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SEÇÃO 25

FISIOT E R A P I A N O PAC I E N T E G R AV E

Fátima Cristina Martorano Gobbi


Leny Vieira Cavalheiro
CAPÍTULO 200
ROTIN A S E R E C U R S O S D E
FISIOT E R A P I A R E S P I R ATÓ R I A E M U T I

Raquel Afonso Caserta Eid


Leny Vieira Cavalheiro
Renata Fulan e Silva

DESTAQUES
 A mensuração da pressão de cuff representa um simples e reprodutivo método de analisar a pressão
exercida na mucosa traqueal.
 Protocolos estabelecidos pela equipe na UTI devem ser criados para maior sucesso do desmame e ex-
tubação.
 Mudanças periódicas de decúbito com posicionamento adequado do paciente no leito otimizam a
oxigenação, melhorando a relação ventilação/perfusão, reduzem o trabalho respiratório e minimizam
o trabalho cardíaco.
 A utilização de técnicas adequadas para reduzir ou eliminar hipoxemia durante a aspiração é impres-
cindível.
 A estimulação elétrica do diafragma tem como objetivo resgatar o máximo de fibras musculares ínte-
gras associando sempre a outras técnicas de treinamento muscular.
 Não há parâmetros para avaliação direta da qualidade, mas sim indicadores que constituem ferramen-
tas para identificar e colocar em foco aspectos específicos de atuação e que merecem maior atenção.

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INTRODUÇÃO que trouxeram maior agilidade e uniformidade ao
trabalho, otimizando o tempo de atendimento.
A fisioterapia em UTI é uma abordagem de
tratamento recente em nosso país. Nos últimos 20
Admissão do paciente na UTI
anos, é a área que mais se desenvolveu dentro dessa
profissão. Estabeleceu uma série de atribuições na A fisioterapia é parte integrante da equipe inter-
terapia intensiva que se diferencia de acordo com disciplinar no momento da admissão do paciente
região, recursos e número de profissionais aptos a na UTI, portanto, todos os pacientes internados
assumir o papel do fisioterapeuta de UTI. na UTI devem ser submetidos à avaliação de risco
A excelência da qualidade de um serviço se di- para complicações respiratórias e/ou motoras na
ferencia pelo estabelecimento de rotinas, as quais indicação de tratamento fisioterapêutico.
devem garantir a continuidade e a uniformidade A fisioterapia estabelece necessidade de oxige-
do atendimento fisioterapêutico. noterapia, uso de ventilação não-invasiva ou ven-
A rotina do fisioterapeuta em uma UTI, adul- tilação mecânica invasiva junto ao médico intensi-
ta ou pediátrica, dependerá do tipo de assistência. vista (Figura 1).
Podemos classificar uma UTI tipo III pelos crité- Os pacientes submetidos à ventilação mecânica
rios divulgados pelo Ministério da Saúde, portaria (VM) devem ter seus parâmetros respiratórios ajus-
no 3.432 de 12 de agosto de 1988, em vigor, em que tados conforme o quadro clínico: modalidade, FiO2,
o fisioterapeuta tem assistência exclusiva à unidade. positive end expiratory pressure (PEEP), volume-cor-
Nesse tipo de classificação, podemos então discursar rente (VT), volume-minuto (VMin), Pico de pressão
sobre algumas rotinas contínuas realizadas por esse inspiratória (PPI)). Se necessário, instalar módulos
profissional juntamente à equipe multiprofissional. de mecânica respiratória e ou EtCO2. Os parâmetros
O papel do fisioterapeuta na equipe, no processo e as alterações necessários deverão ser sempre regis-
de admissão, é o de verificar se os recursos materiais trados no impresso de controle do paciente.
para assistência ventilatória, oxigenoterapia e emergên- Os pacientes em VM devem ser acompanhados
cias respiratórias estão disponíveis. Esta é uma fase de pela equipe de fisioterapia, seguindo protocolos
gerenciamento de risco em que há a disponibilização estabelecidos junto ao grupo de assistência respi-
de recursos para um atendimento seguro e rápido ao ratória da UTI e guias de condutas descritas pela
paciente, independente da utilização efetiva do mes- equipe.
mo. O próximo passo é avaliar o paciente e estabelecer Em se tratando de ventilação não invasiva
a necessidade da abordagem de tratamento fisiotera- (VNI), os métodos e as interfaces devem ser ele-
pêutico. O processo de avaliação é geral, observando- gidos conforme o quadro clínico do paciente e se-
se os aspectos respiratórios e motores e respeitando a guindo critérios estabelecidos na UTI:
funcionalidade respectiva das áreas. A existência de
• CPAP: hipoxemia e hipoventilação;
uma ficha formal para padronizar a abordagem dos
profissionais em relação aos itens avaliados organiza e • BiPAP: retenção de CO2, hipoxemia e insufi-
direciona o tratamento e as decisões da equipe, assim ciência respiratória aguda, doença pulmonar
como auxilia no controle da continuidade do trata- obstrutiva crônica (DPOC), acute respiratory
mento, garantindo o mesmo fluxo de informações. distress syndrome (ARDS) e desmame difícil.

ROTINAS Interfaces

Para melhor eficiência no atendimento da fi- • Máscara facial.


sioterapia respiratória, foram estabelecidas rotinas • Máscara facial total.

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Admissão
do paciente

Definir
Paciente em Sim
necessidade de
ventilação espontânea?
oxigenoterapia
Não

Necessita VNI?

Sim

Não

VM VNI
Ventilação Ventilação
mecânica não
invasiva

Adaptar Ajustar Adaptar Ajustar


respirador parâmetros paciente parâmetros

Instalar módulos
de EtCO2 e/ou
mecânica

Anotar
parâmetros

FIGURA 1 – Fluxograma de admissão.

A retirada gradual da VNI é realizada pela equi- Medidas de cuff


pe de fisioterapia conforme preditores de desmame A mensuração da pressão de cuff do tubo en-
estabelecidos: PImáx, PEmáx, VT, CV, PaO2/FiO2, dotraqueal é usada para prevenir escapes de gás e
gasometria arterial e freqüência respiratória. aspiração pulmonar em pacientes com ventilação

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mecânica. O volume inflado no cuff gera uma pres- • monitorizar os pacientes;
são que é transmitida diretamente para a parede • colaborar com os membros da equipe quando
da traquéia ao redor do cuff. Entretanto, pressões necessário.
de cuff acima de 22 cmH2O estão relacionadas à
diminuição do fluxo capilar, com desaparecimen- Equipamentos respiratórios para remoção
to desse fluxo em níveis acima de 42 cmH2O com
conseqüentes graus de isquemias e suas complica- RESPIRADOR
ções como ulcerações, estenose de traquéia e fístula
• Leve, portátil para poder ser acompanhado jun-
traqueobrônquica. A relação entre intubação pro-
to ao paciente, ciclado a volume e à pressão com
longada e lesão da mucosa traqueal também tem
sido bem demonstrada. Áreas de lesões da mucosa a opção de pressão de suporte e PEEP, ciclado a
e alterações ciliares são vistas após 2 horas de intu- fluxo nos neonatos.
bação. A palpação do cuff é insuficiente para detec- • Fácil manutenção.
tar altas pressões. • Não sofrer influências com as variações de pres-
A mensuração da pressão de cuff representa um sões, temperatura e movimentação.
simples e reprodutivo método de analisar a pressão • Não interferir nos instrumentos de navegação e
exercida na mucosa traqueal devendo ser mensurada comunicação do veículo.
duas vezes por dia no período da manhã e da tarde e • Ter a opção de funcionar com bateria (carga su-
registrada no impresso de controle dos pacientes. ficiente para menos duas vezes o tempo total do
transporte) e com corrente alternada.
Transporte de pacientes da UTI • Não utilizar bateria de chumbo nos transportes
A remoção de pacientes graves envolve risco ao aéreos por conter líquidos corrosivos (norma do
doente e à equipe, na qual os riscos são minimiza- Departamento de Aviação Civil (DAC).
dos mediante planejamento cuidadoso, atuação da • Estar familiarizado com a equipe de transporte.
equipe e uso apropriado de equipamentos. • Materiais:
– AMBU com máscara;
Planejamento da remoção
– máscara de Venturi;
Os pacientes com comprometimento ventilató- – aspirador portátil;
rio ou dependentes de ventilação mecânica neces- – filtro umidificador;
sitarão de equipamentos específicos e um fisiotera-
– cilindros de ar comprimido e de O2.
peuta na equipe.
• A quantidade de cilindros dependerá do tama-
Compete ao fisioterapeuta:
nho dos mesmos, do volume-minuto do pacien-
• conferir o ventilador quanto a funcionamento, te, do fluxo de ar no caso dos respiradores de
baterias e alimentação elétrica nos veículos; fluxo contínuo, do tempo total do transporte,
• montar, conferir e estocar os equipamentos res- da FiO2 utilizada, dos escapes, dos vazamentos
piratórios e acessórios; e do tipo do respirador.
• conferir a carga, o funcionamento e a segurança Efetuar os seguintes procedimentos antes da re-
dos cilindros de oxigênio e ar comprimido; moção:
• manter a permeabilidade das vias aéreas; • pacientes em insuficiência, se possível, devem
• instalar o ventilador no paciente e ajustar os pa- ser intubados e colocados em ventilação mecâ-
râmetros; nica;

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• vias aéreas pérvias: aspiração de secreções respi- Extubação
ratórias;
Após revertido o quadro que levou o paciente a
• manter uma boa oxigenação – FiO2 adequada; ser submetido à intubação traqueal e à VM, inicia-
• fixação da cânula endotraqueal para evitar extu- se o processo de desmame.
bação acidental;
• filtro umidificador para evitar ressecamento das Critérios de extubação
vias aéreas;
• Oxigenação: PEEP = 5-8 cmH2O, SatO2 ≥ 95%
• passagem de uma sonda nasogástrica na presen- com FiO2 ≤ 40% e PaO2/FiO2 > 200;
ça de uma distensão gástrica por piorar a respi- • Ventilação: VT = 6-8 ml/kg, FR ≥ 30 rpm,
ração e risco de vômito; VMin = 10-15 l/min e FR/VT = 60-100;
• drenagem do pneumotórax na presença deste; • Medidas (em valores absolutos): PiMáx ≥ - 30
• imobilização na maca para evitar quedas; cmH2O;
• sedação nos pacientes agitados e pouco colabo- • Estabilidade do sistema cardiovascular: FC
rativos; <120 bpm, PA estável com doses baixas de dro-
• substituir o ar do cuff nos transportes aéreos gas vasoativas;
por água e trocá-lo novamente na chegada ao • Afebril;
destino. • Ausência de acidose respiratória aguda;
Durante a remoção, é importante a avaliação • Hemoglobina = 8-10 g/Dl;
contínua do paciente pela equipe multiprofissional. • Glasgow ≥ 12;
• Eletrólitos aceitáveis;
Papel da fisioterapia na intubação traqueal • Tosse efetiva.
Durante a intubação realizada pelo médico in- O fisioterapeuta avalia e realiza as medidas ven-
tensivista, o fisioterapeuta deve prestar assistência tilatórias, discute a indicação de extubação com
na ventilação do paciente: o médico intensivista e, preenchendo os critérios
• preparar o material de ventilação (ambu, más- descritos acima, realiza a extubação:
cara e O2) e aspiração traqueal (sondas e luvas • preparar material de aspiração;
estéreis); • providenciar oxigenoterapia ou VNI;
• checar os parâmetros do respirador previamente; • explicar ao paciente o procedimento a ser realizado;
• ventilar o paciente com ambu e máscara conec- • aspirar cânula e vias aéreas superiores;
tados ao O2; • posicionar o paciente em decúbito dorsal eleva-
• após a intubação, insuflar o cuff e mensurar a do (30°);
pressão; • desinsuflar o cuff;
• realizar ausculta pulmonar, verificando o posi- • retirar cânula endotraqueal;
cionamento da cânula; • instalar oxigenoterapia ou VNI.
• confirmar os parâmetros do respirador;
• anotar os parâmetros do respirador; RECURSOS EM FISIOTERAPIA
RESPIRATÓRIA
• analisar gasometria e radiografia de tórax
pós-intubação, alterando os parâmetros, se A fisioterapia respiratória tem importante pa-
necessário. pel no tratamento e na prevenção de complicações

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respiratórias, tornando-se fundamental para os pa- Percussão e vibração
cientes que se encontram em UTI, em pós-opera-
tórios de cirurgias cardíacas, torácicas e abdomi- A percussão consiste em realizar percussões rit-
nais, pacientes com doenças pulmonares crônicas, madas sobre a parede torácica, com as mãos em
dependentes de ventilação mecânica invasiva ou concha, tanto na fase inspiratória como na expira-
não-invasiva, doentes neuromusculares ou com fa- tória, para auxiliar no transporte do muco para as
lência do mecanismo de tosse, entre outros. vias aéreas mais proximais.
As principais técnicas fisioterapêuticas utiliza-
das em UTI serão descritas a seguir. Contra-indicações relativas à percussão
• Dispnéia intensa.
Posicionamento • Instabilidade hemodinâmica.
Mudanças periódicas de decúbito com posicio- • Fratura de costela.
namento adequado do paciente no leito otimizam • Osteoporose.
a oxigenação, melhorando a relação ventilação/per-
• Plaquetopenia.
fusão, reduzem o trabalho respiratório e minimi-
zam o trabalho cardíaco. Exemplos de posiciona- A vibração consiste em realizar vibrações com
mento utilizado em UTI são posicionamento em as mãos abertas sobre a parede torácica associada à
decúbito lateral ou posição prona, para auxiliar na compressão expiratória simultânea, com o objetivo
resolução de atelectasias lobares e decúbito elevado de facilitar o transporte do muco e estimular o re-
entre 30o e 45o que auxilia na prevenção de pneu- flexo de tosse.
monia nosocomial, reduzindo a aspiração contínua
de conteúdo da orofaringe e diminuindo o reflexo Contra-indicações relativas a vibrações
gastroesofágico.
• Fratura de costela.
Drenagem postural • Aumento da PIC.
• Instabilidade hemodinâmica.
São posturas com base na anatomia brônquica
a favor da gravidade, que facilitam a drenagem do
Tosse
muco para as vias aéreas distais, otimizam a relação
ventilação/perfusão e a oxigenação. A tosse é um dos mais importantes mecanismos
Utiliza-se associando outras técnicas para mobi- protetores das vias aéreas, e essencial para remoção do
lização do muco como percussão, vibração e uso de muco. O reflexo de tosse é dividido em quatro fases:
técnicas de tosse assistida ou aspiração de secreção, • irritativa: é induzida principalmente por irrita-
se necessário. ção das fibras aferentes do nervo glossofaríngeo
na faringe e terminais sensitivos do nervo vago
Contra-indicações relativas à drenagem na laringe, traquéia e grandes brônquios;
• Pacientes com instabilidade hemodinâmica. • inspiração profunda: o reflexo irritativo estimu-
la uma inspiração profunda;
• Pacientes neurológicos com alterações da pres-
são intracraniana (PIC). • compressão: a glote se fecha rapidamente en-
quanto a musculatura intercostal a abdominal
• Crise de broncoespasmo.
se contraem provocando aumento da pressão
• Edema pulmonar. intratorácica e abdominal, e a pressão intratorá-
• Insuficiência cardíaca congestiva. cica atinge nível elevado e há abertura da glote;

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• expulsão: com a glote aberta o palato mole se ventilador e a utilização de cateteres e luvas es-
eleva fechando a nasofaringe havendo a expul- téreis;
são do material. • sistema fechado: utiliza um cateter protegido
Diversas situações comprometem o reflexo de por um envelope de plástico para várias aspi-
tosse, como doenças neuromusculares, via aérea rações e não necessita desconectar o circuito do
artificial, lesão medular, rebaixamento do nível de ventilador.
consciência, pós-operatório de cirurgias cardíaca, Por algumas razões, o cateter com sistema fe-
torácica e abdominal alta. chado tem vantagens sobre o cateter com sistema
Técnicas de tosse assistida facilitam a remoção aberto: diminuição de alterações hemodinâmicas
do muco. Entre as técnicas, destacamos: e hipóxia, principalmente em pacientes que re-
• tosse cinética: tosse voluntária com uso de co- querem FiO2 altos e PEEP; pode ser usado para
mando verbal do fisioterapeuta. O paciente é prevenir contaminação durante a aspiração, porém
incentivado a realizar uma inspiração lenta se- não existem evidências sobre o efeito protetor dos
guido de uma breve apnéia e efetua uma expira- cateteres com sistema fechado em pneumonia asso-
ção brusca e curta; ciada à ventilação mecânica (Figura 2).
• tosse do Huffing: tosse voluntária também com
uso de comando verbal. O paciente realiza uma
inspiração profunda seguido de expiração pro-
funda com a boca aberta, que pode ser associada
à compressão manual sobre o abdômen;
• tosse assistida: o paciente realiza uma inspiração
profunda, seguida de uma expiração forçada e o
fisioterapeuta assistirá com compressão torácica
manual vigorosa durante a fase expiratória. A
compressão pode ser realizada na parte anterior
do tórax ou em ambos;
• tosse provocada ou induzida: utilizada para pa-
cientes com rebaixamento do nível de consci-
ência, diminuição do reflexo de tosse, criança e FIGURA 2 – Sistema de aspiração orotraqueal fechada.
pacientes com uso de vias aéreas artificiais. Esti-
mulação da traquéia com compressão da fúrcu-
la esternal, e também manobras com ambu em Complicações da aspiração traqueal
vias aéreas artificiais. • Hipoxemia.
• Atelectasia.
Aspiração traqueal
• Trauma das vias aéreas.
Método para remoção de secreção utilizada • Contaminação.
quando a tosse não é eficaz e em pacientes sob ven-
• Arritmia cardíaca.
tilação mecânica e ou traqueostomizados. Existem
dois sistemas para aspiração traqueal em pacientes • Aumento da pressão intracraniana.
sob ventilação mecânica: • Tosse e broncoespasmo.
• sistema aberto: utiliza um cateter de aspiração A instilação de salina é usada às vezes nas vias
simples e necessita desconectar o circuito do aéreas como parte do procedimento de aspiração.

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ROTINAS E RECURSOS DE FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM UTI
TABELA 1 – Técnicas usadas para reduzir ou eliminar hipoxemia durante a aspiração
Técnica Descrição Observação

Hiperoxigenação Administrar aumento da FiO2 antes, durante e após o Deve ser rotineiro com todas as aspirações
procedimento

Insuflação manual Utilizar o ressuscitador manual Dificuldade em gerar altos volumes com este método

Aspiração fechada Procedimento que não requer desconexão do ventilador Benefício para alguns pacientes. Custo-eficiência ainda não
durante a aspiração se sabe

Hiperinsuflação Utilizar suspiros (1 a 2 vezes o volume-corrente) Utilizar adequadamente com ventiladores com suspiro manual

Insuflação Utilizar um cateter com duplo lúmen para administrar oxigênio Dificuldade em utilizar cateter convencional, e custo-benefício
durante a aspiração não se sabe

Isto é feito para facilitar a remoção de secreções, • sustentação inspiratória máxima: consiste em
porém essa prática é controversa. Geralmente mais realizar uma inspiração nasal profunda com
salina é instilada que aspirada, resultando em au- uma sustentação de 6 a 10 segundos, seguida de
mento do volume de secreção. Esse procedimento expiração oral;
não deve ser usado rotineiramente. • exercícios utilizando freno labial: realiza-se ins-
piração nasal lenta e profunda e uma expiração
Cinesioterapia respiratória oral lenta com dentes cerrados e lábios unidos;
Diversos exercícios visando principalmente ao • exercícios com incentivados inspiratórios: vi-
aumento do volume-corrente e reexpansão pulmo- sam estimular o paciente a realizar inspirações
nar são descritos a seguir: profundas com sustentação por alguns segun-
dos. São utilizados principalmente para crianças
• respiração diafragmática: exercício utilizado
e para que pacientes em pós-operatórios possam
principalmente em pós-operatórios de cirurgias
cardíaca, torácica e abdominal. Com o paciente realizar, quando corretamente orientados, esses
sentado, o fisioterapeuta estimula o paciente a exercícios sozinhos;
realizar respirações diafragmáticas, colocando as • exercícios com flutter: flutter é um aparelho de
mãos logo abaixo do processo xifóide e o pa- uso individual, portátil, que permite gerar em
ciente é orientado para que durante sua inspira- cada expiração simultaneamente uma pressão
ção eleve a mão do terapeuta; positiva oscilatória controlada e interrupções
• inspiração em tempos: realizada com o pacien- do débito respiratório de freqüência regulável.
te sentado, orienta-se que este realize inspirações A ação fisiológica do flutter está na oscilação que
nasais com pausa inspiratória (apnéia) seguidas provoca alargamento dos brônquios até as es-
de expiração oral completa. A inspiração pode truturas mais finas e as placas de muco são mo-
ser em um, dois ou três tempos; bilizadas. Os locais dos brônquios onde ocorre
obstrução pelo muco abrem-se novamente e o
• exercícios inspiratórios associados aos mem-
bros superiores: o paciente sentado com os colapso é evitado, pelo fato observado nas vias
membros superiores (MMSS) ao longo do cor- respiratórias instáveis. Assim, a resistência e o
po realiza uma inspiração nasal profunda com trabalho respiratório diminuem enquanto a ca-
elevação dos MMSS até 90o e logo após, reali- pacidade vital aumenta (Figura 3);
za-se a expiração oral com a volta dos MMSS à • End Positive Airway Pressure (EPAP): são
posição inicial; exercícios utilizando pressão positiva composta

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por uma válvula unidirecional acoplada a uma • freqüência de três vezes ao dia;
máscara facial siliconada, e a resistência expira- • duração iniciando com 5 minutos, progredindo
tória varia de 5 a 20 cm H2O. A terapia pode até 20 minutos por sessão.
durar de 15 a 20 minutos e o incremento do Há sugestões para utilização no ventilador, porém
PEEP é feito de acordo com a necessidade do
com pouca evidência científica até o momento:
paciente. O EPAP melhora a oxigenação e a
complacência pulmonar com aumento da capa- • imposição da carga mediante alteração na sensi-
cidade residual funcional; bilidade do respirador;
• exercício com pressão positiva intermitente: • associação ou não de ventilação mandatória in-
utilizado para reexpansão pulmonar, por meio termitente, com sobrecarga de trabalho nos mo-
de equipamentos que proporcionem pressão po- mentos de respiração espontânea;
sitiva, podendo ser coadjuvantes a outras técni- • variações bruscas ou programadas dos níveis de
cas de assistência respiratória para pós-operató- pressão suporte, utilizando sobrecarga com ní-
rios e pacientes hipersecretivos, principalmente. veis menores que o necessário.
Ajuste e monitorização da pressão aplicada du-
rante o exercício são essenciais para evitar picos Estimulação elétrica do diafragma
de pressão e volumes correntes excessivos.
A estimulação elétrica do diafragma tem como
objetivo resgatar o recrutamento de unidades mo-
Treinamento muscular
toras íntegras, podendo ser associada a outras téc-
Utilizado para pacientes com dificuldade de nicas de treinamento muscular. Indicada no trata-
desmame do ventilador mecânico por fraqueza mento de disfunção neuromuscular do diafragma,
muscular. Utilizam-se: devendo estar o nervo frênico íntegro.
• resistor de carga linear (Figura 4); Para iniciar essa técnica é necessária uma análise
• carga de 40% a 60% da pressão inspiratória má- prévia da condução do nervo frênico por meio de
xima (PiMáx); eletromiografia. Outra forma é realizar uma ultra-

1 2 3 4
5

Componentes do equipamento
1. Membrana ou diafragma
2. Carga inspiratória
3. Mola
4. Bocal
5. Fluxo inspiratório para o paciente

FIGURA 3 – Flutter. FIGURA 4 – Threshold – resistor de carga linear.

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ROTINAS E RECURSOS DE FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM UTI
sonografia de tórax para mensuração do desloca- QUALIDADE NO SERVIÇO DE
mento do diafragma durante a inspiração/expira- FISIOTERAPIA
ção que é verificada durante a aplicação de corrente
A implementação de um programa de quali-
elétrica, marcando o ponto motor com caneta so-
dade tem como finalidade estabelecer passos para
bre a pele do paciente.
que um serviço possa atingir as diretrizes precisas
A estimulação é realizada com equipamento de monitorização da qualidade total. É preciso que
para eletroterapia que forneça uma corrente do uma equipe de saúde multiprofissional planeje um
tipo bipolar simétrica. O modo mais utilizado para programa para a melhoria da estrutura física e de
a prática clínica é a colocação de dois eletrodos, recursos humanos, dos processos diagnósticos e de
um para cada hemitórax sobre o ponto motor do tratamento e de armazenamento de informações,
músculo diafragma, no qual podemos verificar visando à obtenção de resultados. A execução desse
uma contração eficaz do diafragma. A duração da propósito é feita em processos com o objetivo de
aplicação é de 20 a 30 minutos e a freqüência em se atingir a eficácia (obter o resultado esperado do
torno de 30 a 50 Hz (Figura 5). processo em questão) e a eficiência (realizar o pro-
cesso de acordo com padrões de conformidade).
O processo de gestão de qualidade é conhecido
como PDCA: planejar ((plan), executar (do), verificar
(check)
check) e agir de forma corretiva (act
check act) (Figura 6).
Não há parâmetros para avaliação direta da
qualidade, mas sim indicadores que constituem
ferramentas para identificar e colocar em foco as-
pectos específicos de atuação e que merecem maior
atenção. A quantificação desses eventos ocorridos é
requisito básico para monitorização dos processos.
Um indicador é um aspecto definido e mensurá-
vel do tratamento oferecido ou do resultado desse
FIGURA 5 – Eletroestimulação do diafragma. tratamento. A utilização de um indicador torna o

Implantar, abandonar ou
refazer a mudança Planejar a mudançaa

Agir – Planejar

Checar – Fazer

Estudar os resultados Executar a mudança

FIGURA 6 – PDCA.

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SEÇÃO 25
processo de monitorização mais objetivo e menos ram coletadas nos períodos da manhã, tarde e noite
aleatório. e limites até 25 cm H2O eram permitidas. Notamos
Aplicando o modelo de melhoria contínua da que as medidas realizadas pela manhã e tarde apre-
qualidade, observamos que mesmo com a rotina sentavam diferença significativa, fato que não ocor-
de mensuração de pressão de cuff implantada, pu- ria no período noturno, o que nos fez descontinuar
demos aprimorá-la. Realizamos medidas de cuff de a mensuração no terceiro período. Em 36% dos pa-
tubo endotraqueal e de cânula de traqueostomia em cientes, a primeira medida realizada da pressão de
pacientes sob ventilação mecânica. As medidas fo- cuff estava acima de 31 cm H2O (Figura 7).

Março/2003 Março/2002
Implantar a mudança 30% dos pacientes
(número de medidas) com pressão de cuff
cuff Ok

Agir Planejar
Checar Fazer

Setembro/2002 Entre março/2002 e


80% dos pacientes setembro/2002
com pressão de cuff Aumento de vigilância

FIGURA 7 – Exemplo de PDCA.

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CAPÍTULO 201
FISIOT E R A P I A R E S P I R ATÓ R I A N A
VENTIL AÇ ÃO C O N V E N C I O N A L

Mineo Kaneko
Ana Lucia Bernardo de Carvalho
Emerson Carvalho Pinho
Corinne Taniguchi

DESTAQUES
 É fundamental lavar as mãos antes e depois de realizar quaisquer procedimentos com os pacientes.
 Ajustar frações inspiradas de oxigênio e níveis de PEEP necessários para obter saturação de oxigênio
> 95%.
 Manter os níveis de sensibilidade do ventilador ajustados adequadamente, evitando esforços excessivos
e autodisparo nos modos ventilatórios assistidos.
 Monitorar constantemente a pressão de cuff a fim de evitar lesões de traquéia e broncoaspiração.
 Cautela ao realizar manobras fisioterapêuticas como Bag Squezing
Squezing, principalmente no tocante às pres-
sões inspiratórias elevadas, evitando assim hiperinsuflações, realizando insuflações rápidas e curtas,
privilegiando o tempo expiratório, principalmente nos pacientes com broncoespasmo e auto-PEEP.
 Na técnica de Bag Squezing
Squezing, é fundamental que o AMBU utilizado tenha válvula de segurança, evitan-
do elevações pressóricas até níveis danosos.
 Avaliar na radiografia de tórax a presença de imagens sugestivas de alterações pulmonares e o posicio-
namento da cânula de intubação.
 Observar o aspecto e aumento da quantidade da secreção pulmonar, que poderá ser indício de processo
infeccioso, servindo também como critério para otimização da umidificação do sistema.
 Utilizar parâmetros ventilatórios adequados evitando assincronia paciente-ventilador.

2517
INTRODUÇÃO Ainda no tocante à atividade do fisioterapeuta
na UTI, é imprescindível que este fique atento ao
As técnicas de fisioterapia têm sido cada vez mais
aspecto da secreção traqueobrônquica (coloração,
aplicadas na prática clínica das UTIs. A atuação do
viscosidade e quantidade) e às imagens radiológi-
fisioterapeuta não se limita apenas a pacientes com
cas, à procura de alterações sugestivas de processo
problemas pulmonares, mas sim aos acometidos
pneumônico, podendo, se necessário, ser traçado
por diferentes afecções em diversos sistemas.
programa de atendimento com manobras de hi-
Na atualidade, o profissional de fisioterapia tem giene brônquica ou intensificar os atendimentos já
atuação garantida na prática clínica, principalmen- programados.
te em UTIs nas quais os pacientes requerem supor-
Ponto fundamental do atendimento, principal-
te ventilatório não-invasivo ou invasivo.
mente em pacientes hipersecretivos, é a aspiração
Nos pacientes que necessitam de suporte ven- da secreção traqueal, que faz parte da higiene brôn-
tilatório mecânico invasivo, a atuação do fisiotera- quica. Esta pode ser realizada com sistema aber-
peuta é ampla. Ela tem início já na admissão dos to, com uso de sonda de aspiração e luvas estéreis
pacientes na UTI, por meio do ajuste dos parâme- ou em sistema fechado, com cateter protegido. O
tros ventilatórios, da monitorização respiratória, da sistema fechado proporciona meio estéril entre a
aplicação das técnicas de higiene brônquica e da extensão do circuito do ventilador e a prótese en-
utilização das manobras de reexpansão pulmonar. dotraqueal, podendo reduzir o risco de contamina-
Além disso, desde o momento inicial do supor- ção bacteriana. Outra vantagem desse sistema é a
te ventilatório, o fisioterapeuta deverá programar possibilidade de manter a PEEP e o fornecimento
como será o processo de desmame da ventilação de oxigênio durante a aspiração, evitando o colap-
mecânica, evitando assim que o paciente perma- so alveolar e mantendo a oxigenação arterial.
neça além do necessário com suporte ventilatório,
É fundamental entender que a prática da aspi-
depois de resolvido o evento inicial que ocasionou
instalação deste. ração traqueal deve ser realizada somente quando
necessária e não em horários previamente estabele-
cidos. As indicações de aspiração brônquica estão
CONSIDERAÇÕES GERAIS
resumidas na Tabela 1.
Em pacientes com prótese endotraqueal e com Finalizada a higiene brônquica com a aspiração
suporte ventilatório mecânico invasivo, a incidên- das secreções presentes na prótese endotraqueal,
cia de pneumonia nosocomial é alta. Isto ocorre recomenda-se a aspiração das vias aéreas superiores
pela associação de diversos fatores, pois, além das
alterações decorrentes da prótese em si, os pacientes TABELA 1 – Indicação de aspiração brônquica
recebem drogas sedativas e, em alguns casos, drogas • Ausculta sugestiva de presença de secreção pulmonar
paralisantes, que influenciam no movimento ciliar
• Tosse
e na produção do muco, ocasionando acúmulo de
secreção e aumento do risco de infecções. • Redução da saturação percutânea de oxigênio, principalmente em pa-
cientes comatosos e/ou curarizados, com reflexo de tosse prejudicado
Um dos grandes desafios, na prática em UTI, ou abolido. Nesses casos, o acúmulo de secreção pode dificultar a pas-
sagem de fluxo de ar do ventilador para os pulmões
está em prevenir a pneumonia nosocomial. Esti-
ma-se que o risco de um paciente em ventilação • Aumento do pico de pressão inspiratório do ventilador, devido à presen-
ça de rolha de muco em brônquio principal
mecânica adquirir pneumonia é de aproximada-
mente 1% ao dia. No entanto, cuidados simples • Por autociclagem do ventilador mecânico. A presença e oscilação da
secreção pulmonar podem ser interpretadas como queda do fluxo ins-
como lavagem das mãos e assepsia durante os pro- piratório, assim o ventilador mecânico cessa o ciclo respiratório e inicia
cedimentos são essenciais, diminuindo esse risco. outro, realizando a autociclagem

2518
SEÇÃO 25
e secreção que fica acumulada na parede posterior Vale lembrar que a pressão do balonete não
da orofaringe. Devemos lembrar que as cânulas deve ultrapassar a pressão capilar da traquéia, mas
orotraqueais e de traqueostomia não evitam com- deve ser suficiente para evitar a aspiração de ma-
pletamente a microbroncoaspiração de secreção terial da faringe e vazamentos de ar durante picos
ou de resíduos alimentares, aumentando o risco inspiratórios na ventilação mecânica. Deve ainda
de infecção hospitalar. Para minimizar a incidên- ser dada preferência às cânulas providas de balone-
cia de pneumonia associada à ventilação mecâni- tes infláveis de alto volume e baixa pressão, porque
ca, podem ser utilizadas cânulas orotraqueais que exercem um grau mínimo de compressão sobre um
permitem a aspiração subglótica, que minimizam maior segmento traqueal, permitindo melhor an-
o acúmulo de secreção sobre o cuff. coragem com menor vazamento.
A manutenção da pressão do balonete elevada
MONITORIZAÇÃO DA PRESSÃO por um período prolongado pode levar a lesões
DO BALONETE (CUFF)
traqueais, como: traqueomalacia, estenose de tra-
As pressões de insuflação do balonete devem ser quéia, hemorragias e fístulas traqueoesofágicas.
cuidadosamente monitoradas em todos os pacien- Neste sentido, sabe-se que a pressão de balonete
tes intubados ou traqueostomizados. maior que a pressão de perfusão traqueal, que va-
O princípio físico do balonete da cânula é seme- ria de 26 a 40 cm H2O (20 a 30 mmHg), pode
lhante ao manguito do esfigmomanômetro, isto é, causar isquemia da parede traqueal. Essa pressão
havendo pressões diferentes, a força resultante estará de balonete se distribui de forma desigual, ou seja,
atuando no sentido de maior pressão para o de me- as regiões anterior e lateral da traquéia sofrem
nor pressão. No manguito, o compartimento inter- maior influência devido aos anéis cartilaginosos
no sofre ação de compressão. No balonete, o com- rígidos.
partimento externo ao balão sofre ação de repulsão. Há estudos que demonstram que cânulas de diâ-
Se o balonete insuflado ocupar um espaço me- metro compatível com a traquéia e balões de baixa
nor que o diâmetro da traquéia, diferentes pressões pressão, em torno de 25 cm H2O, foram suficien-
no mesmo exercerão pouco efeito sobre a via aérea tes para prevenir a aspiração do material da faringe.
(Figura 1). Se o diâmetro da traquéia for menor Porém, em casos específicos, pode-se até necessitar
que o do balonete insuflado, a pressão do mesmo de pressão de balonete elevada, como para prevenir
exercerá importante ação de repulsão sobre a tra- vazamentos de ar em pacientes ventilados com al-
quéia (Figura 2). tas pressões inspiratórias (Tabela 2).

30 cmH2O 50 cmH2O 30 cmH2O 50 cmH2O

FIGURA 1 – Cânula de calibre pequeno e variações de pressões FIGURA 2 – Cânula de tamanho adequado e variações de pressões
terão pouca interferência na parede da traquéia. terão interferências importantes na parede da traquéia.

CAPÍTULO 201 2519


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA NA VENTILAÇÃO CONVENCIONAL
TABELA 2 – Níveis ideais de pressão de cuff
Limite mínimo Limite máximo
Para evitar aspiração do material da faringe: Para evitar isquemia da traquéia abaixo da pressão de perfusão capilar da traquéia:
• maior que 25 cm H2O (18 mmHg) • entre 26 a 40 cm H2O (19 a 29 mmHg)
Para evitar vazamento de ar nos ciclos respiratórios, depende das pressões
de pico e platô inspiratórios:
• maior que 10 cmH2O ( 7 mmHg )

Obs: 1 cmH2O = 0,73 mmHg.

FIXAÇÃO DA CÂNULA Em indivíduos saudáveis, o volume-corrente é de


aproximadamente 400 ml e o volume-minuto de
Após a inserção da cânula, o posicionamento
aproximadamente 6 litros (dependendo do peso e
correto deve ser avaliado inicialmente pela auscul-
da altura).
ta da região epigástrica e do hipocôndrio seguido
dos campos pulmonares laterais e posteriores, pela Sabe-se que pacientes que apresentam, durante
radiografia de tórax, em que a cânula deve estar a monitorização respiratória do processo de desma-
localizada de 2 a 4 cm acima da carina e também me da ventilação mecânica invasiva, volume-cor-
por meio de capnografia. rente menor que 300 ml e volume-minuto acima
Essa avaliação deve ser feita periodicamente de 10 litros podem cursar com insucesso de des-
para reduzir a incidência de intubações seletivas ou mame.
desintubações acidentais. Nas formas de ventilação limitadas à pressão, o
volume-corrente será conseqüência da complacên-
MONITORIZAÇÃO VENTILATÓRIA cia e resistência pulmonares e, dessa maneira, deve-
se estar atento às suas variações.
O controle do paciente em ventilação mecâni-
No tocante à relação entre o volume-minuto
ca, ou seja, a monitorização respiratória à beira do
espontâneo e a PaCO2, esta pode fornecer infor-
leito, é fundamental para um adequado tratamento
mações valiosas a respeito da demanda imposta ao
do paciente grave ventilado artificialmente.
sistema respiratório do paciente.
A monitorização não deve interferir na rotina de
cuidados do paciente e não deve adicionar riscos,
Freqüência respiratória
apesar de certos índices só poderem ser medidos de
forma invasiva. A freqüência respiratória deve ser ajustada de
É importante salientar que o monitor é apenas acordo com a PaCO2 e o pH desejados e dependerá
um auxiliar e não pode ser substituído por uma do modo de ventilação escolhido, do nível de cons-
cuidadosa avaliação clínica à beira do leito. ciência e do espaço morto.
O fisioterapeuta deve conhecer e estar atento Em pacientes ventilados de forma assistida, al-
aos parâmetros do ventilador mecânico para pos- terações na freqüência respiratória podem sugerir
síveis alterações e ajustes necessários. anormalidades. A hipopnéia geralmente está rela-
cionada à depressão respiratória. A taquipnéia pode
Ventilometria ser causada por desconforto respiratório, agitação,
acidose metabólica, acúmulo de secreção ou ainda
Volume-corrente e volume-minuto por autotrigagem do aparelho.
Medidas de volume-corrente e volume-minu- Deve-se lembrar que a elevação da freqüência
to são facilmente obtidas em doentes intubados. respiratória pode promover aumento do trabalho

2520
SEÇÃO 25
respiratório e fadiga muscular, que favorecem a Pressão de pico inspiratório
Pr
retenção de CO2. Além disso, o tempo expirató-
Estudos têm demonstrado que picos elevados
rio diminuído pode provocar ou aumentar a auto-
de pressões inspiratórias e grandes variações de
PEEP.
volume de ar nos pulmões podem provocar lesões
no parênquima pulmonar, como alteração na pro-
Parâmetros ventilatórios dução de surfactante, na permeabilidade vascular,
Fração inspirada de oxigênio (FiO2) edema e lesões intersticiais.
O aumento da resistência de vias aéreas pode
É recomendável aumentar a FiO2 antes de iniciar estar relacionado com circuitos respiratórios dobra-
o procedimento de aspiração traqueal e observar a dos, acúmulo de água no circuito, secreções abun-
saturação percutânea de O2. O ideal é manter uma dantes, rolhas de secreção, cânula estreita, bronco-
FiO2 suficiente para obter SaO2 > 95%, sem expor espasmo ou ainda edema pulmonar, entre outros.
o paciente ao risco de toxicidade pelo oxigênio. O alarme de pico de pressão deve ser ajustado em
No entanto, com a utilização de dispositivos de torno de 40 cm H2O a fim de se evitar barotrauma.
sistema de aspiração fechado, as reduções abrup-
tas de saturação de oxigênio tornam-se menos fre- Mecânica ventilatória
qüentes.
Complacência
Sensibilidade Em condições estáticas (paciente relaxado), a
pressão nas vias aéreas é igual à pressão de reco-
A sensibilidade deve ser compreendida como
lhimento elástico do sistema respiratório. Assim,
o esforço despendido pelo paciente para disparar complacência é a medida da variação de volume
uma nova inspiração assistida pelo ventilador. por unidade de pressão aplicada, geralmente medi-
É recomendado o valor de 0,5 a 2 cm H2O da em ml/cmH2O.
abaixo do PEEP no sistema de disparo por pressão,
de modo que o sistema de disparo a fluxo é mais COMPLACÊNCIA ESTÁTICA
sensível, proporcionando melhor interação entre
A complacência estática informa sobre o esta-
ventilador e o paciente.
do do tecido pulmonar, podendo estar alterada em
A dificuldade na trigagem pode aumentar o doenças como pneumonia, síndrome do descon-
trabalho respiratório, gerando desconforto, fadiga forto respiratório agudo (SDRA), atelectasia e ede-
muscular e atraso no desmame. O autodisparo leva ma pulmonar.
à dessincronia entre paciente e ventilador. Durante a vigência de suporte ventilatório, a
Dentre os fatores que podem levar ao autodis- complacência estática é medida por meio da apli-
paro, podemos citar a presença de secreções, água cação de uma pausa inspiratória (platô ou inflation
no circuito ventilatório ou sensibilidade do ventila- hold) de 0,5 a 2 segundos, que simula um período
hold
dor regulada em valores absolutos baixos. de fluxo zero, sendo determinada pela fórmula:
Já dentre os fatores que dificultam o disparo,
está a regulagem da sensibilidade em valores eleva- volume-corrente
Cest =
dos, atraso da resposta da válvula de demanda, pre- Pressão de platô – PEEP
sença de auto-PEEP, uso de inaladores com fluxos
contínuos, uso de cateter de O2 intracânula utili- Seu valor normal situa-se entre 50 e 100 ml/cm
zado na técnica da TGI (tracheal gas insuflation) ou H2O. Valores acima de 30 estão associados com
uso de circuito muito complacente. desmame da prótese ventilatória bem-sucedido.

CAPÍTULO 201 2521


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA NA VENTILAÇÃO CONVENCIONAL
COMPLACÊNCIA DINÂMICA Por meio de sua monitorização, é possível a de-
tecção precoce de alterações no tônus das vias aére-
A complacência dinâmica dá informações sobre as, principalmente quando lidamos com pacientes
as propriedades resistivas do pulmão, podendo es- obstrutivos crônicos, na avaliação dos efeitos ad-
tar alterada por broncoconstrição ou secreção nas versos causados pela interposição de vias aéreas ar-
vias aéreas. tificiais, umidificadores, filtros e circuitos, na mo-
Pode ser mensurada com freqüência respiratória nitorização da eficácia do tratamento com drogas
definida, sendo uma forma de monitorização sensível broncodilatadoras e no desmame.
do aumento da resistência ao fluxo aéreo nas vias aére- Matematicamente, calcula-se a resistência pela
as de pequeno calibre. É determinada pela fórmula: fórmula:

Cdyn = volume-corrente
Pressão de pico – PEEP Raw = Pressão de pico – pressão de platô
Fluxo inspiratório
Seu valor normal situa-se entre 100 e 200 ml/
cm H2O. Níveis superiores a 30 são preditivos de
Auto-PEEP
desmame bem-sucedido.
Em pacientes submetidos à ventilação mecâni-
COMPLACÊNCIA EFETIVA ca, a auto-PEEP ocorre devido à presença de colap-
É a recíproca das propriedades elásticas do siste- so das vias aéreas que provoca limitação do fluxo
ma paciente-ventilador, corrigida pelo fator de com- aéreo, ou, mais freqüentemente, devido à freqüên-
pressão da máquina. É determinada pela fórmula: cia respiratória ou volume-corrente alto e tempo
expiratório curto.
volume-corrente A maneira mais simples de diagnosticar e quan-
Ceff =
Pressão de platô – PEEP total tificar a auto-PEEP consiste na oclusão da via ex-
piratória do ventilador antes do início de um novo
ciclo inspiratório, possibilitando o equilíbrio entre
Elastância as pressões alveolar, traqueal e a visualização no
Elastância e complacência são propriedades in- manômetro do ventilador. Alguns aparelhos pos-
versamente proporcionais, ou seja, quando uma suem um dispositivo facilitador dessa manobra.
aumenta a outra diminui e vice-versa.
Capnografia
Clinicamente, a elastância dos pulmões está di-
minuída na DPOC e aumentada nas fibroses in- A capnografia envolve a mensuração e o regis-
tersticiais. É determinada pela fórmula: tro gráfico do dióxido de carbono exalado ao fim
da expiração (PetCO2). O capnômetro é um ana-
E = ∆ pressão (cmH2O) lisador de CO2 que exibe sua concentração ou sua
∆ volume (ml) pressão parcial tanto no modo digital como por
ondas em tela de vídeo, permitindo também o seu
Resistência registro gráfico. As principais informações advindas
do capnógrafo incluem a pressão parcial do CO2
Inúmeras variáveis interferem na movimentação exalado ao fim da expiração (PetCO2), a freqüên-
do fluxo gasoso, dentre elas destacamos resistência cia respiratória e o capnograma (registro gráfico da
oferecida pelas vias aéreas do paciente, vias aéreas curva de CO2 em função do tempo, durante todo
artificiais e circuito do ventilador. o ciclo respiratório).

2522
SEÇÃO 25
Nessa monitorização, são definidas graficamente de luz infravermelha pelas vias aéreas. Conseqüen-
as fases do ciclo respiratório. Assim, na inspiração, temente, seu uso está restrito a pacientes intuba-
a concentração de CO2 no ar é zero; em seguida, dos. Sua resposta é mais rápida porque não precisa
quando o paciente começa a expirar, inicialmente de amostra e a representação gráfica da curva do
a taxa de CO2 não se eleva (fase I da curva), pois CO2 é mais fidedigna que no sistema aspirativo.
o ar que está saindo representa o gás das vias aére-
as de condução (parte do espaço morto anatômi- Alterações na monitorização da capnografia e
co). Na seqüência, nota-se elevação progressiva na capnometria
concentração do CO2, representada graficamente
por elevação do traçado em forma de S (fase II). O desvio da configuração normal do capno-
A seguir, vem a fase de equilíbrio ou platô, que re- grama deve ser investigado. Em pacientes com
presenta a saída do gás alveolar (fase III). O valor DPOC, o ar é expelido de alvéolos com diferentes
de pico atingido, ao final da fase III, é chamado de constantes de tempo, dando configuração bizarra
ao capnograma.
PetCO2. Esse valor representa, com boa aproxima-
ção, o CO2 alveolar. Normalmente, a diferença en- O achatamento ou a ausência do capnograma
tre a PaCO2 e o PetCO2 é mínima (< 4 mmHg). pode ser atribuído à desconexão do circuito respira-
tório, à parada respiratória/cardiorrespiratória, à em-
bolia pulmonar ou por alteração do tubo traqueal.
Volume-corrente
A diminuição da altura do capnograma pode ser
De modo geral, os capnógrafos empregam a ab- conseqüência de qualquer fator que aumente o es-
sorção seletiva do dióxido de carbono pela radiação paço morto, como hipotensão arterial.
infravermelha na determinação de suas concentra- O aumento na altura do capnograma pode ser
ções no ar exalado. Logo, quanto maior a absorção decorrente do aumento no metabolismo, como na
de luz, maior será a concentração de CO2 na mis- hipertermia ou na sepse, ou por CO2 liberado pela
tura analisada. Os capnógrafos por absorção de luz circulação, como durante laparoscopia ou infusão
infravermelha são classificados como aspirativos de bicarbonato.
(sidestream) ou não-aspirativos (maistream). Quando a linha de base do capnograma não re-
torna ao zero durante a inspiração, deve-se suspei-
Capnografia de sistema aspirativo tar de reinalação de CO2.
Possui câmara de absorção interna que recebe a A utilização da capnografia tem sido sugerida
amostra de gás a ser analisada, através de um tubo por aumentar a segurança do paciente sob assis-
que promove aspiração contínua de ar do circuito tência ventilatória. É um meio não-invasivo de de-
ou das vias aéreas. Esse sistema tem como princi- tectar problemas que podem ocorrer durante essa
pal vantagem sua aplicação em pacientes com ou assistência, como desconexão do ventilador, intu-
sem prótese ventilatória. O maior problema desse bação seletiva, embolia pulmonar ou hipertermia.
sistema é o vapor de água e a presença de secreções Quando utilizada em conjunto com a oximetria de
que podem ocluir o tubo, determinando medidas pulso, a monitorização de todos os movimentos
errôneas. respiratórios confere extraordinária segurança aos
profissionais e ao paciente, melhorando incrivel-
mente a qualidade da assistência ventilatória.
Capnografia de sistema não-aspi
não-aspirativo
As principais desvantagens da capnografia in-
O sensor é colocado no circuito do ventilador, cluem o preço elevado dos monitores, a necessi-
contendo um dispositivo que permite a passagem dade de calibração e manutenção constantes e sua

CAPÍTULO 201 2523


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA NA VENTILAÇÃO CONVENCIONAL
não-confiabilidade em pacientes com instabilidade niana, instabilidade hemodinâmica, pneumotórax
hemodinâmica. ou broncoespasmo.
O uso de válvula de PEEP conectada à bolsa
RECURSOS FISIOTERAPÊUTICOS de ressuscitação tem como objetivo reexpandir ate-
NA VENTILAÇÃO MECÂNICA lectasias, melhorar oxigenação, reduzir shunt pul-
monar e proteger os pulmões do estresse de estira-
As técnicas utilizadas pela fisioterapia em pa-
mentos. No entanto, altos níveis de PEEP podem
cientes sob ventilação mecânica devem ser utiliza-
diminuir o gradiente de pressão boca-alvéolos e
das para as diferentes condições de cada paciente.
conseqüentemente diminuir o pico de fluxo expi-
A seguir, são descritas as técnicas mais utilizadas.
ratório. Nesses casos, a manobra de hiperinsuflação
pode não ser efetiva como manobra de remoção de
Técnica da insuflação manual ou técnica de bag secreção.
squezing
Essa técnica, descrita inicialmente na década Umidificação
de 1960, é aplicada a pacientes em ventilação me-
O fisioterapeuta deve estar atento aos aspectos
cânica para incrementar a ventilação, desfazendo
da qualidade e quantidade das secreções respira-
atelectasias por hipoventilação e para melhorar a
tórias dos pacientes em ventilação mecânica. Os
oxigenação. Porém, seu grande efeito está relacio-
pacientes intubados e traqueostomizados perdem
nado à remoção de secreção pulmonar.
os processos naturais de fornecimento de calor e
A técnica consiste na realização de insuflação umidade para o ar inspirado. Um bom sistema de
pulmonar com uma bolsa ressuscitadora (AMBU), umidificação e aquecimento é necessário.
visando aumentar o volume pulmonar com fluxo A umidade é descrita como a quantidade de va-
de ar turbulento, mobilizando assim a secreção por de água presente em uma mistura gasosa. Pode
brônquica e estimulando o reflexo de tosse. A in- ser expressa de duas formas:
suflação com AMBU é realizada de forma única e
• umidade absoluta: é a massa de vapor de água
lenta, seguida pelo retorno do AMBU à sua posição
presente em um determinado volume de gás. É
inicial, permitindo a saída do ar de forma rápida.
expressa em mgH2O/l ou gH2O/m3. O valor é
Quando da realização da técnica, podemos as- proporcional ao aumento da temperatura. Umi-
sociar a instilação de soro fisiológico nos pacientes dade absoluta do gás saturado é a quantidade má-
com muco muito viscoso, a drenagem postural, xima de vapor de água no gás em uma determina-
que facilita a saída das secreções e também a mano- da temperatura antes que ocorra a condensação;
bra de vibrocompressão, que aumenta o fluxo expi- • umidade relativa: é a relação entre a umidade
ratório, auxiliando no descolamento das secreções. absoluta do gás e a umidade absoluta do gás sa-
A técnica de bag squezing deve ser realizada com turado a uma dada temperatura. É expressa em
cautela para evitar insuflações repetidas que elevam porcentagem.
muito o volume e as pressões pulmonares, poden- Em condições normais e naturais, o ar é aque-
do causar lesões no parênquima pulmonar. cido e umidificado principalmente pelas fossas
Essa técnica deve ser evitada em pacientes com nasais a uma temperatura aproximada de 33°C
a necessidade de pressão expiratória final (PEEP) com 100% de umidade relativa quando atinge a
maior que 10 cm H2O, para evitar o colapso de traquéia e a 37°C com 100% de umidade relativa
áreas que dependem da manutenção dessa pressão, quando atinge os alvéolos. O ideal é que o ar inspi-
bem como em pacientes com hipertensão intracra- rado atingisse esses valores nos pacientes intubados

2524
SEÇÃO 25
ou traqueostomizados para evitar ressecamento ou • hipertermia e queimaduras na vias aéreas;
umidificação excessiva, hipotermia ou hipertemia • excesso de água pode resultar em uma deficiên-
com risco de queimaduras. cia na atividade muco ciliada, produção de
Existem vários tipos de umidificadores: grande quantidade de muco, ou diminuição da
• HME (Heat Heat and Moisture Exchanger
Exchanger): trocado- viscosidade do muco comprometendo sua capa-
res de calor e umidade: consiste em um tipo de cidade de transporte.
filtro colocado entre o Y e a cânula de intuba-
ção ou traqueostomia que retém a umidade e o Inaloterapia
calor do ar expirado e é reaproveitado durante a
É um recurso utilizado em ventilação mecâ-
inspiração. Podem ser do tipo higroscópico (re-
nica para ofertar substância diretamente no trato
tém a água) ou hidrofóbico (repelem a água).
respiratório. Essas substâncias são principalmente
Alguns tipos de HME atuam também como fil-
soluções medicamentosas como broncodilatado-
tros de bactérias. É recomendável a troca a cada
res, antiinflamatórios, antibióticos, antifúngicos,
48 horas ou quando houver sujidade;
mucotrópicos, mucocinéticos, mucolíticos e soro
• aquecidos: consistem na passagem do ar inspirado fisiológico puro. É importante que essas soluções
seco e frio numa câmara com água previamente apresentem uma osmolaridade semelhante da mu-
aquecida. Podem ser classificados como: umidi- cosa das vias respiratórias para evitar edema, bron-
ficadores de passagem (o fluxo de ar passa sobre coespasmo, irritação e tosse. As medicações apli-
uma superfície aquecida de água e carregam o va- cadas por vias inalatórias são realizadas mediante
por de água) e umidificadores de bolhas (o fluxo a prescrição médica, mas o fisioterapeuta deve co-
de ar mergulha dentro de um conteúdo de água nhecer a colocação adequada do sistema de inalote-
aquecida através de um tubo). Os umidificadores rapia nos pacientes em ventilação mecânica.
de bolhas oferecem maior resistência à passagem
A inaloterapia nos pacientes em ventilação me-
de ar em comparação aos umidificadores de pas-
cânica pode ser feita por meio de:
sagem, não sendo indicados em pacientes com
baixos fluxos inspiratórios como os neonatos. • nebulizador ultra-sônico: o aerosol é produzido
pela vibração do cristal piezelétrico, que emite
Problemas com umidificação inadequada ou ex-
ondas ultra-sônicas na solução a ser nebulizada;
cessiva:
• nebulizador por jato pressurizado: o aerosol é
• espessamento do muco, diminuição da ativida-
produzido por meio da geração de um fluxo de
de ciliar, podendo levar à obstrução da via aérea,
alta velocidade da mistura de ar e da solução a
infecção, atelectasia e necrose do trato respirató-
ser nebulizada;
rio;
• dosadores de aerosol, MDI (metered-dose inha-
• umidade absoluta menor que 22 mgH2O/l faz
ler): o aerosol é produzido por intermédio da
ler
com que o fluxo do muco cesse;
liberação de um frasco sob pressão da medica-
• alterações histológicas: destruição da cília, de- ção em suspensão dentro de um solvente volátil,
sorganização do epitélio, descamação das célu- geralmente o clorofluorcarbonato (CFC).
las, ulceração da mucosa;
A colocação do inalador é importante para um
• comprometimento da função muco ciliado; melhor aproveitamento das partículas do aerosol. Em
• distúrbios estruturais e funcionais com apenas pacientes em ventilação mecânica que estão com sis-
10 minutos de ar seco; tema de umidificação aquecida, o inalador deve ser
• podem alterar mecânica respiratória e conduzir à colocado no ramo inspiratório (Figura 3). Em pacien-
hipoxemia (reduz CRF e complacência estática); tes em ventilação mecânica com sistema de umifica-

CAPÍTULO 201 2525


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA NA VENTILAÇÃO CONVENCIONAL
ção do tipo trocadores de calor e umidade (HME),
o inalador deve ser colocado entre o filtro HME e o
paciente (Figura 4). Nos dosadores de aerosol (MDI),
é importante o uso de um espaçador (Figura 5).
Alguns fatores interferem na eficácia da inalo-
terapia:
• umidade: favorece o crescimento higroscópico
das partículas do aerosol resultando em um me-
nor poder de penetração;
• temperatura: aumento de temperatura, mais
FIGURA 5 – Espaçador no ramo inspiratório.
leve fica o gás ofertado e mais pesado o aerosol
resultando em um menor poder de penetração;
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
• vias aéreas tortuosas, pequeno calibre, presença
de secreções: maior a impactação do aerosol. I Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica. J Pneu-
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2526
SEÇÃO 25
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CAPÍTULO 201 2527


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA NA VENTILAÇÃO CONVENCIONAL
CAPÍTULO 202
FISIOT E R A P I A R E S P I R ATÓ R I A E M
C ONDI Ç Õ E S E S P E C I A I S

Cilene Saghabi de Medeiros Silva


Sandra Sayuri Kanda
Ana Cristina Oliveira Gimenes
Nádia Maria Coraça

DESTAQUES
 Para prevenção de lesão secundária, o tratamento está relacionado à adequada oxigenação cerebral, à
redução da PIC e à adequada pressão de perfusão cerebral.
 O posicionamento no leito deve ser precoce e seguir alguns cuidados como evitar flexão cervical extre-
ma, rotação, inclinação ou hiperextensão que podem interferir no sistema de drenagem venoso jugular,
evitar flexão de quadril maior que 90º podendo limitar a drenagem venosa, evitar excessiva elevação da
cabeceira, pois poderá desencadear ↓ PA, ↓ da PIC e ↓ excessiva da PPC.
 A conduta fisioterapêutica não se aplica apenas à monitoração respiratória ou de parâmetros de ven-
tilação mecânica. Associam-se a esses cuidados as manobras de higiene brônquica, mobilização global
passiva, alongamentos globais e mobilização que proporcionem ou favoreçam a funcionalidade.

2529
INTRODUÇÃO piora do edema cerebral, isquemia e elevação da
pressão intracraniana (PIC).
A intervenção da fisioterapia na UTI se inicia
logo na admissão do paciente. O tratamento con- Fatores que podem levar às lesões secundárias:
elevação da PIC, hipotensão, hipocapnia, baixa da
siste em técnicas e monitorização sistemática do
hemoglobina, hipóxia e febre. Portanto, para preven-
quadro respiratório e motor, em que são traçadas
ção de lesão secundária, o tratamento está relaciona-
metas a serem atingidas por meio de um plano de
do à adequada oxigenação cerebral, redução da PIC
tratamento com objetivos específicos, visando a
e adequada pressão de perfusão cerebral (PPC).
funcionalidades a serem alcançadas.
Em pacientes com monitorização da PIC, ava-
Neste capítulo, abordaremos o papel da fisio-
lia-se a pressão de perfusão cerebral, medida como
terapia em algumas situações especiais, como ma-
a diferença entre pressão arterial média (PAM) e
nejar pacientes neurológicos e/ou neurocirúrgicos,
PIC média:
neuromusculares com fraqueza muscular rapida-
mente progressiva, lesados medulares na fase agu- PPC = PAM – PIC
da, neuropatia ou miopatia adquirida na UTI e Valor médio normal: PIC = 10 – 5 mmHg
grande queimado.
PPC = 60 – 95 mmHg (adulto)
FISIOTERAPIA NO PACIENTE
PPC = 50 – 80 mmHg (criança)
NEUROLÓGICO E/OU
NEUROCIRÚRGICO GRAVE Avaliação neurológica
Atualmente, o manuseio do paciente neuroló- Realizar avaliação sistemática antes, durante e
gico e/ou neurocirúrgico grave é atribuído a toda após cada procedimento. Nos pacientes sedados,
equipe multiprofissional. Para os cuidados, deve-se realizar inspeção das pupilas, presença de contra-
ter amplo conhecimento da fisiologia e fisiopato- ções musculares tonicoclônicas, presença de padrões
logia, dos problemas primários do sistema nervoso musculares, grau de sedação, podendo ser quanti-
central (SNC), alterações secundárias à patologia ficado estado de consciência por meio da escala de
clínica ou cirúrgica e das doenças neuromuscula- agitação e sedação (SAS), descrita na Tabela 1.
res. Em pacientes com lesões cerebrais severas não Em pacientes sem sedação, aavaliar estado de
ocorrem apenas distúrbios decorrentes das lesões consciência por meio da escala de coma de Glas-
primárias, mas também danos decorrentes de le- gow, realizar inspeção de pupilas, presença de pa-
sões secundárias, redução da oxigenação cerebral, drões espásticos ao repouso e durante estimulação

TABELA 1 – Escala de sedação – agitação (SAS)


7. Agitação perigosa Tentando retirar cateteres, tubo traqueal e sair do leito. Agressivo

6. Muito agitado Não se acalma, apesar de freqüentes pedidos e explicações. Requer restrição, morde o tubo traqueal

5. Agitado Ansioso e levemente agitado. Tenta sentar, acalma com instruções verbais

4. Calmo e cooperativo Desperta facilmente e obedece a comandos

3. Sedado Mais difícil de ser acordado. Acorda com estímulos verbais e táteis, mas dorme logo após, obedece a comandos simples

2. Muito sedado Desperta com estímulos físicos mais intensos, não se comunica ou obedece comandos. Pode mover-se espontaneamente

1. Sem resposta Sem contato, resposta mínima ou ausente aos estímulos nociceptivos

Riker RR, Picard JT, Fraser GL. Crit Care Med 1999.

2530
SEÇÃO 25
para movimentação, presença de contração toni- derar necessidade de ventilação não-invasiva após a
coclônicas, resposta do paciente aos comandos desintubação.
verbais, avaliação de força muscular, mobilidades Monitorização da PaCO2 e gás carbônico expi-
voluntárias, amplitude de movimentos (ADM) e rado (ETCO2): mudanças na pressão parcial de gás
presença de dor aos manuseios. carbônico normalmente associam-se à mudança no
fluxo sangüíneo cerebral (FSC) e extração cerebral de
Avaliação respiratória oxigênio (ECO2). Um aumento da PaCO2 aumenta
o FSC e diminui a ECO2. Portanto, mudanças na
Por meio da avaliação identificam-se alterações
PaCO2 referem-se à modalidade terapêutica, hiper-
respiratórias e a possibilidade de intervenção pre-
ventilação como tratamento do edema cerebral.
coce. Avaliar ritmo respiratório, observando fre-
qüência, profundidade e regularidade, podendo Cuidados com a cânula traqueal como: adequa-
caracterizar-se como hiperpnéia, taquipnéia, bra- do posicionamento (2 cm acima da carina), correta
dipnéia, respiração em suspiros, Cheyne-Stokes, fixação (evitar fixações que comprimem o sistema
atáxica (Biot) e obstrutiva. de drenagem cerebral), higienização e monitoriza-
ção da pressão do cuff.
Devem ser avaliados o uso de musculatura aces-
sória, batimento de asa de nariz, cianose, ausculta
pulmonar, deformidades estruturais, movimento e Cuidados especiais e sugestões de técnicas
utilizadas
assimetrias de caixa torácica, trocas gasosas (gaso-
metria e oximetria de pulso). Posicionamento no leito: evitar flexão cervical ex-
Nos pacientes com suporte ventilatório mecâni- trema, rotação, inclinação ou hiperextensão que po-
co e via aérea artificial, realizar sistematicamente a dem interferir no sistema de drenagem venoso jugu-
checagem de parâmetros ventilatórios em que ajus- lar, evitar flexão de quadril maior que 90º que poderá
tes indevidos do respirador podem gerar auto PEEP, limitar a drenagem venosa, evitar excessiva elevação
elevadas pressões nas vias aéreas, conseqüentemen- da cabeceira, pois poderá desencadear ↓ PA, ↓ da
te, aumento da pressão intratorácica, hipercapnia e PIC e ↓ excessiva da PPC. A mudança de decúbito
danos respiratório e hemodinâmico. A modalidade deve ser realizada precocemente, de acordo com as
inicial de escolha para esse grupo de pacientes é alterações da PIC e estabilidade hemodinâmica.
o volume-controlado (VC) por garantir o volume- Utilizar posicionamento de cabeça, tronco e
minuto. Caso haja comprometimento pulmonar, a membros visando à funcionalidade, evitando pa-
pressão controlada (PC) pode ser utilizada, porém drões patológicos, alterações musculares e articu-
com constante vigilância das alterações de volume- lares, podendo também favorecer e otimizar oxi-
corrente e conseqüentemente pressão arterial de genação e volumes pulmonares, reduzir trabalho
gás carbônico (PaCO2). respiratório e aumentar o clearance mucociliar.
Na fase inicial do desmame da ventilação mecâ- Mobilizações no leito: pode ser utilizado um
nica, pode-se utilizar como modalidade de escolha conjunto de técnicas com objetivo de reduzir os
a ventilação mandatória intermitente sincronizada efeitos da imobilidade e permanência no leito, es-
(SIMV) + pressão suporte (PS), com objetivo de timulações para retorno de suas funcionalidades e
garantir algumas ventilações e permitir nos mo- atividades de vida diária (AVDs).
mentos de respiração espontânea a assistência da Manobras de higiene brônquica como drena-
PS e melhor sincronização paciente e respirador. gem postural, vibração e percussão torácica e aspi-
Porém, logo que se restabeleça o ritmo respiratório, ração traqueal com objetivo de auxiliar na remoção
utilizar PS e SIMV, apenas como suspiros. Consi- da secreção pulmonar.

CAPÍTULO 202 2531


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
Em pacientes com reflexos intactos, a tosse pode poxemia), aumento da freqüência respiratória e da
resultar em um aumento da pressão intratorácica, freqüência cardíaca, fraqueza da musculatura ins-
da freqüência cardíaca (FC) e PA, podendo causar piratória e expiratória, facial, laríngea, orofaríngea,
hipóxia e hipercapnia transitória. Essas alterações microatelectasias, hipoxemia e hipercapnia.
aumentam o volume e fluxo cerebral, elevando a Na esclerose lateral amiotrófica (ELA), os sinais
PIC, podendo ser necessário avaliação médica e de insuficiência respiratória surgem quando a capa-
otimização da sedação e/ou bloqueadores neuro- cidade vital (CV) reduz-se em 50% do seu valor pre-
musculares, hiperoxigenação e hiperventilação an- visto. Na miastenia gravis, há envolvimento precoce
tes do procedimento. da musculatura ocular, fraqueza facial e orofaríngea,
A cinesioterapia respiratória é realizada de acordo com disfagia, disartria, risco de broncoaspiração, de
com a capacidade de colaboração do paciente, poden- modo que 30% dos pacientes podem evoluir com
do ser substituída pelo exercício com pressão positiva fraqueza muscular respiratória. Na síndrome de
intermitente. No entanto, seu uso deve ser criterioso, Guillain-Barré (produção de anticorpos e imuni-
a fim de evitar complicações como pneumoencéfalo dade celular contra a mielina), 50% dos pacientes
nos pacientes em pós-operatório de craniotomia. admitidos em UTI têm história de infecção recen-
te, geralmente respiratória, desencadeando quadro
O uso de ventilação não-invasiva como o BiPAP
de fraqueza muscular ascendente, reflexos tendíneos
ou CPAP está indicado em casos de hipoventilação
abolidos e fases de progressão, que variam de 3 a 21
severa, que comprometa as trocas gasosas ou em
dias, fase platô com duração média de 6 a 8 semanas
pacientes que apresentam hipertonia com alteração e fase de convalescença que pode chegar até a 2 anos.
da mecânica respiratória. A falência respiratória cursa com quadro de hipo-
É freqüente a alteração da deglutição nesses pa- ventilação, redução da capacidade vital e dos fluxos
cientes devido ao comprometimento do XII par cra- expiratórios, com dispnéia e grande dificuldade para
niano e a paralisias faciais, ocasionando hipersecreção eliminar secreções pulmonares.
pulmonar devido à aspiração de saliva e/ou alimento.
Avaliação respiratória
FISIOTERAPIA NAS DOENÇAS
NEUROMUSCULARES Consiste na caracterização clínica do compro-
metimento respiratório, considerando-se:
As doenças neuromusculares (DNM) represen- • confusão;
tam um grande grupo de afecções que comprometem
• agitação;
a unidade motora, ou seja, o corpo celular do neurô-
nio motor inferior, o prolongamento axonal, a junção • letargia;
neuromuscular ou o tecido muscular esquelético. • cefaléia matinal;
O quadro clínico geral das DNM apresenta-se • dispnéia;
como: alterações da motricidade e da sensibilidade, • uso de musculatura acessória;
com diminuição dos reflexos tendinosos, flutuação • retração intercostal e supraesternal;
da fraqueza muscular ou fraqueza rapidamente
• batimento de asa do nariz;
progressiva. O acometimento de maior risco é o da
musculatura respiratória. Cronicamente, os sinais • ortopnéia;
são de dispnéia, ortopnéia, piora da qualidade do • monitoração de PImáx e PEmáx;
sono, fadiga e cefaléia matinal. A falência respira- • radiografia de tórax com objetivo de avaliar
tória aguda cursa com queda do volume-corrente e imagem sugestiva de pneumonia, atelectasia ou
da capacidade vital (antes do aparecimento da hi- elevação de cúpula diafragmática;

2532
SEÇÃO 25
• avaliação dos gases arteriais, sinais de hipoventi- racterizar o pacientes como: baixo, médio e alto
lação alveolar (↑ PaCO2, ↓ PaO2); risco, como descritos na Figura 2.
• a mensuração constante da CV detecta não só o Em relação ao suporte ventilatório, a indicação
grau de insuficiência respiratória como também de ventilação mecânica invasiva, em que o objetivo
sinais fisiopatológicos e a necessidade de indica- é repouso muscular, opta-se por ventilação contro-
ção de ventilação não-invasiva (VNI), intuba- lada, com volume-corrente variando de 06 a 08 ml/
ção endotraqueal e traqueostomia já que 16% kg, a PaCO2 entre 35 e 45 mmHg, pressão positiva
dos pacientes necessitam de UTI e 48% cursam expiratória final (PEEP) 5 a 10 cmH2O, manuten-
com intubação de urgência. ção da SaO2 acima de 95%. Como critérios de des-
A indicação de VNI se faz para pacientes com mame da VM, sinais clínicos de melhora da força
DNM que, na descompensação aguda, não te- muscular, CV > 10 ml/kg, FiO2 < 40% e PEEP <
nham quantidade excessiva de secreção pulmonar ou igual a 10 cmH2O. Estabilidade hemodinâmica,
e para o desmame da ventilação mecânica invasiva infecciosa e radiológica e PS < 10 cmH2O. Deve-
de pacientes que ainda necessitam de suporte ven- se considerar o uso de VNI após desintubação do
tilatório. Sugerem-se modalidades com dois níveis paciente. A indicação de traqueostomia pode ser
pressóricos. considerada quando há risco de broncoaspiração,
lesão laríngeo-traqueal e indivíduos que apresentam
Sua aplicação segue os critérios de Rooper, necessidade de intubação por mais de 14 dias.
como descritos na Figura 1.
A conduta fisioterapêutica não se aplica apenas
A indicação de internação em UTI e de VNI à monitorização respiratória ou de parâmetros de
de pacientes com DNM pode obedecer ainda os
critérios de: CV < 20 ml/kg, PImáx: < -30 cmH2O
e PEmáx < + 40 cmH2O, como mostra Figura 2.
A partir da mensuração da CV e das pressões CV
inspiratórias e expiratórias máximas, é possível ca- Baixo risco Alto risco
Médio risco

CV < 65 ml/kg ↓ da CV de 4 a 6h
Fisiopatologia respiratória Atuação ventilatória CV < 30 ml/kg
Paresia orofaríngea
↓ tosse, atelectasia, Fisioterapia CV 8/8h Broncoaspiração
65 ml/kg CV 6/6h Fadiga respiratória
início de hipoxemia respiratória Vias pérvias
(normal) Indicação
SaO2 > 93%
↓ suspiro, de VNI
30 ml/kg Inspirômetro de CV < 15 ml/kg
atelectasia Vias pérvias
incentivo
+ shunt 20 ml/kg Se CV > 30 ml/kg SaO2 > 93%
IOT
15 ml/kg BiPAP
Hipoventilação
VM, ↓ PaCO2, Indicação de desmame
C 10 ml/kg V Repouso,
Hipercapnia fadiga estabilização clínica
5 ml/kg
Ventilação total
Se CV > 30 ml/kg CV < 30 ml/kg
FIGURA 1 – Relação entre a capacidade vital, fisiopatologia e fun-
ção pulmonar em pacientes com DNM. Adaptado de Rooper AH: ICU Manter IOT
management of acute inflammatory-postinfectious polyneuropathy
(Landry-Guillain-Barré-Strohl syndrome). In: Bella I, Chad D. Neu- FIGURA 2 – Caracterização relacionada ao risco de complicação res-
romuscular disorders and acute respiratory failure. Neurologic Clin piratória com base nos valores de capacidade vital, levando a indicação
North Am 16:2, 1998. de internação na UTI, uso de VNI ou intubação orotraqueal (IOT).

CAPÍTULO 202 2533


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
ventilação mecânica. Associam-se a esses cuidados ção nervosa sendo sempre necessário o diagnóstico
as manobras de higiene brônquica, mobilização diferencial da síndrome de Guillain-Barré.
global passiva, alongamentos globais e mobilização Prospectivos estudos, utilizando testes neurofi-
que favoreçam a funcionalidade. Considera-se o uso siológicos, revelaram que a miopatia e/ou neuropa-
de cinta abdominal e posicionamento do paciente tia está presente em 52% a 57% dos pacientes que
no leito, específico às suas necessidades (Tabela 2). permaneceram em UTI por mais de sete dias, 68%
a 100% dos pacientes com sepse ou SIRS, em que
FISIOTERAPIA NA mais de 50% dos pacientes que recebem ventilação
POLINEUROPATIA DO PACIENTE mecânica superior a sete dias desenvolveram altera-
CRÍTICO ções eletrofisiológicas, e 25% a 33% apresentaram
Algumas terminologias são também utilizadas evidência clínica. Como conseqüência, aumentam
para descrever a polineuropatia do paciente crítico: custo hospitalar, mortalidade e morbidade. Suge-
anormalidade neuromuscular do paciente crítico, re-se que a patogenia está relacionada à sepse ou
desordem neuromuscular e paresia adquirida na SIRS, durante a qual ocorre distúrbio da microcir-
UTI, ou ainda miopatia aguda quadriplégica. culação, perda da auto-regulação dos vasos sangüí-
neos que suprem os nervos periféricos e liberação
A desordem neuromuscular adquirida na UTI
é de natureza axonal, predominantemente motora, de citocinas que aumentam a permeabilidade dos
simétrica, aguda, de gravidade variável e normal- vasos, resultando em edema endoneural. Este leva
mente não ocorre desautonomia. Acomete prin- à hipóxia e degeneração axonal de fibras sensitivas
cipalmente membros inferiores com predomínio e motoras.
distal, ocorrendo redução dos reflexos tendinosos Segundo dados da literatura, no período de seis
e da massa muscular, levando a um quadro de te- meses ocorre a normalização da condução nervosa,
traparesia ou plegia e dificuldade no desmame da com tempo médio de ventilação mecânica de 52
ventilação mecânica. Desenvolve-se predominan- dias em polineuropatia moderada e 136 dias em
temente em pacientes com síndrome da resposta polineuropatia grave.
inflamatória sistêmica (SIRS), sepse e falência de Um dos problemas a serem abordados é a imo-
múltiplos órgãos, estando também associada à uti- bilidade no leito que leva a efeitos fisiológicos em
lização de bloqueador neuromuscular, corticoes- diferentes órgãos e sistemas. O início precoce da
teróides, má nutrição, antibióticos neurotóxicos e reabilitação nesses pacientes é de fundamental im-
imobilidade no leito. portância, pois tem como objetivo o restabeleci-
O diagnóstico é dado por achados eletroneuro- mento das funções físicas, psicológicas, sociais, vi-
miográficos, biópsia muscular ou estudo de condu- sando sempre ao funcional de acordo com as limi-

TABELA 2 – Principais condutas descritas em ELA, SGB e MG


Doença neuromuscular (DNM) Conduta motora Conduta respiratória Treinamento muscular

ELA (esclerose lateral amiotrófica) Redução de dor, mobilização Exercício diafragmático, SMI (em Não há indicação formal na literatura
articular, alongamento, tempos), tosse, aspiração traqueal
posicionamento, poltrona (s/n), BiPAP

SGB (síndrome de Guillain-Barré) Idem, exercícios ativo-assistidos e Idem, monitorização ventilatória e Em acordo com evolução clínica
ativo-resistidos (evolução clínica) da VM (pós-fase aguda)

MG ((miastenia gravis) Redução de dor, mobilização Idem, monitorização ventilatória e Em acordo com evolução clínica
articular, alongamento, da VM (pós-fase aguda)
posicionamento, poltrona Não indicada em crise miastênica

2534
SEÇÃO 25
tações impostas pela doença. Os principais efeitos
da imobilidade em órgãos e sistemas são:
• redução dos volumes e capacidades pulmona-
res na posição supina: queda da capacidade vital
(CV) de 2%, capacidade pulmonar total (CPT)
de 7%, do volume residual (VR) de 19% e da
capacidade residual funcional (CRF) de 30%;
• redução da capacidade de tossir;
• atelectasias e pneumonias;
• redução da força, resistência e flexibilidade mus-
cular;
• redução da massa muscular (perda de 2,3% da
massa magra e aumento de 12% da massa gorda FIGURA 3 – Exercício sem ação da gravidade.
em cinco semanas);
• risco de lesão nervosa periférica por compressão
nervosa;
• contraturas articulares;
• osteopenia e osteoporose;
• redução do volume cardíaco;
• redução da circulação periférica;
• riscos de desenvolver embolia pulmonar e trom-
bose venosa;
• redução da mobilidade gastrintestinal;
• infecção urinária;
• úlceras de pressão;
• depressão. FIGURA 4 – Exercício de funcionalidade.

Cuidados especiais e sugestões de técnicas Sistemática monitorização da função respira-


utilizadas tória deve ser acompanhada, principalmente nos
Nesse grupo de pacientes, é utilizado um con- pacientes em que foi iniciado processo de desma-
junto de técnicas com objetivo de prevenir, redu- me da ventilação mecânica. É recomendada pela
zir e/ou tratar os efeitos da imobilidade. Inicia-se literatura avaliação de força muscular respiratória
com posicionamento e mobilizações de cabeça, principalmente nos pacientes com mais de sete dias
tronco e membros. Utilizar técnicas com objetivos em ventilação mecânica. Iniciar assim que possí-
funcionais sem esforço excessivo pela facilidade de vel modalidades ventilatórias assistidas e planejar o
desenvolver fadiga muscular. Sugerem-se exercícios processo de desmame da ventilação mecânica para
passivos, assistidos, muitas vezes na fase inicial sem desintubação. Nesse processo, ficar atento a sinais
ação da gravidade (Figuras 3 e 4), estímulo para de fadiga respiratória e detectar precocemente o
mudanças posturais no leito e a longo prazo com motivo da dificuldade de retirada do ventilador.
melhora da função muscular realizar exercícios Considerar necessidade de VNI após desintubação.
mais intensos como ativos e resistidos. Nesse grupo de pacientes, a necessidade de traque-

CAPÍTULO 202 2535


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
ostomia deve ser considerada pelo prolongamento ou não à rotação. A coluna cervical é comumente a
da ventilação mecânica acompanhada da compro- mais afetada devido à sua mobilidade.
metimento da função muscular.
O treinamento muscular respiratório e/ou esti- Classificação das lesões
mulação elétrica transcutânea diafragmática é uma
1. Lesão medular completa: há perda da função
terapêutica que pode ser utilizada nos pacientes
motora e de todas as modalidades sensitivas
com dificuldade de desmame da ventilação mecâ-
(tátil, térmica, pressão e localização de parte do
nica por fraqueza da musculatura respiratória, po-
corpo no espaço) abaixo da lesão e alteração es-
rém existem poucas evidências na literatura. Nesse
fincteriana (urinário e fecal).
grupo de pacientes, por apresentarem importante
perda de massa e força muscular, deve-se ter ade- 1.1. Secção completa da medula.
quado acompanhamento do suporte nutricional, 1.2. Esmagamento transversal total da medula
metabólico, infeccioso e hemodinâmico para que 2. Lesão medular incompleta: preservação parcial
o exercício tenha objetivo não-deletério. tanto da função motora ou da função sensitiva
abaixo do nível neurológico.
FISIOTERAPIA NO 2.1. Concussão.
TRAUMATISMO RAQUIMEDULAR
– FASE AGUDA 2.2. Contusão.
2.3. Laceração.
A maior parte das lesões medulares acontece
2.4. Compressão.
devido a um traumatismo na coluna vertebral. Os
traumas podem causar fratura do osso vertebral, 2.5. Hemorragia.
compressão medular, ruptura dos ligamentos verte- 2.6. Edema.
brais, deslocamento ósseo, pinçamento, contusão, Determina-se o grau de lesão medular geralmen-
edema, hemorragia ou não, ou então provocar uma te 72 horas após o trauma. O exame neurológico
ruptura da medula e/ou de suas raízes nervosas. consiste na avaliação da sensibilidade, da função
A lesão com preservação dos segmentos da me- motora e dos reflexos tendinosos, não apresentan-
dula abaixo do nível da lesão geralmente produz do relação direta com o nível da fratura vertebral.
uma lesão do tipo neurônio motor superior (NMS) A área de sensibilidade do paciente é examinada no
ou paralisia espástica. Os reflexos intrínsecos não sentido craniocaudal.
poderão ser inibidos devido à lesão e tornar-se-ão As lesões cervicais continuam sendo um dos
hiper-reflexos levando ao aumento do tônus mus- maiores problemas da medicina moderna, sendo o
cular, espasmo e espasticidade. impacto social e financeiro. As alterações e compli-
A lesão do cone medular, sem preservação do cações pulmonares são as maiores causas da mor-
segmento medular, abaixo do nível da lesão, ou bimortalidade e podem desenvolver complicações
uma lesão de cauda eqüina, produz uma lesão do respiratórias.
tipo neurônio motor inferior (NMI) ou paralisia O comprometimento da musculatura respi-
flácida. Nesse tipo de lesão, o estímulo não pode ratória está de acordo com o nível da lesão como
atingir a medula, e os reflexos e tônus muscular mostra o mapa segundo a classificação respiratória
permanecem diminuídos ou ausentes (flácidos). funcional (Tabela 3).
As lesões podem ser causadas por fratura ou lu- Lesão abaixo de C5, a inervação do diafragma
xação, podendo ocasionar compressão medular nos deve estar intacta, com uma capacidade inspiratória
diversos movimentos: flexão/extensão, associados de aproximadamente 60% do predito e moderada

2536
SEÇÃO 25
TABELA 3 – Classificação respiratória funcional
Nível da lesão Diafragma Acessórios Intercostais Abdominais

C2 Ausente Ausente Ausente Ausente

C4 Comprometimento parcial Presente Ausente Ausente

C6 Presente Presente Ausente Ausente

T4 Presente Presente Comprometimento parcial Ausente

T10 Presente Presente Presente Comprometimento parcial

T12 Presente Presente Presente Presente

redução da PImáx. Como conseqüência, paralisia testinal, disfunção urinária, disreflexia autonômica,
dos músculos expiratórios (abdominais e intercos- siringomielia, desnutrição, hipotensão ortostática e
tais), ocorre uma redução da PEmáx e volume de calcificação heterotópica.
reserva expiratório (VRE), apresentando severo
comprometimento da capacidade de tossir. Lesão Cuidados especiais e sugestões de técnicas
acima de C5 (C3 – C4 ou C4 – C5), com parcial utilizadas na fase aguda
envolvimento do diafragma. Lesões em nível de
C1 – C2 causam completa paralisia dos músculos Avaliação respiratória
respiratórios, sendo obrigatório o suporte ventila- Consiste em uma maior vigilância na fase aguda
tório contínuo. Pacientes com comprometimento do controle gasométrico avaliando PaO2 e PaCO2,
do diafragma podem estar com a capacidade vital radiografia de tórax, ausculta pulmonar, padrão
(CV) menor de 50% do predito. Estudos mostram respiratório, eficácia e conteúdo da tosse, medidas
que nestes pacientes 74% requerem intubação e de CV, CI, PImáx e PEmáx, em que se pode carac-
40% desenvolvem pneumonia, de modo que pa- terizar a gravidade do paciente e traçar condutas fi-
cientes com quadriplegia completa, 90% necessi- sioterapêuticas, monitorização respiratória seriada
tam de intubação comparados a 48,5% com qua- e assistência ventilatória invasiva ou não-invasiva.
driplegia incompleta.
A intervenção fisioterapêutica precoce do pa-
Pela fraqueza dos músculos, há uma expansão ciente na UTI tem objetivos respiratórios especí-
paradoxal do abdômen, podendo reduzir o aumen- ficos como: prevenir ou tratar a fadiga muscular
to da pressão intratorácica e aumentar o grau de co- respiratória, hipoventilação pulmonar, adequada
lapso das vias aéreas. Recente estudo constatou que higiene brônquica, podendo-se utilizar técnicas
a PeMáx foi a variável que obteve menores valores variáveis como manobras de higiene brônquica e
em indivíduos tanto com lesão torácica ou lombar exercícios de expansão pulmonar.
em que há comprometimento dos músculos da ex- Em pacientes com indicação de VNI, dar prefe-
piração forçada, principalmente os abdominais. rência para a modalidade com dois níveis de pressão
As complicações respiratórias mais comuns (BiPAP) com objetivo de reduzir o trabalho respi-
nos pacientes com lesão cervical alta são: alteração ratório, recrutamento de unidades alveolares, con-
da mecânica respiratória, hipoventilação alveolar, seqüentemente, melhorando trocas gasosas e volu-
pneumonia, broncoaspiração, embolia pulmonar e mes pulmonares. Porém existem poucas evidências
apnéia do sono. Os problemas associados podem na literatura nesse grupo de pacientes que possam
ser: pneumonia/infecções, trombose venosa, úlce- comprovar a redução da necessidade de suporte
ras por pressão, contratura articular, disfunção in- ventilatório invasivo. Sendo necessária a utilização

CAPÍTULO 202 2537


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
da ventilação mecânica invasiva, deixar em repouso Outros objetivos como prevenir lesões cutâneas,
muscular por 24 a 48 horas. Após estabilidade clí- padrões posturais patológicos, contraturas, defor-
nica, utilizar modalidades assistidas, monitorando midades e redução de quadros álgicos fazem par-
sinais de fadiga e medidas ventilatórias. te do processo de reabilitação logo na fase aguda,
Sugere-se o uso da cinta abdominal cujo ob- podendo-se utilizar técnicas variadas respeitando
jetivo é melhorar a complacência abdominal, au- suas limitações clínicas. O posicionamento funcio-
mentando a pressão intra-abdominal e facilitando nal adequado de todo o corpo pode ser realizado
a mecânica respiratória. utilizando acessórios como: travesseiros, toalhas,
Para indicar treinamento muscular respiratório, splints, versaform, rolos etc. Devem fazer parte não
devemos lembrar alguns conceitos: só do plano de tratamento, mas também do plano
• fraqueza muscular: é a dificuldade de um mús- educacional da equipe multiprofissional. Exercícios
culo gerar força. A fraqueza não é reversível com no leito, alongamento, mudanças posturais são en-
o repouso; fatizadas com objetivos funcionais minimizando os
riscos desenvolvidos pela imobilidade, alteração de
• fadiga muscular: é a incapacidade do músculo
em manter atividade por determinado tempo. tônus e sensibilidade.
A força pode estar normal, mas o músculo não Considerar na fase de maior estabilidade clíni-
tem resistência para se manter em atividade. A ca a utilização da prancha ortostática por ser uma
fadiga é reversível com repouso de aproximada- ferramenta para facilitar o ortostatismo, aumentar
mente 24 horas. pressão de membros inferiores, auxiliar no alinha-
O treinamento muscular respiratório pode ser mento corporal e proprioceptivo e adaptação he-
uma terapêutica aplicada em pacientes com diag- modinâmica. Durante esta terapêutica é recomen-
nóstico de fraqueza muscular, ainda não muito evi- dada a utilização da meia elástica para facilitar o
dente na literatura. O objetivo da técnica é tentar retorno venoso.
resgatar o máximo de fibras musculares íntegras,
principalmente em lesões incompletas. Secundaria- ATENDIMENTO
mente espera-se incrementar o treinamento mus- FISIOTERAPÊUTICO DO
cular, ou seja, associar as técnicas de eletroestimu- PACIENTE GRANDE QUEIMADO
lação às convencionais (alteração da sensibilidade
A sobrevivência do paciente grande queima-
do ventilador e treinadores lineares pressóricos).
do sempre foi vista como uma enorme conquis-
Esse tipo de tratamento é indicado quando te- ta diante do alto índice de mortalidade, de modo
mos a funcionalidade envolvida. Para tanto, é ne- que, no âmbito hospitalar, a fisioterapia tem influ-
cessária análise da condução nervosa do frênico, ência direta sobre a manipulação da área queimada
por meio de eletroneuromiografia, avaliação da e enxertada para um resultado funcional e estético
mobilidade das cúpulas diafragmáticas mensuradas
satisfatório.
pela ultra-sonografia.
Devido à alta complexidade dos cuidados exigi-
dos, os procedimentos e recursos disponíveis atuam
Avaliação neurológica
como coadjuvantes podendo ser adaptados para es-
Deve ser realizada por meio da escala ASIA ses pacientes, tendo como objetivos gerais prevenir
(
(American Spinal Injury Association) padrão inter- ou diminuir complicações clínicas e funcionais,
nacional, que sistematiza o exame neurológico, diminuir morbimortalidade, retorno rápido e efi-
classificando a lesão como completa ou incompleta ciente às atividades de vida diária, envolvimento
e determinando o nível da lesão. familiar e qualidade de vida global.

2538
SEÇÃO 25
A imobilização prolongada do paciente grande Na admissão ou hospitalização em fase aguda,
queimado, principalmente após os enxertos, fa- a avaliação minuciosa e detalhada visa identificar
vorece a colonização de bactérias, prolongando a a severidade e extensão da área queimada, que são
permanência hospitalar e dependência para as ati- determinantes necessários para se adequar a con-
vidades de vida diária, podendo causar comprome- duta, avaliar a necessidade de suporte ventilatório,
timentos secundários que jamais são confinados a programar a terapia no centro cirúrgico, enfati-
um único sistema corporal. A reserva funcional fica zando o atendimento fisioterapêutico freqüente,
reduzida, levando a fraqueza e atrofia muscular, precoce e intensivo. O propósito do plano de re-
deformidades articulares e músculo-esqueléticas, abilitação inclui objetivo a curto e longo prazos
comprometimento do sistema cardiorrespiratório, que facilitam a monitoração do progresso ou per-
endócrino, locomotor e neuromuscular. É um pro- da de funções.
cesso mutável, sendo um desafio constante para o
profissional.
Atendimento fisioterapêutico no centro
O comprometimento articular, músculo-esque- cirúrgico
lético e a perda de habilidades específicas depen-
dem da localização, profundidade e extensão da O principal objetivo é atingir a amplitude má-
área queimada. No entanto, quanto maior a área xima de movimento articular sob efeito anestésico,
queimada, maior a probabilidade e evolução para bem como o contato com a equipe médica e acom-
perdas funcionais. São considerados como critérios panhamento dos curativos, visualização das áreas
de internação: queimadas, enxertadas e doadoras. A manipula-
• queimaduras de 2o e 3o graus com mais de 10% ção é iniciada após sedação, retirada do material
da superfície corporal (SC) em pacientes < 10 contaminado e limpeza do curativo, devendo ser
ou > 50 anos; evitados movimentos bruscos e micro-hemorragias
• queimaduras de 2o e 3o graus com mais de 20% durante e após o contato manual feito por meio de
da SC em qualquer idade; procedimentos estéreis (Figura 5).
• queimaduras de 2o e 3o graus em áreas críticas
(face, períneo, mãos e pés); Objetivos respiratórios específicos
• queimaduras de 3o grau com mais de 5% da su- A integridade da função respiratória pode ser
perfície corpórea; feita por meio de abordagens terapêuticas que in-
• queimaduras elétricas; cluem a manutenção da saturação de O2 > 93%,
• lesão inalatória e queimaduras circunferenciais, manter força muscular respiratória e capacidade
químicas e pacientes com doenças crônicas. cardiorrespiratória, higiene brônquica e expansão
Muitos pacientes apresentam queimadura na ca- pulmonar.
beça, no tronco, nos membros superiores e em vias Alguns estudos mostram que, devido aos cura-
aéreas, podendo evoluir para intubação orotraqueal tivos no centro cirúrgico, o paciente grande quei-
e ventilação mecânica. Alguns estudos mostram que mado pode apresentar, no período pós-anestésico,
a infecção respiratória é a principal causa de morbi- uma diminuição significativa da PImáx e do vo-
mortalidade e que pode atingir uma taxa de 50% lume-corrente (VT) que pode levar à hipercabia,
desses pacientes se os mesmos estiverem sob ven- com PCO2 maior que 50 mmHg, devendo consi-
tilação mecânica, podendo aumentar o tempo de derar, sempre que houver necessidade de suporte
permanência hospitalar que varia em média de um ventilatório, o protocolo para desmame difícil de
a quatro dias por porcentagem de área queimada. ventilação mecânica.

CAPÍTULO 202 2539


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
FIGURA 5 – Mobilização no centro cirúrgico.

Objetivos motores específicos


Nos objetivos gerais são expressas atividades
funcionais, podendo ser modificadas por meio da
avaliação contínua dos resultados após cada tera-
pia, para poder determinar a eficácia da atividade e
sessão terapêutica e, então, modificar o tratamento
quando necessário. Deve-se enfatizar a amplitude
do movimento articular e a força muscular, a pre-
venção de deformidades, retrações e complicações
ósteo-articulares, estimular precocemente coorde-
nação, equilíbrio, controle de tronco, ortostatismo
e marcha, buscando alcançar o mais elevado nível
funcional, independência para habilidades especí-
ficas e atividades da vida diária (Figura 6).
A imobilidade prolongada, o posicionamento
inadequado, a manipulação com movimentos rá-
pidos e bruscos, a ausência do reflexo de proteção
da dor, as deformidades e aderências cicatriciais e
a perda significativa da força muscular podem fa-
vorecer o aparecimento de calcificações heterotópi-
cas e prejudicar ou agravar a aquisição das funções
motoras. FIGURA 6 – Prancha ortostática e enfaixamento dos MMII.

da, liberar as articulações sempre que possível para


Cuidados especiais e sugestões de técnicas
não prejudicar a mobilização do membro, realizar
utilizadas
enfaixamento compressivo dos membros inferiores
Deve-se dar ênfase ao posicionamento e à ma- em posição ortostática e medir pressão arterial no
nipulação cuidadosa da área queimada e enxerta- início e durante as transferências posturais. Respei-

2540
SEÇÃO 25
tar o tempo de imobilização sugerido pela equipe BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
médica durante a fase de enxertia, que pode variar
Adler SS, Beckers D, Buck M. Método Kabat – facilita-
de três a sete dias para enxertos de pele e sete a 21
ção neuromuscular proprioceptiva (PFN) – um guia
dias quando houver enxerto de pele artificial. ilustrado. São Paulo, Manole, 1999.
Avendano M, Güell R. Rehabilitation in patients with
Tratamento neuromuscular and chest wall diseases. Arch Bron-
coneumol 39(12):559-65, 2003.
A abordagem terapêutica em ambiente esté-
ril pode ser realizada por: exercícios passivos com Bella I, Chad D. Neuromuscular disorders and acute
respiratory failure. Neurologic Clin North Am 16:2,
enfoque no método Kabat (Figura 7) – facilitação
1998.
neuromuscular proprioceptiva, massagens de fric-
Cruz J. Neurointensivismo. São Paulo, Atheneu, 2002.
ção no sentido das fibras musculares para minimi-
zar as aderências cicatriciais, manter os membros Deem S, Lee CM, Curtis JR. Acquired neuromuscular
disorders in the intensive care unit. Am J Respir Crit
que foram manipulados em posições de alonga-
Care Med 168:735-9, 2003.
mento até que todo procedimento seja realizado e
auxiliar o enfaixamento das áreas queimadas com Dejongle B, Sharshar T, Hopkinson N et al. Paresis
following mechanical ventilation. Curr Opin Crit
enfoque na funcionalidade.
Care 10:47-52, 2004.
O cuidado intensivo visa enfatizar mudanças de Demling RH, Crawford G, Lind L et al. Restrictive
decúbito a cada 2 horas, posicionamento adequa- pulmonary dysfunction caused by the grafted chest
do, exercícios passivos, ativos-assistidos e ativos-li- and abdominal burn. Crit Care Med 16(8):743-7,
vres sugeridos duas vezes ao dia, treinamento mus- 1988.
cular respiratório se PiMáx < -30 cm H2O, mano- Goldman JM, Rose LS, Willians SJ et al. Effect of abdo-
bras de higiene brônquica, exercícios com RPPI, minal binders on breathing in tetraplegics pacients.
incentivadores respiratórios e ventilação mecânica Thorax 41:940-5, 1986.
não-invasiva, sempre que houver necessidade. Kerr ME, Rudy EB, Weber BB et al. Effect of short-du-
Deve ser avaliada a continuidade do tratamento ration hyperventilation during endotracheal suctio-
quando o paciente encontra-se fora do centro ci- ning on intracranial pressure in severe head-injured
rúrgico e do ambiente de UTI. adults. Nurs Res 46:195-201, 1997.
Kerr ME, Weber BB, Sereika SM et al. Effect of en-
dotracheal suctioning on cerebral oxygenation in
traumatic brain-injured patients. Crit Care Med
27:2776-81, 1999.
MacDuff A, Grant IS. Critical care management of
neuromuscular disease, including long-term venti-
lation. Curr Opin Crit Care 9:106-12, 2003.
Polkey MI, Moxhan J. Clinical aspects of respiratory
muscle dysfunction in the critically illness. Chest
119:926-39, 2001.
Rabinstein A, Wijdicks EFM. BiPAP in acute respira-
tory failure due to myasthenic crisis may prevent
intubation. Neurology 59:1647-9, 2002.
Riker RR, Picard JT, Fraser GL. Prospective evaluation
of the Sedation-Agitation Scale for adult critically ill
FIGURA 7 – Método Kabat. patients. Crit Care Med 27:1325-9, 1999.

CAPÍTULO 202 2541


FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
Robert LW, Jack EW, Young W. Internacional standarts perfusion in patientes with large hemispheric stroke.
for neurological and functional classification of spi- Stroke 33:497-501, 2002.
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Sean M, Peter CG. Noninvasive positive pressure ven- the patient with critical illness. Critical Care Clinics
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Schwarz S, Georgiadis D, Aschoff A et al. Effects of effects of inspiratory muscle training in neuromus-
body position on intracranial pressure and cerebral cular disease. Muscle & Nerve 23:1257-60, 2000.

2542
SEÇÃO 25
CAPÍTULO 203
FISIOT E R A P I A M OTO R A N O
PACIEN T E G R AV E

Fátima Cristina Martorano Gobbi


José Aparecido de Sousa Junior
Andréia Ferreira Rzezinski

DESTAQUES
 Deve-se considerar no paciente a capacidade de planejar, executar e coordenar os movimentos e os
subsídios básicos para tal.
 Os objetivos gerais da fisioterapia motora no paciente grave são prevenir e minimizar os efeitos da
imobilidade no leito e estimulação sensório-motora e cognitiva.
 O primeiro contato de cada terapia com o paciente, mesmo inconsciente, deve ser iniciado localizando
o têmporo espacialmente e, quando possível, fazê-lo ciente dos objetivos e importância do atendimen-
to fisioterápico nessa fase aguda.
 O adequado posicionamento deve ter como base as posições funcionais dos segmentos e o alinhamento
da cabeça e do tronco, conferindo-lhe simetria e estabilidade.
 Na mobilização dos segmentos, deve-se explorar a possibilidade do movimento ser desde passivo até
resistido.
 Deve-se proporcionar ao paciente informações sensoriais de movimentos ou posturas que desejamos
que assuma, colocando-o na postura adequada ou facilitando sua transferência para esta.
 As alterações sensitivas têm duas categorias: a capacidade dessas informações chegarem ao cérebro e
como o cérebro interpreta essas informações e as transformam em movimento.
 Cabe ao fisioterapeuta ajudar o paciente, fornecendo-lhe elementos que o estimulem em sua adapta-
ção, ressaltando os objetivos alcançados e os pretendidos, despertando sua atenção e diminuindo sua
ansiedade.

2543
INTRODUÇÃO AVALIAÇÃO DO PACIENTE

Ao lidarmos com o paciente na UTI em uma A avaliação do paciente é sempre um processo


condição incapacitante, cabe ao fisioterapeuta dinâmico e amplo, devendo ser abordados aspec-
compreender a fisiopatologia da afecção primária tos globais e detalhes dependentes da doença em
e pregressa, os subsídios dos movimentos normais, questão, ter uma abordagem funcional utilizando
seu processo de aprendizagem e estratégias de dados que possam ser comparados a cada terapia,
adaptação para explorar seu potencial remanescen- devendo os objetivos serem definidos com metas
te. Diversos serão os fatores que influenciarão na funcionais e estruturais (Randall, 2000). Quanto
abordagem do paciente em repouso: tipo de lesão, mais precocemente forem definidos os objetivos e
estado clínico, idade e próprio desuso, ocasionan- iniciado o plano de tratamento, melhores serão os
do uma terapêutica própria e um procedimento resultados (Brainin et al., 2004).
adequado para cada caso. Na verificação do prontuário, são relevantes os
O objetivo deste capítulo é destacar a importân- dados de identificação, a história da doença e suas
cia da fisioterapia motora precoce dos pacientes em condições atuais. A idade do paciente pode deter-
terapia intensiva e descrever a rotina de avaliação e minar uma abordagem diferenciada; um idoso re-
planejamento terapêutico para eles. quer cuidados muito mais intensivos em relação à
Nas últimas décadas, têm sido estudados os imobilidade no leito que um adulto jovem. Afinal,
efeitos do repouso prolongado no leito e suas con- há de se contemplar características específicas da
seqüências fisiológicas. Considerando sempre o idade: hipotrofia ou diminuição da coordenação
equilíbrio global do organismo, quanto mais preco- motora global. Todos os dados devem ser devida-
cemente for suspenso esse repouso, menores serão mente balizados para melhores estratégias e eficiên-
seus efeitos adversos. Algumas dessas conseqüên- cia na terapia, direcionando para o objetivo espera-
cias são notórias em pacientes em terapia intensiva, do no tratamento.
como retrações e contraturas musculares, atrofias, Cuidados essenciais com o paciente devem ser
trombose venosa profunda, inadequações posturais destacados como: restrição quanto ao posiciona-
decorrentes de um posicionamento incorreto etc. mento da cabeça, mudanças de decúbito, posicio-
Mediante estudos (Sullivan, 1993; DeLisa, 2002), namento dos membros etc., além do tipo de moni-
foram revelados que os efeitos conseqüentes des- torização, sondas, drenos e cateteres que são usados
sa imobilização superam seus efeitos terapêuticos, e que merecem cuidados especiais na abordagem
tornando-se, em alguns casos, mais problemáticos fisioterapêutica.
que a própria doença em questão. Devemos seguir, ao avaliar a atividade funcio-
Na busca do equilíbrio global do organismo e o nal, o desenvolvimento motor normal, analisando
fato de que, ao lesionarmos um dos sistemas, po- a mobilidade, estabilidade, atividade sobre a estabi-
derá ocorrer alteração nos demais, faz com que a lidade e a função propriamente dita. A partir desse
precocidade viável da abordagem inicial evite com- momento, com estas investigações funcionais, pas-
plicações da incapacidade e de riscos secundários. samos a definir os fatores causais das disfunções
E nessa direção, a experiência da equipe e a indivi- apresentadas (Bertoti, 2003).
dualidade de cada paciente devem ser consideradas O estado de alerta, reações emocionais e mo-
prioritárias no planejamento terapêutico. O cuida- tivação do paciente são ffatores relevantes na ava-
do dessa forma possibilitará um melhor resultado liação e durante o programa terapêutico, devendo
funcional e menor número de medidas terapêuti- ser sempre discutidos e compartilhados com outros
cas adicionais (Brainin et al., 2004). membros da equipe multiprofissional. A experiên-

2544
SEÇÃO 25
cia clínica vinculada a evidências encontradas na TABELA 1 – Escala de coma de Glasgow (GCS)
literatura possibilitará definirmos um prognóstico
Abertura ocular
e traçarmos um plano terapêutico próximo da rea-
lidade clínica e funcional do paciente. Espontânea 4

Serão abordados os seguintes aspectos estruturais Comando verbal 3

relevantes para a fisioterapia: nível de consciência, Estímulo doloroso 2


aspectos neurovegetativos, cognitivos, sensoriais e Nenhuma 1
motores (amplitude de movimento, elasticidade,
Melhor resposta motora
força, tônus e trofismo muscular, motricidade, re-
Obedece a comando 6
sistência, percepção etc.), que serão explorados de-
pendendo do diagnóstico clínico em questão. Localiza estímulo doloroso 5

Retira membro à dor 4


Nível de consciência Flexão anormal (descorticação) 3

Dada a inexistência de uma definição satisfa- Extensão anormal (descerebração) 2


tória para “consciência” até o momento, que con- Nenhuma 1
temple toda a variabilidade de respostas para o seu Resposta verbal
conteúdo, entendemos como mais oportuno des-
Orientado 5
crever as respostas que encontramos no paciente
para cada estímulo específico, já que estas respostas Confuso 4

poderão intervir nos objetivos e abordagens fisio- Palavras inapropriadas 3


terapêuticas. Sons 2
A escala de coma de Glasgow (GCS) é a mais Nenhuma 1
comumente utilizada e contempla respostas para os
Total 3-15
estímulos de abertura ocular, resposta verbal e res-
posta motora (Tabela 1). Além da GCS a descrição
de outras respostas aos estímulos podem suplemen- do membro em postura específica e nas estratégias
tar os dados para a avaliação do nível de consciência que utilizem recursos térmicos ou eletroterápicos e
e esclarecer a condição de participação do paciente. contatos manuais.

Alterações neurovegetativas Sistemas sensoriais


Na fisioterapia devem ser analisados dados re- A monitorização de informações internas (orga-
ferentes aos sinais vitais (freqüências cardíaca e nismo) e externas (ambiente) é a função primária
respiratória, pressão arterial sistêmica), fatores de- dos receptores sensoriais. O input sensorial deter-
pendentes de regulação autonômica e endócrina mina a localização do corpo no espaço, a localiza-
(perfusão periférica, sudorese, presença de edema ção de uma parte do corpo em relação a outra e
– caracterizando estase de origem vasomotora ou aspectos do meio ambiente incluindo temperatura,
renal, trofismo da pele, análise dos anexos, tempe- localização e formas de objetos e tipos de superfície
ratura das extremidades etc.) e fatores emocionais. (Montgomery, 2003). Devem ser avaliadas quatro
Estas informações serão de grande valia quan- propriedades comuns das sensações: modalidade
to aos cuidados que deveremos tomar em relação (ou qualidade), intensidade, duração e localização.
ao esforço requerido do paciente, necessidade de As modalidades que podem trazer aspectos mais
proteção para úlceras de pressão, posicionamento objetivos para o fisioterapeuta no processo de ava-

CAPÍTULO 203 2545


FISIOTERAPIA MOTORA NO PACIENTE GRAVE
liação são dor, tato e propriocepção. Além destas, pendem, sendo os mais comumente pesquisados
devem ser verificadas a temperatura, olfação, gus- reflexo aquiliano (segmentos L5 a S2); reflexo pa-
tação, audição e visão. telar (segmentos L2 a L4); reflexo estilo-radial (seg-
Nessas alterações, dois aspectos são relevantes: mentos C5 e C6); reflexo bicipital (segmentos C5 e
a capacidade de estas informações chegarem ao cé- C6); reflexo tricipital (segmentos C7 e C8). Quan-
rebro, como o cérebro interpreta estas informações to à intensidade, pode-se apresentar hiporreflexia,
e as transforma em movimento. Assim ficará equa- normorreflexia, hiperreflexia e clônus. Na hiperre-
cionada a magnitude da alteração e como poderá flexia pode-se ter tanto o aumento da intensidade
ser abordada durante o tratamento. como também o da área reflexógena. No entanto,
Um recurso a ser empregado na pesquisa da a pesquisa de assimetrias é essencial na intensidade
sensibilidade são os esquemas representativos dos dos reflexos pela variação individual.
segmentos corporais, constando face, tronco e Nos reflexos superficiais o que mais chama a aten-
membros, destacando alterações e sua localização ção é o cutâneo-plantar, cuja alteração se traduz no
(dermátomos). sinal de Babinski, um exemplo de liberação reflexa.
Os reflexos posturais estão presentes no indiví-
Sistemas motores duo normal, mas podem se exteriorizar de forma
mais evidente nas lesões do sistema nervoso cen-
Como citado anteriormente analisaremos o sis- tral. Assim, temos os reflexos tônicos cervicais si-
tema motor conforme o desenvolvimento motor métricos e assimétricos e o reflexo tônico labirínti-
normal, iniciando pela mobilidade (capacidade de co, os quais dependem da integração entre bulbo e
planejar, executar e coordenar os movimentos e medula. Além desses, existem as reações de suporte
seus subsídios básicos), a estabilidade (manutenção positivo e de “endireitamento” da cabeça sobre o
da postura adquirida), mobilidade sobre a estabi- corpo, do corpo sobre a cabeça e do corpo sobre o
lidade (capacidade de realizar tarefas na posição corpo, caracterizando a necessidade de o indivíduo
tanto em cadeia aberta como em cadeia fechada) e manter-se em alinhamento corporal concomitante
a habilidade (atividade específica no tempo, veloci- ao alinhamento da cabeça, e refletindo integridade
dade e força adequada). medular e mesencefálica. Outra reação de “endirei-
Sempre que formos analisar os déficits apre- tamento” é a visual, que ajusta a cabeça no espaço,
sentados, utilizaremos recursos mensuráveis para sem os parâmetros labirínticos ou corpóreos, e que
avaliar o comprometimento estrutural daquela depende de integridade cortical.
função. Os níveis de controle do movimento são Associada à avaliação inicial dos reflexos e rea-
distinguidos em três tipos: reflexos, automáticos ções posturais, à análise dos ajustes posturais tôni-
e voluntário. Quanto mais delicado e fino for o cos (de manutenção) e fásicos (de deslocamento) e
movimento, mais caracteristicamente ele será vo- à variação do tônus muscular em função da postura
luntário e, não sendo modulado pelas estruturas do indivíduo, deve-se verificar assim se o paciente
supra-segmentares, podem ser puramente reflexos. assume e mantém a postura, realizando atividades
Um dos requisitos para a expressão da motricidade sobre ela.
voluntária adequada é a integridade dos reflexos e O tônus muscular é avaliado clinicamente pela
reações que modulam o movimento. Os reflexos palpação e verificação da resistência ao alongamen-
podem ser divididos em três modalidades: miotáti- to durante o movimento passivo dos membros,
cos, superficiais e posturais. sendo essa resistência dependente da velocidade do
Os reflexos miotáticos refletem os níveis de in- movimento e do número de repetições com que é
tegração de acordo com os nervos dos quais de- realizado (Kandel et al., 2000).

2546
SEÇÃO 25
O músculo pode estar hipotônico, normotôni- diagnóstico clínico como conseqüência do desuso,
co ou hipertônico e sua avaliação deve ser iniciada idade, atividades pregressas e da patologia em ques-
posicionando o paciente de forma alinhada da ca- tão. A medida pode ser através da perimetria dos
beça em relação ao tronco, já que, como discutido membros.
anteriormente, a postura da cabeça poderá alterar Na motricidade voluntária é necessário ressaltar
o tônus muscular do tronco e membros mesmo em o envolvimento cortical para a realização do mo-
um indivíduo normal. vimento e interação nos diversos níveis segmen-
A hipertonia do tipo elástica é aquela cuja resis- tares de controle motor; a atividade essencial dos
tência ao alongamento é observada principalmente gânglios da base, no planejamento e iniciação do
quando se realiza o movimento com velocidade, o movimento; e a atuação do cerebelo, na compa-
que causa exacerbação do reflexo de estiramento ração constante entre o movimento executado e o
e, portanto, maior resistência abrupta a este alon- planejado, visando torná-lo preciso e coordenado.
gamento (“sinal do canivete”). A resistência tende Resultando em cinco pontos principais analisados:
a ceder com as repetições do movimento por des- execução, precisão de velocidade e direção, força
sensibilização do fuso muscular. Esta alteração do muscular e especificidade.
tônus é comum em acidente vascular encefálico ou A ênfase dos movimentos deve ser funcional,
traumatismo cranioencefálico. assegurando uma resposta apropriada de todo o
A hipertonia plástica, classicamente descrita corpo. Caso necessite investigar um movimento es-
como sendo o tônus encontrado em pacientes pa- pecífico de uma articulação específica solicitaremos
rkinsonianos, caracteriza-se por um aumento da os movimentos de forma analítica. O movimen-
resistência ao alongamento durante todo o arco do to normal é preciso, tanto em direção quanto em
movimento, independente da velocidade com que velocidade devendo ser solicitado de forma lenta
o movimento é realizado, tanto no músculo ago- ou rápida, em várias direções, atingindo o alvo de
nista quanto no antagonista ao movimento (“sinal forma precisa e harmônica. A avaliação da motrici-
da roda denteada”). dade da face deve ser realizada em seqüência.
Pode ser ainda detectado situação de flacidez, Para a força muscular, vários testes de graduação
comumente encontrada na fase imediatamente são propostos, sendo o mais empregado o proposto
pós-acidente vascular encefálico (AVE). Outras por Kendall que a gradua em: nula (0); vestígios
alterações são hiporreflexia e arreflexia nas lesões (1); pobre (2); regular (3); boa (4); e normal (5),
nervosas periféricas cujo manejo com o paciente em função de o indivíduo conseguir iniciar ou rea-
exigirá cuidados específicos do fisioterapeuta e de lizar o movimento contra a gravidade e contra uma
toda equipe em função da vulnerabilidade muscu- resistência imposta (Kendall, 1995). O problema
lotendíneo e articular. das provas de força muscular é o seu componente
Sugerimos a escala de Ashworth como forma de de subjetividade, devendo ser sempre avaliada pelo
mensurar o tônus, devendo ser testada sempre pelo mesmo terapeuta e de forma comparativa bilateral.
mesmo terapeuta e, sempre que possível, em pos- A ocorrência de sinergismos em certos movi-
turas funcionais (sentado ou em pé), possibilitando mentos é comum e ocorre devido a uma condição
que a informação coletada do tônus muscular seja biomecânica ou neurofisiologicamente determina-
em uma postura utilizada para atividades funcio- da. Em condições normais o paciente avaliado deve
nais e não de relaxamento. ser capaz de controlá-los realizando apenas um mo-
Outra característica da integração neuromus- vimento por articulação, ou seja, com especificida-
cular a ser observada é o trofismo muscular que de. Devemos verificar a amplitude de todos os mo-
poderá estar alterado em pacientes com qualquer vimentos articulares, tendo em vista a amplitude

CAPÍTULO 203 2547


FISIOTERAPIA MOTORA NO PACIENTE GRAVE
normal e circunstancial. Uma forma de indicador tátil ou estereoagnosia quando o paciente é in-
seria a utilização de tabelas que relacionam os valo- capaz de reconhecer objetos através do tato ou
res normais com os avaliados. manuseio ou descrever qualquer detalhe destes;
A presença de movimentos involuntários e re- agnosia auditiva quando o paciente é incapaz de
ações associadas, como tremor, balismo, coréia, reconhecer sons característicos, mas, ao tocar ou
atetose etc. são característicos de lesões em regiões olhar objetos, classifica-os corretamente;
específicas do sistema nervoso central e sua incom- • apraxias: segundo Déjerine é um distúrbio na
patibilidade com o movimento voluntário harmô- atividade gestual intencional em indivíduos
nico. Devem ser avaliadas a freqüência e localização cujos aparelhos de execução estão intactos (au-
(proximal/distal), durante quais movimentos se tor- sência de paralisia, ataxia ou coreoatetose) e
na exacerbado e quando tende a desaparecer, e qual que possui conhecimento total do ato a realizar
a limitação funcional que acarreta para o paciente. (ausência de agnosia e de deficiência intelectual
global). Podem ser classificadas como:
Funções cognitivas – apraxia ideatória caracterizada por uma dis-
A perda da consciência até a deficiência da me- tração extrema e falta de lógica nas ações,
mória, julgamentos imprecisos, períodos curtos embora a realização das diversas partes que
de atenção, desatenção ou dificuldades no proces- compõe o ato completo está normal. Por
samento e aprendizado de informações merecem exemplo, ao ser solicitado para colocar um
avaliação específica, cujo resultado e abordagem relógio no pulso, o paciente terá dificuldade
estão diretamente ligados ao tratamento. Essas in- de manipulá-lo adequadamente para colocá-
formações deverão ser conseguidas com a equipe lo no pulso;
multiprofissional. – apraxia ideomotora caracteriza-se pela inca-
Algumas deficiências a serem exploradas que in- pacidade de executar idéias, o paciente rea-
terferem no processo de reabilitação são: liza atos automáticos normalmente, porém
• distúrbios do esquema corporal e imagem cor- ao comando de outra pessoa não consegue
poral: não consegue reconhecer qual é a mão di- executá-los. Exemplo: ao colocar um sapato
reita ou a esquerda; negligência unilateral, falta com cadarço o paciente é capaz de dar o laço
de preocupação pela existência da hemiplegia, automaticamente. Porém será incapaz de dar
negação da hemiplegia (anasognosia) e perda da um laço em uma fita de presente quando so-
consciência da metade do corpo; licitado;
• síndrome das relações espaciais: apresenta um – apraxia construtiva distingue-se pela im-
conjunto de deficiências como a característica possibilidade do paciente fazer ou copiar
de não perceber a relação de objetos no espaço qualquer figura, desde as mais simples ca-
ou a relação do próprio corpo com os objetos; racterizando-se pela incapacidade em cons-
• agnosias: constituem-se na perda ou alteração na truir coisas a partir das partes componentes.
capacidade de percepção, embora estejam con- Exemplo: ao ser oferecido ao paciente um
servadas as várias formas de sensibilidade neces- objeto, um papel de presente e uma fita, ele é
sárias para este reconhecimento, podendo ser: incapaz de organizar as etapas para execução
agnosia visual quando o paciente não pode no- dessa tarefa.
mear nem descrever a utilidade dos objetos apre- Portanto, ao avaliarmos um paciente com com-
sentados, mas é capaz de identificá-los quando portamento excessivamente exploratório, com len-
os toca ou pelo barulho característico; agnosia tidão no reconhecimento tátil de um objeto, ou

2548
SEÇÃO 25
comportamentos bizarros, podemos estar diante de gastrintestinal, nervoso, renal, cardiovascular; além
uma das afecções acima descritas. de alterações emocionais.
Segundo relato na literatura (De Lisa, 2002), os
METAS músculos não usados atrofiam e perdem força em
taxas que variam desde 5% ao dia a 8% por sema-
Os objetivos gerais da fisioterapia motora no
paciente grave são: na; verifica-se que a velocidade do fluxo sangüíneo
ao nível das veias dos membros inferiores é reduzi-
• prevenção ou minimização dos efeitos da imo-
da à metade após oito horas de imobilização, mos-
bilidade no leito;
trando que existe uma correlação significativa entre
• estimulação sensório-motora e cognitiva. a duração da imobilização do paciente no leito e a
É de extrema importância estabelecermos metas incidência de trombose venosa profunda.
de curtos e longos prazos no processo de reabili- O esquema básico dessas manifestações clínicas se-
tação. Sullivan et al. definem as metas em longo cundárias à imobilidade está representado na Figura 1.
prazo como as relacionadas aos resultados funcio-
nais, e as de curto prazo direcionadas para áreas es-
TRATAMENTO
pecíficas, como força, coordenação, amplitude de
movimento, equilíbrio, postura, resistência e dor. O primeiro contato de cada terapia com o pa-
Como efeitos secundários do repouso no leito ciente mesmo inconsciente deve ser iniciado loca-
ou da diminuição relativa da atividade, temos o lizando o têmporo espacialmente e, quando possí-
descondicionamento que se reflete por alterações vel, fazê-lo ciente dos objetivos e importância do
nos sistemas respiratório, músculo-esquelético, atendimento fisioterapêutico nessa fase aguda.

Sistema renal Sistema psicológico


Sistema cardiovascular
– Estase urinária – Ansiedade
– Hipotensão ortostática
– Cálculos renais – Depressão
– Redução do volume
– Infecção urinária – Deficiência intelectual
plasmático
– Redução do desempenho
cardiovascular
– Tromboembolismo

Riscos Sistema gastrintestinal


da – Perda de apetite
imobilidade – Constipação

Sistema respiratório Sistema nervoso


– Aumento da resistência – Alterações sensoriais
mecânica à respiração – Alterações cognitivas
– Redução da tosse e atividade Sistema músculo-esquelético – Comprometimento do
ciliar brônquica – Contraturas equilíbrio e coordenação
– Redução do volume-corrente – Fraqueza muscular – Diminuição da capacidade
– Embolia pulmonar – Atrofia por desuso funcional

FIGURA 1 – Manifestações clínicas secundárias à imobilidade.

CAPÍTULO 203 2549


FISIOTERAPIA MOTORA NO PACIENTE GRAVE
A análise do ambiente e a melhor posição no rotações, o joelho em ligeira flexão e o tornozelo ali-
leito são fatores terapêuticos, pois viabilizam a in- nhado. Quando estes recursos não forem suficientes
teração do paciente com o meio e sua possibilidade e/ou em lesões mais severas, as órteses podem ser
de “independência”. Assim, pacientes hiperativos bem indicadas o mais precocemente possível.
devem ser locados em áreas mais restritas ou de Nos decúbitos laterais, seguem os cuidados da
menor circulação, evitando ser hiperestimulados cabeça em relação ao tronco: evitar inclinações late-
por sons, luzes etc. Ao contrário, pacientes idosos, rais e rotação da cabeça, o ombro de apoio deve es-
instáveis, que necessitam de observação constan- tar protraído com o cotovelo em semiflexão, semi-
te por parte da equipe, podem ser instalados em supinação de antebraço, semi-extensão de punho,
um leito central da unidade. Naquelas vítimas de semiflexão dos dedos e semi-oponência do polegar
acidente vascular encefálico, o hemicorpo afetado abordagem funcional da mão. O membro superior
deve ser estimulado, para tanto, a opção deve ser contra-lateral deve seguir os mesmos cuidados do
colocá-lo posicionado em um leito que o obrigue membro superior apoiado no leito (para isto, pode-
a, com freqüência, integrar o seu lado afetado em se usar travesseiro, bola, rolo etc.). O membro in-
suas atividades, orientando que toda a equipe mul- ferior de apoio estará com o quadril em extensão
tidisciplinar e familiares acessem-no por esse lado. e joelho semifletido e o pé com a devida proteção
É importante a decisão do melhor local para a no tornozelo evitando escaras em maléolo lateral.
instalação de equipamentos de monitorização, po- O membro contralateral deverá estar apoiado to-
sicionamento de acesso venoso periférico, cânulas talmente, quadril e joelho fletidos, evitando que o
de intubação, sondas gástricas, quando possível, quadril desalinhe, como ilustram as Figuras 2 e 3.
evitando estímulos assimétricos e restrições na li-
berdade de movimento do paciente, como por
exemplo um acesso venoso periférico no lado aco-
metido de um hemiplégico, o que pode persuadi-
lo a usar, ainda menos, este membro.

Posicionamento no leito
O adequado posicionamento deve se basear nas
posições funcionais dos segmentos e no alinhamen-
to da cabeça e do tronco. Nem sempre a posição
mais apropriada é possível devido às condições clí-
nicas do paciente ou a déficits estruturais já instala-
dos; por exemplo contraturas, tornando a adaptação
necessária. Sugerimos, quando em decúbito dorsal,
posicioná-lo com a cabeça alinhada com o tronco,
báscula lateral da escápula, flexão do ombro a 45°,
abdução a 60°, cotovelo em ligeira flexão ou a 90°,
pronação do antebraço, extensão do punho de 30° a
40°, semiflexão dos dedos e semi-oponência do po-
legar, visando manter a posição funcional da mão.
A pelve deve estar em leve antepulsão por meio da
utilização de pequeno travesseiro ou toalha, man-
tendo o quadril em posição neutra em relação às FIGURA 2 – Paciente em decúbito lateral: posição correta.

2550
SEÇÃO 25
A estar exacerbado; o desalinhamento da cabeça po-
derá facilitar respostas do tônus aos reflexos cervi-
cais simétricos e assimétricos; a utilização de órte-
ses que acentuem padrões reflexos (por exemplo,
uma órtese inadequada com o intuito de evitar a
flexão plantar e a inversão poderá estar desencade-
ando a reação positiva de suporte ou outras postu-
ras reflexas), posturas fixas não significam melhora
de função, pois podem limitar o início da mobi-
lidade. Cuidado com posicionamentos e fixadores
que comprimam feixes vasculonervosos, como na
região axilar, côndilo medial do cotovelo, fossa po-
plítea e cabeça da fíbula.
Em pacientes com queimaduras, o posicionamen-
to deverá considerar a área afetada, reparações cirúr-
gicas e considerações adicionais da equipe médica.
Quando possível, explorar a sedestação com os
pacientes. Os mesmos cuidados devem ser consi-
derados em relação aos segmentos, adicionando
atenção especial para a adequada inclinação do
encosto de maneira a expor o paciente aos ajustes
antigravitários da musculatura do tronco e cabe-
B ça, de acordo com a tolerância da manutenção da
postura e dos subsídios neurais que ele apresenta
para tal. Assim o procedimento requer uma ava-
liação criteriosa da posição do encosto e o tempo
que o paciente poderá aproveitar melhor desta esti-
mulação. Também deve se explorar a possibilidade
de alternar o apoio dos pés no solo, pois além de
um melhor estímulo sensorial da descarga de peso
também alivia a sobrecarga sobre a coluna lombar,
como ilustram as Figura 4.
Vale ressaltar nesta posição a orientação ao pa-
ciente e acompanhante quanto a cuidados para o
risco de queda, principalmente se houver possibi-
FIGURA 3 – Paciente em decúbito dorsal: posição correta nas lidade de períodos de agitação, estando o paciente
adaptações do tronco e membros inferiores (A) e da mão (B).
restrito adequadamente, quando necessário.
Outros itens são relevantes no posicionamento
Mobilização
do paciente no leito, como por exemplo: evitar a
permanência por tempo prolongado do paciente A atividade motora apropriada deve servir de
em decúbito dorsal que facilitará o tônus extensor parâmetro para termos sucesso nas terapias, levan-
em função do reflexo tônico labiríntico que pode tando os seguintes questionamentos: queremos

CAPÍTULO 203 2551


FISIOTERAPIA MOTORA NO PACIENTE GRAVE
ganhar mobilidade ou estabilidade, quais tipos de Sugerimos iniciar a mobilização de forma global,
contração muscular iremos trabalhar, isométrica ou com uma boa base de sustentação e a abordagem
isotônica, concêntrica ou excêntrica, qual a melhor do movimento por meio das regiões proximais em
posição de trabalho, quais seguimentos fortes uti- direção das distais a fim de assegurar o cuidado em
lizaremos como forma de irradiação para as partes todos os níveis de segmento do movimento anali-
mais fracas. sado. Exemplo: mobilidade do tronco em compo-
nentes rotacionais e da cintura escapular explorada
antes da abordagem completa da gleno-umeral. En-
tende-se por regiões proximais o tronco, as cinturas
escapular e pélvica, e por distais, cabeça, membros
superiores e inferiores. A mobilização deve permi-
tir ao paciente a sensação normal do movimento,
visando também atingir sua completa amplitude,
respeitando as limitações circunstanciais analisadas
posteriormente. Dessa forma, estaremos abrangen-
do a elasticidade musculotendínea, o retorno veno-
so, a ideal nutrição dos tecidos articulares, hipera-
tividade do fuso muscular e a estimulação de todos
os receptores sensoriais periféricos.
Na mobilização dos segmentos, devemos explo-
rar a possibilidade do movimento ser passivo, ati-
vo-assistido, ativo e resistido.

Passivo
O movimento passivo refere-se a qualquer mo-
vimento de uma articulação que é produzido por
uma força externa (Frank et al., 1984). O cuidado
com a amplitude e mecânica articular é fundamen-
tal durante esse manuseio. A conduta pode ser a re-
petição analítica de movimento por movimento ou
a global, que associa movimentos tridimensionais
de forma lenta e cadenciada, e sempre que possível
solicitando que o paciente atente ao movimento,
acompanhando-o e percebendo-o.
Em pacientes com artralgias, deve-se ter muita
cautela no número de repetições, variando entre
um pequeno número para não exacerbar o proces-
so inflamatório. Ressaltamos que mesmo realizan-
do movimentos passivos, deve-se monitorizar os
sinais vitais do paciente, principalmente: freqüên-
FIGURA 4 – Note a adequação da postura para a dada inclinação
do encosto, o alinhamento dos segmentos e a variação da posição
cia cardíaca, respiratória e pressão arterial que po-
dos pés. dem variar imediatamente na presença de algum

2552
SEÇÃO 25
incômodo, cansaço etc. A manipulação deverá ser vascular. Devemos lembrar que os exercícios dos
interrompida ou alterada caso sejam detectadas va- membros superiores produzem aumento do débito
riações importantes. cardíaco, principalmente por aumento na freqüên-
cia cardíaca, e não no volume sistólico. Portanto
Ativo assistido para exercícios com membros superiores o nível
de esforço deve ser cauteloso, principalmente para
Essa forma pode ser utilizada quando existe a cardiopatas. Ressaltamos a importância de explo-
possibilidade, mesmo que parcial, de colaboração rar os movimentos funcionais com a finalidade de
do paciente. Seu intuito é estimular a função exis- integrá-los às atividades futuras a serem realizadas
tente otimizando a atividade muscular e suas adap- pelo paciente, principalmente naqueles com dis-
tações metabólicas, iniciando, corrigindo, ou com- funções neurológicas.
pletando o arco do movimento. Podemos ainda
associar a essa manobra estímulos neuromuscula- Resistido
res proprioceptivos, tais como tapping sobre o ventre
muscular, gelo, pincéis, estímulos de estiramento e Intensifica as atividades neuromusculares pro-
comandos verbais, visando um melhor desempe- prioceptivas, requerendo a atividade conjunta de
nho do movimento. Quando o paciente apresentar músculos sinérgicos estimulando ainda mais todos
grau 3 na escala de Kendall, associamos aos movi- os aspectos anteriormente citados: trofismo e força
mentos contrações isotônicas concêntrica e excên- muscular, coordenação, adaptação cardiovascular
trica visando melhorar a coordenação, aumentar o etc. A resistência aplicada deve ser sempre adequa-
controle ativo e a amplitude do movimento. da ao paciente, não superestimando nem subes-
Essa mobilização é de grande importância no timando seu potencial. É associada às contrações
pós-operatório de cirurgias ortopédicas, em que isométricas (propiciar estabilidade) e isotônicas
a dor é um fator de imobilismo. A mobilização (melhorar mobilidade). Os cuidados a respeito das
precoce destes pacientes com o adequado suporte alterações cardiovasculares merecem novamente
medicamentoso proporciona alívio dos sintomas, destaque pelo fato de existir carga e componentes
com ganho gradual dos movimentos, amplitudes de isometria neste tipo de movimento. A indicação
articulares e na prevenção da formação de aderên- deste exercício é relativa para pacientes com pro-
cias capsulares. Nas grandes queimaduras, apesar cessos articulares em fase aguda. Outros aspectos
da dor à mobilização, essa estratégia deve ser enco- que podem limitar o ganho de força muscular do
rajada para evitar restrições cicatriciais principal- paciente é sua condição nutricional e presença de
mente pós-operatórias. processos infecciosos.
Observação: diante de afecções neurológicas e/
Ativo livre ou fase aguda o uso da sobrecarga muscular pode
estar contra-indicado (Delisa, 2002; Cash, 2000).
Consideraremos os mesmos aspectos citados an-
teriormente, com a diferença de que o paciente po- Equilíbrio
derá executar de forma independente o arco com-
pleto de movimento ou dentro de suas limitações. O equilíbrio humano se mantém por meio de
Podendo ser realizado contra a gravidade ou não, um processo complexo envolvendo as informações
estará com conseqüente ganho ou manutenção da sensoriais do movimento do corpo; a integração
força muscular promovendo um melhor trofismo, das informações sensoriomotoras no sistema ner-
potencializando ainda um eficiente retorno veno- voso central é uma resposta adequada da execução
so e iniciando um processo de adaptação cardio- neuromuscular (Duncan, 1984). A tarefa básica do

CAPÍTULO 203 2553


FISIOTERAPIA MOTORA NO PACIENTE GRAVE
equilíbrio é manter o centro de gravidade do corpo ma a posição lateral. Uma vez na postura lateral,
sobre a base de sustentação. Devemos analisar as por meio das técnicas de reversão de antagonistas
reações de equilíbrio, proteção e de alinhamento poderemos aumentar a estabilidade, a força e a co-
corporal a cada deslocamento de peso utilizado du- ordenação dos componentes musculares agonistas,
rante as terapias ou atividade funcionais realizadas e antagonistas (Adler, 1999). Passamos a explorar
pelo paciente, identificando os componentes anor- posturas mais altas a cada sucesso adquirido pelo
mais e que requerem uma estimulação mais espe- paciente. Utilizando variedade e variabilidade nos
cífica. Sabemos que estes ajustes respondem até as estímulos, possibilitaremos que o paciente ative as
pequenas transferências de peso possíveis por meio reações de equilíbrio (de retificação e de proteção).
de mudanças de posturas de membros superiores, Podemos considerar as reações de equilíbrio como
membros inferiores, cabeça e tronco (Shumway- sendo um dos principais fatores na manutenção do
Cook, 2003). equilíbrio e o equilíbrio com um dos principais fa-
Mecanismos posturais reflexos pressupõem um tores para uma atividade funcional normal.
cérebro adulto intacto e fornecem um subsídio
para todos os movimentos. Em qualquer postura, Estimulação sensorial
mas principalmente em ortostatismo, é necessário
Com base nos mecanismos neurofisiológicos
o incremento das reações de balanceio (Canelas,
normais, podemos incrementar as informações
1983). Essas reações são automáticas, e indivíduos
sensórias de diferentes formas, observando sempre
normais são capazes de controlá-las ou modificá-las
o resultado que estas estimulações ocasionaram nas
voluntariamente para seu uso funcional. A capaci-
respostas. Por meio de contrações musculares pro-
dade de manter o equilíbrio em diversas posições
porcionamos estímulos proprioceptivos aferentes
fornece a base de sustentação para todos os movi-
no sistema nervoso central (Kabat, 1954). Tapping
mentos funcionais (Davies, 1985).
sobre o ventre muscular, estímulos cutâneos com
O fato de o paciente estar restrito a um leito de diferentes texturas; contato manual direcionando o
terapia intensiva não pode ser fator limitante para movimento e estimulando os músculos agonistas e
iniciarmos o trabalho de equilíbrio na fase aguda. sinérgicos; descarga de peso; técnicas de aproxima-
Posturas que devem e podem ser vastamente ex- ção e tração; mudanças posturais, enfim são algu-
ploradas na UTI são os decúbitos dorsal, lateral mas sugestões para estimulação sensorial.
e o sentado, justamente pela ampla possibilidade
que estes decúbitos proporcionam à estimulação Todos os estímulos devem ser informados ao
dos ajustes posturais. Devemos possibilitar que o paciente pelo profissional, possibilitando que ele
paciente receba informações sensoriais de novas saiba exatamente a atividade a ser realizada e o que
posturas e informações dos movimentos funcionais se espera como meta.
realizados sobre estas posturas. Caso o paciente não Ao melhorar sensações proprioceptivas median-
tenha condições sensoriomotoras para assumir a te técnicas de aproximação, conseguimos propor-
postura desejada, devemos utilizar recursos de fa- cionar ao paciente estabilidade postural que pos-
cilitação que variam desde um simples comando sibilitará realizar atividades funcionais dentro de
verbal e visual até estímulos de facilitação neuro- uma boa sustentação e sobre estruturas articulares
muscular. O decúbito lateral é a primeira postura em padrões normais. As sensações devem ser forne-
que devemos facilitar para que o paciente assuma. cidas constantemente e próximo da normalidade.
Utilizando padrões flexores e extensores, com con- Algumas informações direcionadas aos familiares e
tatos em regiões escapulares e pélvicas facilitaremos acompanhantes podem auxiliar o paciente em seu
a mudança postural, possibilitando que ele assu- dia-a-dia. Por exemplo: manter o paciente simétrico

2554
SEÇÃO 25
e alinhado possibilitará o recebimento de informa- • materiais de diferentes texturas, formas, cores e
ções normais para seu esquema corporal, solicitar temperaturas: para a estimulação sensorial;
ao paciente que acompanhe com o olhar a direção • faixas elásticas e pesos: para otimizar exercícios
dos movimentos que realizará para uma determina- resistidos;
da tarefa, o contato manual sobre os componentes
• estímulos sonoros: incrementam a atenção nos
musculares ativos e o comando verbal como forma
campos visuais;
de explicar e integrá-lo à atividade.
• prancha ortostática: utilizada para facilitar o or-
Motivação tostatismo precoce. Indicada na estabilidade clí-
nica monitorizando PA, FC, FR atentamente. A
A motivação alicerça e reforça o que o pacien- elevação da prancha deve ser gradual (por exem-
te aprende, otimizando sua adesão na reabilitação. plo a cada 10º) para atingir a estabilidade dos
Compartilhar com o paciente os objetivos dos sinais clínicos e permanecer sem sintomas por
exercícios, destacar seus ganhos diários, e ser posi- aproximadamente 30 minutos. O fisioterapeu-
tivo com seus sucessos. ta deve permanecer junto ao paciente avalian-
Assim também é desenvolvida a responsabilida- do criteriosamente alguma alteração que possa
de gradual em incorporar no seu dia-a-dia as estra- ocorrer, evitando alterações bruscas e inadequa-
tégias aprendidas e a coragem de explorar outras das dos sinais vitais (Delisa, 2002);
táticas para sua melhor adaptação futura.
• recursos de eletroterapia: podem e devem ser
utilizados, desde que devidamente monitoriza-
Orientação suplementar
dos e levando em conta qualquer interferência
É de grande valia a orientação de posicionamen- que possam causar em outros equipamentos da
to e exercícios para o paciente, familiares e cuida- unidade.
dores, a fim de dar continuidade no processo reabi- Logo, a cada abordagem do paciente, necessi-
litativo e incitar o envolvimento familiar precoce. tamos da integração sensorial, do equilíbrio, assim
como de suas funções cognitivas, em que cada ma-
MATERIAIS DE AUXÍLIO nipulação terá seus objetivos bem delineados. Res-
É necessário salientar que na UTI pode-se fa- saltamos que mesmo para um paciente puramente
zer uso de materiais de auxílio, devendo-se sempre ortopédico a base de procedimentos pode e deve
consultar previamente o Serviço de Controle de ser ampliada ao relacionarmos todas estas funções
Infecção Hospitalar sobre sua forma de limpeza e analisadas, pois estas constituem a base do controle
higienização. A preferência, sempre que possível, motor envolvidos no tratamento.
deve ser dada a materiais laváveis:
• rolos: para adequação de posicionamento e ma- CONSIDERAÇÕES FINAIS
nutenção da postura específica; O paciente deve sempre ser tratado como um
• bolas e bastões: para estimulação e facilitação de todo, visando o equilíbrio global de seu organismo,
atividades funcionais principalmente em situa- a fim de que possam ser traçados os objetivos de
ção de déficit de compreensão e atenção e para curto e longo prazo. Para tanto, cabe ao fisiotera-
explorar atividades bimanuais; peuta fazer uso de toda técnica e conhecimento ao
• órteses: adequadamente prescritas e no momento assisti-lo, evitando uma abordagem rotulada, pre-
certo estabilizam segmentos que outros posicio- determinada e limitada, mas explorando todo seu
nadores não fariam prevenindo deformidades; potencial remanescente.

CAPÍTULO 203 2555


FISIOTERAPIA MOTORA NO PACIENTE GRAVE
Logo, a cada abordagem, necessitamos: orientar Davies PM. Starting again: early rehabilitation after
o paciente sobre os objetivos da terapia e que estes traumatic brain injury or other severe brain lesions.
objetivos sejam direcionados para uma meta fun- London, Springer-Verlag, 1994.
cional; aplicar a medida que servirá de parâmetro DeLisa JA. Tratado de medicina de reabilitação. São
para avaliar o resultado do tratamento; ser positivo Paulo, Manole, vol. 2, 2002.
e motivar o paciente durante a terapia; ter como Duncan PW. Proceeding of the APTA Forum. Nash-
base o desenvolvimento motor normal – mobili- ville 13-15, 1989.
dade, estabilidade, mobilidade sobre estabilidade e Frank C, Akeson WH, Woo SL et al. Physiology and
a função propriamente dita; medir o resultado da therapeutic value of passive joint motion. Clinical
terapia e avaliar se o plano terapêutico escolhido Orthopaedics and Related Research 185:113-25,
foi apropriado (resultado). 1984.
Grieve J. Neuropsicologia em terapia ocupacional
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2556
SEÇÃO 25
CAPÍTULO 204
FISIOT E R A P I A N A I N S U F I C I Ê N C I A
RESPIR ATÓ R I A AG U DA

Claudia Talerman
Marcos Antonio Manara
Karin Raquel Klava

DESTAQUES
 A insuficiência respiratória pode ser causada por qualquer doença que afete direta ou indiretamente
os pulmões. Aproximadamente um terço das pessoas que sofrem dessa síndrome desenvolvem-na em
conseqüência de uma infecção grave e extensa (sepse).
 O objetivo do tratamento é manter a PaO2 maior que 60 mmHg e otimizar a função cardíaca e o uso
de oxigenoterapia adequada, por meio de cateter nasal ou máscara facial, visando SpO2 ≥ 92%.
 Os benefícios do tratamento da IRpA são reverter hipoxemia, tratar acidose respiratória, aliviar o des-
conforto respiratório, prevenir e tratar a atelectasia, reverter a fadiga dos músculos respiratórios, permi-
tir a sedação e/ou o bloqueio neuromuscular, diminuir o consumo de oxigênio sistêmico e miocárdico,
reduzir a pressão intracraniana e estabilizar a parede torácica.

2557
INTRODUÇÃO • Exemplos:
Podemos definir insuficiência respiratória aguda – pneumonia;
(IRpA) como uma incapacidade do sistema respi- – atelectasia;
ratório em atender aos seus objetivos primordiais, – síndrome do desconforto respiratório agudo
que são a manutenção da oxigenação e/ou ventila- (SDRA);
ção do paciente. Como conseqüência desta anor- – insuficiência cardíaca;
malidade o sangue venoso que retorna aos pulmões
– tromboembolismo pulmonar (TEP);
não é suficientemente oxigenado, assim como o
dióxido de carbono (CO2) não é adequadamente – desequilíbrio ventilação-perfusão (V/Q);
eliminado. – shunt (o alvéolo é perfundido, mas não há
No caso de doença pulmonar crônica a pre- acesso de oxigênio ao alvéolo);
sença de PaO2 < 50 mmHg e PaCO2 > 50 mmHg – alterações da difusão.
não é conclusivo de insuficiência respiratória
aguda, pois a compensação renal da acidose res- IRpA hipercápnica (tipo II)
piratória crônica vai determinar um pH normal.
Porém, a acidose respiratória associada a um pH • PaO2 < 50 mmHg e PaCO2 > 50 mmHg.
< 7,35 é imprescindível para caracterizar uma • Mecanismo básico: déficit de ventilação.
insuficiência respiratória crônica agudizada (Fi- • O aumento no PaCO2 ocorrerá se houver au-
gura 1). A insuficiência respiratória aguda mani- mento no metabolismo da produção de CO2 ou
festa-se por PaO2 < 60 mmHg e/ou PaCO2 > 45 se a ventilação alveolar diminuir.
mmHg podendo apresentar um pH < 7,35 em ar • O aumento na produção de CO2 deve ocorrer
ambiente. durante atividades físicas, febre ou excesso de
alimentação.
CLASSIFICAÇÃO
• A diminuição na ventilação alveolar deve ocor-
Existem várias formas de se classificar a insufici- rer se houver aumento no espaço morto ou di-
ência respiratória aguda: pelo seu mecanismo fisio- minuição na ventilação minuto (diminuição da
patológico, duração, etiologia e local anatômico da freqüência respiratória ou volume-corrente).
disfunção primária. A maioria dos autores divide a • A PaO2 varia com idade e posicionamento do
insuficiência respiratória em dois tipos: paciente:
– posição ortostática: PaO2 = 104,2 - (0,27 x
IRpA hipoxêmica (tipo I) idade);
• PaO2 < 50 mmHg e PaCO2 < 40 mmHg. – decúbito dorsal: PaO2 = 103,5 - (0,42 x
• Mecanismo básico: déficit de oxigenação. idade).
• Insuficiência respiratória por hipoxemia deve-se • Exemplos: disfunção do centro respiratório
a causas de desordens no coração, pulmão ou (medula) – drogas, traumas, tumores, hipoti-
sangue. A função do tecido cardíaco é medida reoidismo.
pelo C(a-v) O2 e é anormal se for maior que 5 • Doenças neuromusculares (Guillain-Barré,
ml/dl. miastenia gravis, trauma espinhal, botulismo,
• Insuficiência respiratória por hipoxemia deve esclerose lateral amiotrófica – ELA, miosite).
ocorrer devido à inabilidade de combinação do • Intoxicação por barbitúricos.
débito cardíaco com o consumo de oxigênio. • Alcalose metabólica.

2558
SEÇÃO 25
• Desordem das vias aéreas periféricas (asma, Algumas doenças extrapulmonares podem afe-
DPOC, corpo estranho). tar o sistema respiratório de forma atípica e silen-
• Doenças da parede torácica ou pleural (trauma, ciosa como em pacientes que apresentam doença
cifoescoliose, derrame pleural). neuromuscular.
• Obstrução das vias aéreas (estenose subglótica, Doenças agudas ou traumas também podem
tumor, edema laríngeo). desenvolver complicações respiratórias que devem
ser observadas precocemente.
APRESENTAÇÃO CLÍNICA A gasometria arterial é essencial para o diagnósti-
co e confirmação da IRpA. Exames de imagem como
A avaliação clínica é de fundamental impor- radiografia simples e TC de tórax são de extrema im-
tância. Sinais como cianose, dispnéia e freqüência portância, podendo fornecer informações adicionais,
respiratória acima de 30 respirações por minuto tais como a presença de pneumonia, pneumotórax
ocorrem inicialmente. Pode-se observar agitação, ou infiltrados pulmonares (Figuras 1 a 4).
cefaléia, convulsões e tremores. Na avaliação respi-
ratória alterações de amplitude, ritmo, freqüência,
padrão e apnéia podem ocorrer. Durante a inspe-
ção do paciente, é preciso avaliar a presença de su-
dorese, cianose e uso de musculatura acessória.
No exame físico, a natureza pulmonar da IRpA
é reforçada pela presença de alterações nos apare-
lhos cardiovascular e pulmonar, com sinais de insu-
ficiência cardíaca esquerda e/ou direita e alterações
no murmúrio vesicular, com a presença de ester-
tores crepitantes ou sibilos. A presença de sinais
sugestivos de infecção grave também é importante,
pela possibilidade de sepse e, conseqüentemente,
FIGURA 1 – Radiografia de tórax – IRpA.
SDRA. Hemodinamicamente observam-se sinais
como taquicardia, bradicardia, arritmias, hiperten-
são, hipotensão e até parada cardiorrespiratória.
Os sinais clínicos de hipoxemia (confusão men-
tal) e/ou hipercapnia (sonolência) são duvidosos e
nem sempre estão presentes; a pressão arterial dos
gases sangüíneos deve sempre ser usada para deter-
minar a presença de insuficiência respiratória.
Pacientes com doença pulmonar obstrutiva crô-
nica com hipercapnia permanente devem ser diag-
nosticados com insuficiência respiratória, quando
há um aumento abrupto na PaCO2 maior que 5
mmHg que comumente é visto nesses pacientes.
O diagnóstico nesses casos deve ser realizado o
mais rápido possível, para que possam ser adminis-
tradas medidas terapêuticas adequadas. FIGURA 2 – TC de tórax – atelectasia posterior.

CAPÍTULO 204 2559


FISIOTERAPIA NA INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA
H2O (normal entre -80 e -120 cm H2O), asso-
ciado ao aumento da freqüência respiratória;
• disfunção de vias aéreas: quadros obstrutivos
como asma e DPOC, aspiração de corpos estra-
nhos ou conteúdo gástrico, disfunções de larin-
ge e cordas vocais;
• disfunção do parênquima pulmonar: os pacien-
tes apresentam dispnéia, elevação da freqüência
respiratória e cianose. Estes sinais estão associa-
dos à pneumonia, atelectasia ou SDRA;
FIGURA 3 – TC de tórax – atelectasia.
• disfunção de caixa torácica: casos de cifoescolio-
se grave ou trauma de tórax;
• disfunção vascular e de ventrículo direito: pre-
sença de tromboembolismo pulmonar;
• disfunção cardíaca esquerda: por aumento da
pressão capilar pulmonar e posterior encharca-
mento dos espaços intersticiais.

TRATAMENTO
FISIOTERAPÊUTICO

A atuação do fisioterapeuta é de extrema im-


portância, devendo avaliar o quadro respiratório
do paciente e indicando a conduta mais adequada
para cada caso específico.
FIGURA 4 – Radiografia de tórax – infiltrado pulmonar D.
Portanto, a avaliação, a vigilância e as reavalia-
ções freqüentes são essenciais bem como a monta-
gem e o manuseio dos equipamentos utilizados.
ETIOLOGIA
Avaliação
A insuficiência respiratória pode ser causada por
A avaliação fisioterapêutica deve contemplar o
qualquer doença que afete direta ou indiretamente
nome, data de nascimento, diagnóstico, em casos
os pulmões.
cirúrgicos anotar o tipo de cirurgia realizada e em
As causas mais freqüentes de IRpA são: que dia de pós-operatório o paciente se encontram,
• alteração do drive respiratório: caracteriza-se ausculta pulmonar, radiografia de tórax, freqüência
por hipoventilação ou hiperventilação. A medi- respiratória e cardíaca, expansibilidade, padrão res-
da da função do drive respiratório é realizada piratório e oxigenoterapia utilizada.
pela mensuração da PO. Seu valor normal é de Mensurar, quando indicado, a pressão inspirató-
2 a 4 cm H2O; ria máxima (PImáx) e pressão expiratória máxima
• disfunção neuromuscular: verifica-se queda no (PEmáx), volume-corrente (VC), volume-minuto
volume-corrente, capacidade vital e pressão ins- (Vmin), capacidade vital (CV), anotando seus res-
piratória máxima com valores abaixo de -30 cm pectivos valores. Solicitar a tosse ao paciente e ano-

2560
SEÇÃO 25
tar sua eficiência, se produtiva, anotar o aspecto e e infiltrados. Em pacientes com disfunção do ventrí-
quantidade da secreção. Na presença de drenos des- culo direito, o uso da PEEP deve ser cauteloso.
crever a localização do dreno, se borbulha ou oscila, Utilização de exercícios com pressão positiva
aspecto e quantidade do débito apresentado. intermitente (RPPI) tem como objetivo manter e/
Anotar parâmetros do paciente em ventilação ou melhorar os volumes pulmonares e promover o
mecânica: freqüência respiratória (f ), fração ins- deslocamento de secreções.
pirada de oxigênio (FiO2); volume-corrente (VC), Uso de ventilação não-invasiva com dois níveis de
pico de pressão inspiratória (PP), pressão positiva pressão, associados ao uso de broncodilatadores leva
expiratória final (PEEP), modalidade da ventilação a uma diminuição do trabalho respiratório, associa-
mecânica, relação tempo inspiratório e expiratório do à diminuição de mortalidade intra-hospitalar.
(I:E), saturação de oxigênio observado no oxímetro Em casos mais graves, intubação e ventilação
de pulso (SatO2), ETCO2 (end tidal dióxido de car- mecânica são necessárias. O objetivo é a hipoven-
bono) se o paciente estiver com monitorização de tilação controlada, uso de volumes-correntes me-
CO2 instalado, pressão do cuff, número da cânula e nores, baixa freqüência respiratória e alto fluxo ins-
número em que a cânula de intubação está fixada. piratório, mantendo níveis de auto-PEEP baixos.
No caso de utilização de ventilação não-invasi- Utilizar FiO2 para manter oxigenação adequada.
va: CPAP (continuous
continuous positive airway pressure
pressure) ano- Após a realização da intubação deveremos colo-
tar (f, PEEP, FiO2, SaO2) e BiPAP anotar (f, IPAP, car o paciente no respirador onde deverá ser ven-
EPAP, FiO2, VC e SaO2). tilado com menor pressão de platô possível, man-
tendo os alvéolos sempre abertos otimizando os
Conduta fisioterapêutica na insuficiência valores da PEEP e promovendo perfeita sincronia
respiratória por hipoxemia (tipo I) entre o paciente e o ventilador mecânico.
O objetivo do tratamento é manter a PaO2
maior que 60 mmHg e otimizar a função cardíaca Insuficiência respiratória por hipercapnia
(tipo II)
e o uso de oxigenoterapia adequada, através de ca-
teter nasal ou máscara facial, visando SpO2 ≥ 92%. O tratamento da hipercapnia visa aumentar a
O posicionamento do paciente com elevação do ventilação alveolar (uso de broncodilatadores ou
decúbito > 30° e na presença de secreções pulmo- aumento da freqüência respiratória) e diminuição
nares, manobras para auxiliar a higiene brônquica. do CO2.
A drenagem postural visa facilitar a drenagem A avaliação e manuseio imediato da hipercapnia
da secreção de uma região específica do tórax e o dependem do pH e da elevação do PaCO2:
paciente deve permanecer em cada uma das posi- • pH maior que 7,45: corrigir alcalose metabólica;
ções durante a aplicação da tapotagem e vibrocom-
• pH entre 7,45 e 7,30: monitorizar paciente;
pressão. Ativar reflexivamente a tosse estimulando
manualmente a fúrcula ou solicitar verbalmente ao • pH entre 7,30 e 7,25: considerar suporte venti-
paciente associado à compressão do tórax. latório;
A aspiração traqueal tem como objetivo remo- • pH menor ou igual a 7,25: se não for revertido,
ver secreção das vias aéreas, podendo ser via naso- suporte ventilatório obrigatório.
traqueal, orotraqueal, cânula de traqueostomia, ou O manuseio da insuficiência respiratória por hi-
cânula naso ou orotraqueal. percapnia envolve os seguintes itens:
Aplicação de pressão positiva expiratória para di- • suporte ventilatório não-invasivo ou necessidade
minuição do débito cardíaco, reversão de atelectasias de intubação;

CAPÍTULO 204 2561


FISIOTERAPIA NA INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA
• ventilação não-invasiva evita a necessidade de
intubação. O uso do BiPAP resulta em melhora
no pH, diminui pCO2 e diminui a freqüência
respiratória.

CRITÉRIOS PARA INDICAÇÃO DE


VENTILAÇÃO NÃO-INVASIVA OU
INTUBAÇÃO TRAQUEAL

Os benefícios do suporte ventilatório mecâni-


co são reverter hipoxemia, tratar acidose respira-
tória, aliviar o desconforto respiratório, prevenir e
tratar a atelectasia, reverter a fadiga dos músculos
respiratórios, permitir a sedação e/ou o bloqueio FIGURA 5 – Máscara total face – VNI.
neuromuscular, diminuir o consumo de oxigênio
sistêmico e miocárdico, reduzir a pressão intracra-
niana e estabilizar a parede torácica. • hipoxemia;
• fadiga muscular;
Critérios para instalação de ventilação • PaCO2 com aumento progressivo e ou pH
mecânica não-invasiva < 7,2;
Os critérios para instalação de ventilação me- • distensão gástrica;
cânica não-invasiva (Figura 5) estão descritos a se- • PCR.
guir:
• paciente cooperativo com Glasgow > 12; BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
• freqüência respiratória > 30 rpm; Alex CG, Tobin MJ. Assessment of pulmonary func-
• estabilidade hemodinâmica; tion in critically ill patients. Laghi F, Tobin MJ.
Disordes of respiratory muscles. American Journal
• ausência de vômitos ou distensão gástrica;
Respiratory Critical Care 168:10-48, 2003.
• ausência trauma facial;
Ayres SM, Grenvik A, Holbrook PR, Shoemaker WC.
• pouca secreção pulmonar; Textbook of Critical Care. Philadelphia, WB Saun-
• PaCO2 > 45 mmHg; ders Company, pp. 649-58, 1995.
• pH < 7,35 e > 7,10. Barbas CSV, Amato MBP, Carvalho CRR. Medida do
trabalho respiratório. In: Monitorização respiratória
Critérios para instalação de intubação em UTI. Terzi GGR. Rio de Janeiro, Manole, pp.
orotraqueal e ventilação mecânica 167-78,1998.
Barbas CSV, Hoelz C, Rodrigues Jr. M. Insuficiência
Os critérios para instalação de intubação oro- respiratória aguda: abordagem diagnóstica e tera-
traqueal e ventilação mecânica estão descritos a pêutica. In: Knobel E. Terapia intensiva: pneumo-
seguir: logia e fisioterapia respiratória. São Paulo, Atheneu
• Glasgow < 12; 1-13, 2004.
• confusão mental; Cuvelier A, Viacroze C. Dependency on mask ventila-
tion after acute respiratory failure in the intermedia-
• instabilidade hemodinâmica; te care unit. European Respiratory Journal 26:289-
• distensão gástrica; 97, 2005.

2562
SEÇÃO 25
Hunrubia T, García Lopéz FJ. Noninvasive versus con- Rubenfeld GD, Caldwell E, Peabody E et al. Incidence
ventional mechanical ventilation in acute respira- and outcomes of acute lung injury. N Engl J Med
tory failure: a multicenter randomized controlled 20;353(16):1685-93, 2005.
trial. Chest Journal 128:3916-24, 2005. Pratter MR, Irwin RS. A physiologic approach to ma-
Jubran A, Tobin MJ. Monitoring during mechanical naging respiratory failure. In: Irwin RS, Cerra FB,
ventilation. Clin Chest Med 17:453-74, 1996. Rippe JM. Intensive Care Medicine. Philadelphia,
Kreit JW, Rogers RM. Approach to the patient with Lippincott-Raven, pp. 571-5, 1999.
acute respiratory failure. In: Ayres SM, Grenvik A Slutsky AS. Mechanical ventilation. ACCP Consensus
Holbrook PR, Shoemaker WC. Textbook of Criti- Conference. Chest 104:1833-59, 1993.
cal Care. Philadelphia, WB Saunders Company, pp. West JB. Fisiologia respiratória moderna. 3. ed. São
680-7, 1995. Paulo, Manole, p. 188, 1990

CAPÍTULO 204 2563


FISIOTERAPIA NA INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA
CAPÍTULO 205
REABILI TAÇ ÃO P U LM O N A R

Leny Vieira Cavalheiro


Ana Maria Braga Marques
Cristiana Eigenheer de Souza Coelho
Ana Cristina Oliveira Gimenes

DESTAQUES
 A intolerância ao exercício é um importante sintoma nos pneumopatas crônicos e exerce um forte
impacto sobre a qualidade de vida desses pacientes.
 Considerando-se um programa de reabilitação pulmonar, o teste de exercício incremental, em fase
pré-reabilitação, indica a intensidade de treinamento, com base na freqüência cardíaca, sintomas como
dispnéia ou fadiga nos membros inferiores e a carga aplicada durante o teste.
 Deve-se ponderar que nenhum dos questionários utilizados atualmente é recomendado na prática
diária, mas que a avaliação da qualidade de vida deve, obrigatoriamente, ser considerada em todos
os trabalhos clínicos envolvendo pacientes com DPOC, sendo um ponto crucial a levar em conta na
elaboração de estratégias terapêuticas e na avaliação dos seus resultados.

2565
INTRODUÇÃO TABELA 1– Indicações para admissão hospitalar nas exacerba-
ções segundo o GOLD
Os pacientes portadores de DPOC e SDRA que
experimentam uma longa estadia em UTI são dire- • Aumento considerável na intensidade dos sintomas, tais como a mani-
festação repentina de dispnéia ao repouso
cionados a programas de reabilitação pulmonar. A
• História prévia de DPOC grave
inclusão neste plano de tratamento deve ser o mais
precoce possível. • Surgimento de novos sinais físicos (ex: cianose, edema periférico)

Esses pacientes oferecem múltiplos fatores de es- • Impossibilidade de resposta da exacerbação ao tratamento médico inicial

tresse físico e psicológico, sendo o diagnóstico e a • Co-morbidades significativas


intervenção precoces indispensáveis para que os pa- • Arritmias de ocorrência recente
cientes, após a alta hospitalar, possuam habilidades
• Incerteza do diagnóstico
para as atividades de vida diária, possam retornar ao
• Idade mais avançada
trabalho e manter uma adequada qualidade de vida.
• Apoio domiciliar insuficiente
Pacientes comatosos podem tornar-se comple-
tamente paralisados devido a desordens neuromus-
culares, desenvolver deficiência e paralisia durante Alguns aspectos da reabilitação pulmonar ini-
o curso da doença. Neuropatia, miopatia ou ambas ciam-se ainda no leito da terapia intensiva, que
têm sido sugeridas como causas. Alteração na fun- beneficiarão esses pacientes no seguimento do tra-
ção motora devido a distúrbios neuromusculares tamento na fase ambulatorial.
poderiam sugerir, por engano, um agravamento da
doença do SNC e induzir a investigação desneces- IMPORTÂNCIA DO EXERCÍCIO NO
sária ou tratamento inapropriado. PNEUMOPATA
Com a melhora dos recursos e habilidade das
equipes de UTI, há a melhora na sobrevida. O in- Efeitos fisiológicos do treinamento
teresse de pesquisadores tem sido não só a taxa de A intolerância ao exercício é um importante sin-
mortalidade, mas também a recuperação da função toma nos pneumopatas crônicos e exerce um forte
pulmonar e qualidade de vida dos sobreviventes. impacto sobre a qualidade de vida desses pacientes.
Sobre outro aspecto, não menos importante, É bem sabido que muitos sobreviventes de SDRA
esses sobreviventes apresentam uma qualidade de têm persistente redução da função pulmonar con-
vida aceitável, mas com déficits nas funções físicas sistindo de déficits ventilatórios restritivos ou obs-
e sociais quando comparados com pessoas de mes- trutivos, hiperreatividade brônquica, capacidade
ma idade com saúde íntegra. O que não é sabido é de difusão de monóxido de carbono prejudicada
qual o grau de recuperação das funções diárias nos e queda na PaO2 durante o exercício. Melhora ou
sobreviventes a longo prazo e especificamente qual normalização da função pulmonar pode ser obser-
é a disfunção pulmonar residual. Limitações pul- vada por até um ano depois da alta hospitalar e
monares podem representar somente um indicador déficits residuais típicos consistem de falha na con-
de um distúrbio mais severo e não ser a causa dos dução de oxigênio. Isto pode ser explicado por fi-
déficits na qualidade de vida relatada. brose e obliteração microvascular, que são seqüelas
Os pacientes com DPOC são admitidos na te- patológicas características depois de SDRA.
rapia intensiva frente a quadro de descompensa- A função muscular é caracterizada por força e
ção clínica. Segundo a Global Initiative for Chronic endurance. Perda de um desses componentes resul-
Obstructive Lung Disease (GOLD), os critérios clí- ta no descondicionamento e efeitos sobre a capaci-
nicos para admissão na UTI seguem na Tabela 1. dade de exercício e qualidade de vida.

2566
SEÇÃO 25
É importante entender os princípios e compo- • troca gasosa anormal;
nentes do treinamento para incorporá-lo adequa- • alterações cardíacas;
damente no tratamento desses pacientes. • desnutrição;
Os efeitos a curto e longo prazo de um condi- • aumento da dispnéia.
cionamento físico sistemático tem sido objeto de
Embora os pacientes mais graves não possam
extensiva investigação. Em indivíduos normais é
exercitar-se no mesmo nível que os mais leves,
sabido que a participação em um programa perso-
onde o efeito do treinamento é imaginado ser ideal
nalizado de exercícios resulta em vários efeitos:
(acima do limiar anaeróbio), uma grande corpo-
• aumento no consumo máximo de oxigênio com ração de evidências confirma que a realização de
melhora no uso do oxigênio periférico; exercícios é um instrumento benéfico na terapêuti-
• treinamento específico aumenta força e endu- ca auxiliar desses pacientes, onde eles podem alcan-
rance; çar seu completo potencial.
• melhora da coordenação muscular;
• troca da composição corpórea com aumento Avaliação da capacidade física
da massa muscular e diminuição do tecido adi- Teste de exercício cardiorrespiratório (TECR)
poso;
• melhora da sensação de bem-estar. O TECR é bastante útil na determinação da ne-
cessidade do uso de medicamentos e seus possíveis
Os resultados de um programa de exercícios
efeitos sobre a função respiratória e/ou cardiopul-
apresentam diferentes benefícios dependendo da
monar. Também pode ser útil na indicação e ava-
severidade da obstrução. Indivíduos com leve a
liação do efeito da oxigenoterapia na DPOC, em
moderada obstrução poderão manifestar os mes- que o objetivo básico é manter uma saturação de
mos achados que indivíduos sadios. Pacientes com oxigênio (SaO2) acima de 90% durante o esforço.
a forma severa da doença aumentam a capacida-
Em geral, considera-se o consumo de oxigê-
de de endurance e sua sensação de bem-estar. Há
nio de pico (VO2 pico) ser indistinguível do VO2
muitos estudos sobre os diferentes tipos de trei-
máximo (VO2máx) como índice prognóstico em
namento e seus efeitos sobre a performance destes
doenças pulmonares e cardiovasculares. A classi-
pacientes, incluindo aumento de enzimas muscu-
ficação de disfunção aeróbia de Weber com base
lares, menor sensação de dispnéia para a mesma
no VO2máx e no limiar anaeróbio é característica
atividade, decréscimo na produção de acido lático
disso (Tabela 2).
para o mesmo trabalho, e melhora das atividades
de vida diária e na qualidade de vida relatada. Uma Considerando-se um programa de reabilitação
vez que os benefícios são alcançados, a informação pulmonar, o teste de exercício incremental, em fase
é disponibilizada e pensamos sobre os efeitos dos pré-reabilitação, indica a intensidade de treina-
programas de manutenção de cada resultado, in- mento, baseado na freqüência cardíaca, sintomas
cluindo a performance de exercícios. como dispnéia ou fadiga nos membros inferiores
e a carga aplicada durante o teste. O TECR pode,
Pacientes com DPOC manifestam decréscimo principalmente, estabelecer os mecanismos de li-
da tolerância ao exercício. Os fatores mais impor- mitação ao exercício, seja ela ventilatória ou perifé-
tantes que contribuem para esta limitação são: rica, permitindo assim a prescrição de programa de
• alterações na mecânica pulmonar; treinamento individualizado.
• disfunção dos músculos respiratórios; No TECR, alguns critérios são relevantes para
• disfunção muscular periférica; identificação dos distúrbios ventilatórios no exer-

CAPÍTULO 205 2567


REABILITAÇÃO PULMONAR
TABELA 2 – Disfunção aeróbia de Weber, baseada no VO2máx e limiar anaeróbio (LA) em TECR incremental limitado por sintomas em
esteira ergométrica
Classe funcional Gravidade VO2máx (ml.min-1.kg-1) LA (ml.min-1.kg-1)

A Ausente a leve > 20 > 14

B Leve a moderada 16-20 11-14

C Moderada a intensa 10-16 8-11

D Intensa 6-10 5-8

cício dinâmico incremental como, por exemplo: Modificações na capacidade oxidativa muscular,
baixa ou ausente reserva ventilatória (através da re- alterações circulatórias centrais e periféricas, menor
dução da ventilação voluntária máxima – VVM), sensação de dispnéia e melhora na mecânica respira-
resposta ventilatória elevada para a demanda meta- tória estão envolvidos no aumento da capacidade de
bólica, padrão taquipnéico (↑ freqüência respirató- exercício após programa de reabilitação pulmonar.
ria em relação ao volume-corrente), anormalidades A melhor maneira de testar o sistema cardiopul-
da troca gasosa intrapulmonar e dispnéia como monar é com exercício dinâmico (como bicicleta
principal sintoma limitante. ergométrica ou esteira).
Distúrbios da troca gasosa também podem ser A ergoespirometria foi recentemente incorpora-
avaliados: redução da PaO2 e/ou SaO2 e/ou aumen- da aos testes pela elevada sensibilidade ao exame.
to da PaCO2, aumento de respostas ventilatórias O exame deve permitir o estudo e a análise de exa-
submáximas, dispnéia de esforça e graus variados mes pertinentes à prática fisioterapêutica que ava-
de redução da reserva ventilatória. liem funções cinesiológicas de órgãos e sistemas.
No teste incremental, algumas variáveis devem
ainda ser consideradas como: reserva cronotrópi- Avaliação de qualidade de vida
ca – a diferença entre a freqüência cardíaca máxi-
A qualidade de vida, o grau com que a condi-
ma atingida e a prevista, para avaliação e quanti-
ção médica afeta a habilidade de cada pessoa nas
ficação do estresse cardiovascular (dependente do
funções da vida diária, tem se tornado progressiva-
VO2máx), redução do pulso de oxigênio máximo,
mente reconhecida como um importante resultado
que sugere distúrbio circulatório e/ou periférico; a
das intervenções médicas. O conceito de qualidade
relação ∆FC/∆VO2, em que maiores inclinações
de vida é baseado no “World Health Organization”
são compatíveis com baixa oferta periférica ou bai- que definiu saúde e qualidade de vida como “um
xa captação de O2. estado de completo bem-estar físico, mental e so-
Consideram-se ainda as respostas subjetivas du- cial” e não simplesmente a ausência de doença. A
rante o teste de exercício: sensação de dispnéia e implicação desta definição é que saúde, e conse-
cansaço dos membros inferiores avaliados através qüentemente qualidade de vida relatada, abrange
da escala de Borg, que se alteram dependendo do múltiplas dimensões. Mais especificamente, tem
nível de intervenção aplicada. sido sugerido que existem cinco critérios básicos e
O treinamento, em nível do limiar de lactato diferentes de qualidade de vida: saúde física, saúde
estimado, parece ser particularmente eficaz. Em mental, função social, funcionamento diário nas
pacientes com DPOC, o limiar de lactato ocorre diversas atividades e percepção geral de bem-estar.
mais próximo do VO2máx do que em indivíduos Existem atualmente diversos questionários que
normais. objetivam avaliar a qualidade de vida dos pacien-

2568
SEÇÃO 25
tes. Estes objetos são de origem internacional e ne- comparativos, de longa duração, relacionados com
cessitam ter validação no Brasil para que possamos o efeito das doenças das vias aéreas nas atividades
usá-los. diárias e no bem-estar dos pacientes. Já existe uma
O SF-36 (short form) foi originalmente dese- versão oficial do SGRQ em português autorizada
nhado como um indicador geral do status da saúde pelo Prof. Paul Jones e validada no Brasil.
para uso em pesquisas populacionais de política de Temos de ponderar que nenhum dos questio-
saúde, mas também pode ser aplicado numa gran- nários utilizados atualmente é recomendado na
de variedade de tipos e severidades de condições de prática diária, mas que a avaliação da qualidade de
saúde. Ele inclui 36 questões e cobre oito domínios vida deve, obrigatoriamente, ser considerada em
(funcionamento físico e social, desenvolvimento fí- todos os trabalhos clínicos envolvendo pacientes
sico e emocional, dor corporal, percepção da saúde com DPOC, sendo um ponto crucial a levar em
geral, vitalidade e saúde mental). Cada domínio conta na elaboração de estratégias terapêuticas e na
produz um score que varia de (0) a 100 (melhor). avaliação destes resultados.
O SF-36 é um questionário de autopontuação. Em vários estudos usando uma variedade de
O Chronic Respiratory Questionnaire (CRQ) foi instrumentos, a reabilitação pulmonar tem conse-
o primeiro questionário específico desenvolvido guido consistente redução dos sintomas de disp-
para avaliar a qualidade de vida de pacientes com néia nos pacientes com DPOC. A importância da
DPOC (doença pulmonar obstrutiva crônica). Ele dispnéia como resultado de uma medida nos estu-
mensura quatro domínios: dispnéia, fadiga, função dos desses pacientes tem ganhado maior reconhe-
emocional e domínio sobre a doença principal. Os cimento com o desenvolvimento de muitos instru-
scores dessas quatro dimensões são somados para mentos de medidas estabelecidos. Estudos futuros
ter um score total da qualidade de vida. Scores para devem utilizar-se destes instrumentos.
os domínios do CRQ obtém uma variação de 1-7;
scores maiores denotam uma melhor qualidade de ASPECTOS DO PROGRAMA DE
vida. Diferenças de scores de 0.5,1.0 e 1.5 são defi- REABILITAÇÃO PULMONAR
nidas como pequenas mas clinicamente importan-
Treinamento de músculos respiratórios e
te, moderada e grande respectivamente.
periféricos em DPOC
O Saint George Respiratory Questionnaire
(SGRQ) é específico para avaliar a qualidade de Numerosos estudos têm demonstrado que o
vida de pacientes portadores de patologias pulmo- paciente com DPOC está associado à fraqueza
nares. O questionário possui 53 questões divididas muscular. Comparado com indivíduos normais,
em três componentes: sintomas, cobrindo o des- pacientes com sintomas e sinais de falência respi-
conforto devido a sintomas respiratórios; ativida- ratória, cardíaca ou a combinação de ambos apre-
de, avaliando alterações nas atividades físicas; im- sentam redução significante da força em músculos
pacto, avaliando o impacto global na vida diária e respiratórios e periféricos. Contudo, força e endu-
no bem-estar do paciente. Um score total também rance não têm sido afetados da mesma forma nestes
é calculado e varia de zero (representando saúde músculos. A fadiga não é provavelmente o fator li-
total) a cem (corresponde ao pior estado possível). mitante da função muscular respiratória, mas sim a
O questionário tem pesos específicos e estes pesos força muscular, que está correlacionada com o grau
parecem ser válidos para ambos os sexos, uma larga de dispnéia do paciente.
faixa de idade e uma extensa variação de gravidade É necessário entender o conceito de que os
da doença. O SGRQ apresenta ainda boa repro- músculos respiratórios de pacientes com DPOC
dutibilidade, tornando-se adequado para estudos operam cronicamente contra a impedância mecâ-

CAPÍTULO 205 2569


REABILITAÇÃO PULMONAR
nica da via aérea. O desequilíbrio entre a capaci- do pela relação intrínseca tensão/comprimento do
dade funcional desses músculos em relação à sua sarcômero. Esse fator torna-se ainda mais relevante
carga de trabalho tem papel importante na gênese quando ocorre a hiperinsuflação dinâmica, durante
da dispnéia e da hipercapnia. A disfunção dos mús- o exercício, onde a limitação do fluxo expiratório
culos respiratórios é determinante importante do também está presente, reduzindo ainda mais a capa-
aumento da utilização de recursos de saúde e da cidade do diafragma em gerar força e endurance.
sobrevida de pacientes com DPOC grave que se Então, para a manutenção da ventilação, pa-
encontram hospitalizados. cientes com DPOC desenvolvem pressões trans-
Ao repouso ou durante exercícios de baixa in- diafragmáticas máximas maiores quando compara-
tensidade, o trabalho da respiração, em indivíduos dos a indivíduos normais.
saudáveis, é pequeno e os músculos respiratórios Em outras palavras, o diafragma preserva ou en-
não têm dificuldade em se manter ativos. tão aumenta suas propriedades instrínsecas à custa
Pacientes com DPOC exibem fraqueza muscu- do prejuízo de suas propriedades extrínsecas. Nessa
lar respiratória funcional e redução da capacidade adaptação estrutural, quanto maior a relação vo-
de endurance muscular, pelo prejuízo de sua estru- lume residual/capacidade pulmonar total, maior
tura e de sua função. De fato, diafragma, músculos a carga mecânica para a musculatura inspiratória,
acessórios e músculos expiratórios são submetidos resultando em: aumento da proporção de fibras
a crônicas cargas mecânicas. Portanto, o descon- do tipo I, aumento da densidade do volume e da
dicionamento não parece ser a causa da disfunção capacidade oxidativa mitocondrial das fibras mus-
muscular respiratória. Por essa razão, é necessário culares diafragmáticas. Esses achados morfológicos
definir as causas desta disfunção e classificá-las em são indicadores da adaptação aeróbia do diafragma
fatores extrínsecos e intrínsecos. Os fatores extrín- frente à doença.
secos referem-se à geometria da caixa torácica, vo- Vários estudos funcionais em indivíduos saudá-
lumes pulmonares e fatores metabólicos sistêmicos. veis e em pacientes com DPOC têm demonstrado
Os fatores intrínsecos relatam as mudanças no tipo que o treinamento com carga inspiratória pode au-
de fibra, na massa e no metabolismo muscular. mentar a endurance e a força muscular inspiratória.
Um dos fatores críticos que causam maior dis- Esta melhora funcional é observada apenas quando
função muscular respiratória é a hiperinsuflação aplica-se treinamento específico desta musculatura
pulmonar. A geometria da caixa torácica é alterada mas não quando se realizam programas de exercí-
na hiperinsuflação levando à redução crônica da cios globais.
zona de aposição do diafragma. Isto gera compro- Alguns autores demonstraram que o treinamen-
metimento mecânico, pois reduz a possibilidade to muscular (carga de 40% da pressão inspiratória
de excursão da cúpula diafragmática e reduz a ex- máxima – PiMáx) pode ter algum impacto sobre
pansão da caixa torácica inferior. A hiperinsuflação a capacidade de exercício, tempo de endurance em
muda o arranjo mecânico das regiões costal e crural esteira, mas principalmente na redução da disp-
do diafragma levando a uma redução da capacida- néia. Entretanto, não há mudança significativa na
de de gerar força, diminuição do seu comprimento função dos músculos inspiratórios submetidos a
e aumento da raio da curvatura diafragmática e, de treinamento específico.
acordo com a lei de Laplace, reduz a conversão de Essa controvérsia aparece, pois há uma diferen-
tensão em pressão. ça muito grande na magnitude e duração da car-
O comprimento da fibra diafragmática é de- ga muscular inspiratória (na literatura elas variam
terminante na capacidade de geração de força. O de 30% a 80% da PiMáx). Sabe-se que após um
comprimento ótimo da fibra muscular é determina- programa específico de treinamento, há aumento

2570
SEÇÃO 25
das fibras do tipo I, ganho da PiMáx e redução da dora de elétrons mitocondrial, prejudicando o me-
dispnéia. Em contrapartida, não foram encontra- tabolismo oxidativo.
dos efeitos adicionais na capacidade de exercício O desuso gera fraqueza muscular pela menor
funcional, nem na melhora da qualidade de vida eficiência da atividade do neurônio motor, redu-
destes pacientes. ção da proporção de fibras do tipo I e aumento de
Dessa forma é preciso salientar que o treina- fibras do tipo II decorrendo declínio da atividade
mento de músculos inspiratórios deve ser consi- de enzimas envolvidas na conversão de energia oxi-
derado em pacientes com DPOC quando: houver dativa. Medicamentos como os corticóides, redu-
fraqueza muscular estabelecida (excluindo-se fator zem a síntese protéica e aumentam o catabolismo
de hiperinsuflação pulmonar), fraqueza muscular de proteínas, estimulando a mobilização de ami-
funcional, quando houver dificuldade no desma- noácidos das proteínas musculares, estimulando o
me da ventilação mecânica, cuja causa seja a re- metabolismo glicolítico.
dução da PiMáx ou indivíduos que apresentem Associam-se ainda a esses fatores a depleção nu-
dispnéia mesmo apesar da ótima terapêutica, seja tricional e a própria inflamação sistêmica, exacer-
ela medicamentosa, suplementação de oxigênio ou bando sintomas como dispnéia e fadiga.
pacientes em programa de reabilitação pulmonar. Treinamento da musculatura periférica, visando
Em relação à musculatura periférica, sabe-se que melhora da performance muscular, seja pelo ganho
aproximadamente 70% dos pacientes com DPOC de força ou de endurance, torna-se fundamental
têm menor força de quadríceps que indivíduos para estes pacientes. O aumento da área seccional
normais de mesma idade. de fibras oxidativas e a elevação da atividade de en-
Na musculatura periférica desses pacientes en- zimas oxidativas do músculo quadríceps, em com-
contram-se menores porcentagens de fibras do tipo binação com menor acúmulo de lactato durante
I e um correspondente aumento de fibras do tipo o exercício, têm sido encontrados em pacientes
II (principalmente fibras do tipo IIb/x). Apenas DPOC treinados.
como informação, as fibras musculares do tipo I O treinamento induz o aumento da proporção
são fibras de contração lenta, dependentes do meta- de fibras do tipo I e IIa, acompanhados de maior
bolismo aeróbio, resistentes à fadiga. Em contraste, capacidade oxidativa e maior resistência à fadiga.
as fibras do tipo II (IIb/x) são de contração rápida, Além disso, a redução do acúmulo de lactato atra-
mais susceptíveis a fadiga, porque sua conversão de vés do treinamento de membros inferiores torna-se
energia está baseada no metabolismo glicolítico, crucial na redução da dispnéia. Menores formações
anaeróbio. As fibras do tipo IIa têm propriedades de lactato geram menores concentrações de íons
intermediárias, contração rápida, desenvolvendo H+, com diminuição da acidez sangüínea. Sendo
moderada tensão e relativamente resistentes à fadi- assim, há uma menor estimulação do centro res-
ga, sendo aptas a trabalhar sobre ambas condições: piratório para o aumento da ventilação em uma
aeróbias e anaeróbias. mesma carga de exercício. Este fator é fundamental
Esse aumento de fibras do tipo II em músculos para a redução da hiperinsuflação dinâmica e alívio
periféricos de pacientes com DPOC é ocasionado da dispnéia.
pela hipóxia, onde a oferta de oxigênio aos músculos Alguns pacientes apresentam dificuldade em
periféricos reduz-se causando hipoxemia, além de ini- participar de programas de reabilitação pulmonar
bir a conversão normal de fibras tipo IIa em tipo I. que empregam treinamento muscular de maior in-
O estresse oxidativo com a presença de radicais tensidade. Esse fato ocorre principalmente quan-
livres, ativos principalmente no período da exacer- do a doença se encontra em estágio mais avança-
bação, reduzem a eficiência da cadeia transporta- do ou quando associam-se limitações da reserva

CAPÍTULO 205 2571


REABILITAÇÃO PULMONAR
cardiopulmonar. Uma alternativa a esta situação Mador et al. (2004) referiram que o treinamen-
é a eletroestimulação neuromuscular transcutânea to de força pode levar a uma melhora significante
(EENM), técnica já comprovada em aumentar a em pacientes idosos com DPOC, porém o aumen-
relação fibra/capilar, massa muscular e número de to de força não se traduz em uma melhora da qua-
fibras do tipo I na musculatura do quadríceps. lidade de vida, performance de exercício ou fadiga
Protocolos baseados na aplicação da estimula- do quadríceps comparado ao atingido pelo treino
ção elétrica 5 dias por semana, durante 6 semanas de endurance sozinho.
demonstraram, sem a associação de outro tipo de Bernard et al. (1999) estudaram o efeito do trei-
treinamento muscular, aumento significante da namento aeróbico associado com o treinamento de
força muscular e capacidade funcional de exercí- força em pacientes DPOC, concluindo que ocor-
cio, na ausência da mudança da função de pacien- re grande melhora na força muscular periférica do
tes com DPOC. que só com o treinamento aeróbico; porém, essas
medidas de melhora não se estendem a aumentos
Trabalhos demonstraram aumento do pico de
na qualidade de vida e na tolerância ao exercício.
torque de até 42% em pacientes com DPOC após
Ainda neste estudo, quando avaliado o efeito deste
uso de EENM e aumento na tolerância de exercí-
treino associando aeróbico com aumento de força,
cio. Além disso, parece ser uma técnica terapêutica
observou-se que o estímulo de treinamento adequa-
ideal para aumento na capacidade de exercício em
do aumenta a força muscular, mas quando compa-
pacientes com limitação ventilatória grave, ou pa-
rados pacientes DPOC com indivíduos saudáveis,
cientes acamados, dependentes de ventilação me-
o aumento de força muscular não foi completo, in-
cânica, caracterizando quadro de extrema disfun- dicando que o período de treinamento não foi su-
ção muscular esquelética. ficiente ou que fatores além da inatividade crônica
Demonstrou-se ainda que o aumento de for- estão envolvidos na explicação da atrofia e fraqueza
ça muscular nestes pacientes, através do uso da muscular no DPOC. Ainda nesta pesquisa, conclu-
EENM, associada ou não à contração muscular íram que o aumento na qualidade de vida não pode
voluntária de quadríceps, aumentou a saturação ser observado pois os movimentos de fortalecimen-
de oxigênio, reduziu a freqüência respiratória to que levaram à aumento da força muscular não
e o tempo de permanência em ventilação me- são os movimentos desenvolvidos pelo paciente em
cânica, além da redução de tempo em que os suas AVDs, e por isso mesmo o paciente não pode
pacientes permaneceram acamados, com maior notar e correlacionar diretamente o aumento de
possibilidade de realizar transferências, minimi- força com melhora na qualidade de vida.
zando assim as complicações associadas ao imo- Zanotti et al. (2003) mostraram o uso de es-
bilismo como pneumonia e tromboembolismo timulação elétrica em pacientes DPOC acamados
pulmonar. e em ventilação mecânica, tendo como efeito um
Os mecanismos de disfunção muscular dos aumento de força muscular global e diminuindo o
membros inferiores são desconhecidos. Os estudos número de dias de passar do leito para poltona.
que avaliam a resistência ou endurance muscular na O uso da estimulação diafragmática elétrica
DPOC são conflitantes. transcutânea (EDET) emprega estímulos elétricos,
Serres et al. afirmaram que portadores de DPOC através de eletrodos, colocados em pontos motores
atingem níveis agravantes, com redução em 50% do nervo frênico (intacto) que promovam a excita-
da resistência muscular em comparação ao grupo bilidade da fibra e contração do diafragma.
controle. Essas características são encontradas pelas O objetivo dessa técnica é recrutar mais fibras
alterações morfológicas e enzimáticas na DPOC. musculares, associar técnica de estimulação elétrica

2572
SEÇÃO 25
com treinamento muscular, seja com alteração da não controlada (como uso de halteres e resistência
sensibilidade no ventilador, seja com treinadores contra a gravidade). Ambos incrementam a carga
lineares pressóricos, para reabilitação e condiciona- no decorrer do treinamento de acordo com a ob-
mento do diafragma, aumentando assim a resistên- servação da performance do exercício demonstrada
cia e a força muscular. pelos pacientes. Na carga controlada, usualmente
Os métodos de avaliação para uso dessa técnica utilizamos de 50% a 60% da carga máxima encon-
são espirometria (CVF e VEF), medidas de PImáx trada no teste incremental.
e PEmáx, eletroneuromiografia e ultra-sonografia. Os benefícios do treinamento de membros su-
Há vários trabalhos na literatura que mostram periores e inferiores persistem até um ano depois
que há aumento de força muscular, aumento do vo- de programas com duração de 8 a 12 semanas.
lume espontâneo e inspirado significativo, melho- A avaliação do membro superior pode ser re-
rando assim a qualidade de vida desses pacientes. alizada por teste incremental em cicloergômetro,
teste de uma repetição máxima de carga e pelos
Membros superiores testes de capacidade de manter-se em exercício
com incremento de carga. Não há consenso sobre
A utilização do membro superior reflete em a melhor forma de avaliação para determinar a car-
assincronia toracoabdominal nos pacientes com ga de treinamento ou a melhora após intervenção
DPOC grave. A elevação do braço a 90º em flexão terapêutica.
já demonstra significante aumento do VO2 e VCO2,
concomitantemente aumento da ventilação minu-
Ventilação não-invasiva com pressão positiva
to e na freqüência cardíaca. Lake et al. verificaram
na reabilitação pulmonar de pacientes com
que o treinamento isolado de membros superiores DPOC
e inferiores resulta em um aumento na performan-
ce muscular de força e endurance, porém se os trei- Como descrito na literatura, programas de reabi-
namentos forem associados existe a referência de litação pulmonar melhoram a capacidade de exercí-
uma maior sensação de bem-estar pelos pacientes cio e qualidade de vida de pacientes com DPOC. A
submetidos ao treinamento (Tabela 3). Ries et al. extensão dos efeitos fisiológicos do exercício nestes
estudaram o efeito de duas formas de treinamento, pacientes parece estar relacionada à intensidade de
o exercício com resistência da gravidade e com faci- treinamento. Muitos estudos têm relatado uso de
litação neuromuscular proprioceptiva modificada, treinamento de alta intensidade como mais eficazes
comparando com um grupo de DPOC que não dentro de um programa de reabilitação pulmonar
treinou membros superiores (MS). Os pacientes quando comparado com os de baixa intensidade.
que fizeram o treinamento melhoraram a tolerân- Contudo, treinamentos de alta intensidade não são
cia nos testes e diminuição na fadiga. tão tolerados por pacientes com DPOC grave, ta-
Os tipos de treinamento são classificados em manha a resposta fisiopatológica e sensação de disp-
sua maioria como exercícios com carga contro- néia frente ao exercício. Na tentativa de melhora
lada (como os cicloergômetros de braço) e carga deste quadro, várias intervenções vêm sendo apli-

TABELA 3 – Nível de evidência da intervenção de treinamento de membros superiores e inferiores


Tipo de treinamento Resultados Evidência

Membros superiores Melhoram a performance nos exercícios de membro superior e diminui o consumo de oxigênio durante sua elevação B

Membros inferiores Melhoram a performance nos exercícios, dispnéia e qualidade de vida A

CAPÍTULO 205 2573


REABILITAÇÃO PULMONAR
cadas durante exercício aeróbio como: medicações, de treinamento, principalmente em pacientes com
suplementação de oxigênio e suporte ventilatório DPOC grave, o que auxilia em melhores resultados
através de ventilação não-invasiva (VNI). do programa de reabilitação pulmonar.
A VNI tem sua função comprovada na exacerba-
ção aguda da DPOC, através do alívio da carga dos RESULTADOS DE PROGRAMAS
músculos respiratórios e da redução da PCO2 arte- DE REABILITAÇÃO PULMONAR
rial, prevenindo a fadiga respiratória e melhorando
As principais metas dos programas de reabilita-
a recuperação após o evento da exacerbação.
ção pulmonar são a redução dos sintomas, melhora
Em pacientes com DPOC estável, o uso de na qualidade de vida e maior independência nas
pressão de suporte inspiratório demonstrou au- atividades de vida diária e prática.
mento da tolerância de exercício durante o teste de
caminhada. A metanálise publicada por Salman em 2003
refere 20 trials randomizados controlados sobre re-
Comparando diversos modos ventilatórios, o
sultados em programas de reabilitação pulmonar.
uso de dois níveis de pressão (BiPAP) ou a ventila-
Todos os trials avaliados fizeram alguma aborda-
ção proporcional assistida (PAV), durante a realiza-
gem de exercício de membros inferiores, superiores
ção de programas de exercício, tem papel superior
e treinamento específico de músculo respiratório.
em reduzir a pressão transdiafragmática quando
As variáveis comparadas foram o teste de cami-
comparados à pressão positiva contínua nas vias
nhada de seis minutos para performance física e
aéreas (CPAP).
CPAP). Além disso, os benefícios da sua
CPAP
o questionário de qualidade de vida pelo CRDQ
aplicação estão em aumentar a duração e intensi-
(Questionário de doença respiratória crônica) para
dade do tempo de treinamento e menores forma-
avaliação da dispnéia.
ções de lactato durante testes de exercício, o que
infere melhor capacidade oxidativa muscular. Isso Essa metanálise mostra que o teste de avaliação
é uma contribuição importante, pois a redução da da capacidade física mais utilizado é o teste de cami-
carga dos músculos respiratórios diminui a necessi- nhada de seis minutos. Para avaliação da dispnéia e
dade de fluxo sangüíneo neste local. Isso sugere um qualidade de vida foi mais utilizado o questionário
aporte maior de sangue para os membros inferiores de doença respiratória crônica (CRDQ). Os pro-
durante o exercício, resultando em melhor nutri- gramas com o melhor resultado no teste de cami-
ção e aporte de oxigênio para estes músculos. nhada são os que incluem treinamento de membros
Alguns estudos sugerem que o emprego de supor- inferiores. O treinamento dos músculos respirató-
te ventilatório inspiratório de 10 cm H2O já é capaz rios isolados não indica melhora nos pacientes com
de melhorar a performance do teste de endurance em DPOC, após a intervenção. Os DPOC classificados
60% de pacientes com DPOC, além de substancial como leves e moderados melhoram mais rápido, en-
redução da sensação de dispnéia durante o exercício. quanto os classificados como grave melhoram signi-
O ajuste do nível de pressão inspiratória fica a cargo ficantemente nos programas com duração de pelo
do conforto respiratório do paciente durante o exer- menos seis meses. Há grande variabilidade entre as
cício. Já para a pressão expiratória, devem ser empre- propostas de programas, portanto a freqüência e
gados níveis entre 2 e 5 cm H2O como descrito na duração ótima não foram determinadas. A maioria
maioria dos estudos em literatura científica. varia entre oito a 12 semanas.
Sendo assim, o emprego da VNI durante o exer- Segue Tabela 4 com os resultados dessa meta-
cício promove aumento da capacidade ventilatória nálise.
e/ou redução da carga sobre os músculos ventila- Nossos resultados são coerentes com a literatura
tórios, permitindo a aplicação de maiores cargas mostrando melhora nos testes descritos na Tabela 5.

2574
SEÇÃO 25
TABELA 4 – Resultados da metanálise publicada por Salman em 2003
Autor No pacientes FEV 1% ou Idade em anos Duração Intervenção Distância Questionário Escore de
litros (DP) (DP) percorrida em de qualidade qualidade
metros (DP) de vida CRDQ
(DP)

Lake FR11 14 0,9 l (0,25) 66 (2) 8 semanas UeL C 355 (72) 3

T 327 (103)

Gosselink R13 19 43% (15) NA 3 meses UeL C – 0,1 (16) * 2

T 15,9 (27) *

Wijkstrs PJ15 36 1,2 l (0,3) 62,1 (5) 12 semanas U, L e R C 462 (34) C 70 (3) 2

T460 (35) T 76 (5)

Simpson K16 28 39,4% (20) 71 (5) 8 semanas UeL C 506 (86) C 15,6 (1,3) 2

T 518 (69) T 13,3 (1,3)

Guyatt G 17
82 1,0 l (0,34) 66 (7,5) 6 mês R C 409 (94) C 33,2 3

T 406 (86) T 35,4

Strijbos JH18 30 42% (14) 61 (5,3) 3 mês L C 262 (12) 2

T 280 (14)

McGavin C19 24 1,05 l (0,50) 59 (6,8) 3 mês L C 509 (156) 2

T 526 (66)

Cambach W 20
19 60% (19) 62 (7) 3 mês U,L, e R C 494 (78) C 19 (4) 2

T 480 (99) T 19 (4)

Cockcroft A21 34 1,42 l (0,6) 61 (4,9) 7 mês UeL C 564 (221) 4

T 523 (296)

Bendstrup K 29 32 1,03 l (0,02) 64 (2) 12 semanas UeL C 36,1 (10)* C 0,6 (3,8) * 3

T 113,1 (18)* T 8,6 (3,5) *

Sassi- 77 1,15 l (0,6) 67,4 (8) 6 semanas R C 397 (114) 2


DambronD24

T 402 (75)

Griffith TL25 200 39,5% (16,3) 68,2 (8,1) 6 semanas UeL C 125 (97) C 12,8 (5,0) 2

T 140 (94) T 13,9 (3,8)

Wedzicha J 27
56 0,98 l (0,3) 68,6 (7,7) 8 semanas UeL C 217 (22) C 82 (22) 2

T 191 (22) T 82(18)

Troosters T29 62 42% (8) 61 (8) 6 mês UeL C 61 (18) C 84 (22) 2

T 60 (19 T 77 (17)

Bauldoff GS30 20 50% (22) 62 (14) 8 semanas U C 14,8 (5) 1

T 17,1 (2,6)

R: treinamento muscular respiratório; U: treinamento dos membros superiores; L: treinamento dos membros inferiores; T: grupo tratado; C: grupo-controle.

CAPÍTULO 205 2575


REABILITAÇÃO PULMONAR
TABELA 5 – Resultados do programa de reabilitação pulmonar do Hospital Israelita Albert Einstein
Inicial Final Significância estatística

Teste de caminhada 394,5 (107,5) 480 m (113,9) P = 0,0004

Teste incremental de MMSS 1,4 kg (0,4) 2,3 kg (0,8) P = 0,0036

Teste incremental de MMII 33 km/h com 6,9% (3,1) 3,3 km/h com 12,2% (3,6) P < 0,0001

Teste de endurance de MMII 7,8 min (4,13) 40,5 MIN (28,5) P < 0,001

Aplicamos o Saint George Respiratory Questionary ser executado por pacientes fisicamente hábeis sem
no início e final do programa com uma diferença im- levar em consideração a idade ou a severidade da
portante na melhora da qualidade de vida desses in- doença, ele deveria ser a peça fundamental de qual-
divíduos. Segundo a literatura, uma melhora em 4% quer programa. Estudos futuros poderão esclarecer
no resultado geral é bastante positiva (Tabela 6). a ótima duração e freqüência de treinamento assim
como os benefícios s longo prazo.
TABELA 6 – Média de melhora no questionário de qualidade de
vida PERSPECTIVAS
Domínios Resultado em % Reabilitação subaquática
Sintomas 29%
Abordagens recentes vêm sendo citadas no tra-
Atividades 30,3% balho com pacientes DPOC na piscina, embora
Impacto social 15,6% este seja um assunto muito pobre dentro do âm-
Geral 22,3% bito científico. Vários materiais estão sendo utili-
zados como coadjuvante no tratamento da piscina,
como bicicleta ergométrica aquática, porém o es-
O programa é constituído de treinamento ae- tudo do homem no meio aquático fica dificultado
róbio de membros inferiores e de força e enduran- pela aplicação e manuseio dos instrumentos dentro
ce de músculos periféricos. A orientação para as da piscina.
AVDS e alongamento também compõem o cir-
Vários efeitos fisiológicos são benéficos para esse
cuito de exercícios. Para os DPOC classificados
como graves, inserimos os exercícios intervalados recurso terapêutico tais como:
associados a técnicas de conservação de energia. A • a energia necessária para a flutuação e a força
vigilância no exercício é importante para manter de atrito que a água oferece ao deslocamento
sempre o parâmetro ótimo de freqüência cardíaca contribuem para um gasto energético aumenta-
e saturação de oxigênio durante os treinamentos. do, quando os exercícios são realizados no meio
A duração é de três meses com freqüência de três líquido. A resistência oferecida pelo líquido, em
vezes por semana. qualquer direção e velocidade que os movimen-
Em síntese, o treinamento dirigido e persona- tos sejam executados, também contribui para o
lizado é o mais importante componente na rea- dispêndio energético do indivíduo;
bilitação desses pacientes com obstrução ao fluxo • o fato de a densidade do corpo humano ser se-
aéreo. Os benefícios do treinamento de extremida- melhante à da água resulta em um peso corporal
des superiores e inferiores são múltiplos e parecem menor quando está submerso. Esta característi-
persistir por até um ano depois de um programa ca do meio líquido o torna propício à iniciação
de 8 a 12 semanas. Por ser o exercício possível de da prática de atividades aquáticas em qualquer

2576
SEÇÃO 25
idade, assim como também possibilita que in- temperatura central estável. A glândula tireóide e a
divíduos com limitações se beneficiem da dimi- medula supra-renal são estimuladas pela mudança
nuição de peso hidrostático tendo maior facili- de temperatura e aumentam a produção de tiro-
dade para exercitarem-se; xina, adrenalina e noradrenalina elevando a taxa
• a grande quantidade de trabalho aeróbio reali- metabólica e a produção de calor. Essa termogêne-
zado nos programas de natação produz notáveis se química contribui para a manutenção da tem-
adaptações no sistema cardiorrespiratório, me- peratura interna em níveis ideais. Outra resposta
lhorando o transporte de oxigênio para os mús- do organismo à exposição ao frio são as contrações
culos implicados no trabalho. involuntárias sincronizadas denominadas calafrios,
que promovem uma elevação da produção de calor
Essas adaptações permitem o desenvolvimen-
no organismo de quatro a cinco vezes em relação
to do metabolismo oxidativo. A quantidade de ar
ao nível de produção de calor quando em condição
mobilizada por minuto (VE) é aproximadamente
de repouso. Esse mecanismo de manutenção da
30% menor para o mesmo nível de consumo de
temperatura leva a um aumento no custo energéti-
oxigênio (VO2) em exercício dentro d’água, devido
co das atividades aquáticas realizadas em tempera-
à pressão exercida pela água sobre o tórax no afun-
turas mais baixas. Nedal et al. (1978) constataram
damento normal do corpo ao nadar. O nadador
que a captação de oxigênio era maior em qualquer
melhora a resistência aeróbia da musculatura ins-
velocidade, quando a temperatura da água era mais
piratória, assim como tem que expirar contra a re-
fria, devido a energia necessária para regular a tem-
sistência oferecida pela água e para compensar esta peratura interna do corpo.
menor VE tem que melhorar a extração tissular de
O2, a nível periférico. Como dissemos anteriormente, o contato com
a água fria desencadeia a vasoconstrição periféri-
O uso de um fluxômetro aéreo (equipamento ca que reduz o fluxo periférico, deslocando maior
de baixo custo e disponível no mercado) pode in- volume de sangue para a região central do corpo.
formar o pico de fluxo respiratório ((peak-flow) an- Essa alteração no volume sangüíneo é constatada
tes e depois da sessão de exercício; se a diferença for por receptores localizados, principalmente no átrio
maior que 20% (para menos e após a aula) fica cla- esquerdo, e esses enviam estímulos para a hipófi-
ro o diagnóstico de obstrução. Uma alta VE induz se posterior, que diminui a secreção do hormônio
ao resfriamento e ressecamento das vias aéreas. vasopressina (antidiurético). A diminuição na pro-
Na natação, a faixa até 30 cm acima do nível da dução de vasopressina promove um aumento na
água fica úmida pela evaporação natural da água, fa- eliminação de água nos rins, e a urina é eliminada
cilitando o processo, sendo portanto altamente reco- até que o volume sangüíneo se normalize. Somado
mendada como atividade física para pneumopatas. a esse mecanismo, o tecido atrial libera o peptídeo
A exposição a baixas temperaturas (37°C) es- atrial natriurético (fator atrial natriurético) que
timula adaptações agudas para que a temperatura atua nos rins estimulando a diurese e nos vasos es-
central do corpo possa ser mantida em níveis óti- timulando a vasodilatação.
mos. Na natação, o contato com a água com tem- No mergulho, a freqüência cardíaca sofre um
peratura mais baixa do que a do corpo desencadeia aumento inicial, em seguida, decresce com o pros-
uma vasoconstrição periférica como resposta aguda seguimento do mergulho, podendo atingir valores
à mudança de temperatura. Essa resposta do orga- abaixo da freqüência cardíaca de repouso, mesmo
nismo ao estresse de uma temperatura mais baixa com a pessoa exercitando-se (Ästrand, 1980). Ex-
visa desviar o fluxo sangüíneo da superf
superfície da pele plica-se essa baixa da freqüência cardíaca como um
para as áreas mais centrais, de modo a conservar a efeito de vários fatores atuando em conjunto, não

CAPÍTULO 205 2577


REABILITAÇÃO PULMONAR
se devendo apenas a apnéia do mergulho. Recepto- Gosker HR, Wouters EFM, Vusse GJ et al. Skeletal
res cutâneos participam dessa resposta, visto que ao muscle dysfunction in chronic obstrutive pulmo-
molhar apenas o nariz (ou a apnéia) a bradicardia é nary disease e chronic heart failure: underlying me-
constatada. No caso do mergulho prolongado, que chanisms e therapy perspectives. Am J Clin Nutr
71:1033-47, 2000.
gera uma hipoxemia progressiva, é também prová-
vel que quimiorreceptores contribuam nesse ajuste. Hul AV, Gosselink R, Hollander P et al. Acute effects of
Voltando à superfície, com as primeiras respirações, inspiratory pressure support during exercise in pa-
tients with COPD. Eur Respir J 23:34-40, 2004.
a freqüência cardíaca retorna a valores normais.
Hul AV, Kwakkel G, Gosselink R. The accute effects of
A câimbra é uma contração involuntária, du- noninvasive ventilatory support during exercise on
radoura e dolorosa, que aparece espontaneamen- exercise endurance e dyspnea in patients with chro-
te podendo se prolongar por vários minutos. Ela nic obstructive pulmonary disease. Journ Cardio-
ocorre em um determinado músculo ou grupo de pulmonar Rehabilitation 22:290-7, 2002.
músculos, e pode ocorrer durante o sono ou em Lake FR, Hendersen K, Briffa T et al. Upper limb e
outra situação de repouso, durante a atividade fí- lower limb exercise training in patients with chronic
sica ou horas após. Observa-se que a ocorrência de airflow obstruction. Chest 97:1077-82, 1990.
câimbras pode ser em função de alterações metabó- Lötters F, Tol B, Kwakkel G et al. Effects of controlled
licas decorrentes do treinamento, ou em função de inspiratory muscle training in patients with COPD:
fluxo sangüíneo deficiente para um grupo muscu- a meta-analysis. Eur Respir J 20:570-6, 2002.
lar. A presença de câimbras também está associada Man WDC, Hopkinson NS, Harraf F et al. Abdominal
à exposição à baixas temperaturas. As chamadas muscle and quadriceps strength in chronic obstruc-
câimbras do “calor” são observadas em decorrên- tive pulmonary disease. Thorax 60:718-22, 2005.
cia de exercícios prolongados, feitos em ambientes Neder JA, Nery LE. Fisiologia clínica do exercício: teoria
com temperatura elevada e com uma alta taxa de e prática. São Paulo, Artes Médicas, p. 404, 2003.
sudorese que acarreta uma perda excessiva de líqui- Neder JA, Sward D, Ward SA et al. Home based neu-
do e baixa acentuada nos íons corporais. Não está romuscular electrical stimulation as a new rehabili-
bem definido o mecanismo responsável pela câim- tative strategy for severely disabled patients with
bra, mas algumas teorias são levantadas. Monod e COPD. Thorax 57:333-7, 2002.
Flandrois (1994) citam dois prováveis mecanismos: Orozco-Levi M. Structure e function of that respiratory
co-ativação de nível anormal dos músculos ago- muscles in patients with COPD: impairment or ad-
nistas e antagonistas pode desencadear a câimbra; aptation? Eur Respir J 22(Suppl. 46):41S-51S, 2003.
modificação do conteúdo de Ca++ do sarcoplasma, Ries AL, Ellis B, Hawkins RW. Upper extremity exerci-
devido a uma insuficiência de ATP, não permite o se training in chronic obstructive pulmonary disea-
retorno do Ca++ para o retículo sarcoplasmático e se. Chest 93:688-92, 1988.
o relaxamento do músculo não ocorre. Em geral Salman GF, Mosier MC, Beasley BW et al. Rehabilita-
a câimbra é mais rapidamente eliminada quando tion for patients with chronic obstructive pulmona-
ry disease – meta-analysis of randomized controlled
se promove a extensão do grupo muscular afetado.
trials. J Gen Intern Med 18:213-21, 2003.
Wasserman K, Casaburi R, Whipp B. Principles of
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
exercise testing and interpretation. 3. ed. Lippincott
Costes F, Agresti A, Court-Fortune I. Noninvasive ven- Williams & Wilkins,Baltimore, USA, p. 556, 1999.
tilation during exercise training improves exercise Zanotti E, Felicetti G, Maini M et al. Peripheral mus-
tolerance in patients with chronic obstructive pul- cle strength training in bed-bound patients with
monary disease. Journ Cardiopulmonar Rehabilita- COPD receiving mechanical ventilation – effect of
tion 23:307-13, 2003. electrical stimulation. Chest 124:292-6, 2003.

2578
SEÇÃO 25
CAPÍTULO 206
REABILI TAÇ ÃO C A R D I OVA S C U L A R

Andrea Kaarina Meszaros Bueno


Pedro Veríssimo da Fonseca Neto
Vanessa Nishiyama Soloviov
Marcos Antonio Manara

DESTAQUES
 O exercício físico nas doenças cardiovasculares tem papel profilático e terapêutico. A prescrição da
atividade física deve observar as indicações, contra-indicações, intensidade, duração, freqüência e pro-
gressão.
 A reabilitação cardiovascular é classificada em fases I, II, III e IV.
 Neste capítulo, enfatizaremos a reabilitação cardiovascular no paciente grave em fase hospitalar (fase I).
 A reabilitação fase I consiste em estimular a progressão das atividades físicas, educar o paciente, dar
suporte psicológico e orientá-lo para alta hospitalar.
 Os pacientes coronariopatas, portadores de insuficiência cardíaca e os pacientes cardíacos cirúrgicos
constituem a maior parte da população que realiza reabilitação cardíaca hospitalar.

2579
INTRODUÇÃO O I Consenso Nacional de Reabilitação Car-
diovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia
Embora haja relatos de atividade física em me- define a reabilitação cardiovascular como um ramo
dicina desde o século XIX, a reabilitação cardiovas- de atuação da cardiologia que, implementada por
cular é ainda um procedimento jovem, nascido da equipe multiprofissional, permite a restituição ao
cardiologia. indivíduo das condições clínica, física, psicológica
Heberden, há aproximadamente 200 anos, já e laborativa satisfatórias.
recomendava a atividade física descrevendo seus
benefícios a pacientes com angor pectoris. Nas pri- CLASSIFICAÇÃO
meiras décadas do século passado, os pacientes
com infarto agudo do miocárdio (IAM) permane- Tradicionalmente a reabilitação cardiovascular
está classificada em quatro fases:
ciam em repouso absoluto no leito por seis a oito
semanas no hospital e igual período em domicílio. • fase I: fase aguda, fase hospitalar;
Acreditava-se que qualquer atividade física poderia • fase II ou ambulatorial: até 12 semanas de exer-
predispor a aneurismas ou rupturas ventriculares, e cício supervisionado após a alta hospitalar;
que a hipoxemia secundária ao esforço poderia pre- • fase III ou de manutenção: com duração variável,
cipitar arritmias, recorrência de infarto e até morte de monitorização intermitente e supervisionada;
súbita. Esse conceito foi reforçado após o estudo de • fase IV ou supervisionada a distância: não-su-
Jetter e White (1944), que mostrava alta incidência pervisionada.
de ruptura miocárdica em pacientes psiquiátricos Essa classificação, além de didática, tem relação
pós-infarto, sugerindo que a atividade física inevi- com o estado clínico em que o paciente se encontra.
tável neste tipo de paciente seria a causa. A partir À medida que o paciente progride nas suas ati-
de meados da década de 1940, Dock e Harrison vidades, necessita cada vez menos de monitoriza-
questionaram o repouso prolongado no leito, enfa- ção e supervisão direta.
tizando os riscos de tromboembolismo, pneumo-
Neste capítulo, enfatizaremos a atuação da fisio-
nias e perda de massa óssea e muscular. A partir de
terapia na reabilitação cardiovascular do paciente
1951, Levine e Lown já recomendavam sentar os grave em fase hospitalar. As principais indicações e
doentes em poltronas e a beira do leito. Em 1952, contra-indicações para um programa de reabilita-
Newman caracterizou como deambulação precoce ção cardiovascular encontram-se na Tabela 1.
3 a 5 minutos de caminhada, duas vezes ao dia,
na quarta semana pós-IAM. No início da década Fase I: avaliação e tratamento
de 1970, surgiram muitos estudos relacionados à
mobilização precoce no Reino Unido e nos Esta- Segundo a American Association of Cardiovas-
dos Unidos. Estudos controlados mostraram não cular & Pulmonary Rehabilitation (AACPR), para
haver diferença na ocorrência de angina, reinfarto, iniciar o programa de reabilitação hospitalar, o pa-
insuficiência cardíaca ou morte entre os pacientes ciente deve estar clinicamente estável, ou seja:
mobilizados na fase hospitalar após infarto quando • não apresentar dor torácica ou dor recorrente
comparados com os pacientes que permaneciam nas útlimas 8 horas;
em repouso. O primeiro conceito de reabilitação • não apresentar nenhuma anormalidade signifi-
cardiovascular surgiu em 1969, na Conferência de cante do ritmo cardíaco ou do ECG nas últimas
Mirtle Beach, na Carolina do Sul (EUA). Wenger 8 horas;
et al. sistematizaram a fase hospitalar da reabilita- • não apresentar nenhum sinal de descompensa-
ção cardíaca aplicando-a na unidade coronária e ção cardíaca (dispnéia ao repouso com alteração
enfermaria pela equipe multiprofissional. da ausculta pulmonar).

2580
SEÇÃO 25
TABELA 1 – Indicações e contra-indicações para um programa de reabilitação cardiovascular
Indicações Contra-indicações

Pós-infarto do miocárdio clinicamente estável Embolia recente/tromboflebite

Angina estável Angina instável

Pacientes submetidos à cirurgia cardíaca Estenose aórtica grave

Insuficiência cardíaca congestiva compensada Queda de pressão arterial maior que 20 mmHg com sintomas

Doença vascular periférica Diabetes descontrolada

Fatores de risco para doença arterial coronariana (DAC): diabetes mellitus, Pressão sistólica > que 200 mmHg ou pressão diastólica em repouso >
hiperlipidemia, hipertensão etc. que 110 mmHg

Transplante de coração Afecções ortopédicas graves

Angioplastia coronariana transluminal percutânea Insuficiência cardíaca congestiva descompensada

Cardiomiopatia Doença sistêmica aguda com febre

Doença renal Alteração em repouso do segmento ST

Arritmias descontroladas

Bloqueio AV total (sem marcapasso)

Segundo a American College of Sports Medi- sua execução, quando comparados aos pacientes
cine (ACSM), para identificar a dose adequada de que permanecem em repouso;
atividade para os pacientes internados, é importan- • oferecem maior confiança e segurança para o
te considerar a história clínica, o estado clínico e os paciente retornar ao lar e ao trabalho, reinician-
sintomas do paciente. Portanto, torna-se necessária do as suas atividades dentro dos limites impos-
a avaliação dos sinais vitais e da escala de percepção tos por sua doença;
de esforço (Borg), instrumentos necessários para a
O programa educacional da fase I tem como
identificação da intensidade, duração, freqüência e
principais objetivos:
progressão do exercício.
• fornecer informações sobre a doença cardíaca e
O exercício corretamente prescrito e supervisio-
fatores de risco;
nado por fisioterapeutas durante a hospitalização e
depois da alta proporciona numerosos benefícios • orientações sobre cuidados apropriados a serem
para pacientes cardíacos devidamente seleciona- tomados na presença de sinais e sintomas;
dos. Esses exercícios: • estratégias de modificação de fatores de risco in-
• melhoram os efeitos psicológicos e fisiológicos cluindo cessação do tabagismo e aconselhamen-
deletérios do repouso no leito durante a hospi- to nutricional;
talização; • informações sobre procedimentos de exames
• proporcionam uma vigilância clínica adicional aos quais o paciente poderá ser submetido;
dos pacientes por uma equipe multidisciplinar • orientações de alta incluindo cuidados com ati-
(médicos, fisioterapeutas, enfermeiros, nutri- vidade sexual, retorno ao trabalho e exercícios a
cionistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais, serem realizados em casa;
entre outros); • orientações sobre os benefícios físicos dos pro-
• podem identificar os pacientes com deficiências gramas de reabilitação cardiovascular fase II e
cardiovasculares, físicas ou cognitivas durante a III.

CAPÍTULO 206 2581


REABILITAÇÃO CARDIOVASCULAR
Portanto, a base para a reabilitação cardiovas- pendente. O exemplo de um programa de reabi-
cular nessa fase consiste em estimular a progressão litação fase I para pacientes que não apresentam
das atividades físicas, educar o paciente, dar supor- complicações é descrito na Tabela 2. Esse pro-
te psicológico e orientá-lo para alta hospitalar. grama é uma adaptação do protocolo da Emory
University School of Medicine para o Hospital
Reabilitação cardiovascular fase I em situações Israelita Albert Einstein (HIAE), e o gasto energé-
específicas tico (METs) foi estudado pelas medidas diretas de
consumo de oxigênio com doentes coronariopa-
Pacientes portadores de síndromes coronarianas
tas estáveis simulando os exercícios propostos. O
agudas, pós-angioplastia ou tratamento clínico
programa é composto de sete etapas progressivas
A fase I de reabilitação pós-infarto do mio- iniciando-se na unidade coronariana (UCO) até a
cárdio segue a estratégia de mobilização precoce, alta hospitalar. No início do programa, da primei-
iniciando movimentação passiva das articulações, ra à terceira etapa, a atividade deve ser de baixa
progredindo para sedestação e ortostatismo, atin- intensidade (2 METS), atingindo em torno de 4
gindo até a alta hospitalar a deambulação inde- METS até a última etapa.

TABELA 2 – Protocolo de fisioterapia cardíaca fase I – Insuficiência coronária


Etapa METs

1 2 Paciente deitado
(A) Exercícios diafragmáticos (1 x 10)
(B) Exercícios diafragmáticos associados a diagonal de Kabath, ativo-assistido ou ativo para MMSS (1 x 10 para cada membro)
(C) Repetir o exercício acima em 2 tempos (1 x 10 para cada membro)
(D) Repetir o exercício acima em 1 tempo com os dois membros simultaneamente
(E) Ativos-assistidos MMII → tríplice-flexão (1x10) + abdução/adução quadril (1x10) para cada membro
(F) Flexo-extensão de tornozelo(1x10) para cada pé
(G) Circundução de tornozelo (1x10) para cada pé
(H) Tosse assistida
(I) Pressão positiva (5x20) se necessário

2 2 Paciente sentado
Realizar os exercícios de A a I, de forma ativa

3 3 Paciente em ortostatismo
• Exercícios de (A) a (D) de forma ativa
• (J) ativos p/ MMII → com apoio de MMSS – ficar na ponta do pé (1x10) com dois membros simultaneamente
• Semi-agachamento (1x10)
• Abdução e adução (1x10) com um membro de cada vez
• Deambulação no quarto (1 volta = do leito até o banheiro e vice-versa)

4 3-4 Paciente em ortostatismo


• Mesmos exercícios da etapa 3
• Deambulação no corredor (50 m)

5 3-4 • Etapa 3
• Deambulação no corredor (100 m)

6 3-4 • Etapa 3
• Deambulação no corredor (150 m)
• Subir e descer 1/2 lance de escadas

7 3-4 • Etapa 3
• Deambulação no corredor (200 m)
• Subir e descer um lance de escadas

1 x 10: 1 série de 10 repetições


Adaptado do Grady Memorial Hospital and Emory University School of Medicine. Membros superiores: MMSS; membros inferiores: MMII.

2582
SEÇÃO 25
Segundo a ACSM, as recomendações para se TABELA 3 – Escala do esforço percebido de Borg
aplicar corretamente um protocolo são:
6 
• intensidade:
7  muito, muito fácil
– Borg inferior a 13 (Tabela 3);
8 
– freqüência cardíaca (FC) que não aumente 9  muito fácil
mais que 20 bpm em relação ao repouso;
10 
– até a tolerância se assintomático;
11  fácil
– são motivos para interrupção ou reanálise, a pre-
12 
sença dos seguintes sintomas: angina, dispnéia,
13  ligeiramente cansativo
tonturas, palidez, cianose, náusea, arritmias, re-
14 
ação hipertensiva (> 220 mmHg para sistólica e
> 110 para diastólica) e hipotensão postural. 15  cansativo

• duração: 16 

– duração total de até 20 minutos; 17  muito cansativo

18 
– exercícios intermitentes de curta duração (3
a 5 minutos); 19  exaustivo

– conforme a necessidade do paciente, oferecer 20 

repouso durante os exercícios de até 2 minutos.


• freqüência: derrame pleural, ineficiência de tosse, hipoxemia,
– mobilização precoce: 3 a 4 x/dia nos três pri- congestão pulmonar. A fisioterapia exerce um pa-
meiros dias e 2 x/dia a partir do quarto dia. pel fundamental em minimizar e até reverter estes
processos, aplicando técnicas específicas conforme
• progressão:
protocolo descrito na Tabela 4.
– inicialmente aumentar a duração até 10 a 15
minutos de exercício, e a seguir, aumentar a
Situações especiais
intensidade.
A presença ou manifestação de complicações • Para pacientes que evoluam com alterações neu-
são impeditivos temporários. Deve-se iniciar ou rológica, hemodinâmica, respiratória ou meta-
retornar ao programa assim que o problema for bólica iniciar o desmame da ventilação mecâni-
contornado. ca (VM) após a estabilização do quadro.
• Critérios clássicos são recomendados para des-
Pacientes em pós-operatório de cirurgia mame e desintubação.
cardíaca • Pacientes que evoluam com quadro de insufici-
ência respiratória após desintubação, sugere-se
As cirurgias cardíacas mais realizadas são revascu-
as seguintes condutas conforme a Figura 1.
larização do miocárdio, troca ou plastia valvar, trans-
plante cardíaco e cirurgia de grandes vasos (correção
de aneurisma de aorta, dissecção de aorta etc.). Pacientes portadores de insuficiência cardíaca
congestiva (ICC)
Inicia-se um vínculo com o paciente no pré-
operatório, e em seguida, a atenção deve focar as A ICC é definida como a inabilidade do co-
complicações respiratórias do pós-operatório. Co- ração em satisfazer as necessidades teciduais, que
mumente, estes pacientes apresentam atelectasias, resulta em sintomas como fadiga e dispnéia de es-

CAPÍTULO 206 2583


REABILITAÇÃO CARDIOVASCULAR
TABELA 4 – Protocolo de fisioterapia em revascularização do miocárdio
Pré-operatório POI 1º PO 2o PO, 3o PO, 4o PO A partir do 5o PO

UTI Semi-intensiva Enfermaria Enfermaria

• Avaliação de fisioterapia Quatro atendimentos Três atendimentos Dois atendimentos Dois atendimentos
F respiratória • Paciente intubado: • Suporte de O2 para satu- • Suporte de O2 para satu- • Suporte de O2 para satu-
I • Orientações quanto ao – modalidade AC em VC ração ≥ 95% ração ≥ 95% ração ≥ 95%
S tratamento de fisiotera- ou PC • RD • RD • RD
I pia, cirurgia, anestesia, – VT de 8 a 10 ml/kg/ • CR associada a exercí- • CR associada a exercí- • CR associada a exercí-
O UTI, intubação orotraque- peso cios ativos de MMSS cios ativos de MMSS cios ativos de MMSS
T al, drenos, dor e incisão – FiO2 para SpO2 > 95% • Inspiração sustentada • Inspiração sustentada • Inspiração sustentada
E cirúrgica PEEP de 5 cm H2O • Incentivadores • Incentivadores • Incentivadores
R • Realização de exercícios – pressão de platô < 35 • Tosse assistida • Tosse assistida • Tosse assistida
A • Avaliação física, exames cm H2O • RPPI • RPPI • Exercícios de MMII
P laboratoriais, RX de toráx, – relação I/E de 1:2 • Exercícios de extremida- • Sedestação • Deambulação no corre-
I identificar fatores de risco – frequência respiratória des • Exercícios de membros dor
A para complicações pulmo- 12 a 14 rpm • Sedestação inferiores (MMII) • Treino de subir e descer
nares • Pacientes com IMC > • Deambulação no quarto escada
30 kg/cm2 deve-se usar progredindo para corre-
inicialmente PEEP 10 cm dor
H2O e avaliar evolução
hemodinâmica
• Paciente desintubado:
– suporte de O2 para sa-
turação ≥ 95%
– respiração diafragmá-
tica (RD)
– cinesioterapia respira-
tória (CR) associada
a exercícios ativos de
membros superiores
(MMSS)
– inspiração sustentada
– incentivadores
– tosse assistida
– respiração com pres-
são positiva intermi-
tente (RPPI)
– exercícios de extremi-
dades

AC: assisto-controlado; VT: volume controlado; PC: pressão controlada; RD: respiração diafragmática; CR: cinesioterapia respiratória; MMSS: membros
superiores; I/E: inspiração/expiração; RPPI: respiração com pressão positiva intermitente; MMII: membros inferiores.

Desintubação

Sinais de insuficiência respiratória Sinais de insuficiência respiratória


hipoxêmica hipercápnica

CPAP BiPAP
PEEP ≥ 7,5 cmH20 Ipap e Epap para VT = 8-10 ml/kg
SpO2 ≥ 95% SpO2 ≥ 95%

FIGURA 1 – Condutas para pacientes com insuficiência respiratória após desintubação.

2584
SEÇÃO 25
forço progredindo para dispnéia em repouso. Estes treinamento específico, não é rotineiro este tipo
sintomas são atribuídos à uma variedade de defici- de procedimento no paciente internado, salvo a
ências, incluindo fluxo sangüíneo prejudicado para necessidade de desmame de ventilação mecânica
as necessidades metabólicas, respostas ventilatórias invasiva ou não-invasiva após detectar fraqueza
anormais, alterações da circulação periférica, perda muscular com repercussões clínicas importantes.
da função oxidativa da musculatura esquelética e Portanto, sempre que possível, a imobilização
fraqueza muscular respiratória. prolongada deve ser evitada, pois pode favorecer
Além disso, no paciente descompensado esses a estase venosa, embolia pulmonar, osteoporose,
sintomas podem ser ainda mais exuberantes devido retenção urinária, obstipação intestinal e infecções
à congestão pulmonar, hiperreatividade brônqui- pulmonares, descondicionar a musculatura esque-
ca e edema agudo de pulmão. Com isso, é muito lética, diminuir os reflexos vasomotores posturais.
comum nas unidades cardiológicas o uso de ven- Com isso, é evidente a importância da reabilitação
tilação não-invasiva (VNI) como tratamento não- precoce em pacientes portadores de ICC.
farmacológico de escolha para auxiliar na melhora
desses quadros. Abordagem da fisioterapia na fase II
Por isso, para esse grupo de pacientes, na fase (convalescença pós-alta hospitalar)
hospitalar da reabilitação, além dos cuidados rela- nos cardiopatas
cionados aos efeitos deletérios do repouso prolon- Os principais objetivos desta fase são: melhorar
gado no leito, esses pacientes necessitam de uma a capacidade funcional, diminuir os fatores de ris-
maior atenção com relação às complicações respi- cos cardiovasculares, restituir a autoconfiança e pre-
ratórias e do sistema músculo-esquelético, já que parar o paciente para sua atividade profissional, fa-
em sua maioria, podem apresentar cronicamente tores que propiciam melhora da qualidade de vida.
menor capacidade funcional, maior intolerância ao A inatividade imposta pela doença e a incerteza do
exercício e maior risco de complicações respirató- restabelecimento podem gerar ansiedade e depressão.
rias. Portanto, é muito importante avaliar clinica-
Recomenda-se, para a prescrição do exercício,
mente o custo-benefício do exercício neste pacien-
que os indivíduos sejam classificados, segundo o
te enquanto internado, pois considerando que ele
risco para exercício físico, em três classes: baixo,
interna quando descompensa, não está completa-
moderado e elevado risco (Tabela 5).
mente elucidado o momento certo de se iniciar a
reabilitação. No entanto, com bastante critério clí- A fase II inicia-se duas a três semanas após o
nico é interessante induzir esses pacientes a ativida- evento agudo. Os pacientes são submetidos a um
des progressivas precoces, respeitando seus limites, teste ergométrico convencional para prescrição da
mas nem sempre esperando sua total compensação. intensidade do exercício, cuja freqüência cardíaca
O uso de drogas vasoativas e de ventilação não-in- de treinamento corresponde a aproximadamente
vasiva em desmame não são impeditivos para o iní- 70% da capacidade funcional.
cio da reabilitação, pois a proposta é sempre de ati- O programa é constituído principalmente de
vidades de baixo consumo de oxigênio (2-4 METs) atividade aeróbica realizada três vezes por semana
assim como acontece com os pacientes infartados durante três meses. Cada sessão tem duração de 45
e, portanto, não levando a risco cardiovascular. minutos, sendo 10 minutos de aquecimento, 25 mi-
Outro fator relevante é a fraqueza dos músculos nutos de condicionamento e 10 desaquecimento.
respiratórios, que pode compor o quadro clínico Neste programa são inclusos também exercí-
destes pacientes. Apesar de evidências fisiopato- cios de resistência com peso, exercícios localizados
lógicas e clínicas da melhora dos sintomas após e de circuito.

CAPÍTULO 206 2585


REABILITAÇÃO CARDIOVASCULAR
TABELA 5 – Risco cardiovascular para exercício físico
Pacientes de baixo risco Pacientes de risco moderado Pacientes de risco elevado

Classe I e II da New York Heart Association Classe funcional I e II da New York Heart Classe funcional > III da New York Heart
Association Association

Capacidade funcional > 6 METs Função VE em repouso limítrofe Dois ou mais infartos do miocárdio

Ausência de insuficiência cardíaca Capacidade funcional > 6 METs Capacidade funcional < 6 METs

Ausência de sinais de isquemia no repouso e em Isquemia ou taquicardia ventricular não-sustentada Disfunção ventricular esquerda em repouso
intensidades < 6 METs no teste ergométrico

Elevação pressórica apropriada ao exercício Depressão do segmento ST > 3 mm ou angina


durante o exercício

Ausência de extra-sistolia ventricular complexa Queda da pressão arterial sistólica durante o


exercício

Capacidade de auto-avaliação da intensidade de Episódio prévio de parada cardiorrespiratória


esforço

Função VE em repouso preservada Taquicardia ventricular durante o exercício em


intensidade < 6 METs

Incapacidade de auto-avaliação de esforço

Aulas sobre a doença cardiovascular e controle Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia, não
dos fatores de risco também fazem parte desta pro- são elegí
elegíveis os pacientes com VO2 pico < 18 ml/
gramação. A reprogramação é normalmente feita kg/min (5METs), aparecimento de angina ou ou-
pelo duplo produto e evolução clínica diária, de tra manifestação clínica de isquemia do miocárdio
modo que ao final de três a quatro meses é realiza- em carga < 18ml/kg/min (5METs), infarto do mio-
do mais um teste ergométrico, podendo ser enca- cárdio extenso com fração de ejeção < 35% em re-
minhado para a fase III. pouso, teste ergométrico com redução de fração de
ejeção de 10% ao esforço, queda da pressão arterial
Abordagem da fisioterapia na fase III (após sistólica no teste ergométrico, arritmia ventricular
terceiro mês) complexa, intervalo QT corrigido > 440 ms, an-
tecedentes de parada cardíaca primária, inabilida-
Os integrantes das fases I e II podem iniciar a fase
de de automonitorização e aderência ao exercício,
III, recomendada para pacientes crônicos com estabi-
obesidade importante, hipertensão arterial refratá-
lidade clínica. Nessa fase procura-se alto nível de ati-
ria e diabetes mellitus descompensada. Na ausência
vidade para melhor desenvolver a capacidade aeróbia,
de contra-indicações, são elegíveis os pacientes es-
e atingir o máximo da capacidade física, compatível
táveis, após seis meses de treinamento, que apre-
com a capacidade funcional do coração. Tem a dura-
ção de 6 a 12 meses, sendo aconselhável estender por sentem conhecimento suficiente do treinamento
tempo indeterminado como procedimento de ma- aeróbio, temperamento e motivação capazes de to-
nutenção da capacidade e profilaxia da aterosclerose. tal aderência ao treinamento. A necessidade de trei-
namento prévio tem sido suprimida em inúmeros
relatos, e substituída por consultas, demonstrações
Abordagem da fisioterapia na fase IV
e palestras em grupos. Nesses casos, a reabilitação
A elegibilidade para reabilitação não supervisio- não supervisionada se torna possível para pacientes
nada varia pouco de acordo com diferentes autores. com perfil psicológico e sociocultural adequado.

2586
SEÇÃO 25
São considerados elegíveis para reabilitação não da SBC. Arquivos Brasileiros de Cardiologia 69:4,
supervisionada os pacientes de baixo risco para ati- 1997.
vidade física (Tabela 5). II Diretriz da SBC para tratamento de IAM. Arquivos
Brasileiros de Cardiologia 74:s.II, 2000.
CONSIDERAÇÕES FINAIS II Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia
(SBC) para diagnóstico e tratamento da insuficiên-
A reabilitação cardiovascular é efetiva para au- cia cardíaca. Arquivos Brasileiros de Cardiologia 72:
mentar a capacidade funcional, favorecer a modi- s.I, 1999.
ficação dos fatores de risco da doença, diminuir Leon AS, Costa F, Franklin BA, Balady GJ et al. Car-
sintomas e melhorar a qualidade de vida dos pa- diac Rehabilitation and Secondary Prevention of
cientes. Coronary Heart Disease – AHA Scientific State-
Apesar de benefícios cientificamente compro- ment. Circulation 111:369-76, 2005.
vados, apenas 10% a 20% dos pacientes elegíveis Meyer FJ. Respiratory muscle disfunction in congestive
participam de um programa de reabilitação cardio- heart failure: clinical correlation and prognostic sig-
vascular ambulatorial. Quando se trata de pacien- nificance. Circulation 103(17): 2153-8, 2001.
tes internados esta porcentagem é ainda menor já Porto CC, Bucher RDD, Meneghello RS. Doenças do
que, na maioria das vezes, esses pacientes iniciam a coração, prevenção e tratamento. Princípios da rea-
reabilitação somente quando apresentam compli- bilitação cardiovascular. 1. ed. Rio de Janeiro, Gua-
nabara Koogan, p. 73-82, 1998.
cações respiratórias.
Regenga MM. Fisioterapia em cardiologia: da unidade
A equipe multiprofissional deve conscientizar de terapia intensiva à reabilitação. São Paulo, Roca,
os pacientes sobre os benefícios da reabilitação pp. 243-60, 2000.
cardiovascular objetivando a captação de pacientes Robertson L. Guidelines for cardiac rehabilitation and
para estes programas e conseqüentemente atingin- secondary prevention programs. American Asso-
do toda a população com real indicação. ciation of Cardiopulmonary Rehabilitation. 3. ed.
Champaign, Human Kinetics, p. 281, 1999.
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA Stewart KJ, Badenshop D, Keteyian SJ et al. Cardiac
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Balady GJ, Berra KA, Golding LA et al. Diretrizes do
tion, heart transplant, heart valve surgery, and for
ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. 6.
chronic heart failure. Chest 123(6):2103-4, 2003.
ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2003.
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Gosker HR, Wouters EF, Van Der Vurse GJ et al. Ske-
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I Consenso Nacional de Reabilitação Cardiovascu- Womack L. Cardiac rehabilitation secondary preven-
lar. Departamento de Ergometria e Reabilitação tion programs. Clin Sports Med 22:135-60, 2003.

CAPÍTULO 206 2587


REABILITAÇÃO CARDIOVASCULAR
CAPÍTULO 207
FISIOT E R A P I A N O PAC I E N T E I D O S O

Telma de Almeida Busch Mendes


Marcos Roberto Faria
José Aparecido de Sousa Junior
Fátima Cristina Martorano Gobbi

DESTAQUES
 O estado funcional é freqüentemente medido por meio das atividades da vida diária (AVD), que
incluem as básicas, e as mais complexas são medidas pelas atividades instrumentais da vida prática
(AIVP).
 O benefício decorrente da avaliação geriátrica abrangente é demonstrado com mais eficácia com pro-
gramas para pacientes internados designados especificamente para avaliação e reabilitação sem aumen-
tar o tempo de internação.
 O objetivo sempre deve ser a manutenção da função, esta é essencial para medir a saúde global e o
bem-estar do idoso.

2589
INTRODUÇÃO pode não ser passageira, mas definitiva. Depender
de alguém sem o menor vínculo, sem o menor laço
O envelhecimento da população trouxe para
de afetividade pode fazer a vida perder o sentido e
a fisioterapia novos desafios. O perfil do paciente
nada ter mais valor a não ser esperar pela morte.
mudou exigindo a busca de novos conhecimentos
e a capacitação de profissionais para as áreas de Ge-
O CUIDADO COM O PACIENTE
riatria e Gerontologia.
IDOSO HOSPITALIZADO
Atualmente, o idoso responde pela maior parce-
la das internações. O grande número de comorbi- A hospitalização por uma doença aguda fre-
dades que envolvem o paciente idoso hospitalizado qüentemente leva a perda da independência fun-
o torna mais suscetível às complicações. Essas com- cional. Embora os resultados funcionais não sejam
plicações vão desde a imobilidade, perda funcional, usualmente o foco do cuidado no hospital em uma
incapacidade e institucionalização. fase aguda, eles são determinantes da qualidade de
Destas internações, um número nada desprezí- vida, da independência física, do custo dos cuida-
vel é de idosos que são vítimas de quedas ocorridas dos e do prognóstico entre pacientes idosos.
em espaço público ou privado. Queda é um pro- Nos Estados Unidos, a freqüência da hospita-
blema sério e comum para esta população e pode lização para idosos com 85 anos ou mais é duas
levar ao medo de cair, dor, lesões severas que po- vezes mais alta comparada com idosos com 65 a 74
dem aumentar o tempo de internação e a maiores anos. Os idosos apresentam a hospitalização mais
complicações com conseqüências desastrosas para freqüente e longa e a severidade da doença maior
qualidade de vida do idoso. comparados a pacientes jovens.
O objetivo deste capítulo é demonstrar a im- Múltiplos são os fatores hospitalares que podem
portância da avaliação na detecção dos vários pro- favorecer o declínio funcional. A própria causa da
blemas que envolvem o idoso hospitalizado; visan- internação, a doença aguda, pode comprometer a
do o idoso como um ser total, não fragmentado habilidade funcional, além do ambiente hostil. Es-
e, portanto, o quanto o trabalho transdisciplinar é ses fatores estão relacionados na Figura 1.
fundamental. A hospitalização representa na vida O estado funcional é freqüentemente medido
do idoso um evento sentinela. Reside aí a oportu- por meio das atividades da vida diária (AVD), que
nidade de os profissionais da área de saúde identi- incluem as básicas, e as mais complexas são me-
ficarem os pacientes de risco e evitarem os efeitos didas pelas AIVPs. Recentes estudos têm identi-
adversos da doença aguda e da hospitalização. ficado os fatores de risco para declínio funcional
O Brasil possui hoje cerca de 14,5 milhões de pela perda na performance das AVDs. Próximos
idosos, o que representa algo em torno de 9,1% da de um terço dos pacientes hospitalizados por do-
população total. Apesar de o envelhecimento co- ença aguda apresentam declínio funcional. Com-
locar-se neste país como fato recente, a população parados com a pré-admissão, 32% dos pacientes
idosa brasileira é considerada uma das maiores do apresentam declínio em uma ou mais funções das
mundo. Em poucos anos, esta população poderá AVDs e 40% em três ou mais funções, referências
superar a marca de 30 milhões de pessoas (IBGE- do mesmo estudo.
Censo/2000). Devido ao grande crescimento de idosos frágeis,
Preocupa-nos não só o custo de uma internação do custo elevado no cuidado de saúde, da incerteza
hospitalar e das complicações que podem aumen- do melhor a ser feito, alguns estudos realizados en-
tar esta estadia, mas o quanto significa na vida do tre 1973 e 1987 conduziram ao desenvolvimento
idoso a dependência e incapacidade funcional que de um Consenso para auxiliar na decisão clínica.

2590
SEÇÃO 25
Ambiente • Desordem dos
Doença aguda
hospitalar hostil corredores e barulho
aumenta o risco de queda
• Mudança na rotina
• Vários procedimentos
podem comprometer a nutrição
• Restrição imposta é
muitas vezes mal indicada
• Excesso de atividades
Comprometimento das Depressão, e exames complementares
habilidades funcionais expectativas negativas • Restrições: sondas,
(AVDs e AIVDs) da hospitalização cateteres prejudicando
a mobilidade
• Prescrições de medicações
inapropridas (delirium)

Perda de tônus
Perda de força
vascular = hipotensão Imobilidade
muscular, equilíbrio
ortostática

Desnutrição Perda de Complicações


condicionamento iatrogênicas: úlceras,
hipotensão ortostática

FIGURA 1 – Fatores relacionados ao declínio funcional do idoso hospitalizado.

Neste consenso, objetivos, estrutura, processos e • atentar para doenças pregressas e atuais;
elementos da avaliação geriátrica foram decididos. • permitir monitorar a evolução – documentar
Considerando os objetivos definidos na avalia- mudanças;
ção geriátrica, os objetivos de uma boa avaliação • predizer resultado.
fisioterapêutica devem ser: Estudos apontam a importância da avaliação
• melhorar a identificação do problema; geriátrica abrangente e da presença de um time in-
• guiar as intervenções; terdisciplinar específico para esta categoria.
• estabelecer objetivos a curto e longo prazo; O benefício decorrente da avaliação geriátrica
• identificar os fatores de riscos envolvidos (mo- abrangente é demonstrado com mais eficácia com
dificáveis ou não); programas para pacientes internados designados

CAPÍTULO 207 2591


FISIOTERAPIA NO PACIENTE IDOSO
especificamente para avaliação e reabilitação sem dade no leito e trocas posturais simples devem ser
aumentar o tempo de internação. incentivadas no limite possível. O idoso de uma
Muitos estudos sobre a queda encontraram UTI é bem mais grave devido a doenças múltiplas.
como fator de risco: idade, alterações no estado Sobrevivem apesar da enorme vulnerabilidade
mental, alterações cognitivas, quadro de confusão, e complexidade e têm alta desta unidade ainda ne-
alterações da mobilidade: fraqueza muscular, défi- cessitando de grandes cuidados que são proporcio-
cit de equilíbrio, instabilidade postural por tontu- nados na unidade semi-intensiva.
ra/vertigem, síncopes, certas medicações, doenças A inclusão de novos profissionais se torna pos-
crônicas (neurológicas), dificuldades nas elimina- sível à medida que o paciente apresenta alguma
ções e meio ambiente. evolução e pode advir da detecção de novos riscos
A avaliação fisioterapêutica deve ser parte de que servem como marcadores das necessidades es-
uma avaliação geriátrica abrangente, transdisci- pecíficas do paciente.
plinar. Não podemos desconsiderar na avaliação A avaliação nutricional é importante para nor-
o respeito pelas diferenças próprias da faixa etária. tear a intervenção proposta pelo fisioterapeuta. Isto
Cada profissional faz sua avaliação e focaliza as in- reforça mais uma vez a importância do trabalho em
tervenções nos problemas detectados, contribuin- equipe. Existem condições que podem predispor o
do para o desenvolvimento de um plano de cui- idoso a um quadro temporário com sintomas simi-
dados coordenados. Cada integrante desta equipe lares a demência, com a perda da função intelec-
tem seu papel e estabelece objetivos, os quais são tual e cognitiva que são a febre alta, desidratação,
compartilhados e (muitas vezes inter-relacionados) depressão, reações medicamentosas, desequilíbrio
com os demais membros. Estes objetivos funcio- eletrolítico, deficiência de vitaminas, desnutrição.
nais devem ser estabelecidos com o paciente, a fa- Certas emoções como extrema tristeza, solidão,
mília e ou cuidador, assim que possível. ansiedade, estresse, podem causar sintomas como
Hoje com o advento da humanização na UTI, esquecimento, perda da memória, confusão. A di-
esse trabalho é possível e envolvente. A família ou ficuldade de lidar com a mudança ou perda da au-
acompanhante podem permanecer ao lado do pa- tonomia, de direcionamento nas atividades da vida
ciente, o que pode minimizar o trauma da mudan- diária, que é comum para quem se aposenta, pode
ça ambiental que para o idoso é fator desencadean- também causar este quadro.
te de confusão. Podem dessa forma participar mais O paciente deve ser reavaliado a cada terapia e
e receber orientações importantes ainda nesta fase novos objetivos devem ser propostos a cada meta
aguda, do melhor manejo, posicionamento e dos atingida. O objetivo sempre deve ser a manutenção
objetivos de cada profissional envolvido. da função, esta é essencial para medir a saúde global
Quando a unidade de internação é a UTI, a e o bem-estar do idoso. Assim se faz necessário o
avaliação fisioterapêutica ocorre automaticamente uso de ferramentas especiais para esta avaliação, os
e o idoso segue em programa de fisioterapia após instrumentos utilizados devem ser sensíveis a esse
uma discussão em equipe voltada para as necessida- grupo, para que os resultados sejam fidedignos.
des específicas do paciente. Embora esta avaliação
seja precoce e global, muitas vezes a gravidade do História
paciente exige que se estabeleçam prioridades no
atendimento inicial. A insuficiência respiratória e Saber ouvir o paciente é fator essencial para um
a dependência mecânica de um respirador podem diagnóstico correto. Só que esta coleta pode ser
limitar algumas intervenções. Neste momento, a muito difícil por inúmeros fatores que envolvem os
manutenção da força muscular, da ADM, mobili- idosos e que podem dificultar esta comunicação.

2592
SEÇÃO 25
A audição prejudicada, a visão, a falta de aten- (AIVD). O nível de consciência pode comprome-
ção, memória são exemplos que também reforçam ter a avaliação respiratória e motora inicial por isso
a necessidade de se coletar a história com a família esta deverá ser completada posteriormente. Aspec-
e/ou cuidador, sempre considerando o idoso no tos da mobilidade do idoso duas semanas antes da
seu ambiente socioeconômico. internação, bem como do seu ambiente social, seu
Além disso, muitos dos sinais e sintomas de doen- bem-estar psicológico devem ser interrogados com
ça não são valorizados pelos idosos que acabam con- a pessoa mais próxima deste idoso.
siderando-os próprios da idade. O medo da doença, O exame físico deve ser específico e conter:
incapacidade ou depressão pela perda da indepen- • nível de consciência: se consciente, orientado
dência contribuem para a negação do idoso diante de (temporal e espacial) ou confuso, comatoso. Há
perdas e isto pode comprometer a história. Por outro várias escalas para avaliar o nível de consciên-
lado as queixas devem ser ouvidas com muita atenção cia, mas nenhuma delas contempla de maneira
já que podem ajudar a discernir as manifestações agu- completa essa avaliação. Escalas CAM – The
das das crônicas. “A clínica é soberana”. Por alterações Confusion Assessment Method avalia o estado
da imunidade o idoso pode não apresentar sintomas confusional agudo (ECA). Devem ser aplicadas
típicos, como é o caso de uma pneumonia sem febre pelo menos duas vezes por dia e a partir do re-
ou tosse e, nos casos de úlcera ou infarto do miocár- sultado positivo medidas devem ser tomadas.
dio, a dor pode se manifestar em menor grau. Mesmo Além do nível de consciência, deve ser analisa-
nas infecções, alterações no hemograma podem não do o estado cognitivo do paciente, a fim de oti-
ocorrer. Observar mudanças nos sintomas pode con- mizar a sua integração e participação efetiva no
tribuir nos achados do que pode ser modificado. tratamento;
Esclarecer qual a expectativa do idoso, a expec- • sinais vitais: FC e ritmo cardíaco: identificar a
tativa do familiar, do cuidador com relação a fisio- presença de arritmias principalmente durante a
terapia, e poder predizer os resultados possíveis e intervenção fisioterapêutica; PA: deve ser checa-
quais não serão. Avaliar o impacto que a doença ou da em ambos os braços quando possível devido a
o problema tem sobre este idoso e sua família. arteriopatias e a pseudo-hipertensão que podem
A própria adesão do paciente ao tratamento estar presentes. Há exceções como em mastecto-
depende de como estes objetivos são traçados, se mias com esvaziamento ganglionar, suspeitas de
juntos ou não. À medida que os objetivos a curto TVP. Deve ainda ser checada em posições dife-
prazo são alcançados maior é o estímulo para se rentes a cada três minutos para descartar hipo-
alcançarem objetivos mais difíceis. tensão ortostática. FR: a frequência respiratória
Outro fator que deve ser valorizado pelo pro- e o ritmo elevado são indicadores de alterações
fissional que avalia são os antecedentes que estão cardiopulmonares ou ainda neurológicas. Vários
relacionados a história pregressa do paciente. fatores como secreção traqueal ou de VAS advin-
das de uma pneumonia podem ser ou não por
Exame físico broncoaspiração, infecções do trato respiratório
mais alto podem resultar em aumento dos níveis
O exame físico tem como objetivo identificar de CO2 e rebaixamento do nível de consciência,
problemas que comprometem a funcionalidade do causando até queda de língua e microaspirações.
idoso e qualidade de vida está intimamente rela- A causa ainda pode ser distúrbios eletrolíticos
cionada ao status funcional, ou seja, as habilidades com alterações no nível de consciência. Aten-
funcionais, divididas em atividades da vida diária ção deve ser dada a oxigenação adequada com
(AVD) e atividades instrumentais da vida diária vigilância na oximetria e posicionamento do pa-

CAPÍTULO 207 2593


FISIOTERAPIA NO PACIENTE IDOSO
ciente. Muitas vezes o paciente relata falta de ar Avaliação neurológica
com padrão respiratório irregular e saturação de
oxigênio adequada. Neste caso deve-se investi- Na presença de déficit neurológico importante
recomendamos uma avaliação neurológica especí-
gar outros fatores e exames laboratoriais como
fica onde predomínio do comprometimento seja
gasometria e/ou radiografia;
identificado, bem como a coordenação e reflexos.
• ausculta pulmonar: deve-se descrever as altera-
ções mais freqüentes;
Avaliação funcional
• alterações do estado geral: desidratação, desnu-
trição, palidez; O estado funcional e de saúde são influenciados
• alterações de pele: escaras, úlceras; por fatores físicos, psicológicos e socioeconômicos.
Assim é preciso avaliar o idoso em diversos domí-
• palpação: avalia o tônus muscular, normalmen-
nios: físico, mental, social, econômico, funcional e
te comprometido pela idade. Avalia flexibili-
ambiental, os quais se interligam.
dade, detectar a presença de encurtamentos e
deformidades. Existem vários instrumentos confiáveis e valida-
dos que foram desenvolvidos para serem aplicados
em idosos, mas o fundamental na escolha do ins-
Amplitude de movimento trumento é que ele seja sensível a população que se
Deve-se avaliar a ADM passiva e ativa. O que estuda. Idosos que vivem em comunidade? Institu-
se observa é a limitação da articulação e de suas cionalizado? Frágil? Saudável?
estruturas ao movimento (cápsula, ligamentos, Os testes submáximos são os de maior aplicabi-
membrana sinovial e músculos). lidade a esta população, pois impõem menor risco
O comprometimento das ADMs de cervical e e proporcionam maior segurança ao terapeuta.
tornozelo está relacionado ao aumento de queda A escala FIM é a que assegura uma avaliação
em idosos. mais completa da mobilidade e da funcionalidade
do idoso restrito ao leito e incapaz de realizar ou-
Força muscular tros testes.
O índice de Barthel é o mais utilizado para
Existem vários instrumentos para avaliar a for- AVDs e a escala de Lawton para AVPs.
ça muscular. Adotaremos aqui a escala de Kendall:
O índice de Katz também avalia o desempenho
• grau 0 – força zero: sem contração visível ou do idoso nas AVDs, mas não é um teste de fácil
palpável; aplicabilidade.
• grau 1 – força 1: só esboça contração muscular, A escala Tinetti avalia a marcha e o equilíbrio
mas insuficiente para produzir movimento mes- no idoso, mas é de difícil e demorada aplicação.
mo sem gravidade;
Um recente estudo de 2002 revelou a concor-
• grau 2 – força 2: inicia o movimento, mas não dância entre observadores dos testes de sensibili-
completa a ADM; dade cutâneo do calcanhar esquerdo, time up and
• grau 3 – força 3: completa o movimento sem a go modificado, o step test 10,5, 20,5, 30,5 cm e
resistência da gravidade; POMA, o que sugere serem testes reprodutíveis,
• grau 4 – força 4: completa a ADM, contra a não sujeitos a interpretação do observador.
gravidade; O teste time up and go modificado avalia o
• grau 5 – força 5: completa a ADM contra a gra- tempo gasto para uma população de idosos reali-
vidade e com resistência. zar uma tarefa solicitada. Verificou-se uma relação

2594
SEÇÃO 25
entre dependência de AVD e a performance no meia-vida é de 21 dias o que dificulta uma rea-
teste. Sabemos da importância da funcionalidade valiação rápida do tratamento.
por isso este teste pode ser complementado com a • Pré-albumina: tem uma meia-vida menor (três
realização de dupla tarefa, o que exigiria dele maior dias), portanto é mais rápida para avaliar a mu-
concentração, mas o aproximaria das atividades do dança no tratamento.
dia-a-dia.
• Exame da prega cutânea: avalia a massa ma-
O POMA avalia equilíbrio e marcha e mostrou gra/% de gordura, mas só é válido na ausência
grande especificidade para uma população de ido- de edema.
sos institucionalizados.
• Balanço nitrogenado: avalia o metabolismo
A escala de BERG não é sensível para idosos protéico e o catabolismo, ou seja, se a dieta está
saudáveis e avalia o equilíbrio funcional, sendo adequada. Vários fatores podem aumentar o ca-
aplicável para idosos institucionalizados ou que vi- tabolismo: febre, infecção, TCE e AVE.
vem em comunidade.
• Antígeno prostatático específico: pode estar ele-
vado em pacientes com hiperplasia de próstata
Exames laboratoriais
no início.
• Albumina: ocorre declínio do valor (< 0,5 g/ml) Alterações com o processo de envelhecimento e
com a idade, especialmente em idosos hospita- sua importância para a intervenção fisioterapêutica
lizados, mas geralmente indica desnutrição. A estão listados na Tabela 1.

TABELA 1 – Envelhecimento e possibilidade de intervenção fisioterapêutica


Cuidados preventivos Alterações Sistema envolvido Intervenção fisioterapêutica1
Manter mobilidade presente evitando • Dispnéia, tosse persistente, tra- • Respiratório • Higiene brônquica, suporte de
deixar o idoso na cama queobronquite, pneumonia oxigênio se SpO2 menor que 93%
• Queda da PO2, considerar a fórmu- (limite = 88%)
la: 96 - (idade x 0,4) • Atenção ao posicionamento (cabe-
ceira elevada)
• Avaliar necessidade de VNI
• Ortopnéia, edema, angina, claudi- • Cardiovascular • Avaliar necessidade de VNI
cação, palpitação, síncope • Posicionamento no leito
Manter cabeceira 45º durante as • Refluxo, dificuldade na deglutição • Gastrintestinal • Posicionar o paciente sentado ou
dietas e evitar a fisioterapia durante a com queimação no decúbito lateral elevado e aspi-
administração rar VAS
Orientar decúbito lateral elevado, • Engasgo, tosse freqüente ao rece- • Sistema neurológico e músculo- • Manter via aérea pérvea, higiene
evitar queda de língua e solicitar ber dieta VO – provável disfagia esquelético brônquica e, ao final, aspiração
avaliação fonoaudiológica e naso-traqueal ou traqueal. Orientar
nutricional – rever dieta decúbito elevado, lateral ou senta-
do, com cabeça bem alinhada
Aumenta o risco de queda • Freqüência nas eliminações, ur- • Geniturinário • Tratamento específico da inconti-
– identificar o risco com pulseira de gência, noctúria, incontinência nência – biofeedeback, cinesiote-
cores diferentes – intervenções1 rapia
Risco de fraturas – orientação • Diminuição da densidade óssea • Sistema ósseo • Tratamento dependerá das conse-
nutricional e acompanhamento – osteoporose qüências e, local da fratura. Mas
médico, fisioterapia preventiva, deve envolver cinesioterapia e ter-
exercícios físicos para melhorar moterapia quando necessário para
a flexibilidade, equilíbrio e alívio da dor, bem como o que foi
fortalecimento muscular utilizado na prevenção e individua-
individualizado em grupo lizado
1
As intervenções são um trabalho conjunto da equipe de enfermagem e reabilitação que dependerão da classificação quanto à severidade do risco.

CAPÍTULO 207 2595


FISIOTERAPIA NO PACIENTE IDOSO
TABELA 1 – Envelhecimento e possibilidade de intervenção fisioterapêutica (continuação)
Cuidados preventivos Alterações Sistema envolvido Intervenção fisioterapêutica1
Visão – encaminhar ao oftalmologista • Distúrbios da visão, perda da au- • Sistema neurológico • Fortalecimento muscular
Audição – otorrino dição, Instabilidade postural e ou • Exercícios de equilibrio, integração
Avaliação específica do equilíbrio e desequilíbrio, tonturas sensorial
balanco • Exercícios de mobilidade global
Avaliação do ambiente do idoso2 • Reabilitação vestibular
• Exercícios de orientação corporal e
alinhamento
Todos exercícios utilizados como • Perda da elasticidade, aumento • Sistema conjuntivo • Exercícios de mobilidade e flexibili-
reabilitadores podem e devem ser da rigidez, perda da mobilidade e dade
usados como preventivos flexibilidade – dificuldade na mo- • Exercícios de alongamento
bilidade em geral: transferências, • Treino de equilíbrio estático e dinâ-
abaixar e levantar, subir de descer mico
degraus • Treino de marcha simples e com
obstáculos, distratores
Cuidados com TVP • Fadiga (diminuição do VO2 máx) • Sistema cardiopulmonar • Treinamento muscular quando PI
Diagnóstico diferencial e cuidados • Diminuição da força dos músculos < 60
com hipotensão ortostática respiratórios (PI/PE), da elasticida-
de da caixa torácica, diminuição da
atividade ciliar; pode comprometer
a tosse, causar acúmulo de secre-
ção – risco de infecções respirató-
rias
• Diminuição da circulação periférica
– risco de edema de MMII e TVP
• Diminuição da efetividade dos ba-
roceptores – risco de hipotensão
ortostática
A desnutrição é fator de alerta ao • Diminuição da visão: dificuldade • Sistema sensorial e alterações nu- • Uma boa conduta é interagir com
fisioterapeuta no preparo do alimento tricionais no idoso nutricionista e dosar a intervenção
• Diminuição do paladar proporcionalmente a adequação da
• Diminuição do olfato – diminuição dieta e exames
do apetite
• Perda dos dentes – diminuição da
ingestão calórica
Incentivar a mobilidade no leito até • Imobilidade • Envolve vários sistemas: • Exercícios que incentivem a mobi-
as AVDs, evitar restrições físicas ou • Músculo-esqueléticos, ósseo, vas- lidade ativa, transferências, ortos-
ambientais cular tatismo e deambulação
Avaliar a marcha e a necessidade de • Restrições para deambular • Sistemas muscular e vestibular • Treino de marcha e equilíbrio com
adaptação para a marcha adaptação ou não
Identificar os fatores de risco, a • Queda • Sistema muscular, neurológico, • Realizar reabilitação com exer-
severidade, realizar orientação (vestibular) cícios gerais e específicos para
educacional e monitorar • Ósseo fortalecimento muscular, treino de
Eleger os pacientes que têm equilíbrio, reabilitação vestibular,
indicação de realizar reabilitação quando necessário
preventiva
Diagnosticar precocemente, impedir • Medo de cair • Psicológico ou outros sistemas • Estimular a realização das ativi-
as restrições das atividades caso podem estar envolvidos dades eliminando os mecanismos
exista e encaminhar ao psicólogo envolvidos: fraqueza muscular,
quando necessário perda de equilíbrio etc.
Realizar o screening de depressão • Depressão • Psicológico • Necessidades psiquiátricas ou
nas primeiras 24 de admissão psicológicas são discutidas com
o time bem como a evolução do
tratamento
2
Atenção com tapetes em locais de circulação, pisos escorregadios,mobiliários etc.

2596
SEÇÃO 25
TABELA 1 – Envelhecimento e possibilidade de intervenção fisioterapêutica (continuação)
Cuidados preventivos Alterações Sistema envolvido Intervenção fisioterapêutica1
Todos os pacientes são avaliados • Delirium • Medidas para diminuir os fatores de
diariamente e anotadas as mudanças risco para delirium:
comportamentais otimizar a função cognitiva
prevenir a perda do sono
evitar a imobilidade
melhorar a visão e audição
tratar a desidratação(função médica)
Orientação espacial e temporal • Desorientação • Sistema cognitivo • Papel do time interdisciplinar
– calendários e relógios de fácil
manuseio

CONSIDERAÇÕES FINAIS Fletcher K. Immobility: geriatric self-learning module.


Medsurg Nurs 14(1):35-7, 2005.
A fisioterapia tem papel fundamental na reabili- Fulmer T, Guadagno L, Dyer CB et al. Progress in el-
tação do idoso, tanto no aspecto preventivo quanto der abuse screening and assessment instruments. J
restaurador da incapacidade. AMGS 52:297-304, 2004.
Esse trabalho só tem resultado positivo se for Grieve J. Neuropsicologia em terapia ocupacional
parte de um time transdisciplinar focado nas ne- – exame da percepção e cognição. 2. ed. São Paulo,
cessidades específicas do idoso. Este time deve ter Santos, 2005.
como foco o cuidado no paciente, a revisão dos Guimarães LHCT; Galdino DCA, Martins FLM et al.
problemas ativos, a preocupação em diminuir o Comparação da propensão de quedas entre idosos
tempo de internação, prevenir o declínio funcional que praticam atividade física e idosos sedentários.
Revista Neurociências 12(2):1-6, 2004.
advindo de uma hospitalização, atenção específica
na transição dos cuidados do hospital para a casa, High KP, Salem W. The Importance of geriatric – specif
instruments and functional status assessment in
criando uma trajetória “funcional”, considerando infectious diseases research: time to start preach-
as exigências dos cuidados em casa. ing to the congregation instead of the choir. JAGS
Realizar modificações no ambiente hospitalar, 52:1768-70, 2004.
maximizando a independência física e encorajando Kauffman TL. Manual de reabilitação geriátrica. Rio de
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CAPÍTULO 207 2597


FISIOTERAPIA NO PACIENTE IDOSO
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2598
SEÇÃO 25
CAPÍTULO 208
FISIOT E R A P I A N O T R A N S P L A N T E

Celso Bella Junior


Marcos Antonio Manara
Sabrina Lacroce Santiago Oliveira
Marcia Helena Faro Savoy

DESTAQUES
 A fisioterapia no paciente transplantado tem como principais objetivos prevenir e tratar as alterações
pulmonares e músculo-esqueléticas.
 Uma equipe multidisciplinar preparada deve estar presente com o paciente a ser transplantado.
 A avaliação pré-operatória permite identificar os fatores de risco e instituir conduta fisioterapêutica
específica; tratando quando se faz necessário, orientando e deixando-o em melhores condições para o
transplante.
 Estando presente a estabilidade do quadro clínico e cirúrgico, o processo de desmame da ventilação
mecânica e extubação devem ser realizados o mais precocemente possível.
 A utilização da ventilação não-invasiva no pós-operatório de transplante pode ser necessária.
 A fisioterapia deve ser precoce, iniciando-se logo após a cirurgia; técnicas de fisioterapia respiratória
como manobras de higiene brônquica e exercícios respiratórios devem ser realizados.
 O paciente deve ser orientado a continuar realizando exercícios respiratórios, deambulação e exercícios
de baixa resistência para a musculatura global após a alta hospitalar.
 É indicado um programa de reabilitação principalmente para pacientes que realizaram transplante
pulmonar e cardíaco, se possível três vezes por semana, para melhora da capacidade física e conseqüen-
temente melhora da qualidade de vida.

2599
INTRODUÇÃO • avaliação da função pulmonar: as complicações
pulmonares são constante preocupação no perío-
A fisioterapia no paciente transplantado tem
do pós-operatório. A avaliação pode ser feita por
como principal objetivo prevenir e tratar as altera- meio de um ventilômetro. São medidas simples
ções pulmonares e músculo-esqueléticas. que podem ser tomadas à beira do leito e que per-
Diversas complicações podem estar presentes na mitem ao fisioterapeuta um acompanhamento fiel
fase pré-operatória decorrentes do tempo de espera da função pulmonar, tanto no pré como no pós-
para a realização do transplante e o agravamento da operatório, nos mostrando o volume-corrente, vo-
doença. A oportunidade de o fisioterapeuta avaliar lume-minuto e a capacidade vital. É de se esperar
o paciente nesta fase traz benefícios no que diz res- que nos transplantes de rim e pâncreas (cirurgia
peito a orientar, prevenir e tratar, deixando-o em abdominal baixa) o volume e a capacidade pulmo-
melhores condições para a realização o transplante. nar podem sofrer alterações, mas com uma menor
Na fase hospitalar a fisioterapia possui um papel incidência e relevância comparada ao transplante
importante na prevenção, cuidados e tratamento de fígado (cirurgia abdominal alta) e às cirurgias
das possíveis complicações que podem ocorrer no torácicas (transplante de coração e pulmão);
período pós-operatório. • avaliação muscular respiratória: pode ser obtida
No momento da alta hospitalar o paciente deve por meio de um manovacuômetro, observando
ser orientado e direcionado para dar continuidade a as pressões inspiratórias e expiratórias máximas.
um programa de reabilitação, com objetivo de me- Opta-se por efetuar as medidas a partir da capa-
lhorar a capacidade funcional e qualidade de vida. cidade residual funcional (CRF), por ser o pon-
Uma equipe multidisciplinar preparada com- to de repouso para o sistema respiratório, não
posta por anestesiologistas, cirurgiões, clínicos, havendo, nessa situação, a interferência da ação
enfermeiros, nutricionistas, psicólogos e fisiote- de forças elásticas iniciais;
rapeutas deve estar presente com o paciente a ser • índice diafragmático: são medidas da circunfe-
transplantado. rência torácica e abdominal inspiratória e expi-
ratória, que podem ser medidas por meio de um
AVALIAÇÃO FISIOTERAPÊUTICA magnetômetro ou pletismografia de indutância;
PRÉ-TRANSPLANTE uma vez não dispondo destes equipamentos, os
dados podem ser obtidos a partir de uma medi-
Quando avaliamos o paciente no pré-operatório da linear, feita com uma fita métrica simples. O
é possível identificar os fatores de risco e instituir índice diafragmático é capaz de refletir o mo-
conduta fisioterapêutica mais específica; tratando vimento toracoabdominal, que evidência mu-
quando se faz necessário, orientando e deixando- danças nas cirurgias torácicas e nas abdominais
o em melhores condições para o transplante. É altas, com diminuição da pressão transdiafrag-
importante salientar que os fatores de risco estão mática e mudança no padrão respiratório, que
estreitamente correlacionados a complicação pul- se torna predominantemente costal por pelo
monar e podem ser classificados em fatores de risco menos 48 horas após a cirurgia;
anestésicos, cirúrgicos e clínicos. • tabagismo: a cessação do consumo de tabaco no
Na avaliação pré-operatória dos diversos tipos de pré-operatório deve-se dar num período míni-
transplante, seja ele de rins, pâncreas, fígado, coração mo de oito semanas, a fim de permitir a redução
e pulmão, devemos obter os dados pessoais de iden- das alterações no epitélio ciliado da árvore brôn-
tificação do paciente, além das datas de internação e quica e, conseqüentemente, diminuir a incidên-
cirurgia, hipótese diagnóstica e proposta cirúrgica: cias de complicações pulmonares;

2600
SEÇÃO 25
• exame físico: observa-se a ventilação, o tipo • interrupção do consumo tabagístico;
de tórax, a amplitude respiratória, o tipo res- • explicações gerais sobre o ato cirúrgico, como
piratório, a expansibilidade, cianose, dispnéia, tipo de incisão, intubação orotraqueal e sedação;
tiragens intercostais, tosse/expectoração e por • conscientização da importância da tosse no pós-
meio dos dados do peso e da altura do paciente operatório para evitar o acúmulo de secreções;
obtém-se o IMC e nota-se que o paciente des-
nutrido pode apresentar diminuição da respos- • explicação dos efeitos da imobilidade no leito,
ta ventilatória e diminuição da força contrátil orientação dos exercícios e deambulação precoce;
do diafragma, enquanto no obeso se percebe • se necessário, realizam-se exercícios fisioterápi-
diminuição progressiva da capacidade residual cos respiratórios. Identificada fraqueza da mus-
funcional (CRF) e do volume de reserva expi- culatura respiratória, pode-se realizar um treino
ratório (VRE), favorecendo o aparecimento de de fortalecimento e endurance com o threshold,
threshold
atelectasia e infecção pulmonar; caso o quadro clínico do paciente permita, dei-
xando-o em melhores condições para o ato ci-
• exames complementares: radiografia de tórax,
rúrgico e desmame da ventilação mecânica.
tomografia computadorizada, espirometria e
gasometria arterial;
ASPECTOS CIRÚRGICOS:
• quadro motor: com a falência de órgãos nobres e o IMPACTO PULMONAR
tempo na fila de espera pelo transplante, mudan-
ças fisiológicas podem envolver o sistema mús- Pacientes que realizam transplante estão susce-
culo-esquelético, cardiovascular e respiratório, o tíveis a complicações pulmonares principalmente
sistema nervoso central e periférico, o autônomo pelo longo tempo de cirurgia, procedimentos anes-
e endócrino e o sistema imunológico, repercutin- tésicos, além das alterações nas propriedades mecâ-
do no quadro motor e manifestando polineuro- nicas no período pós-operatório após a extubação.
patia, retinopatia, atrofia muscular, alteração da A incidência de complicações irá depender prin-
sensibilidade, diminuição ou ausência de reflexos cipalmente da incisão cirúrgica, diferenciando-se a
tendinosos, repercutindo nas atividades de vida cada tipo de transplante e a presença de fatores de
diária e na maioria dos casos impossibilidade risco.
para o trabalho. Cabe, nesses casos, avaliarmos No transplante hepático, a incisão localiza-se
o quadro motor, incluindo o trofismo muscular na região abdominal alta (subcostal). No procedi-
global, força muscular, edema, deformidades, en- mento cirúrgico convencional, a veia cava supra-
curtamentos e independência funcional; hepática é pinçada, uma porção do hemidiafragma
• capacidade física: as desordens músculo-esque- direito é incluída no pinçamento, provocando de-
léticas recorrentes a disfunção metabólica e nu- senvolvimento de derrame pleural à direita. A pa-
tricional são evidentes em grande parte dos can- ralisia do diafragma pode ser causada por lesão do
didatos a transplante, com maior impacto nos nervo frênico durante a clampagem da veia cava.
candidatos a transplante de fígado, coração e As principais complicações pulmonares posterior-
pulmão, repercutindo diretamente na capacida- mente a cirurgia são: derrame pleural, atelectasia,
de física, e o teste de caminhada de seis minutos pneumonia, paralisia diafragmática, aumento da
pode ser um marcador para objetivar melhora secreção pulmonar, desmame ventilatório difícil.
desses parâmetros no pós-operatório. No transplante pulmonar, devido ao porte
Concluída a avaliação pré-operatória, recomen- grande da cirurgia, complicações pulmonares es-
dam-se os seguintes cuidados e orientações aos pa- tão presentes com certa freqüência, tanto no que
cientes: diz respeito ao órgão vindo do doador, como por

CAPÍTULO 208 2601


FISIOTERAPIA NO TRANSPLANTE
exemplo, uma hiper-hidratação anteriormente à ci- a hipertensão pulmonar, situação ao qual o novo
rurgia acarretando edema pulmonar ou até mesmo órgão não está preparado.
embolias, como no receptor. Durante o ato cirúr- A esternotomia produz piora da função pul-
gico pode-se ter secção total dos vasos linfáticos e monar por disfunções ventilatórias restritivas. A
presença de circulação extracorpórea (CEC) levan- paralisia/paresia do nervo frênico pode ser encon-
do a isquemia e reperfusão, além do tempo longo trada por traumas ou lesões na região. As infec-
intra-operatório. Deve-se também contar com a ções pulmonares podem estar presentes ainda na
denervação que ocorre ao transplantarem o órgão, fase hospitalar, sendo mais freqüente nos primei-
havendo posteriormente comprometimento do ros meses após o transplante. O trato respiratório
movimento mucociliar. e renal são as regiões mais acometidas por bacté-
O “novo órgão” quando já transplantado apre- rias e vírus.
senta vários fatores desfavoráveis como propensão Os principais fatores predisponentes a infecção
a inúmeras infecções principalmente devido ao pulmonar são: imunossupressão, disfunção em
contato direto com o meio ambiente e ventilação outros órgãos, intubação prolongada, estado nu-
mecânica no pós-operatório imediato, além de tricional, doenças ou infecções associadas, trom-
deiscências de suturas de anastomose brônquica boembolismo pulmonar, agressão cirúrgica e de-
devido a escassa irrigação sangüínea. As infecções senvolvimento de instabilidade hemodinâmica no
tanto bacterianas como fúngicas são as principais pós-operatório imediato.
causas de mortalidade entre os transplantados, No transplante de rim, a incisão cirúrgica é mais
tanto no pós-operatório imediato, quanto tardio. baixa havendo menor incidência de complicações
Rejeição aguda, lesão pulmonar secundária à is- pulmonares quando comparada aos outros trans-
quemia e reperfusão são caracterizadas por derra- plantes citados acima, sendo mais observada em
me pleural intenso, queda de saturação arterial de pessoas com doença pulmonar prévia, porém são
oxigênio (SatO2) aos mínimos esforços e infiltrado também pacientes que realizam tratamento com
intersticial na radiografia de tórax. A deiscência de imunossupressor, levando ao comprometimento
anastomose brônquica se apresenta menos freqüen- das defesas imunológicas do organismo, aumen-
te em relação a décadas anteriores, porém constitui tando a probabilidade de infecções.
uma parcela importante de ocorrências no pós-
Em geral, pacientes transplantados no período
operatório, visto que a dificuldade de cicatrização
pós-operatório podem desenvolver complicações
brônquica devido a vascularização e denervação é
pulmonares por alteração da função pulmonar
muito acentuada.
(volumes e capacidades), como também altera-
No transplante cardíaco, durante a cirurgia, ções nas propriedades mecânicas no período pós-
quando o receptor é submetido à anestesia geral e operatório após extubação. Ocorre diminuição
circulação extracorpórea (CEC) para implementa- do volume-corrente com aumento da freqüência
ção do órgão, tanto o tecido miocárdico quanto o respiratória, com intuito de manter a ventilação
pulmão sofrem alterações fisiológicas. minuto (volume de gás ventilado por minuto). A
Devido à CEC, poderemos ter o “pulmão pós- resistência e a elasticidade pulmonares estão au-
perfusão” em um pós-operatório imediato que ca- mentadas, implicando em um aumento do traba-
racteriza-se por resistência pulmonar aumentada, lho respiratório, havendo tendência à movimen-
ou seja, diminuição da complacência pulmonar tação paradoxal na inspiração. Entretanto, apesar
devido ao edema, áreas de hemorragia ou presença do uso de modernas técnicas de cuidados preven-
de células septais dentro da luz alveolar, septos al- tivos, as complicações pulmonares ainda ocorrem
veolares espessados, áreas de shunt
shunt, principalmente com freqüência.

2602
SEÇÃO 25
FISIOTERAPIA NO sem presença de drive no momento da admissão,
PÓS-OPERATÓRIO as modalidades de ventilação mecânica controladas
devem ser escolhidas.
Após o término da cirurgia, os pacientes em
pós-operatório imediato de transplante são enca- Estando presente a estabilidade do quadro clíni-
minhados à UTI aos cuidados da equipe multipro- co e cirúrgico, o processo de desmame da ventila-
fissional, onde se iniciam os processos de avaliação, ção mecânica e extubação devem ser considerados.
monitorização e tratamento específico. A avaliação Quando a retirada do suporte ventilatório não
é um instrumento importante para o direciona- é possível no pós-operatório imediato como preco-
mento terapêutico e tem como objetivo a obtenção nizada, a sua manutenção deve ser prudente, crite-
e interpretação de dados relevantes sobre o pacien- riosa e cercada por cuidados específicos devido aos
te à beira do leito. Duas fontes fundamentais de efeitos deletérios que podem ocorrer de sua pre-
dados sobre o paciente são a anamnese e o exame sença, como o surgimento das pneumonias asso-
físico, que ajudam a identificar a necessidade ou ciadas a ventilação mecânica, a fraqueza muscular
não de intervenções imediatas ou futuras. respiratória e as lesões pulmonares decorrentes de
No exame físico inicial o fisioterapeuta deverá estratégias ventilatórias mal aplicadas.
avaliar os seguinte sistemas: Em relação aos cuidados específicos necessários
• neurológico: nível de consciência do paciente com o paciente ventilado artificialmente podemos
mediante as escalas de Glasgow e Ramsay; citar:
• respiratório: inspeção torácica, padrão respira- • certificação e/ou estabelecimento da via aérea
tório, expansibilidade torácica, freqüência res- patente adequada por meio de um tubo en-
piratória, tosse, ausculta pulmonar, presença de dotraqueal, fixação adequada na rima labial de
drenos, de oxigênio suplementar, oxigenação modo a não seletivá-lo em um dos brônquios
pela oximetria de pulso, presença de intubação principais levando ao colapso do pulmão não
traqueal e ventilação mecânica, radiografia de ventilado ou a eventos de extubação acidental,
tórax e gasometria arterial; trocas periódicas da fixação do tubo tanto para
higienização como também para a prevenção de
• hemodinâmico: freqüência cardíaca, pressão ar-
escaras labiais e auriculares;
terial, uso de drogas vasoativas.
Nos pacientes admitidos conscientes e em res- • escolha do ventilador mecânico: dependerá
piração espontânea o uso de oxigenoterapia é fre- basicamente da gravidade em que o paciente
qüente e têm com objetivo atenuar a hipoxemia e a se encontra, da necessidade de uma maior ou
hipóxia tecidual presentes e manter a SatO2 acima menor variedade de modalidades ventilatórias e
de 92%. melhor monitorização;
Já nos pacientes admitidos sob efeito anesté- • verificação do funcionamento adequado do
sico residual, em intubação traqueal e ventilação ventilador antes de conectá-lo ao paciente;
mecânica, a condição neurológica do paciente no • seleção da modalidade ventilatória e parâmetros
momento da admissão na UTI deverá orientar o ventilatórios iniciais: consiste na adequação do
fisioterapeuta quanto a escolha da modalidade ven- suporte ventilatório a condição clínica do pa-
tilatória, isto é, em pacientes onde a administração ciente tendo como objetivo principal a estabili-
anestésica encontra-se ao final do seu efeito e este zação da oxigenação e ventilação;
encontra-se já com drive respiratório, uma modali- • a monitorização contínua e a avaliação da con-
dade espontânea como a ventilação por pressão de dição do paciente e do sistema de ventilação
suporte (PSV) poderá ser aplicada. Já em pacientes devem ser realizadas repetidamente de modo

CAPÍTULO 208 2603


FISIOTERAPIA NO TRANSPLANTE
a constatar novas situações e a necessidade de prazo a realização de traqueostomia deve ser con-
novos aajustes e intervenções. Em relação a mo- siderada. Além das possíveis complicações cirúr-
nitorização ventilatória devem ser observados gicas que esses pacientes podem apresentar, outras
alguns itens como o volume-corrente inspirado complicações decorrentes da própria utilização da
e expirado, volume-minuto, freqüência respira- sedação, bloqueadores neuromusculares e ventila-
tória, sensibilidade de disparo do ciclo respirató- ção mecânica prolongada como a polineuropatia
rio, pico de pressão máximo, fração inspirada de do paciente grave podem ocorrer, levando também
O2 ofertada, relação I:E, mensuração do PEEP e a disfunção muscular respiratória (perda de fibras
presença de auto-PEEP, funcionamento e regu- musculares respiratórias e conseqüente fraqueza
lagem adequada dos sistemas de alarme e a veri- desta musculatura), resultando em mais uma causa
ficação da ocorrência de sincronia ou assincronia de insucesso no desmame. Normalmente, o insu-
ventilatória entre o paciente e o ventilador; cesso no desmame da ventilação mecânica rela-
cionado diretamente ao sistema respiratório se dá
• mensuração da pressão de cuff: realizada duas
basicamente pelo desequilíbrio entre a capacidade
vezes ao dia, rotineiramente nos períodos da
ventilatória e a demanda ventilatória do paciente.
manhã e tarde ou em outros períodos no caso de
novas admissões ou de acordo com necessidade O uso da ventilação não-invasiva (BIPAP ou
específica, com o objetivo de verificar e adequar CPAP) por meio de máscara facial ou facial total
suas pressões (preconiza-se pressões entre 20 a no pós-operatório de transplante na UTI se dá ba-
25 cm H2O) prevenindo tanto as lesões larín- sicamente nas seguintes situações:
geas e traqueais como a ocorrência de microas- • em pacientes que são extubados no POI e ao
pirações do conteúdo supra cuff decorrentes da longo dos dias de pós-operatório evoluem com
insuflação insuficiente; quadro de desconforto respiratório secundário a
distúrbios metabólicos, infecções respiratórias,
• manutenção da via aérea pérvia e melhora da
derrame pleural moderado ou volumoso, edema
condição pulmonar: consiste em um conjunto
agudo pulmonar, atelectasias ou comprometi-
de técnicas e ações realizadas pelo fisioterapeuta
mento do equilíbrio tóraco-abdominal princi-
tais como as manobras de higiene brônquica, palmente em cirurgias abdominais (mecânica
de reexpansão pulmonar, recrutamento alveolar ventilatória desfavorável);
quando necessário, aspiração traqueal e mudan-
• piora radiológica de etiologias diversas sem a
ças de decúbito;
presença de desconforto respiratório;
• acompanhamento de exames complementares
• hipercapnia excessiva;
relevantes ao paciente como radiografia toráci-
ca, tomografia computadorizada, ultra-sonogra- • em pacientes em que a extubação traqueal deve
fia, gasometria arterial e outros exames labora- ocorrer o mais breve possível, devido a possibili-
toriais. dade de que os riscos de complicações excedam
os benefícios gerados por sua utilização e que
Assim que estabilizada a causa que manteve o as condições respiratórias do paciente necessi-
paciente sob ventilação mecânica prolongada e te do uso da VNI para garantir a troca gasosa,
mais o preenchimento dos critérios para futura ex- expansibilidade torácica adequada e também
tubação, o processo de desmame ventilatório de- conforto respiratório. Neste sentido, alguns es-
verá ser iniciado e a extubação realizada o quanto tudos publicados têm mostrado diminuição do
antes possível. tempo de ventilação mecânica invasiva, porém
Nos casos dos pacientes sob ventilação mecânica sem evidência da diminuição do tempo total da
prolongada e sem perspectivas de extubação a curto utilização de suporte ventilatório. Outros estu-

2604
SEÇÃO 25
dos têm relacionado também a influência da ex- das sem sucesso, porém deve-se ter cautela devido
tubação precoce destes pacientes na redução dos a possíveis complicações como aerofagia e até mes-
cuidados intensivos e custos no transplante; mo pneumotórax, entre outras.
• quadro de insuficiência respiratória imediata- O fisioterapeuta deve encorajar e auxiliar o pa-
mente após extubação. ciente a tossir visando a eliminação de secreções
pulmonares.
Fisioterapia respiratória Se necessário, o fisioterapeuta deve solicitar ao
médico a prescrição de analgésico antes da terapia
As técnicas de fisioterapia respiratória têm como
para melhor realização dos exercícios e tolerância
principais objetivos a perviabilidade das vias aére-
a estes.
as, promover condições para adequada ventilação e
reexpansão pulmonar, prevenindo ou amenizando Deve-se encorajar a mobilização precoce do
complicações no período pós-operatório. paciente transplantado desde o período de perma-
nência na UTI (como movimentação de membros
A dor no pós-operatório é quase sempre asso-
inferiores e superiores, sedestação à beira do leito e
ciada a diminuição da expansibilidade torácica e
deambulação precoce quando possível). A mobili-
inibição da tose contribuindo para possíveis com-
zação precoce é indicada por proporcionar maior
plicações como atelectasia e acúmulo de secreção,
expansibilidade torácica e favorecer volumes inspi-
limitando a terapia. Portanto, o fisioterapeuta deve
ratórios maiores, além de prevenir os efeitos dele-
ser criterioso na escolha das técnicas a serem utili-
térios da imobilidade no leito que muitas vezes já
zadas, avaliando as condições do paciente.
estão presentes desde o período pré-operatório.
Manobras de higiene brônquica podem ser rea-
Cabe ao fisioterapeuta estar atento a todos os fa-
lizadas de acordo com a tolerância do paciente de-
tores no sentido de prevenir e/ou amenizar as com-
vido ao acúmulo de secreção pulmonar, já que os
plicações que se instalam no pós-operatório ime-
movimentos ciliares estão prejudicados; associando
a drenagem postural no intuito do favorecimento diato e tardio, tendo sempre em vista a recuperação
da ação da gravidade auxiliar na remoção das se- e melhora da capacidade funcional do paciente.
creções.
PLANO EDUCACIONAL E
Os exercícios respiratórios visam à reexpansão REABILITAÇÃO
ou ao aumento da expansibilidade pulmonar e
constituem-se de exercícios que encorajam ou as- Após a fase hospitalar, o paciente deverá ter
sistem pacientes com inspirações profundas para acompanhamento médico constante, estar atento
que o volume-corrente seja aumentado; entre eles às infecções e rejeições, assim como ao aumento ou
podemos citar o padrão respiratório diafragmático, modificação da coloração da secreção, febre, pros-
inspiração sustentada na capacidade pulmonar to- tração e volta da dispnéia.
tal, inspiração fracionada ou em tempos. O paciente deve ser orientado não só no mo-
Os incentivadores respiratórios também são mento da alta hospitalar, mas também durante toda
indicados como exercícios respiratórios para o au- a internação, que durante o período domiciliar de-
mento do volume pulmonar. verá continuar realizando exercícios respiratórios,
A utilização da pressão positiva intermitente deambulação e exercícios de baixa resistência para
(RPPI) pode ser utilizada principalmente nos casos a musculatura global.
de atelectasia, incapacidade de eliminar secreção Após liberação médica deverá acompanhar pro-
adequadamente e em pacientes não colaborativos grama de reabilitação principalmente para pacientes
em que outras formas de terapia já foram realiza- que realizaram transplante pulmonar e cardíaco,

CAPÍTULO 208 2605


FISIOTERAPIA NO TRANSPLANTE
se possível três vezes por semana, para melhora da freqüência cardíaca como visto em indivíduos nor-
capacidade física e conseqüentemente melhora da mais. O aumento da pressão arterial parece estar
qualidade de vida. mais relacionado ao aumento da resistência vascu-
Segundo alguns estudos, números maiores de lar periférica do que a uma melhor contratilidade
pacientes estão sendo encaminhados para a reabili- miocárdica ou a um débito cardíaco elevado.
tação cardíaca fase II e III logo após o transplante Um programa de exercícios físicos deve levar
(cerca de uma semana pós-alta ou conforme libe- em consideração: tipos de exercício, que devem ser
ração médica). cíclicos, como exercícios em bicicleta ergométrica
A prescrição do exercício para o paciente deve ou caminhadas na esteira; intensidade do exercício;
ter como base dados derivados do teste ergoespiro- duração, que preferencialmente deve ser em torno
métrico em esforço até a fadiga voluntária, utilizan- de 30 a 40 minutos de exercício aeróbio em cada
do protocolos de rampa ou de estado estável com sessão; e freqüência em média de duas a três vezes
acréscimos gradativo de 1 a 2 METs. A avaliação por semana. Devida importância deve ser dada aos
tem a função de identificar as diferentes fases meta- exercícios de resistência muscular localizada, alon-
bólicas do exercício progressivo máximo para a pos- gamento e flexibilidade e relaxamento.
sível programação das sessões de condicionamento.
A sensibilidade do eletrocardiograma ao exercício BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
nesse grupo de pacientes é baixa em termos de cap- II Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica. J Pneu-
tação de isquemia devido a denervação. mol 26(Supl 2):3-68, 2000.
As recomendações para intensidade do exercício American College of Sports of Medicine. Diretrizes do
para os transplantados cardíacos são de 60% a 75% ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. 6.
do VO2 máximo; taxa de esforço referido em torno ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2003.
de 11 a 15 na escala de Borg de esforço (6 a 20); Baz MA, Palmer SM, Staples ED et al. Lung transplan-
limiar ventilatório; e uso da escala de dispnéia. A tation after long-term mechanical ventilation. Chest
resposta inicial da freqüência cardíaca é atenuada e 119(1):224-7, 2001.
muitas vezes pode não corresponder a intensidade Chiavegato LD, Jardim JR, Faresin SM et al. Alterações
do exercício, por isso deve-se empregar cargas de funcionais respiratórias na colecistectomia por via
METs predeterminados, ou escalas de esforço ou laparoscópica. J Pneumol 26(2):1-15, 2000.
dispnéia como guias para a terapia. Períodos lon- Chatila WM, Furukawa S, Gaughan JP et al. Respi-
gos de aquecimento e desaceleração são benéficos, ratory failure after lung transplantation. Chest
pois as respostas fisiológicas ao exercício e à recupe- 123(1):165-73, 2003.
ração são mais lentas. Como resultado, o aumento Esteban A, Frutos-Vivar F, Ferguson ND et al. Non-
do VO2 de pico dependerá mais de uma adaptação invasive positive-pressure ventilation for respiratory
failure after extubation. N Engl J Med 350:2452-
periférica que propriamente central, já que o fa-
60, 2004.
tor mais influenciado pelo treinamento físico é a
Hall JC, Tarala RA, TapperJ, Hall JL. Prevention of res-
diferença arteriovenosa de oxigênio. Esse processo
piratory complications after abdominal surgery: a
adaptativo muscular melhora a capacidade funcio- randomized clinical trial. BMJ 312:148-52, 1996.
nal e, conseqüentemente, a qualidade de vida dos
Lee JH, Jawan B, Fung ST et al. Respiratory manage-
pacientes. ment of orthotopic liver transplant patients. Trans-
Pacientes com transplante cardíaco respondem plantation Proceedings 28(3):1693-4, 1996.
ao exercício isométrico com elevação normal ou Lenner R, Padilla ML, Teirstein AS et al. Pulmonary
esperada da pressão arterial (PA), tanto sistólica complications in cardiac transplant patients. Chest
como diastólica, em contraste com elevação da 120(2):508-13, 2001.

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SEÇÃO 25
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FISIOTERAPIA NO TRANSPLANTE

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