Você está na página 1de 20

TECNOLOGIAS AMBIENTAIS EM

EDIFÍCIOS E CIDADES
AULA 2
Prof.ª Wívian P. P. Diniz

CONVERSA INICIAL

Nesta etapa, nos aprofundaremos nos estudos sobre conforto térmico humano. Em razão da

fisiologia humana de termorregulação – capacidade de regular a temperatura corporal –, característica

especial dos animais homeotérmicos, a não satisfação quanto às condições térmicas é a declaração
mais comum entre as reclamações das pessoas em relação ao conforto ambiental.

Portanto, é fundamental que possamos identificar as principais fontes de desconforto térmico,

como interagem a edificação e o ambiente externo termodinamicamente e como indicar soluções

projetuais passivas – estratégias bioclimáticas.

CONTEXTUALIZANDO

A sensação de conforto térmico é instintiva e está presente em nossas vidas desde os primeiros

momentos de vida. O bebê recém-nascido, ao sentir calor ou frio, reagirá com o choro instintivamente.

À medida que seu equilíbrio fisiológico-ambiental vai se perdendo, ele dá sinais claros de agitação e

descontentamento.

Portanto, o nosso foco de atuação deve ser determinar as causas e situações de desconforto para

minorar ou prevenir, por meio dos nossos projetos arquitetônicos, a sua ocorrência.

De acordo com a American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers[1]

(Ashrae, 2010), o conforto térmico seria “aquela condição mental que expressa satisfação com o

ambiente térmico, avaliada de maneira subjetiva”. O aspecto subjetivo está no fato de que não existe

um determinado parâmetro para “a condição térmica ideal”. Ou seja, são muitas variações, tanto

fisiológicas quanto psicológicas, de pessoa para pessoa, de modo a ser difícil satisfazer todas em um

mesmo ambiente. Desse modo, as condições ambientais necessárias para conforto não são iguais para

todas as pessoas.
Os parâmetros indicados nas normas técnicas são definidos com base na coleta de dados

climáticos que, analisados estatisticamente, definem as condições ambientais que uma porcentagem

majoritária de pessoas considerará termicamente confortável para o ambiente (Ashrae, 2010).

Figura 1 – Ursa polar com seus filhotes: apesar do ambiente extremamente frio para os parâmetros

humanos, conseguimos ter a sensação de que a família está em conforto térmico

Crédito: AndreAnita/Shutterstock.

Vamos observe a Figura 1 anterior. Será que a mamãe ursa e seus filhotes estão com frio em razão

de haver tanta neve no ambiente? E nós, estaríamos com frio? Dependeria da nossa vestimenta?
Provavelmente nós, seres humanos, se não estivéssemos protegidos por roupas adequadas para baixas

temperaturas, morreríamos em poucas horas. Já esses animais têm sua fisiologia adaptada a ambientes

gelados e sua pelagem os protege naturalmente. Diferentemente de nós, no calor, sofrem desconforto.

No entanto, aquele parente que vive na Finlândia e que, quando vem ao Brasil no verão, chega a

passar mal? Percebemos assim que os seres vivos se adaptam às condições climáticas as quais estão

habituados. Em contrapartida, quando em contato repentino com um ambiente muito diverso daquele

ao qual está adaptado, seu organismo se ressente e sofre por algumas horas até sua fisiologia se

adaptar às novas condições.

Leitura complementar
Para entender como tudo isso ocorre no corpo humano, recomendamos a leitura do capítulo

2, p. 43 a 53 do livro a seguir.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência energética na arquitetura. 3. ed. Rio

de Janeiro, 2014. 382 p. Disponível em: <https://labeee.ufsc.br/sites/default/files/apostilas/efi

ciencia_energetica_na_arquitetura.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023.

TEMA 1 – SER HUMANO, SUAS NECESSIDADES TÉRMICAS E TROCAS


TÉRMICAS COM O ENTORNO

Conforme abordamos na conversa inicial, o ser humano é um animal homeotérmico e, portanto,

seu metabolismo busca manter a sua temperatura interna constante. Em um organismo saudável, a

temperatura é mantida entre 36,1 e 37,2°C; já em caso de enfermidade ou de sobrevivência, a

temperatura interna do organismo tem como limite inferior 32°C e, como superior, 42°C.

Quando somos expostos a ambientes com temperaturas acima da nossa temperatura corporal,

mecanismos fisiológicos são ativados para dissipar calor, ou seja, trocar calor com o ambiente de

maneira a cedermos temperatura para esse meio externo e assim equilibrar nossa temperatura

corporal. É por isso que, em ambientes quentes, devemos optar por vestimentas leves, que não criem

resistência térmica[2] para dificultar essa dissipação de energia térmica.

Em oposto, quando somos expostos a ambientes com temperaturas abaixo da nossa temperatura

corporal, precisamos gerar mais calor internamente ou reter o calor corporal por meio do uso de

vestimentas com alta resistência térmica, que dificultem a dissipação dessa energia térmica para o

ambiente.

Logo, para mantermos constante a nossa temperatura interna corporal, o organismo humano se

utiliza de mecanismos que atuam nas trocas térmicas entre o corpo e o ambiente, chamados de

“mecanismos termorreguladores”. Os mecanismos principais são:

sudação – em condições de calor, a ativação das glândulas sudoríparas para liberação de suor

pelos poros da pele é iniciada quando nossa temperatura interna alcança 35°C. Ao suarmos,

promovemos perdas de calor por resfriamento evaporativo da pele, para recuperarmos o

equilíbrio térmico. Quando estamos submetidos a um elevado esforço físico, também suamos
porque aumentamos nosso metabolismo. Consequentemente, elevamos a produção de energia

térmica corporal e precisamos dissipá-la;

vasodilatação – quando submetido ao calor, nosso organismo aumenta a circulação sanguínea.

Consequentemente, ocorre a elevação da temperatura da pele, o que acelera as perdas de calor

corporal para o ambiente, o que resfria o nosso corpo;

vasoconstrição – quando somos expostos ao frio, a circulação sanguínea da pele diminui, o que

reduz nossa temperatura e a torna um bom isolante térmico. Consequentemente, isso diminui a

quantidade de calor perdida pelo corpo para o ambiente, de modo a manter, assim, a energia

térmica interna.

Leitura complementar

Para entender os mecanismos termorreguladores de forma mais pormenorizada,

recomendamos a leitura do capítulo 2, p. 44 a 46 do livro a seguir.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência energética na arquitetura. 3. ed. Rio

de Janeiro, 2014. 382 p. Disponível em: <https://labeee.ufsc.br/sites/default/files/apostilas/efi

ciencia_energetica_na_arquitetura.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023.

1.1 DETERMINAÇÃO DOS ÍNDICES DE CONFORTO TÉRMICO

São várias as metodologias para o cálculo de um índice de conforto térmico indicado para um

determinado ambiente. As duas mais utilizadas no Brasil são:

o modelo adaptativo (Ashrae, 2010);

o modelo preditivo ou Voto Médio Predito – PMV, do termo em inglês predicted mean vote

(Ashrae, 2010), desenvolvido por Fanger no seu livro seminal Thermal comfort: Analysis and

applications in environmental engineering (1970). Fanger extraiu do PMV a Porcentagem de

Pessoas Insatisfeitas (PPD, do termo em inglês predicted percentage of dissatified), estabelecendo

uma relação entre os dois índices (PMV-PPD) para facilitar a aplicação prática do PMV.

Os índices definem as condições humanas para conforto térmico com base em seis variáveis

principais, as quais podem ter maior ou menor impacto no índice final.


1. Atividade física: variável met ou taxa metabólica gasta para executar uma atividade, conforme

tabela de referência[3].

2. Isolamento de roupas: variável clo, conforme tabela de referência[4].

3. Temperatura do ar: variável TAR, em °C (graus celsius), dado ou por medição com instrumentos.

4. Temperatura radiante: variável TRM, em °C (graus celsius), dado ou por medição com

instrumentos.

5. Velocidade do ar: variável V, em m/s (metros por segundos), dado ou por medição com

instrumentos.
6. Umidade relativa: variável UR, em % (porcentagem) dado ou por medição com instrumentos.

Uma pessoa, ao entrar em um ambiente que atenda, a princípio, aos requisitos de conforto, não
necessariamente precisa considerar as condições confortáveis de imediato. Isso ocorre porque a

sensação de conforto depende das condições ambientais as quais a pessoa esteve exposta
anteriormente; quanto mais diferentes, mais tempo para se adaptar. Desse modo, as condições

ambientais anteriores ou uma atividade anterior podem afetar as percepções de conforto por
aproximadamente uma hora, tempo médio necessário para o metabolismo humano se adaptar a novas

condições ambientais.

1.1.1 Modelo adaptativo

O modelo adaptativo da Ashrae 55-2010 foi elaborado para determinar condições térmicas

aceitáveis para o ser humano, desde que obedeçam aos critérios a seguir, ou seja, caso essas condições
não sejam cumpridas, o índice obtido por meio do modelo adaptativo não pode ser validado.

1. Ambientes com comportamento higrotérmico natural.

2. Ausência de sistema de condicionamento artificial instalado.


3. Os ocupantes devem apresentar taxa de metabolismo entre 1,0 e 1,3 met (sentado em repouso ou

em atividade sedentária como leitura, estudo, uso de computador).


4. Os ocupantes estão livres para adaptar suas roupas, variando de 0,5 a 1,0 clo (calça/camiseta ou

roupa formal de trabalho como paletó para os homens e camisa de manga comprida e calça/saia
social para as mulheres).

5. A temperatura exterior média deve estar maior que 10°C e menor que 33,5°C.

1.1.2 Modelo preditivo – PMV


O PMV foi criado por meio da interação de quatro elementos ambientais (temperatura do ar,
pressão parcial do vapor de água no ar, velocidade do ar e temperatura radiante média) e duas

variáveis pessoais (atividade física met e isolamento da vestimenta clo). Para o cálculo do PMV, é
necessário que seis parâmetros sejam obedecidos:

1. metabolismo entre 0,8 met e 4 met (46 W/m² e 232 W/m²);

2. isolamento da vestimenta entre 0 clo e 2 clo (0 m² × K/W e 0,310 m² × K/W);


3. temperatura do ar entre 10°C e 30°C;

4. temperatura radiante média entre 10°C e 40°C;


5. velocidade do ar entre 0 m/s e 1 m/s;

6. pressão parcial do vapor da água entre 0 Pa e 2700 Pa.

Leitura complementar

Para complementação teórica acerca dos índices para conforto térmico, recomendamos as

indicações de leitura a seguir.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência energética na arquitetura. 3. ed. Rio
de Janeiro, 2014. 382 p. Disponível em: <https://labeee.ufsc.br/sites/default/files/apostilas/efi

ciencia_energetica_na_arquitetura.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023. Capítulo 2, p. 46 a 56.


LAMBERTS, R.; XAVIER, A. A. de P. Conforto e stress térmico. Apostila do Laboratório de

Eficiência Energética em Edificações – UFSC. Florianópolis, 2002. Disponível em: <https://labe


ee.ufsc.br/sites/default/files/disciplinas/ECV4200_apostila%202011.pdf_2.pdf>. Acesso em:

26 jan. 2023.

TEMA 2 – PROPRIEDADES TÉRMICAS DOS COMPONENTES


CONSTRUTIVOS

A escolha de componentes construtivos adequada para um determinado clima e,


consequentemente, o entendimento das propriedades térmicas desses componentes é um dos

principais recursos para alcançarmos um desempenho da edificação satisfatório ao conforto térmico


humano.
O conhecimento acerca do comportamento higrotérmico dos componentes inclui os sistemas de

cobertura, pisos e paredes (externas e internas), de modo a definir um sistema construtivo integrado às
estratégias bioclimáticas.

As propriedades térmicas dos componentes construtivos são estabelecidas ao analisarmos cada

elemento e suas características, se translúcidos ou opacos, homogêneos ou compostos por várias


camadas de materiais. Também consideramos nessa análise a cor, se são claros ou escuros.

Figura 2 – Recorte parcial da tabela de componentes construtivos na plataforma Projeteee

Fonte: plataforma on-line Projeteee. Aba “Componentes construtivos”.

Na Figura 2 anterior, temos alguns exemplos de paredes normalmente encontradas em edificações

brasileiras, fornecidas na plataforma on-line Projeteee, aba “3. Componentes construtivos”. É


interessante observar que, nas demais abas, existe a indicação de pisos/coberturas e vidros. Clicando

em algum dos desenhos, as propriedades térmicas da componente construtiva selecionada são


evidenciadas (Figura 3). Dessa forma, podemos escolher facilmente uma especificação para nosso

projeto.
Figura 3 – Detalhe de um componente construtivo na plataforma Projeteee

Fonte: plataforma on-line Projeteee. Aba “Componentes construtivos”.

A indicação de componentes específicos para a nossa localidade é informada após a selecionarmos


na página inicial. A plataforma mostrará vários exemplos, já compatibilizados com a NBR 15220-

3/2005 e a NBR 15575-1/2013. Caso a nossa tipologia construtiva não esteja listada, utilizamos a
“Calculadora de Propriedades” no final da página para compor uma tipologia personalizada.

Saiba mais

Plataforma on-line Projeteee. Desenvolvido pelo PROCEL/Eletrobras e a Universidade Federal


de Santa Catarina – UFSC. Disponível em: <http://www.mme.gov.br/projeteee>. Acesso em: 26 jan.
2023.

As soluções adotadas em relação ao desempenho térmico dos componentes construtivos são


diretamente relacionadas às propriedades térmicas dos elementos, conforme apresentado na Figura 2

anterior. Devemos ainda considerar o fator estético e econômico para uma decisão final.

Leitura complementar
Para um aprofundamento maior a respeito das propriedades térmicas dos elementos

construtivos, recomendamos a leitura do capítulo 7, p. 197 a 226, do livro a seguir.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência energética na arquitetura. 3. ed. Rio
de Janeiro, 2014. 382 p. Disponível em: <https://labeee.ufsc.br/sites/default/files/apostilas/efi

ciencia_energetica_na_arquitetura.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023. Capítulo 2, p. 46 a 56.

TEMA 3 – NORMAS TÉCNICAS E DESEMPENHO TÉRMICO DOS


COMPONENTES CONSTRUTIVOS

A escolha dos componentes construtivos deve levar em conta o balanço energético[5] da

edificação e diversas outras propriedades conforme exposto na NBR 15220­-3 (ABNT, 2003) e na NBR
15575-­4 (ABNT, 2013).

Resumidamente, as normas técnicas determinam que:

em climas frios, devemos reter o calor dentro da edificação, para evitar perdas térmicas para o

ambiente externo. Desse modo, a edificação deve “segurar” a energia térmica nos seus
componentes construtivos, por meio da utilização de materiais com baixo coeficiente de

transmitância (U). A configuração formal da edificação deve reduzir ao máximo as aberturas para
ventilação natural, de modo a evitar, assim, perdas constantes de energia para o ambiente

externo. Devemos otimizar o uso da insolação para a iluminação natural e o aproveitamento da


energia térmica emitida pelo sol por meio da inércia térmica[6] dos materiais;

em climas quentes, as soluções projetuais visam à perda energia térmica para o ambiente externo,
o que reduz os efeitos da radiação solar nos ambientes internos. A escolha de cores claras ou

materiais reflexivos para acabamento externo dos componentes construtivos reduz a absorção da
radiação solar, em conjunto com o uso de elementos sombreantes nas aberturas, como brises,

marquises ou beirais para diminuição da insolação direta nas aberturas (abordaremos a


projetação dos elementos de sombreamento futuramente).

Para ambas as condições climáticas, recomenda­-se o aproveitamento máximo da iluminação


natural, no intuito de atingir a eficiência energética.
Leitura complementar

Para aprofundamento sobre esse tema, recomendamos a leitura do capítulo 9, p. 135 a 151,
do livro indicado a seguir.

CÂMARA BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO. Desempenho de edificações

habitacionais: guia orientativo para atendimento à norma ABNT NBR 15575/2013.


Fortaleza: Gadioli Cipolla Comunicação, 2013. Disponível em: <https://cbic.org.br/wp-conten

t/uploads/2017/11/Guia_da_Norma_de_Desempenho_2013.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023.

Vídeo

Para aprofundamento sobre esse tema, recomendamos assistir aos vídeos a seguir.

CONFORTO Ambiental Arquitetura Inércia Térmica Explicada. Consultoria com Marcelo

Nudel, 24 mar. 2020. Disponível em: <https://youtu.be/aWT6bk9ifww>. Acesso em: 21 dez.


2022.

CONFORTO Ambiental Arquitetura. Playlist de 21 vídeos. Consultoria com Marcelo Nudel,


5 nov. 2020. Disponível em: <https://youtube.com/playlist?list=PLEr69Mt_fkcfdt_z24L6GEvp

EJWm2Akkr>. Acesso em: 26 jan. 2023.

TEMA 4 – DIAGNÓSTICO DO MICROCLIMA E FERRAMENTAS PARA


PROGNÓSTICO DO PROJETO

Para a efetivação das estratégias bioclimáticas no projeto arquitetônico, contamos com várias

ferramentas que auxiliam no diagnóstico e no prognóstico voltados ao projeto. Cada etapa do processo
projetual apresenta suas próprias demandas de informações, direcionando assim a escolha e o uso

dessas ferramentas.

A definição sobre qual diagnóstico será desenvolvido depende da etapa projetual que está sendo

realizada, por exemplo:

para a etapa do estudo preliminar (arquitetura), é necessário conhecer o comportamento

climático local e as estratégias bioclimáticas que devem ser adotadas;


para a etapa do anteprojeto e projetos complementares, a carga térmica da edificação deve ser

calculada para definir os sistemas para climatização ativa (engenharia mecânica);

para a etapa de utilização da edificação, é preciso avaliar a gestão energética na rotina dos

usuários (administração predial);


após a administração predial implantar a gestão energética na rotina de uso, é possível contratar

a auditoria energética (Escos[7] e instituições certificadoras).

Como profissionais da arquitetura, devemos focar nossa atuação na etapa para definição formal e

técnica da edificação (o estudo preliminar), bem como na determinação dos seus componentes

construtivos, além das dimensões e posição das aberturas e como considerar as estratégias

bioclimáticas no partido arquitetônico. Isso, prioritariamente sem a utilização de recursos mecânicos e


que consomem energia.

As principais decisões projetuais relevantes para o desempenho térmico passivo da edificação são:

viabilização das estratégias bioclimáticas indicadas para o zoneamento do local (conforme NBR 15220-

3/2005), implantação, orientação solar das fachadas, volumetria, aberturas/fechamentos, materiais

construtivos e disposição dos ambientes internos, sempre conforme o padrão climático local.

Nesse contexto, retomamos as duas ferramentas fundamentais para o projeto bioclimático:

o diagrama bioclimático de Givoni, para o diagnóstico das condições climáticas do local em que a

edificação será implantada e prognóstico das estratégias bioclimáticas;


o diagrama solar, para estudo da insolação e definição dos elementos de sombreamento

eventualmente necessários. São ferramentas que antes eram manuais, mas que na atualidade

estão disponíveis em recursos digitais, o que proporciona a utilização facilitada e autoexplicativa


e, consequentemente, resultados mais objetivos e direcionados ao processo projetual.

TEMA 5 – DIAGRAMA BIOCLIMÁTICO DE GIVONI

O diagrama bioclimático foi desenvolvido pelo arquiteto Baruch Givoni[8], na década de 1960. Em

1994, ele mesmo adaptou essa ferramenta às condições climáticas de países do sul global, que pode ser

utilizada inclusive no Brasil. O diagrama de Givoni possibilita, de forma direta, a determinação das

estratégias bioclimáticas segundo o clima local e que devem ser incorporadas ao processo projetual,

visando ao conforto térmico.


Figura 4 – Diagrama bioclimático da cidade de Belém-PA

Fonte: Diniz, 2023/programa Analysis Bio (Labeee).

O uso do diagrama é simples, conforme interpretamos com base na Figura 4 anterior. Sobre uma

carta psicrométrica, estão lançados polígonos coloridos que representam as zonas bioclimáticas, cada
uma identificada com uma numeração e descritas na coluna à esquerda da carta psicrométrica. As

descrições indicam as estratégias a serem adotadas para reestabelecer as condições de conforto

térmico do ser humano.

Os pontos vermelhos representam 8.760 dados climáticos horários para a cidade de Belém-PA –

ano climático de referência (TRY) – o que representa um ano típico daquele local, entre 01/01 e 31/12,
disponibilizados “hora a hora”, durante 365 dias. O TRY não é definido por um ano específico porque

representa dados climáticos coletados por vários anos e tratados estatisticamente para representar, de

fato, a tipologia climática daquele local. O local em que os pontos vermelhos atingem os polígonos

significa que aquela estratégia bioclimática deve ser adotada.

Continuemos no nosso exemplo. As 8.760 horas que reúnem os dados climáticos são analisadas

com base na porcentagem desses dados que atingem determinada zona bioclimática. No caso de
Belém, apenas 0,708% das 8.760 horas climáticas atingem a zona de conforto. Ou seja, durante poucas

horas do ano, as pessoas que vivem em Belém sentem-se em condições confortáveis, sem necessitarem
do auxílio de nenhuma estratégia bioclimática para estarem bem com o clima natural. Nas restantes

99,1% das 8.760 horas, as pessoas estão desconfortáveis por causa do calor.

Quadro 1 – Análise bioclimática comparativa entre dados climáticos de Curitiba-PR e Belém-PA

Análise bioclimática Curitiba-PR Análise bioclimática Belém-PA

GERAL GERAL

Conforto: 20% Conforto: 0,708%


Desconforto: 80% Desconforto: 99,1%

- Frio: 73,2% - Frio: 0%


- Calor: 6,84% - Calor: 99,1%

CALOR CALOR

Ventilação: 6.84% Ventilação: 88,8%


Alta Inércia p/ Resfriamento: 1,02% Ar-Condicionado: 9,05%

Resfriamento Evaporativo: 1,02% Alta Inércia p/ Resfriamento: 4,46%


Ar-Condicionado: 0% Resfriamento Evaporativo: 2,33%

FRIO FRIO

Alta Inércia Térmica/Aquecimento Solar: 42,5% Alta Inércia Térmica/Aquecimento Solar: 0%


Aquecimento Solar Passivo: 18,9% Aquecimento Solar Passivo: 0%

Aquecimento Artificial: 11,8% Aquecimento Artificial: 0%


Umidificação: 0% Umidificação: 0%

SOMBREAMENTO SOMBREAMENTO

Porcentagem: 23,2% Porcentagem: 100%

Fonte: Diniz, 2023/programa Analysis Bio (Labeee).

No Quadro 1 anterior, diferentemente de Belém, onde praticamente todo o tempo as pessoas estão
em desconforto por causa do calor, em Curitiba-PR, em 20% do ano as pessoas estão em conforto e,

em 80%, em desconforto. No entanto, nesses 80% de desconforto, 73,2% é desconforto por frio e

apenas em 6,84% é desconforto por calor. Agora, se observarmos as estratégias bioclimáticas

sugeridas, percebemos uma total correlação com o padrão climático.


Em Belém, as principais estratégias a serem inseridas no projeto são a ventilação natural, de

preferência cruzada, seguido por um pequeno período em que o ar-condicionado é necessário. Lá não

existe desconforto por frio.

Já em Curitiba, a maior parte das estratégias são destinadas a resolver a condição de desconforto
por frio. Dessas estratégias, na maior parte do tempo a indicativa é utilizar a inércia térmica dos

materiais para aquecimento solar passivo durante o dia, para que a noite esse calor acumulado nos

componentes construtivos seja liberado lentamente para o interior da edificação. É importante observar

que uma parcela das condições em frio necessita do uso do aquecimento ativo (por equipamentos de
calefação ou lareiras). Não há indicativa para uso de ar-condicionado.

Quanto ao sombreamento, em Belém, é indicado o sombreamento das aberturas em 100% do ano,

enquanto em Curitiba essa indicação é somente para 23,2%, mas horas de verão. Nas condições frias, a

edificação deve possibilitar a captação de calor por insolação das aberturas.

Figura 5 – Diagrama bioclimático da cidade de Curitiba-PR

Fonte: Diniz, 2023/programa Analysis Bio (Labeee).


Saiba mais

Os diagramas apresentados nas figuras 4 e 5 anteriores foram desenvolvidos no programa

Analysis Bio, software livre e gratuito disponibilizado no site do Laboratório de Eficiência Energética
da UFSC. Disponível em: <https://labeee.ufsc.br/downloads/softwares>. Acesso em: 26 jan. 2023.

Leitura complementar

Para nos aprofundarmos mais sobre esse tema, recomendamos a leitura do capítulo 3, p. 86 a

93, do livro indicado a seguir.

CÂMARA BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO. Desempenho de edificações

habitacionais: guia orientativo para atendimento à norma ABNT NBR 15575/2013.

Fortaleza: Gadioli Cipolla Comunicação, 2013. Disponível em: <https://cbic.org.br/wp-conten

t/uploads/2017/11/Guia_da_Norma_de_Desempenho_2013.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023.

TROCANDO IDEIAS

Nesta etapa, relacionada ao conforto térmico em edificações, aprendemos que sentimos conforto

térmico quando as condições ambientes extrapolam determinados parâmetros de temperatura em


função da nossa fisiologia. Também conhecemos as propriedades higrotérmicas dos materiais e

diversas ferramentas úteis para o reconhecimento das estratégias bioclimáticas conforme o clima local.

Propomos, nesse momento, tentar responder às seguintes questões para mobilizar o conteúdo

desta etapa.

Se, em Curitiba, não existe indicativa para uso do ar-condicionado, por que, mesmo assim,

sentimos muito calor em algumas edificações?

Se o ar-condicionado é uma estratégia não indicada em Curitiba, ao se projetar uma academia de


ginástica ou uma cozinha industrial, não devemos utilizar um sistema para resfriamento do ar

interno?

Em Belém, são indicadas quatro estratégias para desconforto por calor: ventilação: 88,8%; ar-
condicionado: 9,05%; alta inércia p/ resfriamento: 4,46%; e resfriamento evaporativo: 2,33%. É

viável pensar todas as estratégias integradas na mesma edificação?


Em qual clima seria mais fácil inserir estratégias bioclimáticas no projeto arquitetônico?

Em Belém, devemos sombrear as aberturas (janelas e vãos) da edificação durante todo o período

diário?

NA PRÁTICA

Existem diversos programas de análise e simulação do conforto térmico disponíveis na internet. Os

que indicamos aqui são de livre acesso, gratuito e de fácil utilização.

O programa Analysys-CST, desenvolvido pelo LabEEE e referenciado na publicação Eficiência


Energética na Arquitetura não está disponível, mas podemos utilizar o Analysis 1.5, também disponível

no website do LabEEE. Ele foi desenvolvido para avaliação bioclimática com base nos dados climáticos

plotados em cartas bioclimáticas e avaliação das condições de conforto térmico segundo a ISO 7730,

conforme descrição dos autores.

Na plataforma do Center for the Built Environment[9] (CBE), (tradução livre, “Centro de pesquisa

para o Ambiente Construído”), existem diversas ferramentas disponíveis on-line e gratuitas, que
suportam simulação avançada e compreensão do desempenho energético do edifício e a experiência do

usuário.

Propomos navegar na plataforma para conhecer as possibilidades de formação e pesquisa que a

instituição oferece. Especificamente, vamos indicar a Ferramenta de Conforto Térmico CBE[10],

desenvolvida para análise do conforto térmico de acordo com o padrão Ashrae 55, com visualizações
de limites de conforto em gráficos psicrométricos ou de temperatura e umidade e geração automática

de documentação LEED para créditos de conforto térmico. Estão inclusos modelos para sistemas

construtivos convencionais (PMV) e para conforto por meio da utilização do modelo de conforto

adaptativo. A plataforma é originalmente no idioma inglês, mas caso seja necessário, basta clicar com o
botão direito do mouse do computador que o navegador fará a tradução automática.

FINALIZANDO

Nesta etapa, nos aprofundamos no atendimento das necessidades térmicas das pessoas que

ocuparão as edificações projetadas por nós. Todos esses conteúdos demandam que você pratique
muito quando estiver projetando. Somente assim incorporará facilmente o bioclimatismo ao seu
processo projetual. Pratique o uso das ferramentas de auxílio, vimos muitas por aqui.

Então não perca tempo e comece a incorporar o que aprendeu aqui.

REFERÊNCIAS

AMERICAN SOCIETY OF HEATING REFRIGERATING AND AIR ENGINEERS CONDITIONING

(ASHRAE). Ashrae 55-2010: Thermal Environmental Conditions for Human Occupancy. Atlanta,

2010. Disponível em: <http://arco-hvac.ir/wp-content/uploads/2015/11/ASHRAE-55-2010.pdf>.

Acesso em: 26 jan. 2023.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência energética na arquitetura. 3. ed. Rio de
Janeiro, 2014. 382 p. Disponível em: <https://labeee.ufsc.br/sites/default/files/apostilas/

eficiencia_energetica_na_arquitetura.pdf>. Acesso em: 26 jan. 2023.

[1] American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers (ASHRAE) é uma

instituição pioneira na área de eficiência energética. Sua colaboração abrange a criação de normas,

manuais, congressos e periódicos. Disponível em: <http://www.ashrae.org>. Acesso em: 26 jan. 2023.

[2] A pele é o principal dispositivo termorregulador do corpo humano. As roupas funcionam como

uma resistência térmica entre a pele e o ambiente, representando uma barreira para as trocas de

calor por convecção. Quanto mais elevada for essa resistência térmica, mais efetiva será a barreira para
evitar as trocas térmicas. A resistência das vestimentas depende do tipo de tecido, da fibra e do ajuste

ao corpo (o ar entre a vestimenta e a pele por ser um bom isolante térmico, incrementando a

resistência térmica). sua unidade de medida é conhecida como clo (do termo em inglês clothing,

vestimenta em português).

[3] Ver tabela 2-1 de Lamberts, Dutra e Pereira (2014, p. 48).

[4] Ver tabela 2-2 de Lamberts, Dutra e Pereira (2014, p. 49).

[5] O balanço energético da edificação, em uma definição simplificada, é a diferença entre a energia

que entra e a que sai da edificação. Essa diferença deve ser igual à variação de energia (Δ ganho ou
perdido) no interior da edificação.

[6]A inércia térmica dos materiais e componentes construtivos é a tendência do elemento de

resistir a mudanças de temperatura. Um elemento de elevada inércia térmica apresenta uma maior
resistência a mudanças de temperatura.

[7] Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Escos) é uma empresa especializada em

serviços de eficiência de energia, fundamental para que os consumidores identifiquem e implementem

medidas de eficiência, não somente de energia, mas também de água e outras utilidades. O mercado

das Escos no Brasil vem crescendo e hoje se organiza em torno da Abesco, sociedade voltada para

difundir e defender os interesses desse grupo de empresas. Disponível em:


<http://www.abesco.com.br/pt/o-que-e-uma-empresa-esco/>. Acesso em: 26 jan. 2023.

[8] Baruch Givoni foi um arquiteto israelense nascido em 1920, reconhecido como um dos maiores

especialistas em arquitetura bioclimática após a publicação de seu livro Homem, clima e arquitetura

(título original Man, Climate and Architecture), em 1969. Foi professor e pesquisador em diversas

instituições e convidado para dar aulas em várias universidades nos Estados Unidos, América do Sul,

Austrália e Europa.

[9] Center for the Built Environment. Disponível em: <https://cbe.berkeley.edu/>. Acesso em: 26

jan. 2023.

[10] Website da Plataforma CBE para acesso a todas as ferramentas para auxiliar a atividade

projetual: https://cbe.berkeley.edu/resources/tools/ e para a ferramenta específica de Conforto Térmico

CBE: https://comfort.cbe.berkeley.edu/. Acesso em: 07 jan. 2023.

Você também pode gostar