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COLAPSO

Debora Chagas
Francielle Lima
Janildes Teles1

Resumo
O presente artigo focalizou a importância da ludoterapia em atendimento
psicoterapêutico em crianças com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade
(TDAH), buscando compreender como a terapia lúdica contribui para o
desenvolvimento cognitivo das crianças com esse transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade, visto que os jogos e as brincadeiras constituem meios naturais de
autoexpressão infantil. Utilizou-se como instrumento norteador as intervenções
psicológicas fundamentadas na teoria humanista, pois esta procura direcionar seus
estudos centrados no ser humano. A Ludoterapia se mostra um instrumento
transformador neste contexto, pois além de permitir uma interação mais prazerosa
da criança com o psicoterapeuta, traz em seu cerne contribuições importantes de
diversos teóricos que se dedicaram ao trabalho com crianças ao longo do tempo. O
estudo de caso, realiza o papel de exemplificar, como a Ludoterapia é abordada no
contexto do tratamento e a resposta do cliente a esse modelo de intervenção
psicoterápica.

Palavras-chave: Transtorno de déficit de Atenção e hiperatividade. TDAH.


Ludoterapia. Estudo de caso.

Abstract

This article focused on the importance of play therapy in psychotherapeutic care for
children with Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD), seeking to understand
how play therapy contributes to the cognitive development of children with this
attention deficit hyperactivity disorder, since games and play are natural means of
children's self-expression. Psychological interventions based on the humanist theory
were used as a guiding instrument, as this seeks to direct its studies centered on the
human being. Ludotherapy proves to be a transformative instrument in this context,
1
Alunas do 3º semestre, do curso de Psicologia da Faculdade Santíssimo Sacramento.
2

as in addition to allowing a more pleasurable interaction between the child and the
psychotherapist, it brings at its core important contributions from several theorists
who have dedicated themselves to working with children over time. The case study
serves to exemplify how Ludotherapy is approached in the context of treatment and
the client's response to this model of psychotherapeutic intervention.

Keywords: Attention Deficit Hyperactivity Disorder. ADHD. Ludotherapy. Case


study.

1. Entendendo o TDAH
O TDAH, consiste em uma desordem neuropediatrica caracterizada por uma
tríade de sintomas: desatenção, comportamentos impulsivos e hiperativos
manifestados de maneira desproporcional.
A hiperatividade tem sido extensivamente investigada do ponto de vista
daquilo que é o transtorno, com um interesse específico direcionado para os critérios
diagnósticos e a etiologia. Inúmeras pesquisas têm sido guiadas para encontras a
causa biológica específica que explique o déficit de Atenção e Hiperatividade
(TDAH), contudo , evidências conclusivas de lesão ou disfunção neurofisiológicos
são poucos substâncias e continua, incertas, conforme dito por Debroitner e Hart
(1997, p 2):

“Aqueles que ainda investem-se não ideia que o TDAH é


uma doença invisível do cérebro estão buscando uma
explicação simples, por um distúrbio que é complexo e
multidimensional. Acreditamos que nossa obsessão nacional
pela genética como fator para explicar as disfunções sociais
e psicológicas encontrou seus limites com o TDAH.”

Por não existirem biomarcadores específicos do TDAH. O diagnóstico é feito


a partir da sintomatologia. Para isso é importante saber diferenciada os sintomas do
Transtorno, com o comportamento característicos de crianças em idade ativa, como
barulho e correria.
Verifica-se que, ainda que certos fatores ligados ao desenvolvimento no início
da vida do recém-nascido (bebê com dificuldade de acalmar ou de dormir) possam
colocar as crianças no grupo de risco, a hiperatividade se caracteriza por uma
multiplicidade desses problemas, pela sua intensidade ou gravidade e pela sua
persistência durante o processo de crescimento da criança.
Assim deve-se observar o comportamento das crianças e, sobretudo aquelas
que apresentem comportamento inquieto e arredio, é preciso observar em crianças
que agem de forma diferente das outras, pois isso pode ter relação com a
hiperatividade. Neste sentido Marzocchi (2004), chama atenção para o fato de:

• Frequentemente não consegue prestar atenção em


detalhes e comete erros de distração nos deveres escolares
ou em outras atividades.
• Frequentemente tem dificuldade para manter a atenção em
seus deveres ou nas atividades lúdicas.
3

• Frequentemente a criança parece não ouvir quando se fala


diretamente com ela.
• Frequentemente deixa seu lugar na sala de aula ou em
outras situações nas quais se espera que a criança fique
sentada.
• Frequentemente fala demais;
• Frequentemente “dispara” as respostas antes que as
perguntas tenham sido completadas;
• Frequentemente “interrompe os outros ou invade os seus
próprios relacionamentos” (intromete-se, por exemplo, nas
conversas ou nos jogos). (MARZOCCHI, 2004, p. 14).

A apresentação dos sintomas variam conforme o estágio de desenvolvimento


do transtorno e poder ser confundida com o comportamento opositivo. (TOD) e com
outros distúrbios, como o de humor e de ansiedade. ( BRASIL, 2019; APA, 2104).
As suas consequências comprometem o desenvolvimento cognitivo, pois
apesar de não referir a incapacidade de aprender, trata-se de um distúrbio que se
caracteriza pela incapacidade de concentrar-se numa atividade, e assim exime o
hiperativo de certas atividades, principalmente na escola, com relação a realização
das atividades escolares. ( EIDT; DUARTE, 2005)

1.2. Relevância do diagnóstico prévio e da psicoterapia

Keith conners2 um pesquisador renomado na área da hiperatividade infantil,


assegura que o diagnóstico da hiperatividade é difícil e complexo, não existe
nenhum teste diagnóstico absoluto para a hiperexcitáveis. O que realmente é
necessário é uma cuidadosa coletânea de informações das mais distintas fontes
( por exemplo, pais e professores), por meios dos mais variados instrumentos
( questionários, entrevistas e testes) e por vários meios. ( GOLDSTEIN,
GOLDSTEIN, 2004)
Não existe uma idade certa para que os pais detectem o transtorno nos seus
filhos, mas um diagnóstico correto, fará com que as pessoas ligadas a esta criança
sofra menos, uma vez que se entende as questões ligadas ao comportamento é
assim iniciar precocemente um programa de intervenção que com certeza irá
amenizar os sintomas. ( ANDRADE, 2000).
Profissionais como pediatras, psicólogos e neurologistas são capacitado e
qualificados a proceder ao diagnóstico da TDAH, porém, somente os psiquiatras,
psicólogo e psicopedagogos tem o conhecimento necessários para aconselhar
melhor os procedimentos que devem ser adotados.
Diferente da medicina, o diagnóstico psicológico tem por finalidade os
processos psíquicos que são influenciados e que influência a doença ou o
comportamento, sendo por meio da anamnese que estes profissionais coletará
dados na busca de um diagnóstico. Neste sentido o psicólogo oferecerá a escuta e
ajudará o cliente a confiar no profissional. CARVALHO, 2008)

1.3. Dificuldades no manejo clínico do TDAH

2
KEITH CONNERS: Clínico, pesquisador, palestrante, autor, editor-chefe e administrador. Sua dedicação ao
estudo do TDAH e outros problemas de infância o impulsionou para escrever vários livros, artigos de revistas e
capítulos de livros com base em suas pesquisas sobre TDAH e distúrbios infantis. Ele é altamente reconhecido
no campo da psicologia por suas numerosas contribuições.
4

Como abordado anteriormente, alcançar o diagnóstico para esse distúrbio


pode ser a parte mais dificultosa do manejo clínico realizado pelo profissional de
saúde primária. Na maioria das vezes, os sintomas coincidem com algum outro
transtorno ou são confundidos pelos pais com distúrbios do comportamento próprios
da idade.
Outro fator contribuinte para a dificuldade do manejo clínico é o pouco
conhecimento acerca do transtorno por parte de alguns profissionais.
Sendo assim, os pais de crianças Hiperativas, necessitam aprender a reagir
aos limites de seu filho de forma positiva e ativa. Aceitar o diagnóstico do Hiperativo
significa aceitar a necessidade de fazer modificações no ambiente da criança. A
rotina precisa ter consistência e raramente variar. As regras devem ser repassadas
claramente e resumida. Atividades ou situações problemáticas já acontecidas devem
ser evitadas ou cuidadosamente planejadas. (BENCZIK, 2000).
A oportunidade oferecida ao público infantil encontra-se na Ludoterapia o
respaldo de se desenvolver sob melhores condições. Em virtude de não ser
direcionada e tem como finalidade confiar na aptidão positiva de cada um, colabora
para que a criança entre em contato com seus sentimentos, no exato instante que se
sentir em condições, com disposição e segurança para isso (AXLINE, 1982).
Neste sentido, o psicólogo ao utilizar essa técnica visa preservar a saúde
emocional da criança, proporcionando alegria e distração, por meio de
oportunidades para brincar, jogar e encontrar parceiros; prepara a criança para as
situações novas que enfrentará, levando-a a familiarizar-se com os brinquedos e
jogos, e por meio de situações lúdicas, auxiliar na recuperação da criança e
amenizar o trauma psicológico que por ventura esteja enraizado na criança. (MELO;
VALLE, 2008).

2. Psicologia e a ludoterapia

A Ludoterapia é um ramo da psicologia, é a psicoterapia voltada para


tratamento psicológico infantil. A prática é um tipo de abordagem terapêutica
utilizada, normalmente, com crianças de 3 a 12 anos. Nessa abordagem, a principal
ferramenta terapêutica é a brincadeira, que se baseia no fato de que brincar é um
meio natural de expressão da criança de seus sentimentos, ansiedades, angústias e
fantasias inconscientes.
Em 1920, a psicanalista Melanie Klein 3 (1882-1960) desenvolveu o método de
brincar para analisar o comportamento infantil. Essa técnica permitiu acessar o
inconsciente bem como memórias e experiências recalcadas das crianças.
Seguindo os passos de suas precursoras, Carl Rogers 4, desenvolveu a
terapia centrada na pessoa durante as décadas de 1940 e 1950. Esse tipo de
terapia enfatiza a importância da genuinidade, confiança e aceitação no
relacionamento terapêutico.

3
MELAINE KLEIN: foi uma das maiores psicanalistas da história, seguidora de Freud, com genialidade e amor a
verdade erigiu uma escola com pensamentos próprios e distintos . Suas teorias vieram de trabalhos com
crianças, são três pilares fundamentais da teoria Kleiniana, identificação do mundo interno e externo, medo de
aniquilamento e ansiedade depressiva infantil.
4
CARL ROGERS: foi um psicólogo estadunidense atuante na terceira força da psicologia e desenvolvedor da
abordagem centrada no cliente.
5

Além disso, Virginia Axline5 deu início aos estudos sobre a terapia não-diretiva
por brincadeira, modificando a abordagem de Rogers em uma técnica de terapia por
brincadeira mais apropriada para crianças.
Logo, a ludoterapia mostra-se como um mecanismo ideal para a criança dar
vazão aos sentimentos mobilizados pela forma que é tratada, além de ajudá-la em
seu processo de desenvolvimento. Os jogos e brincadeiras e as atividades lúdicas
como terapia, igualmente admite que a humanização sempre esteja presente,
embora seja direcionada para adultos ou crianças, constitui tudo àquilo que é
imprescindível para tornar o profissional da psicologia adequado à pessoa humana e
aos seus direitos. (AXLINE, 1982).
Na medida em que se adiciona a brincadeira ou jogos é importante deixar a
criança iniciar o jogo, mas, quando possível fazer incursões na confiança e permitir
que a criança com TDAH sinta altos e baixos de emoção, o psicólogo deve participar
do jogo e aceitar que ele tenha um alto nível de atividade. Não raro, alguns
profissionais começaram a ver o TDAH como um transtorno social. Assim, um jogo
ativo permite que as crianças criem competição e se revezem, fotografem e
trabalhem seu déficit social em um ambiente seguro e confiante. Isso significa que a
ludoterapia tem que ser centrada na criança. (AXLINE, 1998).
A maioria das crianças com idade inferior a dez anos, ao utilizarem atividades
lúdicas, sobretudo por meio de jogos e brincadeiras se comunica naturalmente
através do mesmo. As crianças geralmente não respondem às interações verbais e
não verbais com os adultos, mas, na ludoterapia centrada na criança, os adultos
respondem à escolha de jogo delas para ajudar que seja compreendida a
comunicação, buscando sensibilizá-las para o comportamento e as emoções,
trazendo um significado maior para o jogo. (SMENYAK, 2013)

2.1. Psicoterapia e as contribuições da ludoterapia no tratamento da


TDAH

Na obra Psicoterapia e Consulta Psicológica, de 1942, Rogers compreendia a


consulta psicológica como facilitadora de uma maior independência e integração do
indivíduo. A terapia não seria uma preparação para a mudança, mas sim a própria
mudança (ROGERS, 1942/2005; MOREIRA, 2014).
A Ludoterapia é descrita no mesmo livro como uma terapia de natureza
expressiva, que se desenvolve mais através das ações do que de palavras.
(ROGERS, 1942/2005; MOREIRA, 2014).
Apesar de destacar essa diferença, Rogers compreendia o atendimento de
crianças como similar à consulta psicológica do adulto.
Embora a ludoterapia possa parecer a alguns uma experiência de um tipo
muito diferente da consulta psicológica de estudantes ou da terapia com pais e
adultos, as suas estruturas revelam-se muito semelhantes (...). A diferença mais

5
VIRGÍNIA AXLINE: foi uma psicóloga clínica reconhecida internacionalmente, sendo uma das pioneirismo
desenvolvimento da psicoterapia infantil.
6

notável está em que na ludoterapia a relação é definida muito mais através de ações
do que das palavras. (ROGERS, 1942/2005, p. 94-95).
Por se tratar de um transtorno crônico, TDAH não tem cura, mas, sim,
tratamento para reduzir os impactos dos sintomas. No geral o tratamento é feito com
psicoterapia. Para crianças e adolescentes, o tratamento é multidisciplinar, com
diferentes profissionais de várias áreas, dependendo da demanda. O uso de
medicamentos também pode ser recomendado, devido ao seu alto nível de eficácia.
O terapeuta pode se utilizar dos dois tipos de métodos da ludoterapia: o não-
diretiva e diretiva.

 A terapia não-diretiva é considerada um método não-invasivo e


com pouca interferência do profissional.De acordo com estudos, essa terapia
tem origem na psicoterapia não-diretiva de Carl Rogers. Em seguida, as
teorias de Rogers foram adaptadas para a terapia infantil por Virginia Axline.

 Já a terapia diretiva, é um método em que o terapeuta dá mais


orientação e auxílio, bastante visto no acompanhamento de crianças no
tratamento do TDAH. DUARTE, 2009,p. 110, ressalta:

“Não obstante, pode-se realçar que para cada


tratamento envolvendo crianças com TDAH existem
finalidades específicas que devem considerar ao
menos três aspectos fundamentais:
(1) Causa da consulta ou queixa principal;
(2) O potencial a ser desenvolvido;
(3) Capacidade dos pais em aceitar modificações”.

Portanto, aos pais, é importante que procurem profissionais capacitados para


obter informações acerca do assunto do TDAH. E aos profissionais, é importante
que busquem embasamento teórico suficiente para lidar de forma competente com o
possível transtorno. A interação e participação das crianças nos jogos pode ser uma
fonte de reforçamento em si mesma, visto que através da brincadeira a criança se
relaciona com o ambiente externo, agindo sobre o meio e sofrendo as
consequências de sua ação (GUERREIRAS, Bueno & Silvares, 2000).
Sendo assim a terapia lúdica como também é conhecida a ludoterapia
propõe alguns cuidados, as sessões terapêuticas devem acontecer em um ambiente
em que a criança se sinta tranquila. Em razão disso, os jogos ficam em uma sala
segura e confortável, onde há poucos limites e regras impostas aos pequenos
obedecendo a idade, ao nível cognitivo e singularidade de cada criança.
Alguns recursos e seus objetivos alcançáveis, capazes de gerar grandes
resultados:

Desenhos
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O desenho é um método bastante assertivo para descobrir as perturbações


da mente infantil. É possível até mesmo identificar traços da personalidade por meio
do tipo de desenho, da firmeza do lápis, do enquadramento das figuras na página,
entre outros aspectos.

Faz de conta

O faz de conta pode ser explorado tanto com bonecos quanto com outras
brincadeiras imaginativas. Por imitar a vida real, o faz de conta deixa transparecer a
dinâmica familiar ou escolar, sendo possível identificar fatores problemáticos. Outro
aspecto desse tipo de brincadeira é a identificação de necessidades que não estão
sendo cumpridas na realidade.

Psicodrama infantil

O psicodrama é um método de dramatização utilizado por diversos psicólogos


para compreender os sentimentos e crenças mais intrínsecos do paciente. São
usadas encenações teatrais para dar voz a diversas emoções e praticar a mudança
de perspectiva já que os papéis dos personagens são trocados entre o paciente e o
psicólogo.

Jogos

Jogos da velha, tabuleiro, memória, baralho, bola de gude, e muitos outros,


são janelas para a forma de pensar e raciocinar da criança. Também são técnicas
que permitem trabalhar a frustração e competitividade e identificar as maiores
preocupações da criança durante o jogo. Quando um jogo novo é introduzido, é
possível observar como a criança lida com situações novas.

Construção de Situações-Problema:

“Durante todo o contexto de jogo o terapeuta


trabalha com situações-problema, definidas como situações
desafiadoras e de impasse apresentadas às crianças que
visam gerar questionamentos e têm como consequência a
busca de soluções plausíveis” (MACEDO, Pìtty e Passos,
2000).

São situações que podem ser elaboradas pelo terapeuta ou propostas pelo
jogo. Podem ser geradas a partir de questionamentos ou pedidos de justificativa
feitos pelo terapeuta acerca de determinada jogada efetuada, na qual se desafia a
criança a descrever o que a levou a jogar daquela forma e a pensar outras jogadas
possíveis para a mesma situação.
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“Diante de situações-problema, o terapeuta dirige a


atenção da criança a observar e analisar aspectos que
considera importantes. Têm como objetivo principal que a
criança esteja atenta ao comportamento de jogar,
questionando-a na medida em que prevê a consequência do
mesmo, tornando desta forma o fator sorte e as jogadas de
ensaio e erro menos relevantes; além de proporcionar ao
terapeuta o acesso a comportamentos encobertos da
criança. Trata-se de uma forma diferenciada de trabalhar
com jogos, e que permite a relação direta do jogo com
atividades escolares” (MACEDO, Pìtty & Passos, 2000).

Análise do comportamento de jogar

Durante o trabalho realizado com crianças com diagnóstico de TDAH, o


terapeuta busca, a todo o momento, fazer uma análise do comportamento da criança
na sessão a fim de sinalizar para ela a maneira como se comporta e as
consequências que produz frente a estes comportamentos. Isso é necessário, visto
que estas crianças apresentam comportamentos de impulsividade, desatenção e
hiperatividade, na maioria das vezes, não percebidos por elas mesmas, o que pode
ocasionar conseqüências aversivas em muitos momentos nos diversos ambientes
pelas quais transitam, sem que haja o entendimento dos motivos de tais
conseqüências. Dessa forma, é incentivada a liberdade de expressão para que o
terapeuta consiga observar os comportamentos do pequeno paciente.

2.2. Ludoterapia e as interações psicológicas da teoria humanista

Muito do que está sendo apresentado sobre a ludoterapia está pautado no


humanismo, a partir das contribuições de Carl Rogers, renomado Psicólogo da área
humanista que criou o atendimento denominado Abordagem Centrada na Pessoa
que, trouxe intensas contribuições para o desenvolvimento e base da Ludoterapia
Centrada na Criança, porém o foco dispensado ao estudo com crianças e foi mais
explorado e aprofundado por Virgínia Axline. (YUNES, 2003).
Reconhecemos em certos aspectos apresentados O Tratamento Clínico da
Criança Problema, mesmo que de forma inicial, algumas noções que influenciarão a
Ludoterapia Centrada na Criança, a saber: a importância de enfatizar a criança ao
invés do sintoma comportamental que ela apresenta; a terapia com o objetivo de
ajudar a criança a desenvolver-se, para promoção de maior independência e
responsabilidade.
Virginia Mae Axline, aluna e colaboradora de Rogers, publicou em
Ludoterapia - A dinâmica interior da infância, de 1947, os elementos característicos
deste tópico. Para Axline (1947/2013), a brincadeira é o meio natural de expressão
da criança, que comunica e expressa seus sentimentos através dos brinquedos.
Em Ludoterapia - A dinâmica interior da infância, Axline apresenta sua
compreensão de personalidade pela noção de ajustamento da criança. Seu
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pressuposto central é uma poderosa força, existente em cada indivíduo, direcionada


para uma completa auto realização, maturidade, independência e autodireção. Estes
são parte do crescimento da criança considerado dinâmico e marcado. Rogers
(1939/1978) preconiza que a criança precisa ser vista para além dos problemas de
ordem comportamental:
"Abordaremos a criança, e não os sintomas
comportamentais [...] existem crianças - meninos e
meninas - com background e personalidades
diferentes [...] é com a criança que devemos lidar,
não com a generalização que fazemos a seu respeito
de seu comportamento" (p. 20-21).

Compreendemos que essa forma de reconhecimento da criança retira o foco


no sintoma e no problema e propõe um acesso à criança tal como ela se apresenta
no contato com a psicóloga, o que parece se apresentar como uma perspectiva
diferente dos modelos vigentes à época de publicação da obra.

Sobre as semelhanças entre as ideias de Rogers e Axline, ambos defendiam


a ideia de que o terapeuta deve confiar na capacidade de crescimento do indivíduo,
para possibilitar uma relação onde o cliente possa se autodirigir e esta direção possa
ser seguida pelo terapeuta, sem receios. Dessa forma, Rogers informava que a
terapia, com esse pressuposto, serviria de apoio para que o indivíduo pudesse
desenvolver-se. Rogers (1942/2005) afirmou que:

"A terapia não é uma forma de fazer algo para o


indivíduo ou de induzi-lo a fazer algo sobre si
mesmo. É antes um processo de libertá-lo […], de
remover obstáculos que o impeçam de avançar" (p.
28, grifo no original).

2.2.1. Princípios da ludoterapia centrada na criança.

Axline (1947/1984) destacou, como princípios básicos, as seguintes


propostas:

1. O terapeuta deve desenvolver um bom relacionamento com a criança para


o estabelecimento do rapport;

2. Aceitar a criança completamente;

3. Estabelecer um sentimento de permissividade;

4. Reconhecer e refletir os sentimentos;

5. Manter o respeito pela criança;


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6. A criança indica o caminho;

7. A terapia não pode ser apressada;

8. O valor dos limites:

Acolhida amistosa: O psicoterapeuta deve receber a criança amistosamente


baseada no rapport , a fim de que seja estabelecida uma empatia entre ambos. É
fundamental que o psicólogo tenha o desejo de trabalhar com crianças para que
possa naturalmente desenvolver este ambiente de acolhida;

Aceitação: Cabe ao profissional acolher a criança da maneira que ela é, pois


a sua realidade, sua família e a condição social não forma suas escolhas Independe
as suas particularidades, a criança precisa ser aceita pelo simples fato de ser uma
pessoa. Não é só com palavras que a criança se sente aceita, mas tambématravés
de atitudes que o psicoterapeuta se expressa, ou não, neste relacionamento;

Permissão: Essa relação precisa aceitar a impressão de permissividade,


deixando a criança ter autonomia para expor os seus sentimentos. A hora
terapêutica é a hora da criança, para ela usar da maneira que lhe convir. O
terapeuta renúncia em fazer sugestões permitindo à criança assumir a
responsabilidade de fazer suas próprias escolhas;

Reflexo de sentimentos: O psicoterapeuta deve ficar sempre atento para


analisar os sentimentos expressados pela criança e para refleti-los, de tal modo que
ela possa ter conhecimento acerca do seu desempenho. O brinquedo da criança é
resultado do simbolismo dos seus sentimentos, porém não se deve tentar fazer uma
interpretação do comportamento simbólico da criança, ao contrário se deve tão
somente refletir os sentimentos, lançando mão dos mesmos símbolos utilizados pela
mesma;

Consideração positiva: O respeito precisa ser claro com a competência da


criança em resolver suas próprias pretensões, apresentando-lhes oportunidades
para isso. A responsabilidade das escolhas e da transformação é deixada à criança.

Não diretividade: Não é necessário e nem se deve direcionar ações ou


conversas da criança. A criança indica o caminho e o terapeuta o segue. Não se faz
elogios de maneira a levar à indução da criança em agir no sentido de obter mais
elogios. Não se critica o que a criança faz, para que a mesma não se sinta
desencorajada, nem inadequada, pois assim ela mesma pode descobrir novas
possibilidades. A sala de brinquedos e os materiais devem estar à disposição da
criança, a decisão de utilizá-los compete a ela;
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Respeito ao ritmo pessoal: Em nenhuma hipótese proceda tentando


restringir a duração da terapia. É importante estar à disposição e respeitar o ritmo
que a criança escolher, sem procurar ter pressa ou retardar algum aspecto do
processo terapêutico. Esse processo precisa fluir gradativamente. O terapeuta tem
confiança que quando a criança encontrar-se apta para expor seus sentimentos ela
o fará;

Não antecipar preocupações:Estabelecer tão-somente os limites


imprescindíveis para fundamentar a terapia no mundo concreto e deixar a criança à
vontade nessa relação. Não imprimir à criança, antecipadamente, restrições tendo
por base as ansiedades do terapeuta, ou baseadas em pré concepções atribuídas
por familiares, cuidadores ou quem quer que tenha encaminhado a criança para a
terapia.

Esses princípios procuram explicar por meio da relação que se constitui entre
a criança e o terapeuta. Existem alguns limites necessários para manter a segurança
física e mental da criança, o terapeuta visa auxiliar, através da atividade lúdica, que
a criança explore seu mundo emocional dentro do ambiente do processo ludo
terapêutico. (COLOVINI; BERTOLIN, 2010).

3. Estudo de caso

Esse estudo de caso tem como objetivo apresentar um demonstrativo sobre o


Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), bem como expor como é
feita a Ludoterapia que tem por finalidade reduzir os impactos dos sintomas deste
transtorno. Para atingir este objetivo foi utilizado como base um estudo de caso
apresentado na Universidade Luterana do Brasil pelos autores Ms Jorgina Baú Mena
Barreto e pelo graduando Marcos André Macedo Martins.
Os autores fizeram um estudo utilizando como base o paciente J. S., menino
de 10 anos no início da terapia, que cursava o quinto ano do ensino fundamental
quando foi encaminhado pela escola e pelo médico neurologista para realização de
uma avaliação psicológica no intuito de obter o acompanhamento de um segundo
professor em sala de aula em decorrência de um diagnóstico de Transtorno de
Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).
É relatado pelos autores que o paciente foi descrito como inquieto e
agressivo, foram relatadas dificuldades de aprendizagem geral. Apesar da situação
relatada, ele era capaz de ter uma boa relação com os amigos, professores e
familiares, além de conseguir seguir as regras adequadamente. O comportamento
do paciente melhorou após o início do uso da medicação prescrita.
Dando prosseguimento com os atendimentos a criança, foi executada uma
entrevista de anamnese, buscando compreender os motivos que levaram o paciente
a o psicólogo, e a partir dessas informações decidir como proceder, após foram
aplicados diversos testes com a mãe do paciente e com a segunda professora.
Barreto e Martins (s.d.), nesse processo de avaliação psicológica, que durou
seis sessões, foi notado que, de fato, J.S. apresenta características que podem
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diagnosticá-lo com TDAH de apresentação predominantemente hiperativa/impulsiva.


A atenção do mesmo foi considerada acima da média em algumas situações. Foi
notado também que o paciente, apresenta muitas características que podem ser
consideradas sintomas de dislexia.
Durante um dos testes chamado DFH III que faz uso de desenhos, percebeu-
se que o paciente havia perdido parte de sua espontaneidade, parecendo viver
constantemente sob o constrangimento das regras, parecendo se expressar de
maneira mais livre quando entendia que não estava sendo observado sob uma ótica
avaliativa. A falta de estímulospara que o mesmo encontrasse as soluções dos
problemas sozinhos parecia influenciar diretamente o seu desempenho, pois ele
desistia facilmente quando encontrava alguma dificuldade. Foi dada então a
devolutiva da avaliação a mãe do paciente juntamente foi realizada uma nova
entrevista com ela, momento que a mesma decidiu continuar com o
acompanhamento do filho. (Barreto e Martins [s.d]).
Dada as informações das sessões seguintes fornecidas por Barreto e Martins
(s.d.) podemos pontuar. A mãe relatou vários comportamentos agressivos. Tais
quais bater a cabeça contra a parede, agressividade contra o padrasto. Devido a
isso optou-se por sugerir que o paciente iniciasse um processo psicoterapêutico,
pois problemas de cunho emocional e social também poderiam estar relacionados
com suas dificuldades de aprendizagem e desenvolvimento.
O paciente cresceu em um ambiente hostil, com confusões e até tentativa
de homicídio, que culminou com a morte do pai por cirrose quando o mesmo tinha
três anos, logo após o paciente se apegou a sua avó que também veio a falecer
pouco tempo depois. Passando assim por um longo processo de luto até aceitar a
perda.
No processo terapêutico que se iniciou foram utilizadas abordagens lúdicas.
O paciente demonstrou dificuldades em se comunicar e expressar verbalmente o
que sente e pensa. Devido a isso optou-se por intercalar momentos de ludoterapia
com o auxílio de jogos e brinquedos com técnicas lúdicas e momentos de arteterapia
que permitissem o paciente se expressar livremente.
Durante a ludoterapia com jogos e brinquedos, o paciente teve liberdade para
se permitir fluir livremente dentro do consultório, podendo escolher as brincadeiras e
permitindo ao terapeuta a formação de vínculo com o paciente. Em jogos
competitivos o paciente demonstrou novamente seguir as regras e lidar com a
frustração, apesar de ser inquieto. Já brincando com o carrinho foi possível notar a
necessidade de fugir às regras em alguns momentos e deixar a agressividade fluir.
Nas técnicas de arte terapia, os autores informam que J. S. teve a liberdade
para expressar de maneira lúdica questões inconscientes que pareciam estar
impedindo que sua energia psíquica fluísse de maneira espontânea. Apesar de não
compreender racionalmente o que expressava, ele trouxe conteúdos muito ricos
para se trabalhar.
Mesmo com essa resistência, encontraram-se algumas pistas durante uma
sessão utilizando o instrumento do desenho da família, sobre o momento de vida
atual de J. S. em seu desenho, bem como nos desenhos de figuras humanas que
surgiram durante a avaliação psicológica; neste desenho, as figuras seguem
padrões rígidos, com poucas características que o diferenciam. É um desenho
13

extremamente racional, cheio de linhas e cantos retos, em que foi possível


encontrar uma possível ressignificação de sua relação com seu padrasto. Também
foi possível notar que a figura de sua mãe ocupa o centro da família. O paciente
apresentou novamente características que fizeram crer que ele vive sob o
constrangimento das regras, sem espontaneidade, com muita criatividade e
agressividade reprimidas.

Ao final das sessões a mãe do paciente foi chamada para conversar sobre o
comportamento e para ser questionada se havia notado mudanças no
comportamento do filho. Ela relatou que ocorreram várias mudanças em seu
comportamento; tanto em casa quanto na escola ele está menos agressivo e já não
briga com o padrasto. Na escola, apesar de não estar tendo acompanhamento da
segunda professora, seu desempenho vem melhorando gradualmente. J. S. tem
recebido auxílio em sala de aula de um colega que lhe ajuda. Em casa, a mãe busca
auxílio de pessoas que possam ajudar o filho com as lições quando necessário. Está
sendo incentivado a ter mais iniciativa própria para que resolva seus problemas, sem
que outras pessoas os resolvam por ele. Até o momento da redação deste artigo, a
psicoterapia de J. S. continua em andamento. (Barreto e Martins [s.d]).

4. Considerações Finais

A transtorno de atenção e hiperatividade ( TDAH), em todo o seu processo,


tem sido observada e estudada por inúmeros autores, médicos, psicólogos. A falta
de informação, leva os pais, amigos, professores e colegas de sala de aula a
taxarem de indisciplinados crianças com TDAH. Embora não exista um manual que
aponte de forma plena como diagnosticar a hiperatividade, mas conhecer o que é,
como se processa esse déficit possibilita encontrar mecanismos eficientes a
minimizar suas possíveis consequências.

No processo de desenvolvimento, acredita-se que o papel exercido pelo


psicoterapeuta é de vital relevância, pois através deste, permite-se criar espaços,
incluir atividades de jogos e brincadeiras a fim de que a criança hiperativa sinta-se
mais a vontade em se expressar, e, por conseguinte construa-se o seu
conhecimento. Deve-se considerar também que a realização de atendimentos tendo
a ludoterapia como base fundamental proporciona oportunidade de crescimento
pessoal não apenas para as crianças a ela atinentes, mas também para os
profissionais e terapeutas em formação.

Essa abordagem propõe uma psicoterapia que possibilite a criança interagir


com um ambiente facilitador, isento de julgamentos, entraves ou condições externas.
Este ambiente permite ainda uma interação de respeito e confiança. Assim, para que
a criança busque a si mesmo, o psicoterapeuta precisa lançar mão (apresentar) no
mínimo três atitudes imperativas para uma terapia eficaz, qual seja: relação positiva
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incondicional; compreensão empática e a coerência. Conforme descrito por Rogers


(1997), ao considerar essas três atitudes, seja qual for o relacionamento interpessoal
promovem e liberam uma relação mais prazerosa entre profissional e cliente.

Neste sentido, utilizar atividades lúdicas para crianças hiperativas, não é um


caminho restrito, ao contrário se mostra um longo caminho a ser percorrido, e que
transformar o ambiente de atendimento em um local aberto a ludicidade é uma
tarefa muito árdua, haja vista a formação docente, das condições estruturais das
instituições, e da visão distorcida de que o brinquedo é tudo, menos coisa séria, para
o desenvolvimento pleno da criança com TDAH.

Assim, tem-se a pretensão que este artigo possa despertar estudos futuros e
a preocupação com tal problema, pois há muito que se fazer e descobrir em relação
a este assunto que assola muitas pessoas e prejudica o desenvolvimento da
aprendizagem das crianças, sobretudo àquelas que estão iniciando na vida escolar.

Referências

COUTO, T. S. et. Al. Aspectos neurobiologicos do transtorno de déficit de


atenção e hiperatividade (TDAH): uma revisão. Ciências & Cognição, v. 15, n. 1,
p. pp. 241-251, 21 abr. 2010.
PIOLA, KRISLEN MEDONÇA. Ludoterapia: crianças com transtorno de déficit
de atenção e hiperatividade-TDAH. Ariquemes- RO, 2019.
SILVA, Maria Luiza Visgueira da.et. al. Abordagens em saúde mental em pessoas
com transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH): uma revisão
integrativa. Publicado em : 21/07/2020.
ANTONY, Sheila e RIBEIRO, Jorge Ponciano. Hiperatividade: Doença ou
Essência Um Enfoque da Gestalt-Terapia. Universidade de Brasília, Psicologia,
ciência e profissão, 2005.
VALESKI, Alcione. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: tratamento
fisioterapêutico com abordagem ludoterapêutica. Fisioterapia Brasil 5 (1), 66-72,
2004.
SILVA, Maria das Graças de Morais. Transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade e o uso dos jogos educativos. Currais Novos-RN, 2016.
BARRETO, Jorgiana Báu amena; MARTINS, Marcos André Macedo. Da Avaliação
Psicológica á Psicoterapia infantil: um estudo de caso.
FIGUEIREDO, Juliette de Souza. Um estudo de caso a partir da atuação
psicopedagógica utilizando estratégias lúdicas com o TDAH. João Pessoa,
2015.

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