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Práticas Pastorais II

Material Teórico
A Pastoral de Conjunto

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Me. Elizabete Guilherme

Revisão Textual:
Prof. Esp. Claudio Pereira do Nascimento
A Pastoral de Conjunto

• As Motivações Iniciais do Trabalho em Conjunto;


• Os Elementos do Plano de Pastoral;
• A Necessidade de Articular os Planos Pastorais e a Igreja no Brasil.

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Apresentar os elementos que suscitaram o surgimento de uma pastoral de conjunto;
• Destacar a importância da ação pastoral na comunidade eclesial;
• Conhecer alguns aspectos do planejamento pastoral na Igreja do Brasil.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.

Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.

Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.

Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e de se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;

No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos
e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de
aprendizagem.
UNIDADE A Pastoral de Conjunto

Introdução
A ação pastoral, assim como qualquer outra ação humana, não está isenta da
influência de mudanças que acontecem na sociedade. Seja ela, próxima ou distante,
toda mudança impacta na maneira como vemos e como nos relacionamos com o
mundo, com as pessoas, com a natureza e como nossa ideia de Sagrado, de Divino.
O que veremos nesta Unidade é como a necessidade de articular ações e de
estabelecer metas promoveu profundas alterações nas organizações religiosas.
O desejo de envolver a comunidade eclesial provocou a necessidade de não só
conhecer, mas aprofundar os elementos mais importantes da ação pastoral e de
como essas ações podem influenciar as mudanças nas sociedades.
Muitos foram os protagonistas dessas reflexões e as contribuições de diferen-
tes fontes foram fundamentais para o que passou a ser conhecido como Pastoral
de Conjunto ou Pastoral Orgânica. Essas iniciativas terão início nos países euro-
peus, sobretudo naqueles de tradição protestantes, e mais tarde também países de
maioria cristã católica, como o caso do Brasil. Irão reconhecer a necessidade e a
urgência de repensar, organizar, planejar e desenvolver ações pastorais articuladas
nos vários níveis de Igreja, dedicando especial atenção ao contexto social, político
e econômico onde estão inseridas.

Início da Pastoral de Conjunto


A natureza da Pastoral de Conjunto
Os primeiros responsáveis por pensar em uma ação pastoral articular e que se
preocupasse em anteder outras necessidades da sociedade e agir de forma conjunta
foram os sociólogos. Por isso, a definição da natureza da pastoral, que ficou co-
nhecida como Pastoral de Conjunto, agrega, além da dimensão teológica, também
aspectos sociológicos. Isso compreende-se que, considerando o momento de surgi-
mento dessa pastoral, não só a Igreja tem como preocupação o planejamento das
ações pastorais para a sociedade que passa por profundas transformações.
A dimensão teológica se encontra na responsabilidade do bispo em exercer o
oficio de ensinar, coordenar e articular as ações dos batizados de modo a exercer
com plenitude seu trabalho pastoral. A pastoral de conjunto nasce, portanto, dos
esforços de coordenar um conjunto de ações diferentes e complementares que es-
tão na base das atividades pastorais.
O desafio da pastoral de conjunto está em agir com novidade; em criar equipes e
grupos estruturados; em trocar experiências de planejamento, iniciativas e ação; em
rever as convivências; em aceitar as responsabilidades pessoais e agir com solidarie-
dade, além de respeito e acolhida das opiniões individuais (FLORISTÁN, 1998).

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Os Primeiros Passos
Os elementos que despertam a preocupação por uma ação pastoral realizada
em conjunto e de forma planejada e com planos de ação definidos surgem na Eu-
ropa no início do século XX. Portanto, estamos falando de uma prática bastante
recente das Igrejas.

O crescimento das cidades desperta nas autoridades, civis e eclesiásticas, a pre-


ocupação com o planejamento das ações e com a coordenação pastoral em uma
sociedade cada vez mais urbana e industrializada. As pessoas têm outro ritmo de
vida, as preocupações e os desafios de viver em cidades cada vez mais complexas
esvaziam o sentido do aspecto religioso e as práticas pastorais perdem espaço na
conturbada rotina cotidiana.

Da preocupação com o cuidado pastoral, em 1911 na cidade de Friburgo, em


Brisgovia (região da Alemanha), o padre e assistente social alemão Lorenz Wertmann
(1858-1921) idealiza e funda um organismo que será responsável pela ajuda na
pastoral, a Cáritas. A partir de 1934, ela se tornará uma instituição nacional de ajuda
pastoral e que será uma das instituições beneficentes cristãs mais bem-sucedida até
os dias atuais. Em Viena, na Áustria, a preocupação pela ação pastoral e cuidado
das almas nas grandes cidades também eram o tema de encontros que começaram
em 1921 e dez anos depois, 1931, passaram a ser celebrados anualmente e cuja
responsabilidade era o de coordenar a mentalidade de seus diversos responsáveis.
Com o avanço do nazismo e proibição de encontros nacionais, criaram-se em 1933
“oficinas diocesanas de pastoral” (FLORISTÁN, 1998).

Por sua vez, na França, foi o Movimento da Ação Católica* e seus movimentos
apostólicos que ajudaram a perceber os problemas e dificuldades da ação pastoral
tradicional. Esses movimentos apontavam para uma ação tradicional individualista,
invertebrada e distante da realidade do mundo, além de não responder as urgências
da evangelização. Um bom exemplo é o movimento da Juventude Operária Católica
(JOC), fundada pelo cardeal belga Monsenhor Josef-Léon Cardeal Cardijn, em 1924,
com o objetivo de evangelizar a classe operária, assim como outras iniciativas de
apostolado secular que foram surgindo. Destas iniciativas surgiam um novo tipo de
Igreja a ser implantado em zonas urbanas, industriais, operárias, turísticas etc.

A Ação Católica é, na verdade, um conjunto de movimentos criados na Igreja com o objetivo


Explor

de ampliar seus campos de atuação na sociedade. E, embora o Papa Pio XI seja considerado
seu fundador (pela dedicação e empenho em oficializar muitas das ações propostas pelo
movimento), a data de origem do movimento é anterior ao seu pontificado (de 06/02/1922
a 10/02/1939), como a data de 29/07/1867 indicada na Itália como data de fundação pelos
jovens Giovanni Acquaderni e Mario Fani.

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UNIDADE A Pastoral de Conjunto

Entre 1931 e 1940, as iniciativas de Gabriel Le Bras (1891-1970), um jurista,


sociólogo e historiador da igreja francesa, de inventariar e explicar os efeitos do ca-
tolicismo nas diversas regiões francesas pareceram inócuas. Somente após 1940 é
que se intensificou um movimento de renovação da ação pastoral total com a influ-
ência de fatores como a Missão de França de 1941, assim como a experiência dos
sacerdotes operários, dos campos de concentração durante a segunda guerra e da
resistência francesa ao domínio nazista, ou, ainda, da renovação da missão paro-
quial entre 1943-1945 e o despertar da Ação Católica especializada por ambientes.

No Brasil, entre os fatores que contribuíram para a articulação da ação pastoral


está a criação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil*, em 14 de outubro
1952 na cidade do Rio de Janeiro. As experiências pastorais na Europa, assim
como a Ação Católica e outros movimentos pastorais no Brasil, estiveram na ori-
gem da fundação da CNBB. A introdução da pastoral de conjunto e das práticas de
planejamento estarão entre suas principais atividades.
Explor

Para conhecer um pouco mais da CNBB: http://bit.ly/2PWOFQQ

Essas e outras ações e iniciativas acabaram por influenciar o Concílio Vaticano II e


as concepções de pastoral que nele se fortaleceram e apontaram para um novo jeito
de ser de Igreja e de estar no mundo contemporâneo.

Pastoral de Conjunto antes


do Concílio Vaticano II
Como afirmam os historiadores, as novidades do Concílio Vaticano II foram
resultados de experiências de um novo jeito de ser Igreja que já estavam sendo
gestadas em vários lugares do mundo. A definição deste concílio como “pastoral”
deixa claro sua intenção de estar no mundo e contribuir, efetivamente, para a trans-
formação das realidades que não testemunham os valores do evangelho. Essa pre-
ocupação em participar ativamente da sociedade enfrentando seus desafios e suas
mudanças também influenciaram a pastoral de conjunto. Diante disso, é possível
destacar, ao menos, três momentos de seu desenvolvimento – enquanto organiza-
ção da ação pastoral – que antecedem ao Concílio Ecumênico do Vaticano II.

A primeira etapa pode ser apontada como a ruptura entre vida e religião.
O isolamento da ação pastoral não é percebido apenas nos indivíduos, mas
nas sociedades. Em um processo que não cessará, a Europa, em particular,
vai se tornando menos cristã. As ações pastorais precisavam ampliar seus
horizontes de atuação e era necessário, senão urgente, implantar ações com
uma dimensão social, cuja preocupação ultrapassasse as paredes e muros das
Igrejas e alcançasse as pessoas no lugar onde estivessem.

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Essa constatação da necessidade de uma nova ação pastoral foi sentida pelo
Papa Pio XII, que no ano de 1955, durante um discurso, deixou explícita sua pre-
ocupação com o individualismo e com o isolamento e a desunião das ações pasto-
rais. A preocupação de Pio XII com as ações pastorais será objeto de um segundo
discurso realizado também em 1955, no qual ele convida a uma razoável coordena-
ção dos ministérios em um quadro suficientemente amplo.

Em uma segunda etapa, a preocupação se volta para o interior da Igreja. A orga-


nização da ação pastoral deve definir os papéis de cada um na tarefa evangelizadora
e coordenar as atividades paroquiais. Ou seja, é preciso situar o trabalho apostólico
dos sacerdotes e dos seculares dentro de uma pastoral global. Floristán aponta como
momento decisivo e significativo para esta etapa, o Congresso Nacional “União das
Obras” ocorrido em 1956 na França, sobre o tema “Trabalho Pastoral Comum”, pois
“nele se tomou consciência de ampliar a visão pastoral, integrar as forças apostólicas,
situar a paróquia e a arquidiocese dentro da zona humana e coordenar as responsa-
bilidades” (FLORISTÁN, 1998, p. 231).

E, por fim, a dimensão diocesana da ação pastoral ganha destaque, daí a ne-
cessidade de articular as atividades, direcionando os organismos e seus esforços
para setores da pastoral. O intercâmbio das iniciativas entre os bispos franceses dá
início, em 1959, a experiências da pastoral de conjunto. Em 1962, a Igreja francesa
cria as regiões apostólicas com o objetivo de coordenar as ações. Também, a Igreja
em países como Itália (cuja Conferência Episcopal Italiana – CEI será fundada em
1971) e Alemanha (a Conferência Episcopal Alemanha tem a primeira reunião de
bispo datada de 1848, mas cujo estabelecimento legal se dará por um Decreto,
somente em 1966) irá reconhecer os valores e importância da iniciativa de articula-
ção e trabalho conjunto da Igreja francesa, adotando medidas semelhantes em seus
respectivos países.

A ação pastoral no Brasil não ficou indiferente às mudanças pelas quais a socie-
dade e a Igreja estavam passando e também optou por uma ação que contemplava
a práxis e a reflexão inspirada por um mandato teológico pastoral.

A Organização Pastoral no Brasil


Assim como nos demais países, o Brasil também sofreu os impactos das duas
grandes guerras mundiais. A organização da sociedade e as regras para o convívio
social passaram por mudanças significativas, assim como as crenças das pessoas.
No século XX, a América Latina também passava por profundas mudanças e sofria
com as influências externas. Crises econômicas e políticas, subdesenvolvimento e
aumento da pobreza e da desigualdade se espalhavam pelo continente.

Diante disso, a pastoral no Brasil buscou fortalecer algumas iniciativas isoladas,


mas que estavam dando frutos positivos na ação junto as comunidades mais pobres
do Nordeste brasileiro, aos operários, à educação de base, à evangelização popular
e também àquelas no campo sociopromocional. Todas essas ações careciam de

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UNIDADE A Pastoral de Conjunto

melhor planejamento e de um plano de ação que permitisse a ampliação tanto de


seus objetivos, mas, sobretudo, quanto ao número de sujeitos atingidos. Nesse mo-
mento, a parceria de atuação entre clérigos e leigos foi fundamental para o sucesso
das ações seguintes.

Sob a influência da ação pastoral na Europa, a Ação Católica Brasileira (1935),


os Movimentos de Natal, por um Mundo Melhor e de Educação de Base, o serviço
de Assistência Rural e a criação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), empenharam-se na ajuda mútua e na promoção de ações, pastorais e
sociais, que tinham como objetivo último de, por meio da evangelização, criar uma
sociedade mais justa, solidária e igualitária.

Os Movimentos por um Mundo Melhor e Ação Católica tinham linhas de ação bem diferentes.
Explor

Enquanto o primeiro tinha caráter intereclesial, o segundo propunha uma ação transforma-
dora da sociedade. Pesquise e saiba mais sobre esses importantes momentos da articulação
da ação pastoral na Igreja do Brasil.

Os movimentos, que iniciaram ou que se fortaleceram durante o Pontificado de


Pio XII, tiveram continuidade com as ações de João XXIII – o “Papa Bom”. Seu cui-
dado para com os pobres, além da preocupação para com a situação da América
Latina, fiz com que dedicasse especial atenção à Igreja Latino-americana.

Figura 1 – Angelo Giuseppe Roncalli (25/11/1881 – 03/06/1963) foi um religioso da Ordem Franciscana Secular.
Enquanto era Patriarca de Veneza, foi eleito ao cargo máximo da hierarquia católica em 28/10/1958 e assumiu o
nome de João XXIII. Sua simplicidade e solicitude, além do cuidado para com os mais pobres, remetia à figura do
Bom Pastor e, por isso, recebeu a alcunha de o “Papa Bom”
Fonte: Wikimedia Commons

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Sua eleição ao pontificado se deu em um momento de crise em vários países lati-
nos. As convulsões político-sociais apontam para uma provável revolução comunis-
ta em Cuba, além dos regimes ditatoriais que se espalhavam pelo continente. Quin-
ze dias após sua eleição recebeu os delegados do encontro do Conselho Episcopal
Latino Americano (CELAM), em Roma, e fez um apelo para que, o mais rápido
possível, elaborasse um adequado plano de pastoral capaz de iluminar a mente dos
fiéis, reforçar a vida sacramental e fortalecê-los na fé; aproveitou a oportunidade
para solicitar aos governantes urgência nas reformas sociais e acrescentou que o
esforço na promoção humana é tarefa da Igreja toda – hierarquia e fiéis.

Você Sabia? Importante!

O CELAM é um organismo que reúne os Bispos dos países da América Latina e sua funda-
ção, em 1955 com sede em Bogotá, tem grande influência da experiência do trabalho de
Dom Hélder Câmara na criação da CNBB.

Será este o espírito que norteará a pastoral de conjunto no Brasil precedida


por uma iniciativa de planejamento e organização da ação pastoral num plano
chamado de Plano de Emergência.

Plano de Emergência
A Igreja do Brasil atendeu aos apelos de João XXIII por uma pastoral de conjun-
to e pelo planejamento pastoral. Dentre as figuras que se destacam nesse primeiro
momento do planejamento no Brasil está o Arcebispo de Olinda e Recife, Dom
Hélder Câmara (1909-1999), que, à época, era Secretário Geral da CNBB. Con-
victo não só da necessidade, mas também da urgência de articular e coordenar a
ação da Igreja no País em nível nacional, não poupou esforços a fim de mobilizar o
episcopado no sentido de responder aos apelos do Papa. Cabe acrescentar que as
iniciativas de D. Hélder aproximaram e comprometeram a Igreja às lutas na defesa
dos direitos humanos.

Formulado antes da primeira sessão do Concílio Ecumênico do Vaticano II, o


Plano de Emergência para a Igreja do Brasil (1962) recolheu e sintetizou, à luz da
realidade e da reflexão teológica, o que de mais positivo havia na experiência pas-
toral das Igrejas particulares no País.

Destaque teve a experiência levada à cabo na Arquidiocese de Natal, no Rio


Grande do Norte, com o trabalho e ações pastorais organizadas em três esquemas
fundamentais na ação realizada naquela diocese: a renovação paroquial, a renova-
ção dos educandários e a experiência incipiente da pastoral de conjunto.

Esse esquema foi enriquecido pelas contribuições de D. Hélder que acrescentou


à renovação paroquial elementos teológicos subjacentes à experiência do Nordeste,
tal contribuição introduziu a ideia embrionária das Comunidades Eclesiais de Base
(CEBs) que se configuraram como um “novo jeito de ser Igreja” no Brasil. Também

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UNIDADE A Pastoral de Conjunto

a renovação dos educandários passou por alterações e recebeu acréscimos, uma


vez que o plano foi apreciado pelos movimentos que já atuavam na educação de
base e no meio dos jovens, a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Juven-
tude Estudantil Católica (JEC). Diante das diferentes linhas de ação desses dois
movimentos estudantis existentes no seio da Igreja e atuando ativamente entre os
estudantes (níveis superior e secundário), o texto final apresentado sofreu algumas
alterações com relação ao texto original.

A sensibilidade e o compromisso cristão de Dom Helder, ciente e consciente de


que sua missão evangelizadora deveria atingir a todos e promover mudanças con-
cretas na sociedade, fez com que ele sugerisse o acréscimo de dois novos esquemas
àquele da Diocese de Natal.

Um primeiro novo esquema era o que deixava cada vez mais claro que era
preciso acentuar a atuação da Igreja no campo socioeconômico, por meio de uma
ação planejada e coordenada; o outro esquema tratava justamente da renovação do
ministério sacerdotal. A ação pastoral é uma ação de Igreja, compreendida já na-
quele tempo a partir da eclesiologia que o Vaticano II irá consolidar: a Igreja como
“povo de Deus” com responsabilidades e papéis diferentes, porém com a mesma
dignidade de filhos/filhas de Deus e enquanto batizados participantes do tríplice
múnus: rei, profeta e sacerdote.

O Concílio Vaticano II apresentou 16 documentos finais (Constituições Apostólicas, Constitui-


Explor

ções Doutrinais, Decretos e Declarações) e um deles foi dedicado à doutrina sobre a Igreja – a
Lumem Gentium.

O resultado desses esforços de D. Hélder e do episcopado brasileiro em atender


ao apelo do Papa e planejar a ação da Igreja foi um conjunto de documentos sobre
os diferentes aspectos da vida da Igreja no Brasil. Desse período, Beozzo afirma que:
A CNBB, criada em 1952, crescia graças ao dinamismo do seu secretá-
rio, por 12 anos seguidos, Hélder Câmara, da infraestrutura da Ação Ca-
tólica, de um punhado de leigos que aí prestavam seus serviços e de um
grupo de bispos, de origem nordestina, principalmente, que prestavam
apoio incondicional à organização. (BEOZZO, 1996, p. 40)

O período de elaboração do plano (entre dezembro de 1961 e abril de 1962) ex-


plica suas limitações e deficiências, por um lado, mas por outro expressa a decisiva
vontade do episcopado brasileiro de optar pela pastoral de conjunto. A Assembleia
Geral da CNBB, reunida no Rio de Janeiro entre os dias 02 e 05 de abril de 1962,
aprovou, por quase unanimidade, os textos do Plano de Emergência.

O documento foi chamado de Plano de Emergência para a Igreja do Brasil, jus-


tamente para caracterizar a situação de emergência pastoral que vivia a Igreja no
Brasil, e a natureza mesma do plano: provisório, e que deveria ser (como foi) um
passo inicial para o planejamento da ação pastoral. “O Plano de Emergência era

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a ferramenta que faltava à CNBB no sentido de traçar diretrizes que apontassem
rumo e direção para os trabalhos da Igreja”, afirma Beozzo (1996, p. 41).

Um dos pontos mais importante na operacionalização do plano de emergência,


além da criação de comissões para tratar de áreas específicas como a de ensino
superior, opinião pública etc., a criação dos Secretariados Regionais (CNBB, 2004,
p. 25), do ponto de vista de organização e operação, foi a decisão mais importante.

A execução do plano de emergência coincide com os anos de duração do Con-


cílio Vaticano II. Se por um lado havia a dificuldade da dinâmica de implantar o
plano, por outro, as inovações conciliares na eclesiologia e na prática pastoral indi-
cavam que, embora com ajustes, o caminho escolhido era o correto.

O ano de 1964 não foi marcado apenas por mudanças na Igreja e pelas manifes-
tações em diversos países do mundo. Enquanto a terceira sessão conciliar acontecia
em Roma, o Brasil era jogado numa ditadura civil-militar que perdurou até a década
de 1980.

Plano de Pastoral de Conjunto


O caminho percorrido pela Igreja no Brasil, os movimentos intra e extraecle-
siais, a articulação das ações e os resultados do Plano de Emergência motivaram o
plano quinquenal de Pastoral de Conjunto (ou Pastoral Orgânica) com planejamen-
to de ações para o período de 1966 a 1970. Sobre a aplicação e a abrangência do
plano de Pastoral de Conjunto, Beozzo (1996, p. 41) afirma que “já inteiramente
calcado nos documentos do Concílio, repensados à luz da realidade brasileira e con-
vertidos em metas pastorais concretas, para todas as dioceses e seus organismos
intermediários e de base”.

O que se pode deduzir dessa afirmação de Beozzo é que a experiência adquirida


permitiu que a ação pastoral no Brasil permanecesse organizada, unida e articulada
de tal forma que os planos pudessem ser executados. Mesmo diante dos desafios,
sobretudo no plano social, as crises e embates internos não foram suficientes para
paralisar ou impedir o plano.

Diferente do que ocorreu com o Plano de Emergência e também resultado da ex-


periência de elaboração dele, o Plano de Pastoral de Conjunto apresenta-se como
um documento único, orgânico, formado por três partes intimamente ligadas: uma
introdução do plano, as diretrizes fundamentais da ação pastoral e o plano nacional
de atividades da CNBB.

O plano foi montado em torno de dois objetivos fins: um de caráter teológico,


relacionado com a missão da Igreja, compreendida à luz do Concílio Vaticano II;
o outro, instrumental, próprio da finalidade de um plano de ação. O objetivo geral
do plano é de “Criar meios e condições para que a Igreja no Brasil se ajuste, o
mais rápido e plenamente possível, à imagem de Igreja do Vaticano II” (CNBB,
2004, p. 29).

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UNIDADE A Pastoral de Conjunto

Seu objetivo principal apresenta quatro aspectos fundamentais que traduziam


muito da compreensão de Igreja e de ação pastoral que se tinha à época, bem
como a necessidade de mudança na forma de ser Igreja (CNBB, 2004):
1. Renovação da Igreja, no Brasil, que pode ser traduzido como conhecer a
realidade atual e confrontá-la com a imagem do Vaticano II – em outras
palavras, com a eclesiologia confirmada pelo Concílio – e se ajustar a esse
novo modo de ser Igreja;
2. Criação de meios e de condições para a renovação. A renovação, assim
como se apresenta a partir do Concílio, é dom de Deus. Todavia, não
é suficiente apenas constatar e ter o desejo de mudança e ajuste, mas,
também, criar os meios e dar condições para que esta renovação se efetue
o mais plenamente e rápido possível;
3. O tempo em que se realizará esta renovação. Sendo a renovação dom de
Deus, não é possível prever em que ou quanto tempo ela se dará, porém, é
imprescindível criar as condições e os meios que dependem de nossa ação.
Este é o sentido da ação pastoral;
4. A continuidade da renovação. “O plano deverá dar continuidade, seguran-
ça e progresso à ação da Conferência, tornar-se um instrumento privilegia-
do de aplicação do “afeto colegiado” e da corresponsabilidade e solicitude
episcopal” (CNBB, 2004, p. 30).

Não era suficiente a elaboração de um plano para que a ação pastoral no Brasil
acompanhasse não só as mudanças da sociedade, mas se aproximasse do jeito de
ser Igreja proposto pelo Concílio. Era fundamental apontar quais seriam as opções
básicas do plano e da Igreja.

Um primeiro ponto é a tomada de consciência de onde estamos e de que tal


constatação torne-se a referência de onde queremos chegar. O que é possível ser
feito diante da realidade que nos apresenta e do que temos como recursos e meios
para a ação pastoral.

Sem essa clareza, as ações se tornam atividades sem rumo e os esforços e ações
acabam sendo desperdiçados ou perdidos. A dinâmica do processo é outro aspecto
a ser percebida, a renovação não é algo estático, mas em constante e permanente
movimento respondendo aos impulsos do Espírito Santo que vitaliza a Igreja pere-
grina, fazendo-a crescer e se renovar com constância.

O terceiro aspecto do Plano de Pastoral de Conjunto é promover e garantir a


maior e melhor participação de todo o Povo de Deus, sob orientação do ministério
hierárquico. Nesse ponto cabe destacar a recuperação da figura do pastor, sua fun-
ção de cuidar de seu rebanho e também a importância da participação dos leigos
como agentes da ação. Os objetivos e as linhas fundamentais de trabalho visam
sublinhar as diversas dimensões da missão da Igreja numa pastoral verdadeiramente
orgânica, articulada, coordenada e livre das tendências e mecanismos de justaposi-
ção e paralelismos (CNBB, 2004).

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As linhas de ação da pastoral irão ampliar o campo de atuação do cristão.
Os horizontes dos cristãos se expandem para além dos muros da comunidade
eclesial e pousará os olhos sobre as mais variadas lutas dos povos do Brasil.
O plano definiu seis linhas de ação: unidade visível, evangelização, catequese,
liturgia, ecumenismo e promoção humana. Essa elaboração do plano pastoral de
conjunto permitiu equacionar teologia, pastoral e ciências humanas, e foram as
bases para ampliação da ação da Igreja em diferentes áreas.

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UNIDADE A Pastoral de Conjunto

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Sites
Eclesiologia
http://bit.ly/2PS2Pmq

Livros
Da Igreja da Cristandade à Igreja dos Pobres
BERNAL, S. CNBB. Da Igreja da Cristandade à Igreja dos Pobres. São Paulo: Edições
Loyola, 1989.

Vídeos
O Santo Rebelde
BAUER, E. (direção e roteiro) Dom Hélder Câmara. O Santo Rebelde (Documentário,
74 min.) Sinopse: O filme revisita os pensamentos de Dom Helder Câmara, Bispo
Católico perseguido pela ditadura militar na década de 60. Arcebispo Emérito de
Olinda e Recife, faleceu em 1999. Mostra sua luta pela promoção humana contra a
miséria e as injustiças sociais e sua luta pela paz mundial. Depoimentos de amigos,
estudiosos e o próprio Dom Helder em cenas inéditas no Brasil e na Europa.
https://youtu.be/Bv06s3UNgdY

Leitura
Revista de Cultura Teológica
SOUZA, N. de A. Ação Católica, militância leiga no Brasil: méritos e limites. In:
Revista de Cultura Teológica – V. 14 – N. 55- Abr/Jun - 2006.
http://bit.ly/2PUDxUG

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Referências
BEOZZO, J. O. A Igreja do Brasil. De João XXIII a João Paulo II – de Medellín a
Santo Domingo. 2. ed. Petrópolis: Vozes,1996.

CNBB. Plano de Emergência para a Igreja do Brasil. Documentos da CNBB 76.


2. ed. São Paulo: Paulinas, 2004.

CNBB. Plano de Pastoral de Conjunto. 1966-1970. Documentos da CNBB 77.


2. ed. São Paulo: Paulinas, 2004.

FLORISTÁN, C., Teologia Practica. Teoria y práxis de la accion pastoral. 3. ed.


Salamanca: Sigueme, 1998.

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