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CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET E VYGOTSKY PARA A PRÁTICA

DOCENTE: RELATO DE CASO

Edizângela de Fátima Cruz de Souza1

RESUMO

Jean Piaget e Lev Vygotsky consistem em autores importantes para a área da educação, tendo
desenvolvido teorias da aprendizagem que permitem a compreensão sobre o desenvolvimento humano
e o processo de ensino-aprendizagem. Nesse sentido, o objetivo desse estudo foi verificar as
contribuições desses teóricos na prática dos docentes no âmbito escolar e identificar a abordagem
proposta pela instituição de ensino, visando compreender a efetivação do desenvolvimento da criança.
Para tanto, foram feitas duas observações na sala de aula de educação infantil com 10 crianças, na
faixa etária de quatro a cinco anos, uma professora e uma auxiliar de sala. Além da observação, os
instrumentos utilizados foram o questionário sociodemográfico e uma entrevista semiestruturada,
contendo onze perguntas abertas, que foram feitas à professora. Os resultados mostraram a
importância de aplicar os conceitos de Piaget e Vygotsky na prática dos docentes, uma vez que
fundamenta o processo de aprendizagem das crianças por meio da interação com o meio social, com o
objeto, a apropriação da cultura e a intervenção de um sujeito detentor de experiências. Além disso,
atividades em grupos e o contato com materiais didáticos e lúdicos propostos pela abordagem
sociointeracionista da instituição podem facilitar o processo ensino-aprendizagem e a estruturação do
raciocínio frente aos desafios em que os alunos são expostos. Logo, pode-se concluir que esse estudo
proporcionou a solidificação das concepções estabelecidas pelos principais teóricos da aprendizagem,
compreendendo as suas contribuições para a prática de professores.

Palavras-chave: Teorias da Aprendizagem, Educação, Professores.

INTRODUÇÃO

Jean William Fritz Piaget (1896-1980) foi de grande importância para a compreensão
do processo de aprendizagem, pois estabeleceu conceitos relacionados à biologia, como os de
organização e adaptação (WADSWORTH, 1996). Além disso, é importante ressaltar que tal
autor demonstrou em sua teoria que esses fatores não são independentes, estabelecendo
complementaridade entre si, ou seja, não podem ser observados de forma separada, mas
devem ser entendidos a partir de processos distintos que são relacionados entre si (PIAGET,
2003).
Com isso, é possível dizer que Piaget formulou os quatro conceitos básicos da sua
teoria, como esquema, assimilação, acomodação e equilibração, a fim de alcançar o
conhecimento acerca dos processos de organização e adaptação intelectual, que são conceitos-

1
Mestranda do Curso de Psicologia Social da Universidade Federal - UFPB, edizangela.cruz@outlook.com;
chave do pensamento desenvolvido por ele. Primeiramente, os esquemas são considerados
estruturas mentais do ser humano e, à medida que a pessoa se desenvolve, tornam-se uma rede
complexa de informações e mais diferenciados, sendo necessária a ocorrência da assimilação
e acomodação para que haja mudança naqueles. Além disso, são especificados conforme as
características semelhantes (WADSWORTH, 1996).
Ainda, é importante explicar esses dois conceitos postulados por tal teórico. A
assimilação consiste na integração de uma nova informação aos esquemas presentes no
indivíduo, proporcionando a ampliação desses, ocorrendo, também, a ação do sujeito sobre o
meio. Enquanto, na acomodação, o estímulo não consegue ser encaixado a um esquema
existente, com isso, forma-se um novo ou altera o que a pessoa já possui. Portanto, é
responsável pelo desenvolvimento do esquema (WADSWORTH, 1996).
No entanto, é através da equilibração que acontece a relação entre os processos de
assimilação e acomodação, sendo um mecanismo autorregulador de ambos. Ademais,
representa a passagem do desequilíbrio para o equilíbrio, dado que, para atingir o segundo
estado, é necessário passar antes pelo primeiro (WADSWORTH, 1996).
Além disso, Piaget dá uma importância aos processos de interação social, sendo
denominado como sociointeracionista. Nesse sentido, mostra que o conhecimento é obtido
por meio das interações entre o sujeito e o objeto. Desse modo, é importante, para o
indivíduo, operar ativamente sobre variados instrumentos, para poder formar ferramentas de
raciocínio. Outrossim, a experiência é fundamental para a aquisição do conhecimento, assim
como a interação entre o organismo e o meio, porque a pessoa busca tornar o objeto
significativo para ele (SEBER, 1997).
Para estudar o processo cognitivo no ser humano, Piaget uniu seus estudos sobre
epistemologia genética com a psicologia do desenvolvimento e, de acordo com a abordagem
interacionista do autor, na qual a interação entre o sujeito e o meio é essencial, a escola exerce
um papel de grande relevância para o processo de aprendizagem do indivíduo. A partir dessa
perspectiva elaborou os estágios do desenvolvimento cognitivo que se apresentam em quatro
períodos, o sensório-motor, o pré-operacional, o das operações concretas e o das operações
formais (GOULART, 1985).
O primeiro é o estágio sensório-motor, que se refere às ações, basicamente motoras,
pois a criança não realiza o pensamento de forma exata, apresentando uma inteligência
baseada nas percepções, esse processo ocorre aproximadamente do zero mês aos dois anos de
idade. O período posterior, o pré-operacional, corresponde ao avanço da linguagem e a
comunicação da criança com o outro, denominado por Piaget de socialização da ação. Além
disso, o sujeito apresenta um raciocínio semilógico, e essa fase perdura dos dois aos sete anos
(GOULART, 1985).
O estágio das operações concretas acontece aproximadamente entre os sete e os onze
anos de idade e se caracteriza pela aplicação da lógica à problemas reais, concretos. E, por
fim, o das operações formais, no qual a pessoa torna-se apropriada para resolver com
raciocínio lógico qualquer tipo de problema. Nessa etapa, o indivíduo dá origem a reflexão
possuindo aptidão para organizar os elementos de forma operatória e pode ser observada a
partir dos 12 anos (PIAGET, 2003).
De acordo com Piaget, cada sujeito passa na mesma ordem pelos estágios de
desenvolvimento, por mais que cada um tenha o seu tempo para atingir determinada etapa. Há
fatores importantes para ocorrência do processo cognitivo, sendo também necessária a
interação entre eles, que são a maturação, a experiência ativa, a interação social e a
equilibração (WADSWORTH, 1996).
A maturação permite saber se o indivíduo está apto para construir estruturas mentais
em um determinado estágio, já o fator da experiência ativa promove alterações dessas
estruturas, devido aos processos de assimilação e acomodação. Outrossim, a interação social
pode se dá de diversas formas, seja com os colegas ou outras pessoas, sendo importante
destacar a importância dessa experiência para o desenvolvimento cognitivo. E, por último, a
equilibração, mecanismo regulador do desenvolvimento (WADSWORTH, 1996).
Outros autores se destacaram na Psicologia do Desenvolvimento por suas amplas
teorias. Por exemplo, Lev Semyonovich Vygotsky (1896-1934), fundador da abordagem
sociointeracionista, deu ênfase ao desenvolvimento humano, ao aprendizado e a forma como
esses se relacionavam. A psicologia genética, presente na sua teoria, não se refere ao fator
biológico, mas a origem que ocorre todo o processo de desenvolvimento do indivíduo
(OLIVEIRA, 2010).
Ainda destacou as funções mentais superiores, que são próprias do ser humano e
englobam o domínio consciente das atitudes, essas não são inatas, assim como também não
são passadas hereditariamente. Logo, há uma construção dessas a partir da interação do
indivíduo com o meio físico e social, possibilitando a apropriação da cultura construídas por
gerações anteriores (OLIVEIRA, 2010).
No entanto, por mais fundamental que seja a interação do homem com o meio, o
desenvolvimento ocorre de uma relação entre fatores biológicos e culturais. Esse contato do
sujeito com o meio acontece através de elementos mediadores, tais como os instrumentos que
são ferramentas auxiliares que possuem função e objetivo exclusivamente humanos,
intermediando o trabalhador e seu objeto de trabalho. Somado a isso, os signos são fatores
internos que estão envolvidos com a memória e a atenção do ser humano e regula as ações
sobre o psiquismo das pessoas (REGO, 1995).
Outro ponto relevante na teoria de Vygotsky é a linguagem, que representa um grande
salto no desenvolvimento do indivíduo. Além disso, provoca algumas mudanças no processo
psíquico, proporciona processos de abstração e generalização, assim como permite a
comunicação entre as pessoas (REGO, 1995).
Há um destaque para o processo de internalização, que consiste em internalizar marcas
externas, organizando, de forma autônoma, os processos mentais. No decorrer do processo de
desenvolvimento, o sujeito utiliza signos internos, ou seja, representações mentais que
substituem os objetos do mundo real (REGO, 1995).
Vygotsky também estabeleceu uma relação entre desenvolvimento e aprendizado,
através do conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP). Essa apresenta dois níveis:
o nível de desenvolvimento potencial, no qual a pessoa realiza uma determinada atividade
com ajuda de outra pessoa e o nível de desenvolvimento real, nesse o indivíduo desempenha
uma ação de forma independente, ou seja, sem a intervenção do outro. Portanto, o que se
realiza com a ajuda de alguém no presente, o sujeito executará sozinho posteriormente
(OLIVEIRA, 2010).
Logo, no âmbito escolar, a interação entre os alunos e desses com o professor é de
fundamental importância para o desenvolvimento e para o processo de aprendizagem.
Outrossim, a intervenção de outro indivíduo que detém uma maior experiência, assim como o
contexto cultural, é relevante para a construção do conhecimento (REGO, 1995).
A partir disso, esse trabalho tem a finalidade de correlacionar a teoria dos principais
contribuintes para a área da aprendizagem, Piaget e Vygostsky, com a prática no ambiente
escolar. Ademais, a observação foi feita com o intuito de identificar a abordagem proposta
pela instituição de ensino, visando compreender a efetivação do desenvolvimento da criança.
Esse estudo justifica-se pela sua relevância no processo de aprendizagem do estudante
universitário, pois a aplicação dos conceitos possibilita a consolidação desses de uma forma
mais eficiente. Outrossim, a execução da prática pode promover profissionais mais
especializados e qualificados, uma vez que há o contato com a aplicação das teorias durante a
formação acadêmica.
METODOLOGIA

Participantes
A observação foi realizada com a participação de 10 crianças, dentre esses, meninos e
meninas, com a faixa etária entre quatro e cinco anos. Além disso, incluem-se uma professora
formada em Pedagogia há dois anos, com atuação na profissão há sete anos na educação
infantil e uma auxiliar estudante do curso de Pedagogia.

Instrumentos
Para coletar as informações necessárias à atividade de campo, foi aplicado um roteiro
de entrevista, contendo 10 questões abertas (Quais os tipos de atividades que você desenvolve
em sala de aula?; Como estas são planejadas?; Você propõe atividades em grupo? Com que
frequência? De que maneira geralmente divide os grupos?; Poderia nos dar um exemplo de
atividade em grupo que realiza. Qual o(s) objetivo(s) desta atividade?; Do seu ponto de vista,
qual a importância do professor, da intervenção deste, nesta e em outras atividades? Quais.
Faz tempo que estas fundamenta(m) sua prática? Você fez ou faz alguma atividade ou curso
que ajuda na atualização destas?; Você acha possível atender às necessidades individuais dos
alunos? Se sim, de que maneira?; Você conhece os trabalhos de teóricos como, por exemplo,
Piaget, Vygostsky ou contemporâneos?; Faz quanto tempo que você trabalha como
professora; Faz quanto tempo que você é formada?). Somado a isso, foi utilizado papel,
caneta, relógio e gravador de voz.

Procedimento
Foi realizada uma observação na escola de rede privada de colégios, que ocorreu em
dois momentos diferentes, na sala de aula da turma do Infantil IV. A primeira análise foi feita
no dia 18 de setembro de 2018 das 13h 35min até 15h e a segunda, no dia 19 de setembro de
2018 das 15h 20min até às 16h 30min.
Ademais, foi realizada uma entrevista do tipo estruturada contendo 10 questões abertas
com a docente ao final do primeiro momento.
RESULTADOS E DISCUSSÃO

De acordo com as observações realizadas, a docente apresentou um discurso


condizente com a sua postura, ou seja, o relato da mesma, em se apropriar das teorias dos
autores Piaget e Vygotsky, foi congruente com sua prática.
Conforme o discurso sobre os tipos de atividades desenvolvidas em sala de aula, a
professora busca promover vivências como, jogos e/ou práticas lúdicas, visto que a
abordagem da escola consiste em sociointeracionista, para introduzir o tema que será
abordado na aula, junto a isso, procura utilizar materiais proposto pela escola e finaliza com
uma produção associada ao assunto que foi visto.
Segundo Piaget, a efetivação das experiências e o contato do indivíduo com o objeto
são importantes para a formação do raciocínio da pessoa e para o processo de construção do
conhecimento. Além disso, a interação do sujeito com o meio social também é necessária para
a concretização da aprendizagem (SEBER, 1997).
A participante mencionou que procura proporcionar atividades em grupos com
bastante frequência, tendo a finalidade de socializar e possibilitar a interação entre os
discentes. Tal exercício decorre da divisão entre as crianças que estão mais avançadas no
processo de aprendizagem com as que apresentam mais dificuldades. Outro ponto abordado
pela docente foi a sua intervenção no crescimento da aprendizagem, pois atua como um
facilitador, que une o aluno ao conhecimento.
Para Vygotsky, o conhecimento é construído através da interação do indivíduo com o
outro. Com isso, para que a aprendizagem ocorra satisfatoriamente no ambiente escolar, uma
proposta viável são as atividades em grupo, uma vez que atingem tanto os que apresentam um
nível de conhecimento avançado, como os que demonstram dificuldades. Isso ocorre pelo fato
de haver um compartilhamento de ideias entre os envolvidos no processo (REGO, 1995).
O mecanismo de intervenção proporciona o auxilio ao sujeito para desempenhar uma
atividade que ainda não consegue realizar de forma autônoma, intitulado pelo autor como
nível de desenvolvimento potencial. A partir dessa ação, a pessoa atuará posteriormente de
maneira independente na execução de uma determinada tarefa (OLIVEIRA, 2010).
A observada explanou que visa atender, de maneira individualizada, os alunos,
respeitando as diferenças individuais, mesmo que, no cotidiano haja uma dificuldade para
efetivar esse procedimento específico. Em certos momentos é necessário dar uma atenção
diferenciada à criança.
Cada pessoa tem um tempo para atingir um estágio no desenvolvimento, podendo
variar de um para o outro, em virtude dos fatores experenciais ou hereditários, pois o
conhecimento é internalizado em cada sujeito de forma particular. Contudo, para Piaget, o
avanço nos estágios segue uma sequência crescente, em que necessariamente precisa passar
por todas as fases do desenvolvimento (WADSWORTH, 1971).
Portanto, obteve-se a confirmação das teorias de Piaget e Vygotsky, por meio da
observação feita na instituição, que foi possível comprovar que a execução das práticas
propostas pelos autores é eficiente e relevante para o processo de aprendizagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A aprendizagem, para os autores Piaget e Vygotsky, é fundamental para a aquisição do


conhecimento, em que a consolidação se dá a partir da interação com o meio social, com o
objeto, a apropriação da cultura, na qual pode ser transmitida de uma geração a outra. Além
disso, para que esse processo seja mais eficaz, é preciso que haja a intervenção de um sujeito
detentor de experiências, por meio de suas vivências sobre o indivíduo.
De acordo com as análises realizadas, pode-se demonstrar que a prática se associa a
teoria, a partir das atividades em grupos e o contato com materiais didáticos e lúdicos
propostos pela docente observada, facilitando o processo ensino-aprendizagem e a
estruturação do raciocínio frente aos desafios que os alunos são expostos.
Dessa forma, os objetivos determinados por esse estudo foram alcançados, uma vez
que foi possível identificar a abordagem sociointeracionista na instituição através das
observações e análises efetuadas. Ademais, foi de grande relevância para a solidificação das
concepções estabelecidas pelos principais teóricos, promovendo uma eficiente preparação
profissional, qualificando-se para o mercado de trabalho.

REFERÊNCIAS

GOULART, Iris Barbosa. Piaget: experiências básicas para utilização pelo professor.
1985.

OLIVEIRA, Marta Koll. Vygotsky: Aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-


histórico. São Paulo: Scipione, 2010. São Paulo: ABDR, 2010.
PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. 24. Edição Forense-Universitária ISBN
8521802463, Rio de Janeiro, 2003.

REGO, Tereza Cristina. Vygotsky: Uma Perspectiva Histórico Cultural. Vozes, 1995.

SEBER, Maria da Glória. Piaget: O diálogo com a criança e o desenvolvimento do


raciocínio. São Paulo: Scipione, v. 1, 1997.

WADSWORTH, Barry J. Inteligência e afetividade da criança na teoria de Piaget. rev. São


Paulo: Pioeira, 1996.

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