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TRANSTORNOS RELACIONADOS A SUBSTÂNCIAS

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................... 4

FISIOPATOLOGIA E NEUROBIOLOGIA .................................................. 5

DIAGNÓSTICOS ASSOCIADOS AOS TRANSTORNOS RELACIONADOS


A SUBSTÂNCIAS ................................................................................................. 9

TRANSTORNOS POR USO DE SUBSTÂNCIAS (DSM-5) .................. 12

TRANSTORNOS INDUZIDOS POR SUBSTÂNCIAS (DSM-5) ............ 14

INÍCIO E DESENVOLVIMENTO DE TRANSTORNOS RELACIONADOS A


SUBSTÂNCIAS .................................................................................................. 15

TRANSTORNOS POR USO E TRANSTORNOS INDUZIDOS (DSM-5 E


CID-11) ........................................................................................................... 17

ÁLCOOL ........................................................................................... 17

MACONHA ....................................................................................... 18

COCAÍNA/CRACK ............................................................................ 20

TRATAMENTO DO ABUSO DE SUBSTÂNCIAS NO BRASIL ................ 22

INTEGRAÇÃO: O MODELO DE ATENDIMENTO CRÔNICO (CCM) .. 24

O ENQUADRE TERAPÊUTICO ........................................................... 25

1. AMBIENTES DE TRATAMENTO ................................................. 25

2. COMPOSIÇÃO DA EQUIPE PROFISSIONAL ............................. 27

3. TIPO DE TRATAMENTO .............................................................. 28

REFERÊNCIAS ....................................................................................... 30

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INTRODUÇÃO

Os transtornos por uso de substâncias abrangem uma ampla gama de


condições que resultam do consumo de uma droga de abuso, das reações
adversas causadas por certos medicamentos ou da exposição a toxinas. Esta
terminologia pode ser aplicada a qualquer substância abusada, seja uma droga,
medicamento ou toxina. As categorias de substâncias incluem, entre outras,
álcool, anfetaminas, cafeína, canabinóides (como a maconha), cocaína,
alucinógenos, inalantes, nicotina (encontrada nos cigarros), sedativos e outros.

A definição de substância psicoativa é aquela que altera o humor, a


percepção ou a função cerebral quando consumida por qualquer método. A
utilização dessas substâncias tem impacto direto nas habilidades cognitivas, nas
conexões interpessoais e na estabilidade emocional. Difundido em diversos
países, culturas, classes sociais, gêneros e faixas etárias, o consumo de
substâncias psicoativas é um fenômeno prevalente.

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V)


observou que muitas vezes há confusão entre dependência e vício. Contudo, é
importante ressaltar que os critérios anteriores de dependência eram apenas
reações típicas a medicamentos que afetam o sistema nervoso central e não
indicam necessariamente dependência química. O DSM-V eliminou as categorias
de abuso e dependência de substâncias e, em seu lugar, substâncias específicas
são definidas como as principais culpadas pelos transtornos causados pelo seu
abuso (APA, 2023).

Devido à sua etiologia complexa e multifacetada, o tratamento da


dependência de substâncias é amplamente considerado uma tarefa difícil. Requer
considerar não apenas fatores biológicos como idade, sexo e predisposição
genética, mas também os fatores psicológicos, sociais e ambientais que podem
contribuir para o seu desenvolvimento (MACIEL; TRACTENBERG; HABIGZANG;
WAINER, 2013). No passado, acreditava-se que fatores isolados poderiam ser
responsáveis por comportamentos de dependência isolados. No entanto, a
compreensão atual da dependência de substâncias necessita de um modelo

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multidimensional e integrativo (MARLATT; DONOVAN, 2009) que dê conta da
interação entre todos os fatores acima mencionados.

FISIOPATOLOGIA E NEUROBIOLOGIA

O ciclo pelo qual os transtornos relacionados a substâncias são produzidos


e desenvolvidos é influenciado por efeitos de reforço positivos e negativos. O
reforço positivo refere-se ao processo no qual a presença de um estímulo (neste
caso, drogas) aumenta a probabilidade de respostas prazerosas. O reforço
negativo, por outro lado, é o processo no qual a remoção de um estímulo negativo
(como estados emocionais negativos ligados à abstinência) aumenta a
probabilidade de respostas prazerosas. A impulsividade está associada ao reforço
positivo, caracterizado pelo aumento da excitação antes da realização do ato.
Enquanto isso, a compulsão está associada ao reforço negativo, caracterizado
por ansiedade e estresse antes da realização do ato e alívio do estado negativo
após o uso da substância (CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015).

Nos estágios iniciais do vício, a impulsividade é o fator dominante. No


entanto, à medida que o vício progride, a compulsão começa a desempenhar um
papel crítico, levando a um comportamento de consumo automatizado
impulsionado por emoções negativas. O ciclo dos transtornos relacionados ao uso
de substâncias é constituído pela coexistência de impulsividade e compulsão, que
pode ser identificada em três fases: intoxicação, estado emocional negativo ou
abstinência e preocupação ou antecipação. À medida que os transtornos
relacionados ao uso de substâncias se tornam mais graves, essas fases
interagem entre si com intensidade crescente, resultando em um estado
patológico que apresenta desafios significativos para as estratégias de tratamento
(CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015).

Avanços recentes em neurobiologia, neurociência cognitiva e ciências


básicas levaram a uma reavaliação dos transtornos relacionados a substâncias.
Embora não exista um acordo abrangente sobre o assunto, várias teorias

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compartilham pontos comuns. Uma dessas semelhanças é a presença de déficits
cognitivos, incluindo, entre outros, aprendizagem, motivação, memória, atenção e
tomada de decisões. Além disso, também são evidentes deficiências nos
processos cognitivos ligados aos sistemas neurais e de neurotransmissão.
Nomeadamente, também existem desafios nos processos de autocontrole, com
um desequilíbrio entre a sobrevalorização das recompensas pelo consumo de
drogas e o enfraquecimento dos sistemas de controle (CHAIM; BANDEIRA;
ANDRADE, 2015).

Ao longo da progressão dos transtornos relacionados a substâncias, a


retenção de memórias desadaptativas interligadas é evidente. Essas lembranças
podem sustentar a busca pelo uso de drogas e estimular recaídas por meio de
hábitos inconscientes. Um distúrbio de aprendizagem surge do estabelecimento
de memórias instrumentais potentes que conectam ações e se manifestam por
meio de reações difíceis de controlar a fatores ambientais específicos. Antes dos
transtornos relacionados a substâncias, certos estímulos, como o ato de tomar
uma xícara de café antes da dependência da nicotina, eram considerados neutros.
No entanto, através de processos de condicionamento cerebral, eles tornam-se
associados ao vício e começam a influenciar o comportamento de recaída. Como
resultado, comportamentos involuntários conhecidos como respostas
condicionadas, que são desencadeados por “pistas” ambientais, acompanham a
cronicidade da doença (CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015).

Embora a genética possa ter impacto no abuso de substâncias, as


características biológicas são essenciais no desenvolvimento de distúrbios
relacionados com substâncias. Os medicamentos psicotrópicos apresentam risco
de dependência e têm impacto em regiões específicas do cérebro, levando a
interações intrincadas nas vias dos neurotransmissores (CHAIM; BANDEIRA;
ANDRADE, 2015).

Embora cada substância opere de maneira distinta, a maioria causa


alterações ou ativação sináptica, particularmente no sistema mesolímbico-
mesocortical. Essa intrincada rede de neurônios se estende da área tegmental
ventral (ZTV) até o córtex pré-frontal, hipocampo e núcleo accumbens, que por
sua vez estão ligados à amígdala e contribuem para a composição do sistema

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límbico (CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015).

A intrincada conexão entre essas estruturas é chamada de sistema de


recompensa cerebral (SRC), representado na ilustração a seguir. Esta elaborada
rede é composta por vias neurais que facilitam ações de reforço, sendo a
dopamina o principal neurotransmissor. No entanto, outros neurotransmissores,
incluindo, entre outros, serotonina, norepinefrina, glutamato e ácido gama-
aminobutírico, também podem auxiliar nesse processo (CHAIM; BANDEIRA;
ANDRADE, 2015).

Figura 1 – Estruturas do sistema de recompensa cerebral (SRC)

O SRC, ou circuito relacionado à sobrevivência, tem como objetivo


direcionar respostas comportamentais que priorizem as necessidades de
sobrevivência, como alimentação, água, segurança e reprodução. A liberação de
neurotransmissores que geram reforço positivo ou negativo depende do resultado
do comportamento executado. Se o comportamento for bem-sucedido, o SRC
tende a repeti-lo, o que poderá eventualmente levar à formação de um hábito
(CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015).

O uso de drogas pode desencadear as mesmas vias dos

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neurotransmissores naturais, mas com efeito mais potente. Isso leva a uma forte
sensação de recompensa e ao desejo de repetir o comportamento. Acredita-se
que os transtornos relacionados às substâncias sejam o resultado de uma
interação multifacetada entre os impactos fisiológicos das substâncias em regiões
específicas do cérebro ligadas à formação de hábitos emocionais e adaptativos.
(CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015)

As origens da compreensão da base neurobiológica para os efeitos


eufóricos e prejudiciais das substâncias viciantes remontam à identificação inicial
do sistema de recompensa do cérebro, também conhecido como autoestimulação
intracraniana. Essa estrutura do cérebro é responsável por gerar sensações de
prazer, que podem levar à aquisição de comportamentos, e é ativada
"naturalmente" por atos como consumir alimentos e praticar atividades sexuais
(ambos necessários à sobrevivência), bem como em um forma “artificial” e mais
intensa, como quando são ingeridas drogas de abuso (BARBOSA, 2016).

Figura 2 - Ligações das drogas nos neurônios

A via mesolímbico-mesocortical é a principal via neural responsável pela


transmissão de dopamina, ou DA, durante esse processo. Os neurônios nesta via
originam-se da área tegmental ventral e se estendem ao córtex pré-frontal e ao
hipocampo, áreas responsáveis por funções psicológicas superiores. Além disso,
esses neurônios se conectam ao núcleo accumbens, que por sua vez está
conectado à amígdala e contribui para a composição e regulação das emoções

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do sistema límbico (BARBOSA, 2016)

O Circuito de Recompensa Sensorial opera medindo o grau de


sensibilidade ao abuso de drogas, que pode ser alterado através da plasticidade
sináptica. Isto significa que à medida que ocorrem episódios de dependência e
intoxicação, a sensibilidade aos efeitos das drogas diminui, levando a um aumento
na frequência e quantidade do consumo de drogas. Esse padrão promove o
aparecimento de transtornos por uso de substâncias, conforme observado por
Barbosa (2016).

Durante muitos anos, o comportamento que desencadeia dependências foi


visto como resultado de alterações no sistema de neurotransmissão da dopamina,
que está ligado à capacidade das substâncias psicoativas viciantes de dificultar a
descarga e recaptação de DA no intrincado circuito neural conectado ao SRC,
particularmente o estriado (BARBOSA, 2016).

Apesar da sua prevalência, esta perspectiva fez contribuições mínimas


para o desenvolvimento de novos tratamentos. Mais investigações são
necessárias para obter uma compreensão mais profunda dos mecanismos por
trás das alterações dopaminérgicas causadas por cada substância. Isso inclui a
possibilidade de aumento da liberação, direta ou indiretamente, bem como a
modulação de sua recaptação nas fendas sinápticas, a disponibilidade de
receptores ou uma combinação desses fatores em níveis variados (BARBOSA,
2016).

DIAGNÓSTICOS ASSOCIADOS AOS TRANSTORNOS RELACIONA-


DOS A SUBSTÂNCIAS

De acordo com a Associação Americana de Psiquiatria, em 2023, existem

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dez categorias diferentes de drogas que se enquadram em transtornos
relacionados a substâncias. Essas categorias incluem álcool, cafeína, cannabis,
alucinógenos (com classificações separadas para fenciclidina [ou
arilciclohexilaminas de ação semelhante] e outros alucinógenos), inalantes,
opioides, sedativos, hipnóticos e ansiolíticos, estimulantes (como substâncias do
tipo anfetamina, cocaína e outros estimulantes), tabaco e outras substâncias (ou
substâncias que não são conhecidas). Deve-se notar que essas categorias não
são totalmente separadas.

O consumo excessivo de todas as drogas partilha uma característica


comum: a estimulação direta do sistema de recompensa do cérebro. Este sistema
é responsável por reforçar comportamentos e criar memórias. A estimulação
desse sistema é tão intensa que pode causar o abandono das atividades normais.
Ao contrário do comportamento adaptativo, que estimula indiretamente o sistema
de recompensa, as drogas de abuso estimulam diretamente as vias de
recompensa. (DALGALARRONDO, 2019)

Cada classe de drogas tem seus próprios mecanismos farmacológicos que


produzem sensações de prazer, comumente chamadas de “barato”. Esses
mecanismos diferem de medicamento para medicamento, mas todos ativam o
sistema de recompensa. Aqueles que apresentam baixos níveis de autocontrole,
o que pode indicar problemas com mecanismos de inibição cerebral, têm maior
probabilidade de desenvolver transtornos por uso de substâncias. Isso sugere que
os comportamentos de determinados indivíduos podem predispô-los a transtornos
por uso de substâncias, mesmo antes de eles próprios começarem a usar
substâncias (DALGALARRONDO, 2019).

A Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à


Saúde (CID-11) classifica os transtornos causados por substâncias em uma
categoria solitária para cada substância respectiva, como álcool ou cocaína.
Dentro de cada categoria, para problemas específicos, como transtornos
relacionados ao álcool, especificadores ou subtipos adicionais são adicionados
conforme necessário. Estes podem incluir, mas não estão limitados a: intoxicação,
dependência, abstinência e complicações psicopatológicas induzidas pelo uso de
substâncias.

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Já no Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5), os
transtornos relacionados a substâncias são classificados em dois grandes grupos:
transtornos por uso de substância e transtornos induzidos por substância.

As condições a seguir podem ser classificadas como induzidas por


substância: intoxicação, abstinência e outros transtornos mentais induzidos por
substância/medicamento (transtornos psicóticos, transtorno bipolar e transtornos
relacionados, transtornos depressivos, transtornos de ansiedade, transtorno
obsessivo-compulsivo e transtornos relacionados, transtornos do sono,
disfunções sexuais, delirium e transtornos neurocognitivos).

As categorias diagnósticas mais abrangentes associadas a cada grupo


específico de substâncias são apresentadas na Tabela 1 a seguir.

Tabela 1 - Diagnósticos associados a classes de substâncias

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Fonte: APA, 2023, p.545.

TRANSTORNOS POR USO DE SUBSTÂNCIAS (DSM-5)

O diagnóstico desta categoria inclui a utilização persistente e repetitiva de


uma substância específica (a especificar), apesar das graves consequências. O
indivíduo em questão apresenta uma significativa falta de controle sobre o uso
desta substância, resultando em repercussões psicossociais e sociais adversas,
bem como em riscos físicos e mentais. Além disso, eles podem encontrar ocor-
rências farmacológicas como tolerância e abstinência.

Dentro do DSM-5, a classificação de “transtorno por uso de substâncias”


substitui o termo anterior, definido de forma mais restrita, “dependência química”,
que se refere estritamente a ocorrências farmacológicas e pode não encapsular
com precisão esses transtornos. Um componente essencial dos transtornos por
uso de substâncias é a falta de controle sobre o uso, evidenciada por esforços

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malsucedidos para regular ou diminuir o consumo. As pessoas afetadas podem
dedicar uma quantidade significativa de tempo à aquisição da substância e suas
atividades diárias podem girar inteiramente em torno da droga (APA, 2023)

Normalmente, existe um desejo ou necessidade de uso de drogas que é


comumente ativado pelo ambiente em que a droga foi previamente adquirida ou
consumida. O uso de substâncias pode levar a prejuízos sociais e psicológicos,
como a incapacidade de cumprir obrigações no trabalho, na escola ou em casa,
bem como o abandono de atividades sociais, profissionais ou recreativas cruciais.

A pessoa persiste no uso da droga apesar de enfrentar dificuldades nas


relações pessoais ou sociais decorrentes do uso. Além disso, o uso continuado
da droga representa um perigo para o seu bem-estar mental e/ou físico. Apesar
de ter consciência desses riscos, a pessoa não consegue se abster do uso do
medicamento.

Existem critérios farmacológicos adicionais que podem ser indicativos de


transtorno por uso de substâncias, mas não são um requisito para o diagnóstico
conforme descrito no DSM-5. Esses critérios incluem o desenvolvimento de tole-
rância e a ocorrência de abstinência.

A necessidade de doses significativamente maiores de uma substância


para atingir o mesmo efeito, ou a diminuição do efeito das mesmas doses ao longo
de um período de tempo, são indicadores de tolerância. Certas drogas, incluindo
opioides, benzodiazepínicos e álcool, apresentam frequentemente esse fenô-
meno. A síndrome de abstinência ou abstinência pode ocorrer quando a concen-
tração do medicamento no organismo diminui, resultando em sintomas como an-
siedade, tremores, sudorese, insônia ou sonolência. Os sintomas específicos ex-
perimentados dependem da substância em questão (DALGALARRONDO, 2019).

É comum que os indivíduos apresentem sintomas de abstinência ao inter-


romper o uso de determinadas substâncias. Essas substâncias podem incluir ál-
cool, opioides, cafeína, tabaco, estimulantes (como cocaína e anfetaminas) e se-
dativos (como benzodiazepínicos).

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TRANSTORNOS INDUZIDOS POR SUBSTÂNCIAS (DSM-5)

O DSM-5 é um manual de diagnóstico utilizado por profissionais de saúde


mental em todo o mundo. Inclui uma seção que detalha os transtornos induzidos
por substâncias, que são transtornos de saúde mental causados pelo uso de subs-
tâncias. Esses distúrbios podem se manifestar de diversas maneiras, com sinto-
mas que variam de leves a graves. É importante diagnosticar com precisão esses
distúrbios, a fim de fornecer tratamento e apoio eficazes para indivíduos que lutam
contra o abuso de substâncias (APA, 2023).

Esta classificação abrange uma série de transtornos que surgem da intoxi-


cação e da síndrome de abstinência de substâncias, bem como uma variedade
de estados psicopatológicos que podem ser desencadeados pelo uso de substân-
cias, incluindo, entre outros, transtornos de humor, como depressão ou mania,
ansiedade, delírio, distúrbios neurocognitivos, distúrbios e psicoses. Esses distúr-
bios induzidos decorrem do impacto fisiológico da substância no cérebro.

A síndrome induzida pelo uso de substâncias está intrinsecamente ligada


à frequência desse uso. Embora estas condições sejam na sua maioria reversí-
veis, podem persistir durante algumas horas ou dias, mas raramente ultrapassam
um mês sem consumo continuado. A intoxicação é uma síndrome de natureza
reversível e caracterizada por alterações no comportamento e no estado mental,
incluindo, mas não se limitando a, função cognitiva prejudicada, alterações na
percepção, atenção, julgamento e comportamento psicomotor, bem como mudan-
ças emocionais imprevisíveis e instáveis. Esta síndrome é o resultado da ingestão
recente de substâncias. O termo "binge" refere-se a um episódio de consumo
compulsivo intenso, rápido e intimamente associado à intoxicação. (RIBEIRO; AN-
DRADE, 2007).

Ao trabalhar clinicamente com pacientes, é crucial diferenciar entre condi-


ções psicopatológicas graves causadas por substâncias (ou às vezes por sín-
drome de abstinência) e episódios independentes (como esquizofrenia, mania,
depressão e outros). Existem dois parâmetros cruciais empregados para fazer
essa distinção (DALGALARRONDO, 2019; APA, 2023).

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1. Quando o uso de substâncias ou a síndrome de abstinência são a causa
da condição de um paciente, espera-se que os sintomas se dissipem
em um período máximo de 30 dias após a cessação do uso. Normal-
mente, a condição do paciente melhora alguns dias após a abstinência,
e dentro de uma ou duas semanas, todos os sintomas desaparecem.
Os sintomas específicos que surgem como resultado do uso ou absti-
nência de substâncias estão diretamente correlacionados ao efeito que
a substância ou síndrome de abstinência tem no cérebro do paciente.
Por exemplo, as substâncias que mais frequentemente induzem condi-
ções psicóticas incluem alucinógenos como dietilamida do ácido lisér-
gico (LSD), cocaína, maconha e anfetaminas.
2. Quando um paciente apresenta uma condição causada pelo uso ou
abstinência de uma substância, espera-se que os sintomas desapare-
çam dentro de trinta dias a partir da data em que parou de consumir a
substância. Geralmente, os sintomas diminuem alguns dias após a abs-
tinência e, num período de uma a duas semanas, desaparecem com-
pletamente. O tipo de condição induzida que um paciente experimenta
está diretamente relacionado aos efeitos da substância no cérebro ou à
síndrome de abstinência. Por exemplo, alucinógenos como a dietila-
mida do ácido lisérgico (LSD), a cocaína, a maconha e as anfetaminas
são substâncias que muitas vezes levam a condições psicóticas induzi-
das.

INÍCIO E DESENVOLVIMENTO DE TRANSTORNOS RELACIONADOS A


SUBSTÂNCIAS

O início do consumo de substâncias, especialmente entre adolescentes,


está frequentemente ligado a uma variedade de fatores. Estes fatores incluem o
desejo de satisfazer a curiosidade, a influência e o incentivo de colegas ou
companheiros que já utilizam a substância, a necessidade de se adaptar e ser
aceite pelo grupo, o sentimento de pertencer a uma subcultura distinta, a emoção

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de se envolver em atividades ilegais, uma necessidade de expressar hostilidade
e independência para com os pais ou professores, e uma tentativa de aliviar
emoções desagradáveis, como ansiedade, solidão, tristeza e sentimentos de
desamparo (DALGALARRONDO, 2019).

Uma das preocupações significativas nos transtornos por uso de


substâncias é o declínio da autoestima. Este declínio normalmente acompanha
uma redução de interesses, um declínio nos cuidados pessoais e a perda de
ligações sociais não relacionadas com a aquisição e uso da substância. Em última
análise, isto pode levar ao envolvimento em atividades ilegais e criminosas na
tentativa de obter a substância. A perda de autoestima está ainda relacionada à
falta de respeito próprio, sensação de vazio e sentimentos de solidão
(DALGALARRONDO, 2019).

Durante a progressão de certos transtornos, como os induzidos pelo álcool,


cocaína em pó ou crack, alguns indivíduos tendem a negligenciar a higiene
pessoal, o vestuário e os cuidados dentários. Isso pode levar à desnutrição e ao
comportamento sexual imprudente, como costuma acontecer com pessoas com
transtornos por uso de crack. Esta última pode aumentar a probabilidade de
contrair doenças sexualmente transmissíveis, como a Aids e a sífilis, e deve,
portanto, ser considerada um fator de risco significativo.

Portanto, quando o vício se torna uma necessidade, o processo de


recuperação implica investir emocionalmente em atividades alternativas e cultivar
relacionamentos significativos com indivíduos importantes. Isso é feito para
restaurar o senso de autoestima, a interação social positiva e a vontade de viver.

O foco atual da pesquisa está nos fundamentos neurobiológicos do uso de


substâncias. Estes estudos sublinham a importância das regiões corticais pré-
frontais, que desempenham um papel crítico na regulação do comportamento e
dos processos de tomada de decisão. As regiões corticais pré-frontais interagem
com estruturas subcorticais, como o sistema límbico e o sistema de recompensa,
especificamente o Núcleo Accumbens, que estão associados ao prazer imediato.
A liberação de dopamina no sistema de recompensa é influenciada não apenas
por atividades percebidas como prazerosas, mas também pela antecipação de

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tais atividades (CHAIM; BANDEIRA; ANDRADE, 2015).

TRANSTORNOS POR USO E TRANSTORNOS INDUZIDOS (DSM-


5 E CID-11)

A seguir abordaremos as substâncias mais importantes, por sua frequência


em nosso meio e por sua relevância psicopatológica: álcool, maconha e
cocaína/crack (o tabaco e a cafeína, apesar de representarem uso importante do
ponto de vista epidemiológico, não acarretam consequências psicopatológicas na
mesma intensidade que essas três substâncias).

ÁLCOOL

A CID-11 define transtornos por uso de álcool como uma sequência de


resultados desfavoráveis que surgem do consumo de álcool. Esses resultados
incluem intoxicação alcoólica, uso perigoso, dependência, síndrome de
abstinência e doenças mentais induzidas pelo álcool (WHO, 2018).

A CID-11 mantém o conceito de “dependência do álcool”, que se refere à


incapacidade de regular ou limitar o consumo de bebidas alcoólicas devido ao uso
significativo e repetido. Esta incapacidade é caracterizada por um intenso desejo
ou compulsão para beber, pela incapacidade de regular a quantidade consumida
e pela priorização do consumo de álcool em detrimento de outras atividades,
apesar dos efeitos negativos. Indivíduos com dependência de álcool
frequentemente desenvolvem tolerância ao álcool e apresentam sintomas de
abstinência (WHO, 2018).

O DSM-5 e a CID-11 classificam os transtornos causados ou associados


ao consumo de álcool. Esses transtornos geralmente se manifestam como
sintomas físicos e mentais que surgem do consumo consistente de álcool por no

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mínimo 12 meses. É comum que esta ingestão prolongada resulte em tolerância
ao álcool, embora nem sempre seja esse o caso (DALGALARRONDO, 2019).

Normalmente, os indivíduos que lutam contra o vício do álcool começam a


beber pela manhã para aliviar o desconforto dos primeiros sintomas de
abstinência. À medida que o vício progride, a bebida torna-se cada vez mais
relevante na sua vida quotidiana. O indivíduo pode parar de encontrar prazer em
outras atividades e, em vez disso, depender apenas do álcool para obter
gratificação. Em muitos casos, grande parte do tempo é gasto em atividades para
adquirir álcool, consumi-lo ou se recuperar de seus efeitos (DALGALARRONDO,
2019).

Os indivíduos geralmente negam ou minimizam o impacto do álcool nas


suas vidas, apesar de se envolverem em hábitos de consumo potencialmente
prejudiciais e perigosos. Tais comportamentos podem incluir a incapacidade de
parar de beber ou a perda de controle sobre os padrões de consumo de álcool
(DALGALARRONDO, 2019).

MACONHA

A cannabis, também conhecida como extrato de substâncias canabinóides


da planta Cannabis sativa, é a droga ilegal mais utilizada em todo o mundo. No
Brasil, essa droga é conhecida por vários nomes, como maconha, baseado, beck,
erva, bagulho, Maria Joana, fininho, fuminho, ganja ou baura. Entre as quase 60
substâncias canabinóides, o delta-9-tetrahidrocanabinol (delta-9-THC) é o
componente ativo mais significativo no contexto da dependência da marijuana. Os
canabinóides têm impacto nos receptores canabinóides CB1 e CB2, que estão
localizados em todo o sistema nervoso central (DALGALARRONDO, 2019).

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A maconha é normalmente consumida através do fumo e seus efeitos
podem variar amplamente. No entanto, os usuários geralmente relatam sentir-se
relaxados e experimentar uma sensação de prazer, muitas vezes chamada de
“brisa” ou “euforia”. Efeitos comuns adicionais incluem riso espontâneo, aumento
do apetite e distorções na percepção do tempo e do espaço. Alguns usuários
também podem ter dificuldade de concentração e atenção, experiências
sensoriais intensificadas, vermelhidão nos olhos e boca seca. Para quem é novo
no uso da maconha, é possível sentir ansiedade, ataques de pânico, taquicardia,
distúrbios na coordenação motora fina ou pensamentos confusos durante os usos
iniciais (DALGALARRONDO, 2019).

Indivíduos que sofrem de transtorno por uso de cannabis podem consumir


a substância ao longo do dia, estendendo-se por um período prolongado de
meses ou até anos, resultando em uma parte significativa do dia sendo passada
sob a influência da droga. Podem surgir questões consistentes nas suas vidas
pessoais e profissionais, incluindo ausências recorrentes e desrespeito pelas
responsabilidades familiares ou obrigações académicas/de trabalho (APA, 2023).

Relatórios demonstraram que indivíduos que usam maconha com


frequência podem desenvolver tolerância farmacológica e comportamental aos
seus efeitos. A interrupção do uso diário ou quase diário da droga sem redução
gradual geralmente leva a uma síndrome de abstinência, caracterizada por
inquietação, ansiedade, irritabilidade, agressão ou raiva, humor deprimido, insônia
e redução do apetite. Embora a gravidade desta síndrome não seja tão extrema
quanto a da abstinência de álcool, ela ainda pode causar sofrimento significativo
e representar um desafio para aqueles que tentam parar de usar a droga (APA,
2023).

A taxa à qual indivíduos com consumo intermitente de cannabis


desenvolvem transtorno por consumo de cannabis é notavelmente mais rápida
em adolescentes do que em adultos. Além disso, os adolescentes são mais
propensos a apresentar alterações tanto no humor quanto nos níveis de energia,
bem como nos hábitos alimentares. Normalmente, há um declínio acentuado no
desempenho acadêmico, com faltas às aulas e diminuição do entusiasmo pelas
atividades escolares. Em casos extremos, o indivíduo pode progredir para o

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consumo de cannabis isoladamente ou ao longo do dia, o que pode resultar em
perturbações significativas na sua vida quotidiana, saúde mental e relações
sociais (APA, 2023)

A utilização deste medicamento específico numa idade precoce,


particularmente antes dos 15 anos de idade, é um indicador potente do eventual
aparecimento de transtorno por consumo de cannabis. Outros fatores que
aumentam o risco de desenvolver esse transtorno incluem um ambiente
doméstico instável ou violento, baixo desempenho acadêmico e tabagismo ou uso
de maconha por parentes próximos. Além disso, a facilidade de acesso à
substância também é um fator contribuinte (APA, 2023).

COCAÍNA/CRACK

No Brasil, a cocaína é uma droga derivada das folhas da planta


Erythroxylon coca e tem três modos comuns de ingestão: inalação, injeção na veia
ou fumo. Normalmente, o cloridrato de cocaína em pó aparece como uma
substância branca que é misturada com talco, areia fina, giz em pó, cal ou leite
em pó para aumentar sua quantidade. Essa forma de cocaína costuma ser
inalada, mas também é possível diluí-la em água e injetá-la, que atualmente é um
método de uso menos prevalente (HORTA; HORTA; ROSSET; HORTA, 2011).

O crack, substância produzida pela combinação de cloridrato de cocaína


com bicarbonato de sódio e água e solidificado em cristais, é frequentemente
confundido com cocaína fumada. A pasta básica é combinada com bicarbonato e
“cozida” para criar pequenas pedras que são aquecidas e defumadas em
cachimbos ou dispositivos similares. Acredita-se que o nome "crack" venha do
som que a substância produz quando fumada, um "clique" ou "crack" distinto
(APA, 2023; DALGALARRONDO, 2019).

Os efeitos da cocaína em pó quando inalada demoram aproximadamente


1 a 2 minutos para fazer efeito e podem durar de 30 a 45 minutos. Por outro lado,
quando o crack é fumado, ele é absorvido rapidamente e tem impacto imediato e

20
intenso no cérebro. Embora o efeito dure apenas 10 minutos, a vontade de usá-lo
novamente é forte devido à intensidade de seu efeito. Consequentemente, a
dependência que cria é considerada uma das mais graves (HORTA; HORTA;
ROSSET; HORTA, 2011).

O uso de cocaína, seja na forma de pó ou de crack, muitas vezes provoca


efeitos imediatos que dizem respeito principalmente à percepção que a pessoa
tem de si mesmo. Os usuários geralmente relatam uma sensação de euforia ou
uma sensação geral de bem-estar, juntamente com maior estado de alerta,
autoconfiança e força física. Isso geralmente é acompanhado por excesso de
energia e processamento cognitivo mais rápido. Fisicamente, o uso de cocaína
pode resultar em taquicardia, aumento da frequência respiratória, sudorese,
pupilas dilatadas, pequenos tremores nas mãos e nos pés, tiques e contrações
musculares na língua e na mandíbula (HORTA; HORTA; ROSSET; HORTA,
2011).

Em doses mais elevadas ou em certos indivíduos, pode manifestar-se um


elevado sentimento de suspeita e perseguição (conhecido como "noia"),
juntamente com ansiedade e episódios de pânico. Os relatórios sugerem que
alguns utilizadores experimentam um desejo sexual aumentado, enquanto
também podem ocorrer irritabilidade e agressividade, bem como instabilidade
emocional e dificuldades de atenção e concentração (DALGALARRONDO, 2019).

Quando são consumidas doses maiores da substância, elas tendem a


causar mais do que apenas a sensação de perseguição. Esses efeitos podem
incluir um aumento significativo no ritmo do pensamento, bem como o
desenvolvimento de ideias de referência, zumbido e alucinações de natureza
auditiva e tátil. Mesmo que o indivíduo que toma a substância reconheça essas
alucinações como resultado da droga, elas ainda podem ser bastante
angustiantes. Além disso, doses mais altas da substância podem causar
irritabilidade, ameaças e comportamentos agressivos cada vez mais frequentes.
No entanto, estas alterações normalmente desaparecem em questão de horas a
dias após a suspensão da substância, embora em casos raros possam persistir
durante várias semanas (APA, 2023; DALGALARRONDO, 2019).

21
O uso de cocaína pode resultar em um tipo de transtorno psicótico induzido
por drogas que se assemelha a um episódio esquizofrênico ou a um episódio de
mania psicótica em termos de apresentação sintomática.

Os jovens são particularmente suscetíveis aos graves riscos para a saúde


decorrentes do consumo de cocaína. A droga tem um impacto prejudicial na saúde
do coração, aumentando a probabilidade de ataques cardíacos, arritmias, dores
no peito, acidentes vasculares cerebrais e morte súbita entre jovens utilizadores.
Fumar crack agrava problemas respiratórios, incluindo o desenvolvimento do
"pulmão de crack", que se caracteriza por insuficiência respiratória e alterações
na opacidade pulmonar. Embora a síndrome de abstinência de cocaína
normalmente não seja grave, ela pode se manifestar como sentimentos de apatia,
tristeza e sonolência nos dias seguintes à cessação do uso, potencialmente
mimetizando um estado depressivo (DALGALARRONDO, 2019; HORTA;
HORTA; ROSSET; HORTA, 2011).

O vício em crack é uma condição altamente grave que leva aqueles que
dele dependem a praticar ações extremas para adquirir a droga. Tais ações
podem incluir tráfico, mendicidade, prostituição, roubo ou mesmo agressão
violenta. Em muitos casos, a saúde física do viciado é completamente
negligenciada, levando à perda de conexões significativas em sua vida. Só
poderão reconstruir relações que lhes permitam obter novamente a droga.

TRATAMENTO DO ABUSO DE SUBSTÂNCIAS NO BRASIL

O sistema de saúde pública do Brasil - o Sistema Único de Saúde (SUS) -


visa fornecer serviços universais de saúde, incluindo cuidados de saúde mental e
condições relacionadas ao uso de álcool e outras substâncias. No Brasil, as três
principais estratégias de atenção à saúde mental e aos transtornos relacionados
ao uso de álcool e outras substâncias são a atenção básica (Estratégia Saúde da
Família - ESF), os ambulatórios especializados (Centros de Atenção Psicossocial
- CAPS) e a internação sistemática (Hospitais de Atenção Integral). e

22
comunidades terapêuticas) (XAVIER; MONTEIRO, 2013).

Em 2013, a ESF cobria 56,2% da população brasileira. Uma característica


distintiva da ESF é a contratação de agentes comunitários de saúde (ACS) para
realizar visitas de campo e domiciliares. Os agentes comunitários de saúde são
membros da comunidade com formação básica em promoção da saúde e
prevenção de doenças. Embora o FSE preste serviços para abordar uma vasta
gama de problemas de saúde, incluindo dengue, VIH, planeamento familiar e
participação em programas sociais, serviços de prevenção e educação
relacionados com a saúde mental e perturbações relacionadas com o abuso de
álcool e substâncias, estes serviços raramente são prestados por outras razões.
falta de treino. Para atender a essa necessidade, desde 2013-2014, mais de 290
mil funcionários (ACS e auxiliares de atendimento) receberam treinamento em
Care Pathways, estratégia implementada pelo governo federal para capacitar
pessoas relacionadas ao uso de álcool e transtornos relacionados a substâncias
psicoativas. Duarte; Dal Bosco, 2011).

O segundo nível de atendimento é o CAPS (mais especificamente, “CAPS-


ad” para álcool e drogas), que consiste em ambulatórios atendidos por
enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras especializados em
saúde mental, transtornos por uso de álcool e substâncias psicoativas. O CAPS
atende pacientes diagnosticados com essas condições (XAVIER; MONTEIRO,
2013).

Por fim, pacientes com transtornos relacionados ao uso de álcool e


substâncias psicoativas podem receber tratamento hospitalar em enfermarias
especializadas da rede hospitalar pública, em clínicas psiquiátricas ou em
comunidades terapêuticas. As comunidades terapêuticas baseavam-se
frequentemente em explorações agrícolas, promoviam a recuperação através do
emprego e dependiam de modelos de tratamento mais estreitamente associados
a estratégias religiosas do que a estratégias médicas.

Infelizmente, isso ocorre apesar de a Rede de Atenção Psicossocial


(RAPS) ter sido criada em 2011 com um propósito: aumentar o acesso e a
integração dos serviços de saúde mental e transtornos por uso de substâncias

23
(TUS). O sistema enfrenta vários desafios, incluindo a falta de formação
generalizada e contínua em tratamentos baseados em evidências, a inexistência
de registos electrónicos de saúde mental para acesso dos prestadores e a baixa
disponibilidade de serviços em partes do país. A utilização deste sistema pode ser
um desafio para os pacientes, familiares dos pacientes e até mesmo para os
profissionais de saúde (HORTA et al., 2011).

A adoção de um modelo de gestão de cuidados poderia ajudar a aliviar os


atuais desafios de engajamento e retenção de tratamento entre pacientes com
TUS no Brasil. Para facilitar a coordenação dos cuidados e a integração dos
serviços, a gestão dos cuidados é considerada um complemento importante ao
tratamento das doenças crónicas em alguns países. Ajuda a aumentar o acesso
e a adesão ao tratamento do TUS e melhora a ligação a outros serviços, como o
tratamento do VIH (XAVIER; MONTEIRO, 2013).

INTEGRAÇÃO: O MODELO DE ATENDIMENTO CRÔNICO (CCM)

Segundo Oliveira e Nappo (2008), a maioria dos sistemas de saúde,


inclusive o brasileiro, concentra-se no tratamento de doenças agudas. Esse tipo
de cuidado trata de problemas imediatos e se caracteriza por diagnóstico e
tratamento rápidos, sendo o paciente o receptor passivo do cuidado. A CCM foi
desenvolvida em meados da década de 1990 devido ao aumento das taxas de
doenças crónicas. O CCM enfatiza a integração e coordenação dos cuidados para
promover uma gestão de doenças crónicas de alta qualidade para ajudar os
pacientes a estabelecer uma autogestão eficaz das doenças crónicas.

Figura 3 – Modelo de atenção Crônica (CCM)

24
Os autores citados também mencionaram que a integração traz resultados
benéficos no tratamento do TUS. Vários estudos demonstraram que os serviços
baseados em evidências devem ser integrados nos cuidados de saúde mental e
primários e, mais amplamente, nos serviços sociais (incluindo o sistema jurídico)
para reduzir o consumo de drogas, melhorar a saúde, prevenir a criminalidade e
reduzir a reincidência. A gestão do cuidado pode ajudar a alcançar essa
integração.

O ENQUADRE TERAPÊUTICO

O cenário do tratamento, a composição da equipe profissional e o tipo de


tratamento formam o quadro do tratamento, a organização interna do serviço.
Essa estrutura (prática institucional, profissional e teórica) determina o
funcionamento do programa de serviços.

1. AMBIENTES DE TRATAMENTO

25
Existem inúmeros tipos de ambientes terapêuticos, embora alguns sejam
mais conhecidos e tradicionais (Tabela 1). Cada um deles tem vantagens e
desvantagens na prestação de assistência a toxicodependentes. Nenhum serviço
é melhor que outro, só existem pacientes mais adequados para cada serviço.
Compreender as possibilidades e limitações de cada ambiente de tratamento
pode ajudar a adaptar os serviços às necessidades das comunidades que
atendem.

O tempo de tratamento também afeta a escolha dos serviços. Os usuários


de álcool que sofrem de sintomas agudos de abstinência podem necessitar de
desintoxicação não intensiva, intensiva em ambulatório, hospital-dia ou até
mesmo desintoxicação hospitalar. Contudo, após três semanas, os sintomas de
abstinência já não são um problema importante e podem ser adoptadas
abordagens menos intensivas e baseadas na comunidade. Portanto, é necessário
identificar o serviço mais adequado no momento e saber combiná-lo com outros
ambientes em que ocorrerá a sequência do tratamento.

Em muitos países, os diferentes ambientes de cuidados para a


dependência química estão divididos em modelos distribuídos ao longo do
continuum de cuidados. Infelizmente, o Brasil ainda não possui uma legislação
que regulamente o nível de atenção, nem o papel de cada profissional de saúde
no tratamento da dependência química, embora vários estudos nacionais tenham
identificado esse problema. Essa carência dificulta o encaminhamento adequado
de quem procura ajuda profissional, resultando em departamentos

26
sobrecarregados que deveriam ser responsáveis apenas por parte do tratamento.

Figura 4 - Redes de tratamento

No entanto, continua a fazer parte da organização do serviço que serve


para determinar, ainda que de forma aproximada, o seu ponto de inserção na rede
de tratamentos disponíveis numa determinada área (Fig. 4). O serviço como um
todo deve encontrar o seu lugar para apoiar de forma mais eficaz os pacientes
que procuram serviços e conectar-se a outros serviços disponíveis para formar
uma rede de apoio mútuo. Isso fortalece e amplia a estratégia de tratamento do
serviço e possibilita o encaminhamento daqueles que completaram o tratamento
proposto, mas ainda necessitam de abordagens alternativas.

2. COMPOSIÇÃO DA EQUIPE PROFISSIONAL

Há um grande número de profissionais diretamente envolvidos no


tratamento da dependência química. Cada ambiente (e complexidade
organizacional) requer um tipo diferente de equipe. Um hospital de dia é um
ambiente muito multidisciplinar, enquanto uma comunidade terapêutica pode ser

27
gerida por apenas um profissional de saúde especializado em combinação com
um grupo de antigos utentes. Independentemente da complexidade de cada
serviço, é importante que os pacientes tenham acesso a todos os profissionais
necessários. Mais uma vez, além de compreender as suas limitações e o seu lugar
ao nível dos cuidados, os serviços devem ser integrados em toda a rede de
serviços para melhorar ou suprir pontos não abrangidos pelo seu tratamento.

3. TIPO DE TRATAMENTO

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Comissão


Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas (CICAD) descrevem quatro
aspectos básicos que descrevem os tipos de tratamento: características da
intervenção, estratégias de tratamento, objetivos do tratamento e filosofia de
tratamento (Tabela 2).

28
A definição dos tipos de processamento de serviços é estrutural e pode ser
identificada em qualquer serviço. A sua determinação permite uma avaliação mais
objetiva dos resultados obtidos, leva o procedimento a sério e demonstra a
maturidade da equipa de tratamento.

29
REFERÊNCIAS

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de transtornos mentais: DSM-5-TR. 5.ed. rev. Porto Alegre: Artmed, 2023.

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