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1. INTRODUÇÃO

1.1. Padrões de consumo e aspectos toxicológicos do álcool

O etanol (álcool etílico) é uma droga lícita, de baixo custo e fácil

acesso, sendo considerada uma das substâncias psicoativas mais

consumidas em todo mundo e uma das mais antigas utilizadas pelas

sociedades humanas.

Obtido pela fermentação de diversos vegetais, seu registro mais antigo

é o da civilização egípcia, que descreve o uso do vinho e da cerveja. Com o

passar do tempo, novas formas de bebidas alcoólicas foram sendo

introduzidas, e um produto que ora fora produzido artesanalmente foi

gradualmente transformado numa mercadoria industrial amplamente

disponível.1

Atualmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que

existam dois bilhões de pessoas consumidoras de bebidas alcoólicas e 76,3

milhões com diagnóstico de doenças relacionadas ao uso de álcool. O

consumo de álcool está relacionado com uma variedade de problemas

sociais, mentais e de saúde, seja por causa do consumo excessivo, da

dependência alcoólica ou de outros efeitos bioquímicos oriundos da sua

ingestão.2
2

O uso de álcool e suas conseqüências dependem principalmente dos

seguintes fatores: a) das duas dimensões do consumo de álcool: volume e

padrões de consumo; e b) dos mecanismos mediadores: efeitos

bioquímicos, embriaguez e dependência.

Os efeitos bioquímicos diretos do álcool podem ser tanto benéficos

(como por exemplo, a redução de mortalidade por infarto agudo do

miocárdio e doenças coronarianas observada entre bebedores moderados),3

como prejudiciais, tais como a doença hepática alcoólica, considerada uma

das conseqüências clínicas mais graves do uso crônico de álcool.4 A

embriaguez, observada na intoxicação aguda pelo álcool, é um poderoso

mediador para as conseqüências nocivas do álcool, como por exemplo, os

acidentes de trânsito, a violência interpessoal e as mortes acidentais.5-7 Já a

dependência alcoólica é um fator sustentador do consumo de álcool,

podendo ocasionar impactos tanto nas doenças crônicas como agudas.8

A definição de dependência alcoólica ou alcoolismo é bastante

complexa e envolve diversos critérios (como por exemplo, compulsão pelo

consumo, necessidade de doses crescentes de álcool para atingir o mesmo

efeito obtido com doses anteriormente inferiores, síndrome de abstinência,

entre outros), dos quais pelo menos três devem estar presentes em qualquer

momento durante o ano anterior para que se caracterize a dependência.9

Os demais padrões de consumo são definidos levando em conta tanto

aspectos médicos quanto psicossociais do uso de álcool. Indivíduos que

consomem até duas doses (homens) ou uma dose (mulheres) por dia são

considerados consumidores moderados de álcool, sendo que uma dose


3

típica equivale a aproximadamente 285 ml de cerveja, 120 ml de vinho ou 30

ml de bebida destilada (uísque, vodka, cachaça).10

O padrão de uso pesado de álcool por tempo determinado é

denominado “binge drinking”, ou uso pesado episódico. Esse padrão é

definido pelo uso de 5 ou mais doses de bebida alcoólica em única ocasião

para homens e 4 ou mais doses para mulheres.11 O uso pesado de álcool

também pode ser definido de acordo com o consumo excessivo diário de

certo volume de álcool (por exemplo, 3 doses por dia).12

O álcool é uma droga solúvel em água, sendo absorvida após sua

ingestão principalmente pelo estômago e intestino delgado, e distribuída

livremente pelo corpo humano, podendo afetar praticamente todo órgão do

corpo. Assim, grande parte dos tecidos corpóreos, como o coração, cérebro

e músculos, estão expostos à mesma concentração de álcool que no

sangue.13

A taxa de absorção do álcool pelo organismo humano depende de

diversos fatores. Por exemplo, ele é absorvido mais rapidamente quando

estamos de estômago vazio ou ingerimos bebidas alcoólicas contendo gás

carbônico, como o uísque com soda ou champagne. Já os alimentos,

principalmente aqueles com alto conteúdo de carboidratos, retardam a

absorção (a concentração de álcool sanguínea com o estômago cheio pode

ser 75% menor que a obtida com o estômago vazio).13

No geral, o álcool é depurado do sangue em uma taxa de 3,3

mmol/hora (15mg/100mL/hora), mas tal valor pode variar de acordo com a

constituição física (peso e altura), sexo da pessoa, em diferentes ocasiões


4

de consumo e com o montante consumido.13

A concentração de álcool no sangue tende a ser maior em mulheres,

que possuem um menor volume sanguíneo e baixos níveis de álcool-

desidrogenases no estômago, do que nos homens. Outros fatores que

podem ocasionar diferenças na concentração de álcool no sangue são: fase

do ciclo menstrual (sendo maior no período pré-menstrual e na ovulação),

prévia exposição ao álcool, tipo de bebida, entre outros.13

Em pequenas quantidades o álcool promove uma desinibição, mas com

o aumento desta concentração o indivíduo passa a apresentar uma

diminuição da resposta aos estímulos, fala pastosa, dificuldade à

deambulação, entre outros. Em concentrações muito altas, o indivíduo pode

ficar comatoso ou até mesmo morrer. Na Tabela 1 é apresentada a

correlação dos níveis sanguíneos de etanol com as alterações

comportamentais mais comuns observadas.14

Porém, a associação dos resultados de concentração de álcool no

sangue com valores pré-estabelecidos de dosagem alcoólica deve ser

realizada com muita cautela, devido às diferenças de absorção do álcool

etílico entre diferentes indivíduos.15

Informações compiladas pela própria indústria do álcool sobre a

fabricação e vendas de bebidas destiladas no mundo demonstram que a

China é a maior produtora e consumidora de destilados do planeta (725

milhões de litros de baijiu - bebida destilada típica da China - produzidos e

comercializados), seguida pela Rússia, que ostenta um consumo estimado

em 350 milhões de litros de vodka por ano.16


5

Tabela 1. Relação entre os valores de alcoolemia (g/L) e os sinais


clínicos/sintomas da intoxicação por álcool.

ALCOOLEMIA (g/L) ESTÁGIO SINAIS CLÍNICOS E


SINTOMAS

0,1 a 0,5 Sobriedade Nenhuma influência aparente; testes


especiais revelam pequenos
transtornos clínicos.

Suave euforia; sociabilidade;


decréscimo das inibições; diminuição
0,3 a 1,2 Euforia da atenção, julgamento e controle;
perda da eficiência em testes
especiais.

Instabilidade emocional; decréscimo


da inibição; perda do julgamento
crítico; enfraquecimento da memória e
0,9 a 2,5 Excitação da compreensão; decréscimo da
resposta sensitiva; alguma
incoordenação muscular.

Desorientação; confusão mental e


vertigens; estado emocional
exagerado (medo, aborrecimentos,
aflição); distúrbio da sensação e da
1,8 a 3,0 Confusão percepção às cores, formas,
movimentos e dimensões; debilidade
no equilíbrio; incoordenação muscular;
vacilação no modo de andar e
dificuldade na fala.

Apatia; inércia geral; diminuição


marcada das respostas aos estímulos;
marcada incoordenação muscular com
2,7 a 4,0 Estupor instabilidade para suportar o andar;
vômitos; incontinência de urina e
fezes; debilidade da consciência.

Completa inconsciência; coma;


anestesia; debilidade e abolição dos
3,5 a 5,0 Coma reflexos; incontinência de urina e
fezes; dificuldades circulatórias e
respiratórias; morte possível.

> 4,5 Morte Parada respiratória

FONTE: Modificado de Dubowski, 1980.14


6

Essas mesmas fontes citam que o Brasil ocupa, com a cachaça, a

quarta colocação na ordem dos maiores produtores mundiais de destilados,

com algo em torno de 200 milhões de litros comercializados ao ano, sendo

195 milhões consumidos no mercado interno. Cruzando-se com dados da

população brasileira, cuja densidade é muitas vezes inferior à asiática, os

números anteriormente citados são, por si só, um forte sinal de alerta sobre

o potencial de riscos envolvendo a produção e o consumo de bebidas

alcoólicas no Brasil.16

Estima-se que a cerveja represente 85% das bebidas alcoólicas

consumidas no país, que é o quarto maior produtor mundial deste tipo de

bebida na atualidade, tendo produzido 8,5 bilhões de litros em 2004.17 O

Brasil teve um crescimento sistemático no consumo de bebidas alcoólicas

per capita desde 1961 até 1997, quando o pico da série é atingido, conforme

mostrado na Figura 1. Ainda, segundo estudo da OMS realizado em 2004, o

Brasil está em 81º lugar entre 185 países no ranking de consumo per capita

de álcool, com o valor estimado de 5,32 litros de álcool per capita em 2001.2

O caso brasileiro chama a atenção não tanto pela taxa de consumo per

capita, mas antes por apresentar altas prevalências de consumo e de

dependência de álcool: 74,6% das pessoas consomem álcool (uso na vida,

ou seja, uso da substância alguma vez durante a vida) e 12,3% dos

consumidores podem ser considerados dependentes de álcool, subindo a

taxa de dependentes para 27,4% entre os jovens de 18 a 24 anos do sexo

masculino, de acordo com o critério diagnóstico para dependência do

NHSDA (National Household Surveys on Drug Abuse).18


7

Figura 1. Consumo de álcool per capita por pessoas com mais de 15 anos
de idade no Brasil entre 1961 e 2001. FONTE: FAO (Organização das
Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), World Drink Trends 2003.

O consumo de álcool acaba por gerar conseqüências médico-sociais

preocupantes, tais como perdas econômicas devido ao tempo não

trabalhado relacionado a doenças ou ferimentos, desestabilização de

relações familiares e sociais, mortes prematuras, incapacitação permanente,

entre outras.19

Para a região da América Latina e do Caribe, onde o Brasil está

incluído, estima-se que 3.857.000 anos de vida saudáveis perdidos por

incapacitação (DALY - Disability Adjusted Life Years) são atribuíveis aos

transtornos relacionados ao uso de álcool.20

Ainda, para países de renda média dessa região espera-se que

ocorram aumentos no número de casos de fatalidades relacionadas ao uso


8

de álcool entre 2002 e 2030, pois as projeções demográficas disponíveis

atualmente indicam um número aumentado de pessoas que chegam ao

intervalo de 15 a 64 anos, que é o intervalo de maior risco para o início do

consumo de álcool e dos problemas a ele relacionados. Com isso, projeta-se

um aumento de 600.000 DALYs atribuídos aos transtornos relacionados ao

uso de álcool para essa região até 2030.20

De acordo com o I Levantamento Nacional Sobre os Padrões de

Consumo de Álcool na População Brasileira, entre a população de adultos

que bebem, 45% disseram que têm ou tiveram pelo menos um problema

relacionado ao uso de álcool.21

Os problemas físicos aparecem como os mais citados por todos os

segmentos. Do total dos entrevistados (n=1152), 38% disseram ter

problemas físicos decorrentes do álcool. Os problemas familiares vêm em

segundo lugar, citados por 18% dos entrevistados, seguidos pelos

problemas sociais (17%) e os problemas com violência (17%).21

Para o cálculo do peso global dos danos relacionados ao consumo do

álcool, a OMS caracterizou o padrão de consumo em cada nação do globo

terrestre, classificando-as em quatro níveis de risco com variação crescente

de 1 a 4, conforme padrão encontrado.16 A Figura 2 ilustra estes resultados,

pareando-os com os dados de mortalidade atribuível ao álcool.

De uma forma geral, a Europa ocidental possui padrões de consumo de

menor risco, evidenciando-se o contrário para a Europa central e o bloco da

antiga União Soviética. Grã-Bretanha, China, Austrália, América do Norte e

Oriente Médio compõem, juntamente com a Argentina (representante única


9

da América Latina), um grupo cujo padrão situa-se numa faixa intermediária

ou de baixo risco. Para a grande maioria de países remanescentes, entre

estes o Brasil, verificou-se a vigência de padrões de consumo com elevado

grau de risco (nível 4). Os dados mostram que o padrão de consumo reflete-

se nas taxas de morbimortalidade atribuível ao uso do álcool, numa razão

diretamente proporcional ao grau de risco associado ao mesmo.16

1.2. Violência e os homicídios

As grandes cidades e áreas metropolitanas passaram a experimentar

um crescimento explosivo da violência urbana nas últimas décadas. A

violência pode ser definida como o resultado de processos sociais baseados

na aplicação de força para o exercício de poder de alguém contra outro

indivíduo, grupos, ou contra si mesmo, com intenção de provocar dano

físico.22 Dentre as diferentes formas de violência, destacam-se os

homicídios, que são definidos pela OMS como "lesões infligidas por outra

pessoa com intenção de agredir e matar por qualquer meio".9

As taxas e os padrões de mortes violentas variam de acordo com a

região e o país. Países menos desenvolvidos, especialmente aqueles com

grande discrepância social entre ricos e pobres, tendem a apresentar

maiores taxas de homicídio que países desenvolvidos, onde os suicídios são

mais prevalentes.23
10

Figura 2. Mapas comparativos indicando, em escala mundial, os padrões de


consumo e grau de risco para cada país (escala crescente de 1 a 4) e
respectiva mortalidade atribuível ao consumo de álcool. FONTE:
Organização Mundial da Saúde, 2003.
11

Em 2000, estima-se que 1,6 milhões de pessoas morreram ao redor do

mundo como resultado da violência. A grande maioria dessas mortes

ocorreu em países em desenvolvimento e menos de 10% ocorreram em

países considerados desenvolvidos (Tabela 2). Quase um terço das mortes

foram homicídios (31,3%), valor este superior ao número de mortos

resultantes de conflitos de guerra no mesmo período (18,6%).24

Tabela 2. Estimativa das mortes relacionadas à violência no mundo para o


ano 2000 segundo o tipo de violência empregada e a ocorrência em países
classificados de acordo com a condição sócio-econômica.

Mortes relacionadas com violência no mundo, 2000

Tipo de violência Número a Taxa por 100.000 %

habitantes b

Homicídio 520.000 8,8 31,3

Suicídio 815.000 14,5 49,1

Mortes em Guerras 310.000 5,2 18,6

Total c 1.659.000 28,8 100,0

Países em desenvolvimento 1.510.000 32,1 91,1

Países Desenvolvidos 149.000 14,4 8,9

a
Aproximado para 1000.
b
Padronizado por idade.
c
Inclui 14.000 mortes intencionais resultantes de intervenções legais.
FONTE: Organização Mundial da Saúde, 2002.
12

Entre 1985 e 1994, as taxas de homicídios entre os jovens aumentaram

em várias partes do mundo, especialmente na faixa de 10 a 24 anos de

idade. Em 2000, cerca de 199.000 jovens morreram vítimas de homicídio

(9,2 por 100.000 habitantes), ou em outras palavras, 565 crianças,

adolescentes e adultos jovens de 10 a 29 anos morreram por dia como

resultado de violência interpessoal.24 As taxas de homicídio entre os jovens

variam consideravelmente entre os países, sendo que as maiores taxas são

encontradas na América Latina (Figura 3).

Figura 3. Mapa mundial comparativo das estimativas das taxas de homicídio


entre jovens de 10 a 29 anos para cada país. FONTE: Organização Mundial
da Saúde, 2002.
13

Apesar de menos expostos a doenças e epidemias, os jovens são a

parcela da população mais sujeita a morte por fatores externos: no Brasil, de

acordo com o Mapa da Violência de 2006 divulgado pela Organização dos

Estados Ibero-americanos (OEI), 60,4% dos óbitos na faixa etária entre 16 e

24 anos (praticamente três em cada cinco mortes) são causados por

homicídios, acidentes de trânsito e suicídios. Nas demais faixas, são

atribuídos a essas causas 9,6% das mortes. Se na população não-jovem (0

a 14 e acima de 25 anos) apenas 3% dos óbitos são causados por

homicídios, entre os jovens, os homicídios são responsáveis por 39,7% das

mortes.25

No Brasil, a mortalidade por causas externas, a partir de 1980, passou

a ocupar o segundo lugar entre as causas de morte no país. No ano 2000,

ocorreram 118.367 mortes por causas externas, o que representou 12,5% do

total de mortes. Dentre as causas externas, os homicídios lideraram a

mortalidade: 45.343 vítimas, correspondendo a 38,3% do total, o equivalente

a 124 pessoas assassinadas a cada dia.26 Para esse mesmo ano, de acordo

com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), o homicídio foi a

terceira maior causa de morte no Brasil, com uma taxa de 30,5 mortos por

100.000 habitantes, e a primeira causa de morte entre as pessoas de 15 a

44 anos.27

Ainda, segundo o levantamento das taxas de homicídio em 84 países

realizado pela OEI em 2006, o Brasil ocupa a quarta posição, com uma taxa

total de 27 homicídios por 100 mil habitantes (incluindo todas as faixas

etárias), só ficando atrás da Colômbia, da Venezuela e da Rússia. Quando


14

se consideram somente os jovens, o Brasil sobe para a terceira posição – à

frente estão Colômbia e Venezuela.25

O estudo ainda conclui que o avanço das taxas de homicídios no Brasil

nas últimas duas décadas ocorreu devido ao aumento da mortalidade entre

os jovens: a taxa de homicídios na população de 15 a 24 anos saltou de 30

(a cada 100 mil jovens) para 51,7 entre 1980 e 2004. Nas demais faixas

etárias, o índice passou de 21,3 para 20,8 no mesmo período.25

A análise de dados provenientes do Sistema de Informações sobre

Mortalidade do Ministério da Saúde mostra uma diferença substancial entre

as regiões do Brasil quanto à mortalidade por homicídios (Tabela 3). Entre

os anos de 2005 e 2006, foram contabilizados 96.723 homicídios no país,

com grande parte dessas ocorrências na região Sudeste (42.850).28

Apesar de um menor número absoluto de homicídios comparado à

região Sudeste, as regiões Centro-Oeste e Nordeste apresentaram as

maiores taxas de homicídios em 2006, respectivamente, 28,3 e 27,9

homicídios por 100.000 habitantes. Além disso, essas duas regiões

apresentaram elevações nas taxas de homicídio no período de 2005 a 2006,

ao contrário da região Sudeste, a qual apresentou uma tendência de queda

(-3,3%).

Vale à pena ressaltar que o Estado de São Paulo, com o maior número

de homicídios do país, apresentou uma queda significativa na taxa de

homicídios durante o período analisado (-7,8%), enquanto Pernambuco, com

a elevada taxa de 52,7 homicídios por 100.000 habitantes, apresentou

tendência de crescimento (2,9%).


15

Tabela 3. Comparação do número de óbitos por homicídios e das taxas de


homicídios (por 100.000 habitantes) entre as regiões brasileiras, estados
com maior número de homicídios, região metropolitana e município de São
Paulo nos anos de 2005 e 2006.

2005 2006
a b
Região Óbitos Taxa Óbitos Taxa Variação na Taxa

Sudeste 21633 27,6 21217 26,7 -3,3%

Nordeste 12962 25,4 14394 27,9 9,8%

Sul 5612 20,8 5715 20,9 0,6%

Norte 3693 25,1 4063 27,0 7,7%

Centro-Oeste 3678 28,2 3756 28,3 0,2%

Total 47578 25,8 49145 26,3 1,9%

2005 2006

Estados Óbitos Taxa Óbitos Taxa Variação na Taxa

São Paulo 8727 21,6 8166 19,9 -7,8%

Rio de Janeiro 7098 46,1 7122 45,8 -0,8%

Pernambuco 4307 51,2 4478 52,7 2,9%

Minas Gerais 4208 21,9 4155 21,3 -2,5%

Total 24340 29,2 23921 28,3 -3,0%

2005 2006

São Paulo Óbitos Taxa Óbitos Taxa Variação na Taxa

Região Metropolitana 5613 28,9 5028 25,6 -11,7%

Município de São Paulo 3096 28,3 2556 23,2 -18,1%

a
Número absoluto de óbitos por agressões (homicídios)
b
Taxa de homicídios por 100.000 habitantes
FONTE: Sistema de Informações sobre Mortalidade - SIM/DATASUS
16

Dessa forma, podemos observar que os índices de violência no Brasil

tendem a ser mais altos nos grandes centros urbanos, o que também pôde

ser demonstrado pelo crescimento nas taxas de homicídio em regiões do

país cujo desenvolvimento sócio-econômico nos últimos anos obteve

grandes avanços (como a região Nordeste e Centro-Oeste, por exemplo).

O município de São Paulo, considerado o maior centro urbano do país,

com aproximadamente 11 milhões de habitantes e 1.523 km2 de extensão

territorial (Figura 4), tem vivenciado quedas importantes nas taxas de

homicídios nos últimos anos (-18,1% entre 2005 e 2006), apesar de ainda

apresentar uma preocupante taxa de homicídios (23,2 homicídios por

100.000 habitantes em 2006), principalmente quando comparada com a taxa

média de mortes violentas observada para países desenvolvidos (Tabela 2).

As quedas observadas em algumas regiões do país, em particular na

região Sudeste e na cidade de São Paulo, se deve em parte a uma maior

ação da polícia contra a criminalidade e também à implementação do

Estatuto do Desarmamento em 2004, lei que restringiu o porte de armas de

fogo no Brasil.29

Com expressões e significados bastante importantes, variados e

controversos, o estudo dos homicídios apenas recentemente veio a ser

contemplado pela Saúde Pública em nosso país. Em um levantamento

efetuado pelo Centro Latino-Americano de Estudos sobre Violência e Saúde

(CLAVES), já se detecta a ausência de estudos mais sistemáticos sobre os

homicídios, embora outras causas menos freqüentes em nossa realidade

venham sendo investigadas.30 No nível mundial, os crescentes índices de


17

homicídios fizeram com que esta problemática passasse a ser encarada

como prioritária para a Saúde Pública, assumindo características de

pandemia.31

Município de São Paulo


Estado São Paulo

Área geográfica 1.523 km2

População estimada 10.895.521 hab.

Figura 4. Mapa do Estado de São Paulo com destaque para o município de


São Paulo e suas características geográficas e populacionais. FONTE: Mapa
modificado de: SaoPauloMesoMicroMunicip.svg, Raphael Lorenzeto de
Abreu, 2006; Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
e SEMPLA (Secretaria Municipal de Planejamento), 2005.
18

A preocupação acerca deste tema está explicitada na elaboração de

um plano de ação regional desencadeado pela OPAS, que propõe conhecer

e atuar nas causas da violência, buscando eliminá-las.32

O precário conhecimento acerca dos homicídios dificulta as políticas e

ações preventivas. Sabe-se que a maioria deles envolve o uso de armas de

fogo e que incidem sobre grupos sociais cujo perfil sócio-econômico é

menos privilegiado do que o encontrado em outras causas violentas.33

Entretanto, a real prevalência é desconhecida, existindo falhas consideráveis

nas informações sobre incidência. Os dados não são fidedignos o suficiente

para informar sobre o tipo de arma de fogo utilizada, as circunstâncias do

evento, os agressores e outros fatores.

Pouco se sabe sobre os custos diretos e indiretos desta forma

específica de violência. Max e Rice,34 embora chamem de “atirar no escuro”

os cálculos dos custos com agravos por arma de fogo, os estimaram em

20,4 bilhões de dólares, nos Estados Unidos, em 1990.

Deste montante, 84% foram utilizados em eventos fatais. Despesas

diretas com cuidados de saúde foram orçadas em 14 bilhões. Cerca de 1,6

bilhões foram gastos na perda de produtividade causada por doença e

desajuste conseqüentes à agressão, e 17,4 bilhões na perda de

produtividade por morte prematura. De acordo com estes autores, para cada

agravo fatal por arma de fogo há dois que requerem hospitalização e 5,4 não

são severos o suficiente para serem hospitalizados.

Os efeitos econômicos da violência interpessoal tendem a ser mais

agravantes em países pobres. Entretanto, existem poucos estudos sobre os


19

efeitos econômicos da violência nestes países. As comparações com países

desenvolvidos são complicadas pelo fato das perdas econômicas

relacionadas à produtividade serem subestimadas em países em

desenvolvimento. Por exemplo, calcula-se que um único homicídio, em

média, custa $15.319 dólares na África do Sul, $602.000 na Austrália,

$829.000 na Nova Zelândia e mais de $2 milhões nos EUA.35

Num estudo sobre os custos diretos e indiretos da violência no Estado

de São Paulo no ano de 1998, Kahn36 estimou que esses custos atingiram a

cifra de oito bilhões e 96 milhões de reais, ou cerca de 3% do PIB estadual

da época. Sem dúvida um gasto elevado quando comparado com o que foi

investido em outros setores no mesmo período: representa, por exemplo, 2,7

vezes o gasto realizado com a Secretaria da Saúde naquele ano.

Cabe lembrar que quando se trata de homicídios, estamos lidando

somente com a “ponta do iceberg” do complexo e imenso problema social da

violência, pois baseado em estudos de violência não-fatal foi estimado que

para cada homicídio de um jovem existam de 20 a 30 vítimas jovens não-

fatais que acabam por receber tratamento hospitalar.24


20

1.3. Associação entre o uso de álcool e os homicídios

A relação entre o consumo de bebidas alcoólicas e a violência é

complexa. No entanto, mesmo sem existir uma relação causal simples e

unidirecional, vários modelos teóricos são propostos para entender este

fenômeno, como por exemplo, a hipótese de que o uso de álcool conduziria

ao crime. Neste modelo, o álcool levaria ao crime principalmente por suas

propriedades psicofarmacológicas.37

Do ponto de vista farmacológico, alguns efeitos da intoxicação -

incluindo distorção cognitiva e de percepção, déficit de atenção, julgamento

errado de uma situação e mudanças neuroquímicas - poderiam originar ou

estimular comportamentos violentos. A intoxicação crônica também pode

contribuir com as agressões por fatores como privação de sono, abstinência,

prejuízo de funcionamento neuropsicológico ou associação com transtornos

de personalidade.37

Outros modelos procuram explicar a relação entre crimes e drogas

ilícitas, podendo ser aplicado ao álcool. Estão baseados na suposição de

que os indivíduos que cometem crimes estão mais provavelmente expostos

a situações socioculturais e ambientais onde beber em excesso é perdoado

ou encorajado. Desta forma, em ambientes onde existirem maior expectativa

de aceitação da violência e menor receio das suas conseqüências sociais,

físicas e legais, teríamos um maior índice de criminalidade e abuso de

substâncias psicoativas.37
21

Também existe a probabilidade de que a relação bebida-violência seja

devida a causas comuns, dentre as quais figurariam a personalidade,

antecedentes familiares de alcoolismo, fatores genéticos, transtorno de

personalidade anti-social e todas as circunstâncias sociais que predisporiam

ao crime e à bebida.37

As relações são múltiplas e variadas, mas o consumo de álcool é, no

mínimo, um importante facilitador de situações envolvendo violência. Os

dados existentes na literatura científica mostram que a presença de álcool

está associada com a violência interpessoal e outros crimes, incluindo

crimes sexuais, violência familiar, homicídios, acidentes de trabalho, quedas

acidentais, entre outros.5-7;38-39

No trânsito, o álcool também é um fator importante na ocorrência de

acidentes. Zador e cols.40 referem que 51,9% das vítimas do sexo

masculino, entre 16 e 20 anos, que morreram em acidentes de trânsito

estavam alcoolizadas.

Outros tipos de morte violenta também estão relacionados ao uso de

álcool, como mostrado no estudo realizado por Polewka e cols.41, no qual

48,9% dos adolescentes que cometeram suicídio tinham ingerido bebidas

alcoólicas. Gorniak e cols.42 citam que em casos de morte por afogamento,

no Estado de Ohio, EUA, 21% das vítimas estavam alcoolizadas.

Entre as principais causas de morte no mundo, os homicídios possuem

lugar de destaque, sendo o consumo de álcool considerado um possível

fator de risco para a vitimização por homicídio.


22

Num estudo clássico realizado por Wolfgang43 sobre a natureza dos

homicídios na Filadélfia, entre 1948 e 1952, concluiu-se que 26% dos casos

poderiam ser classificados como “vítimas precipitantes”, ou homicídios

precipitados pela vítima, que diferem dos demais casos de homicídio em

algumas características: proporção elevada do uso de faca como meio,

envolvimento entre vítima e autor, presença de álcool, ocorrência de

antecedentes criminais por agressão, entre outras diferenças relevantes.

O uso de álcool parece estar fortemente relacionado a este processo

de precipitação, pois ele aumenta a agressividade num contexto de

provocação e diminui a capacidade de julgamento do indivíduo.

Alternativamente, indivíduos embriagados podem se tornar alvos fáceis

para ladrões e outros crimes predatórios que comumente culminam em

homicídios.44 Digno de nota é o dado segundo o qual 7,9% dos homens

declararam já ter discutido com outras pessoas após ingestão de bebidas

alcoólicas, de acordo com estudo epidemiológico conduzido no Brasil.45

Uma meta-análise avaliou 65 estudos norte-americanos baseados em

dados médico-legais de vítimas fatais por mortes violentas (exceto acidentes

de trânsito) e encontrou a maior porcentagem de casos positivos para álcool

entre as vítimas de homicídio (47,1%), seguidas das vítimas cujo ferimento

causador da morte foi realizado sem intenção (38,5%) e os casos de suicídio

(29%).46

A relação entre o uso de álcool e a vitimização por homicídio também

foi estabelecida num estudo realizado em Los Angeles, EUA, a partir de

dados de 4950 vítimas de homicídio obtidos no período de 1970 a 1979, o


23

qual indicou a presença de álcool no sangue de 46% das vítimas.44

O uso de álcool por parte dos agressores também pode ser um grande

fator de propensão à ocorrência de homicídios. Em uma amostra de

perpetradores culpados por assassinatos na Escócia, Gillies47 encontrou que

mais de 58% dos homens estavam embriagados no momento do crime.

Estatísticas do Instituto Nacional de Justiça dos EUA apontam que em cerca

de 15% a 66% de todos os homicídios e agressões sérias, o agressor,

vítima, ou ambos haviam ingerido bebidas alcoólicas.48

No contexto latino-americano, pesquisa realizada na Colômbia, país

com uma das maiores taxas de homicídios do mundo, Cardona e cols.49

estudaram uma amostra de 1394 vítimas de homicídio em Medelin, entre

1990 e 2002. Dessas, um quarto havia consumido álcool e nove em cada

dez foram mortas por armas de fogo.

No Brasil, Duarte e Carlini-Cotrim analisaram 130 processos de

homicídios ocorridos entre 1990 e 1995 em Curitiba: segundo o estudo,

53,6% das vítimas e 58,9% dos autores estavam sob efeito de bebidas

alcoólicas no momento do crime. Visto de outro modo, em 76,2% dos

processos ou a vítima, ou o autor, ou ambos estavam sob influência de

álcool no momento da ocorrência.50

Gawryszewski e cols.26 obtiveram dados de homicídios entre residentes

do município de São Paulo no segundo semestre de 2001. Os achados

revelaram o uso de álcool por 42,5% das vítimas que tiveram o exame

toxicológico realizado.
24

Estudo realizado por Coelho51 a partir de prontuários registrados no

Instituto Médico Legal da Cidade de Osasco no Estado de São Paulo,

durante o período de janeiro a junho de 1997, constatou positividade para

álcool etílico em 38,9% de 396 casos de homicídios por armas de fogo.

Os estudos que relacionam o uso de álcool e homicídios reportados na

literatura utilizaram uma variedade de metodologias contrastantes. Muitos

deles se baseiam em relatos do uso de álcool pela vítima e/ou agressor

antes da ocorrência do homicídio, o que limita a interpretação dos resultados

relacionados à influência farmacológica e comportamental do álcool na

prática do homicídio.

É uma experiência geral o fato de o álcool estar presente em amostras

de cadáveres em um grande número de vítimas necropsiadas no âmbito

médico-legal52, o que torna a análise de sangue para obtenção de resultados

confiáveis do valor de alcoolemia importante no esclarecimento da

associação entre álcool e violência.

Entre outros efeitos, o álcool etílico diminui a capacidade cognitiva e

aumenta a probabilidade de respostas agressivas do indivíduo na presença

de uma provocação.53 Também atua junto aos receptores GABA e de

serotonina do cérebro, o que pode reduzir o medo e a ansiedade com

relação às conseqüências sociais, físicas e legais da ação de outrem. Além

disso, o indivíduo alcoolizado apresenta prejuízos tanto na atenção como na

capacidade de julgamento, tornando-o mais vulnerável nas situações

envolvendo acidentes e violência.54


25

As informações sobre o nível de álcool em vítimas de homicídio são

limitadas aos dados fornecidos por exames toxicológicos realizados pelos

Institutos Médico-Legais e ainda são poucos os estudos encontrados na

literatura nacional relacionando o uso de álcool e homicídios.26;50-51

Em nosso país, apesar de apresentarmos números expressivos de

homicídios e outras mortes violentas, carecemos de estudos com uma

abrangência que permita reflexões epidemiológicas para suportar decisões

governamentais e políticas públicas voltadas ao problema.

Argumenta-se que a diminuição no consumo de álcool nos Estados

Unidos possa ser uma das muitas razões pelas quais o número de

homicídios caiu naquele país. Um estudo feito por Parker e Cartmill55

analisou a taxa de homicídio de jovens e a taxa de consumo de álcool por

adultos - principalmente cerveja - entre 1934 e 1995, mostrando a correlação

de tendências entre as duas séries históricas.

É possível especular também que parte da responsabilidade pelo

aumento dos homicídios no Brasil desde os anos 80 deveu-se ao aumento

de 74% no consumo de bebidas alcoólicas entre 1970 e 1990 apontado pela

OMS.56

As evidências presentes na literatura a respeito da influência do álcool

nos homicídios apontam para uma associação positiva entre o uso de álcool

e a vitimização por homicídio.

Devido ao padrão de consumo de álcool estar relacionado a

determinadas características demográficas, e às limitações no entendimento

ainda escasso da associação entre o consumo de álcool e a violência em


26

nosso país, estudos sobre a influência do álcool nas mortes por homicídios

devem ser promovidos e considerados na prevenção do número dessas

mortes e os custos delas decorrentes.


27

2. JUSTIFICATIVA

As mortes por causas violentas possuem números alarmantes no Brasil

e representam uma importante questão para a saúde pública. Além da

parcela direta de danos sobre o indivíduo, a violência acaba por gerar

também altos custos à sociedade como um todo.

Visto a amplitude do problema da violência e de suas implicações na

sociedade brasileira atual, se faz necessário uma abordagem ampla, no

sentido de se conhecer o conjunto de fatores que possam interferir na sua

dinâmica.

Nesse sentido, a cidade de São Paulo é um modelo ideal para outras

regiões brasileiras e centros urbanos em países em desenvolvimento, pois a

influência do álcool na ocorrência de homicídios tem sido investigada

sistematicamente.

Além disso, São Paulo representa um grande desafio para o controle

do consumo nocivo de álcool, já que faz parte da região brasileira com a

maior prevalência de uso na vida de álcool (80,4%)18 e possui uma alta

densidade de pontos de venda de álcool (uma proporção estimada de um

para 16 pessoas em uma região periférica da cidade).57

Dados e informações disponíveis sobre o uso de álcool nas mortes por

homicídios podem ajudar na implantação de políticas de controle que

reduzam o número dessas mortes, o que justifica a necessidade de um

estudo capaz de avaliar a relação entre o uso de álcool e a vitimização por


28

homicídio na maior metrópole do Brasil, a cidade de São Paulo.

O objetivo do presente estudo foi avaliar como a presença de álcool no

sangue de vítimas de homicídio em São Paulo, durante o ano de 2005, está

associada com as características demográficas dessas vítimas e as

circunstâncias do homicídio, informações estas essenciais para a formulação

de políticas de prevenção da violência relacionada ao uso de álcool.


29

3. OBJETIVOS

3.1. Objetivos gerais

Caracterizar a associação entre o uso de álcool e a vitimização por

homicídio com base nos dados de vítimas necropsiadas nos postos médico-

legais do município de São Paulo durante o ano de 2005.

3.2. Objetivos específicos

Realizar a distribuição das informações coletadas por sexo, faixa etária,

grupo étnico, valor de alcoolemia e meio de perpetração da morte.

Identificar a associação do local e da data/horário das mortes com a

ocorrência de homicídios.

Estabelecer a relação entre o uso de álcool e o perfil das vítimas de

homicídio.
30

4. MÉTODOS

4.1. Desenho do estudo

Estudo observacional do tipo transversal.

4.2. Local e período do estudo

Município de São Paulo, de janeiro a dezembro de 2005.

4.2.1. População do município de São Paulo

A população estimada para o município de São Paulo no ano do

presente estudo era de aproximadamente 11 milhões de habitantes, sendo

considerada a maior cidade do Brasil.58


31

4.3. População de estudo

Vítimas de homicídio (N=2042) necropsiadas nos postos médico-legais

do Instituto Médico Legal de São Paulo (IML/SP) e submetidas ao exame de

dosagem de álcool no sangue (alcoolemia).

4.4. Instituto Médico Legal de São Paulo

O Instituto Médico Legal de São Paulo foi fundado em 1885, como

Serviço Médico Policial da Capital, sendo que seu regulamento foi definido

em 1933, com o intuito de fornecer bases técnicas em Medicina Legal para o

julgamento de causas criminais.

A mais conhecida das funções do IML é a necropsia, também

conhecida como autópsia, o exame do indivíduo após a sua morte. Porém,

associar o IML exclusivamente às necropsias é errôneo, pois este tipo de

exame constitui 30% do movimento do Instituto. Cerca de 70% dos exames

realizados (conhecidos como exame de corpo de delito) são feitos em

indivíduos vivos, pessoas que foram vítimas de acidentes de trânsito,

agressões, acidentes de trabalho, entre outros.

Atualmente, na cidade de São Paulo existem quatro postos médico-

legais, denominados de acordo com a região da cidade a que pertencem,


32

conforme descritos a seguir: Central, Leste, Sul e Oeste. Todos eles

recebem vítimas de homicídio, logo, as vítimas utilizadas em nosso estudo

foram oriundas dos quatros postos médico-legais existentes.

4.4.1. Solicitação do exame de alcoolemia

As análises de dosagem alcoólica são solicitadas ao Núcleo de

Toxicologia Forense do Instituto Médico Legal de São Paulo (NTF-IML/SP),

laboratório de toxicologia que atende solicitações de médicos legistas,

delegados de polícia e de alguns outros órgãos policiais do município de São

Paulo, Grande São Paulo e parte do interior paulista.

Os pedidos de dosagem alcoólica são feitos para amostras coletadas

de indivíduos vivos, envolvidos em diferentes situações delituosas, onde o

conhecimento do papel do álcool etílico, numa situação particular, é

desejável, ou para amostras coletadas de cadáveres, onde o fármaco

poderia ter contribuído direta ou indiretamente para o óbito do indivíduo e/ou

de outrem.

Os exames de dosagem alcoólica sanguínea em vítimas de homicídio

podem ser requisitados por autoridades policiais ou médicos legistas. As

autoridades policiais solicitam este tipo de exame porque é uma requisição

padrão em certos distritos policiais. A legislação no Brasil não obriga os

médicos legistas a solicitarem o exame de alcoolemia para vítimas de


33

mortes violentas,59 exceto para vítimas de acidentes de trânsito.

Deste modo, os exames de verificação de alcoolemia não são

realizados em todas as vítimas de homicídio, isto porque o médico legista

pode achar desnecessário realizar um exame interno para estabelecer a

causa da morte ou por outras razões (por exemplo, corpos em estágio

avançado de decomposição). O presente estudo avaliou as vítimas cuja

determinação da concentração de álcool no sangue foi requisitada.

4.4.2. Dosagem alcoólica

A análise de sangue para obtenção de resultados confiáveis do valor de

alcoolemia é uma técnica bastante usada em certas práticas forenses, como

por exemplo, nas investigações dos acidentes de trânsito, homicídios,

suicídios, acidentes de trabalho, entre outras causas de mortes violentas.

As coletas de sangue são realizadas no momento da necropsia,

normalmente entre 6 e 12 horas após a morte, pelo médico legista

responsável. São vertidos aproximadamente 50 mL de sangue do saco

pericárdico, através da técnica de abertura da cavidade torácica por incisão

mediana longitudinal. Em seguida, a amostra é acondicionada em frasco

apropriado e mantida devidamente refrigerada a 4ºC, até o envio ao NTF-

IML/SP num prazo não superior a três dias.


34

No NTF-IML/SP, as amostras ficam sob a guarda dos peritos criminais,

os quais são responsáveis pela realização das análises toxicológicas e

liberação dos resultados que serão encaminhados ao médico legista

requisitante. Este, através do auxílio dos exames toxicológicos e outros que

porventura tenha solicitado, emitirá o seu laudo necroscópico, o qual faz

parte da investigação criminal.

No laboratório, a matriz biológica é submetida à dosagem alcoólica, que

consiste na quantificação de etanol através de cromatografia em fase

gasosa com técnica de separação por “headspace”. A verificação de

alcoolemia pela cromatografia gasosa é amplamente utilizada devido às

suas vantagens, como a rapidez, alta sensibilidade, manipulação/preparação

mínimas e grande seletividade e especificidade dos métodos empregados.14

4.5. Coleta de dados

No presente estudo, os dados de interesse foram levantados nos

arquivos do IML/SP através da leitura direta das cópias dos exames

toxicológicos e laudos necroscópicos, separando, para efeito desta

pesquisa, apenas as ocorrências correspondentes às vítimas de homicídio

submetidas ao exame de dosagem alcoólica. Deve-se aqui salientar que

apesar do objeto deste estudo limitar-se às vítimas de homicídio, dados de

todas as outras vítimas foram revistos para evitar vícios de anotações.


35

Os dados sobre características demográficas e causa da morte das

vítimas foram obtidos a partir da revisão dos laudos necroscópicos, e

associados com os resultados extraídos dos exames toxicológicos. Com o

intuito de avaliar as circunstâncias que possivelmente influenciaram a

ocorrência dos homicídios, o local, data e horário da morte das vítimas de

homicídio foram obtidos por meio de um banco de dados fornecido pela

Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP/SP).

As necropsias foram realizadas nos quatro postos médico-legais do IML

do município de São Paulo, enquanto que os exames de verificação de

alcoolemia foram realizados pelo NTF-IML/SP. As informações foram obtidas

a partir de um formulário padronizado e checadas por no mínimo dois

pesquisadores para identificar e corrigir possíveis inconsistências.

4.5.1. Variáveis

Os dados coletados consistiram em informações sobre o sexo, idade,

etnia, meio de perpetração das mortes e concentração de etanol no sangue

das vítimas. A variável etnia foi baseada na identificação do grupo étnico

feita pelo médico legista e classificada em cinco grupos: brancos, negros,

pardos, asiáticos e não declarados (cuja identificação da cor da pele não foi

declarada no laudo necroscópico).


36

O meio de perpetração da morte foi classificado de acordo com o

ferimento e o instrumento causador da morte, assim denominados: ferimento

por arma de fogo (lesão por projétil de arma de fogo), ferimento por arma

branca (lesão por instrumento cortante, perfurante ou pérfuro-cortante) e

outros meios (enforcamento, espancamento, afogamento, entre outros).

Foram consideradas positivas para a alcoolemia as amostras com

concentrações superiores a 0,2 g/L (gramas de álcool/litro de sangue), visto

que a legislação vigente no Brasil para determinação da quantidade de

álcool no sangue, relacionada aos motoristas de veículos automotores,

estabelece como ilegal a condução de veículos com valores superiores a 0,2

g/L.60

Acima do limite estabelecido, as concentrações de álcool no sangue

foram divididas em quatro categorias para análise, tais como seguem

descritas: 0,3-0,5 g/L; 0,6-1,5 g/L; 1,6-2,5 g/L; > 2,5 g/L.

As vítimas que apresentaram registros inconsistentes do nível de álcool

no sangue (nenhuma informação disponível ou níveis superiores a 7,0 g/L, o

que poderia representar contaminação da amostra) foram excluídas do

estudo (5 casos), resultando num total de 2042 vítimas analisadas.

As informações sobre a idade e circunstâncias do homicídio (local, data

e horário da morte) não estavam disponíveis para alguns casos, o que gerou

um percentual de exclusão de 1,3% (26 casos) para idade e 22,5% (459

casos) para as variáveis relacionadas às circunstâncias da morte, resultando

em um total de 2016 e 1583 vítimas analisadas para essas variáveis,

respectivamente.
37

Não foi possível obter informações sobre as circunstâncias do

homicídio para todas as vítimas do estudo devido à integração incompleta

dos dados provenientes do banco de dados fornecido pela Secretaria de

Segurança Pública e aqueles oriundos dos exames médico-legais.

4.6. Análise estatística

Foi realizada uma análise descritiva dos dados, utilizando-se medidas

de freqüências, médias e desvios padrão. Todas as médias de alcoolemia

citadas se referem à média de concentração de álcool no sangue das

vítimas com alcoolemia considerada positiva.

Uma análise geoespacial foi conduzida objetivando o estudo do local

das mortes e a influência do consumo de álcool pelas vítimas. Foi criado um

mapa do município de São Paulo dividido por distritos, baseado nas taxas de

homicídios produzidas pela divisão do número de vítimas submetidas ao

exame de alcoolemia pela população estimada para os distritos de São

Paulo em 2005.61 Esse mapa foi comparado com um similar contendo, ao

invés de taxas de homicídios, a média da concentração de álcool no sangue

das vítimas de homicídio distribuídas pelos distritos de ocorrência das

mortes.

Um gradiente de cor foi aplicado aos mapas, indicando maiores (tons

de vermelho) e menores (tons de amarelo) taxas de homicídio e médias da


38

concentração de álcool no sangue. Os mapas foram elaborados através do

programa MapInfo Professional Version 8.0 (Pitney Bowes MapInfo

Company, Troy, New York).

As diferenças estatísticas entre grupos para variáveis de mensuração

do tipo nominal foram avaliadas pelo teste de Qui-quadrado (X2) de Pearson,

enquanto que para as variáveis com mensuração do tipo intervalar e

distribuição normal pelo teste t de Student. As variáveis foram testadas para

sua distribuição normal pelo teste de Kolmogorov-Smirnov.

O coeficiente de correlação de Spearman foi utilizado para testar a

associação entre as taxas de homicídio e a média de concentração de álcool

no sangue entre os diferentes distritos apontados nos mapas (Stata/SE 9.0

for Windows; Stata Corporation, College Station, Texas). Para o cálculo da

correlação, os distritos foram agrupados em cinco regiões: Central, Oeste,

Norte, Leste e Sul, de acordo com a divisão adotada pela prefeitura de São

Paulo. Diferenças com p<0,01 foram consideradas estatisticamente

significantes.

4.7. Aspectos éticos

O protocolo desta pesquisa foi aprovado pela CAPPesq, Comissão de

Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

(Anexo A), e pela Comissão Científica do Instituto Médico Legal de São


39

Paulo.

Todos os dados obtidos para a pesquisa são confidenciais e as

identidades das vítimas estudadas foram preservadas. A presente pesquisa

contou com apoio financeiro, por meio de bolsa de estudos, fornecida pelo

CNPq - Conselho Nacional Desenvolvimento Científico e Tecnológico.


40

5. RESULTADOS

Foram estudadas 2042 vítimas de homicídio submetidas ao exame de

alcoolemia entre janeiro e dezembro de 2005. A maior parte das vítimas de

homicídio analisadas foi submetida à necropsia na sede Central (46,7%) do

IML do município de São Paulo (Figura 5). Os demais casos foram

provenientes dos postos médico-legais das regiões Leste (27,6%), Sul

(24,3%) e Oeste (1,4%).

Figura 5. Distribuição da procedência das vítimas de homicídio necropsiadas


no município de São Paulo no ano de 2005 segundo o local de realização da
necropsia (postos médico-legais).
41

A Tabela 4 descreve a amostra em relação às variáveis demográficas,

resultados de dosagem alcoólica e meio de perpetração da morte. Na

amostra estudada, 43% (876) das vítimas apresentaram alcoolemia positiva.

Tabela 4. Descrição das vítimas de homicídio conforme variáveis


demográficas, resultados de dosagem alcoólica e meio de perpetração da
morte. Município de São Paulo, 2005.

Variáveis Geral Positivos Negativos


n (%) n (%) n (%)
Sexo
Homens 1899 (93,0) 838 (44,1)* 1061 (55,9)
Mulheres 143 (7,0) 38 (26,6)* 105 (73,4)
Total 2042 876 1166
Idade
<15 17 (0,8) 3 (17,7) 14 (82,4)
15-24 704 (34,9) 229 (32,5) 475 (67,5)
25-34 672 (33,3) 325 (48,4) 347 (51,6)
35-44 389 (19,3) 211 (54,2) 178 (45,8)
45-54 154 (7,6) 78 (50,7) 76 (49,4)
55-64 47 (2,3) 13 (27,7) 34 (72,3)
>64 33 (1,6) 4 (12,1) 29 (87,9)
Total 2016 863 1153
Grupo étnico
Brancos 1053 (51,6) 439 (41,7) 614 (58,3)
Pardos 743 (36,4) 336 (45,2) 407 (54,8)
Negros 212 (10,4) 92 (43,4) 120 (56,6)
Asiáticos 18 (0,9) 1 (5,6) 17 (94,4)
a
Não declarados 16 (0,8) 8 (50,0) 8 (50,0)
Total 2042 876 1166
Meio de perpetração da morte
Arma de fogo 1605 (78,6) 644 (40,1)* 961 (59,9)
Arma branca 193 (9,5) 117 (60,6)* 76 (39,4)
b
Outros 244 (11,9) 115 (47,1)* 129 (52,9)
Total 2042 876 1166

a
Vítimas cuja identificação da cor da pele não foi declarada no laudo
necroscópico.
b
Outros meios utilizados na perpetração das mortes, tais como enforcamento,
afogamento, espancamento, entre outros.
* As diferenças entre os grupos são estatisticamente significantes (p<0,01).
42

As vítimas de homicídio eram predominantemente masculinas (93%;

1899 casos). A média de idade das vítimas foi de 30,4 ± 11,5 anos e as

mulheres apresentaram uma média ligeiramente maior (32,2 ± 13,5 anos) do

que os homens (30,3 ± 11,3 anos) (t=1,89; p=0,03).

Os resultados de dosagem alcoólica variaram de 0,3 g/L até 6,3 g/L,

com uma média de concentração de álcool no sangue de 1,55 ± 0,86 g/L. A

média observada para o sexo masculino (1,56 ± 0,86 g/L) foi maior do que

no feminino (1,21 ± 0,65 g/L), apresentando uma diferença estatisticamente

significante (t=2,48; p<0,01). A prevalência de alcoolemia positiva entre os

homens (44,1%) também foi maior do que entre as mulheres (26,6%),

χ2=16,73; p<0,01.

A maioria das vítimas alcoolizadas possuía entre 25 e 34 anos de

idade, representando 37,6% (325) das vítimas com resultado positivo para

alcoolemia. Entretanto, a proporção de indivíduos com resultado positivo foi

maior entre vítimas de 35 a 44 anos, com 54,2% (211) de positividade. Digno

de nota é que na amostra estudada, 16,9% (23 de 136) das vítimas menores

de 18 anos de idade apresentaram alcoolemia positiva.

O grupo étnico de maior representatividade foi o de pessoas da cor

branca (51,6%), seguido pelos pardos (36,4%) e negros (10,4%). A análise

dos dados não mostrou diferença estatística (χ2=2,22; p=0,33) do consumo

de álcool entre brancos, pardos e negros (o grupo de asiáticos e não

declarados foram excluídos da análise por apresentarem um número muito

reduzido de vítimas, respectivamente, 18 e 16).


43

Do total de vítimas de homicídio, analisando-se o meio de perpetração,

temos que 78,6% (1605 vítimas) foram mortas por meio de ferimento por

arma de fogo, 9,5% (193) devido a ferimento por arma branca e 11,9% (244)

por outros meios.

O consumo de álcool entre as vítimas também mostrou diferenças

segundo o meio utilizado para a perpetração dos homicídios. Entre aqueles

cometidos por arma de fogo, 40,1% (644) das vítimas tinham feito uso de

álcool, enquanto para os outros meios, esse percentual foi maior, 47,1%

(115). Os homicídios cujo meio utilizado foi a arma branca, o percentual

encontrado foi maior ainda, chegando a 60,6% (117). Essas diferenças se

mostraram estatisticamente significantes (χ2 = 31,57; p<0,01).

A Tabela 5 mostra as diferenças entre os sexos de acordo com os

resultados de alcoolemia. Mais da metade das vítimas estudadas eram

adolescentes e adultos jovens do sexo masculino, visto que os homens na

faixa de 15 a 34 anos concentraram 63,7% (1285) do total de homicídios

para quais foi possível obter a idade das vítimas. Embora com números de

vítimas bem menores que os homens (para todos os grupos de idade), a

mulher que morre vítima de homicídio também é, na maioria dos casos,

jovem.

Para todas as vítimas do estudo, não foi observada diferenças entre os

sexos a respeito do consumo de álcool entre os grupos étnicos.


Tabela 5. Comparação das características demográficas e meios de perpetração da morte entre os sexos de acordo com
os resultados de dosagem alcoólica das vítimas de homicídio. Município de São Paulo, 2005.

Homens Mulheres
Geral Positivos Negativos Geral Positivos Negativos
n (%) n (%) n (%) n (%) n (%) n (%)
Idade
<15 12 (0,6) 2 (16,7) 10 (83,3) 5 (3,5) 1 (20,0) 4 (80,0)
15-24 665 (35,5) 218 (32,8) 447 (67,2) 39 (27,5) 11 (28,2) 28 (71,8)
25-34 620 (33,1) 313 (50,5) 307 (49,5) 52 (36,6) 12 (23,1) 40 (76,9)
35-44 365 (19,5) 201 (55,1) 164 (44,9) 24 (16,9) 10 (41,7) 14 (58,3)
45-54 140 (7,5) 74 (52,9) 66 (47,1) 14 (9,9) 4 (28,6) 10 (71,4)
55-64 43 (2,3) 13 (30,2) 30 (69,8) 4 (2,8) 0 4 (100)
>64 29 (1,5) 4 (13,8) 25 (86,2) 4 (2,8) 0 4 (100)
Total 1874 825 1049 142 38 104
Grupo étnico
Brancos 985 (51,9) 424 (43,0) 561 (57,0) 68 (47,6) 15 (22,1) 53 (77,9)
Pardos 690 (36,3) 319 (46,2) 371 (53,8) 53 (37,1) 17 (32,1) 36 (67,9)
Negros 196 (10,3) 87 (44,4) 109 (55,6) 16 (11,2) 5 (31,3) 11 (68,8)
Asiáticos 14 (0,7) 1 (7,1) 13 (92,9) 4 (2,8) 0 4 (100)
a
Não declarados 14 (0,7) 7 (50,0) 7 (50,0) 2 (1,4) 1 (50,0) 1 (50,0)
Total 1899 838 1061 143 38 105
Meio de perpetração da morte
Arma de fogo 1529 (80,5)* 622 (40,7) 907 (59,3) 76 (53,1)* 22 (28,9) 54 (71,1)
Arma branca 166 (8,7)* 107 (64,5) 59 (35,5) 27 (18,9)* 10 (37,0) 17 (63,0)
b
Outros 204 (10,7)* 109 (53,4) 95 (46,6) 40 (28,0)* 6 (15,0) 34 (85,0)
Total 1899 838 1061 143 38 105

a
Vítimas cuja identificação da cor da pele não foi declarada no laudo necroscópico.
b
Outros meios utilizados na perpetração das mortes, tais como enforcamento, afogamento, espancamento, entre outros.
* As diferenças entre os grupos são estatisticamente significantes (p<0,01).
44
45

Foi encontrada uma maior proporção de homicídios por arma de fogo

tanto entre os homens (80,5%) como entre as mulheres (53,1%). Já o

percentual de homicídios praticados por arma branca e outros meios foi

maior entre as mulheres (18,9 e 28%, respectivamente), enquanto nos

homens a proporção encontrada foi de 8,7% para aqueles cometidos por

arma branca e 10,7% para outros meios (χ2 = 60,18; p<0,01).

Observou-se que a faixa de alcoolemia positiva predominante foi a de

0,6-1,5 g/L em homens e mulheres (Figura 6), sem diferenças

estatisticamente significantes da distribuição dos níveis de álcool entre os

sexos (χ2=7,06; p=0,07). Quase metade das vítimas com alcoolemia positiva

(46,4%) situou-se nessa faixa de alcoolemia, seguida da faixa compreendida

entre 1,6 e 2,5 g/L, representando 31,5% das vítimas alcoolizadas.

Figura 6. Distribuição das faixas de concentração de álcool no sangue entre


homens (N=838) e mulheres (N=38) que apresentaram resultado positivo
para a presença de álcool no sangue. Município de São Paulo, 2005.
46

A Tabela 6 mostra a distribuição das concentrações de álcool no

sangue por faixas etárias entre homens e mulheres. A distribuição dos níveis

de alcoolemia positiva se mostrou diferente em homens de diferentes faixas

etárias (χ2=39,30; p<0,01), com predominância dos níveis maiores que 0,5

g/L nos homens com idade entre 25 e 54 anos. Entretanto, essa diferença

não foi observada entre as mulheres (χ2=13,80; p=0,31).

A maioria dos homicídios ocorreu no período da noite (67,2%), entre

18:00 e 06:00 horas. Quarenta e dois porcento dos homicídios (667 vítimas)

ocorreram nos finais de semana (Sábado e Domingo), principalmente

durante a noite e madrugada. O dia da semana com o maior número de

homicídios (134) foi o Domingo, entre 00:00 e 06:00 horas.

Verificou-se uma maior proporção de vítimas com alcoolemia positiva

também nos finais de semana durante a noite (Figura 7). Cinqüenta e seis

porcento das vítimas de homicídio que foram mortas durante os finais de

semana apresentaram resultado positivo para a presença de álcool no

sangue, contrastando com 38,5% nos restantes dos dias da semana. Essa

diferença também se mostrou estatisticamente significante (χ2 = 49,41;

p<0,01).

Os distritos da cidade de São Paulo com maiores taxas de homicídio

foram coincidentes com os distritos que apresentaram maiores médias de

concentração de álcool no sangue das vítimas de homicídio, como pode ser

visto na análise geoespacial apresentada na Figura 8.


Tabela 6. Distribuição das faixas de concentração de álcool no sangue segundo as faixas etárias em homens e mulheres
vítimas de homicídio. Município de São Paulo, 2005.

Homens* Mulheres
Faixas de
alcoolemia Negativos Negativos
(g/L) 0 - 0,2 0,3 - 0,5 0,6 - 1,5 1,6 - 2,5 >2,5 0 - 0,2 0,3 - 0,5 0,6 - 1,5 1,6 - 2,5 >2,5
n % % % % % n % % % % %
Idade
<15 12 83,3 0 16,7 0 0 5 80,0 20,0 0 0 0
15-24 665 67,2 3,9 18,3 8,3 2,3 39 71,8 2,6 23,1 2,6 0
25-34 620 49,5 4,0 23,4 16,9 6,1 52 76,9 1,9 13,5 7,7 0
35-44 365 44,9 2,7 22,2 19,5 10,7 24 58,3 8,3 20,8 8,3 4,2
45-54 140 47,1 6,4 19,3 17,9 9,3 14 71,4 7,1 7,1 14,3 0
55-64 43 69,8 2,3 7,0 16,3 4,7 4 100 0 0 0 0
>64 29 86,2 0 6,9 3,4 3,4 4 100 0 0 0 0
Total 1874 56,0 3,8 20,4 14,1 5,8 142 73,2 4,2 15,5 6,3 0,7

2
* A distribuição das faixas de alcoolemia positivas se mostrou estatisticamente significante em homens de diferentes faixas etárias (χ =39,30; p<0,01).
47
48

Figura 7. Proporção de vítimas de homicídio com resultado positivo para


alcoolemia de acordo com o dia da semana em que o homicídio ocorreu no
município de São Paulo em 2005 (n=1583). *Houve diferença
estatisticamente significante com relação à presença de álcool no sangue
entre as vítimas mortas nos finais de semana (Sábado e Domingo) em
comparação com aquelas mortas nos restantes dos dias da semana (χ2 =
49,41; p<0,01).

Observou-se também que os homicídios estão mais concentrados nas

regiões centrais e periféricas do município de São Paulo (Norte, Sul e Leste),

distribuição esta que é coincidente com as regiões que apresentaram

maiores valores médios de alcoolemia para as vítimas.

Contudo, o coeficiente de correlação de Spearman entre as taxas de

homicídio e a média de concentração de álcool no sangue para os 96


49

distritos da cidade de São Paulo não foi significativo (rs=0,13; p=0,19). Mas

foi encontrada uma forte correlação positiva entre essas duas variáveis para

os oito distritos que compõem a área Central (rs=0,90; p<0,01), apesar dessa

correlação não ter sido significativa paras as demais áreas da cidade.

Figura 8. Mapas da cidade de São Paulo dividida por distritos. A) Taxa de


homicídio por 100.000 habitantes*, calculada através da divisão do número
de vítimas submetidas ao exame de alcoolemia pela população estimada de
cada distrito em 2005 (N=1583). B) Média da concentração de álcool no
sangue (gramas de álcool/litro de sangue) das vítimas de homicídio por
distrito (n=1583). *Fonte: População estimada para os distritos do município
de São Paulo (população total do município: 10.895.521 habitantes) de
acordo com IBGE/SEMPLA, 2005.
50

6. DISCUSSÃO

Os resultados obtidos indicam que o consumo de álcool teve uma alta

freqüência em vítimas de homicídio, revelando a magnitude da influência do

álcool como fator de contribuição para a vitimização por homicídio na maior

cidade do país. Ainda, o estudo foi capaz de fornecer informações

importantes sobre variáveis que podem influenciar situações de violência em

combinação com a variável desfecho, o uso de álcool.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública, foram registradas 2684

vítimas de homicídio doloso no município de São Paulo durante o ano de

2005.62 Destas, 2042 vítimas (76%) foram analisadas em nosso estudo.

Essa estimativa da porcentagem do número de vítimas de homicídio

submetidas à dosagem alcoólica do total de homicídios ocorridos na capital

paulistana em 2005 pode ser considerada alta, demonstrando que o viés

metodológico presente em nosso trabalho é mitigado, pelo menos em parte,

pela atual abrangência e qualidade dos serviços de investigação e registro

de óbitos do município de São Paulo.

A diferença observada na distribuição da procedência das vítimas de

homicídio segundo o local de realização da necropsia não corresponde à

prevalência de casos nas respectivas regiões do município (Central, Leste,

Sul e Oeste), já que a divisão das necropsias pelos postos médico-legais da

capital não acompanha esse critério (por exemplo, o posto médico legal da

região Oeste concentra os casos de vítimas em estado de decomposição,


51

em sua maioria).

Apesar de não termos a pretensão de considerar as vítimas utilizadas

no presente estudo como representativas das vítimas de homicídio do

município de São Paulo, não há razão para suspeitar que elas apresentem

diferenças quanto à presença de álcool. Ainda, não há nenhuma indicação

de que os exames de dosagem alcoólica foram realizados porque havia

indícios da influência do uso de álcool e/ou outras drogas pelas vítimas.

Além disso, como a duração entre o tempo da ocorrência da injúria (ou

do consumo de álcool) e a morte não foi utilizada como critério de exclusão

das vítimas, os resultados encontrados provavelmente subestimam a

proporção de casos em que o álcool estava presente no sangue das vítimas

no momento do homicídio.

O uso de álcool e a ocorrência de homicídios, portanto, parecem estar

relacionados, pois 43% das vítimas apresentaram alcoolemia positiva e a

média observada nestes casos foi de 1,55 ± 0,86 g/L.

Pessoas com esse valor de alcoolemia podem apresentar instabilidade

emocional, decréscimo da inibição, prejuízo visual, perda do julgamento

crítico, enfraquecimento da compreensão, debilidade no equilíbrio e

incoordenação muscular14, o que corrobora a hipótese dos efeitos

psicofarmacológicos do álcool induzirem comportamentos violentos (como o

aumento da agressividade) e o descuido com relação às situações de

potencial risco de vida, acabando por predispor o indivíduo alcoolizado a se

tornar vítima de delitos, tais como, o homicídio.


52

Esse resultado é próximo ao encontrado em pesquisa realizada com

vítimas não fatais de agressões atendidas no Pronto-Socorro Central do

Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São

Paulo, entre agosto de 1998 a agosto de 1999, onde o percentual de

alcoolemia positiva encontrado foi de 46,2%,63 bem como os achados do

estudo realizado no Instituto Médico Legal de Osasco no Estado de São

Paulo durante o período de janeiro a junho de 1997, que constatou

positividade para álcool etílico em 38,9% de 396 casos de homicídios por

armas de fogo.51

Chervyakov e cols.64 examinaram os processos de homicídios na

República de Udmurt, Rússia, durante a década de 90 e concluíram que

40% de todas as vítimas estavam intoxicadas no momento da ocorrência,

resultados esses que diferem dos encontrados em Medelin, Colômbia, entre

1990 e 2002, onde 25% das vítimas de homicídio apresentaram alcoolemia

positiva.49

A análise desses resultados em conjunto revela que ocorrem variações

no consumo de álcool entre vítimas de homicídio de acordo com a

população e região geográfica pesquisada, devido, provavelmente, aos

diferentes padrões de consumo de bebidas alcoólicas e às diferenças sócio-

culturais entre os grupos analisados. Esses fatores devem ser considerados

na implementação de medidas preventivas que buscam reduzir o uso de

álcool e o número de mortes violentas dele decorrente, dando à abordagem

descritiva significados especiais que transcendem a sua simples capacidade

de descrever o fenômeno de abuso do álcool.


53

O sexo masculino apresentou predominância acentuada na amostra

estudada. O número de vítimas do sexo masculino é aproximadamente 13

vezes maior que as do sexo feminino, sendo o número de homens com

alcoolemia positiva aproximadamente 22 vezes maior que o número de

mulheres com alcoolemia positiva. Do mesmo modo, as faixas etárias

predominantes chamam a atenção. As vítimas entre 15 e 44 anos

(importante fase produtiva da vida) totalizaram 87,5% dos homicídios

analisados.

A diferença gritante na proporção de homens e mulheres vítimas de

homicídio já foi relatada em diferentes populações43-44;49 e em outras causas

de morte violenta.5-7 Uma das explicações para este fato seria o aspecto

comportamental diferenciado das mulheres, as quais são menos afeitas a

conflitos e brigas de rua, ficando menos expostas às agressões físicas. Por

esse motivo, são relativamente poucos os óbitos de mulheres nos registros

de homicídios e violência no geral.65

As vítimas do sexo feminino analisadas apresentaram prevalência de

casos positivos para etanol e valor médio de alcoolemia inferiores ao dos

homens, sugerindo que a menor propensão da mulher ao uso de álcool21

também pode contribuir para que o número de vítimas de homicídios do

sexo feminino seja reduzido em comparação aos homens.

Em relação à mortalidade por causas externas é comum apontar que

as faixas mais jovens são preferencialmente atingidas.24 Embora

generalizada, a violência tem elegido os jovens das regiões metropolitanas

como alvo e instrumento preferencial, atingindo as pessoas no início da vida


54

produtiva.26 Segundo pesquisa realizada por Carlini e cols.66 em 107 cidades

do Brasil com mais de 200 mil habitantes, em 2001, o uso de álcool também

é maior entre a população jovem, principalmente os jovens do sexo

masculino entre 25 e 34 anos, dos quais 85,6% admitem o uso na vida de

álcool.

Em nosso estudo, as vítimas de 25 a 34 anos apresentaram o maior

número de resultados positivos para o álcool, tanto para homens quanto

para mulheres, o que comparado aos dados atuais sobre o consumo de

bebidas alcoólicas no país por essa faixa etária,66 corrobora ainda mais a

presença de uma associação entre o uso de álcool e a vitimização por

homicídio.

Também é digno de nota a magnitude do consumo de álcool revelado

pela análise dos níveis de alcoolemia mais freqüentemente observados em

homens de 25 a 54 anos, os quais apresentaram a maior prevalência de

níveis de álcool superiores a 0,5 g/L.

Nordrum e cols.52 realizaram um estudo na Noruega com base nos

resultados da concentração de álcool sanguínea de 1113 vítimas de mortes

violentas no período de 1973-1992 e encontraram um nível de alcoolemia

predominante semelhante ao presente estudo, variando de 1,0 a 2,9 g/L. Os

autores ainda sugerem que o nível de alcoolemia superior a 0,5 g/L em

amostras post-mortem deveria ser considerado como uma possível causa de

contribuição em todas as mortes violentas.

Essa constatação representa um alarde ao consumo de álcool em

nossa sociedade, pois o álcool é uma droga psicoativa lícita e vendida


55

livremente para indivíduos maiores de idade. Além disso, em nosso trabalho

foi observada uma proporção de 16,9% de vítimas menores de dezoito anos

alcoolizadas, fato esse preocupante, visto que a venda de bebidas alcoólicas

para crianças e adolescentes menores de 18 anos é proibida em nosso

país.67

A análise estatística dos dados não revelou nenhuma diferença

significante nas proporções de vítimas alcoolizadas de acordo com o grupo

étnico. Entretanto, essa relação já foi relatada pela literatura, como por

exemplo, o estudo de Goodman e cols.44 baseado nos arquivos policiais de

4950 vítimas de homicídio, entre 1970 e 1979, em Los Angeles, o qual

revelou que a presença de álcool era mais comum entre vítimas de origem

latina do que entre negros, brancos e outros.

A distribuição étnica das vítimas estudadas mostrou ser congruente

com a distribuição estimada para a Região Metropolitana de São Paulo no

ano de 2007,68 onde a maioria da população possuía entre 15 e 49 anos

(56,2%) e o grupo étnico com a maior representação era formado por

indivíduos brancos (60,3%), seguidos dos pardos (30,3%) e negros (7,2%),

demonstrando que a seleção da amostra para este estudo não foi afetada

por vieses.

As armas de fogo foram os instrumentos mais utilizados na perpetração

dos homicídios, ocorrendo uma maior proporção de homicídios por arma de

fogo entre os homens do que entre as mulheres. Atualmente, os homicídios

se mantêm como uma importante causa de morte da população brasileira,

situando-se em primeiro lugar entre as mortes por causas externas, sendo


56

as armas de fogo o principal instrumento utilizado pela população total e nos

dois grupos de sexo.69

Nas capitais, a situação mostra-se ainda mais grave. No ano 2000, a

proporção de homicídios com armas de fogo superou 80% em seis capitais,

chegando a 92% do total de homicídios ocorridos em Recife. Todas as

capitais, com exceção de Salvador, apresentaram coeficientes de

mortalidade por homicídios por arma de fogo maiores que a taxa média

brasileira.69

Nas vítimas femininas, a proporção de homicídios cometidos com arma

branca e outros meios superaram a encontrada na amostra masculina, o que

aponta para diferenças na dinâmica social relacionadas a esse tipo de morte

quando considerados os dois grupos de sexo. É amplamente discutido na

literatura o fato de que, entre as mulheres, a violência é perpetrada,

majoritariamente, por familiares e parceiros, e, portanto resultante de

conflitos de ordem “privada”. Entre a população masculina predominam os

casos de agressões por estranhos, ocorridos no espaço público e

relacionados, em grande parte, com a criminalidade urbana.70

Os resultados encontrados na presente pesquisa, apesar de indicarem

uma diferença significante para o percentual de homicídios praticados por

arma branca e outros meios entre homens e mulheres, apontam para uma

situação preocupante, uma vez que mesmo entre as mulheres predominam

os homicídios cometidos com armas de fogo.

É controversa a relação entre a disponibilidade de armas de fogo e o

crescimento da violência. Entretanto, estudo formulado por Reiss71 mostra


57

que áreas com maior número de armas apresentam maiores taxas de

homicídio em geral e homicídios por armas de fogo. A influência das armas

de fogo nas taxas de violência varia, ainda segundo Reiss, entre diferentes

países e relaciona-se a uma série de características como legislação,

organização e efetividade dos sistemas judiciário e policial, além de fatores

culturais e sociais. Costa72 aponta que, embora em Israel e na Suíça a

população tenha acesso a essas armas, as taxas de homicídio não são

altas. Não se trata, portanto, de atribuir somente à presença de armas de

fogo a causa dos elevados índices de homicídio no Brasil.

A presença de álcool foi mais comum nas vítimas mortas através de

ferimentos por arma branca (60,6%), mas também foi detectada em 47,1%

das vítimas de homicídio por outros meios e 40,1% daquelas cujo homicídio

foi praticado por arma de fogo. Esses resultados são comparáveis aos

obtidos por Wolfgang43 na Filadélfia entre 1948 e 1952, onde 72% dos

homicídios resultantes de “facadas” estavam associados com históricos do

uso de álcool por parte das vítimas e/ou agressores, enquanto 55% dos

homicídios por arma de fogo possuíam histórico associado ao uso de álcool.

Sabe-se que, ao lado das armas de fogo, as bebidas alcoólicas são um

dos mais importantes fatores criminógenos, na presença dos quais, em um

contexto prévio de conflito, a violência é potencializada.53;55;73 Porém, as

armas de fogo são somente um meio para a perpetração do crime, pois

outros fatores provavelmente estão envolvidos, conforme apontam os

resultados aqui obtidos para o uso de álcool por vítimas de homicídio.


58

O elevado percentual de alcoolemia nos casos envolvendo arma

branca, relatado aqui e em outros estudos,43;46 pode indicar uma grande

impulsividade nos crimes cometidos com este tipo de arma, onde os

envolvidos procuram por algo que possa ser utilizado para facilitar a

agressão (por exemplo, uma faca ou tesoura) no momento de embriaguez.

Os resultados acerca do consumo de álcool de acordo com o dia da

semana e a hora da ocorrência dos homicídios revelaram uma maior

proporção de vítimas alcoolizadas aos Sábados e Domingos durante o

período noturno, o que pode estar relacionado ao consumo de álcool em

bares e festas durante esse período,21 como o uso pesado de álcool

episódico (binge drinking).

A associação entre a distribuição temporal de casos de embriaguez e

as mortes por homicídio já foi estudada na República de Udmurt, Rússia,74

onde a alta tolerância para o consumo pesado de álcool pode atuar como

um fator capaz de aumentar o risco de ocorrência de violência.

A análise geoespacial utilizada neste estudo forneceu dados

importantes sobre a distribuição geográfica das vítimas de homicídio

segundo o consumo de álcool, conforme demonstrado pela correlação

positiva encontrada entre as taxas de homicídio e a média da concentração

de álcool no sangue das vítimas mortas na região Central da cidade.

Apesar de estudos futuros com o emprego de metodologias

geoestatísticas aprimoradas serem recomendados, os resultados

apresentados são consistentes com estudos prévios que indicaram a região

periférica e central do município de São Paulo como “hotspots” para a


59

ocorrência de homicídios.75

A região Central é marcada por um constante tráfego de pessoas em

todos os horários do dia e inclui uma vasta variedade de prédios comerciais,

restaurantes e bares. Por sua vez, as regiões periféricas são tipicamente

compostas por áreas residenciais com altos níveis de deprivação social.

Estudo anterior realizado em uma região periférica densamente

povoada do município de São Paulo com altos índices de criminalidade, o

Jardim Ângela, mostrou que a área estudada possuía a mais alta densidade

de pontos de vendas de álcool já registrada na literatura médica (29 pontos

de venda por quilômetro de rua).57

Diversos trabalhos indicam que políticas de redução do consumo de

álcool culminam na diminuição de comportamentos violentos.55;73;76-78 Entre

1992 e 1996, foi conduzido um estudo na Califórnia para determinar o efeito

de intervenções na redução das altas taxas de acidentes de trânsito e

agressões relacionadas ao consumo de álcool. As intervenções englobaram

ações educativas e repressivas, tais como a mobilização da comunidade,

maior responsabilidade nos locais de comércio de bebidas e maior respeito à

idade limite para o consumo de álcool entre os jovens. Os resultados,

provenientes das emergências hospitalares, comparados com comunidades

onde não houve implantação de qualquer medida, mostraram que os

acidentes de trânsito declinaram 10% e as agressões 43% nas comunidades

com intervenção.79

No Brasil, foi realizado um estudo sobre a relação entre o consumo de

álcool e violência na cidade de Diadema, no Estado de São Paulo, que a


60

partir de julho de 2002 proibiu a venda de bebidas alcoólicas após 23h. De

acordo com a pesquisa, dados comparativos do número de homicídios

desde a data da implantação da “lei seca” revelaram que houve uma

diminuição significativa de quase nove homicídios por mês.80

Esse tipo estratégia pode resultar na redução dos homicídios se

aplicada em conjunto com um modelo capaz de identificar as áreas de risco

para a associação entre o uso de álcool e as ocorrências de homicídio, como

demonstrado pelo presente estudo.

Igualmente, a restrição da compra de bebidas alcoólicas por menores

de 18 anos deve ser reforçada, visto que em nosso país adolescentes têm

fácil acesso a esses produtos.81 Nesse sentido, os achados do nosso estudo

possuem implicações significativas para a área da saúde, pois podem

auxiliar políticas visando o controle do uso nocivo de álcool embasadas em

características demográficas, regionais e em condições específicas que

influenciam a vitimização por homicídio relacionada ao uso de álcool no

município de São Paulo.

Recentemente, ocorreu no Brasil a introdução da Lei n. 11.705, de

junho de 2008,60 que estabeleceu um dos limites mais baixos em todo

mundo de concentração de álcool no sangue (0,2 g/L) para condutores de

veículos automotores, objetivando a redução dos acidentes de trânsito

relacionados ao uso dessa substância. Esse tipo de medida já mostrou ser

efetiva quanto acompanhada por um aumento na fiscalização da lei

concernente ao uso de álcool por motoristas.82


61

Políticas semelhantes voltadas para a mensuração e controle do uso de

álcool por vítimas e agressores de casos de violência, tais como homicídios,

agressões físicas e violência doméstica, poderiam também ter um

importante papel na prevenção e redução das conseqüências nocivas do

álcool para toda a sociedade.

Este e outros estudos sobre a associação do uso de álcool e a

vitimização por homicídio apresentam limitações metodológicas a serem

consideradas em estudos futuros. Primeiro, e talvez a limitação mais

importante, é a dificuldade de obter níveis de alcoolemia em populações

“controle” ou em pessoas que não são vítimas de homicídio, como por

exemplo, vítimas não fatais de agressão. Na ausência desses dados, não é

possível estabelecer estimativas de risco relativo.44

Todavia, estudo realizado por Borges e cols.83 utilizou pacientes

atendidos em emergências hospitalares para estimar o risco relativo de

injúrias após uma hora do uso de álcool, comparado com pacientes que não

haviam consumido álcool, e o risco encontrado foi de 4,33.

Segundo, neste estudo não foi possível determinar se as vítimas de

homicídio eram usuários crônicos ou de curto prazo, isso porque as

informações sobre o hábito do uso de álcool pela vítima não são

rotineiramente coletadas durante as investigações policiais e podem

somente ser indiretamente inferidas através dos achados necroscópicos.

Outras complexidades metodológicas incluem as variações nas

respostas fisiológicas e comportamentais oriundas do uso de álcool em

diferentes indivíduos e a escassez de dados sobre o nível de alcoolemia dos


62

agressores, embora se acredite que porque autores e vítimas convivam

geralmente no mesmo ambiente, os padrões de uso do álcool entre eles

tendem a ser similares.84

A exclusão de 459 casos das análises das circunstâncias do homicídio

também é uma limitação importante deste estudo, o que poderia afetar os

resultados para essas variáveis. No entanto, essa exclusão se mostrou

arbitrária, visto que os casos excluídos possuíam características

demográficas semelhantes ao restante da amostra.

Finalmente, as altas taxas de homicídios no Brasil são contrastantes

àquelas observadas em países desenvolvidos.23 Existem diferenças sociais

e nos padrões de consumo de álcool entre os países, caráter que deve ser

considerado na generalização dos resultados deste estudo.

Apesar das taxas de homicídio apresentarem uma tendência de

declínio na cidade de São Paulo nos últimos anos, essa redução não é

devida a um aumento nas medidas de controle do uso de álcool. Dessa

maneira, esforços devem ser direcionados no sentido de restringir a

disponibilidade de álcool em áreas de risco, conforme aquelas apontadas em

nossos resultados.

O intuito do presente estudo foi caracterizar a associação entre o uso

de álcool e a vitimização por homicídio, que por si só não é capaz de

estabelecer que o álcool seja um fator de risco para a ocorrência de

homicídios. Porém, nossos resultados reforçam a hipótese de que o álcool

está intimamente relacionado com a violência, melhorando o entendimento

sobre o uso dessa substância para que ações preventivas futuras possam
63

beneficiar-se dessas informações.

Os exames médico-legais são uma importante fonte de dados para o

desenvolvimento e avaliação de programas de prevenção da violência,

apesar de serem freqüentemente negligenciados para tal finalidade em

nosso país. De particular importância, são as informações confiáveis sobre o

envolvimento do uso de álcool em fatalidades.

Ademais, a integração de informações da área de segurança pública

com a área da saúde pode melhorar o atual conhecimento sobre as causas

de morte atribuíveis ao uso de álcool, fornecendo dados importantes para

investigações futuras que possam auxiliar estratégias de prevenção e

redução da mortalidade por causas violentas, que acaba por gerar elevados

custos a toda sociedade.


64

7. CONCLUSÕES

O presente estudo corrobora a existência da associação entre o uso de

álcool e a vitimização por homicídio na cidade mais populosa do Brasil,

caracterizando essa associação a partir de dados médico-legais e sócio-

demográficos. De acordo com os resultados obtidos foi possível estabelecer

as seguintes conclusões:

• O álcool estava presente no sangue de 43% das vítimas de homicídio.

• A grande maioria das vítimas de homicídio analisadas pertencia ao

sexo masculino.

• A incidência de alcoolemia positiva foi maior entre os homens do que

entre as mulheres, respectivamente, 44,1 e 26,6% (p<0,01).

• A faixa de alcoolemia predominante foi a de 0,6-1,5 g/L e o maior

número de indivíduos alcoolizados tinham idade entre 25 e 34 anos.

• O grupo étnico predominante entre as vítimas de homicídio foi o de

pessoas da cor branca, não havendo diferença estatisticamente

significante com relação à presença de álcool entre as vítimas de

etnias diferentes.

• Ferimentos por arma de fogo representaram 78,6% dos meios de

perpetração da morte na amostra estudada.


65

• Foi encontrada uma maior proporção de homicídios praticados por

arma branca (18,9%) e outros meios (28%) entre as mulheres do que

nos homens, 8,7 e 10,7%, respectivamente (p<0,01).

• Os homicídios cujo meio utilizado foi a arma branca apresentou o maior

percentual de vítimas alcoolizadas (60,6%), comparados com aqueles

praticados por armas de fogo e outros meios, respectivamente, 40,1 e

47,1% (p<0,01).

• A maioria dos homicídios ocorreu no período da noite e aos finais de

semana, período este que também apresentou uma maior proporção

de vítimas alcoolizadas comparado ao restante dos dias da semana,

respectivamente, 56,4% e 38,5% (p<0,01).

• Os distritos da cidade de São Paulo com maiores taxas de homicídio

foram coincidentes com os distritos que apresentaram maiores médias

de concentração de álcool no sangue das vítimas de homicídio, com a

área Central da cidade apresentando uma correlação positiva para

essas duas variáveis (rs=0,90; p<0,01).


66

8. ANEXOS

Anexo A
67
68

9. REFERÊNCIAS

1. Room R, Babor T, Rehm J. Alcohol and public health. Lancet.


2005;365(9458):519-30.

2. World Health Organization [WHO]. Global status report on alcohol.


Geneva: WHO; 2004.

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