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Minha Menina

Adriana Vargas
Livro 2
De Meu Senhor

ACHERON - NACIONAIS - APOLLYMI


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Editora Ella

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Sumário
Minha Menina
Adriana Vargas
Editora Ella
Mundos Transponíveis
Capítulo 1
Capítulo 2
Confidências Pessoais
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
O Reencontro Decisivo
Epílogo

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Mundos Transponíveis

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Capítulo 1
O vento gélido anunciava a impressão da eternidade do frio que vinha de
Old, e parecia ser feito especialmente para o Castelo de Siv. A primavera
logo viria para forrar as calçadas de flores flamejantes do flamboyant, que
floresce profusamente quando recebe o Sol pleno, competindo com qualquer
outra planta que ficasse sob sua copa.
A atmosfera no Castelo não era mais a mesma desde a chegada dos dias
que se seguiram após a partida de Charlote para a Terra dos Mortos, e a
chegada de novas escravas para o clã de Aragorne Tirel. Por mais que se
esforçasse, Seren não conseguia distrair seu Senhor, que mantinha o
pensamento perdido, ora em algum canto do Castelo, ora no vagar dos olhos
pela janela diante do silêncio que agora o definia.
A menina subia delicadamente pelas pernas, a meia de seda com bordas
rendadas. Acabara de ser possuída pelo Dono, porém ele parecia não estar
presente, o que encheu seu coração de medo e insegurança. Amarrou o laço
na cintura, e ajeitou o pequeno arranjo de flores artificiais que prendiam o
feixe. Ensaiou um meio sorriso e caminhou em direção ao Senhor, que ainda
não havia se trocado. Não sabia se devia tocá-lo, mas algo dizia secretamente
em seu subconsciente, que o melhor a se fazer era permanecer otimista e leal.
Aproximou-se dele e se ajoelhou, olhando para os pés de Tirel, que desejava
imensamente tocá-los.
− Dono de mim, aqui estou à sua disposição. – silenciou na esperança de
ouvi-lo pedir que fizesse algo para agradá-lo.
− Sim, minha pequena. Adoro lhe ver sempre a meu dispor. – cingiu o
assunto enquanto ainda arrostava pela janela em busca de respostas, as quais
daria sua própria vida para trazê-las até ele.

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− Senhor, se me permitir, poderei ler algo que goste… Pensei em alguns


versos… O Senhor aprecia tanto… – atreveu-se.
Tirel voltou à realidade, pestanejou e olhou para Seren.
− Sim, pode ir buscar a obra na biblioteca.
A menina quase cabriolou de alegria. Levantou-se, serelepe, cumprimentou
o Dominador com um gesto, e saiu pela porta esculpida por uma figura
medieval.
O Dono vestia a roupa lentamente enquanto esforçava-se para se manter
presente. Deveria ter se acostumado com a ausência de Charlote, mas a cada
dia sentia ainda mais sua falta. Seu clã estava colmado de escravas sedentas
por sua atenção. Tirel tem feito seu melhor para sanar as necessidades de
cada uma, mas por dentro algo parecia truncado e hiato. Todas as vozes no
silêncio de seus pensamentos não escusavam aquela perda.
Colocou o cinturão e caminhou rumo ao aposento que se localizava ao lado
da masmorra. Lá se encontravam as vinte meninas que estavam sob seus
cuidados desde que sua pupila seguiu para a Terra dos Mortos. Estavam
bordando lençóis novos que haviam chegado da Província. Cantavam uma
canção que aprenderam durante as aulas, e até isso lembrava Charlote. Ele
olhou para a face de cada uma sem que o percebessem. Estavam radiantes,
esta fora a impressão, o que deixou seu coração mais desoprimido.
Voltou para a masmorra quando percebeu Seren chegando com o livro nas
mãos. Ensaiou um sorriso e entraram para o aposento.
− O Senhor gostaria que eu continuasse a ler de onde paramos ou prefere
algum capítulo inédito?
− Quero que escolha algo que agradará seu Dono.
− Sim Senhor.
A menina novamente se ajoelhou e sentou sobre suas pernas. Manuseava o
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calhamaço como se fosse feito da mais delicada joia, até seus olhos brilharem
diante de uma página. Olhou para Tirel e sorriu ao recitar.
“Este alguém aí…
Com um anjo chorando no peito
Posso ouvi-lo no frio de tua alma
Não envelheça sem antes me sentir
Pálido… Sagaz…
Então saberá sobre os ponteiros em minha garganta
E, se eu dissesse que o tempo está se ultimando
Com a aproximação de teus pés a sangrarem
Na benção de um sorriso?
Sente-me?
Tocaria meu corpo nu sob a luz de uma tocha
Nascendo em teus olhos?
Saberia gritar se tua voz se calasse
Se teus lábios pousassem agressivos
Arranhando o céu de minha boca?
Romperia o muro abstrato
Arte do além
Viscerantes ao escutar
A Divina Comédia recitada no rouco lento de minha voz?
Venha-te depressa…
O tempo na ampulheta se perfaz aos poucos
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Não há ninguém aqui além de nós


Toca-me…
Longe das calçadas sujas de um passado que não volta
Jogue a pedra de seu coração
Esvazia-se das mentiras
Não volte antes de me contar teus segredos
Não se exima do mal
Que quebra teu telhado
Sem antes apalpar os meus seios…
Sem antes eu entregar-me inteiramente
Longe o suficiente que não o fará voltar
Distante do que teus olhos me rasgam
E cortam meus pulsos
Há veneno em meu último gole d’água
Bebo-te a miúdo
Lentamente serei tua…
Sem ninguém para me ajudar a voltar
Sem quebrar as garrafas de teu falso pudor
Não há garantias…
Não há juras, nem promessas em um colar de pérolas…
Quando o sublime dos desejos
Instaura-se no teu “eu”…
Com o insaciável meu “eu”…
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A unidade do perpétuo
Um crime mútuo
Sem redenção…”
Ao terminar, ela o olhou, sentia-se fascinada por cada palavra lida. Os
dedos dele apertavam com força o ferro da cadeira, como se quisessem
quebrá-lo. Os olhos firmes não escondiam a paixão latente pela irmã de
coleira que se foi. Seren mordeu o lábio inferior, sabendo que nada o
distrairia, e por mais que ele tentasse, não havia como esconder. Ela queria
acreditar que uma pessoa falecida se dissiparia no abismo dos dias passados,
mas isso não acontece com os sivianos, que não morrem simplesmente
quando enterrados e lembrados como alguém que passou um tempo ao lado
dos seus. Um siviano permanece vivo em outra dimensão, o corpo se refaz
após a entrada no mundo de Siv, semelhante a um ser infindo. Eles voltam
quando são liberados para um novo múnus, e neste momento esquecem a
vida predecessora. Por mais que Seren não entendesse como tudo funcionava,
ela sabia que Charlote estava viva em outra dimensão, e que poderia ter
voltado em seu lugar, mesmo se fosse por um tempo resoluto pela castra
superior da Terra dos Mortos, mas a irmã optou pela honra, cedendo seu
lugar a quem mais compreendeu o Senhor, mesmo quando ninguém poderia
fazê-lo. Seren se sentia grata. Talvez nunca conseguisse retribuir como
desejava, mas suas condolências eram sinceras.
− Vá, menina… Se junte às outras, tenho alguns afazeres. – disse tentando
disfarçar o esmorecimento.
A menina se levantou tristonha, e se foi. Ele a olhava caminhar, com seus
joelhos roçando um ao outro, e as pontas dos pés arcavam levemente para
dentro, dando a ela um ar quase infantil.
Tirel arfou um pouco de ar, arrumou os cabelos e calçou suas botas. Pegou
a bengala e caminhou pelos corredores de Siv, alheio a tudo, mas com
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comiseração inquietante por dentro.


Quando veio a noite, a penumbra que cobria sutilmente os últimos raios de
Sol tornou-se mais sólida, a ponto de forrar o céu rapidamente, enquanto os
assovios noturnos, quase estranhos, faziam a sinfonia durante o jantar dos três
dominadores que estavam sentados à mesa, cada qual ao lado de sua alfa.
Aragorne apenas observava as faíscas que vinham das tochas ostentadas nas
laterais da sala de jantar. Rainha Collins não estava se sentido bem há uma
semana, permaneceu em seu leito ao lado de Apsel, que a cuidava com
maestria e lealdade.
Mestre Olaf bem entendia aquele pesar de Tirel, ele sorveu mais um gole
do vinho servido por uma das criadas, e observou Dominiquè levando o
talher à boca com a mais profunda sutileza das deusas de Siv. Ele roçou sua
perna na dela por debaixo da mesa, beliscando-a na gana de tê-la nua em pelo
assim que deixassem a mesa.
− Peço licença aos caros amigos, preciso me recolher. – disse Aragorne ao
se levantar sem mexer em seu prato.
Seguiu direto para a sala onde se encontravam suas meninas. Abriu a porta
e passou a observá-las. Ao notar a presença do Dono, ajoelharam-se. Todos
os olhares seguiram para ele, parado na porta, mãos no cinturão, olhos
indômitos, buscando fixar-se em algum ponto que lhe chamasse a atenção, e
lhe dissesse que seria aquela, a escolhida da noite. Este era o único momento
em que sentia prazer desde o momento em que se levantava da cama. Cerrou
os dentes num impulso que caracteriza sua fome e sede por um corpo, uma
pele macia que o abrigasse da solidão. Olhou para a morena clara de cabelos
longos e lisos, olhos puxados cor de mel, tinha o estereotipo indiano. Ele
observou suas coxas trigueiras saltando pelas fendas laterais da túnica, as
mãos delicadas pousavam com a palma para cima sobre as pernas. Neste
momento ela abaixou sua cabeça e o coração pulsou fortemente. Erine, seu
nome. Era muda de nascença. Pouco ouvia, mas os olhos eram vorazes e
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felinos, o que atraiu Tirel desde o primeiro instante. Ele apontou para ela, que
se levantou com graça e caminhou descalça até ele.
Ao se aproximar, cumprimentou-o num gesto e abaixou um dos joelhos até
ao chão. Tirel tocou sua mão e a puxou fortemente para si. Com um dos
dedos, acariciou o queixo afinalado e percebeu as bochechas dela rosarem.
Sorriu. Era assim que gostava… Chegou próximo à orelha da menina e
mordeu seu rosto e pescoço, sentindo o eflúvio apetitoso que vinha dos
cabelos dela. Sem olhar para trás, puxou-a pela guia rumo à masmorra.
Ao ver a porta se fechar, a menina se arrepiou. Estivera poucas vezes com
o Senhor, e ainda não se acostumou com a presença que a fazia atroar por
dentro. Ele passou a mão pela fenda da roupa dela, tocando em seu sexo,
estava como gostava, úmida e quente. Com o dedo anelar passou a manipular
seu clitóris, endurecendo-o até que ficasse como uma pequena semente de
alpiste. Voltou com a mão até aos lábios e provou o gosto dela, salivando.
Com os dedos lubrificados, penetrou-a sentindo a superfície interna cheia de
pontos, volúpia e pequenas contrações. Abrenhou-se dentro dela algumas
vezes e a viu fechar os olhos em delírio. Seus gemidos eram baixos e
abafadiços. Ele a agarrou pelo quadril e trouxe o corpo já entregue, junto ao
seu. Levantou a túnica com cuidado e passou a esfregar a vulva sedenta sobre
o volume voluptuoso que se formou em sua calça. Com uma das mãos,
apertava o cóccix dela, rente a sua ereção, para baixo e para cima. Apertou os
lábios pintados, sufocando-a, até ouvir a súplica na respiração. Levantou uma
das pernas bem torneadas de Erine, e beliscou seu mamilo, torcendo-o com
sofreguidão. Ao sentir sua calça umedecida pela excitação da fenda feminina
que desejava ardentemente ser penetrada. Ele a soltou. Levantou seu maxilar
com um toque apenas, mirou-a nos olhos, ela abaixou o olhar com timidez;
desejava secretamente, gozar. Ele gostaria de dizer que sua vontade era de
que ela o olhasse nos olhos, sem abaixar a cabeça. Ao invés disso, respeitou a
deficiência auditiva da menina, franziu o cenho e persistiu em levantar
novamente seu queixo, dessa vez, de uma maneira grotesca, firme… Ela
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deveria saber que as coisas não são como quer, e que deve ter desejos, e não
vontades.
Afastou-se a um metro e meio, e pôs-se a olhá-la detalhadamente. Era uma
bela mulher ansiada de desejos, louca por um gozo profundo e desconexo.
Os olhos dele me desnudavam em silêncio. Passei a retirar a parte da roupa
por onde meu Senhor olhava, começando pelos ombros. A túnica logo correu
por meu corpo em arrepios. Eu sabia que deveria estar preparada todas as
noites para recebê-lo, mesmo sem saber quanto tempo demoraria a ser
escolhida. Por este motivo, nem uma de nós havia colocado a roupa debaixo
após o banho. E nesse dia em especial, algo me tocou por dentro, eu sentia
que seria dele… Preparei meu banho com rosas brancas, e deixei que as
pétalas tocassem meus mamilos, enrijecendo-os até que a água esfriasse. Sei
que é proibido me tocar longe do Senhor, mas acabei não resistindo, e passei
a me masturbar dentro da tina. Eu o desejo muito… Ardentemente… Ainda
me encontro com fome e sede do corpo e toque dele… Ele não pode ouvir
minhas palavras, mas, meus instintos, conhece bem…– pensou a escrava.
Ao fechar os olhos para ser tomada pelo seu Senhor, ela sentiu um par de
mãos, puxando-a. Quase cegamente, fora agarrada pelos cabelos que
deslizavam em suas mãos, e a colocou sobre uma mesa, de bruços. Acariciou
cada polegada da pele em desalinho, que se arrepiava exibindo poros fartos.
Abaixou a calça, cortejando a vista dela por trás, em todos os aspectos,
cada curva ou textura. Achava lindo ver uma mulher com as partes íntimas
dirigidas para cima, abertas, expostas, chamando-o… Passou por toda a parte
da vulva dela, a glande que latejava. Encostava apenas, depois, deslizava com
furor, penetrava um pouco somente, e a estocava com sofreguidão. Ele
precisava fazê-la sentir o próprio corpo, prepará-lo, conhecê-lo. Uma prática
sem preparo era como um prato vazio sem comida, não havia sentido. O
corpo de uma slave precisa ser bem cuidado e estimulado. Ela precisa sentir a
delícia que é, antes, durante e depois.
Quando as pernas já estavam vibrando, ele a puxou pelos cabelos
novamente, levando o rosto da menina para perto do seu, sentindo a

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respiração ofegante, a boca salivando, isso o excitava… O tesão dela era o


seu. Os desejos mais secretos, a ânsia… Tudo… Puxou-a, esfregando a face
delicada em seu abdômen, fazendo-a retirar com os dentes, o restante de
roupa que lhe sobrara após a camisa desabotoada. Colocou de uma só vez,
todo seu mastro dentro dos lábios pintados, fazendo-a arfar, empurrando
profundamente. Deu passos para trás, levando-a arrastada pelo chão pelos
próximos dois metros, abocanhada em seu pênis. Não suportando a pressão
carnal, ejaculou, jorrando o esperma quente, quase a engasgando.
Selvagens estavam seus instintos, com gana a pegou do chão e a colocou
na Cruz de Santo André, rasgando suas roupas, amarrando com forças, pés,
pulsos e tornozelos.
Eu gostaria de poder ouvir agora… Daria tudo para escutar o tanger do
chicote de meu Dono estralando em minha pele, derrapando pelo chão,
voltando a me marcar com instinto febril de um corcel negro. Adoraria poder
sussurrar para ele, meu desejo de correr minha língua por toda a extensão
de seu pênis… Desejo gozar, olhando para ele… Desejo… – pensou Erine
Seus pensamentos foram interceptados quando a chibata chegou até sua
lombar, ardente… Gemidos tórridos saíam sem direção, em sons
desuniformes. Novamente sentiu a pele ser tomada, em seguida, mordidas nas
nádegas e mãos invadiam seu sexo, explorando como um descobridor de
cavernas.
Após a vigésima quinta chibatada, ainda com desejo de orgasmos, ela não
se cansou. Ao desamarrá-la, Erine abriu as pernas, e caiu ali mesmo no chão.
Tirel Apertou firme, os mamilos. Mordeu fortemente os lábios e o esperou…
O orgasmo veio. O suor vertia pelo maxilar, gotejando dentro da boca.
Mesmo sabendo que ela não o ouviria, ele disse:
− Goze, minha menina… Goze para seu Dono. Quero que me lambuze
com seu desejo… – penetrou-a, macio, a princípio, mas não resistiu ao sentir
que ela queria com força, quase a rasgando, até que o oásis vindo de todas as

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células nervosas dela drenasse num profundo e esperado gozo.


Ainda afoito, embora combalido, ele a carregou até sua alcova. Banhou-a,
cuidou das marcas nas costas e a fez dormir tal como um passarinho no
ninho, entre as pernas dele, agafanhada em seus pelos e musculatura. Assim
que ela apagou, levou-a para o quarto coletivo onde dormiam as demais
slaves.
Voltou para suas dependências, pensativo, eram poucas as razões que o
faziam sair de si e esquecer a dor de viver, uma delas é ser Dominador.
Talvez agora, um pouco mais cético, rústico, cuidador e protetor, porém
sentia-se como um barco perdido no mar.
Buscou no travesseiro, o cheiro de Charlote, nada mais havia dela ali. Os
anos somente deixaram registrados o quão importante a menina fora para a
vida daquele Senhor, que esperava apenas o tempo correr, e quem sabe um
dia poder reencontrá-la em outra dimensão.
O dia amanheceu chuvoso, após a prática de equitação, adentrou o Castelo
escondido atrás de sua capa de chuva, molhando o piso por onde passava. Foi
direto até ao refeitório se certificar de que as meninas estavam tomando o
café da manhã no horário previsto. Abriu a porta e a mesa gigante de madeira
estava ocupada pelas vinte submissas. Num sonoro e amável gesto, todas
deram bom dia ao Senhor, num único som. Os olhos correram pelo rosto de
cada uma até chegar em Erine, que corou ao sentir o par de olhos sedentos
pousados sobre ela.
− Quero todas preparadas. Terão uma surpresa. – disse num breve sorriso.
Sem saberem o que esperar, apenas se entreolharam.
Aragorne saiu, já retirando a capa e entrando na biblioteca. Assim que
chegou, assustou com o semblante do Mestre Olaf que o esperava juntamente
com Apsel, que chorava discretamente sentada a uma cadeira.
− O que está havendo por aqui? – admirou-se da cena encontrada.
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− Caro amigo, a Rainha não se encontra em bom estado. – disse Olaf


tentando escolher as palavras.
− O que houve com Collins?
− Ela não reage, Senhor. Por mais que tenhamos seguido as orientações
médicas, nada faz passar a febre, e eu temo muito por isso.
Aragorne deu passos a frente e sentiu-se impotente, do jeito que jamais se
permitira a se sentir.
− O que podemos fazer?
− Eu não sei mais o que fazer, Senhor. Sinceramente estou muito
preocupada. – disse Apsel, secando o rosto com um lenço.
− O médico diagnosticou a causa da doença? – quis saber.
− Sim Senhor. Pelo o que tudo indica, ela se contaminou por essa epidemia
que matou muita gente no vilarejo.
− A epidemia… – ele ficou tenso. – Tem certeza disso?
− Sim Senhor. Eu fui proibida de entrar no quarto, assim como os demais
serviçais. Os médicos pediram isolamento total. Com ela estão somente
alguns enfermeiros preparados, com vestimentas especiais para cuidá-la.
− Não posso acreditar nesta catástrofe!
− Podemos pedir ajuda a Old. Temos alguns Mestres lá, com poderes de
cura. – disse Olaf.
− Não… Não sei se é uma boa ideia. – respondeu Aragorne se lembrando
de que Siv fora despojada da aliança, e que agora em diante deveriam tomar
suas próprias decisões.
− Trata-se de nossa Rainha… Não há motivos para entono neste momento.
Ademais, o Castelo pode estar enfestado pela peste. – considerou Olaf.

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− Temos que achar outra solução…


− Não há outra solução, caro amigo. A Rainha é sua irmã. Não há o que se
pensar. – argumentou o Mestre.
Tirel caminhou pelo aposento pensando sobre as palavras do amigo. Parou
por um segundo, respirou profundamente.
− Vamos pedir ajuda a Old.
− Não temos mais a comunicação direta com eles. – disse Olaf.
− Eu vou até lá. – respondeu Tirel.
− Tem certeza? – perguntou o Mestre sabendo que poderia não ser bom
para o amigo, pois havia a possibilidade de procurar por Charlote na Terra
dos Mortos, que não é tão próximo, mas a caminho de Old. Isso poderia
causar um novo caos para a segurança do Castelo.
− Sim. Parto ainda hoje. – dizendo isso, saiu da sala.
Preocupado, andou pelos corredores tentando entender a preocupação do
Mestre quanto a sua ida a Old. Só então se lembrou da cidade de Siv.
Charlote estaria na Terra dos Mortos, entrada proibida aos sivianos em
missão fora daquela dimensão. Não arriscaria perder muito tempo por lá,
sabendo do estado de saúde de Collins, mas seu coração acelerou pensando
na possibilidade de revê-la.
Entrou na sala de aula onde as meninas estavam em aprendizado, e pediu a
vez para usar a palavra.
− Está cancelado nosso compromisso para esta noite. Precisarei viajar.
Peço que todas se alimentem dentro dos aposentos, não saiam de lá até eu
voltar. – disse preocupado com a possível peste que colocara a Rainha de
cama. Correu os olhos à procura de Seren e não a encontrou entre as meninas.
Preocupou-se. Saiu sem se despedir, olhando para os lados. Fora ao jardim,
estranhando não tê-la visto na sala de aula, como de costume. Algo muito
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sério deveria ter acontecido para que não estivesse cumprindo as tarefas.
Chegando ao jardim, olhou para todos os lados, não estava em lugar
algum. Acelerou o passo e voltou para o Castelo, indo a passos apressados até
o aposento onde ela dormia. Abriu a porta com sede e a viu deitada na cama,
em delírio.
− O que houve, menina? – disse quase correndo ao seu encontro.
− Sir, eu não sei… Tenho febre… – a voz dela estava fraca e muito baixa.
Ele não quis acreditar… Talvez não fosse nada além de uma gripe, mas
como o local estava suspeito de ter sido acometido por uma epidemia, nada
poderia ser impossível de acontecer. Temia pela menina, era muito frágil e
franzina.
− Fique tranquila, vou chamar um médico. – saiu apressado em busca de
ajuda. Ele tinha mais um motivo para ir até Old. Não conseguia pensar na
possibilidade de perder a irmã e a menina. Pediu a Olaf que cuidasse de seu
clã até que ele voltasse, e que chamasse toda a equipe médica do povoado
para ficar no quarto junto a Seren. Não demoraria a chegar, esse era seu
objetivo, mais que uma honra, um compromisso consigo.
Foi até seu aposento, abriu a caixa de madeira forrada por cetim, e tocou
no cordão que tinha uma Medalha Tetragrammaton. Ao tocar na medalha,
seus dedos se aqueceram. Aquela seria a chave para o outro mundo. Não
deveria ter retirado de seu pescoço, talvez fosse por este motivo que o
Castelo fora inundado pela peste. Sentia-se eternamente culpado por sua
negligência. Rapidamente, colocou o cordão e saiu rumo ao portal. Ao passar
pelas portas do Castelo, Olaf, em um dos cômodos, cumprimentou-o com um
olhar de preocupação. Ele assentiu e seguiu seu destino.
Ao chegar ao portal, tocou fortemente na medalha, e algo o contagiou por
dentro e por fora, com uma vibração incomum que retirava seus pés do chão.
Fora transportado numa espécie de luz, que possuía uma velocidade
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inenarrável.
Ao dar por si, estava chegando ao portal de Old, onde fora recebido por
alguns Mestres. A paisagem não era tão diferente da Terra, porém o ar era
mais leve, e a vegetação lembrava uma superfície aveludada, assim como as
flores que tinham uma aparência excêntrica e em grande variedade, muito
diferente das que já tinha visto. Não podia perder tempo, estava ali em uma
missão muito importante.
− Vim em busca de ajuda, a Rainha encontra-se muito doente, pode partir
para a Terra dos Mortos a qualquer momento. Preciso dos curandeiros. –
disse ele, confiante.
Em uma sala branca por todos os lados que olhasse, estava um senhor
bastante alto e de olhar sério.
− Temos a ajuda que precisa, antes, porém, precisamos conversar. – disse o
Ministro de Old, vestido em uma túnica de cor pérola cintilante.
− Não tenho muito tempo, caro Ministro.
− O destino já está traçado, nobre amigo. Podemos ir, mas nada mudará o
que é preciso acontecer.
Tirel ficou pálido. Não acreditava em destino, e sim, no que poderia fazer
para mudar a ordem das coisas.
− Você novamente está em provas! – disse o Ministro.
− O que quer dizer, Ilustre?
− Quero dizer que o destino traça e, nós, pelo motivo lógico e sem
alternativas, acatamos. Precisa procurar pelo Ministro de Siv, na Terra dos
Mortos. Levarei você até lá.
− Mas… – lembrou-se de Charlote. Lembrou-se do tempo que urgia e a
cada minuto passado seria tarde demais para ajudar Seren e Collins.

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− Não há mais nada a se fazer. – disse o Ministro.


Aragorne abaixou a cabeça e apenas acompanhou o Senhor.
A viagem de lá a Siv fora a mesma que fez do Castelo a Old. Talvez um
pouco mais curta. Não deu tempo de pensar muito, logo chegou àquela
cidade muito diferente de tudo que o cercava. Não sabia o que esperar. Sentiu
receio pela primeira vez em sua vida. Não sabia se estava preparado para
rever Charlote ou perder Seren. Tudo o incomodava.
Quando avistou a cidade construída por cristais, percebeu que seus pés não
pisavam no chão, e sim, deslizavam. Qualquer ruído ali era um grande
barulho, como um vidro se espatifando no chão. Tudo era limpo e
transparente, quase irreal. Ao contrário da temperatura amena de Old, A
Terra dos Mortos era fria. Seguiram por quinze minutos entre as paredes
cristalinas do Ministério. Vira algumas pessoas passarem, mas nem uma
delas olhou para ele, sequer perceberam sua presença. Vestiam aventais que
iam até os pés, e usavam turbantes na cabeça. O corpo era de uma substância
volátil, ora ficavam bem visíveis, ora quase desapareciam. Assim que se
olhou para fazer uma comparação, assustou, seu corpo também se encontrava
do mesmo modo.
− Toda massa é modificada para adentrar ao Mundo dos Mortos sivianos,
caso contrário, seu corpo físico não suportará.
− Não compreendo…
− Não é necessário compreender. – disse o Ministro de Old, que também
estava do mesmo modo como os demais.
Assim que chegaram ao final do corredor, viraram à direita e avistaram,
dentro de uma espécie de capela, um ser vestido com uma túnica verde-água
e longos cabelos grisalhos.
− Eis o Ministro de Siv. – disse o Oldiano, que desapareceu assim que
acabou de falar.
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Aragorne se recordou dele, estava presente na cerimônia do coroamento de


Collins.
− Muito prazer em revê-lo. – disse Tirel, olhando para todos os lados, a
angústia o exauria.
− Sopite seu coração, bravo siviano. – disse o Ministro em uma voz suave
e apaziguadora.
− Charlote… – abjugou sem querer o nome dela de seus lábios.
− O caro amigo veio em busca de ajuda ou atrás da menina?
− Desculpe, Ministro… É claro que vim buscar ajuda para salvar nossa
Rainha e a menina Seren.
O homem o olhou profundamente, como se quisesse revolver sua alma, e
certamente seria capaz de muito mais, caso desejasse. A alta envergadura de
sua colocação na Terra de Siv não era um acaso. Tratava-se de um ser de luz
e detentor de poderes paranormais, muito além do que qualquer um pudesse
supor.
− Convido-o a um passeio. – disse ele já se movimentando.
− Convite aceito. – respondeu Tirel, tentando se concentrar no que fora
fazer ali. – Porém, não tenho muito tempo… – disse preocupado com Collins
e Seren.
− O amigo nasceu aqui, e ainda não conhece o sistema? Nosso tempo não
corresponde ao tempo de vinte e quatro horas. Estamos o tempo todo em
tudo, e tudo está do mesmo modo em nós.
Tirel parou por um momento… Tentava se recordar das veredas daquele
local.
− Sim, Mestre, porém…
− Porém a vida como dominante ocupou seu passado, presente e futuro.
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− Talvez seja isso.


Sobrevoaram sobre o piso cristalino por alguns minutos até que
alcançassem o ar livre. Os olhos do dominador brilharam. Devidamente se
lembrara daquela luminosidade jamais vista em qualquer outro lugar do
Universo. Estava no espaço, não havia nuvens, mas não na Terra de Siv. Lá,
elas se encontravam tão próximas que poderiam ser tocadas. Assemelhavam-
se a plumas suaves. Todo o local era cercado por cachoeiras e cristais. Não
havia terra, e, sim, uma textura muito alva, parecida a algodão recentemente
colhido. Pássaros cor-de-rosa e lilás sobrevoavam por todos os lados. Era de
uma beleza incomparável.
Seguiram até alguns bancos feitos de um material transparente semelhante
ao cristal, logo abaixo de uma árvore que brotava uma nascente d’água.
O Ministro se sentou e o convidou a fazer o mesmo.
− O caro amigo poderia responder sinceramente a todas as minhas
perguntas?
− Obviamente.
− Assim será mais fácil a compreensão.
− Elas possuem chance de sobreviverem? – perguntou diretamente.
− Pelo o que ouso a lembrar, não seria eu, a fazer as perguntas?
− Estou apoquentado, Mestre.
− Não há razão de ser… Não existe morte para nós, e sim, missão. A morte
em nosso mundo apenas registra o final de uma missão, para que outra tenha
início.
− Estou disposto a entender, Mestre, mas não consigo apurar suas palavras.
− Quero dizer que ninguém está lá por um acaso. O seu berço é aqui, na
Terra de Siv. Lá se encontra apenas o poder e a Administração de nosso

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mundo. Caso a Rainha fizer a partida, saberá que ela estará aqui, entre os
seus, até o próximo momento de voltar.
− Sim, mas… ficaremos sem a Coroa?
− Acredita nisso?
− Não sei mais em que acreditar… E a menina… Ela morrerá, não é
siviana.
− Ela cumprirá também sua missão, porém como humana.
Tirel abaixou a cabeça e buscou por respostas.
− Ela faz parte de mim… – disse ele, num tom triste.
− Cumpriu seu papel com ela?
− Tenho feito o meu melhor.
− O seu melhor corresponde ao seu papel?
Aragorne o encarou, sem medo de responder.
− Sim, Ministro.
− E seu coração, corresponde ao seu melhor?
Então ele se calou. Não poderia dizer que amava Seren como um dia amou
Charlote, mas não mentira quando disse que a menina era parte de si.
− Corresponde, Ilustre. Eu a estimo pelo o espaço que conquistou dentro
de mim. Isso não quer dizer que…
− Não precisa se comparar a nada. O importante é que tenha cumprido seu
papel de Dominador, e não de amante.
− Não a vejo como amante, a vejo como minha. – disse firmemente.
Dessa vez foi o Ministro que se calou.
− E quanto a Charlote?
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− Eu a vejo como a luz que um dia iluminou a minha vida. – seus olhos
brilharam.
− Você a via como sua? – o Ministro o olhou com um olhar desafiador.
− De todos os membros do meu corpo, Charlote era o meu coração.
O Ministro tocou no ombro dele, expressando considerações.
− Como disse, tudo tem um sentido em Siv. De certo, se tivesse sido por
outro modo, não teria jamais a acepção que hoje tem.
− Eu a sinto. Ela jamais esteve longe de mim.
− Seria capaz de novos desafios?
− Quais?
− Nunca se esqueça de que Siv deve vir sempre em primeiro lugar. Você
foi um escolhido para estar no Castelo, e zelar por nossas tradições. É uma de
nossas referências em uma terra distante, aquela que ainda luta por nossa
causa.
− Quais são os desafios?
− Terá de lutar novamente pela Coroa! – o Ministro disse de uma vez por
todas.
− Isso significa que… – ele desejou não terminar a frase.
− Significa que Collins está partindo para cá.
Mesmo sabendo que a morte não existia para os sivianos, seus olhos
encheram-se de lágrimas, pois vivendo no Castelo, envolto pelas tradições
que o cercavam, não havia como pensar na separação, e na falta que a irmã
lhe fará.
− E Seren?
− Um Dominador muitas vezes precisa perder para ganhar.
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− Ela não é siviana… Ela é muito jovem…


− Você poderá fazer uma escolha…
− Uma escolha?
− No final. Ainda nem começamos.
− O que devo fazer?
− Merecer a Coroa de Siv, que poderia ser sua por sucessão, porém,
existem outras questões em jogo. – ele parou por um momento e observou
algum ponto na imensidão. – Charlote deu a vida em troca de sua liberdade
como Dominador, e a liberdade a Siv. O que você daria a dela? O que daria
por Siv?
Ele abriu a boca para responder, mas antes observou algumas crianças
correndo em algazarra.
− Eu retribuiria tudo que ela me deu, com minha própria vida.
− O amigo tem certeza do que está falando? Cuidado! As palavras têm
peso e condão de realização quando jogadas no Universo.
− Eu faria qualquer coisa para tocá-la novamente…
− E a Coroa de Siv? Trocaria por Charlote?
− Trocaria meu reino, minha paz e minha vida.
Um dominador poderia não chorar, mas naquele momento, um nó apertara
sua garganta, como se fosse ele, o refém de um sentimento que o abatesse tão
profundamente, o qual seria incapaz de não fazê-lo.
− A proposta é, estará encarregado pela conquista da coroa, e esta se dará
através de uma transportação à vida futura. Uma realidade que não se passa
nem em sonhos por sua mente. Algo totalmente diferente do que já viveu
como Dominador.

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− E o que devo fazer para conquistar a Coroa?


− Reconquistar Charlote.
− Não estou entendendo… Irei para o futuro e…
− Charlote estará lá, para que desempenhe sua função. É muito fácil
reconquistá-la aqui, entre as duas dimensões, com os sentimentos latentes,
lembranças… Um sabendo sobre o outro…
− Ao nos reencontrarmos, não iremos nos reconhecer?
− Esquecerão todo o passado durante a missão, será como se sempre
estiveram ali, mesmo diante da confusão psicológica. As adaptações serão
feitas no psíquico de cada um enquanto forem programados para adentrarem
outra época a centenas de anos vindouros. Saberão o que fazer através da
intuição. Os sinais no corpo, que os identificam como afins, desaparecerão.
Conservarão, a priori, os mesmos nomes, mas terão de se adaptarem à
modernidade que lhes mostrará um mundo totalmente novo para vocês, mas
como disse, a programação que será feita no cérebro de cada um, será como
uma ferramenta adaptadora. Saberão fazer coisas que hoje nem sonham,
embora o linguajar e comportamento poderão ser afetados, digamos, pela
vulgaridade das palavras e expressões… De algum modo, os fatores daquela
realidade exigirão de vocês, os melhores esforços. Caso não consiga cumprir,
voltará e perderá o Reino. É sua última chance de ser o melhor Dominador
que já fora um dia. Deve agir dentro da honestidade, integridade e honra.
Estará num tempo moderno onde as pessoas são convencidas pela ilusão,
prazer fugaz, mediocridade e ego. Perceberá que muitas das vezes usam das
práticas para se esconderem de alguma deficiência, ou do mundo em que
vivem. Nossas práticas estarão por muitas vezes, deturpadas da essência.
Uma de suas maiores responsabilidades será levar a honra e o respeito num
tempo tomado pela promiscuidade. Você estará lá, perto ou longe de tudo que
mais deseja. Só depende de você, o resultado.

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− E depois? Quando tudo se perfizer?


− Jamais saberemos o que irá acontecer se não passar pela vivência.
Arkadius, estará lá… Cuidado!
− Arkadius? – ele franziu o cenho tentando se lembrar, mas nada vinha em
sua mente.
− O lider bárbaro siviano. Ele quer o trono, e poderá tomá-lo, se conquistar
o coração e a entrega de Charlote.
− Eu não sei quem é… Arkadius… Para mim, os herdeiros do trono são os
que estão dentro do Castelo.
− Nem tudo é o que parece. Qualquer siviano pode ser Rei, desde que
mereça esta posição. Ser herdeiro não significa uma definição quanto à
Coroa, isso significa apenas que você tem chances a mais.
− Quem é Arkadius, Mestre?
− Quem retirou Charlote do Castelo. – ele disse num tom de preocupação,
sabendo que não poderia falar muito, e que talvez, tenha dito demais. −
Agora vá!
− Quando devo partir para o futuro?
− Saberá. Seu coração dirá.
− E Seren? Como a curo?
− Com amor.
− E as meninas?
− As meninas estarão bem… Não se preocupe quanto a elas.
Dizendo isso, o Ministro desapareceu num sorriso. Tudo ao redor de Tirel
passou a girar, entrando numa ressonância que o fez despertar apenas dentro
do Castelo.

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Capítulo 2
Ainda zonzo pelas circunstâncias, Tirel correu assim que pôde sentir seus
pés nos chão. Não sabia ao certo a quem socorrer primeiro, as informações
dadas pelo Ministro o deixaram aturdido. Não sabia exatamente qual era o
tipo de sentimento que tinha naquele momento, sabia apenas que eles
transbordavam em um vai e vem de sensações. Antes de se recuperar, de
longe vejo a movimentação dos criados, submissas e seus caros amigos
Dominadores. Estranhou.
Aproximou-se, parecia não ser visto. Viu Apsel jogada ao chão, chorando
com as mãos entre a cabeça. Chegou um pouco mais perto, e ela o olhou com
os olhos inchados e vermelhos.
− Ela se foi.
Foram as únicas palavras ditas. Continuou parado, olhando o nada. Era
estranho. Talvez a frustração tenha vindo por não ter sido bom o suficiente
para salvá-la, mesmo sabendo que neste momento está segura, e voltou para
os seus. Agachou-se de frente a menina, e buscou nos olhos dela, a resposta
que os seus queriam, para as perguntas que nem mesmo ele saberia formular.
− Ela estará bem. – disse, com a voz um pouco rouca, e por dentro, uma
aflição contagiante.
− Minha Rainha levou consigo toda m’alma. Sei que não posso
compreender o ponto de vista dos sivianos diante de uma situação desta, mas
eu… Eu sou uma pessoa comum, jamais voltarei a vê-la. Embora pressinto
que ela voltará… – após essas palavras, desabou num choro profundo,
abaixando a cabeça próxima ao colo dos seios.
Tentando confortá-la, sem saber se deveria, ele a trouxe para perto do seu
peito, e pela primeira vez, depois de muito tempo, sentiu novamente o esmero
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que a tinha quando era sua.


Um Dominador toma para si, esse tipo de situação, como uma afronta. O
orgulho impera, fere e machuca. Perdê-la para sua própria irmã era algo que
só havia se amenizado no vasto sentido da palavra.
Abraçou-a com compreensão e a convidou a se levantar de onde estava.
Se, entregar-se àquela dor, demoraria muito mais tempo para se recuperar.
− Não sou mais seu Dono, mas tenho por você um imenso carinho, Apsel.
E por este motivo lhe peço, vá tomar um banho, tente encarar os fatos como
uma submissa faria ao ver sua Dona partir, com honra e dignidade, por todo
desvelo que ela lhe dispensou.
Ela apenas concordou, balançando a cabeça e acatou o que ele a pediu.
Era agora seu momento de se despedir de sua irmã, e dizer no silêncio das
palavras, que tinha muito orgulho por ela ter sido quem foi. Mas ainda
deveria ver Seren. Ela neste momento precisava de toda sua atenção. Era
necessário ser forte, ágil e se sentir seguro de seu papel. Muito mais que um
Dono, sentia pela menina um carinho paternal.
Foi mais rápido que pôde ao seu quarto, e a encontrou delirando sobre a
cama. Chegou mais perto e tocou sua mão, beijando-a na testa.
− Estou aqui… Jamais vou te abandonar… Jamais…
Ela sorriu sem abrir os olhos, e pela face deixou escorrer uma lágrima
encorpada.
− Reaja, minha princesinha. – disse, afagando seus cabelos e beijando seu
rosto.
Algo o tocou por dentro sobre o que deveria fazer, e assim o fez. Tirou
suas botas e o cinturão, e se deitei próximo a ela. Neste momento ela abriu os
olhos, estranhando, quase reprovando sua atitude, e ele sabia o motivo.

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− Não se preocupe, não precisa temer. Estou escudado. – eu disse tocando


na medalha em meu cordão no pescoço, que reluzia de modo florescente.
Ela o abraçou tão forte, que a febre que saia de si, aquecia a pele dele.
− Sir… – a voz era muito fraca, quase comparada ao fio de uma linha. –
Recite um verso para mim?
Lembrou-se de todas as vezes que ela o fez por ele, e em muitas delas com
o afã de consolá-lo ou apenas saciar uma vaidade dele. Fechou seus olhos
para ver se recordava de algum que mais gostava. Foram tantas e repetidas
vezes que Seren os recitava que foi capaz de gravá-los. Em outros momentos,
ele mesmo ia até o livro, abria a página de algum de seus preferidos e lia,
pensando em Charlote.
“A menina passeia em meus pensamentos
Em névoa e espaços
Que me revelam teus segredos bem guardados.
O que era petrificado e morto
Tomou vida quando olhei para teu corpo
Corpo teu, que é meu…
(Todo meu)
Nada mais importava
O mundo se dissipou, enevoou…
És somente tu em meus olhos
Como imagens soltas
Como gaivotas que descobriram
Que voar é bom…

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Abracei-te contra o peito


Desordenei os anéis de teus cabelos
Que bailavam formosamente ao rumor do vento
Buscando o meu toque
Tocando-me como seda…
Lindos olhos… Ah, os teus olhos…
Como a quero…
Tudo em ti, fala…
Desde o suor descendo
Em passos lentos pelas suas pernas…
Os músculos que se contraem
Que me abraçam… Falam…
Eu ouço seus murmúrios…
Ouço o seu sorriso…
Ouço os sons que saem de ti
Todos em mito – rito!
Estamos perdidos em um labirinto sem volta
O conjunto de tuas complexidades
Extasiam-me, deixa-me louco…
Mordo o céu para não deixar-te ir
Dou-te o pulmão, os rins e as vísceras
Não há barreiras, nem fronteiras…
Tudo se encontra exequível
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Questões insolucionáveis…
Quero perder meu tempo
Escorregando em lodo sedento – denso!
Registrou-se em mim sendo-te uma quase reticência
Tão simples – uma incógnita no deserto
Benfazejo dom de me transformar
Em carne e alma.”
Ao terminar de recitar, olhou para a menina, ela estava dormindo. Tentou
refletir sobre o que tem envolvido os dois, e se questionou se tem feito seu
melhor. Por mais difícil que tem sido, fez o possível para se tornar presente,
apesar do inconformismo com os infortúnios, e por que não dizer, do destino
que o afrontou. Lidar com o que não aceita sempre fora seu maior desafio.
Não conheceu outra realidade, sem ser a de todos os seus desejos realizados,
criaram-no para ser Dominador. Este é o lema em Siv para toda criança que
nascesse do sexo masculino, algumas meninas, como Collins, eram exceção,
e isso se manifestava com o passar do tempo. Mas o fadário ditava as regras
em todo e qualquer confim. Não existia domínio para esta questão. Uma hora
ou outra deveria enfrentar o que não conseguia modificar. Perder uma pupila
era perder muito de si, sem se reconhecer. Era se esfarelar aos poucos, diante
da luz do dia e das trevas do anoitecer. Não existia ninguém para socorrê-lo
neste momento. Faria qualquer coisa para que Seren não fosse embora de sua
égide. Não suportaria ter de perder mais uma menina, e no caso dela, isolado,
uma pequena feita de mortalidade, jamais a encontraria novamente…
Precisava salvá-la.
Aconchegou-a mais em seus braços e tentou silenciar a mente, até que tudo
se acalmasse dentro de si, e pudesse apenas viver aquele momento. Estava
quase se entregando ao sono, perdendo-se e solvendo-se num ciclo

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comungado pela liberdade de ser tão somente um homem de mãos atadas…


Quando os sinos tocaram, e a angústia retornou com garras e exatidão.
Deixou-a com diligência, vestindo suas botas, desejando pela última vez
que se recuperasse. Colocou seu medalhão sobre a fonte dela… Não sabia
rezar. Nem teria a quem pedir. Apenas desejou sua cura com tudo que havia
em si. Saiu apressadamente.
Ao cruzar o salão principal, viu a cerimônia póstuma em favor de Collins.
Como toda mulher não-siviana, Apsel chorava, toda vestida de preto, como
estavam vestidas as demais submissas. O véu que caía sobre sua face estava
quase colava às lágrimas. Os amigos dominadores se postavam um pouco a
distância do manto onde se encontrava os restos mortais de Collins. Uma
música renascentista tocava ao fundo, por um grupo de violinistas. As velas
foram colocadas em cada ponta da mesa coberta por madrepérolas. As flores
mais vivas e bonitas do jardim coloriam o colo de Collins, que repousava
apenas, essa era a convicção.
O pesar que Tirel sentia não era o mesmo atribuído ao que sentiu quando
Charlote se foi, então percebeu a diferença de ser um Dominador e um
cidadão siviano.
Uma criada trouxe em passos ritualísticos, uma espada a qual Aragorne
tomou, e cruzou em frente a seu peito, cumprimentando a memória de Collins
e aos presentes, em seguida foi até o caixão, e cruzou por duas vezes a katana
sobre o corpo da Rainha.
− Prometo honrar seu nome e seu reino, minha Rainha. – disse em tom de
agradecimento.
Passaram o tempo de uma hora, aproximadamente, em absoluto silêncio,
apenas ouvindo a música e agradecendo em pensamento, pelo reinado feliz
que a Rainha os concedeu.
O cortejo para o envio de Collins a Siv foi logo em seguida. Aragorne
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aproximou-se de Apsel, e ofereceu seu braço, o que foi aceito em profundo


comisero e deferência. Ofereceu seu lenço para que pudesse secar o rosto, ela
o agradeceu com o olhar perdido. E assim se despediram da Rainha, que os
deixou com honra, respeito e reconhecido decoro.
Todos seguiram para seus aposentos, e Tirel voltou para Seren.
Assim que entrou, ele a viu sentada na cama. Seu rosto estava sereno e
suas mãos pousavam suavemente sobre as pernas. Ela sorriu, ele retribuiu.
Pegou-a no colo e a levou para seu quarto. Passariam a noite juntos, e o
tempo que fosse necessário até ter certeza de que ela não o deixaria.
Após os sete dias de luto no Castelo, tudo passou a transcorrer em seu
ritmo normal. Seren se restabelecia aos poucos, mas ainda não frequentava as
aulas. Sentia-se enfraquecida, e seu espaço havia se tornado apenas o quarto
de seu Senhor. Tirel temia que ela saísse e pudesse contagiar as outras
pessoas. Passaram muitas horas juntos, enquanto ele lia os versos que ela
mais gostava. Dava a ela, comida na boca, embora a menina não sentisse
fome, mas não desobedecia, mesmo com enjoo ou ojeriza do alimento, comia
o que lhe era dado.
Aragorne procurou não me aproximar das meninas a fim de protegê-las,
pois não sabia até qual ponto estava seu quarto enfestado pela epidemia. Ele
se encontrava protegido, mas as demais pessoas, não. A Medalha
Tetragrammaton se restringia apenas à sua proteção. E de forma inexplicável,
curava Seren.
Com o passar dos dias, após uma limpeza geral em todo o Castelo com
produtos recomendados, Tirel foi saindo aos poucos de sua alcova, e tentando
se desdobrar para recompensar o tempo que se manteve afastado das
meninas.
Na vigésima quinta tarde, após a ida de Collins para a Terra dos Mortos,
Tirel viu Apsel seguindo pelos corredores, vestida ainda com seu uniforme de

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luto. Segurava algumas valises. Sentiu no peito um aperto que desejou recuar,
mas não o reprimiu. Ela estava deixando o Castelo. Pararam um de frente ao
outro, e ele se ofereceu para acompanhá-la a fim de atravessar o portal.
Assim que o imenso portão de ferro se fechou atrás de suas costas, ele
segurou firmemente nos braços da menina, olhou vagarosamente em seus
olhos e a beijou na testa.
− Eu desejo que siga com tudo que neste momento te fará forte. – desejou
a ela.
− Obrigada por me ajudar a me descobrir, e eu saber pelo menos uma vez
na minha vida, quem sou. E disso, jamais esquecerei. Grata. – ela se ajoelhou
e tocou as mãos do Dominador, beijando-as. – Gratidão, Senhor.
Então se levantou, olhou-o nos olhos e partiu, sem mais olhar para trás.
O vento lá fora assoviava e as folhas vinham de encontro com o rosto dele.
Naquele exato momento algo o tocava visceralmente. Porém, jamais saberá o
que significava. Não neste agora.
Entrou no Castelo, e sabia que sua missão urgia. Só não sabia quando se
daria. Para se precaver, precisava de um grande momento com suas meninas,
pois não saberia como ficariam em sua ausência. O Ministro prometeu cuidá-
las, mas não disse que Aragorne voltaria a vê-las. Pela primeira vez, perdeu
totalmente o controle da situação. Contava apenas com a boa sorte.
Foi até o grande aposento onde se encontravam, e entrou cabisbaixo. Isso
também doía muito em fazer. Perder parecia ser um lema maior em sua vida.
A única coisa que o fazia se sentir melhor era saber que muitas vezes
precisava perder para ganhar, e seja como for, valia tudo pela honra.
Entrou com cautela e levantou o rosto para olhá-las. Foi recebido com
sorrisos e uma canção de agradecimento. Em seguida, se ajoelharam e
esperaram a ordem. Mas naquele dia, não havia um mandato.
− Quero comunicar a todas, que estou em missão na busca do Trono de
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Siv, e precisarei me ausentar por tempo indeterminado, mas que estarão


cuidadas e protegidas, como deve ser. Sei que não é fácil e ouvir o que tenho
a dizer, mas não me restou alternativas. Somos sivianos, todos nós. Sabemos
o que significa uma Coroa, e o que precisamos fazer para merecê-la. Estamos
prestes a viver ou morrer por essa sina. Mas tenho algo para esta noite,
dormiremos juntos. Sem precisar escolher. Gostaria muito que soubessem
que vocês me sustentaram durante este tempo que se passou. Veio de vocês, a
força que eu precisava para atravessar este período, e por isso levarão para
sempre meu respeito, minha honra e gratidão. Eu sou um Senhor feliz neste
exato instante, pois tive ao meu lado, não apenas escravas, mas mulheres que
possuem o poder de construírem, sobretudo, manterem uma fortaleza.
Abriu os braços e ficou assim, esperando que adivinhassem o que queria.
Fechou seus olhos e foi imediatamente abraçado pelas vinte meninas.
Esparramaram-se por todo o aposento. Sentiam-se felizes por saberem que
seu Senhor está lutando por elas e por todo siviano que um dia passasse por
este Castelo e por toda Siv.
Aragorne tirou a roupa delas, uma a uma, olhando internamente. Não sabia
dizer, mas faziam parte de cada sentido existente em si. Nesta noite não
teriam chicotes, amarras, vendas, velas ou masmorra. Ele as amaria,
profunda, voraz e inteiramente.
Quando o Senhor se deitou, foi servido por ventres e cheiros. Tocou em
seios fartos de moldes diferenciados. Beijou os lábios de uma só, ou de
algumas juntas. Sentiu o gosto de pele ao passear pelos corpos de suas
meninas que se revezavam sobre o Dono, deslizando-se em suas pernas, tórax
e pescoço com fendas umedecidas, que recebiam os dedos dele, tocando-as,
sentindo-as. Alguns corpos esculturais, outros não, mas de beleza isolada, e
quando se juntavam, eram uma só. Percebeu os arrepios dos poros, a força
delas o contagiava.
Saciou os desejos individuais. Tocava fortemente em pescoços, nádegas e
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sentia os líquidos, molhando-o suavemente. Precisou se controlar,


contorcendo-se por muitas vezes, mas não gozaria até que estivessem
saciadas. Não era um homem, e sim, um dominador.
Penetrava em uma enquanto tocava a outra, a que estava em pé, a que
colocava silenciosamente a vulva doce em seus lábios. Mamilos enrijecidos,
gemidos sufocados, esfregando-os uma nas outras, línguas dançando sobre
peles… Tinham gostos e personalidades diferentes, e ele as conhecia
intimamente.
Não seria justo gozar apenas dentro de uma, seria uma afronta… Elas se
organizavam a volta dele enquanto o chupavam, e quando seu líquido estava
quase sendo jorrado, esguichou fortemente rumo a rostos e bocas, que o
lambiam, lambiam-se entre si, uma a outra, até que nem uma gota fosse
cúmplice daqueles lençóis.
Quando o dia amanheceu, o cenário era lindo. Estavam todas dormindo,
exceto Erine, que levantou a cabeça e pôs-se a olhar o Senhor. Assim que ele
se levantou e passou a se trocar, ela ainda estava lá, olhando-o sem
pestanejar. Dos olhos, uma lágrima insistia em cair, mas ela não a deixaria, é
siviana. Persistiu no olhar, e uma ponta de desejo em abraçá-la o tocou.
Poderia não ser justo com as demais, mas a chamou.
Ela se levantou nua, toda morena e pôs-se a andar na ponta dos pés em
direção a Tirel, tendo o cabelo muito negro e longo, encostando-se a suas
curvas. Erine ficou de frente a ele, e o ajudou a abotoar a camisa; arrumou a
gola, deslizou a mão delicada por todo o tórax do Senhor, na tentativa de
desamassar a fazenda. Após terminar o que fazia, voltou a olhá-lo e se
ajoelhou, beijando suas botas. Puxou-a docemente e tocou em seu rosto
afável. Ela não o ouviria, sabe disso, mas falaria de qualquer modo.
− Quero que sempre guarde consigo esse sorriso tão encantador.
Como resposta, ela sorriu novamente e fez menção em dizer algo, mas as

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palavras não saíam. Ela tentou várias vezes, e seu semblante era de
frustração, pois certamente esperou a vida toda por este momento, ou ensaiou
sozinha na expectativa de ser perfeito. Então com os olhos, lábios, mãos,
traço nos rosto, balbuciou:
− M-eeeu Se-nh-or.
Impossível! Como conseguiu falar? Não escuta, não aprendeu as
palavras… Então ela levou a mão até aos olhos do Dono, deslizando como
pluma, em seguida, na boca. Ele entendeu que ela lia os lábios, e certamente
tentava imitar os movimentos através das ondas sonoras.
Sorriu e a abraçou. Em seguida, saiu.
Ele sabia que aquele dia era o momento marcado para sua viagem, e a
qualquer momento deveria embarcar, seja lá como fosse. Então preferiu o
silêncio. Caminhou pelo jardim, pelos escombros do Castelo, pelas salas que
nunca mais havia entrado… Era estranho pensar que não precisaria levar
bagagem, e sim, tudo que era. Então parou para pensar em Charlote.
Como seria esse reencontro? Será que a reconhecerei? Será que me
reconhecerá? Como faremos para nos reencontrar? Em qual local? Em qual
dia? – perguntava-se.
Passou pela biblioteca, e lá estavam seus amigos Dominadores. Ficou um
tempo olhando-os, até que o convidaram para entrar.
− Está preparado, caro amigo? – perguntou Olaf, já sabendo certamente
sobre o feito. – Recebemos mensagem de Siv, para prepararmos a ida das
meninas. Estamos torcendo para que consiga realizar sua missão, e trazer
para nós, a Coroa, que o espera por merecimento.
− Grato, nobre. Mas não é tão fácil assim… Confesso que…
− Está com algum receio? – emendou Fendis.
− Confesso que sim. Não sei para onde vou, e o que preciso fazer. Penso
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apenas que é necessário, e se assim for, então preciso estar pronto. Fiquei
sabendo sobre Arkadius… Eu não conhecia a possibilidade deste bárbaro
disputar o trono.
− Eu sabia… – disse Olaf. – Eles lutam há séculos pelo mesmo objetivo
que nós, a diferença é que não estão dentro do Castelo. Ele… Arkadius foi
quem jogou a lança em Charlote. O Ministério não queria que isso fosse
disseminado, para que uma nova guerra não se instaurasse, porém, meu
amigo, a guerra está dentro de nós.
Tirel sentiu os nervos tomarem conta de seu ser.
Ele não tomaria meu trono, nem minha escrava. Eu não permitiria. –
pensou consigo mesmo.
− Um siviano jamais se engana com o que deve fazer. Quando chegar o
momento certo, o nobre saberá. – disse Olaf. – Aqui não permitiremos que
um bárbaro tome nossa herança. O amigo tem minha palavra.
− Em qualquer lugar, amigo… Em qualquer lugar. Jamais perderá sua
essência. Ela é seu guia. – disse o Mestre.
− Estará no lugar certo… No lugar onde está a Coroa de Siv. – disse
Fendis.
Com essas palavras, apertaram-se as mãos num cumprimento, e Tirel
seguiu seu destino.
Ao chegar em seus aposentos, Seren estava na janela. Algo a perturbava,
ele precisava descobrir o que era. Tocou em seu ombro, e ela se virou.
− É estranho, Senhor, mas me sinto tomada por uma angústia… Como se
um medo se apoderasse de mim, e eu não soubesse lidar com ele.
− Aconteceu alguma coisa?
− Não Senhor, mas uma adrenalina me invade.

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− Não se impressione com nada. Tudo está bem.


− Sim, Mestre, agradeço por me confortar.
− Não se esqueça, nunca a abandonarei…
− Eu acredito fielmente no Senhor.
− Eu te adoro, menina…
Dizendo isso, algo parou no ar, uma luz invadiu sua visão, e nada mais
pôde ouvir ou perceber, apenas um vento forte soprando, retirando-o dali.
***
Anos depois da chegada dos sivianos em um mundo distante, eles vieram
como tinha sido prometido, já chegaram adaptados e programados para lidar
com a vida moderna na cidade de Vitória-ES. Nesta ocasião, mesmo nunca
tendo visto um carro de quatro rodas, eles já sabiam como dirigi-lo. Houve
uma preparação a qual os obrigara a dormir durante certo tempo no espaço,
até que os interlocutores depositados em todas suas células passassem a
interagir, dando a eles o conhecimento de dirigir um carro, manipular um
computador, andar pelas ruas da cidade sem se perderem e exercerem a
profissão que cada um deveria se dedicar. Acabaram sendo programados para
viverem na atual circunstância que os abrigava. Até mesmo quanto aos
costumes e linguajar, foram adaptados.
Houve tempo o suficiente para se adaptarem ao mundo novo, construírem
sua vida, e se prepararem para a missão, mesmo sem terem consciência disso.
Quando chegaram, era como se despertassem de algum sono profundo,
acordando já com as ideias de tudo que precisariam fazer para se manterem.
Tudo foi muito bem planejado no Ministério de Siv, que também buscou a
ajuda em Old, para a construção dos interlocutores que tinham data certa para
entrarem em vigor, e depois os levarem de volta.
Conservaram seus nomes e aspectos físicos de quando vieram. Assim

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como todo siviano no curso normal de qualquer missão, dentro ou fora de


Siv, conservaram seu aspecto físico sem envelhecerem. As personalidades
foram adaptadas aos costumes, e, principalmente, para o cumprimento da
missão, e isso mais se acentuou em Charlote, que serviria como o
instrumento da prova.
O tempo poderia passar para todos, menos para eles, pois seus corpos e
psíquicos foram meticulosamente preparados para tanto. Foram trazidos para
uma realidade obscura, mesmo à luz da cidade, as pessoas andavam como se
desconhecessem a si próprias. O belo e o sagrado se baseavam em números
diante da quantidade de coisas que conseguiriam obter através de um poder
enganoso.
Charlote formou-se em Publicidade. Não tinha muitos amigos, mas os
poucos que conservou não conseguiam acompanhar seu ritmo frenético em
uma carreira bem sucedida, mas optou por um mundo quase deserto em seus
percursos estratégicos diante da solidão intima, era o que a trazia paz,
ninguém parecia entender o que ela mesma traduzia como insatisfação. Tudo
lhe causava uma sensação de que faltava algo, e muitas vezes essa busca
obscena era confundida com ambição, assim muitos a viam o tempo todo
realizando mil e uma tarefas no afã de se sentir completa, mas a realidade é
que isso nunca acontecia, certamente era um segredo seu.
Não conseguia se relacionar. Poucos foram os namorados que teve.
Ultimamente era noiva de Ito, um poeta nas horas vagas, que a cobria de
mimos e tentativas de realizar suas vontades. Ela tinha a sensação de estar
apenas cumprindo com os costumes, assim como qualquer pessoa daquele
mundo novo. Não queria se sentir estranha, mas sabia que existia em si, algo
diferente que a conduzia para lugares e coisas incompreensíveis.
Deixou o celular tocar até cessar enquanto olhava a pilha de papéis sobre
sua mesa. Ito, seu noivo, desejava ir ao teatro naquela noite, mas ela preferia
iniciar o projeto que havia recebido na semana passada. Tudo que pensava,
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não fazia conexão com a proposta de trabalho. Pesquisou algumas fontes e


pouco encontrou a respeito, não o suficiente que tivesse embasamento
convincente.
O projeto se chamava “Clube 167”. Trata-se de uma casa noturna onde se
realizavam algumas apresentações esporádicas para um público restrito. A
empresa precisava expandir sua marca para sobreviver no mercado. E o
motivo da contratação de seus serviços era justamente este, encontrar pessoas
afins que pudessem descobrir que naquele ambiente funcionava o que as
atraiam, pois os adeptos que comungavam de tais gostos faziam tudo
anonimamente, talvez pelo julgamento da sociedade ou por preferirem a
privacidade. Aí então se encontrava a complexidade para a desenvoltura da
criatividade de Charlote na criação do slogan.
Ela pesquisou sobre o local, as fotos pareciam ser retiradas no século
passado devido à rusticidade dos móveis e ambientes. Retirou os óculos e se
fixou nas imagens, tentando restaurar em si, alguma lembrança que parecia
embaraçar sua mente. Sentia uma sensação de medo e nostalgia. Piscou
várias vezes e esticou o corpo em sua escrivaninha, até que o celular
novamente passou a tocar, dessa vez, insistentemente.
−Olá, Ito. – disse com um semblante irritado.
− Oi, minha flor… Pensei que dormiria hoje sobre a mesa do trabalho. –
ele riu, sarcástico.
− Não seria uma má ideia. Mas daqui a pouco já estou indo para casa. –
disse, tentando não entrar no assunto que a prendia ali.
− Ok. Assim que chegar, me avise, passarei lá.
− Não, Ito… Melhor não…
− Não? Achei que quisesse ir ao Teatro.
− Estou cansada, podemos deixar para uma próxima vez.

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− Ah, tudo bem… Podemos ao menos comer churros na feira da esquina


de sua casa? – ele riu dessa vez.
− Estou realmente muito cansada… Deixemos também para o próximo
sábado.
− E o que pretende fazer hoje?
− Nada mais além de dormir e dormir.
− Ok, madame difícil… Amanhã então te pego para a caminhada clássica
de domingo.
Antes que ele insistisse ainda mais, acabou concordando sabendo que este
era o único jeito de deixá-la em paz. Desligou o celular e seguiu para o carro.
As imagens do Clube 167 ainda estavam cravadas em sua cabeça. Jamais
esteve lá, nem sabia da existência do local, mas algo a intrigava muito ao se
lembrar dos móveis feitos de madeira escura, talhadas à mão. A falta de
luminosidade trazia uma característica sombria somada aos objetos e
artefatos de ferro envelhecido e correntes.
Pegou o celular e pesquisou novamente o endereço. Estava perto dali. Não
custava ir até lá e descobrir o que faltava para poder dar ênfase a seu trabalho.
Ninguém a conhecia no Clube, pelo menos era o que esperava. E mesmo se
encontrasse alguém conhecido, estava a trabalho, e não via mal algum em
fazer uma pesquisa de campo. Checou sua bolsa para ver se havia trazido sua
agenda. Olhou-se no retrovisor e deslizou o batom vinho escuro. Respirou
fundo e passou a prestar atenção na numeração dos prédios. Estava no seu
destino. A qualquer momento chegaria.
O prédio com arquitetura medieval lhe chamou atenção. Não havia
luminosidade na entrada, apenas um jardim bem esmerado e uma escada feita
de pedra lavada. Os olhos acompanhavam as pessoas que entravam vestidas
de roupas excêntricas. Os homens vestidos de preto levavam as mulheres por
uma coleira. Elas se equilibravam em saltos e olhavam para baixo. Apesar da
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evidência subjugação, não se pareciam funestos por estarem sob o julgo de


alguém. Abriu a porta do carro sem saber se seguiria ou se era melhor deixar
para outra ocasião, mas a curiosidade era seu paredro.
Assim que subiu a escada, fora recepcionada por uma mulher que usava
um corpete preto de couro, saia muito justa que continha uma abertura lateral,
meia-calça e uma bota até os joelhos.
− A senhorita fez alguma reserva? – a voz dela era firme.
− Não… Na verdade, eu… Eu vim para conhecer o local.
− Sabe do que se trata?
− Bem… Sim. – ela estava embaraçada.
A mulher pegou uma folha de papel e entregou a Charlote. Era um termo
de responsabilidade quanto às práticas realizadas no Clube.
− Eu… Eu não vou participar… – disse, referindo-se às práticas.
− Nunca se sabe. Todas dizem a mesma coisa, mas depois… Melhor me
prevenir.
− Pode ter certeza que não irei. – disse firme.
− Mesmo assim, para entrar é obrigatória a assinatura. – finalizou a
anfitriã.
− Ok. – concordou sem encontrar outra saída.
A olência de uma fumaça perfumada no ar invadiu suas narinas assim que
entrou. A música era erudita e as pessoas quase não se olhavam, estavam
todas concentradas no que foram fazer lá. Sentiu-se desconsertada por alguns
minutos. Sua observação parecia incomodá-las.
Encaminhou-se até o bar e se acomodou numa mesa conjugada com a
parede. Preferiu a última, quase na penumbra. Pediu um drinque, apesar de
não gostar de beber, mas se sentia nervosa. Assim que veio a bebida, ela
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levava o copo à boca e sentia as pedras de gelo brincarem com sua língua,
assim conseguiu relaxar um pouco mais.
No palco subiu um casal vestido elegantemente enquanto todos os olhos
foram direcionados para eles. No microfone foi anunciada a presença do
Senhor Van Randon e sua escrava, Angelis Randon. Ele saudava os
presentes, ela olhava fixamente para baixo. Sem saber exatamente o que
esperar, Charlote continuou olhando a cena cada vez mais tensa. Observava
os detalhes, pois era lá que se encontravam as respostas que tinha ido buscar.
Com tato, Sr. Randon passou a despir sua escrava ali mesmo, diante do
público, deixando-a apenas com o corpete e uma tanguinha minúscula que se
escondia inteira entre suas nádegas. Ela não demonstrava timidez, e sim,
respeito por tudo que o homem realizava em seu corpo, mesmo diante das
pessoas.
Randon pegou o microfone, tocou no queixo de Angelis e a fez olhar para
ele.
− Existem algumas regras, que toda e qualquer submissa deve seguir, caso
queira se sentir bem em uma D⁄s. Eu tenho as minhas próprias, e me dedico a
repassá-las a minha menina. A primeira diz sobre a continência e a
necessidade de que esteja sempre disposta para quando e ao que eu quiser.
Lembre-se, eu mando e você obedece. A regra é simples.
Após dizer isso, ele a tomou e ela se ajoelhou, beijando os sapatos do
Dono enquanto um dos pés pisava em suas costas, e com a mão, ele puxou
seus cabelos forçando-a a olhar para seus olhos.
− Nunca perca a dignidade e o respeito por si mesma. Só os fortes sabem e
podem pertencer.
Ao dizer isso, ele se apossou de algemas e a prendeu, levando-a para a cruz
de Santo André fixada à parede. Prendeu os tornozelos e levantou os cabelos,
beijando a nuca delicada dela. Pegou um chicote médio de 30 tiras, e o
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passou delicadamente em suas costas. Em seguida, deu a primeira lambada


com maestria e controle absoluto sobre o acessório.
Charlote passou a ouvir os sons que eram estralados na pele da masoca, e
seu corpo todo se arrepiou em lampejos e sensações. Não sabia ao certo o que
acontecia dentro de si, era como se conhecesse exatamente o que menina
estava sentindo.
Foram várias chicotadas, e ao término, Randon a soltou das algemas e a
amparou até que descesse do palco.
Nem deu tempo de seus batimentos cardíacos voltarem ao normal, e mais
um casal subiu ao palco, desta vez fora anunciada uma sessão avulsa. Tentou
prestar atenção sobre o que se tratava, e descobriu que ali não era um casal
em uma D⁄s, e sim, um dominador experiente e uma moça que praticava
sadomasoquismo esporadicamente. O homem se apresentou como Senhor
Faed, e em seguida, falou:
− Ame a dor, mas exija que seja apenas a outra face do prazer.
Não havia neles uma cumplicidade como no casal anterior, exceto o desejo
pela prática. Isso podia ser notado na forma como a moça olhava para os
acessórios que o Dominador iria utilizar. Seus olhos brilhavam e ela
demonstrava estar pronta. Ele se apoderou de uma palmatória com várias
tachinhas de ferro em sua superfície, e passou a fustigá-la nas nádegas da
menina, após colocá-la em um cavalete com a bunda para cima. Os gemidos
dela ecoavam desejo por todo o salão. De vermelha, a pele passou para um
tom mais escuro, enquanto a masoca oferecia ainda mais seu corpo,
empinando-o como se estivesse apreciando o gesto ao invés de se retrair.
Com o coração ainda mais acelerado, ela viu o casal saindo do palco, e
outro subindo. Sua pulsação sanguínea passou a bombear com mais
intensidade. Ela olhou para os olhos amendoados do homem que lá estava
vestido de calça social preta e camisa azul. Observou a barba bem feita e

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lábios avantajados. Teve medo de mirá-lo mais uma vez e ser notada,
tamanha era sua ansiedade em descobrir mais sobre ele. Algo lhe era familiar,
mas por nem um momento se lembrou de tê-lo visto antes.
Elegantemente ele puxou sua submissa pela guia e a colocou de joelhos,
próxima aos seus pés. Retirou a guia da coleira e a beijou sobre os olhos.
Existia nele algo mágico e hipnotizante. Não era comum apenas olhar para
uma pessoa e se sentir daquele modo. Pediu mais uma dose da bebida e
passou a esfregar as mãos, que suavam frio. Ela precisava saber ao menos seu
nome, que não fora anunciado. O que tinha naquele dominador que chamou
tanto a sua atenção?
− Beijar os pés de teu Dono é apenas uma de algumas das reverências…
Faça! – ele ordenou a menina, e esta cumpriu de imediato, tocando nos
sapatos dele como alguém que alcançasse o céu. Beijou-o e o venerou de tal
modo que chegou a tocar as pessoas que assistiam. Apossou-se das mãos do
Senhor e as beijou. Assim que terminou, ele a pegou pelos cabelos e a trouxe
para perto de si, falando baixo no ouvido, o que excitou ainda mais Charlote.
Ela não fazia ideia do que ele tinha dito para a escrava, mas imaginou uma
frase assim:
Quero-te uma putinha, uma cadela sempre no cio, sempre pronta…
Depois ele pegou o microfone e disse em voz alta:
− Ame teu Dono. Permita que ele te ame.
Dizendo isso, apossou-se de uma corda e passou a amarrar o corpo da
submissa, do ventre para cima, prendendo os seios até ficarem roxos, o que a
fazia entrar em delírio a cada toque do Senhor. Cada nó era feito com a
excelência de uma obra de arte. Sentou-a num banco baixo, prendendo as
pernas de modo que ficassem abertas. Olhava para o sexo da submissa com
lascívia e paixão. Eu sentia o cuidado que tinha com sua peça, por cada parte
do corpo dela. Com um flogger, passou a estocar toques rápidos e circulares

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em sua vulva enquanto hora ou outra perguntava a ela quem era seu Dono.
Para o espanto de Charlote, a menina teve um orgasmo em pleno palco, o
que deixou o Dominador cheio de satisfação.
− Bater é satisfatório, mas quem está sob o jugo deve gostar de apanhar e
ter o hábito de gozar enquanto apanha, caso não tenha, descubra uma maneira
de fazê-lo.– disse ele, encerrando sua apresentação. – a voz dele era forte e
perene, como se pudesse cortar por onde fosse propagada.
Os olhos de Charlote acompanharam os movimentos enquanto ele descia
do palco seguido por sua submissa. Sentiu-se em desespero sem saber
exatamente o que fazer para ter informações sobre aquele Dominador. Sentiu
um aperto no peito, algo forte, sem nome. Não era normal o que estava
acontecendo, mas não havia outro modo de reagir.
Viu quando as costas largas do corpo grande passaram pela porta que dava
à recepção, e pensou em abordá-lo. Seria afamada de maluca, mas isso era o
que menos importava no momento. Precisava descobrir o motivo pelo qual
ficou daquela forma, perdida, e em êxtase, não acreditava que seu nível de
carência havia chegado a este ponto.
Saiu tropeçando nos degraus do local, com o copo na mão, sussurrando
palavras desconectas. Foi até a recepção e abordou a pessoa que a recebeu.
− Por favor, me diga quem é o último casal que se apresentou?
A mulher a olhou de forma estranha, sem muita vontade de responder.
− Ele é o proprietário do Clube. – disse apenas isso, secamente.
Até que a frase processasse lentamente na mente de Charlote, e ela
conseguisse ligar os fatos, agonizou cada segundo que se passava.
− Obrigada. – deixou o copo em cima do balcão e saiu.
Enquanto dirigia, foi pensando sobre o que aconteceu. Então ele era o dono

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do Clube 167, sendo assim, percebeu que estava diante da pessoa que
contratou seus serviços. Quase não acreditou que havia falado com ele ao
telefone, mas não se lembrava do tom da voz, pois naquele momento era
apenas a profissional e seu cliente. Mais pasma ficou quando percebeu que
tinha o número do celular do Dominador em sua agenda, e que seu nome era
AT. Ficou se perguntando sobre as iniciais, mas era muito tarde para decifrar
mais um mistério.
Parou o carro na porta do condomínio, e entrou diretamente em sua vaga
na garagem. Subiu o elevador com o celular em mãos, olhando para o número
em seus contatos, obcecada pela ideia de ir além do que podia para saber
tudo, exatamente tudo a respeito daquele homem.
Ao acordar de manhã, com seu celular tocando, já sabia que Ito não
descansaria enquanto não o atendesse.
− Estarei pronta em uma hora. – disse, desligando o aparelho em seguida,
sem esperar por sua resposta.
Programou o celular para o modo soneca, e dormiu por mais meia hora.
Assim que começou a tocar novamente, levantou e se jogou com coragem
debaixo do chuveiro. Lembrou-se das cenas da noite passada, e nem percebeu
que estava se tocando, fielmente, como uma loba no cio. Sentia vontade de
experimentar o que vira. Jamais admitiria isso para qualquer outra pessoa,
mas não conseguia mentir para si mesma que seus desejos haviam se
acendido por conta das mãos daquele Dominador, da voz, da forma como fala
e toma.
Trocou-se de frente ao espelho, olhando para seu corpo. Nunca mais havia
se visto, sentia-se desejada por si mesma.
Após a caminhada, Ito e Charlote foram tomar café da manhã. Ela sentia-se
tomada, roubada da realidade. O olhar distante despertou a curiosidade do
noivo, que parecia insistente e incomodado com o jeito repentino dela.

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− Está diferente hoje, ou é impressão minha?


− Está muito impressionado ultimamente. – respondeu.
− Pode ser… Mas, seu olhar, eu conheço bem.
− Estou muito focada em meu trabalho.
− Acredito que precisa de férias. Ninguém consegue produzir se não olhar
para si mesma, preocupar-se com sua pessoalidade.
− Minha pessoalidade está diretamente ligada ao meu trabalho.
− Ou o utiliza para fugir do mundo?
Charlote o olhou, irritada. Estava sendo difícil disfarçar sobre as coisas que
estavam a perturbando ultimamente, e agora, ter de ser elegante perante uma
pressão psicológica parecia demais.
− Acredito que nosso passeio acabou por hoje.
− Você já não estava aqui, Charlote. – disse ele chateado.
− Desculpa… Preciso descansar. – disse, tentando se levantar e chegar o
mais rápido possível em sua casa.
− Quer ir para minha casa?
− Não, não… Quero minha cama, meu travesseiro. Amanhã começa tudo
de novo.
Assim que chegou a sua casa, mal pôde acreditar que se livrara de Ito
naquele dia. Parecia arrogante pensar desta forma, mas estava sendo sugada
por uma força descomunal, que a levava para outra realidade. Era como se o
que faltara em sua vida desde o que consegue se lembrar, havia surgido do
nada, tomando todo o espaço dentro de seus pensamentos.
Pegou novamente o celular, e assim ficou olhando para o número de AT,
até que ideias surgissem em torno do seu projeto, deveria apresentar alguma

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prévia nesta semana que entrará. Precisava estar preparada para enfrentar a
ânsia quando estivesse de frente a ele. Precisava se mostrar boa no que faz,
eficiente e profissional. Queria causar alguma impressão. Queria que ele a
notasse de algum modo. Mal podia acreditar que estariam de frente um ao
outro por algum momento. Era a chance que teria para descobrir mais fontes,
mas… Como?
Jogou-se na cama e passou a imaginar de onde o conhecia para estar tão
impressionada. Havia muitas perguntas sem respostas em sua mente. Sua
vida parecia ser um mistério para si mesma. Tudo a sua volta denotava
desconexão com a realidade. Sentia-se um peixe fora d’água, isso lhe causava
dor sempre que pensava assim. Nunca obteve notícias de um parente sequer,
mal sabia se um dia eles existiram. Estava embriagada num mundo que
parecia, muitas vezes, inventado. Ou tudo não passava de um pesadelo que
em algum momento acabaria. Ela não lembrava exatamente de nada desde o
dia em que acordara e parecia ter nascido deste ponto. Jamais comentara isso
com Ito, que sempre perguntava sobre seu passado e família. Como explicar a
ele, que para si mesma isso não fazia sentido?
Chorou sem ruídos. Sabia que ser forte era um privilégio, e coragem não
lhe faltava. Ela mesma não identificava de onde vinha tamanha força.

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Confidências Pessoais

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Capítulo 1
Confidências de Charlote…
O dia raiou com ar de festa.
Saí de casa um pouco atrasada, mas não a ponto de me perder de mim
mesma. Estava ainda aflita por tudo que havia acontecido ontem. As cenas
estavam muito acesas em minha mente, o que poderia dificultar o processo
natural do meu dia.
Levei algum tempo para conseguir sair de casa, mas trouxe comigo o
rascunho de meu projeto,Clube 167. Havia muito trabalho para ser
desempenhado naquele dia. Pesquisas em comunidades do BDSM seriam
uma das opções. Talvez nosso trabalho começasse por ali.
Li tantos relatos, vi tantas imagens, que fiquei meio zonza. Entrar naquele
universo realmente era algo muito diferente do modo como o mundo se
apresenta aqui fora. Contei quase quatro páginas do que havia abstraído de
minha pesquisa, o que me rendeu boa parte do dia, mas estava satisfeita. O
restante eu sabia como desempenhar após ter todo o material em mãos, afinal,
este sempre fora meu trabalho. A ideia era a mais complicada de desenvolver.
Ito me fez cinco ligações até agora, às quinze horas. Confesso que
precisava pensar sobre este relacionamento após a entrega do projeto.
Certamente a proposta financeira fora boa, e quem sabe não poderia investir
em algo, ou até mesmo, fazer uma viagem. Mas sinceramente, o que me traga
de modo descomunal, ainda é o que está acontecendo por dentro. Parece que
despertei, e que devo de qualquer modo mudar a minha vida, mas não vejo
como fazê-lo. Ito é um ótimo rapaz, de boa índole, porém, não havia nada
nele que me atraia, a não ser a companhia num mundo tão vazio e sem
respostas. Pensando friamente sobre o assunto, ele está sendo utilizado por
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mim, de modo egoísta, o que faz eu não me sentir bem comigo mesma.
Assim que terminei de fazer o café, segui de volta para minha sala,
pensativa e um tanto perdida. A primeira imagem foi o sapato marrom e a
postura através das costas. Arrepiei instintivamente. Eu sabia que era ele, mas
não queria acreditar. A primeira vontade foi de dar meia volta e sair pelos
fundos. O segundo desejo foi correr até onde ele estava e saciar minha
curiosidade sobre o que me tirou a paz. Com a força de uma águia, lá vou eu
para mais uma missão.
Entrei me sentindo meio estranha. Os olhos dele estavam afundados no
jornal que lia. A perna cruzada sobre o joelho direito lhe davam um ar de
superioridade. Eu tossi sem jeito, para que notasse minha presença, e assim,
sem pressa, os olhos dele percorreram meus pés, parecendo investigar cada
detalhe dos meus dedos que ficavam à mostra na sandália. Subiu no mesmo
ritmo até minhas pernas, baixo ventre, abdômen, seios, pescoço e parou em
meus lábios, o que me desconsertou no mesmo instante. Os olhos pousaram
sobre os meus, como se pudessem me desfigurar num único ato. Senti um
ardor queimar minha intimidade, e um lampejo de luz e cores invadirem
minha memória, tentando me forçar a algo que não acontecia. Vi os olhos
amendoados brilharem numa intensidade quase artística, eu o reconhecia sem
nunca antes termos nos visto. Percebi que do mesmo modo ele se prendeu em
algo sem nome e sem explicação em relação a minha imagem. Os segundos
passavam e não conseguíamos dizer uma só palavra. Parecia bom e temido
estar diante dele. Eu não estava errada, algo naquele homem era
impressionantemente anormal.
− AT? - fui a primeira a arriscar, ainda com a voz meio reprimida.
− Muito prazer, senhorita Charlote.
E era nesse exato ponto que eu queria cair no chão como uma boneca de
pano. Ele era ainda mais atraente quando falava com um par de olhos
profundos e brilhantes, e um meio sorriso que não se distraia.
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Eu pensei em estender a mão para cumprimentá-lo, mas ele sequer fez


menção de fazer tal gesto, então me reservei em minha total insignificância.
Fui até a minha cadeira sob seu olhar, e sentei-me o mais rápido que pude.
Pigarreei, tentando amenizar o mau jeito, e busquei dentro do mais profundo
do meu ser profissional, a expressão apropriada àquele momento.
− Espero que o que consegui extrair de minhas pesquisas, seja
considerável. Fiz um prospecto para o projeto, talvez se analisasse com
calma, perceberia que os pontos demarcados na propagação da imagem foram
realmente o mais interessante de toda a proposta. – sorri ainda sem jeito,
tentando me manter na linha, e passar uma postura profissionalmente
convincente.
Ele pegou a pasta de papel com o projeto, e voltou os olhos para mim,
então fiz de conta que não percebi.
− Onde encontrou as fontes? - ele quis saber assim que passou a ler as
primeiras linhas.
− Na internet. – respondi um pouco insegura, sem saber se esta era a
melhor resposta.
− A senhorita tem conhecimento do assunto? - perguntou sem rodeios.
− Em qual sentido? - senti desta vez um medo que me faria parar a
conversa por ali.
− No sentido de experiência.
− Sou profissional, trabalho com fatos e pesquisas.
− Ah sim. – ele disse, apenas.
− Creio que seja o suficiente. – emendei.
− Creio que poderia se aprofundar mais no assunto, para sentir qual é a
necessidade da casa. – disse num tom ríspido e quase grosseiro, o que poderia

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não me diminuir como profissional, mas atingiu também meu orgulho.


− Acredito piamente que sou boa no que faço. Se, ler atentamente a
proposta, saberá que está diante da pessoa certa.
Precisei acreditar no meu potencial, mesmo que de modo forçado. Ele era
desafiador, e eu, um coelhinho assustado.
− Vou confiar em seu trabalho. Mas antes, gostaria de saber por qual
motivo esteve à minha procura em meu estabelecimento.
Cada palavra dele era como um martelo em minha cabeça. Não haveria
motivos para mentir nesse momento, mas mesmo assim, eu ainda procurava
por uma saída rápida e beneficiadora.
− Não fui procurá-lo, estava a trabalho, fazendo pesquisa de campo,
conhecendo o estabelecimento. – quase tossi, mas ao invés disso, apertei
minha perna por debaixo da mesa, buscando apoio em mim mesma.
− Certo. Assistiu minha apresentação?
− Certamente. – fugi do olhar dele.
− E o que achou?
− Ajudou-me em minhas convicções sobre a ideia do projeto.
− Algo mais? - ele insistia em algo que eu não queria falar.
− Não.
− Quando começa a execução do projeto?
− Assim que aprová-lo.
− Está aprovado.
− Mas você leu as premissas? Concordou com os pontos de execução e
locais de marketing?
− Quanto a isso, não me interessa os meios, Charlote. O que quero é
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resultado.
Pasmei. Arrogante. Exigente. Talvez fosse melhor ele procurar outro
profissional.
− Mas preciso saber se concorda com a proposta. Caso não se agradar, não
saberei se não me disser onde está o desacordo. O marketing está relacionado
ao posicionamento da empresa, que se materializa na memória do cliente
através dos produtos e serviços que atendem suas demandas. Isso tudo se dá
através da comunicação, que é o passo seguinte. Após estudar e compreender
o comportamento de compra do cliente agrupa-se um conjunto de
ferramentas e mídias formando um plano de comunicação que tem como
objetivo propagar as mensagens para seu público, através de um conceito
criativo e eficiente, ou seja, que facilite a compreensão da mensagem. E é
neste ponto que estou tentando lhe fazer prestar atenção quanto a minha
estratégia desenvolvida, que se encontra em suas mãos.
− Vou repetir. Como disse, a única coisa que me interessa é o resultado,
seja ele de onde vier. Eu não entendo sobre estratégias de marketing, e por
este motivo busquei seus serviços. Estou confiando em sua experiência como
profissional.
Senti o desejo de me afundar em minha cadeira. Se algo desse errado,
provavelmente eu sumiria do planeta para não encarar a ira deste ser
intrigante e explicitamente direto.
− Tudo bem. Amanhã já começo a execução.
Ele se levantou sem dar tempo de eu ficar vermelha.
− Espero-a no Clube amanhã, às vinte e duas horas. Seja pontual.
− No Clube?
− Creio que entendeu perfeitamente o que eu disse.
− Sim, mas não vejo a necessidade.
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Ele pegou sua carteira e tirou de lá um bolo de notas de cem reais, e


depositou sobre minha mesa.
− Esta é a metade do pagamento que combinamos.
Fiquei sem ação. Imobilizada. Vendo meu estado, ele colocou o dinheiro
em cima da mesa.
− É uma ordem. – disse ele sem reservas.
− Ordem? - eu não acreditava no que ouvia.
− Sim, estou a contratando, e vou acompanhar o desenvolvimento de seu
projeto, como você mesma disse, de pesquisa de campo. Em seu prospecto
falta algo a mais. Você precisa pegar o “x” da questão, sem falar que o
público que quero agradar, primeiramente é aquele que já está lá, além dos
que levará após seu marketing. Aprenda… – disse ele dessa vez se
aproximando de mim a ponto de me sufocar com sua presença, e eu ver
perfeitamente a cor de seus olhos intrigantes. – Se não conhecer o que agrada
a quem já está lá, como vai levar novos adeptos? Precisa conhecer mais sobre
a essência das práticas. Meus clientes serão os seus. Você quer que seus
clientes te ouçam? Você é um líder referente? Então, seja um expert em algo.
Não se deve simplesmente contratar um redator e delegar tarefas como
escrever vinte textos como conteúdo. Coloque-se no lugar de seus clientes
para ajudá-los, você só pode escrever sobre seus próprios produtos, a partir
do ponto de vista do consumidor. Faça com que o assunto seja sempre sobre
o usuário, e não sobre você.
− Eu… – ele me calou sem me tocar um dedo sequer.
− Estarei esperando por você.
Ao dizer isso, virou-se e saiu, deixando-me completamente alterada, eu
não cabia dentro de mim mesma.
Desliguei meu celular e tentei fechar meu dia com paciência. Não queria

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ser incomodada. Não queria saber se meu noivo estava louco atrás de mim.
Tudo que eu precisava era de um tempo para refletir e colocar minha cabeça
em ordem.
Fui para casa sem esperar mais nada daquele dia. Amanhã chegará como
um fenômeno em minha existência como publicitária. Minha campanha
estava fadada ao desastre ou a um grande marco em minha profissão. Já sobre
AT, eu não sabia mais o que pensar. Faria qualquer coisa milagrosa para
separar os fatos de impressões.
Ao abrir a porta de minha casa, ligo meu celular, e antes de jogar minha
bolsa sobre a mesa, ele toca. Olhei no visor, e apareceu lá o nome do homem
que tomou minha paz naquele dia. Sem saber se atendia, meus dedos me
traíram e coloquei o aparelho na orelha.
− Vá vestida apropriadamente. – disse ele com um fundo musical no
ambiente que se encontrava, o que me deixou curiosa.
− O que quer dizer?
− Para saber o que eles desejam, você precisa se sentir um deles.
− Acredito que estamos indo longe demais com os detalhes. – disse enfim,
sentindo-me cansada e aflita.
− Não quero saber sua opinião. Esteja pronta, isso basta.
Desligou.
Meu coração acelerou. O que quis dizer com – esteja pronta! Não
combinamos de nos encontrar no Clube?
Minha noite se tornou um inferno astral. Fui até a sacada e vi de lá uma
cidade cheia de luzes e segredos. Corri para o banheiro e entrei no chuveiro
de roupa e tudo. Estava a ponto de enlouquecer já nos primeiros momentos
desta viagem.

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Como ele poderia amar alguém, como disse naquele dia no Clube?
Lembro-me de suas palavras: Ame teu dono. Permita que ele te ame.
Que universo é esse?
Tirei a roupa molhada e passei a tomar um banho normal. Sentia minhas
mãos percorrendo meu corpo, mesmo sem mexê-las. Elas se moviam
sozinhas. Estava enfeitiçada, um tipo de fascínio por um mundo que não me
pertencia.
Acordei com minha campainha zunindo em meu ouvido. Vesti meu roupão
e minha surpresa ao abrir a porta, foi algo contagiante.
− Encomenda para a senhorita Charlote. – disse um entregador com uma
caixa grande nos braços.
Esfreguei os olhos e arrumei o decote do roupão.
− Encomenda? Acabei de acordar. Não comprei nada ainda.
− Está aqui. – ele mostrou o endereçador com meu nome e endereço.
Peguei a caixa um tanto receosa e abri lentamente. Lá dentro, uma roupa.
Toquei-a e a peguei, colocando sobre meu corpo. Era um vestido vermelho
escuro e justo, forrado por um tecido preto, com uma fenda gigante dos pés
até a altura da coxa, ficando à mostra boa parte da perna. Peguei o bilhete que
acompanhava a roupa.
“Não se esqueça, esteja pronta às vinte horas em ponto.”
Cismei. Tossi. Arfei. E agora?
Cancelei meus compromissos do dia. Liguei para Ito e disse que estava
bem, prometendo vê-lo amanhã, e talvez até dormíssemos juntos. Inventei
uma desculpa, que faria uma curta viagem hoje para o interior e chegaria
somente à noite, muito cansada. Ele compreendeu, mas certamente não
gostou, o que não me atingiu, e o que infelizmente me fez reconhecer que

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precisaria de uma estratégia para acabar de vez com essa mentira.


Troquei-me rapidamente e fiquei andando pelas ruas, até passar as horas e
eu poder voltar para casa, mais tranquila.
Às vinte horas, já estava no banho pensando em como desenrolaria essa
tragédia. Às vinte e quarenta, secava os cabelos enquanto me olhava no
espelho e me achava estúpida. Às vinte e uma e trinta, já havia calçado o
sapato que poderia combinar com o vestido. Passei um batom contagiante e
um pouco de perfume, me questionando se o que estava fazendo era correto.
Coloquei o modelito e me olhei novamente, parecia-me a atrizes de filmes
antigos. Os ombros e colo ficaram de fora, sob a luz de qualquer ambiente,
minha pele clara reluzia. Às vinte e duas horas meu celular tocou, e nos
segundo depois, tudo se perdeu ao ouvir a voz dele:
− Desça. – ele disse, e meu coração poderia sair pela boca se não fosse a
geografia perfeita do corpo humano.
Entrei em seu carro importado com cheiro de fábrica, e minha voz sumiu,
desapareceu do mapa. Olhava-o de resvalo, dirigir, com suas mãos fortes e
potentes, meu estômago embrulhava de nervoso.
− Foi difícil?
− Oi?
− Foi difícil cumprir ordens?
− Eu não cumpri ordens, AT, estou a trabalho. Sou chefe de mim mesma.
Aceitei sugestões.
− Ah sim… Não é AT, é Senhor AT.
Eu pude ver um quase sorriso nele, zombando de meu mal-estar.
− Qual será minha função no Clube, especificamente?
− Irei treiná-la, como se fosse uma de nós.

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− Não, absolutamente, não é necessário tanto… – fiquei incrédula. Eu não


precisava de um treinamento sadomasoquista para ser profissional, estava
totalmente fora de cogitação esta sugestão. – Está fora de ordem este
treinamento.
Eu disse isso como um peixe patinando na água.
Ele estacionou o maserati, e me olhou com o olhar de um falcão.
− Vamos nos entender? - disse ainda me olhando. – A partir deste
momento está em treinamento. Tudo que eu disser, não são palavras, são
ordens. Está sendo contratada, exclusivamente, para atender às minhas
solicitações. – disse ele pegando um talão de cheques do porta-luvas, em
seguida, a caneta. Acendeu a luz interna do carro e passou a preencher a
folha. Assim que terminou, passou para mim, um contrato com duas páginas
em frente e verso.
− Eu a espero ler. – disse ele.
O contrato era de exclusividade quanto aos meus serviços de publicidade,
durante três meses. Meus nervos ferviam, fazendo-me salivar. A quantidade
de dinheiro oferecida pela contratação era irresistível, mas minha razão
calculista e ética pedia para não aceitar.
− Eu não posso assinar este contrato. Não posso aceitar. Sinto muito. –
disse eu, esmagando-me no vestido muito justo enquanto os olhos dele não
saiam da minha coxa à mostra, o que me fez sentir um tanto ridícula.
− Não tenho pressa… Você tem até o final desta madrugada para assinar.
Dizendo isso, ligou o carro e saímos com ele escolhendo uma música para
tocar. Quando ouvi o canto gregoriano de introdução de Fairy Tale de
Shaman, pensei que choraria. Por alguns segundos, imaginei que esse homem
me vigiava há meses, seguindo-me, descobrindo meus gostos e manias. Ele
conseguiu me quebrar em fração de segundos. Minha fragilidade veio à tona
como se eu fosse ainda uma menininha perdida que precisasse de um colo,
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um amparo ou… Uma lembrança… Apenas e tão somente uma lembrança.


Mordi meu lábio tentando me conter, mas o cheiro dele entrava pelas minhas
narinas e me contraia num ser minúsculo, quase insignificante diante de sua
mão. Abstive-me de ser corajosa, quando o que eu mais queria era me
encolher num lugar mais próximo de algo quente e confortável. Fiquei como
uma borboleta batendo suas asas presas em uma porta, enquanto o sonido do
carro em movimento e o soprar do vento em meu rosto, desfaziam meus
cabelos e só me traziam uma certeza, o tempo parece não passar.
Não queria molhar minha maquiagem, nem chorar na frente de um
estranho, o que piorou a situação, pois quando me vi já estava num pranto
secreto, calado, somente com as lágrimas umedecendo minha face. O mundo
era gigante diante de um grão de areia que sou. Talvez eu tivesse soltado um
soluço ou apenas ouvia demais sem sentir um décimo de minhas próprias
reações.
Novamente ele estacionou o carro, e desta vez, juro que se ele se
aproximar, eu abro a porta e saio correndo. De modo cortês, AT retirou o
lenço de seu bolso e me entregou. Aceitei-o com as mãos trêmulas, e limpei o
rosto sem saber o porquê isso tudo estava acontecendo.
− Nada de mal irá lhe acontecer. Eu não deixarei. – disse me olhando, o
que fez parecer que me tocava também. – Vou te proteger de seus próprios
medos. Cuidarei de você, até que possa se cuidar sozinha. Não precisa temer,
eu estou aqui.
Balancei a cabeça, concordando sem entender com o que assentia, e lhe
devolvi o lenço.
− Guarde-o consigo. – disse numa voz suave.
Ele acariciou meu rosto com o polegar, pensei que diria mais alguma coisa,
mas ao invés disso se voltou para o volante. A música tocava não apenas meu
corpo todo, mas atingia meu âmago de forma desconhecida. Eu sentia

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saudades… Sentia que poderia morrer de saudades… E nada naquele


momento poderia me consolar mais do que me lembrar da razão consoante
dessa sensação da falta. Minha subtração abstrata me condenava.
Após algumas voltas pela cidade, em silêncio, até que eu me acalmasse por
completo, chegamos ao Clube, basicamente quase meia hora depois. Pisei
fundo no piso com minha sandália de salto alto, e ao lado daquele estranho.
Segui como uma guerreira que confiava totalmente em seu ponto de apoio,
que naquele momento tornou-se sua espada. As luzes coloridas não
incomodavam, mas os murmúrios dos adeptos em sons diversos, deixavam-
me zonza.
AT me pôs sentada em uma cadeira confortável na mesa de frente ao palco,
e ali deixei que os minutos escorressem soltos pela aquela atmosfera estranha
e curiosa, até a voz no microfone me despertar. Madame Zaran se
apresentava com sua escrava. Em movimentos rápidos e muito habilidosos,
ela colocava uma série de agulhas nas costas da submissa, que gemia
sutilmente diante dos desejos de sua Dona. Percebi os dedos apertarem a
almofada que estava sentada. Era de desejo. Desejo de tocar ao menos um
milésimo de segundo em sua Ama.
Fui despertada daquela visão pelas mãos de AT que me puxaram para
algum lugar que eu tentava descobrir. Ele me conduzia diante de corredores
obscuros de pisos cobertos por tapetes orientais e paredes que ostentavam
objetos sadomasoquistas. Fiquei olhando para tudo, boquiaberta.
Entramos numa sala com as paredes cobertas por uma cortina grená. De
um cômodo saiu uma menina que a reconheci quando olhei nos seus olhos.
Ela era a mesma que se submetera a AT naquela última apresentação que
assisti. Assim que o viu, ela se ajoelhou e beijou suas mãos. Achei bonito,
mas uma sensação estranha me apanhara de súbito.
− Saudações, meu Senhor. Grata por me permitir revê-lo. – disse ela ainda
de joelhos até ele ordenar que se levantasse.
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− Antonele, esta é Charlote, e quero que a instrua em minha ausência, no


que ela precisar. – disse ele sem meias palavras, o que me pegou de surpresa,
pois não saberia dizer no que aquela criatura poderia me conduzir.
− Sim Senhor. – ela respondeu, e só depois me olhou. Por mais que seu
olhar fosse curioso, não deixou se levar pelo o que sentia. Sorriu de maneira
gentil e me cumprimentou com a cabeça.
− Antonele é minha escrava e braço direito. Ela irá te passar tudo sobre
submissão, e como se sente como submissa.
− Talvez haja algum equívoco, AT, eu não estou muito interessada em
invadir a privacidade de Antonele, e creio que não preciso me aprofundar
tanto no assunto para resolvermos as questões do marketing.
Ele espirrou fogo com o olhar. Percebi um leve tremor em seus lábios e,
pela primeira vez, pensei que me dirigisse alguma palavra vulgar e de baixo
calão.
− Primeiramente, Charlote, o que estou fazendo é minha parte na
colaboração do projeto. Não tem como desenvolver algo sem conhecer o
universo, como eu mesmo já lhe expliquei. Segundo, não me chame pelo
nome na frente de minha escrava. Terceiro, ninguém invade a privacidade de
ninguém diante de uma ordem. Estamos entendidos?
− E onde acha que devo receber essas instruções? - estava me sentindo
incrédula. Ele simplesmente se sentia no direito de me dar ordens.
− Como estamos negociando exclusividade em serviços prestados, durante
a desenvoltura do projeto, creio que poderá ser onde eu achar conveniente.
Ele olhou para Antonele e a pediu que se retirasse. Ela se ajoelhou e beijou
as mãos dele novamente, e saiu. Eu fiquei com a sensação de ter na boca uma
maçã inteira, enquanto não sabia como fazer para dizer não a ele.
− Gostaria de ter todas as informações… Mesmo por que, ainda não lhe

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respondi quanto ao contrato. Não sei se devo aceitar. Tenho outras obrigações
e interesses a cuidar, não estou disposta a me dedicar apenas a um tipo de
projeto.
− Acredito que não está entendendo o que estou tentando falar há horas.
Temos um pré-acordo, seria muita falta de descomprometimento de sua parte,
me entregar o serviço pela metade. Poderia processá-la por falta de ética no
Conselho de sua profissão.
− Não desejo me sentir obrigada a nada. Sou autônoma, não estou
agregada a nenhum tipo de absurdo como este.
Ele me olhou diretamente nos olhos. Tocou-me pela primeira vez,
segurando forte em meus ombros, trazendo meu corpo pequeno, para perto do
seu porte másculo. Senti sua respiração em meu rosto, e observei seus lábios
se movimentarem enquanto ele pronunciava:
− Charlote, eu confio plenamente em seu trabalho. Confio que não me
deixará a ver navios. Mas para que tudo seja perfeito, é necessário abrir mão
de seu orgulho, pois ele não cabe diante de tanto talento. Ademais, você é
uma mulher inteligente, não estamos lidando com porcos ou equinos, estamos
tratando de um assunto sério, que depende neste momento de sua única e
exclusiva cordialidade em aceitar. Não posso obrigá-la a nada, exatamente. A
qualquer hora que desejar ir embora, assim como a trouxe, eu a levarei, mas
quero que seja honesta o suficiente para me dizer que não quer desenvolver
este trabalho.
Fiquei me sentindo encurralada. Os passos dele foram progredindo até que
eu andar para trás como caranguejo. Senti minhas costas na parede fria, e
com as mãos um pouco mais firmes sobre meus ombros, ele me suspendeu,
fazendo-me perder o ar, trazendo-me ainda mais para perto do seu rosto. Fui
esfregando em seu tórax até estar bem perto dos seus olhos.
− Diga-me, com suas palavras e lábios, que não deseja desenvolver o

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projeto de marketing para o meu Clube. – sua voz era doce e contagiante,
fazia ciranda em torno dos meus ouvidos enquanto meus pés eram suspensos
do chão, por mãos fortes e imensas.
Um bater na porta me libertou dele, que ainda tinha suas mãos fazendo
pressão em minha pele mesmo sem estarem lá. Senti um formigamento no
local, e um sentimento confortável, mesmo diante de uma pressão
psicológica.
− Está quase na hora. – uma voz veio lhe chamar para a apresentação. Ele
ainda me olhou atravessado, e disse com o mesmo tom de voz de antes:
− Pense… Você tem até o final desta noite para me dar sua resposta. –
dizendo isso, chamou por Antonele e saíram do local, deixando-me passada.
Intimidada, segui o corredor que me levou para aquele ambiente, e me
sentei na mesma cadeira que antes estava. Antes que eu pedisse uma bebida,
o garçom já vinha trazendo algo na bandeja. Era um copo de Martini com um
bilhete curto:
“Experimente se permitir. Eu tenho certeza de que não se arrependerá.”
Peguei o copo da bandeja mais que rapidamente, e, em cinco goles, devorei
a bebida e pedi que trouxesse mais. Na terceira dose, um pouco tonta, percebi
que AT já estava em cima do palco em sua apresentação com Antonele. Ele
estava concentrado em tudo que fazia. Eu ouvi o chicote estralar e vi as
marcas no corpo moreno. As feições do rosto dele se modificaram num
segundo, trazendo à tona um lobo faminto e insaciável, que lambia a pele
chicoteada e levantava novamente o açoite em movimentos vorazes, com
pressa e sem redenção. Ele era insaciável.
− Quem é você? - ele perguntava por diversas vezes, e ela respondia:
− Sua cadela, Senhor.
Ele colocou o chicote nos lábios dela e a fez beijá-lo, encerrando sua

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apresentação.
Ao vir em minha direção, ainda em estado de transe, secou o rosto com o
guardanapo e pediu uma bebida. Fiquei olhando impressionada para suas
feições, não conseguia piscar. Ele estava totalmente diferente. Sim. Era um
lobo, eu tinha certeza disso.
Meus dedos aflitos em cima da mesa foram observados por ele, nada
passava despercebido diante dos seus olhos. Tomou minha mão e prendeu
firmemente sob a sua. Com a outra, bebia o Martini. Vi quando colocou a
pedra pequena de gelo em sua boca, e assim, levou minha mão presa até seus
lábios, mordiscando somente a ponta do meu dedo, encostando-o ao gelo.
Senti um arrepio percorrer minha espinha dorsal. Queria me afastar, mas não
consegui. O efeito do álcool misturado às sensações que aquele homem me
causava era algo difícil de conter.
Ao me soltar, eu nem queria ter saído, então ele pegou sua pasta, abriu, e
de lá retirou o contrato.
− Vai assinar?
Observei o chicote sobre a mesa. Fechei os olhos. Ouvia a música inglesa,
ela pedia para alguém se entregar. Vi quando pegou a caneta e a deixou no ar,
diante de lábios irresistíveis. Neste mesmo instante meu pulso foi segurado
por uma mão gigante e pesada. Tremi.
Peguei a caneta de sua mão, que prendeu a minha mais uma vez. Olhou-me
de modo desafiador. Ele não queria apenas que eu assinasse, queria que eu
me rendesse!
Observei o local onde se colocava a assinatura, e mal consegui me atentar
às cláusulas contratuais. O que eu mais queria era me esconder de tudo isso,
ou me jogar de vez nas mãos daquele maluco.
Assim que assinei, levantei da cadeira.

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− Para onde vai? - disse ele, percorrendo meu corpo com o olhar.
− Quero ir para casa. – eu disse.
− A noite nem começou… – disse ele pacientemente.
− Para mim já se concluiu.
Ele sorriu pela metade e molhou os lábios. Levou tranquilamente a mão
num botão sobre a mesa e apertou. Minutos depois, dois brutamontes vestidos
de terno cercaram o local onde estávamos.
− Podem levar a senhorita.
Sentime extremamente ofendida. Levei a mão na boca e suspirei. Fui
usada. Fui abusada. Fui ridicularizada. Que diabos eu esperava e queria desse
homem?
Não tive outra opção, precisava sair dali de qualquer modo. Segui os
homens que me levaram até um carro, e de lá, somente um me acompanhou,
dirigindo o veículo.
Quando estava quase relaxando, outro susto me tomou.
− Para onde o senhor está me conduzindo? - perguntei assustada, sabendo
que aquele não era o caminho para minha casa.
− Para onde fui ordenado a lhe conduzir.
Eu não podia acreditar que aquele cretino estava me raptando!
− Por favor, pare o carro, vou descer.
− Não tenho ordens para deixá-la descer antes de chegar em nosso destino.
− O senhor não entendeu? Eu não sou prisioneira de ninguém! E quero
descer desse maldito carro!
− Entendo senhorita, mas infelizmente não poderei atender ao seu pedido.
O que eu poderia fazer? Esmurrá-lo? Pular do carro com este em
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movimento? Gritar pela janela? Ligar para a polícia?


Naquele exato momento me ocorreu de ler atentamente o contrato que
havia assinado. Peguei-o da bolsa o mais rápido possível e pedi para o
brutamonte acender a luz do carro.
Minha indignação fora tamanha já nas primeiras cláusulas:
“A partir desta data, durante os próximos 60 dias, estará sujeita a
acompanhar o contratante aos locais que este desejar, estando em sua inteira
disposição durante 24 horas do dia e sete dias da semana.”
“A partir da data deste contrato, estará sob a guarda e tutela de AT,
reservando-se a se instalar em sua residência pelo tempo limitado por este
documento, até que finde os serviços contratados.”
“A multa contratual para o descumprimento de qualquer uma das cláusulas
presentes, sujeitará a contratada ao pagamento de trinta vezes o valor dos
serviços contratados.”
Está bem, eu me ferrei? Eu me ferrei, é isso mesmo? - quase gritei aos
quatro ventos.
No final do contrato,
“Estou ciente e concordo com todas as cláusulas elencadas, e torno-me
durante o prazo estipulado, cumpridora das obrigações descritas, por justo
julgá-las ser perante o ato contratual.”
E a burra assinou as duas vias. Sendo esta, a dela. – pensei alto.

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Capítulo 2
Confidências de Charlote…
Entrei naquele casarão quase cega de raiva e revolta, mas ao abrir a porta, a
curiosidade tomou fortemente o lugar de já quase antiga angústia. Não era
apenas uma casa, mais parecia uma masmorra de filmes antigos, por todos os
lados haviam acessórios sadomasoquistas. A cor predominante era a preta e
vermelha escura. Ferros, correntes, couro e instrumentos de tortura. Nada ali
lembrava exatamente uma casa comum. Sentime tonta, como se já estivesse
conhecido antes algum lugar que tenha essas características.
Fui recebida por uma mulher uniformizada que me chamou pelo nome, o
que deixou bem nítida a intensão premeditada do tal AT, que certamente
cuidou de todos os detalhes e artimanhas.
− Boa noite, senhorita. Poderia me acompanhar? Vou levá-la até seu
aposento.
− Meu aposento? - fiz-me de demente.
− Sim, o quarto da senhorita já está preparado e aromatizado, espero que
goste.
Quem sou eu na fila do pão? Quando uma prisioneira iria ser tratada
assim? Enfim, nada o isenta de uma grosseria sem fim. O que ele fez foi
muito errado e eu não abrirei mão facilmente de meus direitos de me sentir
ofendida com tudo isso.
− Escute, senhora, por um acaso tem noção do horário que seu patrão
costuma chegar? Eu gostaria que me acordasse, caso eu adormecesse.
− Não tenho ordens para subir aos aposentos do andar de cima, senhorita,
quando lá há pessoas nos quartos. Lamento.
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Fiquei olhando para ela com uma cara de paisagem, certamente tudo que
eu dissesse ela jamais ousaria a ir contra as ordens do poderoso AT, e só me
resta subir para a droga do quarto perfumado e esperar o infernal Dominador
chegar. Certamente fui quase marchando degraus acima.
Quando entrei no quarto, para minha total surpresa, não havia cama, e sim,
um tapete muito grosso e felpudo, forrado por um sutil lençol. As paredes
eram revestidas por couro, e o lustre tinha as luzes vermelhas que deixavam o
quarto todo naquele tom. Fui para o close, e lá continha um armário com
roupas femininas. Acendi a luz, e todos os cabides tinham um papel
indicando uma data. Fiquei olhando para aquilo, tentando entender o intuito.
Quem poderia marcar a data que usaria uma roupa? Certamente essa pessoa
não sou eu.
Saí do close e me joguei no único local que havia para dormir. Não tinha
outro jeito, tinha que dormir ali mesmo, apesar de que não era tão ruim assim,
o tapete era macio e felpudo. Ali estava realmente muito aromatizado, como
disse aquela senhora, não entendi o motivo do agrado, quando é oferecido o
chão para que sua visita dormir. A luz vermelha foi me causando um sono
incontrolável, eu ainda estava sob o efeito da bebida.
***
Confidências de AT…
Cheguei por volta das quatro da manhã. Subi até o andar de cima e abri
lentamente a porta do quarto de Charlote. Olhei-a dormir, parecia um
passarinho fora do ninho. Teimosa. Estava descoberta, o que me animou a
puxar o lençol até seu pescoço. Ela se mexeu levemente, e estacionei a
cabeça para olhá-la mais de perto. O rosto dela… Havia nele algo tão familiar
que senti vontade de beijá-la. Forcei-me a deixá-la. Saí do quarto com o
pensamento ainda na pele da pequena. Tudo naquela menina parecia ter sido
feito para me encantar. O cheiro dela… Ah, eu o sinto mesmo de longe…

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Fechei a porta com cuidado e fui para meu quarto com a sensação de sono
perdido. Precisava mantê-la por perto até o momento de convencê-la a ser
minha. Não abrirei mão. Preciosa… Especial, eu a quero como nunca quis
outra menina. Não é de meu costume tomar alguém de si mesma a qualquer
custo, mas não haveria outra maneira de mostrá-la minha verdadeira face, e o
quanto ela lateja por dentro… Incontrolavelmente. Excito-me só de pensar
nela, com aqueles lábios… Eu em sua boca, derramando…
Quando procurei seus serviços, eu já a observava entrando e saindo todos
os dias de seu escritório. A primeira vez que a vi foi num dia de sol, assim
que saiu daquele bendito café, apressada e perdida. Notei seu olhar a procura
de algo, e suas mãos, quando soltas, não tinham direção. Mãos pequenas e
inquietas. Senti vontade de beijá-las. Percebi no seu jeito de andar, que sentia
a falta de alguém que segurasse em sua mão. Vi quando entrou em seu carro
e ficou mais ou menos uns cinco minutos parada, olhando para o nada.
Percebi sua solidão interna e carência por algo que ela mesma não havia
descoberto em si. Eu faria de tudo para mudar seu mundo…
Na segunda vez que a vi, ela entrava numa loja de roupas femininas. Eu a
observei enquanto seu descontentamento por tudo que havia no mundo,
perseguia. Entrei na mesma loja e fiquei por ali, escolhendo algo para
comprar para Antonele, desculpa para vê-la mais um instante. Seus olhos
percorriam as instalações e prateleiras, nada a fazia feliz. Cansada de
experimentar, ela se despediu da vendedora e novamente entrou em seu carro,
pensando em algum lugar para ir, submersa em seu mundo inacessível e
secreto. Sem encontrar uma opção, foi para seu apartamento.
Ao chegar à frente do prédio, atendeu o celular, e olhou para trás, ele
estava lá, o noivo baunilha que não a satisfazia como mulher. Os olhos dela
perderam ainda mais o brilho quando ele se aproximou. O namorado baunilha
não sabia, que nada em seu miúdo universo poderia preencher essa menina.
Vi quando ele a abraçou e os braços dela caíram estendidos nas laterais do

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corpo. Naquele momento Charlote era uma boneca de cera, e não se agregara
àquele rapaz tão somente por amor, sobretudo, porque não sabia viver sem
proteção e cuidados. Precisava de amparo e uma mão forte que a sustentasse,
e não uma que não encaixava a sua, como a dele.
Deitei em minha cama e fiquei com a imagem dela em minha mente, sem
poder imaginar o que fazer para dominar seus anseios. O cheiro da menina
ainda me rondava como um castigo. Queria me levantar e trazê-la para minha
cama, mas se o fizesse, não conseguiria domar o cavalo selvagem que havia
em seu peito. Eu a conhecia de algum outro lugar, de algum tempo… Ela não
faria essa bagunça com a minha cabeça, do nada, sem explicação.
Quando o dia amanheceu, fechei os olhos e adormeci.
***
Confidências de Charlote…
Acordei sem saber ao certo onde estava, percebi apenas que a cortina
estava aberta, e havia a minha frente, um corpo alto e forte, parado como uma
estátua. Pestanejei os olhos e os abri com cautela.
− Que horas são, por favor? - perguntei já preocupada com meu horário do
trabalho, me sentindo constrangida de ele me ver assim, descabelada e de
qualquer jeito estirada naquele tapete.
− Hora de se levantar para tomar o café da manhã.
− Não… Não, não posso, tenho que ir para casa, tomar um banho e seguir
para o escritório. – eu queria era me livrar dele o quanto antes. Procurei
minha bolsa, e dentro dela, o celular. Tinha quinze ligações de Ito.
− Esqueceu-se de seu contrato comigo?
− Qual contrato? - minha cabeça rodava a mil por hora, e eu não sabia
sequer meu sobrenome naquela altura do campeonato. Não tinha o hábito de
beber, e muito menos de dormir na casa alheia. Como poderia me esquecer
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daquela idiotice que havia feito ontem?


− E quanto a esse estorvo que você mantem ao seu lado… – ele me olhou
com cara de poucos amigos, e eu o encarei.
− Não sei de quem está falando…
− Você pode se levantar agora, e usar o banheiro. As roupas, como pôde
notar, estão marcadas no cabide, uma para cada dia da semana até o
encerramento contratual.
– Ele mudou de assunto e veio com outro ainda pior.
− Isso não está no contrato e não tem nada a ver com o trabalho a ser feito.
− Não tem o que se discutir, está sob minha responsabilidade até o final do
contrato, e eu quero que seja assim.
Senti uma raiva infinita daquele ser. Além do mais, ele ainda implicava
com minha vida íntima e privada.
− Me dê licença, preciso fazer uma ligação. – eu disse secamente.
− Te espero em vinte minutos para o café da manhã, em seguida, iremos
trabalhar juntos.
Dizendo isso, fechou a porta e eu quis jogar o sapato no seu rastro. Não
podendo, apenas chutei a minha própria perna. Peguei o celular e liguei para
Ito.
− Desculpe, eu não pude te avisar antes, estou indo fazer uma viagem,
ficarei fora por sessenta dias.
− Está maluca?
− Sim… Digo, não… Farei essa viagem para realizar uma pesquisa de
campo.
− Charlote, temos um compromisso, não estamos brincando de

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namoradinhos de escola, está lembrada disso?


− Sim, sinto muito Ito. – dizendo isso, desliguei o celular sentindo mal-
estar. Jamais pensei que passaria por esse tipo de situação.
Vinte minutos depois, estava na mesa do café da manhã com meu algoz
tomando chá enquanto me olhava. Sentiu meu corpo se arrepiar e tentei
disfarçar as sensações. Sentei-me e me servi.
− Só comerá isso? - apontou para os dois biscoitos de água e sal que me
servi.
− Cada um sabe o quanto cabe em seu estômago. – respondi.
− Sempre foi mal-educada ou só está de mau humor? - disse com ironia,
mas no fundo senti que estava se ofendendo, e isso era tudo o que eu
desejava.
− Sabe, AT, eu não estou gostando nada desta situação… Tenho meus
problemas íntimos e particulares que só dizem respeito a mim… Tenho
minha vida que construí com meu próprio esforço, e uma profissão para
cuidar. O que pretende ao me coagir a fazer suas vontades?
− Estou contratando seus serviços.
Fiquei tão puta que me levantei no mesmo momento.
− E isso inclui cárcere privado? - respondi com um tom muito alto,
fazendo com que sua criada se retirasse espantada.
− Sente-se. – ele pediu calmamente, enquanto tocava em minha mão. Senti
a sua tão quente e acolhedora, que esqueci de que ele era meu adversário
naquele momento. Algo nele me acalmava, mesmo quando o motivo de meu
delírio e ira ele. Não sei onde estava com minha cabeça que acabei me
sentando, mais uma vez fiz suas vontades.
− Não se rebele contra si mesma e nem contra ninguém. Estou aqui para te

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ajudar, oferecer minha mão. Olhe para mim… – sua voz era macia e eu não
sabia mais o que fazer ou pensar. Ele tocou em meu queixo e mirou seus
olhos nos meus. Novamente aquele desejo intenso de chorar, como a
menininha que havia perdido o caminho de volta para sua casa. − Eu estou
aqui… Confie em mim… Apenas confie… Deixe eu te mostrar quem sou.
Não quero te enganar, nem te maltratar. Não quero que saia de perto de
mim…
Eu não entendia o motivo de me querer por perto. De desejar alguém sem
conhecer, mas algo naquelas palavras me tranquilizava mesmo sem ter
sentido algum. Algo nele era indescritivelmente diferente do que havia nas
outras pessoas.
− Eu só preciso entender o porquê está fazendo isso… Por favor, me deixe
entender. – então não consegui mais enlear o choro e este veio como uma
vazante para o rio.
− Porque… – o celular dele tocou bem no momento mais importante do
dia, e ele atendeu rapidamente.
Aproveitei para comer e sair dali com pressa, antes que ele voltasse ao seu
posto de comandante. Seus olhos não me olhavam, mas sua alma me sondava
mesmo quando ninguém percebia isso. Levantei da cadeira e segui
rapidamente para a porta da saída daquela casa que nem reparei na falta da
luz do sol.
Ao abrir a porta fui recebida por um jato de ar frio, caiu a temperatura e eu
nem me dei conta, respirei profundamente e com muita pressa, mas fui pega
por uma mão forte que me arrebatou novamente para dentro do casarão.
Apertou-me em seu peito e tocou forte em meu rosto, comprimiu-me com os
olhos faiscando de qualquer coisa que não era carinho.
− Onde pensa que vai?
Eu mal podia responder, pois seu corpo havia me prensado na porta. Sua
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respiração era agora o ar que eu respirava. Eu vi de perto a cor dos olhos.


Senti o cheiro de homem, aquele que não sai da cabeça da gente o dia todo.
Vi brilharem os fios da barba, e os lábios se abrirem aos poucos num falso
sorriso que mesmo assim capturava a noção que eu tinha de ser gente.
Engasguei em minha própria saliva. Ao invés de responder, perdi o ar.
− Venha. – pegou-me pelo braço e me levou até seu carro.
− Onde pensa que irá me levar?
− Cale a boca! – disse num sonoro tom que me fez ficar quase surda.
Preferi não discutir. Ele ligou o som do carro e seguiu rumo ao centro da
cidade. Eu não via mais nada, apenas pontos de interrogação que povoavam
minha mente, um atrás do outro…
Ao parar o carro, sem me olhar, disse num tom brusco:
− Desça!
Eu obedeci, e fiquei me perguntando para onde deveria ir agora. Então
resolvi segui-lo. Ele entrou numa loja feminina, digamos, muito chique para
meu gosto.
− Gostaria de um casaco para a senhorita. – ele pediu para a atendente, que
sorriu sentindo-se contagiada pela arrogância e charme daquele dominador
ignorante.
Ela logo veio com quase uma dúzia de modelos nas mãos e um sorriso de
orelha a orelha no rosto, e ele apenas disse lá do canto onde estava:
− Escolha o que quiser. – mesmo sendo uma gentileza de sua parte
perceber que eu estava sentindo frio, e que nas peças reservadas para eu usar
durante a semana, não havia um casaco sequer, seu tom de voz me irritava.
Peguei um de cor mostarda com franjas nas laterais.
− Pegue outros. – disse ele me observando enquanto eu escolhia.

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− Mas eu…
− Não pedi para justificar, apenas escolha. – ele continuou grosseiro, e o
que era pior, na frente da vendedora, o que me fez corar e me sentir um lixo.
Então somente nesse momento, ele sorriu. Sentia prazer em me humilhar. Vi
o brilho em seus olhos e a sensação de que conseguiu atingir seu objetivo.
Assim que pagou, novamente me segurou pelo pulso.
− Vamos embora.
− Pode soltar meu braço, por favor? Está me constrangendo na frente das
pessoas.
− Solto quando quiser. – disse apenas, e somente me soltou quando entrei
no carro.
Entrei em silêncio, esperando que os dias passassem logo, e eu pudesse
enfim acabar com aquele pesadelo e retomar as rédeas de minha vida.
Chegamos ao Clube pouco depois. Entramos direto para as dependências
administrativas do local as quais ainda não conhecia. Fiquei em silêncio o
tempo todo, esperando não levar novas repreensões.
− Sente-se. – disse ele me apresentando uma mesa com um computador.
− O que quer que eu faça? - perguntei sem entender, e já me sentindo uma
idiota.
− Escreva como se sente. – pediu.
− O quê? - fiz-me de demente.
− Eu disse para você escrever as sensações de como está se sentindo.
− Para quê?
− Para saber como é se submeter a alguém, e depois comece a desenvolver
seu projeto para o público feminino, primeiramente.

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− Virou meu chefe agora?


− Não. Jamais seria seu chefe. Estou apenas te ajudando a entender este
universo.
Então me calei. Ele certamente me achava burra o suficiente, incapaz de
desenvolver qualquer coisa em minha profissão, sem antes passar pela pele
do meu objeto de pesquisa. Mas eu faria… Eu faria para mostrar a ele que
estava totalmente enganado em suas convicções.
Passei o dia envolvida com as pesquisas. Nem havia percebido a
quantidade de vezes que ele saía e entrava naquela sala. Quando chegou o
horário do almoço, ele se voltou para mim depois de horas.
− Vamos almoçar.
− Estou sem fome, é melhor que vá sozinho, eu posso pedir algo pelo
telefone.
− O que há com você? - sua pergunta parecia ter sido categórica.
− O que há com você? - respondi com a mesma pergunta.
− Ainda não entendeu quem é que manda aqui?
− Vamos deixar bem claro uma coisa, eu não sou submissa e nem sua
empregada. Não sou sua filha ou sua irmã. Eu não sou exatamente nada que
você compreende como sua.
− Você não é minha mesmo, porque se fosse, saberia como se portar.
Agora vamos.
Eu mal tive tempo de argumentar, ele já se encaminhou para o carro e
abriu a porta para eu entrar.
− Fecha o vidro. – pediu. Eu sabia que era por causa do frio, e por eu ter
espirrado pelo menos duas vezes na sala do trabalho. Eu mesma já nem me
lembrava disso, ele sim.

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Chegamos ao restaurante e eu fiquei sem saber como sentiria vontade de


comer, se na verdade o que queria era voltar para aquele escritório e terminar
o que tinha de fazer, e o quanto antes me libertar daquela situação.
− Quero apenas uma salada de rúcula com salmão. – eu disse para o
garçom.
Ele pegou o cardápio e ficou olhando por alguns segundos para fazer seu
pedido.
− Traga um talharim ao sugo para dois.
− Eu não quero massa! – disse indignada.
− Você não tem que querer. Olha seu estado, quase resfriada e comeu feito
um passarinho no café da manhã. Eu sei o que é melhor para você.
− Você sabe? Como pode saber? Mal nos conhecemos!
− Isso não lhe interessa. – ele encerrou a conversa pedindo ao garçom para
se apressar.
Fiquei pasma, a cada minuto me surpreendia mais. Ele não poderia ser pior
do que isso. Não, não possível.
− Qual a próxima ordem sua e subordinação de minha parte? - eu quis ser
irônica, mas isso não foi uma boa ideia.
− Posso ser bem pior, basta desejar.
− Eu desejo que… – ele me interrompeu.
− Você deseja ficar de boca fechada até comer tudo. Assunto encerrado. –
disse ele, olhando o cardápio para pedir uma bebida. Tratava-me como se eu
fosse uma criança. Não estava acostumada com isso. Parecia que aquilo tudo
era um plano para me fazer ficar dependente dele.
A tarde passou e eu a passei, sozinha.

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Após terminar o que tinha de fazer, levantei-me e fui explorar o Clube. Eu


sabia que também era um ótimo momento para fugir e nunca mais voltar ali.
Poderia mudar de endereço do escritório, e se fosse preciso, da casa também,
ele jamais me encontraria. Mas algo maior me dizia para ficar, e com isso a
briga interior passava a ser maior dentro de mim.
Perambulei por ali, meio sem saber aonde ia, pois muitos dos lugares do
ambiente, eu tinha visto antes. Notei uma porta fechada, e os sussurros de lá
paralisaram minhas pernas. Fiquei muda quando ouvi a voz de meu algoz.
− Não se mexa… – ele dizia para alguém.
Com receio, dei alguns passos até a porta e coloquei meu rosto rente a esta,
para ouvir melhor. Escutei um gemido. Abaixei-me até a altura da fechadura
e quase perdi o ar. Ele estava em uma sessão. Sei que isso não era certo de
minha parte, mas minha curiosidade me tomou de assalto. Eu só sairia dali
depois de ver o que tinha de ver.
AT estava vestido de preto, deveria ter trocado a roupa para a sessão. Vi
quando passou o cinto ao redor do pescoço da menina, que não era a
Antonele, e o afivelou para baixo, forçando-a a ficar quase sufocada. Ele se
abaixou e passou a beijar seu ombro e colo dos seios, o que me deu certo
comichão. Quando menos se espera, AT corre um flogger pelo corpo dela,
chegando até sua vagina. Arregalei os olhos. Espremendo o acessório,
esfregando-o. As pernas dela estavam amarradas com o intuito de ficarem
abertas. As batidas eram rápidas, mas não tão leves. Não sei por qual motivo,
mas passei a contar os estalos, o que me causou excitação. A submissa se
contorcia, não sabia se era de dor ou desejo.
− Você gosta, eu sei… – disse ele.
Ao ouvi-la gozar, eu tive a certeza de que estava gostando do que sentia.
− Obrigada Senhor, por me permitir gozar. – ela agradeceu.
Ele a desamarrou e a levou para uma espécie de maca próxima à janela.
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Deitou-a e a vendou. Ele se apossou de um álcool escrito na embalagem,


Isopropil, e com uma toalha pequena, o esparramou sobre o corpo da menina.
Pegou um bastão em chamas e o deslizava sobre a pele dela, salpicando o
fogo com sal. Com a mão livre, ele apagava com uma toalha molhada
algumas pequenas labaredas. Perto de AT também tinha um extintor.
Depois, o dominador pegou um bastão aceso e batido contra a pele do
bottom, como se estivesse tocando uma bateria, o fez com força suficiente
para apagar o bordão, mas tomou tento, certamente para que o impacto não
causasse alguma bola de fogo.
Em seguida, um padrão é desenhado com um bastão apagado embebido em
fluído, deixando um rastro de álcool na pele. Outra haste acesa foi utilizada
apara acender o desenho. Como sempre a mão livre seguiu o rastro da chama,
assegurando que esta fora apagada.
Fiquei estupefata com a imagem a minha frente. Assim que acabou, ele
mesmo a retirou da maca e observou seu corpo todo, examinando se havia
algum tipo de queimadura. Quando se assegurou de que sua peça estava em
perfeito estado, ele a beijou como se fossem namorados.
Saí praticamente correndo, sem olhar para trás. Não queria ser pega numa
situação constrangedora. Quinze minutos depois, ele entrou na sala e minha
respiração ainda estava ofegante.
− Algum problema? – quis saber percebendo minha cara de espanto.
− Não, obviamente. Está tudo certo comigo.
− Que bom. Vamos embora. – disse ao me levar para fora do Clube,
segurando em meu pulso. Ele tinha essa mania de me levar desse modo para
onde quisesse, sem se importar se me incomodava. Para dizer a verdade, eu já
estava me acostumando.
Ao chegarmos a sua casa estranha, fui direto para as escadas na tentativa
de me enfiar dentro do quarto e sair de lá só amanhã pela manhã. Ele foi atrás
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de mim, e novamente segurou em meu braço. Então já estava sendo demais.


− Como ousa a fazer isso a todo o momento e quando deseja?
− Você não tem permissão para ir para seu quarto agora.
− Oiii? – eu mal pude acreditar no que estava ouvindo.
− Exatamente isso que ouviu. Não suba para seu quarto.
− E o que acha que vou ficar fazendo aqui?
− Vai lavar a louça e o banheiro social.
− O quê?
− Você ouviu bem… Precisa ser grata por se hospedar em minha casa.
− Mas… – ele me interrompeu.
− Já!
Meus olhos se encheram de lágrimas. Eu não estava entendendo o motivo.
Sentia-me humilhada, massacrada ou qualquer outra coisa que definisse o que
se passava dentro de mim. Mas eu não fraquejaria. Meu lema sempre fora
enfrentar os desafios. Eu sou forte, eu posso lavar a merda da louça e a
porcaria do banheiro.
Saí pisando firme com meu salto e virei meu pé, caindo no meio da sala.
Ele veio correndo ao meu encontro e se abaixou, passando a mão em meu
tornozelo.
− Machucou? Está tudo bem como você?
A expressão dele era de preocupação. Ficou olhando para meus olhos até
que eu o respondesse. A profundidade daquele olhar me calava, me afogava.
Eu já não sabia mais quem era.
− Sim…
Ele tirou os sapatos dos meus pés, cuidadosamente. Acariciou-me sem
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pressa. Por um momento pensei que aquele homem das cavernas havia
desaparecido da face da terra, mas assim que abri meus olhos, ouvi:
− Agora vá fazer o que mandei.
Eu o farei. Mas farei por orgulho, por desafio ou qualquer coisa que prove
que sou uma mulher forte. Muito mais forte do que ele pensa.
***
Confidências de AT…
O que eu sentia por aquela menina? – me perguntei ao vê-la de longe
cumprindo minha ordem. Quanto mais ela se mostrava difícil de ser domada,
mais eu desejava ver seus joelhos no chão, pronta para mim. Era difícil
adestrá-la. Um trabalho lento, mas que valeria a pena. Onça pintada, gata do
mato… Eu a dobraria, nem que fosse a última coisa que fizesse como
dominador.
No fundo eu sentia que Charlote estava se defendendo, e sua negação ao
que a obrigo é por simples questão de tempo. Quanto mais os minutos
passavam, mais eu a sentia minha… Como se a conhecesse há anos, e
soubesse exatamente o que fazer para adestrá-la.
Olhei seu traseiro arredondado, pernas bem torneadas, pele clara, que me
causava um frisson. Eu desejava aquela menina mais do que tudo neste
momento. Ela seria minha a qualquer custo. Não a tocarei como pretendo,
mas esperarei ansiosamente por cada pedaço de seu corpo.
***
Confidências de Charlote…
Quando terminei de fazer o solicitado. Joguei-me no sofá e fechei meus
olhos. Aproveitei sua ausência para me sentir em paz. Pensei em Ito e em
como ele estava se sentindo naquele momento, pois sei que não agi
corretamente, mas já era tarde demais para consertar, ainda mais nas
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circunstâncias em que me encontrava.


Senti um par de mãos deslizarem entre meus cabelos, o toque estava tão
bom, eu poderia até pedir para não parar, mas ao invés disso, inclinei meu
corpo para frente, livrando-me do que ele fazia.
− O que pretende? – perguntei, fingindo estar puta da vida.
− Senti-la.
− E me pediu para fazê-lo?
− Eu jamais pediria algo que desejasse.
Engoli em seco e pensei rapidamente em algo para mudar o rumo daquela
conversa.
− Vou subir. Preciso de um banho e, depois, cair na cama. A propósito, não
teria uma cama de verdade para eu dormir, já que estou obrigada a
permanecer em sua casa?
− Por enquanto não está merecendo.
Preferi nem discutir. Seria bobagem. Eu jamais deveria ter assinado aquele
inferno de contrato.
Assim que virei minhas costas, ouvi sua voz:
− Às vinte horas te espero para o jantar. Sua roupa já está em cima do
tapete.
Amaldiçoei-o por pensamento. Até pude imaginar seu sorriso de
satisfação.
Às vinte horas estava na sala de jantar. AT ficou olhando para os meus pés,
que estavam descalços, e para o pijama que ele mesmo havia providenciado
para eu usar naquela noite. Confesso que não compraria essa peça, pois me
pareceu bem infantil para minha idade. Por um momento me senti em casa.
Estava cansada e com os pés cheios de calos. Permaneci imóvel como uma
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estátua, e fingi não me importar com seu olhar.


− Seu pé melhorou?
− Sim.
Ele arrastou a cadeira para eu me sentar, e assim jantamos em silêncio.
Estava sentindo sono, mas como ele não tirava os olhos de mim, preferi
forçar uma animosidade. Tudo poderia esperar deste sujeito.
Ao me levantar da cadeira, já procurando o rumo do tapete de dormir, a
voz dele me freou.
− Venha cá.
Dessa vez o sono se foi de vez. Virei-me sem pressa e mirei os olhos em
seu queixo, assim não me pareço mal-educada nem revelaria meu espanto.
− Mais perto. – ele voltou a pedir.
Meu desejo era perguntar o motivo, e com passos lentos, fui me
aproximando. Foi somente nesse momento que percebi a música no ar, justo
quando suas mãos tocaram minha cintura e eu senti o gesto com falta de ar.
Antes que eu dissesse mais alguma palavra, ele encostou seu corpo quente
e aceso junto ao meu, senti sua respiração em meu pescoço, o que me causou
sensações inesperadas. Passamos a dançar.
− Ah, eu não sou boa nisso… – eu disse para tentar me aliviar.
− Não precisa, eu a conduzo.
Fiquei tentando adivinhar a conotação da frase, sei que existiam coisas a
mais ali, além de me guiar numa simples dança.
As mãos dele passeavam em minhas costas num toque aconchegante e
protetor. Eu poderia fazer alguma objeção, mas minhas forças estavam
totalmente entregues naquele exato momento. Fechei os olhos e passe a ouvir
a canção.
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− Está gostando da música?


− Bem… Eu… Sim. É agradável.
− Sabe que é exatamente assim que deve ser em uma relação de dominação
e submissão? O dono conduz a menina em todos os seus passos.
− Humm… – eu não sabia o que dizer. Qualquer coisa que dissesse iria me
parecer uma idiota.
Senti sua mão agora acariciando meus cabelos e, num supetão, me trouxe
com mais força para perto de seu corpo, como se quisesse me colocar lá
dentro. Novamente uma catarse.
Ele tocou meu queixo com cuidado e me forçou a olhar em seus olhos.
− Eu a quero, menina… Quero cuidá-la, protegê-la, não permitir que nada
mais lhe faça mal.
Fiquei parada olhando para os olhos dele que brilhavam.
Naquele instante tive a sensação de que esperei ouvir aquilo a vida toda,
mesmo sem ter a noção dessa espera. Ele passou o dedo em meus lábios e
mexeu em meus cabelos, olhando para o contorno do meu rosto, depois
novamente parou em meus olhos.
− Eu… Sou noiva… – disse tremendo o lábio.
− Isso não é um pedido de casamento… É mais que isso. É um pedido de
sua alma, seu corpo, para mim… Só para mim…
A catarse aumentava com a aproximação dele em meu espaço, em minha
intimidade intrínseca. Jamais ouvira antes aquelas palavras, mas ao mesmo
tempo, elas não me eram estranhas, e eu não sabia dizer o motivo. Não senti
medo, senti saudades sem conseguir explicar a razão.
Tentei fugir, ele me apertou contra seu peito. Tentei respirar, mas meu
mundo estava abafado, tomado, aceso, ardendo…

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− Eu não sei por que está fazendo isso comigo… – as sensações ilógicas
me confundiam, ao mesmo tempo em que eu desejava correr, não queria sair
daqueles braços.
− Fique em silêncio. – disse ele tocando em meus lábios com o polegar. –
Tão linda e delicada… Tão doce… Por que ser tão rebelde?
Sua boca comprimiu a minha, levando minha resistência. Suas mãos
desciam e subiam pelas minhas costas, roçavam em meus cabelos com gana,
senti que ele desejava puxá-los, mas não o fez. Pensei que rasgaria minhas
roupas e me tomaria ali mesmo no tapete da sala, mas não ousou. Que
homem é esse?
− Vamos dormir. – disse ele seguindo na frente, me deixando parada no
mesmo lugar, com os lábios ainda entreabertos, esperando por mais. Apagou
as luzes da sala e subiu as escadas sem olhar para trás.

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Capítulo 3
Confidências de AT…
Eu não consigo reconhecer de onde vem a atração tão arrebatadora que
sinto por esta mulher. Tudo se torna intenso e ínfimo quando me aproximo
dela, sentindo um cheiro familiar que me deixa completamente louco e cego,
a ponto de desejar romper suas muralhas, antes mesmo de roubá-la de si
mesma.
Os movimentos delicados dela entram em meu corpo num instante em que
me esforço cada vez mais para me lembrar de onde a conheço… A cautela se
esvai, temo por meus instintos… Não sei de seus limites, e mesmo assim,
meu desejo de superá-los é bem maior que a mim mesmo.
Deito na cama tentando adivinhar o modo como ela está posicionada neste
momento no tapete do seu quarto, onde eu desejaria passar a noite a
observando. Monto um cenário mental de seu corpo ajoelhado perante a mim,
querendo apenas servir aos meus insanos desejos.
Imagino seus joelhos avermelhando-se com a pressão e peso do seu corpo,
e a expressão de cansaço em seu rosto, mas permanecia na mesma posição
até o comando de minha voz para se levantar… Neste momento eu teria
certeza de que estava entregue somente a mim, apesar de seus limites, seria
minha… Como algo perene que faz parte de tudo que me traduz.
Rolei na cama feito um lobo em plena madrugada. Podia ouvir meus
próprios uivos de ansiedade e loucura por uma menina que acabara de surgir
em minha vida, mudando tudo de lugar. Fechei os olhos e tentei me
concentrar no que deveria fazer no dia seguinte, um compromisso com minha
honra dominante de permanecer intacto no meu posto junto às minhas
submissas, que já fazem parte do meu dia, ao mesmo tempo em que se
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tornaram quase invisíveis perto de Charlote.


Ouvi um barulho estranho, levantei-me mais que depressa e corri ao
encontro dela. Abri a porta com cuidado, e lá estava seu corpo sentado com a
cabeça entre as pernas, chorando. À sua frente, no chão, os cacos de uma taça
de vinho. Sua fragilidade perante o seu gesto bruto revelava uma menina
carente e perdida, alguém que precisava naquele momento, apenas de uma
mão para conduzi-la e um corpo para aquecê-la.
Aproximei-me rapidamente e toquei em seus cabelos claros que faziam
meus dedos se perderem entre os fios e o desejo de possui-la. Puxei-a em
apenas um gesto, e a trouxe para meu colo, onde ela se aninhou como um
passarinho que fora derrubado do ninho. Tão pequena e tão doce… Tão
minha… Ah, menina… Eu jamais a abandonarei.
Seu rosto miúdo deitou-se em meu peito e o choro cessou quando beijei
sua testa e a fiz olhar em meus olhos. Ninei-a como se fosse uma pequena
criança, e coloquei meu queixo sobre sua cabeça, caminhando rumo ao meu
quarto, onde a protegerei dos males noturno, e de qualquer infortuno que
queira roubá-la de mim.
Fechei a porta por detrás de meu corpo teso e ansioso, louco por ela…
Como pode fazer isso comigo? Com qual permissão teve o despautério de me
envolver de forma quase anônima, sem sequer eu ouvi-la dizer – A ti
pertenço, Dono de mim?!
Quase adormecida, ela ainda olha para mim, eu enxugo sua lágrima
derradeira que rolava pela face luminosa. Aproximei meu rosto do dela, e a
beijei docemente. Senti meu membro rígido rasgando meu pijama, faria
qualquer coisa para amarrá-la na cama e vê-la adormecer assim, no cansaço e
perturbação eminente, totalmente vulnerável.
Nunca fui bom cantor, mas senti que poderia arriscar qualquer tom para
cantar alguma música naquele instante, e assim fazê-la dormir. Então ousei, e

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a vi fechar seus olhos quando minha voz chegou até seu acalento e a
adormeceu… Lindamente, como se fosse minha desde o dia em que nasceu.
Agora poderia dormir sossegado. Ela estava ali, ao meu alcance, junto de
mim.
O dia chegou e meu celular logo tocou me lembrando de que precisaria ir a
capital vizinha buscar alguns acessórios importados para o Clube, pois
haviam chegado minhas encomendas. Poderiam ser enviados pela
transportadora, mas eu fazia questão de ir pessoalmente experimentar cada
objeto em uma de minhas escravas. O teste é algo que faz parte de meu ritual
no momento de comprar qualquer acessório que esteja relacionado às sessões
sadomasoquistas, tanto para a minha vida pessoal, quanto para meu
estabelecimento. A qualidade sempre fora a alma do negócio. Aproveitaria
para comprar alguns móveis para a reforma surpresa que faria a ela, o projeto
de Charlote veio a calhar num momento em que minha inspiração estava a
toda a prova, queria revolucionar o que já estava muito bom. Sou exigente,
gosto sempre de alcançar o meu melhor.
Não saberia como fazer para mantê-la comportada em minha casa até meu
retorno. Certamente poderia dar na louca de fugir… E se o fizesse, eu a
acharia onde quer que esteja. Meu sentimento de posse já abrigava aquele
corpo e alma.
Chegamos em silêncio no escritório, apesar de ter me concentrado no que
deveria fazer naquele dia, minuto ou outro insisti em olhá-la de resvalo para
avaliar seu comportamento e sensações depois da noite anterior. Ainda não
falamos sobre o ocorrido. Ela me parecia alheia a qualquer situação que
pudesse acontecer naquele momento. Isso não era bom sinal. Eu não estava
conseguindo captar suas emoções.
Meu voo sairia às 16 horas, e eu já me encontrava ansioso. Precisava
deixá-la tranquila até o momento de partir, mas não haveria muito tempo até
lá, então o que fosse para ser dito, aquele era o momento.
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Ao entrarmos na sala, ela se sentou e nada ainda havia dito. Eu virei sua
cadeira para mirá-la de frente. Os nossos olhos estavam dando choque ao
olharmos um para o outro. A energia era intensa. Eu podia sentir até o calor
que vinha do seu corpo.
− Sobre o que aconteceu ontem, iremos conversar assim que eu voltar de
viagem.
Ela então arregalou os olhos ao me ouvir pronunciar a palavra viagem. Sei
que queria perguntar algo, mas seu orgulho não deixava.
− Vou partir hoje no final da tarde, e só nos veremos daqui três dias. Acha
que pode permanecer comportada, indo e voltando da minha casa para o
trabalho e vice-versa?
− Eu não sei…
Ela quis certamente me desafiar.
− Saiba que nosso contrato está em vigência mesmo em minha ausência.
− Irei cumpri-lo.
Ela mudou de ideia ao se lembrar do que se dispôs.
− Posso confiar em você?
− Sim.
− Por que está monossilábica?
− Não há motivos para tagarelar.
− Sobre ontem à noite…
− Eu já esqueci… Assim como todas as coisas que me aconteceram antes
de eu conseguir me lembrar quais eram.
− Eu a pedi ontem, para mim. – eu disse logo de uma vez, na tentativa de
fazê-la se importar com o quanto isso significava.
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− E o que significa isso?


− Significa que a partir do momento em que for minha, eu a tomarei de si
mesma.
Senti que ela gelou por dentro, pois seus lábios se empalideceram.
− Eu não sou submissa.
− Se, não fosse, eu não estaria aqui diante de você. É uma submissa
arredia, mas que se ajoelhará em pouco tempo de adestramento. Você quer
apenas chamar a atenção do mundo. Quer alguém que se importe com sua
vida. E eu a enxerguei.
− Tenho muitos problemas, não serei boa o suficiente para você.
− Isso quem decide sou eu. E não quero que me trate mais como você. É
tão difícil me chamar de Senhor?
− Não é meu Dono.
− Eu jamais pedi a alguém para ser minha.
− O que faz então? Obriga-as a serem suas?
− Eu as conquisto. Mostro-as que me pertencem desde o dia em que pousei
os olhos sobre elas.
Toquei em suas mãos, estavam frias. Levei-a até meus lábios e mordisquei
seu dedo indicador.
− Terei que ir, preciso preparar minha viagem. Fique atenta ao celular. Não
o deixe tocar mais de duas vezes.
Ela apenas me olhou meio perdida, e saí, fechando a porta, seguindo meu
dia.
Sinto por essa menina algo entre obsessão e amor de vagabundo. Preciso
tê-la. Transpirá-la. Ela está em meus pulmões.

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***
Confidências de Charlote..
Passei o dia tentando adivinhar o que ele tinha feito a mim. Eu queria
resistir e não conseguia definir o motivo pelo qual estava me prendendo a ele
como se isso fosse realmente necessário. Tudo que saía dele invadia meu
âmago, eu não posso acreditar que estava apaixonada por um dominador. Não
posso admitir que sou realmente o que ele pensa que sou. No entanto, não
consigo questionar a hipótese, apenas sei sentir.
Estava incomodada com a minha relação com meu noivo. O que estava
acontecendo poderia ser perigoso a ponto de magoá-lo irremediavelmente.
Não quero ser considerada uma traidora, iludida por um sádico que tinha a
mania de dominar pessoas.
Fiquei olhando o celular por muitos minutos. Eu tomaria coragem e ligaria
logo para Ito, e o diria tudo que estava acontecendo… Mas… O que estava
acontecendo? Por enquanto não havia nada de tão errado, apesar que a todo o
momento eu me traía imaginando como seria se fosse possível.
Deixei o tempo passar um pouco mais. Precisaria ter certeza de que AT já
havia embarcado, e deste modo poderia sair um pouco do cárcere. Esperei
quarenta minutos a mais do horário que ele embarcaria, e novamente peguei
meu celular e disquei o número do telefone de meu noivo.
Assim que tocou, ele atendeu um pouco afoito. Fez uma porção de
perguntas, e resolvi marcar um encontro. No horário combinado, estava lá,
fui de táxi.
− Precisamos conversar. – eu disse logo que o vi.
− Pressinto o mesmo… Mas antes de tudo, me deve algumas
explicações… Onde esteve e por que está evitando atender minhas ligações?
− Não é bem o que você está imaginando, na verdade… Eu nem sei como

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explicar.
− Você tem outro?
Por um momento achei que iria responder, sim, tenho. Mas isso não era
verdadeiro. Eu não tinha ninguém, apesar de… bem, eu beijei AT, mas o que
isso significa? Eu estava encurralada.
− Não tenho ninguém, este não é motivo de… – pausei.
− Qual motivo?
− De encerrar nossa relação.
Ele pôs as duas mãos na cabeça e suspirou profundamente.
− Charlote, eu não acredito que depois de tudo que vivemos juntos, você
terá a coragem de fazer isso, sem nem um motivo aparente… Mas deve
existir alguma razão, eu sinto que sim… É melhor que seja sincera comigo,
eu sempre agi desta forma com você.
− Acredite, não existe um motivo selecionado. O problema sou eu, minha
insatisfação com o mundo… Eu não me encaixo em uma vida normal, com
pessoas normais… Eu nem sei ao certo quem sou. Não posso me casar, nem
com você, nem com qualquer outra pessoa antes de descobrir quem sou.
− Dizendo assim, me dá a sensação de que está falando de uma alienígena.
Pare com isso, Charlote, você colocou essas coisas em sua cabeça com
desculpa para se desagregar do mundo, e eu não vou deixar.
− Você não pode interferir em minhas escolhas… – senti que a qualquer
momento choraria, precisava ser forte.
− Posso e devo! – disse ele, segurando em minhas mãos.
− Não deve! Você não é meu Dono! – eu nem percebi quando proferi esta
palavra, Dono. Deveria estar afetada por coisas que AT tentava por em minha
cabeça. Somente agora percebi que estava submetida a uma dominação

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psicológica.
− Não existem essas denominações, Charlote. Eu sou apenas alguém que te
ama e quer estar ao seu lado…
− Mas eu não me adaptei… É difícil para mim, saber que existe uma vida
atrás do meu esquecimento, e nada consigo me lembrar. Não posso estar com
ninguém, esqueça nossos planos.
− Poderá buscar por um tratamento… Sei lá… Há de ter uma forma de
você se sentir melhor com isso.
− A solução é esta, eu não quero mais me casar. – olhei-o seriamente, até
que percebesse minha sincera vontade.
Então ele se levantou, e eu continuei o fitando. Tirei a aliança do meu dedo
e o entreguei. Ele a pegou e ficou com uma expressão confusa no olhar.
Finalmente se virou e saiu de dentro do restaurante.
Foi difícil optar por voltar para a casa de AT, eu poderia não ir, se
quisesse. Mas cumpriria a qualquer custo o nosso acordo. Quando cheguei,
logo fui abordada por seus seguranças que vieram me tirar satisfações.
− A senhorita sabe que não tem autorização para sair sem ser em nossa
companhia.
− Eu não tenho idade para ter babás.
− Estamos cumprindo ordens… É o nosso trabalho.
− E eu não tenho exatamente nada a ver com isso…
Entrei sem me importar com as bobagens que eles falaram. Mal coloquei
os pés dentro da casa, meu celular tocou, e então me lembrei de que AT me
pediu para atender no segundo toque. Eu não precisava obedecer, mas algo
dentro de mim dizia que sim, preferi não questionar e atendi.
− Boa menina… O que está fazendo?

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− Acabei de chegar. – nem pensei em mentir. Talvez não fosse uma boa
ideia dizer a verdade. Esperarei pelo resultado.
− Onde foi sem minha ordem? – eu podia sentir sua ira daqui.
− Fui terminar minha relação.
Houve um silêncio. Achei até mesmo que ele tinha desligado.
− Não me comunicou que o faria…
− Fiz o que achei que deveria. Fiz por mim, e por mais nada ou ninguém. –
entrei na defensiva.
− Com a intenção de me pertencer?
− Eu não disse isso…
− Depois conversaremos sobre sua saída sem minha permissão. Preste
muito atenção no que vou lhe dizer agora. Eu a espero amanhã no aeroporto
de onde estou. Sua passagem estará comprada, poderá pegá-la com minha
secretária.
− Qual sua intenção, Senhor? – eu disse Senhor numa expressão que soasse
quase um deboche.
− Caso não venha, eu pago a multa da quebra contratual, e você poderá
encerrar seu trabalho por aqui. – sua voz não soava brincadeira, e isso me
causou um frio no estômago. Pela primeira vez senti medo de sair daquela
casa. Minhas mãos ficaram gélidas, e tive medo de responder. Em meu
silêncio, ele desligou o telefone e meu coração disparou.
Andei de um lado para o outro no quarto. Nem me dei conta de que havia
entrado no aposento dele. Sentia-me descompassadamente louca. Fui até a
janela, mas nada me distraia. Ele não estava brincando… Eu poderia inventar
um monte de desculpas para mim mesma, e deixar aquela casa de vez. Eu
poderia ligar para meu ex e dizer a ele que fora um engano, trazendo-o de

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volta para me consolar num momento desses. Eu poderia… Ir ao encontro de


AT e dizer que estava lá, a sua inteira disposição. Enfim… Teria qualquer
uma das opções. Mas naquele momento eu não sabia sequer quem era.
Em meio aos meus pesadelos, deixei-me cair no tapete do quarto enquanto
me olhava no espelho e tentava alimentar um dos personagens dentro de
mim.
***
Confidências de AT…
Deitei-me na cama do hotel e passei a pensar nela. Sei que a perturbei com
minha proposta, e sei que ela virá. Algo me diz que sim, e que amanhã as
horas voarão quando minhas mãos pousarem sobre seu corpo que tanto
espero.
Ela virá… Ela sabe que é minha… Nem mesmo sei explicar de que modo,
mas algo diz que sim, e que seria perder muito tempo em não consolidar logo
esta relação.
Ouvi a porta do banheiro se abrir, e Antonele sair de lá vestida lindamente
numa pequena camisola preta com uma abertura na frente, revelando o púbis
depilado, que esperava por meus anseios. Ela trazia o chicote entre os dentes,
e as algemas abertas, seguradas por uma das mãos, na ponta dos dedos. Veio
rastejando os joelhos no chão até a cama. Olhou-me como uma cadelinha no
cio, desejosa da atenção de seu dono. Olhei-a, sabendo perfeitamente do
quanto ela era linda e quista por mim, mas naquela noite… Meus instintos
haviam se dissipado num vazio profundo e silencioso.
− Hoje não, cadelinha.
Ela fez um bico de descontentamento e voltou para o banheiro. Em sua
ausência, peguei o telefone e pedi à recepção que arrumasse um quarto para
que minha menina passasse a noite. Não a queria presente assistindo a minha
angustia.
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Após acomodar Antonele no quaro ao lado, meus pensamentos novamente


estavam em Charlote, senti o desejo de telefonar mais uma vez, ouvi-la,
massacrá-la… Desordenar seus pensamentos. Fazê-la perder o sono e dividir
comigo o que eu sentia. Mas preferi fazer tudo isso pessoalmente, precisava
testá-la.
***
Confidências de Charlote…
Amanheceu o dia, meu estômago revirava. Antes de sair, fui até a cozinha
e tomei dois copos de água. Depois disso corri até o banheiro e enfiei o dedo
na garganta. Vomitei como se quisesse tirar de dentro de mim, algo que me
sufocava. Ele estava me dominando sem que eu permitisse, e eu já sentia as
reações deste domínio em todo meu psíquico.
Sentei à mesa, e o que fiz foi somente olhar para sua cadeira vazia. Fiz que
tomaria um café, ou que cortaria um pedaço de bolo, mas desisti. Sim, eu
estava desistindo de tudo que conseguia fazer sozinha. Não iria. Não faria sua
vontade. Iria. Não descumpriria de nosso acordo profissional. Não iria, eu
tenho amor próprio. Então me lembrei de que dormi em sua cama, sentindo
seu cheiro no travesseiro, e acordei várias vezes durante a noite, acreditando
ter sentido seu toque em mim.
Ao chegar ao Clube, tentei passar pela secretária, indiferentemente, mas
uma voz me freou antes mesmo do próximo passo.
− AT pediu que lhe entregasse este envelope. Dentro dele estão todas as
orientações quanto a sua viagem.
Engoli em seco. Peguei o envelope sem dizer uma palavra e fui para a sala
que eu ocupava. Fechei bem a porta e fui verificar o que ele me deixou. Não
acreditei quando percebi que a passagem estava marcada para daqui quatro
horas. A decisão naquele momento partiria apenas de mim, e eu não sabia o
que fazer.
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Num ímpeto, peguei minha bolsa e saí correndo daquele lugar. Os


seguranças tentaram me impedir, mas minhas pernas eram mais ágeis. Eu
poderia desistir, AT me deu essa alternativa. Atravessei a rua com a
respiração ofegante, esta foi a única forma que encontrei de fugir de mim
mesma. Corri sem direção, iria para qualquer lugar onde eu pudesse me
esconder. Quando cansava, parava por alguns minutos, retirando o cabelo de
minha boca e voltava a correr.
Eu não conseguia ver mais nem uma pessoa a minha frente. As lágrimas
escorriam pelo meu rosto, e a dor de viver abatia-me a cada trocada de
pernas. A sensação que tinha era de que não conseguiria mais voltar para
mim mesma. Isso jamais aconteceria se eu cedesse às suas vontades.
Quando dei por mim, acenei para o primeiro táxi que passou e entrei. Não
pensei em mais nada. Estava totalmente tomada por um poder anônimo que
me devorava por dentro. Quando consegui cair na realidade, estava em frente
da casa de meu algoz. Entrei correndo procurando por um ninho macio e
acolhedor. Subi as escadas e fui para meu quarto, a mala estava feita em cima
do tapete. A empregada da casa bateu na porta antes de abrir.
− Está tudo pronto, senhora. Quando quiser, chamarei o motorista.
Não haverá mais o frio, quando ele me abraçar. A desproteção irá findar-
se, quando ele me puxar para perto de si. Sua boca vai falar palavras que
preciso ouvir. A cada dia, eu estarei sempre lá, estarei sempre… Sempre um
dia a mais…
Embarquei rumo ao inevitável. Tudo que eu sentia era algo intrínseco e
não estratégico. Fui tentando respirar compassadamente até o momento de
desembarcar.
Desci no aeroporto meio perdida de mim mesma, sem saber o que iria
acontecer daquele momento em diante. Não agia conscientemente, e sim, por
uma força maior que eu, que me levava para onde quisesse, sem que eu
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tivesse tempo de pensar.


Peguei o carrinho de bagagens e saí sem conhecer nada por ali. Avistei o
portão onde ele me instruiu que estaria a minha espera, e tremi o lábio. Ele
estava lá, parado me olhando. Contorci os membros do corpo e segui. Ao
chegar de frente a ele, parei. AT se aproximou e me tomou pela mão, em
seguida, me abraçou como se fizesse muitos anos que não nos víamos. Minha
resistência se quebrou, como a taça de vinho naquela noite, ao chão.
Ele tocou em meu queixo e me fez olhá-lo.
− A partir deste momento está sob minha responsabilidade e meus
cuidados. Ninguém poderá tocar num só pedaço de seu corpo. Ninguém
poderá lhe fazer algum mal. Eu a cuidarei e zelarei pelo seu bem-estar. Não
tenha medo… Você veio… Sabe por que veio, e o que deve fazer.
− Não sei… – disse sinceramente.
− Entrega-se a mim.
Algo me conduzia, impacientemente. Toquei em suas mãos e as trouxe de
encontro aos meus lábios e as beijei. Lágrimas saíam dos meus olhos, e eu
não pude detê-las. Fiquei assim por algum momento até senti-lo me pegando
pelo braço e me levando até o carro que nos esperava.
Sentamos no banco de trás, e assim que entramos, ele pediu ao motorista
que seguisse. Olhou-me com um ar de mistério, e eu tentei disfarçar minha
ansiedade, ajeitando-me no banco. Sua mão tocou a minha e me puxou num
solavanco para junto de si, o que me causou um desejo imenso de beijá-lo,
mas não revelaria.
− Precisamos acertar algumas coisas. – ele disse isso tirando de sua pasta,
umas três páginas de papéis digitados. Talvez fosse algo referente ao nosso
projeto, mas não achei adequado aquele momento, para tratar de assuntos que
me desliguei completamente para viver aquela loucura toda. – Leia. – ele me
passou os papéis. – Assine em cada item quando concordar, e escreva,
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concordo. Nos que não concordar, diga, não concordo, e assine também.
Então passei a sentir frio. Era um acordo de relacionamento, D⁄s. Para
muitos que não sabem, ali diz que muitos dos meus direitos serão repassados
a ele, assim como sua total responsabilidade por meus atos a partir daquele
momento. Logo abaixo estão algumas práticas sadomasoquistas, muitas delas
eu já havia pesquisado na internet. Certamente ele elencou somente as
práticas que lhe interessavam, e isso me causou certo alívio em saber que
muitas das que eu teria certa ojeriza não estavam ali, como qualquer coisa
relacionada a fezes ou as que necessitam de perfurações. Essas na verdade,
são meus limites.
Olhando mais abaixo, atentamente, antes de assinar qualquer coisa, vi
sobre irmãs de coleira e a possibilidade de estarmos juntas em sessão. Eu o
olhei e ele fez um gesto com a cabeça para que eu retomasse a leitura do
acordo. Sinceramente, eu não sabia o que dizer sobre este aspecto, haja vista
que não imagino como seria isso, e se por algum momento eu teria de ficar
com outra mulher para satisfazê-lo, o que também não tinha nenhuma opinião
a respeito. Mas dentro do meu coração, algo apertou sem causa, mas com
efeito explosivo.
Ele me passou a caneta, e como se estivesse sendo movida por um instinto,
passei a assinar as cláusulas. Quando chegou a que se referia a irmãs de
coleira, eu parei por um momento sem saber o que faria. Assinei e escrevi
entre parênteses, negociável. Ele me olhou um tanto confuso e eu correspondi
do mesmo modo, pois nem eu mesma sabia o porquê de ter escrito aquilo.
Eu o entreguei o acordo, e tinha certamente muitas dúvidas e perguntas,
mas todas estavam tão misturadas em minha cabeça, mal conseguiria me
expressar.
− Agora é o momento de dizer qualquer coisa que queira. – disse ele numa
voz pacífica.

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− Eu não sei o que pensar sobre irmãs de coleira.


Ele sorriu e tocou em minha mão.
− Elas já existem. Você tem apenas que aceitá-las ou não.
Engoli em seco e me lembrei claramente do sorriso de Antonele. E depois,
daquela outra menina que o sondei pela fechadura da porta no Clube. Eu não
sentia ciúmes naquele momento, mas algo me incomodava. Talvez mais tarde
eu conseguiria identificar.
− E meu trabalho? E minha casa?
− Poderá trabalhar, porém, quanto a sua casa, ela será onde eu desejar.
Aproximou-se de mim, e num sussurro pediu:
− Tire sua calcinha.
Fiquei sem jeito, não sabia como fazer aquilo com o motorista a minha
frente. Mas resolvi obedecer. A cortina de meu despudor havia sido aberta.
Eu me revelava completamente a quem apenas me disse que eu o pertencia, e
isso era algo completamente diferente de qualquer outro tipo de relação
existente.
− Levante seu vestido, senta-se desnuda sobre o couro do banco, e abra
levemente suas pernas.
Novamente fiz o que ele mandou e tentei olhá-lo, mas algo me dizia que eu
deveria me manter com os olhos voltados para baixo, e assim fiz.
− Toda vez que estiver de vestido diante de seu Dono, repita este mesmo
processo sem que eu precise pedir.
− Sim.
− Sim?
− Sim Senhor. – corei. Eu me curvei diante dele sem ao menos me abaixar.

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Ele pegou uma venda preta e colocou sobre meus olhos. Perdi-me no breu
de minhas próprias emoções. Senti seus dedos deslizarem sobre meus
ombros, em seguida, em minhas coxas que estavam à mostra. Ele percorreu
pela parte interna de minha perna. Por um momento achei que fosse tocar em
minha genitália, mas não o fez, apenas me deixou na expectativa, o que me
causou umidade entre as pernas.
Assim que o carro parou, ele me conduziu pela mão a fim de descermos.
Fui levada como uma criança que andava no escuro. Um pouco mais à frente,
paramos. Senti suas mãos potentes me puxando, em seguida seu corpo me
comprimiu contra a parede, o que me causou uma quentura no baixo ventre.
Sua mão subiu até meus lábios e me sufocou por alguns segundos.
− Fará apenas o que eu mandar…
Balancei a cabeça ainda com sua mão cobrindo fortemente a minha boca.
Senti um objeto frio percorrer meu colo, os beijos dele vinham atrás. Com
o ruído, identifiquei o que ele trazia em mãos e passava sobre minha pele, era
uma tesoura pequena que nesse momento cortava as alças do meu soutien.
Meus seios foram libertos e agora saltavam para fora em plena luz do dia,
sabe-se lá, onde. Meu corpo não suportava de excitação.
Adivinhando o que eu sentia, ele colocou a mão em meu sexo e passou a
me masturbar, ali, no ar livre. Eu tentava me esfregar em seu corpo, mas ele
se afastava.
Senti quando tirou algo do bolso e colocou em meu pescoço. Uma coleira
de couro. Então eu era dele, e isso significa que poderá fazer o que bem
quisesse em mim, pois nada mais existente em qualquer milésimo de minhas
células me pertencia.
− Eu quero que se solte e deixe vir o orgasmo… Bem gostoso…
− Mas… Aqui?

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− Onde eu quiser… E eu quero agora. Goze… – ele dizia em meu ouvido,


quando sua mão novamente me asfixiou, seus dedos trabalhavam em torno do
meu clitóris, macios, ligeiros… Então veio o calor e aceleração das batidas do
coração. Soltei um gemido alto e tenso. Em seguida vários outros sons
expressavam a delícia que sentia, molhando totalmente os dedos dele.
Ele me pegou por debaixo dos cabelos e praticamente me arrastou para
algum outro lugar. Ouvi vozes, mas ainda não identifiquei onde estava.
Escutei uma porta se abrir, em seguida, se fechar.
Retirou minha roupa com pressa, despindo-me completamente. Senti que
se distanciou, e isso me deixou nervosa. Eu apenas ouvia sua respiração e
podia sentir seus olhos sobre meu corpo.
− Fique quieta, não se mexa! – mandou. – Agora vire de lado. – mais uma
vez tive a sensação de que me vistoriava. – Vire de costas! – sua voz
expressava ansiedade.
Ainda estava com a venda nos olhos, meu corpo tremia, não sabia se estava
com medo ou excitação. Em seguida ele me vestiu com algo que apertava
acima de minha cintura, como a um espartilho, porém deixava meus seios à
mostra. Colocou-me uma espécie de colar de ferro, após tirar a coleira, e
prendeu ali uma guia, pois senti a corrente fria esbarrar em meu pescoço.
Fez-me ajoelhar, e disse:
− Ande de quatro como uma cadelinha. – ordenou.
Assim que fiz o que me pediu, sentindo-me quase ridícula, mas certa de
que ele estava apreciando, repentinamente ele introduz algo em meu ânus, e
apenas pude identificar uma calda peluda roçando em minhas pernas. Era
algo que imitava um rabo de animal.
− Pare! Deite o busto no chão e levante a bunda! – disse ele ainda com voz
ansiosa.

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Então senti seu membro rígido me penetrando deliciosamente. Ele abria


levemente minhas nádegas com intenção de me sentir melhor, e estocava
lentamente até me inundar de novo enquanto eu apertava algo que parecia a
ponta de um tapete. Penetrou-me por mais quinze minutos, sem gozar.
Retirou seu membro e novamente senti seus olhos me devorando em absoluto
silêncio.
Ele me amarrou em algum lugar, com as mãos para cima. Manteve minhas
pernas um pouco abertas, amarrando cada tornozelo a fim de que ficasse com
uma abertura entre uma coxa e outra. Colocou uma gag ball em mim boca, e
a princípio aquilo me causou certo enjoo. Tentei morder aquela bolinha
emborrachada para sentir a textura.
− Isso é para morder, mesmo. Você irá precisar. – disse ele, ainda mexendo
em meu corpo.
Fiquei um pouco assustada, totalmente impotente, movida por sentimentos
que não sabia explicar.
− Quero ouvi-la gritar. – disse ele, beijando em meu ombro.
Por que o terror é tão doce? Por que eu sentia coisas que não sabia
explicar? Por que desejava aquilo que ele iria fazer a mim, mesmo sem saber
o que era, e a única impressão que tinha, era de saber exatamente que iria
sentir dor, e mesmo assim, eu a desejava mais do que tudo naquele momento?
Ouvi o chicote estralar em minhas nádegas, em seguida, nas costas, pernas,
num ritmo frenético, enquanto eu babava naquela gag.
− Quero ouvi-la gritar! – disse ele, com uma voz descompassada.
Sentia o prazer da dor, como algo que completava minha alma. Ele poderia
me sangrar, se quisesse, eu poderia sucumbir, desmaiar, mas não sairia de lá,
enquanto não sentisse tudo que meu corpo desejava, e era tão somente
satisfazê-lo.

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Passei a gritar abafadamente enquanto ele parava em um momento ou


outro para esfregar o cabo do chicote em minha genitália, por frente e pelas
costas.
Parou. Tudo cessou. Só meu coração estava disparado.
Desamarrou-me e retirou minha venda dos olhos. Eu ainda não conseguia
encará-lo, e talvez nem devesse até ouvir sua ordem.
− Este é só o começo de nossa relação. – disse ele, beijando em meus
lábios, levando-me para o banheiro. Neste momento percebi que estávamos
em um motel.
Deu-me um banho, carinhosamente, lavando meus cabelos enquanto seus
lábios iam e vinham de minha boca. Como pode ser tão carinhoso e tão
indelicado ao mesmo tempo?
Levou-me para cama e colocou a mesinha portátil sobre meus joelhos,
dando-me de comer como se eu fosse uma criança. Assim que meu cabelo
caiu em meu rosto, ele o prendeu como se tivesse realmente o hábito de
cuidar de mulheres.
− Quero que descanse. Mais tarde virei buscá-la. Não tire a coleira do
pescoço.
Olhei para o espelho a minha frente e me deparei com uma argola linda de
ônix em meu pescoço, nela tinham suas inicias gravadas.
Assim que ele saiu, alguns flashes vinham a minha mente… Algo
relacionado a um Castelo, fogo, uma lança… Sangue. Um momento
nostálgico me cercou. São sempre as mesmas cenas que vejo em sonhos.
Senti um medo extasiante me invadir. Eu precisava fugir de tudo antes que
me perdesse para sempre. Não sabia como poderia estar ali, subjugada a
outrem, sem pensar nas consequências de me sentir só, quando a porta se
fechar toda vez que ele sair de perto de mim, e eu não saber mais o que fazer

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de minha vida. Ser submissa é perder um tanto de si para se agregar ao Dono,


sem ao menos saber se ele compreende seu estado subversivo.
Sentia-me pálida na ausência de AT, sem palavras para me expressar. É
como se uma dependência emocional me invadisse sorrateiramente, e levasse
minha alma. Não posso dizer que eu não sabia que seria assim, pois sinto
dentro de mim esse vazio desde antes de encontrá-lo, mas é como se neste
momento estivéssemos apenas nos reencontrando, e que falta ainda muito
dele dentro de mim… Uma saudade que não se acaba ou uma vontade que
não cessa de estar junto de seu peito, apenas ouvindo seu coração bater.
Encolhi-me em minha insignificância. Não poderia dizê-lo sobre esse
abatimento, como todo homem, poderia não me entender… Poderia me julgar
louca, mas é exatamente assim que já me julgo – dependente instantânea de
uma pessoa que acaba de entrar em minha vida.
Balbuciei algumas palavras e me encolhi abraçada a minhas pernas, num
estado quase fetal, precisando apenas de seu retorno para me sentir viva e
inteira novamente. Jamais direi a ele… Jamais… Era como se eu estivesse
descoberto quem sou, mas todos os meus segredos foram com ele… Eu
pertencia ao mundo agora, mas ao mundo dele…
Eu sei que estou solitária, mas não mais sozinha… Eu poderia telefonar, se
conseguisse… Poderia dizê-lo o quanto sinto sua falta, e sobre o terremoto
que pairou sobre meu mundo desde que ele me tocou.
O mundo passou a ser ínfimo. Eu não poderia mais voltar ao que me
consumiu como pessoa. As palavras seriam insuficientes para me definirem
numa estratégica sufocante. A imagem exuberante de AT fazia de mim quase
um subtítulo.
Corroem as imagens por dentro. Ele não está aqui fisicamente, mas ouço
seus pensamentos em torno de mim. Como isso é possível? Posso ouvi-lo
dizendo quem sou… De quem sou… E que devo me manter segura.

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Quando eu me entrego esqueço as marcas mascaradas do pudor. Só me


entrego se for por inteira, se for me estraçalhar completamente. Esfarelar em
seus braços, suas mãos. Não sei amar sem ser arranhada, sem sangrar.
Morrendo em sua boca; derramando; acendendo…
Que algo me proteja do fogo que me queima quando minhas pernas são
presas entre as dele, ensinando-me uma nova oração, a de não desejar vê-lo
sair de perto de mim… Fique… Até que me parta ao meio. Meu dono. Meu
refúgio conjugado em suas verdades, seu peito, sua pele, seus lábios tatuados
em meus poros que respiram, suspiram a sua ausência…

ACHERON - NACIONAIS - APOLLYMI


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Capítulo 4
Confidências de AT…
Ela deve estar olhando para o relógio neste momento. Angustia-se com
minha ausência… Eu posso senti-la. Posso vê-la se levantar da cama e ir até o
espelho. Quando penso em Charlote, penso em coisas desconectas. Sinto que
a conheço tão mais do que posso imaginar.
Pego o celular por duas ou três vezes na ânsia de ligar e saber como ela
está. Mas não o farei, ela precisa ter este momento só seu, para identificar-se
como minha. Os dedos me traem, chego a discar seu número, mas retomo a
minha posição… Não posso me apaixonar a ponto de me esquecer de quem
sou, e deixar que esta relação perca seu sentido inicial. Mas em tudo que
faço, ela segue em minha mente, em minhas mãos… O cheiro do pescoço,
dos cabelos… O toque leve e sereno. Meu desejo era deixar o mundo apenas
para cuidá-la… Meu passarinho. Espera-me.
Ao terminar a escolha dos acessórios, telefonei para o restaurante para
saber se estava tudo certo, e por sorte, estava sim. Acalmei Antonele, que se
entristeceu após saber a notícia de mais uma irmã de coleira, e que não
dormiria esta noite comigo. Imagino o quanto essas novidades são difíceis de
serem aceitas, pois as submissas acabam se apegando a minha imagem como
homem, querendo ou não, são pessoas propícias a ciúmes, mesmo tomando
todo o cuidado para não sê-lo. Mas o combinado sempre fora ter um canil.
Desde o princípio sabia que seria assim.
− Quer dizer, Dono, que terei de dividi-lo com mais uma menina?
− Como sempre soube que assim o fosse.
− Desculpe, Senhor, estávamos tão próximo, acabei… – seus olhos se
encheram de lágrimas.
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− Trabalhe isso em você, Antonele, não temos um relacionamento


baunilha. Jamais te esconderia a entrada de mais uma menina. Estou tentando
ser o mais honesto possível.
− Sim Senhor. Se, me dá licença, eu preciso arrumar os acessórios, passá-
los para o catálogo online.
− Isso não é tarefa sua… – percebi que ela queria se retirar para chorar.
− Preciso me ocupar, Sir, sei que não passaremos esta noite juntos
novamente.
Assenti, e ela se foi. Não havia como ferir sem sangrar, mesmo quando não
houvesse intenção.
Passei numa loja e comprei o vestido que achei que seria propício para
aquela noite. Azul turquesa ficaria lindo em sua pele branca. Gosto do decote
discreto e das fendas laterais.
Cheguei ao quarto do motel e a encontrei sentada na cama. Estava imóvel,
olhando para a parede. Olhou-me rapidamente, tentando desviar o olhar.
− Como deve cumprimentar seu Dono quando ele chegar?
Ela se levantou nua e linda, e se ajoelhou diante dos meus sapatos,
beijando-os, como se soubesse que era exatamente desta forma que deveria
proceder, o que me deixou contente.
− Onde aprendeu?
− Eu não sei, Senhor. Apenas segui minha intuição.
Fiquei curioso… Ela deveria ter pesquisado na internet ou conversado com
alguém no Clube. Mas depois descubro, agora teríamos coisas mais
importantes a fazer. Mas aquele olhar que ela tentava esconder, me
incomodava. Algo estava errado e eu precisava descobrir o que era.
− O que há com você?

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Ela tentou virar o rosto e eu a acompanhei com os olhos.


Mordeu o lábio, e segurou a lágrima.
− Estou com medo…
− Medo de quê? O que te assusta?
− O Senhor… O que estou sentindo…
− E o que está sentindo?
− Algo estranho me comendo por dentro… Não sei explicar… Eu não
sabia quem era antes de lhe encontrar… Agora sei menos ainda… Estou
sensível, abatida…
− Você está sentindo que não se pertence mais… Está se estranhando…
− Sim Senhor… É uma vontade de chorar sem dor como se algo existente
em mim tivesse me tocado, e tudo… Ficou descontrolado e diferente ao meu
redor. Estou com uma espécie de dor sem sofrimento, um despertar
emergente.
− Sentiu-se só?
Eu ia dizer que não, então me lembrei de como me senti, e um nó na
garganta sobreveio, por mais que eu tentasse piscar os olhos
compulsivamente, fazendo com os cílios impedissem as lágrimas, a voz
embargou.
− Sim. – foi um sim dito com rapidez e transtorno.
Ele tocou em meu rosto e me trouxe para seu colo.
− Não é preciso se sentir assim. Sei que as meninas acabam se apegando ao
Dono muito rapidamente. Fora nossa primeira sessão, o início de uma relação
que iremos desfrutar de sensações maravilhosas. Eu estou aqui… Não a
deixarei.

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− Sim Sir. Porém eu não sei se este é o motivo por eu estar assim. Eu me
sinto apenas vulnerável. Como eu disse, algo nunca tocado foi desnudo por
dentro. Sinto-me fragilizada e com medo.
− Medo de quê?
− Bem… De não conseguir dizer não para as coisas que discordo.
− Sei que seus problemas vão além do que está sentindo. A submissão
inicialmente pode trazer à tona coisas que tentou esconder de si mesma. Você
está se sentido exposta. Mas com o tempo irá crescer de forma gigantesca, e
não sentirá mais tal abatimento. Está assim por causa de sua entrega, que está
sendo maravilhosa… Eu juro que me surpreendeu.
Abaixei a cabeça e comecei a tentar me lembrar dos muitos aspectos que
haviam se apagado de minha mente, mas nada vinha a minha lembrança,
apenas a sensação de que o conhecia de algum lugar.
− Precisa dar um primeiro passo. É você quem deve tomar a decisão de sair
do sofrimento. Pode não ser a mudança que queria neste momento. Porém,
provavelmente, será a mudança que mais necessita. Comece com algo
simples, um passo de cada vez.
− Entendo… Mas não sei dizer bem o que sinto na verdade… E nem o que
devo fazer. Que mudança é essa que está falando?
− Dominar não é apenas disciplinar, sobretudo, orientar, zelar, cuidar…
Curar as feridas. Trazer as respostas. Mas é preciso vencer a si mesma para se
sentir feliz numa relação assim. Há papéis que vivemos na vida por anos
seguidos, que nos estacionam numa mesmice enfadonha produzindo até
alguma satisfação, é verdade, mas superficial, não duradoura.
− Sir, o meu grande problema sou eu mesma… Saiba… Eu não me adaptei
a ideia de estar só neste mundo, sem me lembrar de coisas que tenho certeza
de serem fundamentais em minha vida… Eu não consigo descobrir o que
sinto…
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− Quando a gente não sabe a resposta para alguma coisa na nossa vida, o
melhor a se fazer é parar e perguntar. Mas tem que aprender a perguntar com
a alma, com o coração, com a mente, com perseverança, com garra, com
raiva, com todas as suas forças! E persistir perguntando, mantendo sua
cabeça e coração abertos, porque a resposta virá. Na verdade, ela já está aí,
mas pode ser que você ainda não esteja pronta para percebê-la.
Nossos olhos se encontraram por um momento. Havia entre nós um vão de
algo forte e incomum. Estávamos prontos para viver o inevitável, mesmo sem
sabermos de onde vinha esse sentimento louco que tentávamos camuflar.
Nossas bocas se desejavam, eu a observei enquanto umedeceu suavemente o
lábio inferior, e meu corpo a desejou como jamais quis outra mulher. Linda
minha…
− Agradeço pelas palavras. Eu precisava ouvi-las.
Dizíamos coisas, e pensávamos em outras… Eu vi sua mão aflita descer
pelo seu colo, em seguida, esconder-se de meus olhos. Aflita, pequena…
Arisca ainda, como um bichinho perdido na selva de pedra. Ela precisava de
proteção para alcançar a liberdade de ser o que é, inteiramente para mim.
− Os conflitos podem produzir paciência. Depende de como encará-los.
Podemos e devemos aprender com eles, entender sua mensagem e evitá-los,
do que depender de nossas escolhas. A paciência produz a experiência. Ela
ajuda a observar e analisar, para aprendermos melhor.
Já estava sufocante só olhá-la… Eu a retirei de meu colo e a deixei parada
sob meus olhos, como um soldado à minha inteira disposição. Gosto de olhar
o corpo de minha menina, descobrir cada vereda para melhor cuidá-la.
Afastei suas pernas e olhei a virilha lisinha. A circunferência de seu umbigo
era uma linha tênue, quase tímida, que corria rapidamente para o interior.
Subi com os olhos até os mamilos, que se arrepiaram com meu olhar, um par
de botões recentemente nascidos, rosados, desejosos de saliência.

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− Vire-se! – pedi.
Ela se virou lentamente, eu captei seu movimento enquanto seu corpo
mostrava as costas de pele delicada e muito clara. Os cabelos caiam
naturalmente, fio a fio, sobre a clavícula. Olhei para as pontas claras que se
encostavam suavemente no quadril dela. As nádegas eram maviosas
compostas por dois montes alvos de formato quase infantis. Salivei…
Desejando marcá-las, comprimi-las… Mordê-las.
Entreguei a ela o vestido e pedi que o colocasse em minha frente. Estranhei
que não se envergonhou. Geralmente as mulheres possuem uma vaidade
secreta, e apreciam estar sozinhas nesse momento, e terem a liberdade de se
olharem no espelho. Mas comigo ela não agiu assim. Faço questão de
conhecer todo seu corpo, gestos e manias.
Ajudei-a com o zíper das costas, sentindo o cheiro da pele dela que entrava
pelas minhas narinas e percorria meu corpo num misto de tesão e gana.
− Gosto dos cabelos presos. – eu disse, e ela fez uma expressão no rosto,
como se tivesse se lembrado de algo, mas nada disse.
Delicadamente, foi até o espelho e prendeu os cabelos. Os dedos tocavam
os fios com a leveza de uma pluma enquanto levemente se abaixava para
reparar se estava tudo no lugar. Sua nuca era sexy. Queria dormir, mordendo-
a.
− Eu não coloquei a calcinha. – disse numa voz bem baixa.
− Comigo não usará, apenas se eu desejar.
− Posso saber para onde vamos. – finalmente ela parecia ser a Charlote de
antes, questionadora e insolente. Esta noite prometia.
− Não.
− Tudo bem. – ela disse numa cara de descontentamento com a minha
resposta, o que me ouriçou.
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− Não está se esquecendo de algo?


Ela olhou ao redor e avistou sua bolsa. Foi buscá-la.
− Eu não me referi a sua bolsa, e sim, a algo muito mais importante…
Aliás, comigo não precisará usar nada que eu não diga.
Como ela não iria mesmo se lembrar, fui até a coleira e a coloquei em seu
pescoço.
− Eu… – ela ia dizer algo e eu complementei.
− Sim, irá usar a coleira. Quero saber por que a retirou do pescoço? Eu não
havia dito que não era para ser retirada?
− Sim…
− Sim?
− Sim Senhor, porém, eu fui tomar banho…
− Tomasse banho com a coleira. Ninguém tira uma aliança para se banhar.
Ajustei a guia à coleira, o que a fez arregalar os olhos.
− Sairemos assim? – segurei na guia para sinalizá-la.
− Exatamente! Alguma objeção?
− Não Senhor.
− Ótimo.
Seguimos para o restaurante reservado. Durante o caminho, eu a tocava em
seu clitóris a fim de estimulá-la. Ela umedecia meus dedos, e eu beliscava seu
grão, causando nela, alguns suspiros e esfregões no encosto do banco do
carro.
− Não é para se mexer, cadela. Apenas sinta… – disse quando a percebi
ouriçada.

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O lugar era excepcionalmente propício para a ocasião. Percebi que ela


gostou do ambiente requintado à luz de velas. As pessoas nos olhavam pelo
modo que eu a conduzia pela guia de sua coleira, o que causou alguns
comentários discretos, num tom muito baixo. Eu sabia que a sociedade não
entendia, mas meu mundo não é baunilha, e para mim, é natural que todos
saibam que ela é minha. Minha posse.
− Gosta de velas?
− Sim… Fazem-me lembrar de algo que não sei bem o que é… Eu… Eu
perdi a memória. Quase não me lembro de nada do meu passado…
Então tínhamos alguns pontos em comum, mas não comentaria nada com
ela, afinal, essas intimidades pertencem apenas a mim, e já aprendi a lidar
com isso.
− O passado passou… Não há necessidade de ser lembrado… O agora é o
mais importante.
Caminhamos até a mesa reservada e puxei a cadeira para que se sentasse.
Os olhos claros se iluminavam com a luz das velas. Lindo momento.
O vinho nos foi servido, e degustamos olhando um nos olhos do outro.
− O que sente por mim, menina? – eu precisava ouvi-la.
− Não me sinto à vontade para dizer.
− Não quero que tenha esses medos ou inabilidades para falar sobre seus
sentimentos. Vamos lá, tente dizer…
− Eu senti muita raiva do Senhor, mas algo me tomou de assalto, como se
eu… Eu estivesse enfeitiçada.
Então ri. Não deveria, mas foi inevitável.
− Sabe… – toquei em suas mãos que estavam frias. – Ninguém vive a
paixão impunemente. Ela tem um preço… A intensidade deste sentimento é

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algo contagioso, e… Eu não vivo sem me contagiar com nada a minha volta.
Percebi que ela tomou mais do que o normal, do vinho, ao ouvir minhas
palavras.
− Isso quer dizer, que… – eu a interrompi novamente.
− Eu jamais quero dizer algo. Se, tiver algo a falar, eu falarei, sem que
precise me perguntar o que seja. Um dominador necessita expressar suas
emoções e dizê-las. Se ele é não for capaz, não conseguirá suportar o seu lado
emocional. Se ele não pode controlar seu temperamento, não terá o equilíbrio
e psicológico necessários para respeitar seus limites. Todos têm limites.
− Estou tentando me aproximar do… Senhor… – ela disse um tanto
inadequada.
− Aproxima-se com gestos… Jamais com perguntas.
Ela olhava para a localização da mesa, sem entender muito, pois estava
num ambiente fechado por uma porta. Só estávamos nós dois naquele espaço
reservado. Os demais clientes se encontravam no local de atendimento geral.
− Está com fome?
− Sim Senhor. – ela respondeu.
Olhei para o garçom e fiz um gesto positivo com a cabeça, e ele trouxe o
jantar que já havia encomendado, em uma mesinha com os demais pratos e
talheres. Em seguida, entrou os violinistas e três mucamas. A porta do
ambiente reservado se fechou novamente. O que causou surpresa a minha
menina.
Assim que os violinistas passaram a tocar a música, as mucamas se
aproximaram da mesa. Uma delas me chamou a atenção pelo modo como
abaixava a cabeça. Causou-me certa intriga a forma como andou
vagarosamente até mim, como se estivesse escondendo algo. Tentei desfocar,
pois meu alvo naquele momento é dar continuidade à iniciação de Charlote.
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− Levanta-se. – pedi. Charlote não entendeu, mas se levantou assim


mesmo.
Olhei para as mucamas e estalei os dedos. Uma delas trouxe o lençol e
estendeu a frente da menina para que os músicos não olhassem seu corpo
enquanto a criada intrigante a ajudou a retirar a roupa, colocando nela uma
peça de lingerie bordada à mão com pedras pretas, um colar de modelo
egípcio que cobria os seios, e hena para pintar a pele com alguns breves
arabescos.
Ajudaram a menina a se deitar sobre a mesa, tal como fora meu desejo.
Passaram a colocar as comidas sobre o corpo dela, arrumando-as em grupos
pequenos com alguma decoração feita por frutas e pequenos galhos de ervas,
o que resultou num colorido apetitoso.
Assim que terminaram, pedi que saíssem. Antes que a mucama misteriosa
se retirasse de vez da sala, entreguei-a um cartão de visita. Gostaria de
conversar com ela, saber o motivo pelo qual chamara tanto a minha atenção.
Senti que a conhecia de algum lugar, mas não conseguia me lembrar de onde.
Ela pegou o papel, assustada, e se retirou sem olhar para meu rosto, o que me
deixou ainda mais intrigado.
Voltei-me para Charlote. Estava deitada deliciosamente sobre a mesa do
jantar. Aproximei-me sem pressa, seus olhos estavam fixos nos meus. Passei
a senti-la com os lábios, desde o calcanhar, provando cada centímetro de seu
corpo, o que a fez suspirar sem timidez mesmo na frente dos músicos, que
embriagados pelas notas musicais, não nos percebiam na sala.
Lambi, mordisquei e provei a pele dela misturada ao sabor de cada
alimento. Hora ou outra colocava algum petisco em sua boca, o que a deixava
ansiosa, pois percebi que estava com fome, mas naquela noite eu a castigaria.
Após comer tudo que havia sobre ela, peguei uma das velas, e permiti que me
olhasse. Seus olhos estavam brilhando…

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− Então você gosta de velas?


Ela disse que sim, com a cabeça. A partir deste momento, passei a pingar a
cera em seu pescoço e colo dos seios, ventre, pernas e pés, o que a fazia
estremecer. Derramava sobre ela o vinho, e sorvia, esfregando os lábios na
pele avermelhada para aliviar o ardor. Novamente respinguei a cera durante
três ou quatro intervalos com a bebida.
Quando terminei, ela me olhou com os olhos lacrimejantes.
− Por misericórdia, Senhor, me possua… – disse com a voz embargada.
− Você já é minha há muito tempo… – algo passou rapidamente por minha
mente, mas não fui capaz de captar. Eram flashes de um tempo muito antigo,
mas sem nenhuma ligação com a realidade. Pensei que poderia ser o efeito do
vinho.
Peguei-a do jeito que estava, enrolei-a no lençol, e a levei nos braços,
passando pelas pessoas no saguão do restaurante, que nos olhavam ainda
mais chocadas que antes. Fomos até o carro que nos esperava e seguimos
para o hotel onde eu estava hospedado.
Subimos o elevador e fomos para o andar onde se encontrava meu quarto.
Antes de abrir a porta, Antonele surge em nossa frente, apenas nos olha e sai
apressada.
− Aonde vai? – pergunto sentindo-me indignado com sua petulância.
− Ao restaurante, Sir. Talvez ainda estejam servindo alguma coisa.
− Com a permissão de quem?
− Desculpe. Não queria interrompê-lo. – ela disse olhando para Charlote
que ainda estava enrolada no lençol.
− Já para seu quarto! Sabe muito bem que pode ter usado o telefone para
pedir o que quisesse, eles levariam até sua suíte.

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− Desculpa-me mais uma vez, Sir.


Então ela se virou e se fechou em seu quarto. Eu sei que estava querendo
chamar minha atenção, mas aquele não era o momento propício. Minhas
mãos já formigavam de desejo de tocar no corpo de Charlote e submetê-la.
Levei-a para o quarto. Fechei a porta. Olhei-a e fiquei admirando meu
passarinho. Num solavanco, puxei a parte de cima do lençol, rasgando-o. O
ruído da fazenda se esfarrapando me deixou ouriçado. Vi seus peitos se
salientarem. Belisquei-os, olhando a expressão no rosto. Apertei um pouco
mais e os levantei, Charlote gemeu. Puxei do mesmo jeito a parte da calcinha,
e as pedrinhas do bordado esparramaram-se pelo chão.
Apontei para os meus sapatos, ela se ajoelhou a minha frente, tirando-os.
Coloquei os pés ainda com meias sobre suas costas, e forcei. Apertei sua
cabeça contra o chão, ela arfou.
− Tire minhas meias! – ordenei.
Ela se ajoelhou pacientemente, e as tirou, uma a uma.
Peguei as meias e as emendei num nó. Amarrei-as, amordaçando sua boca,
o que a fez novamente gemer.
− Então me pediu para possuí-la… Não percebeu que já é minha?
Dei um tapa de resvalo em seu rosto. Puxei-a pelo pescoço e deslizei
sorrateiramente a mão até encontrar seu queixo, obriguei-a a me olhar. Os
olhos azuis faiscavam. Puxei seu cabelo para trás e mordi seu maxilar.
Quando voltei novamente para seu rosto, cuspi dentro de seus lábios
semiabertos. Ela engoliu como eu previa. Apertei seu pescoço, até suas
maçãs ficarem coradas. Levei-a arrastada pelas madeixas, para perto da
janela.
− Sabe o que gosto em você? Seu cheiro…
Cheirei com gosto o topo de sua cabeça, a nuca, o meio dos seios. Peguei
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uma das cordas e amarrei seus braços para trás enquanto mordia meu próprio
lábio, sentia gana dela. Com uma segunda corda, amarrei seu pescoço e
passei a ponta pelo suporte da cortina, o que a suspendeu um pouco,
obrigando-a a ficar na ponta dos pés para não se sufocar.
− Abra as pernas, cadela. – pedi sem paciência.
Peguei a palmatória e passei a bater em sua vulva, vinte batidas seguidas, e
um intervalo de chupadas em seu clitóris. Fiz quatro séries.
Desamarrei a corda do suporte da cortina, mas não a retirei do seu pescoço.
Puxei-a até o banheiro.
− A quem pertence?
− Ao Sir AT – respondeu com a voz presa por causa da mordaça na boca.
− Boa menina.
Peguei os prendedores que estavam em cima da pia, e coloquei um em
cada seio, o que a fez soltar um gemido de dor. Comprazendo-me de seu
sofrimento, apertei um pouco mais, e mordi levemente no o mamilo que ficou
saliente.
− Não queria que a fizesse se sentir minha… Pois é… É assim que eu
gosto que seja.
Enchi a banheira e esperei que alcançasse a borda. Puxei-a pela corda,
apertando seu pescoço, o que a fez tossir.
Tirei a corda do pescoço e amarrei seus braços para trás. Com outro fio,
amarrei seus pés, juntos, até alcançar os joelhos. Assim que a banheira
encheu, eu olhei para ela.
− Confia em mim?
Ela balançou a cabeça.
Então a empurrei de bruços na água. Contei até dez e a puxei pelos
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cabelos. Retirei minha roupa e me pus no meio de suas pernas, esfregando


meu pau já ereto entre suas coxas e clitóris. Ficou úmida instantaneamente.
Estoquei-a levemente. Estoquei com mais força e velocidade, sentindo suas
paredes internas, anéis e textura, latejarem.
− Me diga de quem é essa bucetinha?
− Do Senhor AT – respondeu com a voz sufocada.
Novamente a mergulhei na água, e ao contar até dez, puxei-a de novo pelos
cabelos e a comi deliciosamente enquanto ela arfava buscando por ar. Só
parei o processo quando a vi gozando lindamente para mim, entre tremores e
gemidos sufocados.
Tirei-a da banheira e coloquei-a para me chupar, de joelhos.
− Engula tudo, minha puta! – ordenei, enquanto sentia meu esperma
inundando-a goela abaixo.
Após o banho, levei-a para cama e fiz com que comesse algo antes de
dormir. Abracei-a forte junto ao meu peito, e ela adormeceu, neste momento
me senti parte dela. Eu não sou para ser entendido. Eu sou para ser vivido.
Não é fácil se apaixonar pelo que não se pode tocar. Sei que esse era o desejo
de minhas submissas. Porém, sempre que estava para acontecer, minha
autoproteção dos instintos conservadores de meu domínio, faziam com que
algum subterfúgio acontecesse a fim de me salvar de uma derradeira paixão
que pudesse por fim em minha relação. Não que fosse proibido um
dominador se apaixonar. Eu pensava que não sabia lidar com tais
sentimentos. Tinha a sensação de que, se cedesse, seria possuído, como as
possuo, e isso eu não aceitaria sequer em pensamento. Mas de repente, algo
novo bate a minha porta, e me revela que estar num estado febril é algo tão
natural quanto à luz do dia. Estou a ponto de retratar como é sonhar acordado
quando a toco e a sinto como minha. Talvez ela nem saiba o quanto me faz
bem. Mas foi com ela que aprendi que poderia sentir esse sentimento lindo e

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transformá-lo no melhor combustível possível. Então me acalmei… Eu a vivo


dentro de mim numa mistura de loucura e lucidez, tempestade e calmaria… É
assim que acabei me apaixonando, num acidente de percurso, algo inédito,
que não foi planejado. Eu a olhei e a quis, como se soubesse o que
encontraria nela, desde o primeiro momento.
Não a queria magoada nunca. Iria ensiná-la a se valorizar, a crescer sua
autoestima, ao invés de adoecer dia após dia por conta da dependência
emocional. Não a quero doente por mim, desejo que se sinta plena, segura,
confiante e realizada. Ela precisa ser sua melhor versão como mulher,
primeiramente para si própria, pois merece muito. Não abrirei exceção quanto
a isso. Se, estivesse bem consigo mesma, estará bem comigo. Sua entrega
será absoluta, não há por que meu ego disputar com seu bem-estar. Isso é
loucura. Não devo me sentir inseguro quando olhar para minha posse e vê-la
se amando e feliz. Estará satisfeita por estar ao meu lado. Esse é meu desejo
para Charlote.
Ao amanhecer, fiz questão de agradá-la, trazendo o café da manhã na
cama. Acordei-a colocando a flor em contato com seu rosto e nariz, o que a
fez espirrar, e eu rir.
Fiquei olhando-a tomar seu café, silenciosamente. Estava linda. Senti
orgulho de saber que era minha. Assim que terminou, olhei para seu corpo,
desejava-a… Mas evitaria qualquer contato físico agora, queria muito mais…
Desejava subjugá-la.
Peguei os prendedores, coloquei um em cada mamilo, e outro nos grandes
lábios.
− Vista-se! – ordenei, e ela atendeu prontamente. – Quero que vá até à
banca de revista da esquina, exatamente assim, com os prendedores nos
locais onde os coloquei, e me traga um jornal.
Ela fez que sim com a cabeça, e notei seu semblante, estava aparentemente

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incomodada com os prendedores, o que me causou certo frisson.


***
Confidências de Charlote…
Caminhei com aqueles troços apertando minha carne, sentia ardência, mas
me sentia feliz sabendo que estava realizando os desejos dele, que talvez
pudessem ser estranhos para a maioria das pessoas, mas era isso o que o
satisfazia, e por isso, deveria satisfazer a mim também.
Assim que peguei o jornal, meu celular tocou.
− Eu quero que se masturbe para mim, Charlote. – sua voz exalava
excitação.
− Mas… Sir, eu estou no meio da rua… – quis convencê-lo de que aquele
não era o local apropriado.
− Não me interessa! Se vire! Quero minha cadela gozando agora.
Ainda com o celular na orelha, eu olhei para frente e vi um supermercado.
Mais do que correndo, atravessei a rua.
− Está aí, menina? Quero que goze… Toque nessa bucetinha linda…
Quero foto.
− Estou indo para o banheiro do supermercado, Sir. – disse eu, um tanto
quanto excitada, já com a calcinha molhada.
− Boa menina… Eu espero na linha…
Entrei num box, sentei-me sobre o assento do sanitário, tirei a calcinha e
comecei a fazer movimentos circulares com o dedo em torno do meu clitóris,
enquanto gemia baixinho para ele, no celular.
− O que está sentindo, menina?
− Muito desejo, Sir…

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− Coloque dois dedos dentro da buceta, e com a outra mão, toque no


grelinho… Segure o celular com o ombro. Coloque um dos dedos na boca,
quero que sinta seu gosto…
Fiz o que ele pedia enquanto o ouvia falar sobre obscenidades e seu desejo
louco de arrancar sangue de minha pele. Gozei deliciosamente para meu
dono, do jeito que ele queria. Era eu e meu corpo naquele momento,
realizadores de suas vontades. Todas… Faria qualquer coisa que me pedisse.
Estava disposta a quebrar meus limites.
− Antes de vir, traga-me pimentas vermelhas, aquelas grandes.
− Sim Senhor.
***
Confidências de AT…
Ela chegou olhando-me desconfiada, com certa carência. Joguei-a na cama,
e trouxe-a pelas pernas, deslizando seu corpo sobre o lençol. Abri suas coxas,
segurando-a pelos tornozelos, os mamilos dos seios já estavam enrijecidos.
Mordisquei-os. Virei-a de quatro, e coloquei um plug em sua bunda. Bati
algumas vezes nas nádegas, cada vez mais forte, até ver o desenho de minha
mão tatuada em sua pele.
Tínhamos apenas três horas. Não haveria tempo de fazer com ela tudo o
que queria. Iriamos ficar somente nas preliminares até chegar em nossa
cidade. Quando chegássemos lá, eu teria uma surpresa para ela.
Tirei o plug e coloquei o que pedi para que comprasse especialmente para
ela, as pimentas vermelhas. Cortei um pequeno talo da ponta de cada uma das
duas e as introduzi em Charlote. A princípio, somente esquentou, mas quando
passou a arder, comecei a penetrar paralelamente em sua bucetinha, com
gosto, retirava o pau e o batia em seu rosto, fazendo-a engoli-lo até à
garganta. Quando arfava completamente sem ar, eu voltava a penetrá-la, o
que a fez gostar do que estava acontecendo. Em poucos minutos, ela gozou.
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Para mim não havia momento ou local apropriado para submeter minhas
slaves. Desci do táxi com cada uma algemada de um lado de meus pulsos.
Andavam orgulhosas ao meu lado. Isso me agradava. Soltei-as para fazermos
o check in no balcão da companhia aérea do aeroporto. Olhos curiosos
sentiam-se intrigados com nossa presença, a maioria, de mulheres.
Ao chegarmos a minha casa, coloquei antes uma venda em seus olhos. A
minha masmorra estaria pronta, e esse foi o motivo de tirá-la dali por alguns
dias. Queria surpreendê-la.
Antonele estava conosco, senti que se encontrava um pouco estranha por
causa da atenção direcionada a Charlote. Ela precisava se acostumar àquela
realidade.
Ao entrarmos na masmorra forrada de preto do teto ao piso, com todos os
brinquedos e mobiliários presentes, sentime excitado prontamente. Minha
intenção era continuar a sessão com Charlote, mas a presença de Antonele me
inspirou delírios como algo que comia minhas células e me fazia ansiar como
um lobo quase no momento de arrebatar sua presa. Era muito mais forte que
eu.
Olhei para elas, então sabiam o que eu desejava…

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Capítulo 5
Confidências de AT…
− As duas sem roupas. Agora! – ele pediu, e me senti um pouco
intimidada. Nunca havia estado com Antonele intimamente, confesso que não
sei se gostei da ideia.
Ela foi a primeira a se despir, em seguida se ajoelhou, sentada sobre as
pernas, com as mãos pousadas em cima das coxas, e a cabeça baixa. Fiz o
mesmo, e fiquei esperando as ordens, torcendo para que não fosse nada
sinistro.
Aqui estou, nua diante dele. Minhas mãos apertadas firmemente atrás das
minhas costas, e meus olhos voltados para o chão, onde são treinados para
estarem. Estou tremendo um pouco, mas não tenho certeza se é a pela
ansiedade ou a frieza do ar.
As cordas lentamente amarradas ao meu redor são reconfortantes,
catárticas, e minha mente se rende a ele completamente, nem era preciso me
tocar… Saber que ele existe já me coloca aos seus pés. À medida que os nós
me apertavam, minha respiração mudava, e ele reconhece a habilidade com
que silenciosamente trabalha as cordas pelo meu corpo todo, me deixando
ainda mais segura. Minha necessidade torna-se quase um frenesi… Mas não
reagi, resisti às amaras que ele tece ao redor de mim.
Ele aperta firmemente os nós, e me olha; eu sei que está me desejando
intensamente… Que cada ato seu é a vontade de me virar do avesso. Nem
preciso responder… Ele sabe, ajustando lentamente a corda, que é
exatamente onde quero estar.
O Senhor se aproximou de nós duas, roçou as mãos em nossos cabelos, e
colocou uma mordaça em cada uma. Em seguida, nos amarrou deixando-nos
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com a bunda para cima, e as mãos amarradas para trás. Passou a corda em
nossos pescoços, deixando-nos com a cabeça erguida, a ponto de nos sufocar.
Vi quando veio em nossa direção com a cane de bambu nas mãos, e se
colocou atrás de nós. De lá para cá, eu só ouvia o barulho do instrumento em
contato com a nossa pele, e os gemidos e gritos abafados.
Virou-nos, uma de frente para a outra, barriga para o alto, mãos amarradas
junto da cabeça. Uniu nossos pés um no outro, amarrou para cima,
pendurando nossas pernas para que ficassem suspensas. Eu sentia a sola do
pé de Antonele, e sabia que ela estaria ali, sentindo o mesmo que eu, o que
me deixava mais tranquila, embora não tivesse gostado, a princípio, de sua
companhia.
Ele se pôs entre nossas pernas, colocou os prendedores nos mamilos de
cada uma, e passou a chicotear nossos seios e barriga, pernas e pés. Depois da
quinquagésima chibatada, o Senhor se apossou de um vibrador de dois
gumes, feito por um longo cabo de madeira, e penetrou-nos, uma em cada
ponta enquanto pingava as dez velas coloridas em nossas pernas, clitóris,
seios e pés. O ardor me fazia sentir a sensibilidade de minha própria pele,
como algo independente do restante do meu corpo.
Não houve sexo, mas fiquei o tempo todo tensa, esperando por este
momento. Não sei se ficaria à vontade ao transar com uma menina pela qual
não me simpatizei muito desde o primeiro momento que a vi. Não tinha nada
contra ela, mas algo em sua complexidade me dizia que era melhor me
manter afastada.
Quando a sessão acabou, somente neste momento consegui relaxar. Fui
para o quarto do Senhor, e Antonele para um dos cômodos da casa. Após
tomar um longo banho, e nos amarmos loucamente, adormeci em seus
braços, sentindo-me dele, o que não significava apenas que devo lamber suas
botas ou abanar meu rabo, para que os olhos do meu Dono estejam voltados
para mim… Significava que sei quem sou, e reconheço meu valor nisso -
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amada, desejada, necessária, útil, leal.


Ouço batidas na porta, discretas, mas alguém estava lá. Ouço novamente,
insistentes, quebrando o silêncio dos meus pensamentos. Com cuidado, deixo
minha menina ainda adormecida na cama, e vou averiguar o que estava
acontecendo.
Quando abro, dou de frente a Antonele, chorando, segurava um
travesseiro.
− Perdão, Sir, mas tive um pesadelo, estou com medo…
Suspirei profundamente antes de perder as estribeiras.
− Quem te autorizou a me acordar?
− Eu… Não conseguia dormir… – passou a chorar no corredor do hotel.
− Entre cadela, mas já sabe… Terá uma punição amanhã.
− Sim Senhor.
Ela entrou e se deitou na cama, do meu lado esquerdo.
− Amanhã sairei cedo, quero que faça companhia a Charlote. Quero
amizade entre as duas. Nada de competição ou algo do gênero. Não precisa
acordá-la tão cedo. Ajude-a nas compressas com gelo, nas marcas arroxeadas.
− Farei tudo que o Amo pedir.
− Então durma. Amanhã terei um dia cheio. Verei vocês duas somente à
noite.
− Fique absolutamente tranquilo, Sir. Sabe que pode contar comigo para
tudo que precisar. Sempre serei leal às suas necessidades. Farei com que a
irmã se sinta em casa… Pode ter certeza de que ela não sofrerá em sua
ausência.
− Que assim seja, minha morena.

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Capítulo 6
Confidências de Antonele
Assim que ele saiu pela porta, me mantive parada no mesmo lugar,
olhando para minha nova irmã deitada na cama onde caberia somente a mim
e ao meu Dono. Mas ela estava ali, e sua presença era irritante para meus
olhos, ouvidos, paladar, sono, fome, sede… Eu sei que não serei perdoada,
mas o que irei fazer será pensando em minha D⁄s. Ele nunca esteve tão
envolvido antes. Ela não poderá estar entre nós, eu irei perder sua atenção. Já
se passavam duas noites que o Senhor não me encostava… Prefiro perdê-lo
para sempre a viver neste inferno. Não sei qual será o preço que irei pagar,
mas preciso proteger meu relacionamento. Seria melhor, se ele tivesse trazido
mil meninas para o canil, mas que nenhuma fosse como esta… Eu não sei o
que ela tem, sei apenas que ele trocaria qualquer uma das mil por ela. Eu sou
a alfa! E minha doce irmãzinha de coleira há de entender isso… Chegou por
último… Entre na fila e espere sua vez.
Peguei o celular de Charlote e sua carteira, saí do quarto antes de acordá-la
para a execução de meu plano, fui para o aposento que meu Dono me
instalou. Troquei de roupa e olhei para dentro da minha bolsa. Estava tudo
pronto e arquitetado. Eu sabia desde ontem que hoje o dia dele seria cheio, e
teria oportunidade de dar um rumo na vida de Charlote de uma vez por todas.
Preparei tudo ontem… Foi um custo convencer Ashila de recebê-la no Clube
Libertine de Fortaleza. Mas graças aos tantos favores que lhe prestei,
inclusive, de apresentá-la ao seu Dono e ela hoje ser muito feliz em sua D⁄s
como submissa exclusiva, acabou por topar me ajudar. Ainda tem a questão
sobre o Dom Arkadius, pelo o que sei, ele a procura, então, estamos todos
bem arranjados. Sei que dará um pano grande para a manga, mas não vi outra
solução. Meu Senhor não descobrirá tão cedo o paradeiro dessa menina

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pálida. E quando descobrir, ela estará com outro… Agora preciso acordá-la,
seu voo sairá daqui duas horas, ela precisa seguir para o aeroporto.
***
Confidências de Charlote…
Fui despertada pelos raios de uma manhã ensolarada que parecia entrar
inteira dentro do quarto. Antes mesmo de me localizar, eu vi a imagem
morena de Antonele segurando a cortina a fim de me despertar. Assustada,
sentei-me na cama tentando manter o equilíbrio emocionalmente matutino.
Odeio ser acordada dessa forma. Deveria haver um bom motivo para tanto.
Quase não tivemos contato, e me pareceu que ela não se importou muito com
isso.
− Já são dez horas. O Dono de mim pediu para lhe acordar. – disse ela,
rispidamente. Seu tom de voz poderia me fazer soltar uma resposta afiada.
− Onde está o Senhor? – perguntei ainda sonolenta, tentando me levantar
da cama e esconder meu corpo nu no lençol.
− Ele precisou sair. Deixou alguns recados para você. Precisa ser rápida.
Levanta-se e se troque. Ele irá te encontrar em Fortaleza. Sua passagem já
está comprada.
− Não posso sair assim, sem telefonar antes para ele. Mesmo por que,
acabamos de chegar de viagem… Ele não me disse nada sobre viajar
novamente… – eu disse, já olhando ao meu redor à procura de meu celular,
porém, não estava em lugar algum.
− Impossível, querida. O Senhor foi para um local ermo, que não tem sinal
telefônico. Além do mais, levou seu celular, pois hoje é dia de vistoria. Ele
não te disse sobre essa questão?
− Não estou sabendo de nada… Droga! Meu celular! – disse eu,
esbravejando. Não sabia dessa tal vistoria, e nem qual era sua finalidade.

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− Pois é, baby… Vida de submissa não é fácil. O Senhor nunca costuma


conversar sobre seus arbítrios, ele pode de repente optar por algo e comunicar
depois, ou… Não preconizar. O que nos resta é apenas aceitar e cumprir as
ordens.
− Todos os meus contatos estão em meu celular… Inclusive, o número
dele, que não sei de cabeça. E minha carteira… Não está em minha bolsa.
− Creio que não precisa mais de contato algum que não seja apenas o de
seu Dono, sendo assim, era obrigatório você ter decorado o número do
celular do Senhor. Vistorias servem justamente para isso, meu bem, para
averiguar seus contatos… E olhar sua carteira e anotações… Isso é
procedimento comum aplicado às escravas de AT. Não há motivo para
estranhamento.
Então ela riu sarcasticamente, o que me deixou muito intrigada e irritada.
Eu não estava programada psicologicamente para suportá-la, poderia viver
sem uma irmã de coleira. E nem estava contando com uma viagem vinda do
nada, sem um comunicado prévio.
Levantei sem jeito, ele sequer deixou a roupa que eu deveria usar naquele
dia, o que me deixou um pouco perdida, então compreendi que já estava
dependente dos cuidados dele, que não sabia lidar direito com meu dia sem
sua presença, para me dizer o que devo fazer. Tornei-me vazia de repente, ele
era o único líquido complementar de minha existência. Não havia mais nada
longe dele.
− Poderia me passar o número do celular dele, para eu telefonar antes de
sair?
− Infelizmente, não, irmãzinha… Ele me odiaria se eu fizesse isso… Se,
levou seu celular e não pediu para que o ligasse, não há motivos para ligar.
Torci o nariz e terminei de me trocar. Estava soltando fogo pelas ventas.
Teremos uma séria conversa… Pode ser que eu esteja errada… Foi tão
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maravilhoso ontem, mas será que toda vez que o dia amanhecesse, eu teria
uma surpresa?
− Vamos logo, irmãzinha, você já está atrasada. Precisa chegar com
antecedência ao aeroporto.
Ela fala como seu eu não conhecesse o procedimento. Quem dirá a ela para
parar de me tratar como se eu fosse sua irmã mais nova? Somos,
aparentemente, quase da mesma idade.
Ela me acompanhou até o aeroporto, quase não conversamos. Só quando
chegamos, que me passou o envelope com a passagem, minha RG e a
anotação de um endereço. Meu coração estava apertado. Algo me dizia que
estava prestes a passar por provações.
− Você deverá chegar neste endereço de táxi, e lá, procurar por Ashila, que
irá te receber, e te fazer companhia até o Senhor chegar. No mais, está tudo
certo, não tem o que temer.
Peguei o envelope e saí sem olhar para trás. Quase pude ouvir sua risada,
só não sei o motivo.
Ao chegar a Fortaleza, o calor da cidade tomou conta dos meus sentidos.
Suar, fez com que minha ansiedade diminuísse, mas meu coração ainda
estava apertado.
O táxi parou em frente ao Clube Libertine, parecia uma pousada, o que me
deixou em dúvida quanto ao que seria aquele estabelecimento. Não sei ao
certo se funcionava como o Clube do meu Senhor, porém o aspecto lembrava
uma casa antiga.
Logo surgiu a minha frente, uma mulher vestida como dançarina do ventre.
Ela se aproximou e se apresentou como Ashila. O vento batia no corpo dela e
trazia um cheiro de âmbar.
− Seja bem-vinda, Charlote.

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− O que é este Clube?


− Aqui estudamos e praticamos a liturgia. Realizamos alguns encontros,
cerimônias, e também hospedamos pessoas do meio que vêm de fora.
− Você tem notícias do meu Dono? – eu disse ansiosa.
− Fique tranquila, menina… Vamos entrar. Vou te acomodar e preparar
algo para comer.
Percebi que ela fugiu de minha pergunta. Eu estava apavorada… Como
ficaria ali, sem minha carteira e celular? Eu só deveria estar louca.
Entrei num quarto com uma cama alta, preparada para a realização de
sessões. Senti medo e certo nojo de me acomodar ali, sem saber quantas
pessoas haviam se deitado naquele leito. Mas o ambiente estava devidamente
limpo e cheirava bem, assim como os lençóis alvos e bem passados.
− Fique à vontade, pequena… Assim que estiver pronta, vou levá-la para a
sala de jantar. Almoçaremos todos juntos.
Ela disse, todos juntos… Quem serão os demais?
Meia hora depois, lá estava eu sendo levada para a sala de jantar. À mesa
grande, estavam sentadas várias pessoas entre homens e mulheres, e todas
vestidas de forma estranha, como Ashila. Os homens usavam roupas do
século passado, e isso era um pouco assustador.
Ao me sentar, meu prato já estava servido, o que me causou estranheza.
Então um homem se levantou de seu lugar e se sentou ao meu lado, pedindo
licença.
− Coma, menina… Precisa se alimentar. – ele disse num sorriso simpático,
mostrando seus dentes perfeitos.
− Quem é você? – perguntei, achando-me mergulhada em outra realidade,
completamente diferente da que estava.

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− Senhor Arkadius. – ao dizer, colocou um pouco de comida no garfo e


levou a minha boca, o que tentei esquivar, mas ele insistiu. – Coma.
− Não pode fazer isso… Eu tenho Dono, e ele não vai gostar de chegar
aqui, e ver seu amigo me dando de comer na boca.
− Seu Dono não virá. – disse objetivamente.
Meu sangue pareceu esquentar, e meus poros, suaram. Senti vontade de
correr.
− O que disse?
− Eu disse que a partir desse momento, serei seu mentor, e que seu Dono
não virá lhe encontrar.
− Não é possível… Há um engano. Ele me pediu para esperá-lo aqui, disse
que viria me encontrar.
− Não, ele não virá. Tenha a certeza disso.
− Vocês estão loucos! Só podem estar loucos! AT não faria uma coisa
dessas comigo! – gritei, tentando me levantar, o que foi vedado pelas mãos
fortes de Arkadius.
− Calma, menina… Não vai adiantar agir dessa forma… É melhor tentar
ficar tranquila.
− Tranquila? Como vou ficar tranquila? Longe da minha cidade, da minha
casa, meu trabalho, minha carteira, meu celular, meu Dono? Junto a um
monte de pessoas estranhas… – ele cortou o que eu ia dizer.
− Você será bem cuidada… Acalme seu coração. Irei cuidá-la, não lhe
faltará nada.
Passei a gritar e rebater meus pés e pernas por debaixo da mesa. O
desespero tomou conta de meu ser, e eu não sabia exatamente o que fazer
naquele momento. Gritei até sentir certa moleza nas pernas, oportunidade

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esta, que Arkadius me pegou no seu colo, e meu levou de volta ao quarto.
− O que está acontecendo, Senhor Arkadius, por que AT fez isso comigo?
− Menina… Não somos deste mundo… Você não é deste mundo.
Aragorne Tirel não é deste mundo… – ele disse numa voz calma, que me fez
sentir arrepios.
− Aragorne Tirel? – minha cabeça girou ao ouvir este nome, que não me
parecia estranho. − Mentira! Acha que sou idiota para acreditar numa história
dessas? Está querendo me enrolar para não me explicar a verdade!
− Esta é a verdade. Estamos disputando um trono em Siv, e eu serei o novo
rei.
− Que absurdo, um homem do seu tamanho inventar uma história ridícula
dessas, pensando que irá me fazer acreditar nesta palhaçada.
− Você… Não se lembra de seu passado, não é?
− Como sabe disso? – sentia-me incrédula. – Ele lhe contou?
− Não. Vocês não se lembram, pois faz parte do plano para a conquista do
trono.
− Olha, eu não sei do que você está falando. Não sei quem é Aragorne
Tirel, nem Siv, e muito menos, trono.
− As coisas agora dificultaram para ele, pois a missão é minha… E você
será minha… Eu a conquistarei.
− O que quer dizer? – gritei.
− Durma, minha criança… Durma… – disse ele colocando uma das mãos
sobre minha testa, fazendo-me adormecer instantaneamente.
***
Confidências de AT…

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Vim pensando nela durante o trajeto, meu corpo todo sentia sua falta. Mas
o cheiro… O cheiro de sua nuca estava infiltrado em minhas células como se
fossem incapazes de aceitarem a separação de nossos corpos.
O trânsito estava lento por causa da chuva fina que agora batia em meu
parabrisa, a angústia me consumia. O desejo de subjugá-la era algo que
atravessava o peito e subia pela garganta, libertando a ânsia que agora tomava
conta de mim. O mundo havia parado. Todas as mulheres do mundo haviam
perdido a graça. Eu só via minha menina em minha frente, diante dos meus
olhos. Onde ela estivesse, ainda assim era minha.
Ultrapassei o carro a minha frente. Furei o sinal, certamente ganharia uma
multa. Estava impaciente, precisa vê-la, senti-la, penetrá-la, bater em sua
cara, puxar seu cabelo… Morder… Ah, como desejava mordê-la, amarrada,
amordaçada, entregue aos meus desejos… Ouvindo aquela voz doce.
Caralho! Estou apaixonado. Não era para ser assim.
Entrei em minha propriedade sentindo algo estranho no ar. Abri a porta do
quarto, e para minha surpresa, não a vi. Antonele estava sentada na cama,
assistindo televisão. Minha frustração foi grande. Um misto de raiva e
preocupação invadiu meu campo vibratório.
− Onde está Charlote?
Ela saiu da cama e correu para os meus pés, beijando meus sapatos.
− Que bom revê-lo, Sir. Bem… A irmã saiu de manhã, assim que o Senhor
nos deixou, e não retornou ainda.
Peguei-a, desesperado, pelos ombros, e a trouxe para perto dos meus olhos.
− Olha, menina, não é hora para brincadeira. Vou lhe perguntar
novamente… Espero obter uma resposta plausível. Onde está Charlote?
− Eu não sei, Senhor. Eu a vi saindo pela manhã, ainda tentei impedi-la,
mas ela saiu assim mesmo.

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Joguei o corpo frágil de Antonele sobre a cama. Passei a mão entre meus
cabelos, e um grito estava engasgado em minha garganta. Sem saber o que
fazer, num pranto contido peguei meu celular e passei a digitar o número
dela. Em vão. Caiu na caixa de mensagem. Dei alguns passos para frente,
rumo à janela e dei dois murros fortes na parede. Só então soltei um urro de
desespero. Olhei na direção do armário, as roupas já não estavam mais lá…
Suas coisas haviam desaparecido.
Peguei a chave do carro e passei a andar pela cidade em busca de minha
menina. Não poderia perdê-la. Não poderia aceitar essa perda. Andei por
mais de duas horas, sem rumo. Então deixei ocultamente as lágrimas caírem
pela face. Ela fugiu. Ela é minha… Como aceitar? Não era um objeto que eu
havia perdido, era minha posse, a menina por quem me apaixonei pela
primeira vez na vida. Coloquei a cabeça para fora da janela e gritei seu nome
por duas vezes.
Volte para mim, menina… Volte…
***
Confidências de Antonele…
Pelo jeito que ele saiu daqui, certamente havia realmente se apaixonado
pela tal imbecil, que graças a Deus já chegou a Fortaleza e está sob os
cuidados de Arkadius. Que sejam felizes para sempre, bem longe de nós. Mas
como farei para ele olhar para mim, se a única que vê em sua frente é aquela
idiota pálida?
Ao vê-lo retornar para o quarto, tentei me aproximar, mas fui impedida.
− Saia daqui! – gritou.
− Mas, Sir, entenda… Eu não tenho culpa do que aconteceu. Estou
tentando acalmá-lo.
− Irá fazer isso se for agora para seu quarto, e ficar lá até eu mandar você

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sair.
− Sim Senhor.
Saí com o rabo entre as pernas. Eu não era o suficiente para ele neste
momento. Não sentia remorso por ter feito o que fiz. Logo ele a esquecerá,
então chegará a oportunidade de eu me aproximar, e tomar seu amor e sua
atenção somente para mim. Por hora, aceitarei tudo que ele me impor. Sei que
arrumará alguma menina para colocar no lugar daquela insuportável, mas me
farei de demente. Ficarei de olhos atentos, porém, aceitarei como se fosse de
bom grado. Será no final, apenas eu e meu Dono. Com cautela, retirarei todas
de seu caminho, e ainda levarei o título de submissa de alma.
***
Confidências de AT…
Só queria saber onde errei? Por que ela se foi?
Um flash de repente se fez em minha mente. Vi Charlote ensanguentada
em meus braços. Pisquei os olhos várias vezes, mas a imagem não saía. Eu
não entendia…
Fui até meu barzinho e fiz um copo duplo de uísque. Tomei em poucos
goles. Precisava me anestesiar com algo forte o suficiente, que retirasse de
mim aquele urro parado em minha garganta.
Chamei Antonele e fiz novamente as mesmas perguntas para averiguar se
não havia contradição, e as respostas foram as mesmas. Eu precisava
encontrá-la em algum lugar. Nunca senti tamanho vazio. Estava arruinado,
sentia febre sem estar febril. Chorava sem derramar lágrimas. Morria aos
poucos, com o coração acelerado. Sentia que ela não saiu apenas para dar
uma volta. Não faria isso sem pedir o consentimento. Ela fugiu. Foi
traiçoeira. Esperou-me sair de casa.
− Eu preciso encontrá-la! – disse quase gritando.

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− Mas, Sir, ela pode ter voltado para sua casa, não sei… É melhor se
acalmar. Não vale a pena ficar assim por uma menina ingrata, que não teve o
cuidado de ao menos lhe avisar que iria desaparecer de sua vida. Ela não
merece seus cuidados.
− Alguém está pedindo seus conselhos?
− Não Senhor.
− Então cale sua boca.
− Estou apenas lembrando-o do quão preciso é seu domínio, Sir. E o
quanto se empenha, para tornar o mundo de suas meninas melhor.
− Eu tenho certeza que ela não faria isso por fazer. Deve haver algum
motivo… Eu vou descobrir.
− Sir… Ela me disse sobre insatisfação, que possui um abismo dentro de
si, e que não conseguia permanecer muito tempo no mesmo lugar. Mas
jamais achei que poderia fugir…
− Quando ela disse isso?
− Assim que acordou, na mesma manhã que fugiu.
− Mas isso não me parece ser de Charlote…
− O Sir não a conhece há tanto tempo assim… Pode ser alguma pessoa
desequilibrada… Nunca se sabe…
− Cale-se! – eu pedi. Não queria que minha angustia progredisse.
Nenhuma dor que já senti poderia se comparar ao que estou sentindo.
Charlote feriu meu ego e sentimentos. Meu domínio nunca mais será o
mesmo. Ela foi o pior e o melhor que aconteceu em minha vida. Por um
instante acreditei que fosse capaz de me tirar da solidão, do abismo negro o
qual me encontro, mas me enganei… Enganei-me em todas as minhas
convicções como homem, dominador e dono de uma estrela perdida.

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Eu só queria cuidá-la… Só quis seu bem desde o primeiro momento. Abri


as portas do meu coração, deixe-a entrar, mesmo sem saber que ficaria.
Agora… O que fazer para esquecer cada pedaço de seu corpo? Como
esquecer o riso infantil, a pele macia, o cheiro que impregna por onde ela
passa?
Sim, eu perdi muito mais que uma menina. Eu me perdi como dominador,
a única definição que tinha sobre mim mesmo. Quando um dominante chega
a este estágio, ele corrompe muito de si e do desejo de continuar exercendo o
que mais ama, e a única coisa que o identifica como pessoa. Ela
simplesmente me tirou o chão, os sonhos e o desejo.

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Capítulo 7
Confidências de Charlote…
Acordei como quem acordava num mundo frio e sem sentido. Logo que
abri os olhos, ele estava lá, ao lado de minha cama, segurando em minha
mão.
− Eu quero ir embora. – disse numa voz chorosa.
− Não pode sair agora. – Arkadius respondeu, ainda com minha mão entre
as dele.
− Não posso ficar aqui, não é meu lugar. – já não segurava as lágrimas.
− É uma questão de tempo. Logo se acostumará.
− Não posso! Não quero! Ninguém me obrigará a ficar! – disse aos berros,
retirando minha mão das dele, e sentando na cama, sem me importar com
quem pudesse ouvir.
− É melhor ser boa menina, não quero machucá-la. – disse ele fleumático.
− Machuque-me! Acredita mesmo que estou me importando com isso? –
respondi, levantando da cama e correndo para a porta. Eu sairia dali de
qualquer jeito. Ele não me impediu que eu abrisse a porta e seguisse correndo
pelo corredor daquele lugar obscuro, e alcançasse a porta da rua. Então senti
suas mãos me tomando para si, agarrando-me pela barriga, trazendo-me ao
encontro de seu rosto.
− Não sairá daqui, nem que para isso eu tenha que…
− Me surrar? Acredita mesmo que pode? – desafiei.
− Ninguém me diz o que devo ou não fazer. – ele aceitou o desafio.
− Bata-me, covarde! – desafiei ainda mais.
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− Cale a boca. – ele pediu.


Então passei a gritar, pedindo socorro. Arkadius tapou minha boca com
uma das mãos e me levou para o quarto. Amarrou-me do peito aos pés,
sentada numa poltrona, e eu, aos gritos. Para finalizar, usou uma mordaça
grosseira, e disse em meu ouvido:
− Agora grite, pequena! Sapateie. Já disse que não adianta medir forças
comigo. Perderá. Seja boa menina, você só tem a ganhar com isso.
Meu desejo era de cuspir em sua cara. Passei a chorar de soluçar, como se
pudesse expelir meus órgãos pelos olhos. Ninguém me ajudaria. Todos
estavam ali num único objetivo. Sequer, pude analisar o que estava
acontecendo naquele lugar estranho de dois séculos atrás. Só me acalmei
quando passei a ouvir uma música arcaica e sons de risadas. Estavam
dançando, comemorando a minha desgraça.
Horas depois, o demônio arcaico surgiu no quarto que já se encontrava
escuro, somente minha dor brilhava e urgia na penumbra que acalentava
meus sonhos frustrados.
Ele se aproximou, acariciou meus cabelos e voltou a olhar em meus olhos.
Tinha em mãos, uma lamparina, o que ainda era mais estranho, cultivavam
hábitos antigos, mesmo existindo a eletricidade.
− O que te faz ser um corcel negro?
Eu não poderia responder, minha boca estava ainda amordaçada, o que foi
sua sorte.
− Acha mesmo que teria coragem de fazer algum mal a você, minha
calopsita?
Ele não sabe realmente do que eu era capaz… Não faz ideia de que eu
jamais iria obedecê-lo.
− Vou tirar sua mordaça. Espero que se comporte.
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Assim que ele tirou, eu passei a gritar. Ele me deu um tapa no rosto.
− Eu disse para se comportar! Não está acreditando que paciência tem
limites.
− Você não é meu Dono. Não é nada meu! Não tem o direito de encostar a
mão em mim!
− Sabe, pequena, sua tarefa é tão fácil, basta apenas cuidar de seu bem-
estar.
− Meu bem-estar não está sob seu controle.
− Me chame de Senhor. – ele disse, segurando meu queixo, forçando-me a
olhar para ele.
− Jamais.
− Vamos lá, seja razoável consigo mesma.
− Meu Senhor se chama AT, e é somente a ele que devo chamar de Senhor.
− Tudo bem, não vai fazer? Eu ia levá-la para a sala. Estava preocupado
em te deixar aqui no escuro, mas pelo que vejo, me precipitei em me
preocupar. Você é a primeira a não se importar consigo mesma.
Ele se levantou com a lamparina em mãos, saiu do quarto, e voltou
instantes depois com uma maleta. Desamarrou-me e me pôs em pé, de frente
ao seu corpo. Forçou-me a me ajoelhar, sentada sobre as pernas, e assim me
amarrou, juntando minhas canelas às coxas, com as mãos para trás. Tirou da
maleta, um saquinho de sal grosso e feijão. Arrumou fileiras grossas e fartas
no chão, e levantou meu corpo completamente atado, colocando-me sobre
seu preparo.
− Isso é para aprender a respeitar a hierarquia. Aprender a ser grata a quem
se dispõe a te cuidar e tratar bem.
Quando ia responder, ele atou novamente minha boca.

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− Eu lamento muito por isso.


Pela forma como saiu, de cabeça baixa, parecia até que meu
comportamento realmente o atingiu. Mas a única coisa que eu queria naquele
momento era sair dali, que se dane seu senso de dominador. Eu cuspo nele.
Quando dei por mim, estava dormindo sobre as pernas amarradas, e o sal já
ardia muito em minha pele, mas nada se comparava com o que eu sentia por
dentro. Nada faria efeito em minha alma dominada. Meu Dono me esperava
em algum lugar… Meu Dono, amor da minha vida…
Acordei com as mãos imundas e fortes, me retirando do chão,
desamarrando cada nó das cordas, e me colocando sobre a cama, ternamente.
Com uma toalha molhada, ele retirava o sal de minhas pernas, acariciando a
pele ferida. Assim que terminou, fez massagens em meus pés e voltou-se para
meus cabelos, a fim de que eu novamente pegasse no sono. Tentei não me
render, mas estava cansada demais para discutir.
Quando o dia amanhecido clareou o quarto, ele voltou trazendo consigo
uma toalha limpa e uma caixinha de madeira.
− Bom dia, pequena. Como amanheceu? – ele perguntou, esperando minha
resposta num sorriso, e foi exatamente neste momento que prestei atenção em
seus traços e fisionomia, pois até então, a única coisa que eu desejava era
matá-lo.
A barba cerrada dava nele um ar másculo, assim como ao meu Dono, isso
não posso esquecer um só segundo. Os olhos da cor de mel eram brilhantes,
combinavam com a cor dos cabelos longos, levemente encaracolados, que
estavam presos num rabo para trás. O modelo vitoriano nas roupas
combinava perfeitamente com seu jeito. Ele era um homem bonito e
encorpado. Eu percebi os braços fortes quase apertados na manga comprida
da camisa branca que vestia. Percebi também que usava botas até os joelhos.
− O que significa essa caixinha com areia? – perguntei, quando ele retirou
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minha mordaça, e eu passei a mão pelos lábios por diversas vezes.


− Ela serve para amansar meninas mal-educadas. Vamos lá, se levante. –
ele pediu enquanto me aguardava pacientemente.
Quando percebeu minha hostilidade, tratou de me puxar pelo braço,
colocando-me de pé. Então travei no mesmo lugar, o que fez com que ele
praticamente me arrastasse até a porta dentro do quarto. Era um banheiro
todo decorado e planejado à moda antiga, com azulejos brancos coberto por
arabescos azul escuro.
− Vamos, tire a calcinha. – ele pediu.
− Jamais farei isso com você aqui. – disse rindo num deboche.
− Você, não, Senhor.
− Seja o que for, não vou me despir. – estava disposta a seguir com minha
teimosia mesmo que ele arrancasse meu couro no chicote.
Sendo assim, ele passou a rasgar minha roupa de ponta a ponta, o que me
fez me encolher e quase empurrá-lo.
− Não se atreva! – pela primeira vez, ele saiu do tom normal de sua voz,
segurando firme em meu pulso, prendendo-me contra a porta. – Chega de ser
bonzinho. Meninas como você, gostam de ser tratadas como animais. Então
vamos lá, urine agora dentro dessa caixinha, como fazem as cachorrinhas.
− Jamais! – eu disse, sentindo seu hálito quente em meu rosto.
− Ah, não vai… Ok, então vai ser do meu jeito.
Ao dizer isso, puxou meus cabelos, forçando-me a agachar. Acabei
fazendo o que queria, pois senti forte pressão em minha coluna.
− Urine! – ele gritou.
Quando percebeu que eu não obedeceria, ele colocou a moringa em meus
lábios, tapando meu nariz para que eu abrisse a boca, despejando de uma só
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vez, a água do recipiente. Como não havia ido ao banheiro desde que
cheguei, e já estava quase vazando por baixo, acabei urinando, mas não
porque ele desejava, e sim, por não suportar mais segurar.
Então nos momentos seguintes, uma dor invadiu meu ser e passei a chorar
desesperadamente. Os fios de meus cabelos que caíram no meu rosto ficaram
molhados. Sem perceber, no meio do meu tormento existencial, acabei me
sentando em cima do xixi, sobre a areia molhada. Deixando que minhas
pernas caíssem do lado, soltas, moles, eu não queria mais viver. Estava
decidida.
Ao ver minha situação, ele me pegou no colo.
− Não pode se sentar na areia, pequena. Não pode. – disse ele me levando
para a banheira, que já estava preparada e cheirosa. Ensaboava meu corpo
com uma bucha enquanto eu chorava feito uma criança que havia perdido sua
mãe no supermercado.
− Não chore mais… Não precisa chorar, se obedecer. – dizia ele, beijando
minha cabeça.
Quem ele pensa que é?
− Eu quero ir embora… Quero meu Dono… – eu insistia. – Por favor,
Senhor, deixe-me ir embora… Por favor, eu te imploro…
− Você poderia pedir tudo, menos isso. Infelizmente não posso atendê-la.
− Por que não? Existem tantas meninas aqui, poderia arrumar alguma para
te servir, e me deixar ser feliz com meu Senhor.
Ele parou por um instante com o banho, enxugou sua testa e tocou em meu
queixo.
− Porque desde sempre fora o motivo da guerra entre nós dois. Desde antes
de seus pais, avós, tataravós. Antes de sua geração presente, você veio a Siv
como uma bela senhorita, e nesta época duelamos por sua causa. Desde
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então, vida após vida de AT, você fora disputada, assim como no incêndio
que houve… No castelo… – percebi seus olhos perdidos. Certa tristeza
pairou sobre seu olhar, que parecia não mais lhe pertencer.
Então ele saiu, e eu fiquei sem entender uma só palavra. Deixou-me solta,
livre, eu poderia correr agora dali, pelada, do jeito que estivesse. Mas algo
acabara de me intrigar, e ele teria de contar essa história até o fim. Ele sabe
de algo que eu não sei, o motivo talvez de eu ter perdido a memória e viver
nessa neurose por tanto tempo.
Levantei da banheira e me enxuguei. Do jeito que estava enrolada na
toalha, saí ao seu encalce. Dobrava as curvas daquele corredor, e alguns dos
que viviam ali, me olhavam abismados com minha insensatez. Encontrei-o
num quarto de instrumentos de prática SM, curtindo o couro de um chicote.
− Vá se vestir! – ele ordenou.
− Não antes de me contar o que não sei.
− Já disse o suficiente. Agora dê meia volta e vá se trocar.
Como viu que eu não sairia dali sem uma resposta, ele se aproximou e me
jogou em suas costas, seguindo comigo dessa forma, corredor afora, o que fez
com que todos, inclusive Ashila, nos olhassem horrorizados.
Entramos no quarto, o demônio arcaico me depositou grosseiramente no
chão, e apertou meu pescoço.
− Daqui para frente será do meu jeito, queira sim, queira não. E não me
desmoralize na frente dos meus amigos. Para cada desmoralização serão 180
chibatadas, com direito a dormir na masmorra, pendurada numa corda. Só
aviso que meu chicote não é de moça, como o do seu ex-dono, vai sofrer em
minha mão, caso queira pagar para ver e conhecer minha arte, pois sou eu
mesmo quem faço meus brinquedos.
Olhei-o com espanto. Só então pude notar que estava com a camisa suada,

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grudada em seu corpo. Os cabelos estavam soltos, eram lindos. Ele prendeu
assim que percebeu meus olhos sobre eles.
Pegou um caderno e uma caneta e disse num tom ríspido:
− Quero trinta páginas escritas, frente e verso, a seguinte frase - Senhor
Arkadius, não devo desobedecê-lo. Você tem até o horário do almoço para
me entregar a tarefa cumprida, caso contrário, calabouço.
− Não pode fazer isso com a posse alheia.
− Quem disse que você é dele?
− Eu estou dizendo.
− Você não sabe de nada, menina… Quando souber vai me entender
perfeitamente. Agora, faça o que mandei.
Antes de retrucá-lo, ele fechou a janela com o cadeado e saiu porta afora,
fechando-a com chave. Sentei-me na cama e fiz aquilo que mais sei fazer,
chorar.
O sentimento é algo conectado com aquilo que está acima de nossa
compreensão. Eu não sei quando aconteceu tanta coisa que hoje estranho, e
me pergunto sempre a mesma coisa, o motivo… Ainda sem entender, sei
apenas que devo obedecer, algo me diz que é assim que deve ser. Então
começo a cumprir a tarefa.
Quando é chegado o momento marcado por ele, a porta se abriu, e eu já
havia terminado a tarefa. Ele entrou e fechou a porta atrás de si.
− Muito bem! Boa menina. – disse sorrindo.
Tirou do bolso, algo que não dei atenção, e só percebi quando ele colocou
em meu pescoço.
− Isso serve para eu manter o controle sobre você e seus passos pela casa.
– pôs uma coleira em meu pescoço. Pela guia, fui conduzida até a sala de

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jantar. – Quero de joelhos… – disse ele, apontando para o chão.


Fechei a cara e franzi o cenho, mas cumpri. Dessa vez ninguém me olhou
como se visse uma assombração. Parecia normal alguém andar de quatro e
com uma coleira, pelo tal Clube, que mais parecia uma pensão.
Sentei-me à mesa, mas logo que coloquei a bunda na cadeira, fui advertida
na frente dos presentes.
− Está vendo aquele tapetinho ali debaixo da mesa?
− Sim.
− É todo seu, pode tomar seu lugar.
Fiquei constrangida, vermelha, roxa, azul. Sentia-me humilhada.
− Seu potinho já está servido. Pode comer o que está lá.
Olhei para o tal potinho, era algo semelhando a de cachorro. Não havia
talheres ou algo assim. Ao lado, outro potinho com água.
− O que está olhando? Não entendeu o que eu disse? – disse ele já se
sentando, puxando-me pela guia para perto de seus pés.
Se tivesse recebido essa ordem algumas semanas antes, provavelmente a
teria acolhido com aquela aparente passividade, que se lhe tornara armadura.
Mas hoje, ao dar a sua habitual e lacônica resposta, encontro certa dificuldade
em dissimular. Mas eu não tinha outra opção. Estava totalmente perdida.
Minha situação era caótica. Puxei o tapete para mais perto de suas pernas,
para não ficar enforcada enquanto comia. A sorte era que estava com tanta
fome, que mal percebia que comia com as mãos.
Assim que ele terminou sua refeição, saímos do mesmo modo que
entramos na tal sala. Quando chegamos ao quarto, ele me pôs para lavar o
rosto e as mãos.
Toquei no sabonete sobre o lavabo e molhei o rosto. Ele veio por trás, e

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prendeu meus cabelos.


− Não é assim que se faz. – disse num tom quase cordial.
Após prender meus cabelos, molhou suas mãos e colocou um pouco de
sabonete, espumou e veio até meu rosto, sem atingir a área dos meus olhos.
Em seguida, abaixou-me e passou a enxaguar minha face. Pegou uma toalha
pequena e com pequenos toques, secou-me. Ficou me olhando por algum
tempo. Tive a impressão que conhecia aqueles olhos, mas não sabia de onde.
− De onde eu o conheço? – eu quis saber.
− Já lhe disse, desde sempre. Sempre fora minha. Ele a roubou de mim. –
respondeu, com os olhos lacrimejantes.
− Como assim? – eu quis saber.
− Vá descansar. Costumamos dormir após o almoço. – disse, puxando um
colchonete debaixo de minha cama, deitando-se sobre ele, ainda segurando a
guia.
Deitei e fiquei olhando para o teto. As coisas passam, a cada minuto, a
ficarem ainda mais confusas em minha mente. Eu não estou entendendo
absolutamente nada. Não sabia administrar essa saudade sem fim de AT.
Fico tentando adivinhar o que ele está pensando neste momento, e por que
não veio ao meu encontro. Será realmente que ele usa as pessoas e as descarta
como se fossem papel higiênico?
Olhei para o lado e vejo aquele homem dormindo. Ele era lindo.
Inacreditavelmente lindo. Não parecia real. Aliás, nada naquele lugar parecia
pertencer a este mundo. Ouço a música arcaica tocando novamente, e sons de
aplausos. Alguém dançava. Eu não cheguei a dançar para meu Dono, isso era
lamentável. Então fiz um breve retrospecto em minha jornada, desde o dia em
que conheci AT, e percebo o quão mudei, e o quanto tenho cedido desde
então. Jamais aceitaria tais condições tempos atrás. Não sei se é a força do

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estimulo ou algo que fora despertado por dentro. Todos esses acontecimentos
são de certa forma, inexplicáveis.
Existia naquele Dom uma força de vontade que sobressaltava aos íntimos
segredos de seu coração. Levantando um pouco a cabeça, olhando através da
janela, eu via o jardim. Este se estendia em comprimento, fechado ao lado do
mar, por uma balaustrada de pedra gretada, em parte coberto por roseiras
pequeninas vermelho-púrpura e amarelo desmaiado.
Eu prefiro ainda acreditar na confiança, e não me lembrar dela apenas
quando algo se quebra, e você precisa aprender a sobreviver mediante a
sensação de ter fracassado em algum ponto de sua vida. Eu prefiro me
lembrar da confiança que nasce de algum ponto, justamente quando sua
esperança se vai ao leu. A confiança abstrata e invisível, que desperta de onde
morreu uma flor, ou no momento em que se perdeu uma asa… A confiança
que tudo dará certo, porque o propósito está intimamente ligado ao acaso,
mas o acaso jamais está ligado ao nada.

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Capítulo 8
Confidências de Arkadius
Ela dormia como um anjo loiro. Sempre fora assim, inteiramente alva, em
todas as vidas que teve. Os sivianos se esquecem de suas vidas anteriores,
todas as vezes que saem da Terra dos Mortos e voltam para as missões. Eu
jamais me esqueci, apesar de ser um siviano, sou um bárbaro. Não tenho
missões, só lembranças. Nunca morri e não envelheço. Sempre conservei a
mesma identidade. Era para ter ido para a Terra dos Mortos, porém, nunca
consegui morrer para zerar e começar de novo alguma existência numa quase
eternidade cíclica, como qualquer outro siviano.
Ela sempre fora morta brutalmente por conta de nossa disputa por sua
posse. Vendo-a assim, como um passarinho dormindo, sinto certo remorso
por tudo que já a fiz passar no meio de nós dois.
Siv decretou que na existência anterior, ela fosse morar na casa de pais
humanos, a fim de se proteger de nossas intenções, mas ele a encontrou.
Procurava a menina que tinha o sinal que havia em suas costas, mas ela não
sabe que este sinal que tem igual ao dele, é porque fora marcada pelas mãos
sujas de AT na vida antes de chegar ao Castelo. Não existe alma gêmea,
como ele pensa ser. Existe uma vida de poder, ele por ser nobre, eu, um
bárbaro que vive como andarilho com seu povo sem regras, mas possuo o
mesmo anseio de dominador correndo pelas veias.
Sim, eu quero o trono. Lutarei por ele. Preciso dar honra a meu povo.
Preciso dar dignidade a Charlote, para que ela se sinta bem ao meu lado.
Sempre a perdi para ele, devido ao seu poder como herdeiro do trono de Siv.
Não a matei porque quis… Eu o fiz da última vez, naquele Castelo, por não
suportar vê-la novamente nos braços dele. A certeza de que essa dor doeu

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mais em mim, fora a mesma que tive quando a perdi para esse canalha na
última vez que ela me fora tomada. Ele não se lembra ainda… Mas irá se
lembrar, assim que a missão acabar.
Os sentimentos escapuliram por alguma pequena fresta do engano.
Eu sabia que você te encontraria novamente. Eu quase poderia sentir suas
mãos em mim ao ver a imagem congelada de seu corpo numa tela fria da
imaginação. Eu ouvia a sua voz e desejava imensamente entrar pelo orifício
imaginário por onde emitia meus sons de anseios e volúpias que preenchiam
minhas noites pobres e vazias. Eu ria apenas para escutar meu riso. Eu me
sentia feliz e não sabia dizer se era uma cópia fiel do que esperava de mim
um dia, numa morna expectativa de ouvir passos chegando, tocando em meu
ombro, num abraço meu, possessivo, quase sufocante, apenas para te sentir
um pouco minha.
Sua voz me induzia ao que eu não poderia duvidar. As palavras
cuidadosas. A procura momentânea, que mesmo superficialmente, havia se
tornado o prato do dia. Eu tinha no meu corpo as sensações de uma droga
poderosa que se diluía no sangue, correndo para os vasos cerebrais a ponto de
não me deixar comer ou dormir, eu queria apenas a minha menina.
No desespero de ter o que não podia tocar, inventava situações que me
dessem a sensação de acorrentar suas pernas. Assim ficava horas e horas
ancorado à deriva do que era ter seu amor. Seu amor que não vinha, enquanto
eu precisava moldar o que ninguém conseguia entender em mim, e você
corria com medo de ser colocada num calabouço obscuro onde somente as
piores almas existentes em minha vida foram acorrentadas. Talvez eu não
soubesse amar ao ponto de me permitir a ser alguém mais simples. A minha
complexidade e fúria ávida por querer sentir e tocar tudo que lhe pertencia, o
mesmo dédalo que me tirava o sono e a fome era o motivo do fato evitado.
Os sonhos quase infantis, as ânsias que não foram contidas na absoluta
disciplina que transforma seres humanos em meros soldados de um amor não
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correspondido, foram dissolvidos no esquecimento, no tempo, na distância,


na insensatez, eu não era o que você esperava, e nem de perto fora alguém
que eu poderia associar aos personagens criados no brio do que considero
felicidade.
Ela se mexeu, e eu me recompus. Eu a cuidarei dessa vez… Ela é minha.
Eu a farei se lembrar disso.
− Que horas são? – perguntou ela, deixando seus cabelos caírem pelos
ombros, cobrindo a superfície de seus seios que eram marcados naquela
roupa moderna que usava.
− Hora de você se trocar. – eu disse, olhando-a como que hipnotizado por
seu conjunto. Ela é linda… Diante daquele rosto com tonalidades de marfim,
de traços endurecidos e de olhar que friamente pousavam sobre mim
enquanto uma frase de polidez caía dos lábios pálidos que se descerravam
com desprazer, ao que parecia.
− Me trocar? Como assim?
− Como as mulheres que aqui estão.
− Por que se vestem assim?
− Porque seus senhores querem assim.
− Elas são bárbaras como você?
− Não. São sivianas como você. São roubadas de seu povo mesquinho, que
querem sempre tudo do melhor. Não temos direito a nada, precisamos roubar,
massacrar para podermos desfrutar de algum prazer.
Durante um instante ela ficou silenciosa, torcendo inconscientemente suas
finas mãos. Depois, começou a falar em voz baixa, dolorosa. Sua alma enfim
se abria, deixando cair o pesado segredo dos próprios padecimentos.
− Por que não existem mulheres do seu povo?

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− Não podemos ter filhos. Essa é a única regra depois que perdemos a
última guerra. Com isso, a civilização foi diminuindo à medida que foram
morrendo as mulheres. Eu tive a sorte de me manter intacto até hoje, sem
morrer. Por isso lembro-me de tudo.
− É muito estranha a forma como diz sobre as coisas. Eu não acredito
nisso, parece mitologia.
− Com o tempo você irá se lembrar de tudo. Eu a ajudarei.
− Gostaria de não me vestir do mesmo modo como se vestem essas
mulheres. – disse ela, tentando se esquivar de minha ordem.
− Não perguntei o que deseja. Você não deseja nada, aqui quem deseja sou
eu. Você apenas obedece.
Ele abriu um dos armários antigos e expos aos meus olhos, a coleção de
roupas esquisitas que ali estavam.
− Eu gosto da vermelha.
Peguei a roupa indicada e passei a tirar a que ela estava, o que a fez se
intimidar, e eu insistir, retirando suas mãos que me impediam de fazer o que
eu quisesse com o que pertencia a mim.
− Uma submissa não pode ter dois donos. – ela disse tentando me
convencer de algo.
− Uma escrava tem somente um dono, e este sou eu. Você não é apenas
submissa, nunca fora, sempre me serviu, porém fora impedida de concluir o
que iniciou. Dessa vez, iremos até o final.
Sei que ela não entendia, mas obedecia aos poucos, como uma porta que ia
se abrindo sutilmente.
Após colocar nela, a roupa escolhida, peguei um dos colares mais valiosos
de minha coleção, e coloquei em seu pescoço.

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− Somente uma escrava usou este colar… Você. – eu disse, tentando


esconder a emoção. Eu me afastei, fui até minha maleta e trouxe de lá, algo
que a surpreendeu, o retrato que eu mesmo pintei da última vez que usou o
mesmo vestido com o colar. Seu sorriso de menina ainda era o mesmo… Os
olhos dela lacrimejaram como se seu coração pudesse se lembrar de
momentos que a mente não recordava.
− Nunca tivera outra escrava? – a voz dela estava embargada.
− Não. Minha missão é você. É por você que me mantenho vivo até hoje.
Só vou morrer tranquilo quando concluirmos nosso ciclo, juntos.
Ela me olhou com mais realidade, de certo modo, curiosa.
− Te esperei durante toda a eternidade. Sem herança e sem luxo; sem
muito a oferecer. Só tenho amor a dar, aquele que não se cansa de esperá-la. –
olhei-a fixamente, transmitindo tudo que sentia. Desejava beijá-la, mas iria
respeitar seu momento. Ela irá despertar, e nesse instante estarei lá para
segurar a sua mão.
A brisa daquele verão banhava de calor a fronte inclinada, Transudavam os
perfumes das vegetações adormecidas sob as árvores, cansadas do calor do
dia. O próprio mar parecia fatigado, preguiçoso, e seu ruído se fazia ouvir em
surdina. No quarto escuro, em que apenas penetrava o fraco reflexo do dia lá
fora, a menina estava imóvel, parecia um fantasma pálido.
Percebi que ela se esforçou para se lembrar de algo, mas tudo que
conseguiu foi perder os olhos numa imensidão tão vasta quanto o volume do
mar. Era impossível alcançá-la. Eu demorei muito para chegar ao seu mundo.
Ele a tocou por dentro, posso sentir em seus pensamentos e na forma como vê
tudo pela metade. Eu não sentia simplesmente como retirar o que ela sentia, e
fazê-la se lembrar do quanto nos amamos um dia.
− É muito bonita sua história, Senhor Arkadius, embora um pouco surreal
para meus sentidos tão limitados.
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− Não é somente minha história. Você faz parte dela, como peça principal.
− Desculpe… Eu não consigo me lembrar nem mesmo dos fatos desta
vida, muito menos dos de vidas anteriores… Aliás, nem sei se este fenômeno
realmente existe.
− Nos casamos um dia… Nas tradições do meu povo, mas ele a levou de
mim… E por este motivo, eu o matei na primeira, segunda, terceira, décima
vez…
Mostrei a ela, que pegou o retrato pintado de sua imagem vestida
lindamente de noiva. As mãos dela estavam trêmulas, assim como os lábios.
Percebi que ficou confusa. Tossiu, e se virou para outro lado, fugindo do meu
olhar. Creio que era momento de parar de falar. Levantei-me e coloquei em
sua coleira, a guia que continha mais de 100 metros de corrente.
− Eu volto mais tarde.
Ela não olhou para mim, continuou perplexa, olhando para o mar através
da janela. Com esforço, virou seu dorso e encontrou meus olhos, tive a
impressão que a moça iria revoltar-se contra tudo que ouvira. Compreendi
que ela se calava a mercê de um violento esforço, o qual momentaneamente
lhe transmudara a fisionomia. Sem uma palavra, voltou-se à janela. De perfil
ainda pude ver seu olhar perdido, e para todas as perguntas que gostaria de
fazer ao Universo, eu não tinha as respostas. Todas que poderia lhe dar, não
serviam.
***
Confidências de Charlote…
Todas as palavras de Dom Arkadius mexeram comigo como algo que se
revirava por dentro, mas em cada uma delas… Haviam os olhos de AT, que
me olhavam pelos cantos do quarto, no espaçamento entre uma frase ou
outra… No bombear do sangue em minhas veias, e no ar que continha em
meus pulmões. Precisava apenas saber como ele estava, e se me procurava…
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O que aconteceu que o impediu de vir me encontrar? A esperança de revê-lo


é algo que não me deixava em paz. Eu não o perderei enquanto acreditar que
um dia iremos nos reencontrar.
Toda essa história maluca que ouvi de Arkadius, só me fez acreditar em
algo, que a cada minuto que se passa, tenho meu Senhor, mais e mais em
minha vida. Se tudo for verdade, ele me encontrará. Talvez seja este o motivo
pelo qual devo me dedicar a viver, na certeza de que ele voltará…
Eu só preciso de alguém que me faça calar a boca sem que precise me
mandar fazer isso. Alguém que me obrigue a escutar, que me curasse de mim
mesma. Talvez eu precisasse sofrer para aprender que esperar é mais
importante do que morrer.
Debrucei-me na cama e enfiei meu rosto no travesseiro. Sentia-me
completamente perdida, carente. Eu só queria ter tido a oportunidade de lhe
dizer tudo que sentia. Eu sou dele. Sinto-me dele. Não sei me entregar a
outro. Não sei pensar em outro como meu Dono. Não sei ser de mais
ninguém, até o final dos meus dias.
Ninguém se cura de nada. A dor são poros que transpiram a saudade. Tudo
sobra em mim. Preciso encontrar o leito por onde escoar o meu excesso.
Excesso de sentir a falta dele.
− Volte logo, Dono de mim… Venha me tirar daqui… – disse baixinho
enquanto encolhia minhas pernas e ouvia meu coração bater.
Não espero que tudo termine sempre acabando. Só o fim permanece dentro
de um coração que cansou de si mesmo… De mim sem AT.
Não reconheço a mim mesma… Não saber o que quero é fácil, basta ousar
e descobrir… Nunca saberei quando acordarei um dia e pintarei meu cabelo,
minhas unhas, a identidade, da cor que desejar. Poderei correr nas ruas, andar
descalça, cometer uma loucura inusitada, aquela que um dia que jamais
ousei… Poderei roubar um beijo, um chocolate, quebrar estigmas, ou,
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simplesmente mandar alguém se ferrar, pelo simples fato de não saber


exatamente nada sobre mim mesma, mas é indispensável descobrir o que já
não desejo mais. Arkadius está mexendo com alguma coisa dentro de mim,
que eu preferia não despertar. Preciso que meu Dono chegue logo.
Não sei quanto tempo passou até que Arkadius retornasse ao quarto. Eu
estava do mesmo modo vegetativo, na mesma posição, olhando para a
parede.
Assim que se aproximou, tocou em meus cabelos, e com uma voz
apaziguadora, disse:
− Vamos! A apresentação já irá começar.
Eu não sentia vontade de nada. Na verdade, desejava morrer. Desaparecer
dali. Mas mesmo assim me sentei, e aos poucos, levantei-me. Ele trocou a
guia, colocando uma mais curta, e saímos do quarto.
Acreditei que a tal cerimônia fosse realizada ali mesmo no Clube, mas me
enganei, caminhávamos rumo à praia. A rua estava deserta, e no céu, uma lua
linda, grande, luminosa nos servia de guia.
O bando estava animado. Eu olhava para as mulheres submissas, e as
achava muito diferente das que já vi em minha vida. Eram alegres, quando
não estavam às gargalhadas quase irritantes, estavam cantando ou dançando.
Viviam sempre muito arrumadas, demasiadamente enfeitadas para meu gosto,
batom e blush muito vivos. Com um traço forte de lápis, seguido de um
esfumaçado de sombra escura, eram marcados os olhos. Os vestidos eram
longos e esvoaçantes, com cintura acentuada, deixando sempre os seios à
mostra num decote evasivo. Muitas pulseiras traziam nos braços. Anéis com
pedras preciosas eram ostentados nos dedos dos pés. O cheiro dos perfumes
era o mais perturbador, com notas de fundo entre a baunilha, âmbar, musk e
canela.
Mais alguns metros, chegamos ao local da apresentação da noite. Era na
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beira da praia a luz da lua e de uma fogueira. Os músicos já estavam no local,


e a mulheres arrumavam numa grande esteira, a comida que seria servida.
Sentei-me no tapete indicado por Arkadius, e aceitei o vinho servido. Fiquei
observando àquelas pessoas tão excêntricas, que faziam com que eu me
sentisse em outro mundo.
Mesmo vivendo como se estivessem há dois séculos atrás, eles
desfrutavam dos hábitos atuais, como a utilização de celulares. Cheguei a ver
até um computador dentro do Clube, embora não utilizassem de energia
elétrica durante a noite, ocasião em que realizam os rituais, mas certamente
faziam o uso durante o dia, para realizarem pesquisas e interagirem com
outras comunidades sadomasoquistas. Pelos menos, era isso que eu
imaginava.
Percebi quando passaram a tirar fotografias, me senti constrangida, não
queria sair em nenhuma, muito menos ao lado de Arkadius. Mas isso fora
quase inevitável. Com o passar dos minutos, passei a me incomodar menos,
com o efeito da bebida.
Os casais trocavam carinhos, o relacionamento deles era mais intenso e
passional que a costumeira D⁄s. Arkadius sorria, sentia-se feliz com minha
presença junto a ele e a seu povo. Quando a música passou a tocar, lembrava
a sonância de citara. Eles falavam num idioma que eu não conseguia entender
uma só palavra. Enfim, não havia dúvida alguma que não pertenciam a este
mundo, estavam ali por uma causa. E pelo que percebi, não era qualquer
pessoa que aceitavam junto deles.
As submissas passaram a dançar de um jeito muito envolvente e sensual.
Os dominadores bárbaros batiam palmas acompanhando o ritmo do
instrumento. Era envolvente. Por um instante eu me esqueci da tristeza que
abatia meu coração. Tomei mais alguns copos de vinho. Senti a lua rodar em
torno dos meus olhos, que encontraram os dele. Algo mais forte se apossou
de nós, e a atração por algo desconhecido aproximou nossos lábios, sem nos
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importarmos com os olhares, nos beijamos. Ouvi apenas um clique de alguém


tirando uma fotografia. Despertei de onde havia me deixado ser levada. Num
impulso, num desejo de liberdade e retirada do que sentia e estava dentro de
mim, passei a correr na areia. Arkadius vinha logo atrás, chamando pelo meu
nome. Eu não o ouvia mais após o segundo chamado. Apenas corria. Sentia
as ondas lamberem minhas pernas. Ouvia o vento soprar e a maresia
umedecer meu rosto. Uma onda mais forte me levou. Fui naufragada sem
tempo, sem presente e sem passado. Desejava morrer. A água entrava pela
boca e nariz. Neste momento eu não pertencia. Charlote de ninguém.
Senti mãos tocarem em minha roupa e me puxarem. Sua força me arrastava
para fora da água enquanto eu me debatia e implorava pela morte. Arkadius
me jogou sobre seus ombros enquanto andava na areia. Embriagada pelo
vinho e pelos desejos insanos, não sentia mais nada a minha volta. Apenas
ouvi quando ele chegou ao Clube e fechou a porta do quarto, me colocando
sobre a cama. Eu não via seus olhos, mas os sentia. Eles ardiam. Queimavam
a minha pele.
− Por que fez isso? – sua voz era de dor.
Eu não sabia mais falar. Havia engolido as palavras e seus significados.
Senti quando ele se aproximou de meu rosto, e pôs a mão perto do meu nariz
no afã de sentir minha respiração. Então eu o agarrei pelo pescoço num tom
de misericórdia. Queria de algum modo entrar na pele de alguém. Sentir além
do que representava a minha própria e única dor.
− Pare com isso, Charlote! – disse ele, me retirando de seu pescoço. –
Você não está em si, não lhe darei o que deseja… Não sou o tipo de
dominador que se aproveita de situações, para realizar seus desejos egoístas.
Se, tiver que ser, será por amor. Jamais por vaidade.
− Aragorne… Senhor… – eu disse, sem ao certo saber o que dizia.
Num misto de ira e cuidado, Arkadius me retirou da cama e me levou aos

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trancos e barrancos para a banheira. Pôs-me de roupa e tudo debaixo da água,


que enchia aos poucos a bacia.
− O amor entorpece… – eu dizia enquanto minhas mãos buscavam o rosto
dele. Naquele momento não pude dizer a mim mesma que não sentia nem um
tipo de atração física por ele; que não o achava bonito, talvez o homem mais
bonito já visto até aqui. Mas era somente uma admiração, nada mais…
Trocou-me e colocou-me de volta na cama. Deitamos juntos, fato que não
me incomodou. A única coisa que eu queria era ouvir a voz de meu Senhor.
Nada mais me importava.
Passei a chorar compulsivamente, Dom Arkadius abraçou-me fortemente,
retirando meus cabelos do rosto.
− Sir, me liberte… Me leve de volta para meu Dono? – pedi. Eu
conservava ainda nos lábios o vinco amargo que me reproduzira essa
reflexão.
− Se eu fizer isso, menina, estarei abrindo mão de algo que esperei a vida
toda…
− Mas meu coração pertence a ele, não tenho outro Dono, Sir, por
clemência… – disse eu, aparentemente impassível. Mas o coração batia-lhe
precipitadamente.
− Você se lembrará de tudo, saberá o quanto nos amamos e fomos felizes
juntos, até… Até ele surgir e levá-la de mim.
− Sir, por misericórdia, entenda… Eu o pertenço. Ele surgiu a fim de
reaver o que é dele. Farei qualquer coisa que pedir, se me levar de volta para
meu Senhor. Meu mundo é pequeno sem ele. Tudo que me contou são fontes
de coragem e admirável sentimento, porém o coração não responde à
tamanha beleza, quando dentro dele há apenas um lugar.
Arkadius ficou em silêncio. Assim permaneceu até eu adormecer. Eu não

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serei mais aquela que se sujeitava passivamente ao seu despotismo bárbaro.


Jamais me tornarei sua submissa.
***
Confidências de AT:
Marquei um encontro com a mucama que fora nos servir no restaurante.
Mandei a passagem para que chegasse aqui, e me telefonasse assim que
desembarcasse. Algo nela ainda me intrigava.
Quando a vi, ela se ajoelhou no meio das pessoas no aeroporto, o que me
deixou constrangido, somente uma slave faria isso. E ela não era minha. Eu
não tinha informação se a menina era uma submissa. Até instantes atrás,
tratava-se apenas de uma simples serviçal que fora contratada para o feitio de
um serviço isolado, e que me deixou curioso com o modo como me olhou.
Sentamos um de frente ao outro, então vi seus grandes olhos escuros quase
sorrindo para mim. Eu a reconhecia de algum lugar. Mas não sabia de onde.
− Meu Senhor… – ela disse, e me causou espanto.
− Por que diz isso? Não nos conhecemos… – insisti.
− Sou Seren, Sir… Sei que não pode se lembrar de mim no momento, mas
eu jamais o esqueci.
− Seren… – repeti várias vezes seu nome na esperança de me recordar de
algo, mas não consegui. Embora nada nela me fosse estranho.
− Eu vim para ajudá-lo, Sir. Não tenha dúvidas, sou sua, sempre serei.
Estava apenas esperando pelo seu chamado, assim como fora dito para mim,
que o seria.
Mesmo sem entender, senti o desejo intrínseco de abraçá-la, e assim o fiz.
− Não sei por que veio, e quem é você, mas ainda bem que está aqui. – eu
disse, beijando sua testa.

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Fiquei olhando-a por um instante, e veio na memória a imagem de um


castelo, os móveis… O piso. O cheiro… De repente sumiu tudo novamente,
assim como surgira.
− Quero ir para sua casa, Sir, ficar onde se encontra hoje. – ela disse com
uma voz meiga.
− Sim, pequena, é bem-vinda em minha vida. – eu respondi, levando-a
para meu lar.
Ao chegarmos a minha casa, encontro Antonele nos esperando.
− Mais uma menina? – disse antes de se ajoelhar para me cumprimentar, o
que me irritou profundamente.
− Quem lhe deu a ousadia de se referir desta maneira a mim?
− Perdão Senhor.
Senti Seren se encolhendo entre meus braços, e a direcionei até a escada.
− Sir, com sua licença… Tenho algo a lhe mostrar. – disse Antonele.
Ela caminhou até a sala onde funcionava meu escritório em casa. Seguia-a,
estranhando. Ao ligar o computador, acessou o Facebook e entrou num grupo
com o nome de Masmorra do Prazer. Algo fez com que meu coração
disparasse antes mesmo de olhar o que ela tinha a me mostrar. Pressenti que
sentiria a dor de todas as chibatadas que um dia já dei em alguém. Quando
meus olhos pousaram sobre a imagem apontada, algo explodiu por dentro.
Charlote estava sentada numa praia, parecia participar de uma cerimônia, ao
lado de um dominador.
− Arkadius, Sir, o nome dele. – disse Antonele de pronto.
Eu não podia acreditar que Charlote pudesse me trair dessa forma. Não, ela
não o faria. Não havia motivos, estávamos iniciando uma relação… Não
tínhamos vivido nada do que prometemos um ao outro. Como pôde fazer isso

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comigo?
− Onde é esse lugar, menina? – minha voz estava embargada, quase
falhando. Gostaria de acreditar que tudo não passava de uma farsa. Não iria
sucumbir na frente de minhas submissas, mas meu coração me entregava. A
respiração falhava. O ódio fulminante tomou-me de assalto.
− Fortaleza Senhor, mas creio que não iria adiantar o Sir ir até lá, não vale
à pena. Ela está com outro Dono… – senti prazer na voz de Antonele, mas
nada naquele momento me causava mais repúdio do que a imagem à frente
dos meus olhos.
− Cale-se! Não fiz pergunta alguma a você, além do lugar de onde foi
tirada essa foto. – não queria descontar nela, mas minha ira estava crescente.
− Sim Senhor.
− Impossível acreditar que ela fez isso comigo…
Olhei com mais calma, o texto da postagem:
“Temos a honra de convidar a todos, para o encoleiramento da submissa
Charlote ao domínio e cuidados do Senhor Arkadius. A cerimônia se
realizará no Clube Libertine, em Fortaleza, no sábado, às vinte e uma horas.”
Não tinha como não acreditar, era aparente a tranquilidade no rosto dela.
Entregou-se a outro sem ao menos romper comigo; usando minha coleira.
Nas mãos dela, um copo de vinho, celebrava o evento, divertia-se ao lado do
traidor da classe dominante, ladrão de propriedade. O braço dele corria ao
longo da cintura de minha menina, e o meu sangue fervia como veneno nas
veias. Meu desejo era de matá-los. Torturá-los até à morte. A foto seguinte,
um beijo. Os olhos dela, fechados.
Toquei minha fonte e respirei profundamente tentando manter meu
equilíbrio, mas tudo se tornou muito difícil naquele momento. Dei um murro
na escrivaninha. Desejava gritar, espantar os demônios que havia em mim.

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Seren me abraçou forte e passou um senso de lealdade capaz de me trazer de


volta para um lugar que não me lembro de ter feito parte.
− Estou aqui com o Senhor, e é para este momento que vim… Nada irá lhe
impedir de cumprir sua prova. – ela disse com toda certeza do mundo no
olhar. Não entendi absolutamente nada, mas me deixou tão mais calmo, que
decidi acolher. – O Senhor é meu Rei, dou minha vida em troca da sua.
Fiquei por uns minutos pensando sobre suas palavras. Não faziam sentido,
mas nada poderia justificar a paz que ela acabara de trazer ao meu coração,
que ainda ardia. Mesmo sem entender, eu a abracei. O melhor a se fazer era
me deitar. Deixar o tempo passar pausadamente em meu ser. Apagar as boas
lembranças… Eu a tiraria de mim e de minha vida…
Assim que entramos no quarto, Seren se despiu. Seu corpo era algo que
estava guardado em minha mente de forma secreta… Nada nela era estranho
para mim. Deitou-se aos meus pés, e abraçou-os como se fossem seu
travesseiro. Fiquei imóvel, sentindo a dor penetrar por dentro e apertar. Eu
era o meu próprio refém naqueles longos instantes.
Outro irá tocá-la… Eu não aceito… Charlote é minha… Não aceito perdê-
la.
− Usa-me, meu Senhor. Dono de minha alma. Despeje sua ira e revolta em
meu corpo. Cura-se de mal que lhe arrebate. – disse ela com o chicote em
mãos.
Tomei-o, e a deitei do meu lado. Não seria justo fazê-la pagar por algo que
não tem ligação alguma com ela. Cada palavra dita por seus lábios lânguidos,
para mim soava como uma surpresa. Tão nova, tão bela e cheia de vida. Tão
certa do que quer.
Fiquei a observando em silêncio respeitoso a minha dor. Sabia que naquele
momento o melhor a se fazer era esperar minha dor passar. Sabia esperar. Ela
realmente era uma submissa.
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***
Confidências de Charlote…
Acordei cedo, ele estava na janela olhando para o mar. Sentei-me na cama,
e minha cabeça ficou zonza. Estava de ressaca. Mal conseguia me lembrar do
que havia acontecido na noite anterior, mas minha intuição me dizia que algo
estava acontecendo sem que eu soubesse.
− Quero que relaxe, hoje. Logo mais à noite, teremos uma cerimônia a
participar.
− Não estou muito bem, creio que bebi ontem, demasiadamente… Pouco
consigo me lembrar do que ocorrera.
− Tudo bem. Descanse… Trarei seu almoço no quarto.
A tarde passou com ares de tristeza. Não sei dizer, mas havia um anjo triste
ancorado em mim. Ao anoitecer, Arkadius voltou ao quarto com um vestido
em mãos.
− Precisa de ajuda para se arrumar? – quis saber enquanto ainda segurava a
roupa em suas mãos e uma coroa de flores de colocar na cabeça.
− Sir, perdão… Eu prefiro não ir…
− Não poderá faltar a sua cerimônia de encoleiramento.
Dos meus olhos desceram apenas duas lágrimas grossas e quentes. Fiquei
parada tentando imaginar se demoraria muito tempo para eu morrer.
Ele deixou a roupa em cima da cama e me olhou sem ter muito o que dizer.
− Não se atrase. Volto faltando trinta minutos para às vinte e uma horas. –
dito isso, saiu, deixando-me prostrada no chão. Deixei que meu corpo caísse
e busquei um retiro alto onde pudesse me abrigar.
Às vinte horas entro no salão cerimonial do Clube, vestida de um longo
caramelo quase dourado, todo bordado à mão por pérolas, com lágrimas
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correndo a face. Arkadius me instrui para que me ajoelhasse numa almofada


a sua frente. Assim o fiz.
Embora meu corpo estivesse presente, minha alma havia se abrigado em
algum confim longe de tudo que estava acontecendo ali. Sei que estavam
falando coisas bonitas, e que havia sorrisos nos rostos de quem ali estava,
mas eu nada via ou ouvia. Nem mesmo ouvi quando a porta do salão se abriu
de forma inesperada, e ele entrou, fazendo com que meus olhos buscassem
sua imagem marcante, e eu voltasse aos poucos… Minha redenção.
AT ficou parado no meio do salão, até mesmo o orador da cerimônia parou
de falar naquele momento. Seu rosto se repuxava pelos nervos a flor da pele.
Os olhos brilhavam como se pudessem ferir. Houve um silêncio profundo…
Até ele tomar a palavra e dizer em alto em bom som.
− Como ninguém me avisou sobre o novo encoleiramento, eu vim
pessoalmente devolver a coroa de Charlote, que embora estivesse em meu
poder, pertence a ela… Acredito que seja o mais digno a ser feito, depois de
tanta… Patifaria. – ele parecia cuspir fogo. Eu queria entender o motivo pelo
qual estava irado.
Assim que me levantei de onde estava, senti a mão pesada de Arkadius
pressionar meu ombro, fazendo-me ajoelhar novamente.
− Seja bem-vindo, caro amigo… – disse Arkadius ironicamente.
− Amigo? Essa foi a expressão mais falsa e ridícula ouvida por mim, desde
que…
Ele iria dizer algo, mas preferiu se calar. Olhou para mim, abaixou-se e
jogou a coleira de forma arrastada pelo chão até onde me encontrava. Senti
um aperto profundo no peito. Mexi o braço a fim de pegá-la, mas Arkadius
pisou em minha mão, impedindo-me de fazê-lo.
− O nobre poderá assistir a cerimônia, e se pronunciar após esta terminar. –
disse Arkadius tentando manter um equilíbrio que não estava evidente em
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seus olhos.
− Antes, preciso dizer algumas palavras… Foi por amor a esta criança!
Esta criança, que eu imaginava tão doce, tão submissa… Dei tudo quanto fui,
o mais belo de minha vida… Mas este tempo que perdi há de me servir para
alguma coisa…
Senti desejo de gritar. Desejo de correr até seus braços e dizer que não tive
culpa. Mas não houve tempo, suas costas se viraram e novamente o silêncio
se deu, trevas também.
Arkadius se posicionou no centro do salão, e num tom de desalento,
proferiu:
− Está encerrada a cerimônia. Não haverá encoleiramento.
De sorte que ali se achava a verdadeira Charlote, que caminhava toda
fremente, resoluta e ardente, pronta para a luta. Estava finda a obediência
passiva, findo o cativeiro de sua alma. Fui para meu quarto, sem esperar por
mais nada de qualquer outra situação que viesse a seguir. Arkadius
aproximou-se olhando insistentemente para meus olhos. Juro que senti medo.
− Você está tão bonita… – cheirou meu cabelo. – Que cheiro gostoso vem
dos seus cabelos… Eu pensei sobre o que ocorreu… – disse ele numa voz
embaraçada. Quer tanto dar-lhe um pouco de felicidade, fazê-la sabr o que
possa ser uma afeição forte, vigilante e terna, tal como fora um dia.
As macilentas faces, demasiado brancas, ligeiramente se tingiram. Não
conseguia me lembrar direito do que ocorrera para chegar a alguma
conclusão do que ele dizia.
− Poderia ser mais claro, Senhor. – pedi.
− Escute, Charlote, essa decisão foi muito difícil de ser tomada, mas não
posso transformar seus sentimentos por mim. Você não se sente minha…
Certamente sempre fora assim… Não há como modificar, eu já tentei… Sem

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me sentir seu Dono, não existirá nunca sua entrega, e foi por este motivo
sempre a perdi para Tirel. Você está certa… Uma submissa pertence àquele a
quem se entregou. A quem deixou que sua alma fosse levada, sem jamais ser
devolvida.
Percebi o quanto estava difícil de ele continuar aquela conversa, e mais do
que isso, admitir para si, como dominador, que não conseguiu a minha
entrega.
− Irei levá-la de volta para Aragorne, mas farei uma proposta. Sua
devolução depende apenas e unicamente da resposta dele quanto à minha
reinvindicação. Caso, não aceite, não poderei fazer nada, trarei você de volta,
e terá de aprender a me ter como seu Dono.
O que ouvi me deixou angustiada. O resultado poderia ser minha redenção
ou desgraça eterna. Sem dizer que não sei o motivo pelo qual, meu Senhor
não veio ao meu encontro e me condenava de ser a culpada de tudo de estar
ali. A frustração agora se tornou o receio de encarar a realidade frente a
frente.
Arkadius retirou a coleira de meu pescoço e saiu do quarto. Deixou-me
com meus pensamentos. O gelado envoltório que me cobria a alma, pouco a
pouco se dissipou. Começou a surgir um sol claro que lentamente aqueceu
aquela pobre alma transida, semimorta que se encontrava em meu ser.
Tenho sentido que fracassei. Fracassei em ser dele. Não reconheço meu
lugar de submissa quando me vejo gritando por sua falta. Não reconheço meu
lugar de posse quando venho chorando sua ausência. Sinto-me fracassar a
cada dia que tenho a sensação de sufoco. Tenho suportado minuto por
minuto, quando uma hora é muito tempo. Um dia, nem se fala… Só por hoje
resisti…
Tenho me cobrado ser para ele o que ele deseja, mesmo não estando aqui.
Não me prometeu nada, o meu lugar sou eu quem deve reconhecer. Escuro é

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onde me coloquei. Sinto-me só, em um mundo só meu. Eu me culpo, eu me


cobro, eu me julgo, eu me puno.
Sensação de fracasso me define, por ser ele o meu tudo, fracassei em não
compreender que não sou nada. Sou apenas o seu brinquedo esquecido na
caixinha é o meu lugar. Não tenho o direito de nada, nem de desistir de
acreditar ou de contar o tempo que ele gastará para vir me buscar. Não tenho
o direito nem mesmo de me sentir apaixonada, se ele não estiver aqui… Meu
Senhor me cegou, e eu consenti.
Olhei pela janela e vi o mar revolto… Seguindo, com os olhos, a água que
espumava embaixo do promontório, eu pensava: “Se eu me atirasse ali…
estaria acabado…” Que força ardilosa e anônima me obstou o gesto? Um
pouco mais tarde, sem dúvida, não teria resistido à sombria atração daquela
morte, que poria fim a uma existência gelada, infinitamente miserável. Já
estava tardando a acontecer. Acabaria por fim, a angustia de Arkadius, e o
pesar de AT.
O céu cada vez mais se tornava ameaçador e já se ouviam os ribombos do
trovão. Dobrei meus joelhos no chão, postei a cabeça no chão, e em frases
repetitivas, meu subjuguei. Não satisfeita, precisava me punir de um modo
que minha carne pudesse sentir, não apenas a alma. Peguei a guia de
Arkadius, e passei a me autofragelar com batidas nas costas.
Nem ouvi a porta se abrir, Arkadius segurou meu pulso, e retirou de
minhas mãos, a guia.
− Nunca mais faça isso! – disse seriamente. Trouxe-me no colo para a
cama, e adormeci lavando o rosto por algo que não conseguia dar nome.
***
Confidências de Arkadius…
Não fora fácil abrir mão de Charlote, era minha última chance de tê-la ao
meu lado. Sinto que cheguei ao final da linha, e que virá uma prova muito
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difícil diante do meu fracasso como dominador.


Eu a olhava dormir enquanto pensava na melhor solução. A cada vez que
se mexia, chamava-o pelo nome. Seria torturante ter que prendê-la a mim,
assistindo seu amor e devoção a ele. A cada vez que ela voltou à vida, seu
sentimento regressava ainda mais forte por Tirel. Eu teria chances, se fosse
antes… Mas após tantas vidas, sua entrega e espera por ele, só aumentou.
Senti muito desejo por seu corpo, vontade de tomá-la e marcá-la. Por
honra, não o faria, sabendo o que sei hoje. Ela não me pertence… Ela tem
razão… Ela se sente dele. Não seria condigno, tocá-la. Estarei entregando nas
mãos de outro, meu maior tesouro, a razão de minha existência durante
séculos. Farei por amor. Farei por ela, como sempre fiz em toda a minha vida
e dedicação, mesmo em sua ausência.
O amor muitas vezes fere, mas é necessário para nos tornar melhores. Eu
não sei até que ponto poderia ser melhor sem sentir o que hoje trago por
dentro. Ela passou, mas para mim era como se estivesse aqui todos os dias.
Jamais aceitei a hipótese de perdê-la para outro dominador. Os deuses sabem
como foi difícil admitir a derrota. Aquele coração, em extremo apaixonado
por um único objeto que em certo dia lhe faltara, fechou-se e gelou. Aquele
espírito cedeu a uma aberração que, desgraçadamente, resultou na
infelicidade de uma inocente perda. Perda por amor.
Íamos partir hoje. Não ficaria mais um dia com esta espada cravada no
peito. À noite estaríamos diante de meu rival. Entregaria o que lhe pertence, e
o proporia a justiça para meu povo. Eu não tenho mais nada. Tudo perdi.
Assim que escureceu, no pé da noite, cumpri minha promessa. Tristemente
a ajudei a arrumar sua mala. Um bárbaro não choraria por ver uma slave sair
de sua vida. Eu não choraria se ela não fosse para mim, o que é. Deixei que
algumas lágrimas caíssem discretamente enquanto dobrava sua última peça
de roupa, entregaria a propriedade de Aragorne Tirel com zelo, pois os
últimos momentos ao seu lado, ainda assim são importantes e únicos para
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mim.
Toquei sem querer em uma de suas mãos, ela me olhou pela primeira vez
sem raiva.
− Jamais a esquecerei. – eu disse. Ela balançou a cabeça aceitando minhas
palavras. Em seguida, me abraçou ternamente. – Eu poderia morrer por você,
se me pedisse para salvar sua vida. – eu disse como se meu coração estivesse
ajoelhado. Eram minhas últimas confissões a ela, neste momento não me
importava mais minha posição dominante, aquele que não podia sucumbir à
dor, porque existem dores que também sentiria mesmo se fosse o mais cruel
dos sádicos.
− Vai passar, Sir, encontrará uma submissa digna de seu respeito e
dedicação.
Balancei a cabeça em negação… Ela não conseguia entender que eu jamais
submeteria alguém por simples e tão puro prazer de domar. Nasci dominador
para ela.
− Não… Charlote… Eu acreditei na promessa que lhe fiz, em nossa
primeira cerimônia de encoleiramento, que jamais teria outra slave, e para
você, meu coração estava era entregue para toda a eternidade. Lembro-me de
seus olhos brilhantes, sempre foram azuis… A mesma feição… – toquei seu
rosto, que ficou rubro no mesmo instante. – Lembro-me de nosso pacto de
sangue na cerimônia das rosas… Vestia algo parecido com vestido de noivas.
Estava radiante e feliz… Mas em seguida… Semanas depois, durante um
passeio, vocês se conheceram. Depois se encontraram algumas vezes, por
ironia do destino, creio eu. Em seguida, ele veio ao seu encalço, como se
fosse lícito levá-la, apenas por ser eu um bárbaro, em seu julgamento,
desmerecedor de tamanha joia. A partir daí, fora raptada e levada para o
castelo de Siv. Em todas as vidas seguintes, disputávamos sua coleira.
Ela ficou me olhando como se pudesse lembrar-se de algo, mas não

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poderia… Eu tinha certeza disso. Suas mãos suaves tocaram em meus


cabelos, soltando-os. Tocou em algumas mechas. Acariciou meu rosto e
beijou-me a testa.
− Agradeço por todo amor que tem me dedicado durante todos esses anos.
− Você consegue sentir isso?
Ela apenas balançou a cabeça como resposta afirmativa. Fiz uma pausa,
desviando um pouco o seu olhar daqueles olhos tão lindamente azuis, em que
se descortinava uma vida estremecente, um ardente desafio. Os lábios
continuavam a tremer. Mas ela rematou com o mesmo e implacável tom de
voz:
− Sim, Senhor Akadius.
***
Confidências de AT…
Acordei sentindo-me atropelado pelo medo de fraquejar em todas as áreas
da minha vida. Não me lembro de ter sentido o desejo de desistir de fazer
aquilo que mais gosto, que é dominar, mas hoje me bateu forte esta sensação,
um sentimento reincidente. Embora não me lembrasse do passado.
Após chegar de Fortaleza, ´passei o dia no Clube, andando de um lado para
o outro, inquieto e triste, não tinha disposição para trabalhar. O desejo era de
buscá-la e tirar o seu couro no laço, deixando-a sem comer ou beber água
durante um dia e meio. Mas não o faria, seria rebaixar demasiadamente um
orgulho que já se encontrava ferido. Meus sentimentos por ela estavam
confusos. Charlote era meu céu e meu inferno. Trouxe-me luz e me jogou na
escuridão.
Ao anoitecer, vendo os adeptos chegarem ao Clube, não consegui falar
com ninguém. Cumprimentava num simples gesto com a cabeça, era só o que
conseguia. Algo precisava ser feito, antes que decidisse colocar à venda o

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estabelecimento e abandonar meu canil.


Fui para casa em busca de consolo, nos braços de minhas meninas.
Eram mais ou menos seis horas da noite, quando cheguei à minha
masmorra. Já sabia que as meninas me esperavam, eu podia sentir isso sem
ao menos trocar uma palavra. Ao entrar, tirei minha cartola e casaco, e
caminhei até onde estavam me aguardando. Antes de sair, deixei ordens para
que Antonele fizesse companhia a Seren, e não saíssem da masmorra até eu
voltar. Não havia como explicar, mas a pequena se fez instantaneamente
presente em minha vida, como uma peça rara, subitamente minha.
Escutei-as conversando de longe. Elas falavam de como estavam ansiosas,
entrei, imaginando Charlote entre elas, sorrindo, linda minha… Não consigo
admitir que ela não fazia mais parte de minha vida. Estava obcecado.
Transtornado.
− Boa noite, meninas.
Elas responderam juntas:
− Boa noite, Senhor.
Percebi em seus rostos, a alegria em me ver. Logo após se calaram e
ajoelharam fazendo reverência de cabeça baixa e mãos à vista, sentadas sobre
as pernas, vestindo apenas minúsculas calcinhas.
Ao som das Valquírias de Wagner, chamei primeiro a doce Seren, pela
qual nutri, desde que chegou, um apego nostálgico.
− Venha cá.
Ela então veio gatinhando com uma boa menina. Beijou meus sapatos e
minhas mãos, e disse:
− Meu Senhor, dê-me a honra de servi-lo como teu brinquedo, faça de mim
seu objeto de prazer.

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Seren era muito nova, tão meiga, mas com um jeito saliente, parecia saber
exatamente como eu gostaria que agisse.
Com a corda em minhas mãos, comecei o bondage. Amarrei seus braços
juntos em suas costas, sentei-a num sofá, ergui e coloquei suas pernas para
trás com um separador de joelhos feito por mim, de modo que suas coxas
ficassem bem abertas. Logo passei a massagear seu clitóris, ela se contorcia e
revirava os lindos olhos, mas não era o bastante, então peguei o vibrador e o
ajustei na velocidade máxima. Comecei a forçar seu orgasmo, e em poucos
minutos vi a explosão do gozo que de suas entranhas jorrava. Em cada
momento do apogeu, ela chorava de prazer. Forcei o prazer por mais seis
vezes, e mesmo ofegante, ela agradecia por cada vez que chegava ao topo do
regalo.
Peguei meu flogger e dei cinquenta chibatas em sua vulva, para que
cessasse seu prazer, parei por alguns instantes até sua respiração voltar ao
normal.
Chamei Antonelli, que veio rápido ao encontro das mãos de seu Dono.
− Aproxima-se, minha first slave.
Ela sorriu, eu gostava de expressar meu sadismo fazendo todo o tipo de
tortura psicológica e física. Com Antonele não havia tanto mimo, apesar de
amá-la simplesmente pelo prazer que as torturas a ela aplicadas me
proporcionavam. Agarrei-a pelo pescoço e logo pus a mão entre suas pernas,
já estava completamente molhada. Coloquei uma, duas, três e depois os
quatro dedos dentro dela, em movimentos rápidos e com força, mas não lhe
fora dada a ordem para gozar. Retirei os dedos e os coloquei no céu de sua
boca, ela chupou bem devagar sentindo o gosto de seu sexo que ainda
latejava.
Peguei as cordas, amarrei suas mãos e lacei na viga de madeira no teto do
quarto. Com meu chicote de couro cru, comecei a esquentar sua pele com

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leves chibatas, ela não sentia quase nada, e então fui aumentando a força no
braço gradativamente, e as marcas logo foram aparecendo em seu corpo. A
cada chibata, um número ela contava, que no total foram cento e cinquenta,
distribuídos nas nádegas, costas, pernas, barriga e seios. Ela era uma boa
masoquista e nunca me desapontou na prática, sempre supria meus desejos
mais sádicos e tinha prazer em cada marca feita em seu corpo.
Conduzi Seren até o quarto e a deitei em uma mesa grande de madeira.
Coloquei a menina em forma de X com algemas nos braços e nas pernas bem
abertas, e me preparei para começar uma sessão com velas (waxplay). Passei
óleo em sua pele antes de principiar. Sempre usei velas de cera de abelha, por
ser muito quente, mesmo se pingadas de longe, mas a menina aguentava
fortemente, apesar dos olhos lacrimejantes. Lentamente eu pingava a cera,
vendo cada expressão do seu rosto. Ela parecia saber que eu adorava vê-la
assim, com o corpo todo coberto por desejos que somente o sadismo poderia
decifrá-los. E em toda parte, o rosto de Charlote me perseguia, já não sabia
mais se era paixão ou loucura, sua imagem me acossava, até quando tentava
esquecê-la.
Fiz questão de pingar cera quente em sua vulva e nos mamilos. Mandei-a
se virar, e fiz o mesmo processo em suas costas e no ânus. Depois ordenei
que ficasse de pé, olhando para cima com a vela na boca até que eu a tirasse
daquela posição.
Novamente voltei para Antonelli, abri uma gaveta e peguei álcool e
agulhas. Aprecio uma sessão com tais práticas (needle play) – agulhas e um
pouco de sangue - união perfeita em dias como este, em que a alma de um
dominador sádico, grita e ecoa pelos cantos do mundo. Eu precisava escoar
em algum lugar.
Comecei pelos seios lindos e grandes, primeiro amarrei e coloquei agulhas
ao redor e fiz uma cruz, perfurando o mamilo. Depois, uma linha em espiral
em suas costas, com ajuda de uma fita, fiz um desenho que logo se desfez,
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quando puxei a fita arrancando todas as agulhas de seu corpo, gesto este que
minou pequenas gotas de sangue. Ela agradeceu pelo prazer que estava
sentindo, dizendo:
− Obrigada, meu Senhor, eu amo lhe servir. - sua voz estava trépida, vi seu
corpo tremelicar, e notei que estava tendo um orgasmo. Para terminar,
apliquei spray de pimenta nos pequenos furos onde estava saindo sangue, e
pressionei com as mãos, era linda a expressão de choro que ela fazia, me
dava ainda mais tesão em dias como este. Não sabia a dimensão de sua dor,
mas a minha era latente.
Já se passavam quase três horas, então coloquei as duas meninas lado a
lado, ambas amarradas com as mãos para o alto. Uma sequência de
chibatadas era dividida entre as duas, aproveitei para testar meu novo
brinquedo, um chicote feito de fios de aço de cinco mm, o resultado foi muito
satisfatório, marcas lindas, bem definidas e com nível médio de dor.
Agora com os corpos quentes e suados, decidi estreitar mais os laços entre
elas, ordenei que ficassem em posição 69, uma sobre a outra. Feito isso,
peguei o vibrador e coloquei na vulva de Seren enquanto ela tocava Antonele
com os lábios, vigorosamente, porém não permiti que minha first slave
gozasse. Era difícil para ela ver Seren explodindo de tesão enquanto não tinha
permissão para gozar, mas cumpria minha ordem, se não o fizesse, iria ter de
suportar severas torturas nos seios para pagar pela desobediência, ou até
mesmo, ficar sem falar comigo por um tempo determinado, o que para
qualquer slave é um castigo muito doloroso.
Sentei-me diante das duas, fiquei olhando Antonela se deliciar com o gozo
de Seren, ela também tinha atração por meninas, adorava quando eu a
mandava fazer sexo oral em outra submissa enquanto olhava para mim, com
cara de puta. Dizia-se a menina mais feliz do mundo.
Logo escutei:

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– Meu Senhor, por favor, permita-me gozar?! - Antonele implorava por


minha permissão. Aproximei-me dela e puxei seus cabelos, coloquei meu pau
todo dentro de sua boca até a garganta e estoquei com força. Foi o bastante
para ela esguichar no rosto de Seren, que lambeu cada centímetro de sua
vulva embebida.
Vendo as duas exaustas de tanto regozijo, também me permiti o mesmo,
ordenei-as em posição de instrução, e comecei a entrar na boca de Seren até
expelir sem precaução, para saciar a sede de ambas. Dei um pouco à pequena,
e a outra metade, a Antonele, que não se conteve e começou a sugar a língua
de Seren. Juntas, quase iniciaram uma nova cena, se eu não as mandasse
parar.
Depois de ter dado banho nas meninas, coloquei cada uma em seu quarto.
Seren dormia em uma cela que havia mandado fazer para aprisionar Charlote.
Seria uma das surpresas que a faria, nem deu tempo de inaugurar. Novamente
um misto de ressentimento me atormentou. Era um quarto ao lado do meu,
sem parede frontal, apenas continha grades de ferro.
Já Antonele dormia em uma pequena cela ao lado de minha cama, também
feita para Charlote, que jamais experimentará o brinquedo. Ingrata.
Era meia-noite em ponto, tomei algumas doses de vodca e fumei meu
charuto enquanto examinava mentalmente a postura das meninas durante a
sessão, parece que me saí bem como dominador, porém a obsessão ainda me
consumia. Eu precisava mostrar a mim mesmo, que ainda posso exercer o
meu domínio, mesmo estando ferido. Necessitava de momentos assim para
voltar às minhas origens, embora ainda me encontrasse como uma fera ferida.
Elas eram um sonho de consumo, por isso fico em alerta em relação aos
outros dominadores do Clube. Já não bastava alguém ter levado Charlote,
talvez este era o maior trauma de minha vida. Seren acabara de chegar, sabe-
se lá, qual o sentido de tudo que me fala, mas até o momento tem me
mostrado lealdade, o que me apetece de forma rica e espontânea neste
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momento onde a dor e o desespero assolam de forma plausível um coração


rude, mas que ama com sinceridade. Ninguém irá tirá-las de mim.

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O Reencontro Decisivo

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Epílogo
Já era madrugada...
As luzes da mansão de AT estavam acesas. Ele parecia prever que algo
poderia ocorrer de forma tão marcante, que mal conseguiu pregar os olhos.
Desejou dar uma volta de antes dos primeiros raios do sol, não queria
esperar pelos minutos que arrebatavam sua alma como um açoite que o fazia
lembrar-se do motivo… Entrou em seu carro, e em alta velocidade, buscou
abrigo em algum subterfúgio capaz de tirá-la de sua cabeça. Iria rasgar a
cidade até o sono lhe arrebatar.
Ao chegarem em Vitória, mesmo sem saber se o encontraria, seguiram
para a casa de AT na intenção de resolver logo a situação. Para a surpresa de
ambos, ele não estava lá. Charlote observou por todos os lados a fim de
encontrar seu carro, mas não o viu. Uma ponta de tristeza lhe acometera ao
imaginar que poderia ter dormido fora, nos braços de alguma outra menina.
− Vou procurar algo para comer enquanto você toma seu banho. Assim que
eu retornar, esperá-la-ei aqui fora. – disse Arkadius.
− Não precisa… Eu sei o que devo fazer daqui em diante.
− Jamais. Eu a trouxe e a entregarei nas mãos de Tirel. Esteja aqui no
portão em uma hora. – disse num tom de ordem.
Ela acatou e seguiu portão adentro.
Fora recebida por Antonele, que a olhava dos pés a cabeça numa expressão
de receio e repúdio.
− O que quer? – perguntou a Charlote, mesmo sabendo que tudo que
estava acontecendo vinha de sua genuína maldade.

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− Falar com meu Senhor. – respondeu Charlote já entrando na casa,


percebendo a presença de Seren, ela se indagou em silêncio sobre quem era a
menina. Os olhos se encontraram, parecia se lembrar de algo, mas devia ser o
cansaço. Certamente nunca a viu no círculo de amizades e contatos de AT.
Estava certa quanto ao pressentir que arrumara um brinquedo novo a fim de
esquecê-la.
− Não pode entrar. Não é bem-vinda nesta casa! – disse Antonele, tentando
impedi-la de dar algum passo, porém fora ignorada.
− Você não manda em nada aqui. Vou esperar meu Senhor. – respondeu
enquanto subia as escadas deixando Antonele em pé, na sala, sem saber
exatamente o que fazer, pois sentiu receio de ser desmascarada, assim que AT
retornasse, o que ao certo aconteceria, e ela já contava com o castigo da
quarentena. Conhecendo bem seu Dono, sabia que após o período de quarenta
dias em isolamento, sem contato com seu Senhor, seria dispensada, como ele
já fizera com outras e ela mesma presenciou.
Entrou no banho, pensando em onde ele poderia estar nesse momento. Seu
coração dividia-se entre a saudade e o medo de sua reação ao ver Arkadius.
Não sabia o que havia acontecido, e quais foram seus motivos para ele não ter
ido ao seu encontro, e depois, repentinamente aparecido no Clube com sua
coleira em mãos. Tentou relaxar, sentindo a água quente cair pelo seu corpo.
Sabia que ele poderia não aceitá-la de volta, depois de ter presenciado o
início da cerimônia, sem ficar até o fim e se certificar de que não houve
encoleiramento. Mas mesmo assim, sentia-se em casa. Sentia-se segura. O
cheiro dele estava por todos os lados.
Trinta minutos depois, AT voltou. Notou as luzes acesas, não fora ele
quem as deixou. Embora a casa estive com o aspecto de não ter ninguém
dormindo, não encontrou as meninas pelos corredores e nem sala, o que
achou estranho os locais estarem como se estivesse alguém por ali. Pressentiu
algum tipo de surpresa, mas não sabia dizer se era boa ou ruim. Continuou
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caminhando até que pudesse descobrir o que estava acontecendo.


Sentia o cheiro dela pela casa, parecia castigo, estava delirando ou
obcecado pela menina a ponto de criar situações. Subiu a escada e a sensação
era cada vez maior. E foi então que… ouviu o barulho da água caindo no
chão… Suou frio. Entrou no quarto e viu as coisas delas esparramados pelo
tapete misturando-se aos seus pedaços. Não era vertigem.
Ela saiu do banho enrolada na toalha, os cabelos molhados, os olhos
intensamente azuis olhavam-no com súplica e saudade. Ficou petrificado na
cena, imóvel, dando atenção a cada detalhe sem conseguir se embasar em
nenhum.
− O que está fazendo aqui? – perguntou, esperando todas as respostas que
desejava, de uma só vez. Elas não vieram, mas no lugar de tais anseios, ela se
levantou. Vieram lágrimas e passos em sua direção, e logo depois, um corpo
caído aos seus pés, beijando-os, procurando agora pelas mãos de seu Senhor.
Seu coração parecia sair pela garganta. Ele não queria olhá-la. Não queria
tocá-la. Seu desejo era esquecê-la. Mas aqueles olhos, não deixavam que ele
se autodominasse. Nunca mais iria tocá-la. Ela o perdeu, assim dizia a si
mesmo, imaginando as mãos de outro dominador apalpando-a.
− Eu a recuso! – disse em tom áspero. – Não toque em mim. – finalizou,
indo a busca de roupas para que ela se vestisse. Abriu a mala da menina e
jogou em direção dela, algumas peças. – Troca-se! Não a quero nua em
minha frente. Você não me pertence mais.
Ela pegou as roupas com as mãos trêmulas, e voltou para o banheiro a fim
de se trocar. Ao sair, ele já não estava mais no quarto. Charlote desceu as
escadas e o viu em pé, diante da lareira. Foi até a porta da entrada para ir ao
encontro de Arkadius, quando AT a advertiu:
− Aonde vai?
− Vou buscar uma pessoa que quer falar com o Senhor.
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− Que pessoa?
Ela temeu em dizer o nome, mas prosseguiu.
− Senhor Arkadius.
O rosto de AT se fechou num semblante pesado e sua pele esquentou,
avermelhando-se. Ela jamais poderia imaginar o que ele estava sentindo
naquele exato instante, onde o orgulho ferido tomou conta de todo o seu ser.
− Traga este verme aqui! – disse quase rosnando, apertando os punhos.
Aos passos lentos ela seguiu, temendo pelo o que poderia acontecer.
Quando voltou, AT estava na mesma posição de antes.
− Com sua licença, nobre. – disse Arkadius de cabeça erguida, sem receios
algum.
AT ouviu aquela voz, tentando se controlar. Não tinham mais a nada a
tratar. A menina é dele agora, e podia ser levada dali. Não os queria a sua
frente, mas a curiosidade em saber o que queriam, era maior. Seu corpo ficou
gélido e inquieto entre suas células, embora não movesse um só músculo.
Lentamente virou seu corpo, o sangue fervia como tocha olímpica em
plena arena. Ao estar de frente ao seu adversário, a cena de Charlote morta
em seus braços em um Castelo, tomou-o de assalto. Ele se lembrou
detalhadamente de algo que jamais ocorrera antes. Viu Arkadius mirando a
lança em direção a ele, que se esquivou, e esta acertou de cheio a menina. Um
desejo repentino de gritar explodiu em si, quando mais outras cenas vieram
repetidamente de forma grotesca e inédita. Lembrou-se de cada detalhe de
vidas passadas, ambos lutando pela posse de Charlote, e todas as vezes que
sua vida fora ceifada pela força bruta de alguém que não aceitara a perda.
Lembrou-se das guerras iniciadas em todo o reino por conta de tais
eventos, e que muitos sivianos tentavam esconder, inventando outras histórias
que tapassem a verdade dos fatos. Todas as guerras de Siv foram iniciadas

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por conta das vezes que ele mesmo a tirara dos braços de Arkadius,
revoltando o povo bárbaro, que invadia o Castelo atrás de vingança, tentando
saquear seus bens e levarem as slaves. Tudo estava tão claro e evidente, que
era impossível se negar às evidências… Mesmo sem conhecer a ligação que
todas aquelas lembranças tinham com o presente. Enfim, ele lembrava agora
de onde os conhecia… Não havia conexão com aquela realidade, mas era
impossível não acreditar em cenas tão verossímeis.
Charlote recebeu uma descarga elétrica em todo seu corpo, reconheceu a
verdade de sua ida até ali, sendo novamente o pivô de um confronto que a
magoara tanta durante muitas existências. Não pode conter as lágrimas,
ajoelhou-se em seguida com intenção de diminuir o peso de sua alma, em
vão…
Da escada, desce Antonele seguida por Seren, que sorri discretamente ao
reencontrar Charlote, que por sua vez, retribui o carinho, não em um sorriso,
mas num olhar carregado de afeto. Lembrou-se da irmã da coleira, para quem
entregou a oportunidade de estar em seu lugar quando seguiu de Siv para a
Terra dos Mortos.
− Eu quero a verdade. – disse Aragorne, já que não estavam mais usando a
máscara do esquecimento. Sentia-se tão confuso quanto Charlote.
Arkadius deu passos para frente, destemido.
− Eu a trouxe para acabarmos nossa missão de forma pacífica. Não
realizamos a cerimônia de encoleiramento. Ela se findou, assim que o nobre
deixou o salão. Sempre soube que a alma dela pertencia a você, mas era
difícil reconhecer tal verdade diante do orgulho, do sentimento que tenho por
ela, e da miséria do meu povo, que jamais teve a mesma oportunidade em
partes iguais, tudo isso devido a este caso que parece não ter fim. Precisamos
finalizá-lo.
− Você ceifou minha vida todas as vezes que se sentia ameaçado. E por

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último, ceifou a dela, o que esperava? Que os deuses lhe agraciassem com
honraria pelo gesto cometido contra ao que não lhe pertencia?
− Charlote sempre me pertenceu, porém se apaixonou por você, que a tirou
de mim. E somente pelo sentimento que a movia, era sua. De direito e por
honra sempre fora minha. – disse ele firmemente.
− Fizemos tudo do melhor modo, não escondemos nunca os nossos
sentimentos acometidos de forma inesperada. Não fomos desleais.
− Um Dominador do bem jamais olharia para os olhos de uma posse que
não fosse a sua. – disse Arkadius com fúria no olhar.
− Um Dominador, antes de tudo, é um ser dotado de sentimentos. Jamais
deixei que no lugar do meu coração houvesse um chicote. – respondeu Tirel
na mesma ânsia congestionante.
− Apenas com Charlote não havia um chicote, caro amigo? Por que não
adotara a mesma teoria para as meninas que realmente eram suas, ao invés da
posse alheia? – Arkadius se lembrou das muitas slaves que passaram pelas
mãos de Tirel sem serem amadas.
− Eu fiz o meu melhor… – Tirel justificou.
− Sem conseguir. – Arkadius olhou para Antonele, que abaixou seus olhos.
Ele sabia que o amor dela não era correspondido. – Por isso ainda luta pela
Coroa.
Os poderes sivianos de Aragorne voltaram aflorados. Podia sentir no ar, a
energia de Antonele, e sabia que ela estava perturbada.
− Diga logo, menina, o que você fez! – ordenou, direcionando a voz para a
direção de Antonele.
− Eu… – ela não conseguiu pronunciar.
− Diga! – gritou. Sua voz retumbou pela casa.

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− Eu a mandei para Fortaleza. Sabia da história de Arkadius, Shaila havia


me contado, e me ajudou no plano de enviar Charlote para lá, na ausência do
Senhor. – disse em lágrimas.
− Com qual intenção? Acabar comigo?
− Não Senhor, eu queria a exclusividade… Sabia que Charlote havia um
lugar diferente na vida do Senhor.
Houve um silêncio.
− Pegue suas coisas imediatamente e desapareça de minha vida! –
ordenou Tirel, com toda sua ira.
A menina subiu as escadas e foi cumprir a ordem. Não esperava por isso…
Pensou que ficaria apenas no castigo de uma quarentena quase desumana,
mas jamais contaria que ele a expulsaria do clã.
− Você a tocou? – perguntou a Arkadius, seriamente.
− Não sou um estrume. Sou um dominador.
− Eu não acredito em você! – disse ainda com ira, aproximando-se de
Charlote e rasgando suas roupas na tentativa de examiná-la, o que a causou
medo, mas se manteve no autocontrole para não enfurecê-lo ainda mais.
Olhou-a profundamente, e nada encontrou a não ser as marcas com suas
iniciais feitas em sua perna, e a que jazia nas costas, que agora voltaram a
ficar visíveis. Olhou-as com orgulho, e voltou-se para Arkadius, jogando as
roupas para que Charlote se cobrisse com os trapos que restaram.
− O que veio fazer aqui?
− Entregá-la. Eu sou um bárbaro honrado. Tenho um convite e uma
proposta. Quero a disputa limpa e honesta pelo trono de Siv!
− Jamais! É minha herança!
− Mas você não passou na prova. Veio até aqui, e perdeu a oportunidade
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de ser o rei de Siv.


Aragorne parou para analisar o que o adversário havia dito. Ele conquistou
Charlote. Era sua. O que Arkadius quis dizer?
− Você não confiou em sua menina. Não mereceu a entrega dela. Eu
poderia levá-la, não o faço porque tenho brio. Não ficarei com uma posse que
se sente de outro. Numa relação de domínio, ambos precisam confiar, e no
seu caso… Você só confia em si mesmo.
− Está me entregando hoje, mas permaneceu com ela durante todas as
batalhas após minha ida para a Terra dos Mortos.
− Eu me cansei… Se tiver que ser minha, será pelo coração. É por este
motivo que a entrego. Mas quero a disputa pelo trono.
− Jamais deixarei que um bárbaro alcance o trono que fora de meus
antepassados.
Um clarão se fez entre os elos. A órbita a volta deles passou a girar numa
velocidade arrebatadora. Som, luzes e temperatura oscilavam de todas as
formas, nada mais dentro do ambiente passou a ser legível. Chegara o
momento da volta, o instante da trégua de uma luta que durara muitos séculos
na busca por uma resposta, até então sem solução. Um tufão airoso envolveu-
os, evitando que a visão tivesse o alcance de algum ponto. Tudo passou a
ficar escuro e sem formas. A sensação era de girarem parados… Até que a
inconsciência os adormecesse de modo inesperado.
Quando tudo parou de girar, a visão, de turva, passou a ser familiar. O céu
azul com pássaros cantando a qualquer hora do dia, novamente reluzia diante
dos olhos de quem jamais poderia esquecer aquele lugar. Os telhados
cobertos por neve, ainda se encontravam do mesmo modo da última vez que
AT se recorda. O mesmo jardim com as variadas espécies. A fumaça de uma
chaminé que saia da cozinha do castelo. O telhado das antigas casas com
torrezinhas e a velha igreja no estilo romano, mostrando-se o mais atrativo
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dos guias e sabendo entremear à sua erudição o detalhe pitoresco, a nota


emotiva ou espiritual. Um sorriso assomava a seus lábios e comunicava aos
olhos desacostumado brilho. Aquela fisionomia séria, pensativa, em que os
cuidados de uma existência toda devotada aos seus haviam deixado o seu
sinal, parecia transformada por alguma secreta felicidade.
Novamente veio o silêncio. Olhos afoitos estavam curiosos. O jeans fora
trocado pelas roupas medievais. Aragorne sentiu felicidade relâmpago ao se
ver novamente em seu lar. Estavam no meio do jardim, ao redor, suas
escravas olhando-o com um olhar saudoso. A sua frente, Arkadius, entre eles,
o Mestre Mor de Siv. Os sinos do Castelo tocavam. A passarada sobrevoava
o céu que ainda anunciava o dia. Seus amigos dominadores surgiram
segurando as espadas para o alto. Os olhos de Tirel buscavam por Charlote,
não a encontrou em lugar algum. Algo estava estranho. Sentiu no ar, a
melancolia.
− Bravos guerreiros! Saúdo-os! – disse o Ministro de Siv. – A missão se
findou sem o resultado desejado. Embora todos os esforços estavam voltados
para a missão, até mesmo inconscientemente para alguns participantes, o
ápice do que os levaram para o futuro, não fora cumprido. Resolvemos deixar
as revelações para o final, a fim de que desperte o ânimo de recorrerem ao
que foram buscar, porém, novamente o ego se apossou, fazendo do orgulho e
falta da confiança, o maior dos interesses. Eu avisei que os caminhos não
seriam fáceis, e de certo modo, perigosos, mas a imperfeição do ser
infelizmente é o seu maior adversário.
Dizendo isso, ele entregou uma espada para Arkadius, que a olhou e se
curvou num cumprimento de gratidão. Fez o mesmo com Argorne, que a
tomou para si e a levantou saudando seus amigos sivianos que ali chegaram
para assistir a disputa.
− Novamente iremos para um duelo. – disse o Minsitro. – Os caminhos
poderiam ser diferentes, mas a obrigação de se ter a razão sempre desobriga o
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sublime e necessário. Sim, Arkadius tem o direito à Coroa, porém a decisão


sobre o trono de Siv virá da espada.
Ouviu-se um choro. Aragorne desviou os olhos para ver de onde vinha,
chocou-se com a imagem de Seren jogada ao chão pelo medo de ver seu
Senhor lutar com Arkadius. Receava em ver cenas que não suportaria.
Tirel, de onde estava, disse firmemente:
− Levanta-se, menina! Não há o que temer, eu jurei um dia jamais lhe
abandonar, e minha palavra tem honra.
Seren cessou o choro no mesmo momento. Levantou-se e se juntou com as
demais slaves. Os sinos novamente tocaram, anunciando que a luta iria
começar.
Somente um pensamento se passava naquele momento pela mente de
Aragorne, onde estaria Charlote. Gostaria de vê-la ali, pois poderia ser a
última vez que a veria naquela vida. Saudade se define com a presença da
menina no pensamento, como se jamais ela estivesse saído de perto. Saudade
ultrapassa as imperfeições, as diferenças, as desavenças, o orgulho, as
razões… Porque é fruto do amor - do amor que se ama mesmo quando tudo
aparenta ser impossível e improvável - o amor por quem fez parte de um afã é
além de qualquer expectativa deixada ou ressentimento remoído. O amor
ensina a reconhecer quem é; perdoa antes da consciência. Ele desejava seu
perdão por não ter confiado em seus sentimentos.
− Tomem seus lugares. – disse o Ministro. Cada qual foi para sua posição e
esperou o momento de lutarem. – Ergam a espada! – pediu o Ministro. –
Repitam comigo, Por honra a Siv e a meu povo, luto neste momento com
integridade e retidão.
Ao terminarem de pronunciar tais palavras, cumprimentaram-se, curvando-
se um para o outro. Olhos nos olhos. Corações pulsando fortemente. A
sensação era inenarrável.
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− Lutem! – anunciou o Ministro.


Aragorne sacou sua espada antes de entrar na luta enquanto Arkadius
tentava controlar sua respiração e nervosismo, para manter o equilíbrio no afã
de atacar e defender.
Tirel mantinha as pernas abertas na altura e direção dos ombros para
executar os movimentos, segurando a espada de uma maneira que ele pudesse
manuseá-la com facilidade.
Arkadius observava os movimentos de Aragorne para saber quando ele iria
atacar, e lançar um ataque antes. E assim o fez, porém Tirel fora ágil, e
manteve a lâmina da espada perto de si para não bloquear seus movimentos
no momento de um contra ataque, fazendo com que a sola de seu pé tocasse
no chão para que tivesse base para sua investida, deslizando-os, ao invés de
resvalar o calcanhar.
O tinido das espadas era ouvido num eco contundente, que assenhorava-se
todo o ambiente do Castelo, juntamente com pequenos sons que os guerreiros
ecoavam no momento do ataque e defesa.
Arkadius, percebendo a avalanche de ataques de seu oponente, arrumou a
postura, mantendo-se com o dorso reto para não perder o equilíbrio durante
os giros que o livrava da lâmina afiada de Tirel. Estavam atentos a tudo
durante a luta. A habilidade de Aragorne era impressionante, embora o
bárbaro fora criado para lutar. Não houve tempo de pensar em estratégia, mas
ele respeitava a maneira habilidosa de seu adversário.
Aragorne esperava um descuido do bárbaro, tinha a sensação de que ele
poderia se machucar sozinho a qualquer momento. Ferido, seria uma presa
fácil para suas investidas. Ele iniciava o foco para dar seu melhor golpe,
porém acabara de errar um bloqueio, o que poderia ser fatal, mas continuou
concentrado, evitando dar passos para o lado. Então manteve sua espada de
modo que esta ficasse posicionada do tronco a altura de sua cabeça,

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permitindo que ele se livrasse de todos os ataques, devido ao ângulo que


conseguiu encontrar.
Com a espada numa distância confortável de seu corpo, na direção do
pescoço ou do olho do adversário, Arkadius colocou Tirel na mira, num
descuido derradeiro, sendo este gravemente ferido no ombro. Ouviu-se um
grito, e no mesmo instante, Seren deixou o local onde estava e saiu correndo,
jogando-se na frente de seu Senhor no momento em que Arkadius se
preparava para dar o golpe final.
Não houve tempo de desviar a espada…
Os sonhos de uma menina de dezessete anos foram abandonados
brevemente em uma vida de dedicação e amor, que acabara de se desfazer. O
corpo dela tremia ao perder força, sendo amparada por Aragorne, que no
desespero, soltou um urro que fora ouvido nos confins de Siv. A cabeça da
menina fora atingida na testa. Os olhos pairaram no ar…
− Continuem! – gritou o Ministro.
Sem saber o que fazer, Aragorne depositou o corpo agonizante da menina
quase ao seu lado, e olhou com fúria para os olhos de Arkadius. Lágrimas
eram observadas misturadas à poeira. Os olhos ardiam de revolta e dor. Mais
um grito dera com bravura e determinação de um rei, abalando a estrutura de
qualquer que fosse o homem do outro lado da espada a sua frente. Fora para
cima dele, para matar ou morrer. Num pequeno resvalo, Arkadius se
desequilibrou ao por o corpo um pouco mais para trás, recebendo a espada de
Tirel diretamente no peito, que fora aprofundada com desejo de ceifar sua
existência. Com o sangue jorrando pelos cantos dos lábios, ele desfalecia em
agonia, sabendo que chegara sua hora de descansar após séculos. Chegou o
fim da batalha. Não conquistaria Charlote nem o trono, nesta existência.
Assim colocava um ponto final em sua missão, ora vinda do coração ora à
busca de dignidade para seu povo.

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− A você, minha menina, o meu descanso… Eu a liberto. – disse com o ar


faltando nos pulmões.
Fechou os olhos e não os abriu mais. Sua vida e sua morte fora ofertada à
Charlote. Enfim ele abriu a porta de sua própria gaiola, que o aprisionava
através de seu sentimento por ela.
Tirel se ajoelhou perante Seren e ainda teve tempo de assistir seus últimos
suspiros. Ela pegou em sua mão, e antes que a visão escurecesse, tentou
pronunciar algumas palavras, mas foram poucas…
− Servidão e obediência ao meu Senhor.
− Honra a você, minha menina, que deu sua vida para salvar a do seu
Senhor. – ao dizer isso, Seren fechou os olhos como uma menina mortal que
não irá para a Terra dos Mortos, e não terá outras vidas para que retornasse
ao Reino.
O pesar abateu a corte de Siv. As irmãs choraram junto a Tirel, abraçadas
umas as outras de joelhos no chão, em torno do corpo de Seren. Os
dominadores retiraram suas cartolas e abaixaram suas cabeças. Os sinos
novamente foram ouvidos e uma chuva fina chegou limpando o sangue que
escorria pelo rosto tão jovem e sereno da pequena morta, que jamais se
levantaria novamente.
Os bárbaros foram recebidos no Castelo para retirarem o corpo de
Arkadius, levando-o para o Mundo dos Mortos à área reservada para esta
comunidade. Eles respeitaram o resultado do duelo, mesmo em sentimento
por terem perdido seu líder, não levantaram a espada contra os membros da
corte e sua guarda.
Novamente a corte recebe sete dias de luto pela partida da menina que
marcara de certa forma, o reino mais tumultuado da história de Siv. Aragorne
receberá o título com honraria, sabendo que o peso de sua Coroa se deu
através do amor que recebeu de sua slave até o último momento de sua vida,
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instante em que entregou seu corpo e alma ao seu Senhor, pela última vez,
trocando sua vida pela a dele.
O enterro, honrarias, luto de sete dias… Momentos que se passaram em
comoção por todo o reino. Tirel recebera de seus aliados o respeito e lealdade
durante este momento de grande pesar.
Oitavo dia após a morte de Seren. É chegado o momento da coroação.
Vários participantes da cerimônia estavam vestidos de trajes especiais,
uniformes ou roupas. As vestes dos sivianos presentes compreendem um
longo casaco de veludo carmesim e uma capa de arminho. Linhas de manchas
na capa designam a classificação de cada castra; duques utilizam quatro
linhas, marqueses três e meio, condes três, viscondes dois e meio, e os barões
e senhores do Parlamento, dois. Os duques Reais usam seis fileiras de
arminho. Os nobres usam coroas ou diademas, assim como fazem a maioria
dos membros da corte real; tais coroas mostram emblemas com base na
posição ou na associação do nobre para com o rei. O herdeiro aparente da
Coroa exibe quatro cruzes-Pattee alternadas com quatro flores-de-lis
encimados por um arco. O mesmo estilo, sem o arco, é usado pelas slaves de
Tirel. As demais escravas da nobreza usam o mesmo desenho, só que em
versões menores.
Juntamente com pessoas da nobreza, as cerimônias de coroação também
são assistidas por uma ampla gama de figuras políticas, incluindo o primeiro-
ministro de Siv e Old, e todos os membros do Gabinete Oficial,
Governadores-Gerais e primeiros-ministros de ambas as civilizações.
O Mestre de Siv colocou o ornamento da Coroa da serpente na cabeça do
rei e realizou todos os ritos habituais nas salas consagradas da cerimônia do
Castelo.
Com uma voz contida de emoção e contentamento, o Mestre disse aos
presentes:

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− Senhores, eu aqui apresento a vós, o seu rei inquestionável. Portanto


todos são bem-vindos para fazer a sua homenagem e vassalaria. Estão
dispostos a fazer o mesmo?
Após a aclamação do povo ao soberano em cada lado, o Ministro de Siv
administra um juramento a Tirel, a lei de juramento da coroação.
− Prometa e jure governar para o povo do reino de Siv e dos Territórios
pertencentes a esta civilização, de acordo com os estatutos aprovados em
Parlamento sobre e às Leis e de nossos costumes.
− Solenemente prometo fazê-lo. – respondeu Aragorne.
− O nobre vai usar seu poder para trazer a Lei e a Justiça, na misericórdia,
em todos os seus julgamentos?
− Sim, eu vou.
− O nobre vai usar o máximo de seu poder para manter as Leis dos deuses
e da verdadeira pregação de nossos Princípios? Vai usar o máximo do seu
poder para manter no reino unido aos critérios estabelecidos por lei? Vai
manter e preservar invioláveis a liquidação da liturgia, do culto e da
disciplina e governo de Siv, conforme estabelecido por nossas leis? Vai
preservar nosso sistema de proteção e títulos já consagrados nos quais são
comprometidos, todos os seus direitos e privilégios, como estabelecido por
lei?
− Eu prometo fazer. As coisas que prometi antes, irei realizá-las e mantê-
las.
Logo que termina o juramento, um Ministro apresenta um livro sagrado ao
Soberano, dizendo:
− Aqui está a sabedoria, esta é a lei real; estes são os oráculos vivos dos
deuses.
Tirel beija o livro e recebe a coroa.
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Trinta dias se passaram desde a coroação. O novo Rei de Siv ainda de


acostumava à sua nova rotina, não era tão simples como imaginava. A
responsabilidade urgia a cada instante, não poderia jamais quebrar um
juramento que o obrigava a cumprir com a ordem e bem-estar geral.
Logo pela manhã recebera a visita do Mestre Mor de Siv, que vinha ao seu
encontro segurando um cajado abaixo de um olhar enigmático. Aproximou-se
de Tirel e o cumprimentou.
− Saudações, caríssimo nobre.
− Saudações, Mestre. O que o traz até a mim? – seus olhos por um
momento brilharam. Imaginou que receberia notícias de Charlote.
− Acredito que se lembre de nosso trato. Uma vez recuperado de velhos
traumas, é momento de recolher as slaves que foram emprestadas para ajudá-
lo em seu progresso como dominador.
Sentiu tristeza eminente, lembrou-se do combinado. Sabia da condição de
voltarem após ele prestar sua missão. Talvez nunca mais volte a vê-las nesta
época. Talvez as encontre somente quando também partir para o mesmo
destino. Já havia se acostumado às meninas, em especial, a Erine.
− Eu compreendo. – disse apenas um tom baixo.
− Já está recuperado. Já esteve com ela após sua morte. Agora é momento
do fluxo desta vida correr normalmente.
− Eu o agradeço por permitir Charlote ir à missão ao meu lado. Foi muito
importante revê-la, muito embora não me lembrasse de onde a conhecia, mas
sentia em meu coração, quem ela foi um dia para mim.
Ao dizer isso, viu suas meninas andando em fila. Estavam vestidas de
túnica azul esvoaçante. Ele se lembrou do primeiro dia que as viu, usavam a
mesma roupa. Seguiam em carreata de cabeça baixa. Erine o espreitava pelo
canto dos olhos, tinha nos cabelos, uma coroa de flores. Ela corou

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ligeiramente. Era o último galanteio que o dirigia. E o olhar com que o


Senhor a sublinhou fez nascer no coração da menina uma emoção
desconhecida.
Eles pararam de conversar ao verem tamanha beleza. O vento levava os
cabelos longos, soltos aos ombros. Estavam realmente lindas, descalças. O nu
do corpo era revelado através da roupa transparente e leve.
Assim que passaram pelo Senhor, algumas revelaram os mamilos
enrijecidos, tamanho era o desejo de serem tocadas por ele, por uma última
vez.
O cintilante dos raios do sol ofuscava a visão. O vento, o azul límpido do
céu, e os pássaros cantando, celebravam os últimos momentos das meninas
naquele Castelo. Um filme era passado na cabeça de Tirel enquanto elas
caminhavam rumo ao portal. Ele lembrou-se das risadas quase infantis, e o
calor afetuoso dos abraços que ganhara.
Observou quando uma imagem conhecida vestida como as outras se
aproximar da carreata. Sentiu-se confuso. Apsel se posicionou na fila das
meninas. Não entendeu, pois sabia que para seguir para o mundo de Siv,
precisava ser siviano. O portal se abriu, de lá, uma aparência nitidamente
conhecida. Collins segurava um imenso chicote, batia-o no chão, e a poeira
levantava.
− O que está havendo, Ministro? – perguntou sem conseguir acreditar no
que via.
− Collins voltou numa nova missão. As meninas estarão sob seus cuidados,
não no mundo de Siv, mas em outro Castelo subjacente a este, que também
estará sob sua égide como Rei Dominante.
− Collins… – ele ensaiou um sorriso, na intenção de que ela o reconhesse,
mas o esquecimento necessário para as missões impediu que a Domme o
visse como irmão. Cumprimentou-o de longe como qualquer nobre da corte.
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Sentiu-se feliz em saber que ela voltara, mas gostaria de lhe dar o abraço que
não pôde ser dado na despedida.
Diante de uma saudosa angustia, de longe, na capela ao lado do Castelo,
vira algo que fizera seu coração palpitar em desalinho. Suspirou
profundamente, afrouxando o lenço de seda que ornava a volta do colarinho.
Não acreditava no que via… Bem ali, naquele lugar que mal frequentara além
das pouquíssimas vezes que passara para refletir sobre sua vida, após as
práticas de equitação.
Lá, além da miragem angelical notada, encontravam-se apenas dois dos
jardineiros do Castelo, com as flores necessárias para a ornamentação do
santuário, que cujo trabalho era feito com esmero. Era o único luxo do local.
Belas eram essas flores, delicadamente brancas, perfumadas, velando a
decrepitude das paredes, cobrindo o altar, festonando o coro e descendo em
redolentes guirlandas até o genuflexório, onde se ajoelhava a jovem.
Ele parou por um instante… Passou a mãos pelos cabelos, sorrindo. Ao se
voltar para o Mestre, ele já não estava mais lá, partira com as meninas sem se
despedir, desaparecendo nas nuvens que repentinamente se tornaram
carregadas.
Abriu os braços ao perceber que os olhos dela estavam olhando para os
seus. Com a graça de uma pomba branca, Charlote se levanta e caminha rumo
ao seu Dono, com as mãos esticadas para frente, sobre elas, o cordão sagrado
de Tirel. O que o fez sorrir.
Ao se aproximar, curvou-se para cumprimentá-lo, retirando seus olhos em
silêncio, dos dele. Dobrou os joelhos sobre o gramado verde e cheio de vida,
alcançando as mãos do Senhor, beijando-as.
− Saudações, meu Senhor, Dono adorado de mim.
Sem palavras, Aragorne acariciou os cabelos dela, para ter certeza de que a
cena era real.
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− Como é possível? – perguntou, espantado, sabendo que ela não poderia


estar ali, e muito menos, se lembrar de quem ele era após ter regressado, se
fosse o caso de estar ali para uma nova missão ou nova vida.
Ela voltou. Ela voltou. – pensava em desespero.
− Sinto-me ansiosa para conhecer o castelo, Sir. – os olhos azuis
brilhantes, denotavam sentimentos absortos. Sentia como se sempre o tivesse
amado.
Foi neste instante que percebeu que Charlote não se lembrava de nada, mas
era exatamente como se lembrasse. O sentimento de lealdade e servidão
estava arraigado em si. Ela sabia, mesmo sem imaginar como, que pertencia
ao Senhor. E voltou para ele, porque somente algo é maior que o domínio, o
amor.
FIM

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