Baruch Espinosa, que frequenta os cristãos liberais e os livres-pensadores, é
violentamente excomungado e caçado de Amsterdã pela sinagoga por propósito e atitudes contrárias à ortodoxia judaica. Durante muito tempo seria tachado de ateu, acusação de que ele se defende p. 118.
Espinosa quer mostrar que a filosofia, conhecimento de si mesmo, do mundo e
de Deus, conduz à beatitude, esse estado de felicidade perfeita proporcionado pelo conhecimento racional ao libertar o homem das superstições e das paixões que o afetam negativamente p. 118.
Partindo de princípios metafísicos, Espinosa faz a dedução dos princípios
morais e políticos e mostra que o homem deve se desfazer das ilusões que o alienam e submetem. A primeira dessas ilusões consiste na concepção da natureza herdada da tradição religiosa p. 119.
Deus é a totalidade da natureza. Tudo que existe, existe em Deus e dele
procede. Ele é a única substância que existe, substância significando aquilo que existe em si e é concebido por si (o que não depende de nada além de si mesmo) e tem infinidade de atributos p. 119.
O homem não é um ser privilegiado na Natureza, nem é um “império dentro de
um império”, mas é uma parte da Natureza submetida ao determinismo que a caracteriza. O homem se crê livre, não sujeito à necessidade, porque tem consciência de suas volições, mas o livre-arbítrio (capacidade de ser causa primeira de seus atos sem inclinação alguma) é uma ilusão devida à ignorância das causas que agem sobre ele p. 119.
Se o homem é infeliz, isto se deve ao fato de ele separar o real e o racional,
conforme o finalismo que o impele a buscar sempre mais poder. Ora, aquele que sabe que a razão é o real não busca aumentar seu poder: ele já se encontra na satisfação que advém do amor intelectual de Deus p. 120.
Espinosa não desvaloriza o desejo e tampouco o relaciona irremediavelmente
ao corpo. O espírito deseja tanto quanto o corpo e ambos têm a mesma dignidade. O desejo exprime o poder de afirmação do homem, e constitui sua essência p. 120.
A virtude verdadeira consiste no conhecimento racional de si mesmo, que
liberta das paixões tristes devidas ao desconhecimento de si mesmo e da necessidade e permite ao sábio aceder à beatitude. O sábio é aquele que medita a respeito da vida, não da morte, e sabe saborear os prazeres que aumentam seu poder de agir pp. 120-121.
Espinosa defende a liberdade de pensamento e de expressão das opiniões.
Estas, mesmo que contrárias às linhas de condutado Estado, não podem abalá-lo se seu poder é legítimo, e previnem dos abusos de poder. Mais que isso, as opiniões são inclusive necessárias ao bom funcionamento da sociedade p. 121. Ele defende a laicidade e a tolerância em matéria de pensamento e da expressão da opinião e denuncia a dominação política e religiosa que, fundando-se em superstições, priva o homem de sua liberdade. O Estado é tanto mais forte quanto mais reconhecer a pluralidade de opiniões e permitir a liberdade de expressão p. 121.
Pois o pensamento não é livre se não estiver em conformidade com as
exigências da razão. Ele não deve emanar de paixões tristes e alienantes, como a falsidade, a cólera ou o ódio, que não têm relação com um pensamento originado na razão p. 122.
Schopenhauer
Schopenhauer se opõe aos grandes sistemas racionalistas dos filósofos
alemães (Hegel, sobretudo), criticados por ele de maneira acerba. No entanto, ele reconhece sua dívida para com a obra de Kant, que era segundo suas próprias palavras, “a coisa mais considerável que se produziu em vinte séculos de filosofia” p. 186.
A experiência interior, com efeito, do faz-nos intuitivamente descobrir a
essência humana e, por extensão, do muno em seu conjunto como vontade, querer-viver. Todo ser, do ignorânico ao homem, é animado por esse esforço, essa vontade de afirmação da vida sem origem nem fim. O mundo como vontade é a realidade. E é uma realidade absurda: a vontade é sem razão, sem causa, cega p. 187.
Por essencialmente querer-viver, o homem não pode esperar atingir a
felicidade entendida como satisfação total. Submetido ao desejo que renasce sem cessar, ele experimenta primeiro o sofrimento da privação, da falta que caracteriza todo desejo, a satisfação não sendo outra coisa que a ausência de sofrimento que em pouco tempo leva ao tédio p. 187.
Schopenhauer convoca a uma moral da renúncia: uma vez que o querer-viver
nos impele à desgraça da frustração e do tédio, é preciso aboli-lo, desapegar- se disso. É por meio da moral, assentada sobre a piedade, a arte e o ascetismo que se opera essa negação do querer-viver p. 187.
É no caráter desinteressado da contemplação estética, evidenciado por Kant,
que Schopenhauer vê a ocasião da negação do querer-viver. A arte seria a expressão do ser, e nos desviaria de toda preocupação egocêntrica, libertando da tirania dos desejos p. 188.
Esta atitude de renúncia, de resignação e de indiferença consiste em negar em
si o querer-viver. Schopenhauer se inspira, aqui, no princípio do não apego budista que permite atingir o estado de serenidade correspondente ao nirvana p. 188. O mundo é fundamentalmente querer-viver, tudo não passa de expressão de um esforço universal absurdo. Pessimismo e ateísmo estão lado a lado na defesa do ascetismo, modo de encontrar a serenidade p. 188.
A felicidade, a satisfação, remete sempre a uma privação anterior: nós
satisfazemos sempre um desejo concebido como carência. Não existe, portanto, satisfação sem sofrimento anterior p. 189.
Com efeito, o mundo é vontade. O homem é condenado a desejar sempre, a