ser dada a indivíduos hospitalizados ou


institucionalizados, ao uso prévio ou recente de antibióticos,
inibidores de bomba de prótons e quimioterapia e a portadores
de condições que cursam com imunossupressão (doenças ou
medicações em uso). Esses pacientes têm risco maior de quadros
mais graves, como os frequentemente causados pelo
Clostridioides difficile.
• A investigação da etiologia da diarreia aguda não é obrigatória,
sendo realizada nos casos graves e nos pacientes hospitalizados.

• O tratamento consiste em manter hidratação, nutrição e, em


casos selecionados, antibioticoterapia e medicações para alívio
dos sintomas podem ser utilizadas.

REFERÊNCIAS
1. Dupont HL. Acute Infectious Diarrhea in Immunocompetent Adults. N Engl J Med. 2014;
370(16): 1532-40.
2. Torres J, Bonovas S, Doherty G, Kucharzik T, Gisbert JP, Raine T, et al. European Crohn’s
and Colitis Organisation. Guidelines on Therapeutics in Crohn’s Disease: Medical
Treatment. J Crohn’s and Colitis. 2020; 14(1): 4-22,
3. Kelly CP, Lamont JT. Clostridioides (formerly Clostridium) difficile infection in adults:
Treatment and prevention, Literature review. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em junho
de 2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/clostridioides-formerly-
clostridium-difficile-infection-in-adults-treatment-and-prevention.
4. LaRocque R, Pietroni M. Approach To The Adult With Acute Diarrhea In Resource Rich
Settings. UpToDate. [Internet]; 2019. [acesso em junho de 2020]. Disponível em:
https://www.uptodate.com/contents/approach-to-the-adult-with-acute-diarrhea-in-resource-
rich-settings.
5. Shane AL, Mody RK, Crump JA, Tarr PI, Steiner TS, Kotloff K, et al. 2017 Infectious
Diseases Society of America Clinical Practice Guidelines for the Diagnosis and
Management of Infectious Diarrhea. Clin Infect Dis. 2017; 65(12): e45-80.
3.4
DOENÇA CALCULOSA DAS VIAS
BILIARES
Autores:
Fernanda Ramos da Costa
Bruno Moura e Oliveira Birchal
Lívia de Almeida Costa
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes

A doença calculosa biliar é uma das patologias mais prevalentes do


mundo, com predomínio em países ocidentais, onde se observa taxa de cerca
de 20% da população adulta. A composição mais comum dos cálculos
biliares é de colesterol (ocorrendo em aproximadamente 90% dos casos),
seguido dos cálculos pigmentados negros, compostos de bilirrubinato de
cálcio, que são resultados principalmente de hemólise. Raramente se
observam os cálculos pigmentares marrom.
Os cálculos biliares também podem ser classificados pela sua localização
em cálculos intra-hepáticos, cálculos dos ductos biliares extra-hepáticos
e cálculos da vesícula biliar.
Os principais fatores de risco são: idade avançada, sexo feminino,
obesidade, dieta (rica em calorias, colesterol, ácidos graxos saturados e
carboidratos e pobre em fibras), gravidez, diabetes, perda de peso rápida,
nutrição parenteral e algumas drogas (estrogênios, octreotide e ceftriaxona).
A história natural dos cálculos biliares sugere que a maioria permanece
assintomática ao longo da vida. Os sintomas se desenvolvem com uma taxa
de 1 a 4% ao ano.
As complicações mais comuns da doença calculosa biliar são a colecistite
aguda, coledocolitíase e colangite, que serão abordadas neste capítulo.

COLECISTITE AGUDA
DEFINIÇÕES
A colecistite aguda é a complicação mais comum da doença calculosa
biliar. Consiste no processo inflamatório da parede da vesícula biliar,
frequentemente ocasionada pela obstrução do ducto cístico por cálculos
biliares.
A colecistite aguda alitiásica é mais rara, ocorrendo em cerca de 5 a
10% dos casos, sendo mais frequente em idosos e pacientes críticos. Embora
a etiologia não seja clara, isquemia e estase biliar são consideradas as causas
mais comuns.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A obstrução do ducto cístico pelo cálculo biliar leva o órgão a uma
distensão progressiva devido à impossibilidade de secretar o muco e a bile,
provocando edema. Frequentemente, o cálculo se desloca e a inflamação e a
sintomatologia diminuem. A obstrução temporária da drenagem da
vesícula biliar pode provocar sintomas agudos; entretanto, autolimitados.
Nos casos mais graves, quando a obstrução persiste, o edema da parede
pode gerar isquemia seguida de necrose (5 a 10%), o que apresenta uma
alta mortalidade (de 20 a 70% dos casos). O processo inflamatório
inicialmente é estéril, mas aproximadamente 50% dos casos acabam
infectados por bactérias da flora intestinal, como Escherichia coli,
Klebsiella sp. e Streptococcus.sp.

QUADRO CLÍNICO
O sintoma mais característico é a dor constante no quadrante superior
direito (QSD), intensa e geralmente prolongada (superior a seis horas).
Outros sintomas comuns são: irradiação da dor para o dorso e/ou escápula
direita, febre, náuseas e vômitos. Muitas vezes há uma história de ingestão
de alimentos gordurosos antes do início da dor.

EXAME FÍSICO
Ao exame físico, o paciente pode apresentar sensibilidade dolorosa em
QSD, com defesa abdominal. Além disso frequentemente se apresenta com
febre e taquicardia. O sinal de Murphy, frequentemente encontrado na
colecistite aguda, é positivo quando há dor seguida de parada da inspiração
durante a compressão do ponto cístico, localizado no QSD. Em casos de
quadro mais grave, observa-se rigidez abdominal e sensibilidade abdominal
difusa, com dor à descompressão brusca de abdome, sugerindo peritonite.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exames laboratoriais: Leucocitose; leve aumento de amilase,
das enzimas hepáticas (aspartato aminotransferase (AST) e alanina
aminotransferase (ALT)). A elevação das concentrações séricas de
bilirrubina total e fosfatase alcalina não é comum na colecistite aguda
não complicada. Nesses casos, devem ser considerados os diagnósticos
de coledocolitíase ou de Síndrome de Mirizzi.
b. Radiografia de abdome: útil na avaliação da dor abdominal,
especialmente na presença de sinais de peritonite. Entretanto, apenas
25% dos cálculos biliares são visualizados por esse exame.
c. USG de abdome superior: é um exame não invasivo,
considerado de escolha para avaliação de colecistite (sensibilidade de
85% e especificidade de 95%). O exame alterado pode apresentar
espessamento da parede da vesícula biliar (> 4 mm), líquido pericólico,
distensão da vesícula, cálculo impactado no ducto cístico e o sinal de
Murphy sonográfico.
d. TC de abdome: apresenta sensibilidade menor que o USG,
devendo ser solicitada para avaliação de possíveis diagnósticos
diferenciais.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico da colecistite aguda é baseado na avaliação clínica,
laboratorial e radiológica. As diretrizes de Tóquio auxiliam na definição do
diagnóstico, com alta sensibilidade e especificidade (Tabela 1).

A - Sinais Locais de B - Sinais de Inflamação


C - Exames de imagem
Inflamação Sistêmica
A1 – Sinal de Murphy B1 – Tax > 38oC Achados na imagem
A2 – Dor / Massa B2 – Elevação PCR que caracterizem
/ Sensibilidade QSD B3- Elevação contagem colecistite aguda
global de leucócitos

DIAGNÓSTICO SUSPEITO 1 item A + 1 item B

DIAGNÓSTICO DEFINITIVO 1 item A, B e C

Tax: Temperatura axilar. PCR: Proteína C Reativa. QSD: Quadrante superior direito

Tabela 1. Critérios diagnósticos para colecistite aguda, conforme Diretriz de


Tóquio.
Fonte: Takada T, 2018.

TRATAMENTO
O tratamento deve ser realizado sob regime de internação hospitalar.
Deve-se orientar jejum e prescrever hidratação venosa, analgesia e
antibióticos com espectro para gram-negativos entéricos. O controle da
dor geralmente é realizado com anti-inflamatórios não esteróides
(AINEs) ou opioides. Os antibióticos de primeira escolha são cefalosporina
de 3a geração ou quinolonas. A associação de terapia anaeróbica, tais como
clindamicina e metronidazol, é indicada se presente anastomose biliar
entérica ou manipulação prévia da via biliar.
A colecistectomia é a abordagem preferida e o tratamento definitivo para
o paciente com colecistite aguda, sendo indicada preferencialmente até 72
horas do início do quadro. A via videolaparoscópica deve ser preferida,
pois, quando comparada com a colecistectomia aberta, apresenta menor
mortalidade e tempo de permanência hospitalar, com retorno precoce às
atividades laborais.
Em pacientes com alto risco cirúrgico, o tratamento conservador deve
ser realizado inicialmente. No caso de falha com manejo conservador, estes
pacientes devem ser submetidos à drenagem precoce da vesícula biliar; as
opções incluem colecistostomia percutânea ou drenagem endoscópica. A
colecistectomia eletiva deve ser realizada após resolução do processo
inflamatório.
Em casos de suspeita de complicações como gangrena, empiema ou
abscesso perivesicular, a cirurgia em caráter de emergência é indicada.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo feminino, 50 anos, 85 kg,
apresentando dor em QSD com início há aproximadamente 6 horas,
associada a náuseas e vômitos, sem sinais de sepse ou critérios de alto
risco. USG de abdome com espessamento em parede de vesícula biliar
e sinal de Murphy sonográfico.
b. Prescrição sugerida:

1. Jejum para cirurgia (colecistectomia)


2. SF 0,9% 2000 mL

SG 50% 4 FA em cada SF 0,9% 500 mL EV 28 gts/min

KCl 19,1% 10 mL em cada SF 0,9% 500 mL


3. Escopolamina + dipirona 5 mL + ABD 15 mL EV de 8/8 h.
4. Plasil 1 amp + ABD 18 mL EV até de 8/8 h se náuseas ou vômitos.
5. Ranitidina 50 mg 1 amp EV 1x/dia
6. Ceftriaxona 1 g EV 12/12 h
7. Dados vitais e cuidados gerais de 4/4 h
8. Comunicar intercorrências

COLEDOCOLITÍASE

DEFINIÇÕES
A coledocolitíase consiste na presença de cálculo no colédoco. Ela pode
ser classificada em primária ou secundária, sendo a última a mais comum,
tendo como principal origem do cálculo a vesícula biliar. Caso ocorra em até
dois anos após a colecistectomia, ela deve ser classificada como residual.
As duas principais complicações associadas à coledocolitíase são
pancreatite e colangite aguda.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Os cálculos primários do colédoco são formados em pacientes com:

• alterações ductais, como estenoses benignas ou malignas;


• disfunção do esfíncter de Oddi por estenose ou discinesia;
• parasitismo hepatobiliar;
• colangite recorrente crônica;
• anormalidades congênitas biliares (principalmente por doença de
Caroli).
Os cálculos presentes no ducto biliar estão, na maioria das vezes, na
ampola de Vater (região de estreitamento natural da via biliar pela presença
de um esfíncter), o que gera obstrução e, consequentemente, estase biliar e
aumento da pressão intraductal. Como consequência, ocorre o aumento da
absorção de bilirrubina (manifestada por icterícia e o aumento da
bilirrubina direta sérica) e dilatação do ducto biliar, que pode ser
observado por exames de imagem (ultrassonografia, tomografia ou
ressonância).

QUADRO CLÍNICO
A presença de cálculos no colédoco, em geral, é sintomática. A
apresentação mais comum é a dor biliar aguda, causada pela obstrução
parcial ou completa do ducto biliar comum, além de sinais de colestase com
icterícia, prurido, acolia fecal e colúria. Quando febre com calafrios se
associa a esses sintomas, considera-se o diagnóstico de colangite.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exames laboratoriais: alanina aminotransferase (ALT) e
aspartato aminotransferase (AST) são tipicamente elevadas no início do
curso da obstrução biliar. Posteriormente, observa-se um padrão
colestático, com aumentos na bilirrubina sérica, fosfatase alcalina e
gama-glutamil transpeptidase (GGT).
b. USG de abdome superior: é considerado um ótimo exame
devido a sua disponibilidade, praticidade e por ser um método não
invasivo, porém somente 50% dos cálculos e 75% dos ductos dilatados
(> 6 mm) são visibilizados. Portanto, a falta de identificação do cálculo
no colédoco não afasta o diagnóstico.
c. Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE): é
indicada em pacientes com alta probabilidade clínica de coledocolitíase,
pois é um método diagnóstico e terapêutico, com sensibilidade e
especificidade de aproximadamente 95%.
d. Colangiorressonância: é recomendada para pacientes com
probabilidade intermediária de coledocolitíase. Trata-se de um método
não invasivo com elevada sensibilidade e especificidade.
e. Ultrassom Endoscópico: indicado quando persiste a suspeita de
cálculos em via biliar, mesmo com colangiorressonância negativa.
Microcálculos formadores da lama biliar, que são de difícil avaliação
até pela colangiorressonância, podem ser facilmente identificados pelo
ultrassom endoscópico.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Usamos os resultados de exames laboratoriais e ultrassonografia
abdominal para estratificar um paciente como de alto, intermediário ou
baixo risco de apresentar coledocolitíase. O gerenciamento subsequente
varia de acordo com a estratificação demonstrada abaixo (Tabela 2).
Preditores
Fortes Moderados
muito forte

• Bioquímica hepática alterada (ALT, AST,


• USG: Cálculo no colédoco
• USG: dilatação do colédoco (> 6 mm) FA e GGT)
• Colangite aguda
• BT >1.8 - 4 mg/dL • Idade > 55 anos
• BT > 4 mg/Dl
• Clínica de pancreatite aguda biliar

1 OU + PREDITOR “MUITO FORTE” OU


ALTA probabilidade de coledocolitíase
2 PREDITORES “FORTES”

AUSÊNCIA DE QUALQUER PREDITOR BAIXA probabilidade

TODOS OS OUTROS PACIENTES INTERMEDIÁRIA probabilidade

*BT: Bilirrubina total. USG: Ultrassonografia. ALT: Alanina aminotransferase. AST: Aspartato ami-
notransferase. FA: Fosfatase alcalina. GGT: Gama-glutamil transferase.

Tabela 2. Critérios diagnósticos para colangite aguda, conforme Diretriz de


Tóquio.
Fonte: Traduzido e adaptado de ASGE Standards of Practice Committee.
TRATAMENTO
A coledocolitíase deve ser tratada em praticamente todos os casos,
devido ao alto risco de causar complicações graves. O tratamento é baseado
na etiologia, sintomatologia e gravidade do paciente. O prurido causado pela
hiperbilirrubinemia pode ser amenizado com anti-histamínico.
O manejo subsequente deve ser baseado na probabilidade de
coledocolitíase, avaliada conforme exposto previamente.

• Baixo risco (10%): devem ser submetidos à colecistectomia, não


sendo recomendada nenhuma avaliação adicional.

• Risco intermediário (10-50%): As opções para esses pacientes


incluem avaliação no pré-operatório com ultrassom endoscópico
ou colangiorresonância, além da possibilidade de colangiografia
intraoperatória.

• Alto risco (>50%): CPRE.


A CPRE é indicada para a remoção dos cálculos de colédoco em
pacientes com alta probabilidade ou intermediária que apresentem
coledocolitíase à colangiorressonância ou ao ultrassom endoscópico.
Apresenta grandes taxas de sucesso, com menor tempo de hospitalização,
além de ser menos invasiva que o procedimento cirúrgico.
Devido ao elevado risco de recorrência do quadro, a colecistectomia
videolaparoscópica subsequente está indicada, caso não tenha sido
realizada.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 48 anos, 90 kg,
ictérico e com dor biliar, prurido generalizado, sem febre ou alteração
do estado mental. Exames laboratoriais evidenciando leucocitose e
aumento de enzimas canaliculares. USG de abdome mostrou
coledocolitíase.
b. Prescrição sugerida:
1. Jejum para CPRE.

SF 0,9% 2000 mL

SG 50% 4 FA em cada SF 0,9% 500 mL EV 28 gts/min


2. KCl 19,1% 10 mL em cada SF 0,9% 500 mL
3. Escopolamina + dipirona 5 mL + ABD 15 mL EV de 8/8 h
4. Plasil 1 amp + ABD 18 mL EV até de 8/8 h se náuseas ou vômitos
5. Ranitidina 50 mg 1 amp EV 1x/dia
6. Difenidramina 50 mg 1 amp EV 1x/dia
7. Dados vitais e cuidados gerais de 4/4 h
8. Comunicar intercorrências

COLANGITE AGUDA

DEFINIÇÕES
A colangite consiste no processo inflamatório/infeccioso dos ductos
biliares, resultante da obstrução ductal (benigna ou maligna) e infecção
por bactérias intestinais. Aproximadamente 85% das colangites são
causadas por impactação de cálculos na via biliar. Outras causas incluem
neoplasias, parasitas, anormalidades congênitas dos ductos biliares e
estreitamento biliar.
A infecção da bile em estase, em geral, é causada por bactérias, sendo
mais comum Escherichia coli, Klebsiella, Pseudomonas, Proteus e
Enterococos. Em 15% da bile levada para cultura são encontradas bactérias
anaeróbicas, como Clostridium perfringens e Bacteroides fragilis.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A obstrução do ducto biliar causa estase biliar, o que forma um meio
propício para a contaminação bacteriana da bile, causando um processo
inflamatório desse ducto. A colangite é comum nas obstruções causadas por
coledocolitíase e estenoses (benignas ou malignas). A obstrução cursa com
aumento da pressão intraductal, o que gera uma regurgitação das bactérias da
bile e translocação bacteriana, podendo causar sepse.
QUADRO CLÍNICO
A sintomatologia mais comum é dor no QSD, icterícia e febre. Quando
os três sintomas coexistem, chamamos de tríade de Charcot (alta
especificidade, porém baixa sensibilidade para o diagnóstico de colangite
aguda). Quando, além desses sintomas, surgem confusão mental e
hipotensão, chamamos de pêntade de Reynolds, indicando um quadro mais
grave com septicemia.

EXAMES COMPLEMENTARES
As alterações laboratoriais são bastante frequentes nos pacientes com
colangite. A maioria apresenta elevação de enzimas hepáticas, com padrão
colestático predominante. Evidências de inflamação sistêmica também estão
habitualmente presentes, como leucocitose (em geral, com desvio à
esquerda) e elevação de Proteina C reativa (PCR). O aumento da amilase
pode ser decorrente de pancreatite aguda, que também pode ocorrer como
consequência da obstrução biliar.
Hemoculturas deverão ser colhidas imediatamente à suspeita de
colangite. Para diagnóstico radiológico da colangite, deve-se utilizar os
mesmos métodos descritos para coledocolitíase.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico é feito com evidência de inflamação sistêmica, colestase e
exame de imagem sugestivo de obstrução de via biliar. Os critérios de
Tóquio são demonstrado abaixo (Tabela 3):

A - EVIDÊNCIAS DE
INFLAMAÇÃO B – EVIDÊNCIA DE COLESTASE C - EXAMES DE IMAGEM
SISTÊMICA

A1 – Tax > 38º c e/ou calafrios;


A2 – Evidência laboratorial de B1 - Icterícia ( BT > 2 mg / dL) C1 - Dilatação vias biliares
inflamação: Leucócitos < 4.000 B2 - Laboratório: Elevação de aminotransferares e C2 - Evidência da etiologia (cálculos,
ou > 12.000 células/mm3; PCR > enzimas canaliculares (AST, ALT , FA>1,5X LSN) estenose, malignidade)
1 mg/Dl.

DIAGNÓSTICO SUSPEITO 1 item A + 1 item B ou item C

DIAGNÓSTICO DEFINITIVO 1 item A, B e C


Tax: Temperatura axilar. PCR: Proteína C Reativa. BT: Bilirrubina total. ALT: Alanina aminotrans- ferase. AST: Aspartato aminotransferase.
FA: Fosfatase alcalina. GGT: Gama-glutamil transferase. LSN: Limite superior da normalidade.

Tabela 3. Critérios diagnósticos para coledocolitíase, conforme Diretriz de


Tóquio.
Fonte: Takada T, 2018.

TRATAMENTO
O tratamento se baseia na estabilização hemodinâmica, antibióticos
endovenosos e drenagem endoscópica percutânea (CPRE) ou cirúrgica
da via biliar.
O esquema antibiótico escolhido deverá ser de amplo espectro, cobrindo
principalmente gram-negativos, principais causadores da colangite.
Sugerimos a prescrição de cefalosporina de terceira geração (ceftriaxona 1
g EV 12/12 h) ou quinolona (ciprofloxacina 400 mg EV 12/12 h) associado
ou não a metronidazol 500 mg EV 8/8 h. Após controlada a fonte da
infeccção, o antibiótico é mantido por mais 4 a 7 dias.
Caso o paciente mantenha estabilidade hemodinâmica e apresente
melhora clínica nas primeiras 12 horas, a drenagem da via biliar deve ser
realizada em até 72 horas do início dos sintomas. Entretanto, se neste
período houver piora, com desenvolvimento de qualquer disfunção orgânica,
a drenagem da via biliar deverá ser realizada em caráter de emergência. A
CPRE é o método mais indicado, pois apresenta menor morbimortalidade
quando comparada ao tratamento cirúrgico com exploração ductal.
A drenagem percutânea guiada por ultrassom pode ser realizada
dependendo da disponibilidade e experiência local. Idealmente, deve ser
reservada em casos de emergência, nos quais não há disponibilidade de
CPRE, pelos riscos de complicações do procedimento e necessidade de
exploração da via biliar por outros métodos posteriormente (CPRE ou
cirurgia).
Além da terapia antimicrobiana e da drenagem biliar, é necessário o
manejo da causa subjacente. Em pacientes com cálculos biliares, isso inclui
colecistectomia eletiva após a resolução da colangite.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo feminino, 35 anos, 62 kg,
referindo dor em QSD. Ao exame, apresenta-se orientada no tempo e no
espaço, cooperativa, com icterícia 2+/4+, calafrios e Tax 38,8 ºC. Nega
prurido. USG de abdome confirma a presença de coledocolitíase.

b. Prescrição sugerida:

1. Jejum para CPRE (em até 24 a 72 h, a depender da evolução


clínica)
2. SF 0,9% 2000 mL
3. SG 50% 4 FA em cada SF 0,9% 500 mL EV 28 gts/min
4. KCl 19,1% 10 mL em cada SF 0,9% 500 mL
5. Ceftriaxone 1 g EV 12/12 h
6. Escopolamina + dipirona 5 mL + ABD 15 mL EV de 8/8 h
7. Plasil 1 amp + ABD 18 mL EV até de 8/8 h se náuseas ou vômitos
8. Ranitidina 50 mg 1 amp EV 1x/dia
9. Difenidramina 50 mg 1 amp EV 1x/dia
10. Dados vitais e cuidados gerais de 4/4 h
11. Comunicar intercorrências

DICAS DO ESPECIALISTA
• Cólica biliar intermitente (com duração inferior a 6 h) pode ser
característica de colelitíase sintomática, não havendo sinais de
colecistite aguda. Entretanto, é indicação de tratamento cirúrgico
eletivo (colecistectomia).

• Atenção especial deve ser dada para dor mais prolongada


(superior a 6 h), especialmente se associada a sintomas de
obstrução de vias biliares (icterícia, colúria e acolia fecal), além
de náuseas, vômitos e febre. Nessas situações, deve-se investigar
e tratar colecistite, coledocolitíase e/ou colangite aguda sob regime
de internação hospitalar.
• A ultrassonografia de abdome superior é o exame inicial mais
indicado para diagnóstico da doença calculosa das vias biliares,
com ou sem complicações.

• Intervenção endoscópica e/ou cirúrgica é indicada na maioria


dos casos de complicação das doenças calculosas de vias biliares.

• A maioria dos pacientes com colangite aguda respondem bem


com as medidas iniciais se indicadas precocemente, incluindo
antibioticoterapia, não sendo necessária intervenção de
emergência da via biliar.

REFERÊNCIAS
1. Coelho JCU, Contieri FL, Matias JEF, Parolin MB, Godoy JL. Prevalência e fisiopatologia da
litíase biliar em pacientes submetidos a transplante de órgãos. ABCD, Arq Bras Cir Dig.
2009; 22(2): 120-3.
2. Feldman M, Friedman LS, Brandt LJ. Sleisenger and Fordtran’s Gastrointestinal and Liver
Disease. 10. ed. New York: Saunders; 2016.
3. Longo DL, Faucy A. Harrison’s Gastroenterology and Hepatology. 2. ed. New York:
Mcgraw-hill Education; 2015.
4. Lopes AC. Clínica médica: Diagnóstico e Tratamento. São Paulo: Atheneu; 2014.
5. Yokoe M, Hata J, Takada T, Strasberg SM, Asbun HJ, Wakabayashi G, et al. Tokyo
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6. Okamoto K, Suzuki K, Takada T, Strasberg SM, Asbun HJ, Endo I, Iwashita Y, et al. Tokyo
Guidelines 2018: flowchart for the management of acute cholecystitis. J Hepatobiliary
Pancreat Sci. 2018; 25: 55-72
7. Yokoe M, Hata J, Takada T, Strasberg SM, Asbun HJ, Wakabayashi G, et al. Tokyo
Guidelines 2018: diagnostic criteria and severity grading of acute cholecystitis (with videos).
J Hepatobiliary Pancreat Sci. 2018; 25: 41-54.
8. Takada T. Tokyo Guidelines 2018: Updated Tokyo Guidelines for the management of acute
cholangitis/acute cholecystitis. J Hepatobiliary Pancreat Sci. 2018; 25(1): 1-2.
9. ASGE Standards of Practice Committee, Maple JT, Ben-Menachem T, Anderson MA,
Appalaneni V, Banerjee S, et al. The Role Of Endoscopy In The Evaluation Of Suspected
Choledocholithiasis. Gastrointestinal Endoscopy, 2010; 71(1): 1-9.
10. Kiriyama S, Kozaka K, Takada T, Strasberg SM, Pitt HA, Gabata T, et al. Tokyo Guidelines
2018: diagnostic criteria and severity grading of acute cholangitis (with videos). J
Hepatobiliary Pancreat Sci. 2018; 25: 17-30.
3.6
PANCREATITE AGUDA
Autores:
Guilherme Miyakawa Dadalti
Lívia de Almeida Costa
Marcella Motta Lucindo Duarte
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes

DEFINIÇÕES
Pancreatite Aguda (PA): processo inflamatório agudo do pâncreas, que
pode ser restrito ao órgão, acometer tecidos adjacentes ou até mesmo gerar
repercussões sistêmicas, com falência orgânica.

EPIDEMIOLOGIA
PA é uma das doenças mais comuns do trato gastrointestinal e está
associada a elevado grau de morbidade e custos ao sistema de saúde.
Embora a quantificação da incidência dessa doença seja dificultada pelo
grande número de casos sem diagnóstico (PA resolvida e não detectada ou
óbito precoce), estudos recentes evidenciam uma elevação desse parâmetro
no mundo todo, fato que reflete diversas situações, como o aumento
crescente da obesidade na população mundial (levando a um aumento do
número de casos de colelitíase), aumento do consumo de álcool e melhorias
nos métodos diagnósticos. No entanto, nota-se uma redução na taxa de
mortalidade da doença devido aos avanços diagnósticos e terapêuticos
desses pacientes, principalmente daqueles com doença grave.
A taxa de mortalidade é semelhante nas diversas etiologias. Os fatores de
risco associados ao aumento na mortalidade são: diabetes mellitus, infecção
adquirida em ambiente hospitalar e idade maior ou igual a 70 anos.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A ocorrência da PA está relacionada a um bloqueio da secreção de
enzimas pancreáticas, não coincidente com a redução na sua produção.
Segue-se então à ativação intra-acinar desses produtos pancreáticos (tripsina,
fosfolipase, quimiotripsina e elastase), com consequente autodigestão da
glândula. A destruição pode repercutir por todo o pâncreas, acometendo
também o tecido peripancreático e o endotélio vascular, resultando em
vasoconstrição e redução do aporte de oxigênio local. Todas essas alterações
conduzem à produção de citocinas inflamatórias, culminando com o
desenvolvimento da Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica
(SIRS), vasodilatação generalizada e perda de grande quantidade de volume
para o terceiro espaço. Nos casos em que essa resposta é ainda mais intensa,
pode-se observar Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SRDA),
injúria renal e choque.

• Etiologia biliar: responsável por 40 a 70% dos casos, embora


somente 3 a 7% dos pacientes com cálculos biliares desenvolvam
pancreatite.

• Etiologia alcóolica: acomete 25 a 35% dos pacientes e,


geralmente, se caracteriza por agudização de um processo crônico
já instalado. Porém, um paciente etilista importante pode
apresentar PA de etiologia alcóolica, sem a presença da pancreatite
crônica subjacente.

• Etiologia metabólica: a hipertrigliceridemia é a principal delas, e


a PA está relacionada a níveis acima de 1000 mg/dL. Esses níveis
podem estar relacionados a um distúrbio genético ou a condições
como diabetes mellitus, obesidade, hipotireoidismo, gravidez e uso
de medicamentos. A hipercalcemia também pode ser o fator
desencadeante, mas é raramente observado.

• Outras etiologias: tumores (principalmente a neoplasia mucinosa


papilar intraductal e, em menor número, o adenocarcinoma
pancreático), medicamentos (azatioprina, aminossalicilatos,
sulfonamidas, diuréticos, ácido valproico, esteroides, entre outros),
infecções (virais, bacterianas, fúngicas e parasitárias), trauma,
mutações genéticas, anormalidades anatômicas (pâncreas divisum,
disfunção do esfíncter de Oddi), pós-CPRE e distúrbios vasculares
pancreáticos.

QUADRO CLÍNICO E CLASSIFICAÇÃO


As manifestações clínicas decorrentes da PA são variáveis e condizentes
com o grau de acometimento da doença. No entanto, tipicamente, o paciente
apresenta dor intensa e persistente em andar superior do abdome,
frequentemente associada a náuseas e vômitos, com irradiação para dorso
em até 50% dos casos, também conhecida como dor “em faixa”. A
intensidade e a localização da dor não têm correlação com a gravidade do
quadro. Sintomas podem ter remissão parcial mediante flexão do tronco
(posição antálgica).
De acordo com a classificação de Atlanta (1992, revisada em 2012), a PA
pode ser dividida em:

• Edematosa intersticial: forma mais branda e frequente da


doença, correspondendo a, aproximadamente, 85% dos casos de
pancreatite aguda e resolução, frequentemente, dentro de 1 semana.
Caracteriza-se por inflamação aguda do parênquima pancreático e
tecidos peripancreáticos, resultando em aumento focal ou difuso do
volume do órgão, sem a presença de necrose tecidual.

• Necrotizante (ou necro-hemorrágica): forma de pior


prognóstico, relacionada a maiores taxas de mortalidade, que
podem alcançar 17%. Caracterizada por processo inflamatório
associado à necrose do tecido pancreático ou peripancreático.
Outra classificação que a PA ainda pode receber considera a presença de
disfunções orgânicas, além das complicações:

• Leve: ausência de falência orgânica ou complicações locais ou


sistêmicas.

• Moderadamente grave: falência orgânica transitória (com


resolução em até 48 horas), na presença ou ausência de
complicações locais ou sistêmicas.
• Grave: presença de falência orgânica que persiste além de 48
horas e pode acometer um ou múltiplos órgãos.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: febre; icterícia secundária a coledocolitíase ou edema
da cabeça do pâncreas; alteração do nível de consciência, que pode
ser secundária a toxemia, distúrbios hidroeletrolíticos ou síndrome
de abstinência alcóolica.

• Aparelho respiratório: taquipneia e hipoxemia em decorrência


da SIRS e por inflamação diafragmática; redução da ausculta em
bases, secundária a derrame pleural.

• Aparelho cardiovascular: taquicardia, hipotensão e pulsos


periféricos finos, secundário ao choque na PA grave.

• Aparelho gastrintestinal: distensão abdominal, diminuição dos


ruídos hidroaéreos, em virtude de íleo paralítico; equimose
periumbilical (Sinal de Cullen) ou em região de flancos (Sinal de
Grey Turner), sugestivas de sangramento retroperitoneal na
vigência de necrose pancreática; hipersensibilidade à palpação
abdominal local ou difusa e, nos casos mais graves, pode-se
encontrar sinais de irritação peritoneal.

• Extremidades: em casos raros, pacientes podem apresentar


nodulações de coloração avermelhada, principalmente em
articulações distais, que refletem a ocorrência de necrose de
gordura subcutânea ou paniculite.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Bioquímica: leucocitose, elevação do hematócrito, hipo ou
hiperglicemia, elevação de creatinina e ureia sérica, aumento de
marcadores inflamatórios (PCR e VHS). Elevação de ALT (acima de 3
vezes o limite superior) e AST, além de alteração de enzimas
canaliculares, sugerem etiologia biliar. Os pacientes com PA
relacionada à hipertrigliceridemia podem apresentar níveis
falseadamente baixos em decorrência do jejum. Nesses casos, deve-se
repetir nova dosagem de triglicérides após reinício da dieta.

• Amilase sérica: a elevação pode ser observada a partir de 6 a 12


horas do início da PA, permanecendo elevada de 3 a 5 dias. Outras
condições podem elevar a amilase, como insuficiência renal,
isquemia mesentérica e patologias tubo-ovarianas. Entretanto, sua
elevação em três vezes ou mais o valor do limite superior da
normalidade constitui uma evidência importante do diagnóstico de
PA. Contudo, algumas situações clínicas podem não proporcionar o
aumento acentuado da amilase: PA por hipertrigliceridemia
(interferência na dosagem laboratorial) e álcool (inabilidade de
produção de amilase pelo pâncreas).

• Lipase sérica: medição mais sensível e específica para o


diagnóstico de PA. Sua elevação ocorre entre 4 e 8 horas do início
dos sintomas, atingindo pico em 24 horas e retornando aos valores
normais em 8 a 14 dias. É útil, especialmente, em casos de medida
mais tardia, em que a amilase sérica já está em níveis normais e no
diagnóstico de PA de etiologia alcoólica e por hipertrigliceridemia.

b. Radiografias

• de abdome: exclusão de outras causas de abdome agudo, como


obstrução ou perfuração intestinais. Quadros brandos podem não
apresentar alterações a esse exame, enquanto este pode evidenciar
sinais como “alça sentinela” (dilatação proximal e focal de alça
jejunal no quadrante superior esquerdo) e de amputação do cólon
transverso (cutoff) em formas graves da doença. Calcificações na
topografia de pâncreas e vias biliares podem indicar pancreatite
crônica e colecistolitíase.
• de tórax: avaliação de complicações respiratórias da doença,
como derrames pleurais, atelectasias e infiltrados pulmonares.

c. Ultrassonografia

• de abdome: todo paciente com primeira crise de PA deve ser


submetido a esse exame, ainda na admissão, independentemente
da alteração de testes hepáticos, uma vez que os cálculos biliares
constituem a principal etiologia do agravo.

• endoscópica: indicação nos casos de pancreatite idiopática,


visto que é capaz de identificar microcálculos, anormalidades do
ducto pancreático, pâncreas divisium e pequenos tumores na
ampola ou próximos a ela.

d. Tomografia computadorizada de abdome: principal exame de


imagem para diagnóstico de PA e identificação de suas complicações
intra-abdominais. Quando contrastada, ultrapassa 90% de sensibilidade
e especificidade para o diagnóstico da doença. Ainda assim, sua
utilização como rotina na pancreatite aguda não se justifica e sua
indicação é reservada para quadros que geram dúvida diagnóstica,
exclusão de outras causas de abdome agudo e estadiamento de
gravidade do agravo em pacientes que não apresentam melhora clínica
após 48-72 horas de tratamento. A tomografia tem ainda utilidade nos
casos em que há suspeita infecciosa após 7 a 10 dias de evolução, para
detectar sinais sugestivos de necrose pancreática infectada, como a
presença de gás no retroperitônio.
e. Ressonância magnética de abdome: similar no diagnóstico e
estratificação de gravidade da doença quando comparada à tomografia.
Está indicada nos casos de alergia severa ao contraste e/ou
insuficiência renal, quando deve ser empregada sem o uso de
gadolínio.
DIAGNÓSTICO E ESTRATIFICAÇÃO DE
RISCO
Para o estabelecimento do diagnóstico de PA, devem estar presentes 2
dos 3 critérios mencionados a seguir:

• Dor abdominal característica;

• Níveis de amilase e/ou lipase séricas acima de 3 vezes o valor do limite superior de normalidade;

• Achados compatíveis com pancreatite aguda em exames radiológicos do abdome.

Diagnósticos diferenciais: úlcera péptica, coledocolitíase / colangite,


colecistite aguda, obstrução intestinal, isquemia mesentérica e víscera
perfurada, além de hepatite aguda, porém sem apresentar clínica de abdome
agudo.
Os escores de estratificação de risco têm como objetivo identificar
pacientes potenciais para piores desfechos, uma vez que as maiores taxas de
mortalidade se encontram dentro do grupo de pacientes com PA grave.
Entretanto, não há um critério padrão-ouro na PA, e os estudos demonstram
que aqueles já utilizados são pouco específicos, ou seja, apresentam elevado
número de falso-positivos. Dentre os mais conhecidos e utilizados estão os
critérios de Ranson, APACHE II e BISAP. As diretrizes do American
College of Gastroenterology (ACG) recomendam a avaliação de certos
parâmetros para estratificação de risco inicial (Tabela 1).

• Idade > 55 anos


CARACTERÍSTICAS • Obesidade (índice de massa corporal > 30 kg/m2)
DOS PACIENTES • Alteração do nível de consciência
• Comorbidades presentes

• Frequência cardíaca > 90 batimentos por minuto


PRESENÇA DE SIRS • Respirações > 20/min ou PaCO2 <32 mmHg
(2 OU MAIS CRITÉRIOS) • Temperatura > 38ºC ou < 36°C
• Contagem de leucócitos > 12.000 ou < 4.000 células/mm3 ou > 10% de bastões

• BUN* > 20 mg/dL e em ascensão


ACHADOS
• Hematócrito > 44%
LABORATORIAIS
• Creatinina elevada

• Derrame pleural
ACHADOS
• Infiltrados pulmonares
RADIOLÓGICOS
• Coleções extrapancreáticas múltiplas ou extensas

*BUN (Blood Urea Nitrogen) = Ureia (mg/dL) / 2.1428


Tabela 1. Achados clínicos associados a pior evolução da PA segundo o
ACG.
Fonte: Elaborado pelos autores.

TRATAMENTO
• Monitorização:
Sinais vitais, incluindo saturação de oxigênio (SatO2), devem
ser observados, devendo-se manter esse parâmetro sempre
superior a 95%, mediante administração de oxigênio
suplementar, se necessário.

Gasometria arterial deve ser solicitada se SatO2 < 90% ou se


houver indicações clínicas.

O volume urinário deve ser mensurado de hora em hora


(objetivar débito de 0,5 a 1 mL/kg/hora).

Eletrólitos devem ser frequentemente dosados e corrigidos


sempre que necessário.

Pacientes graves devem ser monitorizados em UTI, sendo


avaliados também quanto ao risco de eventual síndrome
compartimental abdominal.

• Hiperglicemia (acima de 180): pode resultar da diminuição da


liberação de glicose, gliconeogênese ou ainda da diminuição de
utilização de glicose. Deve ser tratada com insulina, visto que pode
repercutir no aumento do risco de infecções pancreáticas
secundárias.

• Reposição volêmica: sua necessidade se justifica pelo frequente


quadro de hipovolemia apresentado por pacientes com pancreatite
aguda, que ocorre por múltiplos fatores, como vômitos, perda de
líquido para o terceiro espaço, ingesta hídrica reduzida. Deve ser
realizada de maneira precoce e agressiva, visando à prevenção de
complicações da doença, como a necrose pancreática e
peripancreática, a partir da melhoria da perfusão tecidual. Deve ser
aplicada a todos os pacientes com PA, com exceção daqueles que
possuam comorbidades cardiovasculares, renais ou qualquer outra
que contraindique a infusão volêmica vigorosa.

Utiliza-se solução cristaloide isotônica (Ringer Lactato ou


Soro Fisiológico 0,9%) na dose de 5 a 10 mL/kg/hora, por via
endovenosa, nas primeiras 12 a 24 horas. O volume a ser
infundido deve ser guiado por critérios individuais como idade,
peso e comorbidades, além de parâmetros que indicam o status
hemodinâmico do paciente, como pressão arterial, frequência
cardíaca, perfusão periférica e débito urinário. Em pacientes
com depleção volêmica grave, deve-se administrar uma dose de
ataque de 20 mL/kg em 30 minutos, seguida por manutenção
com 3 mL/kg/hora, durante 8 a 12 horas.

A taxa de fluido deve ser frequentemente reavaliada nas


primeiras 6 horas de admissão e nas próximas 24 a 48 horas.

O ajuste deve ser feito através de parâmetros clínicos


(levando-se em consideração os sinais vitais e débito urinário) e
laboratoriais, com a monitorização do hematócrito, lactato,
creatinina e ureia séricas.

A ressuscitação volêmica agressiva após 48 h de início do


quadro não é aconselhável, pois aumenta o risco de intubação e
síndrome compartimental abdominal.

• Analgesia: os opioides são drogas seguras nesses casos,


administrados por via endovenosa. Tramadol e morfina,
geralmente, cursam com bons resultados. Outra opção seria o
fentanil, uma vez que apresenta efeitos colaterais mais discretos,
principalmente no que se refere à função renal. Pode ser usado em
bolus (20 a 50 mcg, com período de bloqueio de 10 minutos) ou
em infusão contínua. A analgesia epidural pode ser também uma
alternativa para aqueles pacientes que se encontram dependentes
de altas doses de opioides por tempo prolongado.

• Suporte nutricional: a reintrodução precoce da dieta por via oral,


quando possível, é de suma importância, se relacionando com
redução nas taxas de complicações infecciosas, morbidade e
mortalidade, além de menor tempo de hospitalização. A
recomendação é de que a dieta seja iniciada dentro de 24-72 h do
episódio inicial, conforme tolerância do paciente. Avaliar
presença de dor, náuseas, vômitos e presença de ruídos
hidroaéreos. A dieta pode ser introduzia já na consistência sólida,
sugerindo-se somente que apresente baixo teor de gordura para
melhor aceitação. Em caso de intolerância à dieta oral (náuseas
ou vômitos), recomenda-se a administração de dieta enteral com
passagem de sonda nasogástrica, não se observando vantagem no
uso da sonda jejunal. É recomendada infusão lenta (25 mL/h), com
aumento gradual, até se atingir ao menos 30% das necessidades
calóricas diárias calculadas (25 a 30 Kcal/Kg). A nutrição
parenteral somente deve ser empregada nos casos em que não há
tolerância da alimentação por via enteral ou quando não se
alcança o alvo calórico.

• Antibióticos: não há recomendação para o uso profilático de


antibióticos para prevenção de infecção da necrose pancreática.

• Probióticos: seu uso não está indicado, visto que evidências


apontam que não há redução do risco de infecção da necrose
pancreática ou da mortalidade global.

• Cessação de etilismo e tabagismo: são conhecidas causas de


recorrência; portanto, a abstinência deve ser encorajada.

• Colangiopancreatografia rerógrada endoscópica (CPRE): deve


ser realizada na urgência (dentro de 24 h) em casos de colangite.
Em casos de obstrução biliar, sem colangite, deve-se aguardar
melhora clínica para sua realização.

• Colecistectomia: na PA leve deve ser realizada na mesma


internação, enquanto na PA moderada a grave deve ser adiada
para 6 semanas após o quadro inicial, pelo risco de infecção da
necrose pancreática. Em pacientes sem condições clínicas para ser
submetidos a procedimento cirúrgico, a CPRE com esfincterotomia
pode reduzir a chance de novo episódio de pancreatite aguda biliar;
porém, não reduz o risco de outras complicações biliares.

TRATAMENTO DAS COMPLICAÇÕES


A pancreatite aguda pode repercutir em complicações locais (Tabela 2)
ou sistêmicas. Dentre as complicações mais comum estão:

• Necrose infectada: suspeita-se nos pacientes com necrose


pancreática ou peripancreática e que apesentem sinais infecciosos
após 7 a 10 dias de início do quadro, como, por exemplo, febre,
leucocitose com desvio à esquerda, elevação de PCR e
deterioração clínica. Diante da suspeita, deve-se realizar nova
tomografia de abdome com contraste para auxílio diagnóstico. O
tratamento inicial deve ser realizado com antibiótico empírico de
boa penetração na área de necrose e com cobertura para
anaeróbios, aeróbios gram-positivos e negativos (Carbapenêmicos
ou Ciprofloxacino + Metronidazol), sem a necessidade de punção
do líquido necrótico. No entanto, pacientes que não apresentem
melhora clínica após 5 dias da instituição da antibioticoterapia
devem ser avaliados para drenagem percutânea e envio de
material para cultura. O debridamento cirúrgico do tecido
necrótico (necrosectomia), então, deve ser considerado em casos
de instabilidade clínica, devendo ser postergado, quando possível,
para um tempo posterior a 4 semanas, quando a necrose já se
organizou. A abordagem cirúrgica poderá ser dispensada nos casos
em que o paciente apresente remissão clínica completa somente
com o tratamento conservador.
• Trombose venosa esplâncnica: ocorre em até 50% dos pacientes
com pancreatite necrotizante. O tratamento deve seguir a
abordagem geral da PA e o paciente somente deve receber heparina
em dose terapêutica nos casos em que a trombose repercutir com
disfunção hepática ou isquemia intestinal, em decorrência do risco
de hemorragia da necrose pancreática.

• Pseudoaneurismas: complicação rara e grave. Deve ser


suspeitada quando há hemorragia gastrintestinal ou queda abrupta
do hematócrito e deve ser abordada de acordo com a região em que
se localiza.

• Síndrome compartimental abdominal: pressão intra-abdominal


sustentada maior que 20 mmHg, associada a disfunção orgânica.
Geralmente, decorre do íleo paralítico e edema tecidual secundário
à ressuscitação volêmica agressiva e inflamação. O tratamento
inclui medidas de suporte, como posicionamento do paciente em
decúbito dorsal com elevação da cabeceira a 20 graus, drenagem
com sonda nasogástrica, controle da dor e suporte hemodinâmico.
A abordagem cirúrgica deve ser implementada para todos os
pacientes com falha às medidas iniciais ou que apresentem pressão
acima de 25 mmHg.

Até 4 semanas de evolução Após 4 semanas de evolução


Coleção aguda de líquido peripancreático Pseudocisto pancreático
• Geralmente, se resolve espontaneamente, dentro de 7 a 10 dias • Coleções encapsuladas de líquido

Coleção necrótica aguda Necrose encapsulada (walled-off necrosis)


• Inicialmente estéril • Já possui envoltório capsular
• Incialmente estéril

Tabela 2. Complicações locais da PA.


Fonte: Elaborado pelos autores.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Elaborado pelos autores

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 56 anos, 60 kg,
apresenta diagnóstico de pancreatite aguda leve com início dos
sintomas há dois dias. No momento, está com dor abdominal de leve
intensidade, sem náuseas ou vômitos.

b. Exame físico:
• Ectoscopia e sinais vitais: anictérico, afebril, orientado no tempo
e espaço, FC de 85 bpm, FR de 18 irpm e StO2 de 98% em ar
ambiente.

• Abdome: ruídos hidroaéreos presentes, dor à palpação de abdome


superior, sem descompressão brusca.
c. Exames complementares: ao USG de abdome foram
evidenciadas coledocolitíase e colelitíase.

d. Prescrição Sugerida:

1. Dieta sólida hipogordurosa – observar aceitação


2. SF 0,9% 1000 mL EV 6/6h (primeiras 24 h)
3. SF 0,9% 500 mL EV à critério médico (a depender dos sinais
vitais/débito urinário)
4. Tramadol 100 mg + SF 0,9% 100 mL EV, lento, 8/8 h, se dor forte
5. Metoclopramida 10 mg 1 amp EV 8/8 h, se náuseas ou vômitos
6. Dipirona 1 amp EV até de 6/6h se dor ou Tax ≥ 37,8°C
7. Enoxaparina 40 mg SC 1x/dia
8. Balanço hídrico
9. Cuidados gerais e sinais vitais

• Solicitar CPRE (não há indicação de urgência, pois não há


colangite) e colecistectomia, após melhora clínica e antes da alta
hospitalar.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Episódios recorrentes de PA sugerem a etiologia alcoólica com
pancreatite crônica subjacente. No entanto, pacientes com
colelitíase podem apresentar episódios recorrentes de cólica biliar,
colecistite ou mesmo pancreatite.
• Níveis elevados de triglicérides se associam a pior prognóstico,
mesmo em outras etiologias de PA.

• PCR maior que 150 no 3º dia é um fator de pior prognóstico.


• Níveis elevados de amilase e lipase não são considerados
fatores prognósticos da PA.

• A ultrassonografia de abdome realizada nas primeiras horas de


evolução pode apresentar dificuldade na identificação de
colelitíase, principalmente em decorrência da distensão de alças
intestinais, secundária ao íleo paralítico. Caso a dúvida etiológica
permaneça, nova ultrassonografia deve ser realizada após
melhora do quadro clínico.

• Caso a reposição volêmica seja realizada com salina isotônica,


atentar-se para acidose metabólica hiperclorêmica.

• Nas primeiras 2 semanas de evolução do quadro, a mortalidade


está associada ao processo inflamatório sistêmico, enquanto, nas
semanas seguintes, frequentemente, decorre de complicações
infecciosas.

REFERÊNCIAS
1. Crockett SD, Wani S, Gardner TB, Falck-Ytter Y, Barkun AN; American Gastroenterological
Association Institute Clinical Guidelines Committee. American Gastroenterological
Association Institute Guideline on Initial Management of Acute Pancreatitis. Gastroenterol.
2018; 154: 1096-101.
2. Leppäniemi A, Tolonen M, Tarasconi A, Segovia-Lohse H, Gamberini E, Kirkpatrick AW, et
al. 2019 WSES guidelines for the management of severe acute pancreatitis. World J Emerg
Surg. 2019; 4: 27
3. Vege SS. Clinical manifestations and diagnosis of acute pancreatitis. UpToDate. [Internet];
2019. [acesso em mar 2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/clinical-
manifestations-and-diagnosis-of-acute-pancreatitis.
4. Vege SS. Management of acute pancreatitis. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em mar
2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/management-of-acute-
pancreatitis.
5. Vege SS. Etiology of acute pancreatitis. UpToDate. [Internet]; 2019. [acesso em mar 2020].
Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/etiology-of-acute-pancreatitis.
6. Vege SS. Predicting the severity of acute pancreatitis. UpToDate. [Internet]; 2019. [acesso em
mar 2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/predicting-the-severity-of-
acute-pancreatitis.
3.7
ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
Autores:
Carolina Limongi de Oliveira
Drielly Morais Sá Ferreira
Lívia de Almeida Costa
Pedro Henrique dos Santos Pinto
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes

DEFINIÇÕES
A encefalopatia hepática (EH) é uma síndrome neuropsiquiátrica
reversível que ocorre em pacientes com insuficiência hepática avançada,
insuficiência hepática aguda e na presença de desvios portosistêmicos. Tem
grande impacto na qualidade de vida e na sobrevida dos doentes, sendo
frequentemente considerada um indicador de mau prognóstico.
Caracteriza-se por uma variedade de alterações no estado mental, desde
sinais mínimos de função cerebral até coma. Pode ser classificada como:

• EH mínima ou encoberta (covert) - estágio pré-clínico


(comportamentos cognitivos sutis detectados por testes
especializados)

• EH clinicamente manifesta ou aberta (overt)


Estima-se que 60 a 80% dos pacientes com cirrose ou desvio
portossitêmicos apresentem algum grau de EH, sendo clinicamente
manifesta em 30 a 45% dos cirróticos. Há recorrência dos sintomas em até
40% dos pacientes dentro de 1 ano após o primeiro episódio.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A EH apresenta fisiopatologia complexa e não totalmente compreendida,
decorrente de mecanismos distintos, incluindo inflamação, estresse
oxidativo, aumento da permeabilidade da barreira hematoencefálica e
alteração no metabolismo energético, além da presença de neurotoxinas,
como a amônia.
A amônia é a neurotoxina mais bem caracterizada na EH. É produzida
pelos enterócitos, a partir da glutamina, e pelo catabolismo bacteriano do
cólon de fontes nitrogenadas, como proteínas ingeridas. O funcionamento
adequado do fígado elimina quase toda a amônia, convertendo-a em ureia ou
glutamina. No entanto, na disfunção hepática há incapacidade de excretar
essa substância de forma adequada e, como consequência, ocorre
hiperamonemia, presente em mais de 80% dos pacientes com EH. Isso gera
alteração da permeabilidade e aumenta a osmolaridade nos astrócitos,
resultando em edema e disfunção celular, sem aumento clinicamente
evidente da pressão intracraniana. Como consequência, há alteração da
atividade elétrica neuronal, aumentando o tônus das vias inibitórias
gabaérgicas e alterando outros neurotransmissores.
A síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SRIS), secundária a
infecções, sangramento gastrointestinal, obesidade e alterações na flora
intestinal, também se relacionam com a patogênese da EH, pois ocorre
liberação de citocinas e mediadores pró-inflamatórios, gerando alterações no
fluxo sanguíneo e nos metabólicos cerebrais, alterando a permeabilidade da
barreira hematoencefálica.

QUADRO CLÍNICO E EXAME FÍSICO


A EH apresenta amplo espectro de sintomas clínicos, neurológicos e
psiquiátricos, associados às manifestações da doença hepática crônica. Na
maioria das vezes são reversíveis, entretanto, surtos repetidos podem estar
associados a déficits cumulativos persistentes.
Pacientes com EH mínima apresentam déficit cognitivo sutil, geralmente
são assintomáticos e detectados através de testes psicométricos ou
eletrofisiológicos. Os distúrbios no padrão diurno do sono (insônia e
hipersonia) são manifestações iniciais comuns e geralmente precedem outras
alterações no estado mental ou sintomas neuromusculares. À medida que a
EH progride, os pacientes podem desenvolver alterações de humor (euforia
ou depressão), desorientação, comportamento inadequado, sonolência,
confusão e inconsciência, podendo evoluir até estado comatoso.
O asterix ou flapping está geralmente presente em estágios iniciais e
intermediários. Consiste em uma alteração motora secundária à perda do
tônus postural, chamada de mioclonia negativa, testada através de ações que
exigem o tônus, como a hiperextensão dos punhos. Em pacientes não
comatosos, podem ser identificadas alterações motoras como a síndrome
piramidal, que se apresenta com hipertonia, hiperrreflexia e sinal de Babinsk
positivo. A disfunção extrapiramidal, síndrome parkinsoniana associada à
cirrose, pode estar presente e cursar com hipomimia, rigidez muscular,
bradicinesia e tremor, que são alterações mais comuns na EH persistente.
Pacientes com EH podem ter déficits neurológicos persistentes e
cumulativos na memória, inibição de resposta e aprendizado, apesar de uma
aparente normalização do estado mental após o tratamento. Episódios
recorrentes se correlacionam com a gravidade do comprometimento residual.
Alguns pacientes com hepatopatias e história de etilismo, uso de drogas
intravenosas ou com doença de Wilson podem apresentar alterações
funcionais e estruturais cerebrais independentes da insuficiência hepática,
que podem agravar e/ou confundir os sinais e sintomas da EH.

EXAMES COMPLEMENTARES
O achado laboratorial comum é a elevação na concentração sérica de
amônia, entretanto, não deve ser solicitado para diagnóstico e/ou
rastreamento de EH, pois pode estar elevado em outras condições não
hepáticas, como doença renal, choque, sangramento gastrointestinal, em
usuários de ácido valproico e álcool. Se for identificado nível normal de
amônia, o diagnóstico de EH deve ser questionado.
Os pacientes geralmente apresentam testes bioquímicos de função
hepática alterados devido à doença subjacente. Distúrbios hidroeletrolíticos
também são comuns, como hiponatremia e hipocalemia, relacionados à
disfunção hepática e/ou uso de diuréticos, e devem ser obtidos para
diagnóstico diferencial de outras condições que levam a alterações do estado
mental, assim como a dosagem de glicemia e função renal.
Para pacientes com graus leves de EH (mínima ou grau I), nos quais o
diagnóstico clínico não é evidente, testes psicométricos e eletrofisiológicos
podem ser úteis para avaliar o comprometimento da função mental.
Entretanto, são incapazes de discriminar entre disfunção cognitiva da EH ou
de outras causas, assim como diferenças individuais na inteligência e
habilidades cognitivas que influenciam os resultados desses testes. Pela
heterogeneidade dos achados, recomenda-se pelo menos 2 testes diferentes.
O estudo eletrofisiológico, para detectar EH mínima, inclui monitoramento
de eletroencefalograma, potenciais evocados e testes críticos de frequência
de oscilação. No entanto, nenhum desses testes é amplamente utilizado.
Os exames de imagem não servem para o diagnóstico de EH e são
utilizados quando há dúvida diagnóstica, para excluir outras causas de
alterações do estado mental. Os mais utilizados são Tomografia
computadorizada (TC) de crânio sem contraste, principalmente quando o
diagnóstico de EH é duvidoso, no qual não se pode excluir hemorragia
intracraniana, e ressonância nuclear magnética (RNM) de encéfalo. A
ressonância magnética com espectroscopia e a tomografia por emissão de
prótons são exames não invasivos que estão sendo estudados para
diagnóstico de EH, a partir da análise de neurometabólitos.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
A abordagem diagnóstica da EH é baseada em:

1. Dados clínicos (anamnese e exame físico): detectar o


comprometimento cognitivo e neuromuscular
2. Exclusão de outras condições que alterem o estado mental
3. Busca por fatores precipitantes:

• Infecção
• Sangramento digestivo
• Uso de diuréticos
• Uso de medicações depressoras do sistema nervoso central
• Constipação intestinal
• Distúrbios hidroeletrolíticos ou acidobásicos
• Hipoglicemia
• Deterioração da função hepática
• Carcinoma hepatocelular
Testes laboratoriais séricos para descartar anormalidades metabólicas e
TC de crânio devem ser consideradas se o paciente apresentar achados
clínicos que sugiram outra etiologia.
A encefalopatia hepática é categorizada com base em quatro fatores:

• Doença subjacente:
Tipo A: associada à insuficiência hepática aguda;

Tipo B: associada à shunts portossistêmicos sem doença


hepatocelular intrínseca

Tipo C: associada à cirrose com hipertensão portal ou desvio


portossistêmico

• Gravidade das manifestações: de acordo com os critérios de


West Haven (Tabela 1):
Estágio Alterações
0 Ausência de alterações clínicas evidentes

Alterações leves de comportamento e de funções biorregulatórias, como alternância do ciclo


1
sono-vigília

Letargia ou apatia, lentidão nas respostas, desorientação no tempo e espaço, alterações de


2
personalidade e comportamento inadequado, presença de flapping

Sonolência e torpor com resposta aos estímulos verbais, desorientação grosseira e agitação
3
psicomotora, presença ou ausência de flapping

4 Coma não responsivo aos estímulos verbais e com resposta flutuantes à dor

Tabela 1. Critérios de West Haven


Fonte: Manual de hepatologia para clínicos e residentes

• Curso temporal:
Episódica ou aguda: episódio isolado em um período de 6
meses;

Recorrente: mais de um surto em um intervalo de 6 meses;

Persistente: alterações neuropsiquiátricas sempre presentes, com


manifestações dos diferentes graus de EH.

• Presença de fatores precipitantes:


Espontânea ou não precipitada;

Precipitada: os fatores precipitantes devem ser investigados e


tratados.
A EH encoberta é altamente prevalente em pacientes cirróticos (60 a
80%) e tem impacto na qualidade de vida, apesar de não ter manifestações
clínicas aparentes. A International Society for Hepatic Encephalopaty and
Nitrogen Metabolism> (ISHEN) propôs uma nova classificação para EH,
dividindo a síndrome em ausente, encoberta (covert) e clinicamente
manifesta (overt), apresentada abaixo (Tabela 2):

ausente encoberta aparente


ESTADO MENTAL Não comprometido Não comprometido Alterado

TESTES ESPECIALIZADOS Não comprometido Alterados Não requeridos

FLAPPING Ausente Ausente Presente

Tabela 2. Classificação da encefalopatia hepática de acordo com a ISHEN.


Fonte: Manual de hepatologia para clínicos e residentes.

TRATAMENTO
O tratamento é recomendado apenas a EH clinicamente manifesta. A
identificação dos fatores desencadeantes e sua correção é de extrema
importância, pois quando combinado à terapia padrão está associado a uma
rápida melhora na EH, em 90% das vezes.
A terapia da EH depende da gravidade do quadro. Aqueles com EH graus
II, III e IV deverão receber tratamento em ambiente hospitalar, enquanto no
grau I o tratamento pode ser ambulatorial. Nos casos mais graves (EH graus
III a IV), com risco ou incapacidade de proteger via aérea, devem ser
monitorizados em terapia intensiva, considerar intubação orotraqueal para
proteção de via aérea e passagem de sonda nasoenteral para administração de
terapêutica específica e dieta.
Os pacientes com cirrose geralmente são desnutridos e a restrição à
ingestão proteínas aumenta a mortalidade. Dessa forma, é essencial manter
um consumo energético de 35 a 40 kcal/kg/dia, com uma ingestão de
proteínas de 1,2 a 1,5 g/kg/dia, evitando longos períodos de jejum.
As medicações específicas disponíveis visam reduzir a produção e o
aumento da excreção de amômia. A base da terapia da EH manifesta são os
dissacarídeos não absorvíveis, como a lactulose, e antibióticos, como
rifaximina.

• Lactulose: Apesar de evidências incertas sobre seu uso, apresenta


boa experiência na prática clínica, sendo considerada primeira
escolha terapêutica. No cólon, a lactulose é catabolizada pela flora
intestinal em ácidos, que reduzem o pH colônico, favorecendo a
conversão de amônia (NH3) em amônio (NH4+),não absorvível,
reduzindo sua concentração sérica. Além disso, apresenta efeito
prebiótico, alterando a microbiota colônica, permitindo o
crescimento de Lactobacillus não produtores de urease. Efeitos
catárticos de uma carga hiperosmolar no cólon melhoram o trânsito
gastrointestinal, permitindo menos tempo para a absorção de
amônia e maior excreção fecal de nitrogênio.
Trata-se de um dissacarídeo não absorvível, utilizado na dose de 15 a 45
mL, via oral ou por sonda nasoenteral, 2 a 4 vezes por dia, objetivando 2-3
evacuações pastosas diárias. Naqueles com dificuldade para evacuação,
podemos utilizar 20 a 40 mL de 1 em 1 hora até obter o resultado desejado.
O tratamento via oral geralmente é bem tolerado e os principais efeitos
colaterais incluem cólicas abdominais, diarreia e flatulência. Enemas de
lactulose podem ser administrados em paciente intolerantes ou sem resposta
à lactulose por via oral, através da solução de 200 a 300 mL de lactulose em
700 a 800 mL de água, soro, glicerina ou manitol. O enema deve permanecer
retido via retal por 30 a 60 minutos com o paciente em posição de
Trendelenburg.

• Antibióticos: utilizados normalmente associados à lactulose para


o tratamento de EH aguda ou para prevenir episódios recorrentes.
Causam alterações na flora intestinal e consequente redução da
produção de amônia. Apresentam custo mais elevado, sendo mais
adequados para pacientes que não toleraram ou apresentam baixa
resposta aos dissacarídeos. O uso prolongado desses agentes
aumenta o risco de diarreia associada a C. difficile.

Rifaximina: agente antimicrobiano, indisponível no Brasil até o


momento. Pode ser usada na dose de 550 mg por via oral 2 vezes
ao dia ou 400 mg por via oral 3 vezes. Estudos mostram que a
associação à lactulose reduz significativamente o risco de
recorrência de EH manifesta e hospitalização, em comparação
com a terapia isolada de lactulose, sem comprometer a
tolerabilidade.

Neomicina: antibiótico inibidor da glutaminase, usada na dose


1 a 1,5 g a cada 6 horas por via oral, com boa eficácia. Potencial
ototoxicidade e nefrotoxicidade a longo prazo.

Metronidazol: eficácia semelhante à Neomicina, usado na dose


de 250-500 mg a cada 8 horas, por via oral. Apresenta efeitos
gastrointestinais como vômitos e risco de neuropatia periférica,
limitando seu uso a logo prazo.

• L-ornitina-L-aspartato (LOLA): são aminoácidos que


melhoram a metabolização hepática da amônia. A L-ornitina é
substrato para metabolização de amônia em ureia no ciclo de
Krebs, e a L-aspartato atua transformando amônia em glutamina. É
um tratamento alternativo bem tolerado, com eficácia na redução
de aumentos pós-prandiais da amônia sérica, e pode ser usado em
pacientes submetidos à colocação de shunt portossistêmico intra-
hepático transjugular (TIPS) ou em pacientes refratários à terapia
padrão.

• Probióticos: Probióticos são formulações de microrganismos que


possuem propriedades benéficas para o hospedeiro. As espécies
mais eficazes para encefalopatia hepática parecem ser Lactobacilli
e Bifidobacteria. A alteração da flora intestinal com probióticos
pode estar associada à melhora da encefalopatia hepática, porém
não está indicada rotineiramente, sendo necessários estudos
adicionais.

• Polietilenoglicol (PEG): laxante osmótico que auxilia no


tratamento da EH, aumentando a excreção de amônia nas fezes.

• Flumazenil: antagonista benzodiazepínico de ação transitória, que


pode ser utilizado em pacientes graves, com histórico de uso de
benzodiazepínicos. A recuperação da consciência ocorre em 30-
50% dos casos, sem alterar mortalidade.
A profilaxia secundária é recomendada após o primeiro episódio de EH e
deve ser continuado a menos que o fator precipitante seja resolvido. A
lactulose é recomendada como primeira escolha e a Rifaximina, apesar de
indisponível no Brasil, é recomendada como um complemento eficaz para a
prevenção da recorrência.
O tratamento da EH encoberta ainda não é recomendado de rotina, mas
deve ser indicado em pacientes que apresentem prejuízo na qualidade de
vida, sendo recomendado aporte nutricional adequado e o uso da rifaximina
ou lactulose.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1. Manejo da encefalopatia hepática
Fonte: Elaborado pelos autores.
Fluxograma 2: Manejo da encefalopatia hepática
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo feminino, 68 anos, portadora de
cirrose hepática por Hepatite C diagnosticada há 7 anos. Em uso de
hidroclorotiazida, losartana, sinvastatina e metformina. Admitida ao
pronto-atendimento com quadro de aumento do volume abdominal e
dor difusa, sonolência, importante desorientação e presença de flapping.
b. Exame físico: corada, desidratada 1+/4+, ictérica 2+/4+,
temperatura axilar 36°C, FC 105 bpm, PA 130 x 90 mmHg, FR 18
irpm, SatO2 96%. Abdome ascítico, com dor difusa à palpação
abdominal e membros inferiores edemaciados.
c. Diagnóstico: Encefalopatia grau III.
d. Prescrição Sugerida:

• Dieta para hepatopatia, sem restrição proteica, por SNE


• Cabeceira elevada a 30°
• Sinais vitais e cuidados gerais 4/4 horas
• Soro fisiológico 500 mL, EV, 8/8 horas
• Lactulose 20-40 mL 1/1 hora até obter evacuação
• Lactulose 15 mL 8/8 horas
• Metronidazol 500 mg 8/8 horas ou Neomicina 1,5 g 6/6 horas, por
SNE, se ausência de resposta de mais de 24 horas

• Dipirona 500 mg/mL, EV, 6/6 horas se dor ou febre


• Bromoprida 5 mg/mL, EV, 8/8 horas se náuseas ou vômitos
• Suspender diuréticos
• Rastreio infeccioso, incluindo paracentese diagnóstica
DICAS DO ESPECIALISTA
• A encefalopatia hepática é uma manifestação comum da doença
hepática aguda e crônica, marcando doença descompensada,
apresentando amplo espectro de sinais e sintomas
neuropsiquiátricos, que pioram a qualidade de vida dos pacientes.

• O diagnóstico é clínico, devendo sempre buscar fatores


precipitantes e diferenciar de condições neurológicas e sistêmicas.

• A terapia recomendada é o suporte clínico, correção dos fatores


desencadeantes e a redução da produção de amônia intestinal. A
lactulose é a medicação utilizada como primeira linha, podendo
acrescentar antibióticos e LOLA aos casos refratários.

• O diagnóstico precoce e o tratamento adequado permitem que o


quadro seja potencialmente reversível. Nos casos de doença
hepática avançada com encefalopatia recorrente ou persistente, o
transplante hepático é o tratamento definitivo.

REFERÊNCIAS
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maio de 2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/hepatic-encephalopathy-
in-adults-treatment.
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pathogenesis?topicRef=1255&source=see_link.
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4. Ferraz MLG, Silva AEB, Schiavon JLN, Monteiro MM, Sammarco GN, Almeida VB.
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5. Wijdicks EFM. Hepatic Encephalopathy, N Engl J Med. 2016; 375: 1660-70.
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Encephalopathy and Mild Cognitive Impairment Worsen Quality of Life in Elderly Patients
with Cirrhosis. Clin Gastroenterol Hepatol. 2020; S1542-3565(20)30345-1.
7. Kaji K, Okita K, Suzuki K, Sato I, Fujisawa M, Yoshiji H. Lower levels of serum albumin are
associated with impairment of cognitive function in cirrhotic patients with early-stage
hepatic encephalopathy: An exploratory data analysis of phase II/III clinical trials of
rifaximin in Japan. BMC Gastroenteroly. 2020.
8. Labenz C, Adarkwah CC, Wörns, Miehlke S, Hofmann WP, Buggisch P, et al. Management
of hepatic encephalopathy in Germany: a survey among physicians. Z Gastroenterol. 2020;
58(01): 49-56.
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the Study of Liver Diseases and the European Association for the Study of the Liver.
Hepatol. 2014; 60(2): 715-35.
10. Hudson M, Schuchmann M. Long-term management of hepatic encephalopathy with
lactulose and/or rifaximin: a review of the evidence. EUR J Gastroenterol Hepatol. 2019; 31:
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hospitalization. Am J Gastroenterol. 2014; 109: 1757-63.
12. Kappus MR, Bajaj JS. Covert hepatic encephalopathy: not as minimal as you might think.
Clin Gastroenterol Hepatol. 2012; 10(11): 1208-19.
3.8
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA
Autores:
Lívia de Almeida Costa
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes
Breno Araújo Barbosa
Elaine Jéssica Laranjeira Lima

DEFINIÇÕES
A Hemorragia Digestiva Alta (HDA) é definida como sangramento
digestivo intraluminal de origem proximal ao ligamento de Treitz
(demarcação anatômica da junção duodeno-jejunal), podendo ter origem no
esôfago, estômago ou duodeno.
Trata-se da emergência gastroenterológica mais comum, sendo uma
condição frequente nos serviços de urgência e emergência, responsável por
cerca de 1 internação a cada 10.000 adultos/ano, importância relacionada a
alta morbidade e custos elevados. Tem incidência anual de 48 a 160
casos/100.000 habitantes, sendo mais prevalente na população idosa, em
homens (2 homens: 1 mulher) e nas regiões de menor desenvolvimento
socioeconômico. Embora a maioria dos casos (aproximadamente 80%) tenha
caráter autolimitado, a mortalidade pode ocorrer em 5 a 20 % dos casos,
dependendo da etiologia, sendo maior no sangramento de origem varicosa.
Dessa forma, o estabelecimento de medidas de suporte e terapia específica
relaciona-se com a redução desses índices.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A etiologia da HDA pode ser estabelecida em aproximadamente 80% dos
casos (Quadro 1) e pode ser dividida em:

• Não varicosa: decorrente de lesão da mucosa esofágica, gástrica


e/ou duodenal. As causas mais frequentes são: úlcera péptica
(gástrica e duodenal), lesão aguda da mucosa gastroduodenal e
esofagite erosiva. Outras condições menos comuns incluem
tumores benignos e malignos, Mallory-Weiss, má formação
vascular (Dieulafoy, angiodisplasia e angioma), úlceras de esôfago/
úlceras de Cameron, fístula aortoentérica, hemobilia, hemosuccus
pancreaticus, ingestão de corpo estranho e sangramento
iatrogênico após intervenção endoscópica.

• Varicosa: devido à ruptura das varizes esofágicas e/ou gástricas.


Pode ocorrer sangramento secundário à gastropatia hipertensiva
portal ou ectasia vascular antral gástrica, em menor frequência.
Úlcera péptica

Esofagite erosiva

Laceração de Mallory-Weiss

Úlceras de estresse

Varizes esofagogástricas

Gastropatia hipertensiva portal

Ectasia vascular gástrica

Angiodisplasias

Neoplasias

Fístula aortoentéricas

Lesão de Dieulafoy

Quadro 1. Principais etiologias de HDA.


Fonte: Adaptado de Medicina de Emergência. Abordagem Prática. 13.
ed.2019

a. HDA NÃO VARICOSA


Dentre as causas de HDA não varicosa, a doença ulcerosa péptica
(gástrica ou duodenal) mantém-se como a principal causa de sangramento,
apesar da diminuição na incidência devido à terapia com inibidores de
bomba de prótons (IBP). Embora as medidas clínicas para o tratamento da
doença péptica tenham elevada taxa de sucesso, até 25% dos pacientes
podem apresentar recorrência do sangramento.
Os principais fatores relacionados à úlcera péptica são os anti-
inflamatórios não esteroidais (AINE´s), ácido acetil salicílico (AAS) e a
infecção por Helicobacter pylori. Em pacientes graves e
hemodinamicamente instáveis, o estresse fisiológico pode favorecer o
aparecimento de úlceras, especialmente no corpo e fundo gástrico, e com
risco de sangramento aumentado, principalmente naqueles que estejam em
ventilação mecânica por mais de 48 horas ou apresentem coagulopatia grave.
Outros fatores podem estar relacionados, como uso de corticoides em altas
doses, tabagismo e etilismo.
Em pacientes em terapia prolongada com AAS, os fatores que aumentam
o risco para HDA são: história de úlcera péptica complicada, sangramento
prévio (recorrência de 15% ao ano) ou pelo menos dois dos seguintes: idade
superior a 65 anos, uso concomitante de AINE´s (risco duas a quatro vezes
maior), corticosteroide ou anticoagulante, AAS em altas doses, histórico de
úlcera não complicada ou infecção por H. pylori (risco cinco vezes maior).
A esofagite erosiva representa causa importante de sangramento
digestivo, pelo aumento na prevalência da doença do refluxo
gastroesofágico. Muitas vezes, relaciona-se com sintomas de pirose e/ou
regurgitação ou uso de medicamentos (AINE´s, bifosfonatos, tetraciclina) e
infecções (Candida, vírus do herpes simplex, citomegalovírus). Nesses
casos, a hemorragia geralmente tem menor repercussão, com menor período
de internação e taxa de ressangramento mais baixa.
Dentre as causas menos frequentes de HDA não varicosa, as neoplasias
raramente manifestam-se como sangramento digestivo alto súbito, sendo
mais frequente a perda crônica, de baixo volume, com quadro de anemia
ferropriva e sangue oculto positivo nas fezes, da mesma forma que as
malformações vasculares. A laceração de Mallory-Weiss manifesta-se com
sangramento decorrente de laceração da mucosa de esôfago distal após
episódios de vômitos, cessando espontaneamente na maioria dos casos. A
lesão de Dieulafoy manifesta-se com hemorragia digestiva volumosa,
decorrente de erosão de vaso submucoso aberrante, frequentemente
localizado no estômago. A apresentação mais comum é de episódios
recorrentes de sangramento importante e várias endoscopias digestivas
normais, devido à interrupção espontânea da hemorragia e ausência de
alterações na mucosa gástrica, uma vez que anormalidade vascular é
subepitelial.

b. HDA VARICOSA
Trata-se de sangramento de grande monta, pela ruptura de varizes
esofágicas ou, menos frequentemente, gástricas. Essas alterações são
decorrentes do aumento da pressão no sistema venoso portal, secundário à
doença hepática estrutural ou por alteração no sistema vascular pré, intra ou
pós-hepático. A HDA varicosa geralmente decorre de hipertensão portal
significativa, muitas vezes associada a doença hepática avançada (classe B
ou C de Child-Pugh), e é responsável pela morte de até 30% dos cirróticos.
Os fatores de risco para hemorragia varicosa incluem gravidade da doença
hepática, que pode ser estimada pela classificação de Child-Pugh, calibre das
varizes e presença de sinais da cor vermelha (red spots).

QUADRO CLÍNICO
O sangramento digestivo alto geralmente se apresenta sob a forma de
hematêmese (vômito com sangue vivo) ou, mais comumente, melena (fezes
enegrecidas e com odor fétido). Embora a hematoquezia (fezes misturadas
com sangue) e a enterorragia (evacuação de sangue vermelho vivo) sejam
mais relacionadas à hemorragia digestiva baixa, até 15% dos pacientes com
essa forma de apresentação têm como origem do sangramento o trato
gastrointestinal superior, que deve ser investigado nesses casos se houver
maior repercussão hemodinâmica.
Pacientes com sangramento digestivo volumoso podem apresentar
repercussão sistêmica decorrente da hipovolemia, como taquicardia, palidez
cutaneomucosa, hipotensão arterial, lipotímia ou síncope.

EXAME FÍSICO
A avaliação inicial busca identificar fatores de risco na história do
paciente, como idade, presença de comorbidades (doença cardiovascular,
doença hepática, insuficiência renal), medicações em uso, história de
sangramento prévio e, no exame físico, sinais de instabilidade hemodinâmica
(taquicardia, hipotensão arterial, rebaixamento do nível de consciência,
sudorese, perfusão periférica) a fim de definir a melhor abordagem. Alguns
sinais podem sugerir uma causa específica:

• Doença ulcerosa péptica: dor em região epigástrica, uso de AINE


´s ou AAS.
• Erosões ou úlceras esofágicas: história de doença do refluxo
gastroesofágico.

• Laceração de Mallory-Weiss: episódios de náuseas, vômitos e


tosse precedendo a hematêmese.

• Sangramento varicoso: icterícia, ascite ou encefalopatia.


• Neoplasia maligna: disfagia, dor abdominal, desnutrição.
• Fístula aortoentérica: histórico de aneurisma da aorta abdominal
ou enxerto aórtico.

• Angiodisplasia: doença renal, estenose aórtica ou telangiectasia


hemorrágica hereditária.

• Úlceras marginais (úlceras em anastomose): cirurgia prévia


envolvendo trato digestivo superior.
O uso de algumas drogas como AAS, AINE´s, antiagregante plaquetário
e anticoagulante está associado a risco maior de sangramento digestivo.
Outras medicações como ferro e bismuto podem causar escurecimento das
fezes, aspecto que pode confundir com melena.
O exame clínico do abdome permite avaliar sinais de irritação peritoneal
ou obstrução intestinal, que devem ser identificados antes da solicitação da
endoscopia digestiva alta, que está contraindicada se houver perfuração de
víscera oca. O exame da região perianal e o toque retal permitem avaliar
doença orificial e presença de sangue vivo ou coágulos na ampola retal.
Alguns achados no exame físico podem ser sugestivos da etiologia do
sangramento:

• Sangramento varicoso: Icterícia, telangiectasias ou eritema


palmar.
• Câncer gástrico: Linfonodomegalia supraclavicular esquerda ou
periumbilical, massa em epigástrio.

• Hipertensão portal: Ascite, circulação colateral,


hepatoesplenomegalia.
A avaliação dos parâmetros hemodinâmicos permite estimar o volume de
sangue perdido através da classificação do choque hipovolêmico (Tabela 1):

• Classe I: perda volêmica leve (menor que 15%), que se manifesta


apenas por taquicardia.

• Classe II/III: perda volêmica moderada (estimada como pelo


menos 15%); pode apresentar hipotensão postural (queda da
pressão arterial sistólica maior que 20 mmHg em posição
ortostática) ou aumento da frequência cardíaca maior que 20 bpm,
também em posição ortostática.

• Classe IV: perda maior que 40% da volemia; pode apresentar


hipotensão mesmo em decúbito.

CLASSE I CLASSE II CLASSE III CLASSE IV


Perda sanguínea (mL) < 750 750-1500 1500-2000 > 2000

Perda volêmica (%) <15 15-30 30-40 > 40

PAs Normal Normal Reduzida Muito reduzida

PAd Normal Elevada Reduzida Muito reduzida

Pulso (bpm) <100 100-120 120 -140 >140

FR (irpm) Normal Normal >20 >20

Nível de Ansiedade Ansiedade


Confusão Confusão ou letargia
consciência leve moderada

Ressuscitação volêmica
Cristaloides Cristaloides Cristaloides e sangue Cristaloides e sangue
indicada

* PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; FR: frequência respiratória.

Tabela 1: Classificação do choque hipovolêmico.


Fonte : adaptado de Medicina de Emergência. Abordagem Prática. 13.
ed.2019

EXAMES COMPLEMENTARES
• Hemograma: as dosagens seriadas são fundamentais para
monitorização dos níveis de hematimétricos. É importante lembrar
que, nos casos de reposição volêmica agressiva, os níveis de
hematrócrito podem estar falsamente baixos, devido à
hemodiluição.

• Tipagem sanguínea: em casos de sangramento volumoso, com


necessidade de hemotransfusão.

• Função hepática, coagulograma, função renal e eletrólitos.


• Endoscopia digestiva alta (EDA): é o padrão ouro na HDA. Tem
alta sensibilidade e especificidade, permitindo diagnóstico e
abordagem terapêutica. Deve ser realizada após a estabilização
hemodinâmica, sendo necessário jejum de 6 a 8 horas para sólidos
e 2 horas para líquidos claros. É recomendado que seja realizada
em até 12 horas na HDA varicosa e em até 24 horas na HDA não
varicosa.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Aproximadamente 80% dos episódios de sangramento do trato digestivo
superior cessam espontaneamente. A morbidade e a mortalidade nos 20%
restantes decorrem de hemorragia persistente ou recorrente. Dessa forma, a
estratificação de risco para ressangramento e morte é fundamental para
definir a terapêutica. Os critérios clínicos e laboratoriais de gravidade
utilizados levam em conta:

• Idade (> 60 anos)


• Presença de comorbidades
• Hematêmese
• Sangue vermelho-vivo no exame retal ou no aspirado gástrico
• Choque hipovolêmico (pressão arterial sistólica < 100 mmHg e/ou
frequência cardíaca > 100 bpm)

• Nível inicial de hemoglobina < 10g/dL ou queda > 2 g/dL em 24


horas e coagulopatia severa

• Necessidade de hemotransfusão
Para padronização da estratificação de risco, existem escalas
prognósticas que consideram os achados clínicos, laboratoriais e
endoscópicos, permitindo identificar o grupo que necessita de intervenção
intra-hospitalar. O escore de Rockall (ER) (Tabela 2) baseia-se em três
achados clínicos e dois endoscópicos, com pontuação de 0 a 11, sendo o
risco de mortalidade diretamente crescente com a pontuação no escore
(Tabela 3). Pacientes com ER admissional (pré-endoscópico) igual a zero
podem realizar EDA ambulatorial, sem a necessidade de internação
hospitalar, devido à baixa mortalidade e baixo risco de ressangramento.

ESCORE ADMISSIONAL
PONTUAÇÃO 0 1 2 3

IDADE < 60 60-79 ≥ 80 -

CHOQUE (FC, PAS) FC <100 FC ≥ 100 -

IRC, neoplasia maligna


COMORBIDADES PAS ≥100 PAS ≥ 100 PAS < 100 metastática, insuficiência
hepática

ESCORE PÓS-ENDOSCOPIA

Lacerações de Mallory- Outros Neoplasia de trato


DIAGNÓSTICO -
Weiss, sem lesões diagnósticos gastrointestinal alto

ESTIGMAS DE Nenhum ou apenas - Sangue no trato -


HEMORRAGIA pontos de gastrointestinal, coágulo
RECENTE hematina
aderido, vaso visível ou
sangrante

Tabela 2. Escore Rockall.


Fonte : Tratado Gastrointestinal e Doenças do Fígado. 9. ed. 2017

ESCORE 0 1 2 3 4 5 6 7 8+
SANGRAMENTO
RECORRENTE 4,9 3,4 5,3 11,2 14,1 24,1 32,9 43,8 31,8
(%)

MORTALIDADE 0 0 0,2 2,4 5,3 10,8 17,3 27 41,1

RISCO BAIXO INTERMEDIÁRIO ALTO

Tabela 3. Sangramento recorrente e mortalidade de acordo com o ER


completo.
Fonte: Tratado Gastrointestinal e Doenças do Fígado. 9. ed. 2017

O Escore de Glasgow Blatchford (GB) (Tabela 4) é baseado apenas em


dados clínicos e laboratoriais e foi desenvolvido para predizer o risco de
morte em 30 dias e a necessidade de intervenção (hemotransfusão,
tratamento endoscópico ou cirúrgico) nos pacientes com HDA, na chegada
ao hospital. A pontuação varia de 0 a 23 e baseia-se nos níveis séricos de
ureia e hemoglobina, na pressão arterial sistólica (PA), na frequência
cardíaca (FC), na presença de síncope, melena e comorbidades (hepatopatia
e insuficiência cardíaca).
FATORES DE RISCO ACHADOS PONTUAÇÃO

<18,2 0
≥18,2 e <22,4 2
UREIA (MG/DL) ≥22,4 e <28 3
≥28 e <70 4
≥70 6

Homem ≥ 13 0
Homem ≥ 12 e < 13 1
Homem ≥ 10 e < 12 3
HEMOGLOBINA(G/DL)
Mulher < 12 0
Mulher >= 10 e <12 1
Homem ou Mulher <10 6

> 100 0
100-109 1
PRESSÃO ARTERIAL SISTÓLICA (MMHG)
90-99 2
< 90 3

<100 0
PULSO (BPM)
≥100 1

Não 0
MELENA AO EXAME
Sim 1
FATORES DE RISCO ACHADOS PONTUAÇÃO

Não 0
PRESENÇA DE SÍNCOPE
Sim 2

Não 0
HEPATOPATIA
Sim 2

Não 0
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
Sim 2

Tabela 4. Escore de Glasgow Blatchford.


Fonte: Approach to acute upper gastrointestinal bleeding in adults.
UpToDate. 2020

Pacientes com escore de GB maior ou igual a 1 são considerados de alto


risco de intervenção ou morte. Por outro lado, aqueles que pontuam GB
igual a 0 são considerados de baixo risco e podem receber alta precoce com
realização de EDA ambulatorial.
Apesar de os escores serem validados e apresentarem boa acurácia,
muitas vezes temos dificuldade de realização de EDA ambulatorial pelo
sistema público de saúde do Brasil, devendo considerar, diante desse
contexto, a realização de EDA no serviço de urgência na maioria dos casos
de HDA, no nosso país.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO CLÍNICO
Para todos os pacientes internados, é recomendada monitorização de
dados vitais (FC, PA, oximetria de pulso) e avaliação do débito urinário. Nos
pacientes idosos, com comorbidades, instabilidade hemodinâmica,
apresentação inicial com sangramento ativo ou suspeita de sangramento de
origem varicosa, recomenda-se monitorização em unidade de terapia
intensiva (UTI).
Todos os pacientes devem ser mantidos em jejum de 6 a 8 horas para
alimentos sólidos e de 2 horas para líquidos claros até a realização da
endoscopia digestiva alta para diagnóstico e possível terapêutica.

• Proteção de vias aéreas


As medidas iniciais visam garantir via aérea pérvia, ventilação adequada
e estabilidade hemodinâmica. É indicada nos pacientes com risco de
broncoaspiração para proteção de via aérea:
Hematêmese volumosa

Rebaixamento do nível de consciência

Encefalopatia hepática grau 3 ou 4

Insuficiência respiratória

• Reposição volêmica
A manutenção da perfusão tecidual através da reposição volêmica
adequada é a terapêutica inicial a ser adotada, com impacto na mortalidade.
Idealmente, a infusão de cristaloides (Soro fisiológico 0,9% ou Ringer
lactato) deve ser feita por dois acessos venosos periféricos calibrosos, sendo
o acesso venoso central uma alternativa naqueles pacientes sem via
periférica ou com necessidade de uso de drogas vasoativas. O objetivo da
ressuscitação é manter PA sistólica maior ou igual a 100 mmHg e FC menor
que 100 bpm. Nos cirróticos, a reposição volêmica deve ser mais cautelosa, a
fim de evitar aumento da pressão no sistema portal e piora do sangramento.

• Objetivos hemodinâmicos:
→ PAM (pressão arterial média) > 65 mmHg
→ PVC (pressão venosa central): 8-12 mmHg
→ Débito urinário > 0,5 ml/Kg/hora

• Transfusão de hemoderivados
A transfusão de hemoderivados deve ser individualizada. O risco
trombótico de reverter a anticoagulação deve ser ponderado contra o risco de
sangramento contínuo e, para isso, deve-se considerar as comorbidades
associadas e a condição hemodinâmica no paciente.
O uso de hemoderivados geralmente é indicado naqueles com choque
classe IV, ou seja, com perda sanguínea estimada em 30 a 40% da volemia.
Na HDA, recomenda-se a transfusão de hemácias para manutenção da
hemoglobina sérica em torno de 7 e 8 g/dL. Em pacientes com risco
aumentado de eventos cardiovasculares adversos no cenário de anemia
(doença arterial coronariana instável ou sangramento ativo contínuo), são
necessários níveis mais altos de hemoglobina, acima de 9 g/dL.
A transfusão de plaquetas, plasma fresco congelado e o uso de vitamina
K ou sulfato de protamina (antídoto da heparina) é controversa e deve ser
considerada nos pacientes em uso de antiagregantes plaquetários ou
anticoagulantes, com sangramento importante e risco de morte. Doentes com
sangramento ativo e plaquetas < 50.000 ou INR (international normalizated
ratio) > 2,0 devem ser avaliados para a transfusão de plaquetas ou plasma,
respectivamente. Em pacientes com HDA varicosa, o benefício dos agentes
pró-hemostáticos (plasma fresco congelado, concentrado de complexo de
protrombina e fator recombinante VIIa) é incerto.

• Aspiração por sonda nasogástrica


O uso rotineiro de sonda nasogástrica (SNG) para a lavagem do
estômago é controverso, sem impacto nas taxas de transfusão sanguínea,
cirurgia ou mortalidade. A presença de aspirado com sangue associa-se a
lesões de alto risco para sangramento recorrente, porém a ausência não as
exclui, sendo necessária a realização da EDA. Dessa forma, seu uso não é
recomendado rotineiramente, sendo reservado para casos em que existam
resíduos com coágulos, para a lavagem e melhor visualização da câmara
gástrica na EDA.

• Drogas procinéticas
As drogas procinéticas, como a Eritromicina e a Metoclopramida,
aceleram o esvaziamento gástrico e permitem melhor visualização da
mucosa durante a EDA, reduzindo a necessidade de repetir o exame, porém
não alteram desfechos como transfusão sanguínea, tempo de internação e
necessidade de intervenção cirúrgica. A Eritromicina pode ser utilizada por
via intravenosa (3 mg/kg ou 250 mg em 100 mL de soro fisiológico 0,9%,
durante 30 minutos), iniciada 20 a 120 minutos antes da EDA nos pacientes
com suspeita de sangue e coágulos em grande quantidade no estômago.

• Inibidores da bomba de prótons (IBP)


O uso dos inibidores da bomba de prótons visa à supressão ácida e
manutenção do pH acima de 6, que é essencial para a agregação plaquetária,
e deve ser iniciado antes da realização da EDA em pacientes com suspeita de
sangramento por doença ulcerosa péptica, reduzindo a proporção de
pacientes com estigmas endoscópicos de sangramento recente e a
necessidade de terapêutica endoscópica.
A dose de IBP é controversa, podendo ser adotados esquemas com
Omeprazol 80 mg IV bolus, seguido por 40 mg IV 12/12h ou bolus seguido
de manutenção com uma infusão intravenosa contínua (Omeprazol 8 mg/h -
2 ampolas + soro fisiológico 0,9% 100 ml a 10 mL/h), e deve ser mantida
por 72 horas nos pacientes que tenham sido submetidos à hemostasia
endoscópica com úlceras de alto risco para ressangramento (Forrest I, IIa e
IIb – ver adiante). Naqueles sem estigmas de alto risco de sangramento
(Forrest IIc e III – ver adiante), podem trocar a via de administração para
IBP oral logo após a EDA, sendo recomendada a manutenção da dose plena
por 4 a 8 semanas. Nos casos de HDA associada ao uso de AAS e AINE´s e
que precisam manter o uso contínuo dessas medicações, deve-se manter o
uso concomitante de IBP enquanto o tratamento com essas drogas for
necessário.

• Infecção pelo Helicobacter pylori


O H. pylori atualmente é o principal agente etiológico da doença ulcerosa
péptica, sendo recomendada sua pesquisa nesse contexto. No entanto, a
acurácia dos testes da urease, histologia e antígeno fecal para pesquisa desse
patógeno na HDA está prejudicada pelo aumento do pH intragástrico
decorrente do sangramento e do uso de IBP, com maiores taxas de falso-
negativo. O teste respiratório com carbono marcado (C13) mantém alta
acurácia mesmo em vigência do sangramento, embora seja menos
disponível. Se detectada a bactéria, recomenda-se a erradicação a fim de
reduzir a recorrência da doença ulcerosa.

• Antibiótico profilático
Nos pacientes cirróticos, o sangramento gastrintestinal é um fator de
risco para a ocorrência de infecção bacteriana, principalmente por
microrganismos gram-negativos, sendo as mais comuns a peritonite
bacteriana espontânea, infecção do trato urinário e pneumonia. O uso de
antibiótico profilático nesses casos, com ou sem ascite, reduz a incidência de
infecção, ressangramento, tempo de internação e mortalidade. Fatores
importantes na escolha de antibióticos incluem características individuais do
doente e padrões locais de resistência a antibióticos. Naqueles com cirrose
hepática avançada (Child-Pugh B ou C) ou com uso prévio de antibiótico
profilático e nos hospitais com alta prevalência de bactérias resistentes às
quinolonas, recomenda-se o uso da Ceftriaxona (1 g, intravenosa, de 24/24 h,
por 7 dias). Outras opções como o Norfloxacino (400 mg por via oral, de
12/12 h, por 7 dias) e o Ciprofloxacino (500 mg, de 12/12 h, por 7 dias)
também podem ser utilizadas naqueles que não apresentem os fatores de
risco listados acima.

• Drogas vasoativas
Nos pacientes com HDA varicosa, o uso de drogas vasoativas (Tabela 5)
como a Terlipressina, Vasopressina, Somatostatina e Octreotide levam à
constrição dos vasos mesentéricos e esplâncnicos e redução do fluxo
sanguíneo varicoso. Devem ser iniciadas imediatamente após suspeita
diagnóstica de HDA varicosa, antes mesmo da EDA, e mantidas por 2 a 5
dias.
A Terlipressina é a droga de escolha, por ter impacto sobre a mortalidade.
A dose recomendada é bolus de 1 a 2 mg, endovenosa, com manutenção a
cada 4 h de 1 a 2 mg, de acordo com o peso do paciente (1,0 mg até 50 kg;
1,5 mg entre 50 e 70 kg; 2,0 mg se mais de 70 kg). Deve ser iniciada antes
da endoscopia e mantida até que o sangramento tenha sido controlado por 24
horas, com duração estendida por 2 a 3 dias. Recomenda-se monitorização
da infusão em UTI pelo risco de angina, arritmias, hipertensão arterial e
isquemia vascular periférica, que podem ser precipitados pela droga.
A Vasopressina é um potente vasoconstrictor, porém sem benefícios na
redução da mortalidade, e seu uso está associado a eventos adversos graves
(isquemia miocárdica e mesentérica, arritmias, acidentes vasculares cerebrais
e hiponatremia), sendo restrita aos casos em que as outras drogas se
encontram indisponíveis. A posologia é 0,4 a 1,0 UI/minuto, endovenosa,
em bomba de infusão contínua.
A Somatostatina e a droga análoga, Octreotide, apresentam bom perfil de
segurança. A Somatostatina é administrada via endovenosa, em bolus de 250
mcg, seguido pela administração em bomba da infusão contínua de 250
mcg/h. O Octreotide apresenta dose inicial endovenosa em bolus de 50 mcg,
seguido da infusão contínua de 25 a 50 mcg/h.

DOSE DOSE DE Efeitos


DROGA Observação
DE ATAQUE MANUTENÇÃO colaterais

Vasopressina 0,4 a 1 U/min 0,4 a 1 U/min IAM*, arritmias Associar


até 48h e AVC nitroglicerina
(20 mg/dia)

250 mcg em bolus (até 3 250 mcg/h por Náuseas, vômitos 500 mcg/h nos
Somatostatina
vezes em 1h) até 5 dias e hiperglicemia pacientes graves

25 a 50 mcg/h Náuseas, vômitos


Octreotide 50 mcg em bolus -
por até 5 dias e hiperglicemia

Dor abdominal, arritmia,


1 a 2mg, 4/4 h
Terlipressina 1 a 2 mg em bolus angina, isquemia -
por até 2 a 3 dias
periférica

* IAM: Infarto agudo do miocárdio. AVC: Acidente Vascular Cerebral

Tabela 5. Drogas vasoativas mais usadas na HDA varicosa.


Fonte: Proposta de modelo de atendimento da hemorragia digestiva alta para
o hospital universitário da UNIFESP/EPM , 2013.

• Manejo de antiagregantes plaquetários e anticoagulantes na


HDA
Em pacientes com úlceras hemorrágicas associadas ao uso de AAS e
anticoagulantes, a necessidade da droga deve ser avaliada, e a sua retomada
deve ser cuidadosamente considerada conjuntamente pelo
gastroenterologista, cardiologista, neurologista e paciente, caso a caso.
Na prevenção primária (ausência de doença cardiovascular evidente), a
terapia antiplaquetária deverá ser discutida e provavelmente não deve ser
retomada na maioria dos pacientes. Naqueles que fazem uso para prevenção
secundária (doença cardiovascular estabelecida), a reintrodução do AAS será
apropriada na maioria dos pacientes precocemente, após estabelecimento da
hemostasia: idealmente em 1 a 3 dias ou em até 7 dias, acompanhado pelo
uso de IBP a longo prazo (enquanto mantiver o uso do AAS).
Nos pacientes submetidos recentemente à intervenção coronária
percutânea que apresentam HDA, a terapêutica torna-se um desafio. A busca
por hemostasia geralmente requer a descontinuação precoce de drogas
antitrombóticas, que aumenta o risco de eventos isquêmicos do miocárdio,
incluindo trombose de stent. Além disso, o próprio sangramento agudo
promove ativação plaquetária e da cascata de coagulação, contribuindo para
o risco de trombose na ausência de terapia antiplaquetária. Nesses casos, a
manutenção dos antiagregantes plaquetários deve ser tentada, a menos que o
sangramento seja fatal, e principalmente se o stent coronário tiver sido
realizado recentemente.
Para usuários de anticoagulantes, a utilização de agentes de reversão
dependerá da gravidade do sangramento, das características do
anticoagulante específico (por exemplo, meia-vida) e da disponibilidade.
Para pacientes em uso de Warfarina, a endoscopia é realizada idealmente
com INR alvo entre 1,5 e 2,5.

b. TRATAMENTO ENDOSCÓPICO
A EDA é de fundamental importância para identificar a causa do
sangramento e abordagem terapêutica, sendo o exame de escolha tanto para
diagnóstico quanto para tratamento. O momento ideal da realização e as
opções terapêuticas dependem da etiologia.

• HDA não varicosa


Nos pacientes com suspeita de HDA não varicosa, recomenda-se a
realização de EDA nas primeiras 24 horas da admissão, com redução no
tempo de internação, taxa de ressangramento e necessidade de intervenção
cirúrgica. Os achados endoscópicos da doença ulcerosa péptica permitem
avaliar o risco de ressangramento e a necessidade de terapêutica endoscópica
através da Classificação de Forrest (Tabela 6).

PREVALÊNCIA SANGRAMENTO
CLASSIFICAÇÃO
(%) RECORRENTE (%)
Ia – Sangramento em jato 10 90

Ib – Sangramento em babação 10 10-20

IIa –Vaso visível sem sangramento ativo 25 50

IIb – Coágulo aderido 10 25 a 30

IIc – Hematina na base 10 7 a 10

III – Base limpa 35 3a5

Tabela 6. “CLASSIFICAÇÃO ENDOSCÓPICA DE FORREST”


Fonte: Approach to acute upper gastrointestinal bleeding in adults.
UpToDate. 2020.

A presença de úlcera com sangramento ativo em jato (Forrest Ia),


sangramento em babação (Forrest Ib), vaso visível (Forrest IIa) ou coágulo
aderido (Forrest IIb) é classificada como estigmas de alto risco de
ressangramento. A identificação de úlcera com base com hematina (Forrest
IIc) ou limpa (Forrest III) é classificada como de baixo risco. A hemostasia
endoscópica (com associação de dois métodos: mecânico, químico, térmico)
é recomendada nos casos de úlcera Forrest Ia, Ib e IIa, enquanto no IIb a
remoção do coágulo seguida de terapia endoscópica deve ser considerada de
forma individual. Esses pacientes são classificados como de alto risco de
ressangramento e devem manter uso de IBP endovenoso por 72 horas.
Aqueles com úlcera Forrest IIc ou III não necessitam de tratamento
endoscópico, devendo realizar a troca de IBP endovenoso para oral e alta
hospitalar.

• Forrest I e IIa: tratamento endoscópico com 2 métodos + IBP


endovenoso por 72 h

• Forrest IIb: tratamento endoscópico (remoção do coágulo) –


controverso + IBP endovenoso por 72 h

• Forrest IIc ou III: sem necessidade de tratamento endoscópico +


IBP oral + alta hospitalar
A repetição da endoscopia em 24 horas após o exame inicial (second
look) não é rotina, sendo reservada para pacientes com alto risco de
sangramento recorrente, quando a visualização durante a endoscopia inicial
for limitada por sangue ou coágulos, ou quando houver dúvida quanto à
efetividade da terapia endoscópica instituída.
As outras condições associadas à HDA não varicosa, na maioria das
vezes, não necessitam de terapêutica endoscópica, pois o sangramento é
habitualmente autolimitado. Nos casos de hemorragia ativa, o tratamento
endoscópico por método químico, térmico e/ou mecânico é indicado, de
acordo com a etiologia.

• HDA varicosa
Nos pacientes com suspeita de HDA varicosa, a EDA deve ser realizada
nas primeiras 12 horas, após estabilização hemodinâmica, e em combinação
com o uso de droga vasoativa, com impacto na mortalidade. O exame
permite a identificação do sítio de sangramento e a instituição de terapia
hemostática, através de ligadura elástica, método preferencial, ou injeção de
substância esclerosante (escleroterapia com etanolamina ou cianoacrilato).
Ambos os métodos são altamente eficazes no controle imediato do
sangramento, com redução na taxa de recorrência. As varizes gástricas têm
menor risco de hemorragia (3 a 30%) do que as esofágicas, entretanto,
relacionam-se a sangramento mais grave, de difícil controle e maior
mortalidade (25 a 40%).
Após o sangramento varicoso, recomenda-se profilaxia secundária com a
associação de terapia endoscópica e uso de betabloqueadores não seletivos
(Propranolol/Nadolol), iniciada após o quinto dia do sangramento em
pacientes estáveis e sem contraindicação a essas drogas.

• HDA persistente ou recorrente


A maioria dos pacientes com HDA que foram submetidos à terapia
endoscópica apresenta boa resposta à terapêutica. Entretanto, até 30% desses
doentes podem ter sangramento persistente, definido como hemorragia que
não cessa após 48 horas da terapia inicial, ou recorrente, com sangramento
nas primeiras 4 a 6 semanas após terapia inicial com sucesso. Estão
associados ao risco de ressangramento: instabilidade hemodinâmica,
hemoglobina inferior a 10 g/dL, hemorragia ativa no momento da
endoscopia, úlcera maior que 1 a 3 cm, localização da úlcera em bulbo
duodenal posterior ou pequena curvatura gástrica e doença renal em estágio
terminal.
Nesses casos, uma segunda tentativa de tratamento endoscópico pode ser
realizada, sendo preferível um método terapêutico endoscópico diferente do
primeiro. Na ausência de resposta à segunda tentativa, devem ser usadas
medidas de resgate. Na HDA não varicosa, indica-se embolização arterial,
preferível por ser menos invasiva, ou cirurgia. Na HDA varicosa, indica-se o
uso do balão de tamponamento (balão de Sengstaken-Blackmore) ou TIPS
(Transjugular Intrahepatic Portosystemic Shunt). O balão de tamponamento
é muito efetivo no controle imediato do sangramento varicoso, com taxa de
sucesso em cerca de 80% dos casos; no entanto, deve ser usado por no
máximo de 24 horas, pelo risco de aspiração, necrose e perfuração esofágica.
O TIPS permite direcionar o fluxo portal para a circulação sistêmica e
reduzir pressão sobre o sistema portal, com taxa de sucesso em cerca de 90%
dos casos. Nos casos de hemorragia persistente, ressangramento precoce ou
na indisponibilidade do TIPS, o shunt cirúrgico (shunts portossistêmicos e
transecção esofágica) deve ser considerado.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Elaborado pelos autores.
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 42 anos, hígido,
admitido na emergência com relato de epigastralgia, hematêmese e
melena iniciados há 4 horas. O paciente tem histórico de dor crônica em
região lombar, com uso frequente de anti-inflamatórios não esteroidais
(AINEs).
b. Ao exame: Orientado, descorado (1/4), hidratado, FC:108 bpm,
PA: 100 x 60 mmHg e eupneico. Abdome doloroso à palpação profunda
em epigástrio, sem sinais de irritação peritoneal. Toque retal com fezes
enegrecidas. P = 70 Kg. Aguardando exames e tempo de jejum para a
realização de endoscopia (última refeição há 5 horas).
c. Prescrição sugerida:
1. Jejum.
2. Cuidados gerais e sinais vitais.
3. Monitorização.
4. Balanço hídrico.
5. Suporte de O2 por cateter nasal a 2 L/min, se necessário.
6. Soro fisiológico 0,9% 1000 mL – 2000 mL, EV, em 1 hora.
7. Soro fisiológico 0,9% 500 mL + soro glicosado 50% 40 mL, EV,
28 gotas/minuto, de 6/6 h.
8. Dipirona 2 mL + água destilada 8 mL, EV de 6/6 h se dor ou Tax ≥
37,8°C.
9. Metoclopramida 10 mg – 2 mL + água destilada 8 mL, EV, até de
8/8 h, se náuseas ou vômitos.
10. Omeprazol 40 mg – 2 ampolas (80 mg) EV, em bolus.
11. Omeprazol 40 mg – 2 ampolas + soro fisiológico 0,9% 100 mL,
EV, em bomba de infusão contínua, 10 mL/h (8mg de
Omeprazol/h).
12. Hemocomponentes, se necessário (checar hemograma).

DICAS DO ESPECIALISTA
• A HDA é a principal emergência gastroenterológica. Apesar de
o sangramento cessar espontaneamente na maioria dos casos, é
necessário identificar e tratá-la adequadamente pelo risco de
ressangramento.

• A doença ulcerosa péptica é a principal causa de HDA. Nos


hepatopatas, as varizes esofagogástricas devem sempre ser
suspeitadas como etiologia do sangramento.

• O tratamento clínico visa à estabilização hemodinâmica com


reposição volêmica, monitorização, hemotransfusão, quando
necessária, e jejum. O uso de procinéticos e passagem de SNG não
são realizados rotineiramente.
• Na suspeita de HDA não varicosa, deve-se iniciar inibidor de
bomba de prótons endovenoso antes mesmo da realização da
EDA. Nos pacientes com suspeita de HDA varicosa, o uso do
vasoconstritor esplâncnico e antibiótico profilático também
devem preceder o exame.

• A EDA deve realizada após a estabilização hemodinâmica e


jejum adequado. Se houver suspeita de HDA não varicosa, o
exame deve ser realizado em até 24 horas e, no sangramento
varicoso, em até 12 horas.

• O tratamento endoscópico está indicado nos pacientes com


sangramento ulceroso e estigmas de alto risco de sangramento
(Forrest I, IIa e controverso no IIb) por meio de dois métodos
terapêuticos endoscópicos. No sangramento de origem varicosa, o
tratamento deve ser feito através de ligadura elástica ou
escleroterapia.

• Em casos de ressangramento é indicado, repetir tratamento


endoscópico. Na doença ulcerosa, em casos de falha ao segundo
tratamento endoscópico, opta-se por embolização ou intervenção
cirúrgica. No sangramento varicoso, é possível realizar a passagem
do balão de Sengstaken-blackmore por 24 horas, ou a passagem de
TIPS, como método mais definitivo.

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3.9
HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
Autores:
Isaac Nilton Fernandes Oliveira
Celso Carlos de Oliveira Filho
Lívia de Almeida Costa
Tárcia Nogueira Ferreira Gomes

DEFINIÇÕES
A hemorragia digestiva baixa (HDB) é classicamente definida como o
sangramento gastrointestinal que se origina distalmente ao ângulo de Treitz
(demarcação anatômica da junção duodeno-jejunal). Com o advento de
novos métodos endoscópicos, podemos subdividir a hemorragia digestiva da
seguinte forma:

• Hemorragia digestiva alta (HDA): origem do sangramento


proximal à papila duodenal.

• Hemorragia digestiva média: origem do sangramento entre a


papila duodenal e a válvula ileocecal.

• Hemorragia digestiva baixa (HDB): origem do sangramento


distalmente à válvula ileocecal.
Neste capítulo, para fins didáticos, a HDB será abordada como o
sangramento que ocorre distalmente ao ângulo de Treitz, correspondendo a
aproximadamente 20% dos casos de hemorragia digestiva. Embora em 80%
das vezes o sangramento cesse espontaneamente, a identificação da etiologia
e tratamento é importante pelo risco de recorrência, que acontece em até
25% dos casos.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Existem diversas causas relacionadas à HDB, com prevalência variável
associada principalmente à faixa etária do paciente. Nem sempre é possível
definir a etiologia, pois, na maioria das vezes, o sangramento é intermitente e
autolimitado e, em até 15% dos casos, a hemorragia tem origem no trato
digestivo superior, especialmente nos casos de maior repercussão clínica.
As principais causas de HDB são a doença diverticular do cólon,
responsável por até 55% dos casos, e a angiodisplasia, especialmente nos
idosos. As doenças anorretais benignas constituem causa frequente de
sangramento digestivo em qualquer idade (Tabela 1 e Quadro 1).
Doença diverticular dos cólons: 30-55% Colite infecciosa: 2-5%

Angiodisplasia/Ectasias vasculares: 10% Colopatia induzida por anti-inflamatórios: 2%

Colite isquêmica: 5-20% Divertículo de Meckel

Neoplasia colorretal: 2-15% Fístula aorto-entérica

Pós-polipectomia: 2-7% Colite actínica: 2%

Hemorroidas/Fissuras: 5-20% Varizes retais: 3%

Doença inflamatória intestinal: 3-5%

Tabela 1. Principais causas de hemorragia digestiva baixa.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Criança adulto idoso


Divertículo de Meckel Doença inflamatória intestinal Divertículos

Pólipo juvenil Pólipos adenomatosos Angiodisplasia

Doença inflamatória intestinal Neoplasia Neoplasia

- Doenças orificiais: hemorroida, fissura

- Pólipos adenomatosos

- Colite isquêmica / Colite actínica

Quadro 1. Etiologia quanto à faixa etária.


Fonte: Elaborado pelos autores.

A HDB relacionada à doença diverticular geralmente é de grande monta


e indolor, ocorrendo em até 15% dos pacientes com divertículos, sendo mais
frequente naqueles localizados no cólon direito, com possibilidade de
ressangramento de 14 a 38%, e risco ainda maior após o segundo episódio.
Já na angiodisplasia, embora seja diagnóstico diferencial nos casos de
hemorragia aguda, a manifestação clínica mais frequente é a perda crônica
de menor monta, resultando em anemia ferropriva e sangue oculto nas fezes.
Localizam-se mais frequentemente no cólon direito e, na maioria das vezes,
são detectadas pela colonoscopia, embora nem sempre seja identificado
sangramento ativo. Nos pacientes com antecedente de neoplasia pélvica
(vagina, útero, próstata) e tratados com radioterapia, o sangramento retal
pode ser decorrente da proctopatia actínica, ocorrendo de meses até alguns
anos após o término do tratamento.
O uso de anti-inflamatórios não esteroides (AINE´s) pode causar
hemorragia digestiva por uma variedade de mecanismos, incluindo danos
tópicos erosivos locais e disfunção plaquetária, ocasionando erosões e
úlceras no intestino delgado e cólon. A colite isquêmica, que ocorre como
resultado da redução abrupta e temporária do fluxo mesentérico, também
pode ter apresentação sob forma de úlceras, especialmente nas regiões mais
pobremente vascularizadas, como a flexura esplênica, o cólon descendente e
a junção retossigmoide, geralmente poupando o reto, e deve ser suspeitada
nos casos de dor abdominal súbita associada a sangramento digestivo baixo,
especialmente nos portadores de doenças cardiovasculares. A HDB de causa
inflamatória ou neoplásica geralmente se apresenta com sangramento de
pequena monta associado a outros sintomas como alteração do hábito
intestinal, dor abdominal, emagrecimento ou suboclusão intestinal.
O sangramento após polipectomia é a principal complicação da
colonoscopia, ocorrendo em 0,3 a 8% dos casos. Pode ser imediato, de
origem arterial, decorrente de hemostasia inadequada, ou tardio, até 15 dias
após o procedimento, devido à queda de escara local. Associa-se a técnicas
inadequadas de polipectomia, ao tamanho dos pólipos, uso de
anticoagulantes ou distúrbios de coagulação.
As doenças orificiais geralmente apresentam sangramento vermelho-vivo
recorrente, de pequena monta, embora alguns casos tenham maior
repercussão, especialmente nos pacientes em uso de anticoagulantes ou
portadores de coagulopatias. Diante de uma apresentação de HDB
significativa, mesmo na presença de doença orificial, não devemos atribuir a
etiologia às hemorroidas ou fissuras anais até que outras causas tenham sido
excluídas.

QUADRO CLÍNICO
A HDB pode se manifestar clinicamente das seguintes formas:

• Hematoquezia: pequena quantidade de sangue vermelho vivo nas


fezes;

• Melena: fezes com odor fétido e enegrecidas, decorrente da


oxidação da hematina;

• Enterorragia: presença de sangue vivo, com ou sem fezes, em


sangramentos volumosos;

• Sangramento oculto e anemia ferropriva: sangramento crônico


de pequena monta.
A apresentação mais comum da HDB é hematoquezia, quando o paciente
nota a presença grosseira de sangue misturado às fezes ou no papel
higiênico. O sangramento também pode ser exteriorizado com enterorragia
ou melena, geralmente em quadros agudos, ou de forma crônica e
imperceptível, identificada por meio de exames, com anemia e sangramento
oculto nas fezes.
A forma de apresentação pode fornecer pistas quanto à topografia do
sangramento. Aquele oriundo do cólon esquerdo tende a apresentar-se de cor
vermelha viva, enquanto do cólon direito ou intestino delgado, com fezes de
cor enegrecida ou marrom. Embora a hematoquezia sugira sangramento
proveniente dos segmentos mais distais do trato digestivo, nos pacientes com
HDA volumosa a presença de sangue pode acelerar a peristalse e a
exteriorização pode ser sob a forma de sangramento vivo nas fezes.
Outras manifestações clínicas se relacionam à má perfusão tecidual
decorrente da perda sanguínea, como hipotensão arterial, taquicardia,
sudorese, taquipneia ou lipotímia/síncope. Esses achados são preditores de
gravidade e sugerem comprometimento mais significativo do estado
hemodinâmico do paciente.

AVALIAÇÃO INICIAL E EXAME FÍSICO


A avaliação inicial do paciente visa determinar a etiologia e a gravidade
da HDB, triando os pacientes para instituir propedêutica e medidas de
suporte hemodinâmico. Dados clínicos da história e exame físico podem
sugerir a localização e a etiologia do sangramento:

• Idosos com sangramento indolor: sugere doença diverticular ou


angiodisplasia.

• Idosos com sangramento associado a dor abdominal e história


de doença vascular: sugere colite isquêmica.

• Paciente maior que 50 anos, com dor abdominal,


emagrecimento, massa abdominal e anemia crônica: sugere
neoplasia colorretal.

• Paciente jovem com diarreia com sangue e muco, dor


abdominal e perda de peso: sugere doença inflamatória intestinal.

• Uso de AINE´s: pode causar úlceras e isquemia intestinal.


• Colonoscopia recente com polipectomia: sugere sangramento
pós-polipectomia.

• Radiação abdominal/pélvica prévia: sugere proctopatia actínica.


• Pacientes jovens, constipados, com evacuação dolorosa e
sangramento após a evacuação: sugere doença orificial (fissura
anal/hemorroida).

• Cirurgias prévias: possível úlcera anastomótica.


• História de aneurisma da aorta abdominal: possível fístula
aortoentérica.

• Dor anal: fissura anal, carcinoma retal e hemorroidas.


• Histórico de doença hepática crônica: sugere sangramento por
hipertensão portal.
Alguns dados clínicos estão associados a pior prognóstico, como idade
avançada, presença de comorbidades e uso de AINEs ou anticoagulantes.
No exame físico, é fundamental a avaliação dos parâmetros
hemodinâmicos, buscando sinais como taquicardia, hipotensão ortostática,
enchimento capilar lentificado e alterações sensoriais, para determinar a
situação hemodinâmica, ressuscitação volêmica, gravidade da hemorragia e
a necessidade de internação hospitalar e em unidade de terapia intensiva. A
classificação do choque hipovolêmico permite estimar o volume de sangue
perdido (Tabela 2).

• Classe I: perda volêmica leve (menor que 15% da volemia), que


se manifesta apenas por taquicardia.

• Classe II/III: perda volêmica moderada (estimada como pelo


menos 15% da volemia); pode apresentar hipotensão postural
(queda da pressão arterial sistólica maior que 20 mmHg em
posição ortostática) ou aumento da frequência cardíaca maior que
20 bpm, também em posição ortostática.

• Classe IV: perda maior que 40% da volemia; pode apresentar


hipotensão mesmo em decúbito.
CLASSE I CLASSE II CLASSE III CLASSE IV
Perda sanguínea (mL)
< 750 750-1500 1500-2000 > 2000

Perda volêmica (%) 0-15 15-30 30-40 > 40

PAs (mmHg) Sem mudança Normal Reduzida Muito reduzida

PAd (mmHg) Sem mudança Elevada Reduzida Muito reduzida

Pulso (bpm) Taquicardia leve 100-120 120 (filiforme) > 120 (filiforme)

FR (irpm) Normal Normal > 20 > 20

Nível de consciência Ansioso, agressivo ou Sonolento, confuso ou


Alerta, com sede Ansioso, agressivo
sonolento inconsciente

Tabela 2. Classificação do choque hipovolêmico.


Fonte: Adaptado de Valesco et al. (2019)
O exame do abdome e da região perianal, com toque retal, é fundamental
para identificação de doenças orificiais, como hemorroidas ou fissuras, além
da detecção de massas no canal anal e reto distal.

DIAGNÓSTICO
O exame de escolha para a avaliação e diagnóstico de pacientes com
HDB é a colonoscopia. Naqueles que apresentam sangramento maciço, com
repercussão hemodinâmica, é necessária a realização de endoscopia
digestiva alta (EDA) como medida inicial. Caso esses métodos não
identifiquem o sangramento ou não possam ser realizados, por instabilidade
hemodinâmica ou hemorragia maciça, exames radiológicos auxiliam na
identificação da etiologia da HDB, como angiotomografia, cintilografia e
arteriografia (ou angiografia), sendo que a última apresenta vantagem em
permitir intervenção terapêutica.
Para pacientes com sangramento crônico não diagnosticado através de
EDA e colonoscopia, recomenda-se, posteriormente, repetir esses exames a
fim de identificar lesões não visualizadas em análise inicial. A avaliação de
intestino delgado, através da cápsula endoscópica ou enteroscopia, pode ser
indicada nos casos inconclusivos.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Endoscopia digestiva alta (EDA): Até 15% dos casos de HDB
podem ter como local de origem do sangramento o trato digestivo
alto, sendo indicada a realização de EDA nos pacientes que
apresentam melena ou hematoquezia volumosa com repercussão
clínica e instabilidade hemodinâmica ou naqueles com fatores de
risco para doença ulcerosa péptica ou hipertensão portal.

• Colonoscopia: A colonoscopia é a propedêutica de escolha para a


investigação da HDB, definindo o sítio de sangramento em
aproximadamente 70% dos casos, permitindo também a realização
de biópsias e intervenção terapêutica. É um exame seguro e pode
ser realizado na urgência ou em caráter eletivo, de acordo com a
estratificação de risco do paciente. Naqueles com sangramento
volumoso, idosos e com comorbidades significativas, é indicada
internação para realização do exame em caráter de urgência, após
estabilidade hemodinâmica e preparo de cólon.
O tempo ideal para a realização da colonoscopia permanece controverso.
O exame executado de forma precoce, dentro de 24 horas, tem maior
rendimento diagnóstico e terapêutico do que eletivamente, embora as
evidências não sejam claras quanto ao impacto na taxa de ressangramento e
mortalidade. Na HDB maciça, o diagnóstico e a terapêutica podem ficar
comprometidos. Sinais de hemorragia ativa ou recente, como a presença de
vaso visível ou coágulo aderido, indicam necessidade de tratamento
endoscópico, a fim de evitar recidiva precoce, que pode ocorrer em até 66%
desses casos se não houver intervenção. Como a maior parte desses estigmas
de sangramento é identificada no cólon direito (71%), é importante a
realização de preparo colônico anterógrado para análise de toda mucosa,
além de intubação cecal e de íleo terminal, para avaliar se o sangue é
proveniente de segmentos proximais à válvula ileocecal. Não é recomendada
a realização do exame sem preparo intestinal adequado. Nos pacientes que
apresentam ressangramento após terapia endoscópica de hemostasia, é
indicada a repetição da colonoscopia.

• Retossigmoidoscopia flexível: A retossigmoidoscopia flexível


permite avaliar a mucosa até o cólon descendente. O preparo
intestinal pode ser feito pela via retrógrada e com maior facilidade
em relação à colonoscopia. Em indivíduos acima de 50 anos e
naqueles com suspeita neoplasia de cólon, é imperativa a
realização da colonoscopia a fim de avaliar os segmentos mais
proximais. Pode ser uma alternativa em jovens, com suspeita de
sangramento orificial, e na proctopatia actínica.

• Exames radiológicos: A angiotomografia, a cintilografia e a


arteriografia são opções para os pacientes instáveis ou naqueles
com HDB maciça, que não podem ser bem avaliados pela
colonoscopia. Permitem a análise de todo o trato gastrointestinal,
incluindo o intestino delgado, porém é necessário sangramento
ativo no momento do exame, dificultando a identificação nos casos
intermitentes.
• Tomografia computadorizada com angiografia
(Angiotomografia): Trata-se de um exame rápido e minimamente
invasivo, que fornece informações sobre a localização anatômica e
etiologia subjacente, tais como neoplasias e malformações
vasculares, sendo útil para planejar e direcionar o tratamento
definitivo antes de realizar arteriografia ou cirurgia. Apresenta boa
sensibilidade (85,2%) e especificidade (92,1%), detectando
sangramento com fluxo entre 0,3 e 0,5 mL/minuto, com limitação
nos casos de HBD intermitente. Não permite intervenção
terapêutica e apresenta desvantagens pela exposição à radiação e
uso de contraste intravenoso, que pode desencadear reações
alérgicas e deve ser feito com cautela em pacientes com disfunção
renal.

• Cintilografia: A cintilografia é um exame com sensibilidade


elevada, identificando sangramento com baixo fluxo, entre 0,1 e
0,5 mL/min. Tem menor acurácia do que a arteriografia,
detectando o local da HDB em 66% dos casos, pois nos pacientes
com trânsito intestinal acelerado o sangue identificado no cólon
pode ser proveniente de segmentos mais proximais, demandando
cautela na interpretação dos resultados. Não permite abordagem
terapêutica, servindo como método de rastreio para direcionar a
topografia do sangramento antes da realização de arteriografia ou
cirurgia.

• Arteriografia (Angiografia): A arteriografia tem alta


especificidade, de aproximadamente 100%, embora a sensibilidade
seja baixa, em torno de 30 a 47%, pois necessita de sangramento
ativo com um fluxo maior que a cintilografia, de pelo menos 0,5 e
1 mL/min, dificultando a identificação se a causa for intermitente.
É indicada nos pacientes com instabilidade hemodinâmica ou
sangramento maciço e persistente, nos quais a realização da
colonoscopia não é possível, sendo recomendada angiotomografia
prévia para determinar topografia da HDB. Apresenta como
desvantagem a necessidade do uso de contraste, que pode
ocasionar reações alérgicas e disfunção renal. Não demanda
preparo intestinal.
Trata-se de uma modalidade reservada para os casos de sangramento
maciço e instabilidade hemodinâmica, nos quais a colonoscopia não
consegue avaliar a mucosa e nem realizar intervenção terapêutica, e naqueles
casos de sangramento recorrente. O rendimento diagnóstico depende do
momento do sangramento e da habilidade do examinador, com resultados
positivos entre 25% e 70% dos casos. Ao detectar o ponto de sangramento, é
possível a embolização superseletiva de ramos arteriais distais, com controle
do sangramento em até 97% dos casos e redução de complicações como a
isquemia mesentérica.

• Sangramento oculto do trato gastrointestinal: A HDB


decorrente de sangramento do intestino delgado é pouco frequente,
ocorrendo em apenas 2% a 10% dos casos. Devido à baixa
prevalência e dificuldade técnica de avaliar esse segmento, a
investigação não é recomendada de rotina. Nos casos de
sangramento crônico não identificado após avaliação por EDA e
colonoscopia, recomenda-se, posteriormente, repetir esses exames.
Se ainda permanecer sem foco de sangramento definido, a
avaliação do intestino delgado deve ser considerada, e pode ser
realizada através da cápsula endoscópica ou enteroscopia.

MANEJO INICIAL E TRATAMENTO


a. MANEJO INICIAL
Os pacientes devem ser triados para determinar o local de investigação e
tratamento (ambulatorial, internação e unidade de terapia intensiva). Aqueles
com sangramento de pequena monta, intermitente e estáveis
hemodinamicamente, podem realizar a colonoscopia ambulatorialmente. Já
os que apresentam sangramento importante, idosos ou com comorbidades
significativas, é indicada a internação hospitalar. Nos casos com
sangramento de grande volume (queda do hematócrito maior que 6% ou
necessidade de transfusão de dois ou mais concentrados de hemácias) ou
hemodinamicamente instáveis, é indicada a monitorização em unidade de
terapia intensiva.
A investigação diagnóstica deverá ser realizada após medidas de suporte
clínico e estabilização hemodinâmica. Outros preditores de gravidade
também devem ser avaliados para estratificação de riscos, como uso de
medicamentos (AINE´s ou antitrombóticos) e dados laboratoriais.

b. MEDIDAS DE SUPORTE GERAL

• Monitorização dos dados vitais


• Oxigenação
• Acesso venoso e ressuscitação volêmica
• Avaliar necessidade de transfusão de hemoconcentrados
• Manejo de coagulopatia
• Investigar uso de anticoagulantes e antiplaquetários
É indicada a realização de exames laboratoriais como o hemograma,
preferencialmente com coletas seriadas para a monitorização, coagulograma,
tipagem sanguínea, eletrólitos e função renal.

c. REPOSIÇÃO VOLÊMICA
A infusão de solução cristaloide isotônica (soro fisiológico 0,9% ou
ringer lactato) deve ser realizada através de dois acessos venosos periféricos
de grosso calibre ou, se não for possível, por meio de acesso venoso central,
objetivando manter pressão arterial sistólica acima de 100 mmHg. As
soluções coloides têm maior custo e não apresentam diferença na taxa de
mortalidade.

d. TRANSFUSÃO DE HEMOCONCENTRADOS
A transfusão de concentrado de hemácias é indicada se hemoglobina
(Hb) abaixo de 7 g/dL em paciente hígidos ou abaixo de 9 g/dL em idosos ou
naqueles com doenças cardiovasculares. A contagem de plaquetas deve ser
mantida acima de 50.000/mm3.
A hemostasia endoscópica deve ser considerada nos pacientes com o
índice normalizado internacional (INR) entre 1,5 e 2,5, antes de administrar
agentes de reversão da anticoagulação. Estudos recentes sugerem que INR
moderadamente elevado não aumenta a taxa de ressangramento, não
havendo benefício de uso rotineiro de plasma fresco ou vitamina K naqueles
que não estejam em uso de Varfarina. Nos pacientes em uso de
anticoagulante, a suspensão da medicação e a reversão do seu efeito deve ser
considerada para sangramento grave contínuo ou antes do procedimento
endoscópico naqueles com INR > 2,5.

e. PACIENTES EM USO DE ANTITROMBÓTICOS


A interrupção do uso de antitrombóticos (anticoagulantes e
antiplaquetários) deve ser considerada de acordo com a doença de base, o
risco evento tromboembólico e de sangramento. Quando interrompidos,
recomenda-se o retorno dessas drogas assim que a hemostasia for alcançada
(Algoritmo 1).
Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINE´s), mesmo os agentes
inibidores seletivos da COX-2, aumentam o risco de sangramento digestivo e
recorrência, devendo ser descontinuados após quadro de HDB. O uso de
ácido acetilsalicílico (AAS) para profilaxia secundária em pacientes com
doença cardiovascular estabelecida não deve ser interrompido, exceto se
sangramento severo, entretanto, se utilizado como profilaxia primária, a
droga deve ser descontinuada.
O risco de infarto do miocárdio e morte após a interrupção da terapia
antiplaquetária dupla é alto durante os primeiros 30 dias após o stent
coronário e nos primeiros 90 dias após a síndrome coronariana aguda, sendo
aconselhada a continuação da terapia dupla nesses casos. A interrupção por
até 7 dias do segundo antiagregante plaquetário é permitida nos pacientes
com stent coronário ou síndrome coronariana por períodos superiores aos
descritos acima, pois apresentam um risco relativamente baixo se
mantiverem apenas o uso do AAS.
O risco de ressangramento deve ser considerado ao retomar
anticoagulantes. Recomenda-se, se possível, a troca da medicação para
Apixabana ou reduzir a dose de Dabigatrana para 220 mg/dia, pois tal
medida pode reduzir o ressangramento em pacientes que usam Warfarina,
Dabigatrana 300 mg/dia ou Rivaroxabana.
Algoritmo 1. Recomendações para manejo do uso de antitrombóticos na
HDB.
Fonte: Adaptado de Aoki et al. (2019)

f. ABORDAGEM TERAPÊUTICA DO SANGRAMENTO


O tratamento depende da etiologia do sangramento, disponibilidade do
método e experiência da equipe. Na maioria das vezes, é possível abordagem
terapêutica mecânica, térmica ou química através da colonoscopia. Nos
casos de HDB maciça, em que não é possível a avaliação da mucosa, ou no
sangramento proveniente de intestino delgado, ou ainda em pacientes
instáveis, a arteriografia permite a infusão de substâncias vasoconstritoras ou
a embolização vascular superseletiva.
Raramente os pacientes com HDB necessitarão de cirurgia imediata. A
morbidade e mortalidade associadas à ressecção de segmento do cólon são
maiores quando o sítio de sangramento não é previamente identificado.
Dessa forma, é de suma importância estabelecer a topografia da HDB antes
de uma abordagem definitiva.

g. CIRURGIA
O tratamento cirúrgico na HDB apresenta taxa de complicação em 60%
dos casos e mortalidade em 16%, sendo reservado para pacientes que
persistem hemodinamicamente instáveis após ressuscitação volêmica
agressiva ou com necessidade de transfusão de concentrado de hemácias
maior que 6 unidades, apesar das medidas intervencionistas endoscópicas ou
radiológicas.
É imporante determinar com cautela o sítio de sangramento previamente
à abordagem cirúrgica a fim de evitar ressecção extensa. Nos casos de HDB
persistente em que o foco não pode ser identificado por exames
complementares, a cirurgia de urgência é indicada.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Elaborado pelos autores.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente masculino, 67 anos, previamente hígido, é
admitido no pronto-socorro por apresentar enterorragia seguida de
lipotímia. Nega uso de medicações.
b. Exame físico: encontra-se hipocorado, FC de 120 bpm, PA de
100 x 70 mmHg (deitado) e PA de 80 x 50 mmHg (sentado). Abdome
flácido e indolor. Inspeção perianal sem alterações, com toque retal sem
lesões, apresentando sangue vivo em dedo de luva. Admitido na UTI e
aguardando resultado de exames laboratoriais e estabilidade clínica para
avaliação endoscópica. Qual é a prescrição ideal para o paciente nesse
momento?
c. Prescrição sugerida:

1. Jejum.
2. Suporte de O2 por cateter nasal a 2 L/min.
3. Soro fisiológico 0,9% 1000 a 2000 mL, EV, em 1 hora.
4. Soro fisiológico 0,9% 500 mL + Soro glicosado 50% 10 mL, 04
ampolas, EV, 28 gotas/minuto,
de 6/6 h.
5. Dipirona 2 mL + água destilada 8 mL, EV até de 6/6 h se dor ou
Tax ≥ 37,8°C.
6. Metoclopramida 10 mg – 2 mL + Água destilada 8 mL, EV, até de
8/8 h, se náuseas ou vô
mitos.
7. Monitorização.
8. Balanço hídrico.
9. Cuidados gerais e sinais vitais.
10. Após estabilização, iniciar preparo intestinal para a colonoscopia.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Paciente com HDB apresenta exteriorização do sangramento sob a
forma de hematoquezia, melena, enterorragia ou sangue oculto nas
fezes.

• Na avaliação inicial, dados clínicos, exame físico e exames


laboratoriais, são essenciais para estratificar o risco e buscar a
possível etiologia do sangramento.

• A abordagem inicial desses pacientes inclui triagem para


determinar local de investigação (ambulatorial, hospitalar ou
unidade de terapia intensiva) e medidas gerais de suporte
necessárias (monitorização, oxigenoterapia, suporte ventilatório,
hidratação, hemotransfusão).

• A investigação diagnóstica deverá ser realizada após estabilização


hemodinâmica e medidas de suporte geral.

• A maioria dos casos de HDB é autolimitada, portanto, a avaliação


e medidas iniciais realizadas de forma adequada podem ser a
melhor abordagem terapêutica para boa parte dos pacientes.

• A interrupção do uso de antitrombóticos deve ser considerada de


acordo com a doença de base e o risco de sangramento. A
retomada deles deve ser realizada assim que a hemostasia for
alcançada.

• A EDA é recomendada em casos de suspeita de origem do


sangramento do trato digestivo superior, como em pacientes com
melena ou hematoquezia volumosa associada à instabilidade
hemodinâmica, assim como em pacientes com suspeita de doença
ulcerosa péptica e hipertensão porta.

• A colonoscopia é o exame de escolha para o diagnóstico e


tratamento da HDB. A arteriografia é indicada em pacientes com
sangramento maciço não identificado ou não controlado pela
colonoscopia e naqueles instáveis.
• A intervenção cirúrgica é recomendada em pacientes graves
refratários às medidas iniciais e/ou quando não foi possível
identificar o sítio de sangramento por meio dos métodos
disponíveis.

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Bleeding. American College of Gastroenterology. Practice Parameters Committee. Am J
Gastroenterol 1998; 93: 1202-8.
4.1
DENGUE
Autoras:
Gabrielly Borges Machado
Luciana de Almeida Silva Teixeira

DEFINIÇÕES
• É uma doença febril aguda, de etiologia viral, que possui um
espectro clínico complexo e diverso. A maior parte dos pacientes
se recupera após evolução clínica leve/moderada e autolimitada;
uma pequena parte evolui para quadro grave, podendo levar a
óbito.

• Consiste em sério problema de saúde pública no mundo.


• As condições do meio ambiente nos países tropicais e subtropicais
favorecem o desenvolvimento e a proliferação do vetor transmissor
da doença, que está associada à situação de pobreza e precárias
condições de vida. Devido à potencial gravidade dessa doença,
associada aos números alarmantes de casos, todo caso suspeito
deve ser notificado à Vigilância Epidemiológica, pois compete a
ela adotar medidas capazes de reduzir a circulação viral, buscando
promover o controle e a prevenção da doença.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• O agente etiológico é um vírus RNA de fita simples, arbovírus,
pertencente ao gênero Flavivirus e à família Flaviviridae.
Atualmente são conhecidos quatro sorotipos: DENV1, DENV2,
DENV3 e DENV4, disseminados por todo o território nacional,
sendo as epidemias associadas com a alteração do sorotipo
predominante. O período de incubação varia de 4 a 10 dias, sendo,
em média, de 5 a 6 dias.

• Os vetores são mosquitos do gênero Aedes. A espécie Aedes


aegypti é a mais importante na transmissão da doença, mas
também pode transmitir o vírus da febre amarela urbana, vírus
Chikungunya e vírus Zika. O ciclo evolutivo do vetor, em
condições favoráveis, se completa em um período de 10 a 13 dias.
Desenvolvem-se preferencialmente em água parada e limpa. Dessa
forma, o período entre janeiro e abril favorece o desenvolvimento e
a disseminação do mosquito e, consequentemente, o aumento da
incidência da doença.

• A transmissão se dá através da picada da fêmea do A. aegypti


portadora do vírus. Após a inoculação viral pelo mosquito, ocorre a
viremia, com consequente disseminação viral sistêmica e início das
manifestações clínicas da doença.

• A suscetibilidade ao vírus é universal. A imunidade é permanente


para um mesmo sorotipo (sorotipo-específica). Na infecção
secundária com outro sorotipo, pode haver a formação de
anticorpos parcialmente neutralizantes e ativação de resposta
imune celular deficiente, o que favorece o aumento da carga viral,
da vasculite sistêmica e, consequentemente, o aumento da
permeabilidade vascular e do extravasamento plasmático,
predispondo à hipovolemia (com consequente choque
hipovolêmico) e coagulopatia, características das formas graves da
doença.

• Fatores de risco individuais determinam a gravidade da doença


(que é determinada pela gravidade do extravasamento plasmático)
e incluem idade, etnia, comorbidades crônicas e infecção prévia.

QUADRO CLÍNICO
• Período de incubação: 4 a 10 dias.
• Fase febril: tem duração de 2 a 7 dias. Caracterizada por febre
alta, de início abrupto, cefaleia, mialgia, artralgia, dor retro-
orbitária e exantema .

• Fase crítica: comumente ocorre entre o terceiro e o sétimo dia da


doença. Tem início com a defervescência da febre, com surgimento
de sinais de alarme (maioria resultante do aumento da
permeabilidade vascular e extravasamento plasmático), podendo
evoluir para choque hipovolêmico por extravasamento de plasma.

• Fase de recuperação: reabsorção gradual do conteúdo


extravasado com consequente melhora clínica.

• Sinais de alarme:
dor abdominal intensa e contínua

vômitos persistentes

acúmulo de líquidos (ascites, derrame pleural, derrame


pericárdico)

sangramento de mucosa

hipotensão postural e/ou lipotimia

hepatomegalia maior do que 2 cm abaixo do rebordo costal

aumento progressivo do hematócrito

letargia e/ou irritabilidade


DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• Clínico-epidemiológico: considera-se caso suspeito uma pessoa
que viva em área onde se registram casos de dengue, ou que tenha
viajado nos últimos 14 dias para área com ocorrência de
transmissão de dengue, com febre entre dois e sete dias, e duas ou
mais das seguintes manifestações: náusea, vômitos; exantema;
mialgias, artralgia; cefaleia, dor retro-orbital; petéquias; prova do
laço positiva; leucopenia.

• Classificação:
Dengue clássica: febre, entre dois e sete dias de duração, e duas
ou mais das seguintes manifestações: náusea, vômito, exantema,
mialgias, artralgia, cefaleia, dor retro-orbital, prostração.

Dengue com sinal de alarme: é todo caso de dengue que, no


período de defervescência da febre, apresenta um ou mais sinais
de alarme

Dengue grave: presença de transudação plasmática grave


levando à choque hipovolêmico e acúmulo de fluidos com
esforço respiratório; hemorragias; disfunção orgânica.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Virológico: antes do 5º dia dos sintomas:

• Pesquisa de vírus (isolamento viral).


• Pesquisa de genoma do vírus da dengue por reação em cadeia
da polimerase de transcrição reversa (RT-PCR).

• Pesquisa de antígeno NS1.


b. Sorológico: após o 6º dia dos sintomas:

• Pesquisa de anticorpos IgM e IgG (ELISA).


c. Exames inespecíficos: hemograma, transaminases, função
hepática, função renal, coagulograma.

TRATAMENTO E PREVENÇÃO
O manejo clínico é feito de acordo com o estadiamento da doença, ou
seja, a classificação de risco (grupos A, B, C e D) baseada nos sinais e
sintomas apresentados pelo paciente. Durante a evolução da doença, o
enfermo pode passar de um grupo a outro, em curto período de tempo. É
importante reconhecer precocemente os sinais de extravasamento plasmático
(sinais de alarme), para intervenção rápida com infusão de fluidos.

a. Grupo A: caso suspeito de dengue com prova do laço negativo e


ausência de sangramentos espontâneos; ausência de sinais de alarme;
sem comorbidades, grupo de risco ou condições clínicas especiais.

• Tratamento ambulatorial:
Hidratação oral:

→ Adultos: 60 mL/kg/dia, sendo 1/3 com solução salina e no


início com volume maior. Para os 2/3 restantes, orientar o
consumo de líquidos (água, soro caseiro, suco de frutas, água de
coco, chás etc.).

Sintomáticos: analgésicos (paracetamol e/ou dipirona) – não


usar salicilatos ou anti-inflamatórios não esteroides. Deve-se
orientar sobre sinais de alarme e solicita-se o retorno entre o 3º e
6º dia para reavaliação.
b. Grupo B: caso suspeito de dengue sem sinais de alarme mas com
sangramento de pele espontâneo (petéquias) ou induzido (prova do laço
positiva) ou condições clínicas especiais e/ou de risco social ou doenças
crônicas: lactentes (menores de 2 anos), gestantes, idosos
acima de 65 anos, hipertensão arterial ou outras doenças
cardiovasculares graves, diabetes mellitus, doença pulmonar obstrutiva
crônica, doenças hematológicas crônicas (principalmente anemia
falciforme e púrpuras), nefropatias, doença ácido-péptica, hepatopatias
e doenças autoimunes.

• Observação com hidratação oral conforme grupo A até resultado


de exame (hemograma obrigatório).

Hematócrito normal: tratamento ambulatorial (grupo A),


reavaliação clínica diária.

Surgimento de sinais de alarme: seguir conduta do grupo C


(internação hospitalar).
c. Grupo C: caso suspeito de dengue com presença de algum sinal
de alarme.

• Internação hospitalar por um período mínimo de 48h.


• Fase de expansão:
Reposição volêmica: 10 mL/kg de soro fisiológico na primeira
hora (máximo de cada fase de expansão 20 mL/kg em duas
horas).

Exames complementares: hemograma completo, dosagem de


albumina sérica e transaminases, radiografia de tórax e
ultrassonografia de abdome.

Reavaliação clínica e laboratorial (hematócrito) em 2h.

Melhora clínica e laboratorial após fase de expansão: iniciar


fase de manutenção.
• Fase de manutenção:
Primeira fase: 25 mL/kg em 6 h. Se melhora, iniciar segunda
fase.

Segunda fase: 25 mL/kg em 8 h (1/3 com SF 0,9% e 2/3 com


SG 5%).

Sem melhora clínica e laboratorial após 2h de expansão: repetir


a fase de expansão até 3 vezes.

Resposta inadequada após 3 fases de expansão: conduta do


grupo D.
d. Grupo D: caso suspeito de dengue com presença de sinais de
choque, sangramento grave ou disfunção orgânica.

• Acompanhamento em unidade de terapia intensiva.


Fase de expansão rápida parenteral: 20 mL/kg de solução salina
isotônica em até 20 minutos, repetir até três vezes, se necessário.

Reavaliação clínica a cada 15 a 30 minutos e de hematócrito em


2 horas.

Resposta clínica e laboratorial após fase de expansão: retornar


para a fase de expansão do grupo C e seguir a conduta
recomendada para o grupo.

• Resposta inadequada: avaliar hematócrito.


→ Hematócrito em ascensão e sinais de choque: expansores
plasmáticos (albumina 0,5-1 g/kg). Preparar solução de
albumina a 5% (para cada 100 mL desta solução, usar 25 mL de
albumina a 20% e 75 mL de SF a 0,9%). Na ausência desta:
coloides sintéticos 10 mL/kg/hora. Se resposta satisfatória:
conduzir como grupo C.

→ Hematócrito baixo e sinais de choque: pesquisar


hemorragias e avaliar a coagulação. Presença de hemorragia:
transfundir concentrado de hemácias (10 a 15 mL/kg/dia). Se
coagulopatia: plasma fresco (10 mL/kg), vitamina K endovenosa
e crioprecipitado (1 U para cada 5-10 kg).

→ Transfusão de plaquetas: persistência de sangramento,


mesmo após correção de fatores de coagulação e do choque, e
com plaquetopenia e INR maior que 1,5 vezes o valor normal.

→ Hematócrito em queda com resolução do choque, ausência


de sangramentos, mas com outros sinais de gravidade: investigar
hiper-hidratação, sinais de desconforto respiratório, sinais de
insuficiência cardíaca congestiva.

→ Suspender ou reduzir a reposição volêmica quando houver


término do extravasamento plasmático; estabilização da pressão
arterial, do pulso e da perfusão periférica; redução do
hematócrito, na ausência de sangramento; normalização da
diurese e ausência de sintomas abdominais.

• Indicações para internação hospitalar:


Presença de sinais de alarme ou de choque, sangramento grave
ou disfunção orgânica (grupos C e D).

Recusa na ingesta de alimentos e líquidos.

Comprometimento respiratório.

Impossibilidade de seguimento ou retorno à unidade de saúde.


Comorbidades descompensadas como diabetes mellitus,
hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, uso de
dicumarínicos, crise asmática, entre outras.

Outras situações a critério médico.

• Critérios de alta hospitalar (o paciente deve preencher todos


os critérios):

Estabilização hemodinâmica durante 48 horas.

Ausência de febre por 48 horas.

Melhora visível do quadro clínico.

Hematócrito normal e estável por 24 horas.

Plaquetas em elevação e acima de 50.000/mm3.

• MEDIDAS PREVENTIVAS
Controle vetorial: combate aos focos de acúmulo de água, que
são potenciais criadouros do mosquito.

Melhorias nas condições de moradia e vida da população.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Dengue : diagnóstico e manejo clínico: adulto e criança / Ministério
da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância
das Doenças Transmissíveis. – 5. ed. – Brasília : Ministério da Saúde, 2016.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente sexo feminino, 20 anos, sem
comorbidades, nega uso de medicação contínua. Relata que há três dias
iniciou quadro de febre alta (39°C), cefaleia intensa, mialgia difusa,
prostração e astenia. Procurou Hospital Universitário, pois evoluiu com
vômitos persistentes, dor abdominal intensa e petéquias pelo corpo.
b. Exame físico: regular estado geral, corada, desidratada (2 + /4 +),
acianótica, anictérica,
T = 38,5ºC, FR = 20 irpm, FC = 95 bpm, PA = 100 x 60 mmHg, prova
do laço positiva, pulmões limpos, ritmo cardíaco regular, abdome
globoso, flácido, sem visceromegalias, doloroso à palpação.
c. Exames complementares: Hemograma = hemácias: 4,88,
hemoglobina: 15,1, hematócrito: 45, leucócitos: 3.000, plaqueta:
60.000/mm3.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Fase de expansão: 10 mL/kg de SF0,9% EV na 1ª hora.
3. Dipirona – 2 mL EV se dor ou febre.
4. Metoclopramida - 1 ampola EV 8/8 h se náuseas ou vômitos.
5. Reavaliação clínica em 1 hora.
6. Manter a hidratação de 10 mL/kg/hora na 2ª hora, até a
avaliação do hematócrito.

REFERÊNCIAS
1. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação-Geral de
Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços. Guia de Vigilância em Saúde: Ministério
da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Coordenação-Geral de Desenvolvimento da
Epidemiologia em Serviços. – 1. ed. atual. – Brasília : Ministério da Saúde, 2016.
2. Ministério da Saúde (BR). Dengue: diagnóstico e manejo clínico: adulto e criança. 5. ed.
Brasília: Ministério da Saúde; 2016.
3. Furlan NB, Tukasan C, Estofolete CF, Nogueira ML, Silva NS. Low Sensitivity Of The
Tourniquet Test For Differential Diagnosis Of Dengue: An Analysis Of 28,000 Trials In
Patients. BMC Infect Dis. 2016; 16(1): 1-7.
4. Chiaravalloti Neto F, Dibo MR, Barbosa AAC, Battigaglia M. Aedes albopictus (S) na região
de São José do Rio Preto, SP: estudo da sua infestação em área já ocupada pelo Aedes
aegypti e discussão de seu papel como possível vetor de dengue e febre amarela. Rev Soc
Bras Med Trop. 2002; 35(4): 351-7.
5. Oliveira KKD, Fernandes APNL, Moura SGF. Perfil de morbidade por patologias
infectocontagiosas entre crianças de 0 a 12 anos. FIEP Bull. 2012; 82: 203-10.
6. Martins FEP, Porto RS, Dias RV, Viana RS, Linhares MSC. Promoção à saúde no combate à
dengue em Sobral (CE): Relato de experiência. Sanare. 2015; 15(1): 112-8.
7. Queiroz ER. Dengue grave no Brasil central: aspectos clínicos e epidemiológicos.
[Dissertação - Mestrado em Ciências da Saúde]. Goiânia: Pontifícia Universidade Católica
de Goiás; 2016.
4.2
TUBERCULOSE
Autora:
Gabrielly Borges Machado

DEFINIÇÕES
• A tuberculose (TB) é uma doença infectocontagiosa, causada pela
Mycobacterium
tuberculosis, também chamada de Bacilo de Koch (BK), que afeta
preferencialmente os pulmões. Apresenta evolução clínica
insidiosa.

• No Brasil, representa um grave problema de saúde pública, com


elevadas taxas de morbimortalidade. Afeta principalmente
populações vulneráveis, como as pessoas que vivem com
HIV/Aids (PVHA) e as populações privadas de liberdade.

• A TB pulmonar é a forma mais frequente, mas pode ocorrer


disseminação do microrganismo, com acometimento
extrapulmonar, que está frequentemente associado à forma
pulmonar (tuberculose mista), sendo mais comum em indivíduos
imunodeprimidos e crianças. Os sítios mais afetados são:
linfonodos, pleura, trato genitourinário, ossos e articulações,
meninges, olhos, laringe, peritônio e pericárdio.

• TB ganglionar é a forma extrapulmonar mais comum em crianças


e imunodeprimidos (especialmente pessoas vivendo com
HIV/Aids – PVHA).

• TB pleural é a forma extrapulmonar mais comum em


imunocompetentes, principalmente adultos jovens, estando
associada à forma pulmonar em 20% dos casos.

• Fatores de risco: população indígena, privados de liberdade,


imunossupressão, pessoas em situação de rua, precárias condições
socioeconômicas.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• O BK é uma micobactéria aeróbica, intracelular, classificada
como Bacilos Álcool-ÁcidoResistente (BAAR), caracterizada
por multiplicação lenta.

• Transmissão: através da inalação de aerossóis produzidos pela


tosse, espirro ou fala de bacilíferos (principais fontes de infecção).

• Período de transmissibilidade: inicia-se com o surgimento dos


sintomas respiratórios, com término após 15 dias de tratamento.

• Recomenda-se a negativação da baciloscopia para suspensão das


precauções respiratórias.

• A maioria dos infectados não desenvolve a doença, devido à


resposta imune efetiva, evoluindo para infecção latente (ILTB),
que pode ser detectada através da prova tuberculínica.

• Cerca de 5% dos expostos adoecem logo após a primo-infecção


(infecção primária). Outros 5% adoecem mais tardiamente à
primo-infecção, por reativação de infecção latente, caracterizando
a infecção secundária.

• A infecção não confere imunidade permanente ao indivíduo.


QUADRO CLÍNICO
• Período de incubação: 4 a 12 semanas.
• Principal sintoma: tosse persistente por 3 semanas ou mais (seca
ou produtiva, com ou sem escarros hemoptoicos).

• Sintomas associados: febre vespertina, sudorese noturna, perda


ponderal, hiporexia, astenia, mal-estar geral, prostração, mialgia,
dispneia.

• Sintomático respiratório: pessoa com tosse por 3 semanas ou


mais (necessária a investigação com baciloscopia de escarro).

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• Clínico-epidemiológico: indivíduo com tosse por 3 semanas ou
mais (sintomático respiratório) e/ou outros sinais e sintomas,
como febre vespertina, sudorese noturna, emagrecimento,
inapetência.

• Radiológico:
Indicado para todo paciente com suspeita clínica de TB
pulmonar.

Importante para excluir outra doença pulmonar associada,


avaliar a extensão do acometimento e a resposta terapêutica.

Achados sugestivos: lesões predominantemente em ápices


pulmonares, principalmente à direita, opacidades, infiltrados,
nódulos, cavitações, fibroses, retrações, calcificações,
adenomegalia, aspecto miliar, aspecto de “árvore em
brotamento”.
• Baciloscopia direta do escarro:
Pesquisa de BAAR pelo método de Ziehl-Nielsen.

Mínimo de 2 amostras: uma na primeira consulta e a outra na


manhã do dia seguinte.

Controle terapêutico: avaliar resposta ao tratamento (coleta ao


final do 2º mês e após término do tratamento).

• Cultura para micobactéria do escarro e teste de sensibilidade


(TS) – padrão-ouro:

Suspeita clínica ou radiologia com baciloscopia negativa.

Caso suspeito com baixa quantidade de bacilo (paucibacilares).

Suspeita de TB extrapulmonar.

Contato com infectados por TB multirresistente.

Antecedência de tratamento prévio.

Imunodeprimidos.

Falência ao tratamento.

Baciloscopia positiva no final do segundo mês de tratamento.

Indicação para retratamento (casos de recidiva ou de retorno


após abandono).
Alta sensibilidade e especificidade.

Tempo para crescimento bacteriano: 14 a 30 dias.

• Teste rápido molecular para TB (TRM-TB):


Indicado no diagnóstico de TB pulmonar em adultos e
crianças.

Baseado na reação de cadeia de polimerase, que detecta DNA


de Mycobacterium tuberculosis e, simultaneamente, resistência
à rifampicina em 2 horas.

Amostras: pulmonares e extrapulmonares.

• Dosagem de Adenosina deaminase – ADA:


Níveis elevados nos líquidos pleural, pericárdico, sinovial,
ascítico e no líquor: critério diagnóstico, principalmente de TB
pleural.

• Exame histopatológico:
Compatível: presença de processo inflamatório granulomatoso
(granuloma com necrose de caseificação).

• Prova tuberculínica (PT):


Indicações: contatos assintomáticos de pessoas com
tuberculose ativa para investigação de ILTB e diagnóstico de
TB ativa em crianças.

A leitura deve ser realizada após 48 a 72 horas da aplicação.


Limitações: baixa especificidade, pode levar a resultados falso-
positivos para casos de exposição a micobactérias ambientais e
à vacinação pelo Bacilo Calmette-Guérin (BCG) e resultados
falso-negativos em imunodeprimidos.

• Teste IGRA – Interferon Gamma Release Assay:


Consiste na detecção de resposta imune especifica (Interferon
gama) em amostras de sangue.

Importante ferramenta no diagnóstico de tuberculose latente.

IGRA e PT: são testes indiretos que pesquisam as respostas


imunológicas, e não testes diretos que detectam o organismo
causador. Não permitem diferenciar doença ativa de infecção
latente.

Alta especificidade: o resultado não é afetado por vacinação


prévia por BCG ou infecção por outras espécies de
micobactérias.

Indicações: investigação de contactantes; avaliação de


imigrantes com histórico de vacinação por BCG; rastreamento
de TB em profissionais de saúde; auxilia no diagnóstico da
tuberculose latente e da tuberculose ativa; pacientes
imunossuprimidos; pacientes idosos.

Sensibilidade: 95%; especificidade: 98%. Portanto, o IGRA é


mais eficaz na detecção da infecção por TB do que a PT.

• Testagem para HIV: rápido ou sorológico (preferencialmente o


rápido), para todos com suspeita ou diagnóstico confirmado de TB
ativa.
• Exames confirmatórios de TB ativa: baciloscopia direta,
cultura e TRM-TB.

TRATAMENTO
• Atenção básica (tratamento diretamente observado – TDO):
observação diária por um profissional da saúde.

• Esquema preconizado: Rifampicina (R), Isoniazida (H),


Pirazinamida (Z) e Etambutol (E) – Doses fixas combinadas
(RHZE e RH).

• Esquema Básico para adultos e adolescentes (tabela 1):


Casos novos em maiores de 10 anos, formas de TB pulmonar e
extrapulmonar (exceto a forma meningoencefálica), infectados
ou não por HIV.

Retratamento, exceto a forma meningoencefálica.


Fases Drogas Peso Dose Meses

RHZE 150/75/400/275 mg < 50 kg 3 comprimidos


Fase Intensiva (2 RHZE) comprimido em dose fixa 2
combinada > 50 kg 4 comprimidos

< 50 kg 3 comprimidos
RH 150/75 mg comprimido em
Fase de manutenção (4 RH) 4
dose fixa combinada
> 50 kg 4 comprimidos

Tabela 1. Esquema básico para tratamento da tuberculose em adultos e


adolescentes
Fonte: Guia de vigilância em saúde/Ministério da saúde 2016.

• Esquema para a forma meningoencefálica em adultos (casos


novos ou retratamento):
Fase intensiva 2 RHZE/Fase de manutenção 7 RH.

Associar corticosteroide – prednisona oral (1-2 mg/kg/dia) ou


dexametasona IV em casos graves (0,3-0,4 mg/kg/dia), por 4-8
semanas.

• Casos de retratamento:
Solicitar baciloscopia, TRM-TB, cultura e TS, iniciar o
esquema básico até resultado de exames.

• Situações de falência terapêutica/TB multirresistente


(baciloscopia positiva no final do
tratamento; baciloscopia fortemente positiva no início do
tratamento, sem resposta até o quarto mês; baciloscopia inicial
positiva seguida de negativação e nova positividade por dois
meses consecutivos, a partir do quarto mês de tratamento):

Recomenda-se indicação de Esquema Padronizado para


Multirresistência ou Esquemas Especiais individualizados.

Em situações especiais (baciloscopia positiva ao final do 2ºmês


de tratamento, piora
clínica com baciloscopia negativa, monorresistência à
Rifampicina ou Isoniazida): recomenda-se o prolongamento da
segunda fase do tratamento (3 meses).

• Cura: pelo menos duas baciloscopias negativas, uma durante o


tratamento (final do 2º mês) e a outra ao final do tratamento.

• Indicações de hospitalização
Meningoencefalite tuberculosa.
Intolerância aos medicamentos anti-TB incontrolável
ambulatorialmente.

Estado geral que impossibilita tratamento ambulatorial.

Intercorrências clínicas ou cirúrgicas.

Vulnerabilidade social ou alto risco de abandono do


tratamento.

a. REAÇÕES ADVERSAS:

• Reações adversas menores – a suspensão das drogas é


desnecessária.

Rifampicina: náuseas, vômitos, dor abdominal, urina


avermelhada, exantema.

Isoniazida: náuseas, vômitos, dor abdominal, exantema,


artralgia, neuropatia periférica (comum), sintomas neurológicos
(cefaleia, insônia, ansiedade).

Pirazinamida: náuseas, vômitos, dor abdominal, artralgia,


hiperuricemia.

Etambutol: náuseas, vômitos, dor abdominal, neuropatia


periférica, hiperuricemia.

• Reações adversas maiores – necessária a interrupção do


tratamento.

Após a resolução do evento, considerar reintrodução do


esquema básico ou esquemas especiais (alternativos):
Rifampicina: hipersensibilidade de moderada a grave,
hepatotoxicidade, nefrite intersticial, anemia hemolítica,
plaquetopenia, leucopenia.

Isoniazida: psicose, crise convulsiva, encefalopatia ou coma,


hepatotoxicidade, hipersensibilidade de moderada a grave.

Pirazinamida: hipersensibilidade de moderada a grave,


hepatotoxicidade, rabdomiolise com mioglobinúria e
insuficiência renal.

Etambutol: hipersensibilidade de moderada a grave, neurite


óptica.

b. TRATAMENTO DA ILTB (desde que o diagnóstico de TB


ativa seja descartado, através de avaliação clínica e radiológica):

• Isoniazida 5-10 mg/kg/dia (dose máxima de 300 mg/dia) para


270 doses tomadas em 9 a 12 meses.

• PT ≥ 5 mm: contatos adultos e adolescentes maiores de 10 anos;


pessoas com imagem radiológica sugestiva de sequela de
tuberculose; transplantados em terapia imunossupressora; uso de
corticosteroides.

• PT ≥ 10 mm: silicose; neoplasia de cabeça e pescoço; neoplasias


hematológicas; insuficiência renal em diálise; diabetes mellitus.

• Conversão tuberculínica (2 PT com aumento de 10 mm em


a

relação à 1a com intervalo mínimo de 8 semanas): contatos de


tuberculose bacilífera; profissionais de saúde; profissionais de
laboratório de micobactéria; trabalhadores do sistema prisional;
trabalhadores de instituições fechadas, de longa permanência.
• Pessoa vivendo com HIV/aids, contato de doente bacilífero ou
com cicatriz radiológica em tratamento prévio,
independentemente da PT.

• Todas as pessoas vivendo com HIV/aids, assintomáticas,


devem realizar a PT anualmente:

Contagem de LTCD4 + maior que 350 células/mm3 e PT ≥ 5


mm: tratar ILTB.

Contagem LTCD4 + menor ou igual a 350 células/mm3: tratar


ILTB independentemente da PT.)

c. INVESTIGAÇÃO DE CONTATOS:

• Indicada para todos os contatos de um caso de tuberculose ativa


(indivíduos que convivem no mesmo ambiente: em casa,
ambientes de trabalho, instituições de longa permanência ou
escola).

• Contatos assintomáticos – Pesquisar ILTB:


PT ≥ 5 mm e Raio X de tórax normal: tratar ILTB.

PT < 5 mm: repetir em 8 semanas. Se conversão tuberculínica


e Raio X de tórax normal: tratar ILTB. Sem conversão: alta e
orientação.

• Contatos sintomáticos:
Pesquisar TB ativa: baciloscopia do escarro, radiografia de
tórax.
Exames compatíveis com TB ativa: iniciar esquema básico
(RHZE).

d. TUBERCULOSE E HIV:

• A coinfecção TB/HIV e o aumento de casos de TB


multirresistente representam grande preocupação mundial, pelo
impacto expressivo na morbimortalidade.

• A tuberculose é a infecção mais comum em PVHA e a principal


causa de óbito entre as doenças infecciosas nesse grupo, que
apresenta maior risco de acometimento extrapulmonar.

• Em geral, a apresentação pulmonar é atípica e variável.


• O tratamento da tuberculose em PVHA segue as mesmas
recomendações para os não infectados.

• Virgens de tratamento com LTCD 4+ > 200 células/mm : iniciar a


3

TARV (terapia antirretroviral) em torno de 8 semanas após o


início do tratamento anti-TB.

• Virgens de tratamento com LTCD 4+ < 200 células/mm : iniciar a


3

TARV 2 semanas após, devido ao risco da Síndrome de


reconstituição imune (reconstituição e exacerbação de resposta
imune, com intensificação e piora do quadro clínico).

• TARV inicial preferencial na coinfecção TB/HIV:


Tenofovir/Lamivudina/Efavirenz.

e. MEDIDAS PREVENTIVAS:
• A Busca ativa de sintomático respiratório por todos os serviços
de saúde.

• Acompanhamento dos casos confirmados.


• Investigação de contatos para a identificação e tratamento dos
casos de ILTB.

• Monitoramento do tratamento: visita domiciliar, busca de


faltosos.

• Tratamento da ILTB.
• Vacina BCG (bacilo de Calmette-Guërin): evita o
desenvolvimento das formas mais graves da doença em menores
de 5 anos de idade.

• Medidas de precaução para aerossóis em serviços de saúde.


EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, sexo masculino, 44 anos, proveniente de
zona rural, solteiro, compareceu ao hospital apresentando tosse
produtiva persistente há cerca de quatro semanas. Relatou também
febre vespertina não ultrapassando 38,5°C e sudorese noturna, além de
emagrecimento de 5 kg em 1 mês, hiporexia e adinamia. Nega doenças
de base, uso de medicamentos, alergias e uso de drogas ilícitas. Refere
ingestão de bebida alcoólica diariamente. Nega tabagismo.

b. Exame físico: REG, febril (38°C), hipocorado (2 + /4 + ),


desidratado (1 + /4 + ), PA = 120 x 80 mmHg, FR = 28 irpm e FC = 80
bpm; ausculta respiratória com crepitações finas em ápice direito.
c. Exames complementares para confirmação diagnóstica:

• Radiografia de tórax: revela opacidade com cavitação em ápice


de lobo superior direito.

• Baciloscopia de escarro (2 amostras): + +.


• Teste rápido para HIV: negativo.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Esquema básico: RHZE 4 comprimidos ao dia, em jejum.
3. Dipirona: 500 mg 1 comprimido de 6/6 horas se febre ou dor.
4. Notificação no SINAM.
5. Orientações quanto às precauções respiratórias.
6. Investigação dos contatos domiciliares.

REFERÊNCIAS
1. Lopes AJ, Capone D, Mogami R, Tessarollo B, Cunha DL, Capone RB, et al. Tuberculose
extrapulmonar: aspectos clínicos e de imagem: Extrapulmonary Tuberculosis: Clinics And
Image Aspects. Pulmão RJ. 2006; 4(15): 253-61.
2. Ferri AO, Aguiar B, Wilhelm CM, Schmidt D, Fussieger F, Picoli SU. Diagnóstico de
tuberculose: uma revisão. Rev Liberato. 2014; 15(24): 105-212.
3. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde;
2016.
4. Ministério da Saúde (BR). Manual de recomendações para controle da tuberculose no
Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.
5. Ministério da Saúde (BR). Recomendações para o manejo da coinfecção Tb-HIV em
serviços de atenção especializada a pessoas vivendo com HIV/Aids. Brasília; 2012.
6. Bertoni TA, Takao EKH, Dias JRC, Svidzinski TIE. Paracoccidioidomicose e tuberculose:
diagnóstico diferencial: Paracoccidioidomycosis And Tuberculosis: Differential Diagnosis.
J Bras Patol Med Lab. 2010; 46(1): 17-21.
7. Jameson JL, Fauci AS, Kasper DL, Hauser SL, Longo DL, Loscalzo J. Medicina interna de
Harrison. 18. ed. Porto Alegre: Artmed; 2013.
4.3
HIV/AIDS
Autoras:
Gabrielly Borges Machado
Isabela Rodrigues de Oliveira

DEFINIÇÕES
• O HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) é um vírus esférico,
pertencente à família Retroviridae, subfamília Orthoretrovirinae e
gênero Lentivirus, cujo núcleo é constituído por RNA de fita
simples.

• É composto por glicoproteínas estruturais do envelope viral


(gp160, gp120 e gp41), que estimulam resposta imune, e enzimas
virais, como protease (PR), transcriptase reversa (TR) e integrase
(IN), responsáveis pelo processo de transcrição e multiplicação
viral e patogênese no hospedeiro.

• Subtipos: HIV-1 e HIV-2; a maioria das infecções ocorre pelo


HIV-1.

• Trata-se de uma infecção crônica, sistêmica, de evolução


insidiosa, com amplo espectro de apresentações clínicas, desde a
fase aguda até a fase avançada (AIDS).

• Formas principais de transmissão:


Sexo desprotegido (vaginal, anal ou oral).
Vertical (de mãe infectada para o filho durante a gestação, o
parto ou a amamentação).

Compartilhamento de seringa ou agulha contaminada.

Transfusão de sangue contaminado.

Instrumentos perfurocortantes contaminados.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Após cerca de 10 dias do contágio, ocorre a viremia, com
disseminação dos vírus na
corrente sanguínea e acometimento de tecidos linfoides, os quais
atuam como reservatórios virais latentes.

• O vírus infecta células de defesa, principalmente linfócitos TCD4


+ de memória, sofrendo intensa replicação intracelular, com pico
de viremia por volta de 21 a 28 dias após o
contágio (fase aguda).

• Ocorre ativação de resposta imune celular e humoral, porém, a


produção de anticorpos anti-HIV é tardia e insuficiente para
erradicar a infecção.

• A atuação da resposta imune celular e a subsequente síntese de


anticorpos específicos levam à queda da carga viral, estabilização
da contagem de LTCD4+ e cronicidade da infecção (fase de
latência – assintomática).

• Evolução: progressiva depleção de linfócitos TCD4+ e


progressão para AIDS.
QUADRO CLÍNICO
a. FASES CLÍNICAS: infecção aguda, fase assintomática ou fase
de latência, fase sintomática inicial ou precoce e AIDS/SIDA.

• Infecção aguda:
Assintomática ou Síndrome Retroviral Aguda (em cerca de
50% dos casos).
- Fase caracterizada por carga viral elevada, intensa resposta imune
celular e depleção rápida de linfócitos TCD4+.
- Anticorpos anti-HIV não são detectados (janela imunológica),
pois a resposta humoral é tardia (surgem após a fase aguda).

• Síndrome retroviral aguda: ocorre logo após o contágio, entre a


1ª e 3ª semana, autolimitada, com duração de aproximadamente
14 dias.
- Quadro clínico inespecífico (síndrome mononucleose-símile):
febre, adenopatia,
faringite, mialgia, artralgia, rash cutâneo maculopapular
eritematoso, hiporexia,
adinamia, cefaleia, perda de peso, náuseas e vômitos.

• Fase de latência (assintomática):


Caracterizada pela ausência de manifestações clínicas, em
decorrência da atuação de resposta imune celular e humoral,
mediada por anticorpos específicos, com controle da replicação
viral e estabilização da infecção (contagem de LTCD4+ e carga
viral estáveis).

Fase prolongada.

• Fase sintomática inicial:


Caracterizada por manifestações sistêmicas inespecíficas,
resultantes de imunodeficiência: sudorese noturna, fadiga
progressiva, emagrecimento, anorexia, diarreia, sinusopatias,
febre, cefaleia, candidíase oral e vaginal, queilite angular,
leucoplasia pilosa oral (vírus Epstein-Barr), gengivite, úlceras
aftosas, herpes simples recorrente (HSV-1 e HSV-2), Herpes
Zóster, trombocitopenia, púrpura trombocitopênica imune, entre
outras.

• AIDS:
Fase mais avançada da infecção pelo HIV, caracterizada por
imunodepressão grave (TCD4+ < 200 células/mm3).

Maior risco de doenças oportunistas (doenças definidoras de


AIDS).

Em indivíduos não tratados, o tempo médio entre o contágio e


o aparecimento da doença (AIDS) é em torno de 10 anos.

• Principais doenças oportunistas: Citomegalovirose, Herpes


simples, Leucoencefalopatia Multifocal Progressiva,
Micobacterioses (tuberculose e complexo Mycobacterium avium
intracellulare), Pneumonias, Salmonelose, Pneumocistose,
Candidíase, Criptococose, Histoplasmose, Toxoplasmose,
Criptosporidiose, Isosporíase, Sarcoma de Kaposi, linfomas não
Hodgkin, neoplasias intraepiteliais anal e cervical.

DIAGNÓSTICO
• Testes sorológicos (triagem e confirmatório):
Testes de triagem: Imunoensaio (ELISA) de 3ª ou 4ª geração
(janela imunológica de aproximadamente 15 dias); testes
rápidos.

Testes confirmatórios convencionais: Western Blot (WB),


Imunoblot (IB) ou Imunoblot Rápido (IBR).

Testes rápidos (TR): detecção de anticorpos anti-HIV no


sangue periférico ou fluido oral, em até 30 minutos.

Diagnóstico: combinação de um teste de triagem (ELISA de 4ª


geração) seguido por um teste confirmatório (Western Blot) ou
2 testes rápidos diferentes reagentes.

• Testes moleculares pela técnica de PCR (reação em cadeia da


polimerase):

Teste confirmatório: indicado para o diagnóstico de infecções


agudas, nas quais a sorologia pode ser negativa (janela
imunológica), casos de sorologia inconclusiva e quantificação
de carga viral (avaliação da resposta terapêutica).

TRATAMENTO
a. Situações de priorização de atendimento para início da
TARV – iniciar TARV com celeridade:

• Sintomáticos:
CTB ativa: para LT-CD4+ < 200, iniciar TARV na segunda
semana após o início do tratamento de TB. Para LT-CD4+ >
200, iniciar TARV ao final da oitava semana.
Manifestações clínicas atribuídas diretamente ao HIV:
Nefropatia associada ao HIV,
alterações neurológicas, cardiomiopatia associada ao HIV,
imunodeficiência avançada (doença definidora de AIDS) ou
moderada.

• LT-CD4+ < 350 células/mm . 3

• Gestante: a TARV não deverá ser suspensa após o parto,


independentemente do nível de LT-CD4+.

• Tuberculose ativa.
• Coinfecção HBV.
• Coinfecção HCV.
• Risco cardiovascular elevado (> 20%).
• Importante: na impossibilidade de obter contagem de LT-CD4+,
não se deve adiar o início do tratamento.

b. CLASSES DE ANTIRRETROVIRAIS:

• Inibidores da transcriptase reversa análogos de nucleosídeos


e nucleotídeos (ITRN/ITRNt): Zidovudina (AZT), Lamivudina
(3TC), Tenofovir (TDF), Abacavir (ABC);

• Inibidores da transcriptase reversa não análogos de


nucleosídeos (ITRNN): Efavirenz (EFZ), Nevirapina (NVP);

• Inibidores da protease: Atazanavir/ritonavir (ATV/r),


Darunavir/ritonavir (DRV/r), Lopinavir/ritonavir (LPV/r);
• Inibidores da integrase: Dolutegravir (DTG), Raltegravir
(RAL);

• Inibidores de entrada:
Inibidores de Fusão: T20 (Enfuvirtida);

Inibidores do correceptor CCR5: MVQ (Maraviroque).

• Esquema terapêutico inicial preferencial (conforme tabela


1)::

2 inibidores da transcriptase reversa nucleosídeos + 1 inibidor


da integrase:
- Tenofovir (TDF) + Lamivudina (3TC) + Dolutegravir (DTG).

Preferencial para adultos

TERAPIA
SITUAÇÃO DOSE DIÁRIA OBSERVAÇÃO
ANTIRRETROVIRAL

Adultos em início de (300 mg/300 mg)


TDF/3TC + DTG
tratamento 1cp + 50 mg 1 cp ao dia

TDF/3TC + DTG (300 mg/300 mg)


Coinfecção TB-HIV
(DTG dose dobrada) 1 cp + 50 mg 1 cp 12/12 h

Após a 14ª sem:


(300 mg/300 mg) Antes da 14ª sem:
TDF/3TC + DTG
1 cp + 50 mg 1 cp ao dia iniciar EFZ e solicitar
Gestante genotipagem
Antes da 14ª sem:
(300 mg/300 mg/600 mg) (se resistência ao EFZ:
TDF/3TC/EFZ
1 cp ao dia substituir conforme teste)
(3 em 1)

Tabela 1. Tratamento antirretroviral inicial em pessoas vivendo com


HIV/AIDS.
Fonte: Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Manejo da Infecção
pelo HIV em Adultos (PCDT)/SVS/MS.

c. OBSERVAÇÕES:
• Contraindicações ao uso do DTG: uso de Fenitoína, Fenobarbital,
Carbamazepina e Oxicarbamazepina.

• Se, após 6 meses de TARV, o paciente apresentar carga viral


detectável, acima de 500 cópias/mm3 (falha terapêutica): solicitar
genotipagem para avaliar resistência viral.

• Indicações de Genotipagem:
Falha terapêutica com esquema inicial.

Pré-tratamento com TARV (esquema inicial): gestantes,


crianças, adolescentes,
coinfecção HIV/TB e pessoas que tenham se infectado com
parceiro em uso de TARV.

d. MONITORAMENTO:

• Contagem de LT-CD4+ e da carga viral, a cada 6 meses.


• PVHA em uso de TARV, assintomático, carga viral indetectável e
CD4 > 350 células/mm3 em dois exames consecutivos: somente
CV a cada 6 meses.

• PVHA sem uso de TARV, falha virológica ou CD4 < 350


células/mm3: contagem LT-CD4 + e CV a cada seis meses.

• LTCD4+ < 200 células/mm : indicada profilaxia para infecções


3

oportunistas com Sulfametoxazol/ trimetoprim três vezes por


semana.

e. PREVENÇÃO:
• Baseia-se na combinação de medidas preventivas: mudança
comportamental, uso de preservativos masculinos e femininos,
aconselhamento sobre HIV/AIDS e outras IST, incentivo à
testagem, PEP, PrEP.

• Não existe atualmente nenhuma vacina disponível para o HIV.


• PEP (Profilaxia pós-exposição ao HIV):
Consiste no uso de TARV em situações de exposição ao vírus:
violência sexual, relação sexual desprotegida, acidente
ocupacional (com instrumentos perfurocortantes ou em contato
direto com material biológico).

É uma urgência médica, deve ser iniciada preferencialmente


nas primeiras duas horas após a exposição e, no máximo, em
até 72 horas.

A duração da PEP é de 28 dias.

• PrEP (Profilaxia pré-exposição ao HIV):


Consiste na tomada diária de um comprimido antes da
exposição ao HIV, impedindo a transmissão.

Combinação de dois antirretrovirais: Tenofovir +


Entricitabina.

Indicada para pessoas que tenham maior chance de exposição


ao HIV: homossexuais e homens que fazem sexo com homens
(HSH); pessoas trans; trabalhadores(as) do sexo; casais
sorodiscordantes.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, sexo masculino, 45 anos, branco, casado,
previamente hígido, comparece ao posto de saúde relatando
emagrecimento de aproximadamente 15 kg e adinamia intensa com
início há quatro meses. Refere ainda hiporexia e febre esporádica.
Nega doenças preexistentes, uso de medicamentos, alergias e uso de
drogas ilícitas. Refere tabagismo e etilismo. Relata prática de relações
heterossexuais com várias parceiras sem o uso de preservativos.

b. Exame físico: regular estado geral, emagrecido, hipocorado,


temperatura axilar de 36ºC, discreta hiperemia e descamação em face,
frequência cardíaca: 82 bpm, PA: 120/75 mmHg, frequência
respiratória: 20 irpm. Ausculta cardíaca e pulmonar sem alterações.
Oroscopia: lesões brancacentas recobrindo língua e palato, sugestivas
de candidíase oral.

c. Exames complementares:

• Hemograma: anemia normocítica e normocrômica e


linfocitopenia.

• Pesquisa de anticorpos anti-HIV: reagente.


• Anti-HCV não reagente, HBsAg não reagente, anti-HBs não
reagente, VDRL: não reagente.

• Raio X de tórax: sem alterações.


• Prova tuberculínica (PT): 0 mm.
• Contagem de LTCD4 +: 142 células/mm³.
• Carga viral (PCR-HIV): 247.635 cópias/mL.
d. Prescrição sugerida: Iniciada TARV preferencial:
TDF/3TC/DTG e monitoramento terapêutico.

REFERÊNCIAS
1. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST Aids e
Hepatites Virais. Manual técnico para o diagnóstico da infecção pelo HIV. 3. ed. Brasília:
Ministério da Saúde; 2016.
2. World Health Organization. Consolidated Guidelines On The Use Of Antiretroviral Drugs
For Treating And Preventing HIV Infection: Recommendations For A Public Health
Approach. 2. ed. WHO Guidel. 2016; (June): 480.
3. Ministério da Saúde (BR). Nota informativa nº 007/2017 – DDAHV/SVS/MS. Brasília:
Ministério da Saúde; 2017.
4. Ministério da Saúde (BR). Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da
infecção pelo HIV em adultos. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. Atualizado em 2015.
5. Ministério da Saúde (BR). Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para profilaxia pós-
exposição (PEP) de risco à infecção pelo HIV, IST e hepatites virais. Brasília: Ministério da
Saúde; 2018.
6. Ministério da Saúde (BR). HIV: estratégias para diagnóstico no Brasil. Brasília: Ministério
da Saúde; 2010.
7. Ministério da Saúde (BR). Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Recomendações para
vacinação em pessoas infectadas pelo HIV. Brasília: Ministério da Saúde; 2002.
8. Ministério da Saúde (BR). Programa Nacional de DST e AIDS. Critérios de definição de
casos de AIDS em adultos e crianças. Brasília: Ministério da Saúde; 2004.
9. CLSI. Criteria for Laboratory Testing and Diagnosis of HIV Infection; Approved Guideline.
CLSI document M53-A. Wayne: Clinical and Laboratory Standards Institute; 2011.
10. Miller LE. Laboratory Diagnosis of HIV Infection. In: Stevens CD. Clinical immunology
and serology: a laboratory perspective. 3. ed. Philadelphia: FA Davis Company; 2010.
11. UNAIDS/WHO Working Group on Global HIV/AIDS/STI Surveillance. Guidelines for
Using HIV Testing Technologies In Surveillance: Selection, Evaluation And
Implementation, 2009 update. Genebra: World Health Organization; 2009. 382 HIV/AIDS
12. Ministério da Saúde (BR). Guia de vigilância em saúde. Brasília: Ministério da Saúde;
2016.
13. Ministério da Saúde (BR). Nota informativa nº 10/2018 – DIAHV/SVS/MS. Brasília:
Ministério da Saúde; 2018.
14. Ministério da Saúde (BR). Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para o manejo da
infecção pelo HIV em adultos. Brasília: Ministério da Saúde; 2018.
15. Ministério da Saúde (BR). Recomendações para Profilaxia da Transmissão Vertical do HIV
e Terapia Antirretroviral em Gestantes. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.
4.4
INFLUENZA
Autoras:
Gabrielly Borges Machado
Ana Luiza Santos Pereira

DEFINIÇÕES
• Infecção viral que acomete as vias respiratórias, geralmente
autolimitada e benigna, durando aproximadamente sete dias.

• Doença sazonal, mais comum no outono e no inverno.


• Os quadros graves acometem principalmente os grupos de risco.
• Grupos de risco para complicações e sinais de agravamento:
Gestantes e puérperas até 45 dias pós-parto;

Idosos;

Portadores de comorbidades crônicas: DM, cardiopatia,


nefropatia, hepatopatia, pneumopatia;

Indígenas;

Imunossupressão;

Pessoas privadas de liberdade;


Obesidade.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• O vírus Influenza é um RNA vírus e se subdivide em três tipos
antigenicamente distintos: A, B e C.

Tipo A: principal responsável pela ocorrência de epidemias,


devido à sua alta capacidade de mutação e variedade de
subtipos.

Subtipos mais prevalentes: Influenza A H1N1, Influenza A


H3N2 e Influenza B.

• Transmissão: direta (pessoa a pessoa), principalmente através do


contato com gotículas expelidas por tosse, espirro e fala, e indireta,
através do contato das mãos com superfícies contaminadas.

• Período de incubação: um a quatro dias.


• Período de transmissibilidade: 24 a 48 horas antes do início dos
sintomas e dura até três a cinco dias após o final da febre. Em
crianças e imunodeprimidos, esse período é mais longo, podendo
durar, em média, 10 dias.

QUADRO CLÍNICO
• Síndrome Gripal (SG): febre, tosse seca, odinofagia, coriza,
disfonia, mialgia, cefaleia e prostração, sem outro diagnóstico
específico, e geralmente com resolução espontânea em
aproximadamente 7 dias. Podem ocorrer sintomas gastrointestinais,
rouquidão e hiperemia conjuntival.
• Complicações: pneumonia bacteriana, sinusite, otite,
desidratação, piora de doenças crônicas, pneumonia primária por
influenza.

• Sinais de agravamento – Síndrome Respiratória Aguda Grave


(SRAG): presença de dispneia ou taquipneia; desconforto
respiratório; hipoxemia (SpO2 < 95%); persistência ou aumento da
temperatura por mais de três dias ou retorno após 48 horas de
período afebril; rebaixamento do nível de consciência; hipotensão
arterial (sistólica < 90 mmHg e/ou diastólica < 60 mmHg); oligúria
(diurese < 400 mL em 24 horas); exacerbação dos sintomas
gastrointestinais em crianças; desidratação; exacerbação de doença
preexistente; miosite; elevação da creatinina sérica.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Hemograma: leucocitose, leucopenia, linfocitose.
b. Radiografia de tórax: infiltrado intersticial localizado ou difuso;
presença de área de condensação.
c. Reação em cadeia da polimerase de transcrição reversa (RT-
PCR):

• Exame confirmatório (padrão-ouro).


• Amostras: swab de nasofaringe, coletado até o 7º dia após o início
dos sintomas.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• Diagnóstico clínico-epidemiológico.
• Síndrome gripal: febre de início súbito, associada à tosse ou
odinofagia e, no mínimo, um dos seguintes sintomas: cefaleia,
mialgia ou artralgia, na ausência de outro diagnóstico específico.

• Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG): síndrome gripal


associada a pelo menos um sinal de gravidade.

TRATAMENTO
a. Fosfato de Oseltamivir (Tamiflu®) – Indicações:

• Grupos de risco para complicações com síndrome gripal;


• Qualquer paciente com SRAG;
• Iniciar preferencialmente nas primeiras 48 horas do início dos
sintomas, independentemente da condição vacinal.

• Dose: 75 mg de 12 em 12 horas, por 5 dias.


• Em pacientes com alteração da função renal há ajustes, conforme
a tabela abaixo (Tabela 1).

Clearance de creatinina (mL/min/1,73 m2) Dose Posologia

> 60 - 90 75 mg 12/12h

30 – 59 30 mg 12/12h

10 – 29 30 mg 24/24h

Hemodiálise 30 mg após cada sessão*

Dose única, imediatamente após


Diálise peritoneal contínua ambulatorial 30 mg
troca da diálise**

Hipertensão sistólica isolada ≥ 140 < 90

*Apenas três doses, uma após cada sessão de hemodiálise, considerando-se que, num período de cinco dias, serão realizadas
três sessões.
**Serão duas doses de 30 mg cada, considerando-se os dez dias, em que ocorrerão apenas duas sessões
de diálise.
Tabela 1. Oseltamivir (Tamiflu®) dose ajustada para Clearance de
creatinina.
Fonte: Guia de vigilância em saúde/Ministério da saúde 2016.

b. SRAG:

• Internação hospitalar com precaução para gotículas.


• Preencher ficha de notificação do Sinan.
• Reposição volêmica cautelosa, oxigenoterapia e monitoramento
clínico.

• Iniciar imediatamente Oseltamivir (independentemente da coleta


de amostra para avaliação laboratorial e da vacinação).

• Coletar amostra respiratória (swab de nasofaringe) para detecção


viral (PCR): se possível, antes do início do antiviral e até o 7º dia
de sintomas.

• Exames inespecíficos (marcadores prognósticos): hemograma,


função renal, DHL, CPK, proteína C reativa, gasometria arterial.

• Radiografia de tórax.
• Antibioticoterapia (suspeita de infecção bacteriana secundária):
Ceftriaxone ou Amoxicilina/clavulanato + Claritromicina ou
Azitromicina ou Quinolona respiratória IV por 7 a 10 dias.

• Suporte ventilatório e fisioterapia respiratória.


• Indicações de internação em UTI: instabilidade hemodinâmica,
sinais de insuficiência respiratória, outras disfunções orgânicas
(insuficiência renal, hepática, alteração do nível de consciência),
hipoxemia moderada a grave (relação PO2/FiO2 < 300,
caracterizando lesão pulmonar aguda), aumento significativo de
DHL e CPK.

• Critérios de alta hospitalar: após 48 horas com ausência de


febre, estabilidade clínica e sem necessidade de antibioticoterapia
venosa.

c. MEDIDAS PREVENTIVAS

• Higienizar as mãos antes e depois do contato com o paciente.


• Precauções padrão: equipamentos de proteção individual.
• Precaução para gotículas: uso de máscara cirúrgica ao entrar no
quarto.

• Procedimentos que geram aerossóis (intubação, aspiração de via


aérea e nebulização,
massagem cardíaca): máscara tipo N95.

d. VACINAÇÃO

• Composta por vírus inativados.


• Trivalente: proteção contra Influenza A H1N1, Influenza A H3N2
e Influenza B.

• A composição é atualizada a cada ano, de acordo com as cepas


circulantes.

• Recomendada aos grupos de risco: crianças de 6 meses a 5 anos,


profissionais da saúde, gestantes, puérperas até 45 dias após o
parto, idosos acima de 60 anos, indígenas, portadores de doenças
crônicas, imunossuprimidos, obesos, residentes e funcionários de
instituições fechadas e professores.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Guia de vigilância em saúde/Ministério da saúde 2016.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 30 anos, comparece ao
hospital devido à tosse seca, rinorreia e mialgia, há quatro dias. Relatou
febre no dia anterior. Há um dia, apresenta dispneia e dor torácica
ventilatório-dependente. Nega doenças de base, uso de medicações,
tabagismo ou etilismo.
b. Exames físicos:

• Ectoscopia: paciente em regular estado geral, acianótico,


anictérico, febril, normocorado, desidratado ++/4, FR 40 irpm,
SatO2 85% em ar ambiente, PA 90 x 60 mmHg. Tax. 38,3⁰C.

• Tórax: estertores finos em bases pulmonares, RCR em 2T, bulhas


cardíacas normofonéticas, sem sopros.
c. Exames complementares:

• hemograma Hb 14,3%, leucócitos de 5.700/mm3, neutrófilos


4845/mm3, bastonetes 161/mm3, linfócitos 483/mm3, monócitos
322/mm3, eosinófilos de 57/mm3, plaquetas de 202.000/mm3.
Radiografia de tórax revelando infiltrado intersticial pulmonar
difuso com broncograma aéreo, bilateralmente.

• Gasometria arterial: PaO2: 60 mmHg.


d. Prescrição sugerida:

1. Dieta suspensa até segunda ordem.


2. Soro fisiológico 0,9% 500 mL IV em bolus até 3 vezes.
3. Fosfato de Oseltamivir 75 mg oral 12/12 horas por 5 dias.
4. Ceftriaxone 2 g IV ao dia.
5. Claritromicina 500 mg IV 12/12 horas.
6. Dipirona 1 ampola IV 6/6 horas se dor ou febre.
7. Oxigenoterapia.
8. Fisioterapia respiratória.
9. Preencher ficha de notificação do Sinan (SRAG).
10. Precaução para gotículas.
11. Sinais vitais e cuidados gerais 2/2 horas.

REFERÊNCIAS
1. Ministério da Saúde (BR). Protocolo de Tratamento de Influenza. Brasília: Ministério da
Saúde; 2015.
2. Organização Mundial da Saúde. WHO Guidelines for Pharmacological Management of
Pandemic
Influenza A(H1N1) 2009 and other Influenza Viruses. Genebra; WHO; 2010.
3. Martins HS, Neto RAB, Neto AS, Velasco IT. Emergências clínicas: abordagem prática. 10.
ed. Barueri: Manole; 2015.
4. Machado AA. Infecção pelo vírus Influenza A (H1N1) de origem suína: como reconhecer,
diagnosticar e prevenir. J Bras Pneumol. 2009; 35(5): 464-9.
5. Carneiro M, Trench FJP, Waib LF, Pedro FL, Motta F. Influenza H1N1 2009: revisão da
primeira pandemia do século XXI: H1N1 Influenza 2009: review of the first pandemic of the
XXI century. Rev Amrigs, 2010; 2(54): 206-13.
6. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2016.
4.5
ENDOCARDITE INFECCIOSA
Autoras:
Gabrielly Borges Machado
Ana Luiza Santos Pereira

DEFINIÇÕES
• Endocardite infecciosa (EI): doença com repercussão
multissistêmica, decorrente de
infecção, geralmente bacteriana, da superfície endocárdica.

• Acomete tanto a valva nativa quanto a protética.


• Predomina em portadores de próteses valvares e dispositivos
implantados, como
marca-passo e cardiodesfibrilador, usuários de drogas intravenosas,
imunossuprimidos e usuários de dispositivos invasivos, sendo o
patógeno mais prevalente o Staphylococcus aureus, responsável
por quadros graves e metastáticos.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• 80% dos casos de endocardite infecciosa são causados por
estafilococos e estreptococos. Na América do Sul, os agentes
etiológicos mais comuns são: Staphylococcus aureus (mais
comum), Streptococcus viridans e Enterococos.

• Outros patógenos são bactérias gram-negativas e do grupo


HACEK (Haemophilus sp.,
Aggregatibacter sp., Cardiobacterium hominis, Eikenella
corrodens e Kingella sp.),
estafilococos coagulase-negativos e fungos.

• A EI se desenvolve após a concomitância de três fatores


independentes: alteração da superfície valvar cardíaca,
bacteremia e formação de “vegetação”.

• O dano endotelial é decorrente de fluxo sanguíneo turbulento


(cardiopatia reumática e congênita, prolapso da valva mitral nativa,
valvas protéticas), lesão mecânica (por cateteres ou elétrodos) ou
injeção de partículas sólidas em usuários de entorpecentes
injetáveis, levando à resposta inflamatória com deposição de
fibrina e agregação plaquetária na valva cardíaca, processo
conhecido como endocardite trombótica não bacteriana
(ENTB).

• Aproximadamente 24 horas após o estabelecimento da


bacteremia, os microrganismos aderem à matriz de fibrina e
plaquetas da ETNB, formando a vegetação.

• Partes da vegetação podem se desprender da válvula infectada e


alojar em um leito vascular. Esses êmbolos sépticos podem
comprometer vários sistemas orgânicos, manifestando-se por
infartos teciduais, abcessos viscerais e patologias decorrentes da
deposição de complexos autoimunes.

QUADRO CLÍNICO
• Os quadros clínicos são variáveis, dependendo do agente
causador, da presença ou ausência de doença valvar prévia e da
presença de próteses ou dispositivos intracárdicos.

• A EI pode manifestar-se como infecção aguda com progressão


rápida, subaguda e crônica.
• Sinais e sintomas mais comuns: febre, sopro regurgitativo e
insuficiência cardíaca congestiva (edema de membros
inferiores, estertores crepitantes à ausculta pulmonar).
Calafrios, prostração, tosse, sincope, tonturas, hiporexia e perda de
peso podem estar presentes.

• Manifestações extracardíacas (decorrentes de embolização


séptica e depósito de imunocomplexos): acidente vascular cerebral,
infarto pulmonar e esplênico, glomerulonefrites, nódulos de Osler,
manchas de Roth, lesões de Janeway. Endoftalmite, hemorragia
subungueal.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Hemograma: leucopenia ou leucocitose, acompanhadas ou não
de anemia.
b. Proteína C-reativa (PCR) e velocidade de hemossedimentação
(VHS): elevadas.
c. Anticorpo citoplasmático de neutrófilos e complemento:
alterados na presença de vasculite associada a EI.
d. Ecocardiograma: método diagnóstico de escolha.

• Transtorácico (ETT): sensibilidade de 50%, considerar em


pacientes de risco com bacteremia por S. aureus.

• Transesofágico (ETE): sensibilidade de 90%, considerar quando


ETT normal com suspeita clínica.
e. Hemoculturas: devem ser coletadas em três séries, com intervalo
de 30 minutos entre si e,
48 a 72 horas após identificação do patógeno (para avaliar resposta
terapêutica).
DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico de EI é baseado nos critérios maiores e menores de Duke
modificados (conforme tabelas 1 e 2), que auxiliam na elucidação
diagnóstica.
Causas de elevação de troponina:
Critérios clínicos maiores

Hemoculturas positivas para IE:

• Microrganismos típicos consistentes com EI em 2 hemoculturas separadas:


• Stafhylococcus aureus, Streptococcus viridans, Streptococcus bovis, grupo HACEK; ou
• Enterococos adquiridos na comunidade, na ausência de um foco primário; ou
• Microrganismos consistentes com EI de hemoculturas persistentemente positivas:
• ≥2 hemoculturas positivas de amostras de sangue colhidas com intervalo > 12 h; ou
• Todos os 3 ou a maioria de ≥4 hemoculturas de sítios diferentes (com últimas amostras colhidas com ≥ 1 h de
diferença); ou
• Hemocultura ou sorologia positiva (títulos > 1: 800) para Coxiella burnetii.
Imagem positiva para o EI:

• Ecocardiograma positivo para IE:


• Vegetação;
• Abscesso e pseudoaneurisma intracardíacos;
• Perfuração valvar ou aneurisma;
• Nova deiscência parcial da válvula protética.
• Atividade anormal no local do implante de prótese valvar detectado por 18F-FDG PET/CT (somente se a
prótese foi implantada há mais de 3 meses) ou leucócitos radiomarcados SPECT/CT.
• Lesões paravalvulares definidas por TC cardíaca.
Critérios clínicos menores

• Fatores predisponentes: condição cardíaca predisponente ou uso de drogas injetáveis.


• Febre definida como temperatura> 38 °C.
• Fenômenos vasculares: êmbolos arteriais principais, infartos pulmonares sépticos, aneurisma infeccioso
(micótico), hemorragia intracraniana, hemorragias conjuntivais e lesões de Janeway.
• Fenômenos imunológicos: glomerulonefrite, nódulos de Osler, manchas de Roth e fator reumatoide.
• Evidência microbiológica: hemocultura positiva, mas não atende critério principal, como
observado acima, ou evidência sorológica de infecção com organismo consistente com o EI.

Tabela 1. Critérios de Duke modificados para o diagnóstico de endocardite


infecciosa
Fonte: Adaptado de Habib.1
EI patologicamente comprovada;
DIAGNÓSTICO DE EI Dois critérios maiores ou um maior e três menores ou cinco
menores.

Um critério clínico maior e um menor ou


DIAGNÓSTICO POSSÍVEL DE EI
Três critérios clínicos menores

Diagnóstico alternativo firme;


Resolução da síndrome do EI com antibioticoterapia por ≤ 4 dias;
DIAGNÓSTICO REJEITADO DE EI Nenhuma evidência patológica de EI na cirurgia ou autópsia com
antibioticoterapia ≤4 dias;
Não atende aos critérios para possível IE.

Tabela 2. Aplicação dos critérios de Duke.


Fonte: Adaptado de Habib.1

TRATAMENTO
• Antibioticoterapia combinada empírica precoce, de acordo com o
microrganismo suspeito, logo após a coleta das hemoculturas, com
ajuste após resultado dos testes de sensibilidade (de acordo com a
tabela 3)

• Considerar: tipo de valva acometida (nativa ou protética), agente


etiológico envolvido (conforme tabelas 4, 5 e 6) e a evolução
(aguda ou subaguda).
Droga ApresentaçÃo Dose e via de administração
Endocardite de valvas nativas adquirida na comunidade ou prótese valvar tardia

• Ampicilina 500 mg ou 1.000 mg (ampola) 12 g/dia EV em 4-6 doses


+

• Oxacilina 500 mg/5 mL 12 g/dia EV em 4-6 doses


+

• Gentamicina 20 mg/mL, 40 mg/mL, 80 mg/2 mL 3 mg/Kg/dia EV ou IM 24/24h

• Vancomicina 500 mg (ampola) 30 - 60 mg/Kg/dia EV em 2-3 doses


+

• Clortalidona 20 mg/mL, 40 mg/mL, 80 mg/2 mL 3 mg/Kg/dia EV ou IM 24/24h

Prótese valvar endocárdica (<12 meses após a cirurgia) ou endocardite associada a cuidados de saúde hospitalares e não
hospitalares

500 mg (ampola) 30 - 60 mg/Kg/dia EV em 2-3 doses


• Vancomicina
+

• Clortalidona 20 mg/mL, 40 mg/mL, 80 mg/2 mL 3 mg/Kg/dia EV ou IM 24/24h

Tabela 3. Antibioticoterapia empírica.


Fonte: Adaptado de Habib.1

a. ANTIBIOTICOTERAPIA DE ACORDO COM O AGENTE


ETIOLÓGICO

DOSE E VIA DE DURAÇÃO


DROGA APRESENTAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO (SEMANAS)
Tratamento padrão: 4 semanas


1 g (ampola) 2 g/dia EV ou IM 4
Ceftriaxona

Tratamento padrão: 2 semanas

• Ceftriaxona 1 g (ampola) 2 g/dia EV ou IM


+
2
• 20 mg/mL, 40 mg/mL, 3 mg/Kg/dia EV ou IM,
80 mg/2 mL dose única
Gentamicina

Pacientes alérgicos a betalactâmicos


500 mg (ampola) 30 mg/Kg/dia EV em 2 doses 4
Vancomicina

Tabela 4. Antibioticoterapia na EI por Streptococcus viridans e


Streptococcus bovis.
Fonte: Adaptado de Habib.1

DURAÇÃO
Droga ApresentaçÃo Dose e via de administração
(SEMANAS)
VALVA NATIVA

Estafilococo sensível a Meticilina (MSSA)

• Oxacilina 500 mg (ampola) 500 mg (ampola) 4-6


DURAÇÃO
Droga ApresentaçÃo Dose e via de administração
(SEMANAS)
Terapia alternativa: 400 mg + 80 mg/ 5 mL 4.800 mg/dia + 960 mg/dia EV 1 EV + 5 VO
(ampola) em 4-6 doses

Sulfametoxazol/ 400 mg/ 80 mg ou 800 mg/ 160 mg
(comprimido)
Trimetropima
+ 150 mg/mL (ampolas com 1.800 mg/dia em 3 doses 1
• Clindamicina 2 mL, 4 mL ou 6 mL

Pacientes alérgicos a Penicilina e Estafilococos Meticilina-resistentes (MRSA)

• Vancomicina 500 mg (ampola) 30-60 mg/Kg/dia EV em 2-3 doses 4-6

Terapia alternativa:
• Daptomicina 500 mg (ampola) 30-60 mg/Kg/dia EV em 2-3 doses 4-6

VALVA PROTÉTICA

Estafilococo sensível a Meticilina (MSSA)

500 mg (ampola) 12 g/dia EV em 4-6 doses ≥6


• Oxacilina
+

300 mg (comprimido) 900-1.200 mg/dia VO em 2-3 doses ≥6


• Rifampicina
+

20 mg/mL, 40 mg/mL, 3 mg/Kg/dia EV ou IM, dose única 2


• Gentamicina 80 mg/2mL

Pacientes alérgicos a Penicilina e Estafilococos Meticilina-resistentes (MRSA)

500 mg (ampola) 30-60 mg/Kg/dia EV em 2-3 doses ≥6


• Vancomicina
+

300 mg (comprimido) 900-1.200 mg/dia VO em 2-3 doses ≥6


• Rifampicina
+

20 mg/mL, 40 mg/mL, 3 mg/Kg/dia EV ou IM 24/24h 2


• Gentamicina 80 mg/2mL

Tabela 5. Antibioticoterapia na EI por Staphylococcus spp.


Fonte: Adaptado de Habib.1

DOSE E VIA DE
DROGA APRESENTAÇÃO DURAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO
500 mg (ampola) 200 mg/Kg/dia EV em 4-6 doses 4-6
• Ampicilina
+
DOSE E VIA DE
DROGA APRESENTAÇÃO DURAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO
20 mg/mL, 40 mg/mL, 3 mg/Kg/dia EV ou IM 24/24h 2-6
• Gentamicina 80 mg/2 mL

500 mg (ampola) 200 mg/Kg/dia EV em 4-6 doses 4-6


• Ampicilina
+

1.000 mg (ampola) 4 g/dia EV em 2 doses 4-6


• Ceftriaxona
500 mg (ampola) 30 mg/Kg/dia EV em 2 doses 6
• Vancomicina
+

20 mg/mL, 40 mg/mL, 3 mg/Kg/dia EV ou IM 24/24h 6


• Gentamicina 80 mg/2mL
(cepas resistentes
a betalactâmicos)

Tabela 6. Antibioticoterapia na EI por Enterococos.


Fonte: Adaptado de Habib.1
b. TRATAMENTO CIRÚRGICO

• Insuficiência cardíaca secundária à insuficiência aguda grave das


valvas mitral ou aórtica;

• Infecção localmente não controlada, ou seja, com crescimento da


vegetação, formação
de fistulas e abcessos;

• Infecção por patógenos multirresistentes ou fungos;


• Hemoculturas positivas após sete a dez dias de antibioticoterapia;
• Persistência de vegetações > 10 mm, após um ou mais fenômenos
embólicos.
c. PROFILAXIA

• Indicada para pacientes com fatores de risco para EI que serão


submetidos a procedimentos dentários que envolvam manipulação
da gengiva, ou região periapical dos dentes, antes da manipulação
do trato respiratório, geniturinário, e no perioperatório de implante
de dispositivos intracárdicos e implante de prótrese valvar.

• Droga de escolha: Amoxicilina 2 g, via oral, 30 a 60 minutos


antes.

• Alternativas: Clindamicina 600 mg via oral ou IV; Cefalexina 2 g


via oral; Cefazolina ou Ceftriaxona 1 g EV.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO

Fonte: Adaptado de Habib. Guidelines for the management of infective


endocarditis: The Task Force
for the Management of Infective Endocarditis of the European Society of
Cardiology. European Heart
Journal. Europa, Nov. 2015.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 50 anos, procura
atendimento no ambulatório de Clínica Médica do Hospital
Universitário, queixando-se de perda ponderal não intencional de 5 Kg
em um mês. Relata que vem apresentando quadro de dispneia
progressiva aos médios esforços, mal-estar, sudorese profusa e
episódios de febre. Referiu ainda que, na infância, foi diagnosticado
sopro, porém não sabe referir qual, e não possui exames prévios.
Afirmou ter realizado um tratamento odontológico (canal) há cinco
meses. Relata uso de bebidas alcoólicas socialmente, tabagismo há 25
anos (12 anos/maço) e uso de drogas ilícitas (intravenosas).
b. Exames físicos:

• Ectoscopia: regular estado geral, acianótico, anicérico, febril


(38,5⁰C), descorado, taquipneico. PA: 130 x 80 mmHg, FC: 105
bpm, FR: 28 rpm.

• Pele: mancha de Janeway no primeiro quirodáctilo direito.


• Tórax: murmúrio vesicular fisiológico, sem ruídos adventícios.
Ritmo cardíaco regular em 2 tempos, bulhas cardíacas
normofonéticas, com presença de sopro sistólico 3+/4+ e, foco
mitral.

• Abdome: plano, flácido, RHA presentes, ausência de massas e


visceromegalias

• Membros: sem edema, pulsos pediosos presentes e simétricos.


c. Exames complementares: ecodopplercardiograma transtorácico
evidenciando insuficiência valvar mitral e prolapso de folheto anterior e
posterior da valva mitral. Ecodopplercardiograma transesofágico
mostrando imagem sugestiva de vegetação em valva mitral.
Hemocultura positiva para Streptococcus viridans sensível a
Ceftriaxona e Penicilina G.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Ceftriaxona 1 g EV 12/12 horas.
3. Gentamicina 3 mg/Kg/dia EV 24/24 horas.
4. Dipirona 1 g EV 6/6 horas se dor ou febre.
5. Sinais vitais e cuidados gerais 4/4h.

REFERÊNCIAS
1. Habib G, Lancelotti P, Antunes MJ, Bongiorni MG, Casalta JP, Del Zotti F, et al. 2015 ESC
Guidelines for the management of infective endocarditis: The Task Force for The
Management of Infective Endocarditis of European Society of Cardiology (ESC) Endorsed
by: European Association for CardioThoracic Surgery (EACTS), the European Association
of Nuclear Medicine (EANM). Eur Heart J. 2015; 36: 3075-123.
2. Holland TH, Baddour LM, Bayer AS, Hoen B, Miro JM, Fowler Jr VG. Infective
endocarditis. Nat Rev Dis Pimers. 2016; 2: 16059.
3. Habib G, Erba AP, Iung B, Donald E, Cosnys B, Laroche C, et al. Clinical presentation,
aetiology and outcome of infective endocarditis. Results of the ESC-EORP EURO-ENDO
(European infective endocarditis) registry: a prospective cohort study. Eur Heart J. 2019; 40:
3222-33.
4. Tarasoutchi F; Montera MW; Ramos AIO, Sampaio RO, Accorsi TAD, Lopes ASSA, et al.
Atualização das diretrizes brasileiras de valvopatias: abordagem das lesões anatomicamente
importantes – Sociedade Brasileira de Cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2017; 109(6 Supl. 2):
1-34.
4.6
LEPTOSPIROSE
Autora:
Gabrielly Borges Machado

DEFINIÇÕES
• Doença infecciosa febril aguda, caracterizada por amplo espectro
clínico, podendo apresentar desde quadros assintomáticos e
oligossintomáticos até formas graves e fulminantes da doença.

• Zoonose de importância universal e importante problema de saúde


pública no Brasil.

• Tem caráter endêmico no Brasil, com maior incidência no verão,


principalmente em grandes centros urbanos, devido às enchentes
associadas à aglomeração populacional de baixa renda e precárias
condições de saneamento básico.

• Letalidade: em torno de 10%; nas formas graves: chega a 50%.


• Principais complicações: fenômenos hemorrágicos
(principalmente pulmonar) e insuficiência renal aguda, que são as
principais causas de óbito.

• As epidemias urbanas anuais estão relacionadas às condições


precárias de moradia e
trabalho.

• Os surtos são decorrentes de desastres naturais de grande


magnitude, pós-enchentes e inundações.

• É mais frequente na zona urbana, sexo masculino e faixa etária


entre 30 a 49 anos, tendo importância social e econômica
significativa.

• Doença de notificação compulsória no Sistema de Informação de


Agravos de Notificação (Sinan), ou seja, todo caso suspeito deve
ser notificado e investigado.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Agente etiológico: bactéria espiroqueta, aeróbica obrigatória,
altamente móvel, com elevada capacidade de sobrevivência no
meio ambiente, pertencente ao gênero Leptospira.

• Principal espécie envolvida: Leptospira interrogans.


• Principais reservatórios: roedores das espécies Rattus norvegicus
(ratazana ou rato de esgoto), Rattus rattus (rato de telhado ou rato
preto) e Mus musculus (camundongo
ou catita).

• Os animais infectados permanecem assintomáticos, mantêm a


leptospira nos rins, eliminando-a viva na urina, contaminando
água, solo e alimentos.

• O homem é hospedeiro acidental e terminal.


• A leptospira atinge os órgãos-alvo (fígado, rins e pulmões),
através da penetração tecidual direta (pele ou mucosa) e da
disseminação via hematogênica, levando à lesão vascular grave
(vasculite sistêmica) e disfunções orgânicas, responsáveis pelas
manifestações clínicas da doença e com-plicações.

• Período de incubação: em média 5 a 14 dias.


• Modo de transmissão: por meio do contato direto ou indireto
com a urina de animais infectados (reservatórios). A penetração do
patógeno se dá através da pele com a presença de lesões, pele
íntegra imersa por longos períodos em água contaminada ou
através de mucosas, como a conjuntiva.

QUADRO CLÍNICO
• Varia desde formas assintomáticas e subclínicas até quadros
clínicos graves, com alta
letalidade.

• Doença bifásica: fase precoce (fase leptospirêmica/aguda) e fase


tardia (fase imune).

a. FASE PRECOCE OU LEPTOSPIRÊMICA:

• Corresponde a cerca de 85% das formas clínicas.


• Autolimitada, com duração entre 3 e 7 dias e evolução benigna.
• Resultante da disseminação da leptospira pelo organismo.
• Início súbito de febre, associada a cefaleia, mialgia, anorexia,
náuseas e vômitos, diarreia, artralgia, hiperemia ou hemorragia
conjuntival, fotofobia, dor ocular e tosse. Podem ocorrer exantema,
hepatomegalia, esplenomegalia e linfadenopatia (em menos de
20% dos casos).

• Sufusão conjuntival: achado característico no final da fase


precoce.

• Outros achados: petéquias, hemorragias conjuntivais e mialgia,


principalmente em região lombar e nas panturrilhas.

b. FASE TARDIA OU IMUNE:

• Ocorre após a 1ª semana da doença.


• Corresponde ao início da produção de anticorpos específicos.
• Evolução: a maioria evolui para resolução espontânea, mas cerca
de 15% dos casos
evoluem para formas graves, mais comuns no sexo masculino,
podendo apresentar manifestações fulminantes.

c. SÍNDROME DE WEIL:

• Manifestação clássica da forma grave da doença.


• Tríade clássica: icterícia rubínica (tonalidade alaranjada muito
intensa), entre o 3º e 7º dia de sintomas, sendo marcador de pior
prognóstico + insuficiência renal + hemorragias,
principalmente pulmonar.

• Essas manifestações da tríade também podem surgir de forma


isolada.
d. SÍNDROME DE HEMORRAGIA PULMONAR:

• Complicação importante da fase tardia, decorrente de lesão


pulmonar aguda e sangramento pulmonar maciço.

• Caracterizada por tosse seca, dispneia, expectoração hemoptoica


e, ocasionalmente, dor torácica e cianose.

• Hemoptise franca indica extrema gravidade e pode ocorrer de


forma súbita, levando à insuficiência respiratória (síndrome da
hemorragia pulmonar aguda e síndrome da angústia respiratória
aguda – SARA) e a óbito, em poucas horas.

• Pode cursar também com fenômenos hemorrágicos na pele


(equimoses, petéquias e sangramento nos locais de venopunção),
em mucosas, como a conjuntiva ou órgãos internos, como sistema
nervoso central.

e. INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA:

• Ocorre em até 40% dos pacientes.


• Não oligúrica e hipocalêmica.
• A vasculite sistêmica leva à perda contínua de volume
intravascular e hipovolemia com consequente necrose tubular
aguda, necessitando de início precoce de diálise.

f. OUTRAS COMPLICAÇÕES DA FORMA GRAVE:

• Miocardite, arritmias, pancreatite, distúrbios neurológicos como


confusão, delírio, alucinações e meningite asséptica.
• Mais raramente, pode-se observar encefalite, paralisias focais,
espasticidade, nistagmo, convulsões, distúrbios visuais de origem
central, neurite periférica, paralisia de nervos cranianos, radiculite.

g. CONVALESCÊNCIA:

• Dura de 1 a 2 meses, podendo persistir sintomas como febre,


cefaleia, mialgias e mal-estar geral por alguns dias.

• A icterícia desaparece lentamente, podendo persistir por semanas.


• Os níveis de anticorpos diminuem progressivamente.
h. SINAIS DE ALERTA/GRAVIDADE:

• Dispneia, tosse e taquipneia.


• Alterações urinárias, geralmente oligúria.
• Fenômenos hemorrágicos, incluindo escarros hemoptoicos.
• Hipotensão.
• Alterações do nível de consciência.
• Vômitos frequentes.
• Arritmias.
• Icterícia.
EXAMES COMPLEMENTARES
a. Clínico-epidemiológico – caso suspeito: indivíduo que apresenta
febre de início súbito, mialgias e cefaleia, associados a um e mais dos
seguintes sinais e sintomas: sufusão conjuntival ou conjuntivite,
alterações do volume urinário (IRA), icterícia e fenômenos
hemorrá¬gicos OU quadro de febre, cefaleia e mialgia com
antecedentes epidemiológicos sugestivos (contato físico com áreas
alagadas, lama ou esgoto, principalmente após fortes chuvas e
ocorrência de enchentes, residência ou trabalho em áreas de risco da
doen¬ça) nos últimos 30 dias anteriores à data de início dos sintomas.
b. Exames complementares:

• Fase precoce: isolamento da bactéria através de exame direto


(esfregaço), cultura para Leptospira em sangue e detecção do DNA
pela técnica da reação em cadeia da polimerase (PCR).

• Fase tardia: métodos sorológicos (a partir do 7º dia do início dos


sintomas):

Ensaio imunoenzimático (ELISA): pesquisa de anticorpos IgM


e IgG.

Teste de Microaglutinação – MAT (padrão-ouro):


- Soroconversão com 2 amostras, sendo a 1ª (na fase aguda) não
reagente e a 2ª
(14 dias após a data de início dos sintomas) com título maior ou
igual a 200;
- Aumento de 4 vezes ou mais nos títulos da MAT, entre 2 amostras
sanguíneas coletadas com um intervalo de aproximadamente 14
dias após o início dos sintomas entre elas;
- Uma amostra com título maior ou igual a 800.
• Alterações laboratoriais: anemia, plaquetopenia e leucocitose
com desvio à esquerda ao hemograma, ureia e creatinina elevados,
bilirrubina total elevada com predomínio da fração direta, potássio
normal ou diminuído, CPK elevada – lesão muscular grave,
aumento de AST e ALT, gama-GT e fosfatase alcalina normais ou
elevadas.

• Exame de imagem: infiltrado alveolar ou lobar, bilateral ou


unilateral, congestão e SARA.

• ECG: fibrilação atrial, bloqueio atrioventricular e alteração da


repolarização ventricular.
c. Anticorpo citoplasmático de neutrófilos e complemento:
alterados na presença de vasculite associada a EI.
d. Diagnósticos diferenciais:

• Fase precoce: dengue, síndrome gripal, malária, febre maculosa,


doença de Chagas aguda, toxoplasmose aguda, febre tifoide, entre
outras.Transesofágico (ETE): sensibilidade de 90%, considerar
quando ETT normal com suspeita clínica.

• Fase tardia: hepatites virais agudas, hantavirose, febre amarela,


malária grave, dengue grave, endocardite, febre maculosa, doença
de Chagas aguda, pneumonias, pielonefrite, sepse, meningites,
abdome agudo.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• Hospitalização imediata dos casos com sinais de alerta.
• Reposição volêmica adequada e cautelosa.
• Antibioticoterapia precoce: indicada em qualquer fase da doença;
porém, é mais eficaz na 1ª semana do início dos sintomas (ver
tabela 1).

• Suporte respiratório: ventilação mecânica protetora nos casos


graves (SARA).

• Manejo de hemorragias: transfusão de hemoderivados.


• Suporte renal: diálise precoce na IRA oligúrica.
• Casos leves: tratamento ambulatorial e manter monitorização do
paciente até a fase de convalescença.

FASE ANTIBIÓTICO ADULTO

100 mg, via oral,


Doxiciclina
de 12 em 12 horas, por 5 a 7 dias
FASE
PRECOCE 500 mg, via oral, de 8 em 8 horas, por 5 a 7
Amoxicilina
dias

1.500.000 UI, intravenosa,


Penicilina G Cristalina
de 6 em 6 horas

1 g, intravenosa,
Ampicilina
FASE de 6 em 6 horas
TARDIA
2 g, intravenosa,
Ceftriaxona
de 24 em 24 horas

1 g, intravenosa,
Cefotaxima
de 6 em 6 horas

Quadro 1. Antibioticoterapia recomendada para pacientes com leptospirose.


Fonte: Ministério da Saúde.3

• Doxiciclina: contraindicada para crianças menores de 9 anos de


idade, gestantes e nefropatas ou hepatopatas.
• Azitromicina e a claritromicina: alternativas terapêuticas na fase
precoce.

CONCLUSÃO
• Diagnóstico precoce, manejo clínico adequado e criterioso,
principalmente dos casos com sinais de alerta, com reposição
volêmica cautelosa, antibioticoterapia específica e precoce, suporte
ventilatório (ventilação mecânica nos casos de hipoxemia grave e
refratária), transfusão de hemoderivados e manejo renal, com uso
de diuréticos de alça e diálise precoce nos casos de IRA oligúrica,
são as medidas iniciais que influenciam diretamente na evolução
clínica e prognóstico do paciente, reduzindo significativamente a
letalidade.

• Medidas preventivas: controle dos reservatórios, saneamento


ambiental, tratamento de animais contaminados, melhoria das
condições sanitárias, de moradia e de trabalho.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Ministério da Saúde.3
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, 45 anos, sexo masculino, gari,
previamente hígido, refere que há cerca de 8 dias teve início súbito de
febre, cefaleia, astenia, prostração, náuseas e mialgia mais acentuada
em panturrilhas, evoluindo com vômitos frequentes e icterícia. Refere
ainda tosse, dispneia e hemoptise, além de anúria há dois dias. Relata
contato físico com área alagada há cerca de 20 dias. Nega doenças
preexistentes, uso de medicamentos, alergias. Tabagista há 25 anos.
Etilista social.
b. Exame físico: mau estado geral, hipocorado, febril (38ºC),
ictérico (3 + /4 +), PA: 80 x 50 mmHg, FC: 110 bpm, FR: 40 irpm,
SatO2: 82% em ar ambiente. Ausculta respiratória: estertores
crepitantes em bases bilaterais. Abdome: fígado a 7 cm do rebordo
costal direito.
c. Exames complementares:

• Radiografia de tórax: infiltrado alveolar difuso bilateral.


• Gasometria arterial: PaO2 50 mmHg;
• Creatinina: 4,5 mg/dL; ureia: 200 mg/dL.
• Diante da suspeita clínica e sinais de gravidade, foi indicada
internação em unidade de terapia intensiva, realizada notificação
ao Sinan e iniciado tratamento específico.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta zero até segunda ordem.


2. Soro fisiológico 0,9% 500 mL IV em bolus.
3. Ceftriaxone 1 g IV 12/12 h.
4. Se PAM < 60 ou PA < 90 x 60 mmHg: iniciar Noradrenalina 4
ampolas + 234 mL de SG 5% IV em infusão contínua.
5. Dipirona 1 ampola IV 6/6 h se febre.
6. Oxigenoterapia sob ventilação mecânica.
7. Diálise.
8. Aferir diurese.
9. Fisioterapia respiratória.
10. Sinais vitais e cuidados gerais 2/2 h.
11. Exames específicos (sorológicos) para confirmação diagnóstica.

REFERÊNCIAS
1. HabibBernardi I. Leptospirose e saneamento básico. [Monografia - Especialização em Saúde
Pública]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2012.
2. Ministério da Saúde (BR). Doenças infecciosas e parasitárias: guia de bolso. 8. ed. Brasília:
Ministério da Saúde; 2010.
3. Ministério da Saúde (BR). Guia de vigilância em saúde. Volume único. Brasília: Ministério
da Saúde; 2016.
4. Ministério da Saúde. FUNASA (BR). Guia de Vigilância Epidemiológica. vol II.
Influenza/Varíola. 5. ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2002.
5. Ministério da Saúde (BR). Leptospirose: diagnóstico e manejo clínico. Brasília: Ministério da
Saúde; 2014.
6. Ministério da Saúde (BR). Roteiro para a capacitação de profissionais médicos no
diagnóstico e tratamento da leptospirose – guia de bolso. Brasília: Ministério da Saúde;
2014.
7. Goldman L, Ausiello D. Cecil: Medicina. 23. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009.
8. Longo DL, Kasper DL, Jameson JL, Hauser SL, Fauci AS, Loscalzo J. Medicina Interna de
Harrison. 18. ed. Porto Alegre: Artmed; 2013.
9. Lopes AC. Tratado de clínica médica. 3. ed. Rio de Janeiro: Roca; 2016.
10. Souza VMM, Brant JL, Arsky MLS, Araújo WN. Avaliação do sistema nacional de
vigilância eepidemiológica da leptospirose – Brasil, 2007. Cad Saúde Colet. 2010; 18(1): 95-
105.
4.7
LEISHMANIOSE TEGUMENTAR
AMERICANA
Autores:
Gabrielly Borges Machado
Ana Luiza Santos Pereira

DEFINIÇÕES
• Doença infecciosa, não contagiosa, causada por protozoários do
gênero Leishmania, que acomete pele e mucosas.

• Grande problema de saúde pública, predominando na América


Latina.

• Transmissão vetorial predominante em regiões periurbanas e


rurais.

• Doença de notificação compulsória, endêmica no Brasil.


ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

• Causada por protozoários da família Trypanosomatidae, gênero


Leishmania.

• As espécies dermatotrópicas mais comuns no Brasil são:


Leishmania brasilienzis,
L. guyanensis e L. amazonensis.
• A L. braziliensis é a principal espécie envolvida na LTA (cutânea
e mucosa).

• Apresenta duas formas principais: flagelada ou promastigota,


presente no tubo digestivo do mosquito vetor e aflagelada ou
amastigota, presente nos tecidos dos hospedeiros vertebrados.

• Reservatórios: animais silvestres, como roedores e marsupiais, e


animais domésticos, como os cães.

• Vetor: inseto flebotomíneo do gênero Lutzomyia, conhecido


como mosquito palha,
tatuquira, birigui, entre outros.

• Transmissão: ocorre através da picada da fêmea hematófaga do


mosquito vetor
infectada.

• Período de incubação: dois a três meses, ou até dois anos.


• Após a picada, o parasita é inoculado na pele, estimulando a
resposta imune celular
inata (macrófagos, células Natural Killer e linfócitos T helper) e
invade as células do sistema
fagocítico-mononuclear, multiplicando-se nestas e propagando a
infecção.

• O quando clínico depende da espécie envolvida e da resposta


imune do indivíduo:
resposta imune Th1 (mais predominante) elimina patógenos
intracelulares, sendo
responsável por infecção localizada ou subclínica (forma
clássica), com boa resposta
terapêutica e prognóstico favorável; resposta imune Th2 confere
proteção contra
patógenos extracelulares, levando ao agravamento das infecções
causadas por parasitas como a Leishmania.

• Sugere-se que a forma mucosa da doença é resultante de resposta


imune celular exacerbada no local de depósito de antígenos da
Leishmania, associada à incapacidade de promover uma
modulação adequada dessa resposta. A resposta terapêutica nesses
casos é ruim e as recidivas são frequentes.

• A L. amazonensis é a principal responsável pela leishmaniose


cutânea difusa.

QUADRO CLÍNICO
• Leishmaniose cutânea localizada (forma clássica): lesão
ulcerada, única ou em pequeno número, indolor, ovalada, com
bordas bem delimitadas e elevadas, base eritematosa e
infiltrada, fundo granuloso. Podem ocorrer linfadenopatia regional
e linfangite nodular.

• Leishmaniose cutânea disseminada: lesões múltiplas, tipo


papulares e de aparência
acneiforme, acometendo vários segmentos corporais,
principalmente face e tronco,
distantes do local da picada. Decorrente de disseminação
hematogênica ou linfática. Rara, associada à imunodepressão,
com resposta terapêutica variável.

• Leishmaniose cutânea difusa (LCD): placas infiltradas,


múltiplas nodulações não ulceradas, disseminadas, principalmente
em face, tronco e membros, deformidades nas extremidades. No
Brasil, é causada pela L. amazonensis, apresentando resposta
terapêutica pobre. É uma forma clínica rara, grave,
multiparasitária e de evolução lenta.
• Leishmaniose mucosa ou mucocutânea: lesões ulceradas,
destrutivas, eritematosas,
crostosas e indolores em mucosas das vias aéreas superiores. São
lesões metastáticas,
secundárias à lesão cutânea prévia, curada sem tratamento ou com
tratamento inadequado. A mucosa nasal é a mais acometida,
podendo ocorrer perfuração e destruição de septo nasal, com
deformidades.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exame parasitológico direto: pesquisa de amastigotas em
esfregaço da lesão ou
imprints de fragmento de tecidos do paciente. Primeira escolha para
confirmação
diagnóstica; porém, a probabilidade de encontrar o parasito é reduzida
com o tempo de evolução da lesão cutânea. Para coleta de amostra são
utilizadas as seguintes técnicas: escarificação, biópsia com impressão
por aposição e punção aspirativa.
b. Cultura para Leishmania: exame parasitológico que permite
identificar a espécie envolvida. Os fragmentos cutâneos da borda da
úlcera são inoculados em meios de cultivo. Deve ser mantida até um
mês para liberar resultado negativo.
c. Isolamento in vivo: exame parasitológico obtido pela
inoculação intradérmica de fragmentos processados da lesão em
hamsters. Pouco utilizado.
d. Teste intradérmico (Intradermorreação de Montenegro):
teste imunológico cutâneo que avalia a resposta imune celular prévia
contra a leishmania (hipersensibilidade celular retardada). Se positivo,
o teste pode indicar contato prévio, alergia ao diluente do teste ou
reação cruzada com outras doenças. Pode estar negativo em pacientes
fraco-reatores, imunossuprimidos ou início da infecção (4-6 semanas).
e. Testes sorológicos: ELISA (Ensaio Imunoenzimático) e
Imunofluorescência indireta (IFI), que detectam anticorpos
antileishmania (baixa sensibilidade).
f. Reação em cadeia da polimerase (PCR): teste molecular que
detecta o material genético do parasita em amostras de tecido
infectado. Altas sensibilidade e especificidade, principalmente se
associado a exames parasitológicos.
g. Exame histopatológico: visualização de formas amastigotas na
amostra.
h. Teste para HIV: indicado para todos os pacientes com LTA.

TRATAMENTO
As drogas leishmanicidas recomendadas para tratamento estão descritas
nas tabelas 1, 2, 3
e 4, a seguirem:
Apresentação: 81 mg Sb+/mL (cada frasco contém 5 mL)

Forma clínica Dose Via de administração Duração (dias)

Cutânea 15 mg Sb+/Kg/dia EV 20

Cutânea difusa e disseminada 20 mg Sb+/Kg/dia EV 30

Mucosa 20 mg Sb+/Kg/dia EV 30

Infusão: mínimo 30 minutos.


Dose máxima: 03 ampolas/dia.
Efeitos adversos: reação de hipersensibilidade, mialgia, artralgia, dores abdominais, irritabi¬lidade, hepatotoxicidade, cardiotoxicidade,
arritmias, pancreatite aguda, IRA.
Contraindicações: gestação, indivíduos acima de 50 anos, hepatopatias, nefropatias, cardio¬patias e hipersensibilidade ao antimonial
pentavalente.
Monitoramento durante tratamento: avaliação eletrocardiográfica e laboratorial (hemogra¬ma, função renal e hepática, transaminases,
amilase e lipase) semanal.
Uso intralesional (via subcutânea): apenas para leishmaniose cutânea localizada e leishmaniose recidiva cútis, uma a três aplicações de 5
mL por sessão, com intervalo entre as aplicações de 15 dias.

Tabela 1. Antimoniato de N-Metilglucamina (Glucantime®).


Fonte : Manual de vigilância da leishmaniose tegumentar – Brasília:
Ministério da Saúde, 2017.

Apresentação: 50 mg/ampola (dosoxicolato sódico liofilizado de anfotericina B)

Forma clínica Dose Via de administração Duração (dose total acumulada)


Apresentação: 50 mg/ampola (dosoxicolato sódico liofilizado de anfotericina B)

Forma clínica Dose Via de administração Duração (dose total acumulada)

Cutânea 1 mg/Kg/dia EV 1-1,5 g

Mucosa 1 mg/Kg/dia EV 2,5-3 g

Diluição: reconstituir o pó em 10 mL de água destilada para injeção. Para cada 1 mL da solução inicial
(reconstituída), adicionar 50 mL de soro glicosado a 5%.
Dose máxima diária: 50 mg/dia. Dose total acumulada: 25 a 40 mg/kg.
Infusão: 4 a 6 horas.
Efeitos adversos: reação de hipersensibilidade, febre, calafrios, cefaleia, náuseas, vômitos, hipocalemia,
insuficiência renal, hepatotoxicidade, anemia, flebite.
Contraindicações: insuficiência renal, hipersensibilidade à anfotericina B.
Monitoramento durante o tratamento: avaliação clínica e laboratorial (hemograma, função renal e hepática e eletrólitos) diária.

Tabela 2. Anfotericina B Desoxicolato.


Fonte : Manual de vigilância da leishmaniose tegumentar – Brasília:
Ministério da Saúde, 2017.

Apresentação: 50 mg/ampola (anfotericina B encapsulada)

Forma clínica Dose Via de administração Duração (dose total acumulada)

Cutânea 4 mg/Kg/dia EV 1-1,5 g

Mucosa 1-4 mg/Kg/dia EV 3g

Diluição: reconstituir o pó em 12 mL de água destilada para injeção. Diluir cada 1 mL do frasco reconstituído (4 mg) em 1 a 19 mL de soro
glicosado 5%.
Dose total acumulada: 25 a 40 mg/kg (sem limite de dose máxima diária).
Infusão: 30 a 60 minutos.
Eventos adversos: febre, calafrios, dor no peito, taquicardia, hipotensão, mialgia, dor lombar. Suspender a
amamentação durante o tratamento.
Contraindicação: hipersensibilidade à substância ativa.
Monitoramento durante tratamento: avaliação clínica e laboratorial (hemograma, ele¬trólitos, função renal e
hepática) diárias.

Tabela 3. Anfotericina B Lipossomal.


Fonte : Manual de vigilância da leishmaniose tegumentar – Brasília:
Ministério da Saúde, 2017.

Apresentação: 300 mg/ampola (pó lifiolizado)


Forma clínica Apresentação: 300
Dose Viamg/ampola (pó lifiolizado)Duração (dose acumulada)
de administração

Forma clínica Dose Via de administração Duração (dose acumulada)

4 mg/Kg/dia, em dias
Cutânea IM ou EV 3 a 10 aplicações
alternados

4 mg/Kg/dia, em dias
Mucosa IM ou EV 10 aplicações
alternados

Indicações: forma cutânea localizada causada por Leishmania guyanensis e forma cutânea difusa.
Infusão: lenta em 60 minutos.
Dose total acumulada: 2 g.
Eventos adversos: hipoglicemia, diabetes mellitus tardio (toxicidade sobre as células beta-pancreáticas),
pancreatite, arritmias e reações locais.
Contraindicações: diabetes mellitus, intolerância a glicose, gestação, lactação, insuficiência renal e hepática,
doenças cardíacas.
Monitoramento durante tratamento: função renal e pancreática, glicemia e eletrocardiograma semanalmente.

Tabela 4. Isotionato de pentamidina


Fonte : Manual de vigilância da leishmaniose tegumentar – Brasília:
Ministério da Saúde, 2017.

a. Pentoxifilina:

• Indicada na LM como adjuvante em associação ao Antimoniato


de meglumina.

• Dose: 400 mg, via oral, três vezes ao dia após as refeições, por 30
dias.

• Contraindicações: menores de 12 anos, gestação, lactação,


coinfecção pelo HIV, alergia, imunodeprimidos, insuficiência
renal, hepática ou cardíaca.

b. Acompanhamento pós-tratamento: mensal nos primeiros três


meses, e após, a cada dois meses durante 12 meses, devido ao risco de
recidivas.
c. CRITÉRIOS DE CURA: regressão das manifestações clínicas
apresentadas, com a epitelização das lesões ulceradas.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente, sexo masculino, branco, 26 anos, natural
e procedente de Paracatu – MG, solteiro, estudante, procura
atendimento médico referindo surgimento de lesões cutâneas indolores
em membro inferior direito e antebraço esquerdo há cerca de dois
meses. Nega doenças de base, uso de medicamentos, alergias,
tabagismo e etilismo.
b. Exames físicos:

• Dado antropométrico: 70 Kg.


• Pele e fâneros: presença de duas lesões ulceradas, ovaladas, com
bordas elevadas e infiltradas, base eritematosa, com granulação
grosseira, fundo avermelhado sendo recoberto por exsudato
seropurulento, com aproximadamente 4 cm de diâmetro cada.
c. Exames complementares: hemáceas 6,37 milhões;
hemoglobina 13,2 mg/dL; hematócrito 44%; leucócitos 10.000/mm³;
plaquetas 342.000/mm³; glicose: 80 mg/dL; ureia: 39 mg/dL;
creatinina: 1,03 mg/dL; TGO: 28 U/L; TGP 21 U/L; amilase 80 U/L;
lipase: 50 U/L. ECG: sem alterações.
• Exame parasitológico direto: presença de amastigotas em
esfregaço da lesão.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Glucantime® 03 ampolas em 100 mL de soro glicosado 5% via
EV 24/24 horas, durante 20 dias (infundir em 30 minutos).
3. Dipirona 500 mg via oral 6/6 horas se dor ou febre.
4. ECG e exames laboratoriais semanais até o término do
tratamento.
5. Notificação ao Sinan.

REFERÊNCIAS
1. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância em Saúde: volume 3. 1. ed. atual. Brasília:
Ministério da Saúde; 2017.
2. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde;
2016.
3. Ministério da Saúde (BR). Manual de vigilância da leishmaniose tegumentar. Brasília:
Ministério da Saúde; 2017..
4. Ministério da Saúde (BR). Manual de Vigilância da Leishmaniose Tegumentar Americana.
2. ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2007.
4.8
LEISHMANIOSE VISCERAL
Autora:
Gabrielly Borges Machado

DEFINIÇÕES
• A leishmaniose visceral é uma doença sistêmica, crônica, de
evolução insidiosa, potencialmente grave e fatal se não tratada.

• É ainda considerada um problema de saúde pública,


principalmente em países menos desenvolvidos, e doença de
notificação compulsória, sendo necessária a vigilância
entomológica, de casos humanos e de casos caninos.

• Acomete ambos os sexos, sendo o masculino mais afetado.


• É mais frequente em menores de 10 anos.
• Nos últimos anos, houve a urbanização da doença.
• As manifestações clínicas são variadas, desde quadros
assintomáticos e oligossintomáticos até quadros graves da doença
(Calazar), de acordo com a resposta imune do indivíduo.

ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO
• A LV é causada por protozoários tripanossomatídeos do gênero
Leishmania.
• No Brasil, a Leishmania (Leishmania) infantum é a principal
espécie envolvida.

• É um parasita intracelular obrigatório das células do sistema


fagocítico mononuclear.

• Forma flagelada ou promastigota: encontrada no tubo digestivo


do inseto vetor.

• Forma aflagelada ou amastigota: presente nos tecidos dos


vertebrados.

• Na área urbana, o cão é a principal fonte de infecção.


• No ambiente silvestre, os reservatórios são as raposas e os
marsupiais.

• Vetor transmissor: fêmeas de flebotomíneos hematófagos do


gênero Lutzomyia.

• No Brasil, a principal espécie do vetor envolvida: Lutzomyia


longipalpis.

• Período de incubação (variável): 10 dias a 4 meses, em média.


QUADRO CLÍNICO
• Os indivíduos podem apresentar um quadro assintomático,
oligossintomático ou a doença clássica (Calazar).

• Em área endêmica, alguns indivíduos, normalmente crianças,


podem apresentar a forma oligossintomática, com sintomas
discretos, de curta duração, com evolução para cura espontânea.
• A doença clássica é dividida em período inicial, período de
estado e período final.

a. Período inicial:

• Corresponde à fase aguda (primeiras 4 semanas).


• Inclui febre, palidez cutaneomucosa, perda ponderal, prostração,
hiporexia, adinamia e hepatoesplenomegalia.

b. Período de estado:

• Febre irregular associada a emagrecimento progressivo, palidez


cutaneomucosa, aumento da hepatoesplenomegalia e
comprometimento do estado geral.

• O quadro clínico é arrastado com mais de 2 meses de evolução.


c. Período final:

• Febre contínua e com o estado geral comprometido mais


intensamente.

• A desnutrição é marcada por cabelos quebradiços, cílios


alongados e pele seca, além de edema dos membros inferiores que
pode evoluir para anasarca.

• Outras manifestações: he¬morragias (epistaxe, gengivorragia e


petéquias), icterícia e ascite.

• Complicações: infecções bacterianas secundárias que são as mais


frequentes (pneumonia, otite média aguda, piodermites) e
fenômenos hemorrágicos, secundários à coagulopatia de consumo
e disfunção hepática (epistaxe, gengivorragia), podendo evoluir
com gravidade e óbito.

• Fatores de pior prognóstico: idade superior a 40 anos, presença de


sangramentos, imunossupressão, edema, icterícia, dispneia,
infecção bacteriana concomitante, insuficiência renal, leucopenia
e/ou plaquetopenia graves.

DIAGNÓSTICO
• Clínico-epidemiológico.
• Exames complementares:
• Teste rápido: detecção de anticorpos contra o antígeno rK39;
• ELISA;
• Imunofluorescência indireta (IFI): reagente - títulos de
anticorpos a partir da diluição 1:80;

• Exame parasitológico direto: presença de amastigotas nos


tecidos do hospedeiro (medula óssea, baço ou fígado);

• Isolamento do parasito em meios de cultura específicos;


• Reação da Cadeia da Polimerase (PCR): amplificação do DNA
do parasita.

• Diagnósticos diferenciais: malária, brucelose, febre tifoide,


esquistossomose hepatoesplênica, linfoma, mieloma múltiplo,
anemia falciforme, leucemia, dengue, paracoccidioidomicose,
histoplasmose disseminada, dentre outras causas de febre de
origem indeterminada.

TRATAMENTO E PREVENÇÃO
• Droga de escolha: Antimonial pentavalente.
• Alternativas: Anfotericina B Desoxicolato e Lipossomal.
• Antimonial Pentavalente (GLUCANTIME®):
Droga de escolha nas Leishmanioses.

Dose recomendada: 20 mg de Sb+5/kg/dia, EV ou IM, por 30


dias (máximo de 3 ampolas/dia).

Necessário acompanhamento clínico, laboratorial e


eletrocardiográfico: hemograma, ureia, creatinina, AST, ALT,
função hepática e eletrocardiograma.

Reações adversas: mialgia, artralgia, arritmias cardíacas,


reações de hipersensibilidade, nefrotoxicidade,
hepatotoxicidade, pancreatite aguda.

Contraindicações: arritmias, doença de Chagas, > 50 anos, LV


grave, gestação < 6 meses, imunossupressão, coinfecção
LV/HIV, nefropatia, hepatopatia.

• Anfotericina B Desoxicolato:
Dose recomendada: 1 mg/kg/dia (máximo de 3 g de dose
total). Deve ser reconstituída em 10 mL de água destilada; essa
solução deverá ser diluída em soro glicosado a 5% na proporção
de 1 mg para 10 mL.

Administrá-la por via endovenosa em infusão lenta de 4-6


horas.

Dose máxima diária: 50 mg/dia.

Indicação: nos casos com contraindicação ao Antimonial


pentavalente e indisponibilidade da Anfotericina B Lipossomal.

Reações adversas: nefrotoxicidade, mielotoxicidade,


hepatotoxicidade, reações de hipersensibilidade, flebite, febre,
cefaleia.

• Anfotericina B Lipossomal:
Droga alternativa ao Antimonial pentavalente preferencial
(menor toxicidade).

Dose recomendada: 3 mg/kg/dia, durante 7 dias OU 4


mg/kg/dia, durante 5 dias em infusão endovenosa lenta (1 hora),
em dose única diária.

Indicações: LV grave, > 50 anos, insuficiência renal, cardíaca


ou hepática, arritmias, doença de Chagas, DM, transplantados,
gestantes, coinfecção Leishmania/HIV e refratariedade ao uso
do Antimonial pentavalente.

a. CRITÉRIOS DE CURA:

• Clínicos: desaparecimento da febre, redução da


hepatoesplenomegalia, normalização dos parâmetros
hematológicos, ganho ponderal, decorrente do retorno do apetite e
melhora do estado geral.

• Recomenda-se reavaliação do paciente tratado aos 3, 6 e 12


meses após o tratamento, devido à ocorrência de recidivas. E na
última avaliação, se permanecer estável, o paciente é considerado
curado.

• A realização de métodos sorológicos não é útil no seguimento do


paciente, pois se negativam tardiamente, ou podem permanecer
positivos sem associação com recidiva da doença.

b. MEDIDAS DE PREVENÇÃO E CONTROLE:

• Proteção individual: uso de mosquiteiros com malha fina,


repelentes, não se expor nos horários de maior atividade do vetor
(crepúsculo e noite) nas áreas endêmicas.

• Combate ao mosquito vetor: saneamento ambiental.


• Controle da população canina: manejo de cães em situação de
rua.

• O tratamento de animais doentes não é uma medida aceita pelo


Ministério da Saúde (MS) para o controle, pois eles continuam
como fontes de infecção para o vetor, e, portanto, um risco para
saúde da população humana e canina.

• A eutanásia é recomendada para cães sororreagentes, como uma


das formas de controle, mas deve ser realizada de forma integrada
às demais ações recomendadas pelo MS.

• Vacina canina: registrada no Ministério da Agricultura, Pecuária e


Abastecimento, todavia não há constatação do seu custo-
benefício, nem da efetividade para controle de reservatório da LV
canina em programas de saúde pública; o seu uso está restrito à
proteção individual dos cães, e não como uma ferramenta de
saúde pública.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente, 20 anos de idade, sexo feminino, negra,
natural e procedente de Porteirinha-MG, reside em área urbana da
cidade. Deu entrada no setor de emergência do hospital apresentando
febre de 39ºC persistente há 1 mês, sem outras queixas.
b. Exame físico: regular estado geral, prostrada, hipocorada 3 + /4,
hidratada. Sinais vitais: FR: 28 irpm, FC: 136 bpm, Tax: 38,3ºC.
Abdome globoso, ruídos hidroaéreos positivos, indolor à palpação
superficial e profunda, à palpação macicez difusa, esplenomegalia a 8
cm do rebordo costal esquerdo, sem sinal de irritação peritoneal,
hepatomegalia a 6 cm do rebordo costal direito.

• Procedeu-se a internação da paciente para investigação


diagnóstica.
c. Exames complementares: teste rápido para LV,
eletrocardiograma e exames laboratoriais. O teste rápido confirmou a
hipótese diagnóstica de Leishmaniose Visceral; eletrocardiograma sem
alterações e os exames laboratoriais evidenciaram: hemácias: 4,6
milhões, hemoglobina: 9,4 g/dL, hematócrito: 29%, leucócitos globais:
2.100 mm³, plaquetas 120.000 mm³, ureia: 19 mg/dL, creatinina: 0,8
mg/dL, bilirrubina total: 0,6 mg/dL, bilirrubina indireta: 0,2 mg/dL,
bilirrubina direta: 0,4 mg/dL, amilase: 120 mg/dL, TGO: 29 U/mL,
TGP: 18 U/mL, proteínas totais: 6,0, Albumina: 2,0 mg/dL, Globulina:
4,0 mg/dL.

• Iniciado Antimonial pentavalente na dose de 20 mg/kg/dia EV


por 30 dias.
• Paciente evoluiu com melhora do estado geral, após início do
tratamento, mantendo-se afebril, com redução da
hepatoesplenomegalia e melhora laboratorial.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Drogas Leishmanicidas (opções):

• Glucantime: 20 mg Sb+5/kg/dia por via endovenosa ou


intramuscular, uma vez ao dia, durante 30 dias (paciente 70 kg: 3
ampolas de Glucantime + SF 0,9% 100 mL, correr EV em 30
minutos).

• Anfotericina B Desoxicolato: 1 mg/kg/dia por infusão venosa


durante 14 a 21 dias (pa¬ciente de 70 kg: Anfotericina B
Desoxicolato 50 mg + SG 5% 500 mL via EV, uma vez ao dia,
correr em 4h).

• Anfotericina B Lipossomal: 3 mg/kg/dia, durante 7 dias ou 4


mg/kg/dia, durante 5 dias em infusão venosa lenta, uma vez ao dia
(paciente de 70 kg: Anfotericina B lipossomal 4 ampolas + SG
5% 500 mL, via EV, correr em 1h).
3. Dipirona 01 ampola + ABD, EV, 6/6 h se febre ou dor.
4. Sinais Vitais e cuidados gerais 4/4 horas.
5. Notificação ao Sinan.

REFERÊNCIAS
1. Alvar J, Vélez ID, Bern C, Herrero M, Desjeux P, Cano J, et al. Leishmaniasis Worldwide
And Global Estimates Of Its Incidence. Plos One. 2012; 7(5): E35671.
2. Araujo AC, Gonçalves NNVM, Dantas-Torres F, Ferreira F, Horta MC. Visceral
Leishmaniasis In Petrolina, State Of Pernambuco, Brazil, 2007-2013. Rev Inst Med Trop
São Paulo. 2016; 58: 29.
3. Aronson N, Herwaldt BL, Libman M, Pearson R, Lopez-Velez R, Weina P, et al. Diagnosis
And Treatment Of Leishmaniasis: Clinical Practice Guidelines By The Infectious Diseases
Society Of America (Idsa) And The American Society Of Tropical Medicine And Hygiene
(ASTMH). Am J Trop Med Hyg. 2017; 96(1): 24-45.
4. Botelho ACA; Natal D. First Epidemiological Description Of Visceral Leishmaniasis In
Campo Grande, State Of Mato Grosso do Sul. Revi Soc Bras Med Trop. 2009; 42(5): 503-
8.
5. Ministério da Saúde (BR). Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: Ministério da Saúde;
2009.
6. Ministério da Saúde (BR). Manual de vigilância e controle da Leishmaniose visceral.
Brasília: Ministério da Saúde; 2006.
7. Ministério da Saúde (BR). Doenças infecciosas e parasitárias: guia de bolso. Brasília:
Ministério da Saúde; 2010.
8. Fu Q, Li S, Wu W, Hou Y, Zhang S, Feng Y, et al. Endemic Characteristics Of Infantile
Visceral Leishmaniasis In The People’s Republic Of Chi¬na. Parasites & Vectors, 2013;
6(1): 143.
9. Maciel DB, Silva TA, Gomes LI, de Oliveira E, Tibúrcio MG, de Oliveira RF, et al.
Infection With Leishmania (Leishmania) Infantum Of 0 To 18-month-old Children Living
In A Visceral Leishmaniasis-endemic Area In Brazil. Am J Trop Med Hyg. 2014; 91(2):
329-35.
10. Marzochi MCA. Visceral Leishmaniasis In Southern Rio de Janeiro State And The Risk Of
Propagation To São Paulo State, Brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2016; 49(2): 147-9.
11. Monge-Maillo B, Norman FF, Cruz I, Alvar J, López-Vélez R. Visceral Leishmaniasis And
Hiv Coinfection In The Mediterranean Region. Plos Negl Trop Dis. 2014; 8(8): E3021.
12. Van Griensven J, Zijlstra EE, Hailu A. Visceral Leishmaniasis And Hiv Coinfection: Time
For Concerted Action. Plos Negl Trop Dis. 2014; 8(8): E3023.
13. WHO Expert Committee on the Control of the Leishmaniases, World Health Organization.
Control Of The Leishmaniases: Report Of A Meeting Of The Who Expert Committee On
The Control Of Leishmaniases. In: WHO. Control Of The Leishmaniases: Report Of A
Meeting Of The Who Expert Committee On The Control Of Leishmaniases. Genebra:
World Health Organization; 2010.
4.9
MENINGITE
Autora:
Gabrielly Borges Machado

DEFINIÇÕES
• Processo inflamatório/infeccioso que acomete as meninges.
• As etiologias são diversas, podendo ser causada por bactérias,
vírus, e, mais raramente, fungos e parasitas (protozoários e
helmintos).

• A doença meningocócica causada pela Neisseria meningitidis


(meningococo) e os vírus são os principais responsáveis por surtos
e epidemias.

• Todos os casos suspeitos de meningite devem ser notificados e


investigados.

• Meningococo: principal responsável por epidemias no Brasil e


possui vários sorogrupos, sendo o sorogrupo C o mais prevalente.

• Meningite meningocócica: pode ocorrer de forma isolada ou


associada à meningococcemia, resultando em vasculite sistêmica e
fenômenos hemorrágicos fulminantes, com alta letalidade.

• Meningites virais: evolução benigna, baixa letalidade e menor


risco de sequelas. Frequentemente associadas à ocorrência de
surtos, podendo ocorrer casos isolados. Em geral, cursa com bom
prognóstico e a recuperação do paciente é completa. Tende a ser
autolimitada, e a duração do quadro é geralmente inferior a uma
semana.

• Meningite criptocócica: caráter predominantemente oportunista,


acometendo imunossuprimidos (Aids ou outras condições de
imunossupressão); cursa com comprometimento neurológico
importante, apresentando evolução grave; associa-se a elevado
risco de complicações (hipertensão intracraniana, paralisia
permanente de nervos cranianos, déficit cognitivo e hidrocefalia).

ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO
a. Bacteriana:

• Neisseria meningitidis.
• Streptococcus pneumoniae.
• Haemophilus influenzae.
• Outros: Mycobacterium tuberculosis, Listeria monocytogenes,
Staphylococcus aureus.

b. Viral:

• RNA vírus: Enterovírus, Arbovírus, Vírus da caxumba,


Arenavírus (coriomeningite linfocitária), HIV, Vírus do sarampo.

• DNA vírus: Adenovirus, Vírus herpes simples tipo 1 e 2,


Varicela-zoster, Epstein-Barr, Citomegalovírus.

c. Fúngica: Cryptococcus neoformans, Cryptococcus gattii.


d. Transmissão: através do contato com secreções respiratórias
(inalação de gotículas respiratórias).

e. Período de incubação: em geral, 2 a 10 dias.

f. Período de transmissibilidade: desde o início dos sintomas até


24 horas após o início da antibioticoterapia (nas etiologias
bacterianas).

QUADRO CLÍNICO
• Febre de início súbito, cefaleia, prostração, náuseas, vômitos,
hiporexia, mialgia, agitação, fotofobia.

• Exame físico:
Rigidez de nuca;

Sinais de irritação meníngea: Sinal de Kernig e Sinal de


Brudzinski.

• Sinais de gravidade: piora da cefaleia, rebaixamento do nível de


consciência, torpor, convulsões, déficit neurológico focal,
confusão mental, transtornos pupilares, turvação visual, paralisias
de nervos cranianos, bradicardia, nistagmo, papiledema.

• Meningococcemia: palidez, sinais de toxemia, exantema e/ou


petéquias, sufusões hemorrágicas, hipotensão, rebaixamento do
sensório, associados ou não a quadro de meningite (risco de
evolução para choque, CIVD e óbito).

• Meningite viral: manifestações gastrointestinais, respiratórias


(tosse, faringite) e erupção cutânea.
• Meningite criptocócica: deve ser sempre considerada em
pacientes com Aids que apresentam cefaleia, febre, confusão
mental, alteração do sensório e convulsão.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Cultura (padrão-ouro) – líquido cefalorraquidiano (LCR),
sangue, raspado de lesões petequiais ou fezes.
b. Reação em cadeia da polimerase (PCR) – LCR, soro, sangue
total.
c. Aglutinação pelo látex – LCR e soro.
d. Contraimunoeletroforese (CIE) – LCR e soro.

• Bacterioscopia direta (método de Gram) no LCR (diplococos


gram-negativos: Neisseria meningitidis; cocos gram-positivos:
Streptococccus pneumoniae).

• Exame quimiocitológico do líquor.


• Sorologia (pesquisa de anticorpos IgG e IgM) – pesquisar
etiologia viral.

• Exame micológico direto com preparação da tinta da China


no LCR.

• Punção lombar (se não houver contraindicação para tal


procedimento) e coleta de sangue para cultura: antes do início
da antibioticoterapia.

• Exames de imagem (TC ou RNM de crânio): presença de


sinais de gravidade para avaliar complicações, como hipertensão
intracraniana e em imunossuprimidos.
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
• A análise laboratorial do líquor é uma importante ferramenta
diagnóstica de patologias neurológicas. Os achados encontrados
no LCR permitem o diagnóstico e indicam a etiologia envolvida
(ver tabela 1).
MENINGITE Meningite Meningite
LCR Referência
BACTERIANA viral fúngica/tuberculosa

Aspecto Turvo Límpido Límpido ou turvo Límpido

Branca-leitosa ou
Cor ligeiramente Incolor Incolor ou xantocrômica Incolor, cristalino
xantocrômica

Cloretos Reduzidos Normal Normal ou reduzidos 680 – 750 mEq/L

Glicose Reduzida Normal Reduzida 2/3 da glicemia

Aumentadas Discretamente Aumentadas


Proteínas totais 15 a 50mg/dL
(>100 mg/dL) aumentadas (>100mg/dL)

200 a milhares Acima de


Leucócitos
(neutrófilos)
5 a 500 (linfócitos)
10 céls/mm³ (linfócitos) 0 a 4 céls/mm3

Tabela 1. Alterações encontradas no LCR de acordo com a etiologia.


Fonte: Ministério da Saúde.3

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
• Hospitalização dos casos suspeitos.
• Precaução respiratória para gotículas durante as primeiras 24
horas de antibioticoterapia.

• Coleta de amostras para exames diagnósticos.


• Antibioticoterapia empírica conforme a suspeita clínica, logo
após a punção lombar e a coleta de sangue para hemocultura.

• A antibioticoterapia imediata não impede a coleta de material


para exames diagnósticos.

• Notificação do caso à Secretaria Municipal de Saúde.


• Ajuste da antibioticoterapia de acordo com resultados do teste de
sensibilidade (ver tabela 2).

• Investigação epidemiológica de todos os casos notificados e


quimioprofilaxia dos contatos quando houver indicação
(meningite meningocócica e por H. influenza).

a. MENINGITE BACTERIANA
Agente Intervalo Duração Via de
Antibiótico Dose
etiológico (horas) (dias) administração

Neisseria meningitidis 7 a 10

Streptococcus pneumoniae 10 a 14
Ceftriaxone 12 em 12
2g Endovenosa
Haemophilus influenzae 7 a 10

Enterobactérias 10 a 14

Pseudomonas Meropenem 14 a 21

Ampicilina
200 a 400
Listeria monocytogenes + 4a6 21 Endovenosa
mg/kg/dia
Ceftriaxone

MSSA (Staphylococcus
Oxacilina 2g 4 em 4 21 Endovenosa
aureus meticilina sensível)

MRSA (Staphylococcus Vancomicina 1g 12 em 12 21 Endovenosa


aureus meticilina
resistente)
Tabela 2. Antibioticoterapia de acordo com a etiologia.
Fonte: Ministério da Saúde.3

• Uso de corticosteroides (Dexametasona):


Eficaz em crianças com meningite por H. influenzae,
reduzindo o risco de perda auditiva.

Meningite por S. pneumoniae: o uso não é consensual, mas


pode ser considerado. Alguns estudos demonstraram redução na
mortalidade e sequelas.

Situações de choque: é discutível, há controvérsias a respeito


da influência favorável ao prognóstico.

Dose recomendada: 0,4 a 0,6 mg/kg/dia EV, 12/12 ou 8/8


horas, 2 dias.
b. MENINGITE VIRAL

• Não há indicação de tratamento antiviral específico.


• Recomenda-se tratamento de suporte, com sintomáticos,
avaliação criteriosa e acompanhamento clínico.

• Tratamento antiviral específico somente nos casos de meningite


herpética com Aciclovir endovenoso.

c. MENINGITE FÚNGICA

• O tratamento contempla as drogas antifúngicas descritas na tabela


a seguir (tabela 3):
IMUNOCOMPETENTE Indução: Anfotericina B: 1 mg/kg/dia endovenosa + 5-Flucitosina:
100 mg/kg/dia via oral, de 6 em 6h, por 14 dias.
Consolidação: Fluconazol: 400 mg/dia via oral por 6 a 10 semanas ou Anfotericina B:
3 a 6 mg/kg/dia, endovenosa, por 6 a 10 semanas.

Indução: Anfotericina B: 1 mg/kg/dia endovenosa + 5-Flucitosina:


100 mg/kg/dia via oral, de 6 em 6h, por 14 dias.
IMUNODEPRIMIDO
Consolidação: Fluconazol: 400 mg/dia via oral por 10 semanas.
Manutenção: Fluconazol: 200 a 400 mg/dia via oral por 12 a 24 meses.

Tabela 3. Tratamento da meningite criptocócica


Fonte: Ministério da Saúde.3

d. QUIMIOPROFILAXIA

• Está indicada somente para os contatos próximos de casos de


meningite por H. influenzae e doença meningocócica.

• Contato próximo: moradores do mesmo domicílio, indivíduos


que compartilham o mesmo dormitório (em alojamentos, quartéis,
entre outros), parceiro, comunicantes de creches e escolas,
pessoas diretamente expostas às secreções do paciente, indivíduo
que conviveu com o doente por quatro ou mais horas diárias, por
pelo menos cinco dos sete dias que antecederam a admissão
hospitalar do caso.

• Droga de escolha: Rifampicina, idealmente, até 48 horas da


exposição, até 10 dias no caso de doença meningocócica ou até 30
dias no caso do Haemophilus influenza.

• Todos os contatos devem ser monitorados durante 10 dias.


• Indicações:
Todos os contatos próximos de um caso de meningite
meningocócica e por H. influenzae, independentemente do
estado vacinal.
Profilaxia para o profissional de saúde: indicada somente
para casos com exposição às secreções respiratórias e vômitos
do doente, durante procedimentos invasivos como intubação
orotraqueal, ou quando permaneceram no mesmo ambiente que
o doente por um período superior a quatro horas, sem utilização
de equipamentos de proteção individual (EPI).

• Neisseria meningitidis: Rifampicina 600 mg/dose 12/12 horas


por 2 dias.

• Haemophilus influenzae: Rifampicina 600 mg/dose 24/24 horas


por 4 dias.

• Alternativas: Ceftriaxona 250 mg intramuscular dose única ou


Ciprofloxacina 500 mg oral dose única.

e. VACINAÇÃO

• Principal medida preventiva.


• Vacina meningocócica C (conjugada): crianças < 5 anos.
• Vacina meningocócica conjugada quadrivalente (ACWY):
protege contra quatro sorotipos de meningococo (A, C, W e Y),
para crianças a partir de 2 meses e adolescentes de 11 e 12 anos de
idade.

• Vacina conjugada Pentavalente: protege contra meningite e


outras infecções causadas pelo H. influenzae tipo b.

• Vacinas pneumocócicas conjugadas:


Crianças a partir de 2 meses e menores de 6 anos de idade:
vacina pneumocócica conjugada 10-valente (VPC10) ou vacina
pneumocócica conjugada 13-valente (VPC13).

Crianças com mais de 6 anos, adolescentes e adultos


portadores de certas doenças crônicas (anemia falciforme,
esplenectomizados, portadores de síndrome nefrótica, doença
de Hodgkin, doenças cardiopulmonares, renais ou hepáticas):
VPC13 e Vacina pneumocócica polissacarídica 23-valente
(VPP23).

> 60 anos: VPP23.

• Vacina BCG: protege contra as formas graves de tuberculose


(miliar e meníngea).

f. VACINAÇÃO DE BLOQUEIO

• Indicada para população exposta, quando há a confirmação de um


surto de doença meningocócica causada pelo sorogrupo C
(ocorrência de três ou mais casos confirmados laboratorialmente,
na mesma área geográfica, que não sejam comunicantes entre si).

• Vacina meningocócica C (conjugada): interrompe a cadeia de


transmissão do meningococo na comunidade.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, sexo masculino, 23 anos, refere febre
não aferida há três dias, associada à cefaleia holocraniana intensa,
náuseas, vômitos, astenia e prostração. Refere piora do quadro há um
dia. Nega demais queixas. Nega doenças preexistentes, alergias e uso
de medicamentos. Nega tabagismo, etilismo e uso de drogas ilícitas.
b. Exame físico: REG, consciente, orientado, hipocorado,
hidratado, febril (38,5º C), FC: 110 bpm, PA: 110/70 mmHg. Ausculta
pulmonar sem alterações, FR: 36 irpm. Presença de rigidez de nuca.
Sinais meníngeos presentes. Pupilas isocóricas e fotorreagentes,
ausência de déficits motores. Realizada punção lombar.
c. Exames complementares: Análise do LCR: aspecto turvo,
proteínas 120 mg/dL; glicose 35 mg/dL; leucócitos 500/mm3
(linfócitos 28%; monócitos 2% e neutrófilos 70%).

• Bacterioscopia: diplococos gram-negativos.


d. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Ceftriaxona 2 g - IV 12/12 horas.
3. Dipirona 500 mg - 1 ampola IV 6/6 h, se dor ou febre.
4. Metoclopramida 10 mg - 1 ampola IV 8/8 h, se náuseas ou
vômitos.
5. Omeprazol 40 mg - IV ao dia.
6. Sinais vitais e cuidados gerais 2/2 horas.
7. Precaução respiratória para gotículas.
8. Notificação no SINAM.
9. Profilaxia dos contatos íntimos.

REFERÊNCIAS
1. Lopes AC. Clínica médica: diagnóstico e tratamento. São Paulo: Atheneu; 2013.
2. Minas Gerais. Secretaria de Estado da Saúde: Protocolo de Vigilância Epidemiológica de
Meningites. Minas Gerais: Secretaria de Estado da Saúde; 2013.
3. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde;
2016.
4. Ministério da Saúde (BR). Doenças infecciosas e parasitárias: guia de bolso. 8. ed. Brasília:
Ministério da Saúde; 2010.
5. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância Epidemiológica. 7. ed. Brasília: Ministério da
Saúde; 2010.
6. Ministério da Saúde (BR). Meningite – vacinação. Brasília: Ministério da Saúde; 2014.
7. Secretaria de Estado de São Paulo - Divisão de Doenças de Transmissão Respiratória, do
Centro de Vigilância Epidemiológica “Prof. Alexandre Vranjac”, Coordenadoria de
Controle de Doenças, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e Instituto Adolfo
Lutz (Laboratório de Vírus Entéricos). Meningites Virais. Rev Saúde Pública. 2006; 40(1):
65-70.
4.10
HANSENÍASE
Autores:
Isaias Nery Ferreira
Gabrielly Borges Machado

INTRODUÇÃO
A doença hansênica tem evolução lenta e se manifesta, essencialmente,
através de sinais e sintomas dermatoneurológicos, como as lesões de pele e
de nervos periféricos, acometendo principalmente olhos, mãos e pés nos
quais o paciente apresenta um ou mais dos seguintes sinais cardinais:
(ALVES, 2014; BRASIL, 2016).

• Lesão(ões) e/ou área(s) da pele com alteração da sensibilidade


térmica e/ou dolorosa e/ou tátil; ou espessamento de nervo
periférico, associado a alterações sensitivas e/ou motoras e/ou
autonômicas; ou detecção de bacilos M. leprae, confirmada na
baciloscopia de esfregaço intradérmico ou na biópsia de pele.
O diagnóstico é essencialmente clínico e epidemiológico, por meio de
uma boa anamnese. Ocorre, portanto, a realização de exame geral e
dermatoneurológico, que identifica lesões ou páreas de pele com alteração de
sensibilidade e/ou comprometimento de nervos periféricos, com alterações
sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas. (ALVES, 2014; BRASIL, 2016).

CLASSIFICAÇÕES
1. Classificação clínica e operacional
Forma Classificação
Clínica Baciloscopia
clínica operacional
Forma Classificação
Clínica Baciloscopia
clínica operacional

Áreas de hipoestesias, anestesia e/ou parestesia,


manchas hipocrômicas e/ou eritêmato-
Paucibacilar
hipocrômicas, com ou sem diminuição da Indeterminada –
PB
sudorese e rarefação
de pêlos.

Placas eritematosas de limites externos nítidos


Paucibacilar
e/ou marginados com microtubérculos, com ou Tuberculóide -
PB
sem descamação.

Eritemas e infiltração difusas, placas


eritematosas-infiltradas, de bordas difusas, Multibacilar
Virchowiana +
tubérculos e nódulos, madarose (queda de cílios e MB
supercílios), lesões das mucosas.

Lesões pré-foveolares (eritematosas planas com o


centro claro).

Lesões foveolares (eritematosas Multibacilar


Dimorfa + ou -
infiltradas com o centro deprimido). MB

Lesões eritemato-pigmentares (de tonalidade


ferrugínea ou pardacenta).

Fonte: ALVES, 2014; BRASIL, 2016

TRATAMENTO
No esquema terapêutico padrão, os medicamentos são fornecidos em
cartelas individuais, que contem a dose mensal supervisionada e as doses
diárias auto administradas, existindo cartelas para PB e MB, adulto e
infantil, com as seguintes apresentações:

2. Tratamento de Poliquimioterapia – PQT/MS


FAIXA CARTELA PB CARTELA MB
ADULTO Rifampicina (RFM): Cápsula de 300 mg Rifampicina (RFM): Cápsula de 300 mg
(2 cápsulas). (2 cápsulas).

Dapsona (DDS): comprimido de 100 mg Dapsona (DDS): comprimido de 100 mg


(28 comprimidos). (28 comprimidos).
FAIXA CARTELA PB CARTELA MB

Clofazimina (CFZ): cápsula de 100 mg


(3 cápsulas) e cápsula de 50 mg
(27 cápsulas).

Rifampicina (RFM): cápsula de 150 mg Rifampicina (RFM): cápsula de 150 mg


(1 cápsula) e cápsula de 300 mg (1 cápsula). (1 cápsula) e cápsula de 300 mg (1 cápsula).

CRIANÇA Dapsona (DDS): comprimido de 50 mg Dapsona (DDS): comprimido de 50 mg


(28 comprimidos). (28 comprimidos)

Clofazimina (CFZ): Cápsula de 50 mg


(16 cápsulas).

Apresentação das cartelas para poliquimioterapia (PQT) – PB e MB.


Fonte: Coordenação-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação –
CGHDE/DEVIT/SVS/MS

3. Esquemas terapêuticos
O tratamento é ambulatorial, utilizando esquemas terapêuticos
padronizados, de acordo com a classificação operacional.
Esquema terapêutico para casos paucibacilares – 6 cartelas

Rifampicina (RFM): dose mensal de 600 mg (2 cásulas de 300 mg) com administração supervisionada.
ADULTO

Dapsona (DDS): dose mensal de 100 mg supervisionada e dose diária de 100 mg autoadministrada.

Rifampicina (RFM): dose mensal de 450 mg (1 cápsula de 150 mg e 1 cápsula de 300 mg) com
administração supervisionada.
CRIANÇA
Dapsona (DDS): dose mensal de 50 mg supervisionada e dose diária de 50 mg autoadministrada.

A duração do tratamento é de 6 cartelas em até 9 meses.

Fonte: Coordenação-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação –


CGHDE/DEVIT/SVS/MS.

Terapêutica para casos MULTIBACILARES: 12 Cartelas


ADULTO
Rifampicina (RFM): dose mensal de 600 mg (2 cásulas de 300 mg) com administração supervisionada.

Dapsona (DDS): dose mensal de 100 mg supervisionada e dose diária de 100 mg autoadministrada.
Terapêutica para casos MULTIBACILARES: 12 Cartelas

Clofazimina (CFZ): dose mensal de 300 mg (3cápsulas de 100mg) com administração supervisionada e dose
diária de 50 mg autoadministrada.

Terapêutica para casos MULTIBACILARES: 12 Cartelas

Rifampicina (RFM): dose mensal de 450 mg (1 cápsula de 150 mg e 1 cápsula de 300 mg) com
administração supervisionada.

CRIANÇA Dapsona (DDS): dose mensal de 50 mg supervisionada e dose diária de 50 mg autoadministrada.

Clofazimina (CFZ): dose mensal de 150 mg (3 cápsulas de 50 mg) com administração supervisionada e uma
dose de 50 mg autoadministrada em dias alternados.

Duração do tratamento: 12 blísteres por até 18 meses.

Fonte: Coordenação-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação –


CGHDE/DEVIT/SVS/MS.

Acompanhamento dos casos e alta:

• Comparecimento mensal para dose supervisionada quando deverá


ser feito o exame dermatoneurológico no paciente.

• Na alta após seis cartelas de PQT/PB nos casos paucibacilares e


12 cartelas de PQT/MB nos casos multibacilares, o paciente deverá
ser submetido à avaliação dermatológica, neurológica simplificada
e do grau de incapacidade física para receber alta por cura.
(BRASIL, 2016).
TERAPÊUTICA PARA CRIANÇAS MENORES DE 30 KG

DROGA DOSE PQT DOSE MG/KG

RIFAMPICINA (RFM) EM SUSPENSÃO Mensal 10-20

Mensal 1-2
DAPSONA (DDS)
Diária 1-2

CLOFAZIMINA (CFZ) Mensal 5,0


TERAPÊUTICA PARA CRIANÇAS MENORES DE 30 KG

DROGA DOSE PQT DOSE MG/KG

Diária 1,0

Obs: Os episódios de intolerância ou paraefeito dos medicamentos, encaminhar o paciente para centros de referência para mudança
do esquema terapêutico.

Fonte: Coordenação-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação –


CGHDE/DEVIT/SVS/MS.

4. Reações Hansênicas
Os episódios ou surtos reacionais são episódios inflamatórios agudos, de
origem imunológica que ocorrem previamente, ao longo ou após o
tratamento. Exigem cuidado e tratamento imediato para evitar a instalação de
incapacidade e deformidade. Os surtos reacionais podem ser do tipo 1
(reação reversa) e do tipo 2.
4.1. REAÇÃO TIPO 1 – (ou reação reversa)
As lesões cutâneas antigas ficam mais eritematosas, edematosas e
dolorosas, e podem surgir lesões novas.

• A neurite (espessamento e dor) é a sua manifestação mais grave,


uma vez que o dano neural pode se instalar e ocasionar
incapacidade e deformidade. A neurite pode manifestar-se isolada
ou acompanhada de lesões cutâneas.
4.2. REAÇÃO TIPO2
A manifestação mais comum é o eritema nodoso que pode atingir todo o
tegumento cutâneo. Sintomas sistêmicos como febre, mal-estar, anorexia são
freqüentes. Outras manifestações como linfadenopatias, orquite, irite,
iridociclite e glomerulonefrite podem ocorrer. A neurite na reação tipo 2 é
menos dramática que na reação tipo 1.
4.3. TRATAMENTO CLÍNICO DAS REAÇÕES

a. Reação Tipo 1
Iniciar prednisona utilizando a dosagem de 1 mg/Kg/dia ou
dexametasona 0,15 mg/Kg/dia em casos de doentes hipertensos ou
cardiopatas, conforme avaliação clínica.
Manter a poliquimioterapia se o doente ainda estiver em tratamento
específico, não reintroduzi-la em situação de alta.

b. Reação Tipo 2 ou Eritema Nodoso Hansênico (ENH)


Talidomida na dose de 100 a 400 mg/dia, conforme gravidade do quadro.
Na impossibilidade do seu uso prescrever prednisona na dose de 1
mg/kg/dia, ou dexametasona na dose equivalente.
Manter a poliquimioterapia se o doente ainda estiver em tratamento
específico, não reintroduzi-la em situação de alta.
Associar corticosteroides em caso de comprometimento de nervos.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Tratamento dos Episódios Reacionais
Fonte: Alves, E.D.; Ferreira, i.n.; ferreira, t. l. hanseníase: avanços e
desafios,2014.

Principais aspectos de diferenciação de Reação e Recidiva

Características Reação Recidiva

Frequente durante a PQT e menos frequente no


Em geral, período superior a cinco anos após
Período de ocorrência período de dois a três anos após término do
término da PQT.
tratamento.

Surgimento Súbito e inesperado Lento e insidioso.

Algumas ou todas as lesões podem se tornar


Lesões antigas eritematosas, brilhantes, intumescidas e Geralmente imperceptíveis.
infiltradas.
Principais aspectos de diferenciação de Reação e Recidiva

Características Reação Recidiva

Lesões recentes Em geral, múltiplas. Poucas.

Ulceração Pode ocorrer. Raramente ocorre.

Regressão Presença de descamação Ausência de descamação.

Muitos nervos podem ser rapidamente Poucos nervos podem ser envolvidos, com
Comprometimento neural envolvidos ocorrendo dor e alterações alterações sensitivo-motoras de evolução mais
sensitivo-motoras. lenta.

Resposta a
medicamentos Excelente. Não pronunciada.
antirreacionais

Fonte: Minas Gerais, 2016

4.4. CONTATOS:
Contatos familiares recentes ou antigos de pacientes MB e PB devem ser
examinados, independentemente do tempo de convívio. Tanto os contatos
familiares bem como os sociais (indivíduos que convivam ou tenham
convivido em relações familiares ou não, de forma próxima e prolongada)
devem ser avaliados durante cinco anos.
A vacina BCG-ID deve ser administrada nos contactantes examinados
sem presença de sinais e sintomas de hanseníase no momento da avaliação,
independente da classificação operacional do caso índice. (MINAS
GERAIS, 2016). Após analisar o histórico de vacinação pregressa, siga as
recomendações:
Esquema de Vacinação de contatos com o BCG

CICATRIZ VACINAL CONDUTA


Ausência de cicatriz - BCG Uma dose

Uma cicatriz de BCG Uma dose

Duas cicatrizes de BCG Não prescrever

Fonte: Alves, E.D.; Ferreira, i.n.; ferreira, t. l. hanseníase: avanços e


desafios,2014.

REFERÊNCIAS
1. Alves, E.D.; Ferreira, i.n.; ferreira, t. l. hanseníase: avanços e desafios. ceam/nespron-unb,
2014.
2. BRASIL. Ministério da Saúde. Diretrizes para Vigilância, atenção e eliminação da hanseníase
como problema de saúde pública. Brasília, 2016.
3. _____. Ministério da Saúde. Portaria GM?MS nº 3.125, de 07 de outubro de 2010. Aprova as
Diretrizes para Vigilância, Atenção e Controle da Hanseníase. Brasília, 2010.
4. MINAS GERAIS. Secretaria Estadual de Saúde. Atenção à Saúde do Adulto: Hanseníase.
Belo
Horizonte, 20016.
4.11
ROTINA APÓS EXPOSIÇÃO
OCUPACIONAL COM MATERIAL
BIOLÓGICO
Autores:
Gabrielly Borges Machado
Isabela Rodrigues de Oliveira

DEFINIÇÕES
• O risco de transmissão de agentes infecciosos após exposições a
materiais biológicos é variável.

• Depende de alguns fatores, como: tipo de acidente, gravidade,


tamanho da lesão, presença e volume de sangue envolvido,
condições clínicas do paciente-fonte e uso correto da profilaxia
pós-exposição.

• O risco de infecção por HIV após exposição ocupacional


percutânea com sangue contaminado é de aproximadamente 0,3%
e, após exposição de mucosa, aproximadamente 0,09%.

• O risco de infecção pelo HBV pós exposição ocupacional, em


profissionais não vacinados, varia de 6-30 %, podendo chegar a
60%.

• O risco de transmissão do HCV após acidente percutâneo varia de


0 a 7% (em média, 1,8%).
• Esses acidentes são considerados emergência médica; a profilaxia
deve ser iniciada
imediatamente.

• As medidas preventivas devem ser adotadas por todos os


profissionais na assistência a todos os pacientes, na manipulação
de sangue e secreções, e incluem: o uso de Equipamentos de
Proteção Individual (luvas, capotes, máscara, gorro, óculos de
proteção) e o descarte adequado de materiais perfurocortantes
contaminados.

• Tipos de acidentes biológicos:


Perfurocortante: agulha e/ou material cirúrgico contaminados.

Contato com mucosa conjuntival, oral ou pele com solução de


continuidade.

Contato com pele íntegra.

EXAMES COMPLEMENTARES PÓS-


EXPOSIÇÃO
• Ao profissional acidentado e paciente-fonte com situação
sorológica desconhecida: teste rápido para HIV, HBV, HCV e
sífilis.

• Impossibilidade de se obterem as sorologias do paciente-fonte ou


este é desconhecido: avaliar o risco de transmissão, considerando o
tipo de exposição, gravidade do acidente, dados clínicos e
epidemiológicos do local, antecedentes pessoais do paciente-fonte.
• Acompanhamento sorológico do profissional exposto após 1 e 3
meses do acidente para avaliar soroconversão.

a. MEDIDAS INICIAIS

• Cuidados com o ferimento imediatamente após o acidente: lavar


com água e sabão abundantemente.

• Comunicar ao departamento responsável por acidentes


ocupacionais.

• Testes rápidos (HIV, HBV, HCV e sífilis) do profissional


acidentado e paciente-fonte.

b. ROTINA APÓS EXPOSIÇÃO AO HBV:

• Caso ocorra exposição ao HBV, a conduta depende da imunidade


do profissional acidentado ao HBV (imunidade conferida por
vacinação ou infecção prévia):

• Profissional imune (esquema vacinal completo – 3 doses da


vacina contra HBV e anti-HBs reagente – superior a 10 IU/L):

Não há indicação de profilaxia.

• Profissional suscetível (não vacinado ou vacinação incompleta e


anti-HBs não reagente):

Imunoglobulina hiperimune (IGHAHB) contra hepatite B


por via intramuscular (imunização passiva) até 24 horas
após o acidente + iniciar esquema vacinal – 3 doses
(imunização ativa).
Dose de IGHAHB: 0,06 mL/kg por via IM, nas primeiras 48
horas, no máximo até 14 dias depois da exposição (dividir a dose
em duas aplicações em áreas distintas se o volume a ser usado
for maior que 5 mL).

A IGHAHB é constituída por anti-HBs, proporcionando


imunidade provisória por um período de 3 a 6 meses após a
administração.

Não existe benefício comprovado após uma semana da


exposição.

A IGHAHB está indicada somente quando o paciente-fonte for


HBsAg reagente e o profissional acidentado não for vacinado.

c. ROTINA APÓS EXPOSIÇÃO AO HCV:

• Não há profilaxia pós-exposição ao HCV.


• Recomenda-se seguimento laboratorial por 12 meses.
• Anti-HCV: 3, 6, 9 e 12 meses após o acidente.
• Transmissão confirmada (soroconversão): iniciar tratamento
antiviral recomendado – Sofosbuvir 400 mg + Daclatasvir 60 mg
(inibidores da enzima NS5A) por 12-24 semanas, com ou sem
Ribavirina oral.

• Acompanhamento da pessoa exposta: 1º atendimento: ALT, anti-


HCV; 4 a 6 semanas após a exposição: ALT, anti-HCV, CV (carga
viral) - HCV; 3 meses após a exposição: ALT, anti-HCV, CV-HCV;
6 meses após a exposição: ALT, anti-HCV.
• Se Anti-HCV reagente no 1º atendimento: a pessoa já foi
previamente exposta, devendo ser encaminhada para confirmação
laboratorial e acompanhamento clínico.

d. ROTINA APÓS EXPOSIÇÃO AO HCV:

• Profilaxia indicada somente quando o paciente-fonte for


soropositivo (teste rápido reagente).

• Paciente-fonte desconhecido: avaliação individualizada do risco


de infecção, considerando o tipo de exposição, gravidade do
acidente, extensão do ferimento e dados epidemiológicos locais.

• Fatores de maior risco: ferimentos profundos; sangue visível no


instrumento; penetração de agulha com lúmen, contendo sangue;
injeção endovenosa ou intramuscular de sangue contaminado;
paciente-fonte com carga viral elevada.

• PROFILAXIA PÓS EXPOSIÇÃO AO HIV (PEP):


Urgência médica.

Constituída pela combinação de antirretrovirais orais, devendo


ser iniciada o mais precocemente possível.

Preferencialmente nas primeiras 2 horas, até no máximo 72


horas após a exposição.

Esquema preferencial para PEP:

Tenofovir (TDF) 300 mg + Lamivudina (3TC) 300 mg 1 comprimido


VO 1x/dia + Dolutegravir (DTG) 50 mg 1 comprimido VO 1x/dia por 28
dias.
Contraindicações ao DTG: uso de fenitoína, fenobarbital,
oxicarbamazepina e metformina com dose acima de 1000
mg/dia, gestantes antes da 14ª semana de gestação.

Esquemas alternativos para PEP:


- Impossibilidade de TDF: AZT + 3TC + DTG.
- Impossibilidade de DTG: TDF + 3TC + ATV/r.

Deve-se avaliar o uso prévio e atual de antirretrovirais pelo


paciente-fonte e indícios de resistência viral (aumento de carga
viral em vigência de TARV, queda dos níveis de linfócitos CD4+
e falha terapêutica na troca do esquema medicamentoso), sendo
esses casos específicos avaliados por médicos especialistas em
resistência viral (MRG – Médico de Referência em
Genotipagem).

• SEGUIMENTO LABORATORIAL:
Testagem de HIV no 1º atendimento, 30 e 90 dias após a
exposição.

Exames laboratoriais (hemograma, glicose, ureia, creatinina,


AST, ALT, amilase): no 1º atendimento e na 2ª semana após o
início da PEP.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, 36 anos, sexo feminino, parda, casada,
profissional técnica de enfermagem, com esquema vacinal completo
para Hepatite B (1 série de 3 doses) e pesquisa de anticorpos anti-HBs
menor que 10 IU/mL, refere acidente com material perfurocortante
durante o trabalho, há 1 hora.
b. Exames complementares: Os dados sorológicos do paciente-
fonte eram HBsAg e Anti-HBC IgG reagentes. Diante da exposição ao
HBV em profissional não imune, foi indicada a profilaxia com a
Imunoglobulina hiperimune e a 1ª dose do novo esquema vacinal. Peso:
75 kg.
c. Prescrição:

• Imunoglobulina hiperimune 0,06 mL/kg, aplicar 4,5 mL, via IM,


dose única.

REFERÊNCIAS
1. Cardo DM, Culver DH, Ciesielski CA, Srivastava PU, Marcus R, Abiteboul D, et al. A Case-
Control Study Of HIV Seroconversion In Health Care Workers After Percutaneous
Exposure. N Engl J Med. 1997; 337: 1485-90.
2. Panlilio AL, Cardo DM, Grohskopf LA, Heneine W, Ross CS. Updated U.S. Public Health
Service Guidelines For The Management Of Occupational Exposures To HBV, HCV, And
HIV And Recommendations For Postexposure Prophylaxis. MMWR. 2001; 50(RR-11): 1-
52.
3. Ministério da Saúde (BR). Manual dos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais.
Brasília: Ministério da Saúde; 2001.
4. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.823, de 23 de agosto de 2012. Institui a Política
Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Diário Oficial da União.
5. Ministério da Saúde (BR). Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para profilaxia pós-
exposição (PEP) de risco à infecção pelo HIV, IST e hepatites virais. Brasília: Ministério da
Saúde; 2018.
6. Ministério da Saúde (BR). Recomendações para atendimento e acompanhamento de
exposição ocupacional a material biológico: HIV e hepatites virais. Brasília: Ministério da
Saúde; 2004.
7. Ministério da Saúde (BR). Recomendações para terapia ARV em adultos e adolescentes.
Brasília: Ministério da Saúde; 2004.
8. Ministério da Saúde (BR). Exposição a Materiais Biológicos. Saúde do
Trabalhador/Protocolos de Complexidade Diferenciada 3. Brasília: Ministério da Saúde;
2011.
9. Ministério da Saúde do Brasil (BR). Recomendações para terapia antirretroviral em adultos e
adolescentes infectados pelo HIV. Brasília: Ministério da Saúde; 2001.
4.12
ACIDENTES POR ANIMAIS
PEÇONHENTOS
Autora:
Gabrielly Borges Machado

DEFINIÇÕES
• Animais peçonhentos são animais que possuem estruturas
especializadas (dentes, ferrões) capazes de inocular seus venenos,
como cobras, escorpiões, aranhas, abelhas, lagartas, entre outros.
Os acidentes ofídicos, escorpionismo, araneísmo e os acidentes
com lagartas são os acidentes mais comuns na prática médica,
capazes de desencadear quadros moderados a graves. Têm
importância médica significativa devido à sua grande frequência e
gravidade.

• Esses acidentes, em especial os acidentes ofídicos, foram


incluídos, pela Organização Mundial da Saúde, na lista das
doenças tropicais negligenciadas. Acometem principalmente
populações pobres que vivem em zonas rurais. Todo acidente por
animal peçonhento deve ser notificado ao Sistema de Informação
de Agravos de Notificação (Sinan).

• Os acidentes ocorrem mais frequentemente nos meses do verão


(dezembro a março).

CLASSIFICAÇÃO E MANEJO CLÍNICO


ACIDENTE OFÍDICO
• Envenenamento causado por toxinas presentes no veneno de
serpentes peçonhentas, que exercem ação local e sistêmica, sendo
responsáveis pelas manifestações clínicas. Como as serpentes
ocupam quase todos os tipos de ambiente, tanto aquático como
terrestre, os acidentes ofídicos apresentam elevada incidência,
principalmente na zona rural.

• Em geral, a ocorrência está associada a fatores climáticos e


aumento da atividade humana no campo. Acomete mais o sexo
masculino (em 70% dos acidentes) e a faixa etária entre 15 e 49
anos. Os membros inferiores são os locais mais afetados (cerca de
70% dos casos).

• As principais características de serpentes peçonhentas são:


fosseta loreal (orifício entre a narina e olho; órgão sensorial
termorreceptor), cabeça triangular, pupila em fenda vertical e
antes de presas inoculadoras.

• ACIDENTE BOTRÓPICO: causado por serpentes dos gêneros


Bothrops e Bothrocophias (jararaca, jararacuçu, urutu, cruzeira,
caissaca), que têm hábitos noturnos e predileção por locais
úmidos. Responsável por cerca de 90% dos acidentes ofídicos.

• ACIDENTE CROTÁLICO: causado por serpentes do gênero


Crotalus (cascavel), que têm como principal característica a
presença de chocalho na ponta da causa. É o segundo mais
comum no Brasil, responsável por cerca de 8% dos acidentes.
Apresenta maior taxa de letalidade, devido à associação com IRA.

• ACIDENTE LAQUÉTICO: ocasionado por serpentes do


gênero Lachesis (surucucu-pico-de-jaca, surucucu-de-fogo,
surucutinga). Raro no país (cerca de 1,4% dos acidentes).
• ACIDENTE ELAPÍDICO: causado por serpentes do gênero
Micrurus (corais verdadeiras), que apresentam anéis vermelhos,
pretos e brancos em qualquer tipo de combinação, envolvendo
toda a sua circunferência. São raros no Brasil (cerca de 0,4% dos
acidentes).

a. ACIDENTE BOTRÓPICO:

• Ações do veneno: proteolítica, coagulante e hemorrágica.


• Manifestações clínicas (exuberantes e precoces): dor e edema
intensos, equimose no local da mordedura (pode ocorrer extensão
ao longo do membro acometido), lesões bolhosas com conteúdo
sero-hemorrágico, áreas de necrose.

• Complicações locais: infecção secundária, abscesso, gangrena e,


em casos mais graves, síndrome compartimental, com indicação
de intervenção cirúrgica (fasciotomia, desbridamento de tecidos
desvitalizados, amputação) e consequente déficit funcional do
membro.

• Manifestações sistêmicas: sangramentos devido à coagulopatia


(gengivorragia, equimoses, hematúria, hematêmese, petéquias,
entre outros), hipotensão por hipovolemia consequente a
sangramento, sudorese, choque hipovolêmico, insuficiência renal
aguda por ação direta do veneno, desidratação e hipovolemia.

• Acidente leve: forma mais comum, dor e edema local discretos,


manifestações hemorrágicas discretas ou ausentes, com ou sem
alteração do tempo de coagulação (TC).

• Acidente moderado: dor e edema evidentes que ultrapassam o


segmento anatômico afetado, alterações hemorrágicas locais ou
sistêmicas ausentes ou discretas, tempo de coagulação normal ou
alterado.

• Acidente grave: edema intenso e extenso, podendo atingir todo o


membro, dor intensa e, eventualmente, presença de isquemia local
devido à compressão dos feixes vasculonervosos, manifestações
sistêmicas como hipotensão arterial, choque, insuficiência renal
aguda ou hemorragias graves. Tempo de coagulação normal ou
alterado.

• Exames complementares: Tempo de Coagulação (TC) –


importante para avaliar eficácia da soroterapia – hemograma,
exame sumário de urina, eletrólitos, ureia e creatinina.

b. ROTINA APÓS EXPOSIÇÃO AO HBV:

• Ações do veneno: neurotóxica, miotóxica e coagulante (discretas


e restritas ao local da mordedura).

• Manifestações sistêmicas (precoces e potencialmente graves):


Ação neurotóxica (reversível): manifestações neuroparalíticas
com progressão craniocaudal, com ptose palpebral, fácies
miastênica, turvação visual e oftalmoplegia, distúrbios de olfato
e paladar, ptose mandibular, sialorreia e insuficiência
respiratória aguda.

Ação coagulante: distúrbios de coagulação com sangramentos


discretos (gengivorragia).

Ação miotóxica: lesão muscular esquelética com rabdomiólise


e mialgia generalizada, levando à mioglobinúria com
escurecimento da urina (cor de “coca-cola”) e,
consequentemente, à insuficiência renal aguda oligúrica, de
instalação nas primeiras 48 horas (principal complicação
sistêmica e causa de óbito).

• Acidente leve: sinais e sintomas neurotóxicos ausentes ou


tardios, sem mialgia ou alteração da cor da urina, ausência de
oligúria.

• Acidente moderado: sinais e sintomas neurotóxicos discretos, de


instalação precoce,
mialgia discreta, alteração da cor da urina ausente ou discreta, sem
oligúria.

• Acidente grave: sinais e sintomas neurotóxicos evidentes e


intensos, mialgia intensa, urina escura, oligúria/anúria presente ou
ausente.

• Exames complementares: hemograma, ureia, creatinina,


eletrólitos, creatinoquinase (CK), desidrogenase lática (LDH),
aspartase-amino-transferase (AST), aspartase-alanino-transferase
(ALT), TC, sedimento urinário.

c. ACIDENTE LAQUÉTICO:

• Ações do veneno: proteolítica, coagulante e hemorrágica.


• Manifestações locais e sistêmicas: semelhantes às do Acidente
Botrópico.

• Casos graves de envenenamento: manifestações vagais


(náuseas, vômitos, cólicas abdominais, diarreia, hipotensão e
choque).

d. ACIDENTE ELAPÍDICO:
• Ações do veneno: neurotóxica e miotóxica.
• Manifestações locais: discretas.
• Manifestações sistêmicas (decorrentes da ação neurotóxica):
fraqueza muscular progressiva, ptose palpebral, fácies miastênica,
mialgia difusa e dificuldade para deglutir.

• Complicações: insuficiência respiratória aguda e apneia, com


necessidade de suporte
ventilatório.

• Todos os casos devem ser considerados como potencialmente


graves.

TRATAMENTO
O tratamento consiste na administração imediata de soroterapia de
acordo com o tipo e a gravidade do acidente (ver tabela 1):

No de
Acidente Antiveneno Gravidade
ampolas

Leve: quadro local discreto, sangramento discreto,


2a4
TC normal ou alterado.

SAB (Soro Moderado: quadro local evidente, sem manifestações sistêmicas,


4a8
BOTRÓPICO antibotrópico TC normal ou alterado.
pentavalente)

Grave: alterações locais intensas, hemorragia grave,


12
hipotensão/choque, insuficiência renal, TC normal ou alterado.

Moderado: quadro local presente; pode haver


10
sangramentos, sem manifestações vagais.
SABL (Soro
LAQUÉTICO antibotrópico
e antilaquético)
Grave: quadro local intenso, hemorragia intensa,
20
manifestações vagais.
No de
Acidente Antiveneno Gravidade
ampolas

Leve: alterações neuroparalíticas discretas;


5
sem mialgia, escurecimento da urina ou oligúria.

SAC (Soro
anticrotálico) ou Moderado: alterações neuroparalíticas evidentes, mialgia e
SABC (Soro 10
CROTÁLICO mioglobinúria discretas.
antibotrópico
e anticrotálico)

Grave: alterações neuroparalíticas evidentes, mialgia


20
e mioglobinúria intensas, oligúria.

SAEla (Soro
Considerar todos os casos como graves pelo risco
ELAPÍDICO antielapídico 10
de insuficiência respiratória.
bivalente)

Tabela 1. Soroterapia intravenosa de acordo com a gravidade do


envenenamento
Fonte: FUNASA,3 Ministério da Saúde.4

• Manter elevado e estendido o membro afetado.


• Analgesia e antibioticoterapia se evidência de infecção
secundária.

• Hidratação vigorosa: manter diurese entre 30 a 40 mL/hora no


adulto, e 1 a 2 mL/kg/hora na criança.

• Fasciotomia: se presença de síndrome compartimental,


debridamento de áreas necrosadas e drenagem de abscessos.

• Transfusão de hemoderivados: se hemorragias graves ou


coagulopatias.

• Acidente botrópico: se TC permanecer prolongado 24 horas


após a soroterapia, recomenda-se duas ampolas de soro
antibotrópico adicionais.
• Acidente crotálico com oligúria: solução de manitol a 20% (100
mL no adulto). Se oligúria persistente: diuréticos de alça tipo
furosemida por via intravenosa (40 mg/dose no adulto). Ausência
de resposta terapêutica: diálise precoce.

• Acidente crotálico: manter o pH urinário acima de 6,5 com


alcalinização da urina (bicarbonato de sódio parenteral),
monitorizada por controle gasométrico.

ESCORPIONISMO
• Manifestações locais e sistêmicas: decorrentes da ação de toxinas
presentes no veneno, que atuam nas terminações nervosas pós-
ganglionares.

• Atingem predominantemente os membros superiores.


• Grande frequência e potencial gravidade, principalmente em
crianças menores de 10 anos.

• Predominam nos meses quentes e chuvosos e a maioria tem curso


benigno.

• Escorpiões de importância médica no Brasil são: Tityus


serrulatus, responsável por acidentes de maior gravidade, T.
bahiensis e T. stigmurus.

• A gravidade do quadro depende do volume de veneno inoculado,


faixa etária e espécie envolvida. Crianças são mais suscetíveis a
quadro sistêmico grave.

a. Quadro clínico (decorrente da liberação de catecolaminas e


acetilcolina nas terminações
nervosas): manifestações orgânicas simpáticas ou parassimpáticas.
• Manifestações locais: dor intensa de instalação imediata, com
extensão para o membro, parestesia, eritema, edema e sudorese
local.

• Manifestações sistêmicas: sudorese profusa, hipo ou


hipertermia, agitação psicomotora,
sonolência, confusão mental, tremores, náuseas, vômitos,
sialorreia, hipertensão ou hipotensão arterial, diarreia, arritmia
cardíaca, insuficiência cardíaca congestiva, edema pulmonar
agudo e choque (principalmente em crianças).
b. Exames complementares (casos graves): hemograma,
eletrólitos, CPK, CK-MB, glicemia, eletrocardiograma (avaliar
arritmias), radiografia de tórax (avaliar sinais de congestão pulmonar).
c. Tratamento:

• Sintomático: lidocaína 2% sem vasoconstritor (3-4 mL em


adultos) no local.

• Formas moderadas e graves: soroterapia intravenosa com soro


antiescorpiônico (SAEEs) ou antiaracnídico (SAAr) precocemente
(ver tabela 2).
Gravidade No de ampolas
Leve: dor e parestesia locais 2a4

Moderado: dor local intensa associada a uma ou mais manifestações


4a8
(náuseas, vômitos, sudorese, sialorreia, agitação, taquipneia e taquicardia)

Grave: manifestações clínicas da forma moderada e presença de uma ou mais das seguintes
manifestações: vômitos profusos e incoercíveis, sudorese profusa, sialorreia intensa,
12
prostração, convulsão, coma, bradicardia, insuficiência cardíaca, edema pulmonar agudo e
choque

Tabela 2. Soroterapia intravenosa de acordo com a gravidade do


envenenamento.
Fonte: FUNASA,3 Ministério da Saúde.4

ARANEÍSMO
• Envenenamento causado por toxinas presentes no veneno de
aranhas peçonhentas, desencadeando alterações locais e
sistêmicas.

• Atinge principalmente adultos, de ambos os sexos, predominando


em áreas urbanas. Ocorre preferencialmente em mãos e pés.

• Aranhas de importância médica no Brasil:


Loxosceles (aranha-marrom): não são agressivas. Os acidentes
ocorrem quando são comprimidas contra o corpo, em áreas
urbanas, no intra e peridomicílio.

Phoneutria (armadeira, aranha-macaca): hábito


predominantemente noturno. Assumem comportamento de
defesa quando são ameaçadas encontradas no intra e
peridomicílio.

Latrodectus (viúva-negra): apenas as fêmeas são responsáveis


pelos acidentes, ocorrendo quando são comprimidas contra o
corpo. Baixa incidência.

• Acidentes causados por Lycosidae (aranha-de-grama, aranha-de-


jardim) e caranguejeiras: não representam um problema de saúde
pública, sem repercussão sistêmica, apenas alterações locais.

a. Loxoscelismo

• Corresponde à forma mais grave de araneísmo no Brasil.


• Resulta em intensa vasculite no local da picada, obstrução
capilar, hemorragia e hemólise intravascular, por ação do veneno
no endotélio vascular e hemácias.
• Manifestações locais (instalação lenta e progressiva): dor e
queimação, eritema, edema endurado e calor local, equimose
central e áreas de palidez, bolhas com conteúdo seroso, podendo
evoluir com necrose, úlcera de difícil cicatrização e infecção
secundária.

• Forma cutâneo-hemolítica (cutâneo-visceral): decorrente da


hemólise intravascular, observada nas formas mais graves de
envenenamento. Cursa com mal-estar, cefaleia, febre, anemia,
icterícia, hemoglobinúria, petéquias e equimoses, relacionadas à
coagulação intravascular disseminada (CIVD). Ocorre nas
primeiras 72 horas após a picada, podendo cursar com
insuficiência renal aguda (principal causa de óbito).

b. Foneutrismo

• Quadro clínico indistinguível do escorpionismo.


• Manifestações locais (predominantes): dor imediata e intensa,
associada a edema, sudorese no local e parestesia ao longo do
membro.

• Manifestações sistêmicas (decorrentes da ação de acetilcolina


e catecolaminas liberadas): taquicardia, hipertensão arterial,
agitação psicomotora, sudorese e vômitos. Em crianças podem
ocorrer alterações graves como: sudorese profusa, sialorreia,
diarreia, priapismo, hipotensão, choque e edema agudo de
pulmão.

c. Latrodectismo

• Ocorre a liberação de neurotransmissores adrenérgicos e


colinérgicos, pela ação da toxina do veneno em sistema nervoso
autônomo.

• Manifestações locais: dor local de pequena intensidade, em


queimação, pápula eritematosa, sudorese local, hiperestesia e
linfadenopatia regional.

• Manifestações sistêmicas: alterações motoras (tremores,


contraturas musculares intermitentes, contrações espasmódicas
dos membros, movimentação incessante, dor com rigidez
abdominal) e fácies latrodectísmica (contratura facial e trismo dos
masseteres). Mais raramente: opressão precordial, taquicardia e
hipertensão arterial, excitabilidade, náuseas, vômitos, sialorreia,
priapismo, ptose palpebral e midríase.

• Exames complementares: hemograma, eletrólitos, função renal,


coagulograma, sedimento urinário, bilirrubina total e frações,
glicemia e ECG.

• TRATAMENTO:
• O tratamento consiste em soroterapia intravenosa específica, com
base no tipo e gravidade do acidente (ver tabela 3).
Soro No de
Acidente Gravidade
antiaracnídico ampolas
Leve: dor local, edema, eritema, sudorese. -

2a4
Moderado: dor local intensa, sudorese, vômitos ocasionais,
SAA: Soro antiaracnídico
agitação psicomotora, hipertensão
FONÊUTRICO (Phoneutria, Loxosceles
arterial.
e Tityus)

Grave: sudorese profusa, sialorreia, vômitos 5 a 10


profusos, priapismo, choque, EAP.

Leve: ausência de comprometimento sistêmico, sem -


alterações laboratoriais.
SALox: Soro
Moderado: manifestações sistêmicas inespecíficas, 5
antiloxoscélico (trivalente)
LOXOSCÉLICO ausência de hemólise.
ou SAA
Grave: evidências clínicas ou laboratoriais 10
de hemólise intravascular.

Tabela 3. Soroterapia intravenosa para cada tipo e gravidade do acidente.


Fonte: FUNASA,3 Ministério da Saúde.4

• Tratamento sintomático: realizar antissepsia local, compressa


morna no local da picada, anestesia local ou troncular sem
vasoconstritor (com lidocaína 2%), analgesia sistêmica e, nos
casos de dor refratária, meperidina 50-100 mg por via
intramuscular.

• Latrodectismo:
Diazepan 5 a 10 mg para adultos, intravenoso, de 4 em 4 horas;
Gluconato de cálcio 10% de 10 a 20 mL para adultos,
intravenoso lentamente, de 4 em 4 horas; ou Clorpromazina: 25
a 50 mg para adultos, intravenoso, de 8 em 8 horas, se
necessário.

Observação por pelo menos 24 horas.

Soro antilatrodectus (SALatr): em casos graves, administrar


1 a 2 ampolas por via intra-
muscular.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente, 45 anos, masculino, trabalhador rural,
previamente hígido, procura pronto-atendimento referindo acidente
ofídico causado por jararaca, em membro inferior direito, há cerca de
seis horas. Refere dor intensa no local da mordedura, associada a
eritema, edema intenso e calor local. Relata progressão do edema e
surgimento de equimose local. Refere ainda gengivorragia discreta.
Nega demais queixas. Diurese preservada. Nega doenças de base, uso
de medicamentos e alergias. Refere tabagismo e etilismo.
b. Exame físico: BEG, afebril, hidratado, FC: 80 bpm, PA: 120/80
mmHg, FR: 20 irpm, ausculta pulmonar e cardíaca sem alterações.
Presença de dois orifícios de inoculação em membro inferior direito,
associados a edema local importante com extensão para todo o
membro, calor e hiperemia, além de equimose. Ausência de síndrome
compartimental e abscesso. Gengivorragia discreta.
c. Exames laboratoriais: Tempo de Coagulação: 8 minutos
(normal: até 9 min, prolongado: de 10 a 30 min; incoagulável: > 30
min). Hemoglobina: 14; leucócitos: 14.000 com neutrofilia e desvio à
esquerda; plaquetas: 170.000; ureia: 40; creatinina: 0,9.

• Diante do quadro clínico compatível com Acidente Botrópico


moderado, foi indicada soroterapia específica imediata.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta branda.
2. Soro antibotrópico 8 ampolas IV sem diluição, durante trinta
minutos.
3. Dipirona: 2 mL + água destilada 8 mL, EV até de 6/6 h se dor ou
Tax ≥ 37,8 °C.
4. Metoclopramida: 10 mg 2 mL + água destilada 8 mL, EV, até de
8/8 h, se náuseas ou vômitos.
5. Monitorização.
6. Manter membro elevado e estendido.
7. Notificação do acidente botrópico ao SINAM.
8. Cuidados gerais e sinais vitais.
9. Observação mínima de 6 a 12 horas.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Recomenda-se a observação mínima de 6 a 12 horas em todos os
casos de acidentes por animais peçonhentos.
• A indicação de soroterapia deve ser criteriosa, para se evitar a
administração desnecessária de soro nos casos de acidente sem
envenenamento.

• Evidências clínicas e laboratoriais de envenenamento indicam


soroterapia intravenosa específica imediata, por se tratar de
emergência médica.

• Tempo de Coagulação (TC): importante para avaliar eficácia da


soroterapia.

• No acidente botrópico, se TC permanecer prolongado 24 horas


após a soroterapia, recomendam-se duas ampolas de soro
antibotrópico adicionais.

• Diagnóstico e tratamento precoces influenciam favoravelmente a


evolução e o prognóstico do acidente.

REFERÊNCIAS
1. Ministério da Saúde (BR). Manual de Controle de Escorpiões. Brasília: Ministério da
Saúde; 2009.
2. Cardoso JLC. Animais Peçonhentos no Brasil: Biologia, Clínica e Terapêutica dos
Acidentes. 2. ed. São Paulo: Sarvier; 2009.
3. Fundação Nacional de Saúde (BR). Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por
Animais Peçonhentos. 2. ed. Brasília: FUNASA; 2001.
4. Ministério da Saúde (BR). Situação Epidemiológica das Zoonoses de interesse para a Saúde
Pública. Boletim Eletrônico Epidemiológico. 2010;10(2).
5. Ministério da Saúde (BR). Guia de Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde;
2016.
4.13
COVID-19
Autora:
Gabrielly Borges Machado

DEFINIÇÕES
• Trata-se de uma nova infecção respiratória, de evolução aguda,
causada pelo novo coronavírus – coronavírus da Síndrome
respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2), que acomete o trato
respiratório, potencialmente grave e fatal, apresentando elevada
transmissibilidade.

• A doença causada pelo Coronavírus 2019 (Covid-19) foi


reconhecida como pandemia pela Organização Mundial da Saúde
(OMS) em março de 2020.

• É uma emergência de Saúde Pública de Importância Internacional


(ESPII), sendo uma doença de notificação imediata.

• Casos de SG (Síndrome Gripal), SRAG (Síndrome Respiratória


Aguda Grave) hospitalizados, óbito por SRAG,
independentemente da hospitalização, e indivíduos assintomáticos
com confirmação laboratorial por RT-qPCR ou método sorológico
de infecção recente por Covid-19 devem ser notificados dentro de
24 horas a partir da suspeita inicial do caso ou óbito.

• Manifesta-se de forma grave em cerca de 15% dos pacientes.


Nesses, há provável ativação de intensa resposta inflamatória
sistêmica (“tempestade de citocinas”), levando a um estado de
hipercoagulabilidade e alterações hematológicas (plaquetopenia,
alargamento de TAP, aumento de D-dímero e queda dos níveis de
fibrinogênio), que predispõem aos fenômenos tromboembólicos,
com consequente hipoperfusão tecidual e disfunções orgânicas.

Liberação de citocinas Síndrome da resposta inflamatória


sistêmica morte celular ativação da cascata de coagulação
microtromboses isquemia e disfunções orgânicas

• Fatores de risco para possíveis complicações da Covid-19:


Idade igual ou superior a 60 anos;

Tabagismo;

Obesidade;

Miocardiopatias de diferentes etiologias;

Hipertensão arterial;

Pneumopatias graves ou descompensadas (asma


moderada/grave, DPOC);

Imunossupressão;

Doenças renais crônicas em estágio avançado;

Diabetes mellitus;

Neoplasia maligna;

Doenças hematológicas (incluindo anemia falciforme e


talassemia);
Gestação.

ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO
• SARS-CoV-2 é um betacoronavírus descoberto em secreções
respiratórias de pacientes com pneumonia de causa desconhecida
na cidade de Wuhan, província de Hubei, China, em dezembro de
2019.

• Pertence ao subgênero Sarbecovírus da família Coronaviridae.


• Os coronavírus, em geral, consistem em uma grande família de
vírus comuns em muitas espécies diferentes de animais, incluindo
o homem, camelos, gado, gatos e morcegos.

• O MERS-CoV e o SARS-CoV são subtipos de coronavírus de


animais que podem infectar pessoas e se espalhar entre os seres
humanos.

a. TRANSMISSÃO:

• Ocorre através do contato (direto ou indireto) com secreções


respiratórias do indivíduo infectado.

• Contato direto: entre pessoas, por meio da inalação de gotículas


respiratórias eliminadas através da tosse, espirro ou fala, quando
uma pessoa permanece em contato (a menos de 1 metro de
distância) com uma pessoa infectada, ou ainda através do aperto
de mãos, seguido do toque nos olhos, nariz ou boca.

• Contato indireto: com objetos e superfícies contaminados.


• Inalação de aerossóis: partículas respiratórias menores, geradas
por meio de alguns procedimentos médicos em vias aéreas,
capazes de permanecer suspensas no ar por períodos mais longos.

b. PERÍODO DE INCUBAÇÃO: entre 1 e 14 dias; em média, de


5 a 6 dias.

c. PERÍODO DE TRANSMISSIBILIDADE: evidências atuais


sugerem que a maioria das transmissões ocorre através do contato
direto ou indireto com pessoas sintomáticas.

• De acordo com OMS: portadores assintomáticos têm menor


probabilidade de transmitir o vírus do que os sintomáticos.

• A transmissão pode ser iniciada durante o período de incubação,


geralmente 1 a 3 dias antes do início dos sintomas, até 14 dias
após.

• A suscetibilidade é geral.
• Com relação à imunidade, não se sabe ainda se a infecção é capaz
de gerar imunidade permanente contra novas infecções.

QUADRO CLÍNICO
• Pode variar de quadros assintomáticos e manifestações clínicas
leves até quadros graves, com insuficiência respiratória, choque e
disfunção de múltiplos órgãos.

a. CASOS SUSPEITOS:
• SÍNDROME GRIPAL (SG): pelo menos dois dos seguintes
sinais e sintomas: febre (mesmo que referida), calafrios,
odinofagia, cefaleia, tosse, coriza, distúrbios olfativos ou
gustativos.

Idosos: considerar também sinais de agravamento, como


síncope, confusão mental, sonolência excessiva, irritabilidade e
inapetência. A febre pode estar ausente e sintomas
gastrointestinais, como diarreia, podem estar presentes.

• SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE (SRAG):


SG com sinal de agravamento, como: dispneia/desconforto
respiratório OU dor torácica OU saturação de O2 menor que
95% em ar ambiente OU cianose. A presença de algum sinal
de gravidade exige a hospitalização do paciente.

b. CASOS CONFIRMADOS:

• CASOS CONFIRMADOS POR CRITÉRIO CLÍNICO: SG


ou SRAG associado à anosmia OU ageusia aguda sem outra causa
pregressa.

• CASOS CONFIRMADOS POR CRITÉRIO CLÍNICO-


EPIDEMIOLÓGICO: SG ou SRAG com histórico de contato
próximo com caso confirmado, nos últimos 14 dias antes do início
dos sintomas.

• CASOS CONFIRMADOS POR CRITÉRIO CLÍNICO-


IMAGEM: SG ou SRAG ou óbito por SRAG que apresente pelo
menos 1 das seguintes alterações radiológicas:

OPACIDADE EM VIDRO FOSCO periférico, bilateral, com


ou sem consolidação, ou linhas intralobulares visíveis
(“pavimentação”); OU

OPACIDADE EM VIDRO FOSCO multifocal de morfologia


arredondada com ou sem consolidação ou linhas intralobulares
visíveis (“pavimentação”); OU

SINAL DE HALO REVERSO.

• CASOS CONFIRMADOS POR CRITÉRIO


LABORATORIAL: SG ou SRAG que apresente pelo menos 1
das seguintes alterações laboratoriais:

RT-qPCR: DETECTÁVEL para SARS-CoV-2;

Imunológico (Ensaio imunoenzimático – ELISA;


Imunocromatografia – teste rápido para detecção de anticorpos;
Imunoensaio por Eletroquimioluminescência – ECLIA):
REAGENTE para IgM, IgA e/ou IgG (considerar o resultado
IgG reagente como diagnóstico confirmatório somente em
indivíduos sem diagnóstico laboratorial prévio para Covid-19);

Imunocromatografia para detecção de antígeno:


REAGENTE para SARS-CoV2.

c. PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES: insuficiência respiratória


aguda, sepse e choque séptico, fenômenos tromboembólicos,
coagulopatias/CIVD, falência múltipla de órgãos, incluindo lesão
hepática, renal e cardíaca aguda.

DIAGNÓSTICO
a. CLÍNICO: quadro de Síndrome gripal (SG) ou SRAG.

b. LABORATORIAL:
• Teste molecular:
RT-PCR em tempo real (RT-qPCR) em amostras do trato
respiratório obtidas por meio de swab de nasofaringe e
orofaringe, coletadas até o 8º dia após o início dos sintomas;
de preferência, entre o 3º e o 7º dia.

Padrão-ouro para pacientes sintomáticos na fase aguda.

• Testes imunológicos (para detecção de anticorpos IgM, IgA


e/ou IgG):

Imunocromatografia (testes rápidos);

Ensaio imunoenzimático (ELISA);

Quimioluminescência (CLIA) ou
Eletroquimioluminescência (ECLIA);

Imunofluorescência direta e indireta.

Indicações: Sintomáticos, na fase convalescente da doença,


com coleta da amostra recomendada a partir do 8° dia após o
início dos sintomas, por meio de coleta de sangue e
Assintomáticos.

ELISA e Quimioluminescência apresentam desempenho


analítico superior aos testes rápidos.

Observações: os testes sorológicos (teste rápido, ELISA,


ECLIA, CLIA) não devem ser utilizados isoladamente para
estabelecer a presença ou ausência da infecção pelo SARSCoV-
2, nem como critério para isolamento ou sua suspensão,
independentemente do tipo de imunoglobulina (IgA, IgM ou
IgG) identificada.

• Teste imunocromatográfico para pesquisa de antígeno viral


em amostras do trato respiratório superior: pode ser usado
para diagnóstico na fase aguda da doença (janela do 2º ao 7º dia
após o início dos sintomas), na indisponibilidade do teste
molecular ou quando este for negativo.

• Exames complementares inespecíficos e marcadores de fase


aguda:

Hemograma completo, gasometria arterial, coagulograma (TP,


TTPA, fibrinogênio,
D-dímero), PCR, AST, ALT, Gama-GT, creatinina, ureia,
albumina, glicemia, ferritina, DHL,
biomarcadores cardíacos (troponina, CK-MB, Pró-BNP), 25
OH-Vitamina D, eletrólitos,
hemocultura e cultura de escarro.

Elevações dos níveis de D-dímero (> 1.000 ng/mL) e ferritina


(>1.000 ng/mL) são importantes marcadores de desfechos
desfavoráveis.

c. DIAGNÓSTICO POR IMAGEM:

• Alterações tomográficas compatíveis com Covid-19:


Opacidade em vidro fosco periférico, bilateral, com ou sem
consolidação ou linhas intralobulares visíveis
(“pavimentação”);

Opacidade em vidro fosco multifocal de morfologia


arredondada com ou sem consolidação ou linhas intralobulares
visíveis (“pavimentação”);

Sinal de halo reverso ou outros achados de pneumonia em


organização.

Pico dos achados tomográficos: entre o 9º e o 13º dia.

Achados incomuns: derrame pleural, linfonodomegalia,


nódulos ou cavitações (considerar diagnóstico diferencial).

O uso de contraste endovenoso, em geral, não está indicado.

TRATAMENTO E PREVENÇÃO
• Não há, até o momento, tratamento antiviral específico.
• O tratamento baseia-se em medidas de suporte clínico, de acordo
com a gravidade do caso.

a. CASOS LEVES:

• SG sem sinais de agravamento; exame de imagem normal.


• Afastamento/tratamento domiciliar por 14 dias a contar da data
de início dos sintomas.

• Sintomáticos.
• Monitoramento a cada 24 a 48 horas, por 14 dias.
• Contatos domiciliares de paciente com SG: devem realizar as
medidas de distanciamento social por 14 dias.
b. CASOS MODERADOS:

• Evidência de doença do trato respiratório inferior (por avaliação


clínica ou radiológica) e SatO2> 93% em ar ambiente.

• Ausência de disfunções orgânicas ou instabilidade hemodinâmica


e não há indicação de ventilação mecânica ou outros
procedimentos intensivos.

• Internação hospitalar para observação e acompanhamento clínico


até a estabilização clínica (ausência de febre e dispneia por pelo
menos 48h) e laboratorial, em leito privativo ou coorte de
suspeitos/confirmados (precaução para gotículas).

• Suporte ventilatório e hemodinâmico: oxigenoterapia


suplementar, se necessário, e reposição volêmica, de acordo com
os parâmetros hemodinâmicos.

c. CASOS GRAVES (SRAG):

• Presença de um dos seguintes fatores: FR > 30 irpm; SpO < 93%


2

em ar ambiente; relação PaO2/FiO2 < 300; infiltrado pulmonar >


50%; presença de falência respiratória, choque séptico e/ou
disfunção de múltiplos órgãos.

• Isolamento de contato e respiratório (precaução para gotículas e


aerossóis).

• Internação em leito privativo ou coorte de suspeitos/confirmados.


• Suporte ventilatório:
Oxigenoterapia suplementar imediata a pacientes com
dificuldade respiratória, hipoxemia ou choque para SpO2 >
93%: cateter nasal até 5 L/min ou máscara de reservatório não
reinalante (10-15 L/min).

Não são recomendados o uso de máscara de Venturi e a


macronebulização pela disseminação de aerossóis.

Ventilação não invasiva (VNI): quarto com pressão negativa e


filtro HEPA (High Efficiency Particulate Arrestance),
equipamento com circuito duplo, filtro de barreira (ramo
exalatório), máscara orofacial ocluída (sem válvula exalatória).

Teste de VNI: duração de 30 minutos e poderá ser realizado


com parâmetros ventilatórios máximos.

Em situações especificas, na presença de profissionais


treinados, aparelho e EPI disponíveis, pode-se considerar a
cânula nasal de alto fluxo (CNAF).

Indicações de IOT (intubação orotraqueal) e VMI


(ventilação mecânica invasiva): SpO2 < 93% e/ou FR > 24
irpm e/ou sinais de esforço respiratório após oxigênio > 6
L/min ou após VNI, rebaixamento do nível de consciência,
pacientes dependentes de VNI ou que não se adaptaram a ela.

Recomenda-se o uso de máscara de reservatório ou


ressuscitador manual acoplado a filtro de barreira. NÃO
pressurizar pelo risco de contaminação por aerossóis.

Sequência rápida de intubação (SRI): Fentanil 50-100 mcg


EV; Etomidato 0,3 mg/kg ou Propofol 2 mg/kg, 3 min;
Lidocaína 2% sem vasoconstritor 40 mg; bloqueio
neuromuscular com Succinilcolina 1 mg/kg (ou Rocurônio 1,2
mg/kg, caso exista contraindicação à succinilcolina).
Estratégia ventilatória (VMI): modo ventilatório controlado
a volume (VCV) ou a pressão (PCV) com volume corrente
igual a 6mL/kg, pressão de platô < 30 cmH2O, pressão de
distensão ou Driving Pressure (= pressão de platô menos a
PEEP) < 15 cmH2O, PEEP ajustada de forma individualizada,
FiO2 ajustada para PaO2 > 60 mmHg e SpO2 > 90%, frequência
respiratória entre 20-24 rpm para manter pCO2 normal
(hipercapnia permissiva: pH > 7,2).

Recrutamento alveolar: se hipoxemia refratária.

Posição prona: se PaO2/FiO2 < 150 (mínimo de 16 horas).


Repetir se mantiver relação PaO2/FiO2 < 150.

Reposição volêmica conservadora (balanço hídrico zerado)


para pacientes com insuficiência respiratória sem hipoperfusão
tecidual (sem sinas de choque).

Evitar transportar com máscara de Venturi, devido ao risco de


transmissão.

Usar cateteres em linha para sucção das vias aéreas e


pinçamento do tubo endotraqueal quando for necessário
desconectar.

Associação de Propofol (máx. 3 mg/kg/h) com Fentanil (25-50


mcg/h): 1ª escolha para sedação/analgesia.

Alvo da sedação durante as primeiras 48 horas de VM: RASS


-5.

Bloqueador neuromuscular contínuo: quando houver


dissincronia paciente-ventilador grave e persistente.
• Sinais de choque séptico: expansão rápida com solução
cristaloide (30 mL/kg) na 1ª hora.

• Vasopressores (Noradrenalina): se hipotensão refratária à


ressuscitação volêmica (manter PAM > 65 mmHg).

• Antibioticoterapia endovenosa: se suspeita de pneumonia


bacteriana associada (coletar culturas antes de iniciar o
antibiótico).

Não há indicação de antibiótico profilático em pacientes com


Covid-19.

• Corticoterapia sistêmica: Dexametasona 10 a 20 mg EV uma


vez ao dia por 10 dias ou Metilpredinisolona 40 a 120 mg EV
uma vez ao dia por 5 a 10 dias.

• Oseltamivir empírico:
Todos os casos de SRAG até resultado de PCR para Covid-19
ou em casos confirmados de Influenza;

SG com fatores de risco para complicações (grupos de risco


com SG).

Dose habitual: 75 mg via oral 12/12 horas por 5 dias.

Anticoagulação profilática – indicada para todos os casos


hospitalizados:

Enoxaparina 40 a 60 mg SC 1x/dia (cautela em pacientes com


disfunção renal) ou Heparina não fracionada (HNF) 5.000 UI
SC 2 a 3x/dia.

• Anticoagulação terapêutica: não há até o momento evidências


que justifiquem o seu uso de rotina na Covid-19 e não está
recomendada até a presente data pelas sociedades
internacionais.

Reservada para pacientes com indicações: FA, TEP, TVP, entre


outras.

Enoxaparina 1mg/kg via SC a cada 12 horas (necessário ajuste


em pacientes com disfunção renal).

• Fenômenos hemorrágicos/Coagulopatias (CIVD): transfusão


de hemocomponentes (concentrado de hemáceas, plaquetas,
plasma fresco, crioprecipitado, vitamina K).

• INDICAÇÕES DE ADMISSÃO NA UTI:


Insuficiência respiratória aguda com necessidade de VMI ou
VNI.

Necessidade de FiO2 > 50% para manter SpO2 > 94%.

PaCO2 ≥ 50 mmHg e pH ≤ 7,35.

Pacientes com instabilidade hemodinâmica ou choque (PAS <


90 mmHg ou PAM
< 65 mmHg).

d. MEDIDAS DE PREVENÇÃO E CONTROLE:


• As principais medidas incluem: distanciamento social, etiqueta
respiratória (cobrir nariz e boca com lenço de papel ou com o
antebraço ao tossir ou espirrar, descartar adequadamente o lenço
utilizado, evitar tocar olhos, nariz e boca com as mãos não
lavadas, manter uma distância mínima de cerca de 1 metro de
qualquer pessoa tossindo ou espirrando, evitar contato físico,
higienizar com frequência objetos, não compartilhar objetos de
uso pessoal, evitar aglomerações e manter os ambientes limpos e
bem ventilados), higienização das mãos, uso de máscaras, limpeza
e desinfeção de ambientes.

• Isolamento de casos suspeitos e confirmados conforme


orientações médicas.

• Monitoramento de contatos próximos: isolamento domiciliar por


um período de até 14 dias após a data do último contato com o
caso confirmado.

• Profissionais da saúde em contato com pacientes suspeitos ou


confirmados devem fazer uso adequado dos EPIs (Equipamentos
de proteção individual) – gorro descartável,
avental/capote/macacão impermeável de mangas longas, punhos
de elástico e abertura posterior, óculos de proteção, protetor facial
(face shield), luvas de procedimento e máscara cirúrgica comum
(máscara tipo N95 ou PFF2 ou PFF3 sem válvula de exalação: em
procedimentos que geram aerossóis – IOT, VNI, traqueostomia,
ressuscitação cardiopulmonar, ventilação manual antes da
intubação, broncoscopias e coletas de amostras nasotraqueais).

• Procedimentos que geram aerossóis: devem ser realizados,


preferencialmente, em uma unidade de isolamento respiratório
com pressão negativa e filtro HEPA (High Efficiency Particulate
Arrestance); uso obrigatório e adequado dos EPIs.
e. ORIENTAÇÕES PARA ISOLAMENTO:

• SG com confirmação para Covid-19: recomenda-se o


isolamento, suspendendo-o após 10 dias do início dos sintomas,
desde que esteja há pelo menos 24 horas afebril e sem sintomas
respiratórios.

• SRAG com confirmação para Covid-19: recomenda-se o


isolamento, suspendendo-o após 20 dias do início dos sintomas
OU após 10 dias com resultado RT-qPCR negativo, desde que
esteja há pelo menos 24 horas afebril e sem sintomas
respiratórios.

• SG com resultado de exame laboratorial não reagente: o


isolamento poderá ser suspenso, desde que individuo esteja afebril
há pelo menos 24 horas e sem sintomas respiratórios.

• Casos de SRAG hospitalizados com um primeiro teste de RT-


qPCR negativo: um segundo teste deve ser realizado 48 horas
após o primeiro; se os 2 testes forem negativos, o paciente poderá
ser retirado do isolamento.

• Indivíduos assintomáticos confirmados laboratorialmente


(RT-qPCR detectável ou teste rápido para detecção de antígeno
reagente): manter isolamento, suspendendo-o 10 dias após a data
de coleta da amostra.

• Casos confirmados em indivíduos severamente


imunocomprometidos: o teste molecular deve ser considerado
para descontinuidade do isolamento.

REFERÊNCIAS
1. World Health Organization. Transmission of SARS-CoV-2: implications for infection
prevention precautions. World Health Organization. [Internet]; 2020. [acesso em
05/09/2020]. Disponível em: https://www.who.int/news-
room/commentaries/detail/transmission-of-sars-cov-2-implications-for-infection-
prevention-precautions.
2. World Health Organization. Clinical management of COVID-19: interim guidance. World
Health Organization. [Internet]; 2020. [acesso em 05/09/2020]. Disponível em:
https://www.who.int/publications/i/item/clinical-management-of-covid-19.
3. Colégio Brasileiro De Radiologia (CBR). Recomendações de uso de métodos de imagem
para pacientes suspeitos de infecção pelo COVID-19. São Paulo: CBR; 2020.
4. Centers for Disease Control and Prevention. People with certain medical conditions.
Coronavirus Disease 2019 (COVID-19). Centers for Disease Control and Prevention.
[Internet]; 2020. [acesso em 06/09/2020]. Disponível em:
https://www.cdc.gov/coronavirus/2019.
5. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de Vigilância
Epidemiológica. Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional pela Doença pelo
Coronavírus 2019. Vigilância de Síndromes Respiratórias Agudas - COVID-19.
Brasília/DF: Ministério da Saúde; 2020.
6. Associação De Medicina Intensiva Brasileira (AMIB). Orientações sobre o manuseio do
paciente com pneumonia e insuficiência respiratória devido a infecção pelo Coronavírus
(SARS-CoV-2). Versão n. 3, 2020. São Paulo; AMIB; 2020.
7. Ministério da Saúde (BR). Orientações para manejo de pacientes com COVID-19.
Disponível em: https://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2020/June/18/Covid19-
Orientac--o--esManejoPacientes.pdf. Brasília/DF: Ministério da Saúde; 2020.
5.1
CÓLICA NEFRÉTICA
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Patrícia Vas Tostes Mendes

DEFINIÇÕES
A cólica renal aguda ou cólica nefrética é um sintoma que cursa com dor
intensa, sendo uma das principais procuras por atendimento médico em
pronto-socorro. Refere-se a um conjunto de sintomas que podem ter origem
em patologias intrínsecas ou extrínsecas, do foro urogenital ou ginecológico,
havendo a necessidade de descartar estas hipóteses durante a investigação de
um doente com a clínica referida.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• A grande maioria dos casos (90%) de cólica renal ocorre devido a
cálculos urinários, causando obstrução ureteral (litíase urinária
obstrutiva). A dor é provocada pelo espasmo do ureter ao tentar
vencer o obstáculo obstrutivo, originando distensão uretérica,
pielocalicial e da cápsula renal.

• Os fatores de risco estão relacionados com:


Sexo: mais frequente no sexo masculino;

Idade: entre 30 a 40 anos;

História familiar positiva: alterações anatômicas do trato


urinário, como duplicidade pielocalicial, rim em ferradura, rim
espongiomedular e rins policísticos;
Hábitos de vida: sedentarismo, dieta rica em proteína animal e
sal e pouca ingesta de água, com consequente redução do
volume urinário;

Infecções do trato urinário (principalmente por bactérias


produtoras de urease);

Doenças endócrinas: doenças que interferem no metabolismo


do cálcio, como hiperparatireoidismo primário;

Distúrbios metabólicos: hipercalciúria idiopática,


hipersecreção de ácido úrico, hiperoxalúria, entre outros.

QUADRO CLÍNICO
• Dor lombar intensa, de início súbito, sem posição ou movimento
atenuante, com irradiação dependendo da localização do cálculo
renal:

Ureter proximal: a dor irradia anteriormente;

Ureter distal: a dor pode irradiar-se, no homem, para o


testículo ipsilateral e, na mulher, para o lábio vaginal ipsilateral;

Junção ureterovesical: observa-se a frequência e a urgência


urinárias alteradas.

• Sintomas urinários e sistêmicos: disúria, polaciúria e hematúria,


náuseas, vômitos, palidez, sudorese e taquicardia.

EXAME FÍSICO
• O exame físico, quando isolado, raramente direciona ao
diagnóstico.

• Pode estar presente dor intensa à palpação abdominal, porém sem


sinais de irritação peritoneal e dor a punho-percussão da região
lombar com irradiação para ventre (Sinal de Giordano).

• Aparelho cardiovascular e respiratório sem alterações.


EXAMES COMPLEMENTARES
a. Hemograma: pode haver leucocitose.

b. Urina tipo I:

• Leucocitúria significativa e nitrito positivo: atentar-se à associação


com infecção do trato urinário;

• Hematúria;
• Cristais no sedimento.
c. Urocultura: quando houver indicação para afastar quadro
infeccioso.

d. Radiografia simples de abdome: pode não ser visualizado um


cálculo renal ou ureteral, mesmo se radiopaco, caso tenha dimensões
reduzidas.

e. Ultrassonografia de abdome: visualiza apenas os rins e,


possivelmente, o segmento proximal do ureter, não detectando os
cálculos ureterais distais.

f. Tomografia computadorizada helicoidal de abdome sem


contraste (padrão-ouro):

• Alta sensibilidade.
• Não usa contraste.
• Permite a visualização de cálculos de ácido úrico.
• Detecta cálculos com diâmetros < 1 mm.
• Evidencia cálculo ureteral ou sua passagem recente.
Tanto a leucocitose quanto a leucocitúria podem estar presentes, mas não
são patognomônicos de infecção do trato urinário. Essas alterações podem
ocorrer devido ao processo inflamatório provocado pelo fator obstrutivo;
portanto, sempre devem ser correlacionadas com os achados clínicos para
não se prescrever antibiótico indiscriminadamente.
Evitar solicitação de exames com contraste na crise aguda, como, por
exemplo, a urografia excretora.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico de cólica nefrética é clínico (anamnese e exame físico),
seguido de exames complementares descrito a seguir.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Aumentar a ingesta de alimentos ricos em potássio e frutas


cítricas.
• Diminuir a ingesta de sal e adequar a ingestão de proteína animal.
• Ingestão de cálcio e oxalato de cálcio deve ser balanceada.
• Adequar a dieta de acordo com o distúrbio metabólico.
• Aumento da ingesta hídrica (30 mL/kg peso corpóreo).
• Praticar atividade física.
b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Se o paciente estiver estável e responder à terapia analgésica,


exames de imagem podem ser adiados por duas a três semanas. Em
pacientes cujos cálculos não passem ou os sintomas persistam,
necessita-se de exame de imagem.

• A internação hospitalar é necessária em pacientes que não toleram


a ingestão oral ou que têm dor refratária e/ou febre.

• CRISE AGUDA:
Analgesia é prioridade para o controle da dor. Usam-se anti-
inflamatórios não esteroidais (AINEs) e opioides. A vantagem
dos AINEs é que eles diminuem o tônus do músculo.

Hidratação com cautela: apenas repor perdas hídricas diárias


devido ao risco de hidronefrose.

Planejar o procedimento para resolução da litíase (de acordo


com tamanho, localização e se presença de obstrução e/ou
infecção).
• ANTIBIOTICOTERAPIA: SE ASSOCIAÇÃO COM
INFECÇÃO URINÁRIA

Após a crise aguda, realizar a investigação metabólica


ambulatorialmente, para fins de acompanhamento,
principalmente em pacientes com episódios recorrentes,
intervenções urológicas prévias, história familiar significativa,
crianças e rim único. Alguns exames são: dosagens séricas de
cálcio, ácido úrico, fósforo, creatinina; dosagens urinárias de
cálcio, ácido úrico, oxalato, citrato e pH urinário.

De acordo com o distúrbio metabólico, é indicada a prescrição


de drogas como Tiazídicos, se Hipercalciúria, ou Alopurinol, se
hiperuricosúria.
FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Adpatado de Türk C et al, 2012.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente A. M. C., sexo masculino, 38 anos, dá
entrada no Pronto-Socorro com dor intensa em região lombar à
esquerda há 5 horas, de início súbito e irradiação para flanco esquerdo,
sem fator atenuante ou agravante, com piora há 2 horas, associada com
hematúria, náuseas e vômitos, porém sem disúria e febre. Paciente com
história prévia de nefrolitíase, com último episódio de cólica nefrética
com eliminação de um cálculo renal há 3 anos.
b. Exames físicos:

• Ectoscopia: Ao exame físico, Sinal de Giordano presente; PA:


130x90 mmHg; FC: 98 bpm; FR: 20 ipm; Tº: 37,2°C; SatO2: 98%.
Demais aparelhos sem alterações.

c. Exames complementares: Hemograma e urina I, sem alterações.


Tomografia computadorizada helicoidal de abdome sem contraste:
cálculo de 4 mm em ureter proximal à esquerda com moderada
hidronefrose. (Exames complementares indicados devido histórico de
nefrolitíase e risco de hidronefrose graves e outras complicações.) Uma
opção neste caso seria a realização de uma ultrassonografia de rins e
vias, principalmente se não há a acessibilidade a um tomógrafo.

d. Prescrição sugerida:

1. Dieta zero até segunda ordem (paciente apresentando vômitos,


risco de bronco aspiração);
2. SF0,9% 500 mL EV em 1h (a critério médico), a depender da
gravidade da hidronefrose;
3. Cetoprofeno 50 mg/mL 1 ampola + SF 0,9% 100 mL EV de
12/12h até segunda ordem (tratamento de primeira escolha);
4. Tramadol 50 mg/mL 1 ampola + SF 0,9% 100 mL EV de 6/6h (a
critério médico) (tratamento de segunda escolha).
5. Dipirona 500 mg/mL + butilbrometo de escopolamina 4 mg/mL 1
ampola + ABD 20 mL EV de 8/8h (a critério médico) (tratamento
de terceira escolha);
6. Ondansetrona 2 mg/mL 1 ampola + SF 0,9% 100 mL EV se
náuseas ou vômitos;
7. Sinais vitais e cuidados gerais de 4/4h.
Avaliação da Equipe de Urologia para definir conduta
intervencionista, como litotripsia extracorpórea por ondas de choque e
passagem de Cateter duplo J (para manter a via excretora pérvia).
DICAS DO ESPECIALISTA
• Em pacientes com cálculos ureterais < 10 mm, algumas
literaturas consideram < que 7mm (sem a indicação de remoção
ativa), a simples observação com avaliações periódicas é uma
opção de tratamento inicial.

• Os cálculos renais deverão ser tratados em caso de crescimento, de


obstrução urinária, de infecção sobreposta e de dor (aguda e/ou
crônica) associada.

• No tratamento conservador, chamado de terapia médica expulsiva


(TME), os alfa-bloqueadores (Tansulosina) e/ou a Nifedipina
estão recomendados.

• Os pacientes devem ser orientados sobre os riscos da TME,


incluindo os efeitos colaterais das drogas utilizadas. Deve-se
mencionar o emprego off-label destas drogas nesta indicação.

• Os pacientes devem estar com o controle adequado da dor, sem


evidência de sepse e com função renal preservada para serem
seguidos ambulatorialmente com exames de imagem para
monitorar a posição do cálculo e para avaliar a presença de
dilatação pielocalicial.

• A tomografia sem contraste também contribui para avaliação da


densidade do cálculo e taxa de sucesso da Litotripsia extracorpórea
(LECO). Quanto mais elevada a densidade do cálculo, avaliada em
Unidades Hounsfield (UH), mais difícil será sua fragmentação.
Assim, a fragmentação de cálculos com até 500 UH é de cerca de
100%, entre 500 e 1000 UH, 85,7% e acima de 1000 UH, 54,5%.

• Após alta hospitalar devido à crise aguda de cólica nefrética,


sempre encaminhar o paciente para seguimento ambulatorial de
Nefrologia e Urologista.
REFERÊNCIAS
1. Heilberg IP, Schor N, Santos DR, Cheidde L, Noronha I, Duarte RJ. Diretrizes de litíase
urinária da sociedade brasileira de nefrologia. J Bras Nefrol. 2002; 24: 2003-7.
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Atheneu; 2011.
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Urol Nephrol. 2006; 40(2): 119-24.
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6. Türk C, Knoll T, Petrik A, Sarica K, Seitz C, Straub M. Diretrizes para urolitíase. Sociedade
Brasileira de Urologia. Última atualização: Fevereiro de 2012.
5.2
INJÚRIA RENAL AGUDA
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Lucas Augusto Cecílio Chagas da Silva

DEFINIÇÕES
• Injúria renal aguda (IRA) é caracterizada por uma queda abrupta,
pelo menos em parte, e de curso reversível do Ritmo de Filtração
Glomerular (RFG), que, à luz da fisiopatologia, ocasiona a
retenção sérica de escórias do metabolismo nitrogenado pelos rins,
sendo os mais conhecidos a ureia e a creatinina. Essas alterações
cursam com a desregulação do volume extra/intracelular e
consequentes distúrbios eletrolíticos. Tais alterações, por meio de
vários critérios que têm sido adaptados e unificados, ajudarão na
conduta médica para o adequado manejo da injúria, segundo
quaisquer etiologias.

• Classificação clínica
I. anúrica total: 0 a 20 mL/dia
II. anúrica: 20 a 100 mL/dia
III. oligúrica: 101 a 400 mL/dia
IV. não oligúrica: 401 a 1200 mL/dia
V. poliúrica: 1201 a 4000 mL/dia
VI. hiperpoliúrica: > 4000 mL/dia

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Sepses.
• Choque circulatório.
• Queimaduras.
• Cirurgia de grande porte (não cardíacas).
• Contrastes radiopacos iodados.
• Desidratação.
• Idade avançada.
• Sexo feminino.
• Raça negra.
• Diabetes mellitus.
Foi tradicionalmente dividida em três grandes grupos por didática (a
priori), pois a abordagem deve ser hermética para que não se negligenciem
outras causas múltiplas que podem se sobrepor à causa de base, não
necessariamente do mesmo grupo:

a. IRA pré-renal:

• Mais comum (≅ 60% dos casos).


• Secundária à hipoperfusão renal (hipovolemia ou redução do
volume circulante efetivo):

Redução do volume intravascular.


Redução do débito cardíaco.

Redução do volume arterial efetivo.

Redução do fluxo plasmático renal.

• Na maioria dos casos, a diurese é reduzida a menos de 400


mL/dia.

• [Na ]
+
muito baixa (< 20 mEq/L).
URINÁRIO

• FE < 1% (FE = fração de excreção renal de sódio).


Na Na

• Osmolalidade urinária elevada (> 500 mOsm/kg).


• Parênquima renal permanece íntegro (quando como causa
isolada).

b. IRA renal/intrínseca:

• Ocorre em ≅ 35% dos casos.


• Origem isquêmica ou nefrotóxica.
• Há perda da integridade do parênquima renal.
• É avaliada de acordo com os diferentes pontos histológicos renais:
Vascular: vasculites (GN necrosante pauci-imune, poliarterite
nodosa, granulomatose de Wegener, “doença do soro”),
microangiopatias (Síndrome Hemolítico-Urêmica (SHU),
Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT), síndrome HELLP,
hipertensão arterial maligna, esclerodermia e doença
aterotrombótica (embolização de colesterol) e macroangiopatias
(estenose de artérias renais, aneurismas e displasias).

Glomerular: glomerulopatias pós-infecciosas (GN difusa pós-


estreptocócica, endocardite, vírus, abcessos sistêmicos e shunts).
GNs membranoproliferativas e GNs rapidamente progressivas
(idiopática, Lúpus Eritematoso Sistêmico [LES], Wegener,
poliarterite nodosa, Síndrome de Goodpasture, púrpura de
Henoch-Schönlein [PHS], SHU e esclerodermia).

Tubular (Necrose Tubular Aguda (NTA)): isquemia


secundária à causa pré-renal, toxinas e medicamentos
(aminoglicosídeos, anfotericina B, ciclosporina, cisplatina,
venenos de animais peçonhentos, aciclovir, anti-inflamatórios
não esteroidais (AINEs), contrastes iodados e toxinas
bacterianas), toxinas endógenas (rabdomiólise, hemólise por
malária, reação transfusional e deficiência de G6PD (glicose-6-
fosfato-desidrogenase) e hiperuricemia nos casos de Síndrome
de Lise Tumoral.

Intersticial: medicamentos (penicilinas, AINEs, diuréticos,


sulfonamidas, cefalosporinas e rifampicina), doenças
autoimunes (LES, Síndrome de Sjögren [SS], uveíte, nefrite
intersticial e doença mista do tecido conjuntivo), infecções
(pielonefrites, principalmente) e infiltrações (linfomas,
sarcoidose, rejeição celular aguda pós-transplantes e leucemias).

c. IRA pós-renal:

• Mais rara (≅ 5% dos casos).


• Decorre da obstrução aguda do trato urinário.
• Geralmente há hidronefrose na ultrassonografia ou na tomografia.
• É avaliada e tratada de acordo com o nível/local de obstrução,
devendo ser corrigida o quanto antes para impedir a sobreposição
de injúria renal propriamente dita:

Uretral e pélvica: obstrução intrínseca (coágulos e cálculos


renais), infecções (fúngicas e bacterianas) e obstruções
extrínsecas (Hiperplasia Prostática Benigna (HPB), CA de
próstata e CA metastáticos de outros sítios).

Bexiga: bexiga, neurogênica, carcinoma de bexiga (dessa


última, sempre suspeitar na hematúria microscópica
assintomática) e cálculos, como na Síndrome do Coágulo
Retido.

Uretra: estreitamentos, cicatrizes e fimose.

QUADRO CLÍNICO
• Cardiovasculares: hipervolemia (hipertensão leve), congestão
pulmonar (deverá haver estertoração pulmonar bilateral), derrame
pleural (DP), ascite, edema agudo de pulmão (EAP), insuficiência
respiratória aguda (IRpA), arritmias, desidratação e hipotensão
(desde o choque até a parada cardiorrespiratória (PCR)).

• Respiratórios: taquipneia e respiração profunda (padrão


respiratório de Kussmaul, em decorrência do(s) distúrbio(s)
acidobásico(s) e/ou hidroeletrolítico(s) subjacente(s)).

• Neurológicos: podem ser deduzidos pela uremia, podendo o


paciente cursar com confusão mental, sonolência, convulsões e até
coma. Mais raramente podem ocorrer sintomas em decorrência de
hipocalcemia (parestesias, periorais, cãibras, sinal de Chvostek,
sinal de Trousseau, tetania espontânea).
• Gastrintestinais: soluços, vômitos, hemorragias digestivas, dor
e/ou massas palpáveis no abdome.

• Diurese: apesar do volume urinário poder variar entre os extremos


(da anúria a poliúria), o padrão de diurese, se avaliado com
esmero, pode ter bastante valia semiológica e, portanto, pré-
diagnóstica, como se segue:

Anúria: obstrução urinária bilateral ou obstrução arterial bilateral.

Poliúria: uso de Aminoglicosídeo e lítio, por exemplo.

Oligúria: uso de AINEs.

Alternância (anúria/diurese): obstrução urinária intermitente.

EXAME FÍSICO
• Sinais e sintomas da IRA dependem da causa e do grau de
comprometimento da função renal, sendo frequentemente
inespecíficos e mascarados pela doença de base. A observação de
sinais de hipovolemia e hipotensão arterial ou sinais de obstrução
do trato urinário auxiliam o diagnóstico diferencial de IRA pré ou
pós-renal. Deve-se procurar sinais associados com a etiologia e
complicações da IRA.
A presença de livedo reticular e microinfartos digitais podem sugerir
doença renal ateroembólica. Pacientes com dispneia, ortopneia, edema,
turgência jugular e estertoração pulmonar podem estar hipervolêmicos,
enquanto aqueles com fraqueza muscular ou paralisia ascendente podem
estar com Hiperpotassemia.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Ureia e creatinina séricas: estão sempre aumentados na IRA.
• Apenas vale ressaltar que os níveis de ureia sérica podem se
alterar em sangramentos gastrintestinais, dicas ricas em
proteínas, febre, traumas, processos infecciosos e
medicamentos, mais comumente os corticoides.

• Deve-se utilizar o Clearance estimado de creatinina para o


estabelecimento do nível real da função renal.

Cockcroft & Gault – Clearence de Cr (ml/min) = (140-idade) x Peso / (72 x


Cr).
Sexo feminino = Clearance x 0,85 Idade: anos; peso: kg; Cr plasmática:
mg/Dl.

b. Fração de excreção urinária de sódio: reflete a integridade do


processo de reabsorção tubular, com frações de excreção abaixo de 1%
quando não há dano tissular que interfira na sua reabsorção (IRA pré-
renal). Daí sua importância imperativa como teste para distinguir
doença pré-renal da NTA como etiologia de base na IRA:

FENa = [Na]URINA/[Na]PLASMA ÷ [creatinina]URINA/[creatinina]PLASMA x 100

c. Análise qualitativa e quantitativa da urina: a análise


microscópica da urina ajuda a direcionar a investigação da(s) causa(s)-
base, como a presença de leucócitos (infecção e/ou inflamação renal,
predomínio de eosinófilos nas GNs rapidamente progressivas e nefrite
intersticial aguda, além de prostatites e complicações por embolização
de colesterol), hemácias (confirmam/excluem a hematúria franca
levando a depósito de pigmentos; dismorfismos também são
importantes, podendo a presença de acantócitos estar associada a
hematúria de origem glomerular), cilindros (podem ser hialinos
[desidratação], hemáticos (patognomônico de injúria glomerular),
leucocitários (injúria parenquimatosa), granulosos (restos celulares,
característicos na NTA) e lipoides (ocorrem na lipidúria, comum em
casos de síndromes nefróticas) e cristais (ácido úrico [IRA por lise
tumoral] e oxalato de cálcio [intoxicação por etilenoglicol]).
d. Bioquímica sérica e outros exames laboratoriais: também
ajuda na orientação para definição da etiologia (Quadro 1 e tabela 1).
ALTERAÇÃO POSSÍVEIS CAUSAS

Aumento de CPK + mioglobinúria Rabdomiólise

Hiperuricemia Litíase renal, neoplasia, lise tumoral

Hipercalcemia Neoplasia

Eletroforese de proteína com pico monoclonal Mieloma múltiplo

ASLO (antiestreptolisina O) positivo GN pós-estreptocócica

Hemólise, aumento de DHL, trombocitopenia,


SHU, PTT
hiperbilirrubinemia indireta

Eosinofilúria Nefrite intersticial alérgica

FAN e anti-DNA positivo LES

Hipocomplementemia LES, endocardite, GN pós-infecciosa

Anticorpo antimembrana basal Síndrome de Goodpasture

ANCA (anticorpo citoplasmático


Granulomatose de Wegener
antineutrófilo) positivo

Quadro 1. Principais alterações laboratoriais e suas possíveis causas.


Fonte: adaptado de Yu et al, 2007

e. Testes hematológicos: anemia (multifatorial), prolongamento do


tempo de sangramento (plaquetopenia, disfunção plaquetária ou
anormalidades dos fatores de coagulação), eosinofilia (nefrite
intersticial aguda), consumo de plaquetas (SHU, PTT e CIVD
[Coagulação Intravascular Disseminada]).
EXAME PRÉ-RENAL RENAL

FENA (%) <1 >1

NaU [mEq/L] < 20 > 20

Osmolalidade da urina (mOsm/Kg) > 500 < 250


Relação sérica (ureia/creatinina) > 40 < 20

Relação (creatininaURINA/creatininaPLASMA) > 40 < 20

Relação (ureiaURINA/ureiaPLASMA) >8 <3

Densidade urinária > 1.020 < 1.015

FEU (%) < 35 > 50

Cilindros Hialinos Granulosos

Índice de insuficiência renal (IIR*) <1 >1

* IIR: sódioURINÁRIO/creatininaURINÁRIA/creatininaPLASMÁTICA

Tabela 1. Diferenças entre IRA pré-renal e renal.


Fonte: adaptado de Yu et al, 2007

f. Exames de imagem
Têm sua valia na busca de causas-base para a IRA. Podem ajudar a
topografar, tanto a nível anatômico quando histológico, qualitativa e
quantitativamente, as alterações parenquimatosas, o que é fundamental na
diferenciação de IRA e Doença Renal Crônica (há tempos chamada de
insuficiência renal crônica [IRC]).

• Ultrassonografia: exame inicial de escolha. Deve ser realizada


em TODOS os pacientes com IRA de causa indeterminada.

• Tomografia computadorizada: complementa a USG na


visualização de cálculos e obstruções. Atentar para a profilaxia
caso seja necessário o uso de contraste iodado no exame.

• Angiorressonância: tem seu lugar na suspeição de lesões


vasculares. É vantajosa por não necessitar de contraste iodado e
poder ser feito em gestantes com IRA. Apenas deve ser evitada se
o clearance de creatinina for menor que 30 mL/min, pelo risco de
fibrose quando do uso do gadolínio durante o exame.
• Cintilografia: útil na avaliação da função e fluxo renais, assim
como quando se suspeita de nefrite intersticial aguda (o uso do
gálio no exame mostra captação da lesão com elevadas
sensibilidade e especificidade).

DIAGNÓSTICO DE IRA
• História clínica compatível.
• Queda do débito urinário.
• Aumento de ureia e creatinina.
• Avaliando estes dados podemos nos guiar pelo fluxograma 1
apresentado a seguir;

• As causas de base e a avaliação do grau da morbidade da injúria


são feitas com base em critérios diagnósticos, que ao longo do
tempo vêm sendo atualizados e reestruturados com novas
metanálises, como as que seguem abaixo:

a. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DE IRA

• Estágios de RIFLE pela Acute Dialysis Quality Initiative


(ADQI)

Risco (Risk): [aumento de 150% (1,5 vez) da creatinina sérica


ou diminuição de 25% do RFG] ou [diurese < 0,5 mL/Kg/h por
6 horas].

Injúria (Injury): [aumento de 200% (2 vezes) da creatinina


sérica ou diminuição de 50% do RFG] ou [diurese < 0,5
mL/Kg/h por 12 horas].
Falência (Failure): [aumento de 300% (3 vezes) da creatinina
sérica, redução de 75% do RFG ou creatinina sérica > 4 mg/dL
com aumento agudo > 0,5 mg/dL] ou [diurese ≤ 0,3 mL/Kg/h
por 24 horas ou anúria por 12 horas].

Perda (Loss): necessidade de diálise por perda completa da


função renal por mais de 4 semanas.

• Estágio terminal (End-stage): perda completa da função renal


por mais de 3 meses.

• Estágios pela Acute Kidney Injury Network (AKIN)


Proposta posteriormente à RIFLE, simplifica a classificação em
3 estágios e os dois últimos são dispostos como desfechos da
injúria.
Estágio 1: [aumento da creatinina sérica ≥ 0,3 mg/dL ou
aumento de 150% a 200% (1,5 a 2 vezes) em relação à
creatinina de base] e/ou [diurese < 0,5 mL/Kg/h por
6 horas].
Estágio 2: [aumento da creatinina sérica em mais 200% a
300% (2 a 3 vezes) em relação à creatinina de base] e/ou
[diurese < 0,5 mL/Kg/h por 12 horas].
Estágio 3: [aumento da creatinina sérica maior que 300% (3
vezes) em relação à creatinina de base ou creatinina de base ≥
4 mg/dL com aumento agudo ≥ 0,5 mg/dL] e/ou [diurese < 0,3
mL/Kg/h por 24 horas ou anúria por 12 horas].

• Estágios pela Kidney Disease: Improving Global Outcomes


(KDIGO)

Proposta posteriormente aos dois últimos, mescla ambas as


classificações em 3 estágios para padronizar a definição e
classificação da IRA.
• Estágio 1: [aumento da creatinina sérica ≥ 0,3 mg/dL ou
aumento da creatinina sérica de 1,5 a 1,9 vez em relação à
creatinina de base] e/ou [diurese < 0,5 mL/Kg/h por 6 a 12
horas].
• Estágio 2: [aumento da creatinina sérica de 2 a 2,9 vezes em
relação à creatinina de base] e/ou [diurese < 0,5 mL/Kg/h por
6 a 12 ou mais horas].
• Estágio 3: [aumento da creatinina sérica maior que 3 vezes em
relação à creatinina de base, aumento da creatinina sérica para
≥ 4 mg/dL, necessidade de Terapia Renal Substitutiva (TRS)]
e/ou [diurese < 0,3 mL/Kg/h por 24 horas ou anúria por 12
horas].

TRATAMENTO
Idealmente dever-se-ia prevenir a vigência da IRA. Na sua instalação, o
cerne do tratamento é basicamente de suporte, reservando-se a Terapia Renal
Substitutiva (TRS) para casos particulares com lesão renal grave. Realizar a
terapia de suporte requer conhecimento prévio das principais complicações e
as indicações francas de TRS.

a. Indicações francas de TRS:

• Hipercalemia (K +
PLASMA > 6,5 mEq/L) refratária ou de rápido
aumento.

• Acidose metabólica refratária (pH < 7,1).


• Sinais clínicos de uremia (mais comumente a encefalopatia).
• Sobrecarga hídrica refratária às terapias diuréticas.
b. Lesões potencialmente reversíveis:
• IRA isquêmica: restabelecimento do estado hemodinâmico e da
pressão de perfusão renal.

• IRA tóxica: eliminação das toxinas e alcalinização do plasma.


• IRA pós-renal: reversão precoce da obstrução.
c. Complicações e seus respectivos manejos:

• Hipercalemia:
Restrição de potássio (ajustes na dieta do paciente).

Solução polarizante.

Inalação com ß-2-adrenérgico (Berotec®, por exemplo).

Resinas de troca (Sorcal®, por exemplo).

Gluconato de cálcio (pela instabilidade elétrica do miocárdio).

Diálise (em hipercalemias graves, como já indicado).

• Hipocalcemia:
Sintomas leves: carbonato de cálcio via oral.

Sintomas moderados/intensos: cálcio intravenoso.

• Hipervolemia:
Restrição rigorosa de sódio (< 3 g/dia).
Restrição rigorosa de água (< 1 L/dia).

Uso de diuréticos (cautela na nefro toxicidade).

Diálise (se refratária aos diuréticos, como já indicado).

• Hipermagnesemia:
Curso geralmente assintomático, acompanhando o manejo (ou
não) da hipercalemia.

• Hiperfosfatemia:
Restrição dietética (< 800 mg/dia).

Hidróxido de alumínio via oral.

Carbonato de cálcio via oral/intravenosa.

• Hiperuricemia:
Costuma necessitar de terapia apenas na Síndrome da Lise
Tumoral.

• Acidose metabólica:
Manter BIC > 15 mEq/L e pH > 7,2.

Diálise (se pH < 7,1, como já indicado).

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1. Abordagem sindrômica na IRA.
Fonte: adaptado de Yu et al, 2007

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 56 anos, tabagista
crônico (1 maço/dia por 36 anos), sedentário, com diagnósticos prévios
de diabetes mellitus tipo II e hipertensão arterial sistêmica,
dislipidemia, síndrome metabólica e espondiloartrose, todas em
tratamento (metformina 850 mg VO 8/8h, glibenclamida 5 mg VO
12/12h, losartana potássica 50 mg VO 12/12h, atenolol 25 mg VO
12/12h, captopril 25 mg VO 8/8h, sinvastatina 40 mg VO/noite e,
eventualmente, AINEs para crises aguda de espondiloalgia,
respectivamente), necessitou, segundo indicação do seu médico
cardiologista, da realização de cateterismo pelo elevado risco
cardiovascular, dedutível pelas próprias morbidades citadas acima.
b. Exames físicos:
• Antes do procedimento eletivo, os sinais vitais estavam estáveis e o
paciente não apresentava quaisquer sintomas. Fora realizado o exame
sem intercorrências. Dezesseis horas após o procedimento e direta
transferência para leito em unidade de terapia intensiva, o paciente
começou a se queixar de mal-estar. Uma vez suspeitada injúria renal
aguda por contraste iodado, o médico intensivista prontamente solicitou
exames laboratoriais pertinentes.
c. Exames laboratoriais: CreatininaPLASMA: 3,0 mg/dL; UreiaPLASMA:
57 mg/dL; Sedimentoscopia urinária: cilindros granulosos e debris;
FENA: 1,9%; OsmU: 180 mOsm/Kg; Relação sérica (U/Cr) = 19; NIBP
(non-invasive blood-pressure): 110/60 mmHg; Na+PLASMA: 140 mEq/L;
K+PLASMA: 5.9 mEq/L. Diurese média calculada pelo volume em bolsa
SVD: 450 mL/dia; pHA: 7,25; ECG 12dN: espículas em ondas T.

d. Prescrição Sugerida:

1. Dieta oral hipocalêmica e hipossódica para diabético. SF0,9% 500


mL 8/8h.

• SE HIPERCALEMIA:
1. SG10% – 250 ml + 5 UI de insulina regular IV em 30 minutos
(repetir, à critério médico).
2. Polietilenossulfonato de cálcio (Sorcal®) – 1 envelope: diluir em
200 ml de água (VO) 8/8h até segunda ordem.
3. SF0,9% – 10 mL + Fenoterol (Berotec®) – 10 gotas: nebulização
por 15 minutos.
4. Bicarbonato de sódio: 1 mEq/kg de peso IV, lento até cada 4 horas
(corrigindo acidose e hipercalemia).
5. Gluconato de cálcio 10% – 1 amp (EV) lenta à critério médico.

• SINTOMÁTICOS:
1. Dipirona 1 ampola + AD 10 mL (EV) se dor ou febre.
2. Metoclopramida 1 ampola + AD 10 mL (EV) 8/8h se náuseas e/ou
vômitos.
3. Ranitidina 1 ampola (EV)/dia.
4. Oxigênio por cateter nasal a 3 L/min se SaO2 < 94%.
5. Monitorização cardíaca contínua.
6. Oximetria de pulso.
7. ECG 12 derivações 1/1h até segunda ordem.
8. PA não invasiva (NIBP).
9. Cuidados gerais 1/1h e comunicar anormalidades e monitorar
diurese.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Assegure-se de que o volume intravascular esteja expandido.
Mantenha pressão arterial média acima de 80 mmHg, hematócrito
acima de 30% e oxigenação tecidual adequada.

• Evite hiper-hidratação, que poderá causar edema, hipertensão,


insuficiência cardíaca e hiponatremia. IRA é um processo
hipercatabólico, e um paciente que não estiver perdendo ao redor
de 300 g de peso corporal por dia quase certamente está em
balanço positivo de água.

• Lembre-se de que o melhor parâmetro para diagnosticar


precocemente hiper-hidratação é o peso diário. Previna
hipercalemia diminuindo a ingestão de potássio e evite drogas que
interfiram com a sua excreção. Trate agressivamente hipercalemias
graves ou sintomáticas através de infusão endovenosa de cálcio,
soluções polarizantes (glicose e insulina), uso de agonistas ß2,
correção da acidose, resinas de troca iônica e hemodiálise.

• Tome precauções extremas contra processos infecciosos. Evite


antibioticoterapia desnecessária, quebras da barreira
cutaneomucosa (sondas, catéteres etc.) e pesquise cuidadosamente
a presença de focos infecciosos. A maior causa de mortalidade em
pacientes com IRA é septicemia.

• Nutra o paciente. Tente obter o balanço nitrogenado menos


negativo possível através da administração de uma relação
calórico/proteica adequada. Evite restrições alimentares severas. Se
a sobrecarga de volume for um problema não contornável
clinicamente, inicie diálise precocemente ou a intensifique.

REFERÊNCIAS
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medicina de urgência. 2. ed. São Paulo: Atheneu; 2011.
5.3
DISTÚRBIOS DE ÁGUA E SÓDIO
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Lucas Horta de Pádua da Silva

DEFINIÇÕES
• Nos adultos, a água corresponde a cerca 60% do peso corporal de
um homem adulto e 50% do peso de uma mulher adulta, sendo 2/3
localizados no compartimento intracelular e 1/3 no extracelular
(divididos em compartimentos intravascular e intersticial).

• Lembrando que, no compartimento intracelular, o principal


responsável pela osmolaridade é o potássio e que no extracelular, o
cátion dominante é o sódio, a concentração plasmática de sódio é o
principal determinante da Osmolaridade Plasmática).

• Natremia normal: 135 a 145 mEq/L.


• Hipernatremia: É uma concentração de sódio sérico [Na ] acima+

do limite superior da normalidade (> 145 mEq/L).

• Hiponatremia: É uma concentração de sódio sérico [Na ] abaixo


+

do limite inferior da normalidade (<135 mEq/L).

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
a. DISTÚRBIOS DA ÁGUA E SÓDIO
• Principais fatores de risco para os distúrbios de água e sódio
são: diarreia, vômitos, diabetes mellitus, hipocalemia,
hipercalemia, diabetes insipidus, tumores (hipotalâmico,
craniofaringioma, glioma, pinealoma ectópico), hemorragia,
trauma, inflamação neuronal, ingestão compulsiva de água, hiper-
reninemia etc.

• Mecanismos renais de conservação ou eliminação de água:


medula renal hiperosmolar (fluxo sanguíneo medular e ureia) +
mecanismo de contracorrente (fluxo contracorrente intratubular).

• Controle da sede: o déficit de PA e o aumento da osmolaridade


extracelular estimulam o centro da sede no hipotálamo (a privação
de água desencadeia o mecanismo da sede através do aumento da
pressão osmótica do espaço extracelular e, principalmente, do
plasma).

• Secreção de Hormônio Antidiurético (ADH): produzido no


hipotálamo e liberado pela neurohipófise no sangue (o estímulo é o
aumento da pressão osmótica no plasma). Ação = Vasoconstrição
sistêmica + aumento do número de canais de aquaporinas no rim.

• Outros hormônios: catecolaminas, tireoidianos, adrenocorticais,


sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA).

• Fórmula da osmolaridade:

• Essa osmolaridade efetiva deve ser mantida na faixa normal para


impedir a transferência de fluidos entre o meio intracelular e o
meio extracelular. Consideramos como valor de referência:

• Osmolaridade Efetiva Normal: 285 a 295 mOsm/L


• A osmolaridade plasmática encontra-se diminuída na maior parte
dos pacientes hiponatrêmicos, sendo que é basicamente
determinada pela concentração plasmática de sódio. Contudo, em
poucos casos, a osmolaridade (e não a tonicidade) do plasma está
normal (como na hiperlipidemia e na hiperproteinemia) ou elevada
(hiperglicemia, administração de manitol).

• É sabido que a perda ou ganho de sódio é uma alteração na


VOLEMIA, não na NATREMIA, porque a variação de sódio não
ocorre de forma isolada; todavia, vem acompanhada de uma
variação proporcional da água, graças a um controle exercido pela
sede e pelo ADH. Então, a perda de sódio é quase sempre uma
perda de sódio + água, enquanto o ganho de sódio é quase sempre
um ganho de sódio + água.

b. HIPONATREMIA
• Hiponatremia hipovolêmica: o estado hipovolêmico estimula a
liberação de ADH.

Perda Renal (Na urinário > 20 mEq/L): deficiência


mineralocorticoide, nefropatia perdedora de sal, diuréticos
síndrome cerebral perdedora de sal, alcalose metabólica e
bicarbonatúria.

Perda Extrarrenal (Na urinário < 20 mEq/L): desidratação,


diarreia, vômito, perda para terceiro espaço (queimaduras,
pancreatite, trauma). Hiponatremia euvolêmica: Síndrome da
Antidiurese Inapropriada (SIAD), endócrina (hipotireoidismo,
insuficiência suprarrenal).

• Hiponatremia hipervolêmica: aumento de água corporal por


aumento de ADH ou incapacidade de excretar água.

Na urinário < 20 mEq/L: síndrome nefrótica, ICC, cirrose


com ascite.

Na urinário > 20 mEq/L: insuficiência renal oligúrica.

• Polidipsia primária.
• Potomania (consumo crônico excessivo de cerveja).
• Desnutrição.
HIPONATREMIA

QUADRO CLÍNICO
• Usualmente, até a concentração de 125 mEq/L de sódio, a
hiponatremia é assintomática.

• Manifestações leves e inespecíficas: fraqueza, anorexia e mal-


estar.

• Manifestações graves: edema cerebral e aumento da pressão


intracraniana levando a náuseas sem vômitos, cefaleia e
confusão, vômitos, rebaixamento do nível de consciência,
convulsões e coma.

• Hipertensão intracraniana: sonolência, estupor, coma e crises


convulsivas.

• Por não serem específicos, esses sintomas podem ser


manifestações clínicas da doença de base. Às vezes, quadros de
sonolência podem ser interpretados como secundários à
depressão.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: mucosas secas, olhos encovados, perda do turgor
cutâneo.

• Manifestações hemodinâmicas: hipotensão, hipotensão postural,


taquicardia, taquicardia postural, oligúria, poliúria.

• Aparelho neurológico: confusão mental, sonolência, coma.


EXAMES COMPLEMENTARES
a. Osmolaridade urinária: na urina a osmolaridade auxilia a
diferenciar entre uma alteração na capacidade de excretar urina diluída
(presente na maior parte dos casos) e a polidipsia primária, na qual a
excreção de água é normal, mas a ingesta é tão volumosa que ultrapassa
a capacidade de excreção.
b. Sódio urinário: concentrações urinárias de sódio menores que
25 mEq/L sugerem a participação de perdas não renais de sódio na
gênese da hiponatremia, enquanto concentrações superiores a 40
mEq/L sugerem secreção inapropriada de ADH.
c. Potássio plasmático e gasometria: ajudam a distinguir em casos
de alcalose metabólica e hipocalemia, podendo ser por vômitos
persistentes e o uso de diuréticos; acidose metabólica e hipocalemia
ocorrendo nos casos de diarreia persistentes ou uso de laxantes; e
acidose metabólica e hipercalemia muito associadas à insuficiência
renal aguda e/ou crônica.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico da hiponatremia leva em consideração a concentração de
sódio sérico [Na+] que se encontra abaixo do limite inferior da normalidade
(< 135 mEq/L). Requer análise clínica do paciente, podendo ser necessária a
dosagem de osmolaridade plasmática e urinária, sódio urinário e outros
exames para direcionar a causa do distúrbio hidroeletrolítico.

TRATAMENTO
O tratamento adequado da hiponatremia requer a consideração de
diversos fatores, como a velocidade de instalação, severidade e
sintomatologia.

a. Velocidade de Instalação:
Sabe-se que, em algumas situações em que a hiponatremia se desenvolve
em ambiente hospitalar (por exemplo, pós-operatório), fica mais difícil
determinar a duração desse distúrbio. Como após 48 horas de hiponatremia
os mecanismos adaptativos descritos acima já estão operantes, a prudência
indica tratar todos de forma devagar.
Hoje a recomendação é aumentar o [Na+] em < 10 meq/L nas primeiras
24 horas (ideal 6 a 8 meq) e < 18 meq/L nas primeiras 48 horas (evitar a
destruição da bainha de mielina em neurônios situados no sistema nervoso
central, especialmente na ponte – mielinólise pontina central).
b. Severidade:
Hiponatremias severas (< 115 meq/L) devem ser praticadas em ambiente
hospitalar, com prioridades em unidades fechadas, onde seja necessário um
controle frequente (por exemplo, de quatro em quatro horas) da natremia,
principalmente nas primeiras 24 horas de tratamento.
c. Sintomatologia:
Deve-se basicamente à velocidade de instalação e severidade.
Hiponatremias agudas e severas costumam ter sintomas que podem levar a
crises convulsivas (edema cerebral). Com isso, o [Na+] pode ser elevado em
até 2 meq/L/hr nas primeiras duas horas, até que aconteça uma melhora nos
sintomas. Logo após, a velocidade de correção deve ser reduzida para não
ultrapassar a recomendação de < 10 meq/L nas primeiras 24 horas.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1. Algoritmo diagnóstico da hiponatremia.
Fonte: Adaptado de Riella MC, Pachaly MA, 2003
Fluxograma 2. Tratamento das hiponatremias.
Fonte: Adaptado de Riella MC, Pachaly MA, 2003

HIPERNATREMIA
A Hipernatremia é definida quando o sódio plasmático ultrapassa 145
mEq/L. Na hipernatremia, a transferência de água dos fluidos intracelulares
para os fluidos extracelulares provoca desidratação celular, especialmente
dos neurônios. Assim, como resultado, há desidratação cerebral, levando ao
estado de confusão mental e ao rebaixamento da consciência, podendo
causar hemorragia cerebral. Ademais, a hipernatremia é uma das causas do
estado hiperosmolar, o qual pode também ser ocasionado por ureia, glicose e
etanol.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Perda de água:
Perdas insensíveis (respiração e sudorese).

Hipodipsia.

Diabetes insipidus central.

Diabetes insipidus neurogênico.

• Perda de fluido hipotônico.


Perdas Renais:
→ Diurese Osmótica.
→ Diuréticos de alça.
→ Fase poliúrica de NTA (necrose tubular aguda).
→ Diurese pós-obstrutiva.
→ Ingestão de etanol (poliúria aquosa transitória).
→ Furosemida.

Perda Gastrointestinais:
→ Vômitos, sondagem nasogástrica.
→ Diarreia osmótica (gastroenterite).
→ Catárticos osmóticos.

Perdas cutâneas.
→ Queimaduras.
→ Clima quente.
→ Exercício físico extenuante.

Sobrecarga de Sódio:

• Administração de soluções hipertônicas de sódio.


Enemas ricos em sódio.
• Hiperaldosteronismo primário.
• Síndrome de Cushing.
• Diabetes Insipidus (DI):
Deficiência absoluta (síntese) ou relativa (resistência tubular) de
ADH, também chamado de AVP (arginina-vasopressina).

DI Central: lesão da neuro-hipófise, podendo ser congênita,


adquirida (trauma, neurocirurgia, doença granulomatosa,
neoplasia, doença vascular, infecção) ou idiopática.

DI Nefrogênico: lesão tubular, podendo ser congênita ou


adquirida (lítio, hipercalemia, hipocalemia, necrose de papila,
gestantes).
Se não houver atuação do ADH, terá uma grande perda de água livre
pelos rins. A princípio, se for recompensada pela ingestão de água, nenhum
distúrbio se desenvolve. No entanto, se o paciente não ingerir água
adequadamente, teremos as manifestações clínicas e laboratoriais
características.

QUADRO CLÍNICO
• Desidratação.
• Fraqueza, sede intensa (polidipsia), confusão mental, convulsão.
• Poliúria, enurese, noctúria.
EXAME FÍSICO
As manifestações clínicas mais importantes do distúrbio de sódio são as
NEUROLÓGICAS.
Deve-se suspeitar de hipernatremia em qualquer paciente com alteração
do estado mental e história sugestiva de déficit de água ou aporte excessivo
de sódio.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Dosagem de Na+ urinário: concentrações entre 5 e 10 mEq/L
indicam concentração extracelular, enquanto concentrações acima de >
20 mEq/L indicam ganho de sódio ou natriurese.

b. Osmolaridade urinária: valores acima de 300 mOsm/kg


indicam hipernatremia de causas não renais e valores menores indicam
hipernatremias renais.

c. Relação entre osmolaridade urinária e plasmática (Osm


U/Osm P): permite distinguir diurese aquosa, por inabilidade de
concentração urinária (relação < 0,9), da diurese osmótica, por
excreção excessiva de solutos (relação > 0,9). Urina hipotônica (< 300
mOsm/L) + sódio plasmático elevado + poliúria (50 mL/kg/dia).

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• A estimativa clínica da volemia é essencial, devendo-se sempre
avaliar se o paciente encontra-se normovolêmico, hipovolêmico
(desidratado) ou com sinais de hipervolemia (hiperidratado,
hipertenso).

• O diagnóstico da hipernatremia leva em consideração a


concentração de sódio sérico [Na+] que se encontra acima do limite
superior da normalidade (>145 mEq/L).

• Deve-se realizar anamnese completa e exame físico minucioso


para definir a volemia do paciente e classificar o paciente de
acordo com o fluxograma a seguir. Podem ser necessário exames
complementares para elucidação da causa do distúrbio
hidroeletrolítico.

TRATAMENTO
• Independentemente da causa, a hipernatremia implica sempre um
déficit de água.

• Paciente está lúcido e com o mecanismo de sede preservado:


aumento natural da ingestão de água por via oral é capaz de
equilibrar o quadro.

• Paciente com alteração do nível de cosnciência: administração


por via endovenosa de soluções hipotônicas com: glicose a 5%,
salina a 0,2% (diluir o sódio em solução glicosada a 5%) e salina a
0,45%. Quanto mais hipotônico o líquido de infusão, mais lenta
deve ser a administração.

• Soluções que poderão ser utilizadas para a reposição para


hipernatremia apresentadas na tabela 1 abaixo.

Solução a ser Quantidade de Distribuição p/líquido


infundida Na mEq/L) extracelular (%)
Salina a 0,9% 154 100

Solução de Ringer lactato 130 97

Salina a 0,45% 77 73

Salina a 0,2% em glicose a 5% 34 55

Glicose a 5% 0 40

Tabela 1. Soluções padrões para correção de hipernatremia


Fonte: Distúrbios do equilíbrio hidroeletrolítico (2003).

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1. Algoritmo diagnóstico da hipernatremia.
Fonte: Adaptado de Riella MC, Pachaly MA, 2003

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente, 60 kg, sexo masculino, 50 anos, etilista
crônico, com histórico de TCE por queda da própria altura há 10 dias. É
admitido com quadro de confusão mental e relato de 3 crises
convulsivas, sendo a última há poucos minutos.

b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: sonolento, corado, hidratado, acianótico, anictérico,


afebril.
• Aparelho neurológico: Glasgow 14, pupilas isofotorreagentes,
sem déficits focais.

• Aparelho respiratório e cardiovascular: sem alterações.


c. Exames complementares: Hb 12 / Ht 40 / Leucócitos 8.000 /
Plaquetas 250.000 / Glicemia 98 mg/dL / Creatinina 1,01 / Ureia 22,0 /
Na 110 mEq/L

• TC de crânio (realizada há 10 dias): Hematoma Subdural Agudo


Frontal Direito. TC de crânio atual: sem evidência de novas
lesões nem sangramento recente.

• Logo após a constatação da hiponatremia, foram solicitados o


sódio urinário e a osmolaridade urinária para identificação
etiológica:

• Sódio urinário: 60 mEq/L (Ref: 20 a 40 mEq/L).


• Osmolaridade Urinária: 360 mOsm/L.
d. CORREÇÃO DA HIPONATREMIA:

• Preparando Salina 3% (3g de NaCl/100 mL deda solução): SF


0,9% + NaCl 20% na proporção de 9:1.
Exemplo: Queremos preparar 500 mL de salina 3%. Divida 500 por
10 partes (cada uma terá 50 ml). Logo, são 450 mL de SF 0,9% para 50
mL de Nacl 20%.

• Reposição de sódio:
1 a 2 mEq/h – 3 horas – (solução de ataque)
0,5 mEq/ h – nas próximas 21 horas, completando reposição
em 24 horas.

Déficit Na (mEq) = 0,6 x peso x (Na desejado – Na paciente)

0,6 x 60 x 3 = 108 mEq

Convertendo mEq em gramas: 108 / 17 = 6,3 g (1 g de NaCl –


17 mEq).

Solução salina 3%: 210 mL em 3 horas.

Em 24 horas, não infundir mais que 10 mEq:

Déficit Na (mEq) = 0,6 x peso x (Na desejado – Na paciente)

0,6 x 60 x 10 = 360 mEq

Conversão: 360 / 17 = 21 g
210 mL de salina 3% já foram infundias em 3 horas, as próximas 21
horas deverão ser infundidos 490 mL de solução salina 3% (700 – 210 = 490
mL).
e. Prescrição sugerida:

1. Soro Fisiológico 0,9% - 450 mL + NaCl 20% 50 mL:


2. Em Bomba de infusão contínua: Infundir 210 mL em 3 horas (70
mL/h);
3. Em seguida infundir 490 mL em 21 hora (23 mL/h).
O paciente pode ser classificado como um quadro hiponatremia
euvolêmica, pois no seu exame físico não havia sinais de edema ou
congestão (crepitações pulmonares, ascite, edema de membros inferiores,
edema facial). A correção do sódio nas hiponatremias deve ser realizada de
modo a elevar a natremia em no máximo 10 mEq nas primeiras 24 horas.
A Secreção Inapropriada de Hormônio Antidiurético (SIHAD) é a
principal causa de hiponatremia hipotônica euvolêmica e deve ser incluída
nas hipóteses diagnósticas desse paciente. A SIHAD ocorre, sobretudo, em
pacientes com TCE, neoplasias do sistema nervoso central, neurocirurgias,
neoplasias pulmonares e em uso de alguns medicamentos.

DICAS DO ESPECIALISTA
a. Hiponatremia

• A hiponatremia pode ocorrer com aumento ou diminuição do


volume de líquido extracelular.

• As causas comuns incluem uso de diuréticos, diarreia,


insuficiência cardíaca, doenças hepáticas e renais.

• A hiponatremia é potencialmente fatal. O grau, duração e sintomas


da hiponatremia são utilizados para determinar a rapidez com que
o sódio é corrigido no soro.

• O tratamento varia de acordo com o estado do volume de


líquidos, mas em todos os casos os níveis séricos de sódio devem
ser corrigidos lentamente por ≤ 8 mEq/L ao longo de 24h,
embora a correção relativamente rápida por 4 a 6 mEq/L
utilizando solução salina hipertônica nas primeiras horas seja
frequentemente necessária para reverter sintomas neurológicos
graves.

• A síndrome desmielinizante osmótica pode ocorrer após


correção muito rápida da hiponatremia.

b. Hipernatremia:

• A Hipernatremia costuma ser causada por acesso limitado à água


ou mecanismo prejudicado de sede, e menos comumente pelo
diabetes insípido.

• As manifestações incluem confusão, excitabilidade


neuromuscular, hiper-reflexia, convulsões e coma.

• Pacientes que não respondem à reidratação simples ou nos quais


não há uma causa óbvia podem exigir avaliação de volume e
osmolaridade urinários, em particular após privação de água.

• Repor o volume intravascular e a água livre por via oral ou


intravenosa em quantidade ditada pela rapidez (< 24 horas) ou
lentidão (> 24 horas) do surgimento da Hipernatremia e, ao mesmo
tempo, observar outros níveis plasmáticos de eletrólitos
(principalmente potássio e bicarbonato).

REFERÊNCIAS
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Depression. N England Journal Of Medicine. 1973 out; 289(16): 843-844
5.4
DISTÚRBIOS DO METABOLISMO
DO POTÁSSIO
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Anna Luiza Souza

DEFINIÇÕES
O potássio é um íon que está, em sua maioria, concentrado no meio
intracelular (cerca de 120 a 150 mEq/L). Sua concentração plasmática gira
em torno de 3,5 a 5 mEq/L.

• A hipocalemia é definida pela concentração de potássio


plasmático < 3,5 mEq/L.

• A hipercalemia é definida pela concentração de potássio


plasmático > 3,5 mEq/L.

HIPOCALEMIA

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
As principais causas de hipocalemia:

• Depleção de potássio por falta de ingesta quando os rins são


incapazes de conservar potássio.

• Perda de potássio por sudorese profusa.


• Perdas Gastrointestinais:
Aporte dietético insuficiente: idosos e etilistas; pacientes em
fase de rápida síntese celular (ex.: os submetidos à
hiperalimentação).

Diarreias: agudas ou crônicas e abuso de laxativos. Podem


cursar também com acidose metabólica pela perda de
bicarbonato, a qual provoca um desvio iônico que, mesmo em
vigência de hipocalemia, provoca a saída de potássio do meio
intracelular, mascarando os níveis de potássio. Observação:
diarreia > depleção de sódio e hipovolemia > ativação do
SRAA > secreção de potássio aumenta.

Ureterossigmoidostomia: absorção anormal de cloreto de


sódio + secreção de potássio e bicarbonato para a luz da alça
intestinal. Causa também acidose metabólica do tipo
hiperclorêmica.

Vômitos/drenagem nasogástrica: se deve mais à perda de


ácido clorídrico do que à perda de potássio propriamente dita. A
perda de ácido leva à alcalose metabólica, a qual gera um
desvio iônico de potássio para dentro das células e secreção de
potássio pelas células tubulares distais. Também há a ativação
do SRAA, o que acelera a perda de potássio por via renal.

• Perdas Renais:
Hiperaldosteronismo (tumor, hiperplasia de adrenais,
hipovolemia ou hipoperfusão renal): a aldosterona aumenta a
secreção potássica.

Alterações tubulares (ex.: acidose tubular renal, síndrome de


Fanconi, pielonefrite, fase poliúrica da necrose tubular aguda):
as estruturas tubulares do nefro distal excretam a maior parte do
potássio ingerido; assim, suas alterações podem levar a uma
excreção elevada de potássio.

Ânions não reabsorvíveis: em algumas situações, o sódio


chega ao néfron distal acompanhado de um ânion não
reabsorvível (ex.: bicarbonato, penicilina), o que promoverá a
reabsorção de parte do sódio em troca com o potássio,
aumentando sua excreção.

Hipomagnesemia: induz a perda renal de potássio por


mecanismos complexos. Em casos de achados de
hipomagnesemia em pacientes nos quais existe dificuldade para
correção da hipocalemia, só se consegue corrigir o potássio
após a reposição de magnésio.

Anfotericina B: esse medicamento modifica a permeabilidade


celular através da interação com esteróis da membrana, gerando
secreção de potássio.

Gentamicina e Cisplatina: têm efeito tóxico direto sobre as


células tubulares, induzindo a perda renal de potássio.

• Alterações genéticas:
→ Síndrome de Bartter: manifesta-se na infância e cursa com
hipocalemia + alcalose metabólica + hiper-reninemia +
hiperaldosteronismo + hiperplasia do aparelho justa glomerular +
hipomagnesemia (essa última é mais rara). Também resulta de
anormalidades na função tubular, primariamente no transporte de
cloreto de sódio na porção espessa da alça de Henle (ocorre,
portanto, uma discreta depleção de volume, seguida de ativação do
SRAA). Observação: hiperaldosteronismo + aumento do fluxo
distal (pelo defeito reabsortivo) = aumenta a secreção de potássio
e hidrogênio nos túbulos coletores, levando à hipocalemia e
alcalose metabólica.
→ Síndrome de Gitelman: cursa com os mesmos achados da
síndrome de Bartter, porém o defeito é no cotransportador sódio-
potássio do segmento inicial do túbulo distal.

• Diuréticos, com exceção do Amilorida, Triantereno,


Espironolactona e do Esplerenona (causa mais frequente na
prática clínica):
→ Tiazídicos: aumentam o fluxo de urina pelos segmentos corticais
do nefro distal, além de, em parte, inibirem a anidrase carbônica.
→ Furosemida e Ácido Etacrínico: inibem a reabsorção ativa de
cloro na parte ascendente da alça de Henle, responsável,
provavelmente, pela reabsorção passiva de potássio nesse
segmento. Ademais, produzem um maior fluxo de urina e parecem
inibir a reabsorção proximal de potássio, ocasionando caliurese.
→ Inibidores de anidrase carbônica (Acetazolamida): aumentam a
secreção de potássio na porção distal do néfron devido a dois
mecanismos: inibição da secreção de H+ na parte distal do néfron,
gerando hiperpolarização transtubular (força para o movimento
passivo do potássio da célula para a urina); e inibição da
reabsorção proximal de bicarbonato, induzindo um aumento do
fluxo de urina.
→ Diuréticos osmóticos (Manitol): aceleram a excreção de potássio
por elevação do fluxo de líquido tubular no néfron distal.

• Desvio Transcelular: desvio de potássio do meio extracelular


para o meio intracelular.
→ Alterações do estado acidobásico: alcalose
metabólica/respiratória: íons de hidrogênio saem das células para
amenizar as mudanças no pH do meio extracelular e potássio entra
nas células para manter a eletroneutralidade entre os
compartimentos.
→ Ação da insulina: a administração da insulina na hiperglicemia
grave ou na cetoacidose diabética promove a entrada de potássio
nas células musculares e hepáticas, havendo redução dos níveis
plasmáticos de potássio.
→ Infusão de glicose: mecanismo similar à insulina.
→ Atividade β-adrenérgica: estímulo de receptores β2-
adrenérgicos, havendo entrada de potássio nas células. Fenômeno
observado em situações em que há liberação de epinefrina ou
infusão de aminas vasoativas, por exemplo.
→ Paralisia periódica hipocalêmica: ataques recorrentes de
paralisia flácida desde a infância em conjunto com hipocalemia
devido a uma redistribuição do potássio para o meio intracelular.
→ Envenenamento pelo bário: carbonato de bário pode gerar
paralisia flácida e hipocalemia devido a um bloqueio dos canais de
potássio na membrana, que geralmente permitem a passagem de
potássio para o meio extracelular. Observação: o sulfato de bário,
utilizado em exames radiográficos, não ocasiona esse tipo de risco
aos pacientes.
→ Tratamento de anemias graves: rápida assimilação do potássio
para dentro das hemácias que estão sendo sintetizadas –
hipocalemia.
→ Outras causas: hipotermia, intoxicação por teofilina, cloroquina.

QUADRO CLÍNICO
• Neuromusculares: fraqueza muscular, parestesias.
• Renais: concentração prejudicada, poliúria.
• Gastrintestinais: náuseas, íleo adinâmico.
• SNC: irritabilidade, letargia, coma.
• Cardíacos: arritmias tipo bigeminismo e/ou trigeminismo.
EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: fraqueza generalizada, torpor ou irritabilidade.
• Aparelho respiratório: hipoventilação (fraqueza da musculatura
ventilatória).

• Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular ou irregular.


• Aparelho gastrointestinal: ruídos hidroaéreos diminuídos,
distensão abdominal, hipertimpanismo à percussão, náuseas e
vômitos.

• Aparelho geniturinário: poliúria (decorrente da tubulopatia).


• Aparelho locomotor: fasciculações, câimbras.
EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exames laboratoriais:

• Na e K séricos, glicemia e gasometria.


+ +

• EAS, níveis de Na e K na urina e osmolaridade urinária


+ +

• Magnésio sérico: a hipomagnesemia é comumente correlacionada


à hipopotassemia.

Hipocalemia por perdas extra renais:


→ K plasmático < 3,5 mEq/L
→ K urinário < 20 mEq/L
→ Fração de excreção do K < 6% (exceto vômitos)
→ Gradiente transtubular de K < 3

Hipocalemia por perdas renais:


→ K plasmático < 3,5 mEq/L
→ K urinário > 20 mEq/L
→ Fração de excreção do K > 12%
→ Gradiente transtubular de K > 3

Hipocalemia por redistribuição:


→ K plasmático < 3,5 mEq/L
→ K urinário variável
→ Fração de excreção do K variável
→ Gradiente transtubular de K variável

b. Eletrocardiograma: na hipocalemia as alterações


eletrocardiográficas podem ser sutis e incluem:

• Aumento da Amplitude da onda P (onda P “pontiaguda”).


• Aumento da Amplitude e duração do complexo QRS.
• Depressão do segmento ST com infra desnivelamento do ponto J.
• Ondas U (concavidade para baixo ao final da onda T).
• Achatamento da onda T.
• Arritmias (principalmente em cardiopatas e em usuários de
digitálicos).

• Atividade elétrica sem pulso ou assistolia.


c. Outros exames podem ser solicitados de acordo com a suspeita
clínica:
• Aldosterona sérica e atividade de renina plasmática: pode ser útil
nos casos de hiperaldosteronismo primário, estenose de artéria
renal e síndrome de Liddle.

• Doppler de artérias renais: suspeita de estenose de artéria renal.


• Dosagem de TSH e T4 livre: tireotoxicose.
DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
A história e o exame clínico são de suma importância para a condução
do diagnóstico de uma pressuposta hipocalemia, cuja comprovação
laboratorial é feita pela dosagem de potássio plasmático e/ou urinário, além
de exames complementares direcionados às etiologias suspeitas, conforme
citado anteriormente.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
• Objetivos: Antes de fazer a reposição de potássio, assegurar um
débito urinário satisfatório. Na hipocalemia moderada (potássio
entre 2,5 e 3,0 mEq/L), a reposição deve ser feita opor via oral. Já
se a hipocalemia for grave (potássio menor que 2,5 mEq/L),
escolher a via endovenosa.

• Via endovenosa:
Aumenta-se a concentração de K+ nas soluções eletrolíticas
usais.

Cloreto de potássio 10%.

Fosfato de potássio 10%.


• Via oral:
KCl xarope 60mg/mL.

K efervescente ou em comprimidos 600mg.

Observações:

A reposição do K+ se faz de maneira empírica. Seu esquema


usual é a reposição de 40 a 60 mEq/L por via EV a velocidades
menores do que 30 a 40 mEq/hora em veia periférica. Em veia
central, estão descritas concentrações de até 40 mEq em 100
mL.

Os cirróticos são especialmente suscetíveis às complicações da


hipocalemia e devem ser tratados agressivamente com relação a
tal problema.

Os pacientes digitalizados são especialmente suscetíveis às


arritmias (se hipocalêmicos) e também necessitam de
tratamento intensivo.

Deve-se prevenir a hipopotassemia após tratamento para


acidose em geral (em especial, acidose diabética).

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente de 53 anos, sexo masculino, mecânico,
tabagista e etilista crônico. Chega ao pronto-socorro com relato de
fraqueza muscular, diarreia aquosa volumosa, astenia e hiporexia.
Nega uso de medicamentos contínuos.
b. Exames Físicos:
• Ectoscopia: PA 100 x 50 mmHg, FC 118 bpm, FR 20 rpm,
sudoreico, desidratado 2+/4+, normocorado, sem edemas.
Glasgow: 15.
c. Exames complementares: ECG: ritmo sinusal com QRS
estreito e onda T achatada. Exame laboratorial: Hb 11,5 g/dL;
leucócitos 11870 mm³; ureia 98,0 mg/dL; creatinina 1,7 mg/dL; K 2,4
mEq/L; Na 135 mEq/L; Mg 1,9 mg/dL.
d. Prescrição sugerida:

1. Dieta livre.
2. Soro Fisiológico 0,9% (30 mL/kg): Corrigir o distúrbio primário
(diarreia) – tratar a desidratação.
3. Reposição de K+ 20 a 30 mEq/hora (40 mEq/hora é a velocidade
máxima).
4. (KCl 19,1% (IV): cada 1 mL tem 2,5 mEq de potássio).
5. Após a normalização do potássio, deve-se continuar a reposição
via oral por dias ou semanas:

(KCl xarope 6%: 15 mL tem 12 mEq de potássio) – A dose


usual é de 10 a 20 mL após as refeições, 3 a 4 vezes ao dia.

(KCl comprimido: 1 comprimido tem 6 mEq de potássio) –


A dose usual é de 1 a 2 comprimidos após às refeições, 3 a 4
vezes ao dia.

HIPERCALEMIA

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
As principais causas de hipercalemia:

• Pseudo-hipercalemia (diferentemente da hipercalemia


verdadeira, não há alteração no ECG): refere-se à elevação da
concentração sérica ou plasmática de potássio por movimento
desse íon para o meio extracelular durante ou após a coleta
sanguínea. Está relacionado ao trauma durante a coleta, quando o
garrote é mantido por muito tempo antes da punção venosa ou
quando há demora no processamento da amostra, resultando em
liberação de potássio das hemácias por hemólise. Observação:
Leucócitos acima de 100 mil/mm3 ou plaquetas acima de 400
mil/mm3 podem resultar em pseudo-hipercalemia, pois essas
são células ricas em potássio, podendo ser liberadas durante o
processo de coagulação sanguínea.

• Insuficiência Renal Aguda: há uma redução importante na


excreção de potássio, pois se estabelece um quadro de oligúria,
comumente junto com destruição celular num paciente
hipercatabólico, diminuindo a capacidade desse íon e lançando na
circulação o potássio liberado nas células.

• Diuréticos Poupadores de Potássio (Espironolactona,


Amilorida, Triantereno, principalmente): sobretudo se aplicados
em pacientes com insuficiência renal.

• Ureterojejunostomia: o jejuno absorve o potássio existente na


urina, provocando elevação dos níveis sanguíneos deste íon.

• Trimetoprim.
• AINEs.
• Insuficiência Adrenal:
Diminuição do efeito da aldosterona:
→ Doença renal: prejudica a secreção de renina.
→ Disfunção adrenal + crise addisoniana: altera a liberação de
aldosterona, salientada pela depleção de sódio.
→ Resistência tubular à ação da aldosterona.

• Redistribuição:
As acidoses promovem a entrada de íons hidrogênio em
excesso pelas células, levando a um movimento de potássio
para fora delas com o objetivo de manter a eletroneutralidade.

Destruição celular maciça após cirurgia, trauma com


esmagamento e lesão muscular (rabdomiólise), infecções
extensas ou hemólise maciça: liberação rápida de potássio e
redução da excreção desse íon devido ao comprometimento da
função renal nesses casos.

Uso de β-bloqueadores.

Intoxicação digitálica.

Paralisia periódica familiar hipercalêmica.

Exercícios extenuantes.

Administração de succinilcolina.

QUADRO CLÍNICO
• Neuromusculares: fraqueza muscular, paralisia flácida,
parestesias de face, língua, pés e mãos, irritabilidade muscular.

• Gastrintestinais: diminuição dos ruídos hidroaéreos.


• Cardíacas: arritmias cardíacas, parada cardíaca em diástole.
EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: fraqueza generalizada, torpor ou irritabilidade,
adinamia.

• Aparelho respiratório: hipoventilação (fraqueza da musculatura


ventilatória), insuficiência respiratória.

• Aparelho cardiovascular: arritmias cardíacas, parada


cardiorrespiratória.

• Aparelho gastrointestinal: ruídos hidroaéreos diminuídos.


• Aparelho locomotor: paralisia, parestesias ascendentes.
EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exames laboratoriais:

• Função renal, gasometria e Urina tipo 1: para pesquisar causas


renais que possam estar levando à hipercalemia.

• Glicemia e Cetonúria: para casos de descompensação diabética,


que pode causar hipercalemia por Acidose metabólica.

• Creatinofosfoquinase: quando muito aumentada, sugere


rabdomiólise.

• Exames de função adrenal: para suspeita de doença de Addison.


Observação: importante realizar revisão de medicamentos que possam
levar ao quadro de hipercalemia.
b. Eletrocardiograma: nos casos de hipercalemia, o ECG pode ser
muito útil. As alterações principais e progressivas incluem:

• Ondas T apiculadas, estreitas e amplas (“em tenda”).


• Alargamento do complexo QRS.
• Diminuição progressiva da amplitude até a ausência da onda P
(aumento do intervalo PR).

• Alterações do segmento ST (supra desnivelamento).


• Ritmos ectópicos e distúrbios da condução atrioventricular de
diferentes graus.

• ECG com aspecto sinusoidal.


Observação: Onda T apiculada é um achado comum que, se não
tratado, pode levar a arritmias letais.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
A história e o exame clínico são de suma importância para a condução
do diagnóstico de uma pressuposta hipercalemia, cuja comprovação
laboratorial é feita pela dosagem de potássio plasmático e/ou urinário, além
de exames complementares direcionados às etiologias suspeitas, conforme
citado anteriormente.

TRATAMENTO
• Via Endovenosa:
Gluconato de Cálcio 10%: dose 10 a 20 mL de início de 1 a 3
min por uma duração de 30 a 60 min. (estabilizador da
membrana celular dos cardiomiócitos – indicado em casos
de arritmia instalada).

Bicarbonato de Sódio: dose 50 a 100 mEq de início de 5 a 10


min por uma duração de 2h.

Glicoinsulinoterapia: insulina regular 10 UI + 100 mL de


glicose 50%, administrada em 30 minutos.

• Via Oral:
Resina catiônica de troca: dose de 20 a 50 mg de início de 1 a
2 h por uma duração de 4 a 6 h. Essa via pode ser substituída
por 100 g dessa resina pela via retal com sorbitol.

• Via Inalatória
Salbutamol: dose de 10 a 20 mg de início de 30 min por uma
duração de 2 h.

• Observações:
Suspender medicamentos poupadores de potássio e tratar a
causa de base.

Suspender a reposição de potássio em soro de manutenção.

Se hipercalemia grave (potássio maior ou igual a 6,5 mEq/L)


aumenta o risco de arritmias cardíacas.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente de 82 anos, sexo feminino. Chega ao
pronto-socorro trazida por familiares com relato de prostração há 2
dias, oligúria e febre não termometrada. Paciente previamente
hipertensa, cardiopata, diabética e ex-tabagista. Faz uso regular de
Captopril 25 mg, Espironolactona 50 mg, Metoprolol 50 mg, Insulina
NPH 40 UI pela manhã.

b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: PA 110 x 80 mmHg, FC 121 bpm, FR 22 rpm, febril


37,8C, desidratada +/4+, normocorada, sem edemas. Glasgow: 14.

c. Exames complementares: ECG: Taquiarritmia sinusal com


QRS estreito e onda T apiculada. Exame laboratorial: Hb 12,5 g/dL;
leucócitos 13290 mm³; ureia 195,0 mg/dL; creatinina 2,3 mg/dL; K 6,7
mEq/L; Na 136 mEq/L; Mg 1,6 mg/dL.

d. Prescrição sugerida:

1. Dieta leve.
2. Soro Fisiológico 0,9% (25 a 30 mL/kg): Corrigir desidratação.
3. Gluconato de Cálcio a 10% 10 a 20 mL diluídos em 100 mL de
soro fisiológico ou em soro glicosado infundido em 2 a 5 min (em
casos de arritmia).
4. Repete-se o ECG. Caso persistam as alterações, pode-se repetir o
procedimento.
5. Glicoinsulinoterapia (solução polarizante): Insulina regular: 10
U para cada 50 gramas de glicose de 4/4 h (ficar atento a
hipoglicemia).
6. Inalação com β2 agonista Fenoterol ou Salbutamol: 10 gotas de
4/4 h.
7. Bicarbonato de sódio: 1 mEq/kg de peso IV lento de 4/4 h (é
pouco útil no caso de insuficiência renal, porém apresenta efeito
satisfatório em casos de acidose metabólica grave).
8. Diurético: Furosemida 1 mg/kg IV de 4/4 h.
9. Resinas de troca iônica: Sorcal 30 g diluído em 100 mL de
manitol a 10% ou 20% de 8/8 ou 4/4 h. Pode-se dobrar a dose se
necessário. Podem ser usadas via oral ou enema.
10. Diálise: a hemodiálise é mais eficaz que a diálise peritoneal. É
utilizada em hipercalemia associada à insuficiência renal e
refratárias às medidas clínicas anteriores.
11. Suspender medicações que causam hipercalemia – neste caso, a
Espironolactona e captopril.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Hipocalemia
O clinico deve basear o tratamento considerando se há urgência
para o paciente. Deve ter em mente as causas, e sua possível
reversão é um dos grandes objetivos. Deve definir se a causa
principal é uma translocação celular ou um déficit real de
potássio. O desequilíbrio acidobásico também deve ser
considerado. O clínico deve lembrar que a reposição de potássio
por via venosa é uma causa comum de hipercalemia intra-
hospitalar.

Para a maioria dos autores, quando necessária a reposição por


via venosa, essa não deve ultrapassar 20 mEq/h. Alguns autores
sugerem diluição de solução fisiológica a 0,45% com uma
concentração máxima de 40 mEq/L de cloreto de potássio em
acesso periférico e 60 mEq/L em acesso central. O paciente
deve receber monitorização cardíaca.

Pode-se estimar uma elevação de 1 mEq/4h no potássio sérico,


quando em ritmo de 20 mEq/h. Porém, deve-se levar em
consideração outros fatores como reversão ou não de causa de
perdas ou translocação. Alguns autores sugerem infusões mais
rápidas (infusão inicial de 2 mmol/min por 10 minutos, seguido
por 10 mEq/L em 5-10 minutos) quando há arritmias instáveis.
• Hipercalemia
Gluconato de cálcio: A indicação clássica do uso de cálcio
endovenoso é a presença de alterações eletrocardiográficas.
Entretanto, sugere-se que para níveis séricos de potássio > 6,5
MEq/L, independentemente de alterações eletrocardiográficas,
o cálcio deve ser administrado, já que nem sempre as alterações
no eletrocardiograma (ECG) podem ser um bom indicador da
gravidade da hipercalemia em determinados pacientes.

Glicoinsulina: A maior redução dos níveis séricos de potássio


pode demorar de 15-30 minutos para ocorrer e pode durar de 2-
4 horas. Esta dose pode ser repetida a cada 15 minutos, se
necessário.

Beta-agonistas adrenérgicos: Devido às doses mais altas, a


taquicardia, principal efeito colateral dos β-agonistas, se torna
mais marcante. Nem todos os pacientes respondem bem a essa
forma de tratamento, e os níveis séricos de potássio podem ser
reduzidos modestamente, principalmente se estes pacientes
fizerem uso de β-bloqueadores (propranolol, metoprolol,
carvedilol).O efeito maior sobre os níveis séricos de potássio é
atingido em 15-30 minutos e pode durar 1-2 horas.

Diurético de alça: O pico de ação da furosemida ocorre entre


5-10 minutos, e a duração do efeito entre 4-6 horas. Podem
ocorrer outros distúrbios eletrolíticos (hipomagnesemia,
hiponatremia, hipofosfatemia, hipocalcemia e alcalose
metabólica) relacionados ao uso desta classe.

REFERÊNCIAS
1. Cavalcanti EF, Martins HSl. Clínica Médica: dos Sinais e Sintomas Ao Diagnóstico e
Tratamento. Barueri: Manole; 2007.
2. Évora PRB, Reis CL, Ferez MA, Conte DA, Garcia LV. Distúrbios do Equilíbrio
Hidroeletrolítico e do Equilíbrio Ácido-básico - Uma Revisão Prática. Medicina, Ribeirão
Preto. 1999; 32(4): 451-69.
3. Martins HS, Brandão Neto RA, Velasco IT. Emergências Clínicas: abordagem Prática. 3 ed.
São Paulo: Manole; 2007.
4. Netter F. Coleção Netter De Ilustrações Médicas: sistema Urinário. 2. ed. Rio De Janeiro:
Elsevier; 2014.
5. Riella MC, Pachaly MA. Metabolismo do Potássio. In: Riella MC. Princípios Da Nefrologia
E Distúrbios Hidroeletrolíticos. 5. ed. Rio De Janeiro: Guanabara Koogan; 2010.
6. Barbosa AP, Sztajnbok J. Distúrbios Hidroeletrolíticos. J Ped, Rio De Janeiro. 1999; (Supl
2): 223-33.
7. Martins HS, Velasco IT. Manual de Emergências Clínicas. 8. ed. Barueri: Manole; 2013.
5.5
DISTÚRBIO DO METABOLISMO
DO CÁLCIO
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Felipe Silva de Oliveira

DEFINIÇÕES
• Usualmente, os níveis séricos de cálcio total são mantidos entre
8,8 e 10,4 mg/dL, e o cálcio iônico entre 1,10 mEq/L e 1,35
mEq/L.

• Hipocalcemia: cálcio total menor que 8,5 mg/dL ou cálcio


ionizado menor que 1,0 mEq/L.

• Hipercalcemia: cálcio total maior que 10,5 mg/dL ou cálcio


ionizado maior que 1,4 mEq/L.

HIPOCALCEMIA

ETIOPATOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
As principais causas de hipocalcemia:

• Hipoparatireoidismo: redução dos níveis de paratormônio, que


é o hormônio responsável pelo aumento da calcemia à custa da
ativação de osteoblastos. Pode estar ligada a defeitos na
embriogênese (a exemplo da síndrome de DiGeorge, na qual
ocorre ausência das quatro glândulas paratireoides) ou como parte
de síndromes poliglandulares. Todavia, a forma mais comum de
hipoparatireoidismo é a pós-cirúrgica, secundária a cirurgias
na região cervical.

• Pseudo-hipoparatireoidismo: concentrações de paratormônio


podem se encontrar normais ou elevadas; entretanto, há falta de
resposta dos tecidos (rins e esqueleto) a esse hormônio, levando à
redução dos níveis séricos de cálcio.

• Hipomagnesemia: principal etiologia de hipocalcemia em


etilistas. Níveis séricos de magnésio inferiores a 0,8 mEq/L
atuam sobre as paratireoides diminuindo a liberação e a ação do
paratormônio, enquanto a hiperfosfatemia atua na redução da
absorção intestinal e óssea de cálcio.

• Drogas anticonvulsivantes e outras drogas: Anticonvulsivantes


induzem maior degradação enzimática do calcitriol no
hepatócito e inibição da 1-α-hidroxilase. Outras drogas como
Rifampicina, Isoniazida e cetoconazol podem reduzir a síntese de
calcitriol e calcidiol. A gentamicina pode causar hipocalcemia por
mecanismo indireto devido à perda de magnésio na urina.

• Doença hepática: deficiência na hidroxilação da vitamina D e


deficiência de formação da bile (ocorre diminuição na absorção
intestinal da vitamina D).

• Etiologias renais: na síndrome nefrótica, suspeita-se de que a


perda de proteína ligante à vitamina D seja eliminada na urina;
nas disfunções tubulares, é descrita a interferência da acidose na
produção de calcitriol; já na insuficiência renal crônica, a
hipocalcemia ocorre pela retenção de fósforo e diminuição na
produção de calcitriol.

QUADRO CLÍNICO
• Podem ser assintomáticos ou apresentar manifestações clínicas
que dependem do tempo da instalação do déficit e se
correlacionam com a hipomagnesemia. Normalmente não
aparecem até um cálcio sérico total de 7,0 a 7,5 mg/dL.

• Fenômenos neuromusculares: tetania, convulsões mialgia,


câimbras e disfagia;

• Sintomas psiquiátricos: ansiedade, irritabilidade, psicose e


demência;

• Alterações cardíacas: arritmia é a principal.


EXAME FÍSICO
• Taquicardia (podendo apresentar taquiarritmias) e elevação da
pressão arterial sistêmica.

• Sinais clínicos característicos:


Sinal de Trousseau: mais específico e consiste na observação
de uma contração generalizada dos músculos do antebraço com
flexão do punho, ou sinal de mão de parteiro, após a aplicação
do esfigmomanômetro de pressão cerca de 20 mmHg acima da
pressão sistólica, por 3 minutos.

Sinal de Chvostek: pesquisado pela percussão do nervo facial


em seu trajeto anteriormente ao pavilhão auricular, sendo que
nos casos de hipocalcemia observa-se uma contração dos
músculos perilabiais do mesmo lado.

Crises de tetania: as mãos podem assumir a posição


semelhante à clássica “mão de parteiro”, com flexão do punho e
articulação metacarpo falangeanas e adução do polegar. A crise
pode ser acompanhada de sudorese, cólicas abdominais,
vômitos e broncoespasmo devidos, provavelmente, à disfunção
do sistema nervoso autônomo.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Eletrocardiograma (ECG): identificação de arritmias cardíacas
graves e/ou aumento do intervalo QT.
b. Dosagem de cálcio sérico total e iônico: comprovação
laboratorial do distúrbio.
c. Albumina sérica: na hipoalbuminemia, o nível de cálcio total
fica baixo, porém a fração biologicamente ativa permanece inalterada.
Nessa conjuntura, nitidamente, os sintomas de hipocalcemia não estão
presentes.
A correção matemática da calcemia poderá ser efetuada,
acrescentando-se 0,8 mg/ dL no nível de cálcio para cada grama de
albumina abaixo de 4 g/dL.
d. Dosagem dos níveis séricos de Calcitriol (vitamina), fósforo,
fosfatase alcalina e PTH intacto.
e. Marcadores de função hepática: ALT, AST, Bilirrubinas totais
e frações e coagulograma.
f. Função renal e íons: ureia, creatinina, potássio e magnésio.

DIAGNÓSTICO
A história e o exame clínico são de suma importância para a condução
do diagnóstico de uma pressuposta hipocalcemia, cuja comprovação
laboratorial é feita pela dosagem de cálcio total e iônico, além de exames
complementares direcionados às etiologias suspeitas, conforme citado
anteriormente.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
• Reposição de cálcio em casos sintomáticos:
Gluconato de cálcio (94 mg de cálcio elementar, 10 mL): 2
ampolas, por via venosa, em 10 a 20 minutos. Manter infusão
de 0,5 a 1,5 mg de cálcio elementar por kg por hora, durante 4
a 6h. Atenção: infusão rápida pode causar assistolia e
hiperfosfatemia, e deve-se corrigi-la primeiro por haver
risco de precipitação.

• Reposição de cálcio em casos asintomáticos:


Casos leves ou crônicos: pode-se usar suplementação oral
com 1000 a 2600 mg/d. É importante dosar o cálcio de 4/4 h e
fazer monitorização cardíaca.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente de 39 anos, sexo feminino, no 11º pós-
operatório de uma tireoidectomia, deu entrada no pronto-socorro
apresentando quadro de rigidez muscular de início súbito associada à
disartria e trismo.
b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: PA 140 x 90 mmHg, FC 105 bpm, FR 20 rpm,


espasmos musculares difusos, evoluindo com rigidez de membros
superiores com contração de musculatura flexora das mãos;
espasmos de musculatura zigomática. Consciente, diaforética,
hidratada, normocorada, sem edemas, panturrilhas livres, com
ferida operatória em fase de cicatrização em região cervical
anterior.
c. Exames complementares: ECG: taquicardia de QRS estreito
com onda p visualizada e alargamento do intervalo QT. Exame
laboratorial: Hb 11,7 g/dL; leucócitos 9870 mm³; ureia 16,7 mg/dL;
creatinina 0,81 mg/dL; k 4,2 mEq/L; Na 139 mEq/L; Mg 2,2 mg/dL;
Ca sérico 7,1 mg/dL; Proteínas totais: 6,5 g/dL; Albumina: 3,9 g/dL.
d. Prescrição sugerida:
1. Dieta livre desde que o paciente não esteja apresentando
quadros neurológicos graves.
2. Ataque: Gluconato de cálcio 10% (1g/ 10ml): 02amp +
150mL de SG 5% EV em 20 minutos.
3. Manutenção: Gluconato de cálcio 10% (1g / 10ml): 10 amp +
800 mL de SG 5% (solução com 1 mg de cálcio elementar por mL) –
realizar infusão de 0,5 a 1,5 mg de cálcio elementar por kg por hora,
durante 4 a 6 horas.
4. Dosar cálcio de 4/4h.
5. Monitorização cardíaca e sinais vitais (risco de arritmias).

HIPERCALCEMIA

ETIOPATOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• A primeira causa mais frequente de hipercalcemia é o
hiperparatireoidismo primário.

Etiologias de hiperparatireoidismo primário:

Adenoma isolado dessa glândula (85% dos casos). Nos 15%


restantes, se:

Hiperplasia e carcinoma (15% dos casos).

• A segunda causa mais frequente de hipercalcemia são as


neoplasias em geral (20 a 30% dos pacientes). A hipercalcemia
se desenvolve pelo aumento da produção de PTH, com
consequente aumento na reabsorção tubular de cálcio e
diminuição da sua excreção. O estímulo da atividade osteoclástica
e o aumento do turnover ósseo são demonstrados pelo aumento
dos níveis de fosfatase alcalina, osteocalcina e hidroxiprolina
urinária.

QUADRO CLÍNICO
• Formas leves: sintomas brandos, inespecíficos ou ausentes.
• Formas moderadas a graves: níveis séricos de cálcio acima de
12 mg:

Sintomas gastrintestinais: constipação, náuseas e vômitos;

Sintomas do sistema urinário: poliúria e/ou polidipsia, litíase


renal, nefrocalcinose e insuficiência renal;

Sintomas neurológicos: sonolência, cefaleia, letargia, fraqueza


e depressão; e

Sintoma cardiovascular: arritmias.

Os sintomas costumam ser mais exuberantes se a hipercalcemia se


desenvolver rapidamente. Manifestações neurológicas (torpor e coma) são
consideradas como urgência, e esses pacientes devem ser encaminhados a
um serviço de emergência rapidamente.

EXAME FÍSICO
• Taquicardia (podendo apresentar taquiarritmias) e elevação da
pressão arterial sistêmica.

• Avaliação de todos os aparelhos e sistemas identificando sinais


clínicos referente ao quadro clínico apresentado, visto apresentar
desde formas assintomáticas a formais graves de maneira
inespecífica.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Eletrocardiograma (ECG): identificação de arritmias cardíacas
graves e/ou aumento do intervalo QT.

b. Dosagem de cálcio sérico total e iônico: comprovação


laboratorial do distúrbio.

• Valores maiores que 10,4 mg/dL já são considerados


hipercalcemia. Como existem fatores pré-analíticos e analíticos
que podem influenciar no resultado de exames laboratoriais, é
cabível a realização de, no mínimo, dois exames para diagnosticar
o aumento de cálcio no plasma.

• Pacientes que apresentarem cálcio total acima de 13,5 mg/dL


e/ou sintomas neurológicos têm de ser prontamente
encaminhados a um serviço de emergência. Ademais, é possível
fazer a solicitação de cálcio ionizado, na qual o valor de
hipercalcemia é superior a 6,3 mg/dL.

c. Dosagem dos níveis séricos de Calcitriol (vitamina D),


fósforo, fosfatase alcalina e PTH intacto (principal exame para o
acompanhamento desse distúrbio).

DIAGNÓSTICO
A história e o exame clínico são de suma importância para a condução
do diagnóstico de uma pressuposta hipercalcemia, cuja comprovação
laboratorial é feita pela dosagem de cálcio total e iônico, além de exames
complementares direcionados às etiologias suspeitas, conforme citado
anteriormente.
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
• Objetivo: reduzir os níveis séricos de cálcio e, se possível, tratar
a doença de base. O tratamento reduz o cálcio sérico através da
inibição da reabsorção ou do aumento da excreção renal ou da
diminuição da absorção intestinal de cálcio. A escolha ideal de
tratamento depende da causa e da severidade da hipercalcemia.

Hidratação com solução salina isotônica 2 a 5 L/h (conforme


monitoramento renal e cardíaco);

Furosemida 20 a 40 mg EV;

Prednisolona 60 mg/dia VO;

Sais de fosfato (pouco utilizado);

Calcitonina 4 a 8 UI/Kg SC ou IM;

Suspensão de tiazídicos (são poupadores de cálcio);

Refratariedade ao tratamento clínico e pacientes com doença


renal crônica grave indicado realização de hemodiálise.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente de 68 anos, sexo feminino. Chega ao
pronto-socorro com relato de fraqueza muscular, vômitos, crise
convulsiva e rebaixamento do nível do de consciência. Familiar
informa que a paciente apresenta alteração na paratireoide, mas não
sabe relatar mais informações.
b. Exames Físicos
• Ectoscopia: PA 120 x 80 mmHg, FC 110 bpm, FR 20 rpm,
diaforética, hidratada, normocorada, sem edemas. Glasgow: 10.
c. Exames complementares: ECG: QRS estreito com onda p
visualizada e estreitamento do intervalo QT. Exame laboratorial: Hb
10,7 g/dL; leucócitos 8870 mm³; ureia 110,7 mg/dL; creatinina 2,21
mg/dL; k 4,2 mEq/L; Na 137 mEq/L; Mg 1,6 mg/dL; Ca sérico 13,7
mg/dL; PTH: 72 pg/mL; 25(OH)-vitamina D: 16 mg/dL.
d. Prescrição sugeridas:

1. Dieta suspensa até segunda ordem: quadro neurológico grave e


com rebaixamento do nível de consciência.
2. Soro Fisiológico 0,9% 2 L por hora (conforme tolerância renal e
cardíaca).
3. Furosemida 20 a 40 mg EV.
4. Prednisolona 60 mg dia.
5. Calcitonina 4 a 8 UI/Kg IM a critério médico (casos refratários).
6. Suspensão de tiazídicos.
7. Monitorização cardíaca, quantificação de diurese e sinais vitais.
Observação: Solicitar avaliação nefrologista em casos refratários para
verificar indicação de hemodiálise. O principal tratamento é investigar e
tratar a causa base.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Na hipocalcemia:
Em todos os casos, a suplementação oral de cálcio com 1 a 3
gramas de cálcio deve ser instituída. Os sais de cálcio são
administrados em doses fracionadas, e nos casos mais leves são
suficientes para a correção da hipocalcemia. O carbonato de
cálcio é o mais usado por ser o mais facilmente encontrado e o
mais barato. Cada grama de carbonato de cálcio fornece 400
mg de cálcio. Deve ser administrado com as refeições para
que ocorra a sua solubilização. As outras preparações de sais
de cálcio são o lactato, o Gluconato e o cloreto de cálcio.

Em relação à vitamina D, o ideal é o uso da forma mais ativa a


1,25(OH)-vitamina D o calcitriol, (cápsulas de 0,25 mcg). Nos
casos de hipoparatireidismo total e definitivo, a dose é de 0,5 a
2,0 mcg/dia, em duas a tomadas.

O magnésio pode ser reposto por via oral. A forma disponível


é o cloreto de magnésio, que pode, como efeito colateral,
induzir a quadros diarreicos. Uma forma alternativa de
reposição que pode ser formulada são as cápsulas de 250 mg de
citrato de magnésio, associadas a 500 mg de lactato de
cálcio, ingerindo-se duas cápsulas ao dia.

• Na hipercalcemia:
Os diuréticos tiazídicos diminuem a excreção renal de cálcio e
aumentam sua reabsorção renal no túbulo distal, podendo,
algumas vezes, causar hipercalcemia. A persistência dessa
anormalidade aliada a um nível de PTH sérico normal ou
elevado após a suspensão do tiazídico sugere a presença de
hiperparatireoidismo primário.

Nos casos de hipercalcemia relacionados aumento da atividade


osteoclástica, com o objetivo de diminuir reabsorção óssea, está
indicado o uso de bifosfonatos como o Pamidronato 30-90 mg
em solução salina 0,9% infundida em 2-4 horas.

Os glicocorticoides têm lugar no tratamento de hipercalcemia,


quando a etiologia está relacionada à elevação de
1,25(OH)2D3. Portanto, estão indicados em pacientes com
linfoma, doença granulomatosa ou com intoxicação por
vitamina D. A dose preconizada é de 200 a 300 mg de
hidrocortisona EV durante 3-5 dias.
O tratamento de hipercalcemia é direcionado principalmente
para os pacientes sintomáticos, mas, neste caso, o nível
plasmático de cálcio é um importante balizador da necessidade
de ministração de tratamento. Pacientes com elevação discreta
de cálcio, nível inferior a 12 mg/dL, usualmente são
assintomáticos e não se beneficiam de terapêutica de redução de
calcemia. Nos pacientes com níveis de cálcio plasmático entre
12-14 mg/dL, o tratamento deve ser instituído, caso haja a
presença de sinais e/ou sintomas de hipercalcemia. Enquanto
isso, níveis de cálcio acima de 14mg/dL confirmados indicam a
necessidade de instituição imediata de tratamento.

REFERÊNCIAS
1. Riella MC. Metabolismo De Cálcio, Fósforo E Magnésio. In: Riella MC. Princípios De
Nefrologia E Distúrbios Hidroeletrolíticos. 4. ed. Rio De Janeiro: Guanabara Koogan;
2003.
2. Guyton AC, Hall JE. Tratado De Fisiologia Médica. 11. ed. Rio De Janeiro: Elsevier; 2006.
3. Campos FS, Pinhati FR. O Controle Do Cálcio E A Hipocalcemia. Cad UNIFOA. 2013;
23(8): 77-85.
4. Porto CC. Exame Clínico: Bases Para A Prática Médica. 6. ed. Rio De Janeiro: Guanabara
Koogan; 2008.
5. Paula FJ, Foss MC. Tratamento Da Hipercalcemia E Hipocalcemia. Medicina, Ribeirão
Preto. 2013; 36: 70-4.
6. Dutra VF, Tallo FS, Rodrigues FT, Vendrame LS, Delascio RL, Lopes AC. Desequilíbrios
Hidroeletrolíticos Na Sala De Emergência. Rev Bras Clin Med. 2012; 10(5): 410-9.
7. Copês RM, Premaor MO, Zorzo P. Hipercalcemia: avaliação e princípios do tratamento.
Rev AMRIGS. 2013; 57(4): 328-34.
8. Sampaio EAS, Moysés RMA. Paratireoidectomia Na Doença Renal Crônica. J Bras Nefrol.
2011; 33(2): 31-4.
9. Azevedo M, Sales B, Maia L, Leal E. Interpretação Dos Testes De Função Tireoideana. In:
Vilar L (ed.). Endocrinologia Clínica. 3. ed. Rio De Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.
5.6
INTERPRETAÇÃO DA
GASOMETRIA ARTERIAL E
DISTÚRBIOS ÁCIDOS BÁSICOS
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Lucas Augusto Cecílio Chagas da Silva

DEFINIÇÕES
• Exame laboratorial realizado com amostras coletadas de sangue
arterial, o qual possui por objetivo avaliar a eficácia da troca de
gases pulmonares (gás carbônico e oxigênio), avaliar a integridade
do sistema de controle ventilatório, determinar os níveis
acidobásicos do sangue e monitorizar e avaliar a terapia
ventilatória em patologias respiratórias agudas e/ou crônicas.

• A Gasometria arterial, além da dosagem dos gases no sangue


arterial, pode oferecer de maneira rápida o perfil iônico – sódio
(Na+), potássio (K+) e cálcio (Ca2+) –, bem como de perfusão
tecidual (lactato) e glicose. De acordo com os parâmetros da
gasometria arterial (Tabela 1), podemos interpretar a presença ou
não de vários distúrbios. Portanto, é um exame de grande
importância na avaliação de pacientes com distúrbios metabólicos
nos quadros de sepse, traumas e várias outras patologias.

PARÂMETROS VR
pH 7,35 a 7,45

PCO2 35 a 45 mmHg

PO2 80 a 100 mmHg


HCO3- 22 a 26 mmol/L

SatO2 95-99%

BE -2 a +2 mEq/L

Na+ 136 a 145 mEq/L

K+ 3,5 a 5,0 mEq/L

Ca2+ 2,1-2,5 mmol/L

Lactato 0,5-1,6 mmol/L

Glicose 60-100/dL

Tabela 1. Parâmetros e valores de referência.


Fonte: Adpatado Riella MC, Pachaly MA, 2003.

• O pH é o parâmetro utilizado para quantificar a concentração


hidrogeniônica do sangue da amostra. A PCO2 representa a pressão
parcial de gás carbônico e o HCO3– a concentração de bicarbonato.
Se comparadas as amostras de sangue arterial e venoso, esses
valores não apresentam mudanças significativas, enquanto a PO2
(Pressão parcial de oxigênio) e a SatO2 apresentam e dão
informações acerca da qualidade da ventilação do paciente. Base
Excess (BE) reflete a concentração de bases no sangue, que
quantifica tanto o excesso de bases na alcalose, quanto à sua falta
em casos de acidose metabólica.

a. INTERPRETANDO A GASOMETRIA ARTERIAL


(fluxograma 1)

• Passo 1. Analisando pH, PCO e HCO , qual é o distúrbio


2 3

mais aparente?

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma: interpretando a gasometria arterial
Fonte: Adaptado Riella MC, Pachaly MA, 2003.

• Passo 2. Existe compensação adequada?


Depois de identificado o distúrbio presente, avaliar se há resposta
adequada ao quadro do paciente, ou seja, em desequilíbrios respiratórios,
qual é o valor esperado de bicarbonato? Para as desordens metabólicas, qual
o valor esperado de PCO2? Para isso, são utilizadas as fórmulas apresentadas
no quadro abaixo (tabela 2):
Desordem primária Fórmula

Acidose metabólica PCO2 = 1,5 x [HCO3] + 8*

Alcalose metabólica PCO2 = 40 + 0,7 x [HCO3 atual – HCO3 normal]**

Aguda: [HCO3] aumenta 1 mEq para cada 10 mmHg de aumento da PCO2


Acidose respiratória
Crônica: [HCO3] aumenta 3,5 mEq para cada 10 mmHg de aumento da PCO2

Aguda: [HCO3] diminui 2 mEq para cada 10 mmHg de queda da PCO2


Alcalose respiratória
Crônica: [HCO3] diminui 5 mEq para cada 10 mmHg de queda da PCO2

* Nos distúrbios simples é aceita variação de até ± 2 mEq/L.


** Nos distúrbios simples é aceita variação de até ± 5 mEq/L.

Tabela 2. Fórmulas para avaliar mecanismos compensatórios.


Fonte: Adptado Riella MC, Pachaly MA, 2003.

• Passo 3: Calcular e avaliar o ânion gap.


O ânion gap, ou hiato iônico, é a concentração em mEq/L equivalente aos
ânions que não são mensurados normalmente, mas que refletem na
eletroneutralidade do plasma. São eles: lactato, fosfato, sulfato e proteínas.
Seu cálculo é feito entre a diferença de concentração dos cátions,
representado principalmente pelo Na+ (K+ apresenta baixas concentrações e,
por isso, geralmente não é incluído no cálculo) e os ânions cloro e
bicarbonato, resultando na seguinte fórmula:

Aplicando valores normais dos cátions e ânions na fórmula acima,


obtém-se que o valor normal do ânion gap está entre 8 a 16 mEq/L.

b. MECANISMOS COMPENSATÓRIOS
Como o pH plasmático depende diretamente da relação HCO3–/CO2, a
resposta compensatória de um distúrbio ácido básico (tabela 3) visa manter
essa relação o mais próximo possível do normal.
MECANISMO MECANISMO
DISTÚRBIO pH
PRIMÁRIO COMPENSATÓRIO

Acidose metabólica ↓ (< 7,35) ↓ HCO3- (< 22 mmol/L) ↓ PCO2

Acidose respiratória ↓ (< 7,35) ↑ PCO2 (> 45 mmHg) ↑ HCO3-

Alcalose metabólica ↑ (> 7,45) ↑ HCO3- (> 26 mmol/L) ↑ PCO2

Alcalose respiratória ↑ (> 7,45) ↓ PCO2 (< 35 mmHg) ↓ HCO3-

Tabela 3: Resposta compensatória dos distúrbios ácidos básicos.


Fonte: Adaptado Riella MC, Pachaly M, 2003.
• Como é realizado esse mecanismo compensatório?
Via Renal: principal regulador do pH sanguíneo. Resposta lenta
(aproximadamente 2 semanas), por meio do aumento da
reabsorção de HCO3– e eliminação de H+ e NH4.

Via Pulmonar: regula o aumento ou a diminuição da PCO2 por


meio da hipoventilação ou hiperventilação, respectivamente.
Resposta rápida, mas não tão eficiente quanto a renal.

Via Tampão Sérico: ação de curta duração de proteínas e


hemoglobina. Resposta pouco eficiente, sendo as duas primeiras
vias responsáveis pela resposta compensatória.

c. DISTÚRBIOS ÁCIDOS BÁSICOS MISTOS E AVALIAÇÃO


DA RESPOSTA COMPENSATÓRIA

• O distúrbio ácido básico misto é aquele no qual o paciente


apresenta dois ou mais distúrbios simultaneamente. Dessa
forma, pode haver quadros nos quais o paciente apresenta pH
normal devido à combinação dos desequilíbrios. Assim, é
indispensável a interpretação adequada da gasometria arterial.

• A avaliação da resposta compensatória está intimamente ligada


aos achados de distúrbios ácido básicos mistos, tendo em vista que
a aplicação das fórmulas, combinada com a coleta adequada de
história clínica e dados do exame físico, concluem em um
diagnóstico confiável. A tabela abaixo (Tabela 4) consiste na
interpretação de valores resultantes das fórmulas:
Distúrbio Avaliação da resposta
ácido básico compensatória
PCO2 acima do esperado: acidose mista (metabólica e respiratória).
Acidose
PCO2 abaixo do esperado: distúrbio misto (acidose metabólica e alcalose
metabólica
respiratória).

Alcalose PCO2 acima do esperado: alcalose mista (metabólica e respiratória).


metabólica PCO2 abaixo do esperado: distúrbio misto (alcalose metabólica e acidose
respiratória).

HCO3 acima do esperado: distúrbio misto (acidose respiratória com alcalose metabólica).
Acidose respiratória
HCO3 abaixo do esperado: acidose mista (respiratória e metabólica).

HCO3 acima do esperado: alcalose mista (metabólica e respiratória).


Alcalose respiratória
HCO3 abaixo do esperado: distúrbio misto (alcalose respiratória com acidose metabólica).

Tabela 4. Avaliação da resposta compensatória de acordo com o distúrbio


ácido básico.
Fonte: Aptado Riella MC, Pachaly MA, 2003.

d. ÂNION GAP E ASSOCIAÇÃO COM OS DISTÚRBIOS


ÁCIDOS BÁSICOS

• A avaliação do ânion gap é de grande importância para


determinar a etiologia do distúrbio acidótico, principalmente em
casos de difícil coleta de história clínica.

• Em casos de acidose metabólica com concentrações normais de


cloreto, a eletroneutralidade é mantida às custas dos ânions não
mensuráveis. Nesse caso o paciente apresenta acidose
normoclorêmica ou com ânion gap aumentado.

• Já em casos de acidose metabólica por excreção do HCO , o 3


ânion gap não se altera, pois não há acúmulo de ânions não


mensuráveis. Visando manter a eletroneutralidade frente a esse
quadro, há aumento da reabsorção de íons cloreto, que leva o
paciente ao quadro de acidose hiperclorêmica ou com ânion gap
normal. As principais causas são por perda gastrointestinal
(diarreia e fístulas pancreáticas ou biliares) ou renal (acidose
tubular renal, uso de inibidores da anidrase carbônica),
acidose dilucional e nutrição parenteral.

e. CAUSAS MAIS COMUNS DOS DISTÚRBIOS


ACIDOBÁSICOS

• Acidose metabólica
Por adição de ácido (AG aumentado/normoclorêmica):
acidose láctica, cetoacidose diabética, cetoacidose alcoólica,
jejum prolongado, azotemia devido a insuficiência renal aguda,
intoxicação por ácido acetilsalicílico.

Por perda de bicarbonato (AG normal/hiperclorêmica):


diarreia, acidose tubular renal, presença de fístula pancreática ou
biliar, acidose dilucional, uso de inibidores da anidrase
carbônica.

• Alcalose metabólica
Responsiva a reposição de cloreto: vômitos e uso de cateter
nasogástrico para drenagem (HCl), diarreia crônica, uso de
diuréticos (depleção de K+), fibrose cística, correção de
hipercapnia crônica.

Resistente à reposição de cloreto: excesso de


mineralocorticoide (hiperaldosteronismo, síndrome de Cushing,
síndrome de Bartter) e hipocalemia.

• Acidose respiratória
Aguda: acometimento do sistema nervoso central (TCE, coma,
intoxicações exógenas, síndrome de Guillain-Barré, miastenia
gravis), comprometimento osteomuscular torácico devido a
traumas (tórax instável, pneumotórax), edema pulmonar,
embolia pulmonar maciça, parâmetros inadequados de
ventilação mecânica.

Crônica: DPOC, cifoescoliose, paralisia diafragmática,


síndrome de Pickwick.

• Alcalose respiratória
Aguda: febre e infecções sistêmicas, ansiedade, intoxicação por
salicilatos, AVE, altitudes elevadas, pneumopatias agudas,
atelectasia, parâmetros inadequados de ventilação mecânica.

Crônica: tumores cerebrais, insuficiência cardíaca congestiva,


hipertireoidismo, insuficiência hepática.

• Casos especiais
Hipotensão/choque: quando em fase inicial, apresenta quadro
de acidose metabólica junto de alcalose respiratória. Já em fase
final tende a se tornar acidose mista.

Parada cardiorrespiratória: apresenta com acidose mista,


devido a hipoperfusão tecidual somada com a perda de
ventilação pulmonar.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente de 14 anos admitida em pronto-socorro de
Clínica Médica, relatando quadro de dor abdominal de início há 05 dias,
associado à turvação visual e queda do estado geral, com prostração e
vertigem. Relata que, concomitante às manifestações clínicas, houve
perda de peso de aproximadamente 5 quilos nos últimos 5 dias, com
poliúria. Paciente nega patologias pregressas ou uso de medicações de
uso contínuo.

• História Familiar: vó com diabetes mellitus tipo 2.


• Antecedentes Pessoais Patológicos: Refere Traumatismo
Craniano há 01 ano, sem conduta cirúrgica ou complicações.

b. Exames Físico: Regular estado geral, acianótica, Saturação de


O2: 99%, Frequência respiratória: 26rpm, com hálito cetônico,
emagrecida, desidratada +++/4+, anictérica. FC: 110 bpm, PA: 100x 90
mmHg.

• Aparelhos respiratório, gastrointestinal e cardiovascular: sem


alterações.

c. Exames complementares: Hemoglobina: 16,10; Hematócrito:


34,3%; Leucócitos: 9780; Plaquetas: 333000. PCR < 6, Ureia: 12,8
mg/dL, Creatinina: 0,68 mg/dL, Na: 141 mEq/L, K: 3,7 mEq/L,
Glicemia capilar: 450 mg/dL, Cloro: 114,5 mEq/L, Lactato: 0,73. Urina
I com cetonúria e aumento de corpos cetônicos séricos.

• Gasometria Arterial: pH: 7,26; HCO : 5,7; Pco : 13; Po : 208,4;


3 2 2

BE: -18,6.

Interpretação Gasometria:
1°. Acidose Metabólica: pH < 7,35; HCO3< 22.
2°. Distúrbio Misto: PCO2 esperado: {HCO3} x 1,5 + 8
5,7 x 1,5 + 8: 16,5 +/- 2 - PCO2 encontrado: 13: Alcalose
Respiratória
3°. Calculo Ânion Gap: {Na} – {Cl} + {HCO3} = 141 –
114 + 5,7: 22 (cetoacidoses)

d. Conclusão: Acidose metabólica com alcalose respiratória


(distúrbio misto). Acidose com Ânion Gap Aumentado (caso de
cetoacidose diabética).

DICAS DO ESPECIALISTA
Neste capítulo, abordamos de forma prática a interpretação da gasometria
arterial. Seguem algumas dicas técnicas importantes sobre o procedimento
de coleta deste exame corriqueiro nas enfermarias e unidades de pronto-
atendimento.
a. PROCEDIMENTO:

• Higienizar as mãos.
Realizar desinfecção do frasco de heparina sódica com
Clorexidine alcóolico.

Adaptar a agulha à seringa e aspirar 0,2 mL de heparina sódica,


lubrificando a seringa em toda a sua extensão.

Identificar a seringa com o nome do paciente, leito, unidade e


data.

Em seguida, empurrar o êmbolo de volta até o fim, desprezando


a heparina e trocar a agulha.

Caso utilize a seringa específica para gasometria (pré-


lubrificada com anticoagulante), este procedimento é
desnecessário.

• Preparar ambiente.
Explicar para o paciente os riscos/benefícios e objetivos do
procedimento.

Posicionar confortavelmente o paciente em decúbito dorsal ou


sentado.

Calçar luvas de procedimento e óculos de proteção.

• Realizar o Teste de Allen: comprimir simultaneamente as duas


artérias (radial e ulnar), pedindo ao paciente que feche e abra
várias vezes a mão; esta ficará isquemiada e pálida. Em seguida,
com a mão do paciente aberta, retiram-se os dedos da artéria ulnar.
A coloração rósea deve voltar, indicando boa circulação colateral.
• Palpar o pulso radial. Em caso de debilidade, pensar nos demais
locais de punção, em ordem de prioridade: braquial, pedioso e
femoral.

Realizar antissepsia do local da punção com algodão ou gaze


embebido em Clorexidine alcóolico.

Posicionar a agulha inclinada a 45° e o bisel disposto


lateralmente. Observar o enchimento espontâneo de sangue na
seringa ou realizar aspiração até o volume predeterminado.
Para os demais locais, a angulação da agulha deve respeitar:
→ 45- 60º para braquial;
→ 30- 45º para pedioso; e
→ 60- 90º para femoral.

Retirar a agulha e pressionar o local até hemostasia completa.

Remover imediatamente as bolhas de ar da seringa.

Realizar rotação da seringa entre as mãos.

Colocar a seringa dentro do saco plástico.

Retirar as luvas e higienizar as mãos.

Encaminhar imediatamente a seringa ao laboratório, de


preferência em gelo.

Organizar os materiais e encaminhá-los ao destino adequado.

b. RISCOS: Hematoma, Dissecção arterial e Sangramento.


c. PREVENÇÃO DE AGRAVO: Seguir procedimento técnico.
Assegurar completa hemostasia pós-punção. Nunca realizar
movimentos laterais com a agulha em punção.

REFERÊNCIAS
1. Évora PRB, Garcia LV. Equilíbrio Ácido-base. Rev Fac Med Ribeirão Preto. 2008; 41(3):
301-11.
2. Pinto LMO, Martins HS. Insuficiência renal aguda e emergências dialíticas. In: Martins HS,
Velasco IT. Manual de Emergências Clínicas. Barueri: Manole; 2009.
3. Furoni RM, Pinto Neto SM, Giorgi RB, Guerra EMM. Distúrbios Do Equilíbrio Ácido-
básico. Rev Fac Ciên Méd Sorocaba. 2017; 12(1): 5-12.
4. Riella MC, Pachaly MA. Metabolismo Ácido-básico. In: Riella MC. Princípios De
Nefrologia E Distúrbios Hidroeletrolíticos. Rio De Janeiro: Guanabara Koogan; 2003.
5. Rocco JR. Diagnóstico Dos Distúrbios Do Metabolismo Ácido-base. Rev Bras Ter Intensiva.
2003; 15(4): 184-92.
6. Lameire N, Biesen WM, VanHolder R. Acute renal failure. Lancet. 2005; 365(9457): 417-30.
7. Stefani SD, Barros E. Clínica Médica: Consulta Rápida. 3. ed. Porto Alegre: Artmed; 2008.
5.7
SÍNDROME NEFRÓTICA
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Rodolfo Pereira Espíndola

DEFINIÇÕES
A síndrome nefrótica caracteriza-se por proteinúria superior a 3,5 g/24h
no adulto ou maior do que 50 mg/kg/24h em crianças, além de
hipoalbuminemia e edema.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Podemos dividir as etiologias mais comuns da Síndrome nefrótica em
dois grandes grupos:

• Glomerulopatias primárias: glomerulopatia membranosa


(GM), glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF) e doenças de
lesão mínima (DLM).

• Glomerulopatias secundárias: nefrite lúpica, nefropatia


diabética, Hepatite B, Hepatite C, HIV, neoplasias e outras
doenças associadas às paraproteinemias.
Abaixo um fluxograma apresentando o mecanismo fisiopatológico da
síndrome nefrótica:

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1- Fisiopatologia da síndrome nefrótica
Fonte: Riella MC, Pachaly MA, 2003.

• A parede dos glomérulos tem como principal função a


seletividade, controlada basicamente por dois mecanismos: fendas
de filtração, responsáveis pela “Barreira de tamanho”, e a carga
negativa da membrana basal, responsável pela “Barreira de
carga”. Caso haja uma lesão na Barreira de tamanho, tem-se a
chamada proteinúria não seletiva, visto que haverá uma perda
proporcional de todas as macromoléculas (albumina, globulinas
etc.). Já no caso da proteinúria seletiva, ou seja, à custa de
albumina, a lesão estará afetando predominantemente a “Barreira
de carga”.

• A eletroforese de proteínas urinária é capaz de distinguir as


proteínas eliminadas na urina, sendo então utilizada para a
classificação em seletiva ou não seletiva. Deve-se realizar a
investigação completa na procura da doença de base a partir da
história e do exame físico do paciente.

QUADRO CLÍNICO
Os principais sinais e sintomas observados em pacientes com síndrome
nefrótica são:

• Edema: pode ser discreto ou generalizado (anasarca). O edema é


caracteristicamente mais acentuado na face (bipalpebral) pela
manhã e nos membros inferiores ao final do dia.

• Derrames cavitários: (peritoneal, pleural) podem estar


presentes.

• Espuma na urina: se presente, traduz a perda anormal de


proteínas na urina.

• Hipertensão arterial sistêmica: elevação da pressão arterial e


alterações de fundo de olho compatíveis com hipertensão podem
estar presentes, com frequência variável de acordo com o tipo
histológico da glomerulopatia.

• Manifestações da doença de base: podem ser observados sinais


e sintomas próprios de doença subjacente, eventualmente
existente, que originou a síndrome nefrótica (exemplo: lúpus
eritematoso sistêmico).
EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: Ganho importante de peso, com edema intenso em
membros inferiores com sinal do cacifo (anasarca muito comum),
inelástico, não doloroso à palpação, temperatura normal, edema
periorbitário matinal (fácies renal), pressão arterial pode estar
aumentada, mas geralmente não altera níveis pressóricos.
Taquipneia por congestão pulmonar e/ou restrição mecânica do
diafragma por ascites de grande volume.

• Aparelho respiratório: estertores finos, macicez à percussão e


diminuição ou ausência de murmúrio vesicular em derrames
pleurais (quadros de congestão sistêmica importante). As serosas
são muito acometidas devido ao extravasamento para o interstício
do líquido plasmático.

• Aparelho cardiovascular: Podem apresentar taquicardia, devido


a intravascular depletado de volume.

• Aparelho gastrointestinal: Ascite que varia de pequeno a grande


volume, associado ou não a dor à palpação. Dor secundária a
edema de alças intestinais e/ou infecções no líquido ascítico
devido à transloção de bactérias intestinais.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exame de urina I: proteinúria nefrótica sempre presente,
cilindros granulosos; hematúria, leucocitúria e lipidúria podem ou não
estar presentes.
b. Proteinúria (urina 24 horas) ou Relação Proteína/creatinina:
proteinúria nefrótica (maior que 3,5g/dia em adultos ou > 50
mg/kg/24h em crianças - relação Proteína/creatinina > 3,5). Abaixo
destes valores a proteinúria é nefrítica.
c. Albumina sérica: Hipoalbuminemia geralmente abaixo de 3
g/dL que também integra a definição da síndrome.
d. Perfil Lipídico (Colesterol e Triglicérides): geralmente se
mostram elevados, mas isso não é definidor da síndrome.
Não havendo suspeitas evidentes das doenças de base, são comumente
solicitados os seguintes exames:
e) Glicemia;
f) Hemograma;
g) Exame parasitológico de fezes (associação com
Esquistossomose);
h) Pesquisa de anticorpos antinucleares;
i) Avaliação dos níveis de complemento;
j) Pesquisa de HBsAg e anticorpos anti-HBs e anti-HBc;
k) Pesquisa de anticorpos anti-HCV;
l) Pesquisa de anticorpos anti-HIV;
m) Exames específicos para outras doenças, de acordo com a
história e quadro clínico;
n) Exames para afastar neoplasias (principalmente em idosos).
o) Biópsia renal:

• Indicações: Síndrome nefrótica associado a rins de tamanho


normal sem etiologia definida e sem contraindicações
conhecidas; crianças, devido à predominância da doença de
lesões mínimas, nos casos que não responderam ao tratamento
imunossupressor instituído.

• Contraindicações: múltiplos cistos, rim único, pielonefrite e


abscessos associados, neoplasia renal e hidronefrose ou
malformações renais que dificultam o procedimento. Distúrbio de
coagulação, HAS grave não controlada com medicamentos,
uremia, obesidade e paciente não colaborativo.

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é baseado nos achados da história clínica, exames
complementares e anatomopatológicos. A presença dos sintomas clássicos
de edema (anasarca), proteinúria nefrótica quantificada e hipoalbuminemia
sugere síndrome nefrótica. A partir desta hipótese, a investigação da
etiologia definirá melhor o tratamento.
Afastando doenças de base que levam ao quadro de glomerulopatia
secundária com manifestação nefrótica, os achados histológicos ajudam
principalmente no diagnóstico das glomerulopatias primárias e confirmam
as secundárias, conforme apresentado na tabela 1.
Tipo Microscopia Imuno- Microscopia
histológico óptica fluorescência eletrônica

Fusão dos pedículos dos


Alterações histológicas mínimas
DLM Negativa. podócitos; vacuolização de
ou ausentes.
célula epitelial.

Hialinose segmentar; aderência à Fusão do pedículo dos podócitos


cápsula de Bowman; colapso de em área sem esclerose
GESF IgM e C3, segmentar.
alças capilares; áreas de atrofia glomerular; vacuolização de
tubular. células epiteliais.

Espessamento da membrana basal


glomerular; envolvimento
IgG e C3, granular, ao longo das Depósito eletro densos
GM glomerular uniforme e difuso;
paredes capilares. subepiteliais.
presença de espículas na
impregnação pela prata.

Tabela 1. Principais tipos histológicos de glomerulopatias primárias que


cursam com síndrome nefrótica.
Fonte: Adaptado de Morales JV et al, 2008.

TRATAMENTO
a) TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Restrição hídrica com cautela, dieta hipossódica (2 g de sódio ao


dia, ou cloreto de sódio [NaCl, sal de cozinha] 3-3,5 g/por dia) e
normoproteica (0,8-1,0 g/kg/dia), desde que não haja déficit
importante de função renal.

• Atentar-se para evitar uma restrição hídrica rigorosa, pois esses


pacientes, na maioria das vezes, apresentam hipovolemia.
• Restrição de sódio e líquidos: o volume hídrico permitido não
deve exceder o da diurese atual do paciente.
b) TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Diuréticos: preferência pelos diuréticos de alça por via oral ou


endovenosa, principalmente nos pacientes em anasarca.
Parcimônia com os diuréticos para não causar hipotensão e
insuficiência renal aguda pré-renal. A dose inicial de 1 mg/kg
dividida em 2 a 3 vezes ao dia é preconizada, podendo ser
aumentada até 0,5 a 1 mg/kg a cada 6, 8 ou 12 horas (80 a 320
mg/dia). Pode-se aplicar furosemida em bolus ou em infusão
contínua, na dose de até 500 mg/dia.

• Albumina: oral e/ou endovenosa, usada em associação com


diuréticos quando estes não conseguem retirar o líquido do espaço
intersticial mesmo em doses mais elevadas, aumentando o risco de
instabilidade hemodinâmica.

• Dislipidemia: tratar em quadros associados à hipoalbuminemia e


proteinúria persistentes. Iniciar inibidores da hidroximetilglutaril
coenzima A-redutase (estatinas).

• Hipertensão arterial sistêmica: Se presente, manter controle


rigoroso da pressão arterial, preferindo os anti-hipertensivos
inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) e/ou
bloqueadores de receptor de angiotensina II (BRA), assim como
inibidores de renina. Essas classes têm ação nefroprotetora e
antiproteinúrica (após avaliação do especialista, este definirá o
uso de IECA e/ou BRA como antiproteinúrico independentemente
da pressão arterial).

• Tratamento da glomerulopatia propriamente dita em linhas


gerais:
Os diferentes tipos histológicos têm tratamentos preferenciais,
utilizando esquemas de medicações imunossupressoras.
Considerar seu uso quando confirmado o diagnóstico e
afastadas doenças associadas que necessitem de outros
tratamentos.

Assim, o uso dos imunossupressores fica reservado para


glomerulopatia primária e algumas glomerulopatias secundárias
de natureza imune, como na nefrite lúpica, por exemplo.

Principais imunossupressores: Prednisona, Ciclofosfamida,


Azatioprina, Ciclosporina e pulsoterapia com
metilprednisolona.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Um homem negro previamente saudável, 40 anos, está sendo
avaliado por causa de uma urina espumosa associada a um edema
periorbital matutino e edema de tornozelos e dos pés. Ele ganhou 10
kg em duas semanas.

b. Exames Físicos:
• Ectoscopia: sua pressão arterial é de 140 x 88 mmHg. O restante do
exame é normal, exceto pelo edema (cacifo 3+/4+), inelástico,
temperatura normal com pulsos pediosos presentes e simétricos.

c. Exames complementares: ureia plasmática: 14 mg/dL,


creatinina sérica: 1,1 mg/dL e os eletrólitos séricos estão normais. A
glicose plasmática é de 103 mg/mL, o colesterol total: 387 mg/mL,
albumina sérica: 2,2 g/dL. A análise de urina mostra 4+ de proteinúria,
com eritrócitos e corpos gordurosos ovais ocasionais. A excreção de
proteínas na urina de 24 horas é de 11 g. Exames complementares de
investigação de doenças sistêmicas que levariam à glomerulopatia
secundária vieram todos normais (Anti-HIV; Anti-HCV; Anti-HBs;
Anti-HBc total; HBsAg: negativo; Anti-HIV 1&2; VDRL; FAN; C3,
C4 e CH50; ANCA-C; ANCA-P).
“Configurando uma síndrome nefrótica de etiologia a esclarecer.”
d) Prescrição sugerida:
(Manejo clínico inicial)

1. Dieta hipossódica e normoproteica.


2. Restrição de 1000 mL de água/dia via oral.
3. Captopril 25 mg 1 comprimido 8/8h.
4. Furosemida 20 mg/mL – 1mg/kg dividido 2 a 3 vezes ao dia (para
manutenção e aumento de dose, avaliar resposta clínica).
5. Pesar o paciente diariamente – controle rigoroso do peso.
6. Monitorar íons pelo risco de distúrbio hidroeletrolítico e
acompanhar perfil lipídico.
7. Quantificar diurese e monitorar sinais vitais.
8. Solicitar avaliação do nefrologista (indicação de biópsia?).

DICAS DO ESPECIALISTA
• Paciente não respondedor à terapia diurética deverá ter como
associação a albumina humana. A dose preconizada de albumina
humana 20% ou 25% (20 g ou 25 g/100 mL) é 0,5 g/kg de peso
infundida por via endovenosa em 1 hora, 2 a 3 vezes por dia. No
final da infusão de albumina, administra-se 1 a 2 ampolas de
furosemida 20 mg endovenoso para promover excreção de sódio e
aumento da diurese.

• A perda de peso corporal ponderal diária não deve ultrapassar


1,5-2,0 kg, pois, além disso, existe o risco de marcada
hipovolemia induzindo insuficiência renal aguda, principalmente
em indivíduos idosos.

• Com nível de triglicerídeos acima de 500 mg/dL, recomenda-se


o uso de fibrato (ex., Fenofibrato, Ciprofibrato ou genfibrozila)
para reduzir o risco de pancreatite. Entretanto, o benefício em
longo prazo do tratamento com hipolipemiantes sobre a
progressão da doença renal e complicações cardiovasculares não
foi confirmado nas últimas meta-análises.

• Em pacientes com glomerulopatias primárias, a redução da


proteinúria abaixo de 0,5 a < 1,0 g/dia diminuiu a progressão da
doença renal. Mesmo em pacientes normotensos, essas drogas
devem ser usadas para redução da proteinúria, mas com cautela,
pelo potencial de reduzir a filtração glomerular, causando
insuficiência renal.

• Pacientes com Síndrome nefrótica estão expostos a maior risco de


infecções bacterianas e virais pelo estado Nefrótico e pela
necessidade de terapia imunossupressora. Além das vacinas
habitualmente disponíveis no Programa Nacional de Imunizações,
esses pacientes têm indicação dos seguintes imunobiológicos de
uso especial: vacina Haemophilus influenzae tipo b
(conjugada), pneumocócica polissacarídica (Pneumo 23),
varicela e influenza, com exceção de pacientes que estão fazendo
uso de imunossupressores que não poderão receber vacina de
vírus vivo atenuado.

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Disponível em: http://conitec.gov.br/protocolos-e-diretrizes.
5.8
SÍNDROME NEFRÍTICA
Autores:
Robson Eugênio da Silva
Rodolfo Pereira Espíndola

DEFINIÇÕES
A síndrome nefrítica é caracterizada pelo início súbito de hematúria
dismórfica, edema, proteinúria subnefrótica, oligúria, hipertensão arterial
sistêmica e déficit da função renal, sendo a hematúria dismórfica um achado
que obrigatoriamente deve estar presente, associada a pelo menos uma das
outras anormalidades.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A incidência global estimada da doença é de 472.000 casos por ano, dos
quais 77% ocorrem em países em desenvolvimento. A incidência diminuiu
nas últimas décadas, possivelmente devido ao uso generalizado de
antibióticos associado a melhores cuidados de saúde e melhores condições
socioeconômicas e nutricionais.
A síndrome nefrítica é um processo inflamatório agudo que envolve os
glomérulos renais. Várias doenças podem se manifestar com síndrome
nefrítica. As causas são múltiplas, podendo ser divididas em infecciosas,
não infecciosas e sistêmicas.

• Causas infecciosas: glomerulonefrite pós-estreptocócica,


endocardite, sepse, infecção pelos vírus da hepatite B e C,
mononucleose infecciosa, sarampo, rubéola, caxumba, varicela e
malária.

• Causas não infecciosas: Doenças renais primárias: Doença de


Berger (nefropatia por IgA), glomerulonefrite
membranoproliferativa e glomerulonefrite antimembrana basal.
Doenças renais secundárias a doenças sistêmicas: Lúpus
eritematoso sistêmico, púrpura de Henoch-Schölein,
granulomatose de Wegener, crioglobulinemia mista essencial e
doença de Goodpasture.
O protótipo da síndrome nefrítica é a glomerulonefrite pós-
estreptocócica (GNPE), uma glomerulonefrite difusa aguda (GNDA) que
se desenvolve após uma infecção por cepas nefritogênicas do Streptococcus
pyogenes, estreptococo β-hemolítico do grupo A de Lancefield (SBHGA).
Os pacientes apresentam síndrome nefrítica entre uma a três semanas
após um episódio de faringite estreptocócica ou três a cinco semanas após
quadro de piodermite. Logo, a GNPE é considerada uma sequela tardia e
não supurativa decorrente da estreptococcia. A GNPE é a causa mais
comum de doença glomerular aguda em crianças em todo o mundo. A
doença afeta principalmente crianças pré-escolares, com idade entre 3 a 12
anos, sendo incomum abaixo de 3 anos de idade. Em pré-escolares (2 a 6
anos), a GNPE é mais comum após episódios de piodermites; já na faixa
escolar e adolescência (6 a 15 anos) a doença é mais frequente após
faringoamigdalites estreptocócicas.
A GNPE é uma doença glomerular imunomediada. Imunocomplexos
nefritogênicos são formados na circulação e depositados nos glomérulos,
gerando inflamação local. Ocorre também uma reatividade cruzada do
anticorpo antiproteína M, proteína da cápsula do estreptococo, com
estruturas glomerulares. Assim, a proteína M age como superantígeno e
ativa linfócitos T e B. Além disso, há produção de citocinas e ativação nos
glomérulos da via alternativa do complemento, gerando uma resposta
inflamatória localizada nos glomérulos que se manifesta por uma queda dos
níveis de C3.

QUADRO CLÍNICO
O processo inflamatório glomerular resulta em redução na taxa de
filtração glomerular (oligúria e/ou anúria), aumentando a pressão
hidrostática e retenção de sódio e água dentro dos vasos sanguíneos e
congestão, levando a:

• Edema periorbitário, principalmente no período matinal;


• Edema em membros inferiores;
• Tosse, dispneia, ortopneia, derrame pleural;
• Hipertensão arterial sistêmica;
• Hematúria macroscópica e/ou microscópica (a hematúria
macroscópica desaparece em 1 ou 2 semanas, e a microscópica
pode persistir por vários meses).

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: Edema de membrso inferiores com sinal do cacifo
(anasarca menos comum), edema periorbitário matinal (fácies
renal), pressão arterial ≥ 140 x 90 mmHg e taquicardia.

• Aparelho respiratório: estertores finos, macicez à percussão e


diminuição ou ausência de murmúrio vesicular em derrames
pleurais (quadros de congestão sistêmica importante).

• Aparelho cardiovascular e gastrointestinal: podem apresentar


alterações secundárias ao aumento da pressão hidrostática e
sobrecarga de volemia cardíaca. Achados comuns de Insuficiência
renal aguda são descritos em outro capítulo.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Exame simples de urina (EAS) e pesquisa de dimorfismo
eritrocitário: Hematúria dismórfica e cilindros hemáticos; proteinúria.
b. Proteinúria (urina 24 horas) ou Relação Proteína/creatinina:
proteinúria nefrítica (menor que 3,5g/dia em adultos ou < 50
mg/kg/24h em crianças - relação Proteína/creatinina < 3,5). Acima
destes valores, a proteinúria é nefrótica.
c. Dosagem de complemento C3, C4 CH50: baixos níveis séricos
de C3. Podem estar normais ou diminuídos o C4 e o CH50.
d. Cultura de orofaringe para SBHGA: pode corroborar o
diagnóstico ou apenas representar o estado de portador (não realizado
de rotina).
e. Dosagem de anticorpo antiestreptolisina O (ASLO): títulos
aumentados confirmam infecção recente, sendo que se elevam após a
infecção de orofaringe (não realizado de rotina).
f. Dosagem de anticorpo antidesoxirribonuclease B (DNase B):
títulos aumentados confirmam infecção recente de quadros de infecção
estreptocócica cutânea (não realizada de rotina).
g. Dosagem de ureia e creatinina: acompanhamento da função
renal.
h. Biópsia renal:

• Indicação:
História familiar de Nefropatia.

Hematúria macroscópica por mais de 04 semanas.

Proteinúria em nível nefrótico e persistente.

Complemento sérico baixo por mais de 08 semanas.

Persistência de hipertensão arterial sistêmica.

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é baseado nos achados da história clínica, exames
complementares e anatomopatológicos. A presença dos sintomas clássicos
de edema, hipertensão arterial e oligúria associados à EAS com hematúria
dismórfica, cilindros hemáticos, proteinúria subnefrótica, além de baixos
níveis séricos do complemento C3, sugere síndrome nefrítica. A partir desta
hipótese, a investigação da etiologia definirá melhor o tratamento.
TRATAMENTO
a) TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Repouso enquanto persistirem o edema e a hipertensão arterial ou


caso ocorram complicações.

• Restrição hídrica (deve ser ajustada às perdas insensíveis,


subtraídas da água endógena – total de 400mL/m2 /dia, acrescidas
de reposição parcial da diurese, objetivando-se balanço negativo
de líquidos enquanto houver edema.) Realizada na vigência de
hipervolemia e oligúria.

• Restrição do consumo de sal em até 7 gramas por dia. Deve ser


restringida à fase de oligúria, edema e hipertensão.

• Suspender todas as medicações nefrotóxicas.


b) TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Infecção estreptocócica vigente:: erradicar a infecção


estreptocócica através do uso de penicilina Benzatina em dose
única. Dose: 600.000 UI em pacientes menores de 20 quilos e
1.200.000 unidades em pacientes maiores de 20 quilos. A
penicilina V oral também pode ser utilizada, assim como a
Eritromicina para os pacientes alérgicos.

• (Lembrando que a manifestação da síndrome não está relacionada


diretamente com o quadro infeccioso, mas sim com a resposta de
imunocomplexos induzidas por esta infecção).

• Diurético de alça: Furosemida está indicada, com o objetivo de


diminuir volemia e pressão hidrostática.
• Anti-hipertensivos: Recomendam-se inicialmente os diuréticos,
podendo associar outros anti-hipertensivos para evitar
complicações da hipertensão arterial sistêmica.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Menino de 6 anos é levado ao pronto-atendimento
devido a quadro de dispneia iniciado há uma hora. A mãe refere que
seu filho apresenta, há dois dias, edema bipalpebral, especialmente
pela manhã. Além disso, acha que ele está desidratado, pois tem
notado sua urina muito escura e em pouca quantidade. Na anamnese
dirigida, relata prurido estrófulo, especialmente em membros
inferiores, necessitando de tratamento com Cefalexina por dez dias no
mês passado.

b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: regular estado geral; dispneica; FR = 36 irpm; FC =


90 bpm; PA = 160 x 90 mmHg; hidratada; com edema bi
palpebral (+/4+); acianótica e anictérica. Membros inferiores com
edema (+/4+) com diversas lesões cicatriciais, com pulsos
presentes e simétricos.

• Aparelho respiratório: com estertoração fina até terço médio de


ambos os pulmões.

• Aparelho cardiovascular e gastrointestinal: sem alterações.


c. Exames complementares: Exame de urina evidenciou pH 5,5,
densidade urinária de 1030, proteinúria subnefrótica (30 mg/kg/dia),
cilindros hemáticos, 35.000 hemácias/mL e 10.000 leucócitos/mL.
Dosagem de complemento sérico (C3) diminuído. Creatinina: 1,0
mg/dL, ureia: 60mg/dL.

d. Prescrição sugerida:
1. Dieta VO hipossódica.
2. Restrição hidrossalina.
3. Furosemida 20 mg/mL – 1mg/Kg/dose uma a duas vezes ao dia.
4. (Ajuste do diurético conforme melhora do edema – avaliação
clínica.)
5. Considerar o uso associado de outro anti-hipertensivo se não
houver controle pressórico adequado com dieta e o uso da
furosemida.

DICAS DO ESPECIALISTA
• O quadro de lesão renal aguda observado na GNPE é transitório e
de curta duração. Os casos mais graves podem cursar com uremia
e distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos próprios da LRA
(lesão renal aguda) e pode ser necessário tratamento dialítico.

• O prognóstico é muito bom, com recuperação completa para a


grande maioria dos pacientes. Em geral, a diurese retorna ao
habitual em uma semana a partir do início do quadro, e os níveis
de creatinina costumam retornar aos basais em 3-4 semanas.

• Anormalidades mínimas (microalbuminúria e/ou hematúria


microscópica) podem ser observadas na vida adulta em menos de
10-20% dos pacientes. Assim, ressalta-se a importância de
acompanhamento com nefrologista.

• A presença de complemento normal no início do quadro,


proteinúria nefrótica e crescentes epiteliais em biópsias na
fase aguda conferem pior prognóstico, com potencial de
evolução para doença renal crônica.

• Os pacientes hipertensos se beneficiam do tratamento com


diurético e anti-hipertensivos orais, como o Nifedipino.
Inibidores da enzima conversora de angiotensina em geral são
evitados, pois o mecanismo de ação destes medicamentos inclui a
vasoconstrição da arteríola eferente com consequente redução da
taxa de filtração glomerular e aumenta o risco de hipercalemia. Os
sinais de alerta devem ser observados atentamente, como
alteração do nível de consciência, convulsões e anúria.

• Não há benefício do uso de corticoterapia nestes pacientes,


exceto em casos de glomerulonefrite rapidamente progressiva,
mas que devem ser indicados pelo nefrologista, considerando cada
caso em particular.

REFERÊNCIAS
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Treatments For Group A Streptococcal Pharyngitis. Cochrane Database Syst Rev. 2013;
30(4): CD004406.
6.1
EXACERBAÇÃO DE ASMA
Autora:
Rafaela Boaventura Martins

DEFINIÇÕES
• Asma: doença pulmonar obstrutiva caracterizada pela inflamação
crônica das vias aéreas, com limitação variável ao fluxo aéreo. A
limitação ao fluxo aéreo é reversível espontaneamente ou com
tratamento.

• Exacerbação de asma (EA): consiste na piora aguda ou subaguda


dos sintomas usuais de um indivíduo asmático, que leva a uma
mudança do seu tratamento habitual. Pode, ocasionalmente, ser a
apresentação inicial da doença.

ETIOPATOLOGIAS E FISIOPATOLOGIA
• A EA geralmente ocorre em reposta à exposição a um agente
externo, conhecido como gatilho ou trigger. É um evento de grande
morbidade, com custo elevado para o sistema de saúde e associado
a absenteísmo na escola e no trabalho.

• A baixa adesão ao tratamento com corticoide inalatório é a


principal causa de perda do controle da doença.

• Diversas outras condições funcionam como triggers; por exemplo:


infecções respiratórias virais, mudança climática, exposição a
alérgenos (pólen, ácaro, alergia alimentar), tabagismo (ativo ou
passivo), poluição ambiental, exercício físico.
• Após a exposição, ocorre ativação da resposta inflamatória nas
vias aéreas, com liberação de mediadores inflamatórios e resposta
broncoconstritora exagerada ao agente causal. O resultado são as
manifestações clínico-funcionais da híper-responsividade
brônquica.

QUADRO CLÍNICO
• As manifestações usualmente ocorrem de forma gradual, com
deterioração clínica progressiva em um período de dias a semanas.

• Quadro decorrente da broncoconstrição: dispneia, tosse,


sibilos, desconforto/opressão torácica. Os sintomas podem ocorrer
isoladamente ou em associação, principalmente à noite e pela
manhã, ao acordar.

• É de grande importância a identificação precoce de fatores de pior


evolução, como a presença de fatores de risco para morte
relacionada à asma, como:
• história de asma quase fatal, com necessidade de internação em
terapia intensiva, especialmente se houve necessidade de
ventilação mecânica;
• hospitalização ou ida à emergência por sintomas de asma no
último ano;
• uso atual ou interrupção recente do uso de corticosteroide
sistêmico;
• ausência de tratamento atual com corticoide inalatório;
• uso de mais de 1 frasco de salbutamol (ou equivalente) por mês;
• má adesão ao tratamento medicamentoso e/ou pobre adesão ao
plano de ação;
• história de doença psiquiátrica ou problemas psicossociais.
• Uma história breve e focada no quadro respiratório associada a
exame físico direcionado deve ser realizada concomitantemente ao
pronto estabelecimento da terapia.

• Investigar dados que possam indicar a causa da exacerbação e o


perfil clínico do paciente (Quadro 1) são essenciais.
Tempo de início dos sintomas (geralmente quadro progressivo) Fator desencadeante da exacerbação

Tempo desde a última exacerbação Exacerbações prévias

Gravidade dos sintomas Presença de escarro purulento

Infecção respiratória recente Febre

Medicações em uso (de alívio e para controle) Presença de comorbidade

História familiar de atopia Internações prévias

Quadro 1. Anamnese dirigida.


Fonte : Schor 20141

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: avaliação do estado geral, nível de consciência,
habilidade em completar frases, grau de hidratação, palidez,
cianose, taquipneia (frequência respiratória > 30 ipm), taquicardia
(frequência cardíaca > 110 bpm), temperatura, saturação periférica
de oxigênio (SpO2).

• Aparelho respiratório: uso de musculatura respiratória acessória,


murmúrio vesicular reduzido ou ausente, sibilos localizados ou
difusos.

• Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular, podendo


apresentar taquicardia.

EXAMES COMPLEMENTARES
A realização de exames complementares se aplica à avaliação do
diagnóstico diferencial, comorbidades e complicações.
Radiografia de tórax: indicada se exacerbação grave ou suspeita de
comorbidade/complicações, como pneumonia, insuficiência cardíaca e
pneumotórax. Não recomendada rotineiramente.
Gasometria arterial: sinais/sintomas de quadro grave, pico de fluxo
expiratório (PFE) < 50% do valor previsto, SpO2 < 93% e naqueles que não
respondem ao tratamento inicial. PaO2 < 60mmHg e/ou PaCO2 > 45 mmHg
indicam falência respiratória.
Hemograma: na suspeita clínica de infecção.
Eletrólitos: presença de comorbidade cardiovascular, uso de diuréticos
ou altas dose de B2-agonistas, especialmente se associados a corticoides
sistêmicos.
Avaliação da função pulmonar: fortemente recomendada, se possível, e
sem atrasar o início do tratamento. Medida do PFE ou do volume
expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) deve ser registrada e
utilizada como parâmetro de comparação com a função pulmonar prévia,
sendo útil na avaliação da resposta à terapia instituída. Deve ser reavaliada
em uma hora e periodicamente.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico da EA é essencialmente clínico. A realização de exames
complementares não é necessária na maioria dos casos atendidos nos
serviços de urgência.
A classificação da intensidade da exacerbação (Tabela 1) é
fundamental para definição do manejo do paciente, baseada em dados
clínicos (estado geral, sinais vitais e ausculta pulmonar) e funcionais
(espirometria ou medida do PFE).
Notas: MV: murmúrio vesicular. a: A presença de vários parâmetros, mas não necessariamente de todos, indica a
classificação geral da crise. b: Músculos intercostais, fúrcula ou esternocleidomastoideo.

Tabela 1. Classificação da gravidade da exacerbação.


Fonte: Adaptado da Diretriz da Sociedade Brasileira de Pneumologia e
Tisiologia para o manejo de asma, 2012.

Exacerbação de doença pulmonar obstrutiva crônica

Insuficiência cardíaca descompensada

Tromboembolia pulmonar

Pneumonite de hipersensibilidade aguda

Bronquiolites

Disfunção de pregas vocais

Quadro 2. Diagnósticos diferenciais.


Fonte : Schor 20141

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Objetivos do tratamento: rápido alívio da obstrução ao fluxo


aéreo e da hipoxemia, prevenção de hospitalização, complicações
e recaídas.

• O tratamento farmacológico inicial inclui a administração repetida


de broncodilatadores de curta ação (short-acting beta2-agonist:
SABA), introdução precoce de corticosteroides sistêmicos e
suplementação de oxigênio, quando indicado.

• Todos os pacientes devem possuir um plano de ação por escrito


para o automanejo, ainda no ambiente domiciliar, em caso de EA.
Os doentes e seus familiares devem ser educados e orientados a
reconhecer e responder de maneira apropriada e precoce à piora
dos sintomas da doença.

• Plano de ação: orientações claras sobre a modificação do


tratamento de manutenção, uso de medicação de alívio (quando,
como e por quanto tempo), forma de utilizar o corticoide oral e
quando procurar auxílio médico de emergência ou urgência.

• Durante o tratamento, os pacientes devem ser monitorados de


perto e o tratamento, titulado de acordo com a resposta às medidas
adotadas.

• B agonista inalatório de curta ação (SABA):


2

• Terapia de primeira linha no tratamento da EA devido ao seu


potente efeito broncodilatador e rápida reversão da limitação ao
fluxo aéreo. Seus representantes estão descritos na Tabela 2.
• Pode ser utilizado na forma de nebulização a fluxo contínuo
(medicação veiculada em 3-5 mL de solução fisiológica 0,9%,
com fluxo de 6-8 L/min de oxigênio) ou spray acoplado a
espaçador, com melhora semelhante na função pulmonar. A via
endovenosa não é recomendada.
• Recomenda-se, na primeira hora, inalações a cada 20 minutos.
Após a primeira hora, a dose varia de 4-10 jatos a cada 3 a 4
horas até 6-10 jatos a cada 1 a 2 horas, ou, mais frequentemente,
na dependência da gravidade e evolução do caso.
• Nebulização contínua pode ser necessária nos pacientes com EA
grave, seguida do uso intermitente sob demanda durante a
hospitalização.
• Efeitos adversos são dose-dependentes e incluem: taquicardia,
palpitação, tremores e hipocalemia.

Droga Apresentação Doses e intervalos

8-10 gotas (2,5-5 mg) a cada 20 min, por 3 doses


Gotas (solução para nebulização, 5 mg/mL)
Dose máxima: 10-15 mg/h
SALBUTAMOL
4-8 jatos, a cada 20 minutos, por 3 doses
Spray (100 mcg/jato)
Dose máxima: 10 jatos

Gotas (solução para nebulização, 5 mg/mL) 8-10 gotas (2,5-5 mg) a cada 20 min, por 3 doses
FENOTEROL
4-8 jatos, a cada 20 minutos, por 3 doses
Spray (100 mcg/jato)
Dose máxima: 10 jatos

Efeitos colaterais: são dose-dependentes. Taquicardia, palpitação, tremores e hipocalemia.

Tabela 2. B2 agonista inalatório de curta ação


Fonte: Fonte: Adaptado da Diretriz da Sociedade Brasileira de Pneumologia
e Tisiologia para o manejo de asma, 2012.

• Anticolinérgico de curta ação (SAMA):


• O brometo de ipratrópio pode ser administrado em doses
repetidas conjuntamente com um SABA por nebulização ou
inalador pressurizado.
• Recomendado nas exacerbações moderadas a graves, com efeito
na redução da necessidade de hospitalização e maior efeito na
melhora do PFE e VEF1, comparado à monoterapia com SABA.
• Dose recomendada: solução para nebulização (0,25 mg/mL) –
0,5mg - 40 gotas; spray (0,020 mg/jato): 4-8 jatos. A cada 20
minutos por 3 doses, em seguida a cada 2-4 horas.
• Corticosteroides sistêmicos:
• Devem ser prontamente administrados, se possível dentro da
primeira hora da apresentação, especialmente se falência em
atingir melhora dos sintomas com SABA, surgimento de
exacerbação em vigência do uso de corticoide sistêmico ou se o
paciente possui história de exacerbações prévias que
necessitaram do uso de corticoide.
• Benefício em reduzir a inflamação, acelerando a resolução da
exacerbação com redução das recidivas e hospitalizações.
• Todos os pacientes em EA deverão receber corticoide sistêmico
no pronto-socorro, variando a dose e o tempo de uso conforme a
gravidade. Leva cerca de 4 horas para produzir melhora clínica.

• Dose recomendada: 1 mg prednisolona/Kg/dia, ou equivalente,


máximo de 50 mg/dia, preferencialmente por via oral.
Hidrocortisona (200 mg em doses divididas) e metilprednisolona
(60-125 mg, a cada 6 horas) por via endovenosa podem ser
utilizadas nos casos mais graves com incapacidade de deglutição
pela dispneia, vômitos, intubação orotraqueal (IOT) ou
necessidade de ventilação mecânica não invasiva.
• Usualmente prescritos por 5-7 dias, preferencialmente pela
manhã em dose única, quando por via oral.

• Corticosteroides inalatórios (CI):


• Altas doses administradas na primeira hora de apresentação
reduzem a necessidade de hospitalização naqueles que não estão
recebendo corticosteroide sistêmico.
• Pacientes que já faziam uso de CI como terapia de controle da
asma devem ser orientados a aumentar a dose da medicação
pelas próximas 2 a 4 semanas após a alta. Aqueles que não
fazem uso da medicação devem iniciar terapia regular contendo
CI, para reduzir o risco de exacerbações futuras. Monoterapia
com SABA não é mais recomendada.

• Combinação CI + B agonista de longa ação (LABA):


2

• O papel dessas medicações no departamento de emergência


ainda não está claro.

• Sulfato de magnésio:
• Indicado nas exacerbações muito graves, sem reposta ao
tratamento usual.
• Pode ser utilizado na dose de 2 g (diluído em 50 mL de solução
fisiológica a 0,9%), infundida lentamente em 20 minutos, em
dose única, reduzindo a admissão hospitalar naqueles com VEF1
< 25-30% do predito.
• Não recomendado rotineiramente.
• Adrenalina:
• Indicada em associação à terapia padrão nos casos de EA
associada a anafilaxia ou angioedema, via intramuscular.
• Não recomendado rotineiramente.
• Oxigenioterapia com hélio:
• Pode ser considerada naqueles que não respondem à terapia.
• Não recomendada rotineiramente.
• Metilxantinas (aminofilina e teofilina):
• Não são recomendados rotineiramente; possuem pobre eficácia e
baixo perfil de segurança, com interações medicamentosas e
efeitos adversos cardiovasculares, neurológicos e
gastrointestinais.
• Antagonistas do receptor de leucotrieno:
• Sem evidência que suporte seu uso na exacerbação.
• Antibioticoterapia:
• Não há evidência que suporte o uso rotineiro de
antibioticoterapia no tratamento da EA a menos que exista forte
evidência de infecção pulmonar (febre, escarro purulento ou
evidência radiológica de pneumonia).

• Sedativos:
• Ansiolíticos e hipnóticos devem ser evitados devido ao efeito
depressor no sistema respiratório.
b. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Oxigenioterapia:
• A meta é manter a SpO2 93-95%, através de cânula nasal ou
máscara.

• Ventilação mecânica não invasiva (VNI):


• Deve ser considerada na exacerbação grave associada ao uso de
musculatura respiratória acessória, principalmente na presença
de hipercapnia.
• Há pouca evidência sobre sua utilização, e a reposta deve ser
monitorada cautelosamente. Na presença de qualquer indício de
falha, a IOT deve ser realizada seguida de ventilação mecânica
invasiva.

• Ventilação mecânica invasiva (VM):


• Indicada nos pacientes com falência cardíaca ou respiratória,
rebaixamento do nível de consciência e hipoxemia grave.
• Após a IOT, pode-se optar por induzir sedação com um
benzodiazepínico (ex.: midazolam) associado à indução da
anestesia com quetamina (1-4 mg/Kg). Esta última, além de não
comprometer a estabilidade hemodinâmica, possui efeito
broncodilatador.
• Adotar estratégia ventilatória protetora, minimizando
complicações.
• Para doenças obstrutivas como a asma, os parâmetros para VM
são: volume corrente 6 mL/Kg, frequência respiratória baixa
(12-14 ipm), tempo inspiratório menor que o expiratório (I:E)
1:3 a 1:5, fluxos elevados, objetivando resistência menor que 20
cmH2O/L/s.

• Medidas gerais:
• Afastar possíveis exposições ambientais e ocupacionais a
alérgenos.
• Cessação do tabagismo.
• Vacinação anual contra Influenza. Orientar imunização contra
Pneumococo (uso sequencial da vacina 13-valente conjugada
seguida da vacina polissacarídica 23-valente, após 6 meses).
• Tratamento adequado de todas as comorbidades associadas.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte : Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia 2012

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 23 anos, asmático, em
uso de formoterol + budesonida 12/400 mcg a cada 12 horas, há 3 dias
evoluindo com piora da dispneia associada a sibilos e tosse seca. Início
após quadro de resfriado comum. Nega febre.
b. Exames Físicos:
• Ectoscopia: PA 100 x 70 mmHg, FC 103 bpm, FR 24 ipm, SpO 2

96% em ar ambiente, consciente, pouco agitado, fala frases


incompletas, sem uso de musculatura respiratórias acessória.

• Tórax: murmúrio vesicular presente, com sibilos difusos


inspiratórios e expiratórios.

• Exames complementares: medida do PFE 60% do predito.


Exames laboratoriais normais.
c. Diagnóstico: paciente com critérios de exacerbação moderada e
grave, com 2 critérios para gravidade (falas incompletas e pouco
agitado), com gatilho após infecção viral. Medidas devem ser
instituídas para recuperação imediata do quadro, com reavaliação
precoce (30 minutos) dos sinais de gravidade clínicos e medida de pico
de fluxo expiratório.
d. Prescrição sugerida:

1. Jejum.
2. Inalação: SF 0,9% 3 mL + 10 gotas fenoterol + 40 gotas de
brometo de ipratróprio + 6L O2 ou ar comprimido a cada 20
minutos na primeira hora, via nebulizador.
3. Prednisolona 50 mg via oral, agora.
4. Reavaliação clínica e do PFE em 30 minutos.
5. Suporte de oxigênio para SpO2 > 92%.

DICAS DO ESPECIALISTA
• A monoterapia com SABA não é mais indicada na asma.
• Para as crises domiciliares leves de EA, indica-se alívio com B2-
agonista de longa ação associado ao corticoide inalatório.
• Fique atento: nem tudo que “chia” é asma! Avaliar sempre os
diagnósticos diferenciais. Insuficiência cardíaca descompensada
(“asma cardíaca”) e doença pulmonar obstrutiva crônica
exacerbada são alternativas para casos de sibilos difusos; obstrução
brônquica por neoplasia e corpo estranho são diferenciais para
sibilos localizados.

• Sempre checar e revisar a técnica de uso dos dispositivos


inalatórios, corrigindo eventuais erros.

• Revise o plano de ação com o paciente na alta hospitalar.


• Após a alta, o paciente deve ser encaminhado para reavaliação
ambulatorial com especialista dentro das próximas semanas.

REFERÊNCIAS
1. Schor N. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da EPM-UNIFESP – Pneumologia. 2.
ed. São Paulo: Manole; 2014
2. GINA. Global Strategy for Asthma Management and Prevention Global Initiative For
Asthma (GINA). GINA. [Internet]. [acesso em 29 de junho de 2020]. Disponível em:
hhtp://www.ginasthma.org.
3. Edmonds Ml, Milan SJ, Camargo Jr CA, Pollack CV, Rowe BH. Early use of inhaled
corticosteroids in the emergency department treatment of acute asthma. Cochrane Database
Syst Rev. 2012; 12: CD002308.
4. Rodrigo GJ, Castro-Rodriguez JA. Anticholinergics in the treatment of children and adults
with acute asthma: a systematic review with meta-analysis. Thorax. 2005; 60: 740-6.
5. Griffiths B, Ducharme FM. Combined inhaled anticholinergics and short-acting beta2-
agonists for initial treatment of acute asthma in children. Cochrane Database Syst Rev. 2013;
8: CD000060.
6. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes da Sociedade Brasileira de
Pneumologia e Tisiologia para o Manejo da Asma. J Bras Pneumol. 2012; 38(supl 1): S1-46
7. Pizzichini MMM, Carvalho-Pinto RM, Cançado JED, Rubin AS, Cerci Neto A, Cardoso AP,
et al. Recomendações para o manejo da asma da Sociedade Brasileira de Pneumologia e
Tisiologia – 2020. J Bras Pneumol. 2020; 40(1).
6.2
DOENÇA PULMONAR
OBSTRUTIVA CRÔNICA (DPOC)
Autor:
Gustavo Frazatto Medeiros de Miranda

DEFINIÇÕES
• DPOC: alteração pulmonar crônica caracterizada por bronquite
crônica e enfisema, que gera obstrução ao fluxo aéreo.

• BRONQUITE CRÔNICA: definição clínica de tosse, por pelo


menos três meses, em dois anos consecutivos.

• ENFISEMA: Destruição dos alvéolos pulmonares, causando


perda da elasticidade pulmonar.

ETIOPATOLOGIAS E FISIOPATOLOGIA
• Tabagismo: principal fator de risco (80 a 90% dos pacientes).
• Outros gases e fumaças (10 a 20%) – causas ocupacionais,
exposições: fogão a lenha, carvão ou queima de biomassa.

• Deficiência de alfa-1-antitripsina – enzima antiproteolítica, que


desativa a elastase neutrofílica, e quando deficiente potencializa o
dano pulmonar. Até 1% dos pacientes com DPOC apresenta
deficiência grave desta enzima. Todos os pacientes com DPOC
devem ter ao menos uma dosagem de alfa-1-antitripsina.

• A fisiopatologia da DPOC baseia-se na inflamação crônica,


com desequilíbrio entre proteases e antiproteases, com destruição
dos alvéolos e capilares pulmonares, resultando em
aprisionamento aéreo e aumento do espaço morto.

QUADRO CLÍNICO
• Nas fases iniciais, o paciente pode ser assintomático ou
apresentar tosse e expectoração crônicas. Com o tempo, surge
dispneia da doença, surge a dispneia, que é progressiva,
inicialmente aos grandes esforços (subir ladeira ou escada);
posteriormente, aos médios (trocar de roupa, tomar banho,
caminhar no plano) e pequenos (higiene pessoal, caminhar dentro
de casa, alimentar-se). Habitualmente, a dispneia surge depois
da tosse e expectoração. Por serem pacientes com mais de 40
anos e sedentários, frequentemente o cansaço é atribuído à idade
ou descondicionamento físico. A dispneia predispõe ao estilo de
vida sedentário, reduzindo a capacidade física e diminuindo a
realização das atividades diárias.

• Considerar a doença em qualquer paciente com tosse crônica ou


produção de escarro e/ou dispneia associada à história de
exposição a fatores de risco para a doença (Tabela 1).

EXAME FÍSICO
• Normal na doença precoce.
• Tórax em tonel – aumento do diâmetro anteroposterior
(hiperinsuflação pulmonar).
• Ausculta pulmonar usualmente normal ou globalmente reduzida.
• Dessaturação na doença avançada.
• Baqueteamento não é esperado na DPOC, e quando presente
deve-se investigar outras patologias, como neoplasia e fibrose
pulmonar.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Espirometria: distúrbio ventilatório obstrutivo pós-
broncodilatador, caracterizado pela relação entre volume expiratório
forçado no primeiro segundo e a capacidade vital forçada (VEF1/CVF)
menor que 0,70 (ou menor que o limite inferior da normalidade).
b. Exames de imagem: auxiliam a excluir outras doenças, como
bronquiectasias, câncer de pulmão e cardiopatias, além de avaliarem o
parênquima pulmonar.

• Radiografia de tórax inicial: normal ou com aumento da trama


broncovascular. Nos casos mais avançados, com o aumento das
áreas enfisematosas, apresenta retificação das cúpulas
diafragmáticas, aumento do diâmetro anteroposterior do tórax,
aumento dos espaços intercostais, aumento do espaço retroesternal
(> 2,5 cm), afilamento mediastinal e redução da vasculatura
pulmonar.

• Tomografia de tórax: redução da atenuação pulmonar e do


diâmetro dos vasos pulmonares nas áreas acometidas por
enfisema, espessamento das paredes das vias aéreas, áreas de
enfisema centrolobular, parasseptal ou panlobular.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• O quadro clínico do paciente com DPOC está destacado no
Quadro 1.

• A classificação da gravidade do DPOC baseada no VEF1 pós-


broncodilatador está descrita na Tabela 1.

• As escalas de dispneia mais utilizadas nos algoritmos de


estadiamento do DPOC são a escalada de dispneia modificada –
Medical Reasearch Concil (mMRC) (Tabela 2) e a COPD
Assessment Test (CAT).
Tosse crônica – principal sintoma

Expectoração crônica

Predomínio diurno

Expectoração mucoide

Dispneia insidiosa e progressiva

Piora aos esforços

Ortopneia e DPN podem estar presentes, sem indicar necessariamente IC

Tórax em tonel – aumento do diâmetro anteroposterior (hiperinsuflação pulmonar)

Ausculta pulmonar usualmente normal ou globalmente reduzida.

Dessaturação na doença avançada

VEF1/CVF < 0,70 após Bd

DPN – Dispneia Paroxística Noturna; CVF – capacidade vital forçada; VEF1 – volume expiratório forçado no
primeiro segundo; IC – Insuficiência Cardíaca; Bd: Broncodilatador

Quadro 1. Quadro clínico e diagnóstico.


Fonte: Jardim, J. 20041

GRAVIDADE VALOR DE VEF1 (% DO PREVISTO)

GOLD 1 Leve ≥ 80%

GOLD 2 Moderado Entre 50% e 80%

GOLD 3 Grave Entre 30% e 50%

GOLD 4 Muito grave < 30%

Tabela 1. Classificação da gravidade da DPOC baseada no VEF1 pós-


broncodilatador.
Fonte: Adaptado de GOLD 20206

0 Dispneia apenas aos exercícios extenuantes

1 Dispneia ao correr no plano ou em inclinações leves

Caminha mais devagar que pessoas da mesma idade ou quando anda no plano em seu próprio ritmo tem que
2
interromper a marcha para respirar

3 Interrompe a marcha após cerca de 100 metros ou após andar poucos minutos no plano

4 Dispneia que impede a saída de casa, ou para vestir-se

Tabela 2. Classificação de dispneia – mMRC.


Fonte: Adaptado de GOLD 20206

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Todos os pacientes
• Cessação do tabagismo é o principal modificador da doença.
Abordagem em todas as consultas, e encaminhamento para grupo
multidisciplinar quando o paciente apresentar dificuldade em
cessar o tabagismo. A exposição à fumaça de biomassa também
deve ser combatida.

• Educação sobre a doença e a importância da aderência ao


tratamento é um ponto fundamental do tratamento da DPOC,
uma vez que é uma doença crônica. Como a maioria do
tratamento será por via inalatória, todos os pacientes devem ser
orientados quanto à técnica de utilização dos dispositivos
inalatórios. Em todas as consultas, a técnica inalatória deve ser
checada e reorientar o paciente se for necessário.

• Suporte nutricional para pacientes com índice de massa


corpórea menor que 21 Kg/m2.
• Atividade física regular (mínimo 30 minutos, quatro vezes
por semana) está indicada para todos os estádios, desde o
momento do diagnóstico.

• Reabilitação pulmonar é um programa multiprofissional de


cuidados a pacientes com doença respiratória crônica que inclui o
recondicionamento físico, apoio psicológico e educação com o
objetivo de otimizar o desempenho físico e social, reduzir a
dispneia e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Duração de pelo menos 3 meses, com três a cinco sessões por
semana. Indicado para pacientes que tenham dificuldade para a
realização de atividade física domiciliar, ou seja, com mais
sintomas, hipoxêmicos, com comorbidades ou pacientes mais
graves.

• Vacinação anti-influenza: anualmente, para todos os pacientes


com DPOC. Reduz a mortalidade em pacientes DPOC.

• Vacinação antipneumocócica polissacarídea (23-valente) reduz


a incidência de pneumonia adquirida na comunidade em pacientes
< 65 anos com VEF1 < 40% e com comorbidades, como
insuficiência cardíaca e pneumopatias. A vacina conjugada (13-
valente) em pacientes ≥ 65 anos reduz a doença invasiva por
pneumococo. Quando desejadas ambas as vacinas, se a primeira
administrada for a 23-valente, esperar um ano para aplicar a 13-
valente; do contrário, aguardar seis meses.
b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Objetivo: aliviar a dispneia e reduzir o risco de exacerbações


e prevenção de morte. As classes farmacológicas que compõem
o tratamento medicamentoso da DPOC são broncodilatadores,
corticoides inalatórios (ICS), roflumilaste, macrolídeos e N-
acetilcisteína.
• Broncodilatador é a terapia de escolha na DPOC. Deve-se
sempre optar pelos medicamentos inalatórios.

• Corticoides inalatórios (ICS) não devem ser utilizados de forma


isolada; Indicação: exacerbações frequentes, histórico de asma ou
eosinofilia periférica (> 300 células/µL).

• Metilxantinas (aminifilina, teofilina e bamifilina): devem ser


usadas como última opção broncodilatadora e sempre adicionadas
às medicações inalatórias. Têm poucos benefícios clínicos e
muitos efeitos colaterais. Não utilizar na descompensação aguda.

• Roflumilaste: inibidor da fosfodiesterase 4, indicado para


pacientes com VEF1 < 50% e bronquite crônica (tosse e
expectoração crônicas) e que continuam exacerbando com a
terapia inalatória tripla. Eventos adversos: diarreia, epigastralgia,
náuseas e perda de peso.

• Macrolídeo: efeito imunomodulador. Indicado para pacientes


que continuam exacerbando mesmo com terapia inalatória tripla
(pacientes do grupo C e D). A seleção dos pacientes deve ser
criteriosa devido aos seus eventos adversos, como perda auditiva,
seleção e resistência bacteriana aos macrolídeos e arritmias
cardíacas.

• N-acetilcisteína: Seu uso mais conhecido, como mucolítico, não


se mostrou benéfico. Pode ser utilizada como efeito antioxidante,
porém com resultados discutíveis, usualmente até 1.200 mg/dia e
sempre adicionada à terapia inalatória tripla.
c. ESTRATIFICAÇÃO DO TRATAMENTO
FARMACOLÓGICO INALATÓRIO

• A gravidade da doença definirá o tratamento medicamentoso. É


baseado no grau de obstrução das vias aéreas (VEF1), sintomas
de dispneia (mMRC) e histórico de exacerbação nos últimos 12
meses.

• Pacientes mais dispneicos (mMRC ≥ 2) devem receber mais


broncodilatadores. Já aqueles com escala mMRC menor ou igual a
um (mMRC 0 e 1) são menos sintomáticos.

• Exacerbação: duas ou mais exacerbações no ano anterior ou uma


internação por exacerbação da DPOC são considerados
exacerbadores frequentes e merecem tratamento farmacológico
para preveni-las, como, por exemplo associação de dois
broncodilatadores de longa ação com beta-2 agonista de longa
ação (LABA) e anticolinérgico de longa ação (LAMA) ou
associação de beta-2 agonista de longa ação (LABA) e
corticoide inalatório (ICS). Pacientes com, no máximo, uma
exacerbação no ano anterior e sem hospitalização por exacerbação
são considerados de baixo risco para exacerbação futura.

• Grupo A: broncodilatadores de curta ação. Opções são uso


isolado ou associado de beta-2 agonista de curta ação (SABA)
e/ou anticolinérgico de curta ação (SAMA).

• Grupo B: LABA ou LAMA. Não existe diferença entre as duas


classes no alívio da dispneia. Se os pacientes não apresentarem a
resposta desejada, associam-se as duas classes de
broncodilatadores (LABA + LAMA).

• Grupo C: LAMA. Se não apresentar melhora, associar LAMA +


LABA ou LABA + ICS (se indicação de corticoide inalatório). Se
não apresentar melhora, realizar terapia tripla com
LAMA+LABA+ICS.

• Grupo D: Iniciar com LAMA ou LABA + LAMA ou LABA +


ICS (se indicação de corticoide inalatório). Se não apresentar a
melhora desejada, pode-se trocar para terapia tripla com LAMA +
LABA + ICS; se estiver usando LAMA isolado, associar LAMA
+ LABA e depois passar para terapia tripla se persistir
exacerbando. Caso os pacientes estejam exacerbando mesmo em
terapia tripla, pode-se associar roflumilaste 500 mcg uma vez ao
dia ou azitromicina 500 mg três vezes na semana (2ª, 4ª e 6ª
feiras, por exemplo).

• As principais medicações utilizadas no DPOC estão descritas na


Tabela 3.
classe Medicação Dose usual

Beta-2 agonista de Salbutamol Nebulização: 6-20 gotas


curta ação (SABA) Fenoterol 200-400 mcg a cada 4-6h

Anticolinérgico de Nebulização: 20-40 gotas


Ipratrópio
curta ação (SAMA) 40-80 mcg a cada 4-6h

Formoterol 6 a 12 mcg a cada 12 h


Beta-2 agonista de Salmeterol 25 a 50 mcg a cada 12h
longa ação (LABA) Indacaterol 150 a 300 mcg a cada 24 horas
Olodaterol 5 mcg a cada 24 h

Glicopirrônio 50 mcg uma vez ao dia


Anticolinérgico de
Tiotrópio 2,5 a 5,0 mcg a cada 24h
curta ação (LAMA)
Umeclidínio 62,5 mcg a cada 24h

Glicopirrônio/ Indacaterol 110/50 mcg a cada 24h

LAMA + LABA Umeclidínio/ Vilanterol 62,5/25 mcg a cada 24h

Tiotrópio/ Olodaterol 2,5/2,5 mcg a 5,0/5,0 mcg ao dia

Fluticasona/ Umeclidínio/ Vilanterol 100/62,5/25 mcg a cada 24h


LAMA + LABA + ICS
100/6/ 12,5 a 200/12/25 mcg
Beclometasona/ Formoterol/ Glicopirrônio
a cada 12h

Tabela 3. Medicações utilizadas na Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica


Fonte: Adaptado de GOLD 20206

d. EXACERBAÇÕES

• Os pacientes com DPOC apresentam episódios de exacerbação da


doença com mudança aguda dos sintomas e piora da dispneia,
aumento da tosse e volume do escarro. As exacerbações da
doença precisam ser reconhecidas e tratadas.
• Podem ser desencadeadas por causas infecciosas, poluição
ambiental, mudança climática ou má aderência ao
tratamento.

• Durante uma exacerbação, as indicações de internação hospitalar


estão descritas na Tabela 4.

• O tratamento da exacerbação contempla corticoterapia,


broncodilatadores de curta duração, manutenção das medicações
inalatórias habituais do paciente e, nos casos de DPOC grave ou
na presença de purulência do escarro, a antibioticoterapia também
deve ser instituída.

• Os diagnósticos diferenciais são:


• Pneumonia: alteração radiológica presente, aumento de PCR e
pró-calcitonina.

• Pneumotórax: dor ventilatório-dependente e dessaturação nos


casos mais graves. Apresenta alteração típica na radiografia de
tórax e ultrassom.

• Embolia pulmonar: D-dímero aumentado, sinais de


tromboembolia venosa profunda no doppler de membro inferiores
pode estar presente, tomografia de tórax com achados de falha de
enchimento na artéria pulmonar ou em seus ramos.

• Causas cardíacas (arritmias, insuficiência cardíaca).


Indicações para internação Indicações Admissão
na terapia intensiva Hospitalar
Piora da dispneia ou dessaturação
Dispneia intensa sem melhora com tratamento inicial da emergência

Alterações do estado mental (confusão, letargia, coma) Insuficiência respiratória aguda


Indicações para internação Indicações Admissão
na terapia intensiva Hospitalar

Hipoxemia grave (PaO2 < 40 mmHg) e/ou acidose respiratória grave Início de novos sinais físicos
pH <7,25), apesar do oxigênio suplementar e ventilação não invasiva (por exemplo, cianose, edema periférico)

Necessidade de ventilação mecânica Ausência de resposta ao tratamento

Instabilidade hemodinâmica Comorbidades graves associadas

Ausência de suporte social

Tabela 4. Indicações de admissão hospitalar e internação em terapia


intensiva.
Fonte: Adaptado de GOLD 20206

e. OXIGENOTERAPIA

• Indicação: Hipoxemia crônica com gasometria arterial


evidenciando PaO2 igual ou menor do que 55 mmHg em repouso
ou saturação igual ou menor que 88%; ou quando a PaO2 estiver
entre 56 e 59 mmHg com evidências de cor pulmonale ou
policitemia. O período mínimo de uso diário é de 15 horas, sendo
o ideal durante as 24 horas.
f. TRATAMENTO CIRÚRGICO

• Pode ser indicado em casos mais graves, e inclui cirurgia redutora


de volume pulmonar, bulectomia e transplante pulmonar.
g. DPOC E COVID-19

• Pacientes com DPOC são de risco para complicações por


COVID-19.

• Manter precauções de isolamento e cuidados para evitar


contaminação.

• Até o momento, não há nenhuma evidência científica para apoiar


que corticoides inalatórios ou orais devam ser evitados em
pacientes com DPOC durante a epidemia de COVID-19.
• Pacientes com DPOC devem manter sua terapia regular.
FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
• Grupo A: Poucos sintomas e baixo risco de exacerbação
• Grupo B: Mais sintomas e baixo risco de exacerbação
• Grupo C: Poucos sintomas e maior risco de exacerbação
• Grupo D: Mais sintomas e maior risco de exacerbação
Fluxograma 1. Classificação da DPOC
Fonte: Adaptado de GOLD 20206

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 68 anos, com
antecedente prévio de tabagismo, por 35 anos, tendo cessado há 4
anos. Refere piora da dispneia nos últimos meses, especialmente para
subir escadas e caminhar mais rapidamente. Nega piora da tosse ou
aumento/mudança da expectoração. Sem queixas gástricas ou nasais.
Sem uso de medicação atual, e com história de uma exacerbação no
último ano, com necessidade de uso de antibioticoterapia, sem
necessidade de internação. Vacinações atrasadas.
b. Exames Físicos:
• Ectoscopia: Afebril, normocárdico, eupneico e normotenso.
SpO2: 93%. Aumento do diâmetro anteroposterior.

• Tórax: Sons pulmonares globalmente reduzidos. Sem alterações


na ausculta cardíaca, segmento abdominal. Membros sem edema
nem empastamento de panturrilha.
c. Exames complementares: Radiografia de tórax com aumento do
diâmetro anteroposterior. Sem consolidações nem sinais de derrame
pleural.
d. Condutas sugeridas:

1. Vacinação contra Influenza e Pneumococo.


2. Estimular atividade física após avaliação cardiológica.
3. Iniciar medicação broncodilatadora para alívio dos sintomas;
evitar corticoide inicialmente.
4. Reavaliação em 15 dias.
5. Orientar sobre sinais de alarme e necessidade de procurar pronto-
atendimento caso apresente piora.

DICAS DO ESPECIALISTA
• Atentar para a necessidade em utilizar corticoterapia inalatória
para pacientes com exacerbação frequente, asma associada ou
contagem de eosinófilos elevados e doença progressiva.

• Espirometria é um parâmetro importante para avaliar queda


progressiva do VEF1.

• Conferir em todas as consultas o uso adequado dos dispositivos


inalatórios.
• Pacientes com tosse recorrente devem ser avaliados para outras
causas, como doenças de vias aéreas superiores e distúrbios
gástricos.

• Avaliar o paciente como um todo. Na piora da dispneia, também


avaliar causas cardíacas associadas.

REFERÊNCIAS
1. Jardim J, Oliveira J, Nascimento O. II Consenso de DPOC da Sociedade Brasileira e
Pneumologia e Tisiologia. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Clínica Médica e
Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia; 2004 (Suplemento).
2. Camelier AA, Winter DH, Jardim JR, Barboza CE, Cukier A, Miravitlles M. Alpha-1
antitrypsin deficiency: diagnosis and treatment. J Bras Pneumol. 2008; 34(7): 514-27.
3. Qiu S, Zhong X. Macrolides: a promising pharmacologic therapy for chronic obstructive
pulmonary disease. Ther Adv Respir Dis. 2016: 1753465816682677.
4. Vogelmeier CF, Criner GJ, Martinez FJ, Anzueto A, Barnes PJ, Bourbeau J, et al. Global
Strategy for the Diagnosis, Management, and Prevention of Chronic Obstructive Lung
Disease 2017 Report. Am J Respir Crit Care Med. 2017; 195(5): 557-82.
5. Montes de Oca M, López Varela MV, Acuña A, Schiavi E, Rey MA, Jardim J, et al. ALAT-
2014 Chronic Obstructive Pulmonary Disease (COPD) Clinical Practice Guidelines:
questions and answers. Arch Bronconeumol. 2015; 51(8): 403-16.
6. GOLD. Global Strategy for the Diagnosis, Management and Prevention of COPD, Global
Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD) 2020. GOLD. [Internet]; 2020.
[acesso em 22 de junho de 2020]. Disponível em:https://goldcopd.org/wp-
content/uploads/2019/11/GOLD-2020-REPORT-ver1.0wms.pdf.
6.3
TROMBOEMBOLIA PULMONAR
AGUDA
Autores:
Camila Melo de Oliveira Costa
Maíra Thomazini Rodrigues
Jaquelina Sonoe Ota Arakaki

DEFINIÇÕES
• Tromboembolia pulmonar (TEP) aguda: obstrução aguda da
circulação arterial pulmonar por coágulos sanguíneos, geralmente
provenientes da circulação venosa sistêmica, levando à interrupção
total ou parcial do fluxo sanguíneo pulmonar da área afetada.

• Tromboembolismo venoso (TEV): termo utilizado para abranger


todo o espectro da doença, desde a trombose venosa profunda
(TVP) até a sua forma mais grave, a TEP.

ETIOPATOLOGIAS E FISIOPATOLOGIA
• A base fisiopatológica da doença se relaciona à tríade de
Virchow: estase venosa, lesão endotelial e estado de
hipercoagulabilidade. Fatores que determinam alguma alteração
em quaisquer um desses elementos aumentam a chance de o
indivíduo apresentar um evento tromboembólico venoso.

• Diversas condições clínicas e cirúrgicas estão associadas ao


aumento da probabilidade de desenvolvimento da doença (Quadro
1).
• Importante ressaltar que múltiplos fatores podem estar presentes
no mesmo indivíduo, elevando ainda mais o risco de TEV.
FATORES DE RISCO FORTES (ODDS RATIO > 10)

Fratura de membros inferiores


Internação por insuficiência cardíaca ou fibrilação/flutter atrial nos últimos 3 meses
Artroplastia de quadril e/ou joelho
Grande trauma e/ou cirurgia
Infarto do miocárdio nos últimos 3 meses
TEV prévio
Lesão espinal

FATORES DE RISCO MODERADOS (ODDS RATIO 2 - 9)

Cirurgia artroscópica de joelho


Doenças autoimunes
Transfusão sanguínea
Cateter venoso central
Quimioterapia
Insuficiência cardíaca congestiva ou respiratória
Terapia de reposição hormonal (estrógenos)
Fertilização in vitro
Infecção (em especial pneumonia, infecção do trato urinário)
Câncer (risco aumentado na doença metastática)
Doença inflamatória intestinal
Trombofilia
Uso de anticoncepcional oral
Puerpério
Trombose venosa superficial
Acidente vascular encefálico com paralisia

FATORES DE RISCO FRACOS (ODDS RATIO < 2)

Restrição ao leito > 3 dias


Diabetes Mellitus
Hipertensão pulmonar
Imobilidade em viagens longas
Obesidade
Veias varicosas
Gestação
Idade avançada
Cirurgia laparoscópica

Quadro 1. Fatores de risco para eventos tromboembólicos.


Fonte: Adaptado de Konstantinides10

• Várias alterações no sistema de coagulação e fibrinólise foram


descritas ao longo dos anos, sendo a mutação do fator V de Leiden
a mais comumente encontrada. Indivíduos heterozigotos para essa
condição apresentam um risco de 5 a 10 vezes maior de TEV
durante sua vida, enquanto os homozigotos têm seu risco relativo
elevado em até 80 vezes.

• Outras trombofilias descritas são a hiper-homocisteinemia,


deficiência de proteína S ou C, deficiência de antitrombina,
elevação de fator VIII e mutação da protrombina.

• Entre as trombofilias adquiridas, vale destacar os anticorpos


antifosfolípides e a síndrome antifosfolípide.

QUADRO CLÍNICO
• A doença caracteriza-se por uma grande variabilidade clínica,
além de sintomas e sinais pouco específicos.

• A dispneia, frequentemente de início súbito, é o sintoma mais


comum.

• Outros achados frequentes são dor pleurítica, taquipneia e


taquicardia. Tosse e sinais sugestivos de TVP, como edema de
membros inferiores, podem estar presentes. Hemoptise e febre
ocorrem de forma menos frequentes.

• Casos mais graves podem apresentar-se com instabilidade


hemodinâmica e choque.

• A repercussão clínica da doença vai depender do grau da


extensão da obstrução vascular e da reserva cardiopulmonar
do indivíduo.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: na maioria dos casos, o exame físico pode estar
praticamente normal. Cianose, estase jugular, aumento do tempo
de enchimento capilar e hipotensão arterial podem estar presentes
em casos mais graves.

• Aparelho respiratório: pode estar normal. Taquipneia pode estar


presente. Estertores crepitantes podem ser audíveis nas áreas de
infarto pulmonar.

• Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular, sopro de


regurgitação tricúspide, hiperfonese e desdobramento de B2 podem
estar presentes nos casos com sobrecarga de ventrículo direito.
Taquicardia pode estar presente.

• Aparelho gastrointestinal: hepatomegalia pode estar presente.


• Extremidades: atenção aos sinais de TVP: edema assimétrico de
membros inferiores com empastamento de panturrilha e sinal de
Homans positivo.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Radiografia de tórax: os achados são inespecíficos e podem estar
ausentes em até 12% dos casos. Derrame pleural, atelectasias laminares,
sinais de oligoemia regional (sinal de Westmark), opacidades
pulmonares com base pleural (corcova de Hampton) e proeminência das
artérias pulmonares podem ser observados. É útil na avaliação de
possíveis diagnósticos diferenciais.
b. Eletrocardiograma (ECG): taquicardia sinusal é o achado mais
encontrado. Nos casos mais graves, sinais de sobrecarga de câmaras
direitas podem estar presentes, como o padrão “S1Q3T3” (presença
onda S em D1, onda Q em D3 e inversão de onda T em D3), desvio do
eixo para a direita, onda P pulmonale e bloqueio de ramo direito.
c. Gasometria arterial: presença de alterações de trocas gasosas,
como hipoxemia e hipocapnia secundária à hiperventilação. A ausência
dessas alterações, no entanto, não exclui o diagnóstico.
d. Biomarcadores cardíacos: troponina I, BNP e NT pró-BNP,
apesar de não serem úteis para o diagnóstico, possuem importância
durante a investigação de diagnósticos diferenciais, além de relevância
prognóstica, como veremos adiante.
e. D-dímero (DD): produto de degradação da fibrina, estará elevado
na TEP devido à ativação simultânea da fibrinólise durante a formação
dos trombos. Não é específico de TEV, sendo comum seu aumento em
situações como gestação, puerpério, doença vascular periférica,
neoplasia, período pós-operatório, insuficiência renal, sepse e outros
processos inflamatórios. Além disso, costuma apresentar níveis mais
elevados com o avançar da idade. Um resultado negativo associado à
probabilidade clínica baixa ou intermediária é capaz de excluir o
diagnóstico da TEP, sem necessidade de exames complementares. Em
pacientes com alta probabilidade clínica, outros exames serão
necessários e não é recomendada a dosagem do DD, uma vez que
mesmo negativo não exclui com segurança o diagnóstico, e seu
resultado positivo não contribui na investigação diagnóstica.
f. Ecocardiografia transtorácica: grande importância no
diagnóstico da TEP aguda com instabilidade hemodinâmica, uma vez
que os achados de sobrecarga ou disfunção do ventrículo direito (VD)
e/ou de hipertensão pulmonar podem ajudar no diagnóstico e na decisão
terapêutica. Um exame normal em um doente instável torna o
diagnóstico de TEP improvável. Além disso, possui importância na
estratificação prognóstica desses pacientes. A ecocardiografia à beira do
leito deve ser realizada precocemente na suspeita da TEP aguda de alto
risco.
g. Ultrassonografia com doppler venoso de membros inferiores
(US): apresenta boa sensibilidade e especificidade nos pacientes com
sinais e sintomas de TVP. Nos casos em que o DD for positivo, a US
poderá ser realizada como segundo passo da estratégia diagnóstica, caso
o paciente não apresente condições de realizar a angiotomografia de
tórax.
h. Angiotomografia computadorizada (angio-TC) de tórax: exame
de escolha na investigação da TEP aguda, com alta sensibilidade e
especificidade (98% e 94% respectivamente). Os aparelhos com
multidetectores contribuíram de forma significativa no diagnóstico das
lesões em artérias pulmonares segmentares e, especialmente, em ramos
subsegmentares (Figura 1). Outra vantagem do uso da angio-TC de
tórax é a possibilidade de avaliar o parênquima pulmonar e a circulação
pulmonar. Achados como aumento do tamanho das câmaras cardíacas
direitas, retificação ou desvio do septo interventricular em direção ao
ventrículo esquerdo, aumento do diâmetro do tronco e das artérias
pulmonares e o refluxo de contraste para o leito hepático podem estar
presentes, sugerindo disfunção cardíaca. Além disso, pode auxiliar na
procura por diagnósticos alternativos. As limitações do exame
encontram-se nos pacientes com doença renal ou naqueles alérgicos ao
contraste iodado.

Na imagem A, tem-se falha de enchimento desde a bifurcação do tronco da artéria pulmonar (à cavaleira) se estendendo
pelas artérias pulmonares (seta). Evidencia-se ainda dilatação do tronco da artéria pulmonar (3,1 cm) e pobreza vascular
bilateralmente. Na imagem B, veem-se falhas de enchimento concêntricas com pequeno halo de contraste associada à
dilatação do vaso acometido; obstrução parcial (setas) ou obliteração completa do vaso (ponta de seta). Na imagem C,
percebe-se a relação entre o diâmetro do ventrículo direito e esquerdo > 1, sugerindo aumento da pressão na circulação
pulmonar.

Figura 1. Cortes axiais de angiotomografia computadorizada de tórax em


paciente com TEP aguda.
Fonte: Konstantinides10

i. Cintilografia pulmonar de inalação-perfusão (V/Q): realizada


por meio da inalação de um radioisótopo e da injeção intravenosa de
albumina marcada, respectivamente. A presença de falhas de perfusão
com preservação da ventilação caracteriza o mismatching, aumentando
a probabilidade de tratar-se de uma TEP. Em pacientes com radiografia
de tórax normal, pode ser realizada somente a cintilografia de perfusão,
reduzindo a exposição do paciente à energia ionizante. A interpretação
da cintilografia V/Q para a probabilidade de TEP aguda pode ser
classificada em: normal (probabilidade muito baixa), inconclusiva
(probabilidade intermediária ou baixa) e alta probabilidade. Nos casos
inconclusivos, é necessário prosseguir com a investigação. Atualmente
seu uso na investigação da TEP aguda é indicado apenas na
impossibilidade de realizar a angio-TC. Por ser um método que poupa
radiação e contraste, a cintilografia pulmonar V/Q deve ser indicada em
pacientes com história de contraste induzindo anafilaxia ou grave
história alérgica, insuficiência renal grave, casos de mieloma e
paraproteinemia.
j. Angiografia pulmonar convencional: era o método de escolha
antes do desenvolvimento dos tomógrafos de múltiplos canais. Trata-se
de um método invasivo e que pode apresentar discordância entre
observadores, em especial nos casos de falhas de enchimento
subsegmentares. Atualmente, seu uso encontra-se limitado devido à
existência de outros métodos menos invasivos e com alta acurácia
diagnóstica.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
a. Escores de probabilidade clínica e orientação de investigação
diagnóstica

• Os escores de predição clínica são ferramentas criadas para


facilitar a abordagem dos pacientes com suspeita de TEV. Os
escores de Wells e Genebra (Tabela 1), na forma simplificada, são
os mais utilizados na prática clínica.
pontos

Escore de Wells Original Simplificado


TVP ou TEP prévias 1,5 1

Frequência cardíaca > 100 bpm 1,5 1

Imobilização nas últimas 4 semanas 1,5 1

Hemoptise 1 1

Neoplasia maligna ativa 1 1


pontos

Escore de Wells Original Simplificado


Sinais clínicos de TVP 3 1

Diagnóstico alternativo menos provável que TEP 3 1

Probabilidade clínica Original Simplificado


Baixa 0-1 -

Intermediária 2-6 -

Alta ≥7 -

Ou

TEP improvável 0-4 0-1

TEP provável ≥5 ≥2

Escore de Genebra Original Simplificado


TVP ou TEP prévias 3 1

Frequência cardíaca:
75-94 bpm 3 1
≥95 bpm 5 2

Cirurgia ou fratura nas últimas 4 semanas 2 1

Hemoptise 2 1

Neoplasia maligna ativa 2 1

Dor unilateral em membro inferior 3 1

Dor à palpação profunda e edema unilateral em membro inferior 4 1

Idade >65 anos 1 1

Probabilidade clínica Original Simplificado


Baixa 0-3 0-1

Intermediária 4-10 2-4

Alta ≥11 ≥5

Ou

TEP improvável 0-5 0-2

TEP provável ≥6 ≥3

TVP: tromboembolia venosa, TEP: tromboembolia pulmonar, bpm: batimentos por minuto.

Tabela 1. Escores de predição clínica para tromboembolia venosa.


Fonte: Adaptado de Konstantinides10
• O PERC (Pulmonary Embolism Rule-out Criteria) foi
desenvolvido como uma ferramenta para avaliar pacientes com
baixa probabilidade clínica pré-teste para TEP pelos escores de
Wells e Genebra (Tabela 2). Em indivíduos que apresentam todas
as características descritas, a chance de diagnosticarmos TEP é
menor que 1%, tornando desnecessário, inclusive, a solicitação de
D-dímero.

Idade < 50 anos Pulso < 100 bpm

Saturação de pulso de oxigênio > 94% Ausência de edema assimétrico de membros inferiores

Ausência de hemoptise Nenhum trauma ou cirurgia recente

Ausência de TEV prévio Ausência de uso de estrógeno

Tabela 2. Critérios para excluir a embolia pulmonar (PERC) em pacientes de


baixa probabilidade.
Fonte: Adaptado de Konstantinides10

• A investigação diagnóstica (ver Fluxograma) deve ser sempre


orientada conforme a probabilidade clínica pré-teste para TEP
aguda, além da presença ou não de instabilidade hemodinâmica,
definida como:
• Parada cardiorrespiratória; ou
• Choque obstrutivo: pressão arterial sistêmica < 90 mmHg ou
necessidade de vasopressor para manter pressão arterial ≥ 90
mmHg e hipoperfusão orgânica - alteração do nível de
consciência, pele fria e úmida, oligúria ou anúria e aumento do
lactato sérico; ou
• Hipotensão persistente: pressão arterial sistêmica < 90 mmHg
ou redução da pressão sistólica ≥ 40 mmHg por período superior
a 15 minutos que não se justifique por outras causas como
arritmia, sepse e hipovolemia.
• A estratégia a ser usada para os pacientes com probabilidade
clínica pré-teste baixa ou intermediária para TEP conforme os
escores é a mensuração do D-dímero (DD). Se resultado negativo,
excluímos o diagnóstico. No entanto, quando acima do limite
superior da normalidade, a angioTC de tórax deve ser solicitada. Já
os pacientes com probabilidade clínica pré-teste alta devem ser
submetidos diretamente à angioTC de tórax, prescindindo da
dosagem de DD.

• Para avaliar o prognóstico do evento e ajudar a guiar as decisões


terapêuticas, podemos utilizar o índice de gravidade da embolia
pulmonar (PESI, do Inglês, Pulmonary embolism severity index).
Esse modelo avalia o risco de mortalidade em 30 dias após um
episódio de TEP (Tabela 3).

• Os pacientes podem ser classificados conforme o risco de


mortalidade hospitalar precoce em alto risco, intermediário-
alto, intermediário-baixo e baixo risco (Tabela 4):
• Alto risco (pacientes hemodinamicamente instáveis com alto
risco de morte);
• Risco intermediário-alto: pacientes sem choque ou hipotensão,
mas com alto risco de mortalidade (PESI classe III-V ou PESIs ≥
1) e com sinais de disfunção de ventrículo direito, evidenciado
por meio de exames de imagens e biomarcadores cardíacos;
• Risco intermediário-baixo: pacientes sem choque ou
hipotensão, mas com baixo a alto risco de mortalidade (PESI
classe I-II ou III-IV / PESIs ≥ 0) e podem ter ou não um dos
indicadores de disfunção de ventrículo direito;
• Risco baixo: pacientes sem choque ou hipotensão, com PESI
classe I-II / PESIs = 0, sem sinais de disfunção de ventrículo
direito.
Variável Original (1) Simplificado (2)

Idade > 80 anos Idade em anos 1

Sexo masculino + 10 -

História de câncer + 30 1

História de insuficiência cardíaca + 10


1
História de doença pulmonar crônica + 10

Pulso ≥ 110 bpm + 20 1

PAS < 100 mmHg + 30 1

f ≥ 30ipm + 20 -

T < 36°C + 20 -

Estado mental alterado + 60 -

SaO2 < 90% + 20 1

(1) Um total de pontos para cada paciente é obtido somando-se a idade do paciente em anos e os pontos para cada preditor,
quando presente. 65 ou menos pontos: classe I (muito baixo risco); 66-85: classe II (baixo risco); 86-105: classe III (risco
intermediário); 106-125: classe IV (alto risco); > 125: classe V (muito alto risco).
(2) Um total de pontos para cada paciente é obtido através da soma de pontos. 0 pontos: baixo risco, 1 ou mais: alto risco.

Tabela 3. PESI original e simplificado.


Fonte: Adaptado de Konstantinides10

RISCO DE MORTALIDADE CHOQUE OU PESI III-IV DISFUNÇÃO VD MARCADORES DE


HOSPITALAR EM 30 DIAS HIPOTENSÃO OU sPESI >1 (IMAGEM) LESÃO MIOCÁRDICA

Alto risco + + + +

Intermediário Alto - + + +

Intermediário Baixo - + Um (ou nenhum) positivo

Baixo - - - -

Tabela 4. Estratificação de risco da TEP aguda conforme a Sociedade


Europeia de Cardiologia.
Fonte: Adaptado de Konstantinides10

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
• O tratamento deve ser guiado de acordo com o risco de morte
nos primeiros 30 dias, conforme mencionado acima.

• Alto risco: a administração de terapia trombolítica via


endovenosa está indicada e pode ser realizada até o 14º dia do
evento, desde que não haja contraindicações (Tabela 5). No
entanto, o maior benefício é observado quando a droga é
administrada nas primeiras 48 horas do início dos sintomas. Os
medicamentos fibrinolíticos e anticoagulantes aprovados no Brasil
para tratamento do TEP estão descritos na Tabela 6.
• Em pacientes com alto risco de sangramento, piora clínica apesar
da trombólise sistêmica ou com hipotensão ameaçadora à vida, a
trombólise guiada por cateter deve ser considerada em centros
com grande experiência na técnica. As vantagens estão
relacionadas à infusão do trombolítico diretamente no leito
vascular acometido, utilizando apenas um terço da dose prescrita
na trombólise sistêmica, além da fragmentação mecânica
realizada adjuntamente. A remoção mecânica do trombo isolada,
sem trombólise, fica restrita a pacientes com alto risco de
sangramento.

• Risco intermediário-alto: a recomendação atual é de


anticoagulação plena com HNF e monitorização em unidade de
terapia intensiva. Caso o paciente evolua com instabilidade
hemodinâmica e/ou deterioração clínica, a trombólise deve ser
considerada.

• Risco intermediário-baixo: iniciar preferencialmente heparina.


Caso mantenha estabilidade clínica, os anticoagulantes orais
podem ser administrados e o tratamento deve ser realizado em
ambiente hospitalar.
• Os novos anticoagulantes orais (NOACs) ou inibidores diretos
dos fatores de coagulação são uma opção terapêutica, mas vale
ressaltar que os estudos com apixabana, dabigatrana e
rivaroxabana não avaliaram a disfunção de VD por imagem. Já o
estudo com a edoxabana incluiu aproximadamente 35% dos
pacientes com disfunção de VD avaliada por angio-TC de tórax
e NT-proBNP.

• Risco baixo: devem receber anticoagulação plena, sendo os


NOACs a recomendação mais atual nesses casos. Alta hospitalar
precoce ou tratamento domiciliar pode ser considerada desde
que haja segurança quanto à adesão ao tratamento.
Contraindicações Contraindicações
absolutas relativas
• Doença estrutural intracraniana • PAS > 180 mmHg ou PAD > 110 mmHg
• AVC isquêmico nos últimos 3 meses • Hemorragia recente (não intracraniana)
• AVC hemorrágico prévio • Cirurgia recente
• Sangramento ativo conhecido • AVC isquêmico há mais de 3 meses
• Cirurgia do SNC recente e/ou cirurgia da coluna vertebral • Reanimação cardiopulmonar traumática
• TCE recente com fratura ou lesão cerebral • Anticoagulação (antagonistas de vitamina K)
• Coagulopatia • Pericardite ou derrame pericárdico
• Retinopatia diabética
• Gravidez
• Idade > 75 anos
• Baixo peso (< 60kg)
• Sexo feminino
• Raça negra

Tabela 5. Contraindicações para o uso de trombolíticos.


Fonte: Adaptado de Konstantinides10

FIBRINOLÍTICOS

MEDICAMENTO DOSE

Alteplase (rtPA) 100 mg em 2 horas ou 0,6 mg/Kg (máximo 50 mg) IV, em 15 minutos

Estreptoquinase 1.500.000 UI IV em 2h ou 250.000 UI em 30 minutos, seguido por 100.000 UI/h por 12-24h

Uroquinase 4.400 U/Kg ataque em 10min seguido de 4.400 U/Kg/h IV em 12 a 24 horas

** (Re)iniciar heparina quanto TTPA estiver menor que duas vezes o valor normal.

ANTICOAGULANTES
MEDICAMENTO DOSE

Enoxaparina: 1 mg/Kg SC 12/12h ou 1,5 mg/Kg/dia SC


HBPM
Dalteparina: 100 U/Kg SC 12/12h ou 200 U/Kg/dia SC

Foundaparinax < 50 Kg: 5 mg/dia SC; 51-100 Kg: 7,5mg/dia SC; >100 Kg: 10mg/dia SC

Dalteparina 100 U/Kg SC 12/12h ou 200 U/Kg SC 1x/d


FIBRINOLÍTICOS

MEDICAMENTO DOSE

80 UI/Kg (bolus IV), seguido de 18UI/Kg/h IV. Controle com TTPa a cada 4-6h para 1,5 a 2x o limite
HNF
superior da normalidade

Apixabana ab: 10 mg VO 2x/d durante os primeiros 7 dias, seguido de 5 mg VO 2x/d


Rivaroxabana abc: 15 mg VO 2x/d por 3 semanas, reduzido para 20 mg/d pelo tempo determinado para
o tratamento
NOACs
Dabigatrana d: 150 mg VO 2x/d após anticoagulação com heparina por 5 dias
Edoxabana ab: 60 mg/d após anticoagulação com heparina ou enoxaparina por 5 dias. ClCr 15-30
mL/min: 30 mg/d

Dose inicial de 5 a 10 mg/d VO, sendo a primeira tomada nas primeiras 24 horas do evento agudo,
Varfarina* simultaneamente ao uso da heparina. Ajuste de dose conforme o INR, com o objetivo de manter entre
2-3.

a Contraindicadas em pacientes com ClCr inferior a 15 mL/min.


b Contraindicados em hepatopatas graves ou com coagulopatia.
c Devem ser usadas com cautela em pacientes com ClCr entre 15 a 30 mL/min.
d Contraindicado na insuficiência renal grave (ClCr < 30 mL/min). A presença de fatores de risco como idade ≥ 75 anos,
comprometimento renal moderado (ClCr 30-50 mL/min) ou sangramento gastrintestinal prévio podem aumentar o risco de
sangramento. Não é necessário o ajuste de dose quando apenas um fator de risco está presente. Por outro lado, se houver a
coexistência de múltiplos fatores de risco, a dabigatrana deve ser administrada se o benefício superar os riscos de sangramento.

* A heparina deve ser mantida simultaneamente com a varfarina por pelo menos cinco dias e após dois dias consecutivos com
RNI adequado. Existe interação medicamentosa c com vários fármacos, havendo necessidade de maior vigilância, além de
interferência alimentar.

Tabela 6. Fibrinolíticos e anticoagulantes aprovados no Brasil para


tratamento da tromboembolia pulmonar aguda.
Fonte: Adaptado de Konstantinides10

b. CONSIDERAÇÕES NO TRATAMENTO INICIAL:

• Em pacientes com TEP aguda, a anticoagulação deve ser


prontamente instituída.

• Estudos com a heparina de baixo peso molecular (HBPM), um


inibidor do fator Xa, demonstraram superioridade em relação à
HNF, com menores taxas de recorrência de sangramento maior e
de mortalidade. A sua eficácia é incerta na obesidade, baixo peso
(< 45 kg), idosos e na insuficiência renal com clearance de
creatinina (ClCr) < 30 mL/min - situações nas quais a dosagem do
fator Xa é recomendada.
• O fondaparinux, outro inibidor do fator Xa, apesar do número
reduzido de estudos quando comparados a HBPM e HNF,
apresenta eficácia e segurança semelhantes à HBPM. Também não
deve ser administrado em pacientes com ClCr inferior a 30
mL/min, e naqueles com ClCr entre 30 e 50 mL/min a dose precisa
ser reduzida em 50%.

• A HNF é preferível nos casos com alto risco de sangramento


devido à disponibilidade de antídoto (protamina) e menor meia-
vida. Em pacientes com risco intermediário-alto ou com clearance
de creatinina < 30 mL/min, é o anticoagulante de escolha.
c. TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO:

• Novos anticoagulantes orais (NOACs) ou inibidores diretos


dos fatores de coagulação: conforme a diretriz de 2019 da ACCP
para tratamento de TEV, em pacientes com TEP aguda (sem câncer
associado), os NOACs (apixabana, dabigratana, edoxabana e
rivaroxabana) são a primeira opção para terapia a longo prazo.
Essa orientação foi baseada em diversos estudos realizados com
esses medicamentos demonstrando não inferioridade com relação à
eficácia (recorrência de TEV) e segurança (sangramentos) quando
comparado à terapia convencional (heparina associado a
antagonistas de vitamina K). Os NOACs têm a vantagem de dose
fixa (Tabela 6), sem a necessidade de controle laboratorial, porém
tem custo mais elevado quando comparado à varfarina. As funções
renal e hepática devem ser consideradas.
• Já existe no mercado moléculas que inibem especificamente os
NOACs: idarucizumabe para a dabigatrana; andexanet alfa para
apixabana, rivaroxabana e edoxabana. Ressalta-se que esta
recomendação deve ser seguida após criteriosa avaliação da
adesão pelo paciente.

• Varfarina: os antagonistas de vitamina K (AVK) ainda são os


fármacos mais utilizados para manutenção prolongada após evento
agudo da TEP no nosso meio. Apesar da necessidade de controle
laboratorial, em pacientes que apresentam adesão adequada, é uma
boa alternativa, pois, além da boa eficácia e segurança, possui fácil
acesso através da rede pública de saúde. A varfarina deve ser
administrada na dose inicial de 5 a 10 mg/dia, sendo a primeira
tomada nas primeiras 24 horas do evento agudo, simultaneamente
ao uso da HNF ou HBPM. O seu pico de ação ocorre em 36 a 72
horas, portanto a titulação da dose sequencial deve ocorrer a partir
do terceiro dia de uso, objetivando manter a relação de
normatização internacional do tempo de protrombina (RNI) entre
2,0 - 3,0. A heparina (HNF ou HBPM) deve ser mantida
simultaneamente com a varfarina por pelo menos cinco dias e após
dois dias consecutivos com RNI adequado (Tabela 6). O potencial
de interação com inúmeros fármacos leva a necessidade de maior
vigilância.
d. DURAÇÃO DA ANTICOAGULAÇÃO:

• O tempo de anticoagulação está diretamente relacionado ao risco


de recorrência do evento a longo prazo. Caso o fator de risco seja
reversível, a anticoagulação deve permanecer por pelo menos três
meses. Porém, caso o fator de risco não seja identificado, de
acordo com a nova Diretriz da ACCP, a recomendação é de que a
anticoagulação seja estendida. Nessa situação, aconselha-se
seguimento ambulatorial anual do paciente, e o risco versus
benefício da anticoagulação deve ser sempre considerado, assim
como o desejo do paciente em manter a terapia. Se for optado por
suspensão, nesses casos, a aspirina está indicada, desde que o
paciente não apresente contraindicação para o seu uso. Apesar
dessa indicação, estudo recente demonstrou que o risco de
recorrência de TEV com aspirina (100 mg/dia) foi superior àqueles
que foram mantidos por 1 ano com rivaroxabana (10 ou 20
mg/dia). Esses resultados não podem ser estendidos para pacientes
com indicação de anticoagulação por tempo indeterminado, visto
que estes foram excluídos do estudo. Sugere-se a recomendação
da (Tabela 8) nova Diretriz da ACCP de 2019 para o tempo
de tratamento da TEP.
• Em pacientes com contraindicação absoluta para
anticoagulação ou recorrência da TEP na vigência de
anticoagulação adequada, deve-se considerar o uso de filtro de
veia cava inferior.
Primeiro episódio de TEP associado a fatores de risco reversíveis
3 meses
(exemplo: após cirurgias)

Primeiro episódio de TEP sem fator de risco identificado A longo prazo

Segundo episódio de TEP A longo prazo

TEP associado a câncer Enquanto câncer ativo

TEP associado a trombofilias de alto risco A longo prazo

Tabela 8. Recomendações para o tempo de anticoagulação após episódio de


TEP agudo.
Fonte: Adaptado de Konstantinides10

e. SITUAÇÕES ESPECIAIS::

• Comprometimento da função renal: todos os NOACs possuem


excreção renal, sendo contraindicados na presença de insuficiência
renal grave (Tabela 6). Nesses casos, o uso de HNF na fase inicial
e AVK de manutenção é a opção mais segura.

• Câncer: o medicamento de escolha é a HBPM. Rivaroxabana e


edoxabana podem ser alternativas à HBPM em pacientes com
neoplasias não provindas do trato gastrointestinal.

• Trombofilias: os dados disponíveis com os NOACs são limitados.


• Gestação: o medicamento de escolha é a HBPM. AVK e NOACs
são contraindicados. Durante a lactação, HBPM, HNF e AVK
podem ser utilizados.
FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO

Algoritmo diagnóstico e de tratamento da tromboembolia pulmonar aguda.


*Os pacientes de risco intermediário com sinas de disfunção de VD tanto em exames de imagem (ecocardiograma e/ou
angiotomografia de tórax), quanto de exames laboratoriais (aumento de troponina e/ou NT-pró-BNP/BNP) são
considerados de risco intermediário-alto. Já os que apresentam sinais de disfunção em apenas um dos exames (de imagem
ou laboratorial) são considerados de risco intermediário-baixo.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo feminino, 70 anos, 68 kg. Evoluiu
com dispneia e dor torácica súbita 20 dias após ser submetida a uma
colecistectomia. Negou comorbidades.
b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: FC: 98 bpm, PA: 110 X 80 mmHg, SpO2 93% a.a.


• Tórax: ausculta pulmonar sem alterações.
c. Exames complementares: angiotomografia evidenciou TEP aguda
segmentar. Ecocardiograma transtorácico, BNP e troponina sem
alterações.
d. Prescrição sugeridas:

1. Dieta via oral livre


2. Rivaroxabana 15 mg VO 12/12 horas
3. Oxigênio sob cateter nasal se SpO2 < 92% em ar ambiente
4. Sinais vitais e cuidados gerais 4/4 horas

DICAS DO ESPECIALISTA
• O padrão eletrocardiográfico “S1Q3T3”, apesar de muito
associado ao diagnóstico de TEP, tem baixa sensibilidade e pode
ser encontrado em outras situações relacionadas a cor pulmonale
agudo.

• Como a especificidade do D-Dímero diminui com a idade, para


pacientes acima de 50 anos, o valor ajustado pela idade pode
melhorar a performance deste teste. O valor pode ser calculado por
meio da seguinte fórmula: 10 μg/L x idade (por exemplo, um
paciente de 65 anos terá um valor de corte de 10 μg/L x 65 = 650
μg/L).

• A investigação da TEP aguda na gestação é um desafio, pois os


escores de probabilidade clínica, ou mesmo o papel dos exames de
imagens, não incluíram gestantes nos protocolos de estudo. O US
doppler venoso de membros inferiores é a opção inicial de
investigação. A dose de radiação fetal na cintilografia pulmonar
V/Q e angio-TC de tórax são semelhantes e seguras ao feto, porém
a radiação materna é maior na segunda opção. Apesar desta
desvantagem, a angio-TC possui acurácia superior à cintilografia,
sendo a escolha na investigação de TEP em gestantes.

• O uso de trombolíticos nos pacientes de risco intermediário-alto


(disfunção de VD sem instabilidade hemodinâmica) não está
indicado. O estudo PEITHO que incluiu 1.006 pacientes com TEP
de risco intermediário-alto comparou o uso de tenecteplase versus
anticoagulação com heparina não fracionada. Houve benefício no
desfecho primário combinado (mortalidade em 7 dias e
deterioração hemodinâmica) no grupo submetido à trombólise,
porém, isso ocorreu à custa de maiores taxas de sangramentos (2%
vs. 0,2%). Vale ressaltar que a maior faixa etária dos pacientes
incluídos no estudo (média de 70 anos) pode ter influenciada esse
resultado. Posteriormente, foram publicados os desfechos
relacionados ao possível benefício da trombólise em prevenir o
desenvolvimento de hipertensão pulmonar tromboembólica crônica
nessa população e foi visto que a terapia mais agressiva não afetou
as taxas de mortalidade a longo prazo e não reduziu a dispneia
residual ou a disfunção do VD nestes pacientes.

• A HNF pode ser administrada durante a infusão contínua da


alteplase, mas deve ser descontinuada durante a infusão da
estreptoquinase e uroquinase.
• Nos casos não confirmados, mas com alta probabilidade clínica
pré-teste e baixo risco de sangramento, a anticoagulação empírica
está indicada até a definição diagnóstica de TEP.

• A nova diretriz da ACCP não recomenda os termos TEP/TEV


provocado ou não provocado, uma vez que pode causar equívoco
na decisão da duração da anticoagulação.

• Em pacientes com síndrome do anticorpo antifosfolípide, os


anticoagulantes de escolha são os AVK. Nesse subgrupo de
pacientes, os NOACs aumentaram a recorrência de TEV.

• Recomenda-se avaliação clínica de rotina após 3 a 6 meses da


TEP aguda.

• Não é necessária a realização rotineira da angiotomografia de


tórax de controle após o evento agudo.

REFERÊNCIAS
1. Meyer G, Vicaut E, Danays T, Agnelli G, Becattini C, et al. Fibrinolysis For Patients With
Intermediate-risk Pulmonary Embolism. N Engl J Med. 2014; 370(15): 1402-11.
2. Agnelli G, Buller HR, Cohen A, Curto M, Gallus AS, Johnson M, et al. Oral Apixaban For
The Treatment Of Acute Venous Thromboembolism. N Engl J Med. 2013; 369(9): 799-808.
3. Schulman S, Kearon C, Kakkar AK, Mismetti P, Schellong S, et al. Dabigatran Versus
Warfarin In The Treatment Of Acute Venous Thromboembolism. N Engl J Med. 2009;
361(24): 2345-52.
4. The Einstein-pe Investigators. Oral Rivaroxaban For The Treatment Of Symptomatic
Pulmonary Embolism. N Engl J Med. 2012; 366: 1287-97.
5. The Hokusai-vte Investigators, Büller HR, Décousus H, Grosso MA, Mercuri M, et al.
Edoxaban Versus Warfarin For The Treatment Of Symptomatic Venous Thromboembolism.
N Engl J Med. 2013: 369(15): 1406-15.
6. Kearon C, Akl EA, Ornelas J, Blaivas A, Jimenez D, Bounameaux H, et al. Antithrombotic
Therapy For Vte Disease: Chest Guideline And Expert Panel Report. Chest. 2016; 149(2):
315-52.
7. Pollack Jr CV, Reilly PA, Eikelboom J, Glund S, Verhamme P, et al. Idarucizumab For
Dabigatran Reversal. N Engl J Med. 2015; 373(6): 511-20.
8. Konstantinides SV, Vicaut E, Danays T, Becattini C, Bertoletti L, Beyer-Westendorf J, et al.
Impact of Thrombolytic Therapy on the Long-Term Outcome of Intermediate-Risk
Pulmonary Embolism. J Am Coll Cardiol. 2017; 69(12): 1536-44.
9. Weitz JI, Lensing AWA, Prins MH, Bauersachs R, Beyer-Westendorf J, et al. Rivaroxaban Or
Aspirin For Extended Treatment Of Venous Thromboembolism. N Engl J Med. 2017; 376:
1211-22.
10. Konstantinides SV, Meyer G, Becattini C, Bueno H, Geersing GJ, et al. 2019 ESC
Guidelines for the diagnosis and management of acute pulmonaryembolism developed in
collaboration with the European Respiratory Society (ERS). Eur Heart J. 2020 Jan
21;41(4):543-603.
6.4
DERRAME PLEURAL
Autor:
André Bezerra Botelho

DEFINIÇÕES
• Derrame pleural: É definido como aumento de líquido no espaço
pleural e resulta do aumento da taxa de formação do fluido pleural,
redução de sua absorção ou, mais comumente, de ambos os
processos. Apesar de bastante comum e poder estar relacionado a
inúmeras etiologias, na prática clínica, poucas causas são
responsáveis pela maioria dos casos.

ETIOPATOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• É estimado que o derrame pleural acometa cerca de 3.000 pessoas
por milhão. Existem variações importantes na incidência do
derrame pleural ao redor do mundo.

• Nos Estados Unidos, as quatro principais causas nos pacientes


submetidos à toracocentese (punção do líquido pleural) são: câncer
(27%), insuficiência cardíaca (21%), pneumonia (19%) e
tuberculose (9%). Entretanto, a insuficiência cardíaca constitui a
principal etiologia, mas uma parcela significativa desses
indivíduos não são puncionados, sendo excluídos desta estatística.

• Nos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, causas


infecciosas, principalmente a tuberculose, devem sempre ser
incluídas nos diagnósticos diferenciais, com especial atenção aos
adultos jovens e derrame unilateral.

• O acúmulo de líquido no espaço pleural pode ocorrer por diversos


mecanismos. Destacando-se: aumento da pressão hidrostática nos
capilares e/ou linfáticos; diminuição da pressão oncótica das
proteínas do plasma; aumento da permeabilidade capilar; aumento
da pressão hidrostática nos capilares e/ou linfáticos.

QUADRO CLÍNICO
• Os sintomas comumente encontrados são dor torácica do tipo
pleurítica (ventilatório-dependente), tosse e dispneia.

• A intensidade dos sintomas está relacionada com a velocidade de


formação do derrame e a extensão do processo inflamatório
pleural.

• Sintomas inespecíficos podem estar presentes e correlacionam-se


com a etiologia do derrame.

• Febre, perda ponderal, sinais e sintomas decorrentes de congestão


sistêmica podem estar presentes.

EXAME FÍSICO
• Aparelho respiratório: diminuição da expansão torácica, redução
do frêmito toracovocal, macicez ou submacicez à percussão e
diminuição do murmúrio vesicular restrito ao hemitórax
acometido.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Radiografia de tórax: a radiografia de tórax em incidência
posteroanterior (PA) e perfil é fundamental na investigação inicial,
sendo capaz de identificar derrames com volume de aproximadamente
200 mL. Os principais achados são: obliteração do seio costofrênico;
hipotransparência nas bases com formação de uma parábola com
concavidade voltada para cima (curva de Damoiseau). A radiografia
em decúbito lateral com raios horizontais (incidência de Laurell) pode
auxiliar no diagnóstico de derrames com pequenos volumes, na
indicação da toracocentese e na avaliação de complicações relacionadas
ao derrame. Nesta incidência, pode-se notar alteração da imagem
quando comparada a PA, correspondendo ao deslocamento do derrame
(nos casos não complicados) ao longo da superfície pleural lateralmente
(Figura 1).
b. Tomografia de tórax: possibilita melhor avaliação da pleura e do
parênquima pulmonar, além de auxiliar no diagnóstico de derrame
complicado (presença de espessamento e nodulações pleurais, além de
septações e loculações).
c. Ultrassonografia: serve como guia para toracocentese e biópsia,
além de reduzir os riscos de complicações relacionadas a estes
procedimentos. Possui elevada acurácia na avaliação de derrames
complicados, empiema e espessamento pleural.

A. Posteroanterior. B. Decúbito lateral com raios horizontais (incidência de Laurell).

Figura 1. Derrame pleural no hemotórax direito identificado em duas


incidências distintas:
Fonte : Elaborado pelo autor.
d. Análise do líquido pleural

• Citologia total e diferencial: o predomínio de neutrófilos (>


50%) é característico de processo pleural agudo, como visto no
derrame parapneumônico, tuberculose em fase inicial, embolia
pulmonar e pancreatite. Em casos em que há predomínio de
linfócitos (> 50%), no nosso meio, tuberculose e processo
neoplásico (linfoma ou tumor sólido) devem ser afastados;
contudo, outras causas como artrite reumatoide e lúpus não devem
ser negligenciadas.

• Bacterioscopia e culturas: devem ser solicitadas mediante


suspeição clínica de infecção bacteriana, por micobactérias ou
fungos. Na presença de empiema, há um bom rendimento da
cultura. Porém, na tuberculose, a baciloscopia é positiva em menos
de 10% dos casos e a cultura em torno de 30-50%.

• Citologia oncótica: rendimento varia conforme o tipo histológico


do tumor, com sensibilidade entre 40 e 87%.

• Amilase: dosagem deve ser feita diante da suspeita de ruptura do


esôfago, pancreatite, pseudocisto pancreático ou prenhez ectópica
rota. Também pode estar elevada em casos associados a
adenocarcinomas.

• Triglicerídeos: pode sugerir o diagnóstico de quilotórax quando


apresenta valores maiores que 110 mg/dL.

• Colesterol: utilizado no diagnóstico diferencial entre quilotórax


(elevação isolada de triglicerídeos) e pseudoquilotórax (colesterol
> 200 mg/dL).

• Adenosina deaminase (ADA): possui importância principalmente


na investigação de tuberculose pleural. Valores superiores a 30 U
ou 40 U (variações de acordo com a metodologia utilizada)
apresentam sensibilidade maior de 95% para tuberculose, com
especificidade de 80%. Outras doenças como neoplasia, derrame
parapneumônico, artrite reumatoide e empiema também podem
cursar com valores elevados de ADA.

• pH: importante no manejo dos derrames parapneumônico. Nesses


casos, valores de pH menores que 7,2 sugerem derrame
complicado e é indicativo de drenagem pleural. Em neoplasias, pH
menor que 7,2 correlaciona-se com pior prognóstico.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
ETIOLÓGICA
• O diagnóstico é feito com a confirmação da presença de líquido no
espaço pleural através dos exames de imagem já citados.

• O diagnóstico etiológico é mais importante que a identificação do


derrame propriamente dito.

• A toracocentese tem papel fundamental na investigação


etiológica, com o objetivo de avaliar as características
macroscópicas, bioquímicas e citológicas do derrame.

• A descrição das características macroscópicas do líquido pleural


é parte fundamental na investigação, podendo estreitar as hipóteses
diagnósticas, como observado no Quadro 1.

• A avaliação bioquímica classifica o derrame, a partir dos critérios


de Light (Tabela 1), em dois grandes grupos, transudato ou
exsudato, com características e etiologias bastante distintas. A
presença de qualquer um dos critérios classifica o derrame como
exsudativo.

• O Quadro 2 destaca as principais etiologias do derrame pleural.


• Em situações em que o estudo do líquido pleural não é suficiente
para o diagnóstico etiológico, a biópsia pleural está indicada, seja
através de punção por agulha ou por pleuroscopia.

• Os derrame pleurais da insuficiência cardíaca são, em sua maioria,


pequenos a moderados, com predomínio à direita e sem associação
a sinais de alarme (como febre ou dor torácica).
Sanguinolento: neoplasia, tuberculose, embolia pulmonar ou trauma

Odor de urina: urinotórax

Odor fétido: infecção por anaeróbios

Turvo: presença de lipídios, proteínas ou células

Leitoso: quilotórax, pseudoquilotórax

Purulenta: empiema

Partículas alimentares: ruptura de esôfago

Quadro 1. Aspecto macroscópico do líquido pleural e possibilidades


diagnósticas.
Fonte: Porcel 20151

Proteína do líquido pleural / Proteína sérica > 0,5

DHL do liquido pleural / DHL sérico > 0,6

DHL do liquido pleural > 2/3 o limite superior da normalidade do DHL sérico

A presença de qualquer um dos critérios, classifica o derrame pleural como exsudato.

Tabela 1. Critérios de Light.


Fonte: Light 19723

Transudato Exsudato
Insuficiência cardíaca Neoplasia

Cirrose hepática Pneumonia

Síndrome nefrótica Tuberculose

Hipertensão arterial pulmonar Embolia pulmonar

- Serosite autoimune
Quadro 2. Causas de Derrame Pleural.
Fonte: Porcel 20151

TRATAMENTO
• O tratamento do derrame pleural consiste no controle da etiologia
de base. Eventualmente, medidas específicas podem ser adotadas.

• Em caso de derrame pleural transudativo baseia-se, basicamente,


no tratamento da síndrome edematogênica associada, como no
caso da insuficiência cardíaca e cirrose hepática.

• Tuberculose pleural: o tratamento é semelhante ao da forma


pulmonar, sendo utilizado o esquema básico (dois meses de
rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol, seguidos por
quatro meses de rifampicina e isoniazida).

• Derrame pleural parapneumônico: uso de antibiótico para o


agente etiológico mais provável (pneumococo) é fundamental. Em
derrames complicados (empiema, bacterioscopia ou cultura
positiva, pH < 7,2), a drenagem torácica torna-se necessária. Em
quadro de septação pleural associado, está indicada pleuroscopia
com decorticação pulmonar.

• Derrame neoplásico: habitualmente está relacionado a doença


avançada e com sobrevida reduzida. Toracocentese de repetição é a
conduta adotada em pacientes com reduzida expectativa de vida. A
pleurodese pode ser considerada em pacientes com melhor
prognóstico.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
IC: insuficiência cardíaca.
*Sinais de alarme: presença de febre, dor, predomínio a esquerda, assimetria importante.
**Para pacientes em uso de diureticoterapia, a diferença entre albumina sérica
- albumina pleural ≤ 1,2 confirma o diagnóstico exsudato.

Fluxograma 1. Algoritmo diagnóstico de derrame pleural.


Fonte: Elaborado pelo Autor.1

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 68 anos, tabagista,
hipertenso, com relato de febre e tosse produtiva há 5 dias. Há 2 dias
passou a apresentar dispneia aos moderados esforços e dor ventilatório-
dependente.
b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: PA 100 x 70 mmHg, FC 115 bpm, FR 28 rpm, SpO2:


90% em ar ambiente.

• Tórax: redução do frêmito toracovocal, macicez à percussão e


diminuição do murmúrio vesicular em terço basal direito, RCR em
2T, sem sopro.

• Abdome: RHA presentes, abdome livre, sem visceromegalias.


• Membros: sem edemas, pulsos pediosos presentes e simétricos.
c. Exames complementares: radiografia de tórax confirma derrame
pleural à direita. Leucograma: 17800 (15% de bastões), PCR: 155,
proteína total: 4,7, DHL: 300, sem demais alterações em exame
laboratorial. Toracocentese com líquido citrino, 1100 células (85%
neutrófilos), pH 7,35, DHL: 570, proteínas totais: 3,2, glicose 70, ADA
20, bacterioscopia negativa.
d. Diagnóstico: trata-se de um derrame exsudativo (2 pontos
positivos pelos critérios de Light - proteína pleural/sérica: 0,68 e DHL
pleural/sérica: 1,9) neutrofílico, sem outras características de
complicação (glicose, pH e aspecto macroscópicos normais),
compatível com derrame parapneumônico não complicado (pela
história clínica e achados na toracocentese). Nestes, apenas manter
antibioticoterapia é o suficiente para seu tratamento, sem necessidade
de drenagem.
e. Prescrição sugeridas:

1. Dieta hipossódica.
2. Ceftrixone 1 g, IV, 12/12h.
3. Azitromicina 500 mg, VO, 1x/dia.
4. Enoxaparina 40 mg, SC, 1x/dia.
5. Oxigênio por cateter nasal, para manter SpO2 > 92%.
6. Fisioterapia respiratória.

DICAS DO ESPECIALISTA
• A etiologia mais comum do derrame pleural é a insuficiência
cardíaca (IC).

• O derrame pleural da IC tem uma frequência muito maior à


direita.

• Os critérios de Light são fundamentais na avaliação inicial de um


derrame pleural de etiologia desconhecida, para diferenciar
exsudato de transudato.

• O padrão clássico do derrame pleural por tuberculose é um


exsudato com predomínio de linfócitos e com ADA elevada.

• O derrame pleural parapneumônico deve ser submetido à


drenagem em selo d’água quando apresentar bacterioscopia ou
cultura positiva, pH < 7,2 ou aspecto compatível com empiema.

• Quando a análise do líquido pleural não for suficiente para o


diagnóstico, é necessária a realização da biópsia pleural.

• O tratamento do derrame pleural consiste no controle da etiologia


específica.
REFERÊNCIAS
1. Porcel JM, Azzopardi M, Koegelenberg CF, Maldonado F, Rahman NM, et al. The diagnosis
of pleural effusions. Expert Rev Respir Med. 2015; 9(6): 801-15.
2. Miserocchi G. Physiology and pathophysiology of pleural fluid turnover. Eur Respir J. 1997;
10: 219-25.
3. Light RW, MacGregor MI, Luchsinger PC, Ball Jr WC. Pleural effusions: the diagnostic
separation of transudates and exudates. Ann Intern Med. 1972; 77(4): 507-14.
4. Maskell N. BTS Pleural Disease Guideline. Thorax. 2010; 65 (Suppl 2) ii4–ii76.
6.5
PNEUMONIA ADQUIRIDA NA
COMUNIDADE
Autora:
Fernanda Maria Machado Nogueira Acerbi

DEFINIÇÕES
• PNEUMONIA: doença inflamatória aguda de causa infecciosa
que acomete as vias aéreas terminais e o parênquima pulmonar.
Pode ser causada por vírus, bactérias e, mais raramente, fungos e
parasitas.

• PNEUMONIA ADQUIRIDA NA COMUNIDADE (PAC):


acomete o paciente fora do ambiente hospitalar ou se manifesta em
até 48 horas após admissão em unidade de cuidados médicos.

• PNEUMONIA ASSOCIADA À ASSISTÊNCIA À SAÚDE:


termo empregado para identificar pacientes de risco para patógenos
multirresistentes (aqueles hospitalizados nos últimos três meses,
provenientes de clínicas de diálise, asilos ou casas de saúde). No
entanto, um número crescente de estudos mostrou um aumento
inadequado do uso de antibiótico ao realizar esta categorização,
sugerindo que este termo não seja mais utilizado. Os pacientes
deste grupo devem ser tratados de maneira semelhante aos da PAC.

EPIDEMIOLOGIA
• Incidência mundial de PAC: 16 a 23 casos por 1.000 habitantes.
Permanece como a segunda causa de hospitalização e a principal
etiologia infecciosa de óbito, com taxa de mortalidade de 41,7 por
100.000 habitantes.

• Brasil: doenças do aparelho respiratório constituem a quinta causa


de óbitos e, dentre essas, a pneumonia é a segunda mais frequente.
Segundo dados do DATASUS, de maio de 2019 a abril de 2020
ocorreram 611 mil internações por PAC.

• Maior incidência: ocorre em extremos de idade (principalmente


antes dos 5 anos e acima dos 65 anos) e no sexo masculino. Maior
frequência nos períodos de outono e inverno.

• Mortalidade: varia conforme a gravidade do diagnóstico.


Pacientes que não necessitam de internação têm mortalidade em
torno de 1%; os hospitalizados variam entre 4% e 18%, e os
internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) podem chegar a
50%.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• O Streptococcus pneumoniae (pneumococo) é o principal
patógeno causador de pneumonia, independentemente da idade,
com prevalência média de 27,3%. Outros agentes frequentes são o
Haemophilus influenzae e as bactérias denominadas atípicas,
representadas pelo Mycoplasma sp, Chlamydophila sp e
Legionella sp, responsáveis por 34% das pneumonias.

• Entre os agentes virais, há predomínio do vírus Influenza em


adultos, responsável por até um terço dos casos.

• Os patógenos mais comumente identificados estão distribuídos no


Quadro 1, de acordo com o local de tratamento.

PAC ambulatorial Internados em enfermaria Internados em UTI


S. pneumoniae S. pneumoniae S. pneumoniae

M. pneumoniae M. pneumoniae S. aureus

C. pneumoniae C. pneumoniae Legionella sp

Vírus respiratórios* H. influenzae Bacilos gram-negativos

H. influenzae Legionella sp H. influenzae

Vírus respiratórios * Vírus influenza

* Influenza, rhinovírus, coronavírus, adenovírus, vírus sincicial respiratório, parainfluenza

Quadro 1. Agentes esperados de acordo com o local de tratamento.


Fonte: Adaptado de Correa.1

• Infecções polimicrobianas podem ocorrer geralmente com


associação entre pneumococo, vírus e germes atípicos.

• Fisiopatologia: desenvolvimento de pneumonia pode estar


relacionado à deficiência no sistema imunológico do hospedeiro,
à exposição a um microrganismo de alta virulência ou ao
tamanho do inóculo (exposição maciça).

• A transmissão interpessoal através de gotículas ou aerossóis,


seguida da microaspiração, na qual microrganismos que
colonizam as vias aéreas superiores atingem o trato respiratório
inferior, são os meios mais comuns da patogênese da pneumonia.

• Ao contrário do que se acreditava, existe uma colonização não


patogênica dos pulmões por microrganismos, como bactérias,
fungos e vírus. Um desequilíbrio (disbiose) entre estes
microrganismos da flora pulmonar é fator de risco para o
desenvolvimento da pneumonia.

• Outros mecanismos possíveis são: disseminação hematogênica


de um foco de infecção à distância, macroaspiração e
contaminação por foco contíguo.

QUADRO CLÍNICO
• Manifestações respiratórias: tosse, expectoração, dispneia, dor
torácica ventilatório-dependente (na presença de derrame pleural),
febre e hipoxemia (desequilíbrio da relação ventilação-perfusão).
A tosse é o achado mais comum e está presente em até 80% dos
casos.

• Manifestações sistêmicas: prostração, cefaleia, febre, sudorese,


artralgias, mialgias e delirium.

• Idosos: febre e tosse são menos frequentes, e as manifestações


mais observadas são taquipneia (geralmente FR > 24 irpm),
confusão mental, delírios, quedas, alteração da capacidade
funcional e descompensação da doença de base.

• Taquipneia pode ser o sinal inicial de pneumonia e pode estar


presente em mais de 60% dos idosos. Apesar de inespecífico, é
indicador muito sensível de infecção respiratória e tem valor tanto
para diagnóstico como para prognóstico.

EXAME FÍSICO
• Inspeção: taquipneia, expansibilidade torácica reduzida.
• Palpação: frêmito toracovocal (FTV) aumentado; FTV abolido na
presença de derrame pleural associado.

• Percussão: submacicez ou macicez.


• Ausculta: diminuição do murmúrio vesicular; estertores finos ou
grossos; sopro tubário; broncofonia; pectorilóquia fônica ou
afônica.

• Achados extrapulmonares: devem ser avaliados para afastar


infecção em outros sítios (artrite, endocardite, meningite, hepatite,
pericardite).

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Bioquímica: hemograma completo, ureia, creatinina, sódio,
potássio e glicemia.
b. Gasometria arterial: realizar apenas se a saturação periférica de
oxigênio (SpO2) na oximetria de pulso for menor que 90% em ar
ambiente, casos de insuficiência respiratória, ou se houver suspeita
de hipercapnia por doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). A
hipoxemia indica internação.
c. Sorologia para HIV: para pacientes com achados clínicos,
laboratoriais ou radiológicos atípicos (após esclarecimento e
consentimento do paciente).
Exames considerados, a depender da suspeita clínica e gravidade:
d. Proteína C Reativa (PCR): marcador inflamatório que avalia
resposta terapêutica e tem valor prognóstico. Níveis elevados ou à
ausência de queda de pelo menos 50% do seu valor inicial após o 3o dia
de tratamento antimicrobiano estão associados ao pior prognóstico ou
evolução para complicações.
e. Procalcitonina (PCT): marcador inflamatório com alta
sensibilidade, porém baixa especificidade para diferenciar infecção
bacteriana e viral. Tem valor prognóstico. Valores de PCT acima de
0,25 μg/L falam a favor do uso de antibioticoterapia, com maior
concordância quando acima de 0,5 μg/L. Valores abaixo de 0,1 μg/L
corroboram a não indicação de antimicrobiano. Redução dos valores
iniciais de 90% indicam interrupção no tratamento. Estudos
demonstraram redução do tempo de uso de antibióticos sem aumento da
mortalidade ou falha de tratamento baseado na dosagem seriada desse
marcador.
f. Toracocentese diagnóstica: solicitar na presença de derrame
pleural maior que 5 cm a partir do recesso posterior na radiografia de
tórax em perfil ou maior que 10 mm no decúbito lateral, ou ainda
quando há derrame loculado. Realizar toracocentese e analisar o líquido
pleural por meio de técnica bioquímica e microbiológica para excluir
empiema ou derrame parapneumônico complicado, os quais têm
indicação de drenagem torácica.
g. Broncoscopia com lavado broncoalveolar e biópsia
transbrônquica: útil para pacientes sem resposta à terapêutica inicial
ou na presença de achados de imagem não compatíveis com
pneumonia.
h. Pesquisa de Bacilo Álcool-Ácido Resistente (BAAR) no escarro
e cultura para micobactérias: solicitar apenas em pacientes com
achados de imagem e história clínica compatíveis com tuberculose,
como lesões pulmonares escavadas, presença de nódulos
centrolobulares em árvore em brotamento.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
a. Clínico:

• Tosse e um (ou mais) dos seguintes sintomas: expectoração,


dispneia e dor torácica.

• Pelo menos um achado sistêmico: confusão mental, cefaleia,


sudorese, calafrios, mialgia, febre (temperatura ≥ 37,8 °C).

• Achados focais no exame físico do tórax (ausência de


anormalidades não exclui o diagnóstico).

• Alteração radiológica compatível, na radiografia ou tomografia de


tórax.

• A presença de alteração radiológica nova é essencial para


corroborar o diagnóstico de pneumonia, já que os sintomas são
inespecíficos e podem estar presentes em infecções de vias aéreas
superiores.
b. Etiológico: de acordo com a gravidade clínica, os fatores
epidemiológicos de risco e a resposta ao tratamento.

• Pacientes ambulatoriais: métodos de identificação etiológica são


desnecessários, tendo em vista a eficácia elevada da terapia
antibiótica empírica e a baixa mortalidade.

• PAC grave: tratamento direcionado reduz mortalidade, porém não


se deve retardar a instituição da terapia aguardando o diagnóstico
etiológico. Para esses casos, são necessárias hemoculturas (duas
amostras), exame de escarro com pesquisa direta e cultura para
germes aeróbios, além de aspirado traqueal ou broncoscopia com
lavado broncoalveolar (LBA) em casos selecionados. A pesquisa
de antígeno urinário na identificação de pneumonia relacionada
ao pneumococo e Legionella faz-se necessária. A sensibilidade
desse teste não se altera mesmo após a introdução da
antibioticoterapia.

• O Quadro 2 mostra a necessidade de investigação microbiológica,


conforme a gravidade da PAC.
INTERNADOS, NÃO
AMBULATORIAIS INTERNADOS EM UTI
UTI

Cultura de escarro Não Sim Sim


Hemocultura Não Sim Sim
Antígeno urinário para Legionella Não Sim Sim
Antígeno urinário para pneumococo Não Sim Sim
Cultura invasiva do trato respiratório Não Não Sim
Outros* Não Não Sim*
*Outros: indica cultura para fungos e tuberculose, PCR, sorologia específica e biópsia pulmonar.

Quadro 2. Investigação microbiológica na PAC.


Fonte: Adaptado de Prina.2

c. Radiológico:
• Radiografia de tórax (nas incidências posteroanterior e perfil):
método diagnóstico inicial (surgimento de opacidade intersticial
ou consolidação). Auxilia na avaliação da gravidade
(identificação de comprometimento multilobar ou derrame pleural
associado), sugere diagnóstico diferencial (abscesso, tuberculose
e massa pulmonar) e também é útil para acompanhar a resposta ao
tratamento. Não é capaz de determinar o agente etiológico. Em
metade dos casos, a resolução completa das alterações radiológicas
ocorre em duas semanas após o início do quadro e, em seis
semanas, em dois terços dos casos. Idade avançada, doença
pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), imunossupressão,
alcoolismo, diabetes e pneumonia multilobar associam-se
independentemente, com resolução mais lenta.

• Ultrassonografia de tórax (UST): útil na identificação de


consolidação parenquimatosa, além de avaliar a presença e
eventuais complicações associadas ao derrame pleural. Pode
auxiliar na realização de toracocentese.

• Tomografia de tórax: deve ser realizada quando houver dúvida


diagnóstica e na suspeita de complicações, como abscesso
pulmonar e derrame pleural loculado. Útil principalmente em
pacientes obesos, imunossuprimidos e em indivíduos com
alterações radiológicas prévias em que a acurácia da radiografia de
tórax e da UST é baixa. O achado de adenomegalia mediastinal
durante o episódio de PAC é frequente.
d. Escores de Gravidade:

• Avaliação da gravidade: realizar em todo paciente com


diagnóstico de PAC. De acordo com a gravidade, haverá orientação
para o local de tratamento, estratégia diagnóstica com necessidade
de investigação etiológica e tratamento antibiótico inicial.

• Índices de gravidade mais utilizados: o norte-americano


Pneumonia Severity Index (PSI) e os britânicos CURB-65 e CRB-
65. Estes últimos são mais simples para a estratificação da
gravidade, sendo todos eles relacionados à mortalidade em 30
dias.
• PSI: escore que abrange 20 variáveis e classifica os pacientes em
cinco categorias de gravidade que estão associadas ao risco de
mortalidade. Mostra limitações pela dificuldade no cálculo da
pontuação e por subestimar a gravidade em pacientes jovens e
sem comorbidades, além de superestimar a mortalidade em
indivíduos idosos.
• CURB-65: escore que abrange apenas cinco variáveis
representativas da doença aguda na PAC. Cada variável equivale
a um ponto (Tabela 1).
C - Confusão mental
U - Ureia > 50 mg/dL
R - Frequência respiratória > 30 incursões/minuto
B - Pressão arterial sistólica < 90 mmHg ou diastólica ≤ 60 mmHg
65 - Idade ≥ 65 anos (isoladamente, não pontua; necessita de outro dado alterado para ser valorizada)

Tabela 1. Escore CURB-65 para avaliação da gravidade da PAC.


Fonte: Adaptado de Correa.1

• Última diretriz brasileira de PAC recomenda o uso do CRB-65


por sua simplicidade e por dispensar a necessidade de dosagem da
ureia.

• Maior limitação desses escores (CURB-65 e CRB-65): falta de


inclusão de comorbidades que podem acrescentar maior risco de
complicações na PAC, como alcoolismo, insuficiência cardíaca ou
hepática e neoplasias, fazendo com que seu valor preditivo
negativo de mortalidade seja um pouco inferior ao do PSI.
Entretanto, eles se qualificam pela simplicidade, aplicabilidade
imediata e facilidade de uso em ambientes hospitalares ou não
hospitalares.

• Outras indicações de internação: hipoxemia (SpO < 92% em ar 2

ambiente) à oximetria de pulso; comorbidades descompensadas;


consolidações multilobares ou bilaterais e presença de derrame
pleural; impossibilidade de ingerir a medicação; falta de condições
socioeconômicas e baixa cognição.

• Os Escores CURB-65 e PSI são úteis para indicar o local de


tratamento da PAC (Fluxograma 1).

Fluxograma 1. Escore de avaliação CRB-65 e PSI para avaliar gravidade e


local de tratamento da PAC.
Fonte: Adaptado de Prina.2

• A decisão do local de tratamento possibilita prever o provável


agente etiológico e a escolha do antibiótico.

• O Quadro 3 representa os critérios de PAC grave pelos critérios


de Ewig. Na presença de um dos critérios maiores ou dois ou
mais dos critérios menores, há a indicação de admissão à unidade
de terapia intensiva.
Critérios menores Critérios maiores

Hipotensão arterial Insuficiência respiratória aguda com indicação de de ventilação mecânica

Relação PO2 / FiO2 < 250 Choque séptico necessitando de vasopressor

Presença de infiltrados multilobares


Quadro 3. Critérios de definição de pneumonia adquirida na comunidade
grave (Critérios de Ewig).
Fonte: Adaptado de Correa.1

e. Diagnóstico Diferencial

• PAC pode ter como diagnósticos diferenciais causas infecciosas e


não infecciosas.

• Pacientes com sintomas respiratórios e achado de imagem com


consolidação pulmonar devem ter também outras hipóteses
diagnósticas: edema pulmonar cardiogênico e não cardiogênico,
tuberculose pulmonar, atelectasias, embolia pulmonar,
bronquiectasias, câncer de pulmão, doença metastática
pulmonar.

• Outras causas menos comuns incluem: pneumonia em organização


criptogênica (POC), corpo estranho, doenças ocupacionais,
pneumonia eosinofílica, doenças pulmonares fibrosantes,
hemorragia alveolar, sarcoidose, proteinose alveolar, linfoma,
criptococose, histoplasmose, pneumocistose, dentre outras.

• O local de acometimento da lesão pulmonar, a presença ou não de


imunodeficiência, as exposições ambientais e, principalmente, a
evolução do paciente, com melhora clínica e radiológica completa
no período estimado, dita a necessidade de avaliação
complementar ou não.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Suporte ventilatório com oxigênio suplementar pode ser


necessário, se SpO₂ menor que 92% em ar ambiente.

• Fisioterapia respiratória e manejo de secreção nas vias aéreas.


b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Objetivos do tratamento: antibioticoterapia precoce (até


quatro horas após o diagnóstico) está relacionada à redução da
mortalidade na PAC grave.

• Período do tratamento: de acordo com a gravidade, agente


etiológico, complicações associadas e evolução clínica do paciente.

• A Tabela 2 apresenta as principais recomendações para terapia


antimicrobiana empírica para os pacientes com PAC, de acordo
com as novas recomendações brasileiras para o manejo de PAC
(2018).
Tabela 2. Antibioticoterapia empírica inicial conforme estratificação por
nível de gravidade.
Fonte: Adaptado de Correa.3

• PAC ambulatorial
• Tratamento domiciliar se houver garantia do uso do antibiótico
prescrito.
• Paciente hígido: uso de macrolídeo ou betalactâmico (β-
lactâmico) é a sugestão de escolha (Tabela 3).
• A cobertura antibiótica para patógenos atípicos nos casos de
PAC de menor gravidade ainda é controversa, e vários estudos
não mostraram vantagens com essa conduta. As recomendações
norte-americanas, europeias, britânicas e latino-americanas
diferem quanto ao tratamento dos casos ambulatoriais devido a
diferentes posições quanto à resistência antimicrobiana.
• A nova recomendação brasileira para o manejo de PAC de
2018 alega que, em nosso meio, os dados mais recentes apontam
que a resistência pneumocócica à penicilina não deve ser uma
preocupação para os casos menos graves, e sugere o uso de
monoterapia com β-lactâmico ou macrolídeo para os
pacientes ambulatoriais, sem comorbidades, sem uso recente
de antibióticos, sem fatores de risco para resistência e sem
contraindicação ou história de alergia a essas drogas.
• Quanto aos macrolídeos, a recomendação brasileira ressalta que
a azitromicina é mais efetiva in vitro contra a maioria das cepas
de Haemophilus influenzae do que a claritromicina e, por isso,
deveria ser preferida nos pacientes com DPOC.
• Pacientes sem comorbidades: evitar o uso das fluoroquinolonas
devido ao recente alerta da agência norte-americana Food and
Drug Administration sobre o potencial risco de efeitos colaterais
graves.
• Pacientes com comorbidades (DPOC, doença hepática ou
renal, câncer, diabetes, insuficiência cardíaca congestiva,
alcoolismo ou imunossupressão), aqueles que fizeram uso de
antibióticos nos últimos três meses, ou provenientes de
regiões onde a taxa local de resistência aos macrolídeos é
superior a 25% (por exemplo, nos EUA e em alguns outros
países): β-lactâmico associado a macrolídeo ou
fluoroquinolona respiratória por pelo menos cinco dias são as
sugestões.
• Amoxicilina-clavulanato pode ser usada na suspeita de infecção
por gram-negativos (Klebsiella, Haemophilus), apesar de não
possuir maior atividade contra pneumococo e não cobrir germes
atípicos.

• PAC tratada em enfermaria


• O uso de fluoroquinolona respiratória isolada (levofloxacino,
moxifloxacino ou gemifloxacino) ou a associação de um β-
lactâmico a um macrolídeo têm sido recomendados devido à
boa cobertura e aos bons resultados no tratamento dos quadros
infecciosos (Tabela 3). Entretanto, persiste a preocupação
com o surgimento subsequente de organismos multirresistentes.
• A monoterapia com macrolídeo está contraindicada devido à
alta prevalência de resistência do S. pneumoniae a esta
classe de antibióticos (estudo de 2014 demonstra resistência à
eritromicina encontrada em relação ao S. pneumoniae de 17,2%
em todas as faixas etárias). A escolha da cobertura para germes
atípicos continua controversa. Entretanto, a recomendação
atual é o emprego de β-lactâmico associado a um macrolídeo
ou fluoroquinolona respiratória isolada.
• Um β-lactâmico isolado pode ser usado somente se houver
exclusão confirmada de Legionella sp, pelo antígeno urinário
para este agente.

• PAC tratada em UTI


• PAC grave e choque séptico: a utilização de terapia
combinada, em comparação à monoterapia, oferece maior
benefício ao paciente.
• Em uma revisão sistemática e meta-análise, a associação entre β-
lactâmicos e macrolídeos foi superior à associação β-lactâmico
com quinolonas. Entretanto, estudos randomizados devem ser
realizados para a confirmação desses resultados. As explicações
seriam uma possível coinfecção por patógenos atípicos e/ou
efeitos imunomodulatórios dos macrolídeos e/ou sinergismo de
fármacos.
• Para melhor escolha da terapia combinada, deve-se verificar
se o paciente apresenta fatores de risco para patógenos
específicos, sendo para P. aeruginosa os seguintes fatores:
presença de doença estrutural pulmonar (DPOC com VEF1 <
30%, bronquiectasias ou fibrose cística), neutropenia (<
1.000/mm³), uso crônico de corticosteroides (> 10mg de
prednisona ao dia ou equivalente), uso recente de
antibioticoterapia por mais de 7 dias nos últimos 30 dias,
internação hospitalar recente nos últimos 7 dias.
• Na ausência de fatores de risco para Pseudomonas, poderão
ser utilizadas: associação de β-lactâmico (ceftriaxona ou
cefuroxima) associada à macrolídeo (azitromicina ou
claritromicina) ou β-lactâmico (ceftriaxona ou cefuroxima) e
quinolona respiratória (levofloxacino ou moxifloxacino).
• Na presença de fatores de risco para Pseudomonas, a
preferência se dá pelo uso de quinolonas respiratórias,
piperacilina-tazobactam, meropenem e/ou polimixina B (em
monoterapia ou terapia combinada) conforme a Tabela 3.
• Para community-acquired methicillin-resistant S. aureus (CA-
MRSA, S. aureus meticilina resistentes adquirido na
comunidade) os fatores de risco que merecem consideração são:
internação hospitalar em até 90 dias antes do episódio de
pneumonia, uso prévio de antibióticos por 90 dias e
imunossupressão. Os medicamentos de escolha são aqueles que
inibem a produção de toxina: clindamicina, vancomicina ou
linezolida, que podem ser utilizados em monoterapia,
associados entre si (linezolida e clindamicina ou vancomicina e
clindamicina), ou à rifampicina no caso de cepas resistentes.
• As posologias e as vias de administração dos antibióticos estão
descritos no Quadro 4.
• O tempo ideal de tratamento ainda é muito discutido e sua
duração pode ser diferente conforme a gravidade da PAC.

Tabela 3. Posologia e vias de administração dos antibióticos utilizados no


tratamento da pneumonia adquirida na comunidade.
Fonte: Adaptado de Correa.3

• Avaliação da gravidade e das comorbidades: ocorre por meio


de parâmetros clínicos (ausência de febre por 48 - 72 horas,
melhora clínica) e de parâmetros de resposta laboratorial (queda da
leucocitose, PCR e procalcitonina). Para pacientes que apresentam
boa resposta clínica, pode-se suspender a terapia ao final do 7o dia.
• PAC e suspeita de pneumonia viral por influenza A subtipo
H1N1: uso de antiviral, cobertura para pneumococo e S. aureus,
em casos de suspeita de coinfecção.

• A coparticipação dos vírus e bactérias parece se associar a um


quadro clínico de PAC mais grave.

• Uso de corticosteroide por via sistêmica em pacientes com


PAC grave: redução do número de dias de internação; menores
taxas de falha terapêutica, de progressão radiológica e de
necessidade de ventilação mecânica. Embora os trabalhos recentes
forneçam dados sobre a utilidade dos corticosteroides na PAC
grave, são necessários mais estudos para esclarecer seus efeitos
sobre a mortalidade, dose e tempo de tratamento.

• O Fluxograma 2 sugere o perfil de pacientes que deveriam receber


associação de corticoterapia em vigência de PAC.
Fluxograma 2. Sugestão para a associação de corticoterapia na PAC.
Fonte: Adaptado de Prina.4

• COMPLICAÇÕES
• A maioria dos pacientes com PAC evoluem com boa resposta ao
tratamento, porém 10% a 24% dos pacientes internados e 7%
dos ambulatoriais podem apresentar uma resposta clínica
ineficaz.
• O fracasso terapêutico é fator prognóstico, com mortalidade em
torno de 40%. Espera-se uma melhora clínica progressiva nos
pacientes com PAC após 24 a 72 horas do início da
antibioticoterapia.
• Falência precoce: ocorre nas primeiras 72 horas e, geralmente,
está relacionada à gravidade da infecção primária (por
exemplo, evolução com choque séptico).
• Falência tardia: ocorre após 72 horas devido aos eventos
secundários (por exemplo, perinfecção nosocomial,
exacerbação de comorbidade). Assim, aqueles que não evoluem
bem devem ser investigados quanto aos diversos fatores, entre os
quais:
• Resistência bacteriana: presença de pneumococo de alta
resistência, estafilococo resistente ou Pseudomonas;
• Presença de patógeno não bacteriano (vírus, fungos,
micobactérias típicas ou atípicas);
• Erro relacionado ao antibiótico: antibiótico ou dose inadequada,
ausência de aderência ao tratamento;
• Complicações da pneumonia: derrame pleural complicado,
empiema, pericardite, endocardite, abscesso hepático ou esplênico,
pioartrite, meningite, entre outros – os achados clínicos serão
sugestivos da doença associada;
• Diagnóstico incorreto: considerar métodos diagnósticos
complementares;
• Descompensação de doenças de base (IAM, DPOC, AVC, edema
pulmonar);
• Presença de disfunção de órgãos, choque e evolução para
síndrome do desconforto respiratório agudo.

• PREVENÇÃO
• Os fatores de risco relacionados a PAC devem ser ativamente
procurados e removidos para evitar futuros eventos (Quadro 4).

Fator de risco Intervenção


Tabagismo Cessação
Consumo de álcool Reduzir consumo

Status nutricional Adequação dietética

Contato com crianças Evitar contato com crianças doentes

Higiene oral Avaliação odontológica

Vacinação Contra influenza e pneumococo

Quadro 4. Estratégias de prevenção de PAC.


Fonte: Elaborado pela autora.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO

Fonte: Elaborado pela autora.


EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo feminino, 70 anos, sem
comorbidades, há 10 dias com quadro de tosse com expectoração
amarelada, cefaleia e mialgia. Há 2 dias apresenta dor torácica
ventilatório-dependente e febre (T. ax: 38ºC).

b. Exames Físico: (f = 32 ipm), afebril, consciente, orientada, PA:


130x80 mmHg, FC: 80 bpm, SpO2 = 96% em ar ambiente.

• Ectoscopia: regular estado geral, boa perfusão capilar periférica,


taquipneica.

• Tórax: murmúrio vesicular reduzido, frêmito toracovocal


aumentado, percussão maciça e presença de estertores finos em
base direita.

c. Exames complementares:

• Radiografia de tórax (incidências póstero-anterior e perfil):


opacidade em campo pulmonar inferior direito.

• Exames laboratoriais: leucocitose, ureia: 37 e PCR: 10.


• Estratificação de risco através do CURB-65: 2 pontos (FR
aumentada e idade maior que 65 anos). Indicado tratamento
hospitalar em enfermaria.

d. Prescrição sugerida:

1. Dieta geral oral


2. Ceftriaxona 1 g IV 12/12h
3. Azitromicina 500 mg VO 1x/dia
4. Dipirona 1g IV de 6/6h se dor ou febre (T. ax ≥ 37,8ºC)
5. Enoxaparina 40 mg SC 1x ao dia
6. Cabeceira elevada a 45ºC
7. Fisioterapia respiratória

DICAS DO ESPECIALISTA
• As manifestações clínicas não diferenciam, de maneira confiável,
as diversas etiologias de uma pneumonia, mas existem algumas
pistas epidemiológicas e clínicas que devem ser levadas em
consideração na investigação etiológica da PAC:
• Pneumococo nas formas mais invasivas ou associadas ao
comprometimento sistêmico grave.
• Staphylococcus aureus em usuários de drogas injetáveis.
• S. aureus meticilino-resistente adquirido na comunidade (CA-
MRSA) nas formas de pneumonia necrotizante.
• S. aureus, grupo Enterobacteriaceae e Pseudomonas
aeruginosa após quadros de pneumonia viral, tratamento
prévio com antibiótico ou doenças pulmonares crônicas.
• Mycoplasma em quadros associados de miringite bolhosa,
anemia hemolítica (por crioaglutininas), artralgias.
• Legionella nos quadros de pneumonia grave associado a
hiponatremia, dor abdominal e diarreia em idosos.
• Agentes anaeróbios nos casos de pacientes com doença
periodontal grave; pneumonia necrotizante ou abscesso
pulmonar.
• Conhecer a epidemiologia local e o histórico de viagens do
paciente (por exemplo, fungos endêmicos, como Histoplasma,
Coccidioides, Blastomyces e Paracoccidioides spp; hantavírus) e
de exposições específicas.
• A melhora clínica da pneumonia dá-se precocemente, diferente da
resolução radiológica, que pode ocorrer após várias semanas. O
controle radiográfico após tratamento é importante,
principalmente em indivíduos tabagistas, pacientes acima de 50
anos e/ou portadores de DPOC, pelo alto risco nesse grupo de
câncer de pulmão. A imagem deve ser repetida dentro de 6
semanas, e a persistência da consolidação/opacidade sugere a
investigação com exames adicionais. Naqueles com persistência
dos sintomas clínicos ou achados anormais ao exame físico, a
radiografia de tórax de controle também está indicada.

• O uso dos biomarcadores (PCR e procalcitonina) deve ser


complementar à avaliação clínica, e não ser tomado como
critério isolado para estabelecer ou modificar a conduta
terapêutica.

• A diferenciação da pneumonia de outras doenças não infecciosas


(como, por exemplo, insuficiência cardíaca) pode ser difícil em
alguns casos, e biomarcadores, como o peptídeo natriurético
cerebral (BNP) e a procalcitonina, podem evitar o uso indevido de
antibióticos.

REFERÊNCIAS
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brasileiras para pneumonia adquirida na comunidade em adultos imunocompetentes. J Bras
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1097-108.
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Recomendações para o manejo da pneumonia adquirida na comunidade, 2018. J Bras
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4. Prina E, Ceccato A, Torres A. New aspects in the management of pneumonia. Crit Care.
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Tisiologia (SBPT), 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2017.
6. Pereira CAC, Holanda MA. Medicina Respiratória. São Paulo: Atheneu; 2015, v. 2.
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corticosteroids on treatment failure among hospitalized patients with severe community-
acquired pneumonia and high inflammatory response. JAMA. 2015; 313(7): 677-86.
8. Wunderink RG. Corticosteroids for severe community-acquired pneumonia: not for
everyone. JAMA, 2015; 313(7): 673-4.
9. Faresin SM, Santoro IL, Llarges CM. Perfeito JAJ. Guias de medicina ambulatorial e
hospitalar da EPM-UNIFESP – Pneumologia. São Paulo: Manole; 2014, v. 2.
10. Lim WS, Baudouin SV, George RC, Hill AT, Jamieson C, Le Jeune I, et al. British Thoracic
Society guidelines for the management of community acquired pneumonia in adults. Thorax.
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11. Woodhead M, Blasi F, Ewig S, Garau J, Huchon G, Ieven M, et al. Guidelines for the
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59.
12. Ministério da Saúde (BR). Datasus. Ministério da Saúde. [Internet]. [acesso em 6 jun 2020].
Disponível em: www.datasus.com.br.
13. Martins MA, Morinaga CV, Oliveira JC, Ivanovic LF, Jorge MCP, Favarato MHS, et al.
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14. Ewig S, Hendrik S, Torres A. Severity assessment in community-acquired pneumonia. Eur
Respir J. 2000; 16(6): 1193-201.
15. Lanks CW, Musani AI, Hsia DW. Community-acquired Pneumonia and Hospital Acquired
Pneumonia, Med Clin North Am. 2019; 103(3): 487-501.
6.6
PNEUMONIA NOSOCOMIAL
Autora:
Ana Carolina Lima Resende

DEFINIÇÕES
• Pneumonia nosocomial (PN): é definida como infecção do
parênquima pulmonar que ocorre 48 horas após a admissão
hospitalar, podendo-se subdividir em pneumonia adquirida no
hospital (PAH) ou pneumonia associada à ventilação mecânica
(PAV).

• A PAH é definida como processo pneumônico que surge após 48


horas da admissão hospitalar. Na PAV, a infecção ocorre 48
horas após intubação orotraqueal.

• Este é um tema importante devido à sua frequência, constituindo a


segunda causa mais comum de infecção hospitalar, afetando cerca
de 0,5 a 2% dos pacientes internados.

• A PN eleva de forma significativa a mortalidade estimada em até


50%, além de correlacionar-se com aumento de morbidade,
elevação de custos e aumento do tempo de internação hospitalar.

• Pode ser dividida temporalmente em PN precoce ou tardia,


visando estimar o agente etiológico envolvido e,
consequentemente, guiar a terapêutica:
• PN precoce: ocorre nos primeiros 4 dias de internação ou até 4
dias após intubação orotraqueal, sugerindo etiologia de
micoorganismos provenientes da comunidade.
• PN tardia: ocorre após 5 dias de internação ou de intubação
orotraqueal. Geralmente associada a microrganismos
multirresistentes.

• Além destas definições citadas, é importante salientar a definição


de traqueobronquite hospitalar (TH), definida como sinais e
sintomas semelhantes à pneumonia; todavia, sem evidência
radiológica de acometimento pulmonar ou progressão de achado
prévio.

• Finalmente, a pneumonia relacionada a cuidados de saúde


(asilos, centro de hemodiálise, hospital dia, centros de
quimioterapia) não é mais incluída na definição de PN, visto que
esses pacientes aparentemente não estão sob maior risco de
acometimento por germes multirresistentes (GMR). Nessa
população, as características individuais são melhores preditores de
infecção por GMR do que o contato prévio com instalações de
cuidado médico.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Os agentes etiológicos e a sensibilidade antimicrobiana das
bactérias podem variar de acordo com o perfil bacteriano
hospitalar, as características do paciente, o uso prévio de
antibióticos e o período de aquisição (precoce ou tardia). De modo
geral, na PN há prevalência etiológica de bacilos gram-negativos
(55% a 85% dos casos por Pseudomonas, Acinetobacter e
enterobactérias) e Staphylococcus aureus. Além disso, 30 a 70%
dos casos podem ter causa polimicrobiana.

• Pneumonia nosocomial secundária a vírus ou fungos é


significativamente menos comum, exceto em imunossuprimidos.
• De maneira simplificada, podemos correlacionar o tempo de
aquisição da infecção e sua etiologia:
• PN precoce: pacientes sem internação prévia e sem uso de
antibióticos: Streptococcus pneumoniae, Haemophyllus e
Staphylococcus aureus oxacilino-sensível. Há neste grupo baixa
prevalência de bactérias multirresistentes.
• PN tardia: bacilos gram-negativos aeróbios (Klebsiella,
enterobactérias, Pseudomonas, Acinetobacter) e Staphylococcus
aureus oxacilino-resistente. Neste grupo há alta prevalência de
bactérias multirresistentes.

• O principal mecanismo fisiopatológico é a microaspiração para


via aérea inferior de microrganismos patogênicos que colonizam as
vias aéreas superiores (orofaringe) ou estômago. Dependendo da
virulência, magnitude do inóculo bacteriano e da resposta
imunológica do hospedeiro, pode-se desenvolver PN.
• A fibronectina impede a aderência de bactérias gram-negativas
na orofaringe ou mucosa traqueobrônquica. Sua ação pode estar
minimizada em condições como desnutrição, pós-operatório e
enfermidades graves, predispondo a proliferação bacteriana.
• Medidas que elevem pH gástrico (pH > 4) podem predispor a
replicação bacteriana no estômago, aumentando a chance de
colonização da orofaringe.
• Pacientes em ventilação mecânica (VM) não possuem
mecanismos de defesa da via aérea, como a tosse, facilitando a
aspiração e o desenvolvimento de PAV. A colonização das vias
respiratórias, em pacientes críticos, pode chegar a 45% nas
primeiras 72 horas.

• Outros mecanismos fisiopatológicos são:


• Inalação de aerossóis contaminados.
• Invasão direta do microrganismo por foco contíguo.
• Disseminação hematogênica (foco extrapulmonar, colonização
de catéteres, translocação bacteriana intestinal).
• Inoculação direta nas vias aéreas inferiores em pacientes sob
VM.

QUADRO CLÍNICO
• O quadro clínico da PN é caracterizado por sinais e sintomas
relacionados à síndrome infecciosa.

• Para que o diagnóstico de PN seja feito de forma correta, deve-se


levar em conta os aspectos clínicos, radiológicos, laboratoriais e
microbiológicos.

• Alguns fatores de risco para o desenvolvimento de PN são bem


estabelecidos na literatura médica e estão exemplificados no
Quadro 1.

ASSOCIADOS AO PACIENTE:
- Cirurgia torácica ou abdominal
- Idosos - Grande queimado
- Redução do nível de consciência - Politraumatismos
- Acidente vascular encefálico - Desnutrição
- Trauma cranioencefálico - Hipoalbuminemia
- Broncoaspiração - Comorbidades com disfunções orgânicas
- Tabagismo - Doenças imunossupressoras
- DPOC - Uso de drogas imunossupressoras
- SDRA - Pacientes institucionalizados
- Doenças pulmonares intersticiais
- Doenças neuromusculares
- Aspiração pulmonar

ASSOCIADOS À TERAPÊUTICA:
- Terapia antimicrobiana nos últimos 90 dias
- Resistência prévia à antibioticoterapia
- Hospitalização prolongada
- Decúbito inferior 30-45°
- Uso de bloqueador H2 ou antiácidos
- Hiperdistensão gástrica
- Uso de sondas (oro ou nasoenteral)
- Má higiene das mãos e equipamentos/dispositivos
- Higiene oral inadequada
- Necessidade de ventilação mecânica invasiva

Quadro 1. Fatores de Risco para Pneumonia Nosocomial.


Fonte: Adaptado de Kalil.2

• Na tentativa de aumentar a acurácia diagnóstica da PN, inúmeras


escalas clínicas foram criadas. Especificamente para PAV, o
Clinical Pulmonary Infection Score (CPIS) foi amplamente
utilizado (Tabela 1). Uma pontuação maior que 6 pontos possui
sensibilidade de 72% e especificidade de 85% para o diagnóstico
de PAV, todavia, atingir tal pontuação não é comum na prática
clínica. A relação PaO2/FiO2 e a alteração radiológica são,
respectivamente, os parâmetros com melhor e pior correlação
diagnóstica.

Temperatura oC

• ≥ 36.5 e ≤ 38.4 = 0 ponto


• ≥ 38.5 e ≤ 38.9 = 1 ponto
• ≥ 39.0 e ≤ 36.0 = 2 pontos

Leucometria sanguínea (por mm3)

• ≥ 4.000 e ≤ 11.000 = 0 ponto


• < 4.000 ou > 11.000 = 1 ponto + bastões ≥ 500 = + 1 ponto
Secreção traqueal (0-4+, cada aspiração, total/dia)

• < 14+ = 0 ponto


• ≥ 14+ = 1 ponto + secreção purulenta = + 1 ponto
Índice de oxigenação: PaO2 / FiO2+ mmHg
• < 240 ou SARA = 0 ponto
• ≤ 240 e ausência de SARA = 2 pontos
Radiografia do tórax

• Sem infiltrado = 0 ponto


• Infiltrado difuso = 1 ponto
• Infiltrado localizado = 2 pontos
Cultura semiquantitativa do aspirado traqueal (0 - 1 - 2 ou 3+)

• Cultura de bactéria patogênica ≤ 1 + ou sem crescimento = 0 ponto


• Cultura de bactéria patogênica > 1 + = 1 ponto + mesma bactéria identificada ao
Gram > 1 + = + 1 ponto

Tabela 1. Clinical Pulmonary Infection Score (CPIS).


Fonte: Adaptado de Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.1

• Apesar disso, o consenso da ATS/ISDA de 2016 recomenda o


diagnóstico clínico baseado no surgimento ou agravamento de
infiltrado pulmonar na radiografia, associado a pelo menos 2
outros critérios (febre, leucocitose, leucopenia, secreção purulenta
ou queda da relação PaO2/FiO2) em detrimento do uso do CPIS no
diagnóstico de PN.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: alteração do estado geral, taquipneia, pode haver
sinais de choque séptico, a depender da gravidade do quadro
(como: hipotensão, taquicardia, aumento do tempo de enchimento
capilar), cianose, queda na saturação periférica de O2 (medida na
oximetria de pulso); pode ser observada ainda no paciente sob VM
a presença de secreção purulenta.

• Ausculta respiratória: redução ou ausência de murmúrio


vesicular associada a macicez à percussão sob a área de
consolidação; presença de estertores finos ou grossos, estes
podendo estar associados a roncos e sibilos, a depender do
comprometimento pulmonar e do grau de obstrução das vias
aéreas.

EXAMES COMPLEMENTARES
a. ANÁLISE LABORATORIAL

• Marcadores biológicos de inflamação são comumente utilizados


para diagnóstico, definição de gravidade e seguimento de paciente
com PN. Os marcadores mais estudados são a proteína C reativa
(PCR) e a procalcitonina (PCT).

• A PCR é uma proteína de fase aguda que pode elevar-se em


condições inflamatórias, porém, quando atinge valores superiores a
100 mg/L, apresenta forte correlação com processo infeccioso,
particularmente relacionado a agentes bacterianos. Em
contrapartida, inúmeros estudos mostraram que, quando
comparados, os níveis séricos de PCR em paciente submetidos à
ventilação mecânica com PAV e sem pneumonia são semelhantes.

• A PCT, um precursor da calcitonina, é secretada pela tireoide e


pelo pulmão, apresentando valores baixos em indivíduos saudáveis
(< 0,01 ng/mL). As endotoxinas relacionadas às infecções
bacterianas são capazes de aumentar rapidamente a produção de
PCT, porém também podem aumentar na vigência de infecções
virais e condições inflamatórias. Estudos combinados apontam
para uma sensibilidade e especificidade de 67% e 83%,
respectivamente, para o diagnóstico de PN.
• O consenso da ATS/ISDA de 2016 aponta mais uma vez para a
superioridade do diagnóstico clínico sobre o uso de marcadores
inflamatórios no diagnóstico ou seguimento dos pacientes com
PN. A acurácia insuficiente para excluir ou confirmar o processo
infeccioso foi o principal critério levado em consideração.

b. ANÁLISE MICROBIOLÓGICA

• Diversos métodos microbiológicos podem ser realizados para a


obtenção do agente infeccioso causador da PN, não sendo
excludentes entre si.

• Hemoculturas são práticas, amplamente disponíveis, todavia de


baixa sensibilidade. Sempre devem ser solicitadas anteriormente ao
início da antibioticoterapia e conforme necessidade médica.

• A cultura da secreção pulmonar, obtida através de escarro,


aspiração traqueal, lavado broncoalveolar (LBA) ou escovado
traqueal, possui acurácia variável, dependendo do método utilizado
e do crescimento bacteriano presentes na amostra, tendo, por
exemplo, 60% a 80% sensibilidade e 70% a 90% de especificidade
para o LBA, quando há um número maior ou igual a 10.000 UFC.

• A análise microbiológica ainda auxilia na diferenciação entre PN


de TH, sendo nesta o crescimento no LBA menor que 10.000 UFC
e no escovado pulmonar menor que 1.000 UFC.

• A Tabela 2 mostra valores relevantes a serem considerados para o


crescimento bacteriano na PN em secreções pulmonares diversas.
Escovado protegido (EP): Maior ou igual 1.000 UFC

Lavado Broncoalveolar (LBA): Maior ou igual 10.000 UFC

Aspirado Traqueal (AT): Maior ou igual 100.000 UFC


Tabela 2. Valores relevantes da análise da secreção pulmonar, por meios
diversos, para crescimento bacteriano na pneumonia nosocomial.
Fonte: Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.1

• Outras formas de se identificar o agente etiológico são através da


análise do líquido pleural (toracocentese ou drenagem pleural
inicial) ou de biópsia pulmonar (principalmente em
imunossuprimidos, na diferenciação de agentes etiológicos,
incluindo vírus e fungos).

• Seguindo o consenso da ATS/ISDA de 2016, preconiza-se o uso


de culturas semiquantitativas não invasivas (aspirado traqueal)
para diagnóstico de PAV, em detrimento de culturas invasivas
(LBA ou escovado traqueal).

c. ANÁLISE RADIOLÓGICA

• A radiografia de tórax ainda hoje é o exame de imagem mais


utilizado na investigação de pneumonia. Apesar disso, possui baixo
valor preditivo positivo, correlação interobservador ruim, além de
limitações para exclusão de outros diagnósticos diferenciais.
Opacidades pulmonares podem decorrer de hipervolemia, edema
pulmonar cardiogênico, neoplasia ou hemorragia alveolar.

• A tomografia de tórax vem ganhando cada vez mais espaço nas


últimas décadas, auxiliando no diagnóstico precoce de PN e suas
complicações. O exame contrastado pode acrescentar informações
importantes na avaliação de complicações pleurais (empiema) ou
cardiocirculatórias (tromboembolia pulmonar).

• A ultrassonografia de tórax constitui um método rápido e


prático, podendo ser realizado à beira do leito, sem expor o
paciente à energia ionizante. Ela auxilia no diagnóstico de PN, bem
como de eventuais complicações (derrame pleural).
DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• Conforme citado anteriormente, o diagnóstico de PN pode ser
desafiador, devendo ser realizado através da análise dos aspectos
clínicos, radiológicos, laboratoriais e microbiológicos.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Suporte ventilatório com oxigênio suplementar pode ser


necessário e objetiva-se manter a saturação periférica de oxigênio
maior ou igual a 94%, com o menor fluxo de oxigênio possível.

• Fisioterapia respiratória e manejo de secreção nas vias aéreas


são importantes durante a internação hospitalar.

b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Objetivos do tratamento: a terapia precoce e adequada da PN


está diretamente relacionada à sobrevida do paciente, tendo sido
demonstrado que, naqueles em que a antibioticoterapia foi
assertiva, a sobrevida foi, no mínimo, duas vezes maior.

• Diante da suspeita de PN, a opção por iniciar antibioticoterapia


mesmo antes do isolamento do agente etiológico responsável, ou
seja, tratamento empírico, deve levar em conta os benefícios do
tratamento precoce (redução de mortalidade) e os potenciais
malefícios (efeitos adversos associados aos antimicrobianos e
aumento da resistência bacteriana).

• O uso racional dos antimicrobianos depende de três fatores


fundamentais: o perfil microbiológico do hospital, os fatores de
risco do indivíduo e o uso prévio de antibiótico.
A Tabela 3 identifica os fatores de risco para os germes
multirresistentes.

Tabela 3. Fatores de risco para germes multirresistentes nas pneumonias


nosocomiais.
Fonte: Adaptado de Kalil.2

c. TRATAMENTO EMPÍRICO NA PAV

• Para pacientes com PAV, a cobertura antimicrobiana deve incluir


P. aeruginosa, bacilos gram-negativos (BGN) e S. aureus.

• Na presença de fatores de risco para S.


aureus resistentes à meticilina (MRSA) – uso prévio de
antibiótico endovenoso, unidade hospitalar (UH) com prevalência
desconhecida ou superior a 20% de MRSA – vancomicina ou
linezolida devem ser acrescidos à terapia inicial (Tabela 4). Na
ausência desses fatores, esquemas contendo
piperacilina/tazobactam, cefepima, levofloxacino, imipenem ou
meropenem são adequados.

• Com relação a Pseudomonas, a presença de fatores de risco para


resistência (Tabela 3), bem como prevalência desconhecida ou
maior que 10% de BGN multirresistente na UH, deve ser seguida
pela prescrição de duas drogas com atividade antipseudomonas de
classes distintas (Tabela 4). A opção por aminoglicosídeo e
colistina deve ser considerada como segunda linha no tratamento
empírico devido ao perfil de toxicidade menos favorável destas
drogas. Caso não haja fatores de risco para BGN resistente,
utilizar, preferencialmente, apenas uma droga antipseudomonas da
classe dos betalactâmicos.

Antibióticos para gram-


Antibióticos para
Antibióticos para negativos
gram-negativos com
gram-positivos com com atividade
atividade antipseudomona (não B-
atividade contra MRSA antipseudomonas
lactâmicos)
(B-lactâmicos)

Glicopeptídeos Penicilinas antipseudomonas Fluoroquinolonas

Vancomicina 15 mg/kg a cada 8-12h Piperaciclina-Tazobactam Ciprofloxacino 400 mg a cada 8h ou


(considerar em casos graves dose inicial de 4,5 g a cada 6h Levofloxacino 750 mg a cada 24h
25-30 mg/kg) OU OU
OU

Oxazolidinonas Cefalosporinas Aminoglicosídeos

Linezolida 600 mg IV a cada 12h Cefepima 2 g a cada 8h ou Amicacina 15-20 mg/kg a cada 24h ou
Ceftazidima 2 g a cada 8h Gentamicina 5-7 mg/kg a cada 24h ou
OU Tobramicina 5-7 mg/kg a cada 24h
OU

Carbapenêmicos Polimixinas

Imipenem 500 mg a cada 6h ou Colistina 5 mg/kg (dose de ataque) seguida de


Meropenem 1 g a cada 8h 2,5 mg x (1,5 x CrCl + 30) a cada 12h (dose de
OU manutenção) ou
Polimixina B 2,5-3 mg/kg/dia dividida em 2
doses

Monobactâmicos
Aztreonam 2 g a cada 8h

As doses iniciais sugeridas na tabela devem ser modificadas em pacientes com disfunção hepática ou renal.

Tabela 4. Tratamento de PAV.


Fonte: Adaptado de Kalil.2

d. TRATAMENTO EMPÍRICO NA PAH

• As recomendações de cobertura para S. aureus, Pseudomonas e


BGN são semelhantes aos pacientes com PAV.
• Pacientes com fatores de risco relacionados à elevada
mortalidade (choque séptico ou necessidade de ventilação
mecânica) também devem receber cobertura empírica para
MRSA (Tabela 5).

Sem risco de alta Sem risco de alta Risco para alta


mortalidade e sem mortalidade, mas mortalidade ou uso
fatores de risco com fatores risco prévio de antibiótico intravenoso
para MRSA para MRSA (últimos 90 dias)

Dois dos abaixo, evitando


Um dos abaixo: Um dos abaixo:
2 beta-lactâmicos:

Piperaciclina + Tazobactam 4,5 g a cada Piperaciclina + Tazobactam 4,5g a Piperaciclina + Tazobactam 4,5g cada 6
6 horas cada 6 horas horas
OU OU OU

Cefepima 2 g a cada 8h Cefepima 2 g cada 8h ou Cefepima 2 g cada 8h ou


OU Ceftazidima 2 g cada 8h OU Ceftazidima 2 g cada 8h
OU

Levofloxacino 750 mg a cada 24h Levofloxacino 750 mg a cada 24h ou Levofloxacino 750 mg a cada 24h ou
OU Ciprofloxacino 400 mg cada 8h Ciprofloxacino 400 mg cada 8h
OU OU

Imipenem 500 mg cada 6h ou Imipenem 500 mg cada 6h ou Imipenem 500 mg cada 6h ou


Meropenem 1 g a cada 8h Meropenem 1 g a cada 8h Meropenem 1 g a cada 8h
OU OU

Aztreonam 2 g cada 8h Amicacina 15-20 mg/Kg cada 24h ou


Gentamicina 5-7 mg/Kg cada 24h ou
Tobramicina 5-7 mg/Kg cada 24h
OU

Aztreonam 2 g cada 8h

Associado a: Vancomicina 15 mg/kg a Associado a: Vancomicina 15 mg/kg a cada


cada 8-12h (considerar em casos graves 8-12h (considerar em casos graves dose
dose inicial de 25-30 mg/kg) ou inicial de 25-30 mg/kg) ou Linezolida 600
Linezolida 600 mg a cada 12h mg a cada 12h
Obs.: se não for cobrir MRSA, incluir
cobertura para MSSA*

*A cobertura para MSSA (Staphylococcus aureus meticilino sensível) deve ser feita com Piperacilina-tazobactam, Cefepima,
Levofloxacino, Imipenem ou Meropenem. Oxacilina, Nafcilina ou Cefazolina são preferíveis para o tratamento de MSSA, porém não
devem ser usadas no regime empírico de pneumonia hospitalar.

Tabela 5. Tratamento da PAH.


Fonte: Adaptado de Kalil.2

e. OTIMIZAÇÃO DOS ANTIMICROBIANOS


• A escolha adequada do antibiótico deve ser acompanhada pela
avaliação dos aspectos de farmacocinética e farmacodinâmica.
Detalhes como penetração da droga, tempo de infusão, intervalo de
administração, dose ajustada para o peso e disfunção de órgão
específico, além de dosagem do nível sérico, são parâmetros a
serem considerados durante o tratamento da PN.

f. TERAPIA GUIADA PARA AGENTE ESPECÍFICO

• Uma vez identificado, a terapia deve ser guiada de acordo com a


suscetibilidade do microrganismo identificado através do
antibiograma. Além disso, o estreitamento do espectro antibiótico
(descalonamento) deve ser realizado quando possível.

• Em caso de PN por Pseudomonas, o uso de terapia combinada


deve ser mantido, mesmo após antibiograma, nos pacientes em
ventilação mecânica ou durante a fase de instabilidade
hemodinâmica. Nos demais, opta-se por seguir em monoterapia.
Deve ser evitada a monoterapia com aminoglicosídeos,
independentemente da gravidade e da sensibilidade à droga.

• Na PN por Acinetobacter, deve-se dar preferência ao uso de


carbapenêmicos ou ampicilina/sulbactam caso haja sensibilidade a
esses agentes. Polimixina deve ser utilizada em caso de germes
resistentes aos carbapenêmicos, podendo, inclusive, ser associada à
colistina inalatória.

g. TEMPO DE TRATAMENTO

• O tempo de tratamento preconizado atualmente é de sete dias,


devendo ser individualizado de acordo com os aspectos clínicos,
radiológicos e laboratoriais de cada paciente.
• Marcadores como a procalcitonina, quando associada a critérios
clínicos, podem auxiliar na interrupção precoce do esquema
antimicrobiano.

• Em casos de BGN não fermentadores, terapia estendida ainda é


a recomendação.

• A redução no tempo de tratamento está relacionada à redução de


custos e efeitos adversos, sem aumentar a recorrência da doença ou
impacto na mortalidade.

h. PACIENTE IMUNOSSUPRIMIDO

• Esse perfil de paciente vem se tornando cada vez mais comum nos
hospitais, devendo receber atenção especial, já que pode
apresentar PN relacionada a microrganismos pouco comuns ou
até mesmo por mais de um patógeno. Dessa forma, a terapêutica
deve ter um espectro ampliado, sendo analisada a possibilidade de
envolvimento pulmonar por vírus e fungos, através de métodos
diagnósticos específicos.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
PN: pneumonia nosocomial; EV: endovenoso; VM: ventilação mecânica; SDRA: síndrome do desconforto respiratório
agudo; MDR: multidrogarresistente; MRSA: S. aureus meticilino resistente; BGN: bacilo gram-negativo; UH: unidade
hospitalar.

Fluxograma para diagnóstico e tratamento da pneumonia nosocomial.


Fonte: Elaborado pela autora.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 70 anos, hipertenso (faz
uso regular de enalapril), encontra-se internado no quinto dia pós-
operatório de cirurgia para correção de fratura de fêmur. Nega história
de internação ou antibiótico recentes. Evolui clinicamente com
dispneia, tosse produtiva (expectoração amarelada) e febre (38,8°C).
Segue normotenso.
b. Ausculta pulmonar: com murmúrio vesicular reduzido, frêmito
aumentado, percussão maciça e estertores finos em base esquerda.
Eupneico, sem uso de musculatura acessória, SpO2 95% em ar
ambiente.
c. Exames complementares: Radiografia de tórax em incidências
anteroposterior evidenciando consolidação em base direita com
broncograma aéreo (não evidente em imagem pré-operatória);
leucocitose sem desvio à esquerda; PCR: 120 mg/L; sem disfunção de
órgãos.
d. Diagnóstico: paciente com sinais clínicos, laboratoriais e de
imagem compatíveis com pneumonia, a qual se desenvolveu a partir do
quinto dia de internação hospitalar. Trata-se de pneumonia nosocomial
tardia, sendo o tempo de internação o único fator de risco para germes
multirresistentes. Considerando que a unidade hospitalar em que o
paciente se encontra tem prevalência inferior a 20% de MRSA e
inferior a 10% de BGN, devemos iniciar esquema antimicrobiano
empírico para BGN, com uma droga antipseudomonas,
preferencialmente da classe dos betalactâmicos.
e. Prescrição sugerida:

1. Dieta geral hipossódica


2. Cabeceira elevada a 45°
3. Enalapril 10 mg VO de 12/12 horas
4. Piperacilina-tazobactam 4,5 g EV de 6/6 horas
5. Enoxaparina 40 mg SC 1 vez ao dia
6. Dipirona 1 g EV se febre (T > 37,8° C) ou dor
7. Fisioterapia respiratória

DICAS DO ESPECIALISTA
• A PN possui elevada incidência, morbimortalidade e impacto
econômico em nosso meio, tornando-se um relevante problema de
saúde pública. Dessa forma, a prevenção desta patologia tem
extrema relevância.

• Os probióticos e cuidados bucais com clorexidina são medidas


benéficas potenciais na prevenção de PN, mas são necessários mais
dados sobre sua segurança e eficácia antes de sua ampla prescrição.

• Algumas medidas profiláticas podem ser implementadas, como:


reduzir taxas de intubação orotraqueal utilizando métodos
alternativos para ventilação (oxigênio de alto fluxo ou ventilação
mecânica não invasiva, se apropriado), minimizando a sedação e
evitando uso de bloqueadores neuromusculares; realizar técnicas
adequadas de assepsia dos dispositivos de terapia respiratória
(nebulizadores, máscaras, cateteres); mobilizar os pacientes
precocemente; fornecer cuidados orais com água estéril; e elevar a
cabeceira da cama.

• O diagnóstico é um desafio clínico, sendo sempre necessária a


análise conjunta de fatores clínicos, laboratoriais,
microbiológicos e radiológicos.

• Estabelecido o diagnóstico, deve-se iniciar prontamente a


terapêutica necessária, levando em consideração a microbiota
local e os fatores de risco do paciente, minimizando o retardo e a
falha de tratamento.
• Não há, até o momento, estudos que comprovem a eficácia do uso
de corticóides, mas alguns demonstram benefício em pacientes
graves, com PCR elevado, além da indicação bem estabelecida do
uso nos pacientes com choque séptico refratário.

• A melhora radiológica dos pacientes com PN é mais lenta.


• Envolvimento pulmonar multilobar, desnutrição, presença de lesão
escavada ou pneumonia necrotizante causadas por BGN estão
associados a resolução mais lenta e, nestes casos, pode ser
necessário estender o tempo de tratamento, em geral de 14 a 21
dias.

• São necessárias 48-72 horas de tratamento para se observar


melhora clínica nos pacientes com pneumonia. Alguns
parâmetros são indicadores de resposta terapêutica: diminuição ou
cessação da febre, redução da quantidade e melhora do aspecto de
secreção brônquica, queda de leucocitose; quando em ventilação
mecânica, observamos melhora da oxigenação (relação PaO2/FiO2),
redução dos parâmetros ventilatórios e estabilidade hemodinâmica.

• Na falência terapêutica, deve-se investigar: diagnósticos


alternativos à pneumonia (como neoplasia, pneumonia em
organização); complicações associadas (como abscesso, derrame
pleural, empiema); cobertura inadequada da antibioticoterapia.

REFERÊNCIAS
1. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes brasileiras para tratamento das
pneumonias adquiridas no hospital e das associadas à ventilação mecânica – 2007. J Bras
Pneumol. 2007; 33(Supl 1): S1-S30.
2. Kalil AC, Metersky ML, Klompas M, Muscedere J, Sweeney DA, Palmer LB, et al.
Management of Adults With Hospital-acquired and Ventilator-associated Pneumonia: 2016
Clinical Practice Guidelines by the Infectious Diseases Society of America and the
American Thoracic Society. Clin Infect Dis. 2016; 63(1): 61-111.
3. Lanks CW, Musani AI, Hsia DW. Community-acquired Pneumonia and Hospital-acquired
Pneumonia. Med Clin North Am. 2019; 103(3): 487-501.
4. Klompas M. Prevention of Intensive Care Unit-Acquired Pneumonia. Semin Respir Crit Care
Med. 2019; 40(04): 548-57.
5. Corrêa RA. Pneumonia Adquirida no Hospital. Prática Pneumológica. 2. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 2017.
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pneumonia. Curr Opin Pulm Med. 2019; 25(3): 263-70.
7. Almirall J, Serra-Prat M, Bolibar I. Risk factors for community-acquired pneumonia in
adults: a review. Respiratory Infections. Clin Pulm Med. 2016; 23: 99-104.
8. Harris AM, Hicks LA, Qaseem A. Appropriate Antibiotic use for acute respiratory tract
infection in adults: advice for high-value care from the American College of Physicians and
the Centers for Disease Control and Prevention. Ann Intern Med. 2016; 164(6): 425-34.
9. Teixeira PJZ, Lisboa T. Pneumonia Adquirida no Hospital. Medicina Respiratória. 1. ed. São
Paulo: Atheneu; 2014.
10. Restrepo MI, Peterson J, Fernandez JF, Qin Z, Fischer AC, Nicholson SC. Comparison of
the Bacterial Etiology of Early-Onset and Late-Onset Ventilator-Associated Pneumonia in
Subjects Enrolled in2 Large Clinical Studies. Respir Care. 2014; 58(7): 1220-5.
11. Biasi A, Ísola AM, Gama AMC, Duarte A, Viana A, Serpa Neto, A. I Forum de Diretrizes
da AMIB e SBPT. Diretrizes Brasileiras de Ventilação Mecânica. 2013; 1-135.
12. Su LS, Meng K, Zhang X, Wang HJ, Yan P, Jia YH, et al. Diagnosing ventilator-associated
pneumonia in critically ill patients with sepsis. Am J Crit Care. 2012; (21): 110-9.
6.7
INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA
AGUDA
Autor:
Rodolfo Augusto Bacelar de Athayde

DEFINIÇÕES
• Insuficiência Respiratória Aguda (IRpA) é a incapacidade
instalada ao longo de horas ou dias do sistema respiratório em
realizar adequadamente as trocas gasosas.

• Objetivamente, pode ser definida como hipoxemia (PaO < 602

mmHg em ar ambiente) e/ou hipercapnia (PaCO2 > 50 mmHg),


com pH < 7,35, usualmente com necessidade de suplementação de
oxigênio e, muitas vezes, de suporte ventilatório.

• Quando há a suspeita de IRpA, é importante definir qual o


fenômeno responsável pela insuficiência instalada.

• Uma medida útil para essa classificação é o gradiente alvéolo-


arterial de oxigênio (GA-a). Essa medida permitirá identificar se o
problema é fundamentalmente ventilatório (GA-a normal) ou se há
déficit na troca gasosa propriamente dita ou na captação arterial de
oxigênio (GA-a aumentado).

• O GA-a pode ser calculado com base em resultado de gasometria


arterial colhida em ar ambiente (para mais detalhes, veja seção
Diagnóstico e Classificação).
• Quando submetido à ventilação mecânica (VM) com ar inspirado
enriquecido de oxigênio, isto é, com frações inspiradas de O2
(FiO2) superiores a 21%, a PaO2 pode estar normal mesmo em
casos de IRpA hipoxêmica. Nessa situação, evidencia-se a queda
da oxigenação como uma redução da relação PaO2/FIO2 para
valores abaixo de 300 mmHg.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Didaticamente, a IRpA pode ser dividida em 2 tipos, que podem
acontecer de maneira isolada ou em associação (Figura 1):
• Tipo I (Hipoxêmica) – PaO2 < 60 mmHg, com GA-a
aumentado;
• Tipo II (Hipercápnica) – PaCO2 > 50 mmHg, com GA-a
normal.

• A IRpA Tipo I pode ser explicada por 4 mecanismos básicos:


• Distúrbio V/Q: causa mais comum de hipoxemia, ocorre
quando áreas ventiladas são mal perfundidas (efeito espaço
morto) – ou quando áreas perfundidas são mal ventiladas (efeito
shunt).
• Shunt verdadeiro: caracteriza-se por hipoxemia com resposta
pobre à suplementação com oxigênio. Nele, áreas em que há
ausência total de ventilação (como atelectasias, consolidações)
são ainda perfundidas, fazendo com que sangue venoso pouco
oxigenado se misture ao sangue arterial.
• Alterações de difusão da membrana alveolocapilar: situação
menos comum, principalmente em formas agudas, caracterizada
por perda de eficiência da membrana alveolocapilar, área de
contato entre a parede alveolar e o capilar, responsável pela troca
gasosa entre o alvéolo e a hemácia.
• Redução da FiO2: como em elevadas altitudes.

• A IRpA Tipo II é caracterizada por uma redução da ventilação


alveolar. Nessa situação, hipoxemia e hipercapnia tendem a
acontecer de forma proporcional devido à quantidade insuficiente
de ar que entra e sai dos pulmões. Pode acontecer em diversas
condições:
• Afecções do sistema nervoso central (SNC) que comprometam o
centro respiratório, como intoxicação por opioide,
benzodiazepínicos, álcool, ou como acometimentos primários do
SNC tal qual a síndrome de Ondine (Síndrome de
Hipoventilação Central Congênita).
• Alterações do sistema nervoso periférico (SNP), da placa
muscular ou da musculatura respiratória, como miastenia gravis,
polirradiculoneurite aguda, esclerose lateral amiotrófica, entre
outras.
• Alterações da caixa torácica que diminuem a expansibilidade da
mesma, como em casos extremos de cifoescoliose.
• Afecções mistas, como a Síndrome de Obesidade-
Hipoventilação, em que se somam os efeitos de retenção de CO2
pelos eventos obstrutivos da Apneia do Sono, a sobrecarga
ventilatória pela obesidade, uma menor expansibilidade pelo
volume abdominal e a presença de um menor drive ventilatório
por fenômeno de resistência leptínica.

QUADRO CLÍNICO
• As manifestações clínicas incluem diversos sinais e sintomas,
conforme a causa da IRpA.

• Na anamnese, investiga-se sempre ativamente história de dispneia,


sibilância, tosse, febre, anorexia, mialgia, fraqueza muscular
proximal.

• É importante caracterizar a dispneia: sua intensidade, se em


repouso ou aos esforços, se há ortopneia (surgimento ou
agravamento com a adoção da posição horizontal), platipneia (que
alivia com a posição deitada) ou dispneia paroxística noturna (ao
deitar, apresenta dispneia, levantando-se ou sentando-se na busca
de alívio para súbita sensação de sufocamento). Especial atenção
deve ser reservada para o período de instalação dos sintomas e à
presença de fatores agravantes.

• A anamnese também deve compreender a investigação de


antecedentes relevantes como história de doenças cardíacas ou
pulmonares, doença neuromuscular, uso de drogas que possam
deprimir o centro respiratório, tabagismo, alcoolismo.

• Procurar e identificar precocemente sinais que indiquem


insuficiência respiratória. São eles taquipneia, cianose, uso de
musculatura acessória (batimento de asa de nariz, tiragem
intercostal, supraesternal e de fúrcula) e respiração paradoxal.

EXAME FÍSICO
• Ao exame físico, é importante observar se o paciente se encontra
visivelmente desconfortável e se apresenta alterações no nível de
consciência (de agitação à sonolência). Esses achados podem
orientar a necessidade de atendimento de emergência com eventual
suporte ventilatório invasivo.

• A ausculta pulmonar pode ajudar no diagnóstico diferencial.


• Ectoscopia: cianose, taquicardia, uso de musculatura acessória
(batimento de asa de nariz, tiragem intercostal, supraesternal e de
fúrcula) e respiração paradoxal, baixa oxigenação periférica
(medida na oximetria de pulso), edema de membro inferiores com
sinal do cacifo ou mesmo anasarca.

• Aparelho respiratório: sibilos e roncos indicam quadro de vias


aéreas. Estertores crepitantes sugerem preenchimento alveolar.
Quando localizados, podem ser indicativos de pneumonia. Se
difusos, podem significar congestão pulmonar. Diminuição do
murmúrio vesicular localizado pode ocorrer em derrames pleurais
ou pneumotórax.

• Aparelho cardiovascular: sopros sistólicos em geral


regurgitativos (insuficiência mitral e tricúspide secundárias à
dilatação das câmaras), B3 na insuficiência cardíaca de fração de
ejeção reduzida (por disfunção sistólica), B4 na insuficiência
cardíaca de fração de ejeção preservada (por disfunção diastólica).

EXAMES COMPLEMENTARES
O diagnóstico de IRpA é dado a partir de sinais de desconforto
respiratório e confirmado pela oximetria de pulso ou gasometria.
Outros exames complementares, solicitados de acordo com a hipótese
diagnóstica aventada, compreendem hemograma completo, proteína C
reativa, peptídeo natriurético cerebral (BNP), radiografia de tórax,
eletrocardiograma, tomografia computadorizada do tórax ou
angiotomografia (se há suspeita de embolia pulmonar), ecocardiograma,
dentre outros.

a. Oximetria de pulso: recurso muito útil por ser uma medida direta
e não invasiva da saturação periférica de oxigênio (SpO2), além de
oferecer resultado imediato, permitindo ser utilizada como forma de
monitorização contínua. Pode variar em até 2-3% quando SpO2 > 88%,
e por volta de 5% quando entre 88-70%, sendo menos acurado abaixo
deste nível. São fatores que podem interferir na leitura: má perfusão
periférica, anemia, arritmias cardíacas, temperatura do ambiente,
artefato de movimentação e presença de esmalte.
b. Gasometria arterial: apesar de ser um método mais invasivo em
comparação com a oximetria de pulso, é mais completa, pois, além de
estimar a PaO2 e a saturação arterial de O2 (SaO2), permite também a
avaliação da ventilação alveolar através da medida de PaCO2, assim
como suas implicações em termos de acidemia através da medida do
pH. Ainda, a partir dos níveis de bicarbonato, em casos de hipercapnia,
pode-se estimar o tempo de instalação do quadro. A gasometria arterial
também pode ser muito útil para definir a gravidade da insuficiência
respiratória hipoxêmica em pacientes que recebem oxigênio
suplementar.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• Após definir a presença de IRpA, deve-se buscar sua causa.
• Uma ferramenta importante na elucidação dos mecanismos
relacionados ao quadro de IRpA é a avaliação do gradiente
alvéolo-arterial (GA-a) de O2, ou seja, da pressão alveolar de O2 e
da pressão arterial de O2. Ela se dá através da seguinte fórmula:

GA–a = PAO2 – PaO2

onde: PAO2 = FIO2 (PBarométrica – Pvapor de H2O) – 1,25 PaCO2

A fórmula pode ser simplificada para:


GA–a = 130 – (PaO2 + PaCO2)

• O valor de 130 mmHg é utilizado em cidades de altitude entre


700-800m, como no caso de São Paulo-SP. No nível do mar, este
deve ser substituído por 150 mmHg.

• O cálculo do limite superior da normalidade do GA-a é dado pela


fórmula [(idade/4) + 4], sendo usualmente menor que 20 mmHg.

• Um GA–a normal implica que a hipoxemia é decorrente


exclusivamente da diminuição da pressão alveolar de O2 e,
portanto, de hipoventilação.

• Já um GA–a aumentado significa que há alterações no processo de


oxigenação, que podem ou não estar associados à hipoventilação
alveolar.

• Na gasometria arterial, é possível definir a gravidade da


insuficiência respiratória hipoxêmica em pacientes que recebem
oxigênio suplementar.

• A relação P/F, ou seja, a PaO dividida pela fração inspirada de O


2 2

(FIO2) leva em conta a quantidade de O2 suplementada, sendo,


portanto, menos suscetível a erros de interpretação. Valores abaixo
de 100 mmHg indicam IRpA hipoxêmica grave.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• O paciente com queixa de desconforto respiratório deve ser


prontamente avaliado, pois a IRpA não corrigida pode rapidamente
evoluir para parada cardiorrespiratória (PCR).

• Os objetivos principais são aliviar o trabalho respiratório, evitando


assim a fadiga e promovendo conforto, corrigir a hipoxemia e a
acidemia respiratória.

• Importante lembrar que alguns pacientes são retentores crônicos


de CO2. Nesses pacientes, o objetivo nunca será a normalização da
PaCO2.

• AVALIAÇÃO INICIAL
• Iniciar monitorização cardíaca, de pressão arterial e oximetria de
pulso.
• Se Glasgow < 9, instabilidade hemodinâmica ou risco eminente
de parada cardiorrespiratória (respiração agônica, bradicardia),
proceder imediatamente à intubação orotraqueal (IOT).
• Se não há tais riscos acima descritos, suplementar oxigênio com
o objetivo de manter a saturação em 92-94%. Para pacientes
hipoxêmicos crônicos retentores de CO2, os níveis de saturação
desejáveis de 88-92%;
• Em pacientes selecionados, pode-se utilizar dispositivos de
pressão positiva. Na suspeita de edema agudo de pulmão (EAP),
o uso de pressão positiva em um nível de pressão (CPAP –
Continuous Positive Airway Pressure) está indicado. Em
pacientes retentores de CO2, o uso de dois níveis de pressão (ou
VNI – Ventilação Não Invasiva - ou Bilevel) pode evitar
intubação.
• Pacientes com diagnóstico de DPOC e/ou suspeita de retenção
crônica de CO2 devem receber oxigênio suplementar com
cautela por risco de piorar o quadro de retenção e até de levar a
rebaixamento do nível de consciência por narcose. São múltiplos
os mecanismos propostos para explicar essa piora, como
inibição do centro respiratório pelo oxigênio, piora do distúrbio
V/Q através de inibição pelo oxigênio do mecanismo de
vasoconstrição hipóxica e por Efeito Haldane (a hemoglobina
tende a perder afinidade pelo CO2 quando há alta concentração
de oxigênio no sangue, fazendo com que aumente a PaCO2). A
suspeita de hipercapnia, entretanto, não deve impedir a
suplementação de O2 – apenas sugere redobrada cautela e maior
observação.

• MODOS DE OFERTA DE OXIGÊNIO


• Cateter Nasal (Figura 1):
→ Sistema de baixo fluxo (0,5 a 4-5 L/min) com FiO2 aproximada de
3% para cada L/min (por exemplo, com 2 L/min, FiO2 = 21 + (2 x 3)
= 27%). É útil em casos leves.
Figura 1. Cateter Nasal.
Fonte: adaptado de Munson Healthcare.1

• Máscara Facial:
→ Quando são necessários altos fluxos de oxigênio, máscaras podem
ser acopladas a acessórios específicos como as válvulas de Venturi.
→ O uso dessas válvulas, geralmente de cor padronizada para cada
FIO2, permite ofertar FIO2 controladas de 24%-50% (Figura 2).
→ Máscaras não reinalantes com válvulas unidirecionais e reservatório
de oxigênio permitem ofertar FIO2 mais altas, chegando a 100%
(Figura 3).
(A) Princípio de funcionamento da válvula e como a mesma oferta FiO2.
(B) Vávulas de Venturi e suas diferentes FiO2. A FiO2 ofertada é descrita na máscara. Apesar de tendência à
padronização, nem sempre há correspondência entre fabricantes, devendo-se sempre checar o que é posto no dispositivo.

Figura 2. Válvula de Venturi.


Fonte: Medscape.2

Figura 3. Máscara de Reservatório não reinalante com válvula unidirecional.


Fonte: Intensive Care Society.3

• Ventilação não invasiva (VNI):


→ Permite oferecer altos fluxos de O2 com FIO2 variável e ajustável,
assim como pressão positiva às vias aéreas através de dispositivos
específicos (máscara nasal, oronasal, almofada nasal [pillow], facial
total e capacete) (Figura 4).
→ É benéfica principalmente em pacientes com quadros hipercápnicos
e com edema agudo de pulmão (EAP), e pode prevenir intubações.
→ É importante ressaltar que não se deve retardar uma intubação em
detrimento da VNI. Dessa forma, a falência deste método deve ser
prontamente percebida.
→ Os mesmos objetivos da ventilação mecânica invasiva podem ser
alcançados, já que a diferença básica entre os métodos estaria no
espaço morto aumentado pelas interfaces utilizadas em comparação
com o tubo orotraqueal.
→ Na VNI, geralmente utiliza-se o alvo de volume corrente (VT) de 6-8
mL/Kg de peso ideal, aceitando-se em casos excepcionais VT de 4
mL/Kg (Figura 5). Deve-se evitar o uso de rampa (o aumento gradual
da pressão), pois isto poder retardar a resposta ao método.
→ No Quadro 1, encontram-se listadas as principais contraindicações
para a VNI.
→ O uso da VNI é permitido em pacientes com rebaixamento de nível
de consciência devido à hipercapnia. A melhora da consciência deve
ser evidente na primeira hora após o seu início. Se houver
deterioração ou ausência de melhora, deve-se proceder com IOT pelo
risco de perda de proteção da via aérea inferior e evolução com
parada cardiorrespiratória.
→ Importante ressaltar a diferença entre CPAP e VNI: o ar é um fluido.
E, como todo fluido, ele tende a mover-se para uma área de menor
pressão – a diferença de pressões gera a movimentação de ar e,
consequentemente, ventilação. Quando respiramos, geramos uma
pressão negativa intrapleural para inspirar e o ar entra, por exemplo.
Ao atingir sua complacência e elastância máxima, inicia-se um
movimento passivo exalatório, criando uma maior pressão
intratorácia que atmosférica, e o mesmo ar sai. Então, para dizer que
há ventilação, precisamos de dois níveis de pressão. O CPAP
(Continuous Positive Airway Pressure) tem uma pressão contínua, ou
seja, sem 2 níveis de pressão – útil para casos de apneia do sono, por
exemplo, em que se deseja que uma “tala pneumática” impeça o
colapso da via aérea. Útil também para o EAP, em que essa pressão
contínua é capaz de “empurrar” o excesso de líquido intra-alveolar,
assim como a pressão torácica aumentada diminui a pré-carga e
auxilia na função do ventrículo esquerdo. Já o Bilevel PAP (Bilevel
Positive Airway Pressure) tem 2 níveis de pressão; logo, pode ser
chamado de ventilação, de VNI. Devemos lembrar que Bipap® e
BIPAP® são marcas registradas, devendo-se evitar tal nomenclatura.

A: Máscara nasal, B: Máscara oronasal ou “Full face”, C: almofadas nasais, D: máscara


oral,
E: máscara facial total e F: Capacete (“Helmet”).
Figura 4. Exemplos de diferentes interfaces que podem ser usadas durante a
ventilação não invasiva.
Fonte: BaHammam.4

Vt = Volume corrente; FR = Frequência Respiratória; IPAP – Pressão inspiratória; EPAP –


Pressão Expiratória; PS – Pressão de Suporte.
Valores sugeridos: Em verde valores máximos e em amarelo valores mínimos.

Figura 5. Parâmetros para VNI.


Fonte: adaptado de Reis e Sell5

Absolutas (sempre evitar)

• Necessidade de intubação de emergência


• Parada cardíaca ou respiratória
Relativas (analisar caso a caso risco X benefício)

• Incapacidade de cooperar, proteger as vias aéreas ou secreções abundantes


• Rebaixamento de nível de consciência (exceto acidose hipercápnica em DPOC)
• Falências orgânicas não respiratórias (encefalopatia, arritmias malignas ou hemorragia digestivas graves com
instabilidade hemodinâmica)
• Cirurgia facial ou neurológica
• Trauma ou deformidade facial
• Alto risco de aspiração
• Obstrução de vias aéreas superiores
• Anastomose de esôfago recente (evitar pressurização acima de 20 cmH2O)
Quadro 1. Contraindicações absolutas e relativas à VNI.
Fonte: adaptado de AMIB 6

• Cateter Nasal de Alto Fluxo (CNAF):


→ É uma alternativa à oxigenoterapia convencional.
→ Trata-se do uso de um alto fluxo nasal de oxigênio aquecido e
umidificado, conhecido como oxigenoterapia nasal de alto fluxo
(CNAF) (Figura 6).
→ Esta técnica permite fornecer oxigênio aquecido e umidificado com
uma FIO2 controlada e fluxo médio máximo de 60 L/minuto por
intermédio de uma cânula nasal.
→ O uso da CNAF gera um nível variável de PEEP - em voluntários
saudáveis, com a boca fechada e fluxo de 60 L/minuto, o nível de
PEEP medido foi de até 7 cmH2O. No entanto, este nível de PEEP
pode facilmente diminuir, assim que a boca é aberta. Tem sido
considerada para uso em pacientes com insuficiência respiratória
aguda (IRA) hipoxêmica reincidente.
→ Relatos recentes sugerem que a CNAF pode também ser utilizada
para prevenção de IRpA após a extubação.
Figura 6. Cateter Nasal de Alto Fluxo (CNAF).
Fonte: Veoflo.7

• Ventilação Mecânica Invasiva (VMI):


→ A VMI é indicada quando não há sucesso em outros métodos da
suplementação de oxigênio ou quando estes são contraindicados.
→ Após a intubação e checagem adequada da cânula orotraqueal, o
próximo passo é ligar e ajustar o ventilador mecânico. Em um
primeiro momento, estando o paciente sedado (e, se necessário, com
uso de bloqueador neuromuscular), deve-se escolher um modo
assistido-controlado a volume ou pressão (conforme o domínio e
familiaridade da equipe sobre cada modo). Inicia-se com FIO2 alta,
que rapidamente deverá ser titulada de acordo com a oxigenação do
paciente, sendo parâmetro de fácil acesso para tal a oximetria de
pulso. O VT utilizado deve ser de 4-6 mL/kg de peso ideal, de modo a
evitar lesão pulmonar induzida pela ventilação mecânica. Ainda como
parte de uma estratégia ventilatória protetora, deve-se limitar as
pressões de distensão alveolar (Driving Pressure, igual à Pressão de
platô – PEEP) a valores inferiores a 14 cmH2O. A frequência
respiratória deve ser programada conforme o pH - com valor máximo
limite de 35 ipm (em alguns casos de retenção de CO2 com acidemia
podem-se utilizar frequências de até 40 ipm, não sendo usual). A
PEEP deve ser ajustada também conforme o diagnóstico da IRpA. De
modo geral, valores mais altos de PEEP proporcionam melhor
oxigenação. Ressalta-se que o determina uma ventilação protetiva são
baixos volumes correntes associados com uma driving pressure
dentro dos limites aceitáveis – por vezes tenta-se ajustar a pCO2 para
valores fisiológicos a despeito de uma ventilação lesiva. Respeitar
esses parâmetros e tolerar niveis mais elevados de pCO2 é um
conceito denominado de Hipercapnia Permissiva.
b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
Tratar conforme a doença de base estabelecida como causa de IRpA.
• SÍNDROME DO DESCONFORTO RESPIRATÓRIO
AGUDO (SDRA)
• A síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA - do
inglês: ARDS – acute respiratory distress syndrome) é um
acometimento pulmonar inflamatório que pode ser desencadeado
tanto por injúria primária (aspiração, pneumonia, lesão
inalatória) quanto secundária à doença inflamatória sistêmica
(infecção, trauma, pancreatite).
• A SDRA caracteriza-se por lesão pulmonar heterogênea, na qual
áreas sãs coexistem com regiões extremamente lesadas,
geralmente com colapso das áreas acometidas pelo edema
intersticial e alveolar, membranas hialinas e com potencial de
cicatrização anômala e consequente fibrose pulmonar.
• O diagnóstico é definido pelos critérios de Berlim (Tabela 1).

Critérios diagnósticos

TEMPO Até 7 dias do evento causador

Opacidades bilaterais não explicadas por derrame, atelectasias, nódulos ou massas


LOCALIZAÇÃO
pulmonares

ORIGEM DO EDEMA Não explicada exclusivamente de origem cardíaca ou hipervolemia

OXIGENAÇÃO (PaO2/FIO2)

LEVE 201-300 mmHg com PEEP ≥ 5 cmH2O

MODERADA 101-200 mmHg com PEEP ≥ 5 cmH2O

GRAVE ≤ 100 mmHg com PEEP ≥ 5 cmH2O

Tabela 1. Critérios de Berlim para definição de SDRA.


Fonte: adaptado de Thompson e colaboradores 8

• O tratamento é direcionado para a abordagem da causa base e uso


de estratégias ventilatórias específicas para tal. Deve-se ter o
objetivo de:
→ Garantir oxigenação adequada (SpO2 entre 92 e 94% ou PaO2 entre
60 e 65 mmHg) usando a menor FIO2.
→ Não buscar valores maiores de oxigenação e valores normais de
pCO2 e pH às custas de extrapolar limites de ventilaçao protetiva,
com maior risco de VILI (Ventilator-Induced Lung Injury - Lesão
pulmonar induzida pela Ventilação Mecânica);
→ Minimizar o dano alveolar por meio da instituição de PEEP, de
maneira que evite a lesão dinâmica da via aérea (atelectrauma) graças
ao uso de volumes correntes protetores (4-6 mL/kg de peso ideal) e
adotar valores de Driving Pressure (Pressão de platô – PEEP)
menores de 14 cmH2O;
→ Aplicar a posição de decúbito ventral (posição prona) em pacientes
com relação P/F abaixo de 150 mmHg. Esta posição deve ser mantida
por pelo menos 16 horas, com especial cuidado para rodiziar a
posição da cabeça e dos membros superiores para evitar lesão ocular
e úlceras de pressão. Tal posição distribui melhor a ventilação e a
perfusão pulmonar no pulmão de baixa complacência e sujeito ao
colapso gravitacional, característico da SDRA (Figura 7).

Representação esquemática da distribuição da tensão e seu impacto no tamanho alveolar


entre a posição supina (esquerda) e prona (direita), mostrando notado aumento ao pronar, o
que aumenta a área de troca.

Figura 7. Efeitos da posição prona no parênquima pulmonar.


Fonte: adaptado de Kallet9

→ Titular a PEEP de acordo com uma das estratégias definidas, e, se


necessário, considerar manobras de recrutamento alveolar.
→ Hipercapnia Permissiva: tolerar níveis maiores de CO2, salvo
contraindicação (como em pacientes neurocríticos). Valores de CO2
de até 70 mmHg são tolerados desde que pH > 7,15-7,20. É
necessário ter extrema cautela em se instituir a hipercapnia
permissiva em pacientes extremamente hipoxêmicos. Também é
contraindicada em casos de neurointensivismo (o CO2 elevado é
vasodilatador cerebral e consequente promotor de hipertensão
intracraniana). Deve-se ter cuidado especial também em pacientes
coronariopatas e portadores de arritmias agudas.

• É conduta adjuvante o objetivo de balanço hídrico,


negativo/neutro, evitando estado de hipervolemia.

• Há discussão sobre o benefício do uso de corticosteróides,


especificamente dexametasona e metiprednisolona.

• São perspectivas futuras o uso de células-tronco, assim como


terapia-alvo com imunobiológico em virtude de intensa atividade
de interleucinas.

• Deve-se cogitar terapias alternativas/adjuntas como a oxigenação


extracorpórea em pacientes que apresentem deterioração clínica
rápida ou naqueles em que têm valores aceitáveis de oxigenação e
de CO2, mas não podem ser mantidos com ventilação protetora
(Figura 8).
CN = Cateter Nasal.
PEEP = Positive end-expiratory pressure.
HFO = High‐frequency oscillation ventilation.
ECMO = Oxigenação por membrana extracorpórea.
ECCO2-R = Extracorporeal carbon dioxide removal.
Em amarelo, modos em estudo ou validação recente.

Figura 8. Terapias possíveis para SDRA.


Fonte: adaptado de Ferguson.6

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 1. Algoritmo de avaliação da troca gasosa na presença de
hipoxemia.
Fonte: adaptado de Carvalho.7

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente 60 anos, 70 Kg, portador de osteoartrose e
hipertensão arterial sistêmica, trazido por familiares ao PS devido ao
rebaixamento do nível de consciência. Ao exame, regular estado geral,
PA: 100 x 70 mmHg, FC: 58 bpm, FR: 8 ipm, SpO2 89% em ar
ambiente, sonolento, Glasgow 11, pupilas mióticas, murmúrio vesicular
fisiológico, sem ruídos adventícios.
b. Exames complementares: radiografia de tórax sem
anormalidades, exames laboratoriais normais e gasometria arterial: pH
7,25, PO2 50, PCO2 68, HCO3 26, BE +2,0, SatO2 90%.

c. Impressão: avaliado, GA-a: 12, e considerada a IRpA


hipercápnica. Questionado familiares sobre uso de opioides e
confirmado seu uso diário devido à dor crônica e abuso nas últimas 24
horas.
d. Diagnóstico: hipoventilação devido à intoxicação por opioide.
e. Prescrição sugerida:

1. Jejum.
2. Naloxona 0,2 mg EV agora e a critério médico.
3. Ventilação não invasiva com BiPAP – IPAP: 12, EPAP: 5,
Frequência respiratória 20 ipm – objetivar VT: 8 ml/kg/peso ideal
(coletar nova gasometria após 30 minutos da VNI).
4. Cabeceira elevada a 45º.
5. Monitorização contínua e manutenção de SpO2 92 a 94%.

DICAS DO ESPECIALISTA
• A oximetria de pulso é um excelente método não invasivo para
avaliação rápida de um caso, porém a gasometria arterial é
mandatória nos casos de IRpA, já que é capaz de avaliar causas
possíveis, condições associadas e efeitos da terapêutica.

• A boa anamnese continua sendo fator decisivo na avaliação dos


quadros respiratórios; logo, invista em uma boa história e conheça
os antecedentes do paciente antes de condutas enérgicas.

• Da mesma maneira que a hipóxia é danosa, a hiperóxia pode ser


letal. Respeite os limites de aporte de O2 para cada caso. A SpO2 de
100% não é o objetivo. Deve-se objetivar uma saturação aceitável
(entre 92 e 94%) com a menor FiO2 possível;

• Evite fluxos maiores de 4 L/min no cateter nasal de baixo fluxo, já


que ele é incômodo e sem benefício evidente, podendo-se usar
outros dispositivos de oferta de O2;

• Ao utilizar dispositivos de pressão positiva, a adaptação da


interface é primordial. Indivíduos com alterações craniofaciais,
como as alterações de formato e tamanho da mandíbula, assim
como a presença de pêlos faciais e sudorese excessiva, podem
atrapalhar tal adaptação;

• Bem aplicada, a VNI salva vidas e evita IOT. Porém, não deve ser
proteladora de condutas. Ao instituir o uso de VNI para
rebaixamento de nível de consciência em pacientes retentores
crônicos, a reavaliação contínua é mandatória. Caso não haja
melhora sustentada em um espaço de 90-120 minutos, proceder
com ventilação mecânica invasiva;

• O principal diagnóstico diferencial da SDRA, sendo ele um EAP


não cardiogênico, é justamente o EAP cardiogênico. Nos quadros
cardiogênicos, podem ser fatores que auxiliem o diagnóstico o
aumento da área cardíaca, proeminência dos hilos pulmonares, a
presença de edema central à radiografia de tórax e de derrame
pleural, assim como a melhora rápida com a instituição de
diureticoterapia.

REFERÊNCIAS
1. Munson Healthcare. [Internet]. [acesso em jan 2020]. Disponível em:
https://www.munsonhealthcare.org/services/pulmonary-respiratory/respiratory-treatments-
therapies
2. Medscape. [Internet]. [acesso em jun 2020]. Disponível em:
http://img.medscape.com/fullsize/migrated/editorial/journalcme/2008/9172/ahrq.fig2.gif.
3. Intensive Care Society. Handbook of Mechanical Ventilation. A User’s Guide. Londres:
Intensive Care Foundation; 2015.
4. BaHammam AS, Singh TD, Gupta R, Pandi-Perumal SR. BaHammam AS, et al. Respir Care.
2018; 63(2): 227-37.
5. Reis, MAS. Sell, LC. Ventilação Mecanica Domiciliar. In Prática Pneumologica. Maciel, R.
Aide, MA. 2ª edição. Guanabara Koogam. Rio de Janeiro, 2017.
6. AMIB. Diretrizes Brasileiras de Ventilação Mecanica. 2013. Disponível em
https://www.amib.org.br/fileadmin/user_upload/amib/2018/junho/15/Diretrizes_Brasileiras_
de_Ventilacao_Mecanica_2013_AMIB_SBPT_Arquivo_Eletronico_Oficial.pdf
7. Veoflo® High Flow Nasal Cannula Inc. Flexicare. [Internet]. [acesso em jun 2020].
Disponível em: https://www.flexicare.com/product/veoflo/
8. Thompson, B. T., Chambers, R. C., & Liu, K. D. (2017). Acute Respiratory Distress
Syndrome. New England Journal of Medicine, 377(6), 562–
572. doi:10.1056/nejmra1608077
9. Kallet RH. A Comprehensive Review of Prone Position in ARDS. Respir Care.
2015;60(11):1660-1687. doi:10.4187/respcare.04271.
10. Ferguson ND, Fan E, Camporota L, Antonelli M, Anzueto A, Beale R, et al. The Berlin
definition of ARDS: an expanded rationale, justification, and supplementary material.
Intensive Care Med. 2012; 38(10): 1573-82.
11. Carvalho CRR, Ferreira JC, Costa ELV. Ventilação Mecânica – Princípios e Aplicação. 1.
ed. São Paulo: Editora Atheneu; 2015.
12. Carvalho CRR. Fisiopatologia Respiratória. 1. ed. São Paulo: Editora Atheneu; 2005.
13. Martins HS, Pizzo V, Damasceno MCT. Insuficiência Respiratória Aguda e Ventilação
Invasiva. In: Martins HS, Brandão Neto RA, Scalabrini Neto A, Velasco IT. Emergências
clínicas : abordagem prática.10. ed. rev. e atual. Barueri, SP: Manole; 2015. Pp. 104-30.
14. Zampieri FG. Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo in Medicina intensiva :
abordagem prática. 2. ed. Barueri, SP: Manole; 2015.
15. The ARDS Definition Task Force, Ranieri VM, Rubenfeld GD, Thompson BT, Ferguson
ND, Caldswell E, et al. Acute Respiratory Distress Syndrome The Berlin Definition. JAMA.
2012; 307(23): 2526-33.
16. Amato MBP, Barbas CSV, Medeiros DM, Magaldi RB, Schettino GP, Lorenzi-Filho G, et al.
Effect of a protective-ventilation strategy on mortality in the acute respiratory distress
syndrome. N Engl J Med. 1998; 338(6): 347-54.
17. Amato MBP, Meade MO, Slutsky AS, Brochard L, Costa EL, et al. Driving Pressure and
Survival in the Acute Respiratory Distress Syndrome. N Engl J Med. 2015; 372(8): 747-55.
18. Slutsky AS, Brochard L. Mechanical Ventilation – Uptodate in intensive care medicine.
Berlin, Germany: Springer-Verlag; 2004:
19. Thompson BT, Chambers RC, Liu KD. Acute Respiratory Distress Syndrome. N Engl J
Med. 2017; 377(6): 562-72.
6.8
VENTILAÇÃO MECÂNICA
Autores:
Milena Tenório Cerezoli
Felipe Marques da Costa

DEFINIÇÕES
• A ventilação mecânica invasiva (VM) se caracteriza pelo
acoplamento do paciente a um ventilador mecânico.

• Dá-se através do tubo endotraqueal ou traqueostomia para


manutenção da ventilação e da oxigenação, assim como da
homeostase ácido-básica.

• É indicada enquanto o paciente se recupera de um quadro de


insuficiência respiratória aguda, quando ocorre incapacidade da
musculatura respiratória em manter a ventilação espontânea.

a. INDICAÇÃO DE VENTILAÇÃO MECÂNICA

• As principais indicações de VM estão citadas na Tabela 1.


Insuficiência respiratória aguda hipoxêmica ou hipercápnica Reanimação devido à parada
refratárias a medidas não invasivas cardiorrespiratória

DPOC exacerbada e crise asmática com fadiga respiratória PaO2 < 50 mmHg e pH < 7,25

Falência mecânica do aparelho respiratório Relação PaO2/FiO2 < 200 mmHg

Rebaixamento do nível de consciência com


Pacientes com comprometimento hemodinâmico grave
incapacidade de proteção de vias aéreas / grave
(choque séptico ou cardiogênico)
dificuldade de deglutição

Doenças neuromusculares graves /


Cirurgias que necessitem de anestesia geral
fraqueza ou paralisia muscular
Diminuição do consumo de O2 sistêmico ou miocárdico graves Centro respiratório instável

Tabela 1. Principais indicações da Ventilação Mecânica invasiva (VM).


Fonte: Holanda, 20171

b. CICLO RESPIRATÓRIO

• O ciclo respiratório em um paciente sob VM segue quatro fases


(na Figura 1, observa-se o exemplo do modo ventilatório volume
controlado):

Figura 1. Fases do ciclo ventilatório.


Fonte: Holanda, 20171

1. Inspiração – quando acontece a insuflação pulmonar, vencendo as


propriedades elásticas e resistivas do sistema respiratório (válvula
inspiratória está e permanece aberta);
2. Ciclagem – mudança da fase inspiratória para a expiratória, que
pode acontecer controlada por pressão, fluxo, tempo ou volume, de
acordo com o modo ventilatório utilizado;
3. Expiração – esvaziamento dos pulmões, permitindo que a pressão
do sistema respiratório se equilibre com a pressão expiratória final
(atmosférica e/ou pressão expiratória final positiva, PEEP)
programada no ventilador, mantendo o alvéolo distendido ao final
do ciclo, evitando colabamento e atelectasias (válvula inspiratória
se fecha e abre a expiratória);
4. Disparo – mecanismo que interrompe a fase expiratória e inicia a
inspiração, que pode ser ativado por fluxo, tempo ou pressão
(momento de abertura da válvula inspiratória) de acordo com o
modo ventilatório utilizado.
c. EQUAÇÃO DO MOVIMENTO DE GÁS E
MONITORIZAÇÃO DA MECÂNICA RESPIRATÓRIA

• A mensuração da mecânica respiratória durante a ventilação


invasiva fornece dados sobre parâmetros capazes de corroborar o
diagnóstico da provável doença que acomete o paciente,
essencialmente quando houver lesão pulmonar associada, além de
permitir um ajuste individual e otimizado da ventilação e avaliação
da resposta à terapêutica instituída.

• As medidas da mecânica respiratória devem ser realizadas em


todos os pacientes submetidos à ventilação invasiva,
obrigatoriamente naqueles totalmente sedados e passivos, em
suporte ventilatório controlado.

• Durante a ventilação mecânica, quando há ausência de esforço


muscular inspiratório pelo paciente, a pressão positiva na via
aérea (Pva) resulta da adição da pressão resistiva (transição do gás
pelas vias aéreas até os alvéolos pulmonares) com a pressão
elástica (estiramento do parênquima pulmonar e da caixa torácica
após insuflação alveolar).

• A pressão elástica (Pelast) é medida em condições de ausência de


fluxo e, portanto, corresponde à pressão alveolar. É consequência
da relação entre o volume inspirado ou corrente (ΔVol) e a
complacência estática (Cst) do sistema.

• A pressão resistiva (Presist) é resultante do produto do fluxo de


gás (V) e da resistência das vias aéreas (Raw).

• A PEEP também modifica a composição final da pressão na via


aérea.
Assim: Pva = Presist + Pelast + PEEP – Pmus
• A Pmus = zero na ventilação controlada, isto é, sem esforço
muscular respiratório. Logo,

• O efeito prático destes conceitos é compreender que quando se


varia fluxo ou volume há mudança na Pva (esta correspondente à
pressão máxima na via aérea = pressão de pico).

• Com a mudança do fluxo, altera-se a pressão de pico sem variação


da pressão alveolar (Figura 2), enquanto, ao variar o volume
corrente, pressão de pico e alveolar modificam-se na mesma
direção (Figura 3).

• A medida da pressão alveolar tem importância especial, pois se


correlaciona com risco de barotrauma e lesão pulmonar induzida
pelo ventilador (VILI, do Inglês Ventilator Induced Lung Injury),
sendo indispensável sua mensuração rotineira.

• Pressão alveolar é obtida realizando uma pausa inspiratória no


ventilador por pelo menos 2 a 3 segundos (fechando a entrada e
saída de ar do sistema) e é chamada pressão de pausa ou pressão de
platô (Pplat).

• Pplat com valores superiores a 30 cmH O sugerem um estiramento


2

excessivo dos alvéolos, e a correção do volume corrente e/ou da


PEEP faz-se necessária.

• Quanto menor a Pplat, menor a chance de hiperdistensão alveolar


induzida pela ventilação, mesmo em doenças pulmonares
heterogêneas, como na síndrome do desconforto respiratório agudo
(SDRA) e na doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)
exacerbada, nas quais a distensão ocorre predominantemente de
forma regional, nas áreas sadias.
• A medida real da distensão alveolar, conhecida do Inglês como
driving pressure, é dada pela diferença entre a Pplat e a PEEP e
vem ganhando papel expressivo para sua manutenção em valores
abaixo de 15 cmH2O, pois resultados acima mostraram piores
desfechos clínicos, incluindo maior mortalidade, especialmente na
SDRA.

• A partir da medida da pressão alveolar, conseguem-se as medidas


clássicas da Raw e da Cst.

• A Raw é a razão entre a diferença de pressão (∆P) entre as duas


extremidades (pressão de pico – pressão de platô) e a taxa de fluxo
inspiratório (em L/s).

• A Cst corresponde à relação entre o volume corrente e a diferença


entre a pressão alveolar ao final da inspiração e a pressão
expiratória final (pressão de platô – PEEP).
Raw = ∆P (pressão de pico – pressão de platô) / V
Cst = ∆V / ∆P (pressão de platô – PEEP)

• O limite da normalidade da Raw se situa entre 4 a 8 cmH O/L/s,2

variando em função do diâmetro interno do tubo endotraqueal e da


presença ou não de obstrução ao fluxo aéreo no paciente. Pacientes
com doenças pulmonares obstrutivas devem ser ventilados e
mantidos com Raw menor que 20 cmH2O/L/s como meta
terapêutica.

• A Cst tem valor normal em torno de 50 a 80 mL/cmH O e 2

apresenta-se reduzida em situações de distensão abdominal, no


edema agudo de pulmão, na fibrose pulmonar e na SDRA,
enquanto nos pacientes com enfisema pulmonar está elevada.
As setas mostram que, com o aumento isolado do fluxo, há elevação da pressão de pico
(pressão resistiva das vias aéreas) sem variação da pressão alveolar. A elevação da Pva na
inspiração (*) mostra a pressão resistiva do sistema.

Figura 2. Ventilação mecânica em modo volume controlado mostrando


mudança de fluxo.
Fonte: Holanda, 20171
As setas mostram que, com o aumento isolado do volume, há elevação tanto da pressão de
pico (pressão resistiva), como da pressão alveolar (pressão elástica). A diferença entre a
pressão de pico e alveolar não se altera por não alterar a pressão resistiva, devido ao fluxo
constante.

Figura 3. Ventilação mecânica em modo volume controlado mostrando


mudança de volume.
Fonte: Holanda, 20171

d. CICLOS RESPIRATÓRIOS NA VENTILAÇÃO MECÂNICA

• Dois tipos fundamentais de ciclos respiratórios ocorrem durante a


VM:
• Controlado: ciclo passivo, em que o ventilador substitui
totalmente o esforço muscular respiratório e o controle neural
(drive) do paciente. A variável para o disparo do ventilador é o
tempo, dado pela frequência respiratória.
• Assistido: ciclo ativo, em que o ventilador auxilia ou assiste a
musculatura inspiratória do paciente, que se encontra ativa. O
disparo acontece quando se alcança um nível de pressão ou fluxo
predeterminados (sensibilidade), podendo também ser disparado
pelo drive neural, como no modo NAVA.

• CICLOS CONTROLADOS
• Algumas variáveis também são controladas durante a inspiração
destes ciclos. São elas: tempo, fluxo, pressão ou volume ou
mesmo a combinação de duas ou mais destas.
• Assim, o ciclo dito controlado pode ser ciclado a volume (VCV,
do inglês Volume Controlled Ventilation), ou seja, quando muda
da inspiração para expiração após alcançar o volume corrente
estipulado, ou ciclado a tempo, como no modo pressão
controlada (PCV, do inglês Pressure Controlled Ventilation),
quando “cicla” ao atingir o tempo inspiratório fornecido.

• CICLOS ASSISTIDOS
• No ciclo assistido, o comando neural e a musculatura do sistema
respiratório do paciente estão ativos, e o ventilador faz o ajuste
da demanda do paciente, através de medidas regulares do fluxo
e/ou pressão em seu circuito. O parâmetro “sensibilidade”
deflagra a variação de fluxo ou pressão reconhecida pelo
ventilador como esforço muscular do paciente capaz de gerar um
ciclo respiratório (disparo).
• Da mesma forma, os ciclos assistidos também podem ser
ciclados a volume (volume assistido), a tempo (pressão
assistocontrolada), a fluxo (pressão de suporte) ou pelo drive
neural (NAVA).

• Existe diferença na resposta do ventilador ao esforço muscular


gerado pelo paciente entre estes modos.
• Em pressão assistida, o ventilador aumenta a oferta de volume
corrente e o fluxo conforme a demanda do paciente, sendo
potencialmente menos desconfortável e, consequentemente,
mais favorável ao trabalho respiratório do paciente.
• Na Ventilação com Pressão de Suporte (PSV, do inglês Pressure
Support Ventilation), seu disparo ocorre a fluxo ou pressão, o
fluxo inspiratório é livre (elevando com o aumento do esforço do
paciente) e é ciclado a fluxo (geralmente a 25% do fluxo
inspiratório máximo, podendo ser mudado nos ventiladores mais
modernos). Assim, a PSV é capaz de gerar maior conforto ao
paciente, pela possibilidade de variabilidade de fluxo, volume
corrente e tempo inspiratório.
e. MODOS VENTILATÓRIOS BÁSICOS

• A partir dos tipos de ciclos respiratórios citados, três modos


ventilatórios são considerados básicos e de uso rotineiro:
• Assistido/Controlado (A/C, do inglês, assist/control);
• Ventilação com pressão de suporte (PSV);
• Ventilação mandatória intermitente sincronizada com
pressão de suporte (SIMV, do inglês Synchronized Intermitent
Mandatory Ventilation).

• MODOS A/C-VCV e A/C-PCV


• O modo A/C é o modo optado para iniciar o suporte ventilatório,
após a intubação traqueal.
• Este modo permite a oferta de ciclos controlados (quando o
paciente não apresentar fluxo ou pressão capaz de gerar disparo)
e/ou assistidos (quando existir fluxo/pressão para o disparo pelo
próprio paciente).
• O modo A/C pode gerar ciclos em VCV ou em PCV, já explicados
anteriormente.
• Em A/C-VCV, a frequência respiratória varia com o disparo
decorrente do esforço inspiratório do paciente, porém volume
corrente e fluxo mantêm-se fixos.
• Em A/C-PCV os ciclos ocorrem assim que o esforço do paciente
ultrapasse a sensibilidade definida, o que gera um volume
corrente variável, a depender também da frequência
respiratória (dada pelo tempo inspiratório ou a relação
inspiração:expiração) e o limite de pressão inspiratória que
estarão fixos.

• MODO PSV
• Este é um modo de ventilação mecânica espontânea, disparado e
ciclado pelo paciente. O ventilador mantém uma pressão de
suporte predeterminada e fixa nas vias aéreas, até que o fluxo
seja reduzido a um nível fixo de pico de fluxo inspiratório (dado
ajustável, geralmente 25% do pico de fluxo).
• Utiliza-se atualmente este modo quando o paciente apresenta
uma boa recuperação da doença de base e já apresenta drive
respiratório como desmame ventilatório, até a extubação.

• MODO SIMV COM PS


• O modo SIMV com PS é uma junção dos modos A/C e PSV. O
ventilador oferece uma frequência mínima predeterminada, porém
permitindo que ciclos espontâneos aconteçam entre eles, caso o
paciente tenha drive para o disparo do ventilador.

• Este modo garante uma frequência respiratória mínima em que se


pode estabelecer um VC fixo (SIMV-VCV) ou uma pressão
constante na via aérea com ciclagem a tempo (SIMV-PCV), usado
anteriormente para desmame de ventilação.

• Este modo entrou em desuso nos últimos anos por trabalhos que
demonstraram haver um atraso no desmame ventilatório com a sua
utilização.

• Pode-se utilizar este modo quando, na transição entre um modo


controlado e assistido, for necessária a manutenção de um volume
minuto mínimo para garantia da ventilação do paciente.
f. AJUSTE INICIAL DA VM

• Para parâmetros inicias da VM, deve-se realizar a medida do peso


ideal do paciente (conforme Tabela 2) para adequação do volume
corrente em 6 mL/Kg de peso predito e frequência respiratória
suficiente para obtenção de volume minuto de aproximadamente 7
litros por minuto, objetivando manter uma ventilação protetora
(para evitar VILI).

• Deve-se realizar o cálculo da mecânica ventilatória para ponderar


se existem alterações de complacência ou resistência com correta
adequação da ventilação e coletar gasometria arterial vinte minutos
após qualquer ajuste no ventilador para verificar os valores de
PaCO2 e PaO2, assim como os níveis de pH e bicarbonato de sódio
para orientação de novos ajustes no ventilador mecânico.
• MODO VENTILATÓRIO: usar modo assistocontrolado:
VCV ou PCV – considerar o modo com a melhor sincronia entre
paciente e ventilador, bem como a preferência do modo em que
o médico esteja mais habituado.
• PRESSÃO INSPIRATÓRIA (Pinsp): programada somente no
modo PCV e PSV. Iniciar com o valor 10-15 cmH2O e adequar
o ajuste da pressão de acordo com o VC desejado.
• VOLUME CORRENTE (VC): manter volume de 6 mL/kg de
peso predito durante toda a ventilação.
• PRESSÃO DE PICO (PPI): pressão máxima atingida durante a
fase inspiratória. Parâmetro de alerta. Tolerância até 40
cmH2O. Se alta, verificar a causa e corrigir.
• FRAÇÃO INSPIRADA DE OXIGÊNIO (FIO2): inicia-se a
ventilação com 100% de FIO2 e, após, ajusta-se para a FIO2
necessária para manter a saturação arterial de oxigênio entre
93% a 97%.
• FREQUÊNCIA RESPIRATÓRIA (FR): inicialmente
controlada entre 12-16 rpm, através do fluxo inspiratório ou
tempo inspiratório, visando manter inicialmente relação I:E
(inspiração/expiração) entre 1:2 a 1:3. Utilizar frequências
respiratórias menores que 15 para pacientes obstruídos e maiores
que 15 para pacientes restritivos.
• TEMPO INSPIRATÓRIO (Tinsp): ajuste entre 0,8 a 1,2
segundos, conforme objetivo da FR.
• PEEP: iniciar com 5-7 cmH2O, salvo em situações de doenças
como a síndrome do desconforto respiratório agudo, que
necessita de ajuste refinado conforme complacência.
• PAUSA INSPIRATÓRIA: ajuste de 0,3 a 0,5 segundos.
• RELAÇÃO INSPIRAÇÃO: EXPIRAÇÃO (I:E): depende do
VC, FR, Fluxo insp, Tinsp ou pausa inspiratória. Ajuste inicial
da relação I:E em 1:2 a 1:3.
• SENSIBILIDADE (Sens): no disparo a pressão programar
sensibilidade de -0,5 a -2,0 (cmH2O) ou a fluxo entre +2,0 a
+4,0 (L/min).
PESO IDEAL

HOMENS 50 + 0,91 * (Altura - 152,4 cm)

MULHERES 45,5 + 0,91 * (Altura - 152,4 cm)

Tabela 2. Cálculo do peso ideal do paciente.


Fonte: Holanda, 20171
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: paciente do sexo masculino, 62 anos, com passado
de tabagismo importante, história de 5 dias de dispneia aos pequenos
esforços, tosse com expectoração purulenta, prostração, com entrada na
sala de emergência em franca insuficiência respiratória, sonolento,
sendo necessária a intubação orotraqueal.
b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: PA 120 x 80 mmHg, FC 125 bpm, FR 38 rpm, peso:


80 Kg, altura 1,80 m. Tórax: tonel, MV com sibilos e roncos
difusos, RCR em 2T, sem sopros.
c. Exames complementares: ECG mostra taquicardia sinusal, FC
125 bpm, sem alterações isquêmicas. Radiografia de tórax sinais de
hiperinsuflação pulmonar, sem consolidações. Exames laboratoriais
sem alterações relevantes.
d. Parâmetros iniciais sugeridos para a ventilação mecânica de
portador de DPOC exacerbado:

1. Modo: A/C - PCV


2. Pinsp: 12
3. VC: ~450 mL (peso ideal 75 Kg)
4. PPI: ajustar alarme para 40 cmH2O
5. FR: 12 rpm
6. Tinsp: 0,8 segundos
7. PEEP 5 cmH2O
8. I:E: 1:3 (a partir do ajuste de FR)
9. Sens: pressão -2 cmH2O

DICAS DO ESPECIALISTA
a. Metas e ventilação nas doenças obstrutivas (DPOC, asma):
• Baixo volume corrente (6 mL/Kg de peso predito)
• Baixa frequência respiratória (menor que 15 ipm)
• Maior tempo expiratório (relação I:E de 1:3 ou mais)
• Pressão de platô menor que 30 cmH O 2

• PEEP inicial mais baixa: 5-7 cmH O2

• Resistência das vias aéreas menor que 20 cmH O/L/s


2

• Auto-PEEP (pressão alveolar medida ao final da expiração através


de pausa de 3 segundos) abaixo de 10 cmH2O

• Manter PaCO ajustado para o bicarbonato inicial (possibilidade


2

de ser retentor crônico de CO2)

b. Metas e ventilação nas doenças restritivas (fibrose, SDRA):

• Baixo volume corrente (6 mL/Kg de peso predito)


• Frequência respiratória alta (maior que 15 ipm)
• Tempo inspiratório baixo (0,8 segundos)
• PEEP inicial mais alta (7-10 cmH O) se necessidade de altas taxas
2

de FIO2 na SDRA

• Pressão de platô menor que 30 cmH O 2


• Driving pressure (pressão alveolar no final da inspiração - PEEP)
abaixo de 15 cmH2O, principalmente na SDRA

• pH permitido até 7,2 na SDRA (com o objetivo de manter baixo


volume corrente)

• PaCO permitida maior que 50 mmHg na SDRA (com o objetivo


2

de manter baixo volume corrente)

REFERÊNCIAS
1. Holanda MA. Xlung. [Internet]; 2017. [acesso em 23 jun 2020]. Disponível em:
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10. Carvalho CRR. Ventilação Mecânica. Volume I – Básico (Clínicas Brasileiras de Medicina
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11. Carvalho CRR. Ventilação Mecânica. Volume II – Avançado (Clínicas Brasileiras de
Medicina Intensiva). São Paulo: Atheneu, 2000. 500 p. 9 v.
7.1
LÚPUS ERITEMATOSOS
SISTÊMICO (LES)
Autora:
Yanne Franca Montino

def.jpg DEFINIÇÕES
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença reumática
autoimune inflamatória, multissistêmica, crônica, de etiologia multifatorial,
caracterizada pela produção de autoanticorpos dirigidos contra proteínas do
próprio organismo e com manifestações clínicas flutuantes, apresentando
evolução e prognósticos variáveis.

eti.jpg ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA


• O LES é uma doença predominantemente do sexo feminino,
podendo ocorrer em qualquer idade; contudo, apresenta seu pico
de incidência entre 15 e 45 anos em mulheres, com proporção
feminino/masculina que varia com a idade; cerca de 2:1 antes da
puberdade, razão máxima de 12:1 durante a menacme, e declínio
para aproximadamente 2:1 após a menopausa, e apresenta uma
gravidade ligeiramente menor no início da doença. A
predominância do sexo feminino, numa relação de 9 mulheres
para 1 homem, indica um efeito do hormônio estrogênio.

• A taxa de Prevalência varia de 20 a 150 por 100.000 habitantes,


bem estabelecida em países da Europa. A Incidência Estimada é
1,5 a 9,3 casos por 100.000 habitantes/ano.

• Os fatores de mau prognóstico são raça negra, baixo nível


socioeconômico, comprometimento renal e do sistema nervoso
central. As causa de óbitos mais frequente são atividade lúpica
associada a infecções com idade < 55 anos e comprometimento
cardiovascular com idade > 55 anos.

• O LES é o produto da ação de diversos autoanticorpos que, ao se


ligarem aos autoantígenos, originam imunocomplexos que ativam
o sistema complemento, ponto de partida para o processo de
quimiotaxia e inflamação tecidual. Imunocomplexos podem agir
em nível local devido à ligação direta dos autoanticorpos aos
tecidos ou no soro como imunocomplexos circulante.

• Os fatores genéticos corroboram o desenvolvimento da doença


devido ao elevado grau de concordância entre gêmeos univitelinos
e parentes de primeiro grau.

• A exposição aos raios ultravioleta do tipo B mais que do tipo A é


o fator ambiental mais bem estabelecido, podendo desencadear
atividade lúpica ou exacerbar o quadro clínico do LES na maioria
dos pacientes.

• Os hormônios sexuais estrógenos atuam como estimulantes,


enquanto os androgênos e os progestágenos fazem o oposto, o que
explica a predominância elevada no sexo feminino durante
menacme.

• O tabaco aumenta o risco para o desenvolvimento e exacerbação


do LES. A exposição à poeira da sílica, presente em diversas
situações como manuseio de solos, cimento e fumaça de cigarro,
bem como exposição a pesticidas tanto agrícolas quanto
residencial, parecem aumentar incidência da doença.

• Agentes microbiológicos como o vírus Epstein-Barr apresentou


maior taxa de infecção prévia nos pacientes com LES em relação
à população em geral. Na infecção pelo HIV, quando ocorre
depleção de linfócitos TCD4+, inibe doenças autoimunes como o
LES.
• Algumas drogas foram relacionadas ao LES e, por isso,
associadas ao lúpus fármaco induzido. As mais estabelecidas são
descritas no Quadro 1.
SUBSTÂNCIAS APONTADAS COMO CAUSADORAS DE
LÚPUS INDUZIDOS POR DROGAS

• Hidralazina • D-penicilamina
• Procainamida • Metildopa
• Isoniazida • Quinidina
• Fenitoína • Interferon-alfa

• Clorpromazina • Anti-TNF
(etanercepte, infliximabe, adalimumabe)

Quadro 1.
Fonte: Adaptada, Merola JF Drug-induced lupus UpToDate. [Internet];
2020. Acesso 13/08/2020.

quadc.jpg QUADRO CLÍNICO


Os sintomas constitucionais representam 60% a 70% dos achados
inespecíficos caracterizados por mal-estar, febre, diminuição do apetite,
perda de peso, poliadenopatia, mialgia, artralgia e a fadiga, que constitui um
sintoma incapacitante em muitos pacientes com LES. A febre, que pode ser
baixa e contínua, ou alta e em picos, merece uma atenção especial e deve
ser cuidadosamente investigada.

a. MANIFESTAÇÕES CUTÂNEAS (70% A 80%)

• ESPECÍFICAS:
• LÚPUS ERITEMATOSO CUTÂNEO AGUDO
A erupção cutânea em “asa de borboleta” ou eritema malar é a lesão
de pele mais característica do LES. Apresenta-se de forma aguda localizada,
eritematosa, elevada, por vezes pruriginosa ou dolorosa, em geral
descamativa, com edema, distribuição malar e dorso do nariz,
frequentemente precipitada pela exposição solar. A lesão poupa as pregas
nasolabiais devido a sua área fotoprotegida e flutua com a atividade da
doença. Precipitada por exposição solar, pode persistir por dias ou semanas,
facilitando o diagnóstico do LES e acompanha outras manifestações.
Erupção eritematosa generalizada precipita-se de maneira aguda em
áreas de exposição aos raios solares ou luz artificial fluorescente, tais como
região cervical, face e extremidades.

• LÚPUS ERITEMATOSO CUTÂNEO SUBAGUDO


As lesões cutâneas subagudas comumente precipitadas pela exposição
solar apresentam-se eritematodescamativas difusas, sem cicatrizes, não
endurecidas, mas reicidivantes. Predominam em membros superiores e
parte superior do tronco. O lúpus subagudo revela-se como pápulas
eritematosas ou pequenas placas com leve descamação, que podem evoluir
para papuloescamosa e imitar a psoríase ou líquen plano, ou podem se
fundir formando lesões policíclicas ou anulares. O Lúpus subagudo é
fotossensível e está associado ao anticorpo anti-Ro (SSA) em até 90% dos
pacientes.

• LÚPUS CUTÂNEO CRÔNICO


As lesões cutâneas crônicas, mais comumente representadas pelo lúpus
discoide localizado ou generalizadas, podem ocorrer na ausência de
quaisquer manifestações sistêmicas ou como parte do LES. Apresentam-se
como pápulas eritematosas bem definidas ou placas com descamação firmes
que podem se tornar espessas e aderidas com área central hipopigmentada,
localizadas em regiões de exposição ao sol (couro cabeludo, pavilhão
auricular, região mentoniana e malar). A lesão evolui com obstrução dos
folículos capilares e áreas cicatriciais com atrofia central. Ao regredirem,
apresentam regiões cicatriciais discrômicas, com telangiectasias e alopecia
extensa e com frequência irreversível.

• LESÕES CUTÂNEAS NÃO ESPECÍFICAS DO LES


• A alopecia não discoide ou não cicatricial é bastante comum
no LES. É caracterizada pela queda de cabelo, difusa ou
esparsa, que se desprende com facilidade, principalmente nas
regiões temporais e parietais do couro cabeludo. Normalmente
é reversível, com o controle da atividade da doença. Pacientes
com LES geralmente apresentam cabelos quebradiços.
• Lesões mucocutâneas inespecíficas são caracterizadas por
lesões vesiculobolhosas e urticariformes que ocorrem em 5% a
10% dos pacientes. As lesões urticariformes são crônicas e
secundárias a uma vasculite leucocitoclásica associada ou não à
hipocomplementenemia e se manifestam como pápulas com 48
às 72h de duração.
• A vasculite cutânea no LES é observada em até 20% dos
pacientes como púrpura ou petéquias, ulcerações digitais ou
maleolares, nódulos subcutâneos, livedo reticular, hemorragia
em estilhaço, lesões palmoplantares e do espaço da polpa digital
simulando nódulos de Osler e lesões de Janeway. A
vasculopatia pode estar associada aos anticorpos
antifosfolípides, como formação de trombo, inflamação e
alterações isquêmicas que podem culminar em gangrena.
• O fenômeno de Raynaud secundário ocorre em cerca de 50%
dos pacientes, caracterizando vasculite com formação de
trombo e vasoespasmo episódicos das artérias digitais,
manifestando-se com palidez, cianose e rubor digitais. Quando
graves, podem evoluir com ulcerações e até gangrena.

b. MANIFESTAÇÕES MUSCULOESQUELÉTICAS

• Artralgias e mialgias constituem as primeiras e mais comuns


manifestações do LES. A artrite lúpica geralmente apresenta um
padrão simétrico, distal e migratório, intermitente de pequenas
articulações periféricas, com pouco ou nenhum derrame articular,
raramente de evolução crônica e não cursa com erosões ósseas.
• As articulações das mãos, punhos e joelhos são as mais
acometidas; contudo, as articulações do tornozelo, quadril,
cotovelo e ombro também podem ser envolvidas.

• A rigidez matinal é inferior a uma hora. A artrite do LES pode


apresentar deformidades semelhantes à artrite reumatoide em
função do relaxamento das cápsulas articulares, tendões e
ligamentos que acarretam deformidade das mãos e desvio ulnar,
condição denominada de artropatia não erosiva de Jaccoud. As
tenossinovites estão presentes em 10% a 13% dos pacientes.

• Os nódulos reumatoides foram evidenciados em 5% a 7% dos


pacientes, são dolorosos e hipersensíveis. Podem ser precoces ou
tardias, geralmente transitórios e regressivos, conforme resposta a
terapêutica. A miosite, caracterizada por dores musculares,
fraqueza ou ambas, geralmente associada à fibromialgia, é rara e
ocorre em menos de 5%; entretanto, a mialgia é bastante comum.

c. MANIFESTAÇÕES RENAIS

• O envolvimento renal é uma das manifestações mais graves do


LES e associa-se ao aumento da morbimortalidade, sendo
evidenciado pelo achado de proteinúria superior a 500 mg em
24h, cilindro na urina, hematúria, piúria, espumúria, edema,
creatinina sérica elevada e hipertensão.

• A biópsia renal deve ser indicada quando: proteinúria de 24 h seja


> 1 g/24h (ou relação proteinúria/creatininúria ≥ 1,0); Proteinúria
≥ 0,5 g/24horas associada à hematúria dismórfica glomerular e/ou
cilindros celulares ou sempre que houver elevação da creatinina
sérica sem causa aparente e potencialmente associada ao LES.

• Em 2004, um grupo de reumatologistas, nefrologistas e


patologistas desenvolveu a classificação de nefrite lúpica baseada
em correlação clinicopatológica (Quadro 2).
I CLASSE GN mesangial mínima Presença de depósitos imunes a imunoflurescência. MO normal

Presença de hipercelularidade mesangial ou


II CLASSE GN mesangial proliferativa
expansão da matriz mesangial a MO

III CLASSE GN focal Envolvimento de < 50% dos glomérulos

Envolvimento de >50% dos glomérulos


IV CLASSE GN difusa
(extracapilar e/ou mesangial e /ou endocapilar)

Presença de espessamento difuso da parede


V CLASSE GN membranosa
capilar glomerular á MO e de depósitos imunes subepiteliais

VI CLASSE GN esclerosante avançada Mais de 90% dos glomérulos estão esclerosados globalmente

GN: glomerulonefrite; ME: microscopia eletrônica; MO: microscopia óptica

Quadro 2. Classificação das glomerulonefrites lúpicas (segundo as


Sociedades de Nefrologia e Patologia Renal)
Fonte: Adaptada de Weening. Et al; 2004.

d. MANIFESTAÇÕES NEUROPSIQUIÁTRICAS

• As manifestações neuropsiquiátricas podem preceder, ocorrer


concomitantemente ou algum tempo após o início da doença,
durante os períodos de atividade ou quando o LES se encontra
inativo. Podem ser primárias ou secundárias a diversas situações,
como infecção, distúrbios metabólicos, hipertensão arterial, uso de
alguns medicamentos e diabetes. O colégio Americano de
Reumatologia (ACR) propôs uma nomenclatura padronizada para
as síndromes neuropsiquiátricas do LES (Quadro 3).
SISTEMA NERVOSO SISTEMA NERVOSO
CENTRAL PERIFÉRICO

Estado confusional agudo Neuropatia craniana

Disfunção cognitiva Polineuropatia

Psicose Mononeuropatia isolada / múltipla


Transtorno afetivo Síndrome de Guillain-Barré

Transtorno ansioso Miastenia grave

Cefaléia Transtorno autonômico

Acidente vascular cerebral

Mielopatia

Transtorno de movimento

Síndrome desmielinizante

Transtorno convulsivo

Meningite asséptica

Quadro 3. Síndromes neuropsiquiátricas relacionada com o LES.


Fonte: Adaptada de ACR ad hoc Commitee on neuropsychiatric lúpus
nomeclature, 1999.

e. MANIFESTAÇÕES GASTROINTESTINAIS

• Todo o trato gastrointestinal pode ser envolvido pelo LES ou por


suas complicações; e pode incluir acometimento esofágico,
vasculite mesentérica, doença inflamatória intestinal, pancreatite,
acometimento hepático e peritonite.

• Manifestações inespecíficas ocorrem em cerca de 30% a 40% dos


pacientes, como: anorexia, náuseas, vômitos, dores abdominais.

• A trombose mesentérica pode ocorrer em associação à presença


de anticorpos antifosfolípides e pode levar a um infarto intestinal,
que tem alto grau de morbimortalidade. Inflamação peritoneal
pode causar síndrome abdominal aguda, e estudos de autópsia
sugerem peritonite em até 60% dos casos. A ascite pode
acompanhar a peritonite em torno de 11% dos casos e,
geralmente, acompanha a evolução e a resposta ao tratamento.

• Pancreatite aguda ocorre em 5 a 10% dos pacientes,


manifestando-se com aumento da amilase e com quadro clínico
semelhante ao observado em pacientes que não têm lúpus. Os
mecanismos da pancreatite no LES são vasculite ou trombose.

• Envolvimento hepático: é comum e se manifesta com elevação


das enzimas hepáticas aumentadas, incluindo a aspartato
aminotransferase, a alanina aminotransferase, a desidrogenase
lática e a fosfatase alcalina. Essas anormalidades foram associadas
ao lúpus ativo e à administração concomitante de medicamento,
geralmente com associação a anticorpos antifosfolípides.
f. ANORMALIDADES HEMATOLÓGICAS

• As citopenias são características frequentes no LES, podendo


apresentar ou não natureza imunomediada. São representadas por
anemia, leucopenia ou linfopenia e trombocitopenia.

• Anemia (50%): anemia de doença crônica, anemia ferropriva e


anemia hemolítica autoimune são as causas mais frequentes de
anemia em pacientes com LES. Anemia hemolítica (10%):
acompanhada de bilirrubinas aumentadas, reticulócitos e teste de
coombs positivo. Leucopenia: cerca de 50% dos pacientes
apresentam diminuição de leucócitos, muito raro com contagem
menor 1.500/mm³ na atividade lúpica, exceto quando associado a
outras causas. A neutropenia pode ser secundária às drogas
imunossupressoras ou consequência de autoanticorpos inibidores
de unidades formadoras clonais de granulócitos na medula óssea.

• Linfopenia: pode ocorrer no LES ativo ou sem qualquer


manifestação clínica da doença. A linfopenia moderada a grave
geralmente está associada a um grau elevado de atividade lúpica,
agravamento dos danos e propicia um fator de risco para infecções
graves. Trombocitopenia: em 10% dos casos a trombocitopenia é
secundária a um envolvimento multissistêmico do LES
gravemente ativo, apresentando plaquetas < 50.000/mm³;
entretanto, pode apresentar-se de forma discreta em 25% a 50%
dos casos, com plaquetas 100.000 a 150.000/mm³. Em ambos os
casos, os pacientes podem apresentar petéquias leves ou púrpuras.
Pancitopenias: no LES pode ocorrer secundariamente aos efeitos
das drogas, principalmente imunossupressores, ou da síndrome
hemofagocitária.
g. ENVOLVIMENTO PULMONAR

• O acometimento pulmonar primário no LES acarreta:


anormalidade da função pulmonar, que geralmente é padrão
restritivo, com diminuição do volume corrente e da capacidade
vital forçada, pleurite, pneumonite aguda ou crônica, hemorragia
pulmonar, hipertensão pulmonar e o envolvimento de via aérea e
do diafragma. Hemorragia alveolar difusa é um quadro raro,
porém com taxa de mortalidade elevada, entre 50% a 90%.

• O quadro clínico apresenta início abrupto de dispneia, tosse, febre


e infiltrados, com intensa redução de hemoglobina, associado à
insuficiência respiratória aguda e hemoptises em 50% dos casos.
Hipertensão pulmonar é um quadro pouco comum, ocorrendo em
0,5% a 14% dos pacientes com LES em consequência de
complicações da atividade lúpica ou de morbidades como embolia
pulmonar, valvulopatia cardíaca ou doença intersticial pulmonar.
Os sintomas iniciais são inespecíficos e geralmente insidiosos, tais
como dispneia de esforço, fadiga, fraqueza e tosse não produtiva.

• Embolia pulmonar no LES pode ocorrer com ou sem a presença


de anticorpos antifosfolípides. Quando associada à síndrome
anticorpo antifosfolípides, o envolvimento pulmonar está presente
em 66% dos casos e culmina em embolia pulmonar, síndrome da
angústia respiratória adulta, trombose arterial pulmonar,
microtrombos ou hemorragias alveolares.
h. MANIFESTAÇÕES CARDÍACAS

• O acometimento cardíaco secundário ao LES pode apresentar


múltiplas manifestações, como pericardites, miocardites,
endocardites, comprometimento valvar e vasculite coronariana.
Pericardite ocorre em 20% a 30% dos pacientes com LES e pode
manifestar-se na ausência do derrame pericárdico ou secundário
ao derrame pericárdico, sendo este mais comum, representando
30% dos exames ecocardiográficos em pacientes com LES. Os
achados clínicos podem ser clássicos da pericardite, apresentando
dor torácica precordial e um ruído típico do atrito do folheto
pericárdico, porém a condição pode cursar de forma indolor e
silenciosa. A miocardite está presente em cerca de 10% dos
pacientes com LES e geralmente associada à pericardite e maior
severidade da atividade lúpica, apresentando menor índice de
sobrevivência em relação aos não acometidos pela miocardite.

• As radiografias cardíacas apresentam alterações em 55% dos


pacientes com LES. Além disso, os eletrocardiogramas e
ecocardiografias em repouso estão anormais em mais de 70%
desses pacientes.

• O comprometimento valvar é muito comum no LES, e 60%


destes pacientes são encontradas vegetações à ecocardiografia. A
endocardite de Libman-Sacks, encontrada em 43% dos pacientes,
é caracterizada por vegetações verrucosas associadas a anticorpos
antifosfolípides em 50% dos casos, e podem estar presente de
modo similar no átrio esquerdo e imitar tumores intracardíacos.

• As anormalidades valvares podem remitir, persistir ou agravar-se,


e habitualmente evoluem com espessamento que envolve a valva
mitral ou aórtica. Reflete o acúmulo de imunocomplexos, células
mononucleares e trombos de fibrina associada a plaquetas
localizadas, sobretudo nas valvas do coração esquerdo. Podem
culminar em embolia arterial e deformidade valvar.
Ocasionalmente, há acometimento de múltiplas valvas e
instabilidade hemodinâmica.

• Vasculite coronariana é um quadro raro no LES e, quando ocorre,


pode estar associada à atividade lúpica ou não. Doença arterial
coronariana ocorre com maior frequência em pacientes
acometidos por LES do que na população em geral. Reflete uma
aterosclerose generalizada no LES, podendo ocorrer em mulheres
mesmo antes da menopausa. Pacientes com LES em idade entre
35 e 44 anos apresentam risco 50 vezes maior, de infarto agudo do
miocárdio,do que mulheres saudáveis na mesma faixa etária.
i. MANIFESTAÇÕES OCULARES

• A ceratoconjuntivite seca e alterações vasculares da retina,


associadas à síndrome de Sjögren secundária, compreendem as
manisfetações oculares mais comuns no LES. Outras
anormalidades como episclerite, ceratite ulcerativa periférica,
esclerite, coroidopatia, derrames uveais, uveítes, deslocamento de
retina, vasculite retiniana, neurite óptica e glaucoma de ângulo
fechado também podem ocorrer.

exac.jpg EXAMES COMPLEMENTARES


• Realizamos exames de rotina, como: hemograma para avaliar
presença de anemia, leucopenia ou plaquetopenia.

• Creatinina sérica, se elevada, pode sugerir disfunção renal, e a


análise da urina pode evidenciar presença de hematúria, piúria,
proteinúria.

• Exames mais específicos: FAN anticorpo antinuclear, detectado


em praticamente todos os pacientes portadores de LES. Se FAN
positivo, deve-se testar os outros anticorpos, como:
• Anti-DNA (é considerado específico para LES e pode ser
observado em 50-70% dos pacientes, estando relacionado com
comprometimento renal);

• Anti-SM (também considerado específico para LES, com


sensibilidade é de aproximadamente 30%);

• Anti-Ro/Anti-La (estão presentes entre 20-30% dos pacientes.


Ambos os anticorpos estão relacionados com a síndrome de
Sjögren, e o Anti-Ro está associado a lesão cutânea fotossensível,
lúpus neonatal e lúpus cutâneo subagudo);

• Anti-Histona (está presente em 90% dos lúpus induzidos por


drogas);

• Anti-P ribossômico (presente em 10% dos casos e está


relacionado com manifestações neuropsiquiátricas);

• Antinucleossomo (considerado específico para LES, está


relacionado com atividade da doença e comprometimento renal e
é utilizado na prática clínica para avaliação do diagnóstico de
lúpus, especialmente em pacientes com lúpus juvenil com anti-
Dna negativo);

• Anti-C1q (estão associados à nefrite lúpica e à atividade da


doença em adultos e em pacientes com lúpus juvenil).

diag.jpg DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO


• O diagnóstico de lúpus eritematoso sistêmico (LES) baseia-se no
julgamento de um clínico experiente que reconhece constelações
características de sintomas e sinais no cenário de estudos
sorológicos de suporte após exclusão de diagnósticos alternativos.
Isso geralmente é desafiador devido à grande variabilidade na
expressão do LES.

• Seguem, na Tabela 1, os critérios classificatórios do Lúpus


Eritematoso Sistêmico (ACR/EULAR 2019):
CRITÉRIO DE Fatores antinucleares (FAN) com um título ≥ 1:80 nas células HEp-2 ou um teste
ENTRADA positivo equivalente

seta1
Se ausente, não classifique como LES
Se houver, aplique critérios aditivos

seta1
Não conte um critério se houver uma explicação provável que o LES.
A ocorrência de um critério em pelo menos uma ocasião é suficiente.
A classificação do LES requer pelo menos um critério
CRITÉRIOS
clínico e ≥ 10 pontos.
ADITIVOS
Os critérios não precisam ocorrer simultaneamente.
Dentro de cada domínio, apenas o critério ponderado
mais alto é contado para a pontuação total.

seta1
DOMÍNIOS E CRITÉRIOS DOMÍNIOS E CRITÉRIOS DE
PESO PESO
CLÍNICOS IMUNOLOGIA

Anticorpos antifodfolipides
Constitucional Anticorpos anti-cardiolipina OU
2
Febre Anticorpos anti-ß2GP1 OU
Anticoagulante do lúpus 2

Hematológico
Proteinas de complemento
Leocopenia 3
C3 baixo OU C4 baixo 3
Trombocitopenia 4
C3 baixo E C4 baixo 4
Hemólise autoimune 4

Neuropsiquiátrico
Anticorpos específicos para LES
Delírio 2
Anticorpo anti-dsDNA* OU
Psicose 3 6
Anticorpo anti-Smith
Apreensão 5

Mucocutâneo
Alopsia sem cicatrizes 2
Úlceras orais 2
Lúpus cutâneo OU discoide subagudo 4
Lúpus cutâneo agudo 6

Serosal
Derrame pleural ou pericárdico 5
Pericardite aguda 6

Músculo-esquelético
Envolvimento conjunto 6

Renal
Proteinúria > 0,5g/24h 4
Biópsia renal Nefretite lúpica ClasseII ou V 8
Biópsia renal Nefretite lúpica ClasseIII ou VI 10
PONTUAÇÃO TOTAL: Classifique como Lúpus Eritermatoso Sistêmico com uma
pontuação de 10 ou mais se o critério
de entrada for cumprido

Tabela 1.
Fonte: Adaptada Aringer M, Costenbader K, Daikh D, et al. 2019. ACR
classification criteria for systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheumatol
2019.

• Definições dos critérios (Tabela 2):


CRITÉRIO DEFINIÇÃO

Fan > ou igual 1:80 em células HPe-2 ou teste equivalente em pelo menos 1 vez.

Febre Temperatura acima de 38,3°

Leucopenia Glóbulos brancos < 4.000

Trombocitopenia Contagem de plaquetas < 100.000

Evidência de hemólise: elevação de bilirrubina indireta, LDH, reticuócitos. Queda de


Hemólise autoimune
haptoglobulina , coombs direto positivo

Caracterizado por (1) mudança de consciência ou nível de excitação com capacidade


reduzida de foco, (2) desenvolvimento de sintomas entre horas e < 2 dias, (3) flutuação dos
Delírio sintomas ao longo do dia, (4) A- mudança aguda/subaguda na cognição (por exemplo, déficit
de memória ou desorientação) ou B- mudança de comportamento, humor ou afeto (por
exemplo, inquietação, reversão do ciclo sono/vigília).

Convulsão Generalizada ou focal

Psicose Caracterizada por: 1- delírio e/ou alucinação 2- ausência de delirium

Alopecia não cicatricial Alopecia não cicatricial observada por um médico*

Úlceras orais Ulceras orais observadas por um médico *

Lúpus cutâneo agudo Erupção malar ou erupção maculopapular generalizada observada por um clínico.

Lúpus eritematoso cutâneo subagudo observado por um médico*: Erupção cutânea anular ou
papuloescamosa (psoriasiforme), geralmente fotodistribuída.
Lúpus cutâneo ou Lúpus eritematoso discóide observado por um clínico*: Lesões cutâneas eritematovioláceas
discoide subagudo com alterações secundárias de cicatrizes atróficas, dispigmentação, muitas vezes
hiperceratose folicular/hematológica (couro cabeludo), levando à alopecia cicatricial no
couro cabeludo.

Derrame pleural ou Evidência de imagem (como ultrassom, radiografia, tomografia computadorizada,


pericárdico ressonância magnética) de derrame pleural ou pericárdico, ou ambos.
CRITÉRIO DEFINIÇÃO

≥2 de 1-dor torácica pericárdica (normalmente aguda, pior com inspiração, melhorada pela
inclinação para a frente), 2- atrito pericárdico; 3- eletrocardiograma (ECG) com nova
Pericardite aguda
elevação de ST ou depressão PR, 4- nova ou aumento do derrame pericárdico em imagem
(como ultrassom, radiografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética)

sinovite envolvendo 2 ou mais articulações caracterizadas por inchaço ou derrame OU


Envolvimento articular
sensibilidade em 2 ou mais articulações e pelo menos 30 minutos de rigidez matinal.

Proteinúria> 0,5 g / 24 horas Proteinúria > 0,5 g / 24 horas em exame de proteinúria de 24h

Nefrite lúpica classe II ou V na


Classe II: nefrite lúpica proliferativa mesangial
biópsia renal, de acordo com a
Classe V: nefrite lúpica membranosa
classificação ISN / RPS 2003

Nefrite lúpica classe III ou IV na


biópsia renal de acordo com a
Classe III: nefrite lúpica focal
Sociedade Internacional de
Classe IV: nefrite lúpica difus
Nefrologia / Sociedade de
Patologia Renal (ISN / RPS) 2003

Anticorpos antifosfolípides Anticorpos anticardiolipina (IgA, IgG ou IgM) em títulos médios ou altos ou anticorpos anti-
positivos beta-2GP1 positivos (IgA, IgG ou IgM ) ou anticoagulante lúpico positivo

C3 baixo OU C4 baixo C3 OU C4 abaixo do limite inferior do normal

C3 baixo E C4 baixo Ambos C3 e C4 abaixo de seus limites inferiores do normal.

* Isso pode incluir exame físico ou revisão de uma fotografia.

Tabela 2. Definição dos critérios classificatórios


Fonte: Adaptada Aringer M, Costenbader K, Daikh D, et al. 2019. ACR
classification criteria for systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheumatol
2019.

trat.jpg TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Medidas Gerais
• O tratamento do LES objetiva o controle da atividade da doença,
prevenção de danos, minimizar complicações aos órgãos e
sistemas, reduzir toxicidade medicamentosa, orientar os pacientes
e familiares sobre o curso e gestão da doença, melhorar qualidade
de vida e aumentar sobrevida do paciente. O tratamento é
específico para cada paciente, conforme as manifestações clínicas,
gravidade, comorbidades associadas e atividade da doença.

• Os pacientes necessitam de acompanhamento regular com um


reumatologista para fortalecer as terapêuticas farmacológicas e
não farmacológicas, bem como cuidados com outros especialistas
quando há acometimento multiorgânico. Os doentes devem evitar
o sol e obter medidas de proteção solar, como uso de bonés,
guarda-sol, sombrinha e protetor solar, além de evitar exposição a
outras formas de irradiação ultravioleta (UV), como, por exemplo,
lâmpadas fluorescentes e halógenas.

• O hábito tabágico deve ser desencorajado, pois pode agravar o


fenômeno de Raynaud, desencadear efeitos nocivos devido à
exposição a hidrazinas na fumaça do cigarro, prejudicar a eficácia
da hidroxicloroquina e reduzir a oxigenação tecidual. Deve ser
evitada a prática de exercícios extenuantes, já que a fadiga ocorre
em 50% a 90% dos pacientes lúpicos, pois possuem capacidade
aeróbica diminuída em 30% a 40%. Deve-se fazer boa higiene do
sono, realizar exercícios aeróbicos moderados, obter apoio
cognitivo-comportamental, medidas de redução da ansiedade e
evitar estimulantes sem orientação médica.

• Mudança da pressão barométrica é capaz de provocar rigidez


matinal, e a sazonalidade pode influenciar negativamente no
fenômeno de Raynaud. Manter níveis de vitamina D adequados
pelo benéfico da regulação imune. Fazer ingestão semanal de uma
ou duas refeições à base de peixe ou utilizar cápsula de óleo de
peixe (efeito anti-inflamatório do ácido ecosapentanoico);
contudo, não há restrição alimentar específica para o LES, exceto
para minimizar efeitos colaterais do uso de corticoides e dietas
hipoproteicas em pacientes com acometimento renal avançado. O
uso de álcool moderado não é contraindicado nem afeta o curso da
doença.
• Nos indivíduos com LES, a medicação para dor deve seguir a
escala de dor igual para a população em geral, exceto quando
apresenta comorbidades como fibromialgia ou necrose vascular.
Imunização em paciente com LES deve ser contraindicada no
caso de vacinas de vírus vivos (Febre Amarela – Sarampo,
Rubéola, Caxumba – Varicela – Rotavírus – Sabin). As vacinas
contra hepatite B, pneumococos e influenza são seguras.

• A fertilidade no LES não é comprometida, porém a gravidez não


é aconselhada durante atividade lúpica, principalmente na
iminência de nefropatia. Devem ser levadas em conta a extensão
da doença e a toxicidade dos fármacos. Os métodos
contraceptivos indicados são os injetáveis ou orais à base de
progesterona, métodos de barreira e o dispositivo intrauterino
(DIU). Os anticoncepcionais à base de estrógenos são
contraindicados quando positivos para anticorpos antifosfolípides,
e aumentam o risco de osteoporose nos pacientes em uso
corticoide, devido à excreção aumentada de cálcio, diminuição da
absorção intestinal e reabsorção tubular renal de cálcio, elevando
o risco de osteoporose.

b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Dada a heterogeneidade clínica do LES e o curso imprevisível da


doença, a abordagem terapêutica é altamente variável e
geralmente é guiada pelas manifestações predominantes da
doença. No entanto, existem alguns princípios gerais da terapia
medicamentosa que se aplicam a todos os pacientes.

• Em geral, todos os pacientes com LES, com algum grau e tipo de


atividade da doença devem ser tratados com hidroxicloroquina
(400 mg por comprimido) 6,5 mg/kg/ via oral 1 vez por dia ou
cloroquina, a menos que esses agentes sejam contraindicados.
• Os benefícios da hidroxicloroquina ou cloroquina no LES são
amplos e incluem alívio de sintomas constitucionais,
manifestações musculoesqueléticas e manifestações
mucocutâneas, reduzem as taxas de flare, eventos trombóticos,
acúmulo de danos nos órgãos e mortalidade, além de remissão da
doença e impacto positivo na sobrevida.
A terapia adicional é baseada na gravidade da doença e na combinação
de manifestações:

• Pacientes com manifestações leves de lúpus (por exemplo,


envolvimento da pele, articulações e mucosas) podem ser tratados
com hidroxicloroquina ou cloroquina , com e sem AINEs e/ou uso
a curto prazo de glicocorticoides em baixa dose (por exemplo, ≤
7,5 mg de prednisona equivalente por dia).

• Pacientes com comprometimento moderado do lúpus são


definidos como portadores de doença significativa, mas que não
ameaça órgãos (por exemplo, constitucional, cutânea,
musculoesquelética ou hematológica). Os pacientes geralmente
respondem à hidroxicloroquina ou cloroquina mais terapia de
curto prazo com 5 a 15 mg de prednisona (ou equivalente)
diariamente. Um agente imunossupressor poupador de esteroides
(por exemplo, azatioprina ou metrotrexato) é frequentemente
necessário para controlar os sintomas.

• Pacientes com manifestações graves ou com risco de vida


secundárias ao envolvimento de órgãos importantes (por exemplo,
sistema nervoso central e renal) geralmente requerem um período
inicial de terapia imunossupressora intensiva (terapia de indução)
para controlar a doença e deter a lesão tecidual. Os pacientes
geralmente são tratados por um curto período de tempo com altas
doses de glicocorticoides sistêmicos (por exemplo, “pulsos”
intravenosos de metilprednisolona , 0,5 a 1 g/dia por três dias em
pacientes agudos ou 1 a 2 mg/kg/ dia em pacientes mais estáveis)
usados isoladamente ou em combinação com outros agentes
imunossupressores.
O uso de esteroides em longo prazo está associado a complicações como
hiperglicemia, hipertensão, visão duplas, glaucoma, cataratas, osteoporose,
retenção de líquido, ganho de peso, úlcera péptica, alterações emocionais do
comportamento, vulnerabilidade a infecções, necrose avascular, fragilidade
capilar e equimose.

c. TRATAMENTO MEDICAMENTOSO ESPECÍFICO

• Lúpus Cutâneo e Cutaneovascular


• Evitar exposição ao sol, utilizar medidas de fotoproteção, fazer
uso protetor solar FPS

• ≥ 30 com aplicação no início da manhã, repetindo ao longo do


dia.

• Os corticoides tópicos são tratamento de primeira linha para


tratamento de lúpus e lúpus cutâneo. Sugerimos a aplicação 2
vezes ao dia de um corticosteroide tópico de alta potência, como o
propionato de clobetasol 0,05 mg para as crises aguda. Para
pacientes com atividade mínima da doença no rosto, normalmente
usamos 2 vezes ao dia um esteroide tópico de baixa potência,
como hidrocortisona 1% ou 2,5%. Aplicação duas vezes ao dia de
corticosteroides tópicos de média a alta potência, como
triancinolona acetonida 0,1% creme ou fluocinonida creme a
0,05%, são utilizados para lesões em tronco, extremidades e couro
cabeludo.

• Os pacientes que não responderam à terapia tópica são candidatos


à terapia sistêmica como hidroxicloroquina (400 mg/cp) 6,5
mg/kg VO 1 vez por dia. Nos casos refratários, os retinoides
sintéticos isotretinoína e acitretina são fármacos de segunda linda
com boa resposta terapêutica, dose inicial de isotretinoína 0,5 a 1
mg/kg/dia, especialmente no lúpus discoide. Em caso de
permanência ou piora das lesões, considerar uso de corticoide
oral. Em casos ainda refratários ou com apresentação bolhosa,
pode empregar-se: Metrotrexate 10 a 20 mg IV uma vez por
semana; Azatioprina 1 a 2 mg/kg VO em 1-2 doses por dia;
Dapsona 100 mg/dia VO 1 vez por dia; uso de ciclosporinas
principalmente para urticária; e, para queda de cabelo, xampus
contendo cisteína e produtos à base de minoxidil, e injeção
interlesional de esteroides.

• Nas manifestações cutaneovasculares representadas por Síndrome


de Raynaud, vasculite cutânea e levedo reticular, são abordados
preventivamente com medidas de proteção a exposição ao frio, a
terapia cognitivo-comportamental e o biofeedback. Medicações
anti-inflamatórias nos casos de vasculites de grangrena, e nas
manifestações leves a moderadas da instabilidade vasomotora, os
bloqueadores dos canais de cálcio e bloqueadores de 5-
fosfodiesterase estão indicados.

• Lúpus Musculoesquelético
• O tratamento depende da área acometida, extensão e gravidade da
doença. Com base no quadro clínico, os medicamentos AINS,
antimaláricos, corticosteroides e, se necessário, metotrexate,
leflunomida, azatioprina e belimumabe, podem ser utilizados.

• Comprometimento Pulmonar
• O acometimento das serosas (pleurite e pericardite) leves
responde bem ao AINH. Nos casos refratários ou graves, os
corticosteroides têm excelente eficácia. Nos casos ainda não
responsivos, a azatioprina 3 mg/kg/dia 1 a 2 doses pode ser
utilizada. A pneumonite aguda no LES e a hemorragia pulmonar
são complicações raras com indicação de pulsoterapia com
corticoide associada ou não a ciclofofanamida ou plasmaferese.
• Quadro hematológico
• A terapia de escolha é a prednisona em dose alta 0,5-1,0 mg/kg
VO, 1 vez, por dia durante 4 a 6 semanas, com redução posterior
se evolução positiva do quadro. A pulsoterapia com
metilprednisolona pode ser considerada nos casos mais graves.
Nos casos refratários, pode-se associar a azatioprina a
corticoterapia. Nas plaquetopenias leves > 50.000, geralmente não
é tratado, entretanto na plaquetopenia grave deve-se fazer terapia
com imunoglobulina associada com infusão de plaquetas. Quadros
de púrpura trombocitopênica idiopática podem ser tratados com
corticosteroides, imunossupressão imunoglobulina intravenosa,
rituximabe com ou sem esplenectomia. Para a púrpura
trombocitopênica trombótica está indicada aférese, esteroides e
rituximabe, sendo uma complicação com risco de morte em 1% a
5% dos casos.

• Comprometimento neuropsiquiátrico
• A terapia de eventos neuropsiquiátricos deve ser recomendada
para o tipo de manifestações clínicas apresentadas. A neuropatia
periférica responde bem a altas doses de glicocorticoide.

• A mielopatia é tratada com corticoide em pulsoterapia associada


à ciclofosfamida intravenosa. Nos casos refratários está indicada
plasmaférese ou imunoglobulina endovenosa. Nos casos ainda
refratários, lançar mão do rituximabe.

• Comprometimento Renal – tipo histológico Medidas indicadas


para todas as classes: IECA e/ou BRA são recomendados como
antiproteinúricos para todos os pacientes (exceto para os que
tenham contraindicação).
• A hidroxicloroquina é indicada para todos os pacientes (exceto
contraindicações) durante a fase de indução e remissão

• Estimular dieta rica em cálcio e considerar a suplementação,


quando necessário

• Evitar medicamentos nefrotóxicos, especialmente os anti‐


inflamatórios não esteroidais

• Considerar suplementação de vitamina D (25 (OH) vitamina D


sérica > 30 ng/mL)

• Prevenir e tratar os fatores de risco para doença cardiovascular:


sedentarismo, dislipidemia (LDL < 100 mg/dL), diabetes,
obesidade, HAS (PA < 130 × 80 mmHg) e tabagismo

• Remissão da nefrite lúpica completa significa: < 0,5 g/24h ou


relação P/C < 0,5 e taxa de filtração glomerular normal ou
redução ≤ 10% do valor prévio do paciente e exame de urina
normal

• Remissão parcial significa: redução de >50% da proteinúria incial


com valor < 3 g/24h ou relação P/C<3 e taxa de filtração
glomerular normal ou redução ≤ 10% do valor prévio do paciente
e exame de urina normal

• Pacientes com GN mesangial (classe I e II) – para pacientes


com proteinúria persistente ≥ 1 g/24 ou R P/C ≥ 1 deve considerar
o uso de azatioprina e micofenolato de mofetil tanto para indução
como manutenção.

• Pacientes com GN prolifetativas (classe III e IV) – iniciar com


pulsoterapia com metilprednisolona (0,5 a 1 g ev) durante 3 dias.
Manter predsnisona vo 0,5 mg/1mg/kg/dia por 3-4 semanas, com
redução gradual com o objetivo de alcançar a dose de 5-10 mg/dia
em 6 meses

• Juntamente com corticoide venoso, usar ciclofosfamida (CFM)


0,5 mg a 1g/m² mensalmente durante seis meses ou CFM i.v. 0,5 g
a cada 15 dias durante três meses, ou micofenolato de mofetil
(MMF) (2 a 3 g/dia).

• Após 6 meses de tratamento na fase de indução, se a remissão


não tiver sido alcançada, considera‐se refratariedade na indução e
recomenda‐se uma nova terapia com MP e substituição da CFM
por MMF ou do MMF pela CFM.

• A azatioprina 2 mg/kg/dia e o micofenolato de mofetil 2 g/dia


devem ser indicados para terapia de manutenção após 6 meses da
terapia de indução e devem ser usados no mínimo 36 meses.

• Em mulheres com nefrite lúpica que pretendem engravidar,


recomenda‐se preferencialmente o uso do MMF, pois a CFM está
associada a um maior risco de infertilidade, principalmente
naquelas com mais de 30 anos.

• Pacientes com GN membranosa – para os casos leves


(proteinúria não nefrótica e função renal normal), são indicados
glicocorticoides em doses elevadas associados ou não à
azatioprina.

• Para os quadros moderados (proteinúria na faixa nefrótica com


função renal normal na apresentação) a graves (proteinúria
nefrótica com comprometimento da função renal), é indicado
pulsoterapia com metilprednisolona 0,5-1 g ev durante 3 dias,
seguido de prednisona 0,5-1,0 mg /kg/dia por 3-4 semanas, com
desmame gradual. Em conjunto ao uso do corticoide, usar
ciclofosfamida 0,5 a 1 g/m² mensalmente por 6 meses ou CFM ev
0,5 mg a cada 15 dias durante 3 meses ou MMF (2-3 g/dia) ou
azatioprina (2 mg/dia)

• A azatioprina e o micofenolato de mofetil estão indicados para


pacientes que tenham alcançado a remissão total ou parcial na fase
de manutenção. Devem ser usados por, no mínimo, 36 meses,
alcançado RC ou RP na fase de indução.

• Para nefrite lúpica refratária, quando a remissão parcial ou


total não é sustentada após 12 meses de tratamento adequado, é
indicada nova biópsia renal, e o uso do rituximabe e do tracolimus
pode ser usado como alternativa.

• Resumo das doses das drogas:


• A hidroxicloroquina: (400 mg por comprimido) 6,5 mg/kg/ via
oral, 1 vez por dia

• Prednisona dose baixa (0,125 mg/kg/dia VO); dose moderada


(0,125 – 0,5 mg/kg/dia VO); dose alta (0,6-1 mg/kg/dia VO); dose
muito alta (1-2 mg/kg/dia VO)

• Azatioprina: 150 mg/dia, 2-3 mg/kg/dia


• Micofenolato de mofetil: 1500 a 2000 mg/dia, podendo alcançar
3g/dia

• Metrotrexato: 10 a 25 mg/semana
• Rituximabe: 1 g IV a cada quinzena
• Belimumabe: 10 mg/kg, dias 0/14/28 dias em seguida 1x por mês
precri.jpg EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente sexo feminino, 23 anos, p-60kg, portadora
de lúpus eritematoso sistêmico há 2 anos em acompanhamento regular
com reumatologista. Em uso de hidroxicloroquina 400 mg 1 cp ao dia.
Relata que após perda de ente querido, há 30 dias, iniciou com lesões
hiperemiadas em região de tronco, face, associadas à alopécia frontal.
Queixava-se de dor torácica e dor articular em punhos.
b. Exame Físico: artrite franca em punhos, presença de rash malar
em face, lesões descamativas e hiperemiadas em tronco. Alopecia não
cicatricial em fronte.

• Acv- bnf/2t ausência de s/c/e


• Ar – presença de mv diminuído em base à esquerda
c. Exames complementares:

• hg 10,5 (vr-11,3-15,2), leuc 4500 (vr- 4.000-11.000 mm³) linf


1094 (vr-800- 5500 mm³), plaq-80.000 (vr-150.000-450.000),
ureia- 45mg/dl (vr-15-36 mg/dl), creat 1,2 mg/dl (0,52-1.04
mg/dl), ch-50- 37 (vr- >60 u/cae), c3-72 (vr- 90-180 mg/dl)

• Rx de tórax – discreto derrame pleural à esquerda


d. Prescrição sugerida:

1. Protetor solar FPS 30, usar no período da manhã no corpo todo e


repor nas áreas fotoexpostas durante o dia
2. Prednisona 20 mg 1 cp e meio por 7 dias; após, 1 cp ao dia
3. Omeprazol 20 mg 1 cp em jejum
4. Manter a hidroxicloroquina 400 mg 1 cp ao dia
5. Azatioprina 50 mg 1 cp de 12/12 h, avaliar aumento de dose no
retorno
6. Minoxidil 5% tônico capilar: usar nas áreas com alopecia 1 x à
noite
7. Propionato de clobetasol 0,05 mg creme: aplicar nas lesões
cutâneas.

discesp.jpg DICAS DO ESPECIALISTA


• Cuidados com os imunossuprimidos: Atualização vacinal antes
da terapia imunossupressora. Evitar vacinas de vírus vivos.

• Usar tratamento empírico com antiparasitário (albendazol ou


ivermectina) antes da pulsoterapia

• Ficar atento aos pacientes com síndrome nefrótica e possiblidade


de tromboses de veias renais.

• Pacientes que usam hidroxicloroquina ou cloroquina devem fazer


avaliação oftalmológica antes de iniciar o tratamento e repeti-la
anualmente após cinco anos de uso contínuo, exceto nos casos
com maior risco para o desenvolvimento de toxicidade retiniana
(deve-se realizar exame oftalmológico anualmente nestes
pacientes).

• Deve-se obter contagem de leucócitos nos dias 10 e 14 após cada


pulso, com ciclofosfamida para avaliar nadir dos leucócitos. Se se
o nadir dos leucócitos chegar a 1.500/mL, diminuir a dose
seguinte para 25%.

• Em mulheres com elevado risco de amenorreia, considerar o uso


de Leuprorida 3,75 mg SC, 2 semanas antes de cada pulso.

• Pacientes com LES devem ser aconselhadas a não engravidar até


que a doença esteja em remissão por pelo menos 6 meses e a
função renal seja normal. A gravidez deve ser planejada e deve-se
suspender medicamentos teratogênicos como: metrotrexato,
leflunomida, ciclofosfamida, micofenolato, IECA, BRA,
cumarinicos.
• A hidroxicloroquina, a prednisona e a azatioprina podem ser
usadas durante a gravidez.

refere.jpg REFERÊNCIAS
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7.2
SÍNDROME ANTIFOSFOLÍPIDE
(SAF)
Autora:
Lenita Adriana Mazzi Gaino

DEFINIÇÕES
É um distúrbio autoimune multissistêmico caracterizado por trombose
venosa e/ou arterial e/ou morbidade gestacional, associado à presença de
anticorpos antifosfolipídicos (aPLs) persistentes. Suas manifestações clínicas
são heterogêneas e caracterizadas pela trombose, que pode ocorrer em vasos
de qualquer calibre, e em qualquer órgão ou sistema, de forma abrupta ou
insidiosa. A prevalência é de 40 a 50 casos/100 mil pessoas. Acomete
adultos jovens e de meia-idade, com predomínio do sexo feminino. Pode ser
primária, sendo a causa mais comum de trombofilia adquirida, ou
secundária, como, por exemplo, em pacientes com lúpus eritematoso
sistêmico (LES), dos quais 10% a 15% apresentam manifestações clínicas de
SAF e 30-40% têm aPLs presentes. A presença de aPLs em indivíduos
assintomáticos ou com LES não confirma o diagnóstico de SAF; no entanto,
pode estar associada ao aumento no risco de trombose ou morbidade
gestacional.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Ainda não está totalmente estabelecida. O alvo do anticorpo anti-β 2 GPI
é a β2 GPI, uma proteína plasmática que se liga avidamente na superfície
fosfolipídica, mais ainda quando dimerizada pela ligação anticorpo-antígeno.
Em situações normais, seu domínio I está protegido do sistema imune.
Quando há lesão endotelial, a β2GPI se liga ao endotélio e sofre alteração
conformacional, expondo o domínio I. A ligação do anti-β2GPI e β2GPI
desencadeia a superexpressão de moléculas de adesão celular pró-trombótica
como E-selectina e fator tecidual. Além disso, suprime a atividade do
inibidor do fator tecidual, reduz a atividade da proteína C, libera citocinas
pró-inflamatórias e ativa o complemento, resultando no aumento da
formação de trombos. Alguns estudos sugerem que a anexina A2 e o
receptor ativador de plasminogênio tecidual também tenham papel
significativo; a superexpressão de glicoproteína IIb/IIIa e plaquetas podem
ter papel na interação pró-trombótica entre anticorpos antifosfolípides e
células endoteliais; ativação de neutrófilos (expressão de fator tecidual e
liberação de Netosis e interleucina 8); monócitos e micropartículas destes
expressam altos níveis de fator tecidual. Além disso, pode ocorrer um
aumento do tônus vascular, aumentando a susceptibilidade a aterosclerose,
perda fetal e dano neurológico (figuras 1 e 2).
A teoria mais aceita é a dos dois alvos. A presença isolada dos aPLs não
seria suficiente para o desenvolvimento de eventos trombóticos.
Primeiramente ocorreria um dano endotelial e, posteriormente, a
potencialização da formação do trombo (a beta 2-glicoproteína I não se liga
ao endotélio inativo). Potenciais fatores para o “segundo alvo” são:
infecções, tabagismo, imobilização prolongada, gestação e pós-parto, uso de
contraceptivo oral, terapia de reposição hormonal, neoplasias, síndrome
nefrótica, hipertensão, hiperlipidemia.
Na SAF obstétrica, um dos mecanismos é a ocorrência de trombose
uteroplacentária e a insuficiência vascular. Além disso, os anticorpos aPLs
parecem ter ação direta na função trofoblástica placentária, diminuindo a
viabilidade do trofoblasto, sincicialização e capacidade para invasão.
Acredita-se que ocorra também alteração da produção de hormônios e
ativação de receptores Toll like.
Painel A: anticorpos antifosfolípides são produzidos por células B; a ligação às superfícies aniônicas converte a β2GPI
fechada e não imunogênica em aberta e imunogênica.
Painel B: anticorpos antifosfolípides ligam-se a β2GPI imunogênica, resultando na ativação de célula endotelial,
complemento, plaquetas, neutrófilos, monócitos (incluindo o aumento de armadilhas extracelulares de neutrófilos -
NETosis). No painel B: coluna do meio, os anticorpos antifosfolípides promovem a formação de trombos; na coluna da
direita, os anticorpos interferem nos trofoblastos e células deciduais.
Painel C e D: mostram que através de múltiplos mecanismos, os quais não são exclusivos, os anticorpos antifosfolípides
resultam em inflamação, vasculopatia, trombose e complicações gestacionais.

Figura 1. Patogênese proposta de problemas clínicos mediados por


anticorpos antifosfolípides.
Fonte: Garcia.6

Anticorpos antifosfolípides, produzidos pelas células B, favorecem a formação de trombo, através da ativação de monócitos,
neutrófilos, células endoteliais e plaquetas. Estes mecanismos favorecem um estado pró-coagulante, que é necessário, mas
não suficiente para trombose. A formação de trombos requer 2 processos: a presença de anticorpos antifosfolípides e
ativação do sistema complemento.
• aPLs induzem a expressão de fator tecidual em células endoteliais, monócitos, neutrófilos, através da
fosforilação de p38 MAPK e subsequente ativação do fator nuclear κβ.
• a interação aPLs com células endoteliais, através da ligação de β2GPI na superfície celular, induz estado
proinflamatório e pró-coagulante.
• há aumento da produção de interleucinas 1,6,8 e anti-TNFα, e aumento da adesão dos leucócitos, através de
moléculas de adesão, como VCAM-1, ICAM-1, e E-selectina. Além disso, há redução de óxido nítrico.

• a vasculopatia ocorre através da disfunção na via de sinalização da rapamicina.


• a ativação plaquetária leva ao aumento de fator 4 plaquetário e tromboxane B2, que potencializa a agregação
plaquetária.
• aPLs interferem com componentes do plasma da cascata de coagulação, pela ruptura da ligação natural da
Anexina 5, inibindo proteínas anticoagulantes e afetando a fibrinólise.
• a ativação de neutrófilos aumenta a liberação de espécies reativas de oxigênio. Nos monócitos, as aPLs
colocalizam com anexina 2 e Toll like receptores 4, induzindo TNFα
• ocorre a indução de trombose e estenose vascular, devido à injúria endotelial e ativação do complemento.
Esses processos podem ser controlados em vários sítios, através de terapia combinada. As moléculas que incluem
monoterapia são: sirolimus (inibição de mTORC); estatinas (inibição da fosforilação de óxido nítrico sintetase endotelial);
inibidores de C3 ou C5 (eculizumabe), inibem o sistema complemento; inibição do fator tecidual (dilazep, defibrotide);
depletores de células B (rituximabe); inibidor do fator de ativação de célula B (belimumabe); uso de antioxidantes
(coenzima Q10); inibição de PDI ou fator XIa, peptídeo sintético (acetilcisteína); antiplaquetários (aspirina) e
hidroxicloroquina.

Siglas: AKT (proteína quinase B); AnxA2 (anexina A2); AnxA5 (anexina A5); aPL (anticorpos antifosfolípides); ApoER2
(receptor 2 apolipoproteina E); eNOS (oxido nítrico sintetase endotelial); GPIIb/IIa (glicoproteína IIb/ IIIa); HCQ
(hidroxicloroquina); ICAM-1 (molécula de adesão intercelular 1); IL (interleucina); mTORC (alvo de complexo rapamicina
de mamíferos); NAC (n acetilcisteína); NFκB (fator nuclear κB); NO (óxido nítrico); P (grupo fosforil); PDI (proteína
disulfido isomerase); PF4 (fator plaquetário); PI3K (fosfatidilinositol quinase 3); p38MAPK (proteína quinase ativada por
mitogênio p 38); RAPTOR (regulação associada a proteína de MTROC1); RICTOR (ligante insensível); ROS (espécies
reativas de oxigênio); TF (fator tecidual); TLR (receptores Toll-like); TNFa (fator de necrose tumoral alfa); TXB2
(tromboxane B2); VCAM- 1 (molécula de adesão celular vascular 1); XI (fator de coagulação XI); XIa (forma ativa do fator
de coagulação XI); b2GPI (beta 2 glicoproteína I).

Figura 2. Mecanismos fisiopatogênicos induzidos por anticorpos


antifosfolípides e possíveis sítios de ação de medicamentos.
Fonte: Noureldine.8

QUADRO CLÍNICO
• Eventos trombóticos: são os marcadores da SAF, sendo os
eventos venosos mais comuns que os arteriais. O risco de trombose
venosa e arterial e/ou tromboembolismo está aumentado em
pacientes com anticoagulante lúpico positivo ou níveis moderados
ou altos de anticorpos anticardiolipina. Quando o paciente é
triplamente positivo, ou seja, apresenta os 3 anticorpos positivos, a
chance de recorrência dos eventos é maior. Considerando os
eventos venosos, a trombose venosa de membros inferiores é a
mais comum (ocorre em 20-30% dos pacientes com SAF),
entretanto, pode ocorrer o envolvimento pélvico, renal, pulmonar,
hepático, portal, axilar, subclávia, ocular, seios cerebrais, veia cava
inferior e veias superficiais. Já dentre os eventos arteriais, o
acometimento cerebral é o mais comum (acidente vascular
cerebral- AVC ou ataque isquêmico transitório); no entanto,
oclusão na retina, coronárias, renal e mesentérica podem estar
presentes. Eventos trombóticos recorrentes podem ocorrer em 5-
12% dos casos.

• Neurológico: O AVC pode ser ocasionado pela trombose in situ


ou devido ao embolismo ocasionado por doença valvular cardíaca.
De rotina, emprega-se o ecocardiograma transtorácico (se normal:
é recomendada a realização de ecotransesofágico, a fim de avaliar
vegetações - endocardite não bacteriana). Síndrome de Sneddon:
livedo reticular e AVC; metade dos casos apresentam aPLs
positivo. Déficits cognitivos e lesões de substância branca,
trombose seio venoso, epilepsia, psicose, coreia, hemibalismo,
mielopatia transversa, hipotensão ortostática, enxaqueca e perda da
audição neurossensorial (surdez súbita) são outras manifestações
que podem ocorrer.

• Hematológica: Trombocitopenia (ocorre em 16-46% dos


pacientes; definição: menos de 100 mil plaquetas/mL, confirmada
em 2 exames com intervalo de 12 semanas; raramente apresenta
valor menor que 50 mil plaquetas), anemia hemolítica autoimune,
necrose de medula óssea, púrpura trombocitopênica trombótica
(PTT) e síndrome hemolítica urêmica (SHU).

• Pulmonares: tromboembolismo pulmonar, hipertensão de artéria


pulmonar, trombose arterial pulmonar, síndrome da angústia
respiratória aguda microtrombose e hemorragia alveolar difusa.

• Cardiológicas: o acometimento valvar é o mais comum,


geralmente representado pelo espessamento valvular ou nódulos
valvares (endocardite de Libman Sacks), sendo a mitral a mais
acometida (em 25% dos pacientes), seguida pela aórtica; associado
à presença de anticoagulante lúpico ou anticardiolipina IgG; levam
mais frequentemente à regurgitação e, raramente, à estenose; os
nódulos aórticos estão mais associados ao risco aumentado de
AVC. Para o diagnóstico de doença valvar, é necessário:
espessamento valvar > 3 mm, nas porções proximal ou média dos
folhetos, ou nódulos irregulares na face atrial da valva mitral ou
vascular da aórtica, na ausência de febre reumática ou endocardite
infecciosa. Além disso, pacientes com SAF têm um aumento no
risco de doença arterial coronariana, como infarto agudo do
miocárdio.
• Cutâneas: livedo reticular (mais comum; pode estar associada a
tromboses múltiplas e lesões arteriais; padrão de contornos
regulares; pode ocorrer em situação fisiológica) e racemoso
(caracterizado por um padrão em rede, violáceo, contornos
irregulares e descontinuados), infarto e necrose cutânea, gangrena
digital, ulcerações de pele, nódulos/máculas “pseudovasculíticas”,
vasculopatia livedóide e anetoderma. A cicatrização das úlceras
pode leva à atrofia alba de Milian.

• Renal: pode ser silenciosa ou causar insuficiência renal aguda ou


crônica, com proteinúria e hipertensão. A microangiopatia
trombótica é o achado mais característico da SAF e se caracteriza
pela tríade: hipertensão, proteinúria e insuficiência renal. Podem
ser encontrados também: trombose e estenose de artéria renal,
trombose de veia renal, necrose de papila renal e acometimento
tubulointersticial.

• Gastrointestinal: pacientes com SAF podem ter acometimento


isquêmico de esôfago, estômago, duodeno, jejuno, íleo, cólon,
pâncreas (infarto), fígado (trombose venosa). Podem evoluir com
sangramento, abdome agudo, necrose de esôfago, ulceração
gástrica/duodenal, síndrome de Budd Chiari, entre outros.

• Ocular: neuropatia óptica isquêmica, oclusão arterial e venosa


retiniana e amaurose fugaz.

• Adrenal: a trombose de veia adrenal bilateral pode levar à perda


da função adrenal, resultando em infarto hemorrágico; o paciente
pode se apresentar com dor abdominal, torácica, lombar ou
pélvica; geralmente, ocorre em SAF catastrófica; a investigação é
feita através da ressonância.

• Osteonecrose: não está clara a associação com SAF.


• Complicações gestacionais: O risco de doença tromboembólica
na gestação ou pós-parto é de 5-12% em pacientes com SAF
conhecida. A presença de anticorpo anticoagulante lúpico parece
ser o maior preditor para desfechos gestacionais associados à SAF.
A tripla positividade traz prognóstico pior. Dentre as
manifestações, podem ocorrer: perda fetal (notadamente durante o
segundo e terceiro trimestres de gestação, diferindo de perda na
população normal, que geralmente acontece no primeiro trimestre e
por anormalidades morfológicas ou cromossômicas), sofrimento
fetal (trombose de vasos placentários e infarto) e parto prematuro
(complicações: pré-eclâmpsia: pode ocorrer em até 50% dos
pacientes com SAF e se caracteriza por pressão arterial sistólica
>140 mmHg ou diastólica >90 mmHg, em duas ocasiões, com pelo
menos 4 horas de intervalo, associada à proteinúria ≥ 300 mg/24
horas, em paciente previamente normotensa/ síndrome HELLP:
hemólise, elevação de transaminases, consumo de plaquetas/
insuficiência placentária: testes de vigilância fetais anormais,
dopplervelocimetria sugestiva de hipoxemia fetal, oligodramnia ou
peso de nascimento inferior ao 10º percentil para a idade
gestacional/restrição de crescimento intrauterino/ descolamento
prematuro de placenta).

• SAF catastrófica (Síndrome de Asherson): É definida como


doença trombótica generalizada com falência de múltiplos órgãos.
Tipicamente envolve múltiplos pequenos vasos sanguíneos em
vários órgãos, mas tipicamente há acometimento renal (71%), dos
pulmões (64%), do cérebro (62%), do coração (51%) e da pele
(50%). Ocorre em menos de 1% dos pacientes com SAF e
geralmente é desencadeada por infecção, neoplasia, uso de
contraceptivos com estrogênio, gestação, procedimentos
cirúrgicos, atividade da doença de base (como LES) e suspensão de
anticoagulante oral. A mortalidade é de aproximadamente 50%.
Para o diagnóstico, o paciente deve ter: história de SAF e/ou
anticorpos aPLs presentes; 3 ou mais novos órgãos com trombose
ocorrida dentro de 1 semana; biópsia confirmando microtrombos;
exclusão de outras causas de trombose de múltiplos órgãos ou
microtromboses.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Critérios clínicos Critérios laboratoriais

1. Trombose vascular: 1. Anticoagulante lúpico: em 2 ou mais ocasiões com


intervalo de pelo menos 12 semanas, ISTH (International
Um ou mais episódios clínicos de trombose arterial, venosa Society for Thrombosis and Haemosthasis)
ou de pequenos vasos, em qualquer órgão ou tecido
*a trombose deve ser confirmada por estudos de imagem ou 2. Anticardiolipina IGG e/ou IGM: em títulos médios ou
histopatológicos, sendo que, neste último, não deve estar altos ≥ 40 GPL ou MPL, ou > p99, em 2 ou mais ocasiões,
presente inflamação de parede do vaso com intervalo de pelo menos 12 semanas, por Elisa

2. Morbidade gestacional: 3. Anticorpo anti-β2 glicoproteína I IgG e/ou IgM em títulos


> p99, presentes em 2 ou mais ocasiões com 12 semanas de
a. 1 ou + perdas fetais inexplicadas na 10ª ou mais semana de intervalo entre elas, por Elisa
gestação, com feto morfologicamente normal documentado
por ultrassonografia ou exame direto do feto OU

b. 1 ou + nascimentos prematuros em um neonato


morfologicamente normal antes da 34ª semana de gestação
por motivo de: eclâmpsia ou pré-eclâmpsia grave; OU
achados reconhecidos de insuficiência placentária

c. 3 ou + abortos espontâneos inexplicados, consecutivos


antes da 10ª semana de gestação, com exclusão de
anormalidades anatômicas e/ou hormonais maternas e de
causas cromossomiais maternas e paternas

Tabela 1.
Fonte: Fonte: Jesus GR, Jesus NR, Levy RA. Diagnóstico e critérios
obstétricos. In: Levy RA, Andrade D. Manual da Síndrome Antifosfolípide.
São Paulo: Segmento Farma; 2018: 9-16.

A classificação deve ser evitada se menos de 12 semanas ou mais de 5


anos entre o teste aPL positivo e a manifestação clínica.

a. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
• Trombofilias hereditárias: história familiar positiva ajuda e guia
a realização de testes complementares. Dentre elas, há: fator V de
Leiden, deficiência de proteína C, S, antitrombina III, mutação de
protrombina

• Trombofilias adquiridas: hiperhomocisteína


• Devem ser investigados fatores predisponentes como: síndrome
nefrótica, fibrilação atrial, puerpério, uso de estrogênio e síndrome
paraneoplásica

• Vasculites sistêmicas e doença de Behçet


• Hematológicas: PTT, PTI, SHU (síndrome hemolítico-urêmica),
CIVD (coagulação intravascular disseminada), trombocitopenia
induzida por heparina

• Manifestações obstétricas: devem ser investigadas alterações


genéticas e anatômicas, doenças infecciosas (toxoplasmose,
rubéola, sífilis, citomegalovírus, herpes e HIV), uso de álcool e
drogas

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Anticardiolipina: o achado de títulos baixos ou moderados pode
ser transitório e aparecer como consequência de infecções, por isso se
faz necessária a confirmação; títulos moderados a altos, principalmente
IgG, estão associados a manifestações clínicas. O IgM pode suceder
resultados falso-positivos, especialmente na presença de fator
reumatoide e crioglobulinas. Este teste não é influenciado pela
warfarina e heparina.
b. Anticoagulante lúpico: é o maior preditor de trombose e eventos
obstétricos. Vários métodos são utilizados para sua detecção devido a
sua natureza heterogênea. São necessários dois ou mais testes para
rastreio. A detecção é feita em etapas: primeira (é observado o
prolongamento do tempo de formação do coágulo in vitro; o
prolongamento indica a presença de um inibidor ou a deficiência de
fatores de coagulação), segunda (avalia a deficiência de fatores de
coagulação através da mistura de plasma do paciente com plasma
normal, ocorrendo a correção dos fatores necessários; na presença de
um inibidor, o teste permanece prolongado) e terceira (etapa
confirmatória; ocorre a adição de fosfolípides, que competirão com os
anticorpos aPLs, neutralizando a ação in vitro e corrigindo o tempo de
coagulação). O uso de heparina não fracionada, warfarina e outros
anticoagulantes orais gera resultado falso-positivo.
c. Anti-β2 glicoproteína I: aumenta susceptibilidade de eventos
trombóticos.
d. Exames de imagem e histopatológicos: citados anteriormente.

TRATAMENTO
a. Fase aguda de trombose: heparina de baixo peso molecular 1
mg/Kg de 12/12horas + anticoagulante oral (varfarina 5 mg/dia). Para
pacientes idosos, pode ser iniciada varfarina na dose de 2,5 mg/dia.
Depois de 4 a 7 dias, checar INR, com o objetivo de avaliar a suspensão
da heparina (caso INR esteja na faixa esperada: para eventos venosos
entre 2-3 e arteriais entre 2,5-3,5). Duração da anticoagulação: tempo
indeterminado

• Em casos de IAM: INR entre 2-3 + ácido acetilsalicílico (AAS)


100 mg/dia + clopidogrel 75 mg/dia, por 6 meses; após 6 meses,
anticoagulação com INR entre 2-3 + AAS 100mg/dia ou INR
entre 2,5-3,5 sem AAS

• Casos de TVP proximal extensa ou TEP grave: pode ser


indicada terapia trombolítica ou tromboembolectomia. Caso em
que a anticoagulação esteja contraindicada: avaliar filtro de veia
cava para pacientes com TVP em risco de TEP
• checar anticoagulação dos pacientes a cada 2 meses, desde que o
paciente esteja na faixa esperada de INR

• pacientes com múltiplos eventos, mesmo com INR adequado,


devem ser reavaliados e ter fatores de risco tratados, como, por
exemplo, hipertensão, dislipidemia, obesidade, diabetes. Estes
pacientes podem ser beneficiados com uso de hidroxicloroquina
b. Forma apenas obstétrica: AAS 100 mg/dia fora da
gestação/quando gestantes, deve ser associada heparina de baixo peso
molecular (1 mg/Kg/dia). Se a paciente já teve evento trombótico,
quando engravidar, deve ser feita a troca da varfarina por heparina de
baixo peso molecular (dose 1 mg/Kg 12/12 horas) + AAS 100 mg/dia.
Alguns estudos mostraram benefício na associação de
hidroxicloroquina.

• antes do parto: suspender anticoagulação por 24 horas e retomar


6 a 8 horas após o parto, mantendo por 6 a 8 semanas

• monitorização materna e fetal: O Colégio Americano de


Reumatologia (ACR) inclui na rotina pré-natal a solicitação de
contagem de plaquetas, creatinina sérica, relação proteína/creatina
na urina e transaminases; rastreio de anticorpos anti-RO e anti-LA
(a presença destes implica na avaliação e monitoramento de
bloqueio cardíaco fetal); ultrassonografia (com < de 20 semanas de
gestação para estimar a data do parto/ no final do 2º trimestre e
início do 3º trimestre: seriados a cada 4 semanas, para avaliar
crescimento fetal e volume do líquido amniótico/ avaliação
semanal ou 2x/semana, a partir de 32 semanas, devido risco de
morte fetal)

• cuidados com AAS: em mulheres sem história de trombose,


suspender AAS depois de 36 semanas (7 a 10 dias antes do parto) /
pacientes com eventos arteriais severos, manter AAS
• pacientes com eventos a despeito da anticoagulação:
hidroxicloroquina parece ter efeito, mas deve ser iniciada 3 meses
antes da concepção
c. Pacientes com anticorpos aPLs positivos, sem manifestações
clínicas: avaliar risco de trombose, fatores de risco preexistentes e
considerar a prescrição de AAS 100 mg/dia. Como exemplo, paciente
com LES e anticorpos aPLs presentes, sem eventos, recomenda-se AAS
e, neste caso, hidroxicloroquina
d. Recorrência de eventos trombóticos:

• Avaliar se anticoagulante estava em dose subterapêutica, falhas de


adesão, interação medicamentosa ou alimentar. Recomenda-se
aumentar alvo da anticoagulação. Se o novo evento tiver ocorrido
com INR entre 2-3: trocar varfarina por heparina de baixo peso
molecular por tempo prolongado, ou adicionar AAS,
hidroxicloroquina ou estatina. Casos graves: rituximabe ou
imunoglobulina
e. Descontinuação da tromboprofilaxia: pode limitar a
anticoagulação por 3 a 6 meses, em pacientes com evento venoso
isolado + fator risco desencadeante transitório (resolvido) + perfil de
anticorpos de baixo risco (títulos baixos e/ou positividade isolada/ não
persistente, ausência de anticoagulante lúpico). Antes da interrupção,
afastar trombose residual (dímero D e ecodoppler) e avaliar fator de
risco para recorrência, além de realizar profilaxia em situações de alto
risco
f. Situações peculiares:

• SAF catastrófica: anticoagulação terapêutica + corticoterapia em


altas doses + plasmaférese e/ou imunoglobulina endovenosa (1-2
g/Kg, por 3 a 5 dias). Novas terapias estão em estudo: rituximabe
(depletores de células B: 1000 mg nos dias 0 e 15, repetir a cada 6
meses), eculizumabe (inibidores de C5), moduladores endoteliais e
inibidores de calcineurina
• SAF microangiopática: grupo de pacientes que apresentam
trombose microvascular, anemia hemolítica com esquizócitos e
hemácias fragmentadas, trombocitopenia e presença de anticorpos
aPLs. Abrange pacientes com SAF catastrófica e indivíduos com
antifosfolípides + PTT, SHU, CIVD e síndrome HELLP.
Tratamento é anticoagulação; para trombocitopenia e hemólise:
corticoterapia, imunossupressores, plasmaferese e/ou
imunoglobulina (1 g/Kg e pode repetir 1-2 dias após a primeira
dose); HELLP: interrupção da gestação, corticoterapia e
plasmaferese pós-parto.

• Esclerose lupoide: pacientes com características de LES e


esclerose múltipla (EM), mas sem critérios completos para as duas
doenças. Ela deve ser diferenciada de doenças como LES, EM,
neuromielite óptica e SAF; é considerada variante não trombótica
da SAF. Sendo assim, não tem indicação de anticoagulação e
geralmente o tratamento consiste em uso de corticoide,
imunossupressores e plasmaférese.
g. Varfarina e cuidados!!!!

• A varfarina é o único anticoagulante oral até o momento, com


eficácia para pacientes com SAF.

• antes da prescrição, avaliar alergias, histórico de sangramento,


antecedentes pessoais/ comorbidades/ medicamentos em uso (risco
de interação medicamentosa com varfarina/ Tabela 1)/ hábitos
alimentares

• quando paciente for submetido a procedimentos cirúrgicos:


suspender a varfarina 7 dias antes do procedimento; prescrever
heparina de baixo peso molecular, dose terapêutica até 24 horas
antes do procedimento; retornar com heparina baixo peso
molecular 6 a 8 horas após o procedimento

• quando INR acima de 6: evitar exercícios de alto impacto


• caso apresente ferimento corto-contuso: comprimir o local firme e
por tempo prolongado; caso não cesse, buscar pronto-atendimento

• orientar o paciente sobre a importância de não modificar o


tratamento por conta própria. Avisar sempre que houver mudança;
não se automedicar

• melhor horário de tomada: 30 minutos antes do jantar ou antes do


café da manhã

• alimentos com vitamina K reduzem o efeito anticoagulante.


Devem ser evitadas: cascas de frutas e vegetais; reduzir consumo
de óleo e gorduras (Tabela 2)

• paciente deve andar com cartão com nome dos medicamentos em


uso
Redução do efeito anticoagulante
Azatioprina Corticosteroides Hidróxido de alumínio Rifampicina

Barbitúricos Dicloxacilina Fenitoína Sucralfato

Carbamazepina Diuréticos Fenobarbital Vitamina C

Ciclofosfamida Drogas anti tireóideas Mercaptopurina Vitamina K

Colestiramina Etanol (uso crônico) Quinidina -

Aumento do efeito anticoagulante


AAS Antifúngicos Hormônios tireoideanos Salicilatos

Sulfametoxazol
AINH Cimetidina Isoniazida
trimetropina

Aumento do efeito anticoagulante


Alopurinol Clofibrato Metronidazol Ticlopidina

Amiodarona Clorpropamida Omeprazol Tamoxifeno

Andrógenos Etanol (agudo) Paracetamol Vitamina E

Antidepressivos tricíclicos Eritromicina Metilprednisolona (pulso) Zafirlucaste

Antidepressivos IRSS Fluconazol Quinolonas Zileuton


Tabela 1: Interações medicamentosas com varfarina
Fonte: Ferreira.91

ALIMENTOS RICOS EM VITAMINA K MODERADOS/ POBRES EM VITAMINA K

Folhas verdes: espinafre, brócolis, alface, couve, repolho Azeitona, cogumelos, tomate

Óleos e gorduras vegetais: óleos e margarinas Óleo de milho e amendoim e manteiga

Alimentos hipergordurosos Hipogordurosos

Legumes com casca Sem casca

Alimentos refogados ou processados em óleo Sopas que não sejam tipo creme

Miúdos Carnes com pouca gordura e sem fritura

Maionese e temperos para salada, molho de tomate pronto Aves e peixes sem óleo

Atum enlatado em óleo Atum enlatado em salmoura

Ovos fritos Ovos cozidos ou pochê

Creme de leite e queijos gordurosos Laticínios desnatados e derivados

Soja e derivados, lentilha, ervilha, grão-de-bico Cereais/feijão

Vagem, quiabo, pepino, abobrinha Batata, rabanete, beterraba

Sucos e frutas cítricas


Kiwi, abacate, ameixa seca, figo, amora, uvas e abacate
Frutas sem casca

Fast-foods: hambúrguer, pizza, petiscos Lanches com pouca gordura e sem molhos

Waffles, biscoitos recheados, panquecas Biscoitos sem recheio

Folhas verdes para chás e grão de café Infusões preparadas: chá/café

Oleaginosas: nozes, castanha de caju -

Tabela 2: Fontes alimentares de vitamina K


Fonte: Ferreira.91

h. Estatinas: papel positivo como coadjuvante no tratamento de


fenômenos tromboembólicos da SAF, pelo efeito na redução do
colesterol, bem como NF-κB
i. Hidroxicloroquina: inibe a adesão e agregação plaquetárias,
redução de colesterol, bloqueia a produção de anticorpos
antifosfolípides e a ligação de anti-β2 GPI às superfícies de fosfolípides
j. Rituximabe: alguns estudos mostram que ele reduz títulos de
anticorpos antifosfolipídicos e complicações trombóticas
k. Eculizumabe: anticorpo monoclonal, que bloqueia a ligação do
complexo complemento terminal através da ligação ao complemento
C5. Usado para pacientes com LES, com ou sem aPLs e SAF
catastrófica

DICAS DO ESPECIALISTA
• Tripla positividade está associada à maior gravidade e elevado
risco trombótico.

• A ocorrência de trombose pode interferir nos níveis de aPLs, o


que sinaliza que este teste não deve ser solicitado antes da 12ª
semana após o evento.

• Teste positivo de aPLs realizado mais de 5 anos depois da


manifestação não deve ser considerado.

• Não há estudos que comprovem que o título dos anticorpos esteja


associado à atividade ou não da doença.

• A existência de SAF soronegativa tem sido muito discutida.


Devemos lembrar que há outros anticorpos contra fosfolípides,
ainda não detectados, e da existência de outros estados pró-
trombóticos que podem ocasionar manifestações observadas na
SAF.

• Pacientes com aPLs e citopenias, sem histórico de trombose ou


morbidade gestacional, não são classificadas como tendo SAF; no
entanto, estes achados podem representar um estado pré-
trombótico, que precede o início da SAF.

• Vale ressaltar a importância do diagnóstico diferencial da SAF


catastrófica com: coagulação intravascular disseminada,
trombocitopenia induzida pela heparina e microangiopatia
trombótica.
• É de extrema importância controlar potenciais fatores de risco:
obesidade, hipertensão arterial, tabagismo, entre outros.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente de 35 anos, sexo feminino, obesa, procura o
pronto-atendimento devido à dispneia há 1 dia, mesmo em repouso,
iniciada subitamente, negava tosse, negava coriza, negava febre, negava
obstrução nasal. Relatava também ter notado dor e aumento de volume
em membro inferior direito, com evolução de 3 dias, sem história de
trauma. Como antecedentes pessoais: ndn; antecedentes obstétricos: 1
gestação e 1 natimorto com mais de 10 semanas de gestação, feto
morfologicamente normal (na ocasião, não foi feita
investigação)/antecedentes familiares: ndn/ hábitos e vícios: negava
tabagismo/negava uso de medicamentos.
b. Exames complementares: radiografia de tórax sem alterações
significativas, eletrocardiograma taquicardia sinusal, ultrassonografia
venosa com doppler de membro inferior direito com sinais de trombose
e angiotomografia de tórax com sinais de TEP.
c. Hipóteses Diagnósticas: trombose venosa profunda e
tromboembolismo pulmonar/síndrome antifosfolípide (?).
d. Prescrição sugerida: Feita estratificação de risco de PESI: baixo
risco, sendo iniciada anticoagulação plena (enoxaparina 1 mg/kg
subcutâneo de 12/12horas) e marevan 5 mg/dia (considerando síndrome
antifosfolípide como hipótese diagnóstica e ausência de evidência com
relação ao uso de anticoagulantes orais diretos). Paciente permaneceu
internada até melhora clínica e meta terapêutica, INR entre 2-3.
Considerando obesidade com potencial gatilho para desfecho, paciente
foi orientada à realização de dieta, redução de peso e sobre importância
de atividade física. Além disso, foi orientada a fazer acompanhamento
com cardiologista para avaliação cardiovascular/metabólica
(dislipidemia/síndrome metabólica) e encaminhada para ambulatório de
Reumatologia, para complementar a investigação.
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7.3
ARTRITE REUMATOIDE
Autora:
Yanne Franca Montino

DEFINIÇÕES
• Artrite reumatoide (AR) é uma doença sistêmica, autoimune e
inflamatória que acomete preferencialmente as membranas
sinoviais das articulações periféricas.

• Se não controlada ou se não responde à terapia, leva à proliferação


e destruição das articulações devido à erosão das cartilagens e do
osso, causando deformidades irreversíveis e limitações funcionais.
Caso haja acometimento de outros órgãos, aumenta-se a gravidade
da doença e a expectativa de vida do doente pode ser diminuída de
cinco a dez anos.

• Estima-se que a prevalência da AR seja de 0,5%-1% da


população, sendo predominante no sexo feminino numa proporção
de 1:3, e ocorre geralmente na faixa dos 30-50 anos.

• É uma das doenças reumáticas mais frequentes, e a prevalência é


2-10 vezes maior entre os parentes de primeiro grau de pacientes
com AR.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• A etiologia da doença é desconhecida, porém, muitos estudos
avançaram considerando como principal fator genético no
desenvolvimento da doença o antígeno leucocitário humano HLA-
DRB1 e a detecção de anticorpos contra peptídeos citrulinados
cíclicos (anti-CCP).

• A patogênese da doença é complexa e multifatorial, com


participação de fatores ambientais, genéticos e hormonais.

• O tabagismo é um fator de risco passível de modificação e


continua sendo um forte fator ambiental para AR, além de estar
associado fortemente a AR fator reumatoide (FR ) positivo e anti-
CCP positivo. O risco aumenta com o tempo e a intensidade do uso
do cigarro. O tabagismo induz a expressão da enzima peptidil
arginina desaminase tipo IV (PAD4) em macrófagos alveolares.
Essa enzima converte a arginina em citrulina, criando, assim,
neoantígenos.

• Há muito tempo suspeita-se de que infecção seja um fator


precipitante na AR. No entanto, nenhuma infecção bacteriana
específica foi provada como causa da AR.

• Patógenos virais também permanecem em investigação. Entre as


bactérias que foram suspeitas como fatores incitantes na AR estão
Proteus mirabilis, espécies de Mycoplasma e Porphyromonas
gingivalis (expressa a enzima PAD4, desencadeando uma resposta
autoimune a partir da citrulinização de proteínas). Dentre os vírus,
foram mais bem estudados o Epstein-Barr vírus (EBV), retrovírus
e dados conflitantes em relação ao papel do parvovírus humano
B19 na AR.

• As manifestações clínicas da AR decorrem da autorreação de


células TCD4 e linfócitos B que ocasionam a infiltração celular e a
destruição que levam à remodelação óssea.

• Existe uma perda da autotolerância e, consequentemente,


autoimunidade traduzida por ativação linfocitária e produção de
autoanticorpos, acarretando um desequilíbrio entre citocinas pró e
anti-inflamatórias e recrutamento articular de macrófagos,
neutrófilos, células natural killer, T e B, além de ativação de
osteoclastos, fibroblastos e condrócitos. Por fim, geram inflamação
sinovial crônica, cujos mediadores são: fator de necrose tumoral
(TNF-α), IL1, IL17, prostaglandinas e metaloproteinases.

• A presença de citocinas inflamatórias promove a destruição da


cartilagem articular, erosões ósseas mediadas por fibroblastos,
osteoclastos e condrócitos. Ao proliferar e atingir a cavidade
articular, afetando a cartilagem e o tecido ósseo, ocorre a formação
do Pannus – tecido fibrovascular e granular de origem inflamatória
que recobre a cartilagem e o osso subcondral.

• O fator reumatoide ativa o complemento por meio da formação de


imunocomplexos, estimulando a inflamação e sinovite crônica.
Títulos mais elevados de FR estão relacionados com doença mais
grave.

• O TNF-α estimula os fibroblastos da sinóvia a sintetizar


colagenases e estimular a reabsorção óssea.

QUADRO CLÍNICO
• A AR é bastante variável quanto à apresentação clínica, à
gravidade e ao prognóstico. Mais tipicamente, apresenta-se como
doença poliarticular simétrica de pequenas e grandes articulações,
com início gradual, caráter crônico e destrutivo.

• No entanto, alguns pacientes podem apresentar início agudo com


comprometimento articular intermitente ou migratório ou com
doença monoarticular.

• Os sintomas iniciais podem comprometer as atividades diárias do


paciente. Podem coexistir também em um terço dos pacientes o
início agudo da poliartrite com presença de sintomas sistêmicos,
como perda de peso, febre baixa, fadiga, astenia e mialgia.
a. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ARTICULARES E
PERIARTICULARES

• AR clássica: O início da doença geralmente é insidioso, com


acometimento poliarticular aditivo e simétrico associados à dor,
rigidez e edema articular, acometendo tipicamente as
interfalangeanas proximais (IFP), metacarpofalangeanas (MCF)
dos dedos, punhos e as metatarsofalangeanas (MTF), além de
acometer também cotovelos, ombros, joelhos tornozelos. A rigidez
matinal é um sintoma comum e é caracterizada como “letidão ou
dificuldade de mover as mãos” após sair da cama ou depois de
permanecer em uma posição por longo período de tempo. A
rigidez dura > 1 hora e está relacionada com a gravidade da
inflamação.

• Reumatismo palindrômico: A artrite é oligo ou monoarticular, e


o início dos sintomas é súbito, de forte intensidade e acompanhado
de rubor, edema e calor. O quadro articular dura em média de
algumas horas a dias e evolui com períodos de remissão variando
de dias a meses.

• Monoartrite: Frequentemente, uma grande articulação é


acometida, como punho, joelho, ombro, quadril ou tornozelo. Pode
ser a única manifestação da AR ou pode preceder o aparecimento
da doença poliarticular.

• História de trauma articular pode ser o evento iniciador. O


acometimento das mãos atinge principalmente os dedos através das
efusões simétricas e edemas dos tecidos moles ao redor das
articulações MCP e interfalangeanas proximais (IFP), que são
acometidas em mais de 90% dos casos.

• Podem ser encontrados também o eritema palmar, o espessamento


dos tendões flexores devido à tenossinovite, os nódulos ao longo
das bainhas do tendão palmar, além da redução da força de
aderência e o edema em mãos denominado pela sua aparência de
“luva de boxe”.

• O punho tem grande acometimento na doença; sendo assim, a


síndrome do túnel do carpo afeta cerca de 1% a 5% dos pacientes.

• O caráter evolutivo crônico da doença pode levar a alterações


características como: desvio ulnar dos dedos (devido afrouxamento
dos meios de contenção das MCFs), deformidades de Boutonniere
dos dedos (flexão das IFPs e hiperextensão das IFDs), dedos em
“pescoço de cisne” (hiperextensão das IFPs e flexão das IFDs),
“mãos em dorso de camelo” (tumefação das MCFs, especialmente
2°, 3°, bem como tumefação dos punhos, associado a uma
hipotrofia dos músculos interósseos do dorso das mãos), “dedos
em fuso” (tumefação das IFPs), “dedos em martelo” (flexão
permanente das IFDs), “polegar em Z” (flexão das MCFs e
hiperextensão das interfalangeanas).

• Nos pés e tornozelos, o acometimento das articulações MTFs e


tarso é mais comum na doença precoce. Outras alterações
decorrentes da AR nos membros inferiores são: pé planos, hálux
valgo, calosidades, achatamento do arco plantar longitudinal,
dedos em martelo, gerando dificuldade e dor durante à marcha.

• Os joelhos são precocemente acometidos e a doença crônica


resulta em deformidades tipo genu valgo ou varo. Os pacientes
com AR também podem desenvolver cisto de BAKER, que é o
acúmulo de fluido sinovial na região poplítea. A ruptura deste cisto
pode gerar edema, queimação e dor na região posterior da
panturrilha, simulando quadro de trombose venosa profunda ou
tromboflebite aguda.

• A coluna cervical é o local mais comumente afetado,


principalmente nos doentes crônicos. O ligamento transverso do
atlas (C1) é responsável por impedir o deslizamento anterior de C1
sobre o processo odontoide do áxis (C2). A sinovite neste local
gera o aparecimento da subluxação ou luxação de C1 sobre C2.
Rigidez e dor cervical são as queixas mais frequentes, mas pode
haver sinais neurológicos de compressão medular, fraqueza,
sensação que a cabeça pode cair e parestesias. A suspeita clínica
pode ser comprovada por radiografia de coluna cervical em perfil
com flexão máxima. Se a distância entre o processo odontoide e o
arco anterior de C1 for ≥ 3 mm, indica presença de subluxação.

• Um terço dos pacientes com AR tem envolvimento da articulação


cricoaritenoideo. Os sintomas podem incluir rouquidão, estridor
inspiratório e disfagia.
b. MANIFESTAÇÕES EXTRA-ARTICULARES

• Ocorrem em cerca de 40% dos pacientes em algum momento da


evolução da doença. Os fatores de risco para desenvolvimento de
manifestações extra articular são: presença de FR ou anti-CCP
positivo e gene HLA- -DRB1, tabagismo e incapacidade precoce.

• O envolvimento extra-articular na AR é um marcador de


gravidade da doença e está associado ao aumento da morbidade
global e da mortalidade precoce.

• Nódulos reumatoides estão presentes em 20-35% dos pacientes


com AR, geralmente associados a FR positivo. São encontrados
frequentemente em locais de pressão, como cotovelos, mas podem
ser encontrados em vísceras, como pulmão, olhos e cordas vocais.
Seu aspecto histológico é identificado como foco de necrose
fibrinoide central circundado por fibroblastos. Geralmente
regridem com tratamento da doença e, paradoxalmente, o
metotrexato pode ocasionar o aumento dos nódulos,
particularmente sobre os tendões dos dedos.

• As lesões ulcerativas podem ser resultado de estase venosa,


vasculites ou insuficiência arterial. Geralmente, as úlceras crônicas
em pacientes com AR são multifatoriais e podem requerer uma
imunossupressão agressiva para cicatrização.
• A perda óssea da AR pode ser sistêmica (é uma perda óssea
generalizada, devido a uma reabsorção que excede a formação
óssea e causada por inflamação sistêmica mediada por citocinas,
imobilidade e efeitos da terapia com glicocorticoides), periarticular
e focal.

• A fraqueza muscular também é um sintoma comum e apresenta


várias causas, como: inflamação sinovial, miosite, vasculite e
miopatia induzida por fármacos; por exemplo: glicocorticoides,
antimaláricos e estatinas.

• O acometimento ocular mais frequente na AR é a


ceratoconjuntivite seca, que afeta até 10% dos pacientes.
Episclerite (nodular ou difusa), esclerite, uveíte anterior, catarata,
glaucoma, miosite orbitária e paralisia transitória do nervo
oculomotor são outras alterações encontradas em pacientes
reumatoides.

• O acometimento pulmonar, incluindo pleurite e derrame pleural,


na AR é mais comum em homens com FR positivo em altos títulos
e nódulos subcutâneos. Os nódulos pulmonares parenquimatosos
normalmente são assintomáticos e encontrados em pacientes com
AR soropositiva, sinovite disseminada e nódulos em outros locais.

• A síndrome de Caplan é caracterizada por nodulose pulmonar e


pneumoconiose em pacientes com AR. A doença pulmonar
intersticial (DPI) geralmente se configura como uma pneumonia
intersticial inespecífica ou pneumonia intersticial usual. A
tomografia computadorizada de alta resolução e as biópsias
pulmonares abertas são consideradas padrão-ouro para diagnóstico
de DIP.

• A AR é um fator de risco por si só para doença coronariana,


apresentando um risco três vezes maior para eventos
cardiovasculares que indivíduos sem doença inflamatória. A causa
da aterosclerose precoce e acelerada ainda não foi completamente
elucidada, mas é provável que a inflamação constante seja uma
fator relevante.

• Síndrome de Felty é a associação de AR com esplenomegalia e


leucopenia. Ocorre em pacientes com doença de longa data, com
FR positivo, nódulos e deformidades.

EXAMES COMPLEMENTARES
• As provas de atividades inflamatórias como velocidade de
hemossedimentação (VHS) e a proteína C reativa (PCR) são os
marcadores mais utilizados para avaliar o grau de atividade da AR,
embora sejam desprovidas de especificidade.

• O fator reumatoide (FR) é encontrado em 70-80% dos pacientes


com AR. Não é especifico para a doença e pode ser encontrado no
lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de Sjögren, doenças
infecciosas crônicas como: AIDS, doença de chagas,
esquistossomose, endocardite bacteriana, tuberculose, sífilis,
hepatite crônica, sarcoidose, e 5-10% de pessoas saudáveis e
idosas podem apresentar FR positivo. Então, FR negativo não
exclui o diagnóstico de AR, e a sua positividade deve ser analisada
conjuntamente com os sintomas clínicos.

• Os anticorpos antipeptídeos citrulinados cíclicos (anti-CCP)


apresentam uma especificidade de 90-98% e uma sensibilidade 70-
80%. Raramente estão presentes em outras doenças, exceto na
tuberculose ativa.

• O hemograma pode apresentar anemia normocítica e hipocrômica


ou normocrômica, sendo seu mecanismo o encontrado em doenças
crônicas.
• O líquido sinovial apresenta redução da viscosidade, presença de
leucócitos e aspecto turvo.

• O exame de radiografia (RX), geralmente solicitado na primeira


consulta, pode apresentar: aumento de partes moles que traduz o
acometimento periarticular e efusões intra-articulares; redução do
espaço articular devido à destruição da cartilagem; erosões
ósseas que indicam destruição da cartilagem, normalmente
encontras em casos mais avançados; osteopenia que, no início, é
periarticular, e após torna-se difusa; cistos ósseos devido à invasão
do pannus no osso e cartilagem; deformidades e instabilidade
relacionadas com lesões tendíneas e destruição articular ou óssea.

• US é um método não invasivo de custo acessível que pode


detectar acúmulo de líquido sinovial, sinovite e erosões ósseas. A
RNM apresenta uma sensibilidade melhor se comparada com US e
RX, podendo identificar e estimar o volume do tecido sinovial,
edema ósseo, infiltração inflamatório, sinovite. Entretanto, tem
elevado custo, envolve grande quantidade de tempo e, algumas
vezes, não é tolerada pelos pacientes.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• O diagnóstico da AR é feito por meio da associação de
manifestações clínicas e os exames complementares (laboratoriais
ou radiográficos).

• Os novos critérios ACR 2010 (American College of


Rheumatology)/EULAR (European League Against Rheumatism)
têm como objetivos aumentar a sensibilidade do diagnóstico em
fases mais precoce da doença (Tabela 1). Baseia-se em um sistema
de pontuação por um escore de soma direta, em que pontuação ≥ 6
é necessária para a classificação definitiva de um paciente com
AR. O domínio acometimento articular refere-se a qualquer
articulação dolorosa ou inchada, considerando pequenas
articulações para fins de classificação: punhos, interfalangianas
proximais, metacarpofalanginas, metatarsofalangianas da 2°a 5° e
1° interfalfalangianas; como grandes articulações: cotovelos,
joelhos, ombros, quadril e tornozelos.

População-alvo (quem deve ser testado?)

Paciente com pelo menos uma articulação com sinovite clínica definida (edema)*.
Sinovite que não seja mais bem explicada por outra doença.

Acometido articular (0-5)

1 grande articulação 0

2-10 grandes articulações 1

1-3 pequenas articulações (grandes não contadas) 2

4-10 pequenas articulações (grandes não contadas) 3

>10 articulações (pelo menos uma pequena 5

Solorogia (0-3)

Fr negativo e Anti-ccp negativo


0

Fr e ACPA positivo em baixos títulos


2

Fr e ACPA positivo em altos títulos 3

Duração dos sintomas (0-1)

< 6 semanas
0

≥ 6 semanas
1

Provas de atividade inflamatória (0-1)

PCR normal e VHS normal


0

PCR anormal OU VHS anormal


1

*Os diagnósticos diferenciais podem incluir condições tais como lúpus eritematoso sistêmico,
artrite psoriática e gota. Se houver dúvidas quanto aos diagnósticos diferenciais relevantes, um reumatatologista deve ser
consultado.
FR: fator reumatoide; ACPA: anticorpos antiproteínas e peptídeos citrulinados;
VHS: velocidade de hemossedimentação; PCR: proteína C reativa.

Tabela 1- Critérios AR 2010 (ACR/EULAR) para classificação da AR.


Fonte: Adaptada; Aletaha D, Neogi T, Silman AJ, et al. 2010 rheumtoide
arthritis classification criteria: an American College of Rheumatology/
European League Against Rheumatism collaborative initiative, Ann Rheum
Dis. 2010; 69 (9):1580-8
TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• O tratamento da AR inclui: educação do paciente e de sua família,


fisioterapia, apoio psicossocial, terapia ocupacional, terapia
medicamentosa e abordagens cirúrgicas.

• Medidas educativas: o paciente deve ser esclarecido sobre sua


doença e quanto às possibilidades de evolução, prognóstico e
terapêutica. A educação deve ser iniciada desde o primeiro
atendimento e deve incluir os familiares. O paciente tem o direito
de saber sobre suas condições e sobre as opções terapêuticas
disponíveis, e deve participar ativamente das escolhas.

• Fisioterapia: nas fases ativa da doença, deve incentivar o repouso,


pois contribui para diminuição do processo inflamatório. É
recomendada a cinesioterapia com a finalidade de restaurar a
amplitude de movimento articular, fortalecimento e alongamento
muscular e desempenho de habilidades especificas. O exercício
deve ser realizado por, no mínimo, 20 minutos e realizado por 2 x
na semana ou mais, com objetivo de ter efeito clínico positivo sem
gerar dor ou ativação da doença.

• Terapia ocupacional: atua empregando diversas técnicas para


proteção articular e conservação de energia. Tem o objetivo de
diminuir a dor por meio de repouso regular, planejamento de
atividades de estimulação, alternância nos padrões de movimento
articular e uso de órteses.

• Tratamento cirúrgico: o tratamento cirúrgico bem indicado


contribui para a melhora da mobilidade, função, do controle da dor
e da qualidade de vida do paciente. Os procedimentos cirúrgicos
incluem: liberação de neuropatias, reparo e transferência de
tendões, sinovectomia, artroplastia total e estabilização de
vertebras instáveis.
• O benefício trazido por modificações nutricionais ainda não está
claro, devendo ser considerados seus possíveis eventos adversos,
tal como o emagrecimento, que contribuem para o grande número
de perdas de acompanhamento nos estudos. O paciente obeso deve
ser incentivado a perder peso, pois mesmo o leve excesso de peso
aumenta o estresse nas articulações envolvidas com sinovite,
potencialmente apressando a destruição articular.

• Devido ao aumento do risco de aterosclerose coronariana e


morbimortalidade associada em pacientes com AR, deve-se
realizar esforços para modificar fatores de risco como
hiperlipidemia, tabagismo, hipertensão e estilo de vida sedentário.
O controle do processo inflamatório também pode contribuir para a
proteção cardiovascular, enquanto existem evidências de que a
terapia com estatina melhora a inflamação em pacientes com AR.

• Pacientes que estejam em uso de medicamentos


imunossupressores geralmente não devem receber vacinas vivas
(vacinas vivas contra vírus varicela-zoster, sarampo e febre
amarela). Vacinas recomendadas são: vacina pneumocócica, vacina
sazonal contra influenza anualmente, vacinas contra o vírus da
hepatite A e B.
b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• Terapia medicamentosa:
• Uso de anti-inflamatório não hormonais (AINHs) e corticoides
• Os AINHs são utilizados para combate da dor e da inflamação. A
escolha do AINH deve ser individualizada, pois não há estudos
mostrando superioridade conhecida por qualquer fármaco dessa
classe. Deve-se ficar atendo a condições clínicas que possam ser
agravadas com uso dos AINHs, como: insuficiência cardíaca,
hipertensão arterial, doença gastrointestinal, insuficiência renal,
hepatopatias e distúrbios de coagulação.
• Entre os AINHs convencionais, pode-se citar: indometacina
(100-150 mg/dia), cetoprofeno (100-150 mg/dia), piroxicam e
tenoxicam (20 mg/dia), nimesulida (200 mg/dia), meloxicam (15
mg/dia), diclofenaco (100-150 mg/dia), celocoxib (200 mg/dia).
• Atualmente há evidências para indicá-los como participantes na
modificação do curso da doença em associação com as DMCD.
• É sugerido o uso de doses baixas (< ou igual 15 mg/dia) de
prednisona ou prednisolona. Devido a vários efeitos colaterais, o
tempo de uso deve ser abreviado ao menor possível. Se os
pacientes necessitarem de uso de glicocorticoides prolongado
(>3 meses), devem receber suplementação de cálcio (1500
mg/dia de cálcio elementar) e vitamina D3 (400-800 UI/dia).
Para pacientes em uso de concomitante de corticoide e AINH,
recomenda-se proteção gástrica com inibidor de bomba de
prótons. Uso de corticoide intra-articular deve ser feito a
qualquer momento do tratamento, porém uma mesma articulação
não deve ser infiltrada por mais de 3-4 ano.

• Drogas modificadoras do curso da doença - DMCD


• Devem ser indicadas ao paciente a partir da definição do
diagnóstico.

• DMCD sintética
• Metotrexato - MTX
• É um imunomodulador cuja ação consiste na inibição da síntese
de DNA, RNA e proteínas devido à inibição da enzima
diidrofolato redutase. Atualmente, é o fármaco padrão no
tratamento da AR. Recomenda-se dose incial de 10-
15mg/semana, vo ou parenteral (IM ou SC). Caso não se observe
melhora ou controle da doença com a dose inicial, deve-se
aumentar progressivamente a cada 2-4 semanas até alcançar a
dose de 20-30 mg semana. Sugere-se a associação do MTX ao
ácido fólico na dose de 5-10 mg/semana 24-48 h após o MTX, a
fim de minimizar os efeitos adversos. Os efeitos adversos mais
frequentes incluem: náuseas, vômitos, mucosite, anemia,
neutropenia e elevação de enzimas hepáticas. O MTX está
contraindicado em pacientes com hepatopatia, etilismo,
insuficiência renal, supressão da medula óssea. A gestação e a
amamentação estão formalmente contraindicadas.

• Leflunomida - LEF
• É um agente imunomodulador que inibe a enzima diidroorotato
desidrogenase responsável pela síntese de pirimidina. Melhora a
atividade da doença e a qualidade de vida. A dose recomendada
é 20 mg/dia, mas podem ser usados 20 mg/dias alternados. Está
contraindicada em hepatopatas, insuficiência renal gestação e
amamentação. Os efeitos adversos incluem: vômitos, dor
abdominal, náuseas, alteração das enzimas hepáticas, exantema
cutâneo, alopecia reversível. Em casos de intoxicação, pode ser
usada a colestiramina, na dose de 8 g 3 x ao dia durante 11 dias.

• Antimaláricos (difosfato de cloroquina - DCQ e sulfato de


hidroxicloroquina - HCQ)
• São medicamentos utilizados há bastante tempo para tratamento
da AR, e considerados seguros e eficazes. São indicados para
formas iniciais e leves. Seu mecanismo de ação envolve
atividade anti-inflamatória (estabilizando as membranas
lisossomais, inibindo as enzimas lissosômicas e quimotaxia e
fagocitose de polimorfonucleares) e interferência na produção de
prostaglandinas. Há duas formas disponíveis: a DFC e o HCQ
(preferível por seu melhor perfil de segurança, sobretudo
oftalmológico). A dose máxima da HCQ é de 6mg/kg/dia VO,
DFC de 4 mg/kg/dia.
• Os efeitos colaterais incluem: hiperpigmentação de pele,
cefaleia, tontura, intolerância gastrointestinal, miopatia e
retinopatia. A retinopatia é infrequente, mas deve-se ser
monitorizada através de avaliação oftalmológica regular
(avaliação ocular antes da introdução dos antimaláricos e cada
12 meses).

• Sulfassalazina - SSZ
• Pertence ao grupo dos salicilatos e sulfamidas, e é desdobrada
pelas bactérias intestinais na sulfapiridina (tem vários efeitos
imunomodulatórios, como inibição de diversas funções
neutrofilícas e linfocitárias, quimiotaxia e inibição de
prostraglandinas). Usualmente utilizada na dose de 1-3 g/dia
VO.
• Os efeitos colaterais gastrointestinais constituem um fator
limitante (náuseas, vômitos, dor abdominal e diarreia). Está
contraindicada para pacientes alérgicos a salicilatos e a sulfas, e
em indivíduos com porfiria.

• DMARD sintética alvo-específico


• TOFACITINIBE
• Inibe seletivamente a Janus quinase (JAK). É indicado para
tratamento de pacientes adultos com AR ativa moderada a grave
e que tenham apresentado uma resposta inadequada a um ou
mais DMCD. Pode ser usado como monoterapia ou em
combinação com metotrexato ou outros DMARD sintéticos.
• Dose recomendada é de 5 mg 2 x ao dia, reduzida para 5 mg dia
em pacientes com comprometimento renal moderado a grave,
comprometimento hepático moderado, em uso de potentes
inibidores do citocromo P450.

• Agentes biológicos ou DMCD biológicas


• São consideradas um dos mais relevantes avanços no tratamento
da AR. Encontram-se disponíveis no Brasil e aprovadas pela
ANVISA os seguintes DMCD biológicas:
• Bloqueadores de TNF - infliximabe, golimumabe, etanercepte,
adalimumabe e certolizumabe.
• Depletor de lonfócitos B – rituximabe.
• Bloqueador da coestimulação do linfócito T – abatacepte.
• Bloqueados de interleucina-6 (IL6) – tocilizumabe.
• Estão indicados em pacientes refratários a pelo menos dois
esquemas de DMCD sintéticas, incluindo o MTX. Em casos
especiais, a DMCD biológica pode ser prescrita precocemente,
principalmente em pacientes que apresentam manifestações de
pior prognóstico, como: erosões radiográficas na fase inicial da
doença, várias articulações acometidas, FR e ou anti-CCP em
altos títulos.
• Os agentes biológicos são contraindicados em pacientes
portadores de insuficiência cardíaca graus III e IV, gestantes e
lactantes, em vigência de infecção ativa, infecções pulmonares
recorrentes, esclerose múltipla, para pacientes com alto risco
para desenvolvimento de infecções, como os portadores de
úlceras em membros inferiores e artrite séptica nos últimos 12
meses, e para aqueles com doenças malignas atuais ou passadas
< 10 anos.
• Antes de iniciar o tratamento com os agentes biológicos, deve-se
realizar pesquisa de hepatites virais B e C, além do HIV, e deve-
se evitar o uso do biológico se houver presença destas infecções.
• PPD e radiografia de tórax também devem ser realizados devido
ao risco de reativação da tuberculose (TB). Se o paciente
apresenta um PPD ≥ a 5 mm (ou IGRA positivo) ou naqueles
com alterações radiológicas compatíveis com TB prévia ou
pacientes que tiveram contato íntimo com indivíduos com TB
ativa, deve ser utilizar isoniazida na dose de 5-10 mg/kg/dia
(máximo de 300 mg) pelo período de 6 meses.
• O tratamento da TB latente deve ser iniciado pelo menos 1 mês
antes do início da DMCD biológica e, em casos em que a
atividade inflamatória seja intensa e exigir urgência no
tratamento, pode ser usado concomitante.
• Recomenda-se também avalição odontológica antes e durante o
tratamento, para profilaxia e tratamento de infecções
periodontais.

• Anti-TNF
• A inibição do TNF demonstrou ser efetivo para controlar a
atividade da AR. O TNF é uma potente citocina inflamatória
expressa em grande quantidade no líquido sinovial e soro de
pessoas com AR. É responsável pela liberação de outras
citocinas, como: IL-6, IL-1, IL-8 e estimula a produção de
proteases.
• Em termo de eficácia, não existem dados que permitam afirmar a
superioridade de qualquer um dos cincos agentes anti-TNF.
Devem ser usados preferencialmente associados ao MTX ou
outra DMCD sintética, pois o uso combinado mostrou-se um
rápido benefício no controle da atividade da doença quando
comparado com uso do anti-TNF como monoterapia.

• Infliximabe - IFX
• É um anticorpo monoclonal quimérico (humano-murino),
prescrito na dose de 3 mg/kg, endovenoso, seguido da mesma
dose nas segunda e na sexta semana e, depois, a cada 8 semanas
(0,2,6,8 semanas). Para pacientes que não responderam
satisfatoriamente, a dose pode ser aumentada para 5 mg/kg por
infusão, ou o intervalo entre as doses pode ser diminuído.

• Golimumabe - GOL
• O GOL é um anticorpo monoclonal humano anti-TNF
administrado na dose de 50 mg/ mês, via subcutânea.

• Etanercepte - ETN
• É uma proteína de fusão composta por uma região Fc da IgG e
um fragmento Fab de um anticorpo anti-TNF. Prescrita na dose
de 50 mg/semanal, subcutânea.

• Adalimumabe - ADA
• É um anticorpo humano contra TNF, prescrito para aplicação SC
na dose de 40 mg a cada 15 dias.

• Certolizumabe - CERT
• É um fragmento Fab de um anticorpo anti-TNF humanizado,
com alta afinidade ao TNF, conjugado a duas moléculas de
polietilenoglicol. Prescrita a dose de 400 mg a cada 2 semanas,
nas semanas, 0,2,4 e, após isso, na dose de 200 mg a cada 2
semanas ou 400 mg a cada 4 semanas.

• Rituximabe-RTX
• É um anticorpo monoclonal quimérico dirigido contra o linfócito
CD 20+. A dose administrada é de 1.000 mg em duas infusões
venosas em intervalo de 14 dias. Cada infusão deve ser
precedida de 100 mg de metilprednisolona endovenosa 60 min
antes e de 1 g de paracetamol e anti-histamínico, para diminuir a
gravidade e frequência de reações infusionais. É indicado para
pacientes com AR em atividade moderada a grave com falha à
terapêutica ao anti-TNF.

• Abatacepte - ABAT
• É uma proteína de fusão CTLA-4- IgG, que atua como inibidor da
coestimulação dos linfócitos T. É indicado para pacientes com AR
em atividade que tiveram falha à terapêutica com DMCD ou
agentes biológicos. Deve ser administrado como infusão venosa,
durante 30 min, na dose de 500 mg nos pacientes com menos de 60
kg, 750 mg em pacientes entre 60-100 kg, e 1.000 mg naqueles
com mais de 100 kg. A dose seguinte deve ser aplicada duas a
quatro semanas após a dose inicial e, depois, a cada 4 semanas. É
contraindicado em pacientes com doença pulmonar obstrutiva
crônica, pois pode exacerbar o quadro e aumentar os risco de
infecção.

• Tocilizumabe - TOCI
• É um anticorpo monoclonal humanizado que se liga ao receptor
de IL-6, inibindo seu efeito. Prescrito na dose de 8 mg/kg,
endovenoso, a cada 4 semanas.
• Pode ser usado como monoterapia, ou associado ao MTX ou
outras DMCD. Pode ocasionar plaquetopenia, neutropenia e
elevação de transaminases, os quais são efeitos adversos dose
dependentes. Aumenta o risco de infecção e elevação do
colesterol total e do LDL (lipoproteína de baixa densidade). É
indicado para pacientes que falharam com outras DMCD.
Quando o paciente entra em remissão sustentada, por mais de 6-12 meses
(baseando nos índices compostos de atividade de doença), pode-se tentar a
retirada gradual das medicações iniciando primeiramente os AINE, seguidos
de glicocorticoides, depois DMCD biológico, mantendo o uso de DMCD
sintético. Se houver piora da atividade da doença, deve-se reiniciar o
esquema terapêutico anterior e seguir as recomendações de dose inicial e de
ajuste de doses e troca de medicamentos indicadas no Protocolo.
Revisões periódicas devem ser realizadas para avaliar a eficácia do
tratamento e a monitorização de possíveis efeito adversos dos
medicamentos. O intervalo recomendado inicialmente é de 1-3 meses e, uma
vez atingindo a remissão da doença e atividade leve para pacientes com anos
de evolução da AR, os intervalos podem ser de 6-12 meses
FLUXOGRAMA DE TRATAMENTO

*AINH: anti-inflamatórios não hormonais; MMCD: medicamentos modificados do curso da doença; MTX: metotrexato.
a Havendo contraindicação ao MTX, a sulfassalazina ou leflunomida podem ser empregadas. Antimaláricos
(hidroxicloroquina/cloroquina) em monoterapia podem ser considerados em quadros com baixo potencial erosivo.
b As combinações mais utilizadas no Brasil são: MTX + antimaláricos, MTX + leflunomida (com ou sem antimaláricos),
MTX + sulfassalazina (com ou sem antimaláricos).
c A meta do tratamento deve ser alcançar a remissão, conforme critérios ACR/EULAR ou, quando não for possível, a baixa
atividade da doença, avaliada por um dos índices compostos de atividade de doença.
d Não é recomendado o uso de um terceiro anti-TNF após falha das duas opções de anti-TNF.
e No Brasil, o rituximabe é recomendado, em combinação com MTX, para pacientes que tiveram resposta inadequada ou
intolerância a um ou mais anti-TNF.
f No caso de falha ou toxidade a um medicamento na terceira linha de tratamento, o próximo passo será trocar para outro
(MMCDb ou MMCDsae) listado nesse mesmo nível de complexidade, que não tenha sido previamente utilizado.
Fluxograma1: Fluxograma para tratamento da artrite reumatoide no Brasil.
Fonte: Vasconcelos.1

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: RBS, 52 anos, sexo feminino, há 4 meses queixa-se
de dores articulares progressivas que iniciaram em punhos,
metacarpofalangeanas e interfalangeanas das ambas as mãos, relatava
também vermelhidão e inchaço associado. Logo ao acordar, tem
dificuldade de movimentar as mãos, que parecem ficar duras,
melhorando após 1-2 horas.
b. Exame físico articular: punhos com flexão diminuída
bilateralmente, edema e dor em 3º, 4º e 5º interfalangeanas da mão
direita, e 4ª e 5ª interfalangeana da mão esquerda, além de presença de
pequeno nodúlo em interfalangeana do 5º dedo da mão esquerda.
Joelhos apresentavam inchados, quentes e dificuldade a flexão ativa e
passiva.
c. Exames complementares: fator reumatoide-64 (vr- <14), FAN
negativo, anticcp - 128 u/mL (vr- reagente> 10) pcr-70 mg/dL (vr- até
1,0 mg/dL), vhs- 55 mm/1h (vr-0-20 mm), sorologias para hepatite b/c
e HIV negativas.
d. Prescrição sugerida:

1. metotrexato 2,5 mg tomar 6 cp 1 x por semana


2. ácido fólico 5 mg 1cp, 1 dia após a ingesta do item 1
3. prednisona 20 mg 1 cp ao dia, usar por 7 dias após tomar ½ cp ao
dia
4. omeprazol 20 mg 1 cp em jejum
5. codeína 30 mg 1 cp de 6/6h se dor forte
6. beta trinta 1 ampola im região glútea dose única
7. carbonato de cálcio 500 mg 1 cp após o almoço

REFERÊNCIAS
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League Against Rheumatism collaborative initiative, Ann Rheum Dis. 2010; 69 (9):1580-8
7.4
ARTRITES AGUDAS
Autora:
Lenita Adriana Mazzi Gaino

DEFINIÇÕES
O sintoma de dor articular pode estar associado a várias doenças. Na avaliação inicial, é importante observar se
a dor é decorrente da articulação ou de alterações em partes moles.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Monoartrite aguda

Tumores: Tumor de células gigantes


Infecções: bactérias, fungos, micobactérias,
tenossinovial, condrossarcoma, osteoma
vírus e espiroquetas
osteóide, doença metastática

Induzida por cristais: urato monossódico, Doença reumatológica: artrite reumatóide,


pirofosfato de cálcio dihidratado, hidroxiapatita, espondiloartrites, lúpus eritematoso sistêmico,
oxalato de cálcio, lipídios sarcoidose

Hemartrose: trauma, anticoagulação, fratura,


Outros: Osteoartrite erosiva, lesão menisco,
sinovite vilonodular pigmentada, distúrbios
osteonecrose, fratura
de coagulação

Poliartrites inflamatórias

Artrite infecciosa: bactérias, vírus e outros Artrite induzida por cristais

Doenças reumatológicas sistêmicas: lúpus,


esclerose sistêmica, vasculites, dermato/
Artrite pós-infecciosa: febre reumática, artrite
polimiosite, doença de Still, Behçet,
reativa, infecção entérica
policondrite recidivante,
doenças autoinflamatórias

ARTRITE REUMATOIDE

espondilite anquilosante, artrite psoriásica, doença


Outras espondiloartrites:
inflamatória intestinal

OSTEOARTRITE INFLAMATÓRIA

reumatismo palindrômico, sarcoidose, malignidades,


Outras:
hiperlipoproteínas, febre familiar do Mediterrâneo

QUADRO 1. ETIOLOGIA
Fonte : Adaptado de Helfegott2

A avaliação é feita através de: história completa; exame físico e exames complementares (imagem: radiografia,
ultrassonografia, tomografia computadorizada e ressonância), de acordo com a avaliação; análise do líquido
sinovial (Tabela 1) e interpretação de tal exame (fluxograma 1); exames de laboratório (solicitados de acordo com
o quadro); biópsia sinovial (reservada para casos de monoartrite refratária, suspeita de infecções atípicas ou
tumores intra-articulares).

Líquido Não Artrite


Normal Inflamatório Hemorrágica
sinovial inflamatório séptica

Aparência Transparente Transparente Opaco Opaco Sangue

Amarelo
Cor Límpido Amarelo Amarelo opaco Vermelho
opaco/verde
Viscosidade Alta Alta Baixa Variável Variável

Leucócitos
< 200 0 a 2 mil > 2 mil > 20 mil Variável
cel/mm3

Polimorfonu-
< 25 < 25 > ou igual 50 > ou igual 75 50 a 75
cleares (%)

Cultura Negativa Negativa Negativa Comumente + Negativa

**Artrite inflamatória pode incluir artrite séptica. Artrite séptica gonocócica pode cursar com
a contagem de leucócitos baixa.

Tabela 1: Análise do líquido sinovial


Fonte: Sholter.6

FLUXOGRAMA DE TRATAMENTO

FLUXOGRAMA 1. GUIA DE INTERPRETAÇÃO DO LÍQUIDO SINOVIAL


Fonte: Helfegott.2

ARTRITES MICROCRISTALINAS (EXCETO GOTA)


a. Por deposição de cristais de pirofosfato di-hidratado de cálcio (DPFC)/pseudogota

• Características:
• Primária ou secundária.
• É a causa mais comum de condrocalcinose.
• Está fortemente associada à idade (≥ a 65 anos) e, em alguns casos, a fatores hereditários.
• Manifestação: assintomática, sinovite aguda ou artropatia degenerativa; acomete notadamente joelhos,
punhos e quadris; é a causa mais comum de monoartrite em idosos.

• Cristais: romboides ou hastes com birrefringência positiva fraca à microscopia de luz polarizada.
• Quadro clínico:
• Latente ou assintomática: alteração radiológica (condrocalcinose: calcificação da cartilagem hialina
ou fibrocartilagem).
• Pseudogota: artrite aguda, mais comum em idosos, pode ocorrer febre; geralmente é monoarticular
(comum em: joelhos, punhos, ombros, cotovelos e tornozelos), autolimitada (duração de 1-3 semanas)
e pode coexistir com gota. Situações desencadeantes mais comuns: trauma articular, doença clínica
intercorrente, cirurgia, transfusão de sangue, lavagem articular.
• Pseudo-osteoartrite: joelhos, quadris, punhos, metacarpofalangeanas (2-3ª), ombros e
cotovelos/diferença com osteoartrite: locais pouco usuais para osteoartrite, como: punhos, cotovelos e
tornozelos, acometimento preferencial de compartimento medial de joelho, ausência de trauma ou
sobrecarga, inflamação mais proeminente, sobreposição de ataques agudos
• Pseudoartrite reumatoide (ocorre em 5% dos casos): poliarticular, não erosiva, + ou - sintomas
sistêmicos.
• Pseudo-neuropática: alterações degenerativas importantes (semelhantes a Charcot), sem alteração
neurológica.
• Outras: axial (síndrome do dente coroado, por exemplo), tendinite ou tenossinovite, bursite, tofácea
(articulação temporomandibular é a mais comum).

• Condições associadas: Hipomagnesemia, hipofosfatasia, hemocromatose, hiperparatireoidismo, > 60


anos, osteoartrite, trauma articular, gota, hipotireoidismo, gestação, amiloidose, hipercalcemia familiar,
ocronose, doença de Wilson, diabetes, acromegalia, doença de Paget.

• Investigação: laboratório (inicialmente: hemograma, ácido úrico, provas inflamatórias e fator


reumatoide; após o diagnóstico: cálcio sérico, fósforo, fosfatase alcalina, ferro, ferritina, saturação de
transferrina, TSH, magnésio, função hepática), análise do líquido sinovial (cristais azuis quando paralelos
ao eixo do polarizador e amarelos quando perpendiculares; 5% dos casos pode ter sobreposição com
gota) e tecido (biópsia sinovial: vermelho de alizarina); radiografia (calcificações de padrão linear ou
pontilhado em fibrocartilagem e cartilagem hialina, paralelas ao osso, notadamente em joelho e
metacarpofalangeanas, tendões de Aquiles, tríceps, obturadores; calcificação do disco intervertebral;
cistos subcondrais; alterações degenerativas hipertróficas; osteófitos em gancho nas 2-3ª
metacarpofalangeanas; redução desproporcional do espaço patelofemoral); tomografia computadorizada
(síndrome do dente coroado); ultrassonografia (banda hiperecóica fina paralela ao córtex ósseo, aspecto
fino).

• Tratamento: tratamento da doença associada; redução de peso; calçado adequado; gelo; repouso; anti-
inflamatório tópico; exercícios de fortalecimento muscular. Na artrite aguda: 1 ou 2 articulações afetadas
(aspiração articular e infiltração de corticosteróide); duas ou mais articulações (AINES, glicocorticoide-
até 0,5 mg/Kg/d, ou colchicina - dose de 0,5 mg 3 vezes/dia no primeiro dia, seguido de 2x/dia até a
remissão). Artropatia crônica: AINE (na menor dose necessária) ou colchicina (0,5 a 1 mg/dia) ou
prednisona (no máximo 10 mg/dia); hidroxicloroquina e/ou metotrexato (segunda linha).

b. Por deposição de cristais de fosfato básico de cálcio (hidroxiapatita/octacálcio-fosfato e tricálcio-


fosfato)
Cristais em formato de agulha ou achatados não são birrefringentes. Ocorrem entre 40-60 anos; o
acometimento é monoarticular (comumente ombro, trocânter maior do fêmur, epicôndilo lateral do cotovelo e
inserções tendíneas no joelho), mas geralmente os pacientes são assintomáticos (achado radiológico).
É comum em pacientes com insuficiência renal, pacientes submetidos à injeção intra-articular de triancinolona
hexacetonida; doenças do tecido conjuntivo (esclerodermia e dermatomiosite), trauma e infecções.

• Síndromes clínicas: depósitos cutâneos (achado assintomático; inflamação aguda ou crônica; ulceração
na pele; infecção secundária; necrose de pressão/ influência mecânica), periarticulares (achado; bursites
ou tendinites calcificadas; periartrites calcificadas primária ou secundária-familiar; disfunção articular) e
intra-articulares (um achado, sinovite aguda, osteoartrite grave ou artropatias destrutivas).

• *Síndrome do Ombro de Milwaukee: pacientes com mais de 70 anos, mulheres com histórico de dor
crescente, tumefação e perda da função articular; geralmente o lado dominante é acometido, embora 60%
possam evoluir para acometimento bilateral; a dor piora à noite e com movimentos; geralmente, há a
destruição do manguito rotador.

• Investigação: radiografia simples é suficiente; bioquímica (depósitos múltiplos ou grandes: solicitar


cálcio, fosfato e função renal); aspiração de líquido sinovial (mistura parecida com pasta de dente;
sanguinolento nas artropatias destrutivas).

• Diagnóstico diferencial: pseudogota, gota e artrite séptica.


• Tratamento: repouso, AINEs ou colchicina; corticóide local; fisioterapia; cirurgia.
• Tendinite calcárea crônica: tratamento com ultrassonografia pulsada; articular: tratamento igual ao da
osteoartrite, procedimentos cirúrgicos, bloqueio de nervo.

INFECCIOSAS
O possível papel de microrganismos externos (vírus, bactérias, fungos) como causa ou gatilho para artrite
inflamatória é complexo. A associação entre infecções e artrite pode ser dividida em 4 grupos: I (artrite séptica ou
infecciosa como causadora inicial), II (artrite pós-infecciosa com o antígeno bacteriano sendo encontrado na
articulação), III (artrite reativa com infecção originária do trato genitourinário ou gastrointestinal, mas sem a
detecção do microorganismo na articulação) e IV (artrite inflamatória desencadeada por microrganismo).

Doença articular degenerativa, diabetes mellitus, artrite reumatoide, insuficiência renal


FATORES SISTÊMICOS
crônica, malignidades

Trauma articular direto, cirurgia recente de articulação, redução de fraturas abertas,


FATORES LOCAIS
artroscopia, prótese articular, danos na integridade da pele

Atividade ocupacional com exposição a animais, baixo nível socioeconômico, abuso crônico
FATORES SOCIAIS
de álcool, uso de drogas endovenosas, promiscuidade

OUTROS FATORES Extremos de idade, hospitalização prolongada, uso de agentes biológicos, áreas endêmicas

Quadro 2. Fatores de risco para artrite séptica.


Fonte: Adaptado de MATHEW, AJ; RAVINDRAN, V., 2014.

ARTRITE SÉPTICA OU INFECCIOSA


Para definição de um caso, é necessário 1 de 4 pontos, de acordo com os critérios modificados de Newman: 1
(isolamento do microorganismo na articulação), 2 (isolamento do patógeno em outra fonte - sangue ou fluido
corporal), 3 (características clínicas e de fluido sinovial típicas, na presença de antibiótico prévio) e 4 (pós-morte
ou achados patológicos suspeitos para artrite infecciosa). O aumento de sua incidência tem relação com o aumento
da resistência antimicrobiana, idade, procedimentos invasivos e imunossupressão. A via de disseminação mais
comum é a hematogênica, outras vias menos frequentes são a partir de osteomielite, infecção de partes moles
adjacentes, medidas diagnósticas e terapêuticas ou trauma. O acometimento monoarticular ocorre em até 75% dos
casos; ocorre mais em indivíduos com menos de 15 anos e mais de 55 anos de idade, e os agentes etiológicos
variam de acordo com a faixa etária (Quadro 3). Pode, ainda, ser dividida em: gonocócica e não gonocócica
(Quadro 4). A investigação deve ser feita com exames complementares, como: provas inflamatórias, hemograma
completo, hemoculturas (positiva em 50% dos casos), análise de liquido sinovial e exames de imagem
direcionados para o local suspeito.

Grupo Agentes etiológicos

Gonococo; bactérias não gonocócicas; Staphylococcus aureus; Streptococcus; H. influenza;


Pseudomonas aeroginosas; Kingella kingae; Moraxella osloensis; Arcanobacterium
Adultos
haemolyticum; Mycoplasma hominis; Mycobacterium marinum; Shiggela sp; Salmonella
sp.; Ureaplasma urealyticum.

Neonatos Streptococcus grupo B; E. coli; S. aureus.

Crianças < 3 anos S. pyogenes; S. pneumoniae; S. aureus.

Adolescentes S. aureus; N. gonorrhoeae; P. aeruginosa; K. kingae.

Todos os grupos Viroses.

Exposição a carrapato Borrelia burgdorferi.

Humano: Eikenella corrodens, S. aureus, Streptococcus grupo B, anaeróbios.


Mordeduras (cão, gato, Cão ou gato: S aureus, Pasteurella multocida, Pseudomonas sp, Moraxella sp, Haemophilus
humanos, rato) sp.
Ratos: S. aureus, Streptobacillus moniliformis, Spirillum minus.

Idosos Streptococcus

Doenças concomitantes Enterobacter, P. aeruginosa, S. marcescens, Salmonella sp.

Imunocomprometidos, injeções
M. tuberculosis, M. kansasii, M. marinum, M. avium intracelular, M. fortuitum, M.
intra-articulares, artroscopia,
haemophilum, M. terrae, M. chelonae, Nocardia asteroides, Fungos .
HIV associado

Quadro 3. Agentes etiológicos de acordo com a faixa etária.


Fonte: Adaptada de Mathew.3

Características Gonocócica Não gonocócica

Transmitida pela N. gonorrhoeae; pode afetar Recém-nascidos; adultos idosos; adultos com
orofaringe, ânus ou conjuntiva; predomínio em comorbidades: diabetes, artrite reumatoide,
mulheres e adultos sexualmente ativos. osteoartrite.
Fatores de risco: infecção mucosa
assintomática, múltiplos parceiros, uso de
drogas endovenosas, baixo nível
Características
socioeconômico, deficiência de complemento,
LES e anemia falciforme

Febre; poliartrite migratória (mais em joelhos, Monoartrite (joelho é mais comum em adultos
punhos, tornozelos, cotovelos e pequenas e o quadril, em crianças); poliarticular (em 10-
articulações); poliartralgia; monoartrite (rara); 20% dos casos); febre (em 40% dos casos);
tenossinovite assimétrica (até 68%); dermatite queda de estado geral; pode haver indício de
(75%): mácula ou pápula indolor, não outras infecções (pele, urina, por exemplo).
pruriginosa (membros inferiores e tronco,
poupa face e couro cabeludo).
Graves: endocardite, miocardite, defeitos de
Apresentação condução, pericardite, osteomielite,
piomiosite, hepatite, meningite, síndrome
respiratória do adulto, síndrome de
Waterhouse-Friderichsen
Características Gonocócica Não gonocócica

Hemocultura: positiva em 50% Aproximadamente 90% no líquido


dos casos sinovial; 50% na hemocultura;
Pesquisa de mucosa: secreção uretral, cervical, alterações na radiografia indicam que a
faríngea e retal (aproximadamente 80% dos infecção está presente há pelo menos 2-3
pacientes tem cultura positiva em algum dos semanas (*artrite: osteopenia e destruição
sítios)/ coletar culturas do parceiro articular e do osso); ultrassom: identifica
Líquido sinovial: ¼ das amostras é positiva derrame articular; marcação de leucócitos com
Positividade da cultura - (semear em Agar chocolate ou Thayer- índio 111 + tecnécio 99 m; ressonância
Imagem Martin). magnética: S 100%; E: 75%.
Caso todos os testes negativos: considerar
quadro clínico típico, ausência de causa
alternativa e resposta à terapia

Hospitalização: diagnóstico incerto, artrite Artrocenteses seriadas ou artroscopia com


purulenta que exija aspiração articular ou para lavagem ou drenagem cirúrgica aberta.
a certeza da tomada de antibiótico Duração do tratamento: 2 a 4 semanas,
- paciente com dermatite, poliartralgia e inicialmente via parenteral e esta, por pelo
tenossinovite: ceftriaxona 1 grama IM/dia menos 2 semanas. Exceção na infecção por S.
(alternativa: cefotaxime ou ceftizoxime). Se aureus e Gram-negativos: terapia endovenosa
melhorar em 24 a 48h, pode dar continuidade por 4 semanas
com ceftriaxona 250mg IM, por pelo menos 7 - Cocos gram +: vancomicina 1 grama EV de
dias, desde que sintomas tenham se resolvido 12/12 horas.
completamente ou quase. - S. aureus meticilina sensível: cefazolina ou
- artrite purulenta: ceftriaxona 7-14 dias oxacilina
- tratar infecção por clamídia (azitromicina 1 - S. aureus meticilina resistente: vancomicina
g, dose única ou doxiciclina 100 mg 2x/dia, ou linezolida ou clindamicina
Tratamento por 7 dias) - Bacilos Gram-negativos: ceftriaxona ou
- parceiros com contato até 2 meses antes do ceftazidima ou cefotaxima
diagnóstico: ceftriaxone 250 mg IM dose - Pseudomonas aeruginosa: ceftazidima+
única + azitromicina 1grama, dose única, ou aminoglicosídeo (gentamicina)
doxiciclina - Empírico: imunocompetente (vancomicina);
imunodeprimido (vancomicina+ceftriaxona)
Recomenda-se fisioterapia para evitar
compromentimento de amplitude de
movimento articular

Bom Ruim
Mortalidade de 10-20%
Prognóstico A poliartrite séptica por estafilococo ou em
pacientes com artrite reumatoide, tem taxa de
mortalidade de 50%

Quadro 4. Diferenças entre artrite gonocócica e não gonocócica.


Fonte: Elaborada pela autora.

INFECÇÕES EM PRÓTESES ARTICULARES


Há fatores de risco como fratura prévia, artroplastia em artrite reumatoide, obesidade, infecção no sítio
cirúrgico e revisão de artroplastia; ocorrem em quadril e joelho; infecções com menos de 3 meses de
procedimento: estafilococo e bacilo Gram-negativos/ > 3 meses: estafilococo, estreptococo, aeróbios Gram-
negativos e anaeróbios. Na suspeita, coletar material para análise do líquido e culturas. Conduta: antibiótico,
debridamento, troca ou remoção da prótese.

OSTEOMIELITE
Quando a bacteria atinge o osso, sendo o agente mais frequente o S. aureus. O diagnóstico etiológico é feito
pelo isolamento do agente através da punção óssea ou de estruturas próximas. Investigação radiológica:
cintilografia óssea é a mais sensível.

ARTRITE POR SÍFILIS


É uma doença infectocontagiosa causada pelo Treponema pallidum, caracterizada por manifestações cutâneas e
sistêmicas, de evolução crônica e períodos de doença ativa-latente e de transmissão predominante sexual. É mais
frequente em adultos sexualmente ativos, entre 20-29 anos. As manifestações musculoesqueléticas são: congênita
(precoce: osteocondrite, osteíte diafisária, periostite, dactilite/tardia: sinovite, necrose asséptica, artropatia de
Charcot e espondilite); primário (cancro duro, com resolução espontânea dentro de 3 a 6 semanas); secundária
(ocorre 60 dias após a infecção; manifestações: roséolas sifilíticas, astenia, emagrecimento, febre,
linfonodomegalias, rash, alopecia, madarose, uveíte, meningite séptica, poliartralgia, poliartrite, tenossinovite,
lombalgia com espondilite e sacroileíte, osteíte, periostite) e terciária (ocorre entre 1 a 30 anos da infecção inicial;
manifestações: lesões gomosas, artrite crônica, artrite com goma, artropatia neurológica ‒ Charcot, tabes dorsalis).
A suspeita deve ser aventada em pacientes com ausência de dor, desproprocional à destruição rápida e completa da
articulação de carga. O diagnóstico é feito através da microscopia direta (pesquisa do T. pallidum em material de
lesão cutâneo-mucosa), sorologia não treponêmica (VDRL) e sorologia treponêmica (mais específica: FTA-abs;
TPHA; imunofluorescência); exames de imagem (radiografia, tomografia, ressonância e cintilografia, esta última
permite o diagnóstico de lesões precoces). O tratamento para sífilis secundária e latente recente é com penicilina G
benzatina (2400000 UI IM 1x/semana, por 2 semanas); para sífilis terciária, latente tardia ou latente com período
desconhecido, estender o tratamento para 3 semanas e para pacientes com alergia, doxiciclina ou tetraciclina (15
dias nos casos recentes e 30 dias, para tardios); sífilis congênita neonatal (penicilina G cristalina 50 mil
UI/Kg/dose IV 12/12horas nos primeiros 7 dias, e a cada 8horas, do 8º ao 10º dia).

ARTRITES VIRAIS (QUADRO 5)


As manifestações articulares das viroses são comuns e geralmente, consistem em sinovite com menos de 6
semanas de duração ou poliartralgia, notadamente de membros inferiores, simétrica, súbita, que pode cronificar,
quase sempre autolimitada. Ocorre na fase prodrômica da infecção. É importante se atentar à anamnese e exame
físico minucioso.

Artrites Frequência de Apresentação Duração da Transmissão/ Tratamento /


Virais artrite clínica artrite Diagnóstico Prognóstico

Hepatite B: até 25% tem Vertical, Hepatite B:


sintomas articulares. parenteral nenhum
Poliartralgia ou poliartrite, ou sexual tratamento é
que pode ser simétrica, necessário
aditiva ou migratória. Ocorre na Anti-HAV IgM; (resolução
fase prodrômica, mais em mulheres HBsAg e Anti-HBc espontânea
e afeta notadamente mãos e IgM (HBV). em 2-3
joelhos, os pacientes têm rigidez semanas);
matinal e, vasculite
comumente, acometimento (imunossupressores
cutâneo (até 50%). Podem ocorrer: e
poliarterite nodosa (ocorre durante antivirais).
os primeiros 6 meses),
glomerulonefrite e Prognóstico: bom/
crioglobulinemia mista. recidiva em <10%
dos pacientes

Hepatite C: ocorre em 2-20% dos Transmissão: Hepatite C:


Hepatites pacientes. Artropatia Aguda- Parenteral anti-inflamatórios,
Alta
virais coexistente, artrite Crônica baixas
associada ao HCV Anti HCV (PCR doses de
(rara, poliartrite simétrica, para confirmação). corticoide + ou -
não deformante de hidroxicloroquina,
pequenas articulações), artrite na sulfassalazina,
vasculite crioglobulinêmica, ciclofosfamida;
induzida por interferon alfa (a Anti-TNF ou
continuação depende da gravidade rituximabe (após
da artrite X eliminação do vírus). discussão com
hepatologista).
**podem apresentar positividade
para fator reumatoide (40-65%),
crioglobulinas (40-55%), FAN
(10%), antitireoideanos (<10%)
**pode ser difícil diferenciar da
artrite reumatoide: nesta a artrite
erosiva e a presença de anti-CCP
podem ajudar!!

Retrovírus Moderada Crônica


(HIV)
Até 46% dos pacientes Rastreio: anti-HIV 3. Indometacina,
infectados. (ELISA). corticosteroides orais
Confirmação: PCR. ou intra-articulares,
1. Artralgia (oligo e de grandes sulfassalazina e/ou
articulações): ocorre em 25-40% Podem ser hidroxicloroquina.
2. Espondiloartrite indiferenciada encontrados altos 4. Antibiótico
3. Artrite reativa: em resposta a títulos de FAN, FR, específico.
outras infecções entéricas ou crioaglutininas, c 5. AINE;
transmitidas sexualmente; HLA ANCA, anticorpos metotrexato (5-10
B27+ em até 80% dos casos; não é antifosfolípides. mg/semana),
comum a tríade, bem como azatioprina,
envolvimento axial e conjuntivite. sulfassalazina; anti
Ocorre oligoartrite em membros TNF (pode ser
inferiores, uretrite, entesopatias e benéfico).
dactilite. 6. Leve a moderada
4. Artrite séptica: Staphylococcus (AINES); severa e
aureus, Streptococcus e prolongada
Salmonella, micobactérias atípicas (corticoides em
e infecções oportunistas baixas doses,
(geralmente quando CD4 sulfassalazina e/ou
< 200 células). hidroxicloroquina).
5. Artrite psoriásica: curso pior, 7. Sintomáticos.
notadamente nos pacientes não 8. Sintomáticos -
tratados com TARV; afeta pés e corticoesteroides
tornozelos, pode acometer (aumento glandular e
sacroilíacas; apresenta 2 padrões: síndrome sicca);
artrite agressiva e sustentada, leve e imunossupressor
intermitente. Há forte associação (pulmonar e renal).
entre HLA B27, psoríase pustular e
artrite psoriásica em pacientes HIV.
6. Artrite associada ao HIV
(autolimitada, não destrutiva e dura
6 semanas, oligoarticular; membros
inferiores, mais em homens).
7. Síndrome articular dolorosa:
autolimitada, duração menor que
24h; dor óssea e articular em
membros inferiores, assimétrica.

8. Síndrome da linfocitose
infiltrativa difusa: aumento de
parótidas secundárias à infiltração
de linfócitos (T CD8), olho e boca
secos, artralgia, linfoadenopatia
generalizada. Pode afetar fígado,
pulmão, TGI, rins, timo e sistema
nervoso; homens com menos de 40
anos; FR, Anti-Ro e Anti-La são
negativos; tendem a ter uma
progressão lenta para AIDS.

Outras: osteonecrose; osteoporose;


miopatia/ mialgia; vasculite
(poliarterite nodosa induzida por
droga como: didanosina e
zidovudina); síndrome lúpus símile
(rara, entra em remissão com
Retrovírus
Moderada baixas contagens de CD4); Crônica - -
(HIV)
fibromialgia (30%); síndrome
antifosfolípide; síndrome de
Sjogren (diagnóstico diferencial
com: linfoproliferativas e
granulomatosas)

Síndrome da reconstituição
imunológica: intensa reação e
inflamação tecidual, nas infecções,
desencadeada pela terapia
antirretroviral.

Alfavírus * Alta Poliartralgia e/ou poliartrite Semanas - Anticorpos IgM Sintomáticos,


meses específicos. antiinflamatório não
PCR: detecção de hormonal.
RNA viral. Evitar AAS.
Infecta > 90% de pessoas com 40
anos
Têm sido observada associação Sorologia.
com artrite reumatoide e lúpus Isolamento vírus.
Epstein Poliartralgia Teste do ácido
Baixa Dias Sintomáticos
Barr Monoartrite de joelhos nucléico,
Geralmente, autolimitada imuno-histoquímica
Ruptura cisto de Backer e imunocitologia.
Febre
Faringite

Crianças (exantema viral, Transmissão: Anti-inflamatórios.


acometimento oligoarticular e secreções
assimétrico). respiratórias, Infecção persistente:
vertical, transplante imunoglobulina.
Adultos: pode resultar em crise de órgãos e
aplásia transitória com anemia hemotransfusão
crônica; manifestações articulares
(muito comuns em adultos; artrite Anticorpos IgM e
aditiva, autolimitada, geralmente IgG.
poliarticular e simétrica; acomete Amplificação PCR.
articulações do carpo,
metacarpofalangeanas e
Parvovírus interfalangeanas proximais); Semanas a
Alta acompanhado ou antecedido por
B19 meses.
febre, eritema e prurido

O vírus tem sido associado a


vasculite, artrite reativa, síndrome
de Sjögren, miopatias
inflamatórias, esclerodermia.

QUADRO 5. ARTRITES VIRAIS


Fonte: Elaborada pela autora.

*FEBRE CHIKUNGUNYA
O vírus chikungunya (CHIKV) pertence à família Togaviridae, do gênero Alphavirus. A origem do nome vem
do makonde, um dos dialetos falados na Tanzânia, e significa “curvar-se para frente ou contorcer-se”, referência à
postura adotada pelo paciente devido às dores articulares. No Brasil, os principais vetores são o Aedes aegypti e o
Aedes albopictus, cujas fêmeas têm a capacidade de infectar seres humanos através da picada, momento em que
são inoculados vírus. Juntamente à saliva, ocorre a replicação viral e disseminação linfática, com acometimento de
órgãos-alvo.
O período de incubação do vírus é de 3 a 7 dias. A doença pode evoluir em 3 fases: aguda (até 14 dias;
sintomática em 80-97% dos pacientes, caracterizada por febre de início súbito, artralgia e/ou artrite com padrão
simétrico e poliarticular, acometendo punhos, mãos, tornozelos, pés; outros sintomas: astenia, mialgia-60-93%,
cefaleia-40-81%, náuseas/vômitos, diarreia, fotofobia, dor retroorbital, conjuntivite, dor axial, exantema
macular/maculopapular-34-50%/ com ou sem prurido cutâneo, edema de face e extremidades e linfadenopatia
cervical ou generalizada), subaguda (15 dias a 3 meses; ocorre em até 50% dos pacientes; há o predomínio de
sintomas articulares, como: artralgia/artrite, bursite, tenossinovite, rigidez matinal e astenia, com evolução
contínua ou intermitente) e crônica (acima de 3 meses; ocorre entre 14,4 a 87,2% dos pacientes; sob a forma de
queixas persistentes - 20-40% ou recidivantes - 60-80%; oligo ou poliartralgia de intensidade variável, geralmente
simétrica, notadamente em punhos, mãos, tornozelos e joelhos, associadas a rigidez matinal e edema articular;
alguns fatores foram associados à evolução crônica como: sexo feminino, > 40 anos, doença articular prévia,
comorbidades, doença articular importante na fase aguda).
CRITÉRIOS Início abrupto, febre > 38,5°c e artralgia/artrite intensa de início agudo, não
CLÍNICOS explicadas por outras condições médicas.

CRITÉRIOS Indivíduo reside ou visitou área endêmica ou epidêmica no prazo de 15 dias


EPIDEMIOLÓGICOS antes do início de sintomas, ou tem vínculo epidemiológico com caso confirmado.

• Isolamento do chikv por cultura.


• Presença de RNA do chikv avaliada PCR em tempo real
CRITÉRIOS • Presença de anticorpos IgM específicos para chikv.
LABORATORIAIS • Aumento de quatro vezes nos valores de anticorpos IgG específicos para chik em amostras
recolhidas, pelo menos, com 10-14 dias de intervalo.
• Detecção de anticorpos neutralizantes contra chikv por prnt em soro.

• Caso suspeito: o paciente apresenta os critérios clínicos e epidemiológicos.


• Caso confirmado: quando um caso suspeito apresenta qualquer um dos critérios laboratoriais.
CLASSIFICAÇÃO
• Caso atípico: quando há confirmação laboratorial em paciente com outras manifestações
(neurológicas, cardíacas, dermatológicas, oftalmológicas, renais, respiratórias etc.).

RNA = Ácido ribonucleico; PCR = Reação em cadeia de polimerase; PRNT = teste de neutralização por redução de placa;
chikv = chikungunya vírus.

QUADRO 6. DEFINIÇÃO DE CASO.


Fonte: Marques.90

As manifestações clínicas atípicas envolvem acometimento: cutâneo (hiperpigmentação, úlceras aftosas,


eritema nasal transitório, eritema generalizado, lesões vesicobolhosas, descamação das palmas das mãos,
despigmentação labial, lesões vasculíticas, erupções liquenoides), renais (insuficiência renal, precipitada ou
agravada pelo uso de AINEs; nefrite), pulmonares (pneumonia e insuficiência respiratória), gastrointestinais
(diarréia, vômitos, hepatite aguda - relacionada ao vírus, etilismo e uso de paracetamol), cardíacas (insuficiência
cardíaca, arritmias, perimiocardite, doença isquêmica coronariana), neurológicas (encefalite, meningoencefalite,
irritação meníngea, síndrome de Guillain-Barré, síndrome cerebelar, acidente vascular cerebral, confusão mental e
convulsões), oftalmológicas (conjuntivite, neurite óptica, iridociclite, episclerite, retinite, uveíte anterior) e
hematológicas (trombocitopenia, linfadenopatia).

A. DIAGNÓSTICO CLÍNICO, LABORATORIAL E POR IMAGEM

A.1. Em situações de epidemia, diante de um quadro agudo de febre, artralgia/artrite intensa, com ou sem exantema, a
possibilidade de febre chikungunya deve ser fortemente considerada. No entanto, outras doenças febris agudas devem entrar
no diagnóstico diferencial, principalmente diante de casos graves ou atípicos. Concordância: 9,31 (DP ± 1,168); nível de
evidência.

A.2. Em pacientes com suspeita clínica de febre chikungunya na fase aguda, a avaliação laboratorial (hemograma, enzimas
hepáticas, creatinina, glicemia de jejum, VSH/PCR) deve ser decidida caso a caso, a depender das comorbidades e sinais de
gravidade. Concordância: 7,12(DP ± 3,5), nível de evidência.

A.3. A detecção do CHIKV deve ser feita apenas para os casos nos quais se faça necessária a confirmação diagnóstica na fase
aguda: casos atípicos, diagnóstico diferencial diante de formas graves de apresentação ou para definir estratégias de saúde
pública (suspeição de novos focos ou de casos pós-epidêmicos), para as quais o método de escolha é a PCR em tempo real,
deve essa ser solicitada na primeira semana de sintomas. Concordância: 9,19 (DP ± 0,834), nível de evidência.

A.4. Para os casos agudos de febre chikungunya, a sorologia para CHIKV (IgM e IgG) só deve ser feita nas formas atípicas
ou diante da necessidade de diagnóstico diferencial; deve ser solicitada a partir do décimo dia do início dos sintomas. Nas
formas crônicas, a solicitação da sorologia é recomendada para confirmação diagnóstica, mas não para o início do tratamento.
Concordância: 9,29 (DP ± 1,510); nível de evidência.

A.5. Autoanticorpos na fase crônica da febre chikungunya só devem ser solicitados mediante a necessidade de diagnóstico
diferencial com as doenças reumatológicas específicas, obedecendo-se aos consensos/diretrizes existentes. Concordância:
8,55 (DP ± 2,593); nível de evidência.

A.6. Na fase aguda e subaguda da febre chikungunya, a maioria dos pacientes não necessita de exames de imagens. Na fase
crônica, a radiografia simples deve ser solicitada na primeira consulta com o reumatologista, como avaliação estrutural inicial
ou de dano preexistente. Concordância: 9,70 (DP ± 0,651); nível de evidência.

A.7. A ultrassonografia musculoesquelética pode auxiliar na avaliação de alterações articulares e periarticulares em qualquer
fase da febre chikungunya. Na fase aguda, é o único exame de imagem que pode ser feito, a critério médico; é especialmente
útil no diagnóstico diferencial do edema de membros inferiores. Concordância: 9,29(DP ± 1,510); nível de evidência.

B. SITUAÇÕES ESPECIAIS

B.1. No tratamento das gestantes com febre chikungunya, deve-se levar em consideração o risco dos medicamentos para o
feto e, se indicados, analgésicos, prednisona/prednisolona e hidroxicloroquina podem ser usados. Concordância: 9,71 (DP ±
0,534); nível de evidência.

B.2. A febre chikungunya, por si só, não é indicação de parto operatório, devendo ser puramente obstétrica. O aleitamento
materno é permitido. Concordância: 9,67 (DP ± 0,547); nível de evidência.

B.3. Em idosos (> 60 anos) com febre chikungunya recomenda-se em todas as fases da doença, especialmente na fase aguda,
supervisão clínica rigorosa no que se refere ao uso de medicamentos, comorbidades e maior risco de complicações.
Concordância: 9,61 (DP ± 0,737); nível de evidência.

B.4. Crianças abaixo de dois anos devem receber atenção especial pelo maior risco de manifestações graves e atípicas,
particularmente ao acometimento do SNC. Concordância: 9,30 (DP ± 1,179); nível de evidência.

B.5. Recém-nascidos de mães com quadro clínico sugestivo de febre chikungunya próximo ao parto devem ficar sob
observação rigorosa nos primeiros cinco dias de vida. Deve ser feito uso racional de medicações para os que desenvolvem a
doença e manejo dos casos complicados em unidade de terapia intensiva. Concordância: 9,54 (DP ± 0,838); nível de
evidência.

B.6. Na fase aguda da febre chikungunya em crianças, o tratamento consiste em hidratação, analgésicos e antitérmicos; deve-
se evitar uso de salicilatos. Na fase crônica, sugere-se seguir as recomendações dos adultos, levar-se em consideração as
particularidades inerentes à faixa etária. Concordância: 9,48 (DP ± 0,785); nível de evidência.

B.7. Recomendamos atenção em pacientes com diagnóstico prévio de artrite reumatoide, espondiloartrites ou lúpus
eritematoso sistêmico, visto que pode ocorrer reativação ou exacerbação da doença de base. Concordância: 9,42 (DP ± 1,840);
nível de evidência.

QUADRO 7. RESUMO DAS RECOMENDAÇÕES PARA DIAGNÓSTICO E CASOS ESPECIAIS.


Fonte: Marques.90

Exame Indicação Possíveis achados

Apenas na fase crônica Aumento de partes moles Calcificações


Erosões
- Avaliação de lesões articulares prévias, Esclerose subcondral
especialmente em pacientes com fatores de risco Osteófitos
Radiografia para cronificação Osteopenia periarticular
- Avaliação de dano estrutural relacionado ao Reação periosteal
acometimento articular pela febre chikungunya Redução de espaço articular

Fase aguda, subaguda e crônica - Calcificações


- Depósitos cristalinos (diagnóstico diferencial com
- Avaliação de inflamação articular e periarticular gota)
- Avaliação de status articular em pacientes com - Derrame articular
Ultrassonografia suspeita de lesões articulares prévias - Erosões
- Avaliação de dano estrutural relacionado ao - Osteófitos
acometimento articular pela febre chikungunya - Periatrite/entesites
- Sinovite
- Tenossinovite/tendinite

Apenas na fase crônica - Derrame articular


- Edema medular ósseo (especialmente na
- Avaliação de dano estrutural relacionado ao sacroilíaca)
Ressonância acometimento articular pela febre chikungunya, na - Entesopatia
magnética suspeita de evolução para doença reumatológica - Erosões
(Artrite reumatoide/espondiloartrites) -Inflamação periosteal
- Sinovite (espessamento sinovial)
- Tenossinovite/tendinite

QUADRO 8. INDICAÇÕES E POSSÍVEIS ACHADOS NOS EXAMES DE IMAGEM DE PACIENTES COM


CHIKUNGUNYA.
Fonte: Marques.90

TRATAMENTO
Orientar os casos suspeitos sobre medidas de proteção antivetorial: mosquiteiro, repelente, roupa de manga
comprida e calça, além de ações na residência visando impedir a proliferação do mosquito.

TRATAMENTO

C.1. Na fase aguda da febre chikungunya devem ser usados analgésicos comuns e/ou opioides fracos (em casos de dor intensa
ou refratária), devem ser evitados AINEs e salicilatos. Os corticosteroides (CE) não são recomendados nessa fase para as
manifestações musculoesqueléticas. Concordância: 9,31 (DP ± 0,8906). Grade: qualidade de evidência muito baixa.
TRATAMENTO

C.2. Na fase subaguda da febre chikungunya podem ser usados AINEs e/ou medicações adjuvantes para tratamento da dor
(anticonvulsivantes ou antidepressivos) nos casos refratários a analgésicos/opioides. Nos pacientes com dor
musculoesquelética moderada a intensa ou naqueles com contraindicações ao uso dessas medicações, é recomendado o uso de
prednisona ou prednisolona, na dose de até 20 mg/dia, devendo a redução ser feita de modo lento e gradual, de acordo com a
resposta do paciente. Concordância: 9,24 (DP ± 1,057). Grade: qualidade de evidência baixa a muito baixa.

C.3. Na fase crônica da febre chikungunya, é recomendado o uso de analgésicos para alívio sintomático. Os opioides fracos
(codeína e tramadol) podem ser usados nos sintomas álgicos refratários ou intensos (EVA ≥ 7). Concordância: 9,57 (DP ±
0,741). Grade: qualidade de evidência baixa a muito baixa.

C.4. Na fase crônica da febre chikungunya são recomendados os AINEs, devendo-se observar o contexto clínico, as
contraindicações e a resposta terapêutica. Concordância: 8,97 (DP ± 1,679). Grade: qualidade de evidência baixa a muito
baixa.

C.5. Na fase crônica da febre chikungunya, o corticosteroide por via oral pode ser usado para as queixas musculoesqueléticas
e neuropáticas, sendo recomendadas doses baixas (5 a 20 mg/dia de prednisona ou prednisolona). O tempo de uso pode variar
de seis a oito semanas, devendo a retirada ser lenta e gradual, devido ao risco de recidiva dos sintomas articulares.
Concordância: 9,24 (DP ± 1,154). Grade: qualidade de evidência baixa a muito baixa.

C.6. Na fase crônica da febre chikungunya pode ser usado antimalárico, preferencialmente hidroxicloroquina, no tratamento
dos sintomas articulares, de forma isolada ou em associação com MTX ou SSZ. Concordância: 9,21 (DP ± 1,166). Grade:
qualidade de evidência baixa.

C.7. Em pacientes com febre chikungunya que evoluem para a fase crônica e apresentam quadro articular inflamatório na
dificuldade da retirada do CE, sugerimos preferencialmente MTX, nas doses de 10 a 25 mg/semana. Concordância: 9,43 (DP
± 0,858). Grade: qualidade de evidência baixa a muito baixa.

C.8. Na fase crônica da febre chikungunya pode ser usada a sulfassalazina, na dose de 2 a 3 g/dia, isolada ou em associação,
especialmente em pacientes com contraindicação ou falha ao MTX. Concordância: 8,77 (DP ± 1,794). Grade: qualidade de
evidência baixa a muito baixa.

C.9. Terapia biológica pode ser prescrita após avaliação do reumatologista em pacientes com quadro articular inflamatório
crônico pós-infecção pelo CHIKV, refratário ao uso de CE e DMCDs, de acordo com as recomendações usadas para o
tratamento da AR ou EpA. Concordância: 8,97 (DP ± 1,267). Grade: qualidade de evidência baixa a muito baixa.

C.10. Durante a fase aguda, nos pacientes em terapia biológica para sua doença de base, recomenda-se a suspensão da
medicação. No entanto, nas fases subaguda e crônica, o tratamento pode ser mantido. Concordância: 8,97 (DP ± 1,884).
Grade: qualidade de evidência baixa a muito baixa.

C.11. São recomendadas intervenções de reabilitação em todas as fases da febre chikungunya como medida não
farmacológica complementar. Na fase aguda são indicadas condutas analgésicas e anti-inflamatórias, devendo ser evitado o
uso de calor; adicionalmente devem ser recomendadas educação do paciente, orientações posturais e terapia manual, além de
exercícios de leve intensidade. Nas fases subaguda e crônica, manter recomendações anteriores, pode ser incluído calor, além
de exercícios ativos livres, resistidos, proprioceptivos e aeróbicos, alongamento, terapia manual e fisioterapia aquática.
Concordância: 9,43 (DP ± 0,935). Grade: qualidade da evidência muito baixa.

QUADRO 9. TRATAMENTO
Fonte: Marques.90

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO (2,3 e 4)


ME, musculoesquelética; VO, via oral; EVA, escala visual analógica

FLUXOGRAMA 2. TRATAMENTO DA FASE AGUDA DA FEBRE CHIKUNGUNYA DE ACORDO COM


AS RECOMENDAÇÕES DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA.
Fonte: Marques.91

ME, musculoesquelética; EVA, escala visual analógica; AINE, anti-inflamatório não esteroidal; HCQ, hidroxicloroquina

FLUXOGRAMA 3. TRATAMENTO DA FASE SUBAGUDA DA FEBRE CHIKUNGUNYA DE ACORDO


COM AS RECOMENDAÇÕES DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA.
Fonte: Marques.91

ME, musculoesquelética; EVA, escala visual analógica; AINE, anti-inflamatório não esteroidal; CE, corticosteroide; HCQ,
hidroxicloroquina; SSZ, sulfassalazina; DAIC, doença articular inflamatória crônica

FLUXOGRAMA 4. TRATAMENTO DA FASE CRÔNICA DA FEBRE CHIKUNGUNYA DE ACORDO COM


AS RECOMENDAÇÕES DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA.
Fonte: Marques.91

ARTRITE REATIVA OU PÓS-INFECCIOSA


Desenvolvida como uma sequela de uma infecção distante, dependendo do organismo e/ou estado genético
(HLA B27) do paciente.

a. Artrite reativa pós-estreptocócica


Está associada à infecção por estreptococo do grupo A, tendo distribuição etária bimodal, entre 8-14 anos e 21-
37 anos. A artrite simétrica, aditiva, envolvendo pequenas e grandes articulações e esqueleto axial, desenvolve-se
4-12 dias após a faringite/amigdalite e deve haver falha no preenchimento dos critérios de Jones modificados para
diagnóstico de febre reumática.
b. Artrite reativa
É caracterizada por acometimento de uretra, conjuntiva e sinóvia; entretanto, muitos pacientes não apresentam
a tríade. É considerada uma artrite transitória não purulenta reativa, associada ao HLA B27 (até 60% dos pacientes
são positivos), durante ou após (2 a 4 semanas) infecção do trato urogenital, através de relação sexual (Clamydia
tracomatis) ou infecção intestinal (Salmonella, Shiguella, Campylobacter e Yersínia). O quadro clínico é de:
fadiga, mal-estar, emagrecimento, febrícula; artralgia, oligo e, menos comumente, poliartrite assimétrica e
predominando em membros inferiores; sacroileíte, geralmente unilateral, dor lombar; entesite (dactilite, por
exemplo); cutâneas (úlceras orais, balanite circinada, ceratodermia blenorrágica) e inflamação ocular (conjuntivite,
episclerite, ceratite, úlcera de córnea, uveíte anterior). Diagnóstico: considerar dados da história, exposição sexual,
hábitos alimentares, dados do exame físico, questionar sobre gatilho infeccioso e exames complementares
(hemograma, provas inflamatórias, HLA B27). Até 50% dos pacientes ficam assintomáticos em 6 meses, enquanto
20% desenvolvem artrite crônica. O tratamento inicial é feito com AINE (em doses máximas e contínuo por pelo
menos 2 semanas). Se não houver melhora, pode ser realizado glicocorticoide intra-articular e sulfassalazina. Em
raros casos de doença grave, há a possibilidade do emprego de corticóide oral (por 1 a 12 semanas). Antibióticos
para as infecções TGI ativas seguem os padrões para doenças infecciosas (sulfametoxazol/trimetoprima 800/160
mg, via oral, 2 vezes por dia, de 7 a 10 dias, ou ciprofloxacino 500 mg 2 vezes por dia, de 7 a 10 dias). Em geral,
não são indicados para as infecções TGI não complicadas. Para as infecções TGU por Chlamydia, o tratamento
com azitromicina 1 grama/dose única deve ser instituído (para o paciente e parceiro sexual). Na ausência de
controle dos sintomas ou a artrite crônica, pode-se empregar: a sulfassalazina (é a mais estudada, na dose 2-3
gramas/dia) e metotrexato (10-25 mg/dose única semanal); para não respondedores, anti-TNF.

ARTROPATIA TUBERCULOSA

EPIDEMIOLOGIA
A infecção por Mycobacterium tuberculosis ocorre pela inalação, ingesta de bactérias ou inoculação direta. O
acometimento musculoesquelético é responsável por 10-35% dos casos de tuberculose (tb) extrapulmonar.

QUADRO CLÍNICO
• Espondilite (Doença de Pott)
Disseminação hematogênica de um foco primário; a coluna é afetada em 50% dos casos, sendo a torácica e
lombar os locais mais frequentes; curso subagudo. Manifestações clínicas: dor local, perda de peso, febre baixa,
sudorese noturna, mal estar; insidioso (semanas a anos); paraparesia e paraplegia, proeminência espinhal ou
deformidade gibosa (cifose + escoliose). Imagem: alterações sugestivas de Tb (progressão lenta das lesões com
espaço discal preservado, envolvimentos de segmentos contíguos, grandes abscessos intraósseos e paravertebrais e
colapso vertebral). A RNM é o melhor exame (início: reabsorção de margens densas de placas terminais e
desmineralização, redução espaço discal, edema partes moles/ final: lesão lítica do corpo vertebral anterior,
colapso vertebral e cifose)

• Artrite Periférica
Geralmente monoarticular, crônica, insidiosa; mais comum afetar: quadris (mais comum), joelhos, costelas,
sacro e esternoclaviculares. Imagem: iniciais (aumento partes moles e derrame articular), tardias (erosões ósseas
periféricas, destruição articular com redução do espaço articular e osteoporose justa-articular: tríade de Phemister).
Recomenda-se TC, RNM e cintilografia para estabelecer o diagnóstico.

• Osteomielite
Acomete crianças e adultos; ocorre mais em fêmur e tíbia; apresenta-se como abscesso frio (edema, discreta
dor e eritema). Imagem: cavitações em 50% dos casos, lesões líticas com margens borradas, pouca esclerose óssea,
evolui com alargamento da diáfise.
• Artrite Reativa (Doença De Poncet)
Poliartrite de pequenas e grandes articulações +Tb extrapulmonar (geralmente linfonodal), sem evidência de
envolvimento direto da articulação; pode estar associada a febre e eritema nodoso; afeta jovens; responde bem a
AINE e com o tratamento para tuberculose.

• Abscesso Tecidos Moles


Raro; pode ocorrer em pacientes com osteomielite e acometimento vertebral.

• Paniculite
Apresenta-se como eritema nodoso + ou /- poliartrite

• Casos suspeitos
Paciente com Tb prévia, procedimentos invasivos, uso de biológicos, baixo nível socioeconômico,
comorbidades.

DIAGNÓSTICO
• Rastreio primário: PPD ou IGRA.
• Diagnóstico definitivo: demonstração do agente por semeadura, cultura ou técnicas moleculares. É
importante a realização de testes de sensibilidade de antituberculostáticos.

• Biópsia: granuloma caseoso em até 80% dos casos.


TRATAMENTO
• Fase intensiva (2 meses): para peso > 50 kg, RHZE - Rifampicina Isoniazida Pirazinamida Etambutol -
(150/75/400/275), 4 comprimidos por dia.

• Fase de manutenção (4 meses): RH (300/200 ou 150/100), 2 comprimidos de 300/200 por dia.


• Cirurgia: abscessos grandes, casos selecionados de Tb vertebral e/ou instabilidade da coluna.
• Recomenda-se 1-4 semanas de tratamento antes do procedimento.
ARTRITE FÚNGICA (QUADRO 10)
Ocorre por disseminação hematogênica ou inoculação direta pós-trauma, cirurgia, injeções intra-articulares ou
artrocentese. Pode ocorrer por infecção primária ou fungos oportunistas. Comumente se apresenta como
monoartrite ou poliartrite; pode ser aguda em 2/3 dos pacientes ou indolente. Todos os pacientes devem ser
rastreados para HIV. Nos exames de imagem, a reação periosteal e a renovação óssea ausentes em área de
osteomielite podem levar à suspeita de infecção fúngica.

DOENÇA HISTOPLASMOSE PARACOCCIDIOIDOMICOSE CANDIDÍASE ASPERGILOSE ESPOROTRICOSE BLASTOMICOSE CRIPTOCOCOSE COCCIDIOIDOMIC

Ocorre após a Causada pela inalação de Leveduras Causada por Sporothrix Blastomyces Cryptococcus Coccidioides
inalação de Paracoccidioides brasiliensis do gênero qualquer Encontrado no solo, dermatitidis neoformans immitis e
esporos de Candida sp espécie do animais, vegetação Disseminação a posadasii
Causa fungos Histoplasma gênero em decomposição partir dos pulmões
capsulatum Aspergillus
Características
Entre 30-50 anos, Micose profunda, sistêmica e Doença de Paciente Atividades laborais Atividades l Uso de Atividades ao ar livre,
mais em mulheres. granulomatosa. paciente imunossuprimido, ao ar livre, aborais ao corticoesteróides, profissões que exijam
Evolução aguda e Aguda (afeta mais jovens) e a imunossuprimido, transplante de alcoolismo e doenças ar livre neoplasias aerossolização de solo
benigna ou crônica (mais homens, geralmente debilitado e com células-tronco, mieloproliferativas hematológicas, reativação de infecção
progressiva e grave. agricultores). períodos órgãos sólidos, sarcoidose, cirrose preexistente em
Na maioria dos casos Febre baixa, mal-estar, prolongados de neoplasia Inoculação por hepática e Aids imunossuprimido
é assintomática e linfonodomegalias, úlceras orais, internação. hematológica, trauma direto
autolimitada. deformidades, envolvimento Relatos pós- injeção intra- Infecta através do
Fatores de risco: pulmonar e outros. procedimentos articular de Arranhões ou trato respiratório
imunossupressão, > corticosteroides. mordidas de
54 anos, transplante roedores, gatos, cães, Contato com aves
renal, riscos cavalos e tatus urbanas,
ocupacionais excrementos e
(exposição a madeira apodrecida
excrementos de aves,
exploradores de
cavernas)

Histopatologia Testes Hemocultura Isolamento Isolamento Microscopia Antígeno Anticorpos


culturas, detecção de sorológicos; visualização do fungo (negativa do fungo do agente em lâmina criptocócico sérico séricos
antígenos e em lesões ou histopatológico em 50% no tecido do líquido Isolamento
anticorpos. dos casos). ou líquido sinovial pode em tecidos
sinovial. ser positiva Punção
Cultura do liquórica:
líquido sinovial Cultura detecção de
ou lesão; biópsia infecção oculta em
e SNC
histopatológico

Diagnóstico

Geralmente os Formas leves a moderadas: Fluconazol 400 Debridamento Debridamento se Casos Exige Fluconazol: 400 mg a
sintomas articulares intraconazol 200 mg/dia por 9 a mg/dia por 6 clínico e necessário moderadamente debridamento ou mg/kg/dia por toda a v
são autolimitados. 18 meses semanas cirúrgico Itraconazol: severos ou graves: drenagem
*alternativa: sulfametoxazol 800 *alternativa: Medicamentos: 200 mg 2x/dia por anfotericina, Doença óssea severa:
Podem ser utilizados mg+trimetoprima 160 mg,2-3x/dia Anfotericina B Voriconazol (6 pelo menos 12 meses por 1 a 2 semanas Paciente com HIV e anfotericina B, e
anti-inflamatórios ou por 12-24 meses lipídica mg/kg IV 2 ou até meningoencefalite: posteriormente, flucon
corticóide via oral. (3-5 mg/Kg/dia) vezes/dia, Casos de melhora clínica, anfotericina B
Formas graves: anfotericina B por ou por 1 dia, acometimento seguida de deoxicolato
Tratamento 2 a 4 semanas deoxicolato (0,5- seguido de extenso ou não itraconazol (0,7 a 1 mg/kg/dia)
da doença: *alternativa: sulfametoxazol 0,7 mg/Kg/dia) 4 mg/kg respondedores a 200 mg 3x/dia, +
Leve a 800 mg por 2 semanas, durante pelo itraconazol: por 3 dias, seguido flucitosina
moderada: trimetoprima 160 mg, seguida por menos 7 dias, anfotericina por (100 mg/kg/dia
itraconazol 200 mg 3x/dia, fluconazol por seguido de dose 2x/dia, dividida em
VO 3 vezes/dia por 3 com pelo menos de completando-se 4 doses, por
dias; posterior 4 semanas manutenção pelo menos pelo menos
seguida de troca para via oral 12 meses 2 semanas,
200 mg intraconazol Observações: 200 mg/dia seguida de
2 vezes/dia mortalidade por 8 semanas). Moderadas: fluconazol
por pelo chega a 56%. Itraconazol itraconazol 200mg 400 mg/dia
menos Medidas de (não é a 3x/dia, por por pelo menos 8
12 meses, prevenção: primeira 3 dias, semanas
Tratamento Graves: controle do linha de seguido por e depois
anfotericina B diabetes, tratamento). 2x/dia, por profilaxia
lipossomal (3-5 vigilância de no mínimo secundária
mg/kg/dia IV durante cateteres, Anfotericina B 12 meses (200 mg/dia)
1-2 semanas); profilaxia para (alta taxa de Pacientes não
manutenção com pacientes mortalidade) imunossuprimidos e
itraconazol por 12 selecionados com acometimento
meses. SNC:
anfotericina B por
no mínimo 4
semanas
(condicionada a
negativação de
cultura para fungo
no líquor), seguida
de manutenção
fluconazol (
400 mg/dia por 8
semanas); sem SNC
(fluconazol 400
mg/dia por 6-12
meses)

QUADRO 10. ARTRITE FÚNGICA


Fonte: Elaborado pela autora.
FEBRE REUMÁTICA
É comum entre as idades de 4 e 9 anos. Crianças pequenas tendem a apresentar febre e cardite com mais
frequência, enquanto a artrite é mais comum em adultos. Os sintomas geralmente começam 2 a 3 semanas após a
infecção por estreptococos beta-hemolítico do grupo A (EGA).

QUADRO CLÍNICO
• Artrite:
• Mais grave e comum em adultos jovens; geralmente afeta grandes articulações (joelhos, cotovelos,
punhos e tornozelos), duração de dias a 1 semana, caráter migratório, resolutivo na maioria dos casos;
excelente resposta a anti-inflamatório não hormonal com remissão em 48-72 horas. Geralmente não
causa sequelas.
• Pode ocorrer sobreposição dos locais afetados, dando efeito aditivo.
• Artropatia de Jaccoud pode acontecer.
• Cardite:
• 40-91% dos casos.
• Aguda: sopros cardíacos, cardiomegalia, insuficiência cardíaca, derrame pericárdico, bloqueios
cardíacos, miocardite, pericardite. Achado mais comum é regurgitação mitral.
• Indolente subclínica - crônica: maior causa de doença valvular adquirida; na maioria dos casos ocorre
de 10 a 20 anos após o episódio inicial; pacientes com < 30 anos geralmente apresentam regurgitação
mitral pura, enquanto adultos de meia-idade, estenose mitral/válvula aórtica acometida em 20-30% dos
casos.
• A presença de insuficiência mitral e aórtica concomitantes, em um paciente sadio, é altamente
sugestiva de febre reumática.

• Coreia de sydenham (dança de São Vito):


• Movimentos bruscos, espasmódicos, involuntários e sem ritmo, de grupos musculares esqueléticos
estriados, que cessam durante o sono; geralmente unilateral.
• Fraqueza muscular e distúrbios emocionais.
• Ocorre mais em crianças do sexo feminino.
• Período entre a infecção e sintomas: 6 a 8 semanas (pode se estender por 8 meses).
• 50 % dos pacientes se recuperam após 2 a 6 meses (pode persistir por até 2 anos).
• Outros sintomas são: disartria, distúrbio de marcha, perda do controle motor, cefaléia, cognição
reduzida, contração facial e hipotonia, além de fasciculações de língua e “sinal da ordenha”.
• É importante fazer diagnóstico diferencial com lúpus, notadamente em casos de difícil controle.
• Eritema nodoso:
• Rara. É uma erupção evanescente, rosa, sem prurido e indolor, que se estende centrifugamente,
enquanto o centro volta ao normal; ocorre mais em membros e tronco, poupando a face.
• Fortemente associado à cardite e pode ocorrer em qualquer momento no curso da doença.

• Nódulos subcutâneos:
• Superfícies ósseas ou tendões.
• Firmes, indolores e móveis, com duração de menos de 1 mês.
• Mais comuns em pacientes com história de cardite ativa prolongada.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Proteína C reativa e velocidade de hemossedimentação elevadas; leucocitose e leve anemia
• Antiesptreptolisina O (ASLO): em crianças >320 U Todd
• Antidexirribonuclease B: persiste elevado por tempo maior
• Ecodopplercardiograma: deve ser realizado em todos os casos suspeitos de febre reumática com a
finalidade de lesões vavulares silenciosas serem detectadas

DIAGNÓSTICO (quadro 11)

1º surto de FR: Recidiva de FR (FR recorrente):

2 critérios maiores; ou 2 critérios maiores; ou


1 maior + 2 menores 1 maior + 2 menores; ou 3 menores

Populações de baixo risco Populações de risco moderado/alto


(a incidência de FR é menor que 2/100mil escolares entre 5 e
14 anos, por ano ou a prevalência de cardite reumática crônica
em qualquer grupo etário menor ou igual a 1/1.000 por ano)

Critérios maiores: Critérios maiores:


Cardite (clínica ou subclínica); Cardite (clínica ou subclínica);
Artrite (apenas poliartrite); Artrite (poliartrite, poliartralgia e/ou monoartrite);
Coréia; Coreia;
Eritema marginado; Eritema marginado;
Nódulo subcutâneo Nódulo subcutâneo

Critérios menores: Critérios menores:


Poliartralgia Monoartralgia
Febre (≥ 38,5ºC) Febre (≥ 38ºC)
Elevação de VHS (≥ 60 mm na 1 a hora) e/ou Elevação de VHS (≥ 30mm na 1 a hora) e/ou
PCR ≥ 3 mg/dL (ou > que valor de referência indicado) PCR ≥ 3mg/dL (ou > que valor de referência indicado)
Intervalo PR prolongado, corrigido para a idade Intervalo PR prolongado, corrigido para a idade
(só quando não houver cardite) (só quando não houver cardite)

Comprovada evidência de infecção prévia pelo


Streptococcus β-hemolítico do grupo-A
(cultura positiva de orofaringe, positividade em testes rápidos
de detecção de antígenos estreptocócicos,
títulos elevados de anticorpos antiestreptocócicos).

QUADRO 11. CRITÉRIOS DE JONES (REVISÃO DE 2015).


Fonte : PEREIRA 114

TRATAMENTO
• Educação: orientar o paciente e responsáveis sobre a importância do tratamento precoce da doença,
sobre a necessidade de manutenção do tratamento e importância de manter a higiene oral devido ao alto
risco de endocardite infecciosa nestes pacientes. Mulheres em idade fértil devem receber orientações com
relação ao planejamento e contracepção. Vacinação anual de Influenza é recomendada.

• Hospitalização: de acordo com a gravidade da apresentação clínica. Recomenda-se em casos de cardite


moderada ou grave, artrite incapacitante ou coreia.
• Repouso: relativo na febre reumática aguda por 2 semanas. Em casos de cardite, 4 semanas.
• Prevenção primária: o objetivo é reduzir a exposição antigênica do paciente ao estreptococo e impedir
a disseminação de cepas reumatológicas na comunidade (QUADRO 12).
Esquema dose
< 20 kg: 600 mil UI IM.
Penicilina G benzatina ≥ 20 kg: 1.200.000 UI IM. Única.

25 mil-50 mil UI/Kg/dia VO 8/8h ou 12/12h


Penicilina V oral Adulto – 500.000 UI VO 8/8h 10 dias.

30-50 mg/kg/dia VO 8/8h ou 12/12H


Amoxacilina Adulto: 500 mg 8/8h 10 dias.

Em caso de alergia à penicilina:

Esquema dose
Cefalexina: 50-100 mg/Kg/dia 6/6h
Cefalosporina de 1ª geração Cefadroxila: 30 mg/Kg/dia 12/12h 10 dias.

20 mg/kg/dia 1 vez/dia.
Azitromicina Dose máxima: 500 mg/dia 5 dias.

15-25 mg/Kg/dia 8/8h


Clindamicina Dose máxima: 1800 mg/dia 10 dias

QUADRO 12: PROFILAXIA PRIMÁRIA


Fonte: modificado de Pereira e Sociedade Brasileira de Cardiologia.114,115

a. Tratamento das manifestações clínicas

• Artrite
O tratamento recomendado é o ácido acetilsalicílico (AAS) na dose de 80-100 mg/kg/dia (dividida em 4
tomadas), em crianças. Após 2 semanas de tratamento e com melhora do quadro clínico, reduzir dose para 60
mg/kg/ dia, por mais 4 semanas. Para adultos recomenda-se 4-8 g/dia, divididos em 4-5x/dia. Em caso de suspeita
de processo viral agudo: evitar ou suspender o uso de AAS. Como alternativa, tem-se naproxeno (para crianças:
dose de 10-20 mg/kg/dia, dividida em 2 tomadas, por 4 semanas; adultos: 250-500 mg 2x/dia).

• Cardite
• Cardite: recomenda-se prednisona 1-2 mg/kg/dia, via oral (ou o equivalente via endovenosa), por 2-3
semanas, dependendo da clínica e exame laboratorial, reduzir 20-25% da dose a cada semana (o
tratamento deve ter duração de ±12 semanas na moderada e grave e 4-8 semanas na leve).
• Cardite grave, refratária ao tratamento inicial ou naqueles que precisam de cirurgia emergencial:
pulsoterapia com metilprednisolona (30 mg/kg/dia endovenoso) em ciclos semanais.
• Controle de insuficiência cardíaca: diuréticos, restrição hídrica.
• Furosemida (dose de 1-6 mg/kg/dia) e espironolactona (dose de 1-3 mg/kg/dia).
• Estão indicados: os inibidores de enzima conversora de angiotensina (IECA), principalmente nas
situações de insuficiência aórtica importante (captopril 1-2 mg/kg/dia ou enalapril 0,5-1 mg/kg/dia);
digoxina (na presença de disfunção ventricular, confirmada pelo ecocardiograma ou de fibrilação
atrial), sendo recomendada a dose de 7,5-10 mcg/kg/dia em crianças e de 0,125-0,25 mg/dia em
adultos.
• Fibrilação atrial: considerar anticoagulação.
• Coréia
• Autolimitada (maioria dos casos).
• Leve a moderada: repouso em ambiente calmo; podem ser utilizados fenobarbital e benzodiazepínicos.
• Graves: hospitalização pode ser necessária. Em casos moderados a graves, o uso de prednisona na dose
de 1-2 mg/kg/dia, por 2 semanas, com redução gradualmente ao longo das próximas 2 a 3 semanas,
tem sido proposto. Para casos graves, a imunoglobulina e a plasmaférese também têm sido utilizadas;
no entanto, os dados são limitados.
• Os fármacos utilizados são:
• → Haloperidol 1 mg/dia em duas tomadas, aumentando 0,5 mg a cada três dias, até atingir boa
resposta (mais de 75% de remissão dos movimentos) ou dose máxima de 5 mg ao dia. Duração de 3
meses
• → Ácido valproico 10 mg/kg/dia, aumentando 10 mg/kg a cada semana até dose máxima de 30
mg/kg/dia.
• → Carbamazepina (7-20 mg/kg/dia)
b. Monitorização

• Avaliação com relação à melhora dos sinais e sintomas da doença.


• Monitorização de provas inflamatórias (a cada 15 dias).
• Pacientes com acometimento cardíaco: recomenda-se monitoramento com radiografia de tórax,
ecocardiograma e eletrocardiograma, 4 semanas após o início do quadro.
c. Profilaxia secundária (quadros 13 e 14)

• Objetivo: administração contínua de antibiótico para paciente portador de febre reumática prévia ou
cardiopatia reumática comprovada (reduzir recorrências da doença, a severidade de cardiopatia residual e
mortalidade).
MEDICAMENTO DOSE/VIA DE ADMINISTRAÇÃO INTERVALO

< 20 kg 600 mil UI IM


Penicilina G benzatina 21/21 dias
≥ 20 kg 1.200.000 UI IM

Penicilina V 250 mg VO 12/12h

<30 kg: 500 mg VO


Alergia a penicilina: sulfadiazina 1x/dia
≥30 kg: 1 grama VO

Alergia a penicilina e sulfadiazina: Adultos: 250 mg VO 12/12h


eritromicina Crianças: 20 mg/kg/dia 12/12h

QUADRO 13. RECOMENDAÇÕES PARA PROFILAXIA SECUNDÁRIA.


Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia.115

CATEGORIA DURAÇÃO NÍVEL DE EVIDÊNCIA

Até os 21 anos de idade ou 5 anos após o


FR sem cardite prévia I-C
último surto (vale o que cobrir maior período)

FR com cardite prévia, insuficiência


Até os 25 anos de idade ou 10 anos após o último
mitral leve residual ou resolução de lesão I-C
surto (vale o que cobrir maior período)
valvar

Até os 40 anos de idade ou 10 anos após o último


Lesão valvar residual moderada a severa surto (o que cobrir maior período) ou por toda a I-C
vida

Após cirurgia valvar Por toda a vida I-C

QUADRO 14. RECOMENDAÇÕES PARA A DURAÇÃO DA PROFILAXIA SECUNDÁRIA.


Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia.114,115

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chorea.
7.5
GOTA
Autora:
Lenita Adriana Mazzi Gaino

INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES
Gota é uma desordem que se manifesta com um espectro de
características clínicas e patológicas, devido ao excesso de ácido úrico
sérico, o qual varia entre 6,8 a 7 mg/dL (considerado limite de solubilidade
de urato nos fluidos fisiológicos). Os cristais de urato monossódico (MSU)
saturados nos fluidos extracelulares podem se depositar nas articulações,
bursas, tendões, tecidos cutâneos e auriculares, e são detectados pelo exame
físico e/ou de imagem. Litíase renal, nefropatia parenquimatosa,
acometimento ocular e visceral também podem ocorrer.
É uma das doenças reumatológicas mais comuns em adultos de meia-
idade, notadamente no sexo masculino, e em mulheres após a menopausa (o
estrogênio e a progesterona estão relacionados à queda nos níveis de ácido
úrico sérico). Tem sido observado um aumento na prevalência de gota com o
avançar da idade, e os principais fatores envolvidos para tal incluem:
longevidade, uso de medicamentos, insuficiência renal crônica, hipertensão
arterial, obesidade e síndrome metabólica. Além disso, há evidência de
associação entre ácido úrico circulante e hipertensão, doença renal e risco de
eventos coronarianos. A história familiar está presente em até 40% dos
casos.
Os fatores de risco para hiperuricemia e gota são divididos em fatores
não modificáveis e modificáveis (Quadro 1).

Não modificáveis: Modificáveis:


Idade Hiperuricemia Hiperlipidemia

Gênero Obesidade Doença cardiovascular isquêmica

Raça Hipertensão arterial Doença renal crônica

Etnia Diabetes Fatores dietéticos/ Álcool


- - Medicamentos

Quadro 1. Fatores de risco


Fonte: Becher.17

Geralmente manifesta-se com artrite aguda e crônica, alternando com


períodos de remissão; apresenta tempo e intensidade diferentes em cada crise
e afeta um pequeno grupo de articulações, preferencialmente em membros
inferiores. O processo começa anos ou décadas antes de o paciente
desenvolver os sintomas. As crises podem ser desencadeadas por ingesta
excessiva de álcool, estresse metabólico ou com o início de
hipouricemiantes.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O urato é o produto final de degradação da purina e seu nível depende da
dieta, da síntese endógena de purinas e de sua excreção (renal e intestinal),
além de sofrer influência de pH, temperatura, desidratação, entre outros.
A quantidade de urato ingerido diariamente é baixa e de pouca absorção.
Contudo, os níveis de urato são mantidos abaixo da sua concentração
máxima (6,8 mg/mL), através da excreção renal e intestinal. Quando sua
concentração máxima é ultrapassada, pode aumentar a chance de
cristalizações, sobretudo nas extremidades.
No processo de degradação, as purinas são convertidas em xantinas e, na
sequência, em ácido úrico. Esse composto orgânico é transformado em urato,
um sal orgânico que é produto final do metabolismo das purinas no
organismo (Figura 1). No rim saudável, 100% do urato é filtrado e 5-10% é
excretado, ao passo que, quando há alteração da função renal, 3-5% é
excretado. O processamento ocorre no túbulo proximal, onde transportadores
funcionam para reabsorção (URAT1, OAT4, OAT10, GLUT9), secreção
(NPT1 e 4, MRP, e OAT1, 2, 3) de ácido úrico. O sistema renal de excreção
de urato de pacientes com gota pode ser menos responsivo ao aumento do
ácido úrico sérico. O mecanismo de excreção intestinal do urato tem sido
menos estudado. Recentemente, foi observada perda de função de uma
bomba secretória ABCG2 como possível causa de hiperuricemia. A redução
no funcionamento da ABCG2 ocasiona redução da excreção extrarrenal e
aumento compensatório de eliminação de urato na urina (Figura 2).
O urato tem atividade pró-inflamatória e, ao ser fagocitado, estimula a
produção de citocinas inflamatórias, em particular a IL-1, causando uma
inflamação crônica. Geralmente essa inflamação mantém um equilíbrio entre
as citocinas pró-inflamatórias e os inibidores, levando a uma inflamação
subclínica, porém qualquer desequilíbrio pode desencadear uma crise aguda,
com intensa inflamação local (Figura 3).
A gota é consequência do aumento do ácido úrico sanguíneo, seja por
hiperprodução (corresponde a 10% dos casos), seja por diminuição da sua
excreção (90%), levando à sua deposição articular e/ou em tecidos moles
(quadros 2 e 3).
Há dois tipos de gota: a primária ou idiopática e a secundária. Na gota
primária, o paciente pode apresentar deficiência enzimática, que leva a um
aumento da síntese de ácido úrico ou, mais frequentemente, pode ocorrer a
diminuição da depuração renal do ácido úrico. Já a gota secundária é
decorrente do aumento do metabolismo das purinas ou por ação
farmacológica, que podem causar uma produção exacerbada de ácido úrico
ou uma diminuição na excreção renal.
1. PRPP-S (fosforribosil-pirofosfato sintetase)
2. HGPRT-ASE (hipoxantina-guanina-fosforribosil transferase)
3. ND (50 nucleotidase)
4. PNP (purina nucleotídeo fosforilase)
5. XO (xantina oxidase)
6. AMPD (AMP-deaminase)
7. ADA (adenilato deaminase)
8. APRT-ASE (amidofosforribosil transferase)
9. UO (urato oxidase)
10. Condições metabólicas com degradação de ATP

Figura 1. Síntese “de novo” das purinas.


Fonte: Xavier Jr.14
À esquerda: superprodução de urato através do mecanismo de degradação da purina é o menor contribuinte para
concentração de urato sérico. A redução da excreção de urato é a causa dominante de hiperuricemia em pessoas com gota.
No centro, componentes principais para o transporte de urato estão agrupados de acordo com sua função de reabsorção
ou secreção. À direita, no intestino, a ABCG2.

Figura 2. Mecanismos de hiperuricemia.


Fonte: Dalbeth.21
1. Fagocitose de cristal de urato monossódico estimula NADPH oxidase para gerar espécies reativas de O2, que pode ativar
o NLRP3
2. Cristais podem estimular a secreção de ATP, que pode ativar o receptor P2x7, resultando em recrutamento de canais de
panexina 1. A entrada e saída de potássio podem ativar o inflamassoma
3. Concomitante, a interação de cristal com receptores Toll-like na superfície celular estimula a produção de pró-IL 1β
4. Uma vez estimulada, ocorre a clivagem de pró-IL1β em IL1β(ativa), que é secretada de dentro da célula para o meio
extracelular (no sítio de inflamação)
*ASC(proteína associada à apoptose contendo o domínio da caspase)/ IL 1β (interleucina 1β)/ NFĸB (fator nuclear kappa
B)/ NLRP3 (receptor proteína 3 like NOD)/ ROS (espécies reativas de oxigênio)/ TLR (receptores Toll-like)

Figura 3. Ativação do inflamassoma NLRP3 e produção de IL-1β.


Fonte: Igel.24

Defeito enzimático que leva à superprodução de purina:

• Deficiência da hipoxantina-guanina fosforibosiltransferase.


• Hiperatividade da fosforibosil-pirofosfatase sintetase.
• Deficiência da glicose 6 fosfatase.
Desordens clínicas que levam à superprodução de purina e/ou urato:

• Doenças mielo e linfoproliferativas/malignidades.


• Doenças hemolíticas/Psoríase/Síndrome de Down/ Doença de depósito de glicogênio.
• Obesidade.
• Hipóxia tecidual.
Dieta, medicamentos ou toxinas indutoras de superprodução de purina e/ou urato:

• Álcool/ Ingesta excessiva de purinas/Frutose.


• Extrato pancreático.
• Deficiência de vitamina B12.
• Drogas citotóxicas.
Quadro 2. Causas de hiperuricemia devido ao aumento de síntese de purinas
e/ou urato.
Fonte: Gaffo.18

Desordens clínicas:

• Insuficiência renal crônica/Nefropatia por chumbo/Nefropatia Hiperuricêmica Familiar Juvenil/ Doença renal
cística medular/Doença renal glomérulo-cística.

• Depleção volume efetivo.


• Cetoacidose diabética ou por redução ingesta alimentar/Acidose láctica.
• Pré-eclâmpsia.
• Obesidade/Hiperparatireoidismo/Hipotireoidismo.
• Sarcoidose/Beriliose.
Drogas ou dieta:

• Diuréticos de alça ou tiazídicos.


• Ciclosporina e tacrolimus.
• Salicilatos em baixas doses.
• Etambutol/Pirazinamida.
• Álcool (cerveja, vinho e licores).
• Levodopa.
• Abuso de laxantes.
• Restrição sal.
• Ingesta excessiva de alimentos contendo frutose, carne vermelha, miúdos, embutidos, frutos do mar.
• Metoxiflurano.
• Ácido nicotínico
Polimorfismos genéticos nos genes que codificam os transportadores de urato:

• SLC2A9
• SLC22A12
• ABCG2
• SLC17A1
• SCL22A11
• PDZK1
• SCL16A9
Quadro3. Causas de hiperuricemia devido à diminuição do clearance renal
do ácido úrico.
Fonte: Gaffo.18

A importância em se saber a causa da hiperuricemia se deve à conduta


terapêutica a ser adotada. Pacientes com deficiência na excreção renal
podem ser tratados com uricosúricos, aumentando sua excreção, enquanto os
doentes que possuem uma hiperprodução se beneficiam com o uso de
inibidores da síntese de urato.

QUADRO CLÍNICO
A artrite gotosa consiste em períodos longos, assintomáticos, de
deposição de cristais de MSU nas articulações alternando com períodos de
monoartrite ou oligoartrite, evoluindo para gota tofácea crônica, onde pode
ser observada a deformidade óssea. A duração de cada estágio varia de
acordo com cada indivíduo.
Os estágios clínicos da gota são: hiperuricemia assintomática, gota
intermitente aguda, gota tofácea avançada e gota não clássica.
a. Hiperuricemia assintomática
Considerado um estágio precursor da gota, em que ocorre o aumento da
concentração de urato sérico, na ausência de qualquer manifestação clínica,
geralmente com duração de décadas. Estudos mostram que a hiperuricemia
persistente (acima de 9 ou 10mg/dL) é responsável por efeitos deletérios,
como: hipertensão arterial, insuficiência renal e doenças cardiovasculares.
As mudanças nas articulações e de partes moles, que irão desenvolver a gota,
ocorrem nessa fase e é importante salientar que nem todos os pacientes
hiperuricêmicos irão desenvolver gota.
b. Gota Intermitente Aguda
Ocorre por volta de 30 a 40 anos no sexo masculino e, no sexo feminino,
mais tarde, conforme notadamente a idade da menopausa. Geralmente, o
ataque é monoarticular e com sinais flogísticos intensos, mas pode ser
poliarticular em pacientes com doença de longa evolução. Em cerca de 90%
dos casos, a articulação mais acometida é a primeira metatarsofalangeana
(denominada como podagra), ou a do joelho. Outras articulações como
tornozelo, calcâneo e mediopé podem ser afetadas.
As crises são caracterizadas por dor severa, vermelhidão, calor, inchaço e
incapacidade para realização de movimentos, com pico do quadro dentro de
12-24 horas. Os sintomas aparecem subitamente, no período da noite e início
da manhã. O processo inflamatório pode se estender ao redor da articulação
e, ao final, pode apresentar descamação epidérmica. Geralmente, as crises
são autolimitadas e têm duração de poucos dias a semanas, e são seguidas de
períodos assintomáticos (momento em que há uma inflamação, porém de
baixo grau).
Esse processo agudo pode ser iniciado por fatores que modifiquem a
estabilidade dos cristais de MSU intra-articular; por exemplo: pH do líquido
sinovial, trauma da articulação, medicamentos, dieta, cirurgia, dentre outros.
Pode durar 3-4 anos ou um período superior a 20 anos.
c. Gota Tofácea Avançada
É caracterizada pelo aglomerado de cristais de monourato acompanhado
por inflamação crônica e destruição dos tecidos adjacentes. Tofos são
geralmente visíveis e palpáveis e podem estar presente na orelha,
articulação, tendão, bursa e esclera; são observados após alguns anos de
doença. O paciente mantém desconforto e algum grau de edema nas
articulações e evolui com poliartrite deformante ou mutilante, semelhante à
artrite reumatoide.
d. Gota Não Clássica

• De início precoce: corresponde a 5% dos casos; ocorre antes dos


25 anos de idade e tem um curso acelerado, geralmente com
história familiar de gota (em 80% dos casos).

• Deficiências genéticas específicas: levam à hiperprodução de


urato em crianças e adultos jovens.

• Doença renal da infância: nefropatia hiperuricêmica juvenil


familiar e doença renal cística medular autossômica dominante.

• Feminina: geralmente após a menopausa, e as mulheres


apresentam mais comorbidades. A gota geralmente é poliarticular e
acomete mais membros superiores.

• Transplante: os medicamentos como ciclosporina e tacrolimus


utilizados no transplante de órgãos sólidos reduzem a capacidade
renal de excreção de ácido úrico; tem um curso acelerado e a
hiperuricemia assintomática tem duração de 6 meses a 4 anos e o
estágio agudo intermitente de 1-4 anos.

• Saturnina: causada pela intoxicação por chumbo.


DIAGNÓSTICO, EXAMES E
CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico é estabelecido através da anamnese, exame físico e exames
laboratoriais. A análise do líquido articular é considerada padrão-ouro para o
diagnóstico; no entanto, é uma técnica invasiva. Através da microscopia de
luz polarizada compensada são visualizados cristais de urato monossódico
intracelular em formato de agulha e com birrefringência negativa, no líquido
sinovial, além de características inflamatórias na análise bioquímica.
Nos exames laboratoriais, podem ser encontrados: aumento de VHS ou
PCR e/ou leucocitose com predomínio de neutrófilos; níveis de ácido úrico
sérico (na crise: difícil interpretação, pode estar normal, aumentado ou
reduzido - o mais adequado é fazer a análise 2 semanas ou mais após a crise)
e urinário.
Os exames de imagem mais utilizados são:

• Radiografia simples (RX): é um método rápido, mas de baixa


sensibilidade; tem pouca utilidade no diagnóstico e tratamento por
visualizar apenas achados tardios; é útil para excluir fraturas. No
início da doença, não apresenta sinais radiográficos específicos,
somente é possível visualizar o aumento de densidade e de volume
de partes moles. Nos achados tardios podem ser observados:
massas de tecidos moles ou intraósseas, com calcificação ou não e
artropatia erosiva (lesões em saca bocado), assimétrica, com
espaço articular reduzido.

• Ultrassonografia (USG): permite um diagnóstico não invasivo,


melhor decisão terapêutica e maior controle no tratamento. É
possível avaliar a extensão da lesão e o envolvimento de estruturas
adjacentes. O achado característico é o sinal do duplo contorno
(camada hiperecoica linear irregular sobre a margem superficial da
cartilagem hialina anecoica e paralela ao córtex ósseo) e/ou
presença de tofo. Além disso, pode ser vista a entesopatia
secundária a tofo. Quando se utiliza o USG com Doppler, pode ser
observado na crise e naqueles pacientes com artralgia, um aumento
de fluxo. Tem sensibilidade de 84%.

• Tomografia computadorizada: permite a visualização dos tofos


tanto no subcutâneo quanto intra-articular, depósitos de cristais
dentro dos tofos e diferenciação de outros nódulos. Pode ser usada
como método complementar em casos de acometimento de
estruturas profundas, como a coluna vertebral, e para avaliação de
danos. Não é o método de escolha pela radiação ionizante
utilizada.
• Tomografia computadorizada de dupla energia: fornece
informações sobre a composição química dos tecidos. Em estágios
iniciais, esse exame geralmente não é capaz de detectar tofos. É
suscetível a alguns artefatos; no entanto, é capaz de diferenciar
depósitos de urato dos de cálcio, tecidos conectivos.

• Ressonância nuclear magnética: é menos utilizada, podendo ser


escolhida quando a USG não consegue uma boa visualização. É
utilizada para investigar causas de limitações de movimentos e
disfunções motoras ou dolorosas causadas por acometimento de
estruturas profundas e para diagnósticos diferenciais de massas.
Não auxilia no diagnóstico inicial.
Em 2018, o EULAR fez novas recomendações baseadas em evidência:

• Padrão-ouro para o diagnóstico de gota é a demonstração de


cristais de urato no líquido sinovial ou aspirado de tofo, através da
artrocentese de articulações sintomáticas ou assintomáticas
(período intercrítico).

• Artrite aguda em adulto: considerar como possibilidade de


diagnóstico, gota. Caso seja difícil a realização de artrocentese,
considerar diagnóstico clínico, ou seja, envolvimento
monoarticular de pé ou joelho, episódios de artrite semelhantes,
previamente, início súbito do quadro com dor e edema (piora em
menos de 24 horas), eritema, sexo masculino, história de doença
cardiovascular e hiperuricemia. Essas características são altamente
sugestivas de gota.

• Casos de artrite inflamatória não diagnosticada: é fortemente


recomendada a aspiração e análise de líquido sinovial.

• O diagnóstico de gota não deve ser feito apenas na presença de


hiperuricemia. A hiperuricemia é um forte preditor para o
desenvolvimento de gota; no entanto, apenas 22% dos pacientes
com ácido úrico> 9 mg/dL desenvolverão gota em 5 anos. Além
disso, pacientes em crise de gota podem ter uricemia normal.

• Quando o diagnóstico clínico é incerto e não é possível a


identificação do cristal, deve-se proceder à investigação por
imagem, para identificação de depósitos de urato, tofo, erosão
óssea. Não foi possível, até o momento, definir qual melhor
método de imagem a ser empregado.

a. CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO DE GOTA ACR


(American College of Rheumatology) /EULAR (European League
Against Rheumatism) (QUADRO 4)
Categorias Escore

CRITÉRIO DE ENTRADA:
Passo 1: critérios de entrada (só se aplicam os critérios
Pelo menos 1 episódio de edema, dor e sensibilidade
de classificação abaixo se os critérios de entrada forem
articular ou em Bursa.
satisfeitos).
CRITÉRIO SUFICIENTE:
Passo 2: critério suficiente (se encontrá-lo já é gota;
Pelo menos 1 episódio de edema, dor e sensibilidade
não precisa prosseguir).
articular ou em Bursa.
+
Passo 3: prosseguir com os critérios de classificação
Presença de cristais de MSU em articulação
quando o critério suficiente não for encontrado.
sintomática ou bursa ou tofo.

Clínico

Categorias Escore
Padrão de envolvimento articular/bursa durante a crise. * Tornozelo ou mediopé (sem envolvimento 1
da primeira metatarsofalangeana).
* Envolvimento da 1 metatarsofalangeana (como parte
de um processo mono ou 2
poliarticular.
Características do episódio sintomático:
* Eritema na articulação afetada. * 1 característica.
* Não pode ser tocado ou pressionado. * 2 características.
* Dificuldade para deambular ou incapacidade para * 3 características. 1
utilizar a articulação. 2
3
Tempo de curso do episódio:
* Presença de 2 ou mais, independentemente do
tratamento anti-inflamatório: *1 episódio típico.
* Episódios típicos recorrentes.
• Tempo para dor máxima menor ou igual 1
24 horas. 2

• Resolução dos sintomas em no máximo


14 dias.
Presente .
• Resolução completa entre os episódios 4
sintomáticos.

Evidência clínica de tofo.


Laboratório

Categorias Escore

* Ácido úrico sérico: idealmente dosar quando o < 4 mg/dL -4


paciente não estiver utilizando hipouricemiante há 6 -8 mg/dL 2
mais de 4 semanas após o episódio inicial. 8 a < 10 mg/dL 3
≥ a 10 mg/dL 4
* Análise de fluido sinovial de paciente
sintomático. Ausência de cristais de monourato de sódio. -2

Imagem

Categorias Escore

* Evidência de depósito de urato pela imagem, na


bursa/articulação:
• USG: sinal do duplo contorno; ou Presente 4

• Tomografia de dupla energia: depósitos


de urato.

* Dano articular evidenciado pela imagem (radiografia


das mãos ou pés evidenciando pelo menos 1 erosão, Presente 4
excluindo articulações interfalangeanas distais e
aparência de asa de gaivota).

*Calculadora pode ser acessada em http://goutclassificationcalculator.auckland.ac.nz e sites ACR e EULAR

Quadro 4. Critérios de classificação de Gota.


Fonte: Neogi T, Jansen Tl, Dalbeth N, Fransen J, Schumacher HR,
Berendsen D, et al. 2015 Gout Classification Criteria: An American College
Of Rheumatology/European League Against Rheumatism Collaborative
Initiative. Arthritis Rheumatol. 2015; 67(10): 2557-68.

Observação: considerar valor zero se: não for feito exame de imagem e
não for feita a análise de líquido sinovial. Para valores de ácido úrico sérico
entre 4 e < que 6 mg/dL: considerar valor zero. Considerar gota se critério
suficiente presente ou escore total ≥ a 8.
b. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL (QUADRO 5)
Artrite séptica/ Osteomielite Pseudogota Celulite

Artrite reumatoide Osteoartrite Reumatismo palindrômico

Febre reumática aguda Trauma Doença de cristal de fosfato básico de cálcio

Quadro 5.
Fonte: Elaborado pela autora.

TRATAMENTO
O tratamento da artrite gotosa inclui tratamento farmacológico e não
farmacológico.

a. OBJETIVOS NO TRATAMENTO DA ARTRITE GOTOSA


(QUADRO 6)
Aguda Crônica

Interromper e prevenir crises agudas Reduzir a uricemia

Prevenir complicações (tofos) articulares, renais Diminuir progressivamente o urato total no


e em outros órgãos organismo

Combater fatores associados

Quadro 6.
Fonte: Elaborado pela autora.

b. CONTROLE DE FATORES DE RISCO

• Educação do paciente (aspecto-chave no sucesso do tratamento). É


importante o esclarecimento sobre a evolução da doença, fatores de
risco modificáveis e não modificáveis, bem como orientar o
paciente a iniciar o tratamento quando apresentar sinais e sintomas
de uma crise aguda de gota.

• Redução de peso. O risco de gota é maior em pacientes com índice


de massa corporal (IMC) ≥ 25. O aumento de IMC de > 5% foi
associado com 60% mais probabilidade de crise recorrente.

• Atividade física diminui o risco de mortalidade em pacientes com


hiperuricemia.

• Dieta. Evitar carne vermelha, miúdos, embutidos, peixes, frutos do


mar, bebidas alcoólicas (vinho, licor e notadamente cerveja),
alimentos com frutose, refrigerantes, laranja e suco de maçã.
Estimular: ingesta de café, vegetais, hidratação adequada, azeite de
oliva e canola. Pelo ACR, não é indicada a suplementação de
vitamina C e há baixa ou muito baixa evidência, com relação ao
uso de laticínios e cereja como “fator protetor”.

• Avaliação dos medicamentos em uso. Aumentam o ácido úrico


sérico: diuréticos de alça ou tiazídicos, AAS em baixas doses (não
é recomendado suspender o uso), betabloqueadores, inibidores da
enzima conversora de angiotensina e bloqueadores de receptor da
angiotensina, que não a losartana. Diminuem: ciprofibrato,
losartana, bloqueadores de canal de cálcio, terapia de reposição
hormonal.

• Avaliação/controle de comorbidades e de fatores de risco


cardiovasculares, como: insuficiência renal, insuficiência cardíaca,
acidente vascular cerebral, doença arterial periférica, dislipidemia,
hipertensão, obesidade, resistência à insulina e tabagismo, história
de litíase renal e psoríase.

• Exposição à dose baixa de chumbo está relacionada ao aumento


de ácido úrico sérico.
c. TRATAMENTO DA ARTRITE GOTOSA AGUDA
(FLUXOGRAMA 1)
Recomenda-se uso de AINEs ou colchicina ou corticoide, dentro de 12-
24 horas do seu início. Além disso, são orientados: medicamentos
analgésicos, repouso e aplicação de compressas geladas no membro afetado.
Os consensos americano e europeu orientam, sem definir escala de
importância, o uso de colchicina, AINES (anti-inflamatórios não
esteroidais), corticoide sistêmico/intra-articular ou a combinação de terapia,
de acordo com a intensidade da dor e o número de articulações envolvidas,
bem como considerando as contraindicações para cada indivíduo.
Para crises leves a moderadas (≤ a 6 de 10 na EVA - Escala Visual
Analógica), com envolvimento de 1 ou poucas pequenas articulações ou de 1
ou 2 grandes articulações, recomenda-se o uso de monoterapia; entretanto,
para crises severas (EVA 7 -10), poliartrite aguda ou envolvimento de mais
de 1 grande articulação são consideradas terapias combinadas (dose repleta
de um agente + dose profilática de outro agente ou doses repletas de 2
medicamentos), com exceção à combinação de AINE e corticoide oral,
devido à toxicidade. Para pacientes que não podem fazer medicamentos via
oral, é recomendado corticoide intra-articular ou intramuscular ou ACTH.
A colchicina é utilizada para crises com menos de 36 horas de início e é a
primeira escolha. Geralmente é administrada uma dose de ataque de 1 mg e
posteriormente de 0,5 mg, 1 hora depois e posteriormente, conforme a
necessidade. Depois das primeiras 12 horas, manter dose de 0,5 mg 3
vezes/dia, até cessar a crise ou efeitos colaterais ao medicamento
aparecerem. A colchicina interfere diretamente na atividade dos neutrófilos e
inibe a formação do inflamassoma; seu metabolismo é feito pela família do
citocromo P450; portanto, pode interagir com outros medicamentos
metabolizados por essa via.
Os AINES ou corticosteroides agem na supressão da resposta imune de
prostaglandinas e leucotrienos, inibição de fatores de transcrição pró-
inflamatórios e de citocinas (interleucina 1,6,8 e de anti-TNFα). Dentre os
AINES, a indometacina, o naproxeno e o sulindac são os mais utilizados.
Para pacientes com intolerância gastrointestinal, têm sido recomendados o
etoricoxibe e o celecoxibe.
O uso de corticoide deve ser feito baseado no número de articulações
acometidas (1 - 2 articulações: corticoide oral ou intra-articular, o último se
grandes articulações). O corticoide oral deve ser utilizado na dose de 0,5
mg/kg/dia por 7 - 10 dias, seguido pelo desmame ou 2 - 5 dias de dose
repleta de corticoide, seguido do desmame dentro de 7 a 10 dias e suspensão,
pelo ACR, e pelo EULAR, 30 - 35 mg/dia de prednisolona por 3 -5 dias; o
intra-articular deve ser utilizado em associação ao oral, colchicina ou AINE;
o intramuscular (recomendado de acordo com cada caso e seguido pelo uso
do corticoide oral). Não há consenso sobre seu uso isolado.
Em casos específicos, como na gota poliarticular refratária ao AINEs ou
pacientes que não consigam fazer tratamento com medicamento via oral, a
corticotropina (ACTH 25 a 40 UI subcutânea) pode ser utilizada. Ela induz a
produção de glicocorticoesteroide e tem efeito anti-inflamatório periférico.
Os bloqueadores de interleucina 1 (IL-1) podem ser utilizados na crise de
gota. Caso haja contraindicação ou falha ao uso de colchicina, corticoide e
anti-inflamatório. Dentre eles, há: o anakinra (100 mg subcutâneo por 3 dias
consecutivos; é um antagonista do receptor humano recombinante de IL-1β;
meia-vida curta); canakinumabe (150 mg subcutâneo; é um anticorpo
monoclonal que neutraliza a IL-1β, diminuindo a inflamação; o FDA
americano proibiu seu uso, já a Agência de Medicina Europeia, aprovou) e
rilonacepte. Estes medicamentos apresentam um alto custo e, em muitos
países, ainda não foram liberados.

• Resposta inadequada na crise (ACR): FLUXOGRAMA 2


Menos de 20% de melhora EVA dentro de 24 horas ou menos de 50% de
melhora EVA em 24 ou mais horas após o início da terapia: atentar para
diagnóstico alternativo, fazer a troca do medicamento ou adicionar um
segundo agente. O uso de inibidor de IL-1, em casos refratários, pelo
consenso europeu, é uma alternativa; já pelo americano, incerto. Eles não
são usados para profilaxia.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO
Obs.: em doença severa, pode ser usada associação (evitar: antiinflamatório não esteroidal com corticoide).

FLUXOGRAMA 1: TRATAMENTO DA ARTRITE GOTOSA AGUDA


Fonte: Elaborado pela autora.

FLUXOGRAMA 2: AVALIAÇÃO DA RESPOSTA NA CRISE


Fonte: Elaborado pela autora.

d. TRATAMENTO DA ARTRITE GOTOSA CRÔNICA


(FLUXOGRAMA 3)
A terapia de redução de urato deve ser usada por tempo indefinido e,
quando eficaz, está associada a uma diminuição de crises agudas. Entretanto,
na fase inicial do tratamento, há um aumento das crises, o que pode
contribuir para a não adesão ao tratamento. Inicialmente, as crises ocorrem
devido à remodelação no depósito articular de cristais de urato com uma
rápida redução de sua concentração. Além das mudanças no estilo de vida, a
colchicina diária é utilizada para prevenção de tais crises. Atenção deve ser
dada para pacientes com alteração da função renal: clearance de creatinina >
50 mL/min (dose normal); clearance de creatinina < 50 mL/min (reduzir a
dose em 50%). O uso de colchicina deve ser cuidadoso em pacientes com
alteração renal e/ou que estejam em uso de estatina ou ciclosporina, devido
ao risco de neuro e miotoxicidade. Outros efeitos colaterais são: diarreia,
náuseas, arritmia, alteração hepática e alopecia.
Na intolerância ao uso de colchicina, pode ser utilizado AINE, desde que
não haja contraindicação, sendo os mais recomendados a indometacina e o
naproxeno, juntamente com inibidor de bomba de prótons. Em situações
com contraindicação a AINE, pode ser utilizado corticoide em baixa dose
(menor ou igual a 10 mg/dia de prednisona ou prednisolona), segundo o
ACR. Geralmente, o tempo de duração da profilaxia é: pelo EULAR:
paciente sem tofo (6 meses depois da normalização do ácido úrico sérico),
com tofo (incerto, geralmente 6 meses após o desaparecimento das lesões);
pelo ACR: continuar se há evidência de atividade da doença (1 ou mais tofos
detectados; crise recente ou artrite gotosa crônica e/ou uricemia ainda não
bem controlada) por 3 meses para pacientes sem tofos detectados
clinicamente e com níveis adequados de uricemia e 6 meses após controle da
uricemia em pacientes que tiveram a resolução do tofo, previamente
detectados pelo exame físico.
Com relação aos medicamentos hipouricemiantes, há: os inibidores
xantina oxidase, os agentes uricosúricos e as uricases. Geralmente têm seu
uso recomendado quando o paciente teve: 2 crises ou mais em 1 ano; uma
crise em paciente com doença renal crônica estágio 2 ou mais; apresenta
tofo, artropatia por urato e/ou litíase renal. Pela SBR (Sociedade Brasileira
de Reumatologia), para pacientes com 2 ou mais crises por ano, pacientes
com dano articular, presença de 1ou mais tofos ou passado de urolitíase. Pelo
ACR, para pacientes com mais de uma crise, mas infrequente (<2x/ano)
/pacientes com primeira crise e doença renal estágio ≥ a 3, ácido úrico > 9
mg/dL ou urolitíase: pode ser iniciado o tratamento; pacientes com
hiperuricemia apenas (sem crise ou tofo), não é recomendado o tratamento.
Segundo o EULAR, o medicamento hipouricemiante pode ser iniciado logo
no primeiro diagnóstico, em pacientes com menos de 40 anos ou com
uricemia > 8 mg/dL e/ou comorbidades (prejuízo renal, hipertensão, doença
cardíaca isquêmica, insuficiência cardíaca); em todos os pacientes com
crises recorrentes, tofo, artropatia por urato e/ou litíase renal. De acordo com
as recomendações do ACR, seu início, quando indicado, deve ocorrer na
crise, visto que no início do hipouricemiante pode ocorrer crise de gota e
considerando que isto não causaria a extensão da duração ou intensidade da
crise; já o EULAR não definiu se deve iniciá-lo na crise ou 2 semanas após o
término da crise, e a SBR orienta que deve ser iniciado idealmente após o
controle completo de uma crise de gota. O objetivo do tratamento é de
reduzir o ácido úrico sérico para abaixo de 6 mg/dL (pelo ACR,
independentemente de doença mais grave) e em pacientes com tofo e/ou
artropatia crônica e/ou crises frequentes, abaixo de 5 mg/dL (pelo EULAR e
SBR). Alguns estudos têm mostrado que o ácido úrico tem efeito protetor
contra diversas doenças neurodegenerativas. Dessa forma, recomenda-se
evitar a redução do nível de ácido úrico para abaixo de 3 mg/dL.
O alopurinol é primeira escolha para redução da uricemia, agindo na
diminuição da síntese de ácido úrico; tem um custo baixo; preferencialmente
é excretado pelos rins. Sua dose inicial é de 100 mg/dia, podendo atingir até
800 mg/dia em casos refratários. O aumento da dose (100 mg) deve ser feito
a cada 2 a 5 semanas, momento em que também deve ser feita a dosagem de
ácido úrico sérico. Para paciente com doença renal estágio 4 ou mais, iniciar
com dose de 50 mg/dia (pelo ACR). Seu efeito pode ser notado 48 horas
após sua ingestão e, sua estabilização, em duas semanas. Recomenda-se a
pesquisa de HLA B5801 em pacientes coreanos, chineses, tailandeses e
africanos, a fim de se evitar a síndrome de hipersensibilidade ao alopurinol.

• Efeitos colaterais: crises de artrite gotosa, vasculite, nefrite


intersticial, rash, febre, leucopenia, trombocitopenia, elevação de
transaminases, icterícia colestática, necrose hepática grave,
diarréia, síndrome Steven Johnson ou Necrose epidérmica tóxica.
A síndrome de hipersensibilidade ao alopurinol ocorre nos
primeiros 60 dias de início do medicamento e é caracterizada por
exantema eritematoso, febre, hepatite, eosinofilia e insuficiência
renal aguda; como fatores de risco, podem ser observados: dose
inicial de alopurinol > 1,5 (dose em miligramas/taxa filtração
glomerular), doença renal crônica, uso concomitante de tiazida e
HLAB 5801; a taxa de mortalidade de até 20%.

• Evitar: em pacientes com história familiar de reação cutânea


severa e nos pacientes com HLA B5801. Para pacientes que
tiveram alergia ao alopurinol e que não podem ser tratados com
outras classes de medicamentos, o ACR recomenda a
dessensibilização (fraca evidência).
• Interação: 6 mercaptopurina, azatioprina, teofilina,
ciclofosfamida e ampicilina.
Febuxostate: é um inibidor de xantina oxidase; nos Estados Unidos é
usado na dose de 40 a 80 mg e na Europa 80 a 120 mg/dia; metabolismo
essencialmente hepático; opção promissora para pacientes com doença renal
crônica. Efeitos colaterais: erupção cutânea, elevação de transaminases,
diarréia, tontura e possivelmente efeito cardiovascular (não é recomendada
em pacientes com insuficiência cardíaca).
Os uricosúricos agem estimulando a excreção renal de ácido úrico.
Possuem menos efeitos adversos que o alopurinol e seu principal efeito
adverso é a formação de cálculos renais. Estão contraindicados em pacientes
com cálculos renais e pacientes com doença renal moderada a severa. Pelo
ACR, não há recomendação de mensurar o ácido úrico urinário, pelo fato de
sofrer influência da dieta, e não há indicação para alcalinização urinária. O
aumento da ingesta hídrica (aproximadamente 30 mL/Kg) é fundamental. Os
uricosúricos utilizados são a probenecida (doses de 1-2 g/dia: indisponível
no Brasil), sulfimpirazona (50 mg 2 vezes/dia, com doses máximas de 100 a
200 mg 3 - 4 vezes/dia), benzbromarona (doses que variam de 50-200
mg/dia; raros casos de hepatite fulminante foram descritos com seu uso;
evitar em pacientes hepatopatas, pacientes em uso de medicação
hepatotóxica ou etilista importante) e lesinurade (é um inibidor de
reabsorção de ácido úrico; inibe a URAT 1 e OAT4). Alguns agentes com
efeito uricosúrico, como fenofibrato e losartana podem ser úteis para casos
refratários.
Em pacientes com insuficiência renal que estejam utilizando dose
ajustada de alopurinol, no entanto, sem controle adequado de uricemia, o
alopurinol pode ser trocado pelo febuxostate ou benzbromarona, mantendo-
se ou não o alopurinol, exceto quando o clearance de creatinina for menor
que 30 mL/dL (para benzbromarona).

• Efeitos: rash, precipitar crises de artrite gotosa, intolerância


gastrointestinal, litíase renal.

• Evitar: em pacientes com nefrolitíase ou nefropatia por ácido


úrico.
Dentre as uricases, há a pegloticase, que é uma uricase peguilada
recombinante, que converte ácido úrico em alantoína; feita endovenosa (8
mg a cada 2 semanas) e com pré-medicação (anti-histamínico,
acetaminofeno e hidrocortisona 200 mg), para casos severos; profilaxia é
recomendada por pelo menos 6 meses. Não é recomendada como primeira
linha de tratamento e não há um consenso sobre a duração do tratamento.
Estudos demonstram a formação de anticorpos contra a medicação e risco de
reação a partir da segunda exposição à droga, além de perda da resposta de
normalização do ácido úrico. É contraindicada em pacientes com deficiência
de G6PD e deve ser utilizada com cautela em pacientes com insuficiência
cardíaca congestiva.

• Efeitos colaterais: rubores, urticária, hipotensão, dor muscular e


câibras.
e. QUANDO SE DEVE TROCAR O AGENTE REDUTOR DE
URATO?
Pelo ACR, quando o paciente tem níveis elevados de ácido úrico (> 6
mg/dL), a despeito de dose otimizada do primeiro inibidor de xantina
oxidase, e tem crises frequentes de gota (≥ 2 crises por ano) ou tofo não
resolvido, pode-se trocar por outro inibidor de xantina oxidase ou adicionar
uricosúrico. A troca para pegloticase é recomendada apenas quando o
paciente já foi submetido a todos os tratamentos anteriores e continua
apresentando crises (≥ 2x/ano) ou tofo não resolvido.
*Eular: European League Against Rheumatism / **AINE: antiinflamatório não esteroidal
***IBP: inibidor da bomba de prótons****/ SBR: Sociedade Brasileira De Reumatologia

FLUXOGRAMA 3: TRATAMENTO DA ARTRITE GOTOSA CRÔNICA


Fonte: Elaborado pela autora.

f. RESUMO DOS MEDICAMENTOS E SUAS VIAS DE AÇÃO


(FIGURA 4)

FIGURA 4: MEDICAMENTOS E SUAS VIAS DE AÇÃO PARA O


TRATAMENTO DA GOTA
Fonte: Azevedo.141

g. CONCLUSÕES
A artrite gotosa é uma doença que vem aumentando sua prevalência nos
últimos anos. Por ser uma doença que pode vir a se tornar debilitante,
diagnóstico e terapêutica corretos são importantes para uma melhor
qualidade de vida do paciente e maior produtividade no trabalho.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente sexo masculino, 45 anos, obeso, sedentário,
apresenta-se ao pronto-atendimento, de madrugada, com quadro de
artralgia em articulação de primeiro pododáctilo direito, início súbito,
forte intensidade (EVA 10), com aumento de volume e temperatura,
sem história prévia de trauma. Relata ter abusado na feijoada e cerveja,
no dia anterior. Nega episódio prévio. Refere ser hipertenso, em uso de
hidroclorotiazida.
b. Prescrição sugerida:

1. Orientar o paciente sobre provável quadro de gota, considerando


quadro clínico.
2. Orientar sobre necessidade de controle alimentar, redução de peso,
atividade física.
3. Agendar consulta com cardiologista ou clínico geral, a fim de
avaliar a troca de diurético por outra classe de medicamento anti-
hipertensivo, como, por exemplo, losartana (efeito na redução da
hiperuricemia).
4. Prescrever: analgésico comum (dipirona ou paracetamol);
colchicina (comprimido de 0,5mg: tomar 2 comprimidos dose
única e depois de 1 hora, tomar 1 comprimido; a colchicina pode
ser mantida na dose de 0,5 mg de 8/8horas até cessar a crise);
compressa de gelo.
**caso o paciente procurasse atendimento com mais de 36 horas de
sintomas, optaríamos por iniciar AINE ou corticoide.
**como o paciente estava na primeira crise, não iniciar hipouricemiante
neste momento. Recomendaria, coletar ácido úrico sérico 2 semanas depois
do término da crise e reavaliaria ambulatorialmente.

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7.6
OSTEOPOROSE
Autora:
Yanne Franca Montino

DEFINIÇÕES

• A osteoporose é um distúrbio osteometabólico caracterizado pela


diminuição da densidade mineral óssea (DMO), gerando
deterioração da microarquitetura das trabéculas ósseas, levando a
um aumento da fragilidade esquelética e do risco de fraturas. A
capacidade do osso de resistir a forças mecânicas e fraturas
depende não apenas da quantidade de tecido ósseo, mas também da
sua qualidade.

• Estima-se que cerca de 50% das mulheres e 20% dos homens com
idade igual ou superior a 50 anos sofrerão uma fratura devido à
osteoporose longo da vida. Aproximadamente 5% dos indivíduos
que apresentam fratura de quadril morrem durante a internação
hospitalar, 12% morrem nos 3 meses subsequentes e 20% morrem
no ano seguinte ao da fratura, conforme dados norte-americanos. A
osteoporose afeta mais de 200 milhões de pessoas em todo o
mundo.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• A doença pode ser classificada, com base em sua etiologia, em
primária e secundária. A primária é responsável por mais de 95%
dos casos de osteoporose em mulheres e 70% a 80% nos homens,
sendo a forma mais comum e diagnosticada na ausência de
doenças ou relacionada a outras condições que levem à diminuição
da massa óssea.

• A osteoporose idiopática está incluída nesta categoria e é usada


para descrever as formas incomuns de osteoporose encontrada em
crianças e adultos jovens com função gonadal normal ou nenhuma
causa secundária detectável. A secundária é diagnosticada quando
a diminuição de massa óssea é atribuída a outra doença (Quadro 1)
ou está relacionada ao uso de medicamentos.

• O metabolismo ósseo é regulado por uma interação complexa


entre células e por um conjunto de hormônios, fatores de
crescimento e citocinas. O equilíbrio desses processos garante a
adequação de suas múltiplas funções e, caso se alterem ao longo do
tempo, resultam no aumento do risco de fraturas.

• O pico de massa óssea é atingido ao final da adolescência e


mantido até a quinta década pela ingestão alimentar adequada de
cálcio e vitamina D e pela prática de exercício físico. A partir de
então, ocorre progressiva perda de massa óssea, acentuando-se em
mulheres na pós-menopausa.

• A mineralização óssea se faz à custa da hidroxiapatita, composta


por 39% de cálcio e 17% por fosfato. Elemento fundamental em
toda função celular, o cálcio corporal encontra-se 99% depositado
no esqueleto, que também retém 80% do fosfato.

• A mineralização óssea necessita da ação de alguns hormônios,


dentre eles o PTH (paratormônio) – que é produzido pelas
paratireoides, age nos rins diminuindo a secreção de cálcio e
estimulando de forma ativa a vitamina D (1,25OH vitamina D, ou
calcitriol), o que aumenta a absorção intestinal de cálcio dos ossos
para corrente sanguínea; Vitamina D – regula o metabolismo do
cálcio e dos fósforo, facilitando a absorção pelo intestino delgado
e, sob controle do PTH, potencializa a mobilização do cálcio do
osso e diminui a sua eliminação renal; GH (hormônio do
crescimento) – além de atuar diretamente no osso, ele age
estimulando a produção de outro hormônio chamado Insulin-like
Growth Factor-1 (IGF-1), que é produzido em grande quantidade
no fígado e lançado na circulação. Ambos os hormônios aceleram
o crescimento esquelético na puberdade; Hormônio tireoidiano –
aumenta a produção de energia em todas as células, incluindo aas
células ósseas; Cortisol – tem complexos efeitos sobre o esqueleto
e pequenas quantidades são necessárias para o desenvolvimento
ósseo normal.

• O processo de remodelação óssea tem início com o aparecimento


de áreas chamadas unidades multicelulares básicas (basic
multicellular units, BMUs), seguido de neoformação óssea pelos
osteoblastos. Os osteoclastos maduros e os percursores de
osteoclastos expressam em sua superfície uma proteína, o RANK
(receptor ativador do fator nuclear k-B), um estimulador de
colônias de macrófagos. Por sua vez, os osteoblastos expressam o
ligante do RANK (RANKL), que se conecta ao RANK nos
osteoclastos. O RANKL é a citocina – chave indutora da
diferenciação e maturação das células precursoras em osteoclastos.
Os osteoblastos também produzem osteoprotegerina, um receptor
que se liga ao RANKL e o impede de se ligar ao RANK, limitando
assim a formação de osteoclastos. Com a ativação do osteoclasto,
tem início uma fase de 10 dias em que ocorre a reabsorção. O
osteoclasto reconhece uma sequência proteica específica da matriz
óssea através de proteínas chamadas integrinas e adere ao osso. O
osteoclasto, com sua borda em escova, recobre uma área selada do
osso, através da secreção de proteases e íons H+ e CL – atua
digerindo a matriz óssea.

• Esclerostina é uma proteína secretada pelos osteócitos e inibe a


gênese dos osteoblastos, resultando, assim, na redução da
formação óssea. Foram detectados níveis elevados de esclerostina
nas mulheres na pós-menopausa e na pré-menopausa.

• A Catepsina K é uma protease-chave secretada pelo osteoclasto


que degrada o colágeno. Partículas expostas na superfície do tecido
osteoíde e hidroxiapatita são então fagocitadas e degradadas por
hidrólise lisossomal, sendo posteriormente excretadas para
extracelular, assim como ocorre com o cálcio liberado para tecido
ósseo. A seguir vem a fase de formação, que dura cerca de 90 dias
e é executada pelos osteoblastos, responsáveis pela síntese da
matriz orgânica, preenchendo a lacuna de Howship.

• O processo de formação óssea é estimulado pela vitamina D e


pelos pulsos intermitentes de PTH e, por outro lado, pode ser
suprimido pelos glicocorticoides. Os osteoblastos produzem a
matriz orgânica contendo colágeno tipo I, osteocalcina,
osteopontina, entre outras proteínas. Só depois se dá a
mineralização da matriz orgânica, estimulada pela presença de
cálcio, vitamina D e fosfato.

DOENÇAS Hipogonadismo, hiperparatireoidismo, hipertireoidismo, hipercortisolismo,


ENDÓCRINAS hiperprolactinemia, diabetes melito (tipo I)

DOENÇAS Doenças inflamatórias intestinais, doença celíaca, cirrose biliar primária,


GASTROINTESTINAIS cirurgias de bypass gástrico, gastrectomias.

Artrite reumatoide, espondilite anquilosante, lúpus eritematoso sistêmico, doença


pulmonar obstrutiva crônica, acidose tubular renal, hipercalciúria idiopática, mieloma
OUTRAS
múltiplo, doença metastática, mastocitose sistêmica, desordens hereditárias do tecido
DOENÇAS CRÔNICAS
conjuntivo, osteogênese imperfeita, síndrome de imunodeficiência adquirida,fibrose
cística, síndrome de Ehles-Danlos

DESORDENS Deficiência ou insuficiência de vitamina D, deficiência de cálcio, ingestão excessiva de


NUTRICIONAIS álcool, anorexia nervosa, nutrição parenteral.

OUTRAS Transplante de órgãos, imobilização

Quadro 1. Causa secundária de Osteoporose


Fonte: Adaptada Hochberg MC, et al. Reumatologia. 6. ed. Rio de Janeiro:
Elsevier; 2016.

Alguns medicamentos podem estar associados à osteoporose secundária,


conforme o quadro abaixo (Quadro 2).
DROGAS ASSOCIADAS Á OSTEOPOROSE

Glicocorticoides

Inibidores de bomba de prótons


Anticonvulsivante:fenitoína, fenobarbital, valproato de sódio, carbamazepina

Inibidores de reacaptação de serotonina e antidepressivos tricíclicos

Inibidores de aromatase

Lítio

Antirretrovirais

Ciclosporina, tracolimo, micofenolato

Orlistate

Rosiglitazona e pioglitazona

Anticoagulantes: varfarina, heparia e heparinas não fracionadas

Contraceptivos: progesterona

Agonistas do GnRH

Imatinibe

Metotrexato

Diuréticos de alça

Quadro 2. Drogas associadas à Osteoporose


Fonte: Adaptada Hochberg MC, et al. Reumatologia. 6. ed. Rio de Janeiro:
Elsevier; 2016.

QUADRO CLÍNICO
• A osteoporose não apresenta sintomas, até que haja uma fratura.
• A fratura vertebral é a manifestação clínica mais comum na
osteoporose. A maioria destas fraturas é assintomática e
diagnosticada como achado incidental no raio X de tórax ou
abdominal (Figura 1).

• No exame físico, pode-se identificar diminuição da estatura,


aumento da cifose dorsal e retificação da lordose lombar, o que
pode comprometer a função pulmonar.
*As setas demostram o colapso das vertebras e desmineralização geral.

Figura 1. Fraturas por compressão vertebral toracolombar.


Fonte: Rosen.1

EXAMES COMPLEMENTARES

• Proteína Todos os pacientes com diagnóstico de osteoporose


devem ser avaliados para fatores de risco, antes do início do
tratamento para a osteoporose e fraturas, por meio de história e
exame físico minuciosos e exames laboratoriais mínimos.

• Os exames iniciais para investigação da osteoporose são: Exames


de rotina que incluem o Hemograma completo, Cálcio sérico,
fósforo e fosfatase alcalina além de TSH e T4livre, dosagem de
Vitamina D (25OH), creatinina, Calciúria de 24 horas, DMO e RX
lateral de coluna torácica e lombar.

• Os exames específicos vão depender da suspeita clínica.


• DMO está indicada nos seguintes casos:
• Todas as Mulheres com idade igual ou superior a 65 anos na pós-
menopausa; para mulheres com menos de 65 anos, realizar
naquelas que tenham fatores de risco para fraturas.
• Em homens que tenham manifestações clínicas de baixa massa
óssea como osteopenia radiográfica, história de fraturas com
baixo impacto e perda de 1,5 cm de altura e para aqueles que
também tenham fatores de risco para fraturas como: terapia
glicocorticoide a longo prazo, terapia de privação de andrógenos
para câncer de próstata, hipogonadismo, hiperparatireoidismo
primário e distúrbios intestinais
• Mulheres na perimenopausa, se houver história de fratura por
fragilidade ou causas conhecidas de osteoporose secundária.

• Fatores de risco para fraturas: terapia com glicocorticoides, baixo


peso corporal, fratura prévia, idade avançada, tabagismo atual,
consumo excessivo de álcool, osteoporose secundária e artrite
reumatoide.

• Os marcadores de remodelação óssea são úteis para avaliar o


efeito de medicamentos, do próprio envelhecimento ou de alguma
doença sobre as taxas de reabsorção e formação óssea, em um
determinado intervalo de tempo, mas não devem ser usados para o
diagnóstico da osteoporose nem para a escolha da medicação a ser
prescrita.

• Os mais usados são o CTx sérico, como marcador de reabsorção, e


o P1NP sérico, como marcador de formação óssea. Índices
elevados do CTx sérico podem indicar perda rápida de massa óssea
e apresentam correlação moderada como fator de risco para
osteoporose e fraturas, independentemente da densidade óssea. Seu
uso na prática clínica é limitado por sua alta variabilidade entre os
ensaios e pobre valor preditivo em um mesmo paciente.
• A OMS desenvolveu o Fracture Risk Assessment Tool (FRAX),
uma ferramenta que tem por objetivo calcular a probabilidade de
ocorrer, nos próximos 10 anos em pacientes com osteopenia, uma
fratura de quadril ou outra fratura osteoporótica relevante (definida
como uma fratura vertebral, quadril, antebraço ou úmero).

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Segue abaixo os critérios densitométricos da OMS para avaliar o grau da
massa óssea (tabela 3)
Um diagnóstico clínico de osteoporose pode ser feito na presença de:

• Fratura por fragilidade, principalmente na coluna, quadril, punho,


úmero, costela e pelve ou

• Escore T ≤-2,5 desvios-padrão (DPs) em qualquer local com base


na medição da densidade mineral óssea (DMO) por absorciometria
de dupla energia por raios X (DXA)
CATEGORIA Escore T

NORMAL Até -1,0

OSTEOPENIA Entre -1,0 e -2,5

OSTEOPOROSE Igual ou inferior a -2,5

Igual ou inferior a -2,5 associada a ou mais fraturas por fragilidade


OSTEOPOROSE GRAVE ESTABELECIDA
óssea

* Critérios estabelecidos para coluna lombar, colo do fêmur ou terço médio do rádio.

Quadro 3. Critérios Densitométricos da Organização Mundial de Saúde*.

Sugere-se intervalo mínimo de 12-24 meses para realização de novo


exame de desintometria em pacientes com baixa massa óssea.

Fonte: Rosen.1

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Exercício físico
• A atividade física contribui para a redução do risco de fratura de
duas formas: primeiro, porque a força biomecânica que os
músculos exercem sobre os ossos é capaz de aumentar a
densidade mineral óssea; assim, exercícios com ação da
gravidade parecem desempenhar importante papel no aumento e
na preservação da massa óssea. Segundo, porque a atividade
física regular pode ajudar a prevenir as quedas que ocorrem
devido à diminuição de força muscular e alterações do
equilíbrio.
• Exercícios físicos supervisionados, principalmente que envolvam
fortalecimento de quadríceps, e exercícios com suporte do
próprio peso devem ser recomendados para pacientes na pós-
menopausa com diagnóstico de osteoporose ou osteopenia, pois
estão associados à redução do número de quedas.

• O cálcio e a vitamina D
• As mulheres na pós-menopausa que estão recebendo cálcio
adequado, preferencialmente por meio da dieta
(aproximadamente 1200 mg por dia), especialmente com o
consumo de leite e seus derivados, não precisam tomar
suplementos de cálcio.
• Mulheres com ingestão alimentar inadequada devem tomar
cálcio suplementar (geralmente 500 a 1000 mg/dia), em doses
divididas na hora da refeição, de modo que a ingestão total de
cálcio (dieta mais suplementos) se aproxime de 1200 mg/dia.
• A suplementação de cálcio não deve exceder 500 a 600 mg por
dose independentemente da preparação, visto que o
fracionamento aumenta a absorção.
• Existe uma controvérsia considerável sobre os efeitos dos
suplementos de cálcio no risco de doenças cardiovasculares, que
não foram confirmados.
• Em pacientes com osteoporose pós-menopausa, recomenda-se
dosar as concentrações plasmáticas da 25(OH)D antes de se
iniciar o tratamento.
• Em adultos com deficiência de vitamina D (25[OH]D < 20
ng/mL), recomenda-se a dose de ataque de 7.000 UI/dia ou
50.000 UI/semana por oito semanas, seguida da dose de
manutenção entre 1.000 e 2.000 UI por dia.
• A exposição solar da face, tronco e braços antes das 10 horas ou
após as 16 horas por no mínimo 15 minutos, 2-4 vezes por
semana, também é recomendada, salvo contraindicação
dermatológica.

• Fumo, álcool e cafeína


• O tabagismo tem efeito tóxico direto sobre células ósseas, e
estudos populacionais têm mostrado que os fumantes
apresentam DMO menor, uma taxa anual de perda óssea maior e
uma prevalência maior de osteoporose do que os não fumantes.
• O tabagismo deve ser rigorosamente desencorajado, bem como a
ingestão excessiva de álcool.
• Uso excessivo de cafeína tem sido associado à diminuição da
absorção intestinal de cálcio e à baixa ingesta de cálcio na dieta.
Como a cafeína pode induzir hipercalciúria e tem sido associada
a um risco aumentado de fraturas, a cessação ou a redução da
ingesta de cafeína é necessária nas pessoas em risco.

b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
O tratamento medicamentoso está indicado para mulheres pós-
menopausa e homens 50 anos que apresentem:

• Fratura de vértebra ou quadril


• T- Escore = -2,5 em fêmur ou coluna após avaliação de causas
secundárias

• Baixa massa óssea (T-Escore entre - 1,0 e - 2,5 no colo do fêmur


ou coluna) e uma probabilidade em 10 anos de uma fratura de
quadril = 3% ou uma probabilidade em 10 anos de uma fratura
relacionada à osteoporose = 20% de acordo com o algoritmo
adaptado da OMS, conforme os fatores de risco.

• Terapia antirreabsortiva
• BISFOSFONATOS
• Entre os medicamentos que reduzem fraturas osteoporóticas, os
bifosfonatos são a classe com mais informações em termos de
segurança e efetividade, com estudos de até 10 anos de
seguimento publicados.
• São análogos sintéticos estáveis do pirofosfato. O seu efeito
principal consiste em suprimir a reabsorção óssea medida pelos
osteoclastos.
• Os efeitos adversos gastrointestinais frequentes são similares
para todos os bifosfonatos orais e não diferem em incidência do
grupo placebo. Fraturas atípicas de fêmur, apesar de raras, têm
sido associadas a uso prolongado de bifosfonatos.
• Tem sido referida a provável associação do tratamento com
bifosfonatos e a ocorrência de necrose avascular da mandíbula.
Trata-se de área de exposição óssea na região maxilofacial que
não cicatriza em um período de 8 semanas, após a identificação
por profissional de saúde e que ocorra em indivíduos
previamente expostos a bisfosfonatos e que não tenham recebido
radiação na região craniofacial. A prevalência é de
0,001%-0,1%. Antes de iniciar o tratamento com bisfosfonatos,
orienta-se boa higiene bucal e visitas odontológicas regulares;
entretanto, se o paciente necessitar de algum procedimento
invasivo como implante ou extração, deve-se atrasar a terapia
com bifosfonato por alguns meses até a cura completa da
mandíbula.
• Preocupações em relação à osteonecrose de mandíbula e fraturas
atípicas trouxeram à luz discussões sobre o tempo de tratamento,
considerando-se a duração de 5 anos de tratamento, o risco de
fraturas típicas em indivíduos com muito baixa massa óssea ou
que já sofreram fraturas osteoporóticas, permanecerá elevado, e
a suspensão da droga não parece ser melhor do que a sua
manutenção . Ainda não existe definição do tempo do chamado
“holiday”, e estudos mostram que o efeito protetor dos
bisfosfonatos é atenuado ao longo de 3-5 anos após sua
descontinuação (FLUXOGRAMA 1).
• Estudos sugerem que mulheres com osteoporose leve podem ser
capaz de suspensão do bifostonatos após 5 anos de terapia e
manter monitorização com DMO. Resumindo, não há, até o
momento, definição formal sobre o tempo de tratamento e o
intervalo sem droga.
• Os bisfosfonatos orais devem ser tomados em jejum, 30 a 60
minutos antes do café da manhã, com um copo cheio de água
para que tenham o máximo de absorção, e não deve deitar-se
após o uso do fármaco.

• Alendronato de sódio
• É um agente anticatabolizante que reduz a reabsorção óssea aos
valores existentes na pré-menopausa. Reduz em
aproximadamente 50% o risco de fraturas vertebrais, fraturas de
fadiga, de novas fraturas vertebrais, e de fraturas não vertebrais.
• As contraindicações incluem hipersensibilidade ao alendronato
ou a qualquer componente da fórmula, gravidez e lactação,
hipocalcemia, e insuficiência renal grave (DCE abaixo de 30
mL/min), bem como inabilidade dos pacientes para sentar ou
ficar em pé por pelo menos 30 minutos.
• Apresentação: alendronato 10 mg/dia ou alendronato 70
mg/semana, via oral.

• Risendronato de sódio
• O risedronato de sódio previne fraturas tanto em mulheres na
pós-menopausa como em homens com osteoporose estabelecida,
havendo evidência de sua efetividade na prevenção secundária
de fraturas vertebrais, não vertebrais e de quadril. Em pacientes
com perda de função renal preexistente, essa função deve ser
monitorada periodicamente, a cada 1-3 meses.
• Apresentação: risendronato 35 mg/semana, risendronato 150
mg/mensal, via oral.

• Ibandronato
• O ensaio BONE (oral Ibandronate Osteoporosis Vertebral
Fracture Trial in North America and Europeu) avaliou o efeito
de 2,5 mg de ibandronato oral e 20 mg em dias alternados
durante 12 doses a cada 3 meses. As fraturas clínicas vertebrais
também foram significativamente reduzidas; entretanto, as
fraturas não vertebrais, incluindo fraturas de quadril, não
sofreram redução em comparação com o placebo.
• Apresentação: ibandronato 150 mg/mensal via oral ou 3 mg por
via intravenosa a cada 3 meses.

• Ácido Zoledrônico
• É um bifosfonato intravenoso que foi aprovado em 2007. É uma
alternativa para pacientes que não toleram bifosfonatos orais. É
indicado para tratamento de osteoporose na pós-menopausa,
tratamento e prevenção de osteoporose induzida por
glicocorticoides em pacientes que deverão usar glicocorticoides
durante pelo menos 12 meses, tratamento da osteopenia em um
regime dose bianual, tratamento da doença de paget e aumento
da massa óssea de homens com osteoporose em um regime de
dose anual.
• Antes de iniciar o tratamento, o paciente deve ser avaliado
quando hipocalcemia, deficiência de vitamina D e insuficiência
renal.
• Estão frequentemente associados a uma reação de fase aguda
dentro de 24-72 h da infusão, que se apresenta por febre baixa,
mialgias e artralgias. O tratamento é realizado com antitérmicos,
que geralmente melhoram os sintomas e a recorrência nas
próximas infusões.
• Apresentação: ácido Zoledrônico 5 mg/EV anualmente

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO
FLUXOGRAMA 1.
Fonte: Radominski.9

• DENOSUMABE
• É um anticorpo monoclonal IgG2 totalmente humano, que se liga
seletivamente e com elevada afinidade ao RANKL e mimetiza o
efeito da osteoprotegerina no RANKL, reduzindo assim a
formação, função e sobrevivência dos osteoclastos, o que resulta
em diminuição da reabsorção óssea e aumento da densidade
óssea.
• É indicado para pacientes intolerantes ao bifosfonatos ou que
não respondem a outras terapias e naqueles com função renal
comprometida.
• O denosumabe pode ser utilizado na falha, intolerância ou
contraindicação aos bisfosfonatos orais e em situações especiais
em primeira linha de tratamento como em pacientes com função
renal comprometida.
• Antes de iniciar o tratamento o paciente deve ser avaliado
quando hipocalcemia, deficiência de vitamina D.
• Apresentação: Denosumabe 60 mg subcutânea a cada 6 meses.
• MODULADORES SELETIVOS DO RECEPTOR
ESTROGÊNICO
• Análogos do estrógenos, os moduladores seletivos do receptor
estrogênico (SERMs) mimetizam os estrógenos em alguns
tecidos e têm efeitos estrogênicos em outros. Representado pelo
Raloxifeno, é aprovado para prevenção e tratamento da
osteoporose em mulheres na pós-menopausa, diminuindo a
incidência de fraturas vertebrais, sem efeito sobre fraturas de
quadril.
• Diminui o colesterol sérico, não induz ao sangramento nem
proliferação endometrial e diminui consideravelmente a
incidência de câncer de mama.
• Os efeitos colaterais incluem: ondas de calor, câimbras em
membros inferiores, trombose venosa profunda e não deve ser
administrado em mulheres com risco elevado de acidente
vascular encefálico.
• Apresentação: Raloxifeno 60 mg/dia via oral.

• Terapia anabólica
• TERIPARATIDA
• Considerada uma droga anabólica, a teriparatida (PTH, humano
recombinante) está disponível nos Estados Unidos desde 2002.
O PTH é um polipeptídio de 84 aminoácidos secretado pelas
glândulas paratireoides em resposta a pequenas alterações no
cálcio sérico. Sua ação é estimular a reabsorção de cálcio nos
túbulos renais e a reabsorção óssea, mantendo as concentrações
de cálcio dentro de uma faixa estreita. A exposição crônica a
concentrações séricas elevadas de PTH (como visto com
hiperparatiroidismo primário ou secundário) resulta em
reabsorção óssea. No entanto, foi demonstrado que a
administração intermitente de PTH estimula a formação óssea
mais do que a reabsorção, pelo menos durante os primeiros 12
meses de tratamento.
• É recomendada para o tratamento da osteoporose pós-menopausa
em mulheres com alto risco de fraturas, com fraturas prévias ou
que tenham falhado ou sido intolerantes a outras formas de
tratamento para a osteoporose. Não está indicado para períodos
de tratamento superiores a dois anos. Pode ser indicada após
fratura atípica por uso de bisfosfonato.
• Efeitos colaterais incluem: câimbras, tonturas, hipercalcemia,
osteosarcoma.
• Apresentação: Teripatatida 20 mcg subcutânea/dia.

• ABALOPARATIDE
• É o análogo sintético da proteína relacionada ao PTH (PTHrP).
• Foi aprovada pelo FDA em 2017 para tratamento da osteoporose,
é indicada para pacientes com osteoporose grave e apresenta alto
risco de fratura (escore T de -3,5 ou menos, mesmo na ausência
de fraturas; escore T de -2,5 ou menos, mais uma fratura por
fragilidade); para pacientes intolerantes aos bifosfonatos ou que
tenham contra indicação relativas; para pacientes que tiveram
falhas no tratamento com outras terapias anteriores.
• Dose recomendada é 80 mcg SC/dia usado por, no máximo, 2
anos.

• ROMOSOZUMABE
• Romosozumabe é um anticorpo monoclonal antiesclerostina. A
esclerostina é produzida pelos osteócitos e inibe a formação
óssea. Conclui-se que a inibição da esclerostina deve melhorar a
função dos osteoblastos, melhorar a massa óssea e reduzir as
fraturas.
• Foi aprovado pela FDA em 2019 com base nos estudos, que
mostram uma redução de fratura vertebral e não vertebral.
• É indicado para pacientes com múltiplas fraturas por fragilidade,
pacientes com alto risco de fratura que não podem tolerar outras
terapias ou pacientes que falham em outras terapias.
• Não deve ser prescrito para mulheres com antecedentes ou
aumento de risco de IAM ou AVC.
• Dose recomendada: 210 mg SC 1 x por mês usado durante 1 ano.
Pacientes que usam agentes anabólicos devem usar um agente
antirreabsortivo (de preferência um bisfosfonato) após a
descontinuação, para preservar os ganhos na DMO alcançados
com o agente anabólico.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: MGR, 68 anos, sexo feminino, menopausa aos 50
anos, não fez reposição hormonal, esteve em consulta com
reumatologista para acompanhamento anualmente. Negava fraturas
prévias, uso de anticonvulsivantes ou heparina e relatava que ingeria
leite e seus derivados diariamente, mas não tinha hábito de exposição
solar. Trazia consigo uma densitometria atual e alguns exames de
sangue:
b. Exames complementares:
• Cálcio sérico - 8.5 mg/dL (vr- 8,4-10,2 mg/dL)
• Fósforo - 3,5 mg/dL (2,5-4,5mg/dL)
• Pth - 60 pg/dL (vr-15-65pg/dL)
• Vitamina d-25 OHD3 - 19 ng/dl (vr- 30-100 ng/dL)
• Densitometria óssea: L1-L4- -2,8 (T score)
Fêmur total -2,0 (T score)
c. Prescrição sugerida:

1. Risendronato 35 mg ---------- uso contínuo


• Tomar 1 cp em jejum com água, aguardar 40 minutos para
dejejum, durante os 40 minutos de espera, não voltar a deitar
2. Carbonato de cálcio 600 mg ----------- uso contínuo
• Tomar 1 cp após o almoço
3. Vitamina D3 50 000 UI - 8 cp
• cp 1 x por semana por 8 semanas
Obs.: Orientar e incentivar o aumentar da ingesta de leite e seus
derivados, exposição solar, 15 minutos antes das 10h ou depois das 16h.

REFERÊNCIAS
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osteoporosis in postmenopausal women. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em
17/06/2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/clinical-manifestations-
diagnosis-and-evaluation-of-osteoporosis-in-postmenopausal-women.
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Brasileira de Reumatologia. Barueri-SP: Manole; 2019.
3. Hochberg MC, Silman AJ, Smolen JS, Weinblatt ME, Weismns MH. Reumatologia. 6. ed.
Rio de Janeiro: Elsevier; 2016.
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Diagnóstico e Tratamento. 4. ed. Rio de Janeiro: Ac Farmacêutica; 2014. Cap. 21. p. 303-28.
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9. Radominski SC, Bernardo W, Paula AP, Albergaria B, Moreira C, Fernandes CE, et al.
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menopausa. Rev Bras Reumatol. 2017; 57(S2): S452-S66.
10. Frax-Who Fracture Risk Assessment Tool [Internet]. WHO. [Internet]; 2017. [acesso em 29
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vertebral fractures. Fracture Intervention Trial Research Group. Lancet. 1996; 348(9041):
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continuing or stopping alendronate after 5 years of treatment: the Fracture Intervention Trial
Long-term Extension (FLEX): a randomized trial. JAMA. 2006; 296(24): 2927-38.
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22. Pinheiro MM, Reis Neto ET, Machado FS, Omura F, Yang JH, Szejnfeld J, et al. Risk
factors for osteoporotic fractures and low bone density in pre and postmenopausal women.
Rev Saúde Pública. 2010; 44(3): 479-85
7.7
FIBROMIALGIA
Autora:
Lenita Adriana Mazzi Gaino

DEFINIÇÕES
• É uma síndrome dolorosa crônica, caracterizada por dor
musculoesquelética generalizada, com período de evolução maior
ou igual a 3 meses, para a qual nenhuma outra causa alternativa
pode ser identificada, acompanhada de outros sintomas como
fadiga, sono não reparador, entre outros. Geralmente leva a um
comprometimento na qualidade de vida do paciente. A prevalência
é de 0,2 a 5% da população mundial, e no Brasil, de 2 a 5%.
Acomete mais mulheres, entre 25 a 65 anos; no entanto, crianças e
adolescentes também podem ser acometidos.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

• É considerada decorrente de uma desordem no sistema nervoso


central (SNC), sendo denominada de síndrome de sensibilização
central, ou seja, há uma resposta anormal e inadequada do SNC
aos estímulos periféricos (“aumento de volume”), devido a uma
hiperexcitabilidade dos neurônios, causando uma dor amplificada e
que pode ser persistente, mesmo na ausência de estímulos. Os
estímulos podem ser calor, elétrico e auditivo. Pode estar associada
a gatilhos como: infecção, traumas, fatores estressores. Fatores
genéticos estão associados. Estudos mostraram que parentes de
primeiro grau de pacientes com fibromialgia têm chance 8,5 vezes
maior de terem a síndrome. Além disso, estudos de gêmeos
sugerem que o risco de desenvolver a fibromialgia é 50% genético
e 50% ambiental.

• A alteração no processamento da dor no SNC ocorre através


de:
• soma temporal da dor (pacientes com fibromialgia
experimentam aumentos maiores que o normal na intensidade da
dor, quando submetidos a estímulos repetitivos e curtos);
• diminuição da inibição endógena da dor: há uma redução no
controle inibitório nocivo difuso e incapacidade de inibir
estímulos sensoriais irrelevantes. Em pacientes com
fibromialgia, o giro do cíngulo anterior, área importante para
modulação descendente da dor, é disfuncional;
• neuropeptídios relacionados a dor e receptores: alterações nos
receptores opióides foram observadas (há uma regulação
positiva na periferia e redução no cérebro). Além disso, foi
observado um aumento da substância P, a qual está associada a
estado de dor crônica, no líquor de pacientes com fibromialgia,
bem como, foi observado baixo nível de GABA na ínsula,
neurotransmissor inibitório, ocorrendo a falta de ativação do
sistema de antecipação de alívio da dor;
• exames de neuroimagem têm demonstrado: resposta dolorosa
aumentada a estímulos dolorosos experimentais; alteração na
morfologia cerebral; alteração na função de neurotransmissores
(aumento do glutamato na ínsula, o que está associado a
menores limiares de dor, além de amígdala hiperativa, a qual é
responsável pelo grau de alerta a estímulos externos. É
importante lembrar que a amígdala e a ínsula integram o sistema
nociceptivo ao “ circuito cerebral de emoções”, o que justifica
uma grande resposta emocional dos pacientes com fibromialgia
e alteração na conectividade funcional em repouso: quando o
encéfalo está em “repouso”, ele entra em modo de manutenção;
no entanto, em pacientes com fibromialgia, esta rede neural
apresenta maior conectividade com a ínsula, o que desencadeia
evocação de experiências dolorosas, mesmo em “repouso”, e
colabora para déficits cognitivos, hipervigilância e
catastrofização).

• Mecanismos de dor periférica: trigger points miofasciais;


acredita-se que tenha componente central também. A avaliação de
nervos periféricos ainda não demonstrou resultados consistentes,
entretanto, estudos com biópsia de pele demonstraram neuropatia
de fibras finas (não se sabe se é um achado primário ou secundário
a um estado de dor crônica).

• Outros aspectos podem colaborar para o quadro clínico,


como: sono não reparador (pode levar a menor atividade de
sistemas descendentes de controle de dor, o que aumenta a
reatividade cardiovascular autonômica); alterações endócrinas
(parecem estar associadas à ativação constante de uma resposta ao
estresse, como alteração no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal;
alteração tireoideanas, hormônios sexuais e do hormônio de
crescimento, que podem colaborar com a fadiga) e alterações
psicológicas, comportamentais e sociais.

QUADRO CLÍNICO
• Dor: difusa, generalizada e crônica, em pontada, queimação, peso
ou dor de “sensação de cansaço”, de moderada a forte intensidade
e que pode estar associada a sensação de edema e parestesias,
geralmente acometendo antebraços e mãos. A dor pode ocorrer ao
simples toque da pele ou com o uso de roupas apertadas. O
paciente pode associar o início da dor a evento de estresse, como
trauma físico ou psicológico. O paciente sente-se pior do que
quando se deitou. Podem ser encontradas outras dores, como:
cefaleia (ocorre em mais de 50% dos pacientes; migrânea ou
tensional), dor de garganta, dor torácica, dor abdominal (síndrome
do intestino irritável/ sintomas de refluxo gastroesofágico)/
pélvica; sintomas de urgência urinária; olho seco; fenômeno de
Raynaud; disfunção de articulação têmporomandibular; síndrome
das pernas inquietas.

• Fadiga e distúrbios do sono: fadiga persistente, sensação de


esgotamento físico e/ou emocional; mínimas atividades podem
agravar a dor e a fadiga, ao passo que a inatividade também pode
potencializá-las. Rigidez matinal e sensação de cansaço, mesmo
com sono de 8-10 horas. O sono geralmente é leve, levando a
despertares frequentes e dificuldade para induzi-lo novamente, e
não reparador.

• Distúrbios cognitivos: problemas com atenção, memória,


concentração e dificuldade de fazer tarefas que exijam mudança
rápida de pensamento; déficits cognitivos subjetivos são mais
comuns que alterações mensuradas objetivas.

• Sintomas psiquiátricos: depressão e/ou ansiedade (estão presentes


em 30 a 50% dos pacientes no momento do diagnóstico),
transtornos obsessivos-compulsivos e síndrome do pânico.

EXAME FÍSICO
• É essencial fazer avaliação minuciosa do paciente, na tentativa de
buscar alterações sugestivas de fibromialgia ou outras doenças,
como neurológicas, reumatológicas.

• Ao exame físico, os pacientes apresentam bom estado geral, sem


sinais de comprometimento articular inflamatório, sem atrofia
muscular, sem alterações neurológicas, com boa amplitude de
movimentos, força muscular preservada. É encontrada dor à
palpação de múltiplos sítios de partes moles, particularmente nos
tender points (suboccipital, atrás do terço inferior do
esternocleidomastóideo, trapézio, supraespinhoso, epicôndilo
lateral, segunda junção costocondral, glúteo médio, trocânter maior
fêmur, joelhos).
EXAMES COMPLEMENTARES
• A fibromialgia não causa alteração laboratorial ou de imagem.
Geralmente são solicitados exames complementares, a fim de
excluir outras doenças, cujos sintomas se assemelham aos da
fibromialgia. Como diagnóstico diferencial, devemos citar:
síndrome da dor miofascial, síndrome da fadiga crônica, doenças
neurológicas (Parkinson, Miastenia gravis, esclerose múltipla,
neuropatias), doenças autoimunes (lúpus eritematoso sistêmico,
artrite reumatoide, polimialgia reumática, miopatia inflamatória,
espondiloartrites), endocrinológicas (hipotireoidismo,
hiperparatireoidismo), miopatia associada a estatina, infecções
(hepatites B e C, doença de Lyme, arboviroses, HIV). Podem ser
solicitados: hemograma completo, velocidade de
hemossedimentação e proteína C reativa na suspeita de doença
reumática, fator antinúcleo e fator reumatoide; suspeita de doença
da tireoide (TSH: hormônio tireoestimulante) e doença muscular
(CPK: creatinoquinase).

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• O Colégio Americano de Reumatologia (ACR) publicou, em
1990, os critérios de classificação, que combinam: dor difusa (dor
abaixo e acima da cintura, nos lados direito e esquerdo, e em pelo
menos um segmento da coluna) por pelo menos 3 meses e a
presença de 11 de 18 pontos dolorosos, previamente especificados,
com uma sensibilidade de 88,4% e especificidade de 81,1%. O
questionamento aventado foi que os pacientes com fibromialgia
têm múltiplos pontos dolorosos em outras localizações. Em 2010,
o ACR publicou critérios preliminares para o diagnóstico de
fibromialgia, modificados em 2011 (tabelas 1 e 2), em que se
eliminam os pontos dolorosos e criam-se 2 índices, o Índice de dor
generalizada (IDG), que varia de 0 a 19, e a Escala de gravidade
dos sintomas (EGS), de 0 a 12 (tabelas 1 e 2). O diagnóstico de
fibromialgia é sugerido quando: IDG≥ 7 + EGS ≥ 5 ou IDG entre 3
e 6 + ESG ≥ 9, sendo que o quadro doloroso deve estar presente há
pelo menos 3 meses, sem outra causa que justifique a dor.

Marque um X nas áreas onde teve dor nos últimos 7 dias

Área Sim Não Área Sim Não

Mandíbula direita Mandíbula esquerda

Ombro direito Ombro esquerdo

Braço direito Braço esquerdo

Antebraço direito Antebraço esquerdo

Quadril direito Quadril esquerdo

Coxa direita Coxa esquerda

Perna direita Perna esquerda

Região cervical Região dorsal

Tórax Região lombar

Abdome Total de áreas dolorosas

Tabela 1. Critérios diagnósticos e de gravidade da síndrome da fibromialgia


pelo ACR 2010/2011- Índice de dor generalizada (IDGI).
Fonte: Wolfe 59

Marque a intensidade dos sintomas, conforme você está se sentindo


nos últimos 7 dias (0: ausente; 1: leve; 2: moderado; 3: grave)

Fadiga (cansaço ao executar atividades) 0 1 2 3

Sono não reparador (acordar cansado) 0 1 2 3

Sintomas cognitivos (dificuldade de memória, concentração) 0 1 2 3

Você apresentou um destes sintomas nos últimos


seis meses? (0: ausente; 1: presente)
Cefaleia 0 1

Dores ou cólicas abdominais 0 1

Depressão 0 1

Tabela 2. Critérios diagnósticos e de gravidade da síndrome da fibromialgia


pelo ACR 2010/2011- escala de gravidade dos sintomas (EGS).
Fonte: Wolfe 59
• Em 2016, foi realizada nova revisão, retomando como critério
obrigatório a dor difusa e eliminando-se a necessidade de exclusão
de outras doenças. A Sociedade Brasileira de Reumatologia
estabeleceu algumas diretrizes para facilitar a aplicação dos
critérios: o diagnóstico de fibromialgia pode ser feito sem o uso de
critérios de 1990, entretanto, sua aplicação concomitante com os
critérios de 2010/2011 aumenta a acurácia; a presença de dor
difusa é fundamental; os pontos dolorosos podem ser úteis quando
avaliados em conjunto com outros distúrbios funcionais; distúrbios
do sono, alterações cognitivas e fadiga devem ser considerados;
para o diagnóstico da fibromialgia é recomendado o emprego dos
critérios ACR 2010/2011; a fibromialgia não deve ser considerada
diagnóstico de exclusão, mas sempre devem ser considerados
diagnósticos diferenciais; é sugerida a aplicação de instrumentos
para a mensuração de transtornos de humor.

TRATAMENTO
• Avaliação pré-tratamento (diagrama 1)
DIAGRAMA 1: AVALIAÇÃO PRÉ-TRATAMENTO
Fonte: Elaborado pela autora.

• Educação do paciente: é importante orientar sobre a doença,


tanto o paciente quanto seus familiares, explicar sobre a
patogênese incerta e que a doença existe, é real e não causa
deformidades, a importância da participação ativa do paciente no
seu tratamento, as diferentes abordagens terapêuticas; a
importância da higiene do sono (dormir em ambiente escuro,
silencioso e fresco; evitar estimulantes como televisão, celular,
computador, álcool, café, principalmente antes de dormir; tratar
fatores que possam interferir no sono); importância de tratar as
comorbidades.

a. TRATAMENTO NÃO MEDICAMENTOSO

• Exercícios: aeróbicos e de baixo impacto são recomendados


(caminhada, bicicleta, natação, hidroginástica). Tem efeito na dor,
função e sono. Para o paciente com fibromialgia, pode ser difícil
iniciar o exercício devido ao quadro álgico; portanto, se faz
necessário orientar o paciente a realizar uma atividade que ele
tenha mais afinidade, inicialmente de leve intensidade e curto
período, com aumento gradual. Também é útil, atividade de
alongamento e fortalecimento, como o pilates, além de outras,
como ioga e tai Chi Chuan. A combinação de modalidades parece
ser superior a uma isolada.

• Terapias psicológicas: terapia cognitivo-comportamental,


meditação, hipnose, terapia de comprometimento e aceitação,
intervenções de realidade virtual, biofeedback, terapia do espelho e
interpessoal breve.

• Acupuntura, quiropraxia e massagem: tem baixo nível de


evidência.
b. TRATAMENTO MEDICAMENTOSO

• Antidepressivos tricíclicos: melhora da dor, do distúrbio do sono


e da fadiga; amitriptilina, nortriptilina (nas doses de 10 a 75
mg/noite; efeitos adversos: boca seca, constipação, retenção de
fluidos, ganho de peso, dificuldade de concentração e perda de
libido), e ciclobenzaprina (esta para casos leves a moderados; não
tem efeito na depressão; alívio da dor, fadiga e sono; doses de 5 a
40 mg/dia).

• Inibidores de receptação de serotonina-norepinefrina:


duloxetina (dose inicial de 30 mg, que é aumentada a 60 mg/dia,
venlafaxina (dados limitados para fibromialgia; pode ser útil na
fadiga) e minalciprano.

• Anticonvulsivantes: pregabalina (25 mg até 450 mg/dia/ estudos


observaram melhora do sono, fadiga, dor, qualidade de vida e bem-
estar; efeitos adversos: tontura, sonolência, ganho de peso, boca
seca e edema periférico); gabapentina (dose inicial 100 mg/noite,
com aumento gradual conforme necessidade e tolerabilidade, até a
dose de 1200-2400 mg/dia; efeitos adversos mais comuns são
tontura, ganho de peso e sedação).

• Analgésicos: opioides, especialmente o tramadol, parecem ter


benefício.

• Distúrbios do sono podem ser controlados também com indutores


do sono (zolpidem de 5 a 10 mg) e o zopiclone (7,5 mg). O
clonazepam pode ser usado para síndrome das pernas inquietas e
mioclonias.

• Quadros refratários: avaliar a aderência ao tratamento (tomada


irregular, esquecimentos), comprometimento do paciente nas
atividades complementares (atividade física, cuidado com parte
emocional), investigar outras causas para dor, acompanhamento
conjunto com psiquiatra, psicólogo, combinação de classes
medicamentosas.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente sexo feminino, 45 anos, com quadro de
dores difusas (“do fio de cabelo ao dedão do pé”), EVA 10, insônia,
sono não reparador, presença de sintomas depressivos, cefaleia
tensional, esquecimentos, falta de concentração, sensação de dormência
pelo corpo, episódios de diarreia (já investigado pelo proctologista, que
definiu como síndrome do intestino irritável), quadro iniciado após
separação. Ao exame físico: sem sinais inflamatórios articulares, sem
alteração de força muscular, sem restrições às amplitudes de
movimentos. Cálculo: IDGI 19 e EGS 11. Como hipótese diagnóstica:
fibromialgia (o diagnóstico é clínico!!). Solicitaria exames
complementares com a finalidade de excluir outras possíveis causas
para o quadro (provas inflamatórias, TSH, hemograma completo, CPK).
b. Prescrição sugerida:

1. Explicar sobre o que é a doença, como ela funciona, que não causa
inflamação ou deformidades; explicar sobre possibilidade de
melhora
2. Estimular a higiene do sono
3. Fazer um “acordo” com paciente: deve participar ativamente do
tratamento. Incentivar a realização de atividade física (procurar
definir qual atividade a paciente tem mais afinidade; iniciar e
aumentar progressivamente)
4. Encaminhar para acompanhamento psicológico/psiquiátrico: para
ajuste da parte emocional
5. Considerando insônia, dores difusas, quadro depressivo: iniciaria
antidepressivo tricíclico (age adequadamente no sono, fadiga,
emocional e dor)

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28.
8.1
TRAUMATISMO
CRANIOENCEFÁLICO
Autores:
Breno Araújo Barbosa
Millena Nogueira Oliveira
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
• HIC (Hipertensão Intracraniana): Síndrome neurológica
definida como aumento sustentado da pressão intracraniana (PIC)
acima de 20 a 22 mmHg após um intervalo de > 5-10 minutos ou
por medidas seriadas maiores que 22 mmHg em qualquer intervalo
de tempo em posição de decúbito. Deve-se excluir as causas que
sabidamente aumentam a pressão intracraniana, como tosse,
posição de Trendelenburg, manobra de Valsalva.

• TCE (Trauma Cranioencefálico): Agressão ao parênquima


cerebral causada por trauma físico externo, com capacidade de
gerar alteração no nível de consciência, comprometimento das
atividades cognitivas, físicas e comportamentais.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O Quadro mostra as principais causas e etiologias de Hipertensão
Intracraniana (HIC).

CAUSAS DE HIPERTENSÃO INTRACRANIANA (HIC)


Neurológicas Trauma Hematoma subdural agudo, hematoma epidural agudo, contusão cerebral
CAUSAS DE HIPERTENSÃO INTRACRANIANA (HIC)

AVE (isquêmico ou hemorrágico), HSA (hemorragia subaracnóidea hunt-hess >3),


Vasculares
encefalopatia hipertensiva, fístula arteriovenosa craniana, trombose venosa cerebral

Meningites e encefalites de todas as etiologias, neurotuberculose,


Inflamatórias/Infecciosas
neurotoxoplasmose, neurocisticercose

Neoplásicas Cisto de aracnoide, higroma, metástases cerebrais, tumores primários do SNC

Outras Hipertensão intracraniana idiopática, siringomielia, craniossinostose

Intoxicação por opioides, CAD (cetoacidose diabética), falência hepática aguda,


Não Neurológicas encefalopatia hepática aguda, hiponatremia, síndrome de Reye, síndrome do
compartimento abdominal.

Quadro 1. Causas de Hipertensão Intracraniana.


Fonte : Elaborado pelos autores.

• Neurofisiologia: O SNC necessita de oferta de glicose e oxigênio


contínua, o que inviabiliza um metabolismo anaeróbio. O volume
de sangue para o encéfalo é cerca de 14% do débito cardíaco (=~
700 ml/min), sendo que 15% está no leito arterial, 40% venoso e
45% na microcirculação.

• Hemodinâmica cerebral: A fórmula de pressão de perfusão


cerebral (PPC) é definida pela equação PPC = pressão arterial
média (PAM) subtraído pela pressão intracraniana (PIC). A PPC é
diretamente proporcional ao fluxo sanguíneo cerebral (FSC), e esse
tem relação direta com pressão arterial (PA) menos a pressão
venosa (PV) dividido pela resistência vascular cerebral (RVC). A
PV varia muito pouco. A FSC depende de 4 fatores: PIC,
condições da parede vascular, viscosidade sanguínea e calibre dos
vasos cerebrais. Quanto maior for a área de atividade metabólica,
maior será o FSC. A PAM para perfundir o tecido cerebral é
mantido por uma autorregulação pressórica da resistência vascular
periférica (RVP). O Mecanismo de autorregulação da Circulação
Cerebral é determinante para manter a PPC. O fenômeno de
acoplamento é o equilíbrio entre o metabolismo e o FSC. As
injúrias encefálicas provocam desacoplamento, ou seja, pode haver
áreas de baixo metabolismo, porém com alto FSC (hiperemia) ou
com baixo FSC e alto metabolismo (oligoemia). Nas regiões de
queda do fluxo, o fenômeno da vulnerabilidade seletiva diz que
neurônios de regiões distintas respondem de maneira diferente em
situações de anoxia. Portanto, o sofrimento cerebral causa necrose
de neurônios formados mais recentemente na escala
ontofilogenética (isquemia heterogênea).

• Hipótese/Doutrina de Monro-Kellie: No século XVIII, dois


cirurgiões escoceses (Alexander Monro e Georgie Kellie)
postularam uma teoria de que o crânio é uma estrutura óssea rígida,
inelástica e com volume interno fixo; seus constituintes (sangue,
encéfalo e líquido cefalorraquidiano) criam um estado de equilíbrio
de volume. Logo, qualquer aumento do volume de um desses
constituintes requer a diminuição proporcional do volume de outro.
Em fases iniciais de aumento de volume, esse equilíbrio pode ser
atingido sem aumento significativo da PIC, ou seja, ainda em uma
condição de alta complacência cerebral; entretanto, a partir de
certo ponto, ocorre diminuição da complacência do sistema, e o
aumento discreto de volume de um dos constituintes gera um
aumento exponencial da PIC.

• Brain swelling: Ocorre pela liberação de glutamato e aspartato,


tendo como padrão a vasodilatação e a hipervolemia intracraniana,
que cursa com aumento da PIC.

• Edema cerebral: é classificado em 2 formas:


• Edema Citotóxico: Resultado de isquemia o que leva à
inativação da bomba de Na+/K+/ATPase da membrana e
tumefação celular por retenção de líquido, não responsiva a
corticoides.
• Edema vasogênico: Quebra da barreira hematoencefálica que
permite a saída de plasma para o parênquima encefálico, sendo
geralmente causado por processos neoplásicos e inflamatórios, e
estes respondem aos corticosteroides.

• Cascatas patológicas:
• Cascata despolarizadora: a queda da oferta de oxigênio
diminui a efetividade da bomba de Na+/K+ e ocorre redução do
potencial de ação, o que facilita a despolarização neuronal. Essa
é uma despolarização anóxica. A consequência são neurônios
em zona de penumbra, o que inicia uma acidose láctica
anaeróbia.
• Cascata vasodilatadora: O pH periarteriolar é regulador da
contratilidade da arteríola pré-capilar. A baixa do pH do líquido
extracelular, principalmente pelo acúmulo de CO2, promove
vasodilatação da arteríola pré-capilar (sistema de resistência) e
efusão de líquido do sistema vênulo-venoso e da
microcirculação (sistema de capacitância) para o tecido
encefálico. A vasodilatação, que a princípio possui um efeito
neuroprotetor, permite extravasamento de líquido para o tecido
cerebral, além de formar-se o brain swelling. A acidose altera a
autorregulação e aumenta o volume sanguíneo cerebral (VSC).
• Cascata bioquímica é subdividida em: subcascata inflamatória
e subcascata dos radicais livres. A acidose tecidual permite a
saída de íon K+ e entrada de Ca2+. Esse íon no meio intracelular
ativa a fosfolipase (FA2), que libera ácidos graxos poli-
insaturados, sendo um deles o ácido araquidônico, que sofre
ação da cicloxigenase (COX) e da lipoxigenase (LOX),
formando prostaglandinas (PG), tromboxane A2 (TA2) e
leucotrienos (LT). O TA2 faz vasoconstrição e agregação
plaquetária, que gera oclusão da microcirculação e, por
conseguinte, isquemia. A COX funciona adequadamente apenas
na presença de oxigênio. Com a baixa desse elemento, as células
da microglia liberam o superóxido, que, por sua vez, produz
radicais livres de oxigênio que oxidam as membranas celulares
por meio da peroxidação lipídica. Esses radicais, juntamente
com os leucotrienos, acabam com a devida função bioquímica
celular e a barreira hematoencefálica, o que causa edema
citotóxico e acentua o vasogênico, respectivamente, além de
anular a contratilidade da arteríola pré-capilar, o que aumenta o
inchaço encefálico hipervolêmico. As alterações metabólicas e
iônicas que levaram à morte celular na cascata bioquímica
provocam a subcascata inflamatória, que, através das
prostaglandinas, apresenta quimiotaxia para leucócitos, que
liberam mais citocinas inflamatórias e óxido nítrico, gerando
aumento da permeabilidade capilar e edema vasogênico.
Provocam também a subcascata dos radicais livres, causada pelo
metabolismo anaeróbio que consome ATP, que libera adenosina
como subproduto ao meio, agravando a vasodilatação.
a) CURVA DE LANGFITT

• Primeira fase: Fase compensatória em que o aumento do VSC


não é capaz de aumentar a PIC acentuadamente, pois o líquor é
extruído para fora e não ocorre aumento da PIC, não há
vasodilatação isquêmica, mantendo a PPC. Uma reação do
organismo é um aumento da PAM para que haja uma maior PPC.
Esse mecanismo é chamado de reflexo de Cushing (um mecanismo
tampão), no qual a autorregulação se encontra preservada.

• Segunda fase: Fase de descompensação, o início da curva


exponencial ascendente positiva. As pequenas elevações de
volume implicam elevações acentuadas da PIC, a qual diminui a
PPC através de redução do FSC por compressão do leito vascular e
saída do sangue para fora do crânio (edema oligoêmico), o que
desencadeia isquemia e vasodilatação, manifestando-se
clinicamente como sinais de HIC. Surge no traçado do
monitoramento onda A patológica, que surge através de variações
do VSE por meio da vasodilatação. Entretanto, o reflexo de
Cushing consegue manter a PPE por aumento da PAM e a
autorregulação está ainda presente.

• Terceira fase: A fase em que a elevação da PIC é exponencial


pelo mecanismo da cascata de vasodilatação, a isquemia gera
vasodilatação isquêmica que causa aumento hipervolêmico da PIC
e que gera mais isquemia e vasodilatação, iniciando-se novamente
a cascata vasodilatadora. O resultado é um decréscimo na PPC,
pois o reflexo de Cushing não é mais capaz de reverter o processo,
e a autorregulação está gradualmente parético, por ação de acidose
progressiva.

• Quarta fase: Na fase da parada circulatória, tem-se um estado


hipervolêmico da PIC, o VSC é máximo, em que há uma ausência
total da autorregulação, a arteríola pré-capilar encontra-se plégica e
há extravasamento do sistema vênulo-venoso e da microcirculação.
A PIC iguala-se à PAM, fazendo que o FSC diminua
consideravelmente, o que deixa a PPC=0. Representa a morte
encefálica, devido à formação de isquemia global, e os neurônios
não suportam hipóxia. Logo depois, há uma queda da PIC, PPC e
PAM de maneira sincrônica até a parada cardiorrespiratória.
A figura 1 mostra a variação de complacência e elastância.

Figura 1. dV: Variação do volume; dp: Variação da Pressão.


Fonte : Chaddad-Neto FE, Rabelo NN, Santos BFO, Reguin Neto M,
Oliveira E. Traumatismo Craneoencefálico. Manual de Neurointensivismo
da Beneficência Portuguesa. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2014.
EXAMES COMPLEMENTARES
• Tomografia Computadorizada de Crânio (TC de Crânio):
Essencial no contexto de TCE.

• Punção Liquórica: Pressão de abertura > 18 cmH2O:


Encontrado em meningites criptocócicas (Criptocococose) em
pacientes imunossuprimidos ou HIC idiopática.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O TCE tem várias classificações, entretanto, a mais utilizada e prática é a
Escala de Coma de Glasgow.

PARÂMETROS RESPOSTA OBSERVADA PONTUAÇÃO


Espontânea 4

Ao estímulo verbal 3
ABERTURA
OCULAR
Ao estímulo doloroso 2

Ausente 1

Orientada 5

RESPOSTA Confusa 4
VERBAL
(MELHOR Palavras Inapropriadas 3
RESPOSTA)
Sons incompreensíveis 2

Ausente 1

Obedece a comandos 6

Localiza a dor 5
RESPOSTA
Retira o membro à dor 4
MOTORA
(MELHOR
Flexão anormal (Decorticação) 3
RESPOSTA)
Extensão anormal (Descerebração) 2

Ausente 1

Ausente -2
REAÇÃO
Unilateral -1
PUPILAR
Reativa Bilateral 0

Tabela 1. Escala de Coma de Glasgow.


Fonte : ATLS – Advanced Trauma Life Support 10ª Edição

A classificação tomográfica de Marshall é baseada de acordo com


achados na TC de Crânio e avalia o prognóstico do paciente.

CATEGORIA DEFINIÇÃO
Injúria difusa I (sem patologia visível) Sem patologia intracraniana visível na tomografia

Cisternas presentes, com desvio de linha média entre 0-5 mm, sem lesões
Injúria difusa II
> 25 mL

Cisternas ausentes ou comprimidas, com desvio de linha média entre 0-5


Injúria difusa III (edema difuso)
mm, sem lesões > 25 mL

Injúria difusa IV (desvio da linha média) Desvio de linha média > 5 mm, sem lesões > 25 mL

Lesão evacuada V Qualquer lesão evacuada cirurgicamente

Lesão não evacuada VI Lesão > 25 mL não evacuada cirurgicamente

Tabela 2. Classificação Tomográfica de Marshall.


Fonte: Brain Trauma Foundation 4th edition

TRATAMENTO
a) Objetivos do Tratamento: Prevenção de lesões neurológicas
secundárias e morte neuronal.

• MONITORIZAÇÃO
• Suporte Neurológico: O cuidado neurológico na unidade de
terapia intensiva se baseia em 4 avaliações: clínica, hemodinâmica,
metabólica e neurofuncional.

• Sinais Vitais: Pressão Arterial, Frequência Cardíaca,


Temperatura, Saturação periférica de Oxigênio, Capnografia,
débito urinário e nos pacientes com Glasgow < 13, ou seja,
moderado a grave, a monitorização da pressão intracrania (PIC) é
um indicador útil e esses são parâmetros básicos do paciente
neurocrítico.
• Neurológica: exames físicos e neurológicos seriados pela equipe
multidisciplinar e Escala de Coma de Glasgow - ECG (Glasgow
come scale- GCS), e durante essa avaliação devemos parar a
sedação e o bloqueio neuromuscular.

• Hemodinâmica: PPC, PAM, PIC, RVC, FSC – esses 4 parâmetros


são aferidos por meio de uma pressão arterial invasiva (PAI).

• Doppler transcraniano (DTC): Estima a PIC por meio da


pulsatilidade da artéria cerebral média (ACM), a qual tem a sua
forma influenciada pela PAM, PIC, complacência vascular,
postura, ritmo cardíaco e débito cardíaco. Ultrassonografia do
nervo óptico (aferição indireta da PIC pelo diâmetro da bainha do
nervo óptico).

• Metabólica: Avalia o interstício cerebral com aferição de


substâncias essenciais para o seu metabolismo e se dá por meio da
saturação de bulbo de jugular (SjO2). Novas técnicas de avaliação
metabólica, como: PO2 cerebral (por meio de eletrodos de Clarke
modificados), Oximetria cerebral e microdiálise cerebral.

• Neurofuncional: Eletroencefalograma (EEG) – consegue


evidenciar redução de atividade metabólica cerebral em área
isquêmica. Entretanto, é dependente do especialista para análise.
Os Potenciais Evocados (PE) registram atividade elétrica do SNC
determinada por algum estímulo (elétrico, auditivo ou visual,
motor).

• MÉTODOS DE AFERIÇÃO DA PIC


Indicados em paciente com TCE e com ausência de lesões incompatíveis
com a vida, e deve-se encontrar com ECG <= 8 associados à TC de Crânio
normal somado com 2 dos seguintes critérios: Idade > 40 anos, pressão
sistólica < 90 mmHg ou descerebração. Ou TC de Crânio alterada
(Hematoma, Contusão, Inchaço cerebral, Herniação ou cisternas da base
apagadas). Os pacientes eleitos para monitorização da PIC devem receber
uma aferição da pressão arterial invasiva (PAI).
As complicações mais frequentes são infecção, hemorragia e obstrução.
A taxa de infecção é variável de acordo com sua posição e começa a
aumentar a partir do 5º dia de monitorização.
No Brasil, está em desenvolvimento uma forma de aferição da PIC não
invasiva por meio da expansão do crânio durante os batimentos cardíacos.
O quadro 2 mostra os métodos de aferição de PIC
Drenagem
Posição Precisão Recalibração
de LCR
Possui a maior precisão comparado aos outros
Intraventricular Sim Sim
métodos

Moderada precisão nos


Intraparenquimatoso Não Não
primeiros 3-4 dias

Subdural Não Pouco preciso Não

Subaracnoide Não Pouco preciso Sim

Quadro 2. Cateteres de Aferição da PIC.


Fonte : Chaddad-Neto FE, Rabelo NN, Santos BFO, Reguin Neto M,
Oliveira E. Traumatismo Craneoencefálico. Manual de Neurointensivismo
da Beneficência Portuguesa. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2014.

b) Ondas Intracranianas
As ondas pressóricas intracranianas geradas pelo polígono de Willis e
pelo parênquima encefálico possuem três componentes:

• P1 (onda de percussão): formada pelo pulso arterial sistólico, a


mais alta das ondas;

• P2: “tidal wave”, complacência cerebral. Encontra-se aumentada


em situações de baixa complacência;

• P3: a onda dicrótica que representa o início da diástole cardíaca.


Nas situações em que ocorre vasoconstrição, as ondas P2 e P3 se
igualam à P1.
MANEJO DO PACIENTE COM TCE – SUPORTE GERAL
• Suporte Neurointensivo: Quando o paciente estiver estável e não
necessitar de intervenção cirúrgica, ele deve ser encaminhado para
a unidade de terapia intensiva. Caso não haja esse serviço, o
paciente precisa ser transferido de imediato para a unidade de
referência. O objetivo principal é a prevenção de lesões
secundárias (primeiros 5 a 7 dias), seja por isquemia, seja hipóxia
em um encéfalo já com comprometimento. A terapêutica clínica
visa à síndrome de HIC para manter uma boa PPE.

• Posicionamento: Cabeceira elevada a 30º, posição neutra e


centralizada, a fim de facilitar o retorno venoso (medida que
melhora o sistema de capacitância), auxiliando o controle da PIC.
Evitar acesso venoso central em jugulares e subclávias para que
não atrapalhe o retorno venoso.

• Normovolemia: A hipovolemia causa uma queda no FSC, o que


pode causar lesão neurológica secundária. A hipotensão nunca
deve ser aceita no doente politraumatizado e com TCE. A PAM
deve ser maior do que 65 mmHg, e, se necessário, usar droga
vasoativa precocemente.

• Suporte de Oxigênio: Saturação entre 90-92%. O uso de pressão


expiratória positiva em ventilação mecânica não tem
contraindicação em pacientes hipoxêmicos, desde que não piore o
retorno venoso.

• Normocapnia: A hipercapnia é prejudicial por diminuir o pH


periarteriolar, o que, por conseguinte, causa vasodilatação cerebral
e consequente aumento da PIC. Alvo de PaCO2: 35-40 mmHg.
Monitorização com capnografia contínua (ETCO2).

• Normotermia: Não permitir hipertermia. O aumento da


temperatura corporal é deletério para o paciente neurocrítico. A
temperatura deve estar entre 36-37 ºC. As medidas para manter a
normotermia são variadas. Pode-se fazer uma temperatura do
ambiente controlada, exposição do paciente, uso de colchão
térmico, compressas geladas (evitar o contato direto com a pele),
infusão de solução endovenosa gelada, manipulação de
temperatura de banho. Embora muito usado na prática clínica, o
uso de antitérmicos, como paracetamol e dipirona, não apresenta
um efeito clínico importante.

• Controle Glicêmico: Manter a glicemia na faixa de 140-180


mg/dL.

• Sedação e Analgesia: Analgesia adequada poder ser alcançada


com dipirona e opioides fortes (morfina e fentanil). A sedação
pode ser necessária na fase aguda, como meta um RASS 0 a -2, e
pode ser usado o propofol ou midazolam. Sedação profunda é
indicada apenas na presença de HIC.

• Controle da natremia: Manter sódio entre 135-145 mEq/L. É


contraindicado o uso de soluções hipotônicas nesses pacientes para
não causar hiponatremia dilucional. A natremia deve ser seriada e
corrigida o mais rápido possível. O uso de coloides(albumina) foi
associado a maior mortalidade em pacientes com TCE quando
comparada com solução salina e é proscrita no paciente com TCE.

• Nutrição: Preferencialmente enteral e que o paciente tenha um


alvo calórico entre o 5º-7º dia pós-TCE.

• Hemoglobina: Manter hemoglobina de 7 g/dL, o que é


preconizado no paciente crítico.

• Anticonvulsivantes profiláticos: Para pacientes com ECG < 10 e


nos primeiros 7 dias pós-injúria, hematomas (subdural, epidural,
intraparenquimatoso), contusão cerebral, trauma penetrante,
fraturas com afundamento de crânio e crises epilépticas nas
primeiras 24 horas pós-TCE. A droga de escolha é a fenitoína
(dose de ataque 15-20 mg/kg EV seguida de manutenção de 100
mg 8/8).
• Profilaxia para TEV: Heparina não fracionada ou de baixo peso
molecular após 48 horas com hematomas estáveis em TC de crânio
seriadas. Na fase aguda, o uso de anticoagulantes é contraindicado
devido à maior chance de sangramento. Por isso, recomenda-se uso
de agentes mecânico como o balão pneumático intermitente.

• Profilaxia de Úlcera de Estresse: Uso de IBP ou antagonista-H2


durante a fase aguda do TCE.
Mecanismo de Início de
Droga Apresentação Dose Infusão Duração
Ação Ação

Sedação:
Bloqueador de (10 mg/mL):
canais de sódio 10 mg/mL 0,5-1,0 mg/kg EV
15-45 5-10
PROPOFOL e potencializa (frasco-ampola com Diluição (10 mg/kg)
segundos minutos
receptores do 50 ou 100 mL ou 20 mL + 230 mL de
GABA. seringa pronta com SG5% (concentração:
50 mL) 800 mcg/mL)
20 mg/mL Velocidade de
(frasco-ampola com infusão:
50 mL ou seringa 0,3-4,0
pronta com 50 mL) mg/kg/hora
1 mg/mL 20-600 mcg/kg/h
Agonista dos (frasco-ampola com 5 Diluição:
receptores do mL) e 5 mg/mL (50 mg/mL)
60-90 15-30
MIDAZOLAM GABA. (frasco-ampola com 3 30 mL + 120 mL SG
segundos minutos
Ativador de ou 10 mL 5%
canal de cloreto ou
SF 0,9%

Tabela 3. Sedativos utilizados na Sequência Rápida de Intubação


Fonte: Chaddad-Neto FE, Rabelo NN, Santos BFO, Reguin Neto M,
Oliveira E. Traumatismo Craneoencefálico. Manual de Neurointensivismo
da Beneficência Portuguesa. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2014.

• MEDIDAS DE PRIMEIRA LINHA PARA TRATAMENTO


DA HIPERTENSÃO INTRACRANIANA

• Sedação: Diminuir a taxa metabólica cerebral e obter um RASS


-5 (sedação profunda). Propofol 3-5 mg/kg/h. Esse sedativo é o
mais usado nos centros de terapia intensiva por diminuir o
metabolismo neuronal e tem efeito neuroprotetor. Essa droga tem
meia-vida curta e um despertar mais rápido do que os
benzodiazepínicos. Possui um efeito hipotensor que pode ser
contrabalanceado pela reposição volêmica; entretanto, se persistir a
hipotensão, deve-se usar drogas vasoativas para atingir a PAM
alvo. Alternativa ao Propofol é o Midazolam na dose 0,05-2
mg/kg/h.

• Analgesia: Analgésico de eleição é o Fentanil 25-100 mcg/h.


Droga Mecanismo de Ação Apresentação Dose Infusão Início de Ação Duração

Agonista seletivo de 50 mcg/mL 3 mcg/kg peso


30-60 <1-2
Fentanil receptores (frasco-ampola com 2, Manutenção: 30-60 minutos
segundos minutos
Mi opioide. 5 ou 10 mL) 25-100 mg/kg/h

Tabela 4. Analgésico utilizado na Sequência Rápida de Intubação


Fonte: Chaddad-Neto FE, Rabelo NN, Santos BFO, Reguin Neto M,
Oliveira E. Traumatismo Craneoencefálico. Manual de Neurointensivismo
da Beneficência Portuguesa. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2014.

• Pressão Arterial Média: Manter uma PPC de 60-70 mmHg. Usar


solução fisiológica (SF 0,9%). Em pacientes em que não for obtida
a PAM alvo, é necessário o uso de drogas vasoativas, sendo a
droga de escolha a noradrenalina.

• Drenagem Ventricular Externa: Há controvérsias quanto ao seu


uso devido ao fato de que no TCE os ventrículos e cisternas estão
edemaciados, o que dificulta a patência da DVE.

• MEDIDAS DE SEGUNDA LINHA PARA TRATAMENTO


DA HIPERTENSÃO INTRACRANIANA
Se as medidas de primeira linha não atingiram o alvo de PIC ou se o
paciente apresentou piora como perda do reflexo pupilar, anisocória, déficit
neurológico focal ou síndrome de herniação cerebral, deve-se lançar mão das
medidas de segunda linha e considerar auxílio da Neurocirurgia e exames de
imagem.
• Sedação: Aumentar a sedação e associar com um bloqueador
neuromuscular não despolarizante (cisatracúrio em bolus 0,15
mg/kg e infusão contínua de 0,5-1,0 mg/kg/h). Vale ressaltar que o
uso de bloqueador neuromuscular não deve ser usado em todos os
pacientes.
Mecanismo de Início de
Droga Apresentação Dose Infusão Duração
Ação Ação

Intermitente: 0,15-0,2
mg/kg a cada 40-60
min;
Bloqueador BIC: 0,03-0,6
2 mg/mL (ampolas 30-60 <1-2
Cisatracúrio neuromuscular não mg/kg/hora 30-60 minutos
com 5 mL ou 10 mL) segundos minutos
despolarizante Diluição: 1 mL + 20
Ml SF 0,9%; SG 5%
(concentração 0,1
mg/mL)

Tabela 5. Bloqueador Neuromuscular


Fonte: Chaddad-Neto FE, Rabelo NN, Santos BFO, Reguin Neto M,
Oliveira E. Traumatismo Craneoencefálico. Manual de Neurointensivismo
da Beneficência Portuguesa. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2014.

• Soluções Hiperosmolares: NaCl 20% dose 0,5 mL/kg em 10


minutos com alvo de Na+: 145-155 mEq/L. Outra opção é o
Manitol 20% (0,25 g/kg – 1 g/kg) em bolus. Nunca em
gotejamento lento.

• Hiperventilação: Hiperventilação transitória – alvo de PaCO2 30-


35 mmHg. Essa estratégia visa obter um aumento do pH
periarteriolar e uma vasoconstrição diminuindo o FSC.

• HIPERTENSÃO INTRACRANIANA REFRATÁRIA


• Craniectomia Descompressiva: De preferência bifrontal ou
hemicraniana unilateral é realizada retirando parte do crânio para
escape do alto volume intracraniano e assim diminuindo a PIC, o
que permite uma expansão do encéfalo. É indicado para aqueles
pacientes que são refratários às outras medidas clínicas,
principalmente nos pacientes com PIC sustentada maior que 25
mmHg por mais de 1h dentro de 12 horas. A queda da PIC provoca
um desvio para a esquerda da curva de Langfitt. A craniectomia
isolada provoca uma queda em até 15% do valor da PIC, e quando
associado à abertura da dura-máter é capaz de reduzir em até 70%,
resultando em uma melhora na PPC. Há estudos que comprovaram
o benefício do procedimento cirúrgico precoce sobre o tratamento
conservador em lugares que não haja condições de monitorização
da PIC.
O quadro 3 resume as condutas no manejo cirúrgico da HIC Refratária
MANEJO CIRÚRGICO DA HIC REFRATÁRIA

Aumento do volume; presença de sintomas;


desvio da linha média > 5 mm ou espessura
Hematoma Extra/Epidural Craniotomia.
maior que 1,0 cm; volume superior a 30 mL;
localização em fossa posterior e média.

Hematoma com espessura maior ou igual a 1 Esvaziamento do hematoma


Hematoma Subdural Agudo cm; desvio da linha média maior ou igual a 5 com ou sem craniectomia
mm. descompressiva.

Hematoma com espessura maior ou igual a 1


Trepanação e colocação de
Hematoma Subdural Crônico cm; desvio da linha média maior ou igual a 5
dreno subdural.
mm.

Volumes maiores que 30 mL em espaço Esvaziamento do hematoma


Hematoma Intraparenquimatoso supratentorial; para temporais baixos, pode-se com ou sem craniectomia
considerar 20 mL e 15 mL infratentorial. descompressiva.

Tumefação difusa Inchaço grave. Craniectomia descompressiva.

Quadro 3. Manejo Cirúrgico da HIC Refratária


Fonte: Chaddad-Neto FE, Rabelo NN, Santos BFO, Reguin Neto M,
Oliveira E. Traumatismo Craneoencefálico. Manual de Neurointensivismo
da Beneficência Portuguesa. 2 ed. São Paulo: Atheneu; 2014.

• Hipotermia: Promove diminuição do metabolismo cerebral;


assim, diminui o consumo de oxigênio e glicose pelo tecido
neuronal. Porém, há aumento na produção de CO2. Dessa forma,
causa acidose metabólica, hipocalemia, arritmias e bradicardia,
coagulopatia.
• Coma barbitúrico: Diminuição da PIC por suprimir o
metabolismo e fluxo sanguíneo para o parênquima cerebral.
Efeitos colaterais: hipotensão, queda da PPC, efeito “ressaca” por
deposito em tecido adiposo. Essa medida deve ser discutida, pois
tem baixos níveis de evidência quanto à melhora do quadro. A
droga de escolha é o Tiopental.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: paciente do sexo masculino, motoboy, 25 anos, peso:
70 kg, vítima de acidente automobilístico (carro x moto), arremessado a uma
distância de 5 metros do local da colisão e com impacto em poste, há
aproximadamente 1 hora. Foi solicitado o resgate pelo SAMU. O paciente
encontrava-se desacordado, não verbalizava e não obedecia a comandos.
b) Avaliação Primária: A: Estabilização da coluna cervical com
prancha rígida e colar cervical, estabelecida via aérea definitiva por IOT
devido Glasgow 3, B: FR: 22 irpm, som claro pulmonar, murmúrio vesicular
fisiológico sem ruídos adventícios, C: FC: 100 bpm, PA: 110X70 mmHg,
sem hemorragias externas visíveis, D: Pupilas midriáticas, sem motricidade
distal, E: Normotermia, presença de escoriações pelo corpo.
c) Exame Complementares: TC de Crânio evidenciando cisternas
ausentes ou comprimidas, com desvio de linha média de 3 mm, sem lesões >
25 mL.
d) Prescrição sugerida:
1. Dieta Zero
2. Reposição volêmica – Manter euvolemia
3. Intubação Orotraqueal – Glasgow <8
4. Fentanil 15 ml (3 amp. 5 mL) + 250 ml SF 0,9% EV 8/8h
5. Propofol 14 mL + 236 ml SG 5% EV
6. Dipirona 1 mL + AD EV 6/6h se febre (T > 37,8ºC)
7. Elevação da Cabeceira 30-45º
8. Profilaxia de TEV (Compressor Pneumático Intermitente)
9. Controle glicêmico (140-180 mg/dL)
10. Controle da Natremia (Na: 135-145 mEq/L)

DICAS DO ESPECIALISTA
• O TCE é uma das principais causas de HIC.
• Para pacientes com TCE leve sem presença de fatores de risco e
assintomáticos podem ser prescritos analgésico e retorno se piora
do quadro.

• No paciente com TCE moderado é necessária a observação em


Unidade de Pronto-Socorro para avaliação da Escala de Coma de
Glasgow e exame físico neurológico seriado. Se for observada
alguma alteração, é necessário solicitar uma TC de Crânio.

• No paciente com TCE grave é necessária uma TC de Crânio


imediata e suporte clínico para Hipertensão Intracraniana.

• Preferir o Propofol como sedativo em relação ao Midazolam, pois


os estudos comparativos apresentaram melhor benefício do
Propofol.

• A Solução Salina Hipertônica apresenta melhores benefícios em


relação ao Manitol, pelo fato de o manitol causar uma diarreia
osmótica e um controle da osmolaridade

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8.2
TRAUMATISMO RAQUIMEDULAR
Autores:
Breno Araújo Barbosa
Millena Nogueira Oliveira
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
• TRM (Traumatismo Raquimedular): Traumatismo
raquiomedular (TRM) é a lesão da medula espinhal que provoca
alterações, temporárias ou permanentes, na função motora,
sensibilidade ou função autonômica. É caracterizado por uma
agressão, na maioria das vezes de força mecânica, que acarreta
lesão anatômica ou funcional à coluna vertebral e/ou à medula
espinhal ou raízes nervosas em qualquer dos seus segmentos.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
CAUSAS DE TRM: Acidentes automobilísticos (30%), queda de
altura (20%), acidente por mergulho em água rasa (frequentes no verão)
(21%), ferimentos por arma de fogo (12%), acidentes esportivos (2%) têm
sido as principais causas de traumatismo raquimedular. O TRM ocorre
predominantemente em homens na proporção de 4:1, na faixa etária entre 15
e 40 anos. No Brasil, estimam-se 11 mil vítimas de TRM anualmente. O
coeficiente de incidência no Brasil é de 71 casos/milhão por ano. A região
Nordeste se destacou com 91 casos/milhão de habitantes, e a região Sul com
a menor incidência, 38 casos/milhão de habitantes.

• Primário: as lesões primárias estão relacionadas ao trauma


mecânico sofrido pelo paciente. Esse tipo de lesão caracteriza-se
pela transferência de energia cinética para o canal medular no
momento do trauma provocando perda da transmissão
neurofisiológica, causando paralisia aguda. Pode ser por ruptura
completa ou incompleta nos axônios, células gliais e vasos
sanguíneos. As causas mais comuns de lesão raquimedular
primária são hiperflexão, hiperextensão, carga axial, carga lateral e
ferimentos penetrantes.

• Secundário: as lesões secundárias são tidas por alterações


bioquímicas e celulares como resultado da isquemia pós-
traumática causada pela redução de fluxo sanguíneo para a área
lesada, envolvendo hipóxia, alteração iônica intracelular, aumentos
de radicais livres, peroxidação de lipídios, edema, apoptose neural
e outros eventos bioquímicos autodestrutivos que podem durar
horas ou dias, levando à disfunção e morte celular. Essa perda da
microcirculação pode se estender por uma distância considerável
proximal e distal ao local da lesão. Ademais, é durante esse
momento da lesão que o ambiente celular se torna inóspito para a
regeneração e remielinização. A lesão secundária pode ser dividida
em subfases para melhor compreensão:
• Imediata: refere-se às duas primeiras horas após o trauma e se
caracteriza por morte neuronal e glial acompanhada de choque
medular e perda motora do nível da lesão e abaixo. Morte celular
por excitotoxicidade (liberação excessiva de glutamato).
Aumento na expressão de TNF-alfa e IL-1beta.
• Aguda: 2 a 48 horas após o TRM. Aumento da área
hemorrágica, resultando em uma isquemia. Permeabilidade da
barreira hematoespinhal, estresse oxidativo, excitotoxicidade,
apoptose.
• Subaguda: entre a segunda e terceira semana após o trauma e
dura aproximadamente seis meses. Caracterizada pela formação
da cicatriz glial. Infiltração de macrófagos. Estabilização da
barreira hematoespinhal.
• Intermediária: maturação da lesão medular, início da formação
dos cistos.
• Crônica: a partir de seis meses do trauma. Cicatriz glial bem
formada e presença de cistos/ cavidades na medula espinhal
(resultados de restos de tecido neural sendo uma barreira física
que impede a regeneração axonal).

QUADRO CLÍNICO
• Os sinais e sintomas mais comuns de TRM são: dor no pescoço
e/ou nas costas; dor ao movimentar o pescoço e/ou as costas; dor à
palpação da região posterior do pescoço e/ou da linha média das
costas; deformidade da coluna vertebral; paralisia, paresia,
dormência ou formigamento nas pernas ou braços em qualquer
momento após o acidente; sinais e sintomas de choque
neurológico: hipotensão com bradicardia, perda do controle
simpático, extremidades quentes, diurese normal; priapismo
(ereção peniana dolorosa); paralisia de diafragma, se atingir
cervical média e alta; hipoventilação por atingir músculos
intercostais, se atingir cervical baixa e torácica alta; respiração
abdominal e uso de musculatura acessória.
O quadro 1 resume as formas de acometimento medular e a suas
manifestações clínicas
SÍNDROMES MEDULARES
Lesão que ocorre quase exclusivamente na região cervical, com preservação da
Síndrome Centromedular sensibilidade sacral e maior debilidade dos membros superiores que dos membros
inferiores.

Essa lesão é caracterizada por: perda ipsilateral da função motora e propriocepção


Síndrome de Brown-Sequard
consciente; perda contralateral da sensibilidade à dor e à temperatura.

Síndrome de Transecção Abaixo do nível da lesão, o paciente perde a motricidade, a sensibilidade e os


Completa da Medula reflexos autonômicos (inclusive os esfincterianos).

Lesão que produz perda da função motora e da sensibilidade à dor e à temperatura,


Síndrome Anterior Medular
preservando a propriocepção.

Lesão da medula sacral (cone) e das raízes lombares dentro do canal, que
usualmente resulta em arreflexia de bexiga, intestino e membros inferiores. Os
Síndrome do Cone Medular
segmentos sacrais podem ocasionalmente mostrar reflexos preservados; por
exemplo, o bulbocavernoso e os reflexos miccionais.

Lesão das raízes nervosas lombossacrais dentro do canal neural resultando em


Síndrome da Cauda Equina
arreflexia de bexiga, intestino e membros inferiores.
Quadro 1. Síndromes Medulares
Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
• O diagnóstico é feito com base clínica e radiológica. A lesão
medular é classificada segundo a padronização internacional
determinada pela American Spinal Injury Association – ASIA;
assim, criou-se uma avaliação padrão para traumatismo
raquimedular baseada na sensibilidade e na função motora. É
composta por uma etapa compulsória, a qual fornece um escore, e
outra etapa opcional, que não faz parte da pontuação do escore,
mas que adiciona informações clínicas importantes do paciente. O
teste de sensibilidade é feito em pontos específicos: são testados 28
dermátomos predeterminados nos lados direito e esquerdo. Testam-
se a sensibilidade dolorosa (com um alfinete) e tato fino (toque
leve com algodão). A avaliação da sensibilidade postural e a
percepção de pressão ou dor profunda são consideradas opcionais
na avaliação da lesão medular. O exame motor compreende o
exame de dez músculos específicos nos dois lados do corpo.

• A escala ASIA é dividida em quatro partes: exame de motricidade,


exame de sensibilidade, escala de Frankel modificada e FIM
(Functional Independence Measure) - aferição de independência
funcional.19

• Para a motricidade, o exame é graduado de 0 a 5 por grupo


muscular (0: sem contração muscular; 1: contração sem
movimento; 2: movimento em plano horizontal sem vencer a força
da gravidade; 3: movimento vence a força da gravidade, mas não a
resistência; 4: movimento vence a resistência; 5: força muscular
normal).
Grupos musculares por raiz nervosa
C5 Flexão do cotovelo
Grupos musculares por raiz nervosa
C6 Extensão do punho

C7 Extensão de cotovelo e dedos

C8 Flexão dos dedos

T1 Abdução dos dedos

L2 Flexão do quadril

L3 Extensão do joelho

L4 Dorsiflexão do pé

L5 Extensão do hálux

S1 Flexão plantar

Quadro 2.
Fonte : Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

• Para a sensibilidade, avaliam-se os dermátomos de 0 a 2 (0:


ausente; 1: presente com sensação de formigamento; 2: normal ou
completo).
Sensibilidade
C5 Área sobre m. deltoide

C6 Dedo polegar

C7 Dedo médio

C8 Dedo mínimo

T1 Face medial do antebraço

T2 Axila

T4 Mamilo

T6 Apêndice xifoide

T10 Umbigo

T12 Sínfise púbica

L4 Face medial da perna

L5 Espaço entre QDI e QDII

S1 Borda lateral do pé

S3 Área sobre tuberosidade isquiática

S4/S5 Região perianal

Quadro 3.
Fonte : ATLS – Advanced Trauma Life Support 10ª Edição

• Quanto à Escala de Frankel (Quadro 4), chamada pela ASIA de


ASIA Impiamente Scale (AIS), essa avalia o grau de deficiência do
paciente com TRM.
Escala de Frankel
A Completa - sem função motora.

B Incompleta - função sensitiva preservada; sem função motora.

C Incompleta - há função motora e maioria dos músculos tem força inferior a grau 3.

D Incompleta - há função motora e maioria dos músculos tem força superior a grau 3.

E Normal

Quadro 4.
Fonte : Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

• Quanto à FIM, ocorre a avaliação funcional objetiva, que infere a


influência do TRM na independência do paciente para se alimentar,
vestir-se, tomar banho e outras atividades. Seu caráter é
prognóstico. Tipos de lesão:

• Lesão completa: não existe preservação de nenhuma função


motora e/ou sensitiva abaixo do nível da lesão, incluindo
incapacidade de contração anal voluntária e anestesia na região
anal e perianal. Cerca de 3% dos pacientes com lesão completa no
exame inicial vão recuperar alguma função dentro de 24 horas. A
persistência de lesão completa acima de 24 horas indica que a
probabilidade de recuperação de função distal é praticamente
nula.5,7,13,22,

• Lesão incompleta: Qualquer função motora ou sensitiva residual


abaixo do nível da lesão. Exemplo de lesão incompleta:

• Síndrome de Brown-Séquard: perda motora e proprioceptiva


ipsilateral e perda da sensibilidade contralateral da dor e
temperatura.

• Síndrome central da medula: ocorre quase exclusivamente na


região cervical, com preservação da sensibilidade sacral e maior
debilidade dos membros superiores que inferiores.

• Síndrome anterior da medula: produz uma perda da função


motora e da sensibilidade à dor e temperatura, preservando a
propriocepção.

• Para determinar o nível ósseo de lesão, iniciamos a investigação


com radiografia anteroposterior e perfil da coluna. Sempre que
possível, o paciente deve ser submetido a tomografia
computadorizada para melhor avaliar e classificar a lesão óssea.
Tal exame é fundamental nas fraturas cervicais altas e nas fraturas
da transição cervicotorácica que geralmente não são bem avaliadas
pelas radiografias simples.

• Se a lesão não for bem visualizada, recorre-se ao recurso da


tomografia axial computadorizada (TC). A TC é indicada
especialmente para lesões envolvendo os elementos posteriores:
fraturas dos pedículos, lâminas e processos articulares,
frequentemente não visualizados nos exames de rotina,
principalmente na região cervical.

• O exame de Ressonância Magnética (RM) não é realizado de


forma rotineira nos pacientes com lesão medular. Esse exame
demanda tempo, disponibilidade e, por isso, nem sempre é
adequado a muitos desses pacientes que podem estar instáveis do
ponto de vista clínico, neurológico e hemodinâmico.24 A
ressonância é indicada nos casos em que constatamos discrepância
entre o exame neurológico e os exames de radiografia e
tomografia. Podemos estar diante de lesão neurológica sem lesão
óssea, como, por exemplo, as lesões causadas por hérnia de disco
traumática, hematomas ou crianças com SCIWORA – Spinal Cord
Injury With Out Radiologic Abnormality, situações clínicas nem
sempre visualizadas na tomografia e radiografia.

• É também indicada a ressonância magnética nos casos em que o


paciente apresenta déficit progressivo, ou nos casos de fratura
luxação cervical que não podem ser tratados inicialmente com halo
craniano, ou que não apresentam redução de luxação cervical com
esse método e que terão de ser submetidos à redução cirúrgica
dessa luxação. Nesse último caso, a ressonância será importante
para a indicação da via de acesso cirúrgico.

• Se houver a suspeita de instabilidade ligamentar da coluna, deve-


se, idealmente, realizar a RM.

• Como observação, temos que não são indicadas radiografias


dinâmicas na urgência, pois existe o risco do agravamento ou da
ocorrência de uma eventual lesão medular com essa manobra. A
indicação ideal para RM é o paciente com déficit neurológico, sem
alterações no RX ou na TC.

TRATAMENTO
• O tratamento de um TRM tem como objetivo imediato deter a
lesão, preservar e, se possível, restaurar funções neurológicas
afetadas, e, principalmente, evitar complicações secundárias.

• Paciente com suspeita de lesão deve ser imobilizado no local do


acidente, se for o caso, com colar cervical rígido e colocado em
uma prancha dorsal e levado ao atendimento hospitalar. A adesão
aos protocolos do ATLS (Advanced Trauma Life Support) é
importante para otimizar o resultado do atendimento dos pacientes
traumatizados. O tratamento de emergência do TRM começa com
o tratamento cardiovascular e ventilatório, se necessário,
tratamento de suporte da função vesical e intestinal. Deve ser
avaliada a existência de hemorragia, hipotensão por choque
neurogênico (tratada com fármacos vasopressores como
fenilefrina, norepinefrina ou dopamina) ou hipovolemia
(reidratação).

• O tratamento conservador ou cirúrgico deve avaliar a existência de


dano neurológico, por compressão da medula e raízes, e da
estabilidade na coluna vertebral anterior, média e posterior. Se
houver lesão em duas das três colunas, é necessária a estabilização
cirúrgica. O tratamento conservador consiste no uso de colares e
coletes para imobilização do segmento afetado por até 15 semanas.
A conduta cirúrgica consiste em descomprimir os elementos
neurais, alinhamento e estabilização da coluna espinal. Há muitos
métodos disponíveis para estabilização cirúrgica da coluna. O
tratamento cirúrgico deve ser feito o mais breve possível para um
melhor prognóstico.

• Lesão em C5 ou acima resulta em desnervação diafragmática e é


necessária a assistência ventilatória completa, e o tratamento é a
intubação endotraqueal ou nasotraqueal e ventilação mecânica com
um volume corrente apropriado (6 a 10 mL/ kg), uma FIO2 para se
ter uma PO2 entre 80-100 mmHg e uma frequência para dar uma
PCO2 de 40 mmHg. Aplica-se pressão positiva expiratória para
evitar ou minimizar a atelectasia. Se ultrapassar duas semanas, faz-
se uma traqueostomia.

• Uma consequência muito comum no TRM são as doenças


tromboembólicas ocasionadas principalmente pela imobilidade
prolongada. Há um índice de TVP em 70 % dos pacientes com
TRM; portanto, faz-se profilaxia com aparelhos de compressão
intermitente (exemplos as meias pneumáticas) e terapia de
anticoagulação.

• T7-T12 inerva a parede abdominal, e T5-L2, o estômago, intestino


delgado, fígado, pâncreas e dois terços proximais do cólon. Lesões
nesses níveis podem prejudicar as respectivas funções viscerais.
Cada lesão cursa com uma conduta apropriada.
• O aparecimento de úlcera péptica induzida pelo estresse vivido
pelo paciente ocorre em um terço dos pacientes. Faz-se então uso
de ranitidina (antagonista dos receptores H2) 50 mg intravenosa
três vezes ao dia ou de omeprazol (inibidor da bomba de prótons)
20 mg via oral, uma vez ao dia. Alteração na bexiga é usado um
cateter de Foley por 5 a 7 para drenar a bexiga. Pacientes com
traumatismo raquimedular têm propensão a desenvolver úlceras de
decúbito e feridas de pressão. É necessário, pois, mudar o paciente
de posição de 2 em 2 horas e usar órteses acolchoadas.

• Como observação, temo que, de acordo com o NASCIS III, não se


usa mais metilprednisolona para tratar trauma raquimedular, pois
está associado a um aumento do risco de complicações pulmonares
e sangramento gastrointestinal.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: Paciente, 26 anos, advogado, masculino, vítima de
acidente automobilístico com capotamento há aproximadamente 30 minutos.
Foi solicitado o resgate pelo SAMU. Chega ao PS em prancha rígida e colar
cervical, verbalizando e queixando-se de que não consegue movimentar as
pernas.
b) Avaliação Primária: A: Via aérea pérvea, coluna cervical.
c) Prescrição sugerida:
1. Dieta Zero
2. Reposição Volêmica com Cristaloide – SF 0,9% ou RL
3. Dipirona 1 amp. + AD EV 6/6 horas
4. Bromoprida 10 mL + AD EV 8/8 horas
5. Omeprazol 20 mg VO 24/24 horas
6. Cateter Vesical de Demora se Bexigoma
7. Mudança de Decúbito de 2/2 horas
8. Sinais Vitais
9. Cuidados Gerais de Enfermagem

REFERÊNCIAS
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assessment following acute cervical spinal cord injury. Neurosurgery. 2013; 72(suppl_3): 40-
53.
3. Mello LR, Espíndola G, Silva FM, Bernardes CI. Lesado medular. Estudo prospectivo de 92
casos. Arq Bras Neurocir. 2004; 23(4): 151-6.
4. Rieder MM. Trauma raquimedular: aspectos epidemiológicos de recuperação funcional e de
biologia molecular. Tese [doutorado em Medicina: Ciências Médicas]. Porto Alegre:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2014.
5. Santos TSC, Guimarães RM, Boeira SF. Epidemiologia do Trauma Raquimedular em
Emergências Públicas no Município do Rio de Janeiro. [Internet]. [Acesso em 5 fev 2017].
Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ean/v16n4/15.pdf.
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traumatismo da coluna vertebral. Ver Col Bras Cir. 2008; 35(2): 88-93.
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systematic review. J Spinal Cord Med. 2012; 35(4): 229-39.
8. Pereira CU, Carvalho LFP, Santos EAS. Medical complications in traumatic spinal cord
injury: pulmonary, cardiovascular, genitourinary and gastrointestinal. Arq Bras Neurocir.
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Canadian adult trauma center from 1986 to 2006. J Neurosurg Spine. 2010; 12: 131-40.
10. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção à Pessoa com Lesão Medular. Brasília:
Ministério da Saúde; 2013.
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26. Veiga VC, Rojas SSO, Morais EAS, Santos ECA, Cruz OO, Marchesini AM, et tal.
Cuidados intensivos no traumatismo raquimedular. UTI NEURO, Unidade São Joaquim.
2009; 1-7.
27. Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York: Thieme Medical Publishers;
2016.
8.3
HIDROCEFALIA
Autores:
Millena Nogueira Oliveira
Breno Araújo Barbosa
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
• HIDROCEFALIA: Aumento da produção de LCR (líquido
cefalorraquiadiano) dentro dos ventrículos encefálicos.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• A hidrocefalia é a doença mais comum tratada por neurocirurgiões
pediátricos e, segundo dados americanos, os gastos com essa
enfermidade giram em torno US$ 2 bilhões por ano. A prevalência
é de 1 para 1.000 nascidos vivos, porém deve ser maior em países
desenvolvidos. Na África subsaariana, o número de casos de
hidrocefalia na infância ultrapassa 200.000 por ano devido
infecções neonatais.
O quadro 1 mostra as causas de hidrocefalia congênita e adquiridas,
causas e mecanismo fisiopatológico.

HIDROCEFALIA MECANISMO
CAUSA
CONGÊNITA FISIOPATOLÓGICO

Estenose de Aqueduto
Obstrução no fluxo de LCR no III ventrículo Obstrução ventricular
Cerebral Congênito

Defeitos do tubo neural Obstrução da saída do III e IV ventrículo e


(exemplo: Mielomeningocele complacência venosa alterada; cicatriz aracnoide e Variável
e Malforação de Chiari II) ependimária
Malformações de Fossa Obstrução na saída do IV ventrículo Obstrução ventricular
Posterior (Exemplo: Complexo de Dandy-Walker,
Malformação de Chiari I)

Cistos embrionários Efeito de Massa Obstrução ventricular

Atresia congênita do forame de


Obstrução na saída dos ventrículos laterais
Monro

HIDROCEFALIA MECANISMO
CAUSA
ADQUIRIDA FISIOPATOLÓGICO

Inflamatória
Infecção ou hemorragia subaracnoidea Cicatriz aracnoidea Disfunção do espaço
subaracnoideo
Infecção ou hemorragia subaracnoidea Cicatriz ependimária
Obstrução ventricular

Neoplasia
Tumor parenquimatoso cerebral Efeito de massa Obstrução ventricular

Tumor de medula espinhal Composição de LCR alterada Tumores com Disfunção do espaço
infiltração meníngea – ex.: tumor subaracnóideo
neuroectodérmico primitivo

Composição de LCR alterada


Tumores disseminados Disfunção do espaço
subaracnoideo
Efeito de massa
Tumor de plexo coroide Disfunção do espaço
subaracnóideo
Função do plexo coroide alterada
Tumor de plexo coroide Obstrução ventricular

Hiperplasia ou tumor de plexo coroide Superprodução de LCR ou


pulsação intraventricular
hiperdinâmica

Vascular
Malformação vascular Obstrução ventricular (ex.: malformação da Obstrução ventricular;
veia de Galeno; hipertensão venosa; diminuição da complacência
malformação arteriovenosa (MAV) venosa ou diminuição na
absorção de LCR

Obstrução extrínseca venosa (ex.: displasia Diminuição da complacência


Desordem funcional venosa cerebral esquelética; obstrução venosa intrínseca – venosa ou diminuição da
trombose de seio cavernoso; disfunção venosa absorção de LCR
idiopática – hidrocefalia congênita idiopática

Quadro 1. Causas de Hidrocefalia Congênita e Adquirida.


Fonte: Kahle KT., Kulkarni AV., Limbrick DD, Warf BC. Hydrocephalus in
children. Lancet. 2016; 387(10020): 788-99.

QUADRO CLÍNICO
• Intrauterina: O USG pré-natal é capaz de identificar
ventriculomegalia em fetos de idade gestacional de 18-20 semanas,
embora a hidrocefalia fetal tenha melhores resultados quando
diagnosticada no terceiro trimestre, em comparação com o
primeiro e segundo trimestre.
A tabela 1 mostra a classificação da Ventriculomegalia Fetal.
CLASSIFICAÇÃO DA VENTRICULOMEGALIA FETAL
COMPRIMENTO ATRIAL GRAU
< 10 mm Normal

10-15 mm Leve – moderada

>15 mm Grave-severa

Tabela 1. Classificação da Ventriculomegalia Fetal.


Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.
A ventriculomegalia pode ou não estar associada à hidrocefalia. Esta está
associada a um aumento ventricular com aumento da pressão intracraniana.
A ventriculomegalia pode ser uma alteração secundária à atrofia, hipoplasia
ou agenesia de corpo caloso. Essa diferenciação é difícil de ser realizada.

• Neonatal: aumento anormal da circunferência cefálica


(macrocefalia), irritabilidade, vômitos, fontanela anterior
(bregmática) tensa ou afastamento das suturas cranianas. Pode
apresentar mielomeningocele em 5-10% dos casos.

• Crianças mais velhas: cefaleia, vômitos, diplopia (normalmente


por paralisia do NC VI – nervo abducente) e papiledema –
hipertensão intracraniana, anormalidades na circunferência da
cabeça, movimentos descontrolados da cabeça. Alguns pacientes
com mielomeningocele desenvolve hidrocefalia.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: Aumento da circunferência craniana.
• Exame físico neurológico: em pacientes com hidrocefalia
associado ou não a malformações, podem ser encontrados vários
achados, como suturas cranianas oblíquas, Sinal de Macewen –
som de pote rachando quando se percute sobre os ventrículos
dilatados, estrabismo horizontal divergente –, paralisia do sexto
par, “sinal de sol poente” – olhar paralisado para cima.

EXAMES COMPLEMENTARES
• Amniocentese: Pesquisa de infecções congênitas em pacientes
com ventriculomegalia a USG ou RM fetal para Herpes-simplex,
rubéola, toxoplasmose e citomegalovírus;

• Tomografia de Crânio (TC de Crânio): Contorno do crânio,


espessamento e/ou estriações.

• Ressonância Magnética de Crânio e Coluna: Ventriculomegalia.


Tem como vantagem em relação à TC de Crânio à nãoexposição à
radiação.
A tabela 4 mostra os critérios de imagens específicos para Hidrocefalia.

CRITÉRIOS DE IMAGEM ESPECÍFICOS PARA HIDROCEFALIA

1) Cornos temporais >= 2 mm de largura, não sendo visíveis as fissuras silvianas e inter-hemisférica, nem os sulcos cerebrais

2) Cornos temporais >= 2 mm e a relação CF/DI > 0,5


CF: Corno Frontal;
DI: Diâmetro Interno do parênquima encefálico;
CF/DI: < 0,4 (40%): normal; 0,4-0,5 (40%-50%): limítrofe; > 0,5 (50%): hidrocefalia

Tabela 4. Critérios de Imagem Específicos para Hidrocefalia.


Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.
• Outras características sugestivas de Hidrocefalia: Abaulamento
dos cornos frontais dos ventrículos laterais (ventrículos de
“Mickey Mouse”) e/ou do terceiro ventrículo; baixa densidade
periventricular na TC de Crânio ou alta intensidade periventricular
à RM de Crânio ponderada em T2W – absorção transependimária
de LCR;

• Relação de Evans: Razão máxima entre o CF e o diâmetro


biparietal medidos no mesmo corte de TC de Crânio > 0,3 – sugere
hidrocefalia.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico de Hidrocefalia é clínico e por exames de imagem:

• Comunicante (não obstrutiva): Defeito na reabsorção de LCR


pelas granulações da aracnoide. É chamada de comunicante porque
o líquor ainda continua a fluir pelos ventrículos que estão abertos.

• Não comunicante (ou obstrutiva): Acontece quando o fluxo


liquórico está bloqueado em um ou mais pontos das estreitas
comunicações dos ventrículos cerebrais.

• Superprodução de LCR: Rara. Papiloma do plexo coroide.


O quadro 2 mostra os diagnósticos diferenciais de hidrocefalia
DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DE HIDROCEFALIA (PSEUDO-HIDROCEFALIA)

Hidrocefalia ex-vacuo – alargamento dos ventrículos por perda de tecido cerebral (atrofia cortical)

Hidranencefalia: ausência completa, ou quase completa, do cérebro

Agenesia de corpo caloso

Displasia septo-óptica

Quadro 2. Diagnóstico Diferenciais de Hidrocefalia.


Fonte : Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.
TRATAMENTO
a) TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Apoio multidisciplinar (fisioterapia, fonoaudiologia, terapia


ocupacional), na forma congênita, pois são relacionadas a outras
malformações e com déficits cognitivos.

• Acompanhamento com Neuropediatra e Neurocirurgião.


b) TRATAMENTO CLÍNICO:

• Acetozolamida (inibidor da anidrase carbônica) 25 mg/kg/dia,


aumentando 25 mg/kg/dia a cada dia até atingir 100 mg/kg/dia.
Associar com Furosemia 1 mg/kg/dia. Para compensar a acidose,
usar tricitrato (Polycitra) 4 mL/kg/dia (cada 1 mL = 2 mEq de
Bicarbonato e contém 1 mEq de K+ e 1 mEq de Na+). Medicação
indicada apenas para população adulta.

• Punção Lombar: Só pode ser feita em hidrocefalia comunicante.


c) TRATAMENTO CIRÚRGICO

• Terceiroventriculostomia endoscópica – TVE (método de


escolha) – Pacientes com hidrocefalia não comunicante
(obstrutiva).

• Derivação (shunt).
• Desobstrução do Aqueduto de Sylvius – alta morbimortalidade
• Ablação do plexo coroide – não utilizada
O quadro 3 mostra os tipos de Derivação:
CLASSIFICAÇÃO DA VENTRICULOMEGALIA FETAL

TIPOS INDICAÇÃO
Derivação ventriculoperitoneal Técnica mais usada Ventrículo lateral → Cavidade
(DVP) peritoneal

Derivação atrioventricular Ventrículos → Veia Jugular → Veia


Anormalidades abdominais
(DAV) – shunt vascular Cava Superior → Átrio Direito

Shunt de Torkilsen Raramente usada Desvia o ventrículo para as cisternas

Espaço pleural Alternativa quando o


(Shunt ventriculopleural) peritônio não está viável

Hidrocefalia comunicante -
Desvio lomboperitoneal Pseudotumor cerebral e fístula
liquórica

Quadro 3 . Tipos de Derivação.


Fonte : Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

DICAS DO ESPECIALISTA
• As doenças do sistema nervoso na infância são um diagnóstico de
grande impacto familiar, pelo fato de muitas estarem associadas a
déficits cognitivos, disfunções motoras e epilepsia.
• Além disso, muitos desses pacientes precisam de um tratamento
multidisciplinar (neonatologista, geneticista, obstetra, radiologista,
neurologista e neurocirurgião).

• A hidrocefalia deve ser diagnosticada nos estágios iniciais da


gestação, pois, quanto mais rápido identificado, mais precoce será
seu tratamento.

• A hidrocefalia pode não estar associada a outras malformações.


• O estudo do cariótipo deve ser realizado em todos os casos.
• Na hidrocefalia, a dilatação ventricular deve ser progressiva.
REFERÊNCIAS
1. Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York: Thieme Medical Publishers;
2016.
2. Kahle KT., Kulkarni AV., Limbrick DD, Warf BC. Hydrocephalus in children. Lancet. 2016;
387(10020): 788-99.
3. Wright Z, Larrew TW, Eskandari R. Pediatric hydrocephalus: Current state of diagnosis and
treatment. Pediatr Rev. 2016; 37(11): 478-90.
8.4
CEFALEIAS
Autores:
Leidiane Santos Ribeiro
Josué da Silva Brito
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
O termo cefaleia se refere às dores que ocorrem em qualquer região da
cabeça e do pescoço. A cefaleia é uma das principais queixas tanto do
atendimento ambulatorial quanto do atendimento emergencial. Em
aproximadamente 2 a 4% dos atendimentos emergenciais, ela constitui a
queixa principal, seja como parte de um complexo de sintomas ou associada
a doenças em desenvolvimento. Na neurologia, é causa de 25% dos
atendimentos.1-6
As cefaleias podem ser divididas em primárias, que correspondem a 98%
das cefaleias, e secundárias. As cefaleias primárias são dores resultantes de
quadros disfuncionais, não sendo resultado de qualquer outra doença. São
cefaleias primárias: a cefaleia do tipo tensional, tipo mais comum; a
enxaqueca ou migrânea, segunda mais frequente; as cefaleias trigêmino-
autonômicas (em salvas, hemicrania paroxística etc.) e outras cefaleias
(primária da tosse, do exercício, associada à atividade sexual, por estímulo
frio etc.). As cefaleias secundárias (Quadro 1) são causadas por
anormalidades anatômicas, fisiológicas, inflamatórias e infecciosas.4,7,8

Cefaleias secundárias
Cefaleia atribuída a lesão ou traumatismo cranioencefálico e/ou cervical

Cefaleia atribuída a perturbação vascular craniana ou cervical

Cefaleia atribuída a perturbação intracraniana não vascular

Cefaleia atribuída a uma substância ou a sua privação

Cefaleia atribuída a infecção, principalmente sepse

Cefaleia atribuída a uma perturbação da homeostasia


Cefaleia ou dor facial atribuída a uma perturbação do crânio, pescoço, olhos, ouvidos, nariz, seios paranasais, dentes,
boca ou outras estruturas do crânio ou da face

Cefaleia atribuída a uma perturbação psiquiátrica

Quadro 1. Cefaleias secundárias segundo a Classificação Internacional de


Cefaleias.
Fonte: Headache Classification Committee of the International Headache
Society (IHS).7

A cefaleia pode ser definida como de curta duração, quando os episódios


duram < 4 horas, como as cefaleias trigêmino-autonômicas, ou de longa
duração, quando persistem por > 4 horas. Ainda pode ser dita episódica ou
crônica. A crônica é definida como a cefaleia que ocorre por 15 dias ou mais
de um mês pelo período superior a 3 meses (≥180 dias/ano).4,7

EXAME FÍSICO
Na anamnese, são informações relevantes a idade do paciente e seu sexo.
É preciso caracterizar o tipo de dor, local, se uni ou bilateral, irradiação,
frequência, duração, intensidade, fatores desencadeantes, fatores de melhora
ou piora, sintomas que antecederam ou acompanham a dor, evolução,
histórico de traumas e procedimentos na região e uso de medicação.
Também se deve avaliar o histórico médico do paciente, indagando-o quanto
a doenças sistêmicas e histórico de cefaleias.9,10
O exame físico básico da cefaleia inclui a aferição de sinais vitais, exame
físico da cabeça e do pescoço, incluindo avaliação de artérias carótidas,
temporais e seus ramos, dos seios da face e das articulações
temporomandibulares, a realização de exame neurológico completo,
devendo-se avaliar os nervos cranianos, estado e nível de consciência,
resposta pupilar, força motora e a sensibilidade, reflexos tendinosos
profundos, marcha e equilíbrio e sinais de irritação meníngea. Também se
deve realizar fundoscopia com o objetivo de avaliar a presença de
papiledema.10-12

EXAMES COMPLEMENTARES
Exames laboratoriais não são necessários na rotina, porém hemograma,
glicose sérica e eletrólitos podem oferecer auxílio na avaliação do quadro
secundário. A neuroimagem, incluindo tomografia computadorizada e
ressonância magnética, também não é sempre necessária. As bandeiras
vermelhas (Quadro 2) orientam a necessidade de solicitação de exames
complementares de neuroimagem, visto que indicam cefaleias secundárias.8-
14

Bandeira Vermelha Exames indicados Hipóteses diagnósticas

Arterite de células gigantes, lesão em


Taxa de hemossedimentação, TC,
Idade > 50 anos massa, desordens vasculares cranianas ou
RNM
cervicais, neoplasias

Hemorragia subaracnóidea, lesão em


massa, malformação vascular, apoplexia
Cefaleia abrupta TC, RNM, angio-TC, angio-RNM,
hipofisária, trombose do seio venoso
(cefaleia em trovoada) punção lombar
cerebral, vasculite, dissecção da artéria
carótida

Lesão em massa, hematoma subdural,


Intensidade e frequência
TC, RNM abuso de
crescentes
medicamento

Meningite, encefalite, doença de Lyme,


Sinais e sintomas de doenças arterite de células
TC, RNM, hemocultura,
sistêmicas (febre, rigidez nucal, mialgia ou gigantes, metástases,
punção lombar, exames bioquímicos
erupção cutânea) carcinoma leptomeníngeo,
feocromocitoma, abcesso cerebral

Sinais e sintoma Lesão em massa, malformação vascular,


TC, RNM
neurológicos focais acidente vascular cerebral

Histórico de Neoplasia cerebral


RNM
neoplasias ou metástase

Cefaleia
TC, RNM Hipotensão ou hipertensão intracraniana
posicional

Cefaleia precipitada por espirros, tosse, Malformações na fossa posterior,


TC, RNM
manobra de valsava ou exercício malformação de Chiari

Lesão em massa, pseudotumor cerebral,


Papiledema TC, RNM, punção lombar
meningite, neoplasia

Patologias da fossa posterior, patologias


Sintomas
TC, RNM da fossa hipofisária, patologia dos seios
autonômicos
cavernosos, síndrome de Tolosa-Hunt

Imunossupressão / HIV TC, RNM, exames bioquímicos Infecção oportunista


Bandeira Vermelha Exames indicados Hipóteses diagnósticas

Pré-eclâmpsia, trombose dos seios


cerebrais, desordem vascular craniana ou
Surgimento durante TC, RNM,
cervical, trombose venosa do seio
o puerpério exames bioquímicos
cerebral, hipotireoidismo, anemia,
diabetes mellitus

Hemorragia intracraniana, hematoma


Cefaleia após traumatismo TC, RNM de crânio
subdural, hematoma epidural, cefaleia
cranioencefálico e cervical
pós-traumática

TC: Tomografia Computadorizada; RNM: Ressonância Magnética; angio-TC: angiotomografia;


angio-RNM: angiorressonância magnética.

Quadro 2. Bandeiras vermelhas (red flags) na avaliação das cefaleias agudas


em adultos.
Fonte: Chinthapalli, Do, Micieli. 9,13,14

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
a) CEFALEIA DO TIPO TENSIONAL (CTT):
A cefaleia do tipo tensional compreende a cefaleia mais frequente, com
prevalência variando entre 30% a 78%, mais comum no sexo feminino (5:4),
com idade média de início entre 25 a 30 anos e máximo da prevalência entre
30 e 39 anos.7,8,15
A fisiopatologia da CTT ainda é inserta e a causa da dor permanece
controversa. A dor episódica parece ligada a mecanismos miofasciais
pericranianos, enquanto a dor crônica é ligada à sensibilidade das vias de dor
do sistema nervoso central, gerada por estímulos dolorosos prologados dos
tecidos miofasciais pericranianos.7,8,15
A CTT (Quadro 3) manifesta-se por dor do tipo aperto ou pressão, de
intensidade leve a moderada, bilateral (embora possa ocorrer episódios
unilaterais), que não afeta atividades diárias e não apresenta piora com
atividades físicas, com duração variável, podendo ocorrer por minutos a dias.
Não se associa a náuseas comumente. O paciente pode queixar-se de
fotofobia ou fonofobia raramente, contudo os sintomas não devem ocorrer
conjuntamente na forma crônica. Admite-se que ocorra náusea leve, porém
não deve haver vômito nem a ocorrência simultânea à fotofobia ou
fonofobia. Possui relação com estresse, falta de sono e má alimentação;
ocasionalmente, também com álcool e menstruação. Na palpação craniana,
pode ser encontrado dolorimento pericraniano, caracterizando as cefaleias
tensionais associadas com dolorimento craniano (subtipos). Ela pode ser
caracterizada como episódica infrequente (ocorrência < 12 dias/ano),
episódica frequente (ocorrência ≥12 e <180 dias/ano) ou crônica (ocorrência
≥180 dias/ano).1,7,10,15-17
Diante de um diagnóstico de CTT crônica, deve-se excluir diagnósticos
diferenciais como bruxismo, estrabismo não corrigido, sinusite crônica,
hipertensão intracraniana idiopática, desordens psiquiátricas, disfunções
osteoarticulares da coluna cervical e cefaleia secundária ao uso excessivo de
medicação.1,15,17
Critérios diagnósticos da cefaleia do tipo tensional
Ao menos 10 episódios de cefaleia em < 12 dias/ano (episódica infrequente), em ≥12 e <180 dias/ano (episódica frequente),
≥180 dias/ano (frequente)

Duração de 30 minutos a sete dias (episódica) ou de horas a dias (crônica)

Ao menos duas a quatro das características:


1. Localização bilateral
2. Dor em pressão ou aperto (não pulsátil)
3. Intensidade fraca ou moderada
4. Não agravada por atividade física rotineira (caminhar ou subir escadas)

Atenda a ambos os critérios:


1. Ausência de náusea ou vômitos
2. Fotofobia ou fonofobia (apenas um dos sintomas pode ser presente)

Ausência de outra explicação diagnóstica

Quadro 3. Critérios diagnósticos da cefaleia do tipo tensional.


Fonte: Headache Classification Committee of the International Headache
Society (IHS).7

Os episódios de CTT são normalmente tratados pelo próprio paciente


com analgésicos simples e anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), porém
a eficácia se reduz conforme há aumento da frequência. A dipirona de 500 a
1000 mg e o paracetamol 1000 mg (via oral, 3-4 vezes/dia, dose máxima = 4
g) resolvem a maioria dos episódios, sendo esse medicamento de primeira
escolha — devido aos menores efeitos colaterais gastrintestinais. Outros
medicamentos indicados são: ibuprofeno de 200-400 mg (4 vezes/dia, dose
máxima = 2,4 g), naproxeno 375-550 mg (2 vezes/dia), diclofenaco de 50-
100 mg (2-3 x/dia) e cetoprofeno 25-50 mg. A combinação com cafeína,
codeína, tranquilizantes e sedativos é associada a melhora da eficácia.
Medicamentos como triptanos, relaxantes musculares e opioides não são
indicados, devido à ausência de eficácia comprovada. O paciente deve ser
orientado a não utilizar analgésicos simples por mais de 14 dias/mês ou
combinados com opioides por mais de 9 dias/mês.2,17-19
Na urgência e emergência, o esquema de tratamento básico também
envolve analgésicos simples e AINEs:
1) Dipirona 1000 mg (2 mL), IV;
2) Diclofenaco 75 mg, IV,
3) Paracetamol 1000 mg, VO (escolha preferencial para gestantes); outro
esquema possível:
4) a – estabelecimento de acesso venoso, b – SF 0,9%, 5 ml/Kg, pinça
aberta, c – clorpromazina, 0,1 mg/Kg, em 3 min (ampola 25 mg/5 mL), d –
repetir esquema se dor após 1 hora, no máximo de 3 vezes.20,21
O manejo não farmacológico é importante para reduzir a intensidade e a
frequência dos episódios. A fisioterapia é altamente indicada para melhoria
da postura, relaxamento e estimulação elétrica. Também podem ser
indicados acupuntura (embora a sua eficácia permaneça controversa),
biofeedback por eletromiografia, treinamento físico e terapia cognitivo-
comportamental.17,18,19
Em caso de cefaleia que dura mais de 15 dias/mês, que persiste após
manejo não farmacológico, é indicado o tratamento profilático. A
amitriptilina 10-75 mg/dia (1 vez/dia) apresenta os melhores resultados. É
recomendado que se inicie com doses baixas (10 mg/dia) e que a cada
semana se acrescentem 10 mg até que seja obtida uma dosagem que alivie
satisfatoriamente a dor do paciente ou que cause efeitos colaterais (ganho de
peso, sonolência, tontura, constipação, xerostomia). Normalmente, a
manutenção é com 30-70 mg/dia por 6-12 meses. A droga é mais eficaz
quando associada a terapias não farmacológicas. A mirtazapina (30 mg/dia),
clomipramida, maprotilina mianserina e venlafaxina (150 mg/dia)
apresentam também eficácia na profilaxia.17,18,19
b) ENXAQUECA:
A enxaqueca é a segunda cefaleia mais comum, afetando por volta de
14% da população; contudo, seu impacto sobre a qualidade de vida é
superior, sendo a segunda causa mais incapacitante do mundo. Sua
prevalência é maior entre mulheres (3:1) e na faixa etária de 35 a 39 anos.8,22
Ela possui como fatores de risco o abuso de medicação, obesidade,
distúrbios do sono e da vigília, tabagismo, consumo de cafeína,
comorbidades psiquiátricas, sexo feminino, histórico de lesões cranianas.
São identificados como desencadeantes de crises: estresse, odores, falta de
alimentação, atividade física, consumo de álcool, bebidas com cafeína,
queijo, chocolate, adoçantes artificias, carnes em conserva, glutamato
monossódico, contraceptivos orais e medicamentos vasodilatadores.23,24
Apesar de anteriormente vinculada a um processo vascular, atualmente,
sabe-se que a fisiopatologia é mais complexa, envolvendo forte base
genética e regiões corticais, subcorticais e do tronco cerebral. As crises são
desencadeadas por neurônios hipotalâmicos e do tronco cerebral que ou
alteram o equilíbrio do sistema nervoso autônomo sobre os vasos
meníngeos, com predominância parassimpática, ou reduzem o limiar da
transmissão nociceptiva de sinais trigeminovasculares que vão do tálamo ao
córtex cerebral.4,25,26
A enxaqueca é dividida em dois tipos básicos de distúrbios: a enxaqueca
com aura e a sem aura. A aura (Quadro 4) da enxaqueca surge, geralmente,
antes da cefaleia, sendo normalmente constituída de sintomas visuais
(escotomas, cintilações, espectro de fortificação, hemianopsia). Outras auras
comuns envolvem a parestesia de face, membro superior ou membro inferior
unilateral e afasia. Em caso de fraqueza motora, tem-se a enxaqueca
hemiplégica. A duração não é, geralmente, superior a 60 minutos,
excetuando-se sintomas motores, que podem durar até 72 horas. A aura pode
ser precedida em até 48 horas por sintomas prodrômicos, como fadiga,
dificuldade de concentração, náusea, bocejos, palidez, rigidez cervical, visão
turva, entre outros.1,7,26
Critérios diagnósticos da aura da enxaqueca

Um ou mais dos sintomas aura plenamente reversíveis:


1. Visual
2. Sensorial
3. Fala e/ou linguagem
4. Motor
5. Tronco Cerebral
6. Retiniano
7. Unilateral

Ao menos três das seis características:


1. Um ou mais dos sintomas de aura se alastram gradualmente por ≥ 5 minutos
2. Dois ou mais sintomas de aura ocorrem em sucessão
3. Duração individual de sintoma de aura é de 5-60 minutos
4. Pelo menos um dos sintomas é unilateral
5. Pelo menos um dos sintomas é positivo (cintilações e sensação de agulhada)
6. Aura ocorre juntamente com a cefaleia ou essa surge em até 60 minutos

Quadro 4. Critérios diagnósticos da aura da enxaqueca.


Fonte: Headache Classification Committee of the International Headache
Society (IHS).7

A enxaqueca manifesta-se (Quadro 5) por dor, geralmente unilateral,


contudo são bem documentados casos de cefaleia bilateral em crianças e
adolescentes principalmente, mas também na população geral. A dor é do
tipo pulsátil, embora, em alguns casos, o paciente possa descrever como
dolorimento, pressão e pontadas, com duração de 4 a 72 horas (duração
superior é uma complicação denominada status migranosus). A dor possui
intensidade de moderada a forte, atingindo o seu pico em até 90 minutos. É
uma cefaleia que afeta as atividades diárias e piora com atividades físicas.
Ocorre, normalmente, em região frontotemporal e periorbital, podendo
irradiar para as áreas parietal e occipital. Pode ser acompanhada por náuseas,
vômitos, fotofobia e fonofobia.1,4,7,27,28
Critérios diagnósticos da enxaqueca
Ao menos cinco crises (aguda); se ≥ 15 dias por mês por > 3 meses (crônica) ou ≥ 8 dias/mês por > 3 meses se com aura
(crônica)

Duração de 4 a 72 horas com tratamento ineficaz ou sem ele

Ao menos duas a quatro das características:


1. Pulsátil
2. Unilateral
3. Dor moderada ou forte
4. Exacerbada por atividades físicas rotineiras, levando o indivíduo a evitá-las

Atenda um dos critérios:


1. Náusea e/ou vômitos
2. Fotofobia ou fonofobia (apenas um dos sintomas pode ser presente)

Ausência de outra explicação diagnóstica

Quadro 5. Critérios diagnósticos da enxaqueca.


Fonte: Headache Classification Committee of the International Headache
Society (IHS).7

O manejo da crise de enxaqueca (Fluxograma 1) dependerá da


apresentação do quadro. No geral, deve-se buscar realizar reidratação
intravenosa do paciente e estabelecer um tratamento intravenoso, visto que
durante a crise pode haver estase gástrica, levando a uma absorção tardia. Já
se provaram eficazes: sumatriptano (20, 50 ou 100 mg, oral; 6 mg, SC),
naratriptano 2,5 mg, VO, ergotamina, clorpromazina IV, metoclopramida
IM, droperidol IVe cetorolaco IV. 15,21,28
Fluxograma 1. Tratamento da crise de enxaqueca no departamento de
emergência.
Fonte : Robbins, Friedman, Bahra. 20,21,28

Para pacientes que tenham de 4 a 5 crises incapacitantes por mês,


enxaqueca crônica, muitas vezes relacionada ao abuso de opioides (uso por
mais de 10 dias), ou analgésicos simples (uso por mais de 15 dias), deve-se
recomendar o distanciamento de gatilhos, embora essa prática seja
controversa, e instituir tratamento profilático por 6 a 12 meses.26 Atualmente,
são mais indicados: topiramato 25-200 mg/dia, valproato de sódio 500-2000
mg/dia, propranolol 40-240 mg/dia, amitriptilina 50-100 mg/dia,
gabapentina 900-1800 mg/dia.28,29
c) CEFALEIA TRIGÊMINO-AUTONÔMICAS (CTAS):
As CTAs (Quadro 6) manifestam-se por dor intensa (excruciante),
unilateral, comumente com manifestações autonômicas parassimpáticas
lateralizadas e homolaterais à dor. A cefaleia em salvas apresenta
predominância no sexo masculino, enquanto a hemicrania não possui essa
mesma distribuição. 7
Cefaleia em salvas Hemicrania paroxística
Ao menos cinco crises Ao menos 20 episódios

Dor intensa, unilateral, orbital, supraorbital e/ou temporal Dor intensa, unilateral, orbital, supraorbital e/ou temporal
durando 15-180 min se não tratada durando de 2-30 minutos
Ao menos uma das características:
1. Um dos seguintes sinais ou sintomas homolaterais
a. injeção conjuntival e/ou lacrimejamento
b. congestão nasal e/ou rinorreia
c. edema palpebral
d. sudorese frontal e facial
e. miose e/ou ptose
2. Agitação ou inquietude

Frequência entre 1 crise a cada 2-8 dias Frequência entre 1 crise a cada 2-8 dias

Prevenida de forma absoluta por indometacina 150 a 225


mg/dia

Ausência de outra explicação diagnóstica

Quadro 6. Critérios diagnósticos da cefaleia em salva e da hemicrania


paroxística.
Fonte: Headache Classification Committee of the International Headache
Society (IHS).7

Para o paciente com cefaleias em salvas, deve-se estabelecer: 1) O2 por


máscara nasal 8-10 L/min, por 10-15 min, com o paciente sentado apoiado
em encosto de cadeira; 2) colocar paciente em supino, com cabeça a 30º, em
rotação lateral para lado da dor e instilar 1 mL de lidocaína 4% intranasal
homolateral à dor; 3) em caso de novo ataque após os procedimentos ou em
ambiente não hospitalar, é recomendado sumatriptano 6 mg SC; entretanto,
não deve ser utilizado por mais de 2 vezes no dia e é contraindicado para
pacientes com hipertensão arterial descontrolada ou com arteriopatias; 4)
realizar neuroimagem caso seja primeiro ataque.21,30
Após o tratamento da crise, deve-se recomendar que paciente evite
gatilhos, como bebidas alcoólicos, uso de nitroglicerina, cochilos diurnos,
prescrever sumatriptano subcutâneo para que o paciente tenha em casa. A
profilaxia dessa cefaleia pode ser realizada com verapamil.30
d) CEFALEIAS ATRIBUÍDA A TRAUMA OU LESÃO CEFÁLICA
E/OU CEREBRAL:
São cefaleias muito comuns, sem características específicas, podendo se
assemelhar às cefaleias primárias. São diagnosticadas estabelecendo-se uma
relação temporal entre a causa (trauma) e o feito (cefaleia), no geral, em 7
dias. Podem ser acompanhadas de tontura, lentidão psicomotora, alteração
da memória ou da concentração, insônia, ansiedade, irritabilidade, alteração
do humor, fadiga, entre outros. Em caso de duração menor do que 3 meses, é
dita aguda; após, crônica.7
e) CEFALEIA ATRIBUÍDA A TRANSTORNO VASCULAR
CRANIANO E/OU CERVICAL:
As cefaleias atribuídas a transtorno vascular e/ou cervical incluem a
cefaleia após acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico, hemorragia
subaracnóidea espontânea (HSA) e a associada a aneurisma não rompido.7
A cefaleia após AVC isquêmico trata-se de uma dor aguda, com relação
temporal com AVC diagnosticado, que melhora com estabilização do quadro
ou com a melhora de outros sintomas ou sinais do evento. Normalmente é
bilateral, leve a moderada, em pressão, não associada a náusea ou vômito,
fotofobia e fonofobia. Seu tratamento não é bem estabelecido.7,31
A cefaleia ocasionada por HSA caracteriza-se pelo início súbito, dor
intensa, explosiva, com pico em segundos a minutos, focal (geralmente
progressiva refletindo a compressão, que o aneurisma em expansão causa em
estruturas sensíveis à dor) ou generalizada. É também denominada como
cefaleia em trovoada. Pode ser acompanhada de rigidez nucal, hemorragia
retiniana, diminuição do nível de consciência, agitação, confusão, sinais
neurológicos focais. Pode ser o único sintoma da HSA. Caso a dor preceda a
HSA, seja de horas a meses, é dita cefaleia sentinela, uma cefaleia de
características semelhantes; contudo, sem os mesmos sintomas associados. É
um sinal de alerta importante que precisa ser identificado.7,11,32
O diagnóstico da HSA é feito através de: tomografia computadorizada de
crânio, que possui uma sensibilidade 90-95% de detectar a HSA dentro das
primeiras 24 horas, tendo, além do valor diagnóstico, um valor prognóstico
(Escala de Fisher); punção lombar, que exclui com precisão a HSA e é
indicada em paciente com TC negativa ou tecnicamente inadequada. A
xantocromia é um achado patognomônico da punção.11,33
A cefaleia atribuída a aneurisma sacular não roto está relacionada ao
esforço físico, sendo ocasionada por efeito de massa. Pode vir associada a:
alteração visual e da fala, perda de memória e concentração, mudanças de
comportamento, perda da coordenação e equilíbrio, paralisia do III nervo
craniano, hemianopsia temporal bilateral.34
O diagnóstico de aneurisma é feito através de: TC do crânio, que detecta
aneurismas maiores do que 5 mm; angiotomografia (que consiste em
imagens tomográficas obtidas durante a fase arterial de opacificação com
contraste), sendo capaz de detectar aneurismas menores; angiorressonância
magnética; angiografia cerebral por cateterização intra-arterial - padrão-ouro
para o diagnóstico. Para ser relacionada ao quadro, a cefaleia precisa
apresentar relação temporal e ligação a outros sintomas que levaram ao
diagnóstico de aneurisma, piora conforme há crescimento do aneurisma ou
desaparecimento após tratamento, ser súbita ou se associar à paralisia do III
nervo craniano.7,34
f) CEFALEIA ATRIBUÍDA A DESORDENS INTRACRANIANAS
NÃO VASCULARES:
Entre as desordens intracranianas causadoras de cefaleia, os tumores
intracranianos possuem grande relevância. A cefaleia provocada por
neoplasias frequentemente é acompanhada por sinais neurológicos focais,
alucinações, depressão, ansiedade, redução da memória e da concentração,
alucinações e convulsões. Essa cefaleia normalmente se agrava conforme há
aumento da lesão. Em caso de suspeita, deve-se solicitar exame de
neuroimagem.11

TRATAMENTO
a) TRATAMENTO DAS CEFALEIAS SECUNDÁRIAS
Nas cefaleias secundárias, deve-se buscar o alívio da cefaleia, realizando
a pesquisa das causas. No geral, a reidratação deve ser evitada, exceto
quando houver vômitos recorrentes ou outro indicativo de desidratação.11,30

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO
Fluxograma 2. Manejo das cefaleias na emergência.
Fonte : Friedman. 21

DICAS DO ESPECIALISTA
• Cefaleias nem sempre atendem aos critérios rígidos de
diagnóstico; portanto, deve-se ter cuidado na avaliação das
cefaleias primárias.

• Opioides devem ser evitados no tratamento sintomático das


cefaleias.

• Na emergência, dificilmente uma cefaleia é secundária; contudo,


quando ocorrem, são graves, por isso atenção aos sinais de alerta.
• Histórico de perda de consciência e alterações psiquiátricas
recentes podem indicar um quadro secundário.

• O abuso de analgésicos piora a apresentação de cefaleias primárias


de maneira significativa.

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8.5
DOENÇAS VASCULARES
CEREBRAIS
Autores:
Leidiane Santos Ribeiro
Josué da Silva Brito
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
O acidente vascular cerebral (AVC) consiste em um déficit neurológico,
focal ou global, abrupto, que persiste por mais de 24 horas, causado por
alterações do fluxo sanguíneo.1 Atualmente, é a segunda causa global de
morte, apesar da redução da prevalência que houve nas últimas décadas.2
De acordo com a etiologia, o quadro pode ser classificado como acidente
vascular cerebral isquêmico (AVCi) ou acidente vascular cerebral
hemorrágico (AVCh), sendo esse produto do extravasamento sanguíneo para
o tecido nervoso, gerando déficit no suprimento, e aquele resultado da
interrupção do fluxo por obstrução ou redução do débito sanguíneo. O AVCi
é responsável por mais de 80% dos quadros, porém causa menor número
absoluto de mortes.2-4
O AVCh, por sua vez, compreende duas entidades distintas: a hemorragia
intraparenquimatosa (HIP) e a hemorragia subaracnoidea (HSA).3,5
Um déficit neurológico focal de origem isquêmica com duração inferior a
24 horas é dito ataque isquêmico transitório (AIT). Nessa entidade, não há
infarto cerebral. A duração é normalmente inferior a uma hora, em média 8
minutos no território vertebrobasilar e 14 no carotídeo. A maioria dos casos
cursa com melhora clínica na primeira hora.5

ETIOPATOGÊNESE E FATORES DE RISCO


a) ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL ISQUÊMICO:
De acordo com a etiologia, o AVCi pode ser classificado como
aterotrombótico, cardioembólico, lacunar, outras causas e criptogênico.3,6
O AVC aterotrombócito ocorre quando há obstrução de um grande vaso
intracraniano ou extracraniano. É resultante de trombo aterosclerótico
formado no local da obstrução arterial ou, raramente, de trombose aguda de
vaso com estenose prévia. Apresenta grande associação com hipertensão
arterial (principal fator de risco para AVCi), diabetes mellitus (DM),
tabagismo, hipercolesterolemia, síndrome metabólica. Mais frequentemente,
atinge o território da artéria cerebral média. Há também a possibilidade de
ulceração das placas ateroscleróticas e embolização, gerando o AVC
embólico.5,6
O AVC cardioembólico ocorre quando há obstrução vascular por êmbolo
oriundo do coração. Na maior parte dos casos, o êmbolo é gerado pela
fibrilação atrial. Pode ser gerado também por infarto agudo do miocárdio
(IAM) da parede anterior, cardiopatia dilatada, endocardite infeciosa,
estenose mitral reumática, prótese valvar e tumores cardíacos. Tem como
fatores de risco: idade > 65 anos, hipertensão arterial, DM, disfunção do
ventrículo esquerdo, cardioembolia prévia, doença mitral reumática e
válvula cardíaca protética.6
O AVC lacular é resultante de aterosclerose ou lipo-hialinose das artérias
cerebrais perfurantes. Normalmente possui diâmetro entre 0,5 a 0,15 mm,
ocorrendo na região central do cérebro (cápsula interna, tálamo e gânglios da
base) ou na ponte. Possui como fatores de risco a hipertensão arterial de
longa duração, DM, angiopatia amiloide, lipo-hialinose e outras condições
que provocam alterações estruturais dos vasos cerebrais.6
O AVC de outras causas inclui os causados por uso de drogas ilícitas,
vasculopatias não ateroscleróticas, alterações da coagulação e desordens
hematológicas.5,6
Em alguns casos, não é possível estabelecer a causa do AVCi. Isso ocorre
principalmente em pacientes adultos jovens. Nesse caso, tem-se o AVC
criptogênico, também chamado de causa indeterminada.6
b) HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA (HIP):
A HIP consiste na presença de coleção sanguínea no interior do
parênquima sanguíneo, gerando sintomas devido ao inadequado fluxo
sanguíneo. Pode ser decorrente da ruptura de aneurismas de Charcot-
Bouchard (aneurismas formados por degenerações das pequenas artérias
cerebrais perfurantes expostas à hipertensão arterial), que ocorrem mais
comumente nos núcleos da base, tálamo, ponte e cerebelo, angiopatia
amiloide, intoxicação por cocaína, malformação arteriovenosa (MAV),
tumor ou metástase no SNC. Possui como fatores de risco: hipertensão
arterial, sedentarismo, idade > 65 anos, tabagismo, ingestão aumentada de
sal, consumo de álcool, colesterol inferior a 160 mg/dL e fatores genéticos.3-
5,7

c) ANEURISMAS E HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA:


O aneurisma intracraniano (AI) é uma condição com ampla distribuição
mundial. É encontrado em 1 a 6% das necropsias realizadas em adultos. Sua
ruptura e o posterior extravasamento sanguíneo é a principal causa da
hemorragia subaracnoidea no mundo. Os aneurismas saculares são, sozinhos,
responsáveis por 80 a 90% das hemorragias subaracnoideas espontâneas. A
maior parte (aproximadamente 70%) surge na porção anterior do polígono
de Willis, que engloba as artérias cerebrais anteriores, comunicante anterior
e artérias carótidas internas. O restante se origina na porção posterior do
polígono de Willis, que inclui as artérias cerebrais médias e posteriores e
artérias comunicantes posteriores.8-10
O desenvolvimento de AI está relacionado a vários fatores de risco não
modificáveis, como história familiar de aneurismas cerebrais, idade
avançada, etnia japonesa e finlandesa, doença renal policística, síndrome de
Ehlers-Danlos tipo IV, pseudoxantoma elástico, neurofibromatose tipo 1,
deficiência de alfa-1 antitripsina, drepanocitose, anemia falciforme. Também
se deve a diversos fatores a que o indivíduo se expõe ou que adquire durante
a vida, como hipertensão, tabagismo, aterosclerose, contraceptivos orais,
abuso de cafeína, terapia de reposição hormonal, uso de cocaína e diabetes
mellitus.8-10
O risco de ruptura é intimamente ligado à progressão do aneurisma.
Aneurismas maiores que 10 mm de diâmetro são cinco vezes mais propensos
a romper do que os menores. O risco anual de ruptura para aneurismas <10
mm é de 0,7%.8-10
A hemorragia subaracnoidea ocorre quando há ruptura de vasos
superficiais, na proximidade do cérebro ou dos ventrículos, havendo
extravasamento de sangue para o espaço subaracnoideo, delimitado pelas
meninges aracnoide e pia-máter. Pode ser causada por uma diversidade de
processos patológicos, tais como ruptura de aneurismas, MAV, trombose
venosa cerebral, anemia falciforme, vasculite, coagulopatias adquiridas e
congênitas, metástase e tumores cerebrais. Tem como fatores de risco: sexo
feminino, hipertensão, tabagismo, contraceptivos orais, idade avançada,
doença renal policística, doença do tecido conjuntivo, alcoolismo,
enxaqueca, abuso de drogas, DM, dislipidemia.4,7-10

Acidente vascular cerebral isquêmico Acidente vascular cerebral hemorrágico

Fatores de risco modificáveis


Hipertensão arterial sistêmica (principal fator de risco para todos os tipos)

Tabagismo

Diabetes Mellitus

Abuso de drogas

Sedentarismo

Obesidade

Abuso de álcool e drogas (como cocaína e metanfetamina)

Uso de anticoncepcionais

Enxaqueca Baixos níveis de LDL-c

Dieta baseada em consumo excessivo de carboidratos, lipídios,


Fibrilação atrial
principalmente de origem animal, e carne vermelha

Insuficiência cardíaca congestiva -

Doença coronariana -

Terapia de reposição hormonal -

Ataques isquêmicos transitórios -

Estenose carotídea assintomática -

Fatores de risco NÃO modificáveis

Idade > 55 anos

História familiar positiva

Coagulopatias

Sexo feminino

AVE prévio

Negros e latino-americanos

Quadro 1. Fatores de risco para acidente vascular cerebral.


Fonte: Boheme, Kuklina, Chaves.3,7,11,12

FISIOPATOLOGIA
A fisiopatologia do AVCi envolve diferentes processos desencadeados
pela supressão da oferta de oxigênio e nutrientes aos neurônios. O
esgotamento das reservas energéticas do sistema nervoso leva à
despolarização de neurônios, resultando no aumento de receptores de
glutamato e consequente aumento intracelular de cálcio. O cálcio age como
segundo mensageiro, desencadeando a ativação de proteases, lipases e
nucleases, enzimas que possuem como produtos as espécies reativas de
oxigênio, que danificam membranas celulares, materiais genéticos e
proteínas, levando, por conseguinte, à morte celular. A falha energética
também é responsável pela alteração do fluxo de iônico e início de processo
inflamatório. Há perda de potássio e ganho de sódio, cloreto e cálcio,
desencadeando o edema citotóxico. Há também, posteriormente, com maior
duração e menor reversibilidade, edema vasogênico. Ele é resultante do
aumento da permeabilidade das células endoteliais, um outro marco da
isquemia. Essa disfunção da barreira hematoencefálica permite a passagem
de macromoléculas e, consequentemente, o aumento do volume do fluido
extracelular e da pressão intracraniana.3,13,14
A obstrução vascular gera alterações a nível estrutural e funcional. Como
consequência da isquemia, surge uma área de infarto cerebral, que possui
perfusão de 10 a 18 mL/100 g/min, com falhas estruturais e funcionais
inconversíveis (local em que ocorre necrose), e uma área de penumbra
isquêmica (parcialmente irrigada), que possui a função prejudicada sem ou
com pouca alteração estrutural. Ela é extremamente lábil, e uma pequena
demora na reperfusão tecidual provoca apoptose, anexando a área de
penumbra ao núcleo de tecido neuronal infartado.14,15
O AVCh, além dos efeitos causado pela interrupção do suprimento
vascular, causa danos pelo efeito irritante que o sangue possui sobre o
parênquima vascular e sobre a vasculatura e também pelo aumento da
pressão intracraniana, que pode gerar a restrição do fluxo sanguíneo
cerebral.3,13,14

QUADRO CLÍNICO
a) ACIDENTE VASCULAR ISQUÊMICO:
O encéfalo é vascularizado pelas artérias carótidas internas e vertebrais.
As carótidas internas originam as artérias cerebrais anteriores e médias e a
artéria oftálmica, relacionada à alteração visual monocular. As artérias
vertebrais originam a artéria basilar, que dá origem às artérias cerebrais
posteriores, cerebelar superior, posteroinferior, anteroinferior e superior.15,16
As artérias cerebrais anteriores suprem a cápsula interna, parte do núcleo
caudado, do hipotálamo, bulbo, tratos olfatórios, lobo frontal. Os sintomas
da obstrução envolvem paralisia e paresia do membro inferior mais
significante do que a do membro superior, sinais de frontalização, desvio do
olhar conjugado, alteração de cognição e comportamento.15-17
As artérias cerebrais médias vascularizam a face superolateral de cada
hemisfério. Vascularizam as áreas motora, somestésica, de Broca e de
Wernick (no hemisfério dominante); portanto, parte do lobo frontal, lobos
temporais e parietais. Os sintomas de obstrução envolvem parestesia,
hipoestesia, paresia, disartria, síndrome piramidal contralateral, desvio do
olhar conjugado (ipsilateral), paralisia facial e dos membros (contralateral),
sendo mais intensa no membro superior em relação ao inferior, desvio da
rima labial, afasia de Broca, isto é, uma condição na qual há alteração
motora da fala, e/ou afasia de Wernicke, na qual há fala fluente, porém com
palavras incorretas ou sem sentido.15-17
O AVC da artéria lentículo-estriada, artéria responsável pela
vascularização da cápsula interna e que se origina da artéria cerebral média,
resulta em síndrome piramidal, causando; portanto, sincinesias, sinal de
Babinski, hiperreflexia, espasticidade e hiper-reflexia profunda.15-17
Já um AVC carotídeo resulta em afasia (hemisfério dominante) ou
negligência (hemisfério não dominante), hemianopsia homônima
contralateral, declínio motor e sensorial contralateral de face e membros
superiores e inferiores e desvio ipsilateral do olhar conjugado.16,17
As artérias cerebrais posteriores irrigam o lobo occipital e a face inferior
do lobo temporal. Vascularizam a substância negra, pedúnculos cerebrais,
parte do hipotálamo, hipocampo e núcleos do tálamo. Os sintomas da
oclusão incluem hemianopsia homônima, agnosia visual, distúrbios de
leitura, ataxia, alexia, agrafia, prosopagnosia e até cegueira nas obstruções
bilaterais. Pode haver rebaixamento da consciência e déficit sensorial. No
geral, não há paralisia.15-18
A oclusão da artéria cerebelar superior tem como manifestações a ataxia
de marcha, cefaleia, náuseas, vômitos, vertigem, inabilidade ipsilateral,
disartria, nistagmo ipsilateral, síndrome de Horner ipsilateral (ptose pálpebra
discreta a moderada, miose, anidrose e hiperemia facial).16,17
O AVC da artéria cerebelar posteroinferior resulta na síndrome de
Wallenberg, na qual há redução da sensibilidade dolorosa e térmica
ipsilateral da face e contralateral em tronco e extremidade facial, disfagia,
nistagmo, diplopia, mioclonia do palato ipsilateral, síndrome de Horner
ipsilateral.16,17
A obstrução do fluxo da artéria cerebelar anteroinferior causa surdez
súbita, vertigem, vômito, zumbido, disartria, fraqueza facial ipsilateral,
ataxia ipsilateral de membros, podendo ainda prejudicar a sensibilidade
térmica e dolorosa.16,17
Já uma oclusão vertebrobasilar significante resulta em morte ou
incapacidade grave, podendo gerar ataxia, disartria, alterações dos nervos
cranianos, déficit visual, quadriplegia, coma e até, raramente, a síndrome do
encarceramento.16,17
b) HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA:
A hemorragia intraparenquimatosa possui sintomas de acordo com os
locais acometidos (Quadro 2) e o tempo de evolução, sendo mais
comumente acometidos os núcleos da base, principalmente o putâmen.
Contudo, ocorrem também sintomas inespecíficos como cefaleia, náuseas e
vômitos. Muitas vezes, apenas os sintomas não vão permitir a diferenciação
entre o AVCi e o AVCh.19-21

Local hematoma Quadro Clínico

Hemiparesia contralateral
Desvio do olhar conjugado ipsilateral
PUTÂMEN Descerebração/decorticação
Pupilas mióticas
Respiração de Cheyne-Stokes

Cefaleia
Rigidez nucal
NÚCLEO CAUDADO Alterações neurocomportamentais
Diminuição do estado da memória
Diminuição do estado de alerta

Hemiparesia contralateral
Afasia/negligência
TÁLAMO
Desvio do olhar conjugado para baixo
Pupilas mióticas
Local hematoma Quadro Clínico

Cefaleia, náuseas/vômitos, vertigem


Ataxia cerebelar
CEREBELO
Paresia do olhar conjugado ipsilateral
Apneia (compressão do tronco encefálico)

Tetraparesia.
Pupilas puntiforme.
PONTE Hipoventilação.
Desvio do olhar conjugado para o lado no qual há o déficit
Evolução rápida para coma

Quadro 2. Manifestações da hemorragia intraparenquimatosa.


Fonte: An, Ko.20,21

c) HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA:
As cefaleias correspondem em até 2% dos atendimentos realizados pelos
departamentos de emergência. Cerca de 1% das cefaleias são manifestações
da hemorragia subaracnoidea.8,9
O quadro possui uma incidência que varia de 2 a 25 casos por 100.000
habitantes, sendo as maiores incidências encontradas no Japão e na
Finlândia.8,9 No geral, estima-se que a incidência atual é por volta de 7,9
casos a cada 100.000 habitantes.22
A hemorragia subaracnoidea manifesta-se por cefaleia de grande
intensidade, excruciante, que atinge a máxima intensidade em segundos,
sendo descrita como a pior cefaleia da vida, geralmente acompanhada de
náuseas e vômitos. Também pode ser acompanhada por dor cervical,
convulsões, perda transitória da consciência, hemiparesia, perda do campo
visual, fotofobia, diplopia, movimentos extraoculares anormais, disartria,
disfagia, ataxia e comprometimento de nervos cranianos.8-10
d) PIORA SECUNDÁRIA NOS ACIDENTES VASCULARES:
Tanto no AVCh quanto no AVCi pode haver deterioração do nível de
consciência de pacientes inicialmente alertas. A piora nas primeiras 3 horas é
ligada a expansão de hematoma. A piora entre 24 a 48 horas é ligada a piora
do edema cerebral. A progressão do edema também pode levar a
deterioração durante a segunda e terceira semanas após o início da
hemorragia. No AVCi, as causas de deterioração incluí a transformação
hemorrágica, isquemia recorrente, hipertensão intracraniana, além de crises
convulsivas, distúrbios hidroeletrolíticos, infecções e edema.23-25
DIAGNÓSTICO
O AVC é facilmente diagnosticado mesmo em ambiente pré-hospitalar.
São fortes indicativos o surgimento súbito dos sintomas e a procura rápida
de serviço de saúde, alteração de fala, fraqueza muscular de face ou
membros, vertigem e cefaleia severa.26
Na recepção do paciente suspeito, é recomendado o uso da escala de
AVC do National Institute of Health (NIH). É uma forma simples e rápida de
identificar e quantificar déficits neurológicos. Desta forma pode-se
acompanhar de maneira objetiva a evolução do paciente. A escala avalia
nível de consciência, orientação, resposta a comandos, melhor olhar
conjugado, campos visuais, paralisia facial, função motora, ataxia dos
membros, sensibilidade, melhor linguagem, disartria e extinção ou
desatenção.26
Muitas condições apresentam sintomas semelhantes ao AVC e precisam
ser descartadas, como síncope, crise epiléptica, uremia, hipoglicemia ou
hiperglicemia, neoplasia ou abcesso no SNC, distúrbio psiquiátrico, trauma,
encefalite, distúrbio eletrolítico, meningite, intoxicação aguda, insuficiência
hepática, hematoma subdural etc. Para cefaleia em trovoada, inclui cefaleia
sentinela, trombose venosa central, dissecção arterial cervical, apoplexia
pituitária, cisto coloide, estenose do aqueduto, feocromocitoma etc. A
avaliação inicial complementada pela neuroimagem permite que esses
diagnósticos sejam descartados.7-9,27
A tomografia computadorizada (TC) sem contraste (Quadro 3) é o
método mais frequentemente utilizado no manejo do AVC, possuindo
sensibilidade próxima de 100% nas primeiras horas. Ela é preferida por ser
amplamente disponível, fácil de utilizar e pela velocidade mais célere de
realização do exame. Nem sempre, contudo, os sinais de isquemia são tão
evidentes no método, sendo necessário de dois a sete dias para o
reconhecimento, em alguns casos. Para HSA, há uma redução significativa
da sensibilidade a partir de 24-48 horas, sendo necessários outros métodos
de imagem.8-10,26,27
A ressonância magnética (RNM) permite o reconhecimento precoce (< 6
horas) da isquemia, possui maior sensibilidade para o reconhecimento de
malformações arteriovenosas, neoplasias, processo infeccioso ou
inflamatório. Trata-se, contudo, de um exame de alto custo e baixa
disponibilidade, além de não poder ser realizada em pacientes que possuem
marca-passos e implantes metálicos.27,28

Redução da diferenciação entre substância cinzenta e branca


Apagamento dos gânglios da base
Sinais precoces de AVCi Redução de sulcos corticais
Edema cerebral
Sinal da artéria hiperdensa

Hipodensidade do parênquima (hipossinal em T1 e hipersinal em T2, na RNM)


Achados típicos de AVCi Edema cerebral
Apagamento de sulcos e fissuras

Hiperdensidade (isointenso em T1 e hipersinal em T2)


Desvio da linha média
Achados típicos de AVCh Hiperdensidade em sulcos, fissuras ou cisternas (hemorragia subaracnoidea)
Edema cerebral
Herniação

Quadro 3. Achados na neuroimagem.


Fonte: Nentwich.28

A angiotomografia (angio-TC), assim com o angiorressonância, é útil


para obter dados sobre a vascularização, sendo o método não invasivo que
substitui a angiografia, padrão-ouro para a investigação vascular. O exame
pode evidenciar estenoses e aneurismas intracerebrais. Ela deve ser indicada
quando há suspeita de HSA, e a TC e/ou a punção lombar não apresentaram
alterações. Uma angiotomografia negativa geralmente descarta a ocorrência
de HSA.9,10,28
Além da neuroimagem, a punção lombar apresenta importante função
diagnóstica no caso de hemorragia subaracnoidea. Ela é uma abordagem
destinada para o caso no qual há suspeita de HSA; contudo, a TC
apresentou-se inconclusiva ou normal após um período de 6 horas do início
dos sintomas. É, portanto, uma medida de segunda linha. Devem ser
coletados quatro tubos consecutivos para análise. O achado mais
característico é a xantocromia, contudo só está presente após 12 horas do
início dos sintomas. A persistência da contagem de hemácias entre o
primeiro e o quarto tubo e a pressão de abertura elevada são também
elementos sugestivos de HSA.8-10,29,30
A HSA exige uma atenção especial do médico assistente. Seu
diagnóstico da HSA não é simples e é negligenciado em 5 a 15% dos casos.
Os erros são mais comuns em quadros nos quais há sintomas leves, a
consciência do paciente está preservada, a cefaleia típica é ausente, o
paciente apresenta histórico de cefaleia crônica ou cefaleia hemorrágica
intracerebral concomitante. Além disso, o despreparo e o desconhecimento
sobre o caso também contribuem para os erros. Esses resultam na péssima
epidemiologia da doença. Dos acometidos, cerca de 50% morrem no
primeiro mês e cerca de 25-30% dos sobreviventes apresentam déficit
neurológico grave permanente.8-10

GERENCIAMENTO DO AVC
Idealmente, a avaliação médica do paciente deve ocorre nos primeiros 10
minutos, e a avaliação do neurologista, nos primeiros 15 minutos. Na
recepção do paciente com AVC, deve-se indagar quanto a antecedentes
cardíacos, doença arterial periférica, medicamentos de uso contínuo, abuso
de álcool e drogas ilícitas, convulsões, enxaqueca, trauma e gravidez. É
preciso averiguar a hidratação, oxigenação, frequência e ritmo cardíaco,
realizar ausculta cardíaca e respiratória. O exame de fundo de olho pode
auxiliar no diagnóstico de quadros hemorrágicos.27,31,32
Deve-se avaliar o paciente através da escala de coma de Glasgow e
através da escala de AVC do NIS. Essa avaliação deve ser periódica.31-34
São exames essenciais hemograma, coagulograma, níveis sanguíneos de
potássio, sódio, creatinina, ureia, glicemia, marcadores de necrose cardíaca.
A partir das particularidades de cada caso, radiografia torácica, teste de
gravidez, exame toxicológico, enzimas canaliculares hepáticas e marcadores
de necrose hepática devem ser solicitados. Em caso de convulsão, o
eletroencefalograma é indicado. Exames como eletrocardiograma,
ecocardiograma e doppler de carótidas e artérias vertebrais são úteis no
estabelecimento de diagnósticos diferenciais.31-34
É necessário que a TC seja realizada de forma mais precoce possível.
Preferencialmente, ela deve ser solicitada já na admissão ao hospital. A
exclusão de AVCh permite prosseguir com a conduta específica para AVCi.
31-34

O fluxograma 1 resume o gerenciamento dos acidentes vasculares


cerebrais.
a) ACIDENTE VASCULAR ISQUÊMICO:
O tratamento do AVCi envolve medidas de suporte e medidas
específicas.31-34
Como suporte e medidas gerais (Quadro 4), é preciso: 1) manter o
paciente em maca com cabeceira elevada; 2) estabelecer dois acessos
calibrosos; 3) garantir suplementação de oxigênio para pacientes com
hipóxia, mantendo a saturação de oxigênio superior a 94%; 4) monitorar a
temperatura corporal e garantir que esteja próxima da normalidade, visto que
hipertermia aumenta a liberação de radicais livres no tecido isquêmico e
eleva a atividade neuronal; 5) monitorar a atividade cardíaca, principalmente
nas 24 primeiras horas, nas quais o paciente está mais susceptível a
arritmias; 6) monitorar a pressão arterial e controlá-la — PAS ≥ 185 e PAD ≥
110 mmHg para pacientes elegíveis para terapia fibrinolítica —; 7)
monitorar a glicemia a cada 6 horas; 8) corrigir a hipotensão e a
hipovolemia; 9) prescrever, na fase aguda, AAS 100 a 300 mg/dia ou, em
casos de alergia, clopidogrel 75 mg/dia. Essa prescrição não deve ser
realizada, contudo, antes de trombólise intravenosa, e, para o paciente não
eletivo, podem ser adotadas outras técnicas como profilaxia de trombose
venosa periférica (TVP), como compressão.31-34

Recomendações

Antes de infusão de trombolítico, a PA deve ser monitorada a cada 15 min.


Após infusão, nas duas primeiras horas, deve-se monitorar a cada 15 min. Após deve-se
monitorar a PA a cada 30 min.
Para PAS > 220 ou PAD > 140 mmHg, recomenda-se nitroprussiato de sódio (0,5 a 8
mcg/kg/min, devendo ser diluído em 250 mL de SG5%).
PRESSÃO ARTERIAL
Para PAS entre 180 e 220 e PAD entre 110 e 140 mmHg, o controle pode ser realizado com
esmolol, metropolol (5 mg EV a 1 mL/min a cada 20 min, até no máximo 20 mg), enalapril
EV.
PAM deve ser reduzida inicialmente 20% nas primeiras 24 h, em caso de piora neurológica
relacionada, deve-se permitir elevação em 10%.

Temperatura > 39º C é associada a pior desfecho.


TEMPERATURA
Não há consenso sobre a hipotermia.

A glicemia deve ser mantida entre 140 a 180 mg/dL através de insulina, caso necessário.
GLICEMIA
A hipoglicemia (glicemia < 60 mg/dL) deve ser tratada.

Deve-se manter jejum nas primeiras 24 horas.


A nutrição deve ser iniciada nas primeiras 48 horas.
NUTRIÇÃO E
Em caso de disfagia deve-se optar pela nutrição enteral.
HIDRATAÇÃO
A hidratação deve ser mantida por ringer lactato com KCl, SG deve ser evitado pelo risco de
hiponatremia dilucional, hiperglicemia e piora do edema.

A natremia deve ser mantida em níveis normais (135-145 mEq/L) e monitorizada


NATREMIA
diariamente.

Quadro 4 . Recomendações gerais no manejo do AVCi.


Fonte: Gill, Ministério da Saúde, Powers, Martins.30,33-35

O tratamento específico, a trombólise intravenosa, pode ser instituído até


3 a 4,5 horas após o início dos sintomas. Para tanto, é preciso observar os
critérios de inclusão e exclusão (Quadro 5). O tratamento é realizado com
alteplase IV (rt-PA) 0,9 mg/Kg (máximo de 90 mg, 10% da dose em bolus
no 1º minuto e o restante em 60 min, sendo descontinuada caso haja
sangramento importante ou piora do déficit neurológico ou do nível de
consciência).31-35

CRITÉRIOS DE INCLUSÃO

Idade > 18 anos;


Diagnóstico clínico de AVCi;
Déficit neurológico de intensidade significativa;
Evolução < 4,5 h;
TC sem evidências de hemorragia.

CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO

Uso de anticoagulantes orais ou TP > 15 segundos (INR > 1,7);


Uso de heparina nas últimas 48 horas e PTTA elevada;
AVC, TCE grave ou IAM nos últimos 3 meses;
História pregressa de alguma forma de hemorragia cerebral;
História pregressa de MAV ou hemorragia intracraniana;
TC de crânio mostrando evidências de hemorragias ou edema cerebral em desenvolvimento;
TC de crânio com hipodensidade precoce > 1/3 do território de ACM;
PA sistólica > 185 mmHg ou PA diastólica > 110 mmHg (em 3 ocasiões, com 10 minutos de intervalo);
Sintomas melhorando rapidamente;
Déficits neurológicos leves. Isolados, com ataxia isolada, perda sensitiva isolada, disartria isolada ou fraqueza mínima;
Cirurgia de grande porte ou procedimento invasivo dentro das últimas 2 semanas;
Hemorragia geniturinária ou gastrointestinal nas últimas 3 semanas;
Punção arterial não compressível ou biópsia na última semana;
Coagulopatia com TAP, PTTA elevados, ou plaquetas < 100.000/mm³;
Glicemia < 50 mg/dL ou > 400 mg/dL;
Crise convulsiva precedente ou durante a instalação do AVC;
Evidência de pericardite ativa, endocardite, êmbolos sépticos, gravidez recente, doença inflamatória intestinal, ou lactação;
Abuso de álcool ou drogas.

Quadro 5. Critérios para trombólise intravenosa.


Fonte: Oliveira Filho, Evaristo, Ministério da Saúde, Powers, Martins.31-35

Alguns cuidados são recomendados: o tratamento trombolítico deve ser


realizado na unidade de tratamento intensivo, em uma unidade vascular ou
sala de urgência; o paciente deve ser mantido em jejum por 24 horas; não
deve receber sonda nasoentérica; heparina, antiagregante plaquetário ou
anticoagulante, nem deve receber cateterização venosa central ou punção
arterial nas primeiras 24 horas; não se deve passar sonda vesical. Caso seja
imperativo, pode-se fazê-lo após 30 minutos do término da infusão; deve-se
monitorizar a pressão arterial a cada 15 min nas primeiras duas horas, e a
cada 30 min até 36 horas, mantendo a PA ≤ 180/105mmHg; deve-se avaliar a
escala de AVC do NIH a cada 15 min durante a infusão, a cada 30 min após
6 h e a cada hora durante as primeiras 24 horas. Após 24 horas, o tratamento
é o mesmo destinado a quem não recebeu trombólise. Deve-se iniciar
profilaxia para trombose venosa periférica com heparina de baixo peso
(5.000 UI a cada 8 h) ou enoxaparina (400 mg, 1 x/dia). É recomendado que
se faça algum exame de neuroimagem nas primeiras 24 horas após a terapia
trombolítica.31-35
Outro tratamento específico possível é a trombectomia endovascular;
contudo, ainda são raros os hospitais brasileiros que contam com o
procedimento. A trombectomia pode ser realizada até 6-16 horas após o
AVCi, excepcionalmente após 16 a 24 horas. Quanto mais precoce o uso,
melhor o prognóstico do paciente. Os critérios para uso são os estabelecidos
por grandes estudos como o DAWN e DEFUSE-3.34,35
O AVCi pode ter como complicações principais o edema cerebral e
convulsões. O edema geralmente alcança dimensão máxima entre o 4º e o 7º
dia após o aparecimento dos sintomas. O tratamento inicial começa com:
cabeceira elevada em 30°, controle de pressão arterial, de preferência com
agentes que não provocam vasodilatação cerebral. Deve-se evitar hipoxemia,
hipercapnia e hipernatremia, e restringir o uso de soluções hipotônicas. Nos
casos em que a hipertensão intracraniana é uma urgência, medidas como
hiperventilação, diuréticos osmóticos e descompressão cirúrgica podem ser
adotadas. Já as convulsões são mais comuns nas primeiras 24 horas. Não é
recomendada a profilaxia. Caso sejam recorrentes, devem ser tratadas como
as que ocorrem em outras condições neurológicas agudas.31-35
Grandes edemas em território de artéria cerebral média podem exigir
craniectomia descompressiva precoce, isto é, em período inferior a 48 horas.
Ela não deve ser adotada para pacientes com idade superior a 60 anos.
Grandes infartos cerebelares, por sua vez, que podem causar hidrocefalia ou
comprimir o tronco cerebral, podendo resultado em morte, apresentam
melhores resultados com descompressão da fossa posterior.27,34
b) ACIDENTE VASCULAR HEMORRÁGICO:
O gerenciamento do AVCh também envolve medidas de suporte, que são
predominantes, e tratamentos específicos, seja para HIP, seja para HSA. O
tratamento de suporte é similar ao estabelecido para o AVCi. O paciente
deve ser mantido em repouso absoluto no leito, deve ter a pressão arterial
monitorada e deve possuir monitorização cardíaca contínua. Deve ser
realizada analgesia fixa, intubação caso haja escore < 8 na escala de coma de
Glasgow.30,32 A profilaxia com medicação anticonvulsiva não é
recomendada.32,36
c) HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA:
No gerenciamento da HIP, recomenda-se que a pressão arterial média
(PAM) seja mantida < 130 mmHg para paciente previamente hipertenso.
Caso não seja, valem os mesmos cuidados estabelecidos para o AVCi. Caso
haja drenagem cirúrgica, o alvo da PAM é mais rigoroso, não devendo ser
superior a 110 mmHg. Devido à necessidade de se manter a pressão de
perfusão cerebral (PPC) superior a 70 mmHg, pode ser necessário o uso de
agentes vasoativos, caso a pressão arterial sistólica (PAS) seja menor do que
90 mmHg.32,36
É preciso também controlar a hipertensão intracraniana (HIC), quando a
PIC é superior a 20-22 mmHg. Devem ser adotadas medidas gerais, tais
como: elevação da cabeça a 30º, sedação e analgesia, controle da
temperatura e correção de anemia, hipoglicemia ou hiperglicemia e de
distúrbios hidroeletrolíticos. As medidas específicas incluem: manitol a
20% (0,5 a 1 g/Kg, IV, em 5-30 min), hiperventilação, buscando reduzir a
PaCO2 para níveis entre 30 e 35 mmHg, coma barbitúrico (pentobarbital 3-5
mg/Kg IV em bolus, manutenção 1-2 mg/Kg/h).32,36,37
As intervenções cirúrgicas são recomendadas quando há hemorragia
lobar com deterioração neurológica, hemorragia cerebelar > 3 cm de
diâmetro, hidrocefalia aguda e Glasgow < 13.32,36
d) HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA E ANEURISMA
INTRACRANIANO:
A HSA deve ser tratada em uma unidade de terapia intensiva. É preciso
que haja avaliação do neurocirurgião. Na gestão, é realizado o tratamento
das complicações neurológicas (Quadro 6) e do aneurisma roto. O aneurisma
é gerido de acordo com diferentes aspectos, como estado clínico do paciente,
localização, características anatômicas e a experiência do médico.32,38,39
O aneurisma intracraniano pode ser tratado usando técnicas cirúrgicas
diretas, abordagens endovasculares, estratégias cirúrgicas e endovasculares
combinadas, ou técnicas indiretas, como procedimentos de revascularização
ou oclusão de vasos. O tratamento padrão é administrado de forma mais
acertada por uma equipe multidisciplinar. O objetivo da cirurgia de
aneurisma intracraniano é obliterar o aneurisma enquanto o fluxo no vaso
associado ao aneurisma é mantido. O estudo do aneurisma é necessário para
estabelecer adequada localização e relação com a base do crânio e estruturas
adjacentes, sua morfologia, vasos aferentes e eferentes e colaterais, e
característica clínica dos pacientes.40-42
Complicação Prevenção / tratamento
Ressangramento – complicação frequente nas primeiras 24 Repouso absoluto
h, com mortalidade de até 70% Ansiolíticos
Laxantes
Analgesia
Tratamento da PA muito elevada

Vasoespasmo – gera piora do quadro clínico do paciente,


Hipervolemia
manifestando-se entre 4-14º dias, com pico no 7º dia
Hemodiluição
Nimodipina 60 mg, VO, 4/4 h por 21 d
HAS induzida farmacologicamente (hemodiluição
hipervolêmica, mínimo de 3 L SF 0,9%) – PAS pode atingir
até 150 mmHg, se aneurisma não clampeado, e até 200 mmHg
se clampeado
Angioplastia

Hidrocefalia – é gerada pela grande quantidade de sangue no Corticoides


espaço subaracnoideo e a alteração do fluxo do LCR Derivação ventricular externa (hidrocefalia aguda)
Derivação ventrículo-peritoneal (hidrocefalia crônica
sintomática)

Convulsões – são mais comuns nas primeiras Profilaxia não é recomendada


24 horas Uso de fenitoína não é consenso

Quadro 6. Prevenção e tratamento das complicações da HSA.


Fonte: Oliveira Filho, Evaristo, Steiner, Connely.31,32,38,39

Fluxograma 1 . Gerenciamento do AVC.


Fonte : Gill, Oliveira-Filho, Evaristo, Ministério da Saúde, Hemphill,
Steiner, Connolly. 30-33,36,38,39

AVALIAÇÃO DO PROGNÓSTICO
Existem diversas escalas e escores para avaliação do prognóstico do
paciente com AVC e auxílio na tomada de decisão. Para o AIT, há o escore
ABCD e o ABCD2. Para o AVCi, utiliza-se o ASPECTS (Alberta Stroke
Program Early CT Score). Para HIP, emprega-se o escore ICH (intracranial
hemorrhage). Já para HSA, há diferentes métodos, sendo geralmente
utilizadas a escala de Fisher modificada, a escala da World Federation of
Neurological Surgeons e a escala de Hunter-Hess.36,43-51
a) ATAQUE ISQUÊMICO TRANSITÓRIO:
Os escores ABCD e ABCD2 (Quadro 7) forram criados para quantificar
o risco de AVCi em curto prazo após um AIT. Pontuação inferior ou igual a
3 pontos são de baixo risco (risco < 7% em 90 dias), já a pontuação superior
a 3 pontos apresenta alto risco de AVC (risco de cerca de 25% em 90 dias).
Pacientes com AIT devem receber aspirina (150 a 300 mg) e, se de alto
risco, devem ser investigados de forma abrangente. Para todos, deve-se
estabelecer profilaxia secundária.43,51

Fatores de risco Categoria Pontuação

(Age) Idade > 60 anos 1

(Blood pressure) Pressão arterial PAS ≥ 140 mm Hg ou PAD ≥ 90 mm Hg 1

Fraqueza unilateral 2
(Clinical symtoms) Sintomas
Comprometimento da fala 1

≥ 60 minutos 2
(Duration of TIA) Duração
10-59 minutos 1

Diabetes – apenas para ABCD2 Presença de diabetes mellitus 1

Pontuação total ABCD 6

Pontuação total ABCD2 7

Quadro 7. Escores ABCD e ABCD2.


Fonte: Prasad, Bhatt.43,44

b) ACIDENTE VASCULAR ISQUÊMICO:


O ASPECTS (Figura 1) varia de zero a 10, sendo 10 a melhor pontuação,
na qual não há hipodensidade na TC do crânio. Esse escore divide o cérebro
em 10 regiões: caudado, lentiforme, insula, cápsula interna, e as áreas de
irrigação da artéria cerebral média em 6 segmentos. Valores iguais ou
inferiores a 7 apresentam maior risco de transformação hemorrágica.
Pacientes com resultados de 5 a 10 são os que mais se beneficiam da
tromboectomia mecânica.33,45

A = circulação anterior; P = circulação posterior; C = caudado; L = núcleo lentiforme;


IC = cápsula interna; I = insula; MCA= artéria cerebral média; M1= córtex anterior da ACM;
M2 = córtex da ACM lateral à insula; M3 = córtex posterior da ACM;
M4, M5 e M6 são territórios da ACM anterior, lateral e posterior imediatamente
superiores a M1, M2 e M3, rostrais aos núcleos da base.

Figura 1. Aspectos.
Fonte: Prasad, Bhatt.43,44

c) HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA:
O escore ICH (Quadro 8) avalia o risco de mortalidade em 30 dias por
HIP. Sua pontuação varia entre 0 a 6 pontos. A mortalidade é,
respectivamente, para cada pontuação: 0%, 13%, 26%. 72%, 97%, 100% e
100%. 46
Dado clínico Achado Pontuação

3-4 2
Glasgow na admissão
5-12 1
Dado clínico Achado Pontuação
Idade ≥ 80 anos 1

Volume da HIP ≥ 30 cm3 1

Local do hematoma Infratentorial 1

Hemoventriculo Sim 1

Pontuação total 6 pontos

Quadro 8. Escore ICH.


Fonte: Hemphill.46

d) HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA E ANEURISMAS:


A escala de Fisher (Quadro 9) prevê a ocorrência de vasoespasmos a
partir da TC de crânio. A escala inicial, desenvolvida em 1980, foi revisada
em 2006 para que fosse possível mensurar com maior precisão o
vasoespasmo sintomático. O OR para desenvolvimento de vasoespasmo
sintomático é de 1,6 para grau 2 na escala, 1,6 para grau 3 e 2,2 para grau 3.47
GRAU Achado
FISHER 0 Ausência de sangue visível no espaço subaracnoideo ou ventrículos.

Hemorragia subaracnoidea mínima ou difusa delgada (espessura < 1 mm) sem


FISHER 1
hemorragia intraventricular.

Hemorragia subaracnoidea mínima ou difusa delgada (espessura < 1 mm) com


FISHER 2
hemorragia intraventricular.

FISHER 3 Hemorragia subaracnoidea espessa (> 1 mm) sem hemorragia intraventricular.

FISHER 4 Hemorragia subaracnoidea espessa (> 1 mm) com hemorragia intraventricular.

Quadro 9. Escala de Fisher modificada.


Fonte: Hemphill.46

A escala de Hunter-Hess (Quadro 10) é utilizada para estimar o risco


cirúrgico do paciente com HSA. Deve-se adicionar 1 ponto quando há
vasoespasmo ou doença sistêmica.48,49
MORTALIDADE
GRAU CRITÉRIO
PERIOPERATÓRIA (%)

0 Aneurisma não roto 0-5

I Paciente assintomático ou cefaleia mínima e rigidez nucal mínima. 0-5

Cefaleia moderada a severa, rigidez nucal, sem déficits neurológicos exceto por
II 2-10%
paralisia de nervos cranianos.

III Sonolência, confusão, déficits focais moderados. 10-15%


MORTALIDADE
GRAU CRITÉRIO
PERIOPERATÓRIA (%)

Estupor, Hemiparesia moderada ou severa, rigidez precoce em descerebração,


IV 60-70%
distúrbios vegetativos.

V Coma profundo, rigidez em descerebração, aparência moribunda. 70-100%

Quadro 10. Escala de Hunter-Hess.


Fonte: Hemphill.46

A escala WFNS (Quadro 11) utiliza-se da escala de coma de Glasgow e


do déficit neurológico focal para estabelecer uma escala que visa estimar o
prognóstico do paciente com HSA. Quanto maior o grau, pior o desfecho do
paciente.50,51

Grau Pontuação na ECG Déficit focal


I 15 Sem hemiparesia

II 13-14 Sem hemiparesia

III 13-14 Com hemiparesia

IV 7-12 Com ou sem hemiparesia

V 3-6 Com ou sem hemiparesia

Quadro 11. Escala WFNS.


Fonte: Chiang.51

PREVENÇÃO SECUNDÁRIA
O paciente que possui um AVC deve, dentro de uma semana, ser avaliado
quanto aos fatores de risco modificáveis, incluindo HAS, DM, tabagismo,
estenose da artéria carótida, fibrilação atrial e arritmias, e doença cardíaca
estrutural.34,43
O paciente vítima de AVCi deve receber profilaxia secundária com AAS
ou clopidogrel. Esses medicamentos, contudo, não devem ser
combinados.31,34
Deve-se buscar controlar a pressão arterial do paciente e a dislipidemia.
Os pacientes devem ser tratados com estatinas, a depender do risco
cardiovascular. Deve-se estimular mudança de hábitos de vida: interrupção
do tabagismo, exercícios físicos por ao menos 30 min/dia, redução do
consumo de lipídios e carne vermelha, redução do peso corporal, redução da
ingestão de sal e de álcool.34,43
DICAS DO ESPECIALISTA
• Até que se prove o contrário, todo déficit neurológico agudo deve
ser tratado como se ele se tratasse de um AVCi.

• Tempo é cérebro, por isso o gerenciamento de AVC deve ser feito


de forma ordenada e por uma equipe preparada.

• É fundamental que na admissão se colete material para exames


bioquímicos e se solicite TC de crânio com urgência. Isso é
determinante no tratamento.

• Todo paciente é inicialmente elegível para trombólise até que se


prove o contrário.

• Apesar da permissão para que a trombólise seja feita até 4,5 horas,
os resultados mais promissores ainda estão nas primeiras 3 horas
de sintomas.

• A dupla antiagregação não deve ser adotada, visto que ela


aumenta os riscos de AVC hemorrágico.

• A HSA deve ser pensada mesmo para pacientes com cefaleias de


menor intensidade, quando há histórico de cefaleia crônica e o
paciente é idoso.

• A HSA pode se manifestar de formas atípicas, como distúrbios


psiquiátricos.

• A HSA é geralmente ignorada quando o paciente se apresenta


consciente e com Glasgow > 13.

• O não reconhecimento de HSA na emergência é uma das causas


de a mortalidade continuar nos mesmos valores há seis décadas.
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8.6
SÍNDROMES EPILÉTICAS
Autores:
Jonas Silva Paes
Nícollas Nunes Rabelo

INTRODUÇÃO
Estima-se que a prevalência mundial de epilepsia ativa esteja em torno de
0,5%-1,0% da população1 e que cerca de 30% dos pacientes sejam
refratários, ou seja, continuam a ter crises, sem remissão, apesar de
tratamento adequado com medicamentos anticonvulsivantes.2
Desse modo, o conhecimento desse tema é de extrema importância para a
prática médica atual e futura.

DEFINIÇÕES
De O termo “epilepsia” denota qualquer distúrbio caracterizado por
convulsões recorrentes não provocadas. Uma convulsão é um distúrbio
transitório da função cerebral devido a uma descarga neuronal paroxística
anormal no cérebro.
Pacientes com convulsões recorrentes provocadas por uma causa
prontamente reversível, como abstinência de álcool ou drogas, hipoglicemia,
hiperglicemia ou uremia, não são considerados epiléticos.3
Uma síndrome epilética é definida como um distúrbio epilético
caracterizado pela presença de sinais e sintomas complexos que definem
uma condição epilética única. Os sinais e sintomas podem ser clínicos
(história, idade de início, tipos e modos de aparecimento das crises, natureza
progressiva ou não e achados neurológicos e neuropsicológicos) e achados
de exames complementares, como eletroencefalograma (EEG), estudos de
neuroimagem, mecanismos patofisiológicos e bases genéticas.4
PREVALÊNCIA
Há poucos estudos epidemiológicos confiáveis sobre epilepsia no Brasil.
Se considerarmos hipoteticamente a prevalência de epilepsia como sendo
igual à descrita na cidade de Porto Alegre, ou seja, 16,5/1.000 casos de
epilepsia ativa, o que significa mais de três vezes a prevalência em países
desenvolvidos, teríamos atualmente um número próximo a 2.500.000
pessoas com epilepsia no Brasil.5

DIAGNÓSTICO
É essencial que os pacientes sejam acompanhados por uma testemunha
que possa descrever os episódios em detalhes. O diagnóstico é
fundamentalmente clínico e envolve a realização de anamnese detalhada,
visando à caracterização de eventos nos primeiros anos de vida (eventos
precipitantes iniciais) que poderiam ser implicados na gênese das crises e de
outros antecedentes pessoais e familiares. O EEG é usado como um suporte
do diagnóstico, sendo importante para a correlação eletroclínica e a
caracterização do tipo de epilepsia. Estudos de neuroimagem, como
tomografia de crânio e, principalmente, ressonância magnética (RM) do
encéfalo, são importantes na determinação do tipo da lesão epileptogênica.
Estudos funcionais, como a tomografia por emissão de fóton único e a
tomografia por emissão de pósitrons, podem ser utilizados na definição da
zona epileptogênica, ou seja, a região geradora das crises.6

Doença Sinais / Sintomas Diagnóstico Tratamento


Doença Sinais / Sintomas Diagnóstico Tratamento

Epilepsia benigna da infância - Crises ocorrem em crianças - O diagnóstico se baseia em - Fármacos de primeira escolha:
com pontas rolândicas previamente hígidas critérios clínicos e EEG. (7) carbamazepina e oxcarbazepina
- Trata-se do tipo mais comum - Sintomas sensitivos e/ou * Levetiracetam, topiramato e
de epilepsia focal idiopática, motores envolvem: face, intensa lamotrigina possuem eficácia
podendo corresponder a até 20% sialorreia, podendo evoluir para semelhante.
das epilepsias da infância. (7) uma crise unilateral tônica, - Nos pacientes com
- O início das crises ocorre clônica ou tônico-clônica, com recorrências noturnas
geralmente entre 2 e 13 anos, alternância entre os dimídios. frequentes, benzodiazepínicos
com pico por volta dos 9 anos, - As crises ocorrem são uma opção.
havendo um discreto predominantemente durante o - Tratamento medicamentoso
predomínio no sexo masculino. sono ou logo após o despertar. nem sempre é necessário.
(8) (7)(9) - Todos os pacientes evoluem
com remissão completa das
crises.
- Familiares devem encorajar a
criança a ter uma vida normal.
(7)(9)(10)

Epilepsia occipital benigna da - As crises epilépticas são - O diagnóstico se baseia em - Por apresentar risco baixo de
infância de início precoce tipo semiologicamente critérios clínicos e EEG. recorrência de crises, o uso de
Panayiotopoulos caracterizadas por: alterações - O EEG registra atividade de FAE deve ser ponderado.
- síndrome idade-relacionada, comportamentais, irritabilidade, base normal e a presença de - Quando optado por tratamento
que ocorre em ambos os sexos, agressividade, fenômenos descargas de onda aguda na contínuo, indicar carbamazepina
apresenta forte componente autonômicos, palidez cutânea, região occipital. Um terço das ou oxcarbazepina, fenobarbital,
genético e é a segunda epilepsia cianose labial, náusea, vômito e crianças apresenta EEG normal. valproato de sódio ou
parcial benigna mais frequente desvio dos olhos e da cabeça de - A RNM-E deve ser realizada topiramato. (10)(11)(12)
da infância. As crises ocorrem forma conjugada, alterações para afastar lesões estruturais
entre 2 e 8 anos, com pico aos 5 visuais e amaurose ictal. em córtex posterior e deve ser
anos. (10) - As crises podem apresentar normal nesta síndrome.(11)(12)
- As crises são pouco frequentes curta duração ou evoluir com
e muitos pacientes apresentarão EME tipo parcial. (11)
somente um evento durante toda
a vida. O exame neurológico é
normal e não há
comprometimento do DNPM.
(11)(12)
Doença Sinais / Sintomas Diagnóstico Tratamento

Epilepsia occipital benigna da - Manifestações clínicas mais - O EEG apresenta atividade de - Os FAE indicados são
infância de início tardio tipo comuns: auras visuais, seguidas base normal e descargas de onda carbamazepina, oxcarbazepina,
Gastaut ou não de hemigeneralização ou aguda em córtex posterior, topiramato, valproato de sódio e
- É considerada uma síndrome generalização. predominando nas regiões levetiracetam.
rara, idade-relacionada, que - As crises geralmente ocorrem occipitais, ora à direita, ora à - O prognóstico costuma ser
afeta ambos os sexos e tem forte em vigília. esquerda. São descritos ritmos favorável, com remissão
componente genético. (13) - Sintomas visuais como rápidos na faixa beta em córtex completa das crises após 2 a 4
Tem idade de início entre 2 e 17 Hemianopsias, perda parcial ou posterior. anos. (10)(15)
anos, com pico entre 7 e 9 anos. total da visão; A RNM-E deve ser realizada
(10) - Fosfenos ou alucinações para afastar lesões estruturais,
visuais elementares e devendo ser normal. (15)
alucinações visuais complexas;
- Ilusões visuais, como
palinopsia, micropsia, macropsia
e metamorfosopsia;
- Visão de pontos coloridos,
luses piscando, círculos ou
pequenos animais. (14)

Quadro 1. Epilepsias focais idiopáticas do lactente e da criança.


Fonte: Tassinari, Loiseau, Miziara, Liberalesso, Caraballo, Demirbilek,
Gastau, Caraballo, Grosso.7-15

Doença Sinais / Sintomas Diagnóstico Tratamento

Epilepsia neonatal familiar - Crises iniciam entre segundo - EEG apresenta achados O tratamento medicamentoso
benigna e terceiro dias de vida. São inespecíficos, podendo ser deve ser realizado com
- Síndrome rara, autossômica semiologicamente classificadas normal ou apresentar fenobarbital, valproato de sódio
dominante, devido à mutação de como: clônicas, tônicas focais paroxismos epileptogênicos com ou divalproato de sódio, por
genes relacionados aos canais de ou generalizadas, apneias e morfologia de espícula e curto período, devendo ser
potássio voltagem-dependente. crises com fenômenos espícula-onda generalizadas. descontinuado após,
(10)(16) autonômicos. - A ressonância nuclear aproximadamente, 6 meses. (10)
- O exame neurológico é magnética do encéfalo (RNM-E) (16)
normal em praticamente todas não demonstra alterações
as crianças. (10)(16) significativas. (10)(16)
Doença Sinais / Sintomas Diagnóstico Tratamento

Epilepsia do lobo temporal - Clinicamente, a síndrome da - Os achados do EEG podem ser - Remissão espontânea das
- A epilepsia do lobo temporal ELT se manifesta por crises mais difusos e em 20% dos crises ocorre em 10% a 18% dos
(ELT) é a principal causa de tônicas, mioclônicas e casos abaixo dos 12 anos são casos.
crises epilépticas intratáveis em espasmos infantis, sendo raras encontradas descargas fora do - As crises epilépticas são
adultos. Em crianças, a esclerose as crises parciais complexas, as lobo temporal e 40% dos casos refratárias e pode-se observar
mesial temporal (EMT) isolada quais, quando presentes, apresentam alterações interictais morbidade cognitiva.
tem sido descrita em 15% a 43% caracterizam-se por poucos bitemporais ou na região - Tratamento cirúrgico em
dos casos de ELT (17)(18), sendo automatismos, sendo raras as medioposterior do lobo crianças tem prognóstico
mais comum acima dos 5 anos. posturas distônicas. (22)(23) temporal. semelhante ao observado em
(19) - O registro ictal, embora possa adultos, não havendo
- Abaixo dos 5 anos, lesões ser caracterizado pelo clássico justificativas para se protelar a
neocorticais como tumores, ritmo teta-hipocampal, indicação cirúrgica ante a
malformações do evidencia com frequência ritmos determinação da refratariedade
desenvolvimento cortical são mais difusos. (23)(24) clínica. (18)(24)(25)(26)(27)
mais frequentemente
observadas, podendo ou não se
associar à EMT. (20)(21)
Doença Sinais / Sintomas Diagnóstico Tratamento

Síndrome de Rasmussen - A apresentação clínica mais - O diagnóstico final da - O único tratamento que leva à
- É uma doença rara, adquirida, comum é a de crises epilépticas encefalite de Rasmussen baseia- remissão das crises epilépticas é
progressiva, de etiologia focais motoras esporádicas em se em critérios clínicos, EEG e a cirurgia e, na maioria das
desconhecida, que acomete um uma criança previamente de imagem, sendo muitas vezes vezes, a ressecção ou
hemisfério cerebral. (28) hígida. necessário realizar biópsia desconexão de todo o hemisfério
- Caracteriza-se pela presença de - Esta evolui para a fase 2 ou cerebral para sua confirmação. é indicada.
crises focais motoras muito fase aguda caracterizada pela - Os achados histopatológicos - No entanto, o tratamento
frequentes ou contínuas, presença de epilepsia parcial são nódulos microgliais, com ou cirúrgico pode levar à instalação
hemiparesia e hemiatrofia contínua, hemiparesia e déficits sem neuronofagia, infiltrado de déficits neurológicos
cerebral progressivas (29) cognitivos progressivos. celular perivascular, necrose importantes, particularmente
- Sintomas têm início por volta - A terceira fase caracteriza-se giral, perda neuronal e gliose. quando a doença envolve o
pela estabilização do quadro (30)(31)(32)(33)(34)(35) hemisfério dominante para a
dos 6 anos de idade. (31)
neurológico, mas ainda com linguagem, sendo necessário
crises epilépticas refratárias. protelar o procedimento.
Hemiparesia pode ser o Nesses casos são indicados
sintoma inicial da doença. tratamentos alternativos com
- Pacientes com sintomas corticosteroides, imunoglobulina
iniciados mais tardiamente humana e tacrolimo. (30)(31)(32)
podem apresentar-se com crises (33)(34)(35)
parciais complexas ou TCGs
esporádicas que posteriormente
evoluem para o quadro típico
de epilepsia parcial contínua.
Distúrbios de linguagem e
comportamento e retardo
mental são observados na
evolução da síndrome. (31)(32)
(33)(34)(35)

Quadro 2. Epilepsias focais familiares (autossômicas dominantes).


Fonte: Liberalesso, Costa, Harvey, Bocti, Bourgeois, Duchowny, Blume, Ng,
Kramer, Mohamed, Kotagal, Danielsson, Dlugos, Rasmussen, Thomas,
Bien, Granata, Bien.10,16-35

DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO


DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Síndrome de Doose - As crises são mioclônicas, - O EEG é inicialmente normal, - O tratamento deve incluir
- Também denominada epilepsia astáticas ou mioclono-astáticas, mas surge alentecimento e valproato de sódio, divalproato
mioclono-astática, está levando a quedas com traumas desorganização da atividade de de sódio, topiramato,
classificada entre as síndromes de repetição. base e descargas polimórficas lamotrigina e benzodiazepínicos.
epilépticas generalizadas - Outros tipos de crises como as generalizadas com acentuações Há relatos de bons resultados
criptogênicas ou sintomáticas, crises de ausência, crises focais. com etossuximida,
sendo frequente o polimorfismo atônicas e crises TCGs - Em parte dos pacientes, é levetiracetam, primidona,
de crises. Sua incidência é frequentemente estão presentes. possível identificar o “ritmo de ACTH, corticoides orais e
estimada em 1 caso para cada - Alguns pacientes apresentam Doose”, constituído por acetazolamida.
10.000 nascidos vivos, EME de repetição, com crises atividade teta, monomórfica, de - Dieta cetogênica é reservada
correspondendo a 1 a 2% de sutis que se manifestam por média amplitude e com projeção aos casos refratários.
todas as epilepsias iniciadas na torpor ou apatia, mioclonias nas regiões parietais - O prognóstico é muito
infância. É mais comum no sexo irregulares e quedas sutis da bilateralmente. (10)(37)(39)(40) variável, havendo desde casos
masculino. (10)(37) cabeça. (38) com remissão completa dos
- Tem idade de início geralmente sintomas e controle das crises,
entre 2 e 5 anos, com pico de até evoluções com crises
incidência aos 3 anos, ocorrendo refratárias e severo
em crianças previamente comprometimento do DNPM.
hígidas. A herança é poligênica Episódios de EME com crises
e pode haver ocorrência familiar tônico-vibratórias e EME
em até 37% dos casos. (38) mioclônico sugerem pior
prognóstico. (39)(40)

Epilepsia ausência da infância - As crises de ausência têm - O EEG que demonstra um - Os FAE geralmente levam ao
- A epilepsia ausência da início ao redor de 6 a 8 anos e padrão típico de descargas de controle completo das ausências,
infância (EAI) é a epilepsia caracterizam-se por espícula-onda generalizada com estando indicados valproato de
genética generalizada mais comprometimento abrupto e frequência de 3 a 4 Hz. O sódio, divalproato de sódio,
frequente da infância. Embora completo da consciência, com registro deve apresentar etossuximida ou lamotrigina.
acometa ambos os sexos, é mais duração de poucos segundos. A atividade de base normal, - Em casos refratários, a
frequente no feminino, tem forte crise termina com recuperação podendo ocorrer atividade delta associação de benzodiazepínicos
componente genético e ocorre completa e abrupta da rítmica intermitente em regiões pode ser necessária. (10)(42)
em crianças neurologicamente consciência. occipitais, que é considerado um
hígidas. (10) - São reconhecidos sete tipos marcador eletrográfico de
distintos de crises de ausência melhor prognóstico.
típica: - A RNM-E não demonstra
- (a): crise de ausência com anormalidades. (10)(41)
prometimento da consciência;
- (b): crise de ausência com
componente clônico discreto;
- (c): crise de ausência com
componente atônico;
- (d): crise de ausência com
componente tônico;
- (e): crise de ausência com
automatismos;
- (f): crise de ausência com
fenômenos autonômicos;
- (g): formas mistas (10)(41)
DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Epilepsia com Ausência - Crises de ausência típica com - EEG: atividade de base normal - Tratamento: doses elevadas da
Mioclônica abalos mioclônicos bilaterais e e complexos de espícula-onda associação etossuximida e
- A epilepsia com ausências contração tônica dos ombros, generalizados, ritmados a 3 s. valproato.
mioclônicas é uma síndrome braços ou pernas, associado a Resposta à terapêutica pode não Outras drogas: fenobarbital,
relativamente rara, com descargas eletrográficas ser satisfatória; deterioração benzodiazepínicos, lamotrigina.
predomínio no sexo masculino, síncronas com complexos cognitiva. (10)(44) (10)(44)
sendo familiar em 20% dos ponta-onda 3Hz.
casos. A idade de início é entre - A contração muscular envolve
os 11 meses e 12 anos, com pico a musculatura facial e proximal
aos 7 anos, ocorrendo algum dos membros superiores
grau de retardo mental em até - 2/3 casos: crises tônico-
45% dos casos. (43) clônicas generalizadas e crises
de queda. (10)(44)

Epilepsia mioclônica juvenil - As crises mioclônicas - O EEG registra atividade de - Orientações detalhadas a
- Está classificada entre as predominam ao despertar e nas base normal e descargas de respeito dos fatores
epilepsias e síndromes primeiras horas da manhã e são espícula, espícula-onda, desencadeantes são consideradas
epilépticas generalizadas ativadas pela privação de sono, poliespícula e poliespícula-onda parte essencial do tratamento.
idiopáticas idade-relacionadas, ingestão de bebidas alcóolicas, generalizadas e com acentuação - Os principais FAE indicados
sendo considerada a síndrome fadiga física e distúrbios em córtex anterior. são valproato de sódio,
epiléptica generalizada de emocionais. - O achado de espículas focais divalproato de sódio e
natureza genética mais frequente - As crises mioclônicas podem ou multifocais durante o sono é lamotrigina. Clonazepam é
da adolescência, com incidência ser acompanhadas por CTCG habitual nas epilepsias eficaz, mas deve ser considerado
anual entre 0,5 e 6,3:100.000. (em 90% dos casos) e crises de generalizadas idiopáticas. fármaco de adição. Topiramato e
Ocorre em indivíduos ausência (em 15% dos casos). - Prova de fotostimulação é zonizamida podem ser utilizados
neurologicamente hígidos e - Como as mioclonias são obrigatória durante o EEG, uma após falha dos fármacos de
compromete ambos os sexos, muito breves, não há alteração vez que praticamente metade primeira linha. Carbamazepina,
com predomínio no feminino. do nível de consciência e estas dos pacientes apresenta. (45)(46) oxcarbazepina, fenitoína,
- As crises têm início ao redor podem ser desencadeadas por (47) vigabatrina e gabapentina podem
de 14 a 16 anos, sendo estímulos luminosos (epilepsia provocar EME mioclônico e de
caracterizadas por mioclonias fotossensível). (10)(45)(46)(47) ausência. (10)(46)(47)
bilaterais, simétricas, ocorrendo
de forma isolada ou em salvas e
predominando nos membros
superiores. (10)(45)(46)

Quadro 3 . Epilepsias generalizadas idiopáticas.


Fonte: Liberalesso, Neubauer, Dulac, Doose, Kelley, Gibbs, Glauser,
Rubboli, Yacubian, Camfield, Jain, Murthy.10, 37-47

DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO


DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Encefalopatia mioclônica - É definida por crises - O EEG apresenta - O prognóstico é desfavorável,


precoce epilépticas de início, desorganização e alentecimento há elevada morbidade
- Também denominada semiologicamente classificadas da atividade de base e o clássico neurológica e a mortalidade é
síndrome de Aicardi, está como mioclônicas padrão de surto-supressão, estimada em 50% ao final do
classificada entre as epilepsias e fragmentadas (focais) ou sendo os surtos constituídos por primeiro ano de vida.
síndromes epilépticas maciças (envolvendo membros descargas polimórficas de - Os resultados terapêuticos são
generalizadas sintomáticas. e eixo axial). espícula, poliespícula e onda desanimadores, habitualmente
Considerada uma síndrome - Há, também, crises clônicas aguda mescladas por ondas evoluindo com epilepsia
epiléptica rara, tem incidência focais, parciais simples, lentas generalizadas. multifocal de difícil controle.
desconhecida e afeta ambos os tônicas, espasmos epilépticos e - Líquido cefalorraquidiano - Os FAE utilizados são o
sexos e todas as raças. (10)(48) crises com fenômenos deve ser coletado para dosagem fenobarbital, valproato de sódio,
autonômicos. As crises de glicina. (10)(48) topiramato e benzodiazepínicos,
costumam ser frequentes, embora ACTH e corticoides
podendo evoluir com EME. orais possam ser indicados.
- O exame neurológico é - Os FAE não parecem não
alterado, havendo consistente alterar a evolução desfavorável
atraso do Desenvolvimento da síndrome. (10)(48)
Neuropsicomotor.
- A etiologia é variada,
ocorrendo sempre na presença
de lesões cerebrais graves e
podendo estar associada à
hiperglicinemia não cetótica ou
outros erros inatos do
metabolismo. (10)(48)

Síndrome de Dravet - As crises iniciam no primeiro - O EEG cursa com alterações - Por se tratar de uma síndrome
- Também denominada epilepsia ano de vida e progressivas, podendo ser epiléptica com crises
mioclônica severa da infância ou semiologicamente são normal nas fases iniciais. polimórficas, a escolha dos FAE
epilepsia mioclônica grave do classificadas como clônicas, Evolutivamente, há deve ser dirigida aos tipos de
lactente, corresponde a uma comprometendo metade do desorganização e alentecimento crises predominantes.
síndrome epiléptica rara, com corpo e podendo evoluir para da atividade de base e, em Fenobarbital, valproato de sódio,
discreto predomínio no sexo CTCG, com ou sem febre. metade dos casos, surgimento de divalrpoato de sódio,
masculino e etiologia genética. - Posteriormente, associam-se ritmo teta síncrono, com benzodiazepínicos, topiramato,
Ao redor de 75% dos pacientes crises mioclônicas frequência de 4 a 5 Hz, nas etossuximida e zonizamida
apresentam mutação no gene generalizadas ou fragmentadas, regiões central e parietal. podem ser utilizados.
SCN1A, que codifica a tônicas, CTCG e ausências - Descargas de espícula, Carbamazepina, fenitoína e
subunidade alfa-1 dos canais de atípicas, geralmente tendo febre espícula-onda, poliespícula e lamotrigina devem ser evitados,
sódio. (10)(49)(50) como gatilho. poliespícula-onda são devido a relatos de agravamento
- A epilepsia tem registradas ora em projeção das crises. Associação de
comportamento refratário e é generalizadora ora com padrão valproato de sódio, stiripentol e
acompanhada por estagnação e multifocal. clobazam parece ser efetiva em
regressão do DNPM, distúrbio - A RNM-E é normal na maioria uma parcela significativa destes
do comportamento, dos pacientes, podendo haver pacientes.
hiperatividade, impulsividade e alterações inespecíficas como - Casos refratários podem se
transtorno do espectro autista. atrofia cerebral. (10)(49)(50) beneficiar de dieta cetogênica.
- Esclerose medial temporal (10)(51)
está presente em 2 a 70% dos
pacientes. (10)(49)
DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Síndrome de Landau-Kleffner - Crises epilépticas não são - O EEG registra descargas de - ACTH e corticoides orais são
- Também denominada critério obrigatório para o onda aguda nas regiões eficazes em alguns pacientes.
síndrome da epilepsia-afasia, é diagnóstico da SLK, embora temporais, com ocasional - Valproato de sódio, divalproato
considerada uma síndrome estejam presentes em até 80% predomínio à esquerda. de sódio, topiramato e
epiléptica pouco frequente. O dos casos. Em metade dos Descargas extratemporais benzodiazepínicos podem
diagnóstico ocorre entre 3 e 7 pacientes, a crise convulsiva também podem estar presentes e auxiliar na terapia de
anos de idade e há predomínio antecede a afasia. As crises são uma parte significativa destes antiepiléptica de manutenção.
no sexo masculino. (10) ativadas pelo sono NREM, pacientes apresenta espícula- - Etossuximida é indicada em
predominando crises parciais, onda contínua durante o sono, o casos de crises de ausência
CTCG, ausências atípicas e, que agrava a morbidade refratária.
mais raramente, mioclonias neurologia. - Levetiracetam pode ser
epilépticas. - A RNM-E pode ser normal, utilizado em associação.
- Afasia receptiva está presente apresentar achados inespecíficos Fenobarbital e fenitoína são
em todos os pacientes e sua como atrofia cerebral ou contraindicados devido relatos
causa não é totalmente alterações estruturais específicas de agravamento das crises e
conhecida. como malformações do EME.
- Alterações funcionais desenvolvimento cortical e - O envolvimento de área
decorrentes da presença de lesões destrutivas. (10)(53)(54)(55) eloquente impede a realização de
descargas epileptogênicas nas procedimentos cirúrgicos
redes neuronais responsáveis visando ressecção cortical.
pela linguagem falada são - Cirurgias paliativas como a
identificadas como causa direta transecção subpial múltipla de
dos distúrbios do Frank Morrell podem ser
comportamento verbal. indicadas em casos
- Atividade epiléptica intensa selecionados. (10)(52)(53)(54)
no lobo temporal esquerdo
parece contribuir para o
estabelecimento de uma
encefalopatia hipometabólica,
que se manifestaria por
alterações no comportamento
verbal e social.
- Afasia receptiva é seguida por
afasia de expressão e mutismo.
Distúrbios do comportamento e
transtorno do espectro autista
ocorrem em praticamente 80%
destes pacientes e costumam
perdurar por toda a vida. (10)(52)
(53)(54)(55)
DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Síndrome de Lennox-Gastaut - A SLG é definida pela tríade: - O EEG registra descargas de - O tratamento geralmente não
- As crises têm início antes dos crises atônicas, tônicas e onda aguda nas regiões resulta em controle satisfatório
8 anos de idade, com pico entre ausência atípica. Em fases mais temporais, com ocasional das crises e a evolução com
3 e 4 anos. avançadas é comum a presença predomínio à esquerda. EME tônico ou de ausência
-A SLG está classificada entre de crises parciais complexas, Descargas extratemporais atípica é comum.
as epilepsias e síndromes parciais simples e crises tônico- também podem estar presentes e - Carbamazepina e fenitoína
epilépticas generalizadas clônica generalizadas (CTCG). uma parte significativa destes podem exacerbar crises de
sintomáticas - Dois terços dos pacientes pacientes apresenta espícula- ausência atípica e mioclônicas,
- É mais frequente no sexo apresentarão EME não onda contínua durante o sono, o havendo relatos de EME
masculino. convulsivo de ausência atípica que agrava a morbidade mioclônico induzido por estes
- A etiologia é estrutural ou em algum momento e metade neurologia. FAE. Valproato de sódio,
metabólica na maioria dos dos pacientes apresentará - A RNM-E pode ser normal, divalproato de sódio,
pacientes, embora sejam “crises de queda” com apresentar achados inespecíficos benzodiazepínicos, lamotrigina,
relatados casos criptogênicos de mioclonia maciça seguida de como atrofia cerebral ou topiramato e rufinamida são
menor morbidade neurológica. crise tônica generalizada. alterações estruturais específicas indicados, geralmente sendo
(10)(56)(57) - Severo comprometimento do como malformações do necessária politerapia.
DNPM, cognitivo e intelectual desenvolvimento cortical e Levetiracetam pode ser utilizado
é a regra, além da associação lesões destrutivas. (10)(53)(54)(55) em associação a outros FAE.
com distúrbios do - O EEG apresenta as clássicas - Procedimentos cirúrgicos
comportamento, hiperatividade, descargas de espícula-onda lenta paliativos como cirurgias
agitação psicomotora e (com frequência inferior a 3 desconectivas, calosotomia e
impulsividade. Comorbidade Hz), generalizadas, ocorrendo utilização de estimulador do
com transtorno do espectro em uma atividade de base nervo vago (terapia VNS)
autista é frequente e o moderada a acentuadamente podem ser úteis em pacientes
diagnóstico diferencial deve ser desorganizada e alentecida. O refratários. Ressecções corticais
estabelecido com as síndromes registro do ritmo recrutante focais são indicadas em casos
de West, Dravet, Doose e epiléptico generalizado (surto de específicos e criteriosamente
epilepsia parcial benigna atividade rápida com frequência selecionados. Capacetes
atípica (síndrome pseudo- de 10 a 20 Hz, de média protetores podem reduzir o risco
Lennox). (10)(56)(57)(58) amplitude) é frequente durante o de traumatismos cranianos. (56)
sono. Devido à elevada (60)(61)
intensidade das descargas e a
intensa desorganização
eletrográfica, a distinção entre o
traçado interictal e ictal pode ser
impossível.
- A RNM-E complementa a
investigação etiológica, sendo os
achados radiológicos muito
variados, incluindo lesões
estruturais decorrentes de
hipóxia perinatal, malformações
cerebrais, displasias e distúrbios
de migração neuronal. RNM-E
de alta resolução é capaz de
identificar pequenas displasias
em pacientes com SLG
previamente classificados como
criptogênicos, bem como a
tomografia por emissão de
pósitrons (PET-scan) pode
identificar áreas de
hipometabolismo em pacientes
com RNM-E normal. (56)(58)(59)
(60)(61)
DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Síndrome de Ohtahara - Clinicamente, caracteriza-se - O EEG apresenta - Os resultados terapêuticos são


- A síndrome de Ohtahara está por crises iniciadas nos desorganização da atividade de desanimadores, com frequente
classificada entre as epilepsias e primeiros meses de vida, base e padrão de surto- evolução para epilepsia
síndromes epilépticas destacando-se crises tônicas supressão, com frequente refratária.
generalizadas sintomáticas. (10) focais, posturais ou evolução para descargas - Os FAE habitualmente
generalizadas e podendo se polimórficas multifocais (ondas indicados são o fenobarbital,
associar a crises clônicas agudas, espícula, poliespícula, valproato de sódio, topiramato e
focais, parciais simples e espícula-onda e poliespícula- benzodiazepínicos. Em casos
espasmos epilépticos. Crises onda), hipsarritmia e ritmo específicos, ACTH pode reduzir
mioclônicas não estão recrutante epiléptico. (63) a frequência e intensidade das
presentes, o que deve ser crises. (62)(63)
utilizado no estabelecimento do
diagnóstico diferencial com a
síndrome de Aicardi.
- Pode haver distúrbios do
desenvolvimento cortical,
agenesia do corpo caloso e
lesões isquêmicas extensas. O
exame neurológico é alterado e
há severo comprometimento do
DNPM. A morbidade
neurológica é elevada e a
mortalidade pode atingir 50%
ao final do primeiro ano de
vida. Aproximadamente,
metade dos pacientes evoluirá
com síndrome de West e, uma
parcela menor, com síndrome
de Lennox-Gastaut. (10)(62)(63)
DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Síndrome de West - Destacam-se lesões cerebrais - O EEG demonstra o clássico - Desde 1958 utiliza-se ACTH
- A síndrome de West decorrentes de asfixia perinatal, padrão interictal de hipsarritmia, no tratamento da síndrome de
corresponde à encefalopatia malformações cerebrais, caracterizado por atividade de West. Efeitos colaterais como
epiléptica mais frequente do alterações do desenvolvimento base alentecida e desorganizada, aumento da pressão arterial,
primeiro ano de vida, sendo cortical e complexo esclerose com descargas polimórficas de osteoporose, imunossupressão
definida pela clássica tríade: (a) tuberosa. O prognóstico é onda aguda, espícula, transitória e alterações de
crises epilépticas de espasmos; reservado, havendo severo poliespícula, espícula-onda e resposta adrenocortical podem
(b) atraso do DNPM e (c) atraso do DNPM e deterioro poliespícula-onda mescladas por limitar seu uso em algumas
padrão de hipsarritmia no EEG. cognitivo em 95% das crianças. ondas lentas de elevada crianças.
(10)(64) Uma das principais hipóteses amplitude (acima de 200 - Diversos estudos relatam
- Há predomínio no sexo fisiopatogênicas relaciona os microvolts), sendo marcante a eficácia de corticoides orais,
masculino, com incidência espasmos na síndrome de West ausência de concordância de como a prednisona, sendo
variando entre 1,4 e 2,5% das a um aumento na liberação do fase nos surtos de descargas e a considerado uma alternativa ao
epilepsias da infância e entre 2 e neuropeptídio-CRH ativação durante as fases iniciais ACTH. O risco de recorrência
3,5 em 10.000 nascidos vivos. (corticotrofina) no sistema do sono NREM. das crises após a suspensão do
(65) límbico e em regiões do tronco - São descritos cinco padrões corticoide oral é
encefálico. (10)(64) variantes da hipsarritmia: significativamente superior ao
(a) hipsarritmia com aumento da ACTH.
sincronização inter-hemisférica; - Vigabatrina é considerada FAE
(b) hipsarritmia assimétrica; de primeira linha,
(c) hipsarritmia com particularmente nos casos
anormalidades focais secundários à complexo
consistentes; esclerose tuberosa. Ácido
(d) hipsarritmia com episódios valproico e benzodiazepínicos
de atenuação de voltagem podem ser indicados em casos
generalizada; específicos.
(e) hipsarritmia com atividade - Em pacientes refratários às
lenta bilateral de elevada medicações habituais, podem ser
voltagem e assíncrona. A RNM- indicados topiramato,
E auxilia na definição etiológica lamotrigina, imunoglobulinas
da síndrome. (10)(65)(66) endovenosas e dieta cetogênica.

- Em crianças com lesão cerebral


focal e estrita correlação
eletrográfica e de neuroimagem,
procedimentos cirúrgicos podem
ser considerados.
- O prognóstico é reservado,
com elevada morbidade
neurológica e mortalidade
estimada em torno de 5% nos
primeiros dois anos de vida. (10)
(65)(67)(68)
DOENÇA SINAIS / SINTOMAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO

Epilepsia do lobo temporal - As crises epilépticas focais - O EEG de escalpo interictal - De modo geral, para as crises
mesial sem comprometimento da pode demonstrar anormalidade focais, a carbamazepina e
- Corresponde a consciência são bem típicas na não epileptiforme caracterizada oxcarbazepina são drogas de
aproximadamente 60% dos ELTM associada à esclerose por alentecimento intermitente primeira linha para crises
casos de ELT. Alta prevalência e mesial. nas faixas teta e delta sobre as parciais simples, parciais
elevada proporção de pacientes - O tipo de crise mais frequente regiões temporais mésio-basais. complexas ou secundariamente
com crises epilépticas refratárias se apresenta como uma - generalizadas.
ao tratamento medicamentoso. sensação de mal-estar Alguns pacientes apresentam - A fenitoína é classificada de
(69)(70)(71) epigástrico ascendente, EEG interictais repetidamente primeira linha para crises
algumas vezes caracterizada normais, não excluindo o parciais simples ou
como dor, opressão ou frio na diagnóstico de ELTM. Os secundariamente generalizadas.
região epigástrica ou torácica. registros ictais podem ser Clobazam, divalproato,
classificados quanto ao início lamotrigina e valproato são
- Os pacientes podem das crises eletrográficas em considerados de primeira linha
referir sensações dismnésticas focal, regional, lateralizado e como adjuvantes da
como deja vu ou jamais vu, ou bilateral ou difuso. carbamazepina e fenitoína. (76)
ainda medo súbito, e mais (77)(78)
raramente alucinações - O diagnóstico da esclerose
gustatórias e olfatórias. mesial pela RM se traduz por
diminuição do volume ou
- Crises autonômicas, como aumento do sinal hipocampal
piloereção, palpitação e nas seqüências ponderadas em
dilatação pupilar, podem T2, podendo ser acompanhados
também ocorrer. de modificação no formato e na
-O estrutura interna do hipocampo.
comprometimento da A atrofia hipocampal pode ser
consciência é caracterizado por unilateral ou bilateral, mais
graus variados de redução da comumente ela é assimétrica.
reatividade e responsividade ao - Anormalidades extra-
ambiente e aos vários tipos de hipocampais incluem, dentre
estímulos. Pode-se observar outras, a presença de atrofia ou
automatismos oroalimentares e aumento de sinal da amígdala, e
manuais com ocasional postura lobo temporal como um todo,
distônica contralateral ao com dilatação do corno temporal
hemisfério cerebral de origem do ventrículo lateral. (73)(74)(75)
das crises. (71)(72)(73)(74) (76)

Quadro 4 . Encefalopatias epilépticas.


Fonte: Liberalesso, Aicardi, Siegler, Mulley, Chiron, Campos, Caraballo,
Guevara-Campos, Valvo, van Rijckevorsel, Camfiel, Arzimanoglou,
Crumrine, Ferlazzo, You, Engel, Engel, West, Commission on Pediatric
Epilepsy of the International League Against Epilepsy, Brunson, Wheless,
Sharma, French, Engel, Babb, Kim, Stephen, Kobayashi, Andrade,
Williamson, Jackson, Cendes, Betting.12,50-81
CRISE EPILÉPTICA
a) Estado de mal epiléptico
O estado de mal epiléptico (EME) é uma emergência médica e é
classicamente definido como repetidas crises epilépticas ou uma crise
epiléptica prolongada capaz de provocar uma condição duradoura e
invariável.82
Na população brasileira, há ocorrência em torno de 90.000 casos de EME
por ano. A taxa de mortalidade associada ao EME é muito variável, podendo
atingir até 58% de óbitos, dependendo da etiologia. É altamente dependente
da etiologia e faixa etária acometida.83
Indivíduos com e sem história prévia de epilepsia podem apresentar
EME. Naqueles com epilepsia, a causa mais comum de EME é a interrupção
abrupta do uso de drogas antiepilépticas (DAE). Também são causas de
EME:

• Lesões estruturais (acidente vascular cerebral, traumatismo


craniano e tumores);

• alterações metabólicas (hipo ou hiperglicemia, alterações nos


níveis de cálcio, sódio, magnésio, fósforo, ureia e creatinina);

• intoxicações (teofilina, imipenem, isoniazida, clozapina,


ciclofosfamida, fentanil, meperidine, propoxifeno, antibióticos
endovenosos beta lactâmicos e suspensão abrupta de drogas como
benzodiazepínicos e barbitúricos);

• Há ainda casos secundários a doenças ou infecções sistêmicas ou


do sistema nervoso central como as meningites, encefalites e
abscessos, e uma pequena parte não terá causa definida.
a) Sinais e sintomas

• EME é uma crise epiléptica com duração maior ou igual a 30 minutos ou repetidas crises de duração menor,
porém sem recuperação da consciência entre as crises.

B) DIAGNÓSTICO

• O diagnóstico clínico não oferece dificuldades quando há manifestações motoras evidentes. Entretanto, sem
manifestações motoras ou com sinais motores sutis, o diagnóstico pode ser muito mais difícil.
• O EEG é fundamental para este diagnóstico e para seguimento, especialmente naqueles pacientes com EME
refratário e em coma induzido.
• É recomendado um exame clínico minucioso à procura de infecções sistêmicas, exame neurológico, avaliação
do fundo de olho, punção de veia calibrosa e coleta de material visando à realização dos seguintes exames
laboratoriais: hemograma, VHS, PCR, glicemia, dosagem de sódio, potássio, cálcio, fósforo e magnésio, dosagem
sérica de anticonvulsivantes (se o paciente fizer uso de tais drogas), função hepática e função renal, gasometria
arterial, urina rotina e screening toxicológico no sangue e na urina.
• Exames de imagem serão necessários para o diagnóstico de tumores, acidentes vasculares, abscessos,
hematomas etc. Havendo febre, evidência de otite, mastoidite ou infecção em quaisquer outras estruturas da face
ou rigidez de nuca, está indicada a realização de uma punção liquórica.
• Recomenda-se ainda solicitar eletrocardiograma ou o uso de monitor cardíaco e EEG tão logo seja possível.
C) tratamento

• As medidas gerais são tão importantes quanto as farmacológicas específicas. O paciente deve permanecer em
leito com grades ou proteção lateral para que se evitem as quedas e traumatismo craniano. Durante a fase clônica,
deve-se inserir uma cânula de Guedel entre os dentes, prevenindo mordeduras e lacerações na língua. Deve ser
constantemente aspirado para evitar aspiração e pneumonia aspirativa. Os sinais vitais e a temperatura devem ser
monitorados frequentemente e as vias aéreas, mantidas desobstruídas, de modo a garantir uma ventilação
adequada. Sempre que necessário, deve-se proceder à intubação orotraqueal e oxigenação para prevenir a
ocorrência de hipóxia.
• Na impossibilidade da obtenção rápida dos níveis de glicose sanguínea, sugerimos iniciar por infusão
intravenosa de 40 a 60 mL de glicose a 50% para adultos e 2 mL/kg de glicose 25% para crianças, ainda que haja
história de diabetes mellitus, com o duplo intuito de impedir lesões neuronais decorrentes da hipoglicemia e
interromper o EME se esta for sua etiologia. Caso ocorra a hiperglicemia, poderá ser facilmente corrigida após a
checagem dos resultados dos exames laboratoriais. Simultaneamente à infusão de glicose, devem ainda ser
injetados 100 a 250 mg de tiamina por via endovenosa (EV) em pacientes com história de etilismo, e de 50 a 200
mg de piridoxina em crianças menores de 18 meses de idade para o teste diagnóstico de uma condição metabólica
rara, porém tratável com piridoxina, a dependência de piridoxina.
• As drogas mais eficientes na fase aguda do EME são os benzodiazepínicos. Como não há disposição no Brasil
de lorazepam, que tem meia-vida mais longa e é a droga indicada para o tratamento inicial do EME, inicia-se com
diazepam. O diazepam é usado em bolus e sem diluição, inicialmente na dose de 10 mg em adultos (não
ultrapassar 40 mg) e 0,2 a 0,3 mg/kg em crianças, não excedendo a velocidade de infusão de 2 a 5 mg/min em
adultos e 1 mg/kg/min em crianças. Os principais efeitos colaterais são depressão da consciência e depressão
respiratória. O controle do EME pode ser obtido entre 1 e 10 minutos após a administração do diazepam.
• Quando o acesso venoso se encontra difícil, na sala de emergência, pode-se ministrar as DAE utilizando as vias
retal ou nasal. O diazepam pode ser aplicado por via retal, facilmente em crianças, sem diluição na dose de 0,3
mg/kg, infundindo através de um cateter bem fino de O2. Outra via prática em pronto-socorro é a nasal. O
midazolam pode ser instilado através de uma seringa de insulina em adultos (5-15 mg) e em crianças na dose de
0, 15 a 0,3 mg/kg.
• A fenitoína deve ser utilizada na sequência, mesmo que as crises já tenham sido abortadas, em função da alta
probabilidade de recidiva delas devido à curta meia-vida dos benzodiazepínicos. A dose de ataque de fenitoína
para adultos e crianças é de 15-20 mg/kg, em bolus, de preferência sem diluição. Caso seja necessário, pode ser
diluída em água destilada (AD), utilizando equipos de soro com filtros para a remoção dos grumos de
precipitação. A velocidade de infusão não deve ultrapassar 50 mg/min em adultos, 25 mg/min em crianças e 20
mg/min em pacientes idosos. Os principais efeitos colaterais são arritmias cardíacas e hipotensão arterial. O
controle do EME pode ser esperado entre 10 a 30 minutos da sua administração.
• Nos casos resistentes, pode-se utilizar doses adicionais de diazepam até a dose total de 30 a 40 mg em adultos e
0,4 a 0,5 mg/kg em crianças, enquanto se aguardam os efeitos da infusão da fenitoína. Em crianças, esta
sequência poderá ser modificada para fenobarbital em substituição à fenitoína, solução aquosa, e deve ser usado
na dose de 10 a 20 mg/kg EV com a velocidade de infusão de 100 mg/min. Em altas doses, os efeitos colaterais
esperados são hipotensão arterial, depressão respiratória e depressão da consciência.

Quadro 5. Estado de mal epiléptico


Fonte: Garzon, Shorvon, Kälviäinen.82,84,85

Se as crises persistirem, define-se EME refratário.

• Define-se EME refratário quando não há resposta ao tratamento


com as chamadas drogas de primeira linha, ou seja,
benzodiazepínicos, fenitoína e fenobarbital.

• Atualmente antecedendo o coma barbitúrico (tratamento clássico),


o midazolam contínuo é geralmente tentado para o controle do
EME.

• O midazolam, administrado continuamente com bomba de


infusão, é uma droga que recentemente tem sido considerada
vantajosa pela eficácia em muitos casos e em função da meia-vida
curta.86,87 Como acontece com todos os benzodiazepínicos, pode
haver tolerância e ser necessário o uso de doses progressivamente
mais altas que eventualmente demandam suportes ventilatório e
circulatório. A dose preconizada é de ataque.82

• Não havendo resposta com a administração de midazolam


contínuo, o tratamento é o coma barbitúrico, que pode ser feito
com o pentobarbital sódico ou com o tiopental sódico e requer
sempre intubação orotraqueal, ventilação e assistência em unidade
de terapia intensiva. O pentobarbital sódico tem meia-vida entre 20
e 30 horas. A dose de ataque para adultos e crianças é de 10-15
mg/kg administrados na velocidade de, no máximo, 50 mg/min.
Em seguida, instala-se a manutenção: 0,5 a 5 mg/kg/h. Bolus de 1
a 5 mg/kg até o EEG exibir surto-supressão podem ser necessários
enquanto se titula a dose de manutenção. A dose deve ser titulada
com o EEG com o intuito de manter surto-supressão (2 a 8 surtos
por minuto).
• O tiopental sódico tem menor efeito anticonvulsivante do que os
barbitúricos de ação prolongada, porém tem como principal
vantagem sua ação ultra curta, com vida média de 3 a 11 horas.
Esta vantagem, entretanto, desaparece na vigência de níveis séricos
elevados, quando a vida média passa a ser de 18 a 36 horas.
Preconiza-se para adultos e crianças a dose inicial de 3 a 5 mg/kg
em 100 a 250 mg infundidos por via endovenosa em 2 minutos,
seguida de infusão contínua na dose de 3 a 5 mg/kg/h, até que o
EEG mantenha em surto-supressão (2 a 8 surtos por minuto). A
solução deve ser preparada em soro fisiológico e não deve ser
misturada com outras drogas. A solução torna-se instável quando
exposta ao ar. As principais desvantagens são hipotensão arterial
grave, sedação e depressão respiratória, que requerem o uso
prolongado de ventiladores e a permanência dos pacientes em
unidades de terapia intensiva.

• Outra opção de tratamento, se não houver sucesso com o coma


barbitúrico, são os anestésicos. O propofol é um anestésico geral
de meia-vida muito curta (30 a 60 minutos) e extremamente
lipossolúvel, sendo sua taxa de penetração no cérebro unicamente
dependente do fluxo sanguíneo cerebral. A dose preconizada
(adultos e crianças) é de 2 mg/kg em bolus, por via endovenosa,
podendo ser repetida se necessário. A dose de manutenção é de 2 a
10 mg/kg/h em infusão contínua, devendo ser reduzida tão logo
seja possível para 1 a 3 mg/kg/h, também se utilizando O EEG
para a titulação.

• A experiência com o propofol em EME refratário ainda é


relativamente limitada, entretanto há um número de relatos
favoráveis em relação ao seu uso.88,89 Dentre as principais
vantagens em relação aos barbitúricos estão a rápida recuperação
da consciência após sua interrupção e a reduzida influência nos
parâmetros hemodinâmicos.90

• A ocorrência da síndrome da infusão do propofol, um colapso


cardiocirculatório potencialmente fatal com acidose lática,
hipertrigliceridemia e rabdomiólise, limita o seu uso,
especialmente em crianças pequenas. Outros efeitos colaterais
indesejáveis são movimentos involuntários que podem ser
confundidos com crises epilépticas ou ainda a possível ocorrência
de crises provocadas pelo propofol.

• Considerando ainda EME refratário, relatos de casos adicionando


o topiramato após todas as tentativas habituais de controle terem
falhado têm sido publicados.91-93 Considerando que o topiramato
é um anticonvulsivante com múltiplos mecanismos de ação, em
receptores e canais iônicos, pode ser mais eficiente do que as
drogas convencionais para o tratamento do EME refratário. A dose
utilizada em adultos varia de 300 a 1600 mg por dia, em três doses
diárias, e em crianças, de 2 a 12 mg/kg/dia. Os comprimidos
devem ser amassados, diluídos em água e administrados por sonda
nasogástrica. As doses são tituladas em um período de 24 a 72
horas.

• Sendo o topiramato um anticonvulsivante com múltiplos


mecanismos de ação, atuando em receptores e canais iônicos, esta
droga pode apresentar melhor eficácia do que as drogas
convencionais nos casos de EME refratário.82

• Outras alternativas para o EME refratário que não foram


controlados com o coma barbitúrico incluem a lidocaína (dose de
ataque de 1 a 2 mg/kg, em bolus, e dose de manutenção entre 1,5 a
3,5 mg/kg/h em adultos ou 6 mg/kg/h em crianças), os anestésicos
halotano e isoflurano (requerem a presença de anestesiologista,
sendo sua inalação muitas vezes impraticável pela duração do
EME, que pode ser de horas ou dias) e o paraldeído (pode ser
diluído em solução salina, em concentração entre 4 a 6%, doses de
0,1 a 0,15 mL/kg, por via endovenosa, ou ainda por via intraretal,
diluído em óleo vegetal 1:1 ou 2:1, dose de 0,3 a 0,5 mL/kg).

ABORDAGEM INICIAL E MANEJO DAS


CRISES EPILÉTICAS NA EMERGÊNCIA
Fluxograma 1. Algoritmo para abordagem de estado de Mal Epilético na
Emergência.
Fonte:

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8.7
MALFORMAÇÕES NA INFÂNCIA
Autores:
Millena Nogueira Oliveira
Breno Araújo Barbosa
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
• MALFORMAÇÕES NA INFÂNCIA: Possui um amplo
espectro de acometimento do neuroeixo, desde alterações císticas
até agenesias.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Dentre as malformações, os cistos de aracnoide são as
malformações císticas mais comuns do SNC. A sua incidência é 5
por 1.000 nascidos vivos. Corresponde a aproximadamente 1%
das lesões císticas intracranianas. Dentro das desordens da
neurolação, a mielomeningocele é a mais comum. Sua incidência
nos EUA é de 0,2-0,4/1000 nascidos vivos.

ETIOLOGIAS DE MALFORMAÇÕES NA INFÂNCIA


Cisto de aracnoide intracraniano e medular

Craniossinostose

Encefalocele

Malformação de Dandy-Walker

Estenose de Aqueduto Cerebral

Agenesia de Corpo Caloso

Hamartomas hipotalâmicos

Disrafismo espinhal (Espinha Bífida)


ETIOLOGIAS DE MALFORMAÇÕES NA INFÂNCIA
Mielomeningocele

Síndrome de Klippel-Feil

Síndrome da Medula Presa

Malformação de Chiari do Tipo 1

Malformação de Arnold-Chiari Tipo 2

Defeitos de Tubo Neural

Cisto neuroentérico

Quadro 1. Etiologias de Malformações na Infância


Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

• A fisiopatologia das malformações é complexa, podendo


acometer a parte óssea (craniofacial) e encéfalo. A maioria
decorre de anomalias durante o desenvolvimento embrionário ou
de infecções intrauterinas (p.ex.: rubéola, CMV, HSV). Outras não
possuem nenhuma causa aparente para sua causa, ou seja,
idiopáticas. Incluem anomalias da linha média, fossa posterior,
hidrocefalia, anormalidades destrutivas, cistos, tumores da caixa
craniana e defeitos do tubo neural.

QUADRO CLÍNICO DE MALFORMAÇÕES


Craniossinostose: também conhecida como cranioestenose. É o
fechamento prematuro das suturas cranianas. O crânio do neonato possui
duas principais fontanelas: fontanela anterior (bregmática) e fontanela
posterior (lamboide). A fontanela anterior é a maior fontanela, tem forma de
diamante (ou losango) e possui dimensões de 4 cm anteroposterior por 2,5
cm transverso. Ela se fecha por volta aos 2,5 anos de idade. A fontanela
posterior é menor, tem forma triangular e geralmente se fecha aos 2-3 meses
de idade. A presença das fontanelas é para permitir o rápido crescimento do
encéfalo em desenvolvimento, permitindo que a criança adquira seu
desenvolvimento neuropsicomotor adequado. Este crescimento do tecido
neural ocorre até os 2 anos de idade. Com fechamento precoce do crânio,
gera uma rigidez e não permite o crescimento encefálico.
O quadro 2 resume as formas de craniossinostose e as suturas cranianas
acometidas.
Tipo Sutura acometida
BRAQUIOCEFALIA Coronal e/ou lamboidea

ESCAFOCEFALIA (DOLICOCEFALIA) Sagital

TRIGONOCEFALIA Metópica

PLAQUIOCEFALIA Lamboidea

PLAGIOCEFALIA Coronal ou lambdoidea unilateral

ACROCEFALIA Todas ou coronária mais uma outra

Quadro 2. Formas de Craniossinostose


Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

• Microcefalia: Circunferência craniana menor que 3 desvios-


padrão (-3 DP). É uma condição heterogênea e pode ser causada
por processos destrutivos (ex.: infecções intrauterinas, injúria
hipóxica-isquêmica) ou genética, uma diminuição da proliferação
neuronal. Há casos de associação entre a microcefalia com a
lissencefalia, um quadro extremamente grave denominado de
microlissencefalia.
a) MALFORMAÇÕES DO TUBO NEURAL
As malformações encefálicas são divididas de acordo com a
Classificação de Lemire.
Tipo Sutura acometida

- Craniorraquisquise
DEFEITOS DA
- Anencefalia
NEURULAÇÃO
- Mielomeningocele

Cranianas
- Microcefalia
- Hidranencefalia
- Holoprosencefalia
DEFEITOS
- Lissencefalia
PÓS-NEURULAÇÃO
- Porencefalia
- Agenesia de Corpo Caloso
- Síndrome de Dandy-Walker
- Macroencefalia (Megalencefalia)
Tipo Sutura acometida
- Diastemeatomielia
ESPINAIS - Diplomielia
- Hidromielia/Siringomielia

Quadro 3. Classificação de Lemire


Fonte: Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery, 8th ed. Nova York:
Thieme Medical Publishers; 2016.

• Lissencefalia: Anormalidade da migração mais grave. Ocorre


uma malformação dos giros cerebrais. Formas: agiria (superfície
completamente lisa); paquigiria (poucos giros amplos e achatados
com sulcos rasos); polimicrogiria (pequenos giros com sulcos
rasos). As manifestações clínicas e sua severidade dependem do
grau de anormalidade estrutural. Há comprometimento severo
cognitivo, motor e epilepsia do tipo espasmo infantil.

• Heterotopia: Focos anormais de substância cinzenta que podem


estar em qualquer lugar (substância branca, sistema ventricular).

• Hemimegalencefalia: Aumento unilateral de um dos hemisférios


cerebrais associado ao crescimento corporal ipsilateral,
ventriculomegalia e anormalidades dos giros.

• Esquizencefalia: Fenda que se comunica com o ventrículo. Duas


formas: lábio aberto (Tipo I) – fenda grande para os
ventrículos; e lábio fechado (Tipo II) – paredes fundidas.

• Encefalocele: Também conhecida como cefalocele, é uma


extensão das estruturas intracranianas para fora dos limites
normais do crânio. Isto é, há uma protusão das meninges e tecido
cerebral.

• Holoprosencefalia: É uma anomalia da linha média causada pela


falha da separação do prosencéfalo durante a formação do cérebro
e dos ventrículos laterais dos hemisférios. Ausência da separação
dos hemisférios cerebrais resultando em um hemisfério único com
ventriculomegalia. A etiologia é heterogênica, desde causas
genéticas (trissomias do 13 e do 18) a ambientais (principalmente
diabetes gestacional). Pode ser classificada de acordo com sua
gravidade em alobar, semilobar e lobar. A holoprosencefalia
alobar é sua forma mais grave, pois o cérebro é pequeno, esférico,
com ventrículo único, sem corpo caloso e cavum do septo
pellucidum. As formas lobar e semilobar (o cérebro não é
pequeno, os lobos e a fissura inter-hemisférica são rudimentares
na região occipital, não há cavum do septo pellucidum, mas tem
fusão talâmica) e elas são menos graves. A holoprosencefalia é
rara (1/16.000 nascidos vivos).

• Malformação de Dandy-Walker: Presente em cerca de 1 para


25.000-35.000 nascidos vivos. Não tem uma fisiopatologia muito
bem definida. Entretanto, postula-se que a causa inicial seja um
desenvolvimento anormal do rombencéfalo e atrofia do teto do IV
ventrículo, o que resulta na tríade da síndrome agenesia de vermis
e hemisférios cerebelares com um grande cisto da fossa posterior
comunicando com um IV ventrículo grande (> 10 mm). Tem
como diagnóstico diferencial a variante de Dandy-Walker, cisterna
magna proeminente e cisto de aracnoide.

• Agenesia de Corpo Caloso: Falha de comissuração resulta na


expansão do III ventrículo e separação dos ventrículos laterais.
Pode ser parcial ou total. Na parcial, a porção posterior do corpo
caloso é mais acometida.

• Cisto de Aracnoide: Também chamado de cisto leptomeníngeos.


São lesões congênitas que surgem durante o desenvolvimento a
partir da divisão da membrana aracnoide; logo, são cistos intra-
aracnoideos, e contêm líquido semelhante ao LCR, embora esses
cistos não possuam comunicação com o sistema ventricular e com
o espaço subaracnoideo. A maioria é assintomática. Pode ter
sintomas de hipertensão intracraniana (cefaleia, paralisia de nervo
craniano, letargia), convulsões, deteriorização súbita.
• Estenose do Aqueduto: Cefaleia de hipertensão intracraniana,
alterações visuais – redução da visão periférica, quadrantopsia ou
hemianopsia, alterações endócrinas (irregularidade menstrual,
hipotireoidismo e hirsutismo), papiledema, comprometimento
intelectual, espasticidade.

• Agenesia de Corpo Caloso: Pode ser parcial ou total. Na


agenesia parcial, sempre será perdido o rostro (porção posterior).
Está associado a várias outras malformações do sistema nervoso
central, como hidrocefalia, porencefalia, microcefalia,
encefalocele, holoprosencefalia, microgiria, arrinencefalia, atrofia
óptica, espinha bífida aberta e síndrome de Dandy-Walker. O
quadro clínico inclui puberdade precoce, convulsões, retardo
mental, alterações da pigmentação da retina.

• Disrafismo Espinal (Espinha Bífida) Oculta: Ausência


congênita de um processo espinhoso sem exposição visível de
meninges ou de tecido neural. A Meningocele é um defeito
congênito nos arcos vertebrais com distensão cística das
meninges, mas sem anormalidades de tecido neural. A
Mielomeningocele é um defeito congênito que ocorre na terceira
semana de gestação, em que os arcos vertebrais têm uma dilatação
cística de meninges e anormalidades estrutural ou funcional da
medula espinhal ou da cauda equina. A meningocele e a
mielomeningocele são defeitos do tubo neural aberto (ou espinha
bífida aberta).

• Síndrome de Klippel-Feil: Fusão congênita de duas ou mais


vértebras cervicais e varia da fusão somente dos corpos até a
fusão de todas as vértebras. Resultante da falha na segmentação
normal de somitos cervical durante a 3ª-8ª semana de gestação.

• Síndrome da medula presa: Cone medular anormalmente baixo.


Geralmente associado a um filo terminal curto e espessado ou
com lipoma intradural.
• Malformações de Chiari: 4 tipos de anormalidades do cérebro
posterior. A malformação de Arnold-Chiari Tipo 2 não resulta de
aprisionamento da medula pela mielomeningocele. É causada pela
disgenesia primária do tronco encefálico associado a outros
distúrbios do desenvolvimento.

• Mielomeningocele: A hidrocefalia está frequentemente associada


(cerca de 90% dos casos) à presença da malformação de Arnold-
Chiari (Chiari Tipo 2). Possui quadro clínico como paraparesia,
paraplegia, presença de nível sensitivo. Há sinais de tronco
encefálico devido à presença de malformações nessa topografia.

• Síndrome de Klippel-Feil: Tríade clássica (baixa implantação


dos cabelos, pescoço curto, limitação dos movimentos do
pescoço).

• Síndrome da Medula Presa: achados cutâneos – hipertricose,


descoloração hemangiomatosa, dificuldade de marcha, atrofia
muscular visível, déficit sensorial, disfunção da bexiga, dor nas
costas, pernas ou arcos dos pés.

• Malformação de Chiari do tipo 1: Cefaleia em região


suboccipital, cervicalgia, hemiparesia ou hemiplegia de membros,
disbasia, disfasia, zumbido, vômitos, disartria.

• Malformação de Arnold-Chiari (Chiari do tipo 2): Luxação


caudal da junção cervicomedular, ponte, IV ventrículo e medula
espinhal. As tonsilas cerebelares estão no nível ou abaixo do
forame magno. Frequente associação com siringomielia.

EXAME FÍSICO
O exame físico de paciente com malformações deve ser completo
(exame físico geral e segmentar), pois a maioria delas apresenta outros
distúrbios embriológicos subjacentes (ex.: cardiopatia, pneumopatias).
• Ectoscopia: Aumento da circunferência craniana, alterações no
crânio – craniossinostose, fácies sindrômicas (Síndrome de
Crouzon – disostose craniofacial; Síndrome de Apert –
acrocefalossindactilia; Síndrome de Kleeblattschadel), baixa
implantação dos cabelos, pescoço curto, macrocefalia,
microcefalia, sindactilia, pé torto.

• Palpação: palpação de uma proeminência óssea sobre a sutura


sinostótica suspeita (craniossinostose).

• Exame Físico Neurológico: Podem ser encontrados vários


achados: hiperreflexia, hemianopsia, quadrantopsia, nistagmo
horizontal e verticical, hiperreflexia de membros inferiores, ataxia
da marcha, dismetria, disbasia, sinal de Babinski, fasciculações,
diminuição de trofismo muscular em membros inferiores
(mielomeningocele).

EXAMES COMPLEMENTARES
• USG: Sinal do limão – presente em muitos casos de
mielomeningocele, avaliar a fraqueza de membros inferiores. Esse
sinal é caracterizado pela concavidade do osso frontal próximo à
sutura coronal devido à hipotensão liquórica. Presença de
ventriculomegalia avaliada por meio da medida do átrio do
ventrículo lateral maior que 10 mm. Presença do sinal da banana
(cerebelo em forma de banana) está presente quando há herniação
de estruturas da fossa posterior. Esses achados estão relacionados
com mielomeningocele.

• TC de Crânio
• RNM de Neuroeixo
TRATAMENTO
a) TRATAMENTO DA HIDROCEFALIA

• Craniectomia linear em “faixa”: Craniossinostose


• Malformação de Dandy-Walker: Descompressão precoce da
ventriculomegalia. Sem hidrocefalia o tratamento é expectante.

• Estenose de Aqueduto: Derivação (geralmente, DVP -


ventriculoperitoneal); derivação de Torkildsen (derivação de um
ventrículo lateral para a cisterna magna); terceiroventriculostomia
endoscópica.

• Mielomengiocele: Deve ser fechada dentro de 24 horas, com a


membrana intacta ou não. O fechamento precoce mostrou
menores taxas de infecção, embora não haja uma melhora da
função neurológica. Se houver hidrocefalia associada, deve-se
esperar pelo menos 3 dias após o reparo da mielomeningocele
para realizar a derivação. Nos pacientes que apresentarem
mielomeningocele e hidrocefalia aguda (ventriculomegalia e
sinais de hipertensão intracraniana), pode-se realizar o reparo da
mielomengiocele com a derivação. Nos pacientes com
malformação de Arnold-Chiari, deve-se realizar uma
laminectomia cervical alta para reduzir a compressão da tonsila
cerebelar e do tronco encefálico. Esse procedimento é realizado
mais acertadamente nas primeiras semanas de vida. Além disso,
deve-se realizar um acompanhamento ortopédico para prevenção
e tratamento de deformidades e escoliose e, é necessário um
cuidado multidisciplinar.

• Síndrome da Medula presa: Se for apenas um filamento


encurtado, realiza-se uma laminectomia lombossacral.
• Malformação de Chiari tipo 1: Tratamento cirúrgico para os
pacientes sintomáticos.

• Malformação de Arnold-Chiari do tipo 2: Derivação se


hidrocefalia; descompressão de fossa posterior se disfagia
neurogênica, estridor ou surtos de apneia.

REFERÊNCIAS
1. McDowell MM, Blatt JE, Deibert CP, Zwagerman NT, Tempel ZJ, Greene S. Predictors of
mortality in children with myelomeningocele and symptomatic Chiari type II malformation.
J Neurosurg Pediatr. 2018; 21(6): 587-96.
2. Heuer GG, Moldenhauer JS, Scott Adzick N. Prenatal surgery for myelomeningocele:
review of the literature and future directions. Childs Nerv Syst. 2017; 33(7): 1149-55.
3. Cavalheiro S, da Costa MDS, Mendonça JN, Dastoli PA, Suriano IC, Barbosa MM, et al.
Antenatal management of fetal neurosurgical diseases. Childs Nerv Syst. 2017; 33(7):
1125-41.
4. Gaitanis J, Tarui T. Nervous System Malformations. Continuum (Minneap Minn). 2018
February; 24(CHILD NEUROLOGY): 72-95.
5. Bunduki V, Zugaib M. Atlas of Fetal Ultrasound. Nova York: Springer International
Publishing AG; 2018.
8.9
SEDAÇÃO E ANALGESIA
Autores:
Mateus Gonçalves de Sena Barbosa
Nícollas Nunes Rabelo

INTRODUÇÃO
• Hodiernamente, é alarmante a quantidade de pacientes internados
na UTI, visto que esses estão internados por diversas doenças.
Todavia, o que é mais comum entre os pacientes na UTI é a
presença de emoções como ansiedade, nervosismo, medo, tristeza,
dentre outras. Ademais, na maioria das vezes, em consonância a
essas emoções, há também a dor física, em virtude de algum
trauma real ou potencial.

• Graças ao avanço das ciências médica, atualmente, há diversos


mecanismos de tentativa que possibilitam a supressão ou
minimização do grau de dor. Isto é, pela analgesia ou sedação,
permite-se um maior conforto psicológico e físico para os
pacientes, seja no momento de realização do procedimento
cirúrgico ou de estado na própria UTI.

• Dessa forma, indubitavelmente, a analgesia e a sedação são


métodos de tentar assegurar o princípio estabelecido por
Hipócrates, o qual é: “antes de tudo, não cause dano”.

DEFINIÇÕES
a) Analgesia
• É a anulação da sensibilidade à dor sem provocar a cessação da
sensibilidade das demais propriedades sensitivas, e sem perda de
consciência.1
b) Sedação

• É o uso de medicamentos com o intuito de promover conforto ao


paciente para a efetuação de procedimentos tanto médicos quanto
odontológicos. Isto é, suavização da ansiedade, da inquietação e
estimulação de um estado de calma e tranquilidade. Sendo que há a
possibilidade de envolver hipnose.2

CLASSIFICAÇÕES / TIPOLOGIAS
a) Sedação

• Conforme sua etiologia, classifica-se nos níveis:


• Mínimo.
• Moderado (sedação consciente).
• Profundo.3

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
a) Dor

• Ansiedade pré-operatória. 4

• Dor aguda pós-operatória:


• Craniotomia.
• Prostatectomia transvesical.
• Pinçamento de aneurisma cerebral.4,5
• Espontâneas:
• Pós-traumatismos.4

QUADRO CLÍNICO
a) DOR
A definição geral de dor é uma experiência sensorial e/ou emocional
desprazerosa, relacionada a uma lesão real independente de sua etiologia e
natureza ou a um dano potencial a algum tecido.6
O mecanismo neurofisiológico da dor está representado no Fluxograma
1.

Fluxograma 1. Neurofisiologia da dor.


Fonte: Lago.7

• Dor aguda
• Surge com uma lesão ou injúria, e substâncias algogênicas são
produzidas localmente e dispersas, de modo que estimula as
terminações nervosas (nociceptores) de fibras amielínicas ou
mielínicas finas. Caso essa dor se prolongue por um determinado
período significativo, em virtude da ativação de diversas vias
neuronais nesse intervalo de tempo, faz com que ela se altere de
aguda para crônica. Isso em consonância com fatores biológicos,
psicológicos e sociais.6

• Dor crônica
• Não está relacionada com a permanência ou surgimento de
modificações neurovegetativas (sinais de alerta), já que ela não é
um sintoma, e sim a persistência da doença. Por exemplo, esse
tipo de dor não acaba após a cura da lesão.6
• De acordo com a literatura, a dor crônica perdura por um tempo
mínimo de dois meses.6
• Sua constância e sua duração prolongada são responsáveis por:
alterações no sono, em atividades físicas, baixa autoestima,
pensamentos negativos ou suicidas, modificações das relações
familiares, de trabalho e de lazer.6

• Dor crônica persistente pós-operatória (DCPO)


• Baseia-se em um grave problema de saúde, o qual reduz bem a
qualidade de vida dos pacientes acometidos.8
• Permanece pelo menos dois meses após o procedimento
cirúrgico, quando se excluem quaisquer causas de dor, como
câncer ou infecção crônica.8
• A dor neuropática decorrente de trauma cirúrgico é a mais
comum dessa entidade complexa.8
• A DCPO é iniciada por um evento e permanece
independentemente do que a causou.8
• Do ponto de vista clínico, há dor evocada pelo toque cirúrgico,
pela respiração, pelo movimento, pela tosse ou atividade
gastrointestinal. Além disso, também pode ser evocada pelo
dano nervoso.8
• Essa dor tem sido o principal fator quando se trata do retorno do
indivíduo às atividades cotidianas, seja interferindo na
produtividade do trabalho, estudo ou até do lazer.8
• A incidência de pacientes que adquirem essa dor após
procedimentos cirúrgicos tanto de pequena complexidade quanto
de alta complexidade varia entre 5% e 80%.8
• Os fatores que podem estar relacionados à dor crônica
persistente pós-operatória são: idade, histórico de cirurgias
prévias, técnica cirúrgica usada, lesão de nervos, isquemia
muscular, tipos de anestesia analgesia, carga genética, obesidade
e aspectos socioculturais.8
b) OBJETIVOS CENTRAIS DA SEDAÇÃO E ANALGESIA

• Indubitavelmente, nas diversas UTIs estão presentes: dor,


agitação, ansiedade, desconforto e insônia por parte dos pacientes.9

• Quando se trata de Terapia Intensiva, suas sustentações são:


analgesia e sedação. Dessa forma, essas duas sustentações são
mecanismos que visam promover conforto e bem-estar aos
pacientes, principalmente àqueles que se encontram em estado
grave.9

• A sedação possibilita redução de resposta ao estresse e à


ansiedade, e ainda promove amnésia de eventos desagradáveis,
elevando também a tolerância ao suporte ventilatório.9
c) AVALIAÇÃO DA DOR QUADRO CLÍNICO

• Constantemente, os pacientes em UTI sentem dores, seja no


período de repouso, seja no momento de realização dos
procedimentos adequados a eles. Diante disso, é necessária a
avaliação da dor, a fim de compreender a real situação do paciente
e submetê-lo ao tratamento preciso. Há diversos instrumentos de
avaliação da dor; no entanto, nem sempre todos estão disponíveis
para o paciente em análise, em virtude do estado do paciente e das
disponibilidades oferecidas pelo hospital em questão.9
d) CURIOSIDADE RELEVANTE
No Quadro 1 está apresentando uma curiosidade acerca da dor.

A “dor é o quinto sinal vital”, uma vez que os quatro sinais vitais são: pulso, pressão arterial,
temperatura e frequência respiratória. Diante dessa consideração, percebe-se a real importância
da compreensão das dores dos pacientes, posteriormente, poderá executar a analgesia ou
sedação ideal para tal paciente.

Quadro 1. Curiosidade relevante do quinto sinal.


Fonte: Garcia H, White Jr A. et al

e) INSTRUMENTOS PARA A MENSURAÇÃO DE DOR


(QUADRO CLÍNICO)

• Escala unidimensional:
• Escala verbal numérica.
• Escala visual numérica (EVN).
• Escala visual analógica (EVA).
• Escala de faces.
• Escala de categoria de palavras (escala de descritores verbais).
• Escala comportamental.9
• Escala multidimensional:
• Inventário de McGill.
• Breve inventário de dor.
• Escala de Oswestry. 9

• Escala Verbal Numérica (varia de 0-10)


A seguir na Tabela 1 está a representação da Escala Verbal Numérica.
Classificação Valores
Dor ausente Intensidade = 0

Dor fraca Intensidade ≤ 3

Dor moderada Intensidade de 4-6

Dor intensa Intensidade de 7-9

Dor insuportável Intensidade = 10

Tabela 1. Classificações de dores correspondentes a sua intensidade.


Fonte: Drummond.10 Escala Visual Numérica (EVN)

Figura 1. Ilustração da escala visual numérica.


Fonte: Ministério da Saúde.11

• Escala Visual Analógica (EVA)


→ É uma ferramenta de avaliação e controle da analgesia e sedação na
UTI, que mensura a intensidade de dor.11

Figura 2. Ilustração da escala visual analógica.


Fonte: Ministério da Saúde.11
• Escala de Faces

Figura 3. Ilustração da escala de faces.


Fonte: Ministério da Saúde.11

• Escala de Categoria de Palavras

Figura 4. Ilustração da escala de descritores verbais.


Fonte: Ministério da Saúde.11

• Escala Comportamental (Behavioral Pain Scale)


A seguir na Tabela 2 está a representação da Escala Comportamental.
Item Descrição Pontuação

• Relaxada 1
EXPRESSÃO • Parcialmente contraída, como abaixamento palpebral 2
FACIAL • Completamente contraída (olhos fechados) 3
• Contorção facial 4

MOVIMENTO • Sem movimento 1


DOS • Movimentação parcial 2
MEMBROS • Movimentação completa com flexão dos dedos 3
SUPERIORES • Permanentemente contraídos 4

CONFORTO • Tolerante 1
COM O • Tosse; porém, tolerante à ventilação mecânica na maior parte do tempo 2
VENTILADOR • Brigando com o ventilador 3
MECÂNICO • Sem controle da ventilação 4
Tabela 2. Valores correspondentes às descrições da escala comportamental.
Fonte: Gouvêa.9

• Inventário De Mcgill
→ São descritores fragmentados em quatros grupos:
• Sensorial discriminativo.
• Afetivo motivacional.
• Avaliativo cognitivo.
• Miscelânea.12

• Breve Inventário de Dor


→ Composto por:
• Influência da dor na habilidade para caminhar.
• Atividades rotineiras do paciente tanto no trabalho quanto em
outras atividades sociais.
• Humor.
• Sono.
• Intensidade.12

• Escala de Oswestry
→ É uma ferramenta doença-específica a fim de avaliar as desordens da
coluna. São avaliados dez critérios com seis alternativas de resposta
para cada.13
→ Para cada seção de seis afirmações, o ponto total é 5. Caso a primeira
afirmação seja marcada, o ponto é 0. Caso seja o último, o ponto é 5.
As afirmações intermediárias são pontuadas conforme este ranque.
Caso mais de uma afirmação seja assinalada em cada seção, deve-se
escolher o maior ponto. Se todas as 10 seções forem completadas, a
pontuação é calculada da seguinte forma: se deu 16 pontos totais,
uma vez que são 50 os pontos possíveis, 16/50 x 100= 32%. Se uma
seção não for marcada, a pontuação é calculada da seguinte forma,
conforme o exemplo de pontuação máxima de 16: 16/40 X 100=
35,5%. O autor sugere arredondar a porcentagem para um número
inteiro.13
→ Leitura dos resultados:
• 0% a 20% - incapacidade mínima.
• 21%a 40% - incapacidade moderada.
• 41% a 60% - incapacidade intensa.
• 61% a 80% - aleijado.
• 81% a 100% - inválido.13
→ Leitura dos resultados no pós-operatório:
• O% a 20% - excelente.
• 21% a 40% - bom.
• 41% a 60% - inalterado.
• > 60% - piora.13
→ Seção 1: Intensidade da dor.
Sem dor no momento

A dor é leve nesse momento

A dor é moderada nesse momento

A dor é mais ou menos intensa nesse momento

A dor é muito forte nesse momento

A dor é a pior imaginável nesse momento

Tabela 3. Seção 1 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

→ Seção 2: Cuidados pessoais.


Eu posso cuidar de mim sem provocar dor extra

Posso me cuidar, mas me causa dor

É doloroso me cuidar e sou lento e cuidadoso


Preciso de alguma ajuda, mas dou conta de me cuidar

Preciso de ajuda em todos os aspectos para cuidar de mim

Eu não me visto, tomo banho com dificuldade e fico na cama

Tabela 4. Seção 2 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

→ Seção 3: Pesos.
Posso levantar coisas pesadas sem causar dor extra

Se levantar coisas pesadas, sinto dor extra

A dor me impede de levantar coisas pesadas, mas dou um jeito, se estão bem posicionadas, e.g., numa mesa

A dor me impede de levantar coisas pesadas, mas dou um jeito de levantar coisas leves ou pouco pesadas se
estiverem bem posicionadas

Só posso levantar coisas muito leves

Não posso levantar nem carregar nada

Tabela 5. Seção 3 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

→ Seção 4: Andar.
A dor não me impede de andar (qualquer distância)

A dor me impede de andar mais que 2 Km

A dor me impede de andar mais que ? Km

A dor me impede de andar mais que poucos metros

Só posso andar com bengala ou muleta

Fico na cama a maior parte do tempo e tenho que me arrastar para o banheiro

Tabela 6. Seção 4 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13
→ Seção 5: Sentar.
Posso me sentar em qualquer tipo de cadeira pelo tempo que quiser

Posso me sentar em minha cadeira favorita pelo tempo que quiser

A dor me impede de sentar por mais de 1 hora

A dor me impede de sentar por mais de meia hora

A dor me impede de sentar por mais que 10 minutos

A dor me impede de sentar


Tabela 7. Seção 5 da escala de Oswestry.
Fonte: Martinez.13

→ Seção 6: De pé.
Posso ficar de pé pelo tempo que quiser sem dor extra

Posso ficar de pé pelo tempo que quiser, mas sinto um pouco de dor

A dor me impede de ficar de pé por mais de 1 h

A dor me impede de ficar de pé por mais de meia hora

A dor me impede de ficar de pé por mais de 10 minutos

A dor me impede de ficar de pé

Tabela 8. Seção 6 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

→ Seção 7: Sono.
Meu sono não é perturbado por dor

Algumas vezes, meu sono é perturbado por dor

Por causa da dor durmo menos de 6 horas

Por causa da dor durmo menos de 4 horas

Por causa da dor durmo menos de 2 horas

A dor me impede de dormir

Tabela 9. Seção 7 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

→ Seção 8: Vida sexual (se aplicável).


Minha vida sexual é normal e não me causa dor extra

Minha vida sexual é normal, mas me causa dor extra

Minha vida sexual é quase normal, mas é muito dolorosa

Minha vida sexual é muito restringida devido à dor

Minha vida sexual é praticamente inexistente devido à dor

A dor me impede de ter atividade sexual

Tabela 10. Seção 8 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

→ Seção 9: Vida social.


Minha vida social é normal e eu não sinto dor extra

Minha vida social é normal, mas aumenta o grau de minha dor

A dor não altera minha vida social, exceto por impedir que faça atividades de esforço, como esportes etc.

A dor restringiu minha vida social e eu não saio muito de casa

A dor restringiu minha vida social a minha casa

Não tenho vida social devido à minha dor

Tabela 11. Seção 9 da escala de Oswestry.


Fonte: Martinez.13

TRATAMENTO
a) RECOMENDAÇÕES DE ANALGESIA NA UTI

• As primeiras opções para administração da dor em UTI são os


opioides, uma vez que seu uso deve ser individualizado para cada
paciente. Há outros tipos de analgésicos que podem ser utilizados
de maneira adjuvante e a fim de diminuir a necessidade de
opioides, como paracetamol, anti-inflamatórios não esteroidais
(AINES), anticonvulsivantes e anestesias locorregionais. Todavia,
não há estudos e pesquisas que demonstram sua eficácia e
segurança quando administrados isoladamente.14,15

• A seleção do opioide depende do paciente, da farmacocinética e


farmacodinâmica.14,15

• Os opioides são de fácil titulação. Além disso, possuem efeitos


rápidos, são de custo pequeno e provocam níveis baixos
acumulados de metabólicos.14,15

• A inspeção da situação do paciente também é de extrema


importância, visto que, se um lençol estiver mal dobrado, ou um
cateter mal posicionado, dentre outras coisas, pode gerar dor e
desconforto ao paciente em questão. Sendo assim, as inspeções
evitam o uso de analgésicos sem real necessidade, já que nesse
caso é simples de resolver o causador da dor do paciente.14,15
• A seguir na Tabela 12 está a representação das diversas relações
de tratamentos farmacológicos.
Tipo Tratamento Considerações
de dor farmacológico adicionais

Esse tratamento deve ser


considerado como primeira escolha,
DOR LEVE Analgésicos simples, como contanto que seja por um
(ESCALA EVA ENTRE 1-2) dipirona e paracetamol período curto e em pacientes
sem risco de ocultar a
ocorrência de febre

Associação de um analgésico simples a


DOR MODERADA
um opioide fraco ou derivado, como o
(EVA ENTRE 3-7)
tramadol

Administração do opioide forte de forma


DOR INTENSA
Opioide forte, como morfina contínua ou intermitente, de acordo com o
(EVA > 8)
controle dos sintomas

Tabela 12. Relação do tratamento farmacológico indicado conforme o tipo


de dor do paciente.
Fonte: Okada, SPDM.15,16

b) PRINCIPAIS AGENTES ANALGÉSICOS

• AINEs:
• Possuem atividade analgésica, antipirética, uricosúrica e anti-
inflamatória. São recomendados no tratamento de dores de
intensidade: pequena e média. Cabe ressaltar que esses fármacos
são pouco eficazes quando se trata de dores neuropática. Além
disso, os AINES amenizam a precisão do uso de opioides; em
decorrência disso, os efeitos colaterais relacionados ao uso de
opioides.17-21
• Ademais, os AINES podem ser mais tóxicos nos neonatos, de tal
maneira a provocar anormalidades hepáticas, renais, cardíacas
(retenção hídrica), intestinais e plaquetárias. Além disso, existe
relatos de casos sobre sangramento gastrointestinal e de
nefropatia e elevação de sangramento pós-operatório
(cetorolaco) em crianças.22
• É importante retratar que aspirina é pouco administrada para
neonatos, em virtude da sua duradoura eliminação, da chance de
afastamento da bilirrubina da albumina, da não agregação
plaquetária e da possibilidade de causar a Síndrome de Reye.23,24
A seguir na Tabela 13 está a representação dos AINES mais utilizados na
pediatria com suas respectivas doses.
Agente farmacológico Doses de administração

10-15 mg/kg VO 4/4h


ASPIRINA
Máxima dose diária 90-120 mg/kg

10-20 mg/kg VO 4/4h


20-40 mg/kg Via retal 6/6h
Máximo dose diária:
ACETAMINOFENO
· Crianças: 90 mg/kg
· Lactentes: 60 mg/kg
· Neonatos : 45 mg/kg

DIPIRONA 20-25 mg/kg 6/6h

IBUPROFENO 5-10 mg/kg 6/6h


NAPROXENO 6-8 mg/kg 8/8-12/12h

Tabela 13. Os AINEs mais adotados em pediatria e suas respectivas doses.


Fonte: Okada.15

• Opioides:
• Em casos de dor intensa, principalmente pós-operatório ou pós-
traumatismo, os opioides potentes de ação curta são os agentes
mais recomendados e utilizados. Além disso, esses agentes são
muito eficazes em tratamentos de dores crônicas, como geradas
por neoplasias malignas, problemas de falcização e artrite
reumaoóide em crianças e adolescentes.25-30
• Podem ser utilizados em neonatos e ainda possuem muitas vias
possíveis de administração, tais como: VO, IM, IV, via retal,
transdérmica, sublingual, epidural, intratecal, intraventricular ou
intra-articular. A vantagem de se fazer IV durante a operação é
porque diminui a precisão de anestésicos e possibilita analgesia
pós-operatória.31-33
• A seguir na Tabela 14 está a representação dos principais
opioides utilizados em UTI e suas especificações.
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

Intravenosa (IV), Analgesia +++


MORFINA 1 amp + NaCL 0,9%
Entre 2-4h subcutânea (SC) 2 a 10 Sedação + Depr.Resp
(10 MG) AMP 2 ML 8m (1 mg/mL)
mg/bolus +

Analgesia ++
MORFINA Intravenosa, subcutânea
Entre 2-4h Sem diluição Sedação + Depr. Resp
(2 MG) AMP 2 ML 2 mg/bolus
+

Analgesia +++
2 Frascos + NaCl
FENTANIL (50 MCG/ML) Entre Intravenosa 25 a 100 Sedação + Depr. Resp
0,9% 80 mL (10
FRASCO 10 ML 30-60 min mcg/ bolus +++
mcg/mL)
*Contexto-sensitivo

Analgesia +++
REMIFENTANIL Equivalente ao Intravenosa 0,2-0,7 1 frasco + SG 5%
Sedação + Depr.Resp
(2 MG/5 ML) período de infusão mcg/kg/h 95mL (4 mcg/mL)
+++

Intravenosa, Analgesia +++


1 amp + 100 mL
TRAMADOL Entre 6-8h intramuscular (IM) 50- Sedação + Depr.Resp
NaCl 0,9%
100 mg a cada 6 ou 8h +

Intravenosa / subcutânea Analgesia +++


NALBUFINA Entre 5 horas /intramuscular 10 mg de Sem diluição Sedação + Depr. Resp
3-6 horas +

Via Oral (VO): Analgesia +++


VO 8/8 horas ou 12/12
METADONA é entre Não se aplica Sedação + Depr. Resp
horas
24 a 48 horas +

*contexto sensitivo = à medida que se aumenta o tempo de infusão contínua, aumenta-se a meia-vida.

Tabela 14. Os principais opioides usados em UTI.


Fonte: Barros, Okada.14,15

A seguir na Tabela 15 está a representação das doses de opioides.


Agonista opioide Parenteral Oral
MORFINA 10 30

FENTANIL 0,01 -

TRAMADOL 100 300

METADONA - 5

CODEÍNA 0,01 130

OXICODONA - 20

Obs.: A verificação de correspondência é feita considerando a mesma unidade de medida; por exemplo: 1. tramadol 100 mg
EV = tramadol 300 mg VO.14
Tabela 15. A correspondência de doses de opioides.
Fonte: Okada.15

c) PERIODICIDADE DA ADMINISTRAÇÃO DE ANALGÉSICOS

• Ao invés de os analgésicos serem ministrados somente quando é


necessário pela demanda, esses fármacos devem ser utilizados em
intervalos regulares, conforme orientação médica. Isso porque, ao
passo que a dor é controlada, possibilita-se redução da ansiedade e
as chances de efeitos adversos do tratamento, de maneira
contínua.15,17,25,32
d) RECOMENDAÇÕES DE SEDAÇÃO NA UTI

• A identificação da causa subjacente à agitação (dor, delirium,


hipoxemia, hipoglicemia, hipotensão, abstinência) é de extrema
relevância para a utilização de sedativos na UTI.14

• Estudos comprovam que há malefícios em sedações profundas por


períodos prolongados.14

• Há elementos que favorecem desfechos positivos (diminuição no


tempo de ventilação mecânica - VM e internação, redução de
episódios de delirium e diminuição de disfunção cognitiva a longo
prazo). Esses fatores contribuintes são:
• Presença de memórias reais dos fatos referentes à internação;
• Aplicação de escalas de avaliação;
• Utilização de protocolos de sedação;
• Administração de drogas não benzodiazepínicas.14
• Escala Rass (Richmond Agitation-Sedation Scale)
• A escala RASS é fundamentada e segura para avaliar a qualidade
e profundidade da sedação em adultos. Há a recomendação de
que a sedação deve ser mantida em um nível leve/moderado,
com escores do RASS entre -1 a +1, de maneira contínua,
durante a internação do paciente na UTI.33,34
A seguir na Tabela 16 está a representação da Escala Rass.
Pontuação Classificação Descrição

4 Combativo Combativo, risco para a equipa, violento

3 Muito agitado Conduta agressiva, puxa ou remove tubos de cateteres, agressivo verbalmente

2 Agitado Movimentos despropositados frequentes, briga com o ventilador

1 Inquieto Intranquilo, ansioso, sem movimentos vigorosos ou agressivos

0 Alerta e calmo Alerta, calmo

Adormecido, facilmente desertável, mantém contato visual por mais de 10


-1 Sonolento
segundos

Despertar precoce ao estímulo verbal, mantém contato visual por menos de 10


-2 Sedação leve
segundos

-3 Sedação moderada Movimentos e abertura ocular ao estímulo verbal, mas sem contato visual

Sem resposta ao estímulo verbal, mas apresenta movimentos ou abertura ocular


-4 Sedação intensa
ao toque (estímulo físico)

-5 Não desperta Sem resposta a estímulo verbal ou físico

Tabela 16. Exposição da Escala Rass (Richmond Agitation-Sedation Scale).


Fonte: McGrath, Ely.33,34

OBS.: Avaliação do paciente:


1. Se o paciente estiver acordado, podendo atentar espontaneamente para
estímulos ambientais:
a. Deve-se verificar atividade motora e qualidade da interação do
paciente.
2. Se o paciente não estiver em alerta:
a. Deve-se falar o nome do paciente, pedir que ele abra os olhos e olhe na
direção do profissional.
b. Avaliar a abertura ocular, o tempo de sustentação da abertura e a
direção do olhar.
3. Quando o paciente não responde ao estímulo verbal, realizar estímulo
físico:
a. Avaliar a atividade motora reacional ao estímulo físico.14
A seguir no fluxograma 2 está a representação do tratamento
farmacológico segundo a meta de RASS do paciente.

Fluxograma 2. Tratamento farmacológico conforme a meta de RASS do


paciente.
Fonte: SPDM, McGrath, Ely.16,33,34

• Escala de Ramsay
• É uma escala subjetiva usada para fins de analisar o grau de
sedação de pacientes, principalmente em UTI. Permite evitar
níveis de sedações exacerbados ou insuficientes.37
A seguir na Tabela 17 está a representação da Escala Ramsay.
Grau Descrição Do Paciente
GRAU 1 Ansioso e agitado

GRAU 2 Cooperativo, orientado e tranquilo

GRAU 3 Sonolento e atende aos comandos

GRAU 4 Dormindo e responde rapidamente ao estímulo sonoro vigoroso

GRAU 5 Dormindo e responde lentamente ao estímulo sonoro vigoroso

GRAU 6 Dormindo e sem resposta

Tabela 17. Apresentação da Escala Ramsay.


Fonte: Barr.37

• Principais Sedativos Utilizados em UTI e suas Especificações


• Benzodiazepínicos
A seguir na Tabela 18 está a representação dos principais
benzodiazepínicos administrados em UTI.
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

Analgesia 0
LORAZEPAM Enteral (EN), Via oral
Entre 12 - 16 horas Não se aplica Sedação + +
(1 MG) (VO)
Depr.Resp +

Analgesia 0
IV (Intravenosa), IM
MIDAZOLAM Sedação +++
Entre 1,5-2,5 horas (intramuscular) 1 a 5 Sem diluição
(15 MG) AMP 3 ML Depr. Resp +++
mg/bolus
*Contexto-sensitivo

Analgesia 0
Sedação +++
MIDAZOLAM 5 amp + NaCl 0,9%
Entre 1,5-2,5 horas IV, IM 1 a 5 mg/bolus Depr. Resp +++
(50 MG) AMP 10 ML 200mL (1 mg/mL)
Hipnótico Amnésia
Ansiolítico

Analgesia 0
DIAZEPAM Entre 14-60 horas IV 2 a 10 mg/ Bolus Sem diluição Sedação ++
Depr. Resp ++

Analgesia 0
CLONAZEPAM
Entre 19-42 horas EN, VO Não se aplica Sedação ++
2,5 MG/ML FRASCO
Depr. Resp +
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

*contexto sensitivo = à medida que se aumenta o tempo de infusão contínua, aumenta-se a meia-vida.

Tabela 18. Os benzodiazepínicos com a sua meia-vida e a especificação de


vias de infusão e doses
Fonte: Barros, Namigar, Strøm, Barr.14,35-37

No Quadro 2 está apresentando diversas informações relevantes acerca


dos benzodiazepínicos.

• Benzodiazepínicos são responsáveis pela ativação dos receptores GABA A no cérebro.


• Possuem efeito ansiolítico, antiemético, hipnótico, anticonvulsivante e geram amnésia, porém não provocam
analgesia.
• Atravessam a barreira hemato-encefálica, de modo que proporciona um efeito rápido.
• A ordem de potência é: Lorazepam > Midazolam > Diazepam.
• Geram taquifilaxia em infusão prolongada.
• O Midazolam e o Diazepam são mais lipossolúveis que o Lorazepam. Isso explica o porquê do Midazolam e o
Diazepam terem efeito mais rápido.
• Os pacientes idosos são mais sensíveis a esse tipo de droga.
• Todos possuem metabolização hepática, independentemente se os pacientes são hepatopatas, idosos, se tomam
medicações que inibem citocromo p450.
• Os pacientes críticos que possuem doenças cardíacas ou pulmonares têm maior probabilidade de sofrer instabilidade
hemodinâmica, a qual é estimulada por benzodiazepínicos.
• Diazepam e Midazolam, quando metabolizado, gera metabólicos que se acumulam, quando essas duas drogas são
usadas continuamente e ainda mais quando o paciente tem insuficiência renal.
• O Lorazepam tem metabólito ativo (propilenoglicol) tóxico para pacientes críticos, os quais têm acidose metabólica
e têm insuficiência renal aguda (IRA).
• Devido ao fato de possuírem metabolismo rápido, faz com que deva ser usado em pacientes que precisam ser
reavaliados neurologicamente com maior frequência.

Quadro 2. Considerações adicionais de extrema importância dos


benzodiazepínicos.
Fonte: Barros, Namigar, Strøm, Barr.14,35-37

• Neurolépticos
A seguir na Tabela 19 está a representação dos principais neurolépticos
administrados em UTI.
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

IV (Intravenosa), IM Analgesia 0
HALOPERIDOL
Entre 14-26 horas (intramuscular) 2,5 a 20 Sem diluição Sedação +
(5 MG) AMP 1 ML
mg/ bolus Depr. Resp 0
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

HALOPERIDOL Analgesia 0
Enteral (EN), Via oral
(2 MG/ML) Entre 14-26 horas Não se aplica Sedação +
(VO)
FRASCO 20 ML Depr. Resp 0

Analgesia 0
RISPERIDONA 0,5 mg 2x/dia, podendo
Entre 3-20 horas Não se aplica Sedação +
(1, 2, 3 MG) progredir até 3 mg
Depr. Resp 0

Analgesia 0
OLANZAPINA* 2,5 mg 2x/dia, podendo
Entre 21-54 horas Não se aplica Sedação +
(2,5, 5, 10 MG) progredir até 20 mg/dia
Depr. Resp 0

Tabela 19. Os neurolépticos com a sua meia vida e a especificação de vias de


infusão e doses utilizadas.
Fonte: Barros, Namigar, Strøm, Barr.14,35-37

• Alfa-2 agonistas
A seguir na Tabela 20 está a representação dos principais alfa-2-agonistas
administrados em UTI.
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

1 amp + 48 mL de
NaCl 0,9% em
DEXMEDETOMIDINA (200 Analgesia +
Entre Até Bomba de infusão
MCG) Sedação +
2 horas 1,4 mcg/kg/h contínua (BIC) ou
AMP 2 ML Depr. Resp 0
Bomba de Seringa
(BS) (0,4 mcg/mL)

Tabela 20. Os alfa-2 agonistas com a sua meia-vida e a especificação de vias


de infusão e doses utilizadas.
Fonte: Barros, Namigar, Strom, Barr.14,37

• Outros sedativos
A seguir na Tabela 21 está a representação de outros sedativos
administrados em UTI.
Período de Meia- Vias de Administração
Drogas Solução Padrão Efeitos
Vida e Doses

Analgesia 0
Sem diluição em
PROPOFOL Sedação +++
IV (intravenosa) 50 a acesso central Acesso
(10 MG/ML) Entre 30-60 minutos Depr. Resp +++
100 mcg/kg/mi n periférico - diluir 1/1
AMP 10 ML Hipnótico
com SG5%
Amnésia

IV, IM (intramuscular) 2- 2 frascos + NaCl Analgesia ++


KETAMINA
Entre 2-3h 3 mg/kg/ bolus 1-4 0,9% 80mL Sedação ++
(50 MG/ML)
mg/kg/h (10 mg/mL) Depr. Resp +

Analgesia 0
AMITRIPTILINA IV, IM 2-3 mg/kg/ bolus
Entre 10-50 horas Não se aplica Sedação +
(25 MG) COMPRIMIDOS 1-4 mg/kg/h
Depr. Resp 0

2 frascos +
IV Coma barbitúrico: 10
40 mL ABD Analgesia 0
THIONEMBUTAL (1 G) PÓ mg/kg/30mi n 5
Entre 5,5-26 horas (20 mL em cada Sedação +++
LIOFILIZADO mg/kg/3h Manutenção:
frasco) + NaCl 0,9% Depr. Resp +++
1-3 mg/kg/h
160 mL

Tabela 21. Outros sedativos utilizados em UTI com a sua meia-vida e a


especificação de vias de infusão e doses utilizadas.
Fonte: Barros, Namigar, Strom, Barr. 14,35,37

e) A seguir na tabela 22 estão representados os anticonvulsivantes mais


utilizados para o tratamento de dor em Pediatria.
Agente
Dose e via
anticonvulsivante

CARBAMAZEPINA 2 mg/kg VO 12/12h

FENITOÍNA 2,5 – 2 mg/kg VO 12/12h

CLONAZEPAM 0,01 mg/kg 12/12h

Tabela 22. Relação anticonvulsivante e sua dose e via correspondente.


Fonte: Okada.15

• Quais são os critérios essenciais no momento de escolha de um


sedativo ideal?
A seguir no Quadro 3 está a resposta da pergunta acima.
• Ação de início rápido e de pequena duração.
• Baixa interação com outras medicações.
• Pouca toxicidade.
• Baixo custo.
• Administração facilitada.

Quadro 3. Principais critérios para selecionar o sedativo ideal.


Fonte: UFTM, SPDM.3,16

• Quais são as recomendações quando se trata de sedação?


A seguir no Quadro 3 está a resposta da pergunta acima.

• Acompanhamento do nível de profundidade da sedação e da função cerebral.


• Monitoramento da atividade epiléptica não convulsiva em pacientes com crises confirmadas ou suspeitas, por meio
de eletroencefalograma (EEG).
• Eletroencefalograma (EEG) a fim de titulação de medicação eletrossupressiva para atingir cessação da atividade
epileptiforme em pacientes que possuem PIC elevada em UTI.
• Praticar medidas objetivas da função cerebral, de maneira adjuvante, na avaliação da sedação em pacientes, os quais
estão recebendo bloqueadores neuromusculares.

Quadro 4. Recomendações relevantes sobre sedação em UTI.


Fonte: UFTM.3

A seguir na tabela 23 está representado o tratamento farmacológico ideal


para caso específico.
Estado Associação de sedativos
Descrições
do adequados para
adicionais
paciente administração

A associação de um hipnótico em dose


Pacientes com escores de rass entre -1 a 0 Um opioide como morfina ou tramadol e baixa (propofol) pode ser considerada,
e em ventilação mecânica se for necessário fentanil posteriormente o uso de dose máxima de
fentanil

Um fentanil como primeira escolha. Se


Pacientes com com escores de sedação não for possível alcançar o nível de
-
equivalente a rass -5 sedação esperado, usa-se um hipnótico
(propofol)

Pacientes com patologias neurológicas e Utilização do fentanil deve ser


que tenham escores de sedação concomitante com um hipnótico -
corresponde a rass -5 (propofol)

Pacientes em estado de mal convulsivo ou O uso prolongado de benzodiazepínicos


em sedação profunda para hipertensão está relacionado à incidência de delirium.
Possibilita o uso de benzodiazepínicos
intracraniana ou com tétano, dentre outras Além disso, essa droga tem uma meia-vida
situações específicas significativamente grande

Após o uso de medicamentos


Em casos de desmame ventilatório em que
antipsicóticos (quetiapina 25 a 200 mg 8/8
a agitação psicomotora seja de difícil -
h), a administração de dexmedetomedina
controle
deve ser considerada
Estado Associação de sedativos
Descrições
do adequados para
adicionais
paciente administração

Pacientes que foram submetidos à


Devem receber a infusão de propofol ao
intubação orotraqueal com utilização de -
longo da primeira hora após procedimento
bloqueador neuromuscular

A associação com outro opioide deve ser


Pacientes suspeitos de abstinência a
A utilização de Metadona deve ser realizada por até 72 horas do inicio da
opioides, principalmente em pacientes que
reservada para esse tipo de caso medicação, em virtude da meia-vida e pico
usaram Fentanil por mais de 48 horas
de ação da metadona

Deve-se evitar a administração de anti-


Pacientes críticos inflamatórios não esteroides, devido a -
gerarem inúmeros efeitos adversos

Tabela 23. Tratamento farmacológico adequado para cada caso de paciente.


Fonte: Namigar, Strøm, Barr.35-37

A seguir na tabela 24 está representado as variações de intensidades de


efeito para determinados farmácos.
Agente Intensidade
Propriedade
Farmacológico de efeito

PIC 0 ou -

PPC 0 ou -

CMRO2 0

FSC 0

PAM -
MORFINA
Ação epiléptica 0

Prevenção PIC -

Sedação -

Analgesia +++

BENZODIAZEPÍNICO PIC 0 ou +

PPC 0 ou -

CMRO2 -

FSC 0 ou --

PAM --
Agente Intensidade
Propriedade
Farmacológico de efeito

Ação epiléptica +

Prevenção PIC +

Sedação +++

Analgesia +

PIC 0 ou --

PPC 0 ou -

CMRO2 -

FSC 0 ou --

PAM --
PROPOFOL
Ação epiléptica +

Prevenção PIC +

Sedação +++

Analgesia -

PIC --

PPC 0 ou -

CMRO2 -

FSC --

PAM --
BARBITÚRICO
Ação epiléptica +

Prevenção PIC +

Sedação ++

Analgesia -

CURARE PIC 0 ou -

PPC 0

CMRO2 0

FSC 0

PAM 0

Ação epiléptica 0

Prevenção PIC +
Agente Intensidade
Propriedade
Farmacológico de efeito
Sedação +

Analgesia +

PIC 0 ou -

PPC 0

CMRO2 -

FSC -

PAM 0
ETOMIDATO
Ação epiléptica 0

Prevenção PIC +

Sedação +++

Analgesia -

PIC 0 ou +

PPC 0

KETAMINA CMRO2 0

FSC ++

PAM -

0 (sem contribuição); + (aumenta);++ (grande aumento);- (diminuição); - - (grande diminuição).

Tabela 24. Intensidade de efeitos dos agentes farmacológicos em


determinadas propriedades.
Fonte: Rabelo.39

f) INTERRUPÇÃO DIÁRIA DA SEDAÇÃO (DIS)

• A sedação é fundamental no manejo de pacientes que estão sob


ventilação mecânica, pois reduz respostas ao estresse e à ansiedade
do paciente, de modo que possibilita uma evolução do bem-estar e
prognóstico do paciente.40

• Esse mecanismo é usado em 40 a 50% das Unidades de Terapia


Intensiva. Esse tipo de interrupção surgiu com a finalidade de
evitar a sedação exacerbada, a qual influencia negativamente a
melhora do paciente.40
• Consiste na suspensão da sedação até o despertar do paciente.
Quando ele desperta, realiza-se infusão do fármaco com dosagem
reduzida pela metade e velocidades prévias.40

• Essa manobra permite redução do período de ventilação mecânica


e da permanência na UTI, e das alterações no estado mental, como
o delirium. Isso porque a DIS possibilita a diminuição do acúmulo
de sedativos e metabólitos e recuperação mental mais rápida para a
ventilação eficaz. À medida que a capacidade de respirar do
paciente se restabelece, o tempo necessário de ventilação mecânica
reduz; consequentemente, diminuem as complicações decorrentes
da ventilação mecânica.40

• Os pacientes que estão com ventilação mecânica e ainda


recebendo sedativos, de forma contínua. Devem ter a sedação
realizada conforme protocolos e metas, sendo que deve ter
interrupção diária da infusão. Há estudos que demonstram a
eficácia de interromper diariamente a sedação. Sendo assim,
percebeu-se que pacientes durante ventilação mecânica que
tiveram diariamente interrupção de sua sedação obtiveram redução
da quantidade de dias que ficariam sob ventilação mecânica e
internados na UTI, em comparação a um grupo de pacientes que
não tiveram interrupção diária de suas respectivas sedações.40

• A sedação deve ser individualizada, de tal maneira que se


respeitem as particularidades de cada paciente, estabelecendo
objetivos do nível de sedação.40

• Motivos para não executar a DIS:


• Temor de comprometimento respiratório.
• Temor de evasão acidental de cateteres e drenos.
• Instabilidade neurológica, respiratório e cardiovascular.
• Temor de elevação de pressão intracraniana.40
• Problemas associados à DIS:
• Aumento no índice de extubação acidental.
• Angústia e ansiedade.
• Aumento da pressão intracraniana.
• Remoção desadvertida pelo paciente de acessórios de
monitorização e acesso venoso.40

• Contraindicações da DIS:
• Em pacientes que estão usando bloqueadores neuromusculares.
• Em pacientes dependentes de drogas psicoativas, manifestações
de abstinência. Geralmente ocorre 6 horas após a interrupção.
• Em casos de uso para controlar convulsões e agitações.
• Em casos de isquemia do miocárdio anterior (24 horas).
• Em casos de elevação de pressão intracraniana.40
g) QUAIS SÃO AS MEDIDAS NÃO FARMACOLÓGICAS
POSSÍVEIS PARA REDUZIR O ESTRESSE E ANSIEDADE DOS
PACIENTES?
A seguir no Quadro 6 está a resposta da pergunta acima.
São as execuções de técnicas de relaxamento, como:
1. Musicoterapia;
2. Psicoterapia

Quadro 6. Aplicações não farmacológicas para amenizar o estresse e


ansiedade.
Fonte: Nassar Jr.40

h) TRATAMENTO NEUROCIRÚRGICO DA DOR

• Quando o tratamento farmacológico, psicoterápico, fisiátrico e ou


neuroanestésico não gera uma melhora significativa ou quando
provoca efeitos adversos para o paciente, é recomendada a
realização de procedimentos neurocirúrgicos antiálgicos.32,41,42
A seguir na tabela 25 estão representados diversos tratamentos
neurocirúrgicos para solucionar a dor.

Exemplos de procedimentos
Caso Descrição do tratamento
cirúrgicos relacionados ao caso
específico neurocirúrgico indicado
específico

Dor por nocicepção Bloqueio dos aferentes primários Rizotomias, neurotomias

Cordotomia, tratotomia de lisssauer e


Bloqueio tanto de tratos quanto de centros
nucleotomia da substância cinzenta do
Dor por nocicepção ou desaferentação de processamento da dor no sistema
corno posterior da medula espinhal,
nervoso central
tálamo-mesencefalotomia

Procedimentos cirúrgicos do Cingulotomia, tratotomia subcaudata,


Pacientes com aberrações psíquicas
comportamento capsulotomia anterior, hipotalamotomia

O uso prolongado de benzodiazepínicos


Estimulação elétrica do sistema supressor está relacionado à incidência de delirium.
Pacientes com dor por desaferentação
(epidural, encefálica) Além disso, essa droga tem uma meia-vida
significativamente grande

Pacientes doentes que melhoraram seu


Introdução de câmaras ou de bombas para
estado com o emprego sistêmico de
infusão de drogas analgésicas no
agentes morfínicos, miorrelaxantes ou -
compartimento liquórico, seja no espinal
outros fármacos, porém demonstraram
ou cerebral
efeitos colaterais ou tolerância a eles

Tabela 25. Casos especiais de pacientes e seu devido tratamento


neurocirúrgico para resolver a dor.
Fonte: Joshi, Teixeira, Teixeira.32,41,42

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de São Paulo; 1990.
8.10
COMA
Autores:
Mateus Gonçalves de Sena Barbosa
Nícollas Nunes Rabelo

INTRODUÇÃO
• Infelizmente, é enorme a quantidade de pessoas que entram no
estado de coma, seja porque sofreu acidente, por infecção, efeito
tóxico de substâncias, dentre outras causas.

• Dessa forma, percebe-se que cada vez mais é necessário o estudo


atualizado e completo sobre coma, o qual é bastante recorrentes no
dia a dia hospitalar.

CONCEITO/DEFINIÇÃO GERAL
a) Coma

• É um estado em que o indivíduo está impossibilitado de reagir


adequadamente ao ambiente externo, em virtude da redução ou
ausência de suas atividades neuronais.

• Segundo o Instituto Nacional de Distúrbios Neurológicos e


Derrame, a pessoa, durante o período de coma, não possui suas
funções cerebrais mais altas; contudo, as demais funções relevantes
estão intactas; por exemplo, a respiração. Isso possibilita uma
condição acentuada de inconsciência, de modo que a pessoa não
foi despertada e não tem motricidade e sensibilidade.1
b) Delirium
• É um distúrbio de consciência qualificado por distração, em
consonância com alteração da cognição, as quais surgem em curto
intervalo de tempo e possuem um desenvolvimento flutuante
(DSM-IV).2
OBS.: componentes da consciência

• Nível de consciência: É o grau de alerta comportamental (estado


de sono e vigília).2

• Conteúdo de consciência: É a soma de todas as funções cognitivas


e afetivas (linguagem, memória e humor).2

EPIDEMIOLOGIA
O coma é um dos distúrbios neurológicos mais recorrentes em pacientes
que chegam aos Prontos-Socorros.2

• Dados epidemiológicos registrados da UTI do Hospital Geral de


Fortaleza demonstram que somente um paciente evoluiu a óbito de
um total de onze. Esse dado revela a importância de
planejamentos, preparações e intervenções médicas corretas na
UTI, a fim de promoverem uma quantidade satisfatória de
prognósticos aos pacientes internados, independentemente do
gênero, idade e raça.3

• A análise epidemiológica de um grupo de 210 pacientes


comatosos, causados por hipóxia-isquemia cerebral de um
determinado hospital, possibilitou os seguintes dados: 27 pacientes
que se recuperaram do coma adquiriram independência novamente
para o dia a dia, e 52 pacientes que se recuperaram do coma e que
possuem reflexo pupilar não reconquistaram independência para o
cotidiano.4

ETIOLOGIA , ANATOMIA E FISIOPATOLOGIA


a) ETIOLOGIA

• Coma estrutural
• Lesão supratentorial unilateral, causada por:
→ Tumor.
→ Abcesso.
→ Trauma cranioencefálico.
→ Infarto extenso.
→ Hematomas, em destaque o subdural.5
• Lesão supratentorial bilateral, causada por:
→ Encefalite.
→ Gliomatose.
→ Trauma cranioencefálico.
→ Hidrocefalia.
→ Infarto talâmico bilateral.5
• Lesão infraorbital, causada por:
→ Tumor.
→ Oclusão da artéria basilar.
→ Acidente vascular encefálico.
→ Mielinólise pontina.
→ Hemorragia pontinha.5

• Coma metabólico
• Desordens metabólicas, causadas por:
→ Hipoglicemia.
→ Hiperglicemia.
→ Hiponatremia.
→ Hipernatremia.
→ Hipercalemia.5
• Desordens orgânicas, causada por:
→ Uremia.
→ Encefalopatia hepática.
→ Hipercapnia.
→ Hipotireoidismo.
→ Doença de Addison.5
• Agentes exógenos, causados por:
→ Drogas.
→ Inalação de gases.
→ Hipotermia.5
• Causas psiquiátricas, causadas por:
→ Coma psicogênico.5
b) ANATOMIA ASSOCIADA AO COMA

• O SRAA (sistema reticular ativador ascendente) é uma rede de


neurônios originários do tegmento da ponte superior e
mesencéfalo, os quais são primordiais, a fim de estimular e manter
o estado de alerta comportamental e para possibilitar a manutenção
de vigília e consciência. Esses neurônios se incidem para estruturas
no diencéfalo, abrangendo o tálamo e hipotálamo, e desse ponto
para o córtex cerebral.6

• Modificações no estado de alerta comportamental podem ser


geradas por lesões focais dentro do tronco cerebral superior,
comprometendo diretamente o SRAA. Lesões nos hemisférios
cerebrais também podem produzir estados de coma; contudo, neste
caso, o envolvimento é indispensavelmente difuso e bilateral,
unilateral ou suficientemente grande para desempenhar efeitos no
hemisfério contralateral ou no tronco cerebral.6

• O procedimento de coma em etiologias tóxico-metabólicas,


infecciosas e hipotermia é pouco entendido, na maioria das vezes
ainda sem causa específica. Uma sucinta possibilidade é a de estas
condições impossibilitarem uma entrega adequada de oxigênio e de
substrato, de forma que altera o metabolismo cerebral, interfere na
excitabilidade neuronal e/ou na função sináptica.6
• A maior parte dos casos de coma que se apresentam nas
emergências decorre de traumas, intoxicações, doença
cerebrovascular, infecções e/ou distúrbios metabólicos.6
A seguir está representado no Fluxograma 1 os componentes da
consciência.

Fluxograma 1. Estruturas anatômicas associadas com seus respectivos


componentes de consciência.
Fonte: Claudino.6

c) FISIOPATOLOGIA
• O nível de consciência é subordinado à ativação do córtex pelo
Sistema Reticular Ativador Ascendente. Dessa maneira, o
comprometimento do estado de consciência surge com, pelo
menos, disfunção do SARA, disfunção do córtex cerebral ou as
duas disfunções. A fim de que o córtex comprometido gere
redução do nível de consciência, é essencial que a área de
abrangência da lesão seja difusa nos dois hemisférios cerebrais.
Distúrbios cognitivos específicos como afasia, apraxia e agnosia
são decorrentes de lesões isoladas.7
A seguir está representado na Figura 1 o mecanismo que desencadeia o
coma.

Figura 1. Ilustração esquemática do sistema reticular ativador ascendente e


sítios de lesões estruturais que geram coma.
Fonte: Stavale.7

QUADRO CLÍNICO
• O coma é um estado em quse o paciente é incapaz de responder
aos estímulos externos, além de que não pode ou há dificuldade
para despertar o paciente, uma vez que houve comprometimento
em relação à consciência, de tal modo que não responde ou há uma
dificuldade significativamente expressiva. Assim, percebem-se
alterações no nível de consciência (grau de alerta comportamental)
e do conteúdo de consciência (humor, memória, crítica e
linguagem), sendo essas duas alterações as que são levadas em
conta durante a análise clínica.6

• Há casos em que os pacientes pós-coma induzido relatam sentir:


sede, frio e dor. E ainda afirmam ser incapazes de dizer se estavam
acordados ou sonhando.6

• O aparecimento do coma é favorecido por determinadas


manifestações clínicas: hipotensão, hipotermia, hipoventilação,
hipoglicemia, hiperglicemia e bradicardia.6

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O coma é caracterizado como uma apresentação clínica em que o
paciente tem ausência de vigília e do estado consciente de si e do ambiente
externo. O coma possui muitas etiologias; sendo assim, há a necessidade de
excluir algumas delas, conforme o contexto do caso clínico, para identificar
se a causa é neurológica ou tóxico-metabólica. Além disso, os outros
critérios para diagnosticar um paciente com coma é:
a) História natural e patológica pregressa do paciente:

• Durante a anamnese, deve-se investigar por antecedentes


recentes de:
• Cefaleia (que pode estar relacionada a tumor, hematoma,
abscesso e outras massas expansivas).
• Epilepsia.
• Déficit neurológico focal.
• Histórico de tumor.
• Acidente vascular isquêmico.8-11
• Durante a anamnese, é relevante também perguntar quanto ao uso
crônico de fármacos que atuam sobre o sistema nervoso central;
por exemplo, drogas ilícitas e álcool. E ainda questionar se o
paciente tem doenças sistêmicas renais, tais como hepáticas,
cardíacas, hematológicas, diabetes mellitus, infecção recente e
antecedentes psiquiátricos.8
b) Exame físico (com ênfase no exame neurológico):

• Para identificar a etiologia correta da disfunção de consciência, é


essencial realizar exame físico de todos os sistemas; por exemplo,
a presença de cianose (associada à insuficiência cardíaca ou
respiratória), melanodermia (associada à doença de Addison),
sinais de punção venosa (associados ao uso de drogas de droga
injetáveis), icterícia associada a sinais de hepatopatia. Além disso,
a hipertensão arterial pode sinalizar a presença de encefalopatia
hipertensiva ou de nefropatia com coma urêmico ou até hemorragia
cerebral. Já a hipotensão arterial pode sugestionar diabetes
mellitus, alcoolismo, infarto do miocárdio, doença de Addison. Se
houver bradicardia, pode insinuar hipertensão intracraniana ou
bloqueio auriculoventricular. No caso de taquicardia acima de 140
batimentos por minutos, pode apontar insuficiência vascular
cerebral. E a febre pode ser consequência de uma meningite
bacteriana e de lesão dos centros reguladores da temperatura.
Presença de hipotermia relaciona-se ao coma etílico e barbitúrico,
hipoglicemia e há a possibilidade de ser a origem do transtorno de
consciência caso seja menor do que 31°C.8-11

• Na avaliação neurológica dos pacientes com redução da


consciência, é essencial avaliar:8-11
• Escala de coma de Glasgow ou escala FOUR:
→ Resposta ocular:
A seguir na Tabela 1 está representado a resposta ocular da escala Four.
4 Pálpebras abertas, acompanha com o olhar, ou pisca ao comando
3 Pálpebras abertas mas não acompanha com o olhar

2 Olhos fechados mas abrem com estímulo auditivo forte (loud voice)

1 Olhos fechados mas abrem apenas com dor

0 Não há abertura ocular, mesmo à dor

Tabela 1. Resposta ocular da escala Four.


Fonte: Wolf.12

→ Resposta motora:
A seguir na Tabela 2 está representado a resposta motora da escala Four.
4 Faz sinal de OK com as mãos, fecha o punho, ou “sinal de paz”

3 Localiza a dor

2 Resposta em flexão à dor

1 Resposta em extensão à dor

0 Sem respostas à dor ou mioclonias generalizadas

Tabela 2. Resposta motora da escala Four.


Fonte: Wolf.12

→ Reflexos de tronco cerebral:


A seguir na Tabela 3 está representado os reflexos de tronco cerebral da
escala Four.
4 Presentes reflexos pupilares e corneanos

3 Uma pupila fixa e midriática

2 Reflexos corneanos ou pupilares ausentes

1 Ambos os reflexos corneanos e pupilares ausentes

0 Ausência de reflexos corneanos, pupilares ou de tosse

Tabela 3. Reflexos de tronco cerebral da escala Four.


Fonte: Wolf.12

→ Respiração:

• Padrão respiratório. 13

• Alterações pupilares (pupila e fundo de olho).


• Lesões simpáticas geram miose (contração).
• Lesões parassimpáticas geram midríase (dilatação).8,13
• Motricidade ocular extrínseca. 5,13

• Característica de resposta motora e reflexos. 5,13

A seguir na Tabela 4 está representado a respiração da escala Four.


4 Não entubado, com padrão respiratório regular, normal

3 Não entubado, com padrão respiratório Cheyne-Stokes

2 Não entubado, com padrão respiratório irregular

1 Respira com frequência respiratória acima do ventilador

0 Respira com a frequência respiratória do ventilador, ou apneia

Tabela 4. Respiração da escala Four.


Fonte: Wolf.12

1. Exames laboratoriais (Hemograma; função renal; coagulograma;


função hepática; gasometria arterial; considerar testes de função
adrenal).13
2. Rastrear se há infecções (EAS + urinocultura; hemocultura;
radiografia de tórax e análise do líquor).13
3. Rastrear disfunções do SNC (TC de crânio – excluir edema
cerebral, sinais de hipertensão intracraniana com compressão de
estruturas, abcessos cerebrais, isquemia, hemorragias e tumores):

• Se o TC mostrar normalidade ou não justificar o estado de


consciência do paciente, deve-se avaliar a ressonância magnética
em busca de AVE isquêmico, hemorragias, trombose de seio
venoso, tumores, processos inflamatórios, abcessos e lesão axonal
difusa. E, se ainda não identificar uma causa, realiza-se um
eletroencefalograma (retirar estado do mal epiléptico não
convulsivo).13
A seguir no Fluxograma 2 está representado o esquema de diagnóstico de
pacientes comatosos.
Fluxograma 2. Diagnóstico de pacientes comatosos.
Fonte: Sanvito, Calderaro.13,14
CLASSIFICAÇÕES / TIPOLOGIAS
Segundo a sua etiologia, classifica-se em:

• Coma estrutural
• É qualificado por lesões, as quais comprimem, movem ou
desfazem o SRAA.5

• Coma metabólico
• É qualificado por uma disfunção cerebral difusa mediante um
comprometimento dos processos metabólicos ou orgânicos do
cérebro.5
Além dessa classificação, o coma ainda se diferencia em:

• Coma Leve - Grau I


• Sonolento.
• Orientado.
• Segue ordem verbal, há verbalização.
• Perguntas geram respostas verbais.6

• Coma moderado - Grau II


• Torpor.
• Nível de consciência deprimido, capaz de responder simples
comandos verbais.
• Estímulos dolorosos produzem piscar ou abertura das pálpebras.
• pode estar alerta com déficit neurológico focal.6

• Coma profundo - Grau III


• Coma.
• Dor gera resposta motoras elementares.
• Inconsciente - incapaz de responder aos comandos verbais.
• Pode demonstrar respostas motoras anormais (decorticação,
descerebração).6

• Coma depassé - Grau IV


• Coma irreversível.
• Funções vegetativas não se mantêm espontaneamente.
• Morte encefálica.6
a) Classificação de Plum e Posner

• Qualifica os estados de coma pelo sítio lesional causador com


base da tenda do cerebelo.5
• Lesões supratentoriais
→ Lesões que atingem o diencéfalo ou telencéfalo.
→ Lesões destrutivas ou expansivas.5
• Lesões infratentoriais
→ Lesões que atingem o tronco encefálico e cerebelo.
→ Lesões isquêmicas, destrutivas ou compressivas.5
• Disfunção encefálica difusa, multifocal e/ou metabólica
→ Ausência de oxigênio, substrato ou cofatores.
→ Doenças sistêmicas endócrinas, não endócrinas, dentre outras.
→ Intoxicação exógena.
→ Distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos.
→ Mudanças da regulação térmica.
→ Infecções e inflamações do SNC.
→ Crises convulsivas, síndrome de abstinência, delirium.5

TRATAMENTO
O tratamento deve ser individualizado para cada etiologia. Contudo, há
informações que devem ser tratadas:

• Primeiras condutas: Suporte avançado de vida mais glicemia


capilar mais oxigênio mais acesso venoso calibroso mais
monitorização cardíaca e oximetria.

• Se Glasgow ≤ 8: não pode retardar a intubação endotraqueal, a


fim de proteger as vias aéreas.

• Se houver histórico de crise convulsiva: Hidantalização do


paciente.

• Se houver sinais de Hipertensão intracraniana: considerar


manitol ou solução salina hipertônica.

• Se houver suspeita de intoxicação exógena: Lavagem gástrica


com carvão ativado.13
a) PROGNÓSTICO DE PACIENTES COMATOSOS

• Há estudos que demonstram que dos reflexos oculares cílio-


espinhal, fotomotor, óculo-cefálico, vestíbulo-ocular, corneano, os
mais resistentes são os reflexos fotomotor, corneano e vestíbulo-
ocular. Sendo assim, por meio de uma análise de pequenos
intervalos de tempo desses cinco reflexos oculares e considerando
os mais resistentes desses cinco, observando a extinção ou
reaparecimento de algum desses reflexos. Dessa maneira, permita-
se uma melhor avaliação prognóstica do paciente. Além disso,
cabe ressaltar também que o prognóstico depende muito da
etiologia e grau do coma de determinado paciente.13
b) SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA
• Trata-se de um conjunto de sintomas tanto mentais quanto físicos
com gravidade variáveis, que ocorrem posteriormente a uma
interrupção total ou parcial de alguma substância que causa
dependência. As características específicas da abstinência
dependem da droga em questão. Seus sintomas mais comuns são:
ansiedade, fadiga, sudorese, vômitos, depressão, convulsões e
alucinações. Na maioria das vezes, o indivíduo percebe que ele
está com tal síndrome; contudo, essa pessoa precisa de tratamento
médico, a fim de que paciente trate seus sintomas e evite pioras de
seu quadro.16,17

• A utilização de sedativos e analgésicos em infusão contínua pode


gerar sérias consequências; por exemplo, tolerância, dependência
física, síndrome de abstinência (SA) e delirium. Essas condições,
na maioria das vezes, aumentam o período de internação, o período
de ventilação mecânica e, consequentemente, os gastos
hospitalares.18-21

• Pacientes com dependência física podem evoluir para um quadro


de AS entre 1-48 horas, posteriormente à interrupção ou ao
desmame rápido dos medicamentos, sendo que as manifestações
clínicas de AS geralmente surgem depois de cinco ou mais dias de
infusão contínua de benzodiazepínicos e opioides. Além disso, o
momento de início do quadro clínico de AS varia conforme a
meia-vida dos fármacos e com a meia-vida dos metabólitos
ativos.18,21

• A sintomatologia do paciente varia de acordo com as


particularidades do paciente e pode sofrer interferências de
diversos fatores, tais como medicamentos, idade, estado cognitivo
e condições clínicas associadas.22

• São as manifestações do SNC: irritabilidade, redução do sono,


tremores, hiper-reatividade de reflexos tendinosos profundos,
clônus, dificuldade de concentração, bocejos frequentes, espirros,
movimentos mastigatórios, lacrimejamento, rinorreia, piloereção,
delirium e hipertonicidade. Além desses sinais e sintomas, os
outros são: convulsões, alucinações auditivas e/ou visuais,
zumbidos e caretas. E nos RN e lactentes também há os seguintes
sinais a mais: hiperestimulação do SNC envolvendo choro
inconsolável e reflexo de Moro exacerbado.17,18,22

• É frequente a sobreposição de sinais e sintomas de abstinência e


outras complicações que podem surgir na UTIP, como sepse,
delirium, enterocolite necrosante e alterações da perfusão cerebral.
Essas e outras condições que possam gerar quadro clínico
semelhante ao de SA devem ser conferidas e excluídas, antes de
concluir que o quadro clínico do paciente se deva à abstinência. A
febre, por exemplo, pode ser uma barreira na avaliação da
abstinência em UTIP, sobretudo em pacientes com dispositivos
invasivos nos quais a instabilidade térmica requer uma rápida
investigação; na maioria das vezes, tratamento com antibióticos de
largo espectro. Quando febre e vômitos ocorrem na falta dos
demais sinais e sintomas de abstinência, devem ser atribuídos a
outros diagnósticos.17,18,22

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E
TRATAMENTO

Fluxograma 3. Exemplificação da síndrome da abstinência alcoólica.


Fonte: Laranjeira.16

CASO CLÍNICO HIPOTÉTICO DE PACIENTE


COM COMA
• Paciente 49 anos, feminina, admitida na unidade de emergência
em coma (Escala de Glasgow: Resposta ocular: 1, Resposta
motora: 1 e Resposta verbal: 1), sem evidência de trauma.

• Foi trazida pelo filho que mora com ela. Após conversa com o
filho dela, foi adquirida uma história patológica pregressa de
doença coronariana, diabetes mellitus do tipo 2 e depressão. Ela
usa Metformina, Amitriptilina, Venlafaxina e AAS.

• Na sala de estabilização, adquiriu-se tais resultados:


• Exame Neurológico: Glasgow 3, pupilas isofotoreagentes,
dilatadas, boca e olhos secos, ausência de resposta motora.
• Hemodinâmica: PA: 110×60 mmHg, FC: 160bpm. RCR –
sinusal.
• Avaliação respiratória: Bradipneica em ar ambiente, FR: 10,
Sat: 94%.
• Gastrometabólico: Abdômen globoso em região suprapúbica,
sendo retirado 900 ml após passagem de cateter vesical.

• A paciente foi submetida à intubação orotraqueal para proteção de


via aérea. Sua tomografia de crânio constatou-se normalidade e seu
eletroencefalograma não continha evidências de crise. Os exames
laboratoriais da paciente mostraram acidose metabólica e glicemia
normal para níveis de diabéticos do tipo II, e o eletrocardiograma
demonstrou QRS alargado e prolongamento QT.

REFERÊNCIAS
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8.11
DELIRIUM
Autores:
Mateus Gonçalves de Sena Barbosa
Maycon Cristian Gomes de Paula
Isadora Dias Moreira
Nícollas Nunes Rabelo

INTRODUÇÃO
• O termo delirium foi vagamente descrito por Hipócrates por volta
de 460-366 a.C, sendo um dos primeiros transtornos neurológicos
conhecidos.3

• Delirium só teve uma definição formal na década de 1990, pela


American Psychiatric Association’s Diagnostic and Statistical
Manual of Mental Disorders, Fourth Edition (DMS-IV).3

CONCEITO/DEFINIÇÃO GERAL
a) DELIRIUM

• Delirium (estado confusional agudo) é uma condição de confusão


mental que se origina subitamente, provocando alterações no nível
de consciência (flutuações do nível de alerta), atenção, orientação,
comportamento, memória, pensamento, dentre outras áreas da
cognição. Na maioria dos casos, é reversível. Além disso, suas
manifestações clínicas podem se desenvolver durante um período
de horas ou dias.1-3
b) DIFERENÇA ENTRE DELIRIUM E DELIRIUM TREMENS
• O delirium tremens é o estado mais grave da cessação da ingestão
de álcool em um bebedor crônico, manifestada por uma condição
mental alterada (confusão mental global) e hiperatividade
autonômica, a qual pode evoluir para o colapso cardiovascular.4

• O delirium tremens é sempre uma emergência médica, com alta


taxa de mortalidade.4
c) DIFERENÇA ENTRE DELIRIUM E DELÍRIO

• Delírio é caracterizado como um problema mental orgânico


reversível, cujos sintomas são: decréscimo da vigilância,
desorientação de espaço e tempo, confusão, alucinações visuais,
auditivas, dentre outros.4

• Embora o paciente delirante seja completamente lúcido e não


sofra nenhuma mudança quantitativa do nível do seu
funcionamento mental, ele não tem consciência da sua
anormalidade. Essa é a principal diferença entre delírio e delirium.4

• O delírio é recorrente em transtornos psicóticos, tais como a


esquizofrenia, transtorno delirante persistente, episódios maníacos
dos transtornos bipolares ou depressão psicótica, dentre outras
condições.4
d) DIFERENÇA ENTRE DELIRIUM E DEMÊNCIA
As diferenças estão esquematizadas no quadro 1.
Delirium Demência

Início súbito Início insidioso

Alterações cognitivas flutuantes Alterações cognitivas estáveis

Potencialmente reversível Irreversível

Urgência médica Não urgente

Quadro 1. Comparações entre delirium e demência.


Fonte: Setters, Caine.3,5

e) DIFERENÇA ENTRE DELIRIUM E ESQUIZOFRENIA


As diferenças estão esquematizadas no quadro 2.
Delirium Esquizofrenia

Distúrbios no ciclo circadiano Normalmente não altera o ciclo

Alterações no nível de consciência Sem alterações

Vê o desconhecido como conhecido Vê o conhecido como desconhecido

Generalização Personalização

Quadro 2. Comparações entre delirium e esquizofrenia.


Fonte: Caine.5

CLASSIFICAÇÕES / TIPOLOGIAS
a) Delirium subsindrômico

• Frequentemente não é identificado, uma vez que inclui poucos


critérios diagnósticos.6,7
b) Delirium hipoativo

• Conceituado por uma redução da atividade psicomotora, lentidão,


pior concentração, confusão, alucinações visuais ou auditivas,
diminuição da mobilidade, agitação, distúrbios do sono, alterações
do apetite ou letargia. É o tipo de delirium mais difícil de ser
reconhecido.3,8-12

• Tem uma variante (subtipo) que é denominada catatônica, uma


condição extrema do delirium hipoativo.3,8-12

• Há evidências que mostram que esse tipo de delirium está


associado a maior mortalidade. Frequentemente é confundido com
depressão.
• Há estudos que demonstram que o delirium que acontece no
contexto de desordens metabólicas é hipoativo na maioria dos
casos.3,8-12
c) Delirium hiperativo

• Caracterizado por uma elevação da atividade psicomotora,


acompanhado de labilidade emocional, agitação e/ou ausência de
cooperação nos cuidados de saúde prestados.3,12-14

• Tem uma variante (subtipo) que é denominada catatônica, uma


condição extrema do delirium hiperativo, relacionado ao uso de
fármacos simpaticomiméticos, que poderá resultar na síndrome
hipermetabólica e até na morte.3,12-14

• Na maioria das vezes, pacientes com esse tipo de delirium em


Unidades de Terapia Intensiva (UTI) são sedados em excesso;
consequentemente, ocultam-se os sintomas e agrava-se o
prognóstico.3,12-14

• Há estudos que demonstram que o delirium que acontece no


contexto de abstinência ou intoxicação é hiperativo na maioria das
vezes.3,12-14
d) Delirium misto

• Condição em que o paciente identifica-se com uma atividade


psicomotora normal ou flutuante, com distúrbio da atenção e
cognição existentes. Isto é, qualificado pela alternância entre os
tipos hipo e hiperativo.3,12-14

• Segundo estudos de Peterson e colaboradores em 2006, na


totalidade de adultos em UTI submetidos ou não à ventilação
mecânica (VM), a tipologia hipoativa aconteceu em 43,5% dos
casos de delirium, a forma mista em 54,1% e o delirium hiperativo
ocorreu em somente 1,6% dos casos.3,12-14
e) Delirium prolongado (persistente)

• Geralmente acontece com pacientes com comprometimento


cognitivo basal ou com sequelas procedentes de novos processos
intracranianos, ou até em pacientes sob efeitos de intoxicação
aguda ou abstinência.6,7

• Esse tipo pode ser visto em diversos cenários, até após a alta
hospitalar.6,7
Obs.: Segundo alguns autores, como Jackson et al, reconhecem apenas a
existência de dois subtipos psicomotores de delirium, o hiperativo e o
hipoativo.3,13,14

EPIDEMIOLOGIA
• Acredita-se que o número de casos seja subdiagnosticado por dois
motivos:
• falta de um processo fisiopatológico claro;3
• lentidão de muitos profissionais em aplicar métodos diagnósticos
validados.3

• Não é uma condição comum, sendo que entre 30%-40% dos casos
é reversível. Entretanto, acarreta grandes despesas aos serviços de
saúde, pois aumenta a debilidade e a perda de função, bem como a
morbimortalidade dos pacientes:
• demanda um custo anual de $164 bilhões.3
• A prevalência varia entre 9% e 80%. Dependendo da alocação do
paciente, as taxas mais baixas são encontradas no ambiente
ambulatorial (apenas 2%).15

• Pacientes idosos possuem maior risco de desenvolverem delirium,


especialmente se apresentarem demência.15
• A maior prevalência (50% a 80%) ocorre em pacientes pós-
operatórios, em UTIs e enfermarias geriátricas.15

• Pacientes que passaram em departamentos de emergência e


tiveram o diagnóstico de delirium têm um aumento de mais de
70% no risco de mortalidade depois de 6 meses.15

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
a) ETIOLOGIA

• Na maioria das vezes, as causas de delirium são multifatoriais.


Cerca de 10-20% dos pacientes com delirium são de etiologias não
identificadas. De acordo com Mesulam (Quadro 3), as causas de
delirium podem ser fragmentadas em seis grupos:
Classificação etiológica de Mesulam

Encefalopatias tóxico-metabólicas

Estressores ambientais em pacientes vulneráveis

Lesões cerebrais multifocais

Crises epilépticas

Lesões com efeito de massa

Lesões cerebrais focais (em topografias estratégicas)

Quadro 3. Os seis grupos etiológicos de delirium para Mesulam.


Fonte: Pisani.16

Os fatores de risco são segmentados em predisponentes (quadro 4) e


precipitantes (quadro 5). Os fatores predisponentes deixam a pessoa mais
vulnerável ao delirium, já os fatores precipitantes são os fatores etiológicos
propriamente dito. Sendo assim, a somatória dos dois tipos de fatores
corrobora ainda mais a probabilidade de o indivíduo sofrer de delirium.16
As causas mais comuns de delirium são: fármacos (quadro 10),
particularmente anticolinérgicos, drogas psicoativas e opioides; desidratação
e infecção.5
As etiologias podem ser resultado de quase tudo que afete o metabolismo
do cérebro, sejam causas intracranianas, por exemplo, epilepsia, trauma,
infecções, dentre outras. Ou seja, causas extracranianas, como ingestão de
drogas (quadro 8) ou abstinência (quadro 7), intoxicação exógena (quadros 6
e 9), sedativos, tranquilizantes, disfunção endócrina, dentre outras.16

Fatores predisponentes para delirium

• Características demográficas • Redução da ingestão oral


• Idade ≥ 65 anos • Desidratação
• Sexo masculino • Desnutrição

• Drogas
• Status cognitivo • Abuso de álcool
• Demência • múltiplas drogas psicoativas
• Declínio cognitivo • terapia com múltiplas drogas
• História de delirium
• Depressão

• Morbidades coexistentes
• Status funcional • Doença grave
• Dependência funcional • Múltiplas condições clínicas coexistentes
• Imobilidade • Doença hepática ou renal crônicas
• Nível de atividade baixo • Acidente Vascular Cerebral (AVC)
• História de quedas • Doença neurológica
• Distúrbios metabólicos
• Fratura ou trauma
• Doença terminal
• Prejuízo sensorial • Infecção pelo HIV
• Déficit visual
• Déficit auditivo

Quadro 4. Fatores predisponentes para delirium.


Fonte: Pisani.16

Fatores predisponentes para delirium

• Doenças intercorrentes
• infecções
• complicações iatrogênicas
• Drogas
• hipóxia
• sedativos hipnóticos
• choque
• narcóticos
• febre ou hipotermia
• drogas anticolinérgicas
• anemia
• tratamento com múltiplas drogas
• desidratação
• déficit nutricional
• alterações metabólicas

• Doenças neurológicas primárias • Cirurgias


• meningite ou encefalite • ortopédicas
• AVE • cardíacas
Fatores predisponentes para delirium

• Ambiente
• admissão ao CTI
• restrição motora
• uso de sonda vesical • Privação de sono prolongada
• múltiplos procedimentos
• dor
• estresse emocional

Quadro 5. Fatores precipitantes de delirium.


Fonte: Pisani.16

Substâncias que podem gerar delirium por intoxicação

• álcool • sedativos
• cocaína • opioides
• alucinógenos • fenciclidina e associadas
• canabinoides • hipnóticos e ansiolíticos
• anfetaminas e relacionadas • demais substâncias inalantes

Quadro 6. Conteúdos que podem causar delirium por intoxicação.


Fonte: Gonçalves.17

Substâncias que podem gerar delirium por abstinência

• anfetaminas e associadas
• álcool (Delirium Tremens)
• sedativos
• demais substâncias
• hipnóticos e ansiolíticos

Quadro 7. Conteúdos que podem causar delirium por abstinência.


Fonte: Gonçalves.17

Medicamentos que podem gerar o delirium

• analgésicos • antimicrobianos
• antiasmáticos • cardiovasculares
• anestésicos • antiparkinsonianos
• anti-histamínicos • corticosteroides
• anti-hipertensivos • relaxantes musculares
• anticolinérgicos (in. psicotrópicos) • anticonvulsivantes

Quadro 8. Medicamentos que podem causar delirium.


Fonte: Gonçalves.17

Toxinas que causam delirium


Toxinas que causam delirium

• dióxido de carbono • anticolinesterase


• monóxido de carbono • organofosforados
• combustíveis ou tintas • substâncias voláteis

Quadro 9. Toxinas que podem causar delirium.


Fonte: Gonçalves.17

Determinadas drogas causadoras de delirium

Medicações de uso rotineiro,


Drogas com atividade Outras medicações
habitualmente associadas
anticolinérgica relacionadas ao delirium
à automedicação

• cimetidina • difenidramina (Benadryl®) • benzodiazepínicos


• prednisolona • triprolidina • narcóticos
• teofilina • clorfenamina (Benegrip®, Sinutab®) • agentes antiparkinsonianos
• antidepressivos • prometazina (Fenergan®) • anti-inflamatórios não hormonais
• tricíclicos • agentes antidiarreicos (com beladona) • laxativos
• digoxina • hioscina (Buscopan®) • antibióticos
• nifedipina • haloperidol
• antipsicóticos
• furosemida
• ranitidina
• dinitrato de isossorbida
• varfarina
• dipiridamol
• codeína
• captopril

Quadro 10. Algumas drogas que podem causar quadros de delirium.


Fonte: Inouye.18

b) FISIOPATOLOGIA

• A fisiopatologia do delirium (fluxograma 1) é complexa e ainda


não muito bem explicada. Isso porque sua manifestação se dá por
um conjunto de causas subjacentes individuais de cada paciente.3
Fluxograma 1. Fisiopatologia do Delirium
Fonte : Setters. 3

• Esse desbalanço químico causa, de maneira direta ou indireta, um


desbalanço energético e/ou na liberação de neurotransmissores
(fluxograma 2). Essa condição se manifesta com as alterações no
funcionamento cerebral. 3
Fluxograma 2. Causas e desbalanço químico associadas ao delirium
Fonte: Setters. 3

• Além disso, é importante pesquisar por infecções em pacientes


que apresentam delirium. Isso porque a infecção causa um
processo inflamatório com ativação de citocinas, gerando um fluxo
sanguíneo insuficiente e morte neuronal. As principais fontes
infecciosas a serem pesquisadas em pacientes idosos são: infecção
urinária e pneumonia.3

QUADRO CLÍNICO
As manifestações clínicas gerais e específicas de cada tipo de delirium
estão sintetizadas no quadro 12.

Delirium
• Início agudo e flutuações nas alterações de atenção e consciência
• Desorientação
• Déficit de memória
• Distúrbios do ciclo circadiano
• Perturbação perceptiva (vê o desconhecido como conhecido).
• Alteração do humor
OBS.:
• As manifestações se diferenciam, a depender da forma de delirium. Apesar de existir a classificação em todos os
subtipos citados no início do capítulo, grande parte dos autores classificam esse distúrbio apenas em hipoativo,
hiperativo e misto.

Delirium hipoativo

• Letargia
• Redução da função psicomotora
• Diminuição da motilidade
• Alteração do apetite
• Perda da concentração
• Distúrbio do sono

OBS.:
• É comum passar despercebido pelos cuidadores e médicos
• Subtipo catatônico
• É uma apresentação extrema dos sinais e sintomas da forma hipoativa

Delirium hiperativo

• Elevação da atividade psicomotora (agitação)


• Estado de vigilância aumentado
• Alucinações
• Labilidade emocional
• Agitação e/ou ausência de cooperação nos cuidados de saúde prestados

OBS.:
• Raramente passa despercebido pelos cuidadores e médicos
• Subtipo catatônico
• É a manifestação extrema da forma hiperativa
• Relacionado ao uso de fármacos simpaticomiméticos
• Pode evoluir em síndrome hipermetabólica e óbito

Delirium misto

• O estado flutua entre os tipos hiperativo e hipoativo


• Há alterações de consciência e atenção
• Pode haver ou não alterações psicomotoras

Quadro 12. Manifestações clínicas de cada tipo de delirium.


Fonte: Setters, Wong.3,19

DICAS DO ESPECIALISTA: DIAGNÓSTICO

• História completa.
• obtida por entrevista com familiares, cuidadores e amigos.
• auxilia a distinguir distúrbio mental de delirium.3,19,20
• Exame do estado mental. 3,19,20

• Exame físico. 3,19,20

• Caso o paciente não facilite para a realização desse exame, deve-


se focar em: sinais vitais; estado de hidratação; focos potenciais
de infecção; pele, cabeça e pescoço e exame neurológico.
• A partir desse exame, pode-se obter tais resultados: febre,
meningismo, sinais de Kernig e Brudzinski sugerem infecção no
SNC; tremor e mioclonia sugerem uremia, insuficiência
hepática, ou intoxicação medicamentosa ou determinados
distúrbios eletrolíticos (hipocalemia, hipomagnesemia, dentre
outros); oftalmoplegia e ataxia sugerem síndrome de Wernicke-
Korsakoff; anormalidades neurológicas focais (paralisias de
nervos cranianos, déficits motores ou sensitivos, dentre outros)
ou papiledema sugerem doença estrutural do SNC; e lacerações
na face ou no couro cabeludo, hematomas, edemas e outros
sinais de traumatismo craniano sugerem lesão cerebral
traumática.3,19,20

• Testes selecionados para determinar a causa:


• TC (tomografia computadorizada) ou RNM (ressonância
magnética nuclear).
• Testes para infecções suspeitas (hemograma completo,
hemoculturas, radiografia de tórax, exame de urina, dentre
outros)
• Avaliação para hipóxia (oximetria de pulso ou gasometria
arterial).
• Medição de eletrólitos, ureia, creatinina, glicose plasmática e
níveis sanguíneos de qualquer droga suspeita de ter efeitos
tóxicos.
• Triagem de drogas na urina.3,19,20
OBS.:

• Caso o diagnóstico não esteja convincente, outros exames podem


ser feitos, como: testes de função hepática, medição de cálcio
sérico e albumina, TSH, vitamina B12, velocidade de
hemossedimentação, AAN, reações sorológicas para sífilis (por
exemplo, RPR) ou VDRL e eletroencefalograma (diferenciar
quadros de crises não convulsivas e doenças psiquiátricas).3,19,20

• Caso o diagnóstico ainda esteja indefinido, deve-se incluir análise


do LCR (particularmente para remover meningite, encefalite ou
hemorragia subaracnoidea), medida de amônio sérico e teste para
analisar a existência de metais pesados.3,19,20

• Caso haja suspeita de atividade epilética não convulsiva


(recomendada por modificações motoras sutis, automatismos e
padrão oscilante de perplexidade e torpor), deve ser realizado o
monitoramento do EEG.3,19,20

• Feito com base nos critérios CAM (Confusion Assessment


Method) (fluxograma 3):3,19,20
Fluxograma 3. Critérios CAM
Fonte : Setters, Wong, Lagoeiro 3,19,20

• Diagnóstico diferencial no delirium:


• Demência.
• Esquizofrenia.
• Depressão.
• Afasia de Wernicke.3,19,20

PREVENÇÃO DE DELIRIUM
Há estudos que demonstram que a abordagem multifatorial com
fundamento de identificar e controlar os fatores de risco para o delirium
podem reduzir os casos dessa doença em cerca de 30 a 40%. A prevenção é
fragmentada em não farmacológica e farmacológica.10,11
a) Não farmacológica

• É uma intervenção multifatorial, por meio de uma equipe


multidisciplinar capacitada e eficiente, a qual deverá examinar a
presença e executar em fatores de risco para o delirium. Essa
atuação deve ser ajustada conforme a especificidade de cada
doente, sendo que ela demonstra ser mais eficaz em doentes com
risco médio de desenvolver delirium e sem antecedentes de
delirium.7,21

• A intervenção multifatorial possibilita melhoria da orientação,


cognição, sono, mobilidade, déficits sensoriais (visuais e
auditivos), hidratação e nutrição do doente delirante, de tal maneira
que diminui o número de quedas e o período de internamento.10,11,13

• A mobilização e a terapia ocupacional estão associadas à redução


da duração do delirium.10,22

• Com o intuito de melhorar a orientação do doente, no tempo e no


espaço, deve-se garantir a presença de luz natural ou amenizar a
luz artificial no quarto do paciente. Além disso, também
proporcionar relógios e/ou calendários ao alcance visual da pessoa
com delirium. A luminosidade tem relação de prevenção das
mudanças no ciclo do sono, em virtude da hospitalização.
Ademais, é essencial a presença de familiares para a estimulação
verbal, dentre outras do paciente.10,11,13,23

• Durante o período noturno, devem ser evitados ruídos, tratamentos


médicos ou de enfermagem; por exemplo, administração de
medicamentos, caso não haja necessidade de ser realizado naquele
horário. Dessa maneira, há possibilidade de reduzir a incidência de
delirium em pacientes hospitalizados.10

• A utilização de medicamentos, como benzodiazepinas, opioides,


di-hidropiridinas e anti-histamínicos, deve ser evitado, visto que
pode elevar o risco de delirium.10

• Se o paciente tiver alguma dessas condições: desidratação,


hipoxemia e infecções, imediatamente precisa ser tratado. Caso
haja desidratação e/ou obstipação, dever-se-á garantir uma ingestão
adequada de fluidos, porém, se não for possível, deve-se utilizar a
hidratação intravenosa. Todavia, a inserção de cateteres deve ser
abdicada sempre que possível, a fim de diminuir as chances de
desenvolvimento ou agravamento de delirium.10,11

• Há evidências que comprovam que a regulação da profundidade


anestésica recorrendo ao bispectral index (BIS), ao longo de uma
intervenção cirúrgica, reduz a incidência de delirium pós-
cirúrgico.24
b) Farmacológica

• A eficácia da prevenção farmacológica ainda é incerta. Todavia,


há fármacos que apresentam bons resultados e são frequentes para
prevenção de delirium, tais como:10-13
• antipsicóticos (haloperidol, risperidona, ziprasidona).10-13
→ usado para prevenção do delirium pós-cirúrgico.
→ a risperidona é recomendável após uma cirurgia cardíaca com
bypass cardiopulmonar.
→ olanzapina é indicada após artroplastia.
• inibidores da colinesterase (rivastigmina, donepezila).10-13
→ promovem a redução da prevalência do delirium.
→ há evidências de que seu uso gera um número maior de efeitos
adversos.
• melatonina e agonistas da melatonina (ramelteon).10-13
→ o uso de melatonina pode melhorar a qualidade e o tempo do sono.
→ a administração de baixas doses de melatonina relaciona-se a uma
menor incidência de delirium em doentes idosos.
• agonistas α2 (clonidina, dexmedetomidina).10-13
→ A dexmedetomidina após uma intervenção cirúrgica cardíaca tem
uma menor incidência de delirium pós-cirúrgico em comparação ao
uso de propofol. À essa droga associa-se a uma evolução de
delirium mais tardio, a uma duração mais curta dele e,
consequentemente, reduz os gastos hospitalares. Ela ainda
possibilita: diminuição da hipoxemia, melhoria da analgesia,
diminuição da hipertensão, taquicardia, diminuição das
complicações em doentes que não desenvolveram delirium, menor
incidência de delirium nos primeiros sete dias após uma
intervenção cirúrgica não cardíaca e permanência menor na
unidade de cuidados intensivos.

• analgésicos.10-13

TRATAMENTO
• A abordagem terapêutica do delirium possui como propósito
central o tratamento tanto dos sintomas quanto da etiologia
subjacente ao delirium.

• O tratamento de delirium é uma emergência médica cujo desfecho


depende da causa, da saúde geral do paciente e da rapidez do
tratamento. A terapêutica pode ser o tratamento de uma infecção,
ajustar a medicação, organizar o ambiente ou regularizar o
sono.10,25

• A abordagem diagnóstica do paciente com delirium é


fundamental, a fim de estabelecer de imediato o tratamento devido
para sanar o fator causal ou contribuinte de delirium, e ainda
promover uma terapêutica que estabiliza as funções vitais do
paciente.10,25

• A principal maneira de tratar os sintomas do paciente com


delirium hipoativo em fase inicial é por meio de estratégias não
farmacológicas que ajudam a orientar a pessoa. Assim, estimula-se
o retorno à consciência e a melhoria do comportamento. Tais
estratégias são: possibilitar o contato com familiares durante o
período de internação, conservar a pessoa orientada em relação ao
tempo, fazendo-a ter acesso ao relógio e ao calendário e preservar
um ambiente tranquilo, em destaque durante à noite, para
possibilitar um sono calmo e de qualidade. Ademais, os idosos que
usam óculos ou aparelhos auditivos devem possuir acesso a eles,
de modo a evitar que eles tenham dificuldades de compreensão e
comunicação.10,25

• É recomendável o uso de analgésicos para tratar a dor e reduzir a


agitação dos pacientes. Essa terapêutica deve ser iniciada com
doses baixas. Caso precise repetir e/ou aumentar a dosagem do
analgésico, deve ser feito de forma gradual. Há estudos que
demonstram que a metadona é extremamente eficiente para tratar a
dor refratária.10,13,26

• Em casos de delirium hiperativo, o médico pode recomendar o uso


de medicamentos antipsicóticos típicos ou atípicos, como:
haloperidol em dose baixa (0,5 a 1,0 mg, VO, IV ou IM, 1 vez e
então repetido a cada 1 a 2 h, se necessário), risperidona 0,5 a 3
mg, VO, a cada 12 h, quetiapina 25 a 200 mg, VO, a cada 12 h,
olanzapina 2,5 a 15 mg, VO, 1 vez/dia ou clozapina. No entanto, a
utilização destes fármacos deverá ser feita com cautela e por um
tempo limitado, visto que o uso crônico e imprudente desses
medicamentos está relacionado a um risco exacerbado de AVC e
mortes nesses pacientes. Normalmente, esses fármacos não são
administradas por via intravenosa ou intramuscular.10,13,25,27

• Hodiernamente, o haloperidol é o antipsicótico mais usado no


tratamento do delirium hiperativo. As vantagens de seu uso são:
contém uma vasta experiência clínica e várias vias de
administração (oral, intramuscular e intravenoso), uma vez que
certas vezes o doente com delirium não coopera para a
administração por via oral. Há evidências de que doses altas de
haloperidol estão relacionadas a uma maior incidência de efeitos
secundários, como sintomas extrapiramidais. Além do haloperidol,
a olanzapina também é um dos medicamentos mais utilizados no
tratamento de delirium em doentes agitados.10,13,26

• O haloperidol é uma alternativa para tratamento de delirium em


pacientes internados sob cuidados paliativos. Já em pacientes com
Parkinson ou demência com corpos de Lewy, não é recomendável
administrar haloperidol, todavia é recomendável utilizar
antipsicóticos atípicos; por exemplo, a olanzapina.10,11,25,26

• Os fármacos estimulantes, como o metilfenidato ou modafinil, não


são recomendáveis para pacientes com delirium hipoativo, uma vez
que podem agravar a situação e provocar agitação.10

• Em casos de delirium relacionado à abstinência alcoólica ou à


abstinência de outras substâncias, é contraindicada a utilização de
benzodiazepinas, como o lorazepam 0,5 a 1,0 mg VO ou IV, 1 vez,
então repetido a cada 1 a 2 h, como necessário, e o midazolam,
visto que eles aumentam as chances de o paciente ter sua situação
agravada, já que deterioram o estado confusional do doente e por
promoverem sedação.10,25

• A dexmedetomidina é indicada para tratar delirium por


abstinência alcoólica, delirium pós-cirúrgico e delirium associado à
dor por neoplasia. E o midazolam é recomendável para tratar
delirium em casos de doentes internados nos cuidados
intensivos.13,25,26

a) CURIOSIDADE

• A patogénese do delirium envolve diversas atividades


colinérgicas. Por esse motivo, há tendências para surgir novos
estudos de tratamentos de delirium, por meio do uso de inibidores
da colinesterase, tais como a rivastigmina, donepezilo e a
fisiostigmina.13,25,26
b) PROGNÓSTICO DE DELIRIUM

• Os valores de morbidades e mortalidades são grandes em


pacientes com delirium e que são hospitalizados ou naqueles que
desenvolvem delirium ao longo da hospitalização. Há evidências
que cerca de 35 a 40% dos pacientes hospitalizados com delirium
morrem em 1 ano. Cabe ressaltar que essa alta taxa de mortalidade
é explicada porque esses pacientes tendem a ser mais velhos e ter
outras doenças graves.28

• A maioria dos casos de delirium é corrigida rapidamente com o


tratamento. Todavia, alguns casos possuem recuperação lenta
(variando entre dias, semanas ou até meses), em destaque em
idosos. Em decorrência disso, provoca: períodos mais longos de
internação, mais complicações, custos mais altos e incapacidade
prolongada.28

• Alguns pacientes nunca se recuperaram integralmente do delirium.


Além disso, pacientes que não se recuperaram em até dois anos
possuem: maior risco de déficit cognitivo e declínio funcional e
morte.28

CONCLUSÃO
• A compreensão da etiopatogênese de delirium é de extrema
importância para os médicos, a fim de proporcionar um
diagnóstico diferencial exato ao paciente e implementar a melhor
proposta terapêutica a ele.

• Cabe ressaltar que os profissionais da saúde devem diagnosticar e


tratar cada paciente, conforme a especificidade patológica deles,
uma vez que cada indivíduo tem influências de fatores
etiopatogênicos diferentes.

• A abordagem de uma equipe multidisciplinar é sempre de extrema


importância para proporcionar o melhor prognóstico possível aos
pacientes.

• Além dos aspectos de tratamento para os doentes, é fundamental a


promoção de profilaxia às pessoas.

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8.12
ENCEFALOPATIA METABÓLICA
Autores:
Maycon Cristian Gomes de Paula
Mateus Gonçalves de Sena Barbosa
Isadora Dias Moreira
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
• A encefalopatia metabólica refere-se a alguma doença encefálica
que modifica a função do encéfalo devido a algum distúrbio ou
doença metabólica, ou seja, sem envolver alteração estrutural
propriamente dita.1-3

• As causas da patologia de base podem ser: doenças isquêmicas,


hipertensivas, mitocondriais, metabólico-sistêmicas (hepatopatias e
nefropatias), intoxicações exógenas, traumas, neoplasias e
infecções.1,2

• A atuação médica adequada à causa de tal encefalopatia é um fator


dominante para efetivar um prognóstico satisfatório ao paciente.

ETIOPATOLOGIAS E CLASSIFICAÇÕES 4-7,15,18,22-


24,34,

Existem várias etiologias associadas à encefalopatia metabólica. A partir


delas é feita a classificação (Quadro 1).

Encefalopatia hipertensiva 1,4,5

• Causa
- Hipertensão arterial maligna (HAM)
- Elevação súbita da pressão com disfunção de órgão-alvo.
- (PAS ≥ 180 mmHg e/ou PAD ≥ 110 mmHg)
• Normalmente é reversível.
Encefalopatia hipóxico-isquêmica (EHI) 6-10

• Causa
- Isquemia por hipoperfusão cerebral resultando em lesão intraparenquimatosa.
• Pode ser irreversível.
Encefalopatia traumática 33-35

• E também designada como demência pugilística ou Síndrome Boxer ou Encefalopatia Traumática


Crônica (ETC).
• Causa
• Pode progredir com hemorragias intracranianas, hematomas, dissecção vertebral ou carotídea,
concussões e lesões axonais difusas.

Encefalopatia tóxica 36-38

• Causa
- Lesão cerebral associada a intoxicações químicas
• Substâncias que provocam lesões químico-tóxicas ao sistema nervoso
- Pesticidas, solventes, antibióticos (como cefalosporinas, quinolonas e carbapenêmicos), anticonvulsivantes
(lamotrigina, alprazolam, vigabatrina, topiramato e ácido valproico), álcool, cocaína, neurolépticos, aciclovir,
compostos orgânicos voláteis e hidrocarbonetos.
- Anatomia das fibras nervosas, redução do metabolismo das espécies reativas de oxigênio e elevada taxa
metabólica do tecido nervoso.

Encefalopatia de Hashimoto 12-16

• É uma síndrome neurológica de causa autoimune. Normalmente não gera modificações na glândula
tireoide.
• Pode ter relação com lúpus eritematoso sistêmico (LES), diabetes mellitus tipo 1 e síndrome de
Sjögren.

Encefalopatia hepática (EH) 17-21

• Alteração do estado de consciência por acúmulo de substância tóxica no sangue; por exemplo,
amônia, que atingem o cérebro.
• Pode surgir gradualmente ou de forma súbita.
• Classificado em:
• Tipo A
→ causada por insuficiência hepática aguda.
• Tipo B
→ causada por bypass portossistêmico na ausência de doença hepática intrínseca.
• Tipo C
→ causada por cirrose.
→ Esse tipo foi subdividido em:
• Episódica
- paciente previamente hígido do enfoque neuropsiquiátrico.
• Persistente
- existência constante e sem interrupção de sinais e sintomas da encefalopatia hepática.
• Mínima
- condição pré-clínica da encefalopatia hepática em que o paciente expressa menos resposta em testes
neurológicos, contudo sem alteração do estado mental ou outras anormalidades.
Encefalopatia urêmica 22-26

• Causada por insuficiência renal aguda ou crônica com depuração de creatinina inferior a 15 mL/min.
• Origem multifatorial que inclui distúrbios hormonais, estresse oxidativo, retenção de metabólitos,
desequilíbrio entre neurotransmissores tanto excitatórios quanto inibitórios e distúrbio do metabolismo
intermediário.

Encefalopatia urêmica 22-26

• Causada por carência de vitamina B1 (tiamina)


• Constituída pela encefalopatia de Wernicke-Korsakoff ligada à psicose de Korsakoff, que é uma
sequela neurológica desta deficiência crônica.

Quadro 1. Classificações e etiologias das Encefalopatias Metabólicas.


Fonte: Elaborado pelos autores.

EPIDEMIOLOGIA 39
• Ocorre em 10%-40% dos pacientes hospitalizados com mais de 65
anos, sendo que essa idade é o ponto de inflexão da curva
ascendente.

• Cerca de 45%-80% dos pacientes cirróticos desenvolvem


encefalopatia hepática, dependendo do grau de comprometimento
do parênquima.

• Nos EUA, 100-200.000 pacientes são diagnosticados com


encefalopatia a cada ano, sendo 12%-16% causados por deficiência
de tiamina.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
a) ENCEFALOPATIA HIPERTENSIVA40

• O mecanismo mais aceito está sistematizado no fluxograma 1.


• Alguns autores afirmam outro mecanismo: o aumento da PIC
causaria vasoespasmo compensatório, levando à isquemia
cerebral.
Fluxograma 1:
Fonte : Damiani 40

b) ENCEFALOPATIA HIPÓXICO-ISQUÊMICA40

• O mecanismo fisiopatológico da encefalopatia hipóxico-isquêmico


está representado no Fluxograma 2.
Fluxograma 2: Fisiopatologia da encefalopatia hipóxico-isquêmica
Fonte : Damiani 40
Fluxograma 3: Continuação do fluxograma 2
Fonte : Damiani 40

c) ENCEFALOPATIA DE HASHIMOTO 40

• O mecanismo fisiopatológico está esquematizado no Fluxograma


4.
Fluxograma 4: Fisipatologia da Encefalopatia de Hashimoto
Fonte : Damiani 40
d) ENCEFALOPATIA HEPÁTICA 40 - 42

• O mecanismo fisiopatológico se encontra no Fluxograma 5.


Fluxograma 5: Fisiopatologia da Encefalopatia Hepática
Fonte : Damiani, Angel, Bathla. 40 - 42

• A vasodilatação induzida pela amônia também pode gerar edema


cerebral e aumento da PIC, contribuindo para a piora do caso.43
e) ENCEFALOPATIA URÊMICA 40,41

• O mecanismo fisiopatológico se encontra no Fluxograma 6.


Fluxograma 6. Fisiopatologia da Encefalopatia Urêmica
Fonte : Damiani, Angel. 40,41

f) ENCEFALOPATIA DE WERNICKE- KORSAKOFF 40-41

• O mecanismo fisiopatológico se encontra no Fluxograma 7.


Fluxograma 7: Fisiopatologia da Encefalopatia de Wernicke-Korsakoff
Fonte : Damiani, Angel. 40-41

g) ENCEFALOPATIA TRAUMÁTICA 40,41

• O mecanismo fisiopatológico se encontra no Fluxograma 8.

Fluxograma 8. Fisiopatologia da Encefalopatia Traumática


Fonte : Damiani, Angel. 40,41
h) ENCEFALOPATIA TÓXICA 39-41

• O mecanismo fisiopatológico se encontra no Fluxograma 9.

Fluxograma 9: Fisiopatologia da Encefalopatia Tóxica


Fonte : Berisavac, Damiani, Angel. 39-41

QUADRO CLÍNICO
As manifestações clínicas da Encefalopatia Metabólica estão sintetizadas
no quadro 2.

Encefalopatia metabólica

• Relacionadas à severidade do distúrbio metabólico subjacente, mas os sinais e sintomas neurológicos


se dividem em Globais e Focais.
• Além deles, podem estar presentes distúrbios de humor, de memória, demência e até sintomas
depressivos.

Sinais e sintomas Globais


Fase Inicial
• Delirium (Escala de Coma de Glasgow: 11-14).
• Distúrbios de consciência
• Confusão
• Desorientação
Relacionado ao sistema autonômico
• Insônia
• Náusea
• Alterações cardiorrespiratórias
Com a progressão
• Convulsões epiléticas
• Automatismos oral e facial
• Reflexos patológicos
• Mioclonismos
• Tremores
• Coma
Nos estágios mais severos
• Rigidez decorticada/descerebrada
• Coma profundo evoluindo em óbito
Sinais e sintomas Focais
Sintomas hemisféricos
• Distúrbios visuais
• Apraxia
• Afasia
• Hemispasticidade
• Hemiataxia
• Síndromes hemisensoriais
• Reflexos patológicos
Sinais de lesão em tronco encefálico
• Sinais de lesão de pares cranianos
• Reflexos de tronco cerebral patológicos
• Disartria
• Disfagia
• Ataxia
• Hemiparesia
• Distúrbios sensoriais e respiratórios
Quadro 2. Manifestações clínicas de encefalopatia metabólica.
Fonte: Berisavac, Damiani, Angel, Hadjihambi. 39-41,43
DICAS DO ESPECIALISTA: DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de encefalopatia metabólica envolve: 40-43

• História clínica detalhada, buscando avaliar exposição à agente


tóxicos bem como presença de hepatopatia, nefropatia, traumas,
alcoolismo e todas demais etiologias envolvidas.

• Aplica-se a ferramenta dos Critérios CAM, visando confirmar o


quadro de delirium (umas das manifestações mais comuns da
encefalopatia metabólica).

• Exame neurológico, para identificar possíveis déficits neuronais


focais. Deve ser realizado após descontinuação do uso de
sedativos.

• Exames laboratoriais específicos para análise da composição


química do sangue.

• EEG.
• Lentificação ou supressão da reatividade e do ritmo.
• Potencial de evocação somatossensorial.
• Exames de imagem.
a) ESPECIFICIDADES DE CADA ETIOLOGIA 40-43

• Encefalopatia hipertensiva
• Papiledema
• Exsudatos hemorrágicos à fundoscopia
• Alteração do nível de consciência
• Nistagmo
• Paralisia do VI par craniano
• Turgência jugular
• Estertores crepitantes na ausculta pulmonar
• Cefaleia

• Encefalopatia hipóxico-isquêmica
• Não há testes laboratoriais para confirmação diagnóstica
• A anamnese e exame físicos são definitivos
• Exames de imagem são inconclusivos: desde normais até edema
cerebral difuso (Quadro 3).
• Podem ser observadas hemorragias intraparenquimatosas e
intraventriculares
• RNM e estudos de perfusão e difusão podem ser úteis
TC RNM

• Entre 4 e 5 horas após o insulto, mostra: hipoatenuação de estruturas de • Ponderada em T2 pode mostrar
substância cinzenta profunda hiperintensidade e edema na região afetada
• Nas primeiras 24 horas, mostra hipoatenuação de gânglios basais e tálamo 24 horas ou mais depois do insulto (Figura
• Perda da diferenciação entre substância cinzenta e branca pode ser 1).
observada
• Nos casos mais severos, pode-se observar hipoatenuação da substância
branca, gerando o ´´Sinal reverso´´.

Quadro 3. Análise de TC e RNM para teste de encefalopatia hipóxico-


isquêmica.40,42
Fonte: Damiani, Angel, Bathla. 40-42
Figura 1. Imagem de RNM ponderada em T2 demonstrando hiperintensidade
de gânglio basal e face medial do tálamo.
Fonte : Bathla 42

• Encefalopatia de Hashimoto
• Seu diagnóstico é discutido no Quadro 4.
EXAME EXAMES
LÍQUOR TC
FÍSICO LABORATORIAIS

• Alteração do nível de Sugerem o diagnóstico: • Hiperproteinorraquia • Atrofia


consciência • FAN • Pleocitose linfocítica • Alterações da substância
• Letargia • Anti-ENA moderada branca periventricular
• Alterações personalidade • Fator reumatoide
• Convulsões • Anticorpos antigliadina
• Mioclonias • Anti-TPO
• Tremores

Quadro 4. Diagnóstico da encefalopatia de Hashimoto.40


Fonte: Damiani 40

• Encefalopatia hepática
• A classificação é feita com base nos Critérios de West-Haven
(Tabela 1).
Critérios de West-Haven

Níveis de Conteúdo de Exame


Estágios
consciência consciência neurológico

Exame normal / Testes


0 Normal Normal
psicomotores prejudicados

Redução da atenção.
I Leve perda de atenção Adição e subtração Tremor ou Flapping discreto
prejudicadas

Desorientado.
Flapping evidente.
II Letárgico Comportamento
Disartria
inadequado.

Rigidez muscular.
Desorientação completa.
III Sonolento porém responsivo Clônus.
Comportamento bizarro
Hiperreflexia

IV Coma Coma Descerebração

Tabela 1. Classificação de encefalopatia hepática.40-43


Fonte: Damiani, Angel, Bathla, Hadjjhambi 40-43

OBS.: RNM é importante para descartar outras causas:

• Edema principalmente em região de núcleos da base


• Hiperintensidade simétrica em T1 do globo pálido (Figura 2).
Figura 2. Imagem de RNM ponderada em T1 que demonstra
hiperintensidade bilateral simétrica em região de globo pálido.
Fonte : Bathla 42

• Encefalopatia Urêmica
• O diagnóstico é debatido no Quadro 5.
Exame Exames Diagnósticos
Neuroimagem
físico laboratoriais diferenciais
• Nistagmo • Dosagem de ureia sérica e de • Intoxicação por drogas • Frequentemente normal
• Papiledema fármacos que poderiam • Infecções • Acometimento bilateral simétrico ou
• Torpor contribuir para o quadro • AVE assimétrico de núcleos da base (Figura 3)
• Clônus • TC: Hipoatenuação
• Hiperreflexia • RNM: Regiões de prolongamento em T1 e
• Flapping T2

Quadro 5. Diagnóstico de encefalopatia urêmica.40,42


Fonte: Damiani, Angel, Bathla. 40-42
Figura 3. (1) Imagem de TC que demonstra hipodensidade e (2) Imagem de
RNM ponderada em T2 com hiperintensidade bilateral simétrica em região
de globo pálido.
Fonte : Bathla 42

• Encefalopatia de Wernicke-Korsakoff
• Os achados que sugerem essa condição, bem como seus
diagnósticos diferenciais estão no Quadro 6.
Exame Exames Diagnósticos
RNM contrastada
físico laboratoriais diferenciais

• Tríade clássica: Oftalmoplegia • Dosagem dos níveis de • Psicose • Frequentemente normal


extrínseca, ataxia e confusão mental Tiamina • Outras etiologias de delirium • Acometimento bilateral
• Alteração da consciência: mudanças no • Delirium tremens simétrico ou assimétrico de
humor, tremor vocal, apatia, estupor, • Hipoglicemia núcleos da base (Figura 3)
ideação suicida, desorientação • Distúrbios hidroeletrolíticos • TC: Hipoatenuação
temporoespacial • Doença de Alzheimer • RNM: Regiões de
• Amnésia anterógrada ou retrógrada • Epilepsias prolongamento em T1 e T2
• Hipotermia • Concussões cerebrais
• Neuropatia periférica • Encefalites
• Disfunção cardiovascular, taquicardia, • Neoplasias
síncope.

Quadro 6. Diagnóstico de encefalopatia de Wernicke-Korsakoff. 40,42


Fonte: Damiani, Angel, Bathla. 40-42
Figura 4. RNM ponderada em T2 que apresenta em (A) lesão em corpos
mamilares e em (B) lesão em face medial do tálamo.
Fonte : Bathla 42

TRATAMENTO
• É específico para cada tipo de encefalopatia (Quadro 7).
TIPOS DE
TRATAMENTO
ENCEFALOPATIA

• Nitroprussiato de Sódio em dose inicial de 0,3-0,5 mg/kg/min.


• A dose usual é 3 mg/kg/dia e a máxima é 10 mcg/kg/min.
• A via de administração é endovenosa em bomba de infusão contínua, sendo que 100 mg são
ENCEFALOPATIA diluídos em 250 mL de soro glicosado 5%.
HIPERTENSIVA • Os frascos não devem ter alcance de luz.
• O medicamento é fonte de óxido nítrico, um vasodilatador eficiente em artérias e veias.
• Os possíveis efeitos colaterais que devem ser percebidos são: taquicardia, ansiedade e
inquietude, cefaleia, sudorese e tontura.

• Manutenção de vias aéreas, ventilação, circulação e pressão sistólica (caso necessário, usar
drogas vasoativas).
• Todas as convulsões devem ser tratadas, inclusive aquelas diagnosticadas apenas pelo
ENCEFALOPATIA
eletroencefalograma.
HIPÓXICO-
• Para não causar hipoperfusão cerebral em virtude da vasoconstrição, não pode hiperventilar o
ISQUÊMICA (EHI)
paciente.
• É benéfico reduzir o metabolismo cerebral; sendo assim, a hipotermia em torno de 3 a 4 graus
abaixo da temperatura corpórea permite isso.
TIPOS DE
TRATAMENTO
ENCEFALOPATIA

ENCEFALOPATIA • Corticoterapia em doses altas. Prednisona 1 - 2 mg/kg/dia por um período pequeno.


DE • A recuperação clínica é esperada em até 6 semanas. Caso não haja a melhoria esperada, deve-se
HASHIMOTO indicar algum desses: Azatioprina, Imunoglobulina EV ou Plasmaférese.

• Antibióticos como Neomicina, Rifaximina e Vancomicina são eficientes para diminuir a amônia
produzida pelo cólon, sendo que todos esses fármacos devem ser administrados via oral, com o
intuito de limpar a flora intestinal e reduzir a produção de amônia.
• Tais medicamentos devem ser associados à Lactulose 20 mL VO ou enema de Lactulose (300
mL + 700 mL de água destilada por via retal) com a meta de estimular uma maior conversão de
amônia em amônio, além de elevar a população de lactobacilos que não produzem amônia e
ENCEFALOPATIA
maior incorporação desta pelas bactérias locais.
HEPÁTICA (EH)
• Regular as doses com o objetivo de 3 evacuações pastosas por dia.
• A busca pela redução da tumefação cerebral deve ser sempre feita.
• Não descartar a possibilidade de transplante de fígado.
• Os pacientes em Grau III ou IV devem ser imediatamente intubados.
• Cabe ressaltar que níveis arteriais de amônia superiores a 200 g/dL elevam a pressão
intracraniana e levam à herniação encefálica.

• Sempre examinar e retificar possíveis distúrbios hidroeletrolíticos.


• Sempre também averiguar a dose de todos os fármacos que estão sendo injetados no paciente,
uma vez que esses podem favorecer o desenvolvimento do quadro de encefalopatia urêmica.
ENCEFALOPATIA
• Diálise (com o objetivo de diminuir a ureia sérica) ou transplante renal.
URÊMICA
• Terapia antioxidante e antagonistas de cisteinil leucotrienos (CysLTs) podem ser usados como
terapia adjuvante para o tratamento das complicações neurológicas causadas por essa
encefalopatia.

• Suplementação com tiamina 100 mg (vitamina B1) de administração parenteral.


ENCEFALOPATIA
• Na falta de tiamina, deve-se administrar glicose.
DE WERNICKE-
• Após a administração de tiamina, deve-se corrigir os níveis hidroeletrolíticos, em destaque de
KORSAKOFF
potássio e magnésio.

ENCEFALOPATIA
• Analisar e tratar de maneira especializada as consequências do trauma.
TRAUMÁTICA

ENCEFALOPATIA
• Deve-se neutralizar o agente desencadeante, independentemente de qual seja.
TÓXICA

Quadro 7. Medidas terapêuticas para a respectiva encefalopatia.


Fonte: Pancioli, Shankaran, Mocellin, Sechi, Kesler, Shawcross, Hawkins,
Sechi, Areza, Feregyveres, Savolainan.4,7,13,15,16,20,21,29,33,37,48,49,50,51

PREVENÇÃO
• Para encefalopatias metabólicas, em geral incluem:
• Acompanhamento multidisciplinar constantemente
• Dieta saudável
• Atividade física
• O tratamento de determinadas doenças hepáticas, evitar a
ingestão de álcool em excesso e o uso de drogas injetáveis pode
precaver muitas doenças hepáticas.44,45
• A rifaximina adicionada à lactulose é o agente mais estudado
para conservar a remissão em pacientes que já vivenciaram pelo
menos uma ocorrência de EH ao longo do tratamento com
lactulose após o episódio inicial.46
• A utilização de um complexo multivitamínico é recomendado,
embora não existam dados concretos sobre os benefícios de
suplementos vitamínicos e minerais. A suplementação de zinco é
considerada no tratamento de EH.44,45

• A profilaxia de EH é fragmentada em duas partes: 44,45

• Profilaxia primária: utilização da lactulose profilático nos casos


de HDA
• Profilaxia secundária: após o 1º episódio, é recomendada com
lactulose (regular para 2 a 3 evacuações pastosas/dia), exceto
nos casos em que o fator desencadeante foi identificado e
removido, e o paciente possui uma boa reserva funcional
hepática (avaliar de forma específica cada paciente).

• Para profilaxia de encefalopatia urêmica, o mais importante é a


constante realização exames para avaliar se há possíveis distúrbios
hidroeletrolíticos. Além disso, deve-se fazer uma dieta saudável
rica em nutrientes e ingestão de um volume adequado de água, a
fim de manter níveis normais de eletrólitos e de água.26
• Já para prevenir de encefalopatia de Wernicke-Korsakoff é
importante o indivíduo fazer acompanhamento médico para ter
análise constante de seus níveis de vitamina B1 (tiamina) e realizar
suplementação dessa vitamina sempre que houver necessidade. A
alimentação diária de alimentos ricos em tiamina é a principal
profilaxia. Tais alimentos são: cereais integrais, carne, ervilha e
feijão (esses são os principais).28,29,47

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8.13
SÍNDROMES DEGENERATIVAS
Autores:
Jonas Silva Paes
Maycon Cristian Gomes de Paula
Nícollas Nunes Rabelo

DEFINIÇÕES
As doenças neurodegenerativas estão previstas para ultrapassar o câncer
como segunda causa de morte mais frequente entre os idosos por volta de
2040.1
Dessa forma, o conhecimento desse tema é de extrema importância para
a prática médica atual e futura.
As doenças neurodegenerativas são um grupo dentro de síndromes
degenerativas caracterizadas por morte neuronal excessiva e prematura em
regiões focais e/ou comprometimento de estruturas associadas. Isto resulta
em atrofia focal das regiões afetadas do sistema nervoso. Esta atrofia focal
regional e específica é uma marca característica da patologia macroscópica
e da neuroimagem de doenças neurodegenerativas.2
O presente capítulo tratará de apresentar, inicialmente, as principais
síndromes neurodegenerativas não demenciais. As síndromes
neurodegenerativas envolvidas com a demência serão o alvo de estudo de
outro capítulo.

ATROFIA DE MÚLTIPLOS SISTEMAS


A Atrofia de Múltiplos Sistemas (AMS) é um quadro degenerativo de
caráter progressivo que acomete indivíduos a partir da 5ª década da vida.
De modo geral, caracteriza-se pela combinação de parkinsonismo, ataxia
cerebelar e disfunções autonômicas em proporções variando de caso a caso.
Em cerca de 2 a 3 anos, o paciente costuma estar gravemente
comprometido.4
A atrofia multissistêmica afeta aproximadamente 2 vezes mais homens
que mulheres. A média de idade de surgimento desse distúrbio é
aproximadamente 53 anos; os pacientes vivem cerca de 9 a 10 anos após o
aparecimento dos sintomas. A etiologia da atrofia multissistêmica é
desconhecida, mas ocorre degeneração neuronal em várias áreas do
encéfalo; a área e o grau de lesão determinam os sintomas iniciais.5
A Atrofia de Múltiplos Sistemas é caracterizada pela presença de
inclusões citoplasmáticas gliais (GCIs) nas células oligodendrogliais. Essas
inclusões são amplamente distribuídas no cérebro dos indivíduos afetados.
Inclusões citoplasmáticas neuronais e inclusões nucleares neuronais
também podem ser encontradas, mas são muito menos proeminentes em
relação aos GCIs. Foi sugerido que o envolvimento de neurônios e
oligodendrócitos afeta sinergicamente o processo neurodegenerativo na
AMS.6

a) Sinais e sintomas 4,5,7

• Sinais motores
• Parkinsonismo pouco responsivo à levodopa
• Ataxia cerebelar
• Sinais piramidais
• Instabilidade precoce e quedas (dentro de 3 anos após o início da doença)
• Progressão rápida (sinal de cadeira de rodas) apesar do tratamento dopaminérgico (dentro de 5 anos após o
início da doença)
• Distonia Orofacial ou discinesia atípica espontânea ou induzida por levodopa que afeta principalmente os
músculos orofaciais, parecendo ocasionalmente com o risus sardonicus do tétano cefálico.
• Distonia axial:
→ Síndrome de Pisa (distonia axial subaguda com forte flexão lateral tônica do tronco, cabeça e pescoço) ou
camptocormia grave precoce
• Antecolis desproporcional: Queixo no peito, pescoço só pode ser passivo e forçado a ser estendido à sua
posição normal com dificuldade; apesar da severa flexão crônica do pescoço, a flexão em outros lugares é
menor.
• Tremor irregular: postura mioclônica irregular ou tremor de ação das mãos ou dedos.
• Disartria: Tremores atípicos, disartria aguda e gravemente hipofônica ou gravemente aguda.

• Sinais não motores


• Disautonomia grave
• Respiração anormal noturna (sons inspiratórios agudos ou tensos, estridentes) ou estridor inspiratório diurno,
suspiros e suspiros profundos involuntários, apneia do sono (interrupção da respiração po r> 10 s) e ronco
aumentado a partir do nível pré-mórbido ou recém-surgido.
• Transtorno do comportamento do sono REM: Perda intermitente de atonia muscular e aparecimento de
atividade motora elaborada (golpear com os braços no sono, muitas vezes com conversas ou gritos) associada ao
sonho.
• Mãos ou pés frios e mudança de cor (para púrpura ou azul) das extremidades não causadas por drogas,
diminuição da pressão e retorno circulatório deficiente.
• Fenômeno de Raynaud: “Dedo branco” doloroso provocado por drogas ergolinas.
• Incontinência emocional: Chorando inapropriadamente sem tristeza ou rindo inapropriadamente sem alegria.
B) Sinais e sintomas 4,5,7
• Avaliação clínica (parkinsonismo ou sintomas cerebelares que respondem mal à levodopa e são associados à
insuficiência autonômica)
• Ressonância Magnética mostra alterações características no mesencéfalo, ponte ou cerebelo.
• Varreduras com MIBG (I-meta-iodobenzilguanidina) mostram inervação intacta do coração.

• Testes autonômicos indicam insuficiência autonômica generalizada.

c) Tratamento 7

• Para acinesia – rigidez:


• Levodopa (mais inibidor da descarboxilase) até 1000 mg/dia, se tolerado;
• Agonistas da dopamina como medicamentos de segunda linha (dosagem para pacientes com DP);
• Amantadina como medicamento de terceira linha, 100 mg até três vezes ao dia.

• Para distonia focal:


• Toxina botulínica

• Para hipotensão ortostática:


• Inclinar a cabeça para cima da cama à noite;
• Meias elásticas ou collants;
• Maior ingestão de sal;
• Fludrocortisona 0,1-0,3 mg/dia;
• Efedrina (15-45 mg três vezes ao dia);
• L-treo-DOPS (300 mg duas vezes ao dia);
• Midodrina (2,5-10 mg três vezes ao dia).

• Para hipotensão pós-prandial:


• Octreotida (25-50 mg por via subcutânea, 30 minutos antes de uma refeição).

• Para poliúria noturna:


• Desmopressina (spray 10-40 g por noite; comprimido 100-400 g por noite).

• Para sintomas da bexiga:


• Oxibutinina para hiper-reflexia detrusora (2,5-5 mg duas ou três vezes ao dia);
• Autocateterismo intermitente para retenção ou volume residual > 100 mL.

• Outras terapias:
• Fisioterapia;
• Terapia de fala;
• Terapia ocupacional;
• Gastrostomia endoscópica percutânea (raramente necessária na fase tardia);
• Fornecimento de cadeira de rodas;
• Pressão positiva contínua nas vias aéreas (raramente traqueostomia) para estridor inspiratório.

Quadro 1. ATROFIA DE MÚLTIPLOS SISTEMAS


Fonte: Bertolucci, Low, Wenning. 4,5,7

DICAS DO ESPECIALISTA
A atrofia multissistêmica é sinucleinopatia (por causa da deposição de
sinucleína). A sinucleína também pode se acumular em pacientes com
doença de Parkinson, atrofia autonômica pura ou demência com corpos de
Lewy. Sinucleína é uma proteína celular neuronal e glial que pode se
agregar a fibrilas insolúveis e formar corpos de Lewy.5,7
A Atrofia de Múltiplos Sistemas possui três variantes clínicas:8 Atrofia
Olivopontocerebelar, Degeneração Estriatonigral e Síndrome de Shy-
Drager:

• Atrofia Olivopontocerebelar: Grupo de transtornos hereditários e


esporádicos, que apresentam ataxia progressiva em combinação
com atrofia do CEREBELO, PONTE e núcleos olivares
inferiores.9

• Degeneração Estriatonigral: Doença neurodegenerativa


esporádica com início na meia-idade, caracterizada clinicamente
por sinais Parkinsonianos. Os sinais patológicos incluem uma
perda proeminente de neurônios na zona compacta da
SUBSTÂNCIA NEGRA e PUTÂMEN.10

• Síndrome de Shy-Drager: Afecção neurodegenerativa progressiva


dos sistemas nervosos central e autônomo, caracterizada por
atrofia dos neurônios da coluna lateral pré-ganglionar da medula
espinal torácica.11

DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENNE


A Distrofia Muscular de Duchenne afeta principalmente indivíduos do
sexo masculino com incidência estimada de 1/3300 anualmente. As
mulheres são normalmente assintomáticas, mas uma pequena percentagem
das portadoras manifesta uma forma leve da doença.12
A cardiomiopatia e a insuficiência respiratória são a causa de morte nos
jovens adultos. A DMD é uma doença recessiva ligada ao X em que as
lesões ao nível dos músculos são causadas pela ausência completa da
distrofina no sarcolema como resultado de anomalias no gene DMD
(Xp21.2).12
Iniciando-se nos primeiros anos de vida e evoluindo rapidamente,
impossibilita que o paciente ande ao chegar em torno de 10 a 12 anos; com
morte geralmente na terceira década, por problemas respiratórios.13

a) Sinais e sintomas 16,20

• Atraso no desenvolvimento motor


• Sinal de Growers
• Níveis elevados de creatinina
• Fraqueza de tronco e membros inferiores proximais e posteriormente distais
• Marcha miopática
• Cardiomiopatias e arritmias
• Alterações respiratórias
• QI abaixo do normal
• Escoliose
• Fraturas frequentes em vértebras e ossos longos
• Maior risco de hipertermia maligna e de reações que mimetizem essa condição, como na exposição de
anestésicos inalatórios e relaxantes musculares despolarizantes.

B) diagnóstico 13,14

• A suspeita diagnóstica tem como base o quadro clínico, a história familiar e os achados laboratoriais (a
creatinina quinase sérica é 100-200 vezes superior ao nível normal).
• A biópsia muscular mostra características distróficas e existe uma ausência completa da proteína distrofina.
• Os estudos genéticos demonstram deleções e duplicações frame-shift, ou mutações nonsense no gene DMD.

c) Tratamento 14

Embora não haja tratamento específico, prescreve-se o uso de deflazacort diariamente para pacientes > 5 anos de
idade que não estão mais ganhando, ou estão perdendo, habilidades motoras.
O efeito desses fármacos ocorre tão cedo quanto 10 dias após o início da terapia; o pico da eficácia ocorre em 3
meses e persiste por 6 meses. O uso a longo prazo melhora a força, atrasa a idade em que se perde a deambulação
em 1,4 a 2,5 anos, melhora os testes funcionais cronometrados, melhora a função pulmonar, reduz complicações
ortopédicas, estabiliza a função cardíaca e aumenta a sobrevida em 5 a 10 anos.

Quadro 2. DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENNE


Fonte: Bertolucci, Gloss, Nitrini, Rubin.13,14,16,20

DOENÇA DE CREUTZFELDT - JAKOB


A doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) é a doença priônica humana mais
comum. Ocorre em todo o mundo e tem várias formas e subtipos.15
Com incidência anual de cerca de um caso por um milhão de habitantes,
a DCJ acomete igualmente os dois gêneros e geralmente ocorre entre 55 e
70 anos de idade.15,16
A DCJ tem três formas: A esporádica, a familiar e a adquirida.
A DCJ esporádica é o tipo mais comum, sendo responsável por cerca de
85% dos casos. A DCJ esporádica geralmente afeta pessoas com mais de 40
anos de idade (média etária de cerca de 60 anos). A DCJ familiar ocorre em
cerca de 5 a 15% dos casos. A hereditariedade é autossômica dominante; a
idade no início costuma ser mais precoce do que na DCJ esporádica e a
duração da doença é mais longa. A DCJ adquirida é provavelmente
responsável por 1% dos casos. Ela ocorre após a ingestão de carne
contaminada por príons (na variante da DCJ.16
a) Sinais e sintomas 4,17

• Início
• Ansiedade
• Alterações do sono
• Fadiga
• Alterações de humor
• Dificuldade de memória

• Instalação rapidamente progressiva de demência associada a:


• Mioclonias
• Sinais piramidais
• Sinais extrapiramidais
• Sinais cerebelares

B) diagnóstico 4,17
• Alterações do eletroencefalograma, com surtos pseudoperiódicos e ondas trifásicas.
• Exame do LCR e neuroimagem podem mostrar pleocitose discreta.
• RM mostra hipersinal nos núcleos da base.

c) Tratamento 4,17,18
Apesar de relatos bem-sucedidos do tratamento com Risperidona, a doença é inexoravelmente fatal, acarretando
óbito em menos de um ano, na maioria dos casos.

Quadro 3. DOENÇA DE CREUTZFELDT - JAKOB


Fonte: Bertolucci, Low, Wenning. 4,17,18

ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA


As doenças do neurônio motor formam um grupo heterogêneo de
síndromes em que os neurônios superiores e/ou inferiores degeneram. A
esclerose lateral amiotrófica é o tipo mais frequente de doença do neurônio
motor, com uma taxa de incidência anual de 0,4 a 1,76 por 100.000
pessoas.19 A maioria dos pacientes tem 50 anos ou mais quando aparecem
os sintomas. A doença progride implacavelmente. Cerca de metade dos
pacientes morre dentro de 3 anos e, dos demais, 90% dentro de 6 anos.2
A morte, em geral, é causada por insuficiência dos músculos
respiratórios; 50% dos pacientes morrem dentro de 3 anos do início, 20%
vivem 5 anos e 10% vivem 10 anos.20
a) Sinais e sintomas 2,20
• A maioria dos pacientes com ELA apresenta sintomas aleatórios assimétricos, consistindo em:
• Cãibras
• Fraqueza (progride para os antebraços, ombros e membros inferiores)
• Atrofia muscular nas mãos ou nos pés.
• Fasciculações
• Espasticidade Reflexos tendinosos profundos hiperativos
• Reflexos extensores plantares
• Atitude desajeitada
• Rigidez do movimento
• Perda ponderal
• Fadiga
• Dificuldade em controlar a expressão facial ou os movimentos da língua
• Outros sintomas incluem rouquidão, disfagia e fala arrastada; como é difícil engolir, a salivação parece aumentar
e os pacientes tendem a se engasgar com líquidos.
• Na fase tardia da doença ocorrem excessos de risos ou choro inapropriados, involuntários e incontroláveis.
• Observação: Sistemas sensoriais, consciência, cognição, movimentos oculares voluntários, função sexual,
esfíncteres urinários e anais geralmente são poupados.

B) diagnóstico 2,20

• Testes eletrodiagnósticos devem ser realizados para verificar evidências de doenças de transmissão
neuromuscular e desmielinização;
• RM cerebral: é indicada para excluir lesões estruturais, quando não houver evidência clínica na
EMG de fraqueza dos nervos cranianos.
• Testes laboratoriais: realizados para identificar causas tratáveis. Esses exames incluem hemograma
completo, eletrólitos, creatinina quinase e exames de função tireoidea.

B) diagnóstico 2,20

• Anticorpos de glicoproteína associada à antimielina são associados com uma neuropatia motora desmielinizante,
a qual pode se assemelhar à esclerose lateral amiotrófica.
• A coleta de urina de 24 h é realizada para verificar a presença de metais pesados em pacientes que podem ter
sofrido exposição a eles.
• Punção lombar pode ser feita para excluir outras doenças clinicamente suspeitas; se os níveis de leucócitos ou
proteínas estão elevados, um diagnóstico alternativo é provável.

c) Tratamento 2,20
• A base do tratamento para pacientes com ELA é a intervenção no momento oportuno para controlar os sintomas.
• A abordagem com equipe multiprofissional auxilia o paciente a enfrentar a incapacidade neurológica
progressiva.
• Nenhum fármaco oferece benefício clínico substancial para os pacientes com ELA. Entretanto, o riluzol pode
proporcionar melhoria limitada da sobrevida (2 a 3 meses), e a edaravona pode retardar o declínio da função até
certo ponto.
• Os seguintes fármacos podem ajudar a reduzir os sintomas:
• Para a espasticidade, baclofeno
• Para cãibras, quinina ou fenitoína
• Para reduzir a produção de saliva, fármacos anticolinérgicos potentes (p. ex., glicopirrolato,
amitriptilina, benztropina, triexifenidil, hioscina transdérmica, atropina)
• Para aspecto pseudobulbar, amitriptilina, fluvoxamina ou uma combinação de dextrometorfano e
quinidina

Quadro 4. ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA


Fonte: Adams, Rubin.2,20

ESCLEROSE MÚLTIPLA
As A esclerose múltipla (EM) pode ser definida como uma doença
desmielinizante, autoimune e inflamatória, de etiologia desconhecida, do
sistema nervoso central (SNC). A prevalência da Esclerose Múltipla no
Brasil é baixa. Estudos conduzidos em diferentes cidades brasileiras
demonstraram distribuição heterogênea da EM no território nacional, com
taxas que variam de 1 a 15:100.000 habitantes.4,21
A EM é mais comum no sexo feminino e em pacientes de origem
caucasiana. Doença de adulto jovem, é mais frequente entre 20 e 40 anos de
idade, sendo rara acima dos 60 anos.4,21
A EM apresenta quatro formas clínicas:

• Recorrente-Remitente: forma mais comum, observada em 80%


dos pacientes: caracteriza-se por apresentar episódios agudos de
comprometimento neurológico (chamados de surtos), com
duração maior que 24 horas e com intervalo de, no mínimo, 30
dias entre cada nova manifestação.

• Primariamente progressiva: acomete 10 a 20% dos pacientes;


• Secundariamente progressiva: 90% dos pacientes evoluem com
a forma recorrente-remitente em 25 anos após o início dos
sintomas;
• Recorrente-progressiva: de difícil reconhecimento e estimada
em 10%
*A forma progressiva apresenta piora contínua, gradual e aditiva de
sinais neurológicos ao longo de um período maior que 6 meses.
Ocasionalmente, entre os intervalos de piora contínua, pode ocorrer
estabilização dos sintomas. Quando a fase progressiva aparece após um
início recorrente-remitente, é chamada de secundariamente progressiva.
Quando os sintomas e sinais neurológicos assumem caráter progressivo
desde o início da doença, não sendo possível a identificação de surtos,
chama-se de forma primariamente progressiva. A forma recorrente-
progressiva apresenta combinação de exacerbações e progressão, mas é a
forma mais difícil de ser identificada.4,21
a) Sinais e sintomas 4,22
Os sintomas iniciais mais comuns compreendem alterações piramidais, visuais, cerebelares, sensitivas, de tronco
cerebral e esfinctéricas:

• Sinais piramidais: fraqueza muscular em um ou mais membros, espasticidade e sinais de liberação


piramidal (hiper-reflexia, sinal de Babinski e clônus).
• Alterações cerebelares: ataxia de marcha, disartria e comprometimento da coordenação motora
(dismetria). Parestesias, usualmente descritas como formigamento ou adormecimento, podem estar
acompanhadas de hipoestesia superficial e profunda em um ou mais membros, determinando, às vezes,
nível sensitivo medular.
• Distúrbios visuais: diminuição aguda da acuidade visual, precedida ou não de dor, caracterizando
neurite óptica, e escotomas, quase sempre reconhecidos como embaçamento visual. Vale ressaltar duas
manifestações de comprometimento do tronco cerebral, que, quando acontecem em pacientes jovens,
são sugestivas de EM: oftalmoparesia internuclear e neuralgia do trigêmeo.
• O comprometimento esfinctérico apresenta-se sob a forma de incontinência ou retenção urinária e
fecal. Além da alteração esfinctérica, observa-se disfunção sexual, queixa muito comum em pacientes
do sexo masculino.
• Fadiga, que pode significar menor tolerância às atividades diárias ou ser sintoma vago e mal
caracterizado, mas espontaneamente referido como lassidão, é queixa muito comum e pode ser o
sintoma mais limitante, piorando quando sinais piramidais (sobretudo, espasticidade) estão presentes.
• Distúrbios psiquiátricos (p.ex., surtos psicóticos) são infrequentes, mas pacientes com EM se
queixam de depressão. O quadro depressivo tem componentes mistos, reacionais e orgânicos, mas as
correlações clínico-radiológicas são pouco esclarecedoras quanto à presença de lesões responsáveis
pelos sintomas psiquiátricos. Pacientes com EM apresentam comprometimento cognitivo caracterizado
por comprometimento de memória recente, mas raramente evoluem para demência franca.

B) diagnóstico 22

• Segue os critérios de McDonald para ser realizado.


c) Tratamento 21,22
• Os tratamentos atuais têm como principal objetivo prevenir recaídas, reduzindo a incapacidade.
A recuperação de recidivas agudas pode ser acelerada pelo tratamento com corticosteroides, mas a extensão
da recuperação é inalterada.
• Terapia intravenosa é frequentemente administrada primeiro
• 1º: metilprednisolona 1 g por dia por 3 dias
• 2º: prednisona oral de 60 a 80 mg por dia durante 1 semana com uma redução gradual nas 2 a 3
semanas seguintes.
• Em pacientes com doença recidivante, numerosos medicamentos têm eficácia bem estabelecida na redução da
frequência de ataques.
• O acetato de glatiramer ou um interferon é frequentemente usado inicialmente devido a perfis e
disponibilidade de efeitos colaterais favoráveis, embora a eficácia do tratamento precoce com terapia
de maior intensidade esteja sendo explorada.
• Em geral, os medicamentos mais eficazes na redução de recidivas têm efeitos imunomoduladores mais fortes e,
embora raros, efeitos adversos graves. A prescrição desses agentes deve ser gerenciada por um especialista.
• Ocrelizumab é o único medicamento eficaz na redução da progressão da incapacidade na esclerose
múltipla progressiva primária.
• Plasmaférese é útil em pacientes com recidivas graves que não respondem aos corticosteroides.
• Pode ser necessária terapia sintomática para espasticidade, bexiga neurogênica ou fadiga.
• A fadiga é especialmente comum na esclerose múltipla, e uma terapia eficaz é:
• modafinil (200 mg por via oral todas as manhãs).
• Para melhorar a marcha cronometrada na esclerose múltipla:
• Dalfampridina (uma formulação de liberação prolongada de 4-aminopiridina administrada como 10
mg por via oral duas vezes ao dia).
• Depressão e até suicídio podem ocorrer na esclerose múltipla e podem piorar com a terapia com interferon beta-
1a; triagem e tratamento convencional desses sintomas são adequados.

Quadro 5. ESCLEROSE MÚLTIPLA


Fonte: Bertolucci, Murray, Papadakis. 4,21,22

Informações Adicionais Necessárias para fazer


Apresentação Clínica
o diagnóstico de EM

...Em uma pessoa com um ataque típico/


síndrome clinicamente isolada no início

• ≥2 ataques e evidência clínica objetiva de Nenhuma. Disseminação no Espaço (DIS)


≥ 2 lesões e Disseminação no tempo (DIT) foram atendidas.

• ≥2 ataques e evidência clínica objetiva de 1 lesão


com evidência histórica de ataque prévio
envolvendo lesão em diferente localização.

Um desses critérios:
• ≥2 ataques e evidência clínica objetiva de
1 lesão.
• DIS: ataque clínico adicional implicando local
diferente do SNC
• DIS: ≥ 1 lesão sintomática ou assintomática de
T2 em ≥ 2 áreas do SNC: medula periventricular,
justacortical/ cortical, infratentorial ou medular.
Informações Adicionais Necessárias para fazer o diagnóstico
Apresentação Clínica
de EM

...Em uma pessoa com um ataque típico/


síndrome clinicamente isolada no início

Um desses critérios:
• 1 ataque e evidência clínica objetiva de
≥2 lesões.
• DIT: ataque clínico adicional
• DIT: presença simultânea de lesão de ressonância
magnética típica da EM, sintomática ou
assintomática, que aumenta e não melhora em
comparação com a varredura basal (sem levar em
consideração o tempo de varredura basal).
• Bandas Oligoclonais específicas para Fluido
Cerebrospinal.

Informações Adicionais Necessárias para fazer o diagnóstico de


Apresentação Clínica
EM

...Em uma pessoa com um ataque típico/


síndrome clinicamente isolada no início

Um desses critérios:
• 1 ataque e evidência clínica objetiva de
1 lesão.
• DIS: ataque clínico adicional implicando local
diferente do SNC
• DIS: ≥ 1 lesão sintomática ou assintomática de
T2 em ≥ 2 áreas do SNC: medula periventricular,
justacortical/ cortical, infratentorial ou medular.
E
Um desses critérios:
• DIT: ataque clínico adicional
• DIT: presença simultânea de lesão de ressonância
magnética típica da EM, sintomática ou
assintomática, que aumenta e não melhora em
comparação com a varredura basal (sem levar em
consideração o tempo de varredura basal).
• DIT: por T2 novo ou lesão de ressonância
magnética comparada à varredura basal
• Bandas Oligoclonais específicas para Fluido
Cerebrospinal.

Informações Adicionais Necessárias para fazer o diagnóstico de


Apresentação Clínica
EM

...Em uma pessoa com um ataque típico/


síndrome clinicamente isolada no início
Informações Adicionais Necessárias para fazer o diagnóstico
Apresentação Clínica
de EM

...Em uma pessoa com um ataque típico/


síndrome clinicamente isolada no início

• Progressão desde o início • 1 ano de progressão da incapacidade


E
Dois desses critérios:
• ≥ 1 lesão sintomática ou assintomática de T2
em ≥ 2 áreas do SNC: medula periventricular,
justacortical/ cortical, infratentorial ou medular.
• ≥ 2 lesões medulares T2
• Bandas Oligoclonais específicas para Fluido
Cerebrospinal.

Quadro 6. Critérios de McDonald para diagnóstico de Esclerose Múltipla.


Fonte: Thompson.23

ESPONDILOSE CERVICAL COM MIELOPATIA


A espondilose cervical com mielopatia é uma doença degenerativa das
vértebras cervicais mais baixas na qual uma certa combinação de protrusão
de disco e degeneração com exostoses vertebrais e espessamentos dos
ligamentos longitudinal e amarelo é, com frequência, associada com um
canal estreito congênito. Além do comprometimento da ME e raízes por
compressão mecânica, há também certa redução do suprimento sanguíneo
pelas artérias radiculares.17

A) SINAIS E SINTOMAS 22,24

A compressão da medula causa paresia espástica gradual, parestesias ou ambas, nas mãos e nos pés; pode haver
hiper-reflexia. Os déficits neurológicos podem ser assimétricos, não segmentares e agravados por tosse ou
manobra de Valsalva. Após trauma, pessoas com espondilose cervical podem desenvolver uma síndrome medular
central ( Síndromes da coluna vertebral).

Eventualmente, podem se desenvolver atrofia muscular e paralisia flácida nas extremidades superiores no nível da
lesão, com espasticidade abaixo desse nível.

A compressão das raízes nervosas causa dor radicular precoce; posteriormente, pode haver fraqueza, hiporreflexia
e atrofia muscular.

Espondilose cervical decorrente de osteoartrite, especialmente se o canal cervical tiver estenose congênita, pode
levar à estenose do canal e desenvolvimento de osteófitos, que podem comprimir a medula ou raízes nervosas.

B) DIAGNÓSTICO 22,24
Nas lesões medulares compressivas de qualquer natureza, o diagnóstico precoce é imperativo para prevenção de um
déficit neurológico irreversível, pois, com o tratamento da lesão causadora da compressão, pode ocorrer completa
reversão do quadro.

Há suspeita de espondilose cervical quando os déficits neurológicos segmentares característicos surgem em


pacientes idosos, com osteoartrose, ou com dor radicular no nível de C5 ou C6.

O diagnóstico da espondilose cervical é por RM ou TC.

C) TRATAMENTO 21,22

Para os pacientes com comprometimento medular, em geral, é necessária a laminectomia cervical; uma
abordagem posterior pode aliviar a compressão, mas deixa os osteófitos compressivos anteriores e pode provocar
instabilidade da coluna e cifose. Assim, cada vez mais se utiliza uma abordagem anterior com fusão espinhal.

Os pacientes que apresentam apenas radiculopatia podem tentar tratamento não cirúrgico com AINE e um colar
cervical macio; se este tratamento for ineficaz, pode ser necessária a descompressão cirúrgica. As indicações de
descompressão cirúrgica são a dor intratável e o comprometimento da medula espinhal.

Quadro 7. ESPONDILOSE CERVICAL COM MIELOPATIA


Fonte: Papadakis, Rubin. 22,24

MIELITE TRANSVERSA
A mielite transversa é a inflamação das substâncias cinzenta e branca,
em um ou mais segmentos adjacentes da coluna vertebral, em geral
torácicos.
As causas incluem Esclerose Múltipla, neuromielite óptica, inflamação
autoimune ou pós-infecciosa, vasculite e certos fármacos.
A mielite transversa aguda é mais comumente decorrente de esclerose
múltipla, mas pode ocorrer com vasculite, LES, síndrome antifosfolipídica,
outras doenças autoimunes, SLE, infecções por micoplasma, doença de
Lyme, sífilis, tuberculose ou meningoencefalite viral ou em pacientes que
usam anfetaminas, heroína IV, antiparasitários ou antifúngicos. A mielite
transversa ocorre com neurite óptica na neuromielite óptica.
Em geral, quanto mais aguda a progressão, pior o prognóstico. A dor
sugere inflamação mais intensa. Cerca de um terço dos pacientes se
recupera, um terço mantém alguma fraqueza e urgência urinária e um terço
permanece confinado ao leito e incontinente. 13, 25
a) Sinais e sintomas 13,25
Pode ocorrer:
• Dor cervical
• Dor nas costas
• Dor na cabeça
• Aperto em faixa no tórax ou no abdome
• Fraqueza
• Formigamento
• Dormência nos pés e nas pernas
• Dificuldade na micção
Os déficits podem evoluir durante mais vários dias até a mielopatia sensorimotora transversa completa, causando:
• Paraplegia
• Perda de sensação abaixo da lesão
• Retenção urinária
• Incontinência fecal
**Ocasionalmente, as sensações proprioceptiva e vibratória são preservadas, pelo menos no início.
A síndrome costuma reincidir em pacientes com esclerose múltipla, LES ou síndrome antifosfolipídica.

B) diagnóstico 13,25
O diagnóstico da mielite transversa é sugerido por mielopatia sensorimotora transversa com déficits segmentares.

O diagnóstico requer RM e análise de LCR. A RM tipicamente mostra edema da medula espinhal se a mielite transversa
está presente e pode ajudar a excluir as outras causas tratáveis de disfunção da coluna vertebral (p. ex., compressão da
medula espinhal). O LCR, em geral, contém monócitos, discreta elevação do conteúdo de proteínas e elevação do índice
IgG (normal: ≤ 0,85).
Teste para um marcador de IgG na neuromielite óptica (NMO-IgG) — um autoanticorpo que tem por alvo a proteína
aquaporina-4 do canal de água dos astrócitos — é altamente específico e ajuda a distinguir neuromielite óptica de
esclerose múltipla.

Os exames para verificar as causas tratáveis devem conter radiografia de tórax; PPD; sorologia para micoplasma, doença
de Lyme e HIV; velocidade de hemossedimentação; AAN e VDRL no sangue e no líquor. A história pode sugerir um
fármaco como agente causal.

O diagnóstico diferencial da mielite transversa abrange outras mielopatias transversas decorrentes de deficiências
nutricionais (p. ex., deficiência de vitamina B12, ácido fólico, zinco ou cobre), insuficiência vascular e tumores
intraespinhais.

Realiza-se RM do cérebro: a EM ocorre em 50% dos pacientes com lesões brilhantes (hiperintensas) periventriculares
múltiplas em T2 e em 5% dos pacientes nos quais essas lesões estão ausentes.

c) Tratamento 21,22
• Corticoides intravenosos podem diminuir o edema e a inflamação na coluna vertebral e reduzir
a atividade do sistema imunológico. Esses medicamentos podem incluir:
• metilprednisolona ou dexametasona (geralmente administrados por 3 a 7 dias e, às vezes,
seguidos por um período de redução gradual).
*Também podem ser administrados para reduzir ataques subsequentes de mielite transversa em
indivíduos com distúrbios subjacentes.

• Plasmaférese pode ser usada para pessoas que não respondem bem aos esteroides intravenosos.

• A imunoglobulina intravenosa (IgIV) é um tratamento que se pensa redefinir o sistema imunológico. O IgIV é uma
injeção altamente concentrada de anticorpos reunidos em muitos doadores saudáveis que se ligam aos anticorpos que
podem causar o distúrbio e removê-los da circulação.

• Medicamentos para a dor que podem diminuir a dor muscular incluem:


• acetaminofeno,
• ibuprofeno e
• naproxeno.
• A dor no nervo pode ser tratada com certos medicamentos antidepressivos (como duloxetina), relaxantes musculares
(como baclofeno, tizanidina ou ciclobenzaprina) e medicamentos anticonvulsivantes (como gabapentina ou pregabalina).

• Medicamentos antivirais podem ajudar as pessoas que têm uma infecção viral da medula espinhal.
• Os medicamentos podem tratar outros sintomas e complicações, incluindo incontinência, contrações
musculares dolorosas chamadas espasmos tônicos, rigidez, disfunção sexual e depressão.

Quadro 8. MIELITE TRANSVERSA


Fonte: Bertolucci, Rubin.13,25

REFERÊNCIAS
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Corticosteroid treatment of Duchenne muscular dystrophy: Report of the Guideline
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21. Murray T. Multiple sclerosís: the history of a disease. Nova York: Demos Medical
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California: Editora McGraw-Hill Education / Medical; 2019.
23. Thompson AJ, Banwell BL, Barkhof F, Carroll WM, Coetzee T, Comi G, et al. Diagnosis
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[Internet]; 2018. [Acesso em 24 mar 2020]. Disponível em:
https://www.msdmanuals.com/ptpt/profissional/disturbiosneurologicos/disturbios-da-
coluna-vertebral/espondilose-cervical-e-mielopatia-cervical-espondilotica.
25. Rubin M. Mielite transversa. Manual MSD. [Internet]; 2018. [Acesso em 24 mar 2020].
Disponível em: https://www.msdmanuals.com/ptpt/profissional/disturbios-
neurologicos/disturbios-da-coluna-vertebral/mielite-transversa-aguda.
8.14
SÍNDROMES DEMENCIAIS
Autores:
Maycon Cristian Gomes de Paula
Jonas Silva Paes
Nícollas Nunes Rabelo

INTRODUÇÃO
Segundo Lane,1 em 2017 já havia 44 milhões de pessoas diagnosticadas
com demência ao redor do mundo. Esse número cresce ano após ano de
forma acelerada.
Por isso, dominar esse assunto é fundamental para a prática médica hoje
e principalmente, com o envelhecimento populacional, no futuro.

DEFINIÇÕES
• Síndrome caracterizada pelo declínio cognitivo/comportamental
que:
- compromete atividades sociais e profissionais do indivíduo.
- não depende de alterações da consciência.

• O comprometimento deve acontecer em pelo menos 2 dos


domínios linguagem, memória, orientação espacial, capacidade de
abstração, personalidade e comportamento, gnosias, praxias e
funções executivas.

• Diversas doenças podem ter sinais e sintomas de demência. Por


isso, o termo “síndrome” é utilizado.

EPIDEMIOLOGIA
Estima-se que, após os 65 anos de idade, esse valor dobre a cada cinco
anos.2,3 Esse fato possui as seguintes explicações:

• O aumento da incidência de afecções vasculares, degenerativas,


neoplásicas e etc.

• Redução da plasticidade cerebral nessa faixa etária. Assim, as


alterações do SNC são maiores em idosos, sendo estas associadas
aos quadros demenciais.2

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Exige comprovação de comprometimento cognitivo e funcional.
a) AVALIAÇÃO COGNITIVA

• Pelo Miniexame do Estado Mental (MEEM). São testados:


• Orientação temporoespacial, atenção, memória operacional,
evocação verbal, compreensão, praxia e nominação. A
pontuação varia de 0 a 30 pontos (Tabela 1).2
Pontuação Significado

27-30 pontos Estado mental normal

24-27 pontos Tolerado como normal

Abaixo de 23 pontos Comprometimento do estado normal

Tabela 1. Pontuação MMSE e seu significado.


Fonte: Nitrini 2

Observação: Quanto menor a pontuação, maior o comprometimento.


Deve-se sempre levar em consideração fatores que podem afetar o
resultado do exame:

• Nível de escolaridade do paciente avaliado


• Idade
• Sexo
• Bagagem cultural
O MMSE deve ser usado somente como instrumento de rastreio
diagnóstico, uma vez que não descarta quadros de demências em casos de
pontuação normal e não detecta comprometimento cognitivo leve.4
b) AVALIAÇÃO FUNCIONAL
Inicia-se na anamnese, podendo ser utilizados questionários específicos
para complementar o processo.

• Anamnese: Buscar informações pelo paciente, familiares e


acompanhantes que indiquem déficits que estejam interferindo nas
atividades diárias.

• Questionários específicos: Os mais utilizados são adaptações do


Questionário de Atividades Funcionais de Pfeffer e do
Questionário de Atividades de Vida Diária de Lawton e Brody.
OBS.: O primeiro questionário tem o ponto positivo de não ser
influenciado pela escolaridade.2
O esquema de classificação das síndromes demenciais está
esquematizado no fluxograma 1.
Fluxograma 1. Fisiopatologia da ME.
Fonte: Nitrini 2

c) DEMÊNCIAS SEM COMPROMETIMENTO ESTRUTURAL


DO SNC

• Causas tóxico-metabólicas
Essa etiologia se encaixa nas causas reversíveis da manifestação e pode
ser dividida em dois grandes grupos (Fluxograma 2).2
Fluxograma 2. Grupos De Demências Tóxico-Metabólicas.
Fonte: Nitrini 2

Considerações:2
• As manifestações podem apresentar variações na população idosa.
• Quadros carenciais sempre devem chamar atenção em alcoólatras,
doentes crônicos, histórico de cirurgias gástricas prévias e em
indivíduos anoréxicos/deprimidos.
• É necessário interrogar especificamente sobre as medicações que
podem estar associadas, umas vez que os pacientes podem
omitir/esquecer que fazem uso contínuo.
• As causas tóxico-metabólicas estão mais associadas ao Delirium, que
ocorre de forma mais aguda e causa maior rebaixamento de
consciência. Esses quadros, entretanto, podem estar superpostos ao de
demência.

• Depressão
Deve fazer parte do diagnóstico diferencial.2,5-7
d) DOENÇAS COM COMPROMETIMENTO ESTRUTURAL DO
SNC

• Demências primárias
• Doença de Alzheimer
A doença de Alzheimer foi inicialmente descrita como uma demência
degenerativa que incidia em uma faixa etária pré-senil (antes dos 65).2
→ Hoje, essa condição é a principal causa de demência, sendo
responsável por 50% a 75% dos casos diagnosticados (Quadro 1).
→ É imprescindível suspeitar em casos com déficit cognitivo nessa
faixa etária.1
a) Sinais e sintomas

• Comprometimento cognitivo/comportamental de início insidioso e com piora progressiva dos sintomas.


• Esse quadro afeta domínios de memória, funções executivas:
- perda da independência social;
- e personalidade/comportamento, se enquadrando como uma doença demencial.

b) Diagnóstico
Envolve:
• Entrevista clínica e a realização do Miniexame do Estado Mental
• Descartar outras causas de demência por meio de exames laboratoriais e de neuroimagem
• A neuroimagem pode evidenciar atrofia cortical em áreas de associação, como na região parieto- occipital e na
região medial do lobo temporal, principalmente na região hipocampal.
• O exame do líquor apresenta níveis baixos de beta-amiloide e a altos de proteína tau. Além disso, é possível
descartar outras causas de demência

c) Tratamento

• Não existe, ainda, um tratamento específico para essa condição.


• É indicada orientação da família para os cuidados com o paciente, sempre lembrando de não tirar sua
autonomia.
• A abordagem deve ser multidisciplinar, garantindo suporte biopsicossocial do paciente.
• O uso de inibidores de acetilcolinesterase em casos leve a moderados melhora, em alguns casos, o declínio
cognitivo.8

Quadro 1. Sinais e sintomas, diagnóstico e tratamento da Doença de


Alzheimer.
Fonte: Nitrini 1, 2
• Doença de Parkinson
→ Epidemiologia

Possui incidência anual estimada em 15 a cada 100 mil pessoas, com


pico de incidência entre 65 e 70 anos9.
→ Fisiopatologia

• Acúmulo de alfa-sinucleína e formação dos Corpos de Lewy no


citoplasma neuronal, além da deposição de placas de beta-amiloide
e proteína tau.

• A deposição dessas estruturas ocorre preferencialmente na


substância nigra do tronco cerebral, ocasionando déficit na
produção e dopamina, o que causa a principal sintomatologia que
são os tremores de repouso.9,10

• Os sintomas demenciais surgem em cerca de 20% dos pacientes


com doença de Parkinson, geralmente em fases mais avançadas (10
a 15 anos após o início dos sintomas principais) e geralmente
possuem apresentação menos intensa que os de outras doenças
degenerativas.2
Os aspectos clínicos, diagnóstico e manejo da doença de Parkinson estão
sintetizados na tabela 2.
a) Sinais e sintomas

Sinais cardinais:
• Tremor
• Rigidez
• Bradicinesia
Outros:
• Anormalidade e instabilidades posturais
b) Diagnóstico

Critérios necessários para diagnóstico de DP: Bradicinesia e pelo menos um dos seguintes sintomas:
• Rigidez muscular;
• Tremor de repouso (4-6 Hz) avaliado clinicamente;
Critérios negativos para DP (sugestivos de outras formas de parkinsonismo):
• História de acidente vascular cerebral (AVC) de repetição;
• História de trauma craniano grave
• História definida de encefalite
• Crises oculogíricas
• Tratamento prévio com neurolépticos
• Remissão espontânea dos sintomas
• Quadro clínico estritamente unilateral após 3 anos
• Paralisia supranuclear do olhar
• Sinais cerebelares
• Sinais autonômicos precoces
• Demência precoce
• Liberação piramidal com sinal de Babinski
Critérios de suporte positivo para o diagnóstico de DP (três ou mais são necessários para o diagnóstico):
• Início unilateral
• Presença do tremor de repouso
• Doença progressiva
• Persistência da assimetria dos sintomas
• Boa resposta à levodopa
• Presença de discinesias induzidas por levodopa
• Resposta a levodopa por 5 anos ou mais
• Evolução clínica de 10 anos ou mais
c) Tratamento

Deve visar à neuroproteção (redução da progressão da doença) e ao tratamento sintomático.


Em alguns casos, já é adotado o Deep Brain Stimulation. 11

Tabela 2. Sinais e sintomas, diagnóstico e tratamento da Doença de


Parkinson.
Fonte: Nitrini, Storstein, Sanford, Figueiredo.2,9-11

• Protocolo de tratamento da doença de Parkinson (fluxograma 3)11


Fluxograma 3. Algoritmo Doença de Parkinson.
Fonte: Ministério da Saúde 11

• Outros tipos de demência (tabela 3)


Demência Frontotemporal 2,8,12,13
Epidemiologia
• A incidência é estimada entre 1,61 a 4,1 casos por cada 100 mil pessoas anualmente.
Sinais e sintomas
• Apatia
• Alteração da afetividade/ comportamento social
• Redução do senso moral
• Desinibição
• Anomia
• Perda da capacidade de reconhecimento visual
• Redução da fluência verbal
• Afasia progressiva de forma isolada por 2 anos, pelo menos
Diagnóstico
• Anamnese com histórico dessas alterações comportamentais como primeira manifestação
• Comprometimento funcional com certa preservação da memória
• Neuroimagem pode revelar atrofia de regiões frontais e na região anterior do lobo temporal
Tratamento
• Não existe, ainda, um tratamento específico para essa condição.
Demência com Corpos De Lewy2,10

Epidemiologia
• Segunda demência neurodegenerativa mais comum, somente atrás do da Doença de Alzheimer.
• Sanford et al afirmam que essa doença começa a se manifestar entre 70 e 85 anos.
Sinais e sintomas
• Estágios 1 e 2: disfunção autonômica e olfatória
• Estágios 3 e 4: distúrbios motores e do sono
• Estágios 5 e 6: disfunção cognitiva e emocional
Diagnóstico
Além da interferência em atividades diárias, 2 ou mais características:
• Flutuações da cognição (chegando até em quadros de delirium)
• Alucinações visuais
• Parkinsonismo
• Distúrbios de sono
Tratamento
• Ainda não existe tratamento farmacológico específico para essa condição
Doença de Huntington2,14

Definição e epidemiologia
• Se trata, também da demência genética mais frequente no mundo.
• Estima-se que a prevalência seja próxima de 4-10 casos a cada 100 mil habitantes no ocidente.
Sinais e sintomas
• Movimentos coreicos
• Distonia
• Mioclonia
• Bradicinesia
• Rigidez e anormalidades posturais
• Atrofia muscular
Diagnóstico
• História clínica + sinais e sintomas.
• O diagnóstico de certeza só é possível por meio do teste genético.
Tratamento
• Não há cura para essa doença.
• Recomenda-se uma abordagem multidisciplinar para melhor conduzir a evolução da doença, podendo reduzir a
velocidade de progressão e o impacto dos sintomas na vida da pessoa.

Paralisia Supranuclear Progressiva15-17

• São divididos em diversos fenótipos clínicos, que se diferem pelas diferenças nas regiões afetadas pelo acúmulo
de proteína tau.
• O principal fenótipo é o frontotemporal.
Sinais e sintomas
• Apatia
• Dificuldades executivas
• Mudança de personalidade
• Sintomas motores aparecem somente na fase mais tardia
Diagnóstico
• Início esporádico e que tenha acontecido depois dos 40 anos, além de evolução progressiva.
• Deve-se excluir outras causas para os sintomas.
• A neuroimagem é amplamente usada para auxiliar o diagnóstico clínico.
Tratamento
• Por enquanto não há tratamento que modifique a evolução da doença.
Tabela 3. Aspectos de outras demências primárias.
Fonte: Nitrini, Wang, Sanford, Olney, Bertolucci, Ghosh, Armstrong, Lopez,
Ali.2,8,10,12-17

• Demências secundárias
• Demência vascular
→ O´brien et al18 afirmam que 15% dos casos de demência no mundo
são associados a essa causa, sendo que 15-30% das vítimas de AVE
desenvolvem a manifestação cerca de 3 meses depois do ocorrido e
20-25% desenvolvem no longo prazo (Quadro 2)
→ Existem diversos tipos de demência vascular (Quadro 3).
→ É a segunda principal causa de demência2,19 (Quadro 4).
→ Estima-se que a demência por causa cerebrovascular corresponda a
17 milhões dos casos de demência no mundo, gerando custos anuais
de até 200 bilhões de dólares.19
→ A associação com a doença de Alzheimer é comum,2 porém em mais
de 75% dos casos a demência ocorre por causa vascular, não
descartando, obviamente, causas neurodegenerativas nem a
combinação de ambas as etiologias.18
Fatores de risco

• Idade (dobra a cada 5,3 anos)


• Risco vascular:
- Hipertensão arterial sistêmica
- Diabetes mellitus
- Tabagismo
- Hipercolesterolemia

Fatores de risco para demência após AVE


Além da idade e do risco vascular:
• Baixa escolaridade
• Sexo feminino
• Presença e localização do AVE
• Atrofia global, mesial e/ou temporal na neuroimagem
Quadro 2. Fatores de risco das Demências Vasculares.
Fonte: O’Brien, Smith.18,19

Subtipos de Demência Vascular

Demência vascular cortical

Múltiplos infartos corticais


• Causas principais: trombose aterosclerótica ou embolismo cardíaco
Demência de pequenos vasos (demência vascular subcortical)

Múltiplos infartos cerebrais lacunares na substância branca e estruturas subcorticais


• Oclusão de pequenas artérias
• Estenose por hipoperfusão
Infarto de locais estratégicos

Oclusão de artérias que nutrem locais estratégicos, como tálamo, cápsula interna e cabeça do núcleo caudado.
• Oclusão/estenose de artérias críticas
Demência por hipoperfusão (hipóxico-isquêmica)

Infartos corticais ou subcorticais.


• Hipotensão por Parada-cardiorrespiratória; choque.
Demência hemorrágica

Lesões do parênquima por transtornos hemorrágicos, como coagulopatias, aneurismas, malformações arteriovenosas,
angiopatia amiloide hereditária.

Demência vascular hereditária

Lesões lacunares e na substância branca, principalmente no lobo temporal

Doença de Alzheimer com enfermidade cerebrovascular

Combinação de alterações vasculares e neurodegenerativas, principalmente no lobo mesial-temporal.

Quadro 3. Subtipos de Demência Vascular.


Fonte: O’Brien, Rodríguez García.18,20

Sinais e sintomas
Depende da intensidade e da localização do evento.
De forma geral, o quadro é:
• Declínio cognitivo que pode mimetizar a Doença de Alzheimer
• Déficit de memória, linguagem e praxia
• Perda de habilidade para atividades laborais e diárias
• Depressão
• Apatia
• Psicose
• Alucinações
• Sinais motores de AVE, como distúrbios de marcha, hiperreflexia, Sinal de Babinski e Postura de Wernicke-
Mann, por exemplo.
• Déficit sensitivo
• Paralisia facial
Diagnóstico

• O diagnóstico é clínico, chamando atenção para o histórico de AVE prévio.


• Miniexame do Estado Mental e auxiliado pela neuroimagem, que pode apresentar áreas de lesões isquêmicas ou
hemorrágicas.

Tratamento
Engloba medidas de:
• Prevenção de novas lesões cerebrovasculares.
• Intervenções farmacológicas sobre sintomas específicos.
• Inibidores de acetilcolinesterase podem ser usados com melhora do declínio cognitivo.
• Retiradas de drogas desnecessárias ou que aumentam risco de novo episódio.
• Medidas que melhorem a qualidade de vida e adaptação do paciente, como fisioterapia, aconselhamento dos
familiares e cuidadores, reestruturação e adaptação do ambiente.

Quadro 4. Aspectos das Demências Vasculares.


Fonte: O’Brien, Smith, André.18,19,21

• Tumores
→ Comumente as neoplasias podem causar declínio cognitivo em idosos
(fluxograma 4).2
→Estima-se que, em 2050, pelo menos 30% tenha mais de 65 anos.
→ Apesar de terem surgido evidências estatísticas da relação entre o
câncer e doenças neurodegenerativas na última década, esses
resultados não são encarados com tanta relevância porque ambas as
doenças são relacionadas ao envelhecimento. Há grande risco de viés
nessa associação.22
Fluxograma 4. Mecanismos de relação entre câncer e demência.
Fonte: Nitrini, Ganguli, McWilliams, Van der Willik 2,22-24

As relações ainda não são claras e alguns estudos chegam, até mesmo, a
apontar menor prevalência de alguns tipos de cânceres em pacientes com
Alzheimer e Parkinson.22-24

• Infecções
→ A demência de etiologia infecciosa varia de acordo com a idade,
sendo mais incidente na população com menos de 50 anos2 (Quadro
5).
→ O mecanismo dessa associação se dá devido ao fato de que a
inflamação crônica leva a um processo neurodegenerativo que resulta
em declínio cognitivo.25
A) Sinais e sintomas
Dados que sugerem demência de etiologia infecciosa:
• Idade inferior à senil
• Perfil neuropsicológico com predomínio de:
• Apatia e lentidão dos processos mentais
• Antecedentes de doenças venéreas ou de promiscuidade sexual
• Toxicomania
• Imunodeficiência
b) Diagnóstico
Como em outras infecções do SNC, é feito pela interpretação de:
• História clínica
• Exame do líquido cefalorraquidiano
• Neuroimagem
Além disso, pode-se destacar a importância da eletroforese de proteínas e a biópsia cerebral (quando todos os métodos
não invasivos forem inconclusivos).

Quadro 5. Aspectos das Demências por infecções.


Fonte: Nitrini.2

Algumas demências já tiveram sua relação mais bem estabelecidas com


agentes infecciosos, como, por exemplo, a Doença de Alzheimer. A
literatura já estabeleceu relação dessa doença com diversos agentes, como,
por exemplo: 25

• H. Pylori
• Borrelia burgdorferi
• Citomegalovírus
• HSV 1 e 6
• EBV
Outra doença relacionada à demência é a Neurossífilis.2 Apesar da
grande redução no número de casos entre as décadas de 1980 e 1990, a
doença voltou a ter crescimento no número de casos;26 por isso, deve-se
considerar a hipótese da doença sempre em casos de declínio cognitivo e
alterações comportamentais.2,27

TRATAMENTO
a) TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO
Medidas que melhorem:
• Qualidade de vida
• Adaptação do paciente
Por exemplo:

• Fisioterapia Motora
• Tratamento com fonoaudióloga e psicóloga
• Aconselhamento dos familiares e cuidadores
• Reestruturação e adaptação do ambiente
b) TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
Objetivo: Aliviar sintomas envolvidos na síndrome. Fármacos capazes
de regredir ou reduzir a velocidade de evolução dos processos que levam à
demência estão sendo estudados, porém nenhum demonstrou real eficácia
para esse propósito11,28 (Tabela 4).

Fármaco Objetivo Posologia

Além de tratar tremores, reduz flutuações Dose inicial: 250/25 mg por dia dividida
Levodopa/carbidopa
motoras em duas administrações

Além de tratar tremores, reduz flutuações 200/50 mg por dia dividida em pelo menos
Levodopa/benserazida
motoras duas administrações

Bromocriptina Reduz sintomas motores De 7,5 mg/dia a 70 mg/dia

De 2 mg/dia a 4,5 mg/dia dividida em 3


Pramipexol Reduz período de wearing-off
administrações

Dose inicial: 100 mg, duas vezes/dia.


Amantadina Reduz sintomas motores Pode aumentar até 400 mg/dia
Desmame feito em 1-2 semanas

Dose terapêutica situa-se entre 2 mg/dia e


8 mg/dia.
Biperideno Reduz sintomas motores e é neuroléptico
Dose inicial: 1 mg duas vezes/dia
Deve ser feito desmame
Fármaco Objetivo Posologia

De 0,5 mg a 1 mg, 2 vezes/dia, com


incrementos a cada 3-5 dias até atingir 2
mg, três vezes/dia.
Triexifenidil
Maioria responde com até 10 mg/dia, não
devendo passar 15 mg/dia.
Deve ser feito desmame

Selegilina De 5 mg a 10 mg, uma vez/dia

100 mg, três vezes/dia


Tolcapona Redução das flutuações motoras
Dose máxima: 600 mg/dia

200 mg, quatro a dez vezes/dia


Entacapona Redução das flutuações motoras
Dose máxima: 2000 mg/dia

Dose inicial: 12,5 mg/dia. Incremento de


Clozapina Antipsicótico 25 mg a cada 2 dias.
Controle de psicose: 50 mg/dia

Rasagilina IMAO. 1 mg, uma vez/dia.

Inibidor de acetilcolinesterase. 5 mg/dia por via oral


Donepezila Uso para alterações motoras e declínio Pode ser aumentada para 10 mg/dia após
cognitivo 4-6 semanas

Dose inicial: 8 mg/dia VO por 4 semanas.


Inibidor de acetilcolinesterase. Dose de manutenção: 16 mg/dia por 12
Galantamina Uso para alterações motoras e declínio meses
cognitivo Dose máxima: 24 mg/dia ou
hepatopatas ou nefropatas: 16mg/dia

Dose inicial: 3 mg/dia VO


Inibidor de acetilcolinesterase. Aumentada para 6 mg/dia após 2 semanas.
Rivastigmina Uso para alterações motoras e declínio De acordo com tolerabilidade do paciente
cognitivo pode ser feito aumento para 9 e 12 mg/dia
com intervalo de 2 semanas.

Inibidor do receptor de aspartato.


Dose inicial: 5 mg/dia VO
Melhora cognitiva, comportamental e
Aumentar 5 mg/dia por 3 semanas
Memantina funcional.
subsequentes até chegar a 20 mg/dia e
Recomenda-se associação com inibidores
manter a dose.
de acetilcolinesterase.

Quadro 5. Aspectos das Demências por infecções.


Fonte: Wang, Figueiredo, Hartmann.8,11,28,29

DICAS DO ESPECIALISTA
a) CONDUTA DIANTE DO CASO SUSPEITO DE
NEUROSSÍFILIS (Fluxograma 5)

Fluxograma 5. Conduta diante de caso suspeito de neurossífilis.


Fonte: Mukku27

b) ALGORITMO DE ABORDAGEM DO PACIENTE COM


SUSPEITA DE DEMÊNCIA (Fluxograma 6).30
Fluxograma 6. Abordagem paciente suspeito de demência.
Fonte: SMID 30

REFERÊNCIAS
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2. Nitrini R, Bacheschi LA. A neurologia que todo médico deve saber. 2. ed. São Paulo: Editora
Atheneu; 2003.
3. Garre-Olmo J. Epidemiology of Alzheimer’s disease and other dementias. Rev Neurol. 2018;
66(11): 377‐86.
4. Campbell WW. DeJong – O exame neurológico. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan; 2007.
5. Ménard C, Hodes GE, Russo SJ. Pathogenesis of depression: Insights from human and rodent
studies. Neuroscience. 2016; 321: 138‐62.
6. Malhi GS, Mann JJ. Depression. Lancet. 2018; 392(10161): 2299-312.
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Pract [Internet]. 2017; 44(3): 499-510.
8. Wang J, Yu JT, Wang HF, Meng XF, Wang C, Tan CC, et al. Pharmacological treatment of
neuropsychiatric symptoms in Alzheimer’s disease: A systematic review and meta-analysis.
J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2015; 86(1): 101-9.
9. Storstein OTA. Epidemiology of Parkinson’s disease Diagnosis of PD. J Neural Transm.
2017;(1).
10. Sanford AM. Lewy Body Dementia. Clin Geriatr Med. 2018; 34(4): 603‐15.
11. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria conjunta nº 10, de 31 de Outubro de 2017. Aprova o
Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Doença de Parkinson. Diário Oficial da
União.
12. Olney NT, Spina S, Miller BL. Frontotemporal Dementia. Neurol Clin. 2017; 35(2): 339-74.
13. Bertolucci PHF. Guia de Neurologia. São Paulo: Manole; 2010.
14. Ghosh R, Tabrizi SJ. Clinical features of huntington’s disease. Adv Exp Med Biol. 2018;
1049: 1-28.
15. Armstrong MJ. Progressive Supranuclear Palsy: an Update. Curr Neurol Neurosci Rep.
2018; 18(3): 1-9.
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syndrome and other PSP variants. Acta Neurol Scand. 2016; 134(4): 242-9.
17. Ali F, Josephs K. The diagnosis of progressive supranuclear palsy: current opinions and
challenges. Expert Rev Neurother. 2018; 18(7): 603-16.
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Portal Pebmed. [Internet]; 2017. [acesso em 04 abril de 2020]. Disponível em:
https://pebmed.com.br/tratamento-na-demencia-por-corpos-de-lewy-sintomas-
neuropsiquiatricos/.
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Disponível em: http://www.medicinanet.com.br/imagens/20081110031116.gif.
8.15
MORTE ENCEFÁLICA
Autores:
Mateus Gonçalves de Sena Barbosa
Maycon Cristian Gomes de Paula
Nícollas Nunes Rabelo

CASO CLÍNICO
a) Anamnese e HMA:
JFC, masculino, 72 anos, hipertenso em uso de Losartana 50 mg,
tabagista, aposentado, (50 anos-maço). Deu entrada no serviço inconsciente.
Segundo a filha, BFC, há 2 semanas o pai começou a referir cefaleia
holocraniana pulsátil, constante e sem fatores de alívio, associada a vômitos
e náuseas. Hoje pela manhã, a dor se tornou muito mais intensa, associada à
hemiplegia completa à direita e afasia. Devido à piora progressiva, ela
decidiu levar o pai ao atendimento médico.
b) Interrogatório dos sistemas:
Os diversos sistemas sofreram modificações, uma vez que os sistema
nervoso e respiratório foram cessados.
c) Desenvolvimento neuropsicomotor:
Paciente com crescimento e desenvolvimento pertinente à idade.
d) Procedentes médicos:
JFC é hipertenso há 30 anos e faz uso contínuo de Losartana 50 mg, não
possui alergias medicamentosas, alimentares e ambientais; nega outras
doenças e uso de outras medicações. Ademais, nunca passou por
internamentos e cirurgias, conforme as informações passadas pela BFC em
relação ao seu pai.
e) Histórico familiar:
BFC relata pelo seu pai que há casos de hipertensão arterial nos pais do
paciente; a mãe de BFC possuía aneurisma cerebral; não há casos de
diabetes mellitus, neoplasias e infecções sexualmente transmissíveis.
f) Evolução:
Paciente foi atendido pelo serviço de urgência, sedado e posto em
ventilação mecânica.
A Tomografia Computadorizada evidenciou um aneurisma roto de artéria
cerebral média direita, associada à hemorragia intraparenquimatosa e
subaracnoidea Fisher IV (Figura 1).

Figura 1. Exame de imagem do paciente o qual apresenta hematoma


parenquimal e HSA Fisher modificado 4, inchaço cerebral, paciente em
morte encefálica.
Fonte: Imagem ilustrativa de autoria própria adaptada ao caso ilustrativo.

Após 48 horas na unidade de terapia intensiva (UTI), pela condição


clínica do paciente e os parâmetros hemodinâmicos e metabólicos da Tabela
1, foi feita a descontinuação de drogas depressoras do SNC e aberto
protocolo de Morte Encefálica.

Parâmetro Valores
Parâmetro Valores
Temperatura corporal
38,6° C
(esofagiana, visceral ou retal)

Saturação de oxigênio (SPO2) 92%

Pressão arterial 110 mmHg X 70 mmHg

Frequência respiratória 0 rpm

PCO2 35 mmHg

Tabela 1. Registro dos dados vitais do paciente JFC após 48 horas na UTI.
Fonte: Tabela ilustrativa de autoria própria.

Foi constatado que o paciente possui pupilas midriáticas fixas e não


reativas, Escala de Coma de Glasgow: 3 – não detinha os reflexos de tronco
e apresentava reflexo de Lázaro. O teste de apneia não demonstrou nenhum
movimento respiratório, e a PCO2 final foi de 60 mmHg. Depois de 6 horas,
outro profissional confirmou os resultados.
O exame complementar confirmatório escolhido foi a angiografia
cerebral, que demonstrou o seguinte aspecto (Figura 2):

Figura 2. Exame de arteriografia evidenciando ausência de fluxo cerebral e


comprovação de Morte encefálica.
Fonte: Imagem ilustrativa de autoria própria adaptada ao caso ilustrativo.
Ao fim do protocolo, houve a ratificação de morte encefálica do paciente
em questão. Imediatamente, seguindo as recomendações do protocolo, o
médico do caso comunicou tanto o médico assistente quanto a família do
paciente da fatalidade. Além disso, o médico notificou a Central de
Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDO), representada
pela Central Estadual de Transplantes (CET). O médico ainda conversou
com a família em relação à doação dos órgãos de JFC. Ao término da
conversa, a família assinou uma autorização permitindo à junta médica do
hospital realizar a remoção dos órgãos de JFC, a fim de preparar tais órgãos
para transplantes.

INTRODUÇÃO
• O protocolo de morte encefálica (ME) é um processo
sistematizado, comprovado cientificamente, ético e indispensável a
fim de dar o diagnóstico correto, se realmente ocorreu morte
encefálica ou não.

• Os critérios desse protocolo foram descritos pela primeira vez em


1968, pela Escola Médica de Harvard. E em 1997, no Brasil, o
Conselho Federal de Medicina (CFM) estabeleceu os primeiros
critérios clínicos e tecnológicos no Brasil. Todavia, o protocolo não
ficou estagnado aos primeiros critérios descritos, uma vez que já
passou por diversas atualizações.

• A última atualização do protocolo no Brasil se deu pela Resolução


nº 2.173 do CFM, em 2017. Os pontos abordados no presente
capítulo estão em consonância com esse documento.

• Indubitavelmente, desde a abertura do protocolo de ME até a


última etapa deste protocolo devem ser respeitados e realizados, de
maneira integral, a fim de gerar um diagnóstico correto e confiável.

DEFINIÇÕES
• É definida como a perda integral e irreversível das funções do
encéfalo, ou seja, cessação irrecuperável de todas os papéis
funcionais de competência cortical, de tronco encefálico e do
cerebelo.

• A causa deve ser conhecida e constatada de maneira indiscutível.


• A caracterização desse tipo de morte independe da existência de
atividade cardíaca ou de reflexos primitivos.

• O diagnóstico de morte encefálica independe da possibilidade ou


não de doação de órgãos.

EPIDEMIOLOGIA
• Maioria das vítimas são homens (56,3%) com mediana de idade
51,5.1

• AVC e TCE constituem as duas principais causas, somando


aproximadamente 70% dos casos de ME18.

• 10% dos casos de parada cardiorrespiratória evoluem para ME. 1

• 10 a 15% das mortes em UTIs são por ME. 2

• No Brasil, a taxa de doação nos casos de ME é de 19%. 2

• Dentre os possíveis doadores, 25% se tornavam prováveis e,


desses, somente 25% se tornam doadores efetivamente. Isso devido
a diversos fatores, como negação da família e a não notificação dos
casos (algumas pesquisas indicam que esse segundo fator ocorre
em 42% dos casos).2
• Os principais órgãos ou tecidos doados são globo ocular, rins e
fígado.1

• Percebe-se que, apesar da manutenção no número de transplantes,


há mudança no perfil de vítimas de ME que são potenciais
doadores para transplante cardíaco. Perceberam-se as seguintes
mudanças no perfil dos doadores:
• aumento na idade;
• maior quantidade de diabéticos, hipertensos e coronariopatas;
• redução de causa pós-traumática e aumento por causa pós-
anóxia.3

• A morte encefálica é responsável por 15% das mortes em UTIs


pediátricas. A maioria dos perfis das vítimas nesse departamento
são os seguintes:
• Masculino;
• entre 2 e 12 anos;
• por causa hipóxico-isquêmica pós-infarto miocárdico;
• metade deles se tornam doadores.4

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
• Traumatismo cranioencefálico
• Acidente vascular cerebral (AVCH /AVCI)
• Tumores cerebrais primários
• Anóxia cerebral (pós-parada cardiorrespiratória, afogamento)
• Hipoglicemia
• Intoxicação exógena 5,6

a) DIFERENÇA ENTRE ME E MORTE CEREBRAL

• Enquanto a morte encefálica é conceituada pela ausência de


atividade das três áreas: cérebro, tronco encefálico e cerebelo, de
maneira irreversível, a morte cerebral é restrita à interrupção
completa das atividades funcionais apenas do cérebro.7,8

• As duas mortes fazem referência à morte clínica, legal e social.


Todavia, quando se trata de efeitos clínicos, o termo mais
adequado é morte encefálica.7,8
b) DIFERENÇA ENTRE MORTE ENCEFÁLICA E COMA

• Coma é uma condição em que o indivíduo está incapacitado de


responder adequadamente ao ambiente externo e aos estímulos
internos, em razão da redução ou ausência de suas atividades
neuronais. O paciente comatoso está em estado de inconsciência ou
teve uma redução significativa do nível de alerta (consciência).
Além disso, o comatoso não tem sensibilidade nem
motricidade.7,9,10

• O comatoso pode se recuperar, com ou sem sequelas. Já o paciente


diagnosticado com morte encefálica não é capaz de se recuperar.
Além dessa diferença fundamental, o indivíduo em coma ainda
permanece com suas respostas neurológicas reflexas, já que a lesão
pode ter sido cortical ou no tronco encefálico. Ademais, os órgãos
do indivíduo com morte encefálica deverão parar de funcionar em
pouco tempo após o desligamento dos aparelhos.7,9,10
c) FISIOPATOLOGIA7,11
O processo está ilustrado no fluxograma 1.
Fluxograma 1. Fisiopatologia da ME.
Fonte: Morsch, Tannous 7,11.
DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
a) PROTOCOLO DE MORTE ENCEFÁLICA 7,12-15

• Importância:
• Estabelecer o plano terapêutico e evitar terapias inúteis
• Oferecer informações concretas aos familiares
• Reduzir custos e otimizar a ocupação de leitos da UTI
• Apresentar a possibilidade de doação de órgãos à família
1º PASSO | Excluir outras condições que podem interferir no exame.
Os fatores que interferem (fluxograma 2) e que não interferem
(fluxograma 3) estão sintetizados nos fluxogramas.

Fluxograma 2. Algoritmo para exclusão de fatores que influenciam no


exame
Fonte: Morsch, Neto, Brasil, Moura, Moura 7, 12-15
Fluxograma 3. Situações que não excluem ME.
Fonte: Morsch, Neto, Brasil, Moura, Moura 7, 12-15

2º PASSO | Avaliação de critérios para abertura do protocolo


Os critérios estão esquematizados no fluxograma 4.
Fluxograma 4. Critérios para abertura do protocolo de ME
Fonte: Morsch, Neto, Brasil, Moura, Moura 7, 12-15

3º PASSO | Primeiro Exame Clínico Neurológico


Envolve confirmação de coma aperceptivo, exame dos reflexos do tronco
e teste da apneia (fluxograma 5).

• Confirmar estado de coma (Escala de coma de Glasgow: 3)


bilateralmente:
→ Estímulo retromandibular (V e VII pares)
→ Estímulo axial (esternal ou supraorbitário) e apendicular (ungueal)

• Examinar reflexos do tronco encefálico:


→ Reflexo fotomotor ausente bilateralmente (II e III pares).
→ Reflexo corneopalpebral ausente bilateralmente (V e VII pares).
→ Reflexo oculoencefálico ausente bilateralmente (VIII par).
→ Rotação da cabeça em 90o, para cada lado e no plano vertical, com
movimentos rápidos de báscula.
OBS.: Cuidado com a presença de trauma raquimedular.
→ Ausência de reflexo oculovestibular (VII, III, VI pares) bilateral.
→ Ausência de reflexo de tosse (IX e X pares).
→ Ausência de drive respiratório (feito pelo teste de apneia).

Fluxograma 5. Teste de apneia


Fonte: Morsch, Neto, Brasil, Moura, Moura 7, 12-15

4º PASSO | Segundo exame neurológico


Deve ser realizado por outro profissional depois de um intervalo de 6
horas, sendo que esse profissional não pode ser da equipe de remoção e
transplantes. Além disso, pelo menos um dos exames deve ser feito por um
neurologista ou neurocirurgião (fluxograma 6).
Fluxograma 6. Intervalo entre exames neurológicos
Fonte: Morsch, Neto, Brasil, Moura, Moura 7, 12-15

5º PASSO | Exame complementar comprobatório


Existem vários exames que avaliam fluxo sanguíneo, atividade elétrica
ou metabólica (quadro 2). Dentre esses, destacam-se:11,16,17

• Eletroencefalograma
• Doppler Transcraniano
• Arteriografia Cerebral de 4 vasos
• Tomografia por emissão de fóton único (SPECT)
• Tomografia por emissão de próton (PET)
• Potenciais Evocados somatossensitivos (PESS)
Qualquer um destes exames:
• eletroencefalograma;
• doppler Transcraniano;
• arteriografia cerebral de 4 vasos;
Acima de 2 anos • tomografia por emissão de fóton único
(SPECT);
• tomografia por emissão de próton (PET);
• potenciais Evocados somatossensitivos
(PESS).
Qualquer um destes exames:
• eletroencefalograma;
• doppler transcraniano;
De 1 ano a 2 anos incompletos
• arteriografia cerebral;
• cintilografia cerebral.
OBS.: caso for EEG, deve realizar dois EEGs com intervalo de 12 horas
entre o primeiro e o segundo.

De 2 meses de idade a 1 ano incompleto Dois EEGs com intervalo de 24 horas

De 7 dias a 2 meses de idade


Dois EEGs com intervalo de 48 h
(incompletos)

Quadro 1. Exame comprobatório adequado à cada faixa etária.


Fonte: Tannous, Tannous, Luccas.11,16,17

• Eletroencefalograma (EEG) na morte encefálica


• O eletroencefalograma é um exame rápido, indolor, não invasivo
e confiável, o qual analisa a atividade elétrica cerebral; por meio
de eletrodos ocorre captação, expansão e registro dos impulsos
elétricos cerebrais de maneira gráfica, isto é, a frequência desses
impulsos é descrita para investigação.11,16,17
• O EEG tanto no Brasil quanto nos demais países é o exame mais
utilizado para ratificar a ausência de atividade bioelétrica
cerebral (silêncio cerebral é conceituado como a falta de
atividade elétrica maior que 2 microV, no mínimo por 30
minutos) na última etapa do protocolo de ME.11,16,17
• É o único exame que pode ser escolhido para pacientes com
menos de 1 ano de idade na última etapa do protocolo de
ME.11,16,17

• Arteriografia na morte encefálica 18,19

Considerada “padrão-ouro”, por evidenciar diretamente a ausência de


fluxo encefálico. Suas limitações envolvem a dependência de expertise e
equipamento. Os critérios para que o resultado de ME seja positivo são:
• ausência de fluxo sanguíneo nos quatro vasos da entrada do
cérebro por 20 segundos;
• parada circulatória no Polígono de Willis;
• enchimento no seio sagital superior em mais de 15 segundos.
• Angiotomografia computadorizada 18,19

• Já é utilizada em vários países para auxiliar o diagnóstico de ME.


• Kramer et al alertam para a necessidade de criar um critério
específico e consensual para morte encefálica antes de ser
padronizado como um exame complementar comprobatório.
• Já é utilizado em diversos países, como Alemanha, Canadá e
França e tem se mostrado um exame extremamente confiável e
com alta acurácia.
• A AANS ainda não considera esse exame por considerar as
evidências ainda insuficientes.
Mudanças devido à Resolução nº 2.173/2017 do CFM:7,13
O quadro 2 compara as resoluções antigas e atuais no protocolo de ME.
Resolução nº 1.480/97 Resolução nº 2.173/17

Parâmetros clínicos para o início do diagnóstico Parâmetros clínicos para o início do diagnóstico

• Coma aperceptivo com ausência de


atividade motora supraespinal e apneia.
• Coma não perceptivo, ausência de reatividade supraespinhal,
apneia persistente.
• Deve apresentar lesão encefálica de causa conhecida,
irreversível e capaz de causar a morte encefálica, ausência de
fatores tratáveis que possam confundir o diagnóstico de morte
encefálica.
• Temperatura corporal superior a 35º, saturação arterial de
oxigênio acima de 94% e pressão arterial sistólica maior ou
igual a 100 mmHg para adultos.

Tempo de observação para que seja iniciado o Tempo de observação para que seja iniciado o diagnóstico
diagnóstico
• Mínimo de 6 horas.
• Não havia.
• Quando a causa for encefalopatia.
• Hipóxico-isquêmica, a observação deve ser de
24 horas.

Intervalo mínimo entre as duas avaliações Intervalo mínimo entre as duas


clínicas avaliações clínicas

• De 7 dias a 2 meses incompletos • De 7 dias a 2 meses incompletos – 24 horas.


– 48 horas. • De 2 meses a 24 meses incompletos – 12 horas.
• De 2 meses a 1 ano incompleto • Acima de 2 anos – 1 hora.
– 24 horas.
• De 1 ano a 2 anos incompletos
– 12 horas Acima de 2 anos – 6 horas.
Resolução nº 1.480/97 Resolução nº 2.173/17

Confirmação da morte encefálica Confirmação da morte encefálica

1) Exames clínicos, realizados por médicos 1) Dois exames clínicos, por médicos diferentes, especificamente
diferentes, e exames complementares, realizados em capacitados para confirmar o coma não perceptivo e a ausência de função
intervalos de tempos variáveis; do tronco encefálico;
2) Os exames complementares devem demonstrar: 2) um teste de apneia;
ausência de atividade elétrica cerebral, ausência de 3) um exame complementar que comprove a ausência de atividade
atividade metabólica cerebral ou ausência de encefálica. Este exame deve comprovar: ausência de perfusão sanguínea
perfusão sanguínea cerebral. encefálica, ou ausência de atividade metabólica encefálica ou ausência de
atividade elétrica encefálica.

Formação dos médicos examinadores Formação dos médicos examinadores

1) Decreto nº 2.268/97 (revogado pelo Decreto nº 1) Será considerado especificamente capacitado o médico com um ano de
9.175/17) estabelecia que um dos dois médicos experiência no atendimento de pacientes em coma e que tenha
confirmadores da morte encefálica deveria ser acompanhado ou realizado pelo menos dez determinações de morte
neurologista. encefálica, ou que tenha realizado curso de capacitação para determinação
2) Mesmo decreto estabelecia que nenhum desses de morte encefálica.
médicos poderiam fazer parte da equipe de 2) Um dos médicos especificamente capacitado deverá ser especialista em
transplante. uma das seguintes áreas: medicina intensiva, medicina intensiva
pediátrica, neurologia, neurologia pediátrica, neurocirurgia ou medicina de
emergência.
3) Nenhum desses médicos poderá fazer parte da equipe de transplante.

Quadro 2. Alterações do protocolo de ME em 2017.


Fonte: site CFM. 7,13

FINALIZAÇÃO DO PROTOCOLO13,15
O esquema para finalizar o protocolo estão no fluxograma 7.
Fluxograma 7. Finalização do protocolo de ME
Fonte: Brasil, Moura 13,15

DICAS DO ESPECIALISTA
a) Passos técnico-legais para finalizar o protocolo de morte
encefálica4,7,15,20
Os passos estão esquematizados no algoritmo 8.
Fluxograma 8. Algoritmo de condutas técnico-legais na ME
Fonte: Kirshen, Morsch, Moura, Caruso 4,7,15,20

Observações:

• Não utilizar termos genéricos “Morte encefálica” e “Parada


cardiorrespiratória” como causa da morte no atestado de óbito.

• Casos de morte violenta devem ser encaminhados ao Instituto


Médico Legal com relatório cirúrgico de cada órgão retirado.

• Em casos de o paciente não se enquadrar como doador, devem ser


suspendidos suportes terapêuticos. Essa medida deve ser precedida
de comunicação e esclarecimentos aos familiares, bem como
anotado no prontuário do paciente.
b) Telemedicina na emissão de laudo a distância do
eletroencefalograma na morte encefálica

• A expedição de laudo a distância do eletroencefalograma por meio


de instrumentos da telemedicina é uma evolução, visto que
possibilita o aperfeiçoamento integral do processo de morte
encefálica.21,22

• Hospitais em lugares remotos onde não haja um médico


especialista no método em condições de morte encefálica, mas que
contratam empresas fornecedoras de telemedicina com qualidade
recebem laudos seguros, confiáveis e de maneira rápida. Dessa
forma, asseguram o cumprimento da Resolução CFM nº 2173 – o
laudo do exame complementar é de obrigação de um médico
especialista no método em situações de morte encefálica.7,22,23

• Na plataforma de telemedicina ficam registrados e disponíveis on-


line os dados do exame do paciente e o laudo médico, sendo que é
assinado digitalmente pelo médico especialista em ME.22,24
FECHAMENTO DO CASO CLÍNICO DE JFC
• JFC, vítima de hemorragia intraparenquimatosa e subaracnoidea
Fisher IV. Embora o paciente tenha recebido atendimento de
urgência de imediato, não foi possível proporcionar um
prognóstico a ele, uma vez que o extravasamento de sangue para
além da luz do vaso gerou edema cerebral. Tal edema elevou a
pressão intracraniana e, por conseguinte, promoveu a compressão
de diversos vasos sanguíneos, de tal modo que provocou isquemia,
posteriormente hipóxia e por fim infarto cerebral (morte de
neurônios e de células da glia).

• Além dessas séries consecutivas, componentes do sangue


extravasado em contato com outros vasos gerou vasoconstrição
local, assim corroborando a intenção de reduzir a oferta de
oxigênio e nutrientes aos neurônios (células glicodependentes) e
células da glia.

• A consequência final de tais processos em consonância fizeram


com que o paciente JFC fosse vítima de morte encefálica, já que
houve lesão a nível do córtex cerebral, do tronco encefálico e do
cerebelo.

• Após 48 horas de JFC ter sido sedado e posto em ventilação


mecânica, seus valores hemodinâmicos e metabólicos, Glasgow 3,
dentre outras condições do paciente, foram analisados e permitiram
a abertura do protocolo de ME. Houve a realização dos dois
exames neurológicos, um teste de apneia e um exame
complementar comprobatório. Por fim, obteve-se a ratificação de
ME do paciente.

CONCLUSÃO
• O protocolo de ME é constituída de um conjunto de critérios e
procedimentos que devem ser assegurados e realizados
integralmente para obter um resultado fidedigno e real do paciente,
uma vez que é um protocolo seguro, ético e sistematizado
cientificamente.

• O avanço da tecnologia com plataformas de telemedicina eficazes


tem sido de extrema importância para proporcionar laudos de ME
por especialistas aos diversos hospitais localizados em lugares
remotos que não contam com médicos especialistas em ME, de
maneira fácil e veloz.

• O diálogo sobre a doação de órgãos com a família do paciente de


ME é de importância crucial, a fim de restabelecer a saúde de
muitas pessoas que necessitam de transplantes de órgãos, caso a
família autorize a doação dos órgãos de seu familiar que sofreu
ME.

• Os grandes fatores que influenciam a negação da família à doação


de órgãos são:25

• Não compreensão do significado da morte encefálica e acreditar


que o potencial doador ainda tem chance de viver (apenas 19,9%
dos indivíduos submetidos a uma pesquisa sobre ME associaram
essa condição à morte da pessoa).

• Pouca confiança no protocolo e no médico responsável pelo


diagnóstico.

REFERÊNCIAS
1. Kock KS, Santana MG, Da Silva SC, Andrade SB, Dos Santos EN. Epidemiological profile,
organic and electrolytic dysfunction in potential donors of organs tissues of a hospital of the
south of Brazil. Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa São Paulo. 2019; 64(2): 100-7.
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2. Dell Agnolo CM, de Freitas RA, Toffolo VJ, de Oliveira ML, de Almeida DF, Carvalho MD,
et al. Causes of organ donation failure in Brazil. Transplant Proc. 2012; 44(8): 2280-2.
3. Peris A, Lazzeri C, D’Antonio L, Bombardi M, Bonizzoli M, Guetti C, et al. Epidemiological
changes in potential heart donors after brain death: a retrospective 15 year cohort study.
Intern Emerg Med. 2019; 14(3): 371-5.
4. Kirschen MP, Francoeur C, Murphy M, Traynor D, Zhang B, Mensinger JL, et al.
Epidemiology of Brain Death in Pediatric Intensive Care Units in the United States. JAMA
Pediatr. 2019; 173(5): 469-76.
5. Freitas RAD, Agnolo CMD, Benguella EDA, Donoso LMB, Ferreira EC, Pelloso SM, et al.
Diagnóstico de muerte encefálica en víctimas de accidentes: análisis del proceso. Enfermería
Global. 2018; 17(2): 107-30.
6. Carvalho LFAD, Affonseca CDA, Guerra SD, Ferreira AR, Goulart EMA. Severe traumatic
brain injury in children and adolescents. 1st ed. Rev Bras Ter Intensiva. 2007; 19(1): 98-106.
7. Morsch JA. Protocolo de Morte Encefálica: Conceito, Atualizações e Regras do Brasil.
Morsch. [Internet]; 2020. Disponível em: https://telemedicinamorsch.com.br/blog/protocolo-
de-morte-encefalica.
8. Schein AE, Carvalho PRA, Rocha TS, Guedes RR, Moschetti L, Salvia JCL, et al. Avaliação
do conhecimento de intensivistas sobre morte encefálica. Rev bras ter intensiva. 2008; 20(2):
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pacientes em coma induzido. Rev Bras Enfermagem. 2019; 72(3): 857-64.
10. Rabello GD. Coma e estados alterados de consciência. In: Nitrini R, Bacheschi LA. A
Neurologia que Todo Médico Deve Saber. 3. ed. São Paulo: Atheneu; 2015.
11. Tannous LA, Yazbek VMDC, Giugni JR. Manual Para Notificação, Diagnóstico de Morte
Encefálica e manutenção do potencial doador de órgãos e tecidos. 3. ed. Curitiba:
SESA/SGS/CET; 2018.
12. Neto JAC, Ferreira RE, Assad IM, Santos IA, Breder SD, Paula LCD, et al. Atualização dos
critérios diagnósticos de morte encefálica: aplicação e capacitação dos médicos. Rev Bras
Ter Intensiva; 2019; 31(3): 303-11.
13. Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº 2173/2017. Diário Oficial Da
União; 2017. 50-275.
14. Moura E. Protocolo de Morte Encefálica: conheça os conceitos e saiba aplicar. Portal
PebMed. [Internet]; 2019. [acesso em 24 abril 2020]. Disponível em:
https://pebmed.com.br/protocolo-de-morte-encefalica/.
15. Moura LC, Silva VS. Manual do núcleo de captação de órgão: Iniciando uma comissão
intra-hospitalar de doação de órgãos e tecidos para transplante: CIHDOTT. Barueri, SP:
Minha Editora; 2014.
16. Tannous La, Yazbek Vmdc, Giugni Jr. Manual para notificação, diagnóstico de morte
encefálica e manutenção do potencial doador de órgãos e tecidos. 2. ed. Curitiba:
SESA/SGS/CET; 2016.
17. Luccas FJC, Braga NIO, Silvado CES. Recomendações técnicas para o registro do
eletrencefalograma (EEG) na suspeita da morte encefálica. Arq Neuro-Psiquiatr. 1998;
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angiography as a confirmatory test for the diagnosis of brain death. J Neurosurg. 2018;
128(2): 639-44.
19. Kramer AH, Roberts DJ. Computed tomography angiography in the diagnosis of brain
death: a systematic review and meta-analysis. Neurocrit Care. 2014; 21(3): 539-50.
20. Caruso R, Franke C, Ruling RK. Morte Encefálica: Da identificação à manutenção do
potencial doador de órgãos e tecidos. GET-RS. 2017. 48 p.
21. Bashshur RL. Telemedicine and Health Care, Telemed J E-health. 2002; 8(1): 5-12.
22. Agarwal S, Warburton EA. Teleneurology: is it really at a distance? J Neurol. 2011; 258:
971-81.
23. Campos C, Caudevilla E, Alesanco A, Lasierra N, Martinez O, Fernández J, et al. Setting up
a telemedicine service for remote real-time video-EEG consultation in La Rioja (Spain), Int J
Med Inform. 2012; 81(6): 404-14.
24. Craig JJ, McConville JP, Patterson VH, Wootton R. Neurological examination is possible
using telemedicine. J Telemed Telecare. 1999; 5(3): 177-81.
25. Teixeira RKC, Gonçalves TB, Silva JAC. A intenção de doar órgãos é influenciada pelo
conhecimento populacional sobre morte encefálica. Rev Bras Ter Intensiva. 2012; 24(3):
258-62.
9.1
INVESTIGAÇÃO INICIAL DAS ANEMIAS
Autores:
Giovana Aparecida Rufino
Yala Maria de Oliveira Figueiredo
Aline Bonora de Oliveira

DEFINIÇÕES

• Anemia é definida pela redução da massa eritrocitária circulante com consequente queda da
concentração de hemoglobina (Hb) e/ou hematócrito (Ht), tornando a capacidade de
carreamento de oxigênio insuficiente para suprir as necessidades fisiológicas teciduais. É
uma condição clínica extremamente comum com etiologias, manifestações clínicas e
tratamento distintos. Valores normais do eritrograma estão representados nas Tabelas 1 e 2.

• Condições ambientais e genéticas podem interferir no valor individual da hemoglobina, tais


como gênero, estado nutricional, altitude, grau de hipóxia, presença de doenças crônicas,
uso de cigarro e esportes de alto rendimento. Isso reforça a importância de não assumir a
“anemia” como um diagnóstico definitivo, mas sim investigar a etiologia sempre.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Os sintomas da síndrome anêmica são relacionados à redução do transporte de oxigênio tecidual e
são mais intensos nas anemias mais graves e de instalação mais rápida. De maneira geral, o paciente
queixa-se de fadiga, astenia, vertigem ou hipotensão postural, indisposição, sonolência, cefaleia
holocraniana, redução da tolerância aos esforços, dispneia, som pulsátil nos ouvidos, palpitações,
podendo apresentar descompensação de comorbidades cardiovasculares, cerebrovasculares ou
pulmonares. Os sintomas são sempre mais exuberantes em casos associados à hipovolemia, como em
sangramentos agudos e vultuosos. Importante questionar na anamnese sobre perdas macroscópicas de
sangue (trato gastrointestinal, geniturinário, ciclo menstrual), dieta e hábitos alimentares,
comorbidades e medicamentos em uso. O exame físico pode auxiliar no diagnóstico da etiologia da
anemia e deve ser realizado com cautela (Tabela 3). De forma geral, encontramos palidez
cutaneomucosa diretamente proporcional à gravidade da anemia. Icterícia e esplenomegalia chamam
atenção para causas hemolíticas. A concomitância de linfadenomegalias e outras citopenias ao
hemograma pode indicar causas medulares, infecciosas ou neoplásicas e merecem investigação mais
detalhada.

ETIOLOGIA E DIAGNÓSTICO
• Existem várias metodologias para a investigação etiológica da anemia, e o primeiro
questionamento que devemos fazer é o seguinte: “Por que este paciente está anêmico?”. Os
motivos do aparecimento podem estar relacionados a defeitos na cinética da produção ou
alterações morfológicas. Tais condições podem envolver perdas sanguíneas macroscópicas
ou ocultas, aumento da destruição dos eritrócitos por hemólise hereditária ou adquirida,
redução da produção dos eritrócitos por déficits carenciais ou doenças primárias da medula
óssea como leucemia aguda, anemia aplásica, mieloma múltiplo e síndrome
mielodisplásica.

• De acordo com a cinética de produção, a anemia pode ser causada por redução da produção
de hemácias ou eritropoese ineficaz (reticulocitopenia – anemia hipoproliferativa) ou
aumento da destruição das hemácias ou perda sanguínea aguda (reticulocitose – anemia
hiperproliferativa). As principais etiologias de cada grupo estão na Tabela 4.

• Na prática clínica, a análise do VCM (volume corpuscular médio) é extremamente útil na


investigação do diagnóstico etiológico e permite dividir as anemias em três grupos:
microcítica (VCM < 80 fL), normocítica e macrocítica (VCM > 100 fL).

a. Anemias Microcíticas (VCM < 80 fL)

Apresentam hemácias menores que as normais devido à alteração de produção de hemoglobina. A


microcitose pode ser identificada no esfregaço de sangue periférico quando as hemácias são menores
que o núcleo do linfócito maduro. As causas são alteração da produção de hemoglobina (talassemia),
deficiência relativa de ferro (anemia da inflamação), deficiência absoluta de ferro (anemia ferropriva)
ou defeitos na síntese do grupo heme (anemia sideroblástica hereditária, adquirida clonal ou não).
A deficiência de ferro é a causa mais comum de anemia microcítica, e as mulheres são mais
suscetíveis devido ao sangramento menstrual. Redução da absorção de ferro (doença celíaca, gastrite
atrófica ou presença da bactéria Helicobacter pylori), cirurgias gastrointestinais envolvendo duodeno
e perdas gastrointestinais devem ser investigadas para definir a real etiologia da deficiência de ferro.
O hemograma revela anemia microcítica, hipocrômica com anisocitose na maioria das vezes. O
índice de saturação de transferrina costuma ser menor que 16%, e a ferritina menor que 30 ng/mL,
sendo mais específica quando menor que 15 ng/mL.
Se o valor de ferritina é normal ou acima do valor de referência, precisamos rever com mais
cautela hemogramas prévios, pois há a possibilidade de se tratar de uma talassemia ou anemia
causada por doenças agudas graves ou crônicas em atividade (insuficiência cardíaca, doenças
reumatológicas ou inflamatório-infeciosas). Se a anemia microcítica é crônica, desde a infância,
existe forte possibilidade de se tratar de condições genéticas como anemia sideroblástica hereditária
ou talassemias.
Talassemias são doenças da síntese de hemoglobina com subtipos nomeados de acordo com a
cadeia de hemoglobina envolvida na fisiopatogenia. A mais prevalente é a β-talassemia com
fenótipos que variam de acordo com a heterozigose (talassemia minor, com anemia leve ou
inexistente, e microcitose) ou homozigose (maior, com anemia grave e dependência transfusional) da
mutação do par de genes nos cromossomos 11. Alguns pacientes são homozigotos para a mutação do
gene da cadeia β de globina, mas mantêm uma síntese residual com fenótipo intermediário
(talassemia intermédia). A Hb na β-talassemia minor costuma estar maior que 10 g/dL. A
eletroforese de Hb mostra tipicamente aumento da HbA2 para valores maiores que 3,5%. O traço de
α-talassemia não pode ser reconhecido pela eletroforese de Hb, já que todas as frações de Hb
possuem cadeia α em sua constituição. Dessa forma, o diagnóstico requer análise direta do DNA
através de testes moleculares.
Nos casos em que a ferritina é normal e a microcitose é adquirida, as etiologias principais são
anemia da inflamação ou anemia sideroblástica adquirida (rara, com formas dismórficas de hemácias,
RDW aumentado e presença de sideroblastos em anel na medula óssea).
Anemia da inflamação ocorre mediada por citocinas inflamatórias que reduzem a produção renal
de eritropoetina e aprisionam o ferro no setor de estoque. É um diagnóstico de exclusão e o VCM
costuma ser normal, tendo VCM menor que 70 fL nos poucos casos em que a anemia se apresenta
com microcitose. Vários achados sugerem o diagnóstico: valor de eritropoietina não apropriadamente
aumentando em pacientes com anemia com função renal normal, presença de anemia com estoques
normais de ferro, RDW normal e ausência de outras causas detectáveis de anemia.

b. Anemias Normocíticas

Podem ocorrer por deficiências nutricionais combinadas (ferro + cobalamina ou ferro + ácido
fólico) que podem estar presentes, por exemplo, em pacientes submetidos a cirurgias bariátricas,
etilistas e portadores de gastrite atrófica imunológica.
Doença renal crônica pode comprometer a produção de eritropoetina (EPO) e, consequentemente,
a eritropoese, gerando anemia diretamente proporcional à doença renal de diversos graus de
intensidade com níveis séricos de EPO normais no início do quadro. Insuficiência cardíaca pode
gerar anemia normocítica nos estágios avançados por mecanismos somatórios (congestão hepática e
esplênica, inflamação, decréscimo da função renal por hipoperfusão, redução da absorção de
vitaminas essenciais por congestão de alças intestinais).
A anemia hemolítica é normocítica na maioria das vezes com elevação da desidrogenase lática
(DHL), reticulocitose, aumento dos níveis de bilirrubina indireta e queda da haptoglobina sérica,
como será abordado no capítulo seguinte. O teste de Coombs direto (teste de antiglobulina direto) é
reagente em mais de 95% dos casos de anemia hemolítica autoimune; se negativo, vale investigar
anemias hemolíticas hereditárias, especialmente se o quadro for crônico ou recidivante (defeitos de
membrana, enzimopatias ou hemoglobinopatias). Teste de Coombs direto negativo com hemólise e
presença de esquizócitos no sangue periférico levantam a hipótese de anemias microangiopáticas
(síndrome hemolítico-urêmica, púrpura trombocitopênica trombótica, coagulação intravascular
disseminada, por exemplo).
Distúrbios tireoideanos, bem como infecção por HIV ou HCV, também devem ser investigados
nos pacientes com anemia normocítica.
Pacientes hospitalizados antes não anêmicos podem desenvolver anemia multifatorial por
sangramentos ocultos, inflamação, infecção grave, coleta recorrente de amostras para exames
laboratoriais, hemodiluição por hidratação vultosa, perdas sanguíneas por procedimentos invasivos
ou cirurgias. Nestes casos, o VCM costuma ser normal.
Disfunções medulares podem gerar anemia normocítica. Essas condições incluem mieloma
múltiplo, aplasia pura de série vermelha (anemia associada à reticulocitopenia intensa), leucemias
agudas, (aparecendo normalmente com bicito ou pancitopenia e evidência de blastos no sangue
periférico), leucemias crônicas com alterações adicionais como leucocitose e trombocitose, a
depender do subtipo, síndrome mielodisplásica (anemia isolada ou outras citopenias com alterações
displásicas na hematoscopia) e mielofibrose (com dacriócitos no sangue periférico).

c. Anemias Macrocíticas (VCM > 100 fL)

A causa mais prevalente dessa classe de anemia é a deficiência de cobalamina (vitamina B12) ou
ácido fólico (vitamina B9), etiologias da anemia megaloblástica. Este é um grupo distinto de anemia
com alterações morfológicas bem estabelecidas, pancitopenia em alguns casos e assincronia de
maturação núcleo-citoplasmática. Sem as vitaminas essenciais citadas, a produção de ácidos
nucleicos fica prejudicada levando à lentificação da divisão nuclear e formas megaloblastoides. A
deficiência de cobalamina, por interferir na mielinização inicial, pode gerar manifestações clínicas
neurológicas ou neuropáticas.
Alterações clonais da medula óssea podem causar anemia macrocítica, tais como síndrome
mielodisplásica, doenças linfoproliferativas, anemia aplásica ou aplasia pura de série vermelha,
necessitando da avaliação do hematologista para o diagnóstico.
Macrocitose leve pode ocorrer em casos de reticulocitose (VCM do reticulócito é maior que o da
hemácia madura), hepatopatias, distúrbios tireoideanos, abuso de álcool ou uso de algumas
medicações como hidroxiureia, alopurinol, zidovudina, entre outras. Na avaliação do esfregaço
sanguíneo periférico, as alterações eritrocitárias auxiliam muito o diagnóstico (policromatofilia ou
policromasia é equivalente a reticulóticos; células em alvo sugere hepatopatia, hemoglobinopatias ou
síndrome mielodisplásica).
De forma geral, as anemias são altamente prevalentes na prática clínica, e a avaliação correta
reflete diretamente no diagnóstico e tratamento eficazes.

SEM ANEMIA ANEMIA ANEMIA


POPULAÇÃO
ANEMIA LEVE MODERADA GRAVE

HOMEM ≥ 13,0 g/dL 11,0 – 12,9 8,0 – 10,9 < 8,0

MULHER ≥ 12,0 g/dL 11,0 – 11,9 8,0 – 10,9 < 8,0

GESTANTE ≥ 11,0 g/dL 10,0 – 10,9 7,0 – 9,9 < 7,0

Tabela 1. Valores de hemoglobina definidores de anemia e seus graus no adulto (g/dL)


Fonte: adaptação WHO
• Icterícia à custa de bilirrubina indireta sugere anemia hemolítica ou
megaloblástica
CABEÇA E PESCOÇO • Tireoide palpável pode denotar hipo ou hipertireoidismo
• Glossite e queilite angularis sugerem anemia carencial, especialmente
ferropriva

LINFONODOS • Linfadenomegalia pode sugerir inflamação, infecção ou neoplasia


subjacentes

APARELHO • Sopros podem significar gravidade da anemia, valvulopatias, próteses


CARDIOVASCULAR valvares ou endocardite, levando à anemia

APARELHO • Crepitações podem denotar insuficiência cardíaca congestiva que pode


RESPIRATÓRIO cursar com anemia. Perda de sangue pode ocorrer em hemorragias
alveolares ou hemotórax

• Esplenomegalia sugere linfoma, anemia hemolítica ou hipertensão portal


APARELHO • Esplenomegalia, circulação colateral e ascite sugerem hipertensão portal
ABDOMINAL com maior destruição de eritrócitos
• Abdome distendido, doloroso e equimoses periumbilicais ou em flancos
sugerem abdome agudo hemorrágico

• Petéquias ou equimoses associadas à anemia podem ocorrer por


trombocitopenia (síndrome de Evans, anemias microangiopáticas,
insuficiências medulares como anemia aplásica, síndrome mielodisplásica
EXTREMIDADES ou leucemia aguda)
• Alterações articulares podem denotar doenças reumatológicas associadas
• Edema pode estar presente em condições sistêmicas relacionadas à anemia
(insuficiência cardíaca, hepática ou doença renal, por exemplo)

• Rash, alterações cutâneas ou articulares podem estar presentes em doenças


reumatológicas
PELE E FÂNEROS
• Coiloníquia, pele ressecada e cabelos quebradiços podem estar presentes
em anemias carenciais, especialmente ferropriva

Tabela 2. Achados no exame físico que auxiliam no diagnóstico da etiologia da anemia


Fonte: Adaptação Leung, UpToDate.

• Anemias carenciais (deficiência de ferro, B12 ou B9)


• Anemia aplásica
REDUÇÃO DA
• Aplasia pura de série vermelha
PRODUÇÃO DAS • Infiltração medular por parasitas ou tumores sólidos
HEMÁCIAS
• Supressão medular (drogas, quimio ou radioterapia)
• Redução de TSH ou EPO
• Anemia da inflamação
ERITROPOESE
INEFICAZ • Anemia megaloblástica
• Alfa e betatalassemia
• Síndrome mielodisplásica
• Anemia sideroblástica
• Anemia diseritropoética congênita
• Anemias hemolíticas hereditárias: falciforme, talassemias, esferocitose
AUMENTO DA • Anemias hemolíticas adquiridas: autoimune, secundária a drogas, anemias
DESTRUIÇÃO microangiopáticas (púrpura trombocitopênica trombótica, síndrome
DAS HEMÁCIAS hemolítico-urêmica), malária, hemoglobinúria paroxística noturna
• Hiperesplenismo
• Traumas ou cirurgias
• Perdas gastrointestinais
PERDA • Perdas pulmonares
DE
SANGUE • Perdas uterinas
• Perdas induzidas: hemodiálise, exames laboratoriais em demasia, doação de
sangue
• Uso de medicações como AINEs, antiagregantes plaquetários
TSH: hormônio tireoestimulante; EPO: eritropoetina; AINE: antiinflamatório esteroidal.

Tabela 3. Principais etiologias conforme os grupos de anemia de acordo com a cinética de produção
Fonte: Adaptação Leung, UpToDate.

DICAS DO ESPECIALISTA

• Solicite contagem de reticulócitos absolutos para investigação de todos os tipos de anemia.


Reticulocitopenia é considerada quando os reticulócitos estão abaixo de 20.000/mm3 e
reticulocitose quando estão acima de 100.000/mm3.

• A interpretação correta dos achados morfológicos eritrocitários descritos no hemograma


auxilia muito o diagnóstico etiológico das anemias. Você pode não saber identificá-los na
lâmina do esfregaço de sangue periférico, mas precisa saber interpretá-los caso o biomédico
ou analista clínico os descreva no hemograma!

• Você tem plenas condições de iniciar a investigação etiológica da anemia antes de


simplesmente encaminhar o paciente ao hematologista.

REFERÊNCIAS
1. WHO. Haemoglobin concentrations for the diagnosis of anaemia and assessment of severity. Vitamin and Mineral Nutrition
Information System. Geneva: World Health Organization; 2011.
2. Leung LLK. Aproach to the adult with anemia. UpToDate, [Internet]; 2020. [acesso em 30 jun 2020]. Disponível em
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5. Ford J. Red blood cell morphology. Int J Lab Hemat. 2013; 35: 351-7.
9.2
ANEMIA FERROPRIVA
Autores:
Patrícia Vas Tostes Mendes
Daniela Passos Garcia Campos
Iracema Esteves

DEFINIÇÕES

• Anemia ferropriva é o tipo mais prevalente de anemia no mundo, consequência da alteração


das reservas de ferro (metal fundamental à eritropoiese) no organismo.

• Formas de deficiência de ferro:


• Absoluta: as reservas de ferro no corpo estão baixas ou esgotadas, como na anemia
ferropriva.
• Funcional: as reservas de ferro estão normais ou aumentadas, mas o suprimento de ferro
para a medula óssea é inadequado pois o metal está retido nos setores de estoque, como
na anemia da inflamação.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

• A homeostase do ferro é controlada por diversos fatores, especialmente pela hepcidina, um


polipeptídeo produzido no fígado capaz de regular os receptores e portões de absorção do
ferro nos enterócitos e macrófagos dos setores de estoque (principalmente baço e medula
óssea).

• As etiologias mais comuns ao aparecimento da anemia ferropriva são perdas ocultas ou


macroscópicas de sangue, comprometimento da absorção de ferro e redução da ingesta
alimentar (incomum como causa isolada no adulto). O Quadro 1 ilustra as principais
etiologias reportadas na literatura.

Fisiológicas: aumento da demanda nas fases de crescimento e desenvolvimento, gestação, menstruação, doadores
crônicos de sangue, atletas
Ambientais: redução da ingesta por má nutrição ou condições financeiras inadequadas

Redução da absorção: gastrectomia, cirurgia bariátrica, infecção por Helicobacter pylori, doença celíaca,
gastrite atrófica, doenças inflamatórias intestinais

Perdas sanguíneas crônicas:

TGI: esofagite, gastrite erosiva, úlceras, doença diverticular, angiodisplasias, neoplasias benignas ou malignas
(principalmente neoplasia de cólon), hemorroidas, verminoses
TGU: menorragia, hematúria, hemoglobinúria
HPN: anemia hemolítica intravascular, hemólise microangiopática, ou hemodiálise
Sangramentos sistêmicos constantes

Drogas: glicocorticoides, salicilatos, AINEs, inibidor de bomba de prótons, anticoagulantes

Genética: anemia ferropriva refratária ao ferro (mutação do gene TMPRSS6)

Eritropoese restrita: anemia da inflamação, pós-reposição de eritropoietina

TGI: trato gastrointestinal; TGU: trato geniturinário; HPN: hemoglobinúria paroxística noturna; AINE:
antiinflamatório não esteroidal; TMPRSS6: serinoprotease transmembrana 6.

Quadro 1. Principais etiologias da anemia ferropriva


Fonte: Adaptada de Auerbach, UpToDate.

QUADRO CLÍNICO

• A progressão da deficiência de ferro e o tempo para aparecimento de anemia ferropriva


dependem dos estoques de ferro prévios do paciente (relacionados com idade, sexo, a
duração e velocidade da perda sanguínea). Se a instalação for crônica, os pacientes
apresentam compensação cardiovascular com características oligossintomáticas ainda que
revelem níveis consideravelmente baixos de hemoglobina e hematócrito.

• Os sintomas mais frequentes incluem palidez cutaneomucosa, fadiga, dispneia aos esforços
e cefaleia. Habitualmente, o paciente tem alopecia, glossite, estomatite, queilite angular,
síndrome das pernas inquietas, pele seca e áspera, vertigem, redução da tolerância aos
exercícios e baixa produtividade no trabalho.

• Taquicardia, dispneia aos esforços leves, sopro sistólico e angina aparecem com valores
mais baixos de hemoglobina. Pode haver na deficiência grave de ferro síncope, coiloníquia,
perversões alimentares.

EXAME FÍSICO
• Ectoscopia: palidez cutaneomucosa, pele seca ou áspera, glossite atrófica com perda de
papila da língua, queilite angularis, coiloníquia, alopecia, síndrome das pernas inquietas.

• Aparelho gastrointestinal: síndrome de Plummer-Vinson (membrana esofágica, disfagia e


anemia ferropriva).

• Aparelho cardiovascular: dispneia aos pequenos esforços, taquicardia e/ou sopro


sistólico.

• Instabilidade hemodinâmica: aparecem com valores mais baixos de hemoglobina.


EXAMES COMPLEMENTARES

• Os exames iniciais a serem solicitados além do hemograma são valor absoluto de


reticulócitos e cinética do ferro (ferro, transferrina e ferritina séricas; índice de saturação de
transferrina pode ser calculado com ferro / transferrina x 71). Os demais exames devem ser
indicados de acordo com idade, sexo e estado socioeconômico.

• A pesquisa de sangue oculto nas fezes tem sensibilidade e especificidade variáveis; em


casos de investigação de locais ocultos de perdas, é mais seguro realizar endoscopia
digestiva alta e colonoscopia. Investigação adicional de perdas ocultas em intestino delgado
deve ser solicitada através de enteroscopia por cápsula endoscópica ou enterotomografia
para os casos ainda não elucidados. O anátomo-patológico da biópsia gástrica auxilia no
diagnóstico de gastrite atrófica ou infecções por H. pylori. A depender da clínica, exame de
urina, sorologia para doença celíaca, gastrina sérica e anticorpos anticélulas parietais
(investigação de gastrite auto imune) se aplicam.

• A anemia é definida como refratária na ausência de resposta hematológica (aumento de <1g


de Hb) após 2-4 semanas de tratamento correto com ferro oral. Nestes casos, deve-se
investigar doença celíaca, gastrite atrófica e presença de Helicobacter pylori.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO

• O diagnóstico exige, além da anamnese e exame físico, a avaliação do hemograma e da


cinética do ferro.

• A anemia ferropriva é, na grande maioria das vezes, microcítica (VCM baixo), hipocrômica
(HCM reduzido), com RDW elevado. Os leucócitos geralmente estão normais e as
plaquetas podem estar normais ou discretamente aumentadas (estímulo de megacariócitos
pela eritropoetina). Reticulócitos estão normais ou reduzidos na deficiência extrema de
ferro.

• Em relação à cinética do ferro, a ferritina sérica é o teste mais sensível, específico e de


melhor custo-benefício utilizado para identificação de deficiência de ferro (valores < 30
ng/mL) e de anemia ferropriva instalada (níveis comumente menores que 15 ng/mL). O
ferro sérico encontra-se reduzido e o índice de saturação de transferrina menor que 16%.
Condições clínicas associadas (doença renal crônica, ICC, condições inflamatórias)
aumentam o cutt-off de ferritina para pelo menos 150 ng/mL.

• Aspirado de medula óssea com colorações específicas para mensuração de estoques de


ferro (coloração medular para azul da Prússia, por exemplo) ainda são considerados padrão-
ouro para diagnóstico de deficiência de ferro, mas o exame é desconfortável, complexo e
somente realizado em situações conflitantes ou com investigação inconclusiva com os
métodos não invasivos.

• Níveis séricos de hepcidina e receptor solúvel de transferrina seriam muito úteis, mas ainda
não estão disponíveis na prática clínica.

• Os principais exames laboratoriais e os achados esperados estão na Tabela 1.


EXAME ALTERAÇÃO ESPERADA

HEMOGLOBINA Baixa: <12 nas mulheres e < 13 nos homens (g/dL)

VOLUME CORPUSCULAR MÉDIO Comumente < 80 fL

HEMOGLOBINA CORPUSCULAR MÉDIA Comumente < 27 pg

FERRO SÉRICO Baixo (< 50mcg/dL)

ÍNDICE DE SATURAÇÃO DE
< 16%
TRANSFERRINA

< 30 ng/mL: deficiência de ferro


FERRITINA
< 15 ng/mL: deficiência de ferro com anemia

Tabela 1. Principais exames laboratoriais e seus achados na anemia ferropriva


Fonte: Adaptada de Auerbach, UpToDate.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO
• O ferro heme (diretamente absorvido) advém de carnes, principalmente vermelha. A dieta
pode complementar o tratamento da deficiência de ferro, mas é improvável que suprima a
deficiência. A ingestão recomendada de ferro diário é de 8 mg para homens adultos e 18 mg
para mulheres que menstruam.

• Inibidores da absorção de ferro, como cereais, chá e café, devem ser consumidos em
horários distantes da reposição oral medicamentosa.

b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
A etiologia da ferropenia deve ser obrigatoriamente diagnosticada e resolvida.

• A suplementação oral é segura e eficaz para o paciente. As formas disponíveis no Brasil


são o sulfato, o gluconato e o sacarato de ferro. A dose de ferro elementar para o adulto é de
100 a 200 mg por dia, 30 a 60 minutos antes de uma das refeições, em tomada única sem
fracionar, com água ou sucos naturais de frutas, evitando ingesta concomitante de leite, café
ou chá. Alguns estudos recentes já mostram melhores respostas com administrações únicas
de 120 mg de ferro elementar em dias alternados quando comparado às doses diárias
fracionadas. Nas mulheres que receberam tratamento em dias alternados, os níveis de
hepcidina foram menores favorecendo a absorção de ferro.

• Durante o período de suplementação pode haver fezes escurecidas sem, no entanto,


apresentar resultado falso-positivo no exame de sangue oculto das fezes. Os reticulócitos
começam a subir em 4 dias, com pico entre 7 e 10 dias após início do tratamento. A
hemoglobina começa a melhorar por volta de uma a duas semanas de suplementação. A
ferritina normaliza após 3 a 6 meses de tratamento, sempre após normalização dos valores
de hemoglobina.

• O tratamento deve ser mantido por 3 meses após a normalização dos estoques, ou seja, após
normalização dos níveis séricos de ferritina (meta de 50 a 100 ng/mL). Se o paciente não
responde ao tratamento, é necessário rever o diagnóstico, a adesão e se existe má absorção
associada, especialmente por doença celíaca ou presença da bactéria Helicobacter pylori.

• Ferro endovenoso é indicado em casos refratários à reposição oral (perdas excessivas, má


absorção, baixa tolerância, necessidade de correção rápida da hemoglobina, antes do uso de
eritropoetina em renais crônicos e em defeitos genéticos) e em doenças inflamatórias
intestinais. Apesar de efetivo, tem um custo mais alto e efeitos adversos (gastrointestinais,
mialgia, anafilaxia), especialmente se administrado intramuscular.

• A forma disponível no Brasil é o sacarato de hidróxido férrico, cuja dose deve ser
administrada em ambiente hospitalar, em infusão IV lenta, por 60 minutos, de uma a três
vezes na semana, com intervalos mínimos de 48 horas e não ultrapassando 300 mg em cada
dose. O cálculo da dose total de reposição é feito da seguinte maneira:
Dose total = Deficiência de hemoglobina (Hb desejada conforme sexo e idade do
paciente - Hb atual em g/dL) x Peso corporal (em kg) x 2,3 + 500 a 1000 mg (quantidade
de ferro para reposição dos estoques).

• A transfusão de concentrado de hemácias só está indicada em casos de instabilidade


hemodinâmica causada ou agravada pela anemia (insuficiência cardíaca descompensada,
síndrome coronariana aguda ou cor anêmico, por exemplo). Um concentrado de hemácias
gera um incremento de 1 a 1,5 g/dL de hemoglobina.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso Clínico: Mulher, 70 Kg, Hb 6,8 g/dL, alvo 12 g/dL.

b. Prescrição Sugerida:
(12-6,8) x 70 x 2,3 + 500 =
5,2 x 161 + 500 =
837,2 + 500 =
1.337,2 mg = 1.300 mg (dose total a ser reposta)

• A ampola de sacarato de hidróxido férrico tem 100 mg. A infusão IV deve ser realizada na
dose máxima de 300 mg por aplicação, em 60 a 90 minutos, duas a três vezes na semana,
com intervalos de 48h entre as administrações.

• Neste exemplo: Sacarato de hidróxido férrico 100 mg/5 mL 2 ampolas + SF 0,9% 250mL –
Administrar em 60 minutos, EV, duas vezes por semana (7 vezes).

DICAS DO ESPECIALISTA

• Preste atenção pois a dosagem do comprimido de ferro oral é diferente das dosagens de
ferro elementar que ele contém. Ex.: sulfato ferroso de 325 mg contém 65 mg de ferro
elementar.

• A via de escolha de reposição é sempre a oral, a não ser nas particularidades citadas acima.
• Reposição de ferro em pacientes com hipoferritinemia e sem anemia instalada é
questionável, a não ser que haja algum sintoma.

• Em mulheres que menstruam, sem sintomas gástricos e intestinais, sem antecedentes


pessoais e familiares de câncer do trato gastrointestinal, a causa da anemia ferropriva pode
ser inicialmente atribuída às perdas menstruais. Em casos refratários ou recorrentes, deve-se
investigar outras etiologias.
• Deficiências na ingesta não deve ser considerada etiologia de anemia ferropriva no adulto.
REFERÊNCIAS
1. Camaschella C. Iron-deficiency anemia. N Engl J Med. 2015; 372(19): 1832-43.
2. Lopes A, Cacoub P, MacDougal IC, Peyrin-Biroulet L. Iron deficiency anaemia. Lancet. 2016; 387(10021): 907-16.
3. Auerbach M. Causes and diagnosis of deficiency and iron deficiency anemia in adults. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso
em 26 jun 2020]. Disponível em https://www.uptodate.com/contents/causes-and-diagnosis-of-iron-deficiency-and-iron-
deficiency-anemia-in-adults.
4. Auerbach M. Treatment of iron deficiency anemia. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em 26 jun 2020]. Disponível em
https://www.uptodate.com/contents/treatment-of-iron-deficiency-anemia-in-adults.
5. Cappellini MD, Musallam KM, Taher AT. Iron deficiency anaemia revisited. J Intern Med. 2020; 287: 153-170.
9.3
ANEMIA DA INFLAMAÇÃO
Autores:
Thomaz Almeida Vargas
Eduardo de Sousa Santos
Patricia Eiko Yamakawa

DEFINIÇÕES
A anemia da doença inflamatória (anemia da inflamação ou anemia de doença crônica) é
prevalente em pacientes com condições subjacentes que causem ativação inflamatória prolongada ou
intensa como doenças neoplásicas, infecciosas, reumatológicas. Recentemente, a lista de doenças
relacionada a esta anemia incluiu também diagnósticos como doença renal crônica, insuficiência
cardíaca congestiva, doença pulmonar crônica e obesidade. Tais condições levam a um processo de
ativação imune e produção de citocinas inflamatórias que interferem na eritropoese e reduzem a
sobrevida das hemácias.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A anemia da inflamação é a segunda causa mais frequente de anemia sendo superada somente
pela anemia ferropriva. É a anemia mais comum em pacientes hospitalizados, principalmente em
idosos e pacientes com doença crônica conhecida (Quadro 1).

Neoplasias sólidas e hematológicas

Infecções

Doenças imunomediadas

Doenças inflamatórias

Insuficiência renal crônica

Insuficiência cardíaca congestiva

Doença pulmonar crônica

Obesidade

Anemia do idoso

Anemia do doente crítico


Quadro 1. Doenças associadas à anemia da inflamação
Fonte: adaptado de Weiss.

Os mecanismos principais da anemia da inflamação estão representados no fluxograma 1 e


incluem:

• Distúrbio do metabolismo do ferro induzido pela ativação imune, resultando em redução de


absorção de ferro pelo trato gastrointestinal, aprisionamento do ferro nos macrófagos (fonte
principal de ferro para formação do grupo heme dos eritroblastos) e bloqueio da utilização
do ferro por eritroblastos da medula óssea. A produção de citocinas, principalmente de
interleucina 6, estimula o aumento de produção hepática da proteína hepcidina. A hepcidina
exerce sua regulação no metabolismo do ferro se ligando à ferroportina, que é uma proteína
localizada na membrana citoplasmática, única exportadora transmembrana de ferro. A
ligação da hepcidina a ferroportina causa internalização intracelular da ferroportina e sua
degradação. Concentrações elevadas de hepcdina inibem a absorção de ferro no duodeno,
onde a ferroportina é necessária para transportar o ferro absorvido da dieta para a circulação
sanguínea. A ferroportina também age nos macrófagos liberando o ferro de hemácias
senescentes para o plasma. Além disso, citocinas como o fator de necrose tumoral reduzem
a absorção duodenal de ferro e interferem na homeostase do ferro nos macrófagos por
mecanismos independentes da hepcidina.

• Resposta medular inadequada frente à anemia com diminuição dos receptores de


eritropoietina nas células progenitoras hematopoiéticas e secreção inapropriadamente baixa
de eritropoietina, levando à redução na proliferação e diferenciação dos precursores
eritroides.

• Diminuição da sobrevida das hemácias causada pela maior eritrofagocitose pelos


macrófagos esplênicos e hepáticos, gerando a remoção precoce dos eritrócitos circulantes
para 80-90 dias, sendo o normal entre 110-120 dias. Evidências recentes sugerem que, no
período de aumento de destruição eritrocítica, a eritrofagocitose e a reciclagem do ferro são
realizadas por macrófagos em diferenciação no fígado. Uma vez que o ferro é adquirido
pelos macrófagos, é armazenado como ferritina. Em suma, todos esses eventos levam a
alterações características na homeostase do ferro vista nas anemias inflamatórias: ferro
sérico baixo e ferritina alta.

Outros fatores que podem acentuar a anemia em pacientes internados e em estado crítico incluem
perda sanguínea por flebotomias constantes para exames, sangramentos gastrointestinais acentuados
por anticoagulação, uso de sondas nasoenterais e medicações que promovem erosões
gastroduodenais. Perda sanguínea em hemodiálise, hemólise e hemodiluição também são
contribuintes.
Fluxograma 1. Fisiopatologia.
Fonte: Elaborado pelos autores.
QUADRO CLÍNICO
O paciente geralmente tem uma doença conhecida (infecções, neoplasia, doença inflamatória
intestinal, renal crônica, doença autoimune) ou ainda não diagnosticada e apresenta-se com anemia
normocítica na maioria das vezes.
A anemia desenvolve-se gradualmente nos primeiros 30 a 90 dias da doença em atividade e
costuma ser leve a moderada, a menos que exista um fator concomitante que possa agravar o quadro.
O paciente costuma queixar-se mais de sintomas relacionados à doença de base. A sintomatologia
relacionada a anemia inclui astenia, palidez, dispneia, palpitações, confusão mental, redução no
desempenho cardiovascular.
Pode-se correlacionar a intensidade e persistência da anemia a um marcador de gravidade e
progressão da doença subjacente, podendo ser útil para monitorar o curso da doença e a eficácia do
tratamento. A anemia da inflamação tende a melhorar com o tratamento da doença de base quando
esta é reversível.

EXAME FÍSICO
Os achados gerais da anemia envolvem palidez cutaneomucosa, taquipneia e taquicardia,
rebaixamento de nível de consciência e sopro sistólico em foco aórtico nos casos mais graves. É
importante observar lesões cutâneas ou articulares, sinais de artrite, turgência de jugulares, edema de
membros inferiores, estertores finos pulmonares que podem sinalizar alguma doença subjacente
como causa da anemia.

DIAGNÓSTICO E EXAMES COMPLEMENTARES


Devemos suspeitar de anemia da inflamação nos pacientes com infecções agudas ou subagudas,
inflamações (agudas intensas ou arrastadas) ou neoplasias que tenham anemia leve a moderada (Hb
não costuma ser menor que 8 g/dL), normocítica na grande maioria dos casos. O diagnóstico é
baseado em critérios clínicos e laboratoriais.

a. Parâmetros laboratoriais:

• Hemograma: anemia moderada com hemoglobina entre 9 e 12 g/dL, raramente abaixo de 8


g/dL. Geralmente é normocrômica e normocítica, com esfregaço de sangue periférico sem
alterações morfológicas nas hemácias e com pouca variação de tamanho (RDW normal na
maioria das vezes). Em poucas apresentações, o VCM é reduzido (entre 70 e 80 fL).
Leucocitose, desvio escalonado, presença de células anômalas ou trombocitopenia podem
ser visualizadas, a depender do diagnóstico de base.

• Contagem de reticulócitos normal ou diminuída, indicando discreta hipoproliferação.


• Ferro sérico normal ou diminuído (ferro retido nos estoques – macrófagos, enterócitos).
• Índice de saturação da transferrina normal ou diminuído.
• Ferritina sérica normal ou aumentada (geralmente maior que 100 ou 150 ng/mL em
pacientes com IC e DRC). O aumento da ferritina ocorre pela retenção de ferro nos
macrófagos e também por se tratar de uma proteína de fase aguda, com seu aumento
induzido por vários mediadores inflamatórios.

• Receptor solúvel da transferrina e razão do receptor solúvel sobre a ferritina normais (ainda
não disponíveis na prática clínica).

• Provas inflamatórias positivas (velocidade de hemossedimentação, proteína C reativa).


• Dosagem de hepcidina aumentada (ainda não disponível na prática clínica).
• Dosagem sérica de eritropoietina normal ou discretamente reduzida com função renal
normal.

• Avaliação medular realizada somente em casos duvidosos. Em pacientes com anemia


inflamatória, pode-se encontrar macrófagos com estoque normal ou aumentado de ferro.

A anemia da inflamação pode coexistir com outras anemias, como megaloblástica e ferropriva,
hemólise e inibição na eritropoiese causada por medicamentos ou toxinas, devendo-se pesquisar e
avaliar concomitância destas condições.
A anemia ferropriva associada nestes casos pode ser multifatorial, relacionada a situações
frequentes em doentes crônicos, tais como: perda sanguínea crônica do trato gastrointestinal ou
genitourinário, presente em neoplasias; em perdas crônicas durante procedimentos como a
hemodiálise e coletas de exames laboratoriais frequentes, além de outras situações, como
desnutrição. Caso tenha associação com anemia ferropriva, as hemácias podem ser microcíticas e
hipocrômicas e a ferritina pode estar normal, porém raramente acima de 100 ng/mL. O receptor da
transferrina encontra-se aumentado na anemia ferropriva e a medula óssea mostra baixo estoque de
ferro tanto nos macrófagos como em eritroblastos.
A distinção entre anemia da inflamação e ferropriva nem sempre é clara, mas, se não houver
infecção associada, pode-se tentar prova terapêutica com suplementação de ferro. A punção
aspirativa de medula óssea pode ser útil na avaliação de outros diagnósticos diferenciais,
principalmente na suspeita de doença hematológica primária, infiltração neoplásica ou infecção
impactando na eritropoiese (por exemplo, leishmaniose visceral), sendo útil também para
quantificação do ferro medular. Outros diagnósticos diferenciais incluem anemias sideroblásticas,
mieloftise por infiltração de medula óssea e síndromes mielodisplásicas.

TRATAMENTO
Consiste no tratamento da doença de base com o objetivo de corrigir os mecanismos envolvidos
no desenvolvimento da anemia. Tratamentos simultâneos se baseiam em agentes estimuladores da
eritropoiese, como eritropoietina e darbepoetina, e suplementação de ferro quando indicado.
a. Reposição de ferro: terapia adjuvante isolada ou em associação com a eritropoietina. Deve-
se suplementar ferro a fim de manter a ferritina acima de 100 ng/mL e a saturação de transferrina
> 20%. É calculada a dose necessária de acordo com o peso do paciente e o déficit de ferro
estimado. Dá-se preferência por reposição endovenosa, visto que a absorção gastrointestinal
costuma estar prejudicada em situações inflamatórias crônicas, porém pacientes com deficiência
de ferro e inflamações leves podem obter benefício com reposição oral de ferro.

b. Eritropoietina: Geralmente indicada quando anemia sintomática com Hb < 10g/dL, sendo
útil principalmente naqueles com dosagem de eritropoietina < 500mU/mL.

• Dose inicial 50-100 U/kg SC, ou 4.000 U/dia no adulto, uma a três vezes por semana, por
oito a doze semanas. Deve-se monitorar a hemoglobina a cada duas semanas até obter a
resposta desejada. Caso não ocorra resposta terapêutica eficaz (aumento de Hb > 1 g/dL em
quatro semanas), pode-se aumentar a dose em 25% a cada quatro semanas até atingir a dose
de 300 U/kg. Se a Hb aumenta mais de 1g/dL em duas semanas, deve-se reduzir a dose em
25%.

• Dose alternativa de 30.000 a 40.000 U SC uma vez por semana. Pode ser aumentada para
60.000 U SC uma vez por semana se não houver resposta em quatro semanas.

• Níveis de hemoglobina e contagem de reticulócitos ao longo do tempo indicam uma


resposta a esse tratamento, devendo ser suspenso quando alcançar hemoglobina próxima ou
acima de 11 g/dL. O uso de agentes estimuladores de eritropoese aumenta o risco de óbito e
eventos cardiovasculares graves em pacientes com Hb > 12 g/dL. Caso não haja resposta
após 12 semanas de uso, deve-se interromper o tratamento.

• A dose equivalente de darbepoetina utilizada pode ser de 60 a 100 mcg/semana ou 300 mcg
a cada três semanas. Como a darbepoetina tem uma meia-vida maior, podendo resultar em
estimulação excessiva e prolongada, há preferência no uso da eritropoietina.

• Efeitos adversos incluem hipertensão, cefaleia, prurido, náuseas, artralgia, edema e eventos
tromboembólicos.

c. Transfusão de hemácias: pode ser necessária quando anemia grave sintomática,


principalmente em pacientes muito idosos, portadores de neoplasia em que a intensidade da
anemia é importante, com sintomas cardiovasculares. Restringir ao máximo.

d. Condições especiais:

• Doença renal crônica: eritropoietina recombinante (4000 U/frasco) 50-100 U kg/peso, três
vezes por semana, intravenoso (IV) em 1-2 min ou subcutâneo (SC). A dose inicial pode ser
aumentada em 25 UI/kg de cada vez com intervalos de quatro semanas. Utilizar ferro
intravenoso, se necessário (se ferritina <100 ng/mL, saturação de transferrina < 20%), para
melhorar a resposta à terapia com eritropoietina visando a uma Hb próxima de 10 g/dL.
Pode-se usar darbepoetina alfa IV ou SC com dose inicial de 0,45 mcg/kg por semana e
ajustar a dose conforme resposta clínica.

• Neoplasia: eritropoietina recombinante (4000 U/frasco) 150 U/kg SC três vezes por
semana. Há também a alternativa de usar darbepoetina 500 mcg SC a cada três semanas.
Geralmente iniciada em pacientes com anemia relacionada à quimioterapia quando Hb < 10
g/dL. Deve avaliar-se cuidadosamente o risco de eventos tromboembólicos nestes
pacientes, já que agentes estimulantes da eritropoese aumentam a chance de trombose.
Deve-se usar a menor dose possível para aumentar a hemoglobina somente o suficiente para
evitar ou reduzir a necessidade transfusional. Descontinuar se não houver resposta em seis a
oito semanas (aumento de Hb > 1g/dL e redução de necessidade transfusional).

• HIV: eritropoietina recombinante (40000 U/frasco) 100 U/kg SC três vezes semana, até o
máximo de 300 U/kg três vezes por semana.

Novas terapias alvo-específicas como anticorpos monoclonais anti-IL-6, por exemplo, já estão
sendo estudadas. O reconhecimento da anemia da inflamação e o tratamento da causa de base são
pontos cruciais no sucesso do manejo desses pacientes, visto que a cura da doença inflamatória
subjacente costuma resultar na resolução da anemia da inflamação.

DICAS DO ESPECIALISTA

• A anemia da inflamação é a anemia mais frequente em pacientes hospitalizados e doentes


crônicos.

• É essencial para o manejo procurar e tratar a causa de base associada.


• O diagnóstico é de exclusão e a coexistência com anemia ferropriva pode dificultá-lo.
• O uso de eritropoetina e reposição de ferro em pacientes selecionados pode melhorar a
anemia na maioria dos casos. Suplementação de ferro não deve ser iniciada se a ferritina
sérica for maior que 100 ng/mL.

• Iniciar eritropoetina somente se Hb < 10 g/dL com anemia sintomática. Atenção para os
efeitos adversos da medicação. Descontinuar se Hb > 11 g/dL ou se não houver resposta
após oito a doze semanas.

REFERÊNCIAS
1. Goodnough LT, Schrier SL. Evaluation and management of anemia in the elderly. Am J Hematol. 2014; 89(1): 88-96.
2. Weiss G, Ganz T, Goodnough LT. Anemia of inflammation. Blood. 2019; 133(1): 40-50.
3. Stauder R, Valent P, Theurl I. Anemia at older age: etiologies, clinical implications, and management. Blood. 2018; 131(5):
505-14.
4. Tonia T, Mettler A, Robert N, Schwarzer G, Seidenfeld J, Weingart O, et al. Erythropoietin or darbepoetin for patients with
cancer. Cochrane Database Syst Rev. 2012; 12: CD003407.
9.4
ANEMIA MEGALOBLÁSTICA
Autores:
Cristiano Martins Trindade
Iara Baldim Rabelo
Celso Arrais

DEFINIÇÕES
As anemias megaloblásticas constituem um grupo de anemias macrocíticas cujo desenvolvimento
ocorre devido à síntese ineficaz de DNA nas células precursoras hematopoéticas. Desta forma,
ocorrem alterações morfológicas que culminam com apoptose intramedular. Isto acontece devido à
deficiência de cobalamina (Vitamina B12) e/ou folato (Vitamina B9).

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O quadro a seguir (Quadro 1) divide as várias causas da anemia megaloblástica de acordo com a
vitamina em deficiência.

Vitamina B12 Vitamina B9

Anemia perniciosa (Ac antifator intrínseco e


Deficiência nutricional
anticélula parietal)

Doença gástrica ou cirurgia (gastrectomia


Dieta induzida: leite de cabra, dietas sintéticas
parcial/ completa ou redução gástrica)

Gastrite atrófica crônica e ingestão de drogas que


Drogas: álcool, agentes antissépticos, drogas
afetam a secreção de ácido gástrico ou o pH
contraceptivas, antibióticos, fenitoína, quimioterápicos,
gástrico (inibidores de bomba de prótons,
metotrexate, trimetoprim, pirimetamina, sulfas
bloqueadores H2)

Doença pancreática ou pancreatectomia Prematuridade

Outras doenças intestinais, ressecção ileal,


infestações parasitárias e crescimento Doença Celíaca, Sprue tropical
bacteriano

Uso de colestiramina, metformina Gravidez, puberdade (maior demanda)


Vitamina B12 Vitamina B9

Desnutrição, dieta vegetariana ou vegana Anemia hemolítica crônica

Alcoolismo crônico Dermatite esfoliativa

HIV Hemodiálise

Anestesia por óxido nitroso Hipertireoidismo

Quadro 1. Causas de anemia megaloblástica de acordo com a deficiência vitamínica envolvida


Fonte: Adaptação de Means, UpToDate

O estoque de cobalamina é mais duradouro que o do ácido fólico, bem como existem diferenças
marcantes entre o metabolismo dessas vitaminas:

a. Cobalamina:

• Absorção: ileal (metabolismo pormenorizado no esquema da Figura 1)


• Necessidade diária: 0,4 mcg/dia no adulto
• Tempo para instalação da deficiência: um a dois anos, às vezes mais (estoque
principalmente hepático).

b. Ácido fólico:

• Absorção: jejunal
• Necessidade diária: 400 mcg/dia no adulto, podendo chegar a 500 e 600 mcg na lactação e
gravidez, respectivamente.

• Tempo para instalação da deficiência: semanas a meses


As alterações megaloblásticas no sangue periférico e na medula óssea ocorrem porque a falta da
cobalamina e/ou do ácido fólico leva à desaceleração no ciclo de divisão celular e assincronia núcleo-
citoplasmática. Decorrente disso são encontrados no sangue periférico glóbulos vermelhos
macrocíticos (macrovalócitos) e neutrófilos hipersegmentados. Temporalmente, os neutrófilos
hipersegmentados precedem a macrocitose, e a macrocitose antecede a anemia. Não é possível
determinar a vitamina deficiente baseado na morfologia das células. Na medula óssea, as formas
megaloblastoides levam à eritropoese ineficaz com morte prematura por fagocitose ou apoptose das
células precursoras eritropoiéticas (hemólise intramedular).
As alterações de função neuronal devem-se basicamente à deficiência de vitamina B12. Os
mecanismos ainda não foram plenamente elucidados, mas muitos achados podem se explicar pela
desmielinização.
Figura 1. Metabolismo de cobalamina
Fonte: Adaptado de Green.

QUADRO CLÍNICO
• Sinais e sintomas gerais: palidez, astenia, palpitações, fadiga, vertigem, dispneia aos
esforços, amenorreia. A icterícia pode ocorrer por hemólise intramedular e extravascular.
Nos pacientes com anemia perniciosa existe risco aumentado de câncer gástrico e outras
doenças autoimunes podem coexistir, especialmente tireoidite de Hashimoto. Deficiêcias
crônicas de ácido fólico podem aumentar o risco de neoplasias de cólon.

• Quadro neurológico (exclusivo da deficiência de vitamina B ): parestesias simétricas de


12

extremidades (“em luva e bota”), distúrbios de marcha (ataxia), alterações de sensibilidade


vibratória. Pode haver insônia, irritabilidade, lentificação cognitiva, distúrbios visuais por
atrofia do nervo ótico, demência, depressão ou psicóticos.

EXAME FÍSICO

• Ectoscopia: pele e mucosas hipocoradas a depender da intensidade da anemia, icterícia


leve, queilite, glossite, unhas e cabelos quebradiços.

• Sinais neurológicos passíveis de ser encontrados (na deficiência de cobalamina):


desorientação em tempo e espaço; Déficit de sensibilidade vibratória simétrico; Alteração
de propriocepção com alteração de marcha (ataxia, Lhermitte ou Romberg positivo);
Reflexos anormais nos tendões profundos. Sinais extrapiramidais (distonia, disartria,
rigidez).

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Hemograma/esfregaço de sangue periférico: anemia, bicito ou até pancitopenia com VCM
elevado na maioria das vezes; existem anisocitose, poiquilocitose (predomínio de macrovalócitos)
e eritroblastos circulantes. A presença de neutrófilos hipersegmentados (5% dos neutrófilos
contados no esfregaço de sangue periférico contendo cinco segmentações ou 1% com seis ou mais
segmentações) associada ao aumento de DHL (desidrogenase lática) favorece o diagnóstico.

b. Demais exames: a medula óssea é hipercelular com formas megaloblastoides, embora a


necessidade do mielograma para realizar o diagnóstico seja rara. Existem achados laboratoriais de
hemólise (bilirrubina indireta aumentada e DHL muito elevado) e baixo índice de haptoglobina. A
contagem de reticulócitos é normal ou baixa.

c. Dosagem sérica de Vitamina B12: valores inferiores a 200 pg/mL sugerem deficiência;
valores entre 200 e 300 necessitam de complementação laboratorial com dosagem de ácido
metilmalônico e homocisteína sérica. Valores acima de 300 pg/mL, embora tornem menos
prováveis, não descartam o diagnóstico de deficiência.

d. Dosagem sérica de ácido fólico: valores inferiores a 2 ng/mL indicam deficiência, e acima
de 4ng/mL indicam estoques normais. Nos casos duvidosos, a dosagem sérica de homocisteína
elevada com níveis séricos de ácido metilmalônico normais favorecem o diagnóstico.
TRATAMENTO
a. Deficiência de Vitamina B12: para o tratamento parenteral (intramuscular) com ampolas de
1000 mcg, administrar uma ampola por dia na primeira semana, seguida de reposição semanal até
correção da deficiência (três a quatro semanas); após, manter uma ampola a cada dois a três
meses. Para ampolas de 5000 mcg, iniciar com uma ampola três vezes na semana (em dias
alternados, por exemplo), seguida de uma ampola semanal (três a quatro semanas) com
manutenção a cada três a seis meses, a depender da etiologia da deficiência.
A reposição oral pode ser feita com drágeas de 1000 a 2000 mcg (a de 5000 mcg é encontrada
com mais facilidade no Brasil) por dia, mas deve ser reservada para casos mais leves ou para
manutenção após melhora clínica com o medicamento parenteral.
A anemia megaloblástica secundária à deficiência de vitamina B12 responde ao tratamento com
reticulocitose em aproximadamente cinco dias do início do tratamento e geralmente ocorre a correção
da hemoglobina com quatro a seis semanas.
Tratamento de Anemia perniciosa, ou qualquer deficiência de B12 causada por má absorção,
precisa ser mantido por toda a vida.
Anormalidades neurológicas graves devem ser tratadas agressivamente com injeções diárias
por uma semana e depois fazer tratamento semanal até estabilização. A gravidade e a duração dos
sintomas neurológicos antes do tratamento predizem o prognóstico; sintomas neurológicos que não
cedem seis meses após o início da reposição provavelmente não melhorarão. Deve-se sempre
procurar outra causa se houver progressão dos sintomas após correção adequada da vitamina B12.

b. Deficiência de ácido fólico: a deficiência de folato é normalmente tratada com ácido fólico
oral (400 mcg a 1000 mcg por dia) por um a quatro meses ou até que haja evidências laboratoriais
de recuperação hematológica. Em caso de deficiência de ácido fólico, antes de se iniciar o
tratamento, deve-se assegurar a existência de níveis adequados de vitamina B12 e, em caso de
deficiência dessa, deve-se realizar a administração conjunta de ambas as substâncias, uma vez que
o tratamento exclusivamente com ácido fólico, em pacientes com deficiência de vitamina B12,
pode levar a um agravamento das manifestações neurológicas.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Mulher de 80 anos com história de um ano de parestesias em membros
inferiores, queda do estado geral e piora cognitiva progressiva.

b. Exame físico: descorada, confusa e hiporresponsiva. Não reconhecia familiares e


apresentava déficit da memória recente.
• Exame toracoabdominal normal.
• Exame neurológico evidenciou déficit de sensibilidade em membros inferiores, incoordenação
motora, Babinski bilateral, paraparesia crural e desorientação temporoespacial.

c. Exames complementares: Hb: 8,4 g/dL, VCM: 110 fL, hipersegmentação de neutrófilos,
vitamina B12 diminuída (182 pg/mL), TSH normal, tomografia de crânio normal e endoscopia
com gastrite atrófica confirmada por biópsia.
d. Prescrição Sugerida:

1. Vitamina B12 1000 mcg por dia, IM, na primeira semana.


2. Vitamina B12 1000 mcg por semana nas próximas 3 semanas.
3. Avaliar resposta com reticulócitos após 5 a 7 dias com novo hemograma.
4. Manter reposição mensal ou bimensal a depender da etiologia da deficiência.

DICAS DO ESPECIALISTA

• Embora a grande maioria das anemias megaloblásticas sejam macrocíticas, o VCM pode
variar de 100 a valores maiores que 130fL. Um VCM normal não descarta anemia
megaloblástica com ou sem deficiência concomitante de ferro.

• Os pacientes com anemia perniciosa têm risco maior de câncer gástrico e devem realizar
endoscopia digestiva alta a cada um a dois anos mesmo sem sintomas gástricos.

• Anemia perniciosa coexiste com outras doenças autoimunes, especialmente Hashimoto.


Esteja atento aos sintomas e avalie TSH e T4 livre anualmente.

• Iniciar reposição parenteral nos tratamentos de deficiência de cobalamina sempre que os


sintomas forem exuberantes ou neurológicos. A manutenção pode ser feita via oral ou
parenteral; compartilhe essa decisão com seu paciente.

• Compartilhe a possibilidade diagnóstica com seu paciente e lance mão do teste terapêutico
com reposição de cobalamina e ácido fólico concomitantes até as dosagens séricas e os
demais exames etiológicos ficarem prontos!

REFERÊNCIAS
1. Means RT, Fairfield KM. Clinical manifestations and diagnosis of vitamin B12 and folate deficiency. UpToDate. [Internet];
2020. [acesso em 29 jun 2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/clinical-manifestations-and-diagnosis-
of-vitamin-b12-and-folate-deficiency.
2. Means RT, Fairfield KM. Causes and pathophysiology of vitamin B12 and folate deficiencies. UpToDate. [Internet]; 2020.
[acesso em 29 jun 2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/causes-and-pathophysiology-of-vitamin-
b12-and-folate-deficiencies. Acesso em 29.06.2020.
3. Means RT, Fairfield KM. Treatment of vitamin B12 and folate deficiencies. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em 29 jun
2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/treatment-of-vitamin-b12-and-folate-deficiencies.
4. Green R, Allen LH, Bjorke-Monsen AL, Brito A, Guéant JL, et al. Vitamin B12 deficiency. Nat Rev Dis Primers. 2017; 3:
17040.
5. Wang H, Li L, Qin LL, Song Y. Vidal-Alaball J, Liu T. Oral vitamin B12 versus intramuscular vitamin B12 for vitamin B12
deficiency (review). Cochrane Database Sys Rev. 2018(3); CD004655.
9.5
ANEMIAS HEMOLÍTICAS
Autores:
Lays Fernandes Mesquita
Fernanda Aparecida Tranches
Iara Baldim Rabelo

DEFINIÇÕES

• Anemia Hemolítica (AH) ocorre devido à redução da meia-vida dos eritrócitos (120 dias)
por destruição prematura nos meios intra ou extravasculares. A anemia se instala quando a
velocidade de hemólise supera a capacidade da produção eritrocitária. A condução do caso
dependerá diretamente da etiologia da hemólise.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Existem várias etiologias e classificações de anemia hemolítica, sendo as principais:

a. Anemias hemolíticas hereditárias:

• Enzimopatias: deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase, deficiência de piruvato


quinase

• Defeitos de membrana ou do citoesqueleto: esferocitose hereditária, eliptocitose,


estomatocitose

• Hemoglobinopatias: anemia falciforme, talassemias, variantes de Hb instável.


b. Anemias hemolíticas adquiridas:

• Imunomediada: anemia hemolítica autoimune (Coombs direto ou teste de antiglobulina


direto positivo), hemólise aloimune (Coombs indireto ou pesquisa de anticorpos irregulares
positiva), reação transfusional hemolítica imediata ou tardia, anemia hemolítica induzida por
drogas

• Hiperesplenismo
• Trauma mecânico (hemólise do corredor, hemólise por valva metálica)
• Microangiopatias (coagulação intravascular disseminada, hipertensão acelerada maligna,
HELLP síndrome, síndrome hemolítico-urêmica, púrpura trombocitopênica trombótica)

• Administração de imunoglobulina humana ou imunoglobulina anti-D


• Destruição por patógenos (malária) ou toxinas (picada de aranha, deposição de cobre na
doença de Wilson, queimaduras térmicas).

Outra classificação das anemias hemolíticas envolve o local de destruição das hemácias:

c. Hemólise Intravascular: a degradação eritrocitária deixa seus fragmentos livres na circulação


(hemoglobina livre no plasma com consequente hemoglobinúria), predispondo insuficiência renal e
eventos embólicos. As principais causas são:

• Lesões por trauma mecânico (maratonistas, portadores de válvulas cardíacas metálicas) ou


mediadas por complemento, formando o complexo de ataque à membrana (hemoglobinúria
paroxística noturna, hemólise por incompatibilidade ABO), geram hemólise completa e
imediata no meio intravascular, antes de os eritrócitos alcançarem o sistema
reticuloendotelial.

• Microangiopatias, CIVD, sepse por Clostridium, assim como administração de


imunoglobulina humana ou imunoglobulina anti-D, podem causar hemólise intravascular.

d. Hemólise Extravascular: as hemácias são destruídas por macrófagos do baço, fígado, medula
óssea e linfonodos. Seguem as principais causas:

• Anemia hemolítica autoimune (AHAI) com anticorpos reagentes à temperatura ambiente


(usualmente IgG) leva à hemólise extravascular

• Hemólise em quadros de hiperesplenismo.


QUADRO CLÍNICO

• De forma geral, os pacientes apresentam sinais e sintomas de acordo com o grau da anemia e
com o tempo de instalação, podendo apresentar fadiga, astenia, dispneia aos esforços,
taquicardia, palidez cutânea, icterícia leve, esplenomegalia (graus variados), urina
acastanhada (em casos de hemoglobinúria).

EXAME FÍSICO
• Variável de acordo com a etiologia e grau de anemia:
• Palidez Cutânea
• Icterícia leve
• Esplenomegalia
• Taquipneia
• Taquicardia
• Presença de sopro na ausculta cardíaca

EXAMES COMPLEMENTARES
a. Hemograma completo: anemia hemolítica geralmente é normocítica ou macrocítica nos casos
de reticulocitose intensa. Leucocitose ou leucopenia podem aparecer em casos de infecção ou
sepse. Neutropenia em pacientes com coagulação intravascular disseminada e anemia podem
indicar leucemia promielocítica aguda; linfocitose, por sua vez, pode associar-se à doença
linfoproliferativa como causa secundária de AHAI. Trombocitopenia associada à anemia
hemolítica pode indicar síndrome de Evans (púrpura trombocitopênica idiopática associada à
AHAI), CIVD ou microangiopatias trombóticas (púrpura trombocitopênica trombótica, síndrome
hemolítico-urêmica)

• Aumento de reticulócitos (reticulocitose) na ausência de sangramentos recentes ou reposição


vitamínica.

b. Lactato desidrogenase ou desidrogenase láctica (DHL): aumentado. Seus níveis muito


elevados, normalmente, estão associados à maior gravidade ou à anemia megaloblástica.

c. Bilirrubinas: levemente elevada em sua fração indireta, geralmente até 5mg/dL.

d. Haptoglobina: reduzida, especialmente nas hemólises intravasculares.

e. Esfregaço de sangue periférico: fornece informações valiosas na investigação da causa de


hemólise (Quadro 1).

f. Teste de antiglobulina direto (TAD): positivo em 95% dos casos de AHAI; realizado quando
a hemólise é confirmada para determinar se é de natureza imune. O exame demonstra que a
imunoglobulina G (IgG) e/ou complemento (geralmente C3d) está ligado à membrana dos
eritrócitos. Em algumas situações, também podem ser encontradas IgM e IgA.

Causas secundárias de AHAI devem ser descartadas, incluindo reumatológicas, neoplásicas


(tumores sólidos, neoplasias linfo ou mieloproliferativas), virais (HIV, HCV).

Achados do esfregaço de sangue


Etiologia provável/característica da hemólise
periférico
Achados do esfregaço de sangue
Etiologia provável/característica da hemólise
periférico

Policromatofilia, pontilhados basofílicos Equivalente de reticulócitos em geral

Microangiopatia trombótica (PTT, SHU, CIVD; próteses


Esquizócitos
valvares; queimaduras)

Dacriócitos Envolvimento da medula óssea; mielofibrose

Esferócitos AHAI ou esferocitose hereditária

Eliptócitos Eliptocitose hereditária ou mielodisplasia

Estomatócitos Alterações metabólicas ou estomatocitose hereditária

Microrganismos intracelulares Malária ou babesiose

Hemácias mordidas, corpúsculos de Heinz Deficiência de G6PD

Hemácias em foice Anemia falciforme

Hemácias em alvo Talassemia ou Hemoglobinopatia SC

Acantócitos e hemácias em alvo Hepatopatia grave

Quadro 1. Correlação entre etiologia da hemólise e achados no esfregaço de sangue periférico


Fonte: Adaptado de Brodsky, UpToDate.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO

• O diagnóstico de anemia hemolítica deve ser aventado nos pacientes com sinais e sintomas
de anemia, hemograma com níveis de hemoglobina baixos associado à reticulocitose (típicos
nesses casos, mas não específicos), provas de hemólise alteradas e esfregaço de sangue
periférico compatível.

• A história clínica detalhada e os achados ao exame físico podem sugerir etiologia específica
(Quadro 2).

Sinais e sintomas Características/etiologia da hemólise

Instalação aguda de sintomas de anemia


Hemólise aguda
na ausência de sangramento
Urina escura Hemoglobinúria – hemólise intravascular

Transfusão de sangue recente Reação transfusional hemolítica aguda

Transfusão em até quatro semanas Reação transfusional hemolítica tardia

Relação temporal com medicamento causador


Hemólise induzida por fármaco
de hemólise

Anemia hemolítica ou inexplicável em


Anemia hemolítica hereditária
familiares, especialmente de primeiro grau

História de cálculo biliar de bilirrubinato


Hemólise crônica
de cálcio

Quadro 2. Correlação entre sinais/sintomas e etiologia da hemólise.


Fonte: adaptado de Brodsky, UpToDate.

TRATAMENTO
a. TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

• Para os usuários de corticosteroides para tratamento de AHAI, dieta rica em cálcio e


exercícios de sustentação de peso regularmente auxiliam a reduzir os riscos de osteoporose e
fraturas patológicas.

b. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• O tratamento deve ser individualizado e direcionado para o tipo da anemia hemolítica.


• Os pacientes com hemólise ativa, independentemente da etiologia, devem receber
suplementação de ácido fólico (1 mg/dia, oral) para evitar anemia megaloblástica pelo alto
turnover celular.

• Nos casos de AHAI, a terapia recomenda uso de corticoide sistêmico 1-2 mg/kg/dia
(prednisona ou prednisolona), podendo também realizar pulsoterapia com metilpredinisolona
nos casos mais graves. A resposta global (Hb > 10,5 g/dL) ocorre entre duas a três semanas
em 80% dos casos, mas 40% apresentam recidiva. Após classificação da resposta, a redução
gradativa do corticosteroide deve seguir a velocidade de 10 mg/semana até a dose de 20
mg/dia. Nesta fase, reduzir 5 mg/semana e observar recidivas. A redução pode ser feita
alternando-se as doses diariamente (exemplo abaixo).

• Estudos mostram terapia com anti-CD20, rituximabe na dose de 375 mg por metro quadrado
de área de superfície corporal, associado a corticoide sistêmico com resposta superior a
monoterapia isolada. Se o rituximabe não estiver disponível, o corticosteroide deve ser
utilizado como primeira linha e, em casos de recidiva, rituximabe pode ser utilizado com
respostas semelhantes à esplenectomia. Baixas doses de rituximabe (100mg por semana por
quatro semanas) têm tido ótimos resultados com menores custos.

• Esplenectomia está descrita na literatura como possível tratamento de segunda linha, com
resposta em 70% dos pacientes a curto prazo e recidivas que variam entre 30-40%

• Pacientes que realizam esplenectomia apresentam maiores riscos de trombose e infecções;


devem ser imunizados três a quatro semanas antes da esplenectomia com as vacinas Pneumo
13, Pneumo 23, Haemophilus, Meningocócica.

• Terapias como micofenolato de mofetil, azatioprina, ciclofosfamida e ciclosporina são


citadas como tratamento de terceira linha. As taxas de resposta são difíceis de estimar devido
à baixa evidência clínica de eficácia e estudos limitados.

• 30-50% dos pacientes, em casos graves, apresentam boa resposta ao uso de Imunoglobulina
Humana IV.

• Tromboprofilaxia com heparina de baixo peso molecular é recomendada para pacientes


internados com exacerbação aguda de hemólise e deve ser considerada em pacientes
ambulatoriais durante exacerbações graves, a depender dos demais fatores de risco.

• Nos casos suspeitos de púrpura trombocitopênica trombótica (anemia microangiopática,


trombocitopenia, febre, alterações renais e neurológicas), o paciente precisa de plasmaférese
e reposição de plasma fresco congelado tão logo o diagnóstico seja firmado.

Pacientes em uso de corticosteroides devem receber terapia com inibidor da bomba de prótons pelo
maior risco de úlcera gástrica ou duodenal, bem como profilaxia de osteoporose. Devem, também, ter
pressão arterial e glicemia monitorizadas.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fluxograma 1.
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Mulher, 42 anos, 80 kg, referindo cansaço progressivo, palidez cutaneomucosa,
icterícia com evolução de duas semanas. Nega comorbidades conhecidas e uso de medicações
contínuas.

b. Exame físico: palidez 3+/4+, icterícia 1+/4+, levemente taquicárdica, sem sopros cardíacos.
Traube maciço.

c. Exames complementares: Hb 7,3 g/dL; Ht 20%; Plaquetas 120.000/mm3; Reticulócitos


absolutos 342.000/mm3 (20.000 – 100.000); Neutrófilos 8000/mm3; Esfregaço de sangue
periférico: numerosos esferócitos, anisocitose evidente, policromatofilia. Bilirrubina total 5,0
mg/dL (bilirrubina indireta 4,2 mg/dL); Ferro sérico 130 µL/dL; Ferritina 50 µL/L; Coombs direto
positivo.

d. HD: Anemia Hemolítica autoimune

e. Prescrição sugerida:

1. Enoxaparina 40 mg/0,4 mL, uma ampola, subcutânea, uma vez ao dia


2. Ácido fólico 1mg, um comprimido, via oral, uma vez ao dia
3. Omeprazol 20 mg, um comprimido, via oral, cedo em jejum, 45-60 minutos antes do café da
manhã
4. Prednisona 20 mg, quatro comprimidos, via oral, às 8h (1mg/Kg/dia)
5. Carbonato de cálcio 500mg, um comprimido, via oral, 12/12h
6. Vitamina D (colecalciferol) 7000UI, um comprimido, via oral, uma vez na semana
7. Monitorizar pressão arterial e glicemia de jejum e 2h após almoço

DICAS DO ESPECIALISTA

• Reconhecer causas potencialmente fatais de hemólise (AHAI, reações transfusionais


hemolíticas, microangiopatias) garante o sucesso do tratamento e, em muitas situações, o
manejo emergencial deverá ser realizado pelo clínico até a chegada do hematologista.

• Anemia com instalação aguda dos sintomas sem sangramentos macroscópicos e com
reticulocitose pode ser hemólise!

• Avaliar o valor absoluto dos reticulócitos (entre 20.000 e 100.000/mm3) em vez do relativo é
mais fidedigno.

• Pacientes com anemia crônica e achado de sangue periférico sugestivos de anemia


hemolítica hereditária precisam de testes específicos para o diagnóstico.

• Casos suspeitos com TAD negativo devem ser referenciados para realização de eluição ácida
de autoanticorpos em serviços especializados de imuno-hematologia.

REFERÊNCIAS
1. Brodsky RA. Diagnosis of hemolytic anemia in adults. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em 30 jun 2020]. Disponível em:
https://www.uptodate.com/contents/diagnosis-of-hemolytic-anemia-in-adults.
2. Mohandas N. Inherited hemolytic anemia: a possessive beginner’s guide. Hematology. 2018; 377-81.
3. Hill A, Hill QA. Autoimmune hemolytic anemia. Am Soc Hematol. 2018; 382-9
4. Brodsky RA. Warm autoimmune hemolytic anemia. N Engl J Med. 2019; 381: 647-54
9.6
ANEMIA FALCIFORME
Autores:
Andressa Peloso Rabelo
Martha Mariana Arruda
Iara Baldim Rabelo

INTRODUÇÃO
Doenças falciformes são doenças hereditárias causadas por uma mutação pontual num gene da
cadeia β da hemoglobina que leva à substituição de ácido glutâmico por valina na superfície externa
da cadeia β. Quando a mutação ocorre em homozigose (com o nome de anemia falciforme), há
ausência de cadeias β normais e a consequente formação de hemoglobina S (HbS). Quando há
heterozigose de HbS associada a outros defeitos no gene da cadeia β da hemoglobina (β-Talassemia,
HbC, HbD, HbG etc.), ocorre mudança na apresentação clínica e as condições passam a ser
chamadas de doenças falciformes.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O evento central da fisiopatologia da doença é a polimerização da HbS. Quando o tetrâmero
formado por HbS está desoxigenado, ocorre alteração da arquitetura do eritrócito, alterando sua
flexibilidade e promovendo desidratação celular. A reoxigenação das moléculas de hemoglobina
desfaz os polímeros e a hemácia retoma seu formato original. Ciclos repetidos de falcização e retorno
à morfologia normal lesam permanentemente a membrana eritrocitária, fazendo com que a hemácia
se torne rígida e falcizada sob qualquer tensão de oxigênio.
A vasoclusão, obstrução pré-capilar pelas hemácias falcizadas, gera inflamação, aumentando o
número de interações adesivas entre eritrócitos, leucócitos e células endoteliais. A oclusão
microvascular não é permanente e o fluxo sanguíneo é constantemente restabelecido, o que acaba
gerando lesão tecidual, já que a alternância entre isquemia e reperfusão leva à liberação de espécies
reativas de oxigênio. Além disso, ocorre aumento da expressão de moléculas de adesão nas células
endoteliais, produção de citocinas e leucocitose. Hemólise também é um importante pilar na
fisiopatologia da anemia falciforme. O sistema reticuloendotelial destrói prematuramente as
hemácias que já foram danificadas de forma definitiva pelos ciclos de falcização, e a hemólise
intravascular responde por cerca de 30% da hemólise total. Hemoglobina livre no plasma consome
óxido nítrico, molécula responsável pelo relaxamento da musculatura lisa vascular e inibidora da
ativação e agregação plaquetária e da formação de mediadores pró-inflamatórios, proliferativos e
pró-oxidantes no endotélio vascular. A redução de sua concentração é responsável pela importante
disfunção endotelial e pelo estado pró-trombótico observados nas doenças falciformes.
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
a. Hemograma: queda moderada da hemoglobina e do hematócrito; leucócitos normais ou
elevados à custa de neutrófilos, plaquetas normais ou elevadas.

b. Reticulocitose: absoluta e relativa.

c. Hiperbilirrubinemia indireta e lactato desidrogenase elevada: por ser uma anemia


hemolítica crônica.

d. Esfregaço de sangue periférico: hemácias em foice, policromasia, corpúsculos de Howell-


Jolly (asplenia), eritroblastos circulantes.

e. Eletroforese de hemoglobinas: exame confirmatório (HbS > 90% na anemia falciforme).

f. Teste do pezinho: exame de rastreio neonatal.

QUADRO CLÍNICO
As manifestações clínicas da anemia falciforme não estão presentes no nascimento devido à alta
concentração de hemoglobina fetal (HbF). Com o declínio da concentração de HbF e aumento da
concentração de HbS, as hemácias falcizadas já são vistas em esfregaços de sangue periférico aos três
meses de idade e os primeiros sinais de anemia hemolítica podem surgir por volta dos quatro meses.
Dependendo da herança genética, a quantidade de HbS no eritrócito pode ser variável, assim
como o quadro clínico, havendo desde portadores assintomáticos a indivíduos com internações
hospitalares recorrentes devido às complicações da doença. A mais comum é a crise vasoclusiva,
predominando em ossos e articulações e levando, muitas vezes, à internação para receber analgesia
parenteral, além de, quando muito recorrentes, levar a lesões de órgão-alvo.
O quadro clínico é basicamente composto de anemia geralmente com hemoglobina entre 7 e 10
mg/dL, icterícia devido à hemólise crônica à custa de bilirrubina indireta e asplenia funcional na vida
adulta devido a microinfartos esplênicos durante a infância. O indivíduo irá apresentar quadros
pontuados por crises álgicas recorrentes devido à vasoclusão, além de lesões de órgãos-alvo que
serão pormenorizados nos próximos tópicos.

a. MANIFESTAÇÕES AGUDAS

• Crises vasoclusivas:
Episódios de crises vasoclusivas ou simplesmente crises de dor são associadas a aumento da
morbidade e até da mortalidade quando acontecem três ou mais vezes ao ano. A dor é de forte
intensidade, latejante ou em pontadas, geralmente em membros inferiores, joelhos, braços, peito e
menos comumente no abdome; não há sinais objetivos ao exame físico que a expliquem. Podem ser
desencadeadas por estresse emocional, ingestão de álcool, infecção, desidratação, hipoxemia e
mudança climática. A maioria das crises não tem um fator precipitante identificável, mas é
obrigatória a investigação de foco infeccioso. O paciente deve ser avaliado à admissão e
periodicamente após o início do tratamento analgésico, até o alívio completo do quadro. O tratamento
consiste em ANALGESIA e HIDRATAÇÃO. As drogas utilizadas na analgesia são divididas em não
opioides (dipirona, paracetamol, antiinflamatórios não esteroidais – AINEs, agentes tópicos e
corticosteroides), opioides e adjuvantes. Deve-se associar analgésicos de várias classes, como
paracetamol (0,3 a 0,6 g até 4 em 4 horas), dipirona (1 g até 4 em 4 horas) e morfina (ataque de 0,1
mg por kg IV a cada 20 min até controle álgico ou sedação e manutenção oral ou subcutânea de 4 em
4 horas). Medidas voltadas para reduzir a morbimortalidade da doença falciforme, como vacinação
estendida, antibioticoterapia profilática em crianças, uso de Hidroxiureia e regime de transfusão
crônica, geralmente têm o potencial de reduzir a frequência das crises.

• AVC:
O acidente vascular encefálico é a segunda maior causa de óbito em portadores de anemia
falciforme, e os eventos vasculares cerebrais são extremamente heterogêneos. Podem ocorrer
acidentes vasculares encefálicos (AVE), ataques isquêmicos transitórios (AIT) e infartos cerebrais
silenciosos, sendo que esses últimos levam a importante prejuízo neurocognitivo. Os sinais e
sintomas não diferem daqueles apresentados por indivíduos saudáveis. Os eventos isquêmicos
ocorrem mais na infância e após os 30 anos, enquanto os de natureza hemorrágica ocorrem na faixa
etária dos 20 aos 29 anos, muito relacionados à doença de Moyamoya (hiperproliferação de
circulação colateral a partir de uma artéria cerebral estenosada). O tratamento com hidroxiureia é
pilar da profilaxia.
No déficit neurológico agudo (AVC isquêmico, AIT), o tratamento deve ser instituído através de
pronta hemotransfusão de troca com objetivo de reduzir a HbS < 30% em, no máximo, até 2 horas
após a chegada ao hospital.

• Sequestro esplênico:
Sequestro esplênico pode ser definido como queda súbita nos níveis de hemoglobina (20% do
basal) acompanhada por aumento da reticulocitose com sinais de hipovolemia. No adulto com
anemia falciforme, não costuma ocorrer sequestro, pois é frequente a fibrose esplênica secundária a
múltiplos infartos após os 5 anos de idade. Os pacientes devem ser vacinados contra pneumococo,
hemófilo e meningococo, assim como devem receber profilaxia com penicilina na primeira infância.

• Síndrome torácica aguda:


É definida como a presença de infiltrados pulmonares novos à radiografia de tórax associados à
febre, tosse, dor torácica, secreção purulenta, dispneia ou hipoxemia, e é a principal causa de
mortalidade na anemia falciforme. Na infância, a principal causa é infecciosa, e na fase adulta é a
embolia gordurosa. O tratamento é feito através de oxigenioterapia suplementar com objetivo de
manter a saturação de oxigênio > 92%, analgesia, transfusão e antibioticoterapia empírica com
cobertura para o Pneumococo, Gram-negativos respiratórios e germes atípicos (maiores responsáveis
pelos quadros de infecção respiratória nesta situação).

Priaprismo:
Urgência urológica que corresponde a ereção involuntária e dolorosa, impedindo a drenagem
sanguínea do pênis. O tratamento é realizado através de analgesia vigorosa e hidratação, havendo
casos em que há necessidade de aspiração percutânea do corpo cavernoso ou shunt. Quando muito
persistente e recorrente, a profilaxia deve ser feita com estrógenos, Hidroxiureia ou, em alguns casos,
hemotransfusão de troca seriadas visando manter HbS < 30-50%. O quadro pode levar à impotência
sexual permanente se não devidamente tratado.

Crise aplásica:
Complicação desencadeada pela infecção pelo Parvovírus B19, que leva à supressão transitória da
produção eritropoietina, que tem potencial de gerar anemia grave em pacientes portadores de
hemólise crônica, dependentes de reticulocitose para manutenção da hemoglobina. Os pacientes
apresentam febre, dispneia, taquicardia e reticulocitopenia. O quadro geralmente é transitório e
pacientes sintomáticos devem ser submetidos à transfusão sanguínea simples.

b. COMPLICAÇÕES CRÔNICAS
Diversos órgãos e sistemas são afetados na anemia falciforme. O coração sofre as consequências
de um estado crônico de alto débito cardíaco secundário à anemia, que provoca alterações
morfológicas e fisiológicas, como septo interventricular espessado e massa ventricular esquerda
aumentada. O impacto dessas alterações cardíacas não foi bem elucidado, mas postula-se que elas
possam contribuir para a alta incidência de morte súbita observada nesses pacientes. Necropsias já
evidenciaram infartos do miocárdio sem evidência de lesões obstrutivas ou ateroscleróticas em
artérias coronárias, e a explicação parece residir em demanda aumentada de oxigênio pelo miocárdio
e associada à capacidade limitada de carreamento desse gás.
A microvasculatura pulmonar é suscetível a complicações importantes, que podem ser agudas
(englobadas na STA) ou crônicas, sendo essas últimas representadas por anormalidades na função
pulmonar, hipoxemia crônica, hipertensão pulmonar, fibrose intersticial difusa e cor pulmonale. A
hipertensão pulmonar decorre do consumo de óxido nítrico, trombose in situ e embolia. É verificada
em até 11% dos doentes e é fator de risco independente para morte. Os sintomas não são específicos
e incluem dispneia crônica, dor torácica, pré-síncope, tolerância diminuída a atividades de vida diária
e exercícios. O diagnóstico é estabelecido através de ecocardiografia transtorácica com doppler ou
cateterização de artéria pulmonar por arteriografia. Outras desordens respiratórias observadas em
indivíduos com anemia falciforme são asma, distúrbios do sono e fibrose pulmonar.
Envolvimento renal também é comum. Hiperfiltração (taxa de filtração glomerular > 130
mL/min/1,73 m2 em mulheres e > 140 em homens) parece ser o primeiro passo na história natural da
nefropatia falciforme, sendo observada em até 90% dos pacientes adultos. Microalbuminúria acomete
50% dos pacientes adultos e tem sido utilizada como marcador precoce de evolução para
glomerulopatia. Cerca de 20% desenvolvem algum grau de insuficiência renal sintomática. Outras
complicações observadas são hematúria, diabete insípido nefrogênico, hipertensão, síndrome
nefrótica, necrose papilar e infarto renal.
Os olhos podem apresentar lesões em todas as suas câmaras e são possíveis complicações:
glaucoma, por obstrução da malha trabecular que impede o escoamento do humor aquoso; retinopatia
proliferativa falciforme, em virtude da neoangiogênese pela retina isquêmica; hemorragia vítrea,
resultado do estresse mecânico nos delgados neovasos que crescem da retina em direção à câmara
vítrea; e descolamento de retina, como sequela de retinopatia avançada.
Na verdade, nenhum leito vascular escapa das consequências da falcização eritrocítica. Ocorrem
ainda necrose avascular de ossos (cabeças do fêmur e do úmero parecem ser mais afetadas), úlceras
de membros inferiores, osteomielite, osteopenia e osteoporose, todas decorrentes da associação de
vasoclusão, hemólise e isquemia tecidual. Crianças falciformes apresentam um marcante atraso de
crescimento e desenvolvimento. A altura normal é alcançada na idade adulta, enquanto o peso
permanece inferior ao observado em indivíduos sem a doença. A maturação sexual também é
atrasada. Nutrição hipossuficiente, função endócrina anormal (hipogonadismo primário,
hipopituitarismo e insuficiência hipotalâmica) e, principalmente, aumento das necessidades calóricas
devido ao elevado gasto energético.
Por fim, não se deve esquecer do impacto que o estresse de viver com uma doença crônica pode
trazer aos indivíduos e que pode resultar em isolamento social, baixa autoestima, relacionamentos
familiares problemáticos, rotina diária comprometida com redução da qualidade de vida, estratégias
inadequadas de enfrentamento da dor, ansiedade, depressão e comprometimento neurocognitivo.

TRATAMENTO

• Profilaxia infecciosa: com penicilina oral ou intramuscular até os 5 anos de idade.


• Transfusão sanguínea: em casos selecionados para profilaxia primária ou secundária do
AVC, fase aguda do AVC, anemia sintomática grave, crise aplásica ou de sequestro
esplênico, STA. Importante não elevar a Hb para valores acima de 10 g/dL.

• Hidroxiureia: eleva a produção de hemoglobina fetal, aumenta óxido nítrico, reduz


leucocitose, plaquetose, adesão leucocitária, inflamação. Atualmente indicada para todos os
pacientes com Anemia Falciforme fora de programa de transfusão crônica, por ser medida
que reduz a mortalidade.

• US com doppler transcraniano: dos 2 aos 16 anos de idade, para estabelecer o risco de
ocorrência de AVC.

• Profilaxia primária e secundária de AVC: através de transfusão sanguínea ou


Hidroxiureia em casos selecionados.

• Quelantes de ferro: pacientes submetidos a múltiplas transfusões evoluem com sobrecarga


de ferro transfusional. Deve-se dosar a Ferritina a cada 3 meses e iniciar quelante de ferro
quando seu valor estiver acima de 1.000 ng/mL, especialmente com índice de saturação de
Transferrina elevado > 50%.

• Vacinação contra o vírus da Hepatite B, Haemophilus, Influenza, Pneumococo,


Meningococo.

• Ácido fólico: para evitar a anemia megalobástica.


• Exame oftalmológico anual.
• Ecocardiograma: para avaliação de hipertensão pulmonar e função cardíaca.
• Ultrassonografia de abdome: para avaliação de cálculos biliares. Pacientes com
colecistite crônica calculosa devem ser submertidos à colecistectomia eletiva mesmo se
assintomáticos, com o objetivo de evitar cirurgia de emergência.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 27 anos, portador de anemia falciforme,
medicação, dá entrada no PS com quadro de dor intensa em região de MMII de forte intensidade,
tipo latejante. Refere quadro semelhante há cerca de 1 ano.

b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: PA 150 x 80 mmHg, FC 105 bpm, FR 20 rpm, sudorese profusa, saturação de


oxigênio 94% em ar ambiente.

• Tórax: MV sem RA, RCR em 2T.


• Abdome: RHA presentes, abdome livre.
• Membros: edema de MMII 1+/4+, pulsos pediosos presentes e simétricos, sem
empastamento de panturrilhas, sinal da bandeira positivo.

c. Exames complementares: Hb: 9,8 mg/d, leucócitos totais: 13.500, neutrófilos 10.000;
bilirrubina indireta: 1,5; DHL: 400.

d. HIPÓTESE DIAGNÓSTICA: CRISE VASOCLUSIVA

e. Prescrição sugerida:

1. Dieta oral livre.


2. Hidratação: aumentar ingesta hídrica e realizar o balanço hídrico mantendo o paciente
EUVOLÊMICO (evitando hiper ou hipovolemia). Se necessário, reposição com solução
fisiológica 50 mL/kg nas primeiras 24h e 25 mL/kg/dia a partir daí.
3. Analgesia:

• Dipirona 1 g VO ou IV 6/6 horas OU Paracetamol 750 mg VO 8/8h.


• Anti-inflamatório não-esteroidal oral ou venoso.
• Os pacientes são orientados a buscar o hospital apenas com dor não controlada em casa
com Codeína ou Tramadol + Paracetamol ou Dipirona, geralmente EVA > 6. Neste caso,
não se recomenda manter Codeína ou Tramadol, e sim substituir essas drogas por Morfina
ou outro opioide forte. Não se recomenda utilizar Dolantina pelo seu alto risco de adição,
ou Morfina venosa “se necessário”, sem dose fixa, na presença de dor contínua. À
admissão, até controle da dor, utilizar Morfina 0,1 mg/kg a cada 20-30 minutos, venosa.
Após, converter a dose venosa total utilizada para oral ou subcutânea (multiplicar por 3) e
manter Morfina oral ou subcutânea contínua (com intervalos respeitando a meia-vida da
droga, ou seja, de 4/4h) e morfina venosa SOS em intervalos curtos (1/1h ou 2/2h) para
resgate, além da manutenção de analgésico central (Paracetamol ou Dipirona). Após 24h,
recalcular a dose da morfina oral a partir do uso de morfina total, lembrando da
equivalência (1 mg venosa = 3 mg oral).
4. Oxigenioterapia suplementar se saturação de oxigênio menor que 92%.
5. Investigar fatores desencadeantes, como infecção (Urina 1, hemocultura, urocultura,
radiografia de tórax...), hipotermia, desidratação, ingestão alcoólica ou estresse emocional.
6. Radiografia de tórax: na presença de infiltrado pulmonar novo, caracteriza-se Síndrome
Torácica Aguda. Neste caso, iniciar antibioticoterapia para Pneumonia da comunidade, com
cobertura para Pneumococo, Gram-negativos e germes atípicos.
7. Ácido fólico 1 mg ao dia.
8. Fisioterapia respiratória contínua.

DICAS DO ESPECIALISTA
Hidroxiureia constitui terapia que modificou a história natural da doença, reduzindo
significativamente morbidade e mortalidade, devendo ser oferecida para todos os pacientes com
Anemia Falciforme.
Transfusão simples é indicada em casos de anemia grave (exemplo: com hemoglobina < 5 g/dL
ou queda de 20% da hemoglobina basal), crise hemolítica, crise de sequestro esplênico ou crise
aplásica. A transfusão de troca é indicada na profilaxia primária ou secundária do AVC, e é primeira
escolha em caso de priapismo, síndrome torácica aguda e colestase intra-hepática falciforme. Trata-se
de flebotomia (nos moldes da doação de sangue) intercalada com transfusão de hemácias, com o
objetivo de baixar a HbS para 30-50%. Este procedimento também pode ser realizado por
processadoras automatizadas.

REFERÊNCIAS
1. Carden MA, Little J. Emerging disease-modifying therapies for sickle cell disease. Haematologica. 2019; 104(9): 1-10.
2. EWare R, de Montalembert M, Tshilolo L, Abboud MR. Sickle cell disease. Lancet. 2017; 390(10091): 311-323.
3. Piel FB, Steinberg MH, Rees DC. Sickle cell disease. N Engl J Med. 2017; 376(16): 1561-73.
4. DeBaun MR, Jordan LC, King AA, Schatz J, Vichinsky E, Fox CK, et al. American Society of Hematology 2020 guidelines
for sickle cell disease: prevention, diagnosis and treatment of cerebrovascular disease in children and adults. Blood Adv.
2020; 4(8): 1554-88.
5. Vichinsky EP. Overiew of the clinical manifestations of sickle cell disease. UpToDate. [Internet]; 2020. [acesso em 30 jun
2020]. Disponível em:https://www.uptodate.com/contents/overview-of-the-clinical-manifestations-of-sickle-cell-disease.
9.7
NEUTROPENIA FEBRIL
Autores:
Thiago Xavier Carneiro
Amanda Lopes Maia Rodrigues
Daniel Macêdo do Nascimento

DEFINIÇÕES

• A neutropenia é definida por uma contagem absoluta de neutrófilos menor que 1000
células/mL (ou /mm3), neutropenia grave menor que 500 células/mL e neutropenia profunda
ou muito grave, menor que 100 células/mL.

• A febre em pacientes neutropênicos é caracterizada como uma única temperatura oral maior
ou igual a 38,3°C ou uma temperatura de pelo menos 38,0°C mantida por mais de 1 hora.
Não há descrição exata para temperatura axilar.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

• As infecções documentadas compreendem apenas aproximadamente 30% dos casos. No


entanto, as infecções são a principal causa de morbimortalidade em pacientes com câncer
que apresentam febre e neutropenia.

• A maioria das infecções é bacteriana, mas a etiologia viral ou fúngica é possível. Os


patógenos bacterianos comuns incluem bactérias gram-positivas, como Staphylococcus,
Streptococcus e Enterococcus. Organismos resistentes a medicamentos, incluindo as
espécies Pseudomonas aeruginosa, Acinetobacter, Stenotrophomonas maltophilia,
Escherichia coli e Klebsiella, também foram identificados como agentes infecciosos. Maior
letalidade ocorre em infecções por agentes gram-negativos.

QUADRO CLÍNICO

• Os sinais e sintomas podem ser pouco expressivos ou ausentes nos pacientes neutropênicos
febris. Alguns achados mais comuns incluem: disúria, diarreia, dor abdominal, alterações
cutâneas, corrimento vaginal, calafrios e odinofagia. O histórico médico detalhado do
paciente deve ser avaliado, incluindo tratamento antibiótico recente, histórico cirúrgico,
comorbidades subjacentes e exames microbiológicos positivos passados.

EXAME FÍSICO

• Os pacientes são inicialmente investigados quanto à infecção em locais de procedimentos ou


cateteres anteriores, bem como na pele, trato alimentar, orofaringe, trato gastrointestinal,
pulmões, região geniturinária e sistema respiratório.

EXAMES COMPLEMENTARES

• Incluem contagens completas de células sanguíneas com diferenciais de leucócitos,


hemoglobina e plaquetas; eletrólitos séricos, creatinina sérica, ureia e concentração sérica de
lactato; transaminases hepáticas, bilirrubina total; e fosfatase alcalina.

• São recomendados pelo menos duas colegas de hemoculturas de locais anatômicos


diferentes, incluindo de um cateter venoso central e de uma veia periférica. No entanto, duas
coletas de culturas podem ser retirados de punções venosas separadas para a detecção de
patógenos da corrente sanguínea caso o paciente não tenha acesso venoso central.

• Outros locais de cultura, como urina, trato respiratório, fezes ou feridas cutâneas, podem ser
solicitados de acordo com a clínica.

• A radiografia de tórax pode ser indicada se houver sinais e sintomas de infecção respiratória.
• Pacientes com síndrome gripal sugestiva de influenza, diante da sazonalidade local, devem
coletar swab de nasofaringe. Em alguns casos, pode ser considerado um painel viral
expandido para detecção de outros vírus respiratórios.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO

• O julgamento clínico deve ser o principal indicador para selecionar pacientes candidatos ao
tratamento ambulatorial. O índice da Associação Multinacional de Cuidados de Suporte em
Câncer (MASCC; Tabela 1) e o escore de Talcott’s (Tabela 2) são instrumentos para auxiliar
na avaliação inicial.

• O Índice Clínico de Estabilidade para Neutropenia Febril (CISNE; Tabela 3) pode ser
utilizado para determinar risco maior de complicações dentre pacientes com tumores sólidos,
os quais tenham sido submetidos à quimioterapia de média ou alta itensidade.
• Pacientes infectados por patógenos gram-negativos resistentes à fluoroquinolonas e beta-
lactâmicos/cefalosporinas devem ser tratados em regime hospitalar, com esquemas baseados
em carbapenêmicos, em geral com múltiplas doses ao dia. Da mesma forma, pacientes
suspeitos ou infectados por Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA),
Enterococo resistente à vancomicina (VRE) ou Stenotrophomonas maltophilia devem ser
considerados para tratamento hospitalar.

• Pacientes sendo submetidos à terapia de indução para leucemia aguda ou a transplante de


células-tronco hematopoiéticas são candidatos pouco prováveis para tratamento
ambulatorial.

• Algumas medidas devem ser adotadas para pacientes candidatos ao tratamento ambulatorial:
avaliações frequentes nos primeiros três dias, em casa ou no hospital; contato telefônico
diário para monitoramento da temperatura; e retornos frequentes para dosagem da contagem
de neutrófilos e plaquetas, avaliando a recuperação medular.

• Deve ser considerada admissão hospitalar diante dos seguintes eventos: ausência de
defervescência após 2-3 dias da terapia antimicrobiana empírica; recorrência da febre após
período de defervescência; novos sinais ou sintomas de infecção; impossibilidade de manter
medicação oral; necessidade de mudança no esquema antimicrobiano inicial; e/ou testes
microbiológicos identificando agentes resistentes ao esquema antimicrobiano vigente.

• Em pacientes candidatos ao regime ambulatorial, a primeira dose do antimicrobiano


empírico deve ser administrada no ambiente hospitalar, após documentação da febre e coleta
de culturas.

Critérios Pontuação

Sintomas ausentes ou leves 5

Ausência de hipotensão (PAS >= 90) 5

Ausência de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) 4

Neoplasia não-hematológica ou ausência de infecção fúngica prévia 4

Ausência de desidratação 3

Sintomas moderados 3

Febre de origem ambulatorial 3

Idade < 60 anos 2

Baixo risco: ≥ 21 pontos. Alto risco: < 21 pontos.


Tabela 1. Índice da Associação Multinacional de Cuidados de Suporte em Câncer (MASCC) para
estratificação do risco de complicações em pacientes com neutropenia febril.
Fonte: Adaptado de Freifeld.

Grupo Características

I Paciente internado no momento do início da febre

II Paciente ambulatorial com comorbidade, a qual, por si, necessita de internação

III Paciente ambulatorial, sem comorbidade, mas sem controle da neoplasia

IV Paciente ambulatorial, com controle da neoplasia e sem comorbidade

Grupo IV: baixo risco.

Tabela 2. Escore de Talcott’s.


Fonte: adaptado de Freifeld.

Variáveis Pontuação

Performance Status (ECOG) ≥ 2 2

Doença pulmonar obstrutiva crônica 1

Doença crônica cardiovascular 1

Mucosite estágio ≥ 2 1

Monócitos < 200/µL 1

Hiperglicemia induzida por estresse 2

Baixo risco: 0 pontos; risco intermediário: 1-2 pontos; alto risco: ≥ 3 pontos.

Tabela 3. Índice Clínico de Estabilidade para Neutropenia Febril (CISNE).


Fonte: adaptado de Freifeld.

TRATAMENTO

• A primeira dose da terapia empírica deve ser administrada em até uma hora da apresentação
inicial do paciente ao serviço.
• Pacientes ambulatoriais: terapia empírica oral com fluoroquinolona (ciprofloxacino ou
levofloxacino) em associação com amoxicilina/clavulanato (ou clindamicina para pacientes
alérgicos à penicilina).

• Pacientes internados: monoterapia com beta-lactâmicos com ação antipseudomonas (por


exemplo, cefepima), carbapenêmicos (meropenem, imipenem) ou piperacilina-tazobactam.

• O tratamento inicial com vancomicina e outros antibióticos eficazes contra cocos gram-
positivos não é recomendado como tratamento antibiótico empírico padrão. No entanto,
esses agentes podem ser considerados se houver suspeita de infecção relacionada ao cateter,
infecção de pele ou tecidos moles, pneumonia, instabilidade hemodinâmica ou resistência a
antibióticos.

• O esquema inicial proposto pode ser modificado em pacientes com forte suspeita de infecção
pelos seguintes microrganismos resistentes aos antibióticos (ex.: pacientes com infecção
documentada prévia por tais microrganismos), pacientes instáveis e pacientes com cultura
suspeita para infecção por esses agentes.
• Suspeita de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA): incluir adição precoce
de vancomicina, linezolida ou daptomicina (na ausência de suspeita de pneumonia)
• Suspeita de enterococo resistente à vancomicina (VRE): adicionar linezolida ou
daptomicina.
• Suspeita de bactérias gram-negativas produtoras de beta-lactamase de espectro estendido
(ESBL): uso precoce de carbapenêmicos.
• Suspeita de Klebsiella pneumoniae produtoras de carbapenemase (KPC): adição de
polimixina-colistina ou tigeciclina.

• Terapia antifúngica empírica é recomendada para pacientes que continuam com febre
persistente de causa não identificada após 4 a 7 dias de tratamento com antibióticos e que
apresentam neutropenia com expectativa de duração superior a 7 dias. No entanto, existem
dados insuficientes para determinar qual agente antifúngico é mais apropriado.

• O tratamento é necessário até que o paciente fique afebril por pelo menos 48 horas,
clinicamente estável, com resolução da neutropenia (pelo menos 500 neutrófilos por
microlitro) e tenha hemoculturas negativas. Para pacientes com infecções documentadas, a
duração do tratamento pode ser decidida pelo organismo e pelo local da infecção. Os
antibióticos mais utilizados nos pacientes ambulatoriais e internados estão nas Tabelas 4 e 5.

Droga Apresentações Dose


Penicilina + inibidores de - -
beta-lactamase
1cp 500 + 125 mg, de 8/8h ou
Amoxicilina+ clavulanato 500 + 125 mg (cp), 875 + 125 mg (cp)
1cp 875 + 125 mg, de 12/12h

Fluoroquinolonas - -

Ciprofloxacino 250, 500 ou 750 mg (cp) – 750 mg, de 12/12h

Levofloxacino 250, 500 ou 750 mg (cp) 500 – 750 mg, 1 vez ao dia

Licosaminas - -

300 mg, de 12/12h ou 600 mg,


Clindamicina 300 mg (cp)
de 8/8h VO

* Efeitos colaterais: nefrotoxicidade (amoxicilina-clavulanato e quinolonas podem precisar de ajuste de dose),


náuseas/vômitos/diarreia (amoxicilina-clavulanato), tendinopatia, artralgias, neuropatias periféricas e alterações ósseas
e dentárias (quinolonas), colite pseudomembranosa (clindamicina).

Tabela 4. Antibióticos utilizados em pacientes ambulatoriais.


Fonte: Adaptada de Klastersky.

Droga Apresentações Dose

Cefalosporina de
- -
4º geração

Pó para solução injetável 1-2g, EV, de 12/12h


Cefepime
500 mg, 1 g e 2 g ou de 8/8h

Carbapenêmicos - -

Pó para solução injetável 500 mg – 1 g, EV,


Meropenem
500 mg, 1 g e 2 g de 8/8h

500 mg, EV, de 8/8h


Pó para solução injetável
Imipenem ou de 6/6h
500 mg
ou 1g, EV, de 8/8h

Penicilinas + inibidores
Pó para solução injetável 2 g/250 mg
de Betalactamase: 2 - 4g, EV, de 8/8h
e 4 g/500 mg
Piperacilina-tazobactam

Glicopeptídeos: Pó para solução injetável 500 mg 500 mg, de 6/6h ou 1 g,


Vancomicina e1g de 12/12h
Droga Apresentações Dose

Oxazolidinona: 600 mg (cp) ou 2 mg/mL 600 mg, VO ou EV,


Linezolida (solução injetável) de 12/12h

Aminoglicosídeos - -

Gentamicina 10, 20, 40, 80 e 280 mg/ml (amp) 3 – 5 mg/kg/dia

7,5 mg/kg, de 12/12h ou


Amicacina 250 e 500 mg/ml (amp)
5 mg/kg, de 8/8h

500.000. 1.000.000 ou 1.500.00 UI 15.000 - 25.000 UI/kg/dia, de


Polimixina B
(pó para solução injetável) 12/12h

* Efeitos colaterais: nefrotoxicidade (praticamente todas as classes de antibióticos citadas necessitam de ajuste de dose
de acordo com a função renal), neurotoxicidade (imipenem, amicacina, polimixina B), citopenias (aminoglicosídeos,
carbapenêmicos, piperacilina- tazobactam), distúrbios hidroeletrolíticos (hipernatremia e hipocalemia, no caso de
piperacilina-tazobactam), colite pseudomembranosa (vancomicina), síndrome do homem vermelho (vancomicina).

Tabela 5. Antibióticos utilizados em pacientes internados.


Fonte: adaptada de Klastersky.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Adaptado de Taplitz.1

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso clínico: Paciente do sexo masculino, 61 anos, 70 kg, internado no 7° dia após 1° ciclo de
quimioterapia para tratamento de leucemia mieloide aguda. Evoluiu há 1 dia com febre, dispneia e
confusão mental, além do surgimento de múltiplas equimoses pelos membros.

b. Exames Físicos:

• Ectoscopia: regular estado geral, confuso, pouco contactante, PA 100 x 60 mmHg, FC 130
bpm, FR 25 rpm, Tax 39,2°C, Sat O2: 92% extremidades frias, sudoreico, pulso fraco, tempo
de enchimento capilar de 3 segundos.

• Tórax: MV com estertores creptantes em bases pulmonares, BCNF em 2T sem sopros.


• Abdome: RHA presentes, sem alterações à percussão e palpação.
• Membros: edema de MMII +/4+, pulsos pediosos fracos, porém simétricos, múltiplas
equimoses.

c. Exames complementares: Hemograma evidenciou Hb: 5,5; Leucócitos totais: 1500


(neutrófilos: 250), plaquetas: 5000. Radiografia de tórax mostra hipotransparência de bases
pulmonares bilateralmente.

d. Prescrição sugerida:

1. Dieta zero
2. O2 inalatório em máscara de alto fluxo
3. SF 0,9% 2 L- Fazer EV em CVC
4. Concentrados de Hemácias 2U filtradas e irradiadas EV
5. Concentrados de Plaquetas 7U filtradas e irradiadas EV
6. Cefepime 2 g – Fazer EV de 8/8h

DICAS DO ESPECIALISTA

• O uso de antimicrobianos com ação contra gram-negativos, incluindo Pseudomonas sp., é a


principal medida para controle de casos graves. O uso de vancomicina como agente empírico
não deve ser rotineiro.

• A febre não deve ser o único parâmetro a ser considerado para iniciar antimicrobianos. Da
mesma forma, pacientes estáveis, com boa evolução não devem ter o tratamento ampliado
simplesmente porque ainda estão com febre. O desaparecimento da febre pode ser tardio em
alguns casos.
• A descoberta do agente infeccioso é fundamental. Adequado serviço de microbiologia para
bactérias e fungos pode estar vinculado a adequado tratamento do paciente. Pacientes com
quadro pulmonar podem precisar de lavado broncoalveolar para determinação diagnóstica.

• Pacientes em tratamento empírico, com melhora clínica e sem febre podem ter seu
tratamento suspenso com 7 a 10 dias, mesmo que ainda neutropênicos.

REFERÊNCIAS
1. Taplitz RA, Kennedy EB, Bow EJ, Crews J, Gleason C, Hawley DK, et al. Outpatient Management of Fever and
Neutropenia in Adults Treated for Malignancy: American Society of Clinical Oncology and Infectious Diseases Society of
America Clinical Practice Guideline Update. J Clin Oncol. 2018; 36(14): 1443-53.
2. Klastersky J, de Naurois J, Rolston K, Rapoport B, Maschmeyer G, Aapro M, et al; ESMO Guidelines Committee.
Management of febrile neutropaenia: ESMO Clinical Practice Guidelines. Ann Oncol. 2016; 27(suppl 5): v111-v18.
3. NCCN Clinical Practice Guidelines in Oncology. Prevention and Treatment of Cancer-Related Infections, version 2. 2017.
National Cancer Comprehensive Network website. [Internet]; 2017. [acesso em 27 set 2017]. Disponível em:
www.nccn.org/professionals/physician_gls/PDF/infections.pdf.
4. Freifeld AG, Bow EJ, Sepkowitz KA, Boeckh MJ, Ito JI, Mullen CA, et al; Infectious Diseases Society of America. Clinical
practice guideline for the use of antimicrobial agents in neutropenic patients with cancer: 2010 update by the Infectious
Diseases Society of America. Clin Infect Dis. 2011; 52(4): e56-e93.
9.8
INDICAÇÕES E REAÇÕES
TRANSFUSIONAIS
Autores:
Carlos Eduardo E. Velano
Hugo Edgar Silva

DEFINIÇÕES

• Hemoderivados: produtos oriundos do sangue total ou do plasma, obtidos por meio de


processamento físico-químico ou biotecnológico, como soluções de albumina,
imunoglobulinas e fatores de coagulação.

• Hemocomponentes: produtos oriundos do sangue total ou do plasma, obtidos por meio de


processamento físico, como concentrado de hemácias, plaquetas, plasma fresco congelado,
concentrado de granulócitos e crioprecipitado.

• Reação transfusional: toda e qualquer intercorrência que ocorra como consequência da


transfusão de hemoderivados e hemocomponentes, durante ou após a sua administração.
Podem ser classificadas em imediatas (até 24 horas da transfusão) e tardias (após 24 horas
da transfusão), e também como imunológicas ou não imunológicas.

a. INFORMAÇÕES BÁSICAS DOS PRINCIPAIS HEMOCOMPONENTES E


INDICAÇÕES TRANSFUSIONAIS

• Concentrado de hemácias (CH)


• Possui volume médio de 200 a 350 mL e tem hematócrito de 55 a 80%.
• Espera-se que uma unidade de CH aumente a hemoglobina de um paciente adulto em 1
g/dL ou o hematócrito em aproximadamente 3%.

• Principais indicações:
• Anemia aguda associada à hipovolemia com perda sanguínea estimada acima de 30%,
após ressuscitação volêmica com cristaloide.
• Perdas sanguíneas com hemoglobina abaixo de 7 g/dL ou abaixo de 8 g/dL em pacientes
portadores de cardiopatia ou hipóxia (avaliação individual).
• Pré-operatório se hemoglobina abaixo de 8 g/dL em casos de cirurgias cardíacas,
ortopédicas e em pacientes coronariopatas.
• Portadores de talassemia major ou hemoglobinopatias em situações emergenciais (como
transfusão de troca em isquemias graves na anemia falciforme, por exemplo).
• Pacientes em químio ou radioterapia com anemia sintomática.
• Eritrocitoaférese.
A Associação Americana de Bancos de Sangue (AABB) recomenda atualmente a adoção de
estratégias restritivas de transfusão de hemácias em relacão à estratégia liberal, que não é indicada até
o nível de hemoglobina de 7 g/dL para pacientes adultos hospitalizados com estabilidade
hemodinâmica, incluindo pacientes críticos.

• Tipos de concentrados de hemácias:


• Concentrado de hemácias lavadas é obtido a partir da retirada do plasma através de
ressuspensão em solução salina estéril. Está indicado em pacientes com história de
reação anafilática em transfusão pregressa e em casos de deficiência congênita de IgA.
• Concentrado de hemácias filtradas ou deleucotizadas é obtido usualmente pela
remoção de leucócitos através de filtros específicos e deve conter menos que 5 x 106
leucócitos por unidade. Está indicado especialmente na prevenção de reação
transfusional febril não hemolítica em pacientes politransfundidos e para redução do
risco de transmissão transfusional de citomegalovírus em pacientes imunossuprimidos
e/ou submetidos a transplante de células-tronco hematopoeticas, bem como situações de
insuficiência medular como leucemias agudas e anemia aplásica.
• Concentrados de hemácias irradiadas são os submetidos à radioterapia com dose
específica com o objetivo principal de prevenir a doença do enxerto versus hospedeiro
transfusional. As indicações habituais são pacientes transplantados ou portadores de
doenças onco-hematológicas em quimioterapia (como leucemias ou linfomas), doadores
consanguíneos (parentes de primeiro grau), portadores de imunodeficiência congênita,
portadores de anemia aplásica, transfusão intrauterina ou exsanguíneo-transfusão.

• Plasma fresco congelado (PFC)


• O plasma é separado de uma unidade de sangue total (em torno de 200 mL) por
centrifugação e deve ser congelado em até 6 horas após a coleta a -40° C.
• O PFC contém todos os fatores de coagulação em quantidade próximas das normais.

• Indicações:
→ Deficiência de um ou mais fatores de coagulação; congênita ou adquirida, em pacientes
com sangramento ativo (quando não se tem fator de coagulação industrializado disponível).
→ Hemorragia ativa por deficiência de fatores de coagulação devido à insuficiência
hepática.
→ Pacientes que serão submetidos a procedimentos invasivos ou cirúrgicos com INR
superior a 1,5 ou relação de TTPa superior a 1,2.
→ Sangramento intenso relacionado ao uso de anticoagulante oral (warfarina) que coloque
em risco a vida do paciente.
→ Coagulação Intravascular Disseminada (CIVD) ou coagulopatia consumptiva com sangra-
mento ativo.
→ Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT) e Síndrome Hemolítico-urêmica (SHU).

A dose deve ser de 10 a 20 mL/kg dia, dividida em três infusões. Não está indicada transfusão de
PFC em casos de imunodeficiências adquiridas ou congênitas, como expansor volêmico ou para
reposição de proteínas.

• CRIOPRECIPITADO
• Obtido através do plasma fresco congelado, o crioprecipitado possui em sua constituição
Fator VIII, Fator de von Willebrand, Fator XIII, fibrinogênio e fibronectina.
• A principal indicação é a reposição de fibrinogênio em pacientes com hipofibrinogenemia
adquirida ou hereditária (níveis abaixo de 100 mg/dL), especialmente se existe
hemorragia associada.
• Atualmente existem produtos industrializados específicos para a deficiência de Fator VIII
(Hemofilia A) e Fator de von Willebrand, não sendo necessária a transfusão de
crioprecipitado nesses casos.
• A dose depende da gravidade do sangramento, variando de 1 unidade a cada 7ou 10 Kg
de peso corporal por dia.

• Concentrado de plaquetas (CP)


• O concentrado de plaquetas é obtido por centrifugação de sangue total ou por coleta de
aférese em doador único.
• Uma unidade de CP contém aproximadamente 5,5 x 1010 plaquetas em 50-70 mL de
volume e eleva a contagem 5 a 10.000/mm3.
• As unidades obtidas por aférese contêm níveis superiores a 3,0 x 1011 plaquetas em 200-
300 mL de plasma. Uma unidade por aférese corresponde a 6-8 CP obtidos de sangue
total e aumenta a contagem de plaquetas de 30 a 60.000/mm3. As plaquetas por aférese
já estão automaticamente leucorreduzidas.
• A principal indicação clínica da transfusão de plaquetas é o controle de sangramento
secundário à trombocitopenia ou alterações funcionais de plaquetas.

• Indicações profiláticas:
→ Transfusão profilática está indicada em falências medulares quando as plaquetas estão
menores que 10.000/mm3, mesmo na ausência de sangramento ativo ou se as plaquetas
estiverem menores que 20.000/mm3 associadas à infecção, estado crítico ou necessidade de
procedimentos invasivos.
→ A dose profilática geralmente não ultrapassa 7 unidades de CP randômicas (obtidas a partir
de sangue total) ou uma unidade de plaquetas por aférese.

• Indicação terapêutica:
→ Transfusão terapêutica está indicada em situações de trombocitopenia (independentemente
do valor) caso haja sangramento por esse motivo. A dose habitual é de um CP para cada 10
kg de peso do paciente ao dia ou uma unidade de plaquetas por aférese.
→ Não está indicada transfusão de CP em casos de púrpura pós-transfusional, púrpura
trombocitopênica idiopática, púrpura trombocitopênica trombótica ou hiperesplenismo,
salvo raras indicações após avaliação do hemoterapêuta.

b. REAÇÕES TRANSFUSIONAIS

• Reação transfusional é toda e qualquer intercorrência que ocorra como consequência da


transfusão de hemoderivados e hemocomponentes, durante ou após a sua administração.

• As reações transfusionais podem ser classificadas em imediatas (até 24 horas da transfusão)


e tardias (após 24 horas da transfusão) (Quadro 1).

• A manifestação clínica depende do tipo de reação transfusional, mas sintomas que chamam
a atenção para esta ocorrência são:
• Febre (definida como elevação de 1° C na temperatura corpórea em comparação à
temperatura antes da transfusão) ou calafrios.
• Hipertensão ou hipotensão.
• Alterações respiratórias – dispneia, taquipneia, hipóxia e sibilos.
• Alterações cutâneas – prurido, urticária, edema localizado ou generalizado.

• A ocorrência de choque combinado com febre, tremores (bacteremia) e hipotensão sugere


contaminação bacteriana.

• Choque distributivo sem febre e/ou calafrios pode ser o dado mais importante de anafilaxia.
• Hematúria, queda da hemoglobina e alteração de lactato desidrogenase, haptoglobina e
bilirrubina indireta indicam hemólise.

• Tipos de reações agudas:


• Lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão - TRALI
• Sobrecarga de volume
• Hemólise aguda (RHA)
• Anafilaxia
• Sepse
• Urticária
• Reação febril não hemolítica (RFNH)

• Manejo geral de reações transfusionais (Tabela 1):


A conduta geral em todos os casos suspeitos envolve a comunicação imediata da reação ao
hemocentro local e preenchimento da ficha de notificação de reação transfusional. Além disso, deve-
se:
• Interromper imediatamente a transfusão.
• Manter acessos venosos com solução salina a 0,9%.
• Verificar sinais vitais e observar o estado cardiorrespiratório.
• Examinar cuidadosamente todas as etiquetas, rótulos e registros, conferindo novamente
os dados do paciente com os dados da unidade de sangue ou componente em uso.
• Avaliar se ocorreu a reação e classificá-la, a fim de adequar a conduta específica.
• Avaliar a possibilidade de reação hemolítica, TRALI, anafilaxia e sepse relacionada à
transfusão, situações nas quais são necessárias condutas de urgência.
• Coletar amostra pós-transfusional e encaminhar imediatamente ao hemocentro.
• Encaminhar imediatamente ao hemocentro a bolsa contendo o restante do
hemocomponente, mesmo que vazia, com a etiqueta de identificação e com o equipo de
transfusão.

IMUNE

Reação Febril Não Hemolítica (RFNH)


IMEDIATA Reação Hemolítica Aguda (RHA)
Reação Alérgica (Leve, Moderada, Grave)
TRALI (Injúria Pulmonar Relacionada à Transfusão)
Sepse transfusional

TARDIA IMUNE

Aloimunização Eritrocitária

Aloimunização HLA

Reação Enxerto versus Hospedeiro


Púrpura Pós Transfusional

Imunomodulação

NÃO IMUNE

Sobrecarga Volêmica
IMEDIATA Contaminação Bacteriana
Hemólise não imune
Hipocalcemia
Hipotermia

NÃO IMUNE

TARDIA
Hemossiderose
Doenças Infecciosas

Quadro 1. Principais Reações Transfusionais.


Fonte: Adaptado de Silvergleid.

SINAIS e INVESTIGAÇÃO MANEJO


REAÇÃO PREVENÇÃO
SINTOMAS COMPLEMENTAR CLÍNICO

Febre, Tremores,
Enviar amostra
Calafrios, Hidratação
para o Banco de Seguir
Hipotensão, (manter
Sangue; repetir rigorosamente
REAÇÃO Taquicardia, Dor diurese
1:38.000 a testes imuno- todas as normas
HEMOLÍTICA (tórax, local da 100 mL/h).
1:70.000 hematológicos, preconizadas
AGUDA infusão, abdome, Cuidados
cultura do desde a coleta até
flancos), de terapia
componente e a transfusão.
Hemoglobinúria, I. intensiva.
do receptor.
Renal e CIVD.

Afastar hemólise
Antipiréticos Pré-medicação
e contaminação
no caso de com antipiréticos
bacteriana. Enviar
REAÇÃO calafrios é questionável.
Febre, Calafrios, amostras para o
FEBRIL NÃO 0,5 – 1% intensos. Produtos
Tremores. Banco de Sangue;
HEMOLÍTICA Meperidina se desleucocitados
repetir testes imuno-
refratariedade para casos
hematológicos,
dos tremores. recorrentes.
cultura da bolsa.

A maioria
Prurido, urticária,
das reações é
REAÇÃO eritema, pápulas, Pré-medicação
benigna e pode
ALÉRGICA tosse, rouquidão, com anti-
1 – 3% Não se aplica cessar sem
LEVE OU dispneeia, sibilos, histamínico
tratamento. Se
MODERADA náuseas e vômitos, (Difenidramina).
moderada, usar
hipotensão e choque.
Difenidramina.
SINAIS e INVESTIGAÇÃO MANEJO
REAÇÃO PREVENÇÃO
SINTOMAS COMPLEMENTAR CLÍNICO

Instituir
Prurido, urticária,
cuidados
eritema, pápulas, Componentes
REAÇÃO de terapia
rouquidão, tosse, 1:20.000 a Dosar Anticorpo anti celulares lavados
ALÉRGICA intensiva
broncoespasmo, 1:50.000 IgA ou deficientes em
GRAVE (Epinefrina, anti-
hipotensão e IgA
histamínicos
choque.
e corticoide)

Afastar sobrecarga
Qualquer
de volume, RHA
insuficiência Não há
e contaminação
respiratória aguda unanimidade.
1:5.000 – bacteriana. RX tórax
relacionada à Suporte Evitar
TRALI 190.000 de Ecocardiograma
transfusão respiratório. uso de
transfusões Pesquisa de Ac
(até 6 h após) PFC de
anti- leucocitário
com ou multíparas.
doador e/ ou
sem febre.
receptor.

Dispneia, cianose,
SOBRECARGA taquicardia, Suporte de O2 e Aliquotar o
<1% Rx Tórax
VOLÊMICA hipertensão, diuréticos. hemocomponente.
edema pulmonar.

Afastar Instituir Seguir


hemólise cuidados rigorosamente
Tremores intensos
1:3.000 a Cultura do de terapia todas as normas
SEPSE calafrios febre alta
1:123.000 componente intensiva. preconizadas
choque.
e do Antibiótico de desde a coleta até
receptor. amplo espectro. a transfusão.

Seguir
Oligossintomática. Inspeção visual do rigorosamente
Terapia de
HEMÓLISE NÃO Atenção à presença plasma e todas as normas
suporte se
IMUNE de hemoglobinúria urina do paciente. preconizadas da
necessário.
e hemoglobinemia. TAD negativo. coleta à
transfusão.

Infusão lenta de Monitorização


Dosar cálcio iônico cálcio com dos níveis
Parestesia, tetania, ECG com monitorização de cálcio
HIPOCALCEMIA
arritmia. aumento periódica em quem recebe
de intervalo QT. dos níveis transfusão
séricos. maciça.
SINAIS e INVESTIGAÇÃO MANEJO
REAÇÃO PREVENÇÃO
SINTOMAS COMPLEMENTAR CLÍNICO

Diminuir
Desconforto, o tempo Aquecer o
calafrios, queda da de infusão. hemocomponente
temperatura, Aquecimento (GV ou PF) se
HIPOTERMIA arritmia cardíaca e Não se aplica. dos glóbulos previsto acima de
sangramento por vermelhos e/ou 15 mL/kg/hora
alteração da plasma. Terapia por mais de
hemostasia. conforme as 30 min.
intercorrências.

Tabela 1. Principais características das reações transfusionais imediatas.


Fonte: Adaptado de Silvergleid.

REFERÊNCIAS
1. Lopes AC. Tratado de clínica médica. 2. ed. São Paulo: Roca; 2009.
2. Hauser SL, Kasper DL, Braunwald E, Longo DL, Fauci AS, Jameson J, et al. Harrison. Medicina interna. 17. ed. Rio de
Janeiro: Amgh Editora; 2008.
3. Szczepiorkowski MZ, Dunbar MN. Transfusion Guidelines: When To Transfuse. Hematology Am Soc Hematol Educ
Program. 2013; 2013: 638-644.
4. Silvergleid JA. Approach To The Patient With A Suspected Acute Transfusion Reaction. UpToDate. [Internet]; 2020.
[acesso em 29.06.2020]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/approach-to-the-patient-with-a-suspected-
acute-transfusion-reaction.
5. Carson JL, Guyatt G, Heddle NM, Grossman BJ, Cohn CS, et al. Clinical Practice Guidelines From the AABB -Red Blood
Cell Transfusion Thresholds and Storage, JAMA. 2016; 316(19): 2025-35.
6. Harrison P, Subcommittee on Platelet Physiology. The use of platelets in regenerative medicine and proposal for a new
classification system: guidance from the SSC of the ISTH. J Thromb Haemost. 2018; 16(9): 1895–900.
7. Storch EK, Custer BS, Jacobs MR, Menitove JE, Mintz PD. Review of current transfusion therapy and blood banking
practices; Blood Rev. 2019; 38: 100593.
10.1
SURTO PSICÓTICO
Autores:
Valéria Garcia Caputo
Álvaro Tavares de Figueiredo
Renata Paola Parenti Freitas
Juliane de Souza Cavazzana

DEFINIÇÕES

• Surto psicótico: a inferência de que se trata de um surto psicótico requer, antes de mais
nada, saber reconhecer que a psicose está manifestada quando há um prejuízo notável do
contato com a realidade, podendo se dar de várias formas, como, por exemplo, nos delírios e
nas alucinações, incluindo-se ainda comportamentos desorganizados ou qualquer atitude por
parte do paciente que denote tal distanciamento ou ausência de juízo crítico da realidade.

• Delírio: prejuízo no processo mental de discriminação e categorização de estímulos que


alcançam a consciência, como o discernimento entre a verdade e a mentira, a existência ou
não de um objeto e a qualidade desses estímulos. Quando essa capacidade de produzir juízos
(ajuizar) de acordo com as condições da realidade objetiva encontra-se alterada, dando lugar
à emissão de juízos que não encontram fundamento nela, apesar da convicção apresentada
pelo indivíduo, podemos falar em delírio.

• Ilusão: consiste na percepção deformada de um objeto real e presente. Por exemplo, uma
criança olha para uma toalha de banho (objeto real) pendurada na porta do seu quarto
(presente) e enxerga ou imagina uma figura monstruosa que lhe impele choros pela mãe na
madrugada.

• Alucinação: aqui a percepção já é clara e bem definida de um objeto sem a presença dele,
mas com a convicção da sua existência no ambiente. Por exemplo, um adolescente sozinho
no seu quarto escuta (percepção clara e bem definida) uma voz no mesmo cômodo (ausência
do objeto estimulante) dizendo frases depreciativas que o incitam a se automutilar.

QUADRO CLÍNICO

• Ressalta-se que as psicoses representam um conjunto de manifestações patológicas que


podem ter sua etiologia fundamentada nas mais diversas causas, inclusive as orgânicas, cada
qual com suas peculiaridades.
• O delírio é uma alteração psicopatológica comum nas mais diversas síndromes psicóticas e
característica frequente nos estados psicóticos agudos ou reagudizados, apresentando-se nas
mais diversas formas. Dentre elas, o delírio de cunho persecutório é a mais frequente.

• Outras alterações podem estar presentes e compõem uma gama de possibilidades:


agressividade verbal, agressividade física, não colaboração com a entrevista,
despersonalização, desrealização e outras alterações do estado mental (ver a seção de
Diagnóstico e Classificação).

EXAMES COMPLEMENTARES

• Idealmente, deve-se considerar as causas orgânicas para dar sequência na investigação


etiológica da psicose, incluindo exames laboratoriais e de imagem (Quadro 1).

• Deve-se ter precaução adicional quando se trata do primeiro surto ou quando o paciente não
tem diagnóstico prévio, bem como quando o quadro teve início abrupto e/ou o exame físico
apresenta sinais de provável etiologia orgânica.

Exames laboratoriais

Hemograma e glicemia capilar

Eletrólitos básicos (sódio, potássio e magnésio)

Transaminase glutâmico-oxalacética (TGO) e glutâmico-pirúvica (TGP)

Ureia e creatinina

Hormônio estimulante da tireoide (TSH)

Veneral disease research laboratory (VDRL) e anti-HIV

Fator antinuclear (FAN) e screening para doenças imunológicas

Toxicológicos (cocaína e cannabis)

Exames de imagem

Tomografia computadorizada (TC) de crânio

Ressonância nuclear magnética (RNM) de crânio


Quadro 1. Sugestão de exames a serem solicitados para investigação etiológica da psicose.
Fonte: Del-Bem CM et al.9

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO

• O diagnóstico do surto psicótico é eminentemente clínico, mais próximo de uma


apresentação sindrômica do que de uma patologia propriamente dita.

• Alguns dados nos ajudam a direcionar o diagnóstico em dois grandes grupos: as psicoses
orgânicas e as psicoses funcionais, conforme detalhado no Quadro 2.

Dados analisados Psicoses orgânicas Psicoses funcionais

Consciência Comumente prejudicada Lúcida

Atenção Hipoprosexia Variável

Sensopercepção Alucinações táteis e visuais Alucinações auditivas

Orientação Desorientação temporoespacial Normalmente preservada

Memória Prejudicada Frequentemente preservada

Inteligência Dificuldade de abstração, p.e Sem alterações significativas

Exame físico neurológico Comumente alterados Sem alterações significativas

Doença mental na família Sem padrão significativo Geralmente presente

Polifarmacoterapia Comum, podendo ser a causa Geralmente há uso prévio

Início do quadro Súbito Insidioso, às vezes recorrente

1o surto psicótico Geralmente após os 40 anos Geralmente antes dos 30 anos

Funções corticais superiores Afasias, apraxia e agnosias Preservadas

Quadro 2. Psicoses Orgânicas Versus Psicoses Funcionais.


Fonte: Elaborado pelos autores.

TRATAMENTO
a) TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO
• Abordar o paciente utilizando linguagem clara e direta, apresentando conteúdos concretos:
isso não significa tentar trazer o sujeito à realidade de modo brusco, assumindo uma atitude
de confronto direto, mas sim uma comunicação empática o suficiente para se tentar um
diálogo, ou, no mínimo, uma contenção verbal.

• Ajustar o escalonamento de vocábulos para o nível intelectual inferido: apesar de tal


inferência ser empírica e carregar certa bagagem de estereótipos, falar com o paciente de
modo que ele se sinta compreendido, mesmo que parcialmente, e que o conteúdo da
conversa lhe seja de fácil entendimento será de grande valia para o contato.

• Explicar ao paciente os procedimentos que serão realizados (farmacológicos ou não), sempre


que a situação permitir. Esta atitude tem dois objetivos principais: primeiramente avaliar
como o paciente introjeta e corresponde (ou não) à proposta; segundo, aproximar o paciente
da equipe ao dar confidência do que está sendo proposto para que o nível de desconfiança
diminua. Esta última finalidade tem maior importância nos pacientes com delírios de cunho
persecutório, principalmente quando o grau de distorção de realidade chega a colocar a
equipe de saúde como objeto do delírio, ou seja, como parte do “complô” que o persegue.

• Não menos importante e na medida da possibilidade, a abordagem dos familiares é


imperativa. Acompanhantes com bom nível de continência do paciente e higidez mental
podem prover detalhes do caso, fundamentais para que se tente alcançar conhecimento sobre
o histórico da psicose do paciente, seu contexto de vida atual e, assim, ajustar as abordagens
posteriores.

b) TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

• No primeiro surto psicótico, com ênfase especial à esquizofrenia por esta ser o protótipo
clínico das psicoses, tanto em termos de epidemiologia (1% da população mundial) como
pela rica apresentação clínica de sintomas psicóticos, existe uma tendência maior para o
aparecimento de efeitos colaterais extrapiramidais (ECEs). Daí a razão pela qual se costuma
iniciar a terapia antipsicótica em doses mais baixas quando comparada com doses em
pacientes crônicos, bem como a preferência pela monoterapia (durante a primeira crise ou
reagudização em pacientes com diagnóstico prévio) até que sejam feitos os ajustes de doses
em um momento posterior à abordagem do paciente na urgência, se necessários.

• O esquema mais usado em pronto-socorro (PS) é a administração de haloperidol 5 mg/mL (1


ampola IM) com prometazina 50 mg/2 mL (1 ampola IM). Se possível, a administração de
antipsicótico (AP) via oral é preferível, como risperidona (1 a 2 mg), olanzapina (10 mg) e
haloperidol (5 a 10 mg).

• Os benzodiazepínicos também são medicamentos que podem ser utilizados juntamente com
o AP, também via oral (por exemplo, clonazepam 2 mg, lorazepam 2 mg, alprazolam 1 mg,
diazepam 10 mg), principalmente quando se quer obter efeito sedativo, pois, dependendo do
antipsicótico escolhido e da dose administrada, nem sempre este será alcançado.
FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

Fluxograma 1: Surto Psicótico no Pronto Socorro.


Fonte: Adaptado de Quevedo J et al2
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso Clínico: T.A.C., 75 anos, é trazida por familiares ao PS para avaliação psiquiátrica.
Segundo uma das acompanhantes, a paciente já possuía diagnóstico de esquizofrenia há mais de 30
anos, em acompanhamento regular com médico psiquiatra. Não sabiam referir as medicações de
que a paciente fazia uso, mas afirmaram que a paciente estava em uso regular delas. No início da
entrevista, a paciente permaneceu quieta enquanto as 2 irmãs passavam as informações solicitadas
ao médico plantonista. Era nítida sua mímica de incômodo e desconfiança quando o médico
tomava nota da anamnese no computador, chegando ao ponto, inclusive, de interromper a
entrevista para perguntar “o que tanto se anotava a seu respeito”. Adiante no atendimento, uma das
informantes disse que a paciente vinha seguindo bem o tratamento nos últimos anos, mas alguns
comportamentos exagerados e atitudes inapropriadas haviam insidiosamente piorado nos últimos
meses, como comprar “quatro dúzias de ovos para 2 pessoas”, “três pacotes de pão de forma de
uma só vez”, “tomava 4 banhos por dia por alguns dias, e passava dias sem tomar banho, a menos
que solicitada”, “iniciava uma faxina na casa quando acordava na madrugada” e, principalmente,
começou a querelar com a irmã com a qual dividia a casa, acusando-a de “roubar seus documentos
pessoais”, “ouvi-la conversando com outros familiares para colocá-la num asilo”, “ouvir cochichos
dos vizinhos falando mal dela” e mais uma série de discursos que demonstravam uma ruptura com
a realidade. A paciente se recusou a conversar abertamente, apenas com respostas lacônicas e
seletivas, dizendo que “não daria informações a seu respeito” e que “toda a equipe de saúde
naquele momento já estava sabendo e participando das tramas da sua família”.

• Antecedentes pessoais: diabetes mellitus tipo II, em uso de metformina 850 mg – 01


comprimido via oral após almoço; tabagismo (carga tabágica > 10 anos/maço), em uso de
bupropiona 150 mg – 01 comprimido via oral 12/12h.

• Antecedentes familiares: nada relevante para o caso.

b. Exame físico: PA - 140/80 mmHg, FC - 110 bpm, FR - 24 ipm, SpO2 - 99% em ar ambiente,
temperatura axilar: 37°C.

c. Exame do estado mental:

• Aspecto geral: Autocuidado preservado, bom estado geral, atitude passiva


• Orientação: Autopsíquica normal; alopsíquica comprometida em espaço
• Atenção: Hipoprosexia
• Memória: Fixação adequada; evocação prejudicada
• Sensopercepção: Nega alterações da sensopercepção
• Pensamento: Delirante, persecutório, francamente dissociado
• Linguagem: Bradilalia, bom repertório, mas conteúdo incoerente
• Juízo de realidade: Comprometido
• Afetividade e Humor: Afeto adequado e humor predominantemente hipotímico
• Volição: Presente, mas diminuta
• Psicomotricidade: Lentificada, sem sinais de liberação extrapiramidal
• Personalidade: Padrão paranoide
• Insight: Ausente
• Desejo de ajuda: Ausente (lembrar que o juízo crítico está prejudicado)
• Após avaliação, excluídas causas orgânicas agudas que justificassem a apresentação
clínica, optou-se por medicá-la, ainda na sala de observação do OS, com risperidona 2 mg
– 01 comprimido via oral e diazepam 10 mg – 01 comprimido via oral, seguido de
internação hospitalar em enfermaria psiquiátrica da própria instituição para continuação
do manejo do caso, como ajuste de doses, tentativa de remissão dos sintomas, em especial
os de cunho psicótico.

d. Prescrição sugeridaa:

1. Dieta para diabético VO

2. Quetiapina 100 mg/cpb 100 mg VO 24/24h 21:00

3. Biperideno 2 mg/cp 4 mg VO 24/24h 06:00

4. Metformina 850 mg/cp 850 mg VO 24/24h 13:00

5. Clonazepam 2 mg/cp 2 mg VO se insônia ou ansiedade

6. Haloperidol 5 mg/mL 1 ampola IM se agitação psicomotora, agressividade ou fracasso

Prometazina 25 mg/mL 1 ampola na cotenção verbal e mecânica


7. Sinais vitais e controles gerais 6/6h

8. Comunicar anormalidades ao médico

9. Risco de heteroagressividade

10. Risco de fuga

11.
Solicito HMGc, urina (qualitativa), ureia, creatinina, sódio e potássio séricos.
a
Prescrição sugerida: trata-se de um modelo. Cada caso clínico na prática médica traz suas peculiaridades, o
que indica a necessidade de abordagens individualizadas.
b
Antipsicótico que ao longo do tratamento terá sua dose aumentada de forma escalonada (50 a 100 mg a cada 4
dias, em média), a fim de alcançar dose antipsicótica eficaz (frequentemente a partir de 400 mg).

DICAS DO ESPECIALISTA

• Preferir usar o AP de melhor resposta prévia no paciente.


• Considerar preferências do paciente (facilita a adesão ao tratamento).
• Utilizar APs mais sedativos nos pacientes mais agitados; por exemplo, olanzapina na dose
de 5 a 10 mg por vía oral.

• Não desconsiderar a tolerância (ou não) aos efeitos colaterais extrapiramidais (ECEs), como
acinesia, a acatisia e distonias, além de outros efeitos colaterais que não correspondem a
ECEs, como galactorreia, constipação intestinal e xerostomia.

• Mulheres com alterações menstruais: dar preferência para APs com menor probabilidade de
hiperprolactinemia e consequente galactorreia, como quetiapina e o haloperidol.

• Em pacientes idosos, evitar APs com muitos efeitos anticolinérgicos (risperidona e


haloperidol, por exemplo).

• Em cardiopatas, ter cautela no uso de APs que mais frequentemente prolongam o intervalo
QT, como a quetiapina e a clozapina.
• No caso de pacientes gestantes, se possível, evitar o uso de qualquer AP no primeiro
trimestre de gestação; se necessário, o AP mais indicado é o haloperidol, que, apesar de
aumentar o risco de ECEs no recém-nascido (RN) pela sua alta potência, minimiza os efeitos
colaterais maternos, principalmente os efeitos anticolinérgicos, anti-histamínicos e
hipotensores.

REFERÊNCIAS
1. Dalgalarrondo P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2. ed. Porto Alegre: Artmed; 2008.
2. Quevedo J, Carvalho AF, Kapczinski F. Emergências Psiquiátricas. 2. ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.
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5. Cordioli AV, Gallois CB, Isolan L. Psicofármacos: consulta rápida. 5. ed. Porto Alegre: Artmed; 2015.
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15. Barlow DH, Durand VM. Psicopatologia: uma abordagem integrada. Boston: Cengage Learning; 2017.
10.2
RISCO DE SUICÍDIO
Autores:
Valéria Garcia Caputo
Renata Paola Parenti Freitas
Juliane de Souza Cavazzana
Álvaro Tavares de Figueiredo

“Nenhuma teoria será capaz de desvendar um ato tão ambíguo e de razões


tão complexas quanto o suicídio.”
(O Deus selvagem, A. Alvarez)

INTRODUÇÃO
O suicídio é o resultado de uma interação de fatores genéticos, psicológicos e socioambientais,
podendo levar desde lesões graves e incapacitantes até a morte.
A vida moderna trouxe com ela novas formas de sofrer e de adoecer. A falta de tempo e a
preocupação com resultados satisfatórios e rápidos deu espaço para as relações líquidas com vínculos
frouxos. Vivemos um momento em que a angústia e as frustrações são inaceitáveis e, logo que
aparecem, precisam ser substituídas pela felicidade instantânea. As fugas sucessivas do afeto
angustiante dão espaço para a sensação de vazio, empobrecimento afetivo e perda de sentido. Como
consequência, tem aumentado o número de pessoas que enxergam o suicídio como forma de acabar
com o sofrimento. Para algumas, a falta de sentido para a experiência de viver pode ser dada de forma
muito precoce, e, se não houver apoio familiar e preparo adequado dos profissionais de saúde para a
abordagem, o número de desfechos negativos tende a aumentar.

DEFINIÇÕES

• Suicídio: Morte por lesão, envenenamento ou sufocamento quando houver evidência de que
a lesão foi autoinfligida e de que o falecido pretendia se matar.

• Tentativa de suicídio: Um comportamento potencialmente autoprejudicial com um


resultado não fatal, para o qual há evidência de que a pessoa pretendia se matar.

• Tentativa abortada de suicídio: Comportamento com potencial autolesivo, de que a pessoa


pretendia se matar, porém foi interrompida antes de consumar o ato.
• Ameaça de suicídio: Qualquer ação interpessoal, verbal ou não verbal, que uma pessoa
razoavelmente saudável interpretaria como mensagem que sugere que um ato suicida ou
comportamento relacionado ao suicídio pode ocorrer em um futuro próximo.

• Ideação suicida: Pensamentos de servir de agente para a própria morte, podendo variar em
gravidade (tipo de plano de suicídio e grau de intenção suicida).

• Intenção suicida: Expectativa subjetiva de desejo de que um ato autolesivo resulte em


morte.

• Automutilação (Parassuicídio): Aut lesões provocadas, sem intenção de se matar.


EPIDEMIOLOGIA

• 800 mil pessoas cometem suicídio todos os anos, e o número de tentativas é 20 vezes maior.
Estima-se que a cada 40 segundos uma pessoa cometa suicídio no mundo.

• Há uma subnotificação dos casos de suicídio.


• No Brasil, entre 2000 e 2009, 14,7% dos suicídios envolveram crianças de 10 a 14 anos,
sendo 74% por enforcamento e 13% por arma de fogo. Entre 2002 e 2012, houve um
aumento de 40% do índice de suicídio nesta mesma idade.

• Suicídio em idosos: Os principais fatores associados de suicídio são as doenças


degenerativas, transtornos mentais, dependência física e depressão grave.

• As tentativas de suicídio são mais frequentes entre mulheres; porém, homens apresentam
mais sucesso (utilização de meios mais letais).

• Os transtornos psiquiátricos associados mais prevalentes são os transtornos de humor,


transtornos ansiosos, esquizofrenia, transtorno de uso e abuso de substâncias, e transtornos
de personalidade.

• As tentativas de suicídio aumentam no mês anterior ao tratamento, no mês após o


tratamento, após descontinuação da medicação e após qualquer mudança de dose, o que
reforça a necessidade de se garantir o acompanhamento e o monitoramento próximos durante
o tratamento.

• Conhecer os fatores de risco, os precipitantes e os de proteção associados ao suicídio


(quadro 1) é de relevância para o adequado atendimento.
FATORES DE RISCO FATORES FATORES PROTETORES
PRECIPITANTES
Tentativa prévia de suicídio Separação conjugal Bom suporte social e familiar
Doenças Psiquiátricas (90%) Perda de emprego Gestação
Sentimentos de Diagnóstico de doença grave Maternidade
desesperança/inutilidade Perda de entes queridos Paternidade
Impulsividade Desastres naturais Espiritualidade
Sexo masculino Piora da situação econômica Ter filhos
Adolescentes e idosos Luto não elaborado Estar empregado e satisfeito
Raça branca Divórcio dos pais com o emprego
Nunca ter se casado Bullying Gosto pela vida
Doenças crônicas ou Violência familiar Capacidade de adaptação
degenerativas Isolamento social positiva
Baixa resiliência Mídia inapropriada Adesão medicamentosa
História familiar de suicídio Desabrigados
Morar sozinho Aculturamento
Morar na zona rural Guerras
Morar em países Uso de medicamentos
subdesenvolvidos Privação de sono
(75% dos suicídios) Uso patológico da internet
Indígenas Transtorno de compulsão
Acesso a armas de fogo alimentar
Violência Internação psiquiátrica prévia
Adolescentes LGBTs Migração
Baixo QI
Dependência de álcool e drogas
Médicos, dentistas,
farmacêuticos
Presidiários
Refugiados
Idosos (> 65 anos)
Jovens (15-30 anos)

Quadro 1. Fatores de risco, fatores precipitantes e fatores protetores associados ao suicídio.


Fonte: Autores.

AVALIAÇÃO DO RISCO

• O acolhimento e o vínculo terapêutico são a base da abordagem do paciente com risco de


suicídio e, a partir dele, deve-se fazer o contrato de não suicídio com o paciente, lembrando
que isto não é garantia de que ele não cometerá o suicídio.

• Embora as escalas de avaliação do risco de suicídio não possuam precisão diagnóstica, são
importantes auxiliares no manejo da situação.

• Levando em conta os dados da literatura científica podemos propor as situações de baixo,


médio e alto risco para nortear as decisões terapêuticas (Figura 1).
Figura 1. Características e manejo das situações de baixo, médio e alto risco de suicídio.
Fonte: Autores.

TRATAMENTO

• A terapêutica diante das tentativas de suicídio ou do suicídio consumado envolve várias


etapas que incluem abordagens farmacológicas e não farmacológicas que devemos realizar
de forma sistematizada, conforme propõe a figura 2.

• O plano terapêutico a ser elaborado vai depender da avaliação do risco realizada durante a
entrevista, podendo levar à indicação de internação ou de seguimento ambulatorial; e
levando-se em conta a hipótese diagnóstica de base.

• Ao se abordar a família de um paciente que apresenta ideação suicida ou tentativa, alguns


aspectos importantes devem ser observados:

1. Solicitar ao paciente e explicar a necessidade de fazer contato com sua família.


2. Orientar familiares a não deixar o paciente sozinho, sem supervisão; retirar objetos que
possam ser lesivos como armas de fogo, facas, venenos, medicamentos, cordas etc.
3. Realizar a psicoeducação orientando sobre a importância de se escutar, acolher e apoiar o
paciente independentemente de como foi a tentativa.
4. Orientar que questionamentos e julgamentos devem ser evitados, sendo necessário apenas
estar com o paciente, ouvir suas necessidades, medos e inseguranças.
Figura 2. Proposta de abordagem terapêutica
Fonte: Autores.

• Indicadores de internação:
• Paciente psicótico sem continência familiar
• Tentativa com uso de método violento
• Persistência de ideação suicida com baixo suporte social e familiar
• Impulsividade e agitação importantes
• Falha de tratamento ambulatorial
• Possibilidades de liberação para tratamento ambulatorial:
• A tentativa de suicídio foi uma reação a um evento estressante
• Planejamento, método e intenção são de baixa letalidade
• Suporte familiar e social estável
• Posvenção:
O termo posvenção, atribuído a Edwin Shneidman, em 1968, é baseado em intervenções para
cuidar dos sobreviventes enlutados, cuidadores e prestadores de cuidados de saúde. Tem como
objetivo desestigmatizar o suicídio e ajudar no processo de recuperação.
O comportamento suicida pode ser desencadeado após a experiência da perda de um ente querido
por suicídio. Cada suicídio tem impacto na vida de pelo menos outras seis pessoas, e o impacto social,
psicológico e financeiro para a família é imensurável. Por isso, é tão importante identificar transtornos
de humor, estresse pós-traumático, entre outros, nos familiares e tratar efetivamente em serviço
apropriado.

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
Na abordagem em ambiente de urgência e emergência, podem ser realizadas medicações para
aliviar os sintomas que acompanham a ideação suicida, como sintomas de alteração do humor,
ansiedade, sintomas psicóticos, impulsividade ou agressividade. A escolha do medicamento e a via de
administração dependerá do sintoma, da aceitação e da condição física do paciente:

• Sintomas ansiosos: Alprazolam 0,25 mg – 2 mg, Lorazepam 2 mg, Diazepam 10 mg,


Clonazepam, 0,5 mg - 2 mg, Quetiapina 25 - 50 mg.

• Agitação psicomotora: Clorpromazina 50 mg -100 mg, Levomepromazina 25 mg - 100 mg,


Haloperidol 2,5 mg - 10 mg, Quetiapina 100 mg - 200 mg, Olanzapina 5 mg - 10 mg,
Risperidona 1 mg - 2 mg, Prometazina 25 mg.
Uma combinação bastante utilizada em casos de agitação é Haloperidol 5 mg intramuscular com
Prometazina 25 mg intramuscular. Quando a opção é uma sedação mais rápida, pode-se utilizar o
Midazolam, pois este tem uma ação mais rápida de início, mas o seu efeito passa mais rápido. A
dosagem é de 2,5 mg – 5 mg intramuscular ou endovenoso. O paciente medicado com Midazolam
deve ser devidamente monitorado, uma vez que os casos de rebaixamento do nível de consciência são
maiores com esta medicação.
A Ketamina está sendo estudada para uso em sala de emergência com o paciente monitorado. Ela
mostra uma redução rápida nos pensamentos suicidas e na ideação suicida em pacientes deprimidos;
porém, ainda são necessários mais estudos sobre o assunto.
Após estabilização do quadro no ambiente de urgência/emergência, é necessário tratamento das
doenças psiquiátricas de base.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

Fonte: Autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a. Caso Clínico: T.A.V. C. A., 46 anos, sexo feminino, trazida pelo SAMU após tentativa de
suicídio por intoxicação exógena com 20 comprimidos de Levomepromazina 25 mg após discussão
com irmão e mãe. De início foi realizado exame clínico, lavagem gástrica e carvão ativado,
ficando, após o procedimento, em observação. Paciente se encontrava sem acompanhante e
sonolenta, referindo que há 3 semanas iniciou quadro de tristeza, anedonia, avolição, insônia,
diminuição do apetite, pensamentos de morte com ideação suicida. Faz acompanhamento
ambulatorial há 10 anos, com hipótese diagnóstica, referida por ela, de depressão. Faz uso de
Sertralina 100 mg/dia, Carbonato de Lítio 600 mg/dia, Clonazepam 2 mg/dia, e tem retorno com
Psiquiatra agendado para a semana seguinte. Não apresenta comorbidades clínicas. Mora com a
mãe e o irmão, que é usuário de drogas. Relata que o ambiente familiar é bastante conturbado e que
desde que o irmão foi morar lá se sente muito angustiada. Já teve 2 internações psiquiátricas
prévias, por tentativa de suicídio. Nestas ocasiões, segundo o seu relato, avisou aos familiares que
desejava morrer e que iria se matar. No momento da entrevista, a paciente permanece com ideação
suicida; porém, sem planejamento.

b. Conduta Sugerida:

1. Observação na Psiquiatria com supervisão da equipe.


2. Retirada de objetos de risco do local.
3. Contato com o filho para que compareça ao local.
4. Verificação dos aspectos de vínculo e responsabilização do filho para com a mãe: este
declarou desejo e compromisso de levá-la para sua casa a fim de afastar do ambiente
estressor.
5. Realização do contrato de não suicídio.
6. Orientação sobre os cuidados em casa: supervisão, retirada das medicações e objetos de risco
do alcance da paciente.
7. Encaminhamento para psicoterapia e manutenção do atendimento ambulatorial.
8. Solicitação de retorno ao Pronto-Socorro no dia seguinte para reavaliação, ou a qualquer
momento, se julgarem necessário.

DICAS DO ESPECIALISTA

• Risco de suicídio e pandemia Covid-19: Em pacientes com quadros depressivos ou ansiosos


prévios, deve-se abordar ativamente sobre pensamentos ou ideação suicida. Além disso,
estes pacientes devem ser incentivados a manter interação social por telefone ou on-line
durante este período.

• O olhar individualizado para cada paciente é fundamental para a elaboração do plano


terapêutico.

• Nunca dar menor importância para tentativas menos letais de suicídio; elas indicam que há
um sofrimento e que a pessoa precisa de ajuda.

• Em caso de internação, é sempre importante que o paciente seja conduzido por ambulância
do hospital ou município, e nunca por meios próprios..

• Nunca liberar o paciente que tentou suicídio e que mantém ideação suicida sem contato com
familiares ou pessoas de confiança do paciente.

REFERÊNCIAS
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10.3
ATAQUES DE PÂNICO
Autores:
Valéria Garcia Caputo
Juliane de Souza Cavazzana
Renata Paola Parenti Freitas
Álvaro Tavares de Figueiredo

INTRODUÇÃO

• Caracterizados como ataques súbitos de ansiedade, os Ataques de Pânico, embora mais prevalentes
no Transtorno de Pânico (TP), ocorrem em outros Transtornos Psiquiátricos, além de poderem
acometer pessoas sem nenhum diagnóstico psiquiátrico prévio.

• Entre os fatores precipitantes, estão mudanças socioeconômicas, condições clínicas, uso de


substâncias psicoativas, medicações, rememoração de traumas, perdas, medo de morrer, tabagismo,
alcoolismo, temor de um novo ataque, entre outros, o que torna a avaliação desta condição
desafiadora em sua investigação e em seu manejo.

• Dentre os atendimentos no setor de Emergência devido à dor torácica, mais da metade deles são
atribuídos a causas não cardíacas, estando associados a diagnósticos de ansiedade, pânico ou causa
desconhecida. Nos diversos cenários de atendimento, em que os sintomas apresentados podem se
confundir e se sobrepor, tornam-se necessárias estratégias de abordagem adequadas para as
situações em que os níveis de ansiedade se elevam de forma a causar sofrimento mental insuportável
ao paciente.

EPIDEMIOLOGIA
No Brasil, embora seja uma situação frequentemente atendida no cenário médico, faltam dados da
literatura específicos sobre a prevalência dos Ataques de Pânico na população além do contexto de Transtorno
de Pânico.

FISIOPATOLOGIA

• A disfunção de reguladores neurobiológicos (GABA, 5HT, noradrenalina, glutamato, CRF, canais


de cálcio controlados por voltagem, entre outros), de modo intermitente em determinados circuitos
neuronais, pode manifestar relação com os ataques de pânico.

• A amígdala, estrutura envolvida na regulação e manifestação do medo, por estar ligada às áreas
corticais pré-frontais reguladoras das emoções, área orbitofrontal e cingulado anterior, é responsável
por integrar informações sensoriais e cognitivas, através de ligações específicas entre
neurotransmissores e seus receptores. Quando hiperexcitada, estimula outras estruturas
neuroendócrinas, produzindo respostas agudas, adaptativas às ameaças identificadas, as quais,
quando em excesso ou de forma repetida, poderão trazer prejuízos para o organismo submetido a
elas a longo prazo, como ilustra a Figura 1.
Figura 1. Regulação da amígdala e suas repercussões.
Fonte: Elaborado pelos autores.

QUADRO CLÍNICO
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5ª edição (DSM-V), um ataque de
pânico caracteriza-se por surto abrupto (a partir de estado calmo ou ansioso) de medo ou de desconforto
intenso que alcança um pico em minutos e durante o qual ocorrem quatro ou mais dos seguintes sintomas:
SINTOMAS FÍSICOS
01 Palpitações, coração acelerado ou taquicardia.

02 Sudorese.

03 Tremores ou abalos.

04 Sensação de falta de ar ou sufocamento.

05 Sensações de asfixia.

06 Dor ou desconforto torácico.

07 Náusea ou desconforto abdominal.

08 Sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio.

09 Calafrios ou ondas de calor.

10 Parestesias.

11 Desrealização ou despersonificação.

SINTOMAS COGNITIVOS
12 Medo de perder o controle ou “enlouquecer”.

13 Medo de morrer.

Tabela 1. Critérios baseados no DSM-V.*


Fonte: American Psychiatric Association.

Nota: sintomas específicos da cultura (por exemplo, tinido, dor na nuca, gritos ou choro descontrolado)
podem ser vistos, mas não devem ser contabilizados como um dos quatro sintomas requeridos. Após um pico,
o paciente pode permanecer ansioso ou calmo e ter outro pico novamente.

• Ainda de acordo com o DSM-V, os ataques de pânico passam a ser um especificador e definem-se
com sintomas limitados, esperados e não esperados da seguinte forma:

• Com sintomas limitados: os ataques satisfazem todos os outros critérios, mas têm menos de quatro
sintomas físicos e/ou cognitivos.

• Com sintomas esperados: existe um sinal ou desencadeante óbvio, como as situações em que eles
geralmente ocorreram.

• Com sintomas inesperados: não há gatilho ou desencadeante óbvio no momento da ocorrência (p.
ex., quando em relaxamento ou durante o sono).

MANEJO CLÍNICO

• Uma anamnese atenta para detalhes, dentro da apresentação global do quadro, e exame físico
realizado adequadamente contribuem para o estabelecimento do vínculo inicial, assegurando ao
paciente que sua queixa está sendo valorizada, levando à identificação de condições clínicas e
comorbidades que porventura estejam descompensadas, ao raciocínio diagnóstico e à escolha do
tratamento adequado a ser instituído, ainda que diante de limitações situacionais e do ambiente.

• Ao assumir uma postura que demonstra interesse e cuidado para com a condição que conduziu o
paciente ao atendimento, o médico transmite confiança, ferramenta fundamental de absoluta
relevância terapêutica.

• Alguns pontos são muito importantes e devem ser considerados na anamnese, pois, quando
presentes, indicam que é muito provável estarmos diante de um paciente apresentando um ataque de
pânico. São eles:
• A idade do paciente está entre 18 e 45 anos?
• O início dos sintomas foi abrupto?
• Sua evolução foi rápida?
• Naquele momento, está com medo de perder a sanidade mental ou o controle da situação?
• Está com medo de morrer?
• Está passando por algum problema atualmente ou passou por algo traumático recentemente?
• Tem esses sintomas quando está mais longe de ambientes em que se sente confortável?
• Tem comportamentos evitativos?
• Tem medo de desfechos catastróficos para situações imaginadas?

• Sinais de hiperatividade autonômica e sintomas da esfera subjetiva podem ocorrer como


manifestação sintomática de transtornos mentais, condições clínicas, uso de substâncias ou na
ausência destes; por isso, diferenciar ataques de pânico de outras condições clínicas é tão
importante. O Quadro 1 mostra as várias condições clínicas e psiquiátricas diferenciais a serem
consideradas.

CONDIÇÕES CLÍNICAS
IAM, EAP e pericardites.
Aneurisma de aorta.
Angina.
Insuficiência coronariana.
Arritmia cardíaca.
Disfunções vestibulares.
Crises convulsivas.
Abstinência.
Hipoglicemia.
Feocromocitoma.
Hipertireoidismo.
Hiperparatireoidismo.
DPOC e asma.

USO DE SUBSTÂNCIAS
Simpaticomiméticos (cafeína, metilfenidato).
Crises serotoninérgicas.
Cocaína.
Anfetaminas.
Maconha.
Anticolinérgicos.
CONDIÇÕES PSIQUIÁTRICAS
Ansiedade persistente.
Ataques com sintomas limitados.
Outros episódios paroxísticos.
Fobia social.
Fobia específica.
TOC e TEPT.
Transtornos somatoformes.
Transtornos de personalidade.

IAM: infarto agudo do miocárdio; EAP: edema agudo de pulmão; DPOC: doença pulmonar obstrutiva
crônica; TOC: transtorno obsessivo-compulsivo; TEPT: transtorno do estresse pós-traumático.

Quadro 1. Possíveis diagnósticos diferenciais de um ataque de pânico.


Fonte: Autores

EXAMES COMPLEMENTARES
De acordo com as hipóteses levantadas, após avaliado o risco cardíaco, alguns exames podem ser
solicitados para descartar etiologia orgânica, sendo que a realização destes exames fica a critério do médico,
segundo seu raciocínio dentro dos possíveis diagnósticos diferenciais.

a. ECG.
b. Hemograma.

c. Glicemia capilar.

d. Dosagem de cálcio.

e. Dosagem de enzimas cardíacas.

f. Eletrólitos.

g. Função renal e hepática.

h. Toxicológico.

i. TSH, T4.

j. CPK.

k. Exames de Imagem.

TRATAMENTO DA FASE AGUDA

• O grupo medicamentoso mais amplamente utilizado para situações agudas, devido a sua eficácia,
início de ação e baixa toxicidade, são os benzodiazepínicos. Os mais frequentemente utilizados,
disponíveis e estudados em nossa prática são: Alprazolam, Bromazepam, Clonazepam, Diazepam e
Lorazepam. Embora sejam os medicamentos de escolha, algumas situações devem ser consideradas
quando da sua prescrição, quais sejam:
1. Como ocorre com todas as substâncias psicoativas, o efeito dos benzodiazepínicos pode ser
intensificado pelo álcool, portanto, caso um paciente tenha feito ingesta de álcool, seu uso não é
recomendado.
2. A questão da drogadição e o risco de desenvolver uso abusivo deve ser considerado.
3. Se associados a medicamentos de ação central, seu efeito sedativo pode ser intensificado.
4. Em relação à gestação, no primeiro trimestre, o diazepam e o clonazepam devem ser evitados e
poucos relatos asseguram o uso de lorazepam e alprazolam. Na lactação, deve ser evitado o uso de
diazepam, clonazepam, lorazepam e alprazolam.

• A escolha do benzodiazepínico dependerá da disponibilidade e necessidades avaliadas no contexto


do caso, conforme mostra a Tabela 2.

ALPRAZOLAM BROMAZEPAM DIAZEPAM CLONAZEPAM LORAZEPAM

Boa Indicado na Eficácia em Primeira linha na Após ingesta, é


tolerabilidade ansiedade reduzir os redução de absorvido
Reduz aguda e ataques sintomas na fase no trato
ansiedade controle de ataques de pânico aguda e gastrointestinal; por
antecipatória de pânico semelhante manutenção. isso, seu início de
CARACTERÍSTICAS Bloqueia os ao alprazolam Atua na ação é mais lento
ataques de pânico. ansiedade
antecipatória.

Rápido Cerca de 20 min Cerca de 40 min Rápido Cerca de 2h


INÍCIO DE AÇÃO
Administração
via oral

0,7 - 2,1h 1-2h 30-90 min. 1-3h 2 horas


Distribuição
inicial rápida e
PICO intensa, e fase
PLASMÁTICO terminal
prolongada

6-20h 8-19h. 20-90h 20-40h 8-16h


MEIA-VIDA

Hepática. Hepática. Hepática. Hepática. Hepática, não forma


metabólitos ativos,
sendo favorável para
o uso em idosos e
pacientes com
METABOLIZAÇÃO
insuficiência
hepática.

0,5 -1 mg/dia 1,5 -3 mg/dia. 5-10 mg/dia. 1-6 mg/dia. 2-3 mg/dia
máx em 24h: 10 máx em 24h: 18 mg máx em 24h: 60 máx em 24h: 8 mg máx em 24h: 4 mg
DOSAGENS mg mg
ALPRAZOLAM BROMAZEPAM DIAZEPAM CLONAZEPAM LORAZEPAM

Hipersensibilidade Hipersensibilidade Hipersensibilidade Hipersensibilidade Hipersensibilidade


ao ao ao e ao ao fármaco.
fármaco, fármaco, fármaco, fármaco, Relativas:
glaucoma de glaucoma, glaucoma de glaucoma de Alzheimer,
ângulo Insuficiência ângulo fechado, ângulo Esclerose
estreito, respiratória Insuficiência fechado, múltipla,
Miastenia gravis ou DPOC, respiratória ou drogadição, Miastenia gravis,
Relativas: Miastenia gravis DPOC. Doença Insuficiência Insuficiência renal e
CONTRA - Glaucoma de hepática ou renal respiratória ou hepática.
INDICAÇÕES anglo aberto graves, DPOC. Doença É um dos mais
tratado, Miastenia gravis hepática ou renal seguros. Menos
DPOC grave graves. efeitos hepatotóxicos
devido à forma como
é metabolizado.

Tabela 2. Aplicação dos benzodiazepínicos em situações agudas.


Fonte: Autores.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fluxograma: Diagnóstico e tratamento de Ataque de Pânico.
Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
Realizada a abordagem proposta, caso haja a necessidade de manter o paciente sob observação para
melhor elucidação do caso, aguardar tempo de remissão dos sintomas. Pensando numa possível internação,
sugerimos a prescrição abaixo:

a) Prescrição sugerida:

1. Prover ambiente tranquilo e acomodação do paciente para o contato.


2. Monitorar sinais vitais e tentar aplicar técnica de respiração diafragmática.
3. Realizar avaliação clínica com exames que julgar necessários.
4. Solicitar ECG se achar necessário.
5. Descartados eventos clínicos: usar benzodiazepínico, preferencialmente de ação rápida ou de acordo
com disponibilidade do local.
• Diazepam 5 a 10 mg, ou
• Lorazepam 0,5 - 2 mg (se comorbidade hepática associada, ou idoso, preferir) ou
• Alprazolam 0,5 a 1 mg, ou (se insuficiência hepática, usar menor dose)
• Clonazepam 0,5 a 2 mg.(se houver disponível, usar a apresentação sublingual)
6. Manter paciente em observação com profissional de saúde.
7. Reavaliar a necessidade de medicar novamente.
8. Solicitar avaliação de outras especialidades de acordo com evolução clínica, se isto se mostrar
necessário.
9. Se houver remissão dos sintomas e parâmetros clínicos estáveis, dar alta e orientar sobre a
importância da busca de tratamento psiquiátrico e psicológico em serviço especializado, de acordo
com demanda apresentada.
10. Fazer o encaminhamento por escrito.
11. Solicitar retorno ao PS nos próximos dias, se julgar necessário, e avaliar manutenção ou remissão
do quadro.

DICA DO ESPECIALISTA

• A ausência de anormalidades clínicas ou benignidade dos achados não é suficiente para tranquilizar
o paciente nessa condição, uma vez que ele continua sem respostas diante dos sintomas. Por isso,
desde o primeiro episódio, é importante não contribuir para que ele vá embora mais confuso e
apreensivo sobre a causa não esclarecida da sua patologia. Sendo assim, a psicoeducação contribuirá
significativamente para o esclarecimento do paciente e sua aproximação dos mecanismos que o
acometem, e deve ser feita desde que o profissional que o atenda possua recursos para realizá-la.

REFERÊNCIAS
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25. Pollard CA, Lewis LM. Managing panic attacks in emergency patients. J Emerg Med. 1989; 7(5): 547-52.
11.1
CERATITES
Autores:
Mylena Maíssa Cunha Simões
Ayeska Terra Cardoso
Victor Ferreira Schuwartz Tannus

INTRODUÇÃO
Ceratite é a inflamação da córnea, podendo ser causada por agentes infecciosos, traumas, doenças
autoimunes, dentre outros. A sua incidência varia de acordo com cada tipo, sendo a mais comum a
infecciosa e a mais grave a por bactérias, variando a agressividade a depender da virulência do
microrganismo e da integridade da córnea.
A córnea é a parte mais externa do olho, sendo altamente inervada pela primeira divisão do nervo
trigêmeo, e não é vascularizada. Seu diâmetro médio é 11,5 mm na vertical e 12 mm na horizontal,
tendo espessura média de 0,5 mm. A córnea é dividida em 5 camadas: epitélio, camada de Bowman,
estroma, membrana de Descemet e endotélio, sendo o epitélio a sua camada mais externa e tendo
grande capacidade de repitelização, que ocorre entre 7 a 10 dias. Se a ceratite atingir o estroma,
possivelmente ocorrerá a úlcera. Esta poderá deixar cicatrizes que causarão opacidade corneana
permanente e até perfuração ocular.
Tratando-se do Brasil e de seus dados epidemiológicos, estudos apontam como o grupo mais
acometido por ceratites bacterianas e fúngicas os homens na sexta década de vida. Importante
ressaltar que o contato com meio rural, fumo, álcool, cirurgia ocular recente e trauma ocular são
fatores de risco com significância estatística em muitas cidades, sendo as regiões mais quentes e
úmidas as de maior frequência.

DEFINIÇÕES
A) CERATITES INFECCIOSAS

• Ceratite Bacteriana, Viral e Fúngica


As ceratites infecciosas se manifestam comumente quando o patógeno consegue invadir o epitélio
corneano comprometido. Apresentam um amplo espectro de fatores de risco, perfis epidemiológicos
e microbiológicos em todo o mundo. Elas podem ser divididas em bacterianas, virais e fúngicas. O
diagnóstico e tratamento imediatos podem limitar a perda de tecido, minimizar a cicatrização e
reduzir a necessidade de cirurgia futura; por isso, torna-se importante direcionar a atenção a eles.
Nas ceratites bacterianas, os microrganismos mais comuns são P.aeruginosa, S.aures, S.piogenes,
S.pneumoniae, Pseudomonas sp. (mais comum em usuário de lentes de contato), Streptococcussp e
Proteus sp. Na ceratite fúngica, os fungos mais frequentes são Aspergillussp, Fusariumsolani,
Scedosporiumsp e Candida sp.
Já nas ceratites virais, a mais comum é a herpética, que tem por base a grande variedade da
família herpesvírus. O vírus herpes simples (HSV) é o tipo viral mais comum, sendo o subtipo HSV1
o predominante nas infecções oculares. O diagnóstico é clinico, sendo necessário um exame
oftalmológico detalhado, avaliando a acuidade visual, a pressão intraocular (PIO) e uma excelente
biomicroscopia.
Os exames microbiológico, de cultura e histológicos (GRAM e GIEMSA) são essenciais para
diferenciar cada uma, além de auxiliar na melhor escolha do tratamento. Os fatores de risco como
traumas, doenças da superfície ocular e, principalmente, o uso inadequado de lentes de contato são
frequentes causas de ceratites, por isso a importância de uma minuciosa anamnese, observando a
relevância dos hábitos, condições climáticas e físicas do lugar onde o paciente reside.
Os principais sintomas incluem dor, sensação de corpo estranho, fotofobia, hiperemia conjuntival
e turvação/opacificação visual. Nas ceratites bacterianas, secreção mucopurulenta, edema estromal e
hipópio podem ser encontrados.
Nas ceratites fúngicas, infiltrados cinza-amarelados (filamentosas) e branco-amarelados
(leveduriformes - Cândida) podem estar presentes, assim como hiperemia conjuntival e edema
palpebral mais intensos.
Nas ceratites virais, a epífora é um achado frequente, assim como a úlcera com padrão linear
ramificado (dendrítica - geográfica) é muito característica da ceratite herpética. Deve-se fazer o
diagnóstico diferencial com o Herpes zóster pela semelhança do quadro.
O tratamento da ceratite bacteriana é tópico e se inicia com monoterapia ocular usando
Ciprofloxacino 0,3% (Ciloxan®), 1 gota de 4/4 horas por 7 a 10 dias, ou cloridrato de Moxifloxacino
5,45 mg/mL (VIGAMOX®), 1 gota de 6/6h por 7 dias, ou ainda Gatifloxacino a 0,3% (ZYMAR®),
1gota de 6/6 h de 7 a 10 dias. Em casos de úlcera severa, realizar terapia dupla com antibióticos
fortificados como Cefuroxima + Gentamicina, variando de 1,5% a 5%, de 1/1h nas primeiras 24 a 48
horas, posteriormente de 4/4 horas, por 7 a 10 dias, perdurando até a repitelização corneana.
Para casos de eminente perfuração corneana, deve ser considerado o uso de antibiótico sistêmicos
como a Ciprofloxacina 500 mg, 2 vezes ao dia, por 7 a 10 dias. O uso de colírio lubrificante e
pomada repitelizante é importante para o tratamento de todo os tipos de ceratites. Deve-se distribuir
as instilações ao longo do dia, geralmente orientando o paciente a usar com maior frequência possível
ou de 2/2 hora, podendo administrar: Hialuronato de Sódio a 0,15% (Hyabak®), Carmelose Sódica
5,0 mg/mL (Lacrifilm®) e uso de pomadas repitelizantes de aplicações 2 vezes ao dia, como acetato
de retinol 10.000 UI/g, aminoácidos 25 mg/g, metionina 5 mg/g e Cloranfenicol 5 mg/g (
Regencel®).
É importante salientar que nesses casos de ceratite infecciosa o uso de colírios de corticoide é
contraindicado, por dificultar a cicatrização corneana e levar à piora do quadro. Todavia, em casos
bem específicos como os de necrose estromal, o uso pode ser considerado.
O tratamento antifúngico consiste no uso da suspensão de Natamicina (ou Piramicina) colírio 5%
de 4/4h por 7 a 21 dias, nos casos das filamentosas. Nas ceratites fúngicas por cândida, utiliza-se
nitrato de Econazol creme a 1% (Micostyl ®) de 4/4h, por 7 a 14 dias. O uso adjuvante de colírio
lubrificante e um antibiótico de amplo espectro é aconselhável nestes casos, devido ao fato de a
infecção bacteriana secundária ser comum.
As ceratites fúngicas demoram a ter resposta ao tratamento de 14 a 21 dias, podendo ser
necessário estender este tempo. Nas ceratites fúngicas e virais, são comuns o aumento da
sensibilidade corneana e o aparecimento de leucomas corneanos persistentes.

• CERATITE SUPURATIVA
Ocorre comumente devido ao uso contínuo e incorreto de lentes de contato decorrente de má
higienização e suporte de armazenamento inadequado. É caracterizada pela intensa produção de pus
resultante da inflamação.
A infecção é possibilitada pela lente, que pode romper o tecido epitelial e favorecer a adesão dos
agentes infecciosos à córnea. Os agentes infecciosos são as bactérias (Pseudomonas) e os
protozoários, especificamente Acanthamoeba.
A ceratite por Acanthamoeba é uma infecção ocular grave que, apesar dos recentes progressos no
diagnóstico e tratamento, ainda provoca prolongada morbidade e perda da acuidade visual.
A infecção ocorre devido à grande presença desses agentes no meio ambiente, principalmente
colonizando os estojos das lentes e as soluções salinas que servem para a higienização. Os principais
sinais e sintomas são fotofobia, hipópio (pus na câmera anterior), dor ocular intensa, opacidade
corneana e diminuição da acuidade visual.
O diagnóstico é feito a partir do raspado ou biópsia corneana à procura dos agentes infecciosos
evidenciados pelo exame anatomopatológico, que mostrará o infiltrado de polimorfonucleados e a
hipervascularização. O tratamento que envolve as bactérias é o mesmo das ceratites bacterianas.
Já em relação à infecção por protozoários (Acanthamoeba), o esquema terapêutico consiste no
uso tópico de Sulfato de neomicina 0,35%, 1 gota de 4/4h, por 15 dias, ou Isotionato de Propamidina
0,1% (Brolene colírio®), 1 gota de 4/4h, por 15 dias, ou Clorexidina 0,02%, 1 gota de 1/1h, por 3
dias e a manutenção de 4/4h por até 3 meses. Corticoides tópicos podem ser avaliados após melhora
clínica.
Há ainda a opção do uso do antibiótico subconjuntival ou sistêmico na presença de
comprometimento escleral ou intraocular.

B) CERATITES NÃO INFECCIOSAS

• Ceratite Sicca e Síndrome De Sjögren


A ceratite sicca é uma doença de evolução crônica normalmente causada pela diminuição ou
irregularidade do filme lacrimal devido à atrofia progressiva da glândula lacrimal ou aumento da
evaporação lacrimal. As condições de baixa umidade, contato direto com o vento, ambientes com ar-
condicionado e a variação hormonal são propícias para a piora do quadro. Costuma ser 3 vezes mais
incidente em mulheres, com o pico de aparição após os 40 anos. Os sintomas mais encontrados são
sensação de corpo estranho, ardência, queimação, lacrimejamento excessivo, dor ocular, prurido,
cefaleia, hiperemia conjuntival, fotofobia e visão embaçada.
A Síndrome de Sjögren é uma alteração inflamatória devido a uma doença autoimune
caracterizada pela tríade: olho seco, boca seca e artralgia. Isso porque, primariamente, acometem-se
as glândulas salivares e lacrimais, e na forma secundária aparecem com doenças reumáticas, como
artrite reumatoide e lúpus. Possui a mesma incidência da ceratite sicca e em 76% dos pacientes, em
média, a forma secundária é encontrada. Para o diagnóstico são necessários uma boa anamnese, a
avaliação dos sinais e sintomas e uma biomicroscopia. O teste de BUT (ruptura do filme lacrimal) é o
mais utilizado pelo oftalmologista, que também pode utilizar o teste com corante de Rosa Bengala ou
Lisamina verde. Contudo, o Teste de Schimer é o padrão-ouro e o mais solicitado por clínicos e
reumatologistas.
Nos casos de suspeita de Sjögren, é necessária uma pesquisa laboratorial para autoanticorpos
(FAN, FR e anti-RO e anti-LA). O tratamento é sintomático e consiste principalmente na utilização
de lubrificantes oculares, pois eles diminuem a agressão ocular e fazem a função protetora da
lágrima. Em casos mais graves, pode-se utilizar imunossupressores oculares como a Ciclosporina
0,05% (Restasis®) de 8/8h por, no mínimo, 3 meses, assim como iniciar o uso de óleo de linhaça em
cápsula de 1000 mg, 1 vez dia, por 3 meses. Existe a possibilidade de fazer a obstrução cirúrgica do
ponto lacrimal em casos extremos.

• Ceratite Traumática
É causada pela exposição a agentes nocivos, na maioria acidentais, que causam a inflamação da
córnea. Pode ser causada por agentes químicos (fármacos, solventes, ácidos, bases, álcoois), térmicos
(soldas, exposição a luz ultravioleta), de exposição (fechamento inadequado das pálpebras pós
trauma ou por proptose), elétrica, por lente de contato e por corpo estranho (presença de ciscos,
sementes ou areia).
O desenvolvimento da lesão é diretamente proporcional à exposição, à duração, à quantidade e à
penetração ao agente causador. Tem grande incidência nos meios laborais, pois por vezes o EPI
(equipamento individual de proteção) não é utilizado. Os casos mais comuns são queimaduras por
solda, eletricidade e agentes químicos, sendo responsável por 48 a 65% dos casos de úlcera de córnea
nos países em desenvolvimento.
De modo geral os sintomas consistem em dor intensa, lacrimejamento, sensação de corpo
estranho, edema palpebral, midríase, hiperemia conjuntival e fotofobia. O diagnóstico é feito a partir
da história do trauma, exame ectoscópico (com eversão palpebral) e biomicroscopia. A ceratite por
corpo estranho geralmente é única e unilateral, já as ceratites térmica, elétrica ou química tendem a
ser bilaterais, porém assimétricas. Nas queimaduras químicas, a base é a mais grave devido à
bioquímica da córnea.
O tratamento geral se inicia com a limpeza ocular com soro fisiológico em abundância com cerca
de 8 a 10 litros, assim como o uso de lubrificante e pomada repitelizante. O uso de colírio de
antibióticos como a ciprofloxacino 0,35% pode ser feito em casos de secreção purulenta e hiperemia
conjuntival persistente.
Na ausência de corpo estranho, está indicada a oclusão ocular com pomada repitelizante por 24h e
após o uso dos medicamentos acima citados. Nos casos de ceratite por lente de contato, pode ser
administrado topicamente colírio de Diclofenaco de sódio 1% (Maxilerg®) ou Cetorolaco 0,5%
(Cetrolac®) de 6/6h, por 7 dias, para alívio da dor.
Pode-se utilizar no momento do atendimento colírio anestésico, como Cloridato de
Proximetacaína 0,5% (Anestalcon®) ou Tetracaína 10 mg e Fenilefrina 1 mg (Anestesico®) 1 gota,
para alívio da dor. Não é recomendável a prescrição destes anestésicos, visto que o uso rotineiro pode
gerar úlceras ésteres posteriormente.
Em casos de presença de corpo estranho, o oftalmologista deve ser contatado para fazer a retirada
do mesmo na Lâmpada de Fenda. Não é aconselhado fazer a retirada do corpo estranho a “olho nu”,
apenas a lavagem com soro fisiológico e a prescrição de colírio lubrificante, pois a retirada sem a
aparelhagem necessária pode deixar restos de metal no olho e ocasionar úlcera e posterior perfuração
corneana.
Também não é recomendável utilizar pomada repitelizante sobre o corpo estranho (antes de retirá-
lo), apenas o uso de óculos escuros ou um curativo oclusivo.
Enquanto nas ceratites por exposição deve-se indicar o uso de lubrificante, pomada repitelizante e
a oclusão do olho, usando gazes e esparadrapo por 24h, em pacientes acamados ou em CTI deve-se
fazer este procedimento rotineiramente. Tal tratamento é indicado na grande maioria dos casos, com
melhora significativa dos sintomas e da ceratite.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Elaborado pelos Autores

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: Paciente 23 anos, sexo feminino, usuária de lentes de contato gelatinosas. Chega
a unidade de pronto-atendimento referindo que esteve em viagem recente e esqueceu seu estojo de
lentes de contato, então dormiu uma noite com as lentes e no outro dia durante o banho as deixou
expostas sobre a pia do banheiro, reutilizando-as mais tarde. Cerca de 6 horas depois do uso
iniciaram os sintomas: dor, sensação de corpo estranho, fotofobia, vermelhidão ocular, turvação
visual e secreção mucopurulenta . Observado ao exame clinico: edema palpebral, hiperemia
conjuntival e secreção mucopurulenta.

b) HD: ceratite bacteriana.

c) Prescrição Sugerida:

1. Hialuronato de Sódio a 0,15% (Hyabak®) ou Carmelose Sódica 5,0 mg/mL (Lacrifilm®),


pingar 01 gota de 3/3h, por 7 a 14 dias.
2. Ciprofloxacino 0,3% (Ciloxan®) ou Moxifloxacino 5,45 mg/mL (Vigamox ®), 1 gota de
4/4 horas por 7 a 10 dias .

REFERÊNCIAS
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11.2
CELULITE PRÉ-SEPTAL E PÓS-SEPTAL
Autores:
Isabella Ferreira Melli
Pedro Henrique Bernardo de Mendonça
Victor Ferreira Schuwartz Tannus

INTRODUÇÃO
A celulite orbitária bacteriana constitui um quadro infeccioso agudo com risco vital para os
tecidos moles da região orbitária. Globalmente, divide-se em duas situações: celulite periorbitária ou
pré-septal, localizada anteriormente ao septo orbitário, e celulite orbitária ou pós-septal, quando
instalada posteriormente ao septo. A celulite pré-septal tem maior incidência na população e possui
melhor prognóstico mediante o tratamento médico adequado. A celulite pós-septal é mais rara, porém
possui maior risco de complicações, incluindo cegueira e meningite. Ambas podem estar presentes
em qualquer idade, sendo mais comumente encontradas em crianças.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A) ETIOLOGIA
Várias são as causas que podem evoluir para tal patologia, sendo não raramente secundárias a
eventos muitas vezes já instalados (Quadro 1), porém o mecanismo mais comum é a disseminação
por contiguidade a partir de uma rinossinusite.

A - Relação com os seios paranasais: frequentemente secundário a rinossinusite etmoidal e infecções do


trato respiratório superior (mais comum).
B - Pós-traumático: ocorre antes das 72 horas de uma lesão penetrante no septo orbital.
C - Extensão de infecção adjacente: conjuntivite, dacriocistite, abscesso dentário e hordéolo.
D - Disseminação hematogênica.
E - Pós-cirúrgica: complicação de uma cirurgia retiniana, lacrimal ou orbitária.

Quadro 1. Causas de celulite na região orbitária.


Fonte: Elaborado pelos autores.

Os agentes infecciosos mais comumente encontrados nas celulites pré-septais incluem:


Streptococcus pneumoniae, Staphylococcus aureus, Streptococcus pyogenes, Haemophilus
influenzae. Na pós-septal, além dos mencionados, são encontrados anaeróbios e Moraxella
catarralis. Devido à imunização contra Haemophilus influenzae tipo B, estudos têm mostrado uma
redução de casos por esses microrganismos, sendo mostrada maior prevalência de infecções por
Streptococcus.
b) FISIOPATOLOGIA
A anatomia e o sistema de drenagem sanguínea da região justificam o risco aumentado da
infecção. A órbita possui anatomicamente grande afinidade com as pálpebras, os dentes, o ducto
nasolacriamal e os seios da face, principalmente do seio etmoidal, que é separado dos tecidos
orbitários por pequena lâmina óssea. Qualquer alteração da fisiologia colabora para facilitar a
disseminação da infecção. O seio esfenoidal está localizado medialmente à parede do canal óptico;
sendo assim, infecções nesta localização podem afetar o nervo óptico, levando à amaurose, e podem
também atingir o cérebro.

QUADRO CLÍNICO
A celulite pré-septal, assim com a pós-septal, apresenta sintomas comuns de acometimento dos
tecidos moles periorbitários, apresentando eritema, edema, calor, sensibilidade palpebral e quemose
(edema conjuntival). O quadro clínico da pré-septal limita-se aos tecidos moles externos, não
apresentando acometimento orbitário, diferenciando-se assim da pós-septal.
A celulite pós-septal deve ser suspeitada se estiverem presentes os sinais orbitários que incluem a
oftalmoplegia dolorosa, proptose, acuidade visual reduzida, defeito pupilar aferente e diplopia. A
celulite pós-septal apresenta pior prognóstico e pode evoluir de forma fulminante com complicações
severas que incluem a trombose do seio cavernoso, abscessos intracranianos, meningite e cegueira.
Ocasionalmente, a pré-septal pode cursar com febre, prostração e leucocitose, embora sejam mais
pronunciadas na celulite pós-septal.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico é feito por meio dos sinais clínicos de acometimento orbitário já citados associados
a exames complementares e laboratoriais.
Os achados dos exames laboratoriais, hemograma completo e proteína C reativa (PCR)
evidenciam um processo infeccioso com leucocitose e aumento do PCR.
A tomografia computadorizada (TC) de órbita e dos seios da face deve ser solicitada na presença
de celulite orbitária. Na imagem, é possível observar adensamento da gordura retrobulbar e
opacificação dos seios da face, sendo o método radiológico de eleição para o diagnóstico e
acompanhamento. Na impossibilidade de realização da TC, o raio-X simples dos seios paranasais
pode ser útil, pois podem estar presentes sinais sugestivos de sinusite, que é a principal causa de
celulite orbitária.

TRATAMENTO
O tratamento inicial depende da etiologia bacteriana relacionada à maioria dos casos de celulite
pré e pós-septal.
Na celulite pré-septal, usa-se antibioticoterapia via oral associada a AINEs e compressa quente. Já
na celulite pós-septal inicia-se, com antibiótico de amplo espectro com ação contra germes gram +,
gram -, anaeróbios, produtores de beta-lactamase.
Opta-se por antibiótico endovenoso nos casos de celulite pós-septal e/ou necessidade de
drenagem do abscesso.
Na celulite pré-septal, usa-se cefalosporina de 2ª geração (cefuroxima de 8/8 horas) ou
amoxicilina + ácido clavulânico (Clavulin® 500 mg de 8/8 horas), ambos VO por 7 a 10 dias,
associado a AINEs (Nimesulida® 100 mg de 12/12 horas) VO por 5 dias, além de compressa morna.
Na celulite pós-septal em adultos, a 1ª escolha é:cefalosporina de 3ª geração (Ceftriaxone®) 2 g
EV de 12/12 horas + oxacilina (Nafcillin®) 2 g EV de 6/6 horas. A 2ª escolha é amoxicilina com
clavulonato 1 g 8/8 horas, e a 3ª escolha é levofloxacino 500 mg EV/dia + clindamicina 600 mg EV
8/8 horas. Em casos de alergia a penicilina, usa-se vancomicina 1 g EV 12/12 horas. Pode-se fazer
uso de ceftadizime + metronidazol também.
Em crianças, faz-se o uso de Ceftriaxone® 100 mg/kg/dia EV de 12/12h + oxicilina 200
mg/kg/dia EV de 6/6 horas, e a 2ª escolha é amoxicilina com clavulonato 100 mg/kg/dia EV de 8/8
horas. Em casos de alergia a vancomicina, deve-se utilizar 40 mg/kg/dia EV de 8/8h.
Tanto em adultos quanto em crianças o tratamento varia de 3 a 21 dias, dependendo do estado
clínico do paciente.
Caso não haja melhora no tratamento clínico de 48 a 72 horas e a TC do paciente evidenciar
abscesso ou apagamento da gordura orbitária ou espessamento da musculatura, ou o paciente
apresentar limitação dos movimentos oculares, proptose, baixa acuidade visual, diplopia, deve-se
iniciar o tratamento cirúrgico com drenagem de abscesso. Se comprovada a etiologia bacteriana por
germe anaeróbio, associa-se o metronidazol com as demais.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: A.C.S, 12 anos, sexo feminino, deu entrada no serviço de emergência,
queixando-se de dor em olho esquerdo, hiperemia conjuntival e edema em região periorbitária de
início há 3 dias. Negava uso de medicações orais e colírios. De antecedentes patológicos referiu
quadro de rinossinusite prévia. O médico, após a avaliação, suspeitou de conjuntivite e iniciou colírio
c lubrificante ocular (Lacrifilm®) e compressas geladas.
Após 48 horas, a paciente retornou ao hospital apresentando piora do quadro clínico, referindo
“olho para fora”, com dor à movimentação ocular, baixa acuidade visual em olho esquerdo e piora do
edema palpebral.

b) Exame Físico: Paciente em regular estado geral, pirético e algo desorientado.

• Ectoscopia do lado esquerdo: Edema palpebral intenso (superior e inferior), com sinais
flogísticos, proptose, oftalmoplegia dolorosa e hiperemia conjuntival.
• Acuidade visual: Olho direito: 20/20. Olho esquerdo: 20/80.
c) Hipótese diagnóstica: Celulite Pós-Septal à esquerda secundária à rinossinusite.

d) Conduta: Solicitar TC de crânio e seios da face, hemograma, VHS e PCR.


Se esta TC apresentar comprometimento pós-septal, seguir a prescrição a seguir:

e) Prescrição Sugerida:

• Celulite pós-septal:
1. Dieta oral branda.
2. Scalp salinisado.
3. Ceftriaxone 2 g EV, 12/12 horas por 7 dias.
4. Oxacilina 2 g EV, 6/6 horas por 7 dias.
5. Nimesulida 100 mg VO, 12/12 horas por 5 dias.
6. Dipirona® 500 mg, VO 6/6 horas, se houver dor.
7. Compressa morna,4x dia, por 15 mim.
8. Sinais vitais de 6/6h.

• Celulite pré-septal:
1. Amoxicilina + ácido clavulânico 500 mg, 8/8 horas, por 7 a 10 dias.
2. Nimesulida 100 mg VO, 12/12 horas por 5 dias.
3. Analgésico (Paracetamol ou dipirona) VO, 6/6 horas, se houver dor.
4. Compressa morna.

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Koogan; 2014.
11.3
CONJUNTIVITES
Autores:
Henrique Araújo Cenci
Neiffer Nunes Rabelo
Victor Ferreira Schuwartz Tannus

INTRODUÇÃO
A conjuntivite corresponde a uma “inflamação da conjuntiva”, membrana mucosa transparente que
recobre a superfície do globo ocular até o limbo e a superfície interna das pálpebras. Pode ser de
origem infecciosa ou não infecciosa, podendo ter como agente causal bactérias, vírus e até processos
alérgicos.
Constitui uma queixa recorrente da atenção básica, sendo a causa mais frequente de “olho
vermelho”, sendo considerada a doença ocular mais comum, equivalente a 25% de todo o atendimento
emergencial oftalmológico. Afeta todas as faixas etárias e classes socioeconômicas, e apresenta
predomínio dos 20 aos 29 anos.
O quadro clínico geralmente cursa com hiperemia conjuntival, lacrimejamento, ardência e
fotofobia, e seu tratamento se baseia em medidas para evitar proliferação, uso de lubrificantes e
antibióticos quando necessários. Se não tratada adequadamente, pode evoluir com acometimento
corneano e, em algumas ocasiões, levar à cegueira.
A incidência de conjuntivite bacteriana, em comparação à de etiologia viral, é notavelmente
menor, estimada em 135 casos a cada 1000, sendo a viral responsável por 80% do total de casos.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
a) ETIOLOGIA
A conjuntivite pode ser causada por agentes tóxicos ou mecânicos, por alergias ou mesmo por
microrganismos, incluindo vírus, bactérias e parasitos, podendo ser dividas em infeciosas (viral e
bacteriana) e não infeciosas (alérgicas e não alérgicas).
As afecções bacterianas podem ser dividas em hiperaguda (24h), aguda (até três semanas) e
crônica (após três semanas), sendo a aguda a de maior relevância e a qual constitui uma doença
comum, geralmente autolimitada e ocasionada pelo contato direto do olho com secreções ou objetos
infectados, dentre estes toalhas, cosméticos, lentes de contato. Os microrganismos mais comuns são S.
pneumoniae, S. aureus, H. inflkuenzae e M. catarrhalis, e os outras representam uma minoria de casos,
geralmente graves, como nesseria gonorrhaene, clamídia e neisseria meningitidis. Em crianças, a
doença é comumente causada por Haemophilus Influenzae, S. pneumoniae e M. catarrhalis.
A conjuntivite viral constitui o tipo mais comum, e sua transmissão é bastante similar à bacteriana,
porém bastante contagiosa devido à capacidade da partícula viral de se manter viva, facilitando o
surgimento de epidemias. Seu contagio ocorre de forma semelhante ao vírus da gripe, sendo o
adenovírus o principal agente etiológico (90% dos casos).
Já a conjuntivite alérgica é definida como uma resposta de hipersensibilidade por exposição a
alérgenos, e sua gravidade se relaciona à intensidade da resposta inflamatória, à idade do paciente e
aos fatores genéticos e geográficos. Alguns subtipos de alergia ocular são descritos: rinoconjuntivite
alérgica, ceratoconjuntivite vernal, ceratoconjuntivite atópica e a conjuntivite papilar gigante.
Por fim, temos as conjuntivites não infeciosas e não alérgicas, a química, a conjuntivite decorrente
de trauma e as conjuntivites secundárias a outras patologias, como colagenoses e síndrome de Reiter.

b) FISIOPATOLOGIA
A fisiopatologia da inflamação conjuntival está relacionada ao agente causal, em que a
vasodilatação acarretara dano endotelial, através do aumento da permeabilidade, gerando quemose,
diminuição da transparência do tecido e por estímulo de terminações nervosas sensoriais uma
hipersecreção.

QUADRO CLÍNICO
a) Conjuntivite bacteriana
Na conjuntivite bacteriana, o quadro clínico evolui de maneira abrupta, com descarga purulenta
abundante, hiperemia conjuntival, queimação, pálpebras aderidas e baixa visão. Pode ser
acompanhada ainda por edema palpebral e dor ocular à palpação. Importante reforçar que o
envolvimento ocular é geralmente bilateral e assimétrico, embora um olho possa ser afetado 1-2 dias
antes do outro.
Uma forma bastante específica de conjuntivite bacteriana é a ocasionada pela Clamidia tracomatis,
que ocorre no adulto geralmente por transmissão sexual, através do contato da secreção genital ao olho
e, em crianças, é usualmente associada ao parto normal e más condições de higiene. Essa infecção se
inicia com uma conjuntivite subaguda, com comprometimento uni ou bilateral, junto à secreção
mucopurulenta, podendo cronificar e persistir por 3 a 12 meses. Algumas reinfecções de alguns
sorotipos podem acabar ocasionando o traucoma, doença que cursa com folículos na conjuntiva tarsal
e limbar superior, que se não tratadas adequadamente evoluem para as fases tardias da doença,
surgindo áreas de fibrose na conjuntiva tarsal (“Linha de Arlt”) . Esta conjuntivite pode ocorrer no
recém-nascido entre o 5° ao 10° dia de vida após o parto normal, cursando com hiperemia conjuntival
intensa, edema palpebral, secreção mucopurulenta e pode estar associado com doenças sistêmicas,
como pneumonia e otite.
A ceratoconjuntivite gonocócica é causada pela Neisseria Gonorrhoae, que invade o epitélio
corneano através de contato secreções genitais maternas contaminadas. Essa patologia se desenvolve
após 2 semanas de nascimento, se caracterizando por um edema palpebral bilateral, papilas
conjuntivais com pseudomenbranas, adenomegalia, quemose e secreção profusa, purulenta e copiosa.
Se não tratada adequadamente, pode evoluir para uma úlcera corneana, podendo evoluir com
perfuração.

b) Conjuntivite viral
O quadro clínico da conjuntivite viral pode apresentar-se isoladamente ou concomitantemente a
sinais e sintomas sistêmicos associados a infecção por Adenovírus, Herpes vírus (Herpes simples e
Herpes do tipo 3) e HIV. De uma forma geral, quando desencadeada pelo adenovírus, manifesta-se
com hiperemia conjuntival, secreção hialina, aglutinação palpebral matinal, fotofobia, reação folicular,
sensação de queimação ou areia nos olhos bilateral, associados a sintomas de resfriado como tosse
matinal e congestão nasal. O segundo olho costuma ficar envolvido dentro de 48h até uma semana
após o primeiro, e geralmente ocorre a piora dos sintomas entre 3-5 dias, melhorando gradualmente
em 1-2 semanas. Nos casos de infecção por herpes simples, os sintomas oculares geralmente são
unilaterais, podendo estar acompanhados de lesões vesiculares. Diferentemente da afecção bacteriana,
a linfadenomegalia pré-auricular está presente em até 90% dos casos.1,7,8,12

c) Conjuntivite Alérgica
A conjuntivite alérgica pode se apresentar como um sintoma isolado ou compor uma reação
alérgica generalizada, com sintomas em outros segmentos corporais. As queixas principais incluem
prurido intenso, fotofobia, secreção hialina e olho vermelho, e a maioria dos pacientes contém história
prévia de atopia ou apresenta quadros alérgicos com rinite ou bronquite associados. O quadro
geralmente é bilateral, assimétrico e não contagioso, podendo seu curso ser agudo ou crônico. Na
conjuntivite alérgica aguda, costuma haver edema palpebral muito importante, quemose exarcebada,
lacrimejamento e prurido.
O quadro clínico pode variar de intensidade conforme o subtipo da alergia ocular. A conjuntivite
sazonal é a mais frequente dos tipos, sendo integrada a fatores externos, como poeira e pólen, tem
intensidade de leve a moderada, sem envolvimento corneano; a conjuntivite vernal ou primaveril é
encontrada, principalmente, no sexo masculino, dos 5 aos 15 anos, e está associada a outras
manifestações alérgicas, seus sintomas usualmente são mais severos, encontrando hipertrofia papilar e
nódulos limbares de Trantas e úlcera em escudo. A conjuntivite atópica é a mais rara, podendo
acarretar severo dano ocular e geralmente tem acometimento cutâneo, e está associada a asma ou
outras manifestações alérgicas. A conjuntivite papilar gigante é aquela induzida mecanicamente,
frequentemente relacionada ao uso de lentes de contato gelatinosas e próteses oculares,
caracterizando-se pela presença de papilas tarsais gigantes.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico das conjuntivites é clínico, fundamentado na anamnese do paciente e no exame
biomicroscópico, geralmente com o auxílio da lâmpada de fenda, em que se observa inflamação
conjuntival associada a outros achados. Para o esclarecimento etiológico pode-se usar PCR, Elisa,
microscopia direta, biópsia conjuntival, teste de provocação conjuntival com alérgenos e dosagem
sérica de IgE-específica, isolamento de cultura, testes rápidos virais, porém são poucos utilizados no
dia a dia, sendo restrito a casos mais graves, epidemias e pesquisas.

a) DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Os principais diagnósticos diferenciais das conjuntivites constituem as causas de olho vermelho,
dentre estas as uveítes e crises agudas de glaucoma. Nessas situações, observa-se aumento da pressão
intraocular, baixa acuidade visual, presença de células inflamatórias na câmara anterior, além de
quadro de dor ocular, quadros que fogem as alterações comumente encontradas nas conjuntivites,
somente em casos excepcionais.

TRATAMENTO
a) Conjuntivite bacteriana
O tratamento das conjuntivites bacterianas fundamenta-se na utilização de antibióticos, mas não se
deve esquecer de medidas para evitar a proliferação da bactéria, como: higiene ocular com SF 0,9% e
lenço descartável, trocar fronhas e toalhas de rosto, lavar as mãos após manuseio de colírios, uso de
óculos escuros, além de atestado médico de 5 a 7 dias. Deve-se dar preferência por antibióticos
tópicos, sendo utilizadas as quinolonas ciprofloxacino (Maxiflox®), gatifloxacino (Zymar®),
moxifloxacino (Vigamox®)) ou aminoglicosídeos tobramicina (Tobrex®)) 4 a 5 vezes ao dia,
associadas aos lubrificantes (Lacrifilm®, Systane UL®, Hyabak® e Optive®) e compressas frias. Se
houver processo inflamatório muito intenso, o uso de corticoides tópicos também pode ser indicado
associado (Maxiflox-D, Tobradex®, Zypred®, Vigadexa).
Em algumas situações, faz-se necessário um tratamento alternativo, graças à característica própria
do seu agente etiológico. Exemplos disso são os recém-nascidos com ceratoconjuntivite gonocócica
que necessitam ser internados e submetidos à cultura da secreção, uso de antiobiótico (Ceftriaxona 25-
50 mg por kg, não excedendo 125 mg por 7-10 dias), além de uso de colírio de Gentamicina, de 3/3h,
por 10 dias; em adultos deve ser realizado com antibioticoterapia sistêmica e tópico adjuvante, usando
preferencialmente Ceftriaxona na dose única de 1g IM. Adultos com conjuntivite por clamídia
precisam fazer uso de pomada de tetraciclina (4x ao dia por 6 semanas) ou macrolideos por via oral
(Azitromicina 1 g em dose única ou eritromicina 500 mg 12/12hrs por 14 dias).
Em todos os casos de conjuntivite neonatal com suspeita de infecção gonocócica ou por clamídia
devem ser coletados raspado conjuntival para exame laboratorial e devem ser preferencialmente
referidos à oftalmologia.

b) Conjuntivite viral
A conjuntivite viral não apresenta tratamento específico, geralmente a resolução é espontânea em 2
semanas, porém há benefícios com uso de lubrificantes(Lacrifilm®, Hyabak®, Systane UL® e
Optive®.) de 4 a 6 vezes ao dia para alívio dos sintomas, uso de óculos escuros para alívio da
fotofobia, evitar uso de lentes de contato. O uso de AINES e analgésicos em casos de desconforto
intenso por edema palpebral e linfadenopatia pré-auricular pode ocorrer.
Antibióticos tópicos não estão indicados e não protegem contra infecção secundária, inclusive
podem ser tóxicos e causar alergia. Uso do corticoide tópico (dexametasona) também não deve ser
usado devido ao aumento da replicação viral, ao aumento do tempo de doença e por piorar a
conjuntivite por herpes caso não tenha sido diagnosticada. Usar somente em casos de membrana
(secreção de fibrina aderida em tarso) e infiltrados corneanos.

c) Conjuntivite Alérgica
As medidas iniciais nos casos mais simples incluem controle ambiental do agente causal,
compressas frias e uso de lubrificantes, podendo lançar mão de corticoides e anti-histamínicos. Nos
casos moderados, podem ser usados colírios anti-histamínicos (Patanol- S® ou Lastacaft®) 1x/dia, no
período de maior prurido, e antialérgicos sistêmicos durante as crises agudas (Loratadina 10 mg de
12/12h ou Descloferinamida 2 mg de 8/8h). Já os corticoides tópicos (Maxidex® (dexametasona) ou
Pred Fort® (predinisolona) de 6/6h, por 7 dias, devem ser reservados para o controle das
exacerbações, lembrando sempre de realizar o desmame.
O não tratamento ou o tratamento inadequado dos quadros de conjuntivite alérgica pode levar a
complicações como: úlceras corneanas, opacidades corneanas, ceratocone, catarata, perda das partes
laterais das sobrancelhas e cílios, predisposição às ceratites herpética, fúngica e infeção palpebral por
estafilococos.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: A.C.F, 47 anos, sexo feminino, dona de casa, chega ao pronto-socorro
queixando-se de hiperemia conjuntival, secreção purulenta, ardência e fotofobia em olho direito, que
se iniciou há um dia. Refere que seu filho iniciou quadro semelhante há dois dias. Nega baixa
acuidade visual e dor ocular. Afirma não fazer uso de correção, não ser portadora de nenhuma doença
de base e não ter história prévia de patologia ocular.

b) Exame Oftalmológico: biomicroscopia (olho direito) apresentando hiperemia conjuntival,


presença de secreção mucopurulenta e reação papilar. Olho esquerdo apresentando conjuntiva calma e
clara e córnea transparente.

c) HD: Conjuntivite Bacteriana.

d) Prescrição Sugerida:

• Uso Ocular:
1. Ciprofloxacino + Dexametasona (Maxiflox-D®) colírio -------------------------------- 1frasco.
Pingar uma gota em cada olho 4 em 4 horas por 7 dias.
2. Lacrifilm® ou Systane UL® ou Hyabak® ou Optive® colírio ------------------------------- 1
frasco.
Pingar 1 gota nos 2 olhos de 4 em 4 horas por 15 dias.

REFERÊNCIAS
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13. Gerstenblith AT, Rabinowitz MP. Manual de Doenças Oculares Do Wills Eye Hospital: diagnóstico e tratamento no
consultório e na emergência. 6. ed. São Paulo: Artmed; 2015.
14. Azari AA, Barney NP. Conjunctivitis: a systematic review of diagnosis and treatment. JAMA. 2013; 310(16): 1721-9.
11.4
EDEMA PALPEBRAL
Autores:
Emerson Alexandre de Sales Junior
Bruna Sá Eduardo
Victor Ferreira Schuwartz Tannus

INTRODUÇÃO
As pálpebras são estruturas especializadas com componentes anatômicos únicos. Sua espessura
varia de 700 μ a 800 μ, sendo a pele da pálpebra a mais delgada do corpo. Em suas margens,
localizam-se os cílios, juntamente com as glândulas de Zeis e Moll. Têm a função de proteger o olho e
proporcionar conforto ocular contra a luz, além de uniformizar a lágrima sobre a face exposta do globo
ocular.
Edema palpebral é o acúmulo anormal e excessivo de líquido no seu espaço intersticial, resultado
de um desequilíbrio das pressões hidrostática e oncótica.
Sua etiologia é variável, podendo ser de origem alérgica, infecciosa ou inflamatória. É importante
sempre conhecer a causa, para realizar o tratamento específico para cada caso.
Além de tratar a causa base, o uso de anti-inflamatórios e analgésicos é importante para alívio dos
sintomas, como dor e dificuldade visual.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O edema palpebral é um achado clínico, que norteia o diagnóstico e está presente em várias
patologias, locais ou sistêmicas, ocorrendo devido a um acúmulo excessivo de líquidos nos tecidos
palpebrais em razão do aumento da permeabilidade capilar local. É válido ressaltar que a pálpebra
possui a pele aderida frouxamente aos tecidos subjacentes, facilitando a formação de edema.
O edema pode ser precipitado pela exposição ao pólen, picada de insetos (véspulas, vespas e
abelhas), por medicamentos (IEC’s e AINES) ou alimentos (peixes, crustáceos e chocolate), o que leva
a uma liberação de mediadores inflamatórios locais e altos títulos de IgE, tendo sua manifestação com
início repentino e uni ou bilateral, frequentemente acompanhado de edema conjuntival (quemose) e
prurido intenso; neste caso, descrevemos como edema alérgico ou angioneurótico.
A dermatite de contato é uma condição idiopática que gera uma resposta inflamatória tardia, a qual
cursa com edema palpebral. Acontece após a primeira exposição a algum cosmético, soluções para
lentes de contato, colírios (atropina e sulfas) e pomadas, ocasionando o fenômeno de
hipersensibilidade. É facilmente evitada, distanciando-se dos fatores atópicos.
A patologia de origem renal é um evento com repercussão de nível sistêmico, em que ocorre
acúmulo de líquido no organismo, e possui como característica principal o aparecimento do edema
palpebral matutino, sendo um edema frio (por retenção líquida), sem sinais logísticos e que diminui
nos decúbitos prolongados.
Alterações endócrinas sistêmicas devido à disfunção da glândula tireoidiana a longo prazo podem
cursar com mixedema palpebral bilateral, sem sinais flogísticos e sem relação com o decúbito. A
doença de Graves cursa com edema palpebral devido à deposição de mucopolissacarídeos na órbita.

QUADRO CLÍNICO
Cada etiologia se descreve com um achado clínico típico. Tratando-se das causas locais, as
principais são a conjuntivite alérgica e as dermatites de contato.
A conjuntivite alérgica é uma reação de hipersensibilidade mediada pela degranulação de
mastócitos em resposta à ação da IgE. A patologia se apresenta com um edema palpebral
(principalmente na pálpebra inferior), e tem como principal sintoma o prurido ocular e periocular. É
evidenciado também hiperemia conjuntival, lacrimejamento, coriza, prurido nasal e espirros.
A utilização de cosméticos frequentemente leva a dermatites de contato, em que encontramos
lesões eritematosas, papulovesiculosas, vesicular (principal achado), eritema, descamação, exsudação
e crosta associados ao edema palpebral.
O acometimento bilateral refere muitas vezes a um quadro sistêmico, podendo estar associado a
distúrbios renais, endócrinos ou possuindo origem autoimune.
A oftalmopatia de Graves é conhecida como doença tireoidiana ocular de origem autoimune e que
ameaça a boa acuidade visual, havendo uma hipertrofia e aumento do volume da gordura orbitária,
com acúmulo de imunocomplexos antitireoglobulina nos músculos extraoculares, resultando em
proptose. Sua fase aguda é caracterizada, na maioria das vezes, pelo acometimento bilateral, com
hiperemia palpebral, dor, quemose, diplopia, embassamento visual e hiperemia conjuntival.
A síndrome nefrótica é uma outra causa de edema palpebral; contudo, neste caso, gera um edema
palpebral matinal devido à hipoproteinemia que leva a uma diminuição da pressão oncótica do plasma,
com redução da reabsorção do líquido intersticial. O lúpus eritematoso discoide é uma afecção
autoimune que provoca danos simétricos nas pálpebras inferiores, causando madarose, descamação,
eritema, telangectasias e, principalmente, o edema palpebral.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico é feito de acordo com a causa desencadeante do edema. Como as causas sistêmicas
precisam ser abordadas de maneira distinta, será abordado aqui apenas sobre o edema palpebral de
origem local.
A conjuntivite alérgica apresenta quadro clínico sugestivo (prurido) e história pessoal e familiar de
quadros de atopia, se há associação com outras patologias alérgicas, como asma, rinite e dermatite
atópica.
Para dermatites de contato, é preciso associar o quadro clínico com uma possível causa e, a partir
disso, pode ser necessária a realização de testes de contato para identificar o fator causal, sendo este o
padrão-ouro. Na dermatite de contato alérgica, durante o teste de provocação, observa-se a erupção
eczematosa, e raramente há urticárias ou lesões morbiliformes. Na dermatite de contato irritativa,
observam-se bolhas, úlceras e necrose.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
Das causas alérgicas, é importante saber que o edema alérgico agudo (causado por picada de
insetos ou medicamentos, por exemplo) é um edema súbito, indolor e depressível. A dermatite de
contato apresenta edema e eritema palpebrais, comumente associado a descamação e prurido. A
dermatite atópica, além do edema palpebral, se apresenta com espessamento, descamação e fissuras
verticais da pele da pálpebra e geralmente está associada a blefarite estafilocócica e madarose.
As causas infecciosas de edema palpebral são inúmeras. Neste capítulo, iremos tratar das mais
comuns na prática clínica. O herpes zóster oftálmico cursa rash maculopapular, desenvolvimento
progressivo de vesículas, pústulas e ulceração com descamação, sempre unilateral e respeitando a
linha média da face. O herpes simples evolui com grupos de pequenas vesículas que se rompem,
formando crostas em seguidas. Impetigo são máculas eritematosas que rapidamente evoluem para
vesícula e bolha, que ao se romperem produzem crostas amarelo-douradas. A erisipela, como sinais
típicos, apresenta uma placa subcutânea bem definida, eritematosa e endurecida, e, quando o
envolvimento palpebral é primário, geralmente é mais grave, podendo determinar contratura
secundária. A fasceíte necrotizante é uma necrose que evolui muito rapidamente, cursando com edema
e eritema que evoluem para formação de bolha e descoloração negra da pele.
Importante citar aqui o Hordéolo, que é uma infecção estafilocócica de estruturas da pálpebra, e o
Calázio, que é a cronificação do hordéolo, quando esse já se apresenta indolor e sem outros sinais
flogísticos.

TRATAMENTO
Importante ressaltar que o tratamento dos edemas palpebrais sempre se baseia em tratar a causa
base da patologia desencadeante.
Nas etiologias alérgicas, a parte mais importante do tratamento está em afastar o agente causal,
seja ele pó, ácaro, produtos químicos, entre outros. Pode-se iniciar o uso de agentes antes histamínicos
como Loratadina 10 mg de 12/12 horas ou Prometazina 01 ampola (50 mg/2 mL) intramuscular,
transferindo para via oral o tratamento logo que possível.
Quando a causa for infecciosa, combater o microrganismo se torna o objetivo do tratamento.
Considerando que o agente microbiano mais comum dessas infecções é o S. aureus, pode ser
empregada a Ceftriaxone 1 g endovenosa ou intramuscular de 12/12 horas ou a Cefalexina 500 mg de
06/06 horas, geralmente por 7 a 10 dias. A escolha da via de administração da medicação varia de
acordo com a gravidade do caso.
Para as outras causas de edema palpebral, relacionadas a distúrbios renais, endócrinas e outras
causas sistêmicas, o tratamento visa ao controle da causa de base.
O uso de anti-inflamatórios não esteroides e analgésicos como Dipirona e Paracetamol pode ser
feito para controle da dor, caso ela exista.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Yannof.14

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) A.S.R., sexo feminino, 16 anos, procurou pronto-atendimento devido a episódio de febre
associado a dor e edema periorbitário. Na ocasião, foi diagnosticada com celulite periorbitária, sem
indícios clínicos de acometimento pós-septal. Foi prescrito à paciente tratamento oral com
Amoxicilina + Clavulanato.
Em três dias a paciente retorna com piora do estado geral, persistência da febre e lesão com
sangramento, crostas escuras profundas e tumoração com aspecto necrótico.

b) Hipótese Diagnóstica: Fasceíte Necrotizante.

c) Conduta: Realizado debridamento cirúrgico.


Internação hospitalar para tratamento endovenoso.

d) Prescrição Sugerida:

1. Dieta Branda
2. Ceftriaxona 1 g EV 12/12 horas
3. Dipirona 1 g EV 06/06 horas se dor ou febre
4. Cetoprofeno 100 mg IM 24/24 horas
5. Sinais Vitais

REFERÊNCIAS
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de literatura. Revista de Medicina e Saúde de Brasília. 2019; 7(2): 236-44.
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crianças atendidas em serviço especializado. Arq Asma Alerg Imunol. 2018; 2(3): 357-63.
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14. Yanoff M, Duker JS. Oftalmologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009.
11.5
GLAUCOMA AGUDO
Autores:
Andréia do Couto Morais
Andressa Mayumi Matucuma
Victor Ferreira Schuwartz Tannus

DEFINIÇÕES
O glaucoma é a segunda causa de cegueira e a primeira causa de cegueira irreversível em todo o
mundo. Quando ocorre de forma aguda, é uma importante causa de urgência oftalmológica. Essa
patologia, também denominada glaucoma agudo primário (GAP), cursa com um rápido período de
evolução, podendo acarretar danos oculares irreversíveis.
O quadro clínico normalmente é de início abrupto, com baixa acuidade visual (BAV), forte dor
ocular e pupila em média midríase e pouco reativa. Esses sintomas podem ser acompanhados com
queda do estado geral, náuseas e vômitos.
Por se tratar de uma Urgência, o tratamento tem como objetivo interromper a crise o quanto antes,
com o objetivo de diminuir a dor, a PIO (pressão intraocular) e o dano ao disco óptico (DO), devendo
ser utilizada terapia clínica.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O GAP pode se apresentar de forma aguda, subaguda e crônica. Apenas a forma aguda é
considerada uma Urgência, cursando quase sempre com PIO elevada, sendo o principal fator
desencadeante da lesão neuropática glaucomatosa.
Dentre os principais fatores de risco, estão: idade (55-70 anos), ascendência asiática, história
familiar, sexo feminino, hipermetropes, ângulo iridocorneano estreito, íris em plateau e
pseudoesfoliação.
A doença glaucomatosa age atingindo o DO com perda de células ganglionares da retina,
causando lesão neuropática.
Os sintomas do glaucoma agudo ocorrem devido à rápida elevação da PIO, que pode causar uma
disfunção temporária das células do endotélio corneano e isquemia transitória da retina.
Normalmente, a crise ocorre em pacientes com glaucoma de ângulo fechado, devido à dificuldade
na drenagem do humor aquoso, onde o principal mecanismo envolvido é o bloqueio pupilar,
ocorrendo geralmente em indivíduos acima de 60 anos e em hipermetropes (devido ao estreitamento
da câmara anterior).
Isso ocorre porque, com o passar da idade, o cristalino sofre modificações estruturais como
aumento da sua espessura, se aproximando da íris. Assim, ela causa um estreitamento do ângulo
iridocorneano, podendo levar a um fechamento total da filtração, levando à crise aguda em pacientes
que já possuem uma predisposição. O fator desencadeante desse bloqueio pupilar é causado por
estresse e medicamentos capazes de aumentar a PIO ou fechar o seio camerular, como:
anticoagulantes, derivados da sulfa, agentes adrenérgicos, colinérgicos e anticolinérgicos.

QUADRO CLÍNICO
O quadro clínico cursa com sintomas clássicos como dor ocular intensa e retro-orbitária, náusea,
podendo gerar vômitos, cefaleia (em geral hemicraniana e ipsilateral), fotofobia, lacrimejamento,
visão de halos coloridos e visão turva. Também é possível observar sinais como hiperemia
conjuntival, pupilas em média midríase e pouco reativa, diminuição da acuidade visual, PIO elevada
(geralmente maior que 40 mmHg), câmara anterior (CA) rasa, abaulamento periférico da íris,
fechamento angular, reação de CA, olho endurecido (pétrio) à palpação digital e edema corneano. Na
grande maioria dos casos, o glaucoma agudo ocorre unilateralmente.

EXAME FÍSICO
O exame físico deve ser muito minucioso e sempre bilateralmente.

Baixa Acuidade visual – diminuição súbita Pressão intraocular elevada (geralmente maior que 40
mmHG).

Biomicroscopia: hiperemia conjuntival, CA rasa, íris atrófica, com neovascularização ou sinéquia


posterior, pupila em midríase e pouco reativa, edema microcístico de córnea.

Tensão bidigital: endurecido (o normal é a consistência como a ponta do nariz).

Figura 1. Hiperemia conjuntival, pupilas em média dilatação e CA rasa


Fonte: GERSTENBLITH, A. T.; RABINOWITZ, M. P. Manual de Doenças Oculares do Wills Eye
Hospital:
diagnóstico e tratamento no consultório e na emergência. 6.ed. São Paulo: Artmed, 2015

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico é clínico, através da anamnese e exame físico. A anamnese deve ser detalhada,
avaliando os fatores de risco, como hipermetropia, histórico familiar, eventos que possam ter
precipitado a doença, uso de colírios midriáticos. Deve-se avaliar histórico oftalmológico, como
problemas de retina, cirurgias ou tratamento com laser recentes prévios e uso de medicamentos (p.
ex., adrenérgicos ou anticolinérgicos tópicos e topiramato ou sulfa orais). À biomicroscopia, é
possível observar: hiperemia conjuntival, atrofia setorial de íris, pupila dilatada não responsiva,
sinéquias posteriores, epífora, cristalino em Glaukomflecken (opacidade capsular ou subcapsular
anterior associada a fechamento angular primário agudo). À fundoscopia: aumento da escavação do
DO, edema do DO com congestão venosa e/ou hemorragia em chama de vela associados. Ao realizar
a tonometria, a PIO estará aumentada, geralmente maior que 40 mmHg.

TRATAMENTO
a) FECHAMENTO ANGULAR AGUDO

Imediato:

• Deve-se colocar o paciente na posição supina para que o cristalino se desloque


posteriormente.

• ACETAZOLAMIDA (DIAMOX® 250mg) é um diurético que inibe a enzima anidrase


carbônica no túbulo contorcido proximal do nefro. Permite a redução da PIO e retenção de
fluidos.

• Obs.: Deve ser usado na dose de 500 mg VO e continuar com 250 mg a cada 8 horas, até
nova avaliação oftalmológica.

• MANITOL a 20% ou GLICERINA a 50% são diuréticos osmóticos que inibem a


reabsorção de solutos e água, aumentam o volume e diminuem a concentração da urina.

• Posologia: Manitol a 20% via IV: de 1,5 a 2 g/kg de peso (80 a 100 gotas/minuto) ou
glicerina 50% gelada VO: 1,5 g/kg de peso.

• MALEATO DE TIMOLOL 0,5% (Glaucotrat®) ou Combigan (Timolol 0,5 + Tartarato de


Brimonidina 0.2%), 1 gota de 12/12h, são indicados para a redução da PIO.

• Obs.: Em pacientes que apresentam contraindicação ao Timolol, há o Tartarato de


Brimonidina 0,2% colírio: 1 gota de 12/12 hs.
• PILOCARPINA a 2% é um alcaloide parassimpaticomimético usado como agente miótico
no controle da pressão intraocular elevada.

Posologia: 1 gota de 15 em 15 minutos por 3 vezes, depois de hora em hora nas primeiras três
horas e depois de 6/6 hs.

Obs.: Há uma controvérsia quanto ao uso desse agente colinérgico, pois, por causar miose e
aumentar a drenagem do humor aquoso no trabeculado, é usado em algumas formas de glaucoma,
porém, paradoxalmente, pode estimular GAP por ação da anteriorização do diafragma
iridocristaliniano, obtendo um fechamento angular completo capaz de reduzir a drenagem pela via
uveoescleral, podendo ser um agravo para os pacientes com ângulo estreito. Na maioria das vezes, é
utilizado apenas quando a PIO está menor que 40 mmHg.

• Analgesia e antieméticos, se necessários, são utilizados em doses terapêuticas para que não
afetem a pressão dos olhos, como: DIPIRONA® 1 ampola ou 1 cp de 6/6 hs e PLASIL® 1
ampola ou 1 cp de 8/8 hs.

b) FECHAMENTO ANGULAR ABSOLUTO

O olho já se encontra completamente cego.

Obs.: A iridotomia se faz após a crise, nunca na crise, e é realizada nos dois olhos. Esse
tratamento consiste em uma pequena perfuração na íris na porção superior, permitindo assim a
passagem do humor aquoso através da íris.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: Paciente 66 anos, sexo masculino, aposentado, vai ao pronto-socorro relatando
dor ocular intensa de início súbito no olho direito, associado a náusea, cefaleia hemicraniana,
fotofobia, lacrimejamento e diminuição da acuidade visual em olho direito.
Paciente refere que é hipermetrope e em última consulta com oftalmologista foi visualizado
catarata em ambos os olhos.

Nota-se também hiperemia conjuntival e midríase pupilar. Refere ter diagnóstico prévio de
glaucoma, porém nunca o tratou adequadamente.

b) Exame físico: À biomicroscopia (olho direito): pupila em média midríase pouco fotorreativa,
íris com atrofia setorial e edema corneano.

À fundoscopia (olho direito): retina aplicada, DO róseo, escavação 0.7 x 0,8 e brilho macular
preservado.

PIO: 51 mmHg em OD e 17 mmHg em OE.


c) Prescrição Sugerida:

1. Acetazolamida (Diamox) 250 mg, 2 comprimidos VO agora.


2. Maleato de Timolol 0,5%Glaucotrat® ou Combigam® de 12/12h,1 gota.
3. Pilocarpina 2%,1 gota de 30/30 min. (avaliar cada caso)
4. Manitol a 20% por IV, correr 250 mL em 1h.

Após 1h, reavaliar os sintomas, como dor, náusea, cefaleia e a PIO. Se houver melhora dos
sintomas e o quadro estiver estável, dar alta hospitalar e encaminhar ao Oftalmologista com urgência,
prescrevendo:

• Via Oral:
1.Diamox 250mg – frasco. Tomar 1 comprimido de 6/6h, por 7 dias.

• Uso Ocular:
1.Glaucotrat® ou Combigan® – frasco. Pingar 1 gota no olho direito de 12/12h.

DICAS DO ESPECIALISTA
Em todo paciente que der entrada no pronto-socorro com queixa de cefaleia intensa, unilateral,
dor retro-orbitária, com náusea ou vômito, referindo fotofobia e lacrimejamento, deve-se suspeitar de
Glaucoma agudo. Lembrando sempre como diagnóstico diferencial crise de Enxaqueca e Hipertensão
intracraniana.

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11.6
HERPES ZÓSTER OFTÁLMICO
Autores:
Camila Ishii Iguma
Bruna Bonzi
Carolina Schuwartz Tannus Belisário

INTRODUÇÃO
O Herpes Zóster Oftálmico (HZO) é uma doença neurocutânea causada pelo vírus Varicela zoster,
pertencente à família do herpes vírus. O herpes zóster é responsável por cerca de 1% de todas as
doenças de pele e sua incidência anual estimada é de 2,2 a 3,4 por 1.000 habitantes. O ramo oftálmico
do nervo trigêmeo é o segundo mais acometido (10 a 20%), ficando atrás somente do segmento
torácico, que é responsável por cerca de 50% dos casos.
Ao contrário da varicela, o HZO raramente acomete crianças sadias e se desenvolve mais
frequentemente em idosos e imunocomprometidos. Apresenta-se com lesões vesiculares em hemiface
que evoluem para formação de crostas, tendo a dor intensa como principal característica.
É importante iniciar o tratamento precocemente com antivirais e sintomáticos e orientar o paciente
quanto às complicações, pois é uma doença que determina grande morbidade e pode trazer prejuízos à
visão e à qualidade de vida do paciente.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A infecção primária causada pelo vírus Varicela zoster é chamada de Varicela, conhecida como
“Catapora”, doença exantemática típica da infância. Após a resolução desse quadro inicial, o vírus
permanece latente em gânglios dos nervos sensitivos, e por reexposição ou reativação do vírus cerca
de 20% desses pacientes desenvolvem herpes zóster. Quando o ramo oftálmico do nervo trigêmeo é
acometido, dá-se o nome de Herpes Zóster Oftálmico.
O mecanismo de reativação é desconhecido, mas acredita-se que a queda da imunidade celular seja
um fator determinante, o que explica o maior acometimento de idosos e imunocomprometidos.
Pacientes jovens com HZO recorrente devem ser investigados em relação às imunodeficiências,
principalmente o HIV, podendo ser uma manifestação inicial e precoce da doença.

QUADRO CLÍNICO
O HZO possui vários sintomas e sinais clínicos, podendo atingir todos os tecidos oculares e seus
anexos. As manifestações clínicas iniciais são dor e parestesias (formigamento, agulhada, sensação de
peso) ao longo do dermátomo acometido unilateralmente, podendo ser acompanhada de febre, mal-
estar e cefaleia. Após 3 a 4 dias dos pródromos, surgem erupções cutâneas eritematosas ou
maculopapulares que evoluem para vesículas seguidas de crostas, sendo comum o achado de exantema
pleomórfico (lesões em vários estágios evolutivos) que podem persistir por cerca de 3 a 4 semanas.
A complicação mais comum é a neuralgia pós-herpética, caracterizada por dor intensa que persiste
por 30 dias após o desaparecimento do exantema. Acomete mais mulheres e maiores de 70 anos e,
apesar de ter resolução espontânea em alguns casos, ainda é a principal causa de dor debilitante
intratável em pacientes idosos.
O HZO pode trazer ainda complicações mais específicas, a depender das estruturas que forem
acometidas. Algumas são: edema palpebral, ectrópio, conjuntivite, episclerite, esclerite, ceratite,
uveíte, catarata, glaucoma, vitreíte, hemorragia vítrea, retinite e descolamento de retina.
O surgimento de lesões cutâneas no dorso do nariz é chamado de sinal de Hutchinson e, quando
presente, indica 71 a 86% de chance de acometimento ocular.

DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
O diagnóstico do herpes zóster basicamente é feito pelos achados clínicos da doença. Utilizamos
exames complementares quando existe dúvida no diagnóstico.
A detecção direta do vírus e a detecção indireta de anticorpos específicos são os exames
complementares mais usados para auxílio no diagnóstico. O exame citológico do raspado das
vesículas cutâneas também pode ser utilizado.
Algumas patologias possuem características semelhantes ao HZO e, por isso, fazem diagnóstico
diferencial, como: eczema herpético, impetigo contagioso, dermatite por contato, exantema associado
ao enterovírus, erupções por drogas e picada de insetos.

TRATAMENTO
O tratamento do HZO é baseado no uso de drogas antivirais, que visam reduzir a replicação viral e
a chance de disseminação sistêmica do vírus. Além disso, se usado nas primeiras 72 horas após o
início dos sintomas, pode reduzir a incidência e a gravidade das complicações oculares e da neuralgia
pós-herpética. As opções disponíveis no Brasil são: Aciclovir (Zovirax®) 800 mg VO 5 vezes/dia por
7 a 10 dias, Fanciclovir (Penvir®) 500 mg VO 3 vezes/dia por 7 dias e Valaciclovir (Valtrex®) 1 g VO
3 vezes/dia por 7 dias. Apesar de ter a posologia mais fácil, o alto custo do Valaciclovir limita sua
ampla utilização, sendo muito usado na prática o Aciclovir, com mesma eficácia e custo mais baixo.
As formas endovenosas de antivirais estão reservadas para imunocomprometidos, pacientes com
doença grave ou impossibilidade de medicação por via oral, podendo ser utilizado Aciclovir 10
mg/kg/dose EV de 8/8 horas por 10 a 14 dias.
O tratamento sintomático é fundamental devido à dor intensa no local acometido. Podem ser
usados anti-inflamatórios não hormonais tópicos, como Cetoprofeno gel (Profenid®) 25 mg, aplicando
sobre a região afetada 3 a 4 vezes/dia, além de medicações orais como Dipirona, Paracetamol e anti-
inflamatórios não hormonais, isolados ou em combinação com opioides fracos, como Codeína ou
Tramadol. Dores mais intensas e refratárias aos tratamentos convencionais podem ser tratadas com
opioides mais potentes, como Morfina (Dimorf®) 15 a 30 mg VO de 6/6 horas.
Os antibióticos ficam restritos aos casos de infecção bacteriana secundária de pele e pneumopatias
bacterianas associadas, podendo ser usadas associações de Betalactâmicos (Penicilina ou
Cefalosporina) e Clindamicina.
Em caso de neuralgia pós-herpética, está indicado o uso de anticonvulsivantes, como
Carbamazepina (Tegretol®) 200 mg VO 2 vezes/dia, aplicação tópica de creme de Capsaicina 0,025 a
0,075% de 4/4 horas e compressas geladas. Antidepressivos tricíclicos, Gabapentina e Pregabalina
também mostraram boa eficácia no controle da dor na neuralgia pós-herpética.
Ao observar o sinal de Hutchinson, diminuição da acuidade visual ou hiperemia conjuntival, o
paciente deve ser encaminhado ao Oftalmologista, a fim de diagnosticar e tratar corretamente as
possíveis lesões oculares. Lubrificantes oculares podem ser prescritos, como Optive® ou Systane® 1
gota 4 a 6 vezes/dia.
Pacientes com HZO podem transmitir a doença, por isso deve-se evitar o contato com pessoas
susceptíveis, principalmente gestantes e imunossuprimidos, até que todas as lesões tenham evoluído
para a formação de crostas.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Elaborado pelos autores.
EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: Paciente do sexo feminino de 50 anos de idade, em tratamento quimioterápico
devido à neoplasia de mama, iniciou com quadro de rash cutâneo em hemiface direita há 48 horas,
com dor intensa local associada a vermelhidão ocular, secreção, sensação de areia e edema palpebral
em olho direito.

b) Exame Físico: exantema pleomórfico em hemiface direita com lesões acometendo dorso de
nariz (Sinal de Hutchinson), hiperemia ocular em olho direito associada a edema palpebral, secreção
mucoide em fundo de saco conjuntival.

c) HD: Herpes Zóster Oftálmico associado à Conjuntivite

d) Prescrição Sugerida:

• Uso Local:
Compressas frias
Profenid® gel 25 mg – aplicar fina camada sobre a região afetada 4x/dia

• Uso Ocular:
Systane-UL® - pingar 1 gota em olho acometido de 4/4h

• Uso Oral:
Tramal® 50 mg VO 3x/dia por 5 dias
Valaciclovir 1g VO 3x/dia por 7 dias

REFERÊNCIAS
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16. Tuft S. How to Manage Herpes Zoster Ophthalmicus. Comm Eye Health. 2020; 33(108): 71-2.
11.7
HORDÉOLO E CALÁZIO
Autores:
Paula Denoni Gomes
Rayssa Tavares
Rebecca Martins Oliveira Tannus

INTRODUÇÃO
O Hordéolo é uma inflamação aguda, supurativa e nodular das pálpebras. Pode ocorrer por
comprometimento do folículo piloso, das glândulas de Zeis e Moll (Hordéolo externo ou terçol) ou
das glândulas de Meibomius (Hordéolo interno).O principal agente etiológico é o Staphylococcus
aureus.
Geralmente ocorre mais em crianças e adolescentes, devido às alterações hormonais, mas pode
acometer qualquer faixa etária.
Calázio é uma inflamação crônica lipogranulomatosa das glândulas de Zeis ou Meibomius, mais
comum em mulheres e pode ter associação com baixas ametropias.
O tratamento varia desde compressas mornas e uso de antibióticos até a excisão cirúrgica, em
alguns casos de calázio.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
A obstrução e/ou infecção aguda das glândulas de Zeis ou das glândulas de Meibomius pelo
Staphylococcus aureus leva ao surgimento do hordéolo. O espessamento anormal das secreções das
glândulas meibomianas leva à obstrução não infecciosa, causando extravasamento de material
lipídico irritante nos tecidos moles das pálpebras com inflamação granulomatosa focal, ocasionando
a formação do calázio.

QUADRO CLÍNICO
Inicialmente, o hordéolo é caracterizado pelo aparecimento de hiperemia palpebral, aumento da
sensibilidade, dor no bordo palpebral e prurido. Posteriormente, pode evoluir para a formação de
abscesso focal, edema e endurecimento local. Tais sintomas têm duração de aproximadamente 7 a 14
dias. Geralmente ocorre a drenagem espontânea do abcesso, tanto o interno quanto o externo, não
sendo aconselhável o paciente tentar fazer a drenagem manual (apertando), e não é usual o
oftalmologista fazer esta drenagem ambulatoriamente, estando essa situação reservada a casos
específicos.
Quando a inflamação persiste por mais de duas semanas (em alguns casos, 4 semanas), surge o
calázio, que é a cronificação do hordéolo, tendo como característica a formação de uma nodulação,
sem sinais flogísticos e geralmente indolor. Depois da formação do calázio, este geralmente não
aumenta de tamanho e dificilmente reduz.
DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO
A abordagem inicia-se com anamnese detalhada, em busca de sinais e sintomas oculares
característicos. O diagnóstico é clínico.
A diferenciação do hordéolo para o calázio se dá pela evidência de sinais inflamatórios agudos,
dor e tempo de evolução.
Não é necessário solicitar exames complementares adicionais para o diagnóstico, que pode ser
realizado pelo oftalmologista ou pelo clínico geral.

a) DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Existem afecções que fazem diagnóstico diferencial com hordéolo e o calázio, sendo as mais
comuns: blefarite, celulite pré-septal, trauma, dermatite de contato, canaliculite, granuloma
piogênico, carcinoma sebáceo e/ou carcinoma basocelular.

TRATAMENTO
O tratamento baseia-se em:

• Recomendar uso de compressas mornas por 15 minutos, 4 vezes ao dia, com massagem
suave sobre a lesão.

• Antibiótico tópico associado à esteroide (colírio e/ou pomada). O antibiótico de escolha


nesses casos é a Ciprofloxacina 0,2%, podendo utilizar também a Tobramicina 0,3% ou a
Monofloxacina 0,5%. Os esteroides mais utilizados são a Dexametasona 0,1% e o Acetado
de Predinisolona 1,0%. Essas associações de antibiótico tópico com esteroides devem ser
utilizadas 4x dia por um período de 14 dias. Os mais utilizados são: Maxiflox-D e
Tobracin-D

• AINEs sistêmicos durante 05 dias, se dor e/ou edema palpebral intenso, também podem ser
utilizados.

O calázio dificilmente regride por completo, sendo necessária a avaliação cirúrgica nesses casos.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: RSO, sexo masculino, 15 anos, procura PS sem serviço de oftamologia,
queixando-se de surgimento de tumoração, hiperemia, secreção purulenta e dor em pálpebra superior
direita há 5 dias. Nega trauma, nega prurido ocular e nega alteração da acuidade visual.

b) Exame Físico: Presença de edema palpebral leve, hiperemia e tumoração externa com
drenagem de secreção em olho direito. Não apresentou alterações à ectoscopia em olho esquerdo.

c) Prescrição Sugerida:
• Uso Ocular:
1. Ciprofloxacino 0,2% + Dexametasona0,1% colírio (MAXIFLOX-D® ou CYLOCORT®)
colírio - 1 fr.
2. Pingar 01 gota no olho (acometido) de 6/6h, por 14 dias.
3. Ciprofloxacino 0,2% + Dexametasona 0,1% pomada (MAXIFLOX-D® ou CYLOCORT®)
pomada - 1 tubo.

• Aplicar sobre a conjuntiva (acometida), 2 x ao dia, por 14 dias.


• Compressa de água morna durante 15 minutos, quatro vezes ao dia, por 15 dias.
• Massagem compressiva e circular sobre o local, durante 15 segundos, quatro vezes ao dia.

REFERÊNCIAS
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Saúde Pública. 1999; 33(5): 513-20.
11.8
TRAUMA DE ÓRBITA
Autores:
Neiffer Nunes Rabelo
Victor Ferreira Schuwartz Tannus
Marcelo Paraiba Cavalcanti

INTRODUÇÃO
O trauma de órbita é uma frequente causa de fratura óssea, lesão de tecido mole e neurovascular. A
órbita pode sofrer lacerações, perfurações e contusões.
O trauma pode ter diferentes padrões de fraturas, que devem ser avaliados após a estabilização
hemodinâmica. Ter conhecimento do mecanismo do trauma é importante para prever a gravidade da
fratura, assim como a precaução de infecções, hemorragias e investigação de corpo estranho.

EPIDEMIOLOGIA
A órbita é uma cavidade piramidal, quadrangular e composta por 7 ossos.
O teto da órbita é formado pela lâmina orbitária do osso frontal e asa menor do osso esfenoide. O
teto da órbita une-se à parede medial na sutura frontoetmoidal ao nível da lâmina cribiforme e a base
da fossa craniana anterior.
A parede medial, parede mais fina da órbita, é formada pela asa menor do osso esfenoide, lâmina
orbitária do etmoide, osso lacrimal e processo frontal da maxila.
A lâmina papirácea separa a cavidade orbital dos seios etmoidais.
O assoalho da órbita repousa sobre o seio maxilar e é formado pela face orbitária da maxila,
zigomático e pelo processo orbitário do osso palatino.
A parede lateral é formada pela asa maior do osso esfenoide e pelo osso zigomático. Essa fratura
raramente causa alteração volumétrica da órbita.
A fratura da órbita está correlacionada em 16% de todas as fraturas faciais e é mais comum em
adultos jovens. A colisão de veículos automobilísticos é o mecanismo mais comum em adultos e
trauma relacionado ao esporte em crianças e adolescentes. Fraturas tipo blow-out são mais comum de
fratura da órbita.

QUADRO CLÍNICO
A anamnese bem realizada é essencial nestes casos, devendo especificar o mecanismo do trauma,
força, tempo do trauma, duração e se houve hemorragias ou saída de algum tecido. Na inspeção
clínica, é fundamental avaliar edemas, hematomas e a presença de Enoftalmia (diminuição do globo
ocular). No exame Oftalmológico podemos observar diminuição da acuidade visual, perda da
mobilidade ocular, diplopia, defeito pupilar absoluto ou relativo, anisocoria e alteração na pressão
intraocular.
Nos casos de trauma orbitário, é essencial solicitar a tomografia computadorizada (TC) de crânio
e órbita para o diagnóstico definitivo de fraturas, que atualmente é o padrão-ouro. Os principais
achados tomográficos são: abaulamento ou deslocamento da parede medial da órbita, fratura óssea
com ou sem deslocamento e atenuação de partes moles e coleção de ar ou níveis hidroaéreos visíveis
dentro da órbita.

TRATAMENTO
Após estabilização hemodinâmica, deve ser solicitada avaliação com a equipe indicada. Lesões
concomitantes são comum, e a avaliação oftalmológica, otorrinolaringológica, bucomaxilo e
neurocirúrgica é necessária.
A cantotomia, tratamento para hematoma retrobulbar, é uma condição semelhante a uma síndrome
compartimental e deve ser realizado pelo médico clínico ou cirurgião assistente na urgência, pois o
atraso nesta conduta pode ocasionar cegueira irreversível. Procedimento indicado quando o olho se
encontra tenso secundário a uma síndrome compartimental. É realizado sob anestesia local, com uma
tesoura, realize uma incisão cantolateral no sentido horizontal.
Fraturas complexas devem ser abordadas imediatamente. Os demais pacientes com fraturas de
órbita sem acometimento do zigomático devem ter avaliação oftalmológica antes do procedimento
cirúrgico.
O uso de corticoide e descompressão do canal óptico em casos de neuropatia óptica traumática não
é indicado, assim como em casos TCE – Trauma Crânio Encefálico.

FLUXOGRAMA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


Fonte: Elaborado pelos autores.

EXEMPLO DE PRESCRIÇÃO
a) Caso Clínico: Paciente de 20 anos vai ao pronto-socorro após sofrer um acidente
automobilístico no qual não estava com sinto de segurança. Refere dor e inchaço em hemiface
esquerda e dor à movimentação ocular.

b) Em Exame Clínico e de Imagem, observamos (Figura 1):

(A) Não há restrição à infraversão. (B) Sem restrição à lateroversão. (C) Sem restrição à medioversão. (D)
Restrição ao fazer supraversão, devido ao encarceramento do reto inferior. (E) TC em corte coronal
demonstrando a fratura do assoalho da órbita com encarceramento do reto inferior.

Figura 1. Paciente com encarceramento do reto inferior esquerdo, pela fratura do assoalho da órbita.
Fonte: Elaborado pelos autores.

c) HD: Fratura em blowout.

d) Prescrição Sugerida:

1. Encaminhar para a cirurgia.

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106(7): 1268-77.
Table of Contents
Capa
Créditos
Sumário
Apresentação
Autores e colaboradores
01 - Módulo de Cardiologia
1.1 ELETROCARDIOGRAMA
1.2 HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA
1.3 DISLIPIDEMIAS
1.4 SÍNDROMES CORONARIANAS AGUDAS
1.5 INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CRÔNICA
1.6 INSUFICIÊNCIA CARDÍACA DESCOMPENSADA
1.7 TAQUIARRITMIAS
1.8 BRADIARRITMIAS
1.9 Parada Cardiorrespiratória e RESSUSCITAÇÃO
1.10 FEBRE REUMÁTICA
1.11 ANTICOAGULANTES
02 - Módulo de Endocrinologia
2.1 Cetoacidose diabética
2.2 ESTADO HIPERGLICÊMICO HIPEROSMOLAR
2.3 INSUFICIÊNCIA ADRENAL AGUDA
2.4 CRISE TIREOTÓXICA
2.5 COMA MIXEDEMATOSO
2.6 CORTICOIDES – DOSES E EQUIVALÊNCIAS
2.7 CONTROLE GLICÊMICO INTRA-HOSPITALAR
03 - Módulo de Gastroenterologia
3.1 ASCITE
3.2 ABDOME AGUDO
3.3 Diarreia Aguda
3.4 DOENÇA CALCULOSA DAS VIAS BILIARES
3.6 PANCREATITE AGUDA
3.7 ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
3.8 HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA
3.9 HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA
04 - Módulo de Infectologia
4.1 DENGUE
4.2 TUBERCULOSE
4.3 HIV/AIDS
4.4 INFLUENZA
4.5 ENDOCARDITE INFECCIOSA
4.6 LEPTOSPIROSE
4.7 LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA
4.8 LEISHMANIOSE VISCERAL
4.9 MENINGITE
4.10 HANSENÍASE
4.11 ROTINA APÓS EXPOSIÇÃO OCUPACIONAL COM
MATERIAL BIOLÓGICO
4.12 ACIDENTES POR ANIMAIS PEÇONHENTOS
4.13 COVID-19
05 - Módulo de Nefrologia
5.1 CÓLICA NEFRÉTICA
5.2 INJÚRIA RENAL AGUDA
5.3 DISTÚRBIOS DE ÁGUA E SÓDIO
5.4 DISTÚRBIOS DO METABOLISMO DO POTÁSSIO
5.5 DISTÚRBIO DO METABOLISMO DO CÁLCIO
5.6 INTERPRETAÇÃO DA GASOMETRIA ARTERIAL E
DISTÚRBIOS ÁCIDOS BÁSICOS
5.7 SÍNDROME NEFRÓTICA
5.8 SÍNDROME NEFRÍTICA
06 - Módulo de Pneumologia
6.1 EXACERBAÇÃO DE ASMA
6.2 DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA (DPOC)
6.3 TROMBOEMBOLIA PULMONAR AGUDA
6.4 DERRAME PLEURAL
6.5 PNEUMONIA ADQUIRIDA NA COMUNIDADE
6.6 PNEUMONIA NOSOCOMIAL
6.7 INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA
6.8 VENTILAÇÃO MECÂNICA
07 - Módulo de Reumatologia
7.1 LÚPUS ERITEMATOSOS SISTÊMICO (LES)
7.2 SÍNDROME ANTIFOSFOLÍPIDE (SAF)
7.3 ARTRITE REUMATOIDE
7.4 ARTRITES AGUDAS
7.5 GOTA
7.6 OSTEOPOROSE
7.7 FIBROMIALGIA
08 - Módulo de Neurocirurgia/Neurologia
8.1 TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO
8.2 TRAUMATISMO RAQUIMEDULAR
8.3 HIDROCEFALIA
8.4 CEFALEIAS
8.5 DOENÇAS VASCULARES CEREBRAIS
8.6 SÍNDROMES EPILÉTICAS
8.7 MALFORMAÇÕES NA INFÂNCIA
8.9 SEDAÇÃO E ANALGESIA
8.10 Coma
8.11 DELIRIUM
8.12 ENCEFALOPATIA METABÓLICA
8.13 SÍNDROMES DEGENERATIVAS
8.14 SÍNDROMES DEMENCIAIS
8.15 MORTE ENCEFÁLICA
09 - Módulo de Hematologia
9.1 INVESTIGAÇÃO INICIAL DAS ANEMIAS
9.2 ANEMIA FERROPRIVA
9.3 ANEMIA DA INFLAMAÇÃO
9.4 ANEMIA MEGALOBLÁSTICA
9.5 ANEMIAS HEMOLÍTICAS
9.6 ANEMIA FALCIFORME
9.7 NEUTROPENIA FEBRIL
9.8 INDICAÇÕES E REAÇÕES TRANSFUSIONAIS
10 - Módulo de Psiquiatria
10.1 SURTO PSICÓTICO
10.2 RISCO DE SUICÍDIO
10.3 ATAQUES DE PÂNICO
11 - Módulo de Oftalmologia
11.1 CERATITES
11.2 CELULITE PRÉ-SEPTAL E PÓS-SEPTAL
11.3 CONJUNTIVITES
11.4 EDEMA PALPEBRAL
11.5 GLAUCOMA AGUDO
11.6 HERPES ZÓSTER OFTÁLMICO
11.7 HORDÉOLO E CALÁZIO
11.8 TRAUMA DE ÓRBITA

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