O Complexo de Édipo Arcaico no menino e na menina (1928) -
Jean-Michel Petot
A fase fálica, na menina - Jean-Michel Petot (autor do texto) -páginas 124 a
127 do livro “Melanie Klein I: primeiras descobertas e primeiro sistema 1919 -1932 - São Paulo : Perspectiva,2008. - (Estudos 95 / dirigida por J. Guinsburg).
No ponto de confluência destes dois processos, o terror crescente pela mãe
introjetada e decepção com um pai. A menina inverte a posição inicial e entra na segunda fase de seu desenvolvimento edipiano. Distancia-se do pai, aproximasse da mãe e considera, a partir de então, seu pai como um rival. É uma fase que Freud observou e descreveu sobre o nome de fase fálica e que ele considerou como marcando a entrada da menina no Édipo. Num certo sentido, Melanie Klein confirma as concepções de Freud: existe, de fato, uma fase masculina, anterior à entrada no complexo de Édipo, na menina. Admite também que esta fase é caracterizada pela inveja do pênis. Pelo desejo da menina de possuir o órgão genital masculino, teoria que, no entanto, foi contestada na época pela maioria das mulheres psicanalistas. Sabe-se quais são os elementos essenciais da caracterização freudiana da fase fálica, que J. Laplanche e J.-B. Pontalis, resumem, deste modo: “a criança, de sexo masculino ou feminino, só conhece nesta fase um órgão genital, o órgão masculino, e a oposição dos sexos é equivalente à oposição fálico-castrada. A fase fálica corresponde a um momento culminante e ao declínio do complexo de édipo; o complexo de castração é aqui predominante”. No que concerne à menina, descrevem a forma particular que assume seu complexo de castração: “na menina, a ausência do pênis é sentida como um dano sofrido que ela procura negar, compensar ou reparar” (J. Laplanche e J.-B. Pontalis, página 74). E definem a inveja do pênis da seguinte forma:
Elemento fundamental da sexualidade feminina e mola real de sua dialética. A inveja do
pênis nasce da descoberta da diferença anatômica entre os sexos: a criança do sexo feminino sentisse lesada relativamente ao rapaz e deseja possuir um pênis como ele (o complexo de castração); depois. esta inveja do pênis assume, no decorrer do Édipo, duas formas derivadas: desejo de adquirir um pênis dentro de si (principalmente sobre a forma de desejo de ter um filho) e desejo de fruir do pênis no coito (Idem, página 136).
A partir do surgimento das primeiras ideias, propriamente kleiniana. Os dados
empíricos descritos por Freud ainda são mantidos e a divergência se dá na interpretação da maior parte deles. Para Melanie Klein, a criança no estágio fálico não ignora a diferença dos sexos e a diferença da vagina, mas as desconhece. A ignorância é apenas consciente, o conhecimento da vagina é inconsciente e reprimido no decorrer da fase Fálica. O estágio fálico não corresponde, na menina, ao apogeu e ao declínio do Édipo, mas sim ao declínio da primeira posição feminina. Embora o complexo de castração e a inveja do pênis sejam, de fato, prevalentes, eles não podem ser descritos como “elemento fundamental da sexualidade feminina e mola real da sua dialética": qualquer perspectiva dialética está excluída. A fase fálica não é o momento de negação indispensável ao desenvolvimento do processo edipiano, mas um fato irredutível a qualquer desenvolvimento do processo edipiano, mas um fato irredutível a qualquer desenvolvimento da ideia, entendida no sentido filosófico do termo, pois a fase fálica é tão pouco dedutível do complexo de édipo quanto este é engendrável, dialeticamente, a partir da fase fálica. O conjunto do processo da fase fálica explica-se a partir do encontro de duas linhas de desenvolvimento que se entrecruzam, embora provenientes de fontes diferentes. O desenvolvimento edipiano propriamente dito decorre das pulsões genitais. Os elementos negativos do complexo devem ser vinculados a Fontes pulsionais diferentes: as pulsões sádico-orais e sádico-anais, que o complexo edipiano organiza antes de ser por elas submerso. A inveja do pênis não nasce das descobertas da diferença anatômica do sexo: segundo Melanie Klein, esta já é objeto de um reconhecimento inconsciente a partir da emergência das pulsões genitais, fazendo parte, portanto, da primeira fase edipiana. Podemos, pois, resumir as posições kleiniana, de 1927, da seguinte maneira: vindo após a primeira posição feminina, a fase fálica da menina não é a manifestação das tendências genitais infantis mas, ao contrário, revela a sua primeira repressão; a fonte pulsional deste primeiro período do Édipo negativo deve ser buscada nas tendências sádicas que presidem a formação do superego arcaico. A entrada da menina na fase fálica, suponho, com efeito, uma derrota de seu erotismo genital infantil. A intensidade e a duração desta fase dependem da gravidade desta derrota. As pulsões genitais do primeiro estágio edipiano são enfraquecidas pelas frustrações que sofrem: o pênis do pai não pode substituir o seio da mãe enquanto fonte de satisfação reais; as tendências maternais não podem ser satisfeitas.O erotismo genital é portanto decepcionante e seu fracasso renova a frustração originária do desmame.Ao mesmo tempo, as tendências sádico-orais e sádico-anais atingem seu ponto máximo e, em virtude do temor do talião, o medo da vingança da mãe introjetada torna-se terrificante. Ele conduz, portanto, ao abandono da primeira posição edipiana, segundo um processo que nada deve a um desenvolvimento lógico da situação, mas que testemunha a influência de forças intrapsíquicas perturbadoras - as pulsões sádicas. A partir de então, a menina afasta-se do pai que lhe recusa o coito e a maternidade, e o detesta enquanto frustrador, assim como detestou a mãe frustradora do desmame e da educação da higiene. Volta-se para a mãe, para apaziguá-la, ou melhor, ligar-se à mãe real para apaziguar a cruel mãe introjetada. Nesta perspectiva, a entrada da fase fálica não é acompanhada, de forma alguma, pelo desprezo ou desvalorização da mãe, e a supremacia do pênis é apenas um derivado da reaproximação com a mãe. Nesta nova posição, a menina, que detesta o pai, em função da frustração sofrida, considera-o como um rival em relação à sua mãe. A fantasia de ter um pênis possui uma dupla raiz: Revela a permanência do desejo primitivo (roubar os conteúdos do corpo da mãe: fezes = bebês = pênis) sob uma forma deslocada (roubar o pênis do pai) e, portanto, menos ansiógena, visto que neste estágio, o pai até então amado não é introjetada do como um perseguidor sádico e parece pouco perigoso; Essa fantasia exprime também o desejo de supercompensar o ódio culposo e ansiógeno pela mãe através de fantasias em que a menina, graças ao pênis roubado do pai, preenche sexualmente a mãe e lhe dá bebês. Isto corresponde à supercompensação invocada em 1927, convém notar o antepassado da noção de reparação. A inveja do pênis aparece deste modo, como um acompanhamento em fantasia de um rebento deformado - por deslocamento e inversão - do complexo de Édipo inicial. É, portanto, o produto de um trabalho defensivo: “A identificação com o pai está menos carregada de ansiedade que a identificação com a mãe; além disso, o sentimento de culpa para com ela impele a uma super compensação.Por meio de uma nova relação amorosa com ela” (Idem, página 237). A fase fálica, no seu apogeu, caracteriza-se, portanto, por um complexo de Édipo negativo ou invertido: a menina adota imaginariamente, uma posição masculina, deseja ser menino, sonha dar filhos a sua mãe, roubar o pênis do pai, afastá-lo e excluí-lo. Esta fase fálica, puramente defensiva, não tem nenhum poder de desencadear o surgimento do complexo de Édipo clássico, a não ser pelo seu malogro. Como Freud havia observado, é preciso que a menina renuncie a sua posição masculina para alcançar o Édipo. Mas este fator não é o único e determinante. Particularmente, o ódio pela mãe, que fornece um motivo poderoso para o abandono da posição masculina, não se origina do complexo de castração; o prejuízo imaginário da ausência do pênis só pode desencadear este ódio, reativando a hostilidade primitiva contra a mãe que a fase fálica havia deslocado para o pai. Se a fase fálica desaparece é porque “o complexo de castração, que dificulta uma atitude masculina, e também o ódio contra ela, que tem sua origem nas posições anteriores, atuam ambos contra esta nova relação. O ódio e a rivalidade com a mãe conduzem, entretanto, a criança a abandonar novamente a identificação com o pai e a voltar-se para ele como o objeto que deseja amar e pelo qual se deseja ser amada” (Idem, página 237). Mas esta nova transformação só é um definitivo possível, porque o decréscimo das pulsões sádicas inverte a relação das forças em favor das pulsões genitais. O medo da mãe introjetada se enfraquece então, por que os ataques em fantasia que a visam são menos permeados pela agressividade oral e anal e mais exclusivamente associados à rivalidade edipiana, propriamente dita, baseada nas pulsões genitais: “se a relação com a mãe é mais positiva, se ela é construída sobre a posição genital, não só estará a mulher mais livre de todo o sentimento de culpa em sua relação com seus filhos, como também o seu amor pelo seu esposo será fortemente reforçado” (Idem, página 237). Embora esta ideia não seja anunciada explicitamente, tudo se passa como se melaine Klein admitissem, em 1927, que a rivalidade edipiana tardia com a mãe não dá lugar à introjeção de um superego ameaçador, mas sim de um ideal a ser imitado no qual a dimensão destrutiva passa para um segundo plano. A partir de então, o superego comporta três níveis sucessivos, correspondentes às três etapas do Édipo:
Da identificação arcaica com a mãe, na qual o plano sádico-anal é tão preponderante,
desenvolvem-se na menina pequena ciúmes e ódio e se constitui um superego cruel, segundo a imago materna. O superego que se forma nesta etapa, a partir de uma identificação com o pai, pode ser também ameaçador e causar ansiedade, mas nunca parece igualar-se neste domínio aquele que provém da identificação com a mãe. Quanto mais a identificação com a mãe, se estabelece numa base genital, tanto mais se caracterizará pela devoção e bondade de uma mãe ideal e generosa. Esta atividade afetiva positiva depende, portanto, da proporção dos traços pré-genitais e genitais que o ideal da mãe maternal comporta (Idem, página 239).
Permaneceríamos, sem dúvida, mas perto da inspiração kleiniana, dizendo que na
rivalidade com a mãe do primeiro estágio, edipiano a filha e a mãe introjetadas rivalizam em ataques sádicos recíprocos, enquanto que, na posição edipiana definitiva, rivalizam em ternura e amor pelo pai. Melanie Klein sofre aqui a influência de Karl Abraham, porém, vai mais longe que ele: a libido genital está, em si mesma, livre de ambivalência, e isto é assinalável desde o estágio gentital infantil.Nesta perspectiva, Melanie Klein vinculará todos os elementos hostis do complexo tardio a sobrevivências e atenuações dos elementos sádicos herdados das duas formas anteriores. Com esta diferença, adere, quanto ao essencial, à descrição Freudiana no que concerne ao apogeu e declínio do complexo de Édipo pós-fálico na menina. A única divergência a notar tem relação com a ideia de que o complexo feminino, longe de estender-se progressiva e incompletamente, é reprimido como o do menino sob o efeito de uma ansiedade feminina homóloga à ansiedade de castração. Porém, não se trata aqui, se não de uma repetição atenuada - não chegando até a adoção de uma posição masculina e se limitando ao abandono da escolha do objeto incestuoso - do abandono do primeiro amor incestuoso pelo pai sob o efeito do medo da vingança da mãe e introjetada.
recorte do LIvro: Jean-Michel Petot (autor do texto) -páginas 124 a 127
do livro “Melanie Klein I: primeiras descobertas e primeiro sistema 1919 -1932 - São Paulo : Perspectiva,2008. - (Estudos 95 / dirigida por J. Guinsburg).