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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

SUMÁRIO

À GUISA DE INTRODUÇÃO

CAPÍTULO I – CONCEITUALIZAÇÃO DOS TERMOS

1.1 – Definição e natureza da filosofia africana

1.2 - Objecto e método de estudo

1.3 – Pertinência do estudo da filosofia africana

CAPÍTULO II – PENSAMENTO EUROCÊNTRICO: Discurso ocidental sobre a


África

2.1 – Pensamento de Immanuel Kant (1724 - 1804)

2.2 – Pensamento de Georg Wilhelm Hegel (1770 - 1831)

2.3 – Pensamento de Lucien Levy-Bruhl (1857 - 1939)

2.4 – Pensamento de Alexis de Tocqueville

2.5 – Pensamento de Pieter Botha

CAPÍTULO III – HISTÓRIA DA FILOSOFIA AFRICANA

3.1 – A filosofia cristã antiga em África

3.1.1 – O legado do antigo Egipto para o progresso do pensamento humano

3.1.2 – Cartago e o Cristianismo da África ocidental

3.2 – A filosofia medieval em África

3.2.1 – A filosofia na Igreja do Norte de África: Santo Agostinho

3.2.2 – Filosofia etíope indígina: traduções filosóficas etíopes

3.3 – Filosofia moderna africana

3.3.1 – Filosofia etíope indígina: traduções e obras originárias

3.3.2 – A diáspora africana: Anton Wilhelm Amo

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CAPÍTULO IV – A FILOSOFIA AFRICANA CONTEMPORÂNEA

4.1 – Etnofilosofia ou filosofia cultural do africano: Placides Tempels

4.2 – Negritude ou filosofia da raça negra: Leopold Sénghor

4.3 – Socialismo africano ou filosofia social negra: Julius Nyerere

4.4 – Consciencismo africano ou filosofia da mente africana: Kwame Nkrumah

4.5 – Humanismo africano ou filosofia antropológica do africano: keneth kaunda

4.6 - Panafricanismo: William Du Bois

4.7 – Nacionalismo africano ou filosofia da libertação de África

4.8 – Rastafaranismo ou filosofia natural africana

ANEXOS

CONCLUSÃO

BIBLIOGRAFIA

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À GUISA DA INTRODUÇÃO

Segundo alguns historiadores o termo “África” deriva da palavra grega “Aphriké”,


significando “Colónia”, ao passo que, do latim “Aprica” significa “o que está exposto
ao Sol”. Foi a partir deste último significado que se foi compondo a concepção errónea
do africano como o indivíduo que não tem inclinação para o exercício do raciocínio, ou
seja, o africano não tem Filosofia.

Os historiadores africanos, assim como, a maioria dos seus filósofos vêem espicaçadas
suas mentes com objecções como: Será que o africano pode filosofar? Existe, realmente,
uma Filosofia africana?

A tendência para a Filosofia faz parte da própria natureza humana, como é sabido, todo
ser humano por natureza é um filósofo, por isso, até certo ponto todo ser humano tem
uma inclinação natural para a Filosofia uma vez que está apto para reflectir e colocar
questões sobre a totalidade do Universo mesmo que estás questões não sejam tão
rigorosas como aquelas colocadas pelos filósofos profissionais. Questões como: Como
apareceu o mundo? Porquê é que anoitece? O porquê da morte? São problemas que o
homem comum (homem da rua) se coloca mas que, igualmente, são estudados com
maior rigor pelos filósofos de carreira. E questões como estas não são colocadas apenas
por homens e mulheres ocidentais, mas também por homens e mulheres de todo o
mundo incluindo africanos.

Deste modo, todo ser humano possui uma veia questionadora que o impele naturalmente
a filosofar. Se o africano faz parte a raça humana, é óbvio que, o africano está apto para
reflectir, como dissemos antes.

Ao concordarmos com a expressão do professor Wilson Correia “onde há homem que


pensa, valoriza, escolhe, decide e age no mundo, ali também está o germe do
pensamento filosófico” queremos demonstrar que existe, sim, uma filosofia africana,
embora este pensamento tenha aparecido a ribalta aquando das questões levantadas
pelos ocidentais; isto não significa que o africano não tenha raízes dum pensamento
filosófico, tal pensamento, querendo ou não, está desenvolvido e continua a ser
desenvolvido, não o encontramos mais ao período pré-lógico – como defendiam os
ocidentais. Isto demonstra que não estamos felizes quando se defende a
“irracionalidade” do pensamento africano o que, o professor Moisés Quitari, chama de
passividade do pensamento africano e não irracionalidade – como Lévy-Bruhl o
chamou.

Embora a filosofia ocidental tenha nascido da harmonia sócio-económica e cultural que


a Grécia vivia, ou seja, surgido no espírito da politeia em que “havia um direito de
igualdade na lei e ninguém poderia estar acima da lei” – demonstrando o milagre
grego – Não coloca o pensamento africano ao nível inferior perante si, visto que, para
muitos a filosofia africana é uma resposta aos discursos ocidentais sobre a África feita

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pelos africanos residentes em Nova York na cidade de Harlem (E.U.A) que lutavam
pela dignidade do homem Negro.

Por outro lado, se voltarmos a génese dos povos encontraremos um problema de


interpretação como aquele que existe quando se discute sobre a originalidade da própria
Filosofia (Filosofia é milagre grego ou descoberta oriental? Aqui surge a questão se a
Filosofia foi pensamento dos Hordas Dóricas “povos que se fixaram na Grécia” ou dos
Aqueus “povos autóctones da Grécia” que se fixaram mais tarde na Ásia Menor), tal
problema é levantado com relação ao Homem Negro.

Segundo Elisa Larkin Nascimento “a espécie humana nos livros didácticos é,


geralmente, representada com a imagem do homem branco e as teorias pseudo-
científicas de hierarquia entre as raças destituíram o africano de sua condição humana
tratando-o como selvagem ou primitivo classificado como ser sub-humano ou,
irremediavelmente, inferior”.

Hoje, sabemos que, a África é o berço da humanidade e do desenvolvimento


civilizatório e que a dois milhões de anos, o homo erectus ou hominídeo – autor de
importantes avanços na manufactura de implementos com machado – saiu da África em
ondas migratórias rumo à Ásia e à Eurásia, iniciando o povoamento do mundo. Por isso,
o continente africano é palco de exclusivos processos interligados de hominização e de
sapientização – o único lugar do mundo onde se encontram, em perfeita sequência
geológica, todos os indícios da evolução da nossa espécie a partir dos primeiros
ancestrais hominídeos.

Se como afirmam alguns que a Filosofia «é uma forma de estar no mundo», então,
podemos também assegurar que qualquer comunidade ou povo, de qualquer raça e de
qualquer região ou cultura tem uma concepção própria de fazer Filosofia, típica da sua
forma de encarar o mundo e da sua realidade particular; visto que, nenhuma filosofia é
feita fora do contexto sócio-cultural do filósofo que a faz. Ela faz-se dentro de um povo,
de uma cultura, de um tempo, de um espaço. Assim acontece e continuará acontecendo
com a filosofia ocidental, assim acontece e continuará acontecendo com a filosofia
americana, assim acontece e continuará acontecendo com a filosofia africana, assim
acontece e continuará acontecendo com a filosofia oriental e com qualquer outro tipo de
filosofia que surgir.

Neste sentido está certo o filósofo Karl Jaspers quando afirma que “cada filosofia
defini-se a si própria pelo modo como se realiza”.

No entender do filósofo Paulin Hountondji «a filosofia africana é aquela, apenas,


feita em África e pelos filósofos africanos independentemente de todos aportes
externos»; caríssimos, o professor Hountondji clama por um pensamento genuíno de
carris africano. Mas, para o professor padre Maurice Makumba, é todo o pensamento
organizado e debatido por «pessoas que produzem e reflectem filosofia dentro do
contexto africano», quer sejam ou não africanos.

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Em resposta a objecção levantada – existe sim, uma filosofia africana e o africano pode
filosofar. Visto que, A Filosofia é uma actividade racional e a racionalidade pertence a
todos os seres humanos (sem excepção).

Segundo o professor padre Maurice Makumba «o africano não pode permanecer


numa actitude de incerteza e de indecisão (se existe ou não filosofia africana), no
horizonte das certezas parciais proporcionadas pelo seu contacto com outras culturas
mais cíentificas, num mundo em rápida transformação», por isso, o povo africano tem
de sondar em profundidade a sua experiência existencial e procurar retirar daí as
verdades quanto ao seu próprio lugar no mundo.

Para o professor Moisés Quitari «hoje, o problema da Filosofia africana já não reside
no dilema da sua existência, mas sim na praticabilidade dos seus efeitos
transformadores, ou seja, o tema central da Filosofia africana já não é a sua plena
justificação frente as demais filosofias, nem tão pouco a defensiva racial, mas as metas
orientadoras do pensamento africano em virtude do progresso e do desenvolvimento da
África através do pensar africano».

Nesta panaceia, estamos de acordo que a África e os seus autênticos pensadores devem
preocupar-se em produzir conhecimentos a partir de suas cadeias de reflexão cultural, só
assim, poderemos ousar dizer em filosofia africana de carris científico e, eventualmente,
apresentar tal pensamento aos académicos de diversas áreas de investigação em culturas
tradicionais africanas. “Ser filósofo africano” – segundo professor Moisés Quitari –
«não é defender a ferro e fogo a África, mas racionalizar e criticar seus feitos».

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CAPÍTULO I – CONCEITUALIZAÇÃO DOS TERMOS

1.1 – DEFINIÇÃO E NATUREZA DA FILOSOFIA AFRICANA

DEFINIÇÃO DA FILOSOFIA AFRICANA

Como já é sabido, a definição da Filosofia constitui-se como um problema filosófico,


visto que, a discussão a este respeito enquadra diferentes perspectivas e correntes
filosóficas resultando daí diferentes definições.
Deleuze, na sua obra O que é Filosofia? Apresenta-nos uma definição simplista de
Filosofia, ao defini-la como «o ponto singular em que o conceito e a criação se
relacionam entre si».

Sendo Filosofia africana, um dos ramos da Filosofia, podemos defini-la como «o estudo
científico sobre a racionalidade africana tendo em conta seu modo de agir, de pensar,
de ser, dentro do contexto cultural».

A Filosofia africana é «uma ciência que se preocupa em investigar desde a


antiguidade até a contemporaneidade, aspectos ligados ao atraso do continente e sua
evolução».

Para Battista Mondin “a definição da Filosofia constitui em si um problema


filosófico”. Se discorrermos deste axioma veremos que as particularidades definitórias
da Filosofia “também constitui um problema filosófico” e para entendermos a Filosofia
africana vale realçar as definições seguintes:

Segundo Karls Anyanwu (filósofo nigeriano) Filosofia Africana: «é um esforço para


compreender ou justificar os princípios gerais que regulam as crenças do indivíduo
africano assim como a sua cultura». A filosofia Africana não é uma Argumentação
sobre a existência cultural Africana e nem se quer é a descrição da aquela cultura, quer
dizer que, não analisa ou descreve as crenças em deus nas divindades, nos antepassados
ou as máscaras, as lendas e os provérbios.

A filosofia africana – segundo o filósofo moçambicano Severino Elias Ngoenha - é


«uma visão colectiva do mundo, mas existirá uma filosofia na condição de
confrontação do pensamento individual de discussão de debates quer seja entre
africanos quer com o resto do mundo».

Segundo Alexis Kagame, filósofo Rwandês, a filosofia Africana é «um pensamento


especulativo que subfaz nos provérbios, nas máximas, nos costumes que os africanos de
hoje herdaram dos seus antepassados». Esta definição apresenta como suporte a defesa
das tradições africanas.

Em resumo, entende o professor Moisés Quitari, como “uma reflexão sobre a dignidade
do homem negro em defesa da sua forma de pensar desde a antiguidade até a

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contemporaneidade para compreender as razões que estiveram na base do atraso do


desenvolvimento do continente conhecendo seus valores e feições, a fim de interpretar a
eurocentricidade”.

NATUREZA DA FILOSOFIA AFRICANA

A actividade filosófica está aberta a toda a espécie humana e é na base desta premissa
que a Filosofia se estrutura enquanto disciplina sistemática. Quando Placide Tempels
nos diz que «quem pretender que os povos primitivos não possuem um sistema de
pensamento, excluiu-os, como consequência, da categoria dos seres humanos» quer
demonstrar que todos possuem uma filosofia enquanto empreendimento realizado com
as capacidades da racionalidade. Neste itinerário, encontra-se o filósofo africano
Parrinder que alega: «dizer que os povos africanos não têm sistemas de pensamento
explícitos e assumidos, seria negar a sua humanidade» e negar a humanidade do
africano, simplesmente, através da cor da pele demonstraria a incapacidade racional do
europeu.

Uma Antropologia filosófica consistente e unitária não pode minimizar a importância da


racionalidade na definição da pessoa humana a partir da sua fisionomia e características.
Enquanto não se pretender que todos sejam filósofos, em virtude de serem todos
racionais, já não é aceitável – segundo o professor Maurice Makumba – que se negue
o pensamento especulativo a uma raça particular.

A investigação realizada pelos filósofos africanos, como Henry Oruka, tem evidenciado
com maior nitidez que, no pensamento tradicional africano, não existia apenas o nível
de primeira ordem da Filosofia, mas também o nível da segunda ordem.

Para Tempels «declarar a priori que os povos primitivos não têm ideias acerca da
natureza dos seres ou que eles não possuem uma ontologia e que estão totalmente
privados de lógica é simplesmente, virar as costas a realidade». Não há dúvida de que
existe uma contribuição cultural de cada povo, assim como do africano dentro dos temas
universais da Filosofia.

Cada povo tira do seu seio determinados elementos que oferece ao espírito universal.

Não se pode negar que um africano exposto a Filosofia ocidental clássica, como base
de sua formação filosófica, pense autenticamente como africano fruto do
enraizamento da fusão de pensamentos.

A influência das novas ideias é inexorável e a tentativa de isolar a África do resto do


mundo através de um abraçar da africanidade é uma tentativa de atrasar o pensamento.
O resultado que se pode conseguir é apenas o empobrecimento intelectual. Nem o
Nacionalismo nem o Panafricanismo se podem orgulhar da promoção de uma filosofia
isolacionista.

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Por isso, segundo Paulin Hountondji “não chegaremos nunca a criar uma autêntica
Filosofia africana, uma Filosofia genuína, genuinamente africana”. A maior parte da
literatura escrita a respeito da Filosofia africana é relativamente recente; há indícios nas
culturas africanas, de opiniões acerca de algumas das principais questões debatidas na
Filosofia ocidental.
A Filosofia africana é de natureza racional, assim como, todas as outras filosofias e não
podemos nos apartar desta realidade que é visível em todos os seres racionais.

Quando falamos de Filosofia africana pretendemos incluir todos os estádios de


desenvolvimento do pensamento humano como: o antigo pensamento literário; o
pensamento tradicional oral e a Filosofia profissional na África contemporânea.

1.2 - OBJECTO E MÉTODO DE ESTUDO

OBJECTO

A filosofia africana preocupa-se, principalmente, pela racionalidade do homem negro


que se deve reflectir na organização do continente. Hodiernamente, esta preocupação
está virada à economia, política e literatura africana e seus aspectos racionais (Filosofia
Primeira).

Assim sendo, o objecto de estudo da filosofia africana é “a racionalidade do homem


negro”.

MÉTODO DE ESTUDO

A existência da filosofia africana é dado bem adquerido, não há dúvidas da afirmação


do povo africano como um povo que possue um pensamento bem sistematizado e
desenvolvido, onde o nivel intelectual e discursivo é bastante elevado.

A filosofia africana tem os mesmos estatutos epistemológicos tal como a filosofia


helénica. A filosofia africana deve ser vista como as outras filosofias, ou seja, ser
interpretada como a filosofia ocidental. O pensamento africano tem uma referência
subjectiva e objectiva, pois é preciso desmitizar que “África não possue filosofia ou
negação da filosofia africana”. E este é o tempo de colocar as ideias africanas no centro
de qualquer análise que envolve a cultura e o comportamento africano (afrocentrismo).
A filosofia africana apresenta caracteristicas bem explícita e analítica.

O método empregue pelos filósofos africanos foi sempre o «analítico».

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1.3 – PERTINÊNCIA DO ESTUDO DA FILOSOFIA AFRICANA

A filosofia africana enquanto campo de investigação procura debater assuntos


relacionados com o continente levando os estudiosos a interpretá-lo da melhor forma
possível. É mister estudar a filosofia africana por enumeras razões, tais como:

 Ajuda-nos a criar uma intelectualidade compacta à luz da razão através da


análise temporal;

 Liberta-nos das hipocrisias eurocêntricas e assegura a nossa humanidade

 Retira-nos, através da compreensão, a mentalidade de revolta e perseguição a


dita “raça superior”

 Eleva-nos a tarefa de progressão e desenvolvimento de maneiras a efectivar a


racionalidade africana.

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CAPÍTULO II – PENSAMENTO EUROCÊNTRICO: Discurso ocidental sobre a


África

PENSAMENTO EUROCÊNTRICO EM TORNO DO CONTINENTE NEGRO

A África desde sempre foi entendida pelos historiadores europeus como continente sem
história alegando a perca de contribuição científica que vem acompanhando a
humanidade desde o período antigo. Se nos propusermos a analisá-lo do Egipto antigo,
passando pelas terras sudanesas, Kushitas até Mwana Mutapa (o grande Zimbambwé)
veremos que ela já havia feito descobertas importantíssimas ao esculpir metais para caça
e pesca fluvial.

A hierarquia das raças é a que mais preocupou desde muito cedo os pensadores
europeus. A raça passou a ser um sistema de classificação usado para categorizar os
seres humanos em grupos ou populações grandes e distintas divididas por aspectos
anatómicos, culturais, étnicos, genéticos, geográficos, históricos, linguísticos, religiosos
e sociais. Usando em primeiro lugar, para se referir a falantes de um idioma comum e,
posteriormente, para denotar filiações nacionais.

No século XVII, iniciou-se o uso do termo para relacionar os traços físicos observáveis
das pessoas. Tal uso promoveu hierarquias favoráveis ​ ​ a diferentes grupos étnicos.
A partir do século XIX, o termo passou a ser usado frequentemente, em um sentido
taxonómico, para designar as populações humanas geneticamente diferentes, definidas
pelo fenótipo.

As concepções sociais e agrupamentos de raças variaram ao longo do tempo,


envolvendo taxonomias populares que definem tipos essenciais de indivíduos com base
em traços observáveis.

Mesmo que haja um amplo consenso científico de que conceituações essencialistas e


tipológicas de raça em humanos sejam insustentáveis, cientistas de todo o mundo
continuam a conceituar o termo "raça" de maneiras muito diferentes, algumas das quais
com implicações essencialistas. Embora, por vezes, alguns pesquisadores usem o
conceito de "raça" para fazer distinções entre conjuntos difusos de traços físicos, outros
na comunidade científica sugerem que a ideia de raça muitas vezes é usada de uma
maneira ingénua ou simplista e argumentam que, entre os seres humanos, o termo não
tem importância taxonómica, apontando que todos os humanos vivos pertencem à
mesma espécie (Homo sapiens) e subespécie (Homo sapiens sapiens).

Desde a segunda metade do século XX, as associações do conceito de raça com


ideologias e teorias que se desenvolveram a partir do trabalho de antropólogos e
fisiologistas do século XIX, tornou o uso da palavra "raça" em si problemático. Apesar
de ainda ser usado em contextos gerais, a palavra raça tem sido muitas vezes substituída
por outras palavras que são menos ambíguas e emocionalmente carregadas, como
populações, povos, grupos étnicos ou comunidades, dependendo do contexto. A África
foi vista, desde sempre, como continente sem história por conter a raça negra.

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Até os célebres pensadores ocidentais que, nem se quer passaram por ela, afirmam o
mesmo; dentre eles: Kant, Hegel e Levy-Bruhl.

4.1 – PENSAMENTO DE IMMANUEL KANT (1724 - 1804)

Kant foi filósofo alemão nasceu em Konigsberg, Prússia oriental (actual Alemanha) em
22 de Abril de 1724 e morreu em 12 de Fevereiro de 1804, em sua cidade natal da qual
jamais saiu. Autor de várias obra, uma das quais se chamou “Sobre a Divisão das Raças
Humanas” onde fez uma passeata em torno do raciocínio dos diversos povos que
constituem a humanidade.

Nesta obra Kant tenta explicar a origem das raças afirmando que a “raça negra terá
surgido devido ao ar quente e húmido que batia na pele original”.

Por outro lado, afirmou entre as várias raças do género humano, a raça negra e a
ameríndia são as mais decadentes dentre todas podendo ser as mais vulneráveis da
humanidade.

Enquanto, a ciência ao dealbar das raças nos diz que a os primeiros hominídeos
apareceram em África, concretamente, na Etiópia, por isso, a África é tida como “Berço
da Humanidade”.

O filósofo Immanuel Kant atendendo os seus discursos passou a ser presença


obrigatória nos currículos dos cursos de filosofia devido a sua obra “Observações sobre
o sentimento do belo e do sublime”, de 1764, nela procurou tratar as “diferenças entre
os caracteres das nações”, segundo ele, na tentativa “apenas de esboçar traços que neles
exprimem os sentimentos do sublime e do belo”, mas sem a intenção de “ofender a
ninguém”.
“Na minha opinião, escreve Kant, entre os povos do nosso continente, os italianos e os
franceses são aqueles que se distinguem pelo sentimento do belo; já os alemães, os
ingleses e os espanhóis, pelo sentimento de sublime. O espanhol é sério, reservado e
sincero. O francês possui um sentimento dominante para o belo moral. É cortês,
atencioso e amável. No início de qualquer relação o inglês é frio, mantendo-se
indiferente a todo estranho. Possui pouca inclinação a pequenas delicadezas; todavia,
tão logo é um amigo, se dispõe a grandes favores. O alemão no amor, tanto quanto nas
outras espécies de gosto, é assaz metódico, e, unindo o belo e o nobre, é suficientemente
frio no sentimento de ambos para ocupar a mente com considerações acerca do decoro,
do luxo ou daquilo que chama a atenção” (KANT, 1993, pág. 65-70).
Depois de caracterizar os povos dos outros continentes, desta vez realçando aqueles
aspectos que considera extravagantes, grosseiros e exagerados, Kant expõe as suas
opiniões sobre os negros, suas manifestações culturais e formas de religiosidade,
revelando toda a sua ignorância e arrogância. Para Kant:
“Os negros da África não possuem, por natureza, nenhum sentimento que se eleve
acima do ridículo. O senhor Hume desafia qualquer um a citar um único exemplo em
que um Negro tenha mostrado talentos, e afirma: dentre os milhões de pretos que foram
deportados de seus países, não obstante, muitos deles terem sido postos em liberdade,

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não se encontrou um único sequer que apresentasse algo grandioso na arte ou na


ciência, ou em qualquer outra aptidão; já entre os brancos, constantemente arrojam-se
aqueles que, saídos da plebe mais baixa, adquirem no mundo certo prestígio, por força
de dons excelentes. Tão essencial é a diferença entre essas duas raças humanas, que
parece ser tão grande em relação às capacidades mentais quanto à diferença de cores.
A religião do fetiche, tão difundida entre eles, talvez seja uma espécie de idolatria, que
se aprofunda tanto no ridículo quanto parece possível à natureza humana. A pluma de
um pássaro, o chifre de uma vaca, uma concha, ou qualquer outra coisa ordinária, tão
logo seja consagrada por algumas palavras, tornam-se objecto de adoração e
invocação nos esconjuros. Os negros são muito vaidosos, mas à sua própria maneira, e
tão matraqueadores, que se deve dispersá-los a pauladas.” (KANT, 1993: pág. 75-76).
Kant vai mais além com o seu pensamento racista quando procura analisar, do mesmo
modo, os índios; por isso, para ele:
“Os indianos possuem um gosto dominante para o caricaturesco, daquela espécie que
atinge o extravagante. Sua religião consiste em caricaturas. Ídolos de forma monstruosa,
o dente inestimável do poderoso macaco Hanuman, as penitências desnaturadas do
faquir (frades mendicantes pagãos) etc. fazem parte desse gosto. O sacrifício voluntário
da mulher na mesma fogueira que consome o cadáver do marido é uma horrível
extravagância”. (KANT, 1993: pág. 75).
No lugar destas formas preconceituosas e discriminatórias de classificação dos seres
humanos espalhados pelo Globo, podemos construir uma política de reconhecimento da
heterogeneidade cultural da humanidade e da pluralidade das formas de existência
material e relação com o ambiente.
Com isso, podemos superar o pensamento eurocêntrico que acredita e difunde que há
um padrão único para a beleza e para a inteligência, o europeu, e que nos leva a avaliar
a nós mesmos e aos nossos alunos de acordo com tal padrão, esquecendo que é apenas
um padrão próprio de culturas específicas de uma região do mundo. Quando utilizamos
como critérios de beleza ou de verdade as formas de arte e de pensamento europeus
estamos sendo cúmplices com as instituições dominantes e legitimando a sua
dominação.
Evidentemente, essa superação do eurocentrismo não quer dizer que devemos ignorar os
códigos culturais, experiências e linguagens de origem europeia, como as ciências, artes
e religiões, mas quer dizer que devermos ter a capacidade de criticá-las, dimensionando-
as como formas particulares de expressão cultural de populações e grupos particulares,
sem dúvida relevantes, mas que não são superiores a nenhuma outra forma de expressão
cultural dos grupos humanos espalhados pelo mundo.
Os estudos que referenciam Kant como importante pensador, retoma a tradição de uma
geografia voltada para antropologia, Kant descreveu a realidade humana num livro
publicado em 1802 no qual se referia aos africanos do sul do Saara, os negros, como
"homens que cheiram mal" e tem pele negra por "maldição divina".
Desta forma passemos aos argumentos hegelianos sobre o africano.

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4.2 – PENSAMENTO DE GEORG WILHELM HEGEL (1770 - 1831)

Hegel indiscutivelmente faz parte do cânon filosófico. Seu pensamento é de suma


importância para a história da filosofia: suas teses atingiram a Europa de tal maneira,
que, nas palavras de Ernst Cassirer: “nenhum outro sistema filosófico exerceu uma
influência tão forte e tão duradoura como a metafísica de Hegel. Não há um único
grande sistema político que tenha resistido à sua influência” (apud HARTMAN, 1990,
p. 9).

Uma análise da obra Filosofia da História, de Hegel, publicada postumamente em 1837.


Ela representa, para alguns, o estágio mais
avançado de seu pensamento, assim como o resumo e a conclusão de toda sua obra
anterior.

Se a história, como Hegel sustenta, é o auto desenvolvimento do Espírito, a realização


da Idéia divina, de um plano cósmico, então o homem histórico deve ser um em quem
se concentram as potencialidades de seu tempo, a situação histórica. (HARTMAN, 1990,
p. 14).

Uma vez que a história é a realização do divino e, como Hegel afirma: os africanos não
possuem divindade ou “consciência de algo superior” estes não são considerados
homens históricos, foram excluídos da análise histórica da razão por não possuírem
nada que a cultura europeia da época considerasse relevante para ser parte do “mundo
civilizado”.

Podendo citar Carolus Linnaeus e Carlos Lineu (1707 - 1778), em português Carlos
Lineu, e em sueco após nobilitação Carl Von Linné (23 de Maio de 1707 - 10 de janeiro
de 1778) foi um botânico, zoólogo e médico sueco, criador da nomenclatura binomial e
da classificação científica, sendo assim considerado o "pai da taxonomia moderna". Foi
um dos fundadores da Academia Real das Ciências da Suécia. Lineu participou também
no desenvolvimento da escala Celsius (então chamada centígrado) de temperatura,
invertendo a escala que Anders Celsius havia proposto, que tinha 0° como ponto de
ebulição da água e 100° como o ponto de fusão.
Em seu livro "sistema naturae" , Charles Linné, ele classifica o homo sapien como:
"... classificada em cinco variedades, cujas principais delas são: sumariadas em seguida:
a) Homem selvagem, quadrúpede, mudo, peludo.
b) Americano: cor de cobre, colérico, ereto, cabelo negro, liso, espesso, narinas largas,
semblante rude, barba rala, obstinado, alegre. pinta-se com finas linhas vermelhas e
guia-se por costumes.
c) Europeu: claro, sanguíneo, musculoso, cabelo loiro, castanho, ondulado, olhos azuis,
delicado, perspicaz, inventivo. Coberto por vestes justas, governado por leis.
d) Asiático: escuro melancólico, rígido, cabelo negros, olhos escuros, severos,
orgulhosos, cobiçosos. Coberto por vestimentas soltas. Governados por opiniões.

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e) Africano: negro, fleumático, relaxados, cabelos negros, espesso, pele acetinada, nariz
achatado, lábios túmidos, engenhosos, indolente, negligente. É governado pelo capricho.
"

Para o filósofo Friedrich Hegel as atrocidades da África decorrem em duas razões


interdependentes:
1. Pelo faro de a história ser entendida como propósito do velho mundo que exclui
a África Subsaariana;
2. Por conceber o africano como ser sem autonomia para construir sua própria
história.
O filósofo alemão cita: “a África propriamente dita é a parte que caracteriza
continente através da pele negra. Porque em seguida podemos deixar de lado por assim
dizer. Não tem interesse histórico próprio, senão os de que os homens vivem ali na
barbárie e na selvageria, sem fornecer nenhum elemento à civilização. Por mais que
retrocedamos na história, acharemos que a África estará sempre fechada no contacto
com o resto do mundo, é um Eldorado recolhido em si mesmo, é o País criança,
envolvido na escuridão da noite aquém da luz da história” escreve ainda: "... Aqui o
homem em seu estado bruto tal é o homem na África. Por quanto o homem aparece
como homem, põe-se em oposição à natureza, assim é como se faz homem. Mas, por
quanto se limita, se diferenciar-se da natureza, encontra-se no primeiro estágio,
dominado pela paixão, pelo orgulho e a pobreza; é um homem estúpido. No estado de
selvageria achamos os africanos enquanto podemos observar e assim ter permanecido.
O negro representa o homem natural em toda sua barbárie e violência; para
compreendê-lo devemos esquecer todas as representações europeias. Devemos
esquecer Deus e a Lei moral. Para compreendê-lo, exactamente, devemos abstrair de
todo respeito e moralidade, de todo sentimento. Tudo isso esta no homem em seu estado
bruto, e cujo carácter nada se encontra que pareça humano."
Hegel via nos nativos americanos um valor superior com relação ao negro alegando a
favor, de tal forma: “mansidão e indiferença, humildade e submissão perante um crioulo
(branco nascido na colônia), e ainda mais perante um europeu”. Segundo o filósofo
alemão “ainda custará muito até que europeus lá cheguem para incutir-lhes uma
dignidade própria. A inferioridade desses indivíduos, sob todos os aspectos, até mesmo
o da estatura, é fácil de se reconhecer” (HEGEL, 1999: pág. 74-75).
Sobre os negros, o grande filósofo alemão escreve que:
“A principal característica dos negros é que sua consciência ainda não atingiu a
intuição de qualquer objectividade fixa, como Deus, como leis, pelas quais o homem se
encontraria com a própria vontade, e onde ele teria uma idéia geral de sua essência. O
negro representa, como já foi dito o homem natural, selvagem e indomável. Devemos
nos livrar de toda reverência, de toda moralidade e de tudo o que chamamos
sentimentos, para realmente compreendê-lo. Neles, nada evoca a idéia do carácter
humano. A carência de valor dos homens chega a ser inacreditável. A tirania não é
considerada uma injustiça, e comer carne humana é considerado algo comum e
permitido. Entre os negros, os sentimentos morais são totalmente fracos – ou, para ser
mais exacto inexistentes”. (HEGEL, 1999, pág. 83-86).
Depois de fazer tais considerações, o filósofo conclui esta parte de sua obra
argumentando que não irá mais tratar da África, pois a mesma “não faz parte da

Material de apoio da 12ª classe


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história mundial; não tem nenhum movimento ou desenvolvimento para mostrar”


(HEGEL, 1999: pág. 88) e mesmo o Egipto, embora situado no norte da África, Hegel o
interpreta “como transição do espírito humano do Oriente para o Ocidente, mas ele
não pertence ao espírito africano”. O continente africano é assim eliminado da
“história universal”, enquanto é retirada dos povos que lá habitam a condição de seres
humanos. Esta é uma das heranças eurocêntricas da filosofia de Hegel, o filósofo que
mais influenciou na elaboração do pensamento dialéctico de Karl Marx.
Segundo Hegel, “a história universal vai do leste para oeste, pois a Europa é o fim da
história universal, e a Ásia é o começo”.

Assim, quando o filósofo apresenta o desenvolvimento da Razão na História, observa os


principais fatos históricos que ocorreram na Ásia e na Europa. Somente a Ásia e a
Europa têm história, pois apenas nessas regiões há o desenvolvimento da liberdade.
Para Hegel, o mundo oriental é a infância da história universal, onde o grau de
desenvolvimento da Razão se encontra em seu estágio mais primitivo. O que Hegel
chama de mundo oriental começa com a China por volta de 300 a.C., passa pela
Mongólia e Índia e tem seu apogeu no Império Persa. Para o filósofo alemão, a
característica do mundo oriental é a “visão substancial” do mundo.

Para Hegel o Estado surge quando ordens subjectivas, que variam ao sabor do acaso,
são substituídas por ordens objectivas com maior fixidez. Diante disso, “Mnemósine,
com vistas ao fim perene de formar e constituir o Estado, é induzida a conferir o
perdurar da recordação” (Hegel, G.W.F. Filosofia da história, p. 58). O perdurar da
recordação se dá com o registo escrito das ordens. Produzir leis escritas é registar um
fato histórico. Baseado nas informações históricas que dispunha, Hegel julga que na
África não se produziu nenhuma organização política que visasse à liberdade. A
ausência do registro de ordens objectivas e a prática de escravidão vista como algo
comum por diversas tribos africanas, seria para Hegel fatos que comprovariam sua tese.
Na América o caso já é diferente, essa não faz parte da história por ser a terra do futuro.
Mesmo havendo ordens objectivas na América, estas para Hegel, são somente ecos das
ideias do velho mundo, e não resultado da consciência da liberdade por parte dos
americanos.

Hegel identificou na Reforma, no Iluminismo e na Revolução Francesa os momentos da


história onde o espírito se conheceu plenamente como sujeito livre e pode realizar-se no
mundo. O próprio Hegel afirma que “daquela época até nossos dias, nada mais se
realizou ou deve se realizar a não ser cultivar esse princípio no mundo”.

O que nos é incómodo é a seguinte questão: como é possível falar da América enquanto
terra do futuro? Ou seja, se nada mais há de se realizar na história a não ser o princípio
da subjectividade, como pode na América um dia parar de ecoar ideias do Velho Mundo
e surgir algo de novo? As lições sobre filosofia da história de Hegel não oferecem uma
resposta para esse problema. Destarte, o tema do fim (End) da história conserva esse
paradoxo dentro do pensamento de Hegel. Por um lado, o que havia de ser realizado
pelo Espírito na história já foi realizado na Europa. Mas, por outro lado, a América
aparece como um lugar que pode realizar algo de novo, mas o que é esse novo
permanece um enigma, visto que o Espírito já atingiu sua meta que é conhecer a si
mesmo e se efectivar na história.

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4.3 – PENSAMENTO DE LUCIEN LEVY-BRUHL (1857 - 1939)

Lucien Lévy-Bruhl (Paris, 1857-1939) foi um filósofo e sociólogo francês.

De 1879 a 1882 leccionou filosofia no liceu de Poitiers e depois, entre 1882 e 1885 no
liceu de Amiens. Doutorou-se em filosofia em 1884 com a tese A idéia de
responsabilidade. No ano seguinte passou a leccionar no liceu Louis le Grand, de onde
saiu em 1895. Foi nomeado director de estudos na Sorbonne em 1900. Dois anos depois,
substituiu Émile Boutroux na cadeira de história da filosofia.

Sob influência da teoria sociológica de Émile Durkheim, Lévy-Bruhl procurou elaborar


uma ciência dos costumes. Acreditava que a moral era determinada pelas épocas
históricas e pelos grupos sociais. Assim, afirmava que ela era relativa, passível de ser
aceite ou não pelos homens, constituindo um meio — variável de acordo com as
diferentes culturas — que os homens utilizam para relacionar-se com o mundo.

Para comprovar suas teses, dedicou-se principalmente ao estudo das sociedades


chamadas primitivas. Segundo Lévy-Bruhl, os homens das sociedades chamadas pouco
diferenciadas teriam uma mentalidade pré-lógica, que não estaria submetida aos
princípios de contradição e causalidade, mas seria baseada em representações míticas.

Entre suas obras, destacam-se:

 A filosofia de Auguste Comte, de 1900;


 A moral e a ciência dos costumes, de 1903;
 As funções mentais nas sociedades inferiores, de 1910;
 A mentalidade primitiva, de 1922;
 A alma primitiva, de 1927;
 Sobrenatural e a natureza na mentalidade primitiva, de 1931;
 A experiência mística e os símbolos entre os primitivos, de 1938.

A grande contribuição de Lévy-Bruhl foi ter permitido uma compreensão dos factores
irracionais no pensamento e nas religiões primitivas. Diz ele: «É por isso que a
mentalidade dos primitivos tanto pode ser pré-lógica como mística. Temos aí antes dois
aspectos de uma mesma propriedade fundamental do que dois aspectos distintos. Essa
mentalidade será chamada mística se se considerar mais especialmente o conteúdo das
representações; pré-lógica, se se olhar antes para as ligações. Pré-lógica não deve
também fazer supor que esta mentalidade constitui uma espécie de estádio inferior, no
tempo, ao aparecimento do pensamento lógico. Existiram alguma vez seres humanos ou
pré-humanos cujas representações colectivas não tenham obedecido a leis lógicas?
Ignoramo-lo. Em todo o caso, é muito pouco verossímil. Pelo menos, a mentalidade das
sociedades de tipo inferior, a que chamo pré-lógica à falta de melhor nome, não
apresenta de modo algum esse carácter. Não é anti-lógica; também não é alógica.
Chamando-lhe pré-lógica, quero somente dizer que ela não se sujeita, antes de tudo o
mais, a abster-se de contradição. Primeiro obedece à lei da participação. Assim
orientada, não se compraz gratuitamente no contraditório (o que a tornaria
constantemente absurda para nós), mas também não pensa em evitá-lo. Na maioria das
vezes, é indiferente ao princípio de contradição. O que significa que é difícil de
acompanhar».

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O duplo carácter da mentalidade primitiva ajuda Lévy-Bruhl a explicar a concepção de


causalidade que a caracteriza: «A causalidade que ela concebe é de um tipo diferente
daquele que nos é familiar». As sociedades primitivas ignoram as cadeias de causas
intermediárias e concebem apenas uma «causalidade mística e imediata», que implica
uma representação completamente distinta do tempo e do espaço. Para os primitivos,
não há fenómenos naturais, no sentido que damos a este termo. Assim, por exemplo, a
morte resulta sempre de práticas de magia, mesmo quando se trata da morte de um
homem idoso e doente. Imaginemos a seguinte cena: um búfalo investe contra um
homem e mata-o. Segundo Lévy-Bruhl, o homem primitivo prefere a explicação mística
à explicação objectiva natural: a morte deste homem será assim explicada pela bruxaria.
Haverá aqui uma contradição? Será o homem primitivo indiferente à contradição?

Evans-Pritchard considera que não há aqui nenhuma contradição, alegando que os


primitivos fazem uma análise mais aguda da situação: «Eles estão perfeitamente cientes
de que foi um búfalo que matou o homem, mas sustentam que isto não teria acontecido
se não tivesse havido bruxaria. Se não fosse a bruxaria, o homem não teria sido morto
pelo búfalo, ou teria sido outro homem que não aquele ou teria sido outro búfalo e
outro espaço e outro tempo e não aqueles: por que aconteceria como aconteceu se não
fosse a bruxaria? Eles estão a perguntar por que - como nós diríamos - duas cadeias
causais de eventos independentes se cruzam, levando um determinado homem e um
determinado búfalo ao mesmo lugar e no mesmo tempo». Nesta perspectiva mais subtil,
que Evans-Pritchard (1937) explanou na sua obra Witchcraft, Oracles and Magic
among the Azande, as duas explicações - a natural e a mística - são complementares: os
primitivos salientam mais a causa mística do que a causa natural, porque ela permite a
vingança contra quem enfeitiçou o homem. A subtileza desta análise não deve iludir a
incapacidade dos antropólogos para solucionar as questões relativas ao pensamento-
primitivo.

Lévy-Bruhl estudou - de 1910 a 1938 - o sistema de conhecimentos que correspondem à


sociedade primitiva, sem pretender procurar a origem do conhecimento filosófico e do
conhecimento científico das sociedades civilizadas. O conhecimento perceptivo do
mundo exterior, bem como o conhecimento do Eu, do Outro e do Nós, é, entre os povos
primitivos, completamente diferente dos nossos conhecimentos. Convém deixar bem
evidenciado que Lévy-Bruhl era descontinuísta e anti-evolucionista: os povos
primitivos vivem num mundo físico e num mundo social que não pode ser comparado
ao mundo dos povos civilizados. As leis da lógica formal são substituídas - nas
sociedades primitivas - pela lei da participação mística. Ora, esta última baseia-se,
como demonstrou Lévy-Bruhl em 1931, na categoria afectiva do sobrenatural. As
representações colectivas dos primitivos não são puramente intelectuais; são, antes de
tudo, «estados complexos em que os elementos emocionais e motores constituem partes
integrantes das representações».

Em 1920, Lévy-Bruhl já tinha renegado expressamente a tese do pré-logismo: «Vi ser-


me atribuída uma doutrina, chamada "pré-logismo", segundo a qual haveria duas
espécies de espíritos humanos, uns lógicos, como os nossos, e outros, os dos primitivos,

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pré-lógicos, isto é, destituídos dos princípios directores do pensamento lógico e


obedecendo a leis diferentes; e essas duas mentalidades seriam exclusivas uma da
outra... Não julguei necessário defender-me contra uma refutação que afirmava um
absurdo palpável e não dizia realmente respeito aos meus trabalhos».

Portanto, se nos atermos ao pensamento de outros europódes notaremos que muitas


vezes relevamos o fato de filósofos, cientistas, sacerdotes, artistas, viajantes e
colonizadores classificarem os grupos humanos que abordavam em seus trabalhos como
pertencentes a raças e etnias misteriosas, donas de comportamentos selvagens, idéias
atrasadas, costumes e religiões primitivas e bizarras, aparência horripilante e idéias
irracionais. Como se o nosso mundo não-europeu fosse habitado por seres aos quais era
negado o reconhecimento como humanos. O homo sapiens foi dividido pela filosofia e
pela ciência européias em “uma hierarquia de raças que desumanizou e reduziu os
subordinados tanto ao olhar científico como ao desejo dos superiores” (SAID, 2004: pág.
52)

Em seu livro “Rediscutindo a mestiçagem no Brasil”, o professor Kabengele


Munanga demonstra como inúmeros autores europeus considerados clássicos e
inatacáveis em nossos currículos advogam as mais ensandecidas teorias racistas.
Segundo Kabengele,
“Na vasta reflexão dos filósofos das luzes sobre a diferença racial e sobre o alheio, o
mestiço é sempre tratado como um ser ambivalente, visto ora como o “mesmo”, ora
como o “outro”. Além do mais, a mestiçagem vai servir de pretexto para a discussão
sobre a unidade da espécie humana. Para Voltaire, é uma anomalia, fruto da união
escandalosa entre duas raças de homens totalmente distintas. A irredutibilidade das
raças humanas não está apenas na aparência exterior: “não podemos duvidar que a
estrutura interna de um negro não seja diferente da de um branco, porque a rede
mucosa é branca entre uns e preta entre outros”. Os mulatos são uma raça bastarda
oriunda de um negro e uma branca ou de um branco e uma negra” (MUNANGA, 1999:
pág. 23).

4.4 - PENSAMENTO DE ALEXIS DE TOCQUEVILLE

O francês Alexis de Tocqueville, que viveu na mesma época de Comte, e é considerado


um dos grandes clássicos da ciência política, realizou uma viagem para os Estados
Unidos, nos anos de 1831 e 1832, da qual resultou o seu livro mais conhecido, A
democracia na América. Na segunda parte da obra o autor discute sobre “o futuro
provável das três raças que habitam o território dos Estados Unidos”. Segundo
Tocqueville, entre os homens que compõem a jovem nação “o primeiro que atrai os
olhares, o primeiro em saber, em força, em felicidade, é o homem branco, o europeu, o
homem por excelência; abaixo dele surgem o negro e o índio. Essas duas raças infelizes
não têm em comum nem o nascimento, nem a fisionomia, nem a língua, nem os
costumes. Ocupam ambas uma posição igualmente inferior no país onde vivem...”
(TOCQUEVILLE, 1977: pág. 243-244). Tocqueville reconhece a opressão exercida
pelos colonizadores europeus sobre os negros e índios, mas também não deixa de
considerar os mesmos como selvagens e inferiores. Sobre os negros, o nobre francês
não economiza adjetivos depreciativos em sua obra:

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“O escravo moderno não difere do senhor apenas pela liberdade. Mas ainda pela
origem. Pode-se tornar livre o negro, mas não seria possível fazer com que não ficasse
em posição de estrangeiro perante o europeu. E isso ainda não é tudo: naquele homem
que nasceu na degradação, naquele estrangeiro introduzido entre nós pela servidão,
apenas reconhecemos os traços gerais da condição humana. O seu rosto parece-nos
horrível, a sua inteligência parece-nos limitada, os seus gostos são vis, pouco nos falta
para que o tomemos por um ser intermediário entre o animal e o homem”
(TOCQUEVILLE, 1977: pág. 262).
Nem mesmo na obra de um dos autores mais influentes sobre a sociologia
contemporânea como Max Weber, deixamos de encontrar expressões grosseiras e
racistas em referência aos negros. Weber, é o autor do livro A Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo, que foi considerado por alguns estudiosos brasileiros o melhor
livro de não-ficção do século XX (Folha de São Paulo 11/04/1999). Na segunda parte da
obra em que Weber mais trabalhou em sua vida, Economia e sociedade: fundamentos
da sociologia compreensiva, o autor discute de passagem a idéia de “pertinência à raça”,
e comenta que, “nos Estados Unidos, uma mínima gota de sangue negro desqualifica
uma pessoa de modo absoluto, enquanto que isso não ocorre com pessoas com
quantidade considerável de sangue índio” (WEBER, 1991: pág. 268). Até este ponto o
texto parece descritivo e é apresentado como uma constatação da situação existente
naquele país. Mas, logo a seguir, o Weber sempre tão cuidadoso em tentar controlar os
juízos de valor emitidos em sua obra afirma:
“Além da aparência dos negros puros, que do ponto de vista estético, é muito mais
estranha do que a dos índios e certamente constitui um factor de aversão, sem dúvida
contribui para esse fenómeno a lembrança de os negros, em oposição aos índios, terem
sido um povo de escravos, isto é, um grupo extra mentalmente desqualificado”
(WEBER, 1991: pág. 268).
Como podemos ler acima, além da “aparência dos negros puros”... que “certamente
constitui um factor de aversão” para o grande sociólogo alemão, ele também considera
que entre as “maiores diferenças raciais...”, “como eu pude observar”, argumenta Weber,
também deve constar o que ele denomina como “o propalado cheiro de negro”
(WEBER, 1991: pág. 272).
O pensamento clássico europeu não difunde representações depreciativas apenas sobre
negros e índios. Èmile Durkheim, por exemplo, outro autor considerado um dos
fundadores da sociologia na França, em seu livro Da Divisão do Trabalho Social, ao
tratar das diferenças entre os gêneros masculino e feminino, se baseou nas pesquisas do
cientista Lebon, para quem
“...o volume do crânio do homem e da mulher, mesmo quando se comparam pessoas de
igual idade, estatura e peso iguais, apresenta diferenças consideráveis em favor do
homem e esta desigualdade vai igualmente crescendo com a civilização, de maneira
que, do ponto de vista da massa do cérebro e, por conseguinte, da inteligência, a
mulher tende a diferenciar-se cada vez mais do homem. A diferença que existe, por
exemplo, entre a média dos crânios dos parisienses é quase o dobro daquela observada
entre os crânios masculinos e femininos do antigo Egito” (Lebon, citado por Durkheim,
1978: pág. 28).
Observemos que no raciocínio de Lebon, no qual Durkheim se baseia para elaborar a
sua teoria sobre a divisão do trabalho nas sociedades modernas, conforme um povo vai
crescendo em civilização maior o crânio e a quantidade de massa encefálica dos seus
membros e, também, maior a diferença de inteligência entre o homem e a mulher,
sempre em favor do homem.

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Durkheim é também autor de As formas elementares da vida religiosa, que é uma obra
ainda hoje muito respeitada pelos estudiosos das disciplinas de sociologia e
antropologia. O que chama a atenção no texto são os adjetivos que o autor utiliza para
se referir às religiões não-européias. Para Durkheim, do seu ponto de vista, era
importante estudar “a religião mais primitiva e mais simples que atualmente seja
conhecida, fazer sua análise e tentar explicá-la”. O autor considera importante estudar
“as formas caducas de civilização”, mas não “pelo prazer de relatar coisas bizarras e
singularidades”, e sim para que seja revelado um “aspecto essencial e permanente da
humanidade”, que é o que ele chama de “natureza religiosa do homem”.
Embora Durkheim considere importante estudar o fenômeno religioso, ele não deixa de
considerar que existe uma hierarquia entre as religiões, “umas podem ser ditas
superiores às outras no sentido em que elas põem em jogo funções mentais mais
elevadas, são mais ricas em idéias e sentimentos, nelas figuram mais conceitos, menos
sensações e imagens, sua sistematização é mais engenhosa” (DURKHEIM, 1978: pág.
205-206).
No final da introdução de sua obra, Durkheim parece se desculpar por estudar as
religiões que considera “primitivas”, afirmando que não pretendida “atribuir virtudes
particulares às religiões inferiores [... ]. Ao contrário, elas são rudimentares e grosseiras.
[...] Mas a sua própria grosseria as torna instrutiva; pois elas constituem assim
experiências cômodas, onde os fatos e suas relações são mais fáceis de perceber”
(DURKHEIM, 1978: pág. 210).
Preocupado em demonstrar como as relações sociais de produção e o desenvolvimento
das forças produtivas são os fatores primordiais para entendermos os processos de
estruturação e mudança nas sociedades, Karl Marx abordou muito pouco o problema
das diferenças entre as supostas raças humanas em sua obra. O eurocentrismo do
pensamento de Marx pode ser constatado de outra maneira, como já demonstrou
Edward Said (1990: pág. 161-190). Em um texto de 1853, ou seja, de um Marx já
maduro, aparece uma reflexão sobre os “Resultados futuros da dominação britânica da
Índia”, com a qual é avaliada a atuação colonialista da Inglaterra na Índia e suas
conseqüências. Para Marx (1982: pág. 520) “a Inglaterra tem que cumprir na Índia uma
dupla missão: uma destrutiva, outra regeneradora – a aniquilação da velha sociedade
asiática e o estabelecimento dos fundamentos da sociedade ocidental na Ásia”.
Marx está considerando a ocidentalização da Índia como uma missão regeneradora, mas
ele ainda expõe de forma mais evidente o seu eurocentrismo ao comparar outras
civilizações como a indiana e a inglesa. Vejamos:
“Árabes, Turcos, Tártaros, Mongóis, que sucessivamente invadiram a Índia, cedo
ficaram indianizados, uma vez que, segundo uma lei eterna da história, os
conquistadores bárbaros são eles próprios conquistados pela superior civilização dos
seus súbditos. Os Britânicos foram os primeiros conquistadores superiores e, por
conseguinte, inacessíveis à civilização hindu. Destruíram-na, rebentando com as
comunidades nativas, arrancando pela raiz a indústria nativa e nivelando tudo o que
era grande e elevado na sociedade nativa. As páginas históricas da sua dominação na
Índia quase não relatam mais nada para além dessa destruição. A obra de regeneração
mal transparece através de um montão de ruínas. Apensar disso ela
começou”. (MARX, 1982: pág. 520).
Em um outro texto jornalístico de 1853, “A dominação britânica na Índia”, Marx não
deixava de denunciar a violência do colonialismo inglês, mas considerava tal violência
como necessária para a modernização e ocidentalização da civilização indiana. A
filosofia da história de inspiração hegeliana é evidenciada quando Marx afirma que “não

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podemos esquecer que estas idílicas comunidades aldeãs, por muito inofensivas que
possam parecer, foram sempre o sólido alicerce do despotismo oriental, confinara o
espírito humano ao quadro mais estreito possível, fazendo dele o instrumento dócil da
superstição, escravizando-o sob o peso de regras tradicionais, privando-o de toda a
energia histórica” (MARX, 1982: pág. 517). Marx denuncia a violência das civilizações
da Índia, considerando a vida das populações indianas como “indigna, estagnada e
vegetativa”, uma “espécie de existência passiva”, que “desencadeava forças de
destruição selvagens, sem objectivos e sem limites, e tornavam o próprio assassínio um
rito religioso no Indostão”. Sobre as religiões da Índia, Marx também não economiza
expressões depreciativas, atribuindo-lhes “um culto da natureza brutalizador, que exigia
a sua degradação no fato de o homem, o senhor da natureza, cair de joelhos em
adoração de kanuman, o macaco, e Sabbala, a vaca”. Por tudo isso, Marx, ao final do
seu texto, como se fosse um colonialista absolve a violência do colonialismo Inglês:
“quaisquer que possam ter sido os crimes da Inglaterra, ela foi o instrumento
inconsciente da história ao provocar essa revolução” (MARX, 1982, pág. 517-518).
Como vimos, não encontramos nos textos mencionados acima, nenhuma distinção
relevante entre o pensamento de Marx e os dos filósofos Hegel e Kant, quando o
assunto são as populações não europeias e suas formas de vida material e religiosidade.
Apenas para ilustrar mais uma vez a semelhança de abordagem, no texto citado, em que
demonstra toda a sua arrogância eurocêntrica com relação aos negros, Kant também
desqualifica os indianos, em termos muito parecidos aos utilizados por Marx.
Para usarmos as palavras de Edward Said, “os filósofos podem conduzir suas discussões
sobre Locke, Hume e o empirismo sem jamais levar em consideração o fato de que há
uma conexão explícita, nesses escritores clássicos, entre suas doutrinas “filosóficas” e a
teoria racial, as justificações da escravidão e a defesa da exploração colonial” (SAID,
1990: pág. 25). Ainda, segundo o mesmo autor, “muitos humanistas de profissão são,
em virtude disso, incapazes de estabelecer a conexão entre, de um lado, a longa e
sórdida crueldade de práticas como a escravidão, a opressão racial e colonialista, o
domínio imperial e, de outro, a poesia, a ficção e a filosofia da sociedade que adota tais
práticas” (SAID, 1995: pág. 14).

4.5 – PENSAMENTO DE PETER BOTHA (1916)

Pieter Wilhem Botha nasceu no distrito de Paul Roux, Estado Livre de Orange, aos 12
de Janeiro de 1916. Foi jurista de profissão e presidente do Partido Nacional Sul-
Africano. Em 1948 foi eleito pela primeira vez para o parlamento como representante da
Georgia. Ocupou várias pastas ministeriais, entre as quais a da Defesa sobre a
presidência de F. Verwoerd, entre 1966 à 1978. Em 1978 tornou-se primeiro-ministro e
em 1984 graças a uma emenda constitucional, presidente.

Enre em conflito com os grupos Bôeres ultraconservadores, dando os primeiros passos


para a desmantelamento do Apartheid com a qual a demissão para o governo de
representantes de grupos raciais não brancos ainda em ministérios de pequenas
relevância. Em 1989 introduziu uma reforma constitucional que previa uma participação
política restrita desses grupos. Foi substituído no cargo de presidente por Frederick de
Wilhem de Klerk. Foi o último presidente da época do apartheid na África do Sul.

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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Enquanto presidente da África do Sul Pieter Botha proferiu um discurso onde procurou
demonstrar a sua posição e a posição da Europa em torno da concepção dos negros.
Segundo Botha, «Pretória foi erguida pela mente branca para o homem branco. Não
somos obrigados a provar a qualquer um nem mesmo aos pretos que nós somos um
povo superior. Já demonstramos de mil e uma maneiras.

A República da África do Sul que nós hoje conhecemos não foi criada apenas de sonho.
Nós criamo-la a custa da inteligência, do suor e de sangue. Foram os Afrikaners que
tentaram eliminar os aborígenes Australianos? São os Afrikaners que descriminaram aos
pretos e os chamam Niggers nos Estados Unidos? Foram os Afrikaners que começaram
o comércio de escravos? Onde o homem preto é apreciado? Inglaterra descrimina os
seus pretos, a sua lei de “Sus” está para disciplinar os pretos. Canadá, França, Rússia e
Japão também descriminam.

Por que tanto barulho por nossa causa? Por que nos condenam a nós?

Eu estou tentando simplesmente provar a todos que não há nada incomum no que
estamos a fazer – diferente do que o mundo chamado civilizado está fazendo.

Nós somos simplesmente um povo honesto com uma Filosofia clara de como nós
queremos viver à nossa própria vida branca.

Nós não fingimos que gostamos conforme os outros brancos fazem. O facto de os
Negros parecerem como seres humanos não lhes faz necessariamente sensíveis a
seres humanos.

O porco não é porco-espinho e o lagarto não é crocodilo simplesmente porque são


idênticos. Se Deus nos quisesse igual aos pretos, criavam-nos a todos de uma única cor
e de um intelecto uniforme. Mas criou-nos diferentes: brancos, pretos, amarelos,
governantes e governados. Intelectualmente nós somos superiores aos pretos; isso foi
provado para além de toda a dúvida razoável ao longo dos anos.

Eu acredito que o Afrikaner é honesto, pessoa temente a Deus, que demonstrou


praticamente a melhor forma de estar. Não obstante, é confortável saber que nos
bastidores, Europa, América, Canadá, Austrália e todos os outros dizem através de nós o
que pensam.

Para relações diplomáticas, todos nós sabemos que a língua deve ser usada e onde. Só
para provar o meu ponto de vista, camaradas, quem de vocês conhece um país branco,
sem investimento ou interesse na África do Sul? Quem compra o nosso ouro? Quem
compra nossos diamantes? Quem negoceia connosco? Quem nos está a ajudar a
desenvolver outra arma nuclear? A maior verdade é que nós somos o seu povo e eles
são nosso povo. É um segredo grande. A força da nossa economia é suportada pela
América, Grã-Bretanha, Alemanha, etc. É nossa forte convicção, consequentemente,
que o preto é a matéria-prima para o homem branco.

Assim, irmãos e irmãs juntem as mãos e lutemos contra este diabo preto. Eu apelo a
todo os Afrikaners a saírem com meios criativos de travar esta guerra.

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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Certamente, Deus não pode condenar os seus próprios povos que somos nós. Por agora
cada um de nós tem visto praticamente que os pretos não se podem governar.

Dê-lhes armas que eles vão se matar uns aos outros. São bons em nada mais do que
fazer barulho, dançar, casar com muitas esposas espojarem-se no sexo. Vamos
todos aceitar que o homem preto é o símbolo da pobreza, da mente inferior, do
perder e da incompetência emocional. Não é plausível? Consequentemente que o
homem branco é criado para governar o homem preto?

Vamos só pensar no que aconteceria se um dia vocês acordassem com um “Kaffir”


sentado no trono! Pode acontecer o que aconteceria às nossas mulheres? Qualquer um
de vocês acredita que o preto pode governar este país? Daí que, nós temos todas as boas
razões para deixar todos os Mandelas adeptos e seguidores na prisão, eu penso que nos
deviam elogiar por mantê-los vivos, apesar de já possuirmos meios para acabar com eles.

Desejo anunciar um conjunto de novas estratégias que devem ser postas em prática para
eliminar este “erro” preto. Devemos a partir de agora usar armas químicas.

Primeira prioridade:

1. “não deve permitir mais o aumento das populações negras, para que não nos
arrependamos mais tarde. Tenho a notícia emocionante dos nossos cientistas que
desenvolveram um novo material e eficiente. Estou a mandar mais
investigadores ao terreno para identificar quanto mais locais possíveis e onde as
armas químicas poderiam ser usadas para combater o aumento da população. O
hospital, por exemplo, é uma boa abertura estratégica e deve ser inteiramente
utilizado. A rede da fonte de alimento deve ser usada”.

Nós temos desenvolvido bons venenos que matam lentamente e excelentes destruidores
de fertilidade. Nosso medo é somente um, caso este material voltar-se contra nós! Nas
suas mãos podem começar a usar contra nós, é só parar e pensar quantos pretos
trabalham para nós.

Contudo, nós estamos a fazer de tudo para nos certificarmos de que o material
permaneça estritamente em nossas mãos.

Segunda prioridade:

2. “É explorar a vulnerabilidade da maioria de pretos ao dinheiro. Eu reservei um


fundo especial para explorar esta faceta. O velho truque de dividir para reinar é
ainda muito válido hoje. Nossos peritos devem trabalhar dia e noite para fazer o
homem preto trair os ses mentores. O seu sentido moral inferior pode ser
explorado”.

E está aqui uma criatura com falta de carácter. Há uma necessidade de nós o
combatermos, a longo prazo para que não possa suspeitar.

O preto médio não planeia a sua vida para além de um ano: esse facto, por exemplo,
deve ser explorado.

Material de apoio da 12ª classe


23
FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Meu departamento especial está a trabalhar contra o tempo num projecto de operação ao
longo prazo, estou a fazer também um pedido especial a todas as mães Afrikaners para
dobrar a sua natalidade. Pode ser necessário desenvolver uma indústria de crescimento
da população, criando centro onde nós empregamos e suportamos homens novos e
mulheres inteiramente brancos para produzirem crianças para a Nação. Nós estamos
investigando também o mérito de aluguer de útero como meios possíveis de apressar-se
o crescimento da nossa população, por um tempo, nós devemos também activar uma
engrenagem muito sofisticada para assim certificar de que os homens pretos estão
separados das suas mulheres e multas impostas as mulheres casadas que geram crianças
ilegítimas.

Eu tenho um comité a trabalhar em torno de um método melhor de incitar os pretos uns


contra os outros e incentivar assassinatos entre si. Os casos de assassinatos entre pretos
devem merecer uma punição tão leve, a fim de os incentivar.

Os meus cientistas desenvolveram uma droga que pode ser usada para efectuar o
envenenamento e destruição lenta de fertilidade. Trabalhar com as fábricas de bebidas a
fim de fabricarem bebidas, especialmente, para pretos, que podiam promover formas da
redução da população.

Não é uma guerra em que nós podemos usar a bomba atómica para destruir os pretos,
assim sendo, nós devemos usar a nossa própria inteligência para isso. O ataque de
indivíduos a indivíduos pode ser muito mais eficaz. Os registos mostram que os homens
pretos morrem para ir à cama com uma mulher branca, está aqui uma oportunidade
original.

Nosso esquadrão de mercenários do sexo devem sair camuflados e infiltrados como


lutadores contra o Apartheid para fazerem suas operações e administrarem
silenciosamente venenos de destruição lenta de fertilidade.

Nós estamos modificando os esquadrões de mercenários do sexo introduzindo os


homens brancos que devem ir procurar mulheres pretas militares e todas as outras
mulheres pretas vulneráveis. Nós recebemos uma remessa nova de prostitutas da Europa
e da América que estão desesperadas e demasiado desejosas de aceitarem a missão.

O meu último apelo é que as operações de maternidade nos hospitais devem


intensificar-se. Nós não estamos pagando aquelas pessoas para ajudarem a trazer bebés
pretos a este mundo, mas sim eliminá-los no momento de seu nascimento. Se este
departamento trabalhasse muito eficientemente, muito poderia se conseguir.

O meu governo reservou um fundo especial para erguer hospitais e clínicas secretas
para promover este programa. O dinheiro pode fazer qualquer coisa para nós. Enquanto
nós o tivermos, devemos fazer o melhor uso dele. Entretanto, meus adoráveis
concidadãos brancos não levem a peito o que o mundo diz e não se envergonhem de
serem chamados racistas. Eu não me chateio por ser chamado de arquitecto e rei do
Apartheid.

Eu não me transformarei num macaco simplesmente por alguém me chamou de macaco.

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Eu continuarei a ser a vossa estrela brilhante… Sua excelência BOTHA».

CAPÍTULO III – HISTÓRIA DA FILOSOFIA AFRICANA

5.1 – A filosofia cristã antiga em África

A história antiga da filosofia africana está sobretudo limitada ao Norte de África e à


Igreja do Norte de África.

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Esta Igreja deve assinalar-se desde o inicio surgindo na paisagem histórica do


Cristianismo como local onde o Cristianismo latino começou a aparecer na literatura. A
partir do séc. II Cartago, centro do pensamento cristão antigo, era tido como a rival de
Roma.

A história da filosofia divide-se, durante este período, em duas partes.

a) Período inicial ou fase cristã latina e grega dos pensadores católicos do


norte de África: estende-se do séc. II ao VI da era cristã.

Os autores deste período são: Clemente de Alexandria (Grego ateniense),


Orígenes, Tertuliano, Santo Agostinho e Hipátia de Alexandre (primeira mulher
filósofa conhecida até então). As suas contribuições não se limitaram à Filosofia,
tendo contribuindo também, sobre a Sagrada Escritura, Teologia, Retórica,
Política e Ética.

Os factores que influenciaram a formação deste período foram tanto indígenas e


endógenas.

b) Período tardio ou fase islâmico-árabe de pensadores africanos muçulmanos:


estende-se entre os sécs. IX e XV.

Este período é caracterizado por pensadores africanos árabes do Magreb


(Avicena e Averróis) e de africanos negros indígenas convertidos ao Islão.

5.1.1 – O legado do antigo Egipto para o progresso do pensamento humano

O período que caracteriza o Antigo Egipto (império faraónico egípcio) entende-se desde
3 000 anos até 300 anos antes da era cristã (a.e.c) arco temporal que mede, de grosso
modo, a Filosofia Antiga da África.

O Egipto foi reconhecido por muitos primitivos proponentes da filosofia grega, e outros
escritores antigos, como o Berço da Filosofia. Assim afirmaram ao longo de suas
pesquisas: Tales de Mileto, Platão, Aristóteles de Estagira, Proclo, Santo Agostinho de
Hipona ao associarem o Antigo Egipto aos inícios da Filosofia.

Aristóteles, na Secção das Leis, apresenta o diálogo entre o ateniense e Clínias, onde o
ateniense reconhece que os antigos egípcios tinham, já há muito, identificado o
princípio que os gregos apenas então começavam a admitir a virtude na educação das
crianças. Disse ainda: “as artes matemáticas foram fundadas no Egipto; pois, ali, à
classe sacerdotal era permitido dedicar-se ao lazer”.

Platão, no Timeu, demonstra como Crítias narra como o grego Sólon esteve
maravilhado pelo imenso conhecimento dos sacerdotes egípcios. Crítias avança: “Sólon
descobriu que, tanto ele como qualquer outro grego não sabiam, por assim dizer, quase
nada sobre aquele assunto”.

Segundo Tertuliano, no séc. III “Platão seguiu de perto os ensinamentos do egípcio


Mercúrio (Hermes)”

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Para o Bispo de Hipona, Platão encontrou no Egipto um conhecimento que lhe foi
benéfico para o seu próprio pensamento; conforme ele mesmo escreveu: “Dando-se
conta, porém, de que nem o seu próprio génio nem a formação socrática eram tão
adequados para desenvolver um sistema perfeito de Filosofia, ele atravessou longas
distâncias até onde quer que houvesse alguma esperança de encontrar algum
acréscimo válido ao conhecimento. Assim, no Egipto, ele dominou a sabedoria que ali
era tida em estima”. Prossegue Santo Agostinho: “Falando da Filosofia, a função
essencial desta disciplina é a de ensinar os homens a atingirem a felicidade. Não havia
nada deste género no Egipto até ao tempo de Mercúrio ou Trismegisto… Isto foi,
reconhecidamente, muito antes de aparecerem na Grécia os sábios e filósofos”.

5.1.2 – Cartago e Alexandria como celeiros do Cristianismo na África ocidental

 Cartago e o Cristianismo da África ocidental

A Igreja do Norte de África tinha sido latinizada nos seus Hábitos, leis e línguas uma
vez que essa região estava sobre domínio romano. Alguns de seus habitantes eram,
muito provavelmente, de origem Semita. Os Fenícios fundaram Cartago (Karthada,
Karchedon ou Carthago) cerca do ano 800 antes de Cristo, na actual Tunísia, na Costa
do Norte de África. Devido a sua posição estratégica, ligando a África, a Ásia e a
Europa, Cartago haveria, rapidamente, de rivalizar com a Roma. Acabou por ser
saqueada por esta, no ano 146 a.C., mas haveria de se reerguer, para se tornar um centro
próspero e importante do Cristianismo no mundo latino.

Na era cristã do século II da era cristã, Cartago tinha atingido uma importância somente
ultrapassada por Roma. Os vândalos procuraram destruí-lo no ano 439 e, finalmente
destruído pelos árabes muçulmanos em 647. Foi em África (Cartago e Alexandre) que o
domínio do pensamento cristão foi modelado e sobre seus ombros repousou a Teologia
Cristã.

Em Cartago surgiu a mais antiga tradução latina da Bíblia, a Ítala, a partir da qual São
Jerónimo baseou a sua Vulgata. O latim era a língua predominate, numa altura em que o
Grego ainda era falado em Roma, e foi, também em África que nasceu a teologia latina.

Os primeiros protagonistas desta Igreja foram: Tertuliano, Minúcio Félix, Cipriano,


Arnóbio e Lactâncio.

a) QUINTUS SEPTIMIUS FLORENS TERTULLIANUS (150-220)

Nasceu em meados do séc. II, próximo do ano 150, em Cartago, onde vieveu até
a morte. Converteu-se ao Cristianismo, em adulto, depois de experimentar todos
os prazeres da carne (mundo). A conversão ocorreu depois de ter testemunhado
a coragem heróica dos cristãos em tempo de perseguição.

Ao ridicularizar os oficiais romanos, Tertuliano, afirmou: “Crucificai-nos,


torturai-nos, condenai-nos! A vossa iniquidade é a prova da nossa inocência…
Tornamo-nos mais numerosos de cada vez que somos despedaçados por vós: o
sangue dos cristãos é semente”.

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Escreveu obras como: Apologia, O Testemunho da Alma e Acerca da Alma.

b) MARCUS MINUCIUS FELIX

Minúcio foi contemporâneo de Tertuliano. Exerceu advocia em Roma, mas


nascera em Cirta (actual Constantine, Argélia), no Norte de África, no séc. II.

Segundo Minúcio “As coisas que são duvidosas devem ser deixadas como elas
são, e enquanto tantas das maiores inteligências estiverem indecisas, não
devemos precipitadamente e imprudentemente decidir em favor de alguma das
partes. De outro modo, uma crença religiosa própria de mulheres idosas toma
raiz ou toda a piedade é destruída”.

 Alexandria e o Cristianismo na África Ocidental

A presença do cristianismo no Egipto remonta, talvez, à idade apostólica, embora o seu


contacto com a história da salvação se entendia em um período anterior. Até ao Cairo se
ter evidenciado, Alexandria, fundada por Alexandre Magno, era a célebre metrópole do
Egipto, e centro do conhecimento como do comércio. Era ainda um importante elo de
ligação entre a Ásia e a Europa. Em Alexandria, encontram-se «Jerusalém» e «Atenas»;
ao contrário do que aconteceu em Cartago, aqui não se resistiu a compreensão filosófica,
que foi acolhida tendo em vista a justificação da verdade revelada. A cultura grega foi
trazida ao Cristianismo numa busca de reconciliação com a Filosofia. Desta forma,
lançaram-se naquela cidade os fundamentos para uma das maiores escolas catequéticas
de todos os tempos. A instituição foi primeiro dirigida por Panteno, a quem sucedeu
Clemente e, depois, Orígenes. Em finais do séc. IV, a escola tinha perdido o seu fulgor,
e a própria cidade caiu na insignificância, preparando o terreno para a aparição do Cairo
no ano 969. Clemente de Alexandria e Orígenes são os mais notáveis representantes
desta escola, tanto na prosperidade como na teologia. Talvez um dos seus trunfos mais
valiosos tenha sido o uso mais livre da filosofia grega, vendo nela um dom de Deus para
a propagação do Evangelho.

a) TITO FLÁVIO CLEMENTE (150-211/215)

Nasceu cerca do ano 150 da era cristã, de pais pagãos, provavelmente em Atenas.
Converteu-se ao Cristianismo por influências de Panteno (líder da Escola
alexandrina), a perseguição de Septímio Severo, em 201-202, fê-lo fugir para
Cesareia, na Capadócea, tendo morrido em Jerusalém, entre os anos 211 e 215.

Clemente é justamente apelidado como o pai da filosofia cristã alexandrina.


Para ele: “a literatura e a filosofia gregas eram muito valiosas para a tarefa do
anúncio do cristianismo porque a verdade cristã precisava de se exprimir numa
linguagem compreendida à sociedade em que era anunciada. Há uma certa
harmonia entre a mensagem do Evangelho e a Filosofia, e esta não deve, a
priori, ser posta de lado”.

b) ORIGEN ADAMANTINUS (185-254)

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Orígenes foi filho de um cidadão romano e de uma cidadã egípcia. Nasceu em


185, provavelmente, em Alexandria, Alto Egipto. Morreu em Tiro em 254. É
considerado o mais ilustre pensador e defensor das Sagradas Escrituras da qual
muito influenciou para a nova versão.

O bispo Demétrio nomeou-o para a presidência da escola catequética no ano 203.


Aprendeu hebraico e, para se familiarizar com as doutrinas das escolas gregas,
estudou filosofia com Amónio Sacas, pai do Neoplatonismo e mestre de Plotino.

Orígenes afirmou: “Esta é agora a nossa resposta às alegações, e a nossa


defesa da verdade que se encontra no Cristianismo, que se alguém passasse do
estudo da opinião e dos costumes dos gregos para o Evangelho, não apenas
decidiria que as suas opiniões são verdadeiras, mas haveria de estabelecer pela
prática a sua verdade, e acrescentar o que parecesse estar em falta, de um
ponto de vista grego, à sua demonstração, e assim confirmar a verdade”.

5.2 – A FILOSOFIA MEDIEVAL EM ÁFRICA

Se é verdade que se levanta dúvidas quanto à existência de filósofos individuais na


África a Sul do Saara, o mesmo não se pode, exactamente, aplicar a região do Norte do
continente.

Há uma longa tradição de filosofias e de filósofos individuais nesse território,


particularmente na Igreja do Norte de África: Argélia, Egipto e Etiópia.

5.2.1 – A filosofia na Igreja do Norte de África: Santo Agostinho (354-)

Aurélio Agostinho nasceu a 13 de Novembro de 354, em Tagaste, na província da


Numídia, Argélia.

Converteu-se ao Cristianismo depois de ter ouvido a homilia do Bispo Ambrósio. Tinha


iniciado o caminho do retorno pela verdade; ansiava pela Verdade e nada mais do que
isso o satisfaria. Não poderia contentar-se com a verdade oferecida pela Filosofia; essa
serviria apenas como uma introdução à Verdade. Agostinho seguiu o Maniqueísmo, do
qual Fausto era mestre, mas ficou desiludido ao descobrir que Fausto era ignorante
quanto aos assuntos em que supunha que era mestre; aqueles mesmos que o tinham
atraído ao Maniqueísmo.

Como ele mesmo o disse: “Embora grande admirador desta eloquência, eu sabia
distingui-la da verdade das coisas que estava ávido de aprender, eu não reparava tanto
no prato do discurso, mas que comida me servia esse famoso Fausto, tão citado pelos
seus”.

Em 383, Santo Agostinho chegou a Roma com o fito de ensinar Retórica. Em Milão
teve um encontro com o Neoplatonismo através da obra de Plotino, Enéadas. Este
encontro ocorreu depois do contacto com a obra de Cícero, Hortênsio, como ele mesmo

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

diz: «já tinham decorrido muitos anos – talvez uns doze – desde que, aos dezanove anos,
lendo o Hortênsio de Cícero, me sentira atraído para o estudo da sabedoria».

A teoria da verdade de Agostinho e o seu entendimento de como se pode chegar até a


ela conduzem-nos a um aspecto da sua epistemologia que tem gerado muita discussão: a
Iluminação. Esta Epistemologia agostiniana que assenta na Iluminação: vem
estabelecendo uma dicotomia entre o conhecimento dos sentidos e o conhecimento
intelectual. Deste modo afirma: “e tudo que conhecemos, conhecemo-lo através da
razão. Por conseguinte, nenhuma sensação é conhecimento, mas tudo aquilo de que
estamos conscientes corresponde a conhecimento”; mas, além disso, “o conhecimento
não se obtém simplesmente por ser se estar consciente de algo, mas somente se essa
consciência resultar de um exercício da razão”. O cume do conhecimento humano é a
contemplação das verdades eternas, somente conhecidas pela inteligência por meio de
uma luz divina que vem de Deus. A luz divina é uma iluminação especial incorpórea
que provém de Deus e faz visíveis os objectos incorpóreos, tornando possível, por
conseguinte, o conhecimento daqueles que são corpóreos.

As obras de Agostinho dividem em duas partes:

 Período anterior à sua ordenação sacerdotal de 386 à 391: encontram os


seguintes tópicos – Teoria do Conhecimento, a Natureza da Felicidade, o
Conhecimento de si mesmo e de Deus e a existência da providência divina
juntamente com o problema do mal. Algumas obras deste período são: Contra os
Académicos (386): escritos em que argumenta contra o Cepticismo dos
académicos; De Beata Vita – Diálogo sobre a Felicidade (386): corresponde ao
seu modo cristão de entender o discurso platónico acerca de uma vida feliz; De
Ordine – Diálogo sobre a Felicidade (386): dedicado à questão do mal e à sua
relação com a Providência divina; e Solilóquios (386-387): Diálogo sobre Deus
e a imortalidade da alma.

 Período posterior à sua ordenação sacerdotal: Sobre a imortalidade da alma


(387); Sobre a potencialidade da alma (387-388); Sobre o livre-arbítrio (388-
395); Sobre a génese contra os Maniqueus (388-390); De magistero ou O
mestre (389); Sobre a verdadeira religião (389-390); Sobre a doutrina cristã
(397-426); Confessiones ou as Confissões (397-401); De trinitate ou A Trindade
(399-419); e De Civitate Dei ou A Cidade de Deus (413-426).

No Hortênsio, obra de Cícero, Santo Agostinho buscou incansavelmente a verdade, que


passou a ser o princípio orientador de toda a sua especulação, tanto filosófica quanto
teológica; uma busca que o conduziu a reconhecer que o desejo da sabedoria só em
Deus encontra a sua culminação autêntica. Só quando abraçou o Cristianismo é que ele
encontrou descanso em relação à febre do mundo.

5.2.2 – Filosofia etíope indígena: traduções filosóficas etíopes

O homem africano foi durante muito tempo chamado de: etíope (do grego homem de
rosto queimado), negro, núbio, nilótico, hamilita ou cuchita.

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

A Etiópia legou a posteridade, em África, um rico reservatório de conhecimento. Além


das tradicionais obras filosóficas de carácter oral (como aquela apresentada por Henry
Odera Oruka), especialmente a Sagacidade filosófica, existiram também Textos
filosóficos indígenas em África. É o caso da filosofia escrita da Etiópia.
As obras mais conhecidas foram: O Fisiólogo (séc. V d.C.), O Livro dos Sábios
Filósofos (1510-1522), A Vida e as máximas de Skendes (séc. XI), O Tratado de Zãr’a
Ya’agob (1667); e a Tratado de Walda Haywãt (séc. XVIII).

Dentro deste cinco escritos, os três primeiros são adaptações de obras transmitidas das
fontes gregas por meio de árabe e os dois últimos são obras originais de tom racionalista.

A identidade etíope destas obras de tradução, sustenta Claude Sumner, residem no facto
de que «os etíopes nunca traduziram literalmente… a tradução é uma adaptação: eles
acrescentaram, subtraem, modificam. Uma obra estrangeira torna-se autóctone, não
pela originalidade da invenção, mas pela originalidade do estilo». Acrescenta Claude
Sumner: “a resposta etíope à influência externa não representou uma adesão servil às
formas importadas, mas, antes, uma incorporação criativa”.

5.3 – FILOSOFIA MODERNA AFRICANA

A história moderna da filosofia africana estende-se do séc. XVI ao séc. XIX,


movimentado dentro do continente e nas diásporas americanas e europeias.

As contribuições etíopes e as de Anton Wilhelm Amo aparecem como os representantes


do desenvolvimento simultâneo a dois níveis do pensamento africano tanto no
continente quanto fora dele.

5.3.1 – Filosofia etíope indígena: traduções e obras originárias

A Etiópia é tida como o berço do pensamento moderno em África pelo facto de, a sua
filosofia assumir papel preponderante para o crescimento da filosofia africana. O
estudioso que se preocupou em investigar sobre o pensamento etíope foi: Claude
Sumner.

O autor árabe egípcio Abba Mikhael ao escrever obras como: O Livro dos Sábios
Filósofos, o Tratado de Zar’a Ya’agob e o Tratado de Walda Haywat quis incorporar
no pensamento africano doutrinas pré-socrática, socrática, aristotélica, platónica e
neoplatónica. A título de exemplo, o Livro dos Sábios filósofos é uma colecção de ditos
ou um liber sententiarum que apresenta a quinta essência do que foi pronunciado por
diversos filósofos num determinado número de tópicos na sua maioria éticos.

O racionalismo em África apareceu em circunstâncias críticas movido pelas histórias


em que originou o racionalismo na Europa. Na Europa, têm por base o colapso do
escolástico e da harmonia entre a Fé e a Razão, e, na Etiópia, o confronto com a cultura
ocidental e a violenta discórdia religiosa.

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

O ser humano, em virtude da sua razão, pode chegar ao criador e pode vê-lo
mentalmente. Deus instituiu uma lei natural acessível ao ser humano pelas capacidades
da sua inteligência. A bondade da natureza criada ou asa leis da natureza constituem o
princípio básico de Ya gob semelhante ao papel desempenhado pelas ideias claras e
distintas de Descartes.

5.3.2 – A diáspora africana: Anton Wilhelm Amo (1703-1756)

O primeiro filósofo africano a estudar e ensinar numa Universidade Europeia foi Anton
Wilhelm Amo (estudante de Jurisprudência, Psicologia racionalista, Lógica e
Metafísica), nasceu em 1703, em Axim, actual Gana. Assinava “Amo-Guinea-Afer ou
Guinea-Africanus”- Amo, o Guineense.

Ao ser enviado para os Países Baixos (Holanda), para aí se formar em educação


religiosa e tornar-se padre e professor, aos quatro anos de idade foi transferido para a
Alemanha do séc. XVIII. Estudou Filosofia e Jurisprudência nas Universidades de Halle,
Wittenberg e Jena. Após cerca de quarenta anos na Europa, regressou ao Gana em 1747,
conforme ele mesmo confirmou: «aquele que se adapta segundo as necessidades é
sábio e possui um toque divino».

A primeira obra de Amo que se perdeu foi Dissertatio inauguralis de jure Maurorum in
Europa ou Dissertação inaugural acerca dos direitos dos Mouros (africanos) na
Europa (1726), - esta obra destinava-se a combater a escravatura e a sublinhar os
direitos dos africanos na Europa com recurso a antigas proibições demonstrando as
ligações de Roma com a África. A obra ajudou, igualmente, a inibir a escravatura
respondendo de forma erudita, criar um estatuto dos africanos como estrangeiros na
Europa, a reflectir o impacto das populações africanas na Europa metropolitana e a
desintegração da hegemonia do Sacro-Império Romano.

As suas principais obras foram: Dissertatio de humanae mentis apartheia ou


Dissertação sobre a impassibilidade da mente humana (1734) e Tractatus de arte
sobrie et accurate philosophandi ou Tratado sobre a arte de filosofar com sobriedade e
precisão (1738) – esta é tida como a magnum opus.

John Theodosius Meiner foi seu tutorando, na qual o ajudou a compilar a tese: Discurso
filosófico distinguindo entre o que diz respeito à mente e ao corpo vivo e orgânico.

Os pensadores que influenciaram Amo, directa e inderctamente, são inúmeros


destacando entre outros: Aristóteles, Tertuliano, Agostinho e Tomás de Aquino.
Enquanto estudante em Halle, Wittenberg e Jena recebeu influências de Gottfried
Leibniz e Christian Wolff e, consequentemente, os racionalistas iluministas.

Para Hountondji, “Anton Amo não deve ser tido como filósofo africano porque cresceu,
estudou e viveu uma boa parte da sua vida na Europa”. Ao passo que, o biógrafo
alemão Burchard Brentjes, “Amo foi um filósofo negro em Halle”. Já Osuagwu, na sua
obra citada, diz-nos que: “Amo tinha uma obra, ou ideias, que podem ser
autenticamente consideradas como filosofia africana e que lhe merecem o epíteto de
filósofo africano”.

Material de apoio da 12ª classe


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CAPÍTULO IV – A FILOSOFIA AFRICANA CONTEMPORÂNEA

O período contemporâneo da filosofia africana estende-se desde a segunda metade do


século XIX até ao momento actual tendo como apogeu de sua reflexão o século XX.

Os protagonistas desta filosofia são africanos indígenas (nascidos em África e filhos de


africanos), não indígenas (nascidos fora d’África e filhos de não africanos) e
expatriados (nascidos fora d`África e filhos de africanos); embora a todos corresponder
o epíteto de filósofos africanos contemporâneos tiveram métodos, doutrinas e literaturas
diferentes tal como qualquer outra história da filosofia.

Os filósofos africanos como Bilolo e Osuagwu, assim como muitos outros pensadores,
colocaram a filosofia africana no mapa académico da investigação filosófica formal e

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

científica ao defender a filosoficidade da filosofia africana a partir da realidade


científica histórica.

Os famigerados pensadores africanos contemporâneos são: Kwame NKrumah, Leopold


Senghor, Lacinay () Keita, Henri Oruka, Kwasi Wiredu, Paulin Hountondji, Peter
Bodunrin, Placide Tempels, Frantz Fanon, Alexis Kagame e Aimé Césaire.

O pensamento africano contemporâneo enalteceu não só as ideias, as políticas, a religião,


mas também o papel da Filosofia no desenvolvimento e emancipação económica do
continente.

A Grécia começou a fazer filosofia «quando todas as necessidades vitais e aquelas


coisas que são próprias para o conforto e a recreação foram alcançadas (…)» - como
afirmou Aristóteles na obra Metafísica, livro I.

A filosofia africana profissional é aquela feita por académicos que procuram atingir a
verdade suprema num autêntico espírito filosófico sem considerar a experiência real do
continente. Esta filosofia é uma crítica a etnofilosofia.

Depois do domínio colonial a África experimentou toda a espécie de política tendo


sequestrado a consciência dos seus cidadãos, por isso, só uma filosofia sensível à
cultura, à história e aos valores tradicionais do seu povo poderia ser capaz de dialogar
com a cultura moderna e contemporânea, a fim de, criar um enquadramento político no
qual a autêntica libertação do homem e da mulher africanos possam ser nutridos e
valorizados.

A filosofia africana autóctone corresponde ao pensamento dos povos africanos cuja


visão do mundo não foi ainda influenciada por ideias externas.

Ao tentar diferenciar o sábio popular do sábio filosófico, aquando da abordagem da


Filosofia dos sábios, Odera Oruka apresentou seis tendências para compreender a
filosofia africana contemporânea, tais como: etnofilosofia, filosofia nacionalista-
ideológica, sagacidade filosófica, filosofia profissional, filosofia hermenêutica e
filosofia artístico-literária.

a) A Etnofilosofia: estuda o pensamento e as crenças tradicionais do povo africano,


de forma a apresentá-los como germe do pensamento racional.
b) A Filosofia nacionalista-ideológica: é aquela que estuda o pensamento dos
líderes políticos africanos (estadistas-pensadores) e que se apresenta como um
estágio tão importante do desenvolvimento da filosofia africana.
c) Sagacidade filosófica: é o estudo da sabedoria da comunidade através da qual
se opera, necessariamente, o pensamento crítico do africano. Ela, na visão de
Oruka, divide-se em duas partes, nomeadamente: a do sábio popular e a do
sábio filosófico.

 A sagacidade filosófica do sábio popular aborda de modo acrítico a


sabedoria popular, a cultura, os costumes e as crenças comuns do povo
tendo a sua sagacidade permanecendo ao nível de primeira ordem.

Material de apoio da 12ª classe


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 A sagacidade filosófica do sábio filosófico aborda de modo crítico e


independente aquilo que o sábio popular não questiona pertencendo ao
nível de segunda ordem.
d) A Filosofia profissional: é o estudo analítico apresentado por intelectuais
africanos que receberam formação filosófica especializada e se dedicaram aos
assuntos especificamente africanos.
e) A Filosofia hermenêutica: é a interpretação filosófica de conceitos numa dada
língua africana para ajudar a clarificar o seu significado e implicações lógicas.
f) A Filosofia artístico-literária: é aquela constituída tanto pelas reflexões
filosóficas explícitas propostas pelos espíritos criativos da África
Contemporânea quanto pelas filosofias implícitas presentes na literatura de seus
pensadores.

CORRENTE IDEOLÓGICA: Discurso em favor da África

Hodiernamente, entende-se que a filosofia africana é aquela feita pelos pensadores


contemporâneos por uma única razão. Visto que, estes pensadores colocaram a África
no cerne dos debates universitários internos e externos através dos temas ligados a
filosofia africana contemporânea que abordaram problemas racionais, humanos, raciais,
económicos, políticos, religiosos e de conjuntura social. Tais temas estavam voltados à:
Etnofilosofia, Negritude, Socialismo, Consciencismo, humanismo, Panafricanismo,
Nacionalismo ou Filosofia da Libertação, Personalidade africana e
Rastafarianismo.

1) – ETNOFILOSOFIA OU FILOSOFIA CULTURAL DO AFRICANO

A Etnofilosofia, em geral, define-se como corpo de crenças e de conhecimentos


manifestados pelos pensamentos e acções de pessoas africanas que partilharam uma
cultura comum. A Etnofilosofia aponta a existência de uma filosofia unificada africana
(Bantu) que se expressa por meio de elementos linguísticos e culturais.

Seus maiores expoentes são: Placide Tempels e Leópald Sènghor, podendo ser
também encontrado autores como: Alexis Kagame, John Mbiti e Valentim Mudimbe.

A narrativa colectiva e a revelação dos conteúdos por meio de diversos códigos como:
os mitos, os sistemas simbólicos, as linguagens religiosas e comuns apresentam-se
como características fundamentais da ETNOFILOSOFIA.

Placide Tempels, na sua obra FILOSOFIA BANTU, “procurou demonstrar o espírito


da consciência negra manifestado pelo discurso do nacionalismo cultural da África”.

Alexis Kagame deu continuidade a obra de Tempels ao apresentar uma formulação mais
rigorosa sobre a construção da filosofia subjacente à visão africana (ruandesa) do
mundo, na sua obra «A filosofia bantu-ruandesa do ser» publicada em 1956.

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

A cultura africana é única, como nos confirmou Cheikh Auta Diop e Mubabinge Bilolo,
ao destacarem que o antigo Egipto estava inserido na cultura africana quando deu
grandes contribuições para as áreas da Ciência como: Matemática, Arquitectura e
Filosofia que foi, de certa forma, a base civilizacional da Grécia.

Um dos críticos desta corrente foi Paulin Hountondji. Segundo ele, não se pode
confundir uma prática de ordem científica e académica com um conjunto de crenças e
práticas comum do quotidiano de uma etnia ou população. Sendo assim, Filosofia é
multiplicidade de pensamento e não sobrevalorização de formas simplistas de
pensamento.

1) – NEGRITUDE OU FILOSOFIA DA RAÇA NEGRA: Leopold Sénghor

O termo negritude é um empréstimo feito ao Aimé Césaire, no poema escrito na obra:


Caderno de um regresso ao país natal, de 1939

«Desconsidero fronteiras no que diz respeito ao Negro; o mundo inteiro é a minha


província até que o negro seja livre» (apud Aimé, 2010: 13). Ou ainda como disse
Fanon «sou um homem, e é todo o passado do mundo que tenho a reassumir cada vez
que um homem fez triunfar a dignidade do espírito, cada vez que um homem disse não a
uma tentativa de sujeição do seu semelhante, senti-me solidário com o seu acto».

A negritude foi concebida como a celebração do legado negro e um incentivo para a


restauração da dignidade da raça negra desvalorizada pela ideologia colonial.

Esta corrente filosófica procurou transformar em virtudes as supostas características


negativas da cultura negra.

A Negritude define-se como a soma total dos valores culturais da raça negra.

Seus maiores expoentes são: Aimé Césaire, Leon-Gontran Damas e Leópold Sènghor.

A Negritude foi impulsionada pelo movimento norte-americano denominado


«Renascimento de Harlem».

A Negritude, além da valorização da raça, procurou também tratar da situação sócio-


política do continente. A vida política e social tem de ser inspirada por uma cultura a
partir da qual se pode buscar um sistema político responsável enraizado no coração de
um determinado povo.

Para Julius Nyerere «a África tem de mudar as suas instituições para que a sua nova
aspiração se torne possível; o seu povo deve mudar de atitudes e práticas de acordo
com estes objectivos».

Os pensadores acentuados apresentaram três importantíssimos conceitos ligados à


Negritude, como:

Material de apoio da 12ª classe


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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

1 – Identidade: Consiste em o negro assumir plenamente a sua condição de homem no


mundo. Passa pelo enegrecimento da pele branca e não branqueamento da pele negra.

2 – Fidelidade: Consiste na ligação do homem negro à terra mãe (África). Em


Kiswahili, reforça-se com o seguinte teor: «shienyu ni shienyi khali shihunyi bukundu,
ou seja, o teu irmão é teu irmão ainda que cheire a mal (feda)»

3 – Solidariedade: Consiste na actitude sentimental que liga secretamente todos irmãos


negros independentemente do país natal.

3 – SOCIALISMO AFRICANO OU FILOSOFIA SOCIAL: NEGRA Julius


Nyerere

Segundo Platão na sua obra a República, os filósofos-reis devem governar o Bem


Comum por serem zelosos e virtuosos.

A par disto, fala-se do socialismo africano como retorno a república platónica na qual
os filósofos-reis africanos deveriam, de igual modo, governarem a África na base
racional sem quaisquer intimidação do Conselho da República.

Socialismo africano ou filosofia social negra: é todo conjunto de elementos ou corpus


materiais que combina teorias sociais e económicas marxistas com as diferenças
políticas da negritude.

Assim como a Etnofilosofia, o socialismo africano sustentou, igualmente, que os


valores centrais de África são comunitários. O socialismo africano não pode ser
concebido como uma corrente homogénea de pensamento, visto que, é tão variado
quanto o número de povos africanos apresentados por Nações-Estado.

Os socialistas africanos procuraram elaborar uma síntese entre os valores humanos


tradicionais de África e a tecnologia moderna. Por isso, o objectivo do socialismo
africano era considerar a sociedade africana de um modo tal que o humanismo da vida
tradicional africana se reformasse na comunidade técnica moderna.

Os seus mais acentuados pensadores são: Julius Nyerere, Kwame NKrumah e


Kenneth Kaunda.

Segundo Nyerere, na obra Ujamaa, «o autêntico pan-africanismo deveria conduzir a um


autêntico pan-humanismo».

Ujamaa (que quer dizer família fraterna em Kiswahili): é uma estrutura


socioeconómica que evita o antagonismo conflituante tanto do capitalismo continental
quanto do socialismo doutrinário.

4) – CONSCIENCISMO AFRICANO OU FILOSOFIA DA MENTE AFRICANA:


Kwame Nkrumah

Consciencismo africano: é um tipo de saber criado por Nkrumah através da qual se


procurava sintetizar o socialismo marxista com o pensamento tradicional africano.

Material de apoio da 12ª classe


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Segundo Nkrumah o Consciencismo filosófico apresenta uma ideia tradicional africana


da existência absoluta e independente da matéria, a ideia dos seus poderes de
movimento espontâneo, a ideia da convertibilidade categorial e a ideia do enraizamento
da Ética na natureza da pessoa humana.

O pensamento tradicional africano inclui uma atitude para com o ser humano que
apenas pode ser descrita na sua manifestação social, como sendo socialista.

O Consciencismo africano entende-se a partir do socialismo que se apresenta por sua


vez como o fim do comunalismo tradicional africano que esteve voltado a acumulação
de capital e investimento aplicados ao Bem Comum.

Os seus maiores expoentes são: Kwame Nkrumah (fundador), Kwasi Wireddu,


William DuBois e Padmore.

Nkrumah escreveu a obra: «Consciencismo: Filosofia e Ideologia para a


descolonização».

O materialismo dialéctico herdado de Marx fez com que se estudasse uma teoria da
realidade primária da matéria que admitisse tanto a mente quanto a realidade espiritual
da experiência humana.

5) – HUMANISMO AFRICANO OU FILOSOFIA ANTROPOLÓGICA DO


AFRICANO: Keneth Kaunda

Entende-se como a epicentralidade do homem do ponto de vista da ligação entre a


religião e a política de forma a valorizar o nacional.

Ao colocar o homem no centro dos interesses africanos a África tornou-se potência


devastadora contra o colonialismo, pois, este se interessava simplesmente ao poder.

O pai do humanismo africano, Kenneth Kaunda, não acreditava na mortalidade da alma


humana porque – segundo ele – a vida humana não podia se confinar ao período
intermédio entre a maternidade e o túmulo; uma vez que, a imortalidade era possível ser
atingida pelo dom da razão que Deus depositou em nós.

Seus maiores expoentes são: Kenneth Kaunda (fundador), Wiredu, Mazrui e Fanon.

Os oprimidos deviam partir pela violência para que pudessem elevar a sua humanidade.

6) – PAN-AFRICANISMO: William Du Bois

Etimologicamente, [(Pan quer dizer todo), (african reporta-se àquilo que é concernente
a África) e (ismo exprime corrente ou doutrina)], assim definiremos Pan-africanismo
toda a corrente ou doutrina que procurava a unificar a África como um todo.

Do ponto de vista interpretativo, o Pan-africanismo é o movimento cultural, político,


filosófico e social cuja finalidade visava defender os direitos dos povos de África e a
união do continente de forma a torná-lo um Estado Soberano tanto para os que nele
vivem como os que vivem na diáspora.

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Eles propunham a unidade política de toda a África e o reagrupamento das diferentes


etnias divididas pelas imposições dos colonizadores valorizando a realização de cultos
aos ancestrais, a defesa e ampliação do uso das línguas nativas proibidos ou limitados
pelos europeus.

Os seus maiores expoentes são: William DuBois, Sylvestre William e Marcus Garvey

Os principais objectivos do movimento foram:

a) – A unidade espiritual de toda África sob pretexto de um Estado Único


b) – A capacidade de criar condições de prosperidade para todos os africanos

7) – NACIONALISMO OU FILOSOFIA DA LIBERTAÇÃO

O Nacionalismo ao procurar criar uma teoria política única que colocasse a África ao
progresso apresentou a filosofia da libertação ideológica como um pensamento comum
tanto da Negritude quanto da Etnofilosofia.

As premissas iluministas e marxistas foram as bases da filosofia da libertação; embora a


mesma esteja ligada directamente ao movimento surgido na América latina nas décadas
de 60 e 70 do século XX.

O papel do filósofo africano reside na procura de melhor opção tanto da organização


social como da política.

A influência das sociedades antigas e tradicionais no pensamento contemporâneo


catapultou a filosofia nacionalistico-ideológica aos valores africanos para a criação de
um sistema político para a África.

Os filosófos-reis africanos defenderam na sua maioria o Socialismo comunalista voltado


ao pan-africanismo e ao pan-humanismo do negro.

Os maiores expoentes do nacionalismo-ideológico são: Augusto Salazar-Bomdy,


Leópold Zea, Aimé Césaire, Leópold Sénghor e Henrique Dussel

8) – PERSONALIDADE AFRICANA: Edward Blyden

O conceito de “African personality” depende de toda uma tradição de pensamento


cultural do homem negro e que remonta aos tempos de Wilmot Blyden.

O pai do pensamento político africano, Edward Blyden, partia do pressuposto de que era
necessário procurar o nosso próprio passado sobre o qual se pudesse fundar a nossa
própria dignidade ou personalidade africana. Visto que, a raça negra tinha uma história
e uma cultura das quais se podia orgulhar.

Na sua obra, sobre a Defesa da Raça Negra, publicado em 1857, refutou as teorias
acerca da inferioridade racial do homem negro. E na obra A história ancestral dos
Negros, de 1869, sustentou o papel desempenhado pelos negros na edificação da
civilização egípcia asseverando que as raças são diferentes entre elas, mas em
contrapartida negava a existência de uma possível hierarquia entre elas.

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Ao contrário dos que o procederam, Blyden não tomava a Europa como ponto de
referência para explicar a África, mas pensava-o como entidade autónoma, como
referência imediata ao negro acreditando numa civilização africana milenária e viva,
animada por valores morais e espirituais elevadas.

Severino Elias Ngoenha, na sua obra Filosofia Africana: das independências às


liberdades, citando Edward Blyden, escrevia o seguinte: «(…) a nossa personalidade e
a nossa raça pressupõem a existência de uma responsabilidade. O dever de cada um, e
de cada raça é lutar pela própria individualidade, para mantê-la e desenvolvê-la. Se
não fordes vós mesmos, se abdicardes da personalidade, não havereis deixado nada ao
mundo».

Os seus maiores expoentes são: Edward Blyden e Severino Ngoenha.

A Personalidade africana ou a afirmação da negação do homem negro apareceu como


uma justificativa de todas as formas de maus tratos e carnificinas contra a raça negra
imposta por toda a África pelo imperialismo colonial do ocidente ao retirar do negro
tudo aquilo que fazia dele um ser humano.

8) - RASTAFARIANISMO OU FILOSOFIA NATURAL AFRICANA: Marcus


Garvey e Bob Marley

A doutrina rastafari surgiu entre pessoas que estavam oprimidas e sentiam que a
sociedade não tinha nada para oferecê-los, senão mais sofrimento.

Rastas: são todos aqueles que buscam viver a cultura negra voltada à natureza, em
conformidade com a vida africana, que lhes foi roubada de seus ancestrais quando
foram obrigados a abandonar o continente em tempo de escravatura.

Rastafarianismo é um fenómeno cultural sobre os valores africanos contra a


higienização cultural imposta aos negros da África e aos seus descendentes nas
Américas pelos homens europeus.

Surgimento do Rastafarianismo

O movimento é uma doutrina religiosa que adopta Haile Selassie I (antigo Imperador
da Etiópia) como Deus encarnado denominado Jah ou Jah rastafari. Ele é parte da
Santíssima Trindade dito pelos profetas na Bíblia e que aparecia como o Messias à
Terra. Rastafari é uma expressão que provém do Etíope «Ras, quer dizer, “Cabeça”
com equivalência de “Duque”e Tafari (Tafari Makonnem) aparece como o nome de
coroação de Haile Selassie I.

Este movimento apareceu, pela primeira vez, na Jamaica no século XX (na temporada
da década de 30). O reino da Etiópia é o único no continente africano

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CONCLUSÃO

Contudo, é “inegavel a expectativa do conhecimento do africano, não se trata de colocar


perguntas se o africano é um ser pensante ou tornar às categorias filosóficas e literaturas
que outrora domiram o as mentes preconceittuosas do ocidente”. Desde modo o
ocidente não via ou mesmo vê com bons olhos a filosofia africana, pois, Hegel coloca o
pensamento africano no estágio de infantilidade, também Levy-Bhru classifica o povo
africano como pré-lógico e estático. Mais isto não nos faz mais ou menos homens.

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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

Como se constatou, foi com Placide Tempels que o pensamento africano começou a ser
divulgado com uma certa claridade, apesar de receber muita preconceituasidade pela
parte do ocidente. Assim sendo, é erroneo dizer a priori que os africanos não têm idéias
sobre as coisas, eles não têm ontologia. Placide ainda acrescenta, que a “etnologia, a
lingüística, a psicanálise, a ciência do direito, sociologia e estudos religiosos não podem
fornecer conclusões definitivas, após a filosofia e a ontologia do primitivo foram
totalmente estudados e descritos. De facto, se os primitivos têm uma visão particular de
ser e do universo, a "ontologia" vontade própria a um carácter especial, a cor local, suas
crenças e práticas religiosas, seus costumes ao seu direito , suas instituições e costumes,
suas reações psicológicas e, mais genericamente a qualquer comportamento.

O pensamento africano é também sistemático, reflexivo e ingador, pois através da


linguagem, da religião, dos provébios sobresaiu o pensar do africano. Se a filosofia é
definido como pensamento sistenático, reflexivo e que cria mecanismo para o bem estar,
o pensamento africano não esta isenta destes pressupostos. É dai que surgiu a
etnofilosofia buscando clarificar o pensamento do povo primitivo, arcaicos ou
tradicionais.

“A afirmação da existência da filosofia africana encontra uma elaboração sistemática”


pois o simples facto de afirmar que o africano é um homen, logicamente é racional e
sendo racional ele possue um pensamento sistemático e possuindo este princípio de
racionalidade, o seu pensamento também é racional. No agir e no pensar do africano
existe uma filosofia. Em suma, aquilo que o africano produz é a filosofia. Pois para
Jonh Mbiti a compreensão é uma filosofia, e africano possue esta compreensão da vida,
da natureza e das coisas que lhe circunda.

Na formação da civilização grega que deu origem a filosofia, as cultutras africanas


deram grande contributo para sua formação. “...os textos disponíveis sobre o antigo
Egipto permitem afirmar a existência de uma autêntica filosofia que floresceu nas
margens do Nilo”. Deste modo o Egipto abriu caminhos para surgimento da filosofia,
Pois, para George James, os gregos antigos não tinham a habilidade inata para
desenvolver a filosofia.

Para Cheik Anta Diop, a origem da filosofia deve ser procurada em África,
especialmente na civilização egípcia, ou seja, o lugar que a Grécia ocupa na história do
pensamento científico filosófico, deveria ser ocupado pelo Egipto antigo. “O que a

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Grécia explorou mais do Egipto foi porém o campo de ideias, particularmente o das
ideias filosóficas. Começa-se, por exemplo, pelos nomes dos deuses gregos que foram
emprestados do Egipto, seguindo-se também os conceitos, as conexões entre os
conceitos e até ambiente” Castiano, na sua obra Referenciais da filosofia africana,
salienta que é preciso desmitificar por exemplo, o mito de que Grécia é o berço do saber
universal mostrando como muitos gregos tiveram ímpeto de viajar para o Egipto porque
consideravam, naquela altura, este território como a fonte do saber e do conhecimento.

BIBLIOGRAFIA

1. CASTIANO, José P. .(2010) Referenciais da filosofia africana: em busca da


intersubjectivação. Ed. Ndjira, 1a ed. Maputo.

2. CHAUI, Marilena.(2005). Convite à Filosofia. Ed. Ática, São Paulo.

3. FERREIRA, Alberto João. Texto de apoio, História do pensamento africano


moderno.

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FILOSOFIA AFRICANA DOCENTE MOISÉS QUITARI M.Sc.

4. MAKUMBA, Maurice M. Introdução à Filosofia Africana – passado e presente.


Edições Paulinas, Nairobi-Quénia, 2007

5. MUKALE, Ergimino Pedro. Afrocentricidade: Complexidade e liberdade.


Edições Paulinas, Moçambique, 2013

6. Ngoenha, Severino Elias. (1993). Das independências às liberdades, Ed.


Paulistas, Maputo.

Outras referêncais:

 Fascículo de Filosofia africana do 3º ano de Filosofia, Faculdade de Letras,


UAN-2010

 Fascículo de Filosofia africana, da autoria do professor Pedro Nkosy, material


Universitário

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