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Mindfulness
O que é? Qual é a sua importância?
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Consciência envolve tanto estar atento como atenção. Estar atento (awa
reness) é o “radar” de segundo plano da consciência, continuamente
monitorando os ambientes interno e externo. Pode-se ter a percepção de
estímulos sem que eles estejam no centro da atenção. Atenção é o processo
de focar estando atento consciente, fornecendo sensibilidade aumentada a
uma variedade limitada de experiências (Westen, 1999). Na realidade, estar
atento e atenção estão interligados, de modo que a atenção continuamente
arranca “vultos” da “terra” do estado de alerta, mantendo-os em foco por
períodos de tempo variáveis (p. 822).
Você está usando tanto estar alerta (awareness) quanto a atenção enquan
to lê estas palavras. O som de uma chaleira apitando em segundo plano po
deria comandar sua atenção caso ficasse suficientemente alto, particularmen
te se você quisesse tomar uma xícara de chá. Do mesmo modo, podemos diri
gir por uma rota familiar no “piloto automático”, vagamente conscientes da es
trada, mas responder imediatamente se uma criança atravessar na nossa frente.
Mindfulness é o oposto do funcionamento no piloto automático, o oposto de
devanear; é prestar atenção ao que é proeminente no momento presente.
Também diz respeito a lembrar, mas não viver de memórias. Recordar
para reorientar nossa atenção e estar alerta para a experiência do momento de
uma maneira receptiva, incondicional. Essa reorientação requer a intenção de
desembaraçar nossa atenção de nossos devaneios e vivenciar plenamente o mo
mento presente.
O termo mindfulness pode ser usado para descrever um construto teóri
co (a ideia de mindfulness), exercícios para cultivar mindfulness (como a medi
tação) ou processos psicológicos (mecanismos de ação na mente e no cérebro).
Uma definição básica de mindfulness é “estar alerta momento a momento”. Ou
tras definições incluem “manter nossa consciência viva para a realidade presen
te” (Hanh, 1976, p. 11); “estar clara e determinadamente alerta ao que realmen
te nos acontece em momentos sucessivos da percepção” (Nyanaponika, 1972, p.
5); e “o estado de alerta que emerge por meio da atenção, intencional, no mo
mento presente e no desenrolar da experiência momento a momento” (Kabat
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Mindfulness terapêutico
Uma definição precisa de mindfulness pode ser ainda mais difícil porque as de
finições modernas divergem de suas raízes budistas multidimensionais (Gross
man, 2011; Olendzki, 2011), e diferentes tradições dentro da psicologia budista
não necessariamente concordam sobre o significado de mindfulness (Williams
& Kabat-Zinn, 2011). Abordagens práticas para definir mindfulness em con
textos clínicos incluem descobrir os pontos em comum encontrados em vários
programas de treinamento (Carmody, 2009) ou investigar o que parece ser útil
para os pacientes no tratamento orientado a essa técnica. Em uma opinião de
consenso entre especialistas, Bishop e colaboradores (2004) propuseram um
modelo de dois componentes: “O primeiro componente envolve a autorregula
ção da atenção a fim de que ela seja mantida na experiência imediata, permitin
do desse modo maior reconhecimento dos eventos mentais no momento pre
sente. O segundo componente envolve adotar uma orientação particular à ex
periência do indivíduo que seja caracterizada por curiosidade, abertura e acei
tação” (p. 232).
Embora a regulação da atenção tenha recebido maior consideração na li
teratura psicológica ao longo da década passada, a qualidade do estar alerta é
particularmente importante em contextos clínicos, sendo caracterizado por au
sência de julgamento, aceitação, amor-bondade e compaixão. Jon Kabat-Zinn
(2005), o líder pioneiro em utilizar mindfulness na assistência à saúde, definiu-o
como “estar alerta de coração aberto, momento a momento, sem julgamento”
(p. 24). Necessitamos de uma resposta de compaixão à nossa própria dor quan
do estamos lidando com emoções intensas e constantes (Feldman & Kuyken,
2011; Germer, 2009). Se o terapeuta ou o paciente afastam-se de uma experiên
cia desagradável com ansiedade ou repulsa, nossa capacidade de trabalhar com
essa experiência diminui significativamente.
Do ponto de vista de mindfulness, aceitação refere-se à capacidade de per
mitir que nossa experiência seja exatamente como é no momento presente –
aceitar tanto as experiências prazerosas como as dolorosas à medida que elas
surgem. Aceitação não se trata de validar mau comportamento. Pelo contrário,
o aceitar momento a momento é um pré-requisito para a mudança de com
portamento. “A mudança é irmã da aceitação, mas é a irmã mais nova.” (Chris
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Não precisamos nem mesmo estar calmos para ter algum alerta conscien
te, tal como quando descobrimos “Estou realmente irritado agora”. Isso é mind
fulness na vida diária – e como também ocorre com frequência na psicoterapia.
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SABEDORIA E COMPAIXÃO
O mindfulness não é um fim em si mesmo – o objetivo de fomentá-lo é a liberta
ção do sofrimento. À medida que se aprofunda, sabedoria e compaixão tendem
a surgir, e essas qualidades levam naturalmente a libertação psicológica (Ger
mer & Siegel, 2012). Por exemplo, a prática de mindfulness nos liberta do pen
samento repetitivo, que, por sua vez, nos permite ver o quanto nossas vidas são
na verdade fluidas e inconstantes, incluindo nosso sentido de identidade. Esse
insight nos libera da constante necessidade de nos promovermos na sociedade
e de nos defendermos de ofensas mesquinhas. Isso é considerado sabedoria na
psicologia budista – compreender a impermanência e a ilusão de uma “identi
dade” fixa e entender como criamos sofrimento para nós mesmos lutando con
tra a realidade do momento presente.
O filósofo grego Heráclito escreveu: “Candidatos à sabedoria, façam o que
eu fiz: entrem e perguntem” (Hillman, 2003. p. xiii). Buda disse: “Venha e veja”
(pali: ehipassiko). A estreita associação entre insight contemplativo e sabedoria é
a razão de a meditação mindfulness também ser conhecida como meditação de
insight – a prática de olhar para dentro e ver as coisas como elas são, sob nossas
percepções e reações condicionadas, para libertar o coração e a mente.
Sabedoria e compaixão são “duas asas de um pássaro” (Dalai Lama, 2003,
p. 56; Germer & Siegel, 2012). Compaixão refere-se à capacidade de abrir-se
para o sofrimento (em nós mesmos e nos outros) junto com o desejo de aliviá
-lo. Ela surge naturalmente da sabedoria – a percepção e a aceitação profun
das das coisas como elas realmente são. A compaixão também pode ser culti
vada diretamente por meio de práticas deliberadas. Como terapeutas, se senti
mos compaixão por um paciente, mas não temos sabedoria, ficamos sobrecar
regados pela emoção e incapazes de encontrar uma saída para o sofrimento, en
tão concluímos que o tratamento não tem esperanças. Inversamente, se formos
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OS PSICOTERAPEUTAS E O MINDFULNESS
O mindfulness tornou-se uma tendência popular nos Estados Unidos (Ryan,
2012). Em um levantamento de 2007, 9,4% dos norte-americanos disseram que
praticaram meditação no ano anterior, acima dos 7,6% registrados apenas cin
co anos antes (National Center for Complementary and Alternative Medicine,
2007). Isso não nos surpreende, visto que essa ciência é altamente influente na
sociedade moderna, e a comunidade científica tem mostrado forte interesse por
ela. Nos círculos clínicos, a meditação se tornou um dos métodos psicoterápicos
mais pesquisados (Walsh & Shapiro, 2006). Os clínicos são atraídos por mind
fulness a partir de vários pontos: pessoal, clínico e científico.
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Ano
FIGURA 1.1 Número de publicações sobre mindfulness por ano: 1980-2011. Figura
fornecida por David S. Black, PhD, Institute for Prevention Research, Keck School of
Medicine, University of Southern California, e reimpressa com permissão do autor (www.
mindfulexperience.org).
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PRATICAR MINDFULNESS
O mindfulness ocorre naturalmente na vida diária, mas requer prática para ser
mantido. Periodicamente, todos nós despertamos para nossa experiência pre
sente, mas em seguida escorregamos rapidamente de volta para o nosso pen
samento discursivo comum. Mesmo quando sentimos que estamos particular
mente atentos enquanto fazemos terapia, por exemplo, estamos apenas inter
mitentemente alerta. Nossas mentes tornam-se facilmente absorvidas por asso
ciações relacionadas ao que nossos pacientes estão dizendo ou fazendo. Pode
mos, então, ter um momento de despertar de nosso devaneio, nos reorienta
mos ao paciente e retomamos nossa exploração do que ele esteve comunicando.
Logo, entretanto, escapamos novamente para o pensamento distraído. Às vezes,
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Atenção focada
A atenção focada, ou meditação de concentração, pode ser comparada a um
feixe de raio laser, que ilumina qualquer objeto para o qual é dirigido. Exemplos
de objetos internos de meditação incluem a sensação da respiração, palavras
e frases selecionadas ou um único local do corpo. Os objetos de foco externo
poderiam ser uma imagem, um som, a chama de uma vela ou mesmo um pon
to na parede. A concentração geralmente é mais fácil quando o objeto é agra
dável. A instrução para esse tipo de meditação é: “Quando você percebe que sua
mente está vagando, suavemente traga-a de volta para [o objeto de atenção]”.
A meditação de concentração ajuda a cultivar uma mente calma, imper
turbável. (O termo em pali para atenção focada, samatha, denota tanto sere
nidade como concentração). Nossa atenção torna-se fixa e relaxada quando a
mente é atraída para um único objeto, repetidamente, e desviada das muitas
preocupações (reais e imaginárias) que nos tomam durante todo o dia. Na psi
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Meditação da respiração
Encontre um lugar silencioso e sente-se em uma postura ereta e relaxada. Respire algu-
mas vezes lenta e suavemente para acalmar seu corpo e sua mente. Então, feche seus
olhos vagarosamente, total ou parcialmente.
• Explore seu corpo com sua percepção e tente descobrir onde você pode sentir sua
respiração mais facilmente. Algumas pessoas sentem-na em torno das narinas, tal-
vez como uma brisa fria sobre o lábio superior. Outras percebem mais facilmente o
peito subindo e descendo, e outras ainda sentem a respiração no abdome quando a
barriga se expande e se contrai.
• Apenas sinta as sensações físicas da inspiração e da expiração.
• Quando você notar que sua mente está vagando, apenas sinta a respiração novamente.
• Não há necessidade de controlar a respiração. Deixe seu corpo respirar por você –
como ele faz naturalmente.
• Não se preocupe com que frequência sua mente vagueia. Cada vez que você notar
que sua atenção está em outro lugar, simplesmente retorne para a respiração, tal
como você redirecionaria uma criança ou um cachorrinho que se perdeu.
• Quando você desejar terminar sua meditação, abra os olhos suavemente.
Monitoramento aberto
A meditação de monitoramento aberto pode ser comparada a um holofote
(vs. um feixe de raio laser na meditação de concentração), que ilumina uma
variedade mais ampla de objetos à medida que eles surgem na consciência,
um de cada vez. Ser receptivo a qualquer som que seja mais evidente no am
biente em um determinado momento é um exemplo de monitoramento aber
to, enquanto escutar deliberadamente o som de um sino é considerado aten
ção focalizada.
Podemos usar o monitoramento aberto para perceber nossas intenções,
sensações, emoções, pensamentos e/ou comportamentos. Uma utilização co
mum do monitoramento aberto na prática clínica é aquela que busca desenvol
ver a percepção interoceptiva (interocepção) de sensações corporais (Farb, Se
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1. atenção focada
2. monitoramento aberto
3. amor-bondade e compaixão
• Localize sua respiração onde você a sente mais facilmente. Sinta como ela se move
no corpo, e, quando sua atenção se desviar, suavemente volte a sentir seu movimento.
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Amor-bondade e compaixão
Amor-bondade e compaixão descrevem mais a qualidade do estar alerta – a atitu
de ou a emoção – do que a direção do alerta. Pense na diferença entre a luz em uma
sala de cirurgia e a luz de velas em um jantar. O amor-bondade aquece a experiência
da meditação, trazendo as qualidades de ternura, calma, conforto, alívio, cuidado e
conexão. Essas qualidades são particularmente importantes quando estamos lidan
do com emoções difíceis que contraem nossa percepção e ativam nossas defesas.
Um exemplo de meditação de amor-bondade (em pali: metta) é a repetição lenta
de frases como “Que eu esteja seguro(a)” ou “Que eu seja feliz e livre de sofrimento”.
O propósito de uma meditação de amor-bondade é plantar sementes de benevo
lência por nós mesmos e com os outros, repetidas vezes, que por fim brotem como
pensamentos, emoções e comportamentos positivos. Em um sentido mais amplo,
qualquer meditação que evoque uma sensação de felicidade e cordialidade pode ser
considerada meditação de amor-bondade.
Amor-bondade é um “estado mental que aspira a que todos os seres sensí
veis desfrutem da felicidade”, enquanto compaixão (em pali: karuna) é o “dese
jo de que todos os seres sensíveis possam ser livres de sofrimento” (Dalai Lama,
2003, p. 67). A compaixão ocorre quando o amor-bondade encontra o sofri
mento. Tanto o amor-bondade como a compaixão são emoções positivas que
melhoram nossa saúde e bem-estar (Fredrickson, 2012; Fredrickson, Cohn, Co
ffey, Pek, & Finkel, 2008; Klimecki, Leiberg, Lamm, & Singer, 2012). Eles mu
dam nossa consciência da atenção preocupada para a atenção amorosa e abrem
nosso campo de percepção, ajudando a nos tornar mais conscientes.
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Meditação de amor-bondade*
Esse exercício visa trazer cordialidade e boa vontade à nossa vida. Sente-se em uma
posição confortável, feche os olhos total ou parcialmente e permita que sua mente e
seu corpo se acalmem com algumas respirações profundas.
• Coloque suas mãos sobre seu coração para lembrar-se de que você está trazendo
não apenas atenção, mas atenção amorosa, à sua experiência. Por alguns minutos,
sinta o calor de sua mãos e a pressão suave que elas fazem sobre seu coração. Per-
mita-se ser acalmado pelo movimento rítmico de sua respiração sob suas mãos.
• Agora pense em uma pessoa ou outro ser vivo que naturalmente o faça sorrir. Pode
ser uma criança, sua avó, seu gato ou seu cão – quem quer que traga felicidade ao
seu coração. Sinta como é estar na presença daquele ser. Permita-se desfrutar da
boa companhia.
• Em seguida, reconheça o quanto esse ente querido é vulnerável – exatamente como
você –, sujeito a muitas dificuldades na vida. Além disso, perceba que ele deseja
ser feliz e livre de sofrimento, exatamente como você e todos os outros seres vivos.
Repita suave e delicadamente o significado de suas palavras para que ressoem em
seu coração.
−− Que você esteja seguro.
−− Que você esteja em paz.
−− Que você seja saudável.
−− Que você viva com tranquilidade.
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Terapeutas praticantes
Os clínicos aspirantes com frequência perguntam: “Como eu me torno um psico
terapeuta orientado a mindfulness?”. A resposta mais simples é: “Obtenha o me
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Visão de mundo
Todas as teorias e terapias psicológicas estão imersas em metateorias ou em
visões de mundo. Cada um de nós tem uma visão de mundo, uma inclina
ção a percebê-lo de uma forma particular (Johnson, Germer, Efran, & Over
ton, 1988). A estrutura metateórica de referência para mindfulness é o contex
tual (Hayes, 2002a; Pepper, 1942).
As visões de mundo explicam a natureza da realidade (ontologia), descre
vem como a conhecemos (epistemologia), são responsáveis pela causalidade e
contêm um conceito de personalidade. A visão de mundo contextual faz os se
guintes pressupostos:
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Patologia e saúde
A psicologia budista afirma que a forma como construímos nossas realidades
particulares é sobretudo ilusória; elaboramos inconscientemente os aconteci
mentos atuais a partir de nossa experiência passada e desejos atuais, o que leva
a erros e sofrimento desnecessário. O antídoto – atenção plena – nos permite
entender nosso condicionamento e ver as coisas mais claramente. O que vemos,
entretanto, não é uma verdade absoluta; antes, vemos através da ilusão de nos
sas conceituações. Ao perceber essa tendência a pensamentos e convicções ilu
sórios, aprendemos a manter nossas interpretações de forma leve.
Essa nova abordagem, mais suave, às nossas próprias concepções estende
-se à nossa visão dos sintomas. Queixas, problemas ou sintomas não são entida
des estáveis que devem ser diagnosticadas e então extirpadas. O que cria e man
tém os sintomas é a resistência, ou seja, nossa tendência instintiva, com frequên
cia pré-verbal, a repelir o desconforto tensionando nossos músculos, pensando
demais, bebendo muito ou empregando defesas para reestabelecer nosso equi
líbrio. Esse tipo de esquiva experiencial (Hayes, Strosahl, & Wilson, 1999) pode
ajudar a curto prazo, mas nos mantém congelados no lugar e amplifica nossas
dificuldades a longo prazo. Considere o ditado “Aquilo a que você resiste persis
te”. Um bom exemplo é “tentar dormir” – esforços contínuos para lutar contra a
falta de sono tendem a resultar em insônia crônica (ver Capítulo 10). Nosso ní
vel de sofrimento emocional pode ser medido pela lacuna entre nossas expec
tativas e a realidade (o que é).
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A prática da terapia
Todos os pacientes vêm à terapia apresentando uma relação resistente com seus
sintomas. As duas perguntas principais na mente de um psicoterapeuta orien
tado a mindfulness provavelmente são:
A terapia pode assumir uma variedade infinita de formas, tais como diá
logo autêntico, compassivo; terapia de exposição; reestruturação cognitiva; me
ditação; envolvimento em atividades saudáveis; ou prescrição de medicamen
tos. Independentemente da forma, do ponto de vista de mindfulness, não esta
mos buscando uma vida livre de dor, e sim uma libertação emocional mais sig
nificativa por meio de uma relação plena, receptiva, compassiva com nossas di
ficuldades inevitáveis.
É uma exigência absurda esperar que nossos pacientes aceitem seu sofri
mento emocional da noite para o dia. Antes, queremos ajudá-los a abrir-se gra
dualmente para o que os está perturbando, passando da curiosidade (encarar
o desconforto), para a tolerância (suportando o desconforto com segurança),
para a permissão (deixar o desconforto ir e vir), para a amizade (encontrar um
valor oculto em nossas dificuldades). Esse processo reflete o abandono progres
sivo da resistência.
A relação terapêutica
A psicoterapia orientada a mindfulness é idiográfica – ou seja, a estrutura e o
processo dependem de qualidades e capacidades únicas de cada paciente em
seu mundo. Assim como as instruções para essa forma de meditação são “no
tar o que é mais vívido e vivo em nosso campo de alerta”, o terapeuta orientado
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Mecanismos de ação
Como o mindfulness funciona? Vários processos foram propostos a partir dos
pontos de vista teórico e neurológico. Por exemplo, Hölzel, Lazar e colaborado
res (2011) identificaram seis mecanismos de ação – efeitos da prática formal de
mindfulness – para os quais temos evidências neurológicas:
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Aplicabilidade ao tratamento
O mindfulness pode ser usado para tratar uma ampla variedade de transtornos,
de psicose (Braehler et al., 2012; Langer, Cangas, Salcedo, & Fuentes, 2012) ao
manejo de estresse no local de trabalho (Davidson et al., 2003). E, como uma
capacidade universal de cura, está se associando a diferentes abordagens à saú
de mental, como terapia cognitivo-comporamental (TCC), psicoterapia psico
dinâmica, psicoterapia humanista/existencial, medicina comportamental e psi
cologia positiva.
Terapia cognitivo-comportamental
A TCC é a forma de tratamento que tem sido mais extensivamente investigada de
forma empírica. Estamos atualmente na “terceira onda” de TCC (Hayes, 2011).
A primeira refere-se à terapia do comportamento, focalizando-se nos clássicos
condicionamento pavloviano e reforço das contingências. A segunda foi a terapia
cognitiva visando alterar padrões de pensamento disfuncionais. A terceira onda é
a psicoterapia baseada em mindfulness, aceitação e compaixão, na qual nossa rela
ção com nossa experiência (intenções, sensações, emoções, sentimentos, compor
tamentos) gradualmente muda no curso da terapia.
Os quatro programas de tratamento pioneiros que têm base nessa técnica,
de múltilplos componentes, apoiados empiricamente, são: redução do estresse
baseada em mindfulness (REBM; Kabat-Zinn, 1990), terapia cognitiva baseada
em mindfulness (TCBM; Segal et al., 2012), terapia comportamental dialética
(TCD; Linehan, 1993a) e terapia de aceitação e compromisso (TAC; Hayes et al,
1999). Muitos outros programas se originaram desses modelos ou foram desen
volvidos para populações, condições ou treinamento de habilidades específicas.
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Psicoterapia psicodinâmica
Como mencionado anteriormente, os teóricos psicodinâmicos reconheceram o
valor da psicologia budista pelo menos desde a época de Carl Jung (1927/2000).
A psicanálise, historicamente, tem compartilhado aspectos comuns com a prá
tica de mindfulness – ambos são eventos introspectivos, supõem que consciên
cia e aceitação precedem a mudança e reconhecem a importância dos processos
inconscientes. O próximo capítulo explora de forma mais completa os pontos
em comum e as diferenças entre a abordagem psicodinâmica/psicanalítica tra
dicional em relação ao tratamento e a perspectiva de mindfulness.
Psicoterapia humanista/existencial
A prática de mindfulness visava originalmente a tratar o sofrimento de condi
ções existenciais como doença, velhice e morte – condições não clínicas, vis
to que essa categoria não existia na época de Buda. Essa forma de meditação
tem muito em comum com a psicoterapia humanista, que abrange amplamen
032
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Resumo
A satisfação no trabalho e atitudes de mindfulness têm sido objeto de estudo da área da psicologia
social, do trabalho e das organizações. Na última década temos assistido a um crescente número
de investigações, as quais destacam o papel do mindfulness no contexto de trabalho, na eficiência
de atividades e na promoção da saúde física e psicológica. Estas evidências têm demonstrado que
as práticas meditativas melhoram a atenção plena, além de promoverem a saúde psicológica em
ambientes de trabalho.
Os resultados do presente estudo são corroborados por diversos estudos internacionais de renome,
o que nos leva a concluir que programas de introdução da meditação e/ou mindfulness nos
currículos académicos, implementados com sucesso nesses vários países, poderão ser facilmente
transpostos para a realidade portuguesa, já que os níveis e as diferenças estatisticamente
significativas encontrados, mostram semelhanças entre os respondentes dos vários países.
Considera-se que, como futura linha de investigação, deveria de ser implementado um programa de
MBCT e MBSR, como unidade curricular optativa, nos cursos de enfermagem, enquanto piloto para
uma abrangência maior futuramente.
Palavras-chave: satisfação com a vida, satisfação com o trabalho, meditação, mindfulness, MBCT,
MBSR.
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Lista de Siglas
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Índice Geral
Introdução
1. Contextualização Teórica
2. Metodologia
Tratamento de Dados
Caraterização da Amostra.
Referências Bibliográficas
Anexos
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Índice de Tabelas
Tabela 4 - Mínimo, Máximo, Média e Desvio padrão SWLS e GJSS em relação ao Sexo
Tabela 5 – Mínimo, máximo, média e desvio padrão MAAS por “As suas atividades de vida diária
incluem a prática de algum exercício de meditação e/ou mindfulness?”
Tabela 6 - Resultados do teste t-Student para amostras independentes - SWLS e GJSS por sexo
Tabela 7 - Resultados do teste Post-Hoc Bonferroni para a satisfação com a vida por estado civil
Tabela 8 - Resultados do teste t-Student para amostras independentes - SWLS e GJSS por pratica
ou não exercícios de meditação e/ou mindfulness na atividade diária
038
Introdução
Efetivamente, o contexto de trabalho ocupa um lugar central na vida do ser humano, uma vez
que é um dos papéis sociais desempenhados com maior importância e que mais tempo ocupa
na vida quotidiana. A partir da revolução industrial, as transformações profundas que ocorreram
no modo de vida das sociedades, seja a nível socioeconómico e posteriormente tecnológico,
conduziram a uma valorização crescente do trabalho e da pessoa humana. Para além de um
meio de subsistência, a conceção de trabalho evoluiu para a abrangência de uma forma de
realização pessoal e afirmação no meio social.
039
Introdução
De acordo com a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, o trabalho deve ser
promotor de saúde física e mental e proporcionar aos indivíduos um estatuto e identidade, bem
como uma sensação de inclusão social. No entanto, assiste-se no mundo ocidental a um
aumento do stress provocado por motivos laborais, com efeitos negativos na saúde e bem-estar
dos trabalhadores (Eurofound and EU-OSHA, 2014). O fenómeno do stress e das doenças
ocupacionais tem vindo a assumir uma conjuntura de tal forma alarmante no contexto de
trabalho, que a Agência Europeia de Segurança e Saúde no Trabalho tem, desde há alguns
anos, promovido campanhas de esclarecimento e sensibilização para a mudança de uma
realidade que continua a perseguir os países europeus, com o intuito de tornar os locais de
trabalho mais seguros, mais saudáveis e produtivos. Segundo dados desta agência, o stress e
as perturbações de saúde mental constituem o problema de saúde mais grave no local de
trabalho para cerca de um quinto dos trabalhadores da União Europeia (Eurofound and EU-
OSHA, 2014).
Desta forma, o estudo da satisfação laboral tem interesse científico, tendo em conta a influência
que esta exerce sobre o trabalhador, afetando sua saúde física e mental, atitudes,
comportamento profissional e social, com repercussões para a vida pessoal e familiar do
indivíduo e para a organização com a qual colabora (Zalewska, 1999). Assim, acredita-se que o
grau em que os funcionários se sentem satisfeitos com o seu trabalho, tanto pode interferir no
funcionamento e na efetividade organizacional, como pode ser um alerta de que existe algo
inadequado.
Deste modo, a satisfação laboral traduz a forma como os profissionais se sentem nos seus
contextos de trabalho e, tendo definições diversas, tem sido associada ao stress ocupacional, na
medida em que indivíduos com bons níveis de satisfação laboral revelam níveis adequados de
stress e boa capacidade de adaptação na forma como lidam com os desafios laborais (Cardoso,
2018). A satisfação laboral pode entender-se como uma avaliação subjetiva contínua da
realidade laboral, em que a perceção e a regulação emocional têm um papel preponderante
(Kabat-Zinn, 2013).
Nos últimos anos tem vindo a ser adotado e difundido o Mindfulness, uma perspetiva oriental
cuja abordagem visa aumentar a consciência e responder de forma hábil aos processos mentais.
O mindfulness é descrito como uma forma de concentração e atenção ao momento presente, um
mecanismo pelo qual um indivíduo se torna consciente das suas próprias respostas internas a
estímulos externos. O interesse pelas práticas de meditação que promovem o bem-estar geral
tem sido crescente e a sua aplicação tem-se verificado em diversas áreas e contextos.
040
Introdução
A investigação aponta para uma relação inversa entre stress percebido e mindfulness e sugere
que a capacidade de regular emoções (autorregulação emocional) é um fator que pode afetar
potencialmente as respostas ao stress (Gross, 2014; Kozlowski, Hutchinson, Hurley, Rowley, &
Sutherland, 2017). O mindfulness tem sido então apontado na literatura como um relevante
mecanismo na regulação emocional e no bem-estar psicológico (Brown & Ryan, 2003),
despertando o interesse em contexto académico, mas também por parte das organizações.
Tendo em conta o que foi referido anteriormente, é importante analisar a satisfação laboral, a
prática de atitudes de mindfulness e o bem-estar em trabalhadores de organizações.
041
1. Contextualização Teórica
042
Contextualização Teórica
de trabalho. Inerente à satisfação no trabalho, são referidos pelos mesmos autores fatores como
integração, autonomia, motivação, envolvimento e uso das capacidades físicas e mentais.
Locke (1976) citado por Marqueze e Moreno (2005) refere ainda que os níveis de satisfação no
trabalho têm influência não só no próprio indivíduo como na organização em geral, envolvendo
aspetos comportamentais e a saúde física e mental do trabalhador.
Para Harris (1989) citado por Marqueze e Moreno (2005), a satisfação no trabalho traduz-se num
sentimento que resulta da situação total do trabalho. Fraser (1996) citado por Marqueze e Moreno
(2005) apresenta satisfação no trabalho como um estado pessoal, dinâmico, subjetivo e
frequentemente mutável por condições intrínsecas e extrínsecas do trabalho e do trabalhador.
Mais recentemente, Alonderiene e Majauskaite (2015) definiram satisfação no trabalho como um
conjunto de emoções, sentimentos ou atitudes relacionadas ao ambiente de trabalho de um
indivíduo e é descrita como um sentimento agradável de perceções pessoais relacionadas à
busca de um emprego e aos valores de uma pessoa. É uma das variáveis organizacionais que
podem afetar a saúde física, psicológica e espiritual, melhorar a qualidade de vida e, finalmente,
melhorar a eficiência de qualquer organização (Esmaeili & Seidzadeh, 2017). Os resultados
empíricos indicam que a alta satisfação no trabalho é um importante determinante, com
implicações organizacionais como a dinâmica do mercado de trabalho, retenção de funcionários,
melhoria do desempenho organizacional e da produtividade (Asgari, Mezginejad, & Taherpour,
2019).
Por outro lado, baixa satisfação no trabalho devido ao baixo desempenho, baixa produtividade e
alta saída de funcionários, representa elevados custos para uma organização (Rhodes &
Toogood, 2016; Yeganeh & Good, 2016).
Reciprocamente, de uma forma geral, os funcionários exaustos apresentam pior desempenho,
evidenciam menor comprometimento organizacional, exibem maior absentismo, maior
rotatividade e mais insatisfação no trabalho (Schaufeli & Enzmann, 1998).
Numa escala mais ampla, o burnout individual pode ter um efeito contagioso dentro de uma
organização, onde um funcionário altamente stressado pode ter impacto negativo nos seus
colegas, com repercussões nas tarefas de trabalho, produtividade e desempenho (Reb & Choi,
2014).
043
Contextualização Teórica
A literatura define, em termos concetuais, bem-estar subjetivo como aquele que concerne à
apreciação afetiva e cognitiva que uma pessoa faz da sua própria vida, do seu funcionamento
psicológico e social. O caráter multidimensional do bem-estar subjetivo integra três dimensões:
o afeto positivo (a frequência com que se sentem emoções e humores agradáveis), o afeto
negativo (emoções e humores desagradáveis) e a satisfação com a vida (Albuquerque & Tróccoli,
2004; Ed Diener, 2000). O afeto positivo pode ser contemplado como um sentimento
momentâneo, “um contentamento hedónico puro, experimentado num determinado momento
como um estado de alerta, de entusiasmo e de atividade” (Albuquerque & Tróccoli, 2004, p. 154),
enquanto o afeto negativo consiste num sentimento transitório que “inclui emoções
desagradáveis como ansiedade, depressão, agitação, aborrecimento, pessimismo e outros
sintomas psicológicos aflitivos e angustiantes” (Albuquerque & Tróccoli, 2004, p. 154). Já a
satisfação com a vida comporta uma apreciação cognitiva da própria vida, bem como os padrões
e as circunstâncias que a medeiam, nomeadamente satisfação com as relações pessoais, a
carreira ou as capacidades físicas.
044
Contextualização Teórica
Infere-se que o grau mais ou menos elevado de bem-estar é uma reunião do modo como se
sente o ser humano - dimensão afetiva: experimentar prazer e não experimentar desprazer - e
da forma como pensa - dimensão cognitiva: satisfação com a vida.
De uma forma global, o bem-estar dos trabalhadores evidencia constituir-se como um indicador
favorável para a gestão das organizações. Em conformidade com Martin (2005), o nível geral de
felicidade pessoal é melhor indicador do bom desempenho do que o grau de satisfação com o
trabalho, visto que trabalhadores felizes, com elevados níveis de bem-estar pessoal apresentam,
em média, um melhor desempenho de tarefas, números inferiores de absentismo e maior
persistência e capacidade de produção.
É uma tradução para a língua inglesa da palavra “sati”, referente à língua Pali, a língua da
psicologia budista há cerca de 2500 anos, em que o principal ensinamento era o “sati” –
mindfulness, conotado com lembrança, atenção e consciência (Neff & Germer, 2013).
O mindfulness é definido como "a consciência que emerge prestando propositadamente atenção,
no momento presente e sem julgamento para o desenrolar da experiência momento a momento"
(Miller, Fletcher, & Kabat-Zinn, 1995, p. 145). A definição inclui três componentes: intenção,
atenção e atitude.
É um estado de espírito caraterizado por focar a atenção no momento presente com aceitação e
sem julgamento. Essa habilidade pode ser treinada e aprimorada através da meditação (Coffey,
Hartman, & Fredrickson, 2010).
045
Contextualização Teórica
São reconhecidos, de uma forma geral, os benefícios das atitudes de mindfulness a vários níveis:
sanitários (ajuda no tratamento de algumas doenças clínicas e psiquiátricas, prevenção contra o
stress), educativos (melhor concentração e rendimento, relações interpessoais) e
empresariais/organizacionais (redução ou prevenção do stress, aumento da satisfação), além de
que o praticante desenvolve um sentimento de espiritualidade natural, não ligado a uma religião
específica (Campayo & Demarzo, 2015).
A prática de atitudes de mindfulness pode ser importante para afastar os indivíduos dos
pensamentos, hábitos e padrões de comportamento não saudáveis e, portanto, pode
desempenhar um papel fundamental na promoção da regulação comportamental, que há muito
tempo está associada à melhoria do bem-estar (Ryan & Deci, 2001).
O conceito de momento presente também é abordado por diversos autores que estudam o
mindfulness (Coffey et al., 2010; Kabat-Zinn et al., 1992; Neff & Germer, 2013). Para esses
autores, o conceito em questão está em oposição ao ritmo de vida acelerado que a cultura
ocidental preconiza como ideal. Trata-se de fazer menos e aproveitar mais, de forma intencional,
os momentos como eles se manifestam: no presente.
Para Brown e Ryan (2003), a atenção plena é um atributo da consciência, capaz de promover
bem-estar psicológico e que envolve awareness e atenção. Awareness diz respeito à
monitorização das experiências internas (sensações, sentimentos, pensamentos) e do ambiente,
ao passo que a atenção envolve, exclusivamente, a “seleção” da experiência, promovendo
aumento de sensibilidade a estímulos delimitados (Brown & Ryan, 2003).
Estar atento significa estar totalmente no "aqui e agora", momento a momento. Mindfulness inclui
a conscientização dos estímulos externos atuais, como objetos ou eventos extrínsecos, bem
como dos processos e estados internos, sejam emoções, perceções, sensações ou cognições
(Reb, Narayanan, & Chaturvedi, 2014).
Uma vez que a personalidade tende a modular cognições, emoções e comportamentos, entende-
se que esse fenómeno influencia a atenção plena. O estado de mindfulness, em certa medida,
atua no nível da regulação das emoções, uma vez que as pesquisas também têm sugerido
associações entre mindfulness e inteligência emocional (Baer, Smith, Hopkins, Krietemeyer, &
Toney, 2006; Brown & Ryan, 2003).
046
Contextualização Teórica
Com frequência é referida a atividade meditativa como uma prática de mindfulness. Por isso, faz
sentido falar também de mindfulness como prática/atitude.
Os efeitos produzidos pela prática de mindfulness podem ser inúmeros: promove a empatia,
ajuda a desenvolver a capacidade de experimentar e comunicar sensações internas, estar
presente e ajudar a expressar sensações corporais e sentimentos; fomenta a compaixão
relacionada com o não julgamento; incremento de autoconsciência, compreensão acerca da
própria identidade profissional e bem-estar geral; controlo de stress, ansiedade e diminuição dos
afetos negativos; promove a resiliência; outros benefícios relacionam-se com a capacidade de
distinguir experiências e aumentar a sua clareza, nomeadamente em contexto laboral,
incremento dos níveis de paciência, gratidão e consciência corporal (Vásquez-Dextre, 2016).
Quando alguém toma consciência do que está a ocorrer no momento presente, está
conscientemente a manter a atenção no momento presente e agir com consciência, em vez de
agir de modo piloto automático (Baer et al., 2006). Reb et al. (2014) afirmaram que “ficar sem
mente pode ser definido como nem prestar atenção nem ter consciência das atividades em que
se envolve ou dos estados e processos internos (por exemplo, emoções) que alguém está
experimentando” (p. 4). Exemplos de falta de atenção incluem a execução de tarefas em piloto
automático, sonhar acordado ou ruminar sobre o passado ou o futuro e a distinção conceitual de
viver no presente de viver para o presente; pode manifestar-se como ilusão, impulsividade,
hedonismo e fatalismo (Brown & Ryan, 2003; Reb & Choi, 2014).
Já Weare (2013) define a atenção plena como algo difícil de transmitir adequadamente usando
as palavras, pois refere tratar-se essencialmente de desenvolver formas de consciência que não
são verbais, mas são metacognitivas, ou seja, estar ciente dos processos internos envolvidos
em fazer, sentir e pensar e ciente dos impulsos, pensamentos e sentimentos que surgem na
mente e no corpo. Aprender a ser consciente inclui adquirir gradualmente a capacidade de estar
ciente e prestar muita atenção a estados internos, como pensamentos, emoções e sensações
físicas, bem como ao que acontece no ambiente externo.
A importância da qualidade da consciência plena tem vindo a ser salientada por perspetivas
filosóficas e psicológicas, no que concerne à manutenção e melhoria do bem-estar. Ainda assim,
é frequentemente negligenciada a importância da consciência no bem-estar humano, porque o
exercício das capacidades primárias como a atenção e a consciência é feito no quotidiano como
se de algo inato se tratasse.
047
Contextualização Teórica
Os registos sobre mindfulness nas tradições contemplativas há muito que referem que, estar
plenamente no momento presente, traz uma variedade de benefícios, incluindo o bem-estar (Reb
et al., 2014).
Tem sido argumentado que o mindfulness permite aos indivíduos gerirem melhor as suas
experiências, incluindo as que são carregadas de emoções fortes ou dor física (Baer et al., 2006;
Reb & Choi, 2014). Além disso, o mindfulness também pode moderar a ansiedade por redução
da atenção autocentrada reflexiva e elaboração cognitiva de pensamentos negativos (Brown,
Weinstein, & Creswell, 2012).
O mindfulness tem então sido discutido como um atributo da consciência associado ao bem-
estar. Como anteriormente referido, é comummente definido como o estado de estar atento e
consciente do que está a acontecer no presente. Reconhecendo que quase todos têm a
capacidade de observar e estar atentos, assume-se, no entanto, que os indivíduos diferem na
sua propensão ou vontade de estar atentos e de manter a atenção no que está a acontecer no
presente. Assume-se ainda que essa capacidade consciente varia entre as pessoas, visto que
pode ser espoletada ou adormecida por vários fatores. Isto é, a variedade de formas de bem-
estar psicológico e construções psicológicas, prende-se com aspetos inter e intrapessoais de
mindfulness (Brown & Ryan, 2003).
O aprimoramento de attitudes mindfulness por meio de treino e terapia cognitiva facilita uma
variedade de resultados de bem-estar (Kabat-Zinn et al., 1992).
048
Contextualização Teórica
Um estudo levado a cabo por Allen e Kiburz (2012) concluiu que pais que trabalham com
consciência plena e atenção às funções desempenhadas a cada momento, relataram melhor
equilíbrio entre vida profissional e pessoal, melhor qualidade de sono e vitalidade. Outro estudo
demonstrou que uma intervenção de mindfulness por auto treino reduz a exaustão emocional e
proporciona maior satisfação no trabalho e, consequentemente, um maior bem-estar (Hülsheger,
Alberts, Feinholdt, & Lang, 2013).
Langer, Schmidt, Aguilar-Parra e Cid (2017) conduziram um programa numa escola no Chile com
88 alunos adolescentes, dos quais 41 foram sujeitos a uma intervenção baseada em mindfulness
durante oito semanas. Os autores pretendiam testar o impacto do programa em estados
emocionais negativos de ansiedade, stress e depressão dos alunos. Para avaliar os estados
emocionais negativos de stress e ansiedade, foi utilizada a escala Depression, Anxiety, and
Stress Scale (DASS) desenvolvida por Lovibond e Lovibond (1995).
Os resultados mostraram que houve uma redução significativa na ansiedade, depressão e
problemas gerais no grupo experimental em comparação com o grupo controlo e sugerem a
viabilidade e eficácia de uma intervenção de mindfulness nas escolas chilenas, como estratégia
para reduzir estados emocionais negativos e prevenir fatores de risco em grupos populacionais
de adolescentes.
Desta forma, pesquisas em diferentes amostras, incluindo profissionais e estudantes,
confirmaram que os exercícios de mindfulness reduzem a preocupação e a perturbação do
humor (nervosismo, sofrimento emocional), aumentando o relaxamento muscular, estados de
equilíbrio e o bem-estar geral (Amutio, Martínez-Taboada, Delgado, Hermosilla, & Mozaz, 2015).
049
Contextualização Teórica
Há muito que, nas tradições contemplativas, a atenção plena ao momento presente é admitida
como potenciadora de inúmeros benefícios, nomeadamente ao nível do bem-estar e da saúde.
Por outro lado, o estudo do mindfulness dentro de um paradigma científico ocidental é
relativamente recente. Grande parte desta pesquisa tem sido realizada nos domínios da
medicina e da psicologia e tem, consistentemente, apresentado relações positivas entre a prática
de mindfulness e resultados desejáveis (Reb et al., 2014). Objetivando, alguns estudos apontam
como benefícios da atenção plena a redução da dor crónica, aumento da imunidade, redução da
ansiedade e aumento do bem-estar psicológico e do afeto positivo (Brown & Ryan, 2003; Reb et
al., 2014).
De uma perspetiva mais geral, alguns autores consideram o mindfulness uma ferramenta
terapêutica ou técnica de intervenção viável (Kabat-Zinn, 2013; Kabat-Zinn et al., 1992), porque,
através da sua prática, o indivíduo aprende a observar e aceitar os pensamentos. O mindfulness
foi aceite na psicologia contemporânea como uma abordagem para maior consciência e resposta
hábil aos processos mentais que contribuem para o sofrimento emocional e o comportamento
disruptivo.
De acordo com Sansó et al., (2019), vários estudos fornecem evidências sobre como práticas
contemplativas e de meditação melhoram o bem-estar psicológico e ajudam a desenvolver
atitudes de calma, clareza, concentração e resiliência (Oñate & Calvete, 2017; Walsh & Shapiro,
2006). Dos Santos et al. (2016) por exemplo, encontraram uma relação positiva entre a aplicação
de um programa de redução de stress baseado na meditação através de mindfulness em
profissionais de enfermagem brasileiros e uma melhoria nas atividades de enfermagem. Uma
revisão recente do tópico mostrou o desenvolvimento da atenção plena através de intervenções
baseadas em mindfulness no local de trabalho, o que por sua vez levou a resultados favoráveis
para a ansiedade, stress e angústia ou raiva (Lomas, 2017 citado por Sansó et al., 2019). Os
resultados relativamente ao burnout foram, no entanto, mais ambíguos, não se observando uma
melhoria significativa nessa variável.
050
Contextualização Teórica
A meditação está a ser utilizada de forma crescente em diversos contextos na área da saúde
como intervenção profilática e terapêutica segura, efetiva e eficaz. Como exemplo de tal
utilização, pode citar-se o sistema nacional de saúde de Inglaterra (National Institute for Health
and Care Excellence - NICE) que apoia o uso da meditação mindfulness para adultos com crises
recorrentes de depressão (Mouzinho, Costa, Alves, Silva, & de Lima, 2018).
Uma consciência aberta pode ser especialmente valiosa para facilitar a escolha de
comportamentos consistentes com as necessidades, valores e interesses de uma pessoa. Por
outro lado, o processamento automático ou controlado, geralmente impede considerações de
opções que seriam mais congruentes com necessidades e valores (Ryan & Kuhl, 1997). Nesse
sentido, a atenção plena pode facilitar o bem-estar por meio da atividade autorregulada, como
foi previamente mencionado, e do atendimento das necessidades psicológicas básicas de
autonomia, competência e relacionamento (Hodgins & Knee, 2002). Ou seja, a conscientização
facilita a atenção às solicitações decorrentes de necessidades básicas, aumentando a
probabilidade de regular o comportamento de maneira a atender a essas necessidades.
Evidências mostram que a atenção consciente pode substituir respostas indesejadas, estando
ligada ao fomento de bem-estar nos domínios cognitivo, emocional e comportamental e,
necessariamente, à saúde.
O mindfulness revela um conjunto de práticas simples, porém poderosas, que podem ser
incorporadas na vida quotidiana para ajudar a quebrar o ciclo de infelicidade, stress, ansiedade
e exaustão mental e promover a resiliência, a satisfação e alegria de viver. A terapia cognitiva
baseada na atenção plena (MBCT) gira em torno de uma forma direta de meditação da atenção
plena, que leva apenas alguns minutos por dia para que todos os benefícios sejam revelados. O
MBCT tem demonstrado clinicamente ser, pelo menos, tão eficaz na prevenção de eventuais
recorrências de depressão, quanto os medicamentos utilizados no seu tratamento e é
recomendado pelo Instituto Nacional de Excelência Clínica do Reino Unido. Mais importante, é
também indicado para pessoas que, não estando deprimidas, sofrem de ansiedade e
preocupação causados pelas mudanças constantes do mundo moderno. É precisamente uma
prática focada em ajudar as pessoas comuns no dia-a-dia a aumentar os seus níveis de felicidade
e confiança, além de reduzir a ansiedade, o stress e a irritabilidade (Liberali, 2017).
As evidências mais diretas dos benefícios da atenção plena vêm de pesquisas que demonstram
que o treino da atenção está relacionado a resultados físicos e psicológicos positivos. Atividades
intrinsecamente motivadas, que são caracterizadas pelo envolvimento e atenção ao que está a
ocorrer, produzem um prazer considerável e uma sensação de vitalidade (Brown & Ryan, 2003;
Kabat-Zinn et al., 1992).
051
Contextualização Teórica
Num estudo realizado por Evans (2008) citado por Vásquez-Dextre (2016), foram avaliados 11
pacientes com trastorno de ansiedade generalizada que experienciaram um programa de MBCT.
Os resultados obtidos indicaram uma redução significativa de sintomas ansiosos e depressivos.
Noutro estudo, Hoge et al. (2013) compararam 39 pacientes também com transtornos de
ansiedade, que frequentaram sessões de treino de MBSR durante oito semanas, com um grupo
de controlo. Da mesma forma, os resultados revelaram uma expressiva redução da ansiedade
no grupo que frequentou o programa MBSR (Vásquez-Dextre, 2016).
De acordo com Vásquez-Dextre (2016), um estudo realizado por Lakhan e Schofield (2013),
acerca dos efeitos do mindfulness na somatização, inferiu que as intervenções baseadas em
mindfulness diminuíram a dor, a ansiedade, a depressão e a gravidade dos sintomas associados
à somatização e melhoraram a qualidade de vida dos pacientes. Os autores concluíram que este
tipo de intervenções pode ser útil no tratamento de alguns aspetos do distúrbio de somatização.
Vásquez-Dextre, (2016) refere ainda um estudo de Fjorback, em 2013, em que foram avaliados
um total de 119 pacientes, acompanhados ao longo de um ano, que possuíam somatização e
síndromes funcionais somáticas, como fibromialgia, cólon irritável e síndrome da fadiga crónica.
Eles foram divididos aleatoriamente em dois grupos: um recebeu MBSR e MBCT, enquanto o
outro recebeu atenção médica e terapia cognitivo-comportamental breve. A melhoria foi obtida
no final do tratamento para o grupo que desenvolveu práticas de MBSR e MBCT e foi mantida
durante o ano de acompanhamento, enquanto o outro grupo não obteve nenhuma alteração no
final do acompanhamento.
O mesmo autor descreve um estudo de Ledesma e Kumano (2009), em que foram avaliados os
efeitos da MBSR no estado de saúde física e mental de vários pacientes com cancro. Os
resultados sugeriram que a MBSR pode melhorar o estado psicossocial destes pacientes.
Cramer (2012) citado por Vásquez-Dextre (2016) desenvolveu um estudo que consiste numa
meta-análise cujo objetivo era avaliar a eficácia da MBSR em pacientes com cancro de mama.
052
Contextualização Teórica
053
Contextualização Teórica
lidar com o stress de forma proativa e a uma melhor adaptação (Glomb, Duffy, Bono, & Yang,
2011).
Riskin (2002) citado por Reb et al., (2014) argumenta que a atenção plena move as pessoas de
uma mentalidade contraditória para uma mentalidade mais colaborativa e, portanto, facilitadora
de interações, tais como negociações necessárias nas organizações. É útil na redução do
abandono e do esgotamento no trabalho entre funcionários.
Sendo que o mindfulness significa a qualidade ou estado de estar consciente de alguma coisa,
um funcionário é uma pessoa atenta quando representa e entende todos os eventos que ocorrem
à sua frente (Raza et al., 2018). Um tom emocional positivo e respostas atenuadas ao stress
demonstraram melhorar o desempenho das tarefas e do trabalho nas organizações (Hunter &
Thatcher, 2007 citado por Good et al., 2016).
Verifica-se que o indivíduo mentalmente presente no trabalho com concentração total ficará
satisfeito com o trabalho (Hülsheger et al., 2013). Apesar de se saber que variações individuais
têm um papel significativo na satisfação no trabalho, sabe-se também que o mindfulness está
positivamente ligado à satisfação no trabalho (Hofmans, De Gieter, & Pepermans, 2013;
Zivnuska, Kacmar, Ferguson, & Carlson, 2016). Outro estudo recente explica que indivíduos
atenciosos e mais focados no trabalho estavam mais satisfeitos com os seus empregos
(Wongtongkam, Krivokapic-Skoko, Duncan, & Bellio, 2017). Com base na literatura, supõe-se
que o mindfulness tenha um impacto positivo na satisfação no trabalho.
Num ambiente de trabalho dinâmico, o mindfulness ajuda as pessoas a lidar com tarefas
desafiadoras e, portanto, negativamente associadas à intenção de rotatividade e absentismo
(Dane & Brummel, 2014).
De acordo com Krogh et al., (2019), no que respeita aos serviços de saúde, o desenvolvimento
de uma prática clínica associada ao mindfulness permite fomentar uma relação clínica saudável
ao nível da empatia e compaixão, atingir maiores níveis de resiliência e aumentar a qualidade da
atenção, ao mesmo tempo que diminui erros médicos e níveis de stress e burnout.
Um estudo de Manocha, Black, Sarris e Stough (2011) analisou os efeitos da meditação no nível
de ansiedade e stress no local de trabalho. Participaram 178 indivíduos, empregados em tempo
integral com, pelo menos, trinta horas de trabalho semanais, divididos em três grupos: meditação,
relaxamento e grupo de controlo. Para os dois grupos de intervenção ativos, o programa consistia
num acompanhamento de oito semanas, com sessões de grupo de uma hora, duas vezes por
semana e uma prática independente duas vezes por dia, com a duração entre dez a vinte
minutos. Os participantes eram avaliados antes e depois do programa na sua tensão psicológica,
estado de ansiedade e na subescala de depressão-desânimo. Os resultados mostraram
melhorias significativas dos níveis de ansiedade, stress, humor e sentimentos depressivos no
grupo de meditação em relação aos outros dois grupos.
054
Contextualização Teórica
Os locais de trabalho atuais estão, geralmente, repletos de interrupções e distrações que podem
desafiar o controlo atencional e prejudicar o funcionamento ocupacional (Jett & George, 2003).
Cada uma dessas interrupções está associada a um aumento de 12% nos erros (Westbrook,
Woods, Rob, Dunsmuir, & Day, 2010). As interrupções deixam um "resíduo" de atenção (por
exemplo, pensando no estímulo ao invés do presente) que pode prejudicar o desempenho
subsequente. No entanto, demonstrou-se que a prática de mindfulness durante cinco minutos
reduz esse resíduo em tarefas simples (Kuo & Yeh, 2015 citado por Good et al., 2016).
Nos Estados Unidos, estima-se que as doenças relacionadas com stress custem às empresas
aproximadamente 300 biliões de dólares por ano, em resultado do aumento do absentismo,
atrasos e rotatividade de funcionários. Já os distúrbios associados ao humor custam cerca de 50
biliões de dólares por ano e mais de 321,2 milhões de dias perdidos (Reb & Choi, 2014).
055
Contextualização Teórica
do burnout (Bakker, Schaufeli, Leiter, & Taris, 2008; Schaufeli & Bakker, 2003; Schaufeli,
Martinez, Pinto, Salanova, & Bakker, 2002).
Leroy, Anseel, Dimitrova e Sels (2013), levantaram a hipótese de que o mindfulness estaria
positivamente relacionado com o envolvimento com o trabalho, através do funcionamento
autêntico com expressão da autoconsciência e autorregulação. Os investigadores supracitados,
em conjunto com um instituto de treino em mindfulness, reuniram dados durante um período de
um ano em seis organizações distintas. Os participantes foram alvo de avaliação por três vezes:
antes da intervenção, imediatamente após a conclusão do programa de treino em mindfulness e
quatro meses após a conclusão do programa. Oito grupos foram formados no total, com 6 grupos
experimentais (n = 76) e 2 grupos controlo (n = 14). O treino foi baseado no programa MBSR,
realizado durante oito semanas com sessões semanais e práticas diárias individuais de
meditação. Como resultado, o estudo concluiu que o mindfulness estava positivamente
relacionado com o envolvimento no trabalho e melhorias em termos gerais do funcionamento
das organizações.
056
Contextualização Teórica
Reb et al., (2014) analisaram a influência que o grau de mindfulness dos líderes de uma
organização exerce sobre a performance e o bem-estar dos colaboradores. O nível de
mindfulness dos líderes foi medido através da MAAS, enquanto os seus subordinados foram
avaliados nos níveis de exaustão emocional, equilíbrio vida-trabalho, satisfação das
necessidades psicológicas, satisfação no trabalho, performance no trabalho, performance na
tarefa, desvio e comportamento de cidadania organizacional. O estudo mostrou que o nível de
mindfulness dos líderes estava positivamente associado aos níveis de bem-estar e de
performance dos seus subordinados. Assim, os autores inferem que os líderes podem criar,
através do mindfulness, melhores relações com os seus subordinados, atender às necessidades
individuais, com benefício nos níveis de satisfação no trabalho e um nível de desempenho
superior.
Ainda que a prática de mindfulness tenha uma história de mais de 2500 anos, Jon Kabat-Zinn
desenvolveu, na década de 1970, uma versão adaptada ao contexto ocidental, num primeiro
momento como intervenção direcionada para pacientes com dor crónica. Trata-se do programa
de redução do stress baseado em mindfulness (Mindfulness Based Stress Reduction – MBSR),
que começou a ser aplicado também para outras condições, tais como stress, ansiedade e
enfermidades, sendo adotado de forma crescente em centros médicos, hospitais e instituições
de saúde. O programa MBSR geralmente consiste em 8 sessões, em grupos de até 30
participantes. Os participantes são também incentivados à prática diária individual, com auxílio
de gravações (Hervás, Cebolla & Soler, 2016) e neste sentido inclui, portanto, atividades diárias
de conscientização relacionadas à consciência da mente e do corpo, usando técnicas focadas
no momento atual e sem julgamento.
Em 2002, Segal, Williams e Teasdale adaptaram este programa, dentro de um marco mais
especificamente psicológico, aplicado, num primeiro momento, ao tratamento da depressão e
057
Contextualização Teórica
A terapia cognitiva baseada na atenção plena (MBCT) é uma terapia de grupo com 10 a 15
participantes, realizada por 6 a 8 semanas, criada especificamente para ajudar a gerir o stress e
os sintomas depressivos, recomendado pelo Instituto Nacional de Saúde e Excelência Clínica,
no Reino Unido, como tratamento médico para pessoas com depressão recorrente. Os
benefícios dessa meditação podem estar associados à melhoria do controle cognitivo, regulação
das emoções, humor positivo e aceitação, pois visa ensinar os pacientes a relacionarem-se com
pensamentos, sentimentos e sensações desagradáveis (Liberali, 2017). De acordo com esta
autora, o MBCT reduz os sintomas depressivos em comparação com os outros tratamentos,
melhora os níveis de ansiedade e potencia pensamentos e palavras positivas.
Assim, a prática do MBCT é benéfica para esses sintomas, pois combina terapia cognitiva com
treino intensivo em meditação, com foco na observação e no trabalho em processos cognitivos
e afetivos. Ensina os indivíduos a tornarem-se mais conscientes e a relacionarem-se, ajudando
a eliminar os padrões de pensamentos negativos que podem contribuir para a recaída da
depressão, trazendo consciência para a experiência do desejo, ensinando os sujeitos a observar
sem reagir ou julgar e evitar o sofrimento.
O MBSR combina meditação, mindfulness e ioga num programa de treino de 8 semanas, como
já referido anteriormente, onde os participantes aprendem técnicas projetadas para manter o
foco no momento presente por longos períodos de tempo (Kabat-Zinn, 1994). Os participantes
reúnem-se semanalmente para duas sessões de três horas mais uma sessão de dia inteiro. Além
disso, consiste na execução de tarefas de forma autónoma, sendo estimulados a praticar
técnicas, usando meditações guiadas e materiais do curso, aproximadamente 45 a 60 minutos
por dia, seis dias por semana. O programa é realizado num ambiente de grupo, mas também
inclui tempo para feedback e suporte individuais. As técnicas concentram-se no treino da
consciência e no exame do pensamento e dos padrões de comportamento, através do cultivo de
observação não avaliativa em relação às sensações mentais, emocionais e fisiológicas.
Especificamente, os participantes realizam práticas formais de mindfulness e meditação, como
leitura do corpo (body scan), foco na respiração, práticas de ioga e meditações sentadas que
expandem a atenção para consciência ilimitada. O fenómeno do stress no corpo e na mente e o
impacto que o mesmo tem, são discutidos juntamente com estratégias cognitivas e
058
Contextualização Teórica
Shapiro e colegas (2004) citado por Reb e Choi, (2014) conduziram um estudo de três partes
sobre a capacidade da MBSR em diminuir o desgaste, o sofrimento psicológico e aumentar a
atenção em profissionais de enfermagem. Enfermeiros foram recrutados para participar numa
sessão informativa de uma hora sobre um programa de 8 semanas de gestão do stress. Os 27
participantes eram todos funcionários da mesma organização dos EUA, falavam e liam inglês,
tinham pelo menos 18 anos de idade e lidavam com pacientes. Foram aleatoriamente distribuídos
no grupo de intervenção (n = 14) ou no grupo de controlo (n = 13). Ambos os grupos foram
testados antes da intervenção e imediatamente após a conclusão do programa. O grupo de
tratamento foi avaliado uma última vez 3 meses após a intervenção. O estudo constatou que a
ênfase da intervenção de MBSR no autocuidado, compaixão e na cura, ajudou os enfermeiros a
gerir mais eficazmente o stress e a reduzir o desgaste. Este mesmo grupo de enfermeiros relatou
maior relaxamento e autocuidado, e melhoria nas relações de trabalho e família. Referiram ainda
inquietação, dor física e lidar com emoções difíceis como desafios do programa.
Qualquer um dos métodos: MBSR ou MBCT, se constitui como ferramenta muito útil, que pode
ser utilizada em contexto de trabalho, com vista à melhoria do bem-estar geral e aumento da
satisfação no trabalho, bem como na prevenção de perturbações do foro mental.
059
2. Metodologia
060
Metodologia
Indo de encontro ao objetivo, o estudo pretende responder aos seguintes Objetivos de Estudo
(OE):
H3: As pessoas que praticam meditação ou mindfulness na vida diária têm níveis de bem-estar
superiores
H4: As pessoas que praticam meditação ou mindfulness na vida diária têm níveis de satisfação
no trabalho superiores
H5: Existe uma correlação entre atitudes de mindfulness, bem-estar e satisfação no trabalho
061
Metodologia
A primeira parte integra questões socioprofissionais, nomeadamente: género, idade, estado civil,
habilitações académicas, número de filhos, situação profissional, local de trabalho, anos de
experiência profissional e se tem ou não práticas de meditação e/ou mindfulness.
A segunda parte avalia atitudes sobre mindfulness através da Mindful Attention Awareness Scale
(MAAS), uma escala de autorrelato, unidimensional (Brown & Ryan, 2003). Esta escala não
pressupõe que tenha de existir experiência ou familiaridade com a prática de meditação; é uma
das escalas indicadas para medir o traço de mindfulness; é adequada para a investigar
correlações entre o mindfulness e indicadores globais de bem-estar e performance no trabalho.
É uma escala acessível e de rápida aplicação que avalia, de forma global, a capacidade de um
indivíduo estar atento e consciente à experiência do momento presente no dia-a-dia, sendo
inclusivamente validada para diferentes populações e em diferentes línguas (Soler et al., 2012).
A MAAS é composta por quinze itens, dos quais fazem parte, por exemplo, “tenho dificuldade
em permanecer focado/a no que está a acontecer no presente” e “parece que funciono em piloto
automático, sem muita consciência do que estou a fazer.” Os participantes indicam o quão
regularmente experienciam cada um destes itens usando uma escala de Likert de 6 pontos, em
que 1 corresponde a “Quase Sempre” e 6 corresponde a “Quase Nunca” e a classificação final
varia entre 15 e 90 pontos, sendo que quanto maior a pontuação, mais elevado é o nível de
mindfulness, isto é, maior o nível de consciência e atenção ao momento presente. A média
teórica da escala é 3.50.
A terceira parte é composta pela Satisfaction with Life Scale (SWLS) (E Diener, Emmons, Larsen,
& Griffin, 1985), uma escala de autorrelato, unidimensional, que avalia o bem-estar através da
satisfação com a vida.
Em relação a outras escalas similares, a SWLS destaca-se por conseguir distanciar a satisfação
global com a vida da influência de outras dimensões (Diener et al., 1985). De acordo com De
Barros et al., (2008) é a escala mais utilizada em estudos realizados com base em contextos
culturais diferentes.
Os mesmos autores referem que a SWLS é adequada para utilizar com diferentes grupos etários.
A SWLS é composta por cinco itens, avaliados segundo uma escala de Likert de 7 pontos em
que os extremos correspondem a 1 = “discordo completamente” e 7 = “concordo completamente”.
A classificação final oscila entre 5 e 35 pontos e quanto maior a pontuação, maior é o nível de
satisfação com a vida. A média teórica é de 4.00.
A quarta e última parte do instrumento de recolha de dados é constituída pela Generic Job
Satisfaction Scale (GJSS) (Macdonald & Maclntyre, 1997), um questionário de autorrelato que
avalia o nível de satisfação no trabalho. Embora a consistência interna seja razoável, com valor
de alfa de Cronbach de .77, é uma escala que se manifesta fiável para medir amostras
heterogéneas, sendo por isso adequada à investigação.
062
Metodologia
Conforme referem MacDonald e Maclntyre (1997), a GJSS foi validada a partir de uma amostra
com uma grande variedade de profissões, o que a torna relevante para medir qualquer profissão.
A GJSS é constituída por dez itens, como por exemplo, “sou reconhecido quando faço um bom
trabalho” e “dou-me bem com os meus superiores diretos”, sendo cada um deles avaliado através
de uma escala de Likert de 5 pontos, em que 1 corresponde a “Discordo fortemente” e 5
corresponde a “Concordo fortemente”. A média teórica é 3.00.
A fim de analisar a consistência interna das dimensões das escalas aplicadas, procede-se ao
cálculo do índice de alfa de Cronbach (Cronbach, 1951, 1988). Um alfa de Cronbach abaixo de
0,5 é considerado inaceitável, entre 0,5 e 0,6 fraco, entre 0,6 e 0,7 questionável, entre 0,7 e 0,8
aceitável, entre 0,8 e 0,9 bom, e acima de 0,9 é considerado excelente (Cronbach, 1951, 1988;
Moore, McCabe, & Craig, 2009).
a de Cronbach
Dimensão do presente Interpretação a de Cronbach e estudo a de Cronbach e estudo
estudo
MAAS .927 Excelente .87 (Brown & Ryan, 2003) .89 (Soler et al., 2012)
.87 (Bester, Naidoo, & Botha,
SWLS .910 Excelente .87 (E Diener et al., 1985)
2016)
.79 (Jaradat, Nielsen,
.77 (Macdonald & Maclntyre,
GJSS .888 Bom Kristensen, & Bast-Pettersen,
1997)
2017)
Conforme pode ser observado na Tabela 1, a consistência interna no presente estudo é superior
em todas as dimensões, quando comparada com a dos estudos que deram origem às escalas
originais, bem como quando comparado com outros estudos de referência.
Tratamento de Dados
Os dados foram processados e as estatísticas calculadas recorrendo ao programa estatístico
IBM SPSS, na sua versão 23.
Foram calculadas as médias e o respetivo desvio padrão para as dimensões em estudo e para
calcular a existência de diferenças significativas entre os grupos definidos nas hipóteses de
investigação e, considerando a dimensão da amostra, aplicou-se o Teorema do Limite Central
(ou teorema de Lindberg-Levy), que afirma que para amostras grandes (maiores do que 30), a
distribuição tende para a normalidade (Ghasemi & Zahediasl, 2012), tendo assim aplicado testes
estatísticos paramétricos, nomeadamente o t de Student e a ANOVA para amostras
independentes.
Nos casos em que existam diferenças significativas, foi também calculado o tamanho de efeito
através do d de Cohen (Cohen, 1988; Sullivan & Feinn, 2012). O tamanho do efeito é a magnitude
063
Metodologia
Quanto maior d de Cohen, maior o tamanho do efeito, sendo que a interpretação do valor é: d <
.01 = muito pequeno; .01 £ d < .5 = pequeno; .5 £ d < .8 = intermédio; .8 £ d < 1.2 = grande; 1.2
£ d < 2 = muito grande; e, d ³ 2.0 = enorme (Sawilowsky, 2009).
Para calcular as correlações entre as dimensões, foi aplicado o teste de correlações, também
paramétrico, ou seja, foi calculado o coeficiente de Pearson para cada uma das combinações de
dimensões. O coeficiente de Pearson varia, em termos absolutos, entre 0 e 1, podendo assumir
vários níveis, sendo uma das convenções mais consensual para o tipo de correlação a
seguinte: 0.00–0.09 negligenciável; 0.10–0.39 fraca; 0.40–0.69 moderada; 0.70–0.89 forte; e,
0.90–1.00 muito forte (Schober & Schwarte, 2018).
Os testes aplicados para cada objetivo específico (OE) e para testar as hipóteses de investigação
(H) são apresentados na Tabela 2.
Para toda a análise relacionada com os testes estatísticos e para a decisão das hipóteses de
investigação, optou-se por um intervalo de confiança de 95% e uma margem de erro admissível
de 5%.
064
Metodologia
065
3. Apresentação, Análise e Discussão dos
Resultados
Neste capítulo são apresentados os resultados obtidos através da análise estatística efetuada,
conforme descrita na Metodologia. Os resultados apresentados têm em consideração as
questões de investigação e hipóteses de investigação, conforme formuladas e mencionadas
anteriormente, tendo em conta as variáveis em estudo: caraterísticas sociodemográficas,
atitudes e comportamento de saúde e literacia em saúde.
066
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
Caraterização da Amostra
A amostra é composta por 272 respondentes, conforme apresentado na Tabela 3, podendo-se
observar que destes, 214 (78.7%) são do sexo feminino e 58 (21.3%) do sexo masculino. A faixa
etária mais representativa é a de entre 36 e 45 anos de idade (n=88;%=32.4), a maioria é
casado/a ou vive em união de facto (n=143; %=52.6), tem bacharelato ou licenciatura (n=155;
%=57.0) e não inclui nas suas atividades de vida diária a prática de algum exercício de meditação
e/ou mindfulness.
n %
Masculino 58 21.3%
067
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
n %
Há quantos anos trabalha? Menos de 5 anos 59 21.7%
5-10 anos 34 12.5%
11-15 anos 42 15.4%
16-20 anos 32 11.8%
21-25 anos 37 13.6%
Mais de 25 anos 68 25.0%
Total 272 100.0%
As suas atividades de vida Sim 71 26.1%
diária incluem a prática de
algum exercício de meditação Não 201 73.9%
e/ou mindfulness?
Total 272 100.0%
Nota: n – número de observações da amostra
068
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
Tabela 4 - Mínimo, Máximo, Média e Desvio padrão SWLS e GJSS em relação ao Sexo
Mínimo 1 1
Máximo 7 5
DP 1.363 .834
n 214 214
Mínimo 2 2
Máximo 7 5
DP 1.361 .710
n 58 58
Mínimo 1 1
Máximo 7 5
DP 1.362 .810
n 272 272
Como pode ser observado pela Tabela 4, as pontuações médias no presente estudo estão acima
das médias teóricas de, respetivamente, 4.00 e 3.00 para a SWLS e GJSS, indiciando uma
satisfação com a vida e com o trabalho equilibrada.
No que concerne à pontuação média na SWLS do nosso estudo (M=4.43; DP=1.362), esta é
comparável ao estudo de Athay (2012) (M=4.41; DP=1.550) ou ao estudo de Maroufizadeh et al.
(2016) (M=4.73; DP=1.606). Em relação à pontuação média no GJSS do nosso estudo (M=3.39;
DP=.810), verificamos que esta se encontra abaixo das médias encontradas em vários outros
estudos, como por exemplo: M=4.32; DP=.498 (Summaira, 2015); M=3.43; DP=.780 (Vaamonde,
Omar, & Salessi, 2018).
069
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
Tabela 5 – Mínimo, máximo, média e desvio padrão MAAS por “As suas atividades de vida diária incluem
a prática de algum exercício de meditação e/ou mindfulness?”
MAAS
Sim Mínimo 1
Máximo 6
M 3.76
DP 1.169
n 71
Não Mínimo 1
Máximo 6
M 3.84
DP 1.011
n 201
Total Mínimo 1
Máximo 6
M 3.82
DP 1.053
n 272
Até este ponto, além de fazer a caraterização socioprofissional dos respondentes, foi possível
responder aos dois Objetivos Específicos do presente estudo, podendo-se concluir que, em
geral, os respondentes têm níveis de satisfação com a vida e satisfação com o trabalho
moderadamente positivos, que a maioria dos respondentes não pratica exercícios de meditação
e/ou mindfulness na sua atividade diária e que a, à primeira vista, pontuação média discrepante
com o expetável no MAAS é frequente. Conclui-se, igualmente, que os resultados no presente
estudo vão ao encontro de vários estudos internacionais (Athay, 2012; Barajas & Garra, 2014;
Maroufizadeh et al., 2016; Summaira, 2015).
070
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
e GJSS, bem como os valores de prova para as diferenças encontradas entre os respondentes
do sexo masculino e do sexo feminino.
Tabela 6 - Resultados do teste t-Student para amostras independentes - SWLS e GJSS por sexo
Desvio Interpretação do
Dimensão Origem Média p-value d de Cohen
Padrão d de Cohen
Como pode ser observado pelos dados apresentados na Tabela 6, não existem diferenças
estatisticamente significativas entre os sexos, tanto para a satisfação com a vida, como para a
satisfação com o trabalho.
Tabela 7 - Resultados do teste Post-Hoc Bonferroni para a satisfação com a vida por estado civil
Desvio Interpretação do
Dimensão Origem Média p-value d de Cohen
Padrão d de Cohen
071
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
divorciados ou os que são viúvos (Goleman, 2007; Maslach, Schaufeli, & Leiter, 2001; Silva,
Queirós, Cameira, Vara, & Galvão, 2015).
Ao realizar os testes ANOVA para as restantes variáveis socioprofissionais: Faixa etária; Número
de filhos; Habilitações literárias; e, “Há quantos anos trabalha”, não foram encontradas diferenças
estatisticamente significativas.
Para verificar as seguintes duas Hipóteses de Investigação: H3: As pessoas que praticam
meditação ou mindfulness na vida diária têm níveis de bem-estar superiores; e H4: As pessoas
que praticam meditação ou mindfulness na vida diária têm níveis de satisfação no trabalho
superiores, apresentam-se na Tabela 8 os resultados dos testes t-Student realizados.
Tabela 8 - Resultados do teste t-Student para amostras independentes - SWLS e GJSS por “pratica ou
não exercícios de meditação e/ou mindfulness na atividade diária”
Desvio Interpretação do
Dimensão Origem Média p-value d de Cohen
Padrão d de Cohen
De acordo com os resultados da Tabela 8, as pessoas que praticam nas suas atividades diárias
exercícios de meditação e/ou mindfulness, apresentam níveis de satisfação com a vida, trabalho
e bem-estar superiores e estatisticamente significativos, relativamente àquelas que não praticam
esse tipo de exercícios. Estes resultados convergem com os obtidos nos principais estudos
internacionais, onde os benefícios da meditação e mindfulness são cada vez mais salientados
(Brown & Ryan, 2003; Darby & Beavan, 2017; de Zoysa, Ruths, Walsh, & Hutton, 2014; Farb,
Segal, & Anderson, 2013; Kingston, Chadwick, Meron, & Skinner, 2007; Miller et al., 1995; Ott,
Norris, & Bauer-Wu, 2006; Williams, 2010).
Daigle, Talbot e French (2018) aplicaram um programa de MBSR num grupo de enfermeiros que,
comparativamente ao grupo de controlo, revelou resultados postivos no que concerne a
diminuição dos níveis de ansiedade, redução dos erros e incremento do equilíbrio nos níveis de
072
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
satisfação com o trabalho e com a vida. Por sua vez, Carpena e Menezes (2018) aplicaram
treinos de meditação focados durante seis semanas num grupo de estudantes universitários, a
fim de investigar os seus efeitos nos estudantes em várias vertentes, nomeadamente na
mediação do stress. No final do programa foi possível inferir que, nesses mesmos estudantes,
se verificou uma redução da ansiedade e do stress ao lidar com as normais tensões da vida
diária e um aumento dos níveis de bem-estar, comparativamente aos níveis por eles
apresentados inicialmente.
Portanto, outros estudos recentes corroboram com os resultados obtidos no presente estudo,
realçando os benefícios de práticas de mindfulness e meditação para a manutenção de níveis
mais elevados de bem-estar, satisfação com a vida e com o trabalho.
Para dar resposta à última Hipótese de Investigação: H5: Existe uma correlação entre atitudes
de mindfulness, bem-estar e satisfação no trabalho, calcularam-se os índices de correlação de
Pearson entre as três dimensões em estudo, apresentando-se os resultados na Tabela 9.
MAAS 1
SWLS .387** 1
073
Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados
stress. Assim sendo, os resultados obtidos neste estudo vão ao encontro da evidência científica
atual.
074
075
Conclusões, Limitações e Futuras Linhas de
Investigação
A prática de mindfulness tem vindo a crescer exponencialmente no contexto laboral e têm sido
produzidas evidências que corroboram os benefícios do mindfulness e a sua relação positiva
com a satisfação no trabalho. Encontrámos trabalhos recentes sobre a temática em apreço,
desenvolvidos em mestrados de gestão aplicada.
076
Conclusões, Limitações e Futuras Linhas de Investigação
positivos, concluindo-se igualmente que a variável sociodemográfica “estado civil” é aquela que
origina diferenças estatisticamente significativas nos níveis de bem-estar e satisfação com o
trabalho, bem como que a prática de exercícios de meditação e/ou mindfulness nas atividades
diárias influencia positivamente o bem-estar e satisfação no trabalho.
Qualquer um dos métodos: MBSR ou MBCT, se constitui como ferramenta muito útil, que pode
ser utilizada em contexto de trabalho, com vista à melhoria do bem-estar geral e aumento da
satisfação no trabalho, da mesma forma que atuam na prevenção de perturbações do foro
mental.
Considera-se que, como futura linha de investigação, deveria ser implementado um programa
de MBCT e MBSR, como unidade curricular optativa nos cursos de enfermagem, enquanto piloto,
numa perspetiva longitudinal. Além do contexto de trabalho, a implementação curricular de treino
em MBSR e MBCT nos cursos de enfermagem do primeiro e segundo ciclo seria uma mais valia
na promoção da saúde mental positiva, na prevenção de perturbações mentais e na forma de
lidar e comunicar com os pacientes em contexto de estágio curricular.
Dado que a satisfação profissional assume uma significativa relevância, quer ao nível individual,
como potenciador de melhor performance e eficiência, quer organizacional, sendo que as
077
Conclusões, Limitações e Futuras Linhas de Investigação
Demonstram as evidências que o aumento dos níveis de mindfulness está associado ao aumento
de satisfação no trabalho e de bem-estar que, por sua vez, são indicadores positivos para a
criação de valor das organizações. O bem-estar geral dos colaboradores e a satisfação no
trabalho parecem ser bons indicadores para o desempenho e, consequentemente, para a gestão.
Isto porque, os modelos de gestão atual de recursos e de pessoas nas organizações
representam um conceito amplo, que ultrapassa a ideia linear de moldar os colaboradores à
tarefa e ao ambiente de trabalho para apresentarem bons resultados. Para otimizar o
desempenho dos colaboradores e, consequentemente, o sucesso alcançado pelas
organizações, uma gestão eficaz não só para a organização, mas também para os
colaboradores, através da preocupação com os seus interesses e bem-estar, torna-se
imperativa. As pessoas, enquanto maior capital das organizações, serão parte integrante da
rentabilidade quando se sentem valorizadas e, por isso, satisfeitas. Neste âmbito, todas as
ferramentas que permitam conduzir os colaboradores a elevados níveis de envolvimento positivo
com o trabalho, nomeadamente o mindfulness como se infere neste trabalho de investigação,
são fundamentais para as organizações que os empregam.
Assim, o contributo deste trabalho de investigação para a gestão das organizações parece-nos
muito oportuno, pois as organizações poderão ter boas razões para a criação de condições
favoráveis ao desenvolvimento de níveis mais elevados de mindfulness dos seus colaboradores.
078
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088
Anexos
089
Anexos
1.Idade
18-25 anos
26-35 anos
36-45 anos
46-55 anos
56-65 anos
66 ou mais anos
2. Género
Feminino
Masculino
3. Estado Civil
Casado(a)/União de facto
Solteiro(a)
Divorciado(a)
Viúvo(a)
090
Anexos
5. Habilitações
6. Profissão: ___________________________________________________
Menos de 5 anos
5-10 anos
11-15 anos
16-20 anos
21-25 anos
Mais de 25 anos
9. As suas atividades de vida diária incluem a prática de algum exercício de meditação e/ou mindfulness?
Sim
Não
091
Anexos
Em baixo encontra um conjunto de frases que caracterizam as suas experiências do dia-a-dia. Utilizando
a escala de 1 a 6, indique a frequência com que ocorrem cada uma das experiências, colocando um
círculo à volta do número que corresponde à sua resposta. Por favor, responda de acordo com o que
realmente reflete a sua experiência e não do que gostaria que fosse. Trate cada frase como única, sem
se deixar influenciar pela resposta que deu nas afirmações anteriores.
Mindfull Attention Awareness Scale – MAAS (Brown & Ryan, 2003), traduzido para português
1 2 3 4 5 6
092
Anexos
Em baixo encontra-se um conjunto de afirmações com as quais pode concordar ou discordar. Utilizando
a escala indicada de 1 a 7, refira o seu grau de concordância em relação a cada frase, colocando um
círculo à volta do número correspondente à sua resposta.
Satisfaction With Life scale – SWLS (Diener, Emmons, Larsen & Griffin, 1985), traduzido para português
1 2 3 4 5 6 7
Não
Discordo Discordo concordo Concordo Concordo
Discordo Concordo
completamente levemente nem levemente completamente
discordo
Para cada uma das frases abaixo, por favor coloque um círculo à volta do número que indica o seu grau
de concordância.
The Generic Job Satisfaction Scale – GJSS (MacDonald & Maclntyre, 1997), traduzido para português
1 2 3 4 5
Discordo Discordo Não sei Concordo Concordo
fortemente fortemente
093
Anexos
094
095
Prática de mindfulness na educação pré-escolar
096
Resumo
Palavras-Chave:
097
Índice Geral
1 - Introdução
2.2.2 - O Grupo
2.2.3 - O Espaço
2.2.4 - O Tempo
2.2.5 - As Interações
5.Bibliografia
098
Índice de Figuras
099
Lista de Tabelas
100
Índice de Anexos
101
Lista de Siglas
102
1 - Introdução
1
O desenvolvimento transpessoal tem como objetivo o estudo da consciência e reconhecimento dos significados
de dimensões espiritual da mente, na manifestação dos valores positivos. Insere-se no ramo da psicologia
Transpessoal, cuja tarefa é elevar o inconsciente a uma dimensão superior e promover a sua expressão. (Maslow
1968).
103
questões a estudar, elaborar os objetivos a prosseguir e as metodologias para os abordar e
monitorizar, definir formatos para avaliar os resultados” (Máximo-Esteves, 2008, p. 11.).
A primeira parte do relatório destina-se ao contexto em que decorreu a investigação.
Apresenta os princípios orientadores e metodologias adotadas na prática profissional, a
caracterização da entidade cooperante e o os aspetos primordiais que estiveram na origem da
escolha do tema da investigação.
A segunda parte do relatório compreende o projeto de intervenção desta investigação.
Neste ponto será apresentada a fundamentação teórica onde serão definidos os principais
conceitos relacionados com o mindfulness. Seguidamente será definido o objeto de estudo e
identificados os principais objetivos com a implementação de um programa de mindfulness em
contexto de Pré-Escolar. Ainda nesta parte, apresenta-se a metodologia da investigação que
compreende a indicação e justificação das escolhas metodológicas. O último ponto da segunda
parte compreende a apresentação/descrição do programa implementado, seguido da análise e
discussão dos resultados.
Para terminar serão apresentadas as considerações finais e as referências bibliográficas.
104
2 - A Prática de Ensino Supervisionada
105
teoria assenta em pressupostos que transcendem o domínio académico e cientifico. Preocupa-se
com questões ligadas à realização pessoal como a moralidade, as emoções, a criatividade, a
aceitação e integração, a autoestima, a confiança, a realização, o respeito, a confiança, o amor, a
família, a amizade, os relacionamentos, a segurança do corpo e a saúde. Maslow organizou estas
necessidades em categorias dando origem a uma pirâmide conhecida como “hierarquia de
necessidades”. 2
No decorrer da prática de ensino supervisionada procurei promover situações ou
simplesmente deixar que as crianças vivessem momentos em que lhes fosse “permitido” serem
apenas si próprias, de forma autêntica, genuína e empática, podendo sentir e reconhecer o que há
em sim. Evitei intervir logo nas situações, dando tempo e espaço para se apropriarem-se das
sensações e emoções, construindo o seu próprio conhecimento relativamente ao mundo exterior e
o mundo interior. É nesta perspetiva que me apoio nos contributos da Teoria Espiritual.
Longe de religiosíssimos ou fundamentalismos, preocupo-me bastante com esta questão da
relação da pessoa com vida e com o universo, pois acredito nos benefícios que este
(auto)conhecimento pode ter para cada individuo e para o Mundo. Afinal, como poderemos nós
mudar o mundo e torná-lo num lugar harmonioso se não soubermos qual o nosso papel nele? Quais
as nossas reais potencialidades? Como e com o que é que podemos contribuir? Para além do plano
material, acredito que a vida possuí uma dimensão imaterial, a que habitualmente chamamos Alma,
que nos remete para um plano de consciência universal.
Acredito que este plano faz parte da consciência holística que a educação deve ter sobre a
criança ou qualquer outro ser contemplando não só os aspetos do exterior, mas também do interior,
isto para quem como eu pretende, por meio da Educação, ajudar a formar pessoas, no verdeiro
sentido. O movimento espiritualista nasceu nos inícios do século XIX, tendo como origem as
filosofias religiosas orientais tais como o Budismo e o Taoismo e tem referências como Mestre
Bucke, Eckhart, Osho. É um movimento assente essencialmente nas questões da transcendência e
da consciência e que procura dar resposta a questões que comprometem o pleno e harmonioso
desenvolvimento do ser humano.
Os valores que dominam a visão espiritualista assentam em princípios como a realidade
percebida como um Todo, um sentimento global de pertença à Vida e à espécie humana; descoberta
dos valores fundamentais de amor e respeito pela vida, através dos vários níveis de consciência;
2
Também conhecida como pirâmide de Maslow corresponde a uma divisão hierárquica de necessidades humanas,
divididas em cinco grupos diferentes, sendo que cada nível só pode ser satisfeito, após satisfeitas as necessidades
do nível imediatamente anterior.
106
desenvolvimento das potencialidades de cada individuo e participação consciente no crescimento
individual bem como o desenvolvimento do individuo através da comunidade.
Para possibilitar este tipo de educação, é importante que a escola ofereça uma experiência
educativa que vise a criatividade existencial do ser humano possibilitando o desenvolvimento de
todo o seu potencial através de experiências educativas que sejam significativas, que façam sentido,
que afetem e que atinjam a criança de mondo a que ocorra uma transformação nas várias dimensões
pessoais.
Para desenvolver a ação interventiva, procurei suportar-me em modelos alternativos à
pedagogia transmissiva, de implementação possível e pertinente no contexto da ação e que de
alguma forma integrassem os pressupostos da teoria humanista-espiritual. Assim sendo procurei
alicerçar a prática de ensino supervisionada no modelo pedagógico Highscope, inspirei-me também
na Pedagogia-em-Participação desenvolvida pela Associação Criança e recorri a algumas práticas
do método Montessori
O modelo Highscope reconhece que a aprendizagem é feita por meio da ação da criança e
não por repetição e memorização, como no modelo tradicional. O currículo Highscope diferencia-
se por meio de características específicas como a organização da ação pedagógico em torno de
“experiencias-chave” e pela reconceptualização do papel do adulto. Inspirando-me neste modelo,
procurei que a minha atuação contemplasse o principio da aprendizagem ativa, descrito segundo
“experiências-chave” que contemplam uma interação acolhedora e facilitadora entre o adulto e a
criança; um ambiente físico e acolhedor orientado para a criança; horários e rotinas adaptadas,
observações diárias que orientam as interações, trabalho de equipa entre os vários agentes (pais,
educadores, auxiliares) e a planificação da ação. Procurei também ser um novo modelo de adulto
que gere oportunidades para a criança iniciar experiências e propor atividades que lhe permitem
efetuar aprendizagens.
De um modo geral, foi minha intenção “pôr a criança em contacto com uma nova realidade
educacional estimulante onde se acredita que ela, por sua iniciativa, constrói o conhecimento,
tendo, portanto, o adulto um papel menos diretivo e mais de apoio e suporte”. (Formosinho, 2013,
p.75).
À Pedagogia de Participação fui buscar o reforço do papel do educador e da criança.
Esta pedagogia não é um modelo, mas sim a perspetiva pedagógica da Associação Criança,
apoiada pela Fundação Aga Khan de Portugal desde a sua formação e que atualmente é utilizada
em diversos contextos de Lisboa. Também se assume como uma proposta de rutura com a
107
pedagogia tradicional, trazendo um novo entendimento sobre o processo de ensino
aprendizagem e o oficio de aluno e professor.
A essência de uma pedagogia de infância participativa é “a criação do espaços e tempo
pedagógicos onde as interações e relações sustentam atividades e projetos que permitem às
crianças coconstruir a sua própria aprendizagem, e celebrar as suas realizações”
(Formosinho. 2011, p. 19).
Tendo em conta esta ideia, tentei criar um ambiente pedagógico nutrido de um tipo de
relações e interações, com espaço para o desenvolvimento de atividades e projetos onde a
experiência os valores, as culturas e os saberes são valorizados através do diálogo com os
saberes e conhecimentos dos adultos, permitindo à criança ser, viver, conhecer, criar e
significar.
Com uma outra intenção, transversal a todo o projeto de intervenção, recorri a práticas
do Método Montessori. A obra de Maria Montessori sustenta-se no principio básico de que as
crianças precisam de um ambiente apropriado onde possam viver e aprender. Ressoa com as
teorias humanistas, na medida em que “a característica fundamental de seu programa
pedagógico é que ele dá igual importância ao desenvolvimento interno e ao desenvolvimento
externo, organizados de forma a se complementarem.” (Cribari & Xavier, 2010, p. 18)
Montessori atribui um imenso valor às tarefas de foco mental como exercícios de
paciência, exatidão e repetição, com a finalidade de treinar o poder de concentração. Segundo
a percursora
(...) era importante que esses exercícios fossem feitos a cada dia no contexto de uma “tarefa”
verdadeira, e não como simples jogos ou passatempos. Eles eram complementados por uma prática
da imobilidade e da meditação, que marcavam a passagem da educação “externa” para a educação
“interna” (Cribari & Xavier, 2010, p. 20).
108
2.2 - Contexto Socioeducativo da Prática de Ensino
2.2.1 - A Instituição
109
O número de auxiliares e ajudantes de ação educativa permite não só o acompanhamento e
apoio da ação pedagógica das educadoras, como também colmatar eventuais faltas ou ausências de
pessoal. A equipa é bastante coesa e todos os membros estabelecem uma relação aprazível de
harmonia que se traduz num ambiente de respeito, confiança e afetividade.
2.2.2 - O Grupo
110
2.2.3 - O Espaço
A intervenção decorreu em duas salas distintas. O Projeto foi concebido tendo em conta
todas as características do ambiente educativo, nomeadamente o espaço. O espaço sofreu alterações
duas vezes, obrigando a ajustes e adaptações ao projeto inicialmente concebido. A sala original
localiza-se no rés-do-chão e entrou em obras profundas no segundo mês de intervenção.
A sala deslocou-se para o 2º andar, para a antiga sala de reunião das educadoras, com uma
área consideravelmente inferior à da sala anterior. O impacto desta mudança sentiu-se de forma
muito acentuada nas dinâmicas do grupo, na utilização do espaço e dos materiais, nas brincadeiras
e nas rotinas das crianças.
A dimensão significativamente mais reduzida deste novo espaço, levou a uma nova
organização das áreas, tendo sido alguns materiais suprimidos e alguns móveis de arrumação e
mesas inseridos no corredor, no exterior da sala. A área do tapete e da casinha mantiveram-se tal
como estavam, a área da garagem fundiu-se com a área dos legos e as peças de encaixe, situada
diretamente ao lado da casinha sem nenhuma divisória, permitindo às crianças misturar brinquedos
e materiais pedagógicos que levam de uma zona para a outra. Os jogos mantém-se numa prateleira
inacessível às crianças. Existe, ainda, uma mesa para plasticina entre a área dos desenho e o tapete
da garagem, que limite a circulação das crianças entre os espaços.
A grande mudança está relacionada com a área da expressão plástica que foi transferida para
o corredor de passagem exterior à sala, juntamente com os materiais de apoio ao desenho. Esta
disposição dos espaços e materiais limita a visibilidade global sobre a sala e as crianças.
No geral, as áreas continuam pouco claras e confusas, mal delimitadas e a transição entre
os espaços tornou-se difícil, devido à falta de espaço. Este fator origina muitos conflitos. As crianças
pisam-se e empurram-se nas transições, as áreas estão lotadas, não tem material suficiente para que
todos possam brincar.
A casa de banho, situando-se na outra ponta do corredor, mais distante da sala, o que faz
com as crianças se distraiam na brincadeira pelo corredor. As sanitas são pequenas, sendo mais
indicadas para as crianças de três anos. A maioria está entupida e verte água que se espalha pelo
chão, tornando-o perigoso e escorregadio. Os lavatórios e dispensadores de papel estão à altura das
crianças e são em número suficiente para que possam fazer a higiene de forma autónoma. O
dispensador de sabão encontra-se vazio. As crianças não têm sabonete disponível para fazer a sua
higiene de forma correta e saudável, lavando as mãos apenas com água. A inexistência de sabão é
um constrangimento para a criança que o solicita frequentemente ao adulto após fazer as suas
necessidades fisiológicas para poder lavar as mãos.
111
2.2.4 - O Tempo
O acolhimento é o primeiro momento do dia. Inicia por voltas das 9h15, hora a que a
educadora traz o grupo da sala de Atividades de Animação e de Apoio à Família (AAAF), para
a própria sala. As crianças são acolhidas calorosamente com um abraço, um beijinho ou um
colo de consolo para as separações mais difíceis dos pais.
À medida que vão chegando, sentam-se no tapete, em roda, conversando e partilhando
brinquedos de casa com os seus amigos. A maioria das crianças chega depois das 9h30. O tempo
do tapete dura até às 10h. É o espaço primordial de comunicação entre a educadora e as crianças.
É o momento de grande grupo no qual se dá a exploração dos instrumentos de pilotagem, se
canta a canção do Bom Dia, ouvem-se histórias ou lançam-se as atividades propostas pelo
educador.
A educadora é também a Coordenadora da instituição, sendo solicitada muitas vezes, o
que leva a uma quebra nas rotinas da sala. As rotinas acabam por não ser respeitadas sendo os
momentos de grande grupo, especialmente na primeira parte da manhã, frequentemente
interrompido pelas auxiliares que entram na sala para dar recados ou por crianças que chegam
mais tarde. Momentos como ouvir uma história, cantar uma música, são interrompidos várias
vezes, com pessoal que entra na sala, fala alto, pais que dão recados no próprio momento, e
chamadas telefónicas que são atendidas também no momento da história. As crianças
inquietam-se, perdendo a concentração muito rapidamente, devido ao excessivo tempo no
tapete e às interrupções constantes. Ainda no tapete, tomam a merenda e bebem água. Caso a
educadora traga alguma atividade planeada apresenta-a ao grupo no tapete e de seguida parte
para a sua execução em pequenos grupos, enquanto o restante grupo brinca nas áreas de
interesse e desenvolvimento.
Segue-se o momento do recreio, das 11h às 11h30. É o único tempo de contacto com o
exterior, mas não é certo, nem rotineiro. O frio, a humidade da noite, a falta de tempo para
terminar os trabalhos, ou excessivo tempo que as crianças demoram a arrumar são motivos para
não se ir ao recreio. Isto reflete-se no comportamento crianças, que se tornam mais agitadas e
inquietas durante os momentos que se seguem. Segue-se o momento da higiene para o almoço.
As crianças sentam-se em roda indo duas a duas à casa-de-banho, enquanto cantam canções.
Nos dias sem recreio, este momento de roda torna-se demasiado agitado. As crianças não
conseguem acompanhar as canções, nem manter-se calmos nos seus lugares, agarrando-se,
empurrando-se, rebolando pelo chão.
112
Após a refeição, as crianças de três e quatro anos retornam à sala, diretamente para os
sanitários, onde fazem uma nova higiene e se preparam para o repouso.
As crianças de cinco anos não dormem a sesta. aguardam no refeitório, juntamente com
as crianças de cinco anos da restantes salas do Pré-Escolar, formando um novo grupo de cerca
de 15 elementos. Este grupo denominado “Exploradores”, aguarda no refeitório que haja uma
auxiliar ou educadora disponível para levar o grupo para o momento de higiene e
posteriormente para a sala onde ficaram até ao momento do lanche. Ficam bastante impacientes,
sozinhos na sua mesa, sem permissão para trocar de lugar e juntar-se com os amigos, numa
outra mesa. Seguem do almoço para a higiene, e novamente para a sala onde se sentam no
tapete. Estão geralmente bastante agitados e dispersos. Querem brincar, mexer-se, empurrar-se.
Conversam mais alto que habitual, atiram-se para o chão de joelhos, deitam-se e rebolam,
comportamento deixa a auxiliar descontente e leve a fortes chamadas de atenção, sendo
frequentemente ameaçados de ir dormir na sala dos “bebés”, como castigo.
O grupo dos “exploradores” fica ao cuidado de uma das quatro educadoras do pré-
escolar, por um período de um mês, de forma rotativa. Obedece a um planeamento e rotina
pensado especificamente para este grupo: 2ª feiras dia de ginástica, 3ª feira dia de “cadernos”
no qual realizam exercício escritos de matemática e português, e a 4ª, 5ª e 6ª são os dias
destinados ao projeto a desenvolver naquele mês. A planificação diária das atividades é pensada
e executada pela educadora responsável pelo grupo em cada mês. Contudo, a rotina deste grupo
também não é cumprida na medida em que, de acordo com outras necessidades, as educadoras
trocam a vez de dirigir o grupo, ou não existe ninguém disponível para dirigir o grupo. Para
solucionar estas situações são colocadas mesas nos exterior das quatro salas de pré-escolar,
ondes os “exploradores” pintam desenhos ou modelam plasticina. Nestas situações, as crianças
têm uma dificuldade ainda maior em regular o seu comportamento, pois estão sozinhas, não
podem falar alto para não acordar quem dorme, e são obrigadas a estar novamente sentadas e
contidas, após o momento do almoço, durante 2h30.
2.2.5 - As Interações
113
restante grupo são poucas ou praticamente inexistentes, parecendo que a sala é formada por dois
grupos independentes.
De um modo geral as crianças são sociáveis e comunicativas. O mesmo verifica-se na
relação com os adultos, a quem recorrem e respondem com à vontade, com a exceção de um menino
de quatro anos que muito pouco comunica, solicita ou recorre ao adulto. Quando este se lhe dirige,
não responde nem interage, chegando inclusive a desviar o olhar, evitando estabelecer contacto
visual direto.
As crianças têm vários conflitos interpessoais, nomeadamente na partilha de brinquedos e
no respeito e cumprimento das regras de convivência social. A maior parte dos conflitos e das
agressões ocorrem no grupo dos três e quatro anos.
No que respeita à gestão de conflitos, sendo um grupo bastante heterogéneo existem vários
conflitos e problemas entre as crianças, devido à imaturidade que têm na resolução de conflitos.
Nestas situações, são ignoradas ou perentoriamente ordenado o pedido de desculpas. Os adultos não
procuram formas para converter o comportamento das crianças em oportunidades para ensinar a
prender. Não existem estratégias pensadas para apoiar as crianças e encorajar a socialização.
As interações adulto-criança são determinadas pelo tipo de ambiente. Não se verifica uma
atitude de apoio. Não se verifica também um interesse genuíno pelo o que as crianças dizem ou
pensam, pelo que o diálogo não corresponde a uma alternância de ouvir e falar entre o educador e
o grupo.
As interações entre as crianças e o educador não são regulares devido aos períodos de
ausência da educadora. No momento de grande grupo, quando se encontra presente, de forma
apressada, transmite o programa do dia, apresentado o plano de trabalho. Este que deveria ser um
espaço de partilha de troca de informações, saberes e discussão de ideias, é um momento de
prescrição de trabalho do educador para as crianças. É frequente ouvir-se as crianças entre si
trocarem comentários sobre o que ouvem, no entanto não lhes é dada oportunidade de partilhá-los
com o grupo, de serem incluídos na conversa.
O ambiente é o reflexo da alternância de momentos de ausência e de presença do educador.
Quando está presente, está por pouco tempo, geralmente durante as primeiras duas horas ou, até só
durante uma hora. Sendo o tempo curto, o educador aproveita ao máximo para orientar e prescrever
o trabalho do dia, não dando tempo e oportunidade à crianças de comunicarem, expressarem os seus
interesses. Após este momento, vão para as áreas sem nenhuma orientação na distribuição, nas
trocas de área, ou nas regras de convivência e utilização dos materiais o que resulta em brincadeiras
conflituosas, desorganizadas.
114
Por esta características, verifica-se a existência de dois tipos de ambiente contrastantes,
segundo os pressupostos do modelo HighScope ( Homann, M., & Wikart, D, 2007) relativamente
ao ambiente de aprendizagem, sendo estes um ambiente diretivo e um ambiente permissivo.
Ambiente diretivo porque quem detém o controlo é adulto. É ele que fala e que dá instruções, sendo
o curriculum centrado nos objetivos do adulto e não das crianças. Neste modelo prevalecem as
atividades de repetição e reprodução, no qual o produto da aprendizagem se torna o próprio objetivo.
No ambiente permissivo, quando o educador não está, são as crianças que têm o controlo, o
educador não acompanha nem observa a brincadeira, sendo apenas um vigilante que só intervém
para responder às solicitações, para dar informações ou para repor a ordem. Sendo eu um adulto
desconhecido foi necessário algum tempo para estabelecer laços afetivos com a maioria do grupo
e cativar o seu interesse para que participassem nas minhas propostas não de atividade ou me
permitissem entrar nas suas brincadeiras. Especialmente o menino acima referido, que durante os
dois primeiros meses não criou qualquer tipo de relação comigo, ignorando e rejeitando as minhas
tentativas de aproximação ou de diálogo. Para ele eu não existia. Algumas crianças chegaram
inclusive a desafiar-me com os seus comportamentos de desrespeito e incumprimento de regras,
indicações ou solicitações da minha parte.
115
de investigação, suportado por um quadro teórico eu sustenta e os benefícios do mindfulness dar
resposta à questão: Como desenvolver uma prática pedagógica com base nos princípios do
mindfulness?
116
3 - A Investigação
(...) as suas atitudes de não julgamento e aceitação plena das experiências são elementos
da consciência considerados a antídotos potencialmente efetivos contra formas comuns de
angústia psicológica, ansiedade, preocupação, medo, raiva, etc. muitos dos quais
envolvem tendências inadaptadas para evitar, reprimir ou superar os pensamentos e
emoções angustiantes.
Numa das investigações os autores (Keng, Robins e Smoski, 2011) concluem que a prática
e cultivo da atenção plena facilitam o funcionamento psicológico. Verificaram a existência de uma
correlação entre os resultados de estudos correlacionais, estudos de intervenção clínica e estudos
experimentais com base laboratorial de atenção plena, que sugerem a existência de uma associação
positiva entre a atenção plena e a saúde psicológica. Terminam o artigo, indicando que o
treinamento da atenção pode provocar efeitos psicológicos positivos. Esses efeitos variaram desde
117
o aumento do bem-estar subjetivo, redução de sintomas psicológicos e reatividade emocional, até
uma melhor regulação do comportamento.
O mindfulness tem vindo a entrar no mundo da educação, por meio da Parentalidade
Consciente. Os primeiros passos neste sentido foram dados Zabat- Zinn em 1997 ao publicar o livro
Everyday Blessings: The Inner Work of Mindful Parenting, sobre a forma como o mindfulness pode
melhorar a relação entre pais e filhos.
Atualmente, vários autores publicaram livros, de carácter mais de guia prático para pais,
como Educar com Mindfulness de Mikaela Oven, (Oven, 2015) Mindulness para Pais de Laura
Sanches (Sanches, 2016) que nos mostram como a adoção de uma atitude mindfulness permite
criação de uma relação forte que permite um desenvolvimento saudável de todas as portes
envolvidas – crianças e educadores.
É no campo teórico e filosófico fértil do final dos anos 60 que Kabat-Zinn se dedica ao
estudo do mindfulness, sendo o principal responsável pela sua divulgação desde a década de 70.
Kabat-Zinn é médico e fundador do Center for Mindulness in Medicine, Health Care, and Society
da Universidade de Medicina do Massachusett desenvolvendo, o primeiro programa de mindfulness
em 1979.O programa era isento de qualquer conotação religiosa e dirigido para pessoas com
problemas de saúde, pacientes no hospital onde trabalhava. O programa consistia num curso
estruturado em oito semanas, no qual os pacientes podiam aprender técnicas de meditação e
exercícios de ioga que permitiam uma diminuição significativa dos níveis de stress.
Jon Kabat-Zinn torna-se um dos grandes responsáveis do reconhecimento que esta prática
tem vindo a colher, pois desde esta época que a Atenção Plena vem caminhando, lado a lado, com
a ciência. Kabat-Zinn já era praticante da meditação zen budista, tendo sido discípulo de um monge
budista no Vietnam. O médico começou a perceber que o estado de atenção plena que aprendia com
o monge, juntamente com alguns exercícios que praticava no ioga, continham um imenso valor.
Esta era também uma altura em que o ioga e a meditação começavam a ter o seu lugar nas sociedades
ocidentais, porém ainda muito conectados à tradição religiosa budista, o que acaba por limitar a sua
divulgação.
Trazendo a experiência pessoal da prática de meditação budista para o contexto cientifico,
Kabat-Zinn consagrou-se pioneiro na difusão desta técnica que foi alvo de variadas investigações
relativamente ao seu contributo na redução do stress e consequente melhoria da saúde. Conseguiu
118
também mudar a forma como até então era vista a meditação. Simplificou o seu conceito,
contribuindo para o abandono da crença que devia ser prática com muito afinco, durante horas a
fio, inserido num contexto religioso.
O mindfulness assenta em três componentes fundamentais (Sanches, 2016): prestar atenção
intencional ao momento presente, abandonar a tendência para o julgamento e, por fim, acolher todas
as partes da nossa experiência, contudo, ainda está muito enraizada a ideia de que para meditar é
necessário que a mente esteja completamente parada, em silêncio. Se os pensamentos não
desaparecem, significa que estamos a meditar mal, ou não estamos a conseguir. Através desta
técnica, Kabat-Zinn tenta demonstrar o contrário: não existem metas a atingir quando se medita e
não é possível meditar bem ou mal. Meditar é, por si só, o ato de prestar atenção ao que acontece
na nossa mente.
Esta abordagem traz uma leveza à pratica de meditação e torna-a acessível a qualquer
indivíduo que a pratique. Não é necessário esvaziar completamente a mente, sentir-se totalmente
relaxado nem sentar-se em posição de flor de lótus, de olhos fechados, durante horas, para sentir os
benefícios do mindfulness. O mindfulness, ensina-nos que podemos aprender uma nova forma de
nos relacionarmos com o que acontece dentro de nós: emoções, sentimentos e pensamentos. Não é
necessário eliminar, lutar ou tentar modificá-los, basta aprender a mudar o foco, a redirecionar a
atenção, criando um modo diferente de nos relacionarmos com a nossa experiência interna porque
“quando aprendemos a relacionar-nos melhor com o que se passa dentro de nós, torna-se mais
fácil encontrar alternativas para lidar também com o que se passa fora” (Sanches, 2016, p.22).
Para meditar basta estar disposto a trazer a mente de volta para o momento presente, cada vez que
dermos conta que ela já se afastou do momento ou da respiração que estamos a observar.
Ciente da dificuldade do cultivo desta nova forma de consciência Kabat-Zinn, edita o livro
Full Catastrophe Living,(1990) no qual define as nove atitudes que permitem ampliar as práticas
formais ou informais do mindfulness. São estas:
1 - “Não julgar”, adotando antes o papel de testemunha imparcial da própria experiência;
2- “Ser paciente”, consigo e com a vida, deixando os acontecimentos desenrolarem-se no
seu próprio ritmo”;
3- “Ter uma mente de principiante”, vendo cada momento como único e portador de um
universo de novas possibilidades;
4- “Ser confiante”, aprendendo a confiar em si próprio, na sua intuição e experiência
(mesmo nos erros);
5- “Não lutar”, apenas observar a mente e os pensamentos sem querer contrariar ou negar;
6- “Aceitar”, a vida, nós, e as nossas experiências exatamente como são;
119
7- “Deixar ir” desapegando-nos das pessoas, das emoções e dos pensamentos que já não
nos servem e que nos prendem;
8- “Ser grato”, trazendo gratidão ao momento presente, pelo simples facto de estar vivo e
respirar;
9- “Ser generoso”, estando ao sincero e honesto cuidado do outro.
A prática de mindfulness tem vindo a ser utilizado como ferramenta terapêutica no âmbito
da Psicologia Transpessoal, uma tendência moderna da Psicologia. A Psicologia Transpessoal
combina princípios de várias correntes psicológicas com aspetos do budismo tibetano, tendo como
objetivo o estudo da consciência.
O interesse pelo estudo da consciência tem vindo a desenvolver-se desde os anos 40, no
terreno da Psicologia Humana desenvolvida por Abraham Maslow (1908 – 1970) e Carl Rogers
(1902 – 1987), após a Psicanálise e o Behavorismo. Rogers e Maslow dão inicio aos estudos no
campo da Psicologia Humanista que se caracteriza por uma orientação não diretiva e por uma
abordagem centrada na pessoa e em todos os aspetos do domínio humano. A Psicologia Humanista
torna-se o berço da Psicologia Transpessoal que surge posteriormente no Estados Unidos, nos anos
60, a partir de um movimento que ficou conhecido como a “quarta força” da Psicologia. Esta nova
corrente integra corpo, mente e espírito, tendo como objetivo o estudo da consciência.
A Psicologia Transpessoal, inicialmente denominada de Psicologia da Consciência, foi
objeto de vários estudos, como os que serviram suporte cientifico para a recente obra Traços
Alterados (2018) da autoria de Richard Davidson e do psicólogo David Goleman, reconhecido pelo
trabalho desenvolvido no campo da inteligência emocional. Nesta obra podemos encontrar o
resultado de várias investigações desenvolvidas no âmbito da Psicologia Transpessoal, em que se
verifica a relação entre um determinado modelo da mente e a transformação da consciência no
sentido dos estados alterados.
Segundo as investigações, a mente pode apresentar dois tipos de estádios: estádios
“saudáveis” e “doentios”, sendo que os nossos estádios mentais variam frequentemente entre
agitação, egoísmo, desejo e sentimentos menos positivos (Davidson & Goleman, 2018, p. 54). Por
outro lado, “os estados saudáveis incluem a constância mental, a compostura, a constante
mindfulness e a confiança realista” (Davidson & Goleman, 2018, p. 54) e curiosamente um
subconjunto de estados saudáveis como descontração, flexibilidade, adaptabilidade e maleabilidade
aplicam-se ao corpo em simultâneo. As pesquisas dos autores indicam que enquanto imerso na
120
atenção plena os estados “doentios” do meditador são suprimidos tendo este conhecimento servindo
de suporte para o desenvolvimento da teoria de como o treino mental – mindulfness - poderia
conduzir ao desenvolvimento de traços alterados positivos (Davidson & Goleman, 2018, p. 55). Os
autores conduziram as suas investigações no sentido de comprovar que a meditação é um
instrumento que possibilita a incorporação de traços positivos como a bondade, a paciência, a
presença, a aceitação e a calma constante.
(...) uma educação formadora das pessoas, cujo advento se torna mais necessário à medida
que coações sempre mais duras separam e fragmentam cada ser. trata-se então de não mais
adquirir, de maneira exata, conhecimentos definitivos, mas de preparar para elaborar ao
longo de toda a vida, um saber em constante evolução e de aprender a ser (1973, p. 225)
(...) a educação não pode limitar-se como no passado a formar, em função de um modelo
predeterminado de estruturas, de necessidades e de ideias, os quadros da sociedade de
amanhã, nem preparar de uma vez para sempre os jovens para um certo tipo de existência.
A educação deixou de ser um privilégio de uma elite e de estar vinculada a uma determinada
idade. Ela tende a coexistir com a totalidade da comunidade e com relação à existência do
indivíduo” (p, 249)
121
pilar menos contemplado pelos educadores, em prol dos restantes pilares, embora deva ocupar o
mesmo espaço no currículo e na formação das crianças e jovens.
122
3.2 - Objeto de estudo
123
grupo que observa. Assim, “a participação, ou seja, a intervenção observador - observado está ao
serviço da observação; ela tem por objetivos recolher dados (sobre ações, opiniões ou perspetivas)
aos quais um observador exterior não teria acesso. (Boutin, Goyette & Lessard-Hebert,1990, p.
155).
Por basear-se essencialmente na observação de comportamentos e atitudes no decorrer da
ação, o estudo tem uma configuração fortemente empírica. O procedimento desenvolvido
corresponde a um conjunto de ações levadas a cabo pelo investigador, de forma estruturada e
sistematizada. A fase inicial é essencialmente exploratória, na qual serão encabeçadas situações
pontais de prática de mindfullness informal. Estes momentos serão registados e avaliados, visando
verificar a evolução das ações. A avaliação é um processo contínuo e essencial para este estudo,
pois “procede-se a uma avaliação com a finalidade de verificar se a evolução das ações está a
suceder em conformidade com o previsto ou se há necessidade de se efetuarem ajustes ou
correções.”(Sousa, A. 2005, p. 96) .As inferências resultantes da primeira fase serviram para
implementar a segunda fase do estudo, na qual será desenvolvida uma prática formal de
mindfulness. Paralelamente serão narradas situações que apresentam evidências do estudo
levado a cabo.
Os dados foram recolhidos através de instrumentos distintos: Grelha de Registo e
Reflexão5, de natureza descrita e narrativa (APÊNDICE A); Diários de Borda e Notas de
Campo de natureza narrativa e, por fim, Fotografias, instrumentos de natureza tecnológica.
Os instrumentos de natureza descritiva tendem a basear-se numa análise retrospetiva
dos acontecimentos anteriormente registados, tendo como objetivo “fornecer uma descrição
aprofundada e pormenorizada dos fenómenos estudados (acontecimentos, comportamentos,
conversas) e, comparando-os entre si, construir novas variáveis que permitam fazer emergir
modelos do conjunto dos dados já recolhidos, isto orientando sempre a recolha de novos
dados” (Boutin, Goyette, & Lessard-Hebert, 1990, p.153) .
Os instrumentos de natureza narrativa permitem um registo escrito dos dados numa
linguagem simples e usada na vida quotidiana. Tratando-se de uma observação participante, a
as notas de campo e dos diários de bordo são um instrumento prático de se utilizar durante a
investigação, pois
5
Instrumento concebido a partir de uma grelha de planeamento de sessão de mindfulness para o 1º Ciclo, no
Workshop Técnicas de Meditação e Relaxamento Infantil de Daniela Marto.
124
que se produzem durante um período de tempo ou retrospetivamente quando um
acontecimento ou um período de observação participante chega ao fim. (Boutin, Goyette,
& Lessard-Hebert, 1990, pp.154)
Os dados recolhidos serão analisados pelo método de análise de conteúdo, que consiste
numa “técnica de pesquisa que visa uma descrição do conteúdo manifesto de comunicação de
maneira objetiva, sistemática e quantitativa” (Sousa, 2005, p. 71).
Aplicação de
Prática Informal de
mindfulness
Aplicação da
Prática Formal de
mindfulness
Adoção de uma
atitude mindfulness
125
Figura 1- Bola expansora
126
novos, com características distintas do mindfulness aplicado nesta primeira fase mais
exploratória.
6
Símbolo de origem Hindu, associado ao equilíbrio, à harmonia e à eternidade. Representação geométrica
composta por círculos e outras formas com um centro em comum.
127
tem como objetivo preparar as crianças para a sessão, trazendo a atenção para o seu carpo e
para aquele momento.
Segue-se a fase de desenvolvimento que integra os exercícios de mindfulness que
compreendem as diversas técnicas a cima referidas e que podem recorrer à utilização de objetos
e outros materiais. Independentemente da técnica ou do objeto utilizado, esta fase respeita
sempre a dinâmica de alternância de momentos de concentração (convergência) com momentos
de dispersão (divergência), que podem, por exemplo, conter músicas com movimentos ou
outros exercícios mais dinâmicos como o ioga.
A última fase do processo é a fase de conclusão da sessão, que contém um exercício de
atenção plena por meio de um jogo, dinâmica ou outra atividade, como o “amigo da respiração”,
o “jogo do sino”, ou pinturas de mandalas. Todas as sessões terminam com uma conversa, ao
som de música relaxante, para que as crianças possam falar sobre o que mais gostaram de fazer
e como se sentiram. Este momento de partilha tem como objetivo ajudar a criança a ter
consciência do seu ritmo cardíaco bem como comunicar emoções, sentimento e sensações
físicas; trazem a consciência para o corpo e para respiração procurando refletir como se sentiam
antes da sessão e como se sentem depois da sessão.
A segunda parte da grelha da sessão de mindfulness, preenchida após a sessão, contém
um primeiro ponto relativo ao desenvolvimento da ação que descreve o desenrolar de toda a
sessão, seguido de uma reflexão sobre os aspetos mais relevantes da ação (O que aprendi sobre
o grupo/reflexão da sessão). Segue-se uma reflexão sobre próprio investigado (O que aprendi
sobre mim) com espaço para realçar aspetos do pessoais, como a postura do educador, a pré-
disposição, a postura corporal, as emoções e sensações, as dificuldades. Uma reflexão pessoal
do educador sobre como se sentiu na sua pele durante a sessão, com vista a melhor ou a trabalhar
aspetos intrapessoais como a ansiedade, o desconforto, ou a expectativa pessoal que coloca na
sessão, que podem ter influência na pré-disposição do grupo no próprio desempenho das
crianças. No final da grelha surge um campo destinado às melhorias a efetuar no plano se sessão
(Pontos a trabalhar no futuro), em que indicam aspetos a melhorar nas próximas sessões (curto
prazo) ou outras intenções a colocar em prática quando oportuno (médio prazo).
A primeira sessão de mindfulness (APÊNDICE G) é uma adaptação pessoal de uma
sessão-tipo de relaxamento para crianças do 1º ciclo do ensino básico7 (ANEXO B) que
7
Obtida no workshop de Técnicas de Relaxamento e Meditação Infantil de Daniela Marto.
128
contemplou essencialmente exercícios de respiração, com o objetivo de apresentar às crianças
formas diferentes de respirar.
A segunda sessão de mindfulness sofreu algumas alterações na sua estrutura
(APÊNDICE H), tendo sido incluído um momento inicial, de retorno à calma, com exercícios
de relaxamento, seguido da fase de desenvolvimento da sessão, que contempla momentos
alternados de respiração e movimento. Na dinâmica da D. Aranha foi meditar as crianças
acompanham a canção com gestos, levantam-se e sentam-se em postura de meditação (pernas
cruzadas ou flor de lótus). Na respiração em grupo as crianças dão as mãos em grupo ou em a
pares, levantando e descendo os braços enquanto respiram. As posturas de ioga surgem através
de uma história com várias personagens (animais) que as crianças imitam.
129
Esta sessão deixou de ser essencialmente de atenção plena, semelhando-se ligeiramente
a uma sessão de meditação ativa Ainda nesta sessão, as crianças pediram para respirar com a
Bola Expansora, que foi então introduzida na sessão seguinte.
A terceira sessão de mindfulness manteve a estrutura anterior (APÊNDICE I). Nesta
sessão, a fase inicial decorreu de forma mais tranquila e serena pois, entrando na sala, as
crianças descalçaram os seus sapatos, sentaram-se calmamente em roda, cruzando as pernas,
aguardando o inico da sessão sem esperar indicações. Realizaram as respirações com mais
concentração, mostrando-se mais descontraídos, rindo-se menos ou tentando fazer com que os
outros se rissem. Disseram que não queriam cantar a música da “Dona Aranha” e assenti.
Contrariamente a outras situações não fiquei constrangida por não mostrarem interesse na
minha proposta. Vi antes uma oportunidade de lhes permitir apropriarem-se das sessões, tomar
decisões e respeitarem a sua vontade interior. A sessão terminou com uma nova dinâmica de
atenção plena, tendo como recurso um sino pequeno, que as crianças deviam passar de mão em
mão, sem que sino tocasse.
Desempenharam a tarefa com muita concentração, mantendo-se quietos e em silêncio.
Algumas crianças fizeram o sino tocar, mas foram persistentes, pedindo para continuar o jogo
até que o sino desse uma volta completa e passasse por todos os jogadores sem tocar. Quando
o jogo terminou, pediriam para jogar novamente e introduzi uma variante deste jogo mais
complexa, em que as crianças circulam de pé sobre uma linha, evitando tocar o sino.
Desempenharam a tarefa com concentração, movimentando-se a passos muito lentos e contidos,
sem deixar tocar o sino.
A quarta e última sessão de mindfulness (APÊNDICE J).respeitou a estrutura de anterior
no que respeita à alternância de momentos de quietude e movimento, tendo também sido divida
em três fases (preparação, desenvolvimento e integração). Manteve-se a respiração com recurso
à bola expansora, que pela primeira vez, leva algumas crianças intuitivamente a fechar os olhos,
no seu momento de respirar com este objeto.
130
Figura 5 – Respiração com bola expansora e pernas cruzadas em flor de lótus
131
Figura 7 - Jogo da Teia
A adoção de uma atitude mindfulness foi uma estratégia transversal, aplicada durante o
período de estágio, paralelamente às duas fases de prática de mindfulness (informal e formal).
Tentei, diariamente, adotar as nove atitudes mindfulness (não julgar, ser paciente, ter uma mente
de principiante, ser confiante, não lutar, aceitar, deixar ir, ser grato, e ser generoso) e ajudar as
crianças a desenvolver também algumas destas atitudes. A estratégia encontrada para a
desenvolver os valores de uma atitude mindfulness, consistiu em intervir especificamente na
gestão de conflitos inter e intra-pessoais. Quer nos momentos de conflito entre as crianças ou
nas manifestações de sentimentos e moções negativas como a tristeza, o medo e a raiva, procurei
agir de acordo com as nove atitudes mindfulness, demonstrando-as pelo próprio exemplo, bem
como ajudar acriança a reconhecer e a desenvolver também algumas dessas nove atitudes. Para
o efeito, primeiramente comecei por permitir à criança expressar a sua autenticidade. Isto não
significa que lhe permiti fazer tudo o que quer, ou que fui demasiado permissiva. Significa que
não fiz julgamentos sobre as suas emoções, nem pedi que as reprimisse. Do mesmo modo,
também não julguei a criança pelo comportamento e reações mais agressivas.
Um exemplo prático desta forma de respeitar a autenticidade das crianças foi por
exemplo, o caso particular de uma menina de três anos que chorava todos os dias de manhã
após o momento de separação da mãe (APÊNDICE L). A criança chorava durante maior parte
do período da manhã, pedindo a chucha (que voltara a usar neste ano letivo), pedindo colo e
chamando pela mãe. Contrariei a forma habitual de resolver a situação, em que lhe era dito
“Chega! Não tens razão para chorar. A mãe foi trabalhar e já vem!”, “Mas tu agora és bebé?”,
“Se continuas a chorar vais para a sala dos bebés!, oferecendo uma outra forma de intervir
132
nestas situações. Não foi minha intenção reprimir o choro, ou fazê-la compreender que a mãe
voltava logo, no fim do dia. Em vez disso, explicava: “Eu sei que estás triste. E sei que ficas
mesmo muito triste quando não estás como a mãe. Está tudo bem. Nó estamos aqui e podemos
te ajudar. Se quiseres podes sentar-te ao pé de mim, ou no colo de um amigo.”. Com esta forma
de comunicar pretendo transmitir à menina que compreendia a tristeza dela e poder ensinar-lhe
algumas estratégias par lidar com aquele sentimento como, por exemplo, recebendo conforto
de alguém que ela goste ao sentar-se no colo de um amigo.
Outro exemplo de comunicação no âmbito de emoções, consistiu em ajudar a criança a
identificar e nomear emoções novas, como por exemplo, “sentir-se emocionado”(APÊNDICE
L). Num momento de pintura ao som de música clássica, percebendo que um menino estava
emocionado e triste ouvindo a melodia, conversámos em grupo sobre o que é “estar
emocionado”, partilhando as sensações que esse sentimento nos traz. A conversa estendeu-se
para as outra as emoções, como a raiva e sensações como o estar calmo em que as crianças
tentam explicar o seu significado através de explicações como “Sentimo-nos calmos e felizes;
“O coração bate devagarinho; É vontade de abraçar, de ser amigo. Vontade de amar e de estar
ao pé dos outros; É não sentir raiva” (Diário de bordo de 24 de Dezembro de 2017). A conversa
terminou com propostas e ideias das crianças de como agir ou o que fazer quando sentem raiva,
“Por música gentil que faz acalmar; Dar abraços para acalmar e não ficar tristes; Fazer um
desenhe que acalme”, são alguns dos exemplo dados pelas crianças.
Outra forma de adoção das atitudes de mindfulness, diz respeito às situações de conflito
entre as crianças, por serem mais desafiantes e exigirem um maior controlo das minhas próprias
emoções. Das nove atitudes, particularmente o não-julgamento, a paciência, mente de
principiante e a aceitação foram as que mais pratiquei e tentei ajudar a criança a desenvolver.
Os conflitos entre crianças que resultam em agressão e choro da parte agredida exigiram maior
capacidade de controlo emocional da minha parte, para não reagir de forma impulsiva, gritando
ou castigando as crianças que agridem frequentemente as outras. O conflito entre duas meninas,
em que uma dá um pontapé forte nas costas da outra, foi um exemplo destas situações
(APÊNDICE M). Nesta situação procurei respirar fundo antes de agir, para não transmitir a
zanga/raiva que senti perante as lágrimas e os gritos de dor da criança agredida, paciência em
perceber que aquele situação não poderia ser resolvida naquele momento (na roda, na canção
do Bom Dia), mente de principiante, num esforço significativo em não julgar a situação e a
criança agressora pela expectativa que já tenho da mesma. Aceitação em compreender que
133
aquele comportamento é o que é: o pontapé foi disferido, a outra criança está magoada e não
vou alterar esse momento. Este momento de respiração concedeu-me tempo e espaço para
perceber as minhas emoções perante a situação observada e para escolher a resposta a dar. Optei
por consolar a menina agredida massajando-lhe as costas na zona ferida e informar as duas
crianças. “Agora não é o momento, mas a seguir precisamos de conversar sobre isto.”. Após
o momento de roda no tapete, tive uma conversa em particular com a menina agressora, em que
juntas procuramos entender o que motivou aquela reação e ajudá-la a deflectir no impacto que
teve na outra criança, para que ele decida qual a melhor forma de resolver. Desta conversa
resultou um pedido de desculpa à criança agredida, acompanhado de uma explicação do que
levou a primeira a dar o pontapé. O resultado foi um abraço espontâneo da criança agredida.
Numa outra situação de conflito, enquanto duas crianças brincavam na casinha e uma
empurrou a outra, impedindo-a de brincar, agi com um intuído de promover o desenvolvimento
da capacidade de descentralização, do saber colocar-se “no lugar” do outro e ajudar a criança a
comunicar as suas emoções (APÊNDICE N). Neste exemplo prático em que a criança excluída
se dirige a mim para se queixar, ouvi-a primeiro e sem julgar, a atitude da outra criança,
perguntei-lhe apenas como se sentia e porquê. De seguida, incentivei a criança chorosa a dizer
o que sentiu à outra criança. A criança não quis, e disse “Diz tu, Sara”. Expliquei que podia
acompanhá-la, que ficaria ao lado dela, e assim consegui, entre lágrimas, explicar que estava
triste e que também queria brincar. A outra criança observou-a com atenção, enquanto
explicava, mas não se retificou. Mais tarde, enquanto se preparavam para dormir, pediu
desculpa e deu um abraço à amiga.
Estas situações foram muito frequentes durante o desenvolvimento deste processo e
foram sempre aproveitadas para transmitir um valor de responsabilização pessoal pelo o que
provocamos (emoções e sentimentos) nos outros, mesmo que não sejamos capazes de resolver
a situação na altura. Um outro exemplo muito prático desta capacidade de refletir sobre os
impactos das nossas ações e da responsabilidade pessoal na resolução dos conflitos, foi um
desentendimento entre duas grandes amigas (APÊNDICE O). Nesta situação procurei ajudar a
criança, através da uma atitude mindfulness a lidar com o sentimento do orgulho e do
arrependimento. Neste caso específico, a criança que tinha magoado a outra recusou-se a falar
comigo, cruzando os braços e dirigindo o olhar para o chão. Depois de ouvir a explicação da
menina magoada, pareceu-me que perante aquela situação, e tendo já algum conhecimento da
personalidade da criança, estaria envergonhada. Assim, apenas dei-lhe um conselho, explicando
134
que percebia o que ela estava a sentir, e que eu também já tinha passado por isso. Expliquei
também que o importante é saber retratar-se com a pessoa e não deixá-la magoada, mesmo que
necessitemos de tempo para o fazer. A criança manteve-se de olhos voltados para o chão e
almoçou sem dizer uma palavra, porém, na fila para a escovagem de dentes, pediu desculpas à
amiga e abraçou-a.
135
3.5 - Avaliação do processo de implementação do programa de mindfullnes
136
Comprovei também que o momento após o recreio é pertinente, na medida em
que permite à criança retornar à calma e diminuir o ritmo cardíaco. Por decorrer na hora
do repouso das crianças mais pequenas, as sessões contaram com o máximo de quinze
elementos, um número que se revelou ideal para este tipo de prática.
Relativamente à natureza da sessão, enumero alguns elementos que considerei
fundamental garantir em todas as sessões: as crianças devem usar roupas confortáveis e
meias quentes para poderem praticar descalças; o pavimento deve ser em linóleo ou conter
tapetes de ioga para que seja confortável, deve ser um local silencioso ou com muito
pouco ruído, para não levar o estado de consciência e de presença para outro lado que não
aquele.
A sessão deve iniciar-se com um momento de relaxamento para trazer a atenção
ao corpo e ao espaço, atenuando a transição do recreio para a sessão. As dinâmicas e os
exercícios podem variar de sessão para sessão, mas devem respeitar uma alternância de
momentos de concentração, como as respirações, e de movimento, com momentos de
movimento e deslocamento, como por exemplo, as posturas de ioga ou a musica da D.
Aranha. O final da sessão deve conter um momento de atenção plena ao som de música
serena, como por exemplo, pintura de mandalas ou o jogo da teia.
Relativamente às propostas de exercícios, pude verificar que as cainças sentem
inicialmente algum desconforto na sua execução. Os risos e atitudes exageradas
observadas nas primeiras sessões parecem demonstrar que sentem alguma preocupação
em “fazer – mal” o exercício, revelando assim, dificuldade em abstrair-se do exterior. As
situações em que as crianças faziam gesto e brincadeiras para provocar o riso das outras,
exigiram um esforço de não recriminação desses comportamentos. Em momentos de
exposição como este é importante não recriminar a criança para que se sinta
progressivamente mais confortável, ou seja, instalar um clima de confiança e aceitação
para que, progressivamente, abandonem esta necessidade. Este comportamento foi
deixando de existir no decorrer das sessões.
A periodicidade das sessões, o fato de decorrerem sempre no mesmo horário e
obedecerem a uma estrutura fixa, tornou a sessão de mindfulness espectável e ajudou as
crianças a apropriarem-se e conhecerem as regras, procedimentos e o desempenho
esperado nas diferentes fases. Por exemplo, após a segunda sessão, sem necessitar de
indicações as crianças entravam na sala, descalçavam-se, sentavam-se em roda no tapete,
colocavam as pernas em flor de lótus e aguardavam por mim. Com a evolução da
investigação, pude também verificar que sentiam-se mais confortáveis com os exercícios
137
que realizavam já com maior capacidade de concentração, conseguindo autonomamente
fechar os olhos enquanto respiravam.
Observei também situações em que as crianças demonstraram mais empatia e
vontade de se ligar ao outro, como por exemplo, na situação do amigo da respiração
(APÊNDICE I) em que duas crianças, de salas diferentes e que pouco convivem, de olhos
fechados, foram lentamente aproximando-se até darem a mão, permanecendo nesta
posição durante a execução do exercício. Ainda neste exercício verifiquei também a
dificuldade que as crianças têm em distinguir a respiração abdominal da diafragmática,
conseguindo executar apenas a segunda.
10Inspirado nos valores definidos pela autora Mikaela Oven no livro Educar com Mindfulness (2015) para o
exercício de uma parentalidade consciente.
138
educadora, significa estar focada precisamente em cada momento e não noutros que
possam vir a seguir ou no que possa vir a acontecer. Significa também lidar com situações
imprevistas com a atenção que requerem, sem o sentimento de estar a perder tempo, ou
quebrar a rotina. Um exemplo desta capacidade de presença, foi a gestão de conflito
(APÊNDICE L) que decorreu na fila do almoço. Este é uma situação muito frequente de
situações que correm na transição de momentos da rotina, em que não há muito tempo
para resolver a situação tendo verificado que a solução encontrada era simples e
perentória, solicitando a criança que pedisse desculpa a outra ou que lhe desse um abraço.
Nesta situação, a atitude de presença foi praticada nem medida em que o momento foi
aproveitado coma uma oportunidade para ajudar as crianças a resolverem os seus
conflitos e a reconhecerem sentimentos como a vergonha e o arrependimento.
3.6.2 - Assumir o papel de detetive ativo como parte fundamental do processo educativo
Durante o dia no jardim-de-infância percebi que existem muitas situações que nos
levam a julgar os comportamentos das crianças, intervindo sobre as suas atitudes e ações.
Durante a prática de ensino supervisionada, observei situações da intervenção sobre os
comportamentos das crianças em que os “maus comportamentos” eram rapidamente
resolvidos com pedidos de desculpas forçados ou em caso de choro, indicando a supressão
do mesmo ao abrigo da falta de motivos para a criança chorar. Percebi que é importante
refletir nas nossas convicções com as ideias comportamentalistas e perceber de que modo
estão enraizadas na nossa sociedade, uma vez que tendemos para educar para um
comportamento dito “correto”. Para tal, há-que procurar primeiro o “porquê”. Isto
significa mudar o foco da nossa atenção, colocando a energia principal no entendimento
do comportamento.
A situação de conflito entre duas crianças em que uma agride a outra por esta
pedir-lhe que sente na roda (APÊNDICE L), é um exemplo da importância de desenvolver
a capacidade de procurar primeiro a necessidade que possa ter levado à ação. Esta situação
deixou-me irritada e zangada, prestes a reagir de forma mais autoritária e repressiva. Num
primeiro pensamento julguei a criança e o seu comportamento, rotulando-a de agressiva
e exagerada na reação. Porém, respirei fundo e tentei perceber o que poderia te motivado
realmente aquele comportamento, considerando novamente uma reação exagerada. Neste
curto momento entre a ação da criança e a minha resposta, percebi que a criança agressora
chega à escola sempre atrasada, no momento da roda inicial do dia, fazendo com que o
139
momento tenha que ser interrompido, e atenção seja direcionada para si. Neste momento
questionei-me se aquela criança não teria um sentimento negativo perante o facto de
chegar todos os dias atrasada. Encontrar aquela que me parecia ser a necessidade na
origem do pontapé, retirou o julgamento inicial que fiz relativamente ao comportamento
e alertou-me para a urgência de agir perante aquela necessidade, resultando numa
conversa entre mim e a criança relativamente a esse sentimento, e nas formas não-
agressivas de reagir quando sente essas emoções.
140
me que aquele menino adora a Porquinha Peppa, a personagem principal de uns desenhos
animados que gosta muito de saltar nas poças. Então explico:
Eu: Fizeste como a porquinha Peppa, não foi?
F: Sim, ela salta nas poças.
Eu: Pois é, eu sei e é muito divertido. Mas sabes, a porquinha Peppa tem galochas
e nós estamos de ténis e não podemos molhá-los porque não temos outros para trocar.
Mas podemos combinar um dia para trazermos galochas e podemos todos saltar nas
poças. Pode ser?
Todos assentiram e contornaram a poça. Conversei com a criança sobre o porquê
de não querer que saltassem na poça, sem criticar diretamente o comportamento da
criança, compreendendo que, “ (…) só a autenticidade nos permite manifestar as nossas
necessidades, os nossos limites e o que é realmente importante para nós.” (Oven, 2015,
p. 35).
Acredito que o educador coloca tudo o que tem no momento em que exerce o ato
de educar o que significa trazer à luz o melhor e o menos bom que há em nós. Foram
vários os momentos em que me senti dominada pelas minhas emoções. O cansaço, a
insegurança, o receio de falhar ganharam proporções altas aumentando o meu nível de
irritabilidade e traduzindo-se consequentemente na dificuldade em lidar com as emoções
das próprias crianças. Essa constatação exigiu de mim um esforço significativo em
compreender e gerir as minhas próprias emoções, o que me levou a refletir sobre as
expectativas que estava a colocar em cada dia, sobre mim e sobre as crianças.
141
A primeira atitude a ter perante as minhas emoções, foi perceber o que eram - o
resultado da expectativa que colocava nos acontecimentos. Percebi que a expectativa
sustentava-se nos objetivos que defini e que eram constantemente avaliados pela minha
mente, antes, durante e após o processo.
Ter objetivos é diferente de ter intenções, pois um objetivo corresponde a uma
meta que queremos atingir e para isso precisamos de verificar, de tempos a tempos, se
nos estamos a aproximar. Uma intenção é algo mais vago e menos concreto que um
objetivo, mas que contém um valor.
Quando comecei a distinguir os objetivos das intenções, foquei-me mais no
processo em si, do que no resultado final. Percebi que o meu trabalho como educadora é
um caminho, e não uma meta à qual eu e as crianças temos que chegar. Quando conseguir
distinguir os meus objetivos das minhas intenções, reduzi as minhas expectativas e
consequentemente o nível de tensão e pressão.
Estar consciente das minhas intenções permitiu-me valorizar mais o processo,
constatar que “as intenções devem servir para nos guiar, orientar e fazer voltar ao
caminho quando sentimos que nos estamos a afastar muito dos nossos valores” (Sanches,
2016, p. 49).
Ao conseguir lidar melhor com as minhas emoções, comecei a lidar melhor com
as emoções das crianças e a perceber a responsabilidade do educador neste campo,
ajudando-me a gerir melhor os conflitos das crianças, de forma mais consciente.
142
4 - Considerações Finais
143
Quanto ao objetivo de definir o perfil do educador mindfulness, através das
experiências vividas com as crianças em diversas situações e do recurso a bibliografia
específica (Mikaela Oven, 2015), reforço um conjunto de valores e atitudes que o
educador minfulness deve desenvolver:
1- estar 100% presente, desligando o modo de “piloto automático”, focando-se
unicamente no momento presente, vivendo cada momento como se fosse o
primeiro e o último;
2- Assumir o papel de detetive ativo como parte fundamental do processo educativo
através da procura das necessidades que motivam os comportamentos das crianças
ou manifestações de sentimentos mais difíceis como a tristeza, a raiva, ou o medo,
3- Praticar o respeito pela integridade, tendo presente que a integridade corresponde
aos limites e necessidades psicológicas. A integridade da criança é a soma dos
seus pensamentos, dos valores e emoções, independentemente dos
comportamentos menos desejáveis que esta manifesta;
4- Praticar a autenticidade, dando espaço para manifestação de “bons” e “maus”
comportamentos permitindo à criança viver momentos de harmonia e de conflito;
5 - Lidar com as próprias emoções, observando a minhas emoções, sentimentos
evitando que controlem de forma menos positiva as minhas ações, reações e
expectativas.
6 – Distinguir objetivos de intenções, colocando o foco principal nas intenções e não
nos objetivos.
O último objetivo da investigação consistia em construir um plano mindfulness
para crianças dos três aos cinco anos concretizou-se de uma forma distinta da inicialmente
pensada. Devido ao tempo limitado em que decorreu a investigação, este último objetivo
não correspondeu propriamente a um plano, mas a um conjunto de ações que poderão,
numa perspetiva futura vir a transformar-se num formato de programa de mindfulness a
desenvolver por educadores de infância.
Estas ações desenvolveram-se em duas fases distintas: uma primeira fase de
prática informal de mindfulness com o objetivo de familiarizar as crianças com alguns
dos exercícios e com o conceito de atenção plena de forma prazerosa e integrada nas suas
atividades diárias, cujo resultados indicaram tratar-se de uma boa estratégia de iniciação
ao mindfulness. seguida de uma segunda fase, de prática de mindfulness formal, através
de sessões, mais longas e estruturadas. O momento em que se introduz a prática de
mindfulness formal é definido pelo educador, quando percebe que as crianças já estão
144
familiarizadas com alguns exercícios, sentem prazer no seu desempenho, e aumentaram
a capacidade de manter o foco e de estar em “atenção plena”.
Tendo em conta que a educação pré-escolar engloba a faixa etária dos três aos
cinco anos de idade e que a capacidade de concentração, atenção e reconhecimento de
emoções aumenta conforme a idade da criança, considero que a prática de mindfulness
formal, através de sessões mais longas, é mais indicada para as crianças de cinco anos,
sendo a prática de mindfulness informal mais indicada para as crianças mais pequenas de
três e quatro anos.
Apesar do cumprimento da maioria dos objetivos, saliento algumas dificuldades
sentidas e fatores que poderiam contribuir de forma ainda mais positiva para o
desenvolvimento da investigação. A primeira dificuldade diz respeito ao período de
tempo relativamente curto destinado à implementação do programa e o facto de esta ser
desenvolvida em simultâneo com a prática de ensino supervisionada. Tanto a investigação
como a PES são dois momentos cruciais e trabalhosos na última etapa da formação de
professores e embora tivesse sido possível integrar o projeto de intervenção no projeto de
estágio, gostaria de ter tido oportunidade de me dedicar exclusivamente a cada um, em
momentos diferentes. Relativamente ao programa implementado, gostaria que tivesse
sido desenvolvido por um período de tempo mais alargado, de forma a poder explorar um
pouco mais a prática de mindfulness formal que tendo sido a última fase a desenvolver,
permitiu-me apenas conceber quatro sessões, deixando algumas técnicas e propostas de
exercícios por experimentar. Gostaria também de poder observar os resultados ou os
benefícios que acredito que o mindfulness possa ter no bem-estar das crianças, no
desenvolvimento emocional e nas relações de afeto e empatia com os outros, que não
foram possíveis de observar no período em que decorreu a investigação.
Apesar das limitações e das dificuldades, considero que o tema desta investigação
pode trazer benefícios para a Educação, contribuindo para a evolução do sistema
educativo. Um sistema educativo que preconize o desenvolvimento natural e holístico da
criança, ajudando-a tornar-se mais consciente das suas emoções, dos seus pensamentos,
para que seja mais confiante, mais positiva, menos insegura permitirá tornar a escola um
local onde, por meio do exemplo e da experiência, as pessoas se tornem mais humanas,
mais centradas nos valores da vida. Um local de aprender a “fazer” e “conhecer” mas
onde também se aprende a “parar”, a apreciar o silêncio e o vazio, a abrandar o ritmo, e
a observar as emoções e os pensamentos.
145
Sendo o relatório final a última etapa do Mestrado em Educação Pré-Escolar, esta
investigação foi importante para a construção do meu próprio perfil de educadora,
permitindo-me conjugar as teorias e os modelos pedagógicos aprendidos ao longo da
formação profissional, com as minhas as minhas próprias convicções relativamente ao
sistema do ensino, fruto da minha da experiência como estudante desde os 4 aos 21 anos
de idade. Através desta investigação pude experimentar aquilo que acredito ser também
o papel de um professor/educador: um orientador emocional. O mindfulness assenta em
valores como a gentiliza, empatia, otimismo e a paciência, instrumentos que podem
ajudar cada ser humano a tornar-se uma pessoa emocionalmente mais saudável,
permitindo ir um pouco mais longe no processo evolutivo da educação emocional e do
desenvolvimento holístico da criança. Para que esta mudança de paradigma de educação
aconteça é preciso que o adulto consiga ser uma espécie de orientador emocional,
ajudando as crianças a desenvolver a autoconsciência emocional. Como futura educadora
que se preocupa particularmente com as questões do desenvolvimento pessoal considero
importante aprender a incentivar as crianças à honestidade dos sentimentos, mantendo
bem definidos os limites de comportamento. Para que tal aconteça, devo oferecer às
crianças estratégias para melhor expressarem os seus sentimentos, em vez de tentar acabar
com eles, reprimindo-os. Ajudar as crianças de hoje a tornarem-se adultos mais
empáticos, capazes de sentir o que a outra pessoa está a sentir, a estabelecer ligações
saudáveis com os outros e de expressar as suas emoções.
Termino manifestando o meu desejo de um dia poder ver o mindfulness como um
instrumento ao serviço do ensino, não só incluído na formação básica de professores e
educadores, mas quem sabe também incluído do no próprio currículo desde o pré-escolar
estendendo-se a todo o ensino básico uma prática integrante do dia-a-dia das crianças e
jovens e não um programa exterior ao qual apenas algumas escolas e instituições tem
acesso, através de programas pontuais e de curta duração.
146
5. Bibliografia
Davidson, R., & Goleman, D. (2018) Traços Alterados. Temas e Debate, Circulo de
Leitores.
147
Kabat–Zinn, J. (2013) Full Catastrophe Living: Using the Wisdom of Your Body
and Mind to Face Stress, Pain, and Illness. Delta.
148
149
ANEXOS
150
Anexo A -Modelo de planificação de uma sessão de mindfulness
Tipo de sessão
(regular/individual/pontual)
Elementos
(caracterização do grupo/individual)
Ambiente e Envolvência
(caracterização do espaço)
151
Anexo B - Grelha de Momento de Relaxamento
1º PARTE - FOCO
• Música calma e tranquila (opcional)
• Descalços ou de meias (opcional)
• Posição de flor de lótus (se possível), pernas cruzadas ou de joelhos
• Costas direitas
• De olhos abertos até que progressivamente se sintam confortáveis em fechá-los
2ª PARTE – RESPIRAÇÕES E RELAXAMENTO
1- Respiração progressiva
Inspira em 3-2-1 Expira em 6-5-4-3-2-1 (Repetir 3 vezes).
3- Borboleta
Colocar as mãos nos ombros e movimentar para baixo e para cima ou em
movimentos circulares (30/40 segundos).
4- Cascata
Fletir os braços (< >) à altura do queixo. Inspirar profundamente pelo nariz e
em simultâneo fazer o movimento de braços para a frente. De seguida, repetir
mesmo movimento para trás expirando com o som “sheeeeeeeee” (repetir no
máximo 5 vezes).
5- Abelha
Tapar cada ouvido com o dedo indicador. Inspirar profundamente. Ao seu
ritmo, expirar com o som “zzzzzzzzzzz” (repetir no máximo 5 vezes).
3ª PARTE – FINALIZAR
152
APÊNDICES
153
APÊNDICE A – Grelha de planificação / reflexão de uma sessão de
mindfulness
Sessão de Mindfulness
Data:
Tipo de Sessão
Caracterização do
grupo
Momento do dia
Intenções
Técnicas
Utensílios/objetos
Processo
Aquisições
Desenvolvimento da
ação
O que eu aprendi
sobre o grupo
O que eu senti/
aprendi sobre mim
Pontos a trabalhar no
futuro
154
APÊNDICE B – Diário de bordo de 18 de dezembro de 2017
155
APÊNDICE C – Diário de bordo de 13 de dezembro de 2018
“Faltando cerca de 10 minutos para a merenda, aproveitei o ambiente sereno que ainda
existia e decidi realizar exercícios de respiração e atenção plena, com ajuda de um objeto.
Exemplifiquei a posição meditativa “Flor de Lotus” e coloquei as mãos em “conchinha” sobre
o colo. Imitaram-me, colocando as pernas na mesma posição. Fecharam os olhos e respiram
fundo três vezes, conforme pedi. Introduzi a bola expansora. Cumpriram todas as instruções
da dinâmica, aguardando calmamente a sua vez e acompanhando as respirações dos colegas.”
156
APÊNDICE D - Diário de bordo de 14 de dezembro de 2017
157
APÊNDICE E – Planificação de Atividade
Ter prazer em explorar e Observar, tocar, cheirar e 1. Conversa sobre o trabalho Elementos da Observação Naturalista.
brincar com materiais brincar com mais do que 2 previamente realizado acerca natureza:
naturais. elementos naturais. do artista Frans Krajcberg - paus, pedras, Registos no Diário de
areia, folhas Bordo.
Utilizar um ou mais 2. Conversa sobre mandalas secas, caruma,
Realizar produções artística elementos para a construção - Conhecimentos prévios; pinhas e bolotas. Registo Fotográfico
de forma livre e criativa, da sua mandala. - Demonstração de exemplos;
utilizando elementos - Significado e técnica de Imagens de
naturais. construção de mandalas mandalas
pintadas e em 3D
Manter-se calmo, sereno e 3. Construção de mandalas
Permanecer em estado de empenhado na construção da 3D no recreio Música
relaxamento atenção plena. sua mandala. Dispor os materias no chão “Peaceful
em sacos e caixas abertas Retreat”
-Cada criança escolhe um (Spotify).
local, com espaço para estar à
vontade onde constrói a sua Coluna de som
mandala. portátil.
158
Reflexão:
159
APÊNDICE F - Reflexão de dia 23 de novembro de 2017
Hoje fizemos as mandalas no recreio. As crianças aguardaram ansiosas por este dia
perguntado diariamente “Sara, é hoje que vamos fazer as mandalas lá fora?”, demonstrando
a satisfação que sentiram naquela tarefa.
As crianças sabiam o que fazer. Apenas reforcei a importância de se afastarem
suficientemente entre si para poderem construir as mandalas e circularem livremente sem
tocarem na construção dos outros. Alguns iniciaram sozinhos, outros em pares e no final a
maioria tinha- se juntado a outras crianças, formado um grupo maior. Foi interessante
observar esta dinâmica de interação. Não tiveram qualquer orientação nem foi necessário
chamar a atenção de ninguém. De forma educada e respeitadora convidavam os amigos para
se juntarem a si ou perguntavam se podiam juntar-se ao grupo. No grupo, organizavam-se e
distribuíam tarefas: uns traziam as pedras, outros as folhas, outros compunham e alguém
orientava. Partilharam os materiais. Quando terminavam, levantavam-se para contemplar as
composições dos outros grupos. Elogiavam e perguntava o significado das construções, e os
criadores partilhavam orgulhosamente a sua ideia. Foi um ambiente harmonioso, sem a
habitual competitividade, comparação, e desconforto por ser imitado ou copiado. Foi um
momento de partilha, de convívio amigável, de entreajuda e de introspeção.
Mais importante, foi uma oportunidade de ser criativo, não de forma condicionada,
como nos trabalhos em que os materiais já estão previamente definidos, num molde já
preparado e igual para todos; criatividade no sentido de liberdade e autenticidade, pela
oportunidade de explorar, experimentar, optar e criar.
Os objetivos para esta atividade foram cumpridos, no entanto, gostaria de ter a
oportunidade de repeti-la na mata, fora da escola, para que pudessem ser as crianças a recolher
os próprios elementos e que construíssem as suas mandalas na própria natureza.
160
APÊNDICE G – 1ª Sessão de Mindfulness
Data: 12/01/2018
Técnicas • Respiração
• Alongamento
Materiais Nenhum
Processo 1ª Fase (Preparação)
Descalços, sentar em flor de lótus ou de pernas cruzadas, respirando
calmamente ao som de música relaxante.
2º Fase (Desenvolvimento)
1-Respiração progressiva
Inspira em 3-2-1 Expira em 6-5-4-3-2-1 (Repetir 3 vezes).
2- Polegares no trago da orelha
Fletir os braços (< >). Colocar o polegar no trago da orelha e massajar
- calmamente. Os restantes dedos apoiam na cabeça, massajando
também a testa e cabeça. (30/40 segundos).
3- Borboleta
Colocar as mãos nos ombros e movimentar para baixo e para cima ou
em movimentos circulares (30/40 segundos).
4-Cascata
Fletir os braços (< >) à altura do queixo. Inspirar profundamente pelo
nariz e em simultâneo fazer o movimento de braços para a frente. De
seguida, repetir mesmo movimento para trás expirando com o som
“sheeeeeeeee” (repetir no máximo 5 vezes).
5-Abelha
Tapar cada ouvido com o dedo indicador. Inspirar profundamente. Ao
seu ritmo, expirar com o som “zzzzzzzzzzz” (repetir no máximo 5 vezes).
6-Respirar com conchinha
Colocar as mãos em conchinha. Respirar fundo a seu ritmo. Focar a
atenção na respiração (começar por cinco segundos e aumentar o tempo
progressivamente).
161
exclamaram “ohhh”. Estavam agitados e conversadores e levaram muito
tempo a sossegar para iniciar os exercícios de respiração.
O que eu aprendi As crianças vêm do recreio com um nível de agitação muito grande e
sobre o têm dificuldade em abrandar o rimo cardíaco. Iniciar a sessão com
grupo/Reflexão da respirações é uma paragem muito brusca no ritmo da criança.
sessão
A bola expansora é o recurso favorito para a respiração. É um
instrumento que permite respirar mantendo um foco num objeto
dinâmico, ajudando a criança a concentrar-se e que gostam de usar
sempre.
162
A respiração cascata resultou bem. Acompanhar a respiração com um
movimento é uma estratégia eficaz na concentração e no controlo da
velocidade da expiração. Contribuiu também para o estado de atenção
plena, que traz o foco à respiração.
O que eu senti/ A linguagem corporal é suficiente para comunicar algo que é espectável
aprendi sobre mim para as crianças e deve ser privilegiada. Comunicar com o corpo sem
recorrer à linguagem oral é uma boa forma de promover o respeito pelo
silêncio.
Não recriminar as reações das crianças para que se sintam cada vez mais
confortáveis. Instalar um clima de aceitação para que progressivamente
as crianças abandonem a necessidade de aprovação ou o medo do
julgamento dos pares.
163
APÊNDICE H – 2ª Sessão de Mindfulness
Data: 15/01/20148
Técnicas • Alongamentos
• Respirações
• Posturas de ioga
• Mandalas
2º Fase (Desenvolvimento)
“Dona Aranha foi meditar”:
Cantar a Musica “Dona Aranha foi meditar”, acompanhando os
gestos ( namastê, e flor de lótus).
Respiração a pares (3 ou mais vezes):
-Dois a dois, frente a frente, cruzar as pernas na posição de flor
de lótus, segurar as mãos do amigo;
-Sem largar, subir e descer os braços inspirando (quando sobe)
e expirando (quando desce);
164
Bola Expansora
Posturas de Ioga
Posturas de ioga: Borboleta / Montanha / Árvore / Cobra / Gato.
3ª Fase (Integração)
Pintar uma mandala ao som de música relaxante
165
No final deitaram-se no chão, confortáveis a pintar uma
mandala. Os desempenhos foram diferentes. A única criança
que conseguiu permanecer em estado de atenção plena foi
amenina com alguns problemas emocionais e baixa autoestima
que escolheu um cantinho do tapete, afastada dos amigos.
Pintou a sua mandala sem tirar os olhos da folha, apenas
deslocava-se ao centro do tapete para trocar de lápis, o que fazia
sem se distrair e sem falar. As outras crianças pintaram também
as suas mandalas, mas conversaram enquanto o faziam,
explicavam o que estavam a pintar e espreitavam as mandalas
dos colegas.
O que eu senti/ Que fico nervosa quando as crianças demoram mais a retornar
aprendi sobre mim à calma e a brandarem o ritmo.
Crio uma grande expectativa relativamente à sessão e começo
a julgar e a criticar o meu desempenho durante o processo.
166
Mesmo não demonstrando, fico impaciente relativamente aos
comportamentos das crianças que não correspondem, por
momentos, ao que intencionei.
167
APÊNDICE I– 3ª Sessão de Mindfulness
Data: 20/01/2018
Técnicas • Alongamentos
• Respiração
• Atenção Plena
1ª Fase( Preparação)
Processo -Sentar em roda, com pernas esticadas, unindo os pés no centro da
roda.
-Agarrar os pés, sem dobrar as pernas;
-Segurar os joelhos, mantendo os pés no ar (começar com um de
cada vez e terminar segurando os dois);
- Fazer a posição borboleta com as pernas
- Espreguiçar
2ª Fase (Desenvolvimento)
Respiração Cascata
Fletir os braços (< >) à altura do queixo. Inspirar profundamente
pelo nariz e em simultâneo fazer o movimento de braços para a
frente. De seguida, repetir mesmo movimento para trás expirando
com o som “sheeeeeeeee” (repetir no máximo 5 vezes).
168
3ª Fase (Integração)
Jogo do Sino:
1ª Variante– Sentados em roda, passam o sino de mão em mão,
sem tocar a campainha
2ª Variante– De pé, circular à volta do tapete, sem fazer tocar o
sino.
169
acostumados às dinâmicas, não necessitando de muito orientação
para se prepararem.
Começam a focar-se
e mais na realização do próprio exercício do que em outros
aspetos. Não tecem comentários sobre o seu desempenho (“Não
consigo”, “Vou cair”, “olhem para mim”) nem tentam provocar
o riso nos colegas.
170
APÊNDICE J – 4ª Sessão de Mindfulness
Data: 22/01/2018
Tipo de Sessão Planeada
Caracterização 15 crianças de 5 anos
do grupo
Novelo de lã
Processo 1ªFase( Preparação)
-Sentar em roda, com pernas esticadas, unindo os pés no centro da
roda.
-Agarrar os pés, sem dobrar as pernas;
-Segurar os joelhos, mantendo os pés no ar (começar com um de cada
vez e terminar segurando os dois);
- Fazer a posição borboleta com as pernas
- Espreguiçar
2ª Fase (Desenvolvimento)
Bola expansora
- Em roda, pernas em flor de lótus utilizar a bola para respirar;
- Inspirar quando abre e expirar quando fecha. Fazer duas respirações
e passar ao amigo;
- Grupo acompanha as respirações dos colegas.
Amigo da Respiração
- Deitar de costas no chão e colocar o peluche sobre a barriga.
- Respirar lenta e profundamente, observando o peluche a subir
quando inspira e a descer quando expira
3ª Fase (Integração)
Dinâmica da Teia
171
- Em roda, à vez, cada criança segura numa parte da lã e passa o
restante novelo a outro menino.
- Cada um segura a sua parte da lã, formando uma teia.
172
grupo/ Reflexão entrega. Permite-nos desligar-nos de todos os estímulos exteriores e
da Sessão levara nossa atenção o mundo Interior. Os inicias risos de vergonha e
desconforto deram lugar a uma integração do momento e maior
entrega à experiencia.
O que eu senti/ Sinto-me cada vez mais tranquila e confiante nas sessões. Permito-me
aprendi sobre relaxar cada vez mais. Não tenho tantas expectativas sobre o
mim desenvolvimento da ação, entregando-me mais à experiencia.
Pontos a Desafiar as crianças para que tentem “encher e esvaziar a barriga” nas
trabalhar no suas respirações, promovendo respiração abdominal na vez da
futuro respiração diafragmática.
Numa fase mais adiante gostaria de utilizar esta dinâmica com uma
outra intenção, transforma o jogo numa teia de gratidão. seria utilizada
para finalizar a sessão de mindfulness. Nesta variante, cada elemento
“agradece” por algo de bom (uma situação agradável, algo /alguém
que goste, etc.), antes de passar o novelo, tecendo a teia da gratidão.
173
APÊNDICE L – Diário de Bordo do dia 04 de Dezembro de 2018
174
Explico que está emocionado e que é algo que também me acontece a mim. Que existem
músicas tão bonitas que parecem fazer doer o coração e temos vontade de chorar. Encosta-se
a mim e chora por uns segundos. Abraço-o explicando: “Está tudo bem, Z. podemos chorar
quando estamos emocionados”. Enxuga as lágrimas para retornar à mesa. Pergunto se quer
que tire a música. Responde que não, e continua o seu desenho.
Aproveito o momento de serenidade e introspeção para conversar sobre as sensações
e emoções provocadas pela música.
Eu: “O que acham desta música?”
Z: “É bonita”
L: “É uma música calma”
Y: “Olha, é assim…..” (faz um movimento lento com as mãos e os braços num
espécie de onda)
Eu: “Como se sentem quando ouvem a música?”
Sofia: “Sentimo-nos calmos e felizes”
Yara: “ Calmo. O coração bate devagarinho”
Eu: “O que é estar calmo?
S: “Vontade de abraçar, de ser amigo. Vontade de amar. De estar ao pé dos outros”
Y: “É não sentir raiva”
Eu: “O que é sentir raiva”?
Y: “Raiva é vontade de bater em alguém ou deitar a raiva aos outros”.
Conversámos um pouco sobre esta emoção e concluímos que todos temos momentos
em que sentimos raiva. Explico que também sinto, e dou exemplos práticos. As crianças dão
também alguns exemplos desses momentos. Discutimos algumas ideias e estratégias de como
libertar a raiva ou ajudar um amigo quando vimos que está com raiva. Surgiram as seguintes
propostas:
Y: “Pôr uma música gentil que faz acalmar”.
S: “Dar abraços para acalmar e não ficar tristes”.
Z: “Dar beijinhos”.
L: “Animá-lo”.
Y: “Fazer um desenho que acalme”
175
APÊNDICE M – Diário de Bordo do dia 27 de Dezembro de 2018
176
V: Mas eu não gostei. (Repete num tom de lamuria enquanto remexe no meu
cabelo).
Eu: V, eu percebo que tu ficas muito irritada, e quando estamos irritados temos
vontade de bater em alguém. Mas quando sentires essa raiva tenta respirar, como
fazemos com a nossa bola e dizer para ti: eu estou zangada, mas não posso bater.
V: Mas ela mexeu no meu rabo e eu não gosto! (insiste novamente).
Eu: Eu percebo V, há partes do nosso corpo que não gostamos nada que nos
toquem e o rabo é uma delas. Mas talvez a Lr não saiba isso. Como é que achas que ela
se está a sentir?
V: Triste.
Eu: Achas que podemos fazer alguma coisa para mudar isso?
V: Pedir desculpa.
Eu: Sim, isso é uma ótima ideia. Mas também podemos explicar porque é que lhe
deste o pontapé, para a Leonor perceber que tu não gostaste que ele te tivesse mexido no
rabo.
Fui chamar a L as duas conversaram
V: L, tu mexeste no meu rabo e eu não gostei.
L: Mas tu bateste com muita força e dói minha perna
Eu: Pois foi, foi muito força eu vi que te doeu muito. Mas sabes uma coisa, a V
fica sempre muito zangada quando chega e vê que estão todos na roda menos ela. E
quando estamos zangados fazemos disparates. Compreendes?
L fica em silencio por uns segundos e sem dizer nada abraça a amiga. As duas
sorriem e explico “Um abraço é o melhor pedido de desculpas”.
Termino a conversa explicando. “Todos fazemos coisas menos boas que magoam
os amigos e até podemos ficar envergonhados. Também acontece comigo e com as
minhas amigas. Mas é importante tentar sempre conversar ou explicar o que sentimos. E
se precisarem de ajuda, eu ajudo.
As duas deram as mãos, viraram costas e entre pulinhos, voltaram para a sala.
Momentos depois, durante a brincadeira a V empurra uma menina que cai no chão. No
mesmo momento leva as mãos à cabeça sobre e explica. “Ai esqueci-me de não bater!!”
A minha conversa não serviu para reprimir o seus sentimentos nem para inibir o
seu comportamento. Mas serviu para o iniciar de uma tomada de consciência do próprio
estado emocional e do comportamento revelado.
177
APÊNDICE N– Diário de Bordo de 12 de dezembro de 2017
178
APÊNDICE O – Diário de Bordo de 30 de Novembro de 2017
179
MINDFULNESS COMO FATOR DE PROMOÇÃO DA APRENDIZAGEM
180
Resumo
Este trabalho se propõe a discutir sobre a prática de mindfulness como fator de promoção no
processo de aprendizagem. A fim de ser atingido o objetivo dessa pesquisa foram utilizadas
revisão sistemática e estudos descritivos. Os resultados apontam que a pratica de mindfulness
apresenta reflexos positivos para o processo de aprendizagem no que se refere a manutenção
do fator atenção e de outros fatores relacionados intimamente com o aprender, como estresse
ansiedade e depressão. Conclui-se que a pratica de mindfulness promove muitos benefícios
relacionados não somente ao aprendizado como também a uma melhor qualidade de vida, mas,
no entanto, não se apresenta como fator decisivo ou solucionador de todos os problemas de
aprendizagem existentes, mas que corrobora para uma alternativa viável e para a inserção de
um aprendizado mais sólido e consistente. Expressando bem como a necessidade de novas
pesquisas para esse tema que possam alcançar mais alternativas e evoluções para os problemas
de aprendizagem.
181
A aprendizagem é um tema muito estudado por profissionais e cientistas de áreas como,
pedagogia, psicologia, neuropsicologia, etc. Pois, sua notável presença na vida dos seres
humanos provoca interesse e esforços para a busca de um conceito coerente para defini-la.
Além, da explicação de muitos dos fenômenos relacionados ao assunto sendo que a maior parte
do comportamento e conhecimento humanos são frutos da aprendizagem. Ainda que autores
renomados tenham aberto caminhos preciosos para o desbravamento da complexidade que é o
processo de aprendizagem no ser humano, muito ainda se tem a descobrir, compreender e
explicar. (Netto & Costa, 2017).
A aprendizagem possui uma ampla variação de conceitos e funções, de acordo com a
ótica da área que a estuda. Como, por exemplo, a neuropsicologia, uma ciência que se dedica a
relação entre as funções do sistema nervoso e o comportamento. (Mograbi, Mograbi &
Landeira-Fernandez, 2014).
A neuropsicologia produz uma roupagem funcional para o processo de aprendizagem
agregando importância para o funcionamento cerebral que ocorre simultaneamente com fatores
intrínsecos e extrínsecos e que resultam na individualidade do aprender de cada sujeito, ou seja,
a atividade cerebral e de todo sistema nervoso são importantes e estão intimamente ligados com
os comportamentos dos indivíduos, com a cultura e experiências prévias de aprendizagem para
adquirir novos aprendizados. (Silva, 2018).
Outras searas da psicologia também se dedicam a aprendizagem. Uma delas é o
behaviorismo radical de Skinner que foi a filosofia que deu origem a terapia analítica
comportamental, apesar de muito divergente da neuropsicologia, também, tem um olhar
funcional sobre a aprendizagem compreendendo que o ser humano é formado pela filogênese,
ontogênese e a cultura e é em meio a esses fatores que se dá aprendizagem dos comportamentos
das pessoas, seja ele escrever, falar ou até expressar sentimentos. (Baum, 2006).
E é pensando nesse valor que a aprendizagem tem para o ser humano é que algumas
teorias a respeito de práticas de atenção plena vêm sendo desenvolvidas e cada vez mais
aplicadas para a obtenção de resultados referentes a aprendizagem.
Mindfulness ou atenção plena é uma prática que está se tornando cada vez mais
conhecida e utilizada pelos resultados que tem apresentado. (Gherardi-Donato, 2018). O
objetivo aqui não é colocar o mindfulness como uma forma mágica de resolver qualquer
problema relacionado a aprendizagem, mas sim como um colaborador eficaz na melhora da
capacidade atencional e, assim, produzir efeitos na aprendizagem.
Não há, enfim, como falar de aprendizagem sem falar de atenção: “Entende-se,
portanto, que a atenção é um processo básico para a ocorrência da aprendizagem, e seus déficits
182
causam impacto negativo no desempenho escolar, assim como nas demais atividades do
sujeito.” (Guadagnini & Simão, 2016, pag.260). Portanto, a atenção demonstra ser relevante,
pelo fato de que a desatenção pode prejudicar o indivíduo social, acadêmico e/ou
profissionalmente. (DSM-V, 2014).
Um exemplo em números desta questão é apresentado pela Associação Brasileira do
Déficit de Atenção (ABDA) que afirma que 3 a 5% da população mundial é portadora de TDAH
(Transtorno de Deficit de Atenção). (Retirado de https://tdah.org.br/sobre-tdah/o-que-e-tdah/).
Além dos demais transtornos que envolvem a atenção, como, por exemplo, o Transtorno
Específico da Aprendizagem que prevalece em 5 a 15% em crianças em idade escolar e
aproximadamente 4% nos adultos (DSM-V, 2014); fora as dificuldades atencionais não
detectadas como transtornos.
Por esse motivo, este artigo tem por objetivo geral responder: os estudos científicos
evidenciam que a prática de mindfulness pode ser utilizada como uma estratégia de intervenção
que através da manutenção da atenção repercute no processo de aprendizagem?
Assim sendo, o presente estudo possui como objetivos específicos descrever o conceito
de mindfulness, apresentar alguns conceitos e definições de aprendizagem que abrangem caráter
funcional e, por fim, intenta relacionar tais variáveis.
Este tema envolve uma apuração a partir de obras já publicadas, sobre o quanto o
mindfulness tem sido utilizado ou abordado com êxito, a partir de seu aspecto de melhorar a
atenção, para os processos de aprendizagem existentes, cabendo aqui ressaltar que são todos os
possíveis processos de aprendizagem, incluindo os ditos de cunho escolar e os mais informais
propriamente das experiências de vida dos sujeitos.
O processo de aprendizagem ocorre em favor de vários fatores, um deles, a atenção. Por
isso a importância deste estudo no que tange em associar uma técnica que tem por um de seus
objetivos o trabalho com o foco atencional e que talvez refletirá significativamente ou não na
melhoria do processo de aprender do sujeito suscitando assim uma averiguação propicia e
conveniente para a ciência.
Este estudo demonstra relevância para os estudantes e profissionais da psicologia, no
sentido de que a aprendizagem é uma capacidade essencial na atuação profissional do
psicólogo. Do mesmo modo que agrega conteúdo para pesquisas sobre os efeitos da prática de
mindfulness no que tange ao processo atencional em especial com a finalidade de aprendizagem
e incentivando similarmente novas pesquisas para o assunto. Além de contribuir para o
aprimoramento do construto teórico de ciências como a psicologia e a pedagogia, para fins de
183
aplicação prática de mindfulness em escolas, consultórios, grupos, ou mesmo para uma ampla
população na sociedade como um todo.
Como forma de estruturação acadêmica, esse trabalho apresenta em um primeiro
momento de uma maneira geral uma explanação sobre os conceitos, definições e
contextualizações sociais e históricas sobre o tema aprendizagem.
Em um segundo momento, são apresentados também de uma forma geral os conceitos,
definições e contextualizações sociais e históricas sobre o tema mindfulness, além de suas
teorias de eficácia e aplicabilidade em diversos contextos atualmente.
E por fim, serão expostas as possíveis relações entre o processo de aprendizagem e a
prática do mindfulness, pontuando, portanto, os benefícios de alcance e os desafios de não
alcance até então encontrados e estudados por alguns autores, manifestados nos processos de
aprendizagem.
Metodologia
Método é definido segundo Gill (2008) como meio para alcançar um fim, especificando
ainda o método para a ciência como uma reunião de processos, sendo esses de origem técnica
e intelectual selecionados com o objetivo de chegar a conhecer algo.
Este trabalho apresenta-se como uma abordagem qualitativa de objetivo descritivo
explanando sobre os reflexos da prática do mindfulness no processo de aprendizagem, tratando
assim de uma pesquisa com procedimento revisão sistemática.
Os procedimentos técnicos a serem utilizados para a efetuação dessa pesquisa será uma
revisão sistemática onde contará com a dedicação em buscar trabalhos de ordem científica para
analisar e comparar os dados obtidos e publicados até o momento.
Como critérios de inclusão serão definidos artigos em português e em inglês dos últimos
cinco anos, artigos completos, além de livros acerca do tema. Como critérios de exclusão serão
definidos artigos de estudos realizados em outros idiomas que não sejam em português ou inglês
e artigos com mais de cinco anos de publicação.
Nesse estudo serão utilizados descritores tais como: “mindfulness”, “atenção plena”,
“atenção”, “aprendizagem”.
O Processo de Aprendizagem
184
A cerca do conceito sobre aprendizagem encontra-se uma dificuldade em um termo
definitivo e padronizado sobre suas características e funções, variando de acordo com linhas
teóricas e de raciocínio que apresentam contextos diferentes em períodos históricos diferentes,
o que na verdade acontece com muitos conceitos dentro da psicologia. (Catania, 1999).
Na perspectiva da linha de pesquisa do Desenvolvimento Humano sabe-se que são
estudados os aspectos físicos, cognitivos e psicossociais que acontecem no decorrer da vida do
ser humano, desde o nascimento até o envelhecimento. Através desses estudos é que os autores
como, Vygotski, Piaget, Wallom, trazem o termo aprendizagem sendo estudado pelo viés dos
aspectos cognitivos, mas em caráter de completude, são intimamente conectados com o físico
e o psicossocial, levando em consideração, portanto, pontos importantes da sociedade em que
os sujeitos estão inseridos. (Papalia & Feldman, 2013).
Henri Wallon (1879-1962) propunha que o ser humano é um ser biologicamente social,
isso quer dizer que ao nascer já necessita de cuidados realizados por outras pessoas e nessa
relação o recém-nascido começa a aprender. A herança genética permite a criança
características inatas como o sugar, todavia ela precisará aprender diversos movimentos para
ter a capacidade de se alimentar sozinha. (Silva & Garcez, 2019).
Vygotski e Piaget possuem características convergentes, de forma mais ampla, ambas
as teorias dão relevância ao social, inclusive ao explanar sobre aprendizagem. Entretanto, as
divergências, especialmente epistemológicas, podem ser notadas, tanto que o primeiro deu
origem ao sociointeracionismo e o segundo ao interacionismo construtivista. (Palangana, 2015).
Para Vygotski (1896-1934) a aprendizagem da criança passa pelo processo de
internalização da comunicação de acordo com cada cultura, a partir da exploração de seu
ambiente com a influência dos outros seres humanos que a cercam, a criança vai aos poucos
aprendendo o que é ser humano, a partir daí internalizando formas de comportamento,
desenvolvendo a criação de repertórios de ações e ao mesmo tempo compartilhando o
significado destes. (Silva & Garcez, 2019).
Vygotski apresenta o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal que pode ser
explicado de forma sucinta assim: no processo de aprendizagem é preciso observar o que o
indivíduo já tem capacidade de fazer, mas ainda não sabe fazer sozinho. Então, oferecer um
modelo para que a criança possa ver e imitar. (Silva & Garcez, 2019).
Becker (2017) promove uma aproximação entre Piaget e Paulo Freire e identifica que
ambos consideram o ser humano como indivíduos únicos com a capacidade de agir e decidir
sobre o meio. Partindo para considerações acerca da aprendizagem, o autor afirma que ambos
entendem que para ensinar algo a alguém é necessário iniciar de onde a pessoa se encontra
185
cognitivamente, levando em conta o que ela consegue fazer no momento e a partir daí gerar
contexto para o indivíduo prosseguir em se desenvolver.
O autor analisa o que encontra em Freire e em Piaget em questões de epistemologia e
chega a uma conclusão: “Afirmamos, pois, que tanto Piaget quanto Freire concebem a
construção das capacidades humanas, a construção da subjetividade e da correlativa
objetividade, por um processo de interação. Professam ambos uma epistemologia interacionista,
construtivista.” (Becker, 2017, p.27).
A neurociência experimental apresenta teorias relacionadas a neuroplasticidade
cerebral, como por exemplo o autor Kelso (1995) que articula o aprendizado com as redes
neurais altamente plásticas e que se auto-organizam em função dos estímulos externos. (Mourão
& Melo, 2011).
A neuropsicologia mais especificamente agregando seu foco de estudo entre relação das
funções cerebrais do SNC e o comportamento do sujeito define a aprendizagem como sendo
um processo psicológico no qual se amplia conhecimentos com a mediação de variáveis
socioculturais e contextuais, elementos afetivos e o corpo sendo notável a organização e
funcionamento cerebrais. Entre estes aspectos existem interações profundas onde influenciam
e são influenciados convertendo a aprendizagem em um processo complexo, dinâmico e
contextual (Hazin, Lautert, & Garcia, 2012).
Sendo assim, o processo de aprendizagem para estas teorias de viés neurocientífico,
envolve as funções executivas, que dizem respeito a diversas habilidades que se relacionam
capacitando o sujeito para “direcionar comportamentos a metas, avaliar a eficiência e a
adequação desses comportamentos, abandonar estratégias ineficazes em prol de outras mais
eficientes e, desse modo, resolver problemas imediatos, de médio e de longo prazo”. (Fuentes
& colaboradores, 2014, p.115).
Nesse sentido, mesmo não consciente totalmente de que o fazem, as pessoas definem
objetivos e criam formas para realizar bem as atividades do dia-a-dia. Ao efetuar os passos em
direção ao alvo, também são precisas avaliações para medir a eficácia da execução e, se houver
erros devem ser corrigidos e definidas outras táticas. Durante todo o processo o indivíduo tem
que sustentar a atenção focada na atividade em decorrência, autorregular a atenção e assimilar
as etapas efetuadas e ainda as que virão. E não acaba por aí, é preciso memorizar conhecimentos
utilizados por um período de tempo e não permitir que sejam interferidos por distratores. Esse
processo assegura a eficácia em tarefas rotineiras, em especial nas com complexidade maior e
aquelas que são inéditas ou possuem características inéditas que exigem maior implicação das
funções executivas. (Fuentes & colaboradores, 2014).
186
Contribuições da pedagogia com um viés mais psicometricista também auxiliam para a
conceitualização do tema. Thompsom, por exemplo, diz que, “a aprendizagem é o resultado da
estimulação do ambiente sobre o indivíduo, que se expressa, diante de uma situação-problema,
sob a forma de uma mudança de comportamento em função da experiência” (p.45), revelando
assim uma aprendizagem que depende de uma estimulação do ambiente e que por meio de uma
situação problema há uma estimulação para o raciocínio, provocando ações no indivíduo
fazendo com que haja com comportamentos refletidos para uma mudança em função dessa
experiência. Ou seja, a autora coloca em pauta um conceito de aprendizagem experiencial e
comportamental. (Thompsom, 2000).
Apresentando uma outra perspectiva pelo viés da pedagogia para o conceito de
aprendizagem as autoras Feitosa e Nunes, trazem como conceito geral uma conclusão muito
objetiva e histórica, afirmando que “a aprendizagem é um processo pelo qual se visa o
desenvolvimento das capacidades físicas, motoras e sociais de cada indivíduo, é uma forma de
fazer com que ele desenvolva e estabeleça suas habilidades tornando-se capaz de estender sua
relação com o meio em que vive” (p.2), revelando assim uma integração de fatores
caracterizando o processo de aprendizagem como um desenvolvimento dos fatores físicos,
motores e sociais do indivíduo produzindo então habilidades que irão contribuir para sua
relação com o meio onde vive (Feitosa e Nunes, 2012).
Isso contribui para uma assertiva de que a aprendizagem ao não se deparar apenas com
um conceito especifico, também caminha de encontro para aquilo que indica que a mesma
ocorre em todos os níveis da vida do ser humano, desde o nascimento até o momento do
envelhecer, assim como não tão somente para o âmbito mais conhecido, o da área escolar, mas
também de outros tipos de aprendizagem como, por exemplo, falar, andar de bicicleta, mexer
no computador ou no celular, uma nova receita ou até mesmo o caminho para a escola, assim
como os diversos repertórios sociais que aprendemos durante a nossa história que compõe
nossos valores, costumes e condutas, ou seja, desde processo mais complexos ou mais simples
do processo de aprender.
Para tanto, suscita uma reflexão sobre como a aprendizagem pode acontecer por
diversos caminhos, e mais, além disso, ela pode adquirir características diferentes de acordo
com a subjetividade de cada indivíduo, sobre as condições de vida, sobre o ambiente inserido,
os aspectos biológicos, mas também psicológicos, históricos e sociais da vida de cada pessoa.
Considerando todos os aspectos abordados que estão relacionados ao processo de
aprender, vale ressaltar o momento presente impactado em vario níveis pela pandemia do
COVID-19. Tal fato histórico tem muito a dizer sobre a aprendizagem seja ela educacional
187
tanto de crianças como adultos que passaram a estudar de forma remota com a mediação da
tecnologia, seja no trabalho onde diversos colaboradores tiveram que aprender a forma de fazer
home office, e ainda em uma posição social onde as pessoas tiveram de aprender novos
repertórios de cuidado social, como o uso da máscara e do álcool gel, a forma de viver o
isolamento e distanciamento social. A realidade vivenciada no Brasil e no mundo demonstra na
pratica como o ser humano é um ser social, histórico e ao mesmo tempo único indo ao encontro
de diversas teorias citadas acima. (Pimentel & Silva, 2020; Junior & Monteiro, 2020).
Mindfulness
Para Kabat-Zim autor que ganha destaque sobre o tema por ser considerado um pioneiro
em trazer o mindfulness para o Brasil, a definição de atenção plena ou mindfulness, se classifica
como voltar atenção para o aqui-agora, ao tempo presente, de forma proposital e sem julgar.
Objetiva tirar a pessoa dos devaneios do automatismo, do pensamento acelerado, do foco no
passado ou futuro para, ao contrário, vivenciar o que ocorre no agora, permitindo a tomada de
decisão de forma consciente. (Kabat-Zinn, 2020).
Agregando sentido a isso, a palavra “Sati” se refere a mindfulness na língua budista Pali.
Portanto, mindfulness é uma tradução de Sati para a língua inglesa em um significado que
abrange algo do tipo: rememorar, reconhecer, mente em vigília, atenção plena, consciência de
si. Portanto, não se resume em uma única palavra em português. (Balbeira, Marques & Temótio,
2018).
A atividade de mindfulness não consiste em se afastar do que se passa internamente,
como sentimentos e emoções, não é um “desligar a mente”. Na realidade é direcionar a atenção
ao que está ocorrendo no presente, inclusive emoções, onde estas podem fluir e serem aceitas,
de maneira que a pessoa não se determine por elas nem produza respostas automáticas
padronizadas. É uma forma de se relacionar com os eventos internos e externos sem
resistências. (Balbeira, Marques & Temótio, 2018).
A postura mindfulness é uma proposta contrária ao que se vive na cultura ocidental onde
tudo ocorre em ritmo acelerado e automático. Mindfulness vem trazer uma ideia de desacelerar
e voltar a atenção ao que se está fazendo, vivenciando, assim, o presente. (Assunção &
Vandenberghe, 2009).
Ellen Lager estudou por muito tempo o mindleness que seria uma postura automática
diante da vida, na qual o indivíduo se volta para uma única visão rígida dos acontecimentos.
Esta postura não é de todo ruim, ela é de grande valia para experiências como dirigir ou ler um
188
livro, mas se for preponderante na vida da pessoa a mesma corre o risco de agir dentro de uma
zona de conforto sem a percepção límpida do que faz. Por vezes, se adota crenças antigas diante
de novas circunstâncias, o que pode ser incoerente, ou seja, “Mindlessness promove uma visão
de si limitada por conceitos descritivos e papéis. O indivíduo forma um conceito de si baseado
em regras rígidas, desconsiderando possibilidades que estão ao alcance, mas que não condizem
com tal conceito formado”. (Assunção & Vandenberghe, 2009).
Mindfulness se apresenta como promovedor de qualidade de vida na medida em que
trabalha a receptividade diante de novas informações e um olhar focal sobre processos
complexos. Ressaltando assim que, não basta se abrir a todas as novidades, pois ainda estas
podem ser interpretadas com base em regras já usuais. São precisas táticas conscientes para
evitar falhas. Acatar vários ângulos de um mesmo evento é um dos frutos de mindfulness, sendo
que gera flexibilidade psicológica ao passo que o indivíduo compreende o fenômeno de várias
formas. No caso de um problema, poderá ver mais de uma solução plausível. (Assunção &
Vandenberghe, 2009).
Para ficar mais clara a definição de minfulness, os autores Willian e Penman
(2015) destacam o que não é atenção plena (ou meditação). Os autores argumentam em primeiro
lugar que não se trata de uma religião, apesar de este ter se desenvolvido muito intimamente a
tradições milenares como Budismo, Ioga e Taoísmo, mas a atenção plena se trata na verdade
de um treinamento mental e um modo de ser momento-a-momento. Em segundo lugar
apresentam que a atenção plena não é complicada e nem obscura, embora não seja fácil, e não
possua caráter relacional com o "sucesso" ou "fracasso" quando se chega ou não a algum estágio
inicial ou final do processo. Em terceiro lugar os autores colocam que a pratica da atenção plena
não possuí o efeito de entorpecer e nem de atrapalhar os objetivos da vida do sujeito. Em quarto
lugar, a atenção plena não diz sobre uma condição em aceitar o inaceitável, mas sim, em uma
maneira de ver o mundo com mais clareza para enfim tomar atitudes consideradas mais sábias.
Em quinto lugar, não se classifica como uma técnica de distração, uma vez que trabalha
justamente o oposto, ou seja, trabalha a atenção ao momento presente. E em sexto e último
lugar a atenção plena, não se configura como um relaxamento, embora este seja um resultado
ou subproduto que acontece com a prática.
Praticar mindfulness engloba uma posição de observador das próprias experiências e
sensações, de recepção diante das informações, sensibilidade em relação as contingências e
aberto a diversas perspectivas, exige atenção no aqui e agora. A presença de tais condições
viabiliza a aprendizagem de formas mais funcionais de se comportar diante das situações. Por
isso o mindfulness colabora na promoção do bem-estar e qualidade de vida e capacita a pessoa
189
a lidar com emoções negativas, promove estados emocionais positivos, criatividade e
proporciona uma visão de si, do mundo e do tempo diferenciada. (Balbeira,Marques & Temótio,
2018).
Mindfulness pode ser praticado de duas maneiras, sendo elas a chamada formal que é a
meditação e se caracteriza por ser estruturada onde o praticante tira um tempo para treinar
atenção plena de modo sistemático; e a considerada informal onde a pessoa aplica a atenção
plena em seu dia a dia, por exemplo, ao caminhar, comer e tomar banho. (Germer, Siegel &
Fulton, 2016).
Nesse sentido embora o mindfulness não se limite apenas a uma prática meditacional,
vale salientar que a meditação é uma praxe oriental muito antiga relacionada a teorias
espirituais, os budistas, por exemplo, vêm se utilizando dessa ferramenta desde o século V a.C.
já no ocidente é algo de fato mais recente e que veio ganhando espaço de 1.960 em diante. À
medida que o senso comum aderiu as diferentes práticas de meditação, a comunidade científica
passou a se interessar em estudar os resultados positivos obtidos pelos praticantes. (Oliveira,
2019; Kingsland, 2018).
Em uma meta-análise sobre a prática de mindfulness realizada por Khoury e
colaboradores (2015) foram apresentados resultados moderados para reduzir estresse,
depressão, ansiedade e angustia da qualidade de vida de indivíduos saudáveis. Em outra meta-
análise feita por Hilton e colaboradores (2017), nos resultados as estatísticas revelaram-se
significativas na prática de mindfulness para depressão, qualidade de vida relacionada à saúde
física e a saúde mental.
Dentro da psicologia há diversos autores que vem se dedicando ao estudo e a
aplicabilidade de mindfulness, alguns deles são Ellen Langer, talvez a mais expressiva com
mais de 35 anos de estudos sobre o tema. Também há um grande interesse em mindfulness nas
terapias de terceira geração da análise do comportamento onde quatro psicólogos se destacam:
Steven Hayes criador da ACT- Terapia de Aceitação e compromisso, Kohlenberg e Tsai
criadores da FAP- Terapia Analítica Funcional, e Marsha Linehan criadora da DBT- Terapia
Comportamental Dialética. (Ramos, 2015; Langer, 2018).
Esta dada postura de presença no aqui-agora do estado mental de mindfulness se encaixa
bem no que a ACT traz como “contato com o momento presente”, Saban (2015) ressalta que
esta postura é necessária em qualquer técnica a ser utilizada em terapia. O paciente deve estar
com presença integra nas circunstancias do momento para realizar os exercícios e compreender
as metáforas. Afirma que as práticas de meditação corroboram para direcionar os indivíduos ao
contexto. Ainda vem dizer dos benefícios fora do setting terapêutico, da importância de um
190
contato com o presente: “nos torna mais sensíveis as contingências vigentes, promove mais
discriminações, e nos torna mais hábeis para nos comportarmos de forma mais eficiente”.
(Saban, 2015, p.73). Ou seja, a prática de mindfulness torna as pessoas mais disponíveis a
aprender (em um sentido amplo) dentro e fora da terapia.
Condizendo com a afirmativa de Saban, Assunção e Vandenberghe (2009) trazem que
em psicoterapia onde se utiliza de mindfulness o cliente poderá aprender a entender seus
comportamentos atuais com base na vivência do momento e sua ontogênese, não julgando
eventos isoladamente, mas percebendo que é tudo questão de processo e poderá ainda voltar
sua atenção para os acontecimentos de maneira consciente, visando seus valores atuais.
Marsha Lineham considera as habilidades de mindfulness fundamentais em sua proposta
para a DBT e por isso as chama de centrais: “As habilidades centrais são as primeiras a serem
ensinadas e funcionam como o alicerce de todas as outras habilidades em DBT. Elas são
revisadas no início de cada um dos outros três módulos de habilidades e são as únicas realçadas
ao longo de todo o tratamento. ” (Linehan, p. 148, 2018).
A DBT é um tipo de terapia que envolve muito a capacidade de aprender, os terapeutas
realmente aproveitam tal capacidade em seus clientes. São realizados treinamentos intensos
com os pacientes visando que estes adquiram repertórios de comportamento habilidosos o que
pode ser dito como “aprender comportamentos” que, por sua vez poderão ser utilizados no
cotidiano do indivíduo. E em meio a este propósito da DBT mindfulness é um aliado onde tanto
terapeuta, treinador de habilidades como paciente devem praticar mindfulness, sendo que, se
constatou a relação de mindfulness com melhores resultados no processo terapêutico. (Linehan,
2018).
Há indícios da preocupação de Ellen Langer com a aplicação de mindfulness na
aprendizagem há duas décadas onde publica um artigo juntamente com Moldoveanu abordando
a atenção na mudança da educação: “A pesquisa de mindfulness sugere intervenções imediatas
para tornar o aprendizado em sala de aula uma experiência mais consciente”. (Langer &
Moldoveanu, 2018).
Na edição de 25 anos da publicação de seu livro Atenção Plena, Langer (2018) vem
afirmar que a partir da pesquisa publicada na edição original de seu livro Mindfulness passou a
perscrutar outras conjunturas como a aprendizagem, criatividade, negócios e saúde.
Como pode ser notado, a habilidade de mindfulness é muito versátil podendo ser aderida
por crianças, adolescentes, adultos e idosos e em diversos contextos, principalmente a pratica
informal, sem deixar de lado a formal que também é muito abrangente. Tanto é verdade o que
foi dito que há registro de estudos e implementação da prática de mindfulness em escolas
191
(https://www.mindfulschools.org), organizações (Simões, 2019), saúde (Mouzinho, Costa,
Alves, Silva, & Lima, 2018), psicoterapia (Germer, 2016), etc.
O treinamento de mindfulness: Mindfulness Trainings Internacional (MTI) dirigido por
Lama Janchub Reid registrou 109 instrutores de mindfulness no Brasil até 2018, sendo estes de
variados Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande
do Sul, Rondônia, Goiás, Bahia e Pernambuco. Estes atuam na saúde, na educação, em
organizações e em presídios.
Discussão
192
assim, que déficits na atenção são prejudiciais em nível social, acadêmico e/ou profissional.
(DSM-V, 2014).
As dificuldades de aprendizagem atingem em grande escala a sociedade. O senso de
2017 obteve que apenas 1,6% dos alunos do ensino médio brasileiro chegam ao nível adequado
de aprendizagem predito pelo MEC (Ministério da Educação). Em matemática apenas 4,52%
superaram o nível 7 da Escala de Proficiência na avaliação. (Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2018). Grande parte das dificuldades em
aprendizagem está relacionada a déficits atencionais, exemplo, 3 a 5% da população mundial é
portadora de TDAH (Transtorno de Deficit de Atenção). (https://tdah.org.br/sobre-tdah/o-que-
e-tdah/). O Transtorno Específico da Aprendizagem prevalece em 5 a 15% em crianças em
idade escolar e aproximadamente 4% nos adultos (DSM-V, 2014); fora as dificuldades
atencionais não detectadas como transtornos. Dessa forma, estes dados se demonstram
preocupantes e apresentam notoriedade para a busca por intervenções na aprendizagem, e que
por vezes ainda prejudica uma grande parcela dos indivíduos que estão em desenvolvimento
escolar e social.
A definição de mindfulness por Jon Kabat-Zinn trazida pelo texto é clara e resumida,
sendo classificado como voltar a atenção para o tempo presente, de maneira intencional e sem
julgamentos. Visa levar a pessoa do modo automático, do pensamento acelerado, do foco no
passado ou futuro à vivência do que se passa no agora de forma consciente (Kabat-Zinn, 2020).
Mindfulness é uma postura oposta ao ritmo de vida acelerado e automático do ocidente, a
proposta é desacelerar e prestar atenção ao que se está fazendo. (Assunção & Vandenberghe,
2009).
A atividade de mindfulness exige um trabalho com a atenção para direcioná-la para o
instante em que se está. Consiste em observar as experiências, emoções e sensações aceitando
e deixando que elas fluam sem resistência, mas não se determinar por elas nem produzir
respostas automáticas padronizadas. Estas condições propiciam a aprendizagem de
comportamentos mais efetivos frente aos fenômenos. (Balbeira, Marques & Temótio, 2018).
Foram encontradas meta-analises onde, em uma, o mindfulness mostrou resultados
moderados para reduzir estresse, depressão, ansiedade e angustia da qualidade de vida de
indivíduos saudáveis (Khoury e colaboradores, 2015) e em outra, resultados positivos para
depressão, qualidade de vida relacionada à saúde física e a saúde mental. Para Saban (2015) a
postura é crucial em todas as técnicas usadas em terapia ao passo que direciona os indivíduos
ao contexto e tem benefícios fora do setting terapêutico: “nos torna mais sensíveis as
contingências vigentes, promove mais discriminações, e nos torna mais hábeis para nos
193
comportarmos de forma mais eficiente”. (Saban,2015, p.73). Logo, praticar mindfulness
colabora na disposição para obter aprendizado dentro e fora do consultório de terapia.
Na DBT a capacidade de aprender é valorizada. São realizados treinamentos para que
os pacientes aprendam uma série de comportamentos habilidosos. Na DBT terapeuta, treinador
de habilidades e paciente devem praticar mindfulness, sendo que, se constatou a relação de
mindfulness com melhores resultados no processo terapêutico. (Linehan, 2018).
Langer e Moldoveanu (2018) há duas décadas publicam um artigo abordando a atenção
na mudança da educação: “A pesquisa de mindfulness sugere intervenções imediatas para tornar
o aprendizado em sala de aula uma experiência mais consciente” (Langer & Moldoveanu,
2018). Em 2018 Ellen Langer afirma que a partir da pesquisa publicada na edição original de
seu livro “Mindfulness” o mesmo foi levado a campos como a aprendizagem, criatividade,
negócios e saúde. (Langer, 2018). Há registro de estudos e implementação da prática de
mindfulness em escolas, organizações (Simões, 2019), saúde (Mouzinho et al., 2018),
psicoterapia (Germer, 2016), etc.
Assim, é possível perceber que o mindfulness tem ganhado espaço na psicologia
relacionada a diversos conceitos, incluindo a aprendizagem.
Concatenando as ideias discorridas podemos dizer que a aprendizagem vai muito além
da escola, acontece no ambiente familiar, de trabalho, na terapia, em qualquer lugar. Não se
aprende só matemática e português, se aprende a falar, a nadar, novas habilidades,
autoconhecimento, lidar com emoções, estresse e ansiedade, etc. E as dificuldades de
aprendizagem podem ser as mais variadas, neste artigo foram ressaltadas as que envolvem
déficits na atenção, pois a intervenção apresentada é a proposta de mindfulness que trabalha
diretamente com a atenção e mais especificamente com o direcionar atenção ao momento
presente.
Bem, a ideia central da teoria sobre mindfulness é sobre o viver no comando do piloto
automático e que viver neste comando não oferece liberdade a pessoa para que esta lide de
maneira mais flexível com os eventos do momento. Viver desta maneira promove modos
rígidos e limitantes para reagir ao ambiente, o que se apresenta comum nos dias atuais, e que
evidenciam como os seres humanos fazem várias coisas ao mesmo tempo, se envolve
emocionalmente com todas elas, mas não notam os objetivos diferentes que cada uma possui e
se atrapalham na vida rotineira. Quando menos perceber estará agindo de forma rápida e
automática se considerando produtivo ou eficiente e sem se dar conta da confusão que ficam os
pensamentos e nem de como está vivendo o momento atual.
194
Foram encontrados artigos e livros dedicados à aplicação de mindfulness nos mais
diversos contextos, alguns como a DBT que é realmente ligada a aprendizagem, no caso, em
ambiente de psicoterapia ou da minful school que leva a cultura do mindfulness para escolas
através dos educadores. (https://www.mindfulschools.org/). Logo, conclui-se que mindfulness
já é aplicado em aprendizagem e que tem ganhado espaço nesse lócus.
Como foi dito a aprendizagem é influenciada por diversos fatores internos e externos ao
indivíduo, portanto se foi comprovado por pesquisas a capacidade do mindfulness em reduzir
estresse, depressão, ansiedade e angustia da qualidade de vida e qualidade de vida relacionada
à saúde física e mental, melhores resultados no processo terapêutico, etc. Isso pode sim se
expressar em melhor aprendizagem. Tudo isso além da atenção diretamente trabalhada. Para
isso seriam exigidos mais estudos que abordassem as diversas variáveis citadas, portanto, este
estudo estimula futuras pesquisas que relacionem os mais diversos aspectos da aprendizagem e
os benefícios do mindfulness para tais aspectos.
Em termos práticos as relações mindfulness e aprendizagem podem ser muito valiosas,
porém também há seus pontos fracos, um deles seria o fato de que o minfulness foi apresentado
pela pesquisa como colaborador no processo do aprendiz e até mesmo de quem ensina, mas é
fato que a prática de mindfulness por si só não é capaz de resolver os inúmeros problemas de
aprendizagem. Entretanto, pode ser relacionada a outras intervenções, sendo que serão
necessárias investigações que revelem a eficácia da junção de tais intervenções.
Considerações Finais
Por meio de revisão bibliográfica o presente estudo trouxe os mais diversos conceitos
que, a literatura revela acerca da aprendizagem, valorizando aqueles que demonstram uma
roupagem contextual aplicada a aquisição de comportamentos em ambientes heterogêneos.
Nesse sentido a aprendizagem é um processo que percorre toda a vida do ser humano
desde o seu nascimento até seu envelhecimento e ocorre por meio de aspectos intrínsecos e
extrínsecos ao indivíduo. Inclusive a atenção, tanto que as estatísticas demonstram que grande
parte das dificuldades e transtornos de aprendizagem envolvem prejuízos na atenção. O
mindfulness apresentado como uma técnica voltada ao estar presente no aqui e agora
revoluciona a manutenção desse fator que se faz tão importante para o aprendiz. A técnica aqui
estudada trabalha uma atenção redirecionada para o momento presente, levando em
consideração as experiências, emoções e sensações do mesmo, aceitando-as com suas
195
implicações e assim promovendo respostas mais bem analisadas e mais adaptativas a cada
situação.
Assim, numa visão mais aprimorada, tem-se o registro por outros pesquisadores de que
a inserção da prática da atenção plena no ambiente de aprendizagem de forma interventiva pode
tornar o aprendizado cada vez mais sólido.
As pesquisas aqui citadas demonstraram que o mindfulness tem sido utilizado não
somente como fator promovedor do processo de aprendizagem como também para a redução
do estresse, ansiedade, depressão e angustia e que neste caso são fatores que estão também
intimamente ligados com a aprendizagem. O mindfulness tem sido utilizado como uma
alternativa não só momentânea ou reparatória, mas como um estilo de vida que reflete na
qualidade de vida, uma vez que trabalha em todas as suas esferas de vida.
Autores também consideram como importante os resultados da pratica de mindfulness
para a psicologia, no que diz sobre aprimoramento ou desenvolvimento de novos repertórios de
comportamentos mais eficazes e assertivos para os sujeitos, aplicados nos diversos campos de
atuação do psicólogo.
Por fim acredita-se que diante dos estudos aqui analisados e citados o
mindfulness vem ganhando seu espaço em diversas áreas, não só produzindo benefícios para a
psicologia, mas como para outras áreas afins. Embora a aprendizagem seja um tema de alta
complexidade tanto em suas discussões teóricas quanto na sua atuação natural na vida dos seres
humanos, percebe-se que o mindfulness não atua como um fator solucionador ou mágico para
todos os problemas de aprendizagem, mas é necessário ressaltar as vantagens e desvantagens
que o mesmo promove para o aprendizado melhorando aspectos importantes e essenciais
envolvidos nesse processo que neste momento já se esclarece como bastante complexo.
196
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199
200
PROGRAMA DE PROMOÇÃO DA SAÚDE BASEADO
EM MINDFULNESS PARA O EDUCADOR
202
2 1 A IMPORTÂNCIA DO MINDFULNESS NA EDUCAÇÃO
3 1 O MBHP-EDUCA
O programa MBHP-Educa em São João dei-Rei foi aplicado por meio da formação
de um grupo piloto, composto por indivíduos em processo de formação docente inicial
(3 alunos de licenciatura, de diferentes áreas), de formação continuada (11 professores
em atividade, também de áreas distintas), e, ainda, por uma psicóloga atuante na área
de educação, totalizando o número de 15 participantes.
Essas pessoas se reuniram, entre os meses de outubro e dezembro do ano de
206
2017, por um período de 8 semanas, no qual tomaram contato teórico e prático com
os exercícios de mindfulness. As reuniões aconteciam uma vez por semana, com 2
horas de duração para cada encontro, sob a condução do Prof. Dr. Alex Mourão Terzi.
O local de realização da intervenção foi o Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais - Campus São João dei-Rei (MG), o qual
cedeu toda a estrutura logística.
Dessa forma, nós replicamos aquilo que cultivamos, aquilo que carregamos dentro
de nós, como se nossa percepção fosse a única e a mais verdadeira. A memória em
si não é o problema. A questão se torna mais complicada porque há uma identificação
frequente do que aconteceu "comigo", ou seja, com a ideia do "eu", levando a uma
fixação da experiência, como se ela fosse única, permanente, estável e, por isso,
absolutamente "real".
Com a prática de mindfulness, cultiva-se a percepção da visão de que as
experiências são transitórias e não fixas, isto é, impermanentes.
Jon Kabat-Zinn (2017, p. 11), explica que a "atenção plena é consciência -
cultivada através de um foco de atenção prolongado e específico, que é deliberado,
voltado para o momento presente e livre de julgamentos." Por exemplo, quando
alguém realiza a prática da atenção plena da respiração, leva-se a consciência ao
ato de respirar. Haverá uma distração (uma memória, uma fantasia, a cobrança pela
realização de projeto). No momento em que é percebida essa identificação, volta-se
ao foco meditativo, que é a respiração, evitando-se, assim, o desgaste emocional
provocado pela narrativa mental promovida pelos nossos hábitos.
Perna Chõdrõn (201O, p. 34) aponta o que vem a ser shenpa. Essa palavra
tibetana, geralmente, é traduzida por "apego". Mas uma tradução alternativa poderia
"ser fisgado", ou aprisionado. Shenpa estaria relacionada à ansiedade e aos hábitos
que cultivamos ao longo da vida, como, por exemplo, a vontade de comer em excesso;
de impor o ponto de vista particular; de dizer algo negativo a alguém. Shenpa seria a
carga atrás das emoções, dos pensamentos e das palavras e, obviamente, difere para
cada indivíduo.
210
Por meio da prática regular de mindfulness, é possível desenvolver duas
habilidades importantes relacionadas à autorregulação emocional:
a) O descentramento, que é a capacidade de se relacionar com pensamentos e
emoções de modo desapegado, como mero observador(DEMARZO, CAMPAYO, 2015,
p. 174), sem uma identificação imediata, evitando-se, dessa forma, o fortalecimento de
estados de 'ruminação' ou preocupações excessivas, quanto ao passado ou ao futuro.
b) O reconhecimento de padrões emocionais, com a possibilidade de responder
mais conscientemente às situações, em vez de tão somente reagir automaticamente
diante delas(JENNINGS, 2015, p. 63)(grifos nossos), como muitas vezes fazemos no
chamado estado de 'piloto automático' e quando somos fisgados por nossos hábitos.
Nos dizeres dos participantes do MBHP-Educa, percebemos sentidos
relacionados a um maior reconhecimento de seus processos mentais e emocionais,
propiciando, possivelmente, a habilidade de perceberem quando estão sendo levados
por hábitos, como configurado nas expressões: "entender melhor o funcionamento
da minha mente" (P1); "entrar em contato com meu corpo, meus sentimentos e
pensamentos" (P8); "olhar um pouco mais para mim" (P9); "Não cair novamente e
indefinidamente para o automatismo" (P1O).
A fala de PS, no excerto "Aprendi a me dar um tempo, mesmo que muito
pequeno, para me perceber, me olhar (...) a nos distanciar, analisar e resolver o que
faço em certas ocasiões(...)", especialmente, remete a uma prática fundamentalmente
relevante no cultivo da atenção plena: a pausa. As referências interdiscursivas no
universo de mindfulness são muitas.
Tenzin Palmo (2018, p. 130) aponta para essa noção de "recuar", a fim de ver
os fatos com clareza, para atuar com frescor e espontaneidade, em vez de replicar
nossas reações usuais. Essa autora ainda expõe que: "quando os pensamentos
negativos surgem, podemos reconhecê-los, aceitá-los e soltá-los", com a opção de
não segui-los. Por outro lado, quando pensamentos de saudáveis emergem, podemos
aceitá-los e incentivá-los (PALMO, 2014, p. 21O).
Para Perna Chõdrõn(201O, p. 15-21), quando fazemos uma pausa, temos tempo
para refletir, antes de atuarmos, pois abrimos espaço, tendo a opção de acolher e
alimentar nossa receptividade e nossa cordialidade, podendo, assim, nos desvencilhar
de hábitos indesejáveis.
b) "Dimensão ética em mindfulness":
P1 - "Olhar mais compassivo para mim mesmo quando percebo minhas
limitações."
P2 - "Muitas questões foram uma surpresa e ao mesmo tempo libertadoras de
se praticar, como a autocompaixão, autogentileza (...)."
P3 - "Praticar a compaixão, ser gentil consigo mesma, estar atenta(...)"
P4 - "(...) buscar fazer as coisas bem feitas e também com autocompaixão."
211
PS - "ter conhecido e praticado mais a empatia e a compaixão."
P6 - "( ...) compaixão e autocompaixão podem contribuir para diminuição do
grau de sofrimento da comunidade local onde trabalho."
P7 - "Sempre que me cobro sem compaixão, vou lá fazer, faço guiada no
WhatsApp e fico feliz com o sucesso."
P8 - "No trabalho, acho que ainda preciso desenvolver a compaixão( ...)."
P9 - "A importância da autocompaixão, compaixão e cuidado foram alguns
deles."
P1 O - "O olhar de principiante, a postura de não cobrança e gentileza, mais do
que a prática formal, no meu caso, tiveram ações transformadoras."
P11 - "Tenho certeza que a compaixão será minha maior companheira, depois
de fazer esse curso."
P12 - "O mindfulness foi muito importante, pois através da prática da compaixão
e a atenção plena eu percebi o quanto é importante olhar para dentro de si ( ...)."
P13 - "Penso que poderei aplicar no trabalho muito a prática da compaixão
comigo e com os colegas e alunos ( ...)."
P14 - "Hoje consigo ser mais tolerante comigo e me ajudar."
Algo merece ser enfatizado na análise do imaginário da dimensão ética em
mindfulness: dos 15 participantes do Programa MBHP-Educa em São João dei-Rei,
14 responderam à avaliação final. Na narrativa de todos eles houve a recorrência
semântica do valor da compaixão.
Outra questão que vale perceber: na avaliação, não foi feita uma pergunta
direcionada que tocasse explicitamente no ideário da compaixão. Como explicado
acima, as perguntas apenas giravam em torno da experiência do praticante e de como
mindfulness poderia ser aplicado ao trabalho.
O MBHP-Educa, além do cuidado com a promoção da saúde do professor,
insere-se, notadamente, no contexto de formação docente (inicial e continuada). O
interessante é que não havia nenhuma vinculação desse programa com as instituições
educativas onde os participantes atuavam, ou seja, suas falas não visavam responder
a um anseio do contexto educacional de onde se originavam. Há, portanto, uma
espontaneidade discursiva que demarca a compaixão como um valor fundamental
para a prática meditativa.
Bhikkhu Bodhi (2011) afirma que mindfulness não se dá de forma automática,
mas, ao contrário, pressupõe uma qualidade a ser cultivada (bhavetabba), levando
se em conta uma dimensão ética, no sentido de eliminar aquilo que é prejudicial e
estabilizar o que é benéfico. Em outras palavras, buscar não se identificar com hábitos
não saudáveis e cultivar estados positivos para a saúde e para a coletividade, ou seja,
ações prossociais.
Thupten Jinpa (2016, p. 13) aponta que a compaixão é a base comum dos
212
ensinamentos éticos de todas as principais tradições, sejam elas religiosas ou
humanistas. A compaixão, por definição, é percepção da existência do sofrimento e o
desejo de que esse estado seja aliviado.
Segundo Demarzo e Campayo (2015, p. 149), dois são os elementos-chave da
compaixão: a sensibilidade ao sofrimento dos outros e de si mesmo; e o compromisso
de aliviar esse sofrimento.
Discursivamente, percebe-se a construção tanto do elemento da compaixão
(nos enunciados proferidos por P3, P5, P6, P7, P8, P9, P1O, P11, P12 e P13), como
também se verifica a emergência, para essa comunidade de falantes, do valor da
"autocompaixão", nas falas de P1, P2, P3, P4, P6, P7, P9, P1O, P12, P13 e P14.
No capítulo "O reencontro científico com a compaixão", Vicente Simón (2015,
p. 190) sintetiza a relevância da compaixão, apontando que, atualmente, a atitude
compassiva é benéfica para a saúde mental e para o bem-estar fisiológico, tendo,
ainda, "importantes repercussões sociais (...) de reduzir a violência e de promover
uma convivência amável e pacífica".
Uma explicação para isso é proposta pelos neurocientistas Daniel Goleman e
Richard Davidson (2017, p. 98), segundo os quais: "o cultivo de uma preocupação
terna com o bem-estar alheio traz um benefício único e surpreendente: os circuitos
cerebrais de felicidade se energizam, junto com a compaixão."
Dada a importância da compaixão, foram criados protocolos exclusivos para o
seu desenvolvimento. Em Mindfulness y Compassión (2015), Campayo e Demarzo
descrevem o programa de compaixão das Universidades de Zaragoza (Espanha) e
Federal de São Paulo(Brasil). Já na obra Um coração sem medo, 2016, Thupten Jinpa
explica o TCC - Treinamento de Cultivo da Compaixão, da Universidade de Stanford
(Estados Unidos).
c) "consciência da interconexão com os outros"
P1 - "Aprofundou-se, em mim, uma compreensão(...) a característica essencial
de todo ser humano que se revela na sua busca pela felicidade."
P2 - "(...) refletir sobre o "outro" e o "eu", sobre as relações, as palavras e sobre
nossa presença naquele momento."
P4 - "Ao lidar com as pessoas exercer a compaixão, sem se esquecer da auto
(compaixão)."
P5 - "Compreendi que assim com eu sofro as outras pessoas também sofrem.
E que elas também desejam ser felizes como eu." "Aprendi a me colocar no
lugar do outro(...) e perceber que as pessoas não agem de certa forma porque
querem, mas, muitas vezes porque não se conhecem e não se percebem."
P7 - "Acho importante racionalizar mais as atitudes, as negligências dos alunos,
e agir com empatia."
P8 - "principalmente com os colegas cujas posturas profissionais destoam das
213
minhas."
P9 - "Temos a consciência de que todos querem a felicidade e não somente
nós."
P1O - "(...) a importância de não julgar o próximo por algumas ações."
P12 - "(...) pois exercitando a compaixão, você transfere para o outro aquilo que
quer para si."
A carga semântica da noção de alteridade, nos dizeres dos participantes,
mostra-se presente, como nas expressões e nos vocábulos demarcados: "todo ser
humano" (P1); "refletir sobre o 'outro' e o 'eu "' (P2); "ao lidar com as pessoas exercer
a compaixão" (P4); "assim com eu sofro as outras pessoas também sofrem" (P5);
"os colegas cujas posturas profissionais destoam das minhas" (P8); "todos querem a
felicidade" (P9); "não julgar o próximo" (P1O); "você transfere para o outro aquilo que
quer para si" (P1O).
Há uma afirmação baseada no senso comum de que as pessoas estão cada
vez mais individualistas e competitivas. Geralmente acredita-se, equivocadamente,
que agimos apenas motivados pela competição e pelo egoísmo (JINPA, 2016, p. 14).
Pesquisas têm apontado para a natureza gregária e cooperativa dos seres
humanos (WAAL, 201O), bem como para demonstrar que o altruísmo exerce um "papel
determinante na maior parte das dimensões de nossa existência e, em especial, que ele
era a chave da resolução das crises social, econômica e ecológica que atravessamos
no momento atual" (RICARD, 2015, p. 615).
Cunhado pelo monge vietnamita Thich Nhat Hanh, um dos mais proficientes
professores de mindfulness, o termo intersersignifica que existe uma interdependência
em se tratando de todos os fenômenos. Ele traz como exemplo a existência de uma
folha. Sem a nuvem, sem a chuva, as árvores não podem crescer e, sem árvores, não
há a produção de papel. O autor também descreve que essa folha é parte de nossa
percepção mental, ou seja, nós também "intersomos" com a folha: "'Ser' é interser.
Você simplesmente não pode 'ser' por você mesmo, sozinho. Você tem que interser
com cada uma das outras coisas" (NHAT HANH, 2014, p. 17).
Somando-se à ideia de alteridade, discursivamente é erigida a noção de
empatia, ou seja, a de se colocar no lugar do outro, como pode se ver textualmente
em: "compreensão (...) a característica essencial de todo ser humano que se revela
na sua busca pela felicidade" (P1); "Aprendi a me colocar no lugar do outro" (P5); e
também no já citado enunciado de P1O: "você transfere para o outro aquilo que quer
para si".
Monja Coen (2014, p. 161) menciona que "se pudermos compreender as
dificuldades e sofrimentos pelos quais as pessoas passam (...) a transformação estará
no nosso comportamento e atitude." Para Matthieu Ricard, "a ciência contemplativa e
a neurociência demonstraram que é possível treinar a mente e modificar aos poucos
nossos traços de personalidade" (RICARD, 2018, p. 238), sendo que as mudanças
214
dos indivíduos é que mudarão a cultura e as instituições (RICARD, 2015, p. 120). Não
pode haver mudança na sociedade, se não houver mudança humana (RICARD, 2015,
p. 41).
Pode-se, erroneamente, imaginar que a prática de meditação é alijada das
vicissitudes do mundo e que os praticantes não se ocupam do sofrimento alheio.
Todavia, mindfulness é muito mais que apenas um evento esporádico, podendo se
converter, sobretudo, em um processo de transformação pessoal e social. Paulo Freire
(1996, p. 11 O) apontava que ensinar exige compreender que a educação é uma forma
de intervenção no mundo. Mindfulness pode nos trazer a consciência de nosso papel
social, enquanto agentes, de fato, transformadores.
8 1 PERSPECTIVAS FUTURAS
REFERÊNCIAS
BHIKKHU BODHI. What does mindfulness really mean? A canonical perspective, Contemporary
Buddhism: An lnterdisciplinary Journal, 2011, p.19-39.
CHÕDRÔN, Perna. O salto: um novo caminho para enfrentar as dificuldades inevitáveis. Rio de
Janeiro: Gryphus, 201 O.
COEN, Monja. A sabedoria da transformação: reflexos e experiências. São Paulo: Planeta, 2014.
Dahl CJ, Lutz A, Davidson RJ. Reconstructing and deconstructing the self: cognitive mechanisms
in meditation practice. Trends in cognitive sciences. 2015;19(9):515-23.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 4. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
215
216
Mindfulness como Prática de Autocuidado para a
Saúde Mental de Enfermeiros
Marlene Silva de Menezes1; Ivanete da Rosa Silva de Oliveira2
217
Introdução
218
A forma convencional de tratamento, que é predominantemente medicamentosa
(TENG et al., 2005), é normalmente realizada, após o aparecimento de sintomas físicos.
Nessa fase, muitas vezes, os transtornos e as doenças já estão instalados de tal forma que a
reversão do quadro se torna difícil, trazendo sofrimento e abandono.
O Mindfulness ou atenção plena surge como uma terapia que auxilia a pessoa a
encontrar a paz em um mundo frenético e acelerado, tornando-a ciente de si mesma, a fim de
apreciar o que está acontecendo ao seu redor, numa busca de autoconhecimento. Essa
modalidade terapêutica pode contribuir para relações intrapessoais e interpessoais melhores
por incentivar atitudes positivas, como a gentileza, apreciações e o carinho, a compaixão,
dentro da atenção plena vivida no aqui e no agora, sem resistência e com resiliência.
Em 2020 e 2021, os cenários complexos que foram produzidos pelo novo coronavírus
(COVID-19), nos fez refletir sobre a saúde mental dos profissionais da saúde que prestavam
cuidados na linha de frente. No caso especifico deste estudo, a temática emerge relacionada à
saúde do enfermeiro, que, além de lidar com toda a adversidade trazida pelo cotidiano de sua
prática laborativa, também se colocou como protagonista no atendimento às vítimas da
COVID-19. Assim, atuando em meio às implicações das incertezas que eram conflitantes pela
necessidade da prestação do cuidado e o medo da contaminação, a saúde mental desses
profissionais sofreu muitos desgastes (DRESCH et al., 2020).
Diante exposto, o objetivo deste estudo consistiu em efetuar uma proposta para o
desenvolvimento de um workshop de Mindfulness para discentes do curso de enfermagem,
como forma de contribuir para a saúde mental, por meio de práticas de autocuidado. Entende-
se que a pertinência da abordagem se situa em alargar o espaço de debate acerca da
necessidade de construção de práticas de autocuidado na saúde mental do enfermeiro.
Método
O presente estudo foi constituído por duas etapas metodológicas: uma pesquisa
bibliográfica-exploratória, de cunho qualitativo, que evidenciou reflexões e contribuições que
se constituíram no ponto de partida para a produção da segunda etapa da pesquisa, que foi a
construção do Produto Educacional (PE), denominado de “Workshop Pedagógico em
Mindfulness”. Na primeira etapa, com o apoio dos descritores - “Atenção plena”
(Mindfulness), “Técnica de relaxamento”, “Meditação”, “Alívio do estresse”, “Terapia
Cognitiva” – utilizados de forma isolada ou associada, foram encontradas 18 obras (livros,
219
periódicos, artigos na mídia etc.) que atendiam aos critérios de inclusão estabelecidos:
publicação após 2010, disponível em texto completo, em português ou inglês (Quadro 1).
220
cuidativo-educacionais (TCE), a “estratégia IPAC: Informação (I) – Sobre o que será a TCE;
População-alvo (PA) – Para quem a TCE; Contexto (C) – Que situação-contexto a TCE vai
mediar” (TEIXEIRA; NASCIMENTO, 2020, p. 52). Nesse sentido, ao aplicar a estratégia
IPAC no desenvolvimento (produção-construção) do produto educacional, no caso o
workshop, obtêm-se: (I) Mindfulness como prática de autocuidado; (PA) Discentes de curso
de graduação em enfermagem; (C) Saúde mental.
A produção-construção é a primeira etapa de criação de uma TCE, que pode ser
originada por meio de duas estratégias: produção-construção baseada na literatura e baseada
no contexto. A primeira assegura as bases teórico-científicas dos conteúdos da TCE, enquanto
a segunda, baseada no contexto, garante a pertinência sociocultural da temática pertinente à
TCE (TEIXEIRA; NASCIMENTO, 2020). No caso deste PE, ocorreu a combinação das duas
estratégias que poderá ser divulgada no formato digital ou impresso, com o intuito de
promover, inclusive, reflexões acerca do currículo de cursos de enfermagem.
Resultados e Discussão
221
A COVID 19 passa a exigir muito desses profissionais que estão na linha de frente do
combate à doença, que ultrapassou, em março de 2022, mais de 652.000 mortes3. Esse fato
incrementou negativamente as condições de trabalho dos enfermeiros, implicando no aumento
de carga horária trabalhada, o que causou estresse, requerendo, também, equilíbrio emocional
maior desse trabalhador. Nesse contexto, pode-se afirmar que a prática laboral do enfermeiro
acomete processos de adoecimento mental (DRESCH et al., 2020).
O medo de adoecer ou até mesmo de levar a doença para os seus familiares se tornam
algo que assombra o enfermeiro de forma constante. Como também há relatos que ficaram
isolados das famílias, para a preservação da saúde da mesma (RAMOS-TOESCHER, 2020).
Pode-se inferir que os aspectos emocionais dos profissionais da área da saúde
acarretam sofrimento mental, impactando, até mesmo, nas taxas de absenteísmo das
instituições de saúde. Assim, as equipes hospitalares desenvolvem ações voltadas para a
atenção à saúde mental, buscando estratégias para sanar ou dar suporte para esses
colaboradores. Alguns hospitais vêm implantando e implementando equipes
multidisciplinares em saúde mental, que oferecem o serviço de apoio psicológico para lidar
com esse período pandêmico que até hoje perdura, mas em menor escala. A implementação
de planos de intervenção começou a surtir efeito, pois deram visibilidade a esses profissionais
que, até então, não a possuía, apresentando urgência de serem acolhidos e ouvidos em suas
necessidades mais proeminentes. (DRESCH et al., 2020).
Nesse contexto, a pandemia possibilitou reflexões e diversas lições no que se refere à
saúde física e mental articulada ao processo de cuidado e de autocuidado, ascendendo, assim,
ao entendimento que aquelas pessoas que cuidam da população nas instituições hospitalares e,
em outros espaços de saúde, devem ser compreendidas como seres integrais.
3
Dados retirados do site: https://covid.saude.gov.br/
222
elevada carga horária, a baixa remuneração, possuir mais de um local de trabalho, enfrentar a
dor/sofrimento/morte de pacientes dentre outros fatores podem corresponder às causas de
aparecimento de uma sobrecarga emocional que pode desencadear algum transtorno mental
para o enfermeiro, tais como: ansiedade, estresse e depressão.
O transtorno de ansiedade, que pode se manifestar de diferentes formas e com
características variadas, pode gerar doenças psicossomáticas, dificuldades nas relações
interpessoais e intrapessoais. Pode-se dizer que, quando a ansiedade ocorre sem motivos e
objetivos reais e proporcionais para isso acontecer, ela é patológica. Suas manifestações
patológicas são classificadas da seguinte forma: transtorno de pânico, transtornos fóbicos,
transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático, transtorno de estresse
agudo, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de ansiedade induzido por
substâncias, transtorno de ansiedade devido a uma condição médica geral
(VANDENBERGHE; VALADÃO, 2013).
O Transtorno de ansiedade generalizada se caracteriza por um estado de ansiedade e
preocupação excessiva sobre diversas coisas da vida. Há preocupação desproporcional e
podem ocorrer sintomas como inquietação, nervosismo, irritabilidade, dificuldade de
concentração, cansaço, tensão muscular, insônia, fadiga e humor deprimido, os quais acabam
interferindo na sua vida de forma intensa, fazendo com que a pessoa afetada modifique as
suas atividades diárias, desde as profissionais, sociais ou acadêmicas (DEUS, 2016).
223
dominar o indivíduo e, ao mesmo tempo, o fato de a pessoa se acostumar com ele. A partir do
momento em que passa a ser percebido como algo familiar e normal, o indivíduo não percebe
o quanto ele o está afetando (PAZ; VITÓRIA, 2015)
O limite da pessoa ao estresse é atingido, quando ele passa a ser contínuo e de longa
duração, podendo se transformar em doenças, tais como a obesidade, doenças da pele,
infertilidade, problemas gastrointestinais (como diarreia, gastrite, úlcera, prisão de ventre) e
menopausa precoce nas mulheres. Devido à grande descarga de hormônios, essa agitação
pode elevar as frequências cardíacas, provocando a pressão alta, infarto e acidentes vasculares
cerebrais, afetando o humor, a produtividade, as relações e a qualidade de vida.
O estresse profissional pode causar o adoecimento da pessoa. Para se obter alívio do
estresse, é preciso manter o ritmo biológico, respeitando o sono de qualidade e gozar de
atitude de introspecção, fazer atividades físicas e yoga, técnicas de relaxamento, comer de
acordo com a fome, cantar, dançar, descansar e reavaliar o seu sistema de crença, pois tais
ações reduzem os níveis de estresse diário e aumentam o sentimento de felicidade e
serenidade. Entretanto, se for preciso, é necessário buscar ajuda de profissionais
especializados e o Mindfulness para controle (DEMARZO et al., 2015).
O Mindfulness, por ser uma técnica de redução do estresse, propõe um reajuste das
emoções, pois não é a presença do estímulo estressor que determinará como se vai reagir, mas
sim a necessidade de adaptação do organismo de cada um. Com esse pressuposto, o
Mindfulness surge como estratégia clínica centrada na regulação da emoção, que auxilia na
sua melhora e no retorno à atenção plena no momento presente.
O transtorno da depressão é uma doença que se caracteriza pela perda de prazer nas
atividades diárias (anedonia), como apatia, alterações cognitivas, com a diminuição da
capacidade de raciocinar adequadamente, de se concentrar ou de tomar decisões. É um
distúrbio afetivo que acompanha a humanidade ao longo de sua história (LUCAS, 2016).
Muitas patologias clínicas crônicas, quando associadas à depressão, acaba levando a piores
evoluções e aderências aos tratamentos propostos, com piora da qualidade de vida e maior
morbidade como um todo (TENG et al., 2011).
224
A depressão pode ser vista e tratada de várias maneiras e pode se apresentar como
unipolar ou bipolar, crônica ou episódica, de leve a grave e, até mesmo, pode existir sozinha
ou com outros transtornos. Deve-se sempre, aos primeiros sintomas, procurar um médico
psiquiatra que dê um diagnóstico preciso e faça as intervenções necessárias devidas para cada
pessoa (PINHEIRO, 2016).
Há diferentes manifestações da síndrome de depressão: transtorno depressivo,
depressão atípica, depressão bipolar, depressão pós-parto, o transtorno afetivo sazonal e a
distimia. Existem algumas causas e fatores de risco para a depressão, como a solidão, falta de
apoio social, recentes experiências de vida estressantes, história familiar de depressão,
problemas de relacionamento ou conjugal, tensão financeira, trauma ou abuso na infância, usa
de drogas, situação de desemprego ou subemprego, problemas de saúde ou dor crônica.
Compreender a causa da depressão é o primeiro passo para superar o problema e
buscar um tratamento baseado em mudança para um estilo de vida saudável, que incluem
práticas de yoga, relaxamento, dança, alimentação saudável, medicação, psicoterapias,
eletroconvulsoterapia, estimulação magnética transcraniana repetitiva, suplementos
alimentares, atividades físicas e Mindfulness (LUCAS, 2016).
225
auxiliar, contribuindo para a saúde das pessoas (MELO, 2014; RAMOS, 2015; RIJO et al,
2014). O Mindfulness pode ser utilizado por pessoas de qualquer idade e com poucas
restrições para ser executado (PAZ; VITÓRIA, 2015).
O Mindfulness, ao ser aplicado, está associado à regulação do afeto e da autoaceitação,
auxiliando o indivíduo a ser menos propenso aos pensamentos negativos e às ruminações, que
lhe tiram a felicidade e trazem mais dores emocionais.
O propósito da meditação Mindfulness é de libertar o indivíduo do padrão de respostas
automáticas, conduzindo a uma atenção maior e consciência dos hábitos, que determinam a
maneira da pessoa se comportar e se relacionar com o mundo. Exercícios de meditação
permitem que se possa fazer uma relação entre os pensamentos, emoções e opiniões, de
maneira mais flexível e racional. O treino intencional da atenção permite que se possa usar
determinadas técnicas para se manter centrado e focado, levando à consciência de que
pensamentos, emoções e respostas corporais, muitas vezes, são ativados de modo
inconsciente, buscando-se controlar essa integração da maneira mais flexível e racional
(DEMARZO et al., 2015).
No que tangem aos aspectos sanitários, essa prática contribui para o tratamento de
doenças clínicas e psiquiátricas, bem como para a prevenção do estresse. No âmbito
educativo, percebe-se melhorias nos aspectos relacionados à concentração, rendimento escolar
e nas relações interpessoais. No empresarial, manter a rotina desse disciplinamento mental
contribui para reduzir e prevenir o estresse laboral e aumentar o prazer pelo trabalho.
226
neurocientistas chamam essa atividade de neuroplasticidade. Ainda não se entende como todo
esse processo funciona, mas os resultados são observáveis na formação de uma memória. A
técnica é uma tarefa multifacetada e heterogênea, que envolve de forma focada a
concentração, como abertura de experiências sensoriais, emoções e pensamentos (LAZAR,
2016). A terapia em Mindfulness auxilia o indivíduo na quebra de mecanismos condicionados
negativamente e oferece novas ferramentas para a redução de vulnerabilidades psiquiátricas
(SURREY, 2016).
227
fazer ou reviver situações que já aconteceram produz um movimento de futuro versus
passado, que implica na perda da oportunidade de viver o único momento que existe, que é o
momento presente, quando, na maioria das vezes, não está presente qualquer estímulo de
estresse ou tensão. Entretanto, mesmo quando se está repleto de estímulos estressantes,
aprende-se a estar dentro dessa experiência de forma receptiva, curiosa e sem julgamento,
aceitando a experiência que surge a cada momento, porque essa aceitação nos permite agir de
forma mais discernida e equilibrada, em vez de reagir impulsivamente à situação presente
(POLLAK, 2016).
Com a consciência corporal, aprende-se a ter noção do corpo em cada momento
presente da experiência. Na realidade, presta-se pouca atenção ao corpo e, no entanto, ele dá
dicas de como acontece o pensamento refletido nele, trazendo desequilíbrios ao bem-estar
físico, que, muitas vezes, passam despercebidos pela pessoa. Ao cultivar a capacidade de
reconhecer os sinais, o indivíduo será mais apto a geri-los de uma forma construtiva, para que
o reequilíbrio seja restabelecido. Por exemplo, ao notar a tensão dos ombros enquanto se está
trabalhando no computador, deve-se buscar relaxá-los, ou, quando se está nervoso e se
contraem as mãos de forma inconsciente, notar e tentar relaxá-las (OLAZ et al., 2019).
228
relaciona com eles, se acredita ou não neles e como se deixa influenciar ou não por tais
pensamentos. Pensar que esses pensamentos e sentimentos são realidade produzirá grande
sofrimento, mas, ao tomar consciência de que eles são simples acontecimentos mentais, que
são impermanentes e não têm fundamento na realidade, a sua influência será mínima, sem
trazer turbulência para a vida da pessoa (BRIERE, 2016).
A terapia em Mindfulness é a melhor ferramenta para desenvolver a inteligência
emocional, a perceber o surgimento dos pensamentos e das emoções em si e nos outros e
conseguir discernir entre eles, e assim passar a ter escolha, permitindo cultivar o desejável e
não dar atenção ao indesejável (RIJO et al., 2014).
Estudos sobre terapias mostram a sua utilização no incremento do rendimento no
trabalho e da produtividade, em geral, por meio da atenção, da concentração e da resiliência e
também no desenvolvimento da inteligência emocional, que proporciona uma melhora na
qualidade dos relacionamentos e da liderança (GOLEMAN, 2012).
Como toda terapia, existe contraindicação e precauções no momento de ser utilizada, e
deve-se fazer uma avaliação clínica antes de participar de grupos terapêuticos. A primeira
precaução é com indivíduos saudáveis e com baixa motivação, hipercríticas ou com atitudes
de oposição, e a outra precaução é com indivíduos doentes, ou seja, pacientes em fase aguda
de qualquer transtorno, como depressão grave, transtorno bipolar ou psicose, em crise
dissociativa, transtornos de estresse pós-traumático e de personalidade (HIRATA; RANGÉ,
2014, p. 83).
Quanto à adesão à terapia,
[...] pacientes com dor crônica abandonam com mais frequência do que os que
padecem de outras doenças como o estresse, a insônia, a ansiedade, hipertensão
arterial. E os homens tendem a abandonar a prática com mais frequência do que as
mulheres (DEMARZO; GARCIA-CAMPAYO, 2015, p. 218).
229
indivíduo na quebra de mecanismos condicionados negativamente e oferece novas
ferramentas para a redução a vulnerabilidades psiquiátricas (SURREY, 2016).
Assim, o Mindfulness tem sido proposto por diferentes autores como intervenção
terapêutica para transtornos mentais, promovendo o treino mental de emoções, sensações etc.
(BRIERE, 2016; FULTON, 2016; HIRATA; RANGÉ, 2014; PERGHER, 2016; POLLAK,
2016; RANGÉ; SOUZA, 2015; SIEGEL, 2016).
230
Portanto, entende-se que o produto ganha relevância diante do que defendem Carneiro
e Porto (2014), ao destacar que o processo de desinstitucionalização de hospitais
psiquiátricos, promovido pela Reforma Psiquiátrica em 2001, deu origem a um modelo de
atendimento balizado por princípios como: “[...] a internação como último recurso a ser
indicado à pessoa com transtorno mental; a assistência humanizada e integral em serviços
comunitários que contam com equipe interdisciplinar e recursos terapêuticos diversos”
(CARNEIRO; PORTO, 2014, p. 152).
No caso específico do curso de graduação em enfermagem, que é o foco deste estudo,
o período de levantamento dos dados ainda coincidiu com o início da maior pandemia vivida
no planeta: a COVID-19, que estabeleceu o distanciamento social como uma das práticas de
precaução e controle. Assim, tanto a pandemia quanto o distanciamento social implicaram
diretamente na saúde mental da população.
Essa afirmação é confirmada por Garrido e Rodrigues (2020), quando relatam que a
restrição de contatos interpessoais, além de complexas questões sociais e econômicas, pode
trazer agravos substanciais a saúde individual, incrementando, inclusive, o número de
patologias associadas à ansiedade, depressão e, até mesmo, aquelas que desencadeiam
práticas de suicídio.
Portanto, pode-se inferir que a investigação aqui apresentada veio ao encontro da
necessidade de se pensar na saúde daqueles profissionais que estão na linha de frente da
pandemia do Coronavírus, que descortinou um cenário no qual foi possível constatar a
angústia que discentes de enfermagem apresentaram ao lidar com a população nos hospitais
ou nos Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) das cidades, impactando na saúde
mental desses estudantes que já estão atuando nas instituições hospitalares, causando estados
de ansiedade, estresse acentuado e, até mesmo, depressão.
O Workshop Pedagógico foi pensado justamente para auxiliar os graduandos de
enfermagem na aquisição do equilíbrio necessário para lidar com a população que chega até
ele, como também para uso próprio, constituindo, assim, como uma estratégia de alívio e
combate ao estresse, ansiedade e a depressão.
Desse modo, procuramos desenvolver um produto que pudesse contribuir para a
capacitação desses graduandos em Enfermagem, para assegurar o seu equilíbrio emocional na
sua prática diária e restauração de sua saúde mental, que se constituiu em uma formação em
Mindfulness como técnica de equilíbrio mental.
231
Etapas do Planejamento Workshop
O Workshop Pedagógico de Mindfulness foi roteirizado com 20 horas, que podem ser
distribuídas de acordo com a necessidade do público-alvo, possibilitando ser, no mínimo, dois
dias, parte da manhã e tarde, ou distribuídas por mais dias, com duração diária de duas horas e
trinta minutos, atingindo o total de 8 semanas.
Com a pretensão de se tornar mais um espaço para debater a saúde mental desses
estudantes, pretende-se, também, que se constitua em uma estratégia de autocuidado que pode
ser utilizada autonomamente em diversos momentos do cotidiano do discente em
enfermagem, com o intuito de diminuir ansiedade, estresse e depressão.
As atividades, com as suas respectivas práticas de operacionalização, foram
organizadas em etapas (Quadro 2). Sugere-se que essas atividades sejam desenvolvidas com o
apoio de setores e outros profissionais envolvidos no atendimento aos discentes, dentro da
universidade.
232
Certificação dos Encaminhamento, para o e-mail dos participantes do curso e para o respectivo
participantes do Workshop campus, para a Auditoria Geral ou Coordenação do curso para o respaldo legal
Pedagógico em perante a legislação.
Mindfulness
Fonte: Autoras (2021)
Considerações finais
233
Ressaltamos, que essa associação – TCC e Mindfulness - contribui para o combate ao
negativismo, defende a responsabilidade individual e fornece soluções rápidas, com base em
objetivos, diferentemente de outras terapias que utilizam a fala terapêutica a longo prazo.
Pode-se concluir que a problemática da saúde mental de profissionais da área da
saúde, incrementada pelo momento pandêmico, se apresenta para os enfermeiros como grande
um desafio, pois esses trabalhadores representam um dos grupos que está mais exposto à
COVID 19, devido ao contato mais próximo com as pessoas adoecidas e pelas circunstâncias
laborais que envolvem, inclusive, jornada dupla de trabalho.
Portanto, a proposta de oferta do Workshop Pedagógico no âmbito da formação
superior desses profissionais constitui em uma ferramenta auxiliar para este profissional
desenvolver práticas de autocuidado para a sua saúde mental e adquirir mais autonomia no
alcance do equilíbrio emocional, que impactará positivamente para uma melhoria na
qualidade de vida.
Referências
BAUMAN, Z. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro. Zahar.
2004.
CARNEIRO, L. A.; PORTO, C. C. Saúde mental nos cursos de graduação: interfaces com as
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