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Material Teórico
Objetivos da Unidade:
O Início do Fim
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Tal como o nascer, o morrer também é um momento ímpar. Familiares, amigos e cuidadores
viverão um momento de intenso sofrimento, independentemente de ter havido um “preparo”
para o fim.
Nessa ocasião, o uso de recursos terapêuticos de forma desenfreada deve ser avaliado pois
geralmente os efeitos são nocivos e poucos são os benefícios. Além disso, expõe o paciente e
seus familiares a mais dor e sofrimento do que a própria doença de base.
Essas situações geralmente acontecem em locais onde a morte não é aceita como um processo
natural ou quando os profissionais sentem-se inseguros legalmente. É importante ressaltar que
o uso desses recursos causa dependência do paciente em relação ao suporte hospitalar,
afastamento do contato com familiares e amigos, falta de privacidade e individualidade,
especialmente quando internados em unidades de terapia intensiva.
Nas últimas horas de vida observamos um declínio funcional intenso, sendo necessário
condutas e cuidados da equipe profissional. Nessa hora, o que queremos é promover conforto e
controle dos sintomas, suavizando os últimos momentos de vida.
O processo de morte é difícil de ser reconhecido, precisamos estar atentos que em determinado
momento da evolução da doença algumas situações são irreversíveis e os tratamentos não
devem objetivar o prolongamento da vida, que consequentemente trarão também o
prolongamento do sofrimento.
A avaliação clínica deve acontecer em um menor espaço de tempo e novas condutas devem ser
consideradas, sempre que necessária a intervenção.
É comum que, nos momentos finais, o paciente apresente-se mais desconectado da vida,
comunicando-se de forma prejudicada, alimentando-se e movimentando-se também com
dificuldade. As expressões não verbais tornam-se difíceis de serem interpretadas e podem
sugerir, muitas vezes, dor ou sofrimento.
É impossível que familiares e cuidadores não percebam a gravidade do quadro e, quando estão
preparados, esse momento é calmo e a espiritualidade, já tratada nessa unidade, pode auxiliar a
todos no momento de partida.
Os sintomas mais comuns nessa fase são anorexia, ausência de ingestão de líquidos,
imobilidade, sonolência, dor, abalos musculares involuntários (mioclônus), falência funcional,
colapso periférico e ronco da morte.
Nesses instantes finais, pode aparecer a agonia e todos os demais sintomas já apresentados
devem ser minuciosamente tratados e antevistos, sempre que possível. A prevenção é a melhor
medida. Além da terapêutica específica, medidas de conforto, bem como de apoio espiritual e
familiar, são fundamentais nessa fase.
Uma orientação religiosa também pode ser fundamental para o conforto da família e deve ser
estimulado pelos profissionais, respeitando as crenças e a história de vida do paciente.
Assim, as discussões sobre a cura das doenças, bem como a qualidade de vida dos pacientes
portadores de doenças começam a surgir e, quanto mais a Medicina evolui em suas técnicas,
com o surgimento de novos medicamentos e equipamentos de manutenção da vida, maiores
serão os dilemas éticos, especialmente nas situações que não encontraremos a cura (PINTO,
2008).
Para tanto, é necessário conhecermos os quatro princípios bioéticos, que serão apresentados a
seguir.
Princípio da beneficência
Esse princípio traz o conceito de devemos tratar as pessoas como seres autônomos e que nosso
objetivo seja sempre agir em benefício do outro, nos abstendo de prejudicar o outro.
Em Cuidados Paliativos, os dois pilares do cuidado estão relacionados ao controle dos sintomas e
qualidade de vida do paciente.
Em cuidados paliativos, o prolongamento da morte com sofrimento deve ser evitado, por
exemplo, com a não instituição de procedimentos invasivos e/ou agressivos que não trarão
benefícios aos pacientes.
Princípio da autonomia
Esse princípio determina que o paciente tem seus direitos de liberdade, privacidade, escolha
individual, liberdade da vontade e pertencimento a si mesmo (BEAU-CHAMP, 2002).
BVSALUD
VEJA EM BVSALUD
Princípio da justiça
Nesse princípio, devemos considerar que os tratamentos médicos visam a cura e a probabilidade
de sucesso é o critério mais relevante. Nesse contexto, a justiça está em definir que recursos
médicos deverão ser utilizados e em casos de recursos definidos, que devem ser distribuídos
entre pacientes, o princípio norteador deve ser a chance de benefício para cada um deles. Assim,
não haverá desperdício de recursos.
Eutanásia e ortotanásia
A eutanásia é definida pelo abreviamento da vida, feito pela ajuda de terceiros, de forma a
amenizar a dor ou sofrimento de pacientes portadores de situações que não condizem com a
vida, na percepção do paciente. Trata-se de uma prática proibida no Brasil, classificada, em
nosso meio, como homicídio.
Deve ser diferenciada da ortotanásia, definido pelo ato de cessar o uso de recursos que
prolonguem artificialmente a vida quando não há mais chances de recuperação (por exemplo,
ressuscitação cardiopulmonar).
Não cabe ao profissional infringir a legislação, mas devemos, na medida do possível, entender
as necessidades do paciente. Talvez esse seja também um dos grandes dilemas em cuidados
paliativos, e hoje sua direção está em definir cuidados que promovam conforto garantindo o
curso natural da doença e do processo de morte.
Conforme já abordado, o avanço tecnológico ocasionado nas últimas décadas trouxe para esse
ambiente recursos que, por vezes, são utilizados como suporte artificial de vida ao paciente. São
equipamentos que, quase sempre, substituem a função do órgão ou sistema e que, quando
utilizados, podem prolongar a vida do paciente.
Por isso, apesar de estarmos sempre buscando a cura, é impossível tentar adiar a morte quando
o corpo, por meio de sinais e sintomas, evidência que não há mais viabilidade biológica para
continuar. Nesse processo, outras dimensões psicológicas, espirituais, sociais devem ser
consideradas e assistidas pela equipe.
Não é um momento fácil tampouco agradável. Mesmo vivenciando isso diariamente, os
profissionais da UTI precisam encarar a assistência técnica ao paciente bem como todo o apoio
ao familiar. E nesse momento também nos deparamos com nossas próprias crenças e
experiências pessoais e profissionais que determinarão o impacto em nossas vidas e aí,
distanciar-se, é mais fácil.
Já os pacientes sob cuidados paliativos estão em busca de conforto, sabem o futuro, sem saber o
tempo. Os profissionais envolvidos estão em busca de conforto e alívio (tanto físicos como
emocionais), controle da dor e outras reações desconfortáveis em busca de melhorar na
qualidade de vida do paciente até o seu fim; os objetivos são os mesmos mas, as prioridades são
diferentes, portanto fica a pergunta: na UTI cabe realizar cuidados paliativos?
A resposta é simples, não é o local que define o cuidado. Muitos pacientes estão na UTI sem
possibilidade de cura e serão submetidos a cuidados paliativos. As famílias nem sempre são
comunicadas com transparência sobre o prognóstico de situações que levaram o paciente à UTI
e a cobrança pela manutenção da vida é ainda maior e a aceitação de morte mais difícil.
Há de ser revisto, também, se todos os pacientes que vão para a UTI deveriam mesmo ser
direcionados para lá. Quantos desses pacientes tem, verdadeiramente, indicação de
monitorização e tratamento agressivo? Desses, quantos apresentam no decorrer de sua
evolução dados inequívocos de que não mais se beneficiarão de estar na UTI? Quantos desses
efetivamente sairão da UTI?
A realidade nos mostra que, muitas vezes, o caminho hospitalar ainda é cultural e há falta de
profissionais e equipes habilitados em cuidados paliativos para avaliação e definição do melhor
local para o paciente estar. Nesse sentido parece mais apropriado lançar um novo olhar para o
velho problema.
Uma vez que a morte é um processo iminente para pacientes internados nesse local não seria
razoável que a equipe de UTI estivesse preparada para paliar, obtendo habilidades específicas em
comunicação e manejo de conflitos, planejamento da postura frente ao paciente/família a partir
de cada novo problema, observando o exercício da autonomia, geralmente tão pouco valorizado
nesse ambiente.
Dessa forma, vale reforçar que os cuidados paliativos não excluem, em nenhum momento, os
cuidados intensivos. São cuidados complementares!
Antes de tentarmos mudar a cultura podemos enfrentar as dificuldades que nos impedem
profissionalmente de atuarmos pelo alívio do sofrimento dos pacientes que, por estarem na UTI,
são privados de uma morte digna, sofrendo dor, longe de seus familiares e em situação de
abandono social e espiritual.
Sedação paliativa
VEJA EM COREN-SP
É sabido que pacientes sob cuidados paliativos que estão em fase avançada da doença,
oncológica ou não, apresentam diversos sintomas que provocam sofrimento, sejam eles físicos
(dor, dispneia, constipação), psicossociais (medo, angústia, delirium) e espirituais
(desesperança).
Assim, os profissionais devem estar atentos ao tratamento mas também devem considerar que
esses sintomas geram ainda mais angústia e sofrimento, tanto ao paciente quanto aos seus
familiares e assim, determinar precocemente a introdução de sedação paliativa como uma opção
de tratamento.
A sedação paliativa tem dois efeitos: o desejado reduz os sofrimentos físicos e psicológico e o
indesejado pode diminuir o tempo de vida do paciente. O princípio do duplo efeito (MENEZES et
al., 2019) torna a sedação paliativa moralmente aceita uma vez que a intenção (alívio do
sofrimento) tem mais importância que a consequência (diminuição do tempo de vida, privação
da consciência) no julgamento ético desse procedimento.
A indicação de sedação paliativa deve ser criteriosa e, na maioria das vezes, não é administrada
de forma primária, contínua e profunda. A administração de uma medicação sedativa não
significa supressão permanente do nível de consciência. Novamente, o objetivo dessa sedação é
aliviar o estresse e promover conforto e o nível de sedação deve ser titulado em função de cada
paciente e do alívio de seu sintoma ou estresse (sedação proporcionada).
A prescrição da sedação paliativa envolve geralmente a avaliação das emoções, dor total e
sofrimento, que dificulta a abordagem com a família sobre o procedimento e a decisão de
implementação.
Em cuidados paliativos, três situações clínicas distintas podem ser avaliadas para a
implementação da sedação:
2 Interconsultas foram realizadas com equipe em Cuidados Paliativos e/ou com outros
especialistas?
É importante ressaltar que antes da implementação o paciente e/ou familiares devem receber
toda a informação e o profissional deve estar respaldado para o procedimento. Trata-se de um
consentimento, seja do paciente quando este tiver responsabilidade para defini-lo, ou de seus
familiares, no caso de pacientes que já não podem mais decidir sozinho a terapêutica
recomendada. As medicações mais utilizadas na sedação são (ANCP, 2013):
A medicação acima descrita pode ser utilizada associada, em diferentes apresentações (soro,
associações, bolus). Após o início da sedação, é necessário:
Atentar para retenção urinária e impactação fecal (fecaloma), que geram grande
desconforto nos pacientes sedados.
A seguir, a escala de Ramsay que apresenta os níveis de avaliação para tomada de decisão na
utilização da sedação paliativa (NOGUEIRA et al. 2012):
Quadro 1 – Escala de Ramsay
A morte
A morte é tema paradoxal: por um lado, seduz e serve de inspiração a artistas, transparecendo
em todas as linguagens artísticas; por outro, provoca medo, fuga e terror. De acordo com a
percepção individual, pode significar ausência ou permanência, finitude ou eternidade.
Nascimento e morte são processos igualmente naturais. Genericamente, seres vivos são regidos
por determinismo biológico, pois nascem, crescem, amadurecem e morrem (VICENSI, 2016).
Nesse contexto, é impossível garantir o preparo para esse momento. Apesar de um processo
natural nenhum de nós, profissionais ou não, estamos preparados para a finitude da vida e esse
é, certamente, um dos principais dilemas da humanidade.
Quando falamos em perdas não nos referimos necessariamente à morte, mas perdas psíquicas,
físicas, materiais, entre outras. A perda está relacionada à privação de algo ou alguém, no caso do
ser humano, algo insubstituível e repleto de emoções acompanhará esse fim.
A morte humanizada é abordada por Kübler-Ross (2005) e Saunders (2004), que escreveram
sobre cuidados aos pacientes e familiares na aproximação da morte, acolhendo o sofrimento. O
paciente volta a ser centro da ação, resgatando seu processo de morrer (ARIES, 1977; KOVACS,
2007). O desenvolvimento da tanatologia, como área de estudos proposta por Kübler-Ross,
aborda a morte como significante da existência, por isso tratada com respeito, humildade, sem
banimento ou banalização. A morte é conselheira e o profissional seu aprendiz.
As fases do luto são descritas por Klüber-Ross (2005) como negação, raiva, barganha,
depressão e aceitação. Nem todos viverão todas as fases e não precisamos enquadrar os
familiares nas fases descritas, sendo essas apenas um norte para os profissionais de saúde.
Franco (2008) também descreve as fases do luto de forma diferente, sendo o reconhecimento da
perda, reagir à separação (expressividade emocional), recordar e reexperienciar a pessoa
perdida/relacionamento (objetos, fotos), abandonar velhos apegos/elaboração, reajustar para
se mover adaptativamente ao novo, sem esquecer o velho e reinvestir.
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VEJA EM SCIELO
Considerações Finais
Ao estudar a Unidade, o aluno se depara com questões éticas e com sensações advindas do
processo de morte.
É fato que não somos preparados para encarar o fim quer seja na vida pessoal ou na profissional,
e toda nossa formação é pautada nos cuidados que mantenham a vida e não é fácil aceitar que
não somos definidores desse processo.
Mas, podemos exercer nossos cuidados voltados para o respeito e autonomia, considerando os
reais desejos e necessidades do paciente e de seus familiares e podendo oferecer apoio e
conforto no âmbito espiritual e psicológico que norteiam os momentos finais de vida do
paciente.
Para isso, é necessário que o profissional compreenda que o processo de nascer, viver e morrer
é complexo e a qualidade de vida deve prevalecer nesse pensamento “filosófico”. Por um lado,
queremos viver e nos prepararmos para a finitude da vida, a única certeza da vida.
Por fim, é necessário refletir que a morte não é só um processo biológico e faz com que todos os
envolvidos nesse processo e luto tenham consciência e sabedoria para enfrentá-lo.
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Sites
ACESSE
Leitura
Sentidos de vida e morte: reflexões de pacientes em cuidados paliativos
Convido a realizar a leitura do artigo “Sentidos de vida e morte: reflexões de pacientes em
cuidados paliativos”, tendo como autores Ho mann et al., mostram que a finitude não é o
sentimento principal nos cuidados paliativos e sim outros fatores que aflige esse paciente. Vale a
pena conferir!
SCIELO
VEJA EM SCIELO
CUIDADOSPALIATIVOS
VEJA EM CUIDADOSPALIATIVOS
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Referências
BEAUCHAMP, T. L.; CHILDRESS, J. F. Princípios de ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola,
2002.
CREMESP (São Paulo). Conselho Regional de Medicina (ed.). Parte 2 - Ações: Sedação Paliativa.
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Disponível em:
<http://www.cremesp.org.br/library/modulos/publicacoes/pdf/livro_cuidado%20paliativo.pdf
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<https://www.scielo.br/j/csc/a/6RQCX8yZXWWfC6gd7Gmg7fx/?lang=pt>. Acesso em:
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GARCIA, J. L. A. Double e ect. In: REICH, W. T. (ed.). Encyclopedia of bioethics, New York: Simon
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KOVÁCS, M. J. Parte 4 – Espiritualidade, Morte e Luto: Náusea e vômito. In: ANCP (Brasil).
Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ed.). Manual de Cuidados Paliativos. Rio de Janeiro,
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MEDEIROS, M. B. de et al. Dilemas éticos em UTI: contribuições da Teoria dos Valores de Max
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Disponível em: <https://www.scielo.br/j/reben/a/VLkGBWgLk8XmskhBzTWQpVQ/abstract/?
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PINTO, C. da S. Quando o tratamento oncológico pode ser fútil? Do ponto de vista do Paliativista.
Revista Brasileira de Cancerologia, [s. l.], v. 54, n. 4, p. 393-6, 2008. Disponível em:
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