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Nesse capítulo sobre a interação entre aprendizado e desenvolvimento, Vygotsky

explora essa relação, ainda pouco fundamentada com sucesso por falta de uma base sólida e
comprovável, em crianças em idade escolar. Ele divide em 3 modelos teóricos as principais
correntes que tentam explicar a relação aprendizagem-desenvolvimento.

O primeiro modelo baseia-se na ideia de que o desenvolvimento e o aprendizado são


processos independentes um do outro. O aprendizado nessa corrente seria “considerado um
processo puramente externo” (VYGOTSKY, p. 53), ou seja, não proporciona ou influencia o
desenvolvimento, porém utiliza os avanços mentais desse desenvolvimento para se
consolidar, como admite o pedagogo Binet, que vê “o desenvolvimento como um pré-
requisito para o aprendizado” (VYGOTSKY, p. 54), não sendo capaz uma criança de
absorver certo conteúdo se ela não possui a desenvoltura para tal. Um outro expoente desse
modelo é Piaget e seu método experimental, em que o experimentador faz perguntas para
crianças além do nível intelectual delas, sabendo-se que elas serão incapazes de responder,
para, dessa forma, “obter as tendências do pensamento das crianças na forma pura,
completamente independente do aprendizado” (VYGOTSKY, p. 53-54), mostrando que não
há relação entre desenvolvimento e aprendizado. Resume-se, então, que essa concepção
teórica não admite que o aprendizado seja percursor do desenvolvimento.

O segundo modelo baseia-se numa igualdade entre aprendizado e desenvolvimento,


sendo eles o mesmo processo para os seguidores desse pensamento. Existem, segundo
Vygotsky, diversas teorias que utilizam desse princípio da igualdade entre os dois conceitos,
uma delas a de William James, que vê o desenvolvimento como “o domínio dos reflexos
condicionados” (VYGOTSKY, p.54), ou seja, o desenvolvimento e o aprendizado, colocados
como processos intrínsecos um do outro, seriam a formação de hábitos a partir de reflexos. É
possível fazer uma aproximação desse modelo com o primeiro modelo citado quanto o
concebimento do desenvolvimento como uma “elaboração e substituição de respostas inatas”
(VYGOTSKY, p. 54), ou seja, essa consolidação dos reflexos em atos. Os modelos, se
diferem, entretanto, quanto a relação aprendizado-desenvolvimento propriamente dita: o
primeiro considerando que o desenvolvimento é um pré-requisito para o aprendizado, e o
segundo considerando-os como processos inerentes e simultâneos.

O terceiro modelo busca uma conciliação entre os dois modelos mencionados, como
articulado pelo teórico Koffka. Ele divide o desenvolvimento em 2 processos diferentes,
porém que se relacionam: a maturação, que depende de um desenvolvimento biológico e
cerebral, e o desenvolvimento decorrente do aprendizado de fato. Assim, essa relação se dá
com a maturação sendo preparatória para o aprendizado e o aprendizado sendo um
estimulante para a maturação (AULA 8, slide 5), expandindo-a. Essa teoria coloca o
aprendizado com um “amplo papel no desenvolvimento da criança” (VYGOTSKY, p. 55), e
é a partir dessa amplitude que Vygotsky traça uma discordância entre correntes: Koffka e
aliados de sua linha de pensamento acreditam em um aprendizado não específico, em que
adquirir uma certa habilidade em uma área em particular influencia o desenvolvimento como
um todo, rejeitando, ao mesmo tempo, que o aprendizado “pode ser reduzido simplesmente à
formação de habilidades” (VYGOTSKY, p. 56) como afirmam os outros modelos. Já os
defensores desses outros modelos, como Thorndike, adepto à teoria dos reflexos, acreditam
em um aprendizado específico, em que o desenvolvimento de uma habilidade particular é
independente do desenvolvimento de outras habilidades, e influencia pouco no
desenvolvimento como um todo.

Tendo exposto os 3 modelos, Vygotsky, que rejeita todos eles, começa sua própria
análise sobre a relação aprendizado-desenvolvimento, iniciando-a com a afirmação de que o
aprendizado começa antes da idade escolar, desde esse início se relacionando com o
desenvolvimento. Esse aprendizado iniciado antes do ingresso na escola, entretanto, é
diferente do aprendizado escolar, sendo pautado na assimilação do mundo ao redor e das
práticas culturais pela criança. O aprendizado escolar, porém, “produz algo
fundamentalmente novo no desenvolvimento da criança” (VYGOTSKY, p. 57), e esse algo
produzido seria o conceito de zona de desenvolvimento proximal cunhado por Vygotsky.
Para entender esse conceito, divide-se o desenvolvimento em 2 níveis: o real, que registra a
capacidade mental da criança de solucionar problemas e questões sozinha, e o potencial, que
registra a capacidade mental da criança de solucionar problemas e questões com assistência
ou em conjunto com outros. A zona de desenvolvimento proximal seria a distância entre
esses dois níveis, representando, assim, uma antecipação das habilidades mentais que estão
“presentemente em estado embrionário” (VYGOTSKY, p. 58), e irão posteriormente ser
maturadas e consolidadas. Esse conceito para Vygotsky se mostra como um recurso
extremamente útil para pesquisadores e profissionais da área da educação infantil,
propiciando maior entendimento do funcionamento do desenvolvimento e podendo adequar a
cada criança o processo de aprendizado de acordo com os resultados desse método, ajudando-
as.
A compreensão do conceito de zona de desenvolvimento proximal gera, também, uma
nova imagem da realização da imitação dentro do processo de aprendizado, que antes não era
vista como um marcador do desenvolvimento. Psicólogos mostram, entretanto, que “uma
pessoa só consegue imitar aquilo que está no seu nível de desenvolvimento” (VYGOTSKY,
p. 59), ou seja, a imitação só é possível de ser aplicada independentemente quando se
compreende o que está sendo imitado. A criança que imita já é capaz de compreender o que
está imitando, apenas não consegue chegar no raciocínio sozinha ainda. A imitação passa
agora a ser vista como uma etapa fundamental do aprendizado.

Dessa forma, determina-se qual deve ser o objetivo do aprendizado escolar e sua
relação com o desenvolvimento: baseando-se no conceito de zona de desenvolvimento
proximal, deve-se mirar o aprendizado para o desenvolvimento potencial, para que ele seja
estimulado e impulsionado para que se torne real. Uma lei geral do desenvolvimento das
funções mentais superiores, ou seja, voluntárias, também é estabelecida, e sintetiza os pontos
de Vygotsky sobre o aprendizado e o desenvolvimento. Primordialmente, é colocado que o
aprendizado cria a zona de desenvolvimento proximal, resultado da criança “desde seus
primeiros dias de vida já ser inserida nas práticas culturais” (AULA 8, slide 7), desenrolando,
dessa maneira, processos de desenvoltura que são ativados pela interação e pela ajuda até
serem internalizados e possam ser realizados pela criança sozinha. Nessa ideia o aprendizado
precede e gera o desenvolvimento, sendo “um aspecto necessário e universal do processo de
desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente
humanas” (VYGOTSKY, p. 61).

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