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CURITIBA
2022
TRACY RAMOS DE OLIVEIRA
CURITIBA
2022
FOLHA DE APROVAÇÃO
Orientador (a):
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Examinador (a):
______________________________________________________________
Examinador (a):
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Starting from the premise that the city presents itself as a living organism in
constant evolution, growing over itself countless times, and originating a dense, consistent
and heterogeneous tissue, its diversity, its main characteristic, resides in the encounter
between its mass with the ambiences, sensations and stimulation for individual and
communal life. Its uniqueness is based on the relationship between the various layers of
time that compose it and the actions of its main agent, the man. Thus, the investigation
between the possibilities of intervention in the pre-existing building in detriment of new
projectual paths becomes urgent. As one of the possible answers to the questions raised
above, the Parasite Architecture, with scientific theoretical basis, seeks to function as an
external body to the host object, having as a result an evocative architectural game. The
present research aims to initiate the discussion about the new ways of intervening and
coexisting with pre-existences without one of the parts being harmed in the process, and
presents theoretical bases that will guide the reading and the action on a densely built and
consolidated urban clipping, the Praça General Osório and its surroundings, to the
development of an architecture project in the future.
1. INTRODUÇÃO 8
2. A CIDADE 10
2.2.1.1 O Modernismo 25
2.2.1.2 O Pós-modernismo 26
3. ANÁLISE DIRIGIDA 38
5. ANÁLISE DA REALIDADE 66
9
2. A CIDADE
10
Deste modo, ações com foco urbanístico ou voltadas especificamente aos
edifícios, mas que propõe o fortalecimento da relação entre as preexistências e as
propostas futuras devem ser vistas como práticas necessárias para a continuação da
pluralidade presente nas cidades (RAMOS, 2014).
Vale salientar que a cidade não deve ser experienciada como um objeto inanimado
e indiferente a passagem do tempo (RAMOS, 2014) mas, de modo a ser traduzida em
seu estado sublime, a mesma precisa ser palco de experimentos e, dentro do campo da
arquitetura, exprimida em uma conjugação infindável de ocupações e espaços, onde os
paradigmas sobre o habitar e viver possam ser transpostos (SALGUEIRO, 2011).
Considerando assim a cidade como o palco de experimentos, Koolhas e Mau
(1998) propõe que o futuro da arquitetura, em especial nas áreas centrais, tendo em vista
os processos e dinâmicas socioespaciais que ocorrem nas mesmas, irá consistir de
mutações e aglomerações com artefatos do passado, a fim de desenvolver novos
espaços destinados a suprir as necessidades decorrentes do aumento da densidade
populacional e do déficit habitacional. Ainda, tendo em vista as novas formas de relação
humana, que através dos avanços tecnológicos começaram a se estender para além dos
espaços físicos, as noções de habitar e como o fazer mudaram (RAMOS, 2014), o que
promove subsídio para novas experimentações e propostas.
Em seguida serão exploradas reflexões a respeito das características atuais das
áreas centrais e a relação com novas formas de produzir arquitetura. Nesse âmbito,
busca-se compreender as relações entre a massa construída e os vazios urbanos,
tomando como objeto de análise a relação entre os elementos e a cidade. Este capítulo
introduz as questões que fundamentam a pesquisa e compõem a discussão necessária
para o desenvolvimento dos capítulos posteriores.
11
dinâmicas nestes espaços, sobretudo nas áreas centrais, consideradas o coração das
cidades. Ainda que compreendido como sendo um fenômeno antigo e de maior
expressão após a Revolução Industrial, durante o século XVII, o crescimento do tecido
urbano no Brasil se deu de forma mais acentuada durante as décadas de 1960 e 1970
(PÓLIS, 2001).
A partir dos anos 1970, observa-se nas cidades a existência de estruturas
espaciais que experimentam um intenso e rápido processo de urbanização e, por
consequência, o aumento da concentração populacional (MATOS, 2000). Este novo
conjunto de aglomerações, resultante da expansão das áreas centrais, promove o
aumento da pluralidade nas cidades com a introdução de novas dinâmicas socioespaciais
e questões urbanas a serem discutidas (GADENS, 2010).
Em oposição ao que se vinha apresentando como dinâmica socioespacial, nos
últimos anos, em especial em cidades de médio e grande porte, a população com maior
poder aquisitivo está deslocando-se para as áreas periféricas, especialmente a procura
de condomínios fechados, muitas vezes enclaves fortificados1 (GADENS, 2010), sob a
justificativa de maior segurança. Deste modo, os núcleos centrais que anteriormente
agrupavam grande parte da população com maior concentração de renda, passaram por
um processo de gradativo abandono e esvaziamento, especialmente no campo
habitacional, ocasionando a subutilização de sua infraestrutura e admitindo a presença
de uma significativa população flutuante, cujo o objetivo é o estudo ou a prestação de
serviço nestas áreas (FERREIRA, 2004).
Conforme Gadens (2010), no cenário nacional existem duas principais vertentes
para a discussão da reversão do quadro apresentado, a primeira delas apresenta a
proposição do incentivo a atividade de cunho habitacional nos núcleos centrais, no
entanto, a proposta encontra incompatibilidade com os interesses do setor imobiliário que
não observa qualidade arquitetônica e/ou econômica nos artefatos encontrados dessas
regiões. A segunda vertente se baseia em projetos de reestruturação urbana, como a
requalificação de trechos, todavia, com base em experiências de outras cidades
1 “São propriedade privada para uso coletivo e enfatizam o valor do privado ao mesmo tempo em
que desvalorizam o que é público e aberto na cidade” (CALDEIRA, 2000, p. 258).
12
brasileiras, existe a tendência à elitização destas áreas e a expulsão de certos atores
sociais do espaço público.
Dentro deste aspecto, e tendo como premissa de que a cidade é tal qual um
organismo vivo, a discussão sobre ações com foco urbanístico ou voltadas
especificamente aos edifícios, mas que propõe a relação entre as preexistências com as
propostas futuras (RAMOS, 2014) é imprescindível para a promoção do revigoramento
das áreas centrais sem com que haja a heterogeneidade dos espaços, mas sim a
manutenção da diversidade formal e espacial, o que caracteriza a cidade por ser um lugar
rico (ROSSI, 2001).
Deste modo, observa-se que o processo de deterioração das áreas centrais está
relacionado a um ciclo de dinâmicas socioespaciais, e que levam ao processo de
readequações sócio funcionais onde, dentro de um determinado espaço de tempo, novas
atividades econômicas, modos de utilização do espaço e o perfil de usuários que se
apropriam das regiões mudam, assim como um organismo vivo que passa por mudanças
ao longo de sua existência (GADENS, 2010).
No caso da maior parte das cidades brasileiras de médio e grande porte, os
núcleos centrais passaram a acomodar atividades econômicas e prestadoras de serviço
de caráter popular, que levam ao adensamento e intensificação do uso de maneira
flutuante (FERREIRA, 2004), de modo a garantir o suprimento das necessidades destas
atividades. Essa dinâmica pode ser observada ao se percorrer estas áreas fora dos
períodos de utilização do comércio e outros serviços que, pela concentração de uma
gama específica de usos do solo, não apresenta vitalidade em outros momentos.
Segundo Gadens (2010), é possível observar que em Curitiba a readequação
sócio funcional, por se relacionar com a intensiva utilização de seu espaço, em especial
por um perfil de usuário de camadas mais populares, faz com que, diferente de outros
núcleos centrais, esta área não entre em um total processo de deterioração. Desta forma,
a mudança de usos corrobora com a permanência da centralidade da região, e o poder
de atração que o núcleo central gera é refletido no setor imobiliário e nas condições de
acessibilidade e mobilidade presentes na região. No entanto, como grande parte da
apropriação acontece em decorrência da prestação de serviços, é possível observar a
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existência de edifícios subutilizados (Figura 1) e o esvaziamento demográfico da região
central, ainda que menos acentuada em relação aos últimos anos (GADENS, 2010).
15
conceito geométrico e vetorizado, onde elementos precisos e mensuráveis, como a
altura, largura, profundidade, área e volume, auxiliam no seu embasamento e
compreensão (MACIEL, 2014). Deste modo, o espaço é caracterizado por uma natureza
inerte, onde os objetos se articulam, mas possuem suas próprias delimitações.
O termo lugar, em contrapartida, é antropológico, impalpável, subjetivo à
compreensão individual e relacionado às noções do tempo, onde as ações e
conhecimentos do homem passam a acumular significados (MACIEL, 2014). Sendo
assim, o lugar pode ser considerado um palco para as manifestações, individuais ou
coletivas, socioculturais do cotidiano, e embora os objetos se disponham distintamente
em relação aos demais, os mesmos estabelecem uma interação.
A partir de tais premissas e da permeabilidade entre os conceitos, a cidade se
constrói como o poder conferido pelo não natural sobre o natural (MAU, 2004), dando
origem assim a um tecido denso e consistente. Segundo o antropólogo Marc Augé (2012),
os lugares possuem três propriedades fundamentais: a identidade, o conceito de relação
e a história, e o que não se encaixa nestas características é chamado pelo autor de não-
lugar. Estes ambientes não estabelecem relações com os usuários e não os direciona ao
caminho da constituição de uma memória.
Dentro deste aspecto, o cruzamento da sobreposição das camadas do tempo, o
constante crescimento das cidades e necessidades coletivas e individuais, e a relação
entre o homem, o edifício e a cidade, originaram os vazios urbanos (SILVA, 2019), que
são observados em sua forma mais convencional através de miolos de quadra
inocupados, lotes e/ou edifícios subutilizados ou abandonados, e em sua forma atípica,
em empenas cegas, coberturas não utilizadas, e outros espaços.
Apresentando-se de diversas formas, os vazios urbanos possuem o mercado
imobiliário como um dos principais agentes responsáveis por sua formação, uma vez que
desencadeiam uma dinâmica de retenção de terras com a finalidade de ganhos futuros e
geram a chamada especulação imobiliária3. Esta reserva de terras provoca a formação
3 “Uma forma pela qual os proprietários de terra recebem uma renda transferida dos outros
setores produtivos da economia, especialmente através de investimentos públicos na
infraestrutura e serviços urbanos” (FILHO, 2001, p. 48).
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de alguns vazios urbanos, ocasionando a diminuição da oferta de terra urbanizada e
resultando na elevação artificial do valor do solo urbano nas áreas centrais e estratégicas,
promovendo também na segregação social através dos deslocamentos de pessoas com
menor poder aquisitivo para áreas periféricas (GADENS, 2010).
Deste modo, os núcleos centrais que anteriormente agrupavam grande parte da
população com maior concentração de renda, passam por um processo de gradativo
abandono e esvaziamento, direcionado a desocupação parcial ou total, ou a substituição
do perfil populacional (FERREIRA, 2004).
Vale salientar a importância destes lugares não convencionais como elementos
fundamentais para a promoção da costura urbana e pluralidade de usos e formas de
apropriação da cidade, como no exemplo abaixo (Figura 2), em que a Via Elevado
Presidente João Goulart, também conhecida como Minhocão, em São Paulo, é utilizada
aos finais de semana como parque linear, promovendo assim lugares de encontro e lazer,
ativando inclusive as fachadas e empenas cegas do entorno.
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O termo foi disseminado pela primeira vez pelo arquiteto espanhol Manuel de Solà-
Morales, através de uma série de mudanças urbanísticas que revolucionaram e abriram
Barcelona, na Espanha, para o mar, antes da realização das Olimpíadas de 1992 e, vem
sendo ressignificado e empregado em diversas obras arquitetônicas e urbanísticas ao
longo das últimas décadas (TELES, 2018). Abrangendo projetos com elevado grau de
reversibilidade, a proposta da Acupuntura Urbana permite que correções e melhorias
sejam efetuadas a qualquer momento, o que assegura dinamismo para a gestão das
localidades e a adaptação das ações às necessidades de seus usuários.
Com escala variável, esse tipo de urbanismo é uma alternativa a grandes
intervenções realizadas de cima para baixo, que normalmente requerem pesados
investimentos, lenta tramitação burocrática e não possuem relação com a comunidade
local (LERNER, 2011). As iniciativas propostas pelo conceito não contam,
necessariamente, com grandes orçamentos ou intervenções, mas propõe o benefício
imediato das localidades através de ações pontuais com base no conhecimento das
diferentes realidades dos tecidos urbanos.
Para Casagrande (2013), o caminho das ações da Acupuntura Urbana devem
basear-se em um processo de aprendizagem e consciencialização para a reconexão
coletiva urbana, sendo vital a metodologia multidisciplinar de pesquisa e projeto em
conjunto com o conhecimento local e a memória coletiva da cidade. Nas redes de hortas
comunitárias espontâneas, por exemplo, Casagrande (2013) observou o ápice da
Acupuntura Urbana caracterizada por intervenções pontuais, que visam estabelecer o
contato entre a consciência coletiva urbana e os sistemas de vida da natureza. Uma vez
que o objetivo das ações é resolver as descontinuidades energéticas e os problemas por
estas causados, de forma a contaminar a maior área possível da cidade, procura-se na
ocupação de espaços vazios estabelecer a continuidade na ligação à cidade.
Segundo Lerner (2011), intervenções pontuais, como o estímulo de uma picada
de agulha ao corpo, possuem a capacidade de recuperar a energia do local, incitando
reações da população e promovendo uma série de novos acontecimentos positivos em
cadeia. Além disto, tendo em vista que a formação das cidades e a interação do homem
culmina em dinâmicas socioespaciais contrastantes, as cidades apresentam uma série
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de conflitos e problemáticas. Desta forma, a Acupuntura Urbana propõe meios de atenuar
as problemáticas existentes nas cidades e estimular regiões "adormecidas", como áreas
de um corpo com má circulação sanguínea.
Não somente através de obras arquitetônicas e/ou de cunho urbanístico, mas
também por meio do estímulo de novos hábitos e a promoção de condições positivas
para a transformação da região, ações de Acupuntura Urbana em comunidades
vulneráveis, como o projeto “Espaços de Paz”, do escritório venezuelano Pico Estudio
(Figura 3), normalmente são seguidos por uma série de outras intervenções nesse
mesmo âmbito, reforçando o reconhecimento do potencial transformador de
intervenções específicas, estratégicas e localizadas como princípio norteador dos
projetos.
FIGURA 3 – PROJETO “ESPAÇOS DE PAZ”
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2.2 O PARASITISMO NA ARQUITETURA
6Parasita, segundo o dicionário: BIOLOGIA: Diz-se de ou organismo que vive em outro organismo
(hospedeiro), retirando seu alimento e geralmente causando-lhe dano. Disponível em:
<https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/parasita/>. Acesso
em: 28 de mar. 2022.
7Disponível em: <http://www.charlottexcsullivan.com/index.php?/halecounty/bubble-drawings/>.
8 Grandes Formas na Construção Residencial, tradução livre In: UNGERS, Oswald. Grossformen
im Wohnungsbau. Technical University of Berlin, Lehrstuhl für Entwerfen und Gebäudelehre, 1966.
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área degradada pode influenciar toda a região, acarretando no abandono e deterioração
dos espaços, produzindo áreas debilitadas, que deverão passar por um processo de
requalificação (LERNER, 2011).
Assim sendo, a Arquitetura Parasita ou Mutualística apresenta-se como uma ação
dentro do contexto de Acupuntura Urbana, com o objetivo de revalorizar o espaço
construído de forma a dinamizar, reenergizar ou revitalizar áreas debilitadas ou
moribundas. Bem como apresentado por Lerner (2011), o importante é que as
intervenções ocorram de maneira rápida e precisa e, caso não resulte efeitos, a obra
precisa ser reversível, assim a Arquitetura Parasita propõe a criação de estruturas
flexíveis e temporárias podendo ser determinadas como um transiente adaptável de
forma exploradora da arquitetura, forçando relações com as edificações hospedeiras a
fim de as completar, e assim oferecer respostas para os problemas nos órgãos ou
sistemas das cidades.
Segundo Pit, Steller e Streng (2007), as cidades podem ser lidas como organismos
vivos, compostos por sistemas e, o parasita arquitetônico, de modo a produzir mudança,
deve constituir-se de uma provocação para despertar o sistema imunológico das cidades,
promovendo discussões e inquietações as novas formas de arquitetura e apropriação do
espaço. Desta forma, caracterizada pela solidificação dos conceitos biológicos, a
Arquitetura Parasita propõe a intervenção em uma massa edificada, alinhado ou não com
a sua forma de utilização, de modo a promover a transformação do espaço através da
justaposição das camadas do passado e do presente, dos jogos de corpos, formas e
volumes, buscando promover a discussão de novos modos de apropriação da cidade.
Em seguida serão exploradas reflexões a respeito da relevância das vanguardas
arquitetônicas no processo de desenvolvimento da Arquitetura Parasita, e quais as suas
aplicações nos centros urbanos.
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cidades e sua massa construída e, consequentemente, quanto às formas de produção e
apreensão da arquitetura frente às mudanças socioculturais, as vanguardas promoveram
uma nova visão de ruptura capaz de responder à ânsia pelo novo, ao gosto da sociedade
e ainda às novas necessidades que surgiam (MONTANER, 2001). A relação do
Modernismo e do Pós-Modernismo com o desenvolvimento do pensamento parasitário
na arquitetura será investigada a seguir.
2.2.1.1 O Modernismo
2.2.1.2 O Pós-modernismo
28
2.2.2 O parasita urbano
29
2.2.2.1 O parasita arquitetônico
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Sob este aspecto, e entendida como uma ação, a Arquitetura Parasita possui a
capacidade de se autorreproduzir e multiplicar, assim como um vírus, através das ações
dos usuários (SOLFA e SANTOS, 2014). Neste sentido, as propostas projetuais não
devem ser compreendidas como ações únicas, mas sim elementos capazes de despertar
a população, colocando-a como agente de transformação das cidades, e estimulando
reflexões acerca dos edifícios e espaços públicos de uso cotidiano.
De forma a subsidiar o entendimento do papel da Arquitetura Parasita nos centros
urbanos, faz-se necessária a compreensão das esferas públicas e privadas. O arquiteto
norte-americano Vito Acconci, nos livros Making Public: the writing and reading of public
space (1993) e Public space in a private time (1995), identifica e diferencia dois tipos de
espaços públicos nos quais as pessoas se reúnem.
O primeiro deles, geralmente de caráter institucional e ligado a uma entidade
pública ou corporação privada, constitui-se pela imposição de regras de conduta
explícitas e implícitas que o público, para ter o direito de usá-lo, deve seguir (SOLFA,
2014). Desta forma, o espaço se constitui mediante a instauração de um contrato, que
releva as convenções de uso, dita ordens e formas de comportamento através de
informações direcionadas diretamente aos usuários, que tendem a assimilá-las de forma
quase inconsciente.
Em contrapartida, a segunda morfologia de espaço constitui-se onde a
comunidade se reúne precisamente porque não tem o direto, apropriando-se dele e o
tornando público à força (ACCONCI, 1993). Por possuir muitas vezes um caráter
temporário, este tipo de espaço abriga inúmeros conflitos e contém inevitavelmente
traços da esfera privada, visto que a distinção entre os domínios se torna borrada pela
ausência de convenções.
Segundo Acconci (1993), enquanto o espaço público institucionalizado possui
características de homogeneidade e união, o segundo espaço, tornado público visto a
necessidade da comunidade, tende a multiplicidade, heterogeneidade e instabilidade.
Assim, a tendência contemporânea de dissolução da distinção entre as esferas públicas
e privadas com o intuito da criação de áreas de transição, chamadas de “intervalos” por
Hertzberger (1999), desencadearia novas formas de compreender e projetar espaços
31
públicos, visto que a presença física deixaria de ser um fator determinante para a sua
concepção.
Ainda, segundo Acconci (1995), os espaços físicos delimitados nas cidades e
intitulados públicos, como as praças, são áreas remanescentes do pensamento e forma
de apropriação do espaço do século XIX, e na era contemporânea tais locais não podem
mais ser representados pelo signo da permanência visto que a circulação passou a ser
um item essencial – circulação incessante de pessoas, de imagens e objetos em espaços
onde os indivíduos conectados virtualmente recebem toda a informação necessária sem
que seja obrigatório o contato direto com outros.
Desta forma, com a diminuição constante do contato físico entre as pessoas no
espaço público, estas o adentram carregando em seu corpo uma espécie de “casulo”
invisível, do qual dificilmente ausentam-se (SOLFA, 2014). Assim, o espaço público,
sendo Acconci (1995), passaria a ser composto por uma massa de corpos privados,
munido de objetos e interesses individuais (Figura 6).
33
2.2.2.2 As favelas e ocupações informais
34
Segundo Jacques (2003), as favelas e ocupações irregulares apresentam três
elementos fundamentais para a sua compreensão. O primeiro deles, a fragmentação, se
manifesta nas estruturas das construções. Em um primeiro momento, o objetivo do
construtor na favela é abrigar a si e a sua família, desta forma os barracos são construídos
a partir de fragmentos de materiais heteróclitos, muitas vezes encontrados pela cidade,
e este abrigo inicial, mesmo que precário, constitui a base para a futura evolução da
habitação. Tão logo o morador conquista melhores condições econômicas, o mesmo
passa a promover melhorias na edificação, buscando assim aumentar o barraco até
progredir para a habitação em alvenaria. Como não existe um projeto preestabelecido,
as construções nas favelas apresentam a característica de evolução constante, assim
como um organismo vivo em constante mutação.
12 Rizoma, segundo o dicionário: BOTÂNICA: Caule subterrâneo, comum em plantas vivazes, rico
em reservas e caracterizado por possuir nós, botões, gemas e pequenas folhas com escamas; com
capacidade para produzir novos ramos folíferos, floríferos e raízes, armazena alimento para ser
utilizado pela nova planta. Disponível em: <https://michaelis.uol.com.br/moderno-
portugues/busca/portugues-brasileiro/rizoma/>. Acesso em: 28 de mar. 2022.
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e informais não devem ser compreendidas como ações únicas, mas sim como partes do
organismo da favela.
Ao passo que a cidade, tal qual um organismo vivo, cresce sobre si mesma, os
espaços intersticiais entre os edifícios e os não lugares tornam-se relevantes para as
dinâmicas do espaço urbano, e dão origem a um novo olhar da arquitetura frente às
necessidades atuais. Desta forma, frente a complexidade das dinâmicas socioespaciais
presentes nos centros urbanos, a Arquitetura Parasita apresenta um novo pensamento
quanto às relações entre a massa construída e os espaços públicos, servindo como um
mediador entre as mudanças nos vários fatores de desenvolvimento das cidades e os
seus órgãos, almejando alcançar novas possibilidades para o funcionamento dos
sistemas urbanos (RAMOS, 2014).
O parasita é um corpo que se comporta tal como um vírus, anexado a um
hospedeiro, propagando e reproduzindo-se com diferentes corpos, criando assim uma
rede, para o seu próprio sustento. Propondo o questionamento da posição tradicional
do arquiteto no processo de concepção e construção de espaços (SOLFA e SANTOS,
2014), a Arquitetura Parasita busca atribuir, para além de qualquer vínculo autoral ou
espacial, uma espécie de “vida própria” à arquitetura frente a complexidade das
dinâmicas socioespaciais presentes nos centros urbanos.
Fundamentado na concepção parasitária, as intervenções promovem o
estabelecimento de uma relação de coexistência em harmonia e sintonia com o
hospedeiro, buscando a incorporação da memória e valores de origem da massa
edificada a ser reabilitada ou reciclada, estabelecendo laços entre o edifício e o lugar.
Sob a ótica da arquitetura, o parasita é empregado como um método reanimador,
alinhado à Acupuntura Urbana (TELES, 2018) possibilitando a melhoria radial de áreas
do meio urbano através da intervenção.
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3. ANÁLISE DIRIGIDA
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3.1 A GENTILEZA AO PREEXISTENTE: CITÉ DU GRAND PARC
16Disponível em:
<https://aplust.net/blog/transformation_of_cit_du_grand_parc_lacaton__vassal_druot_hutin_borde
aux_france/>. Acesso em: 01 abr. 2022.
42
Outro conceito essencial ao projeto foi a compreensão que não somente através
da construção de novos edifícios se altera a imagem da cidade e a qualidade dos espaços
para seus habitantes (RAMOS, 2018). A cidade pode ser transformada a partir de
situações e projetos simples, sem necessariamente a monumentalidade visual, mas
estes têm de ser necessários à cidade e sua população, gerando dinamismos, uma nova
imagem, caráter e forma de atuar na e da cidade. Deste modo, a proposta, especialmente
a adição das varandas (Figura 12) nas fachadas, tem como premissa a oposição a ações
como a demolição de artefatos arquitetônicos, de modo a preservar o que há de mais
importante no tecido urbano, sua diversidade.
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3.2 FOCO PARASITÁRIO: CASA PARÁSITO
Tal qual os organismos parasitários, seres vivos que retiram de outros seres os
recursos necessários para sua sobrevivência (RAMOS, 2014), a obra Casa Parásito, do
escritório equatoriano El Sindicato, associa-se estruturalmente a um edifício com o intuito
de aproveitar-se de sua localização e infraestrutura para proporcionar as condições
adequadas para a habitação. Em um momento em que muitas cidades estão enfrentando
a escassez de moradias acessíveis, faz-se necessária a reflexão quanto à forma
convencional de construção dos espaços, especialmente no campo habitacional.
Inspirados pela citação do ex-político uruguaio José Mujica18, o escritório propôs
a construção de uma habitação de 12m² (Figura 13), que empoleirada no telhado de um
edifício preexistente, fornece apenas as estruturas básicas para resolver as
necessidades básicas de habitabilidade de um jovem ou casal considerando banheiro,
cozinha, cama, espaço de armazenamento e espaço de estar – comer, trabalhar,
socializar –, garantindo todo as funções de uma casa em uma pequena área (OTT, 2020).
18 “'pobre não é quem tem pouco, mas quem precisa de muito para viver”. Disponível em:
<https://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/05/pepe-mujica-presidente-mais-pobre-do-
mundo.html>. Acesso em: 07 de abr. 2022.
19 Disponível em: <https://www.elsindicatoarquitectura.com/casaparasito>. Acesso em: 03 abr.
2019.
45
A intervenção consiste em três módulos criados por quatro pórticos estruturais de
madeira com o formato “A”, que combinam os espaços livres de objetos utilitários para
maximizar o uso do volume e reduzir sua área construída, de modo que o espaço versátil
do retângulo central possa ser usado de acordo com a atividade executada. Os arquitetos
propuseram o acesso a todas as áreas funcionais da habitação a partir do módulo central,
privilegiando a realização das atividades em pé, como a cozinha, o banheiro e a área de
convívio social (Figura 14). Adjacentes a este núcleo, os) triângulos e romboides20
menores, resultantes da forma da habitação, fornecem locais para o armazenamento e o
dormitório, além de proporcionar estabilidade à estrutura (OTT, 2020).
2019.
46
(OTT, 2020), promovendo um conceito amplamente discutido pelo escritório, o da
inclusão de materiais reciclados nos processos construtivos de modo a baratear os custos
e possibilitar a reutilização de materiais (EL SINDICATO, 2019).
Outro aspecto importante para a concepção do projeto foi a presença da luz nos
espaços, tendo em vista que o intuito da proposta é ser seja difundida como modelo de
habitação de baixo custo e rápida construção, a iluminação dos espaços é essencial
(Figura 15). As fachadas leste e oeste, que recebem luz solar direta o ano todo, são
envolvidas por painéis de aço, de modo a bloquear a incidência direta, e as fachadas
norte e sul são revestidas de vidro translúcido, possibilitando a entrada da luz natural e
estabelecendo a relação de contato entre a habitação e a cidade (EL SINDICATO, 2019).
De acordo com os arquitetos, embora seja possível construir o projeto em terrenos
urbanos ou rurais sem construções existentes, a intervenção tem como pressuposto a
conexão com telhados subutilizados em ambientes urbanos sólidos, onde exista a
possibilidade de ligar a infraestrutura da casa às redes. Desta forma, a casa contribui
para o adensamento da cidade numa escala reduzida, com o mínimo de investimento
econômico e utilização de recursos (EL SINDICATO, 2019).
48
3.3 O PARASITA MARGINAL: O PARACAIDISTA
52
degradação e abandono, e também promover a discussão sobre as formas tradicionais
de arte e arquitetura.
A segunda característica da intervenção, que é destacar-se na paisagem urbana,
rompendo a monotonia cotidiana e direcionando as atenções dos moradores a um
espaço que estava se direcionando ao esquecimento, é concordante com os
pensamentos de Lerner (2011). Ao sintetizar o projeto em volumes orgânicos
conformados pelas possibilidades plásticas que os materiais lhe conferiram, o artista cria
um ponto de densidade no contexto urbano, aceitando assim a preexistência na qual se
insere e reforçando as características da região. Assim o projeto conserva a sua
identidade parasitária enquanto mantêm-se conectadas com o seu entorno, articulando
a cidade e promovendo um raio de interesse ao seu redor.
53
4. METODOLOGIA: RELAÇÃO COM AS PREEXISTÊNCIAS
54
Por meio da análise da Las Vegas strip27, os autores buscaram compreender o
papel do simbolismo na forma arquitetônica, rejeitando a atribuição de valores morais ao
território de pesquisa em questão. Assim, através do apontamento de construções
consideradas representativas, os arquitetos, juntamente ao grupo de estudantes,
analisaram os principais tipos de edifícios presentes na área e, a partir disto, produziram
uma série de documentos, em especial diagramas, que justapuseram as construções à
ícones da arquitetura mundial (Figura 20), obtendo semelhanças metodológicas entre os
objetos bastante distintos.
27 Corresponde ao trecho da Las Vegas Boulevard no qual se concentram a maior parte dos hotéis
e cassinos da região, sendo assim caracterizada por uma quantidade massiva de comunicação
visual.
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Entre as estratégias utilizadas para o mapeamento, o grupo partiu da dualidade
apresentada no mapa de Nolli28 através da leitura bidimensional da strip, contrastando os
espaços públicos com os privados, esclarecendo assim a proporção entre os contrastes
de Las Vegas (Figura 21). No entanto, por meio de recombinações dos componentes e
parâmetros do mapa – o asfalto, os carros, as edificações e o espaço cerimonial – a strip
pode ser lida em suas várias camadas. Ainda assim, Scott-Brown, Venturi e Izenour
(2003) pontuam como os mapas tipo-figura fundo, ou os de distribuição de usos, não
eram capazes de demonstrar toda a animação e iconografia da cidade, visto que as
qualidades ambientais de Las Vegas dependem de elementos que não podem ser
representados desta forma, como a iluminação dos espaços.
Por meio da análise, foi possível observar que há uma grande duplicidade
presente nos espaços abertos da cidade. Ainda que a strip em si consista em um
elemento público, a mesma está repleta de áreas privadas, como os letreiros e luminosos.
Os estacionamentos, por exemplo, foram classificados como elementos abertos ao
28“O mapa constitui-se em um documento que auxilia o entendimento e estudo do espaço urbano,
e permite distinguir três categorias: os espaços privados, os espaços públicos e os espaços
privados acessíveis ao público”. (BALULA, 2011, p. 100).
56
público, no entanto são estruturas privadas que dependem do funcionamento e reportam-
se a espaços privados (VENTURI, SCOTT BROWN, IZENOUR, 2003). Dessa forma, a
strip pode ser vista como um elemento que sintetiza muitos aspectos de Las Vegas,
principalmente essas dualidades – o que justifica a escolha da via como alvo do estudo.
Após o reconhecimento dos elementos mais representativos da strip, o grupo
propôs a classificação dos mesmos em categorias e desenvolveram uma tabela síntese
destes elementos, que consistia no nome do cassino, seguido por uma planta de
cobertura tipo Nolli, um corte que destaca a escala da forma arquitetônica em relação ao
entorno, e por fim algumas partes dos edifícios a serem retratadas por fotos – panorama,
frente, lateral, partes, entrada e estacionamento (VENTURI, SCOTT BROWN, IZENOUR,
2003).
FIGURA 22 - TABELA DE HOTÉIS E CASSINOS
57
sobre o que seriam medidas positivas de embelezamento da cidade, que os arquitetos
enviaram ao Comitê de Embelezamento de Las Vegas. Segundo Scott-Brown, Venturi e
Izenour (2003) a essência urbana da cidade essência está justamente no eco da cultura
pop, que transborda através de comunicação visual e decoração cliché, e as intervenções
futuras devem seguir está linha, preservando o caráter original e singular de Las Vegas.
Vito Acconci, um artista provocador dos anos 1970, baseou sua produção artística
e arquitetônica no debate entre o que é considerado assunto pertencente à esfera pública
e o que deveria ser restrito a esfera privada, produzindo obras que questionam a posição
tradicional do arquiteto no processo de concepção e construção dos espaços (SOLFA,
2017). Segundo Acconci (2001), a arquitetura dificilmente poderia inserir-se em um
contexto de preexistências consolidadas de forma harmoniosa, tendo em vista que o
espaço já contém todo o design que necessita, assim, suas intervenções buscam colocar-
se no meio dos caminhos, espremer-se e ajustar-se às estruturas preexistentes,
adicionando, subtraindo, multiplicando ou dividindo o que é oferecido.
A ideia de identificar, analisar e refletir sobre o espaço preexistente, realizando
sobre ele uma ação que desestabiliza sua ordem, tal qual um organismo atingido
repentinamente por uma doença, deu origem às intervenções parasitas que nortearam a
produção do arquiteto na década de 1990. Segundo Sobel (2002), trata-se da concepção
de atos de arquitetura, pois o foco da intervenção reside na ação do arquiteto que
intervém, comenta e transforma o espaço, e não no objeto físico em si.
Idealizada de modo a intervir no espaço público em frente a um edifício de valor
histórico, o English Department do Queens College, em Nova Iorque, em 1993, a
intervenção More Balls for Klapper Hall parte da leitura do local de intervenção, onde,
ladeando a escada de acesso principal, esferas de concreto sobre pedestais marcavam
a entrada (Figura 23), remetendo à figura de dois guardas – a posição das esferas
influenciava na forma de aproximação das pessoas, deixando-as cautelosas. A proposta
consiste em explicitar e neutralizar a condição espacial criada pelas esferas
58
preexistentes, como a simetria e seu caráter simbólico e decorativo submetendo o local
a um “ataque” por uma grande quantidade de esferas de concreto, que se rebelam contra
a função às quais as esferas originais foram projetadas (Figura 24).
2022.
59
Associando-se com a proposta de Acconci em projetar espacialidades que
favoreçam o desenvolvimento de atividades que se colocam entre a esfera pública e a
privada, as esferas propostas funcionam como mobiliário, isolando-se e ao mesmo tempo
se integrando ao espaço onde se encontram, promovendo o ideário de quebra da unidade
e heterogeneidade do ambiente (SOLFA, 2017). Tendo sido submetidas a um processo
de corte e extração de algumas partes, as esferas se transformaram em nichos, bancos,
portais e espaços de refúgio para um indivíduo ou para um pequeno grupo.
Estratégia semelhante foi utilizada nas propostas Park up a Building e House up a
Building, em 1996, para o Centro Galego de Arte Contemporânea em Santiago de
Compostela. Com o intuito de promover o debate sobre o impacto das empenas e muros
cegos nas cidades, e servir de exemplo para a ocupação desses não lugares, o escritório
propôs um espaço de convívio, a praça, e um de uso doméstico, a casa, para serem
pendurados nos muros cegos do museu (ACCONCI, 2017). Ambas as propostas foram
concebidas a partir de um sistema modular, o qual seria anexado nas paredes ou
empenas cegas, formando uma espécie de escada com largos degraus, possibilitando a
apropriação do espaço conforme as necessidades do usuário (Figura 25).
61
Em sua publicação, The Manhattan Transcripsts (1981), Tschumi propõe a
interpretação arquitetônica da realidade de Manhattan, Nova York, buscando revelar
aspectos normalmente removidos da representação urbana convencional. A proposta
busca trazer um novo olhar a outras camadas que compõe a leitura do espaço, como a
relação entre o mesmo e seu uso, entre a forma e o programa, entre os objetos e seus
eventos (TSCHUMI, 1994). Em seu livro, o arquiteto apresenta o termo “notação
arquitetônica”, que descreve seu processo de projeto, e trata-se da leitura e
representação da realidade através de três elementos fundamentais: o evento, o espaço
e o movimento (Figura 26).
62
exprime a ação ou o processo que compõe a ocorrência de um incidente no espaço
(TSHCUMI, 1994, p. 9).
No projeto do Parc de La Villete (1982-1990), em Paris, Bernard Tschumi
apresenta uma proposta composta por camadas distintas e sem hierarquia, que se
sobrepõe dando origem a uma lógica de entorno próprio na colisão dos três elementos
citados acima, formando o corpo do parque (MONTANER, 2001). A metodologia
incorporada na elaboração do projeto é composta de uma leitura muito aprofundada das
dinâmicas da metrópole contemporânea em questão, caracterizada pela constante
transformação devido às inter-relações, colisões e fragmentações, e representa-se na
aplicação do conceito de layering, tanto como análise quanto como forma (Figura 27).
A análise das interfaces urbanas presente em Aprendendo com Las Vegas (2003)
busca compreender a metodologia por trás dos edifícios da cidade, através de uma
aproximação isenta da crítica arquitetônica quanto ao valor das construções, mas sim o
seu papel e sua relação com o meio onde se encontra. O processo de projeto presente
nas obras de Vito Acconci busca promover a análise do espaço, especialmente da esfera
pública, a fim de propor intervenções que subvertam a compreensão tradicional do local
e que se coloquem no meio dos caminhos preestabelecidos, espremendo-se e ajustando-
se às estruturas preexistentes. Já o processo analítico presente nas obras apresentadas
de Bernard Tschumi promove a leitura do espaço através de outras formas de
representação e compreensão, diferente das tradicionais, em busca do entendimento de
outras das dinâmicas socioespaciais que possam colaborar para a elaboração das
propostas projetuais.
O presente estudo propõe a aproximação do recorte proposto através da
representação em camadas, análoga à adotada nos casos metodológicos anteriores. O
intuito da pesquisa é a observação e compreensão das interfaces urbanas propostas
pelas construções selecionadas para com o espaço público em questão, a fim de
64
entender como potencializar as condicionantes do entorno, promovendo o conceito de
Acupuntura Urbana discutido anteriormente. Também busca-se compreender como o
recurso da Arquitetura Parasita pode ser incorporado no recorte em questão.
A partir disso, o entendimento e sistematização desses edifícios se dão a partir
dos passos:
a) Delimitação do recorte;
b) Mapeamento e representação em camadas da área em questão;
c) Definição de categorias para análise, com base no levantamento realizado;
d) Seleção e investigação formal desses artefatos arquitetônicos no sítio e análise
da interface de seus limites.
65
5. ANÁLISE DA REALIDADE
66
análise do recorte não será finalizada no presente capítulo, sendo que continuará durante
o trabalho final a ser desenvolvido no próximo semestre.
5.1 A DELIMITAÇÃO DO RECORTE
67
Oceano Pacífico, mas a mesma foi rebatizada um ano depois em homenagem ao
comandante brasileiro General Osório, figura importante na guerra do Paraguai32.
Ao longo dos anos, a Praça General Osório foi palco de diversas formas de
manifestação da população curitibana, transformando-se em cenário para a realização
de atividades de lazer, entretenimento e eventos de ordem política, além de dispor como
função a distribuição de água para a população, especialmente em períodos de estiagem
(BOLETIM CASA ROMÁRIO MARTINS, 2006).
No início do século XIX, após mais uma de suas reformas, a praça recebeu
tratamento paisagístico de influência francesa – influência do art nouveau – com o
acréscimo de canteiros e um chafariz, com algumas estátuas. Durante o período da
ditadura, a praça era usada como local de tribuna livre e nos anos 80, foi palco do
movimento Diretas Já – o que aumentou a sua importância política. Nos anos 90 a Praça
Osório passou por uma série de intervenções que a caracterizou como está hoje (Figura
abr. 2022.
68
29), com o espaço para os engraxates na Boca do Brilho, um novo playground e um novo
espaço de recreação esportiva (VIEIRA, 2020).
70
utilidade, desempenham algum papel relacionado com a visão e identificação das
pessoas com o território analisado. Além disso, o conjunto apresenta de que maneira
determinados eventos, naturais ou artificias, decorrentes ou não da apropriação humana,
podem afetar características espaciais do meio urbano e redesenhar, constantemente,
as representações físicas do recorte estudado.
71
FICHA 1 – ENTORNO EDIFICADO IMEDIATO
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de abrangência do entorno edificado a ser estudado. FONTE: IPPUC (2020), modificado
pela autora (2022). // FIGURA 02: Imagem aérea da Praça General Osório. FONTE: GAZETA DO POVO.
Disponível em: <https://www.gazetadopovo.com.br/haus/estilo-cultura/praca-osorio-um-oasis-na-
curitiba-concreta/>. Acesso em: 18 de abr. de 2022.
72
FONTE: AUTORA (2022).
73
FICHA 2 - PÚBLICO X PRIVADO
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de lotes públicos e privados. FONTE: IPPUC (2020), modificado pela autora (2022).
74
FONTE: AUTORA (2022).
75
FICHA 3 - MASSAS EDIFICADAS
Cidade palpável
O mapa a seguir representa a porosidade do tecido urbano. Tendo em vista a análise das
projeções das edificações que preenches os lotes, para além de seus limites cadastrais,
é possível perceber as lacunas e os espaços intersticiais que se formam com o
assentamento das camadas do tempo e as modificações nas construções. Assim o mapa
demonstra que tais espaços, geralmente, não se relacionam com as demais áreas da
cidade, mas a sua articulação com o espaço público possibilitaria novas apreensões e
formas de ocupação.
FIGURA 01: Mapa da porosidade urbana. FONTE: IPPUC (2022), modificado pela autora (2022).
76
FONTE: AUTORA (2022).
77
FICHA 4 - VAZIOS URBANOS
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de vazios urbanos. FONTE: IPPUC (1997), modificado pela autora (2022). Disponível em: <
https://curitibaemdados.ippuc.org.br/Curitiba_em_dados_Pesquisa.htm>. Acesso em: 18 de abr. de 2022 //
FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela autora.
78
FONTE: AUTORA (2022).
79
FICHA 5 - CAMINHOS E ARTICULAÇÕES
Cidade palpável
Compreendendo que a cidade transborda para além dos limites impostos pelas
interfaces dos edifícios, o mapa a seguir mostra como são as articulações no contexto
em questão, destacando áreas privadas, mas que possuem livre passagem ao público
(Figura 02 e 03). A calçada, principal componente do espaço público no recorte, funciona
como um objeto ou estrutura que articula e conecta uma série de outras superfícies
caminháveis.
FIGURA 01: Mapa de articulações urbanas no nível térreo. FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela
autora (2022). // FIGURA 02: Galeria Tijucas. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA 03: Acesso ao edifício
Moreira Garcez. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA 04: Acesso pedestrianizado para Rua Comendador
Araújo. FONTE: AUTORA (2022).
80
FONTE: AUTORA (2022).
81
FICHA 6 - ATÉ 3 PAVIMENTOS
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de edifícios com até 3 pavimentos. FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela autora
(2022). // FIGURA 02: Edifício de esquina, sem uso no momento. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA 03:
Edifício de esquina, uso comercial. FONTE: AUTORA (2022).
82
FONTE: AUTORA (2022).
83
FICHA 7 – EDIFÍCIOS COM ATÉ 7 PAVIMENTOS
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de edifícios com até 7 pavimentos. FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela autora
(2022). // FIGURA 02: Edifício de esquina de uso comercial + habitacional. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA
03: Edifício de uso comercial + habitacional. FONTE: AUTORA (2022).
84
FONTE: AUTORA (2022).
85
FICHA 8 – EDIFÍCIOS ACIMA DE 7 PAVIMENTOS
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de edifícios acima de 7 pavimentos. FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela autora
(2022). // FIGURA 02: Edifício de esquina, sem uso no momento. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA 03:
Edifício de esquina, uso comercial. FONTE: AUTORA (2022).
86
FONTE: AUTORA (2022).
87
FICHA 9 - PATRIMÔNIO HISTÓRICO
Cidade sensível
FIGURA 01: Mapa de patrimônios. FONTE: IPPUC (2011), modificado pela autora (2022). // FIGURA 02: Edifício
Moreira Garcez. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA 03: Rua XV de Novembro. FONTE: AUTORA (2022). //
FIGURA 03: Edifício de esquina de uso comercial. FONTE: AUTORA (2022).
88
FONTE: AUTORA (2022).
89
FICHA 10 - NUMERAÇÃO DE LOTES DO RECORTE
Cidade palpável
FIGURA 01: Mapa de numeração de lotes no recorte. FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela autora
(2022).
90
FONTE: AUTORA (2022).
91
FICHA 11 – IMAGENS DOS EDIFÍCIOS
Cidade palpável
FIGURA 01: Quadro com as fachadas do edifícios no entorno imediato da Praça Osório. FONTE: AUTORA
(2022).
92
FONTE: AUTORA (2022).
93
FICHA 12 - CONCENTRAÇÃO DE PESSOAS
Cidade sensível
FIGURA 01: Mapa de concentração de pessoas. FONTE: AUTORA (2022). // FIGURA 02: Feirinha de
Primavera. FONTE: G1 PARANÁ (2021). Disponível em:
<https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2021/10/10/feiras-de-primavera-das-pracas-osorio-e-santos-
andrade-em-curitiba-terminam-na-terca-12.ghtml>. Acesso em: 19 de abr. de 2022 // FIGURA 03:
Concentração para Zoombie walk. FONTE: CURITIBA CULT (2016). Disponível em:
<https://curitibacult.com.br/mais-de-20-mil-mortos-vivos-participaram-do-zombie-walk-2016/>.
Acesso em: 19 de abr. de 2022 // FIGURA 04: Protesto contra reforma trabalhista. FONTE: G1 PARANÁ
(2017). Disponível em: <https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/centenas-de-pessoas-se-reunem-na-
boca-maldita-para-protestar-contra-as-reformas-trabalhista-e-da-previdencia.ghtml>. Acesso em: 19
de abr. de 2022 // FIGURA 05: Natal Palácio Avenida. FONTE: G1 PARANÁ (2020). Disponível em:
<https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2020/10/08/natal-no-palacio-avenida-2020-em-curitiba-tera-
apresentacao-unica-e-virtual-por-causa-da-pandemia.ghtml>. Acesso em: 19 de abr. de 2022
94
FONTE: AUTORA (2022).
95
FICHA 13 - CONCENTRAÇÃO DE VEÍCULOS
Cidade sensível
FIGURA 01: Mapa de concentração de veículos. FONTE: GOOGLE MAPS (2022), modificado pela autora
(2022).
96
FONTE: AUTORA (2022).
97
FICHA 14 - FEIRINHAS TEMÁTICAS
Cidade sensível
FIGURA 01: Mapa das feirinhas da Praça Osório. FONTE: PMC (2022), modificado pela autora (2022). //
FIGURA 02: Feirinha de Primavera. FONTE: G1 PARANÁ (2021). Disponível em:
<https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2021/10/10/feiras-de-primavera-das-pracas-osorio-e-santos-
andrade-em-curitiba-terminam-na-terca-12.ghtml>. Acesso em: 19 de abr. de 2022 // FIGURA 03: Feirinha
de Natal. FONTE: PMC (2021). Disponível em: <https://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/feiras-das-pracas-
osorio-e-santos-andrade-comecam-nesta-sexta-e-vao-ate-23-de-dezembro/61524>. Acesso em: 19 de
abr. de 2022 // FIGURA 04: Feirinha de Páscoa. FONTE: TRIBUNA PARANÁ (2022). Disponível em:
<https://tribunapr.uol.com.br/noticias/curitiba-regiao/feiras-de-pascoa-de-curitiba-comecam-nesta-
sexta-nas-pracas-osorio-e-santos-andrade/>. Acesso em: 19 de abr. de 2022 // FIGURA 05: Feirinha de
Inverno. FONTE: CLUBE GAZETA DO POVO (2017). Disponível em:
<https://clube.gazetadopovo.com.br/noticias/outros/feira-de-inverno-da-praca-osorio/>. Acesso em: 19
de abr. de 2022
98
FONTE: AUTORA (2022).
99
FICHA 15 - OCORRÊNCIA DE ALAGAMENTOS
Cidade sensível
A região central de Curitiba apresenta o subsolo ocupado por rios, dentre eles o rio Ivo,
que, juntamente a estruturas de drenagem ineficazes e ao avanço da ocupação humana
na região, são responsáveis por um histórico de décadas de alagamentos constantes.
Tais eventos cíclicos possuem a capacidade de alterar momentaneamente a paisagem
do espaço, assim como interferem nas dinâmicas socioespaciais. O mapa a seguir
sobrepõe alguns momentos de alagamentos no recorte – quanto maior a escala de cinza
mais vezes a área passou por tais eventos.
100
FONTE: AUTORA (2022).
101
FICHA 16 - PERCURSO TURÍSTICOB
Cidade sensível
102
FONTE: AUTORA (2022).
103
5.2 AS POTÊNCIAS
104
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
105
A partir dos conceitos teóricos e processos metodológicos estudados, almeja-se
uma atuação arquitetônica que consiga tirar proveito do caráter contemporâneo da
cidade, devolvendo aos usuários a possibilidade de se habitar e se aproximar da
arquitetura e cidade, além de servir como um potencializador para a região. Dessa forma,
apresenta-se como diretriz projetual o desenvolvimento e exploração do mapa como
ferramenta prospectiva e como um guia para intervenções posteriores.
Os mapas desenvolvidos na análise do território não se apresentam como um
produto acabado da pesquisa, mas sim um processo exploratório e não finalizado. As
séries de mapas apresentam-se incompletas, assim como cada mapa em sua
individualidade, repletos de lacunas e questionamentos. O objetivo é visualizar bases que
possam posteriormente auxiliar na continuidade do processo de mapeamento, com intuito
de descobrir novas “janelas” para a atuação arquitetônica em relação ao meio urbano
consolidado.
106
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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of Chicago Press, 1993. In: MOURE, Gloria. Vito Acconci: Writings, Works, Projects.
Barcelona: Ediciones Polígrafa, p. 394-400, 2001.
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In: Critical Inquiry, v. 16, n. 4. Vito Hannibal Acconci Studio. Museu d'Art
Contemporani de Barcelona, p.416-431, 2004.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs - Capitalismo e Esquizofrenia. Ed. 34.
Rio de Janeiro, 1997.
GEHL, Jan. Cidade para pessoas. 2.ed. São Paulo: Perspectiva, 2013.
JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes,
2001.
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The Monacelli Press, 1998.
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109
PLENO, André. A origem da identidade arquitetônica dos Lacaton & Vassal: a
influência do período em África e do mentor Jacques Hondelatte. 2018.
Dissertação (mestrado) - Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de
Coimbra, Coimbra, 2018.
PÓLIS – Instituto Pólis. Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios
e cidadãos. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001.
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TELES, Paulo. Um novo paradigma de cidade? Reflexão sobre a contingência de
uma alteração no modo de viver e conviver: como pode a arquitetura contribuir
para essa mudança? 2018. Dissertação (mestrado) – Faculdade de Arquitetura da
Universidade de Lisboa, Lisboa, 2018.
VISCONTI, Jacopo. Héctor Zamora: dinâmica não linear. Jacopo Crivelli Visconti
(curador). São Paulo: Base7 Projetos Culturais, 2016.
111